Introducão à História Do Direito

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URCA (IGUATU): HISTÓRIA DO DIREITO Ms Magnus Geleno Felga Fialho INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DO DIREITO Ms Magnus Galeno Felga Fialho 1

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Apostila Introduçaõ à História do Direito

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  • URCA (IGUATU): HISTRIA DO DIREITO Ms Magnus Geleno Felga Fialho

    INTRODUO HISTRIA DO DIREITO

    Ms Magnus Galeno Felga Fialho

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  • URCA (IGUATU): HISTRIA DO DIREITO Ms Magnus Geleno Felga Fialho

    Universidade Regional do Cariri URCA IguatuDedicatria: Para minha querida e inesquecvel me: Clia Conceio Felga Fialho. Trsanos de saudade.

    Prefcio: Uma introduo a um longo e interessante assunto. Visa ao aluno mdio dedireito. Alunos que reclamam de textos longos ou de linguagem pesada para novatos naacademia. Possui textos extras de leitura que chamam ateno pela curiosidade,aprofundamento e conscientizao dos problemas do direito na histria. Faam bom usoe busquem na ampla bibliografia naquilo que sua fome de saber no foi saciada.

    Biografia: Bacharel em Teologia Livre pelo Seminrio Presbiteriano do Sul; Bacharel emTeologia pela Universidade Mackenzie; Bacharel em Filosofia pela Faculdades JooCalvino; Mestre em Cincias da Religio pela UMESP; Doutorando em Filosofia pelaUniversidad Catolica de Santa F ARG. Professor de matrias diversas na UniversidadeMackenzie por 10 anos. Pastor Presbiteriano (1985 1998). Professor e Coordenador por2 anos da FAETEN. Professor na Universidade Vale do Acara por 8 anos (Histria,Filosofia e Sociologia das Organizaes). Ex-professor de Ensino Mdio (Colgio RuiBarbosa, JBC e Polos) e cursinhos (Lgica e Fnix) em Iguatu. Atualmente professorsubstituto/Temporrio da URCA por 6 anos. Ministrando aulas na rea de Cincias daReligio, Histria, Filosofia, Sociologia, tica Filosfica, Antropologia Cultural e jurdica;Evoluo do Pensamento Jurdico.

    Dados de Catalogao:

    FIALHO, Magnus Galeno Felga. Introduo histria do Direito. 1 Ed. Iguatu Ce: 2014.127 p. (Apostilado) (1962)

    1)Direito na histria Geral; 2)Direito Romano; 3)Direito no Brasil; 4)Histria do Brasil eGeral aplicada.

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    SUMRIO

    INTRODUO HISTRIA DO DIREITOPARTE 1: DIREITO E HISTRIA GERAL...............................................................................05

    1)O HOMEM PRIMTIVO: PRECEITO RELIGIOSO, MORAL E DIREITO........................ 052)O DIREITO NO ORIENTE PRXIMO........................................................................... 082.1)Egito......................................................................................................................... 082.2)mesopotmia........................................................................................................... 11

    Texto 1: O Cdigo de Hamurbi............................................................................ 122.3)Hebreus ....................................................................................................................163)O DIREITO NA GRCIA E EM ROMA ......................................................................... 203.1)Direito na Grcia ..................................................................................................... 213.1.1)Legisladores ..................................................................................................... 22

    3.1.2)Instituies Jurdicas ....................................................................................... 233.1.3)Filsofos: Direito, Justia e Lei ........................................................................ 24

    3.2)Direito em Roma ..................................................................................................... 263.2.1)Introduo ........................................................................................................ 26 Texto 2: A vida e as Leis em Roma ..................................................................... 27

    Texto 3: Dualismo na Religio e Direito em Roma .............................................. 283.2.2)Perodos Polticos ..........................................................................................., 30

    3.2.3)Perodos Judicirios ........................................................................................ 303.2.4)O Corpo do Direito Civil ................................................................................... 333.2.5)Os jurisconsultos ............................................................................................ 34

    3.3.6)A filosofia Romana do direito............................................................................ 344)O DIREITO NA IDADE MDIA OCIDENTAL ................................................. 364,1)Direito rabe............................................................................................................ 364.2)Direito e Feudalismo ............................................................................................... 40 Texto 4: A vendeta e a faida ................................................................................... 42 Texto 5:Charivari e o ritual judicirio ......................................................................464.3)Direito na idade mdia Crist .................................................................................. 48

    4.3.1)O Direito Cannico .......................................................................................... 49Texto 6: Direito Cannico e Inquisio ..................................................................... 49

    4.3.2)Direito, Lei e Justia em Santo Agostinho ....................................................... 544.3.3)Direito, Lei e Justia em Toms de Aquino ..................................................... 564.3.4)Poder Temporal e Poder Religioso ................................................................. 57 Texto 7: A Iluso e a Cura Reis Taumaturgos ..................................................... 595)DIREITO MODERNO E CONTEMPORNEO .............................................................. 645.1)Jusnaturalismo e Juspositivismo .............................................................. 655.2)Nova Viso Penal ................................................................................................... 66 Texto 8: Pequeno Resumo de Dos delitos e das Penas ..................................... 665.3)Cdigo Civil Napolenico ........................................................................................ 67

    PARTE 2: DIREITO E A HISTRIA DO BRASIL ........................................................................ 69

    INTRODUO ............................................................................................................................ 69

    6)HISTRIA DE PORTUGAL E SUA EVOLUO JURDICA ....................................... 697)A JUSTIA NO BRASIL ................................................................................. 72 Texto 9: Criminalidade e Amor no Brasil Colnia ................................................ 72

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    Texto 10: A Prtica da Faida ............................................................................... 748)ORGANIZAO JUDICIRIA NO BRASIL COLNIA ......................................................759)A JUSTIA NO BRASIL HOLANDS ........................................................................ 7610)O DIREITO NO BRASIL POMBALINO ..................................................................... 77

    Texto 11: A Devassa no Brasil Colnia A Inconfidncia ................................ 7811)O DIREITO NO BRASIL JOANINO E NO IMPRIO ................................................ 82 Texto 12: Impunidade no Brasil Colnia e Imprio ........................................... 83 Texto 13: Crime Sexual e Acompanhamento do Ato ........................................ 86 Texto 14: O Caso da Fera de Macabu .............................................................. 88 Texto 15: O Julgamento de Pinto Madeira ........................................................ 89

    Texto 16: Pontes Visgueiro e Maria da Conceio ........................................... 9012)A CONSTITUIO DE 1824, O LIBERALISMO, ATO ADICIONAL E REFORMAS.. 96

    Texto 17: O Liberalismo e a Cultura Jurdica .................................................... 9913)CONSTITUIES E DIREITO NO BRASIL REPBLICA ...................................... 10513.1)A Constituio de 1891 .................................................................................. 105

    Texto 18: O Primeiro Cdigo Civil Brasileiro ................................................... 10713.2)Emenda Constitucional de 1926 ..................................................................... 10813.3)As Constituies da Era Vargas ...................................................................... 108

    13.3.1)Introduo .............................................................................................. 10813.3.2)A Constituio de 1934 .......................................................................... 10913.3.3)A Constituio de 1937 Polaca ........................................................... 111 Texto 19: Extinctos todos os Partidos polticos do paiz .................................. 11213.3.4)A Constituio de 1946 .......................................................................... 113

    13.4)A Constituio de 1967 e a 1 Emenda de 1969 ............................................. 11613.5)A Constituio de 1988 e o Cdigo Civil de 2002 ........................................... 11813.6)Os Grandes Juristas do Brasil ......................................................................... 121

    BIBLIOGRAFIA ......................................................................................................................... 123

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    INTRODUO HISTRIA DO DIREITO

    difcil definir o direito. Ele se faz presente em todos os momentos da vida humana.Como se refere Carlos Santiago Nino (2003), o cantor em sua casa, debaixo de seu chuveiropode estar ferindo o direito positivado, pois a altura de seu canto e o horrio so regulados nasociedade por leis. Saindo de casa e indo ao servio, o homem moderno encontra nasmovimentadas cidades o trnsito de pedestres, bicicletas, motos e carros, trnsito estetambm regulado por leis. Pode-se seguir indefinidamente estas descries e a conclusoseria: como ser que vive em sociedade, o homem est cercado de normas de convivncia quevaria em grau de complexidade e rea de atuao.

    No sem motivo que a histria no decorrer dos sculos se preocupou em relatar odireito como a mais importante esfera da produo humana e tem sua existncia como base daconvivncia social. Em verdade a histria tem como objeto o relato do ser humano na sucessotemporal de seus atos. O direito , portanto, objeto da histria posto que ele feito pelo homemno tempo e no espao. Porm, um estudo sistemtico e separado destes atos denominadohistria do direito fruto recente da sociedade ocidental, mormente do sculo XIX e de suadiviso dos estudos em esferas menores. A histria do direito que surge no sculo XIX temsuas matizes e sistemas intimamente ligados sua prpria poca e as correntes depensamento sobre direito e histria. O direito dos povos equivale a seu tempo e interpretaoque o homem faz do seus atos. Assim como nos diz Fonseca impossvel fazer uma histriado direito sem saber um pouco da teoria da histria.

    A viso mtica do que Histria est ligada religio. H um senso de que a histria cclica, se repete tal como na natureza: O nascimento, o por do sol e seu novo nascimentoseria um exemplo deste ciclo. O prprio exerccio da justia no perodo mtico se d em frasesrepetidas e mgicas.

    Uma histria mais preocupada com a razo e a lgica descritiva dos fatos s se darcom o grego Herdoto, denominado Pai da Histria. Sua metodologia e viso narrativa soclssicas e registradas por ele mesmo em um pequeno trecho de sua obra:

    Eis ai como Persas e Fencios narram os fatos. Quanto a mim, no pretendoabsolutamente decidir se as coisas se passaram dessa ou de outra maneira; e,depois de ter narrado o que conheo sobre o primeiro autor das injrias feitasaos gregos, prossigo minha histria, na qual tratarei tanto dos pequenos Estadoscomo dos grandes. Os outrora florescentes encontram-se hoje, na sua maioria,em completa decadncia, e os que florescem hoje eram outrora bem poucacoisa. Persuadido da instabilidade da ventura humana, estou decidido a falarigualmente de uns e de outros. (HERDOTO, 2001, p. 46)

    No ocidente cristo nasce ainda uma forte corrente de filosofia histrica: oProvidencialismo segundo o qual, existe um ser superior que rege e providencia cada ato doser humano. Com esta base Agostinho produz sua grande obra: A Cidade de Deus1. Nestelivro ele refora a ideia providencialista de um Deus Soberano que conduz toda a histriahumana para um final que Ele mesmo providenciou. Essa ideia, no judasmo, era tambmcorrente. O incipiente cristianismo ter essa viso defendida por Eusbio de Cesaria, oprimeiro historiador cristo a defender o cristianismo como uma continuidade providencial doimprio romano. Os acontecimentos estariam ligados determinao de Deus. Tudo, a partir1Em cerca de 10 anos (416 a 427 d.C.) ele escreve 22 livros da sua grandiosa obra: A cidade de Deus (De Civitate Dei).

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    da origem da terra, deve ser explicado pela Providncia Divina. Assim, fatos aparentementeruins so designos de Deus e da sua santa providncia para alcanarem um fim destinado porEle.

    Para Agostinho, a histria no circular, mas linear. Isto quer dizer que ele pensava oincio da histria humana como o Gnesis e acreditava que o final desta histria estavadeterminado pela segunda vinda de Cristo descrita na Bblia, no livro do Apocalipse. No centrodesta viso da histria estava a razo de tudo: Cristo, seu nascimento e a formao de seupovo (A Cidade de Deus). As intempries continuariam at o fim, mas debaixo do controle deDeus. Agostinho no tinha a viso de uma dinmica crescente e grandiosa. Para ele, a cidadede Deus no construo humana de suas obras e realizaes, mas da interveno divinapara salvar e proteger seus fiis.

    Essa viso Agostiniana dominou a Idade Mdia Ocidental, influenciou oprotestantismo calvinista e diversos historiadores importantes. No sculo XVII, JacquesBossuet, na obra "Discurso Sobre a Histria Universal", afirma que toda a Histria foi escritapela mo de Deus, E no sculo XIX, o historiador italiano Csare Cantu produziu uma "HistriaUniversal" de profundo engajamento providencialista. Neste contexto as leis para os homensprovinham da revelao Bblica, portanto, como no passado grego romana, ligadas a religio.

    Somente no final do sculo XVIII at o sculo XXI, que as cincias sociais e humanasganharam seus mtodos, distintos das cincias naturais e puderam aspirar na comunidadecientfica da poca o lugar efetivo de Cincia. Quem iniciou essa mudana foi GiambattistaVico.2 Que era Filsofo e historiador de Roma e de seu direito. Sua obra principal e queinteressa ao assunto da Filosofia da Histria e das Cincias Sociais e Humanas, foi publicadainicialmente em 1725 e se chamava Sienza Nuova (Cincia Nova). De contedo assistemtico,sua obra s foi aproveitada posteriormente. Ele procurou separar a cincia da natureza desta Cincia Nova. Entre outras coisas, dizia ele:

    Para se conhecer realmente a natureza de qualquer coisa era necessrio t-lafeito. Ao contrrio do mundo dos objetos e dos acontecimentos naturais, queuma vez que Deus os criou, s ele os conhece, o mundo das naes, ouhistria humana, foi de fato criado pelos homens e , portanto, algo que oshomens podem esperar conhecer. Desta forma fica traada uma linha entre ahistria e a cincia da natureza e inicia-se uma tentativa de caracterizao dosaspectos distintivos da indagao histrica em contraste com outros ramos deconhecimento. (GARDINER, 1974, p. 12)

    A escola providencialista estava intimamente ligada ao jusnaturalismo. Os iluministasdeixaram de lado a ideia de Deus como fonte do direito natural e avanaram para a razo,enveredando a histria e, consequentemente, o direito pela metafsica. Herder, Kant e Hegelso exemplos claros deste. So os idealistas. Com eles a preocupao com a histriadocumental, onde os atos dos poderosos ou dos governos eram a fonte do estudo histrico. Opositivismo alemo e depois francs criaram a mais forte e organizada filosofia da histria dossculos XIX e incio do XX. O juspositivismo se apegou a lei e as normas do estado comobase de direito e justia.

    No direito o mesmo se d, e a busca por uma maneira diferente de ser fazer a histriado direito nasceu com um novo pensamento jurdico, uma nova preocupao: uma consistenterefutao do direito natural. Liderados por Friedrich Karl von Savigny (17791861), professorda Universidade de Berlim. O grupo de juristas ficou conhecida por Escola Histrica doDireito.

    2Italiano, nascido na cidade de Npoles. Viveu de 1668 at o ano de 1744 d.C.

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    Como reao ao racionalismo iluminista, este grupo com fortes ideais do romantismovisavam umapregao do direito vivo contra o direito abstrato e inerte; a intuio contra oraciocnio calculador. (MACEDO, 1982, p. 115) Introduziram na Alemanha essa disciplina Histria do Direito como um meio de se afastar dos extremos do sculo em questo jurdica:o direito positivo codificado, quanto o direito natural so expresso da razo e assim produtosum tanto artificiais. (MACEDO, 1982, p. 115) A busca passa ser enteder os grandes perodos esaber o que eles mudaram, mas principalmente saber os motivos e contemplar nodesenvolvimento das instituies das normas e leis uma clara reao ao desenvolvimento dohomem no seu contexto histrico.

    A Escola historicista passou tambm por fases e divises. Enquanto Savigny se apegavaao Direito Romano como uma espcie de base perfeita para novas investidas presentes,alguns acreditavam em estudar mais profundamente as vertentes germanistas do direitoAlemo. Rudolf Von Ihering foi um dos alemes que se afastou do formalismo do direitoRomano estudado na Alemanha e ...posteriormente, inclina-se, (...) para uma jurisprudnciapragmtica e sociolgica. (MACEDO, 1982, p. 121)

    No Brasil a disciplina foi introduzida no final do sculo XIX, vindo a sumir no inciodo sculo XX nas escolas de direito. Volta mais tarde como parte de uma tentativa de estudar ahistria do direito como uma anlise das postulaes perfeitas dos Romanos. Assim, o CorpusJuris Civilis, por exemplo, vista como uma base intemporal, que serve universalmente paratodos os dias e civilizaes. Tem-se assim uma histria mais preocupada na histria dosgrandes codigos com reveladores da lei e da justia. No entanto, a prpria histria mudou seurumo dessa viso positivista de histria, onde s os grandes cdigos e juristas se tornamimportantes.

    Novas vises de histria3 podem introduzir novas curiosidades e descobertas neste novocampo epistemolgico, onde a filosofia da histria do direito conduziria o pensador aos seusalvos estabelecidos filosoficamente para o estudo. Explicita essa saudvel vocao na histriao historiador do direiro WOLKMER (2006: p. 12):

    Com o intento de recuperao da verdadeira histria, aquela que nem sempre foiescrita, traduzida e interpretada (a histria dos vencidos e perifricos), quesurgiu a proposta desta sntese de investigaes jurdicas, dentro de um projetodirecionado para uma Nova Histria, fundada na inquietude e no engajamentode uma jovem gerao de juristas imbudos pela fora da crtica, datransgresso, do inconformismo e da postura libertria.

    Tal trabalho no tem essa funo, mas reconhece sua possibilidade e busca no cotidianodas pessoas uma nova forma de se ver a histria do direito. A funo ajudar o estudante dedireito a ter intrumental histrico para se aventurar em cincias afins, como sociologia do direitoe antropologia, bem como a importantssima filosofia do direito, formando no bacharel um basesegura para fugir das frmulas prontas e das verdades descoladas do povo e da poca quevive. Repetindo Cristiano Arajo Pinto: Assim, a atividade do historiador do direito envolveduas dimenses: a cartografia das formas de sociedade (ou, como diria Braudel, a Gramticadas Civilizaes e a percepo do fenmeno jurdico que brota na coletividade. (ARAJOPINTO, In, WOLKMER: 2006, p. 27)

    Na primeira parte desta obra uma ligao do homem primitivo e suas descobertas dooutro e do direito na viso religiosa. Na segunda parte uma descrio da evoluo do direito na

    3 As diversas correntes de histria influenciam o ponto de partida de cada historiador e consequentemente o seu ponto de chegada. A Escola Francesa dos Anais tem se tornado a mais importante, moderna e instigante, principalmente com a srie de grandes escritores com Le Goff, Matim Block e outros. Ver: Burke, Peter. A Revoluo Francesa da Historiografia: A Escola dos Annales (1929-1989), So Paulo: EDUSP, 1992

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    antiguidade e na idade mdia, ficando a terceira parte para o perodo moderno ecomtemporneo. No poderia deixar de existir uma quarta parte, onde de forma breve serexposta a histria do direito no Brasil. Acompanham os textos algumas notas de rodapexplicativas ou explanatrias e texto no final das partes como subsdio aos trabalhos e leiturasde sala de aula. Assim, os objetivos do estudo da histria do direito, tarefas e at a histria dasinstituies jurdicas, podem ser enumerados:1)Auxilia a compreenso das ligaes que existem entre a sociedade pulsante com todas assuas caractersticas, e o direito que ela produziu.2)Auxilia o autoconhecimento da pessoa humana e tambm o exerccio de suas tarefasprofissionais.3)Tentar mostrar que o direito no somente o que ele tem feito, mas o que o Direito na suaessncia.4)Discutir a hierarquia das fontes de modo a saber o que realmente est em vigor: o costumeou a lei.5)Como as instituies agem na busca da justia? So elementos que promovem a justia ousolidifica a lei? Qual a relao de lei e justia nas nossas instituies?

    PARTE 1 O DIREITO E A HISTRIA GERAL

    1)O HOMEM PRIMITIVO: PRECEITO RELIGIOSO, MORAL E DIREITO

    Para quem viaja hoje pelas modernas naes do mundo ocidental fica perceptvel apresena de uma estado sem religio. A cada gerao o ordenamento jurdico que respalda avida de uma nao fica distante da f, da religiosidade e dos templos. No que a religio tenhadeixado de estar presente ou tenha acabado no dia-a-dia de um estado moderno laicizado.No. A religio agora vivida em outra esfera da sociedade. Em alguns pases a religioest em fase de declnio e mudana sensvel de paradigmas e dogmas, mas em outros maisexuberantes que nunca se mostra em instituies novas e poderosas. Na verdade, o que sepassa, que a sociedade moderna com sua cincia afastou as outrora inseparveisrealidades: religio e poltica, ou se preferem pelo contedo deste trabalho: religio edireito.

    A separao foi drstica, cheia de consequncias, e as rusgas ainda hoje persistemincrustadas no debate nacional. Quando as instituies religiosas discutem leis que esto paraser aprovadas usando argumentos religiosos, as vozes de oposio se levantam e lembram doestado laicizado. As marcas e feridas foram tantas que o estado na figura de seus legisladoresesto dispostos a ouvir a sociedade em seus segmentos com pouco ou nenhuma capilaridade,mas no a sociedade religiosa organizada - igreja. Chamam para o debate sindicatos, partidospolticos, e diversos outros agrupamentos com suas ideologias, mas a igreja no tem o direitode manifestar-se. Resqucios de anos de interferncias da religio no estado e da lutapara emancipar os direitos civis em face das diferenas religiosas . preciso colocar delado alguns paradigmas modernos, pois apesar do tom discordante da poca atual, a religio eo direito nasceram simultaneamente, confundindo-se um com o outro e formando um s

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    edifcio de pensamento na antiguidade. No se estuda o nascimento do direito deixando delado a religio.

    Da parte dos historiadores da religio, o fato religioso tpico e exclusivo da Cincia daReligio, mas abrangente em todas as reas, pode-se citar e Loam Couliano na introduo desua Obra (COULIANO; MIRCEA:1999, p. 18):

    Mas de que maneira a religio forma um sistema? Alguns autores, alis comorientaes bem diferentes, como mile Durkheim, Marcel Mauss, GeorgesDumzil, Mircea Eliade e Claude Lvis-Strauss, enfatizaram todos a ideia deque a religio corresponde a certas estruturas profundas. Em seu livrofundamental, Les Formes lementares de la vie religieuse (1912), Durkheimexprimia a ideia de que o sistema religioso heteronmico, no sentido decodificar outro sistema: o sistema das relaes sociais no interior de um grupo.

    O direito nasce exatamente no momento da conscincia do homem diante de simesmo, do ambiente que o cerca e de seus semelhantes. Na constituio de uma sociedade,com todas as relaes presentes e pujantes, a religio se instala e serve de base, canal einterprete para o sistema social, entre eles a ideia do que direito ou justo . Claro que nose fala ainda de uma lei ou uma norma claramente estabelecida em papel, pedra ou mesmo naoralidade. A ideia de direito e justia sero desenvolvidas junto com a prpria complexidade dasociedade e de acordo com suas relaes sociais mais antagnicas, onde a proteo ao seramado, ao ser a quem se apega e ao mais fraco passa a ser uma necessidade urgente.

    A sobrevivncia como instinto nmero um vai aos poucos sendo controlado ou diminudodiante da produo de segurana alimentar e da sobrevivncia do grupo. A lei do mais fortecede lugar as normas da boa convivncia. A conscincia jurdica a convico que ohomem deve respeitar a vida, a liberdade e a propriedade dos demais, porque dessa forma que se d o nico modo de conviver socialmente. O que se pode fazer, como se pode agir,sem prejudicar o grupo a primeira noo do justo. Assim, o que moralmente correto seexpressa na norma religiosa e mais tarde definida como o justo ou norma jurdica.

    Encontrar exatamente este momento de conscincia em cada formao grupal dehomindeos praticamente impossvel, mas se pode delimitar um tempo dentro da era grafa4.Perodo de tempo longo. O homem vivia de forma rudimentar em cavernas. De forma nmadepassava seus dias na rdua tarefa de caar e coletar alimentos em pequenos grupos. O grupo,em alguns autores denominados de hordas, viva uma vida em comum. A pouca diviso dotrabalho existente era o de gnero (homens e mulheres). Nos milhares de anos da chamadaEra paleontolgica (Pedra Lascada) o homem tem suas habilidades manuais exaltadas. Passaa enterrar seus mortos em sinal de respeito e reverncia e deixam claras marcas de umareligiosidade aflorada. As perdas so sentidas e na crena de uma continuao da vida,crianas so enterradas com seus brinquedos e guerreiros com suas armas. J existe umpensar questionador e inquietante sobre os fenmenos fsicos ao redor. O homem comeasua primeira explicao do mundo e seus mistrios atravs de uma explicaomitolgica para a realidade. O Sagrado e o Profano divide a mente humana. A observaodas repeties cria a ideia da normalidade, da ordem csmica que o cerca e sua falta decompreenso tornam estes temas, lugares ou manifestaes como sagradas, enquantoaquilo que o homem domina e conhece, se torna o seu campo, ou seja, o profano. Aoposio entre ambos clara. O sagrado deve ser venerado, seguido como preceito de

    4 A histria positivista sempre insistiu no documento oficial, de preferncia escrito para ser oficialmente histrica. Por isso, operodo anterior a escrita era chamado erroneamente de Pr-histria. Hoje, com os novos e amplos conceitos de documentohistrico, de bom tom e correo histrica chamar o perodo anterior a escrita de Era grafa (Sem Escrita), mas um perodohistrico.

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    comungar com a ORDEM, o CORRETO que a natureza oferece ao homem. Seguir o ritmo danatureza no se expor as eventualidades catastrficas que so anmalas e contrrias anatureza: um trovo, um raio, um incndio, uma tempestade ou doena que traz a morte. Bulirna ordem o mau (moralmente falando) o pecado (religiosamente falando) o injusto(juridicamente falando). Aqui, Pecado crime e crime pecado, pois a ordem biolgica uma s na mente do homem primitivo e os fios invisveis, porm reais, ligam de maneirainequvoca o reino animal, vegetal e humano. Contrariar um bulir e atrapalhar o outro. Ohomem deve seguir o ritmo uno da natureza. Mircea Eliade escreve:

    Um crime um sacrilgio que pode ter consequncias muito graves a todos osnveis da vida, pelo simples fato de que o sangue vertido envenena a terra. E acalamidade manifesta-se na esterilidade dos campos, dos animais e doshomens. No prlogo de dipo-Rei, o sacerdote lamenta-se por causa dasdesgraas que caram sobre Tebas: A cidade morre nas sementes frutgeras daterra, nos rebanhos de bois, nas crianas nos ventres das mes. Um rei sbio,um reino fundado na justia garantem, pelo contrrio, a fertilidade da terra, dosanimais e das mulheres. (ELIADE:1998, p. 207)

    O perodo glacial vai chegando ao fim e o homem comea a ganhar novas proporesde vida sobre a terra. Ele domina a caa com seus novos instrumentos de pedra polida(Perodo Neoltico). Domestica os animais e passa a fazer uso da agricultura. Todas estascoisas favorecem o fim do nomadismo e a fundao das primeiras vilas agrcolas. A populaoaumenta e a diviso social do trabalho o meio encontrado para cuidar das diversidades dereas produtivas na comunidade. Nasce o grupo do caador-guerreiro. Vivem pelas habilidadesfsicas e pelo manuseio de suas armas. Protegem a vila e se destacam dentro do grupo. Outrogrupo o agricultor-pastor. Seu fsico mais frgil o leva para o plantio ou mesmo para cuidardos animais domesticados. Outras tarefas acabam sendo passadas para esse numerosogrupo. Os mais fracos fisicamente, mas com profundas habilidades mentais ou da fala, setornamos sacerdotes-inventores. Cuidam das doenas com suas ervas e razes, e suas leiturasdos tempos e da alma humana lhe do profundos poderes na sociedade. Por centenas deanos, at na revoluo francesa, persistiam os trs grupos (trs estados): O clero; osnobres e os que trabalhavam.

    So mais alguns poucos milhares de anos e surgem as primeiras grandes civilizaesegpcias e mesopotmicas.5 Assim, quando o homem comea a se organizar em sociedade, odireito desponta com mais clareza, mas ainda envolto na religio, na ordem universal. Pormuito tempo as sociedades permaneceram com esses fios que ligam a vrias instituies dasociedade. O mestre hispnico do direito, Pedro Torre explora o gnesis do direito em umasociedade montada com a conscincia do homem de seus deveres diante do mundo que ocerca, da ordem que o envolve e da f que lhe d o substrato da vida. O Clssico texto abaixodestaca como substrato da vida um contedo tico, conscincia psquica, solidariedade ecarinho.

    La idea del Derecho es un producto social; nace de la vida em saciedad, pero nonace sino cuando los sentimientos del hombre llegan a tener un gran contenidotico, como consecuencia del perfeccionamiento de los sentimientos psquicosdel hombre. Cuando la vida en sociedad puso al hombre en contacto con sussemejantes, fue perdiendo el miedo por stos; les fue tomando cario, sesolidariz com sus semejantes en el dolor, en el placer, y fue naciendo en el

    5 Por volta dos ano 10.000 antes de Cristo o perodo grafo chamado Neoltico comea a se estabelecer. Em cinco mil anos aparecem os primeiros sinais de escrita, inicialmente fechadas a um crculo poltico religioso,mas suficiente para aumentar bastante as informaes sobre o perodo.

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    hombre un nuevo grupo de sentimiento; fue perfeccionando su alma y slodespus de haber llegado a adquirir cierto desarrollo psquico fue apareciendoen el hombre la idea de las leyes, como una idea abstracta que es la perfeccinen la convivencia humana, y no puede radicar sino sobre sentimientos psquicosperfectos. (TORRE, 1949, p. 1)

    Pode-se tentar resumir o direito no perodo grafo com algumas caractersticas bsicas:a)Raras regras abstratas: valor aos casos concretos; b)O costume da regio e de um grupo como a principal fonte do Direito, criando o pluralismojurdico onde cada comunidade tinha seu prprio costume; c)Grande juno entre Direito e religio: Grande temor em relao aos poderes sobrenaturais(chuvas, raios, troves etc.); d)Inexistncia de distino entre Direito, religio e moral, e de padres sobre o termo justia:e)Penas muito rgidas. (perda da vida, afastamento do grupo social ou desprezo pelocriminoso).d)Tolerncia poligamia, mas sendo comum apenas Poliginia e no a Poliandria6.

    Um dos grandes escritores e historiadores da cidade, Fustel de Coulanges, em sua obraclssica A Cidade Antiga, deixa claro que mesmo depois das cavernas, onde o homem jdesenvolve civilizaes complexas e cidades estados, a religio continua a mandar e serfios do tecido social. Comenta ele:

    Assim, em tempo de paz como em tempo de Guerra, a religio intervinha emtodos os atos. Achava-se presente em toda parte, como que envolvendo ohomem. A alama, o corpo, a vida privada. A vida pblica, os banquetes, asfestas, as assembleias, os tribunais, os combates, toda esfera sob o imprio dareligio da cidade. A religio regalava todas as aes do homem dispunha todosos instantes de sua vida, fixava todos os seus hbitos. A religio governava acriatura humana com autoridade to absoluta, que nada lhe escapava.(COULANGES: 2006, p. 258)

    Para os espritos mais avessos a religio, e que detestariam ter que estuda-la em umcurso jurdico, Fustel vai mais longe ao deixar claro que todo sistema legislativo (normasjurdicas sendo erguidas em uma sociedade j avanada) dependiam da religio e doespaa sagrado. Diz ele:

    Em Roma, antes de se abrir a sesso, era necessrio que os aguresassegurassem que os deuses eram propcios. A assembleia comeava por umaorao, que o agure pronunciava e o cnsul depois repetia. O mesmoacontecia com os atenienses: a assembleia sempre se iniciava por um atoreligioso. Os sacerdotes ofereciam sacrifcios; traava-se depois um grandecrculo, espargindo a terra com gua lustral, e era dentro desse crculo sagradoque os cidados se reunio. Antes que algum orador tomasse a palavra,pronunciava-se uma prece diante do povo em silncio. Consultavam-se tambmos auspcios, e, se aparecesse no cu um sinal pouco propcio, a assembleia eradissolvida imediatamente. A tribuna era lugar sagrado; o orador s podia subir amesma com uma coroa, e durante todo o tempo quis o costume que comeasseo discurso invocando os deuses. O lugar de reunio do senado de Roma erasempre um templo. Se se realizasse alguma sesso fora do lugar sagrado, asdecises tomadas seriam consideradas nulas, pois os deuses haviam estadoausentes. (...) Em Roma, como em Atenas, s se administrava justia na cidade

    6 Poliandria a poligamia aplicada ao casamento de uma mulher com dois ou mais homens.

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    em dias determinados pela religio como favorveis. Em Atenas, a sesso dotribunal era realizada junto a um altar, e se iniciava com um sacrifcio. Nostempos de Homero, os juzes se reunio em recinto sagrado. (COULANGES:2006, p. 253, 254)

    A comunidade dos homens grafos continua na sua marcha de descobertas e de organizao.Sociologicamente falando, a base desta sociedade no ainda, como ser em dias futuros oESTADO. Pelo contrrio, este ainda vai demorar a surgir, e o far em condies especiais. Abase que neste perodo vai dar a devida consistncia outra. Diz-nos EHRLICH (1986: p. 27):

    Entre os diveros tipos de agrupamentos humanos, porm, um tipo deorganizao deve receber destaque especial e ser encarado como a associaooriginria (gentica). J na pr-histria (sic) a encontramos sob diversas formas,como parentela (estirpe, gens, cl), famlia, comunidade domstica. Parentela efamlia so suas formas originais. No possvel determinar qual das duas deveser vista como a forma mais primitiva, isto , se a parentela no nada mais queuma famlia crescida e ampliada, ou se a famlia se formou muito mais tarde nointerior da parantela.

    A maneira mais clara de se perceber a base social da famlia (parentela) verificar arelao do direito familiar com as sociedades mais desenvolvidas. Claro que elas tiveram seuincio, a gneses embrionria, que ao se analisar no se foge da realidade social descrita pelosocilogo jurdico Ehrlich.

    Escrevendo a obra Cidade Antiga, Coulanges no deixa de lado esse fato fundamentalda ordem social da cidade: a parentela. Busca em diversas razes a argamassa quesustentaria a famlia. Nega que seja a gerao, afeto ou poder. Para cada um destes pretensosargumentos mostra na Roma antiga e nas cidades gregas as incongruncias dos argumento.Por fim mostra o sentimento da religio e a base para o direito futuro. Diz-nos ele:

    O que une os membros da famlia antiga algo mais poderoso que onascimento, que o sentimento, que a fora fsica; a religio do fogo sagrado edos antepassados. Essa religio faz com que a famlia forme um s corpo nestee no outro mundo. A famlia antiga mais uma associao religiosa que umaassociao material (...) A antiga lngua grega tinha uma palavra muitosignificativa para descrever a famlia; dizia-se epstion, palavra que significaliteralmente aquilo que esta perto do fogo. (COULANGES: 2006, p. 260)

    2)O DIREITO NO ORIENTE PRXIMO

    A histria destaca o Oriente Prximo como uma das regies mais antigas do processocivilizatrio. Diferentemente do extremo oriente, ele exerceu profundas influncia na culturaocidental. A regio demarcada pelo nordeste da frica e o lado mais ocidental da sia, quefoi denominada de Mesopotmia. Seus 3 ncleos civilizatrios foram: o Egito, a Mesopotmiae a Palestina (Israel).

    Conforme a descrio de Karl Marx, essa regio avanou para um novo Modo deProduo7, deixando de lado o modo das hordas do perodo grafo: produo comunal. Essamudana foi gradual e ficou conhecida como Idade do Bronze por volta do ano 6000 A.C. Ascaractersticas do perodo so: a)o surgimento de grandes centro urbanos, vivendo de um

    7 Marx dividiu a histria da produo de riqueza humana em perodos distintos. O modo de produo a maneira como a sociedade se organizou em todas as suas reas (poltica, cultura, economia, sociedade etc) para sobreviver em um determinado espao e perodo.

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    intenso processo de agricultura. A base agrcola so os leitos de grandes rios e suasenchentes. Cortam a regio os rios Nilo, Jordo, Tigre e Eufrates; b)A utilizao do bronze e desociedades mais organizadas, onde uma elite domina a terra em nome do estadocomunitrio; c)Surgimentos de grupos liderados pela religio (teocentrismo) com profundasmarcas na cultura e no direito.

    Obviamente nem todas as reas tero desenvolvimento igual. A questo geogrfica serfator determinante nos detalhes e peculiaridades que cada regio e perodo. De maneira maisgenrica os livros costumam denominar a rea de crescente frtil, pois estes rios formam afiguram de uma lua crescente no mapa da regio. Apesar de pontos em comum as diferenassero reproduzidas nos tpicos de cada civilizao que vale ser analisada.

    2.1)O Egito

    O Egito cortado pelo Rio Nilo, levando inundaes e riquezas a um imenso vale commais de 5 mil quilmetros. Foi ocupado no incio do Neoltico e fortemente explorado para aagricultura. Os egpcios formaram uma srie de vilas agrcolas nas margens do rio e nodesembarcadouro em forma de Delta. Essas vilas foram chamadas de Nomos e lideradas poruma elite denominada de Nomarcas. Por causa do grande aumento populacional, as reasagricultveis tiveram que aumentar. As grandes obras de irrigao necessitavam de grandescontingentes humanos. A soluo foi a unio dos Nomos, que acabaram se unindo em duasgrandes comunidades civilizatrias e distintas: O Reino do Baixo8 Egito e o Reino do Alto Egito.Com o passar dos tempos o Alto Egito tende a se tornar hegemnico, acabando por conquistaro Baixo Egito, unificando-os em um lento processo. A dominao final aconteceu por volta doano 3.000 anos antes de Cristo, quando o Fara Narmer (Menes em Grego), do Alto Egito,conquista e unifica os dois reinos. (CARDOSO: 2008)

    Diferente da Mesopotmia a unificao produziu uma certa lentido no processo deavano da sociedade egpcia. Suas cidades no se comparam as Mesopotmicas e ocomrcio, apesar de existente e de profunda atividade pela regio, era mais conduzido peloestado centralizado do que por um grupo autnomo de comerciantes. Isto influenciou para queno Egitono desenvolvesse uma classe mdia livre do estado, mas sim uma classe mdia defuncionrios mais graduados de um estado centralizado.

    Politicamente o Egito viveu trs fases. A primeira fase o perodo de ouro. Destaca-seum governo profundamente centralizao e domnio faranico total (chamava-se AntigoImprio). Foi a poca das grandes obras e pirmides e das dinastias mais ricas. A segundafase o Mdio Imprio. Uma grande e longa revolta dos Nomos contra o poder central marcouo perodo. Facilitou a invaso de povos asiticos, como os Hicsos. Na historiografia chama-seo perodo feudal egpcio. A terceira fase denominada de Novo Imprio. Foi a reao deFara centralizado seu poder em Tebas. A implantao do militarismo acrescentou novasrealidades ao Egito e uma poderosa classe at ento inexistente: os militares.

    No temos no estudo do direito egpcio, a mesma riqueza de fontes dos direitos dascidades da Mesopotmia. Nenhum texto legal do perodo antigo do Egito chegou at o sculoXX, s enxertos de contratos, testamentos, decises judiciais e atos administrativos, e de umaabundncia de referncias indiretas s normas jurdicas em textos sagrados e narrativasliterrias que permitem inferncias no campo do direito.

    Os Egpcios acreditavam numa lei reguladora e organizadora dos sistemas decoisas, como na religiosidade antiga havia uma noo de eterna ordem das coisas e doUniverso. A prpria cosmogonia dos egpcios falava de Nun (ordem) e Caos (desordem).

    8Alto e Baixo Egito no se relacionam a posio no mapa, mas pela altitude. O Alto Egito tinha suas possesses nas regies mais altas, nas nascentes do rio Nilo, enquanto o Baixo Egito se estendia ao nvel prximo do mar, onde o Nilo corre para desaguar no Mediterrneo.

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    Depois da existncia destes e que se d o surgimento das divindades: Roy Willis (2007: 38)diz:

    Uma imagem alternativa da criao foi o ltus primevo, que se levantou dasguas e se abriu para revelar um deus criana. A primeira divindade eraequipada com vrios poderes divinos, tais como Hu ("dom da palavraautorizada"), Sia ("percepo") e Heka ("magia").Usando esses poderes, elacriou ordem a partir do caos. Essa ordem divina era personificada por umadeusa, Maat, filha do deus-sol. A palavra Maat tambm significava justia,verdade e harmonia. A ordem divina estava constantemente sob risco de voltar ase dissolver no caos do qual se formara.

    Monarcas, militares, funcionrios, sacerdotes e escribas acreditavam que os deuseshaviam reinado pessoalmente neste mundo, sendo o rei-deus o seu legtimo herdeiro esucessor: a ordem csmica e poltico-social, encarnada na deusa Maat (justia-verdade ounorma justa do mundo), tinha pois uma base sagrada, tal como o respeito pelas opinies dosantepassados. A deusa Maat, vista vrias vezes sendo consultada por Fara naaplicao da Justia. Por sinal, em quase todo perodo do Imprio Egpcio, Fara exercia ajustia com total soberania e sem maiores impedimentos.

    Em perodos de crescimento do Imprio e suas expanses militaristas (Novo Imprio),Fara podia dividir muitas funes legais a outra, que ficavam em um mesmo patamar de suaautoridade. (CARDOSO, 2008) Ele cada vez mais delegava poderes para um grupo de grandesfuncionrios. Para escolh-los, supervisionar a sua ao e servir de rbitro ao ocorreremconflitos, Fara tinha O tjati, Que se parecia a um primeiro-ministro. Mas o cargo se duplicou,havendo um tjati do sul que residia em Tebas e outro do norte com sede em Helipolis; oprimeiro tinha maior importncia. Ambos tinham supremas atribuies judicirias efinanceiras, velando sobre as obras pblicas, a agricultura, o exrcito, a administrao e osarquivos. Quanto administrao provincial, tornou-se centralizada: os governadores dosnomos (Nomarcas) cessaram de ter papel poltico importante e dependiam diretamente dopoder central. Os tjati enviavam aos nomos mensageiros que serviam de elemento de ligaoentre o governo central e as provncias, trs vezes ao ano em cada uma das trs estaes.A Nbia era administrada por um vice-rei, com sede na cidade de Napata. Como no passado,havia uma multido de funcionrios subalternos em todos os nveis da burocracia estatal:tesoureiros, escribas, coletores de impostos, policiais etc. Alm dos tributos pagos pela Nbia epelas terras asiticas conquistadas, a terra do Egito continuava a ser taxada, bem comopermanecia vigente o sistema de corvias.

    O pensamento egpcio estava interessado na preservao do estado de coisas: era,assim, conservador e conformista em sua forma predominante (quando no abertamenteoportunista, ao legitimar a nsia de agradar aos poderosos).Os documentos jurdicos (atosjurdicos e decises judiciais) eram compilados nos papiros. As obrigaes eram assumidasmediante juramento em nome do fara, como garantia da sua observncia. A aplicao da Leiera feito por juzes locais, que julgavam em nome do fara, orientados por um funcionrioda corte, que dirigia o julgamento. A tortura um meio de prova usualmente empregado nos para os acusados, pasmem, com tambm, para as testemunhas. As penas eramcruis, duras e perversas.

    No perodo do Reino Mdio acontece no Egito a Revolta dos Nomos, onde a figura deFara perdeu fora. Neste perodo de profunda comoo social e dvidas sobre o futuro,surgiram literaturas crticas e de profundos alertas para com a vida. At mesmo os rituais (amumificao um exemplo) que antes pertenciam as elites religiosas, passam a serdemocratizadas para servir queles que podiam pagar e no futuro ao grosso da populao.Dentro desta literatura se destaca: a)Advertncias de Ipuwer, onde um velho sbio se desfaz

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    em injrias contra as mentiras e as violncia do rei e de seu reinado. (COULIANO; ELIADE:1999, p. 142) b)Os Conselhos para Merikere, que era uma exaltao aos valores antigos damoralidade egpcia, da justia para com todos e a generosidade especialmente aos pobres.Essas e outras obras exaltavam a volta aos tempos de ordem, da lei antiga e da justia.(COULIANO; ELIADE: 1999)

    A contribuio maior do direito egpcio refere-se ao direito internacional, quandoelaborou um tratado de aliana e paz celebrado por Ramss II com o rei hitita HattusibisIII (1297-1231). Aqui j se vivenciava o novo imprio com o surgimento de Guerras localizadase uma intensa atividade comercial.

    Outra caracterstica interessante dos egpcios era a forma como se escolhia Fara. Ocarter divino dos reis transmitia-se pelas mulheres: era preciso que o herdeiro fosse filho nos do rei, mas tambm de uma princesa de sangue real. Por isso ocorriam freqentescasamentos de faras com suas irms e meias-irms, e ocasionalmente com suas prpriasfilhas. comum da literatura de antropologia fsica a observao de problemas nas dinastiaegpcias, tpicas de uma vivncia Endogmica.9 Quando o novo rei era filho de uma esposasecundria, ou de fato um estranho linhagem real, devia casar-se com uma princesa desangue. Isto d um significado especial aos textos bblicos abaixo:

    23 Pela f Moiss, logo ao nascer, foi escondido por seus pais durante trsmeses, porque viram que o menino era formoso; e no temeram o decreto dorei. 24 Pela f Moiss, sendo j homem, recusou ser chamado filho da filha deFara, 25 escolhendo antes ser maltratado com o povo de Deus do que ter poralgum tempo o gozo do pecado, 26 tendo por maiores riquezas o oprbrio deCristo do que os tesouros do Egito; porque tinha em vista a recompensa. 27 Pelaf deixou o Egito, no temendo a ira do rei; porque ficou firme, como quem vaquele que invisvel. (Hebreus 11: 23 a 27)

    Qual teria sido o grande ato de f de Moiss? Recusou ser chamado filho da filha deFara. Provvel herdeiro de todo Egito e sua riqueza material. Moiss preferiu uma visoidealista de f e servio para com seu povo cativo.

    2.2)Mesopotmia

    Na Mesopotmia ocorreu uma transio mais rpida e eficaz do modelo desociedade e direito. Um modelo mais dinmico substituiu o modelo mais arcaico. Trs fatoreshistricos importantes contriburam para a mudana e diferenciam a Mesopotmia do Egito: (l)o surgimento das cidades, sendo que muitas delas autnomas (cidade estado); (2) ainveno e domnio da escrita e de uma slida base cultural (Os Sumrios formaram essabase); (3) o advento do comrcio e, numa etapa posterior, da moeda metlica e deprofissionais livres (classe mdia).

    A mesopotmia teve sua ocupao mais favorvel e antiga na parte mais baixa10. Entreos anos da idade de Bronze de 3100 a 2330 A.C. a Sumria contava com pelo menos 14centro urbanos tripartites, ou seja, a cidade murada, a periferia e o local dos estrangeiros. Soas cidades chamadas de despticas: Eridu, Badtibira, Sippar, Larak, Shuruppak, Kish, Akshak,Nippur, Adab, Umma, Lagash, Uruk, Larsa e Ur. (LEVEQUE, 2001) Para preservao da

    9 Bastante comum na Europa Medieval e Moderna, o casamento Endogmico assegurava um suporte legal e estratgico para os reinos europeus, mas a consequncia conhecida: reis loucos e alta mortandade entre os soberanos da Europa.

    10 Chamada de Baixa Mesopotmia - regio normalmente designada como Sumria, nas margens do Rio Eufrates, mais prxima ao Golfo Prsico.

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    memria e identidade dos primeiros povos urbanos, que j possuem uma estrutura religiosa,poltica e econmica mais diferenciada, a simples transmisso oral da cultura comea a setomar insuficiente. A Escrita Cuneiforme aparece com uma alto grau de elaborao e possibilitauma sociedade em confrontos internos (sociais) e em confrontos externos (cidades e povosque se estabelecem), de deixar gravada sua cultura e automaticamente suas leis que anteseram orais.

    As sociedade que se formam em todo Mesopotmia so relativamente autnomas, ese acercando delas, um perigoso grupo de povos menos organizados socialmente quemigravam do deserto para a regio. As cidades no se unem com facilidade, e quando ofazem de maneira temporria ou fragilizada pelos poderes em jogo. (LEVEQUE, 2001) Assim,os primeiros reinos da regio, com governos dspotas e reis absolutos sero os fracosAcdios. Surgem depois os reinos do 1 Imprio Babilnio (na regio central da Mesopotmia)com um pouco mais de vigor e domnio. Na regio norte da Mesopotmia aparecem ospoderosos e militaristas Assrios. Diferentemente dos Egpcios que tiveram uma s monarquia,na mesopotmia os governos e povos que invadiam e predominavam na regio eram mudadoscom muita frequncias. Muitas das cidade Sumrias mantinham certa autonomia diantedos conquistadores. Alm disso, cada povo tinha sua prpria cultura e deus, apesar de umaforte dependncia dos primeiros habitantes Os Sumrios.

    Ainda de forma recente, as primeiras cidades estado da mesopotmia vinhamproduzindo pequenos conjuntos de leis para serem utilizados em seus domnios. Sumriosdivulgavam os chamados formulrios Judiciais, pois pretendiam trazer justia terra. Osque buscavam a justia nos reis das cidades deveriam apresentar suas queixas, testemunhase outros reclames nas portas da cidade ou mais comumente no templo. Ali os sacerdotes juzespodiam realizar a tarefa. Somente mais tarde essas queixas de um processo judicial passarampor uma laicizao e mudou para o palcio do governador. Aloiso Gavazzoni (2003, p.35):

    L pela metade do 3 milnio (a.C.) os chefes das cidades-estado j tinhampromulgado uma srie de regulamentaes legais. Depois, com o incrvelcrescimento das complexidades existentes nas relaes entre grandescomerciantes e grandes proprietrios de terra e ainda com as crescentestentaes ameaando a moral pessoal e da famlia, surgiu a necessidade de seimpor uma certa ordem legal. Os reis nacionais devem ter querido estabelecerum padro de justia para todos os seus assuntos. O conjunto dessas coleesde leis e julgamentos mais ou menos ordenados chamado de cdigo. O maisantigo desses, chegado at ns, o de Ur-Nammu, fundador da 3 dinastia deUR. seguido por um cdigo da cidade de Eshaunna, sem nome realconectado, e um pouco mais tarde pelo de Zipit-Ishto de Isin (1913 1924a.C.).

    Com isso nos livramos da Ideia de que O grande Cdigo de Hamurabi foi o primeirocdigo escrito da Mesopotmia e original na sua apario11. Na verdade ele foi uma grandecompilao desses cdigos Sumrios aplicados s necessidades de Babel e seu Reino. OCdigo de Hamurabi foi colocado em uma pedra e deixado exposto para ser visto por todos nacidade. No alto de Pedra.

    O Cdigo foi produzido pelo Rei Hamurabi por volta do ano 1694 a.C., no apogeu do seugoverno no Reino Central da Mesopotmia. Sua capital era a j conhecida cidade de Babel.

    11 As primeiras compilaes de Cdigos na Mesopotmia se do principalmente em carter penal, mas na medida que se aproxima a feitura do Cdigo de Hamurbi a legislao tende a evocar tanto o penal como o civil. O documento de Esnunna j contempla institutos conexos responsabilidade civil, ao direito de famlia e responsabilizao de donos de animais por leses corporais seguidas de morte.

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    Fica clara a influncia dos Sumrios, que naquele perodo haviam renascido culturalmente naregio de Babel. O documento legal, gravado em pedra negra, deixava claro a diviso social.O tratamento dispensado aos homens era de acordo com sua posio social, ...assim, hum estrato de homens livres, uma camada de homens dotados de personalidade jurdica, mascom liberdade limitada (pode-se cham-los subalternos) e uma parcela de escravos(equiparados a um bem mvel). (PINTO. In WOLKMER: 2006, p.25) Possui 282 Artigos, em3600 linhas, tratando do direito econmico, penal, privado etc. Seu contedo, incompleto porser imenso, est logo abaixo e deve ser leitura obrigatria. Fica conhecido por um de seusArtigos, que mostra o seu teor para restituio, onde diz: olho por olho, dente por dente.

    O Cdigo regula o casamento e os dotes, bem como a posio da mulher na sociedade. monogmico e permite a Adoo. Invade o direito privado ao tentar regular alguns preos esalrios. O direito penal entra com a pena capital, retaliao e at na mutilao. Fazia-secontratos de compra e venda (inclusive a crdito), arrendamento (com nfase naregulamentao das terras cultivveis) e depsito. (PINTO. In WOLKMER: 2006, p.28)Imprimisse uma grande preocupao com as responsabilidades civis e a nomeao de juzesde recursos.

    O Cdigo de Hamurabi ainda o documento mais elucidativo da antiga mesopotmia.Foi descoberto pelos franceses, quando vasculhavam antiguidades na Prsia no ano de 1901,e apesar de ser patrimnio cultural de pases da regio, se encontra no museu do Louvre, emParis.

    TEXTO 1: O CDIGO DE HAMURABI (PARTES)

    IV - LOCAES E REGIMEN GERAL DOS FUNDOS RSTICOS, MTUO, LOCAO DECASAS, DAO EM PAGAMENTO42 - Se algum tomou um campo para cultivar e no campo no fez crescer trigo, ele deverser convencido que fez trabalhos no campo e dever fornecer ao proprietrio do campoquanto trigo exista no do vizinho.43 - Se ele no cultiva o campo e o deixa em abandono, dever dar ao proprietrio docampo quanto trigo haja no campo vizinho e dever cavar e destorroar o campo, que eledeixou ficar inculto e restitu-lo ao proprietrio.44 - Se algum se obriga a por em cultura, dentro de trs anos, um campo que jaz inculto,mas preguioso e no cultiva o campo, dever no quarto ano cavar, destorroar e cultivar ocampo inculto e restitu-lo ao proprietrio e por cada dez gan pagar dez gur de trigo.45 - Se algum d seu campo a cultivar mediante uma renda e recebe a renda do seucampo, mas sobrevem uma tempestade e destri a safra, o dano recai sobre o cultivador.46 - Se ele no recebe a renda do seu campo, mas o d pela tera ou quarta parte, o trigoque est no campo dever ser dividido segundo as partes entre o cultivador e o proprietrio.47 - Se o cultivador, porque no primeiro ano no plantou a sua estncia, deu a cultivar ocampo, o proprietrio no dever culp-lo; o seu campo foi cultivado e, pela colheita, elereceber o trigo segundo o seu contrato.48 - Se algum tem um dbito a juros, e uma tempestade devasta o seu campo ou destri acolheita, ou por falta d'gua no cresce o trigo no campo, ele no dever nesse ano dar trigoao credor, dever modificar sua tbua de contrato e no pagar juros por esse ano.49 - Se algum toma dinheiro a um negociante e lhe concede um terreno cultivvel de trigoou de ssamo, incumbindo-o de cultivar o campo, colher o trigo ou o ssamo que acrescerem e tom-los para si, se em seguida o cultivador semeia no campo trigo ou ssamo,por ocasio da colheita o proprietrio do campo dever receber o trigo ou o ssamo queesto no campo e dar ao negociante trigo pelo dinheiro que do negociante recebeu, pelosjuros e moradia do cultivador.50 - Se ele d um campo cultivvel (de trigo) ou um campo cultivvel de ssamo, oproprietrio do campo dever receber o trigo ou o ssamo que esto no campo e restituir aonegociante o dinheiro com os juros.

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    51 - Se no tem dinheiro para entregar, dever dar ao negociante trigo ou ssamo pelaimportncia do dinheiro, que recebeu do negociante e os juros conforme a taxa real.52 - Se o cultivador no semeou no campo trigo ou ssamo, o seu contrato no ficainvalidado.53 - Se algum preguioso no ter em boa ordem o prprio dique e no o tem emconsequncia se produz uma fenda no mesmo dique e os campos da aldeia so inundadosd'gua, aquele, em cujo dique se produziu a fenda, dever ressarcir o trigo que ele fezperder.54 - Se ele no pode ressarcir o trigo, dever ser vendido por dinheiro juntamente com osseus bens e os agricultores de quem o trigo foi destrudo, dividiro entre si.55 - Se algum abre o seu reservatrio d'gua para irrigar, mas negligente e a guainunda o campo de seu vizinho, ele dever restituir o trigo conforme o produzido pelovizinho.56 - Se algum deixa passar a gua e a gua inunda as culturas do vizinho, ele deverpagar-lhe por cada dez gan dez gur de trigo.57 - Se um pastor no pede licena ao proprietrio do campo para fazer pastar a erva sovelhas e sem o consentimento dele faz pastarem as ovelhas no campo, o proprietriodever ceifar os seus campos e o pastor que sem licena do proprietrio fez pastarem asovelhas no campo, dever pagar por junto ao proprietrio vinte gur de trigo por cada dezgan.58 - Se depois que as ovelhas tiverem deixado o campo da aldeia e ocupado o recinto geral porta da cidade, um pastor deixa ainda as ovelhas no campo e as faz pastarem no campo,este pastor dever conservar o campo em que faz pastar e por ocasio da colheita deverresponder ao proprietrio do campo, por cada dez gan sessenta gur.59 - Se algum, sem cincia do proprietrio do horto, corta lenha no horto alheio, deverpagar uma meia mina.60 - Se algum entrega a um hortelo um campo para plant-lo em horto e este o planta eo cultiva por quatro anos, no quinto, proprietrio e hortelo devero dividir entre si e oproprietrio do horto tomar a sua parte.61 - Se o hortelo no leva a termo a plantao do campo e deixa uma parte inculta, dever-se- consignar esta no seu quinho.62 - Se ele no reduz a horto o campo que lhe foi confiado, se campo de espigas, ohortelo dever pagar ao proprietrio o produto do campo pelos anos em que ele fica incultona medida da herdade do vizinho, plantar o campo cultivvel e restitu-lo ao proprietrio.63 - Se ele transforma uma terra inculta num campo cultivado e o restitui ao proprietrio, eledever pagar em cada ano dez gur de trigo por cada dez gan.64 - Se algum d o horto a lavrar a um hortelo pelo tempo que tem em aluguel o horto,dever dar ao proprietrio duas partes do produto do horto e conservar para si a tera parte.65 - Se o hortelo no lavra o horto e o produto diminui, o hortelo dever calcular oproduto pela parte do fundo vizinho.LACUNAS DE CINCO COLUNAS; CALCULAM EM 35 PARGRAFOSV - RELAES ENTRE COMERCIANTES E COMISSIONRIOS100 - Com os juros do dinheiro na medida da soma recebida, dever entregar umaobrigao por escrito e pagar o negociante no dia do vencimento.101 - Se no lugar onde foi no fechou negcio o comissionrio, dever deixar intato odinheiro que recebeu e restitu-lo ao negociante.102 - Se um negociante emprestou dinheiro a um comissionrio para suas empresas e ele,no lugar para onde se conduz, sofre um dano, dever indenizar o capital ao negociante.103 - Se, durante a viagem, o inimigo lhe leva alguma coisa do que ele conduz consigo, ocomissionrio dever jurar em nome de Deus e ir livre.104 - Se um negociante confia a um comissionrio, para venda, trigo, l, azeite, ou outrasmercadorias, o comissionrio dever fazer uma escritura da importncia e reembolsar onegociante. Ele dever ento receber a quitao do dinheiro que d ao mercador.105 - Se o comissionrio negligente e no retira a quitao da soma que ele deu aonegociante, no poder receber a soma que no quitada.

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    106 - Se o comissionrio toma dinheiro ao negociante e tem questo com o seu negociante,este dever perante Deus e os ancios convencer o comissionrio do dinheiro levado e estedever dar trs vezes o dinheiro que recebeu.107 - Se o negociante engana o comissionrio pois que este restituiu tudo que o negociantelhe dera, mas, o negociante contesta o que o comissionrio lhe restituiu, o comissionriodiante de Deus e dos ancios dever convencer o negociante e este, por ter negado aocomissionrio o que recebeu, dever dar seis vezes tanto.VI - REGULAMENTO DAS TABERNAS (TABERNEIROS PREPOSTOS, POLCIA, PENASE TARIFAS)108 - Se uma taberneira no aceita trigo por preo das bebidas a peso, mas toma dinheiroe o preo da bebida menor do que o do trigo, dever ser convencida disto e lanadangua.109 - Se na casa de uma taberneira se renem conjurados e esses conjurados no sodetidos e levados Corte, a taberneira dever ser morta.110 - Se uma irm de Deus, que no habita com as crianas (mulher consagrada que nose pode casar) abre uma taberna ou entra em uma taberna para beber, esta mulher deverser queimada.111 - Se uma taberneira fornece sessenta j de bebida usakami dever receber ao tempoda colheita cinquenta ka de trigo.VII - OBRIGAES (CONTRATOS DE TRANSPORTE, MTUO)PROCESSO EXECUTIVO E SERVIDO POR DVIDAS112 - Se algum est em viagem e confia a um outro prata, ouro, pedras preciosas ououtros bens mveis e os faz transportar por ele e este no conduz ao lugar do destino tudoque deve transportar, mas se apropria deles, dever-se- convencer esse homem que eleno entregou o que devia transportar e ele dever dar ao proprietrio da expedio cincovezes o que recebeu.113 - Se algum tem para com um outro um crdito de gros ou dinheiro e, sem cincia doproprietrio, tira gros do armazm ou do celeiro, ele dever ser convencido em juzo de tertirado sem cincia do proprietrio gros do armazm ou do celeiro e dever restituir osgros que tiver tirado e tudo que ele de qualquer modo deu, perdido para ele.114 - Se algum no tem que exigir gros e dinheiro de um outro e fez a execuo, deverpagar-lhe um tero de mina por cada execuo.115 - Se algum tem para com outro um crdito de gros ou dinheiro e faz a execuo, e odetido na casa de deteno morre de morte natural, no h lugar a pena.116 - Se o detido na casa de deteno morre de pancadas ou maus tratamentos, o protetordo prisioneiro dever convencer o seu negociante perante o tribunal; se ele era um nascidolivre, se dever matar o filho do negociante, se era um escravo, dever pagar o negocianteum tero de mina e perder tudo que deu.117 - Se algum tem um dbito vencido e vende por dinheiro a mulher, o filho e a filha, oulhe concedem descontar com trabalho o dbito, aqueles devero trabalhar trs anos na casado comprador ou do senhor, no quarto ano este dever libert-los.118 - Se ele concede um escravo ou escrava para trabalhar pelo dbito e o negociante osconcede por sua vez, os vende por dinheiro, no h lugar para oposio.119 - Se algum tem um dbito vencido, e vende por dinheiro a sua escrava que lhe temdado filhos, o senhor da escrava dever restituir o dinheiro que o negociante pagou eresgatar a sua escrava.VIII - CONTRATOS DE DEPSITO120 - Se algum deposita o seu trigo na casa de outro e no monte de trigo se produz umdano ou o proprietrio da casa abre o celeiro e subtrai o trigo ou nega, enfim, que na suacasa tenha sido depositado o trigo, o dono do trigo dever perante Deus reclamar o seu trigoe o proprietrio da casa dever restituir o trigo que tomou, sem diminuio, ao seu dono.121 - Se algum deposita o trigo na casa de outro, dever dar-lhe, como aluguel doarmazm, cinco ka de trigo por cada gur de trigo ao ano.122 - Se algum d em depsito a outro prata, ouro ou outros objetos, dever mostrar auma testemunha tudo o que d, fechar o seu contrato e em seguida consignar em depsito.

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    123 - Se algum d em depsito sem testemunhas ou contrato e no lugar em que se fez aconsignao se nega, no h ao.124 - Se algum entrega a outro em depsito prata, ouro ou outros objetos perantetestemunhas e aquele o nega, ele dever ser convencido em juzo e restituir sem diminuiotudo o que negou.125 - Se algum d em depsito os seus bens e a por infrao ou roubo os seus bens seperdem com os do proprietrio da casa, o dono desta, que suporta o peso da negligncia,dever indenizar tudo que lhe foi consignado em depsito e que ele deixou perder. Mas, odono da casa poder procurar os seus bens perdidos e retom-los do ladro.126 - Se algum, que no perdeu seus bens, diz t-los perdido e sustenta falsamente seudano, se ele intenta ao pelos seus bens, ainda que no tenham sido perdidos e pelo danosofrido perante Deus, dever ser indenizado de tudo que pretende pelo seu dano.XIII - MDICOS E VETERINRIOS; ARQUITETOS E BATELEIROS (SALRIOS,HONORRIOS E RESPONSABILIDADE) CHOQUE DE EMBARCAES215 - Se um mdico trata algum de uma grave ferida com a lanceta de bronze e o cura ouse ele abre a algum uma inciso com a lanceta de bronze e o olho salvo, dever receberdez siclos.216 - Se um liberto, ele receber cinco siclos.217 - Se o escravo de algum, o seu proprietrio dever dar ao mdico dois siclos.218 - Se um mdico trata algum de uma grave ferida com a lanceta de bronze e o mata oulhe abre uma inciso com a lanceta de bronze e o olho fica perdido, se lhe devero cortar asmos.219 - Se o mdico trata o escravo de um liberto de uma ferida grave com a lanceta debronze e o mata, dever dar escravo por escravo.220 - Se ele abriu a sua inciso com a lanceta de bronze o olho fica perdido, dever pagarmetade de seu preo.221 - Se um mdico restabelece o osso quebrado de algum ou as partes moles doentes, odoente dever dar ao mdico cinco siclos.222 - Se um liberto, dever dar trs siclos.223 - Se um escravo, o dono dever dar ao mdico dois siclos.224 - Se o mdico dos bois e dos burros trata um boi ou um burro de uma grave ferida e oanimal se restabelece, o proprietrio dever dar ao mdico, em pagamento, um sexto desiclo.225 - Se ele trata um boi ou burro de uma grave ferida e o mata, dever dar um quarto deseu preo ao proprietrio.226 - Se o tosquiador, sem cincia do senhor de um escravo, lhe imprime a marca deescravo inalienvel, dever-se- cortar as mos desse tosquiador.227 - Se algum engana um tosquiador e o faz imprimir a marca de um escravo inalienvel,se dever mat-lo e sepult-lo em sua casa. O tosquiador dever jurar : "eu no o assinaleide propsito", e ir livre.228 - Se um arquiteto constri uma casa para algum e a leva a execuo, dever receberem paga dois siclos, por cada sar de superfcie edificada.229 - Se um arquiteto constri para algum e no o faz solidamente e a casa que eleconstruiu cai e fere de morte o proprietrio, esse arquiteto dever ser morto.230 - Se fere de morte o filho do proprietrio, dever ser morto o filho do arquiteto.231 - Se mata um escravo do proprietrio ele dever dar ao proprietrio da casa escravopor escravo.232 - Se destri bens, dever indenizar tudo que destruiu e porque no executousolidamente a casa por ele construda, assim que essa abatida, ele dever refazer suacusta a casa abatida.233 - Se um arquiteto constri para algum uma casa e no a leva ao fim, se as paredesso viciosas, o arquiteto dever sua custa consolidar as paredes.234 - Se um bateleiro constri para algum um barco de sessenta gur, se lhe dever darem paga dois siclos.

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    235 - Se um bateleiro constri para algum um barco e no o faz solidamente, se nomesmo ano o barco expedido e sofre avaria, o bateleiro dever desfazer o barco e refaz-lo solidamente sua custa; o barco slido ele dever d-lo ao proprietrio.236 - Se algum freta o seu barco a um bateleiro e este e negligente, mete a pique ou fazque se perca o barco, o bateleiro dever ao proprietrio barco por barco.237 - Se algum freta um bateleiro e o barco e o prev de trigo, l, azeite, tmaras equalquer outra coisa que forma a sua carga, se o tabeleiro negligente, mete a pique obarco e faz que se perca o carregamento, dever indenizar o barco que fez ir a pique e tudode que ele causou a perda.238 - Se um bateleiro mete a pique o barco de algum mas o salva, dever pagar a metadedo seu preo.239 - Se algum freta um bateleiro, dever dar-lhe seis gur de trigo por ano.240 - Se um barco a remos investe contra um barco de vela e o pe a pique, o patro dobarco que foi posto a pique dever pedir justia diante de Deus, o patro do barco a remos,que meteu a fundo o barco a vela, dever indenizar o seu barco e tudo quanto se perdeu.

    2.3)Hebreus

    Completando o que ficou conhecido como o Crescente Frtil, temos a civilizao maisimportante da parte central desse crescente: Os hebreus. Chamados s vezes de Judeus ouIsraelitas, pode-se considerar como sinnimos para efeitos deste estudo.12 Habitaram asmontanhas e vales ao redor do Rio Jordo. Outros grupos (Cananeus, Filisteus etc) demenor importncia tambm viveram ali, mas pouco ou nada deixaram de importante. O quedestaca entre os Hebreus o monotesmo tico que desenvolveram e uma legislao muitointeressante baseada na unicidade de sua divindade. Alm dos motivos levantados, foram osjudeus que legaram boa parte da cultura religiosa e jurdica do cristianismo, tornando-osimportantes para a formao e evoluo do direito ocidental, bem como a presena macia deJudeus em todas as grandes naes crists e muulmanas do perodo medieval at nossodias.Os hebreus eram pastores nmades. Semitas, migraram com diversos grupos semitas daregio da Arbia e chegaram Mesopotmia. Parece no terem tido dificuldades de viveremnas fronteiras da Mesopotmia, pois sua atividade no usava das frteis terras de agricultura.Em um dado momento da histria, por volta do ano 1800 A.C., um desses ricos semitas teriasado de Ur da Caldia (onde moravam) buscando novas reas de criao de suas ovelhas.Possivelmente o grande crescimento do rebanho indisps as duas atividades (pastoreio eagricultura), obrigando ento Abro a pensar em uma nova habitao na parte central daPalestina. Aquela era uma rea de boa gua, mas de terra pouco frtil, apesar disto seria maisque suficiente para o pouco exigente rebanho de cabritos. Ali existiam pequenas cidadescanaanitas, sem grande expresso militar ou agrcola, que dificilmente criariam problemas comhomem to rico e de tantos agregados como Abrao vinha se tornando. Assim comea apresena dos judeus na regio de Cana.

    Importante citar a figura do agora Abrao, pois se torna figura de f para o mundomonotesta. Ele afirmava ter recebido um chamado desse Deus nico para ser-lhe um povoespecial:

    Abrao teve papel significativo para as trs maiores religies monotestas, oJudasmo, o Cristianismo e o Islamismo. Esse personagem aparece em todas,tendo um papel de fundamental importncia, que resultaram na base do

    12 O nome Israel derivado da mudana do nome Jac, ficando no decorrer da histria associado com o Reino do Norte, chamado de Samaria ou Israel. O Reino do Sul se denominou Jud ou Judeus, por ter sido esta tribo a formadora do Reino do Sul no Cisma de Roboo e Jeroboo. Na poca de Cristo os nomes eram usados como sinnimos.

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    surgimento das religies citadas. As religies aparecem nessa ordem, devido ahistoricidade de seu surgimento. (COSTA: 2009, p. 70)

    O povo judeu viveu perodos distintos na sua vida poltica, social e religiosa. No seuincio com Abrao at a volta de um longo cativeiro no Egito (+-1290 A.C) o povo vivia de formanmade, cercado por um firme sistema patriarcal. Trouxeram na cultura uma clara influnciados Sumrios, e trataram logo no fim deste perodo patriarcal de compilarem uma legislaoescrita: Os dez Mandamentos. Essa regra moral e comportamental seguida por diversasoutras leis, todas elas de inspirao religiosa, mas tratando de questes sanitrias(principalmente na longa peregrinao de 40 anos no deserto), civis e administrativas.

    Uma das principais caractersticas deste povo , alm do monotesmo tico, umaformao teocracia. A base de tudo provm de uma revelao divina (os livros do Pentateuco eno futuro o Antigo Testamento como um todo), depois de escrita se torna a basecomportamental e jurdica de um povo. Posteriormente ao perodo dos patriarca, de volta apalestina, o povo se organizara por cerca de 300 anos em tribos descentralizadas, regidaspor um juiz religioso que julgava as questes maiores e conduziam o povo como corpo deguerra.

    No perodo de destaque de Israel se implanta a monarquia na figura de trs reis iniciais(Saul, Davi e Salomo). Neste perodo ocorre uma organizao de um estado, centrado nacidade Jerusalm que havia sido tomada dos jebuseus. Ponto estratgico, passa-se acobranade impostos, formao de uma corte, de um exrcito regular, palcio e finalmente a ideia deuma grande templo. O auge do reis ocorreu com as vitrias e expanso das fronteiras comDavi e a construo do templo com Salamo e sua riqueza.

    Aps a morte de Salomo, os outros reis governam em um perodo de Cisma e divisodo Reino em dois (Jud e Samaria). A decadncia militar, religiosa e moral vai se acentuando.Atacados por exrcito Assrio, e posteriormente Babilnico os dois reinos sero levadoscativos para a Mesopotmia. Os judeus voltam para Jerusalm com a subida ao poder dospoderosos cavaleiros Persas. Apesar de conselheiros dos persas e por eles bem tratados. opovo judeu j no possui liberdade poltica. Sero dominados por vrios povos que vo sealternar no domnio da regio. Uma profunda dispora no primeiro sculo da era crist porparte do Romanos, dispersa de vez os judeus de Cana e os obriga a se instalarem emreinos diversos por cerca de 1600 anos. No entanto, suas leis e cultura so estabelecidas.Fazem que mesmo espalhados pelo mundo os judeus mantenha sua viso de mundo e suasleis prprias. Alm disso, um forte sistema de educao baseado na leitura da Lei nasSinagogas13, especializam os judeus na administrao, comrcio, levando-os a exercerimportantes papis por onde se estabelecem.

    Base de toda a estrutura societria, a famlia judaica tem suas peculiaridades e, para opovo judeu, no podia ser diferente. Tudo se concentrava na pessoa do patriarca (sistemapatriarcal). A defesa da famlia tambm recebia tratamento detalhado no Talmude.

    O Direito Penal j era retratado na historicidade do povo judeu, sendo que o seu Direitotem uma lei penal das mais antigas da histria da humanidade. Ela estudada em trsperodos, a saber: 1)a Lei divina: retratada pelo episdio de Ado quando advertido peloCriador para que no comesse do fruto da rvore proibida, mesmo assim ele no ouve a Deuse dela come. A infringncia a esta lei divina acarretou como consequncia uma pena. A penaem referncia a morte, visto que Ado e Eva foram criados imortais. Tecnicamente, temosaqui o primeiro crime cometido pelo homens desde que habitam o planeta terra. Afirmamos que

    13A sinagoga nasceram no cativeiro babilnico, se tornando substituto para o templo destrudo de Salomo. No perodo de 500 anos (400 A.C at 100 A.C) ele domina a religiosidade em dos israelitas, tanto para educao, rezas e canto. Quando Israel volta a ter templos e sacrifcios, as Sinagogas continuam incorporadas a vida comunitria. Em algumas cidades os seus lderes julgavam questes religiosas e questes judiciais permitidas pelos dominadores.

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    para o povo hebreu o crime tinha muita relao com aes religiosas e estas se fossemcometidas poderiam levar at a morte. 2) A segunda fase do direito hebraico chamada de LeiNatural, chamada assim, pois, aps o dilvio no havia outra autoridade seno a de No emforma de patriarcado.3) A terceira fase chamada de Lei Escrita, remonta o perodo de Moiss,conduzindo o povo Terra prometida, depois da escravido do Egito.

    No que se refere a Lei escrita, o direito criminal dos Hebreus evolui, aps a legislaomosaica com o Talmud. A pena de Talio, que se limita reao ofensa a um mal idntico aopraticado (olho por olho, dente por dente), constituiu uma evoluo das primeiras sanesexistentes, frutos da vingana defensiva, sendo substituda pela multa, priso e imposio deflagelos fsicos.

    Os crimes e os delitos eram agrupados em cinco categorias, a saber: a)atentados contra o prximo, distinguindo com clareza os atos dolosos e culposos; (muitoantes de Drcon na Grcia Antiga) b)leses corporais graves e leves; c)atentado moral e aos bons costumes; d)danos propriedade alheia; e)roubo e a legtima defesa inclusive a da propriedade com as naturais agravantes eatenuantes.

    Veja a proteo dada ao que mata involuntariamente (Deut 4; 19):

    41 Ento Moiss separou trs cidades alm do Jordo, para o nascente, 42 paraque se refugiasse ali o homicida que involuntariamente tivesse matado o seuprximo a quem dantes no tivesse dio algum; para que, refugiando-se numadestas cidades, vivesse. (...) 3 preparar-lhe-s caminhos, e partirs em trs ostermos da tua terra, que o Senhor teu Deus te dar em herana; isto ser paraque todo homicida se acolha nessas cidades. 4 Este, pois o caso no tocanteao homicida que se acolher ali para que viva: aquele que involuntariamentematar o seu prximo, a quem dantes no odiava; 5 como, por exemplo, aqueleque entrar com o seu prximo no bosque para cortar lenha e, pondo fora na suamo com o machado para cortar a rvore, o ferro saltar do cabo e ferir o seuprximo de sorte que venha a morrer; o tal se acolher a uma dessas cidades, eviver; 6 para que o vingador do sangue no persiga o homicida, enquantoestiver abrasado o seu corao, e o alcance, por ser comprido o caminho, e lhetire a vida, no havendo nele culpa de morte, pois que dantes no odiava o seuprximo. 7 Pelo que eu te deu esta ordem: Trs cidades designars para ti. 8 E,se o Senhor teu Deus dilatar os teus termos, como jurou a teus pais, e te dertoda a terra que prometeu dar a teus pais 9 (quando guardares, para ocumprires, todo este mandamento que eu hoje te ordeno, de amar o Senhor teuDeus e de andar sempre nos seus caminhos), ento acrescentars a estas trs,mais trs cidades; 10 para que no se derrame sangue inocente no meio da tuaterra, que o Senhor teu Deus te d por herana, e no haja sangue sobre ti.

    Os crimes mais graves eram aqueles praticados contra Deus. Desde o Cdigo daAliana isso j ocorria. Normalmente a pena para quem cometesse uma dessas OFENSAS aDeus era a morte. Alis foi por esta pena que JESUS foi condenado, tendo os seusacusadores invocado, habilmente, os dois crimes de Jesus; um contra a lei judaica que opunia com morte por se afirmar filho de Deus (heresia).

    O Direito Civil hebreu tem trs tratados, do Talmude, B. Kamma, B. Metzia e B. Batha,e se ocupam exaustivamente das aes de perdas e danos. J havia a punio civil para ohomem que desejasse manter relao sexual com a mulher contra a sua vontade, o estupro jtinha previso para o Direito Hebreu. J se previa certa indenizao para a mulher estuprada.

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    A sociedade tinha suas caractersticas prprias. No livro de Deuteronmio cobra-sejustia do patro com o trabalhador e a misericrdia do agricultor diante do que no temcomida. H, de certa forma, um esprito liberal e humanitrio para com os escravos, os pobrese os estrangeiros. Veja o registro em Deuteronmio :

    Deuteronmio, captulo 21, fala ainda do direito do primognito diante dos outros filhos(mesmo que mais queridos):

    15 Se um homem tiver duas mulheres, uma a quem ama e outra a quemdespreza, e ambas lhe tiverem dado filhos, e o filho primognito for dadesprezada, 16 quando fizer herdar a seus filhos o que tiver, no poder dar aprimogenitura ao filho da amada, preferindo-o ao filha da desprezada, que oprimognito; 17 mas ao filho da aborrecida reconhecer por primognito, dando-lhe dobrada poro de tudo quanto tiver, porquanto ele as primcias da suafora; o direito da primogenitura dele.

    Fala ainda o livro sobre o pobreza e o dever para com os pobres, e o dever de pagar emdia o trabalhador, Deuteronmio, captulo 24:

    14 No oprimirs o trabalhador pobre e necessitado, seja ele de teus irmos, ouseja dos estrangeiros que esto na tua terra e dentro das tuas portas. 15 Nomesmo dia lhe pagars o seu salrio, e isso antes que o sol se ponha; porquanto pobre e est contando com isso; para que no clame contra ti ao Senhor, ehaja em ti pecado. 18 Lembrar-te-s de que foste escravo no Egito, e de que oSenhor teu Deus te resgatou dali; por isso eu te dou este mandamento para ocumprires. 19 Quando no teu campo fizeres a tua sega e esqueceres um molhono campo, no voltars para tom-lo; para o estrangeiro para o rfo, e para aviva ser, para que o Senhor teu Deus te abenoe em todas as obras das tuasmos. 20 Quando bateres a tua oliveira, no voltars para colher o fruto dosramos; para o estrangeiro, para o rfo, e para a viva ser. 21 Quandovindimares a tua vinha, no voltars para rebusc-la; para o estrangeiro, para orfo, e para a viva ser.

    As dvidas prescreviam em 7 anos (Deut. 15):

    1 Ao fim de cada sete anos fars remisso. 2 E este o modo da remisso: todocredor remitir o que tiver emprestado ao seu prximo; no o exigir do seuprximo ou do seu irmo, pois a remisso do Senhor apregoada.(,,,) 7 Quandono meio de ti houver algum pobre, dentre teus irmos, em qualquer das tuascidades na terra que o Senhor teu Deus te d, no endurecers o teu corao,nem fechars a mo a teu irmo pobre; 8 antes lhe abrirs a tua mo, ecertamente lhe emprestars o que lhe falta, quanto baste para a suanecessidade. 9 Guarda-te, que no haja pensamento vil no teu corao evenhas a dizer: Vai-se aproximando o stimo ano, o ano da remisso; e que oteu olho no seja maligno para com teu irmo pobre, e no lhe ds nada; e queele clame contra ti ao Senhor, e haja em ti pecado. 10 Livremente lhe dars, eno fique pesaroso.

    Os filhos no poderiam ser punidos pelos pais (Deut. 21): 16 No se faro morrer ospais pelos filhos, nem os filhos pelos pais; cada qual morrer pelo seu prprio pecado. O reino est acima da lei, mas deve submeter-se a ela. A justia administrada pelo povo.

    O estatuto do estrangeiro diferenciava em direitos e deveres o residente e o visitante.(Deut 10):

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    17 Pois o Senhor vosso Deus, o Deus dos deuses, e o Senhor dos senhores, oDeus grande, poderoso e terrvel, que no faz acepo de pessoas, nem recebepeitas; 18 que faz justia ao rfo e viva, e ama o estrangeiro, dando-lhe poe roupa. 19 Pelo que amareis o estrangeiro, pois fostes estrangeiros na terra doEgito.

    Dita o livro, que estabelecers juzes e magistrados em todas as cidades que Jeov,teu Deus, de acordo com as tribos, e eles julgaro o povo com justia. No ters consideraopelas pessoas e nem recebers quaisquer presentes, pois os presentes cegam os olhoperspicazes e corrompem as palavras dos justos. O livro retrata claramente um preceito contraa corrupo dos magistrados que deveriam manter-se distante dos presentes e das ddivasdas pessoas.

    Como sempre acontece, o Talmude acrescentou outros preceitos que os doutoresjudeus foram inserindo no conjunto de leis de Israel.

    Agora vejamos o Cdigo (constituio) de Israel, feito por Moiss, calcado nos DEZMANDAMENTOS: 1)Repetiu como lei espiritual e material as proibies: No matar; Nofurtar; No dar falso testemunho. 2)Estabeleceu prazo para o cumprimento de um trabalhoescravo, estipulando a liberdade aps seis anos de servios escravos. 3)Mandou que se desseuma importncia ao alforriado em dinheiro ou em bens (roupas, alimentos, gado, etc.).4)Regulamentou pesos e medidas. 5)Determinou o divrcio em casos especiais. 6)Condenou oadultrio. 7) Condenou a usura. 8)Consagrou a inviolabilidade do domiclio.

    3)O DIREITO NA GRCIA E EM ROMA

    O estudo do direito na Grcia e em Roma pode ser feito dentro de uma unidade nica. Assimcomo os povos do crescente frtil mantinham princpios e desenvolvimento semelhante, Grciae Roma tambm possuem alguns itens comuns.

    Inicialmente pode-se falar em uma cultura (religio, poltica, direito etc) indo-europeia.Os povos originrios de gregos e romanos so grupos que comearam a migrar para a Europapor volta do ano 2000 A.C. So caadores e guerreiros, e vo se instalando em meio aospovos nativos. Dominam a regio e os seus povos acabam compondo camadas inferiores nassociedades que nascem dominadas pelos Indo-europeus. Os povos Helenos encontramhabitando a pennsula helnica os denominados Pelgios. No ser diferente com os latinosque vo para a denominada pennsula itlica. Na Grcia e na Itlia vo predominar pequenosgrupos humanos, baseados na