JUNHO 2012

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E D I T O R I A L ÓRGÃO DA FUNDAÇÃO CHRISTIANO ROSA DISTRIBUIÇÃO GRATUITA PIQUETE, JUNHO/2012 - ANO XV - N o 185 O ESTAFETA Foto Arquivo Pró-Memória No mês em que comemoramos o aniversário de Piquete, devemos festejar a cidade e refletir sobre seu presente, seu passado e seu futuro. A data vale, também, para nos lembrar dos grandes homens que contribuíram para sua história e sonharam ver emancipado o pequeno e montanhoso bairro lorenen- se, fato ocorrido a 15 de junho de 1891, quando foi empossada sua primeira Intendência. Os esforços desses homens e, principalmente, o espírito comunitário que os norteava devem ser imitados. Despojados de vaidades políticas, trabalharam incansavelmente para o engrandecimento da Vila Vieira do Piquete. Devemos nos mirar em seus exemplos e aplicá-los ao cenário atual. No próximo mês de outubro, os piquetenses irão às urnas escolher prefeito e vereadores para gerirem os destinos da cidade. As eleições muni- cipais são um momento ideal para mudanças. Para transformarmos em realidade o sonho de uma cidade da qual todos possamos nos orgulhar, os piquetenses precisam eleger um prefeito com capaci- dade de planejamento, vontade de trabalhar e com olhos voltados para o futuro. Ele deverá estar vinte e quatro horas a serviço da municipalidade. Se assim não for, estaremos repetindo um modelo ultrapassado de administração que não vem dando bons resultados, e postergando uma grande oportunidade de crescimento e desenvolvimento. É preciso que o novo prefeito tenha planos e metas de governo, objetivos claros, e entenda de planejamento e de cidades. Hoje, diferentemente de déca- das passadas, a cidade tem recebido dos governos federal e estadual muitos recursos, mas a administração pode, também, buscá-los em outras fontes como instituições nacionais e interna- cionais. O que falta para que esses recursos cheguem à nossa cidade são bons projetos, além de um gestor que saiba utilizar modernos instrumentos administrativos como a parceria público privada, o consórcio público, entre outros. Falta, ainda, projetar a cidade de acordo com o interesse dos que nela residem. É preciso planejamento. Educa- ção, saúde e segurança são fundamen- tais e prioritários. Também é preciso pensar com seriedade em infraestrutura e saneamento básico. Tudo isso sem se descuidar do meio ambiente, uma vez que sustentabilidade é a palavra de ordem nos municípios modernos. Neste aniversário do município cabe- nos uma profunda reflexão: que cidade queremos no futuro? Cento e vinte e um anos são passados desde 15 de junho de 1891, quando, às 12h, tomou posse a primeira Intendência da Vila Vieira do Piquete. A partir daquela data, o destino do então mais novo muni- cípio do estado de São Paulo começou a ser administrado por seus próprios mora- dores. Enfrentaram todos os tipos de dificuldades. Erros e acertos aconteceram ao longo dos anos. Muitos sonham com uma Piquete mo- derna, antenada com o que de melhor pode haver numa pequena cidade. Que possua boa infraestrutura urbana, com ruas e avenidas arborizadas, com calçamento bem cuidado e amplos passeios. Que prime pelo respeito ao cidadão. Que conserve seu patrimônio cultural e artístico, que preserve sua arquitetura, com imóveis de significado e importância artística, cultural, religiosa, documental ou estética para a sociedade. Uma cidade que se preocupe com o meio ambiente, que trate corretamente seu esgoto, que mantenha seus fragmentos florestais de Mata Atlântica e que conserve e restaure suas matas ciliares, protegendo as nascentes e os rios. Uma cidade com áreas de lazer, com parques e jardins. Uma cidade em que saúde, educação, segurança, cultura e hospitalidade sejam marcas da qualidade. Esta é a cidade que idealizamos, que queremos e merecemos. Sonhar com um espaço urbano assim é pensar na cidade que deixaremos para as próximas gerações. Este é o desafio do planejamento urbano colo- cado para nosso município. Ao completar mais um aniversário, Piquete merece como presente um moderno projeto de cidade. É importante, impres- cindível até, planejamento urbano com vistas para os próximos dez, vinte, cin- quenta e até cem anos; que assegure qualidade de vida e bem-estar aos pique- tense de hoje e de amanhã. Mas, para atingir esses objetivos temos muito tra- balho pela frente. Com relação ao plane- jamento urbano, lamentavelmente nossa cidade não construiu, ainda, qualquer projeto a médio ou longo prazo, que nos permitisse olhar com segurança para além de seus 121 anos e enxergar um novo horizonte, melhor para todos. Pobre a cidade que assiste, inerte e impotente, à morte de suas belezas naturais, pela falta de cuidados e de boa vontade política, de planejamento urbano e de fiscalização. A nossa omissão e conivência com esse estado de coisas nos deixa tristes e indignados. Paga-se caro pelo devaneio e irresponsabilidade de administrações que não trabalham com planejamento urbano. A cidade cresceu ocupando encostas e expondo a riscos seus moradores. Só recentemente, nas últimas décadas, é que as cidades vêm trabalhando com planejamento e planos diretores. No aniversário de Piquete, cabem alguns questionamentos: que futuro queremos para nossa cidade? Queremos qualidade de vida? Serviços básicos eficientes? Só querer, no entanto, não é suficiente. O que estamos fazendo e podemos fazer para melhorar a cidade? As respostas dependem de cada um de nós. Parabéns, Piquete, por mais um aniversário. A Piquete que queremos No aniversário de Piquete, cabem alguns questionamentos: que futuro queremos para nossa cidade? Queremos qualidade de vida? Serviços básicos eficientes? Só querer, no entanto, não é suficiente. O que estamos fazendo e podemos fazer para melhorar a cidade?

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ANO XV - No. 185

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E D I T O R I A L

ÓRGÃO DA FUNDAÇÃO CHRISTIANO ROSA

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA PIQUETE, JUNHO/2012 - ANO XV - No 185

O ESTAFETAFoto Arquivo Pró-Memória

No mês em que comemoramos oaniversário de Piquete, devemos festejara cidade e refletir sobre seu presente,seu passado e seu futuro. A data vale,também, para nos lembrar dos grandeshomens que contribuíram para suahistória e sonharam ver emancipado opequeno e montanhoso bairro lorenen-se, fato ocorrido a 15 de junho de 1891,quando foi empossada sua primeiraIntendência. Os esforços desses homense, principalmente, o espírito comunitárioque os norteava devem ser imitados.Despojados de vaidades políticas,trabalharam incansavelmente para oengrandecimento da Vila Vieira doPiquete. Devemos nos mirar em seusexemplos e aplicá-los ao cenário atual.

No próximo mês de outubro, ospiquetenses irão às urnas escolherprefeito e vereadores para gerirem osdestinos da cidade. As eleições muni-cipais são um momento ideal paramudanças.

Para transformarmos em realidade osonho de uma cidade da qual todospossamos nos orgulhar, os piquetensesprecisam eleger um prefeito com capaci-dade de planejamento, vontade detrabalhar e com olhos voltados para ofuturo. Ele deverá estar vinte e quatrohoras a serviço da municipalidade. Seassim não for, estaremos repetindo ummodelo ultrapassado de administraçãoque não vem dando bons resultados, epostergando uma grande oportunidadede crescimento e desenvolvimento. Épreciso que o novo prefeito tenhaplanos e metas de governo, objetivosclaros, e entenda de planejamento e decidades. Hoje, diferentemente de déca-das passadas, a cidade tem recebido dosgovernos federal e estadual muitosrecursos, mas a administração pode,também, buscá-los em outras fontescomo instituições nacionais e interna-cionais. O que falta para que essesrecursos cheguem à nossa cidade sãobons projetos, além de um gestor quesaiba utilizar modernos instrumentosadministrativos como a parceria públicoprivada, o consórcio público, entreoutros. Falta, ainda, projetar a cidade deacordo com o interesse dos que nelaresidem. É preciso planejamento. Educa-ção, saúde e segurança são fundamen-tais e prioritários. Também é precisopensar com seriedade em infraestruturae saneamento básico. Tudo isso sem sedescuidar do meio ambiente, uma vezque sustentabilidade é a palavra deordem nos municípios modernos.

Neste aniversário do município cabe-nos uma profunda reflexão: que cidadequeremos no futuro?

Cento e vinte e um anos são passadosdesde 15 de junho de 1891, quando, às12h, tomou posse a primeira Intendênciada Vila Vieira do Piquete. A partir daqueladata, o destino do então mais novo muni-cípio do estado de São Paulo começou aser administrado por seus próprios mora-dores. Enfrentaram todos os tipos dedificuldades. Erros e acertos aconteceramao longo dos anos.

Muitos sonham com uma Piquete mo-derna, antenada com o que de melhor podehaver numa pequena cidade. Que possuaboa infraestrutura urbana, com ruas eavenidas arborizadas, com calçamento bemcuidado e amplos passeios. Que prime pelorespeito ao cidadão. Que conserve seupatrimônio cultural e artístico, que preservesua arquitetura, com imóveis de significadoe importância artística, cultural, religiosa,documental ou estética para a sociedade.Uma cidade que se preocupe com o meioambiente, que trate corretamente seuesgoto, que mantenha seus fragmentosflorestais de Mata Atlântica e que conservee restaure suas matas ciliares, protegendoas nascentes e os rios. Uma cidade com áreasde lazer, com parques e jardins. Uma cidadeem que saúde, educação, segurança, culturae hospitalidade sejam marcas da qualidade.Esta é a cidade que idealizamos, quequeremos e merecemos. Sonhar com umespaço urbano assim é pensar na cidade quedeixaremos para as próximas gerações. Esteé o desafio do planejamento urbano colo-cado para nosso município.

Ao completar mais um aniversário,Piquete merece como presente um moderno

projeto de cidade. É importante, impres-cindível até, planejamento urbano comvistas para os próximos dez, vinte, cin-quenta e até cem anos; que assegurequalidade de vida e bem-estar aos pique-tense de hoje e de amanhã. Mas, paraatingir esses objetivos temos muito tra-balho pela frente. Com relação ao plane-jamento urbano, lamentavelmente nossacidade não construiu, ainda, qualquerprojeto a médio ou longo prazo, que nospermitisse olhar com segurança para alémde seus 121 anos e enxergar um novohorizonte, melhor para todos.

Pobre a cidade que assiste, inerte eimpotente, à morte de suas belezasnaturais, pela falta de cuidados e de boavontade política, de planejamento urbanoe de fiscalização. A nossa omissão econivência com esse estado de coisas nosdeixa tristes e indignados. Paga-se caropelo devaneio e irresponsabilidade deadministrações que não trabalham complanejamento urbano. A cidade cresceuocupando encostas e expondo a riscosseus moradores. Só recentemente, nasúltimas décadas, é que as cidades vêmtrabalhando com planejamento e planosdiretores. No aniversário de Piquete,cabem alguns questionamentos: quefuturo queremos para nossa cidade?Queremos qualidade de vida? Serviçosbásicos eficientes? Só querer, no entanto,não é suficiente. O que estamos fazendo epodemos fazer para melhorar a cidade? Asrespostas dependem de cada um de nós.

Parabéns, Piquete, por mais umaniversário.

A Piquete que queremos

No aniversário de Piquete, cabem alguns questionamentos: que futuro queremos para nossa cidade?Queremos qualidade de vida? Serviços básicos eficientes? Só querer, no entanto, não é suficiente. Oque estamos fazendo e podemos fazer para melhorar a cidade?

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Fotos arquivo Pro-Memória

Página 2 Piquete, junho de 2012

A Redação não se responsabiliza pelos artigos assinados.

Diretor Geral:Antônio Carlos Monteiro ChavesJornalista Responsável:Rosi Masiero - Mtd-20.925-86Revisor: Francisco Máximo Ferreira NettoRedação:Rua Coronel Pederneiras, 204

Tels.: (12) 3156-1192 / 3156-1207Correspondência:Caixa Postal no 10 - Piquete SP

Editoração: Marcos R. Rodrigues Ramos

Laurentino Gonçalves Dias Jr.

Tiragem: 1000 exemplares

O ESTAFETA

Fundado em fevereiro / 1997

A separação entre a Igreja e o Estado,provocada pela proclamação da República,em 1889, fez com que a instituição ecle-siástica restringisse sua atuação apenas aoplano espiritual e sem nenhuma parti-cipação efetiva no âmbito político-social.Após a Revolução de 1930, porém, ocatolicismo, principalmente o clero do RioGrande do Sul, passou a apoiar o movi-mento revolucionário.

Foi em torno da figura de Getúlio Vargase do clero do Sul que teve início umareaproximação entre o Estado e a IgrejaCatólica. Vargas inaugurou, nesse período,concessões à classe trabalhadora, inovandoem políticas sociais. O catolicismo paulista,por essa época, possuía características quese assemelhavam ao projeto do Estado:preocupação com o bem-estar social e amanutenção da ordem familiar e da moralcristã católica.

Em 1939, assumiu a arquidiocese de SãoPaulo D. José Gaspar de Afonseca e Silva,nomeado arcebispo com a morte de D.Duarte Leopoldo e Silva, em 1938. O jovemarcebispo acompanhou as transformaçõespropostas pela hierarquia no processo demodernização da Igreja, seguindo fielmenteas ordens vindas de Roma. Administrou aarquidiocese num período em que o Brasil eo mundo viviam momentos difíceis decor-rentes da 2ª Guerra Mundial. Dom JoséGaspar procurou unificar a linha de atuaçãode todos os párocos, criou novas paróquiase decanatos (conjunto de paróquias),procurando iniciar um trabalho pastoral emconjunto. Esses decanatos eram percorridosperiodicamente por visitadores diocesanos.

Dom José Gaspar foi um vanguardistaem relação à participação mais efetiva dosleigos na Igreja. Realizou, em 1942, o IV

Congresso Eucarístico Nacional, que acon-teceu em São Paulo de três a quatro desetembro, e que contou com a participaçãode leigos.

Em preparação para esse grandiosoevento, histórico para a Igreja paulista, aDiocese de Lorena, tendo à frente seuprimeiro bispo, D. Francisco Borja do Amaral,promoveu um Congresso Eucarístico Dioce-sano. Esse acontecimento teve início no dia1º de Maio de 1942. Apesar de o país viverem regime de exceção e do clima de inse-gurança, decorrentes da guerra na Europa,o Congresso contou com a participaçãoefetiva de todas as paróquias e foi umsucesso. Fez parte desse Congresso a visitaa Lorena do arcebispo e de bispos paulistas.No dia 3 de maio, às 10h, a cidade operáriade Piquete recebeu a honrosa visita dosmembros dessa comitiva da Igreja: oarcebispo D. José Gaspar de Afonseca eSilva, os bispos de Lorena, D. FranciscoBorja do Amaral, de Sorocaba, D. José CarlosAguirre, de São Carlos, D. Gastão LiberalPinto, e o vigário capitular de Santos,monsenhor João José de Azevedo. Foramrecebidos na avenida Major Pedro porautoridades civis, militares e eclesiásticas,representações de diversas classes e daimprensa. Feitas as apresentações, segui-ram para o Cassino dos Oficiais da FPV, ondeaguardavam os visitantes o tenente coronelWaldemar Brito de Aquino, diretor da FPV,seus oficiais e químicos. Foram saudadospelo operariado e pela Banda de música daFábrica. Seguiram, depois, para uma visita àárea fabril, tendo sido recebidos no refeitóriodos operários, local em que foi dada abênção a um quadro da Santa Ceia. Discur-sou o bispo de São Carlos, seguido peloagradecimento do diretor da Fábrica. A

comitiva visitou, ainda, o Grupo Escolar daFábrica, o Grêmio Literário General Carneiro,à rua Major Carlos Ribeiro, ao lado do CineGlória, onde o povo de Piquete lhes ofereceuum banquete. Após o almoço, seguiram paraa Prefeitura, onde foram recebidos peloprefeito José Monteiro de Brito Júnior.

Após homenagens na Prefeitura, acom-panhada de grande massa popular acomitiva seguiu para a Matriz de SãoMiguel, cujo trajeto estava ornamentadocom flores e folhagens.Em frente à Matrizfoi dada a bênção solene do SantíssimoSacramento. D. José Gaspar dirigiu cari-nhosas palavras ao povo piquetense edeu sua bênção final. Jornais da épocamostram que os membros da comitivavoltaram para Lorena impressionados coma visita do arcebispo à pequena cidade.

Logo após essa visita, o Pe. SeptímioRamos Arantes, pároco da Piquete, recebeua provisão de Visitador Diocesano daParóquia de Cunha.

O Congresso Eucarístico Diocesano e a visita de D. Gaspar a Piquete

Imagem - Memória

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O ESTAFETA

GENTE DA CIDADEGENTE DA CIDADE

Página 3Piquete, junho de 2012

Manoel dos SantosUma característica pitoresca de Piquete:

quase todos seus moradores são conhe-cidos por apelidos. Ser apelidado na cidadefaz com que o verdadeiro nome do cidadãoacabe sendo eclipsado, de maneira que soaestranho quando o mesmo é chamado pelonome. Assim acontece, a exemplo de tantosoutros, com um dos mais antigos moradoresda Rua Expedicionário Genésio ValentimCorreia. É só perguntar onde mora o ManéPança, que, de imediato, sua residência éapontada. Mas quando perguntado porManoel dos Santos, fica sempre umainterrogação. Quem???

Nascido no bairro do Poço Fundo, numacasa próxima ao campo da Piquetense, em 6de outubro de 1931, Manoel dos Santos, oMané Pança, é o mais velho de 19 filhos deDona Maria José dos Santos. Muito populare conhecido na cidade, cresceu no antigoPiquete, de onde se recorda do nome doschefes de tradicionais famílias, cujos filhosforam seus amigos de infância: Juca Brito,Benedito Elias, Serafim Moreira, BeneditoChaves, Genaro Coelho, Chiquinho Máximo,Zé do Bar...

Manuel dos Santos iniciou seus estudosno Grupo Escolar de Piquete, passou peloAntônio João e concluiu o primário noGrupo da Fábrica. Guarda boas recordaçõesdas professoras Leonor Guimarães, CelinaGuimarães, Palmira Ferrari... Foi colega dasirmãs Maria Aparecida e Elza Encarnação,Antônio Santos, Ana Albertina, Sebastia-ninha, Sebastianona...

Recorda-se da data em que iniciou osestudos na Escola Industrial Masculina –1o de março de 1946. Deve à FPV o ensinomodelar que recebeu. Após estagiar pordiversas oficinas, identificou-se com amarcenaria e fez dela sua profissão. Conta-nos que tinha aulas teóricas e práticas ehomenageia com suas lembranças osprofessores Willi Vieth, Lutgardes deOliveira, Laércio Azevedo, João Evan-gelista do Prado, José Geraldo Evangelista,Paulo Canetieri, Helvécio e HermíniaRossi... Refere-se ao professor LaércioAzevedo como uma sumidade. “Ele co-nhecia de tudo... Música então, nem sefale... Tocava vários instrumentos. Ensi-nava como poucos, substituía o professorfaltoso de qualquer disciplina e dava umasenhora aula”.

No aprendizado técnico tem o professor

Romeu Dota como referência máxima: “Comoele sabia carpintaria... Era um senhorcarpinteiro. E como ensinava”, completa.

Formou-se em 1952 e logo se empregouna Fábrica para trabalhar na Carpintaria,cujos mestres na época eram HermógenesJunqueira, Antônio e José Capistrano. Forammuitas as obras em que trabalhou: oficinas,pontes e residências. Orgulha-se de tertrabalhado sob a supervisão do Major PitaXavier, na construção da Matriz de SãoMiguel. Trabalhou, também, na decoraçãoda Praça Duque de Caxias nos carnavais enatais promovidos pela administração doGeneral Adhemar Pinto. Após 38 anos detrabalho na Fábrica, aposentou-se no dia 15de junho de 1985. Mas logo foi chamado devolta, trabalhando por mais 7 anos, até 1992,sendo homenageado pela Direção daFábrica.

Manoel dos Santos diz que quandojovem gostava de dançar. Era um pé devalsa. Frequentava os bailes dos Ex-Alunos, Comercial, Elefante Branco eGrêmio General Carneiro. Foi num baile noComercial que conheceu Antônia Monteirodos Santos. Ele já estava de olho nela.Chegou até a moça e a convidou paradançar: “Sinto muito, disse ela, mas nãodanço...” Apesar da recusa, continuaram

conversando. Namoraram algunsanos e em 17 de dezembro de1959 se casaram. Já completa-ram bodas de ouro. Tem umcasal de filhos e um casal denetos.

Bem humorado e com me-mória prodigiosa, Manoel dosSantos continua fazendo pe-quenos serviços – reforma ca-deiras, camas, assenta portas,enverniza... Diz que se distraiamolando serrotes. Acreditaser um dos poucos em Piquetea dominar esse ofício que re-quer muita atenção, precisãoe paciência. E isso ManéPança tem, e muito...

Piquete comemorou 121 anos deemancipação politico-administrativa. Nãoestava na cidade, mas a internet mepermitiu visualizar muitas imagens dodesfile realizado no dia 15 de junho...

A Cidade Paisagem passa por ummomento histórico, em que turbulênciaspolíticas levaram à cassação de seuprefeito, à renúncia do vice e à posse dopresidente da Câmara Municipal noExecutivo. Sem entrar no mérito político, oprimeiro sentimento que me vem à mente éde tristeza. Não me agrada ver o desgo-verno de minha cidade natal; porém, avalioque isso tudo é reflexo de um país em quegrassam a corrupção e a desfaçatez depolíticos interessados em nada mais doque enriquecimento ilícito e descaso coma coisa pública.

O desfile organizado pela EscolaMunicipal Antônio João, no entanto, mefez lembrar, sem saudosismo, daqueles deque participei, nos idos anos de 70 e 80.

Os desfiles da então Escola de Primeiroe Segundo Graus da FPV, sob a direção doprofessor Leopoldo, eram organizadís-simos. Havia ensaios diários, criatividadepara contar um enredo especialmentepensado para a data e participação ‘quaseobrigatória’ de todos os alunos – ai dequem faltasse sem uma justificativaplausível... Eu gostava de desfilar...Lembro-me do clima dos 15 de Junho...Alguns fatores tornavam-no ainda maisdiferenciado, mas não caberiam nestacoluna... Importante é ressaltar que,aparentemente, os piquetenses valoriza-vam muito mais o aniversário de suacidade... Era, literalmente, uma festa, daqual todos participavam, e o desfile eraseu ponto alto... Em anos recentes aimportância dispensada pelas escolas àdata máxima de Piquete parecia minguar:contingente mínimo de alunos, pouco ounenhum recurso ilustrativo, ausência depesquisa um pouco mais elaborada. Jáneste 2012, parece que um pouco daqueleorgulho aparentemente esquecidomostrou-se vivo no desfile do AntônioJoão... Garotas em uniformes das décadaspassadas, homenagens a professores,‘alas’ organizadas conforme o traje dosalunos, muitos alunos... E, também es-sencial, muitos piquetenses nas ruas paraprestigiar o trabalho das escolas...

Senti-me orgulhoso de minha cidade.Num momento em que passa por traumá-ticas mudanças é gratificante evidenciarsinais de retomada do civismo, resgate dacidadania e do amor próprio dos pique-tenses. É isso que depreendi das imagensque vi... Nada mais apropriado para um anode eleições: quanto mais amarmos nossacidade, mais nos preocuparemos com aqualificação de nossos candidatos e,consequentemente, com nosso voto.

Um futuro de conquistas, de qualidadede vida e desenvolvimento é o que merecenossa Piquete, é o que merecemos ospiquetenses, é o que desejo.

Laurentino Gonçalves Dias Jr.

Um desfile decidadania

Mané Pança a caminho da carpintaria, na FPV. Foto 1964

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O ESTAFETA Piquete, junho de 2012Página 4

De quem teria sido a ideia de colocar

Os galinhos nas torres da Matriz?

Indicadores dos ventos, perfilam-se

Quais lâmpadas de prata,

Projetadas no azul opalino.

Graciosos no recorte artístico

De um artesão prestimoso,

São obras de arte ingênua.

Por isso, românticos.

Sinalizadores. Entenda-os

Quem quiser, ou puder.

Talvez tenham sido preciosos

Para os movimentadores das tropas

De burros carregados de bruacas,

Algum ouro enrustido,

Muitas aventuras,

E muitas mágoas.

Sob a luz da lua cheia incendeiam-se

Injetados de luz e ar.

Sabem decifrar mistérios

Do tempo, do céu, do espaço e do luar.

Anunciadores do cristianismo.

/ São arautos.

Dormem no anoitecer,

Ponteiam nas madrugadas.

Anunciadores de novo dia,

Combinados com as auroras.

Nota: bruacas são baús feitos de peleanimal (couro), muito usados para transportede mercadorias pelos tropeiros.

Os galos com seu canto matutinomantêm um antigo poder. Quando cantam,os homens e as mulheres acordam para quetodo mundo saiba que o dia aí está para otrabalho e o labor.

O trabalho dividido pelas horas dorelógio dos capitalistas.

O labor na construção da sobrevivência– permeado pela subsistência da luta na terrae nos afazeres do lar.

Os galos simbolizam o despertar na viae na luta pela vida. Ave matutina. Quandocantam à noite, despertam a atenção. Pelaestranheza, criam-se ditos populares dehumor picaresco.

Ora, mostram todo o seu poderia quan-do inflam o peito e soltam o seu canto,avermelhadas as peles da crista e daslaterais dos bicos. Principalmente quandosão novos. Depois, já se tornam maisenrouquecidos e o canto menos vibrante.Mas, enfim, quando no vigor da idade,empoleirados em pedras ou cercas sono-rizam magníficos e parecem saber do poderque detêm.

Homero dizia que o canto do galoequivalia à duração de cinco respiraçõeshumanas.

Entre os galos há diferenças. Há, entreeles, os belicosos, isto é, os que apreciamas disputas e os desafios nos ringues ondea luta é dada até a morte de um doscontendores, para gáudio de uma plateiasedenta de sangue. Plateia essencialmentemachista, com apostas e muita bebida. Vi,

no México, a importância que tem, nasperiferias das cidades, a rinha das aves deguerra. Disputados a peso de ouro eanimados na barbárie. É jogo proibido, masrenitente. No Brasil, no nordeste, perce-bemos a existência de rinhas e, assim, demodo geral, pela América Latina.

Há os galos de bela plumagem egargantas privilegiadas. Os musicaisdesafiam-se nos cantos.

Uma visão bíblica lhes é atribuída, a umdeles, especialmente, por ter sido sinalizadorde reiteradas negativas do apóstolo Pedroao ser admitido seguidor de Jesus, quandoinquirido pelos militares do imperadorromano no Jardim das Oliveiras, no ato daPaixão. A narrativa bíblica registra essemomento dramático para mostrar o ladoinseguro do apóstolo que havia juradofidelidade ao mestre e completa aceitação.

Admoestado fora por Cristo, ao qual,entretanto, jurara fidelidade completa, mas,para salvar a própria pele negou-se a si e aEle. Mostrou, na grande prova, a fragilidadehumana. A narrativa desse evento é de João,em “a negação predita” – 36: 21,18 / Mt 26,33-35 / Mc 14, 29-31 / Lc 22, 31-34.

Assegura Simão Pedro que daria a vidapor Cristo, que lhe respondeu: “Darás tuavida por mim? Em verdade, em verdade, tedigo: não contará o galo antes que me tenhanegado três vezes!”.

Por outro lado, interessante é registrarque o galo, anunciador que é, dá nome aosblocos carnavalescos que, em algumascidades brasileiras, antecede os demais nosdias dedicados ao Carnaval. Estridente etriunfante, o Galo da Madrugada abre ocaminho para os foliões.

Não fosse o galo, desafiante, o pre-cursor dos eventos e do calendário. Nospresépios de Natal é testemunha de alerta,por lembrar as negativas de Simão Pedro;nas rinhas, magro e quase sem crista, osolhos agressivos e as garras afiadas,afiançando-se como rei das contendas, enos terreiros, absoluto e único, um rei. Quenão o desafiem. As galinhas lhe sãoobedientes. Os humanos respeitam-no. E,quanto a esses, os galos têm suas idios-sincrasias, isto é, preferências. Sabemdemonstrar quando gostam ou não gostamde alguém. Há muitas histórias para contar.Fica para outro momento.

Entretanto, um registro aqui deve serfeito: os galinhos da Matriz ancestral, nossomais antigo monumento histórico, perenizamo tempo da fundação da cidade emancipadaa 15 de junho de 1891: a ereção da Matriz -era condição: “sine qua non” para que,segundo a lei em vigor, o núcleo, entãoFreguesia, se emancipasse como Vila.Centenária na força de seus pais fundadoresque sonharam um futuro sólido para a Vilaque se instalava com foros administrativosde município. Sonho legado para as gera-ções que se sucedem e devem se com-prometer com a garantia de um lugar pátriobelo e digno de nele se viver e crescer.

Dóli de Castro Ferreira

Os galinhos da Matriz

A invenção dos galos

Anacyr

O vento e o tempo fixaram as palavras,

Gestos se eternizaram

Em beleza de cores e formas

Nas telas imantadas de luz...

O vento, guardador das memórias,

Dia e noite espalha

Sementes aprofundadas

Para testemunhar

No chão da terra da cidade

O palimpsesto da memória

Sempre renovada.

No tempo pleno das horas,

Impressões se atualizam,

Sentimentos manifestados

Para lembrar nos agoras

Relíquias de passado,

Presenciais de futuro.

Para sempre...

Eunice

Da janela sorria

Entrevista por uma roseira.

Dizia-nos palavras amáveis.

Cultivava a boa amizade.

Transcendia-se nos gestos,

Irmanava-se à natureza,

Valorizava o companheirismo.

Mestra tornou-se

Na trajetória do ensino:

Semeaduras pródigas

Dos terrenos férteis,

Ventos favoráveis,

Regenerativas seivas.

Nos poemas lúcidos,

Sazonados de maturidade,

Plenificou-se perene,

Perpetuou-se, Eunice.

Um sineiro chegou ao céu

Um sineiro chegou ao céu.

Pelo caminho do infinito.

Um bando de anjinhos

Colocados enfileirados

Celebraram com seus sininhos

A chegada do Getulinho.

Que de lá nos abençoa

Para jubilar

São Miguel e o Natal.

Sorria, seu Getulinho,

Que fez da vida

A alegria sonorizada

Nos corações aquecidos

Pra sempre lembrar,

Getulinho

Dóli de Castro Ferreira

Maio de 2012

Três poemas, três amigos,memória...

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O ESTAFETA Página 5Piquete, junho de 2012

O discurso é a palavra em movimento,é a prática da linguagem. Aprofundar-seno tema permite compreender melhor o quedizem uns e outros por aí...

Os dizeres são muito mais do quemensagens a ser decodificadas, sãoefeitos de sentidos produzidos em condi-ções determinadas, são pistas a seguirpara se compreender os sentidos. Se-gundo Foulcalt, “esses sentidos têm a vercom o que é dito ali, mas também emoutros lugares, assim como com o que nãoé dito, e com o que poderia ser dito e nãofoi. Desse modo, as margens do dizer, dotexto, também fazem parte dele”.

Quando nos posicionamos diante deum fato, o fazemos para nos afirmar comopessoa e conquistar um espaço na socie-dade. Quando alguém se expressa, refletee ao mesmo tempo refrata o meio social aque pertence, bem como suas experiências.Nesta perspectiva, toda enunciação édeterminada por uma situação mais ime-diata, pelo contexto social. A forma e oestilo da enunciação são resultados, naverdade, das pressões sociais a que estásubmetido o locutor.

Esta curiosa definição de discurso nosleva a compreender o que tem sido faladono cenário político de nossa cidade. Bastaentender qual é o contexto histórico em queestá presente o locutor. Sabemos que omomento político é tenso, as eleições acon-tecem dentro de poucos meses e há pressaem se posicionar para alcançar os objetivos.

Segundo Bakhtin, renomado linguistarusso, todo enunciado revela as posiçõesdos interlocutores. Observa-se que não háneutralidade na circulação das vozes; elasnão circulam fora do exercício do poder –têm uma dimensão política.

Atestamos a presença desse fenômenoquando analisamos os discursos surgidosprincipalmente nos meios de comunicação.Ficam evidentes enunciados que deixampatente a subordinação e o assujeitamento.São as relações hierarquizadas, sustentadasno poder de diferentes lugares, que fazemvaler a comunicação. Isto, certamente,afetará os discursos, controlando-os eregulando-os. É o que Foucault denominade interdições: “sabe-se que não se podefalar de tudo em qualquer circunstância, quequalquer um, enfim, não pode falar de

qualquer coisa”. Estamos, na verdade,sujeitos às normas que a sociedade – oualgum grupo – nos impõe.

Nesse sentido, o discurso não expressasimplesmente o desejo do homem. Odiscurso mascara, camufla a verdade. O queprevalece é o (discurso) do indivíduo quedetém ou deteve o poder. Os discursospolíticos não são dissociados dessaprática. Assim, para a análise do discurso,os sentidos estão aquém e além daspalavras, ou seja, são determinados pelasposições ideológicas e pelo processosócio-histórico em que as palavras sãoproduzidas. Estas mudam de sentido se-gundo as posições dos que as empregam.

Portanto, ao se analisar os discursosnos meios de comunicação ou nas “con-versas de esquina” sobre a política emPiquete, é importante ouvir além dasevidências. Esta análise permitirá relacionaro dito em relação ao não-dito. Permitirá,ainda, analisar os discursos de acordo coma posição que seu autor ocupa, os diversosmodos de transmitir uma ideia, o sentidoreal de suas palavras.

Prof. Evelize Chaves

O discurso e o poder

A Rio+20, conferência das NaçõesUnidas sobre desenvolvimento susten-tável, tem motivado debates e inserido otema sustentabilidade à lista dos assuntosmais comentados deste mês. O esforço delíderes de diversas nações em estabelecermetas e compromissos que tornem menosdanosas e impactantes as atividadeshumanas na Terra, é muito importante e geraesperança em todos nós que estamosacostumados a viver numa sociedadeimpiedosamente predatória e desrespeitosacom a comunidade de vida e com osrecursos naturais que a sustentam.

Uma conferência de grande porte, comoa que está ocorrendo no Brasil, é funda-mental para o futuro de nossa Casa Comum,mas também é urgente uma transformaçãoradical, uma reformulação dos alicercessobre os quais se estrutura o ethos, oscostumes de nossas sociedades. O desen-volvimento econômico, entendido comocrescimento do poder aquisitivo, tem sidosinônimo de progresso, e o valor supremoem nosso tempo. Esse poder não é almejadoapenas até o limite das necessidadesbásicas, mas desejado ilimitadamente emnome do conforto, do bem-estar, do luxo edo status; mesmo que origine destruição edegradação irreparáveis do ambiente neces-sário ao desenvolvimento da teia da vida.

As palavras são como os bolsos de umacamisa: cada uma pode carregar algo dentrode si. Um bolso pode estar cheio de coisasou vazio. Assim também acontece com aspalavras, elas são dinâmicas podem portarsignificados densos e ricos em uma época eser empobrecidas em outra. Progresso é umtermo empobrecido de significado em nossotempo; tal fragilidade semântica é oriundada horizontalidade cultural que foi seestabelecendo desde a Renascença até aatualidade. Não há dúvidas de que a ciênciamoderna trouxe grandes avanços à huma-nidade, mas o humanismo gerou a desvalori-zação da Terra e de toda a comunidade devida, autorizando as sociedades modernasa oprimir e massacrar a natureza em nomedo progresso, dizimando espécies animaise vegetais, contaminando o solo, as águase o ar, colocando em sério risco o equilíbrioe a harmonia do planeta. Ainda hoje, apesarde já terem sido causados danos irreparáveisao meio ambiente, o progresso continuasignificando consumir mais, ter mais poderaquisitivo, gerar energia mesmo que asfontes sejam sujas, gerar empregos emcrescente número de fábricas, para que aeconomia se aqueça e haja mais consu-midores, e assim por diante.

A Terra não pode dar suporte a essamaneira atual de organizar a vida e as

sociedades. Os PIBs necessariamente terãoque começar a regredir e deixar de ser o maisimportante indicador de desenvolvimentodas nações; a riqueza deverá ser distribuídacom maior equidade e o poder aquisitivolimitado à satisfação das necessidadesbásicas das pessoas. Progresso terá quepossuir novos significados em nossacultura, terá que nos remeter à sustenta-bilidade, à justiça social, ao respeito pelaTerra e sentimento de comunhão com todaforma de vida, paz entre os povos e nações,diálogo e unidade na pluralidade humana.Cada vez mais progredir deverá significar apassagem para um novo e superior patamarde humanidade. Uma evolução do espíritohumano à benevolência, à compaixão, aoamor integrado a todo o cosmos, onde aexistência se dá.

Esse novo paradigma já está presente,ainda que embrionariamente, entre nós. Acontinuidade do grande sistema vivo doqual fazemos parte depende de sua matu-ração, que vai se dando paulatinamente.Nossa esperança é que se implante essemodelo a tempo de salvar o fragilizadoequilíbrio da Terra e possibilitar que a vidacontinue seu processo de evolução eaperfeiçoamento.

Pe. Fabrício Beckmann

Nossa Casa Comum deve ser cuidada

Foto Arquivo Pró-Memória

Page 6: JUNHO 2012

O ESTAFETA

Edival da Silva Castro

Página 6 Piquete, junho de 2012

Crônicas Pitorescas

Palmyro Masiero

Sinal de alerta

O bramido do elefante

As pessoas, atraídas pela qualidade dobicho, vinham de muito longe conferir se oelefante era branco mesmo. Chegando aqui,passavam a procurá-lo. Acabavam decep-cionadas quando tomavam conhecimentode que se tratava de um ginásio. Acabavam,então, visitando o zoológico.

Nas décadas de 50 e 60, o presidente doclube, o saudoso Alony Oswaldo Soares,“o encantador de festas”, fazia o elefantebramir com suas festas juninas, natalinas,carnavalescas e bingos dançantes. Procu-rava, no decorrer do ano, contratar notáveisorquestras, famosos conjuntos e bandas emdestaque para abrilhantarem os bailesmensais.

Num sábado de dezembro, os BiribaBoys, de São José dos Campos, tocavamaos convivas músicas do hit-parade quan-do, de repente, o vocalista começou a cantarOnly You. Foi se inflamando: soltou omicrofone, tirou o casaco, girou-o algumasvezes em torno da cabeça e atirou-o aopúblico. Os pares que dançavam foramparando; as pessoas que se encontravamsentadas, arredando as cadeiras, foram selevantando e, tácitos, passaram a absorvero show improvisado. E o vocalista, aumen-tando o tom da voz, com a mão destraalisava os cabelos, agachava-se e, cansado,encerrou a apresentação.

A orquestra Cassino de Sevilhaapresentou-se num palco de montagemrequintada. Com coreografia impecável, osmúsicos de smoking engalanaram a noiteinesquecível. A maioria das pessoas ficavaalém da grade apenas para ouvir e curtir adoce orquestra. O ambiente, que se en-contrava à meia-luz, de repente iluminou-sequando a orquestra começou a tocarAquarela do Brasil. Um ‘ah, ah’ de admiraçãoencheu o salão.

A banda OK, da cidade de Taubaté, comseus músicos trajando casacos lante-joulados mostrava um ritmo que mexia comos corações dos dançarinos; eram mo-mentos de reflexão, aconchego e bem-estar.Nas mesas que circundavam o salão, ocuba-libre era o mais servido.

O conjunto Plazza, produto da terra,escolheu uma grande noite para sua estreia:um sábado acalorado, em que a lua cheiabailava no céu estrelado. As damas trajavamvestidos longos e os cavalheiros, a maioriadeles, vestiam ternos brancos, mesclavam-se no salão dourado e os casais suspiravamfundo quando o saudoso Almiro começavaa cantar Sentimental Demais...

Molecão com tudo... Prendado... Bonito,ricaço, carango último tipo e, óbvio, mu-lherada às pampas... O rei dos rachas... Suasexibições noturnas eram comparáveis àsdaqueles que aparecem de vez em quandona TV e que a gente acha que não funcionambem da bola para fazerem o que fazem...Cavalo-de-pau, ora... Isso é para princi-piantes... Evidente o exagero no que voudizer, mas que se tem essa impressão, issose tem: quando dobra uma esquina para fazera volta em determinado quarteirão, chegaantes de sair... No duro mesmo!

Incontestavelmente, muita coisa acon-teceu. Abalroamentos, trombadas, pessoasoutras para o Pronto Socorro, mas nadadisso implicava em implicações para ogarotão. O papaizinho dele era um dessesfigurões que ocupam altos cargos públicose que, com um simples rabisco num papel,punha e dispunha do que pretendia. “Meumenino é um santo”! Pra resumo, o rapaztem as costas mais largas que as do Brasil.Apoio total do coroa legal. Rimático everídico...

Suas trampolinagens não se restringiamapenas a problemas motorizados não...Boates, lanchonetes, bailes, quando lhedava na telha, ele punha pra quebrar. Todomundo sabe que nego com dinheiro nobolso é cacique de grande tribo. Quando acoisa partia pro pega, havia tanta gente dolado dele que, no fim, virava tudo umaquebradeira geral, ninguém sabendo contraquem estava brigando... Os estragos, ajusta? Um telefonema pro cara pai dele etudo ficava resolvido.

Certo dia, o bom das bocas, com seucupincha, sempre acarrapatado nele, e maisduas bonecas, resolveu dar uma esticadaaté o litoral para uma refrescação no mar.Bom de rico é que não pensa duas vezes...O Emerson levou tão a sério a questão davelocidade máxima ser estabelecida em 80

km/h que lá nas corridas dele se esquece deque pode puxar um pouco mais... Nossoherói daqui, entretanto, interpretou oinverso: os 80 eram no arranque do pos-sante... Saía assim...

Plena Serra do Mar, rumo à praia, está oquarteto curtindo aquele som, com oponteirinho do velocímetro tentando, semconseguir, descer mais... Vai que tinha radarde serviço... Um guarda avisou outro e esteficou na boca de espera. Foi só de esperamesmo, pois, sem dar a mínima para oguardião das estradas que lhe dava sinalpara encostar, o bicho passou lascado... Aífoi um pega-pega... O rádio funcionou e umabarreira foi formada, razão pela qual o ás dovolante e do resto teve que parar...

Pondo a cara de fora, o bonitão gritoupara o sargento que se aproximava:

– Qual é, meu chapa?Os outros guardas chegaram, anotaram

a placa e deram ordens:– Todos pra fora!– Calma, ô meu! Quem você pensa que

é?– Vamos... Pra fora! – Imperturbável,

falou o sargento.– Tá querendo uma grana?Desceu puxado pelo cangote... Os

outros saíram não tão petulantes, mas comarzinho confiante de que logo estariamnovamente em marcha.

– Documentos! – exigiu o sargento.– Sabe quem eu sou, cara?– Detesto ser apresentado a homem. –

ironizou o guarda.O insolentezinho tirou, então, da

garganta, seu coringa:– Olha, cara... Você sabe quem é meu pai?O sargento segurou-o firme nos dois

braços e, olhando-o fixamente, deu-lhe aresposta:

– Não, eu não sei... Mas e você... Temcerteza absoluta de que sabe?

“Morros e sinuosidades mantiqueiras.

Semeadas aqui, acolá, as casas formaram um pequenino núcleo.

O povoado virou vila.

A vila, um dia, amanheceu cidade.

Nas ruas, as pegadas invisíveis e os segredos dos que ajudaram a construí-la.”

Chico Máximo

Page 7: JUNHO 2012

O ESTAFETAPiquete, junho de 2012 Página 7

O instituto da emancipação cria umgrande número de arapucas.

Emancipar-se significa livrar-se da mãopesada, libertar-se da tutela.

Quando algo ou alguém se emancipa,admite-se que tenha chegado ao nível deexigências necessárias para prosseguirsozinho, estabelecendo as próprias leis.

Consideremos o espaço, em um primeiromomento, a fração de autoridade que umapessoa, um partido, uma classe ou umgrupo social tenha em determinado país.

Não interessa a origem, o rótulo. O quepesa é a representatividade.

Admitamos um ditador que mantivessesuas forças armadas com seus própriosrecursos, que não cobrasse impostos dopovo.

Seria apenas uma espécie de fiscal paraque o povo nunca contrariasse suavontade.

Mesmo assim eu o consideraria umpsicopata, um homem que, de repente,cismou que só ele sabe fazer as melhoresescolhas para o bem do povo. Não temrepresentatividade. Não tem legitimidade,porque alcançou o poder pela força oupela fraude.

Pessoalmente, julgo que um homemcomo este, quando arrancado do poder, nãodeve ser condenado à morte ou à prisãoperpétua. Penso que deve ser assistido porpsicólogos e psiquiatras porque tem umsério desvio mental.

Quanto aos seus comparsas, eu osconsidero simples aproveitadores, genteque faz qualquer coisa – inclusive matar –para obter um troco – posição ou posses;pretensão ou pose.

A disputa do espaçoAtualmente, a disputa no Brasil é de

outra ordem – trata-se da ocupação doespaço físico.

Depois da criação do Ministério doDesenvolvimento Agrário, MDA, os gri-leiros ficaram desesperados.

Tempos atrás, grilavam as terras doGoverno e dos posseiros. Agora, obrigamos assentados a assinar um documento dedesistência da gleba recebida, sob ameaçade morte.

Grilar é registrar em Cartório uma terraque não foi comprada ou recebida pordoação ou herança.

É por isso que se diz que grande parteda Amazônia Legal tem três andares – cadapedaço de terra tem, pelo menos, três donosdiferentes.

Durante a discussão do Código Flores-tal, os ambientalistas avançaram com unhase dentes contra os brasileiros que plantame criam, limitando sua área de atuação.

Lixões e terrenos que receberam, durantemuito tempo, resíduos industriais sãoconsiderados áreas impróprias até para aconstrução civil.

A mesma construção civil demanda áreasde mineração de produtos básicos comoareia, saibro, argila e pedra.

De repente, o “impávido colosso”, combaixa densidade demográfica, foi dimi-nuindo, diminuindo, sem florestas para ocontrole do aquecimento global e sem apossibilidade de produzir os alimentossolicitados pela FAO.

É nestas situações que parecem fugir aosparadigmas que os argumentos para adecisão dos novos rumos da nação devemser elencados.

Qual a população que o “giganteadormecido” tem condições de abrigar comdignidade?

É justo nascer para viver em um barracosem água potável e esgoto sanitário?

Hoje nos preocupamos com animais emextinção. Despreocupadamente regis-tramos que algumas etnias brasileiras estãodesaparecendo – que há apenas quatrofalantes de determinada língua.

Que vai acontecer quando faltar espaçopara a sobrevivência? Só os mais fortes,os mais adaptados sobreviverão?

O Ministério da Agricultura, Pecuária eAbastecimento (MAPA) pretende fazer umestudo pormenorizado de cada Estado daFederação a respeito do que ficou regis-trado no Código Florestal.

Bom seria que as Secretarias de cadaEstado aguardassem os funcionários doMinistério com um mapa fiel de todos osproblemas que podem trazer prejuízos paraa população.

Será este o momento oportuno para quea população observe o comportamento doshomens e mulheres que pretendemrepresentá-la no Município, no Estado eem Brasília.

O Espaço Físico está periclitando. Emnenhum tempo ele dependeu tanto doEspaço Político.

Vamos deixar de lado o troquinho quepossamos receber agora.

Deixemos que cérebros iluminados pelaciência e pelo senso de justiça desenhemo mapa que vai garantir o futuro de todosos brasileiros.

Abygail Lea da Silva

Suponhamos que você queira saber deque maneira viviam os piquetenses em 1891,quando ocorreu a Emancipação Político-administrativa da Freguesia do Piquete.

Poderia pesquisar nos livros, nos jornaisou nos documentos da época. O primeirolugar a se procurar seria nos arquivosmunicipais. Acontece que no município nãoexiste um espaço onde esses documentospossam ser encontrados.

Por muito tempo, um cidadão apai-xonado pela cidade e preocupado com suahistória – Carlos Vieira Soares – teve a

preocupação de guardar fotos, jornais,revistas, documentos, proclamas... tudo quefizesse referência a Piquete. Colecionou edoou esse acervo para a municipalidade,criando o Museu Municipal. Infelizmente,por falta de cuidados e de responsabilidadeadministrativa, esse museu não mais existe.Assim, nos últimos anos, em junho, quandoalunos das escolas municipais e univer-sitários valeparaibanos buscam saber sobreo processo emancipatório de Piquete e ospersonagens que dele participaram, recor-rem ao acervo da Fundação Christiano

Rosa. Por termos nossa história fragmen-tada, esta Instituição vem formando umbanco de dados com tudo o que se refere aomunicípio sob o aspecto histórico, culturale ambiental. É crescente a consulta a esseacervo formado principalmente por docu-mentos, fotografias e jornais. Estudiosos daHistória social, da História das mentalidadese dos mais diferentes gêneros da História,quando tomam contato com esse material,se surpreendem. Prazerosamente, a Funda-ção Christiano Rosa procura disponibilizá-lo sempre.

História fragmentada

Fotos Arquivo Pró-Memória

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Page 8: JUNHO 2012

O ESTAFETA Piquete, junho de 2012Página 8

Outro dia, numa dessas redes sociais aque somos inevitavelmente ligados, foramcolocadas algumas fotografias que, aprincípio, me chocaram. Depois de vê-lasinúmeras vezes, o choque deu lugar à tristezae, porque não dizer, a alguma revolta.

Elas mostravam alguns animais pas-tando, silenciosa e impunemente, nasgramas da pracinha. Outros animaisadentraram as dependências do hospital,pelo portão dos fundos e lá também comiamo que havia de verde no lugar.

Sem saudosismos, mas também semquerer esconder as lembranças do queesses lugares já foram um dia, voltei meuspensamentos para o significado, tanto dapracinha como do hospital, para o povodessa terra.

A pracinha abriga até hoje os locaisonde se concentravam quase todas asatividades sociais e culturais da cidade. Osbailes no Elefante Branco, as brincadeirasdançantes no General Carneiro, e o Cinema,que era, para mim, o melhor desses locais,o lugar dos sonhos onde todos os diaspassava um filme diferente.

Assisti a muitos filmes naquele cinema.Ali fui apresentada e pude conhecer osgrandes diretores, atores e atrizes da época.

Esse universo cultural me acompanha portoda minha vida.

Nessa mesma pracinha, além do pipo-queiro pontual e assíduo, as pessoaspasseavam, se encontravam, trocavamconversas, olhares, paqueras. O movimentode pessoas era fervilhante aos sábados edomingos, à noite. Ali era um ponto deencontro.

Por isso a minha tristeza e revoltaquando me deparei com as imagens dasfotografias que mostravam jumentos ecavalos pastando, comendo a grama, tirandoda pracinha a prioridade do encontro depessoas. Transformando-a quase num pastocomum, não fossem essas lembranças.

Como se o abandono estivesse dizendoàqueles animais: bem-vindos à pracinha,jumentos, cavalos e outros animais irracio-nais não cuidados pelos racionais!!!

Isso me fez lembrar a conhecida frase deShakespeare: “Bem-vindos a Chipre – bodese macacos”. No entanto, me recuso a aceitarque essa frase se torne a imagem de hoje dapracinha.

Na verdade pretendo que essa frase setransforme e represente a revalorização dascoisas da nossa cidade, da sua gente, doseu patrimônio físico, emocional, cultural e,

como não poderia deixar de ser, das boaslembranças.

Quero que a frase seja dita de outrasformas: bem- vindos a Piquete todos seusfilhos que partiram, mas que ainda a amam;bem-vindos a Piquete pessoas interes-sadas na sua recuperação e no seucrescimento; bem-vindos a Piquete empre-endedores que queiram gerar novosempregos, novas fontes de renda; bem-vindos a Piquete pessoas ligadas às artes,para fazer renascer a vida cultural paratodos; bem-vindos a Piquete todos os quea querem ver sair desse sono que lhe foiimposto e que se abra para um novocomeço.

Pensar que pode ser assim, que a cidadetem potencial para inúmeras ações posi-tivas que a valorizem, que resgatem suascoisas boas e a coloquem num outro nívelde relevância me dá um pouco de ânimo,um pouco de esperança.

Bem-vindos a Piquete, não bodes,macacos, jumentos e cavalos. Bem-vindosa Piquete todos que podem ajudá-la, dealguma maneira, a se tornar, cada dia mais,a paisagem, os braços abertos, a cidade daprosperidade, da tranquilidade e daalegria!!!!! Eunice Ferreira

Bem vindos a Piquete

A Fábrica Presidente Vargas na história de Piquete

Fotos Arquivo Pró-Memória

Rico em história, Piquete é um municípiovaleparaibano singular quanto à suaprincipal atividade econômica: trabalhacom a produção de pólvoras e explosivosquímicos para a defesa do Brasil.

A Fábrica de Pólvoras aqui instalada,nos primórdios do século XX, foi e continuasendo o sustentáculo da economia pique-tense. Essa industria bélica contribuiu,indiscutivelmente, para a consolidação doprocesso emancipatório de Piquete ocor-rido em 15 de junho de 1891. O recém-emancipado município, de economia rural-agrária, cujo principal produto, o café, já nãoproduzia como em décadas anteriores,estava fadado à insolvência, quando oMinistério da Guerra escolheu suas terraspara que nelas fosse edificada a primeirafábrica de explosivos químicos do Brasil. Apartir de então houve um renascimento dapacata Vila do Piquete, que passou a atrairinúmeras famílias de diferentes lugares. Alémda geração de empregos, Piquete experi-

mentou um surto de crescimento recebendoo status de cidade operária. Até o final dadécada de 1970, a Fábrica, além de provedorade empregos e salários foi a grande cons-trutora da cidade. Ao longo dos anos, todasas administrações municipais, sem exceção,se beneficiaram com suas obras. É sócorrermos os olhos pela paisagem urbanade Piquete para constatarmos essa afir-mação. As principais edificações na cidade:hospitais, cinemas, vilas operárias, clubesrecreativos, parque zoológico, monumentose praças, quadras esportivas, escolas,igrejas... foram construídas pela Fábrica.Mas, infelizmente, dentro de uma novapolítica do Governo Federal, a Fábrica deixoude ser uma unidade do Exército, passando aser uma unidade da IMBEL no final dadécada de 1970, voltando-se apenas parasua produção industrial. A partir de então,Piquete teve que aprender a caminhar comsuas próprias pernas. Sem as benesses daFábrica nenhuma obra significativa foi

edificada. Passados trinta anos, a cidadeainda engatinha. Retrocedeu em algunsquesitos que no passado foram referências.Entendemos que somos um município novo.Esperançosos e otimistas quanto ao futuro.A cidade aguarda por um administradordinâmico, competente, antenado com novostempos e com a modernidade.

Herdeiros de uma natureza exuberante evariada, queremos respeitar o meio ambientepara legá-lo como fonte de vida às futurasgerações. Queremos progresso, educação,crescimento econômico e mais empregos.Queremos fortalecer a cultura da solida-riedade. Estes são desejos para os próximosanos. Que a cidadania prevaleça em suadimensão prática e que a impunidade nãoofusque a justiça.

Neste aniversário saberemos respeitar asrealizações de nossos antepassados e serherdeiros de seus sonhos e esperanças.Enfrentaremos o futuro com a confiança dosque constroem uma grande cidade.