INFORME C3 - EDIÇÃO 09

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INFORME C3Edição 09 – Mar/Abr - 2010“Pré-natalTempo de gestação”Criatividade/Invenção/Descobertas/PossibilidadesQual a relação entre criar, descobrir e inventar? Falar de criação é falar de possibilidades de fazer e pensar algo, e são essas possibilidades que permitem vislumbrar um panorama que indica quais os caminhos que se pode escolher. Que escolhas fazer? A gestação em seres humanos tem uma previsão de 9 (nove) meses que seria o tempo para a criação, para o desenvolvimento do feto. E o criar de um modo geral tem um tempo estabelecido? Se pensarmos que tudo está em processo, tudo está em constante construção, podemos pensar em estar sempre em criação?

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Foto: Anderson de Souza

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“Pré-natal - Tempo de gestação”Criatividade/Invenção/Descobertas/Possibilidades

Qual a relação entre criar, descobrir e inventar? Falar de criação é falar de possibilidades de fazer e pensar algo, e são essas possibilidades que permitem vislumbrar um panorama que indica quais os caminhos que se pode escolher. Que escolhas fazer? A gestação em seres humanos tem uma previsão de 9 (nove) meses que seria o tempo para a criação, para o desenvolvimento do feto. E o criar de um modo geral tem um tempo estabelecido? Se pensarmos que tudo está em processo, tudo está em constante construção, podemos pensar em estar sempre em criação?

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Informe C3 - 05

Título provisório da Edição: DA RUA PARA...Contextualização/Apropriação/Atenção/Distancimanto

A rua, o fora, o distante... É importante estar atento para o que acontece e se apresenta fora do meio em que habito. Assim talvez seja possível transitar por outros territórios e se apropriar de elementos que despertem identificação e estranhamento. Porém é importante pensar em como contextualizar esse outro, que está fora, do outro lado, talvez distante da “realidade” que faz parte do meu dia-a-dia. Como conviver, aceitar, acolher e contextualizar o estranho, o estrangeiro o ser da rua?

Próxima Edição - Maio/2010Colabore/contato: [email protected]

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EXPEDIENTE

Direção Geral e Coordenação Editorial:Wagner Ferraz

Pesquisa e Organização:Processo C3 Grupo de Pesquisa

Anderson de Souza, Francine Pressi e Wagner Ferraz

Projeto Gráfico e Direção de Arte:Anderson de Souza e Wagner Ferraz

Produção Gráfica e Edição de Arte:Anderson de Souza e Wagner Ferraz

Colaboradores/colunistas:Rodrigo Monteiro - Porto Alegre/RS/Brasil - www.teatropoa.blogspot.com;

T. Angel - Frrrk Guys - São Paulo/Brasil- www.frrrkguys.com;Luciane Moreau Coccaro - Porto Alegre/Rio de Janeiro;

Marta Peres - Rio de Janeiro/Brasil;Mário Gordilho - Espírito Santo/Brasil.

Conselho Editorial:Luciane Moreau Coccaro (UFRJ/RJ); Marta Peres - (UFRJ/RJ); Anderson

L. de Souza (SENAC/Moda e Beleza - Processo C3); Francine Pressi (Processo C3); Wagner Ferraz (Processo C3 e Terpsí Teatro de Dança);

Rodrigo Monteiro - Critica Teatral/Porto Alegre/RS; Betina Guedes - (UNISINOS/rs)

Apoiadores/Espaços para divulgação:Wagner Ferraz

Contatos:Wagner Ferraz

[email protected]

www.processoc3.comwww.processoc3.blogspot.com

www.processoc3.ning.com

O Processo C3 Grupo de Pesquisa é uma ação em parceria com a Terpsí Teatro de Dança

Informe C3 Revista DigitalProcesso C3 Grupo de PesquisaPorto Alegre/Canoas/São Leopoldo

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Capa:Barriga de Wagner Ferraz

Foto:Anderson de Souza

Local:Canoas/RS/Brasil

Edição:Anderson de Souza

Direção de Arte:Wagner Ferraz

Ano 02 - Edição 09Março e Abril/2010

BibliografiaFERRAZ, Wagner (orgs.). “Informe C3: Pré-Natal - Tempo de Gestação: Criatividade/ Invenção/ Descobertas/ Possibilidades. Canoas, RS: março e habril de 2010. On line. Disponível em: http://www.processoc3.com

Classificação: 18 anos

O conteúdo apresentado pelos colaboradores (textos, imagens...) não são de responsabilidade do Processo C3 Grupo de Pesquisa e da Informe C3 Revista Digital. Nem todo opinião expressa neste meio eletrônico ou em possível verão impressa, expressam a opinião e posicionamento dos organizadores por determinados assuntos.

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APRESENTAÇÃO - Gestando esta ediçãoWagner Ferraz

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ÍNDICE

08 - Informe C3

ENSAIO 01 - A criação de uma Política Cultural para a ModaWagner Ferraz

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ENSAIO 02 - Gerando o GrávidaLuciane Coccaro

26

ENSAIO 03 - Propostas Criativas: Saint-Étienne – Cité Du DesignAnderson de Souza

32

ENSAIO 04 - O que faz o gesto cotidiano se transformar em arte?Marta Peres

40

ENSAIO 05CowParade São Paulo 2010Francine Pressi

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Informe C3 - 09

ENTREVISTA - O CORPO EM MODIFICAÇÃO - Rev Lincoln Taka EldgeT. Angel

50

ESPAÇO LIVRE - A Vácuo – QuitandaGiltanei Amorim

64

ENSAIO 06 - SÃO PAULO COMPANHIA DE DANÇA: A criação recente de uma proposta de estímuloWagner Ferraz

80

CRÍTICA TEATRAL - F5 teatralRodrigo Monteiro

92

ENSAIO 07 - Da gestação ao nascimento: A obra como processoFRANCINE PRESSI

100

POEMA - PropósitoMário Gomes Jr

103

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Foto: Anderson de Souza

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“Pai é quem cria!”

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Agradecimentos desta edição

Terpsí Teatro de DançaPorto Alegre/RS/Brasil

www.terpsiteatrodedanca.blogspot.com

T. Angel - Frrrk GuysSão Paulo/Brasil

www.frrrkguys.com

Rodrigo MonteiroPorto Alegre/RS/Brasil

www.teatropoa.blogspot.com

Marta PeresRio de Janeiro/Brasil

Luciane Moreau CoccaroRio de Janeiro/RJ/Brasil

Mário GordilhoEspírito Santo/Brasil

Katia AndradeSão Paulo/SP

Cláudio EtgesPorto Alegre/RS

CCBB São PauloSão Paulo/SP

Renato SassSão Paulo/SP

Magaly Corgosinhoc.h2a Comunicação

São Paulo/SP

São Paulo Companhia de DançaIracity Cardoso, Inês Bogéa e

Marcela BenvegnuSão Paulo/SP

João CaldasSão Paulo/SP

Reginaldo AzevedoSão Paulo/SP

André PortoSão Paulo/SP

Rev Lincoln Taka EldgeCape Town - África do Sul

Giltanei AmorimSalvador/Bahia

Aldren LincolnSalvador/Bahia

Betânia DutraPorto Alegre/RS

KyranPorto Alegre/RS

Julio AndradePorto Alegre/RS

Agradecemos também a todos que de forma diretaou indireta colaboraram com o Processo C3 Grupo

AGRADECIMENTOS

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“Gestar” essa edição da Informe C3 foi extremamente prazeroso apesar de demorado. Com a correria da vida urbana nesse mundo contemporâneo, tão diversificado, onde nossas atividades diárias se desdobram em mui-tas ações, o tempo pode ser percebido como algo líquido (lembrando Baumann) que escorre por entre os dedos.

Pensar, organizar, aproximar colaboradores para falar sobre “Criatividade/Invenção/Descobertas/Possibi-lidades”, me fez descobrir o quanto o resultado que se busca em um processo de criação está muitas vezes esbar-rando no tempo. Poderia desviar o foco, ou relacionar o assunto “Criatividade” a visão relativa de “Tempo”. Porém, vou tentar aproveitar o “tempo” ao máximo e apresentar o que foi construído nesta edição.

Ao elaborar o release que se apresenta a seguir, estava estimulado por determinadas informações e co-nhecimentos, que com o passar o do tempo (mais uma vez venho falar no tempo), minhas vivências foram construin-do constantemente minhas identificações e automaticamente alterando essas informações que me constituiem. Mas fico muito feliz de ter pessoas colaborando, buscando formas de falar sobre: “Qual a relação entre criar, descobrir e inventar? Falar de criação é falar de possibilidades de fazer e pensar algo, e são essas possibilidades que permitem vislumbrar um panorama que indica quais os caminhos que se pode escolher. Que escolhas fazer? A gestação em seres humanos tem uma previsão de 9 (nove) meses que seria o tempo para a criação, para o desenvolvimento do feto. E o criar de um modo geral tem um tempo estabelecido? Se pensarmos que tudo está em processo, tudo está em constante construção, podemos pensar em estar sempre em criação?”

Dessa forma, o que fui (fomos) gestando e criando no decorrer dos meses - nasceu. A esperança era de falar de criação sem cair em certos clichês, mas muitas vezes se parte de muitos clichês, mas isso será definido pelo olhar e compreensão do leitor que fará suas conclusões. Talvez assim possa-se se falar em um clichê relativo... Será?

O interessante é que diferentes formas de falar do assunto foram abordadas, através de textos, de ima-gens e da construção de um cenário onde essas possibilidades estão sendo apresentadas. Fico feliz com a partici-pação de tantos colaboradores que estão “juntos” de “nós”, e de outros que vão se aproximando.

Espero que os assuntos desta edição sejam importantes para os leitores, mesmo que seja para perceber que algumas idéias não servem para auxiliar na busca de seus objetivos. “A criação de uma Política Cultural para a Moda” (texto escrito por mim) vem para despertar atenção para as mudanças nas políticas culturais no Brasil, onde agora a Moda está inserida. “Gerando o Grávida” de Luciane Coccaro (UFRJ) vem apresentar o processo criativo de um espetáculo de dança que teve a gestação como foco. A cobertura da exposição “Saint-Étiene Cite Du Design” feita por Anderson de Souza (Processo C3) fala das obras apresentadas no Centro Cultural Banco do Brasil de SP, colocando em voga a criação neste segmento. Marta Peres (UFRJ) fala sobre “O que faz o gesto cotidiano se transformar em arte?”, de forma poética, simples e como sempre muito inteligente. “CowParade São Paulo 2010” foi relatado por Francine Pressi (Processo C3) e teve o registro fotográfico feito por Anderson de Souza. T. Angel (Frrrk Guys) sempre com suas ousadas e instigantes colaborações, nos apresenta as curiosíssimas modificações corporais de Rev Lincoln Taka Eldge (Cidade do Cabo - África do Sul). Em nosso primeiro Espaço Livre, Giltanei Amorim trás fotos e informações sobre seu espetáculo A Váculo do Quitando, aparentemente desprendido de muitos códigos vigentes na dança, o trabalho apresentado na rua mostra uma proposta estética contemporânea e muito ousada (gostaria muito de assistir). Eu, apresento a São Paulo Companhia de Dança, projeto recente (2 anos) que tem proporcionado difusão da dança, formação profissional, formação de platéia e empregado bailarinos. Rodrigo Monteiro (Crítica Teatral) está conosco novamente com um texto que leva a pensar sobre a criatividade para escre-ver um texto, apesar de não ter sido esse seu foco, mas a forma como escreve pode auxiliar (para alguns) a pensar sua escrita. Francine Pressi e Mário Gomes encerram esta edição - Francine questiona a criação em dança e Mário apresenta seu poema “Propósito”. Além da divulgação do Colóquio de Moda, fotos da Terpsí Teatro de Dança, frases de grandes criadores e pesquisadores sobre o assunto...

Desejo que essa edição desperte algo que sirva para seus processos criativos, esse assunto tão clichê como já falei anteriormente, mas que está sempre presente em diferentes sociedades. Aproveitem e sintam-se a vontade para colaborar e dialogar conosco.

Obrigado aos colaboradores e leitores!!!

AbraçoWagner Ferraz

Editor – [email protected]

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Apresentação - Gestando esta edição

APRESENTAÇÃO

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Foto: Anderson de Souza

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Algumas criações perturbam,porém fogem do clichê

Algumas criações perturbam, incomodam, irritam... Colocam muitos sob o estímulo de intensas sensações e em um redemoinho de idéias onde estas se cru-

zam como redes. Mas essas criações fogem do clichê ou se utilizam das idéias e assuntos já considerados muitas vezes esgotados, para

falar do que muitas outras obras falam, porém de um ponto de vista “dife-rente”, ousado e provocativo, convi-

dando a desnaturalizar o que está acomodado por se con-siderado “natural” (óbvia observações, mas foi proposital). Despertando assim

para uma possível compreensão de que a cultura é cons-truída, produzida e inventada, e as

criações artísticas são construções que se utilizam de diferentes visões, de diferentes focos, de diferentes lentes...

Wagner Ferraz

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Foto: Cláudio etgesIntérprete: Angela SpiazziEspetáculo: “Ditos e Malditos: Desejos da Clausura” - 2009 Direção e Coreografia: Carlota Albuquerque

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A noção de cultura de um ponto de vista antropológico, pode ser compreendida resumidamente como os costumes, valores, crenças, práticas e escolhas de diferentes so-ciedades e/ou grupos sociais. Muito das prá-ticas culturais podem ser observadas através das diferentes manifestações da humanida-de, seja nas artes, na comida, no vestuário, na arquitetura... Para estimular e fomentar a produção resultante dessas manifestações se faz necessário a criação de políticas culturais específicas para diferentes setores.

No Brasil a criação de uma política cultural já se deu há algum tempo, porém com algumas restrições onde muitos setores da cultura brasileira não foram beneficiados. Esta política está voltada para fomentar algumas di-ferentes manistações através de incentivo que possibilita a produção, difusão, manunteção e criação de artefatos culturais que são conside-rados de grande importância para a constru-ção da(s) identidade(s) do nosso país.

As políticas culturais no Brasil estão passando por grandes modificações, inserindo na pauta da Ministério da Cultura diferentes áreas que até o presente momento não rece-biam incetivos, mesmo sendo reconhecidas como manifestação cultural do país. Para su-prir essa carência foram criadas Setoriais de Cultura, e aqui falo especificamente da recém criada Setorial de Moda. Através dessa setorial alguns representantes da classe, que compar-tilham da “produção” da cultura, participaram de discussões em março de 2010 em Brasília, para fomentar a criação de uma política cultu-ral voltada para a Moda.

BRANDT (2002)[1] esclarece que para Teixeira Coelho, em seu Dicionário Crítico de Política Cultural, essa política voltada para a cultura pode ser compreendida como:

“programa de intervenções realizadas pelo Es-tado, instituições civis, entidades privadas ou grupos comunitários com o objetivo de satis-fazer as necessidades culturais da população e promover o desenvolvimento de suas repre-sentações simbólicas”.

A partir dessa visão sobre política cultural, é possível compreender que esse programa de intervenções pode proporcionar diferentes produções da Moda Brasileira.

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A Moda merece uma atenção espe-cífica no panorama cultural brasileiro onde ela já ocupa um lugar e papel de grande importân-cia. De acordo com o blog da Setorial de Moda, entre os dia 07 e 09 de março do presente ano, mais de 60 pessoas se reuniram em Brasília na Pré-Conferência Setorial de Moda para discutir e construir propostas que resultaram em um “documento que começa ser esboçado como um plano setorial de moda”[2]. Entre os presentes estavam Paulo Borges (SP), Ronal-do Fraga (MG), Maria Auxiliadora Goya Lopes (BA) e muitos outros que com sua participa-ção confirmaram a necessidade de atenção do Ministério da Cultura para a Moda. Mostrando assim que a Moda já possui representantes e que há uma organização voltada para as Polí-ticas Culturais.

Foi por meio da participação de al-guns representantes na Pré-conferência Se-torial de Moda, que se elegeu os delegados setoriais de Moda que representaram seus estados e a moda brasileira na II Conferên-cia Nacional de Cultura (11 a 14 de março). Estavam presentes os (as) delagados (as) da Moda: Maria Auxiliadora Goya Lopes (BA), Jander Mendes Pontes (CE), Maria da Con-ceição da Silva Matos (RR), Cassiane Dantas (PA), Margareth Rose Santos Alves (DF), Cla-rice Ferreira (SP), Luís Fortunato (RJ), Doro-teia Barduy Pires (PR), Luciano Cenci (BA) e Fatima Leite da Costa (RJ), infelizmente não havia nenhum representante do RS. “Nossa primeira Conferência Pré Setorial teve grandes dificuldades em seu processo de preparação. Haja vista que muitos foram os estados que não enviaram representantes e, por exemplo, toda a região Sul do Brasil teve apenas uma delegada” [3]. CENCI, Luciano (2010)

Onde estão os representantes da Moda do Rio Grande do Sul? Será falta de interesse dos gaúchos pelo assunto? Será falta de informação, de conhecimento sobre a criação de uma política cultural para a Moda? A ausência de uma representação gaúcha, de profissioanis, de estudantes e pesquisadores que compreendam as necessidades para a produção da Moda é preocupante. Aproveito para lançar a seguinta pergunta: Quem está preparado ou atento no RS para elaborar e gerenciar Projetos Culturais com o o foco na moda? Podendo assim organizar estratégias para fortalecer o setor da Moda e receber fi-nanciamento para viabilizar produções, cria-

ENSAIO 01

A criação de uma Política Cultural para a Moda

Wagner Ferraz*

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ções, geração de renda e ensino? Os prepara-dos para as questões citados ou interessados, estejam atentos para os próximos aconteci-mentos pautados para a construção de uma Política Cultural de Moda.

Independente da situação represen-tacional de moda salientada acima, os repre-sentantes (delegados) já citados anteriormente participarão da eleição que constituirá o Con-selho Nacional de Políticas Públicas (CNPC).

“A eleição da lista tríplice de onde saem os nomes para ocupar a cadeira no Conselho Nacional de Políticas Culturais (CNPC) deve ser feita somente no Seminário de Moda que o Ministério da Cultura irá organizar ainda no pri-meiro semestre. Até lá, o blog segue sendo o principal canal de diálogo. Participem e dêem as suas sugestões”[4].

É possível ficar por dentro do que está acontecendo, antes de ocorrer este Se-minário de Moda acompanhando o blog http://culturadigital.br/setorialmoda/, neste além de esclarecimentos e informações sobre o que já aconteceu e o que virá a contecer, é possível dialogar com outros interessados no assunto. Luciano Cenci, um dos representates da Moda, dividiu algumas observações no blog através de um texto intitulado “Avaliação das conferên-cias e proposta de Seminário da Moda” onde diz que:

“A surpresa e até a resistência de alguns de-legados de outros setores abordados por nos-sas propostas mostra que estamos dando os primeiros passos numa luta que é, principal-mente, pela conscientização nacional de que moda pode ser arte e é cultura. Moda, sobre-tudo, não é modismo! Este equívoco ainda é a grande armadilha em que caem os desavisa-dos devido à imagem estereotipada difundida pela grande mídia e, portanto, se coloca como um dos maiores obstáculos as nossas propos-tas e nossa organização.[5]” CENCI, Luciano (2010)

As palavras de Cenci, alertam para a importância de a cada dia firmarmos nossa posição e esclarecer mais sobre a Moda, bus-cando sair apenas deste “equívoco” de uma imagem “estereotipada” da moda. A Moda está em tudo, na arquitetura, nos cabelos, nas gí-rias, nas palavras, nos corpos, no turismo, na dança… A Moda está totalmente ligada aos costumes e valores de cada grupo social que constrói suas identidades através de vivências que vão se modificando o tempo todo. Por isso podemos ver a Moda como Cultura, constru-ída pelo homem e em constante construção, modificação, alteração, guiada pelos valores vigentes que podem ser substituidos por mui-tos outros amanhã. O mundo pós-moderno… Moda é Cultura e merece uma atenção espe-cifica como o que está sendo feito “agora”.

Para fomentar essa ideia de que Moda é Cultura, cinco estratégias(eixos) fo-ram aprovadas na Pré-Conferência Setorial de Moda. Essas foram apresentadas pelos representates eleitos do setor na II Conferên-cia Nacional de Cultura. Confira as propostas aprovadas:

Eixo I – Produção simbólica e diversidade cul-tural Registrar de maneira multimídia, organizar e promover as memórias que formam a identi-dade cultural material e imaterial da moda bra-sileira por meio de recursos públicos, conside-rando as diversidades locais. Eixo II – Cultura, cidade e cidadania Promover a articulação interministerial para formação e qualificação do profissional da moda, fomentar estudos e pesquisas que ma-peiem, a partir do território, a interdisciplinari-dade e diversidade do setor e potencializar as microrregiões com a realização de projetos de moda.

Eixo III – Cultura e desenvolvimento susten-tável Financiar projetos de geração de emprego e renda, promover estudos de mapeamento e fomento de processos sustentáveis na moda com reafirmação cultural em grupos/comuni-dades por meio de políticas de capacitação, profissionalização e estímulo à produção e à circulação.

Eixo IV – Cultura e Economia Criativa Elaborar editais públicos específicos para o se-tor de moda e fomentar parcerias com órgãos públicos e privados para a consolidação das atividades de grupos acadêmicos, experimen-tais e oriundos da sociedade civil organizada com ações nacionais e internacionais. Eixo V – Gestão e institucionalidade da Cul-tura Promover a institucionalização da Moda no Ministério da Cultura por meio da criação: do Fundo Nacional da Moda; do Comitê da Moda; e da agenda propositiva de trabalho com o Mi-nistério da Cultura.[6]

Todos os eixos definidos trazem questões fundamentais para pensar e desen-volver práticas na moda. Acredito que se tudo for de acordo como os eixos estão apresen-tando teremos muitos profissionais, pesquisa-dores e estudantes de moda com mais “espa-ço” e “financiamento” para desenvolver suas propostas mais próximas da sociedade em geral. Talvez com esses eixos voltados para questões culturais possa-se legitimar mais a moda que não seja somente uma moda eli-tizada e dita “descolada, de luxo, ou do bom gosto”. A Moda é construida pela cultura e a cultura pode ser construida pela moda.

Outro ponto importante é pensar no número de profissionais na área da gestão e produção cultural, que tem a cada dia mais aumentado em decorrencias dos cursos livres, de graduação e de pós-graduação voltados para esse assunto. Com uma representação da moda no Ministério da Cultura aumentará o mercado de trabalho para esses profissio-nais que poderão dar assessoria para profis-sionais, estudantes e pesquisadores da moda na elaboração e gerenciamento de projetos. Complementado tudo isso, cito o Manifesto “A Cultura está na Moda”.

Assim como a cultura está na moda, chegou a hora da moda ser entendida como arte e

cultura. O setor da moda representa o quarto maior PIB do país. Neste sentido, queremos ampliar a compreensão geral de que a moda, envolvendo o setor têxtil, pequenas e grandes confecções, indústrias, estilistas, costureiras, bordadeiras e muitos outros trabalhadores, está ligada e presente em todos os outros se-tores culturais através das interações de seus criadores com a cultura popular, a música, a arte visual e digital, a arquitetura, etc . E, por isso mesmo, é atualmente líder em geração de empregos.[7]

Após a Pré-conferência de Moda onde os cinco eixos foram descutidos, e após a apresentação desses eixos na II Conferência Nacional de Cultura (CNC) foram elaboradas duas moções[8] que foram encaminhadas, na mesma conferência, pelos delegados da Moda e conseguiram a adesão de mais de 200 de-legados cada. Os 10 delegados setoriais da Moda tiveram uma particiação bastante rele-vante mostrando a importância da Moda como um setor cultural bem organizado. Segue a moção aprovada.

Moção 23 (aprovada) Nós delegados da II Conferência Nacional de Cultura, reunidos em Brasília no período de 11 a 14 de março de 2010, consideramos que “a cultura está na moda e a moda está na cultura” chegou a hora da moda ser entendida como arte e cultura. O setor da moda representa o 4º maior PIB do país. Neste sentido, queremos ampliar a compreensão geral de que a moda – setor têxtil e do vestuário contemplando os ar-ranjos produtivos locais, representado por mi-cro, pequenas e médias empresas, presentes em todos os setores culturais que se seguem: A) Teatro, cinema, circo, dança (figurino) B) Musica (figurino, trilha sonora) C) Arquitetura (projeto de ambiente e arquite-tura da moda) D) Cultura popular, indígena, afro-brasileira (influência cultural, ancestralidade, figurino, técnicas artesanais, ambiência) E) Artes visuais, digitais (influência estética, recursos técnicos e tecnológicos) F) Livro, leitura e literatura (registro, temas, ilustrações) G) Museu (conteúdo e expositivo) H) Patrimônio material e imaterial (legitimação da memória dos ofícios) I) Design (Referência estética e conceitual) Entendemos e pedimos apoio para viabilizar projetos culturais de inclusão social e forma-ção profissional nos níveis técnicos, tecnológicos e científicos que possibilitem dos meios de produção, promova processos sustentáveis que resultem na formalização da indústria criativa de moda e o design como diferencial competitivo nas comunidades es-tratégicas para o desenvolvimento cultural re-gional.[9]

É importante compreender que toda essa mobilização é de grande importância para profissionais, pesquisadores e estudan-tes de moda, que neste momento de destaque na historia da Moda no Brasil, estão sendo representados por profissionais que tem se preocupado com “rumo” da moda brasileira. É possível pensar em grandes surpresas pela frente, é possível pensar em colher resultados

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dessa luta que está se iniciando para a criação de uma política cultural para a Moda, constituí-da de estratégias voltadas para a capacitação, formação e fomento na área da Moda.

É fundamental para impulsionar ainda mais este setor e gerar ainda mais oportunidades à população, a implementação de programas legitimamente culturais, que promovam sua aproximação das capacitações, profissionali-zações e fomentos ao know how acumulado por estilistas e designers. Isto possibilitaria uma produção de mais e mais qualidade, soli-dificando assim, as iniciativas de inserção des-ta produção, absolutamente cultural e social, aos mercados nacionais e internacionais.

Diante disso, propomos à CNC 2010: Financiar projetos de geração de emprego e renda, promover estudos de mapeamento e fomento de processos sustentáveis na moda com reafirmação cultural em grupos/ comuni-dades por meio de políticas de capacitação, profissionalização e estímulo à produção e à circulação.

Promover a institucionalização da moda no Ministério da Cultura por meio da criação: do Fundo Nacional da Moda; do Comitê da Moda; e da Agenda Propositiva de Trabalho com o MinC. (Propostas defendidas no Eixo III – Cul-tura e Desenvolvimento Sustentável)[10].

Serão essas propostas que auxilia-rão a fortalecer e legitimar a Cultura da Moda no Brasil? Será realmente criado um Fundo Nacional de Moda, um Comitê da Moda e uma Agenda Propositiva de Trabalho com o MinC? De agora em diante, talvez, tudo isso e muito mais seja possível, porém é de grande impor-tância a participação e empenho de todos os interessados para que esse movimento em prol da criação de uma Política Cultural para a Moda se fortaleça e alcance resultados “satis-fatórios”, ou pelo menos estimulantes. Por isso se faz necessário a organização de todos do setor da Moda como salienta Luciano Cenci:

Já conquistamos espaço. Depois desta sema-na em Brasília a presença da moda na cul-tura brasileira não é mais a mesma. O MinC é o nosso grande aliado. Precisamos aguçar nossa atenção, arrumar tempo, fortalecer e acelerar nosso processo de organização para recuperar o tempo perdido no mangue da de-sorganização e corresponder ao que milhares de pessoas do setor da Moda e o próprio MinC espera de nós[11]. CENCI, Luciano (2010)

Assim como a Política Cultural para a Moda está em criação, em construção, tam-bém se encontram as idéias deste artigo. Es-pero que amanhã este texto já esteja desatu-alizado, isso será um sinal de que muito já se fez pelo setor da moda na cultura brasileira. Se os sujeitos da Moda passarem a criar seus projetos e propostas para a Cultura da Moda no Brasil, já poderemos sugerir e solicitar que as estratégias traçadas para a Moda sejam co-locadas em práticas para fomentar e fortalecer a Cultura da Moda ou a Moda como Cultura.

NOTAS:[1] BRANDT, Leonardo. Mercado Cultural: Pa-norama crítico com dados e pesquisas e guia prático para gestão e venda de projetos. 3ª Ed. – São Paulo: Escrituras Editora, 2002. [2] Informação obtida em diálogo com Lauro dos Santos Mesquita no blog da Setorial de Moda. Lauro é o responsável pela comunicação da Coordenação Geral de Economia da Cultura e de Estudos Culturais da Secretaria de Polí-ticas Culturais do MinC. Disponível em: http://culturadigital.br/setorialmoda/2010/03/10/confira-as-cinco-estrategias-aprovadas-na-pre-conferencia-setorial-de-moda/#comment. Acessado em: 13/03/2010

[3] CENCI, Luciano (2010) em “Avalia-ção das conferênciais e proposta de Se-minário da Moda”. Disponível no blog da Setorial de Moda - http://culturadigital.br/setorialmoda/2010/03/22/avaliacao-das-con-ferenciais-e-proposta-de-seminario-da-moda-por-luciano-cenci/. Acessado em 24/03/2010. [4] Informação disponível em: “Conheça os dez delegados setoriais da Moda na CNC” no blog da Setorial de Moda http://culturadigital.br/setorialmoda/2010/03/10/conheca-os-dez-delegados-setoriais-da-moda-na-cnc/. Aces-sado em: 12/03/2010. [5] CENCI, Luciano (2010) em: “Avalia-ção das conferênciais e proposta de Se-minário da Moda”. Disponível no blog da Setorial de Moda http://culturadigital.br/setorialmoda/2010/03/22/avaliacao-das-con-ferenciais-e-proposta-de-seminario-da-moda-por-luciano-cenci/. Acessado em: 24/03/2010. [6] Informações pesquisadas no texto: “Con-fira as cinco estratégias aprovadas na Pré-Conferência Setorial de Moda”. Disponível no blog da Setorial de Moda: http://culturadigital.br/setorialmoda/2010/03/10/confira-as-cinco-estrategias-aprovadas-na-pre-conferencia-se-torial-de-moda/ Acessado em: 12/03/2010

Foto: Anderson de Souza

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[7] Citação retirada do texto: “MANIFESTO “A CULTURA ESTÁ NA MODA”, texto assi-nado por Luciano Cenci (Moda-BA); Luciana Galeão (Moda - BA); Júnia Martins (Comuni-cação-BA); Francisco Weyl (Audiovisual-PA); Viviane Martins (Moda-RJ); Tereza Accioly (Música-PE); Valber Almeida (Cultura Po-pular Tradicional-PB); Cassiane Dantas (Moda-PA). Disponível em: http://culturadi-gital.br/setorialmoda/2010/03/22/manifesto-%E2%80%9Ca-cultura-esta-na-moda/. Aces-sado em: 24/03/2010. [8] MOÇÃO é uma forma de registrar a apro-vação ou discordância de pessoas ou grupos, dentro de uma assembléia, conferência ou evento que permita estatutariamente tal ato. É uma proposta, acerca do estudo de uma questão, ou relativa a qualquer incidente que surja no evento, manifestando apoio ou repú-dio ao encaminhamento dado ao assunto em questão. A Moção, para ser incorporada como Moção de Conferência ou de Assembléia, é submetida à Plenária Final para delibera-ção”. Disponível em: http://resistenciavaiana.blogspot.com/2009/08/avai-recebe-mocao-de-aplauso.html. Acessado em: 27/03/2010.

[9] Conteúdo pesquisado em: “Delega-dos da Moda conseguem a aprovação de moção na II CNC”. Disponível no blog da Setorial de Moda: http://culturadigital.br/setorialmoda/2010/03/22/delegados-da-moda-conseguem-a-aprovacao-de-duas-mocoes-na-ii-cnc/. Acessado em: 24/03/2010 [10] Trecho extraído de: MANIFESTO “A CUL-TURA ESTÁ NA MODA”. Assinado por: Lucia-no Cenci (Moda-BA); Luciana Galeão (Moda -BA); Júnia Martins (Comunicação-BA); Fran-cisco Weyl (Audiovisual-PA); Viviane Martins (Moda-RJ); Tereza Accioly (Música-PE); Val-ber Almeida (Cultura Popular Tradicional-PB); Cassiane Dantas (Moda-PA).” Disponível no blog da Setorial de Moda em: http://culturadi-gital.br/setorialmoda/2010/03/22/manifesto-%E2%80%9Ca-cultura-esta-na-moda/. Aces-sado em : 24/03/2010.

[11] Conteúdo apresentado por Luciane Cenci (2010) no texto “Avaliação das conferênciais e proposta de Seminário da Moda”. Disponível no blog da Setorial de Cultura http://cultura-digital.br/setorialmoda/2010/03/22/avaliacao-das-conferenciais-e-proposta-de-seminario-da-moda-por-luciano-cenci/. Acessado em: 24/03/2010.

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* Wagner Ferraz: Diretor do Processo C3 Grupo de Pesquisa, desenvolve trabalhos, pesquisas e escreve sobre Corpo/Cultura/Artes/Moda; Editor da Informe C3 Revista Digital; Cursa Pós-Graduação em Gestão Cultural e Educação Especial; Graduado em Dança; Atua como Assessor da Co-ordenação de Cultura da ULBRA; Presta Assessoria para elaboração de Projetos Culturais; Coordenador responsável pelo site www.processoc3.com. Endereço para acessar CV completo: http://lattes.cnpq.br/7662816443281769

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O Colóquio de Moda é o maior congresso científico de moda no Bra-sil e se apresenta como espaço de intercâmbio acadêmico entre estudantes e pesquisadores de vários Programas de Graduação e Pós-Graduação. Acon-tece anualmente desde 2005 e a Universidade Anhembi Morumbi acolherá a 6ª edição do evento recebendo seus participantes e integrando, dessa forma, pessoas que buscam refletir sobre o avanço científico, tecnológico e cultural no campo da moda.

Tem a missão de proporcionar o encontro entre pesquisadores, aca-dêmicos, profissionais de Moda e áreas de aderência, Psicologia, Sociologia, Marketing, Jornalismo, Administração, Artes Plásticas, Design e História e pro-mover a reflexão, o questionamento, a integração e relações entre as várias formas de abordagem da moda.

Aberto a acadêmicos (pesquisadores, professores e alunos) e pro-fissionais de Moda, bem como da área do Design, Artes Plásticas, Arquitetura, Comunicação, História, Figurino, Psicologia, Sociologia, Antropologia, Marke-ting, Jornalismo, Administração e áreas afins.

Período: 12, 13, 14 e 15 de setembro.

Dia 16 de setembro – V Fórum das Escolas de Moda

Local: São PauloUniversidade Anhembi Morumbi –

Escola de Artes, Arquitetura, Design e Moda

Fonte: http://www.facebook.com/pages/Coloquio-de-Moda/285057383491?ref=ts#!/pages/Coloquio-de-Moda/285057383491?v=info

http://www.coloquiodemoda.com.br

Informações:www.coloquiodemoda.com.br

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Nasceu!

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O que o verbo gerar pode nos suge-rir num contexto de criação em dança? Tenho pensado muito na ideia de pesquisa em dança contemporânea. Tenho pensado muito sobre processos de criação num espetáculo dito au-toral. Tenho pensado muito e, estimulada pelo tema gestação proposto nesse número da re-vista gostaria de compartilhar com os leitores uma experiência de gestação de um espetácu-lo de dança contemporânea.

O Grávida foi gerado na tentativa de união de duas pesquisas: uma, antropológica, tendo como campo temático corpo e saude, e a outra na área da metodologia de criação co-reográfica, pesquisas realizadas por Luciane Coccaro e Maria Falkembach sob a direção de Roberto Oliveira.

A dissertação de mestrado[1] reali-zada por mim em 2000 repensa a questão da obesidade, motivada pelo fato desta ser apon-tada como uma doença em estágio crescente na nossa sociedade. Essa classificação bio-médica da obesidade como doença provoca uma reflexão sobre a influência da medicina no que diz respeito à percepção por parte da sociedade mais ampla sobre o aumento de peso corporal. Mas, apesar de a biomedicina – alguns setores - considerar o excesso de peso corporal um problema de saude, fazendo dele algo indesejável, verifica-se pelo menos numa situação da vida das mulheres em que ele é desejável e aceito socialmente, que é na gra-videz.

O interesse no estudo da gravidez surgiu porque este período parece justamente apresentar peculiaridades no que diz respeito ao engordar, pois é esperado que as gestan-tes aumentem seu peso corporal em função do bebê que estão gerando. Estas questões foram pesquisadas junto a um projeto de pes-quisa maior desenvolvido no HCPA intitulado DAG: Estudo de dieta e atividade física na gestação, e é composto por uma equipe multi-disciplinar da área da saude junto à Faculdade de Medicina (FAMED/UFRGS) no Hospital de Clínicas (HCPA) de Porto Alegre[2].

A referida dissertação teve como foco de análise as representações de corpo das gestantes obesas ou com sobrepeso par-ticipantes do DAG. Foram analisadas quais as representações dessas gestantes sobre o peso corporal e como foram percebidas as

Gerando o GrávidaPara Maria Falkembach: hoje mãe

Luciane Coccaro*

ENSAIO 02

modificações sofridas em seus corpos em de-corrência da gravidez.

No total quinze mulheres foram se-lecionadas para o projeto DAG e todas estive-ram dispostas a colaborar nessa pesquisa. Foi utilizado o método etnográfico de pesquisa, que possibilita privilegiar a intersubjetividade entre pesquisador e pesquisados nas situa-ções de campo, fundamental para o estudo proposto.

No processo de gestação do es-petáculo ocorreu uma ampliação da visão do fenômeno gravidez, não mais restrito a modifi-cações e sensações corporais, mas expandido a um maior número de eventos vividos pelas gestantes entrevistadas.

O Grávida inicia onde termina a dis-sertação. Uma vez terminada a pesquisa de campo, um vazio pós-defesa e um incontável número de aspectos qualitativos referentes aos significados desse momento na vida da mulher ficaram ainda intocados na disserta-ção. Revisitando os depoimentos, verdadeiros testemunhos de vida, percebe-se hoje não só revelações quanto aos ganhos de peso corpo-

ral, inerentes à metamorfose que é a gravidez, mas uma infinidade de outros ganhos em suas vidas.

Este ofício de tentar entender o modo de vida do outro acaba nos colocando questões (ser ou não ser mãe, quando e por quê?), e nos tocando tão intensamente que provoca a necessidade de revelar e questio-nar, por meio da arte, este estado de graça.

Incentivada pela atriz-bailarina Ma-ria Falkembach, em 2002, iniciamos juntas um questionamento sobre o que significa a gravidez hoje, e percebemos que mesmo para quem escolhe não ser mãe, está presente a questão da maternidade pois ela é colocada na nossa sociedade como sendo algo univer-sal - quase necessário.

Roberto Oliveira, diretor teatral, pro-pôs um olhar masculino sobre a gravidez. Uma vez estabelecido o grupo partimos para busca de mais relatos significativos de gestantes de uma faixa etária e condição de vida próximas as nossas, nessa nova leva de entrevistas 14 gestantes contribuíram.

Foto: Kyran26 - Informe C3

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A pesquisa de movimento coreográ-fico específica do Grávida teve como inspira-ção diversas falas e situações encontradas nas histórias de vida de todas as gestantes pesquisadas, nos valemos tanto de relatos retirados da dissertação quanto de trechos de entrevistas mais atuais. Estavam presentes muitas dúvidas das gestantes, suas angústias, as expectativas, os medos, os desejos, as ale-grias etc.

Foi mais de um ano de criação, experimentando partir primeiro de ações físi-cas concretas para logo em seguida chegar à abstração dos movimentos, o que é próprio da linguagem de dança. A preocupação do grupo nunca foi engessar o espetáculo como dança ou teatro, mas permitir a fluência desses limi-tes de linguagem teatral e dança contemporâ-nea.

Após a fase de composição de al-gumas cenas, fruto de um mergulho em horas exaustivas-prazerosas de improvisação, era hora de escolher que falas poderiam ser ditas e quando, inspirada em qual das mulheres entrevistadas, pois afinal buscava-se: quem era o personagem da fala? Na tentativa de responder a tal pergunta percebemos durante o processo que mesmo sendo a gravidez um fenômeno universal ela acontece de manei-ra única em cada gestação; cada gravidez é uma, e acontece num corpo, ou no mesmo em circunstâncias distintas.

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Foto: Kyran

As idas e vindas na busca de um ca-minho no processo criativo foram inevitáveis, tanto se foi da construção de personagem por meio de dicas vindas dos relatos quanto de partituras corporais informadas por temas também presentes nas entrevistas. Além dis-so, assistimos a partos normais, cesarianas e curetagens no Hospital Conceição (POA) como mais um meio de impregnação no ato de ganhar.

A animosidade e a humanidade pa-receram estar presentes no nascimento. Logo um questionamento saltou aos olhos, toda a mulher tem capacidade de gerar um filho, isso faz parte de um discurso calcado na existência de uma natureza feminina, mas nos perguntá-vamos onde está esta condição de natureza quando nos deparamos com inúmeras mulhe-res em fase fértil e ainda sem filhos?

De certa forma o Grávida é dedi-cado às mães felizes, mas também as ainda não mães e as não mães assumidas. Porque as escolhas tem fundamento na cultura e em aspectos sociais. E, por acreditar que as mu-lheres não têm tanta escolha assim, ou talvez ainda não pararam para perceber que podem escolher, é que acredito ter sido feito este es-petáculo.

O objetivo do Grávida é propiciar um múltiplo olhar sobre a gravidez, trazendo a diversidade de tipos femininos, com vivência

em algo universal num corpo particular. E é um convite a uma reflexão mais profunda sobre os múltiplos significados da gravidez. Momento liminar, rito de passagem, em que se encontra a mulher durante nove meses de sua vida, as-sistida por outros, sendo muitas vezes o duplo, o que por muitas vezes deflagra a confusão de limites entre mãe e filho.

A temática gravidez envolve inúme-ros aspectos, portanto selecionamos aqueles tópicos que nos relatos das entrevistadas ti-nham mais força, e ao mesmo tempo para nós eram os mais significativos do estado transitó-rio, liminar da gestação. Chegamos à divisão das cenas bem como na definição de seus nomes após transcrever e ouvir juntos as en-trevistas gravadas.

A partir daí selecionávamos trechos que ou iriam ser inseridos como texto falado por nós ou em off, ou ainda iriam servir para inspirar na construção da cena. Mesmo não sendo dita muitas vezes verbalmente determi-nada fala, a tínhamos presente corporalmente. Cada improvisação dirigida organizava na prá-tica boa parte das reflexões sobre os temas abordados teoricamente. Dessa forma chega-mos a um roteiro de seqüência cênica para o espetáculo.

O roteiro do espetáculo segue 16 te-mas escolhidos e coreografados pelo diretor-coreógrafo e as duas bailarinas-coreógrafas.

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São eles em ordem de cena:

v - Gravidez,v - A trança,v - As calças,v - A comilança,v - Sim e não,v - A perda,v - Plenitude,v - Enjôo,v - Medo,v - Aborto,v - Nomes,v - Mãe feliz,v - Telefone,v - Consultório,v - Futurov - Ganhar

A ordem não é cronológica, ainda que tenham cenas bastante descritivas de acontecimentos, não há linearidade em se contar uma estória. Como trata-se de um es-petáculo de dança, com elementos teatrais, a narrativa na dança é um jeito de organizar os elementos utilizados em cena, e, portanto a dramaturgia está presente nos movimentos, nos corpos das bailarinas, são as intérpretes que dão pistas sobre a dramaturgia assim como a composição da cena.

A primeira e a última cena do espe-táculo tem seqüência cronológica sendo com-pletadas por outras 14 cenas sem ordenação temporal. A cena número um, de nome Gravi-dez, é inspirada na formação do bebê dentro da barriga, é a representação cênica dos nove meses, das modificações que ocorrem com o bebê. É como se pudéssemos ver o que acon-tece por dentro da barriga da mãe. Enquanto que a última cena, Ganhar, há uma represen-tação de um parto, uma bailarina no papel de mãe e a outra nascendo.

A partir destas duas cenas o espetá-culo foi recheado de muitas outras sensações das gestantes, indo desde o estranhamento da percepção de engordar na cena As Calças, até os desejos esquisitos que dizem: toda grávida tem - presentes na cena A Comilança. Além de um bloco mais tenso do espetáculo que aborda a Perda, o Medo e o Aborto. Essas três cenas configuram o lado não tão cor de rosa da gravidez, contrastando com o cenário do espetáculo, quase todo em cor de rosa – Pink mesmo.

O Telefone, por exemplo, foi inspira-do no momento das primeiras contrações ou ruptura da bolsa onde as mulheres relatam situações embaraçosas e engraçadas. A idéia da cena é a mulher em casa, sozinha tendo que decidir para quem ligar (marido, mãe, táxi, irmão, etc) na hora de ir ao hospital, mas não se resume somente em telefonar para alguém, está presente a escolha do que vestir, o arru-mar a mala para o hospital, que roupinhas do bebê ela vai levar e assim por diante. Foram utilizadas duas técnicas, a câmera lenta e a câmera rápida, a cena acelera e desacelera várias vezes como uma forma de mostrar de-sespero e pressa.

O foco desse depoimento não é descrever as cenas que compõem o Grávida, mas explicitar de onde partimos para conce-

ber o espetáculo, ou seja de uma dissertação de mestrado centrada nas percepções de en-gordar durante a gravidez que apontou para outros ganhos da gestação para além do peso corporal, numa visão mais abrangente do fe-nômeno gravidez que na prática ocorreu com a realização do Grávida, fruto de duas pesqui-sas, uma etnográfica e outra de movimento cênico.

Por esse motivo, pode-se sem dú-vida afirmar que o espetáculo inicia quando a dissertação não dá mais conta de explicar a gestação. Pois através da representação cê-nica representações sociais são reveladas por meio de uma linguagem simbólica. E esse é o ponto, símbolos são expostos no espetáculo, propiciando de forma não consciente um con-tato com modelos da realidade. O espectador se depara com visões de mundo, contextos sociais distintos em que a gravidez acontece. E, de alguma forma, é chamado a (re)significar simbolicamente a gravidez, pois mesmo os ho-mens que não são pais nasceram de uma mãe o que revela a universalidade do tema escolhi-do.

Ainda que tenhamos uma represen-tação particular sobre o nascimento, o parto e a gravidez, esses eventos fazem parte da es-tória de todos nós, constituem-se em algo que nos é comum. O Grávida parte dessa visão universal da gravidez para tentar chegar na vivência particular (cultural) com respeito a ex-periências de gestações, experiência no plural que inclui discursos de negação à gravidez.

O espetáculo por meio de uma abor-dagem antropológica tentou esboçar a diversi-dade de experiências e representações sobre gravidez pesquisadas, incluindo discursos e práticas sobre a não gravidez, onde aborto, perda e escolha ganham significado no con-texto em que ocorrem.

Revisitando 7 anos depois de ter tido essa experiência de ficar numa gravidez por 2 anos envolvida em gerar o Grávida, comparti-lhada com Maria Falkembach e, numa anterior gestação de 2 anos: a da dissertação; percebo o quanto muitas das questões geradas nesse período ainda continuam latentes.

O mais impactante hoje voltando às memórias desse tempo é perceber o processo de criação de um espetáculo como um perío-do de descobertas. Um momento de investi-gação, de rupturas, de escolhas, um lugar de autoconhecimento.

*Luciane CoccaroRio de Janeiro/Porto Alegre/BrasilMestre em Antropologia Social/UFRGS; Ba-charel em Ciências Sociais/UFRGS; Pro-fessora Assistente do curso de Bacharelado em Dança – Departamento de Arte Corporal – UFRJ; Foi Professora Adjunta do Curso de Graduação Tecnológica de Dança/ULBRA; Foi Professora Adjunta da Faculdade Decision de Administração de Empresa/FGV; Foi Profes-sora do Curso de Pós-Graduação em Enfer-magem/IAHCS; Bailarina – Prêmio Açorianos 2000; Atriz – Prêmio Volkswagen 2003; Core-ógrafa de dança contemporânea; Diretora da Cia LuCoc e do Grupo Experimental de Dança da ULBRA – de 2006 até 2008; Diretora e in-térprete do Espetáculo Estados Corpóreos em 2009.

[1] COCCARO 2000, Engordar na Gravidez: Estudo sobre as representações de gestan-tes vinculadas ao DAG/HCPA de Porto Alegre acerca do ganho de peso corporal. PPGAS/UFRGS, Orientadora Ceres Gomes Víctora.

[2]Bruce Duncan, Maria Inês Schimidt e Sandra Fuchs são os médicos professores que enca-beçam o projeto citado. Além deles participam três obstetras, um cardiologista, três médicos em fase de defesa de doutorado, duas pro-fessoras de Educação Física, três bolsistas e alunos da graduação de Medicina da UFRGS, outros dois bolsistas da Estatística da UFRGS e eu, mestranda de antropologia.

O espetáculo por meio de uma abordagem an-tropológica tentou es-boçar a diversidade de experiências e represen-tações sobre gravidez pesquisadas, incluindo discursos e práticas so-bre a não gravidez, onde aborto, perda e escolha ganham significado no contexto em que ocor-rem.

Foto: Julio Andrade

Foto: Julio Andrade

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Foto: Anderson de Souza

Algas, 2004Erwan e Ronan BouroullecProduzido por Vitra – Plástico Injetadowww.bouroullec.com

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Propostas CriativasSaint-Étienne – Cité Du Design

Anderson de Souza*

ENSAIO 03

O Centro Cultural Banco do Brasil apresentou em São Paulo a exposição Saint-Étienne – Cité du Design, que trouxe da Fran-ça trabalhos de design e arquitetura sustentá-vel. Exposição que integrou as comemorações do Ano da França no Brasil ocorridas no ano de 2009. Após ter passado por Brasília, Rio de Janeiro e Curitiba, a exposição desem-barcou em São Paulo em dezembro de 2009 permanecendo em cartaz até o final de janeiro de 2010, apresentando pela primeira vez no Brasil o trabalho inovador e criativo que vem sendo desenvolvido desde 2005 na cidade de Saint-Etienne, localizada no sul França.

Patrocinada e apresentada pelo Banco do Brasil, a exposição que era dividida em três módulos mostrou que independente de onde esteja, a função do design é contribuir com a vida das pessoas.

O primeiro módulo intitulado “Cité du Design”, dá nome à exposição e também é o nome da bienal internacional de design inaugurada em 2008 na cidade francesa de Saint-Étienne. E este módulo destaca alguns projetos e ações que integraram esta bienal.

O segundo módulo recebeu o nome de “Mini City Eco Lab”, e trata-se de uma adaptação para o Brasil da exposição-evento apresentada por John Thackara[1] em Saint-Étienne. A versão apresentada no Brasil ex-põe projetos de pequena escala “constituindo exemplos determinantes que ajudem à transi-ção para uma realidade sustentável” buscando melhorias para a vida cotidiana ao abordar te-mas como água, energia, alimentação e edu-cação sob o ponto de vista sustentável.[2]

E o terceiro módulo intitulado “Flight Number 10” era composto por uma seleção de trabalhos desenvolvidos por alguns dos jovens talentos do design francês, diploma-dos pela Escola Superior de Arte e Design de Saint-Étienne. Trabalhos que buscavam além de questionar “os modos de vida, os proces-sos de criação, de pesquisa, de produção, os materiais utilizados e sua adequação aos territórios onde são utilizados”, elaborar novas soluções para alguns anseios dentro dos con-textos sociais e culturais.[3]

Totalmente voltada para as questões que trabalham o conceito de sustentabilidade. A exposição proporcionou o contato e a troca de experiências entre os visitantes e demais interessados no assunto, através de conferên-

Foto: Anderson de Souza

Foto: Anderson de Souza

La Fabrique de Coeurs, 2005-2008. Roxane AndrésPelúcia reciclada - http://www.panserautrement.com/

Módulo e Prótese, 2008. Roxane AndrésProtótipo de objeto de construção destinado às crianças hospitalizadashttp://www.panserautrement.com/

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Qual sua relevância? O que propõe?

Ao procurar estabelecer uma cone-xão entre as dimensões culturais e as dimen-sões econômicas do design por meio de proje-tos de desenvolvimento econômico e territorial a Cité Du Design de Saint-Étienne, acabou se destacando dentre as demais instituições de design francês, se posicionando internacio-nalmente como uma referência estratégica ao consolidar o design, as mudanças sociais e as dinâmicas econômicas.[9]

Ações que podem ser tomadas como exemplo para reforçar as iniciativas de se de-senvolver idéias, movimentos e conexões em prol do desenvolvimento criativo e sustentável das cidades brasileiras. Motivando e inspiran-do o surgimento de novas iniciativas para se alcançar o título de Cidade Criativa[10].

Quais as principais obras em des-taque? Objetos de design ou arte?

Considerando a definição do que vem a ser o design, apresentada por Nathália Cruz[11], que dentre todos os significados do termo, ressalta o desenhar e o projetar sem deixar de lado as questões estéticas e de pra-ticidade. Ela complementa esta informação ao

cias internacionais realizadas durante a expo-sição e das próprias propostas apresentadas na exposição.

“A exposição traz projetos de profis-sionais que pensam o design como ferramenta social e econômica, apresentando soluções que levam em conta principalmente as carac-terísticas da realidade para qual estão sendo projetadas, sem deixar de lado a estética e a praticidade.”[4]

E como forma de estimular um olhar crítico, aproximando ainda mais os observado-res das propostas apresentadas na exposição, as informações contidas no caderno de media-ção procuravam instigar a curiosidade, o sen-so crítico e os sentidos de cada observador. Propondo argumentos e questionamentos so-bre alguns projetos que compõe a exposição de forma que o observador pudesse identificar, entender ou mesmo estabelecer um sentido no que era proposto.

O que é a Cidade do Design? O que apresenta?

Segundo a revista Bravo![5] Saint-Étienne era uma antiga vila no interior da Fran-ça que se transformou em uma cidade indus-trial. Onde, de acordo com a abcDesign[6], no ano de 1999 aconteceu uma Bienal Internacio-nal do Design, promovida pela escola Superior de Arte e Design de Saint-Étienne. Aconteci-mento que contribuiu para que em 2005 fosse criada a Cité du Design (do francês, Cidade do Design). Local que se tornou referência mundial no assunto, sediando diversos even-tos e fóruns internacionais no que diz respeito ao universo do design. E foi a partir da Bienal Internacional de Design de Saint-Étienne reali-zada em 2008 que surgiu a idéia de se montar esta exposição.

“A Cidade do Design é um espaço de vanguar-da que procura formar profissionais que pen-sem no design como uma ferramenta social, por meio de soluções que, sem deixar a estéti-ca de lado, não percam de vista as caracterís-ticas sociais e econômicas da realidade para a qual estão sendo projetadas.”[7]

Segundo Josyane Franc, curadora da exposição, tratava-se de um convite para que os brasileiros pudessem descobrir, além das riquezas do design francês, o seu conceito de cidade do Século XXI, através da união de várias linguagens oriundas dos mais diferen-tes seguimentos. Através de uma ação conjun-ta que consolidou design, arquitetura e susten-tabilidade gerando algumas possibilidades de respostas ao que Josyane definiu como “ques-tionamentos sobre o papel do design frente às mutações sociais.”[8]

dizer que “o designer deve levar em conside-ração o material utilizado, os valores sociais, a ergonomia e as necessidades especiais de cada pessoa.” Mas a maneira como tais proje-tos são apresentados, ocupando vários espa-ços do Centro Cultural, como obras de arte em uma galeria, automaticamente lhes atribuem o conceito obras de arte. Será que poderia ser chamado de Arte Design?

Foto: Anderson de Souza

Foto: Anderson de Souza

Módulo e Prótese, 2008. Roxane AndrésProtótipo de objeto de construção destinado às crianças hospitalizadashttp://www.panserautrement.com/

Algas, 2004. Erwan e Ronan BouroullecProduzido por Vitra – Plástico Injetado. www.bouroullec.com

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A exemplo do protótipo de lustre inti-tulado de Compota da Vovó, desenvolvido em 2006 por Noémie Bonnet Saint-Georges[12] – que apresentava uma proposta de luminária confeccionada com potes de geléia, lâmpa-das e fios elétricos e se baseava na idéia de acumulação, uma proposta criativa e aparen-temente barata que propunha a reutilização de materiais (no caso os potes de vidro) que poderiam ser descartados no meio ambiente.

“na casa da vovó, tudo se acumula, se empi-lha, se amontoa, se guarda em uma bela orga-nização, numa emocionante confusão.” [13]

Assim como as nuvens não possuem uma forma fixa e exata, pois estão continua-mente sendo esculpidas pelo deslocamento do ar, o projeto intitulado Clouds (2008), do inglês nuvens, se trata de um sistema modular, com-posto por um conjunto de peças geométricas confeccionadas em material têxtil que podem ser montadas de várias maneiras assumindo variadas formas e dimensões. Assemelhando-se muito a formas orgânicas como uma colônia de liquens, uma colméia de abelhas ou mesmo uma nuvem, como sugere seu nome. E par-tindo de aspectos como esses que Erwan e Roman Bouroullec desenvolveram este siste-ma de paredes têxteis em estreita colaboração com a marca Kvadrat, projeto que transita en-tre o móvel e a cortina. Sugerindo propostas para algum tipo de revestimento, isolamento térmico ou acústico, a exemplo do que é feito com caixas de ovos, normalmente utilizadas no revestimento interno de estúdios de grava-ção sonora. [14]

Assim como Clouds “é inteiramen-te dependente da maneira segundo a qual o usuário esculpe sua forma tridimensional”[15], o projeto intitulado Algas (2004) desenvol-vido também pelos irmãos Bouroullec, man-tém uma proposta similar ao projeto citado anteriormente.“São módulos de arquitetura in-terior e, ao mesmo tempo, elementos decorati-vos em matéria sintética que evocam o mundo vegetal,” que podem ser unidos para formar estruturas de delimitação de espaço formando desde a mais fina cortina até o mais denso e intransponível tapume[16].

E pensando em questões sociais mais delicadas, como as que envolvem as-suntos relacionados a saúde humana, como transplante e doação de órgãos, os trabalhos Os transplantados (2005-2006) e Módulo e Prótese (2008), intitulam algumas das peças criadas pela artista e designer Roxane Andrés. Propostas que apresentam um fundo peda-gógico muito forte propiciando principalmente ao público infantil levantar questionamentos éticos sobre o corpo humano, transplantes e doação de órgãos.

“Os questionamentos levantados por estas discussões resultaram em personagens de formas estranhas que levam órgãos nas pon-tas de suas patas, contribuindo para criar uma ligação entre a criança e a medicina. Estes objetos servem como mediadores (suportes) para explicar certas noções delicadas com as quais é difícil lidar.”[17]

Foto: Anderson de Souza

Foto: Anderson de Souza

Compota da Vovó, 2006Associação 1.8 – Noémie Bonnet Saint-Georges Lustre protótipo – potes de vidro, fios elétricos http://1point8.blogspot.com

Clouds, 2008Erwan e Ronan Bouroullec Editado por Kvadrat A/s – Têxtil Kvadratwww.bouroullec.com

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Ambos os trabalhos se tratavam de bonequinhos de pelúcia (como mencionados a cima) que muito se assemelham a estética dos Toy Art[18], se utilizando exatamente de sua estranheza e diferença em relação aos demais brinquedos, para questionar de assuntos ím-pares.

E em complemento a estas obras, não se pode deixar de mencionar os corações de pelúcia, (também de autoria de Roxane) que davam as boas vindas a todos que aden-trassem ao grande hall do CCBB SP. Trabalho que integrava o projeto intitulado La Fabrique Du Coeur (do francês A Fábrica de Corações)[19], onde estes corações, confeccionados em oficinas por crianças a partir de pedaços de outros brinquedos de pelúcia, integravam um projeto social voltado a recuperação de crian-ças hospitalizadas.

Os exemplos citados acima compre-endem apenas uma centelha diante de todos os projetos e propostas que integraram a ex-posição Saint-Étienne – Cité du Design. Fican-do este artigo restrito a divulgar além desta

iniciativa, algumas percepções a respeito dos assuntos abordados nesta exposição. Na ten-tativa de instigar de alguma maneira a todos os que possam se interessar em desenvolver ini-ciativas similares as tomadas pelos designers e artistas franceses.

Pois tal exposição apresentou uma vasta gama de descobertas, invenções e pro-postas que estão sendo desenvolvidas e ain-da podem ser aprimoradas na tentativa de se buscar responder a muitas questões, especial-mente no campo da sustentabilidade.

Para Nicola Goretti, a exposição buscou estabelecer um ponto de vista dife-renciado sobre o design, transcrevendo um sentimento renovado, capaz de apresentar o que o design é capaz de desenvolver. Nicola complementa que o design:

“pode confortar na solidão ou melhorar o ren-dimento no trabalho, nos proteger dentro de nossas casas ou nos resguardar fora delas, curar fisicamente ou brindar alivio psicológi-co, ajudando-nos a obter as energias renová-

veis necessárias para preservar a vida deste planeta.”[20]

Enfim, embora possa parecer um tanto quanto utópica, a exposição Saint-Étien-ne – Cité du Design, mostrou que um bom projeto de design no atual momento em que vivemos, (tão abalado por crises econômicas, sociais, ecológicas e climáticas), independe de seu tamanho físico, do tempo que venha a to-mar durante seu desenvolvimento e implanta-ção ou dos investimentos que consuma em sua realização. Desde que ele atenda os anseios e necessidades de seu entorno de maneira sus-tentável, partindo de iniciativas sustentáveis ou mesmo propiciando ações que venham a contribuir com a sociedade no geral contribuin-do com a criação de um mundo melhor.

Referências:- Caderno de Mediação Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educativo, Dez 2009/Jan 2010.- Programa Exposição Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educativo, Dez 2009/Jan 2010.http://www.citedudesign.com/

Foto: Anderson de Souza

Compota da Vovó, 2006. Associação 1.8 – Noémie Bonnet Saint-Georges Lustre protótipo – potes de vidro, fios elétricos - http://1point8.blogspot.com

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Notas:[1] John Thackara – estudou filosofia, atuou como jornalista, antes de trabalhar por dez anos, como editor de livros e revistas. John foi o primeiro diretor (1993-1999) da Netherlands Design Institute. Ele foi diretor do programa, em 2007, Design do tempo (Dott 07) uma nova bienal no Nordeste da Inglaterra. Em 2008 foi comissário da Eco City Lab no Cité du Design de Saint Etienne, a mais importante bienal de design francesa. John faz parte da Associate of The Young Foundation, Reino Unido; sênior de sustentabilidade para o Conselho de Design do Reino Unido, e também consultor em indi-cadores de sustentabilidade à Agence France Presse.. Informação disponível em http://www.thackara.com/ acessada em 10/03/2010, origi-nal em inglês, tradução nossa.

[2] Informação disponível no programa da Ex-posição Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educativo, Dez 2009/Jan 2010.

[3] Informação disponível no programa da Ex-posição Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educativo, Dez 2009/Jan 2010.

[4] Trecho retirado do Caderno de Mediação Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educati-vo, Dez 2009/Jan 2010.

[5] Informação disponível em http://bravonline.abril.com.br/conteudo/bravoindica/saint-etien-ne-cidade-design-483969.shtml acessada em 10/03/2010.

[6] Informação disponível em http://abcde-sign.com.br/categoria-1/1407-a-2308-mostra-saint-etienne-cidade-do-design/ acessada em 10/03/2010.

[7] Trecho retirado do programa da Exposição Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educati-vo, Dez 2009/Jan 2010.

[8] Trecho retirado do programa da Exposição Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educati-vo, Dez 2009/Jan 2010.

[9] Informação disponível no programa da Ex-posição Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educativo, Dez 2009/Jan 2010.

[10] Cidade Criativa: são cidades capazes de construir uma agenda de políticas públicas e privadas geradoras de uma transformação sócio cultural e econômica, sempre com olhar voltados para o entrelace das singularidades e vocações locais. O titulo de cidade criativa é concedido pela UNESCO a municípios que formam uma rede mundial de cidades em transformação, valorizando soluções inovado-ras e sustentáveis, como Barcelona, Bogotá e Buenos Aires. Informação disponível na Rela-toria do Seminário Internacional Porto Alegre Cidade Criativa realizado pela prefeitura de Porto Alegre e Santander Cultural, setembro de 2009.

[11] Informação disponível no Caderno de Me-diação Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educativo, Dez 2009/Jan 2010.

[12] Este e outros trabalhos podem ser acessados em http://1point8.blogspot.com/2007_04_01_archive.html acessado em 10/03/2010.

[13] Texto de apoio que complementava a le-genda da obra. Disponível no local da expo-sição.

[14] Informação disponível em http://www.bou-roullec.com/ acessada em 10/03/2010.

[15] Trecho retirado do texto de apoio que complementava a legenda da obra. Disponível no local da exposição.

[16] Texto de apoio que complementava a le-genda da obra. Disponível no local da expo-sição.

[17] Texto de apoio que complementava a le-genda da obra. Disponível no local da expo-sição.

[18] Toy Art - “brinquedo de arte”: É um brin-quedo feito para não brincar, dirigido para pes-soas com idade acima de 14 anos - especial-mente adultos - e com o intuito de colecionismo e/ou decoração. O toy art é, em síntese, uma “tela” em 3 dimensões para artistas e designers expressarem sua arte. Toy Art é manifestação contemporânea que se apropria do brinquedo para mesclar design, moda e urbanidade. In-formação disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Toy_art acessada em 10/03/2010.

[19] Informação disponível em http://www.pan-serautrement.com/ acessada em 10/03/2010.

[20] Trecho retirado do programa da Exposição Saint-Etienne Cité Du design. CCBB Educati-vo, Dez 2009/Jan 2010.

Foto: Anderson de Souza

Foto: Anderson de Souza

Foto: Anderson de Souza

Project Noé (Roseta), 2008. András Riglerhttp://www.rigler.hu

Project Noé (Roseta), 2008. András Riglerhttp://www.rigler.hu

De onde viemos? O que fizemos? Para onde vamos?, 2009Caroline D’Auria e Thomas GouxEspelho e aço cortado – Protótipo, peça única

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Foto: Anderson de Souza

La Fabrique de Coeurs, 2005-2008 - Roxane Andrés - Pelúcia reciclada http://www.panserautrement.com/

*Anderson Luiz de Souza - Brasil/RS/CanoasBacharel em Moda. Especializando em Arte Contemporânea e Ensino da Arte e atualmente é Docente no SENAC Moda e Beleza / Canoas-RS no Curso Técnico em Produção Moda e em cursos livres nas áreas de pesquisa, design e processo criativo em moda e cultura, Pesquisador do Pro-cesso C3 Grupo de Pesquisa e idealizador e responsável pelo site www.processoc3.com. Também desenvolve trabalhos como estilista, figurinista, vitrinista, artista plástico e ilustrador de moda.

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Foto: Anderson de Souza

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O que faz o gesto cotidiano se transformar em arte?

Marta Peres*

ENSAIO 04

Tanto quando fala de coisas que existem, na realidade, quanto sefala de coisas irreais, a arte nunca deixa de falar do que existe.

Ainda que se trate de um ser imaginário, de um contexto absurdoEles existem, na imaginação em que foram gestados.

As divisões entrefigurativo X abstrato

cinema documentário X ficcionalnarratividade X pura composição de movimento

são maneiras didáticas de classificar aquilo que nunca deixa de ser, ao mesmo

tempo, real e criação, porque sempre resultam do ato voluntário deriscar o espaço

Foto: Anderson de Souza

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sejao espaçoda teclapelículatela’rgila

ou puro ar (respectivamente)

da músicacinema

artes plásticasdança

mas então, se é tudo real e criação,o que faz da arte, arte, e não simplesmente o real propriamente dito???

a diferença está numa espécie de ‘colocar em relevo’,concretude , textura, consistência, maior e sempre intencional,

ainda que ao acaso,presente na obra de arte.

As pessoas caminhando na cidade, isto existe.A seqüência de acontecimentos

aparentemente sem pé nem cabeçado sonho da véspera.

Também existe.Até aí é só uma calçada da Av. Copa ou um sonho qualquer, e daí?

Mas quando eu pego esta caminhada ou este sonho e dou um tom, umadinâmica, uma moldura, um recorte, aí sim, é uma obra. E nem por isso

é menos real, muito pelo contrário, é mais:é uma espécie de hiperrealidade

como se houvesse uma maior concentração de realidade,concretude, como os planetas no vazio do éter

o oásis no deserto, as pedras no rio-que-corre...

Os tipos de concretudes são muitos e infinitos até as texturas maisfrágeis e diáfanas como os planetas gasosos.

A equação da Teoria da Relatividade Restrita pode ser interpretada deforma que, ao final, matéria (massa) = energia.

Foto: Anderson de Souza

*Marta Peres - Rio de Janeiro/BrasilProfessora Adjunta do Departamento de Arte Corporal EEFD-UFRJ, Doutora em Sociologia (UnB) com Pós Douturado em Antropologia, fisioterapeu-ta e bailarina. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/5570019500701293.

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Foto: Anderson de Souza

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CowParade São Paulo 2010Francine Pressi*

ENSAIO 05

A CowParade, considerada um dos maiores eventos de arte de rua no mundo, já visitou muitas cidades levando cor e desper-tando inúmeras sensações e diferentes rea-ções naqueles que conferem a exposição. O projeto que leva às ruas esculturas reprodu-zindo vacas em fibra de vidro, são produzidas por artistas locais e espalhadas por diferentes pontos das cidades.

Muitas empresas patrocinam este projeto e após o término da exposição, as mesmas serão leiloadas com o intuito de re-verter o dinheiro para entidades beneficientes.

Como o grupo de pesquisa Proces-so C3 estava reunido em São Paulo no mês de janeiro, aproveitou-se para fazer um regis-tro deste momento, bem, ao menos em partes, já que infelizmente não foi possível fotografar todas as 90 vacas expostas na cidade.

São Paulo, que recebeu pela primei-ra vez a CowParade em 2005, deu início a sua segunda edição no dia 22 de janeiro, per-manecendo durante dois meses com a exposi-ção. As vacas, que contam com o trabalho de diferentes artistas plásticos, arquitetos, desig-ners, pintores, artesãos, entre outras pessoas, sugerem inúmeras temáticas, como o caos no trânsito, a moda, alimentos, entre outras.

Mas por que vacas? Ao acessar o site do evento São Paulo CowParade 2010, além de você ter acesso à tudo o que está ocorrendo durante o CowParade, também passa a compreender melhor o prórpio even-to. Vacas, segundo o site, porque: “Há algo de mágico sobre a vaca. Ela representa coisas diferentes para pessoas diferentes ao redor do mundo: é sagrada, é histórica, mas o senti-mento comum é de carinho. Ela simplesmente faz todos sorrirem.”

Pode-se imaginar que durante essa edição, muitos foram os sorrisos, os olhares e os flashes direcionados às vaquinhas expos-tas por São Paulo. Elas não apenas estavam lá para serem vistas, como tocadas, fotogra-fadas, filmadas, apreciadas. E não somente isso, serviam inclusive como ponto de referên-cia, isso mesmo, era tão simples marcar para encontrar alguém próximo à “VacaTorpedo”, ao lado da “Vaca Toddy”, atrás da “Vaca Chicle-te”...

Foto: Anderson de Souza

Foto: Anderson de Souza

Obra: VACA TORPEDOArtista: Fabio Malx

Obra: SAMPA SEM PARARArtista: Morandine

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Foto: Anderson de Souza

Obra: DO PASTO À PASSARELAArtista: Kiko César, Luiz Almeida e Felipe Madureira

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Encontramos para nossa grande surpresa na Estação da Sé, aquela que viria a ser a última vaca do nosso percurso, a “Vaca de Presépio” de José Hélio Silveira Leite, che-gando a um total de 10 das 90 vacas expostas pelas ruas de São Paulo no CowParade Brasil 2010. Mas já no ônibus com destino ao aero-porto Internacional de Guarulhos – SP deparo-me com a última vaca, a qual não pudemos registrar em fotografia, mas que tinha como tema o café. Foi uma surpresa e ao mesmo tempo uma tristeza por não podermos fotogra-fá-la, mas fica no registro, foram 11 e não 10 vacas...

Com tudo, para-se para refletir sobre a influência da arte de rua no cotidiano daque-les que presenciam e/ou apreciam a mesma. Até onde um projeto como a CowParade é ca-paz de chegar com a arte de rua? E quando digo “onde”, não me refiro apenas a lugares, pois creio que um projeto como este possibilite levar a arte a todas as partes, para que qual-quer pessoa, independente de idade, sexo, cor ou religião possa ter acesso aos trabalhos ex-postos. Mas indago sobre até onde estas es-culturas representando vacas são capazes de mexer com o imaginário e com as emoções de cada indivíduo?

Particularmente aposto em iniciati-vas como esta, na tentativa de romper com as cores acinzentadas das grandes metrópoles, levando mais arte e cultura às ruas e possibi-litando que as pessoas tenham cada vez mais acesso à esse tipo de trabalho. E que venham mais edições da CowParade para o Brasil, mas que dessa vez, outros Estados possam ser agraciados com essa possibilidade.

Acesse: www.cowparade.com.br/

Obra: ESCOWDARIAArtista: André Ortiz

Foto: Anderson de Souza

Obra: COWXINHAS DE CHICLETESArtista: Renato Zandoná & Rubens Marinelli

Obra: UPSIDE-COW - ENCOSTOU, COLOU MESMO!Artista: Aldo Cappucci Filho

Obra: VACA 43Artista: Ken Block

Foto: Anderson de Souza Foto: Anderson de Souza

Foto: Anderson de Souza

* Francine Cristina Pressi - Brasil/RS/São LeopoldoGraduada no Curso Superior de Tecnologia em Dança pela ULBRA; Cursa Licenciatura em Dança pela ULBRA. É bailarina, professora, coreógrafa e pesquisadora em dança com ênfase em linguagens contemporâneas. Desenvolve trabalhos artísticos como bailarina desde 2003, participando de várias performances, espetáculos, festivais e mostras de dança, atuando em companhias de dança como a Cia. Corpo Alma, Cia. Hackers Crew, e colaborando como bailarina/interprete de dois estudos coreográficos orientados por Carlota Albuquerque e dirigidos por Wagner Ferraz (O Jogo) e Raul Voges (Provisório – Processo I). Hoje atua também na área de pesquisa em dança, abordando temas como dança, corpo, moda, cultura e contemporaneidade. Pesquisadora do Processo C3. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/8890297538503375.46 - Informe C3

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Obra: CowddyArtista: Cusco e Novos Talentos

Obra: VACA DE PRESÉPIOArtista: José Hélio Silveira Leite

Obra: COW IN THE SKY DIAMONDSArtista: Angelo Palumbo

Foto: Anderson de Souza

Foto: Anderson de Souza Foto: Anderson de Souza

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Foto: Anderson de Souza

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Obra: SOJA E MUUUITO MAISArtista: Toni Machado

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ENTREVISTAO CORPO EM MODIFICAÇÃO Rev Lincoln Taka Eldge

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O CORPO EM MODIFICAÇÃO

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ENTREVISTA

O corpo em modificação de Rev Lincoln Taka Eldge

T. Angel*

Tradução | Português

Nosso entrevistado de hoje é a pro-va viva de que não se deve julgar um livro pela capa e no quão surpreendente os seres huma-nos podem ser.

Diretamente da África do Sul, pres-tes a entregar seu doutorado, Eldge nos con-ta um pouco sobre sua carreira acadêmica e processos corporais. Sem dúvida alguma, uma profunda aula de vida. Confiram abaixo!

1 - T. Angel: Conte-nos um pouco sobre sua vida acadêmica. Quando e como começa?Eldge: Terminei o colégio com a expectativa de ir para a universidade (na minha família não existe outra opção). Eu estava interessado em design e considerando arquitetura, mas a idéia de toda aquela matemática me fez sentir doente. Eu queria continuar com idiomas, que era minha favorita na escola. Então, eu fiz um BA (Bacharelado de Artes) com especialização em inglês e incluindo francês, latim, africâner e holandês. Assim, comecei em um programa de direito e pensei que seria uma boa idéia fa-zer isso, mesmo que na verdade eu quisesse continuar com idiomas. Mas naquele estágio, direito soou com uma boa prática vocacional (“algo para se “acomodar”, Yuck. Por que al-guém se “acomodaria” numa cama com flores com espinhos, que é o que o Direito parece pra mim?) Quando terminei o programa, eu não estava certo do que fazer a seguir, então ape-nas continuei com o direito, e me graduei com o LLB (Bacharelado em Direito). Na universi-dade eu tinha me envolvido com questões do direito gay, principalmente depois que eu havia acabado de “sair do armário”, mas a política de tudo isso fez me sentir inconfortável, pois era tão cássica, séria e sem criatividade. Eu não estava pronto pra me tornar um advogado e queria experimentar um pouco do mundo. En-tão, eu fui para Londres e trabalhei por lá para um promotor durante dois anos, naquele tem-po eu explorei meu próprio “fetishe” e sexuali-dade nos finais de semana. Eu ainda não es-tava certo do que queria ser “quando crescer”, então, voltei pra África do Sul para terminar a minha qualificação jurídica. Acho que naque-le momento eu só queria terminar o que tinha começado, porque eu não poderia pensar em algo mais interessante pra fazer. Estava inte-

ressado na elaboração de contratos, no que eu era bom e recebi um prêmio na escola de prática legal. Eu comecei a trabalhar como ad-vogado, e logo encontrei minha vida ocupada por divórcios, seqüestros, casos de embria-guez ao volante e disputas mesquinhas sobre quem fez o que a quem e quem deve pagar. Logo percebi, que quando uma pessoa vai à um advogado é tarde demais, o estrago está feito, e a causa é demasiadamente irreparável. O que as pessoas precisam é de um psicólo-go, não um advogado! Percebi que quando a maioria das pessoas vão até um advogado, na verdade elas estão pedindo pra ele/ela fazer as vidas deles melhores e não apenas resolver uma questão jurídica. Eu era desqualificado pra isso. E o mais importante, advogados são geralmente muito conservadores e não muito criativos e, eu estava louco pra deixar o terno

e a gravata e deixar minha própria criatividade sair, em especial meus desejos para me mo-dificar. Então eu deixei o direito e me juntei a uma produtora de filmes como pesquisador. Filme foi um ótimo sopro de ar fresco, cheio de pessoas interessantes e criativas. Eu trabalhei em filmes por um número de anos, mas depois de um tempo percebi que mesmo que eu es-tivesse mais livre e mais feliz que quando era um advogado, eu estava um pouco insatisfeito intelectualmente. Produção de filme tende ser realmente “pró-ativa” e o que é ótimo, mas não há muito tempo para considerar os elementos intelectuais das coisas. Então um dia eu tive um encontro com uma amiga minha, falei so-bre isso, e ela disse “por que você não volta estudar?”. Eu não tinha pensando sobre, e era uma ótima idéia, então voltei. Escolhi cuidado-samente o que eu queria fazer, que fosse ex-

Foto do arquivo pessoal de Rev Lincoln Taka Eldge

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plorar a idéia do masculino e o corpo, no con-texto de histórias da vida, e em especial à luz do meu novíssimo implantes de peito. Assim fiz meu mestrado. Então, estava mais animado sobre os elementos acadêmicos das coisas do que os práticos e, eu encontrei um emprego como professor em uma escola privada de ci-nema. Eu amei dar aula lá, mas logo percebi que eles estavam mais interessados em arran-car muito dinheiro dos alunos do que dar uma boa educação. Eu não estava tendo chance em desenvolver minha própria carreira acadêmica, então eu abandonei e comecei meu doutorado, o qual estou terminando agora, enquanto eu ensino roteiro de cinema em uma universidade pública (muito mais divertido e com muito mais integridade). O Doutorado tem realmente sido sobre trazer meus interesses em conjunto e terminando com uma ampla visão geral, social da ciência/humanas, eu senti falta ao longo do caminho enquanto eu entendia melhor meus não usuais interesses pessoais: enquanto o mestrado foi sobre gênero (masculino), identi-dade e o corpo em uma perspectiva sociológi-ca, o doutorado tem sido sobre sexualidade e seu relacionamento com objetos materiais, em uma perspectiva psicológica.

2 - T. Angel: Você é “fortemente” modifica-do, você teve algumas “portas fechadas” por conta do seu corpo?Eldge: Eu suponho que sim. Foi muito difícil pra mim conseguir um trabalho como advoga-do, mas acho que foi mais porque eu realmen-te não via interesse em ser um, e porque eu realmente não me adaptaria ao molde nos ter-mos e modos que penso, menos do que pelo aparento, desde que eu não estivesse visivel-mente modificado naquele momento, por isso era mais a minha cabeça em vez do meu corpo que provavelmente tornou isso mais difícil. Mas em geral, eu descobri que as pessoas respon-dem ao modo como se pensa sobre si mesmo e não como uma aparência. Eu ainda poderia ir à um tribunal para representar um cliente (yuck, eu prefiro comer merda de cachorro!), mas o magistrado ou juiz provavelmente não me levariam a sério, pelo menos até que eu comece a falar, e eu provavelmente não con-seguiria nenhum cliente. Mas eu descobri que a maioria das pessoas supõem uma coisa so-bre mim (e cada um supõe algo diferente) e então reajustam suas opiniões quando eu falo, uma vez que eu sou claramente bem educado e eloqüente. A coisa mais difícil tem sido en-contrar o que eu quero fazer (à parte de “ser modificado”, o que não paga muito bem!) e de-pois a coragem de fazê-lo. Uma vez que eu es-teja rolando, eu fico bem. Além disso, acredito firmemente que tudo é possível e se alguém fica preso em suposições sobre o que os ou-tros estão pensando, nunca vão fazer nada. As pessoas são infinitamente surpreendentes so-bre o que elas gostam ou pensam. Como por exemplo, um número de conservadores idosos vieram até mim na rua e disseram que eles amaram o que eu fiz de/para mim. E uma du-pla de heteros machistas bem agressivos me

disseram que acharam meus peitos muito sexy. Mas nenhuma empresa conservadora me empregaria ou chamaria meus serviços e pessoas conservadoras não me ouviriam com uma mente aberta. Mas ao contrário, e é por isso que eu sou bom no que eu faço e no que eu gosto de fazer porque isso me alimenta num nível além de simplesmente fazer uma vida: ensino e mudanças de paradigmas. Eu agito as pessoas de suas complacências e deixo-as saberem que suposições são uma coisa ruim e que tudo é possível. Não fácil, mas possível.

3 - T. Angel: Como se deu o interesse sobre os estudos da África?Eldge: Há um debate em curso na África sobre o que é ser “africano”, especialmente depois do Apartheid, que tanto desumanizou pessoas e dispensou culturas “não ocidentais”. Muitas pessoas aqui estão interrogando o papel do “branco” na África, e eu acho que existe um ressentimento e uma defensiva por muitos indígenas acerca das reivindicações das pes-soas de origem européia em ser “africano”. Eu fui criado em uma comunidade anglófila “branca”, onde todas as referências culturais e sociais eram da Europa ou América. África

Foto do arquivo pessoal de Rev Lincoln Taka Eldge

praticamente não existia, e ainda não existe para a maioria das pessoas nessas comunida-des, mesmo que consista em alguns milhões de pessoas que vivem na África e não têm acesso a cidadania européia ou americana e nunca poderão se considerar “européias”. Pessoalmente, eu sempre me senti mais que deslocado de todas as culturas, e nunca me senti como “pertencente” a qualquer lugar. Por exemplo, através do meu avô que era de Chi-pre, eu sou um cidadão (grego) cipriota. Mas eu não falo grego e não tenho costumes cul-turais gregos/oriente médio. Ainda há também inglês, alemão, holandês, francês, polonês, ju-deus do oriente médio e quem sabe a herança de outros, incluindo talvez Khoi-san (um povo indígena africano) e/ou indonésio/indiano que eu também poderia recorrer. Alguns ramos da minha família têm vivido na África desde 1700, e eu sou “da África”, mesmo que eu não tenha sido criado com qualquer identificação cultural “africana”. Eu estava, portanto, interessado em explorar o que “ser africano” significa. Eu percebi que, como todo essencialismo, que não há nenhum significado real para isso, e culturalmente, menos que geograficamente, frequentemente é um rótulo imposto de fora. Eu percebi que ninguém “pertence” à lugar al-

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gum e que nós somos todos crianças da Terra, mas que eu tenho uma compreensão maior da África do Sul que qualquer outro lugar do mun-do. No entanto, isso não significa que eu tenha que permanecer aqui.

4 - T. Angel: Sobre o seu doutorado: você está pesquisando e estudando fetishes e sexualidades do gay masculino. Fale um pouco sobre o progresso de trabalho?Eldge: Eu praticamente já terminei (assim es-pero). Finalizei o projeto completo da tese, o qual meu supervisor está olhando e que es-pero apresentar nos próximos meses. Foi uma viagem interessante que tem sublinhado para mim a importância do pensamento gay, que pretende ir além das identidades essencialis-tas e para um foco no que as pessoas fazem.

Foto do arquivo pessoal de Rev Lincoln Taka Eldge

A pesquisa também reorientou minha própria compreensão de como as pessoas se relacio-nam com os objetos materiais e, que elas os usam como pontos de orientação em relação ao mundo material e normas culturais/sociais. Se estamos falando de fetishe sexual, modifi-cação corporal ou outra prática “underground” ou subcultural, ou mesmo as culturas tradicio-nais, eu posso agora confortavelmente alegar que as pessoas fazem sentido de seu mundo e se estabelecem em relação a isso, em nível social e psicológico, através de como elas li-dam com os objetos materiais.

5 - T. Angel: Você é anti religião mas pró es-pírito. O que você pensa sobre as relações contemporâneas com a espiritualidade?

Eldge: Depende do que você quer dizer com “relações contemporâneas com a espiritu-alidade”. Eu moro num país muito cristão e conservador, mas onde práticas indígenas co-existem confortavelmente, ou algumas vezes não tão confortavelmente. Por exemplo, nosso presidente acabou de casar com sua quinta esposa. (Apenas para esclarecer, eu não te-nho problemas com o poliamor, mas eu tenho um enorme problema com o sexismo da poli-gamia: suas esposas deveriam ter o direito de ter muitos maridos, mas elas não tem). Assim, nesse espaço, relações contemporâneas com a espiritualidade pra muitas pessoas significa escurecer o cristianismo, que em si é uma im-posição colonial, sobre as práticas culturais tradicionais, tais como reverência ancestral. Em alguns níveis, eu sou um ateísta com pon-tos de vistas bem sólidos: não há um “Deus” olhando pra gente aqui embaixo. Pelo contrá-rio, nós somos os autores dos nossos próprios destinos. Como tal, não há “certo” ou “errado” definidos a partir do exterior e não importa quem ou o que você quer foder, comer, falar ou construir uma casa, ou o que você quer fazer com sua vida ou seu corpo, ou mesmo como você se sujeita as normas sociais. Mas de uma perspectiva ocidental moderna, eu aplaudo a dissolução do cristianismo em algum tipo de relíquia do passado, onde pessoas apenas iam na Igreja no natal e páscoa, e só porque é uma ótima maneira de se conectar com a comunidade. Eu rebaixo o terrível fundamen-talismo e conservadorismo fundamentalista da América e a terrível força da Igreja Católica em grande parte do mundo e o fundamenta-lismo islâmico. Basicamente, qualquer coisa que professe “ter as respostas” é um monte de merda que só serve para fingir que algumas pessoas são melhores que as outras e que eles estarão “salvos”, enquanto que os outros estarão condenados. E entre estes eu incluo a “Oprahficação” e “comodificação” da ”alternati-va” espiritualidade, em que cada remédio espi-ritual charlatão e “solução” psico-blablabla que desce a estrada é saudada como “a resposta”. Simplesmente substituindo um “Deus” mo-noteísta com “o universo”, com se houvesse alguma consciência singular motriz que faça a mesma coisa. Enquanto você respeitar um conjunto de éticas adotadas a partir de dentro, baseado no bem estar e desenvolvimento de todos os seres (humanos) do planeta. Neste sentido, creio que são fluxos de energia ao qual nós podemos bater, que não são nem boas e nem más, mas são apenas o elemento “invisível” da física. Isso pode parecer obscuro, mas se nós pensarmos “espiritualidade” como “oração”, nós somos suscetíveis de recair em velhos padrões de êxtase religioso, agrade-cendo algum ser senciente fictício por nossa existência. Pelo contrário, devemos celebrar o mero fato de existir, juntamente com as mara-vilhas do mundo em qual vivemos e ao fazê-lo, nós deveríamos nos permitir seguir o fluxo da vida onde quer que isso possa levar, escolhen-do interessantes opções, onde pode haver uma bifurcação no rio, e fazer as escolhas in-formados, em vez de pensarmos que somos

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s obrigados ou impedidos por alguma coisa do tipo “força maior”. Nesse sentido, aqueles que elevam “espiritualidade” em algo “sagrado” ou apenas re-expressando as mesmas mentiras das velhas religiões com novas roupagens. Aqueles que vivem suas vidas de forma livre e fundamentada e, apenas “são” (incluindo ateístas entre nós, que não precisamos de religião para viver e aproveitar e apreciar as maravilhas da existência) tem uma espirituali-dade mais honesta e valiosa. Eu suponho que minha opinião é de certa forma semelhante ao budismo, mas sem as conotações religiosas.

6 - T. Angel: Você acha que é possível mo-dificar o corpo separando-o da mente e es-pírito?Eldge: Não. Partindo do pressuposto de que corpo, mente e espírito são inseparáveis e, ainda, não são realmente identificáveis como coisas separadas. Eu sou bem anti-cartesiano nesse sentido: “cogito, ergo sum” (penso, logo existo) é um monte de lixo. Do ponto de vis-ta fisiológico, nossa memória celular não vive em nossos cérebros sozinha, mesmo que as sinapses do cérebro façam conexões com base em mensagens sensoriais enviadas a

partir do corpo. Nossa visão de mundo está ligada às nossas experiências sensoriais do mundo, tais experiências nos desenvolve in-consciente e conscientemente e nos recriam emocionalmente mais e mais pela maneira de “quem somos”. Daí a eficácia da programa-ção neurolinguística (PNL), como uma forma de “reprogramar” nosso falido emocional. E, como mencionado acima, eu não acredito que há um “Deus” que nos deu um espírito. Pelo contrário, nós somos um grupo de seres que evoluíram a partir do lodo primordial, para ser-mos conscientes do nosso mundo material, o que inclui a nossa própria corporeidade e nós temos experiências emocionais em relação ao mundo. “Espírito” é uma relação emocional com o valor de estar vivo, e para conexões com a idéia de existência. Se esta consciência transcende o material, e se a energia física que habita nossos corpos se move em outra parte (ou volta em um outro corpo, ou talvez algu-ma outra opção) depois que nós morremos é uma questão só passível de resposta quando nós realmente morrermos, e pode muito bem depender da constituição da energia de uma determinada pessoa. Assim, é possível que as pessoas que acreditam em céu vão para um lugar que se aproxima quando elas morrem,

porque elas criaram a força energética para levar aquela sensibilidade com eles depois da morte. Aqueles que acreditam em reencarna-ção poderiam muito bem reencarnar, enquanto os ateus poderiam simplesmente “puff” e de-saparecerem, as energias deles seriam para alimentar alguma outra coisa. Ou talvez nós todos nos reunirmos em uma indistinguível e inconsciente bola de energia depois da morte. Ou talvez nós simplesmente desaparecermos. Mas eu digresso... Essa digressão rotunda sig-nifica que modificar o corpo é, por definição, modificar a mente e o espírito, que são todos um só. Por sua vez, modificar o corpo é real-mente modificar a sociedade e o mundo, e, por implicação no universo também, uma vez que é um exercício de escolha que conflita com o embutido desejo evoluído para evitar a dor, e só para fazer coisas que são praticamente úteis. A modificação serve para muitos pro-pósitos, por exemplo, expressar simbolismo, transformar estados emocionais, reajustar prá-ticas aprendidas, localizando e nos orientando social, cultural e espiritualmente e etc. Depen-de do que cada indivíduo precisa alterar como o que já foi mudado. Para alguns, a modifica-ção é principalmente sobre desafiar a socie-dade, enquanto para alguns é sobre se tornar

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mais OK com eles próprios, enquanto que para outros é sobre a conexão com algum tipo de significado transcendente. Mas você não pode separar mente, corpo e espírito, para a maioria é uma combinação de todos os tipos de coisas. Pra mim, a modificação é sobre afastar-se da dor, medo e obrigação em direção a conexão, possibilidade e libertação, nos planos social, cultural, emocional, sexual e espiritual.

7 - T. Angel: Você está se modificando (cor-po e mente) por duas décadas. Quando isso começa?Eldge: Tudo começou quando eu tinha uns 14 e tinha o desejo irreprimível de furar minha orelha. Até mesmo porque era muito desafia-dor em minha comunidade conservadora, eu tinha que esconder isso dos meus pais. Nada demais aconteceu entre aquela época e quan-do eu cheguei à universidade e, morei longe de casa pela primeira vez eu tinha 18 anos (em 1991), quando eu comecei perfurar outras coi-sas. Eu fiz minha primeira tatuagem com 21, depois quando tinha uns 23 comecei os alar-gadores e assim por diante. Afastei os limites o tanto quanto eu poderia ainda ser empregável, mas eu realmente só comecei com a ideia da modificação corporal completa, quando decidi que eu nunca queria ser um membro “normal” da sociedade. Suponho que depois que eu dei-xei a prática legal, e me dei permissão para o risco do desemprego, pois a minha liberação corporal era mais importante que o suicido emocional da conformidade.

8 - T. Angel: Conte-nos sobre os seus im-plantes no seio. Quando você decidiu tê-los?Eldge: Creio que eu sempre quis ter um pei-to grande. Me interessei pelo “body building”, mas eu era muito preguiçoso para treinar á sério. Naquela época eu estava ativamente interessado em desenvolver meus músculos peitorais, que sempre foram proporcionalmen-te maiores que meus outros músculos. Mas eu não penso muito sobre isso. Então, em 2001 meu lóbulo alargado estourou (eu estava com 4 cm de cada lado), tive que ir até um cirurgião plástico para concertá-los. Quando eu estava no consultório do cirurgião eu perguntei, fora de interesse, quais possibilidades haviam para aumentar o tamanho do meu peito. Ele me dis-se tudo sobre os implantes de peitorais, mas eu estava interessado em algo mais suave e maior do que eles permitiam, pois o implan-te de peito parecia algo como muito dinheiro para pouquíssimo retorno. Eu pesquisava a questão, perguntando sobre os implantes ma-mários e ele parecia aberto à idéia. Naquele momento, creio que me dei permissão para “ir lá” e me permitir estar aberto a idéia, a qual es-teve inconsciente o tempo todo. Armado com informações, eu fui embora e pensei muito so-bre isso e decidi que eu REALMENTE queria seios. Levei muito tempo para juntar o dinheiro para fazer a operação e para encontrar um ou-

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tro cirurgião disposto a fazê-lo, uma vez que o cara que eu havia falado tinha emigrado. Eu finalmente fui adiante em 2004, com o maior tamanho que o cirurgião pode implantar: 500 cc em cada lado. Então eu tive contratura cap-sular em um dos lados e tive que retornar para um ajuste em 2005. Depois da primeira cirur-gia eu estava decepcionado com a forma com a qual eles estavam pequenos, e fiz um upgra-de para 700 cc cada lado, que é o que meu orçamento permitiria (o custo dos aumentos dos implantes aumentaram dramaticamente para tamanhos grandes). Quem dera tivesse pagado a mais pelos de 1000cc, uma vez que 700cc ainda estão demasiado pequenos.

9 - T. Angel: Há uma discussão transexual envolvida nessa parte do seu projeto de modificação corporal?Eldge: Havia a questão da identidade transgê-nera, a qual eu luto por um bom tempo, antes e depois da cirurgia. Mas eu percebi que a conversa era realmente sobre o que as outras pessoas pensariam, ao invés do que eu acre-ditava sobre mim mesmo. Eu realmente cavei profundamente dentro de mim e me questio-nei sobre gênero, o que isso significa pra mim, como eu sinto sobre ser um garoto, como sin-to sobre meu corpo e também como eu sinto sobre meu pau e bolas (daí o meu mestrado). Intelectualmente eu percebi que não há dife-rença essencial entre masculino e feminino e que não importa se eu tenho um pinto ou não, ou se eu tenho mamas ou não. É mais sobre os diferentes componentes de mim como um ser humano e não como um “garoto” ou uma “garota”. Percebi que eu não sou transgênero de verdade, no sentido de não estar feliz com o meu sexo e querendo ser outro. É um pouco sobre puxar sentimentos e associações juntas de várias partes e transformá-los em um todo, que não é na verdade conflitos entre um cor-po sexuado e um mente sexuada oposta. Isso se liga em minha sexualidade também, que é uma questão que precisa ser respondida para muitos transgêneros. Eu fico excitado com homens, mas eu amo pornô hétero, homens-trans, “shemale” (desculpas às mulheres-trans que odeiam esse termo, politicamente me opo-nho a ele, mas de uma perspectiva gay eu amo “tanto quanto” a libertação e a sensualidade de uma linda mulher com um pinto grande). Eu não tenho interesse em enfiar meu pau em lu-gar algum e eu prefiro ser fodido, o que não faz de mim “femino”. Então, eu não sou “transgê-nero” como em querer ser/sentir como uma ga-rota. Porém, eu me sinto “transgênero” como significando de “gênero transcendente”. Acho que algum tipo de rótulo seria “gênero mas-culino não conformista com fundo agressivo”. Ou talvez apenas “pervertido”. Isso quer dizer que eu não quero seios “reais”, mas eu amo ter os implantes. Pra mim é realmente sobre a perversão: é como uma perversidade sexual, política e emocional, ligado para ser um garo-to com seios falsos e um pinto grande demais para ser usado!

Eldge implantou mais de um litro de silicone no pênis e escroto. Foto do arquivo pessoal de Rev Lincoln Taka Eldge

Eldge com silicone no pênis e escroto. Foto do arquivo pessoal de Rev Lincoln Taka Eldge

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10 - T. Angel: Vamos falar sobre seu pênis e bolas. Conte-nos sobre o processo do si-licone.Eldge: O processo é realmente bastante sim-ples, uma vez que você encontre os recursos: é difícil encontrar o grau certo de silicone líquida (grau cirúrgico). Muitas pessoas tentaram ou-tros tipos de fluídos e morreram no processo, devido ao silicone sujo e técnicas impróprias. Você não pode ir na loja de ferragem local e comprar o material lá! Também é potencial-mente perigoso em casos que se injetam na veia, isso pode viajar para o coração e causar uma embolia. Por isso, é imperativo que seja feito por um médico conceituado e, geralmente não é um procedimento inteiramente “legal”. Embora na maioria dos locais não seja ilegal fazer, não é aprovado pela fraternidade médi-ca, então, cirurgiões plásticos e doutores não vão fazer esse tipo de procedimento. Há um doutor em Tijuna, México , e um profissional em Londres, que é onde eu vou. Mas depois de ter encontrado a pessoa certa, é realmente simples. Você liga para o cara, faz um agenda-mento, gasta muito dinheiro em passagens de avião, se você vive do outro lado do mundo e vai visitá-lo. O silicone é injetado sob a pele do pênis e em vários lugares do escroto, não no pau ou testículos em si. O ponto de inserção da agulha fecha por si só ou é fechado com um maço de super cola e papel. Então você enrola isso ao redor para conseguir o efeito desejado, por fim, você o deixa se ajustar so-zinho. Os profissionais desenvolveram várias técnicas para minimizar o inchaço e para ga-rantir o melhor efeito e, no geral, é um proces-so indolor, exceto pela picada de agulha como uma injeção, o que realmente é, apenas em uma grande escala. Eu descobri que para o maior tamanho o melhor é esperar um longo tempo para se ajustar, o que parece melhor é fazer depois de 9 meses, 18 meses parece ser o truque para que a pele relaxe totalmente e esteja pronta para uma outra grande carga (a primeira vez eu injetei somente 240cc, a segunda vez aproximadamente o mesmo e a terceira vez em torno de 450). A pele se torna muito sensível durante muito tempo, eu tive que investir em calças e cuecas macias. De-pois disso, a pele nunca desliza sobre o pau e bolas como fazia antes e eu não posso mais fazer nenhuma ginástica sexual com meu pau, desde que se tornou doloroso sem lubrificação, mas eu prefiro não usar meu pinto de qualquer modo. O efeito é fantástico e o constante peso pendurado entre minhas pernas é incrível.

11 - T. Angel: Tattoo, piercings, implantes e alargadores. Algum plano para futuras mo-dificações?Eldge: Estou trabalhando na parte 1 do meu “Embedded Form Project” (Projeto formulário incorporado) que deve ser terminado em De-zembro de 2012. Atualmente estou trabalhan-do no meu processo de tatuar o corpo inteiro (tatuagem em toda parte do meu corpo, não 100% coberto, exceto pelo meu rosto e meio

das costas ). Este ano eu vou provavelmente terminar minha perna esquerda e meu quadril direito. Em média eu visito uma vez por mês o meu artista (Simon do Wildfire em Cape Town. Eventualmente, após 2012, eu termine minhas costas com um Buda, para representar a aproximação do projeto. Eu provavelmente continuarei com meu rosto depois disso tam-bém, mas eu preciso me estabelecer melhor trabalho sábio primeiro, e de qualquer modo, eu não quero esconder completamente o meu rosto. Piercings vão e vem. Eu tenho cerca de 22 agora, e posso fazer mais, ou não, depende do meu humor. Eu alarguei meus nostrils para 18 mm, e provavelmente irei deixa-los em 20 mm ou mais. Meu labret está cerca de 14 mm.

Foto do arquivo pessoal de Rev Lincoln Taka Eldge

Eu o fiz para ficar em torno de 22, mas ficou in-comodando muito no dia-a-dia, então eu deixei fechar. Eu gostaria de poder ter 100 mm e eu tenho um enorme respeito por pessoas como Jenya na Rússia e Rafa no Brasil, mas pra mim ficou muito pesado e doloroso (acho que a perfuração era muito baixa) e eu preciso da minha capacidade de voz desempedida para poder dar aula. Eu estou re-alargando meus mamilos, ambos estão em 10 mm agora, e eu provavelmente irei parar em torno de 12 mm, embora eu possa ir mantendo em uma polega-da ou mais, mas é possível que eles rasguem antes. Eu gostaria de dilatar com pesos ao in-vés de alargar, possivelmente, seja o caminho a percorrer. Eu quero aumentar o tamanho dos

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meus implantes no seio para 1200cc em cada lado até o fim de 2012. Estou tentando juntar o dinheiro para isso. Infelizmente, consta que implantes de silicone de mais que 1000cc não estão sendo feitos (eu não quero salina, que não faz bem), então eu vou ver o que pode ser feito. Eu não sei se é possível, mas eu ama-ria conseguir expandir o implante preenchidos com 1200cc de silicone, expansível até 3 litros ou mais, então eu posso lentamente trabalhar o meu caminho para os implantes super-gran-des sem ter que ter caras e dolorosas cirurgias ao longo do caminho e me possibilitando parar quando o tamanho estiver bom, se maior ou menor que 3 litros. É muito arriscado ter silico-ne liquida injetada diretamente no meu peito, devido a proximidade ao coração. Eu não que-ro uma embolia. Espero conseguir mais 1.2 li-tros de silicone no meu pinto e bolas antes do fim de 2012, e então, nos anos seguintes es-pero aumentar para cerca de 6 litros ou mais, como Greg nos USA. Mas de novo, eu preciso estabilizar melhor o meu trabalho e rendimento antes disso, e chegar a um acordo em estar sendo chamado de lado todo tempo que passo pela segurança no aeroporto. O segredo será em encontrar o equilíbrio entre meus desejos perversos e minha vida real. Por alguma razão implantes subdermal e transdermal estão em baixa na minha lista, embora alguma brinca-deira com aparência alien, implantes na testa seriam legais, como seria legal uma mandíbula hiper masculina e maçãs do rosto acentuadas. Novamente, isso é um plano para algum tem-po no mais distante futuro, mas se eu conse-guisse financiamento para o projeto de arte de 2012 eu consideraria seriamente mais cedo. Mas, dito isso, eu tenho estado muito concen-trado nas grandes mods por um longo tempo, como fazer as grandes doses de silicone no meu pinto e bolas, e maiores implantes nos seios e terminar meu tattoo suit. Agora estou focando uma progressão mais holística e me-nos invasiva, como lentamente fazer uma cha-pa de dentes de prata o que é praticamente in-dolor, e colocar minha peça da língua de volta depois de muitos anos sem ela, e deixar meu cabelo crescer de novo (sim, eu vejo estilos de cabelo como uma mod também!). É bom focar em manter o ajuste e olhando minha saúde e encontrando um equilíbrio de vida, ao invés de estar obcecado em ter mais e maiores mods, como eu fiz no passado. As vezes tenho ten-dência para esquecer de “cheirar as rosas”, apreciando a jornada que me permite aprovei-tar as pequenas coisas de novo.

12 - T. Angel: Qual a coisa mais interessan-te que você poderia nos contar sobre sua pesquisa com corpos?Eldge: Corpos são as coisas mais fascinantes. Todo mundo tem um, nenhum deles é igual e nenhum executa a mesma função para todos, além das necessárias, comer, cagar, foder, etc, e até mesmo essas experiências tem um sig-nificado diferente para cada um. Não existe tal coisa como “um corpo”. “O corpo” é uma cons-trução da sociedade e de nossas experiências

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em nossa própria materialidade. Preferencial-mente, a experiência incorporada transporta significado e valor para as pessoas. Desta for-ma, o corpo físico é como qualquer outro obje-to em torno de nós: portanto, é parte de nós e nos separa, e faz parte do continuum entre as consciências individuais. Não é necessário um começo ou fim para o corpo, nem entre o corpo e a mente, ou entre corpos e coisas. Assim, estamos todos conectados uns aos outros e ao mundo que nos rodeia, quer queiramos ou não. Quando nos construímos (ou nos modifi-camos), nós construímos um mundo em torno de nós e quando destruímos nossos corpos, destruímos também o mundo em torno de nós. Então corpos (e modificações) estão ligados à política e ecologia, economia e bem estar so-cial e tudo mais. Eles são pessoais, públicos, políticos, emocionais e o único meio à nossa disposição para existirmos. Nós devemos ce-lebrá-los!

Eldge antes do implante de silicone no pênis. Foto do arquivo pessoal de Rev Lincoln Taka Eldge

CONTATOS | CONTACTSwww.eldjaytee.co.zaProfile no FRRRKguys.com

*T. Angel - São Paulo/BrasilTécnico em moda pelo SENAC e acadêmico em História pela Universidade FIEO, integra o staff do site argentino Piel Magazine e é dire-tor geral do website Frrrk Guys, que aborda as temáticas da modificação corporal e da beleza masculina oriunda dessa prática. Desde 2005 vem atuando no cenário da performance art. Nos últimos anos, Thiago Ricardo Soares vem colaborando com artigos para diversas revis-tas nacionais e internacionais. Tem experiên-cia na área de História, atuando principalmente nos seguintes temas: body art, performance e modificação corporal. Como pesquisador his-tórico, interessa-se pelos seguintes temas: body art, performance e modificação corporal. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/2319714073115866

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“Em toda criação humana, no entanto,

revelan-se certos critérios que foram

elaborados pelo indivíduo através de

escolhas e alternativas.”

OSTROWER (1987)

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Foto: Cláudio etgesIntérprete: Simonne RoratoEspetáculo: “Ditos e Malditos: Desejos da Clausura” - 2009 Direção e Coreografia: Carlota Albuquerque

“A cada novo projeto, um olhar para o processo de composição da obra. No Terpsí cada obra é soberana, cada processo é único e em cada momento nos transformamos, tal-vez por acreditarmos que faremos de forma intensa tudo como da primeira vez...” ALBUQUERQUE, Carlota, 2009Diretora e coreógrafa da Terpsí Teatro de Dança

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ESPAÇO LIVRE

Foto: Aldren Lincoln

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A Vácuo – QuitandaGiltanei Amorim*Fotos: Aldren Lincoln

ESPAÇO LIVRE

Histórico do Quitanda

O Quitanda surgiu em meados de 2006 a partir da reunião de artistas então es-tudantes do Curso de Graduação em Dança da Universidade Federal da Bahia. Traz em sua emergência uma dança investigativa pos-sibilitada por intérpretes com experiência em linguagens como Teatro, Vídeo, Iluminação, Fotografia e Vídeo. Por esses aspectos, vem, ao longo de sua existência, desenvolvendo tra-balhos artísticos que propõem borrar fronteiras entre as categorias da arte, iniciando proces-sos de desterritorialização entre linguagens para promover distintas formas de apreciação estética na obra de arte.

É possível reconhecer, nos trabalhos do Quitanda, temas que atrelam a imagem à idéia de estranhamento, e fazem emergir questões que se associam ao corpo na socie-dade de consumo, a relação espaço-tempo na contemporaneidade e as discussões sobre se-xualidade e gênero - discursos políticos que se materializam na elaboração da dança.

Release da Intervenção Urbana

A Vácuo

A intervenção urbana A Vácuo dis-cute o corpo na sociedade de consumo e per-passa questões como raça, gênero e sexua-lidade. A obra se configura pela aproximação de informações diversas que partem de con-textos diferentes e que estão estritamente re-lacionadas à idéia de produto. Neste aspecto, a aproximação dessas informações, relocadas para o espaço público, promove o sentido de estranhamento e, por conseguinte, distancia o público para gerar reflexão critica sobre o que é apresentado.

Em “A Vácuo”, o corpo, o plástico, o carro de supermercado, e os arquétipos dos performers que participam da obra, compõem imagens que objetifica o sujeito, num entrecru-zamento onde emergem as perguntas: O que é consumível? Quem consome o que? Quem come quem?66 - Informe C3

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Foto: Aldren Lincoln

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Nessa abordagem, os performers deslocam-se pelo espaço urbano e dialogam com as paisagens e as situações que emer-gem na experiência entre os sujeitos e o espa-ço público. A aproximação da intervenção com as paisagens e situações inerentes do espa-ço urbano detona os mais variados nexos de sentido no público que experiência o A Vácuo, explicitando sua plasticidade e a diversidade de leituras que esta pode promover. Carros de supermercados confundem-se com os au-tomóveis no trânsito caótico da cidade, corpos embalados em plástico-filme são disponibi-lizados frente às galerias das grandes lojas, out-doors são configurados e desconfigurados constantemente, apresentando o corpo em sua funcionalidade mercadológica.

Ficha Técnica

Concepção e direção: Giltanei AmorimPerformers: Eros Ferreira, Isaura Tupiniquim, Ítalo Zazú, Joane Bittencourt, João Miguel, Luna, Mab Cardoso, Milianie Matos e Thiago Enoque.

Repertório do QuitandaEspetáculo Seu João Ninguém - 20062006- Espetáculo apresentado no XIX Painel Per-formático da UFBA – Salvador - BA;- Espetáculo Contemplado pelo Edital do Quar-ta que Dança da Fundação Cultural do Estado da Bahia – Salvador – BA;

Espetáculo INBOX - 20072007- Espetáculo apresentado no World Dance Alliance – Aliança Geral das Américas – Sal-vador – BA;

2008- Espetáculo Contemplado pelo Edital do Quar-ta que Dança da Fundação Cultural do Estado da Bahia - Salvador – BA;- Espetáculo apresentado no Seminário Dan-ça em Debate da Escola de Dança da UFBA – Salvador – BA;2009- Espetáculo apresentado no Projeto Nós de Casa Ano II – Salvador – BA;

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Foto: Aldren Lincoln

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- Espetáculo Contemplado pelo Calendário de Apoio da Fundação Cultural do Estado da Bahia – Circulação nos Interiores do Estado da Bahia – Salvador – BA;

A VÁCUO - 20092009- Intervenção Urbana apresentada na Platafor-ma Internacional de Dança (PID) – Salvador – BA;

Espetáculo-Instalação UM ALEMÃO CHA-MADO SEVERINO - 20092009- Espetáculo Contemplado pelo Edital Yanka Rudska para Montagem de Espetáculos de Dança – Fundação Cultural do Estado da Bahia;- Temporada no Teatro ICBA – Espaço do Go-ethe Institute – Salvador – BA;- Espetáculo apresentado na Bienal SESC de Dança – Santos – SP;- Espetáculo em curta temporada no Projeto Outras Dança (Projeto realizado pela FUNAR-TE em parceria com a FUNCEB em homena-gem ao ano da França no Brasil) – Salvador – BA;- Espetáculo em curta temporada no Projeto Mudanças (Projeto realizado pela Diretoria de Dança em parceria com a Diretoria dos Mu-seus - FUNCEB) – Salvador – BA.

Outros Projetos2009- Formação para jovens artistas do interior do Estado – Projeto apoiado pelo Edital de For-mação e Qualificação Artística e Cultural da FUNCEB – Salvador – BA.

*Giltanei Amorim - Salvador/BahiaFormou-se em Interpretação para atores no ano de 2002. Em 2004 trabalhou com o Grupo Dimenti e em 2006 ingressou no Curso de Gra-duação em Dança da Universidade Federal da Bahia. No mesmo ano fundou o Quitanda e passou a fazer parte do Grupo de Dança Con-temporânea da UFBA onde atuou como intér-prete, e em 2008, como Assistente de Direção. Em 2009 trabalhou junto ao Núcleo VAGAPARA e participou de Festivais e Mostras importantes no cenário da Dança Contemporânea no Bra-sil, a exemplo da Bienal SESC de Dança-SP e do projeto Outras Danças – parceria entre a Funceb e a Funarte em comemoração ao ano da França no Brasil.

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São Paulo Companhia de Dança

EntreatoCoreografia de Paulo CaldasFoto de João Caldas

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São Paulo Companhia de Dança

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SÃO PAULO COMPANHIA DE DANÇA A criação recente de uma proposta de estímulo

Wagner Ferraz*

ENSAIO 06

“Todo dia a gente al-cança alguma coisa, e todo dia a gente vê que ainda tem muito que fazer, todo dia você acerta alguma coisa e vê a fragili-dade de outro lado”. Inês Bogéa

Sentado em um confortável sofá em um corredor onde bailarinos passavam de um lado para o outro, batendo o ponto de chegada ao trabalho, se preparando para aula de dança e ensaios, me encantei com um contexto onde a dança é o foco de tudo. Onde a dança é vista como elemento fundamental e constituidor da cultura de um país, recebendo o apoio do es-tado e de diferentes profissionais.

Fiquei tão impressionado que me senti em um filme, até pode ser um comentário romântico, mas era a plena verdade que tem sido construída pela São Paulo Cia de Dança (SPCD) que teve seu lançamento oficial no dia 28 de janeiro de 2008 sob a direção de Ira-city Cardoso e Inês Bogéa. Ambas permane-cem na direção e foram criadoras do projeto a convite do Secretário da Cultura do Estado de SP.

“O projeto é esse, foi o projeto que fi-zemos juntos desde o início, a criação da

Foto: Reginaldo Azevedo

Foto: André Porto

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Foto: Reginaldo Azevedo

Tchaikovsky Pas de Deux - Aline Campos e Ed Louzardo - Foto de Reginaldo Azevedo

Tchaikovsky Pas de Deux - Luisa Lopes Foto de Reginaldo Azevedo

Cia com essa quan-tidade de bailarinos, trabalhando do séc XIX ao séc. XXI com o clássico, o moderno e o contemporâneo, As Figuras da Dan-ça, o Projeto Educa-tivo Corpo a Corpo com o Estudante, Corpo a Corpo com o Professor...” Iracity Cardoso Recebido, com muita atenção, por Marcela Benvegnu, Coordenadora de Comu-nicação e Marketing da SPCD, o Processo C3 Grupo de Pesquisa conheceu o espaço onde reside a citada Cia de Dança na cidade de São Paulo. Acompanhamos alguns momentos das aulas, observando maravilhosos bailarinos de vários estados brasileiros, além de bailarinos que estavam trabalhando em outros países e perceberam a possibilidade de voltar para o nosso Brasil através dessa Cia.

Além da produção e circulação de espetáculo, a SPCD desenvolve outros pro-jetos onde envolve estudantes e professores investindo na formação de platéia. Um dos projetos tem se preocupado com a memória da dança brasileira, FIGURAS DA DANÇA, consiste na produção de documentários com a participação de artistas que construíram e constroem a história da dança no Brasil e con-vidados. De acordo com Marcela: “A Cia é a única no mundo com um projeto de registro e memória...

A Cia olha para o passado, por isso que fazemos tudo isso, para entender o presente, e para poder pensar num futuro em dança”. Marcela Benvegnu

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Foto: Reginaldo Azevedo

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Outro projeto desenvolvido, já citado anteriormente, é o CORPO A CORPO, que em um primeiro momento é voltado para a apro-ximação, de professores e arte-educadores, com a dança, onde estes participam de pales-tras e recebem um DVD com informações que servem de apoio para trabalhar na escola. “O corpo a corpo com o professor aqui em SP já é sucesso absoluto” declara Iracity Cardoso. E em segundo momento é voltado para estudan-tes aonde, saliente Marcela Benvegnu:

“esses mesmos professores que vieram aqui, preparam seus alunos para o espetáculo. Mui-tos nunca foram ao teatro. A expressão deles é um espetáculo a parte, eles ficam deslumbra-dos, e nós nos emocionamos... Normalmente acontece na semana de estréia da Cia, em en-saios da manhã ou da tarde, dançamos para eles, com luz, com figurino, com maquiagem, é um espetáculo, não tem nada de diferente de um espetáculo que seria para a noite”.

Outro produto desenvolvido é o “Vida de Bailarino”. É um DVD onde os bai-larinos contam os bastidores da cena, falam do dia-a-dia, falam sobre a escolha de elenco, que é algo difícil, pois alguém sempre fica de fora. Esclarecem como que é trocar o elenco, ser substituído por ter se machucado, uma sé-rie de fatores que normalmente o público não conhece. Essas ações mostram o quanto a SPCD se preocupa com o encaminhamento de informações para os espectadores, o quan-to o trabalho envolve a sociedade que aprecia ou tem algum tipo de contato com a dança.

A rotina da Cia para os bailarinos ini-cia às 10 horas da manhã e se estende até as 17 horas com uma hora para o almoço. Neste período participam de aulas de pilates, balé clássico, moderno, envolvidos com 3 professo-res as turmas se revezam nas salas. Além das aulas ainda vivenciam montagens, ensaios em grupos e ensaios separados, os intérpretes têm atendimentos de fisioterapia e psicológico. Há um grande cuidado com os envolvidos que constituem este trabalho.

Também há uma preocupação com o olhar que pode se tornar “acostumado” com os trabalhos, então sempre há um convidado para assistir as obras e escrever sobre elas no caderno de mesa da Cia, que é uma publi-cação que fala desta e de seus espetáculos. Artistas são convidados para criar a capa do caderno, traçando assim um diálogo com dife-rentes segmentos, o que auxilia no crescimen-to e amadurecimento artístico deste projeto.

A SPCD vive em uma intensa produ-ção, em dois anos se apresentou em 19 cida-des e realizou 101 apresentações, produziu 18 documentários e atingiu um público de 58.000 pessoas. “Nesses dois anos a Cia produziu oito trabalhos, oito coreografias. Quatro foram remontadas especialmente para a Cia, e ou-tras quatro foram concebidas, ou seja, desde a trilha sonora até o figurino foram pensadas especialmente para este corpo que a gente vê aqui”. Marcela Benvegnu

E “esses corpos” que compõe a Cia falam do trabalho desenvolvido no DVD inti-tulado “Canteiro de Obras”. Este DVD reúne alguns acontecimentos da Cia nos bastidores 82 - Informe C3

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Tchaikovsky Pas de Deux - Luisa Lopes - Foto de Reginaldo Azevedo Foto: Reginaldo Azevedo - Les Noces

e a frente da cena, apresenta as montagens e como foram feitas. As pessoas que participam contam suas experiências. O DVD vem acom-panhado de um livreto com textos e fotos que falam sobre a SPCD.

“A gente sempre pensa na continui-dade das ações da Cia, é claro que um caminho foi percor-rido e esse caminho é, sobretudo dos en-contros com artistas de diversas áreas, bailarinos, coreó-grafos, ensaiadores, escritores, músicos, artistas plásticos, pessoas da moda e juntos nós fomos construindo esse caminho. A idéia ini-cial surgiu entre eu

e a Ira conversan-do com o Secretário (da cultura do esta-do de SP), mas ela só se consolida nas próprias ações”.Inês Bogéa

Ações essas que envolvem diferen-tes pessoas e com múltiplos focos na dança, como propostas diferenciadas para os mesmo corpos. “A Cia é uma Cia de repertório, não é por que dança Balé de Repertório, é uma Cia que dança clássicos do Século XIX até os dias atuais. Como a gente dança o Serenade que é um Balé super antigo a gente dança os Duplos, a nova montagem do Maurício de Oli-veira. Esses corpos são treinados para dançar de tudo. E é isso que a Cia quer, quer um ecle-tismo, que eles dancem tudo, que eles transi-tem por todos esses espaços, que esse corpo saiba dançar um Balé Clássico, que ele saiba dançar a Dança Contemporânea”.

Isso é confirmado por Iracity Cardo-so quando fala sobre o processo de seleção dos bailarinos que devem ter uma base clás-sica, mas precisam estar disponíveis para pro-postas diversificadas. “Nosso repertório é bas-tante diversificado, deve-se ter conhecimentos bastante sólidos do Balé Clássico e para as mulheres pontas, além de aulas de Balé Clás-sico, Dança Moderna e entrevista”.

Mas são essas prioridades que fun-damentam a construção da identidade cênica desta Cia que mesmo tão jovem tem realizado algo que já esteve no imaginário de muitos ar-

tistas, como possibilitar que a dança no Brasil esteja consolidada enquanto profissão, com registro. É claro que outras Cias no Brasil pos-sibilitam que alguns bailarinos vivam da dança, mas a SPCD tem sido a facilitadora para que muitos bailarinos voltem para o Brasil podendo continuar suas carreiras por aqui.

“Nós temos várias Cias que têm ver-ba pública, e quan-do se foi criar a Cia, uma das questões era: Olhar para as Cias Brasileiras e ver como se produz dança. Como exem-plo temos os Balé do Teatro Castro Alves, do Palácio das Artes, o próprio Balé da Ci-dade de São Paulo, o Teatro Guairá... E outra questões é a longevidade do bai-

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Foto de João Caldas - Entreatov

larino. Todo mundo fala: A Cia é jovem! Mas aí quando você pára pra ver mesmo a idade dos baila-rinos, a média é 25 anos, não é uma Cia jovem compara-da ao New York City Ballet onde a média dos bailarinos é 22 anos. Então, o que é uma Cia de Dan-ça que optou por um tipo de repertório onde a capacidade técnica, destreza e o virtuosismo são fun-damentos para a ex-pressividade? Como é que você pensa na

estruturação dessa Cia que vai ter ao mesmo tempo uma jovialidade, mais uma presença cêni-ca, uma capacidade de expressão que só vem com o tempo?” Inês Bogéa

As palavras de Bogéa despertam algumas interrogações. Seria a SPCD o estí-mulo para um novo momento para a Dança no Brasil? Através do exemplo dessa Cia muitos outros estados e cidades poderiam pensar na criação de Cia de Dança que gere emprego para profissionais da Dança, e que tenha um produto final a ser oferecido e disponibiliza-do para a sociedade com grande qualidade e conscientes de questões fundamentais que o produzem.

A SPCD salienta a importância de trabalhos onde bailarinos recebam todos seus direitos trabalhistas, tenham um contrato de trabalho, mas estejam atentos, pois passam por fases de experiência como em outros empregos. “Houve alguns momentos em que algumas pessoas ficaram chocadas quando alguns contratos de trabalho não foram reno-vados, mas isso faz parte do mercado de tra-balho. Às vezes a pessoa se adapta a um tipo de trabalho e às vezes não. Nós temos aqui a vantagem de termos contratos em que o baila-rino recebe um aviso prévio, ele tem suas fé-

rias pagas, seu 13º salário pago, seu Fundo de Garantia retirado, ele não sai com uma mão na frente e outra atrás (risos). O que é o nor-mal no nosso mercado de trabalho, pessoas que trabalham 10 ou 11 anos e saem de um lugar sem nada. E isso é grande volume do nosso orçamento, a folha de pagamento, pois todos são contratados rigorosamente de acor-

do com as leis trabalhistas. A Dança é uma profissão em que o bailarino co-meça muito jovem, e quando vai acor-dar aos 40 anos e se perguntar. E agora? O corpinho já não dá mais conta”. Iracity Cardoso

São tantas questões que permeiam o mercado de trabalho, a criação artística e produção da dança, e na SPCD é possível perceber que esses pontos foram pensados em seu planejamento. Gostaríamos muito de fazer uma análise artística da Cia, mas nossa visita só nos possibilitou um conhecimento es-trutural e organizacional do trabalho. A análise do resultado de todos os elementos citados neste texto que constituem essa Cia,fica para o momento em que tivermos a oportunidade de assistir uma obra ao vivo.

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“Depois de dois anos eu olho para trás e penso que, o caminho é certo por que ele é cercado de artistas. Não só se pensa na pro-dução e circulação do espetáculo, mas também se pensa em como a dança tem que fazer parte da discussão central da Cultura, como é que você gera co-nhecimento a partir de uma área espe-cifica artística, como é que outras pes-soas se interessam por discutir a dança. E também como é que chegamos até aqui...? Refletir so-bre as pessoas que fizeram a história da dança, que fazem a história da dança e tê-los como parcei-ros da Cia. Nesse sentido a gente tem toda a parte de me-mória da dança e do registro da dança...” Inês Bogéa

Paula Penachio e Amanda Pessoa em Passanoite - Foto Reginaldo Azevedo

Cena de Passanoite - Foto Reginaldo Azevedo

Cena de Passanoite - Foto Reginaldo Azevedo

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Foto: João Caldas - Ballo

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Que muitas Companhias de Dança se estabilizem estruturalmente, organizacio-nalmente e financeiramente, proporcionando a continuidade da criação da história da Dança Brasileira. Proporcionando momentos de con-templação por trabalhos cênicos tão diversos desenvolvidos pelo Brasil a fora. Parabéns a SPCD pelo maravilhoso trabalho e pelo suces-so em tão pouco tempo.

Visitem o site da São Paulo Cia de Dança!!!www.saopaulocompanhiadedanca.art.br

Luiza Lopes e Felipe Antunes em Polígono - Foto Reginaldo Azevedo

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Gna

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Gnawa - João Caldas

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F5 teatralRodrigo Monteiro*Fotos: Betânia Dutra

CRÍTICA TEATRAL

Outro dia, tive que excluir um amigo do twitter. Não. Ele não é do tipo chato, quem posta cinco tweets[1) por minuto informan-do aos seus mil followers notícias chocantes sobre o alface que cai do seu sanduíche ou impressionantes apontamentos sobre uma letra que digitou errado no MSN. Não é esse o caso. Trata-se de um amigo que expressa no miniblog do momento a ânsia por mostrar ao mundo que seus vinte anos valeram a ele, até agora, mais leituras e vivências do que a muita gente de quarenta. A cada novo post, havia uma informação mais nova, um hiper-link mais interessante, uma expressão que eu nunca tinha ouvido falar. Resultado: ao efes-sincar o browser, eu acabava desviando minha atenção dos estudos para saber sobre o quê o menino estava dizendo. E lá ia eu pesquisar alucinadamente até compreender a mensa-gem coolest do minuto. Deusmelivre da não atualização!

Há tempos, me intrigava essa coisa nervosa do teatro pós-dramático. É fácil com-preender o que motiva o espectador/leitor de uma história hierarquizada: ele quer saber o que vai acontecer no final, uma vez que tudo se encaminha pra isso. E não desiste do ob-jeto enquanto não descobrir que final é esse. Então, só ontem eu entendi o frenesi de um texto em que as informações não convergem, os personagens não se unem, os elementos narrativos não são interligados e a lógica é a ausência de lógica, a coerência vive inde-pendente da coesão. Na platéia de “Solos Trágicos”[2], novo espetáculo do Depósito de Teatro[3], eu percebi que, a cada efessin-cada, uma multidão de hiperlinks surge com novos sentidos na fruição dessa assinatura de Roberto Oliveira[4]. E você não descansa en-quanto não dominar todos eles, ávido por não ser/estar ultrapassado.

Não há dúvida: Porto Alegre é uma cidade bem servida de diretores teatrais. Mas, de fato, muitos precisam comer bem mais fei-jão para se aproximar de quem também se chama Modesto Fortuna. E, para que não se pense que o calor da hora ainda não passou e se reflete nessa consideração, explico: noto que, quando vou ver uma peça do diretor X, Y ou Z eu já sei o que vou ver. Já sei que vai ser uma peça tradicionalista, já sei que vai ser um espetáculo sem cenário, já sei que vai ter muitos vídeos, já sei que os atores vão gritar muito, já sei que vai ser uma produção muito cuidadosa, etc, etc... Como poucos, no entan-to, Roberto Oliveira me dá duas certezas: já sei que vou ver algo que o diretor, até então, nunca fez e que, para ele, é um desafio. E te-nho a certeza de que vou ver algo bom. “Solos Trágicos” é o exemplo da vez.

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Fiz questão de não ler o blog da peça que, agora sei, mais funciona como o caderno de direção de Oliveira, o que é um material de consulta excelente! Assim, sabia por amigos que se tratava de um espetáculo em que vários trechos de tragédias foram pi-coteados e colocados fora de seus contextos em forma de monólogos na boca de oito ato-res. Para me prevenir da chatice conferentó-ria, não me interessei em saber que tragédias eram essas, que personagens eram esses, que textos seriam utilizados à guisa de outros. Na platéia, então, aqui e ali reconhecia uma Ofélia, uma Antígona, um Hamlet, bibibi, mas nunca realmente tinha a total certeza disso. In-vocação: quem são esses personagens? Que texto é esse? Que história é essa? Que autor é esse?

Então, vem o coro e outros elemen-tos surgem, muitas vezes, em direções opos-tas ao texto dito. O texto dito é só um texto pronunciado. Completamente descontextuali-zado, unido a outros textos e de outras partes da mesma história, e, ainda, acompanhado de personagens de outros tempos e luzes com outras propostas e uma trilha proposital (os músicos) e não proposital (os sons do ambien-te) motivadora, sua força semântica se perde totalmente. Dele, das palavras ditas, fica qua-se sempre apenas o som. Convocação: O que esses personagens têm a ver com isso? O que esse ator está dizendo? Por que ele está as-sim vestido? Que barulho é esse? Olha aquela luz lá!!! Meldeuz, que imagem linda!

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Então, olho para o público, cochicho com um amigo que me acompanha nessa as-sistência e que não sabe absoltamente nada de Shakespeare, Racine, Eurípides e Nelson Rodrigues. Os rostos de quem recebe a peça me dizem muito: poucos parecem entender o que estão vendo, mas ninguém tira os olhos da cena em nenhum momento. Então, me lembro de um relato da estréia de Show Boat[5], um musical de 1927. Quando o espetáculo produ-zido por Florenze Ziegfield[6], o maior produtor da Broadway antes da depressão americana, termina os aplausos vêm mornos. Entristecido, Ziegfield vai pra sua casa consciente de que, pela primeira vez em sua carreira, produziu um fracasso. Um espetáculo teatral como aquele nunca tinha sido produzido: caro, grandioso e inovador: números de vaudevilles, músi-ca popular, figurinos modernos, dança con-temporânea (anos 20). Só no dia seguinte, o produtor entendeu que os aplausos não eram de decepção: eram de êxtase em excesso. Ninguém estava acostumado com aquilo, não sabiam como reagir, não tinham meios de se expressar. O sucesso foi absoluto e repetido e repetível ainda hoje a cada musical que estréia no planeta. Em “Solos Trágicos”, me senti na platéia de Show Boat: você sabe que tem mui-ta coisa ali, você sente que é algo muito bom, mas você não sabe o que é, você não domina, é alheio a você. Que raiva!

A motivação desse novo espetáculo do “Depósito de Teatro”, um dos grupos mais importantes da história do teatro gaúcho, é o constrangimento. Roberto Oliveira e sua equi-pe de produção desorganizam o público, nos deixam atônitos com tamanha carga sígnica, expressam na dramaturgia encenada a reali-dade vivida por quem não é Édipo, mas está em frente à Esfinge[7]: ou responde, ou morre. Talvez, o trágico da pós-modernidade é a in-capacidade humana de conviver com tamanha velocidade informacional: se um dia, o nome genealógico dividia os humanos entre castas, ou, então, a classe social e os bens patrimo-niais, hoje, certamente, quem sabe mais, man-da mais. E corra você ao seu browser mais próximo, evitando o Wikipédia, para estar on top dos assuntos do momento.

Em termos técnicos, pouco não deve ser elogiado na produção. O elenco é excelen-te, estando na surpreendente força de Fernan-da Petit a concretização da força de Oliveira em fazer os músicos andarem com seus sons, em fazer a luz de Cláudia de Bem espalhar o espaço e aumentar o lugar, em motivar a con-cepção de figurinos que gritem tanto quanto e não menos do que qualquer outro elemento. As vozes dessa produção são, com apenas uma exceção, afinadas.

A exceção é Marcelo Adams e che-gar a isso parece ridículo uma vez que, sabe-se, de todo o elenco, é o ator mais bem prepa-rado intelectual e fisicamente para a tragédia clássica. Converso: ao andar pelo espaço de assistência, notei que, não importando o lugar em que eu parava, não conseguia fugir da dic-ção perfeita do ator. Na cena mais longa de todo espetáculo e também a última, só houve um elemento: o texto tão bem dito, tão bem interpretado, límpido. Diferente de tudo o que acontece até ali, no encerramento do espetá-culo, estabelece-se uma hierarquia, domina-mos o contexto, os demais elementos ficam em segundo plano infelizmente. E o ritmo cai. Por mais que o coro passante em roupas de banho e com champagne tente, o foco está inevitavelmente nele e não há outra opção. A voz de Marcelo Adams pára tudo, divergindo das demais cenas em que aproveitamos a confusão do texto para deitar nosso olhar em todos os outros elementos que, nem de longe, são o resto.

Apertar o F5 é atualizar a tela. Atu-alizar é unir o presente a quem assiste a ele. Assistir a Solos Trágicos é chorar por tudo o que não se sabe e vibrar pelo momento em que se sente vivo e disposto a correr atrás do que se perdeu. Até que, cansados da corrida, você resolva excluir do seu twitter teatral quem

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é mais cool que você, rendendo-se aos seus próprios interesses.

Mas minha sugestão é que você não faça isso e siga o @solostragicos.

Ficha Técnica:Elenco: Marcelo Adams, Daniel Colin, Isandria Fermiano, Fernanda Petit, Rodrigo Fiatt, Elisa Heidrich e Lucas Sampaio.

Direção: Roberto OliveiraTrilha Sonora: Arthur de Faria e Adolfo Almeida Jr.Preparação Corporal: Carlos GontijoPreparação Vocal: Lígia MottaAmbientação Cenográfica: Modesto FortunaIluminação: Cláudia De BemAssistente de Iluminação: João FragaFigurinos: Coca Serpa, Francisco de los San-tos e Modesto FortunaMaquiagem: Heinz LimaverdeAdereços: Elton ManganelliProjeto Gráfico: Modesto FortunaProdução Executiva: Francine KliemannOrientação: Profª Dra. Marta Isaacsson de Souza e Silva

Notas:1 - http://www.vejaisso.com/2007/12/20/o-que-e-o-twitter-como-usar-e-como-responder/2 - http://solostragicos.blogspot.com/3 - http://www.depositodeteatro.com.br/4 - http://modestofortuna.blogspot.com/2009/02/entrevista-com-o-diretor-roberto.html5 - http://www.pbs.org/wnet/broadway/musi-cals/showboat.html6 - http://www.pbs.org/wnet/broadway/stars/ziegfeld_f.html7 - http://www.algosobre.com.br/mitologia/edipo.html

* Rodrigo Monteiro - Porto Alegre/RS/BrasilLicenciado em Letras, atuando profissional-mente como professor de Língua Portuguesa, Língua Inglesa e Literatura. Leciona desde 1997, quando concluinte do Curso de Magisté-rio. É Bacharel em Comunicação Social - Ha-bilitação Realização Audiovisual, com especia-lidade em Direção de Arte e em Roteiro. Foi aprovado em primeiro lugar no processo de seleção 2009 para o Mestrado em Artes Cêni-cas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escreve dramaturgia desde 2000. Endere-ço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/7379695337614127

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“Muitos artistas contam que a predisposição para criar o fazem sair em busca de um corpo qual-quer que desempenhará o papel de uma imagem geradora de uma obra específica.” SALLES (2004)

Terpsí Teatro de DançaEspetáculo: “Ditos e Malditos: Desejos da Clausura”Coreografia e direção: Carlota Albuquerque

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Da gestação ao nascimento: A obra como processo

Francine Pressi*

ENSAIO 07

Até onde vai o envolvimento do cria-dor com sua obra? Onde começa e onde ter-mina as fronteiras limítrofes entre o dentro e o fora? O que seria necessário nesse processo de criação? Inspiração, criatividade, intuição, fonte de pesquisa, diálogo entre obra e autor, a final, o que poderia estar ai envolvido?

Atenta ao livro de Fayga Ostrower, Criatividade e os Processos de Criação, passo a questionar-me sobre diversas questões refe-rentes ao ato de criar e recriar-se, reinventar-se o tempo todo durante a montagem de uma obra, seja ela na área em que for, na dança, artes plásticas, em fim, mas trazendo um olhar mais atento e focado aos trabalhos desenvol-vidos na dança. O que seria realmente signifi-cativo para um indivíduo no momento em que cria sua obra? Até onde vai o envolvimento que estabelece com ela no momento de sua “gestação”?

Pensa-se que o(a) autor(a) gestan-te, não só traz consigo, abrigado em seu ser toda a essência da obra, como também seja talvez o(a) grande responsável por dar a luz ao trabalho. O tempo de gestação? Não há como definir. Cada obra traz diferentes ques-tionamentos, expectativas, explora diferentes respostas, exige um tempo de “maturação” diferente, não podendo ser estipulado quando e se a obra realmente vai se esgotar em uma única “versão”. Talvez muitos trabalhos neces-sitem de uma continuação, na tentativa de tra-zer novos olhares, novas abordagens para um mesmo assunto.

“O problema às vezes não se esgota numa só obra. Há certos ângulos que propõe outras op-ções e implicam às vezes o empreendimento de nova obra, eventualmente com outras res-postas. Por isso, o processo de criação nunca se esgota; permanece um processo aberto.” (OSTROWER, 1987 - Pag. 72)

Mas nesse “processo aberto”, o indi-víduo gestante estaria em inteira conexão com a obra? Até onde a obra influencia em seu vi-ver e até onde as vivências de seu dia a dia são capazes de atingir a obra? As mais varia-das emoções, sentimentos, as reações físicas e psicológicas do indivíduo podem vir a refletir em sua obra, trazendo diferentes entonações ao trabalho que podem ou não se tornarem claramente visíveis em cena. Foto: Anderson de Souza

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No livro Transformatividade há um capítulo em que a autora fazendo uma aproxi-mação entre a fala de vários artistas plásticos em relação ao mistério da criação, traz ideias em comum em relação ao diálogo existente entre a obra e o autor no momento da cria-ção. Os trechos citados a seguir, muito embo-ra tenham sido relatados por artistas plásticos, podem aqui possivelmente serem transpostos para o cenário da dança, pois supõe-se que haja certa familiaridade entre a forma como o processo criativo se dá em ambas as áreas ar-tísticas.

“Na hora em que você vai produzindo [o tra-balho], ele vai te fazendo perguntas. Vai te encaminhando. Tem uma coisa assim: você vai fazendo o trabalho e tem uma hora que ele começa a te direcionar, por onde ir, como fa-zer. Eu tenho que fazer um pouco o trabalho para depois ele me falar um pouco dele. Daí eu acho que aparecem estas questões. Não são premeditadas.” Flávia Ribeiro (REA, 2000, pg. 147)

Observa-se na fala de Flávia Ribeiro a importância do autor estar aberto e receptivo a “ouvir” o que a obra tem a dizer, tornando-se disponível a possíveis mudanças e alterações que vão aos poucos se dando através de fato-res que surgem de forma não premeditada ao longo do processo e que possibilitam ao autor explorar novas formas de lidar com o acaso, com o imprevisto. O processo criativo na dan-ça se daria de forma diferente? Acredita-se na possibilidade de aproximação entre a fala de artistas plásticos e coreógrafos que lidam com obras em processo aberto.

A necessidade de se ouvir a obra e de se manter um diálogo com ela, torna-se necessária a partir do momento em que há uma troca entre o que cada um pode ofere-cer naquele momento. Quando se aproxima do processo de criação em dança, tem-se a obra como aquela que pode vir a todo instante levantar novos questionamentos e inquieta-ções tanto para o coreógrafo quanto para os bailarinos. Têm-se também os bailarinos que possivelmente trazem corpos com diferentes “marcas” e linguagens para serem utilizados na obra e o coreógrafo, que além de ser o grande provocador de estímulos e de se tor-nar o mediador responsável por tudo e todos os que estão em jogo, é ainda, aquele que abriga a obra em gestação, aquele que busca ao mesmo tempo o diálogo e o enfrentamento com a obra, que entra em crise e a partir dela enxerga novas possibilidades de lidar com o acaso.

“À medida que você vai fazendo as provas, vão surgindo as sugestões. Acasos imprevisí-veis que você tem que incorporar. Então, essa cautela que eu tenho dá muito prazer, sempre vai surgir ali alguma coisa que vou aproveitar e que não estava previsto.” Regina Katz. (REA, 2000, pg. 148)

Neste caso questiona-se o fato de que se ao longo do processo surgem fatores que são imprevisíveis, será que é realmente necessário ter que incorporá-los na obra como diz Regina Katz? Não seria possível apenas experimentá-los, talvez os explorar, modificar, ou até mesmo não os utilizar na obra? Ao ana-

lisar o contexto em que Katz está inserida ao lançar estas palavras em depoimento ao livro Transformatividade, fica claro que a artista plástica refere-se ao trabalho com gravuras desenvolvido por ela, e que talvez não permita a ela retirar ou modificar a obra após deter-minadas etapas da confecção da obra. Mas transportando suas palavras à dança, há sim a possibilidade de se questionar a forma como certos “imprevistos” podem ou não ser agre-gados à obra.

“Portanto, depende de cada trabalho. Cada um é diferente do outro. (...) Interessa a reflexão que ocorre no procedimento do trabalho. Acho que isso não é somente um processo interior, mas uma relação. (...) É um diálogo. Existe, é obvio, uma necessidade expressiva que só vem de dentro. Mas ela não recobre a ques-tão toda. O processo criativo como processo de um artista, é uma interação. Interage com o próprio trabalho, com o trabalho dos outros. E mais à frente, ‘as pessoas falam, mas a pintura e a escultura não falam e tem-se que saber ouvir. Acho que é obrigação do artista saber ouvir o trabalho, esse diálogo sem palavras’.” Carlos Fajardo (REA, 2000, pg. 148)

A partir das palavras de Carlos Fajardo nota-se a importância dada por ele à escuta e ao diálogo entre obra e autor. Im-portância essa que se acredita ser relevante à possivelmente todos os âmbitos de criação artística, ainda mais quando se trata de uma obra em processo de criação.

Mas independente do que cada um traga consigo como sendo algo essencial em um processo de criação, observa-se geral-mente essa necessidade da escuta e de um diálogo que não é falado através de palavras, mas sim percebido, sentido pelo artista criador que doa um pouco de si e de suas vivências e se torna disponível à perceber o que a obra tem a oferecer seja referente aos possíveis ca-minhos a se seguir, ou a todas as inquietações e provocações que a todo o instante ela pode levantar durante o processo de criação. Estar em processo é estar disponível ao acaso, ao imprevisto, aos possíveis “erros” de percurso que podem na verdade indicar uma nova pos-sibilidade de jogo no processo. E se houvesse uma compreensão da vida como um eterno processo, estariam os seres humanos sempre se reinventando?

Referências:

OSTROWER, Fayga. Criatividade e o Proces-so de Criação. – Petrópolis, Vozes, 1987.

REA, Silvana.Transformatividade: aproxima-ções entre psicanálise e artes plásticas: Regi-na Katz, Carlos Fajardo, Flávia Ribeiro. – São Paulo: Annablume: FAPESP, 2000.

COHEN, Renato. Work in Progress na cena contemporânea: criação, encenação e recep-ção. – São Paulo: Perspectiva, 2004.

Foto: Anderson de Souza

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Obra de: OSGEMEOS - SP

Foto: Anderson de Souza

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PROPÓSITO

Por Mário Gomes Jr.

Surgimos,Fortalecemo-nos,

Trilhamos nosso destino.

Evoluímos,Preparamo-nos,

Impomos nossa vontade.

Florescemos,Multiplicamo-nos,

Deixamos nosso legado.

A família, alicerce do homem,Estruturada constantemente

Permite a sua existência.

Lutamos,Sustentamo-nos,

Conservamos nossa conquista.

Caímos,Desgastamo-nos,

Construímos nossa honra.

Partimos,Despedimo-nos,

Sonhamos na eternidade

A família, propósito do homem,Consolidada continuamente

Perpetua... a Vida!

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104 - Informe Foto: Anderson de Souza

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Pode haver um esgotamento no

processo de criação?

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www.terpsi.com.br

www.processoc3.com

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