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Introdução à Liturgia Ano Litúrgico, Liturgia das Horas e Espiritualidade Litúrgica Textos e exercícios

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Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro Escolas de Fé e Catequese – Escola Mater Ecclesiae Núcleo Jacarepaguá – Freguesia

Liturgia 1A

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Sumário I. Motu Proprio Tra le Sollicitude .......................................................................................................... 3

II. Carta Encíclica Mediator Dei ............................................................................................................ 6

III. Constituição Apostólica Sacrosanctum Concilium ........................................................................... 11

IV. Doutrina do Mistério .................................................................................................................... 14

V. Experimentar a Liturgia – dimensão corporal .................................................................................. 19

VI. Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas .................................................................................... 21

VII. Ano Litúrgico .............................................................................................................................. 26

VIII. Carta Apostólica Dies Domini ..................................................................................................... 31

IX. Espiritualidade Litúrgica ............................................................................................................... 40

X. Estudo Dirigido – 1 ........................................................................................................................ 43

XI. Diretório para Celebrações Dominicais na Ausência do Presbítero ................................................... 44

XII. Estudo Dirigido – 2 ..................................................................................................................... 51

XIII. Vocabulário Prático de Liturgia ................................................................................................... 52

XIV. Exercício sobre o Vocabulário Prático .......................................................................................... 53

XV. Revisão ...................................................................................................................................... 54

Bibliografia ....................................................................................................................................... 56

Oração para antes dos estudos .......................................................................................................... 57

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I. Motu Proprio Tra le Sollicitude São Pio X, sobre a Música Sacra

INTRODUÇÃO

Entre os cuidados do ofício pastoral, não somente desta Suprema Cátedra, que por imperscrutável

disposição da Providência, ainda que indigno, ocupamos, mas também de todas as Igrejas particulares, é, sem dúvida, um dos principais o de manter e promover o decoro da Casa de Deus, onde se celebram

os augustos mistérios da religião e o povo cristão se reúne, para receber a graça dos Sacramentos,

assistir ao Santo Sacrifício do altar, adorar o augustíssimo Sacramento do Corpo do Senhor e unir-se à oração comum da Igreja na celebração pública e solene dos ofícios litúrgicos.

Nada, pois, deve suceder no templo que perturbe ou, sequer, diminua a piedade e a devoção das fiéis,

nada que dê justificado motivo de desgosto ou de escândalo, nada, sobretudo, que diretamente ofenda o decoro e a santidade das sacras funções e seja por isso indigno da Casa de Oração e da majestade de

Deus.

Não nos ocupamos de cada um dos abusos que nesta matéria podem ocorrer. A nossa atenção dirige-se

hoje para um dos mais comuns, dos mais difíceis de desarraigar e que às vezes se deve deplorar em lugares onde tudo o mais é digno de máximo encômio para beleza e suntuosidade do templo, esplendor

e perfeita ordem das cerimônias, frequência do clero, gravidade e piedade dos ministros do altar. Tal é o

abuso em matéria de canto e Música Sacra. E de fato, quer pela natureza desta arte de si flutuante e variável, quer pela sucessiva alteração do gosto e dos hábitos no correr dos tempos, quer pelo funesto

influxo que sobre a arte sacra exerce a arte profana e teatral, quer pelo prazer que a música diretamente produz e que nem sempre é fácil conter nos justos limites, quer, finalmente, pelos muitos preconceitos,

que em tal assunto facilmente se insinuam e depois tenazmente se mantêm, ainda entre pessoas

autorizadas e piedosas, há uma tendência contínua para desviar da reta norma, estabelecida em vista do fim para que a arte se admitiu ao serviço do culto, e expressa nos cânones eclesiásticos, nas ordenações

dos Concílios gerais e provinciais, nas prescrições várias vezes emanadas das Sagradas Congregações Romanas e dos Sumos Pontífices Nossos Predecessores.

Com verdadeira satisfação da alma nos apraz recordar o muito bem que nesta parte se tem feito nos

últimos decênios, também nesta nossa augusta cidade de Roma e em muitas Igrejas da Nossa pátria,

mas em modo muito particular em algumas nações, onde homens egrégios e zelosos do culto de Deus, com aprovação desta Santa Sé e dos Bispos, se uniram em florescentes sociedades e reconduziram ao

seu lugar de honra a Música Sacra em quase todas as suas Igrejas e Capelas. Este progresso está todavia ainda muito longe de ser comum a todos; e se consultarmos a nossa experiência pessoal e

tivermos em conta as reiteradas queixas, que de todas as partes Nos chegaram neste pouco tempo

decorrido, desde que aprouve ao Senhor elevar a Nossa humilde Pessoa à suprema culminância do Pontificado Romano, sem protrairmos por mais tempo, cremos que é nosso primeiro dever levantar a voz

para reprovação e condenação de tudo que nas funções do culto e nos ofícios eclesiásticos se reconhece desconforme com a reta norma indicada.

Sendo de fato nosso vivíssimo desejo que o espírito cristão refloresça em tudo

e se mantenha em todos os fiéis, é necessário prover antes de mais nada à

santidade e dignidade do templo, onde os fiéis se reúnem precisamente para haurirem esse espírito da sua primária e indispensável fonte: a participação

ativa nos sacrossantos mistérios e na oração pública e solene da Igreja. E debalde se espera que para isso desça sobre nós copiosa a bênção do Céu,

quando o nosso obséquio ao Altíssimo, em vez de ascender em odor de

suavidade, vai pelo contrário repor nas mãos do Senhor os flagelos, com que uma vez o Divino Redentor expulsou do templo os indignos profanadores.

Portanto, para que ninguém doravante possa alegar a desculpa de não conhecer claramente o seu dever, e para que desapareça qualquer equívoco

na interpretação de certas determinações anteriores, julgamos oportuno indicar com brevidade os princípios que regem a Música Sacra nas funções do São Pio X

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culto e recolher num quadro geral as principais prescrições da Igreja contra os abusos mais comuns em

tal matéria.

E por isso, de própria iniciativa e ciência certa, publicamos a Nossa presente instrução; será ela como que um código jurídico de Música Sacra; e, em virtude da plenitude de Nossa Autoridade Apostólica,

queremos que se lhe dê força de lei, impondo a todos, por este Nosso quirógrafo, a sua mais escrupulosa

observância.

I. Princípios gerais

1. A música sacra, como parte integrante da Liturgia solene, participa do seu fim geral, que é a glória de

Deus e a santificação dos fiéis. A música concorre para aumentar o decoro e esplendor das sagradas cerimônias; e, assim como o seu ofício principal é revestir de adequadas melodias o texto litúrgico

proposto à consideração dos fiéis, assim o seu fim próprio é acrescentar mais eficácia ao mesmo texto, a fim de que por tal meio se excitem mais facilmente os fiéis à piedade e se preparem melhor para receber

os frutos da graça, próprios da celebração dos sagrados mistérios.

2. Por isso a música sacra deve possuir, em grau eminente, as qualidades próprias da liturgia, e

nomeadamente a santidade e a delicadeza das formas, donde resulta espontaneamente outra característica, a universalidade.

Deve ser santa, e por isso excluir todo o profano não só em si mesma, mas também no modo como é

desempenhada pelos executantes.

Deve ser arte verdadeira, não sendo possível que, doutra forma, exerça no ânimo dos ouvintes aquela

eficácia que a Igreja se propõe obter ao admitir na sua liturgia a arte dos sons. Mas seja, ao mesmo tempo, universal no sentido de que, embora seja permitido a cada nação admitir nas composições

religiosas aquelas formas particulares, que em certo modo constituem o caráter específico da sua música própria, estas devem ser de tal maneira subordinadas aos caracteres gerais da música sacra que

ninguém doutra nação, ao ouvi-las, sinta uma impressão desagradável.

II. Gêneros de Música Sacra

3. Estas qualidades se encontram em grau sumo no canto gregoriano, que é por consequência o canto

próprio da Igreja Romana, o único que ela herdou dos antigos Padres, que conservou cuidadosamente no

decurso dos séculos em seus códigos litúrgicos e que, como seu, propõe diretamente aos fiéis, o qual estudos recentíssimos restituíram à sua integridade e pureza.

Por tais motivos, o canto gregoriano foi sempre considerado como o modelo supremo da música sacra,

podendo com razão estabelecer-se a seguinte lei geral: uma composição religiosa será tanto mais sacra e

litúrgica quanto mais se aproxima no andamento, inspiração e sabor da melodia gregoriana, e será tanto menos digna do templo quanto mais se afastar daquele modelo supremo.

O canto gregoriano deverá, pois, restabelecer-se amplamente nas funções do culto, sendo certo que uma

função eclesiástica nada perde da sua solenidade, mesmo quando não é acompanhada senão da música gregoriana.

(...)

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III. Texto Litúrgico

(...)

9. O texto litúrgico tem de ser cantado como se encontra nos livros aprovados, sem posposição ou

alteração das palavras, sem repetições indevidas, sem deslocar as sílabas, sempre de modo inteligível.

(...)

VII. Amplitude da Música Sacra

22. Não é licito, por motivo do canto, fazer esperar o sacerdote no altar mais tempo do que exige a cerimônia litúrgica. Segundo as prescrições eclesiásticas, o Sanctus deve ser cantado antes da elevação,

devendo o celebrante esperar que o canto termine, para fazer a elevação. A música da Glória e do Credo, segundo a tradição gregoriana, deve ser relativamente breve.

23. É condenável, como abuso gravíssimo, que nas funções eclesiásticas a liturgia esteja dependente da

música, quando é certo que a música é que é parte da liturgia e sua humilde serva.

(...)

Dado em o Nosso Palácio do Vaticano, na festa da Virgem e Mártir Santa Cecília, 22 de novembro de

1903, primeiro ano do nosso pontificado.

PAPA PIO X

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II. Carta Encíclica Mediator Dei

Papa Pio XII, sobre a Sagrada Liturgia

INTRODUÇÃO

1. "O mediador entre Deus e os homens"1, o grande pontífice que penetrou

os céus, Jesus filho de Deus2, assumindo a obra de misericórdia com a qual enriqueceu o gênero humano de benefícios sobrenaturais, visou sem dúvida

a restabelecer entre os homens e o Criador aquela ordem que o pecado

tinha perturbado e a reconduzir ao Pai celeste, primeiro princípio e último fim, a mísera estirpe de Adão, infeccionada pelo pecado original. E por isso,

durante a sua permanência na terra, não só anunciou o início da redenção e declarou inaugurado o reino de Deus, mas ainda cuidou de promover a

salvação das almas pelo contínuo exercício da pregação e do sacrifício, até que, na cruz, se ofereceu a Deus qual vítima imaculada para "purificar a

nossa consciência das obras mortas, para servir a Deus vivo"3. Assim, todos

os homens, felizmente chamados do caminho que os arrastava à ruína e à perdição, foram ordenados de novo a Deus, a fim de que, com sua pessoal

colaboração na obra da própria santificação, fruto do sangue imaculado do

Cordeiro, dessem a Deus a glória que lhe é devida.

2. O Divino Redentor quis, ainda, que a vida sacerdotal por ele iniciada em seu corpo mortal com as suas

preces e o seu sacrifício, não cessasse no correr dos séculos no seu corpo místico, que é a Igreja; e por isso instituiu um sacerdócio visível para oferecer em toda parte a oblação pura4, a fim de que todos os

homens, do oriente ao ocidente, libertos do pecado, por dever de consciência servissem espontânea e

voluntariamente a Deus.

3. A Igreja, pois, fiel ao mandato recebido do seu Fundador, continua o ofício sacerdotal de Jesus Cristo, sobretudo com a sagrada liturgia. E o faz em primeiro lugar no altar, onde o sacrifício da cruz é

perpetuamente representado5 e renovado, com a só diferença no modo de oferecer; em seguida, com os sacramentos, que são instrumentos particulares por meio dos quais os homens participam da vida

sobrenatural; enfim, com o tributo cotidiano de louvores oferecido a Deus ótimo e máximo6. "Que

jubiloso espetáculo – diz o nosso predecessor de feliz memória Pio XI – oferece ao céu e à terra a Igreja que reza, enquanto continuamente dia e noite, se cantam na terra os salmos escritos por inspiração

divina: nenhuma hora do dia transcorre sem a consagração de uma liturgia própria; cada etapa da vida tem seu lugar na ação de graças, nos louvores, preces e aspirações desta comum oração do corpo

místico de Cristo, que é a Igreja."7

4. Certamente conheceis, veneráveis irmãos, que, no fim do século passado e nos princípios do presente,

houve singular fervor de estudos litúrgicos; já por louvável iniciativa de alguns particulares, já sobretudo pela zelosa e assídua diligência de vários mosteiros da ínclita ordem beneditina; assim que não somente

em muitas regiões da Europa, mas ainda nas terras de além-mar, se desenvolveu a esse respeito uma louvável e útil emulação, cujas benéficas consequências foram visíveis, quer no campo das disciplinas

sagradas, onde os ritos litúrgicos da Igreja oriental e ocidental foram mais ampla e profundamente

estudados e conhecidos, quer na vida espiritual e íntima de muitos cristãos. As augustas cerimônias do sacrifício do altar foram mais conhecidas, compreendidas e estimadas; a participação aos sacramentos

maior e mais frequente; as orações litúrgicas mais suavemente saboreadas e o culto eucarístico tido,

1 Tm 2,5. 2 Cf. Hb 4,14. 3 Cf. Hb 9,14. 4 Cf. Ml 1,11. 5 Cf. Conc. Trid., sess. XXII, c.l. 6 Cf. Ibid., c.2. 7 Carta. Encicl. Caritate Christi, de 3 de maio do ano 1932.

Papa Pio XII

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como verdadeiramente o é, por centro e fonte da verdadeira piedade cristã. Além disso, pôs-se em mais

clara evidência o fato de que todos os fiéis constituem um só e compacto corpo de que é Cristo a cabeça, com o consequente dever para o povo cristão de participar, segundo a própria

condição, dos ritos litúrgicos.

(...)

7. Ora, se de uma parte verificamos com pesar que em algumas regiões o sentido, o conhecimento e o estudo da liturgia são às vezes escassos ou quase nulos; de

outra, notamos, com muita apreensão, que há algumas pessoas muito ávidas de novidades e que se afastam do caminho da sã doutrina e da prudência. Na intenção

e desejo de um reavivamento litúrgico, esses inserem muitas vezes princípios que,

em teoria ou na prática, comprometem esta santíssima causa, e frequentemente até a contaminam de erros que atingem a fé católica e a doutrina ascética. (...)

PRIMEIRA PARTE: NATUREZA, ORIGEM E PROGRESSO DA LITURGIA

I. A liturgia é culto público

17. A Igreja (...) tem em comum com o Verbo encarnado o escopo, o empenho e a função de ensinar a todos a verdade, reger e governar os homens, oferecer a Deus o sacrifício, aceitável e grato, e assim

restabelecer entre o Criador e as criaturas aquela união e harmonia que o apóstolo das gentes claramente indica por estas palavras: "Não sois mais hóspedes ou adventícios, mas concidadãos dos

santos e membros da família de Deus, educados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, com

o próprio Jesus Cristo por pedra angular, sobre a qual todo o edifício bem ordenado se levanta para ser um templo santo no Senhor, e sobre ele vós sois também juntamente edificados em morada de Deus,

pelo Espírito"8. Por isso a sociedade fundada pelo divino Redentor não tem outro fim, seja com a sua doutrina e o seu governo, seja com o sacrifício e os sacramentos por ele instituídos, seja enfim com o

ministério que lhe contou, com as suas orações e o seu sangue, senão crescer e dilatar-se sempre mais – o que se dá quando Cristo é edificado e dilatado nas almas dos mortais, e quando, vice-versa, as almas

dos mortais são educadas e dilatadas em Cristo; de maneira que, neste exílio terreno prospere o templo

no qual a divina majestade recebe o culto grato e legítimo. Em toda ação litúrgica, junto com a Igreja está presente o seu divino Fundador: Cristo está presente no augusto sacrifício do altar, quer na pessoa

do seu ministro, quer por excelência, sob as espécies eucarísticas; está presente nos sacramentos com a virtude que neles transfunde, para que sejam instrumentos eficazes de santidade; está presente, enfim,

nos louvores e súplicas dirigidas a Deus, como vem escrito: "Onde estão duas ou três pessoas reunidas

em meu nome aí estou no meio delas"9. A sagrada liturgia é, portanto, o culto público que o nosso Redentor rende ao Pai como cabeça da Igreja, e é o culto que a sociedade dos fiéis rende à sua cabeça,

e, por meio dela, ao Eterno Pai. É, em uma palavra, o culto integral do corpo místico de Jesus Cristo, ou seja, da cabeça e de seus membros.

18. A ação litúrgica inicia-se com a fundação da própria Igreja. Os primeiros cristãos, com efeito, "eram assíduos aos ensinamentos dos apóstolos, e à comum fração do pão e à oração"10. Em toda a parte onde

os pastores possam reunir um núcleo de fiéis, erigem um altar sobre o qual oferecem o sacrifício, e em torno dele vêm dispostos outros ritos adaptados à santificação dos homens e à glorificação de Deus.

Entre esse ritos estão, em primeiro lugar, os sacramentos, isto é, as sete principais fontes de salvação; depois, está a celebração do louvor divino, com o qual os féis reunidos obedecem à exortação do

Apóstolo: "Instruindo-vos e exortando-vos uns aos outros com toda a sabedoria, cantando a Deus em

vosso coração, inspirados pela graça, salmos, hinos e cânticos espirituais"11; depois, ainda, a leitura da Lei, dos Profetas, do Evangelho e das epístolas apostólicas; e, enfim, a prática com a qual o presidente

da assembleia recorda e comenta utilmente os preceitos do divino Mestre, os acontecimentos principais de sua vida, e admoesta todos os presentes com exortações oportunas e exemplos. (...)

8 Ef 2,19-22. 9 Mt 18,20. 10 At 2,42. 11 Cl 3,16.

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II. A liturgia é culto externo e interno

20. Todo o conjunto do culto que a Igreja rende a Deus deve ser interno e

externo. É externo porque o exige a natureza do homem composto de corpo e alma; porque Deus dispõe que "pelo conhecimento das coisas visíveis sejamos

atraídos ao amor das invisíveis"12; porque tudo o que vem da alma é

naturalmente expresso pelos sentidos; e ainda porque o culto divino pertence não somente ao particular mas também à coletividade humana e

consequentemente é necessário que seja social, o que é impossível, no âmbito religioso, sem vínculos e manifestações exteriores; e, enfim, porque é um meio

que põe particularmente em evidência a unidade do corpo místico, acrescenta-

lhe santos entusiasmos, consolida-lhe as forças, intensifica-lhe a ação: "se bem que, com efeito, as cerimônias, em si mesmas, não contenham nenhuma perfeição e santidade, são todavia atos externos de

religião que, como sinais, estimulam a alma à veneração das coisas sagradas, elevam a mente à realidade sobrenatural, nutrem a piedade, fomentam a caridade, aumentam a fé, robustecem a devoção,

instruem os simples, ornam o culto de Deus, conservam a religião e distinguem os verdadeiros dos falsos cristãos e dos heterodoxos13.

21. Mas o elemento essencial do culto deve ser o interno. É necessário, com efeito, viver sempre em Cristo, dedicar-se todo a ele, a fim de que nele, com ele e por ele, se dê glória ao Pai. A sagrada liturgia

requer que estes dois elementos estejam intimamente ligados; o que ela não se cansa jamais de repetir toda vez que prescreve um ato externo de culto. Assim, por exemplo, a propósito do jejum, nos exorta:

"a fim de que se opere de fato em nosso íntimo o que a nossa observância professa externamente"14. De

outro modo, a religião se torna um formalismo sem fundamento e sem conteúdo. Sabeis, veneráveis irmãos, que o divino Mestre considera indignos do templo sagrado e expulsa dele os que creem honrar a

Deus somente com o som de bem construídas palavras e com atitudes teatrais e estão persuadidos de poder prover de modo adequado à sua salvação sem arrancar da alma os vícios inveterados"15.

(...)

III. A liturgia é regulada pela hierarquia eclesiástica

35. Para melhor compreender, ainda, a sagrada liturgia é necessário considerar outro seu caráter

importante.

A Igreja é uma sociedade; exige, por isso, uma autoridade e hierarquia próprias. Se todos os membros

do corpo místico participam dos mesmos bens e tendem aos mesmos uns, nem todos gozam do mesmo poder e são habilitados a cumprir as mesmas ações. O divino Redentor estabeleceu, com efeito, o seu

reino sob fundamentos da ordem sagrada, que é reflexo da hierarquia celeste16. Somente aos apóstolos e àqueles que, depois deles, receberam dos seus sucessores a imposição das mãos, é conferido o poder

sacerdotal em virtude do qual, como representam diante do povo que lhes foi confiado a pessoa de Jesus

Cristo, assim representam o povo diante de Deus. Esse sacerdócio não vem transmitido nem por herança, nem por descendência carnal, nem resulta da emanação da comunidade cristã ou de delegação

popular. Antes de representar o povo, perante Deus, o sacerdote representa o divino Redentor, e porque Jesus Cristo é a cabeça daquele corpo do qual os cristãos são membros, ele representa Deus junto do

povo. O poder que lhe foi conferido não tem, pois, nada de humano em sua natureza; é sobrenatural e vem de Deus: “assim como o Pai me enviou, assim eu vos envio”17; “quem vos ouve, a mim ouve”18;

“percorrendo todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura; quem crer e for batizado, será salvo”19.

12 Missal Romano. Prefácio da Natividade. 13 I. Card. Bona, De divina psalmodia, c 19, § 3,1. 14 Missal Romano. Secreta da féria V depois do II Domingo da Quaresma. 15 Cf. Mc 7,6 e Is 29,13. 16 Cf. 2Cor 6,1. 17 Jo 20,21. 18 Lc 10,16. 19 Mc 16,15-16.

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58. (...) Ninguém se arrogue o direito de ser lei para si mesmo e de impô-la aos outros por sua vontade.

Somente o sumo pontífice, na qualidade de sucessor de Pedro, ao qual o divino Redentor confiou o rebanho universal20, e juntamente os bispos, que sob a dependência da Sé Apostólica "o Espírito Santo

colocou para reger a Igreja de Deus"21, têm o direito e o dever de governar o povo cristão. (...)

SEGUNDA PARTE: O CULTO EUCARÍSTICO

I. Natureza do sacrifício eucarístico

59. O mistério da santíssima eucaristia, instituída pelo sumo sacerdote

Jesus Cristo e, por vontade sua, perpetuamente renovada pelos seus

ministros, é como a súmula e o centro da religião cristã. Em se tratando do ápice da sagrada liturgia, julgamos oportuno, veneráveis irmãos, deter-nos

um pouco, chamando a vossa atenção para esta importantíssima temática.

(...) 61. O augusto sacrifício do altar não é, pois, uma pura e simples

comemoração da paixão e morte de Jesus Cristo, mas é um verdadeiro e

próprio sacrifício, no qual, imolando-se incruentamente, o sumo Sacerdote faz aquilo que fez uma vez sobre a cruz, oferecendo-se todo ao Pai, vítima

agradabilíssima. "Uma... e idêntica é a vítima: aquele mesmo, que agora oferece pelo ministério dos sacerdotes, se ofereceu então sobre a cruz; é

diferente apenas, o modo de fazer a oferta"22.

62. Idêntico, pois, é o sacerdote, Jesus Cristo, cuja sagrada pessoa é representada pelo seu ministro.

Este, pela consagração sacerdotal recebida, assemelha-se ao sumo Sacerdote e tem o poder de agir em virtude e na pessoa do próprio Cristo23; por isso, com sua ação sacerdotal, de certo modo, "empresta a

Cristo a sua língua, e lhe oferece a sua mão"24. (...)

II. Participação dos fiéis no sacrifício eucarístico

73. É necessário, pois, veneráveis irmãos, que todos os fiéis tenham por seu principal dever e suma dignidade participar do santo sacrifício eucarístico, não com assistência passiva, negligente e distraída,

mas com tal empenho e fervor que os ponha em contato íntimo com o sumo sacerdote, como diz o

Apóstolo: "Tende em vós os mesmos sentimentos que Jesus Cristo experimentou"25, oferecendo com ele e por ele, santificando-se com ele.

(...)

83. Para não dar ensejo a erros perigosos neste importantíssimo argumento, é necessário precisar com

exatidão o significado do termo "oferta". A imolação incruenta por meio da qual, depois que foram pronunciadas as palavras da consagração, Cristo está presente no altar no estado de vítima, é realizada

só pelo sacerdote enquanto representa a pessoa de Cristo e não enquanto representa a pessoa dos fiéis. Colocando, porém, no altar a vítima divina, o sacerdote a apresenta a Deus Pai como oblação à glória da

SS. Trindade e para o bem de todas as almas. Dessa oblação propriamente dita os fiéis participam do modo que lhes é possível e por um duplo motivo: porque oferecem o sacrifício não somente pelas mãos

do sacerdote, mas, de certo modo ainda, junto com ele; e ainda porque com essa participação também a

oferta feita pelo povo pertence ao culto litúrgico. Que os fiéis oferecem o sacrifício por meio do sacerdote, é claro, pois o ministro do altar age na pessoa de Cristo enquanto Cabeça, que oferece em

20 Cf. Jo 21,15-17. 21 At 20,28. 22 Conc. Trid., Sess. XXII. c, 2. 23 Cf. s. Tomás, Summa Theol., III, q. 22, a. 4. 24 João Cris. In Joan. Hom., 86,4. 25 Fl 2,5.

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nome de todos os membros; pelo que, em bom direito, se diz que toda a Igreja, por meio de Cristo,

realiza a oblação da vítima. Quando, pois, se diz que o povo oferece juntamente com o sacerdote, não se afirma que os membros da Igreja de maneira idêntica à do próprio sacerdote realizam o rito litúrgico

visível – o que pertence somente ao ministro de Deus para isso designado – mas sim que une os seus votos de louvor, de impetração, de expiação e a sua ação de graças à intenção do sacerdote, aliás do

próprio sumo pontífice, a fim de que sejam apresentados a Deus Pai na própria oblação da vítima,

embora com o rito externo do sacerdote. É necessário, com efeito, que o rito externo do sacrifício manifeste, por sua natureza, o culto interno; ora, o sacrifício da nova Lei significa aquele obséquio

supremo com o qual o próprio principal ofertante, que é Cristo, e com ele e por ele todos os seus membros místicos, honram devidamente a Deus.

(...)

III. A comunhão eucarística

111. Certamente a pública assembleia da comunidade está dissolvida, mas é necessário que os indivíduos

unidos com Cristo não interrompam na sua alma o cântico de louvor, "agradecendo sempre tudo em nome de nosso Senhor Jesus Cristo a Deus e Pai"26. A isso nos exorta ainda a própria liturgia do sacrifício

eucarístico, quando nos manda rezar com estas palavras: "Concede, nós te pedimos, render-te contínuas

graças27 e não cessar jamais de louvar-te"28. Se se deve, pois, sempre agradecer a Deus e jamais cessar de louvá-lo, quem ousaria repreender e desaprovar a Igreja que aconselha aos seus sacerdotes29 e aos

fiéis entreterem-se ao menos um pouco de tempo depois da comunhão em colóquio com o divino Redentor, e que inseriu nos livros litúrgicos oportunas orações enriquecidas de indulgências com as quais

os sagrados ministros se possam convenientemente preparar antes de celebrar e de comungar e,

acabada a santa missa, manifestar a Deus a sua ação de graças? A sagrada liturgia, longe de sufocar os íntimos sentimentos particulares dos cristãos, os facilita e estimula a que sejam assimilados a Jesus Cristo

e por meio dele dirigidos ao Pai; portanto ela mesma exige que aquele que se aproxima da mesa eucarística agradeça devidamente a Deus. O divino Redentor compraz-se em ouvir as nossas orações,

falar conosco de coração aberto e oferecer-nos refúgio no seu Coração ardente. (...)

QUARTA PARTE: DIRETRIZES PASTORAIS

160. A essas múltiplas formas de piedade não pode ser estranha a inspiração e a ação do Espírito Santo;

elas, com efeito – se bem que de várias maneiras – visam todas a voltar e dirigir para Deus as nossas almas, porque as purificam dos pecados, as dispõem à conquista da virtude e as estimulam à verdadeira

piedade, habituando-as à meditação das verdades eternas, e tornando-as mais capazes da contemplação

dos mistérios da natureza humana e divina de Cristo. Além disso, nutrindo intensamente nos fiéis a vida espiritual, preparam-nos para participar das sagradas funções com fruto maior, e evitam o perigo de se

reduzirem as orações litúrgicas a um ritualismo vão. (...)

Dado em Castel Gandolfo, junto de Roma, no dia 20 de novembro do ano de 1947, IX do nosso pontificado.

PIO PP. XII

26 Ef 5,20. 27 Missal Romano. Postcommunio do Domingo da Oitava da Ascensão. 28 Ibidem, Postcommunio do Domingo I depois de Pentecostes. 29 CIC, cân. 810.

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III. Constituição Apostólica Sacrosanctum Concilium

Constituição Conciliar sobre a Sagrada Liturgia

CAPÍTULO I: PRINCÍPIOS GERAIS EM ORDEM À REFORMA E INCREMENTO DA LITURGIA

I - NATUREZA DA SAGRADA LITURGIA E SUA IMPORTÂNCIA NA VIDA DA IGREJA

Jesus Cristo salvador do mundo

5. Deus, que “quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade” (1Tm 2,4),

“tendo falado outrora muitas vezes e de muitos modos aos nossos pais pelos profetas” (Hb 1,1), quando chegou a plenitude dos tempos, enviou o Seu Filho, Verbo feito carne, ungido pelo Espírito Santo, a

evangelizar os pobres, curar os contritos de coração30, como médico da carne e do espírito31, mediador entre Deus e os homens32. A sua humanidade foi, na unidade da pessoa do Verbo, o instrumento da

nossa salvação. Por isso, em Cristo “se realizou plenamente a nossa reconciliação e se nos deu a

plenitude do culto divino”33.

Esta obra da redenção dos homens e da glorificação perfeita de Deus, prefigurada pelas suas grandes obras no povo da Antiga Aliança, realizou-a Cristo Senhor, principalmente pelo mistério pascal da sua

bem-aventurada Paixão, Ressurreição dos mortos e gloriosa Ascensão, em que “morrendo destruiu a

nossa morte e ressurgindo restaurou a nossa vida”34. Foi do lado de Cristo adormecido na cruz que nasceu o sacramento admirável de toda a Igreja35.

Pelo sacrifício e pelos sacramentos

6. Assim como Cristo foi enviado pelo Pai, assim também Ele enviou os Apóstolos, cheios do Espírito Santo, não só para que, pregando o Evangelho a toda a criatura36, anunciassem que o Filho de Deus,

pela sua morte e ressurreição, nos libertara do poder de Satanás37 e da morte e nos introduzira no Reino do Pai, mas também para que realizassem a obra de salvação que anunciavam, mediante o sacrifício e os

sacramentos, à volta dos quais gira toda a vida litúrgica. Pelo Batismo são os homens enxertados no mistério pascal de Cristo: mortos com Ele, sepultados com Ele, com Ele ressuscitados38; recebem o

espírito de adoção filial que “nos faz clamar: Abba, Pai” (Rm. 8,15), transformando-se assim nos

verdadeiros adoradores que o Pai procura39. E sempre que comem a Ceia do Senhor, anunciam igualmente a sua morte até Ele vir40. Por isso foram batizados no próprio dia de Pentecostes, em que a

Igreja se manifestou ao mundo, os que receberam a palavra de Pedro. E «mantinham-se fiéis à doutrina dos Apóstolos, à participação na fração do pão e nas orações... louvando a Deus e sendo bem vistos pelo

povo» (Act. 2, 41-47). Desde então, nunca mais a Igreja deixou de se reunir em assembleia para

celebrar o mistério pascal: lendo “o que se referia a Ele em todas as Escrituras” (Lc 24,27), celebrando a

30 Cfr. Is 61,1; Lc 4,18. 31 S. Inácio de Antioquia aos Efésios, 7, 8: F. X. Funk, Patres Apostolici, I, Tubinga, 1901, p. 218. 32 Cfr. 1Tm 2,5. 33 Sacramentário de Verona (Leoniano): ed. C. Mohlberg, Roma, 1956, n.° 1265, p. 162. 34 Missal Romano, Prefácio pascal. 35 Cfr. S. Agostinho, Enarr. in Ps. CXXXVIII, 2: Corpus Christianorum XL, Tournai, 1956, p. 1991; e a

oração depois da segunda leitura de Sábado Santo antes da reforma da Semana Santa, no Missal

Romano. 36 Cfr. Mc 16,15. 37 Cfr. At 26,18. 38 Cfr. Rm 6,4; Ef 2,6; Cl 3,1; 2Tm 2,11. 39 Cfr. Jo 4,23. 40 Cfr. 1Cor 11,26.

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Eucaristia, na qual “se torna presente o triunfo e a vitória da sua morte”41, e dando graças «a Deus pelo

Seu dom inefável (2Cor 9,15) em Cristo Jesus, “para louvor da sua glória” (Ef 1,12), pela virtude do Espírito Santo.

Presença de Cristo na Liturgia

7. Para realizar tão grande obra, Cristo está sempre presente na sua igreja, especialmente nas ações litúrgicas. Está presente no sacrifício da Missa, quer na pessoa do ministro – “O que se oferece agora

pelo ministério sacerdotal é o mesmo que se ofereceu na Cruz”42 -quer e sobretudo sob as espécies eucarísticas. Está presente com o seu dinamismo nos Sacramentos, de modo que, quando alguém batiza,

é o próprio Cristo que batiza43. Está presente na sua palavra, pois é Ele que fala ao ser lida na Igreja a

Sagrada Escritura. Está presente, enfim, quando a Igreja reza e canta, Ele que prometeu: “Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles” (Mt 18,20).

Em tão grande obra, que permite que Deus seja perfeitamente glorificado e que os homens se

santifiquem, Cristo associa sempre a si a Igreja, sua esposa muito amada, a qual invoca o seu Senhor e por meio dele rende culto ao Eterno Pai.

Com razão se considera a Liturgia como o exercício da função sacerdotal de Cristo. Nela, os sinais sensíveis significam e, cada um à sua maneira, realizam a santificação dos homens; nela, o Corpo Místico

de Jesus Cristo - cabeça e membros - presta a Deus o culto público integral.

Portanto, qualquer celebração litúrgica é, por ser obra de Cristo sacerdote e do seu Corpo que é a Igreja,

ação sagrada par excelência, cuja eficácia, com o mesmo título e no mesmo grau, não é igualada por nenhuma outra ação da Igreja.

A Liturgia terrena, antecipação da Liturgia celeste

8. Pela Liturgia da terra participamos, saboreando-a já, na Liturgia celeste celebrada na cidade santa de

Jerusalém, para a qual, como peregrinos nos dirigimos e onde Cristo está sentado à direita de Deus,

ministro do santuário e do verdadeiro tabernáculo44; por meio dela cantamos ao Senhor um hino de glória com toda a milícia do exército celestial, esperamos ter parte e comunhão com os Santos cuja

memória veneramos, e aguardamos o Salvador, Nosso Senhor Jesus Cristo, até Ele aparecer como nossa vida e nós aparecermos com Ele na glória45.

Lugar da Liturgia na vida da Igreja

9. A sagrada Liturgia não esgota toda a ação da Igreja, porque os homens, antes de poderem participar na Liturgia, precisam de ouvir o apelo à fé e à conversão: “Como hão de invocar aquele em quem não

creram? Ou como hão de crer sem o terem ouvido? Como poderão ouvir se não houver quem pregue? E

como se há de pregar se não houver quem seja enviado?” (Rm 10, 14-15).

É por este motivo que a Igreja anuncia a mensagem de salvação aos que ainda não têm fé, para que todos os homens venham a conhecer o único Deus verdadeiro e o Seu enviado, Jesus Cristo, e se

convertam dos seus caminhos pela penitência46. Aos que creem, tem o dever de pregar constantemente

41 Conc. Trento, Sess. XIII, 11 Out. 1551, Decr. De ss. Eucharist., ci 5: Concilium Tridentinum, Diariorum, Actorum, Epistolarum, Tractatuum nova collectio, ed. Soc. Goerresiana, t. VII. Actas: Parte IV, Friburgo

da Brisgóvia, 1961, p. 202. 42 Conc. Trento, Sess. XXII, 17 Set. 1562, Dout. De ss. Missae sacrif., c. 2: Concilium Tridentinum, ed. cit., t. VIII, Actas: Parte V, Friburgo da Brisgóvia, 1919, p. 960. 43 Cfr. S. Agostinho, In Joannis Evangelium Tractatus VI, c. I, n.° 7: PL 35, 1428. 44 Cfr. Ap 21,2; Cl 3,1; Hb 8,2. 45 Cfr. Fl 3,20; Cl 3,4. 46 Cfr. Jo 17,3; Lc 24,47; At 2,38.

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a fé e a penitência, de dispô-los aos Sacramentos, de ensiná-los a guardar tudo o que Cristo mandou47,

de estimulá-los a tudo o que seja obra de caridade, de piedade e apostolado, onde os cristãos possam mostrar que são a luz do mundo, embora não sejam deste mundo, e que glorificam o Pai diante dos

homens.

10. Contudo, a Liturgia é simultaneamente a meta para a qual se encaminha a ação da Igreja e a fonte

de onde promana toda a sua força. Na verdade, o trabalho apostólico ordena-se a conseguir que todos os que se tornaram filhos de Deus pela fé e pelo Batismo se reúnam em assembleia para louvar a Deus

no meio da Igreja, participem no Sacrifício e comam a Ceia do Senhor.

A Liturgia, por sua vez, impele os fiéis, saciados pelos “mistérios pascais”, a viverem “unidos no amor”48;

pede “que sejam fiéis na vida a quanto receberam pela fé”49; e pela renovação da aliança do Senhor com os homens na Eucaristia, e aquece os fiéis na caridade urgente de Cristo. Da Liturgia, pois, em especial

da Eucaristia, corre sobre nós, como de sua fonte, a graça, e por meio dela conseguem os homens com total eficácia a santificação em Cristo e a glorificação de Deus, a que se ordenam, como a seu fim, todas

as outras obras da Igreja.

A participação dos fiéis

11. Para assegurar esta eficácia plena, é necessário, porém, que os fiéis celebrem a Liturgia com retidão

de espírito, unam a sua mente às palavras que pronunciam, cooperem com a graça de Deus, não aconteça de a receberem em vão50. Por conseguinte, devem os pastores de almas vigiar por que não só

se observem, na ação litúrgica, as leis que regulam a celebração válida e lícita, mas também que os fiéis

participem nela consciente, ativa e frutuosamente.

II - EDUCAÇÃO LITÚRGICA E PARTICIPAÇÃO ATIVA

28. Nas celebrações litúrgicas, limite-se cada um, ministro ou simples fiel, exercendo o seu ofício, a fazer

tudo e só o que é de sua competência, segundo a natureza do rito e as leis litúrgicas.

30. Para fomentar a participação ativa, promovam-se as aclamações dos fiéis, as respostas, a salmodia,

as antífonas, os cânticos, bem como as ações, gestos e atitudes corporais. Não deve deixar de observar-se, a seu tempo, um silêncio sagrado.

A língua litúrgica: traduções

36. § 1. Deve conservar-se o uso do latim nos ritos latinos, salvo o direito particular.

§ 2. Dado, porém, que não raramente o uso da língua vulgar pode revestir-se de grande utilidade para o povo,

quer na administração dos sacramentos, quer em outras partes da Liturgia, poderá conceder-se à língua vernácula

lugar mais amplo, especialmente nas leituras e admonições, em algumas orações e cantos, segundo as

normas estabelecidas para cada caso nos capítulos

seguintes.

Roma, 4 de dezembro de 1963 PAPA PAULO VI

47 Cfr. Mt 28,20. 48 Oração depois da comunhão na Vigília Pascal e no Domingo da Ressurreição. 49 Oração da missa de terça-feira da Oitava de Páscoa. 50 Cfr. 2Cor 6,1.

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IV. Doutrina do Mistério

CASEL, Odo. O Mistério do Culto no Cristianismo.

São Paulo: Edições Loyola, 2009, p. 18-20 e 55-68.

Mas o que é o Mistério divino? O sentido dessa expressão, embora sendo no fundo muito simples,

apresenta três aspectos.

1. O Mistério divino é antes de tudo Deus nele mesmo. É o infinito e o inacessível, três vezes Santo, de

quem nenhum homem pode se aproximar sem morrer. É o Senhor, diante de quem tudo é impuro, segundo a palavra do Profeta: “Eu sou um homem de lábios sujos e moro no meio de um povo de lábios

sujos; meus olhos viram o Rei, o Senhor dos exércitos!” (Is 6,5). E esse Santo dos Santos revela seu mistério, desce até sua criatura a ela revelando-se. Mas essa revelação ainda se dá no mistério, isto é,

Deus se manifesta numa plenitude de graça aos pobres escolhidos por ele, àquele que tem o coração puro. Ele continua sempre se escondendo aos soberbos, àqueles que estão cheios de si. Eis por que esta

revelação vem a ser ela mesma um profundo mistério, pois ela não se dirige abertamente ao mundo

profano, ela mesma se esconde diante deste mundo, doando-se aos eleitos. O Ser de Deus em sua majestade está infinitamente acima do mundo, mais, misericordiosamente, habita

sua criatura, a humanidade. Ele é ao mesmo tempo transcendente e imanente; e, por sua natureza, ultrapassa infinitamente toda criatura; por sua ubiquidade e seu todo-poder, penetra em todas as coisas.

(...)

2. Para o Apóstolo São Paulo, o mistério é a maravilhosa revelação de Deus em Cristo. O Deus que

permanecia escondido no eterno silêncio, aquele que habita uma luz inacessível, que nenhum homem não viu nem pode ver (1Tm 6,16), é aquele que apareceu em natureza humana.

(...)

Cristo é o mistério em pessoa, manifestando em nossa carne humana a divindade que nós não podemos ver. Suas ações humanas, sobretudo sua morte e seu sacrifício na cruz, são um mistério porque aí Deus

se revela de um modo que ultrapassa todo entendimento humano. Sua ressurreição e sua ascensão são um mistério porque a glória divina se manifesta no homem Jesus. Mas tudo isso se reveste de uma

maneira escondido ao mundo e conhecida apenas pela fé. Os apóstolos anunciaram esse Mistério de Cristo, e a Igreja o transmite a todas as gerações. Contudo, da mesma forma que a economia da

salvação não compreende apenas um ensinamento, mas acima de tudo a obra redentora de Cristo,

assim, a Igreja não conduz a humanidade à salvação apenas com a palavra, mas também com ações sagradas. É pela fé e pelos mistérios que o Cristo vive sempre na Igreja.

3. Assim, um terceiro sentido completa os dois primeiros. Desde que o Cristo já não está visível entre

nós, “as presenças do Senhor e Redentor passaram para os mistérios” (“quod redemptoris nostri

conspicuum fuit, in sacramenta transivit”), como se exprime São Leão Magno. A pessoa do Senhor, sua obra redentora, a operação de sua graças, tudo isso possuímos nos mistérios do culto, segundo a palavra

que Santo Ambrósio dirige a Cristo: “É em vossos mistérios que eu vos encontro” (“In tuis te invenio sacramentis”).

(...)

A liturgia dos mistérios

No Mistério de Cristo é Deus que se revela em seu Verbo encarnado para a salvação e a santificação da Igreja. Desde a Ascensão do Homem-Deus até a Parusia final, o Mistério de Cristo continua plenamente

no Mistério do culto, atingindo nele todos os membros da Igreja espalhados no espaço e no tempo. No

Mistério do culto, Cristo, imperceptível aos nossos sentidos, permanece presente de modo espiritual e ativo, oferecendo sua redenção a todos os homens, que se tornaram objeto da benevolência de Deus (Lc

2,14). Portanto, é o próprio Senhor quem opera o Mistério do culto. Mas ele não opera sozinho, como cumpriu o

Mistério da cruz. Ele aí associa a Igreja, Esposa que conquistou com seu sangue (Ef 5,14ss). Ele entregou a ela o depósito de todos os seus tesouros, a fim de que ela os transmita e distribua a todos os seus

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filhos, àqueles que pela virtude de seu Esposo ela dará a vida. Desde a Encarnação, aquele que quer ter

Deus como Pai deve ter a Igreja por Mãe. Da mesma forma que no Paraíso a mulher foi tirada do lado do primeiro Adão, para se tornar sua auxiliar semelhante a ele, assim a Igreja foi formada do lado de Cristo

adormecido na cruz, para ser daí por diante sua associada e sua auxiliar na obra da redenção divina. Mas, segundo o ensinamento dos Padres, no momento em que nasceu a Igreja, também os mistérios

brotaram, no sangue e na água, do lado do Senhor, de seu coração transpassado. A Igreja e o mistério

nasceram ambos do sangue de Cristo morrendo e permanecem inseparavelmente unidos. É neste fato que encontramos a razão última pela qual o mistério do culto torna-se liturgia. Em grego, a palavra “liturgia” (ληιτουργία) significa em sua origem uma prestação individual de serviço ao

Estado, como por exemplo o encargo de equipar um navio de guerra ou, ainda, o de criar um coro para

as tragédias em honra do deus Dionísio. Designava ainda o “serviço” em geral e, especialmente, o serviço a Deus no culto oficial. As Sagradas Escrituras do Antigo e do Novo Testamento empregaram-na com

este último sentido. Zacarias, por exemplo, cumpria a “liturgia” no Templo (Lc 1,23), quando o anjo lhe

anunciou o nascimento de são João Batista. Em sua Epístola aos Coríntios, são Clemente de Roma fala da liturgia sob a Lei e estabelece que a ordem desta liturgia deve ser a figura e o modelo daquela da Nova

Aliança. Se, com Cristo, toda a vida tornou-se um serviço a Deus, fica estabelecido então que as diretivas deste Padre da Igreja têm em visto sobretudo o serviço divino da comunidade cristã reunida para o culto.

(...) Comparados entre eles, os termos “mistério” (se o tomamos no sentido de

mistério do culto) e “liturgia” significam a mesma coisa, mas de um ponto

de vista diferente. O “mistério” antes de tudo coloca à luz toda a própria essência da ação sagrada, isto é, a obra redentora que o Senhor glorioso

opera e aplica pelos ritos sagrados que instituiu. O termo “liturgia”, de acordo com sua etimologia (função do povo, serviço), designa mais

especificamente a parte que toca à Igreja nessa ação redentora de Cristo.

Vimos acima como Cristo e sua Igreja estão estreita e inseparavelmente unidos na ação do Mistério. Podemos, todavia, pela palavra “mistério”

caracterizar, antes, a parte do Esposo, e pela palavra “liturgia” a parte da Esposa, sem toca, contudo, o fundo das coisas. Pois a ação da Igreja

também é mistério; é ela que cumpre os ritos exteriores e sensíveis, enquanto Cristo opera neles e por eles. Contudo, permitimo-nos reservar o termo “liturgia” para

expressar mais especialmente a atividade cultual da Igreja.

Coloca-se agora a questão de como o mistério da Nova Aliança tornou-se liturgia. Acima já entrevimos a resposta de como Cristo remeteu e confiou seus mistérios à Igreja. Eis como o

santo Concílio de Trento se expressa sobre este aspecto:

“O novo sumo sacerdote, Jesus Cristo, devia, de uma vez por todas, sofrendo a morte da cruz, oferecer-se a Deus, seu Pai, a fim de para todos operar uma Redenção eterna. Mas esta morte nunca deveria extinguir seu sacerdócio. Eis por que, na última Ceia, na noite mesma de sua entrega, ele quis deixar à Igreja, sua Esposa amada, um sacrifício que tomou presente e comemorou, até o final dos tempos, aquele que deveria cumprir, de uma vez por todas, de maneira sangrenta na cruz. Um sacrifício que aplicava a virtude redentora à remissão dos pecados que cometemos todos os dias. Expressando que ele foi constituído sacerdote para a eternidade, como Melquisedec, ele ofereceu a Deus, seu Pai, sob as espécies do pão e do vinho, seu corpo e seu sangue e, sob as figuras dessas mesmas espécies, ele deu aos seus apóstolos de comer e de beber. Ao mesmo tempo, ele os instituía sacerdotes da Nova Aliança, a estes sacerdotes como aos seus sucessores, ele ordenava que se oferecesse o mesmo sacrifício. Como sempre acreditou e ensinou a Igreja católica, ele lhes ordenou com estas palavras: Fazei isto em minha memória. Com efeito, depois de ter celebrado a antiga páscoa que o povo dos filhos de Israel imolava em memória da saída do Egito, Jesus Cristo instituiu a Páscoa nova: isto era sua própria imolação realizava sob sensíveis sinais, que a Igreja, pelas mãos dos sacerdotes, deveria repetir em memória de sua passagem deste mundo para o Pai; assim que pela efusão de seu sangue ele nos remia e nos arrancava do poder das trevas, introduzindo-nos no seu reino.”

Seria de um interesse real expor, com a ajuda de um exemplo, esta evolução do mistério para a liturgia.

Mas devemos nos contentar em esboçar este desenvolvimento em seus traços gerais. O Senhor exige em renascimento para nos conceder a entrada em seu reino, pois o homem, em seu

estado natural, não pode se aproximar de Deus sem antes ter sido transformado. O velho homem deve morrer; o novo, nascido de Deus deve ressuscitar. Aquele que não nascer da água e do Espírito não pode

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entrar no reino de Deus. O Espírito é o sopro da vida divina, de onde procede nossa vida sobrenatural;

ele é o próprio Deus, mas ele é também a vida divina insuflada, que habita no homem novo. Isto mostra que não se trata de uma conversão da vontade que nos torna cristãos, mas uma maneira de ser

totalmente nova, uma vida nova, uma “participação na natureza divina”, segundo São Pedro. Até aqui permanecemos no reino da graça e da invisível vida divina. Mas Nosso Senhor disse que o

homem deveria nascer de novo, renascer “da água”. Assim aparece portanto o Mistério do culto. Pois

esse renascimento pela água, no domínio da ação divina e sobrenatural, é a expressão exterior e sensível do nascimento interior e espiritual pelo Espírito. O renascimento pela água tem um valor simbólico e não

um valor próprio e natural. No entanto, o Senhor declarou esse símbolo absolutamente indispensável. Com efeito, sem esse ato exterior não seria possível reconhecer a operação divina, interior e invisível.

Esse ato necessário, objetivo, discernível aos nossos sentidos, essa imersão na água é requisitada porque

ela garante a realidade da regeneração divina e espiritual. Ao mesmo tempo, diante da comunidade, ela produz um testemunho indispensável – um novo membro nasceu.

Contudo, seria um grave erro acreditar que uma imersão pura e simples na água pudesse significar a graça divina. A água é um elemento da terra, muito material, para em si ordenar tal fim, sozinha ela não

pode significar coisa de uma ordem tão elevada. É preciso que haja um elemento superior, vindo do alto, para determinar, precisar e informar o ato material. Justamente aqui está o papel do Espírito, que o

Senhor menciona ao mesmo tempo que a água. O que há de mais expressivo que a palavra para

significar o Espírito, tão etéreo e simples, segundo o Senhor em São João? A palavra é a expressão alada do pensamento. Ela é o logos dos antigos, isto é, o espírito expresso, e como tal ela é aparentada ao

próprio espírito, pois frequentemente logos e pneuma são equivalentes. A palavra, que é do alto, anuncia com clareza o que o elemento material significa de uma maneira sensível. É preciso o concurso de

ambos: a água e a palavra, para formar o Mistério. “Se eliminarmos a palavra, resta somente a água. À

palavra acrescenta-se a matéria e a realidade do mistério aparece, sendo ele como uma palavra visível. De onde tira a água uma tal virtude que, tocando o corpo, purifica o coração? Evidentemente, do poder

da palavra”.

(...)

A essência do Mistério, o que constitui o mysterium propriamente dito, significa as ações e as palavras

instituídas pelo Senhor. Mas o Senhor, para ensinar e espargir a salvação conquistada ao preço de seu sangue, não quis criar algo absolutamente novo. Ele antes quis se conformar à velha tradição, extraída

do próprio coração humano. Ele serviu-se dos costumes e das formas consagradas por um consentimento universal das religiões antigas. Mas a tudo isso ele trouxe um novo clarão, uma nobreza e uma dignidade

até então desconhecidas. Todo simbolismo antigo, sob a ação de Cristo, sofreu uma reformulação

completa. Ao longo de toda a história da humanidade, encontramos, por exemplo, a ideia e mesmo a forma de um certo batismo, mais ou menos vivas, segundo a necessidade de purificação e o desejo de

uma vida santa que buscavam sua realização no símbolo. Os ritos exteriores, assim como os elementos que entram em sua realização, impõem-se por eles mesmos, por assim dizer. De um lado, são gestos

simples, tirados da vida humana, por outro produtos naturais da terra. A água é sempre água; quer

utilizada nas cerimônias de purificação profanas, quer adotada para os atos altamente simbólicos, ela sempre guarda sua natureza e seus efeitos próprios.

A palavra é mais livre, imaterial, mas permanece ligada a uma língua estabelecida. Para fazer-se compreender, Deus se revela aos homens numa linguagem humana. A liturgia faz a mesma coisa; ela

emprega expressões, formas e gestos que tornam inteligível o que se cumpre espiritualmente no Mistério divino. Quanto aos textos rituais, a liturgia os escolheu no depósito incomparável das Sagradas

Escrituras, neste tesouro em que o próprio Espírito de Deus anuncia o Evangelho da salvação por meio

da língua dos homens. Um grande número de passagens das Escrituras passou, assim, sem nenhuma modificação para a liturgia e aí encontraram um quadro novo e uma nova vida. Liberadas da letra morta,

muitas dessas palavras sagradas reencontraram sua primeira vitalidade. Isso se aplica sobretudo aos textos do Antigo Testamento, pois eles só recebem sua definitiva luz e revelam sua riqueza maravilhosa

graças à liturgia do Mistério do Cristo. Por exemplo, na noite de Natal, quando lemos as passagens de

Isaías que falam do mistério da Encarnação, toda a realidade torna-se presente e concreta; assistimos, de certa forma, ao admirável cumprimento das profecias longínquas e obscuras. A exposição alegórica e

espiritual da Escritura encontra aqui a mais elevada aplicação de toda a sua razão de ser. A aparição de Cristo é a chave de todas as coisas. Já não nos chama a atenção unicamente a letra, que mata, mas por

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trás dela percebemos e sentimos o Espírito que vivifica. O caráter pneumático das Sagradas Escrituras

revela-se verdadeiramente melhor na liturgia. Na liturgia, todas as palavras cantam o louvor e a glória do Mistério de Cristo; elas pintam a vida dos fiéis em seu Senhor e Salvador. A palavra dos Livros sagrados

renasce assim do coração da Igreja e dela recebe um crescimento de poder e vida. Nas palavras dos Profetas agora soa a voz de Cristo, e a voz da Esposa se une à do Esposo. A palavra humana se apaga e

passa ao momento mesmo em que nasce. A Palavra de Deus, ao contrário, possui a imutabilidade divina;

ela guarda sempre a sua virtude e sem cessar é sempre gravada nas almas santas e fiéis que vivem na Igreja. Ela forma um depósito venerável e nas almas ela brota como uma juventude eterna, como se a

cada instante acabasse de ser proferida pelo Espírito, que sopra onde quer. Objeta-se frequentemente que as fórmulas antigas na oração perdem sua espontaneidade, impedindo o elo do coração. Seja como

for, não é o caso da oração litúrgica, pois na liturgia as antigas palavras surgem frescas e límpidas do

coração da Igreja, do coração da Esposa eternamente jovem, virginal e sem rugas.

(...)

Toda a humanidade e toda a criação “serviam ao mistério de Cristo”, como se expressa o Ritual romano da bênção da água. Da mesma forma que cada elemento material apresentava à liturgia suas

propriedades, assim também a humanidade oferecia formas religiosas tais que os povos, as raças e as

diversas épocas lhe tinham oferecido. O cristianismo é tão “católico”, isto é, universal, que, malgrado sua intangível unidade dogmática e moral, lhe é possível e mesmo natural expressar-se por meio de uma

grande diversidade de formas. O mesmo acontece com a expressão litúrgica, diferentemente daquela da antiga Roma: séria e refletida, sóbria e apaixonada por grandeza; da do oriental: penetrante, mística e

efervescente; da dos gauleses: fina, poética, leve e expansiva; enfim, da dos germânicos: profunda,

voluntária e sonhadora. Citamos apenas algumas, mas cada povo possui seus traços e suas características próprios, manifestando seu gosto e suas preferências até mesmo na liturgia, oferecendo

assim sua originalidade em homenagem ao Senhor.

(...)

É verdadeiramente toda a Igreja e não só o clero que deve tomar

parte ativamente na liturgia, contudo segundo sua ordem sagrada, no setor e na medida estabelecida. Todos os membros são de

maneira físico-sacramental unidos e incorporados ao Chefe, à Cabeça que é Cristo. Pelo caráter sacramental do Batismo e pela

Confirmação, cada fiel participa do sacerdócio de Cristo.

Isso quer dizer que o leigo não pode se contentar com uma piedade individualista, com uma oração privada, quando ele participa da

liturgia que o padre celebra. Em virtude de sua incorporação ao Corpo místico de Cristo, ele é membro necessário e indispensável, de certa forma, à comunidade cultual

e litúrgica. E para dar sua perfeita participação o fiel deve evidentemente atualizar seu sacerdócio

objetivo e viver em comunhão de modo pessoal com o mistério. A experiência psicológica nos ensina que a reação interior e vital é cada vez maior e mais forte quando o ato exterior correspondente se coloca

com mais consciência e vontade. Podemos assim viver um canto escutando-o, mas se o executamos nós mesmos a alma vibra diferente e mais facilmente.

Na liturgia, a participação interior, sem dúvida, deve ter um papel decisivo – o que não exige absolutamente uma parte exterior. Mas, se queremos tornar intensa e viva a comunhão interior, se

queremos dar todo seu significado à expressão simbólica, tudo indica que a participação exterior à ação

litúrgica se impõe realmente. Todavia se requer, conforme as leis fundamentais do próprio Corpo místico, que cada membro observe o

seu papel e se mantenha nos limites de suas atribuições, agindo segundo a medida das graças que lhe são distribuídas. Os leigos nunca devem se arrojar a exercer funções próprias dos sacerdotes. Cada

estado deve guardar a ordem estabelecida; as coisas não estão indistintamente postas ao serviço de todo

mundo. Não é preciso também que tenhamos acesso a tudo, por mais proveitoso que possa ser, nem que seja lícito a cada um entrar por sua própria vontade nos segredos do santuário. O Mistério

permanecerá sempre Mistério, e ele só se revela às almas puras e humildemente desejosas de encontrar o Senhor. A elas, ele se manifestará, mas sempre progressiva e organicamente. Não pregamos, aqui,

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nenhum “esoterismo”, mas evidentemente não é pela formação intelectual ou pela cultura estética que

alcançamos a verdadeira inteligência dos Mistérios cristãos, mas pela humildade, pela pureza do coração e pelo abandono a Cristo e à Igreja. A natureza mesma dos Mistérios tem, aliás, algo de muito popular,

pois o povo ama as coisas concretas e a elas se prende e, ao mesmo tempo, entrega de bom grado sua fé ao misterioso, no qual ele percebe o divino.

Segundo os Padres da Igreja, o conhecimento dos Mistérios comporta graus e para simbolizar tais graus

somente os sacerdotes ocupam o santuário ao redor do altar, os monges e as virgens consagradas ocupam lugares atrás, enquanto o povo fiel se mantém na nave.

(...)

Devemos encorajar a louvável intenção de levar o povo à participação ativa na liturgia divina, sim, mas é preciso que esse esforço não degenere numa tendência democrática de colocar todo mundo em pé de

igualdade. A hierarquia, a ordem sagrada das dignidades e dos valores devem ser conservadas e mantidas em nossa santa liturgia. Somente assim cria-se a verdadeira comunidade da Igreja, pois a

comunidade não é formada sobre uma comunicação de bens pura e simples, mas sobre uma mútua solidariedade. A razão da comunidade, com efeito, não é que tenham todos a mesma coisa, mas que se

dê o supérfluo àquele que não tem e que ele preencha sua própria indigência pela abundância do

outrem. Essa entreajuda recíproca constitui o princípio do exercício da caridade. Esses dons possuídos e comunicados mutuamente contribuem para a edificação do Corpo místico, como afirma São Paulo: ...

unido e coordenado por todos os laços dos membros, que se prestam mútuo auxílio, e dentro da atividade proporcionada a cada um, todo o corpo cresce e se aperfeiçoa na caridade (Ef 4,16).

O santo Mistério é a representação mais concreta do Corpo místico, ao mesmo tempo em que é a

suprema atividade: a Cabeça e os membros se unem e não formam senão um, para oferecer o sacrifício ao Pai, para o qual sobem, pelo Filho e no Espírito Santo, toda honra e toda glória. Do Pai descem sobre

a Ecclesia, por Cristo, no Espírito, todas as graças e bênçãos. Eis por que a inteligência cada vez mais profunda e a participação cada vez mais viva no mysterium devem tornar-se o centro mesmo da vida

cristã e constituir este sacrifício soberanamente agradável a Deus, como diz um sermão pascal de São Gregório Nazianzeno:

“Nós temos de apresentar uma oferenda àquele que sofreu e ressuscitou por nós. Não pensais que eu sonho com o ouro e a prata, ou com algum tecido de valor, ou ainda com pedras preciosas e brilhantes – tudo isso é matéria terrestre e efêmera e, com frequência, nas mãos dos maus e dos escravos do mundo. O que queremos oferecer é nós mesmos, o único dom precioso e agradável a Deus. Ofereçamos ao nosso divino Modelo o que é digno dele, nosso estado de semelhança; reconheçamos nossa própria dignidade e esforcemo-nos para honrar nosso divino Modelo; penetremos no sentido e no poder do Mistério e compreendamos por que Cristo morreu. Sejamos como Cristo, tornemo-nos semelhantes a ele, pois ele se fez semelhante a nós. Elevemo-nos até a sua divindade, por causa dele, pois ele mesmo se fez homem por nós... Que cada um ofereça, portanto, tudo que possui àquele que se ofereceu em troca de nós e como resgate por nós. Não podemos oferecer nada melhor que o dom total de nós mesmos numa inteligência perfeita do Mistério e na vontade de tornar-se por amor a Cristo aquilo que ele mesmo se tornou por nós.”

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V. Experimentar a Liturgia – dimensão corporal

Romano Guardini:

FLORES, Juan Javier. Introdução à Teologia Litúrgica.

São Paulo: Paulinas, 2006, p. 132 a 138.

No prefácio da obra “Os sinais sagrados”, Romano Guardini declara que “na liturgia não se trata de conceitos, mas de realidades presentes, de realidades humanas em figura e gesto”. Também em sua

obra “Espírito da Liturgia”, de 1918, tratou da capacidade simbólica, que com o progresso da história se

foi perdendo gradualmente, e nisso vê a causa da decadência da vida litúrgica. Entre outras coisas, falou precisamente da relação simbólica que seria propriamente a relação alma-corpo:

“O símbolo surge quando o interno e espiritual encontra sua expressão externa e sensível. No entanto,

não basta o fato de que um conteúdo de ordem espiritual esteja arbitrariamente ligado a algo material, por convênio consuetudinário, como, por exemplo, a ideia de justiça, representada por uma balança.

Para que o símbolo exista, é precisa que a transposição, que a projeção do interno para o exterior se

verifique com caráter de necessidade essencial e obedeça a uma exigência da natureza. Dessa maneira, o corpo, por sua própria condição natural, transforma-se em imagem expressiva da alma.”

A implicação de todo o ser humano é possível precisamente porque a liturgia tem em si mesma uma

força simbolizadora que se expressa em gestos religiosos, em ações rituais e também em objetos que

intensificam e ampliam no espaço gestos e ações.

Por ser a liturgia uma realidade de vida, não podemos nos aproximar dela como de um objeto que tem de ser explicado, como se fosse um elemento isolável e depois analisável. Também não é suficiente uma

pesquisa histórica carente da paixão hermenêutica. O único método é o de reviver a experiência e, ao

revivê-la, deixá-la falar. Portanto, para captar o sentido verdadeiro da liturgia, o único método é realizar o mesmo ato, isto é, reviver o que se realiza na ação litúrgica e deixar falar o que no ser humano se vê,

que corresponde ao que se realiza; o método é uma tarefa vital. A liturgia é mestra. Introduz plenamente na verdade, mediante a oração; mais ainda, ela mesma não é mais do que o dogma orado, “a verdade

revivida orando”.

“A liturgia é um mundo de acontecimentos misteriosos e santos transformados em figura sensível: por

isso tem um caráter sobrenatural. O caminho que conduz à vida litúrgica não se explica através da mera instrução teórica, mas é oferecido, sobretudo, pela prática.”

“Seja-me permitido narrar uma pequena experiência minha. Faz muitos anos, encontrava-me no Sábado

Santo, no maravilhoso Duomo de Monreale, em Palermo. A liturgia desenvolvia-se com toda solenidade.

Crianças eram batizadas, sacerdotes eram ordenados. Depois de várias horas, eu estava no limite da minha capacidade receptiva, confesso. Mas o povo certamente não estava. Ninguém tinha em suas mãos

um livro, um rosário, mas todos estavam vivamente presentes. Num dado momento, voltei-me e olhei todos aqueles olhos dirigidos para a função sagrada. Nunca mais esqueci os aspectos daqueles olhos

abertos: afastei-me imediatamente deles, como se não me fosse permitido olhá-los. Ali estava ainda a antiga capacidade de viver olhando. Naturalmente, aquelas pessoas também pensaram e oraram;

olhando, porém, e sua oração era oração contemplativa.

Uma capacidade semelhante com o progresso da história foi-se perdido em grande parte. De olhar passou-se a observar e comprovar, com os quais se vai ordenando e elaborando o trabalho do intelecto

abstrato. Porém desse modo não se realizava toda a essência da liturgia e essa foi a causa da decadência da vida litúrgica.

Essa capacidade, porém, não pode nem deve ser perdida para sempre. O ser humano continua sendo ser

humano. Seu olho é um olho de ser humano, dado pelo Pai das luzes e destinado a ser transformado.”

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Bento XVI:

Discurso no Encontro com Sacerdotes da diocese de Albano, em Castelgandolgo, 31.08.2006.

Ars celebrandi: também neste aspecto diria que existem diversas dimensões. A primeira é que a

celebratio é oração e diálogo com Deus: Deus está conosco e nós com Deus. Portanto, a primeira

exigência para uma boa celebração é que o sacerdote entre realmente neste diálogo. Anunciando a Palavra, sente-se ele mesmo em diálogo com Deus. É ouvinte da Palavra e anunciador da Palavra, no

sentido de que se torna instrumento do Senhor e procura compreender esta Palavra de Deus que depois de deve transmitir ao povo. É um diálogo com Deus, porque os textos da Santa Missa não são textos

teatrais ou algo semelhante, mas são orações, graças às quais, juntamente com a assembleia, falo com

Deus. Portanto, entrar neste diálogo é importante. São Bento, na sua Regra, diz aos monges, falando da recitação dos salmos: “Mens concordet voci”. A vox, as palavras precedem a nossa mente. Normalmente

não é assim: primeiro temos que pensar e depois o pensamento torna-se palavra. A Sagrada Liturgia dá-nos as palavras; nós devemos entrar nessas palavras, encontrar a concórdia com esta realidade que nos

precede.

Além disto, devemos também aprender a compreender a estrutura da Liturgia e por que está articulada

desta forma. A Liturgia cresceu em dois milênios e também depois da reforma não se tornou algo elaborado apenas por alguns liturgistas. Ela permaneceu sempre continuação deste crescimento

permanente da adoração e do anúncio. Assim, é muito importante, para nos podermos sintonizar bem, compreender esta estrutura que cresceu no tempo e pensar com a nossa mens na vox da Igreja. Na

medida em que interiorizamos esta estrutura, compreendemos esta estrutura, assimilamos as palavras da

Liturgia, podemos entrar nesta consonância interior e assim não só falar com Deus como pessoas individualmente, mas entrar no “nós” da Igreja que reza. Desta forma transformamos também o nosso

“eu” entrando no “nós” da Igreja, enriquecendo, alargando este “eu”, rezando com a Igreja, com as palavras da Igreja, estando realmente em diálogo com Deus.

Esta é a primeira condição: nós próprios devemos interiorizar a estrutura, as palavras da Liturgia, a

Palavra de Deus. Assim o nosso celebrar torna-se realmente um celebrar “com” a Igreja: o nosso coração

alarga-se e nós não fazemos algo, mas estamos “com” a Igreja em diálogo com Deus.

Parece que as pessoas sentem se nós estamos verdadeiramente em diálogo com Deus, com elas e, por assim dizer, atraímos os outros nesta nossa oração comum, atraímos os outros para a comunhão com os

filhos de Deus; ou se, ao contrário, fazemos apenas algo de aparente. O elemento fundamental da

verdadeira ars celebrandi é esta consonância, esta concórdia entre o que dizemos com os lábios e o que pensamos com o coração. O Sursum corda, que é uma antiquíssima palavra da Liturgia, deveria ser já

antes do prefácio, antes da Liturgia, o “caminho” do nosso falar e pensar. Devemos elevar ao Senhor o nosso coração, não só como uma resposta ritual, mas como expressão de quanto acontece neste

coração, que se eleva e, na elevação, atrai também os outros.

Por outras palavras, a ars celebrandi não pretende convidar para uma espécie de teatro, de espetáculo,

mas para uma interioridade que se faz sentir e se torna aceitável e evidente para o povo que assiste.

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VI. Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas

CAPÍTULO 1: IMPORTÂNCIA DA LITURGIA DAS HORAS OU

O OFÍCIO DIVINO NA VIDA DA IGREJA

1. A oração pública e comunitária do povo de Deus é com razão considerada uma das principais funções

da Igreja. Daí que, logo no princípio, os batizados “eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fração do pão e às orações” (At 2, 42). Da oração unânime da comunidade cristã nos dão

repetidos testemunhos os Atos dos Apóstolos.

Que também os fiéis se costumavam entregar à oração individual em determinadas horas do dia, provam-no igualmente os documentos da primitiva Igreja. Depois foi-se introduzindo muito cedo, aqui e

além, o costume de consagrar à oração comunitária alguns tempos especiais, por exemplo, a última hora do dia, ao entardecer, no momento em que se acendiam as luzes, e a primeira hora da manhã, quando,

ao despontar o astro do dia, a noite chega ao seu termo. Com o decorrer dos tempos, foram-se ainda santificando pela oração comunitária outras horas, que os

Padres viam insinuadas na leitura dos Atos dos Apóstolos. Assim, os Atos falam-nos dos discípulos

reunidos [para a oração] à terceira hora; o Príncipe dos Apóstolos “sobe ao terraço da casa para orar, por volta da sexta hora” (10, 9); “Pedro ... e João sobem ao templo, para a oração da hora nona” (3, 1); “a

meio da noite, Paulo e Silas, em oração, entoavam louvores a Deus” (16, 25).

2. Estas orações, feitas em comunidade, foram-se progressivamente organizando, até que vieram a

constituir um ciclo horário bem definido. Esta Liturgia das Horas, ou Ofício Divino, embora enriquecida de leituras, é antes de mais oração de louvor e de súplica: oração da Igreja, com Cristo e a Cristo.

I. A ORAÇÃO DE CRISTO

Cristo, Orante do Pai

3. Vindo ao mundo para comunicar aos homens a vida divina, o Verbo que procede do Pai como esplendor da sua glória, “Sumo Sacerdote da Nova e Eterna Aliança, Cristo Jesus, ao assumir a natureza

humana, introduz nesta terra de exílio o hino que eternamente se canta no Céu”. Desde aquele momento, ressoa no coração de Cristo o louvor divino expresso em termos humanos de adoração,

propiciação e intercessão. E tudo isto Ele apresenta ao Pai, como Cabeça da nova humanidade, Mediador

entre Deus e os homens, em nome de todos, para benefício de todos.

4. O próprio Filho de Deus, que é “um com o Pai” (cf. Jo 10, 30) e que, ao entrar no mundo, disse: “Eu venho, ó Deus, para cumprir a

tua vontade” (Hb 10, 9; cf. Jo 6, 38), quis-nos deixar também

exemplos da sua oração. E assim é que os Evangelhos no-l’O apresentam com muita frequência a orar: quando pelo Pai é revelada

a sua missão, antes de chamar os Apóstolos, quando bendiz a Deus na multiplicação dos pães, no monte, aquando da sua transfiguração,

quando opera a cura do surdo-mudo e ressuscita a Lázaro, antes da confissão de Pedro, quando ensina os discípulos a orar ao regressarem

os discípulos da sua missão, ao abençoar as criancinhas, quando roga

por Pedro. A sua atividade quotidiana vemo-la estreitamente ligada à oração,

como que nasce da oração; levanta-Se alta madrugada ou fica pela noite além, até à quarta vigília, entregue à oração a Deus.

Temos, além disso, justos motivos para crer que tomava parte nas

orações que publicamente se faziam nas sinagogas, onde «tinha por costume» ir aos sábados, ou no templo, ao qual chamava casa de

coração, e bem assim nas orações que os piedosos israelitas costumavam fazer diariamente em particular. Recitava também às refeições as tradicionais “bênçãos” a Deus, como expressamente vem

narrado na multiplicação dos pães, na última Ceia, na ceia de Emaús; e (na última Ceia) cantou os salmos com os discípulos.

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Até aos derradeiros momentos da sua vida — próximo já da Paixão, na última Ceia, na agonia, na Cruz —

o Divino Mestre apresenta-nos a oração como sendo a alma do seu ministério messiânico e do termo pascal da sua vida. Assim, “nos dias da sua vida mortal, apresentou orações e súplicas, entre clamores e

lágrimas, Àquele que O podia livrar da morte, e foi atendido pela sua piedade” (Hb 5, 7); e, mediante a oblação perfeita consumada na ara da cruz, “realizou a perfeição definitiva daqueles que são

santificados” (Hb 10, 14); finalmente, ressuscitado de entre os mortos, continua sempre vivo a interceder

por nós.

II. ORAÇÃO DA IGREJA

Preceito da oração

5. Aquilo que Jesus fez, isso mesmo ordenou fizéssemos nós. “Orai” — diz repetidas vezes — “rogai”, “pedi”, “em meu nome”. E até nos deixou, na oração dominical, um modelo de oração. Inculca a

necessidade da oração, oração humilde, vigilante, perseverante e cheia de confiança na bondade do Pai, feita com pureza de intenção, consentânea com a natureza de Deus.

Os Apóstolos, por sua vez, apresentam-nos com frequência, em suas Epístolas, fórmulas de oração,

mormente de louvor e ação de graças, e exortam-nos a orar no Espírito Santo, pela mediação de Cristo, ao Pai, com perseverança e assiduidade; sublinham a eficácia da oração para alcançar a santidade;

exortam à oração de louvor, de ação de graças, de súplica, de intercessão por todos os homens.

A Igreja continuadora da oração de Cristo

6. Vindo o homem inteiramente de Deus, é seu dever reconhecer e confessar a soberania do seu Criador.

Assim o fizeram, através da oração, os homens piedosos de todos os tempos. Mas a oração dirigida a Deus tem de estar ligada a Cristo, Senhor de todos os homens, único Mediador, o

único por quem temos acesso a Deus. Ele une a Si toda a comunidade dos homens, e de tal forma que entre a oração de Cristo e a de toda a humanidade existe uma estreita relação. Em Cristo, e só n’Ele, é

que a religião humana adquire valor salvífico e atinge o seu fim.

7. É totalmente peculiar e profunda a união que existe entre Cristo e aqueles que, pelo sacramento da

regeneração, Ele assume como membros do seu Corpo que é a Igreja. Deste modo, partindo da Cabeça, por todo o Corpo se difundem todas as riquezas pertencentes ao Filho: a comunicação do Espírito, a

verdade, a vida, a participação na sua filiação divina, que se manifestava em toda a sua oração enquanto

viveu no meio de nós. O sacerdócio de Cristo é também participado por todo o Corpo da Igreja. Os batizados, mediante a

regeneração e a unção do Espírito Santo, são consagrados como casa espiritual e sacerdócio santo; e por esta forma, ficam habilitados a exercer o culto da Nova Aliança, culto este proveniente, não das nossas

forças, mas dos méritos e dom de Cristo.

“Nenhum dom poderia Deus ter feito aos homens mais valioso do que este: ter-lhes dado por Cabeça o seu Verbo pelo qual criou todas as coisas, e tê-los unido a Ele como membros seus; ter feito com que Ele

seja ao mesmo tempo Filho de Deus e Filho do homem, um só Deus com o Pai e um só homem com os homens. Deste modo, quando falamos a Deus na oração, não podemos separar d’Ele o Filho; e, quando

ora o Corpo do Filho, não pode separar de Si mesmo a Cabeça. E assim, é Ele próprio, o Salvador único do seu Corpo, Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, quem ora por nós, ora em nós e a Ele nós

adoramos. Ora por nós, como nosso Sacerdote; ora em nós, como nossa Cabeça; a Ele oramos, como

nosso Deus. Reconheçamos, pois, n’Ele a nossa voz, e a voz d’Ele em nós”. E é nisto que assenta a dignidade da oração cristã: em participar da piedade mesma do Filho Unigênito

para com o Pai e daquela oração que Ele, durante a sua vida cá na terra expressou por palavras e continua agora, sem interrupção, em toda a Igreja e em cada um dos seus membros, em nome e para

salvação de todo o gênero humano.

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Ação do Espírito Santo

8. A unidade da Igreja orante é realizada pelo Espírito Santo, o mesmo que está em Cristo, em toda a

Igreja e em cada um dos batizados. “É o próprio Espírito que vem em auxílio da nossa fraqueza”; é Ele que “ora por nós com gemidos inefáveis” (Rom 8,26); é Ele mesmo, como Espírito do Filho, que infunde

em nós “o espírito da adoção filial, no qual clamamos: Abba, Pai” (Rm 8,15; cf. Gl 4,6; 1Cor 12,3; Ef

5,18; Jd 20). Nenhuma oração, portanto, se pode fazer sem a ação do Espírito Santo, o qual, realizando a unidade de toda a Igreja, conduz pelo Filho ao Pai.

Caráter comunitário da oração

9. O exemplo e o preceito do Senhor e dos Apóstolos, de orar incessantemente, hão de considerar-se, não como regra puramente legal, mas como um elemento que faz parte da mais íntima essência da

própria Igreja, enquanto esta é uma comunidade e deve expressar, inclusive pela oração, a sua natureza comunitária. Daí que, quando nos Atos dos Apóstolos se fala, pela primeira vez, da comunidade dos fiéis,

esta nos aparece reunida precisamente em oração, “com as mulheres, com Maria, Mãe de Jesus, e seus irmãos” (At 1,14). “A multidão dos crentes era um só coração e uma só alma” (At 4,31); e esta

unanimidade assentava na palavra de Deus, na comunhão fraterna, na oração e na Eucaristia.

É certo que a oração feita a sós no quarto, portas fechadas, é necessária e recomendável, e não deixa nunca de ser oração de um membro da Igreja, por Cristo, no Espírito Santo. Todavia, a oração

comunitária possui uma dignidade especial, baseada nestas palavras de Cristo: “Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles” (Mt 18,20).

III. A LITURGIA DAS HORAS

Consagração do tempo

10. Cristo disse: “É preciso orar sempre, sem desfalecimento” (Lc 18,1). E a Igreja, seguindo fielmente esta recomendação, não cessa nunca de orar, ao mesmo tempo que nos exorta com estas palavras: “Por

Ele (Jesus), ofereçamos continuamente a Deus o sacrifício de louvor” (Hb 13,15). Este preceito é

cumprido, não apenas com a celebração da Eucaristia, mas também por outras formas, de modo particular com a Liturgia das Horas.

Entre as demais ações litúrgicas, esta, segundo a antiga tradição cristã, tem como característica peculiar a de consagrar todo o ciclo do dia e da noite.

11. Ora, uma vez que o fim da Liturgia das Horas é a santificação do dia e de toda a atividade humana, a sua estrutura teve que ser reformada, no sentido de repor cada uma das Horas, tanto quanto possível,

no seu tempo verdadeiro, tendo em conta o condicionalismo da vida moderna. Por isso, “já para santificar realmente o dia, já para rezar as próprias Horas com fruto espiritual, importa

recitá-las no momento próprio, quer dizer, naquele que mais se aproxime do tempo verdadeiro

correspondente a cada Hora canônica”.

Relação entre a Liturgia das Horas e a Eucaristia

12. A Liturgia das Horas alarga aos diferentes momentos do dia o louvor e ação de graças, a memória dos mistérios da salvação, as súplicas, o antegozo da glória celeste, contidos no mistério eucarístico,

“centro e vértice de toda a vida da comunidade cristã”.

A própria celebração eucarística tem na Liturgia das Horas a sua melhor preparação, porque esta suscita e nutre da melhor maneira as disposições necessárias para uma frutuosa celebração da Eucaristia, quais

são a fé, a esperança, a caridade, a devoção, o espírito de sacrifício.

Exercício da função sacerdotal de Cristo na Liturgia das Horas

13. “A obra da redenção e da perfeita glorificação de Deus” realiza-a Cristo no Espírito Santo por meio da

Igreja. E isto, não somente na celebração da Eucaristia e na administração dos Sacramentos, mas

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também, e dum modo primacial, na Liturgia das Horas. Nela está Cristo presente, quando a assembleia

está reunida, quando é proclamada a palavra de Deus, quando “ora e salmodia a Igreja”.

Santificação do homem

14. Na Liturgia das Horas, opera-se a santificação do homem e presta-se culto a Deus, por forma a

estabelecer uma espécie de intercâmbio, um diálogo entre Deus e o homem: “Deus fala ao seu povo, ... e o povo responde a Deus no canto e na oração”.

Aqueles que tomam parte na Liturgia das Horas podem colher dela abundantíssimos frutos de santificação, em virtude da palavra de Deus que nela ocupa lugar importantíssimo. Efetivamente, é da

Escritura Sagrada que são tiradas as leituras; aos salmos se vão buscar as palavras de Deus cantadas na

sua presença; duma forte inspiração bíblica estão repassadas todas as preces, orações e cânticos. Não só quando se lê “aquilo que foi escrito para nossa edificação” (Rm 15,4), mas também quando a

Igreja ora e canta, é alimentada a fé dos participantes e os seus corações elevam-se para Deus, a fim de Lhe oferecerem a homenagem espiritual e d’Ele receberem a graça em maior abundância.

Louvor prestado a Deus, em união com a Igreja celeste

15. Na Liturgia das Horas, a Igreja exerce a função sacerdotal da sua Cabeça, “oferecendo ininterruptamente a Deus o sacrifício de louvor, ou seja, o fruto dos lábios que glorificam o seu nome”.

Esta oração é “a voz da Esposa a falar ao Esposo, e também, a oração que o próprio Cristo, unido ao seu Corpo, eleva ao Pai”. Consequentemente, “todos os que assim rezam desempenham, por um lado, o

ofício da própria Igreja, e, por outro, participam da excelsa honra da Esposa de Cristo, enquanto estão,

em nome da Igreja, diante do trono de Deus, a cantar os divinos louvores”.

16. Cantando os louvores de Deus nas Horas canônicas, a Igreja associa-se àquele hino de louvor que por toda a eternidade é cantado na celeste morada. Ao mesmo tempo antegoza as delícias daquele

celestial louvor que João nos descreve no Apocalipse e que ressoa ininterruptamente diante do trono de Deus e do Cordeiro. Realiza-se a nossa estreita união com a Igreja celeste, quando “concelebramos em

comum exultação os louvores da Divina Majestade, quando todos os que fomos resgatados no sangue de

Cristo, de todas as tribos, línguas, povos e nações (cf. Ap 5,9), congregados numa só Igreja, engrandecemos a Deus, uno e trino, no mesmo cântico de louvor”.

Esta liturgia celeste, já os profetas a anteviram na vitória do dia sem noite, da luz sem trevas: “Já não será o sol a tua luz durante o dia, nem a claridade da lua será a tua luz durante a noite, porque o Senhor

será a tua luz eterna” (Is 60,19; cf. Ap 21,23.25). “Será um dia contínuo, conhecido somente do Senhor,

sem alternância do dia e da noite; ao entardecer, brilhará a luz” (Zc 14,7). Ora, “a última fase dos tempos chegou já para nós (cf. 1 Cor 10,11); a restauração do mundo encontra-se irrevogavelmente

realizada e, em certo sentido, antecipada já no tempo presente”. Pela fé somos instruídos acerca do sentido da própria vida temporal, de tal modo que vivemos, com a criação inteira, na expectativa da

manifestação dos filhos de Deus. Na Liturgia das Horas, proclamamos a nossa fé, exprimimos e

fortalecemos a nossa esperança, e tomamos parte já, de certo modo, na alegria do louvor perene, do dia que não conhece ocaso.

Súplica e intercessão

17. Mas, na Liturgia das Horas, a par do louvor divino, a Igreja expressa igualmente os votos e anseios

de todos os cristãos; mais ainda: roga a Cristo e, por Ele, ao Pai pela salvação do mundo inteiro. E esta

voz não é somente a voz da Igreja; é também a voz de Cristo, uma vez que todas as orações são proferidas em nome de Cristo – “por Nosso Senhor Jesus Cristo”. Deste modo, a Igreja prolonga aquelas

preces e súplicas que o mesmo Cristo fazia nos dias da sua vida mortal; daí, a sua particular eficácia. Não é, portanto, somente pela caridade, pelo exemplo, pelas obras de penitência, mas também pela oração,

que a comunidade eclesial exerce uma verdadeira maternidade para com as almas, no sentido de as

conduzir a Cristo. Isto diz respeito principalmente a todos aqueles que receberam mandato especial de celebrar a Liturgia

das Horas, isto é: os bispos e presbíteros, que têm por dever de ofício orar pela grei que lhes está confiada e por todo o povo de Deus, os outros ministros sagrados e os religiosos.

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Ápice e fonte da atividade pastoral

18. Aqueles que tomam parte na Liturgia das Horas contribuem, através duma misteriosa fecundidade

apostólica, para o incremento do povo de Deus. Efetivamente, o objetivo do trabalho apostólico é conseguir que “todos aqueles que pela fé e pelo batismo se tornaram filhos de Deus se reúnam em

assembleia, louvem a Deus na Igreja, participem no sacrifício, comam a Ceia do Senhor”.

Por esta forma, os fiéis exprimem na sua vida e manifestam aos outros “o mistério de Cristo e a genuína natureza da verdadeira Igreja, que tem como característica peculiar o ser (...) visível e dotada de

riquezas invisíveis, ardorosa na ação e dedicada à contemplação, presente no mundo e, todavia, peregrina”.

Por outro lado, as leituras e as preces da Liturgia das Horas são fonte de vida cristã. Esta vida alimenta-

se na mesa da Escritura Sagrada e nas palavras dos Santos e robustece-se na oração. O Senhor, sem o qual nada podemos fazer, quando O invocamos, dá eficácia e incremento às nossas obras; e assim, dia

após dia, vamos sendo edificados como templo de Deus no Espírito, até atingirmos a medida da idade perfeita de Cristo; ao mesmo tempo, vamos robustecendo as nossas energias para podermos anunciar

Cristo àqueles que estão fora.

Que a mente concorde com a voz

19. Para que esta oração seja própria de cada um daqueles que nela tomam parte, seja fonte de piedade

e da multiforme graça divina e sirva também de alimento à oração pessoal e à atividade apostólica, importa celebrá-la com dignidade, atenção e devoção, e fazer com que o espírito concorde com a voz. É

necessário que todos cooperem com a graça divina, para que não a recebam em vão. Buscando a Cristo

e esforçando-se por aprofundar o seu mistério na oração, louvem a Deus e elevem as suas súplicas com o mesmo espírito com que orava o Divino Salvador.

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VII. Ano Litúrgico

CARTA ENCÍCLICA MEDIATOR DEI (PAPA PIO XII)

150. Assim o ano litúrgico, que a piedade da Igreja alimenta e acompanha, não é uma fria e inerte representação de fatos que pertencem ao passado, ou uma simples e nua evocação da realidade de

outros tempos. É, antes, o próprio Cristo, que vive sempre na sua Igreja e que prossegue o caminho de imensa misericórdia por ele iniciado, piedosamente, nesta vida mortal, quando passou fazendo o bem!

(Cf. At 10,38) com o fim de colocar as almas humanas em contato com os seus mistérios e fazê-las viver

por eles, mistérios que estão perenemente presentes e operantes, não de modo incerto e nebuloso, de que falam alguns escritores recentes, mas porque, como nos ensina a doutrina católica e segundo a

sentença dos doutores da Igreja, são exemplos ilustres de perfeição cristã e fonte de graça divina pelos méritos e intercessão do Redentor; e porque perduram em nós no seu efeito, sendo cada um deles, de

modo consentâneo à própria índole, a causa da nossa salvação. Acresce que a pia Madre Igreja, enquanto propôs à nossa contemplação os mistérios de Cristo, invoca com as suas preces os dons

sobrenaturais pelos quais os seus filhos se compenetram do espírito desses mistérios por virtude de

Cristo. Por influxo e virtude dele podemos, com a colaboração da nossa vontade, assimilar a força vital como ramos da árvore, como membros da cabeça, e progressiva e laboriosamente transformar-nos

"segundo a medida da idade plena de Cristo" (Ef 4,13).

SACROSANCTUM CONCILIUM – CAPÍTULO V: O ANO LITÚRGICO

Sua natureza: o ciclo do tempo

102. A santa mãe Igreja considera seu dever celebrar, em determinados dias do ano, a memória sagrada

da obra de salvação do seu divino Esposo. Em cada semana, no dia a que chamou domingo, celebra a da Ressurreição do Senhor, como a celebra também uma vez no ano na Páscoa, a maior das solenidades,

unida à memória da sua Paixão.

Distribui todo o mistério de Cristo pelo correr do ano, da Encarnação e Nascimento à Ascensão, ao Pentecostes, à expectativa da feliz esperança e da vinda do Senhor.

Com esta recordação dos mistérios da Redenção, a Igreja oferece aos fiéis as riquezas das obras e merecimentos do seu Senhor, a ponto de os tornar como que presentes a todo o tempo, para que os

fiéis, em contato com eles, se encham de graça.

As festas da Virgem e dos Santos

103. Na celebração deste ciclo anual dos mistérios de Cristo, a santa Igreja venera com especial amor, porque indissoluvelmente unida à obra de salvação do seu Filho, a Bem-aventurada Virgem Maria, Mãe

de Deus, em quem vê e exalta o mais excelso fruto da Redenção, em quem contempla, qual imagem puríssima, o que ela, toda ela, com alegria deseja e espera ser.

104. A Igreja inseriu também no ciclo anual a memória dos Mártires e outros Santos, os quais, tendo pela graça multiforme de Deus atingido a perfeição e alcançado a salvação eterna, cantam hoje a Deus no céu

o louvor perfeito e intercedem por nós. Ao celebrar o “dies natalis” (dia da morte) dos Santos, proclama o mistério pascal realizado na paixão e glorificação deles com Cristo, propõe aos fiéis os seus exemplos,

que conduzem os homens ao Pai por Cristo, e implora pelos seus méritos as bênçãos de Deus.

Exercícios de piedade

105. Em várias épocas do ano e seguindo o uso tradicional, a Igreja completa a formação dos fiéis

servindo-se de piedosas práticas corporais e espirituais, da instrução, da oração e das obras de penitência e misericórdia.

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Por isso, aprouve ao sagrado Concílio determinar o seguinte: Domingo e festas do Senhor

106. Por tradição apostólica, que nasceu do próprio dia da Ressurreição de Cristo, a Igreja celebra o

mistério pascal todos os oito dias, no dia que bem se denomina dia do Senhor ou domingo. Neste dia

devem os fiéis reunir-se para participarem na Eucaristia e ouvirem a palavra de Deus, e assim recordarem a Paixão, Ressurreição e glória do Senhor Jesus e darem graças a Deus que os “regenerou

para uma esperança viva pela Ressurreição de Jesus Cristo de entre os mortos” (1Pd 1,3). O domingo é, pois, o principal dia de festa a propor e inculcar no espírito dos fiéis; seja também o dia da alegria e do

repouso. Não deve ser sacrificado a outras celebrações que não sejam de máxima importância, porque o

domingo é o fundamento e o centro de todo o ano litúrgico.

107. Reveja-se o ano litúrgico de tal modo que, conservando-se ou reintegrando-se os costumes tradicionais dos tempos litúrgicos, segundo o permitirem as circunstâncias de hoje, mantenha o seu

caráter original para, com a celebração dos mistérios da Redenção cristã, sobretudo do mistério pascal, alimentar devidamente a piedade dos fiéis. Se acaso forem necessárias adaptações aos vários lugares,

façam-se segundo os art. 39 e 40.

108. Oriente-se o espírito dos fiéis em primeiro lugar para as festas do Senhor, as quais celebram

durante o ano os mistérios da salvação e, para que o ciclo destes mistérios possa ser celebrado no modo devido e na sua totalidade, dê-se ao Próprio do Tempo o lugar que lhe convém, de preferência sobre as

festas dos Santos.

A Quaresma

109. Ponham-se em maior realce, tanto na Liturgia como na catequese litúrgica, os dois aspectos

característicos do tempo quaresmal, que pretende, sobretudo através da recordação ou preparação do Batismo e pela Penitência, preparar os fiéis, que devem ouvir com mais frequência a Palavra de Deus e

dar-se à oração com mais insistência, para a celebração do mistério pascal. Por isso:

a) utilizem-se com mais abundância os elementos batismais próprios da liturgia quaresmal e retomem-se,

se parecer oportuno, elementos da antiga tradição;

b) o mesmo se diga dos elementos penitenciais. Quanto à catequese, inculque-se nos espíritos, de par

com as consequências sociais do pecado, a natureza própria da penitência, que é detestar o pecado por ser ofensa de Deus; nem se deve esquecer a parte da Igreja na prática penitenciai, nem deixar de

recomendar a oração pelos pecadores.

110. A penitência quaresmal deve ser também externa e social, que não só interna e individual. Estimule-

se a prática da penitência, adaptada ao nosso tempo, às possibilidades das diversas regiões e à condição de cada um dos fiéis. Recomendem-na as autoridades a que se refere o art. 22.

Mantenha-se religiosamente o jejum pascal, que se deve observar em toda a parte na Sexta-feira da

Paixão e Morte do Senhor e, se oportuno, estender-se também ao Sábado santo, para que os fiéis possam chegar à alegria da Ressurreição do Senhor com elevação e largueza de espírito.

As festas dos santos

111. A Igreja, segundo a tradição, venera os Santos e as suas relíquias autênticas, bem como as suas imagens. É que as festas dos Santos proclamam as grandes obras de Cristo nos seus servos e oferecem

aos fiéis os bons exemplos a imitar.

Para que as festas dos Santos não prevaleçam sobre as festas que recordam os mistérios da salvação,

muitas delas ficarão a ser celebradas só por uma igreja particular ou nação ou família religiosa, estendendo-se apenas a toda a Igreja as que festejam Santos de inegável importância universal.

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O Domingo “Devido à tradição apostólica que tem origem no próprio dia da ressurreição de Cristo, a Igreja celebra o mistério pascal a cada oitavo dia, no dia chamado com razão o dia do Senhor, ou domingo. O dia da ressurreição de Cristo é ao mesmo tempo o primeiro dia da semana, memorial do primeiro dia da criação, e o oitavo dia, em que Cristo, depois do seu repouso do grande sábado, inaugura o dia que o Senhor fez, o dia que não conhece ocaso. A Ceia do Senhor é o seu centro, pois é aqui que toda a comunidade dos fiéis se encontra com o Senhor ressuscitado, que os convida ao seu banquete.” (CIgC 1166)

GUARDINI, Romano. El domingo, ayer, hoy y siempre. Buenos

Aires: Editorial Lumen, 1992, p. 33 a 37, tradução não oficial.

O dia do Senhor na nova Aliança

Como aparece o dia do Senhor na ordenação do Cristianismo? O Filho do Pai eterno se fez homem,

obedecendo à sua vontade, em tudo semelhante a nós. Assumiu o mundo em sua existência. Sem

pecado, ele mesmo se colocou na situação que vem do pecado e experimentou-a sofrendo. Nesta existência, amou o Pai com amor perfeito e, com isso, voltou a orientar o mundo a Deus, que, segundo a

ideia de Santo Agostinho, precipitou-se ao nada, apartando-se de Deus. O que ocorreu assim no espírito, no coração, no amor de Jesus, era a Redenção na essência, dada com a própria existência do Deus-

homem. Ao contrário, a forma histórica que havia de encontrar a Redenção dependia de como receberiam os homens a mensagem de Deus. Conforme sua conduta, Ele aceitaria a vontade do Pai.

Jesus não fez nada para influenciar sua tomada de posição; nada que não fosse a pura manifestação da

verdade de Deus, da evidenciação de seu amor, da irradiação da sua santidade. Nada de violência, de excesso de persuasão, de tática ou de astúcia. Manteve-se disposto para tudo o que lhe coubesse

segundo o acontecimento da hora. O que se viu foi o rechaço dos homens. O povo da Aliança devia tê-lo recebido; então a Redenção haveria de se desenvolver na fé e no amor dos

homens. Significaria julgar de forma muito reduzida o que representou o infinito sofrimento interior de

Jesus, ao passar pelo mundo desgarrado de Deus, caso se pretendesse dizer que isso não haveria sido o bastante para expiar a culpa do mundo. Porém os homens “não o receberam” (Jo 1,11). Recusaram a fé,

voltaram-se contra Ele e Ele aceitou a consequência que disso derivava. Assim Ele morreu e sua morte se converteu na forma definitiva em que se cumpriu a Redenção. Logo foi posto no sepulcro; mas no

terceiro dia, o dia depois do sabbat da Páscoa, levantou-se dentre os mortos. Cristo fundou uma nova

existência. (...)

A ação redentora de Cristo encontra seu monumento comemorativo na estrutura da semana. Durante muito tempo continuou vigorando o sabbat como dia do descanso, mas ao seu lado aparece, “como

primeiro dia depois do sábado”, aquele dia em que se celebra a memória da Ressurreição. Logo se reúnem ambos significados. Surge o dia do Senhor (dominica), do Redentor entronizado, tal como hoje o

conhecemos, o primeiro dia da semana cristã, segundo o qual os demais se contam como segundo,

terceiro, etc. O momento de descanso, de tomar fôlego sem a carga do trabalho e da liberdade para Deus,

permaneceu, mas se acrescentou algo novo: o domingo se converteu na memória da Ressurreição de Cristo. Com solenidade expressamente litúrgica, esta memória se celebra como festa da Páscoa, o

primeiro domingo do equinócio da primavera [do hemisfério norte]. Seu conteúdo, bem entendido, forma

a síntese da fé cristã em geral: a vitória do amor de Deus sobre o pecado e a morte, e nesta vitória, a

Quando meditamos, ó Cristo, as maravilhas que foram operadas neste dia de domingo da vossa santa ressurreição, dizemos: Bendito é o dia do domingo, pois foi nele que se deu o começo da criação, a salvação do mundo, a renovação do gênero humano. É nele que o céu e a terra rejubilam e que o universo inteiro foi repleto de luz. Bendito é o dia do domingo, pois nele foram abertas as portas do paraíso para que Adão e todos os banidos entrem nele sem medo.

Ofício sírio-antioqueno

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revelação de quem é Deus. Portanto, a Páscoa constitui a festa cristã por

antonomásia. Penetra pelo ano inteiro ao fazer-se reviver de novo em cada dia do Senhor. Todos os domingos são Páscoa.

Contudo, também pela Redenção a mesma ação recebe um caráter novo. Permanecem seus deveres naturais e permanece também o que há de ser

elevado em consequência da culpa original. Mas revela-se o mistério da

providência, de que tudo o que acontece constitui uma parte do grande processo do novo nascimento. Portanto, o trabalho já não é somente a luta

pela vida e a obra, carregada de maldição, mas também a forma como vai crescendo, dia a dia, através de toda atividade e esforço, o homem

conformado a Cristo. Com isso, o trabalho adquire uma nova plenitude de

valor, de dignidade e confiança. E uma nova alegria que vai além daquela que brota do uso da energia, de conquista do mundo e do sucesso da obra. É

a alegria pela vinda do novo céu e da nova terra, de que falam o Apocalipse e o capítulo oitavo da Epístola aos Romanos, isto é, a criação renascida pela Redenção e pela fé.

No dia do Senhor, o cristão fica livre do trabalho e deve voltar sempre a se dar conta, nessa liberdade, de que está redimido. Por isso é tão grande a importância do dia. Enquanto o crente deixa de vivê-lo

conforme seu sentido, o transitório inunda sua consciência de eterno; sua consciência de Deus, mas

também de sua própria essência mais profunda. Pois, com efeito, ele não tem só que crer em Deus, mas também no que é ele mesmo a partir de sua Redenção. Isso fica continuamente recoberto pela vida

cotidiana: perde realidade pela debilidade, fica confuso pelo seu enredo, se diminui em seu valor pela maldade; mas no domingo deve voltar sempre a consolidar o que o cristão tem de sua autêntica

existência. Quando o domingo não o exortar a isso, desaparece isso da consciência.

A experiência assim demonstra. Já o homem crente, pelas mais diversas razões, se vê tentando em converter o dia santo em dia de trabalho; o que ocorre muito mais para o indeterminado ou indiferente

na religião. Empresários e comerciantes, agricultores e propagandistas declaram que a produção necessita do domingo e que os clientes deveriam poder comprar. Todos os argumentos insistem para que

se explore economicamente o domingo e a regra cristã parece um desperdício sem sentido. Porém, isso representa uma grande miopia; pois se esse dia é o que há assinalado nossa consideração dos ritmos

naturais da vida, então tais opiniões calculam mal. Com o trabalho contínuo se perde o que se chamou

de pausa criadora, o soltar-se e esponjar-se internamente; com isso, sofrem tanto a vida, quanto a produção. Mas por trás do cálculo equivocado, há outro perverso: o instinto da inimizade à fé sabe que

se obtém sucesso em desarraigar o domingo; o homem perde a consciência religiosa e fica entregue aos poderes econômicos e políticos.

O domingo e a integridade do homem

O problema do domingo está em conexão com outro que alcança às raízes de nossa existência. Surge do fato de que o homem da época moderna pagou o enorme sucesso científico e técnico deste último século

com a perda de cuja importância cada vez nos damos conta de forma mais aguda: tornou-se um ativista,

durante muito tempo considerou-se seu ativismo como ascensão a um valor vital superior e a uma responsabilidade moral mais séria. Porém um número crescente de pessoas se dá conta do que havia de

falso nesta opinião. Certamente, ganhou-se algo grande, mas também se perdeu algo importante; a saber, tudo aquilo que pode se chamar de valores contemplativos; as energias da quietude e da

concentração; do saber mais profundo, que vem do fundo da alma; do sentido para as indicações e os avisos procedentes de um domínio que está muito mais no interior do que a mera razão e a utilidade. O

homem moderno perdeu calado em tudo. Sua vida se torna cada vez mais artificial; seu instinto cada vez

mais frágil. Cada vez se perde mais nesse conjunto de instalações mecânicas que enche seu mundo. Algo análogo ocorre em relação ao poder do Estado. Pelo mundo inteiro perpassa essa tendência totalitária,

não só pelo mundo comunista, mas também pelo liberal: só que aqui adquire um novo caráter: recordemos o aparato autoritário que invade cada vez mais territórios da vida; a imprensa, que

condiciona as ideias, os juízos, as atitudes da população; a cunhagem do sentido da vida e o gosto por

parte do cinema e do rádio; a crescente publicidade de toda a vida, que destrói o terreno privado. Contra tudo isso, o homem moderno se torna cada vez mais frágil, porque constantemente diminui nele a

energia de resistência da pessoa, enraizada em sua própria profundidade, a capacidade de ser senhor de si mesmo, a conexão com os valores absolutos que lhe dão a firmeza.

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Uma pedagogia autêntica tem, pois, a importante tarefa de recuperar os valores perdidos. Mas para isso

é de máxima importância obter um âmbito em que seja possível a existência sem intenções, no livre repouso em si mesma; e para isso serve, acima de tudo, o domingo. Não é só ausência de trabalho e

possibilidade de recuperação, mas sim festa: uma situação da vida em que se eleva à altura de Deus e se liberta os homens. Se o domingo desaparece, isso representa um passo maior e mais decisivo até a

exteriorização da vida. Mas a perda de substâncias humanas e o enfraquecimento da energia autêntica,

formadora da história, que se derivaram disso, não se compensariam com nenhuma vantagem técnica ou econômica. Dessa forma, ainda aqueles para quem o núcleo cristão do domingo já não é válido devem

levar em consideração esse elemento e não considerar somente o domingo mediante pontos de vista técnicos ou de paridade formal, mas a partir de outros mais profundos.

Por outro lado, caso afirme-se que no dia de descanso alternado alguém pode aprofundar-se na religião,

só resta contestar que quem assim fala não conhece nem a natureza do domingo, nem a natureza do homem. Realmente acredita que esse ponto do dia do Senhor, que vigora há mais de três mil anos, se

pode substituir por uma expressão do calendário que, por mandato das mais modernas utilidades, salta de um dia semana a outro? E que a alma do homem responderá a esse artifício técnico-econômico,

aprofundando-se religiosamente nele? Só o Senhor de todos os dias pode tornar firme o seu dia e dar-lhe essa santidade que percebe a intimidade disposta à fé, e da qual participam também aqueles que não

creem nele, de forma que não se dão conta.

(...) Portanto só resta a luta. Os cristãos fariam bem em dar-se conta claramente disto. Dirão que são

atrasados; que têm interesses, por algum motivo, ou estão sendo pagos por alguém que o tenha; que não compreendem o homem que trabalha, etc.; através da série de falseamento de motivos, tal qual

sempre vão surgindo. Na verdade, trata-se de algo simplesmente decisivo e não se pode ceder.

Uma questão de consciência

Entretanto, finalmente deve-se dizer algo mais; melhor, deve-se perguntar e é preciso fazê-lo com toda

franqueza. As manifestações da Igreja e a educação religiosa e moral têm feito tudo o que haviam de fazer? Mais precisamente, não se há colocado o dever de santificação do domingo somente sob a

perspectiva do mandamento e da obrigação?

Obviamente, por trás do dia do Senhor está o terceiro mandamento da Lei de Deus. Não só – já se disse – deve ele exercer mais importante influxo, mas também que nele reside o caráter de sua altura, que

encontra expressão no mandamento: “lembra-te de santificar o dia do Senhor”. Isso é verdade e não se pode discutir de modo algum. Porém a promulgação e instrução ocuparam-se suficientemente também

de elaborar os valores do domingo e de apresentá-los convincentemente? O dia do Senhor se apresenta,

para o homem atual, em relação com sua vida, como realmente está, de tal modo que ele se sinta compreendido e veja a ajuda que se lhe oferece aqui? Ou teve que perceber o mandamento do domingo

como algo que se herdou de um mundo pretérito, tendo sido imposto ao seu mundo atual? O ensinamento e a prática ocuparam-se bastante em mostrar como se pode preencher o domingo com

elementos plenos de valor e que dão alegria?

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VIII. Carta Apostólica Dies Domini João Paulo II, sobre a santificação do domingo

1. O dia do Senhor — como foi definido o domingo, desde os tempos apostólicos — mereceu sempre, na

história da Igreja, uma consideração privilegiada devido à sua estreita conexão com o próprio núcleo do mistério cristão. O domingo, de fato, recorda, no ritmo semanal do tempo, o dia da ressurreição de

Cristo. É a Páscoa da semana, na qual se celebra a vitória de Cristo sobre o pecado e a morte, o cumprimento n'Ele da primeira criação e o início da “nova criação” (cf. 2Cor 5,17). É o dia da evocação

adorante e grata do primeiro dia do mundo e, ao mesmo tempo, da prefiguração, vivida na esperança,

do “último dia”, quando Cristo vier na glória (cf. At 1,11; 1Ts 4,13-17) e renovar todas as coisas (cf. Ap 21,5).

7. O domingo é um dia que está no âmago mesmo da vida cristã. Se, desde o início do meu Pontificado,

não me cansei de repetir: “Não tenhais medo! Abri, melhor, escancarai as portas a Cristo”, hoje neste mesmo sentido, gostaria de convidar vivamente a todos a redescobrirem o domingo: Não tenhais medo

de dar o vosso tempo a Cristo! Sim, abramos o nosso tempo a Cristo, para que Ele possa iluminá-lo e

dirigi-lo. É Ele quem conhece o segredo do tempo e o segredo da eternidade, e nos entrega o “seu dia”, como um dom sempre novo do seu amor. Há de se implorar a graça da descoberta sempre mais

profunda deste dia, não só para viver em plenitude as exigências próprias da fé, mas também para dar resposta concreta aos anseios íntimos e verdadeiros existentes em todo ser humano. O tempo dado a

Cristo, nunca é tempo perdido, mas tempo conquistado para a profunda humanização das nossas

relações e da nossa vida.

CAPÍTULO 1 – DIES DOMINI

8. O domingo, segundo a experiência cristã, é sobretudo uma festa pascal, totalmente iluminada pela

glória de Cristo ressuscitado. É a celebração da “nova criação”. Este seu caráter, porém, se bem entendido, é inseparável da mensagem que a Escritura, desde as suas primeiras páginas, nos oferece

acerca do desígnio de Deus na criação do mundo. Com efeito, se é verdade que o Verbo Se fez carne na “plenitude dos tempos” (Gl 4,4), também é certo que, em virtude precisamente do seu mistério de Filho

eterno do Pai, Ele é origem e fim do universo. Afirma-o S. João, no Prólogo do seu Evangelho: “Tudo começou a existir por meio d'Ele, e sem Ele nada foi criado” (1,3). Também S. Paulo, ao escrever aos

Colossenses, o sublinha: “N'Ele foram criadas todas as coisas, nos Céus e na Terra, as visíveis e as

invisíveis [...]. Tudo foi criado por Ele e para Ele” (1,16). Esta presença ativa do Filho na obra criadora de Deus revelou-se plenamente no mistério pascal, no qual Cristo, ressuscitando como “primícia dos que

morreram” (1Cor 15,20), inaugurou a nova criação e deu início ao processo que Ele mesmo levará a cabo no momento do seu retorno glorioso, “quando entregar o Reino a Deus Pai [...], a fim de que Deus seja

tudo em todos” (1Cor 15,24.28).

Portanto, já na aurora da criação, o desígnio de Deus implicava esta “missão cósmica” de Cristo. Esta

perspectiva cristocêntrica, que se estende sobre todo o arco do tempo, estava presente no olhar comprazido de Deus quando, no fim da sua obra, “abençoou o sétimo dia e santificou-o” (Gn 2,3). Nascia

então — segundo o autor sacerdotal da primeira narração bíblica da criação — o “sábado”, que caracteriza profundamente a primeira Aliança e, de algum modo, preanuncia o dia sagrado da nova e

definitiva Aliança. O mesmo tema do “repouso de Deus” (cf. Gn 2,2) e do repouso por Ele oferecido ao

povo do êxodo, com o ingresso na terra prometida (cf. Ex 33,14; Dt 3,20; Js 21,44; Sl 95[94],11), é relido no Novo Testamento sob uma luz nova, a do “repouso sabático” definitivo (cf. Hb 4,9), onde

entrou Cristo com a sua ressurreição e também o Povo de Deus é chamado a entrar, perseverando na senda da sua obediência filial (cf. Hb 4,316). É necessário, portanto, reler a grande página da criação e

aprofundar a teologia do “sábado”, para chegar à plena compreensão do domingo.

“Recordar” para “santificar”

16. O mandamento do Decálogo, pelo qual Deus impõe a observância do sábado, tem, no livro do êxodo, uma formulação característica: “Recorda-te do dia de sábado, para o santificares” (20,8). E mais adiante,

o texto inspirado dá a razão disso mesmo, apelando-se à obra de Deus: “Porque em seis dias o Senhor fez o céu, a terra, o mar e tudo quanto contém, e descansou no sétimo; por isso o Senhor abençoou o

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dia de sábado e santificou-o” (v. 11). Antes de impor qualquer coisa a ser praticada, o mandamento

indica algo a recordar. Convida a avivar a memória daquela grande e fundamental obra de Deus que é a criação. É uma memória que deve animar toda a vida religiosa do homem, para depois confluir no dia em

que ele é chamado a repousar. O repouso assume, assim, um típico valor sagrado: o fiel é convidado a repousar não só como Deus repousou, mas a repousar no Senhor, devolvendo-Lhe toda a criação, no

louvor, na ação de graças, na intimidade filial e na amizade esponsal.

Passagem do sábado para o domingo

18. Por esta dependência essencial que o terceiro mandamento tem da memória das obras salvíficas de Deus, os cristãos, apercebendo-se da originalidade do tempo novo e definitivo inaugurado por Cristo,

assumiram como festivo o primeiro dia depois do sábado, porque nele se deu a ressurreição do Senhor.

De fato, o mistério pascal de Cristo constitui a revelação plena do mistério das origens, o cume da história da salvação e a antecipação do cumprimento escatológico do mundo. Aquilo que Deus realizou

na criação e o que fez pelo seu povo no êxodo, encontrou na morte e ressurreição de Cristo o seu cumprimento, embora este tenha a sua expressão definitiva apenas na parusia, com a vinda gloriosa de

Cristo. N'Ele se realiza plenamente o sentido “espiritual” do sábado, como o sublinha S. Gregório Magno: “Nós consideramos verdadeiro sábado a pessoa do nosso Redentor, nosso Senhor Jesus Cristo”. Por isso,

a alegria com que Deus, no primeiro sábado da humanidade, contempla a criação feita do nada, exprime-

se doravante pela alegria com que Cristo apareceu aos seus, no domingo de Páscoa, trazendo o dom da paz e do Espírito (cf. Jo 20,19-23). De fato, no mistério pascal, a condição humana e, com ela, toda a

criação, que geme e sofre as dores de parto até ao presente (cf. Rm 8,22) conheceu o seu novo “êxodo” para a liberdade dos filhos de Deus, que podem gritar, com Cristo, “Abba, Pai” (Rm 8,15; Gl 4,6). À luz

deste mistério, o sentido do preceito veterotestamentário do dia do Senhor é recuperado, integrado e

plenamente revelado na glória que brilha na face de Cristo Ressuscitado (cf. 2 Cor 4,6). Do “sábado” passa-se ao “primeiro dia depois do sábado”, do sétimo dia passa-se ao primeiro dia: o dies Domini torna-se o dies Christi!

CAPÍTULO 2 – DIES CHRISTI

19. “Nós celebramos o domingo, devido à venerável ressurreição de nosso

Senhor Jesus Cristo, não só na Páscoa, mas inclusive em cada ciclo semanal”: assim escrevia o Papa Inocêncio I, nos começos do século V,

testemunhando um costume já consolidado, que se tinha vindo a desenvolver logo desde os primeiros anos após a ressurreição do Senhor. S.

Basílio fala do “santo domingo, honrado pela ressurreição do Senhor,

primícia de todos os outros dias”. S. Agostinho chama o domingo “sacramento da Páscoa”.

Esta ligação íntima do domingo com a ressurreição do Senhor é fortemente

sublinhada por todas as Igrejas, tanto do Ocidente como do Oriente. De

modo particular na tradição das Igrejas Orientais, cada domingo é a anastàsimos hemèra, o dia da ressurreição, e precisamente por esta sua

característica, é o centro de todo o culto.

À luz desta tradição ininterrupta e universal, vê-se com toda a clareza que, embora o “dia do Senhor” tenha as suas raízes, como se disse, na mesma obra da criação, e mais diretamente no mistério do

“repouso” bíblico de Deus, contudo é preciso fazer referência especificamente à ressurreição de Cristo

para se alcançar o pleno sentido daquele. É o que faz o domingo cristão, ao repropor cada semana à consideração e à vida dos crentes o evento pascal, donde mana a salvação do mundo.

Progressiva distinção do sábado

23. É precisamente sobre esta novidade que insiste a catequese dos primeiros séculos, procurando

distinguir o domingo do sábado hebraico. O sábado, para os judeus, impunha o dever da reunião na sinagoga e exigia a prática do repouso prescrito pela Lei. Os Apóstolos, e de modo particular S. Paulo,

continuaram de início a frequentar a sinagoga, para poderem anunciar lá Jesus Cristo, ao comentar “as profecias que são lidas todos os sábados” (At 13,27). Em algumas comunidades, podia-se registrar a

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coexistência da observância do sábado com a celebração dominical. Bem cedo, porém, se começou a

diferenciar os dois dias de forma cada vez mais nítida, sobretudo para fazer frente às insistências daqueles cristãos que, vindos do judaísmo, eram favoráveis à conservação da obrigação da Lei Antiga. S.

Inácio de Antioquia escreve: “Se os que viviam no antigo estado de coisas passaram a uma nova esperança, deixando de observar o sábado e vivendo segundo o dia do Senhor, dia em que a nossa vida

despontou por meio d'Ele e da sua morte [...], mistério do qual recebemos a fé e no qual perseveramos

para sermos reconhecidos discípulos de Cristo, nosso único Mestre, como poderemos viver sem Ele, se inclusive os profetas, que são seus discípulos no Espírito, O aguardavam como mestre?”. E S. Agostinho,

por sua vez, observa: “Por isso, o Senhor também imprimiu o seu selo no seu dia, que é o terceiro após a paixão. Porém, no ciclo semanal, aquele é o oitavo depois do sétimo, isto é, depois do sábado, e o

primeiro da semana”. A distinção entre o domingo e o sábado hebraico vai-se consolidando sempre mais

na consciência eclesial, mas em certos períodos da história, devido à ênfase dada à obrigação do descanso festivo, registra-se uma certa tendência à “sabatização” do dia do Senhor. Não faltaram,

inclusive, sectores da cristandade em que o sábado e o domingo foram observados como “dois dias irmãos” (S. Gregório de Nissa).

O dia da nova criação

25. O domingo, com efeito, é o dia em que, mais do que qualquer outro, o cristão é chamado a lembrar

da salvação que lhe foi oferecida no batismo e que o tornou homem novo em Cristo. “Sepultados com Ele no batismo, foi também com Ele que ressuscitastes pela fé no poder de Deus, que O ressuscitou dos

mortos” (Cl 2,12; cf. Rm 6,4-6). A liturgia põe em evidência esta dimensão batismal do domingo, quer

exortando a celebrar os batismos, para além da

Vigília Pascal, também neste dia da semana “em que a Igreja comemora a ressurreição do Senhor”

(Ritual do Batismo de Crianças), quer sugerindo, como oportuno rito penitencial no início da Missa, a

aspersão com a água benta, que evoca precisamente o evento batismal em que nasce toda

a existência cristã.

O oitavo dia, imagem da eternidade

26. Por outro lado, o fato de o sábado ser o sétimo dia da semana fez considerar o dia do Senhor à luz de um simbolismo complementar, muito apreciado pelos Padres: o domingo, além de ser o primeiro dia,

é também “o oitavo dia”, ou seja, situado, relativamente à sucessão setenária dos dias, numa posição

única e transcendente evocadora, não só do início do tempo, mas também do seu fim no “século futuro”. S. Basílio explica que o domingo significa o dia realmente único que virá após o tempo atual, o dia sem

fim, que não conhecerá tarde nem manhã, o século imorredouro que não poderá envelhecer; o domingo é o prenúncio incessante da vida sem fim, que reanima a esperança dos cristãos e os estimula no seu

caminho. Nesta perspectiva do dia último, que realiza plenamente o simbolismo prefigurativo do sábado,

S. Agostinho conclui as Confissões falando do eschaton como “paz tranquila, paz do sábado, que não entardece”. A celebração do domingo, dia simultaneamente “primeiro” e “oitavo”, orienta o cristão para a

meta da vida eterna.

CAPÍTULO 3 – DIES ECCLESIAE

46. Sendo a Eucaristia o verdadeiro coração do domingo, compreende-se por que razão, desde os

primeiros séculos, os Pastores não cessaram de recordar aos seus fiéis a necessidade de participarem na assembleia litúrgica. “No dia do Senhor, deixai tudo — declara, por exemplo, o tratado do século III

denominado Didaskália dos Apóstolos — e zelosamente correi à vossa assembleia, porque é o vosso louvor a Deus. Caso contrário, que desculpa terão junto de Deus aqueles que não se reúnem, no dia do

Senhor, para ouvir a palavra de vida e nutrir-se do alimento divino que permanece eternamente?”.

Geralmente o apelo dos Pastores foi recebido na alma dos fiéis com uma convicta adesão, e, se não faltaram tempos e situações em que diminuiu a tensão ideal no cumprimento deste dever, não se pode,

todavia, deixar de recordar o autêntico heroísmo com que sacerdotes e fiéis observaram esta obrigação

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em muitas situações de perigo e restrição da liberdade religiosa, como se pode constatar desde os

primeiros séculos da Igreja até aos nossos dias.

47. Esta obrigação de consciência, baseada numa necessidade interior que os cristãos dos primeiros séculos sentiam tão intensamente, a Igreja nunca cessou de a afirmar, embora, num primeiro tempo,

não tenha julgado necessário prescrevê-la. Só mais tarde, face à tibieza ou à negligência de alguns, teve

de explicitar o dever de participar na Missa dominical: a maior parte das vezes fê-lo sob forma de exortação, mas às vezes recorreu também a disposições canônicas concretas. Assim aconteceu em

diversos Concílios particulares, do século IV em diante (por exemplo, no Concílio de Elvira, do ano 300, não se fala de obrigação, mas de consequências penais depois de três ausências) e, sobretudo, a partir

do século VI (como sucedeu no Concílio de Agde, de 506). Estes decretos de Concílios particulares

desembocaram num costume universal de caráter obrigatório, como algo completamente óbvio.

O Código de Direito Canônico, de 1917, compilou pela primeira vez a tradição numa lei universal. O Código atual confirma-a, dizendo que “no domingo e nos outros dias festivos de preceito, os fiéis têm

obrigação de participar na Missa”. Essa lei foi normalmente entendida como implicando obrigação grave: assim o ensina o Catecismo da Igreja Católica, sendo fácil de compreender o motivo, quando se

considera a importância que o domingo tem para a vida cristã.

Outros momentos do domingo cristão

52. Se a participação na Eucaristia é o coração do domingo, seria contudo restritivo reduzir apenas a isso o dever de “santificá-lo”. Na verdade, o dia do Senhor é bem vivido, se todo ele estiver marcado pela

lembrança agradecida e efetiva das obras de Deus. Ora, isto obriga cada um dos discípulos de Cristo a

conferir, também aos outros momentos do dia passados fora do contexto litúrgico — vida de família, relações sociais, horas de diversão —, um estilo tal que ajude a fazer transparecer a paz e a alegria do

Ressuscitado no tecido ordinário da vida. Por exemplo, o encontro mais tranquilo dos pais e dos filhos pode dar ocasião não só para se abrirem à escuta recíproca, mas também para viverem juntos algum

momento de formação e de maior recolhimento. Porque não programar, inclusive na vida laical, quando for possível, especiais iniciativas de oração — de modo particular a celebração solene das Vésperas — ou

então eventuais momentos de catequese, que, na vigília do domingo ou durante a tarde deste, preparem

ou completem na alma do cristão o dom próprio da Eucaristia?

Esta forma assaz tradicional de “santificação do domingo” tornou-se talvez mais difícil, em muitos ambientes; mas, a Igreja manifesta a sua fé na força do Ressuscitado e no poder do Espírito Santo

mostrando, hoje mais do que nunca, que não se contenta com propostas minimalistas ou medíocres no

plano da fé, e ajudando os cristãos a cumprirem aquilo que é mais perfeito e agradável ao Senhor. Aliás, a par das dificuldades, não faltam sinais positivos e encorajadores. Graças ao dom do Espírito, nota-se,

em muitos ambientes eclesiais, uma nova exigência de oração na múltipla variedade das suas formas. Retomam-se também antigas formas de religiosidade, como, por exemplo, a peregrinação: muitas vezes

os fiéis aproveitam o descanso dominical para irem aos Santuários, talvez mesmo com a família inteira,

passar algumas horas mais de intensa experiência de fé. São momentos de graça que é preciso alimentar com uma adequada evangelização e guiar com verdadeira sabedoria pastoral.

CAPÍTULO 4 – DIES HOMINIS

O dia do descanso

64. Durante alguns séculos, os cristãos viveram o domingo apenas como dia do culto, sem poderem

juntar-lhe também o significado específico de descanso sabático. Só no século IV é que a lei civil do Império Romano reconheceu o ritmo semanal, fazendo com que, no “dia do sol”, os juízes, os habitantes

das cidades e as corporações dos diversos ofícios parassem de trabalhar. Grande contentamento sentiram os cristãos ao verem assim afastados os obstáculos que, até então, tinham tornado por vezes

heroica a observância do dia do Senhor. Podiam agora dedicar-se à oração comum, sem qualquer

impedimento.

65. Por outro lado, a ligação entre o dia do Senhor e o dia do descanso na sociedade civil tem uma importância e um significado que ultrapassam o horizonte propriamente cristão. De fato, a alternância de

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trabalho e descanso, inscrita na natureza humana, foi querida pelo próprio Deus, como se deduz da

perícope da criação no livro do Gênesis (cf. 2,2-3; Ex 20,8-11): o repouso é coisa “sagrada”, constituindo a condição necessária para o homem se subtrair ao ciclo, por vezes excessivamente absorvente, dos

afazeres terrenos e retomar consciência de que tudo é obra de Deus. O poder sobre a criação, que Deus concede ao homem, é tão prodigioso que este corre o risco de esquecer-se que Deus é o Criador, de

quem tudo depende. Este reconhecimento é ainda mais urgente na nossa época, porque a ciência e a

técnica aumentaram incrivelmente o poder que o homem exerce através do seu trabalho.

67. Graças ao descanso dominical, as preocupações e afazeres quotidianos podem reencontrar a sua justa dimensão: as coisas materiais, pelas quais nos afadigamos, dão lugar aos valores do espírito; as

pessoas com quem vivemos, recuperam, no encontro e diálogo mais tranquilo, a sua verdadeira

fisionomia. As próprias belezas da natureza — frequentemente malbaratadas por uma lógica de domínio, que se volta contra o homem — podem ser profundamente descobertas e apreciadas. Assim o domingo,

dia de paz do homem com Deus, consigo mesmo e com os seus semelhantes, torna-se também ocasião em que o homem é convidado a lançar um olhar regenerado sobre as maravilhas da natureza, deixando-

se envolver por aquela estupenda e misteriosa harmonia que, como diz S. Ambrósio, por uma “lei inviolável de concórdia e de amor”, une os diversos elementos do universo num “vínculo de união e de

paz”. Então, o homem torna-se mais consciente, segundo as palavras do Apóstolo, de que “tudo o que

Deus criou é bom, e não é para desprezar, contanto que se tome em ação de graças, pois é santificado pela palavra de Deus e pela oração” (1Tm 4,4-5). Portanto, se depois de seis dias de trabalho — para

muitos, na verdade, reduzidos já a cinco — o homem procura um tempo para relaxe e para cuidar melhor dos outros aspectos da própria vida, isso corresponde a uma real necessidade, em plena harmonia com a

perspectiva da mensagem evangélica. Consequentemente, o crente é chamado a satisfazer esta

exigência, harmonizando-a com as expressões da sua fé pessoal e comunitária, manifestada na celebração e santificação do dia do Senhor.

Dia de solidariedade

69. O domingo deve dar oportunidade aos fiéis para se dedicarem também às atividades de misericórdia, caridade e apostolado. A participação interior na alegria de Cristo ressuscitado implica a partilha total do

amor que pulsa no seu coração: não há alegria sem amor! O próprio Jesus no-lo explica, ao pôr em

relação o “mandamento novo” com o dom da alegria: “Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor, do mesmo modo que Eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai, e

permaneço no seu amor. Digo-vos isto para que a minha alegria esteja em vós, e a vossa alegria seja completa. O meu mandamento é este: Que vos ameis uns aos outros como Eu vos amei” (Jo 15,10-12).

Assim, a Eucaristia dominical não só não desvia dos deveres de caridade, mas, pelo contrário, estimula os fiéis “a tudo o que seja obra de caridade, de piedade e apostolado, onde os cristãos possam mostrar que

são a luz do mundo, embora não sejam deste mundo, e que glorificam o Pai diante dos homens”.

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Breve Percurso pelo Ano Litúrgico51

“Como a estrada que serpenteia ao redor da montanha e assim lentamente a escala até chegar ao cume escarpado, assim nós, voltando a cada ano, devemos recomeçar o mesmo caminho, atingindo sempre uma altitude mais

elevada, até que alcancemos finalmente o objetivo, Cristo.”

CASEL, Odo. O Mistério do Culto no Cristianismo. São Paulo: Edições Loyola, 2009, p.85.

Quadro Ilustrativo do Ano Litúrgico (Fonte: Apostolado Litúrgico)

TEMPO DO ADVENTO (JR) “Advento” não significa “aguardar” como se poderia estar disposto a admitir, mas é a tradução do termo grego “parusia”, que significa “presença” ou, mais exatamente, “chegada”, isto é, presença iniciada. Na Antiguidade, a palavra era o termo técnico para a presença de um rei ou monarca, ou também do deus o culto que concede aos seus o tempo de sua “parusia”. Portanto, Advento significa presença iniciada – a saber, de Deus mesmo. Por isso, o Advento nos lembra duas coisas: primeiro, que a presença de Deus no mundo já começou, que ele está presente de modo oculto; segundo, que a sua presença precisamente apenas começou, ainda não está consumada, mas ainda a crescer, a devir, a amadurecer. Pode-se dizer que a liturgia do Advento forma uma espécie de tríptico. Num quadro desse altar de três partes está João Batista como a grande figura que domina o Advento. O outro quadro mostra Maria, a Mãe do Senhor. Ambos apontam para o quadro central: Jesus Cristo. São João Batista e Maria Santíssima são os dois grandes tipos da existência segundo o Advento. Por isso dominam a sua liturgia.

51 Anotações extraídas de RATZINGER, Joseph [JR]. Dogma e Anúncio. 2ª ed. São Paulo, Edições

Loyola: 2008, páginas 271 a 369; e de BOROBIO, Dionisio [DB] (org.). A Celebração Cristã. Vol. 3. São

Paulo, Edições Loyola: 2000, páginas 31 a 252.

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TEMPO DO NATAL (DB) Não se pode fazer teologia do Natal e da Epifania apenas do ponto de vista do nascimento de Jesus, mas deve-se evidentemente apoiar-se no aspecto da manifestação do Senhor. É certo que o início de sua manifestação é seu nascimento segundo a carne, mas só será plena essa manifestação com sua morte-ressurreição-ascenção e efusão do Espírito Santo; e mais, só culminará sua manifestação em sua segunda vinda no fim dos tempos. Temos que elaborar sobre esse paradigma a teologia do Natal e da Epifania, contemplando o nascimento do Senhor não como acontecimento isolado, mas como acontecimento plenamente conjugado com a páscoa e a parusia. É claro que os textos da celebração litúrgica desses mistérios nos devem servir de base e fonte para sua teologia. Natal: memória ou mistério? Essa questão foi suscitada por Agostinho ao afirmar que o Natal não é mistério (sacramento) da mesma forma que a Páscoa; o Natal para Agostinho é mera recordação (memória) do nascimento de Jesus, ainda que a data dessa memória não seja a data aniversária mas apenas data propícia para recordar o acontecimento por causa do simbolismo da luz. Leão, ao contrário, não considera a festa do Natal somente memória, mas também mistério, ou seja, sacramentum. A argumentação de Leão fundamenta-se na contemplação complexiva do único mysterium salutis que se atualiza cada vez que se celebra algum de seus aspectos; por isso, Leão contempla a festa do Natal em relação com a Páscoa, e vê nela o início de nossa redenção.

TEMPO DA QUARESMA (JR) A palavra Quaresma com que designamos os dias entre a Quarta-Feira de Cinzas e a Páscoa não diz nada do que a Igreja quer com esse tempo. Originariamente era o tempo da administração do Batismo, quer dizer, o tempo de tornar-se cristão, o que não se acredita ser possível realizar num breve momento, mas apenas por um caminho de transformação, de conversão que o homem deve percorrer passo a passo. Se mais tarde nesse caminho foram incluídos os penitentes e, finalmente, toda a Igreja, então se exprime a convicção de que esse caminho não se pode percorrer de uma vez até o fim; ele abrange toda a nossa vida, deve ser percorrido sempre de novo. Assim, a quaresma quer conservar presente na nossa lembrança e na nossa vida que o ser cristão sempre se pode realizar apenas como novo tornar-se cristão, que nunca é um processo terminado que fique atrás de nós, mas exige sempre um novo exercício.

Ser cristão significa em primeiro lugar que reconhecemos a nossa insuficiência, que deixamos que Ele, o Deus que é outro, disponha de nós.

O nosso mundo está de tal modo atravancado de coisas superficiais e de primeiro plano que sempre estamos em perigo de só vermos ainda as partes e não mais o todo. É preciso vencer a si mesmo, para ver mais fundo e tornar-se livre da ditadura das coisas só de primeiro plano. (...) Precisamos de um jejum que nos liberte de nós mesmos, nos liberte para Deus, tornando-nos livres para os outros.

O fato de que o jejum cristão tem que ser um sair libertador do próprio eu inclui a exigência de que o tempo do jejum também fosse um tempo de fecundidade em boas ações.

A Igreja no deserto, a Igreja na Quadragesima, é a nossa experiência: exposição no vazio, num mundo que religiosamente parece ter-se tornado sem palavra, nem imagem, nem som. Exposição a um mundo no qual o céu acima de nós é escuro, distante e intangível.

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TRÍDUO PASCAL (DB) Esse Tríduo [não se constitui numa preparação para a celebração da Páscoa anual, mas] é a própria realidade da Páscoa do Senhor celebrada sacramentalmente em três dias, cujo centro de gravitação se acha obviamente na Vigília Pascal com sua celebração eucarística. As Normas gerais sobre o ano litúrgico precisam, com efeito, que o “tríduo pascal da paixão e ressurreição do Senhor tem seu início na missa da Ceia do Senhor, seu ápice na vigília pascal e seu termo nas vésperas do domingo da ressurreição”.

TEMPO PASCAL (JR) No seu grandioso quadro da ressurreição, Matthias Grünewald representou a Cristo que ressuscita como teofania: como o aparecimento de Deus no homem que passou pelo sacrifício. Assim traduziu para a pintura um pensamento básico da teologia bíblica e paleocristã da ressurreição, dando-lhe uma força de expressão, como as palavras não a podem alcançar. De fato, o sentido propriamente dito é este: a ressurreição de Cristo nos dá a certeza de que Deus existe e que como Pai de Jesus Cristo é o Deus dos homens. A ressurreição de Jesus é a teofania definitiva, a resposta triunfal à pergunta sobre quem agora reina propriamente, a morte ou a vida. Deus existe – é esta a mensagem propriamente dita da Páscoa. Quem, ao menos, começa a compreender o que isso quer dizer, sabe o que significa ser redimido. Sabe, por que a Igreja neste dia, nas suas orações, canta quase interminavelmente aleluia – o júbilo sem palavras que é grande demais para ser articulado em palavras da linguagem de cada dia, porque abrange toda a nossa vida, tanto o que se pode dizer como o que é inefável. Aprender alguma coisa dessa alegria significa celebrar a Páscoa!

TEMPO COMUM52 O tempo comum é uma grande oportunidade para integrar as situações mais comuns da vida dos homens no mistério de Cristo. É o que alguns autores chamam a teologia do “tempo cotidiano”. A chave da espiritualidade desse tempo é sempre o mistério de Cristo no dia tomado como unidade básica, santificado pela celebração eucarística e pela Liturgia das Horas. O começo de cada dia traz a recordação da nova criação inaugurada na Ressurreição do Senhor, as horas médias evocam a vinda do Espírito em Pentecostes (nove horas), a crucificação (doze horas) e a Morte de Jesus (quinze horas). As vésperas convidam a se unir ao sacrifício vespertino da cruz consagrado na última Ceia. E, no centro, a Eucaristia, verdadeira Páscoa cotidiana na qual o cristão pode se unir à ação sacerdotal de Cristo e apresentar sua própria vida como oferenda pura, agradável a Deus e culto espiritual (cf. Rm 12,1). A Igreja estabeleceu uma sequência de leituras bíblicas que se repetem a cada três anos, nos domingos e nas solenidades. As leituras desses dias são divididas nos anos A, B e C. No ano A lê-se o Evangelho de São Mateus; no ano B, o de São Marcos e no ano C, o de São Lucas; contemplando, assim, os Evangelhos Sinóticos. Já o Evangelho segundo São João é reservado para ocasiões especiais, como o Tempo Pascal, e dias de Festas e Solenidades.

52 Extraído de MARTÍN, Julián López. A Liturgia da Igreja. São Paulo: Paulinas, 2006, p. 390.

Os Anos A, B e C

A Ressurreição, por Matthias Grünewald (1516)

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Na SC 122, lemos que “a Santa Mãe Igreja sempre foi amiga das belas-artes e de seu nobre ministério”. A arte está expressa de diferentes maneiras no culto cristão: através da música, das imagens sacras e, também, através das sagradas alfaias, que exprimem, pela sua cor, o sentimento que deve brotar no coração daquele que ora ao longo dos diferentes momentos do Ano Litúrgico. Trata-se de contribuir para a celebração sensorial: o uso do incenso, os ritmos musicais, o abraço fraterno, o pão da eucaristia e as cores litúrgicas visam a envolver aquele que celebra de maneira completa através dos sentidos para que possam chegar ao transcendente – aquele que ultrapassa todos os sinais materiais, tão necessários para a realidade humana. Pode-se perceber que as alfaias que adornam o altar, o tabernáculo, o ambão e mesmo os paramentos do clero seguem algumas cores (fixadas no séc. XII) que procuram convergir com o mistério celebrado. Assim, toda a Igreja (salvo exceção devido a alguma diferença cultural) usa uma única cor, quando celebra a mesma liturgia, manifestando claramente a unidade profunda do Corpo Místico de Cristo.

Branco – sinal de alegria, ressurreição, pureza, vitória. Usado na Páscoa, no Natal, nas solenidades

e festas do Senhor e de Maria e dos santos (a exceção dos Apóstolos e Mártires);

Vermelho – recorda o fogo do Espírito e o sangue derramado, por isso é usado nas solenidades

dos Apóstolos e Mártires, no Domingo de Ramos, na Sexta-Feira Santa e na solenidade de Pentecostes;

Verde – traz à mente o crescimento dos vegetais, que recorda a expansão da fé, da Igreja, da

Palavra de Deus em nosso meio, sendo usado no Tempo Comum;

Roxo – como símbolo de penitência e conversão, é usado no Advento e na Quaresma; podendo

também ser usado nas missas dos fiéis defuntos e no sacramento da Reconciliação;

Rosa – facultado ao 3º Domingo do Advento (Gaudete) e ao 4º Domingo da Quaresma (Laetare), o

rosa recorda que o Sol se aproxima pelo Natal e pela Páscoa, o que torna o roxo mais suave e ameno, anunciando a chegada da Luz;

Preto – símbolo de tristeza e luto, era a cor das celebrações dos fiéis defuntos, mas com a

renovação do Concílio Vaticano II, que ordenou uma revisão nas celebrações das exéquias (SC 81), caiu em desuso, embora não seja proibido.

As Cores Litúrgicas

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IX. Espiritualidade Litúrgica Juan Javier Flores53

Uma reflexão “espiritual” a partir do dado litúrgico

Com o Concílio Vaticano II chegou-se, finalmente, a sintetizar todos

os anseios do movimento litúrgico, de seus pioneiros, de seus teóricos, de suas obras, que desembocaram numa autêntica teologia

da liturgia, até o ponto de, no dizer de Marsili, dever-se falar de uma

verdadeira “teologia da celebração litúrgica”, superando, assim, preconceitos e precompreensões infundadas. Tal é a liturgia que hoje

nos afeta e nos interpela diretamente. A liturgia é a forma e o modo que Deus nos oferece para falar com ele.

A reflexão que temos de fazer deve conduzir-nos a uma

espiritualidade litúrgica, que, por sua vez, nos abra à experiência

divina. Portanto, o único caminho possível parte da teologia da celebração litúrgica e desemboca numa espiritualidade que leva

diretamente à vida vivida.

Desde o momento em que a espiritualidade é a reflexão teológica

sobre o viver cristão e a liturgia é a celebração do mistério pascal de Cristo, sabendo que “Cristo é a plenitude do culto divino” (SC, n. 5),

essa celebração e a consequente reflexão sobre Cristo (como plenitude do culto) devem fundir-se numa experiência cheia de sentimentos e de vivência espiritual. Nessa experiência a dimensão pessoal não

anula a comunitária, tampouco deve haver ruptura entre a dimensão interior e a exterior, desde o

momento em que ambos os elementos são realidades indissolúveis do ser humano e, portanto, se colocam em relação em tudo o que nos leva a entrar em contato com a divindade.

A essa visão comunitária da celebração não se opõe de modo algum à vivência interpessoal de cada

membro, porque está carregada de elementos espirituais, desde o momento em que não podemos esquecer que não pode haver uma liturgia sem a dimensão mais pessoal do ser humano. Essa dimensão,

que adquire força na vida, supõe um prolongamento existencial da liturgia.

Partindo do princípio de que “toda celebração litúrgica, pois, como obra de Cristo sacerdote e de seu

corpo, a Igreja, é ação sagrada por excelência, cuja eficácia, com o mesmo título e no mesmo grau, não a iguala nenhuma outra ação da Igreja” (SC, n. 7), toda comunidade eclesial deve realizar o esforço por

centrar suas melhores forças na celebração litúrgica, com uma especial consideração da eucaristia.

A oração é um momento particular de nossa existência, no qual se realiza uma especial relação com

Deus, que nenhuma outra reunião ou assembleia humana poderá substituir. Na oração, feita mais de silêncio do que de palavras, é o Espírito que fala em nós, fazendo com que nossos sentimentos se

insiram no fluxo de amor eterno que o Pai dá ao Filho e este, por sua vez, em ação de graças, devolve ao Pai. Com a oração, entramos em comunhão com Deus, vivemos sua vida divina, tornamo-nos

contemplativos dos mistérios de sua vida humano-divina, que celebramos na ação litúrgica. O conceito de

oração pode revelar o tipo de espiritualidade ao qual estamos habituados ou no qual recebemos certa educação. O Catecismo da Igreja Católica54 diz que todo tipo de oração encontra seu sentido e sua razão

na liturgia. Se, quando se fala de oração, se continua vendo unicamente o contato íntimo e pessoal com o Senhor, onde a dimensão comunitária está ausente, corremos o risco de reduzi-la e minimiza-la.

Se, ao contrário, entendemos por oração uma ação comunitária e eclesial, que invade toda a celebração, então a oração constituirá o substrato de toda celebração e seu elemento catalisador, evitando tanto uma

celebração que se transforme em um “acontecimento” como um conjunto de rubricas perfeitamente

53 FLORES, Juan Javier. Introdução à Teologia Litúrgica. São Paulo : Paulinas, 2006, p. 398 a 405. 54 CIgC 1073

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desenvolvidas e celebradas na própria oração, que, ao carecer da dimensão orante, carece de

fundamento.

Apesar da clareza com a qual se expressam os textos pós-conciliares e os documentos do magistério, não se chegou, ainda, à meta fixada. Embora com os novos livros litúrgicos tenhamos chegado a uma

descoberta da celebração litúrgica que deu esperanças motivadas de renovação, não conseguimos

traduzir o conteúdo desses livros em nossa espiritualidade eclesial presente concretamente na vida cristã (de cada fiel).

Continua aberto, portanto, o problema da relação entre a vida espiritual e a vida litúrgica e da

consequente experiência de Deus. Toda experiência divina tem sua fonte e seu modo de ser na celebração litúrgico-sacramental. Sobre isso, poderiam ser feitas as seguintes propostas de

espiritualidade litúrgica como desejo de esclarecer as relações entre teologia, celebração e vida:

1. A espiritualidade litúrgica é comunitária, mas não exclui a vivência pessoal: a dimensão comunitária deve acontecer continuamente. Da dimensão comunitária à dimensão pessoal há um fluxo

recíproco que supõe um intercâmbio de experiências de natureza interior. Celebra-se em comum e adora-

se em particular, mas sem que a dimensão privada deixe de ser interior e, ao mesmo tempo, comunitária. Para tornar concretos os princípios da constituição sobre a sagrada liturgia, promulgou-se a

instrução geral Inter oecumenici, a fim de aplicar devidamente a Sacrosanctum concilium (26 de julho de 1965), na qual se estabelece que, para que os fiéis se acostumem a participar plenamente na celebração

litúrgica e para alimentar através dela sua própria vida espiritual para comunicá-la depois aos demais,

devem ser levados à prática seus conteúdos nos seminários e nas casas de estudo e de formação. Trata-se, portanto, de assimilar a celebração na vida e de inserir nesta sua força renovadora. Essa contínua e

recíproca relação entre tais dimensões, que vão além da simples celebração e superam a vida cotidiana, introduz-nos no tempo de Deus.

2. A centralidade eucarística não pode ficar à margem da vida espiritual de uma comunidade

cristã: trata-se de chegar a um maior entendimento da celebração eucarística e de traduzir em realidade

o que santo Tomás, a propósito da eucaristia, dizia: “o efeito próprio desse sacramento é a conversão do ser humano a Cristo, vindo a dizer com o apóstolo: Vivo, mas não eu, na verdade, é Cristo que vive em

mim” (Gl 2,20). O grande mérito da reforma litúrgica promovida pelo Papa Paulo VI e continuada por João Paulo II consistiu em abrir as portas para uma autêntica espiritualidade litúrgica. A eucaristia foi

definida como “fonte e vértice de toda a vida cristã”. Graças à espiritualidade litúrgica não podemos

permanecer nos aspectos históricos ou rubricistas – certamente importantes – mas temos de tentar chegar ao coração da celebração para beber da fonte de onde indiscutivelmente brota a totalidade da

vida da Igreja.

3. Deve-se conhecer, celebrar, viver e assimilar o melhor possível todo o mistério eucarístico,

centro da liturgia cristã, e fazer dele o centro da comunidade cristã: a centralidade da eucaristia exige um esforço notável de atingimento de

toda a comunidade, pois é o paradigma de uma ação celebrativa que constitui a vida da comunidade no espaço e no tempo, no passado e no

hoje, desde os primeiros séculos até o momento atual. Na eucaristia realiza-se cada igreja diocesana e particular; nela cada comunidade cristã faz-se

universal, aberta às dimensões missionária e contemplativa.

4. Com a eucaristia chegamos ao núcleo mais original e autêntico

da espiritualidade cristã, numa chave litúrgico-experiencial: na celebração eucarística encontramos realizada em grau máximo a presença

do Senhor e de sua obra salvífica. A passagem da celebração para a vida é

fundamental. O papa Leão Magno expressava-o com estas palavras: “Que se complete a obra celebrada no sacramento”.

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5. A primazia da eucaristia consiste numa celebração memorial de Cristo como Salvador,

mediante a qual nos tornamos co-herdeiros e comensais à espera do banquete eterno: a comunidade eucarística torna-se uma só com a celebração. Uma expressão de são João Crisóstomo

denota essa simbiose: “Não queremos somente aderir a Cristo, mas queremos também nos unir a ele, porque, se nos separarmos dele, pereceremos”. Na celebração eucarística, fazendo-nos comensais da

mesa de Cristo, introduzimo-nos no mesmo mistério eucarístico no qual comungamos. A participação na

vida gloriosa do Deus feito homem, Jesus Cristo, é-nos concedida já na forma de banquete neste mundo, como antecipação do banquete escatológico, desde o momento no qual a eternidade age já entre o

tempo e a plenitude de Cristo, até chegar a nós.

6. A participação no único pão eucarístico realiza a unidade da comunidade celebrante,

fazendo dela uma só em Cristo: como os grãos de trigo, antes dispersos, se unem no pão, agora, mediante o pão eucarístico, os seres humanos de todos os tempos e de todos os povos transformam-se

em um só corpo, que é a Igreja. Desse corpo eclesial faz parte a comunidade celebrante, que, durante o tempo e no hoje, reúne-se no banquete do Senhor, vivendo, assim, a experiência de sua presença

permanente. Nesse hoje da celebração realiza-se o mistério do tempo nem tríplice nível: como categorização do hoje, como relação mais íntima entre a celebração e a divindade e como fato admirável,

segundo o qual a dimensão divina, entrando na história, deixa-a carregada de eternidade. Na celebração

encontramos o tempo pleno do acontecimento salvífico, sabendo que este é já, em sai mesmo, celebração.

7. A celebração do louvor divino transforma os elementos eucarísticos em chave orante e

estende-se para a vida: existe um modo privilegiado de penetrar na experiência religiosa que

poderíamos chamar sacramentalidade em chave orante. Trata-se de penetração-compreensão de toda a realidade mistérica numa dimensão de súplica e de louvor, portanto, oracional. Por isso, “no vértice de

sua celebração litúrgica, a Igreja reconhece-se na presença mística do sacrifício de Cristo como mistério de sua fé”, acontece a unidade e a identificação entre o mistério original e o mistério do culto, entre a

paixão e cada celebração da eucaristia, que se abrem para novas perspectivas, onde o mistério de Cristo entra no louvor oracional da Igreja de maneira sinérgica.

8. Uma reflexão “vivificante” a partir do dado litúrgico: a vida espiritual da Igreja passa através da liturgia. Assim o expressava João Paulo II: “Na liturgia, a Igreja compreende-se a si mesma, alimenta-se

na mesa da Palavra e do pão da vida, recupera forças todos os dias para continuar o caminho que deve conduzi-la à alegria e à paz da terra prometida”.

A liturgia não se esgota na celebração, mas existe um antes e um depois que devem ser cuidados com atenção. Se a celebração é a fonte e o vértice da vida da Igreja, sua preparação será muito importante e

não será menos importante seu prolongamento. Assim, da celebração passamos para a vida. Não pode haver divórcio entre celebração e vida. A celebração litúrgica exige e postula uma vida litúrgica, que,

imersa na celebração das coisas sagradas, busca seu prolongamento na vida espiritual e na experiência

do viver cotidiano.

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X. Estudo Dirigido – 1 Leia o Catecismo da Igreja Católica (§ 1066 a 1112) e responda às seguintes questões:

1. Na Liturgia, toda a oração cristã encontra sua __________________ e seu ___________________.

2. A bênção divina penetra na história da humanidade a partir de _________________________.

3. A dupla dimensão da liturgia consiste em que, de um lado, a Igreja bendiga a ________________ e,

de outro, Deus envie o seu _________________________________ sobre a Igreja.

4. Ao derramar sobre os Apóstolos seu Espírito, Cristo lhes concede o poder de ____________________.

5. É o Espírito Santo que prepara a assembleia: dá aos leitores e ouvintes a compreensão da

_____________________________; recorda à comunidade tudo aquilo que ________________ fez por

nós; e torna presente o mistério celebrado.

Leia o livro “Liturgia – Mistério da Salvação”, do Monsenhor Guido Marini, e responda às seguintes

questões:

6. Devemos acolher a Liturgia da Igreja como um ______________ e nos deixarmos transformar por ela,

visto que trata-se de uma ação _____________________ por excelência.

7. Entendida dessa forma, fica claro que a Liturgia não pode ser manipulada e renunciamos a procurar

nela nossa _________________________________.

8. Rezar voltado para o Oriente expressa de forma visível que nosso coração está voltado a

____________________.

9. Tudo na Liturgia deve nos levar à ____________________ e à união com Deus.

10. Ter a _________________________ como meta é o testemunho mais expressivo de uma

participação ____________________ na Liturgia.

Pergunta final: O que você entende pela frase: “a Liturgia é um dom que nos precede”?

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XI. Diretório para Celebrações Dominicais na Ausência do Presbítero

Congregação para o Culto Divino

2 de junho de 1988

O "Diretório para as celebrações dominicais na

ausência do presbítero" é uma resposta a diversos fatores convergentes. O primeiro deles

é a realidade atual: nem sempre e em toda a

parte é possível realizar uma celebração plena do domingo (n. 2). Outro fator é: o pedido de várias

conferências episcopais, que nos últimos anos solicitaram à Santa Sé orientações para esta

situação de fato (n. 7). Em terceiro lugar o fator experiência: a Santa Sé, através de indicações e

orientações gerais, e vários bispos nas suas

Igrejas particulares, ocuparam-se deste assunto. O Diretório beneficiou-se da experiência de todas

estas intervenções ao avaliar as vantagens e ao mesmo tempo os possíveis limites de tais

celebrações.

O pensamento fundamental de todo o Diretório é o de assegurar, da melhor maneira e em cada

caso, a celebração cristã do domingo, sem esquecer que a Missa permanece a sua

celebração própria, mas reconhecendo ao

mesmo tempo a presença de elementos importantes, mesmo quando ela não pode ser

celebrada. Este documento não pretende promover e ainda

menos facilitar de maneira desnecessária ou artificial as assembleias dominicais sem

celebração da Eucaristia. Ele quer apenas

orientar e regulamentar aquilo que convém fazer quando as circunstâncias reais reclamam uma

decisão deste gênero (n. 21, 12). A primeira parte do Diretório é inteiramente

dedicada à apresentação, de modo esquemático,

do sentido do domingo e toma como ponto de

partida o n. 106 da Constituição Sacrosanctum Concilium (n. 8). A segunda parte prevê as condições necessárias

para decidir destas assembleias na ausência do

presbítero, numa diocese, de maneira habitual. Do ponto de vista orientativo e prático é a parte

mais importante do documento. Quanto aos leigos prevê-se, em tal caso, a sua colaboração.

Trata-se dum exemplo das responsabilidades que os pastores podem entregar a membros da sua

comunidade.

A terceira parte é uma descrição breve do rito das celebrações dominicais da Palavra com

distribuição da Eucaristia. Como noutros documentos semelhantes, a

aplicação deste Diretório depende de cada bispo,

de acordo com a situação da sua Igreja, e, quando se trata de normas mais amplas,

depende da Conferência Episcopal. O que é importante é assegurar às comunidades

que se encontram em tais situações a

possibilidade de se reunirem no domingo, tendo a preocupação de inserir estas reuniões na

celebração do ano litúrgico (n. 36) e de as relacionar com a parte da comunidade que

celebra a Eucaristia à volta do próprio pastor (n. 42).

Em todos os casos, o fim pastoral do domingo

segundo as afirmações de Paulo VI (n. 21) e de João Paulo II (n. 50) continua a ser o de

sempre: celebrar e viver o domingo de acordo com a tradição cristã.

Cidade do Vaticano, junho de 1988.

PROÊMIO 1. A Igreja de Cristo, desde o dia de Pentecostes, após a descida do Espírito Santo, sempre se reuniu

fielmente para celebrar o mistério pascal, no dia que foi chamado "domingo", em memória da ressurreição do Senhor. Na assembleia dominical a Igreja lê aquilo que em todas as Escrituras se refere a

Cristo55 e celebra a Eucaristia como memorial da morte e ressurreição do Senhor, até que Ele venha.

2. Todavia nem sempre se pode ter uma celebração plena do domingo, pelo que muitos têm sido e ainda são os fiéis aos quais, "por falta do ministro sagrado ou por outra causa grave, se torna impossível

participar na celebração eucarística"56. 3. Em diversas regiões, depois da primeira evangelização, os bispos confiaram aos catequistas o encargo

de reunir os fiéis no dia de domingo e de dirigir a sua oração na forma dos exercícios de piedade. Com

efeito, os cristãos, tendo aumentado em número, achavam-se dispersos em muitos lugares, por vezes até afastados, de modo que o sacerdote não podia reuni-los cada domingo.

55 Cf. Lc 24,27. 56 CIC. cân. 1248, parágr. 2.

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4. Noutros lugares, por causa da perseguição contra os cristãos, ou por outras severas limitações impostas à liberdade religiosa, é totalmente proibido aos fiéis reunirem-se no domingo. E tal como

outrora houve cristãos, que se mantiveram fiéis à participação na assembleia dominical até ao martírio57,

assim hoje há os que tudo fazem por se reunir no domingo para orar, em família ou em pequenos grupos, mesmo quando privados da presença do ministro sagrado.

5. Por outro lado, nos nossos dias, em várias regiões, cada paróquia já não pode usufruir da celebração da Eucaristia em cada domingo, porque o número dos sacerdotes diminuiu. Além disso, em virtude das

circunstâncias sociais e econômicas, muitas paróquias despovoaram-se. Por tal motivo, a muitos presbíteros foi entregue o encargo de celebrar a Missa várias vezes no domingo, em igrejas dispersas e

distantes entre si. Mas tal costume não parece sempre oportuno, nem para as paróquias privadas de

pastor próprio, nem para esses mesmos sacerdotes. 6. Por isso, em algumas Igrejas particulares, nas quais se verificam as condições acima referidas, os

bispos julgaram necessário estabelecer outras celebrações dominicais, na falta do presbítero, para que a reunião semanal dos cristãos se realize do melhor modo possível, e seja assegurada a tradição cristã no

domingo.

Não raro, sobretudo em terras de missão, os próprios fiéis, conscientes da importância do domingo, com a cooperação dos catequistas e dos religiosos, reúnem-se para ouvir a palavra de Deus, para orar e por

vezes também para receber a sagrada comunhão. 7. Consideradas atentamente todas estas razões, e tidos em conta os documentos promulgados pela

Santa Sé58, a Congregação do Culto Divino, secundando aliás os desejos das Conferências Episcopais, julga oportuno recordar alguns elementos doutrinais sobre o domingo, e estabelecer as condições que

tornam legitimas tais celebrações e ainda fornecer algumas indicações para o correto desenvolvimento

das mesmas. Será da competência das Conferências Episcopais, conforme for sendo oportuno, determinar

posteriormente as próprias normas e adaptá-las à índole dos diversos povos e às várias circunstâncias, e disso informar a Sé Apostólica.

Capítulo I – O DOMINGO E A SUA SANTIFICAÇÃO

8. "Por tradição apostólica, que nasceu do próprio dia da ressurreição de Cristo, a Igreja celebra o mistério pascal todos os oito dias, naquele que se denomina, com muita razão, dia do Senhor ou

domingo"59.

9. Testemunhos da assembleia dos fiéis, no dia que já no Novo Testamento é chamado "domingo"60, aparecem explicitamente nos antiquíssimos documentos dos séculos primeiro e segundo61, entre os quais

se salienta o de São Justino: "No chamado dia do sol, todos, que habitem na cidade ou no campo, se reúnem num mesmo lugar... "62. Como o dia em que os cristãos se reuniam não coincidia com os mais

festivos do calendário grego e romano, tal fato constituía, mesmo para os outros cidadãos, um certo sinal do nome cristão.

10. Desde os primeiros séculos os pastores nunca cessaram de inculcar nos fiéis a necessidade de se

reunirem no domingo: "Não queirais separar-vos da Igreja, pelo fato de não vos reunirdes, vós sois membros de Cristo... não queirais tornar-vos negligentes, nem separar o Salvador dos seus membros,

nem rasgar e desmembrar o seu corpo... "63 Isso mesmo recordou recentemente o Concílio Vaticano II com as palavras: "Neste dia os fiéis devem reunir-se em assembleia para ouvir a palavra de Deus e

participarem na Eucaristia, e assim fazerem memória da paixão, da ressurreição e da glória do Senhor

57 Cf. Acta Martyrum Bytiniae, em D. Ruíz Bueno. Actas de los Martyres, BAC 75 (Madrid 1951) 973. 58 SCR e Consilium, Instrução Inter oecumenict (26 de setembro 1964). n. 37, AAS 56 (1964) 884-885;

C.D.C. 1248 parágrafo 2. 59 Conc. VAT. II, Constituição sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium, n. 100. Cf. ibid. Apêndice. Declaração do Conc. VAT. II sobre a reforma do calendário. 60 Cf. Ap 1,10. Cf. também Jo 20,19.26; At 20,7-12; 1Cor 16,2; Hb 10,24. 25. 61 Didaqué 14, 1; ed. F. X. FUNK, Doctrina duodecim Apostolorum, p. 42. 62 S. Justino, Apologia I, 67, PG 6, 430. 63 Cf. Didascália dos Apóstolos, 2, 59, 1-3; ed. F, X. FUNK 1, p. 170.

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Jesus, e darem graças a Deus que os regenerou na esperança viva pela ressurreição de Jesus Cristo de entre os mortos"64.

11. A importância da celebração do domingo na vida dos fiéis é assim definida por Santo Inácio de

Antioquia: "(Os cristãos) já não celebram o sábado, mas vivem segundo o domingo, no qual até mesmo a nossa vida ressurgiu por Ele (Cristo) e pela sua morte"65. O sentido cristão dos fiéis, quer no passado,

quer hoje em dia, teve sempre em tão grande honra o domingo, que mesmo nos tempos de perseguição e nas regiões de culturas afastadas ou até opostas à fé cristã, de modo nenhum aceitou substituir o dia

do Senhor. 12. Os elementos requeridos para haver assembleia dominical são principalmente os seguintes:

a) reunião dos fiéis para manifestar que a Igreja não é uma assembleia formada espontaneamente, mas

convocada por Deus, ou seja, o povo de Deus organicamente estruturado, ao qual preside o sacerdote na pessoa de Cristo Chefe;

b) instrução sobre o mistério pascal por meio das Escrituras que são lidas e que o sacerdote ou o diácono explicam;

c) celebração do sacrifício eucarístico, a se realizar pelo sacerdote na pessoa de Cristo e oferecida em

nome de todo o povo cristão, pela qual se torna presente o mistério pascal. 13. O cuidado pastoral há de procurar principalmente que o sacrifício da Missa seja celebrado cada

domingo, pois só por ele se perpetua a Páscoa do Senhor66 e a Igreja se manifesta plenamente. "O domingo é o principal dia de festa a propor e a inculcar na piedade dos fiéis... Não lhe devem ser

antepostas outras celebrações, a não ser que sejam de máxima importância, porque o domingo é o fundamento e o núcleo de todo o ano litúrgico"67.

14. É necessário que tais princípios sejam inculcados desde o inicio da formação cristã, para que os fiéis

observem voluntariamente o preceito da santificação do dia de festa, e compreendam o motivo pelo qual se reúnem cada domingo para celebrar a Eucaristia, convocados pela Igreja e não apenas por sua

devoção privada. Assim os fiéis poderão fazer a experiência do domingo como sinal da transcendência de Deus acima do trabalho do homem e não apenas como simples dia de repouso; e poderão ainda, graças

à assembleia dominical, perceber mais profundamente e mostrar exteriormente que são membros da

Igreja68. 15. Os fiéis devem poder encontrar nas assembleias dominicais, como na vida da comunidade cristã, quer

uma participação ativa quer uma verdadeira fraternidade, e devem ter a oportunidade de se revigorarem espiritualmente conduzidos pelo Espírito. Desse modo se protegerão também mais facilmente contra os

atrativos das seitas, que lhes prometem ajuda no sofrimento da solidão e mais profunda satisfação das

suas aspirações religiosas. 16. Por fim, a ação pastoral deve favorecer as iniciativas que visam tornar o domingo "também dia de

alegria e de repouso do trabalho"69, de modo que na sociedade atual a todos ele apareça como sinal de liberdade, e consequentemente como dia instituído para o bem da própria pessoa humana, a qual, sem

dúvida, tem mais valor do que os negócios e os processos produtivos. 17. A palavra de Deus, a Eucaristia e o ministério sacerdotal, são dons que o Senhor apresenta à Igreja,

sua Esposa. Devem ser acolhidos, e também solicitados, como graça de Deus. A Igreja, que possui estes

bens sobretudo na assembleia dominical, nela dá graças a Deus70, enquanto espera a alegria perfeita do dia do Senhor "diante do trono de Deus e na presença do Cordeiro"71.

64 Conc. Vat. II, Constituição sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium, n. 106. 65 S. Inácio de Antioquia, Carta aos magnésios 9, 1; ed. F. X. FUNK I, p. 199 (Cartas de Santo Inácio de Antioquia, Intr., trad. e notas de Dom Paulo Evaristo Arns, Editora Vozes 19843, p. 53). 66 Cf. Paulo VI. Alocução a alguns bispos da França em visita ad sacra limina. 26 de março de 1977, AAS 69 (1977) 465: "O objetivo deve continuar a ser a celebração do sacrifico da Missa. única e verdadeira

realização da Páscoa do Senhor". 67 Conc. VAT. II. Constituição sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium, n. 106. 68 Cf. SCR, Instrução Eucharisticum mysterium (25 de maio de 1967), n. 25, AAS 59 (1967) 555. 69 Ibid., Conc. VAT. II, Constituição sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium. n. 106. 70 Cf. "O sentido do domingo numa sociedade pluralista. Reflexões pastorais da Conferência dos Bispos

do Canadá" em La Documentation Catholique, n. 1935 (1987) 273-276. 71 Ap 7,9.

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Capítulo II – CONDIÇÕES PARA AS CELEBRAÇÕES DOMINICAIS

NA AUSÊNCIA DO PRESBÍTERO

18. Quando em alguns lugares não for possível celebrar a Missa no domingo, veja-se primeiro se os fiéis não podem deslocar-se à igreja dum lugar mais próximo e participar aí na celebração do mistério

eucarístico. Tal solução é de recomendar também nos nossos dias, e até de conservar quanto possível; isso exige, todavia, que os fiéis sejam devidamente instruídos acerca do sentido pleno da assembleia

dominical e aceitem de bom grado as novas situações. 19. É para desejar que, mesmo sem a Missa, aos fiéis reunidos em diversas circunstâncias no dia do

domingo, sejam abertos com largueza os tesouros da Sagrada Escritura e da oração da Igreja, a fim de

não serem privados das leituras que são lidas no decurso do ano durante a Missa, nem das orações dos tempos litúrgicos.

20. Entre as formas que se encontram na tradição litúrgica, quando a celebração da Missa não é possível, é muito recomendada a celebração da palavra de Deus72, que, se for oportuno, pode ser seguida da

comunhão eucarística. Desse modo os fiéis podem alimentar-se ao mesmo tempo da Palavra e do Corpo

de Cristo. "Na verdade, escutando a palavra de Deus reconhecem que as suas maravilhas, ali anunciadas, atingem a plenitude no mistério pascal, cujo memorial se celebra sacralmente na Missa, e no qual

participa pela comunhão"73. Além disso, nalgumas circunstâncias, pode unir-se a celebração do dia do Senhor e a celebração de alguns sacramentos, e principalmente dos sacramentais, segundo as

necessidades de cada comunidade. 21. É necessário que os fiéis percebam com clareza que tais celebrações têm caráter supletivo, e não

venham a considerá-las como a melhor solução das novas dificuldades ou concessão feita à

comodidade74. Por isso as reuniões ou assembleias deste gênero nunca podem realizar-se no domingo naqueles lugares onde a Missa já foi ou será celebrada nesse dia, ou foi celebrada na tarde do dia

anterior, mesmo noutra língua; e não convém repetir tal assembleia. 22. Evite-se com cuidado qualquer confusão entre as reuniões deste gênero e a celebração eucarística.

Tais reuniões não devem diminuir, mas aumentar nos fiéis o desejo de participar na celebração

eucarística e devem torná-los mais diligentes em frequentá-la. 23. Compreendam os fiéis que não é possível a celebração do sacrifício eucarístico sem o sacerdote e que

a comunhão eucarística, que eles podem receber em tais reuniões, está intimamente unida ao sacrifício da Missa. Partindo daqui pode mostrar-se aos fiéis quão necessário é orar "para que se multipliquem os

dispensadores dos mistérios de Deus, e sejam perseverantes no seu amor"75.

24. Compete ao bispo diocesano, ouvindo o parecer do Conselho Presbiteral, estabelecer se na sua diocese devem realizar-se regularmente reuniões dominicais sem a celebração da Eucaristia, e definir

para elas não só normas gerais, mas também particulares, tendo em conta os lugares e as pessoas. Portanto, não se constituam assembleias deste gênero, a não ser por convocação do bispo e sob

ministério pastoral do pároco. 25. "Nenhuma comunidade cristã se edifica sem ter a sua raiz e o seu centro na celebração da santíssima

Eucaristia"76. Por isso, antes do bispo estabelecer que se realizem reuniões dominicais sem a celebração

eucarística, devem ser examinadas, além do estado das paróquias (cf. n. 5), as possibilidades de recorrer a presbíteros, mesmo religiosos, não diretamente dedicados à cura de almas, e a frequência às Missas

celebradas nas diversas igrejas e paróquias77. Mantenha-se a primazia da celebração eucarística sobre todas as outras ações pastorais, especialmente no domingo.

26. O bispo, pessoalmente ou por meio de outrem, instruirá a comunidade diocesana com uma catequese

oportuna sobre as causas determinadas desta provisão, mostrando a sua gravidade e exortando à corresponsabilidade e à cooperação. Ele designará um delegado ou uma comissão especial que vele pela

correta realização das celebrações, escolherá aqueles que as hão de promover e providenciará para que

72 Cf. Conc. VAT. II, Constituição sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium, n. 35, 4. 73 Ritual Romano, A Sagrada Comunhão e o Culto do Mistério Eucarístico fora da Missa, n. 26. 74 Cf. Paulo VI, Alocução a alguns bispos de França em visita ad sacra limina, 26 de março de 1977, AAS 69 (1977) 465: "Avançai com discernimento, mas sem multiplicar este tipo de assembleias, como se

fosse a melhor solução e a última oportunidade". 75 Missal Romano, Pelas vocações às ordens sacras, oração sobre as oblatas. 76 Conc. VAT. II, Decreto sobre a vida e o ministério dos presbíteros, Presbyterorum ordinis, n. 6. 77 SCR, Instrução Eucharisticum mysterium (25 de maio de 1967), n. 26, AAS 59 (1967) 555.

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eles próprios sejam devidamente instruídos. Todavia terá sempre a preocupação de que esses fiéis possam participar na celebração eucarística algumas vezes durante o ano.

27. Compete ao pároco informar o bispo sobre a oportunidade de tais celebrações, a realizar na área da

sua jurisdição, preparar os fiéis para elas, visitá-los de vez em quando durante a semana, celebrar-lhes os sacramentos no tempo devido, sobretudo a Penitência. Tal comunidade poderá assim experimentar

verdadeiramente o modo como no dia do domingo se reuniu não "sem presbítero", mas somente "na sua ausência", ou melhor, "na expectativa da sua vinda".

28. Quando a celebração da Missa não for possível o pároco tomará providências para que a sagrada comunhão possa ser distribuída. Fará as coisas de modo que em cada uma das comunidades se faça a

celebração da Eucaristia no tempo estabelecido. As hóstias consagradas devem ser renovadas com

frequência e guardadas num lugar seguro. 29. Para dirigir estas reuniões dominicais chamem-se os diáconos, como primeiros colaboradores dos

sacerdotes. Ao diácono, ordenado para apascentar o povo de Deus e para o fazer crescer, compete dirigir a oração, proclamar o Evangelho, fazer a homilia e distribuir a Eucaristia78.

30. Quando estão ausentes quer o presbítero quer o diácono, o pároco deve designar leigos, aos quais

confiará o cuidado das celebrações, isto é, a responsabilidade da oração, o serviço da Palavra, e a distribuição da sagrada comunhão.

Sejam eleitos por ele em primeiro lugar os acólitos e os leitores, instituídos para o serviço do altar e da palavra de Deus. Na falta destes, podem ser designados outros leigos, homens e mulheres, que pela

força do Batismo e da Confirmação podem exercer este múnus79. Devem ser escolhidos tendo em atenção as suas qualidades de vida, em consonância com o Evangelho, e tenha-se também em conta que

possam ser aceitos pelos fiéis. Habitualmente a designação será feita por um período determinado de

tempo e deve ser manifestada publicamente à comunidade. Convém que se faça por eles uma oração a Deus numa celebração80.

O pároco tenha o cuidado de dar a estes leigos uma formação adaptada e contínua, e prepare com eles celebrações dignas (cf. Capítulo III).

31. Os leigos designados devem considerar o múnus que lhes foi confiado não tanto como uma honra,

mas principalmente como um encargo, e em primeiro lugar como um serviço em favor dos irmãos, sob a autoridade do pároco. O seu múnus. não lhes é próprio, mas supletivo, pois o exercem "quando a

necessidade da Igreja o sugere, na falta dos ministros"81. "Façam tudo e só o que pertence ao ofício que lhes foi confiado"82. Exerçam o seu múnus com piedade sincera e com ordem, como convém ao seu ofício

e como justamente deles exige o povo de Deus83.

32. Se no domingo não for possível fazer a celebração da palavra de Deus com distribuição da sagrada comunhão, recomenda-se vivamente aos fiéis "que se entreguem durante um tempo razoável,

pessoalmente ou em família ou, segundo as circunstâncias, em grupos de famílias"84 à oração. Nestes casos as transmissões televisivas das celebrações sagradas podem ser uma boa ajuda.

33. Tenha-se, sobretudo, presente a possibilidade de celebrar alguma parte da Liturgia das Horas, por exemplo Laudes matutinas ou Vésperas, nas quais podem inserir-se as leituras do domingo. Com efeito,

quando "os fiéis são convocados e se reúnem para celebrar a Liturgia das Horas, pela união das vozes e

dos corações manifestam a Igreja que celebra o mistério de Cristo"85. No fim desta celebração pode ser distribuída a comunhão eucarística (cf. n. 46).

34. "A graça do Redentor não falta de modo nenhum a cada um dos fiéis ou às comunidades, que por causa das perseguições ou por falta de sacerdotes se veem privadas, por muito ou pouco tempo, da

celebração da sagrada Eucaristia. Com efeito, animados interiormente pelo desejo do sacramento e

unidos na oração com toda a Igreja, invocam o Senhor e elevam para Ele os seus corações, e assim, pela

78 Cf. Paulo VI, Motu proprio Ad pascendum (15 de agosto de 1972), no I, AAS 64 (1972) 534. 79 CIC cân. 230. parágrafo 3. 80 Ritual Romano. De Benedictionibus, cap. II, I, B. 81 CIC cân. 230. parágrafo 3. 82 Conc. Vat. II, Constituição sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium, n. 28. 83 Cf. ibid., n 29. 84 CIC. cân. 1248, parágr. 2. 85 Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas, n. 22.

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força do Espírito Santo, participam da comunhão com a Igreja, corpo vivo de Cristo, e com o próprio Senhor... e têm parte, desse modo, no fruto do sacramento"86.

Capítulo III – A CELEBRAÇÃO

35. A ordem a observar na reunião do dia dominical, quando não há Missa, consta de duas partes, a saber, a celebração da palavra de Deus e a distribuição da comunhão. Na celebração não deve ser

inserido o que é próprio da Missa, sobretudo a apresentação dos dons e a oração eucarística. O rito da celebração deve ser organizado de tal modo que favoreça totalmente a oração e dê a imagem duma

assembleia litúrgica e não duma simples reunião.

36. Os textos das orações e das leituras para cada domingo ou solenidade tomam-se habitualmente do Missal e do Lecionário. Desse modo os fiéis, seguindo o curso do Ano litúrgico, terão possibilidade de orar

e de ouvir a palavra de Deus em comunhão com outras comunidades da Igreja. 37. O pároco, ao preparar a celebração com os leigos designados, pode fazer adaptações, tendo em

conta o número dos participantes e a capacidade dos animadores, e relativamente aos instrumentos que

servem ao canto e à execução musical. 38. Quando o diácono preside à celebração, comporta-se do modo que é próprio ao seu ministério nas

saudações, nas orações, na leitura do Evangelho e na homilia, na distribuição da comunhão e na despedida dos participantes com a bênção. Paramenta-se com as vestes próprias do seu ministério, isto

é, a alva com a estola, e, se for oportuno, a dalmática, e utilize a cadeira presidencial. 39. O leigo que orienta a reunião comporta-se como um entre iguais, como sucede na Liturgia das Horas, quando o

ministro é leigo ("O Senhor nos abençoe...", "Bendigamos ao Senhor..."). Não deve usar as palavras que

pertencem ao presbítero ou ao diácono, e deve omitir aqueles ritos, que de modo mais direto lembram a Missa, por exemplo: as saudações, sobretudo "O Senhor esteja convosco" e a forma de despedida, que

fariam aparecer o moderador leigo como um ministro sagrado87. 40. Deve usar uma veste que não desdiga do ofício que desempenha, ou vestir aquela que o bispo

eventualmente tenha estabelecido88. Não deve utilizar a cadeira presidencial, mas prepare-se antes uma

outra cadeira fora do presbitério89. O altar, que é a mesa do sacrifício e do convívio pascal, deve servir apenas para sobre ele colocar o pão consagrado antes da distribuição da Eucaristia.

Ao preparar a celebração cuide-se da conveniente distribuição dos serviços, por exemplo, para as leituras, para os cânticos etc., e da disposição e arranjo dos lugares.

41. O esquema da celebração compõe-se dos seguintes elementos:

a) Os ritos iniciais, cuja finalidade é conseguir que os fiéis, quando se reúnem, constituam a comunidade e se disponham dignamente para a celebração;

b) a liturgia da palavra, na qual o próprio Deus fala ao seu povo, para lhe manifestar o mistério da redenção e da salvação; o povo responde mediante a profissão de fé e a oração universal;

c) a ação de graças, com a qual se bendiz a Deus pela sua imensa glória (cf. n. 45); d) os ritos da comunhão, pelos quais se exprime e realiza a comunhão com Cristo e com os irmãos,

sobretudo com aqueles que, no mesmo dia, participam do sacrifício eucarístico;

e) os ritos da conclusão, através dos quais se indica a relação que existe entre a liturgia e a vida cristã. A Conferência Episcopal, ou o próprio bispo, tendo em conta as circunstâncias de lugar e de pessoas,

pode determinar melhor a própria celebração, com subsídios preparados pela comissão nacional ou diocesana de Liturgia. Todavia este esquema de celebração não se deve modificar sem necessidade.

42. Em aviso inicial, ou noutro momento da celebração, o moderador recorde a comunidade com a qual,

naquele domingo, o pároco celebra a Eucaristia e exorte os fiéis a unirem-se a ela em espírito. 43. Para que os participantes possam assimilar a palavra de Deus, haja ou uma certa explicação das

leituras, ou um silêncio sagrado para meditar no que se ouviu. Como a homilia é reservada ao sacerdote ou ao diácono90, é para desejar que o pároco entregue a homilia por ele antecipadamente preparada ao

86 Congregação para a Doutrina da Fé, Carta sobre algumas questões relativas ao ministro da Eucaristia

(6 de agosto de 1983). AAS 75 (1983). 1007. 87 Cf. Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas, n. 258; cf. Ritual Romano, De Benedictionibus, n. 48,

119, 130, 181. 88 Ritual Romano, A Sagrada Comunhão e o Culto do Mistério Eucarístico fora da Missa. n. 20. 89 Cf. Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas, n. 258. 90 Cf. CIC. cân. 766-767.

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moderador do grupo, para que a leia. Observe-se, porém, aquilo que a Conferência Episcopal tiver estabelecido sobre o assunto.

44. A oração universal faça-se de acordo com a série das intenções estabelecidas91. Não se omitam as

intenções por toda a diocese, eventualmente propostas pelo bispo. De igual modo, proponha-se com frequência a intenção pelas vocações às Ordens sacras, pelo bispo e pelo pároco.

45. A ação de graças faz-se de um dos modos aqui indicados: a) depois da oração universal ou depois da distribuição da comunhão, o moderador convida à ação de

graças pela qual os fiéis exaltam a glória de Deus e a sua misericórdia. Isto pode fazer-se com um salmo (v. g. Salmos 99, 112, 117, 135, 147, 150), ou com um hino ou um cântico (v. g. "Glória a Deus nas

alturas", "Magnificat"...), ou também com uma prece litânica, que o moderador, de pé com os fiéis,

voltado para o altar, diz juntamente com todos eles; b) antes da oração do Pai-Nosso, o moderador aproxima-se do sacrário ou do lugar onde se encontra a

Eucaristia e, feita a genuflexão, depõe a píxide com a sagrada Eucaristia sobre o altar; depois, ajoelhado diante do altar, juntamente com os fiéis, canta o hino, o salmo ou a prece litânica, que, neste caso, é

dirigida a Cristo presente na santíssima Eucaristia.

No entanto, esta ação de graças não deve ter, de modo nenhum, a forma duma oração eucarística. Não se utilizem os textos do prefácio e da oração eucarística propostos no Missal Romano, e evite-se todo o

perigo de confusão. 46. Para o ordenamento do rito da comunhão, observe-se quando se diz no Ritual Romano da Sagrada

Comunhão fora da Missa92. Recorde-se com frequência aos fiéis que eles, mesmo quando recebem a comunhão fora da celebração da Missa, estão unidos ao sacrifício eucarístico.

47. Para a comunhão, utilize-se, se for possível, pão sagrado nesse mesmo domingo, na Missa celebrada

noutro lugar e daí levado pelo diácono ou por um leigo num recipiente (píxide ou caixa), e reposto no sacrário antes da celebração. Também pode utilizar-se pão sagrado na última Missa aí celebrada. Antes

da oração do Pai-Nosso, o moderador aproxima-se do sacrário, ou do lugar onde a Eucaristia foi reposta, pega no vaso com o Corpo do Senhor, depõe-no sobre a mesa do altar, e introduz a oração dominical, a

não ser que se faça a ação de graças, da qual se falou n. n. 45, b).

48. A oração dominical é sempre recitada ou cantada por todos, mesmo quando não se distribuí a sagrada comunhão. Pode se realizar o rito da paz. Depois da distribuição da comunhão "conforme as

circunstâncias, pode-se guardar por algum tempo o silêncio sagrado ou cantar um salmo ou um cântico de louvor"93. Pode-se também fazer a ação de graças da qual se falou n. n. 45, a).

49. Antes do fim da reunião, fazem-se os avisos e dão-se as notícias que dizem respeito à vida paroquial

ou diocesana. 50. Nunca se dirá suficientemente a importância capital da assembleia do domingo, quer como fonte de

vida cristã de cada pessoa e das comunidades, quer como testemunho do projeto de Deus: reunir todos os homens em seu Filho Jesus Cristo.

Todos os cristãos devem estar convencidos de que não é possível viver a sua fé sem participar, de maneira própria a cada um, na missão universal da Igreja, se não se alimentarem do pão eucarístico. De

igual modo "devem estar convencidos que a reunião do domingo é sinal para o mundo do mistério de

comunhão, que é a Eucaristia"94.

Este Diretório, preparado pela Congregação do Culto Divino, foi aprovado pelo Sumo Pontífice João Paulo II no dia 21 de maio de 1988, que o mandou publicar.

Sede da Congregação do Culto Divino, 2 de junho de 1988, na solenidade do SS. Corpo e Sangue de

Cristo.

Paulo Agostinho Card. MAYER, O. S. B. Prefeito

Virgílio NOÉ Arcebispo tit. de Voncária

Secretário

91 Cf. Instrução Geral do Missal Romano, n. 45-47. 92 Ritual Romano, A Sagrada Comunhão e o culto do Mistério Eucarístico fora da Missa, cap. I. 93 Cf. ibid., n. 37. 94 João PAULO II, Alocução a alguns bispos de França em visita ad sacra limina, no dia 27 de março de

1987.

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XII. Estudo Dirigido – 2 Leia o Diretório para Celebrações Dominicais na Ausência do Presbítero e responda as seguintes

questões:

1. O dia da assembleia cristã por excelência é o domingo, que recebe esse nome em memória da ______________________________ de Jesus.

2. Segundo o Diretório, há lugares em que os cristãos são impedidos de se reunirem aos domingos. Marque os motivos que impedem essa reunião segundo o texto:

( ) dispersão geográfica ( ) falta de vontade dos fiéis ( ) perseguição religiosa

3. Considerando a importância da celebração dominical, os fiéis cristãos ( ) nunca ( ) algumas vezes

substituíram o dia de domingo.

4. A Igreja só se manifesta plenamente no sacrifício da _________________________.

5. Quando não há celebração de Missa no domingo, a primeira opção sempre é deslocar os fiéis para a igreja do lugar ( ) mais movimentado ( ) mais próximo.

6. Caso não haja celebração da Missa, os fiéis não devem ser privados das ________________________ nem das _______________________ dos tempos litúrgicos.

7. A celebração eucarística tem ___________________________ sobre todas as outras ações pastorais,

especialmente no domingo.

8. Quando a celebração da Missa não for possível o pároco tomará providências para que a

___________________________________ possa ser distribuída.

9. Aos leigos que vierem a ser chamados para conduzir as celebrações na ausência do ministro ordenado,

deve ser dada _________________________ adaptada e contínua.

10. Sempre é indicado que a celebração sem ministro ordenado ocorra em ligação com alguma parte da _____________________________________________.

11. A celebração sem ministro ordenado possui duas partes: ____________________________________

e _________________________________________.

12. As leituras dessas celebrações devem ser retiradas do _____________________________.

13. O ministro leigo ( ) deve ( ) não deve usar as palavras próprias do ministro ordenado, omitindo os

ritos que façam a celebração parecer uma Missa, sobretudo a saudação:

“____________________________________________________”.

14. O ministro leigo não deve sentar-se na cadeira presidencial, mas deve utilizar um acento fora do __________________________.

15. Sobre o altar só deve ser colocado cibório com as __________________________________ que

serão distribuídas em comunhão.

16. A celebração é dividida em ( ) quatro ( ) cinco elementos.

17. O cibório com a reserva eucarística é retirado do sacrário e deposto no altar antes da oração do

______________________.

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XIII. Vocabulário Prático de Liturgia Pe. Luiz Miguel Duarte

1. Altar – mesa destinada à celebração do sacrifício eucarístico.

2. Alva – veste longa, de cor branca, usada pelos ministros sagrados nas celebrações.

3. Ambão – estante de onde se proclamam as leituras nas celebrações.

4. Âmbula ou cibório – recipiente para a conservação e distribuição das hóstias aos fiéis.

5. Aspersório – instrumento com que se joga água benta sobre o povo ou objetos.

6. Baldaquino – armação ornamental, sustentada por colunas, na cobertura de altar, trono.

7. Caldeirinha – vasilha onde se coloca a água benta para aspersão.

8. Cálice – recipiente onde se coloca o vinho para ser consagrado.

9. Candelabro – castiçal para várias velas.

10. Castiçal – utensílio que serve de suporte para uma vela.

11. Casula – espécie de manto que se coloca sobre a alva e a estola.

12. Cíngulo – cordão que prende a alva ao redor da cintura.

13. Círio pascal – vela grande que simboliza o Cristo ressuscitado.

14. Corporal – tecido quadrado sobre o qual se coloca o cálice e a patena ou cibórios.

15. Credência – mesa lateral onde se colocam os objetos a serem usados na celebração.

16. Crucifixo – cruz com a imagem de Cristo.

17. Custódia – parte do ostensório onde se mostra a hóstia consagrada.

18. Dalmática – veste própria do diácono, colocada sobre a alva e a estola.

19. Estola – veste colocada ao redor do pescoço.

20. Evangeliário – livro que contém os Evangelhos usados nas celebrações.

21. Galhetas – recipientes para transportar água e vinho.

22. Hóstia – pedaço de pão não fermentado.

23. Incenso – resina colocada sobre brasas para exalar odor e fumaça.

24. Lavabo – conjunto de bacia e jarra usado para a purificação do sacerdote.

25. Lecionário – livro que contém todas as leituras bíblicas usadas nas celebrações.

26. Luneta – peça circular do ostensório onde se coloca a hóstia consagrada.

27. Manustérgio – toalha com que o sacerdote enxuga as mãos durante a missa.

28. Missal Romano – livro que contém as orações a serem usadas nas celebrações.

29. Naveta – recipiente para transportar o incenso durante a missa.

30. Ostensório – objeto usado para expor a hóstia consagrada aos fiéis.

31. Pala – cartão quadrado, revestido de pano, usado para cobrir a patena e o cálice.

32. Patena – pequeno prato de metal onde se coloca a hóstia maior usada na missa.

33. Presbitério – espaço na igreja onde ficam altar e ambão e se realizam os ritos sagrados.

34. Reserva eucarística – hóstias consagradas guardadas no sacrário.

35. Sacrário ou tabernáculo – pequena urna onde se guarda a reserva Eucarística, ou seja, o Santíssimo Sacramento.

36. Sanguinho ou purificatório – tecido retangular com o qual o sacerdote purifica os vasos sagrados e, se preciso, a boca e os dedos.

37. Teca – estojo de metal onde se leva a eucaristia aos enfermos.

38. Turíbulo – vaso usado para incensações.

39. Véu umeral – manto colocado nos ombros do ministro para a bênção com o ostensório.

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XIV. Exercício sobre o Vocabulário Prático

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4 5 6

7 8 9

10 11 12

13 14 15

16 17 18

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XV. Revisão

TRA LE SOLLICITUDE

1. Conforme TS 1, qual o fim geral da música sacra e da liturgia como um todo? 2. Segundo TS 2, quais são as qualidades próprias da liturgia?

MEDIATOR DEI

3. De que forma MD 3 compreende que a Igreja continua o ofício sacerdotal de Cristo?

4. Segundo MD 21, qual o elemento essencial do culto divino? 5. Como MD 73 exemplifica tanto a boa quanto à má participação na liturgia?

6. De acordo com MD 160, qual a relação entre liturgia e atos de piedade?

SACROSANCTUM CONCILIUM

7. Segundo SC 5, qual a relação entre a Encarnação e o culto divino? 8. Com base na SC 6, explique o papel fundamental do Batismo e da Eucaristia no eixo dos

sacramentos da Igreja. 9. Conforme SC 7, de que maneira Cristo está presente nas ações litúrgicas?

10. O que são ações litúrgicas? 11. Leia SC 8 e diga qual o papel da liturgia na espiritualidade cristã.

12. De que maneira se pode explicar a expressão na SC 10: “a liturgia é fonte e cume de toda a ação

da Igreja”? 13. Segundo SC 11, como deve ser a participação dos fiéis na liturgia?

14. O que se entende por “participação ativa”? 15. Qual a orientação da SC sobre a língua litúrgica?

OFÍCIO DIVINO 16. Qual o objetivo do Ofício Divino?

17. Onde a oração cristã encontra o fundamento de sua dignidade? Explique. 18. De que maneira, além da Eucaristia, a Liturgia das Horas também santifica e consagra o tempo?

19. Qual a relação entre o louvor a Deus e a santificação dos homens se identifica na liturgia?

ANO LITÚRGICO

20. O que é Ano Litúrgico? 21. Qual dia é o fundamento de todo o Ano Litúrgico? Explique.

22. Como se deve compreender a repetição contínua do Ano Litúrgico no contexto do amadurecimento cristão?

23. Quais são os dois grandes ciclos do Ano Litúrgico e quais os cinco tempos?

24. Como são divididos os domingos e os dias da semana do Ano Litúrgico?

ESPIRITUALIDADE LITÚRGICA 25. Para se falar em espiritualidade litúrgica, é possível reduzir a liturgia somente ao sequenciamento

de regras de uma celebração?

26. Qual a relação entre oração e liturgia? 27. Explique porque se diz que a espiritualidade litúrgica é comunitária, sem excluir a vivência

pessoal. 28. Qual o centro da espiritualidade litúrgica? Explique.

29. Descreva o aspecto escatológico da espiritualidade litúrgica.

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DOUTRINA DO MISTÉRIO 30. De que forma o Mistério divino se articula no Antigo Testamento, no Novo e no tempo da Igreja?

31. Qual a relação entre o Mistério do culto e o Mistério de Cristo?

32. Quais as semelhanças e diferenças entre Mistério e Liturgia? 33. De que forma o Mistério de Cristo pode ser expresso em nossas vidas na Liturgia?

34. De que forma todo o povo cristão pode participar do culto divino? 35. Qual o perigo profetizado por Dom Odo Casel na última parte de seu texto?

DIMENSÃO CORPORAL DA LITURGIA

(Verdadeiro ou Falso) 36. ( ) Na Liturgia, devemos vivenciar a verdade celebrada, mais do que elaborar conceitos

abstratos. 37. ( ) De acordo com Romano Guardini, é possível estudar Liturgia somente pela leitura e

pesquisa.

38. ( ) Somente pela observação e comprovação não se pode chegar à essência da Liturgia. A perda do olhar contemplativo foi a causa da decadência da Liturgia.

39. ( ) Segundo Bento XVI, a Liturgia é um diálogo: o sacerdote fala com Deus e Deus fala somente com o Sacerdote.

40. ( ) Na oração litúrgica, é preciso que a mente concorde com a voz. 41. ( ) Segundo Bento XVI, quando o sacerdote se dá conta do sentido das palavras que profere, a

ação ritual torna-se naturalmente cheia de significado, capaz de sensibilizar quem o vê.

42. Qual a relação da frase “a liturgia é um mundo de acontecimentos misteriosos e santos

transformados em figura sensível”, de Romano Guardini, com o conceito de Mistério de Odo Casel?

DIES DOMINI

(Verdadeiro ou Falso) 43. ( ) O domingo guarda pouca relação com a ressurreição de Cristo.

44. ( ) O repouso tem valor sagrado, conforme ensinamento do livro do Êxodo.

45. ( ) Os cristãos somente celebram a Páscoa anualmente. 46. ( ) O domingo é o centro de todo o culto litúrgico.

47. ( ) O domingo expressa também, como oitavo dia, o futuro escatológico da criação. 48. ( ) O domingo cristão é dedicado exclusivamente ao culto.

49. De que forma o domingo expressa mais perfeitamente o conceito de dia do Senhor do AT? 50. Qual a relação do domingo com a criação?

51. Qual a importância do dia do repouso no domingo?

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TRIACCA, Domenico Sartore e Anchille (Org.). Dicionário de Liturgia. São Paulo : Paulus, 1992.

Lista de siglas

CIC – Código de Direito Canônico (do latim, Codix Iuris Canonici)

CIgC – Catecismo da Igreja Católica95

IGLH – Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas

LC – Constituição Apostólica Laudis Canticum, sobre o Ofício Divino

MD – Encíclica Mediator Dei, sobre a Sagrada Liturgia

RS – Instrução Redemptionis Sacramentum, sobre alguns aspectos que se devem observar e evitar

acerca da Santíssima Eucaristia, da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos

SC – Constituição Sacrosanctum Concilium sobre a sagrada liturgia, do Concílio Vaticano II

TS – Motu Proprio Tra Le Sollicitude, sobre a Música Sacra

DD – Carta Encíclica Dies Domini, sobre a santificação do domingo

MF – Carta Encíclica Mysterium Fidei, sobre o culto da Sagrada Eucaristia

95 Para evitarmos a ambiguidade e a dúvida que a sigla CIC geralmente promove (porque também pode

designar o Codex Iuris Canonici, ou seja, o Código de Direito Canônico), utilizaremos a notação CIgC

neste trabalho, embora tenha-se presente que não se trata de uma notação usual.

Page 57: Introdução à Liturgia - Textos para Estudo · PDF fileAno Litúrgico, Liturgia das Horas e ... fim para que a arte se admitiu ao serviço do culto, ... a restabelecer entre os homens

Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro Escolas de Fé e Catequese – Escola Mater Ecclesiae Núcleo Jacarepaguá – Freguesia

Liturgia 1A

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Oração para antes dos estudos Santo Tomás de Aquino

Criador inefável,

que dos tesouros da vossa sabedoria,

estabelecestes três hierarquias de Anjos

e as dispusestes numa ordem admirável

acima dos Céus,

conduzindo-as pelas regiões do universo,

com arte e beleza.

Vós, a quem chamamos

a verdadeira fonte de luz e de sabedoria,

e o Princípio supereminente,

dignai-Vos derramar

sobre as trevas da minha inteligência

um raio de vossa clareza.

Afastai para longe de mim

a dupla obscuridade na qual nasci:

o pecado e a ignorância.

Vós, que tornais eloquente

a língua das criancinhas,

modelai a minha palavra

e derramai nos meus lábios

a graça de vossa bênção.

Dai-me o dom do discernimento,

a capacidade da memória,

a habilidade para aprender,

a profundidade na interpretação,

e uma graça abundante de expressão.

Orienta o começo do meu trabalho,

dirigi o seu desenvolvimento,

e levai-o à conclusão.

Vós que sois verdadeiro Deus e verdadeiro homem,

e que viveis e reinais pelos séculos dos séculos.

Amém.

Apoteose de Santo Tomás (séc. XVII)