JORGE LUIZ DE FREITAS - Livros Grátislivros01.livrosgratis.com.br/cp034247.pdf · 1.1 INTRODUÇÃO...

153
JORGE LUIZ DE FREITAS A PRÁTICA PEDAGÓGICA DA DISCIPLINA DE CAPOEIRA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR E A SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A FORMAÇÃO DO FUTURO DOCENTE MESTRADO EM EDUCAÇÃO PUCPR CURITIBA 2006

Transcript of JORGE LUIZ DE FREITAS - Livros Grátislivros01.livrosgratis.com.br/cp034247.pdf · 1.1 INTRODUÇÃO...

JORGE LUIZ DE FREITAS

A PRÁTICA PEDAGÓGICA DA DISCIPLINA DE CAPOEIRA NA E DUCAÇÃO SUPERIOR E A SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A FORMAÇÃO DO FU TURO

DOCENTE

MESTRADO EM EDUCAÇÃO PUCPR

CURITIBA 2006

Livros Grátis

http://www.livrosgratis.com.br

Milhares de livros grátis para download.

2

JORGE LUIZ DE FREITAS

A PRÁTICA PEDAGÓGICA DA DISCIPLINA DE CAPOEIRA NA E DUCAÇÃO SUPERIOR E A SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A FORMAÇÃO DO FU TURO

DOCENTE

Dissertação apresentada como exigência parcial para obtenção do grau de Mestre, pelo Programa de Mestrado em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Orientadora: Profª. Drª. Evelise Maria Labatut Portilho.

CURITIBA 2006

3

AGRADECIMENTOS Aos meus pais Anadir e Yvone por nunca terem poupado esforços para que eu

me tornasse o homem que sou.

À minha esposa Sandra, eterna parceira, por entender que toda ausência

sempre é recompensada.

Ao grande colega e companheiro de ideologia, professor Cláudio Miyagima,

pelo incentivo e pela confiança, que muitas vezes foram motivo para não

desistir.

À professora Doutora Marilda A. Behrens pelo amor contagiante com que

leciona, fazendo-nos perceber que “ainda vale a pena”.

À professora Doutora Araci Asinelli da Luz pelo apoio, pelo carinho, pela

amizade, pelo incentivo... por tudo.

À minha orientadora, professora Doutora Evelise M. L. Portilho, pelo nosso

começo turbulento, pelos nossos momentos de mútuo aprendizado, pela

paciência que tanto exercitou comigo.

À toda a minha família e amigos de hoje e sempre, que sonharam este sonho

junto comigo.

4

SUMÁRIO

CAPÍTULO I ........................................ ..................................................................

1.1 INTRODUÇÃO..........................................................................................

01

01

1.2 Histórico da minha prática pedagógica: paixão j ustificada................ 07

1.3 Apresentação da pesquisa....................... .............................................. 14

1.4 Definição e delimitação do problema............ ........................................ 15

1.5 Objetivos ..................................... ............................................................ 16

1.5.1 Objetivo Geral............................... ........................................................

1.5.2 Objetivos Específicos........................ ..................................................

16

16

1.6 Metodologia.................................... ......................................................... 16

CAPÍTULO II........................................ ..................................................................

2.1 A CAMINHADA HISTÓRICA DA CAPOEIRA........ ...................................

19

19

2.2 As “duas Capoeira”............................. ..................................................... 31

CAPITULO III....................................... ..................................................................

3.1 A EDUCAÇÃO FÍSICA FRENTE A EVOLUÇÃO PARADI GMÁTICA DA

EDUCAÇÃO........................................... .................................................................

36

36

3.1.1 A Educação Física e os Paradigmas Conservador es da Educação 36

3.1.2 A Educação Física e os Paradigmas Inovadores da Educação........ 40

3.1.3 A Educação Física e o Paradigma Emergente ou da Complexidade. 46

CAPITULO IV........................................ ..................................................................

4.1 A DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA............

58

58

4.2 O professor formador de professores............ ......................................... 64

4.3 A difícil arte de ensinar e aprender........... ............................................... 67

4.4 A Capoeira na Educação Física.................. ............................................. 70

CAPITULO V......................................... ..................................................................

5.1 O CAMINHO METODOLÓGICO DA PESQUISA....... ................................

75

75

5.1.1 A opção pela pesquisa qualitativa do tipo par ticipante................. 75

5

5.1.2 População / amostra da Pesquisa.............. ........................................... 77

5.1.3 Instrumentos da Pesquisa..................... ............................................... 79

5.1.4 Descrição da Pesquisa........................ .................................................. 80

5.2 Contribuições dos (das) professores (as)....... ....................................... 81

Importância da Capoeira no Currículo do Curso de Ed ucação Física ..... 81

Expectativas dos Acadêmicos na Visão do Docente.... .............................. 83

5.3 Depoimentos dos acadêmicos..................... ........................................... 85

Expectativa sobre a Disciplina de Capoeira ........ ........................................ 85

CAPÍTULO VI........................................ ................................................................. 111

CONSIDERAÇÕES FINAIS............................... .................................................... 111

REFERÊNCIAS....................................................................................................

APÊNDICES..........................................................................................................

119

133

6

RESUMO

A presente dissertação é resultado da pesquisa realizada com alunos e professores da disciplina de Capoeira, no curso de Educação Física de quatro instituições de ensino superior. O objetivo central foi analisar como a disciplina de Capoeira, no curso de Educação Física pode subsidiar a prática pedagógica desta atividade, em ambiente escolar, do futuro docente e apresentando como questão norteadora: O que caracteriza a prática pedagógica do professor de Capoeira no curso de Educação Física e quais as contribuições dessa prática para a formação e aprendizagem do profissional desta área? Para tanto foi realizada uma pesquisa com abordagem qualitativa tipo participante. O estudo demandou a inclusão de uma investigação bibliográfica acerca do histórico de surgimento e evolução da Capoeira até sua chegada aos meios universitários. Foram pesquisados também os fenômenos da evolução paradigmática da Educação frente à Educação Física, a fim de respaldar possíveis considerações sobre o processo metodológico da disciplina de Capoeira nas universidades. Ainda como referencial teórico, focamos o professor de Educação Física, seu papel enquanto formador de professores e seu compromisso com a aprendizagem do aluno. Participaram da pesquisa um total de 135 acadêmicos (as) e 2 professores dos cursos de Educação Física que responderam a um questionário contendo perguntas abertas. Os dados da prática docente no Ensino Superior foram relacionados à posição dos diferentes autores consultados. Na análise dos dados foi possível observar que a Capoeira apresenta-se como uma atividade viável de educação em ambiente escolar e ainda, que há forte influência da postura do docente universitário na formação do futuro professor de Educação Física. O estudo enfatiza a necessidade urgente de uma profunda reflexão crítica da ação dos docentes formadores de professores, visando a elaboração de novas metodologias que possam formar profissionais transformadores e críticos, conscientes de seu papel, conforme as exigências da sociedade. Palavras-Chave: Prática Pedagógica Universitária; Capoeira; Aprendizagem; Educação Física; Formação de Professores.

7

ABSTRACT

The present dissertation is resulted of the research carried through with pupils and teachers of discipline of Capoeira, in the course of Physical Education of four institutions of superior education. The central objective was to analyze as it disciplines it of Capoeira, in the course of Physical Education can subsidize practical the pedagogical one of this activity, in pertaining to school environment, of the teaching future and presenting as main question: What it characterizes practical pedagogical of the teachers of Capoeira in the course of Physical Education and which the contributions of this practical for the formation and learning of the professional of this area? For in such a way participant type was carried through a research with qualitative boarding. The study it demanded the inclusion of a bibliographical inquiry concerning the description of sprouting and evolution of the Capoeira until its arrival to the half colleges student. The phenomena of the paradigms evolution of the Education had been searched also front to the Physical Education, in order to endorse possible resulted on the of educational practices discipline of Capoeira in the universities. Still as reference theory, we have the teacher of Physical Education, its paper while teacher of teachers and its commitment with the learning of the pupil. They had participated of the research a total of 135 academics () and 2 teachers of the courses of Physical Education that they had answered to a questionnaire I contend open questions. The data of the practical teacher in Education Superior had been related to the position of the different consulted authors. In the analysis of the data it was possible to observe that the Capoeira is presented as a viable activity of education in pertaining to school environment and still, that has fort influence of the position of the university professor in the formation of the future professor of Physical Education. The study it emphasizes the urgent necessity of a deep critical reflection of the action of the teacher training aiming at the elaboration of new methodologies that can form transforming and critical professionals, conscientious of its paper, as the requirements of the society. Key Words : Practical Pedagogical College Student; Capoeira; Learning; Physical Education; Formation of Teachers.

CAPITULO I

8

1.1 INTRODUÇÃO

A pesquisa sobre a temática que envolve a Capoeira enquanto prática

pedagógica e ainda conteúdo da Educação Física sempre pautou meus estudos e

nunca esperei que esta fosse uma tarefa tranqüila a ser executada. Porém, ao dar

início a este trabalho, logo percebi que seriam muitas as noites sem dormir a

procura de soluções para as enormes dúvidas surgidas em função dos choques de

teorias e, até mesmo, em função das minhas próprias concepções e conceitos que

já há tanto tempo acompanham minha prática docente e que agora estariam sendo

também passíveis de questionamentos.

Talvez, por ser este mesmo o objetivo da pesquisa científica: provocar

a chamada entropia1, a qual abala as ordens pré-estabelecidas (e aceitas) gerando

desordens para privilegiar o estabelecimento de uma “nova” ordem, agora re-

significada, refletida, re-interpretada, não estagnada.

Nessa perspectiva os estudos foram encaminhados.

Sobre a Capoeira, logo de início observei que se tratava de algo mais

além de simplesmente um conjunto de movimentos corporais de ataque e defesa;

ela evidencia na sua história, nos seus cânticos, nos seus rituais, importantes

contradições que marcam uma sociedade. Conhecida historicamente também como

arma de escravos em busca de liberdade, a Capoeira traçou um longo percurso até

chegar às universidades e ser pautada como conteúdo da Educação Física.

Com o intuito de transpor ainda mais os limites da Capoeira, optei

então pela verificação de sua importância na formação de futuros docentes da área

da Educação Física.

A escassa bibliografia referente a este assunto foi compensada pelo

conhecimento do autor sobre a Capoeira, pois esta temática faz parte da vida deste

1 Originalmente, "entropia" surgiu como uma palavra cunhada do grego de em (en - em, sobre, perto de...) e sqopg (tropêe - mudança, o voltar-se, alternativa, troca, evolução...). O termo foi primeiramente usado em 1850 pelo físico alemão Rudolf Julius Emmanuel Clausius (1822-1888). O conceito de entropia foi introduzido na Ciência há mais de 150 anos, mas somente a partir de meados do Século XX é que se difundiram suas aplicações por diversas áreas do conhecimento. Numa visão mecanicista, a ênfase está unicamente no que se ordena e se desconsidera a desordem causada pela ordenação. É como se ignorássemos, por exemplo, o problema do lixo ao arrumarmos nossa casa.

9

pesquisador. Justifico essa escolha na medida em que pretendo contribuir para a

melhoria na formação de profissionais que possam apresentar essa atividade como

mais um meio para a educação nas escolas.

Campos (1990) afirma que a Capoeira na escola pode ser ministrada

de várias formas: Capoeira luta, Capoeira dança e arte, Capoeira folclore, Capoeira

educação, Capoeira como lazer e Capoeira como filosofia de vida. Para Falcão

(1995), a inclusão da Capoeira nas instituições de ensino superior representa uma

situação inusitada; o que causa admiração é que a sua prática há algumas décadas

atrás era uma ação marginal, passiva de penalidades previstas no Código Penal

Brasileiro. E hoje, fazendo parte da Educação Física, a Capoeira desenvolve

inúmeros valores positivos, como o respeito à pessoa humana.

O professor Boaventura (apud CAMPOS, 1990) cita que a

aproximação entre o currículo e a cultura há de ser sempre uma preocupação

dominante para os educadores. E a educação, para que seja realmente nacional,

há de refletir valores, condicionamentos e ingredientes culturais.

Barbieri (apud CAMPOS, 1990, p.43) apresenta a importância da

Capoeira como educação e chama atenção para a relação entre a unidade e a

totalidade:

Essa relação é um caminho para se observar a Capoeira diacronicamente e nele se dá o encontro entre vários elementos, tais como o exercício físico, a música, a poesia, o canto, o ritmo, a criatividade, a determinação, a coragem, a liderança, o diálogo, a comunicação e outros elementos não menos importantes, contribuindo principalmente para o desenvolvimento do auto-conhecimento.

Portanto, acredito que a Capoeira na escola serve de alicerce para a

busca da cultura e de um maior conhecimento do ser humano e sua relação com a

sociedade. A inclusão da disciplina de Capoeira na Universidade serviu para que o

futuro professor pudesse conhecer essa arte e pudesse perceber que toda

mensagem corporal, se traduzida e interpretada por profissionais conscientes de

seu papel, torna-se sinal evidente da importância desta na formação de cidadãos

críticos e responsáveis.

10

Nesse sentido, cabe a citação de Evelise Portilho (apud FREITAS,

2005, p.6): “quando o professor ama e conhece o que faz, seu ensino se torna a

marca da competência; do compromisso com o outro e consigo mesmo”.

Na década de 1970, no momento do término da graduação, o

profissional estaria pronto para atuar junto ao mundo do trabalho. Essa afirmação

passa a ser superada na década de 1980 quando a graduação não carrega mais a

visão de terminalidade. Assim, todos os profissionais, inclusive os que escolheram a

área da docência, devem estar conscientes de que a formação, a qualificação e a

capacitação são processos contínuos. Nesse sentido, Nóvoa (2002, p.23)

acrescenta que “o aprender contínuo é essencial e se concentra em dois pilares: a

própria pessoa, como agente e a escola, como lugar de crescimento profissional

permanente”.

O docente deve estar o tempo todo a procura de propostas que visem

a melhoria de sua prática, articulando sua formação à realidade na qual vive e atua.

Segundo Behrens (1998, p.63), a construção de uma formação

contínua com base na ação docente junto ao ensino superior, aponta para um

“saber por que fazer”. Pensar em formação contínua nesse contexto implica saber

que a formação profissional não termina na Universidade. Esta lhe aponta

caminhos, fornece conceitos e idéias, a matéria-prima de sua especialidade. Cabe

ao profissional, buscar aprender com sua prática, estudando, pesquisando,

observando e, muitas vezes, errando para obter contribuições que lhe permitam

(re)pensar e (re)formular práticas e metodologias de intervenção que, por

conseqüência, venham a contribuir para a articulação teórico-prática da formação

inicial.

Nesse contexto, cabe a contribuição de Freire (1991) quando afirma:

"Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador,

a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão da

prática" (p.58). Por isso, a formação de professores deve incluir a permissão para a

reflexão e a produção de saberes e valores. A opção

pela especificidade da formação do professor em Educação Física levou-me a

investigar as relações entre a teoria e a prática. Talvez, essa relação seja um dos

maiores problemas da área, pois em geral, a expectativa dos alunos, candidatos a

docentes, focaliza-se na docência com aulas extremamente voltadas à prática e

11

recheadas de momentos de lazer. Outro fator relevante na investigação trata da

urgência desses jovens em se tornar professores para ministrar aulas em

academias de grande porte, numa demonstração de que talvez ainda não consigam

distinguir as propostas de formação de Licenciados e Bacharéis.

Por serem considerados conteúdos relativamente novos na Educação

Física, quando falamos em dança, jogos cooperativos e na própria Capoeira a

situação se agrava, pois como acima comentado, o aluno do curso superior chega à

faculdade com seus objetivos muito interiorizados. Esse aluno, que muitas vezes é

ex-atleta de alguma modalidade esportiva, limita-se a tal atividade e negligencia

outras, esquecendo-se do “todo” de sua formação. Muitas vezes, não consegue

perceber a importância de outras disciplinas ou da articulação entre elas.

Existem ainda aqueles que, mesmo tendo como meta profissional o

exercício da docência escolar, acabam refletindo em sua prática os modelos aos

quais foram submetidos em sua vida escolar, num eterno repetir de discursos e

técnicas.

O grande desafio na entrada do século XXI focaliza-se na formação de

profissionais que superem o acúmulo de saberes para transformá-los,

contextualizá-los e adaptá-los à realidade do hoje.

Esse processo desafiador envolve a necessidade de provocar os

alunos para que re-pensem sua condição de ouvintes e para que se estabeleça

uma nova condição: a de participantes do seu processo de formação. Assim,

pensar a formação profissional do futuro docente de Educação Física esbarra num

aspecto importante que é a postura do professor/formador.

No que tange à Capoeira enquanto conteúdo da Educação Física,

pesa ainda a questão da novidade. A especificidade do tema e principalmente, do

medo que isso acarreta, já que toda inovação gera certa exposição e nem sempre

estamos preparados para isso.

Ramal (1997, p. 11) comenta que numa possível troca de experiências

entre professor e aluno, duas posturas são impensáveis:

Aquele velho medo de errar. O erro deve ganhar novo valor. Aquele que nunca erra nunca é, porque não teve coragem de experimentar uma prática nova, está parado no velho paradigma que já não atende nossos objetivos educacionais. O erro, apesar de frustrante, acena para a possibilidade de um futuro acerto e, portanto, de uma futura melhora na ação pedagógica.

12

*Aquele velho medo de dizer não sei. A prática da troca de saberes pede do professor que ele se livre daquela armação de ‘senhor dos conteúdos’. É importante que o profissional esteja bem preparado, sim, pois ele será sempre um referencial para o aluno. Mas não é mais necessário saber tudo, ter as respostas na ponta da língua – até porque, na Era da informação, isso é praticamente impossível. Bom mesmo é que o professor também se fascine, junto com o aluno, pela pesquisa e pelo novo. Uma postura nesse estilo, desarmada e aberta, nos aproxima muito mais daqueles que orientam e possibilita que sejam construídas relações afetivas mais verdadeiras.

Para tanto, a partir de vinte de dezembro de 1996, com a aprovação

da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (2006) – Lei n. 9394/96, a

Educação brasileira sofreu novas e significativas mudanças, com destaque para a

liberdade atribuída aos Conselhos de Educação, às escolas e aos professores, a

fim de que pudessem organizar e estruturar o ensino. Acredita-se que a nova LDB

surgiu, nesse momento, como ponto de referência às mudanças necessárias à

Educação brasileira com possibilidade de novos projetos, mais ousados e com

característica participante.

A autonomia proporcionada pela LDB para que novos conteúdos

fossem incluídos na proposta pedagógica, possibilitou a opção pela Capoeira como

um dos conteúdos a serem abordados pela Educação Física.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), em relação à Educação

Física também apontam a Capoeira como proposta de conteúdo, uma vez que ela

se encontra no bloco dos esportes, jogos, lutas e ginásticas. Assim, pude observar

a preocupação de algumas instituições de ensino superior em se adaptar a esta

nova realidade. Em Curitiba, espaço delimitado para esta investigação, das seis

Universidades que oferecem o curso de Educação Física apenas uma delas não

tem em sua grade curricular a disciplina de Metodologia do Ensino das Lutas na

qual a Capoeira também é abordada ou trabalhada juntamente com outros estilos

de lutas.

Outro problema que a inclusão da Capoeira enfrenta enquanto

conteúdo da Educação Física, é que por ser um fenômeno recente faz com que

surjam algumas limitações quanto ao docente universitário dessa disciplina. Há, no

momento, dificuldades em se encontrar profissionais que detenham o domínio do

saber empírico da Capoeira, com titulação e aptidão exigidas para a docência

universitária.

13

Esses enfrentamentos levaram à concepção de ensino aplicada e à

forma como estão sendo formados os futuros profissionais da Educação Física

quanto ao ensino das Lutas e, mais especificamente, da Capoeira. Nesse contexto,

mostram-se pertinentes as colocações de Campos (2001, p. 87):

O ensino/aprendizagem da Capoeira não deve ser voltado apenas para o aspecto técnico de aprender determinada forma de luta e de esporte. O ensino dos golpes deve ser acompanhado da transmissão de todos os elementos que envolvem a sua cultura, história, origem e evolução, ao tempo em que se estimulará a pesquisa, debate e discussão, para que o educando tenha uma participação efetiva na Capoeira como um todo. O professor deve estimular constantemente esta prática, oportunizando aos alunos vivenciarem todos os momentos da aula/prática.

O desenvolvimento da Capoeira acompanhou a evolução e

conseqüente mudança paradigmática da Educação, que também são objetos de

análise neste trabalho haja vista a necessidade de uma definição por parte do

docente universitário, de suas ferramentas teóricas.

Como afirma Ferreira (2001, p.16)

É preciso que o professor estabeleça pontos de referência com os quais poderá exercer sua dimensão hermenêutica: atribuir sentidos, produzir interpretações do que vive nas ações pedagógicas desenvolvidas, inserindo-se em uma vertente teórica e tendo condições de propor a continuidade de uma reflexão-ação sobre o seu projeto educativo.

Nesse sentido, os paradigmas da educação são orientadores das

práticas educativas, tais como são lidas na realidade. Constituem-se em estruturas

determinantes não só da forma de conceber a educação, mas de agir

educacionalmente; mesmo que saibamos, e já tenhamos comentado que o aluno

do ensino superior voltado à docência possui o que Carvalho (1992) chama de

“formação docente anterior”, a qual traz à tona, junto à prática do futuro docente, a

reprodução do conhecimento adquirido quando estudante.

De acordo, Campos (1985, p.84) diz que:

Desde cedo se toma contato com as atividades desenvolvidas numa escola, e o indivíduo, ao entrar no curso de formação especializada, já criou uma opinião sobre o que significa ensinar efetivamente, de tal forma que apesar de entrar em contato com as teorias e metodologias mais recentes, emprega

14

mais tarde, quando já em exercícios, técnicas aprendidas quando era estudante.

Daí a importância de conhecer e refletir sobre os paradigmas

educacionais sob pena de haver sérias restrições na efetivação de uma prática

educacional transformadora.

A reflexão sobre as questões aqui apresentadas permite compreender

também que quando se promove a educação, o professor deixa de ser estático

frente a mecanismos de manipulações impostas pela falta de leitura e pelo

comodismo aliados à falta de criatividade durante a prática docente.

1.2 Histórico da minha prática pedagógica: paixão j ustificada .

Como muitas vezes acontece, a prática da Capoeira foi o motivo que

me levou a cursar Educação Física. Lembro-me de, ainda adolescente, ter sido

encantado pela propaganda de uma companhia aérea na qual duas pessoas, sob a

luz do sol (baiano), realizavam movimentos ágeis e de muita beleza plástica: a

Capoeira. Matriculei-me em uma academia e dediquei-me quase que

exclusivamente ao aprendizado de tal arte. Fui atleta dedicado e conquistei alguns

títulos em campeonatos específicos (bi-campeão brasileiro e pentacampeão

paranaense). Nessa trajetória, fui professor de Capoeira antes de entender o que

era ser professor.

Conheci, nessa época (início da década de 1980), muitas pessoas

ligadas à Educação Física e, entre elas, Gladson de Oliveira Silva, Professor que

até hoje ministra aulas de Capoeira no Centro de Práticas Esportivas-CEPEUSP da

Universidade de São Paulo-USP. Mestre Gladson, como é conhecido no meio

capoeirístico, foi um dos primeiros e importantes incentivadores que tive para cursar

Educação Física - o que veio a ocorrer em 1984, quando dei início ao primeiro ano

do curso de Educação Física na Pontifícia Universidade Católica do Paraná-

PUC/PR.

Foi um período de muitos conflitos, pois eu era atleta, professor de

Capoeira que realizava eventos de grande porte social e formava seguidores. O

choque foi inevitável. Na faculdade voltei a ser “apenas” mais um aluno. Comecei a

15

perceber, em meio a muitos embates, minha própria imaturidade e despreparo e me

dei conta de que havia ainda muito mais a aprender.

A faculdade propiciou a percepção da falta de didatismo no ensino da

Capoeira e fez com que minha visão se ampliasse extremamente nesse sentido.

Vale lembrar que na década de 1980, a Educação Física passava por um período

de reformulação “que lhe identificava um caráter pedagógico, orientado por um

movimento de reflexão numa perspectiva social” (BARROS, 2006, p.12).

Nesse sentido, cabe a contribuição de Figueiredo (1997, p.1) que

acrescenta:

(...)a rigor, percebe-se que a produção do conhecimento na Educação Física alcançou a discussão da Educação acerca da democratização da escola e das pedagogias que a permeiam. Esta nova produção visou à orientação que buscasse a superação de uma nova prática baseada em pressupostos eminentemente biológicos e esportivos, até então quadro efetivo na realidade da Educação Física brasileira.

O autor focaliza a preocupação com a dimensão pedagógica,

dimensão esta que até hoje move minhas pesquisas e meus ideais. Sempre

acreditei que a busca pelo aperfeiçoamento técnico, em qualquer esporte, deve

estar articulada a valores educacionais que compreendam o significado da

existência do movimento então realizado e a faculdade de Educação Física acabou

por subsidiar e respaldar cientificamente essa questão.

Como acadêmico, desde os anos iniciais, fui estagiário da Prefeitura

Municipal de Curitiba trabalhando em praças, parques, entre outros locais da

cidade. No bairro de Vilas Oficinas, onde trabalhei junto ao Centro Social Urbano

por 11 anos, mais de 300 alunos por ano puderam vivenciar a Capoeira, incluindo

crianças, jovens e idosos. A comunidade, sensibilizada pelo trabalho realizado,

organizou um abaixo-assinado pedindo minha contratação como funcionário

municipal efetivo. O prefeito da cidade de Curitiba em 1987, Sr. Roberto Requião,

em ação solene durante a inauguração do Projeto Irmão Menor2 aceitou o pedido e

fui nomeado coordenador das atividades com Capoeira no Projeto recém

inaugurado.

2 Projeto Social da Prefeitura Municipal de Curitiba que acontecia em vários locais da cidade visando incentivar a prática de esportes de crianças carentes até 12 anos de idade.

16

A caminhada como docente se intensificou e em 1988, juntamente

com a colega e ex-atleta Elenice Berno, entrei em contato com a professora Araci

Asinelli da Luz (então professora do Departamento de Métodos e Técnicas da

UFPR) tentando apoio para a elaboração da proposta que pedia a inclusão da

Capoeira no currículo da graduação de Educação Física da Universidade Federal

do Paraná-UFPR.

A proposta foi apresentada e aceita, não sem “luta” é claro, pelo

colegiado da instituição. Neste momento, valem as palavras do Professor Cláudio

Miyagima (apud FREITAS, 2003, p.7) que em 1988 era Coordenador do Curso de

Educação Física da UFPR:

Para se ter uma idéia daquele momento, inserir a Capoeira no currículo de um curso de Educação Física, especialmente numa universidade do sul do país, significava ouvir dos profissionais da área da Educação Física algumas indagações, como: isto é coisa para o Nordeste! Temos que considerar a cultura corporal da nossa região! Portanto, pensar em Capoeira no sul do país, que tem raízes étnicas basicamente européias, era algo muito distante. Inseri-la numa formação acadêmica mais ainda, principalmente na UFPR, onde muitos professores tinham vínculos fortíssimos com suas disciplinas, conteúdos, equipamentos e instalações. O clima de reformulação curricular era de muita resistência, mas, por outro lado, favorecidas pela busca da democracia no país, as discussões foram amplas e abertas. Suportes de investigação, como dados coletados junto aos egressos da UFPR e PUC-PR, nos ajudaram nessa mudança. Alguns quadros demonstravam a rejeição quanto ao caráter de obrigatoriedade das disciplinas de Judô e Esgrima, especialmente esta última, pois a Esgrima não havia se consolidado nas escolas e o judô encontrava dificuldades de permanência pela sua ênfase na técnica e não pelo aspecto pedagógico. (...) após muitos debates, conseguimos inserir a Capoeira no contexto destas disciplinas, com o forte argumento de ser uma modalidade culturalmente muito mais enraizada e marcante na história do povo brasileiro do que qualquer outro tipo de luta.

Mais tarde, a Capoeira foi incorporada a outras faculdades que

sentiram a necessidade de enaltecer o currículo de Educação Física com uma arte,

que também é luta, dança, esporte, além de genuinamente brasileira.

Em 1990, fui à Brasília-DF como Técnico da Delegação Paranaense

de Capoeira acompanhando jovens atletas para a participação nos Jogos Escolares

Brasileiros (JEB’s), que já tinha a Capoeira como uma das modalidades incluídas

desde o ano de 1985. Rendendo do então Ministro do Estado da Educação e do

Desporto, Sr. Murilo de Avellar Hingel, o seguinte comentário:

17

Pela concepção, estrutura e desenvolvimento da competição de Capoeira nos JEB’s durante esses anos, podemos notar que não se trata apenas da prática do esporte pelo esporte, mas sim de ser Esporte, a Capoeira, uma forma, uma estratégia, um motivo para realizarmos o processo educativo fundamentado em nossas raízes culturais, um jeito de brasileiro para uma educação também brasileira (apud BARBIERI, 1995,p. 03)

Sobre a inclusão da Capoeira nos JEB’s, Falcão (1996) também

contribui afirmando que a presença desta atividade nos Jogos Escolares Brasileiros

a partir de 1985, foi também um dos grandes motivos para que a Capoeira se

tornasse mais discutida nos contextos educacional e desportivo.

Ainda em 1990, por ter conquistado uma autonomia sobre minhas

ações docentes e acreditar em meus ideais, desliguei-me do grupo de Capoeira ao

qual pertenci durante 14 anos e criei o grupo “Oficina Beija-Flor” no qual, por dois

anos, desenvolvi um trabalho com um maior direcionamento pedagógico.

No início de 1993, encontrei apoio para esse trabalho, que agora

poderia ser alinhado no sentido de auxiliar a prática de um maior número de

colegas e professores de Capoeira que, como eu, tinham o sonho de vê-la

formando crianças e adultos em cidadãos, na Associação Brasileira de Apoio e

Desenvolvimento da Arte Capoeira – ABADÁ-CAPOEIRA, instituição com sede na

cidade do Rio de Janeiro e que tem até hoje como Presidente, o renomado Mestre

Camisa. Homem visionário incentivou-me ainda mais a continuar acreditando no

potencial da Capoeira e no meu próprio potencial enquanto articulador de

pressupostos educacionais até então quase inexistentes na área. Segundo Mestre

Camisa (apud FREITAS, 1997), a Capoeira necessita e merece trabalhos que

dignifiquem sua condição de meio para uma educação infantil que entrelace o

mundo mágico e imaginário da criança à realidade do seu dia-a-dia - o que vinha de

encontro aos meus ideais.

Hoje, sou responsável por todo o trabalho da Capoeira vinculado ao

ensino de crianças na Associação, prestando acessoria aos mais de oito mil

professores de Capoeira infantil dessa instituição.

Paralelamente, mantive o vínculo com as atividades acadêmicas e em

1990 participei como docente do Curso de Extensão Universitária da Universidade

Federal do Paraná intitulado “Importa o que se importa?”, ministrando aula sobre a

18

Capoeira como proposta para o ensino de 1° Grau (ho je Ensino Fundamental).

Esse evento foi muito significativo, pois além de propiciar a discussão sobre a

Capoeira e sua entrada na escola, dentro de uma instituição de renome como a

UFPR, também contou com a presença de grandes nomes da pesquisa científica

junto à área da Educação Física como João Paulo Medina e Valter Bracht, autores

que deram contribuições para o presente estudo e que, naquela época, de pés

descalços participaram de uma vivência prática de Capoeira por mim ministrada.

No ano seguinte novamente participei do curso “A dimensão

educacional da Capoeira”, Extensão Universitária também realizada pela

Universidade Federal do Paraná, junto ao setor de Educação.

Como docente do Instituto de Educação do Paraná, atuei em todas as

séries, sempre apontando o ensino da Capoeira como fator importantíssimo na

transmissão de conceitos sociais, base para a formação do cidadão. Lembrando

que o Instituto de Educação do Paraná foi a primeira escola a instaurar a Capoeira

no sistema de atividades de contra-turno (escolinha) e que foi ali o lugar onde pude

colocar em prática todo um trabalho de pesquisa e experiências feito durante a

graduação.

Mais uma vez os erros foram muitos. Contudo, acreditar na Capoeira

enquanto meio de educação era o motor de minha vida profissional e, assim, logo

aprendi que os erros são necessários para que possamos identificá-los e são

caminhos para a busca de acertos.

Com o trabalho ali desenvolvido, para o qual pude contar com o

envolvimento de toda a comunidade escolar também contagiada pela magia da

Capoeira, a escola servia como “vitrine” do projeto que demonstrava a validade da

Capoeira-Educação, permitindo assim, que eu fosse convidado por várias

instituições de ensino superior para apresentar a Capoeira nesse contexto.

A partir daí surgiu a necessidade de fundamentar a chamada

“Capoeira Pedagógica” e, em conjunto com um grupo de alunos que também

ministravam aulas, por mim orientados, formamos em 1993 o projeto “A arte de

brincar com o próprio corpo”. Esse projeto visava o ensino da Capoeira para

crianças em idade pré-escolar, hoje Educação Infantil. E, logo no primeiro ano de

sua implantação, desenvolveu-se em cerca de quarenta Escolas atingindo

aproximadamente mil e quinhentas crianças. O maior desafio foi convencer

19

pedagogos, psicólogos, fisioterapeutas de que era possível, neste caso aliando a

Capoeira ao lúdico, evidenciar a auto-descoberta levando em consideração o

desenvolvimento motor e a transmissão de valores. Todos esses elementos

articulados à responsabilidade do profissional docente totalizam o trabalho

educacional a que a Capoeira Infantil se dedica.

Nos anos que se seguiram, ministrei aulas direcionadas a crianças de

três a seis anos de idade. O trabalho, além de inovador, era extremamente

gratificante, pois eu aprendi muito com cada criança.

Devido às experiências vivenciadas e à certeza de que a Capoeira

não podia ficar fora do ambiente escolar lancei, em 1997, o livro “Capoeira Infantil: a

arte de brincar com o próprio corpo”. No mesmo ano, a convite da Prefeitura

Municipal de Curitiba, ministrei um curso de capacitação profissional sobre a

Capoeira Infantil para professores de Educação Física que lecionavam em turmas

de pré a 4ª série do ensino fundamental.

Outros cursos ocorreram, como por exemplo, a “Oficina de Capoeira”

pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná-PUC/PR e o Curso de Extensão

“Capoeira” pela Universidade Federal do Paraná-UFPR - ambos realizados em

1999 e, ainda, uma conferência na “VII Clínica de Capoeira” da Universidade de

São Paulo-USP, com o título: “Capoeira, um instrumento psicomotor para a

cidadania”.

Juntamente aos cursos, palestras e oficinas ministrados no início de

2001, fui convidado para atuar como docente da disciplina de Metodologia do

Ensino das Lutas, do curso de Educação Física do Centro Universitário Positivo –

UnicenP.

À frente, novo desafio e nova busca por aprender. Porém, agora

estaria trabalhando com pessoas que queriam ser professores, mas que, muitas

vezes, não tinham interesse em Capoeira especificamente ou que, devido a sua

bagagem cultural, traziam os pré-conceitos acerca de uma atividade que não lhes

tinha sido abordada quando ainda eram alunos em fase escolar.

Hoje, quando encontro ex-alunos da graduação, já professores

convictos, muitos fazem questão de contar as suas experiências trabalhando a

Capoeira em suas aulas, apresentando-a como mais um conteúdo da Educação

20

Física. Tais encontros constituem para mim motivo de orgulho e, é claro, entendo

sua validade.

No ano de 2003, durante a realização de um curso de capacitação

para mais de 100 professores de Capoeira da cidade do Rio de Janeiro e a pedidos

dos mesmos publiquei meu segundo livro: “Capoeira Infantil – Jogos e

Brincadeiras”. Esse segundo livro tem como objetivo principal trazer informações

básicas para que capoeiristas e profissionais da Educação Física possam ter um

referencial inicial de trabalho, tendo em vista a dificuldade em se encontrar

publicações sobre o assunto.

No final do mesmo ano apareceu o convite para ministrar aulas na

Universidade Tuiuti do Paraná – UTP, junto à disciplina Capoeira, ou seja, mais e

mais profissionais teriam o conhecimento de que a Capoeira era uma atividade

importante em sua formação docente.

Ministrando aulas em cursos de ensino superior, para os quais a

legislação exigia titulação, mas principalmente pelo fato de minha busca por

qualificação nunca ter cessado, matriculei-me e fui selecionado em primeiro lugar

para o Programa de Mestrado em Educação Física da Universidade do Porto –

Portugal. Licenciei-me de minhas atividades profissionais e fui à Portugal, onde

concluí os créditos do referido curso. Em meio aos afazeres acadêmicos, que não

foram poucos, ministrei vários cursos de capacitação à professores de Capoeira

atuantes em toda a Europa. Dentre os locais onde os cursos ocorreram estão

Londres, Bruxelas, Paris, Luxemburgo, Portugal e Espanha, numa demonstração de

que a Capoeira encontrou seu espaço no mundo.

A falta de sensibilidade para a Capoeira como manifestação de

cidadania e espírito de desenvolvimento da cultura brasileira impossibilitou a

organização da dissertação de Mestrado junto à Universidade do Porto em

Portugal. Mas, este fato foi superado quando em passeio de férias ao Brasil,

candidatei-me ao Programa de Mestrado em Educação da Pontifícia Universidade

Católica do Paraná – PUC/PR, onde também fui aprovado e hoje apresento este

estudo.

Mais que nunca, entendo-me ciente da necessidade de fundamentar

teoricamente a prática na qual se possa privilegiar a redescoberta, a busca por

novos meios educacionais, aliando não somente o saber científico desta ou daquela

21

disciplina, mas sim uma interação através da qual seja possível o estabelecimento

de relações entre elas.

1.3 Apresentação da pesquisa

Procurando uma delimitação com contornos claros o presente estudo

tem como campo de trabalho a prática pedagógica do professor de Capoeira no

curso de Educação Física e sua influência na formação do profissional dessa área.

Apresentamos a seguir o problema e os objetivos e, no capítulo seguinte

levantamos uma progressão cronológica da história da Capoeira a fim de que se

possa observar sua condição inicial de marginalidade social até sua inclusão como

disciplina em cursos universitários evidenciando uma elitização da atividade, mas

também, e talvez conseqüentemente, a sua valorização enquanto atividade

pedagógica e meio de Educação.

O terceiro capítulo desta pesquisa se destina a investigar a evolução

dos paradigmas da Educação frente à Educação Física, tratando especificamente

dos modelos Conservadores, os Inovadores, o Emergente e do Paradigma da

Complexidade da Educação, sempre observando e explicitando sua relação com o

contexto da Educação Física.

No quarto capítulo, houve a preocupação com a docência no ensino

superior de Educação Física, uma vez que esta pesquisa trata da formação de

professores e, enquanto sujeitos de nossa própria história, trazemos conosco as

concepções que nos serviram de referências. Daí a dificuldade, muitas vezes, de

aceitação de novas metodologias ou propostas de atividades. Este capítulo aborda

ainda as peculiaridades existentes quando se é professor universitário e a arte de

ensinar e aprender quando se está formando outros professores.

O quinto capítulo apresenta a opção metodológica da pesquisa

qualitativa participante, seus pressupostos e encaminhamentos. Descrevemos os

sujeitos da amostra, o campo de investigação e os instrumentos de coletas de

dados. Este capítulo ainda contempla o tratamento e análise dos dados, a partir das

contribuições dos sujeitos pesquisados. Nele destacamos as colocações mais

importantes a fim de melhor ilustrar os apontamentos generalizantes e que

22

subsidiam os comentários feitos pelo pesquisador durante as considerações finais

desta pesquisa.

Finalmente, incluímos no trabalho as Referências e como apêndices,

os instrumentos de coleta de dados e, o modelo do Termo de Consentimento Livre

e Esclarecido.

1.4 Definição e delimitação do problema

Numa busca por espaço entre as diversas áreas do conhecimento, a

Educação Física nas últimas décadas tem desenvolvido grandes estudos. Contudo,

a sociedade exige, emergencialmente, cada dia mais uma Educação Física que

aponte subsídios para a melhoria na qualidade de vida dos indivíduos. Para atender

às exigências sociais é que a formação dos profissionais em Educação Física tem

se mobilizado.

Nesse sentido, a presença da Capoeira, que até então era marcante

em academias, conquista espaço rapidamente nas escolas, embora muitas vezes

com objetivo plenamente técnico.

Em várias instituições de ensino superior do Brasil e até mesmo do

exterior, a Capoeira já pode ser vista como conteúdo inerente à formação docente.

Ao questionarmos os conceitos que estariam sendo lançados a esses

futuros profissionais sobre a Capoeira, em especial, por ser um saber relativamente

novo quando articulado a valores didático-pedagógicos formais, buscamos

investigar o seguinte problema:

O que caracteriza a prática pedagógica do professor de Capoeira

no curso de Educação Física e quais as contribuiçõe s dessa prática para a

formação e a aprendizagem do profissional desta áre a?

Com a problemática estabelecida, buscamos analisar os referenciais

teóricos e práticos das abordagens pedagógicas na Educação e em especial da

Educação Física. Neste processo de pesquisa objetivamos envolver os estudantes

para ampliar a visão que os alunos têm da Capoeira e sua possível influência na

formação desses acadêmicos.

23

1.5 Objetivos

1.5.1 Objetivo Geral

� Pesquisar como a disciplina Capoeira, no curso de Educação

Física pode subsidiar a prática pedagógica do futuro

profissional nessa atividade em ambiente escolar.

1.5.2 Objetivos Específicos

� Investigar como as abordagens pedagógicas propostas durante

as aulas da disciplina de Capoeira podem influenciar na ação

docente do futuro profissional no ambiente escolar.

� Analisar as expectativas que os acadêmicos têm em relação à

disciplina de Capoeira junto à formação universitária.

� Identificar como os alunos percebem a disciplina de Capoeira

na formação do professor de Educação Física enquanto

atividade viável à prática escolar.

� Buscar aproximações entre as contribuições dos professores e

alunos para a formação do futuro docente e a prática do

professor de Capoeira.

1.6 Metodologia

Ao tentar a ampliação da compreensão desta pesquisa optamos pela

adoção de métodos referentes à pesquisa qualitativa visando uma análise

detalhada dos significados e características situacionais apresentadas pelos

sujeitos participantes, em lugar do levantamento de dados somente quantitativos de

características e comportamentos, numa abordagem participante.

Vale lembrar que os conceitos qualitativos e quantitativos não se

anulam mutuamente, pelo contrário, servem para a confirmação um do outro.

Com relação à pesquisa qualitativa, algumas críticas quanto a seus

critérios de cientificidade são feitas. Segundo Demo (1996, p.17) tais critérios são:

24

Coerência: discurso logicamente construído Consistência: qualidade argumentativa Originalidade: contribuição do conhecimento Objetivação: abordagem teórico-metodológica de aproximação da realidade

Para esse autor a intersubjetividade ou “ingerência da opinião

dominante dos cientistas” também se caracteriza como critério para uma possível

falta de cientificidade nas pesquisas.

Porém, para Chizzotti (1991, p.79), “o conhecimento não se reduz a

um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito-

observador é parte integrante do processo de conhecimento e interpreta os

fenômenos, atribuindo-lhes um significado”. O objeto não é um dado inerte e neutro;

está possuído de significados e relações que sujeitos concretos criam em suas

ações.

Triviños (1987, p.120) considera como definição da pesquisa

qualitativa o seguinte:

Por um lado ela compreende atividades de investigação que podem ser denominadas específicas. E por outro, estas atividades podem ser caracterizadas por traços comuns, o que a torna uma ‘expressão genérica’. Esta é uma idéia fundamental que pode ajudar a ter uma visão mais clara do que pode chegar a realizar um investigador que tem como objetivo atingir uma interpretação da realidade do ângulo qualitativo.

Já em relação à pesquisa participante Demo (2000, p.21), contribui

afirmando que esta “é ligada à práxis, ou seja, à prática histórica em termos de usar

conhecimento científico para fins explícitos de intervenção”. Há na pesquisa

participante um componente político que possibilita discutir a importância do

processo de investigação tendo por perspectiva a intervenção na realidade social.

Segundo Brandão (1985), a pesquisa participante vislumbra uma

convergência de atitudes favoráveis à perseguição de objetivos comuns. Nessa

caminhada o pesquisador coloca-se como sujeito, juntamente com o grupo

interessado, e a serviço não do grupo, mas da prática política daquele grupo.

Devemos lembrar que ao reduzir depoimentos a dados estatísticos,

pura e simplesmente, perdemos de vista a questão da subjetividade inerente ao

comportamento humano. A melhor compreensão das relações humanas, de sua

evolução não podem ser retratados tendo como base apenas registros numéricos.

25

De acordo com Chizzotti (1991, p.80), "a pesquisa não pode ser o

produto de um observador postado fora das significações que os indivíduos

atribuem aos seus atos; deve, pelo contrário, ser o desvelamento do sentido social

que os indivíduos constroem em suas interações cotidianas". Sendo até necessário

o conhecimento e o envolvimento do pesquisador com os sujeitos da pesquisa, para

que este entenda e possa interpretar suas colocações.

Interpretar e compreender a realidade dos sujeitos participantes surge

como característica fundamental da pesquisa qualitativa. Ainda que se busque, uma

imparcialidade na transcrição dos depoimentos, os significados dados aos mesmos

sempre estarão ligados aos conceitos do próprio investigador.

Assim, após as definições levantadas, o desenvolvimento

metodológico desta pesquisa levou em consideração alguns fatores descritos por

André & Lüdke (1986, p.1):

Para se realizar uma pesquisa é preciso promover o confronto entre os dados, as evidências, as informações coletadas sobre determinado assunto e o conhecimento teórico acumulado a respeito dele. Em geral, isso se faz a partir do estudo de um problema, que ao mesmo tempo desperta o interesse do pesquisador e limita sua atividade de pesquisa a uma determinada porção do saber, a qual ele se compromete a construir naquele momento. (...) Esse conhecimento é, portanto, fruto da curiosidade, da inquietação, da inteligência e da atividade dos indivíduos, a partir e em continuação do que já foi elaborado e sistematizado pelos que trabalharam o assunto anteriormente. Tanto pode ser confirmado ou negado pela pesquisa o que se acumulou a respeito do assunto, mas o que não pode é ser ignorado.

Partindo deste ponto de vista pretende-se não só reduzir o isolamento

entre a pesquisa, o pesquisador e os sujeitos, como envolvê-los em relações de

caráter mais coletivo propondo, numa ação conjunta trazer contribuições durante o

desenvolvimento da pesquisa e após sua realização.

26

CAPÍTULO II

2.1 A CAMINHADA HISTÓRICA DA CAPOEIRA

Como elemento ativo da dinâmica cultural, a Capoeira hoje em dia

apresenta contornos bem diferentes dos que a originaram. É possível facilmente

observar uma crescente esportização da Capoeira, bem como sua conseqüente

inserção no contexto educacional e isto a tem feito ganhar cada vez mais espaços.

Assim, torna-se salutar que façamos um resgate, ainda que de modo

breve, sobre a história do surgimento e desenvolvimento da Capoeira, afim de que

ela seja devidamente situada como elemento central e objetivo desta pesquisa.

Com a análise bibliográfica verificou-se que, historicamente, o termo

Capoeira é citado pela primeira vez em 1712 por Bluteau em livro publicado em

Coimbra – Portugal, com o título Vocabulário Português e Latino. Desde então

muitas foram as tentativas de definição do termo e dentre elas a mais aceita entre

os pesquisadores é de origem Tupi, apresentada por Soares (1880) como: caa –

mato, floresta virgem, mais puêra – o que foi, que não existe mais. O Tupi da

Geografia Nacional propõe Kapuera como roça abandonada, da qual o mato já

tomou conta, mato renascido (REGO, 1968).

Com o passar do tempo, o termo assumiu novos significados. O mais

presente é utilizado para denominar uma luta apresentada por movimentos ágeis

envoltos por música, ritmo e ginga.

Para Marinho (1956) a Capoeira era praticada pelos Angolas3 como

dança religiosa. Já Rego (1968), diz que a Capoeira é uma invenção dos africanos

no Brasil. Areias (1983), afirma que a Capoeira nasce da necessidade do escravo,

trazido da África para o Brasil, sobreviver à escravidão e, por não possuir armas

suficientes descobriu no próprio corpo um meio de defesa, imitando animais e

estruturas das manifestações trazidas da África.

Como se pode perceber, há ainda uma grande controvérsia sobre o

surgimento da Capoeira, contudo, convém observar a complexidade do assunto

uma vez que pesquisadores (PIRES, 2001; CARVALHO,1999; SOARES,2001;

3 Nomenclatura utilizada no período colonial para definir negros trazidos da região de Angola, na África, para serem escravizados no Brasil.

27

FREYRE, 2003) que defendem que a Capoeira surgiu em terras brasileiras usam o

argumento de que os negros aqui escravizados vieram de diversas regiões da

África e foram trazidos não apenas para o Brasil, mas para outras ex-colônias do

continente americano. Porém, parece não haver registro histórico conhecido do

desenvolvimento da Capoeira nestes locais, somente no Brasil.

Por outro lado, existem aqueles que acreditam na origem africana da

Capoeira (MARINHO, 1956) sendo trazida daquele continente pelos cativos, uma

vez que podem ser encontradas danças e rituais também características de luta. A

partir dessa concepção, a Capoeira seria simplesmente uma variação dessas

danças.

Deve ficar claro, que o objetivo desta análise, não é tomar partido ou

optar por seguir esta ou aquela versão histórica, e sim evidenciar a já comentada

complexidade do tema, entendendo que este já foi abordado por muitos

pesquisadores, dentre eles: Araújo (1997), Capoeira (1998), Carvalho (1999), Pires

(2001), Rego (1968), Areias (1983) e ainda assim não existe consensualidade.

Conta a história que por volta do século XVI, durante o período do

tráfico negreiro, muitos negros foram trazidos de suas pátrias, na maioria províncias

africanas como, Luanda, Congo, Moçambique, Angola, Cabinda, Benguela, entre

outras (REIS, 1988). O caminho era longo e podia se tornar maior ainda se

pensarmos nas condições em que estes negros viajavam, presos aos porões

fétidos e abarrotados dos navios, rumo ao cativeiro e ao sofrimento do trabalho

escravo. Ao chegar em solo brasileiro eram separados de seus parentes e

compatriotas. Justamente com o objetivo de que não se formassem grupos

uniformes capazes de se unirem contra a força opressora (REGO, 1968).

Porém, mesmo pertencendo a grupos com língua, costumes e

tradições diferentes, ainda que oriundas do mesmo continente, no momento em que

eram obrigados a trabalhar e conviver juntos em senzalas pode-se dizer que essa

experiência levou-os a absorver e difundir a cultura uns dos outros.

Há registros em Freyre (2003) que afirmam que os negros

escravizados tinham raramente alguns momentos de descanso e quando gozavam

deste momento aproveitavam para cantar suas canções, cultuar os Deuses

africanos, perpetuando suas raízes. Comenta Sevecenko que (apud

WISSENBACK,1998, p. 85) “o regime escravista determinou a convivência em

28

grupos de trabalhadores escravos e no interior dos quais foram criadas expressões

a eles peculiares”.

A constante vigilância e severa violência empregada contra os negros

foram a marca dos cativeiros brasileiros, que preservaram a cultura de quanto mais

o outro for subjugado, humilhado, castigado, amedrontado, mais controle se tem

sobre ele. De certa forma, esta também foi a mola propulsora para que houvessem

rebeliões nas senzalas. Aos descontentes com este tratamento restava o tronco.

Tronco no sentido literal, onde o escravo rebelde era amarrado e, exposto em

público, era chicoteado quantas vezes fossem necessárias para esquecer idéias

contrárias às de submissão e servidão. Ribeiro (1996) nos reforça estas questões

com as seguintes palavras:

(...) sua rotina era sofrer o castigo diário das chicotadas soltas, para trabalhar atento e tenso. Semanalmente vinha um castigo preventivo, pedagógico, para não pensar em fugas e, quando chamava atenção, recaia sobre ele o castigo exemplar, na forma de mutilação de dedos, do furo de seios, de queimaduras de tição, de ter todos os dentes quebrados criteriosamente, ou dos açoites do pelourinho, sobre trezentas chicotadas de uma vez, para matar, ou cinqüenta chicotadas diárias , para sobreviver (p.120).

Uma saída encontrada pelo escravo à esta situação foi o chamado

Banzo, um suicídio no qual ingeriam terra até morrerem asfixiados. Para evitar este

tipo de atitude, era colocada uma máscara de ferro na boca do escravo que fosse

suspeito de querer cometer suicídio.

Na ânsia de liberdade, e diante da inconformidade com a situação de

maus tratos e principalmente de clausura, os negros escravos acabaram por

perceber que sua única arma contra toda a opressão que sofriam seria o seu

próprio corpo, como se pode observar no comentário de Santos.

Para poderem adestrar seus corpos à vista dos seus senhores, disfarçavam os movimentos da luta numa forma de dança, passando assim uma imagem de simples divertimento, e quando fugiam das senzalas e eram encontrados, procuravam se defender com seus coices, cabeçadas e rasteiras para não serem reconduzidos ao cativeiro (1990, p.35)

29

A partir da percepção de que sua agilidade e destreza corporal

poderiam ser eficazes para empreender fugas, os negros escravos passaram a

enfrentar seus opressores em emboscadas e a refugiar-se em bandos, criando

assim o quilombo, entre os quais o mais famoso foi o quilombo dos Palmares. Os

primeiros registros de quilombo segundo Marques (1989) datam de 1580 e são de

pequenos acampamentos formados por escravos fugitivos na Serra da Barriga (hoje

estado de Alagoas), um local de acesso relativamente difícil que era escolhido por

estes como um esconderijo. Mas ainda segundo ao autor, o crescimento começou a

acontecer quando, devido à invasão holandesa (1630), foram montadas tropas para

a defesa da colônia, sendo oferecida a alforria para os escravos que lutassem

contra os holandeses. Entende-se por alforria, a liberdade concedida ao escravo via

documento escrito por seu senhor (FERREIRA, 2004).

Muitos dos negros alforriados aproveitavam a primeira oportunidade

para fugir em direção a Palmares, onde estava o quilombo considerado uma das

maiores organizações de escravos negros foragidos das fazendas, tendo os

escravos organizado um verdadeiro Estado, nos moldes africanos, constituído de

povoações diversas, mocambos, governados por oligarcas sob a chefia suprema de

um rei (FREITAS, 1984).

Segundo Bueno (1997), talvez Palmares tenha sido o mais

significativo e simbólico dos quilombos, onde nenhum outro lugar a resistência dos

escravos fugidos, obteve tanto sucesso em relação à organização.

Sob a liderança de um negro conhecido como Zumbi, o quilombo dos

Palmares serviu, durante décadas, como abrigo a todos aqueles que lutavam contra

a condição de escravidão, fossem negros, índios e até brancos, chegando a uma

população de milhares de habitantes e ampliando cada vez mais sua força.

De acordo com Capoeira (1998), Zumbi era um grande lutador que

usando as pernas, desarmava e vencia facilmente seus adversários. Analisando

esta colocação é possível imaginar que a Capoeira já poderia estar sendo praticada

na época dos quilombos, porém, é claro, com uma conotação diferente da praticada

atualmente.

30

A presença forte de Palmares levou os governantes, pressionados

pelos grandes senhores de engenho, a decidirem pelo seu extermínio. De acordo

com Reis e Gomes (1996, p.52) “as comunidades dos quilombos representavam um

desafio ao poder colonial”, além de serem a prova do surgimento e persistência de

uma consciência escrava que lutava contra uma hegemonia manipuladora e

opressora. Burlamaqui (apud SILVA, 1993) caracteriza o negro escravo como:

(...) evidentemente superior na luta, pela agilidade, coragem sangue frio e astúcia, aprendidas ali, afrontando os bichos, as feras mais perigosas, lutando mesmo com elas, saltando valados, trepando em árvores as mais altas e desgalhadas, para se acomodar nas suas frondes, pulando de umas ás outras como macacos, onde as nuvens batiam. E tiravam partido disso, tornando-se assim, extraordinariamente ágeis e muito comumente um homem desarmava uma escolta, punha-a em desordem, fazendo-a fugir (p.13).

Os negros refugiados no quilombo de Palmares chegaram a vencer

vinte e quatro expedições chefiadas por capitães do mato (homens contratados

pelos senhores ou pelo governo). Segundo Rego (1968), neste momento já se

ousava afirmar que os negros se utilizavam amplamente do que mais tarde viria a

se chamar de Capoeira, para se defender.

Vários autores (VIEIRA, 1995; REIS, 1996; PINTO, 1995) atribuem a

época dos quilombos, o período de gestação da Capoeira. Mas, em 20 de novembro

de 1697, organizou-se uma expedição com sete mil homens, chefiada por Domingos

Jorge Velho, um bandeirante paulista conhecido por sua astúcia e competência em

capturar e aprisionar escravos, foi convidado pelo governo alagoano para

exterminar por completo os quilombos de todo o país e principalmente o quilombo

de Palmares. E em troca de terras, depois de dez anos de sangrentas batalhas,

assim o fez.

Há quem diga que Zumbi se atirou de um rochedo, que lhe cortaram a

cabeça ou ainda que teria morrido com dois tiros a queima roupa, marcando o fim

do quilombo de Palmares, e eternizando o acontecido como fato importantíssimo na

história da resistência negra contra a escravidão (FREITAS, 1984).

Mais tarde, no início de 1970, a data da destruição do quilombo e

morte de Zumbi, seria definida como Dia Nacional da Consciência Negra, como nos

mostra Vogt (2003, p.44):

31

Em 1971, o poeta gaúcho Oliveira Silveira sugeria ao seu grupo que o 20 de novembro fosse comemorado como o Dia Nacional da Consciência Negra, pois era mais significativo para a comunidade negra brasileira do que o 13 de maio. ‘Treze de maio traição, liberdade sem asas, e fome sem pão’, assim definia Silveira o Dia da Abolição da Escravatura em um de seus poemas. Em 1971 o 20 de novembro foi celebrado pela primeira vez. A idéia se espalhou por outros movimentos sociais de luta contra a discriminação racial e, no final daquela década, já apareceria como proposta nacional do Movimento Negro Unificado.

Mas durante a escravidão os negros não fugiam apenas para os

quilombos, iam também para os grandes centros urbanos, como afirma Wissenback

(apud SEVECENKO, 1998, p.99):

Durante todo o período da escravidão brasileira, as cidades exerceram uma enorme atração sobre os grupos de escravos e forros que continuamente se deslocaram em direção aos núcleos urbanos. Essa atração, que decorria de vários fatores, tinha como chamariz e esteio à existência de aglomerações constituídas por tais segmentos sempre dispostas a abrigar recém-chegados. Costuma-se dizer que estabeleciam territórios negros, espacialidade marcada por laços sociais, estruturas de parentesco e expressões culturais singulares que revelaram fulcros significativos no processo de resistência à dominação escravista e à discriminação social se seguiu.

A chegada às cidades, embora fosse assustadora haja vista a

novidade do desconhecido mostrou a capacidade de socialização do escravo

fugido. A própria extensão da cidade e sua organização social acabava por

propiciar uma forma independente de viver. Algo que o escravo, de certo modo, já

estava acostumado.

Com este movimento de chegada a espaços mais urbanos, Pires

(2001) afirma que a Capoeira deixa de ser prática exclusiva de escravos e passa a

englobar pessoas de diferentes segmentos sociais, como homens livres, imigrantes

e até estrangeiros.

Comenta Capoeira (1998, p.34) que em 1808, a Capoeira passou a

ser expressamente proibida, quando da vinda da Família Real ao Brasil. Aliás, D.

João VI influenciado tanto pelos nobres quanto pelos intelectuais, acreditava que

era fundamental perseguir a Capoeira e toda a cultura local, já que estas

manifestações davam autoconfiança aos praticantes, formando lutadores ágeis e

32

perigosos, além de solidificar a união dentro do grupo sendo um grande empecilho

para os interesses da corte.

Um ano depois (1809) é criada a Guarda Real da Polícia e sob o

comando do Major Miguel Nunes Vidigal passou a amedrontar todos aqueles que

eram adeptos da Capoeira ou de rodas de samba e candomblés, por exemplo.

Segundo Rego (1968) o Major Miguel Nunes Vidigal ficou conhecido como “o terror

dos Capoeiras” devido ao alto grau de severidade nas punições aos que fossem

presos praticando capoeira.

Até metade do século XIX, segundo Holloway (1997), a Capoeira era

utilizada pelos escravos da cidade do Rio de Janeiro em brigas e discussões,

deixando grande número de feridos e mortos. Em 1850, começaram a ocorrer

sucessivas prisões de capoeiras, os quais aterrorizavam a cidade do Rio de

Janeiro, também com a formação das denominadas Maltas, que de acordo com

Reis (2000) eram grupos organizados que, utilizando-se da Capoeira, promoviam a

violência e a desordem servindo aos mais diversos propósitos.

Várias “Maltas” ficaram famosas na cidade do Rio de Janeiro pela sua

constante atuação na vida pública, dentre elas destacaram-se os Nagoas e os

Guaiamus (SOARES, 1994). No cenário político, os Nagoas eram ligados aos

monarquistas do partido Conservador, e os Guaiamus eram ligados aos

Republicanos do Partido Liberal. Para Reis (2000 p. 50), nessa relação é preciso

demonstrar “que tal papel exercido por essas maltas era fruto de uma opção

política, ou seja, quando interessava, servia como um instrumento nas mãos

políticas”.

Como afirma Vieira (1995) os negros capoeiras (no imaginário da

época, considerados maus elementos), bem com aqueles que compartilhavam de

sua revolta, eram incapazes de pensar com autonomia estando, portanto sujeitos à

manipulação política dos propagandistas abolicionistas, estes sim, dotados de

capacidade de reflexão e decisão. Era o preço pago pra que se mantivesse um

certo grau de impunidade.

A Capoeira não esteve iminente só na política, mas também em

momentos importantes, como participação na Guerra do Paraguai (1860-1865)4,

4 Bibliografia indicada para o assunto: DORATIOTO, F. F. M. O conflito com o Paraguai: a grande guerra do Brasil. São Paulo: Ática, 1996.

33

onde foram enviadas centenas de escravos para os batalhões de frente, pois o

exército brasileiro não possuía grande crédito e não conseguia dominar os conflitos

gerados pela guerra. Soares (1993, p.63), nos dá um panorama de como isso

aconteceu:

Os aliados uruguaios e argentinos não estavam preparados para um conflito de grandes proporções em virtude de suas divisões internas. A conseqüência é que foi nos ombros do Exército Brasileiro que recaiu o maior peso do conflito. Com seus efetivos dramaticamente reduzidos, foi necessário, antes de partir para a ofensiva, levar a efeito uma feroz campanha de recrutamento em todos os cantos do país para formar os batalhões de voluntários da pátria.

Como a Guarda Nacional não conseguia manter os conflitos externos,

e era especificamente usada para problemas políticos, os “voluntários” (negros

escravos) eram caçados para servir como praça nas Forças Armadas.“A promessa

de alforria dos escravos engajados na guerra transformou os quartéis militares em

pontos finais das rotas dos cativos que fugiam das fazendas do interior” (id. p.63).

Assim os negros foram mandados em massa para a Guerra do Paraguai e “lá se

fizeram heróis, portadores que eram de sangue frio, audácia e coragem, tendo-se

em conta que as condições da guerra de então exigia muitos combates corpo a

corpo” (MARINHO, 1956, p.16).

Outro fator histórico marcante em relação à Capoeira, segundo

Carvalho (1999), foi a criação da Guarda Negra, sob a inspiração de José do

Patrocínio. Esta guarda se constituía em uma tropa brasileira que era composta de

uma esquadra de negros capoeiristas, prontos para defender a monarquia, além de

lutar a todo custo para honrar e zelar pela Princesa Isabel em demonstração de

agradecimento a 13 de maio de 1888 (dia da abolição da escravidão).

Os capoeiras da Guarda Negra continuaram sendo úteis aos

princípios monárquicos: não houve um comício dos republicanos que não fosse

dissolvido, segundo Areias (1983).

Com a libertação dos escravos o governo baixou o comando para o

extermínio total dos capoeiristas. Os escravos recém-libertos não possuíam

condições de se integrar na comunidade preconceituosa da época, “muitos ex-

escravos não tiveram como ganhar o pão de forma honesta. Inaptos para o trabalho

34

rendoso, eles tiveram que optar entre a insolvência física e moral (...) daí,

degenerar-se a capoeiragem em práticas turbulentas de agressão inopinada e

desforra covarde” (LISANTI FILHO, 1973, p.337).

Na marginalidade e sem trabalho os negros organizavam-se em

grupos poderosos dos quais também faziam parte pessoas da classe média que se

uniam para proteger negócios escusos e fins políticos. Assim, a formação das

maltas, sua utilização em tumultos contribui para que a Capoeira fosse

marginalizada.

Com a instalação do governo republicano provisório, os capoeiras

foram novamente perseguidos de forma severa, sendo um dos principais alvos de

repressão policial no início da república, recebendo, na revisão do Código de 1890,

por meio do Decreto n° 847, sob o título “Dos Vadio s e Capoeira”, a seguinte

sanção:

Art. 402. Fazer nas ruas e praças públicas, exercícios de agilidade e destreza corporal conhecidos pela denominação de capoeiragem; andar em correrias com armas ou instrumentos capazes de produzir lesão corporal, provocando tumultuo ou desordens, ameaçando pessoa certa ou incerta, ou incutindo temor de algum mal: Pena – De prisão celular de dois a seis meses. Parágrafo Único. É considerada circunstância agravante, pertencer o capoeira de algum bando ou malta. Aos chefes ou cabeças se imporá a pena em dobro. (...) (CÓDIGO PENAL BRASILEIRO apud VIEIRA,1995, p.93)

Esta situação se arrasta até o início do século XX e neste espaço de

tempo a Capoeira passa a ser praticada “às escondidas”. Aos poucos vai ganhando

adeptos ilustres e embora ainda fosse vista como atividade marginal, despertava

algum encantamento, iniciando uma nova fase no seu desenvolvimento histórico.

De acordo com Rego (1968, p.03) a Capoeira antes pautada pela

criminalidade e obscuridade social adentra um novo mundo, o da cultura, “por mais

que tentemos não pensar, estes dois mundos como separados, o dualismo, que

tem caracterizado o pensamento cientifico e também o senso comum, possibilita

arquitetarmos essa transição”.

Nesta medida o significado social da Capoeira transforma-se conforme

muda o significado do negro e, sendo assim, em 1930, com o advento do Estado

35

Novo a Capoeira é liberada no Brasil. Foram séculos de perseguição até as

modificações ocorridas na década de 1930.

Em 1937, comenta Araújo (2000), mais precisamente em uma Quarta-

feira, {dez de novembro} é implantado o chamado Estado Novo, regime criado sob

a presidência de Getulio Vargas (1937 – 1945). Ainda de acordo com Araújo, o

regime fora inspirado em doutrinas políticas de todo mundo. A política em vigor

tinha como um de seus ideais, o principio de que o Estado deveria ser superior à

sociedade e ao individuo.

Segundo Carvalho (1999) Getúlio Vargas necessitava de apoio

popular e objetivando a integração do país acabou por liberar várias manifestações,

entre elas a Capoeira. Como a violência estava ficando incontrolável nos centros

urbanos, a permissão da prática da Capoeira restringiu-se ao ambiente fechado das

academias.

Neste momento histórico a Capoeira passou a ser vista também pelos

seus aspectos positivos, ou seja, esta era fruto da mestiçagem ocorrida no Brasil e,

portanto, algo genuinamente brasileiro. Este discurso em favor da mestiçagem foi

ganhando força na medida em que as autoridades notaram a inviabilidade de negar

o grande contingente negro que o Brasil possuía (MELLO, 2000).

Pode-se dizer que a descriminalização da Capoeira ocorreu também

através de sua esportização. Era necessário colocá-la dentro dos valores aceits

pela classe branca e assim ampliar sua aceitação.

Na ânsia de afastar a visão de atividade marginalizada e delinqüente

imposta pela sociedade, surge Manoel dos Reis Machado, Mestre Bimba, com uma

proposta inovadora para a Capoeira. Ele teria incorporado à Capoeira denominada

posteriormente de Regional, elementos de outras lutas como “a luta greco-romana,

jiu-jitsu, judô, além de golpes do chamado batuque (luta nordestina, que seu pai foi

lutador), perfazendo assim um total de 52 golpes” (REGO,1968, p.33).

A Capoeira Regional segundo Falcão (1996, p.68), teria sido

influenciada, pela Educação Física e pelo militarismo que estavam em ascensão na

década de 30 (como veremos no capítulo 3). A prova da influência militarista é

percebida em uma das etapas do “curso” de Mestre Bimba, o treinamento de

guerrilha (emboscadas) realizado nas matas.

E assim, como nos conta Vieira (1995):

36

A primeira academia de capoeira foi fundada por Mestre Bimba em 1932, em Salvador no Engenho Velho de Brotas, com o nome de ‘Centro de Cultura Física e Capoeira Regional da Bahia’. Essa academia foi a primeira a receber a autorização oficial para o ensino da capoeira, em 1937, ano da decretação do Estado Novo. O mesmo documento, expedido pela Secretaria de Educação, Saúde e Assistência Pública do Estado da Bahia reconhecia Mestre Bimba como o professor de educação física (p.138).

A Capoeira sai, então, de seu cenário natural a caminho de ambientes

fechados. Essa passagem reflete mudanças que podem ser observadas na

descrição de Rego (1968):

(...) como o advento de Mestre Bimba, que tira a capoeira dos terreiros e a põe em recintos fechados, com o nome e caráter de academia, onde os ensinamentos passaram a ter um cunho didático, (...) a capoeira passou por modificações profundas. A classe média e a burguesia para lá acorreram, a princípio para assistirem as exibições e depois para apresentarem e se exibirem a título de prática de educação física, daí a 9 de julho de 1937 o governo oficializar a capoeira, dando a Mestre Bimba um registro para sua academia. Um status social superior ao dos capoeiras invade as academias e os afugenta. Os que resistem, por minoria, se esforçam para se enquadrarem no modo de vida invasor, porém sendo tragados por ele, começando assim a sua alienação e decadência como capoeira. Forçando uma compostura de rapaz-família, exibem-se somente em recintos fechados, salões burgueses, palácios governamentais e jamais onde primitivamente se exibiam, como nas festas do largo (p.361).

Após diversas inovações e o contato com diferentes meios, foram

geradas inúmeras discussões sobre as mudanças ou a perda das raízes da

Capoeira. Preocupados com a legitimação da Capoeira alguns mestres

tradicionalistas, discutiram quanto ao modo de praticá-la. A partir daí, dividiu-se em

duas vertentes: Capoeira Regional e Capoeira Angola. Sobre este fato, Falcão

(1995) comenta:

Mestre Bimba pode ser considerado um divisor de águas na história da capoeira. Para muitos mestres angoleiros, Bimba foi o grande deturpador da capoeira. No entanto, para os seus seguidores, um dos herdeiros diretos de Zumbi” (p.20).

37

Enquanto outras figuras conhecidas da Capoeira como Vicente

Ferreira Pastinha, o mestres Pastinha, defensor da capoeira tradicional (Angola),

insistia na origem africana da Capoeira e na impropriedade de sua fusão como

outras lutas, mestre Bimba (Capoeira Regional), reivindicava a origem baiana da

luta e defendia a incorporação de movimentos corporais provenientes de outras

modalidades esportivas, Reis (2000, p.96,97).

Mestre Bimba, por meio da Capoeira Regional, sofreu influências da

cultura popular baiana no seu desenvolvimento, havendo assim uma mudança dos

objetivos e de conceitos. Já mestre Pastinha não deixou que a Capoeira Angola

sofresse alterações, pois ela foi criada por intermédio da união de conceitos de

vários povos africanos e sendo assim, deveria continuar com a sua própria

identidade, que fosse voltada a cultura negra e suas raízes na antiga África.

Momento que, explica Vieira (1995, p.87), para alguns praticantes tornou-se

confusa, havendo divergências quanto sua classificação. Na mesma visão, Pires

(2001, p. 250) cita que a criação da regional, sem dúvida, produziu conflitos internos

e fissuras na comunidade da capoeira. Ademais, houve um conflito de concepções,

de espaço entre “as ruas” e “as academias”, o que acabou acarretando uma ruptura

entre os grupos, demonstrando interesses contraditórios, como a manutenção das

raízes e a carência da circularidade.

Podemos levantar pontos interessantes sobre o comparativo das

distintas “linhagens” da Capoeira. Primeiramente, percebe-se a solidificação de

frentes distintas, não ao que se refere quanto seu modo de movimentação física

(ginga) ou quanto seu objeto no ritual do jogo, mas sim quanto ao respeito, das

concepções políticas, da identidade cultural.

Verificando a disposição da Capoeira Angola, evidenciam-se pontos

que chamam nossa atenção, como o envolvimento do misticismo e da religião e da

religião, a preocupação com ritual da roda, o predomínio da dança, a presença da

malícia. O que demonstra a direta ligação com as tradições, o enraizamento a

cultura negra, sem oferecer espaço para novas influências ou tendências como as

técnicas marcializantes mais agressivas, a ênfase na competição, na luta.

Processos no qual, os tradicionalistas encaram como uma descaracterização, o que

na verdade se trata apenas de um ciclo de transformação, onde a participação de

38

diversas classes sociais absorve diferentes experiências, o que resulta na

consolidação de uma única cultura.

2.2 As “duas Capoeiras”

A Capoeira Angola apresenta características e estética própria, onde

os capoeiristas se expandem em gestos e movimentos, traduzindo uma mistura de

dança e luta com golpes, rasteiras, com beleza de movimentos.

Mas ainda há uma grande controvérsia em torno da Capoeira Angola,

o que faz com que este seja um dos mais difíceis, senão o mais difícil para se

discutir na Capoeira. Muitos capoeiristas ainda acreditam que a Angola é

simplesmente uma Capoeira jogada mais lentamente, menos agressiva e com

golpes mais baixos, com maior utilização do apoio das mãos no chão. Outros

explicam que ela contém o que há de essencial da filosofia da Capoeira. Há ainda

aqueles que, mais radicais, chegam a afirmar que a Capoeira Angola foi

completamente superada na história dessa arte-luta pelas técnicas mais modernas,

que seriam mais eficientes e adequadas aos tempos atuais.

Mestre Pastinha, em seu livro Capoeira Angola, (apud VIEIRA, 1995)

afirma que “sem dúvida, a Capoeira Angola se assemelha a uma graciosa dança

onde a ‘ginga’ maliciosa mostra a extraordinária flexibilidade dos capoeiristas. mas,

Capoeira Angola é, antes de tudo, luta e luta violenta” (p.32).

É importante observar que, tradicionalmente, o ensino da antiga

Capoeira Angola ocorria de maneira vivencial, isto é, de forma espontânea, sem

qualquer preocupação metodológica. Os mais novos aprendiam com os

capoeiristas mais experimentados diretamente, com a participação na roda.

Atualmente, a maior parte dos capoeiristas refere-se à Capoeira

Angola com uma das formas de se jogar Capoeira, não propriamente como um

estilo metodizado de Capoeira. Para os não iniciados nesta luta, é importante

lembrar que a velocidade e outras características do jogo da Capoeira estão

diretamente relacionados com o tipo de “toque” executado pelo berimbau

(instrumento rústico composto por uma verga de madeira, um fio de aço e uma

cabaça). Entre vários outros, existe aquele denominado toque de Angola, que tem a

39

característica de ser lento e compassado. Dessa forma, “jogar Angola” consiste, na

maioria dos casos, em jogar Capoeira ao som do toque de Angola. Este cenário, no

entanto, vem mudando, com a enorme proliferação dos fundamentos dessa

modalidade (VIEIRA, 1995).

Dessa forma, a maior parte das academias e associações de Capoeira

do Brasil, ao realizarem suas rodas têm o hábito de dedicar algum tempo ao jogo de

Angola, que nem sempre corresponde àquilo que os antigos capoeiristas

denominavam Capoeira Angola.

Portanto, afirma Vieira (1995), o jogo de Angola caracteriza-se por

uma grande utilização das mãos como apoio no chão, e pela execução de golpes

de pouca eficiência combativa, mas baixos e mais lentos, realizados com um maior

efeito estético pela exploração do equilíbrio e da flexibilidade do capoeirista, como

também afirma Couto (1999):

A ginga é a base dos movimentos da capoeira Angola; o corpo dança e luta ao mesmo tempo, ela impede o confronto direto entre os capoeiristas. É a partir dela que sairão os golpes e contragolpes, o alvo do ataque é a cabeça do outro, os corpos não se tocam, apenas as mãos e os pés devem tocar o chão (p.18).

Por sua vez, a Capoeira Regional é caracterizada pela agilidade de

seus movimentos, bem como a variedade bem maior do que os da Capoeira

Angola. Mestre Bimba colocou mais agilidade nos movimentos da Capoeira Angola,

pois queira ver um jogo alegre, festivo, acrobático e, principalmente, ágil. Colocou,

também, algumas influências do batuque, dando ainda mais agilidade à luta. Tudo

isto aconteceu por volta do ano de 1928 (ALMEIDA, 1994) e, esta modalidade de

Capoeira ganhou, primeiramente, o nome de Capoeira Regional Baiana por ser, na

época, praticada somente em Salvador e, a partir da década de 1930, quando foi

instituído o Estado Novo e Mestre Bimba levou o seu estilo de Capoeira para as

classes mais privilegiadas da sociedade e quando fez, como já comentado, a

primeira apresentação no Palácio do Governo, onde estavam presentes várias

autoridades importantes e muitos convidados da ‘alta sociedade’. Após este evento,

a Capoeira Regional foi reconhecida como esporte nacional e Mestre Bimba foi

reconhecido pela Secretaria de Educação e Assistência Social da Bahia como

professor de Educação Física e a sua academia/escola passou a ser conhecida por

40

lei, em 1932 como a primeira do Brasil. Sendo assim, “a Capoeira Regional é

esporte, porque é um conjunto de exercícios físicos praticados com métodos, em

todos os estados da Federação” (COUTO, 1999, p 24).

O estilo Regional de jogar Capoeira é marcado pela rapidez de seus

golpes e contra-golpes e pelo ritmo acelerado dos toques do berimbau

acompanhado do atabaque e do pandeiro. Na roda de Capoeira Regional,

atualmente, são utilizados três berimbaus (Gunga, Médio e Viola), acompanhado do

atabaque, de dois pandeiros; e as palmas do povo da roda são batidas em três

compassos. E é somente na Regional que existe o “toque de Iúna”, que foi criado

por Mestre Bimba para o jogo dos discípulos graduados e do Mestre. A Capoeira

Regional de Bimba passou a ser ensinada até mesmo em quartéis, universidades,

clubes sociais, e outras instituições públicas sem interferência dos “moralistas” da

época.

Os movimentos da Capoeira Regional são diferenciados e mais

variados do que os da Angola e alguns dos mais rápidos e perigosos são: armada,

queixada, meia lua de compasso, meia lua solta, bênção, martelo, arrastão, meia

lua de frente, aú, pisão rodado, joelhada, giro de costas entre outros.

Para melhor compreensão desse embate de concepções, apresenta-

se nas obras de Vieira (1995 p.87/88) e Reis (2000, p.192-194) esquemas que

facilitam o entendimento das principais diferenças ente a capoeira angola e a

capoeira regional (quadros 1 e 2).

QUADRO 1. Comparativo capoeira angola e regional.

Capoeira Angola (tradicional) Capoeira Regional

Original Descaracterizada

Tradicional Moderna

Jogo baixo Jogo alto

Jogo lento Jogo rápido

Recreativa e maliciosa Agressiva e sem malícia

Envolta de religiosidade e misticismo Secularizada e isenta de simbolismos

religiosos

Integração à cultura negra Expressão da dominação branca

41

Praticada pelas camadas sociais

marginalizadas

Praticadas pelos estratos sociais

médios e superiores

Fonte: (VIEIRA, 1995)

QUADRO 2. Comparativo entre capoeira angola e regional.

Capoeira Angola (tradicional) Capoeira Regional

Movimentação constante pela ginga

baixa

Movimentação constante pela ginga

alta

Os jogadores mantêm-se

aparentemente na defesa e atacam

quando o oponente menos espera.

Jogo centrado no ataque.

Alvo é a cabeça do outro Alvo é a cabeça do outro

Os corpos não se tocam Quando não há espaço suficiente o

capoeirista deve usar os golpes

atingindo o corpo do outro

A intenção deve ser sempre

desequilibrar o outro, o que acontece

menos pela forca muscular e mais pela

malícia.

A intenção deve ser sempre de

derrubar o outro, em geral com golpes

desequilibrantes.

Há uma ênfase na dança Ênfase na luta, pois os movimentos

são traumatizantes

Fonte: (REIS, 2000).

De fato, Vieira (1995) afirma que delimitar a separação entre essa

duas escolas da Capoeira é algo muito difícil hoje em dia, e há muitos anos sabe-se

que a tendência é que a Capoeira incorpore as características dessas duas escolas.

No entanto, é fundamental que os capoeiristas conheçam a sua história, para que

possam desenvolver sua luta de maneira consciente. A Capoeira Angola e a

Capoeira Regional estão fortemente impregnadas de conteúdo histórico, e não se

excluem, ao contrário, completam-se e fazem parte de um mesmo universo cultural.

Devemos entender as diferenças entre a Capoeira Angola e a

Regional como conseqüência de um período histórico em que o contexto e as

influências sociais foram sendo determinantes para que elas ocorressem, uma

42

vertente não anula a outra nem tampouco a ela se sobrepõe, ambas se

complementam, “formando o universo simbólico e motor da Capoeira” (MELLO,

2000, p.05).

A partir dos anos de 1960, em decorrência da migração de

capoeiristas baianos para vários estados brasileiros, (principalmente São Paulo e

Rio de Janeiro) começaram a surgir os grupos de Capoeira. Esses grupos são

organizações existentes até os dias de hoje, que congregam seus participantes sob

princípios filosóficos e técnicos, princípios estes que não são hegemônicos. Isto

explica a grande quantidade de grupos existentes.

Segundo Santos (1990), em 1972 a Capoeira é registrada como

prática desportiva regulamentada pela Confederação Brasileira de Pugilismos, a

partir daí a modalidade vem sendo valorizada progressivamente, conquistando

espaço no cenário artístico, esportivo, cultural e educacional do Brasil.

Após os períodos aqui explicitados, a Capoeira perpetuou-se

alcançando outras esferas, conquistou lugar na promoção da saúde, em debates e

encontros acadêmicos, e principalmente na sua inserção como meio pedagógico,

chegado a ser ministrada como disciplina curricular de Cursos de Educação Física.

Fato este que será melhor argumentado no capítulo três deste trabalho.

43

CAPÍTULO III

3.1 A EDUCAÇÃO FÍSICA FRENTE A EVOLUÇÃO PARADIGMÁTI CA DA

EDUCAÇÃO

3.1.1 A Educação Física e os Paradigmas Conservado res da Educação

Para o entendimento do processo que deu crédito à Capoeira

enquanto disciplina dos currículos de cursos de Educação Física é necessário que,

inicialmente, verifiquemos todo o processo de desenvolvimento da própria

Educação Física como curso superior e sua articulação às abordagens

educacionais.

No período histórico brasileiro entendido como Primeira República

(1889-1930) a Educação Física surge como disciplina curricular. Sua função era

higienista, ou seja, era necessária para a saúde e assepsia social e saneamento

público, na busca de uma sociedade livre de doenças, através da disciplina escolar

(Tolkmitt, 1996).

De acordo com Costa (apud CASTELLANI,1991, p.42), o objetivo da

Educação Física era “assegurar a saúde e o vigor dos corpos, aumentando a

reprodução e longe dos indivíduos, incrementar a população do país e melhorar os

costumes privados e a moral pública”.

Crespo (1990) também afirma que o exercício desempenhava um

papel fundamental na conservação da saúde. Esta importância resultava,

especialmente, da sua capacidade para dinamizar o calor natural, fator decisivo no

aumento da transição que facilitava a eliminação da matéria prejudicial ao corpo.

A Educação Física neste contexto era militarista, além de que

higienista, ou seja, objetivava também a preparação militar, a disciplina cívica, o

endurecimento do corpo e o aumento da energia física: homens fortes para a

defesa do país e adestrados para o combate. A Educação Física era a instrução

física militar.

De acordo com Tolkmitt (1996, p. 176), na Educação Física militarista

o professor:

44

(...) era o modelo que o aluno reproduzia passivamente, pois este era adestrado e apenas executava as prescrições do professor (...) Os exercícios eram repetitivos, mecânicos, extraídos de um rol de receitas. A avaliação se dava pela reprodução de um modelo atleticamente bem configurado e/ou através de uma bateria de testes pré-determinados pelos poderes públicos.

A educação como um todo estava pautada num paradigma

conservador tradicional, onde a apropriação e transmissão do conhecimento são

compromissos que devem ser transmitidos pelos professores através de conteúdos

e de modelos pré-determinados.

Nesta perspectiva, é possível perceber a escola como um ambiente

disciplinado, sem muito estímulo, onde o aluno não poderia ser distraído sob pena

de prejudicar sua aprendizagem estabelecendo-se assim, uma relação de

dependência com o professor pela forma de transmissão e repetição das

instruções. O professor, nesta concepção, é o centro do processo de ensino,

atuando com severa autoridade, para garantir que todos os alunos aprendam em

condições iguais.

Behrens (2005, p.43) afirma que a abordagem tradicional “é

referendada por uma visão cartesiana, onde a metodologia fundamenta-se em

quatro pilares: escute, leia, decore e repita”.

Com relação à Educação Física, os pressupostos higienistas

determinavam um novo modelo de homem também fundamentado numa visão

cartesiana mecanicista onde corpo e mente são vistos como duas coisas distintas.

A partir da década de 1930, com a chegada de Getúlio Vargas ao

poder, surgem novas concepções de como deveria ser o novo homem brasileiro, a

chamada “retórica do corpo”, ou seja, corpos adestrados em defesa da Pátria. Para

Araújo (2000, p.13) a filosofia de Vargas dizia que o patriotismo constituiria a nação.

Assim como a política, nesta época a educação também sofreu

transformações e a abordagem em voga era a Escola Nova.

A pedagogia da Escola Nova parte das relações entre o sujeito e o

seu meio tendo como preocupação principal as diferenças individuais.

O ensino deixa de centralizar-se no professor para focar-se no aluno,

entendendo que é preciso levar em consideração seus anseios e necessidades.

45

Sobre estas considerações Ferreira (1999, p, 7) trás sua contribuição afirmando que

a escola, no contexto escolanovista “deve ser ativa e basear-se no princípio da

necessidade constituindo-se num ambiente estimulador, capaz de mobilizar a

atividade do aluno e catalisar as energias necessárias ao seu auto-

desenvolvimento”.

A Educação Física, por sua vez, demora a se desvencilhar dos antigos

conceitos militarizantes de educação, voltados ao físico, à formação do homem

obediente e adestrado, desprivilegiando a reflexão teórica (BETTI, 1991). Mas vai

gradativamente atendendo as mudanças políticas e econômicas do período,

enfocando o esporte com mais precisão, tornando-o meio para a construção de

“máquinas humanas” a serviço da Pátria.

A Escola Nova propunha o oferecimento de condições que

facilitassem o aprendizado do aluno, tornando-o responsável por sua própria

aprendizagem. Como comenta Mizukami (1986, p.45):

Tudo o que estiver a serviço do crescimento pessoal, interpessoal ou intergrupal é educação. O objetivo da educação será uma aprendizagem que abranja conceitos e experiências, tendo como pressupostos um processo de aprendizagem pessoal. Nesse processo, os motivos de aprender deverão ser do próprio aluno.

Na teoria, esta visão focada nos interesses do aluno era muito bem

aceita e podia ser perfeitamente adaptável em aulas de Educação Física. Assim,

este passou a ser objetivo descrito em planos de ensino da época da disciplina,

porém não era o que acontecia na prática pedagógica dos docentes, ministrada

quase que somente sob a forma de atividades esportivas (BARROS, 2006, p.20).

Já na década de 1960, muitas foram as mudanças políticas ocorridas

no Brasil e com o forte impulso na industrialização, a educação brasileira sofre

grande interferência de educadores americanos. Estes educadores juntamente com

o governo brasileiro implementaram a Lei 5692/71 e divulgaram os pressupostos da

chamada abordagem Tecnicista.

Tal abordagem baseia-se em princípios como a racionalidade, a

eficiência e a produtividade em contraposição aos ideais então propostos pela

Escola Nova.

46

Para Libâneo (1986, p.31) “a pedagogia Tecnicista foi introduzida

efetivamente no final dos anos 60, como o objetivo de adequar o sistema

educacional à orientação político-econômica do regime militar: inserir a escola nos

modelos de racionalização do sistema de produção capitalista”.

Assim, a escola passou a ser utilizada como meio de preparação de

mão-de-obra. O objetivo maior do aluno era sair da escola com uma profissão nas

mãos, tendo a exata noção do quão estaria sendo útil para a sociedade. O ensino

era funcional.

A Educação Física logo foi contagiada pelos ideais tecnicistas. Neste

período a competitividade é elevada. A Educação Física é colocada como apêndice

de um projeto que privilegia o treinamento desportivo para o esporte de alto nível,

onde marcada pela ditadura militar acaba se tornando propagandista do governo,

onde o professor é o técnico e o aluno o atleta (BRACHT, 1992).

Na escola, as aulas de Educação Física enfatizam a busca de talentos

esportivos, a performance, a quebra de recordes, a vitória sempre, ao mesmo

tempo em que preparava indivíduos para a manutenção da força de trabalho.

Bracht (apud MOREIRA,1991, p.175) fala da Educação Física

tecnicista enquanto servidora das idéias políticas vigentes no período:

(...) essa forma de transmitir onde o esporte educa, se educação aqui significa levar o aluno a internalizar valores, normas de comportamentos, que lhe possibilitará se adaptar à sociedade vigente. É uma educação que leva ao acomodamento, ao fatalismo e não ao questionamento; uma educação que ofusca ou lança uma cortina de fumaça sobre as contradições da nossa sociedade. Uma educação que não leva à formação de um aluno crítico, consciente e sensível a realidade que o envolve.

Até o final da década de 1970 estes foram os ideais de educação

propostos para a Educação Física. Pode-se perceber que urgia a necessidade de

mudanças e estas aconteceram já no início de 1980 como veremos a diante.

47

3.1.2 A Educação Física e os Paradigmas Inovadores da Educação

No início da década de 1980 a Educação Física atravessa um período

de reformulação e redirecionamento metodológico. Surgiram questionamentos

sobre o pensamento dominante (conservador) o que favoreceu o surgimento de

novas propostas.

De acordo com Falcão (1996, p.57) nesta época (1980) começaram a

aparecer indícios de medidas que promoveriam significativas mudanças nos

currículos dos cursos superiores de Educação Física. O processo de

desmilitarização da Educação Física amenizou o comportamento autoritário e

hierarquizado dos professores da área.

No final do século XX, houve a necessidade de uma educação para o

progresso da humanidade e o desenvolvimento do ser humano total.

Giraldelli Júnior (1988) acredita que a Educação Física necessitava de

um novo enfoque: o enfoque progressista; embasado em pressupostos da

Pedagogia Crítico-Social dos conteúdos, onde é preciso engajar-se crítica e

intelectualmente na sociedade e comprometer-se com o seu objeto de estudo.

Neste sentido, Freire (1992, p.135-136) nos fala sobre as indagações

decorrentes de uma ação docente ideal:

(...) que conteúdos ensina, a favor de que ensiná-l os, a favor de quem, contra que, contra quem? Que escolhe os conteúdos e como são ensinados. Que é ensinar? Que é aprender? Como se d ão as relações entre ensinar e aprender? Que é o saber de experiên cia de feito? Podemos descartá-lo como impreciso, desarticulado? Como superá-lo? Que é o professor? Qual o seu papel? E o aluno, que é? E o seu papel não ser igual ao aluno significa dever ser o profes sor autoritário? É possível ser democrático e dialógico sem deixar de ser professor, diferente do aluno? Significa o diálogo um bate-pap o inconseqüente cuja atmosfera ideal seria a do “deixa como está pr a ver como é que fica”? Pode haver uma séria tentativa de escrita e leitura da palavra sem a leitura do mundo? Dignifica a crítica necessária à educação bancária que o educador que a faz não tem o que ensinar e nã o deve fazê-lo? Será possível um professor que não ensina? Que é a codificação, qual o seu papel no quadro de uma teoria do conhecimento? Como entender a relação teoria-prática sem que a frase vire a frase feita? (Grifo nosso)

48

Ou seja, do ponto de vista da abordagem progressista o professor

precisa tornar-se reflexivo sobre sua própria ação docente. Afinal, não são raros os

dias em que nós, professores, entramos em uma sala de aula, dia de “prova” e ao

encontrarmos uma turma quieta, com sinais claros e visíveis de medo sentimo-nos

como seres super-poderosos. Também não são raras as situações onde nós,

professores elogiamos o aluno calado, anônimo, que não expressa opiniões, mas

que diz sim senhor à todas as nossas questões.

Como afirma Freire (1997, p.100) já fomos um tipo de professor que

“em função do passado autoritário, nem sempre com segurança por uma

modernidade ambígua, oscila-se entre formas autoritárias e silenciosas. Entre uma

certa tirania da liberdade e o exacerbamento da autoridade ou ainda, na

combinação das duas hipóteses”. E ainda pela falta pura e simples do diálogo

deixamos de ser “professores progressistas”.

Numa abordagem progressista, o professor encoraja o aluno a buscar

o pensamento divergente entendendo isto como parte do processo de ensino.

O “aluno progressista” é um sujeito autônomo que organiza sua

própria experiência e constrói conhecimento em interação com o mundo e com o

outro. É crítico e ativo, auto-confiante, reflexivo, como aponta Misukami (1986).

Há que se ressalvar, quanto às aulas de Educação Física, no

momento em que as ditas “aulas livres” são tão comuns. Fazer com que o aluno

aprenda por ele mesmo não significa deixá-lo descobrir o mundo sozinho. A auto-

descoberta deve ser buscada sim, mas com responsabilidade como fala Freire

(apud DANKE, 1995, p.88):

O papel do professor adquire relevância nessa concepção de educação. Sua tarefa principal é problematizar. À medida que dialoga cabe ir chamando a atenção para pontos obscuros ou ainda ingênuos, bom como para as descobertas que estão sendo feitas pelos sujeitos envolvidos na situação.

Logo, a abordagem progressista mostra novas propostas para a

prática pedagógica do professor de Educação Física, transpondo velhos padrões

impregnados na prática diária, transformando a aula “num ambiente crítico, onde a

riqueza cultural se estabelece com trampolim para a crítica” (GHIRARDELLI

49

JÚNIOR, 1998, p.58). Assim, na Educação Física o conflito foi crucial para a

mudança e neste sentido, Gusdorf (1997) comenta que sempre que o ser humano

entra em conflito com o Ocidente, ele procura o Oriente. A esse respeito afirma

Buarque (1994, p.37):

Com a redescoberta do pensamento oriental, com a aceitação de formas alternativas de pensar, o Ocidente começa a contestar seu materialismo como objetivo e como método de pensar. Surge uma valorização do uso da intuição, do sentimento, da globalidade. Ressurge uma prática de espiritualidade sem complexo de inferioridade. O holismo se afirma como uma prática intelectual... a universidade ensina todos os nomes de todos os rios, mas anula nos alunos a capacidade de emocionar-se ao ver um deles. Ensina por que a economia se desequilibra, mas leva cada aluno a ignorar que há nomes por trás do desemprego criado.

Na busca deste ensino que privilegie uma totalização do indivíduo,

surge a visão holística da educação. O paradigma holístico estaria, na visão de

Capra (1995, p.14) substituindo “os conceitos de uma visão de mundo obsoleta – a

visão de mundo mecanicista da ciência cartesiana-newtoniana”. O autor elabora em

seu livro "O ponto de mutação", uma descrição detalhada de como o mecanicismo

cartesiano foi incorporado por todas as ciências tradicionais, levando à crise

individual, social e ambiental de caráter global que vivemos hoje.

A visão holística pretendida estimula não apenas o bom desempenho

social ou a criticidade pertinente a um ser transformador de estruturas, mas sim

uma visão que estimule o educando a “aprender a aprender” para desenvolver suas

potencialidades.

Aprender a aprender na concepção da Educação Física, segundo

Barros (1996) pode significar que o aluno deve ser levado pelo professor a entender

o mundo, ter prazer no conhecimento, desenvolver a criatividade, curiosidade, o

senso crítico e a aquisição de autonomia, isto tudo através do movimento.

De acordo com Capra (1993, p.14):

Para descrever esse mundo apropriadamente, necessitamos de uma perspectiva ecológica que a visão de mundo cartesiana não nos oferece. Precisamos, pois de um novo “paradigma”... uma nova visão da realidade, uma mudança fundamental em nossos pensamentos, percepções e valores...

50

da concepção mecanicista para a holística da realidade, já são visíveis em todos os campos e suscetíveis de dominar a década atual.

Podemos facilmente encarar a abordagem holística, como uma

abordagem mais humana, pois inovadoramente, considera a intuição e o

sentimento como meios de construção do real e não somente a razão como vinha

sendo feito sob o aspecto de paradigmas mais conservadores.

Segundo Crema (1995), só somos seres inteiros quando

desenvolvemos as faculdades cerebrais tanto do hemisfério esquerdo

(racionalidade crítica, lógica, memorização), quanto do hemisfério direito

(criatividade, sensibilidade estética, paixão, sentimento).

Corroboramos com Paulo Freire quando fala da incompletude do ser,

estando este em formação e constante desenvolvimento, porém a concepção de

seres inteiros acompanha o novo paradigma.

Baseada na concepção holística, conforme defendida por Capra

(1988, p.207-208), Costa (1997) apresenta a educação como elemento chave

nesse contexto. A autora propõe o resgate da totalidade como contraponto à visão

fragmentada de homem. Nesse aspecto, defende uma Educação Física liberta do

caráter instrumental para ser meio da ou meio de uma Educação Física que,

independente da atividade empregada (dança, ginástica ou esporte), seja uma ação

política com as seguintes características: dialógica, democrática, socialmente

produtiva e libertadora. Ao fazer a crítica ao processo de formação profissional, a

autora assim se expressa:

(...) parece não ter havido uma preocupação dominante com a formação completa do profissional de Educação Física. Se a maioria dos cursos está voltada para a formação de profissionais do ensino, quase sempre em completa desarticulação entre os departamentos de Educação Física e as faculdades de educação, isso implica uma formação limitada e deficiente, deixando campos de ação profissional sem formação específica (p. 217).

Face a estas questões é possível imaginar o quanto pode ser sofrível

para a Educação Física redimensionar toda a sua visão compartimentada de

educação, sustentada até pouco tempo atrás por uma cultura dominante. As ações

da Educação Física sempre giraram em torno da competência, da eficácia e da

51

produtividade. Behrens (2005, p.59) fala sobre este desafio que não é só da

Educação Física:

O grande desafio da visão holística será a superação do saber fragmentado que foi dividido nas escolas em disciplinas isoladas, assemelhando-se ao trabalho na indústria que se tornou especializado e repartido em setores, e, por conseqüência, os homens passaram, na escola e no trabalho, a se restringir a tarefas estanques sem a consciência global do processo e do produto a ser produzido.

Valores como a educação dicotômica de corpo e mente, ainda tão

presentes na Educação Física precisam ser quebrados para que uma educação

holística junto a ela se efetive, já que seus conteúdos buscam um equilíbrio do

desenvolvimento harmonioso do aluno em todas as suas dimensões: corpo,

intelecto, sentimento e espírito.

Como acredita Crema (1995, p.64):

Nem o educador e nem o educando são, isoladamente, o centro energético que impulsiona o processo de aprendizagem. Este centro está no encontro ente eles, como numa dança em que os passos marcados acabam por fluir livremente, tornando quase imperceptível quem conduz ou quem é conduzido.

A recente abertura para a análise de novas epistemologias na prática

da pesquisa em Educação Física indica novos caminhos para a área permitindo a

integração dessa com outras áreas do conhecimento.

Feitosa (1986) destaca que os professores de Educação Física ainda

não conseguiram vislumbrar, em suas ações teórico-práticas, a dimensão social da

Educação Física que justifique sua própria existência. Para este autor a Educação

Física deveria comprometer-se com a “tomada de consciência”, como fator decisivo

para que o ser humano reconheça o seu direito à liberdade.

Com o início da década de 1990, a educação novamente ruma em

direção às mudanças sociais. A informação e o conhecimento agora estão

disponíveis em redes de informática e comunicação.

Behrens (2005, p.81) nos afirma que:

52

Os meios informatizados atravessaram fronteiras e disponibilizaram o conhecimento causando uma revolução nos meios de comunicação e, especialmente, da aprendizagem em geral. O desafio que se impõe nessa sociedade é o de como acessar a informação recebida, como interpretá-la e, acima de tudo, como produzir novas informações com criatividade, ética e visão global.

O desafio comentado pela autora é visto sob a ótica de uma outra

abordagem chamada de Ensino com Pesquisa. Neste contexto, interpretar as

informações recebidas, transformá-las, primando pela ética e por uma visão global

torna-se desafio ainda maior, pois a base matriz da abordagem do Ensino com

Pesquisa coloca o aluno na situação de co-responsável pela aprendizagem e o

professor só pode ensinar aquilo que pesquisa. Caso contrário, apenas ensinara o

aluno a fazer cópias.

Para Demo (1991, p.14) “quem ensina carece pesquisar; quem

pesquisa carece ensinar. Professor que apenas ensina, jamais o foi”.

A pesquisa deve subsidiar o aluno para que ele leia, reflita e produza

conhecimento. Daí a importância do professor, neste momento, portar-se de forma

dinâmica e criativa, mediando a reflexão do aluno e auxiliando na construção de

seu conhecimento através de um ambiente inovador e extremamente participativo.

Como propõe Demo (1996, p.47):

A competência que a escola deve consolidar e sempre renovar é aquela fundada a propriedade do conhecimento como instrumento mais eficaz de emancipação das pessoas e da sociedade. Neste contesto, mera transmissão é pouco, embora como insumo seja indispensável. Em termos emancipatórios, competências jamais coincidiria como cópia, reprodução, imitação. Torna-se essencial construir atitude positiva, construtiva, crítica e criativa, típica do “aprender a aprender”.

Com relação à Educação Física, pode-se pensar que a execução de

um movimento corporal não tenha significado social ou que possa ser refletido,

pensado, passível apenas de repetições por parte dos alunos, porém esta é uma das

posturas que se pretende estinguir com trabalhos como este.

A linguagem corporal quando vivenciada na educação, pode abrir

perspectivas de construção e produção de equilíbrio nos processos de

aprendizagem, nos quais “a discussão sobre o conhecimento abarca hoje todos os

processos naturais e sociais onde se geram, e a partir daí são levadas em conta,

53

formas de aprendizagem. Tudo aquilo que vive cumpre processos cognitivos”

(ASSMANN,1996, p. 26-27).

Ainda de acordo com Assmann:

Vejo a ponte fundamental entre motricidade e educação no papel fundamental da participação corporal nos processos de aprendizagem. Todo conhecimento se instaura como um aprender mediado por movimentos internos e externos da corporeidade viva. Toda aprendizagem tem uma inscrição corporal. Não existe mentalização sem corporalização. Por isso, o corpo aprendente é a referência fundante de toda aprendizagem. A morfogênese do conhecimento acontece no interior da motricidade corporal do ser humano. E a unidade dos processos cognitivos com os processos vitais obedece normalmente a uma dinâmica de prazerosidade (1996, p. 47).

A Educação Física, enquanto ramo pedagógico na educação básica,

entendida como uma área responsável pelo ensino de conhecimentos deve

proporcionar aos alunos, pelos conteúdos que lhes são específicos, situações que

envolvam análise, reflexão e abstração sobre sua motricidade, não se limitando

apenas a um simples “fazer” no qual o aluno é “configurado” como executor de

movimentos padronizados, estereotipados, mecânico (PALMA, 2001).

O Ensino com Pesquisa, então, enquanto proposta para a Educação

Física pode operacionalizar os conteúdos curriculares de maneira integrada,

sistêmica, proporcionando, como resultado, uma educação interdisciplinar e uma

visão de mundo integrada e não mais fragmentada como ocorre no ensino

tradicional. Despertando o interesse dos alunos, pois os mesmos aprendem fazendo,

resolvendo um dos maiores problemas em escolas dos dias de hoje - garantir a

motivação dos alunos e sua atenção para o aprendizado.

3.1.3 A Educação Física e o Paradigma Emergente ou da Complexidade

A constante busca por referenciais educacionais inovadores que

transformem a educação visando a produção do conhecimento em detrimento da

sua pura e simples reprodução, delineou a formação de um novo paradigma. A

denominação: Paradigma Educacional Emergente é uma proposta de Boaventura

Santos (1989) e referendado por Moraes (1997), Pimentel (1993). Neste caso,

Behrens (2006) propõe o paradigma emergente ou da complexidade com uma

54

aliança entre a abordagem holística, a abordagem progressista e a abordagem do

ensino com pesquisa que juntas fazem parte das propostas do paradigma

emergente podendo assim contribuir para uma aprendizagem compatível com as

exigências deste novo milênio.

Se como afirma Moraes (1997,p.199-201) uma das metas da

educação é levar o aluno a produzir conhecimento, o processo de renovação

paradigmática aqui referido, deve levá-lo a desenvolver uma atitude construtiva

para a produção deste conhecimento.

Hoje, a visão newtoniana ou cartesiana do mundo, está sendo muito

criticada, uma vez que focaliza o conhecimento por partes e retalha a visão de

totalidade. Porém, o que não se pode esquecer é que esta mesma visão, também

foi responsável pela própria democratização do conhecimento e pela formulação de

um espírito científico de investigação aberta e validação pública do conhecimento

(MORAES,1997 p. 42).

Talvez este tenha sido o principal motivo pelo qual a educação se

deixou levar por tanto tempo, devido ao grande arraigamento desta idéia em toda

sociedade, que por conseqüência, se instala com mais propriedade na educação

Isto pode ser percebido quando observarmos que a própria escola

atual, por exemplo, caracteriza-se como uma instituição fechada, que obedece a

normas pré-estabelecidas por estruturas “enlatadas”, longe da realidade social.

Esse fenômeno se reflete facilmente em sala de aula, revelando um

descompromisso com a tão sonhada postura crítica e reflexiva de docentes e

discentes.

Na maioria das vezes, até nos consideramos educadores condizentes

com o modelo do paradigma emergente ou da complexidade, porém nossa prática

continua conservadora. Sabemos dos encantos e da adequação do novo

paradigma ao nosso tempo, mas a tal práxis, ou prática reflexiva, ainda acontece

pouco.

Aliás, observar e compreender o contexto social regente se torna

fundamental durante a mudança paradigmática. É cruel perceber a aceleração na

transmissão do conhecimento, gerado pelo intensivo uso da tecnologia, milhares e

milhares de crianças no mundo todo não têm acesso sequer ao ensino fundamental

enquanto cresce absurdamente o número de analfabetos.

55

O Informe Mundial de Educação para todos, publicado pela Unesco,

corrobora esses dados e também mostra que:

(...) continua existindo uma grande defasagem no nível de conhecimento entre os países do Norte e do Sul, especialmente no que se refere à capacidade de assimilar e aplicar ciência e a tecnologia de um maior acervo de informações científicas e melhores condições de realizar suas próprias aspirações de desenvolvimento, bem como de intervir no processo de interdependência mundial. Os dados mundiais sobre educação colocam-nos diante de uma dura realidade, demonstrando que os países, pelo menos parcialmente, não deram a devida prioridade à dimensão humana do desenvolvimento, deixando de oferecer uma educação básica adequada e necessária à população (UNESCO,1993)

O que significa que a sociedade do conhecimento já existe, mas para

poucos. Os excluídos economicamente são também os excluídos da sociedade do

conhecimento.

No entanto, Behrens (2005, p.103) afirma que “nesse momento

histórico, em decorrência das dificuldades de acesso aos recursos de ensino de

última geração, o docente precisa investigar o uso de tais instrumentos, mas

salvaguardar as possibilidades de realizar um bom projeto com recursos disponíveis

na escola e na comunidade”.

Por outro lado, Templenton (apud MORAES 1997, p.114) reconhece

que estamos vivendo uma era maravilhosa, um período sem precedentes na

história da humanidade, muito embora, este também seja um mundo de dramáticas

mudanças políticas, econômicas, culturais e espirituais.

Enfrentando obstáculos, na grande maioria sócio-econômicos a

globalização de informações através de grandes redes digitais continua sua

marcha.

Moraes (1997, p. 125-126) nos mostra alguns exemplos:

O desenvolvimento de automação bancária melhorou muito a qualidade dos serviços que os bancos prestam a seus clientes, fazendo com que as filas diminuam de tamanho ou mesmo se extingam, possibilitando ao cliente a resolução de seus problemas sem precisar sair de casa ou do escritório. Graças ao sistema de código de barras, agilizam-se as compras nos supermercados, e o indivíduo pode fazer sua caminhada sem sair de casa, utilizando aparelhos que incorporam os últimos avanços da medicina esportiva e que permitem a realização de exercícios mecânicos com a

56

mesma precisão de quem tivesse caminhado alguns quilômetros. Há computadores nos aviões, nos carros, nos aparelhos de som e de televisão, nas geladeiras e nos fornos de microondas, que estão revolucionando a maneira de morar, trabalhar, fazer compras e se comunicar. Depois do papel-moeda, do cheque e do cartão de crédito, temos hoje o cartão inteligente, que memoriza dados do cliente e pode ser carregado e recarregado a serem realizados (...) é um mundo que fica cada vez mais digital.

Talvez o professor, dia-a-dia em sala de aula, não esteja preparado

para ter o conteúdo por ele exposto confrontado com informações captadas pelo

aluno na Internet. Ou ainda não esteja capacitado para articular tal informação à

aula previamente planejada. Mas é preciso levar em consideração que o aluno

esteve em busca de conhecimento quando se utilizou da Internet.

Vale ressaltar a importância da utilização dos recursos tecnológicos,

valorizando a autonomia e a liberdade do aluno quando esta busca “contribui como

elemento responsável pela sua aprendizagem, pela qualidade do seu processo e do

seu grupo na metodologia do aprender a aprender” (BEHRENS, 2005 p, 103)

A verdade é que se nos identificarmos com este novo cenário mundial,

estaremos nos inserindo nele e caminhando juntos. Disso trata especificamente o

paradigma emergente, do entrosamento entre indivíduo e sociedade, interconexos,

interdependentes e interativos.

O mundo não é algo externo ao indivíduo. Cabe à escola e mais

especificamente ao professor ser responsável pela formação de indivíduos

conscientes de seu papel social. Papel não estanque, contínuo carente de educar-

se permanentemente.

Cabe ao professor identificar, numa sala de aula imposta, diferentes

perfis cognitivos, bem como ritmos diferentes de aprendizagem em indivíduos que

ao mesmo tempo em que constroem sua própria história também são sujeitos dela.

Cada pessoa tem uma forma diferente de compreender a realidade e é este sistema

individual que transforma a realidade.

E depois de identificadas estas diferenças não se pode acreditar tão

ingenuamente que a solução para o “problema” foi encontrada, pois um problema

bem formulado não é solucionado simplesmente, ele abre possibilidades para

novas estratégias que visam o encontro de novos paradigmas.

57

Para Adorno (apud MORIN, 2001,p.100) a complicação é um

elemento constituinte da complexidade, ou seja, é a confusão extrema das inter-

retroações, ou seja, “a totalidade não é a verdade”. Assim, “o conhecimento é, com

efeito, uma navegação que se efetiva num oceano de incerteza salpicado de

arquipélagos de certeza (MORIN, 2002, p.61).

Na tentativa de encontrar respostas aos nossos anseios enquanto

docente universitário, atuante na formação de futuros profissionais da Educação

Física, acreditamos que o paradigma da complexidade tornou possível uma prática

pedagógica significativa.

Sobre o Paradigma Emergente ou da Complexidade recorremos a

Morin (1986, p.127) quando afirma que “o verdadeiro problema do conhecimento

(entendido como teoria e prática, discurso e postura/atitudes) é saber distinguir e

relacionar, evitando separar e confundir”. Nessa perspectiva, toda interpretação de

fatos históricos, ou sociais, ou políticos, ou econômicos, que se pretenda correta, só

pode ser complexa, dialógica. Não existe uma única verdade, afirmada como

dogma, como doutrina, mas múltiplas possibilidades, a partir das várias

perspectivas adotadas.

Morin (1997,p.30) fala ainda em exercitar um estilo de pensamento

ecocêntrico e cosmológico que privilegie a síntese, a cooperação e cumplicidade

entre homens e coisas, a sabedoria intuitiva, o imaginário, o poético, enfim, o

intercâmbio entre vida e idéias, a transdisciplinaridade, a migração de conceitos e

categorias.

Assim, Moraes (2004, p.20) apresenta as idéias de Edgar Morin

quando defende a complexidade, afirmando:

Se queremos formar indivíduos intelectual e humanamente competentes e bem formados, capazes de aceitar desafios, construir e reconstruir teorias, discutir hipóteses, confrontá-las com o real, formar seres em condições de influenciar na construção de uma ciência no futuro ou participar dela, então necessariamente, o paradigma educacional precisa ser revisto. Isso porque o modelo convencional de ensino adotado pela maioria das escolas, não estimula o pensamento divergente, a criatividade, a criticidade, não gera ambientes para descobertas científicas, para o desenvolvimento de um trabalho cooperativo, além de uma série de outros valores que necessitam ser resgatados nos novos ambientes de aprendizagem.

58

No entanto, vale lembrar que a revisão paradigmática necessita

também sair do papel, ou seja, ser transportada das prateleiras das bibliotecas para

a prática profissional do docente. Deixar de ser simplesmente teoria, para articular-

se a realidade das salas de aula, à realidade da educação.

O Paradigma Emergente empreende uma aliança entre os

pressupostos “inovadores” das abordagens sistêmica, progressista e ensino com

pesquisa, (BEHRENS, 2005). Porém, Capra (2002) no prefácio de sua obra As

conexões ocultas – Ciências para a vida sustentável, passa da denominação de

paradigma emergente para paradigma da complexidade. Defendendo uma

integração entre as chamadas dimensões biológica, cognitiva e social da vida, da

mente e da sociedade.

Segundo Behrens (2006, p.19):

O paradigma da complexidade reforça os princípios e referenciais teóricos e práticos que foram propostos para o paradigma emergente. Os paradigmas inovadores são fortemente enfocados na visão de totalidade, de interconexão, de inter-relacionamento, na superação da visão fragmentada do universo e na busca da reaproximação das partes para reconstituir o todo nas variadas áreas do conhecimento.

Vemos que numa abordagem conservadora em todas as áreas

educacionais, o conhecimento ficou fragmentado de tal forma que nas suas

aplicações práticas, as modalidades e os exercícios físicos passaram a ser tão

específicos a ponto de fugirem ao caráter de complexidade. Complexidade essa

que não podemos pensar só em termos de unidades de todas as vertentes

possíveis (afetivo-social, intelectual, física, etc.), mas que também devemos pensar

no interior de cada vertente.

É comum na Educação Física a preparação ou o trabalho com braços,

gastrocnêmios, quadríceps, abdominais, lombares, músculos da cintura escapular e

demais, sem que se perceba a interdependência segmentar existente entre eles,

pois a unidade existe também no corpo.

No paradigma da complexidade, se defende fundamentalmente a

análise do todo. A tendência é considerar a unidade do homem levando em

59

consideração sua relação com os demais e a combinação bio-psico-social

distinguindo uma das outras sem separá-las da visão global do indivíduo.

É preciso aqui, no entanto, que não se reduzam ou simplifiquem os

pressupostos da complexidade propostos por Morin (2001) já que isto incorreria

num ato inibidor que limita o processo de conhecimento. No mesmo sentido, Morin

(apud MARTINELLI, 2003, p.35) acredita que temos obsessão pelo simples e que a

pesquisa obstinada pelo simples desembocou no complexo. Contudo, enquanto

seres humanos não poderíamos deixar de sermos mais complexos, e Morin (2002,

p. 59-60) define de forma belíssima a complexidade humana:

O ser humano é um ser racional e irracional, capaz de medida e desmedida; sujeito de afetividade intensa e insustentável. Sorri, ri, chora, mas sabe também conhece com objetividade; é sério e calculista, ms também ansioso, angustiado, gozador, ébrio, extático; é um ser de violência e de ternura, de amor e de ódio; é um ser invadido pelo imaginário e pode reconhecer real, que é consciente da morte, mas não pode crer nela; que secreta o mito e a magia, mas também a ciência e a filosofia; que é possuído pelos deuses e pelas idéias, mas que duvida dos deuses e critica as idéias; nutre-se dos conhecimentos comprovados, mas também ilusões e de quimeras. E quando, na ruptura de controles racionais, culturais, materiais, há confusão entre o objetivo e o subjetivo, entre o real e o imaginário, quanto há hegemonia de ilusões, excesso desencadeado, então o Homo demens submete o Homo sapiens e subordina a inteligência racional a serviço de seus monstros.

Assim, quando falamos em educação a complexidade fica pertinente,

pois seu propósito não é encontrar todas as explicações ou informações, mas

buscar, religar e respeitar todas as dimensões de um ser ou de um fato.

Partindo destes princípios podemos pensar em uma educação para o

futuro, pautada em questões que Morin (2002, p.36) chama de condição humana,

aprendizagem cidadã, enfrentamento de incertezas, compreensão humana e

identidade terrena, e acrescenta:

Trata-se de um trabalho que deve ser empreendido pelo universo docente, o que comporta evidentemente a formação de formadores e a auto-educação dos educadores. Com efeito, apenas a auto-educação dos educadores se efetiva com ajuda dos educandos será capaz de responder à grande questão deixada por Karl Marx: “quem educa os educadores?” . Por meio dela, creio ser possível operar a ressurreição de uma missão que freqüentemente acabava por se dissolver na profissão (...). No fundo, essa

60

missão é uma missão das luzes, portadoras de um saber que ajuda a compreender e abraçar a complexidade do real (...) este saber que abraça deve ressuscitar uma cultura que não é pura e simplesmente a cópia da antiga cultura, mas sim a sua integração em conexão com a cultura das Humanidades e das Ciências (p.36) (grifo nosso).

Daí a importância em tratar o professor como um “eterno aprendiz”.

Aprendizado que não está presente apenas em pilhas de livros, mas na vida, no

cotidiano, na relação professor/aluno, entre outras. Quando tratamos então da

formação de professores, em especial do docente de Educação Física questão que

tange o objetivo deste trabalho, vemos novamente a necessidade da não promoção

da fragmentação e nem tampouco a redução do conhecimento.

O professor é o alicerce das reflexões sobre o conhecimento. Estas

reflexões provocam reformas e quando o professor privilegia a busca pela reforma

de seu pensamento, também estará promovendo reformas no seu modo de ensino

e fazendo proliferar ao seu redor o “gérmen da reflexividade” (MARTINELLI, 2003,

p. 107).

A reflexão não compartimentada não deve ser confundida com olhar

tudo de forma superficial, mas sim descobrir e realçar as interações resultantes da

união dos conhecimentos separados.

O conhecimento historicamente acumulado pode apoiar a construção

de sua formação quando unido ao apoio de seus mestres orientadores e

companheiros de aprendizado (MARTINELLI, 2003).

Morin (2000) sugere que a formação de professores tenha em vista

um educador que consiga concebe o ser humano em sua grandeza e em sua

pequenez. Entendendo-se também como este ser humano, imperfeito,

multidimensional. Um ser humano que vive num grande sistema dependente da

responsabilidade individual e coletiva sobre ele.

De acordo com Behrens (2006, p.21) “o professor necessita

reconhecer que a complexidade não é apenas um ato intelectual, mas também o

desenvolvimento de novas ações individuais e coletivas que permitam desafiar os

preconceitos, que lacem novas atitudes para encarar a vida, que gere situações de

enfrentamento dos medos e das conquistas”.

A Universidade precisa se livrar das amarras do tradicionalismo

cartesiano, o que muitas vezes, acontece apenas teoricamente. O objetivo de uma

61

Universidade que atende a visão educacional complexa deve ser a transformação

social, através de uma aprendizagem sociocrítica.

Freire&Freire (apud BEHRENS, 2006, p.24) afirmam que a prática

educacional não é o único caminho para a transformação social, mas sem ela esta

transformação jamais aconteceria. Para Fergusson (1992, p. 265), “só se pode ter

uma nova visão da sociedade, dizem os visionários, se for modificada a educação

da geração mais jovem”.

Por fim, com o advento do século XXI, ao que Moraes (1997, p.209)

chama de Era das Relações, é preciso aceitar os desafios como compreender que

a evolução humana encaminha-se para a comunicação com o eu, com o outro, com

a natureza e com o mundo.

Behrens (2006, p. 69) nos sugere um quadro muito pertinente, sobre

as visões que demandam um “repensar” em relação à prática pedagógica de

professores do Ensino Superior para o século XXI:

Quadro 3 : As visões para uma aprendizagem significativa

• Visão da totalidade – considera-se que a prática pedagógica deve superar a visão fragmentada, retomando as partes num todo significativo.

• Visão de rede, de teia, de conexão – considera-se que os fenômenos estão

interconectados havendo uma relação direta de interdependência entre os seres humanos

• Visão de sistemas integrados – considera-se que todos os seres humanos devem

ter acesso ao mundo globalizado, aumentando assim as oportunidades para construir uma sociedade mais justa, igualitária e integrada.

• Visão de realidade e movimento – considera-se que é essencial ter uma percepção

de que os conhecimentos são relativos, não existindo uma verdade absoluta, e que esses conhecimentos estão em constante movimento, qualquer esforço em solidificar a verdade poderá ser redimensionado em movimentos subseqüentes por novas descobertas.

• Visão de cidadania e ética – considera-se que a formação dos seres humanos deve

estar alicerçada na construção da cidadania com uma postura ética, onde exista o respeito aos valores pessoais e sociais, espírito de solidariedade, justiça e paz.

Neste sentido, Morin (2001, p.11) comenta sobre a importância de se

“transmitir não o mero saber, mas uma cultura que permita compreender nossa

62

condição e nos ajude a viver, e que favoreça, ao mesmo tempo um modo de pensar

aberto e livre”.

Concordando com as idéias apresentadas sobre o paradigma da

complexidade, esta dissertação propõe a Capoeira como meio de educação e

pretende confirmar que a utilização do paradigma da complexidade favorece e

subsidia um Ensino Superior (voltado à formação de professores de Educação

Física) significativo e relevante.

Baseando-se nas propostas do paradigma da complexidade, espera-

se formar não só professores como seres humanos mais críticos, capazes de

desenvolver um pensamento mais reflexivo, não fragmentado, mas apaixonado pelo

ensinar, afinal ensinar é aprender eternamente.

Neste momento marcante da pesquisa cabe destacar as palavras que

Morin (2002, p. 36) traz como condição primeira para ser educador:

A ressurreição de uma missão inclui igualmente a ressurreição de uma fé, de uma fé na cultura, de uma fé no espírito humano, e é justamente isto que restitui o que Platão declarava ser fundamental para o educador: para ser educador é preciso ter eros, isto é, ter amor (...) é preciso ter amor para com a matéria que ensina, para com as pessoas a quem ensina. É preciso despertar esse eros. Creio que é na ressurreição trinitária do amor, da missão e da fé que se poderá tentar formar os cidadãos do terceiro milênio.

Além do amor pelo educar é necessário pensar em que tipo de

educação daremos aos futuros cidadãos do século XXI. Para tanto, reuniram-se em

Paris, no ano de 1997, educadores de todo o mundo tentando responder a este

questionamento. Jacques Delors (2003) propôs um relatório em que destacou

quatro pilares como base da educação para o século que já se iniciou.

A chamada globalização, que não é apenas econômica, mas política,

social e cultural preconiza a preocupação com a formação dos indivíduos, bem

como sua preparação para uma melhor convivência neste mundo globalizado.

O homem necessita ser solidário, democrático e aberto à relação com

novas culturas. Neste caso, “a competitividade em educação subordina-se aos fins

maiores de solidariedade e de justiça, pois não contempla apenas o indivíduo, mas

também orienta para projetos coletivos” (BARROS, 2006, p.36).

63

O Relatório de Jacques Delors (2003) apresentado após reflexões

sobre os pontos que norteariam a educação no século XXI, lembra que é dever da

educação trilhar o caminho para o bem viver em um mundo cada vez mais

complexo e agitado. Assim, foram formulados os quatro pilares da educação:

� 1°- Aprender a conhecer : que trata de uma relação com o

domínio dos instrumentos do conhecimento. Há também a preocupação com o

desenvolvimento de um processo de aprendizagem através da descoberta, do

vivenciar com prazer. Desenvolver o prazer e o gosto pelo estudo significa

despertar a curiosidade intelectual transmitindo as bases para que o aluno continue

a aprender ao longo de toda a sua vida.

De acordo com Santos (apud LIBÂNEO, 2002, p.67):

Um dos grandes desafios que se põe ao desenvolvimento do currículo é o de contemplar experiências de aprendizagem que permitam construir estratégias que ajudem o aluno a utilizar de forma consciente, produtiva e racional o seu potencial de pensamento e que permitam torná-lo consciente das estratégias de aprendizagem a que recorre para construir (reconstruir) os seus conceitos, atitudes e valores.

Aprendendo a conhecer podemos aprender a aprender, nos

beneficiando com as oportunidades que a educação nos oferece, a fim de re-

inventar o pensar. Um pensar consciente e emancipatório.

� 2°- Aprender a fazer : Aprender a conhecer e aprender a fazer

são indissociáveis, embora esta segunda aprendizagem esteja mais ligada à

educação profissional. Contudo, aprender a fazer também significa uma ampliação

de competências no âmbito das experiências sociais e não só do trabalho,

possibilitando o enfrentamento de novas situações e privilegiando a aplicação da

teoria na prática.

Aprender a fazer se define como ter capacidade de fazer escolhas,

pensar criticamente e não confiar ou depender apenas de modelos existentes

(DELORS, 2003).

� 3°- Aprender a viver juntos : Nesta abordagem, observamos o

desenvolvimento da compreensão do outro ao mesmo tempo em que há uma

preparação para gerir conflitos.

64

Aprender a viver juntos é um dos grandes desafios do século XXI.

É o desafio da convivência que apresenta o respeito à todos e o exercício da

fraternidade como caminho para o entendimento. Então este pilar da educação se

mostra fundamental no mundo atual, haja vista a competitividade cega e as

injustiças a que estamos sujeitos.

Por isso, é preciso promover a descoberta do outro, descobrindo-

se a si mesmo, para sentir-se na situação do outro e compreender suas reações.

Estas necessitam ser ações permanentes visando uma formação mais cidadã.

� 4°- Aprender a ser : Esta aprendizagem sugere uma autonomia

intelectual e uma visão crítica da vida, para desenvolver a capacidade de ação em

diferentes circunstâncias.

Aprender a ser significa contribuir para o desenvolvimento mental,

corporal e espiritual. Neste sentido, a aprendizagem precisa ser integral, sem

negligenciar nenhuma potencialidade inerente a cada indivíduo.

Segundo o Relatório de Delors (2003, p.99):

A educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa, espírito e corpo, inteligência, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal, espiritualidade. Todo ser humano deve ser preparado, essencialmente graças à educação que recebe na juventude, para elaborar pensamentos autônomos e críticos e para formar os seus próprios juízos de valor, de modo a poder decidir, por si mesmo, como agir nas diferentes circunstâncias da vida. Assim, cabe à educação preparar pessoas, criar um referencial de

valores e de meios para que estas se compreendam e atuem em sociedade.

No capítulo seguinte, trataremos das questões que envolvem

especificamente a docência no ensino superior de Educação Física, querendo crer

que a formação profissional nesta área seja dotada de mecanismos que levem o

aluno ao encontro do “eros” comentado por Morin e que este contagie tanto

docentes quanto discentes efetivando o aprendizado mútuo, cooperativo, integral,

em todos os sentidos, como pede o Relatório de Jacques Delors (2003) pautado

nos quatro pilares da educação.

65

CAPÍTULO IV

4.1 A DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO FÍSIC A

Hoje em dia é possível observarmos uma constante preocupação por

uma linha de pensamento e ação junto à Educação Física. Acredita-se que fazendo

parte de um conjunto educacional, esta área também seja regida pelos progressos

alcançados no tocante aos paradigmas da educação.

Assim espera-se obviamente, que a Educação Física supere a ordem

tradicional e mecanicista que objetivava dotar cidadãos de corpos fortes e sadios,

perfeitos para o trabalho e para a defesa do país, bem como se distancie cada vez

mais, das correntes positivistas (Escola tradicional, Escola nova e Escola tecnicista)

que tratavam o corpo como uma máquina, aplicando movimentos repetitivos e

mecânicos acríticos.

A Educação Física, atualmente, parece ter conseguido sair do rol das

atividades paralelas ao processo educativo para integrar-se a ele, que tem como

principal papel, segundo Barbosa (1997, p.21) “formar cidadãos críticos, autônomos

e conscientes de seus atos, visando a transformação social”. A Educação Física

mostrou-se também como meio de educação.

De acordo com Tubino (2002, p.61) “o sentimento de

indispensabilidade da Educação Física foi crescendo até chegar a um consenso

mundial de que essa área pode contribuir para a formação integral das pessoas”.

Muitas foram as tendências surgidas afim de re-significar a Educação

Física, e hoje é possível perceber que algumas foram incorporadas ao sistema

educacional e têm dado bons resultados, como por exemplo a abordagem feita por

João Batista Freire, compreendida dentro do paradigma inovador. Sua proposta

visa o desenvolvimento motor, afetivo e cognitivo do aluno “com vertentes em uma

pedagogia humanista e que faz uma crítica a cientificização da Educação e da

Educação Física” (DAÓLIO, 2004, p. 23).

Porém, os avanços propostos nas diferentes abordagens da Educação

Física parecem ainda não terem sido suficientes para a transformação da prática

pedagógica de professores universitários, como apontam os estudos de Miranda

66

(1998), uma vez que a referida prática de muitos docentes continua desarticulada

das novas teorias da educação.

Com relação à formação de professores, Behrens (1995, p. 152)

afirma que os docentes precisam “estar com vontade de mudar, sensibilizados pela

necessidade de transformar a ação docente em busca de um ensino de melhor

qualidade”.

Entendendo que não haverá transformação no comportamento do

aluno sem a participação coletiva de todos aqueles envolvidos no processo

educacional, cabe ressaltar, neste contexto, a transformação também dos currículos

até hoje utilizados. É pena identificar que os currículos de muitos cursos da área da

Educação Física ainda estão alicerçados em modelos tradicionais ou tecnicistas,

que limitam o ensino à transmissão pura e simples de técnicas esportivas. É

necessário entendermos que a Educação Física é capaz de viabilizar o processo

ensino-aprendizagem. Mas é preciso, como já comentado, vontade e envolvimento

na busca de um processo crítico, criativo e transformador que inutilize para sempre

a visão reducionista de que educar é transmitir conteúdos e que aluno bom é

aquele que mais os acumula.

Em documento elaborado por ocasião do II Congresso Brasileiro de

Esporte para Todos, no ano de 1984, uma comissão de pesquisadores já tratava de

questões que ainda hoje, mais de vinte anos depois, continuam fazendo parte dos

problemas que atordoam professores e estudantes de Educação Física.

Neste documento os autores consideraram:

- a proliferação indiscriminada de cursos de Educação e uma mercantilização do seu ensino, o que compromete a qualidade profissional. - a existência, na legislação, de dispositivos que permitem uma formação inadequada à realidade atual, deturpando-se assim, o exercício da profissão de professor de Educação Física. - a exigência de um currículo mínimo, fruto do autoritarismo e intervencionismo do Estado na Educação tem-se revelado inibidor da qualidade de cursos de formação, estimulando a fraude e a simulação. - que os atuais currículos das escolas superiores de Educação Física estão defasados em relação às novas exigências da sociedade, que determinam um novo perfil para o professor de Educação Física. - que esse novo professor de Educação Física deve apresentar condições de atuar nas novas demandas do mercado de trabalho, em empresas privadas, organismos públicos e entidades comunitárias, utilizando metodologias adequadas, que atendam à especialidade dos diversos

67

campos de atuação, como a recreação, a dança, o desporto, a ginástica, as lutas e outros. - que a necessidade de permanente atualização e aperfeiçoamento de professores, após sua formação escolar, é imperativa (TUBINO, et all,1984, p. 06).

Todos os pontos apresentados em 1984 são passíveis de reflexão

ainda hoje, principalmente quando aponta a defasagem curricular nos cursos de

Educação Física, onde desarticulados da realidade social vigente, acabam

formando profissionais sem as condições necessárias ao enfrentamento desta

realidade. O profissional, ao sair da universidade, formado, ficava desorientado em

relação à sua prática profissional.

O Conselho Federal de Educação consegue alguns avanços quando

propõe o Parecer 215/87 que teve como decorrência a Resolução 03/87, mediante

a que, houve novas definições para os cursos de licenciatura e viabilizou-se a oferta

de cursos superiores de Bacharelado em Educação Física, como comenta Menezes

(1991, p.92):

O descompasso entre o que a Universidade formava e a sociedade exigia do profissional de Educação Física, culminou, após inúmeras discussões entre os intelectuais da área, como Parecer 215/87 do Conselho Federal de Educação, que tratou da reestruturação dos cursos de graduação em Educação Física e Desportos, facilitando á Universidade pensar seu próprio currículo e o perfil do profissional necessário a sua região, propiciando-lhe assim, no exercício da autonomia universitária, pensar sobre duas graduações para a área sendo uma licenciatura e/ou bacharelado em Educação Física.

A partir da Resolução 03/87, uma das principais considerações era

para que fossem contempladas, desde então, disciplinas que ainda não se faziam

presentes nos currículos de Educação Física, mas que deveriam estar contidas na

proposta destes cursos tentando buscar uma formação profissional de qualidade.

No sentido da citada formação profissional de qualidade, cabe lembrar

o que Perrenoud (2000) chama de “10 novas competências para ensinar”, listando o

que considera ser imprescindível saber para ensinar bem, numa sociedade em que

o conhecimento está cada vez mais acessível:

1) Organizar e dirigir situações de aprendizagem;

68

2) Administrar a progressão das aprendizagens; 3) Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação; 4) Envolver os alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho; 5) Trabalhar em equipe; 6) Participar da administração escolar; 7) Informar e envolver os pais; 8) Utilizar novas tecnologias; 9) Enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão; 10) Administrar a própria formação;

O autor nos remete a pensar numa proposta de agregação de saberes

onde tudo é importante para a atuação profissional, tudo é importante e pode ser

utilizado para solucionar problemas e conseqüentemente para a vida em sociedade.

Coelho (1996, p. 35) afirma que a formação universitária não pode

jamais se referir a apenas um ângulo específico e parcial do mundo, da sociedade,

mas sim “referir-se ao todo, ao homem como capaz de pensar, compreender e

recriar a natureza, a sociedade e o próprio homem, isto é, a totalidade daquilo que

é. Ainda com relação a Resolução 03/87, ficou estabelecido que os

currículos dos cursos de graduação, num primeiro momento deveriam tratar da

Formação Geral-Específica, com 80% do total de horas do curso, para

posteriormente, utilizar 20% das horas para o chamado Aprofundamento de

Conhecimentos.

Barros (1993, p. 15-16), caracteriza a formação geral e específica da

seguinte forma:

(...) delineia o caráter inter e intra-indisciplinar da Educação Física, abordando conhecimentos na área de interesse no estudo da motricidade humana. Entende-se que tanto o bacharel quanto o licenciado, do ponto de vista profissional, utilizam o movimento como instrumento de atuação, necessitando ambos dominar o conjunto de conhecimentos básicos necessários à ação profissional. (...) tanto o bacharelado quanto a licenciatura têm uma preocupação permanente com a formação de atitude científica. Ambos os profissionais devem ser capazes de, nos seus campos profissionais, analisar criticamente os conhecimentos no sentido de compreender as condições e os processos pelos quais o conhecimento foi produzido.

Porém, constatou-se que mesmo depois de algumas mudanças na

grade curricular dos cursos de Educação Física, a nova proposta para uma

69

Educação Global não aconteceu, assim como também não houve incorporação

desses ideais na prática pedagógica de alguns professores. Por conseqüência,

“esta situação ocasionou desencontros na proposta curricular e na prática

pedagógica exercida pelos professores, resultando na falta de unidade no trabalho,

onde cada professor exercia sua docência sem se deter e refletir sobre a proposta

do curso como um todo” (MIRANDA, 1998, p.60).

Mas aos poucos é possível observar que a Educação Física vai

voltando-se lentamente para o lado psico-físico do indivíduo e que o que acaba

impedindo que essa área se desenvolva é justamente a falta de uma visão mais

ampla de alguns professores, que restringe o corpo a um objeto, móvel apenas

quando dado oportunidade e mesmo assim com severas repressões (ROCHA,

1994, p. 40).

Neste sentido, as palavras de Freire (1989, p.138) nos são válidas:

O que está faltando, numa concepção de Educação Física que privilegie, acima de tudo, o humano, é ver além do percebido: é enxergar o movimento carregado de intenções, de sentimentos, de inteligência, de erotismo. É ver o rumo do movimento, sempre na direção de buscar, no mundo, as partes que faltam ao homem para ser humano.

Não se pode negar que em aspectos humanos, pedagógicos,

antropológicos, filosóficos e psicológicos, muitos cursos de Educação Física ainda

sejam deficientes, ou que apesar de explorá-los, o façam com muita restrição.

Na maioria das vezes é dada grande ênfase ao esporte, à competição,

à vitória, privilegiando-se o alto rendimento e tornando o futuro profissional um

caça-talentos esportivos.

Muitos professores recém-formados saem do curso ainda

desorientados, pois não sabem que postura tomar ou onde aplicarão o

conhecimento recebido, já que a realidade fora da universidade é outra.

Estes profissionais, só então, perceberão o estrago causado em suas

carreiras, pela falta de criticidade, de reflexão, de estímulos e pela absorção

passiva dos conteúdos durante as aulas na graduação.

De acordo com Medina (1985, p.86):

70

Os profissionais de Educação Física, quaisquer que sejam as suas áreas de atuação, só se realizam na medida que assumem plenamente o seu papel como agente renovador e transformador. Procuram atingir os seus objetivos específicos, mas ao mesmo tempo, são capazes de auxiliar e abrir novas perspectivas para que cada um e todos sejam donos de seus destinos. Devem agir como sujeitos de sua história, e não como peças de uma engrenagem, determinados a realizar funções específicas em face de uma educação domesticadora e autoritária que chega a anestesiar os anseios de conquista da liberdade.

Mas a tal educação domesticadora prevalece. Os alunos da

graduação ao receberem seus diplomas (supostamente) estão prontos para atuar.

Pena que muitos estejam prontos mais para seguir “modismos” que para atuar

como agentes da educação. Muitos profissionais recém saídos das instituições

formadoras ainda não perceberam o valor educativo da Educação Física.

Mais uma vez esbarra-se na questão curricular, onde as chamadas

disciplinas pedagógicas e específicas deveriam compor um único espaço, com o

objetivo de integrar um projeto coletivo de formação profissional.

Segundo Lawson (apud BETTI, 1980, p.258) “Ensinar os estudantes a

aprender deve ser uma das principais preocupações do currículo. Isso inclui a

aprendizagem de avaliar e corrigir a sua própria ação profissional e a capacidade

de acompanhar minimamente a produção de conhecimento na área”. É a difícil

tarefa de articular na prática os conteúdos teóricos estudados.

Medina (1985, p.88) também contribui quando diz que:

O currículo de uma Faculdade de Educação Física deveria servir como referencial básico para a formação do futuro profissional, incluindo as disciplinas fundamentais consideradas de forma dinâmica e flexível. Isto significaria um currículo aberto às constantes transformações e á evolução do conhecimento científico e pedagógico voltado para a arte e a ciência do movimento.

E Fazenda (1991, p.84) completa afirmando que “toda prática tem a

sua sustentação na teoria e toda teoria revela ou confirma uma prática”.

Mas além de toda a dificuldade da transmissão articulada de teoria e

prática, sem que se consiga esclarecer a sua importância no cotidiano do futuro

profissional, os jovens, ansiosos em cursar disciplinas práticas, desprezam a

formação teórica como a Sociologia, a Psicologia, a Didática, a Psicomotricidade e

71

áreas afins. Fazendo vir à tona questões que traduzem um dos graves problemas

que envolve o processo ensino aprendizagem nos cursos de Educação Física: a

formação essencialmente técnica que gera despreparo.

Betti (apud OLIVEIRA 1998, p.41) afirma que o profissional de

Educação Física ao chegar à escola acaba frustrando-se ao perceber que o aluno

não está preparado para todo aquele conteúdo técnico trazido em sua bagagem ou

simplesmente não precisa dele e o ignora. Assim, a participação dos alunos,

principalmente dos menos habilitados, sofre profundo declínio e gera insatisfação

de todas as partes envolvidas no processo de ensino.

Segundo Oliveira (1998, p.54) muitas vezes, o fracasso do curso de

Educação Física se deve a inversão do processo seqüencial de evolução dos

sistemas de ensino, já que começam com grande quantidade de conteúdos

técnicos, quando deveriam partir do “processo de ensino humanístico”.

Entende-se disto, que o aluno do curso de Educação Física devesse

inicialmente ser formado enquanto educador. Consciente e comprometido com a

“escolarização” para só então especializar-se, se possível, tornar-se especialista em

educação (ROCHA, 1994, p.47).

Caberia então ao docente universitário transformar as necessidades

do futuro profissional de Educação Física em objetivos educacionais, organizando o

ambiente de aprendizagem (articulando teoria e prática) visando a resolução de

problemas com responsabilidade? Sobre esta questão discorreremos a seguir.

4.2 O professor formador de professores

O professor tem sido apontado como um dos culpados pela má

qualidade na formação de futuros docentes. Porém, se é verdade que somos

sujeitos de nossa própria história, também é verdade que o professor é sujeito de

seu próprio desenvolvimento profissional, onde segundo Almeida (2001,p.3)

vislumbra-se, neste contexto, um processo em que a reflexão sobre a experiência

prática é fundamental, pois o que ocorre normalmente é a implementação, por parte

dos professores, de descobertas feitas por outros.

Apple (apud ALMEIDA, 2001) diz que os professores são profissionais

capazes de julgarem e entenderem suas próprias ações. Porém, muitas vezes já

72

nos apegamos de forma muito intensa ao comodismo ratificado por rótulos ou

jargões que parecem eternos como: “Professor de Educação Física só sabe jogar

bola” ou ainda “Teoria da Educação? Não, ele é professor de Educação Física,

discutamos nós professores teóricos”.

Mas, repetir discursos é fácil demais. Vasconcelos (1997) nos diz que

é preciso que o professor entenda que tem voz e que será ouvido, uma vez que

surja a tentativa de transformação, de “libertação do discurso dos outros”.

Para Gadotti (2004, p19):

O novo profissional da educação precisa saber porque aprender, para quê, contra quem. O processo de aprendizagem não é neutro. O importante é aprender a pensar, a pensar a realidade e não pensar pensamentos já pensados. Mas a função do educador não acaba aí: é preciso pronunciar-se sobre essa realidade que não dever ser apenas pensada, mas transformada.

O professor atual está numa época de transformação. Tem como

dever não se furtar da curiosidade científica estando, portanto, consciente da

importância do seu papel e das conseqüências de suas ações junto ao processo

educativo.

O professor deve ser capaz de refletir sobre sua prática e direcioná-la

segundo a realidade em que atua, voltada aos interesses e às necessidades de

seus alunos.

Giroux (1997, p.158) defende a idéia de que o trabalho docente é um

trabalho intelectual e não puramente instrumental ou técnico e que no momento em

que dignificamos a capacidade humana de integrar pensamento e prática

acabamos por valorizar “a essência do que significa entender os professores como

profissionais reflexivos”. Encarando, então, os professores como intelectuais

transformadores.

Não se trata aqui, no caso da Educação Física, de abandonar a

utilização da técnica na prática docente, mas haverá momentos em que o professor

estará em situações conflitantes e ele não terá como guiar-se somente por critérios

técnicos pré-estabelecidos.

Para Nóvoa (1997, p.27) “as situações conflitantes que os professores

são obrigados a enfrentar (e resolver) apresentam características únicas exigindo,

73

portanto características únicas: o profissional competente possui capacidades de

auto-desenvolvimento reflexivo. A lógica da racionalidade técnica opõe-se sempre

ao desenvolvimento de uma prática reflexiva”

O que estes autores sugerem é que o professor deixe de ser um

técnico, um executor, para tornar-se um “investigador na sala de aula”, um prático

autônomo ou um “artista capaz de criar suas próprias ações, de manejar a

complexidade do real e de resolver situações problemáticas por meio da integração

inteligente e artístico-criativa do conhecimento da técnica com os saberes práticos

adquiridos na prática docente” (GÓMEZ, 1991,p. 38).

Contudo, vale lembrar que a formação do professor não acontece em

momentos distintos, onde ocorra primeiro a formação teórica e depois a experiência

prática, mas no diálogo entre ambas. É neste diálogo que o professor aprende e

aperfeiçoa seus conhecimentos.

Deve-se apenas tomar cuidado para que não haja má interpretação do

que aqui se pretende, uma vez que entendemos que a relação entre a teoria e a

prática vem sendo cada vez mais valorizada como um espaço de construção de

saberes na formação de professores e jamais proporíamos que a teoria seja banida

do mundo acadêmico.

Para tanto recorremos a Cunha (1994):

É importante que encontremos formas de contracenar com a teoria. O pensamento teórico, fruto de inúmeras formulações, só se adquire quando o presente e o passado são estímulos para o diálogo de significados entre o que o texto expressa e o que o leitor percebe. A teoria, como contribuição para a pesquisa e a reflexão, é sempre potencialmente útil quando não é entendida como fonte direta da prática, como queria a perspectiva positivista, mas sim como possibilidade de iluminar o leitor, desde que este tenha possibilidade de fazer um jogo com sua própria luz. A relação entre a teoria acumulada e o aprendiz é atravessada por um elemento fundamental, nem sempre facilmente percebido pelo professor, que é a cultura.

Então, o trabalho docente necessita ter por alicerce não somente a tão

almejada prática aliada á teoria, mas uma teoria inovadora, transformadora, onde

se admita o envolvimento do acadêmico na sua construção, sendo ele um agente

ativo da construção do processo ensino-aprendizagem.

74

Ao relacionar estas questões à Educação Física Tani (1988) cita como

um dos pontos problemáticos o fato de que a concepção de ciência que predomina

no âmbito da produção do conhecimento ainda é o das ciências naturais de matriz

positivista. Sendo que uma das principais características desta concepção de

ciência é justamente a separação entre a teoria e a prática. Uma das

conseqüências desta fragmentação é evidenciada na dissociação entre o que é

aprendido e o que a realidade escolar permite. O trabalho continua sendo

convencional, com ênfase nos aspectos físicos e no rendimento motor, onde a base

é a competição esportiva, conforme indicam os estudos de Souza (1990).

Neste caso é visível o despreparo dos docentes de Educação Física

recém-formados para enfrentar a realidade do cotidiano, evidenciando também a

falta de sustentabilidade na relação teoria e prática.

4.3 A difícil arte de ensinar e aprender

Inúmeras razões levam o docente e o discente do curso de Educação

Física a sentirem-se desmotivados. Uma delas, certamente é a percepção por parte

do docente, da falta de interesse do aluno pelas questões teórico pedagógicas junto

ao curso.

Muitos jovens adentram o curso imaginando que suas aulas serão

todas no campo de futebol ou à beira da piscina, por exemplo. Quando percebem o

quão sério e teórico é, e deve ser o curso, acabam desistindo do mesmo ou

criticando esta situação severamente.

Como já citado, somos todos sujeitos da história e este é o referencial

de Educação Física que o aluno que pleiteia a profissão possui. Cabe a nós

professores, informar ao aluno das responsabilidades pedagógicas a profissão de

professor, para que este futuro profissional não repita as mesmas aulas que teve

quando ainda era aluno. E que o levaram a crer que o curso superior de Educação

Física seria um festival de bolas, jogos e competições, sem alicerce teórico.

O que há de mais grave, neste sentido, é que o “professor que não

aprende com prazer não ensinará com prazer” (SNYDERS, 1990, p.47), e cada vez

mais estarão sendo jogados no mercado de trabalho, professores sem a noção da

75

importância do saber ensinar. Professores capazes, quando muito, apenas de

transmitir o conhecimento adquirido em quatro anos de uma angustiante graduação.

Drucker (1995,p.156) nos salienta que é preciso aprender como se

aprender:

Na verdade, na sociedade do conhecimento as matérias podem ser menos importantes que a capacidade dos estudantes para continuar aprendendo e que a sua motivação para fazê-lo. A sociedade pós-capitalista exige aprendizado vitalício. Mas aprendizado vitalício exige também que ele seja atraente, que traga em si uma satisfação.

Neste contexto, podemos observar que é importante que o aluno

entenda o significado do que lhe está sendo proposto, a utilização prática dos

conceitos e da teoria aplicada, para assim se manter motivado e envolvido cada vez

mais com o seu processo de aprendizagem.

Lucci (1998, p. 3) nos chama atenção para o fato de que sabemos dos

problemas enfrentados pelo professor em sala de aula, mas mesmo sem métodos

adequados, com salas abarrotadas de alunos, muitas vezes sem os recursos e

estrutura necessários, “o processo pedagógico não chega a estar comprometido se

existir o fundamental: a vontade de ensinar e o gosto pela atividade docente”.

Cláudio Moura e Castro, em agosto de 1998, num artigo publicado na

Revista Veja5, dizia que “a essência do aprendizado tem que ver com o professor,

aquele que ministra, que testemunha, enriquece e dá vida a uma série de

processos que levam o aluno a aprender”.

Cabe evocar as palavras de Platão (apud BARROS, 2002, p. 19) onde

um dos interlocutores diz ao mestre: “parece-me que receias entrar nessas

questões por causa da nossa ignorância. E responde o mestre: Muito mais recearia

tratar com pessoas que tivessem estudado tais coisas, porém mal. No caso, não é a

ignorância das multidões a mais perigosa, nem a mais temível, nem o maior dos

5 CASTRO, Cláudio de Moura. Modelo de educação. Revista Veja. São Paulo: Abril. 19 de agosto de 1998. P. 110-115.

76

males. Ter estudado muito e muito, haver aprendido, mas com métodos viciosos, é

mal muito maior”.

Ou seja, aprender mal é pior que não aprender. Assim, deixemos

nossos alunos livres de nossa ignorância, se não for para dá-los formas de

aprender a ensinar, subsidiá-los na reflexão de sua própria prática e torná-los

educadores e não meros executores.

Na busca de uma educação universitária contextualizada, é

necessário que sejam respeitadas todas as individualidades. O professor também é

ser humano, com necessidades, carências e passível de erro, precisa ser tratado na

amplitude de sua dignidade de cidadão.

Mas, nesta difícil arte de ensinar, é preciso estar disposto a “repensar

o vivido, ousando criar novas possibilidades para redescobrir outras formas de

ensinar, capazes de despertar o apetite dos estudantes para o processo a ser

travado com o conhecimento” (DESORDI, apud VEIGA &CASTANHO, 2000, p.232).

Neste caso, poderíamos pensar a Capoeira enquanto nova prática de

ensino, enquanto meio para despertar o tal apetite pelo aprender, pelo

conhecimento.

Por fim, valem-nos as colocações de Gadotti (2003, p 48):

Nós educadores, precisamos ter clareza do que é aprender, do que é aprender a aprender, para entendermos melhor o ato de ensinar. Para nós, educadores, não basta saber como se constrói o conhecimento. Nós precisamos dominar outros saberes da nossa difícil tarefa de ensinar. Precisamos saber o que é ensinar, o que é aprender e, sobretudo, como aprender.

A Capoeira pode surgir então, como um novo saber a ser dominado

pelos futuros docentes de Educação Física, como nova proposta de educação tão

viável quanto outras tantas já preconizadas como conteúdos, ainda assim,

trataremos a seguir da sua importância eminente junto à disciplina de Educação

Física.

77

4.4 A Capoeira na Educação Física

A Capoeira pode ser considerada uma das atividades humanas

culturalmente construídas que mais atende as vertentes curriculares atuais da

Educação Física, seja em relação à ginástica, à dança, aos jogos ou aos esportes e

no quadro elaborado por Monteiro (2000, p. 22-24) encontra-se várias formas de

analisar a Capoeira sob a ótica da Educação Física que justificam esta afirmação:

Quadro 4 : A Capoeira enquanto Educação Física Atividade ginástica Devido a sua diversidade gestual facultar movimentações

riquíssimas o que toca à originalidade, variabilidade e exigência neuromotora.

Segmentos corporais

Trabalhados de diversas formas (sentido, intensidade, direção, contração, etc. como estimuladores de valências físicas).

Dança Seu exercício é comandado pelo ritmo dos instrumentos a ela afetos, ritmo esse que deverá ser respeitado para uma correta organização do jogo.

Atividade rítmica O fato de todos terem de tocar os diversos instrumentos de percussão faz com que todos se beneficiem de uma percepção rítmica. E ainda, as seqüências de movimentos aprendidas, inseridas no compasso rítmico, tem efeito similar ao das seqüências coreográficas da dança, em termos de controle neural.

Jogo A constituição própria da Capoeira (o jogo da Capoeira)

Brincadeira O caráter lúdico se evidencia favorecendo a integração do sujeito no todo comunitário (social), onde ele terá que se afirmar como único e como parte do todo.

Esporte Haja vista a mercantilização já ter atingido todos os setores sociais. Apesar de incipiente o fator esportivo já se faz presente em competições de Capoeira

Fonte: (MONTEIRO 2000, p. 22-24)

Tendo em vista as considerações apresentadas no quadro acima

podemos nos referir à Capoeira como meio de Educação Física, idéia reforçada por

Lussac (1996, p.37):

78

Da parte psicomotora, pode-se falar que a Capoeira desenvolve a coordenação motora, explorando a sua lateralidade, a percepção do próprio corpo e o seu relacionamento com outros corpos (pessoas); desenvolve também o equilíbrio estático e dinâmico e a percepção espaço-temporal, conjugando como o ritmo (instrumental e canto), que também cadencia a velocidade e intensidade dos movimentos a serem desenvolvidos. Junto com a respiração diafragmática que é aperfeiçoada pelo canto, pro exemplo, o perfeito controle da respiração (educando-a inconscientemente) entre harmonia através da motivação contínua, com movimentos diferentes e alternados. A resistência muscular, força, capacidade aeróbica e anaeróbica, agilidade, equilíbrio, impulsão e flexibilidade são amplamente trabalhados com um grande número variações, através dos movimentos, tanto que nesta arte a criatividade e expressão corporal são fundamentais.

Outro fator no qual a Capoeira interfere é em relação ao

desenvolvimento afetivo-social, na medida em que sua prática leva inevitavelmente

ao estabelecimento de relações sociais com o grupo no qual se está inserido.

O aluno, ao praticar a Capoeira, o faz em sua amplitude, se

movimentando, criando, pensando em como se sair melhor, inovando situações e

estimulando seu companheiro a fazer o mesmo e ainda se expressam juntos,

brincam juntos, jogam, se comunicam, se interagem, ensinam e aprendem um com

o outro.

Por intermédio da roda de Capoeira é possível que haja a relação com

o companheiro, estabelecendo um conhecimento de suas possibilidades, vantagens

e limitações, numa quase negociação. O que é fundamental para o

desenvolvimento do respeito mútuo e da humildade, atributos essenciais par uma

vida social saudável.

As interações sociais desenvolvem, ainda, o senso de cooperação, de

liderança, de responsabilidade e participação, fatores que contribuem para alargar o

diálogo inter-social entre agentes sociais que talvez não tivessem esta oportunidade

em outra ocasião de suas vidas. Afinal, na roda de Capoeira, todos são brancos e

todos são pretos, todos são ricos e todos são pobres: são todos iguais.

Neste sentido, cabe a contribuição de Rocha (1994, p, 58): “ainda

podemos destacar aquele misterioso e inexplicável sentido que cada indivíduo

carrega dentro de si no memento de entrar na roda e que não há pesquisa que se

concentre neste detalhe que possa nos trazer tantas revelações”.

Acredita-se que a Capoeira, então, se solidifica cada dia mais e

justifica sua existência como conteúdo da Educação Física, seja ela aplicada nas

79

escolas ou em centros que visam o puro desenvolvimento esportivo, como

apresenta Santos, (1983, p. 119):

Numa concepção didática consideramos a Capoeira uma atividade física completa, pois atua de maneira direta e indireta sobre os aspectos cognitivos, afetivo e motor. Sendo encarada como lúdica e instrucional, articula atividades de desenvolvimento visomotor com desenvolvimento artístico e social levando a criança a estabelecer relações a partir dela própria, fato que torna a Capoeira multidirecional, uma vez que permitirá, desde que adequadamente conduzida, desenvolver na criança noções de equilíbrio e disciplina.

Porém, alguns aspectos ainda travam ou tencionam a chegada da

Capoeira no meio acadêmico e dentre eles citamos os seguintes:

- a visão técnica da Capoeira, percebida apenas como uma luta de

academia e não como possível ação educativa e cultural;

- o preconceito em relação a Capoeira, devido à sua trajetória

histórica;

- o não conhecimento das contribuições da Capoeira para o

desenvolvimento motor, cognitivo e afetivo-social do praticante;

- a noção superficial de que é preciso ser “Mestre” em Capoeira para

poder ensiná-la com propriedade.

Reconhecer, perceber a Capoeira como uma atividade

essencialmente rica em aspectos educativos e culturais não é, realmente, tarefa

fácil para o acadêmico de Educação Física, pois o mesmo traz a sua própria

experiência enquanto aluno da fase escolar, onde seus professores ousavam pouco

e não desafiavam a ordem já estabelecida.

Segundo Rocha (1994), o preconceito em relação a algumas práticas

pode levar o estudante que está em uma universidade cursando Educação Física a

desvalorizar atividades que, sem ele perceber, dizem muito de seu dia a dia e do

seu passado. Atividades folclóricas, rítmicas, culturais, musicais, etc, são pouco

valorizadas pelas universidades e pelos estudantes.

Ensinar a Capoeira na Universidade, para que ela seja ensinada na

escola acaba sendo um grande desafio. Incluí-la ao processo educativo, da mesma

forma que outras modalidades esportivas, já tão conhecidas é trabalho complicado.

80

Pois somos acomodados, logo nos vem à cabeça questões como: Mudar para quê

se ninguém reclamou até agora?

O professor luta contra o fenômeno da mídia televisiva, que mostra a

toda hora, corpos bem definidos, esportes sendo praticados visando a competição,

dando abertura, ainda, à manifestações estrangeiras que são lançadas nestes

países, com tecnologias avançadas e com a “marca cultural” de origem bem

definida, as quais engolimos a seco, muitas vezes em detrimento de nossa própria

cultura.

Se pensarmos também, no fator receptividade do aluno, que é sempre

imprevisível, a parte histórica, a estrutura da aula diferente, a utilização de

instrumentos musicais, tudo isso tornaria a aula de Educação Física diferente

demais, chamaria atenção, revelaria outros valores. Acreditamos que seria um bom

começo no processo de transformação da prática pedagógica tradicional ainda

enraizada em nosso cotidiano profissional.

Uma das grandes preocupações de professores recém-formados em

Educação Física sobre como dar aulas de Capoeira na escola decorre do fato de

acharem não terem sido bem preparados tecnicamente para tal. Então, talvez isto

signifique que também não tenham sido bem preparados para dar aulas de

basquete, futebol, vôlei, natação, etc, já que o princípio do ensino da Capoeira na

Educação Física é o mesmo que para tais atividades.

Em entrevista concedida à Jaqueira (2006), o Professor Doutor Paulo

Coelho Araújo responde a duas questões importantíssimas quando tratamos da

validade do ensino da Capoeira na Universidade, junto à formação docente:

Revista Estação Científica- É possível aprender a Capoeira em um semestre letivo? Paulo Coelho Araújo – Depende do que se quer dizer com “aprender a Capoeira”. É possível aprender alguns dos movimentos da Capoeira, é possível aprender a utilizar conscientemente esses movimentos básicos, não só com a perspectiva de desenvolvimento físico, mas também como elemento rítmico, como elemento de dança de cariz coreográfico, considerando fundamentalmente o nível de desenvolvimento psicomotor dos indivíduos, ou a característica da clientela a ser atendida.

A resposta do referido professor vem ao encontro ao que tratamos

nesta pesquisa, pois todas as quatro Instituições de Ensino Superior aqui

81

envolvidas destinam à disciplina Capoeira, um semestre letivo. Neste sentido,

concordamos com o Professor Paulo Coelho Araújo, acreditando que a Capoeira

não pode ser vista como meio de desenvolvimento ou aprimoramento técnico

durante as aulas na universidade, mas apenas como uma iniciação à prática da

atividade a fim de despertar o interesse tanto do acadêmico em trabalhá-la durante

sua ação docente, como de seus futuros alunos em aprender Capoeira e através

dela desenvolver uma série de valores e valências já comentados no decorrer desta

pesquisa.

Revista Estação Científica – Qual é a função de se ensinar a Capoeira aos futuros profissionais da Educação Física? Paulo Coelho Araújo – Entendo que, assim como o Vôlei, o Basquete, o Futebol, o Karatê, o Judô e tantas outras modalidades desportivas, possuem um potencial educativo, a Capoeira, é igualmente mais um recurso de natureza educativa, riquíssima em elementos de cariz rítmico-melódicos e corporais da nacionalidade brasileira, riquíssima ainda em componentes histórico-culturais, recheadas de movimentos muito particulares e possuidora de formas multifacetadas que nos permitem trabalhar os seus aspectos de luta de defesa pessoal, lúdico, coreográfico, folclórico e desportivo. Sendo assim, nossos alunos em Educação Física precisam aprender como desenvolver essas várias facetas e não se manterem presos e estáticos perante a somente uma forma de expressão da Capoeira que é o da luta ou do que é chamado jogo, conseguindo assim compreender as várias dimensões que esta expressão corporal tem para aplicá-las nos ambientes adequados: seja na Escola, seja na Comunidade em algum centro comunitário, de forma a levar essas pessoas a aprenderem um pouco da cultura brasileira e um pouco da corporeidade brasileira, pois que esta expressão é um exemplo típico e acabado da expressividade corporal do indivíduo brasileiro.

Fica claro, assim, que a Capoeira ao fazer parte da capacitação

profissional do docente de Educação Física tanto como outras modalidades os

torna aptos a ensinar a Capoeira como iniciação na escola e principalmente como

meio de socialização, de auto-descoberta, de educação.

82

CAPÍTULO V

5.1 O CAMINHO METODOLÓGICO DA PESQUISA

5.1.1 A opção pela pesquisa qualitativa do tipo par ticipante

Com o objetivo de investigar como a disciplina Capoeira, no curso de

Educação Física pode subsidiar a prática pedagógica desta atividade, em ambiente

escolar do futuro profissional, utilizamos como metodologia de pesquisa a

abordagem qualitativa tipo participante.

A abordagem da metodologia qualitativa torna-se importante no

momento em que concebe os sujeitos envolvidos como atores, ou seja, àqueles que

possuem a capacidade de “retratar e refratar” a realidade, sendo “um movimento

totalizador que reúne a condição original, o movimento significativo do presente e a

intencionalidade em direção ao projeto futuro” (MINAYO, 1999, p.252).

Minayo (1999) em seus estudos sobre a aplicação da metodologia

qualitativa procura mostrar que:

É a partir dos indivíduos, dos grupos ou das classes que a totalidade fundamental se expressa no perene conúbio entre mente e corpo, matéria e espírito: que na aparente simplicidade de uma manifestação verbal, os sujeitos individuais projetam sua visão de sociedade e de natureza, a historicidade das relações e condições de produção inscritas no seu corpo, seu espaço, sua temporalidade social, seus infinitos culturais, seus fetiches, seus fantasmas e seus anseios de transcendência (p.252).

Além disso, a autora assinala que a metodologia qualitativa requer

referenciais teóricos, instrumentos de coleta de dados que possibilitem a apreensão

da realidade, tudo isso somado ao potencial criativo do pesquisador.

O fato de o pesquisador ser docente da disciplina de Capoeira em

duas das Instituições de Ensino Superior participantes deste trabalho, já o torna um

inter-agente da pesquisa. Mas sua relação com o objeto de estudo é ainda mais

intensa e porque desde antes de sua graduação já estava envolvido com a

Capoeira.

Neste sentido, a pesquisa participante também se constitui uma

metodologia apropriada. Uma investigação desse caráter rejeita a distância

83

tradicional entre o sujeito, o pesquisador e o objeto, buscando a participação ativa e

conjunta.

Um dos problemas que se coloca para reflexão refere-se à relação

entre o quanto se observa e o quanto se participa quando o pesquisador se

encontra no campo. Brandão (1984), com a perspectiva de superar tal

questionamento, aponta uma certa orientação para a abordagem das relações que

ali se estabelecem. Assim ele observa: "É necessário que o cientista e sua ciência

sejam, primeiro, um momento de compromisso e participação com o trabalho

histórico e os projetos de luta do outro, a quem, mais do que conhecer para

explicar, a pesquisa pretende compreender para servir". (BRANDÃO, 1984, p. 12).

O autor retrata ainda que a pesquisa participante não é uma simples

pesquisa e sim, uma estreita vinculação a uma visão de mundo: “Pesquisa

participante é a explicitação de uma intencionalidade” (BRANDÃO, 2000, p.16).

Os objetivos da pesquisa participante dão suporte à intencionalidade

afirmada anteriormente e que neste estudo basicamente resumem-se em dois: visa

à compreensão e transformação da realidade; questiona a monopolização do saber

e do conhecimento provocando reconstruções, afirmando o papel do docente como

mediador e problematizador.

A prática da pesquisa participante favorece a criação de um ambiente

de indagações, questionamentos, discussões, debates, trocas de informações e

proposições. A pessoa é reconhecida como sujeito, pois há a valorização do seu

pensar através de sua linguagem de senso comum. E, a partir disso, “é possibilitada

a construção do conhecimento, numa ótica menos fragmentada, linear,

descontextualizada e impositora, numa perspectiva dialética” (ROSSETTO,

GAUER, CASTOLDI, 2005, p. 4)

No entanto, André (1992), avaliando a produção científica que se

desenvolveu sob a metodologia da pesquisa participante nos últimos dez anos

avalia:

O que se verifica, é que a grande maioria envolve dados de campo, sistematizados em forma de descrições que acrescentam muito pouco ao que se sabe ou conhece ao nível do senso comum. É a empiria pela empiria. O autor parece satisfazer-se com o fato de coletar uma grande quantidade de dados e parece esperar que esses dados por si produzam alguma teoria. Mas é evidente que sem um referencial de apoio que oriente o processo de

84

reconstrução desses dados não há avanço teórico, fica-se na constatação do óbvio, na mesmice, na reprodução do senso comum (p. 31/32).

A proposta que se coloca aqui vai na direção de superar tais

limitações. Trata-se de ir para além do senso comum. Trata-se, segundo

Ezpeleta&Rockwell (1986). de "documentar a realidade não-documentada" uma vez

que:

A heterogeneidade e a individualidade do cotidiano impõem o reconhecimento de sujeitos que incorporam e objetivam, a seu modo, práticas e saberes dos quais apropriaram em diferentes momentos e contextos de vida, depositários que são de uma história acumulada durante séculos (p. 28).

Assim, seguiu-se esta pesquisa com a elaboração um questionário

para professores e acadêmicos que desencadeou relatos dos acadêmicos sobre as

expectativas dos mesmos em relação à disciplina de Capoeira, e se estas foram

correspondidas; os conteúdos abordados; as possibilidades de relação entre os

conteúdos da disciplina de Capoeira com outras disciplinas ou atividades da

Educação Física; a contribuição da disciplina de Capoeira para a formação e

atuação para a futura prática docente. Dos professores, objetivamos observar suas

considerações sobre a importância da Capoeira no Currículo do Curso de Educação

Física; se a carga horária dispensada à disciplina de Capoeira é suficiente para a

capacitação profissional do futuro docente.

5.1. 2 População / amostra da Pesquisa

Como critérios de inclusão para professores foram observados os

seguintes: Ser professor de Educação Física de uma das quatro Instituições de

Ensino Superior envolvidas na pesquisa e ser professor da disciplina de Capoeira

ou equivalente (Lutas).

E como critérios de inclusão para alunos: Estar matriculado em uma

das quatro Instituições de Ensino Superior envolvidas na pesquisa; ser aluno do

85

curso de Educação Física; estar cursando ou ter cursado a disciplina de Capoeira

ou equivalente.

As quatro Instituições de Ensino Superior envolvidas na pesquisa

foram: uma Universidade particular de grande porte; uma Universidade confessional

de grande porte, um Centro Universitário de grande porte e uma Universidade

Federal de grande porte, devido a estas instituições apresentarem em seu currículo

acadêmico a disciplina de Capoeira ou alguma disciplina onde a Capoeira também

é abordada.

No entanto, algumas considerações foram observadas de acordo com

cada instituição, que agora passarão a ser chamadas de Instituições de Ensino

Superior ou IES e que serão listadas como A, B, C e D aleatoriamente afim de que

sua identificação seja preservada, cabendo ainda comentar o nome das disciplinas

em cada Instituição: “Metodologia do Ensino das Lutas”, “Capoeira”, “Teoria e

Prática das Artes Marciais” e “Lutas”.

A seguir apresentaremos a carga horária dispensada à disciplina em

cada IES, bem como o nível de formação; o ano de inclusão da disciplina em

questão e o número de alunos e professores:

IES A:

* carga horária: 40 horas/ Semestre

* nível do curso: Licenciatura Plena

* ano de inclusão da disciplina: 2001.

* 26 alunos participantes

IES B:

* carga horária: 54 horas/ Semestre

* nível do curso: Licenciatura Plena

* ano de inclusão da disciplina: 2005

* 49 alunos participantes

IES C:

* carga horária: 40 horas/ Semestre

* nível do curso: Bacharelado e Licenciatura (distintamente)

* ano de inclusão: 2003

86

* 36 alunos participantes

IES D:

* carga horária: 60 horas/ Semestre

* nível do curso: Bacharelado e Licenciatura (distintamente)

* ano de inclusão:1988

* 24 alunos participantes

Foram observados um total de 135 alunos 2 professores

5.1.3 Instrumentos da Pesquisa

O universo investigado envolveu um total de 135 de alunos

distribuídos em: 26 da IES A; 49 da IES B; 36 da IES C; 24 da IES D, e também 2

professores, tendo em vista que o professor da disciplina em duas das quatro

instituições é o próprio pesquisador.

Como instrumento de pesquisa foram utilizados dois questionários

com perguntas abertas. Segundo Deshaies (2002) o questionário é um instrumento

de investigação que visa recolher informações baseando-se, geralmente, na

inquisição de um grupo representativo da população e estudo. Para tal, coloca-se

uma série de questões que abrangem um tema de interesse para os investigadores

tornando-o um instrumento de recolha e avaliação de dados muito importante na

pesquisa científica.

Assim, o primeiro questionário (Apêndice A), foi destinado aos

acadêmicos dos Cursos de Educação Física, onde o objetivo é investigar como este

aluno entende a disciplina de Capoeira no ensino superior, ou seja, na visão do

acadêmico, quais as contribuições especificamente da Capoeira para a sua

formação, a partir do subsídio fornecido pelo docente da área.

O segundo questionário (Apêndice B), destinamos a professores da

disciplina de Capoeira e teve como objetivo principal observar e analisar a prática

pedagógica destes durante suas aulas para também perceber a influência desta

postura na formação do futuro docente.

87

5.1.4 Descrição da Pesquisa

Partindo da disposição de reconhecer e encontrar possíveis respostas

ao problema levantado neste estudo, algumas etapas foram desenvolvidas:

• 1ª Etapa – Inicialmente buscamos uma revisão bibliográfica sobre a

história da Capoeira; sobre a evolução cronológica dos Paradigmas da Educação

relacionando-a ao desenvolvimento das concepções de Educação Física; e ainda,

sobre a docência no ensino superior.

• 2ª Etapa – Delimitação da amostra da pesquisa (população e

instrumentos).

• 3ª Etapa – Apresentação do Projeto de Pesquisa para o Comitê de

Ética da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, para aprovação (Apêndice C)

• 4ª Etapa – Após a aprovação do Projeto de Pesquisa pelo Comitê de

Ética da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e a devolução dos Termos de

Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice D), teve início a coleta dos dados.

• 5ª Etapa – Logo após a coleta e análise dos dados foi elaborada a

conclusão preliminar, com o objetivo de responder a pergunta de pesquisa e aos

objetivos propostos.

Neste momento da pesquisa pretendemos evitar qualquer tipo de

reducionismo, procurando antes construir um conhecimento que releve da

dimensão qualitativa dos fenómenos estudados tendo como perspectiva a descrição

apresentada dos mesmos, e que ainda assim nos possa permitir algum tratamento

estatístico julgado pertinente.

Para Kerlinger (1980, p. 335) a metodologia utilizada quando da

análise dos dados de uma pesquisa significa "maneiras diferentes de fazer coisas

com propósitos diferentes", ou seja, maneiras de formular problemas, hipóteses,

métodos de observação e recolha de dados, medida de variáveis e técnicas de

análise de dados. No entanto, como o mesmo autor refere, a "metodologia inclui

também aspectos da filosofia da ciência", pressupondo uma constante atitude de

análise crítica, sobretudo quando tal análise assume a forma de uma crítica

epistemológica dos conceitos utilizados, no quadro de uma investigação.

88

Assim, conscientes da forte influência da metodologia no processo de

investigação é este o sentido mais genuíno da nossa opção metodológica, com

conceitos simultaneamente instrumental e conceitual.

Os dados para reflexão aqui apresentados, como já citado, foram

extraídos de questionários propostos a dois grupos de indivíduos (professores e

acadêmicos), com objetivos exploratórios e serão tratados distintamente a seguir

explicitando as questões por eles respondidas.

5.2 Contribuições dos (das) professores (as)

A Importância da Capoeira no Currículo do Curso de Educação Física

O currículo padrão, o currículo de transferência é uma forma mecânica e autoritária de pensar sobre como organizar um programa, que implica, acima de tudo, numa tremenda falta de confiança na criatividade dos estudantes e na capacidade dos professores.

Paulo Freire

Várias são as vertentes curriculares da Educação Física e de modo

geral nelas sempre estão preconizadas conteúdos como a ginástica, a dança, os

jogos e os desportos. A Capoeira é passível de adequação para qualquer destas

vertentes e eventualmente os currículos de Educação Física se propõem a oferecer

experiências que visam oportunizar a aquisição de um acervo motor amplo, que

permita maior independência de quem a vivenciar, pensando que assim, não

haveria limitações de ordem motora para experimentar qualquer modalidade ou

atividade.

A consideração da situação de estímulo ao acervo motor em muitos

currículos acaba propondo uma série de atividades que, embora importantes,

exigem maior conhecimento técnico e até mesmo obtenção de materiais que a

maioria das instituições de ensino não consegue adquirir.

Ao pensarmos em atividades capazes de reunir uma variedade de

padrões motores com o desenvolvimento de um grande número de capacidades

89

físicas, a Capoeira se mostra como instrumento útil no cumprimento dos objetivos

curriculares. Neste sentido, ao perguntarmos aos docentes da disciplina de

Capoeira sobre a importância da Capoeira no currículo do curso de Educação

Física obtivemos as seguintes respostas:

Como implícita nas contribuições feitas pelos professores, a Capoeira

em função de toda a sua ritmicidade, musicalidade, ainda pode dar conta dos

aspectos motor, cognitivo e afetivo do desenvolvimento humano. Podemos ainda

perceber que ambos os professores acreditam na importância da Capoeira

enquanto conteúdo a ser trabalhado junto à formação de professores de Educação

Física.

Neste sentido, a Capoeira pode e deve ser incentivada e promovida

nas instituições de ensino. Com a grande vantagem de não exigir para o seu

aprendizado, materiais sofisticados e caros, mas simplesmente o corpo e a vontade

de praticar dos indivíduos envolvidos.

Muitas vezes, de nada adianta o aluno do curso de Educação Física

aprender as técnicas ou regras da esgrima, por exemplo, ou ser subsidiado

didaticamente sobre os fundamentos do Voleibol, onde todos os alunos têm uma

bola cada um e espaço oficial de treino, quando a realidade encontrada na maioria

das escolas estatais e até mesmo de algumas escolas particulares, é bem diferente.

São estes, locais onde a criatividade do educador não pode jamais ter fim, tendo

que driblar a falta de estrutura física, material e também cultural para o rompimento

de padrões educacionais.

A realidade dos alunos, onde a escola está inserida, deve ter papel

preponderante e deve ser respeitada no momento da oferta de atividades pelos

professores de Educação Física. Assim, arriscamos dizer que se o que sonhamos é

Sim, por fazer parte da cultura brasileira. Por trabalhar com música. Por poder ser caracterizada como dança, luta e folclore desenvolvendo competências do conhecer, do fazer e quando o professor é capaz, pode transmitir virtudes, valores, edificando o ser (Prof. 1).

Sim, a riqueza de conteúdos pedagógicos rítmicos e a bagagem cultural propiciadas pela Capoeira são inestimáveis no contexto da formação de profissionais de Educação Física (Prof. 2).

90

uma Educação Física não mecanicista e voltada para a formação de um ser integral

(holístico), a Capoeira pode ser um meio para o alcance de tal conceito.

Expectativas dos Acadêmicos na Visão do Docente

Ao indagarmos os participantes sobre qual a sua percepção a respeito

das expectativas dos acadêmicos de Educação Física sobre a disciplina de

Capoeira, foi possível destacar:

Constatamos nestes discursos duas situações: na primeira que o

aluno chega à faculdade esperando encontrar um conteúdo extremamente voltado

ao aprendizado técnico da modalidade. Aprender a lutar ou a jogar Capoeira

suplanta a idéia de aprender a ensinar a lutar ou aprender a ensinar como se joga

Capoeira. Na segunda situação a diferenciação da disciplina nos níveis do

Bacharelado e Licenciatura.

Nas falas dos professores percebemos que o (jovem) acadêmico não

conhece profundamente (tecnicamente) a atividade e busca este aprofundamento

no próprio curso. Contudo, o aluno precisa estar ciente de que o aprimoramento

técnico de qualquer atividade, seja Voleibol, Futebol, Natação ou mesmo a

Capoeira, se obtém em centros de treinamento específico que visam a

especialização, fora do ambiente universitário.

Estão presentes também nos depoimentos, referências ao caso da

Licenciatura, afirmando que a expectativa do aluno é com relação a adequação da

iniciação da atividade a uma boa progressão pedagógica. O que seria um grande

Identificar as lutas quanto suas características de arremesso ou projeção, corpo a corpo (imobilizações, estrangulamentos e chaves de articulações) e percussão (batidas, pancadas através de golpes com membros articulações). Identificar as capacidades físicas predominantes em cada grupo. Perceber a filosofia das lutas, uma introdução ao menos. Entender a origem e a história das lutas. E no caso do Bacharelado como periodizar um treinamento e para a Licenciatura com adequar uma iniciação com boa progressão pedagógica (Prof. 1).

Muito desconhecimento sobre os conteúdos das lutas e precariedade de material didático pedagógico para a disciplina (Prol. 2).

91

avanço para uma melhor formação profissional, haja visto que muitas vezes, os

acadêmicos começam a freqüentar as aulas (exceto os ex-atletas) sem a noção de

tais elementos, ou da sua importância para o aprendizado.

Muitos acadêmicos não conseguem distinguir a real intenção da

diferenciação entre Bacharelado e Licenciatura, o que fez com que sigam uma ou

outra linha sem um aprofundamento de suas características.

O que podemos obervar também é que a distinção feita pelo Professor

1, entre o conteúdo proposto ao Bacharelado e à Licenciatura de Educação Física,

gera a conseqüente distinção na docência da disciplina Capoeira nos dois níveis,

nos fazendo entender que o saber transmitido junto ao Licenciado é pedagógico e

didaticamente preparado para a atuação no meio escolar, enquanto que o Bacharel

o conteúdo é voltado ao alto rendimento, à formação de atletas.

Sob este prisma, deixamos de ver o Bacharel como professor e

passamos a percebê-lo como treinador e ainda tiramos deste profissional

qualidades inerentes à educação, como a valorização de fenômenos sociais,

cognitivos e afetivos do atleta/aluno. Assim, o professor/treinador estaria capacitado

a treinar atletas, sem vinculação com a relação ensino-aprendizagem.

Nós, docentes de curso superior em Educação Física por força de

sermos sujeitos da evolução histórica do curso, também nos vemos perdidos sobre

como transmitir os mesmos conteúdos à Bacharéis e à Licenciados e continuamos

perpetuando e investindo numa formação docente fragmentada.

Quando há tempos atrás questionávamos fechamentos dos currículos,

não pensávamos que a maleabilidade posteriormente ocorrida teria uma

manutenção tão trabalhosa. Abriu-se um leque de grandes possibilidades, resta-nos

conseguir articulá-las à Educação Física para que num movimento cíclico não

sejam novamente compartimentadas, ou então fiquem soltas em demasia.

Tornando os saberes da Educação Física, em função da quantidade, saberes muito

superficiais aparecendo em vários segmentos sociais sem que realmente se tenha

sido formado para isto.

Como questionamento sobre a carga horária dispensada à Capoeira

durante as aulas e se o docente acredita que estas foram suficientes para capacitar

seu aluno a dar aulas de Capoeira na escola, pudemos colher os seguintes

depoimentos:

92

Ambos os professores acreditam que a carga horária dispensada a

disciplina que ministram é curta para que seja possível capacitar o aluno a uma

ação docente de qualidade.

Porém, ao encarar a carga horária como pequena, os professores

deixam de acreditar que é viável o tempo destinado à disciplina para a formação

profissional, o que aparentemente é contraditório se pensarmos que o aluno não

necessita ser um exímio lutador para que possa ensinar os elementos necessários

desta modalidade. aprendeu na faculdade aos seus alunos.

Mais uma vez, devemos lembrar que a Educação Física na escola não

objetiva a formação de atletas, e sim poder dar ao aluno uma maior variedade de

atividades que possam fazê-lo vivenciar e trabalhar uma maior quantidade de

valências físicas, bem como questionar sua condição de cidadão crítico e reflexivo.

5.3 Depoimentos dos acadêmicos

Expectativa sobre a Disciplina de Capoeira

Lembrando que para que fossem salvaguardadas as identidades dos

acadêmicos dos cursos de Educação Física envolvidos nesta pesquisa, bem como

suas respectivas instituições, estes foram denominados como: Sujeitos, e

receberam um número (exemplo: Suj. 1, Suj. 2 e assim por diante) e as instituições

serão IES A, IES B, IES C e IES D.

As contribuições apresentadas pelos acadêmicos dos cursos de

Educação Física permitiram coletar dados significativos para esta pesquisa. Ao

serem indagados sobre qual era sua expectativa ao saber que teriam a Capoeira

como disciplina curricular, foi possível destacar o seguinte:

A carga horária é de 8 horas mensais. Não acho suficiente para a capacitação do aluno, em virtude do pouco tempo e pela proposta da ementa direcionada a apresentar as lutas superficialmente (Prof. 1).

A carga horária da disciplina de lutas é pequena, e da Capoeira menor ainda, pois é ministrada em forma de seminário. Não sendo suficiente para informar aos alunos, imagine formar (Prof. 2).

93

� IES A:

As contribuições aqui expostas foram escolhidas por representarem a

idéia expressa em grande parte das respostas obtidas em cada instituição. A partir

de tais respostas, podemos verificar que os acadêmicos envolvidos na pesquisa

criam expectativas assentadas naquilo que vivenciaram durante a escola, nas

academias e nos clubes, esperando encontrar a mesma realidade na Universidade.

Ao analisarmos os depoimentos dos acadêmicos da IES A,

percebemos que o aluno ainda se assusta com a proposta de novos conteúdos. Ele

ainda está sendo influenciado pela sua vivência quando era aluno da fase escolar,

onde os esportes coletivos eram supervalorizados, fazendo parecer que tudo o que

fosse feito fora do contexto dos esportes coletivos era “menos” Educação Física

que os mesmos.

O fator novidade talvez seja a questão mais difícil de ser suplantada

para a aceitação da Capoeira como conteúdo da Educação Física, por parte de

alguns acadêmicos.

Curiosidade em saber qual a relação da Capoeira com a Educação Física (Suj. 26).

Não foram muito boas, eu não gostava de Capoeira, além disso achava pouco tempo para aprender uma luta tão complexa (Suj. 11).

Fiquei receosa, pois tenho uma certa dificuldade com lutas (...) e também curiosa para saber de que maneira a Capoeira me acrescentaria algo como professora futuramente (Suj. 29).

Aprender a fazer golpes de Capoeira (Suj. 27).

Não fiquei entusiasmada, pois é uma atividade que não tenho interesse em trabalhar depois de formada (Suj. 6).

Gostei, mas tive medo de não conseguir realizar os movimentos específicos da Capoeira (Suj. 2).

94

� IES B:

Através dos depoimentos dos acadêmicos da IES B podemos ver que

para muitos deles, a implantação de conteúdos novos serve de motivação e

estímulo ao aprendizado. A mesma motivação e estímulo que durante 18 anos

ministrando aulas, o autor desta pesquisa é capaz de observar nos olhos dos

alunos, nas aulas de Educação Física de escolas do Estado.

O (simples) som do Berimbau, a música, um movimento básico de

Capoeira e a perspectiva de uma aula diferente são suficientes para transformar tal

aula em um ambiente de aproximação entre professor e aluno, provocando um

efeito mágico de troca de experiências onde se torna impossível não pensar em

aprendizado mútuo.

Segundo os depoimentos, percebemos também que a Capoeira é

outra opção de atividade, para que possamos não mais repetir o ensino que

tivemos, buscando “reciclar” boas posturas e mesclá-las às novas atividades,

valorizando a realidade do aluno em questão. Aluno que anda tão carente de uma

chance para se expressar corporalmente e à espera da criatividade do professor de

Educação Física permitindo que dentro da aula isto se efetive.

Contudo, ao observarmos os depoimentos destacamos também, uma

expectativa de aprendizagem meramente técnica. O acadêmico de Educação Física

continua entendendo que é preciso ter um domínio técnico exacerbado de uma

Pensei, sinceramente, que não seria importante. Que só seria para cumprir a grade curricular (Suj. 39).

Que aprenderia uma luta que se mistura com a dança (Suj.38.)

Muito boa, pois teria a oportunidade de vivenciar e conhecer algo que eu ainda não tinha tido oportunidade (Suj. 33).

Que eu teria que ‘sair’ uma capoeirista por completo (Suj. 37).

A primeira impressão foi que não tinha nem porque ter esta disciplina no curso (Suj. 36).

Primeiro fiquei receoso, mas com o desenvolver das aulas pude perceber que é uma boa idéia para trabalhar com crianças (Suj. 26).

95

atividade para poder aplicá-la na escola. Quando na verdade, não é necessário ser

atleta ou técnico de Vôlei nem de Futebol, por exemplo, e mesmo assim estas

atividades são muito oferecidas nas aulas de Educação Física. Então também não

seria necessário se tornar “capoeirista” para lecionar Capoeira na escola.

A escola serve de base inicial para as vivências esportivas e não para

a especialização dos alunos em alguma modalidade específica.

Ainda sobre a expectativa do aluno em formação para lecionar

Educação Física saber que cursaria a disciplina de Capoeira, um depoimento

simboliza a carga de preconceitos ainda existentes para a inclusão desta atividade

como prática pedagógica dos futuros docentes:

Resta-nos questionarmos sobre quem realmente estaria evoluindo. Se

a Capoeira ou a própria Educação Física, quando permite que uma atividade tão

rica em valores bio-psico-sociais se aproxime de um meio antes tão fechado como

a Universidade que parece ter se rendido à realidade social que bate à sua porta,

mostrada em todos os meios de mídia provando que a Capoeira já é praticada por

muitas pessoas no nosso país e fora dele. Talvez devêssemos ficar mais surpresos

devido a demora em se ofertar a Capoeira como disciplina do curso de Educação

Física.

O que necessita ser ressaltado é que pré-conceitos podem ser

quebrados quando conhecemos minimamente o objeto da crítica e é neste sentido

que a evolução da Capoeira é mais pertinente.

� IES C:

Me surpreendi, pois vi que a Capoeira está evoluindo (Suj. 10).

Achei interessante, porque afinal é mais um campo de atuação (Suj. 3).

Fiquei ansiosa, pois nunca tinha vivenciado nenhuma atividade como artes marciais antes, então agora, que estou fazendo vejo que é um campo muito amplo para trabalhar (Suj.27).

96

Os acadêmicos se manifestaram de forma positiva, entendendo que

toda e qualquer atividade proposta durante os anos de sua formação docente são

importantes para a sua futura atuação.

Um ponto relevante foi observado no momento em que um dos

sujeitos envolvidos se refere à busca por aperfeiçoamento. Numa demonstração de

compreender que na graduação as várias modalidades esportivas são expostas

como iniciação e que a especialização deve acontecer em centros especificamente

voltados a este fim.

Alguns depoimentos tratam ainda da abertura junto ao campo de

atuação profissional, sendo que hoje, muitos dos profissionais que atuam como

professores de Capoeira não possuem curso superior em Educação Física,

podendo ser este um diferencial.

� IES D:

Adquirir conhecimentos básicos para trabalhar esta disciplina em sala de aula e se despertar interesse buscarei aperfeiçoamento no assunto, digo na luta específica (Suj. 32).

Normal porque no meu conceito, todas as disciplinas são interessantes e importantes para a minha formação (Suj. 36).

Nada demais, pois não é uma área que me atraia (Suj. 1).

Ter apenas uma noção da modalidade assim como outras tantas: Karatê, Judô, etc (Suj. 6).

Expectativa para ver qual seria a forma da aula e sua aplicação na prática (Suj. 3).

Era que aprenderíamos, não como lutar, mas sim aprender a como condicionar um atleta para uma boa performance (Suj.8).

Aprender a técnica básica e ter vivência prática e é lógico, dar aqueles saltos mortais (Suj. 9).

Sinceramente nenhuma, porque não era este o meu foco ao ingressar na Educação Física (Suj. 22)

97

As colocações dos acadêmicos da IES D nos evidenciam que alguns

deles tinham, em relação às aulas da disciplina de Capoeira, uma expectativa inicial

de que aprenderiam os golpes acrobáticos que tanto chamam atenção quando a

Capoeira é apresentada em forma de exibição, ou ainda que as aulas seriam

voltadas à performance e condicionamento físico de atletas.

Outros acadêmicos, no entanto, afirmam não nutrirem grandes

expectativas sobre a referida disciplina, uma vez que não têm interesse na

modalidade nem como praticantes e muito menos como docentes.

Com o objetivo de observar se as expectativas dos acadêmicos em

relação à disciplina de Capoeira foram correspondidas após a participação nas

aulas, alguns dados tornaram-se significativos para a investigação.

A questão apresentada aos acadêmicos previa uma investigação

sobre a relação entre o que o aluno esperava encontrar e o que realmente

encontrou quando participou da atividade.

O que se percebeu, no entanto, é que a partir desta pergunta já foi

possível começar a traçar o perfil metodológico utilizado pelo docente da Capoeira

no ensino superior.

Para melhor visualização dos resultados optamos ainda pela

apresentação via gráfico:

0

10

20

30

40

50

SIM 9 16 46 24

NÃO 7 11 3 2

Não Responderam 8 9 0 0

IES D IES C IES B IES A

GRÁFICO 1: ACADÊMICOS QUE TIVERAM AS EXPECTATIVAS CORRESPONDIDAS EM RELAÇÃO À DISCIPLINA DE CAPOEIRA

98

Dos 135 acadêmicos que participaram da pesquisa (sem distinção por IES), 95 deram resposta positiva e 23 deram resposta negativa. Foi possível identificar ainda que 17 acadêmicos não responderam a esta pergunta. Dentre os depoimentos dos participantes da pesquisa destacamos:

� IES A:

Constatamos, através das contribuições dos acadêmicos da IES A que

as aulas da disciplina de Capoeira deram suporte que vai além da técnica, da

execução correta dos golpes de Capoeira.

Os acadêmicos parecem ter mudado o conceito que tinham

anteriormente da Capoeira e demonstram com seus depoimentos que têm prazer e

se divertem durante as aulas. A partir disto podemos concluir que durante as aulas

existe uma forte presença lúdica e neste sentido Barros (2006, p. 80) afirma que “a

busca do saber torna-se importante e prazerosa quando se aprende brincando. É

possível, com o brincar, formar indivíduos com autonomia, motivados para muitos

interesses e capazes de aprender rapidamente.”

� IES B:

Sim, percebi que consigo superar minhas dificuldades e limitações com relação às lutas e também que me foi acrescentado uma boa quantidade de conteúdos que poderão ser aplicados em aulas (Suj. 29).

Sim, mas vi que não é só golpe que envolve a Capoeira, mas muitas outras coisas, além de ser uma cultura brasileira (Suj. 27).

Sim, porque estamos aqui para aprender a ensinar o básico, dar noções do esporte, e não para sermos mestres de Capoeira. Além de ser uma aula muito divertida (Suj 24).

Sim, ao contrário do que eu pensava foi fácil aprender os golpes, as aulas foram interessantes e divertidas (Suj. 13).

Até o momento sim, a adaptação foi fácil e as aulas prazerosas (Suj. 8).

Não, queria aprender a dar aqueles mortais e ninguém ensina isso (Suj 18)

99

Mais uma vez, podemos observar o quanto os alunos se sentem

atraídos por aulas nas quais o conteúdo é proposto de forma dinâmica e lúdica.

Os acadêmicos, de forma geral tiveram suas expectativas em relação

a disciplina de Capoeira superadas e mesmo aqueles que no início não

demonstravam interesse pela atividade, parecem ter gostado das aulas e entendido

o potencial da Capoeira como meio de Educação, assim como sua importância para

a formação do profissional da Educação Física.

� IES C:

Sim, além do esperado, brincadeiras, jogos e conhecimento cultural da Capoeira, o aprendizado de forma lúdica, se aproveitando ao máximo esse processo de aprendizado diferente (Suj. 20).

Sim, me diverti e aprendi muito (Suj. 23)

Com a Capoeira aprendemos muito. Teve até colegas que utilizaram as aulas de Capoeira nas suas escolas (Suj.36).

Sim, porque aprendi a gostar de um esporte que não me fascinava (Suj. 37).

Sim, com certeza e criei novas expectativas e a cada aula é uma surpresa, uma novidade (Suj. 39).

Minhas expectativas foram superadas. Consegui ver o outro lado da Capoeira (Suj. 43).

Sim. As aulas práticas são muito produtivas (Suj. 33).

Sim, porque aprendi na prática e com certeza posso ensinar a base e me abriu portas para me especializar (Suj. 12).

Sim, aprendi muitas posições, movimentos e golpes (Suj. 5).

Não. Pois não tenho interesse em Capoeira, nem em praticar, nem em ensinar (Suj. 12).

100

Os depoimentos da IES C se dividem: alguns dos universitários

acreditam que o aprendizado dos golpes, movimentos, peculiares da Capoeira são

de fácil execução ou que serviram de base para que possam ministrar aulas; outros

ao contrário, criticam esta situação afirmando que as aulas não foram aprofundadas

o necessário para possibilitar uma capacitação de qualidade. O que, segundo os

acadêmicos torna a Capoeira algo complexo e por conseqüência não tendo como

ser proposta na futura ação docente.

� IES D:

No curso de Educação Física se aprende a ser professor, a trabalhar a Capoeira

em sala de aula, levando em conta o ambiente de aprendizagem onde ela estaria

sendo proposta.

A Educação Física escolar deve ser entendida pelo acadêmico e

futuro docente de forma diferenciada porque efetivamente é diferente. Não se visa a

Não, porque na faculdade aprendi o básico não indo muito a fundo (Suj. 6).

Sim, mas a Capoeira para mim ainda é algo muito complexo e os golpes são de difícil execução (Suj. 36).

Não, pois minha expectativa era sabe dar os saltos e fazer as manobras já que para ensinar os alunos você tem que saber ao menos mostrar o movimento, se não souber fica precário o ensinamento (Suj. 9).

Sim, pois aprendi a respeito do treinamento para lutadores e como prosseguir e analisá-lo e quais valências devemos analisar de acordo com cada tipo de luta (Suj. 8).

Sim, adquiri os conhecimentos básicos da luta (Suj. 6).

Não, a Capoeira é legal de ser vista. Mas, é preciso muito tempo de treino pra poder ensinar (Suj. 9).

Não, o professor não consegui mostrar que conhecia a Capoeira (Suj. 17)

101

formação de atletas na escola, e sim proporcionar ao aluno uma série de atividades

que o valorize em todos os sentidos, podendo vir a contribuir para o seu

desenvolvimento geral, ou seja, na escola propriamente dita e também na vida.

A utilização do lúdico, por parte do docente, também é marcante nas

respostas dos acadêmicos reforçando a importância da existência do sorriso nas

aulas de Educação Física. Brincar de Capoeira pode ser uma excelente opção ao

invés de lutar Capoeira.

O prazer e a motivação em participar das aulas de Capoeira

demonstrado por alguns depoimentos pode ser reflexo do prazer que o docente

sentiu em ministrar tal aula. Uma aula empolgante, diversificada, criativa, vale muito

e como comentado neste estudo, não se pode cobrar empolgação do aluno se o

professor se mostra desanimado, ou ainda, como afirma Snyders (1990,p.47)

“professor que não aprende com prazer não ensinará com prazer”.

Consideramos como surpreendentes alguns dos depoimentos da IES

D em função do curso ser em nível de Licenciatura e os conteúdos serem voltados

mais para a área do Bacharelado, como “treinamento de lutadores”. E também

outros sujeitos estarem decepcionados por aprender apenas as noções básicas da

modalidade.

Este dado mostra que o próprio acadêmico talvez não tenha ainda

entendido que o curso que ele escolheu como carreira profissional a percorrer, não

lhe permitirá a formação de atletas ou o trabalho com esta área, pois o suporte

dado aos Licenciados é especificamente voltado para a escola.

A situação comentada no depoimento do sujeito 24 (IES D),

demonstra que o docente, não domina a temática sobre a Capoeira e na tentativa

de ainda assim abordá-la como conteúdo, convida profissionais e grupos ligados a

Capoeira para demonstrações. A idéia não é ruim, já que proporciona ao aluno uma

experiência prática da Capoeira, porém, mais uma vez o acadêmico estará

Não, porque não tivemos aulas de Capoeira com nosso professor e sim assistimos a algumas apresentações de grupos de Capoeira. Isso só, não basta para que possamos dizer que conhecemos o que é a Capoeira (Suj. 24).

102

recebendo um conteúdo sem a articulação com questões teórico-pedagógicas

importantes num curso de Licenciatura, evidenciando uma metodologia que

privilegia os movimentos e golpes do que a totalidade proposta na Capoeira.

A indagação sobre o que os acadêmicos aprenderam na disciplina de

Capoeira permitiu eleger alguns depoimentos significativos nas diferentes

instituições:

� IES A:

Podemos evidenciar nas explanações destes acadêmicos que a aula

de Capoeira também apresenta uma teoria que envolve noções de didática, como

planejamento e adequação não só de conteúdos como também da linguagem a ser

adotada pelo docente a cada clientela/alvo das aulas.

Ainda assim, são expressos em todos os depoimentos, comentários

sobre o aprendizado da Capoeira em si, dos golpes e movimentos característicos e

necessários para a sua prática.

O principal de tudo a respeitar a individualidade e o temp que cada um leva para assimilar o exercício. E também formas de conduzir a aula para não deixá-la monótona, o que eu não havia aprendido em nenhuma outra disciplina, nem de esportes coletivos (Suj. 5).

Que para se ensinar uma luta na escola eu não preciso de várias repetições de um movimento para que a aula se torne motivante (Suj.1).

Como aplicar os variados movimentos e golpes de Capoeira de forma recreativo-pedagógica em aulas de Educação Física Escolar (Suj. 4).

Alguns passos da Capoeira, brincadeiras e jogos que ajudam na elaboração de uma aula, a parte pedagógica de uma aula de Capoeira, como trabalhar as diversas faixas etárias (Suj. 2).

Movimentos básicos; formas de motivar a aula, trabalhar com a ludicidade (Suj.3).

103

� IES B:

Os conteúdos da disciplina de Capoeira nas IES A e B visam a

formação básica, sem a intenção de grande aperfeiçoamento técnico.

É interessante a postura dos alunos pesquisados, pois a idéia de

aprender a ensinar fica clara em alguns depoimentos (o que conforta este autor

enquanto pesquisador da formação de docentes de Educação Física). Já que

ensinar e aprender nunca deixam de caminhar juntos e é bom verificar que alguns

futuros professores já sairão da Faculdade com estes conceitos traçados em seus

caminhos podendo se utilizar do conhecimento transmitido na graduação e

transformá-lo de forma subjetiva.

É possível verificar também uma postura do docente do ensino

superior identificada por Freire (1993) ao afirmar que se o educador tem uma opção

democrática, com autocrítica e procura diminuir a distância entre o discurso e a

prática, ele “vive uma difícil, mas possível e prazerosa experiência de falar AOS

educandos e COM eles”.

Os alunos comentam novamente sobre a metodologia com a utilização

do lúdico durante as aulas, dando até mesmo um “tom” de recreação à aula de

Capoeira. Fundamental, no entanto, é que o acadêmico entenda que uma aula mais

brincada se torna motivante tanto no ensino superior quanto na escola e brincar

sempre teve espaço importante dentro das aulas de Educação Física.

Sobre o brincar, Maluf (2003, p.20) comenta o seguinte:

O brincar é importante porque incentiva a utilização de jogos e brincadeiras. No brincar existe, necessariamente, participação e engajamento com ou sem brinquedo, sendo uma forma de desenvolver a capacidade de manter-se

Aprendi a ensinar a Capoeira e como trabalhar os movimentos naturais da

melhor forma que é brincando (Suj. 36).

Aprendi diversas formas de trabalhar a Capoeira na escola com a utilização de materiais simples e até sem material (Suj. 34).

Muitas coisas, por exemplo a ginga, os golpes e aprendi a respeitar os valores humanos, aprendi a brincar de Capoeira (Suj. 29).

104

ativo e participante. É importante o aluno brincar, pois ele irá se desenvolver permeado por relações cotidianas, e assim vai construindo sua identidade, a imagem de si e do mundo que o cerca.

Mas as aulas com forte influência lúdica (brincadeiras) não devem

jamais perder o seu objetivo de educar. Afinal, se levarmos em consideração todos

os predicados de um professor de Educação Física sempre estarão entre eles a

capacidade de articulação entre teoria e prática, “criatividade, carisma, percepção,

mas é preciso que o professor tenha consciência de que a questão pedagógica

deve estar sempre presente e ser extremamente valorizada. Caso contrário, de

acordo com Freitas (2003, p.135) ”a criança brinca muito melhor sozinha”.

Para Cunha (1994), brincando o aluno desenvolve seus potenciais. Os

desafios que estão ocultos no brincar fazem com que o aluno pense e alcance

melhores níveis de desempenho.

� IES C:

Os acadêmicos da IES C expressam-se de forma objetiva. Suas

respostas demonstram que as aulas de Capoeira têm como meta principal o

desenvolvimento da técnica da Capoeira e valorizam questões como a disciplina, o

auto-controle e a concentração.

� IES D:

Regras das lutas, golpes, ataque e defesa (Suj. 5).

Aprendi como melhor aplicar a parte prática e teórica em crianças, adolescentes ou até adultos (Suj. 11).

Aprendi a importância da disciplina e da concentração (Suj. 12).

A respeitar meus companheiros de turma (Suj. 14).

Nada de interessante (Suj. 6).

Aprendi a organizar o treinamento de atletas que se dedicam a lutas (Suj. 14).

105

Percebe-se nas respostas dos acadêmicos da IES C e D uma

valorização da técnica por parte dos docentes aliada a alguma transmissão de

valores.

Quando um dos sujeitos envolvidos comenta sobre ter aprendido a

importância da disciplina e da concentração, conseguimos perceber que as aulas

podem estar com uma sobrecarga neste sentido. Mas se este era o objetivo do

docente, foi alcançado, ou seja, é preciso que entendamos os objetivos do docente

ou o conceito que se quer dar a aula.

Nem sempre uma aula mais técnica é dada sem esta intenção. Porém,

devem ser observadas as ementas das disciplinas para que se possa cobrar do

docente uma postura condizente ou a articulação da prática nas aulas com a

proposta do curso como um todo.

Com relação ao sujeito 6 da IES D, que diz não ter aprendido nada de

interessante na disciplina, mesmo não sendo este um caso para generalizações,

observamos ou a falta de comprometimento com a pesquisa científica onde o aluno

não entende a importância desta para a evolução de sua própria área de atuação

profissional, ou realmente não conseguiu aprender nada demonstrando não estar

preparado para articular os saberes a ele transmitidos durante o período de sua

formação universitária.

Com o questionamento: “Você conseguiu relacionar algum conteúdo

da disciplina de Capoeira a outra disciplina ou atividade da Educação Física?”,

visamos observar questões de interdisciplinaridade e a partir das contribuições dos

acadêmicos foi possível construir o seguinte gráfico:

A importância do condicionamento físico para o bom andamento no esporte de lutas (Suj. 17).

Aprendi coisas como a história da luta, etc, mas não vou usar isto em minhas aulas. Não pretendo trabalhar com Capoeira (Suj. 22).

106

10

30

41

25

9

5

8

1

5

1

0

0

IES D

IES C

IES B

IES A

NÃO RESPONDERAM

NÃO

SIM

GRÁFICO 2: ACADÊMICOS QUE CONSEGUIRAM ARTICULAR A DISCIPLINA DE CAPOEIRA À OUTRAS DISCIPLINAS DO CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA

Do total de participantes (135 sujeitos) apenas 6 não responderam a

esta questão. Dentre o restante 106 responderam sim e 23 responderam não.

Ao distinguirmos as respostas de acordo com cada IES selecionamos

as seguintes:

� IES A:

Em todas, pois a Capoeira nos ajuda na criatividade, adaptação, socialização e no respeito a questão individual. Eu mesma já usei alguns elementos de forma adaptada, que tive a oportunidade de vivenciar na disciplina de Capoeira, em uma aula de basquete (Suj. 10).

Pedagogia, como trabalhar com as pessoas, a metodologia utilizada para a aprendizagem da Capoeira (Suj. 13).

Na verdade é a forma que é trabalhado os conteúdos da Capoeira e pode ser aplicada em todas as disciplinas (Suj. 14).

A pedagogia relacionando a educação ao meio social, a filosofia pela cultura da Capoeira envolvendo junto a história (Suj. 17).

Não relacionei a Capoeira à nenhuma atividade (Suj. 2)

107

Como questão relevante, as contribuições dos acadêmicos da IES A

nos apresentam a percepção da capacidade de articulação da Capoeira a uma

séria de outras disciplinas ou atividades da Educação Física.

Para estes estudantes a aula de Capoeira ou a “forma como a aula de

Capoeira acontece” (o que acreditamos tratar-se da metodologia utilizada pelo

docente) serve de exemplo a ser seguido em outras disciplinas. Ou seja, o

conteúdo pode ser outro, mas a metodologia é que dever trazer o aluno para a

busca e satisfação pelo aprendizado.

� IES B:

Com estas contribuições vemos uma preocupação com a totalidade

fenômenos e a relação entre eles. A citação de conceitos como adaptação,

socialização, respeito ao cidadão entre outros nos direciona a pensar que alguns

docentes trabalham mais que “só” Capoeira em suas aulas.

A relação com outras disciplinas é fundamental se partirmos de uma

visão “inovadora” onde se prima pelo ensino não compartimentado que visa a

noção do todo com aprendizagem pautada na relação dialética entre professor e

aluno. Dando lugar a chamada interdisciplinaridade, que de acordo com Fazenda:

(...) nasceu como oposição a todo o conhecimento que privilegiava o capitalismo epistemológico de certas ciências, como oposição à alienação da academia às questões da cotidianeidade, às organizações curriculares que evidenciavam a excessiva especialização e a toda e qualquer proposta de conhecimento que incitava o olhar do aluno numa única direção, a uma patologia do sabe (1995, p.19).

Pedagogia do movimento, som e ritmo (Suj. 28).

Acredito que a Capoeira influencie todos os esportes (Suj.26).

A Capoeira pode ser associada a muitos conteúdos de outras disciplinas, pedagogia do movimento, sons e ritmos, cinesiologia, fisiologia, entre outras (Suj. 22).

108

Até porque o mundo é complexo, não se constitui de atos e

acontecimentos isolados, mas que se complementam num grande circuito de

revelar e solucionar problemas.

Para Gadotti (2000, p.224) “nas ciências da educação, a

interdisciplinaridade é entendida como a coordenação de todas as disciplinas e

interdisciplinas do sistema de ensino inovador sobre a base de uma axiomática

geral, ética, política e antropológica”. O que nos deixa certos de que a articulação

entre disciplinas que têm os mesmos objetivos é necessária e deve ocorrer sempre.

Construir o conhecimento também é, neste caso, uma premissa, pois

o aluno deve se tornar capaz de relacionar conteúdos e contextualizá-los de acordo

com suas próprias concepções e da importância disto frente sua formação.

� IES C:

É possível observar que os acadêmicos da IES C conseguem

conectar os conhecimentos adquiridos nas aulas de Capoeira à outras atividades da

Educação Física. Porém, alguns deles informam que não se sentem seguros para a

docência de Capoeira, uma vez que os conteúdos propostos ainda são superficiais

em demasia.

� IES D:

Desenvolvimento motor e lazer (Suj. 16).

Atletismo, pois você precisa ser determinado e ter disciplina para chegar onde você quer (Suj. 17).

Na ginástica artística, muitos movimentos são parecidos podendo ser um auxílio na execução (Suj. 23).

Não. Não aprendi tudo o que precisava para ser um bom professor de Capoeira. O conteúdo foi passado de forma muito simples e rápida (Suj. 25)

Desenvolvimento motor e esportes complementares (Suj. 12).

109

Nos depoimentos das IES C e D observamos que as aulas ainda que

possam ser articuladas a outras atividades ou conteúdos e disciplinas e que os

alunos consigam perceber isto, o fazem articulando à disciplinas que são parte do

mesmo bloco temático. É como unir conhecimentos da Natação ao Pólo Aquático,

simples demais, mas é claro que ainda assim: válido.

A contradição no processo de formação acadêmica está no fato de

que se tenta ampliar ao máximo a oferta de disciplinas (currículo extensivo) para

preparar o profissional para os diversos campos, mas de uma forma que fraciona

cada vez mais o conhecimento.

Como contribuição, apontamos ainda as análises apresentadas por

Betti (1992), que também partem da ação profissional baseada num corpo teórico e

interdisciplinar de conhecimento. Entre as conclusões consolidadas merecedoras

de crítica, apontamos as seguintes:

1) a ação do profissional de Educação Física/Esporte deve basear-se num campo

teórico que tem sido caracterizado como uma disciplina acadêmica ou ciência;

2) a ênfase na atuação profissional está no aspecto intelectual e não físico-motor;

3) saber como ensinar deve ser complementado com o saber por que ensinar, o

que implica no processo intelectual de tomar decisões de natureza filosófica,

sociológica, psicológica e biológica;

4) a profissão aplica seus conhecimentos em serviços sociais úteis;

5) é preciso produzir práticas bem sucedidas, para o maior número de pessoas;

6) processo de formação profissional continua para além da universidade.

A indagação dirigida aos acadêmicos para saber se estes se

consideram aptos a ministrar aulas de Capoeira em escolas foi elaborada da

seguinte forma: “Você acredita que as aulas da disciplina de Capoeira foram

Em todas as outras lutas que aprendemos (Suj. 16).

Ginástica Olímpica (Suj. 21).

Não. Não vi necessidade de articulação da Capoeira com outras disciplinas (Suj. 14).

110

suficientes para capacitá-lo a dar aulas e Capoeira na escola?”. Este

questionamento permitiu levantar os seguintes posicionamentos:

16

45

2621

29

3

0

2

1

1

00 10 20 30 40 50 60

IES D

IES C

IES B

IES A

SIM NÃO NÃO RESPONDERAM

GRÁFICO 3: ACADÊMICOS QUE SE CONSIDERAM CAPACITADOS PARA A DOCÊNCIA DE CAPOEIRA NA ESCOLA

Nesta questão, 4 foram os sujeitos que não a responderam. Outros 53

responderam negativamente e 78 sujeitos responderam afirmativamente.

Deste questionamento elegemos alguns depoimentos:

� IES A:

A grande parte dos acadêmicos da IES A respondeu afirmativamente

sobre se sentirem aptos a ministrar aulas de Capoeira em escolas.

Sim, porque a partir das aulas de Capoeira eu consegui aprender as noções básicas e o mais importante, aprendi a sentir a essência da Capoeira. Através das aulas e é claro da pesquisa e estudos posteriores, eu me julgo apta para dar aula de Capoeira na escola (Suj. 19).

Sim, mas acredito ter tido uma noção básica, sendo necessário um estudo maior para desenvolver a técnica (Suj. 21).

Sim, oportunizou uma boa vivência da Capoeira dando suporte para o acadêmico passar com qualidade aos futuros alunos (Suj. 22).

Sim, porque as aulas são voltadas para que nós ensinemos na escola, bem pedagógicas e não para nos formarmos mestres (Suj. 29).

111

Muitos fizeram menção a não obrigatoriedade de serem “mestres de

Capoeira” para que, na escola, possam ensinar Capoeira e também ao fato de

terem tido apenas uma noção sobre a modalidade, o que requer estudo e

dedicação mesmo após a graduação.

Ainda assim, consideram que o que aprenderam durante as aulas já

os qualifica para serem bons e responsáveis professores com domínio da atividade

Capoeira.

� IES B:

Os depoimentos permitiram observar que os acadêmicos da IES B se

sentem capazes de ministrar aulas de Capoeira em escolas, mas também

enfatizam a busca pelo aprimoramento, seja técnico ou pedagógico.

Podemos verificar que os acadêmicos em questão, acreditam que a

articulação de outras disciplinas propostas durante a graduação em Educação

Física, com a disciplina de Capoeira também foi fator relevante para que a

segurança enquanto docente se mostrasse de forma mais evidente.

� IES C:

Acho que nós já temos condições de aplicar, com essas aulas, as atividades de Capoeira para colégios e escolas, mas é sempre bom buscar aprender mais, pois a Capoeira é rica e movimentos novos e que não faltam (Suj.. 16).

Sim, porque juntando as outras aulas na faculdade com a prática que vivenciei na Capoeira considero-me apto a isso (Suj. 13).

Sim, porque eu entendi a aula e percebi que podemos fazer várias atividades trabalhando componentes da Capoeira (Suj. 38).

Não, é muito pouco tempo para que possa dar aulas, temos que buscar um conhecimento maior. A disciplina serve apenas para que nos interessamos pelo assunto (Suj. 23).

Não, acho que para dar aula em escolas tem que ter uma base muito maior do que as aulas na faculdade seja de Capoeira, Judô, Karatê ou qualquer outra luta (Suj. 25).

112

Em relação aos acadêmicos da IES C, os depoimentos demonstram que

estes estudantes não se consideram aptos para ministrar aulas de Capoeira na

escola e apontam como principal motivo o fato de que durante as aulas na

graduação tiveram apenas uma noção sobre a modalidade. Sem desconsiderar a

validade do conteúdo, afirmam que a Capoeira, assim como outras lutas,

necessitam de um aprofundamento maior para que só então possam ser propostas

como atividades da aula de Educação Física.

� IES D:

Os depoimentos em geral demonstram que muitos acadêmicos das

IES A e B (100% e 92% respectivamente) se acham capazes de ministrar aulas de

Capoeira em escolas.

A busca pela continuidade do aprender, do estudar além do estudado

nas aulas, também foi evidenciada em muitas respostas o que frisa a importância

do aprendizado contínuo obedecendo as transformações que ocorrem não apenas

a níveis sociais, mas de maturidade profissional entre outros.

Entendemos ainda, que se achar capaz é sinônimo de se sentir

seguro e ter domínio do conteúdo a que se propõe, mesmo que os acadêmicos não

façam relação com o fato de também terem respondido que adquiriram durante as

aulas, “apenas” noções básicas da disciplina em questão.

Ora, se os conteúdos que lhes foram transmitidos foram noções

básicas e ainda assim se consideram aptos a ministrar aulas em ambiente escolar é

por que talvez tenham aprendido o necessário.

Sim. Eu já trabalhava com lutas antes de cursar a matéria, então pra mim ficou mais fácil, mas meus colegas sentem muita dificuldade (Suj. 17).

Não. Não acredito que conseguirei dar aulas de Capoeira depois de formado, não aprendi o suficiente, acho que a carga horária é pequena demais (Suj. 20).

Não. Não tive aulas direito. Quando tive foram superficiais. Não posso dizer que me deram base para aplicar Capoeira na escola (Suj. 21).

113

Mais uma vez houve diferenciações quanto as respostas das IES C e

D, cuja grande maioria foi negativa.

Talvez muitos acadêmicos se imaginem inaptos para ministrar aulas

de Capoeira, com já comentado, porque esta ainda é uma atividade relativamente

nova na formação de professores.

Se pensarmos que a disciplina de Capoeira tem a mesma carga

horária de disciplinas como Basquetebol, Voleibol, Futebol, por exemplo, então

entenderíamos que os acadêmicos também não estariam aptos a ministrar aulas de

tais esportes nas escolas. Voltamos a comentar também, sobre a experiência já

vivida do acadêmico, onde ainda na sua fase escolar, conheceu os esportes

coletivos propostos como conteúdos das aulas de Educação Física e isto gera um

conhecer muito maior do tema, que quando abordado na faculdade recebe status

de continuação.

Não é necessário ensinar um acadêmico a se posicionar numa quadra

de Voleibol, assim o início da aula já se dá em como didaticamente aplicar os

fundamentos do Voleibol na escola. Mesmo que, hoje em dia, com minha carga de

cinco anos na docência universitária tenha percebido que a limitação motora e

também sobre a prática até dos esportes coletivos (que sempre foram ícones da

Educação Física Escolar) vem se acentuando nos recém-chegados à Universidade.

O conhecimento prévio da modalidade permite ao acadêmico maior

segurança na hora de sua aplicação e com relação a Capoeira, é preciso aprender

“tudo” desde o início, pois nunca vivenciaram tal atividade apesar de a conhecerem,

saberem de sua influência e presença na mídia, na sociedade.

O que talvez também aconteça com o docente, que quando não

domina o conteúdo o transmite de forma superficial. Pena que voluntariamente

acabe perpetuando velhas posturas de não aposta no novo, no criativo, na

mudança.

A indagação feita aos acadêmicos investigava se eles consideravam

importantes as contribuições que a Capoeira trouxe à sua futura ação docente e

levou-nos a destacar os seguintes dados:

114

4

1

6

6

3

1

14

29

46

25

IES D

IES C

IES B

IES A

SIM

NÃO

NÃO RESPONDERAM

GRÁFICO 4: ACADÊMICOS QUE CONSIDERAM IMPORTANTES AS CONTRIBUIÇÕES DA DISCIPLINA DE

CAPOEIRA PARA A FUTURA AÇÃO DOCENTE

A análise dos gráficos nos permite a seguinte conclusão: 114 sujeitos

responderam sim, 16 responderam não e 5 não responderam a questão, num total

de 135 participantes. Das contribuições destes participantes, destacamos:

� IES A:

Sim. Como eu pretendo dar aulas em escola para crianças, acredito que a Capoeira será uma excelente contribuição no conteúdo, irá enriquecer como uma forma diferenciada de utilizar o movimento. É algo novo na maioria das escolas atualmente. Trabalha o movimento de forma mais divertida, lúdica e agradável (Suj. 29).

Sim. A Capoeira abre novas idéias e maneiras de pensar que podem ser aplicadas nas mais diversas áreas, assim como na vida (Suj. 16).

Sim, por ser uma disciplina “incomum”, por não ser muito trabalhada ela é uma forma de diversificar o trabalho do profissional, e dando mais possibilidade aos alunos, um conhecimento maior a eles (Suj. 14).

Sim, é um esporte que deveria ser trabalhado nas escolas, pois na Educação Física Escolar os esportes trabalhados são sempre os mesmos. É importante que se apresente novos conteúdos para ser uma aula diferente das outras (Suj. 13).

Sim. Como professor de natação, posso utilizar como diversificação das atividades em forma de aprimoramento e/ou uma recreação (Suj. 4).

115

Além dos comentários sobre a ludicidade presente na própria

Capoeira e que pode ser transportada também para a aula, os acadêmicos da IES

A também citam em seus depoimentos o fato de a Capoeira ser uma atividade

“incomum” na escola. Acreditam que ainda são poucos os profissionais que têm

interesse em ministrar aulas de Capoeira, sendo mantidos como monopolizantes

nas aulas as modalidades com bola.

Então, evidenciam que a Capoeira pode apresentar-se como uma

novidade ao aluno, um conteúdo diferente e por conseqüência motivá-los e tornar a

aula algo prazeroso tanto para os alunos quanto para o docente.

� IES B:

Foram levantadas questões quanto a integração da aula de Capoeira

à outras disciplinas do currículo escolar, o que é muito pertinente e nos leva a crer

que os acadêmicos da IES B entendem a necessidade e importância de uma

educação global e não fragmentada.

Observamos ainda comentários sobre a metodologia utilizada pelo

docente e que proporcionou aos acadêmicos a consciência de que as aulas, seja

de qual for o conteúdo, precisam ser dinâmicas, movimentadas, no sentido de

despertar no aluno a vontade participar.

Sim, é uma maneira de trabalhar diferente a Educação Física. Dando a possibilidade de integrar as disciplinas como história, geografia, entre outras, numa forma de educar através do movimento (Suj. 28).

Sim, desenvolvendo valores para passá-los aos futuros alunos, ajudando a olhar a Capoeira não apenas com os olhos do preconceito, mas enxergando a parte pedagógica que ela traz, podendo mudar o conceito das pessoas (Suj. 43).

Sim. Contribui com uma forma de ensinar, um modo diferente sendo mais dinâmico (Suj. 2).

Sim, Acredito que tudo que aprendemos no curso, por mínimo que seja, alguma coisa sempre contribui para a nossa prática como futuros professores (Suj. 44).

116

� IES C:

Embora sintam uma necessidade de aprofundamento técnico, os

acadêmicos da IES C concordam (a maioria) que as aulas da disciplina de Capoeira

puderam apresentar algumas contribuições para a sua futura ação docente. Como

exemplos dessa contribuição foram citados: “é mais uma vivência que pode ser

proposta aos alunos”; “os movimentos da Capoeira podem ser aproveitados em

outras modalidades esportivas”; “a Capoeira pode ser trabalhada com meninos e

meninas sem distinção”; “a valorização da expressão corporal do aluno sem a

necessidade de uma rigidez na execução dos movimentos”; entre outras.

� IES D:

Sim. Toda realidade vista dentro da Educação Física traz algo de importante para nosso crescimento como profissional, com a Capoeira não é diferente. É mais uma vivência que podemos transmitir para os nossos alunos (Suj. 27).

Sim. Com essa disciplina aprendemos a abordá-la com as crianças na escola, talvez não como grandes conhecedores ou mesmo lutadores, mas teremos pelo menos a base necessária (Suj. 26).

Sim. Aproveitando os movimentos diversificados que são utilizados na prática da Capoeira para serem aproveitados muitas vezes em outras modalidades esportivas (Suj. 29).

Sim. Pois se nunca tive contato com a Capoeira, na disciplina terei uma primeira noção do básico. Com isso contribuindo para uma futura atuação (Suj. 33).

Sim, através das diversas atividades e exercícios utilizados durante a aula que poderão também ser aplicados em outras aulas que trabalhem as mesmas valências físicas da modalidade ou para trabalhar com o desenvolvimento motor, social, etc, de crianças (Suj. 11).

Sim. Por ser um esporte que auxilia no desenvolvimento de vários fatores além de ser um esporte relativamente barato. Porém deve-se também preservar outros estilos de luta (Suj. 13).

117

Os depoimentos parecem refletir a necessidade que os acadêmicos

têm em aprender coisas novas, ainda que com medo por não conseguirem executar

a atividade de forma perfeita ou de não se acharem capazes de transmiti-la aos

seus futuros alunos, mesmo assim, querem vivenciar atividades diferentes das que

estão tão acostumados.

A possibilidade de articulação das aulas de Capoeira à outras

disciplinas ou à transmissão de valores sócio-culturais também foi verificada em

grande parte dos depoimentos.

Podemos observar através de todas as contribuições dos acadêmicos

que a Capoeira, além de contribuir para a formação docente, apresenta-se como

opção para Educação Física, com objetivos bem amplos, numa perspectiva de

educação através do movimento e que atinge aspectos culturais, motores, afetivos

e cognitivos de forma lúdica e recreativa. De acordo com Martins (2004, p.12) a

Capoeira “além de ser uma manifestação popular, que acompanha e se mescla à

história do Brasil, pode o professor de Educação Física apropriar-se de sua cultura,

afim de utilizá-la para catalisar e otimizar um processo pedagógico, servindo neste

momento como mais uma alternativa para educação”.

Então, é possível entender que os acadêmicos de Educação Física

envolvidos nesta pesquisa não apresentam a postura de “fazer por fazer” a

disciplina de Capoeira, participando da aula simplesmente por que ela está prevista

na grade curricular, sem a noção de importância desta junto a sua formação. Mas

sim aproveitando ao máximo as horas ali atribuídas, bem como as trocas de

informações e experiências numa perspectiva de intervenção e aprendizagem

contextualizada e significativa.

Sim. Já pratiquei Capoeira e utilizo diversos movimentos e atividades lúdicas relacionadas a mesma quando executo programas de atividade física para crianças (Suj. 12).

118

CAPÍTULO VI

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Num mundo caracterizado pela compartimentação acadêmica, um intelectual é aquele que consegue romper esses obstáculos para construir caminhos que o coloquem debatendo temas fundamentais de sua época.

Edgar Morin

A formação de professores de Educação Física não é um assunto que

possa ser considerado de fácil discussão e análise. Mesmo assim, a realização

desta pesquisa foi um desafio que teve a intenção de responder inquietações

profissionais do pesquisador, tentando primar pela transformação e pelo

crescimento da ação pedagógica.

A prática da docência na disciplina de Capoeira nos cursos de

Educação Física foi o motor dos questionamentos. No entanto, realizar este estudo

constituiu para o pesquisador uma experiência extremamente positiva, por algumas

razões como:

• pelo extenso aprendizado;

• pela estimulante visão do futuro do processo de ensino-aprendizagem,

especificamente a nível dos papéis do professor, do aluno, da aprendizagem

e da escola;

• pela possibilidade de propiciar a contributos, esperamos que válido e útil, à

uma área recente no campo da formação de professores de Educação

Física;

• pelas perspectivas de pesquisa futura, já que a Capoeira enquanto disciplina

de cursos de Educação Física ainda dá seus primeiros passos e

conseqüentemente, ainda há muito a ser explorado;

Vale comentar que a experiência de 17 anos como docente em

escolas públicas e privadas da cidade de Curitiba, fez com que este pesquisador

observasse e viabilizasse muitos métodos e técnicas que tentavam tornar a

119

aprendizagem mais significativa e menos autoritária. Durante estes anos muito se

pôde observar em relação à prática dos colegas de profissão. Professores de

Educação Física que mesmo com a evolução histórica, social e científica, se

mantinham com as mesmas posturas profissionais, sem se importar com busca de

melhorias na ação pedagógica. Alguns, recém saídos da graduação, pareciam

ainda mais obsoletos quanto à prática docente do que os profissionais que já

deixavam transparecer um certo descaso pela educação demonstrando falta de

comprometimento.

Foi então, durante a docência no ensino superior que todos os

esforços deste pesquisador rumaram em direção à mudança, à transformação de

antigos conceitos. Neste momento é que se objetivou um estudo científico sobre os

comportamentos ou as diferentes posturas dos profissionais que atuam nos cursos

superiores de formação de professores, no nosso caso, tratamos específicamente

dos professores da disciplina de Capoeira.

A presente pesquisa traz um levantamento sobre as abordagens

educacionais que aliadas à verificação de como os acadêmicos de Educação Física

têm percebido a sua formação profissional com o intuito de subsidiar possíveis

esclarecimentos. Principalmente no tocante a prática docente ou às metodologias

utilizadas junto a disciplina de Capoeira e de que forma estas poderiam influenciar a

prática profissional de quem está sendo formado.

Atualmente, a qualidade do ensino superior oferecido no Brasil tem

sido muito criticada e algumas destas críticas dizem respeito ao docente

universitário. Segundo Cunha (1998), parece fácil entender o professor como ator

especial da prática pedagógica do ensino superior, “ainda que ele não seja o único

elemento significativo do processo, não há como desconhecer que é o agente

principal das decisões no campo” (p.33).

Sabemos que no processo de ensino, seja qual for o nível, a prática

pedagógica é influenciada por inúmeros fatores, mas a condição de docente acaba

sendo determinante para a avaliação da qualidade do ensino.

O que não podemos desconsiderar é a complexidade presente na

atividade docente, sendo esta historicamente determinada e modificada de acordo

com as necessidades sociais, situadas no tempo e no espaço.

120

O cotidiano do docente universitário é hoje um misto de diferenciações

e convergências, repleto de relações formais e informais, internas e externas e

assim mesmo se constroem processos de produção, transmissão e re-significação

do conhecimento, refletidos na prática pedagógica dos docentes.

Ao longo desta pesquisa muito falamos, até para justificativa da

utilização desta ou aquela abordagem consideradas adequadas ou não para a

educação atual, que o docente assim como o aluno é sujeito de sua própria história.

Ou seja, não há como deixar de articular sua atuação à fatores subjetivos como seu

modo de ver o mundo, de pensar e de sentir, que são condicionados pelas

diferentes histórias de vida e pelos contextos onde ensinam e aprendem.

É possível observar atualmente, em função do grande número de pós-

graduações voltadas à Educação em geral, bem como ao aprofundamento das

questões que envolvem a didática, que o docente tem tentado atualizar-se com a

intenção de reverter quadros que demonstram práticas pedagógicas tradicionais.

Na tentativa de romper com o ensino teórico e livresco que permeia a

ação de muitos docentes é necessário que haja uma reflexão onde o próprio

professor compreenda o significado de sua prática para que ele mesmo valorize a

ação de ensinar, de ser educador.

Na concepção do pesquisador deste estudo, quando se é professor se

é também “construtor de mentes”, afinal contribuir para a formação de um ser

implica em influenciá-lo profundamente com palavras e ações. Daí a importância de

não resistir às mudanças, de ser capaz de motivar, animar e incentivar o aluno,

cultivando otimismo e entusiasmo pelo aprender. É preciso que o professor tenha

consciência de que a Educação não se faz num processo individual e sim

escutando a opinião do aluno, questionando-a quando necessário e aceitando-a da

mesma forma, mas sempre dando vez à inter-relação primando por um aprender

mútuo.

No que diz respeito à ação pedagógica no Ensino Superior, foi

possível observar que algumas estruturas carecem de mudanças urgentes, como o

trabalho pedagógico na sala de aula, as relações humanas e com o próprio

conhecimento, que talvez, se fossem refletidas privilegiassem a construção crítica

de novas metodologias.

121

Ao tratarmos mais especificamente da docência na Educação Física,

estudos como os de Castellani, Betti, Bracht, Medina e Moreira, alertam para o fato

de que embora a Educação Física tenha aumentado o seu alcance na sociedade

atual, as transformações pedagógicas não assumiram lugar de destaque e muitas

vezes a tônica dominante ainda é tecnicista-desportiva. Fato que foi confirmado

durante a realização deste estudo tendo como base não somente as proposições

dos autores consultados como as contribuições dos acadêmicos dos cursos de

Educação Física.

Muitas propostas teóricas auxiliam a sustentação de práticas

pedagógicas para a Educação Física e vários são os paradigmas educacionais

existentes capazes de garantir uma ação condizente com as atuais vertentes do

ensino. Podemos afirmar, com base nos estudos aqui propostos, que nenhum

paradigma deixou de existir completamente. O que ocorre é a co-existência, quase

que sobreposta de várias abordagens, demonstrando que cada profissional tende a

re-significar as teorias científicas e associá-las às suas concepções histórica e

socialmente construídas.

Mesmo assim, a dificuldade em se transformar a ação pedagógica foi

muito comentada pelos acadêmicos envolvidos nesta pesquisa. Alguns até de

forma “dura” se posicionaram muito criticamente demonstrando grande insatisfação

pela postura docente por eles percebida.

Ao considerar as contribuições dos acadêmicos de Educação Física,

vimos que a influência exercida pelo docente é muito intensa. Ainda que muitos

alunos critiquem e consigam visualizar o que alguns chamaram de “falta de

didatismo” ou “posturas antiquadas” por parte dos docentes, fica nítida a situação

de repetição destas posturas. Pois, em resposta à questões sobre o que teriam

aprendido em um semestre letivo, um grande número de depoimentos tenderam a

valorizar conceitos do ensino tradicional e fragmentado dos quais alguns haviam

sido severamente questionados. Podendo ser conclusivo o fato de que o acadêmico

muitas vezes entende que a aula de Educação Física deveria ser embasada em

paradigmas modernos e inovadores, sabendo também criticar posturas contrárias,

afinal são objeto das mesmas, mas quando é sua vez de praticar a ação docente o

fazem perpetuando as velhas teorias tão criticadas por eles próprios, refletindo

assim a formação recebida.

122

Com relação às aulas da disciplina de Capoeira, o que se observou

foram as práticas desprovidas de novas metodologias que tanto deterioram a

qualidade da atividade profissional.

Dentre os docentes envolvidos, segundo relato dos acadêmicos,

alguns até são capazes de despertar prazer e satisfação em suas aulas, que

quando aliadas à fenômenos lúdicos envolviam os acadêmicos proporcionando

momentos de “leveza” que viabilizavam a assimilação de conteúdos, talvez

tornando-os mais acessíveis à transformação e re-elaboração. Porém, outros

docentes, devido até mesmo a uma confusão provocada pela não identificação dos

objetivos propostos aos cursos de licenciatura, tendem ao ensino técnico com vistas

a performance, à formação de atletas e com o mínimo de considerações pertinentes

à didática ou a um ensino mais pedagógico.

Por outro lado, quando observamos o depoimento dos próprios

docentes da disciplina de Capoeira, estas situações não foram evidenciadas e

ainda foi possível entender que tais docentes têm consciência da importância de

novas concepções na prática educacional e estão dispostos a isto. O que nos faz

crer numa contradição entre discurso e prática.

Talvez seja muito difícil para alguns docentes mudar a rotina de

trabalho quando o conhecimento adquirido já o acompanha há muito tempo,

tornando-o imutável. Isto implicaria também em se assumir uma condição de

desatualização frente aos avanços das abordagens educacionais, ou seja, um

grande desafio. Mas, refletir sobre a própria prática se faz urgente para a docência

no ensino superior.

O aprendizado constante deve ser levado em conta em seu sentido

mais amplo e não apenas quando objetivamos a obtenção de titulação. Afinal, um

título perde o sentido se nossa prática pedagógica não for condizente e gera ainda

mais desmotivação no acadêmico para que continue estudando, se aperfeiçoando e

se qualificando, além de ser passível de cada vez mais crítica. Neste sentido, a

prática docente deve ser repensada, onde a receptividade de novas idéias percorra

caminhos menos tortuosos e mais diretos possibilitando crescimento.

É pena constatar que os cursos de Educação Física continuam presos

a pressupostos arcaicos Tradicionais e Tecnicistas, muito embora alguns esforços

para o rompimento de tais pressupostos venham acontecendo. É necessária e

123

urgente a superação da prática pedagógica reprodutora por uma prática

progressista e que contemple a competência técnica e a produção do

conhecimento, mas que seja pautada numa ação transformadora.

O docente deve entender que seu papel, antes de tudo, é a formação

de profissionais competentes para a atuação no ensino. Para tanto o profissional da

Educação Física deve ser criativo, crítico, transformador, autônomo e consciente da

importância do Educar afim de que estas condições também sejam valorizadas em

seus alunos.

Apesar da trajetória do autor desta pesquisa como docente

universitário desde 2001, ser ainda bastante curta, estas reflexões sempre se

mostraram presentes e inquietantes. Esperamos conseguir sensibilizar, agora por

meio da pesquisa científica, profissionais e acadêmicos sobre a importância da

mudança e transformação da ação docente, onde a própria ação refletida mereça

ser vivenciada para novamente ser transformada. Afinal, não existem soluções para

a eternidade, mas soluções para determinados momentos, viáveis à determinadas

situações, onde as características essenciais do processo de ensino como o tempo

de aprendizagem individual de cada aluno, a condição social destes, considerações

cotidianas e externas ao ambiente de aprendizagem e a valorização da realidade

entre outras, devem ser respeitadas e levadas em conta.

Como docente de Capoeira, a experiência do autor é um pouco mais

extensa e muito intensa. A publicação de três livros referentes especificamente ao

ensino da Capoeira à crianças sob uma ótica inovadora lhe permite considerações

importantes. Mas, principalmente o torna um mobilizador de pessoas envolvidas

com a docência da Capoeira. Pensando em não limitar a entrada da Capoeira no

meio acadêmico a um modismo passageiro ou que seja “agarrada” apenas por uma

minoria, para que a Capoeira possa ser levada a sério realmente mostre sua

eficácia e, assim ocupar o lugar que lhe compete frente ás ferramentas da

Educação.

Então, uma das pretensões desta pesquisa também foi a necessidade

de “uma fundamentação teórica frente a uma cultura de movimentos reprodutores,

dicotomizados, sem história e sem consciência pedagógica” (MIYAGIMA apud

FREITAS, 2003, p. 09).

124

A Capoeira em momento algum deixou de ser a inspiração principal

desta pesquisa, muito menos a viabilização da educação através dela, visando a

transformação social. Acreditamos que mesmo que alguns docentes não tenham

conseguido evidenciar o valor da Capoeira junto à Educação, como pôde ser

observado, ainda assim os acadêmicos dos cursos de Educação Física aqui

envolvidos já perceberam sua importância. Transformando-se na prova de que

através do comprometimento educacional, a Capoeira pode ser articulada à relação

ensino-aprendizagem que acontece na escola, contribuindo para a aquisição do

saber construído, na formação de cidadãos críticos e responsáveis.

De acordo com Falcão (2004, p. 201):

Entendemos que uma disciplina é legítima ou relevante quando a presença de seu objeto de estudo é fundamental para a reflexão pedagógica do estudante, e a sua ausência compromete a perspectiva de totalidade dessa reflexão. O que se verifica é que, freqüentemente, a capoeira se coloca como disciplina importante para discutir questões mais amplas, como preconceito, racismo, discriminação, constituindo possibilidade de ser tratada como um complexo temático capaz de contribuir no processo de construção de uma escola revolucionária. Talvez esteja aí a sua maior contribuição (FALCÃO, 2004, p.201)

Contudo, como um dia afirmou Guimarães Rosa6: “o caminho se faz

ao caminhar” e ao observarmos a evolução histórica da Capoeira podemos

perceber que esta atividade soube conquistar seu valor frente a sociedade.

Por fim, um sentimento dúbio e contraditório contempla o pesquisador,

por um lado, de obra acabada, por outro, de obra incompleta, pois ao mesmo tempo

em que este sente que cumpriu minimamente os objetivos a que o estudo se

propôs, também observa que o estudo não está concluído. Isto porque não pode

estar, porque é um processo em evolução permanente. Como processo, certamente

deixou diversas áreas de interesse a explorar, entre elas a aplicação da Capoeira à

comunidades específicas como à Educação Infantil, à Terceira Idade, aos

6 João Guimarães Rosa (1908-1967) foi médico, escritor e diplomata brasileiro. Autor de contos e livros marcados pela presença do sertão como palco das ações. Sua obra ficou marcada pela linguagem inovadora, utilizando elementos de linguagem popular e regional, com fortes traços de narrativa falada. É considerado por muitos críticos o maior escritor brasileiro da segunda metade do século XX.

125

portadores de necessidades especiais, aos Projetos Sociais, a Capoeira enquanto

ginástica laboral, qualidade de vida, mantenedora de consciência ecológica e outras

tantas.

Mas a semente foi plantada e não somente em relação à Capoeira e

sim à todas as novas temáticas introduzidas nos meios educacionais, já que somos

conhecedores da importância delas para a formação e evolução do ser.

Assim esperamos que este estudo traga contribuições e instigue aos

que buscam conhecer e transformar sua prática pedagógica servindo de incentivo à

novas pesquisas sobre o tema engrandecendo ainda mais o valor do didatismo e da

aposta em novas metodologias, principalmente e não somente, junto ao ensino da

Capoeira nos curso de Educação Física.

126

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, R.D. Integrando a universidade e escola por meio de uma pesquisa colaborativa . Tese de livre docência em Prática de Ensino. Rio Claro: Depto. De Educação . UNESP, 2001.

ALMEIDA, R. C. A saga do Mestre Bimba . Salvador: o autor, 1994.

ANDRÉ, M. E. & LUDKE, M. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas .

São Paulo: EPU, 1986.

________. Um projeto de investigação da prática pedagógica de professores da

Escola Normal. In: FAZENDA, I. (org) Novos enfoques da pesquisa educacional . São Paulo: Cortez, 1992.

ARAÚJO, M.C.S. O Estado Novo (Descobrimento do Brasil). Rio de Janeiro:

Jorge Zahar, 2000.

ARAÚJO. P C. Abordagens sócio-antroplógicas de luta/jogo da capo eira .

Editora PUBLISMAI- Departamento de Publicações do Instituto Superior da Maia, Portugal, 1997.

AREIAS, A. O que é Capoeira . São Paulo: Brasiliense, 1983.

ASSMANN, H. Paradigmas educacionais e corporeidade - Piracicaba: Editora

Unimep, 1994

_________. Metáforas novas para reencantar a educação : epistemologia e

didática. Piracicaba : Unimep, 1996.

BARROS, P.C. A prática pedagógica do professor de Educação Físic a e a

inserção do lúdico como um meio de aprendizagem . Dissertação de Mestrado – Programa de Mestrado em Educação da PUC-PR, Curitiba: 2006.

BARBOSA, C. L. A . Educação física escolar: da alienação à libertação . 1. ed.

Petrópolis: Vozes, 1997. v. 1. 150 p.

127

BARROS, G. N. M. Eros, a Força do Amor na Paideia de Platão . Notas da conferência proferida na I Semana de Estudos Clássicos & Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 2002.

BARROS, J.M.C. Educação Física e esportes: Profissões? Revista Kinesis,11, 5-

16, 1993.

________. Educação Física: perspectivas e tendências na profi ssão . Ponto de

Vista. Vol. 2, n°1. Motriz: junho, 1996. p. 51.

BEHERENS, M. A. A Formação Continuada de Professores e a Prática

pedagógica. Curitiba: Champagnat, 1996.

________. A. A prática pedagógica dos professores universitários : perspectivas e desafios . Revista Faculdade de Educação. Porto Alegre: PUCRS, Ano XXI, n° 35, 1998.

________. A prática pedagógica dos professores universitários : perspectivas. Curitiba: Champagnat, 2000.

________. O Paradigma emergente e a prática pedagógica . Petrópolis, RJ: Vozes, 2005

________. Paradigma da complexidade : metodologia de projetos, contratos didáticos e portifólios. Petrópolis/ RJ, Vozes: 2006.

BETTI, M. Novas Perspectivas na Formação Profissional em Educ ação Física .

Revista Motriz, Rio Claro , v.2, n.1, p.10-14, 1980.

________. Educação Física e Sociedade . São Paulo: Movimento, 1991.

________ Educação Física Escolar – Uma abordagem fenomenológ ica . In:

Moreira, W. W. Unicanp, 1991.

BRACHT. A educação física escolar como campo de vivência so cial . Revista

Brasileira de Ciências do Esporte, 9(3), 23-29, 1988.

________. Educação Física – Uma abordagem fenomenológica . In: Moreira, W.

Unicanp, 1991.

128

________. Educação física e aprendizagem social . Porto Alegre: Magister, 1992.

BRANDÃO, R. C. (org), Repensando a pesquisa participante , São Paulo;

Brasiliense, 1985.

________. Pesquisa Participante , São Paulo: Brasiliense, 1984.

BRANDÃO, Z. Entre questionários e entrevistas . In: NOGUEIRA, M. A.;

ROMANELLI, G.; ZAGO, N. (orgs.). Família & escola. Rio de Janeiro: Vozes, 2000.

BUARQUE, C. Aventura na universidade . Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994.

BUENO, E. História do Brasil, os 500 anos do país em uma obra completa ,

ilustrada atualizada. 2°Ed. São Paulo: Zero Hora/RB S Jornal. 1997.

CAMPOS, H.J.B.C. Capoeira na universidade: uma trajetória de resistê ncia .

Salvador: EDUFBA, 2001.

CAMPOS, R. "A luta dos trabalhadores pela escola ". Dissertação de Mestrado,

UFMG-FE, Belo Horizonte, 1985.

CAPOEIRA, N. Capoeira pequeno manual do jogador . Rio de Janeiro: Editora

Record, 1998.

CAPRA, F. O ponto de mutação: A ciência, a sociedade e a cultura emergente.

São Paulo: Cultrix, 1988.

________. “Ecologia profunda: Um novo renascimento” . Revista Thot n°57. São

Paulo: Palas Athena, 1993.

________. O ponto de mutação . As ciências, a sociedade e a cultura emergente.

São Paulo: Cultrix, 1995.

________. As conexões ocultas . Ciência para uma vida sustentável. São Paulo

(SP): Cultrix; 2002.

129

CARDOSO, C. A canção da inteireza. Uma visão holística da educa ção . São

Paulo: Summus, 1995.

CARVALHO, D. A educação com projecto antropológico . Porto: Edições

Afrontamento, 1992.

CARVALHO, L.C.A. A perseguição e proibição da capoeira . Revista Praticando

Capoeira. Ano 1. n.5 p.21-23, 1999.

CASTANHO, M. E. (org.) Pedagogia Universitária: pedagogia em foco .

Campinas, SP: Papirus, 2000. – Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico.

CASTELLANI, L. F. Educação Física no Brasil – A História que não se c onta . 3ª

ed. São Paulo: Papirus, 1991.

CASTRO, C. M. Modelo de educação . Revista Veja. São Paulo: Abril. 19 de

agosto de 1998.

CHIZZOTI, A. Pesquisas em Ciências Humanas e Sociais . São Paulo: Cortez,

1991.

COELHO, I. M. (org.) Formação de educador . Vol. 1 Júnior Bicudo. UNESP, 1996.

COSTA, V. L. M. Formação universitária do profissional de Educação Física – A

discussão sobre a andragogia. In: COSTA, Vera Lúcia de M. (Org.). Formação profissional universitária em Educação Física . Rio de Janeiro: Editora Central da universidade Gama Filho, 1997.

COUTO, A. (Mestre Zoiao) Historia, Arte & Filosofia da Capoeira Nacional ,

Salvador: Gráfica Sta Helena, 1999.

CREMA, R. Saúde e plenitude: um caminho para o ser . São Paulo: Summus,

1995.

CRESPO, J. A História do Corpo . Lisboa: Difel, 1990, (Coleção Memória e

130

Sociedade)

CUNHA, M. I. da. O bom professor e sua prática . Campinas, São Paulo: Papirus,

1994.

________. Educar pela pesquisa . Campinas, São Paulo: Autores Associados,

1996.

CUNHA, P. Ética e educação . Lisboa, Universidade Católica Editora, 1996.

CUNHA, M. I. O bom professor e sua prática . Campinas, São Paulo: Papirus,

1994.

DANKE, H. R. O processo do conhecimento na Pedagogia da Libertaç ão. As

idéias de Freire, Fiori e Dusel. Petrópolis: Vozes, 1995.

DAOLIO, J. . Educação física e o conceito de cultura . Campinas/SP. Autores

Associados, 2004.

DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir . São Paulo: Cortez, 2003.

DEMO, P. Desafios modernos para a Educação Física . Brasília: IPEA, 1991.

________. Educar pela pesquisa. Campinas: Autores Associados, 1996

________. Metodologia do conhecimento científico . São Paulo: Atlas, 2000

DESHAIES, B. Metodologia da investigação em ciências humanas . Lisboa:

Instituto Piaget, 1992.

DORATIOTO, F. F. M. O conflito com o Paraguai: a grande guerra do Brasi l.

São Paulo: Ática, 1996.

DRUCKER, P. A escola responsáve l. In: Asociedsde pós – capitalista. Tradução

de Nivaldo Montogelli jr. São Paulo: Pioneira, 1989.

131

EZPELETA, J: ROCKWELL, E. Pesquisa Participante . São Paulo: Cortez, 1986.

FALCÃO, J. L. C. et al. O processo de escolarização da capoeira no Brasil .

Revista Brasileira de Ciências do Esporte. Florianópolis (SC), v.16/3, p. 173

________. A escolarização da capoeira. Brasília : ASEFE – Royal Court, 1996.

________. O jogo da capoeira em jogo e a construção da práxis capoeirana .

2004. 409 f. Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2004.

FAZENDA, I. A interdisciplinaridade: um projeto em parceria . São Paulo:

Loyola, 1991.

FEITOSA, A. M. A Educação Física precisa de filosofia . Revista Brasileira de

Ciências do Esporte, São Paulo, v.8, n.1, p.140-141, setembro/1986.

FERGUSON, M. Voar e ver: Novos caminhos para o aprendizado. In: Conspiração

Aquariana . Tradução de Evaristo Costa, 7ª ed. Rio de Janeiro: Record, 1992.

FERREIRA, A. B. de H. Novo Dicionário da Língua Portuguesa . 3ª ed. Curitiba:

Positivo, 2004.

FERREIRA, T. F. Reflexões e práticas pedagógicas no dia-a-dia da es cola .

Concepções educacionais e Prática Pedagógica. Coletânia AMAE- Educando, 1999.

FERREIRA, V.L.C. Prática de Educação Física no primeiro grau: mode lo de

reprodução ou perspectiva de transformação? São Paulo: Ibrasa, 1984.

FILHO, J. L. Introdução à Sociologia dos Desportos . 3ª Edição, Rio de Janeiro:

Bloch Editores S.A., 1994.

FILHO, L. C. Educação Física no Brasil – A história que não se c onta . 3°ed.

São Paulo: Papirus, 1991.

132

FRANCO, I. L. Formação continuada: uma alternativa para o atendim ento das

necessidades didático-pedagógicas do professor univ ersitário . Londrina, PR: UEL, 2001.

FREIRE, J. B. Educação de corpo inteiro ; teoria e prática da Educação Física.

São Paulo: Scipione, 1989.

FREIRE, P. Trabalho, Comentário, Reflexão. Petrópolis, RJ: Vozes, 1991. ________. Pedagogia da esperança . Um reencontro com a pedagogia do

oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

________. Medo e ousadia. O cotidiano do professor . São Paulo: Paz e Terra,

1992.

________. Pedagogia da autonomia . Saberes necessários à prática educativa.

Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.

FREITAS, D. Palmares: A guerra dos escravos . 5ª Edição, Porto Alegre: Novas

Pers-pectivas, 1984.

FREYRE, G. Casagrande & Senzala: formação da família brasileir a sob o

regime da economia patriarcal . Rio de Janeiro: J. Olympio, 2003.

GADOTTI, M. Perspectivas atuais da educação . Porto Alegre: Artes Médicas,

2000.

________. Boniteza de um sonho: ensinar-e-aprender com sentid o. Novo Hamburgo: Feevale, 2003

________. Escola cidadã . 10ª ed. São Paulo: Cortez, 2004.

GIROUX, H. Os professores como intelectuais . Rumo a uma pedagogia crítica da

aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

GOMES, F. S. No meio das águas turvas (Racismo e cidadania no alvorecer da

República: A Guarda Negra na Corte – 1888-1889). “Estudos Afro-Asiáticos”. Rio de Janeiro: Univ. Cândido Mendes, 1991.

133

GÓMEZ, A.P. O pensamento prático do professor: Formação do professor como

profissional reflexivo. In: Os professores e a sua formação. Org. NÓVOA, A. Lisboa: Don Quixote, 1992.

GUIRALDELLI, P. J. Educação Física Progressista: a pedagogia crítico-s ocial

dos conteúdos e a Educação Física Brasileira . São Paulo: Loyola, 1988.

GUSDORF, G. "Professores para Que? " Para uma Pedagogia da Pedagogia, São

Paulo: Martins Fontes, 1997.

HAGUETE, T. M. F. Metodologias Qualitativas na Sociologia . Petrópolis: Vozes,

1987.

HOLLOWAY, T. Polícia no Rio de Janeiro: repressão e resistência numa cidade

do século XIX (trad. De Francisco Castro Azevedo). Rio de Janeiro: Ed. da Fundação Getúlio Vargas, 1997.

JAQUEIRA, A. R. F. A Capoeira Entrevista com o Professor Paulo Coelho .

Disponível em www.jf.estacio.br/revista/artigos/2ent_capoeira.pdf. Acesso em 2006.

KERLINGER, F. N. Metodologia da pesquisa em ciências sociais . São Paulo:

E.P.U. Lei n° 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996. Disponível em

http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Leis/L9394.HTM . Acesso em 2006.

LIBÂNEO, J. C. Democratização da escola pública – A pedagogia crítico-social

dos conteúdos, 9ª ed. São Paulo: Loyolla, 1986.

________. Didática . Coleção Magistério 2º Grau. Série Formação do Professor.

São Paulo: Cortez, 1991.

________. Democratização da Escola Pública: a pedagogia crítico-social dos

conteúdos . São Paulo: Ed. Loyola – 18ª edição, 2002.

________. “Reflexividade e formação de professores: outra osci lação do

pensamento pedagógico brasileiro? ”, in PIMENTA, Selma Garrido, e

134

GHEDIN, Evandro: Professor reflexivo no Brasil: gênese e crítica de um conceito. São Paulo, Cortez Editora, 2002.

LISANTI FILHO, L. Negócios Coloniais . Rio de Janeiro: Casa da Moeda, 1973

LUCCI, E. A. É Difícil Ensinar (mas mais difícil é aprender nos dias que correm:

por que será?). São Paulo: Editora Saraiva, 1998.

LUCKESI, C. Didática . São Paulo: Loyola, 1996.

LUSSAC, R. P. Educação Física e desportos . Rio de Janeiro: Catavento, 1996.

MALUF, A.C..M. Brincar: prazer e aprendizado . Petrópolis: Vozes, 2003.

MARINHO, I. P. Subsídio para a história da capoeiragem no Brasi l. Rio de

Janeiro: Tupy, 1956.

MARQUES, J. P. Manutenção do tráfico de escravos num contexto

abolicionista . A diplomacia portuguesa (1807-1819). Rio de Janeiro: Estudos Africanos, 1989.

MARTINELLI, L. M. B. As contribuições do pensamento complexo de Edgar

Morin para a formação do professor . Curitiba: 2003 Dissertação (Mestrado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

MARTINS, B. R. Por que faço capoeira: paradigmas infantis sobre as aulas de

capoeira . In: SIMPÓSIO DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA EEFD/UFRJ, Rio de Janeiro: EEFD/UFRJ, 2004.

MEDINA, J. P. S. Educação Física cuida do corpo ... e”mente ”. Campinas:

Papirus, 1985.

MELLO, A. P. Os negros do Brasil: quem são eles? São Paulo: o autor, 2000.

MENEZES, V.L. Escola de Educação Física – Universidade de São Paulo. In:

Revista Paulista de Educação Física. Vol. 5,n° ½. J aneiro/dezembro, 1991.

135

MINAYO, M. C. de S. Quantitativo-qualitativo: oposição complementaridad e?

Caderno da Saúde Pública 1993.

________. O desafio do Conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 5ª ed.

São Paulo: Hucitec, 1999.

MIRANDA, S. As abordagens pedagógicas na Educação Física: a vis ão dos

acadêmicos a respeito da prática de ensino da PUC-P R. Curitiba, 1998. Dissertação (Mestrado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

MIZUKAMI, M.G.N. Ensino: abordagens do processo . Temas Básicos de

Educação e Ensino. São Paulo: E.P.U., 1986.

MONTEIRO, K.M. Capoeira nas Escolas: Porque não? Monografia de conclusão

de curso de Licenciatura em Educação Física. Universidade Federal do Paraná, 2000.

MORAES, M. C. O Paradigma Educacional Emergente . São Paulo: Papirus,

1997.

________. Pensamento eco-sistêmico . Educação, aprendizagem e cidadania no

século XXI. Petrópolis: Vozes, 2004.

MOREIRA, W.W. Educação Física : uma abordagem fenomenológica. Campinas:

Unicamp, 1991.

MORIN, E. Para sair do século XX . Trad. Vera Azambuja Harvey. Rio de Janeiro:

Nova Fronteira, 1986.

______. “Complexidade e ética da solidariedade”. In: Ensaios de Complexidade . Porto Alegre: Sulina, 1997.

______. Ciência com Consciência . Trad. Maria D. Alexandre e M. Alice Sampaio Dória. 2ed. Rio de Janeiro: Bertrans Brasil, 1998.

______ . O método: 4. As idéias . Trad. Juremir Machado da Silva. Porto Alegre: Sulina, 1998.

______. Saberes globais e saberes locais: o olhar transdisciplinar. Rio de

136

Janeiro: Garamond, 2000.

______. Cultura de massas no século XX: necrose . 3 ed. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2001.

NÓVOA, A. (coord). Os professores e sua formação. Lisboa-Portugal, Dom

Quixote, 1997.

________. Os professores e o novo Espaço Público da Educação. Espaços de

Educação, Tempos de Formação . Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 237-263, 2002.

OLIVEIRA, J.G.M. Preparação profissional em Educação Física. in: PASSOS, S.

(Org.). Educação Física & esportes na Universidade . Brasília: MEC/SEED/UnB, p. 225-242, 1998.

________ Recursos humanos em Educação Física e Esportes, for mação e

utilização ; os recursos de formação de bacharéis em esporte: avaliação de uma proposta. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, v. 11, n. 2, p. 158-59, jan. 1990.

PALMA, Â. P. T. V. A Educação Física e o construtivismo: a busca de um

caminho na formação continuada de professores . 2001. Tese (Doutorado) - Faculdade de Educação, UNICAMP, Campinas, São Paulo.

PERRENOUD, P. Dez Novas Competências para Ensinar Porto Alegre: Artmed

Editora, 2000.

PIMENTEL, M. G. O professor em construção. Campinas: Papirus,1993.

PINTO, S. M. F. Novos Paradigmas e Novos Usuários da Informação. In: Ciência

da Informação - Vol 25, número 2, 1995 – Artigos disponível em: http://dici.ibict.br/archive/00000360/01/Novos_paradigmas

PIRES, A. L. C. Movimentos da cultura afro-brasileira: a formação h istórica da

capoeira contemporânea 1890-1950 . Campinas, 2001. Tese (Doutorado em História) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas.

137

QUADROS, C. Trabalho docente na educação superior : proposições e perspectivas. Santa Maria: Centro Universitário Franciscano, 2003.

RAMAL, A. “O templo da palavra invadido pelo mundo da imagem e da

navegação ” in Revista Guia da Internet.br. Rio de Janeiro: Ediouro, número 8,1997.

REGO, W. Capoeira de angola . Salvador: Editora Itapoá, 1968

REIS, J. J. "Um Balanço dos Estudos sobre as Revoltas Escravas d a Bahia ". In:

J. J. Reis, Escravidão & Invenção da Liberdade. Estudos sobre o Negro no Brasil. São Paulo, Brasiliense, 1988.

________. Liberdade por um fio: história dos quilombos no Bra sil . São Paulo:

Companhia das Letras, 1996.

REIS, L. V. S. O mundo de pernas para o ar: a capoeira no Brasil . São Paulo:

Publisher Brasil, 2000.

RIBEIRO, D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil . 2 ed. São

Paulo: Cia. das Letras, 1996.

ROCHA, J.C.C. Educação Física teoria e prática . 4 ed. Rio de Janeiro: Sprint,

1994.

ROSSETO, GAUER & CASTOLDI. Uma escola seriada que ousa a pesquisa

participante. In: V COLÓQUIO INTERNACIONAL PAULO FREIRE – RECIFE, 2005.

SANTOS, A. O. Capoeira: Arte-Luta Brasileira. Curitiba: Imprensa Oficial do Estado, 1983.

SANTOS, B. Introdução a uma ciência pós-moderna . Rio de Janeiro: Graal,

1989.

SANTOS, V.S. Ciência e verdade, uma grande reportagem . São Paulo: Gestão

Volta ao Mundo, 1982.

138

SEVECENKO, N. (org) História da vida privada no Brasil: república: da b elle

époque à era do rádio. Vol. 3. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

SILVA, G. Capoeira:do engenho à Universidade . São Paul: o autor, 1993.

SNYDERS, G. Entrevista dada à Lourdes Stamato de Camilles, PUC/SP,1990.

Disponível em www.centrorefeducacional.com.br/profprat.htm acesso em 2006. SOARES, C. E. L. Um Rio de Impérios e Nações (resenha de Devotos da Cor )

Estudos Afro-asiáticos, Rio de Janeiro, v. 24, p. 61-82, 1993.

________. A negregada instituição: os capoeiras no Rio de Jan eiro 1850-1890 .

Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, 1994.

SOUSA, A. Introdução à Gestão na Educação Física. Uma Abordag em

Sistémica . Lisboa: Editora Verbo, 1990.

TANI, G. et al. Educação física escolar: fundamentos de uma abordag em

desenvolvimentista . 2. ed. São Paulo: E. P. U., 1988.

TOLKMITT, V.M. Educação física: uma produção cultural . Curitiba: Módulo,

1996.

TUBINO, M. G. et all. Carta de Belo Horizonte . Documento elaborado por ocasião

do I I CONGRESSO BRASILEIRO DE ESPORTE PARA TODOS, Reuniões Plenárias das Associações de Professores de Educação Física (APEFs) (FBAPEF),1984. Disponível em www.cev.org.br/br/biblioteca/artigos acesso em 2006.

TUBINO, M. J. G. A necessidade de uma revisão da formação dos alunos

universitários das ciências da saúde. Revista de Psicologia/Universidade Veiga de Almeida. Vol. 1, n. 1. Rio de janeiro: O Instituto, 2002.

________. Uma Visão Paradigmática das Perspectivas do Esporte para o Início

do Século XXI. In: GEBARA, A. [et al]; MOREIRA, W. W. (Org.). Educação física & esportes: Perspectivas para o século XXI. 9ª edição. Campinas: Papirus, 2002, p.125-139.

________. et all. Carta de Belo Horizonte . Documento elaborado por ocasião do I I

139

CONGRESSO BRASILEIRO DE ESPORTE PARA TODOS, Reuniões Plenárias das Associações de Professores de Educação Física (APEFs) e eleição da Diretoria da Federação Brasileira das Associações de Professores de Educação Física (FBAPEF), 1984. Disponível em www.cev.org.br/br/biblioteca/artigos acessado em 2006.

UNESCO. Declaração mundial sobre educação para todos : satisfação das

necessidades básicas de aprendizagem. Jomtien, 1993.

VASCONCELOS, E. M. Serviço Social e interdisciplinariedade: o exemplo da saúde

mental. In: Revista Serviço Social & Sociedade , São Paulo: Cortez,1997.

VEIGA, I. P. A.; CASTANHO, M. E. L. M. Pedagogia universitária: a aula em foco.

Campinas, São Paulo: Papirus, 2000.

______. A relação entre os princípios pedagógicos em Educaç ão Física com a

Capoeira praticada em escolas do Distrito Federal . São Paulo: CEPEUSP, 1993.

VIEIRA, L. R. O jogo da capoeira: corpo e cultura popular no Bras il . Rio de

Janeiro: Editora Sprint, 1995.

VOGT, C. A espiral da cultura científica. ComCiência – Revista Eletrônica de

Jornalismo Científico , n. 45, jul. 2003. Disponível em http://www.comciencia.br/reportagens/cultura/

WISSENBACH, M. C. C. Da escravidão á liberdade: dimensões de uma privacidade

possível. In F. A. Novais (Org.), História da vida privada no Brasil (N. Sevcenko, Org. Vol. 3, pp. 49

140

APÊNDICES

141

APÊNDICE (A)

142

Questionário para alunos do Curso de Educação Físic a

*Sujeito n°: _________________ Data: ___/___/______

1. Idade:_______(anos)_______(meses)

1. Ao entrar na Universidade, qual foi a sua expectativa ao saber que teria a disciplina de Lutas com ênfase Capoeira? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 2. Após cursar a disciplina de Lutas com ênfase em Capoeira, as expectativas iniciais foram correspondidas? ( ) sim ( ) não Justifique: _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 3. O que você aprendeu nesta disciplina? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

143

4. Você conseguiu relacionar algum conteúdo da disciplina de Lutas com ênfase em Capoeira, a outra disciplina ou atividade da Educação Física? ( ) sim ( ) não Se assinalou sim , quais conteúdos e em qual (is) disciplina (s) pôde utilizá-los? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 5. Você acredita que as aulas da disciplina de Lutas com ênfase em Capoeira foram suficientes para capacitá-lo a dar aulas de Capoeira na escola? ( ) sim ( ) não Por que? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 6. Você considera importante a Capoeira fazer parte do Currículo do Curso de

Educação Física? ( ) sim ( ) não Por que? _____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

144

145

Questionário para Professores da Disciplina de Capo eira

*Sujeito n°: _________________ Data: ___/___/______

• Formação Acadêmica: Graduação: ___________Ano de

conclusão:________ Especialização:_________Ano de conclusão:________ Mestrado:_____________Ano de conclusão:________ Doutorado:____________Ano de conclusão:________

• Tempo de docência no Ensino Superior:_________________.

1. Você considera importante a Capoeira fazer parte do Currículo do curso de Educação Física?

( ) sim ( ) não Por que? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

1. Qual a sua percepção a respeito das expectativas dos acadêmicos em relação à disciplina que você ministra?

______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

146

______________________________________________________________________________________________________________________________________

2. Qual a carga horária dispensada à Capoeira durante suas aulas? Você acredita que as aulas de Capoeira ministradas no decorrer da sua disciplina foram suficientes para capacitar seu aluno a dar aulas de Capoeira na escola? Justifique.

_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

147

APÊNDICE (C)

148

149

150

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu___________________________________________________________, RG nº________________, estou sendo convidado a participar de um estudo denominado: “A prática pedagógica da disciplina de Capoeira na Educação Superior e sua contribuição para a formação do futuro docente” cujo objetivo é pesquisar como a disciplina Capoeira, pode contribuir para o curso de Educação Física subsidiando a prática pedagógica desta atividade em ambiente escolar, do futuro profissional.

Sei que para o avanço da pesquisa a participação de voluntários é de fundamental

importância. Caso aceite participar desta pesquisa eu responderei a um questionário

elaborado pelo pesquisador, que consta de questões abertas e objetivas, referentes a

participação e conceito sobre as aulas da disciplina de Capoeira no curso de Educação

Física.

Estou ciente de que minha privacidade será respeitada, ou seja, meu nome, ou

qualquer outro dado confidencial, será mantido em sigilo. A elaboração final dos dados será

feita de maneira codificada, respeitando o imperativo ético da confidencialidade.

Estou ciente de que posso me recusar a participar do estudo, ou retirar meu consentimento a

qualquer momento, sem precisar justificar, nem sofrer qualquer dano.

O pesquisador envolvido com o referido projeto é Jorge Luiz de Freitas, com quem poderei

manter contacto pelos telefones: (41) 3362-6966 e (41) 9989-6769

Estão garantidas todas as informações que eu queira saber antes, durante e depois do estudo.

Li, portanto, este termo, fui orientado quanto ao teor da pesquisa acima mencionada e

compreendi a natureza e o objetivo do estudo do qual fui convidado a participar. Concordo,

voluntariamente em participar desta pesquisa, sabendo que não receberei nem pagarei nenhum valor

econômico por minha participação.

____________________________________

Assinatura do sujeito de pesquisa

______________________________ ____________________________

Assinatura do pesquisador

Curitiba_______de _________________________de 2006.

Livros Grátis( http://www.livrosgratis.com.br )

Milhares de Livros para Download: Baixar livros de AdministraçãoBaixar livros de AgronomiaBaixar livros de ArquiteturaBaixar livros de ArtesBaixar livros de AstronomiaBaixar livros de Biologia GeralBaixar livros de Ciência da ComputaçãoBaixar livros de Ciência da InformaçãoBaixar livros de Ciência PolíticaBaixar livros de Ciências da SaúdeBaixar livros de ComunicaçãoBaixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNEBaixar livros de Defesa civilBaixar livros de DireitoBaixar livros de Direitos humanosBaixar livros de EconomiaBaixar livros de Economia DomésticaBaixar livros de EducaçãoBaixar livros de Educação - TrânsitoBaixar livros de Educação FísicaBaixar livros de Engenharia AeroespacialBaixar livros de FarmáciaBaixar livros de FilosofiaBaixar livros de FísicaBaixar livros de GeociênciasBaixar livros de GeografiaBaixar livros de HistóriaBaixar livros de Línguas

Baixar livros de LiteraturaBaixar livros de Literatura de CordelBaixar livros de Literatura InfantilBaixar livros de MatemáticaBaixar livros de MedicinaBaixar livros de Medicina VeterináriaBaixar livros de Meio AmbienteBaixar livros de MeteorologiaBaixar Monografias e TCCBaixar livros MultidisciplinarBaixar livros de MúsicaBaixar livros de PsicologiaBaixar livros de QuímicaBaixar livros de Saúde ColetivaBaixar livros de Serviço SocialBaixar livros de SociologiaBaixar livros de TeologiaBaixar livros de TrabalhoBaixar livros de Turismo