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KATHIA ALMEIDA SOARES SÍDROME DILATAÇÃO VÓLVULO GÁSTRICA SÃO PAULO 2009

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KATHIA ALMEIDA SOARES

SÍDROME DILATAÇÃO VÓLVULO GÁSTRICA

SÃO PAULO

2009

FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS

KATHIA ALMEIDA SOARES

SÍDROME DILATAÇÃO VÓLVULO GÁSTRICA

SÃO PAULO

2009

Trabalho apresentado à disciplina de

Técnica Cirúrgica, do curso de Medicina

Veterinária/FMU, sob orientação da

Professora Aline Machado De Zoppa.

II

KATHIA ALMEIDA SOARES

SÍDROME DILATAÇÃO VÓLVULO GÁSTRICA

Profa. Aline Machado De Zoppa

FMU – Orientadora

Profa. Ana Claudia Balda

FMU

Profa. Thaís Fernanda Machado

FMU

Trabalho apresentado à disciplina Técnica Cirúrgica, do curso de Medicina Veterinária da FMU, sob orientação da Prof. Aline Machado De Zoppa. Defendido e aprovado em de de , pela banca examinadora constituída pelos médicos veterinários:

III

Dedico este trabalho aos meus pais, Maria Almeida Soares e Celestino Soares, pelo

apoio e incentivo dedicados a mim todos esses anos, abnegando muitas vezes seus próprios

interesses para que os meus fossem priorizados. Embora singela esta é uma forma de

agradecer não apenas o fato de terem me proporcionado a oportunidade de iniciar e concluir

uma faculdade, mas também pelo fato de estarem sempre ao meu lado me ajudando a ser um

ser humano melhor. Ao final dessa primeira etapa de tantas outras que virão, sei que a vitória

não é apenas minha e sim da minha família a qual ainda quero orgulhar muito, mostrando que

cada momento valeu à pena.

IV

Agradeço primeiramente a Deus por ser uma pessoa privilegiada e ter tido

oportunidade na vida, situação que muitos atualmente buscam, mas infelizmente nem sempre

encontram.

Não são muitas as pessoas as quais quero agradecer, mas essas poucas contribuíram de

forma muito importante na minha vida durante esses cinco anos de faculdade.

Agradeço a Professora Aline Machado de Zoppa pela enorme consideração não apenas

por mim, mas por todos os seus alunos, dedicando seu tempo a ensinar com competência,

paciência e amor, mostrando-nos que um profissional não deve ser apenas constituído de

conhecimento, mas também amor pelo que faz, para que assim possa ser humano em todas as

situações nas quais se encontrar. Agradecer ainda a confiança em mim depositada, fazendo

com que hoje eu seja uma pessoa muito mais preparada para lidar com as adversidades da

profissão. Obrigada por tudo e tenha certeza que além da minha admiração e do meu respeito,

você tem minha amizade.

Agradeço a Dra. Daniela, médica veterinária responsável pelo setor de cirurgia de

pequenos animais do Hospital Veterinário da FMU, pelo auxílio dado durante os anos de

estágio que lá realizei, mostrando sempre muita competência em todos os procedimentos que

acompanhei. Obrigada por ter tido a paciência de esclarecer minhas dúvidas e por ter me

ajudado em tantos outros momentos durante todo esse tempo. Tenho muita admiração, não

apenas pela profissional que você é, mas também pela pessoa autêntica que conheci. Não

apenas agradeço, mas desejo a você muito sucesso na vida profissional e pessoal.

Agradeço à minha irmã Patrícia Almeida Soares, uma das pessoas mais importantes da

minha vida e sem a qual eu jamais conseguiria viver. Obrigada por todos os momentos que

esteve ao meu lado, mostrando através de uma série de atitudes que amor incondicional não

existe apenas na relação entre pais e filhos, mas também entre irmãos.

Por fim, agradeço ao meu amigo Bruno de Souza Torlai, por estar ao meu lado durante

esses cinco anos, alegrando minhas manhãs e tardes na faculdade. Cada momento foi

importante a sua maneira, por isso agradeço as horas divertidas, os momentos de bronca, de

preocupação, as palavras de conforto, as horas que passamos fazendo trabalho, os estágios,

dentre tantos outros que eu sei que existem. Não importa como, quando ou onde nossa

amizade nasceu, o fato é que dura até hoje e se depender de mim comemorará muitos

aniversários mais.

V

“A grandeza de uma nação pode ser julgada pelo modo que seus animais são tratados.”

Mahatma Gandhi

VI

RESUMO

Kathia Almeida Soares/ Síndrome Dilatação Vólvulo Gástrica/ 48 páginas/ 2009

A Síndrome Dilatação Vólvulo Gástrica é caracterizada pelo aumento do tamanho do

estômago associado à rotação em seu eixo mesentérico, resultando em anormalidades quanto à

remoção de ar e conteúdo líquido, uma vez que os portais esofágico e pilórico ficam

obstruídos. Trata-se de uma enfermidade aguda que afeta principalmente cães de raça grande

e gigante, estando sua etiologia associada a características anatômicas e alimentares, embora

tal assunto não esteja completamente elucidado. O seu diagnóstico está baseado nas

manifestações clínicas e na avaliação radiográfica, e é extremamente importante para dar

início ao tratamento emergencial que consiste em fluidoterapia intravenosa para reposição de

líquido e eletrólitos e descompressão gástrica. Uma vez o animal estável para o procedimento

anestésico e cirúrgico, deve ser realizada a laparotomia para desfazer o vólvulo, avaliar a

viabilidade dos outros órgãos abdominais e realizar a gastropexia como método preventivo.

As técnicas de gastropexia incluem a gastropexia com sonda, a gastropexia circuncostal, a

gastropexia com flape muscular (incisional) e a gastropexia de alça de cinto.

Palavras-chave: Síndrome dilatação vólvulo gástrica. Gastropexia. Cão.

VII

ABSTRACT

The gastric dilatation-volvulus syndrome is characterized by an increase in the

stomach size, associated to the rotation in your mesenteric axis, resulting in air-liquid

clearance abnormalities, once that the esophageal and pyloric gateways are obstructed. It is an

acute disorder that affects specially large and giant breeds, having its etiology associated with

anatomic and feed characteristics, although that is not an elucidated subject. The diagnose is

based on the clinic signs and radiographic exams, being extremely important an emergency

treatment that consists in intravenous fluid for liquid and electrolytic reposition, besides

gastric decompression. Once the patient is stabled for the anesthetic and surgical procedure, it

must be done laparotomy to the volvulus resolution, estimate the another abdominal organs

viability and realize the gastropexy as a preventive method. The gastropexy techniques

includes lead-line, circuncostal, incisional and belt-loop gastropexy.

Keyword: gastric dilatation-volvulus syndrome, gastropexy, dog.

VIII

LISTA DE FIGURAS

Fig. 1: Direção da rotação gástrica na maior parte dos cães. 16

Fig.2: Radiografia abdominal - Projeção laterolateral. 20

Fig. 3: Radiografia abdominal – Projeção ventrodorsal. 20

Fig. 4: Anatomia Gástrica. 26

Fig. 5: Gastrostomia Temporária. 29

Fig. 6: Gastrectomia Parcial. Remoção da curvatura maior do estômago. 31

Fig. 7: Gastropexia com Sonda. 33

Fig. 8: Sutura de uma gastropexia com sonda. 34

Fig.9: Gastropexia Circuncostal 35

Fig. 10: Técnica de retalho. 36

Fig. 11: Gastropexia Incisional. 37

Fig.12: Gastropexia de Alça de Cinto. 38

IX

SUMÁRIO

1. Introdução 11

2. Revisão Bibliográfica 13

2.1 Epidemiologia e Etiologia 13

2.2 Fisiopatologia 15

2.3 Diagnóstico 18

2.3.1 Anamnese 18

2.3.2 Exame Físico 18

2.3.3 Exame Radiográfico 19

2.3.4 Exames Laboratoriais 20

2.3.5 Diagnóstico Diferencial 21

2.4 Tratamento Clínico 21

2.4.1 Fluidoterapia 22

2.4.2 Descompressão Gástrica 22

2.4.3 Descompressão percutânea 23

2.4.4 Tubo Orogástrico 23

2.4.5 Tratamento Adjuvante 24

2.5 Anestesia 24

2.6 Tratamento Cirúrgico 25

2.6.1 Posicionamento 26

2.6.2 Anatomia Gástrica 26

2.6.3 Anatomia Cirúrgica 27

2.6.4 Técnica Cirúrgica 27

2.6.4.1 Gastrostomia Temporária 28

2.6.4.2 Gastrectomia Parcial e Invaginação do Tecido Gástrico 30

2.6.4.3 Gastropexia 31

2.6.4.3.1 Gastropexia com Sonda 32

2.6.4.3.2 Gastropexia Circuncostal 34

2.6.4.3.3 Gastropexia Incisional 36

2.6.4.3.4 Gastropexia em Alça de Cinto 37

2.6.5 Cicatrização Gástrica 39

2.6.6 Materiais de Sutura e Instrumentos 39

2.7 Cuidados Pós-Operatórios 39

X

2.8 Complicações Pós-Operatórias 40

2.9 Prognóstico 42

3.0 Prevenção 42

4. Discussão 44

5. Conclusão 46

6. Referências Bibliográficas 47

11

1. INTRODUÇÃO

O aumento do tamanho do estômago associado com a rotação em seu eixo mesentérico

é uma forma de atuação imperfeita da função digestória denominada síndrome dilatação

vólvulo gástrica, também conhecida como torção gástrica, timpanismo ou empazinamento.

Nessa enfermidade, os meios fisiológicos normais de remoção de ar e conteúdo líquido como

eructação, vômito e esvaziamento pilórico ficam alterados, pois os portais esofágico e pilórico

estão obstruídos (FOSSUM, 2005).

Embora existam muitas teorias com relação à etiologia da dilatação vólvulo gástrica,

nenhuma é totalmente aceita ou definitiva (SILVA, 2006). A origem mais provável do

acúmulo de ar é a aerofagia, enquanto que o componente líquido surge da combinação de

secreções gástricas, ingesta e aporte de líquidos secundariamente ao aumento da pressão

hidrostática em decorrência da obstrução venosa e do aumento da permeabilidade da mucosa

(LANTZ, 1996). Dentro das possíveis causas consideram-se principalmente as características

anatômicas, como tórax profundo encontrado em cães de raça grande e alongamento crônico

dos ligamentos hepatogástrico e hepatoduodenal, visto em animais mais idosos e que ingerem

grandes quantidades de alimento de uma única vez; e características da dieta, envolvendo tipo,

quantidade, freqüência, comportamento alimentar, bem como exercício e estresse após as

refeições (SULLIVAN, et al., 1998, MONNET, 2003).

O diagnóstico da síndrome dilatação vólvulo gástrica baseia-se principalmente nas

manifestações clínicas, como timpanismo, aumento de volume abdominal, esplenomegalia,

manifestações compatíveis com choque hipovolêmico, hipersalivação, esforço de vômito

improdutivo, dor abdominal, dorso arqueado e inquietação; e na avaliação radiográfica.

Isoladamente, as manifestações clínicas não diferenciam entre a dilatação simples e o vólvulo

gástrico acompanhado de dilatação. A capacidade de passar um tubo não é critério confiável

para a diferenciação entre dilatação simples e o vólvulo, uma vez que a passagem do mesmo

pode ser fácil se a torção for inferior a 180° (MATTHIESEN, 1998; FOSSUM, 2005).

A síndrome dilatação vólvulo gástrica é uma enfermidade aguda, que requer

tratamento emergencial, o qual consiste na rápida reposição de grandes volumes de líquido, e

eletrólitos por meio da fluidoterapia intravenosa em veias de grosso calibre craniais ao

diafragma, descompressão gástrica e, após estabilizar o animal, é feita a laparotomia para

desfazer o vólvulo, avaliar a viabilidade das vísceras abdominais e realizar a gastropexia

(COSTA, et al., 1999).

12

As técnicas de gastropexia se destinam a aderir permanentemente o antro pilórico à

parede abdominal direita. Foram descritas muitas técnicas de gastropexia e, embora a força e

a extensão das aderências criadas por essas técnicas difiram, todas elas (quando realizadas

apropriadamente) evitam o movimento gástrico e, portanto, evitam a recidiva do quadro

(FOSSUM, 2005, MONNET, 2003).

13

2.1 Epidemiologia e Etiologia

Usualmente cães de raças grandes e gigantes de tórax profundo são mais acometidos

(dogues alemães, weimaraners, são-bernardos, pastores alemães, setters irlandeses e gordon,

dobermans), mas também foi descrita em gatos e cães de raças médias e pequenas (FOSSUM,

2005).

Em um estudo, cinco raças apresentaram risco alto de dilatação vólvulo gástrica, sendo

elas: dogue alemão, weimaraner, são bernardo, gordon setter, setter irlandês. Neste mesmo

estudo, basset hounds tiveram o oitavo risco mais alto de dilatação vólvulo gástrica, ficando

em primeiro lugar na categoria abaixo dos 23 quilos (GLICKMAN, 1994). Os shar peis

podem ter maior ocorrência em comparação com outras raças de porte médio (FOSSUM,

2005).

Em um estudo realizado em 1994, verificou-se que cães de raça pura apresentavam

chances maiores de desenvolver dilatação vólvulo gástrica, bem como os machos e os animais

sexualmente intactos (GLICKMAN, 1994)

A idade de cães afetados é variável, ficando entre as idades de dois a dez anos, sendo

mais prevalente em cães idosos (LIPPINCOTT, et al., 1992, MATTHIESEN, 1998).

A etiologia da dilatação vólvulo gástrica ainda não está completamente elucidada,

visto que os fatores desencadeantes parecem variar entre os pacientes. Muitas teorias foram

propostas, mas nenhuma é totalmente aceita ou definitiva (SILVA, et al., 2006).

A origem do acúmulo de ar não é completamente conhecida, embora a aerofagia seja a

origem mais provável. A análise do gás gástrico por ocasião da dilatação revela conteúdo

gasoso similar ao do ar atmosférico. O ar é normalmente deglutido durante a ingestão de

alimentos e água; a quantidade deglutida pode aumentar em animais excitados ou nervosos,

ou que comem com rapidez. Outras origens de gás são a fermentação bacteriana do conteúdo

gástrico de carboidratos, ou o resultado da reação do ácido gástrico com secreções contendo

bicarbonato. O componente líquido do conteúdo gástrico é a combinação de secreções

gástricas, ingesta e aporte de líquidos secundariamente ao aumento da pressão hidrostática em

decorrência da obstrução venosa e do aumento da permeabilidade da mucosa (LANTZ, 1996).

A dieta, quantidade de alimento ingerido, freqüência de alimentação, comportamento

alimentar (comer rapidamente), exercício e estresse após uma refeição, são fatores que

contribuem para o desenvolvimento da dilatação vólvulo gástrica (MONNET, 2003). Em

1997 um estudo avaliou cães alimentados com ração seca, de carne ou óssea, uma ou três

14

vezes ao dia. Um ano após a instituição da dieta, a concentração de ácido gástrico e a

motilidade gástrica ao longo de um período de duas horas não eram significativamente

diferentes entre os grupos; entretanto, a concentração de ácido gástrico era mais alta em

animais alimentados uma única vez ao dia, bem como os estômagos estavam

consideravelmente dilatados (HOSGOOD, 1994). Além disso, alimentações repetidas com

grandes quantidades de alimentos podem promover o alongamento crônico dos ligamentos

hepatogástrico e hepatoduodenal, favorecendo o vólvulo (SULLIVAN et al, 1998).

O deslocamento esplênico e a torção podem contribuir para dilatação vólvulo gástrica,

uma vez que aumenta a tensão do ligamento gastroesplênico e também pode aumentar a

tensão nos ligamentos hepatoduodenal e hepatogástrico, resultando em maior mobilidade do

estômago, predispondo ao vólvulo (MILLIS, 1995).

A disfunção ou exagero de qualquer um dos mecanismos anti-refluxo pode impedir a

eructação normal do gás gástrico. A prevalência da dilatação vólvulo gástrica em raças de

grande porte e tórax profundo sugere, na verdade, possível disfunção dos arranjos anatômicos

normais projetados para o impedimento do refluxo gastroesofagiano (LANTZ, 1996).

Em 1984 um estudo investigou o papel da gastrina na dilatação vólvulo gástrica, uma

vez que ela tem papel trófico na mucosa gástrica e pode então, causar atraso no esvaziamento

gástrico secundário à obstrução pilórica. Além disso, foi proposto que a gastrina pudesse

atrasar diretamente o esvaziamento gástrico, aumentando a pressão no esfíncter

gastroesofagiano, induzindo o espasmo, aumentando aerofagia e reduzindo a possibilidade de

emese. Autores revelaram aumento da concentração de gastrina no pós-operatório de

dilatação vólvulo gástrica, sendo que tal fator poderia ser atribuído ao fluxo renal reduzido, se

não fosse a comprovação deste aumento mesmo em animais hemodinamicamente

restabelecidos. Cinco anos depois, Hall após um estudo, concluiu que tanto a pressão

gastroesofágica quanto a concentração de gastrina não eram significativamente diferentes

quando comparadas entre animais clinicamente normais e pós-tratamento de dilatação vólvulo

gástrica. A administração intravenosa de pentagastrina exógena, um análogo sintético da

gastrina, causa aumento da pressão no esfíncter gastroesofágico em cães clinicamente

normais, porém, as concentrações plasmáticas não aumentam nesses cães em resposta ao

aumento de volume intragástrico. Assim, o papel da gastrina no desenvolvimento da dilatação

vólvulo gástrica tem sido questionado, e a hipótese de que a pressão no esfíncter

gastroesofágico aumentou secundariamente a hipergastrinemia é um fator contestado

(HOSGOOD, 1994).

15

O papel da disfunção miolétrica gástrica na dilatação vólvulo gástrica tem sido

investigado, mas permanece desconhecido. Um estudo realizado em 1992 avaliou a atividade

mioelétrica em cães após a indução experimental de dilatação vólvulo gástrica e gastrostomia

de tubo, percebendo que a dilatação vólvulo gástrica sozinha não produziu alterações

significantes (HOSGOOD, 1994).

Estudos recentes documentaram motilidade esofagiana anormal em quinze cães com

dilatação vólvulo gástrica. Nestes cães foi notada aerofagia, principalmente quando

peristaltismos primários não conseguiam transportar o bolo de alimento para o estômago

(HOSGOOD, 1994).

Os fatores hereditários fazem com que os animais sejam predispostos a dilatação

gástrica aguda. Algumas linhagens de família são conhecidas por terem maior prevalência da

doença que outras (ANDERSON, 1980).

Estudos recentes sugerem que o retardo no esvaziamento gástrico não é um problema

pré-existente em animais com dilatação vólvulo gástrica (LANTZ, 1996).

2.2 Fisiopatogenia

Comumente a síndrome da dilatação vólvulo gástrica é iniciada pelo acúmulo gástrico

de gás e/ou líquido, com certo grau de obstrução funcional ou mecânica do esvaziamento

gástrico. O mecanismo de obstrução do esvaziamento gástrico é desconhecido. A dilatação

progressiva do estômago pode permitir que a simples dilatação progrida para o vólvulo

gástrico (MATTHIESEN, 1998). Uma vez que o orifício gastroesofágico está fechado, não

pode haver vômito ou eructação. A torção é continuada acompanhando a curvatura maior do

estômago para o antro. O fundo e o antro pilórico ao se expandirem comprimem a região

piloroduodenal, bloqueando a saída de gás e líquido para o duodeno (LIPPINCOTT, et al.,

1992).

Ainda não está esclarecido se a dilatação precede o vólvulo ou vice-versa. A teoria

mais aceita é a de que a dilatação progressiva do estômago leve ao vólvulo. No entanto, o fato

de a gastropexia prevenir recidivas vai de encontro a esta hipótese, sugerindo que o vólvulo

seja o primeiro evento a ocorrer, portanto, muitos autores consideram ambas as hipóteses

possíveis (SILVA, et al., 2006).

Em casos de dilatação vólvulo gástrica, o estômago gira geralmente no sentido horário

quando visto a partir da perspectiva do cirurgião (com o cão em decúbito dorsal e o clínico de

16

pé ao lado do cão, olhando-o cranialmente). A rotação pode ser de 90° a 360°, mas

geralmente é de 220° a 270° (FOSSUM, 2005).

No vólvulo, o piloro e o duodeno migram ventrocranialmente. O piloro se movimenta

da direita para a esquerda, ficando dorsal ao lado esquerdo do corpo do estômago. O piloro

então é localizado dorsal ao esôfago e ao fundo do lado esquerdo da cavidade abdominal

(MONNET, 2003). O fundo desloca-se em direção ventral no sentido da parede abdominal,

passando sob o piloro até a posição ao longo da parede abdominal ventrolateral direita. O

deslocamento caudal da grande curvatura resulta no seu posicionamento ao longo da parede

abdominal esquerda e borda dorsal da cavidade abdominal com os vasos gastroepiplóicos e

grande omento praticamente paralelos à linha média ventral. Devido à fixação normal do

omento a grande curvatura, o folheto ventral do omento cobre a porção ventral do estômago

deslocado. Isto fica evidente por ocasião da abordagem da cavidade peritoneal por ocasião da

cirurgia (MATTHIESEN, 1998).

Fig. 1: Direção da rotação gástrica na maior parte dos cães.

Fonte: FOSSUM, 2005

Independentemente do grau e tipo de rotação, a dilatação vólvulo gástrica resulta em

uma série de ocorrências fisiopatológicas que podem levar à morte do paciente (SILVA, et al.,

2006).

O aumento da pressão no interior da cavidade abdominal gera compressão da veia

porta e da veia cava caudal, reduzindo o retorno venoso para o coração, o débito cardíaco e a

pressão arterial, evoluindo para o choque hipovolêmico (MONNET, 2003).

Experimentalmente, o débito cardíaco demonstrou diminuição de 50% com a dilatação

17

gástrica (ANDERSON, 1980). A compressão portal induz edema e congestão do sistema

gastrointestinal e uma redução do volume vascular. O aumento da pressão portal compromete

a microcirculação nas vísceras e reduz a oferta de oxigênio para o trato gastrointestinal. Os

órgãos abdominais sofrem ingurgitamento, aumento da viscosidade sanguínea e acidose local

(LIPPINCOTT, et al., 1992)

Vários fatores causais são responsáveis pela isquemia gástrica, inclusive a pressão

gástrica transmural elevada, obstrução da saída venosa gástrica, infarto da microvasculatura,

edema gástrico, débito cardíaco reduzido e avulsão ou infarto das artérias curta e epiplóica ao

longo da curvatura maior (LANTZ, 1996). A isquemia e a necrose do tecido acabam

ocorrendo em grandes áreas da parede gástrica, ao longo da curvatura maior, tornando as

mesmas necróticas (MONNET, 2003). Em casos avançados, necrose mural pode levar à

perfuração e uma peritonite generalizada (SULLIVAN et al, 1998).

O esgarçamento da mucosa gastrointestinal permite a translocação bacteriana e a

endotoxemia, evoluindo para o choque séptico/endotóxico (MONNET, 2003). A hipertensão

portal reduz a capacidade do sistema retículo endotelial hepático quanto à eliminação de

bactérias e endotoxinas, uma vez que o fígado recebe 85% de seu suprimento sanguíneo da

veia porta e na dilatação vólvulo gástrica, este é interrompido (LANTZ, 1996; LIPPINCOTT,

et al. 1992).

O alargamento do estômago acaba comprimindo o espaço torácico, gerando queda do

volume corrente e aumento da freqüência respiratória. A incapacidade de expandir a cavidade

torácica diminui severamente a expansão pulmonar e esta acaba tornando a respiração restrita,

dificultando a ventilação alveolar e conseqüentemente gerando índices anormais de perfusão e

lesões compatíveis com atelectasia congestiva (ANDERSON, 1980).

Sob condições de isquemia, o pâncreas produz o fator depressor do miocárdio. A

isquemia, acidose, liberação do fator depressor do miocárdio pelo pâncreas e a produção de

radicais livres de oxigênio induzem a isquemia do miocárdio, redução da contratilidade

cardíaca e indução de arritmias que comprometem ainda mais a função cardíaca (MONNET,

2003).

Alongamento do ligamento gastroesplênico também pode ocorrer no vólvulo fazendo

com que o baço siga a curvatura maior enquanto se move para a direita e dorsalmente. Isso

pode levar ao comprometimento vascular do baço, que se torna congesto com o alongamento

dos vasos esplênicos. Ocasionalmente, infarto, avulsão dos vasos esplênicos ou torção

esplênica prolongada levarão a isquemia esplênica (SULLIVAN et al, 1998).

18

Injúria por reperfusão ocorre quando os tecidos isquêmicos sofrem a reperfusão com

sangue oxigenado. O oxigênio nos tecidos reage com alguns produtos celulares da isquemia

para produzir radicais livres de oxigênio. Estes são responsáveis pela peroxidação lipídica na

membrana celular, tornando as células mais permeáveis e vulneráveis a fatores osmóticos

(SULLIVAN et al, 1998; HOSGOOD, 1994). Outros fatores que complicam a dilatação

vólvulo gástrica incluem insuficiência renal aguda após hipotensão e coagulação intravascular

disseminada na seqüência de toxemia e alterações circulatórias. (SULLIVAN et al, 1998).

2.3 Diagnóstico

O diagnóstico da síndrome dilatação vólvulo gástrica baseia-se nas manifestações

clínicas e na avaliação radiográfica. Isoladamente, as manifestações clínicas não diferenciam

entre a dilatação simples e o vólvulo gástrico acompanhado de dilatação. A capacidade de

passar um tubo não é critério confiável para a diferenciação entre dilatação simples e o

vólvulo, uma vez que a passagem do mesmo pode ser fácil se a torção for inferior a 180°

(MATTHIESEN, 1998).

2.3.1 Anamnese

Um cão com dilatação vólvulo gástrica pode apresentar histórico de abdômen

timpânico e distensão progressiva, ou o proprietário pode simplesmente encontrar o animal

em decúbito e deprimido, com abdômen distendido. O cão pode aparentar dor e apresentar

dorso arqueado. São comuns esforço de vômito improdutivo, hipersalivação e inquietação

(FOSSUM, 2005). Além disso, é comum o proprietário relatar exercícios ou excitamento após

a ingestão de grandes volumes de alimento e água (ANDERSON, 1980).

2.3.2 Exame Físico

A distensão cranial do abdômen é mais comumente notada pela observação do

paciente. Esta distensão pode projetar-se para a esquerda, direita ou ambos os lados,

dependendo do grau da dilatação e do deslocamento dos órgãos abdominais. A percussão da

parte cranial do abdômen pode revelar um som timpânico, se o estômago tem um predomínio

de ar, ou pode ser maciço, indicando grandes volumes de líquidos ou alimentos

(ANDERSON, 1980).

19

A palpação abdominal geralmente é desconfortável para o animal, mas é válida por

revelar graus variáveis de timpanismo e aumento de tamanho abdominal; no entanto, pode ser

difícil sentir a distensão gástrica em cães de raças grandes musculosos ou muito obesos. Às

vezes, palpa-se esplenomegalia (FOSSUM, 2005; MONNET, 2003).

A dilatação vólvulo gástrica induz diferentes graus de choque, refletindo em diversas

manifestações clínicas que devem ser reconhecidas durante a avaliação do paciente. As

primeiras manifestações são semelhantes ao choque hipovolêmico, uma vez que a maior parte

do volume sanguíneo está restrita na veia cava caudal e na veia portal. Logo, os animais

apresentam taquicardia e taquipnéia, com um pulso femoral normal, tempo de preenchimento

capilar lento, mucosas pálidas e extremidades frias. Com a progressão da síndrome, os

pacientes entram em choque endotoxêmico com taquicardia, taquipnéia, pulso femoral fraco,

palidez de mucosa, tempo de preenchimento capilar lento e febre. Finalmente os pacientes

descompensam com hipotensão grave, bradicardia, hipotermia, mucosas brancas e

extremidades frias (MONNET, 2003).

2.3.3 Exame Radiográfico

A radiografia geralmente é realizada após iniciado o tratamento suporte e a

descompressão, sendo que ajuda a distinguir a dilatação simples do vólvulo (HALL et al.,

2005). Prefere-se vistas radiográficas dorsoventrais e laterais direitas, embora a primeira deva

ser evitada, diminuindo assim a manipulação do paciente. Em cães normais, o piloro se

localiza ventralmente ao fundo, na vista lateral, e no lado direito do abdômen, na vista

dorsoventral. Na vista lateral direita de um cão com dilatação vólvulo gástrica, o piloro se

situa cranialmente ao corpo gástrico e fica separado do resto do estômago por tecido mole

(sinal de C reverso), além disso, observa-se o estômago compartimentalizado. Na vista

dorsoventral, o piloro aparece como uma estrutura preenchida por gás, à esquerda da linha

média (FOSSUM, 2005).

Perda de contraste abdominal pode indicar peritonite e hemorragia por avulsão dos

vasos esplênicos. Aumento de contraste pode considerar pneumoperitônio e ruptura gástrica

(HALL et al., 2005).

20

Fig.2: Radiografia abdominal - Projeção laterolateral

Fonte: MONNET, 2003

A. Aumento do volume gástrico por acúmulo de gás. B. Piloro. Observa-se o sinal de C

reverso causado pela projeção de tecido mole.

Fig 3: Radiografia abdominal – Projeção ventrodorsal

Fonte: FOSSUM, 2005

.

2.3.4 Exames Laboratoriais

As alterações hematológicas não são muito freqüentes na dilatação vólvulo gástrica,

diferentemente do desequilíbrio ácido-básico e distúrbios eletrolíticos (HALL et al., 2005).

21

A contagem sanguínea completa raramente é útil, a menos que uma coagulação

intravascular disseminada (CID) cause trombocitopenia (FOSSUM, 2005). Na CID, além da

diminuição do total de plaquetas ocorrem outras alterações como, tempo de protrombina

prolongado (PT), tempo de tromboplastina prolongado (PTT) e a presença de produtos de

degradação da fibrina (FDP) (ANDERSON, 1980).

Acidose metabólica e hipocalemia são as anormalidades mais comuns, sendo que a

primeira ocorre provavelmente devido à hipoperfusão tecidual, metabolismo anaeróbico e

acúmulo de ácido láctico e a segunda é resultante da conjugação de potássio no estômago

dilatado (HALL et al., 2005, SULLIVAN et al., 1998). O aumento do lactato tem sido

relacionado à necrose gástrica (MONNET, 2003). No entanto, a alcalose metabólica causada

por seqüestro de íons hidrogênio no lúmen gástrico pode sobrepor-se à acidose metabólica,

fazendo com que o pH permaneça normal, ou seja, um distúrbio ácido básico misto. A acidose

respiratória pode se causada por hipoventilação secundária à invasão gástrica sobre o

diafragma e a diminuição na complacência ventilatória (FOSSUM, 2005).

Além disso, a hipotensão arterial sistêmica predispõe ao acumulo de uréia, creatinina e

fósforo, sendo que os dois primeiros caracterizam a azotemia pré-renal (ANDERSON, 1980).

2.3.5 Diagnóstico Diferencial

A dilatação gástrica simples ocorre comumente em cães jovens por causa da

superingestão e raramente requer tratamento específico. O estômago, embora com o tamanho

bastante acentuado por ingesta e gás, não fica mal posicionado. O vólvulo de intestino

delgado é um diagnóstico diferencial, pois resulta em abdômen timpânico e com tamanho

aumentado; no entanto, a dilatação do trato intestinal fica aparente em radiografias. A torção

esplênica primária causa dor abdominal aguda; no entanto, se houver distensão gástrica, essa

geralmente será leve. Uma herniação diafragmática poderá produzir sinais semelhantes aos de

uma dilatação vólvulo gástrica, particularmente se o estômago ficar herniado e o escoamento

ficar obstruído (FOSSUM, 2005).

2.4 Tratamento Clínico

O sucesso de muitos casos de dilatação vólvulo gástrica depende muitas vezes do

manejo rápido e adequado de emergência no pré-operatório, que tem como objetivo principal

o tratamento simultâneo do choque e a descompressão gástrica (WHITNEY, 1989). O

22

tratamento clínico é realizado para estabilizar o paciente e torná-lo um candidato melhor para

a cirurgia, não devendo ser adiado por meio de testes de diagnóstico. O momento ideal para a

intervenção cirúrgica é baseado na estabalização do paciente (MONNET, 2003).

2.4.1 Fluidoterapia

Cateteres de grande calibre são colocados nas veias jugulares ou veias cefálicas para

fluidoterapia agressiva usando cristalóides. Ringer Simples (60-90 ml/kg/h) é o fluído de

escolha juntamente com Cloreto de Sódio 0.9% (20 ml/kg/h) (HALL, et al., 2005).

Inicialmente, deve ser evitada a cateterização da veia safena, devido ao reduzido retorno

venoso conseqüente ao estômago dilatado (MATTHIESEN, 1998). Uma combinação de

colóides, como Voluven® (10-20 ml/kg/IV) ou solução salina hipertônica 7,5% com dextran

70® (5 ml/kg/15 minutos), combinada com cristalóide na dose de 10-40 ml/kg pode ser

usada. Os colóides prolongam o efeito dos cristalóides, aumentando a pressão oncótica

(MONNET, 2003). Potássio e bicarbonato devem ser administrados com base em gasometria

(HALL, et al., 2005).

A resposta à fluidoterapia é baseada no exame físico (freqüência cardíaca, caráter do

pulso, coloração das mucosas, tempo de preenchimento capilar) e com a mensuração da

pressão venosa central, pressão sanguínea arterial, hematócrito e proteína total

(MATTHIESEN, 1998).

Se a resposta à fluidoterapia não é suficiente, inotrópicos, como a dopamina (2-4

mcg/kg/minuto/IV) ou dobutamina (2-6 mcg/kg/minuto/IV) são utilizados normalmente para

melhorar a contratilidade e débito cardíaco, desde que o paciente possa ser monitorado

eletrocardiograficamente, uma vez que ambas são arritmogênicas (SULLIVAN, et al.,1998,

MONNET, 2003).

2.4.2 Descompressão Gástrica

Descompressão do estômago com qualquer tubo estomacal ou trocater é fundamental

no tratamento da dilatação vólvulo gástrica, uma vez que melhora o retorno venoso,

ventilação e perfusão da parede do estômago, devendo ser instituída tão logo o acesso venoso

seja garantido (MONNET, 2003).

23

2.4.3 Descompressão Percutânea

A área caudal ao arco costal esquerdo deve ser preparada assepticamente e o baço

deve ser palpado para evitar que ele esteja na área de trocaterização. Inserir duas ou três

agulhas de grande calibre mantendo firmemente no local com pressão. Um gás com um odor

característico vem através da agulha. (WHITNEY, 1989, MONNET, 2003).

2.4.4 Tubo orogástrico

Fatores como a cooperação do paciente, a quantidade de distensão gástrica e o grau de

vólvulo gástrico freqüentemente determinam a facilidade e exeqüibilidade da introdução do

tubo. A impossibilidade da introdução do tubo orogástrico não é diagnóstica de vólvulo, e

nem a efetiva introdução do tubo descarta a possibilidade de ocorrência de vólvulo

(MATTHIESEN, 1998).

Apesar da passagem da sonda orogástrica sem sedação, a mesma é freqüentemente

necessária, uma vez que os pacientes na maioria das vezes estão ansiosos e não cooperam

para permitir a adequada descompressão e lavagem; e o desconforto respiratório pode ser

agravado por uma contenção estressante. Agentes hipotensores como acepromazina e

barbitúricos são contra indicados por causa dos efeitos hipotensivos, arritmogênicos e

depressão respiratória. A associação entre diazepan e fentanil (0.3 mg/kg e 0.01 mg/kg,

respectivamente) é a ideal para perda de reflexo de deglutição. Além disso, o diazepan

intravenoso pode ser usado em combinação com cetamina (5.5 mg/kg) ou cloridrato de

oximorfona (0.05 - 0.10 mg/kg, 3mg no máximo). (WHITNEY, 1989).

A sonda orogástrica deve ser um tubo flexível de grande diâmetro, constituída de

material duro, apresentando a extremidade proximal afilada e com fenestrações. Um rolo de

fita branca é colocado na boca como uma mordaça para evitar que o cão mastigue o tubo

enquanto ele é introduzido. O tubo é medido da ponta do nariz até o apêndice xifóide para dar

uma idéia de quando a extremidade distal do tubo se aproxima do esfíncter inferior do

esôfago, evitando a perfuração gástrica iatrogênica. Quando a extremidade proximal do tubo

se encontra no esôfago distal, recomenda-se virar a ponta do tubo ventralmente para ajudar a

introduzir o tubo no estômago. Se for difícil passar o tubo no estômago podemos ajudar

elevando o cão com a mão na frente. As patas dianteiras do cão são colocadas na mesa de

exame, e as patas traseiras são deixadas no chão. Esta posição reduz a quantidade de pressão

do estômago no diafragma (SULLIVAN, et al., 1998; MONNET, 2003).

24

Após o tubo atingir o estômago, é importante recolher o efluente em um balde para a

avaliação. Líquido hemorrágico ou a presença de fragmentos de mucosa de coloração

enegrecida é um sinal de isquemia avançada com probabilidade de necrose da mucosa do

corpo do estômago, justificando intervenção cirúrgica imediata. O estômago é então lavado

com água morna (5-10 ml/kg) injetados com uma bomba. O estômago é drenado de novo, e a

lavagem é repetida duas a três vezes. Se nenhum líquido é recuperado, deve-se suspeitar de

uma perfuração gástrica. Se a descompressão foi bem sucedida, o tubo é removido e o animal

pode ser encaminhado para a cirurgia. Alguns pacientes podem precisar manter um tubo no

estômago até a cirurgia, porque o mesmo dilata-se rapidamente após a remoção do tubo

(MONNET, 2003).

2.4.5 Tratamento Adjuvante

Devido ao risco de sepse por dano da mucosa e necrose mural, os antibióticos são

indicados. Preparação intravenosa de ampicilina, amoxicilina com ácido clavulânico,

cefalexina ou trimetropina sulfonamida são preferenciais e podem ser combinadas com

metronidazol (SULLIVAN, et al., 1998).

Os corticóides promovem a estabilização de membrana vascular, reduzindo os efeitos

do choque hipovolêmico, sendo a hidrocortisona o corticóide de eleição, devendo ser

utilizadas em dose baixa (SULLIVAN, et al., 1998).

Alguns estudos demonstraram redução nas lesões teciduais e também na taxa de

mortalidade de grupos tratados previamente com antioxidantes em cães com dilatação vólvulo

gástrica. O mesilato de deferoxamina deve ser aplicado IV na dose de 10mg/kg (COSTA, et

al., 1999).

Em caso de distrição respiratória, deve-se ministrar oxigenioterapia, por insuflação

nasal ou mascara (FOSSUM, 2005).

Flunixin meglumine (2,2 mg/kg/IV) tem sido utilizado para evitar o efeito deletério de

endotoxinas sobre a função cardíaca, atuando na redução de prostaciclinas (MONNET, 2003).

2.5 Anestesia para Dilatação Vólvulo Gástrica

Além do tratamento clínico que tem como objetivo estabilização do animal, mediante

fluidoterapia de choque e descompressão gástrica, deve-se ter atenção para a possível

presença de arritmias cardíacas que devem ser tratadas antes da indução anestésica

25

(FANTONI, et al., 2002). A ocorrência de arritmias cardíacas no início do quadro pode ser tão

baixa quanto 10%, mas aumenta à medida que a doença progride, chegando até 40%-50% dos

casos. A maioria das arritmias cardíacas é de origem ventricular, principalmente os

complexos ventriculares prematuros (WHITNEY, 1989). Deve-se monitorar as mesmas com

eletrocardiograma e realizar tratamento antiarrítmico com lidocaína (2-4 mg/kg/IV em bolus,

infusão contínua de 25-75 mcg/kg/minuto ou 6 mg/kg/IM a cada uma hora e meia),

procainamida (8-20mg/kg/IM/IV ou infusão contínua de 25-50mcg/kg/minuto) ou sulfato de

quinidina (5-10mg/kg/IV, a cada 6 horas), além de corrigir possíveis desequilíbrios

eletrolíticos e ácido-básicos (SULLIVAN et al., 1998, PAPICH, 2009).

Inúmeros protocolos são descritos para cães com dilatação vólvulo gástrica.

Inicialmente, antes da indução da anestesia, deve-se proceder a oxigenioterapia via máscara

facial. Se o estômago do animal já estiver sido descomprimido, e ele estiver estável

hemodinamicamente e não houver arritmias, ele pode ser pré-tratado com analgésico, como

morfina, tramadol ou butorfanol, associado ou não a acepromazina (metade da dose) e

induzido com etomidato e fentanil, propofol, cetamina e midazolam ou cetamina e diazepam.

O etomidato é a melhor escolha, caso o animal não esteja ainda estável, pois é capaz de

manter a estabilidade hemodinâmica e o ritmo cardíaco. Deve-se evitar a administração de

agentes arritmogênicos, como barbitúricos e halotano, sendo, portanto, o isofluorano e o

sevofluorano os agentes inalatórios de escolha, por serem menos arritmogênicos. A xilazina

também deve ser evitada, pois causa diminuição da pressão do esfíncter gastroesofágico,

facilitando o refluxo gástrico, além de diminuir a motilidade intestinal, podendo prolongar a

recuperação da função normal após a correção cirúrgica (FANTONI et al., 2002).

2.6 Tratamento Cirúrgico

A correção cirúrgica da dilatação vólvulo gástrica é feita logo que o paciente está

estável o suficiente para submeter-se a anestesia. Atrasar a cirurgia só aumenta o risco de

perfuração do estômago, uma vez que este vai ficando mais isquêmico. Os objetivos da

cirurgia são: descomprimir, quando não tal não foi efetivo no pré-operatório e reposicionar o

estômago, avaliando a viabilidade do mesmo e do baço, realizar gastrectomia parcial ou uma

esplenectomia se necessário, e gastropexia para evitar a recorrência (MONNET, 2003,

FOSSUM, 2005).

26

2.6.1 Posicionamento

O cão deve ser posicionado em decúbito dorsal, e o abdome deve ser preparado para

uma incisão na linha media. A área preparada deve-se estender do meio-tórax ao púbis. Caso

se tenha de realizar uma gastropexia com sonda, a área preparada deverá ser estendida cranial

e dorsalmente para permitir que a sonda seja exteriorizada atrás da costela direita caudal

(FOSSUM, 2005).

2.6.2 Anatomia Gástrica

O estômago pode ser dividido em quatro regiões: cárdia, fundo, corpo e piloro. O

estômago está situado em um plano transversal, sendo que sua maior parte (fundo) está

localizada á esquerda da linha média. A entrada esofágica e a saída duodenal são dorsais,

sendo que a primeira situa-se a esquerda da linha média e a segunda à direita. As artérias

gástrica e gastroepiplóica irrigam as curvaturas menor e maior, respectivamente. As veias

drenam o lado esquerdo do estômago através da veia gastroesplênica e o lado direito através

da veia gastroduodenal, sendo que ambas desembocam na veia porta. O omento maior

estende-se caudalmente da curvatura maior à bexiga, formando uma cobertura de duas

camadas do intestino delgado. Uma porção esplênica do omento liga a curvatura maior do

baço e uma porção menor prende-se ao pâncreas. O omento menor estende-se da curvatura

menor do estômago e liga-se ao diafragma, ao fígado e ao duodeno. Os ligamentos

hepatoduodenal e hepatogástrico são ligações frouxas entre os componentes respectivos

(BRIGHT, 1998).

Fig 4. Anatomia Gástrica

Fonte: FOSSUM, 2005

27

2.6.3 Anatomia Cirúrgica

Na abordagem cirúrgica, piloro e duodeno estão deslocados ventrocranialmente, sendo

que o primeiro migra da direita para a esquerda ficando dorsal ao esôfago, ao fundo do lado

esquerdo da cavidade abdominal e ao lado esquerdo do corpo do estômago (MONNET,

2003). O fundo desloca-se em direção ventral no sentido da parede abdominal, passando sob o

piloro até a posição ao longo da parede abdominal ventrolateral direita. Devido à fixação

normal do omento a grande curvatura, o folheto ventral do omento cobre a porção ventral do

estômago deslocado (MATTHIESEN, 1998). Em cães com dilatação vólvulo gástrica é

comum a ruptura das artérias gástricas pequenas e isso pode contribuir para a perda sanguínea

e infarto ou necrose gástricos. Oitenta por cento do fluxo arterial correspondem à mucosa e o

restante corresponde às camadas muscular e serosa; portanto, a observação da coloração da

mucosa não e um indicador confiável da viabilidade da parede gástrica. (FOSSUM, 2005). O

alongamento do ligamento gastroesplênico pode ocorrer fazendo com que o baço siga a

curvatura maior, movendo-se para a direita e dorsalmente, havendo muitas vezes

comprometimento vascular do baço (SULLIVAN, et al., 1998).

2.6.4 Técnica Cirúrgica

Após acesso à cavidade abdominal de um cão com dilatação vólvulo gástrica deve ser

feita a descompressão do estômago antes do seu reposicionamento (FOSSUM, 2005). A

descompressão gástrica pré-operatória freqüentemente é incompleta, e o conteúdo

remanescente pode ser evacuado durante a cirurgia pela passagem de uma sonda gástrica ou

por meio do uso de uma agulha de calibre grande acoplada a um aspirador, sendo inserida

através de uma área da parede gástrica com aparência relativamente normal até o lúmen

(LANTZ, 1996). Outra alternativa de descompressão gástrica com remoção de conteúdo é a

gastrostomia temporária, porém esta deve ser evitada se possível (FOSSUM, 2005).

Na seqüência o cirurgião deve se encontrar do lado direito do animal para distorcer o

estômago. Com sua mão direita, ele segura o piloro situado ao longo da parede abdominal

esquerda e puxa ventralmente, ou seja, em direção à incisão e com sua mão esquerda, ele

empurra o corpo do estômago dorsalmente para a esquerda, ou seja, em direção à mesa. O

estômago precisa ser reposicionado até que ele esteja de volta em uma posição anatômica

28

normal. O esôfago distal e cárdia precisam ser palpados para se certificar que não estão

torcidos (FOSSUM, 2005, MONNET, 2003).

Após o reposicionamento do estômago, avalia-se a viabilidade da parede do mesmo

que é baseada na coloração, espessura, ondas peristálticas e sangramento após a incisão da

camada serosa. Geralmente a curvatura maior do estômago é mais severamente danificada

devido ao comprometimento vascular. Hemoperitônio resultante da avulsão de pequenos

ramos gástricos e epiplóicos, normalmente não levam à ressecção. As áreas hemorrágicas

vermelho-arroxeadas ou vermelho-escuras difusas indicam um comprometimento mais

severo, mas geralmente não exigem uma ressecção, uma vez que após o reposicionamento

gástrico a aparência da serosa pode melhorar entre cinco ou dez minutos, indicando que a

circulação intramural está intacta. As áreas negras ou negro-azuladas indicam oclusão venosa,

mas o tecido pode sobreviver uma vez que se alivie o comprometimento vascular pelo

reposicionamento gástrico. São feitas pequenas incisões serosas nessas áreas; o aparecimento

de sangue arterial indica uma provável sobrevivência, que é auxiliada pela circulação colateral

extensa da parede gástrica. Se não observar sangue arterial, estão presentes danos hipóxicos e

necrose tecidual severos, e o segmento é excisado. A coloração acinzentada ou esverdeada

indica danos vasculares e necrose tecidual severos, devem-se excisar tais áreas, Os segmentos

necróticos são finos quando palpados em comparação às áreas adjacentes. A ausência de

propagação de ondas peristálticas através de uma área do corpo do estômago é uma indicação

de redução de viabilidade (LANTZ, 1996, MONNET, 2003).

Por fim, a exploração abdominal é importante, devendo-se ter atenção especial para o

baço e a artéria esplênica. A congestão do baço é muito comum durante dilatação vólvulo

gástrica, mas, após o reposicionamento gástrico e a exploração abdominal, o mesmo deve

estar voltando para um tamanho próximo ao normal. Caso isso não ocorra ou haja trombose

da artéria esplênica, há necessidade de uma esplenectomia (MONNET, 2003).

2.6.4.1 Gastrostomia Temporária

A gastrostomia temporária é um método de remoção de todo o conteúdo gástrico,

utilizado quando a trocaterização com a agulha ou a passagem da sonda gástrica não

obtiverem sucesso, ou ainda quando a descompressão de um paciente moribundo for um risco

muito grande para a anestesia inicial e uma cirurgia (LANTZ, 1996).

A gastrostomia temporária é realizada sob sedação e anestesia local, onde a parede

abdominal e a pele são bloqueadas com lidocaína. É feita uma incisão paracostal no flanco

29

direito dois centímetros caudal a ultima costela. As camadas musculares são dissecadas ao

longo de suas fibras até a parede do estômago. O estômago é então retirado através da incisão

e sutura-se a parede abdominal com um padrão de sutura contínua para proporcionar uma boa

vedação. Este procedimento evita a contaminação da cavidade abdominal. O estômago é

então aberto, e as bordas do estômago são suturadas à incisão na pele (MONNET, 2003).

Alguns autores relatam desvantagens associadas ao uso da gastrostomia temporária,

como o tempo cirúrgico adicional necessário para fechar a incisão do estômago após a

cirurgia exploratória e a gastropexia; o antro do estômago é preferido para a maioria das

técnicas de gastropexia profilática, mas se esta área antral for usada para um procedimento

temporário, pode se romper, ser contaminada e pode não servir para o procedimento

permanente; a penetração no lúmen do estômago pode causar infecção, celulite no local da

gastrostomia e peritonite generalizada (WHITNEY, 1989).

Fig. 5: Gastrostomia Temporária

Fonte: FOSSUM, 2005

A. Bloqueio em L invertido ou infiltração direta sobre a incisão. B. Incisão em espessura completa da parede

corporal paracostal direita. C. Sutura do estômago à pele padrão contínuo simples. D. Incisão no estômago.

30

2.6.4.2 Gastrectomia Parcial e Invaginação do Tecido Gástrico

Após avaliar a viabilidade da parede gástrica através da coloração, espessura, ondas

peristálticas e sangramento após a incisão da camada serosa, o cirurgião pode encontrar áreas

necróticas, principalmente na curvatura maior do estômago, havendo necessidade da excisão

desses seguimentos (MONNET, 2003).

O estômago é afastado e isolado da cavidade abdominal com o uso de inúmeras

compressas de laparotomia umedecidas. Após determinar a área de ressecção, as bordas

sadias do estômago são afastadas com ajuda de suturas de sustentação ou pinças Babcock,

para que não ocorra o extravasamento do conteúdo gástrico e para ajudar na manipulação

gástrica durante a sutura da incisão. Na seqüência, os vasos que irrigam a área a ser ressecada

são ligados e a parede necrosada é excisada com um bisturi ou tesoura de Metzenbaum até o

nível da parede gástrica viável, detectada com base nos parâmetros clínicos e no sangramento

ativo das bordas da incisão. As partículas de líquido ou alimento sólido freqüentemente são

drenadas por sucção do lúmen gástrico, para que seja minimizada a possibilidade de

extravasamento desse material (MATTHIESEN, 1998). O estômago é fechado, com padrão

de sutura inversor de duas camadas, usando um fio de sutura absorvível (por exemplo,

polidioxanona ou poligliconato 2-0 ou 3-0). Na primeira camada, são incorporadas as

camadas submucosa, muscular e serosa em padrão contínuo de Cushing ou simples. Depois,

usa-se um padrão Cushing ou de Lembert para inverter a serosa e a camada muscular sobre a

primeira camada (FOSSUM, 2005).

Os métodos GIA-50 ou TA-90 podem ser utilizados na realização da gastrectomia

parcial. As vantagens destas técnicas são a redução do tempo operatório e a menor

possibilidade de extravasamento do conteúdo gástrico, porque a ressecção do tecido gástrico é

efetuada depois que os grampos foram aplicados (MATTHIESEN, 1998).

A técnica de invaginação gástrica é recomendável em cães com viabilidade gástrica

questionável, porque evita retardos e também evita o risco da contaminação abdominal

associada à técnica de ressecção (MATTHIESEN, 1998). Para invaginar o tecido necrosado,

use o padrão de sutura simples, seguido por padrão de sutura inversor. Coloque suturas no

tecido gástrico saudável em ambos os lados do tecido que deve ser invaginado, colocando o

tecido saudável sobre a parte superior do tecido necrosado. Certifique que as suturas estejam

colocadas em tecidos saudáveis para evitar deiscências (FOSSUM, 2005). Caso ocorra

necrose gástrica envolvendo a porção invertida, esta parte irá esfacelar no interior do lúmen

gástrico, sem risco de ocorrência de peritonite. Pode ocorrer melena no período pós-

31

operatório, com esfacelamento do tecido invaginado. Se o tecido invertido permanece viável e

não foi lesionado pela aplicação das suturas, poderá continuar funcionando normalmente. Há

necessidade de estudos clínicos mais extensos e prolongados, para que a técnica possa ser

avaliada adequadamente (MATTHIESEN, 1998).

Fig. 6: Gastrectomia Parcial. Remoção da curvatura maior do estômago.

Fonte: FOSSUM, 2005

Para remover a curvatura maior gástrica, ligam-se os ramos dos vasos gastroepiplóicos esquerdo e/ou dos vasos

gástricos pequenos, excisando na sequencia o tecido necrosado. O estômago é fechado com um padrão de sutura

inversor em duas camadas.

2.6.4.3 Gastropexia

As técnicas de gastropexia se destinam a aderir permanentemente o antro pilórico do

estômago à parede abdominal direita Foram descritas muitas técnicas de gastropexia e,

embora a força e a extensão das aderências criadas por essas técnicas difiram, todas elas

(quando realizadas apropriadamente) evitam o movimento gástrico (FOSSUM, 2005,

MONNET, 2003).

Em um estudo foi descrita uma técnica de gastropexia na qual a parede do estômago é

puxada para a parte cranial da incisão da laparotomia, sendo fixada à parede abdominal

através de uma sutura na linha Alba, havendo inclusão da musculatura do estômago sem

entrar no lúmen. Defensores da técnica relatam a simplicidade da mesma, a facilidade de ser

32

aprendida e sua rapidez, sendo tal fato importante por não prolongar a cirurgia e manter a

anestesia tão breve quanto possível (LINDENBERG, et al., 1993).

Nesse estudo, 88 cães foram tratados cirurgicamente, sendo que seis morreram durante

a cirurgia e outros três foram eutanasiados por lesões extensas em parede gástrica. Dos 79

sobreviventes, doze morreram em 2-8 dias após a cirurgia, sem retorno de dilatação vólvulo

gástrica, um cão morreu após um dia da operação por falha de fixação e outros três foram

eutanasiados a pedido dos proprietários, por não apresentarem melhora. Após uma semana os

63 cães restantes apresentaram boas condições gerais e receberam alta. Após 21 meses, os

proprietários foram contactados, sendo que apenas dois não estavam disponíveis. A situação

era que quatro cães haviam tido recaída, entre 2-6 meses após a cirurgia, sendo que dois

foram eutanasiados sem descompressão e os outros dois morreram dois dias após a

descompressão com sonda orogástrica; três cães morreram de outras doenças não relacionadas

à dilatação vólvulo gástrica, entre três, dez e vinte meses após a cirurgia e um animal foi

eutanasiado a pedido do dono por epilepsia. Restaram 53 cães, ou seja, 80.8% onde a recidiva

não foi observada. Necropsia, US, radiografia contrastada e uma laparotomia secundária por

piometra revelaram a perfeita aderência do estômago à parede abdominal.

Embora no estudo, a gastropexia não tenha interferido em laparotomias posteriores,

sabe-se que existe o risco de perfuração gástrica e a necessidade de uma incisão paracostal em

cães com hérnia diafragmática ou cirurgia hepática. Portanto, embora essa técnica seja

preferível a não realização de nenhuma outra técnica, ela não costuma ser recomendada. Os

cirurgiões devem se familiarizar com uma das técnicas descritas a seguir (LINDENBERG, et

al., 1993, FOSSUM, 2005).

2.6.4.3.1 Gastropexia com Sonda

A gastropexia com sonda (gastrostomia) é rápida e relativamente simples. Além disso,

ela permite descompressão gástrica pós-operatória e colocação de medicações diretamente no

estômago, em animais inapetentes. Para formar uma aderência permanente, deve-se deixar a

sonda na posição por sete a dez dias, realizando aplicação de bandagem abdominal. Embora

isso possa aumentar o tempo e custo de internação em comparação com outras técnicas, pode-

se tampar a sonda e fixá-la contra o troco, mandando o paciente para a casa com alimentação

oral (FOSSUM, 2005). Os problemas associados à técnica são: deslocamento prematuro do

tubo secundariamente à ruptura do balão, remoção do tubo pelo paciente, celulite ou peritonite

local ou generalizada associada ao extravasamento do conteúdo gástrico em torno do tubo

33

(MATTHIESEN, 1998). Em estudos realizados, entre 1984 e 1985, observaram-se taxas de

recorrência altas, variando de 5-29%. Além disso, as complicações pós-operatórias, tais como,

peritonite secundária a remoção prematura do tubo e celulite pela infiltração de conteúdo

gástrico no subcutâneo, estavam presentes, tornando o pós-operatório complicado, levando

muitas vezes o animal a óbito (HOSGOOD, 1994).

Fig. 7: Gastropexia com Sonda.

Fonte: FOSSUM, 2005

É feita uma incisão na parede abdominal direita, 4-5cm caudalmente à última costela e

4-10cm lateralmente à linha média. Um cateter de Foley (18-30 “French”) é passado através

da incisão. Em uma área hipovascularizada da camada seromuscular da superfície ventral do

antro pilórico, é colocada uma sutura em bolsa de fumo com fio de material absorvível 2-0,

tomando cuidado para que o balão do cateter não obstrua o escoamento gástrico. É efetuada

uma incisão na parede gástrica e a extremidade do cateter de Foley é introduzida até o lúmen

gástrico. O bulbo do cateter é inflado com 8-10ml de solução salina e a sutura em bolsa de

fumo é fixada de modo a garantir a vedação em torno do tubo. Três a quatro fios de sutura

absorvíveis são pré-posicionados entre o antro pilórico e a parede corporal, onde a sonda sai.

Deve-se evitar penetrar no cateter ou no balão quando colocar os fios de sutura. O estômago é

puxado até a parede corporal por meio da colocação de uma tração no cateter e os fios de

sutura pré-posicionados são amarrados. A sonda é fixada na pele, devendo-se evitar penetrá-la

34

com o fio de sutura. Uma atadura é aplicada ao redor do abdômen do animal sobre a sonda,

para evitar sua remoção prematura (use colar elisabetano). A sonda permanece nessa posição

por 7-10 dias, na sequência o balão é desinflado e a sonda removida. A incisão cutânea fica

aberta para facilitar a drenagem, podendo-se colocar atadura no ferimento aberto

(MATTHIESEN, 1998, FOSSUM, 2005).

Fig. 8: Sutura de uma gastropexia com sonda.

Fonte: FOSSUM, 2005

A. Inserção de uma ponta do cateter de Foley no interior do lúmen gástrico por uma sutura em bolsa de tabaco.

B. Quatro fios de sutura absorvíveis pré-colocados entre o antro pilórico e a parede corporal, onde a sonda sai. C.

Tração do estômago até a parede corporal e amarração dos fios de sutura pré-colocados. A sonda é fixada na pele

com um padrão de sutura de alpercata romana.

2.6.4.3.2 Gastropexia Circuncostal

A gastropexia circuncostal forma uma aderência mais forte que a maior parte da outras

técnicas, mas é tecnicamente mais desafiadora, e apesar da vantagem de não invadir o lúmen

gástrico apresenta complicações, como fratura de costela e pneumotórax iatrogênico

(MATTHIESEN, 1998, FOSSUM, 2005).

Em 1985, Leib avaliou o resultado da gastropexia circuncostal em 30 cães que foram

acompanhados de 4-28 meses, sendo que apenas um animal apresentou retorno clínico de

dilatação gástrica depois da cirurgia e os demais apresentaram gastropexia intacta avaliada

através de radiografias ou necropsia (HOSGOOD, 1994).

35

Um flape em dobradiça é feito em uma ou duas camadas (aproximadamente 5-6cm de

comprimento) por incisão através da camada seromuscular do antro pilórico. Não se deve

incisar a mucosa gástrica ou entrar no lúmen gástrico, e se isso ocorrer, deve-se suturar a

mucosa com fio de material absorvível. O flape é levantado através da dissecção. É feita uma

incisão de 5-6cm sobre a 11ª ou a 12ª costela. Importante certificar-se de que a incisão não

penetre nas ligações diafragmáticas da parede corporal, causando um pneumotórax. Forma-se

um túnel sob a costela, usando uma pinça hemostática. Colocam-se suturas de fixação no

flape e o mesmo é passado craniodorsalmente sob a costela e sendo suturado com material

absorvível 2-0 na margem gástrica original (técnica de um flape) ou em outro retalho (técnica

de dois flapes) (FOSSUM, 2005).

Fig.9: Gastropexia Circuncostal

Fonte: MATTHIESEN, 1998

A. Efetuada incisão sobre a 11ª ou 12ª costela, através do peritôneo parietal e músculo transverso do abdômen. B. A

costela é cuidadosamente exposta por meio de divulsão. C. Efetuado um retalho antral no estômago e com o auxílio da pinça

Allis, ou suturas aplicadas na extremidade do retalho antral, para a introdução do retalho, sob a costela exposta. D. O retalho

é suturado às margens gástricas seromusculares originais.

36

Fig. 10: Técnica de retalho

Fonte: FOSSUM, 2005

A. Na técnica de um retalho suture o retalho circuncostal na margem gástrica original. B. Na técnica de

dois retalhos introduza a seromuscular sob a costela e suture-o no segundo retalho.

Em 1999, foi realizado um estudo que consistia na aplicação de uma gastropexia

circuncostal modificada que ia de encontro a algumas desvantagens da original, dentre elas a

dificuldade técnica (execução sem auxílio) e aumento do tempo de anestesia. A gastropexia

circuncostal modificada difere da original pelo fato da costela ser serrada para a passagem do

túnel seromuscular criado no estômago, próximo à curvatura maior. Os estudos foram feitos

primeiramente em cadáveres e posteriormente em cinco cães da raça Galgo, sendo que nesses

a persistência da adesão gástrica foi confirmada após seis meses de cirurgia através de

laparoscopia.

2.6.4.3.3 Gastropexia Incisional

A gastropexia incisional é mais fácil que a circuncostal e evita as complicações

associadas à gastropexia com sonda (FOSSUM, 2005).

É efetuada incisão longitudinal na camada seromuscular, localizada sobre a superfície

ventral do antro pilórico, e eqüidistante da pequena e grande curvatura. Também é efetuada

incisão no peritônio e fáscia interna do músculo reto do abdômen ou transverso do abdômen,

sendo esta localizada na parede abdominal ventrolateral direita. As margens da incisão

gástrica são suturadas à incisão da parede abdominal por meio de padrão de sutura contínua

simples com material absorvível ou não 2-0 (MATTHIESEN, 1998).

37

Fig. 11: Gastropexia incisional.

Fonte: MATTHIESEN, 1998

A. Efetuada incisão das camadas serosa e muscular do antro pilórico. B. Efetuadas incisão no peritônio e na

fáscia interna do músculo reto do abdômen ou transverso abdominal, com localização da parede abdominal

ventrolateral direita. C e D. As bordas da incisão gástrica são suturadas à incisão abdominal por meio de padrão

de sutura contínua simples.

2.6.4.3.4 Gastropexia de Alça de Cinto

A gastropexia em alça de cinto é a modificação da gastropexia circuncostal; é utilizada

alça de músculo transverso do abdômen, ao invés de uma costela para a passagem circundante

do flape gástrico seromuscular (MATTHIESEN, 1998).

São feitas duas incisões transversais na parede abdominal ventrolateral, por incisão de

peritônio e da musculatura abdominal. As incisões devem ter 3 a 5cm de comprimento, e estar

a intervalos de 2,5-4cm. Com uma pinça, um túnel é criado por baixo da musculatura

abdominal (FOSSUM, 2005). É construído um flape seromuscular de 4cm por 2.5-3cm no

antro pilórico ventral, sendo recomendável ter pelo menos dois ou três ramos da artéria

gastroepiplóica incorporados no local. A elevação da submucosa é feita com dissecção romba.

O estômago é trazido para perto da parede abdominal direita. O flape seromuscular é passado

debaixo do músculo transverso abdominal, sendo suturado em sua margem gástrica original,

38

usando padrão continuo simples, de material de sutura absorvível ou não 2-0. Podem-se

colocar suturas adicionais entre a parede corporal e o estômago, diminuindo assim a tensão na

gastropexia (MONNET, 2003, FOSSUM, 2005).

Fig.12: Gastropexia de Alça de Cinto

Fonte: MATTHIESEN, 1998

A. Duas incisões perfurantes transversais são efetuadas no peritônio parietal e músculo transverso do abdômen.

As incisões devem estar afastadas 2.5cm/3cm. B. É utilizada tesoura Metzembaum para a ampliação do

comprimento das incisões; este procedimento resulta em formação de um retalho de 2.5cm,/3cm de músculo

transverso do abdômen. C. é construído retalho seromuscular no antro pilórico. D. A parede gástrica é suturada à

parede abdominal. E. O retalho antral é introduzido sob o retalho da parede abdominal. F. O retalho antral é

suturado de volta às margens incisionais gástricas originais.

39

2.6.5 Cicatrização Gástrica

O suprimento sanguíneo extraordinariamente rico, o número reduzido de bactérias

(como resultado da acidez gástrica), o epitélio de regeneração rápida e os mecanismos de

defesa proporcionados pelo omento permitem que as incisões gástricas cicatrizem

rapidamente. Como o estômago possui uma parede mais espessa que o intestino, o controle de

hemorragia e mais difícil, pois os vasos sanguíneos sangrantes podem ser mais difíceis de

localizar. Uma pressão suave aplicada nos tecidos sangrantes costuma ser eficaz; devem-se

evitar pinças esmagadoras e bisturis elétricos (FOSSUM, 2005).

2.6.6 Materiais de Sutura e Instrumentos

Em casos de cirurgias gastrintestinais, preferem-se materiais de sutura

monofilamentares absorvíveis (ou seja, polidioxanona [PDS], poligliconato [Maxon] ou

poliglecaprona 25 [Monocryl]). Esses fios de sutura são fortes, possuem arrastamento tecidual

mínimo, e mantêm a força tênsil por mais de 10dias. O fio de sutura de categute cromado é

removido rapidamente por digestão e fagocitose, e deve ser evitado. Um material de sutura

não absorvível que penetre no lúmen, poderá fazer com que se formem úlceras ao longo da

linha de sutura, portanto, deve-se evitar esse tipo de material. Para cirurgia gastrintestinal,

preferem-se geralmente agulhas de ponta afilada moldadas e de diâmetro pequeno. No

entanto, usam-se, algumas vezes, agulhas de corte, pois elas penetram mais facilmente na

submucosa e exigem menos estabilização tecidual (o que pode resultar em menos

sangramento) (FOSSUM, 2005).

Com relação ao instrumental utilizado na cirurgia, deve-se evitar a utilização de pinças

esmagadoras em tecidos que não serão excisados (FOSSUM, 2005).

2.7 Cuidados Pós-Operatórios

No pós-operatório, deve-se monitorar rigorosamente os estados eletrolítico, hídrico e

ácido-básico dos animais, tendo muita atenção para hipocalemia, um desequilíbrio muito

comum de ser visto e que exige suplementação. Além disso, analgésicos, antiinflamatórios e

antibióticos devem continuar sendo administrados, uma vez que tiveram início logo na

apresentação do quadro (FOSSUM, 2005).

40

Comida e água devem ser retiradas por 24-48 horas após a cirurgia, sendo que a

nutrição oral é gradualmente introduzida primeiramente com os fluídos e, em seguida, com os

sólidos leves compostos por baixo teor de gordura e carboidratos, devendo ser interrompida

na ocorrência de vômitos e reintroduzida após 24-48 horas (SULLIVAN et al., 1998).

A ocorrência de vômitos é comum no pós-operatório de dilatação vólvulo gástrica,

sendo necessário usar antieméticos, como metoclopramida, protetores de mucosa gástrica,

como cimetidina no caso de gastrite como causadora dos vômitos e avaliar o débito urinário e

perfis bioquímicos, descartando azotemia, hipocalemia ou outros distúrbios metabólicos como

causadores dos vômitos freqüentes (WHITNEY, 1989).

Os pacientes devem ser monitorados com relação à hipoproteinemia, que embora não

seja um problema clínico nos casos de dilatação vólvulo gástrica, encontra-se freqüentemente

em pacientes com peritonite secundária a gastrectomia, ou ainda como resultado de anemia,

gastrite hemorrágica, perda de sangue devido avulsão de vasos gástricos e esplenectomia

(WHITNEY, 1989).

Arritmias ventriculares como os complexos ventriculares prematuros são comuns,

sendo e devem ser monitoradas através de eletrocardiogramas, para que haja intervenção

necessária (FOSSUM, 2005).

2.8 Complicações Pós-Operatórias

A mortalidade pós-operatória acontece geralmente dentro dos quatro primeiros dias,

havendo uma lista das possíveis causas (arritmias ventriculares, choque, endotoxemia/sepse,

necrose gástrica, ruptura gástrica, peritonite, hipoproteinemia, anemia, melena,

broncopneumonia, abscesso pulmonar, hepatopatias, hemorragia gástrica, vômito,

hipocalemia, desequilíbrio acido-básico, pneumotórax, atonia gástrica, dilatação/vólvulo,

infecções, pancreatite, insuficiência renal, coagulação intravascular disseminada,

intussuscepção intestinal, vólvulo intestinal e febre de origem desconhecida), mostrando a

necessidade de cuidados intensivos no pós-cirúrgico. Embora a lista seja impressionante e

extensa, a maioria das mortes de dilatação vólvulo gástrica no pós-operatório são associadas a

dois eventos fisiopatológicos: peritonite, sepse e choque; e arritmias cardíacas (WHITNEY,

1989).

O choque após a cirurgia pode ser decorrente do tratamento inadequado no período

pré-operatório do choque hipovolêmico em combinação com o efeito hipotensivo de vários

medicamentos anestésicos, da perda de sangue durante a cirurgia e do seqüestro do líquido

41

gastrintestinal ocorrente secundariamente ao íleo paralítico. O choque séptico-endotóxico

pode resultar da absorção de toxinas bacterianas e teciduais da mucosa gástrica necrosada ou

ulcerada, ou pode ocorrer em cães com ruptura gástrica e peritonite secundária

(MATTHIESEN, 1998). A avaliação citológica de fluidos obtidos através da

abdominocentese é útil, determinando a necessidade de uma reexploração, porém, eles devem

ser interpretados levando em conta as mudanças compatíveis com a laparotomia exploratória

recente (WHITNEY, 1989). Tanto o choque hipovolêmico quanto o séptico são corrigidos

com fluidoterapia semelhante ao do tratamento clínico e antibioticoterapia já iniciada no

início da apresentação, respectivamente (MONNET, 2003).

A hipocalemia é o desequilíbrio eletrolítico mais comum, podendo contribuir para o

surgimento de arritmia cardíacas. As perdas de potássio resultam da hipersecreção gástrica e

do seqüestro de líquidos, entubação e lavagem orogastrica, perdas renais, fluidoterapia

prolongada, refluxo duodenogástrico e regurgitação de secreções pancreáticas e biliares, não

ocorrência de alimentação oral, dentre outros. A suplementação intravenosa deve ser feita

mediante disponibilidade do valor de potássio sérico (MATTHIESEN, 1998, FOSSUM,

2005).

Arritmias cardíacas, principalmente os complexos ventriculares prematuros acontecem

em aproximadamente 50% dos pacientes com DVG. A maioria destas arritmias,

aproximadamente 75%, acontece 12-36 horas depois da apresentação. É comum coincidir

com o período pós-operatório. A causa das arritmias ventriculares é desconhecida. Podem ser

fatores contributivos quedas no debito cardíaco e na perfusão coronária, desequilíbrios ácido-

básicos e eletrolíticos, fatores circulatórios depressores cardíacos e lesões cardíacas de

reperfusão tromboembólica. Deve-se monitorar as mesmas com eletrocardiograma e realizar

tratamento antiarrítmico com lidocaína (2-4 mg/kg/IV em bolus, infusão contínua de 25-75

mcg/kg/minuto ou 6 mg/kg/IM a cada uma hora e meia), procainamida (8-20mg/kg/IM/IV ou

infusão contínua de 25-50mcg/kg/minuto) ou sulfato de quinidina (5-10mg/kg/IV, a cada 6

horas (WHITNEY, 1989, SULLIVAN et al., 1998, MATTHIESEN, 1998, PAPICH, 2009).

Outra complicação é a coagulação intravascular disseminada causada pela dilatação

vólvulo gástrica ou por peritonite, exigindo avaliação de parâmetros de coagulação para um

tratamento apropriado com fluídos e heparina (FOSSUM, 2005).

42

2.9 Prognóstico

Terapia medicamentosa e cirurgia precoces tornam o prognóstico favorável,

diminuindo assim, a taxa de mortalidade. O prognóstico será mau se ocorrer necrose ou

perfuração gástrica ou se a cirurgia for adiada. A necrose gástrica é avaliada pré-

operatoriamente através da medição do lactato plasmático, que estando abaixo de 6mmol/L

sugere não haver presença da mesma, tornando o prognóstico mais favorável. Em um estudo

realizado em 1998, foi determinado que os cães que apresentavam necrose gástrica tinham

onze vezes mais probabilidade de morrer que os que não apresentavam. (FOSSUM, 2005).

Cães com gastrectomia parcial e esplenectomia também apresentam taxa de mortalidade

maior, porém, nenhuma das duas técnicas deve ser evitada se existir a necessidade de realizá-

las (HALL, et al., 2005, SULLIVAN, et al., 1998).

As taxas de recorrência de dilatação vólvulo gástrica diferem, dependendo das técnicas

usadas, mas a maioria dos autores descreveu taxas inferiores a 10%, com exceção da

gastropexia com tubo, que apresenta uma recorrência mais alta (FOSSUM, 2005).

Alguns cães com dilatação vólvulo gástrica respondem somente a uma descompressão

com sonda e estabilização clínica. Isso ocorre, porque muitas vezes após o ar ser removido o

estômago volta a sua posição normal, ou havia apenas uma rotação parcial, ou ainda, ele se

encontrava apenas dilatado. No entanto, estudos mostram que esses cães ainda apresentam

alta probabilidade de recorrência, sendo, portanto, importante recomendar a gastropexia

(FOSSUM, 2005).

3.0 Prevenção

Como as causas da síndrome dilatação vólvulo gástrica são desconhecidas, não se

podem administrar medidas específicas de prevenção, porém, algumas sugestões são dadas e

devem ser seguidas, como oferecer várias refeições pequenas por dia, em vez de uma única

refeição grande; evitar estresse durante a alimentação, separando os cães se necessário;

restringir exercícios antes e depois das refeições; não utilizar comedouros elevados, evitando

assim aerofagia e não cruzar cães que tenham um parente de primeiro grau com histórico de

dilatação vólvulo gástrica (FOSSUM, 2005).

O risco elevado de dilatação vólvulo gástrica em algumas raças de cães e a eficácia

não comprovada de técnicas não cirúrgicas existentes como recomendações preventivas, têm

levado alguns donos de raças de alto risco a solicitar a gastropexia profilática. Porém, existem

43

questões éticas envolvidas com a realização da mesma em cães destinados à exposição.

Regulamentos incluem que cães modificados na aparência por meios artificiais que tenham o

efeito de ocultar, disfarçar ou eliminar qualquer anomalia congênita ou hereditária ou

características indesejáveis serão desclassificados, diferentemente dos cães que passaram por

procedimentos instaurados estritamente para restaurar sua saúde. Ou seja, a gastropexia pode

ser realizada, mas não em um cão saudável, disfarçando ou eliminando dessa forma uma

característica indesejável ou hereditária (WARD, et al., 2003).

Além disso, o proprietário deve ser orientado com relação às manifestações clínicas de

timpanismo e sobre a necessidade imediata de cuidados veterinários (FOSSUM, 2005).

44

4. DISCUSSÃO

A síndrome dilatação vólvulo gástrica é uma enfermidade aguda que resulta em uma

série de ocorrências fisiopatológicas que podem levar à morte do paciente se não forem

corrigidas a tempo (SILVA, et al, 2006). Logo, o manejo rápido e adequado de emergência é

de suma importância, evitando maiores alterações causadas pela síndrome e estabilizando o

quanto antes o paciente, reduzindo assim o tempo até a cirurgia e garantindo o sucesso de

muitos casos (WHITNEY, 1989).

As técnicas de gastropexia se destinam a aderir permanentemente o antro pilórico do

estômago à parede abdominal direita. Muitos estudos foram e são feitos até hoje para

desenvolver um método tecnicamente simples e rápido de gastropexia, que assegure a

prevenção da reincidência do vólvulo, que não interfira na função gástrica, reduza o tempo

cirúrgico, bem como as complicações trans-operatórias e pós-operatórias, e que necessite de

cuidados pós-operatórios mínimos (WHITNEY, 1989, LINDENBERG, et al., 1993,

MONNET, 2003).

A gastropexia com sonda (gastrostomia) é rápida e relativamente simples, tendo como

vantagens a descompressão gástrica pós-operatória e a colocação de medicações diretamente

no estômago, em animais inapetentes. Os problemas estão associados ao tempo e custo de

internação, uma vez que para a aderência permanente há necessidade da sonda permanecer na

mesma posição por sete a dez dias; pode ocorrer deslocamento prematuro do tubo

secundariamente à ruptura do balão; remoção do tubo pelo paciente; celulite ou peritonite

local ou generalizada associada ao extravasamento do conteúdo gástrico em torno do tubo

(MATTHIESEN, 1998, FOSSUM, 2005).

A gastropexia circuncostal tem várias vantagens sobre a gastropexia com sonda, por

exemplo, o lúmen gástrico não é penetrado, reduzindo a chance de contaminação abdominal e

peritonite; forte adesão à parede corporal; e não há necessidade de pós-operatório adicional.

As desvantagens estão associadas ao fato de ser mais difícil de realizar, risco de pneumotórax,

possibilidades de fraturas e ainda não permite acesso ao lúmen gástrico se for necessário

descompressão pós-operatória (LEIB, et al.,1985, FOSSUM, 2005).

A gastropexia com flape muscular (incisional) e a gastropexia de alça de cinto

apresentam as vantagens de serem rápidas e de maior facilidade em realização, não abrem o

lúmen, reduzindo a possibilidade de contaminação e peritonite, porém suas desvantagens são:

a menor aderência do estômago quando comparada a gastropexia circuncostal e também não

proporciona acesso direto ao lúmen gástrico caso seja necessária uma descompressão pós-

operatória (FOSSUM, 2005).

45

É evidente que a gastropexia do lado direito é indicada como tratamento cirúrgico de

cães com dilatação vólvulo gástrica, para prevenir a recorrência. Nenhuma das técnicas

descritas atualmente parece ser realmente a ideal, portanto, os fatores mais importantes na

porcentagem do sucesso são os cirurgiões, sua familiaridade com a técnica e habilidade para

realizá-la de forma eficiente e na hora certa (HOSGOOD, 1994).

O sucesso do caso não depende apenas de um pré-operatório e cirurgia adequados,

mas também da continuidade desse trabalho no pós-operatório. Logo, monitorar o paciente

dando continuidade a medicamentos previamente estabelecidos e atentar-se para possíveis

complicações, como choques hipovolêmico e séptico, e arritmias são de extrema importância

(FOSSUM, 2005).

46

5. CONCLUSÃO

A Síndrome Dilatação Vólvulo Gástrica é uma enfermidade aguda que acomete

principalmente cães de raças grandes e gigantes. Embora, sua etiologia não seja

completamente conhecida, sabe-se que anatomia e dieta apresentam papéis importantes no seu

desenvolvimento. Seu diagnóstico e tratamento clínico precoces auxiliam em uma intervenção

cirúrgica mais rápida, tendo um prognóstico mais favorável. Existem diversas técnicas de

gastropexia descritas na literatura, e embora todas cumpram sua função quando corretamente

executadas, é sabido que algumas são melhores que outras em termos de dificuldade técnica e

complicações trans e pós-operatórias.

O mais importante é que os veterinários divulguem as medidas profiláticas bem como

as manifestações clínicas de dilatação ou torção gástrica, para que os proprietários possam

contribuir de maneira positiva tanto na prevenção quanto em uma situação emergencial.

Associado a esse fato, o sucesso do tratamento de dilatação vólvulo gástrica depende do

cirurgião, sua familiaridade com a técnica e habilidade para realizá-la de forma eficiente e na

hora certa.

47

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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