Jornal Comunicação

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Co::: unicação www.jornalcomunicacao.ufpr.br jornal laboratório do curso de jornalismo da ufpr - edição 04 | julho de 2009 POLÍTICA PÁG. 3 Caso Carli levanta questionamentos sobre a imunidade parlamentar UFPR PÁG. 7 Alunos de turnos novos sem aula no primeiro semestre do Reuni Chumbo contamina Adrianópolis Chumbo contamina Adrianópolis

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Jornal laboratório do curso de jornalismo da Universidade Federal do Paraná - Edição de Julho de 2009.

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jornal laboratório do curso de jornalismo da ufpr - edição 04 | julho de 2009

Política

Pág. 3

Caso Carli levanta questionamentossobre a imunidade parlamentar

UFPR

Pág. 7

Alunos de turnos novos sem aula no primeiro semestre do Reuni

Chumbo contamina

AdrianópolisChumbo contamina

Adrianópolis

2::: junho de 2009

opinião

A reportagem de capa deste mês do Jornal Comunicação denuncia a contaminação por chumbo dos mora-dores de Adrianópolis, especialmente dos que vivem nos bairros de Vila Mota e Capelinha. O problema foi detectado por diversos estudos, como a pesquisa conduzida pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) durante os anos de 1999 a 2001. Constatou-se que o solo próximo à antiga refinaria da Plumbum encontra-se contaminado mesmo após o fechamento da fábrica, resultando em diversos malefícios à população residente da região. Foi esse o tema da tese de doutorado da geóloga Fernanda Gonçalves da Cunha no Instituto de Geociências da Unicamp. Fernanda atualmente coordena o pro-jeto Mapeamento Geoquímico Multi-elementar e Multiúso do Brasil, visando dar subsídios a pesquisa mineral, estu-dos ambientais e de saúde pública.

Como foi realizada a pesquisa com os moradores da região de Adrianópolis?Fernanda:Sabíamos que o Alto Vale do Ribeira ficou por várias décadas sob influência das atividades de mineração de chumbo e de uma usina de refino e beneficiamento dos minérios que eram produzidos nas minas da região. Por isso, provavelmente, a região es-tivesse altamente contaminada pelo metal. Procedeu-se uma pesquisa para verificar as concentrações de chumbo nas águas dos rios, na água consumida pela população, nos solos e em alguns tipos de alimentos produzidos nos quintais das casas dos moradores de Adrianópolis, especialmente dos que vivem em Vila Mota e Capelinha. Paralelamente a esse estudo, foi realiza-do um trabalho com a população desses locais, crianças e adultos, com coleta de amostras de sangue para dosar os teores de chumbo. O objetivo era verificar se o metal que estaria presente no meio ambiente estava sendo absorvido pelo organismo humano, mesmo após cinco anos da data de paralisação das ativi-dades da refinaria Plumbum, em 1995.

De que maneira se dava a contami-nação?Fernanda: O chumbo emitido pela re-finaria para a atmosfera depositou-se no solo, que já era naturalmente enrique-cido pelo metal por ser uma área de mineração. Cumulativo no organismo humano, ele pode ser absorvido através da inalação da poeira ou pela ingestão de alimentos e água contaminados. Há ainda a possibilidade de contaminação após a ingestão de pequenas partículas de solo, principalmente pelas crianças, que possuem o hábito de brincar na terra e levar as mãos e brinquedos até a boca. Elas são consideradas um grupo de alto risco porque absorvem e retêm maior quantidade de chumbo ingerido do que os adultos, devido a sua fisiolo-gia. Independente da idade, a população residente em Vila Mota e Capelinha,

mais próximas da Plumbum, continua até hoje exposta aos efeitos adversos à saúde já que o metal fica retido no solo por muitos e muitos anos.

Quais são os danos à saúde que a con-taminação por chumbo pode causar à população do Vale da Ribeira?Fernanda: O Centers for Disease Con-trol and Prevention (CDC) [agência do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos que tra-balha na proteção da saúde pública da população] estabeleceu como limite tóxico de chumbo no sangue de crian-ças o valor de 10mg/dL. Acima desse valor, diversos problemas de saúde po-dem aparecer, afetando severamente o sistema nervoso central, com sequelas irreversíveis. Sinais de intoxicação in-cluem: hiperatividade, dificuldades motoras, distúrbios de aprendizagem e de comportamento, além de distúrbios no crescimento, anemia e diminuição do metabolismo da vitamina D. Em níveis mais elevados, pode causar ne-fropatias [lesões no rim], encefalopa-tias [lesões no cérebro] e até a morte. Adultos com teores de 40 a 60 mg/dL de chumbo no sangue podem apresen-tar sintomas como distúrbios de humor e neuropatias. Teores de 50 a 80 mg/dL podem ocasionar sintomas de toxici-dade crônica, como cansaço, sonolên-cia, irritabilidade, dores nas articulações e problemas gastrintestinais.

A quais conclusões a pesquisa chegou?Fernanda: A pesquisa realizada no Alto Vale do Ribeira constatou que tanto as crianças quanto os adultos que moram mais próximos à antiga fábrica da Plumbum apresentam os níveis de chumbo no sangue mais elevados. Em crianças, os resultados mostraram teores até quatro vezes mais elevados do que o limite tóxico recomendado pelo CDC. Do total analisado, 59,6% das crianças residentes em Vila Mota e Capelinha apresentam teores do metaalchumbo no sangue que já indi-cam necessidade de acompanhamento médico. Não existem pesquisas sobre a incidência de doenças e/ou sintomas que possam ser relacionados com a contaminação ambiental e exposição humana na região.

A água consumida na região também está contaminada? Apenas amostras de solo apresentaram contaminação?Fernanda: Todos os resultados en-contrados nas amostras de água utiliza-das para consumo doméstico estavam muito abaixo do valor máximo permit-ido pelo Conama [Conselho Nacional do Meio Ambiente] e pelo Ministé-rio da Saúde. Porém, as amostras de solo apresentaram teor de chumbo bastante elevado, especialmente ao en-torno da refinaria. Foram analisadas, também, amostras de hortaliças, leite e ovos produzidos nos quintais das casas. Os resultados indicaram valores de concentração de chumbo acima do tolerável para os ovos e verduras:::

editorial

Diversos motivos nos levaram a desistir de publicar essa última versão do Comunicação em papel. Primeiro, tive-mos as férias, depois, o recesso. Foram quase dois meses sem aulas, com um jornal pronto para ser publicado, sem um público leitor. Sendo assim, achamos melhor não gastar dinheiro público para publicar um jornal para ninguém.

Também passamos por um período de reformulação. Devido a questões internas do curso, mudaram os co-ordenadores, assim como a equipe de editores e secretários do jornal ficou mais enxuta. Infelizmente, agora trabalhar-emos com menos gente e, até nos adaptarmos novamente à nova estrutura do jornal, perdemos tempo precioso.

No entanto, não poderíamos deixar de publicar esse jornal de alguma maneira. Além do trabalho de todos os envolvidos, que seria em vão, perderíamos algumas das melhores matérias produzidas neste ano, como a reportagem sobre a contamina-ção por chumbo em Adrianópolis, na região metropolitana de Curitiba. Nossa equipe de reportagem foi até a cidade, próxima da fronteira com São Paulo, para relatar uma tragédia causada pelo descaso do homem com o meio-ambiente.

A editoria de UFPR decidiu abordar outro problema bastante notório na Universidade. A partir do Reuni, diversos cursos foram criados, sem que houvesse a estrutura necessária para abrigá-los. Muitos estudantes passaram o semestre sem ter aula, ou tendo aulas improvisadas, resultado de uma reestrutu-ração feita às pressas e sem consulta à comunidade acadêmica.

Portanto, decidimos aproveitar nosso espaço on-line para publicar essa edição do Jornal Comunicação, que deveria ter saído no final do semestre passado. É um atraso longo, indesejado, mas que não deve comprometer a leitura dessas matérias, que foram feitas com muito esforço e dedi-cação por nossos repór-teres. An-tes tarde do que nunca.

O Comunicação é uma publicação do curso de Jornalismo da Universidade Fe-deral do Paraná, com a participação de alunos das disciplinas de Laboratório de Jornalismo Impresso e Laboratório Avançado de Jornalismo Impresso.

Professor orientador: Toni Andre Scharlau Vieira. (jornalista responsável – RP/MT 6680 - RS).editor Chefe: Fábio Pupo.seCretaria de redação (imPresso): Chico Marés e Manuela Salazar. seCretária de redação (on-line): Iasa Monique. subseCretárias: Juliane Massaoka, Lina Hamdar e Luciana Galastri. Webmaster: Tiago Capdeville. Chefe de rePortagem: Mário Messagi Jr.

editores: CiênCia e TeCnologia: Guilherme de Souza. CoMPoRTaMenTo: Rodrigo Batista. CulTuRa: Rafael Rodrigues e Ilana Stivelberg. eSPoRTeS: Gabriela Bas-tos. PolíTiCa: Cícero Bittencourt e Luciane Belin. SoCiedade: Juliana Vitulskis e Henrique Kugler. ufPR: Lilian Wiczneski, Nayara Brante e Sharon Abdalla.

fotografia: Julia Guedes. Arte: Renata Bossle. CaPa: RenaTa BoSSle. Charge: Yuri Alhanati. infografiCos: Tiago PizzoloProjeto gráfiCo e diagramação:Juliana Karpinski.

endereço: Rua Bom Jesus, 650 – Juvevê – Curitiba-PR. telefone: (41) 3313-2017.

e-mail:[email protected] site:www.jornalcomunicacao.ufpr.br

tiragem: 4 mil exemplares. imPressão: Gráfica O Estado do Paraná.

expediente Em entrevista ao Jornal Comunicação, a geóloga Fernanda Gonçalves da Cunha

conta detalhes dos procedimentos

utilizados na pesquisa, os

resultados do estudo e o que

ainda pode ser feito para amenizar as

consequências da atividade extrativista

na área

conheça também nosso site

www.jornalcomunicacao.ufpr.br

Por uma Adrianópolis livre do chumboMudando os planos

Bruno Calzavara

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junho de 2009 3:::

Na primeira semana de se-tembro a Justiça acatou denúncia realizada pelo Ministério Público Estadual por duplo homicídio qualificado contra o ex-deputado estadual Fernando Ribas Carli Filho (PSB-PR). Ele passou a responder pelas acusações de-pois de renunciar ao mandato, em 29 de maio, quando ainda es-tava internado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Em junho, o prefeito de Guarapuava e pai do ex-parlamentar, Fernando Ribas Carli, anunciou que filho pretende voltar à vida política depois que a questão judicial estiver resolvida. O prefeito não só anunciou a pre-tensão do filho, como confirmou uma prática muito difundida entre os políticos do país: sob o amparo da lei, não serem condenados pe-los crimes que cometem.

Ao renunciar, Carli Filho ale-gou estar abrindo mão do foro privilegiado a que tinha direito por considerar ‘correto’ o seu julgamento pela justiça comum. O ex-deputado se envolveu em um grave acidente no dia 7 de maio que resultou na morte dos jovens Gilmar Ra-fael de Souza Yared e Carlos Murilo de Almeida. Multado mais de 30 vezes nos últimos seis anos, o ex-deputado a c u m u -lava cerca de 130 p o n t o s na cartei-ra e tinha o direito de diri-gir sus-penso.

Para o advogado Fabio Gil, a renúncia de Carli Filho constituiu uma manobra política conhecida: a de se esquivar do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a fim de ganhar tempo no desenrolar do processo. “Ao ser julgado direta-mente pelo Supremo, não há possi-bilidade de recorrer da decisão, en-quanto que nos casos em que não há foro privilegiado, dispõe-se de vários mecanismos para contestar a decisão e adiar a sentença final”, diz Gil. Além disso, ao renunciar ao car-go público e optar pelo julgamento pela justiça comum o parlamen-tar não põe em risco seus direitos políticos, podendo se candidatar novamente nas próximas eleições.

Proposta de quebra da imunidade

O deputado estadual Ney Leprevost (PP-PR) enviou em maio uma carta ao Presidente da Câmara Federal, deputado Michel Temer (PMDB- SP) sugerindo o fim da imunidade parlamentar. “De maneira astuta os advogados dos políticos acabam utilizando-se do foro pra fazer um jogo de idas e vindas empurrando o processo até que o crime seja prescrito”, afirma o deputado. Leprevost defende, porém, que a essência da medida, que diz respeito à liberdade de ex-pressão, deve ser mantida. “Num regime democrático, é impossível não contar com a imunidade de palavras. É ela que garante que o deputado suba na tribuna sem medo de represálias”, defende.

Por se tratar de uma lei federal, a prerrogativa só pode ser alterada nesta instância através de emenda constitucional. No entanto, sua quebra acabaria com a falta de jul-gamento da classe política e, por isso, a proposta tem encontrado resistência entre os deputados. “Hoje existe uma minoria que tem consciência de que ou os parla-mentares mudam a cara do Con-gresso Nacional ou o povo acaba com o Congresso”, diz Leprevost, que tem dúvidas quanto à aceita-ção da proposta

O Presidente da As-sembléia Legislativa do Paraná (Alep), Nelson Justus (DEM), se mostra par-

cialmente favorável à imunidade parlamentar. “Para crimes cometi-dos aqui no plenário, a imunidade é indispensável. Mas o parlamen-tar é um cidadão comum como qualquer outro. Não tem cabi-mento existir uma prerrogativa especial”, argumenta.

Há três anos, o ex-deputado do Acre, Hildebrando Pascoal foi condenado por alguns dos crimes que cometeu quando ainda era parlamentar, inclusive o mais bár-baro e nacionalmente conhecido “crime da serra elétrica”. Pascoal amputou os braços e as pernas de Agilson Firmino dos Santos antes de assassiná-lo, em 1996 e só foi julgado 12 anos após a execução do mecânico. “Nesse caso, o Hil-debrando demorou um bom tempo para deixar de ser deputa-do depois que o crime veio à tona. Não tenho dúvidas de que o foro privilegiado influenciou nessa de-mora”, declara Leprevost.

Legado da ditadura

O artigo 53 da Constituição Federal data do período de dita-dura militar e trata das imunidades inerentes a todos os senadores e deputados estaduais e federais em exercício no país: a formal, que dá cobertura contra prisões indevidas, salvo em flagrantes de crimes inafiançáveis ou decisões definitivas da justiça; e a mate-rial, que permite ao parlamentar a liberdade de expressão e votos, impedindo que o processo por calúnia, injúria ou difamação no exercício de suas funções possa ser levado à justiça.

A medida traz a herança da época em que foi criada, quando sua fun-ção maior era proteger os legisladores c o n t r a represálias q u a n d o s u a s manifes-tações em plenário

externavam críticas ao governo militar. “Garantia-se, a um só tempo, o exercício do cargo e a manifesta-ção do pensamento”, explica Gil. O advogado acredita que o instituto se degenerou depois que a ditadura passou. “Manobras passaram a ser utilizadas como tentativa de fuga às penas previstas aos crimes comuns e de responsabilidades cometidos no exercício do cargo”, diz.

Exemplo disso foi o que fez o então Presidente da República Fernando Collor de Melo ao ser processado no Senado Federal por crime de improbidade administra-tiva – crime de responsabili-dade cuja pena é a perda dos direitos políticos e a impossibili-dade de exercer qualquer função pública por oito anos. Collor re-nunciou ao cargo no dia do julga-mento final, pretendendo, assim, esquivar-se das penas que seriam impostas. “O Supremo Tribunal Federal (STF) atento à intenção de Collor, julgou um mandado de segurança afirmando que a renún-cia não impediria a imposição das penas previstas”, conta Gil.

Reformulação

Até a promulgação da Emenda Constitucional nº 35, de 20 de dezembro de 2001, o artigo 53 da CF previa, dentre outras coi-sas, que deputados e senadores só poderiam ser julgados por seus crimes comuns caso a Câmara dos Deputa-dos ou o Senado concedesse p e r -

Justiça acata denúncia contra Carli Filho e

reacende discussão sobre imunidade parlamentarFim da vantagem

que impede punições aos

legisladores ésugerida ao

Congresso

missão ao STF autorizando a aber-tura do processo. “Se a licença não fosse concedida, o caso só poderia ser retomado quando o parlamen-tar deixasse de exercer função pública e passasse a responder o processo enquanto pessoa civil”, explica Fábio Gil.

A emenda passou a permitir que essa licença seja dispensável na definição do processo contra o parlamentar. “O partido políti-co, representado por todos os seus membros, pode interferir no andamento do processo do parlamentar, tendo autonomia para, inclusive, interrompê-lo”, ressalta Gil. A interrupção do processo pela Câmara ou Sena-do só pode ser materializada nos crimes cometidos após a posse do político.

Para o professor de Direito da Universidade Tiradentes de Ara-caju (SE), Maurício Monteiro, a emenda fere a Constituição Federal por tornar os atos parlamentares mais passíveis de punição por parte do Judiciário. “A imunidade parlamentar, mes-mo que formal, representa a ga-rantia de atuação independente dos parlamentares. Restringir essa atuação significa vulnerabili-zar a soberania popu-lar”, declara Mon-teiro:::

Helen Anacleto

política

IMUNIDADE Na atual legislação, parlamentares são julgados diretamente pelo STF quando processados por crimes ocorridos no decorrer de seus mandatos

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O anúncio das doze cidades brasileiras que receberão jogos da Copa de 2014, entre elas Curitiba, marcou o início dos preparativos para a competição. A indústria do esporte será responsável por movimentar uma grande quan-tidade de capital em todo o país, em áreas que vão desde a venda de material esportivo até a in-fraestrutura de transportes, co-municação e hotelaria.

Para o secretário executivo da Associação Brasileira de Indús-tria do Esporte (Abriesp), Edu-ardo Sayeg, em um quadro geral, a indústria do esporte espera um crescimento da ordem de dez a 15 por cento. O secretário da Abriesp avalia que os gastos com a Copa são contraídos antes do mundial, e os benefícios se inicia-rão quando a cidade está pronta para ser sede. “As despesas acon-tecem durante a adequação da ci-dade e do estádio. Após essa fase, o comércio relativo à Copa passa a aquecer”, afirma.

“A industria esportiva é ba-sicamente aquilo que o esporte gira em termos financeiros. É o conjunto de empresas que fun-cionam em razão do esporte”, define o pesquisador da Univer-sidade de Liverpool, doutoran-do em Indústria do Esporte, Oli-ver Seitz. Já Sayeg explica que o setor abrange todas as atividades comerciais ligadas de alguma forma ao esporte. “A indústria esportiva inclui duas linhas de comércio. Diretamente, há atributos como infra-estrutura de locais, equipamentos, ma-teriais e serviços vinculados ao esporte. No caso de megaeven-tos, há também atividades como direitos de transmissão, comer-cialização de produtos relacio-nados, entretenimen-to e hotelaria”, explica.

Ele afirma que, atualmente, o PIB do esporte brasileiro represen-ta algo na ordem dos 35 bilhões de reais por ano. “Somando-se todas as atividades, o setor vem regis-trando um crescimento médio

de dez por cento ao ano na última

década, enquanto o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) Nacional registrou média de crescimento de quatro por cento”, declara o secretário.

Seitz resume os aspectos essencialmente esportivos do setor: “uma organização esporti-va precisa de capital para investir em salário de atletas, equipa-mentos e estruturas. Para isso, ela cobra ingressos de torcedores pelo acesso ao estádio, busca pa-trocinadores interessados em vincular sua marca ao clube e ao esporte, e procura veículos de comunicação para a transmissão das partidas, além de, eventual-mente, capitalizar em cima do valor de rescisão de contratos”.

Crescimento

De acordo com, os setores comerciais que devem ter maior crescimento com o mundial são as empresas do ramo de turis-mo, como hotéis e restaurantes.

“Além destas, aquelas que

vendem

produtos de varejo relacionados à temática do futebol também devem se fortalecer, mas este é um investimento mais incerto”, complementa Seitz.

O representante de marketing esportivo Renato Chvindelman, atesta o otimismo no setor com relação à Copa. “A expectativa é a melhor possível. Para a pequena in-dústria, esperamos um substancial incremento na venda de produtos que vão desde itens simples, como chaveiros, camisas, bonés e outros acessórios, até os mais sofisticados, como os licenciados pela Fifa e seus patrocinadores”, explica ele.

No entanto, o aumento no preço dos produtos também é esperado. “É natural que haja um acréscimo. Ainda é difícil, por en-quanto, precisar a porcentagem deste aumento, variável entre cada setor”, afirma Chvindelman. Se-gundo ele, o ramo de hotelaria deve sofrer os maiores reajustes. Para o diretor de marketing es-portivo Eduardo Hatschbach, boa parte dos lucros serão originados de pacotes turísticos vendidos antecipadamente. “Empresas de turismo fazem contratos com hotéis, bares e restaurantes, entre outros, e os vendem a turistas do Brasil e do mundo. Destes pacotes virá grande parcela das receitas para os estabe-lecimentos comerciais da cidade”, diz Hatschbach.

Será também o setor de turis-mo o maior gerador de empregos no contexto da Copa, segundo Seitz. “Em sua maioria, contudo, os empregos criados são tem-porários. A organização do even-to também pode contratar mão de obra temporária para ajudar na realização, mas normalmente eles contam com voluntários”, alerta o pesquisador. “Afora isso, indústrias de produtos de varejo também podem contra-tar funcionários para ampliar a produção de itens relacionados ao futebol”, explica ele.

De acordo com Seitz, a Federação Internacional de Futebol (Fifa) é certamente a entidade que mais lucrará com o evento. “A Fifa praticamente não tem despesas. Ela recebe grande parte das receitas (ingressos, co-tas de patrocinadores, venda de produtos licenciados) e deixa os custos nas mãos do país, dos es-tados e das cidades”, afirma.

O país se prepara para a Copa 2014 Indústria do esporte

deve movimentar recursos em

diversos setores da economia

4::: junho de 2009

esportes

Rafael Neves

Período pós-CopaAlguns fatores financeiros da

Copa 2014 estão ainda em fase de especulação, como explica Seitz. “É muito difícil prever um balanço de gastos e receitas cinco anos an-tes do mundial. Na maioria dos casos, o saldo da economia nacio-nal é irrisório, mas vai depender muito de como o país vai tratar o evento”, analisa ele. Segundo Seitz, para a indústria, é provável que as receitas em vendas sejam contra-balanceadas com a possibilidade da produção industrial como um todo cair, devido ao mês de festa no país. “Muita gente vai trabalhar menos na ocasião”, justifica ele.

O setor de marketing esportivo espera um grande legado financeiro. “Acredito que teremos um grande incremento no número de ações (diretas e indiretas) e campanhas publicitárias, pois se trata um even-to de grande porte. Existem mul-tinacionais envolvidas e a circula-ção de dinheiro é enorme”, afirma

Renato Chvindelman. Eduardo Hatschbach compartilha do oti-mismo. “A expectativa de aque-cimento da economia vai além do campo da indústria do esporte”, aponta o diretor de marketing.

Oliver Seitz afirma que o es-porte curitibano também deve receber benefícios. “O evento vai propiciar uma estrutura esportiva mais moderna e pode desenvolver o interesse das pessoas em consumir produtos relacionados. Além disso, aumentará a visibilidade de nosso futebol para o mundo”, conclui.

Apesar do otimismo, Eduardo Sayeg, da Abriesp, fala sobre a chance do evento ser uma grande decepção, caso não haja comprometimento. “Se as metas forem cumpridas, teremos um país melhor a partir de 2014. Sem dúvida o legado será imenso em infra-estrutura, cultura e modernização. Mas não podemos esquecer que ainda há muito que fazer”, alerta o secretário:::

COPA DO MUNDO O segmento de materiais esportivos deve se beneficiar com a realização da Copa

A industria esportiva é

basicamente aquilo que o esporte gira em termos

financeiros. É o conjunto de empresas que funcionam em

razão do esporte” Oliver Seitz

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5:::junho de 2009

sociedade Adrianópolis sofre com contaminação por chumbo

Adrianópolis, cidade da Região Metropolitana de Curitiba, no Vale do Ribeira, é marcada pelo chum-bo. O desenvolvimento da região ocorreu junto com a instalação da mineradora Plumbum, na década de 30, o que garantiu melhorias de infraestrutura e gerou empregos à população com a extração de chumbo e prata. A empresa, porém, fechou as portas em 1995 e deixou um rastro de despreocupação com o meio ambiente: rejeitos de chumbo abandonados ao ar livre. Esses restos de minérios não trata-dos até hoje contaminam os rios, o solo, o ar e, consequentemente, os habitantes da região.

Pesquisas

Vila Mota e Capelinha são as regiões mais afetadas, segundo estudos da Secretaria de Estado da Saúde e do Ministério da Saúde, divulgados em 2008. Foram en-contradas altas concentrações de chumbo na poeira destes locais: enquanto os números aceitáveis são 17 mg/Kg, os detectados foram de 300 a 3.300 mg/Kg. Há também níveis acima dos toleráveis nos alimentos cultivados nas vilas (hortaliças, leguminosas e ovos).

O estudo para a tese de dou-torado da geóloga Fernanda Gon-çalves da Cunha, no Instituto de Geociências da Unicamp, mostrou também elevado nível de chumbo nos habitantes da região. “Do total analisado, 59,6% das crianças de Vila Mota e Capelinha apresentam teores de chumbo no sangue que já indicam necessidade de acompan-hamento médico”, revela Fernanda.

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tAlta concentração de chumbo

prejudica saúde de moradores da

cidadeBruno Calzavara

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Os moradores reclamam tam-bém do mau gosto e do aspecto da água, problema que alguns consi-deram mais urgente que o do chum-bo. “Fizemos uma análise dessa água na Universidade e, apesar das recla-mações, constatamos que ela não faz mal para a saúde”, explica Guilherme Albuquerque, professor do Departa-mento de Saúde da UFPR.

A mineradora

A Plumbum pode ser vista como geradora de desenvolvimen-to da região – a relação é tão forte que a cidade de Adrianópolis rece-beu esse nome em homenagem ao proprietário da empresa, Adriano Seabra de Fonseca. No entanto, também é responsabilizada pela contaminação por chumbo no local, devido à falta de cuidados ambien-tais, que consequentemente trouxe

prejuízos sócios econômicos.Há mais de uma hipótese so-

bre o motivo de seu fechamento. Alguns acreditam que é econômi-co. “Não havia mais o que explorar na cidade, então ela fechou porque não era mais lucrativo”, diz Maria Dolores Torres Rúbio, moradora de Iporanga. Já a ambientalista e funcionária da Secretaria de Es-tado do Meio Ambiente, Laura Je-sus de Moura e Costa, afirma que o motivo são as várias multas am-bientais que a empresa recebeu.

O que foi feito desde então

Segundo Laura, pouco foi feito para corrigir os problemas ambi-entais durante os últimos 14 anos. Em Adrianópolis, principalmente em um raio de cinco quilômetros de onde ficava a mineradora, o solo está contaminado e existem rejeitos

expostos ao ar livre, sem de trata-mento. Além disso, existem ruas pavimentadas com restos de chum-bo. Sempre que veículos trafegam por elas, a poeira contaminada se espalha pela região.

Um aterro foi feito à beira do rio que corta a cidade. Porém, sua ca-pacidade é de apenas cerca de 10% da quantidade total dos rejeitos e sua situação é irregular. “A ma-nutenção, que deveria ser realizada pelo IAP [Instituto Ambiental do Paraná] de três em três meses, não está sendo feita”, denuncia Gui-lherme Albuquerque. O IAP não se pronunciou sobre o assunto.

Quem vive o problema

Uma parte da população não acredita que o local esteja contami-nado. “Trabalhei na Plumbum du-rante 30 anos e nunca tive nada”,

diz o aposentado Antonio de Ol-iveira, que duvida dos prejuízos à saúde causados pelo chumbo. Já Sueli Aparecida de Almeida diz ter motivos para acreditar. Seu marido faleceu de câncer ano passado e seu filho mais velho possui fortes dores na panturrilha. “Os médicos já o dia-gnosticaram: é excesso de chumbo no sangue”. Ela afirma também que há pouca conscientização entre os habitantes da região. “A maioria da população daqui finge não ver a contaminação, é mais cômodo”.

Nelma Maria Cardoso, habi-tante da Vila Mota há dois anos, concorda: “Nosso maior problema é a falta de informação. As pessoas reclamam da qualidade da água, mas as consequências do chumbo são muito piores”, garante. Ela ain-da afirma que, se soubesse da gravi-dade do problema, teria comprado sua casa em outro lugar.

Para a ambientalista Laura, o que falta é mais reflexão sobre o assunto. “Eles precisam ter cons-ciência de que destruir e poluir o meio ambiente traz danos à saúde. Essa consciência precisa ser melhor trabalhada”, afirma.

Há solução?

Segundo um relatório da Se-cretaria Estadual de Saúde, a solução definitiva para o problema seria a re-tirada da população do local, já que o chumbo não pode ser removido. Entretanto, os moradores não estão dispostos a serem realocados.

Segundo o professor do Depar-tamento de Saúde da UFPR, Paulo Perna, há outras soluções paliativas: “Uma série de medidas como asfal-tar as estradas para evitar o levan-tamento de poeira contaminada, fazer uma cobertura mais efetiva do aterro e reforçar a mata ciliar, pra ninguém remover areia do rio, seriam boas alternativas”, explica. Ele ressalta, porém, que tudo deve ser acompanhado pela consciência dos moradores. Essas medidas tam-bém são apontadas pelo relatório do Ministério da Saúde.

O projeto de extensão da UFPR denominado VER-SUS visa cons-cientizar a população da região de Adrianópolis sobre a contaminação pelo chumbo e suas consequên-cias. Para isso, desenvolve junto à comunidade uma matriz de pro-cessos críticos, que funciona como instrumento de “empoderamento”. Isto é, a partir da conscientização dos moradores a respeito de sua condição e da necessidade e direito de buscarem melhorias, estimula que se articulem politicamente em busca de mudanças.

O projeto é executado desde o início de 2008 pelos cursos de

Medicina, Enfermagem e Odon-tologia da UFPR e está integrado com o Ministério Público do Meio Ambiente e da Saúde Públi-ca. Os professores Guilherme Al-buquerque e Paulo Perna são os coordenadores do projeto, que tem participação de 19 alunos.

Segundo Albuquerque, a maior dificuldade é o diálogo com a comu-nidade. “Muitos não consideram que existe contaminação e outros têm interesse em negá-la”, explica. Um dos motivos, segundo a estu-dante de Medicina e participante do projeto Lívia Bonfim, é o medo de que a divulgação das irregulari-

dades traga prejuízos econômicos à região. “Eles acham que negando a contaminação estão protegendo suas terras”, afirma. Albuquerque reconhece que o temor da popula-ção procede, já que é recomendado que não se faça qualquer atividade econômica na região afetada.

O ano passado foi dedicado à aproximação com os habitantes da região. “Esse ano, estamos auxilian-do a comunidade na criação de uma associação de moradores”, comenta Albuquerque. Além disso, uma or-ganização não governamental se dispôs a auxiliar no projeto e dar suporte jurídico aos moradores:::

Contaminação Resíduos de chumbo estão impregnados no solo, contaminando o ar, a água e os alimentos

Projeto visa conscientizar sobre malefícios do chumbo

Prejuízos à saúde causados pelo Chumbo

Segundo a médica Luciana Ara-cema Borsato, a intoxicação causa

danos ao organismo humano nos sistemas sanguíneo, digestivo, renal, sistema nervoso

central e, em menor extensão, no sistema nervoso periférico. “O contato com exposição de chumbo

ainda pode provocar dermatites e úlceras na epiderme”, ressalta. São sinais e sintomas: dor de cabeça, cansaço, alterações de

comportamento, irritabilidade, redução da capacidade de con-trole racional e alterações do estado mental. “Além disso, im-potência sexual e diminuição da libido costumam a ser queixas

comuns dentre as essoas contaminadas”, acrescenta Luciana.

6::: junho de 2009

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João Gustavo Loureiro, 19 anos, Brunno Partica da Silva, 25 e Pedro*, 20, são estudantes de medicina de diferentes insti-tuições de ensino. Alem disso, os três tem como ponto em comum terem sofrido, e ainda sofrerem, com as grandes dificuldades que enfrentam durante a graduação. Eles continuam nos cursos, mas tiveram que buscar tratamento psicológico para aguentar as situa-ções do início da vida acadêmica.

A pressão e o estresse a que os alunos de medicina são submetidos não é novidade e, em certos mo-mentos, são considerados exagero por pais e colegas. Carga horária intensa, ritmo puxado das aulas e grande quantidade de matérias são agravantes nos quadros psicológi-cos dos alunos. O psicólogo Clo-vis Amorim afirma serem três as variáveis que levam alunos de me-dicina à situação: a auto cobrança, as relações acadêmicas e a obriga-ção de ter que saber o conteúdo todo. “A medicina é uma profissão que não tolera erros. O aluno quer ser sempre o melhor”, afirma.

O complicado início

Quando João Gustavo iniciou o curso sentia dificuldades, o que resultou em notas baixas. Teve de recorrer ao grupo de apoio de sua faculdade e descobriu que sofria de Transtorno de Déficit de Aten-ção e Hiperatividade (TDAH). Segundo ele, quando o aluno não apresenta um bom desempenho em medicina, os colegas geral-mente o excluem. Ele está retido no segundo semestre, devido às disciplinas em que ficou em de-pendência e se sente um estranho. “Para os alunos da turma é como se eu fosse um perdido que chegou e, também por estar em dependên-cia, já me tratam de forma difer-ente”, comenta. Amorim explica que isso acontece porque entre estudantes de medicina a compet-itividade é alta. “A marginalização de quem tira notas baixas ocorre porque há um interesse nos estu-dantes de se envolver apenas com os melhores”, afirma.

Pedro* passou por uma situação parecida. Ao entrar na faculdade, sentiu a diferença gritante entre o modo de estudar para o vestibular e para a faculdade. “No cursinho a matéria é dada; na faculdade você tem que correr atrás de tudo e eu não consegui me adaptar”, comen-ta. Além de tirar notas baixas, Pe-dro* também fez amizade com um colega ‘meio excluído’ pela turma

e, assim, também foi marginaliza-do. O fato de não se adaptar no iní-cio, o mau desempenho nas avalia-ções, o ritmo de estudos puxado e a exclusão que sofreu por parte da turma levaram-no à depressão. O estudante chegou a trancar a fac-uldade por um ano, pois o estresse gerado nos primeiros anos o des-motivaram a continuar. “Quando tranquei, fiz teste vocacional e um acompanhamento com psicólo-gos durante três meses e percebi que o que eu queria era medicina mesmo”.

Com a mesma dificuldade que passou ao sair do pré-vestibular, Brunno Partica da Silva sofreu no início da graduação, até conseguir se adaptar. “Na faculdade, o estudo é completamente diferente, ainda mais em medicina”, afirma. . O estudante teve que fazer tratamen-

De futuros médicos a pacientesEstudantes de

medicina são os que mais sofrem, no início

dos cursos, com grande desgaste

emocional Gabriela Zavadinack

ufpr

to psicológico durante o primeiro período e se sentia angustiado ao pensar que os colegas de turma poderiam ter mais conhecimento que ele. “Já pensei em desistir porque achava que todos sabiam mais, que eu poderia reprovar em alguma matéria e por medo do fu-turo, de não conseguir ter uma vida tranquila”, afirma. Ele acredita que o que pode causar dificuldades e levar os alunos à desistência são os dois primeiros anos do curso, que não são verdadeiramente medicina, pois se estuda apenas o pré-clínico. “Isso une a chatice das matérias ao desinteresse do aluno e à necessidade de estudar”.

As consequências

Casos como os citados acima são muito comuns, ao contrário

do que se pode imaginar. Segundo dados do Grupo de Apoio Multi-disciplinar ao Aluno (Gama), da Faculdade Evangélica do Paraná, o curso de medicina é o mais aten-dido. São 523 alunos matriculados no curso. Só no segundo semestre de 2008, foram feitos 236 aten-dimentos de estudantes de me-dicina. A pesquisa mostrou que membros do terceiro período são os que mais procuram ajuda, pois estão em fase de transição, e tota-lizam 47% de atendimentos.

O esgotamento é uma das consequências que os transtornos podem acarretar, além do desgaste emocional, despersonalização - quando o aluno começa a tratar pessoas como coisas - e a propensão ao abandono, revelada na falta de realização e prazer em estudar me-dicina. Consequências físicas como

úlcera, gastrite e doenças de pele também ocorrem e, em escala bem menor, a tentativa de suicídio. “Claro que o suicídio não é frequente, mas existem casos e é visto como uma alternativa para escapar do sofri-mento”, afirma Amorim. Como nos casos descritos, a depressão tam-bém está na lista. “É fato compro-vado que a incidência de depressão em alunos de medicina é maior que em outros cursos”, comenta.

Patrícia Helena Napolitano, psicóloga que trabalha com as-sistência aos alunos no Gama, afirma que recebe estudantes com problemas variados. “Dificuldades no namoro, depressão, uso de dro-gas, álcool, bipolaridade. Aqui a gente vê de tudo”, diz. Ela conta que os estudantes de medicina chegam ao grupo de apoio espon-taneamente ou trazidos por cole-gas e professores, movidos por fa-tores específicos, como depressão, tristeza e angústia. “O principal problema é que eles entram muito novos e a exigência é muito alta. O fato de apenas decorar a matéria (e não entender) e ter que lidar de perto com a morte também são complicadores”, afirma.

Possíveis soluções

Para Amorim, casos como es-tes acontecem também porque o curso de medicina ainda é muito técnico. Segundo ele, disciplinas como filosofia e teologia deveriam ser agregadas à grade curricular para melhor desempenho e for-mação dos futuros médicos. “O curso deveria complementar a formação técnica com uma for-mação humanística”, opina.

O psicólogo aponta alguns três caminhos como possibilidades de solução desses problemas. A cria-ção de grupos de apoio ao aluno em todas as universidades é um deles. “Desse modo, os alunos po-dem ter quem recorrer quando se encontrarem em situações delica-das, como essas”, diz. Napolitano conta que todos os alunos que procuraram apoio retornam para agradecer e contar como estão. Ela, juntamente com outros psicólogos e pedagogos, ouve as angústias dos estudantes e tenta ajudá-los a de-cidir o melhor caminho a seguir. “Boa parte entende que é apenas uma crise de transição e decide continuar no curso”, completa.

Outra forma de contornar os problemas no curso seria a faculdade disponibilizar acesso ao bem-estar geral, como locais descontraídos, em que o aluno pudesse se sentir bem. Por último, seria necessária a reorganização dos currículos acadêmicos. “Tirar a ênfase do mecanismo do ensi-nar e passá-la ao mecanismo do aprender, mudando os programas de aprendizagem e fazendo com que os alunos não apenas decoras-sem as matérias”:::

Pedro*: nome fictício

ESTRESSE Pressão por resultados leva alunos de medicina a angústia e depressão

Problemas de falta de professores, salas de aula e

laboratórios foram agravados com a

abertura de novas vagas

Novos cursos enfrentam dificuldades em seu primeiro semestre letivo

junho de 2009 7:::ufpr

Fernanda Bomfati

Com a adesão da Uni-versidade Federal do Paraná (UFPR) ao Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Públicas (Reuni), foram cria-das 1215 vagas a mais no ves-tibular 2009: algumas gradu-ações passaram a oferecer mais vagas, e 21 novos cursos foram criados. O primeiro semestre de aulas das novas graduações, no entanto, foi marcado pela falta de professores, técnicos-administrativos, salas de aula e laboratórios, o que reacende o receio dos alunos de que a qualidade de ensino seja preju-dicada com o programa.

Das 235 vagas de professores previstas pelo Reuni para a UFPR até 2012, a ocupação de 185 está prevista para até o fim de 2009. Os concursos foram realizados e homologados em janeiro. No entanto, as aulas começaram em março e apenas dez professores haviam sido nomeados. No início de julho, o Ministério do Planeja-mento liberou o Ministério da Educação (MEC) para realizar as nomeações de professores e técnico-administrativos, o que deve acontecer em julho e setem-bro, respectivamente. O atraso na contratação prejudicou o início das aulas em alguns cursos.

A estudante de Química do períodonoturno, curso aberto em 2009, Fabiana Gavelaki, conta que ficou uma semana sem aulas, em março. “Ainda estava tudo in-definido e fomos mandados para casa. Na semana seguinte tivemos

aulas normalmente, menos as de matemática, que começaram em abril”, afirma. O coordenador do curso de Química, Cláudio Antônio Toneguti, explica que o quadro docente de Matemática, do qual depende o curso de Química para matérias como cálculo, já es-tava defasado, e não havia profes-sor para deslocar para o curso de Química. “Para as demais aulas, por enquanto nós conseguimos nos ajeitar, mas ainda não con-seguimos montar uma coordena-ção, por falta de um quadro do-cente efetivo”, diz Toneguti.

Durante o primeiro semes-tre do novo curso de História no período noturno, os calouros chegaram a ter cinco professores diferentes para a disciplina de História Medieval. “A situação era tão crítica que muitas pessoas chegaram a desistir do curso, por não ter nenhuma expectativa”, afirma a estudante Manoela Mi-litão. Ela conta que muitos alu-nos pensam até mesmo em fazer novamente as disciplinas do primeiro semestre, como optati-vas. “Chega a parecer piada, mas eu não posso me intitular uma historiadora se minhas aulas foram ‘em pedaços’”, justifica.

Segundo a coordenadora do curso de Arquitetura, Josi-lena Maria Zanello, o déficit de professores é histórico. “Em dez anos, tivemos 11 profes-sores substitutos no quadro”, diz. O curso, que antes era inte-gral, foi reestruturado e passou de uma turma com 44 vagas para duas turmas com 30 va-gas — uma com a maioria das aulas pela manhã e uma com a maioria das aulas à tarde.

Sem salas de aula e laboratórios

Uma das premissas para a mudança para dois turnos do curso de Arquitetura era o es-paço ocioso no departamento à tarde. Já o curso de História

sofre o problema inverso, no prédio da Reitoria. Os 40 calouros do noturno sofrem com falta de espaço, e temem que faltem salas de aula para o próximo semestre. “A questão é provisória. O Conselho Uni-versitário vai se reunir para decidir que cursos vão para o prédio da RFFSA”, argumenta o coordenador do Reuni na UFPR, Adriano do Rosário Ribeiro. Mas para o professor coordenador do curso notur-no, Magnus Roberto de Mello Pereira, o problema é preocu-pante. “O novo prédio é uma questão para daqui a uns anos. O que me preocupa é a questão a curto prazo”, afirma.

O curso de Letras cresceu em 55 vagas. Foram abertas mais duas habilitações: Japonês e Polonês. Até 2012, espera-se que sejam contratados dois professores para cada uma das duas habilitações e qua-tro professores de linguística. Metade deles já foi concursada e aguarda nomeação. Para que os alunos não ficassem sem aula, a professora que ficou em segundo lugar no concurso para a habilitação de Japonês foi nomeada substituta. “No começo estava meio confuso, a professora que estava nos dan-do aulas não era oficial”, afirma a aluna da primeira turma de Japonês, Alessandra Asato.

Quem assumiu as aulas de Polonês foi o professor Eduar-do Nadalin, que ministrava aulas de Francês. A UFPR concursou e nomeou um pro-fessor substituto para o cur-so de Francês enquanto ele dava aulas para o novo curso. “Havia demanda para os cur-sos serem criados há quinze anos, mas houve uma sobre-carga do Departamento de Línguas Estrangeiras Moder-nas (Delem)”, diz a coordena-dora do curso de Letras, Eva Cristina Dalmolin.

Eva conta que, esse ano, foi liberada verba apenas para a aquisição de equipamentos e materiais. Dezessete com-putadores foram comprados e ainda estão em suas caixas na sala da coordenação. “Não temos onde instalá-los, é um desperdício”. No curso de História, o mesmo problema. Novos computadores foram comprados e estão sem desti-no, já que não há laboratório.

Segundo o coordenador de Engenharia Elétrica, Ewaldo Mehl, a estrutura de com-pras da Universidade é muito pequena para a demanda dos novos cursos. Além disso, ele comenta que o processo para concursar um professor demo-ra meses e requer muita buro-cracia. “O MEC cumpre a sua parte, mas a Universidade está um pouco devagar”, opina.

Técnicos-administrativos

Pelo programa da Universi-dade proposto ao Reuni, serão contratados 70 técnicos-adminis-trativos até o fim de 2009. 24 con-cursos foram homologados, mas ainda não houve contratações. Enquanto isso, a falta de técnicos-administrativos vem adiando o funcionamento da secretaria no período noturno, como no curso de História. “A promessa é que dois funcionários seniores sejam contratados até que a situação com o MEC se resolva”, adianta o professor Magnus.

Para Ribeiro, os problemas de infraestrutura e falta de pro-fessores se devem ao modo como o programa foi proposto pelo Ministério da Educação (MEC): os cursos deveriam ser abertos antes dos recursos serem repassados à Universidade — cinco mil reais por vaga nova nos próximos cinco anos, divididos entre contratação de professores e técnicos, custeio, bolsas de as-sistência estudantil, equipamen-tos e obras de infraestrutura.

Em História, os alunos se mobilizaram para tentar con-seguir alguma melhoria. “Fize-mos várias reuniões, inclusive com o reitor, e temos a promes-sa que no primeiro dia letivo do segundo semestre tudo estará resolvido. Mas não podemos ficar parados esperando”, con-clui Manoela:::

HISTÓRIA Falta de espaço e de professores prejudica alunos

Chega a parecer piada,

mas eu não posso me intitular

historiadora se minhas aulas foram

‘em pedaços’”Manoela Militão

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O amor está no ar?

Como em uma conhecida lei da física moderna – Lei de Cou-lomb –, os opostos se atraem na genética humana. De acordo com um trabalho apresentado pela ge-neticista Maria da Graça Bicalho, professora do Departamento de Genética da UFPR, as pessoas tendem a escolher, inconsciente-mente, parceiros com genes de parte do sistema imunológico diferentes dos seus próprios. A percepção desse detalhe é feita através do olfato. A pesquisa foi ini-ciada em 2005, e apresentada no congresso da Sociedade Européia de Genética Humana em Viena, Áustria, em maio desse ano.

“O sistema imunológico é uma ferramenta biológica que foi mol-dada ao longo da evolução para a defesa do organismo contra a in-vasão de agentes estranhos, como vírus e bactérias”, explica Maria da Graça. A atuação desse sistema de-pende do Complexo Principal de Histocompatibilidade (MHC, na sigla em inglês), que é uma região cromossômica que ocorre em quase todos os vertebrados e que tem dezenas de genes envolvidos.

O estudo analisou o MHC de 90 casais reais e comparou com o de 152 pares de homens e mu-lheres aleatórios. De acordo com João Carlos Magalhães, professor do Departamento de Genética e membro da equipe de pesqui-sa, os casais reais apresentaram mais diferenças nos genes MHC, quando comparados com os gru-pos aleatórios. “Eles tiveram uma diferença de até 3,6%, que, embora pareça pequena, evolutivamente é bastante significativa”, pontua.

Segundo a pesquisadora, até hoje não se tem conhecimento de uma região tão diversificada do genoma quanto a do MHC. “Essa variabilidade influencia uma maior resistência imunológica, o que é vantajoso para a espécie humana, pois quanto maior a variabilidade genética, maior a chance de per-

Pesquisa mostra que seres humanos

tendem a escolher parceiros sexuais

geneticamente diferentes a partir

do cheiro

8::: junho de 2009

ciência e tecnologia

Luan Galani

petuação da espécie”, afirma. Uma estratégia evolutiva é escolher par-ceiros com diferenças no MHC e aumentar a variabilidade genética.

Genética pelo cheiro

O olfato desempenha um pa-pel central nesse processo. Uma das hipóteses levantadas no estudo seria a de que moléculas de MHC parcialmente degrada-das e presentes nos fluidos cor-porais volatizariam, como se fos-sem perfumes, e seriam captadas por receptores olfativos. De acordo com a equipe de pesqui-sadores, o odor corporal seria um dos sinais de referência para identificar possíveis parceiros geneticamente distintos, à se-melhança de feromônios (subs-tâncias químicas que permitem que dois seres da mesma es-pécie se re-conheçam e tenham relações).

De acor-do com a geneticista, este odor corporal é

Quando escolhemos um par-ceiro, nossas escolhas são mais ins-tintivas do que racionais. “Embora seja tentador pensar que os huma-nos escolhem conscientemente

os seus par-

ceiros, é o impulso subconsciente para ter filhos saudáveis, pelo me-nos no referente às mulheres, que é o responsável pela escolha”, opina a psicóloga Eides Medeiros. Segundo ela, os fatores sociais influenciam na escolha de parceiros, sim. “Mas

a influência genética e h o r m o n a l d e s e m p e -nha um papel

preponderan-te nas nossas escolhas”, de-fende. “Como dizia Jung, nós não somos do-nos de nós mes-mos. A escolha de parceiros é mais ciência que romantismo”.

Já a sexólo-ga Talita Borges

Castelão acredita que a escolha de parceiros não é tão determinista e

inconsciente. “Existem al-gumas características físicas

universais de beleza que agra-dam a atraem a todos – pele lisa,

simetria e estruturas arredondadas –, mas a escolha final do parceiro tem influência considerável de fa-tores psico-sociais”, ressalta.

Quem é que manda no coração? m

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r

PESQUISA Pesquisadores da UFPR comprovaram que as pessoas tendem a escolher seus pares a partir do gene MHC

extremamente sutil e caracterís-tico do MHC. “Os seres huma-nos o percebem por meio de um ‘nariz primitivo’ ligado ao sistema límbico (região cerebral responsável pelo processamento das emoções)”, explica Maria da Graça.

Em um estudo feito na Univer-sidade de Berna, Suíça, em 1995, estudantes universitários foram analisados com relação ao agrado

ou desagrado que sentiam após serem expostos a odores corporais presentes em camisetas usadas pelo grupo (moças e rapazes). To-dos haviam sido classificados pre-viamente de acordo com os genes MHC. Em geral, as mulheres preferiram odores de homens com MHCs diferentes dos seus. Os homens, por sua vez, também preferiram mulheres com MHCs diferentes, embora os resultados

De acordo com Castelão, um fator psicológico importante na escolha de parceiros é a influência psico-emocional dos pais na cons-trução da sexualidade da criança e vivência no ambiente familiar. “Muitas vezes somos atraídos para um parceiro que tende a repetir a dinâmica do relacionamento fami-liar que tivemos na infância, ainda que o rejeitemos, por ser mais conhecido para nós. Desse modo, é verdade que somos atraídos por carcterísticas físicas inicialmente, mas a duração do vínculo é melhor determinada por fatores psico-so-ciais”, explica.

As mulheres preferem homens de classe social mais alta, pois está imbutida a ideia de ter melhores condições para sustentar seus fi-lhos. Já os homens, não. “O fator social não influencia tanto. Os fe-romônios fazem todo o trabalho”, afirma Eides, explicando que o homem segue mais o lado instin-tivo e visual, não seguindo muitas regras sociais na escolha das parcei-ras. Por outro lado, Talita destaca que o comportamento humano de atração é complexo demais para se restringir a uma única causa. “Por isso, devemos ter cuidado com es-sas restrições de comportamento”, salienta a sexóloga:::

não fossem significativos nesse caso. Segundo os cientistas da pesquisa brasileira, o experimento suíço reforça a tese do olfato como avaliador das características asso-ciadas ao MHC.

O próximo passo da equipe é investigar a morfologia facial como um outro sinal possivelmente as-sociado ao MHC e investigar a in-fluência de pistas visuais na escolha do parceiro com MHC diferente.