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DACOSTA, LAMARTINE (ORG.). ATLAS DO ESPORTE NO BRASIL . RIO DE JANEIRO: CONFEF, 2006 1. 35 Jogos tradicionais e brincadeiras infantis ALEXANDRE MORAES DE MELLO Definições Jogos e esportes tradicionais são atividades lúdicas, competitivas e/ou cooperativas, que refletem a identidade cultural de um determinado grupo étnico, distinguindo-se dos esportes de apelo internacional sujeitos a padrões organizacionais e regras universais. Já os jogos e brincadeiras tradicionais infantis são atividades passadas de geração a geração, em geral aprendidas pelas crianças mais novas com as de mais idade, durante o próprio ato de brincar. No Brasil, a denominação de jogo é mais apropriada quando existe o caráter competitivo, enquanto que o termo brincadeira engloba os jogos, mas também atividades não competitivas, como o faz-de-conta, brincadeiras-de-roda, atividades com areia, terra, água, etc. Embora o termo brinquedo tenha sido utilizado por alguns autores em substituição a jogo ou brincadeira – como, por exemplo, Câmara Cascudo desde a primeira edição do Dicionário do Folclore Brasileiro, datada de 1954 –, os pesquisadores atuais indicam como brinquedo o objeto utilizado na ação de brincar. Os jogos tradicionais são também denominados de jogos populares, sejam aqueles praticados por adultos ou pela população infantil, principalmente por crianças integrantes de famílias menos privilegiadas. Estes ocorrem com freqüência em calçadas, ruas, quintais, terrenos baldios e pátios escolares, ao passo que aqueles se tornam parte da vida cotidana de seus praticantes em seus momentos de tempo livre e de oportunidade de encontro grupal. Focalizando-se o grupo infantil, o de maior proeminência no Brasil rural e rural-urbano, admite-se geralmente que as brincadeiras de faz-de-conta são atividades baseadas nas representações de situações adultas construídas pelas crianças, em geral observadas no seu cotidiano. São praticadas desde cedo, quando as crianças entram na etapa das atividades simbólicas. Exemplos são as brincadeiras de casinha, escolinha, ônibus, vendinha, etc. As brincadeiras-de- roda são acompanhadas por cantigas e possuem certa movimentação do grupo, geralmente disposto em círculo. São exemplos: a canoa virou, atirei o pau no gato, carneirinho- carneirão, ciranda-cirandinha, entrei na roda, fui no Itororó, pirulito que bate-bate, o cravo brigou com a rosa, sambalelê, Terezinha de Jesus e outras. Origem Os jogos tradicionais são manifestações de criação regional ou nacional mas com raízes de identificação entre países de cultura similar ou mesmo distantes. O surgimento de vários desses jogos e brincadeiras infantis está ligado à apropriação pelas crianças e reprodução à sua maneira, de práticas culturais observadas entre adultos. O jogo de amarelinha ou academia parece ter origem na Roma e Grécia antigas, a partir de práticas culturais de adultos. Na Grécia foi registrado há séculos o jogo de pedrinhas (jogo das cinco pedras) a partir de desenho numa ânfora exposta no Museu de Nápoles, e anteriormente jogado com pequenos ossos ou em peças de marfim e outros materiais. Contudo, precisar a origem dessas atividades é impróprio dado a que ela se confunde com a origem dos entes humanos. Daí na obra intitulada “Homo Ludens – O jogo como elemento da cultura”, Johan Huizinga indica que a origem do jogo antecedeu a origem da cultura. Isso porque a constituição da cultura pressupõe a existência da sociedade humana, enquanto o jogo já aconteceria entre os animais antes do surgimento do homem. Portanto, Traditional games and children’s games Traditional sports and games (TSG) are playful activities, competitive and/or cooperative, which reflect the cultural identity of a particular ethnic group. This makes TSG distinct from sports of international appeal that are subject to organizational standards and to universal rules and regulations. Children’s traditional games and plays are activities that are handed down from generation to generation, picked up by young children during their play with older children. In Brazil TSG have been either inherited from Native Brazilians or acquired from European immigrants, especially Italian and German. Italian bocce, for instance, is the traditional game most practiced in the country today. Adult TSG have been kept alive either as a form of leisure or as a way to preserve group and community identity. It is possible to notice that there has been some evident reduction in TSG practices in both versions – children’s and adults’. However, there seems to be another way to preserve of TSG brought to light by national and international studies: the pedagogical use of TSG, which would include the development of sport and physical education. conhecer os jogos de um grupo humano é conhecer sua cultura e a partir dela conhecer como seus participantes lidam com o jogo. Século XVI e XVII No Brasil, jogos e brincadeiras na forma encontrada em várias partes do mundo, na sua maioria, indicam ter vindo com os colonizadores, muito embora fosse rica a cultura lúdica infantil indígena como já observada quando da chegada dos primeiros navegantes às costas brasileiras. Há registros de brincadeiras naquele período, como por exemplo, o que expressa o depoimento do Padre Fernão Cardin, descrito por Florestan Fernandes na coletânea de textos sobre as práticas educacionais na sociedade tupinambá: “(...) têm seus jogos, principalmente os meninos, muitos vários e graciosos, em os quais arremedam muitos gêneros de pássaros, e com tanta festa e ordem que não há mais que pedir”. Semelhante à cabra-cega praticada pelas crianças brasileiras, Philippe Ariès identificou através da análise de uma tapeçaria do século XVI, o jogo sendo realizado na França por adultos e, em quadros holandeses da segunda metade do século XVII, observou adultos e crianças que participavam conjuntamente desse mesmo jogo. Verificou também, através do diário de um médico da corte de Henrique IV de França, que ainda criança, Luis XIII (nascido em 1601) também brincava de cabra-cega, esconde-esconde e outros jogos. A existência em alguns gráficos da amarelinha, desenhados no chão pelas crianças e nos quais figuram o céu e o inferno, significando o acesso ao céu resultado de uma jogada bem sucedida e ao inferno de uma jogada errada, aparece em pinturas da Idade Média, o que pode indicar ser o registro da influência marcante da igreja católica naquele período. A cultura brasileira possui fortes elementos de origem africana. O Brasil é um dos países de maior contingente populacional negro do mundo. Entretanto, provavelmente pela própria opressão imposta à população negra, não se observam muitos registros quanto às influências na prática dos jogos tradicionais tanto de adultos como infantis ao longo do tempo. Através da oralidade, muitos jogos, brincadeiras e brinquedos devem ter recebido influências africanas que se incorporaram à cultura brasileira. Alguns estudos sociológicos e antropológicos registram passagens sobre brincadeiras entre meninos de engenho e meninos escravos nas casas-grandes e senzalas, onde a dominação branca era reproduzida na atividade infantil. No Maranhão, estado de significativa população negra, há o registro do jogo capitão-de-campo-amarra- negro, que retrata a captura de escravos foragidos, mas que, por sua vez, possui um determinado espaço físico onde não podem ser pegos – a mancha, que provavelmente representa a área de resistência em que se constituíam os quilombos. Entre os jogos de adultos, a capoeira é a herança mais evidente desta fuga lúdica e emancipatória. Século XIX e XX Em determinadas áreas do Brasil as colonizações mais recentes, como, entre outras, a alemã e a italiana no sul, a japonesa e a italiana em São Paulo, através da sua cultura trouxeram influências para as atividades lúdicas das crianças além de introduzir na cultura local seus jogos de adultos. Quanto maior a interação dos imigrantes com a população brasileira, mais as atividades se enriqueceram. É o caso da influência italiana em São Paulo, onde se pode citar a capucheta, um tipo de pipa feita com jornal e sem varetas, como resultante dessa interação entre as crianças. A bocha, por sua vez, tem tido indicações de ser o jogo tradicional mais praticado no país nos dias presentes, embora seja uma manifestação típica italiana. Situação Atual Com denominações diferentes e variações em forma, jogos e brincadeiras tradicionais estão presentes em todas as regiões geográficas do Brasil. Grande número está concentrado nas áreas urbanas, principalmente nas periferias, onde há mais espaços físicos disponíveis para adultos e crianças interagirem de forma autônoma. No meio rural são registrados também jogos e brincadeiras diversas, porém com estímulos sazonais devido às suas características, como, por exemplo, a pipa ou papagaio que depende da freqüência dos ventos, ou a finca, jogo em que a criança desloca-se lançando um objeto pontiagudo no solo, puxando linhas até completar um percurso, e que depende do chão molhado do período de chuvas. Os jogos infantis tradicionais mais praticados no Brasil têm sido levantados e caracterizados por Alexandre de Mello com o apoio de colaboradores de várias regiões do país, como se pode apreciar no mapa deste capitulo. Vários jogos estão preservados nos dias atuais por interesse de crianças e até de adolescentes. Entretanto, a redução do número de quintais, as questões de segurança, os programas televisivos e as novas opções de atividades lúdicas através da informática têm reduzido a sua freqüência de modo sensível. Como parte das atividades das instituições de educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, as brincadeiras-de-roda são em geral orientadas pelas professoras e professores e realizadas com grande entusiasmo pelas crianças. Entretanto, mesmo na escola e principalmente fora dela, a sua freqüência tem apresentado redução. Quanto aos jogos de adultos, a sobrevivência no Brasil tem ocorrido como uma alternativa de lazer, tanto quanto de manutenção de identidade grupal e comunitária. E em ambas as dimensões – infantil e adulta – a perspectiva revelada por estudos internacionais (vide mapa) é a do uso educacional dos jogos, o que incluiria no caso o desenvolvimento do esporte e da Educação Física em qualquer país. Fontes Mello, A. M. Psicomotricidade, educação física e jogos infantis. São Paulo: Ibrasa, 2002; Mello, A M. Jogos Populares e educação física. Boletim de Intercâmbio (SESC/AN) 1981, 8, 37-45; Aries, P. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1981; Cascudo, L. C. Dicionário do folclore brasileiro. São Paulo: Melhoramentos, 1979; Fernandes, F. Folclore e mudança social na cidade de São Paulo. Petrópolis: Vozes, 1979; DaCosta, L.P. Mapping the wordwide trends of traditional sports and games. Proceedings of Symposium on Traditional Games, Duderstadt 2000; Holanda, S.B. Raízes do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1979; Huizanga, J. Homo ludens – O jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 1971; Medeiros, E.B. Jogos para recreação infantil. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961; Melo, V. Folclore infantil. Rio de Janeiro: Cátedra/INL, 1981; Miranda, N. 200 jogos infantis. Belo Horizonte: Itatiaia, 1983; Souza, L.C. Concepção da professora da pré-escola sobre a função dos brinquedos cantados: um estudo descritivo e etnográfico. Rio de Janeiro: EEFD/UFRJ, Dissert. de Mestrado, 1994; INDESP. Esporte como identidade cultural – Coletânea. Brasília, 1996; Marina Vinhas e Beatriz Ferreira (UNICAMP).

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Jogos tradicionais e brincadeiras infantisALEXANDRE MORAES DE MELLO

Definições Jogos e esportes tradicionais são atividadeslúdicas, competitivas e/ou cooperativas, que refletem aidentidade cultural de um determinado grupo étnico,distinguindo-se dos esportes de apelo internacional sujeitos apadrões organizacionais e regras universais. Já os jogos ebrincadeiras tradicionais infantis são atividades passadas degeração a geração, em geral aprendidas pelas crianças maisnovas com as de mais idade, durante o próprio ato de brincar.No Brasil, a denominação de jogo é mais apropriada quandoexiste o caráter competitivo, enquanto que o termo brincadeiraengloba os jogos, mas também atividades não competitivas,como o faz-de-conta, brincadeiras-de-roda, atividades comareia, terra, água, etc. Embora o termo brinquedo tenha sidoutilizado por alguns autores em substituição a jogo oubrincadeira – como, por exemplo, Câmara Cascudo desde aprimeira edição do Dicionário do Folclore Brasileiro, datada de1954 –, os pesquisadores atuais indicam como brinquedo oobjeto utilizado na ação de brincar.

Os jogos tradicionais são também denominados de jogospopulares, sejam aqueles praticados por adultos ou pelapopulação infantil, principalmente por crianças integrantes defamílias menos privilegiadas. Estes ocorrem com freqüênciaem calçadas, ruas, quintais, terrenos baldios e pátios escolares,ao passo que aqueles se tornam parte da vida cotidana de seuspraticantes em seus momentos de tempo livre e de oportunidadede encontro grupal. Focalizando-se o grupo infantil, o de maiorproeminência no Brasil rural e rural-urbano, admite-segeralmente que as brincadeiras de faz-de-conta são atividadesbaseadas nas representações de situações adultas construídaspelas crianças, em geral observadas no seu cotidiano. Sãopraticadas desde cedo, quando as crianças entram na etapadas atividades simbólicas. Exemplos são as brincadeiras decasinha, escolinha, ônibus, vendinha, etc. As brincadeiras-de-roda são acompanhadas por cantigas e possuem certamovimentação do grupo, geralmente disposto em círculo. Sãoexemplos: a canoa virou, atirei o pau no gato, carneirinho-carneirão, ciranda-cirandinha, entrei na roda, fui no Itororó,pirulito que bate-bate, o cravo brigou com a rosa, sambalelê,Terezinha de Jesus e outras.

Origem Os jogos tradicionais são manifestações de criaçãoregional ou nacional mas com raízes de identificação entrepaíses de cultura similar ou mesmo distantes. O surgimento devários desses jogos e brincadeiras infantis está ligado àapropriação pelas crianças e reprodução à sua maneira, depráticas culturais observadas entre adultos. O jogo deamarelinha ou academia parece ter origem na Roma e Gréciaantigas, a partir de práticas culturais de adultos. Na Grécia foiregistrado há séculos o jogo de pedrinhas (jogo das cinco pedras)a partir de desenho numa ânfora exposta no Museu de Nápoles,e anteriormente jogado com pequenos ossos ou em peças demarfim e outros materiais.

Contudo, precisar a origem dessas atividades é impróprio dado aque ela se confunde com a origem dos entes humanos. Daí naobra intitulada “Homo Ludens – O jogo como elemento da cultura”,Johan Huizinga indica que a origem do jogo antecedeu a origemda cultura. Isso porque a constituição da cultura pressupõe aexistência da sociedade humana, enquanto o jogo já aconteceriaentre os animais antes do surgimento do homem. Portanto,

Traditional games and children’s games

Traditional sports and games (TSG) are playful activities,

competitive and/or cooperative, which reflect the cultural identity

of a particular ethnic group. This makes TSG distinct from sports of

international appeal that are subject to organizational standards

and to universal rules and regulations. Children’s traditional games

and plays are activities that are handed down from generation to

generation, picked up by young children during their play with

older children. In Brazil TSG have been either inherited from Native

Brazilians or acquired from European immigrants, especially Italian

and German. Italian bocce, for instance, is the traditional game

most practiced in the country today. Adult TSG have been kept

alive either as a form of leisure or as a way to preserve group and

community identity. It is possible to notice that there has been

some evident reduction in TSG practices in both versions – children’s

and adults’. However, there seems to be another way to preserve of

TSG brought to light by national and international studies: the

pedagogical use of TSG, which would include the development of

sport and physical education.

conhecer os jogos de um grupo humano é conhecer sua cultura ea partir dela conhecer como seus participantes lidam com o jogo.

Século XVI e XVII No Brasil, jogos e brincadeiras na formaencontrada em várias partes do mundo, na sua maioria, indicamter vindo com os colonizadores, muito embora fosse rica a culturalúdica infantil indígena como já observada quando da chegadados primeiros navegantes às costas brasileiras. Há registros debrincadeiras naquele período, como por exemplo, o que expressao depoimento do Padre Fernão Cardin, descrito por FlorestanFernandes na coletânea de textos sobre as práticas educacionaisna sociedade tupinambá: “(...) têm seus jogos, principalmenteos meninos, muitos vários e graciosos, em os quais arremedammuitos gêneros de pássaros, e com tanta festa e ordem que nãohá mais que pedir”.

Semelhante à cabra-cega praticada pelas crianças brasileiras,Philippe Ariès identificou através da análise de uma tapeçaria doséculo XVI, o jogo sendo realizado na França por adultos e, emquadros holandeses da segunda metade do século XVII, observouadultos e crianças que participavam conjuntamente desse mesmojogo. Verificou também, através do diário de um médico da corte deHenrique IV de França, que ainda criança, Luis XIII (nascido em1601) também brincava de cabra-cega, esconde-esconde e outrosjogos. A existência em alguns gráficos da amarelinha, desenhadosno chão pelas crianças e nos quais figuram o céu e o inferno,significando o acesso ao céu resultado de uma jogada bem sucedidae ao inferno de uma jogada errada, aparece em pinturas da IdadeMédia, o que pode indicar ser o registro da influência marcante daigreja católica naquele período.

A cultura brasileira possui fortes elementos de origem africana. OBrasil é um dos países de maior contingente populacional negro domundo. Entretanto, provavelmente pela própria opressão impostaà população negra, não se observam muitos registros quanto àsinfluências na prática dos jogos tradicionais tanto de adultos comoinfantis ao longo do tempo. Através da oralidade, muitos jogos,brincadeiras e brinquedos devem ter recebido influências africanasque se incorporaram à cultura brasileira. Alguns estudossociológicos e antropológicos registram passagens sobrebrincadeiras entre meninos de engenho e meninos escravos nascasas-grandes e senzalas, onde a dominação branca era reproduzidana atividade infantil. No Maranhão, estado de significativapopulação negra, há o registro do jogo capitão-de-campo-amarra-negro, que retrata a captura de escravos foragidos, mas que, porsua vez, possui um determinado espaço físico onde não podem serpegos – a mancha, que provavelmente representa a área deresistência em que se constituíam os quilombos. Entre os jogos deadultos, a capoeira é a herança mais evidente desta fuga lúdica eemancipatória.

Século XIX e XX Em determinadas áreas do Brasil ascolonizações mais recentes, como, entre outras, a alemã e aitaliana no sul, a japonesa e a italiana em São Paulo, atravésda sua cultura trouxeram influências para as atividades lúdicasdas crianças além de introduzir na cultura local seus jogos deadultos. Quanto maior a interação dos imigrantes com apopulação brasileira, mais as atividades se enriqueceram. É ocaso da influência italiana em São Paulo, onde se pode citar acapucheta, um tipo de pipa feita com jornal e sem varetas,como resultante dessa interação entre as crianças. A bocha,

por sua vez, tem tido indicações de ser o jogo tradicional maispraticado no país nos dias presentes, embora seja umamanifestação típica italiana.

Situação Atual Com denominações diferentes e variaçõesem forma, jogos e brincadeiras tradicionais estão presentes emtodas as regiões geográficas do Brasil. Grande número estáconcentrado nas áreas urbanas, principalmente nas periferias,onde há mais espaços físicos disponíveis para adultos e criançasinteragirem de forma autônoma. No meio rural são registradostambém jogos e brincadeiras diversas, porém com estímulossazonais devido às suas características, como, por exemplo, apipa ou papagaio que depende da freqüência dos ventos, ou afinca, jogo em que a criança desloca-se lançando um objetopontiagudo no solo, puxando linhas até completar um percurso,e que depende do chão molhado do período de chuvas.

Os jogos infantis tradicionais mais praticados no Brasil têm sidolevantados e caracterizados por Alexandre de Mello com o apoio decolaboradores de várias regiões do país, como se pode apreciar nomapa deste capitulo. Vários jogos estão preservados nos dias atuaispor interesse de crianças e até de adolescentes. Entretanto, a reduçãodo número de quintais, as questões de segurança, os programastelevisivos e as novas opções de atividades lúdicas através dainformática têm reduzido a sua freqüência de modo sensível.

Como parte das atividades das instituições de educação infantil eséries iniciais do ensino fundamental, as brincadeiras-de-roda sãoem geral orientadas pelas professoras e professores e realizadascom grande entusiasmo pelas crianças. Entretanto, mesmo na escolae principalmente fora dela, a sua freqüência tem apresentadoredução. Quanto aos jogos de adultos, a sobrevivência no Brasiltem ocorrido como uma alternativa de lazer, tanto quanto demanutenção de identidade grupal e comunitária. E em ambas asdimensões – infantil e adulta – a perspectiva revelada por estudosinternacionais (vide mapa) é a do uso educacional dos jogos, o queincluiria no caso o desenvolvimento do esporte e da EducaçãoFísica em qualquer país.

Fontes Mello, A. M. Psicomotricidade, educação física e jogosinfantis. São Paulo: Ibrasa, 2002; Mello, A M. Jogos Populares eeducação física. Boletim de Intercâmbio (SESC/AN) 1981, 8,37-45; Aries, P. História social da criança e da família. Rio deJaneiro: Guanabara Koogan, 1981; Cascudo, L. C. Dicionário dofolclore brasileiro. São Paulo: Melhoramentos, 1979; Fernandes,F. Folclore e mudança social na cidade de São Paulo. Petrópolis:Vozes, 1979; DaCosta, L.P. Mapping the wordwide trends oftraditional sports and games. Proceedings of Symposium onTraditional Games, Duderstadt 2000; Holanda, S.B. Raízes doBrasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1979; Huizanga, J. Homoludens – O jogo como elemento da cultura. São Paulo:Perspectiva, 1971; Medeiros, E.B. Jogos para recreação infantil.Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961; Melo, V. Folclore infantil.Rio de Janeiro: Cátedra/INL, 1981; Miranda, N. 200 jogosinfantis. Belo Horizonte: Itatiaia, 1983; Souza, L.C. Concepçãoda professora da pré-escola sobre a função dos brinquedoscantados: um estudo descritivo e etnográfico. Rio de Janeiro:EEFD/UFRJ, Dissert. de Mestrado, 1994; INDESP. Esporte comoidentidade cultural – Coletânea. Brasília, 1996; Marina Vinhase Beatriz Ferreira (UNICAMP).

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1.36 DACOSTA, LAMARTINE (ORG.). A T L A S D O E S P O R T E N O B R A S I L . RIO DE JANEIRO: CONFEF, 2006

AmarelinhaBoca de forno

Lenço-atrásQueimada

AmarelinhaChicotinhoqueimadoEsconde-escondeQueimada

MALHA

AmarelinhaBoca de fornoEsconde-escondeFincaLenço-atrásQueimadaSela

BOCHAMALHA

AmarelinhaEsconde-escondeLenço-atrásQueimadaSela

BOCHABOLÃO

AmarelinhaBoca de fornoLenço-atrásMãe-da-ruaPique bandeiraQueimada

Boca de fornoQueimada

Boca de forno

CAPOEIRACORRIDA DE ARGOLINHAS

Esconde-escondeLenço-atrás

BOCHABOLÃO

Sela

BOCHABOLÃO

BOCHAMALHAPETECA

MALHAPETECA

PETECA

VAQUEJADA

Boca de fornoChicotinho queimado

CAPOEIRA

AmarelinhaBoca de forno

CAPOEIRA

Boca de fornoFincaLenço-atrás

Boca de forno

Boca de fornoEsconde-esconde

JOGO DE PAU

Boca de fornoQueimada

AmarelinhaBoca de forno

Boca de forno

CORRIDA DE ARGOLINHAS

Boca de forno

CORRIDA DE ARGOLINHAS

Boca de fornoChicotinho queimado

AmarelinhaBoca de forno

QueimadaSela

BOCHAMALHATRUCO

CORRIDAS A CAVALO,COM APOSTAS

Nordeste

DADOS – COPO DE COUROVAQUEJADA

REGATAS DE SAVEIROS E JANGADAS

Sul

TABULEIRO DE DAMAS

TRUCO

Centro-Sul

TABULEIRO DE DAMASDADOS – COPO DE COURO

Região do Pantanal

CORRIDAS A CAVALO,COM APOSTAS

Todo o brasil,em bares

QUEDA DE BRAÇOSINUCA

Norte

VAQUEJADA

*Outros: praças, clubes, balneários, praias, açudes, lagos, rios, salões,quadras de esportes, campos de futebol, áreas residenciais, etc.

Locais de maior freqüência dos jogos tradicionaispor Grande Região e BrasilPreferred places of traditional games practices per region

Principais jogos infantis praticados no Brasil por estado

Major children’s games found in Brazil per state

Principais jogos tradicionais do Brasilpor estado e região

Major traditional games foundin Brazil per state and region

Tendências gerais dos esportes e jogos tradicionais (TSG), 2000(n= 28 países de cinco continentes – 35 especialistas respondentes)

Traditional sports and games (TSG) – General trends – 2000 (n = 28 countries of five continents – 35 respondent experts)

Fonte / source: DaCosta, L.P. , Mapping the worldwide trends of traditional sports and games.Proceedings of Symposium on Traditional Sport and Games, Duderstadt, 2000.

Número médio de crianças participantespor jogo tradicional em Grandes Regiões e BrasilAverage number of participating children per game and region

Jogos tradicionais sazonais e não-sazonais

Seasonal and non-seasonal traditional games – %

Percentuais em Grandes Regiões e Brasil / per region

*População de crianças de 7 a 10 anos no Brasil: 13 182 595Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000.

Idades de maior freqüência na participaçãode jogos tradicionais por Grande Região e Brasil*

Ages of most participating children in TSG per region(n = 13 million) – Brazil 2000