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JAMILI AKILA TEIXEIRA EL KADRI OCLUSÃO: ELIMINANDO INTERFERÊNCIAS POR MEIO DE ACRÉSCIMO DE MATERIAL RESTAURADOR Londrina 2017

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JAMILI AKILA TEIXEIRA EL KADRI

OCLUSÃO: ELIMINANDO INTERFERÊNCIAS POR MEIO DE ACRÉSCIMO DE MATERIAL RESTAURADOR

Londrina 2017

JAMILI AKILA TEIXEIRA EL KADRI

OCLUSÃO: ELIMINANDO INTERFERÊNCIAS POR MEIO DE

ACRÉSCIMO DE MATERIAL RESTAURADOR

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Odontologia da Universidade Estadual de Londrina. Orientador: Prof. Dr. Pedro Marcelo Tondelli

Londrina 2017

JAMILI AKILA TEIXEIRA EL KADRI

OCLUSÃO: ELIMINANDO INTERFERÊNCIAS POR MEIO DE ACRÉSCIMO DE MATERIAL RESTAURADOR

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Odontologia da Universidade Estadual de Londrina.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________ Orientador: Prof. Dr. Pedro Marcelo Tondelli

Universidade Estadual de Londrina - UEL

____________________________________ Componente da banca:

Profa. Dra. Elisa Emi Tanaka Carloto Universidade Estadual de Londrina - UEL

Londrina, _____de ___________de _____.

Dedico este trabalho a todos aqueles que fizeram parte da minha vida e formação acadêmica, que de alguma forma contribuíram

para a realização de mais uma etapa.

AGRADECIMENTOS

A Deus por toda força, proteção e sabedoria necessária para a conclusão

deste trabalho e de mais essa etapa fundamental.

Aos meus pais e meu irmão que jamais mediram esforços para me tornar

cada dia melhor, por todo amor, apoio e incentivo, não apenas para a conclusão

deste trabalho, mas durante toda minha vida, amo vocês incondicionalmente.

A todos meus amigos e namorado que aguentaram juntos comigo todas as

angústias, felicidades, estresses e dúvidas. Vocês foram essenciais.

Ao meu Professor Orientador, Pedro Marcelo Tondelli, por toda dedicação,

conhecimento transmitido e pela paciência para a realização deste trabalho. Meu

eterno obrigada.

A Profa. Dra. Elisa Emi Tanaka Carloto por compartilhar seu conhecimento e

enriquecer ainda mais este trabalho. Muito obrigada.

A todos os professores, alunos, funcionários e pacientes que contribuíram,

direta ou indiretamente, para a construção dos meus conhecimentos.

“Que os vossos esforços desafiem as impossibilidades, lembrai-vos de que as grandes coisas do homem

foram conquistadas do que parecia impossível.” Charles Chaplin

EL KADRI, Jamili Akila Teixeira. Oclusão: eliminando interferências por meio de acréscimo de material restaurador. 2017. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Odontologia) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2017.

RESUMO A oclusão mutuamente protegida é um dos objetivos a serem alcançados no

tratamento odontológico, a fim de restabelecer a saúde do sistema estomatognático.

No movimento mandibular de lateralidade, deve existir apenas o contato dos caninos

do lado em que a mandíbula está deslocando - lado de trabalho - promovendo total

desoclusão dos dentes posteriores do mesmo lado e ao lado oposto ao movimento -

lado de balanceio. No movimento de protrusão, apenas os incisivos devem se tocar,

liberando os dentes posteriores. Assim, as forças em direção horizontal tocam

somente nos caninos e incisivos, e as forças da mastigação, em um plano vertical,

são dissipadas pelos pré-molares e molares, promovendo uma proteção mútua.

Quando há contato nos dentes posteriores durante esses movimentos, são

denominados interferências, que contribuem para o surgimento de abfrações, perda

óssea, mobilidade, reabsorção radicular e DTMs. As remoções das interferências

podem ser feitas por meio de desgaste seletivo ou por meio de acréscimo

restaurador nos caninos e/ou incisivos. Este trabalho procurou elucidar por meio de

2 casos clínicos a remoção das interferências com acréscimo restaurador nos

caninos, evidenciando quando a incorporação é feita em caninos superiores ou

inferiores. Conclui-se que o acréscimo restaurador nos caninos possibilita a remoção

das interferências de forma rápida e prática, promovendo uma oclusão mutuamente

protegida.

Palavras-chave: Oclusão Dentária; Sistema Estomatognático; Dente Canino.

EL KADRI, Jamili Akila Teixeira. Occlusion: eliminating interference by adding restorative material. 2017. Work Completion of course (Undergraduate Dentistry) - State University of Londrina, Londrina, 2017.

ABSTRACT

Mutually protected occlusion is one of the objectives to be achieved in dental

treatment in order to restore the health of the stomatognathic system. In lateral

mandibular movement, there must be only the contact of the canines on the side

where the mandible is moving - working side - promoting total disocclusion of the

posterior teeth on the same side and on the opposite side of the movement - balance

side. In the protrusion movement, only the incisors should touch, releasing the

posterior teeth. In this way, the forces in the horizontal direction are absorbed only by

the canines and incisors, and the chewing forces, in a vertical plan, are dissipated by

the premolars and molars, promoting mutual protection. When exists contact in the

posterior teeth during these movements, they are called interferences, which

contribute to the appearance of abfrations, bone loss, mobility, root resorption and

TMDs. Interferences removal can be done by selective tooth grinding or through the

use of restorative materials in the canines and/or incisors. This work aims to

exemplify through two clinical cases, the removal of interferences with restorative

addition in the canines, evidencing when the attachment is done in upper or lower

canines. In the first case, composite resin incorporation was made on the palatal and

incisal surfaces of the upper canine, since there was a horizontal overlap between

the canines, making this indication safer, with less grinding or fractures. It is

concluded that the restorative addition in the canines allows the removal of the

interferences in a fast and practical way, promoting a mutually protected occlusion.

Key-words: Dental Occlusion; Stomatognathic System; Cuspid.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AE Aparelho Estomatognático

ATM Articulação Temporomandibular

SNC Sistema Nervoso Central

SNP Sistema Nervoso Periférico

DVO Dimensão Vertical de Oclusão

RC Relação Cêntrica

MIH Máxima Intercuspidação Habitual

DVR Dimensão Vertical de Repouso

EFL Espaço Funcional Livre

EO Estabilidade Oclusal

ORC Oclusão em Relação Cêntrica

SDDM Síndrome da Dor-Disfunção Miofascial

IASP Associação Internacional de Estudo da Dor

DTM Disfunção Temporomandibular

AAOP American Academy of Orofacial Pain

DDCP Deslocamento do Disco articular com Redução

DDSP Deslocamento do Disco articular sem Redução

RM Ressonância Magnética

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Músculo temporal......................................................................................19

Figura 2 - Músculo masseter.....................................................................................19

Figura 3 - Músculo pterigóideo lateral.......................................................................20

Figura 4 - Músculo pterigóideo medial......................................................................20

Figura 5 – Côndilo.....................................................................................................23

Figura 6 - Transmissão de forças do periodonto ao osso.........................................24

Figura 7 - Dimensão vertical.....................................................................................25

Figura 8 - Oclusão cêntrica.......................................................................................26

Figura 9 - Guia anterior.............................................................................................27

Figura 10 - Movimento de translação........................................................................28

Figura 11 - Movimento de protrusão.........................................................................29

Figura 12 - Movimento de lateralidade para a esquerda...........................................30

Figura 13 - Overbite/trespasse vertical e Overjet/trespasse horizontal.....................31

Figura 14 - Movimentos de Posselt...........................................................................32

Figura 15 - Curva de Spee – plano sagital................................................................33

Figura 16 - Curva de Wilson – plano frontal..............................................................33

Figura 17 - Contatos oclusais com a arcada inferior contida na superior.................34

Figura 18 - Contatos oclusais superiores nas faces palatinas dos anteriores, cristas

marginais e fossas centrais dos sulcos oclusais posteriores.....................................35

Figura 19 - Contatos oclusais inferiores nas pontas de cúspides dos dentes

posteriores e incisais dos anteriores..........................................................................35

Figura 20 - Contato prematuro em região de segundos molares..............................37

Figura 21 - Interferência oclusal no movimento de protrusão tocando na vertente da

cúspide vestibular do segundo pré-molar superior esquerdo e do primeiro molar

superior direito (marcas retangulares).......................................................................38

Figura 22 - Interferências oclusais no lado de trabalho tocando nas vertentes das

cúspides vestibulares do segundo pré-molar e primeiro molar superior (marcas

retangulares). ............................................................................................................38

Figura 23 - Interferências oclusais no lado de balanceio tocando nas vertentes das

cúspides palatinas dos pré-molares e primeiro molar superior do lado direito (marcas

retangulares)..............................................................................................................39

Figura 24 - Arcada em oclusão.................................................................................53

Figura 25 - Movimento de lateralidade para a direita com interferências.................53

Figura 26 - Arcada superior após a checagem das interferências com carbono......54

Figura 27 - Arcada inferior após a checagem das interferências com carbono........54

Figura 28 - Remoção das interferências por desgaste seletivo – arcada superior...55

Figura 29 - Remoção das interferências por desgaste seletivo – arcada superior...55

Figura 30 - Remoção das interferências por desgaste seletivo – arcada inferior.....56

Figura 31 - Relação dos caninos do lado esquerdo em topo-a-topo........................59

Figura 32 - Vista lateral esquerda – relação topo-a-topo..........................................60

Figura 33 - Movimento de lateralidade para o lado esquerdo (lado de trabalho) com

a desoclusão feita pelos dentes posteriores..............................................................60

Figura 34 - A- Condicionamento com ácido fosfórico 37% na superfície

lingual,vestibular e vertente distal do canino. B e C– Aplicação de sistema adesivo e

posteriormente sua fotopolimerização. D- Incorporação de resina em uma única

camada na face lingual e incisal do canino inferior...................................................61

Figura 35 - A – Escultura prévia. B e C – primeira fotopolimerização com os dentes

ocluídos e posteriormente com a boca aberta. D - Acabamento e remoção de

excesso de forma a eliminar qualquer contato prematuro........................................62

Figura 36 - Resultado final – guia de desoclusão efetuada por caninos .................62

Figura 37 - Trespasse horizontal entre caninos impossibilitando a desoclusão

imediata.....................................................................................................................64

Figura 38 - Aplicação de adesivo após o condicionamento com ácido fosfórico 37%.

Note o aspecto opaco do esmalte............................................................................ 64

Figura 39 - Inserção de resina composta em camada única....................................65

Figura 40 - Após a escultura da resina, o paciente oclui para que o canino inferior

imprima a anatomia e a guia de desoclusão na resina do canino superior. A

fotopolimerização é feita com os dentes ocluídos.....................................................65

Figura 41 - Resultado final - guia de desoclusão imediata após a restauração do

canino superior..........................................................................................................66

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO E PROPOSIÇÃO ................................................................................. 14

2 REVISÃO DA LITERATURA ........................................................................................ 17

2.1 Aparelho estomatognático .......................................................................................... 17

2.2 Movimentos mandibulares .......................................................................................... 27

2.3 Descrição simplificada de uma oclusão ideal ............................................................. 33

2.4 Distúrbios oclusais ..................................................................................................... 36

2.5 Distúrbios neuromusculares ....................................................................................... 39

2.6 Distúrbios temporomandibulares ................................................................................ 43

2.6.1 Classificação das DTMs ....................................................................................... 44

2.6.1.1 Desvios de forma .......................................................................................... 44

2.6.1.2 Deslocamento de disco ................................................................................. 45

2.6.1.3 Deslocamento do complexo disco-côndilo ..................................................... 46

2.6.1.4 Anquilose ...................................................................................................... 49

3 ELIMINAÇÃO DAS INTERFERÊNCIAS DE FORMA SIMPLIFICADA ......................... 52

4 CASOS CLÍNICOS ....................................................................................................... 58

4.1 Caso clínico I .............................................................................................................. 58

4.2 Caso clínico II ............................................................................................................. 63

5 DISCUSSÃO ................................................................................................................ 68

6 CONCLUSÃO .............................................................................................................. 73

INTRODUÇÃO E PROPOSIÇÃO

14

1 INTRODUÇÃO E PROPOSIÇÃO

A oclusão pode ser descrita como o estudo das relações estáticas e

dinâmicas, relacionadas à superfície oclusal dos dentes e estas com os demais

elementos do aparelho estomatognático (AE). Para a compreensão dos conceitos

que envolvem a oclusão, é fundamental o conhecimento do aparelho

estomatognático, suas funções e componentes, segundo Fernandes Neto et al.5.

A oclusão é considerada fisiológica quando há o equilíbrio entre os aspectos

anatômicos e as unidades fisiológicas do aparelho estomatognático sem que haja o

aparecimento de patologias. Entretanto, quando há um desequilíbrio, este poderá

contribuir para o aparecimento de certas patologias, de acordo com Fernandes Neto

et al.5

Um dos mais frequentes desequilíbrios que acometem os pacientes são as

interferências oclusais. Elas podem ser responsáveis por grande parte do

aparecimento de patologias dentárias e de distúrbios neuromusculares e

temporomandibulares. Durante os movimentos de lateralidade da mandíbula, o ideal

é que exista apenas o contato dos caninos do lado do desvio, protegendo os dentes

posteriores de receber forças horizontais. As interferências ocorrem quando algum

dente posterior recebe estas cargas horizontais. Da mesma forma, no movimento da

mandíbula no sentido anterior, os incisivos inferiores devem deslizar pela face

palatina dos incisivos superiores, sem haver interferências nos dentes posteriores.

Apesar da grande importância em eliminar estas interferências, de certa

forma, ainda é muito negligenciada pelos profissionais por entenderem que existe

uma certa complexidade na execução. Além disso, muitos cirurgiões-dentistas

acreditam que somente é possível por meio do desgaste seletivo. Assim, os

pacientes ficam expostos por muito tempo a estes distúrbios que acarretam danos

sérios ao sistema estomatognático. Em certas situações, a melhor, e as vezes única

indicação para a remoção de interferências oclusais é o acréscimo de material

restaurador, promovendo uma desoclusão ideal dos dentes.

O objetivo deste trabalho é demonstrar, por meio de uma revisão de literatura,

uma visão sobre a oclusão, e elucidar, por meio de dois casos clínicos, a

15

simplicidade na eliminação de interferências oclusais com o acréscimo de material

restaurador, evidenciando quando, como, onde e por que deve ser realizado.

16

REVISÃO DA LITERATURA

17

2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 Aparelho estomatognático

Para compreender os princípios de oclusão, é necessário primeiro ter o

conhecimento do aparelho estomatognático, seus componentes e suas funções.

Para Fernandes Neto et al.5, o AE pode ser definido como uma entidade fisiológica e

funcional composta por diferentes tecidos e órgãos com funcionamento totalmente

interdependentes. A saúde de um indivíduo não significa apenas a ausência de uma

doença e sim a avaliação do seu bem-estar somático, psicológico e social, que pode

estar associado com distúrbios do aparelho estomatognático.

Seus componentes anatômicos são ossos, músculos, articulações,

ligamentos, sistema vascular e nervoso de cabeça e pescoço, além de dentes,

bochechas, língua, lábios e glândulas salivares. Para Fernandes Neto et al.5, existem

4 unidades fisiológicas básicas do AE, o sistema neuromuscular, as articulações

temporomandibulares (ATMs), a oclusão dentária e o periodonto, além de todos

estes sistemas que formam o indivíduo, devendo ser levado em consideração nos

diagnósticos, prognósticos e terapêuticas com o objetivo de promoção de saúde.

No sistema neuromuscular, os músculos são excitados pelo sistema nervoso

dando origem as forças necessárias para as funções a que se destinam. Para se

compreender a relação entre o sistema neuromuscular e a morfologia oclusal é

primordial o conhecimento de relações anatômicas das ATMs, ligamentos e a função

de cada músculo.

O sistema nervoso é dividido em sistema nervoso central (SNC) e sistema

nervoso periférico (SNP). O SNC é constituído por encéfalo (cérebro, cerebelo e

tronco encefálico) e medula espinhal. Já no SNP, a estrutura principal é o neurônio,

composto por dendritos, corpo celular e axônio. Um neurônio aferente é responsável

pela condução de impulsos nervosos da periferia do corpo em direção ao SNC,

enquanto que um neurônio eferente conduz os impulsos nervosos do SNC sentido à

periferia por meio de seu axônio.

A percepção do estímulo, a integração no SNC e a consequente reação

motora, são três etapas da neurofisiologia bucal que devem ser compreendidas para

a elaboração dos recursos terapêuticos. A percepção do estímulo é feita pelos

neurônios aferentes primários com terminais periféricos, que são chamados de

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nociceptores. Em seguida, os neurônios aferentes conduzem este estímulo até o

SNC, que desencadeia uma ação muscular ou glandular. A nocicepção refere-se

detecção e transmissão de um estímulo ou evento nocivo.

O arco reflexo é um tipo de mecanismo neuromuscular incondicionado, ou

seja, sem um treinamento prévio ou a intervenção do cérebro. Normalmente, nas

primeiras ocorrências existe uma intervenção do cérebro para a percepção,

integração e resposta motora, que com a repetição, o estímulo é levado apenas até

o nível do tálamo onde por meio de uma sinapse, a resposta motora é

desencadeada tornando o reflexo inconsciente e instantâneo.

O sistema muscular é composto por músculos esqueléticos também

denominados estriados, que são encarregados do controle de movimentos

voluntários do corpo, e de músculos lisos, que atuam no controle de movimentos

involuntários presente em paredes de vasos sanguíneos e órgãos internos. Os

músculos que atuam de forma direta na mastigação são o temporal, o masseter, o

pterigóideo lateral e o pterigóideo medial, ilustrados a seguir. No entanto, ainda

participam dos movimentos e com grande importância na função mandibular os

músculos digástricos, supra-hioideo, infra-hioideo, milo-hioideo e posteriores do

pescoço que terão uma breve descrição.

O músculo temporal (Figura 1) tem a função de elevação, retração,

posicionamento e oclusão dos dentes. Sua origem é na linha temporal superior e

assoalho da fossa temporal e inserção no processo coronóide e borda inferior do

ramo da mandíbula. É inervado pelos nervos temporais profundos (ramos do

trigêmeo) e vascularizado por artérias temporais profunda anterior, média e

posterior.

19

Figura 1: Músculo temporal

O músculo masseter (Figura 2) tem a função de elevação da mandíbula e

oclusão dos dentes assim como o temporal. Sua porção superficial tem origem nos

dois terços anteriores do arco zigomático, enquanto sua porção profunda origina-se

na superfície média do arco zigomático e ambos têm sua inserção na superfície

lateral externa do ramo e ângulo da mandíbula. É inervado pelo nervo massetérico -

também um ramo do trigêmeo - e vascularizado pela artéria massetérica - ramo da

artéria maxilar.

Figura 2: Músculo masseter

O músculo pterigóideo lateral (Figura 3) tem a função de protrusão da

mandíbula e tracionamento do disco articular para frente. A porção superior tem

origem na superfície infratemporal da asa maior do osso esfenóide e a inferior na

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superfície do processo pterigóide do osso esfenóide inserindo-se ao feixe superior

no disco articular (menisco) e na cápsula da ATM além do feixe inferior na fossa

pterigóidea (colo do côndilo). É inervado pelo nervo pterigóideo lateral e

vascularizado pela artéria pterigóidea lateral.

Figura 3: Músculo pterigóideo lateral

Já o músculo pterigóideo medial (Figura 4) tem a função de elevação e

estabilização lateral da mandíbula. Sua origem é na face medial da lâmina lateral da

fossa pterigóidea que fica na base do crânio e insere-se nas porções posterior e

inferior da superfície medial do ramo ascendente e do ângulo na mandíbula. É

inervado pelo nervo pterigóideo e vascularizado pela artéria pterigóidea medial.

Figura 4: Músculo pterigóideo medial

21

O músculo digástrico tem a função de puxar o mento para trás e para baixo

durante a abertura da boca ajudando o pterigóideo lateral a realizar a protrusão da

mandíbula. Sua origem é o ventre posterior na incisura mastóidea do temporal e o

ventre anterior da fossa digástrica da mandíbula, e sua inserção é no tendão

intermediário junto ao osso hióide. É inervado pelos nervos milo-hioideo e facial, e

vascularizado pelas artérias submentual, occipital e auricular posterior.

São considerados músculos supra-hióideos os músculos gênio-hióideo, milo-

hióideo e estilo-hióideo. O músculo gênio-hióideo tem como função a movimentação

do osso hióide para frente. Sua origem fica nos tubérculos genianos inferiores na

superfície interna da sínfise mandibular e sua inserção na superfície anterior do

corpo do osso hióide. É inervado pelo nervo gênio-hióideo e vascularizado pelas

artérias lingual e sublingual.

O músculo milo-hióideo tem como função a elevação do assoalho bucal e

consequentemente a língua, auxiliando na deglutição com os dentes ocluídos.

Origina-se na linha milo-hióidea da mandíbula (raiz do último molar até a sínfise

mandibular) e tem sua inserção no corpo do osso hióide e na rafe milo-hióide. Sua

inervação é feita pelo nervo milo-hióideo e a vascularização pela artéria

submentoniana.

Já o músculo estilo-hióideo é responsável pelo tracionamento do osso hióide

para cima e para trás. É originado na borda posterior do processo estilóide e inserido

no corpo do osso hióide na junção com o corno maior. Sua inervação é feita pelo

ramo estilo-hioide (do nervo facial) e vascularizado pela artéria auricular posterior.

Dentre os músculos infra-hióideos pode-se destacar o tireo-hióideo, o esterno-

hióideo, o esternotireoideo e o omo-hióideo. Eles possuem a função de abaixamento

e estabilização do osso hióide permitindo assim auxiliar os músculos supra-hióideos

no processo de abaixamento da mandíbula. Têm sua origem na clavícula e inserem-

se no osso hióide. Sua inervação é feita pelo nervo hipoglosso.

Entre os músculos posteriores do pescoço temos o esternocleidomastóideo e

o trapézio. O primeiro tem como função a flexão da coluna vertebral e girar a cabeça

para o lado oposto, sua origem é no manúbrio do esterno e na porção medial da

clavícula, e inserção no processo mastóide do osso temporal. É inervado pelo nervo

acessório e vascularizado pela artéria supraescapular e occipital. O segundo tem

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como função girar a escápula, tendo origem na protuberância occipital externa e

insere-se na borda posterior do terço lateral da clavícula além de sua inervação ser

realizada pelo nervo acessório espinal.

Basicamente, os músculos intrínsecos do pescoço atuam e auxiliam na fala.

Entre eles pode-se destacar o músculo bucinador, orbicular da boca, platisma e

músculos da língua.

O músculo bucinador é responsável pelo auxílio à mastigação, distenção da

bochecha e retração do ângulo da boca. Origina-se nos processos alveolares das

maxilas e da mandíbula na região molar e no ligamento pterigomandibular,

inserindo-se no ângulo da boca, misturando fibras com as do músculo orbicular da

boca. É inervado pelo nervo facial e vascularizado pela artéria bucal.

O músculo orbicular da boca comprime os lábios sobre os dentes, auxiliando

no fechamento da boca e a protrusão dos lábios. Apresenta sua origem nas fibras do

bucinador, e a inserção nas fibras do lado oposto na linha mediana. É inervado

também pelo nervo facial e vascularizado pela artéria labial superior e inferior.

Os músculos da língua fazem uma pressão de dentro para fora contra a

pressão realizada pelo bucinador de fora para dentro da boca, sendo assim

responsáveis pela zona neutra, ou seja, um corredor da pressão nula onde se

posicionam os dentes. Ao todo são dezessete músculos, oito pares e um ímpar, o

lingual superior.

Em geral, a função dos músculos pode ser isotônica ou isométrica. A função

isotônica é exemplificada pelo abrir e fechar a boca, caracterizada pelo músculo

contraído ter apenas um de seus extremos de inserção fixo, e ao se encurtar não

aumenta a tensão de suas fibras, mas sim reduz seu comprimento. Já a função

isométrica, exemplificada pelo bruxismo, a contração do músculo apresenta dois

extremos de inserção fixos, sem poder se encurtar, causando o aumento da tensão

das fibras.

Também podem ser classificados em motores primários, sinergistas,

antagonistas e estabilizadores. Durante o movimento fisiológico de fechamento da

mandíbula, tem-se os masseteres como músculos primários, ou seja, iniciadores.

Como sinergistas, que auxiliam os primários, apresentam-se os pterigóideos mediais

e os temporais anteriores e médios. Como antagonistas, que fazem oposição aos

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primários, os pterigóideos laterais e digástrico. E como estabilizadores, garantindo a

firmeza de ossos e articulações, os músculos temporais posteriores.

Com a ativação de um músculo, simultaneamente ocorre a inibição ou

relaxamento de outro de ação antagônica, sendo realizada pela inervação recíproca.

Grande parte das patogenias ligadas a disfunções do AE estão relacionadas ao

problema nessa inervação.

A articulação temporomandibular (ATM) é caracterizada como

ginglemoartroidal devido à realização de movimentos de rotação (ginglemoidal) e de

translação (artroidal). As ATMs possuem todas as características de uma articulação

sinovial inclusive disco articular. Este se apresenta de uma forma bicôncava e

localiza-se entre o côndilo e a fossa mandibular do osso temporal. O côndilo possui

revestimento de uma camada fibrocartilaginosa posicionada anterossuperiormente

na fossa mandibular apoiado anteriormente oposto a eminência articular que possui

também uma camada fibrocartilaginosa em toda superfície funcional (Figura 5).

Figura 5: Côndilo

Basicamente, a ATM possui quatro ligamentos, o temporomandibular, o

estilomandibular, o esfenomandibular e o capsular. O ligamento temporomandibular

é originado na superfície lateral da eminência articular do osso temporal e é inserido

no colo da mandíbula. O ligamento estilomandibular origina-se no processo estilóide

e insere-se no ângulo da mandíbula. O esfenomandibular tem origem na espinha do

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osso esfeinóide e sua inserção ocorre na língula da mandíbula. E a capsular origina-

se no osso temporal e é inserido na face lateral do côndilo.

Cada um dos dentes possui uma função na arcada, em geral, os dentes

anteriores apresentam aspectos estéticos, fonéticos, de apreensão e corte de

alimentos além de fornecer proteção aos dentes posteriores e às ATMs durante

movimentos excêntricos da mandíbula. Os dentes posteriores são o ponto de apoio

da mandíbula durante a mastigação, sendo responsáveis pela trituração dos

alimentos, manutenção da dimensão vertical de oclusão (DVO) e proteção dos

dentes anteriores e ATMs durante a oclusão dos dentes em relação cêntrica (RC)

e/ou máxima intercuspidação habitual (MIH).

O ligamento periodontal transmite as forças oclusais dos dentes para o osso e

são capazes de converter uma força que poderia ser destrutiva em uma força

aceitável (Figura 6).

Figura 6: Transmissão de forças do periodonto ao osso.

Para Okeson12, quando existe o contato em um dente tanto em uma ponta de

cúspide como uma superfície relativamente plana, como, por exemplo, na crista

marginal, a força resultante é direcionada para o longo eixo do dente e dissipada de

forma fisiológica pelo ligamento periodontal.

Na mandíbula, a orientação presente para dissipação de forças é a trajetória

das trabéculas ósseas em direção dos côndilos, onde ocorre a transmissão e

neutralização nas regiões temporal, parietal e occipital. Na maxila essa trajetória

forma três pilares, o anterior, o médio e o posterior, direcionando as forças para a

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região frontal, orbital, nasal e zigomática, onde ocorre a neutralização. Essa

conformação trabecular garante uma resistência máxima do osso à tensão.

A dimensão vertical (Figura 7) é medida entre dois pontos quaisquer,

localizados um acima e outro abaixo da boca e geralmente na linha mediana da

face. Ela varia entre a dimensão vertical de repouso (DVR) e a dimensão vertical de

oclusão (DVO). A DVR é encontrada quando a mandíbula está sustentada pela

posição postural ou de repouso, onde os lábios se encontram em leve contato. A

DVO encontra-se quando os dentes estão em máxima intercuspidação habitual

(MIH) com a máxima contração dos músculos do AE. Para a obtenção da DVR não é

necessária presença de dentes, ao contrário da DVO. A diferença entre a DVR e a

DVO (aproximadamente 3 mm) é denominada espaço funcional livre (EFL) que

corresponde à distância entre as superfícies oclusais e incisais de elementos

dentários antagonistas quando a mandíbula está sustentada pela posição postural

ou de repouso fisiológico dos músculos.

Figura 7: Dimensão vertical

A dimensão horizontal, também chamada de relação cêntrica, refere-se à

relação temporomandibular que possui extrema importância na saúde do AE. Neff11

define a relação cêntrica como a posição inicial dos movimentos da mandíbula,

sendo uma posição estável e possível de ser reproduzida. Para Okeson12, é a

posição mais anterior e superior dos côndilos em suas fossas com seus discos

interpostos. Já para Fernandes Neto e colaboradores6, é definida como a relação

horizontal condilar com a fossa mandibular do osso temporal harmonicamente com o

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disco articular, considerando o equilíbrio fisiológico dos músculos relacionados com

a mandíbula, e independe do relacionamento dentário.

A estabilidade gerada entre mandíbula e maxila ocorre através da

intercuspidação simultânea das cúspides funcionais dos dentes antagonistas,

chamada de estabilidade oclusal (EO). A oclusão cêntrica (ORC) ou máxima

intercuspidação cêntrica ocorre quando há uma coincidência da posição de MIH

dentária com a posição de RC das ATMs (Figura 8).

Figura 8: Oclusão cêntrica.

Para o restabelecimento da estabilidade maxilomandibular do AE é

necessário a presença de oclusão dos pré-molares e molares antagônicos (Figura 5

e 6).

A guia anterior (Figura 9) faz referência ao relacionamento das bordas incisais

dos dentes anteroinferiores com a face palatina dos dentes anterosuperiores durante

a reprodução dos movimentos de protrusão e retrusão mandibular. Quando isso

ocorre, há a formação de um tripé de estabilidade com as ATMs, além de não

apresentar nenhum contato com os dentes posteriores.

27

Figura 9: Guia anterior.

Em geral, os itens citados anteriormente, como a dimensão vertical, relação

cêntrica, estabilidade oclusal e guia anterior são indispensáveis para a preservação

das unidades fisiológicas do aparelho estomatognático.

2.2 Movimentos mandibulares

Segundo Fernandes Neto et al5 a posição fisiológica inicial é a relação

cêntrica, por ser mais estável e possível de ser reproduzida. A posição de máxima

intercuspidação habitual (MIH) é considerada como de adaptação, por isso não deve

ser considerada como referência.

A direção do movimento está relacionada com o plano em que ele ocorre, ou

seja, em relação ao frontal, sagital ou horizontal. Visto em um plano sagital, a

rotação é quando há um movimento rotatório entre o disco e o côndilo na parte

inferior da ATM. A translação ocorre quando todos os pontos de um corpo se movem

em uma mesma direção e ao mesmo tempo, com o avanço da mandíbula,

aumentando o grau de abertura da mandíbula conforme rotaciona. Em média, o

movimento de translação é em torno de 40 mm (Figura 10 A, B, C).

28

Figura 10: Movimento de translação.

29

O significado clínico dos movimentos está relacionado ao grau de sucesso na

reabilitação do paciente, levando em consideração que cada indivíduo expressa

diferentes relações maxilomandibulares e temporomandibulares.

A protrusão (Figura 11 A e B) é o movimento anteroposterior onde ocorre o

deslizamento dos incisivos inferiores sobre a fossa lingual dos incisivos superiores

(guia anterior) junto como deslizamento dos côndilos sobre a eminência articular

(guia posterior)5.

Figura 11: Movimento de protrusão

A mandíbula desloca-se para os lados deslizando os dentes inferiores sobre

os superiores em movimentos chamados de lateralidade. O movimento de

lateralidade de trabalho é o lado para onde a mandíbula se desloca, e o movimento

de não trabalho ou também chamado de balanceio é o lado oposto ao de trabalho

(Figura 12 A e B). Ambos os movimentos são de, aproximadamente, 10 mm.

30

Figura 12: Movimento de lateralidade para a esquerda

Durante o movimento do lado de trabalho, o côndilo faz rotação e translação

sobre as paredes posterior e superior da fossa mandibular do osso temporal. As

cúspides dos pré-molares e molares devem passar pelos planos inclinados

antagonistas sem que haja contatos ou interferências, tornando o movimento suave,

apenas com o contato da superfície vestibular do canino inferior deslizando sobre a

face palatina do canino superior (guia de proteção pelos caninos). Ainda no

movimento do lado de trabalho, poderá haver contatos contínuos nos caninos, pré-

molares e molares inferiores sobre as vertentes dos dentes superiores antagonistas

com intensidades semelhantes, sendo denominada função em grupo (guia de

proteção em grupo).

Em uma oclusão mutuamente protegida, os dentes posteriores recebem toda

a carga de forças mastigatórias no sentido, e evitam o excesso de contato dos

dentes anteriores em uma máxima intercuspidação, havendo apenas um contato

31

suave. Já os dentes anteriores são responsáveis pela desoclusão dos dentes

posteriores em todos os movimentos mandibulares excursivos, ou seja, em qualquer

deslocamento mandibular, as forças produzidas no plano horizontal são dissipadas

pelos incisivos e caninos, protegendo os pré-molares e molares destes esforços.

A oclusão anteriormente protegida é um componente da oclusão mutuamente

protegida em que o trespasse vertical e horizontal de elementos dentais anteriores

fazem a desoclusão de dentes posteriores em todos os movimentos mandibulares

excursivos.

Overbite ou também chamado de trespasse vertical é a distância em que os

dentes superiores se projetam, verticalmente, sobre os inferiores em máxima

intercuspidação. O overjet ou o trespasse horizontal faz referência a distância em

que os dentes superiores se projetam, horizontalmente, sobre os inferiores em

máxima intercuspidação (Figura 13).

Figura 13: Overbite/ trespasse vertical e Overbite/ trespasse horizontal

O movimento de Bennett é o deslocamento encontrado no côndilo de trabalho

durante o movimento de lateralidade realizado pela mandíbula. Entretanto, o ângulo

de Bennet refere-se ao ângulo formado pela trajetória de avanço do côndilo do lado

de balanceio com o plano sagital. Vale ressaltar que a distância intercondilar é

inversamente proporcional ao ângulo formado, ou seja, quanto menor a distância

intercondilar maior o ângulo de Bennett.

32

Os movimentos mais extremos realizados pela mandíbula são chamados de

bordejantes, sendo limitados pelas estruturas anatômicas, formando o envelope de

movimentos de Posselt. É caracterizado pelo espaço tridimensional delimitado pela

trajetória de um ponto na incisal de um incisivo inferior, que inicia com a mandíbula

em RC avançando em movimentos de máxima protrusão, abertura e fechamento,

retornando para RC (Figura 14).

Figura 14: Movimentos de Posselt.

O plano oclusal é uma superfície imaginária, teoricamente, delimitada pelas

bordas incisais dos incisivos e pelas pontas de cúspides de dentes anteriores. Em

razão de certa inclinação que existe para mesial nos dentes naturais, o componente

anterior da força tem como resultante a dissipação das forças em direção ao longo

eixo e nos contatos proximais de dentes posteriores e acabam se anulando entre os

incisivos centrais.

Além dos itens já citados anteriormente, há ainda duas curvaturas anatômicas

em diferentes planos, uma no plano sagital e outra em um plano frontal, chamadas

de curva de Spee e curva de Wilson. A curva de Spee (Figura 15) tem início no

ângulo incisal do canino e passa pelas cúspides vestibulares dos pré-molares e

molares continuando em direção a borda do ramo da mandíbula. A curva de Wilson

(Figura 16) passa pelas cúspides tanto vestibulares como linguais dos dentes

posteriores dos dois lados. Ambas servem para aumentar a amplitude dos

movimentos mandibulares.

33

Figura 15: Curva de Spee – plano sagital

Figura 16: Curva de Wilson – plano frontal

2.3 Descrição simplificada de uma oclusão ideal

Basicamente, uma oclusão ideal pode ser descrita quando existe um encaixe

dos dentes posteriores superiores com os inferiores, com a ponta das cúspides

mesiovestibulares dos primeiros molares superiores ocluindo no sulco

mesiovestibular dos primeiros molares inferiores, ou seja, os primeiros molares

inferiores devem ocluir com os primeiros molares superiores, ficando levemente a

frente destes. Isto permite que os pré-molares fiquem engrenados, com um dente

inferior ocluindo entre dois dentes superiores.

34

Os caninos superiores devem ocluir entre o primeiro pré-molar inferior e o

canino inferior, o que permite uma guia de desoclusão imediata que fornece uma

função ideal aos dentes e mastigação (Figura 12). Da mesma forma, os incisivos

superiores devem cobrir levemente os incisivos inferiores (em torno de 2 a 3 mm em

média), contactando de forma a fornecer uma guia anterior de desoclusão,

contribuindo para o corte dos alimentos e a estética dos dentes (Figura 11).

Nos dentes posteriores, existe um contato oclusal das pontas das cúspides

funcionais ou de trabalho dos dentes posteriores (cúspides vestibulares dos dentes

inferiores e palatinas dos dentes superiores) com as cristas marginas e fossas

centrais dos sulcos dos dentes da arcada antagonista (Figuras 17-19). Todos estes

contatos oclusais promovem a chamada Máxima Intercuspidação Habitual (MIH),

que torna-se ideal quando está coincidindo com o posicionamento dos côndilos em

relação cêntrica (RC), estabelecendo assim uma relação de oclusão cêntrica (ORC)

que promove as condições fisiológicas ideais para o perfeito funcionamento de todo

o aparelho estomatognático (Figura 8).

Figura 17: Contatos oclusais com a arcada inferior contida na superior

35

Figura 18: Contatos oclusais superiores nas faces palatinas dos anteriores, cristas marginais e fossas

centrais dos sulcos oclusais posteriores.

Figura 19: Contatos oclusais inferiores nas pontas de cúspides dos dentes posteriores e incisais dos

anteriores

36

2.4 Distúrbios oclusais

De acordo com Fernandes Neto et al5, um dos principais problemas que

podem levar a patologias do aparelho estomatognático são os distúrbios oclusais,

que podem se apresentar como trauma oclusal, contato oclusal prematuro,

interferência oclusal (excursivo), ausência de estabilidade oclusal, ausência de guias

de desoclusão ou alteração da dimensão vertical. Estes por sua vez podem causar

consequências como as alterações neuromusculares e das ATMs, abrasão dos

dentes e bruxismo.

O trauma oclusal ocorre quando as forças oclusais ultrapassam a capacidade

de adaptação dos componentes do AE e/ou do periodonto de sustentação. É

considerado trauma primário quando forças excessivas ocorrem em um periodonto

que não esteja comprometido por doença periodontal inflamatória, não gerando

perda de inserção, e pode ser reversível eliminando o fator causal. O trauma

secundário é uma lesão causada por forças em um local comprometido por doença

periodontal, geralmente, com inserções reduzidas.

O contato oclusal é definido como toque entre as superfícies oclusais de

dentes antagonistas ao realizar o fechamento da mandíbula. Pode ser dividido em

cêntrico, prematuro ou ainda prematuro deflectivo. O contato cêntrico é um toque

fisiológico responsável pela estabilidade no fechamento da mandíbula em ORC,

principalmente durante a deglutição, totalizando cerca de 4 a 10 minutos por dia. O

contato prematuro (Figura 20) pode impedir ou dificultar o fechamento completo em

ORC sem causar desvio, normalmente ocorrendo entre ponta de cúspide e fossa

antagonista. Já o contato prematuro deflectivo também não é fisiológico, dificultando

ou impedindo o fechamento completo da mandíbula, porém gerando desvios de

trajetória para anterior, em direção à linha média ou ainda contrária a linha média.

37

Figura 20: Contato prematuro em região de segundos molares

A interferência oclusal é um contato não fisiológico entre as superfícies

oclusais antagonistas que pode dificultar ou impedir os movimentos mandibulares

excursivos de protrusão e lateralidades no lado de trabalho ou balanceio. A

interferência oclusal na protrusão acontece entre a vertente oclusal mesial das

cúspides dos dentes inferiores e a vertente oclusal distal das cúspides dos dentes

superiores (Figura 21). Na marcação com o carbono, deveria ocorrer apenas o

contato de deslize do canino inferior na superfície palatina do canino superior.

Normalmente está ligada a instabilidade condilar e hiperatividade muscular. Já no

movimento excursivo de trabalho, a interferência oclusal verifica-se entre a vertente

lisa de uma cúspide funcional (palatina superior ou vestibular inferior) e a vertente

triturante de uma cúspide não funcional (vestibular superior e lingual inferior),

podendo também estar relacionada a instabilidade condilar e hiperatividade

muscular (Figura 22). A interferência no movimento excursivo de balanceio ocorre

entre duas vertentes triturantes de cúspides funcionais e está relacionada aos

mesmos problemas já citados anteriormente (Figura 23).

38

Figura 21: Interferência oclusal no movimento de protrusão tocando na vertente da cúspide vestibular

do segundo pré-molar superior esquerdo e do primeiro molar superior direito (marcas retangulares)

Figura 22: Interferências oclusais no lado de trabalho tocando nas vertentes das cúspides

vestibulares do segundo pré-molar e primeiro molar superior (marcas retangulares).

39

Figura 23: Interferências oclusais no lado de balanceio tocando nas vertentes das cúspides palatinas

dos pré-molares e primeiro molar superior do lado direito (marcas retangulares).

2.5 Distúrbios neuromusculares

Os distúrbios neuromusculares também podem ser denominados de síndrome

da dor-disfunção miofascial (SDDM). Ela envolve diversos problemas, inclusive

distúrbios relacionados às articulações temporomandibulares.

Os distúrbios musculares são considerados os mais comuns, que geram

desconforto na cabeça e pescoço, segundo Bell2. Geralmente causam a contração

muscular e sua inatividade, além de difícil localização pelo paciente devido ao local

da dor e sua fonte poderem ser distintos. A dor muscular pode ser dividida em dor

aguda ou crônica. Comumente utiliza-se prazo de três meses, indicado pela

Associação Internacional de Estudo da Dor (IASP), para fazer a diferenciação entre

as duas.

Para Okeson12, os distúrbios musculares podem ser desmembrados em

quatro principais, sendo eles a contratura muscular protetora, mioespasmos ou

também chamado de espasmos musculares, miosite e a dor miofascial de pontos

álgicos.

40

A contratura muscular protetora é um reflexo protetor em que os músculos

esqueléticos tornam-se hipertônicos e doloridos quando estão contraídos, de acordo

com Frost7. Para Bell2 é uma condição involuntária hipertônica provocada pelo

sistema nervoso central (SNC). Entretanto, para Okeson12, os músculos já se

encontram em um estado de média contração, em que não há fadiga devido à

alternância entre movimentos de contração e relaxamento das fibras, o que mantém

o comprimento inalterado e impede qualquer alongamento súbito.

Segundo Bell2, o mioespasmo ou também chamado de espasmo muscular,

são contrações involuntárias geradas pelo SNC. Okeson12 afirma que a diferença

entre o mioespasmo e a contratura é o fato do SNC fazer o recrutamento de

unidades motoras para as contrações contínuas. Comumente encontra-se na forma

de contratura muscular não tratada em tempo hábil, aumento do nível de estresse

emocional e dor constante e profunda. Alguns autores - como Okeson12; McNeill10;

Kraus8; Pertes e Gross13 - definem o espasmo muscular como um distúrbio agudo

de certo músculo ou um grupo deles através de uma contração tônica repentina e

involuntária. Ainda pode haver dor e limitação da amplitude dos movimentos

conhecida como trismo agudo, causando tremores na superfície muscular.

O tratamento deve ser relacionado ao SNC para que haja a diminuição de

impulsos nervosos, já que com o tecido muscular propriamente dito não há nada

errado, como sugere Okeson12. É necessária a utilização de aparelho oclusal, nos

casos de bruxismo noturno, para manter os dentes separados, evitando sobrecarga

muscular, fazer uso de analgésicos, injeções anestésicas ou procedimentos que

gerem relaxamento do músculo. Como terapia complementar pode-se ainda utilizar

fisioterapia com calor e spray anestésico de vapor gelado, calor úmido, massagem

suave, estimulação eletrogalvânica ou ainda ultrassom.

Para McNeill10; Pertes e Gross13, a miosite é uma inflamação muscular gerada

por fator local, traumas externos, tensão muscular por longos períodos ou ainda por

infecções provenientes de abscessos dentários. Entretanto para Okeson12, é

resultante de mioespasmos prolongados, de mais de algumas semanas que acabam

gerando a inflamação ou também uma infecção disseminada.

O tratamento, ao contrário do que é feito com o mioespasmo, segundo

Fernandes Neto et al5, não deve ser direcionado SNC, já que este é resultado de um

41

problema local dentro do próprio músculo e não induzido pelo SNC. Assim, devem-

se restringir os movimentos mandibulares aos limites indolores, evitar sobrecargas

musculares e dar preferência aos alimentos líquidos e pastosos. Pode-se utilizar

placas para o relaxamento muscular, assim como prescrição de medicamento anti-

inflamatório não esteroidal por cerca de três semanas. A terapia de suporte pode ser

usada através de exercícios isométricos que aumentem a força muscular, além de

aparelhos com calor úmido e ultrassom. Vale ressaltar que a miosite demora mais a

ocorrer, porém também precisa de mais tempo para ser tratada quando comparada

ao espasmo muscular.

A dor miofascial de pontos álgicos, também denominada de pontos de gatilho,

ainda não possui uma fisiopatologia bem definida. Reeves et al14 que os pontos de

gatilho são, clinicamente, pontos específicos em uma musculatura tensa

sensibilidade, quando na presença de contração muscular local em função de um

estimulo mecânico na região. Já para Okeson12, deve haver uma fonte de dor deve

profunda e constante (para que criem pontos álgicos não somente na fonte como

também a distância), o nível de estresse emocional deve estar elevado (o que pode

desencadear pontos-gatilho) e deve existir uma sobrecarga muscular. Para

Solberg15, este problema é proveniente de áreas que são hipersensíveis nos

músculos e que tendem a refletir essa dor e o espasmo através de efeitos

excitatórios centrais, colaborando assim com a dor na região de cabeça e pescoço.

A palpação muscular é de extrema importância para descobrir a localização

dos pontos álgicos. A aplicação de pressão nesses pontos gera a exacerbação da

dor no lado refletido. Após a definição do diagnóstico, o tratamento inicial deve ser o

mais conservador possível, realizando o alongamento do ponto álgico através de

spray anestésico de vapor gelado na parte superficial do músculo em questão.

Pode- se utilizar o ultrassom que atua produzindo calor provocando o relaxamento

do músculo, como também a estimulação eletrogalvânica que pulsa ritmicamente os

músculos ao nível de fadiga, gerando também o relaxamento do mesmo. Caso haja

insucesso nesse tratamento deve-se considerar a necessidade de intervenção

cirúrgica.

Enfim, os distúrbios neuromusculares são provenientes de um colapso do

aparelho estomatognático que envolvem distúrbios oclusais, fatores psíquicos ou

emocionais, SNC e hipertonicidade dos músculos. Esses itens citados contribuem

42

para que haja um circulo patogênico no núcleo mesencefálico do nervo trigêmeo,

que promove reações motoras específicas que são conduzidas por neurônios

eferentes até o órgão executor. Com repetição por longos períodos dessa situação,

ocorrem sinapses entre os neurônios aferentes e eferentes de forma automática e

inconsciente no núcleo mesencefálico do nervo trigêmeo.

O diagnóstico diferencial das disfunções neuromusculares já citadas

anteriormente pode ser estabelecido através de três etapas realizadas

consecutivamente, segundo Fernandes Neto et al5. A primeira etapa é o

reposicionamento mandibular, com intuito de combinar a oclusão de dentes

posteriores antagônicos, máxima intercuspidação com a estabilidade dos côndilos

na fossa mandibular do osso temporal, promovendo o conforto neuromuscular. A

confecção de um “JIG” que contribui para o reposicionamento mandibular por inibir

os contatos de dentes posteriores, o que gera o relaxamento dos músculos

mastigatórios. Outros dispositivos também podem ser utilizados para o mesmo fim,

porém por oferecer mais segurança o JIG é mais comum.

Para a obtenção da relação cêntrica, duas técnicas de manipulação

mandibular podem ser utilizadas para esse objeto e foram descritas por Fernandes

Neto et al5. Vale lembrar que o importante não é qual a técnica, e sim, qual o

resultado será melhor e mais preciso. Ambas as técnicas deverão serão executadas

com o paciente em posição supina com o mento dirigido para cima, evitando a

protrusão da mandíbula.

A primeira técnica é chamada técnica frontal de Ramfjord. Após o correto

posicionamento do paciente e do dispositivo JIG ou qualquer outro, utiliza-se o dedo

polegar frontal e cervicalmente na face vestibular anterior da mandíbula, na região

de gengiva inserida e o dedo indicador sob o mento. Já com a mandíbula relaxada e

com uma abertura mínima, orientar o paciente a simular uma deglutição, colocando

a língua contra a porção posterior do palato duro levando a mandíbula no arco de

fechamento várias vezes até que os côndilos estejam em posição de RC. A técnica

bilateral de Dawson é realizada em 11 horas e assim como a técnica descrita

anteriormente, o paciente deverá estar em posição supina e com o dispositivo JIG

ou qualquer outro em posição. Inicia-se com o posicionamento de quatro dedos de

cada mão sob a borda inferior da mandíbula, e como se fosse erguer a cabeça do

paciente, ficam apenas os dedos mínimos sobre o ângulo da mandíbula e os

43

polegares na sínfise mandibular sem que nenhuma força seja aplicada. Em seguida,

com movimentos suaves a mandíbula é levada a realizar movimento de dobradiça

(abertura e fechamento) e a mandíbula desliza até a RC. Após a obtenção da RC,

coloca-se uma resina acrílica no local do contato, manipulando a mandíbula para

fazer o fechamento gerando uma endentação na face palatina do dispositivo que

garante a exatidão do registro da relação cêntrica.

A segunda etapa do diagnóstico diferencial dos distúrbios neuromusculares é

a palpação muscular. Possui como objetivo localizar o músculo em disfunção

apontando e distinguindo os desconfortos provocados. Deverão ser analisados todos

os músculos do AE, em sua origem, trajetória e inserção, além de uma criteriosa

palpação de ATMs.

E a última etapa para o diagnóstico diferencial é o uso de front-plateau ou

chamada de placa de mordida anterior. Essa placa tem como intuito desocluir dentes

posteriores, o que promove, mesmo que de forma provisória, a eliminação desses

distúrbios, aliviando a sintomatologia de dor dos músculos em questão,

demonstrando que o desequilíbrio na oclusão dos dentes estaria produzindo

disfunções.

2.6 Distúrbios temporomandibulares

A articulação temporomandibular é uma estrutura craniofacial altamente

especializada composta pelos ossos temporal e mandibular, podendo ser atingida

por distúrbios de origem neurológica ou musculoesquelética, de acordo com

Fernandes Neto et al5. Frequentemente, os sinais e sintomas são dores nas

articulações, face, pescoço ou até nos ouvidos, alterações nos mecanismos

mandibulares, presença de ruídos ou estalidos, limitação e descoordenação dos

movimentos mandibulares.

Segundo Pertes e Gross13, é importante levar em consideração a etiologia em

relação aos distúrbios temporomandibulares (DTM), e assim suas consequências no

tratamento destas disfunções. Os fatores etiológicos podem ser predisponentes,

determinantes e perpetuantes.

Os fatores predisponentes podem ser considerados biomecânicos, genéticos

ou psicológicos. Condições sistêmicas podem interferir no aparelho

44

estomatognático, como por exemplo, distúrbios reumáticos, nutricionais e

hormonais, produzindo DTMs. Além disso, a grande diferença entre máxima

intercuspidação (MI) e a relação cêntrica (RC) ou a presença de interferências nos

movimentos excêntricos são considerados fatores primários para o aparecimento de

DTMs. Porém, não há comprovação científica entre a relação de maloclusão e a

presença de distúrbios temporomandibulares. Ainda assim, algumas condições

oclusais como mordida aberta anterior ou mordida cruzada unilateral são associadas

como sinais e sintomas que estão relacionadas a DTMs.

Entre os fatores determinantes para o surgimento das DTMs, incluem-se duas

grandes categorias, o macro e o microtrauma. O macrotrauma, definido como uma

força súbita na articulação, podendo ser tanto de origem intrínseca (mastigação de

alimentos muito duros ou longos períodos de boca aberta) quanto extrínseca

(acidente automobilístico que causa fratura condilar ou um processo inflamatório

crônico na ATM) causando problemas estruturais. Já os microtraumas, resultam de

sobrecargas que podem gerar mudanças adaptativas e degenerativas na ATM,

produzindo disfunção dolorosa. Por exemplo, hábitos parafuncionais ou contatos

prematuros podem propiciar as disfunções.

E por fim, os fatores perpetuantes, como parafuncionais hormonais e

psicossociais, que associados a outros fatores predisponentes ou determinantes,

podem aumentar as DTMs.

2.6.1 Classificação das DTMs

A classificação sugerida pela American Academy of Orofacial Pain (AAOP)

considera os desvios na forma, o deslocamento do disco, o deslocamento do

complexo disco-côndilo, as condições inflamatórias, as doenças degenerativas e a

anquilose.

2.6.1.1 Desvios de forma

Os desvios na forma podem ser defeitos na superfície articular ou condilar, e

podem estar relacionados a distúrbios hormonais, artrite reumatóide, artrose e

degeneração condilar idiopática, trazendo alterações nos movimentos mandibulares

e sintomas dolorosos. Em geral, as irregularidades na superfície articular são

45

causadas por traumas na mandíbula quando existe uma maloclusão, presença de

inflamação, anormalidades na estrutura ou no desenvolvimento, podendo ainda ter

relação com uma anquilose fibrosa. A pressão passiva interarticular pode variar com

o nível de tensão emocional do paciente o que gera interferências no movimento.

Quando há o aumento da tensão emocional há também o aumento da pressão

interarticular.

Outros desvios na forma são o afinamento e perfuração do disco, podendo

ocorrer com o apertamento dentário que sobrecarrega a ATM, afinando

principalmente a parte central do disco. Ocasionalmente, poderá ocorrer a

perfuração do corpo médio do disco devido a pressão continua, promovendo um

orifício circular com bordas fragmentadas. A perfuração pode promover mudanças

degenerativas na superfície da articulação, sendo mais comum em idosos. O

diagnóstico para esses casos deve ser confirmado por exames de imagens,

preferencialmente de ressonância magnética. Como não há regeneração do disco, o

tratamento é basicamente cirúrgico, e somente nos casos em que o paciente não

tolera os sintomas.

2.6.1.2 Deslocamento de disco

Uma articulação normal tem sua banda posterior terminando no ápice do

côndilo em oclusão, e o disco encontra-se interposto entre as superfícies do côndilo

e a fossa glenóidea. A função do disco articular é acompanhar a cabeça do côndilo

durante os movimentos mandibulares, ajudando os movimentos e protegendo as

estruturas relacionadas. O deslocamento de disco está ligado a um desarranjo

interno causado por uma anormalidade em relação ao côndilo, disco articular e fossa

glenóidea. Entre as causas tem-se o processo de afinamento na borda posterior do

disco, as pressões excessivas na ATM eliminando o líquido sinovial levando a uma

aderência do disco na fossa, e a distensão e alongamento gradual dos ligamentos

discais quando o disco está fixado na fossa. Clinicamente, a característica mais

comum na identificação dessa situação, baseia-se na análise frontal do paciente

durante a abertura bucal com a existência ou não de desvio ao final do movimento.

No deslocamento do disco articular com redução (DDCR) o disco não se

encontra interpondo as superfícies do côndilo e a da fossa, mas sim anterior a elas

46

durante o deslize do côndilo para anterior, e volta para sua posição no momento do

fechamento. Tanto na abertura como no fechamento, quando ocorre a separação

entre o côndilo e o disco produz um efeito sonoro chamado de estalido. As causas

podem estar relacionadas com parafunção (excesso de carga sobre o conjunto

disco-côndilo e fossa mandibular), ausência de suporte dentário e interferência

oclusal. Segundo Pertes e Gross13, nem todo caso de DDCR é necessário

tratamento, devendo levar em consideração a adaptação do paciente quanto aos

sinais e sintomas. Caso haja presença de dor espontânea ou à palpação caracteriza

ausência de adaptação.

No deslocamento do disco sem redução (DDSR), o disco não retorna a sua

posição fisiológica sobre a cabeça do côndilo e abaixo da fossa articular em nenhum

momento da abertura ou fechamento mandibular. Nesse caso, o disco articular se

mantém interiorizado ao côndilo, e todo o seu deslocamento ocorre sobre o tecido

conjuntivo dos ligamentos retrodiscais, caracterizando assim essa disfunção com

limitação e alteração de movimentos, podendo gerar queixas álgicas pela

compressão destes tecidos. A confirmação do diagnóstico deve ser feita por meio da

Ressonância Magnética (RM), podendo ser feito abordagens clínicas conservadoras

e avaliar a adaptação do paciente aos sinais e sintomas. O tratamento cirúrgico,

conhecido como discopexia, é realizado reposicionando o disco em sua posição

adequada e estabilizando através de miniâncoras de titânio durante a cirurgia.

2.6.1.3 Deslocamento do complexo disco-côndilo

O deslocamento do complexo disco-côndilo é o movimento da cabeça do

côndilo a partir de sua posição normal na fossa articular até a eminência articular, e

quando ocorre a luxação, o côndilo ultrapassa a eminência. Pode ser considerada

parcial (subluxação), completa (luxação), uni ou bilateral, aguda, crônica recorrente

ou crônica. Pode ser também considerada anteromedial, superior, com

deslocamento medial, lateral ou posterior, com causas espontâneas ou induzidas,

como traumas, procedimentos odontológicos traumáticos e prolongados.

As luxações anteriores são mais frequentes e levam ao deslocamento

condilar anterior a eminência articular do osso temporal, ocorrendo geralmente no

fechamento bucal após uma abertura extrema. Já as luxações posteriores são raras

47

e podem ser respostas a um golpe direto na região do mento, empurrando o côndilo

em direção posterior á região mastóide, podendo comprometer o canal auditivo

externo. Esse tipo de luxação pode evoluir ainda para lesões do nervo facial e

contusão cerebral. O deslocamento lateral está relacionado a fraturas mandibulares,

segundo Lowery et al9 .

Durante a luxação aguda, o côndilo está localizado lateralmente e

superiormente e pode ser sentido no espaço temporal e reduzido através da

manobra de Sócrates, utilizando força para colocar a mandíbula em direção

posteroinferior a eminência articular. Importante enfatizar que quanto antes essa

manobra for realizada melhor, após cerca de duas semanas, os espasmos e

encurtamento do músculo temporal dificultam a redução necessária gerando o

deslocamento crônico que possibilita uma pseudoarticulação, provocando

dificuldade no fechamento bucal e na oclusão alterada com o prognatismo

mandibular e a mordida cruzada anterior. Portanto, o tratamento de escolha a

princípio deve ser o de redução manual do deslocamento posicionando o côndilo na

fossa mandibular, caso contrário, o tratamento cirúrgico pode ser necessário. A

indicação cirúrgica deve ser tomada após a avaliação de diversos fatores como o

tipo de deslocamento, etiopatogênese e fatores predisponentes, de acordo com

Akinbami1. Nos casos de luxações recorrentes, a cirurgia indicada é denominada

eminectomia, consistindo na remoção da eminência articular que contribui para a

excursão condilar impedindo assim que ocorra a luxação anterior.

As condições inflamatórias encontradas nos distúrbios de ATM

intracapsulares são geradas por diversas sobrecargas na articulação, como por

exemplo, causada por bruxismo ou mastigação pesada provocando uma resposta

inflamatória na cápsula fibrosa, na membrana sinovial e nos tecidos retrodiscais.

Comumente, os pacientes relatam dor contínua até mesmo em repouso que pioram

com o uso funcional da ATM. Os distúrbios inflamatórios mais frequentes são a

capsulite, sinovite e retrodiscite.

A capsulite é uma inflamação da camada externa de fibras da cápsula

articular, enquanto a sinovite consiste na inflamação do revestimento interno

sinovial. Ambas, geralmente, são consideradas uma única entidade clínica e

apresentam basicamente as mesmas características clínicas. O sintoma principal é a

dor em repouso acentuada durante a função ou quando a articulação é pressionada,

48

podendo limitar o movimento. O tratamento está relacionado com a etiologia. Se

estiver ligado a um macrotrauma, a recorrência é difícil, havendo somente uma

limitação mandibular que pode ser atenuada com prescrição de analgésicos leves

(não-esteróidais), calor úmido ou ultrassom na região da articulação. Caso a

etiologia esteja ligada a microtrauma crônico ou ocorrer devido a um deslocamento

do disco, será indicada uma terapia mais definitiva. Nesse caso, exames

radiográficos não apresentam grande valor, pois não há alteração óssea.

Já a retrodiscite está relacionada com o processo inflamatório dos tecidos

retrodiscais, sendo o trauma em acidentes ou quedas na região de mento, o fator

etiológico mais comum. Os microtraumas podem gerar o afilamento da banda

posterior dos côndilos, aumentando a possibilidade de traumas dos tecidos. Os

sintomas continuam sendo dor contínua que são exacerbadas com hábitos

parafuncionais. Quando ocorre o edema, o côndilo é forçado anteriormente

promovendo maloclusão repentina, principalmente em dentes posteriores do lado da

inflamação e contato prematuro dos dentes anteriores do lado oposto.

Outro distúrbio da ATM são as chamadas doenças degenerativas, que

consistem em um processo destrutivo responsável pela alteração da superfície

articular óssea dos côndilos e da fossa. Em condições normais, a articulação tem

adaptação às demandas funcionais, utilizando processos de remodelamento

articular progressivo garantindo o equilíbrio entre a forma e a função. Porém, quando

ocorre sobrecarga das estruturas, essa capacidade de adaptação das ATMs pode

ser excedida tornando incapazes de se adaptarem. Por isso, esse grupo de

doenças, composto por osteoartrose, osteoartrite e poliartrite, é caracterizado por

uma resposta da articulação ao aumento de carga.

A osteoartrose é uma das doenças mais prevalentes, sendo considerada

musculoesquelética promovida por um desequilíbrio da homeostasia do condrócito.

Geralmente apresenta crepitação e limitação de abertura bucal com deflexão para o

lado comprometido pelas mudanças articulares.

A osteoartrite, ou também conhecida como artrite inflamatória, possui alguns

pontos em comum com a osteoartrose, embora a distinção entre as duas seja a

presença de inflamação secundária na articulação temporomandibular. Inicia-se

gradualmente e possui característica autolimitante. Após um período de cerca de

três anos, o processo degenerativo cessa, até mesmo sem terapia definitiva, a dor

49

desaparece, o grau de mobilidade se torna aceitável e os ruídos parecem diminuir.

Porém, as deformações estruturais no osso do côndilo ou na fossa permanecem.

Quando isso ocorre, essa condição pode ser referida como osteoartrose, já que não

há componente inflamatório e dor. Os sintomas mais comuns são a dor localizada e

constante, que é aliviada em repouso. Para o tratamento, pode-se utilizar

analgésicos ou anti-inflamatórios não-esteroidais para o controle da dor e da

inflamação articular, além do uso de placa estabilizadora durante o maior tempo

possível. Caso o tratamento conservador não seja suficiente, e o paciente ainda

relate dor intolerável é possível considerar a intervenção cirúrgica.

A poliartrite possui características semelhantes à osteoartrite, por isso a

necessidade de se fazer diagnóstico diferencial para o correto tratamento. As

mudanças degenerativas são encontradas na cartilagem articular e no osso

adjacente, associadas à inflamação do tecido capsular e sinovial. Abrangidos no

termo poliartrite, existem outros distúrbios com diferentes etiologias, tais como artrite

reumatóide, artrite reumatóide juvenil, artrite infecciosa. No que se refere às doenças

reumáticas inflamatórias, o principal aspecto a ser considerado é que envolvem os

dois lados do corpo e assim ocorrem nas duas ATMs.

Durante o estágio agudo, os pacientes relatam presença de dor e

sensibilidade à palpação lateral da ATM. O tecido sobre a ATM pode apresentar os

sinais característicos de inflamação como, calor, rubor, edema, função limitada e

também a exacerbação da dor com atividades parafuncionais, mastigação excessiva

ou até mesmo atividades normais.

2.6.1.4 Anquilose

A anquilose é uma séria incapacitação da articulação, que compromete a

expressão, dificulta a mastigação, podendo gerar deficiência na higiene oral, cáries

rampantes, e até mesmo comprometer vias aéreas com consequências físicas e

psicológicas. A classificação considera sua localização (intra ou extra-capsular), o

tipo de tecido envolvido (ósseo, fibroso ou ósseo-fibroso) e a extensão da fusão

(completa ou incompleta).

Os casos normalmente iniciam antes dos 10 anos, e o tratamento cirúrgico

deve ser o mais cedo possível devido à nutrição ser afetada com a limitação de

50

abertura bucal, além de facilitar diversos riscos no desenvolvimento de processos

infecciosos, de acordo com Chidzonga4. O tratamento cirúrgico pode ser realizado

utilizando várias técnicas, porém o profissional deve avaliar o grau de severidade e o

tipo de anquilose apresentada pelo paciente. As técnicas que podem ser usadas

variam de artroplastia simples ou interposicional, ressecção do bloco anquilótico com

reconstrução com enxerto ósseo, e a osteotomia vertical, que consiste na ressecção

do côndilo e da borda posterior do ramo ascendente, regularização da cabeça

condilar, reposicionamento e fixação das estruturas ósseas osteotomizadas.

A anquilose fibrosa é a mais frequente e na maioria das vezes está associada

com trauma na região anterior do mento, gerando forte compressão no sentido

posterior do côndilo ou também com infecções otológicas recorrentes. A anquilose

fibrosa propicia uma união fibrótica entre as superfícies e dentro da articulação

ocorre uma hemorragia (hemartrose) sendo uma matriz para o desenvolvimento da

fibrose. Clinicamente, apresenta uma pequena movimentação na abertura da

mandíbula, deflexão para o lado comprometido e restrição do lado oposto, sem estar

associada a dor ou alterações na oclusão do paciente. Por meio de radiografia,

distingue-se da anquilose óssea, pois ainda apresenta um espaço entre o côndilo e

a fossa.

A anquilose óssea está associada a uma infecção prévia, fraturas do côndilo

com complicações e inflamações crônicas. Clinicamente, assemelha-se a anquilose

fibrosa, no entanto, radiograficamente o espaço articular está diminuído ou

totalmente obliterado, com uma fusão do côndilo com a fossa mandibular, e ainda, o

processo coronóide aparece alongado.

Para ambos os casos de anquilose, é fundamental para a recuperação dos

pacientes a realização de fisioterapia, com ao menos 10 movimentos, 3 vezes ao

dia, com exercícios de abertura forçada levemente associada à contrarresistência.

51

ELIMINAÇÃO DAS INTERFERÊNCIAS DE FORMA

SIMPLIFICADA

52

3 ELIMINAÇÃO DAS INTERFERÊNCIAS DE FORMA SIMPLIFICADA

Visto que grande parte das patologias dentárias, distúrbios neuromusculares

e temporomandibulares, estão vinculados aos distúrbios oclusais, o objetivo desta

revisão e descrição de casos clínicos é facilitar a resolução destas patologias por

meio de procedimentos clínicos simples para uma boa compreensão e execução

pelos cirurgiões-dentistas.

O contato dos dentes posteriores durante os movimentos excursivos da

mandíbula em lateralidade e protrusão deve ser eliminado para que ocorra o perfeito

funcionamento da oclusão, promovendo guias de proteção mútua (Figuras 24-30).

Nos movimentos de lateralidade, a desoclusão realizada pelos caninos não permite

que as forças no plano horizontal toquem os dentes posteriores. Da mesma forma,

no movimento de protrusão os incisivos inferiores deslizam sobre a face palatina dos

superiores aliviando os dentes posteriores de receberem forças no sentido

horizontal. Os dentes posteriores são programados para receberem as forças no

sentido vertical, provenientes da mastigação, aliviando os dentes anteriores de

receberem este tipo de carga.

A literatura é bastante vasta descrevendo os ajustes oclusais por meio de

desgastes com brocas nos dentes posteriores que apresentam interferências, de

forma a deixar apenas o contato dos caninos nos movimentos de lateralidade. No

entanto, muitas vezes a melhor indicação para devolver a desoclusão pelos caninos

seria o acréscimo de resina composta para restituir a forma ideal dos caninos, ou

alterar o contorno de modo a facilitar a desoclusão, contribuindo para uma melhor

função. Os trabalhos ou citações sobre este ajuste oclusal por acréscimo são

poucos e muito sutis como o descrito por Busato3, onde é apresentado apenas

algumas imagens com legendas, sem haver uma maior discussão sobre a técnica.

Desta forma, o presente trabalho irá descrever e ilustrar, por meio de casos

clínicos, as melhores indicações de um ajuste oclusal por acréscimo de resina

composta na arcada superior ou na inferior, quando e por que fazer em determinada

arcada, de modo a embasar o clínico para realizar estes procedimentos com

eficácia.

53

Figura 24: Arcada em oclusão.

Figura 25: Movimento de lateralidade para a direita com interferências.

54

Figura 26: Arcada superior após a checagem das interferências com carbono.

Figura 27: Arcada inferior após a checagem das interferências com carbono.

55

Figura 28: Remoção das interferências por desgaste seletivo – arcada superior.

Figura 29: Remoção das interferências por desgaste seletivo – arcada superior.

56

Figura 30: Remoção das interferências por desgaste seletivo – arcada inferior.

57

CASOS CLÍNICOS

58

4 CASOS CLÍNICOS

4.1 Caso clínico I

Uma paciente de 41 anos de idade possui relação dentária de Classe I, com

pré-molares e molares bem posicionados, no entanto, os caninos inferiores

apresentam-se em topo-a-topo com os superiores, impossibilitando uma desoclusão

ideal entre eles, pela ausência de um trespasse horizontal e vertical adequado

(Figuras 31-33). A ausência da desoclusão imediata pelos caninos produz

interferências sobre os dentes posteriores ou uma desoclusão em grupo, quando

existir um equilíbrio adequado na distribuição das forças de desoclusão sobre os

pré-molares e molares do lado de trabalho.

Assim, para obtenção de uma função ideal de modo simplificado, foi realizado

um isolamento relativo dos dentes inferiores, seguido do condicionamento ácido do

esmalte do canino inferior com ácido fosfórico a 37%, na superfície palatina, incisal e

vestibular, durante 30 segundos (Figura 34 A). Em seguida realizou-se a lavagem

abundante com jato de água por 15 segundos e a secagem da superfície do esmalte

por 15 segundos. O adesivo foi aplicado sobre o esmalte condicionado e

esparramado com um jato de ar seco por 5 segundos, de forma a promover uma

camada fina do adesivo, evitando excesso do mesmo, e seguiu-se com a

fotopolimerização do adesivo por 20 segundos e a incorporação de uma camada de

resina composta (Figura 34 B-D).

A incorporação da resina composta (Z250, 3M) foi feita com uma única

camada aplicada na face palatina, incisal e vestibular do canino inferior. A resina foi

esculpida de modo a promover a melhor forma para o canino, respeitando a sua

anatomia e tentando melhorar a sua estética (Figura 35 A). Antes de fazer a

polimerização da resina, foi pedido para que o paciente ocluísse os dentes em MIH,

e desta forma, a oclusão do canino inferior com o superior determinou a escultura da

resina na face vestibular do canino inferior. Assim, com os dentes em oclusão,

procedeu-se a polimerização da resina composta por 20 segundos (Figura 35 B). Na

sequência, pediu-se para o paciente abrir a boca e a polimerização foi efetuada por

mais 20 segundos (Figura 35 C). Ao pedir para o paciente abrir a boca, escuta-se

um “clec”, que é o descolamento da resina composta dos dentes superiores que

estavam ocluídos, mas como não foram condicionados, não existe uma adesão com

eles.

59

A resina composta na superfície vestibular do canino inferior fica com a forma

da superfície palatina do canino superior, até mesmo com bordas salientes pelo

escoamento da resina composta, gerando um excesso de contato entre estes

dentes. Indica-se então um leve desgaste destas bordas promovendo um adequado

contorno e escultura da resina (Figura 35 D), e ainda um polimento com borracha

abrasiva de forma a deixar um contato muito suave entre estes dentes, sem o

paciente se queixar de desconforto na oclusão ou um relato de dente “alto” com

mais contato que os demais. Desta forma, obtém-se uma desoclusão imediata pelos

caninos no movimento de lateralidade (Figura 36).

Figura 31: Relação dos caninos do lado esquerdo em topo-a-topo

60

Figura 32: Vista lateral esquerda – relação topo-a-topo

Figura 33: Movimento de lateralidade para o lado esquerdo (lado de trabalho) com a desoclusão feita

pelos dentes posteriores

61

Figura 34: A- Condicionamento com ácido fosfórico 37% na superfície lingual,vestibular e vertente

distal do canino. B e C– Aplicação de sistema adesivo e posteriormente sua fotopolimerização. D-

Incorporação de resina em uma única camada na face lingual e incisal do canino inferior

62

Figura 35: A – Escultura prévia. B e C – primeira fotopolimerização com os dentes ocluídos e

posteriormente com a boca aberta. D - Acabamento e remoção de excesso de forma a eliminar

qualquer contato prematuro.

Figura 36: Resultado final – guia de desoclusão efetuada por caninos.

63

4.2 Caso clínico II

Um paciente de 18 anos de idade possui relação dentária de Classe I, com

um bom encaixe dos pré-molares e molares, no entanto, existe um espaço entre a

superfície palatina dos caninos superiores e a vertente vestibular dos caninos

inferiores (Figura 37). Isto não permite que exista uma desoclusão imediata pelos

caninos durante o movimento de lateralidade no lado de trabalho, ocorrendo uma

interferência sobre os dentes posteriores até que o canino inferior toque no superior

e inicie uma desoclusão pela face palatina do mesmo.

Assim, para que a solução fosse feita de forma simplificada, foi realizado um

isolamento relativo dos dentes superiores, seguido do condicionamento ácido do

esmalte do canino superior com ácido fosfórico a 37%, na superfície palatina e 1/3

da superfície vestibular, durante 30 segundos. Em seguida realizou-se a lavagem

abundante com jato de água por 15 segundos e a secagem da superfície do esmalte

por 15 segundos. O adesivo foi aplicado sobre o esmalte condicionado (Figura 38) e

espalhado com um jato de ar seco por 5 segundos, de forma a promover uma

camada fina do adesivo, evitando excesso do mesmo, e seguiu-se com a

fotopolimerização do adesivo por 20 segundos.

A incorporação da resina composta (Z250, 3M) foi feita com uma única

camada aplicada na face palatina e incisal do canino superior (Figura 39). A resina

foi esculpida de modo a promover a melhor forma para o canino superior,

respeitando a sua anatomia e tentando melhorar a sua estética. Antes de fazer a

polimerização da resina, foi pedido para que o paciente ocluísse os dentes em MIH,

e desta forma, a oclusão do canino inferior com o superior promove a escultura da

resina na face palatina do canino superior, promovendo um íntimo contato (Figura

40). Assim, com os dentes em oclusão, procede-se a polimerização da resina

composta por 40 segundos. Ao pedir para o paciente abrir a boca, escuta-se um

“clec”, que é o descolamento da resina composta dos dentes inferiores que estavam

ocluídos.

A resina composta na superfície palatina do canino superior fica com a forma

da superfície vestibular do canino inferior, até mesmo com bordas salientes pelo

escoamento da resina composta, gerando um excesso de contato entre estes

dentes. Indica-se então um leve desgaste destas bordas promovendo um adequado

contorno e escultura da resina, e ainda um polimento com borracha abrasiva de

64

forma a deixar um contato muito suave entre estes dentes, sem o paciente se

queixar de desconforto na oclusão ou um relato de dente “alto” com mais contato

que os demais. Desta forma, obtém-se uma desoclusão imediata pelos caninos no

movimento de lateralidade (Figura 41).

Figura 37: Trespasse horizontal entre caninos impossibilitando a desoclusão imediata.

Figura 38: Aplicação de adesivo após o condicionamento com ácido fosfórico 37%. Note o aspecto

opaco do esmalte.

65

Figura 39: Inserção de resina composta em camada única.

Figura 40: Após a escultura da resina, o paciente oclui para que o canino inferior imprima a anatomia

e a guia de desoclusão na resina do canino superior. A fotopolimerização é feita com os dentes

ocluídos.

66

Figura 41: Resultado final - guia de desoclusão imediata após a restauração do canino superior.

67

DISCUSSÃO

68

5 DISCUSSÃO

As interferências oclusais nos movimentos mandibulares são os grandes

causadores de patologias dentárias, distúrbios neuromusculares e

temporomandibulares, e fica de certo modo negligenciado por muitos clínicos pela

complexidade encontrada em se executar os ajustes oclusais por desgaste seletivo.

Apesar de existir muitos trabalhos relatando as formas de realizar estes ajustes

oclusais, o fato de realizar desgastes dentários em tecidos sadios para remoção das

interferências, afasta muitos clínicos do desejo em conhecer a técnica e se

aperfeiçoar na sua execução. Assim, os pacientes continuam por muito tempo

expostos a estes distúrbios, sofrendo danos, muitas vezes irreparáveis ao sistema

estomatognático.

Em diversas situações a melhor indicação para obter uma desoclusão ideal

seria o acréscimo de resina composta para devolver a forma aos caninos, ou alterar

o contorno de modo a facilitar a desoclusão, contribuindo para uma melhor função.

Quando se realiza o desgaste das interferências nos dentes posteriores marcadas

com o carbono, novas interferências surgem em outros locais até que seja

conseguido que a marca de desoclusão esteja apenas sobre os caninos. Portanto,

em pacientes com dentes que apresentam grandes desgastes pelo tempo,

perimólise, parafunção ou ainda cúspides enfraquecidas pela perda de estrutura, o

acréscimo de resina seria a melhor indicação quando comparada ao desgaste

seletivo.

O tipo de má oclusão também tem relevância na indicação do ajuste oclusal.

A classificação de Angle para as más oclusões descreve a cúspide mesiovestibular

dos primeiros molares superiores ocluindo no sulco mesiovestibular dos primeiros

molares inferiores. Com esta relação dos molares, os pré-molares e caninos estão

aptos a ter um encaixe ideal, assim como o trespasse vertical e horizontal dos

incisivos, o que favorece uma desoclusão ideal nos movimentos mandibulares. Em

uma má oclusão Classe III de Angle, como o primeiro molar inferior está mais

mesializado em relação ao superior, o canino inferior quase sempre está à frente do

superior sem haver o contato entre eles no movimento de lateralidade para o lado de

trabalho. Nestes casos, tanto o ajuste oclusal por acréscimo quanto por desgaste

seletivo estão contraindicados, pois apenas um tratamento ortodôntico corretivo

permitiria haver uma desoclusão ideal pelos caninos, após o estabelecimento de um

69

engrenamento correto com o canino superior ocluindo entre o primeiro pré-molar

inferior e o canino inferior. Caso não possa ser realizado o tratamento ortodôntico,

deverá ser obtida uma desoclusão em grupo, distribuindo os contatos da desoclusão

sobre os pré-molares e molares de forma equilibrada em extensão e intensidade, de

forma a diluir entre eles as forças horizontais deletérias ao periodonto. Já em uma

má oclusão de Classe I ou II, é totalmente possível a obtenção de uma desoclusão

pelos caninos, exceto quando exista uma mordida cruzada dos mesmos, e desta

forma, os ajustes por desgaste ou acréscimo estão indicados na presença de sinais

e sintomas de patologias dentárias e neuromusculares.

Poucos trabalhos descrevem a técnica de ajuste por acréscimo, e ainda o

fazem de forma sutil. Busato3 apresenta apenas algumas imagens com legendas

sem haver uma maior discussão sobre a técnica, o que poderia contribuir muito com

os colegas na conduta de seus pacientes. O presente trabalho apresenta 2 casos

clínicos com acréscimo de resina composta nos caninos para eliminar as

interferências sobre os dentes posteriores.

Primeiramente deve ser discutido se o acréscimo em resina composta deveria

ser feito na arcada superior ou inferior. Apesar das resinas atuais apresentarem alta

resistência ao cisalhamento, fratura e desgaste, sempre que são inseridas em

pontas de cúspides e incisais dos dentes anteriores acabam por ter uma

longevidade reduzida pelos desgastes naturais em virtude do atrito, intensificados

em casos de parafunções como o bruxismo. Desta forma, o acréscimo na face

palatina dos caninos superiores favorece a durabilidade da restauração, devendo ser

a escolha sempre que possível. Para isto, deve existir um leve trespasse vertical e

horizontal entre os caninos superior e inferior, conforme está evidente no caso

clinico 2, o suficiente para inserção da resina na face palatina do canino superior.

Quando existir uma relação de topo entre os caninos superiores e os inferiores, ou

uma relação normal, no entanto, com pouco trespasse vertical entre eles, a extensão

de superfície palatina do canino superior é pequena para que o canino inferior

deslize de forma a desocluir os dentes posteriores. Desta forma, o acréscimo de

resina composta poderia ser feito na incisal do canino superior, e até mesmo por

vestibular para conseguir uma espessura que torne a restauração resistente, o que

compromete a estética do sorriso pelo aumento do canino. Nestes casos, conforme

apresentado no caso clinico 1, uma alternativa é o acréscimo de resina composta na

70

superfície palatina e incisal do canino inferior, o que traz pouco desequilíbrio estético

e possibilita uma desoclusão ideal pelos caninos.

Na ausência de contato entre os caninos com a presença de um trespasse

vertical e horizontal, como no caso clínico 2 apresentado, a escolha em realizar um

ajuste oclusal por desgaste das interferências nos dentes posteriores marcadas com

o carbono, levaria ao aparecimento de novas interferências em outros locais, pois

ainda iria existir um trespasse horizontal entre os caninos superior e inferior. Para

que os caninos pudessem se tocar e conseguir a desoclusão imediata, haveria a

necessidade de desgastar os dentes posteriores de forma exagerada até haver uma

perda de dimensão vertical, com aumento da sobremordida ou trespasse vertical,

até que os caninos antagonistas se encontrassem. Isto torna a indicação do

acréscimo em resina composta como a melhor escolha para a solução dos casos de

ausência de contato entre os caninos com presença de trespasses entre eles.

O acréscimo de resina composta deve ser feito como um procedimento

comumente empregado em Dentística Restauradora, com profilaxia da área, seguido

de isolamento relativo, condicionamento ácido no esmalte do canino, aplicação de

adesivo, polimerização e inserção da resina composta. A indicação do isolamento

relativo ao invés do absoluto se justifica pela facilidade da obtenção da relação de

contato entre os caninos obtida facilmente pela oclusão dos dentes antes da

polimerização da resina. Como não houve o condicionamento ácido no canino

oposto, o contato com a resina durante a polimerização não promoverá a união

química por não haver a formação dos “tags”, que é a penetração da resina

composta nos prismas de esmalte condicionados. Quando o paciente abre a boca

após a polimerização da resina, ocorre um “descolar” do canino oposto verificado

pelo som de “clec”, pois existiu uma adesão tênue por meio de forças químicas de

valência, que promovem uma união fraca entre a resina e o esmalte não

condicionado, que são quebradas durante a abertura da boca e desoclusão dos

dentes.

Em um ajuste oclusal, o carbono de espessura de 20 micrômetros é indicado

para conseguir os melhores resultados. Os contatos oclusais dos dentes anteriores e

posteriores foram descritos anteriormente e com o uso do carbono fica fácil a sua

visualização. No “Kit”, entre as folhas de carbono, existem folhas de acetato

intercaladas que muitos profissionais não sabem de sua utilidade, ou imaginam que

71

apenas existem para separar os papeis de carbono. Estas folhas são utilizadas para

testar o contato entre os dentes em oclusão e servem para quantificar o espaço

entre os dentes anteriores em máxima intercuspidação (MI). Quando o paciente

apenas encosta os dentes em MI, sem apertar uma arcada contra a outra, o papel

acetato interposto fica preso entre dentes posteriores ao tentar puxá-lo. Já nos

dentes anteriores com a mesma força de oclusão, o papel acetato deve escapar

quando puxado, de forma a existir um contato muito tênue entre os dentes anteriores

na oclusão sem forçar. Deve existir um espaço em torno de 20 micrômetros

justamente para haver o alivio dos dentes anteriores durante a mastigação, de forma

que apenas os dentes posteriores recebam as forças no sentido vertical. Este

espaço é tão discreto que ao iniciar os movimentos de lateralidade ou protrusiva,

ocorrerá o contato imediato entre os caninos e incisivos, respectivamente,

promovendo um sistema de proteção mútuo durante a desoclusão nos movimentos

mandibulares. Desta forma, após o acréscimo dos caninos, indica-se a remoção dos

excessos de escoamento da resina e remoção de qualquer contato excessivo com

broca diamantada e borracha abrasiva para conseguir um polimento adequado, sem

ultrapassar os 20 micrômetros de espaço entre os caninos, verificado pelo papel

acetato.

Deste modo, o ajuste oclusal por acréscimo de resina composta parece ser

um procedimento simples e perfeitamente exequível aos Odontólogos,

desmistificando, ao menos em parte, a solução de problemas funcionais que

frequentemente comprometem a função correta do aparelho estomatognático de

muitos pacientes, desenvolvendo a diversas patologias associadas. A falta de

discussões como esta levou a realização deste trabalho, no entanto, novos relatos

devem ser apresentados no intuito de esclarecer, corroborar ou confrontar as ideias

aqui expostas, de modo a facilitar a compreensão do tema pelos clínicos e execução

de métodos que solucionem os problemas oclusais dos pacientes.

72

CONCLUSÃO

73

6 CONCLUSÃO

Baseado na literatura consultada e nos casos clínicos apresentados,

podemos concluir que:

1. O ajuste oclusal por acréscimo é uma alternativa para obtenção de uma

desoclusão ideal dos dentes, sem prejuízos aos tecidos dentários sadios.

2. Os ajustes oclusais por desgaste ou acréscimo de resina são indicados para

obtenção de uma desoclusão pelos caninos nos casos de más oclusões de

Classe I e II de Angle.

3. Na falta de contato entre os caninos superiores e inferiores, com presença de

trespasse vertical e horizontal, o acréscimo de resina composta na superfície

palatina dos caninos superiores parece ser a melhor opção.

4. Na presença de mordida cruzada dos caninos, apenas o tratamento

ortodôntico corretivo pode devolver uma desoclusão ideal, ou então a

desoclusão deverá ser feita em grupo.

74

REFERÊNCIAS

75

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