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www.aquinate.net/traduções ISSN 1808-5733 AQUINATE, n. 17 (2012), 72-95. Edição, tradução & notas© Paulo Faitanin 72 IOANNIS DUNS SCOTI JOÃO DUNS ESCOTO QUAESTIONES SUBTILISSIMAE SUPER LIBROS METAPHYSICORUM ARISTOTELIS 1 . QUESTÕES SUTILÍSSIMAS SOBRE OS LIVROS DA METAFÍSICA DE ARISTÓTELES. LIBER SEPTIMUS LIVRO SÉTIMO QUAESTIO XVIII 2 QUESTÃO 18 UTRUM UNIVERSALE SIT ALIQUID IN REBUS? 3 SE O UNIVERSAL É ALGO NAS COISAS? 1 [721b] [15] Quod sic videtur, omne quod est tale per participationem reducitur ad aliquid per essentiam; alioquin esset ipsum tale. Sed singulare est tale per participationem, ut hic homo per participationem hominis, quia aliter non [20] plurificatetur homo in istis. Ergo, etc. 1 [721b] [15] Parece que sim, pois tudo o que é tal por participação reduz-se a algo por essência; do contrário, seria a mesma coisa. Ora, o singular é tal por participação, como este homem é por participação de homem, porque do contrário homem não [20] multiplicar-se-ia nestes. Logo, etc. Praeterea, substantia est primum ens, et ita reale. Sed intellectus noster nihil causat, nisi accidens. Secunda vero substantia est substantia. Ergo, etc. Ademais, a substância é primeiro ente e, certamente, real. Mas, o nosso intelecto nada causa, senão por acidente. A substância segunda é verdadeira substância. Logo, etc. Propterea, si nihil esse in re, nisi singulare, nulla [25] est unitas realis, nisi unitas numeralis, quae est propria singulari. Consequens falsum propter sex. Ademais, se nada existe no real, senão o singular, não [25] há unidade real, senão a numérica, que é própria do singular. A conclusão é falsa por seis razões. Primo, quia tunc differentia Primeira, porque então toda 1 IOANNIS DUNS SCOTI, Quaestiones subtilissimae super libros Metaphysicorum Aristotelis. Editio F. L. Waddinggi. Tomus Quartus. Lugduni: Sumptibus Laurentii Durand. 1639; Reimpressão: JOHANNES DUNS SCOTUS, Opera Omnia. IV. Hildesheim: Georg Olms Verlagsbuchhandlung, 1968, Lib. VII, Quaestio XVIII, pp. 721-726. Em português, um artigo sobre a vida e a obra de Duns Escoto: DE BONI, L.A. “Sobre a vida e a obra de Duns Scotus”, Veritas, n° 53, 3 (2008), 7-31. 2 Para a edição bilíngue desta Quaestio mantive a numeração original das páginas e parágrafos da edição de Waddingi de 1639. Identifiquei a dupla coluna com as letras ‘a’ e ‘b’. Inseri os nú- meros das linhas. Dividi o texto em referência à ordem da argumentação proposta pelo autor. Assim, 1 [721b] [15] significa: 1 à margem, indica o parágrafo, [721b] 721 indica o número da página e a letra ‘b’ a coluna; e [15] indica o número da linha. Visou-se fazer uma tradução literal e clara, tanto quanto possível, apesar da sutil exposição do autor. 3 Outros lugares onde Escoto tratou dos universais: Super universalia Porphyrii quaestiones acutissimae, qq. 4 a 12; Ordinatio, II, d. 3, em diferentes passagens.

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IOANNIS DUNS SCOTI JOÃO DUNS ESCOTO QUAESTIONES SUBTILISSIMAE

SUPER LIBROS

METAPHYSICORUM

ARISTOTELIS1.

QUESTÕES SUTILÍSSIMAS SOBRE OS LIVROS DA METAFÍSICA DE ARISTÓTELES.

LIBER SEPTIMUS LIVRO SÉTIMO QUAESTIO XVIII2 QUESTÃO 18 UTRUM UNIVERSALE SIT ALIQUID IN

REBUS?3

SE O UNIVERSAL É ALGO NAS COISAS?

1 [721b] [15] Quod sic videtur,

omne quod est tale per participationem reducitur ad aliquid per essentiam; alioquin esset ipsum tale. Sed singulare est tale per participationem, ut hic homo per participationem hominis, quia aliter non [20] plurificatetur homo in istis. Ergo, etc.

1 [721b] [15] Parece que sim, pois tudo o que é tal por participação reduz-se a algo por essência; do contrário, seria a mesma coisa. Ora, o singular é tal por participação, como este homem é por participação de homem, porque do contrário homem não [20] multiplicar-se-ia nestes. Logo, etc.

Praeterea, substantia est primum

ens, et ita reale. Sed intellectus noster nihil causat, nisi accidens. Secunda vero substantia est substantia. Ergo, etc.

Ademais, a substância é primeiro ente e, certamente, real. Mas, o nosso intelecto nada causa, senão por acidente. A substância segunda é verdadeira substância. Logo, etc.

Propterea, si nihil esse in re, nisi

singulare, nulla [25] est unitas realis, nisi unitas numeralis, quae est propria singulari. Consequens falsum propter sex.

Ademais, se nada existe no real, senão o singular, não [25] há unidade real, senão a numérica, que é própria do singular. A conclusão é falsa por seis razões.

Primo, quia tunc differentia Primeira, porque então toda

1 IOANNIS DUNS SCOTI, Quaestiones subtilissimae super libros Metaphysicorum Aristotelis. Editio F. L. Waddinggi. Tomus Quartus. Lugduni: Sumptibus Laurentii Durand. 1639; Reimpressão: JOHANNES DUNS SCOTUS, Opera Omnia. IV. Hildesheim: Georg Olms Verlagsbuchhandlung, 1968, Lib. VII, Quaestio XVIII, pp. 721-726. Em português, um artigo sobre a vida e a obra de Duns Escoto: DE BONI, L.A. “Sobre a vida e a obra de Duns Scotus”, Veritas, n° 53, 3 (2008), 7-31. 2 Para a edição bilíngue desta Quaestio mantive a numeração original das páginas e parágrafos da edição de Waddingi de 1639. Identifiquei a dupla coluna com as letras ‘a’ e ‘b’. Inseri os nú-meros das linhas. Dividi o texto em referência à ordem da argumentação proposta pelo autor. Assim, 1 [721b] [15] significa: 1 à margem, indica o parágrafo, [721b] 721 indica o número da página e a letra ‘b’ a coluna; e [15] indica o número da linha. Visou-se fazer uma tradução literal e clara, tanto quanto possível, apesar da sutil exposição do autor. 3 Outros lugares onde Escoto tratou dos universais: Super universalia Porphyrii quaestiones acutissimae, qq. 4 a 12; Ordinatio, II, d. 3, em diferentes passagens.

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omnis realis esset numeralis. Nam omne diversum ea unitate est diversum ab aliquo, quam est in se unum. Hoc consequens est [30] falsum.

diferença real seria numérica. Com efeito, tudo que é diverso pela unidade é diverso por algo, que é em si uno. Esta consequência é [30] falsa.

Tum, quia omnia aeque

differrent realiter, et ita non esset in re aliquid, quare intellectus magis unum conceptum abstrahit ab hoc albo, et illo, quam ab albo, et nigro.

Então, todas as coisas, igualmente, diferem de modo real e, assim, não existiria algo no real, pelo qual o intelecto abstrai mais um conceito desde este branco e de aquele, do que desde branco e negro.

Haec consequentia patet: quia si

differentia realis esset numeralis [35] tantum, ergo differentia numeralis est praecisa causa differentiae realis.

É evidente esta consequência, porque se a diferença real só fosse numérica [35], então a diferença numérica seria causa precisa da diferença real.

Sed quaecumque aequaliter

participant praecisam causam alicuius effectus, aequaliter participant effectum, patet.

Mas, é evidente que quaisquer efei-tos que, igualmente, participam de algum causa precisa, de igual ma-neira, participam como efeitos.

Sed omnia differentia realiter,

aequaliter participant istud, [40] scilicet, diferre numero, quia omnia differentia realiter in aliquo communi, conveniunt et inter se distinguuntur, ut patet per deffinitionem differentiae 5 Metaph4. Ergo, omnia aequaliter differunt numero et ultra. Ergo, omnia aequaliter [45] realiter.

Mas, todas as diferenças participam real e igualmente disso, [40] isto é, diferir numericamente, pois todas as diferenças realmente convergem por algo comum e distinguem-se entre si, como na definição de diferença, em Metaf. 5. Logo, todas, igualmente, diferem numericamente e além. Logo, todas igual [45] e realmente.

Tum, quia differentia genere et

specie erunt tantum differentia ratione, et ita secundum quid.

Então, porque há diferenças de genero e espécie e, assim, elas só relativamente5 existirão na razão.

Sed, si differentia numeralis

esset realis, et ita arguendo, differunt specie. Ergo, differunt numero, esset fallacia, secundum quid et simpliciter, [50] quod est

Mas, se a diferença real fosse numérica, arguindo assim diferiria na espécie. Logo, diferiria numericamente; seria uma falácia relativa e absoluta, [50] que é

4 ARISTÓTELES, Metafísica, 5, c. 9, 1018a 11-13. [ARISTÓTELES, Metafísica. Ensaio introdutório, texto grego com introdução e comentário de Giovanni Reale. Vol. II. Texto grego com tradução ao lado. Tradução Marcelo Perine. São Paulo: Edições Loyola, 2002.]. Citada de agora em dian-te: REALE, Metafísica. Salvo exceção indicada, esta edição será usada para referir-se à Metafísi-ca. 5 Traduzi ‘secundum quid’ por ‘relativamente’, em oposição ao que é ‘secundum se’, ‘por si’, ‘es-sencialmente’.

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contra Arist. 5 Metaph. c. De uno, text. c. 126.

contra Aristóteles em Metaf. 5, c. Sobre o uno, texto c. 12.

Secundo, consequens principale

est falsum, quia tunc non esset generatio univoca, sine consideratione intellectus.

Segunda, a consequência principal é falsa, porque então não haveria geração unívoca, sem a consideração do intelecto.

2 Tertio, non esset aliqua

similitudo realis, quia [55] proximum eius fundamentum est unum ex 5 Metaph7. et illum tertium improbat responsionem, quae posset dari ad secundum, scilicet, quod generans et genitum non habent aliquam unitatem, sed similitudinem tantum.

2 Terceira, não existiria alguma similitude real, porque [55] seu fundamento próximo é o uno, como se tem, a partir da Metafísica 5. e, esta terceira, refuta a resposta que poderia ser dada à segunda, a saber, que aquele que gera e o que é gerado, não tenham alguma unidade, mas tão somente semelhança.

Quarto, non esset [60] aliquod

unum mensura realis aliarum specierum in genere, quia non unum numero secundum Aristotelem.

Quarta, não seria [60] alguma unidade de medida real das outras espécies, no gênero, porque não é a unidade numérica segundo <a definição> de Aristóteles.

Quinto, non esset contrarietas

oppositio realis, quia extrema eius prima non sunt singularia et oportet utrumque esse in se unum.

Quinta, não existiria oposição real por contrariedade, porque seus princípios extremos não são singulares; e é necessário que ambos sejam, em si, uno.

[65] Sexto, ipsius sensus non

esset aliquod obiectum unum, quia non univocae rationis. Nam, obiectum praecedit natura actum sentiendi. Et iste omnem intellectionem in nobis. Et illud obiectum sensus, non est unum singulare, quia tunc aliud non sentietur.

[65] Sexta, não haveria razão unívoca, porque não existiria um único objeto do próprio sentido. Com efeito, o objeto precede a natureza, no ato de sentir. E o sentir, a toda nossa intelecção. E o objeto do sentido não é uno singular, porque, então, não seria sentido por outro.

[70] Confirmatur per illud 2.

Poster. 1, c. ultimi: [722a] [1]

[70] Confirma-se isto em 2 Poster. 1, c. 19: [722a] [1] o ato da sensa-

6 ARISTÓTELES, Metafísica, 5, c. 6, 1016b 9-11: “Com efeito, são consideradas muitas as coisas que não são contínuas, ou cuja espécie não é uma”. Em síntese, se só existisse a diferença numé-rica no real, a razão da diferença específica seria a numérica, mas isto é falso, porque a diferença numérica não é causa da diferença específica, como se atesta pela passagem acima referida. [Escoto cita Aristóteles pela referência dos comentários de Averróis. Cf. ARISTOTELES, Aristotelis Opera cum Averrois commentariis. Vol. VIII. Venetiis: Apud Junctas, 1562-1574, f. 114v, col. 2 M; Reimpressão: Frankfurt am Main: Minerva, 1962]. Citarei: ARISTOTELIS, Junctas. 7 IBIDEM.

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sensus est universalis8. Sed, sensus est tantum obiecti realis. Ergo, etc.

ção <refere-se> ao universal. Ora, só há sensação de um objeto real. Portanto, etc.

Sed contrarium Arist. 7 Metaph.

in 1 cap. Quoniam autem de substantia consideratio9.

Mas, contradiz Aristóteles na Metaf. 7, c. 15: Mas, porque se trata de considerar a substância.

Primo, sic: [5] substantia

uniuscuiusque est propria sibi et non inest alteri. Sed universale nulli est proprium.

Primeiro, assim: [5] a substância de qualquer coisa é a sua própria, e não existe em outro. Mas, o universal não é próprio de nada.

Praeterea, secundo, sic:

substantia non dicitur de subiecto, et universale dicitur, et Commentator ibidem10, universale est, de cap. relationis.

Ademais, o segundo, assim: não se diz substância do sujeito, mas o universal sim, como ensina o Comentador, aí mesmo, que o universal é assim, no c. da relação.

Item [10] primo de Anima,

universale aut nihil est, aut posterius est11.

Do mesmo modo, [10] no De anima, c. 1: o universal não é nada ou é algo posterior.

Item, aliter: Logica, qua est de

universalis esset scientia realis12. Quod, falsum est.

De outro modo, igualmente: a Lógica, que trata do universal seria ciência do real. O que é falso.

SCHOLIUM 113. ESCÓLIO 1. 8 Cf. ARISTÓTELES, Segundos Analíticos, 2, c. 19, 100a 16-18: “porque embora seja o particular o que percebemos, o ato da sensação <refere-se> ao universal”. Tradução livre do editor deste texto. [ARISTOTELIS, Analytica Priora et Posteriora. Recensvit brevique adnotaione critica ins-truxit W.D. Ross. Oxonii: E typographeo Clarendoniano, 1964]; ARISTÓTELES, Órganon. Tradu-ção, Textos Adicionais e Notas Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2005, p. 345. 9 Duns Escoto extrai esta passagem do comentário que Averróis fez como introdução ao capítulo 15 do Livro VII da Metafísica, e encontra-se na versão latina de ARISTÓTELES, Junctas, f. 197r col. 1 A. Contudo, pode-se encontrar paralelos em (1) ARISTÓTELES, Metafísica, 7, c. 1, 1028b 2-4: “E na verdade, o que desde os tempos antigos, assim como agora e sempre, constitui o eterno obje-to de pesquisa e o eterno problema: ‘o que é o ser’, equivale a este: ‘que é a substância’”; (2) A-RISTÓTELES, Metafísica, 7, c. 15, 1039b 2o-1040a-7. [REALE, Metafísica]. 10 Cf. AVERROIS CORDUBENSIS, Aristotelis Metaphysicorum Libri XIIII. Liber VII, c. 15, 197v col. 2 K. [ARISTOTELIS, Opera cum Averrois commentariis. Vol. VIII. Venetiis: Apud Junctas, 1562-1574]. 11 ARISTÓTELES, De anima, 1, c. 1, 402b 7-8. [ARISTOTELIS, De anima. Recognovit brevique adno-taione critica instruxit W.D. Ross. Oxonii: E typographeo Clarendoniano, 1959]. 12 ARISTÓTELES, Segundos Analíticos, 1, c. 2, 71b 17-19. [ARISTOTELIS, Analytica Priora et Poste-riora. Recensvit brevique adnotaione critica instruxit W.D. Ross. Oxonii: E typographeo Claren-doniano, 1964]; ARISTÓTELES, Órganon. Tradução, Textos Adicionais e Notas Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2005, p. 253.]. Cf. IOANNIS DUNS SCOTI, Super universalia Porphyrii quaestiones acutissimae. Editio F. L. Waddinggi. Tomus Primus. Lugduni: Sumptibus Laurentii Durand. 1639; Reimpressão: JOHANNES DUNS SCOTUS, Opera Omnia. I. Hildesheim: Georg Olms Verlagsbuchhandlung, 1968, Q. I, p. 87.

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Positis breviter sex rationibus,

quas etiam habet 2. d. 3. q. 114 suadentibus dari unitatem realem minorem numerica, et locis Philosophi in contrarium ponit sententiam Platonis de ideis15, ac [20] modum explicationis eius, qui non facile impugnari potest.

Postas, brevemente, as seis razões, que também estão em 2. d. 3. q. 1, somos persuadidos a dar a menor unidade real à unidade numérica, nos lugares onde o Filósofo contradiz a sentença de Platão sobre as ideias, de [20] modo a explicar a sua, que não pode ser impugnada facilmente.

3 Ita quaestio primo potest

pertractari contra positionem Platonis, ponentis ideas, secundum [25] quod Arist. imponit sibi16, propter entitatem formalem rerum, secundum primam rationem superius positam ad quaestionem, et propter scientiam, quae est de necessariis tantum, et singularia ista sunt corruptibilia, et etiam propter generationem, [30] quia generans particulare non sufficit.

3 Assim, primeiro, esta questão pode ser tratada contra a posição de Platão, que pôs as ideias, conforme [25] o que Aristóteles lhe impõe, por causa da entidade formal das coisas, justamente conforme a primeira razão posta para questão acima e, por causa da ciência, que só trata dos necessários, uma vez que os singulares são corruptíveis e, também, por causa da geração, [30] porque não é suficiente que se gere o particular.

Ista opinio, si ponat ideam esse

quandam substantiam separatam a motu et ab accidentibus per accidens, nihil in se habentem, nisi naturam separatam specificam perfectam, quantum potest esse [35] perfecta et forte habentem per se passiones speciei (aliter de ipsa nihil sciretur) non potest bene improbari, quia non videtur repugnare rationi absolutae entitatis, tale singulare sic naturam habens.

Esta opinião, se põe a ideia ser uma substância separada do movimento e dos acidentes, por acidente, nada tem em si, exceto uma natureza separada específica perfeita, enquanto possa ser [35] perfeita e, talvez, ter por si, as paixões da espécie (do contrário, nada se conheceria da mesma) nem poderia ser bem refutada, porque não parece repugnar a razão de entidade absoluta, tal como, assim mesmo, tem a natureza o singular.

Nec absolute hoc improbat Arist. Em absoluto Aristóteles desaprova 13 SCHOLIUM, do grego σχόλιον ‘escólio’, ‘comentário’, ‘interpretação’, são explicações críticas, gramaticais ou comentários originais ou extraídos de comentários anteriores, que são inseridos no corpo ou na margem de um manuscrito de um autor antigo, como uma glosa. 14 B. IOANNIS DUNS SCOTI, In II Lib. Sententiarum, d. 3, q. 1. [Commentaria Oxoniensia ad IV Libros Sententiarum. Novis curis edidit P. Marianus Fernandez Garcia. Tomus II. Ad Claras Aquas (Quaracchi): Ex Typographia Colegii S. Bonaventurae, 1914, p. 223, n° 228]; JOANNIS

DUNS SCOTI, Quaestiones in Librum Secundum Sententiarum, d.3, q.1. [DOCTORIS SUBTILIS, Opera Omnia. Editio Nova. Juxta editionem Wadding. Tomus XII. Parisiis: Apud Ludovicum Vivès, 1893, p. 6]. 15 ARISTÓTELES, Metafísica, 7, c. 13, 1038b 9-15. [REALE, Metafísica].

16 ARISTÓTELES, Metafísica, 7, c. 14, 1039a 24-30. [REALE, Metafísica].

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Sed [40] quatenus ponatur incorruptibile, arguitur contra hoc in fine decimi17.

isto. Mas, [40] se a coloca incorruptível, argui-se contra isto no final do livro 10.

Hic autem in 7, arguitur non

impossibilitas, sed non necessitas, quia enim nihil non manifestum ponendum est a philosophantibus, sine necessitate, arguit Arist. contra ideas, quod [45] non sunt necesse, propter quae ponebantur, et ita simpliciter non sunt ponendae.

Mas, aqui no livro 7, argui-se não acerca da impossibilidade, mas da não necessidade, porque, de fato, não é manifesto para os filósofos que se deva pôr as ideias sem necessidade; por isso, Aristóteles argui contra as ideias, que [45] não são necessárias, pois são postas como também não poderiam absolutamente ser postas.

Quod non propter entitatem, nec

scientiam, arguit Arist. 7 Metaph. cap. illo, utrum autem quod quid est18, quod non propter generationem, in cap. sequenti19.

Aristóteles argui não por causa da entidade e da ciência em Metaf. 7, no capítulo, se, porém o que é, nem argui, no capítulo seguinte, por causa da geração.

Si autem [50] ulterius ponat quis,

quod dicta idea est formaliter universale, ita quod per identitatem praedicetur, de isto corruptibili praedicatione dicente, hoc est hoc: statim videtur includere contradictionem, quod idem numero sit quiditas multorum diversorum, [55] et tamen extra illa, aliter non esset incorruptibilis.

Se, porém, [50] alguém afirmar, ulteriormente, que a dita ideia é formalmente universal, de tal modo que se predique por identidade, dizendo que se predica disto que é corruptível, entenda-se que se for assim, parece incluir contradição, pois o idêntico numericamente seria quididade de muitas coisas diversas, [55] e existiria fora dela, do contrário não seria incorruptível.

Isto praetermisso, potest

quaestio pertractari secundum sententiam Aristotelis loquendo de universali.

Previamente posto isto, pode ser tratada a questão, segundo a sentença de Aristóteles, falando sobre o universal.

SCHOLIUM 2. ESCÓLIO 2. Prima opinio, universale esse in

rebus, triplici ratione suadetur, et totidem impugnatur. Secunda sententia, universale fieri per intellectum [65] suadetur, sed multis rationibus impugnatur.

Primeira opinião: o universal existe nas coisas e argui-se com três razões, igualmente refutáveis. Segunda: argui-se que o universal é produzido pelo intelecto [65], mas refuta-se, com muitas razões.

17 ARISTÓTELES, Metafísica, 10, c. 10, 1058b 26-1059a 1-14. [REALE, Metafísica]. 18 ARISTÓTELES, Metafísica, 7, c. 6, 1031b 1-10. [REALE, Metafísica]. 19 ARISTÓTELES, Metafísica, 7, c. 7, 1032a 15-25. [REALE, Metafísica].

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4 Et sunt hic duae opiniones

extremae, quarum prima est, quod universale est in re, propter tres rationes, quarum prima est: universale est quod est [70] aptum natum dici de pluribus.

4 E estas duas opiniões são extremas, a primeira delas é que o universal existe no real, por três razões, das quais a primeira é: o universal é o que é [70], por natureza, dito de muitos.

Sed res de se est [722b] [1] apta

nata dici de pluribus, quia si non, aptitudo sibi repugnaret, nec conferri sibi potest saltem non ab intellectu, quia tunc posset intellectus dare Socrati talem aptitudinem.

Mas, o real é de si [722b] [1] apto por natureza de ser dito de muitos, porque se não fosse, repugnaria de si a aptidão, nem pode conferir-se-lhe, ao menos pelo intelecto, porque então o intelecto poderia dar a Sócrates tal aptidão.

[5] Praeterea, universale, de quo

loquimur, praedicatur de re, puta de singulari, praedicatione dicente, hoc est hoc, ut Socrates est homo. Sed impossibile est aliquid praedicari de re, nisi sit in re.

[5] Ademais, o universal, do qual falamos, predica-se do real, por exemplo, do singular, pela predicação que é dita deste modo: Sócrates é homem. Mas, é impossível algo predicar-se do real, exceto se existe nele.

Item, quicquid absolutissime

sumptum est vera res et [10] ut in alio, vel ut limitatum, erit vera res, quia est principium et causa, ut habetur ultimo cap. 7 Metaph20. Sed ipsum absolute sumptum est universale.

Assim, o que é concebido absoluto é verdadeiro e real [10], como outro ou limitado; será verdadeiro e real, porque é princípio e causa, como se tem em Metaf. 7, c. 17. Mas, o próprio considerado de modo absoluto é universal.

Probatio, quia sic absolute

sumptum exprimitur per deffinitionem. Sed definitio non est nisi universalis.

Prova-se, porque assim considerado de modo absoluto, exprime-se pela definição. Mas, a definição não é senão do universal.

[15] Modus ponendi est talis in re

cum gradu limitationis, quo singulare est hoc, ut dictum est in quaestione de individuatione21, est etiam natura per illum

[15] O modo de colocar tal no real como um grau de limitação, pelo qual o singular é isto, como foi dito na questão sobre a individuação é, também, a natureza limitada por

20 ARISTÓTELES, Metafísica, 7, c. 17, 1041b 27-28. [REALE, Metafísica]. 21 IOANNIS DUNS SCOTI, Quaestiones subtilissimae super libros Metaphysicorum Aristotelis. Lib. VII, Quaestio XIII, Scholium 3, n° 8. [JOHANNES DUNS SCOTUS, Opera Omnia. IV. Hildesheim: Georg Olms Verlagsbuchhandlung, 1968, p. 701]; IOANNIS DUNS SCOTI, In II Sententiarum, dist. 3, q.6. Ad argumenta principali, 191-193. [Opera Omnia. Studio et cura Commissionis Scotisticae. P. Carolo Balic. VII. Civitas vaticana: Typis Polyglotis Vaticanis, 1973, p. 486-487]; B. IOANNIS DUNS SCOTI, In II Lib. Sententiarum, d. 3, q. 1. [Commentaria Oxoniensia ad IV Li-bros Sententiarum. Novis curis edidit P. Marianus Fernandez Garcia. Tomus II. Ad Claras Aquas (Quaracchi): Ex Typographia Colegii S. Bonaventurae, 1914, pp. 270-271, n° 290].

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gradum limitata. aquele grau. Ista natura non solum est

intelligibilis sine illo gradu, sed prior etiam est [20] natura in re, et ut sic non repugnat sibi esse in aliquo, quia ut sic est prior, non est adhuc limitata ad hoc, ut sic ergo prior est, est universalis.

Esta natureza não só é inteligível sem aquele grau, mas é, também, anterior [20] à natureza no real, e assim, não se lhe repugna existir em algo, porque assim é anterior, não é, ainda, limitada a isto; logo, como tal, é anterior e é universal.

Contra istam opinionem arguitur

tripliciter:

Contra esta opinião argui-se de três modos:

Primo sic: universale est unum

obiectum intellectus [25] et una intellectione numero intelligitur, ita quod intellectus attribuendo ipsum diversis singularibus, attribuit obiectum idem numero pluries conceptum, ut praedicatum diversis subiectis dicendo, hoc est hoc.

Primeiro, assim: universal é um objeto do intelecto [25] e uma intelecção individual que se intelige, de modo que o intelecto o atribui a diversos singulares e atribui o mesmo objeto individual a muitos conceitos, como quando se entende um predicado de diversos sujeitos.

Impossibile autem videtur, [30]

quod aliquid quod est in re sit idem intelligibile numero, et sic attribuatur diversis.

Mas, parece impossível [30] que algo que existe no real seja o mesmo numéricamente inteligível e, assim, é atribuído a diversos.

Confirmatur, quia et ista natura

ut prior gradu limitante, si intelligatur, numquam vere attribuetur nisi uni, alteri enim singulari non vere attribuitur ille [35] conceptus, sed est alius alterius naturae, quae est in alio.

Confirma-se, porque esta natureza, como prévio grau que limita, se inteligida, de fato, não é atribuída, senão a um, pois não é atribuída àquele conceito de outro singular [35], mas é de uma outra natureza, que existe em outro.

Praeterea, secundo sic: cui inest

subiectum sub ratione quam est subiectum, ei inest et passio. Si ergo homo inest Socrati sub ea rationi, sub qua homo est universalis vere, Socrates est vere universalis, [40] nec est accidens, quia medium non variatur.

Segundo assim: o que existe no sujeito, sob a noção do que é sujeito, existe nele como paixão22. Logo, se homem existe em Sócrates sob tal noção, à qual homem é, pois, universal, então Sócrates é universal [40], não por acidente, porque o meio não é variado.

Praeterea tertio sic: sequeretur

quod sensus haberet per se pro obiecto, ipsum universale, quia ut dictum est, in quaestione de

Terceiro assim: seguir-se-ia que o sentido teria o próprio universal como objeto essencial, porque, como foi dito na questão sobre a

22 Pode-se considerar como ‘acidente’.

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intellectione singularis23, natura movet non inquantum haec, licet non nisi haec.

intelecção do singular, a natureza não move, enquanto é esta, exceto que ela não seja esta.

[45] Sequeretur etiam, si omne

universale est actu in re ex se, quod omnino superflue ponitur intellectus agens.

[45] Seguir-se-ia, também, que se todo universal é ato no real por si mesmo, seria totalmente supérfluo afirmar o intelecto agente.

Contra modum ponendi sequitur

quod tot sint universalia, quot singularia, quia quaecumque [50] natura in quocunque individuo habet istam rationem universalis, quae assignatur et nulla est nisi respectu individuorum, ut ostendit prima ratio supra.

Contra o modo de colocar assim, segue-se que tantos forem os universais, quantos serão os singulares, porque qualquer [50] natureza, em qualquer indivíduo, tem esta noção universal, que se designa e não é senão, com relação aos indivíduos, como mostra a primeira razão acima.

Et ita quaelibet universalis, et

nulla. Idem etiam praedicaretur de se in praedicatione [55] universalis de singulari.

E, assim, qualquer um ou nehum seria universal. Igualmente, predicar-se-ia de si na predicação [55] do universal sobre o singular.

5 Alio opinio est, quod universale

est in intellectu. Ad hoc est auctoritas Commentatoris, I de Anima24. Intellectus facit universalitatem in rebus, alias etiam non videretur intellectus [60] agens necessarius.

5 Outra opinião é que o universal existe no intelecto. Para isto está a autoridade do Comentador em De anima, 1. O intelecto produz o universal nas coisas, do contrário não pareceria que o intelecto [60] agente fosse necessário.

Confirmatur etiam propositum,

quia intellectus agens non est vis factiva. Ergo, nihil causat extra intellectum. Item Boëtius, De unitate et uno25.

Confirma-se, o propósito, porque o intelecto agente não é potência ativa. Logo, nada causa fora do intelecto. Assim considera Boécio em De unitate e uno.

23 IOANNIS DUNS SCOTI, Quaestiones subtilissimae super libros Metaphysicorum Aristotelis. Lib. VII, Quaestio XIV, Scholium, n° 4, p. 710b; Quaestio XV, Scholium 2, n° 6, p. 714b; Scholium 3, n° 8, p. 715a. [JOHANNES DUNS SCOTUS, Opera Omnia. IV. Hildesheim: Georg Olms Verlagsbuchhandlung, 1968]. 24 Cf. AVERROIS CORDUBENSIS, Commentarium Magnum in Aristotelis De anima Libros. Liber I, com. 8, n. 21-26, p. 12. in: Corpus Commentariorum Averrois in Aristotelem. Ediderunt Henricus Austryn Wolfson, David Baneth, Franciscus Howard Fobes. Versionum Latinarum. Volumen VI-1. Commentarium Magnum in Libros de Anima. Recensvit F. Stuard Crawford. Cambridge, Massachusetts: The Mediaeval Academy of America, 1953. 25 Durante o século XIII, o De unitate foi atribuído a Boécio. Ademais de Escoto e Henrique de Gante, muitos outros lhe atribuiram a autoria deste texto. De fato, teve ampla divulgação sob sua atribuição a Boécio. Por esta razão, foi incluída sob o nome de Boécio na obra editada por Migne, Patrologia Latina [PL 63, col. 1075-1078]. Já no final do século XIX, o estudioso Paul Correns, depois de pesquisas comparativas entre o texto de Ibn Gbirol [Avicebrão], Fons vitae, que havia sido editada pelo espanhol Domingo Gundissalvo e o texto do De unitate, conclui identificando como seu autor, Gundissalvo, como se o De unitate fosse uma glossa da referida

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Omne quod est, est unum

numero. Ad hoc est ratio: quia universale est unum in multis [65] et de multis, 1 Poster, cap. 2526, includit ergo essentialiter comparationem ad supposita, ut praedicabile ad subiicibile27.

Tudo que existe, tem unidade numérica. A razão é que o universal é um em muitos [65] e de muitos, 1 Poster, 1, cap. 25, inclui, portanto, essencialmente, a comparação com os supostos, como predicável ao subjacente.

Sed talis comparatio non est in

re, sed tantum in intellectu comparante.

Mas, tal comparação, não existe no real, mas tão somente no intelecto que compara.

Auctoritas ad hoc et modus

positionis habetur ab [70] Avic. 5 Metaph. c. 228, ubi vult quod forma intelligibilis [732a] [1] respectu animae est singularis et alia in alio intellectus, sed eadem respectu individuorum extra est universalis, quaere ibi.

A autoridade nisto e o modo da sua exposição tem-se em [70] Avicena, Metaf. 5, c.2, onde diz que a forma inteligível [732a] [1] em relação à alma, é singular e, outra, em outro intelecto; mas, é a mesma em relação aos indivíduos externos e investiga aí, o universal.

Contra istam opinionem:

obiectum naturaliter [5] praecedit actum; ergo universale naturaliter praecedit intellectionem, quando universale intelligitur; sed non est in intellectu in actu, nisi per intellectionem.

Contra esta opinião, o objeto naturalmente [5] precede ao ato; por conseguinte, o universal naturalmente precede à intelecção, quando se intelige o universal; entretanto, o universal não existe em ato no intelecto, exceto pela intelecção.

Confirmatur: quia si obiectum, ut

obiectum, et ut prius intellectione, non esse [10] universale, non posset ab intellectu comparari ad plura extra.

Confirma-se, porque se o objeto, enquanto objeto e, enquanto prévio à intelecção, não existe [10] como universal, não poderia ser comparado pelo intelecto a muitos, que estão fora.

obra do pensador judeu, Gabirol. Cf. CORRENS, P. Die dem Boethius fälschlich zugeschriebene Abhandlung des Dominicus Gundisalvi De unitate. In: Beiträge zur Geschichte der Philosophie des Mittelalters. Herausg. Clemens Baeumker. Band I-Heft 1. Münster: Druck und Verlag der Aschendorffschen Buchhandlung, 1891, p. 10, linhas 2-7. 26 Não encontramos na obra Segundos Analíticos, referência à passagem em destaque no corpo do texto: ‘quia universale est unum in multis et de multis’. A indicação do c. 25, refere-se à conclusão da argumentação de que ‘a demonstração universal é melhor que a particular’: Segundos Analíticos, 1, c. 25, 86a 31-33. [ARISTOTELIS, Analytica Priora et Posteriora. Recensvit brevique adnotaione critica instruxit W.D. Ross. Oxonii: E typographeo Clarendoniano, 1964]. Ver, por exemplo: Metafísica, 7, c. 13, 1038b 9-15; Sobre a interpretação, c. 7, 17a 38-40. 27 ARISTÓTELES, Segundos Analíticos, 1, c. 18, 81b 2-9. [ARISTOTELIS, Analytica Priora et Posteriora. Recensvit brevique adnotaione critica instruxit W.D. Ross. Oxonii: E typographeo Clarendoniano, 1964]. 28 AVICENA, Liber de Philosophia Prima sive Scientia Divina. V, c. 2, A 209, 19-22. [In: AVICENA

LATINUS. Édition critique de la traduction latine médiévale, par S. Van Riet. Louvain: E. Peeters, 1980, pp. 241-242].

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Praeterea, subiectum scientiae,

inquantum subiectum, praecedit intellectionem; sed ut sic, est universale, quia ut subiectum est primo tale, comparando propriam passionem; et si [15] primo, igitur de omni; et sic de eo sciencia esse potest.

Ademais, o sujeito da ciência, enquanto sujeito, precede à intelecção; mas, assim, é universal, porque como sujeito é primeiro, comparando a própria paixão; e se for [15] primeiro é, por conseguinte, em relação a todos; e, assim, poderia haver ciência dele.

Confirmatur: sicut primum

principium, quod est propositio universalis, primo actu complexo concipi potest, ita terminus eius extra sub ea ratione, sub qua est eius terminus, prima intellectione incomplexa.

Confirma-se: tal como o primeiro princípio, que é uma proposição universal e no primeiro ato simples pode ser concebido, assim, também, seu término exterior, sob esta razão, que é seu término, é uma primeira intelecção simples.

[20] Sed terminus, ut terminus

universalis est intra primum principium, quia universaliter sumptibilis.

[20] Mas o término, enquanto término universal, existe entre os primeiros princípios, porque são considerados de modo universal.

Praeterea tertio: universalitas

esset conditio entis in intellectu, sicut verum, et ita diminueret ens hoc, sicut illud; et ita non magis esset [25] aliqua scientia de universali, quam de vero.

A terceira: a universalidade seria condição da verdade do ente no intelecto; assim, diminuir-se-ia o ente, com relação ao universal; e não haveria [25] uma ciência da verdade, mais que a do universal.

Ad ista, posset dici, quod licet obiectum sit prius natura actu: non tamen hoc oportet de modo necessario in obiecto: maxime, qui non est modus cognitus, sed sub quo cognoscitur, maxime si [30] obiectum non est simul, nisi tempore cum actu: sicut ponit Avicenna de universali29.

A isto poderia dizer que, embora o objeto seja prévio por natureza ao ato, não é preciso que o seja de modo necessário; ainda mais que não é modo conhecido, mas sob o qual se conhece e, também, que [30] o objeto não é simultâneo, exceto no tempo, com o ato, como afirma Avicena sobre o universal.

Sed contra, tunc nullo

considerante, non esset universale in actu, et ita scientia habitualis non esset obiecti universalis actu.

Mas contra isto, segue-se então que nada seria considerado, não haveria universal em ato e, assim, a ciência habitual não seria do objeto universal em ato.

Praeterea, inquantum obiectum Ademais, enquanto o objeto é

29 AVICENA, Liber de Philosophia Prima sive Scientia Divina. V, c. 2, A 211, 53-62. [In: AVICENA

LATINUS. Édition critique de la traduction latine médiévale, par S. Van Riet. Louvain: E. Peeters, 1980, pp. 243-244].

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est prius [35] actu, non intelligetur sub hoc modo; ergo vel sub nullo modo, vel sub opposito: quia ut est obiectum, aliquem modum sibi determinat.

prévio [35] ao ato, não se lhe intelige sob este modo; logo, sob este, sob nenhum ou oposto, porque enquanto é objeto, determina, para si, algum modo.

Contra modum ponendi, illa

forma intelligibilis subiective est in anima, et realiter: universale autem si [40] est in intellectu, videtur ibi esset, ut est obiectum cognitum in cognoscente, isti modi essendi sunt diversi; ergo, etc.

Contra o modo de expor: a forma inteligível está subjetiva e realmente na alma; mas se o universal [40] existe no intelecto, parece que estaria aí, como objeto conhecido no cognoscente; estes modos de ser são diversos; logo, etc.

Et sic improbant hanc opinionem

iam positae rationes.

E assim reprova esta opinião com as razões já postas.

SCHOLIUM 3. ESCÓLIO 3. Praemittit triplicem claram

acceptionem universalis, et quo sensu prima opinio, et quo secunda quodammodo conciliari possint; explicat [50] etiam, quomodo aliquid potest esse objective dupliciter in intellectu, scilicet per speciem ante actum, et per ipsum actum.

Exposta antes a tríplice clara acepção de universal e, em que sentido a primeira e a segunda opiniões possam ser conciliadas, também, se explica [50] como algo pode estar objetivamente, de dois modos, no intelecto, ou seja, pela espécie, antes do ato, e pelo próprio ato.

6 Circa huius quaestionis

solutionem primo [55] distinguendum est de universali. Sumitur enim, vel sumi potest tripliciter: quoniam pro intentione secunda quae scilicet est quaedam relatio rationis in praedicabili, ad illud de quo est praedicabile, et hunc respectum significat hoc nomem [60] universale in concreto, sicut et universalitas in abstracto.

6 Acerca da solução desta questão, primeiro [55] deve-se distinguir algo sobre o universal. Considera-se, ou pode ser considerado, de três modos: um, pois, pela segunda intenção, a saber, a que é por certa relação de razão com o predicável, com aquilo de que é predicável, e a este respeito significa este nome [60] universal em concreto, como também significa universalidade em abstrato.

Alio modo accipitur universale

pro illo, quod denominatur ab illa intentione, quod est aliqua res primae intentionis, nam secundae intentiones applicantur primis; et sic accipi potest dupliciter.

Outro modo, concebe-se o universal por aquilo, que se denomina por aquela intenção, que é algo real da primeira intenção, pois são aplicados à primeira, os da segunda intenção; e, assim, pode ser duplamente considerado.

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[65] Uno modo, pro illo, quod quasi ut subiectum remotum denominatur ista intentione: alio modo pro subiecto propinquo.

[65] Um modo, pela segunda, e denomina-se esta intenção quase como um sujeito remoto; outro modo, pelo sujeito próximo.

Primo modo dicitur natura

absolute sumpta, universale, quia non est de se haec; et ita non repugnat sibi ex se dici de multis.

Primeiro modo: diz-se natureza universal a tomada absolutamente, porque não é por si esta; assim, não lhe repugna ser dita de muitos.

[70] Secundo modo non est

universale, nisi sit actu [723b] [1] indeterminatum, ita quod unum intelligibile numero, sit dicibile de omni supposito, et illud est complete universale.

[70] Segundo modo: não é universal, exceto se existe em ato [723b] [1] indeterminada, inteligível como unidade numérica e que é dita de todo suposto e este modo é totalmente universal.

De primo modo, potest intelligi

opinio secunda, quia ista comparatio quae [5] est intentio secunda non est, nisi obiecti, ut in intellectu comparante.

Do primeiro modo, pode-se entender a segunda opinião, pois esta comparação que [5] é com a segunda intenção, não é senão do objeto, que o intelecto compara.

De secundo modo potest intelligi

prima opinio, quia natura non est de se haec; sed nec prima opinio ponit completum universale, quia non sufficienter indeterminatum: [10] quia non contrarie ad determinationem: sed quasi privative, vel contradictorie.

Do segundo modo, pode-se entender a primeira opinião, pois a natureza não é por si esta; mas nem a primeira opinião estabelece o universal completo, porque não é suficientemente indeterminado [10], porque não contraria a determinação, mas apenas de um modo privativo ou contraditório.

Nec secunda opinio loquitur de

completa ratione universalis, ut quaestio habet difficultatem; sed de quadam intentione posteriore naturaliter ratione eius completa; [15] nam indeterminatio quasi contraria, qua homo est sic indeterminatum, ut unica intellectione conceptum quiditative insit omni, praecedit naturaliter illam intentionem secundam, quae est universalitas Logica, sive habitudo de multis.

Nem a segunda opinião fala acerca da completa noção de universal, e esta questão tem dificuldade; mas fala de certa intenção da sua noção completa, que é naturalmente posterior; [15] pois a determinação como contrária, pela qual homem é, assim, indeterminado, como única intelecção conceptual quiditativa existente em todos, naturalmente precede àquela segunda intenção, que é a da universalidade lógica, ou a aptidão de ser predicado de muitos.

[20] De illo igitur tertio modo

accipiendi universale; restat videre; an sit primo in intellectu,

[20] Deste, pois, toma-se o terceiro modo de universal, que resta ver; se existe primeiro no intelecto; e

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et distinguo, quod dupliciter potest aliquid esse in intellectu obiective, sicut modo loquimur de esse in.

distingo, pois algo pode objetivamente existir no intelecto de dois modos, tal como o modo de que falamos do existir em.

Uno modo habitualiter, et alio

modo actualiter, [25] sive in actu primo, et secundo.

Um modo habitualmente, outro atualmente, [25] ou em ato primeiro e ato segundo.

Primo modo, est ibi quando est

ibi ut immediate moriuum ad intellectionem.

Primeiro modo: ele existe aí quando é imediatamente apto pelos hábitos para a intelecção.

Secundo modo, quando

actualiter intelligitur ista esse secundum positionem Avicennae30, simul sunt tempore, licet primum prius [30] natura.

Segundo modo: se entende este existir atualmente, como a posição de Avicena: são simultâneos no tempo, embora o primeiro seja prévio [30] à natureza.

Licet enim non ponat speciem

intelligibilem, per quam obiectum est praesens primo modo, manere in intellectu, nisi dum actu intelligit.

Apesar de não estabelecer a espécie inteligível, pela qual o objeto está presente, segundo o primeiro modo, permanece no intelecto, enquanto inteligível em ato.

Tamen prius natura est obiectum

praesens, ut motivum, quam ut intellectum actu, quia primum [35] praecedit intellectionem, ut causa, secundum sequitur sive concomitatur.

Contudo, a natureza é prévia à presença do objeto, como motivação ao ato do intelecto, porque primeiro [35] precede à intelecção, como causa, segundo a segue ou a acompanha.

Alius autem, qui negat speciem

intelligibilem, non videtur, quomodo possit illa duo esse distinguere; quia nullum esse habet obiectum in intellectu secundum ipsum, [40] nisi per actum intelligendi; et ita nullum esse primum, et ita nullo modo movebit intellectum: cuius tamen contrarium tenet ipse.

Por outro lado, quem nega a espécie inteligível, não parece ver como é possível que se distingam aqueles dois ser, porque nenhum ser tem objeto no intelecto segundo si mesmo, [40] exceto pelo ato de inteligir e, assim, não há nehum ser primeiro e, de nehum modo, moverá o intelecto, embora detenha em si o contrário.

Tertia via est communis, quod

primum esse, et tempore, et natura praecedit esse secundum, et manet sine eo, [45] secundum

A terceira via é comum: o primeiro ser precede no tempo e na natureza ao segundo ser, e permanece sem ele, [45] enquanto

30 AVICENA, Liber de Philosophia Prima sive Scientia Divina. V, c. 2, A 211, 53-62. [In: AVICENA

LATINUS. Édition critique de la traduction latine médiévale, par S. Van Riet. Louvain: E. Peeters, 1980, pp. 243-244].

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ponentes species intelligibiles manere sine actu.

coloca as espécies inteligíveis permanentes, sem o ato.

Inconveniens enim videtur

retentionem proprii obiecti post actum negare intellectui inquantum intellectus creatus, cum haec sit perfectionis in sensitiva.

Parece, pois, inconveniente a própria retenção do objeto depois de negar o ato do intelecto, enquanto intelecto criado, sendo esta perfeição a que existe na potência sensitiva.

Et licet coniungatur [50]

intellectus phantasiae: quaero, quae est perfectio intrinseca intellectus; accidit enim sibi inquantum intellectus coniungi cum phantasia.

E ainda que se una [50] o intelecto com a fantasia, procuro o que é esta perfeição intrínseca do intelecto; pois, ocorre-se-lhe enquanto o intelecto se une com a fantasia.

Et licet sit imperfectior non

coniuncto phantasiae; non tamen forte alterius rationis inquantum potentia; ergo [55] sicut separatus est intrinsece retenituus, ita noster, licet minus.

E ainda que seja mais imperfeito não se unir com a fantasia, talvez, ocorra não enquanto potência de outra razão; logo [55], assim como no intelecto separado é retido intrisecamente, assim também no nosso, embora menos.

SCHOLIUM 4. ESCÓLIO 4. [60] Universale sumptum pro

denominato, non negative, sed contrarie, seu indeterminate positive ad multa, esse habitualiter in intellectu, et non tantum actualiter, id est, habet speciem intelligibilem post actum, unde intellectus agens cum [65] natura facit universale hoc sensu31.

[60] O universal tomado pelo denominado, não negativamente, mas o contrário ou positivamente indeterminado a muitos, existe habitualmente no intelecto e não só atualmente, isto é, possui a espécie inteligível, depois do ato, onde o intelecto agente com [65] a natureza produz o universal neste sentido.

8 Ad quaestionem igitur, quo ad

hoc membrum, dico, quod universale tertio modo dictum non [70] est in intellectu secundo modo ex necessitate, ita quod quasi illud esse sit sibi

8 Portanto, digo nesta questão, para esta parte, que o universal dito no terceiro modo, não [70] está no intelecto de acordo com o segundo modo por necesidade, como se tal estar nele fosse necessário, tal

31 IOANNIS DUNS SCOTI, In II Sententiarum, dist. 3, q.6. Ad argumenta principali, 191-193.

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necessarium; sicut probant rationes contra secundam opinionem, sed necessario est in intellectu primo modo, ita quod sine illo concomitante obiectum, non inest [724a] [5] ei universalitas.

como prova os argumentos contra a segunda opinião, mas é necessário estar no intelecto quanto ao primeiro modo, assim que sem aquele objeto concomitante, não existiria nele [724a] [5] a universalidade.

Hoc probat bene prima ratio

contra primam opinionem. Sed quae est causa illius indeterminationis, quam obiectum cum habet esse primum in intellectu, est complete universale?

Isto prova bem a primeira razão contra a primeira opinião. Mas, qual é a causa daquela indeterminação, pela qual o objeto possuindo primeiro o ser no intelecto, é completamente universal?

Respondeo, quod non sola res,

quia non est eius [10] in se tanta indeterminatio, ut probat illa prima ratio.

Respondo, que não é só por causa da coisa, porque não há nela [10] mesma tanta indeterminação, como prova aquela primeira razão.

Nec etiam intellectus possibilis,

quia non reciperet indeterminatius, quam obiectum esse factivum.

Nem mesmo o intelecto possível, porque não receberia nada de modo indeterminado, se o objeto existisse de modo determinato.

In omni autem natura, ut arguit

Aristo. in 3 de Anima, tex. com. 17 et 1832, est dare [15] aliquid, quod est omnia facere, dato aliquo, quod est omnia fieri, hoc est in tota natura universali, cuilibet potentiae passivae correspondet potentia activa.

Mas, em toda natureza, como argui Aristóteles, em De anima, 3, é dado [15] algo para fazer todas as coisas, o que é dado é pelo que se faz todas as coisas, há isto em toda natureza universal, pois a qualquer potência passiva, corresponde uma potência ativa.

Et si non extrinseca, intrinseca in

eadem natura. Ergo cum experiantur, quod est aliquis intellectus [20] in nobis, quo est universale fieri.

E se não for extrínseca, será intrínseca à própria natureza. Logo, como se ensaiou, há algum intelecto [20] em nós, que é capaz de produzir o universal.

Hoc est, cui insit aliquid, per

quod obiectum est praesens, ut universale; necesse est aliquid esse activum illius, et non extra, ut argutum est. Ergo, intra.

Este é que faz algo existir nele, pelo qual o objeto se faz presente como universal; e é necessário que haja algo ativo nele e não fora, como se arguiu. Logo, dentro.

Intellectus igitur agens Portanto, o intelecto agente

32 Cf. ARISTÓTELES, De anima, 3, c. 5, 430a 10-18. [ARISTOTELIS, De anima. Recognovit brevique

adnotaione critica instruxit W.D. Ross. Oxonii: E typographeo Clarendoniano, 1959].

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concurrens cum natura aliquo [25] modo indeterminata ex se, est causa integra effectiva obiecti in intellectu possibili secundum esse primum, et hoc secundum completam indeterminationem universalis.

contribui com a natureza [25], que de algum modo é de si, indeterminada, como causa íntegra efetiva do objeto no intelecto possível, segundo o primeiro ser, e isto de acordo com a completa indeterminação do universal.

Nec est alia causa, quod

intellectus agens cum natura facit obiectum sic [30] esse, nisi quia est talis potentia, sicut nec quare calidum calefacit.

Não há outra causa: o intelecto agente faz com a natureza o objeto ser assim [30], porque é tal potência; como, pela mesma razão, o quente é capaz de esquentar.

Est ergo natura in potentia

remota ad determinationem singularitatis, et ad indeterminationem universalis.

Portanto, a natureza está em potência remota para a determinação da singularidade e para a indeterminação universal.

Et sicut a producente coniungitur

singularitati, ita a re agente, et [35] simul ab intellectu agente coniungitur universalitati.

Como se une o que produz à singularidade, o agente à coisa, também [35] pelo intelecto agente une-se à universalidade.

Et isto modo bene intelligitur

illud dictum Avicennae, 5 Metaph. cap. 133, quod natura de se non est universalis, nec particularis, sed tantum natura.

E entende-se bem isto pelo que disse Avicena em Metafísica, 5, c.1, que a natureza em si não é universal, nem particular, mas apenas natureza.

[40] Et hanc tertiam

indeterminationem probat tertium argumentum cum suis probationibus, non illam quae est universalis, quia illa minor salvat similitudinem, contrarietatem, etc.

[40] E esta terceira indeterminação prova o terceiro argumento com as suas comprovações, não aquela que é universal, porque aquela premissa menor salva a semelhança, a contrariedade, etc.

Et illo modo dicatur quid, et ista

indeterminatio eius est privativa, [45] alia maior quae est universalitas contraria.

E, mediante aquele modo, diz-se o que, e esta sua indeterminação é privativa, [45] a outra maior, que é contrária a universalidade.

Sed quae est actio realis

intellectus agentis? Non videtur quod circa obiectum reale, cum illud nihil sit in re.

Mas qual é a real ação do intelecto agente? Não parece ser sobre o objeto real, uma vez que ela não seja nada no real.

33 AVICENA, Liber de Philosophia Prima sive Scientia Divina. V, c. 1, A 196, 19-36. [In: AVICENA

LATINUS. Édition critique de la traduction latine médiévale, par S. Van Riet. Louvain: E. Peeters, 1980, p. 228].

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Hic dicunt quidam, quod

abstractio non sit a phantasmate, sed ab obiecto, quia [50] nullam speciem intelligibilem ponunt.

Alguns dizem que a abstração não é a dos fantasmas, mas a do objeto, porque [50] não estabelece nenhuma espécie inteligível.

9 Contra: obiectum quando est in

esse primo in intellectu, aliter se habet ad intellectum, quam prius, quando non fuit in esse primo, quia nunc movet, prius non; nunc intellectus intelligit ex illa [55] motione, et prius non.

9 Contra: quando o objeto está no intelecto, no primeiro sentido de ser, ele lhe tem de modo distinto daquele que não estava no primeiro sentido, pois agora move, antes não; o intelecto intelige por esta [55] moção, antes não.

Ergo aliqua mutatio facta est

prius naturaliter, quam intellectus intelligat. Sed illa non est in phantasmate.

Logo, alguma mudança foi naturalmente feita antes que o intelecto inteligisse. Mas, esta mudança não é nos fantasmas.

Patet, nec in intellectu agente,

nec in eorum coniunctione, quia semper erant aequaliter coniuncta, ex quo illud [60] phantasma infuit.

Claro, nem no intelecto agente nem em suas conjunções, porque sempre estavam igualmente unidas, com aquilo que [60] existiram nos fantasmas.

Ergo oportet ponere in intellectu

possibili aliquam mutationem priorem natura, ipsa intellectione, per quam obiectum sit in esse primo in quo non fuit.

Logo, é preciso pôr no intelecto possível alguma mudança anterior à natureza, à própria intelecção, pela qual o objeto seja ser primeiro, no qual não estava.

Hoc conceditur, ita quod

abstractio obiecti non est aliqua actio [65] realis, sed causatur species intelligibilis a phantasmate, et intellectu agente simul, quam causata in intellectu possibili, formaliter, simul causatur obiectum abstractum ibi non formaliter, sed obiective, et sic bene salvatur Avicen. 5. Metaph. cap. 234 [70] de forma intelligibili.

Concede-se isto: que a abstração do objeto não é alguma ação [65] real, mas simultaneamente causa-se a espécie inteligível pelos fantasmas e pelo intelecto agente, que é causada no intelecto possível formalmente e simultaneamente é causado aí o objeto abstrato não formalmente, mas objetivamente e, assim, se salva bem em Avicena, na Metafísica, 5, c.2 [70] a forma inteligível.

Licet enim sit duplex [724b] [1]

modus essendi in, tamen unus concomitatur alium necessario;

Apesar de ser duplo [724b] [1] o modo de ser em, um é necessariamente concomitante ao

34 AVICENA, Liber de Philosophia Prima sive Scientia Divina. V, c. 2, A 211, 53-62. [In: AVICENA

LATINUS. Édition critique de la traduction latine médiévale, par S. Van Riet. Louvain: E. Peeters, 1980, pp. 243-244].

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nisi enim ponatur illa gignitio, nulla actio realis potest dari intellectui agenti, et ita nec aliqua circa obiectum, quia illa nunquam [5] est intentionaliter, nisi propter aliquam realem.

outro; exceto se puser aquela geração, então nenhuma ação real poderia dar-se no intelecto agente e nenhuma acerca do objeto, porque aquela nunca [5] é de modo intencional, exceto por algo real.

Similiter nunquam obiectum est

abstractum, nec universale prius natura, quam intelligatur, nisi ponatur quodcumque obiectum habens phantasma in phantasia coniuncta intellectui agenti, esse [10] abstractum, et semper in esse primo, postquam eius inest phantasia.

De modo semelhante, nunca o objeto é abstrato, nem universal primeiro pela natureza, do qual se intelige, exceto se puser qualquer objeto tendo fantasma na fantasia unida ao intelecto agente, como ser [10] abstrato e sempre no primeiro ser, depois de existir nele como fantasia.

Et tunc quomodo post addiscere,

est magis in potentia accidentali, quam ante ad speculari? Respondeo, per habitum generarum, et phantastica ordinate occurrunt.

Então, como depois de adicionar está mais em potência acidental do que ante para especular? Respondo, que pelo hábito gerado e pelas fantasias ordenadas que concorrem.

[15] Contra: iste habitus est in

phantasia; si enim esset in intellectu possibili, quid facit circa phantasma, ut illud moveat intellectum possibilem, hic nunc, et illud tunc? Non enim inclinat nisi potentiam in qua est.

[15] Contra: este hábito estaria na fantasia; se, pois, estivesse no intelecto possível, o que faz acerca dos fantasmas, enquanto move o intelecto possível, aqui e agora e lá e antes? Não inclina, pois, senão à potência, na qual existe.

Sed quod illorum est prius

scilicet esse [20] in intellectu, vel illa indeterminatio, quae ponitur propria universali?

Mas, qual deles é anterior, a saber, o ser [20] no intelecto ou aquela indeterminação que se põe como própria do universal?

Videtur quod esse in intellectu;

nam intellectus agens primo videtur facere aliquid in intellectu possibilis; ergo si facit universalitatem, hoc erit mediate.

Parece que é o ser no intelecto, pois o intelecto agente parece fazer algo primeiro no intelecto possível; por conseguinte, se produz o universal, este será feito de modo mediato.

Contra: [25] tunc universale erit

posterius ente vero. Non enim solum est ens unum, quod est in intellectu in actu secundo, sed etiam quod in primo.

Contra: [25] então, o universal será posterior ao ente. Não só ao ente uno, que está no intelecto em ato segundo, mas também, ao que está em ato primeiro.

Et videtur, quod sit imperfectius Parece ser mais imperfeito o ente,

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ens, ens verum, quod est in habitu, quam quod est in actu.

a verdade, que está em hábito, do que o que está em ato.

Item, singularitas prior est [30]

natura, quam esse in re, igitur a simili.

Assim, a singularidade é anterior [30] por natureza, ao ser no real; logo, dá-se semelhante modo.

Confirmatur, quia magis videtur

universale abstrahere a quacumque existentia, quam singulare. Ad istam dubitationem potest dici, etc.

Confirma-se, porque parece mais universal abstrair de qualquer existente do que de qualquer singular. Pode-se dizer isto para esta dúvida, etc.

SCHOLIUM 5. ESCÓLIO 5. Eandem naturam, quae est in re,

et singulariter existens, fieri potest universalis per relationem ad intellectum, ut cogniti ad cognoscens; potest [40] tamen universale non esse in re, sed nequis esse non in intellectu35.

A mesma natureza que existe no real de modo singular, pode ser universal pela relação com o intelecto, como do conhecido com o cognoscente; pode [40], todavia, não existir no real, mas não deixa de existir no intelecto de ninguém.

10 Quo ad secundum membrum

quaestionis scilicet [45] an sit in re? Respondeo, esse in intellectu primo modo, vel secundo, non est nisi habere relationem rationis ad intellectum.

10 Quanto à segunda parte da questão, a saber, existe no real? Respondo: existe no intelecto no primeiro ou segundo modo, que não é senão ter relação de razão com o intelecto.

Istud autem quod est in re, bene

habet istam relationem; ergo illud, quod est universale, est in re.

Mas isto que existe no real, tem certamente esta realção; por conseguinte, o que é universal existe no real.

Confirmatur, [50] aliter in

sciendo aliqua de universalibus, nihil sciremus de rebus, sed tantum de conceptibus nostris, nec mutatetur opinio nostra a vero in falsum, propter mutationem in existentia rei.

Confirmar-se: [50] do contrário, ao conhecer algo dos universais, nada conheceríamos das coisas, mas só dos nossos conceitos, nem mudaria a nossa opinião em verdadeiro e falso, em razão da mudança na existência da coisa.

Potest igitur universale esse in re,

ita quod eadem natura [55] est,

Pode o universal existir no real, tal como a própria natureza [55] é,

35 IOANNIS DUNS SCOTI, In II Sententiarum, dist. 3, q.6. Ad argumenta principali, 191-193.

[Opera Omnia. Studio et cura Commissionis Scotisticae. P. Carolo Balic. VII. Civitas vaticana: Typis Polyglotis Vaticanis, 1973, p. 486-487]; B. IOANNIS DUNS SCOTI, In II Lib. Sententiarum, d. 3, q. 1. [Commentaria Oxoniensia ad IV Libros Sententiarum. Novis curis edidit P. Marianus Fernandez Garcia. Tomus II. Ad Claras Aquas (Quaracchi): Ex Typographia Colegii S. Bonaven-turae, 1914, pp. 270-271, n° 290].

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quae in existentia per gradum singularitatis est determinata.

que é determinada na existência pelo grau de singularidade.

Et in intellectu, hoc est, ut habet

relationem ad intellectum, ut cognitum ad cognoscens, est indeterminata; ita quod sicut ista duo esse concurrunt per accidens in eadem natura; et [60] posset utraque esse fine altera; ita etiam determinatio, et indeterminatio praedicta.

E no intelecto, como indeterminado e tenha relação com o intelecto, como a do conhecido com o cognoscente; assim, que estes dois modos de ser ocorram por acidente na mesma natureza; e [60] uma pode ser fim da outra; assim, também, a referida determinação e indeterminação.

Et ex hoc apparet, quod non est

necesse illud, quod est universale, esse in re, licet possit, sicut necesse est ipsum esse in intellectu.

E isto mostra que não é necessário que o que é universal, exista no real, embora possa, como também é necessário, que o mesmo exista no intelecto.

[65] Contra: contraria non insunt

eidem; determinatio, quam est hoc, et indeterminatio, quam est idem huic, et illi, sunt conceptus contrarii secundum praedicta.

[65] Contra: os contrários não coexistem num mesmo; a determinação é para isto e a indeterminação para isto ou aquilo; e são conceitos contrários.

Dicitur, quod non insunt

secundum idem; quia unum secundum unum esse, et aliud [70] secundum aliud esse; sed tunc oporteret ponere illa esse [725a] [1] naturaliter esse priora istis contrariis.

Diz-se que os contrários não coexistem no mesmo, porque um é segundo um ser e o outro [70], segundo outro ser; mas, então, precisaria naturalmente pôr aquele ser [725a] [1] como anterior a estes contrários.

Similiter, quod absolute

contraria compariuntur se in eodem, non videtur; nec aliqua diversa secundum quae contraria insunt, puta album, et nigrum [5] secundum aliam, et aliam partem superficiei: talia non insunt eidem subiecto proprio.

Igualmente, não parece que, em absoluto, sejam comparáveis os contrários numa mesma natureza; nem algo diverso, enquanto coexista como contrário, como branco e negro [5] numa e noutra parte da superfície: não coexistem num mesmo sujeito próprio.

Si autem ad totum comparantur,

respectu eius sunt contraria secundum quid.

Se, porém, são comparados com o todo, com respeito a eles, são contrários relativamente.

Item, quomodo intelligitur quid,

absolute, vel quomodo singulare, si semper natura [10] cum intellectu agente facit indeterminatum complete in

Então, como se entende o relativo de modo absoluto como singular se a natureza sempre [10] faz com o intelecto agente completamente o indeterminado no intelecto

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intellectu possibili? possível? Item est ne abstractio illa

intellectus agentis, perfectionis?

Então, nem a abstração é daperfeição do intelecto agente?

Videtur quod sic, quia sine

intellectu agente, non posset esse intellectio abstracti; ergo illud adiungitur, ut [15] concausa propter perfectionem maiorem.

Parece que sim, pois sem o intelecto agente não poderia haver intelecção do abstrato; logo, aquilo se junta, como [15] concausa, por uma maior perfeição.

Contra: cognoscere confuse est

imperfectionis; ergo magis confuse imperfectius.

Contra: conhecer de modo confuso é imperfeição; logo, mais confuso, mais imperfeito.

11 Ad primum de contrariis, potest

dici, etc. Ad aliud dicitur, quod quid intelligitur absolute, et [20] ita id quod est singulare, sive in differentia universalis, quando natura sola movet intellectum, sine intellectu agente.

11 Ao primeiro dos contrários pode-se dizer aquilo, etc. Ao outro é dito que o que se intelige absoluto e [20] do que é assim singular, ou seja, na diferença universal, quando a natureza só move o intelecto, sem o intelecto agente.

Sed singulare inquantum hoc,

numquam movet, ut prius dictum est; igitur non intelligitur, nisi ab intellectu intelligente res, [25] inquantum sunt in se manifestae: nam quia primo movetur, primo modo visus videt singulare; secundo modo, non; tertio modo quando coagit intellectus agens naturae, intelligitur universale complete.

Mas, o singular assim, nunca move, como já dito; então, não é inteligido, exceto pelo intelecto que intelige as coisas, [25] enquanto lhe são manifestas; porque, de fato, move-se primeiro: no primeiro modo, a visão vê o singular, no segundo, não, no terceiro, quando interage com a natureza, com o intelecto agente, é completamente inteligido o universal

Contra: fictio videtur, quod

intellectus [30] agens quandoque coagit phantasmati, et quandoque non; cum utriusque virtus activa sit naturalis et non libera.

Contra: parece ficção que o intelecto [30] agente quando, às vezes, interaja com os fantasmas e, quando, às vezes, não; sendo em ambos uma virtude ativa natural e não livre.

Item, quomodo phantasma sola

virtute propria movebit intellectum possibilem?

Então, como só o fantasma, por virtude própria, moveria o intelecto possível?

Ad secundum argumentum,

cuiuslibet potentiae [35] passivae proprium obiectum, secundum quod obiectum, est moriuum eius; ergo proprium obiectum

Ao segundo argumento, por meio de qualquer potência [35] passiva, em relação ao próprio objeto, segundo o qual o objeto é apto para aqueles hábitos; logo, o próprio

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intellectus agentis, si responsio sit vera.

objeto do intelecto agente, se a resposta for verdadeira.

Respondeo, quod prima

propositio est falsa: nam potentia cognoscitiva non tantum habet [40] recipere speciem obiecti, sed etiam tendere per actum suum in obiectum, et illud secundum est essentialius potentiae.

Respondo, que a primeira proposição é falsa: pois, a potência congnitiva não tem apenas [40] a capacidade de receber a espécie do objeto, mas também de buscá-la no objeto por seu ato e, este segundo, é o mais essencial da potência.

Primum requiritur propter

imperfectionem potentiae, et obiectum principalius est obiectum; quia in ipsum tendit potentia, quam quia imprimit speciem, quod patet, si Deus [45] imprimeret speciem intellectui, vel etiam in oculo, eodem modo ferretur in obiectum, sicut modo, et obiectum ita esset obiectum.

Primeiro, requer-se por causa da imperfeição da potência e o mais importante objeto é objeto, porque a ele tende a potência, da qual, pois, imprimi a espécie, o que é evidente, si Deus [45] imprimisse a espécie no intelecto ou mesmo no olho, ainda assim se teria do mesmo modo pelo objeto, e assim o objeto seria objeto.

Sed Deus non esset obiectum,

quia in ipsum non tendit; et tamen ipse [50] imprimit sicut impressit Angelis species creaturarum; haec ergo est vera; cuiuslibet passivi est aliquod motivum per se.

Mas, Deus não seria objeto, porque não tenderia a Ele; e, todavia, Ele [50] imprimi, tal como imprimiu as espécies dascriaturas nos Anjos; portanto, esta impressão é verdadeira; qualquer que é passivo é essencialmente motivado.

Sed non oportet in potentiis

apprehensivis, quod illud motivum sit proprium obiectum potentiae sub ratione, quam obiectum [55] terminat actum potentiae.

Mas, isto não é preciso nas potências apreenssivas, que aquela motivação seja objeto próprio da potência sob a noção, pela qual o objeto [55] determina o ato da potência.

Hoc patet in voluntate: qui enim

dicunt eam passivam, dicunt eam moveri ab obiecto, secundum quod in intellectu est; sed tendere in obiectum, non secundum quod est in intellectu, sed secundum quod est in se, iuxta [60] illud Commentatoris 12. Metaphysic. Commento 3636: Balneum secundum quod in

Isto fica claro na vontade: que dizem ser pois passiva, que ela se move pelo objeto, conforme o que está no intelecto; mas tender ao objeto, não o faz segundo o que está no intelecto, mas de acordo com o que está junto dela [60], o que o Comentador trata em Metafísica, 12, comentário 36: move ao banho segundo o que na

36 Cf. AVERROIS CORDUBENSIS, Aristotelis Metaphysicorum Libri XIIII. Liber XII, comentário.

36, 318v col. 1 I. [ARISTOTELIS, Opera cum Averrois commentariis. Vol. VIII. Venetiis: Apud Junctas, 1562-1574].

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anima movet appetitum effective; secundum autem quod in re extra movet, ut finis.

alma efetivamente move o desejo; mas, conforme ao que no real externo move, enquanto fim.

Sed propria ratio obiecti

voluntatis est ratio finis, et ut res est in se, et non [65] ratio efficientis, vel ut in intellectu; ergo.

Mas a própria noção de objeto da vontade é a noção de fim, como o real é em si, e não [65] a noção de eficiente, ou como no intelecto; por conseguinte.

Patet falsitas propositionis, et

quomodo verificatur: immo nec vera est in potentiis naturalibus: obiectum enim proprie potentiae passivae est ens actu, vel actus ad quem terminatur, et illud non agit in [70] potentiam passivam; sed aliud agens in ipsam producit [725b] [1] illum actum, vel illud ens actu.

Clara é a falsidade da proposição e como se verifica: nem mesmo é verdadeira nas potências naturais: pois, o objeto próprio da potência passiva é o ente em ato ou o ato para o qual se determina, e ele não age na [70] potência passiva, mas outro agente produz nela mesma [725b] [1] aquele ato ou aquele ente em ato.

A simili, haec est falsa: omnis

potentia activa, nata est per se agere in suum obiectum: si suum obiectum sit terminus actionis suae.

De modo semelhante, está é falsa: toda potência ativa é apta naturalmente a agir por si em seu objeto, se o seu objeto for o término da sua ação.

Terminus actionis [5] intellectus

agentis non est phantasma, in quod agit, sed universale, saltem in cognitus videtur verum.

O término da ação [5] do intelecto agente não é o fantasma, em que age, mas o universal, ao menos se parece verdade no conhecido.

Intellectus Dei activus est

respectu essentiae suae: nec tamen quicquam agit in ipsam.

O intelecto de Deus é ativo com relação à sua essência: todavia, não age de qualquer modo sobre ele.

Similiter voluntas nostra nihil

agit in obiectum, etiam [10] secundum ponentes ipsam activam: sed tantum actione sua intendit in obiectum.

Igualmente, nossa vontade não age sobre o objeto, também [10], mesmo que se afirme a mesma como ativa: mas apenas a sua ação tende ao objeto.

Probatur falsitas primae: nec

enim omni, nec soli obiecto conveniret movere; ergo, etc.

Prova-se a falsidade da primeira: pois nem do todo nem só do objeto convém mover; logo, etc.