Kant x ferrer

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE EDUCAÇÃO/DEPARTAMENTO DE ESTUDOS BÁSICOS HISTÓRIA DA ESCOLARIZAÇÃO BRASILEIRA E PROCESSOS PEDAGÓGICOS PROFESSORA: SIMONE VALDETE DOS SANTOS ALUNO: LEONARDO PEIXOTO DA SILVA TURMA: D EDUCAÇÃO LIBERTÁRIA E LIBERDADE KANTIANA A instituição escola parece estar sempre em crise, ela vem sendo criticada desde sua fundação. Parece claro para todos que os sistemas educativos não mudam, existe uma homogeneização que pode ser explicada pelo caráter universal que acompanha a escola desde o seu surgimento. Este trabalho tenta compreender por que a escola permanece fechada em si mesma, com um processo de ensino que ocorre de forma homogênea; para isso serão analisados dois autores com idéias completamente diferentes: Kant e Francisco Ferrer. Hoje não parece segredo que o ensinar tem como objetivo o “passar de ano”, ele não leva em conta a vida dos alunos e por isso não tem a intenção de fazer analogias entre a experiência de vida dos alunos e o conhecimento escolar. O processo de ensino ocorre de forma homogênea, não importando a origem social do aluno, a idade, etc. As diferenças estabelecidas são de ordem cognitiva: bom ou mau aluno, esforçado, preguiçoso, obediente, disciplinado, etc. Ao comparar “bons” e “maus” alunos, a escola acaba gerando uma competição entre eles, onde o mau aluno será sempre o perdedor, aquele que será um fracasso no mercado de trabalho,só sobrará para ele, os piores empregos. Kant foi um dos grandes pensadores do ensino moderno, em seu livro Sobre a Pedagogia (1777), o autor mostra uma grande preocupação com a formação do homem,desde a infância.O ensino moderno que forma mão de obra para o mercado de trabalho sofreu grande influência do pensamento do filósofo prussiano. Kant diz que é

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

FACULDADE DE EDUCAÇÃO/DEPARTAMENTO DE ESTUDOS BÁSICOS

HISTÓRIA DA ESCOLARIZAÇÃO BRASILEIRA E PROCESSOS PEDAGÓGICOS

PROFESSORA: SIMONE VALDETE DOS SANTOS

ALUNO: LEONARDO PEIXOTO DA SILVA

TURMA: D

EDUCAÇÃO LIBERTÁRIA E LIBERDADE KANTIANA

A instituição escola parece estar sempre em crise, ela vem sendo criticada desde sua

fundação. Parece claro para todos que os sistemas educativos não mudam, existe uma

homogeneização que pode ser explicada pelo caráter universal que acompanha a escola

desde o seu surgimento. Este trabalho tenta compreender por que a escola permanece

fechada em si mesma, com um processo de ensino que ocorre de forma homogênea;

para isso serão analisados dois autores com idéias completamente diferentes: Kant e

Francisco Ferrer.

Hoje não parece segredo que o ensinar tem como objetivo o “passar de ano”, ele

não leva em conta a vida dos alunos e por isso não tem a intenção de fazer analogias

entre a experiência de vida dos alunos e o conhecimento escolar. O processo de ensino

ocorre de forma homogênea, não importando a origem social do aluno, a idade, etc. As

diferenças estabelecidas são de ordem cognitiva: bom ou mau aluno, esforçado,

preguiçoso, obediente, disciplinado, etc. Ao comparar “bons” e “maus” alunos, a escola

acaba gerando uma competição entre eles, onde o mau aluno será sempre o perdedor,

aquele que será um fracasso no mercado de trabalho,só sobrará para ele, os piores

empregos.

Kant foi um dos grandes pensadores do ensino moderno, em seu livro Sobre a

Pedagogia (1777), o autor mostra uma grande preocupação com a formação do

homem,desde a infância.O ensino moderno que forma mão de obra para o mercado de

trabalho sofreu grande influência do pensamento do filósofo prussiano. Kant diz que é

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preciso acostumar o homem com os princípios da razão e da disciplina. Diferente dos

animais, o homem necessita de cuidados especiais que o farão sair do estado de

selvageria, é através da educação que o homem deixa de ser um selvagem. A criança

deve ir à escola para aprender a obedecer desde cedo, pois, quando ao homem foi

permitido seguir a sua vontade durante a juventude,ele permaneceu selvagem por toda a

vida.

Kant vai detalhar como deverá ser a educação escolarizada de modo que se torne

eficiente para uma dominação estatal. Por trás de um pretenso humanismo universal, o

que estava em jogo era a imposição, pela via educacional, de um padrão cultural

eurocêntrico. Para Kant (1996) a criança deve se habituar ao trabalho na escola:

“Que a criança, portanto, seja habituada ao trabalho. E onde a tendência ao

trabalho pode ser mais bem cultivada que na escola? A escola é uma cultura

obrigatória. Prejudica-se à criança se a acostuma a considerar tudo um

divertimento”(p.62).

O Estado tomou para si a escola como a instituição que, a seu serviço iria realizar a

tarefa de regular a sociedade tornando-a homogênea e previsível. A escola que

encontramos hoje nada mais é do que herdeira deste pensamento.

O outro autor analisado no trabalho é Francisco Ferrer, homem influenciado pelos

ideais anarquistas que tinha uma proposta totalmente diferente para os padrões

hegemônicos; Ferrer buscava uma educação laica que estivesse sob o poder da

comunidade, sem influência da ideologia Estatal para não comprometer a liberdade

educacional,este é o objetivo da Escola Moderna, uma escola sem influência do Estado

ou da igreja, que assim formará um homem integral. Em 1901, Francisco Ferrer forma a

Escola Moderna,uma escola mista e aberta a todos os meios(existe uma cobrança de

acordo com a renda dos pais),ela é laica e bane o ensino religioso.Ela é também

racional e científica.O foco principal é na cultura popular, para isso, a escola libertária

será dotada de uma biblioteca específica, de uma tipografia e de um serviço de edição

que publica manuais e obras pedagógicas.Ferrer ambiciona que a Escola Libertária seja

um instrumento de emancipação e propagação de ideias libertárias;segundo Ferrer, a

escola tradicional adestra as crianças, ela é um poderoso meio de subjugação nas mãos

dos dirigentes;que habitua as crianças a obedecer e a pensar segundo seus dogmas

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sociais. Para Ferrer,o ensino deve funcionar como um instrumento de mudança, de

emancipação.

O princípio fundamental da Escola Moderna é a liberdade das crianças, ela busca a

liberdade individual, o movimento natural, ela desenvolve o espírito crítico das

crianças; ela analisa as características da personalidade infantil. Conforme Ferrer:

“Prefiro a espontaneidade livre de uma criança que não sabe nada, à instrução de

palavras e a deformação intelectual de uma criança que sofreu a educação

atual”.(FERRER,1912).

Kant tinha uma ideia diferente de liberdade, para o autor só se pode chegar a ela

através da disciplina;para Kant: “a disciplina submete o homem às leis da humanidade e

começa a fazê-lo sentir a força das próprias leis”(KANT,1996,p13).Liberdade para Kant

deve ser controlada desde a infância,pois o homem que se acostuma a seguir a sua

liberdade durante a sua juventude será sempre um “selvagem”.

Os métodos de ensino da educação libertária de Francisco Ferrer eram totalmente

contrários ao contexto escolar elitista da época, buscavam a superação do conhecimento

imposto pelo Estado e pela Igreja, por esse motivo foi perseguido pelo poder

hegemônico. Em 1909 foi detido na Catalunha, julgado a portas fechadas por um

conselho de guerra, condenado a morte e executado. A Escola Moderna tinha como

princípio fundamental a liberdade da criança para que ela desenvolvesse um espírito

crítico; Ferrer (1912) dizia: ”prefiro a espontaneidade livre de uma criança que não sabe

nada, à instrução de palavras e a deformação intelectual de uma criança que sofreu a

educação atual”. O Estado e o poder hegemônico nunca tiveram interesse em que a

escola fosse formadora de pessoas críticas que iriam por em questão a sociedade em que

estavam inseridas; por esse motivo, a educação libertária e qualquer outra forma de

educação que não vise formar mão de obra para o mercado de trabalho sempre será

perseguida e exterminada. Se hoje a escola forma mão de obra para o mercado de

trabalho é porque o idealismo de Kant impregnou o entendimento moderno do que deve

ser uma verdadeira teoria da educação: uma escola que ensina a criança a obedecer,

respeitar as leis, ainda que não lhe agradem.

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REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

KANT, Immanuel, (1996). Sobre a pedagogia. Piracicaba: UNIMEP. Tradução de

Francisco Cock Fontanella.

FERRER Y GUARDIA, F. La Escuela Moderna, Barcelona: Ed.Solidaridad, 1912.

Revista HISTEDBR On-line, Campinas, n.25, p. 67–74, mar. 2007 - ISSN: 1676-2584.