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príncipe se transmuta em sapo para ser

eternamente infeliz.E mesmo que não se conte entre as diversas

acusações que Michael Baigent faz contra o Novo

Testamento, e por conseqüência aos apóstolos, osimbólico beijo do Iscariotes tem sido objeto de

discórdia entre muitos pesquisadores doEvangelho, sem que incluamos aqui aqueles que

pertencem a escolas cristãs conservadoras.

Isso digo, porque no meio cristão protestantenunca se cogitou que Judas tivesse um motivo real

para trair o Mestre da Galiléia, aceitando-se semreservas que esse discípulo agiu apenas porinfluência diabólica, depois de envenenar-se pelacobiça.

Os que usam de outros critérios, no entanto,

motivados talvez pelo próprio fato de os apóstolosnunca terem dado definitivas explicações sobre os

 verdadeiros motivos que levaram Judas a entregaro Mestre aos que o queriam matar, crêem que sua

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de Da Vinci, no caso em questão, a cena de  A

Última Ceia. E deixando de lado sua hipótese de que Maria

Madalena estaria ali retratada na condição de

legítima esposa de Jesus, atentemos para o detalhede Pedro buscando uma faca, tendo na face uma

expressão hostil contra Judas Iscariotes.

Que Leonardo da Vinci e outros artistasfamosos da Idade Média transmitiam mensagenssecretas em suas obras não é novidade, e no casoque ora abordamos, há várias possibilidades, das

quais, a jamais justificada fúria dos apóstoloscontra Judas é apenas uma delas. Uma dasmensagens secretas estaria no significativo gestode hostilidade que Pedro expressa em relação a

 Judas Iscariotes, ameaçando-o com uma faca.

Mas os leitores de Dan Brown preferirãoacreditar que Pedro, movido pela inveja, estaria

hostilizando a suposta esposa de Jesus Cristo,imaginada na figura de João Zebedeu.

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Entende-se, pelo testemunho do Evangelho,

que João de fato ocupava um lugar de honra à mesada última ceia, possivelmente o assento à esquerdade Jesus, tal como é visto na pintura de Da Vinci.

Resta-nos saber quem estaria habilitado a ocupar olugar à sua direita, reservado ao convidado de

honra.

Curiosamente, pesquisadores da arqueologia

bíblica são da opinião de que a pessoa maisindicada para estar situado nesta posição não seria

outro senão o Iscariotes, e essa sugestão parte dotexto evangélico onde nos é possível entenderatravés do gesto simbólico de Jesus ao passar umpouco do seu próprio pão às mãos de Judas.

Um comportamento bem peculiar da época,quando durante a ceia o anfitrião honrava o seu

convidado mais ilustre, dando-lhe a comer do seupróprio prato. Esse convidado de honra costumavasentar-se sempre à direita do dono da casa. Assim,

  Judas Iscariotes teria sido honrado por Jesus na

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para levar a cabo uma delação do Mestre junto aos

seus perseguidores.E como o Evangelho parece silenciar sobre as

 verdadeiras causas dessa traição, já que cremos que

até então a amizade entre Mestre e discípulo eradas mais sinceras, ficamos a imaginar se Judas não

estava desiludido, ou se ao contrário, era maisastuto do que já ousamos cogitar.

E se ficar comprovado que antes daquelaPáscoa, Judas e Jesus haviam sido grandes amigos,como explicar que uma traição tão rude fosse

suscitada por pura cobiça?

De outro modo, como justificar que Cristo,sendo conhecedor das mentes e corações

humanos, tenha convivido tão amistosamente nacompanhia de um bandido por mais de três anos?

Já que o Evangelho não dá maiores detalhesdesta traição, pesquisadores sem ligação com a fécristã concluem que a razão para tal omissão pode

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ser bem lógica, a saber: que Judas nunca tramou

essa traição!Embora sendo participante da mesma fé

apostólica, e depois de haver por tantos anos

consultado tanto a Bíblia quanto documentosantigos da igreja, a conclusão a que cheguei pode

soar um pouco estranha, mas entendi que a traiçãode Judas verdadeiramente era desnecessária até do

ponto de vista do eterno propósito divino. Mas issonão quer dizer que ela de fato não tenha

acontecido!

E se é verdade que os evangelistas nuncatentaram amenizar a culpa de Judas, citando aomenos os verdadeiros motivos de sua traição, nãome deixaram duvidar que a cobiça fosse apenas umpretexto, e a influência diabólica, uma

conseqüência.Em outras palavras, Judas teve lá os seus

motivos. Mas se não podemos bancar o advogadodo diabo, podemos ao menos anuir que mui

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possivelmente dentre todos os apóstolos de Cristo,

  Judas foi o único para quem os motivos da suafidelidade estavam muito além dos aneloshumanos.

Era o mais nobre (em seus propósitos), o maispatriota, e talvez o mais altruísta. Se havia algum

outro cujos objetivos estivessem tão elevados, esseprovavelmente era Simão Zelota.

Judas Iscariotes foi o tesoureiro da escola de  Jesus. Isso dá testemunho de sua capacidadeadministrativa e da confiança que o Mestre nele

depositava no princípio, de onde se conclui quenão era ladrão quando foi separado para oapostolado.

Ele tinha alguma dignidade, pois era de seesperar que alguém, sonhando ser ministro do

santo Messias de Deus, devia abandonar todo um  viver relapso e adequar-se à sua imagem. Se

quisermos então encontrar um motivo de fato para

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a traição que executara, teremos de entender sua

mente, seu perfil psicológico, sua história.E como não dispomos de muita coisa para essa

tarefa, vamos nos valer de pequenos detalhes nas

entrelinhas dos relatos evangélicos, a começar peladecisão de Jesus ao selecionar seus mais diletos

amigos, aos quais também chamou de apóstolos.

Suficiente é para o leitor atentar nos quatroevangelhos e perceber alguns traços peculiares nométodo usado por Jesus para escolher oscontinuadores da sua abra. Talvez excetuando se

  Judas Iscariotes, os demais eram galileus,residentes nas cercanias do Lago da Galiléia, com apossibilidade de serem todos praticamenteparentes, ou no mínimo, velhos conhecidos.

Mas ainda que existisse a possibilidade de

estarem unidos pelos laços de sangue, ou mesmoque tal ligação estivesse limitada ao mero conceito

de vizinhança, isso não devia estar redundado em

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mútua afeição, como se no passado recente aqueles

homens houvessem vivido em harmonia.Ao contrário, era bem possível que alguns

dentre eles até se odiassem mortalmente, o que

muitas vezes veio a gerar desconfortos, ciúmes, jactâncias e desconfianças mesmo depois de haver

se formado o chamado grupo apostólico,considerando que cada um reclamava para si a

primazia, quando o Reino de Deus finalmentefosse estabelecido por meio de seu Messias.

 Vejamos então se tem fundamentos o argumentode um possível parentesco entre os primeirosseguidores de Jesus.

De início temos a informação de que algunstomaram a decisão de seguir ao Nazareno,motivados por uma espécie de admiração ao

docente. E de fato alguns eram peregrinosreligiosos, buscando a cada dia uma revelaçãodivina em qualquer ensinador que parecessedominar assuntos de caráter espiritual.

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Tal foi o caso de André, que antes de haver se

tornado seguidor de Jesus, aplicou-se a sorver osensinamentos de João Batista. Isso nos permiteentender que ele já possuía uma expectativa

messiânica bastante definida, e um fervor religiosoque não sendo devidamente temperado, podia

conduzir ao fanatismo, bastante comum naqueles

dias.

Mas André (como tantos outros devotos  judeus), apenas entrou para a escola do Batista

porque acreditava ser ele o Messias prometido aIsrael, e o seguia, deslumbrando-se na certeza dehaver atingido o objetivo da sua fé.

 Aconteceu, porém, de um dia João serinterrogado a respeito de sua identidademessiânica, e ele, por nobreza, assumiu

publicamente que não era o Cristo que haveria delibertar a nação, usando inclusive um gestoimpressionante, quando ao correr com o dedoapontado para a multidão, disse que o Messiasdecerto estava ali presente, e podia ser qualquer

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um dos que o estavam escutando. E como era de se

imaginar, André ficou surpreso com a declaraçãodo Batista.

No dia seguinte João ainda estava ali,

quando de repente viu a Jesus que vinha em suadireção, e disse, de modo que todos pudessem

ouvir, que havia encontrado o Cordeiro de Deusque tirará os pecados do mundo.

Obviamente que cristãos de todas as erasignoraram o verdadeiro sentido daquelas palavras,

 julgando que o batizador estivesse se referindo ao

sacrifício vicário de Jesus. Seus ouvintes,entretanto, entenderam perfeitamente que Joãoestava abordando a identidade do Messias a partirde uma perspectiva escatológica do judaísmobastante popular e quase oficial naqueles dias.

 A imagem do Cordeiro de Deus, tal como foiapresentada por João, dizia respeito a um conceito

de liderança (o que se repetirá no Livro do Apocalipse), de modo que a alusão nada mais era

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do que um título messiânico, uma maneira de ligar

a pessoa ao seu ofício.Quanto a tirar o pecado do mundo, ora, todos

bem sabiam que o sacrifício oferecido pelas culpas

humanas não era de um cordeiro, mas de bode outouro, exatamente como explicaria o sapientíssimo

autor da Carta aos Hebreus.

De outro modo, era contrária às expectativasdo messianismo a idéia de um Cristo sendosacrificado e morto. Evidentemente, também, queno judaísmo vigente o ato messiânico de remover o

pecado do mundo ia muito além de perdoar oupurificar; significava literalmente eliminar de uma

  vez por todas não os efeitos do pecado, mas aprópria capacidade (ou tendência) que os sereshumanos têm de pecar. Severino Pedro diria que

isso equivale a confirmar a criação no mais perfeitoe eterno estado de santidade.

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Dentro da escatologia judaica esse seria o

último trabalho do Messias, antes de conduzir oshomens aos portais da eternidade.

Tendo escutado isso dos lábios de João Batista,

  André prontamente entendeu que já não haviamais motivos para continuar seguindo-o. Então se

despediu do profeta, e acompanhou a JesusNazareno.

De imediato outro discípulo de João também odeixou para seguir àquele que devia ser o salvadordos homens, mas em palavras a Bíblia não nos diz

qual era o seu nome.

 À semelhança de André, muitos iam seguindo a Jesus por espontânea vontade, mas ele foi depois

pessoalmente convocado pelo Mestre, e escolhidopara ser o seu primeiro evangelista, pois que de

pronto saiu a pregar para Simão Pedro, que, aliás,era seu irmão.

E dizia-lhe que havia acabado de encontrar oMessias profetizado. Pedro aí se deixa convencer, e

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também acompanha ao Nazareno, quando adiante

 vão se encontrar com um vizinho chamado Filipe,igualmente convertido em discípulo de Jesus. EsseFilipe imediatamente procura outro vizinho,

conhecido como Natanael (Bartolomeu).

E em todos os casos a premissa é sempre a

mesma: o Messias dos Judeus havia sido reveladopor João Batista, e desde então começava a

selecionar os seus ministros. Até aqui dissemos decomo surgiram os cinco primeiros discípulos, os

quais parecem estar ligados pelo sangue, ousimplesmente pela amizade.

 Aí surgem Tiago e João, filhos de Zebedeu ecompanheiros de Pedro no ofício da pesca. Essedois, dirá a tradição, são primos do próprio Jesus.Temos também um cobrador de impostos

chamado Mateus, irmão de outro Tiago, sendoambos igualmente primos de Jesus, segundoinformações que parecem ser verdadeiras.

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Agora falta-nos mencionar apenas três dos

doze que formavam a escola do Nazareno, mas pornome precisamos identificar a quatro, já que oEvangelho não nos fez saber quem era o outro

discípulo de João Batista que acompanhou a Andréquando de sua decisão de seguir o Profeta da

Galiléia.

Tomé, de acordo com alguns, era irmão gêmeo

de Natanael. Judas Tadeu nunca foi totalmenteidentificado, mas crêem alguns que era filho de

Tiago Zebedeu, e, portanto, o mais jovemdiscípulos de Jesus.

Outros, porém, são da opinião de que erairmão sangüíneo do mesmo Mestre, e por vez,também autor o da epístola que leva esse nome.Simão Zelota tem origem incerta, mesmo assim

tem-se acreditado que se trata de outro irmão de Jesus.

E a alcunha desse nome é bem sugestiva, poisfoi propagado nos primeiros séculos da igreja que

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um dos irmãos do Salvador havia se tornado zelota

antes de entrar para o ministério cristão. Comefeito, se acreditou que foi Tiago, irmão doMessias, quem tinha aderido à causa destes

guerrilheiros até o dia em que Cristo, já ressurreto,apareceu-lhe e o converteu em cristão. Nada disso

ficou perfeitamente explicado, entretanto.

Seja como for, não resta dúvidas de que esse

Simão havia pertencido a uma famosa seita defervorosos guerrilheiros que desprezavam a

autoridade de Roma, reconhecendo tão somente asordens divinas registradas em sua Lei; nem oslíderes do judaísmo eram por eles considerados.Mas nesse viver à margem da sociedade, os zelotastambém eram alvo da ira popular, que osconsiderava como criminosos, e inimigos da ordempública.

Já alistado no grupo dos apóstolos, SimãoZelota certamente ainda era visto sobdesconfiança, pois os zelotas, a despeito do

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cuidado que julgavam ter das coisas divinas, eram

 violentos, frios, calculistas e sempre imprevisíveis.Igualmente estranho neste ninho, temos a

misteriosa presença de Judas Iscariotes, cuja

cidade natal, de acordo com muitos pesquisadores,estava fora dos limites do reino independente da

Galiléia, o que o torna totalmente distinto dosdemais apóstolos de Jesus, que eram todos galileus.

Mesmo assim, esse Judas, ao que tudo indica,era seguidor de uma seita cujos princípios nãodiferiam muito daqueles que até então nortearam a

mente de Simão Zelota.

Não são muitos os estudiosos que aceitam talpossibilidade, mas há indícios de que esse

discípulo tenha sido participante de um grupo detemidos revolucionários que viviam numa busca

desenfreada pela chegado do Messias e do seureino.

Eram os famosos sicários, homens de um ardorreligioso doentio, capazes de levar seus loucos

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intentos até as mais extremas conseqüências.

Diziam-se tementes a Deus, mas assassinavamtraiçoeiramente a todos quantos imaginassemestar na contramão dos seus projetos.

O que sabemos ao certo é que por sua traição, Judas ficou eternamente marcado como sinônimo

de um mal ao qual não se devia associar.

Como o cristianismo se espalhasserapidamente por todo o império, e fosseprevalecendo o pensamento evangélico nasculturas em que se instalavam as igrejas, nasceu

daí o cuidado de se evitar que os crentes tomassemo nome do traidor para os seus filhos, de modo queo nome “Judas” aos poucos foi caindo em desuso,haja visto ser impossível mencioná-lo sem fazerimediata ligação com a traição a Jesus.

Mas nem sempre foi assim. Houve uma épocaem que “Judas” era o mais concorrido dos nomes.

Todos queriam ter um “Judas” na família, postofosse belo, honroso, digno.

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O nome da moda em Israel. Diversos

personagens do Novo Testamento eram assimchamados, e não em virtude de ter Jacó assimregistrado um de seus filhos, mas por ser a vívida

lembrança de Judas Macabeu, o último grandeherói da recente historia judaica.

Um homem cuja valentia, nobreza e devoçãobem podiam superar em muito até mesmo a

grandes vultos como Abraão e Davi. Sua históriacheia de atos magníficos, seu espírito indômito e o

 valor que demonstrara em servir aos objetivos deYaveh, eram inspiradores a todos quantosprezavam a liberdade, a religião e o sentido daprópria existência no mundo.

Portanto, ter esse nome era como estar vestidode honras; fazia sentir-se predestinado para os

elevados projetos do Altíssimo. Por esse motivonão poucos revolucionários dos anos vindourostomaram emprestado esse nome, devido aorespeito que o epíteto impunha àqueles quedeviam ser liderados.

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Somado a isso, existia em Israel o costume de

se fazer jus ao nome recebido por ocasião donascimento, conquanto os pais assim agissem naesperança de atrair honras para a família.

Esse costume, todavia, não era típico apenasdos hebreus; outros povos antigos eram dados à

semelhante cultura. De qualquer forma, se JudasMacabeu por sua magnanimidade exaltou

sobremaneira esse nome, Judas Iscariotes por sua vez o envileceu ao máximo, quando arquitetou

trair o Messias por trinta míseras moedas deargento. Hoje Judas é um nome lançado à lama.

Mas afinal de contas, quem era JudasIscariotes antes de haver entrado para a escola dediscípulos do Pregador Galileu? A resposta maissugestiva pode estar por trás do segredo de seu

próprio nome.Normalmente se entende que Iscariotes é um

adjetivo composto de duas palavras do idiomahebreu: ish-keriotes, cujo significado é “homem

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em mente que seu sobrenome, na forma que veio

ao nosso conhecimento, o identificará comoalguém que antes de haver entrado para a escolados apóstolos foi partidário da seita dos sicários.

Desse modo, “Iscariotes” seria uma corruptela de“sicarii”, rebeldes judeus, que outra coisa não

faziam senão promover o terror nas terras da

 Judéia, saqueando os ricos e assassinando a todosquantos imaginavam haver traído a nação, os quaiseram sempre políticos ou representantes religiosos

simpáticos à Roma.

Mas dentro da ideologia dos sicários, todosaqueles a quem matavam (sempretraiçoeiramente), eram pessoas que não mereciamoutra sorte.

Flávio Josefo, o grande historiador dos judeus,

foi destemido sicário e um personagem dedestaque durante a revolução que eclodiu no fimdos anos sessenta, no primeiro século da era cristã.

 A revolta que encabeçara resultou na carnificinageral dos judeus, e por conseqüência, a destruição

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do Templo; mas isso somente depois que o mesmo

 Josefo abandonou a causa dos revolucionários e sealiou aos romanos.

Uma atitude que o tornou importante, porém

bajulador dos inimigos, Josefo veio a descrever osseus sicários com palavras carregadas de tanta

infâmia que julgo não serrem de todo verdadeiras.

Ele então segue falando de sicários e zelotasalternadamente, como se esses dois distintosbandos de guerrilheiros fossem ou houvessem sefundido em um.

Enfim, por que deveríamos duvidar que Judas

tivesse de algum modo sido sicário antes de setornar seguidor de Jesus? Sabemos seguramente

que outro discípulo do Nazareno foi um zelota, daía razão para se suspeitar que Judas também o

tivesse sido.

O fato é que estando nessa condição (notemque o Evangelho expressamente declara que doisdos discípulos de Jesus andavam armados), era

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natural a Judas esperar que Jesus, sendo Messias, a

qualquer momento declarasse guerra ao domínioromano a partir de uma revolução na Judéia, e paratanto, devia contar com soldados devidamente

preparados. Sicários e zelotas sonhavam com essedia, portanto, se Judas e Simão viam em Jesus um

Messias, tinham todos os motivos para acreditar

que ele logo lideraria uma grande revolução em Jerusalém.

 Aliás, foi essa esperança que os fez abraçar a

filosofia do Nazareno, de modo que enquanto semostrasse disposto a implantar literalmente umReino de Deus na terra, Judas seria seu fielescudeiro...

 Judas

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OTraidor

Um documento apócrifo bastante interessante,chamado de Evangelho de Pedro, traz à luz um

detalhe saliente do julgamento do Nazareno.

Que os procedimentos do sinédrio sãoquestionáveis não resta dúvidas, porém, eranecessário manter uma aparência de justiça, e

como a vida religiosa de todo judeu crescia àsombra do Templo, foi igualmente oportunoprovocar tumulto entre as pessoas, pondo-as emoposição a Jesus.

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Parece que tudo conspirava para que ele fosse

levantado na cruz, pois seus acusadores seapegavam a qualquer vestígio de culpa que pudessepairar sobre o Galileu. A deixa da vez foi uma

declaração que fizera quando de seu últimodiscurso no Templo. Ele de fato afirmou que

aquele edifício haveria de ser destruído, não

restando nada além de escombros. As pessoasinduzidas a testemunharem contra Jesus, diziamque ele também tinha anunciado a destruição do

Santuário e sua posterior reedificação em três dias.

Acontece que esta declaração feita por Jesusteria ocorrido há cerca de três anos, e as falsastestemunhas já não podiam se recordar de tudo oque escutaram dos lábios do Mestre, pelo que,prestando depoimentos uma de cada vez, como erade praxe, não lhes foi possível manter as acusações.

Pela Lei estas testemunhas deviam sercondenadas à morte, mas isso não aconteceu. Oque nos deixa supor que suas palavras, ainda que

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mentirosas, foram de alguma maneira mantidas;

talvez para preservar-lhes a vida.Pelo Evangelho entendemos que fora do

sinédrio realmente se divulgou que Jesus estava

tramando alguma coisa contra o Templo. Mas é nosuposto “Evangelho de Pedro” que temos as

seguintes afirmações:

  “Eu, de minha parte, estava sumido em

minha aflição, juntamente com meus amigos,

e, feridos no mais profundo da alma,

mantínhamo-nos escondidos, pois éramos

tidos como malfeitores e como aqueles que  pretendiam incendiar o Templo. Por causa

destas coisas, permanecíamos sentados,

lamentando-nos e chorando noite e dia até o

Sábado.” 

Ora, se as acusações procedem, os discípulostêm motivos para se esconder, pois desde que

Herodes o Grande lançou os fundamentos do novoTemplo dos judeus, ficou patente que qualquer

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tentativa de ataque físico ou moral contra este

santuário teria a morte como punição, e a própriapolícia romana se empenharia na execução dapena.

Recordemos que os líderes religiososrequisitaram um pelotão da guarda romana para a

captura de Jesus e seus discípulos. E comodesconhecemos a dimensão das mentiras que

contaram para convencer a polícia imperial a partirarmada em busca de um simples aldeão, hipóteses

surgirão para tentar explicar tamanha precaução.

Mas quando a população foi até o Calváriolançar impropérios diante do crucificado,exclamavam:

  “Tu que destróis o Templo de Deus, e em três

dias o reedificas, desce da cruz para que

creiamos!” 

Que pesem as falsas acusações; as pessoascertamente se recordaram que há dois ou três dias

 Jesus pronunciou a destruição do Templo, dizendo

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que dele não ficaria pedra sobre pedra que não

fosse removida. Seus inimigos levaram isso a sério.Mas por que não o executam em

conformidade com as suas leis? E por que desejam

tanto ver o Mestre dependurado numa cruz,morrendo à moda de Roma? Uma sugestão simples

seria que o plano era fazer com que as pessoasabandonassem a esperança de vê-lo tornar-se o

Messias Salvador da nação. Já dissemos que asesperanças messiânicas de Israel descabiam nos

planos dos saduceus, principalmente porque oadvento de um Messias significaria o desprestígiodesta classe dominante e usurpadora.

 Ademais, os judeus compreendiam pelasEscrituras, que aquele que fosse levantado nomadeiro deveria ser contado entre os amaldiçoados

por Deus, de sorte que se os saduceusconseguissem conduzir Jesus à cruz, ficaria a todosprovado que ele não podia ser o Messias.

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No entanto, para crucificá-lo, era-lhes

necessário criar uma situação pela qual pudessemcolocá-lo em declarada oposição ao governoromano. E foi sob essa possibilidade que

trabalharam a sua condenação durante o  julgamento perante o sinédrio, empregando um

método mais tarde copiado pelos inquisidores da

Idade Média. A solução era simples e eficaz,fazendo com que o investigado pronunciasse aprópria culpa.

Se Anás se interessou tão somente pelo cerneda doutrina de Jesus, seu genro Caifás, seempenhou em interrogá-lo sobre a sua identidadetranscendente, montando um labirinto de palavrasno qual pretendia envolver o Mestre:

_ Por Deus, responde-nos: tu és o Rei de

Israel? 

_ Se eu o disser não acreditareis... nem me

deixareis ir em liberdade. Mas vereis o Filho

do Homem assentado à direita de Deus.

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_ Então és mesmo o Filho de Deus? 

_ Tu disseste que eu o sou.

_ Eu não, mas tu mesmo é que o declaras com

a tua boca! Agora não precisamos mais das

testemunhas.

A inquisição foi seguida de uma sessão deespancamentos, cusparadas, humilhações exingamentos. Agora tinham com que o incriminar

diante do Procurador Pôncio Pilatos, o qual jáhavia sido de antemão advertido por um decreto de

Tibério no qual se exigia que qualquer um quelevantasse sedição contra o seu governo tinha de

ser imediatamente crucificado.

Ora, a história se encarregará de mostrar quePilatos, embora frio e inescrupuloso, era obtuso e

fraco; uma marionete à qual os astutos sacerdotessabiam usar para seus fins. E que ficasse bemcomprovado que o Nazareno não padeceu nasmãos destes santos homens, mas que por uma

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sentença pronunciada pelo governador é que ele

foi levantado na cruz.O jornalista e romancista J. J. Benítez,

flutuando em seu “Cavalo de Tróia” entre a ciência

e a ficção, dá interessantes detalhes de comodeveriam ser conduzidas as coisas diante do

sinédrio, caso o julgamento de Jesus tivesse sidopautado na justiça e na verdade. Ele recorre ao

testemunho da  Miznah , antigos documentos detradições judaicas. Ele cita doze princípios que a

  jurisprudência sinedrita desconsiderou ao tratardo caso Jesus de Nazaré. Os dez indicadores quemencionarei a seguir são adaptados do primeirolivro da série Operação Cavalo de Tróia, do Sr.Benítez.

1-  Miznah (ordem quarta, sinédrio). Os

processos chamados de pena capital deviam serabertos declarando-se a inocência do réu e nãoa sua culpabilidade;

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2- Os processos de sangue deviam ser realizados

de dia, e a sentença, caso fosse condenatória,não podia ser pronunciada no mesmo dia;

3- Tais processos (que podiam resultar em

condenação de morte) não deviam serconduzidos pelo maioral dos juízes, para que a

sua posição não viesse a influenciar aosdemais;

4-   As testemunhas (sempre de acusação) eramprimeiramente orientadas com severidade, nãopodendo usar de suposições e nem falar do que

ouviram de outras;

5- Se o réu é declarado culpado, a sentença deveser protelada para o dia posterior;

6- Cada juiz deve decidir por si, de modo que a

sentença venha por votação;7- O juiz não deve ser também o acusador;

8- Depois de condenado, a sentença do réu será

escrita. E mensageiros irão divulgar em toda

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parte que determinada pessoa foi condenada à

morte;9- Caso seja acusado do pecado de blasfêmia, o

réu só deve ser condenado se pronunciar

expressamente o nome proibido de Deus (paraBenítez, Jesus não o teria pronunciado

claramente);

10-   Ainda que o acusado tenha pronunciado onome secreto de Deus, ele só devia sercondenado à morte (por apedrejamento) se astestemunhas atestassem tê-lo escutado de seus

próprios lábios.

Fica aí evidente que, ao contrario dadeclaração de Nietzch, Jesus não foi condenado e

morto pelos seus próprios pecados, mas que ossinedritas o julgaram sem lei e o condenaram por

ser inocente. Quanto a Judas, que esteve todo otempo na penumbra, parece que se deu por conta

de sua loucura ao ver que o Mestre havia sido

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condenado diante do sinédrio, e que o enviariam

para ser julgado diante de Pilatos.Mateus foi o único a mencionar o drama do

Iscariotes ante a declaração da culpa do Mestre,

fazendo-nos entender que o traidor entrou emdesespero ao saber que Jesus foi condenado à

morte na cruz, como se alguma coisa estivesseacontecendo além do que haviam combinado.

E aqui nossas suspeitas tomam formas; Judas,decerto, não pretendia entregar o Mestre à morte.Sua intenção, além dos lucros financeiros, previa

talvez apenas um “leve” castigo, algo do tiporetratação, prisão, ou no máximo algumaschibatadas. Mas ele foi enganado pela astúcia dossacerdotes.

Se atentarmos para os procedimentos de Judas

ante o pronunciamento da sentença de morte para Jesus, teremos uma pista do tipo de permuta que

ele deve ter efetuado com os líderes dos judeus,quando de sua decisão de entregar-lhes o

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Nazareno. Admitindo que o apelo feito por J. J.

Benítez aos ensinamentos da  Miznah tenhacogitação, seguir-se-á que Jesus serviu de objetoem uma negociação de cunho legal, como num

contrato em que cláusulas devem ser consideradaspelas partes envolvidas.

Na abordagem de Benítez os procedimentosseriam assim: feito um negócio do tipo compra ou

 venda, caso o vendedor se sentisse prejudicado,tinha o prezo de um ano para desfazer da venda.

O tempo em questão era relativo ao período de

que se precisava para consegui-se dinheiro, caso jáo tivesse gasto. No caso de o negócio ser umacasa, o vendedor procuraria o comprador, que emacordo já previsto, devolver-lhe-ia o imóvel.

Caso se recusasse em desfazer-se da aquisição,

a lei prescrevia que o vendedor prejudicado sedirigisse ao Templo e lá espalhasse o dinheiro

equivalente, então retornaria para a casa, forçariaa porta e tomaria posse da mesma.

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Quanto ao comprador irresoluto, que se

encarregasse de ir até o Templo recolher o que lhecompetia.

Isso deve esclarecer o motivo que teve Judas

ao atirar as trinta moedas ao Templo quando ossacerdotes se recusaram a desfazer o acordo que

tinha assumido em relação à traição.

Façamos aqui nova observação, e o leitordecerto não se apercebeu de que nas narrativas deMateus lê-se que em cumprimento às profecias de

  Jeremias, os acusadores de Jesus avaliariam o

preço de sua traição em trinta moedas de prata.

Mas é uma declaração equivocada, posto queesta profecia tenha sido feita por Zacarias em 11.

12,13.

Nossos exegetas garantem que se trata de umsimples erro de tradução, mas deve ser algo além,conquanto os pergaminhos antigos de quedispomos apresentam Jeremias em vez deZacarias.

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Não acredito que o evangelista tenha se

enganado, até porque sabemos que os originais doseu livro foram escritos em hebraico e não emgrego, como lemos em nossos dias. Ainda assim,

poucos são os leitores que notam a troca destesnomes.

Enfim, Judas não conseguiu reverter o mal quefizera cair sobre o Messias, pelo que intentou tirar

a própria vida. Mateus nos diz que ele foi seenforcar, mas Pedro, em Atos 1.16-19, cerca de

quarenta e cinco dias depois da traição, afirmouque Judas morreu tendo as suas víscerasderramadas ao chão.

Foi sugerido que o traidor, dependurando-senum galho sobre o despenhadeiro, despencou,tendo o seu corpo se rasgado ao meio.

O que é possível. Nunca se entenderá,entretanto, a razão de haver Papias, um dos mais

antigos biógrafos dos apóstolos (já se disse,inclusive, que chegara a ser discípulo de João

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Zebedeu em sua primeira juventude), escrito que

 Judas, tendo engordado muito, morreu atropeladopor uma carruagem.

O testemunho de Papias discorda de Mateus,

mas não necessariamente de Pedro, pois sendoatropelado por uma carruagem é possível ter o

corpo dilacerado, de modo a ficar com asentranhas derramadas. Em todo o caso, há de se

notar que Mateus expressamente não diz que Judas se enforcou, mas que partiu com a intenção

de fazê-lo.

No depoimento de Pedro lemos que Judasadquiriu um terreno com o dinheiro de suatraição. Mateus escreveu que foram os sacerdotesque compraram o campo de um oleiro com odinheiro que o traidor lançou ao Templo.

 A priori isso parece supor que Judas não tenhamorrido imediatamente à condenação de Jesus,

mas algum tempo depois.

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   A posteriori, porém, é possível que tenha se

enforcado de fato, e naquele mesmo dia,lançando-se de um precipício, como as palavras dePedro parecem sugerir, quando a corda ou o galho

se rompeu e ele teve o corpo dilacerado naspedras.

Pesquisadores, trabalhado essa hipótese,procuraram nas cercanias de Jerusalém um

precipício do qual Judas pudesse se atirar, massem muito êxito. A meu ver eles procuraram no

lugar errado. Mas isso será explicado mais tarde ecom outras palavras.

Quanto a ter Judas pessoalmente compradoum campo, há três possibilidades:

1_ Ele pode tê-lo requisitado ainda em vida, massem fazer o pagamento;

2_ Ele pode ter sugerido aos sacerdotes, comoúltimo desejo em vida. Isso pode se ajustar com aprofecia, visto que as moedas atiradas ao Templodeviam ser recolhidas pelo oleiro, segundo

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escreveu Zacarias. E Mateus nos faz saber que o

proprietário do dito terreno era mesmo um oleiro.Há aqui uma feliz coincidência com as leis da Miznah mencionadas por Benítez; foi como se

  Judas igualmente desejasse desfazer-se de umsuposto negócio que tivera com o dono do campo,

ou numa providencial circunstância (ou

coincidência ainda maior), os sacerdotescompraram o mesmo pedaço de terra ao mesmooleiro, e pagaram com as mesmas moedas que

 Judas pretendia usar em sua aquisição;

3_ Talvez a afirmação de Pedro seja meramenteretórica, querendo significar apenas que ossacerdotes compraram o campo de um oleiro como dinheiro que era de Judas, transformando-o emcemitério em sua homenagem.

Em consideração ao que dissera Papias,penso que a despeito da estima que temos por ele,estava enganado, e provavelmente não consultoupessoalmente o evangelho de Mateus, ou quem

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sabe recebera informações erradas a respeito da

morte do traidor.Por fim, imagino que Judas, ao mesmo tempo

em que se transformava na abominável criatura

que conhecemos, tornou-se também no maisinfeliz dos homens, tendo a sua história marcada

por uma tragédia que apenas no imaginário doinsuperável Sófocles, encontrará em Édipo o seu

equivalente, cometendo o maior dos seus errosquando o que mais desejava era acertar na vida.

E a pesar de todas as angústias que causou ao

Maravilhoso Jesus, nos perguntaremos se nofundo cada um de nós não deve sentir um poucode compaixão por tão desditoso homem, o qualapenas muito tarde pôde descobrir que ao trair oseu Mestre, traía a si mesmo; e não querendo ser

perdoado, entregou a alma ao Hades, na ilusão deque em sendo castigado no espírito, pudessealiviar o crime de sua louca consciência.

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