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Iracema Lenda do Ceará

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IracemaLenda do Ceará

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Contexto sócio-histórico: - Independência dos EUA (1776), Revolução Francesa (1789);- Revolução Industrial;- alcance das ideias iluministas;- decadência das instituições e ideologias senhoriais-absolutistas;- crescimento das camadas médias, burguesas; - final do século XVIII – desenvolvimento da tipografia e do jornalismo, maior procura pelo livro impresso;- novo público; novas relações entre escritor e público.

Romantismo

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O pensamento romântico:- pensamento clássico: res cogitans (só é válido o objeto pensado);- Rousseau – retorno à natureza; (Natureza X Cultura); o bom selvagem;- Filósofos românticos: prevalência dos sentidos sobre a razão, pois a Verdade não se manifesta por meio da razão, ela é anterior à consciência;- a liberdade é infinita, a filosofia não pode alcançá-la por meio da razão. Como obtê-la? Por meio dos sentidos, da arte.

Romantismo

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Estética romântica (século XIX)- originalidade pessoal, autoral X imitação clássica;- desprezo pelos valores da antiguidade clássica;- liberdade criadora;- improvisação;- evasão da imaginação;- desordem psíquica;- o enevoado, o noturno, o sonho;- obsessão pela morte – dor do existir;- exagero sentimental e melodramático.

Romantismo

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Estética romântica (século XIX)- Romantismo europeu: volta ao passado (medieval, oriental), aspiração a um passado mítico;- Romântico – roman: romances medievais de cavalaria;- recuperação das tradições medievais em oposição à cultura aristocrática.

Romantismo

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Contexto sócio-histórico: - chegada da corte portuguesa ao Brasil (1808);- Independência do Brasil (1822);- fortes laços culturais com a Europa; - 1836: início do Romantismo no Brasil com a publicação de Suspiros poéticos e saudades, de Gonçalves de Magalhães.

Romantismo no Brasil

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Nacionalismo/Patriotismo: - escritor brasileiro, em sintonia com os ideais do intelectual europeu, acredita em seu papel de desenvolver o orgulho patriótico e uma literatura independente da europeia;- exaltação da pátria;- cor local: valorização de aspectos da cultura e do espaço nacionais;- nativismo: exaltação da natureza brasileira;- criação da identidade brasileira.

Romantismo no Brasil

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Indianismo:- identidade nacional Þ herói nacional: ÍNDIO;- tentativa de reconhecer o mito fundador do Brasil;- índio no Romantismo: cordial, leal, hábil guerreiro Þ qualidades dos heróis dos romances de cavalaria europeus;- ideal de heroísmo e beleza nacional.

Romantismo no Brasil

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- José Martiniano de Alencar nasceu em Mecejana (Ceará), em 1829, e faleceu no Rio de Janeiro, em 1877;- ainda menino, mudou-se para a corte;- estudou Direito em São Paulo e Olinda;- começou sua carreira de escritor em 1854, como cronista;- escreveu algumas obras em forma de folhetins, como é o caso de O Guarani (1857);- nome central da prosa romântica brasileira, autor de obras que transitam entre o romance histórico e indianista (O Guarani, Iracema); o romance regionalista (O sertanejo); o romance urbano (Lucíola; Senhora).

Autor

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Síntese do enredoA lenda do Ceará começa com o encontro entre Iracema, filha dopajé Araquém, da tribo Tabajara, e Martim, um guerreiro portuguêsaliado dos pitiguaras. Iracema e Martim apaixonam-se enquanto ocolonizador refugia-se na cabana de Araquém após ser ferido pelaíndia. Sem que os tabajaras, inimigos dos pitiguaras, saibam,Martim esconde-se na cabana e mantém relações com Iracema,que deveria permanecer virgem para guardar o segredo da jurema,uma bebida sagrada. Grávida de Martim, Iracema abandona, com oamado e Poti, seu aliado pitiguara, a terra de seus irmãos e seguepara a tribo inimiga, causando uma batalha da qual saemvencedores os pitiguaras. Iracema passa a viver feliz com Martim ePoti, mas o guerreiro branco começa a dar sinais de saudade daterra natal.

Iracema, lenda do Ceará (1865)

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Síntese do enredoIracema deprime-se após a partida de Martim para guerrear contraos franceses. Durante uma outra batalha, da qual participam Martime Poti, Iracema, triste e abandonada, dá à luz Moacir. Adoecida,morre quando Martim retorna à cabana. Martim volta com o filhopara sua terra natal e, depois de algum tempo, retorna ao Brasilpara, juntamente com o comandante Jerônimo Albuquerque,catequizar os índios e fundar o Ceará.

Iracema, lenda do Ceará (1865)

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- Forte atração acomete os amantes: força do destino;- consumação do amor romântico: sofrimentos e provações;- Iracema: filha do pajé, deve permanecer virgem;- Martim: guerreiro branco, aliado dos inimigos dos tabajaras, homem incapaz de trair a confiança de Araquém;- morte: fim do sofrimento + realização do sentimento amoroso em outra esfera;- amor romântico: sentimento puro, verdadeiro e desinteressado;- Iracema sacrifica sua vida em prol da felicidade do amado, permitindo seu retorno à terra natal.

Iracema: o amor romântico

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- Iracema: anagrama de América;- “a índia fecundada pelo português” (Afrânio Peixoto): a nova América;- criação da lenda de fundação do Ceará;- uma história de amor sentimental e trágica é o palco para se estabelecer, por meio de uma lenda, uma origem digna e heróica para a nação brasileira;

Iracema: identidade nacional

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História: - caráter profano;- “verdade científica”;- explica a condição e a existência do homem mediante fatos, eventos registrados ao longo do tempo;- o homem moderno não precisa conhecer a História para existir.

Iracema: História X mito X lenda

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Argumento histórico do romance: - duas expedições portuguesas enviadas para colonizar a região do Ceará;- dessas expedições participou o português Martim Soares Moreno;- primeira expedição (1603): Martim alia-se aos pitiguaras, dentre eles, os irmãos Jacaúna e Poti;- segunda expedição (1608): efetiva-se o processo de colonização, e Poti, convertido ao cristianismo, adota o nome de Antônio Filipe Camarão.

Iracema: História X mito X lenda

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Mito: - caráter sagrado;- “verdade mágico-religiosa”;- manifestação oral;- narrativa de acontecimentos fabulosos que ocorreram num tempo primordial, não cronológico;- remetem à criação (do universo, de um espaço, de um ser, de um costume etc.);- o homem das sociedades arcaicas precisa conhecer o mito para dar sentido à sua existência.

Iracema: História X mito X lenda

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“Perto havia uma formosa lagoa no meiode verde campina. Para lá volvia aselvagem [Iracema] o ligeiro passo. Era ahora do banho da manhã; atirava-se à águae nadava com as garças brancas e asvermelhas jaçanãs.

Os guerreiros pitiguaras, queapareciam por aquelas paragens,chamavam essa lagoa Porangaba, oulagoa da beleza, porque nela se banhavaIracema, a mais bela filha da raça de Tupã.

E desde esse tempo as mãesvinham de longe mergulhar suas filhas naságuas da Porangaba, que tinha a virtude dedar formosura às virgens e fazê-las amadaspelos guerreiros.”(Capítulo XXIII)

Iracema: História X mito X lenda

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Lenda:- narrativa de caráter oral;- ponto de partida: fato histórico;- desfiguração do argumento histórico pela imaginação popular ao longo do tempo;- História + ficção.

Iracema: História X mito X lenda

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“Que deixara ele na terra do exílio?Uma história que me contaram nas lindas várzeas onde nasci, à calada da noite, quando a lua passeava no céu, argenteando os campos, e a brisa rugitava nos palmares.”(Capítulo I)

“Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema.”(Capítulo II)

Iracema: História X mito X lenda

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- Iracema: História + lenda + mito.

Iracema: História X mito X lenda

“A jandaia pousada no olho da palmeira repetia tristemente:

- Iracema!

Desde então os guerreiros pitiguaras, que passavam perto da cabana abandonada e ouviam ressoar a voz plangente da ave amiga, afastavam-se, com a alma cheia de tristeza, do coqueiro onde cantava a jandaia.

E foi assim que um dia veio a chamar-se Ceará o rio onde crescia o coqueiro e os campos onde serpeja o rio.” (Capítulo XXXII)

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- Natureza romântica: expressiva, significativa, reveladora;- não se trata de mero cenário em que se desenrola a trama;- a descrição da variedade de fauna e flora da região é responsável por propiciar a cor local à narrativa;- natureza: elemento estético do romance;- ponto de referência para os índios, desempenha o mesmo papel na narrativa.

Natureza: espaço ou personagem?

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“Já descia o sol das alturas do céu.Chegam os viajantes à foz do rio onde se criam em grande abundância as saborosas traíras, suas praias são povoadas pela tribo dos pescadores, da grande nação dos pitiguaras.(...)Os pescadores em suas jangadas seguiam o chefe e atroavam os ares com o canto de saudade e os múrmuros do uraçá [concha], que imita os soluços do vento.Além da barra da Piroquara estava mais entrada para as serras, a tribo dos caçadores. Eles ocupavam as margens do Soipé, cobertas de matas, onde os veados, as gordas pacas e os macios jacus [ave] abundavam. Assim os habitadores dessas margens lhes deram o nome de país da caça.(...)Depois que partiram do Soipé, os viajantes atravessaram o Rio Taíba, em cujas margens vagavam bandos de porcos-do-mato; mas longe corria o Cauípe, onde se fabricava excelente vinho de caju.No outro sol viram um lindo rio que surdia [jorrava] no mar cavando uma bacia na rocha viva.” (Capítulo XXI)

Natureza: espaço ou personagem?

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- Natureza Þ marcação temporal:

“Quatro luas tinham alumiado o céu depois que Iracema deixara os campos do Ipu e três depois que ela habitava nas praias do mar a cabana de seu esposo”. (Capítulo XXIII)

“A alegria ainda morou na cabana todo o tempo que as espigas de milho levaram a amarelecer.” (Capítulo XXV)

Natureza: espaço ou personagem?

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- Natureza Þ marcação temporal:

“Era o tempo em que o doce Aracati [brisa]chega do mar e derrama a deliciosa frescura peloárido sertão. A planta respira; um suave arrepio erriçaa verde coma da floresta.

O cristão contempla o ocaso do sol.”(Capítulo VI)

Natureza: espaço ou personagem?

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- Natureza Þ marcação espacial:

“Quando tinham andado o espaço que transpõe a garça de um vôo, o chefe pitiguara tornou-se inquieto (...).”(Capítulo XVI)

Natureza: espaço ou personagem?

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- Natureza Þ caracterização de personagens:

“O ancião [Araquém] fumava à porta, sentadona esteira de carnaúba, meditando os sagrados ritosde Tupã. O tênue sopro da brisa carmeava [desfaziaos nós], como frocos de algodão, os compridos e raroscabelos brancos. (...)

Quando os viajantes entraram na densapenumbra do bosque, então seu olhar, como o dotigre, afeito às trevas, conheceu Iracema e viu que aseguia um jovem guerreiro, de estranha raça e longesterras.”(Capítulo III)

Natureza: espaço ou personagem?

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- Natureza Þ pensamento selvagem:

“[Martim] - Iracema quer ver o estrangeiro forados campos dos tabajaras; então a alegria voltará aseu seio.

[Iracema] - A juruti [espécie de ave], quando aárvore seca, foge do ninho em que nasceu. Nuncamais a alegria voltará ao seio de Iracema: ela vai ficar,como o tronco nu, sem ramas, nem sombras.”(Capítulo VIII)

Natureza: espaço ou personagem?

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- Natureza Þ personagem:

“O cristão contempla o ocaso do sol. A sombra, que desce dos montes e cobre o vale, penetra sua alma. Lembra-se do lugar onde nasceu, dos entes queridos que ali deixou. Sabe ele se tornará a vê-los algum dia?Em torno carpe a natureza o dia que expira. Soluça a onda trépida e lacrimosa; geme a brisa na folhagem (...).”(Capítulo VI)

Natureza: espaço ou personagem?

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- Os eventos do romance têm como cenário a região correspondente ao estado do Ceará;- tribo dos tabajaras: serra da Ibiapaba, na fronteira com o Piauí;- tribo dos pitiguaras: região litorânea, que compreende a foz do Rio Jaguaribe e a foz do rio Acaraú;- cabana de Martim e Iracema: região de Fortaleza (rio Ceará; lagoa da Porangaba; lagoa da Messejana).

Espaço

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Espaço

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- A história apresenta uma estrutura temporal acronológica, uma vez que o primeiro capítulo do romance revela o momento em que Martim parte com seu filho Moacir após a morte de Iracema (1604). A história é contada, então, em um flashback que se estende por 31 capítulos (1603). No trigésimo terceiro capítulo do romance, o narrador relata o retorno de Martim com seu filho para efetivar a colonização no Ceará (1608);- tempo mítico, lendário: impreciso, marcado pela observação dos fenômenos naturais.

Tempo

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- Narrador em 3a pessoa, onisciente;- contador de histórias: narrativa lendária (“Quedeixara ele [Martim] na terra do exílio? Umahistória que me contaram nas lindas várzeas ondenasci, à calada da noite, quando a lua passeavano céu, argenteando os campos, e a brisa rugitavanos palmares”- Capítulo I);- perspectiva do nativo brasileiro: conhecedor decrenças, de costumes e da língua indígena.

Foco narrativo

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“O cristão amou a filha do sertão, como nos primeiros dias, quandoparece que o tempo nunca poderá estancar o coração. Mas breves sóisbastaram para murchar aquelas flores de uma alma exilada da pátria.

O imbu [fruta], filho da serra, se nasce na várzea porque o vento ou asaves trouxeram a semente, vinga, achando boa terra e fresca sombra; talvez umdia cope a verde folhagem e enflore. Mas basta um sopro do mar, para tudomurchar. As folhas lastram o chão; as flores, leva-as a brisa.

Como o imbu na várzea, era o coração do guerreiro branco na terraselvagem. A amizade e o amor o acompanharam e fortaleceram durante algumtempo, mas agora longe de sua casa e de seus irmãos, sentia-se no ermo. Oamigo e a esposa não bastavam mais à sua existência, cheia de grandesdesejos e nobres ambições.”(Capítulo XXVII)

Foco narrativo

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Linguagem

Estudando profundamente a língua e os costumes dos selvagens,obrigou-nos o autor a entrar mais ao fundo da poesia americana; entendia ele,e entendia bem, que a poesia americana não estava completamente achada;que era preciso prevenir-se contra um anacronismo moral, que consiste emdar ideias modernas e civilizadas aos filhos incultos da floresta. O intuito eraacertado; não conhecemos a língua indígena; não podemos afirmar se o autorpôde realizar as suas promessas, no que respeita à linguagem da sociedadeindiana, às suas ideias, às suas imagens; mas a verdade é que relemosatentamente o livro do Sr. José de Alencar, e o efeito que ele nos causa éexatamente o mesmo a que o autor entende que se deve destinar ao poetaamericano; tudo ali nos parece primitivo; a ingenuidade dos sentimentos, opitoresco da linguagem, tudo, até a parte narrativa do livro, que nem pareceobra de um poeta moderno, mas uma história de bardo indígena, contada aosirmãos, à porta da cabana, aos últimos raios do sol que se entristece.(Machado de Assis, a respeito de Iracema)

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Linguagem

- Prosa poética;- primeira intenção do autor: compor um poema indianista.

“Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaúba;

Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros;

Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa, para que o barco aventureiro manso resvale à flor das águas.

Onde vai a afouta jangada, que deixa rápida a costa cearense, aberta ao fresco terral a grande vela?

Onde vai como branca alcíone [ave] buscando o rochedo pátrio nas solidões do oceano?” (Capítulo I)

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Linguagem

- Pesquisa linguística: identidade nacional;- mescla do português erudito (colonizador) e da simplicidade do pensamento indígena.

“Triste dela! A gente tupi a chamava jandaia, porque sempre alegre estrugia [vibrava] os campos com seu canto fremente. Mas agora, triste e muda, desdenhada de sua senhora, não parecia mais a linda jandaia, e sim o feio urutau [ave de rapina] que somente sabe gemer.

O sol remontou a umbria [lugar sombrio] das serras; seus raios douravam apenas o viso das eminências.

A surdina [canto abafado] merencória [melancólica] da tarde, precedendo o silêncio da noite, começava de velar os crebros [frequentes] rumores do campo. Uma ave noturna, talvez iludida com a sombra mais espessa do bosque, desatou o estrídulo [som agudo].” (Capítulo X)

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Linguagem

- Construção verossímil da fala do índio (ausência da 1a pessoa);- farta incidência de perífrases, metáforas e, principalmente, comparações.

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“A virgem estremeceu. O guerreiro cravou nela o olhar abrasado:- O coração aqui no peito de Irapuã ficou tigre. Pulou de raiva. Veio

farejando a presa. O estrangeiro está no bosque, e Iracema o acompanhava. Quero beber-lhe o sangue todo: quando o sangue do guerreiro branco correr nas veias do chefe tabajara, talvez o ame a filha de Araquém.

A pupila negra da virgem cintilou na treva, e de seu lábio borbulhou, como gotas do leite cáustico de eufórbia [planta], um sorriso de desprezo:

- Nunca Iracema daria seu seio, que o espírito de Tupã habita só, ao guerreiro mais vil dos guerreiros tabajaras! Torpe é o morcego porque foge da luz e bebe o sangue da vítima adormecida!

- Filha de Araquém, não assanha o jaguar. O nome de Irapuã voa mais longe que o guaná [ave] do lago, quando sente a chuva além das serras. Que o guerreiro branco venha, e o seio de Iracema se abra para o vencedor.

- O guerreiro branco é hóspede de Araquém. A paz o trouxe aos campos de Ipu, a paz o guarda. Quem ofender o estrangeiro, ofende o Pajé.”(Capítulo VII)

Linguagem

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Linguagem

- Perífrase:

“quando o sangue do guerreiro branco correr nas veias do chefe tabajara, talvez o ame a filha de Araquém”

“Torpe é o morcego porque foge da luz e bebe o sangue da vítima adormecida!”

“O nome de Irapuã voa mais longe que o guaná [ave] do lago, quando sente a chuva além das serras.”

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Linguagem

- Comparação:

“A pupila negra da virgem cintilou na treva, e de seu lábio borbulhou, como gotas do leite cáustico de eufórbia [planta], um sorriso de desprezo”

- Metonímia e Metáfora:

“O coração aqui no peito de Irapuã ficou tigre.”

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Linguagem

- Comparação: expressão do pensamento do nativo, recurso mais expressivo na obra.

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Linguagem - comparação

“Martim amparou o corpo trêmulo da virgem; ela reclinou lânguida sobre o peito do guerreiro, como o tenro pâmpano [ramo] da baunilha que enlaça o rijo galho do angico.

O mancebo murmurou:- Teu hóspede fica, virgem dos olhos negros: ele fica para ver abrir

em tuas faces a flor da alegria, e para sorver, como o colibri, o mel de teus lábios.

Iracema soltou-se dos braços do mancebo (...).[Iracema] - O mel dos lábios de Iracema é como o favo que a

abelha fabrica no tronco da andiroba: tem na doçura o veneno. A virgem dos olhos azuis e dos cabelos do sol guarda para seu guerreiro na taba dos brancos o mel da açucena.

Martim afastou-se rápido; mas voltou lentamente. Eles caminharam par a par, como dois jovens cervos que ao pôr

do sol atravessam a capoeira recolhendo ao aprisco [local] de onde lhes traz a brisa um faro suspeito.”(Capítulo VIII)

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Linguagem

- Exemplo célebre de metáfora:

“Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos maisnegros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira.

O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilharecendia no bosque como seu hálito perfumado.

Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertãoe as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo, da grande naçãotabajara. O pé grácil e nu, mal roçando, alisava apenas a verde pelúcia quevestia a terra com as primeiras águas.”(Capítulo II)

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- Personagens simples, planas;- idealização do herói romântico;- índio: ser perfeito físico e moralmente;- colonizador português: virtudes do herói dos romances de cavalaria medievais; - lealdade: traço distintivo do herói romântico.

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Iracema:- índia virgem da tribo Tabajara; - modelo ideal de esposa e mãe;- por amor a Martim, abandona a tribo e rompe uma importante tradição religiosa;- por amor ao filho, sacrifica-se ao amamentar as iraras até sangrar;- características idealizadoras da perfeição física e moral da heroína: coragem; beleza; doçura;- símbolo de sua terra.

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Martim:- personagem histórico transformado pela imaginação do narrador;- típico herói do Romantismo: força, coragem, lealdade.

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Irapuã:- anti-herói romântico (maniqueísmo);- exagero de traços pouco nobres: ira, egoísmo, orgulho;- executor de atos imorais;- representação do erro, da má conduta;- ficcionalização do personagem histórico Mel Redondo (tradução para o português de Irapuã). Temido por sua força, coragem e destreza com as armas, no entanto, apaixonado por Iracema e tomado pelo ódio à tribo inimiga, o chefe guerreiro deixa as emoções se sobreporem à sabedoria. Falta a Irapuã a prudência de um chefe, o que o torna extremamente impulsivo e violento.

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Araquém – pai de Iracema, velho pajé da tribo Tabajara. Homem corajoso, sereno e sábio.

Caubi – irmão de Iracema. Excelente guia, pois possuía o domínio das terras onde vivia, estava plenamente integrado ao meio. Também se caracteriza pela força e coragem.

Andira – velho irmão de Araquém. Apesar da idade avançada, ainda revela-se forte e corajoso o suficiente para participar das batalhas além de revelar a sabedoria e a prudência que só um ancião pode acumular.

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Jacaúna – chefe guerreiro da tribo Pitiguara. Personagem histórico que se aliou a Martim desde a primeira expedição do cristão à região do Ceará. Revela-se corajoso, leal ao amigo Martim e ao irmão Poti, forte e habilidoso com as armas.

Poti – irmão de Jacaúna, uniu-se a Martim por fortes laços de amizade. Incapaz de abandonar o amigo em qualquer que fosse a situação, revela-se fiel e submisso a todas as vontades de seu irmão e senhor. Como todos os índios de sua raça, é um guerreiro forte e corajoso. Na segunda expedição de Martim ao Ceará, torna-se cristão, recebendo o nome de Antônio Filipe Camarão e se transforma em uma figura lendária no Ceará.

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Batuireté ou Maranguab – Avô de Jacaúna e Poti. Antigo chefe guerreiro dos pitiguaras, abandona o posto devido à idade avançada e vai viver no alto de uma serra, no interior do Ceará. Por ser conselheiro de guerreiros que, antes de partirem para a guerra, pediam-lhe ensinamentos de como vencer, passou a ser conhecido como Maranguab, o grande sabedor da guerra. Morre depois de ver Martim e Poti juntos e de profetizar a dizimação dos índios pelos brancos.

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