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INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA INPA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BIOLOGIA DE ÁGUA DOCE E PESCA INTERIOR BADPI CONTRIBUIÇÃO DE ESPÉCIES ORNAMENTAIS PARA A ESTRUTURA FUNCIONAL DE ASSEMBLEIAS DE PEIXES DE IGARAPÉS DO MÉDIO RIO NEGRO, AMAZÔNIA BRASILEIRA DANILO GABRIEL DA ROCHA CASTANHO MANAUS AMAZONAS JUNHO/2017

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INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA – INPA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM BIOLOGIA DE ÁGUA DOCE E

PESCA INTERIOR – BADPI

CONTRIBUIÇÃO DE ESPÉCIES ORNAMENTAIS PARA A ESTRUTURA

FUNCIONAL DE ASSEMBLEIAS DE PEIXES DE IGARAPÉS DO MÉDIO RIO

NEGRO, AMAZÔNIA BRASILEIRA

DANILO GABRIEL DA ROCHA CASTANHO

MANAUS – AMAZONAS

JUNHO/2017

i

DANILO GABRIEL DA ROCHA CASTANHO

CONTRIBUIÇÃO DE ESPÉCIES ORNAMENTAIS PARA A ESTRUTURA

FUNCIONAL DE ASSEMBLEIAS DE PEIXES DE IGARAPÉS DO MÉDIO RIO

NEGRO, AMAZÔNIA BRASILEIRA

ORIENTADORA: Dra. Cláudia Pereira de Deus

COORIENTADORES: Dr. Jansen A. S. Zuanon

Dr. Rafael Pereira Leitão

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Instituto Nacional de Pesquisas da

Amazônia – INPA, como parte dos

requisitos para obtenção do título de

Mestre em Ciências Biológicas, área de

concentração em Biologia de Água Doce

e Pesca Interior.

MANAUS – AMAZONAS

JUNHO/2017

ii

B Castanho, Danilo Gabriel da Rocha. Contribuição de espécies ornamentais para a estrutura funcional de assembleias de peixes de igarapés do médio rio negro, Amazônia Brasileira / Danilo Gabriel da Rocha Castanho. - Manaus, 2017, 55f.: il, color.

Dissertação (mestrado) – INPA, Manaus, 2017 Orientadora: Cláudia Pereira de Deus Coorientador: Jansen Alfredo Sampaio Zuanon; Rafael Pereira Leitão Área de concentração: Biologia de Água Doce e Pesca Interior

1.Diversidade Funcional. 2. Ictiofauna. 3. Pesca Ornamental. 4. Igarapés. 5. Amazônia. I. Título

CDD.

Sinopse

Foi analisada a estrutura funcional das assembleias de peixes em 13 igarapés

utilizados pela pesca ornamental na porção média da bacia do rio Negro. A partir de

cenários hipotéticos de subtração de abundâncias, foi avaliada a contribuição das

espécies ornamentais na estrutura funcional das assembleias amostradas.

Palavras-chave: Diversidade Funcional; Ictiofauna; Pesca Ornamental; Igarapés;

Amazônia.

Keywords: Functional Diversity; Ichthyofauna; Ornament fishing; streams, Amazon.

iii

Agradecimentos

Agradeço aos notáveis pesquisadores, professores, orientadores e

amigos Dr. Cláudia Pereira de Deus, Dr. Jansen Zuanon e Dr. Rafael Leitão por

todos os conselhos, ensinamentos e apoio concedido, pela paciência e tempo

desprendido e pela oportunidade de realizar essa etapa de minha formação em

ótima companhia.

Agradeço, também, ao Dr. Fabrício Teresa por aceitar entrar nessa “empreitada”,

por toda ajuda prestada e pelo tempo cedido.

Agradeço ao INPA - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e ao

Programa de Pós-Graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior, pelo

auxílio técnico e administrativo, pela infraestrutura proporcionada. Agradeço

ainda ao CNPQ pela bolsa concedida.

Gostaria de agradecer às amigas Paulinha, Akemi, Thatyla, Cris, Camila

e Natália pelos cafés com muita prosa, os almoços compartilhados e pelas

“enroladas” no laboratório. À Dra. Sidinéia pelas conversas sempre

divertidíssimas, pelos conselhos e reflexões que ultrapassam a vida profissional

(no mínimo). À companheiríssima Marina por me apresentar o sistema médico

manauara e pelas inúmeras risadas regadas com suco de cevada. Aos

companheiros de Catalão, Fabiano, Oliveira e Frank pelas coletas sempre muito

produtivas.

Agradeço aos amigos Tiago e Sergio pelo tempo e muita paciência

quando o assunto é o R e, pelas sugestões sempre bem-vindas.

Agradeço aos amigos da melhor turma de Pós-Graduação que já houve:

Adria, Marcele, Susana, Paola, Carla, Felipe, Danniel, Valesca, Raize, Maiby,

Camila, Andressa, Cris, Eduardo, Elio e Enzio pela companhia, experiências

trocadas, ajudas de última hora e principalmente pelos churrascos, festas,

viagens, risadas e muita união.

Agradeço aos amigos de república Nayana, Kaue, Gringo #1 (Scott),

Gringo #2 (Cameron), Tai e Fer pelos almoços em família, pelos podrões e

principalmente por dividir o tempo comigo no Botafogo, o melhor bar da região

norte.

iv

Agradeço aos companheiros de coleta Gonô e Eudes por me

apresentarem a real face da maior floresta tropical do mundo, pelas pescarias

sempre muito divertidas e por fazerem das coletas a melhor experiência que eu

poderia ter.

Por fim, agradeço imensamente minha família por todo apoio, confiança e

incentivo dado a mim.

v

Dedico este trabalho aos meus pais e

toda minha família, pela confiança cedida,

pelo apoio incondicional, pelo incentivo pleno

e pela união sempre presente em nossa

família.

vi

“Cada um de nós compõe a sua história

cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser

feliz”

Almir Sater & Renato Teixeira

vii

Resumo

O estudo da biodiversidade através de sua faceta funcional traz vantagens

relacionadas à compreensão dos mecanismos estruturadores, às relações entre

as espécies e seus respectivos papeis ecossistêmicos, e à predição de

alterações nos serviços biológicos frente às alterações ambientais. Uma das

principais fontes de pressões sobre as populações naturais de peixes na

Amazônia é a pesca, que tem sido realizada mais intensivamente ao longo das

últimas décadas. Visto que a pesca ornamental realizada na porção média da

bacia do rio Negro é uma atividade extrativista com foco direcionado a certas

espécies, é possível que a pressão exercida pela atividade gere perturbações na

estrutura funcional das comunidades e suprima funções ecológicas específicas.

Com esse cenário, o presente estudo buscou estimar os efeitos da pesca

ornamental na estrutura funcional de assembleias de peixes de igarapés, por

meio da elaboração de cenários hipotéticos de subtração de abundâncias de

espécies ornamentais e não ornamentais. Por meio da avaliação de três índices

funcionais complementares (Redundância, Divergência e Dispersão funcional)

constatamos que as assembleias estudadas possuem alta diversidade funcional

relacionada ao uso do ambiente e de recursos alimentares. As espécies

exploradas pela pesca ornamental contribuem significativamente para a

redundância funcional das assembleias, e a retirada simulada do Tetra cardinal

Paracheirodon axelrodi causa maiores perdas para a assembleia do que a

retirada de espécies não ornamentais. Tais resultados indicam que a atividade

deve ser executada de forma ordenada e com manejo adequado dos estoques,

a fim de não comprometer a estrutura funcional das assembleias locais de

peixes. Uma vez que a atividade não gera alterações significativas nas condições

físicas e químicas do ambiente, e que a inviabilidade econômica diminui as

chances de extinção local, a pesca ornamental na região de Barcelos tem

condições propícias a se manter viável sem alterar a estabilidade do

ecossistema.

.

Palavras-chave: Diversidade Funcional; Ictiofauna; Pesca Ornamental; Igarapés;

Amazônia.

viii

Abstract

The study of biodiversity through its functional facet brings advantages related to

the understanding of the structuring mechanisms, the relationships between the

species and their respective ecosystemic roles, and the prediction of changes in

biological services in the face of environmental changes. One of the main sources

of pressures on natural fish populations in the Amazon is fishing, which has been

more intensively carried out over the last decades. Seeing that the ornamental

fishery carried out in the middle portion of the Negro River basin is an extractive

activity focused on certain species, it is possible that the pressure exerted by the

activity generates disturbances in the functional structure of the communities and

suppresses specific ecological functions. With this scenario, the present study

sought to estimate the effects of ornamental fishing on the functional structure of

streams fish assemblages, through the elaboration of hypothetical scenarios of

subtraction of abundances of ornamental and non - ornamental species. Through

the evaluation of three complementary functional indexes (Redundancy,

Divergence and Functional Dispersion) we found that the assemblies studied

have high functional diversity related to the use of the environment and food

resources. The species exploited by ornamental fisheries contribute significantly

to the functional redundancy of the assemblages, and the simulated withdrawal

of the Tetra cardinal Paracheirodon axelrodi causes greater losses to the

assembly than the removal of non-ornamental species. These results indicate

that the activity should be performed in an orderly manner and with adequate

management, in order not to spoil the functional structure of local fish

assemblages. As the activity does not generate significant changes in the

physical and chemical conditions of the environment, and that economic

unfeasibility decreases the chances of local extinction, ornamental fishery in the

Barcelos region is prone to remain viable without altering the stability of the

ecosystem.

Keywords: Functional Diversity; Icthyofauna; Ornament fishing; streams,

Amazon.

ix

Sumário

1. Introdução geral ......................................................................................... 1

2. Objetivos .................................................................................................... 5

2.1 Objetivo Geral ........................................................................................... 5

2.2 Objetivos Específicos ................................................................................ 5

3. Referências bibliográficas..........................................................................6

4. Contribuição Funcional de Espécies Ornamentais Em Assembleias de

Peixes do Médio Rio Negro, Amazônia brasileira........................................ 10

5. Introdução ................................................................................................ 11

6. Material e Métodos................................................................................... 12

6.1 Área de estudo ........................................................................................ 12

6.2 Delineamento experimental .................................................................... 13

6.4 Material ictiológico ................................................................................... 14

6.5 Estrutura funcional .................................................................................. 14

6.6 Análises estatísticas ................................................................................ 16

7. Resultados ............................................................................................... 18

7.1 Estrutura taxonômica............................................................................... 18

7.2 Estrutura funcional................................................................................... 19

7.3 Efeito da retirada de espécies ornamentais na estrutura funcional das

assembleias (Análise A).................................................................................... 21

7.4 Comparação do efeito gerado pela subtração das abundâncias de espécies

ornamentais e não ornamentais na estrutura funcional das assembleias (Análise

B)....................................................................................................................... 23

8. Discussão................................................................................................. 27

9. Considerações finais............................................................................... 30

10. Referências Bibliográficas...................................................................... 30

11. Material suplementar............................................................................... 35

x

Lista de Figuras

Figura 1. Área de estudo e locais de coleta (círculos pretos) na porção média da

bacia do rio Negro, região de Barcelos-AM (estrela

cinza).................................................................................................................13

Figura 2. Volume ocupado pelas espécies categorizadas como ornamentais no

espaço multidimensional. Polígono branco: volume ocupado pelo total de

espécies amostradas; polígono rosa: volume ocupado por espécies ornamentais;

círculos brancos: espécies não ornamentais; círculos pretos: espécies

ornamentais.......................................................................................................20

Figura 3. Resultados obtidos no índice de redundância funcional, nos cenários

1 e 2, análise A, em condições originais e com 100% das abundâncias das

espécies ornamentais subtraídas.......................................................................22

Figura 4. Resultados obtidos no índice de divergência funcional, no cenário 2,

análise A, em diferentes porcentagens de subtração de abundâncias de P.

axelrodi. ............................................................................................................ 23

Figura 5. Resultados obtidos no cenário 1 de seleção de espécies nos índices

de Redundância, Divergência e Dispersão funcional, nas diferentes

porcentagens de subtração de abundâncias de espécies ornamentais (preto) e

não ornamentais (cinza). .................................................................................. 24

Figura 6. Resultados obtidos no cenário 2 de seleção de espécies nos índices

de Redundância, Divergência e Dispersão funcional, nas diferentes

porcentagens de subtração de abundâncias de P. axelrodi (preto) e espécies não

ornamentais (cinza). ......................................................................................... 26

Figura S1. Fotografia de um rapiché, aparelho de coleta de peixes ornamentais

típico da região do médio rio Negro. Fonte: Danilo G. R. Castanho.. ............... 35

Figura S2. Vista lateral de um cacuri, tipo de armadilha para peixes ornamentais

utilizada na região do médio rio Negro. Fonte: Danilo G. R. Castanho. ........... 35

Figura S3. Esquema das medidas ecomorfológicas obtidas com auxílio de

paquímetro digital e análise fotográfica, através do programa computacional

Image J. Siglas: Cp comprimento padrão, Amc altura máxima do corpo, Aco

Altura da cabeça, passando pelo centro do olho, Do diâmetro do olho, Doc

distância do centro do olho até a parte inferior da cabeça, Lc largura do corpo,

Lb largura da boca, Ab altura máxima da boca, Po distância entre a pré-maxila

e a base da cabeça, Aip altura da inserção da nadadeira peitoral, Acp altura do

corpo passando pela inserção da nadadeira peitoral, Cnp comprimento máximo

da nadadeira peitoral, Anp área da nadadeira peitoral, Hnc altura da nadadeira

caudal, Anc área da nadadeira caudal, Apc altura do pedúnculo caudal, Prt

xi

comprimento da protrusão bucal, Fo comprimento do focinho, Massa peso total.

Fonte: Leitão et al., 2016. ................................................................................. 36

Figura S4. Qualidade do espaço funcional baseado no protocolo proposto por Maire et al. (2015)..............................................................................................38 Lista de Tabelas

Tabela S1. Lista de atributos funcionais e seus respectivos significados ecológicos. Códigos para medidas morfológicas são apresentados na figura S3.......................................................................................................................36 Tabela S2. Atributos funcionais que mais influenciam cada eixo da PCoA.

Valores obtidos através da correlação entre os atributos funcionais e os eixos da

PCoA..................................................................................................................39

Tabela S3. Lista das espécies amostradas e respectivas abundâncias.

*Espécies categorizadas como ornamentais.....................................................40

Tabela S4. Variáveis ambientais amostradas....................................................44

Tabela S5. Resultados encontrados nas condições originais de cada igarapé. Ne. Número total de espécies; Nt. Número total de exemplares capturados; NeO. Número de espécies ornamentais; No. Número de exemplares ornamentais; FR. Redundância Funcional; FDiv. Divergência funcional; FDis. Dispersão funcional............................................................................................................ 45

1

Introdução geral

Dentre as temáticas da ecologia, a compreensão dos mecanismos estruturantes

das comunidades e dos ecossistemas sempre esteve em foco. Com a

degradação ambiental em ritmo acelerado (Vitousek, Mooney, Lubchneco, &

Melillo, 1997) e elevada taxa atual de extinção de espécies (Barnosky et al.,

2011), essa é uma questão de grande importância para o manejo e conservação

da biodiversidade. A maior parte dos estudos com foco na conservação biológica

das espécies são baseados em aspectos taxonômicos da biodiversidade,

gerando informações limitadas sobre o funcionamento das comunidades, ao se

basearem principalmente na análise de alterações na quantidade de indivíduos

por espécie e sua distribuição espaço-temporal (Magurran, 2004; Cianciaruso,

Silva, & Batalha, 2009; Teresa & Casatti, 2012).

Há algum tempo essas formas tradicionais de mensuração da biodiversidade

vêm sendo questionadas com o pressuposto de que não refletem

adequadamente a estrutura e funcionamento das comunidades (Villéger, Mason,

& Mouillot, 2008). Desta forma, métricas que consideram relações filogenéticas

e características funcionais vêm ganhando espaço no meio científico (Webb,

2000; Diaz & Cabido, 2001; Ricotta, Avena, & Chiarucci, 2005; Petchey &

Gaston, 2006; Cianciaruso et al., 2009).

Uma alternativa para se quantificar a diversidade de uma comunidade é a

utilização de medidas de diversidade filogenética. Estas possuem como base a

história evolutiva das espécies e levam em consideração as relações de

parentesco entre elas (Magurran, 2004). Uma comunidade que apresenta níveis

elevados de diversidade filogenética tende a possuir espécies distantes entre si

em termos evolutivos. Neste caso, essa comunidade poderia ser considerada

mais diversa do que uma outra composta por igual número de espécies, mas

filogeneticamente mais próximas entre si (Cianciaruso et al., 2009).

Outra forma de caracterizar uma comunidade é através de sua estrutura e

diversidade funcional. Essa abordagem faz uso de índices obtidos por

características do indivíduo que expressem algum tipo de funcionalidade

(Villéger et al., 2008; Cianciaruso et al., 2009; Mouillot, Villéger, Scherer-

2

Lorenzen, & Mason, 2011; Mouillot, Graham, Villéger, Mason, & Bellwood, 2013;

Leitão et al., 2016). Uma definição amplamente aceita para diversidade funcional

é o valor e a variação dos atributos ecológicos das espécies que influenciam o

funcionamento da comunidade (Tilman, 2001; Petchey & Gaston, 2002; 2006;

Cianciaruso et al., 2009).

As medidas de diversidade e estrutura funcional das comunidades podem ser

feitas a partir do espaço multidimensional, no qual as espécies estão contidas e

posicionadas de acordo com o conjunto de suas características funcionais

(Villéger et al., 2008). Nele são calculadas as distâncias entre espécies, a

distribuição de suas abundâncias, e o volume ocupado por diferentes conjuntos

de espécies (i.e. comunidades locais).

Os índices funcionais estão ganhando visibilidade crescente no meio científico,

uma vez que com esse tipo de medida é possível fazer inferências sobre o nicho

ocupado pelas espécies e as características ambientais que favorecem sua

existência local. De acordo com Hutchinson (1958), é possível mensurar o nicho

de uma espécie a partir da definição de um espaço multidimensional. Nesta

perspectiva, as características ecológicas do organismo que permitem sua

sobrevivência e reprodução são representadas pela posição no espaço

multidimensional (Hutchinson & MacArthur, 1959; Maguire, 1973; Whittaker,

Levin, & Root, 1973).

Com o uso desse tipo de métrica é possível analisar a similaridade de funções

exercidas por espécies diferentes (redundância funcional), inferindo sobre a

estabilidade potencial de uma comunidade ou ecossistema. Um exemplo é o

estudo realizado por Laliberté et al. (2010), onde inferiu que a resiliência é

dependente da redundância funcional da comunidade. A redundância funcional

também é associada à garantia de continuidade no desempenho de certas

funções ecológicas, mesmo com a extinção de espécies (Ricotta et al., 2016).

Com os índices funcionais pode-se avaliar, ainda, o nível de especialização das

funções exercidas e o quão originais elas são (Villéger, Miranda, Hernández, &

Mouillot, 2010; Leitão et al., 2016). É possível, também, analisar eventuais

diferenças nas respostas de espécies similares a determinadas alterações

ambientais, o que pode ser fundamental para a manutenção da estabilidade da

comunidade frente a distúrbios (Laliberté et al., 2010). A abordagem funcional

3

também permite avaliar como a comunidade explora os recursos ambientais, a

partição e a ocupação de nichos (divergência e dispersão funcional), e quais

características predominam na comunidade (identidade funcional) (Moreno,

Arita, & Solis, 2006; Ricklefs, 2012; Villéger et al., 2008; Laliberté et al., 2010;

Laliberté & Legendre, 2010; Mouillot et al., 2013).

A diferenciação na forma como as espécies utilizam o ambiente e os recursos

disponíveis, é um aspecto importante na viabilidade da enorme diversidade

encontrada na bacia amazônica, principalmente em regiões pobres em

nutrientes, como em ambientes aquáticos da bacia do rio Negro. Nesta bacia, a

coexistência de mais de 1.000 espécies de peixes (Chao, Prang, & Petry, 2001)

em uma região de baixa produtividade primária, elevada acidez e baixas

concentrações de oxigênio dissolvido é explicada, em partes, pela grande

diversidade de habitats encontrados e pela variedade de itens alimentares,

autóctones e alóctones, explorados de diferentes formas (Goulding, Carvalho, &

Ferreira, 1988).

A maior diversidade de peixes de água doce do mundo está localizada na Bacia

Amazônica, superando a marca de 3.000 espécies (Santos, Ferreira, & Zuanon

2006; Reis et al., 2016), e expectativas de que ainda existam cerca de 2.000

espécies por serem descritas (Queiroz et al., 2013). A enorme biodiversidade da

bacia é associada a diversas características ecológicas da região, como por

exemplo a grande diversidade de ambientes aquáticos, tipos de água, e a

estabilidade climática da região (Goulding et al., 1988; Reis et al., 2016). Em

regiões de várzea, o grande aporte de sedimentos carreados das regiões

andinas atuam como fertilizantes, aumentando as taxas de produção primária,

enriquecendo a base da cadeia trófica (Irion, 1978; Junk, 1984; Downing, Plante,

& Lalonde, 1990; Assis, Wittman, Piedade, & Haugaasen, 2014). A grande

quantidade de matéria orgânica alóctone e sua rápida ciclagem, favorecida pelo

clima tropical e pela diversa fauna decompositora, fazem com que os nutrientes

retornem rapidamente ao sistema. Aliado a isto, o regime de inundação sazonal,

que regula a dinâmica dos sistemas de grandes rios e planícies de inundação

desta área, também favorece a alta disponibilidade de nutrientes e de hábitats

temporários, que podem ser explorados por um grande número de espécies

(Junk, Bayley, & Sparks, 1989; Junk & Wantzen, 2004).

4

O grande potencial biológico da região vem sendo submetido a intensas

pressões antrópicas, das mais variadas fontes. Tais distúrbios ambientais têm

sido ocasionados por grandes obras de infraestrutura (Junk et al., 2014) e pelas

diversas formas de uso da terra (i.e. atividades agropecuárias, madeireiras e

urbanização), que modificam a paisagem; pela poluição, que descaracteriza as

condições físico-químicas de ambientes terrestres e aquáticos (Couceiro,

Fosberg, Hamada, & Ferreira, 2006); e pela explotação não sustentável dos

recursos naturais (Isaac & Bathem, 1995).

Dentre os diversos tipos de atividades extrativistas na Amazônia, a pesca é um

dos principais. Movimentando de 100 a 200 milhões de dólares por ano e

empregando cerca de 250.000 pessoas, estima-se que a produção pesqueira

nas águas interiores da região alcance a marca de 217.000 toneladas por ano

(Santos et al., 2006). Outra atividade extrativista importante no cenário

econômico regional é a pesca ornamental, sendo considerada a terceira maior

atividade extrativista do estado do Amazonas (Souza & Mendonça, 2009). A

atividade é realizada pela população ribeirinha e tem por finalidade o comércio

de peixes vivos para fins de aquariofilia.

No estado do Amazonas, foram comercializados mais de 20 milhões de

exemplares, somente no ano de 2003, destes, 90% são representados por

apenas onze espécies. A porção média da bacia do rio Negro é o principal polo

extrator, representando mais de 80% do peixe ornamental comercializado no

estado (Chao et al., 2001; Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos

Renováveis [IBAMA], 2008; Anjos, Amorim, Siqueira, & Anjos, 2009). A intensa

explotação direcionada a um número reduzido de espécies, e agrupada em uma

área específica, potencialmente, pode ocasionar alterações na estruturação das

assembleias de peixes e extinguir serviços ecossistêmicos executados pelas

espécies explotadas.

Com base no exposto acima, o presente trabalho busca avaliar a estrutura

funcional das assembleias de peixes em áreas com histórico de pesca

ornamental e estimar o potencial efeito da retirada de espécies ornamentais no

funcionamento dessas assembleias. A questão chave a ser respondida é: A

retirada de espécies ocasionada pela explotação direcionada de espécies de

interesse ornamental poderia levar à perda de funções dentro das assembleias?

5

Ou existe um nível de redundância funcional capaz de compensar os efeitos

dessa sobre-explotação?

Objetivos

Objetivo geral

Avaliar a contribuição de espécies ornamentais e o possível impacto de sua

retirada para a estrutura funcional de assembleias de peixes em igarapés

sujeitos à explotação pela pesca ornamental na região do médio rio Negro,

Amazonas, Brasil.

Objetivos específicos

Determinar a composição e abundância das assembleias de peixes em

igarapés sujeitos à explotação de espécies pela pesca ornamental;

Analisar a estrutura funcional das assembleias de peixes nesses

igarapés;

Estimar o efeito potencial da extirpação local de espécies de peixes de

interesse ornamental na estrutura funcional das assembleias.

A presente dissertação é apresentada a seguir em formato de artigo científico, a

fim de otimizar o processo de publicação do estudo, intitulado “Contribuição de

espécies ornamentais para a estrutura funcional de assembleias de peixes

de igarapés do médio rio Negro, Amazônia brasileira”. Tal artigo será

submetido a revista Ecology of Freshwater Fish.

6

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10

Contribuição de espécies ornamentais para a estrutura

funcional de assembleias de peixes de igarapés do médio rio

Negro, Amazônia brasileira

DANILO G. R. CASTANHO¹*, CLÁUDIA P. DE DEUS¹, JANSEN ZUANON¹, RAFAEL P. LEITÃO²,

FABRÍCIO B. TERESA³

¹Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Manaus, Brasil

²Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil

³Universidade Estadual de Goiás, Anápolis, Brasil

*Correspondência: E-mail: [email protected]

Resumo

Uma atividade extrativista só é considerada sustentável quando não interfere na

estabilidade e resiliência das comunidades biológicas e do ambiente explorado.

A pesca ornamental é uma das principais atividades econômicas do médio rio

Negro desde a década de 50, retirando milhões de exemplares anualmente. Tal

atividade é direcionada a um pequeno número de espécies e tem o Tetra cardinal

(Paracheirodon axelrodi) como principal representante. Visto os potenciais

efeitos da pressão exercida em um número reduzido de espécies e a falta de

informações sobre os impactos gerados, o presente estudo caracterizou a

estrutura funcional das assembleias de peixes de igarapés explotados pela

atividade e analisou, por meio de cenários hipotéticos, os possíveis efeitos da

depleção das populações de peixes ornamentais sobre a estrutura funcional

destas assembleias. Por meio da avaliação de três índices funcionais

(redundância funcional, divergência funcional e dispersão funcional)

constatamos que (1) a exclusão completa de todas as espécies ornamentais,

simultaneamente, pode diminuir em até 12% a redundância funcional das

assembleias estudadas; (2) a divergência funcional tende a aumentar com a

retirada de espécies ornamentais; e (3) a diversidade de respostas frente à

alterações ambientais, analisada através da dispersão funcional, não sofreria

alterações significativas com a exclusão das espécies ornamentais. Uma

comparação entre os efeitos potenciais da retirada do Tetra Cardinal versus

espécies não ornamentais indica que a retirada desta espécie ornamental possui

efeito específico, reduzindo em maior intensidade a redundância funcional das

assembleias. Com esses resultados é possível inferir que a pesca ornamental

na região do médio rio Negro necessita de manejo adequado, e poderia continuar

a ser realizada sem comprometer a estabilidade e resiliência das assembleias

de peixes e dos ambientes explotados.

Palavras chave: Diversidade Funcional; Ictiofauna; Pesca Ornamental; Igarapés; Amazônia

11

Introdução

Em um cenário de extinção de espécies comparado aos grandes eventos de

extinção em massa (Barnosky et al., 2011), uma preocupação difundida são as

consequências geradas na integridade e funcionamento dos ecossistemas.

Quando a perda de espécies é acompanhada pela perda de funções e serviços

ecossistêmicos, os prejuízos deixam de ser somente taxonômicos e afetam a

estabilidade das comunidades ou dos ecossistemas. O desempenho de funções

similares por espécies diferentes, garante a continuidade na execução de

funções ecossistêmicas mesmo com eventos de extinção, tal propriedade é

usualmente conhecida como redundância funcional (Ricotta et al., 2016).

Os ambientes de água doce concentram grande parte da biodiversidade global

e são facilmente afetados por mudanças ambientais (Taylor et al., 2006). Dentre

os veículos de extinção em ambientes aquáticos, a descaracterização do habitat

(Casatti, Ferreira, & Carvalho, 2009) e a sobre-explotação dos recursos estão

entre os principais. Realizada, na maioria das vezes, de maneira desordenada,

a pesca é um importante agente causador de declínio nos estoques

populacionais de organismos aquáticos, atingindo de macro invertebrados

(camarões) à peixes (Isaac & Barthem, 1995).

A pesca ornamental na Amazônia é uma atividade extrativista que retira de forma

seletiva milhões de exemplares de peixes anualmente (Anjos, Amorim, Siqueira,

& Anjos, 2009). A categorização de uma dada espécie como “ornamental”

envolve uma perspectiva antropocêntrica, pois o que torna uma espécie atrativa

ou não pode envolver aspectos da forma do corpo, padrão de colorido,

comportamento, ou uma combinação desses fatores. Do ponto de vista

ecológico, as espécies-alvo da pesca ornamental desempenham funções que

contribuem para a manutenção do ecossistema local. Entretanto, são escassas

as informações sobre as funções desempenhadas por essas espécies em seus

ambientes naturais, o que dificulta a avaliação das possíveis consequências

geradas pela sua retirada seletiva das comunidades biológicas. Um estudo

realizado por Gasparini, Floeter, Ferreira & Sazima (2005) evidenciou uma

redução na densidade de indivíduos jovens de peixes-anjo (Pomacanthidae),

potencialmente, decorrente da pesca ornamental. A espécie, em seu estágio

12

jovem, é associada a relação mutualística de “limpeza” à outras espécies de

peixes recifais e tem como instrumento de reconhecimento a coloração

conspícua, característica também associada ao interesse ornamental. A perda

dessa função ecossistêmica pode afetar a saúde da comunidade e até influenciar

a diversidade local (Floeter, Ferreira, & Gasparini, 2007).

A análise da estrutura funcional de assembleias biológicas permite relacionar

diretamente as espécies com determinadas funções ecológicas. Além disso,

essa abordagem permite a avaliação de respostas potenciais das espécies às

múltiplas pressões antrópicas sobre os ecossistemas. Por exemplo, estudos vêm

demostrando que o desmatamento da zona ripária favorece espécies detritívoras

e onívoras com maior tolerância a hipóxia (Teresa & Casatti, 2012). A predição

de potenciais respostas às alterações ambientais é de grande valia no

direcionamento de ações de manejo e na criação de áreas de proteção.

O potencial crescimento da pesca ornamental direcionada a um número reduzido

de espécies, e concentrada em uma área específica, gera preocupações em

relação as eventuais consequências no funcionamento do ecossistema em nível

local. O presente trabalho buscou analisar a estrutura funcional das assembleias

de peixes em áreas com histórico de pesca ornamental e avaliar o efeito da

explotação direcional ocasionada pela atividade.

Material e Métodos

Área de estudo

O presente estudo foi realizado em igarapés de terceira a quinta ordem,

historicamente explorados pela pesca ornamental. Apresentam água preta ou

clara, com largura variando de 5,7 a 19,2 m; profundidade média de 0,4 a 1,6 m;

abertura média de dossel variando de 14,6 a 100%; e velocidade da corrente de

0,06 a 0,32 m.s-1. A temperatura da água variou de 25 a 30.6°C; condutividade

de 0,017 a 0,114 S.s-1 e pH variando entre 4,02 e 5,27 (dados pessoais). Os

igarapés estudados pertencem às bacias dos rios Negro, Itu, Aracá e Cuiuni, e

13

estão localizados na região do município de Barcelos, estado do Amazonas

(figura 1).

A bacia do Rio Negro cobre uma área aproximada de 700.000 km² (Latrubesse,

2008), sendo 118.000 km² constituídos de áreas alagáveis (Melack & Hess,

2010). Essas incluem as planícies de inundação ao longo do rio principal e as

regiões de cabeceira localizadas na Amazônia colombiana, venezuelana e

brasileira. O rio Negro é o segundo maior afluente da bacia do rio Solimões-

Amazonas, ficando atrás, apenas, do rio Madeira. Sua ictiofauna ultrapassa a

marca de 1.000 espécies (Chao, Prang, & Petry, 2001) e abriga mais de 80%

dos peixes ornamentais comercializados no estado do Amazonas (Anjos et al.,

2009).

Figura 1. Área de estudo e locais de coleta (círculos pretos) na porção média da bacia do rio

Negro, região de Barcelos-AM (estrela cinza) (QGIS Development Team, 2016).

Delineamento experimental

Foram selecionados 13 igarapés, sendo que cinco deságuam diretamente no rio

Negro, quatro no rio Aracá, três no rio Itu e um no rio Cuiuni. Em cada igarapé

foi delimitado um trecho de 100 metros de extensão, em locais historicamente

utilizados pela pesca ornamental (definidos por meio de informações obtidas

diretamente com pescadores ornamentais de Barcelos). As amostragens foram

14

realizadas uma única vez, no período de vazante-seca, em abril de 2016. O

período de coleta foi selecionado por seu maior rendimento na pesca

ornamental.

Material ictiológico

As coletas de peixes foram conduzidas com base na metodologia estabelecida

pelo Projeto Igarapés (Mendonça et al., 2005), com modificações. Foram

estabelecidos trechos não bloqueados de 100 metros, onde os peixes foram

coletados com auxílio de rapiché (apetrecho semelhante a um puçá, largamente

utilizado pelos pescadores ornamentais da região do médio rio Negro. Figura

S1), rede de cerco, malhadeiras e cacuri (armadilha do tipo “covo”, com

orientação vertical, utilizada pelos pescadores ornamentais da região do médio

rio Negro. Figura S2).

Em cada igarapé amostrado foram utilizadas cinco malhadeiras de cinco metros

de comprimento, com malhas de 30, 50, 70, 90 e 120 mm entre nós opostos, por

um período de duas horas. No caso dos cacuris, foram utilizadas três unidades

por um período de duas horas. O esforço de coleta utilizando rapiché foi

padronizado como um coletor por um período de uma hora. As amostragens com

rede de cerco se deram por meio de um arrasto por trecho, utilizando uma rede

de 11 m de comprimento e malha de 2 mm entre nós adjacentes.

Todos os exemplares capturados foram eutanasiados com uma dose letal de

anestésico (Eugenol), fixados em formalina a 10%, e transferidos para solução

alcóolica (etanol 70%), para posterior identificação, pesagem, contagem e

realização das medidas ecomorfológicas.

Estrutura funcional das assembleias de peixes

Para mensurar a diversidade e a estrutura funcional das assembleias,

primeiramente foi realizada uma análise ecomorfológica de todas as espécies

coletadas nos igarapés. Para tal, foram tomadas 21 medidas ecomorfológicas de

cada exemplar, obtidas diretamente dos exemplares, com uso de paquímetro,

balança e estereomicroscópio (para classificação de dentes e rastros

branquiais), e, também, por meio de medidas ponto a ponto obtidas em imagens

fotográficas dos mesmos exemplares (Figura S3). Sempre que possível, as

medidas foram tomadas em dez exemplares adultos por espécie; para aquelas

15

que não atingiram a abundância de dez indivíduos, foram mensurados todos os

exemplares adultos capturados (variando de 1 a 9 exemplares). As medidas

foram combinadas em 16 atributos funcionais que refletem aspectos da

locomoção, forrageamento e uso do habitat (Villéger, Miranda, Hernândez, &

Mouillot, 2010; Leitão et al., 2016) (Tabela S1). Tais aspectos representam o

potencial nicho ecológico ocupado pelas espécies, e estão intimamente ligados

às respostas das espécies frente a alterações no ambiente (Ribeiro, Teresa, &

Casatti, 2016; Teresa & Casatti, 2017)

A possível existência de colinearidade entre os atributos funcionais foi testada

através de correlações de Pearson; e como não houve valores do coeficiente de

correlação acima de 0,65, todos foram utilizados nas análises. A partir dos

valores dos atributos foi calculada uma matriz de distância de Gower e, em

seguida, realizada uma Análise de Coordenadas Principais (PCoA). As

coordenadas de cada espécie nos primeiros quatro eixos da PCoA foram

utilizadas para construir o espaço funcional multidimensional. A seleção dos

quatro primeiros eixos se baseou na qualidade do espaço funcional, estimada

pelo protocolo proposto por Maire et al. (2015). Com isso, foi selecionada a

quantidade mínima de eixos que representasse fidedignamente as distâncias

funcionais iniciais entre pares de espécies (Figura S4).

Para representar a estrutura funcional das assembleias, utilizamos os índices FR

(Functional Redundancy – Redundância funcional), FDiv (Functional Divergence

- Divergência funcional) e FDis (Functional Dispersion - Dispersão funcional). O

índice FR reflete a coocorrência de espécies funcionalmente idênticas ou

similares. Este é obtido através da diferença entre o índice de diversidade de

Simpson, baseado na faceta taxonômica da diversidade, e o índice de

diversidade quadrática de Rao, que utiliza a diversidade dos atributos funcionais

(de Bello, Lep, Lavorel, & Moretti, 2007). Dessa forma, uma assembleia com

espécies totalmente diferentes, em termos funcionais, possui valores de FR

tendendo a zero. O contrário se espera em uma comunidade com espécies

totalmente redundantes em termos funcionais, onde FR tende ao valor de um.

Dessa forma, valores mais próximos a um indicam uma assembleia mais

redundante e valores mais próximos a zero indicam uma assembleia com baixa

redundância.

16

O índice FDiv retrata o desvio das espécies na distância média da comunidade

em relação ao centroide do espaço multidimensional (Villéger, Mason, & Mouillot,

2008). Levando em consideração as abundâncias, pode-se analisar se as

espécies mais próximas à média (ou mais comuns em termos de padrões

ecomorfológicos), são também as mais abundantes, o que faz os valores se

aproximarem de zero. Quando as espécies mais distantes à média apresentam

maior abundância, a tendência dos resultados é se aproximar de 1. Neste caso,

infere-se que comunidades com altos valores de FDiv apresentam maior

diferenciação na utilização dos recursos, uma vez que as características

mensuradas são relacionadas à utilização do ambiente.

E por fim, o índice FDis representa o quão distantes as espécies estão da média

dos atributos funcionais da comunidade, deste modo, valores elevados indicam

elevada dispersão de atributos funcionais na comunidade e valores baixos

indicam baixa dispersão, padrão agregado de atributos funcionais na

comunidade. FDis é calculado através da média das distâncias de cada espécie

em relação ao centroide do espaço multidimensional. Diferente do índice FDiv,

nesse caso, o centroide é estimado através das posições das espécies e suas

abundâncias. Desse modo, espécies com maiores abundâncias possuem maior

influência no deslocamento do centroide. FDis é pouco influenciado pela riqueza

de espécies, sendo que a abundância das espécies tem maior peso para este

cálculo (Villéger et al., 2008; Laliberté & Legendre, 2010; Colzoni, 2013; Meira

Junior, 2015). Desse modo, pode ser associado à diversidade de respostas de

uma comunidade frente a alterações ambientais (Laliberté et al., 2010).

Análises estatísticas

Para a decisão de quais espécies seriam consideradas como “ornamentais”, e,

portanto, avaliadas diferenciadamente no estudo, foi confeccionada uma lista

com as espécies presentes na Instrução Normativa IN 001/2012 do Ministério da

Pesca e Aquicultura e Ministério do Meio Ambiente; a lista apresentada no

estudo de Anjos et al. (2009), e espécies citadas pelos pescadores ornamentais

da região de Barcelos (observações pessoais dos autores).

17

Para analisar a contribuição das espécies ornamentais na estrutura funcional das

assembleias, foram criados dois cenários:

Cenário 1. Neste cenário, todas as espécies categorizadas como “ornamentais”

presentes em cada um dos igarapés foram selecionadas e tiveram suas

abundâncias subtraídas em intervalos de 5%, até o limite de 100%, simulando

um aumento da pesca ornamental. A fim de testar o efeito da subtração das

abundâncias foram realizadas duas análises: A) Foram comparados através do

teste de Wilcoxon para amostras pareadas os resultados obtidos nos índices

funcionais com as assembleias em condições originais e com 100% das

abundâncias das espécies ornamentais de cada igarapé subtraídas. B) Para

verificar se a subtração das espécies ornamentais ocasiona um efeito específico,

foram selecionadas de forma aleatória através da função Sample do programa

R (R Core Team, 2016) um número de espécies “não-ornamentais” (espécies

que não se enquadraram na categoria “ornamental”) igual ao número de

espécies ornamentais de cada igarapé. As espécies selecionadas tiveram suas

abundâncias subtraídas no intervalo de 5% até o limite de 100%. Os resultados

obtidos nos índices funcionais no gradiente de subtração das abundâncias de

espécies “ornamentais” e “não ornamentais” foram comparados através do teste

de Wilcoxon para amostras pareadas.

Todas as análises foram realizadas individualmente em cada igarapé, dessa

forma os 13 igarapés foram utilizados como réplicas.

Cenário 2. Como a principal espécie explorada pela pesca ornamental é o Tetra

cardinal, Paracheirodon axelrodi (Schultz, 1956), foram avaliados os possíveis

impactos gerados pela redução da abundância dessa espécie nos igarapés.

Para isso, foram selecionados os igarapés onde a espécie ocorreu (n= 9) e sua

abundância foi subtraída em intervalos de 5%, até o limite de 100%,

individualmente em cada igarapé. A fim de testar o efeito da subtração das

abundâncias foram realizadas duas análises: A) Foram comparados através do

teste de Wilcoxon para amostras pareadas os resultados obtidos nos índices

funcionais com as assembleias em condições originais e com 100% da

abundância do Tetra cardinal de cada igarapé subtraída. B) Para verificar se a

subtração dessa espécie ocasiona um efeito específico, foi selecionada de forma

aleatória através da função Sample do programa R (R Core Team, 2016) uma

18

espécie “não-ornamental” (espécie que não se enquadrou na categoria

“ornamental”) presente em cada igarapé. As espécies selecionadas tiveram suas

abundâncias subtraídas no intervalo de 5% até o limite de 100%. Os resultados

obtidos nos índices funcionais no gradiente de subtração das abundâncias do

Tetra cardinal e de espécies “não ornamentais” foram comparados através do

teste de Wilcoxon para amostras pareadas.

Todas as análises foram realizadas individualmente em cada igarapé, dessa

forma os 13 igarapés foram utilizados como réplicas.

Hemigrammus vorderwinkleri apresentou abundância 224% maior que a

segunda espécie mais abundante (Hemigrammus analis). Em um único evento

de coleta foi capturado cerca de 50% de sua abundância total, o que aparenta

ser efeito da captura de um cardume, influenciando a amostragem e, não

representando de fato a proporcionalidade real entre as espécies. Assim, a fim

de evitar tendências errôneas nos cálculos dos índices, essa espécie foi excluída

das análises.

Resultados

Estrutura taxonômica e proporção de espécies ornamentais nas

assembleias

Foram capturados 4.286 peixes, pertencentes a sete ordens, 24 famílias e 110

espécies. A ordem mais abundante foi Characiformes (89,92 % dos exemplares

coletados), seguida por Perciformes (5,62 %) e, Siluriformes (2,70 %). A família

Characidae foi a mais representativa, com 34 espécies e 3.147 exemplares,

representando 73,42% do total de peixes amostrados.

Das 110 espécies coletadas, 22 foram classificadas como ornamentais, sendo

sete da família Cichlidae, sete Lebiasinidae, cinco Characidae, duas

Gasteropelecidae e uma Potamotrygonidae, totalizando 1.148 exemplares

(Tabela S3). Em todos os igarapés amostrados foi encontrada pelo menos uma

espécie ornamental.

19

Dentre as espécies ornamentais, o Tetra cardinal (Paracheirodon axelrodi)

apresentou a maior abundância (396 exemplares) e a maior frequência de

ocorrência (9 dos 13 igarapés). Carnegiella marthae foi a segunda espécie

ornamental mais importante, com 297 exemplares e ocorrência em quatro

igarapés. Hemigrammus analis foi a espécie mais representativa fora da

categoria ornamental, com 492 indivíduos coletados, seguida de H.bellottii, com

275 indivíduos.

Estrutura funcional das assembleias

Considerando o total de espécies amostradas nos 13 igarapés (110), 13,11% do

volume do espaço funcional foi preenchido pelas 22 espécies enquadradas na

categoria ornamental (figura 2).

20

Figura 2. Volume ocupado pelas espécies categorizadas como ornamentais no espaço

multidimensional considerando o total de espécies amostradas. Polígono branco: volume

ocupado pelo total de espécies amostradas; polígono rosa: volume ocupado por espécies

ornamentais; círculos brancos: espécies não ornamentais; círculos pretos: espécies

ornamentais.

Os valores do índice de Divergência Funcional (FDiv) foram altos em todos os

igarapés, variando de 0,53 a 0,91. Foi observado no índice de Dispersão

Funcional (FDis) valores variando de 0,05 a 0,14. A Redundância Funcional (FR)

total das assembleias variou de 0,15 no igarapé Zalala, o qual apresentou 11

espécies, a 0,50 no igarapé Mamulé, com 17 espécies amostradas. O igarapé

21

Bui-Bui apresentou o maior número de espécies (34) e redundância funcional de

0,47. A maior concentração de ornamentais foi encontrada no igarapé Daracuá

(10) com redundância funcional de 0,44 (tabela S5).

Efeito da retirada de espécies ornamentais na estrutura funcional

das assembleias (Análise A)

O teste de comparação de medianas mostrou diminuição significativa nos

valores de redundância funcional (FR) das assembleias nos cenários 1 (P= 0,03)

e 2 (P= 0,003), para análise A (figura 3). A queda média nos valores do índice

foi de 3,19% no cenário 1, para os 13 igarapés. A partir da subtração de 35%

das abundâncias do cardinal, foi possível constatar diminuição significativa nos

valores de FR no cenário 2 (P= 0,042). No cenário 1, não houve diferenças

significativas nos resultados de FDiv, com exclusão completa das espécies

ornamentais. Já no cenário 2, foi constatado aumento significativo nos valores

de FDiv a partir da retirada inicial de 5% das abundâncias do cardinal, P. axelrodi

(P= 0,036) até 95% (P=0,027). Com a exclusão completa da espécie o teste de

comparação de medianas mostrou valor de P= 0,054 (figura 4). Para o índice

22

FDis, não foram constatadas diferenças significativas em nenhum dos dois

cenários.

Figura 3. Resultados obtidos no índice de redundância funcional, nos cenários 1 e 2, análise A,

em condições originais e com 100% das abundâncias das espécies ornamentais subtraídas.

23

Figura 4. Resultados obtidos no índice de divergência funcional, no cenário 2, análise A, em diferentes porcentagens de subtração de abundâncias de P. axelrodi.

Comparação do efeito gerado pela subtração das abundâncias de

espécies ornamentais e não ornamentais na estrutura funcional

das assembleias (Análise B)

No cenário 1, análise B, onde todas as espécies ornamentais de cada igarapé

tiveram suas abundâncias subtraídas no intervalo de 5%, a perda de

redundância funcional foi significativamente menor do que quando comparada

com a subtração das abundâncias de espécies não ornamentais (P< 0,001.

Figura 5). A dispersão e a divergência funcional tiveram um aumento

significativamente maior com a retirada de espécies ornamentais do que com a

retirada de espécies não ornamentais (P< 0,001 em ambos os índices. Figura 5).

24

Figura 5. Resultados obtidos no cenário 1 de seleção de espécies nos índices de Redundância,

Divergência e Dispersão funcional, nas diferentes porcentagens de subtração de abundâncias

de espécies ornamentais (preto) e não ornamentais (cinza).

25

O teste de comparação de medianas mostrou para o cenário 2, análise B,

(subtração das abundâncias de P. axelrodi) uma perda de redundância funcional

maior do que para a remoção de espécies não ornamentais (P< 0,001. Figura 6).

FDiv e FDis apresentaram comportamentos semelhantes ao cenário 1, onde a

subtração das abundâncias de espécies ornamentais gerou um aumento maior

que a subtração das abundâncias de espécies não ornamentais (figura 6).

26

Figura 6. Resultados obtidos no cenário 2 de seleção de espécies nos índices de Redundância,

Divergência e Dispersão funcional, nas diferentes porcentagens de subtração de abundâncias

de P. axelrodi (preto) e espécies não ornamentais (cinza).

27

Discussão

O presente estudo revelou que as espécies categorizadas como ornamentais

exploram o ambiente e utilizam os recursos de forma similar à maioria das

espécies amostradas, proporcionando maior redundância à estrutura funcional

das assembleias de peixes em igarapés explorados pela pesca ornamental, na

porção média da bacia do rio Negro. Segundo a hipótese da garantia (Insurance

hypothesis, Yachi & Loreau, 1999), assembleias com maior redundância

funcional são menos vulneráveis às alterações ambientais. Neste sentido, a fim

de garantir maior resiliência aos ambientes e comunidades biológicas explotadas

pela pesca ornamental, é fundamental que haja um ordenamento da atividade e

a manutenção dos estoques dessas espécies (Naeem & Li, 1997; Yachi &

Loreau, 1999, Laliberté et al., 2010).

Embora a perda de redundância funcional seja, em média, de apenas 3,192%

com a retirada completa das espécies ornamentais nos igarapés, em alguns

ambientes esse valor ultrapassa os 12%, como é o caso do igarapé Daracuá. Ao

compararmos a condição original e com todas as espécies ornamentais

excluídas, existe uma queda significativa de redundância.

Numerosos estudos apontam a redução de redundância funcional como um dos

mecanismos causadores de aumento da vulnerabilidade de comunidades

biológicas e ecossistemas (Joner, 2008; Jonsson, 2011; Laliberté et al., 2010).

Uma assembleia em que diversas espécies desempenham a mesma função é,

teoricamente, mais resistente às mudanças estruturais do que assembleias em

que as funções são desempenhadas por uma ou poucas espécies (Fonseca &

Ganade, 2001). A garantia de que uma determinada função ecológica estará

presente em uma assembleia, mesmo com a extinção de uma espécie, é refletida

na estabilidade do ecossistema, a qual é relacionada à capacidade do

ecossistema de evitar qualquer alteração (resistência) e a habilidade de retornar

ao estado prévio após sofrer alguma alteração (resiliência) (Harrison, 1979;

Carpenter, Walker, Anderies, & Abel, 2001).

Através da comparação com a retirada de espécies não ornamentais, foi

constatado que a exclusão do Tetra cardinal (P. axelrodi) possui efeito específico

na redundância funcional das assembleias. Por apresentar grande abundância,

28

explorar os recursos comumente encontrados nos igarapés do médio rio Negro

e utilizar o ambiente de forma semelhante à maioria das espécies da família

Characidae (Walker, 2004), o cardinal contribui significativamente com a garantia

de desempenho de serviços ecológicos, favorecendo a resiliência do

ecossistema.

O presente estudo foi baseado em um conjunto de características morfológicas

relacionadas à utilização do ambiente e exploração de recursos, não tendo

incluído características comportamentais, relações filogenéticas ou padrões de

coloração. Apesar do cardinal apresentar uma morfologia “generalizada” nas

assembleias amostradas, a espécie apresenta um padrão único de coloração.

Entretanto, a função eventualmente exercida por essa propriedade, presente em

ambos os sexos, ainda é desconhecida. Via de regra, toda característica fixada

em uma população possui valor adaptativo positivo ou neutro.

Estudos realizados com ciclídeos africanos mostram que o padrão de coloração

é um importante mecanismo de reconhecimento intraespecífico, funcionando

como isolamento reprodutivo entre espécies próximas vivendo em sintopia

(Maan & Sefc, 2013). A coloração pode ser relacionada, também, à pressão de

predação, como em Poecilia reticulata, onde a coloração conspícua atua de

forma negativa, aumentando as taxas de predação (Magurran, 2005), e ao

reconhecimento de espécies que desempenham relações mutualísticas de

“limpeza” à outras espécies de peixes em recifes de coral (Gasparini et al., 2005).

O comportamento social e o forrageamento são outros aspectos relacionados

com os padrões de coloração, onde certas características demostram

dominância e favorecimento na utilização de recursos alimentares (Ochi &

Awata, 2009).

Os valores originalmente obtidos na dispersão funcional (FDis), em ambos os

cenários, são reflexos da concentração de espécies próximas ao centroide. Com

a elevada abundância concentrada nas espécies com morfologia “generalizada”

(morfotipo semelhante a maioria das espécies amostradas), o centroide é

posicionado a curtas distâncias da maioria das espécies, aproximando de zero

os valores do índice. Isso explica por que em ambos os cenários de seleção de

espécie não houve variações significativas nos valores de FDis com a subtração

das abundâncias de espécies ornamentais. Com atributos ecológicos similares

29

a maioria das espécies, as ornamentais se concentraram, em sua maior parte,

no centro do espaço multidimensional, colaborando em pequenas proporções

com a diversidade de respostas a possíveis modificações ambientais. O

posicionamento das espécies e a distribuição das abundâncias fizeram com que

os valores de FDis aumentassem com a retirada das espécies ornamentais, isso

ocorre devido ao distanciamento do centroide em relação a grupos de espécies

não ornamentais próximas às ornamentais.

Quando a retirada de espécies ornamentais é comparada com a retirada de

espécies não ornamentais (análise B), há um incremento significativo na

divergência funcional das assembleias, nos dois cenários de seleção de

espécies. Como a FDiv é obtida através do desvio das espécies na distância

média da comunidade em relação ao centroide do espaço funcional, e a

abundância é considerada, a retirada de espécies ornamentais abundantes e

próximas a distância média da comunidade, aumenta os valores desses índices.

Este aumento está ligado, provavelmente, à retirada de grandes quantidades de

P. axelrodi e Carnegiella marthae, ambas espécies ornamentais com grande

peso no cálculo do índice, devido sua elevada abundância e proximidade à

distância média da assembleia. Sob esse cenário, espécies mais divergentes e

menos abundantes, como Potamotrygon wallacei e Trichomycterus hasemani,

ganham relevância no cálculo do índice.

Mesmo com baixas taxas de produtividade primária e baixa concentração de

nutrientes em suas águas, a região do médio rio Negro apresenta elevada

riqueza de espécies de peixes (Chao et al., 2001; Goulding, Carvalho, & Ferreira,

1988) e sustenta uma intensa pesca ornamental. A considerável diferenciação

na utilização do ambiente e na exploração de recursos, evidenciada pelos altos

valores de divergência funcional, é um aspecto importante que permite a

coexistência de uma grande diversidade de espécies. A exemplo disso, estudos

realizados no lago Victoria, no leste africano, sugerem que a grande riqueza de

espécies de ciclídeos do gênero Hoplachromis (aproximadamente 500 espécies)

é viabilizada, em partes, pelas diferentes formas e períodos de uso do habitat e

exploração de recursos alimentares (Meyer, Verheyen, Salzburger, & Smoeks,

2003).

30

Considerações finais

Na região do médio rio Negro, a pesca ornamental explora espécies com baixo

valor monetário individual; com isso, para se tornar rentável, os pescadores

necessitam capturar grandes quantidades de indivíduos dessas espécies,

diferentemente da pesca ornamental realizada no rio Xingu, por exemplo, onde

a comercialização de poucos peixes de elevado valor individual é rentável.

A captura de grandes quantidades de indivíduos induz a uma queda nos

estoques populacionais, inviabilizando as expedições de pesca do médio rio

Negro. Devido a inviabilidade econômica, os pescadores são forçados a

substituir o ponto de pesca, com isso, as chances de extinção local das espécies

ornamentais são diminuídas.

A pesca ornamental, realizada de maneira ordenada e com manejo adequado

dos estoques, tem condições propícias para se manter viável e sem alterar a

estabilidade do ecossistema, uma vez que as assembleias apresentam

considerável redundância, na maioria dos casos, não suprime funções

ecológicas, e a atividade não gera alterações significativas nas condições físicas

e químicas do ambiente.

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35

Material suplementar

Figura S1. Fotografia de um rapiché, aparelho de coleta de peixes ornamentais típico da região do médio rio Negro. Fonte: Danilo G. R. Castanho

Figura S2. Vista lateral de um cacuri, tipo de armadilha para peixes ornamentais utilizada na região do médio rio Negro. Fonte: Danilo G. R. Castanho.

36

Figura S3. Esquema das medidas ecomorfológicas obtidas com auxílio de paquímetro digital e análise fotográfica, através do programa computacional Image J. Siglas: Cp-comprimento padrão, Amc-altura máxima do corpo, Aco-Altura da cabeça, passando pelo centro do olho, Do-diâmetro do olho, Doc-distância do centro do olho até a parte inferior da cabeça, Lc-largura do corpo, Lb-largura da boca, Ab-altura máxima da boca, Po -distância entre a pré-maxila e a base da cabeça, Aip-altura da inserção da nadadeira peitoral, Acp-altura do corpo passando pela inserção da nadadeira peitoral, Cnp-comprimento máximo da nadadeira peitoral, Anp-área da nadadeira peitoral, Hnc -altura da nadadeira caudal, Anc -área da nadadeira caudal, Apc-altura do pedúnculo caudal, Prt-comprimento da protrusão bucal, Fo-comprimento do focinho, Massa peso total. Fonte: Leitão et al., 2016.

Tabela S1. Lista de atributos funcionais e seus respectivos significados ecológicos. Códigos para medidas morfológicas são apresentados na figura S3.

Atributo funcional Cálculo/Classe Significado ecológico

Referências

Área da abertura da boca

(Lb*Ab)/(Lc*Amc) tipo/tamanho de itens alimentares capturados

Adaptado de Karpouzi e Stergiou (2003)

Formato da boca

Ab/Lb Tática alimentar Karpouzi e Stergiou (2003)

Posição da boca

Po/Aco Tática alimentar e posição na coluna d’água

Adaptado de Sibbing e Nagelkerke (2001)

37

Comprimento da protrusão bucal

Prt/Fo Tática alimentar e natureza dos itens alimentares

Leitão et al., 2016

Tamanho do olho

Do/Aco

Acuidade visual

Adaptado de Boyle e Horn (2006)

Posição do olho Doc/Aco Posição vertical ocupada na coluna d’água

Gatz (1979)

Formato do corpo

Amc/Lc Hidrodinamismo e posição ocupada na coluna d’água

Adaptado de Sibbing e Nagelkerke (2001)

Área do corpo

(ln(((Pi/4)*Lc*Amc)+1)) /(ln(Massa+1))

Manobrabilidade Adaptado de Villéger et

al., 2010

Posição da nadadeira peitoral

Aip/Acp Manobrabilidade Leitão et al.,2016

Aspecto relativo da nadadeira peitoral

(Cnp^2)/Anp Uso da nadadeira peitoral para propulsão

Leitão et al.,2016

Estrangulamento do pedúnculo caudal

Hnc/Apc Eficiência da propulsão caudal

Leitão et al.,2016

Área relativa das nadadeiras

(2*Anp)/Anc Principal tipo de propulsão entre as

nadadeideiras

Adaptado de Villéger et

al., 2010

Proporção das nadadeiras em relação ao tamanho do corpo

((2*Anp)+Anc)/ (((Pi/4)*Lc*Amc))

Eficiência da manobrabilidade e/ou aceleração

Leitão et al.,2016

Rastros branquiais Ausente, pequenos e numerosos, pequenos e esparsos, intermediários e numerosos, intermediários e esparsos, longos e numerosos e longos e esparsos

Capacidade de filtragem e proteção das brânquias

Leitão et al.,2016

Massa Log(Massa+1) Metabolismo, resistência e capacidade de natação

Villéger et. al, 2010

Formato dos dentes Ausente, viliforme Cônico, Caniniforme Incisiviforme, Espatulado largo e fino Multicúspide central, Mamiliforme, Multicúspide triangular, Multicúspide serrilhado, Reniforme

Natureza de itens alimentares capturados e tática alimentar

Adaptado de Gatz (1979), Keenleyside (1979), Sazima (1986)

38

Figura S4. Qualidade do espaço funcional baseado no protocolo proposto por Maire et al. (2015).

39

Tabela S2. Atributos funcionais que mais influenciam cada eixo da PCoA. Valores obtidos

através da correlação entre os atributos funcionais e os eixos da PCoA

Atributo funcional Eixo 1 Eixo 2 Eixo 3 Eixo 4

Formato dos Dentes

0,7924

Rastros branquiais

0,7342

Posição da nadadeira peitoral

-0,6579

Massa 0,8679

Tamanho do olho

-0,6977

Posição da boca -0,4870

Área da boca

-0,6884

Formato da boca -0,5927

Área do corpo 0,3656

Formato do corpo 0,7127

Posição do olho -0,4248

Proporção das nadadeiras em relação ao tamanho do corpo

-0,3853

40

Tabela S3. Lista das espécies amostradas e respectivas abundâncias. * Espécies

categorizadas como ornamentais

Espécies Abundância

Characiformes 3854

Acestrorhynchidae 14

Acestrorhynchus_falcirostris 3

Acestrorhynchus_microleps 10

Acestrorhynchus_minimus 1

Anastomidae 3

Leporinus_klausewitzi 3

Characidae 3147

Axelrodia_stigmatias 1

Brittanichthys_axelrodi* 6

Bryconops_giacopinii 49

Characidium_pellucidum 18

Charax_condei 4

Gnathocharax_steindachneri 15

Hemigrammus_analis 492

Hemigrammus_bellottii 275

Hemigrammus_bleheri* 50

Hemigrammus_coeruleus 78

Hemigrammus_levis 21

Hemigrammus_lunatus 10

Hemigrammus_ocellifer 3

Hemigrammus_stictus* 137

Hemigrammus_vorderwinkleri 1102

Hoplocharax_goethei 95

Hyphessobrycon_aff_melazonatus 98

Hyphessobrycon_bentosi 2

Hyphessobrycon_diancistrus 1

Hyphessobrycon_rosaceus* 10

Hyphessobrycon_sp_microschemobrycon 18

Iguanodectes_adujai 1

Iguanodectes_gesleri 3

Iguanodectes_spilurus 3

Microschemobrycon_casiquiare 3

Moenkhausia_aff_coletti 145

Moenkhausia_coletti 14

Moenkhausia_lepidura 5

Moenkhausia_mikia 2

Paracheirodon_axelrodi* 396

Parapristela_aubiygnei 79

Poptella_compressa 1

41

Priocharax_sp 2

Rhinobrycon_negrensis 8

Crenuchidae 14

Ammocryptocharax_minutus 1

Crenuchus_spilurus 3

Elachocharax_junki 6

Elachocharax_puncher 1

Odontocharacidium_aphanes 2

Poecilocharax_weitzmani 1

Ctenoluciidae 2

Boulengerella_lateristriga 2

Curimatidae 93

Curimatopsis_evelynae 90

Curimatopsis_macroleps 3

Erythrinidae 21

Hoplerythrinus_unitaeniatus 6

Hoplias_curupira 1

Hoplias_malabaricus 14

Gasteropelecidae 329

Carnigiella_marthae* 297

Carnigiella_strigata* 32

Hemiodontidae 27

Hemiodus_gracilis 27

Lebiasinidae 196

Copella_nattereri* 33

Copella_nigrofasciata 11

Nannostomus_digramus* 96

Nannostomus_eques* 12

Nannostomus_marginatus* 3

Nannostomus_marilynae* 7

Nannostomus_trifasciatus* 1

Nannostomus_unifaciatus* 29

Pyrrulina_semifasciata 4

Serrasalmidae 8

Metynnis_hypsauchen 1

Metynnis_sp1_linha lateral preta 4

Metynnis_sp2 2

Pygopristis_denticulata 1

Chondrichthyes 3

Potamotrygonidae 3

Potamotrygon_wallacei* 3

Cyprinodontiformes 53

Poecilidae 52

Fluviphylax_obscurus 16

42

Fluviphylax_pigmeus 36

Rivulidae 1

Rivulus_ornatus 1

Gymnotiformes 18

Hypopomidae 17

Hypopygus_lepturus 12

Microsternachus_cf_bilineatus 4

Steatogenys_elegans 1

Ramphicthyidae 1

Hypopygus_hoedeman 1

Perciformes 241

Cichlidae 240

Acarichthys_heckelii 3

Acaronia_nassa 1

Acaronia_vultuosa 1

Aequidens_cf._pallidus 10

Aequidens_pallidus 3

Aequidens_sp 2

Aequidens_sp2 1

Apistogramma_gephyra* 1

Apistogramma_gibbiceps* 3

Apistogramma_pauciscranis* 11

Apistogramma_pertensis* 1

Apistogramma_uaupesi* 5

Biotecus_opercularis 12

Biotodoma_wavrini 3

Cichla_orinocensis 3

Crenicichla_notophthalmus 4

Dicrossus_filamentosus* 11

Heros_notatus* 4

Hoplarchus_psitticus 143

Laetacara_fulvipinis 2

Mesonauta_insignis 3

Satanoperca_lilith 2

Satanoperca_sp 1

Taeniacara_cf_candidi 9

Uaru_amphiacanthoides 1

Eleotridae 1

Microphilypnus_ternetzi 1

Siluriformes 116

Doradidae 70

Acanthodoras_spinosissimus 3

Ambliodoras_afinis 5

Scorpiodoras_heckelii 62

Heptapteridae 1

43

Gladioglanis_conquistador 1

Loricariidae 9

Acestridium_discus 2

Ancistrus_dolichopterus 6

Dekeyseria_scaphyryncha 1

Pimelodidae 3

Rhamdia_laukidi 3

Trichomycteridae 33

Trichomycterus_hasemani 33

Synbranchiformes 1

Synbranchidae 1

Synbrancus_sp 1

Total Geral 4286

44

Tabela S4. Variáveis ambientais amostradas

Igarapé Código Bacia Temperatura (°C)

pH Condutividade (mS)

Abertura de Dossel (%)

Largura (M)

Profundidade (Cm)

Velocidade (M/S)

Substrato

Puxurituba PXT Negro 29.8 4.44 0.028 63.54% 15.87 48 0.12 Misto

Zamula ZML Negro 26.97 4.8 0.024 54.16% 9.87 47.83 0.09 Misto + Argila

Bui-Bui BUI Negro 27.36 4.52 0.032 52.08% 10 41.97 0.19 Misto

Daracuá DCA Itu 30.01 5.27 0.047 63.54% 9.87 49.62 0.15 Areia

Cazurucu CZC Itu 28.01 4.29 0.114 51.04% 11 58.32 0.28 Areia

Aduiá ADU Itu 29.84 4.96 0.085 95.80% 16.75 62.14 0.11 Misto + Argila

Maqui MQI Aracá 25 4.32 0.018 14.58% 11.62 89.41 0.13 Liteira

Zalala ZLL Negro 27.54 4.38 0.031 100% 19.25 125.6 0.06 Liteira Fina

Arraia IGR Negro 30.55 4.83 0.018 47.90% 5.75 64.25 0.12 Misto

Cutiuaia CTA Aracá 28.08 4.02 0.028 97.91% 8.63 164.91 0.32 Misto + Areia

Mauaú MAU Aracá 25.9 4.26 0.025 65.62% 16 185.8 0.21 Misto + Areia

Calibuque CLB Aracá 26.32 4.72 0.022 17.70% 7.6 52.41 0.25 Liteira

Mamulé MML Cuiuní 26.87 4.28 0.017 56.25% 7.25 141.08 0.27 Misto + Troncos

45

Tabela S5. Resultados encontrados na condição original de cada igarapé. Ne. Número total de

espécies; Nt. Número total de exemplares capturados; NeO. Número de espécies ornamentais;

No. Número de exemplares ornamentais; FR. Redundância Funcional; FDiv. Divergência

funcional; FDis. Dispersão funcional

Igarapé Ne Nt NeO No FR FDiv FDis

Aduiá 19 802 5 21 0.198165 0.810856 0.051492

Bui-Bui 34 418 8 142 0.470105 0.664327 0.100328

Calibuque 22 491 7 188 0.329822 0.534317 0.070273

Cutiuaia 19 96 6 31 0.329109 0.917294 0.146738

Cazurucu 16 193 7 125 0.375625 0.566266 0.109953

Daracuá 23 416 10 117 0.444744 0.743344 0.092564

Arraia 8 139 2 11 0.29859 0.60015 0.076124

Mauaú 21 313 9 197 0.494249 0.792657 0.058527

Mamulé 17 254 3 27 0.501064 0.671647 0.051384

Maqui 14 51 1 1 0.452561 0.66469 0.0722

Puxurituba 29 702 8 204 0.461382 0.575912 0.099306

Zalala 11 219 2 3 0.150209 0.893372 0.103335

Zamula 21 192 5 81 0.356976 0.709794 0.11245