LEGALIZAÇÃO DAS DROGAS ILÍCITAS POLITICA ... · modelos de legalização de drogas. A monografia...
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ANDERSON MICHEL RODRIGUES SANTOS
LEGALIZAÇÃO DAS DROGAS ILÍCITAS:
POLITICA ANTIPROIBICIONISTA DA REGULAMENTAÇÃO DO USO E DO TRÁFICO
DE DROGAS
RECIFE
2012
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE
LEGALIZAÇÃO DAS DROGAS ILÍCITAS:
POLITICA ANTIPROIBICIONISTA DA REGULAMENTAÇÃO DO USO E DO TRAFICO
DE DROGAS
Monografia apresentada à banca
examinadora da faculdade de direito
do recife, universidade federal de
Pernambuco como exigência parcial
para a obtenção do grau de bacharel
em direito, sob a orientação do
professor Cláudio Roberto Cintra
Bezerra Brandão.
RECIFE
2012
Ao deus pai, todo poderoso e aos meus pais pelo eterno incentivo.
Agradeço o apoio que jamais me foi negado, a toda a minha família, em especial, a minha mãe Ivete Santos e ao meu pai Aventino Santos, aos meus irmãos Ligia, Antonio e Aventino Jr., aos meus avós, Deolinda e Maninha Mota e os meus avôs in memoriam, Antonio Mota, Juvito e Andrade Ribeiro, aos meus tios e tias, e também ao meu querido sobrinho Edvin. A minha querida namorada
Edira que sempre esteve do meu lado, aos meus amigos de cabo verde e de todo mundo. Agradeço a todos os funcionários e professores da faculdade de direito, da UFPE, em especial ao meu orientador professor Cláudio Brandão que sempre me apoiou e sempre me ajudou. Agradeço ao meu orientador pela sua disponibilidade e o empenho para que esse trabalho se concretizasse.
“Assim como o direito veda ao poder humano invadir-nos a consciência, assim lhe veda transpor-nos a epiderme. Uma, envolve a região moral do pensamento. A outra, a região fisiológica do organismo. Dessas duas regiões se forma o domínio impenetrável da nossa personalidade”. Rui Barbosa
RESUMO
O objetivo desse trabalho é demonstrar e tentar desvendar o mistério que existe por trás da
política antidrogas. Questionar esse sistema que fracassou como política, que aumentou o
consumo e trafico de drogas a níveis incontroláveis, que contribui para o aparecimento de
múltiplas outras drogas, que aumentou o numero de mortes com o seu combate . O objetivo
desse trabalho é também tentar entender o porque que este sistema aparece como refugio
de outros crimes e porque da criação de fenômenos como: a criminalização da pobreza, a
politização do crime e a criminalização da política. Este trabalho tem ainda como escopo
conhecer toda a política de proibição com o objetivo de compreender o fenômeno das
drogas, para que possa saber os verdadeiros males que ele evidentemente pode causar.
Apresentar políticas alternativas como a política de redução de danos e os modelos de
legalização para melhor combate as drogas através de uma regulamentação, do uso e do
trafico.
Palavra chave: Direito Penal, Criminologia, Sociologia Júridica, Políticas Publicas, Proibicionismo, Drogas
ABSTRACT
The purpose of this study is demonstrate and try to unravel the mystery that exist behind of
antidrug policies. Question this system that failed as policy, which increased the
consumption and trafficking of drugs to the uncontrollable levels, which contributes to the
appearance of multiple other drugs, which increased the number of deaths with their fight.
The purpose of this study is also try to understand why this system appears as refuge for
other crimes, and why the creation of phenomena like: the criminalization of poverty, the
politicization of crimes, and criminalization of politics.This study has yet as a scope, know all
of the prohibition policy in order to understand the phenomenon of drugs, so you can know
the true ills that he evidently can cause. Presenting alternative policies such as the policy of
harm reduction and legalization models to better combat drugs through a regulation of use
and trafficking.
Keys Words: Criminal Rigth, Criminology, Legal Sociology, Public Policies, Prohibition,
Drugs.
Résumé
Le but de ce travail est de démontrer et d'essayer de percer le mystère qui se cache derrière
la politique anti-drogue. Questionner ce système qui a échoué en tant que politique, qui a
augmenté la consommation et le trafic de drogues à des niveaux incontrôlables, qui
contribue à l'apparition de plusieurs d’autres drogues, qui a augmenté le nombre de décès
avec son combat. Le but de ce travail est aussi d'essayer de comprendre pourquoi ce
système apparaît comme refuge pour d'autres crimes, pourquoi la création de phénomènes
tels que la criminalisation de la pauvreté, la politisation du crime et la criminalisation de la
politique. Ce travail a encore comme but connaître tout la politique de prohibition afin de
comprendre le phénomène des drogues, pour que je puisse connaître les véritables maux
qu'il peut évidemment causer. Présenter des politiques alternatives telles que la politique de
réduction des risques et des modèles de légalisation pour mieux lutter contre les des
drogues a travers d'une réglementation de l'utilisation et de trafic.
Mot-Clé: Droit Penal, Criminologie, Sociologie du Droit, des Politiques Publiques,
l'interdiction, les Médicaments
RUZUMU
Obujetivu des trabadju li e dimonstra i tenta diskubri misteri ki sta pa tras di pulítika
antidróga. Kistiona kel sistema ki frakasa komu pulítika, ki omenta konsumu i tráfiku di
drógas pa nivis inkontrolavi, ki kontribui pa parsimentu di un munti otu dróga, ki omenta
nunbru di mórti ku si konbati. Obujetivu des trabadju li e tanbê tenta ntende pamódi ki kel
sistema la parse komu lugar di otus krimi sukundi i pamódi ki surji otus fenóminu sima:
kriminalizason di pobréza, pulitizason di krimi i kriminalizason di pulítika. Kel trabadju li ten
inda un otu intenson ki e konxe tudu pulítika di proibison ku obujetivu di konprende
fenómenu di drógas, pa sabedu kes verdaderu mal ki kel fenóminu la pode ividentimenti
tarse. Prizenta pulítikas alternativu sima pulítika di raduzi danus i modélus di legalizason
para konbati drógas midjór através di un ragulamentason di uzu i di tráfiku.
Palabra xavi: Diretu Penal, Kriminolojiâ, Sosiolojiâ Jurídiku, Pulítikas Públiku,
Proibisionismu, Drógas
SUMÁRIO
Conteúdo INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................... 1
1. O CONCEITO DE DROGAS DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO .......................... 4
1.1 LEI DE DROGAS: EVOLUÇÃO HISTÓRICA E LEGISLATIVA NO BRASIL ................................................ 4
1.2 DEFINIÇÕES LEGISLATIVAS ............................................................................................................... 11
1.3 CONCEITOS DOUTRINÁRIOS SOBRE DROGA ..................................................................................... 16
1.4 O PROBLEMA DAS SUBSTÂNCIAS NÃO CONSIDERADAS DROGAS ...................................................... 19
2 ANALISE DA LEI DE ANTITÓXICOS (LEI 6368/76) E DA LEI DE DROGAS (LEI 11.343/06) .................. 21
2.1 LEI 6368/76 – LEI ANTITÓXICOS ....................................................................................................... 21
2.2 LEI 11.343/06 – LEI DE DROGAS ...................................................................................................... 26
3 MODELOS DE CONTROLE SOBRE DROGAS ...................................................................................... 31
3.1 MODELOS PROIBICIONISTA ................................................................................................................ 31
3.2 DANOS PROVOCADOS PELA POLÍTICA REPRESSIVA ......................................................................... 42
3.3 POLÍTICA DE REDUÇÃO DE DANOS .................................................................................................... 47
4 LEGALIZAÇÃO DAS DROGAS: ESTRATÉGIAS ALTERNATIVAS AO CONSUMO E AO TRAFICO DE DROGAS
........................................................................................................................................................ 54
4.1 MODELOS DA LEGALIZAÇÃO DE DROGAS .......................................................................................... 58
4.1.1 LEGALIZAÇÃO LIBERAL ................................................................................................................ 59
4.1.2 LEGALIZAÇÃO COM FORTE CONTROLE ESTATAL ....................................................................... 60
4.1.3 LEGALIZAÇÃO CONTROLADA ....................................................................................................... 65
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................. 72
REFERENCIAS .................................................................................................................................. 75
1
Introdução
O consumo de drogas não é uma inovação da contemporaneidade, mas um
comportamento historicamente determinado. O abuso e a dependência de drogas, no
entanto, são fenômenos mais recentes, característicos das sociedades modernas,
industriais, constituindo-se em uma importante questão de saúde e de segurança pública. O
que mudou nos tempos modernos refere-se á fabricação de substancias sintéticas, a
produção em grande escala, a introdução de convenções sociais e jurídicas, e a
transformação da droga em mercadoria lucrativa envolvendo inúmeros interesses de
produção, comercialização, propaganda, fiscal, etc.
No Brasil, ao longo dos últimos anos houve um aumento do consumo de
drogas, sendo o álcool e o tabaco, substancias socialmente aceitas, que causam a maior
parte dos problemas causados pelas drogas no país.
Nas sociedades contemporâneas o inicio do uso de drogas é cada vez mais
precoce e estimulado por uma sociabilidade norteada pelo modo de produção capitalista
que promove o consumo de fetiches e a obtenção do prazer imediato. Neste cenário as
drogas aparecem como uma possibilidade de suprir estas novas necessidades. Mas
contraditoriamente, o consumo de drogas licita é propagandeado e naturalizado, enquanto
que o consumo de drogas ilícitas é marginalizado e demonizado. Esta expressão da
questão social exige do estado e da sociedade uma mudança de comportamento.
O estudo das políticas antiproibicionistas tem por objetivo compreender a
estratégia proibicionista de criminalização de determinadas drogas como meio puramente
simbólico de proteção da saúde pública.
Destacam-se as peculiaridades da questão da droga, e as transformações
ocorridas a partir do inicio do século XX, quando se deu a criminalização.
2
A pesquisa foca na atuação do sistema repressivo e seu impacto no sistema
penal e na sociedade. Também tem como foco a analise de alternativas ao sistema
repressivo, como a redução de danos e a legalização das drogas. A necessidade e a
compreensão dessas alternativas como propostas racionais de alteração na legislação.
A tese assume o deslocamento temático das políticas antiproibicionistas,
apresentando como proposta ao proibicionismo as políticas de redução de danos e os
modelos de legalização de drogas.
A monografia apresenta as seguintes subdivisões:
O capitulo 1 apresenta o conceito de drogas no ordenamento jurídico
brasileiro. Trazendo como ideia central as diferentes abordagens sobre o conceito de droga
na legislação Brasileira. Inicia-se o trabalho fazendo uma abordagem das leis de “droga”, da
sua evolução histórica e legislativa, depois passa pela analise doutrinaria da sua
terminologia “droga”, e no final desse capitulo trago a problemática das substancias não
consideradas como drogas, o seu impacto na sociedade e na legislação.
O capitulo 2 explora as leis 6368/76, conhecida como lei antitóxicos e a lei
11.343/06, conhecida como a nova lei de drogas. O objetivo desse capitulo é mostrar a
diferença entre essas leis no que se refere ao tratamento sobre a repressão as drogas,
explicita a questão da proibição do uso de drogas, e do trafico de drogas e das políticas
publicas tendo em conta a prevenção e a reabilitação dos usuários, e de como essas leis
tratam essa matéria.
O capitulo 3 ingressa no tema sobre os modelos de controle sobre drogas
mas propriamente sobre o modelo proibicionista. Procuram-se mostrar a origem, as
ideologias fundamentadoras do sistema repressivo, a sua evolução enquanto sistema. O
capitulo 3 explora também os danos provocados pelo sistema repressivo, as suas falhas e o
seu fracasso. Analisam os danos provenientes do combate ás drogas, e as consequências
devastadoras provocadas pelo sistema repressivo, o aumento da epidemia da AIDS,
aumento do consumo e do trafico de drogas e também o aumento do numero de mortes
provocados pelo uso e pelo combate as drogas. E por fim trás a política de redução dos
3
danos provocados pelo proibicionismo, tentando minimizar os danos e reduzir ao maximo os
problemas provocados pela marginalização dos usuários.
O ultimo capitulo, o capitulo 4 enfrenta o problema da repressão, e apresenta
como solução a legalização das drogas. Nesse capitulo é apresentamos as estratégias de
legalização do uso e do trafico de drogas. Inicia-se com uma pequena abordagem sobre os
outros modelos que antecederam a legalização, mas que tiveram sua importância para a
flexibilização do sistema repressivo. Trazemos a colação os modelos de descriminalização
e despenalização de algumas condutas de comercio de drogas leves e do seu cultivo.
Depois passamos a analise dos modelos de legalização propriamente ditos, começando
com o modelo de legalização liberal defendida por Milton Friedmann; depois o modelo de
legalização com forte controle estatal, defendida por Henrique Carneiro e por fim o modelo
de legalização controlada defendida por Francis Callabero.
A compreensão do fenômeno das drogas passa-se por uma analise
transdiciplinar, que atravessa os campos, da criminologia, da política criminal, e das
ciências sociais, com o auxilio das ciências médicas e da economia, além da historia. Por
isso a importância de estudar as origens do proibicionismo e a evolução das leis penais
para se evidenciar como se deu a construção do conceito de ilicitude sobre as drogas, como
fundamento do modelo repressivo.
4
1. O CONCEITO DE DROGAS DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
1.1 LEI DE DROGAS: EVOLUÇÃO HISTÓRICA E LEGISLATIVA NO BRASIL
A tutela penal sobre as drogas no Brasil começa com as Ordenações
Filipinas sob a forte influência do direito Romano, do direito Canônico e do Germânico.
Dispunha em seu Titulo 89: que ninguém tem em casa resolgar, nem o venda, nem outro
material venenoso:
Nenhuma pessoa tenha em sua casa para vender, resolgar branco1,
nem vermelho, nem amarelo, nem solimão2, nem água delle e nem
escamonea3, nem ópio, salvo se for boticário examinado, e tenha
licença para ter botica, e usar de oficio. E qualquer outra pessoa que tiver em sua caza alguma das ditas cousas para vender, perca toda sua fazenda, a metade para nossa câmera, e a outra para quem o accusar, e seja degradado para África até nossa mercê. E a mesma pena terá quem as ditas cousas trouxer de fora, e as vender a pessoas, que não forem Boticários
4
Depois das Ordenações Filipinas segue-se o código criminal do império do
Brasil que não tratou especificamente da matéria, mas o regulamento 29 de setembro de
1851 dispôs sobre as drogas ao tratar da policia sanitária e da venda de substancias
medicinas e de medicamentos:
Art. 48. Inspeccionarão com o maior escrupulo as substancias alimentares expostas á venda; visitarão todos os annos, huma vez pelo menos e em epocas incertas, as boticas quer de particulares, quer de Corporações, as drogarias, armazens de mantimentos casas de pasto, botequins, mercados publicos, confeitarias açougues, hospitaes, colegios, cadêas, aqueductos, cemeterios, officinas, laboratorios, ou fabricas, em que se manipulem remedios ou quaesquer outras substancias que servem para a, alimentação e podem prejudicar a saude; e em geral todos os lugares donde possa provir damno á Saude Publica, ou pelas substancias que se frabricão
1 Rosolgar Branco: ôxido de arcenico
2 Solimão, Currupção de Sublimado: sal de mercurio, hoje em dia cloreto de mercurio
3 Escamonea: uma planta de cuja a raiz se extrai por incisão um suco residoso, eslhartico mui ativo,
disgridio. 4 As ordenações Filipinas, Livro V, Titulo LXXXIX. Disponivel em:
«www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/15p1240.htm» Acesso em: 2012.06.29.
5
ou pelos trabalhos que se operão, devendo preceder as convenientes participações ás respectivas Autoridades, quando se
trate de Estabelecimentos publicos5.
Art. 67. Os medicamentos compostos, de qualquer denominação que sejão, ou quaesquer outros activos, não poderão ser vendidos senão por pessoa legalmente autorisada. Os droguistas não poderão vender drogas ou medicamentos por peso medicinal, nem poderão
vender os medicamentos compostos chamados officinaes6.
Art. 68. As substancias venenosas constantes da 1ª tabella a que se refere o Art. 79 não poderão ser vendidas se não a Boticarios e droguistas matriculados. As empregadas em artes e para fabricas só serão vendidas aos fabricantes, quando estes apresentarem certidão
de matricula7.
Segue-se então o Código Penal de 1890, que considerava Crime, expor a
venda ou misturar substâncias venenosas sem autorização e sem formalidades previstas
nos regulamentos sanitários.
Nessa época o Brasil não tinha adotado nenhuma política sobre as Drogas,
apenas tratava de substâncias venenosas.
A partir da Convenção Internacional do Ópio em Haia, em 1912, o Brasil
passou a fiscalizar o consumo da Cocaína e do Ópio. Já se iniciava um controle do
consumo e do trafico dessas substancias por parte do governo brasileiro.
Com o aumento da demanda pelas Drogas, aumenta também a oferta, que
começa a preocupar as autoridades brasileiras. Por causa disso, foi criado o decreto nº
4294, de 6 de julho de 1921, que depois foi modificado pelo decreto nº 15.683, seguindo-se
regulamento aprovado pelo decreto nº 14.969, de 3 de setembro de 1921.
A titulo de exemplo, a maconha (cannabis sativa) foi proibida no Brasil a partir
de 1930, por causa do aumento da demanda, a partir de quando as normas penais
5 Decreto nº 828, de 29 de setembro de 1851. Publicação Original: Legislação Informatizada:
acesso em: «WWW2.camara.gv.br/legin/fed/decret/1824-1899_decreto-828-29-setembro-1851-549825-publicacaooriginal-81781-pe.html». Acesso: 2012.06.29. 6 Ibidem. 29 de Setembro de 1851.
7 Ibidem. 29 de Setembro de 1851.
6
brasileiras começaram a ser editadas conforme a evolução do consumo e do trafico de
Drogas.
O decreto 4294 de 06 de julho de 1921, regulamentada posteriormente pelo
decreto nº 14.969, de 03 de setembro de 1921, previa em seu texto a internação
compulsória de usuários de substancia de entorpecentes, no seu artigo 6º.
A primeira disposição expressa sobre a proibição de algum tipo de substância
tóxica somente é encontrada no Código Penal Republicano de 1890. Segundo o Código,
era considerado delito: “Expor á venda ou ministrar substância venenosa sem legítima
autorização e sem formalidades previstas nos regulamentos sanitários8”.
Note-se que a primeira disposição expressa referente a substâncias tóxicas
no país já consagrava norma penal em branco que seria complementada, posteriormente
pelos regulamentos sanitários vinculados à discricionariedade do poder executivo9.
Em abril de 1936, a publicação do Decreto 780, modificado pelo Decreto
2.953 de agosto de 1938, é considerada o primeiro “grande impulso” na luta contra a
toxicomania no Brasil10.
Uma das consequências dessa influencia foi à edição da Lei de Lavagem de
Dinheiro, “A ligação entre essas duas atividades ilícitas verifica-se no momento em que os
grandes traficantes de Drogas procuram no Money Laundering (lavagem de dinheiro) um
meio de encobrir os ganhos oriundos do comercio ilegal de Drogas11.
A partir de 1942, quando o Decreto-Lei 4.720 dispôs sobre cultivo e,
principalmente, após 1964, momento em que a Lei 4.451 introduz ao tipo do artigo 281 a
ação de plantar, veremos, na legislação pátria, processo de total descodificação, do controle
8 Carvalho, Salo de. A Política Criminal de Drogas no Brasil, do discurso de Descriminalização.
Rio de janeiro: Luam, 1996, p.19. 9 Idem, op. Cit., p.20
10 Idem, op. Cit., p.20
11 Carlyle, Raimundo. Crime de “Lavagem de Dinheiro”: Disponivel em
«http://carlyle.blog.digi.com.br». Acesso em: 2012.07.02
7
de drogas ilícitas, com consequências drásticas para toda a estrutura legislativa em matéria
criminal12.
O Legislador Constituinte de 1988 ao editar a norma do art. 5º, XLIII, criou a
categoria de “crimes hediondos”. A Lei de crimes hediondos foi considerada o suporte legal
e político criminal para a edição da lei do crime organizado13.
Em 21 de outubro de 1976 foi decretada a lei nº 6368, que dispunha sobre
medidas de prevenção e repressão ao trafico ilícito, e ao uso indevido de substancias
toxicas, ou substâncias que determinem a dependência física e psíquica.
Após vinte e seis anos de vigência da Lei 6368/76, acompanha-se a
modificação da visão proibicionista para uma política abolicionista, impulsionada pela
descriminalização do uso de substâncias toxicas.
Após longa tramitação legislativa, em 11 de janeiro de 2002 é editada a Lei
10.409/02, conhecida como «Lei de Tóxicos», elaborada no intuito de substituir a anterior. A
Lei de Tóxicos em nada inovou, mantendo o desrespeito aos direitos humanos14.
Atualmente vige a lei nº 11.343, de 23 de Agosto de 2006, que veio instituir o
sistema nacional de políticas sobre drogas – SISNAD; prescrever medidas para a
prevenção de uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de
drogas; estabelecer normas para a repressão, a produção não autorizada e ao trafico ilícito
de drogas e definir crimes.
O capitulo III da Lei 11.343/2006, volta a sua atenção para o usuário e
dependentes de drogas. Para fins penais, entende-se por usuário de drogas com o advento
12
Carvalho, Salo de. Op. cit., p. 20-21. 13
Carvalho, Salo de. Op. Cit., p. 118
14 PACHECO FILHO, Vilmar Velho. Lei Antitóxicos. 2. Ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 19.
8
da Lei 11.343/06, “quem adquire, guarda, tem em depósito, transporta ou traz consigo, para
consumo pessoal, qualquer tipo de droga proibida, art. 2815.
Em relação ao art. 28 da Lei 11.343/06, houve concomitantemente
descriminalização formal e despenalização do uso de drogas, ou seja, o fato deixou de ser
crime, mas continua dentro do direito penal16.
Os conceitos de descriminalização e despenalização são usados muitas
vezes como sendo sinônimas confundindo muitas vezes o leitor. Cabe fazer uma distinção
entre elas: “Descriminalizar significa retirar de algumas condutas o caráter de criminosas. O
fato descrito na lei penal, como infração penal, deixa de ser crime17”.
Segundo os autores Bianchini, ET AL. (2009), há três espécies de
descriminalização:
a) Descriminalização formal – é o que retira o caráter criminoso do fato, mas
não o retira do campo do direito penal. Transforma o “crime” numa infração
penal “sui generis”. O fato descriminalizado formalmente só perde a
característica de crime, mas é punido com outras sanções.
b) Descriminalização “penal” – é o que elimina o caráter criminoso do fato e
o transforma em um ilícito civil ou administrativo. O fato descriminalizado
penalmente é eliminado do âmbito do direito penal, mas continua sendo
punido como ilícito civil ou administrativo.
c) Descriminalização substancial – a que afasta o caráter criminoso do fato
e o legaliza totalmente.
15
Bianchini, A.; Gomes, L.F.; Cunha, R.S.; Oliveira, W.T. de. Lei 11.343/06: Legislação Criminal Especial. são Paulo: editora revista dos tribunais, 2009, vol. 6, p. 163. 16
Bianchini et AL. Ibidem. 2009, p. 166. 17
Bianchini et AL. Ibidem. 2009.p. 167
9
A legalização, é o fato descriminalizado substancialmente e deixa de ser
ilícito, passa a não admitir qualquer tipo de sanção. Saí do campo sancionatorio do direito18.
Despenalizar significa suavizar a resposta penal, evitando-se ou mitigando-se
o uso da pena de prisão, mas mantendo-se intacto o caráter ilícito do fato, o fato continua
sendo uma infração de outra natureza. O caminho natural da despenilização consiste na
adoção de penas alternativas para a infração19.
Segundo o entendimento da 6ª Câmara do tribunal de justiça de são Paulo
(apelação criminal 993.07.126537-3, rel. José Henrique R. Torres, J. 31.03.2008),
considerou que portar droga para o uso próprio não configura delito, e que representaria
uma afronta ao principio da alteridade, pois pune conduta inofensiva ao bem jurídico de
terceiro, lesando o direito fundamental a liberdade, a intimidade e da igualdade, já que
subtraído individuo a prerrogativa inalienável de gerenciar sua própria vida de maneira que
lhe aprouver, independente da moralista intervenção estatal20.
O principio da alteridade resumida por Luiz Flavio Gomes, em obra coletiva e
também um dos coordenadores:
Só é relevante o resultado que afeta terceiras pessoas ou interesses de terceiros. Se o agente ofende bens jurídicos pessoais, não há crime. Exemplos tentativa de suicídio, autolesão, danos a bens patrimoniais próprios
21.
No entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal), o art. 28 faz parte do
direito penal e é crime. Apenas houve uma mera despenalização, não se podendo falar em
“Abolitio Criminis22” (STF. RE 430.105-9-RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, J.13.02.2007).
18
Bianchini et AL. Ibidem. 2009.p. 167 19
Bianchini et AL. Ibidem. 2009.p. 167 20
Bianchini et AL. Ibidem. 2009.p. 173. 21
Bianchini et AL. Ibidem. 2009.p. 174 22
“Com o abolition criminis, cessam todos os efeitos penais da condenação, além de extinguir-se a culpabilidade, não subsistindo nenhum efeito penal decorrente daquele fato (art. 107 do código penal)”.
10
O professor Luiz Flavio Gomes, entende que o art. 28, não constitui crime,
mas sim uma intervenção penal sui generis, isto é, houve uma descriminalização formal e
ao mesmo tempo despenalização, mas não abolitio criminis. Já a professora Alice
Bianchini, entende que o art. 28 não pertence ao direito penal, ma sim, é uma infração do
direito judicial sancionador, ou seja, sanção alternativa é fixada em transação penal, seja
quando imposta em sentença final, no procedimento sumaríssimo das leis dos juizados
especiais, tendo ocorrido descriminalização substancial, ou seja, abolitio criminis23.
É prevista para os usuários penas alternativas que não possuem o caráter
penal, no sentido clássico da palavra, quando imposta em transação penal, que são as
seguintes24:
a) Advertência sobre os efeitos das drogas.
b) Prestação de serviços á comunidade.
c) Medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
A lei 11.343, no seu art. 31 prevê a repressão à produção não autorizada, e
sobre o tráfico ilícito de Drogas:
É indispensável à licença prévia da autoridade competente para produzir, extrair, fabricar, transformar, preparar, possuir, manter em deposito, importar, exportar, reexportar, remeter, transportar, expor, oferecer, vender, trocar, ceder ou adquirir, para qualquer fim, drogas ou matéria- prima destinada a sua preparação, observada as demais exigências legais
25.
O art. 2º da mesma lei proíbe, em todo o território nacional, as drogas, bem
como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais
possam ser extraídas ou produzidas drogas, ressalvada a hipótese da previa autorização
legal ou regulamentar, bem como o que estabelece a convenção de Viena, das Nações
23
Bianchini et AL. Ibidem. 2009, p. 174 24
Lei de Drogas. Art. 28, Lei 11.343/2006. 25
Lei de Drogas. Art. 31, lei 11.343/2006.
11
Unidas, sobre substancias psicotrópicas, de 1971, a respeito de plantas de uso estritamente
ritualístico religioso 26.
Para além das inovações legislativas que a lei 11.343/06 trouxe, também
instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD), órgão
encarregado de articular, integrar, organizar e coordenar as atividades relacionadas com a
prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de
drogas e também, com a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de
drogas.
Essa inovação trás um reconhecimento da prevenção do uso de drogas, por
meio da educação e do tratamento dos usuários e dependentes, além de representar um
refinamento no que concerne á repressão, com aumento de penas e tipificação de novos
crimes27.
1.2 DEFINIÇÕES LEGISLATIVAS
No que refere a terminologia da palavra Droga, observamos que a
Constituição Federal dispõe de «trafico ilícito de entorpecentes e drogas afins».
As Leis 6.368/76, no seu art. 1º utilizavam as expressões “substancia
entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica”, e também a lei
10.409/2002, no seu art. 1º utilizava a mesmas expressões.
26
Bianchini et AL. Ibidem. 2009.p. 193. 27
Sistema Nacional de Politicas Públicas sobre Drogas- SISNAD: Disponivel em: «http://apache.camara.gov.br/portal/arquivos/Camara/internet/publicacoes/edicoes/elivros.html/sisnad.pdf» . Acesso em: 2012.07.16.
12
Na nova Lei de Drogas, Lei 11.343/06, utiliza simplesmente o termo “Drogas”.
Como nas Leis anteriores, ela não relaciona quais substâncias se enquadram na definição
de “Drogas”, a Lei apenas faz referencia que são produtos capazes de causar dependência,
assim especificados em Lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo
Poder Executivo da União, ou seja, trata-se de norma penal em branco, que precisa de
outra norma para completar o seu sentido.
A norma penal em branco foi utilizada pela primeira vez por Karl Binding
como explica Magalhães de Noronha:
Ele utiliza como lei penal em branco para batizar leis que continham a sanctio júris determinada, com tipo genérico formulada como proibição, a ser completado por outra lei em sentido amplo. E também é dele, a frase “a lei penal em branco é um corpo errante em busca de alma
28.
Um dos órgãos competentes do Poder Executivo da União para estabelecer o
rol de substâncias considerada Drogas, é a ANVISA (Agencia Nacional de Vigilância
Sanitária), e algumas utilizadas como insumos na produção de drogas são regulamentadas
pelo Ministério da justiça.
A ANVISA divide as substancia consideradas drogas em varias listas29:
a) Lista A1 (listas das substancias entorpecentes);
b) Lista A2 (lista das substancias entorpecentes de uso permitido
somente em concentrações especiais);
c) lista A3 e B1 (listas das substancias psicotrópicas);
d) Lista B2 (lista das substancias psicotrópicas anorexígenas);
e) Lista C1 (lista das outras substancias sujeitas a controle especial);
28
Noronha, Magalhães. Direito Penal. Editora: Saraiva, 1981, vol. 1, pág. 57. 29
Agencia Nacional de Vigilância Sanitária. Portaria n.º 344, de 12 de maio de 1998. Disponivel em: «http://www.anvisa.gov.br/legis/portarias/344_98.htm». Acesso em: 2012.07.16.
13
f) Lista D1 (lista de substancias precursoras de entorpecentes e/ou
psicotrópicos);
g) Lista D2 (lista de insumos químicos utilizados como precursores para
fabricação e síntese de entorpecentes e/ou psicotrópicos);
h) Lista F (lista de plantas que podem originar substancia entorpecentes
e/ou psicotrópicas);
i) Lista F2 (substancias psicotrópica).
A secretaria de vigilância sanitária do Ministério da saúde (SVS/MS) precisa
conceder uma licença chamada de autorização especial, a empresas, instituições e órgãos,
para o exercício de atividades de extração, produção, transformação, fabricação,
fracionamento, manipulação, embalagem, distribuição, transporte, reembalagem,
importação e exportação das substancias constantes das listas anexas a este Regulamento
técnico30.
Para a autorização da dispensa de medicamentos, das listas A1 e A2
(entorpecentes); A3, B1 (psicotrópicas), B2 (psicotrópicas Anorexígenas); C2 (retinóica para
uso sistêmico) e C3 (imunossupressoras) é preciso uma notificação de receita. Notificação
de receita é um documento que acompanha a receita autorizando a dispensa dos
medicamentos31.
Constam ainda nas listas da ANVISA, algumas substâncias que podem ser
utilizadas licitamente, como por exemplo, a Morfina e a Anfetamina. Então, comete crime de
trafico ilícito de droga “o agente que porta a substancia sem autorização ou em desacordo
com determinação legal ou regulamento32”.
30
Ibidem . 2012.07.02 31
Ibidem .2012.07.02 32
Lei de Drogas. Art. 31, Lei 11.343/2006.
14
Considerando que algumas das substâncias e produtos químicos têm
sofridos desvios de suas legitimas aplicações para serem usadas licitamente, como
precursores, solventes, reagentes diversos e adulterantes ou diluentes, na produção,
fabricação e preparação de entorpecentes e substancias psicotrópica, e ainda considerando
a frequência com que certos produtos químicos vêm sendo encontrados em laboratórios
clandestinos de fabricação ilícita de drogas ou identificados nas amostras de entorpecentes
e substancias psicotrópicas apreendidas, fica sob a competência do Ministério da Justiça a
regulamentação dessas substancias pela Portaria nº 1.274, de 25 de agosto de 200333.
A Lei 11.343/06, no seu art. 1º estabelece como sendo Drogas, todas as
substancias ou produtos capazes de causar dependência, assim especificados em Lei ou
relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União. Temos
então um conceito de Drogas, que não ficou restrito a categoria de entorpecentes, nem das
substancias causadoras de dependência física ou psíquica. Drogas serão todas as
substancias ou produtos com potencial de causar dependência, mas que estejam
relacionados em dispositivo legal competente34.
O termo droga é a nomenclatura preferencial da Organização Mundial de
Saúde – OMS, que não mais utiliza os termos ou expressões “narcóticos”, “substâncias
entorpecentes” e “tóxicos”35.
A convenção sobre entorpecentes, da ONU, promulgada em 1961 e a
convenção contra o Trafico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas, de Viena,
de 1988, ao se referirem as substancias toxicas ou entorpecentes, utilizam o Termo “Drug”.
33
Portaria nº 1.274, de 25 de agosto de 2003: Disponível em: « http://www.dpf.gov.br/servicos/produtos-quimicos/legislacao/PORTARIA1274.pdf». Acesso em: 2012.07.05. 34
Política Criminal e a lei Nº 11.343/2006. Nova Lei de Drogas: Novo Conceito de Substância Causadora de Dependência. Disponivel em:« http://jus.com.br/revista/texto/8957/politica-criminal-e-a-lei-no-11-343-2006-nova-lei-de-drogas-novo-conceito-de-substancia-causadora-de-dependencia#ixzz1ykhfrgbo. Acesso em: 2012.07.05 35
GRECO FILHO, Vicente. Tóxicos – Prevenção – Repressão. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 4.
15
A legislação Brasileira se baseia nas normas e recomendações dessas duas Convenções
internacionais como também de outras diretivas emanadas da ONU e da OMS.
A linguagem jurídica penal Brasileira também tem preferido o termo “drogas”,
referindo-se ás substancias até então legalmente denominadas de Substancias
Entorpecentes e Psicotrópicas.
O art. 66 da Lei 11.343/06, em consonância com referido parágrafo único, do
art. 1º, é taxativo ao definir como “drogas” as substancias Entorpecentes, Psicotrópicas, sob
o controle especial da Portaria SVS/MS nº344, de 12 de Maio de 1998. Trata-se de norma
penal em branco, a referida Portaria do Serviço de Vigilância Sanitária, do Ministério da
Saúde. É a norma penal em branco atuando como fonte integradora do mundo real com o
direito positivo.
Parte da doutrina considera que, melhor seria, analisando o caso concreto,
comprovar-se, através do competente laudo, a capacidade ou não, da substancia produzir
dependência36.
Acácio Rebouças, citado por Valdir Sznick, diz que: “(...) o que pensar dos
produtos estrangeiros que entram no país clandestinamente e são comercializados, e que
nunca figurão em nenhuma portaria de qualquer órgão administrativo?37”.
A convenção de Viena sobre substâncias Psicotrópicas (1971) já anotava:
Basta que uma droga tenha capacidade de produzir, um estado de dependência, estimulo ou depressão do sistema nervoso central, que cause alucinações, distúrbios de função motora, do raciocínio, do comportamento, da percepção ou do estado de ânimo ou abusos e efeitos semelhantes a uma substância constante da tabela I a IV, art. 2º. Item 4
38.
36
Bianchini et AL. Ibidem. 2009.p. 195 37
Bianchini et AL. Ibidem. 2009.p. 195 38
Convenção de Viena de 1971 sobre as substâncias psicotrópicas: Disponível em: « http://www.idt.pt/PT/RelacoesInternacionais/Documents/ConvencoesInternacionais/convencao_1971.pdf» Acesso em: 2012.07.05.
16
1.3 CONCEITOS DOUTRINÁRIOS SOBRE DROGA
A origem etimológica da palavra Droga é incerta. Ela pode ter derivado de
Drowa (árabe) cujo o significado é bala de trigo, ou também pode ser originaria de Drooge
Vate (Holandês), cujo o significado são toneis de folhas secas. As palavras que
provavelmente levaram ao aparecimento da palavra Droga ressaltam sua natureza vegetal.
O consumo de Drogas nos tempos antigos ocorria exclusivamente a partir de plantas39.
A primeira língua a utilizar a palavra tal como nós conhecemos hoje foi o
francês, Drogue, ingrediente, tintura ou farmacêutica, remédio, produto farmacêutico.
Atualmente a medicina define Droga como sendo, qualquer substancia capaz de modificar o
funcionamento dos organismos vivos, resultando em mudanças fisiológicas ou de
comportamento40.
A organização mundial da saúde (OMS) define Droga como qualquer
substância, natural ou sintética que, uma vez introduzida no organismo vivo, pode modificar
uma ou mais de suas funções. O termo droga presta-se a varias interpretações, mas para o
senso comum é uma substancia proibida, de uso ilegal e nocivo, que pode modificar
funções orgânicas, as sensações, o humor e o comportamento. Em sentido restrito as
Drogas são substancias químicas que produzem alternações dos sentidos41.
A OMS considera a intoxicação química por substancias psicoativas como
uma doença e classifica a compulsão por Drogas como transtornos mentais e
comportamentais42.
39
Álcool e drogas sem distorção. NEAD- núcleo de Einstien de álcool e drogas do hospital isrealita Albert Einstein: Disponivel em « http://apps.einstein.br/alcooledrogas/novosite/drogas_conceito.htm». Acesso em: 2012.07.05. 40
Ibidem. 2012.07.05. 41
O Assunto é Droga. Disponivel em: «http://oassuntoedroga.blogspot.com.br/2009/08/definicao-de-droga.html» Acesso em: 2012.07.05. 42
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Programa de prevenção às drogas e HIV/AIDS: Escritório contra drogas e crimes – UNODC : disponível em: « http://www.unodc.org/brazil/pt/campanha_drogas_2007.html». Acesso em: 2012.07.05.
17
Do ponto de vista farmacológico, Droga é um termo muito amplo, que
engloba qualquer substancias que, quando administrada ou consumida por um ser vivo,
modifica uma ou mais das suas funções, com exceção daquelas substancias necessárias
para a manutenção da saúde normal43.
Na tentativa de delimitar os diversos campos de significação do vocábulo em
questão, Vicente Greco Filho, citando o autor espanhol Javier Ignacio Prieto Rodriguez,
conceitua drogas, em sentido amplo, como “um fenômeno contracultural que significa
qualquer substância não admitida pela coletividade, cuja concepção esconde um jogo de
interesses e conotações subjetivistas, morais, políticas44”.
Segundo o historiador Henrique Carneiro, a palavra “droga” é um derivado do
termo holandês “droog”, usado para produtos secos e substâncias naturais utilizadas,
principalmente, na alimentação e na medicina. Antes de definir os produtos usados como
remédio, o termo “droga” representava, na época colonial, “um conjunto de riquezas
exóticas, produtos de luxo destinados ao consumo, ao uso médico e também como ‘adubo’
da alimentação” – tornando-se, mais tarde, o que conhecemos como especiarias. As
fronteiras e as diferenciações entre droga e alimento, tão bem definidas nos dias de hoje,
foram delineadas ao longo dos séculos por fortes ambições de controle político e jurídico45.
Mais do que apropriar-se da experiência do uso de Drogas, o que as
sociedades modernas parecem ter feito foi criar literalmente o próprio fenômeno das
Drogas; e o criaram sob duas vias principais: a medicalização e da criminalização da
experiência do consumo de substancias que produzem efeitos sobre os corpos e que, até
sua prescrição e penalização, não eram consideradas como Drogas46.
43
Vernancio, Renato Pinto; Carneiro, Henrique. Álcool e Drogas na história do Brasil. Editora: Puc Minas, 2005, p.157. 44
Vicente, Greco FILHO. Tóxicos: prevenção-repressão. 2009, p. 6. 45
Carneiro, Henrique, Transformações do significado da palavra ‘droga: das especiarias coloniais ao proibicionismo contemporâneo. apud in: Vernâncio, Renato Pinto; Carneiro, Henrique (orgs.). Álcool e drogas na História do Brasil. São Paulo, Alameda, Belo Horizonte, PUC Minas, 2005, p. 13-15). 46
Fiore, Mauricio. A medicalização da questão do uso de drogas no Brasil: reflexões acerca de debates institucionais e jurídicos. apud in: Renato Pinto Venâncio e Henrique Carneiro (orgs.).
18
Para o filósofo Michel Foucault, “as drogas são parte de nossa cultura”. Da
mesma forma que não podemos dizer que somos ‘contra’ a música, não podemos dizer que
somos‘contra’ as drogas47.
Algumas substâncias, nomeadas a partir de então como drogas, propiciavam
estados de loucura, comportamentos anormais e se tornavam, enfim, vícios que impediam
um desenvolvimento de uma vida social saudável e regrada. Essas substâncias foram
separadas de outras cuja a função terapêutica podia ser comprovada cientificamente, e que
terminaram restritas sob o aval dos médicos48.
A Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) do governo Brasileiro, classifica
as Drogas de forma muito pratica:
a) Drogas que diminuem a atividade mental, que são as Drogas
Depressoras. Essas Drogas afetam o cérebro, funcionando de forma mais
lenta diminuindo a atenção, a concentração, a tensão emocional e a
capacidade intelectual. Exemplos: Ansiolíticos (Tranquilizantes), Álcool,
Inalantes (cola de sapateiro), Narcóticos (Morfina, Heroína).
b) Drogas que aumentam a atividade mental são as Drogas Estimulantes.
Afetam o cérebro, funcionando de forma mais acelerada. Exemplos: Cafeína,
Tabaco, Anfetamina, Cocaína, Merla, Crack.
c) Drogas que alteram a percepção, são as substancias Alucinógenas.
Provocam distúrbios no funcionamento do cérebro, de forma que ela passa a
trabalhar desordenadamente, numa espécie de delírio. Exemplos: LSD,
Extasy e Maconha.
Álcool e Drogas na História do Brasil. São Paulo, Alameda; Belo Horizonte, PUC Minas, 2005, p. 258-259. 47
Foucault, Michel. Uma Entrevista: Sexo, Poder e Política. Ed.5º,Verve, São Paulo, 2004, p. 264-265. 48
Fiore, Mauricio. A medicalização da questão do uso de drogas no Brasil: reflexões acerca de debates institucionais e jurídicos. Apud in: Vernâncio, Renato Pinto; Carneiro, Henrique (orgs.). Álcool e Drogas na História do Brasil. São Paulo, Alameda; Belo Horizonte, PUC Minas, 2005, p. 259-260.
19
Do ponto de vista legal as Drogas podem ser classificadas, em lícitas e
ilícitas, ou Legais e Ilegais. As primeiras são vendidas e consumidas Livremente, como o
álcool e o tabaco; as segundas tem sua comercialização e o seu consumo restrito e
controlada (Tranquilizantes, Morfina, Antidepressivos, Anorexígenos etc.) ou
terminantemente proibido (Maconha, Cocaína, Crack, Merla, Heroína, etc.). A oficina Pan-
americana de Saúde classifica as Drogas em Psicoativas, as que alteram ou prejudicam o
sistema nervoso central (SNC), e Psicotrópico, as que alteram ou prejudicam o SNC e
causam dependência49.
Quanto á forma de produção, as Drogas são classificadas em:
a) Naturais - como a cafeína existente no café e no chá mate, a Nicotina
presente no Tabaco, o Ópio da semente da papoula e o THC
(tetrahidrocanabinol) do vegetal Cannabis (Maconha);
b) Às Semissintéticas - substancias naturais modificadas quimicamente no
laboratório, a exemplo do Crack, Cocaina, Cristais de Haxixe;
C) Às Sintéticas - fabricados em laboratório, exigindo para isso técnicas
especiais. São substancias ou Misturas de substancias psicoativas
produzidas através de meios químicos cujos principais componentes
ativos não são encontradas na Natureza50.
1.4 O PROBLEMA DAS SUBSTÂNCIAS NÃO CONSIDERADAS DROGAS
49
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Biblioteca virtual: Disponivel em: «www.saude.gov.br». Acesso em: 2012.07.13. 50
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO. CEBRID - Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas: disponível em: «http://www.estudobiblico.com.br/drogas/ CEBRID.htm». Acesso em: 2012.07.13.
20
Novas gerações de drogas entram no Brasil, e são consumidas livremente,
substâncias facilmente acessíveis e que imitam os efeitos das famosas drogas ilícitas são
as chamadas legal highs, conhecidas como drogas disfarçadas.
Segundo o coordenador de produtos controlados da ANVISA, ELMO
SANTANA, “enquanto essas substancias não são classificadas como proibidas ou
controladas, não se configura crime a sua utilização e comercialização”51.
Qualquer substancia, até que seja integrada na lista de droga proibida, ela
poderá ser legalmente comercializada. O tempo que leva as instituições públicas para que
seja tomada uma decisão sobre a sua proibição ou permissão não tem acompanhada a
velocidade de surgimento destas novas drogas.
É um risco muito grande porque muita dessas substâncias tem toxicidade
alta, e o efeito colateral também é muito grande, e isso só se descobre depois de algum
tempo de uso, diz Paulo Telles, pesquisador do núcleo de estudos de drogas UERJ52.
Segundo Valentin Siminov, da Romain Harm Reduction Network:
O sistema atual está focado na proibição e no controle firme de substancias em geral, mas as drogas legais podem ser uma consequência do atual sistema, porque de certo modo criminalizar as drogas clássicas seria um incentivo para sinterização de outras drogas
53.
Destas novas drogas destaque-se a Mifedrona que tem servido como uma
droga substituta da cocaína e do Ecstasy ou o Spice como substituta da Canabis. A
Mefedrona tem sido comercializada como fertilizantes para ter um enquadramento legal
enquanto que o Spice para todos os efeitos é um incenso54.
A atual política proibicionista tem incentivado o surgimento destas novas
substancias no mercado. E mais uma prova de que a política de “Guerra as Drogas” para
51
Drogas novas, criadas em laboratórios, entram livremente no Brasil: Disponivel em:«fantástico.globo.com/jornalismo/fant/o,mul1679999-15605,00html»: Acesso em: 2012.07.13. 52
Ibidem. 2012.07.13. 53
Euronews right on. Voar sem limites: A Realidade das Drogas legais. Disponivel em: «www.youtube.com/watch?v=dg_limjx2dq». Acesso em: 2012.07.13. 54
Novas drogas. Venda legal: risco desconhecido. Disponivel em: «esquerda.net/dossier/novas-drogas-venda-legal-risco-desconhecido?pag=7». Acesso em: 2012.07.13.
21
além de ser ineficaz no seu objetivo de erradicar as drogas do planeta, contribui ainda para
o aparecimento de novas drogas.
2 ANALISE DA LEI DE ANTITÓXICOS (LEI 6368/76) E DA LEI DE DROGAS (LEI 11.343/06) 2.1 LEI 6368/76 – LEI ANTITÓXICOS
A lei 6369/76 conhecida como a lei antitóxicos dispõe no seu capitulo I, sobre
as medidas de prevenção e repressão ao trafico ilícito e uso indevido de substancias
entorpecentes ou substancias que determinem dependência física ou química, que se
encontram nos artigos 1º a 7º da lei.
A lei 6368/76 entendia como substancia entorpecente ou substancia que
determina dependência física ou psíquica, aquelas que assim forem especificadas em lei ou
relacionadas pelo serviço nacional de fiscalização da medicina e farmácia, do ministério da
saúde. Trata-se de norma penal em branco, que precisa de outra lei ou regulamento para
completar o seu sentido e alcance, se faz mister que seja a substancia ou especialidade
farmacêutica prevista por lei, ou prevista por Portaria do Ministério da Saúde.
No capitulo II, traz a lei o tratamento e a recuperação de dependentes de
substancias entorpecentes, que se encontram nos arts.8º a 11º.
Na pratica de crime pelo dependente, ele sujeitar-se-á ás normas previstas
nos arts. 9º a 11 da lei 6368/76 independentemente do cometimento de qualquer dos delitos
definidos no art. 12. Praticado esses crimes dos artigos apresentados em cima, o fato não
constituiria condição de tratamento55.
No capitulo III, se encontram dispostas os crimes e as penas, art. 12 a 19 da
lei 6368/76.
55
Jesus, Damasio E. Leis Antitóxicos anotada. São Paulo, Ed. Saraiva, 1995, p.5.
22
O art. 12 aprofunda mais sobre a matéria trazendo os conceitos de droga,
toxico, psicotrópico, dependência física, dependência psíquica, tolerância, compulsão,
passador e experimentador. O art.12 no seu caput, diz o seguinte:
Art. 12. Importar ou exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda ou oferecer, fornecer ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a consumo substancia entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 3 (três) a 15 (quinze) anos, e pagamento de 50 (cinquenta) a 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.
Ainda diz os parágrafos 1º e 2º, que incorre nas mesmas penas do art. 12,
quem tiver em deposito, transportar, trazer consigo ou guardar matéria prima destinada á
preparação de substancia entorpecente ou que cause dependência física, também quem
semeia, cultiva ou faz a colheita de plantas destinadas á preparação de entorpecente56.
Incorre ainda nas mesmas penas, quem induz, instiga ou auxilia alguém a
usar entorpecente; e também quem utilizando da sua propriedade, posse, administração,
guarda ou vigilância ou permite que alguém utilize, ainda que de forma gratuita, para trafico
de entorpecente, parágrafo 2º, inc II da lei 6368/7657.
O artigo 12 faz referencia a alguns fatos que não se trata de trafico
propriamente dito, como por exemplo, a cessão gratuita e a divisão da droga. Em face
dessa problemática a jurisprudência dos tribunais firmou o entendimento, explicitando que:
“a simples cessão de entorpecente ou droga afim entre companheiros não configura o delito
do art. 12, inserindo-se na descrição do art. 16”58.
Também a 1º turma do STF, no HC 69.806 em que foi relator o Ministro
Celso de Mello, explicou que:
A legislação penal brasileira não faz qualquer distinção, para o efeito de configuração típica do delito de trafico de entorpecentes, entre o comportamento daquele que fornece gratuitamente e a conduta do que, em caráter profissional, comercializa a substância tóxica. Assim, a noção legal de trafico de entorpecentes não supõe,
56
Idem. Ibidem. 1995, p.7. 57
Idem. Ibidem. 1995, p.7 58
Idem. Ibidem. 1995, p.8
23
necessariamente, a pratica de atos onerosos de comercialização (RT, 701:401). O tipo não exige a efetivação do comércio (RT, 549:393)
59.
Convenção de Viena contra o trafico ilícito de entorpecentes e de substancias
psicotrópicas foi concluída em Viena, a 20 de Dezembro de 1988, aprovada pelo decreto
legislativo nº 162, de 14 de junho de 1991, e entrou em vigor internacional em 11 de
novembro de 1990.
Essa convenção trouxe novas preocupações e urgências para o combate ao
trafico de drogas. Além de trazer novas preocupações ela trouxe novas responsabilidades
aos estados no combate às drogas.
No plano da saúde pública, o progresso da humanidade trouxe novos tipos
de doenças e vícios, exigindo do estado cuidado redobrado no sentido de assegurar um
mínimo de nível decente de vida.
A dogmática penal tradicional estava acostumada a tratar de interesses
jurídicos tangíveis, como a vida, a incolumidade física, o patrimônio etc., normalmente
relacionadas a um individuo e de lesões facilmente perceptíveis. Tais delitos sempre têm
em vista um agente e um fato60.
A saúde publica no que se relaciona especialmente com o crime de trafico de
entorpecentes e drogas afins, cujo interesse de prevenção e repressão se encontra previsto
nas constituições federais da maioria dos países, na constituição brasileira ela encontra
respaldo no art. 5º, XLIII, 108, V, e 200, VII. O objeto principal da proteção penal nos crimes
de trafico ilícito e uso indevido de entorpecentes e drogas afins é a saúde pública61.
Realmente, o interesse jurídico concernente á saúde pública, de natureza
difusa, não é fictício. Resulta que os delitos de trafico e uso indevido de entorpecentes e
drogas afins têm a saúde pública como objeto jurídico principal ou imediato, entendida como
“o estado em que o organismo exerce normalmente todas as suas funções”. O direito a
59
Idem. Ibidem. 1995, p. 8. 60
Idem. Ibidem. 1995, p.9. 61
Barreto, Menna. Estudo Gerald a nova Lei de toxicos. 2º. Ed., Rio de Janeiro. Ed. Rio, 1978, p. 83.
24
vida, à saúde individual, à juventude, à segurança coletiva e á ordem pública, compõem a
sua objetividade jurídica secundaria ou mediata, e são tutelados por eles de forma indireta
ou reflexa62.
Dessa forma, se em consequência de overdose de cocaína oferecida por um
traficante há morte de um consumidor, surge um concurso de crimes63.
Em suma a objetividade jurídica é dupla: “protege-se a saúde publica tendo
como a objetividade jurídica principal, no sentido de interesse do estado de preservação e
normal funcionamento do organismo dos membros da sociedade”64.
Nesse sentido o STF, no RECrim. 109.435, RT, 618:407 e 08 firmou o
entendimento de que a norma protegeria também outros bens jurídicos, como a vida, a
saúde pessoal, a família, que os chamaria de objetividade jurídica secundaria.
O doutrinador Martín Gonzáles nos esclarece que: “ a saúde publica como
interesse jurídico difuso, não resulta das somas das saúdes individuais dos membros que
compõem a coletividade”. Nas palavras dele “o termo se refere ao nível da saúde da
coletividade”65.
A natureza jurídica dos crimes de trafico e uso indevido de entorpecentes e
drogas afins é de perigo abstrato. Como se sabe, nos delitos de perigo abstrato, este não
precisa ser comprovado, é suficiente a realização da conduta, sendo a situação de perigo
presumida pelo legislador66.
Transcrição do art. 16 da lei 6368/76, diz a redação do art.:
Art.16 – Adquirir, guardar ou trazer consigo, para uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de 20(vinte) a 50 (cinqüenta) dias-multa.
62
Arzamendi, J.L de La Cesta. Drogas, abordagem interdisciplinar, fascículos de ciências penais. Sérgio A. Fabris Editor, Porto Alegre, 1990. V. 3, n.2, p. 38. 63
Rodriganez, Maria Paz Arenas. Proteccion penal de la saúde pública y fraudes alimentares. Madrid, Edersa, Editoriales de derecho reunidas, 1992, p. 130. 64
Cernicchiaro, Luiz Vicente. Dicionario de direito penal. Brasilia, Ed. Universidade de Brasilia, 1974, p. 447. 65
Gonzáles, Martín. Sanidad Pública: Concepto y Escuadramiento. Madrid, 1970, p. 422. 66
Idem. Op. Cit. 1995, p. 12.
25
Se tomarmos por base a aplicação da pena do art. 16, percebemos que a
intenção do legislador foi a de punir com mais severidade esse delito, não se preocupando
com a figura do usuário de drogas, não o tratando como um problema de saúde pública,
mas sim como problemática apenas de ordem jurídica.
Como bem ressalta o doutrinador Greco Filho:
Para a incidência do art. 16, portanto as condutas “adquirir”, “guardar” e “trazer consigo” só podem ser praticadas quando a finalidade exclusivamente seja o uso próprio e não seja ela desviada pelo fornecimento a terceiro
67.
Para a configuração do art. 16 é necessário um fim especial de agir, ou seja,
a substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica deve destinar-
se “para uso próprio”. Porque se for para uso de terceiro configurará o crime de trafico do
art. 12 da lei 9368/7668.
É imperioso, observar que, se faz necessário a prova da exclusividade da
destinação para uso próprio, tanto que no sistema anterior ao Decreto-lei nº 385, o critério
único de destinação era o da pequena quantidade, circunstância que determinou que o
tráfico passasse a ser feito sempre em pequenas quantidades, de modo a possibilitar ao
traficante a arguição constante do uso próprio.
Neste palco, o artigo 37 da Lei definiu outras circunstâncias que deverão ser
levadas em consideração para a caracterização do delito, sendo elas: local e as condições
em que se desenvolveu a ação criminosa, as circunstâncias da prisão, bem como a conduta
e os antecedentes do agente.
O capitulo IV traz os procedimentos criminais, do art.20 a 35, e no capitulo V,
as disposições gerais, do art. 36 a 47 da lei.
67
GRECO FILHO, Vicente. Tóxicos: prevenção – repressão: comentários à Lei nº 6.368, de 1976, acompanhados da legislação vigente e de referência e ementário jurisprudencial. 11.ed. atual. São Paulo, Ed. Saraiva, 1996. p. 113. 68
Marcão, Renato. Tóxicos: Leis n. 6.378/76 e 10.409/02: anotadas e interpretadas. 2.ed. rev. e. ampl.São Paulo. Ed. Saraiva, 2005. p. 219.
26
2.2 LEI 11.343/06 – LEI DE DROGAS
A lei 11.343, de 23 de agosto de 2006, denominada “nova Lei de Drogas”
entrou em vigor no dia 8 de outubro de 2006 e instituiu importantes mudanças no campo
normativo e no campo social.
Pode-se considerar a “Nova Lei de Drogas” um avanço em relação ás outras
leis de drogas já promulgadas no Brasil, apesar de ainda não ter uma abordagem
totalmente humanista da droga.
O art. 1º, da lei 11.343/06, inova em relação às leis anteriores a ela quando
traz no seu caput o Sistema Nacional de Políticas públicas sobre Drogas, à SISNAD.
O Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas tem por finalidade articular,
integrar, organizar, e coordenar as atividades relacionadas com a prevenção do uso
indevido, atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de drogas, e também a
repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas, artigo 3º, I, II da lei.
A prevenção do uso de drogas ocorre principalmente através da educação
sobre os malefícios das drogas, sobre os efeitos das drogas, que deve ser tratada com a
ajuda da família, das escolas, em hospitais que tratam de dependentes ou usuários,
entidades religiosas, clubes etc., mas que deve ser assistida e autorizada pela SISNAD69.
A reinserção social do usuário ou dependente de drogas se faz necessária
devido à existência de uma cultura própria das pessoas usuárias de drogas. Logo, para
aquele que além de usar drogas também compartilha de uma cultura que não é
convencional ou de uma subcultura, necessário se faz dar oportunidades de aceitação do
outro, por parte do convencional pelo que ele é como pessoa e por parte do estigmatizado
69
Bacila, Carlos Roberto; Rangel, Paulo. Comentários penais e processuais penais à lei de drogas. Ed. Lumen Juris. Rio de Janeiro, 2007, p. 6.
27
aceitar-se também como possibilidade de viver de forma mais saudável e mais segura ao
abandonar as drogas70.
A repressão ao trafico trazida pela “nova lei de Drogas”, visa desconstituir a
essa atividade ilícita e dos lucros econômicos astronômicos, proporcionadas pelo comercio
ilegal de drogas. Essa atividade é bastante lucrativa e que não recebe fiscalização sobre a
qualidade do produto, de falta de advertência sobre perigos adicionais aos males mais
comuns, como é o caso da overdose71.
Um dos princípios básicos da SISNAD é a observância das normas do
CONAD. A lei determina observância às orientações e normas emanadas do Conselho
Nacional Antidrogas (CONAD), órgão colegiado que tem o objetivo de promover a Política
Nacional Antidrogas, organizar o SISNAD e avaliar a gestão de recursos do Fundo Nacional
Antidrogas.
Outra grande inovação trazida pela lei 11.343/06 é do art. 28, que trata da
droga para uso próprio. Diferentemente de outras leis que o antecederam ele retirou da lei a
pena privativa de liberdade que era imposto ao usuário de drogas, e também ao produtor de
pequenas quantidades de drogas destinadas ao consumo pessoal.
Houve uma mudança de características da lei, foi mantida a tipificação, mas
lhe foi retirado o cunho punitivo, passando a auxilio ao usuário e ao dependente de droga.
As medidas sancionatórias do art. 28, não mais prevê pena privativa de liberdade ou multa,
salvo se não houver cumprimento das medidas anteriores72.
O atual tipo penal que dispõe sobre a posse de drogas para uso próprio
acrescentou dois verbos relativamente à lei 6368/76, que prescrevia, “adquirir, guardar ou
trazer consigo, enquanto que atualmente o tipo atinge quem, adquirir, guardar, tiver em
deposito, portar ou trouxer consigo a droga para consumo pessoal”. A aquisição pode ser a
qualquer titulo, gratuito ou oneroso. Constitui também norma penal em branco, por isso
70
Idem. Op. cit. 2007, p. 6. 71
Idem. Op. Cit. 2007, p. 7. 72
Idem. Op. Cit. 2007. P. 44.
28
necessita da complementação e da regulamentação da Portaria SVS/MS 344, de 12 de
maio de 199873.
As drogas propriamente ditas constituem elemento descritivo do tipo, pois
constituem coisas perceptíveis pelos os sentidos, e a falta de autorização ou o desacordo
com determinação legal ou regulamentar constituem elemento normativo jurídico do tipo. Se
por exemplo um paciente possui droga prescrita legalmente por um médico, a conduta é
atípica. O tipo também pode ser considerado unissubjetivo, pois pode ser praticado por um
só agente ou mais, também pode ser considerado crime de mera conduta ou mera
atividade, pois não se exige determinação de relação de causalidade, e os problemas de
tempo e lugar do crime tornam-se reduzidos, ou seja, se o agente trouxer consigo a droga
de uma cidade para outra, não há que se falar sobre onde ocorreu o resultado, afinal, o
crime nessa modalidade de trazer consigo também é permanente74.
Os tipos do art. 28, caput e parágrafo 1º são tipos de ação múltipla, ainda que
o agente pratique mais de uma ação descrita no tipo, somente responde por um crime. O
tipo subjetivo é constituído do dolo, constituído este na vontade de ter a posse da droga nas
formas dos verbos descritos no tipo. Além do dolo deve existir o elemento subjetivo do tipo
diverso do dolo, consiste na vontade de ter a droga para consumo pessoal. Esse elemento
e extremamente importante, pois sem ele o agente incidiria na figura gravíssima do trafico
prevista no art. 3375.
A própria lei procurou demonstrar como se faz a prova do elemento subjetivo
para consumo pessoal, destinando no parágrafo 2º uma orientação exemplificativa, como a
natureza e quantidade da substancia apreendida, pois dois gramas de maconha pode
configurar posse para o uso, mas dois gramas de LSD podem significar tráfico, pois essa
droga é muito concentrada. Devem esses indícios serem analisados em conjunto com
73
Idem. Op. Cit. 2007, p. 44-45. 74
Idem. Op. Cit. 2007, p. 46. 75
Idem. Op. Cit. 2007, p. 46.
29
outros indícios indicados no parágrafo 2º, como o local e as condições em que desenvolveu
a ação76.
O art. 31 da lei 11.343/06 trata da repressão à produção não autorizada e ao
tráfico ilícito de drogas, que estabelece a produção de drogas ou matéria-prima destinada a
sua preparação e as condutas correlatas, como possuir, manter em depósito, etc.,
dependem de licença prévia da autoridade competente. A lei 6368/06 fazia regulamentação
semelhante, mas não se referia à licença prévia da autoridade competente. Agora antes de
possuir ou produzir ou realizar qualquer das condutas previstas no disposto do art. 31,
deve-se providenciar a licença prévia da autoridade competente77.
O tipo de trafico de drogas vem descrito no art. 33 da lei 11.343/06, diz o
artigo 33:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor a venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias – multa.
O bem jurídico protegido é a saúde pública, e esse bem jurídico é finalidade
da norma tanto nos tipos de trafico ou similares quanto nos tipos de posse de drogas para
consumo pessoal ou similares. A simples posse de droga, para o trafico ou o uso próprio
tem o potencial de atingir a sociedade principalmente no que se refere à saúde pública, isto
é, a saúde das pessoas como um bem geral e não de um individuo78.
Trata-se de um tipo comum, exceto na figura de prescrever que implica
profissional como médico ou dentista, quando o tipo é próprio ou especial. Sujeito passivo
são o estado e a coletividade, tendo em vista que o bem jurídico tutelado é a saúde pública.
Como o tipo do art. 28, o art. 33 também e de ação múltipla, ou seja, ainda que o agente
76
Idem. Op. Cit 2007, p. 47. 77
Idem. Op. Cit. 1997, p. 79. 78
Idem. Ibidem. 1997, p. 84.
30
pratique mais de uma ação descrita no tipo através dos verbos, somente responde por um
crime79.
A nova lei, no artigo 33, caput, repetiu os dezoito verbos do tipo de trafico da
lei anterior,com a diferença de que a lei nº 6368/76 o artigo 12 mencionava a expressão,
“entrega, de qualquer forma”, e a lei atual deixou de repetir as palavras de “qualquer forma”,
pois agora o tipo previsto no parágrafo 3º prevê pena bem mais branda para aquele que
oferece a droga sem objetivo de lucro para a pessoa do seu relacionamento, constituindo a
entrega da droga para tal pessoa mero exaurimento do tipo menos grave80.
A sutil retirada do termo “de qualquer forma” conjugada com o tipo do artigo
33, parágrafo 3º, tornou-se o artigo 33, caput, Lex Mittior e Lex Gravior ao mesmo tempo,
dependendo da conduta praticada pelo autor.
O tipo descrito no art. 44 da lei 11.343/06, estabelece o seguinte:
Art. 44. Os crime previstos nos arts. 33, caput e parágrafo 1º, e 34 a 37 desta lei são inafiançáveis e insuscetíveis de “Sursus”, “Graça”, “Indulto”. “Anistia” e “Liberdade Provisória”, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos: Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao reincidente especifico.
A constituição federal no seu, artigo 5º, XLIII, equiparou as condutas
adequadas ao tráfico de drogas aos crimes considerados hediondos, isto é, o crime de
trafico de drogas fica insuscetível de graça ou anistia, a impossibilidade de saída mediante
pagamento de fiança, além de outras medidas previstas na lei 8072/90, como o
cumprimento da pena em regime inicialmente fechado. Hediondo é um crime horrendo,
repugnante81.
Apesar de a lei nova corrigir algumas imperfeições normativas, e de trazer
algumas inovações em relação á lei Antitóxicos (lei 6368/76), ainda assim não acompanha a
realidade em que vive o Brasil hoje.
79
Idem. Ibidem. 1997, p. 85. 80
Freitas Junior, Roberto Mendes de. Drogas: comentários a lei nº 11.343,2006. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 48. 81
Rodrigues, Diego. Lorouse ilustrado da lingua portuguesa. São Paulo: Larousse do Brasil,
2004, p. 464.
31
A lei nova não foi capaz de resolver o problema da epidemia de crack, do
aumento crescente da demanda e consequentemente da oferta, ainda não foi capaz de
resolver o problema das mortes decorrentes do uso e do trafico de drogas, o seu cunho
repressivo ainda não foi capaz de dar uma resposta social e nem política.
3 MODELOS DE CONTROLE SOBRE DROGAS 3.1 MODELOS PROIBICIONISTA
“A religiosidade é um dos aspectos básicos para se compreender as origens da proibição das drogas no mundo moderno, especialmente porque, um dos pilares da política proibicionista veio da influência do protestantismo norte americano, e de seu ideal religioso de abstinência, pregado pelas proeminentes figuras de formação religiosa que atuaram como influentes arquitetos do proibicionismo
82.
Até a Idade Média não havia proibição ao uso de drogas, mas tão somente
algumas prescrições morais trazidas pela doutrina cristã. Os historiadores sociais
identificaram dois tipos de uso social de drogas na transição entre a Baixa Idade Média e
Renascimento:
Nas classes baixas, um uso desesperado, famélico, escapista, e nas classes altas, um consumo de especiarias que se confunde com a busca de remédios exóticos, cuja eficácia costuma ser medida pelo
preço das substâncias empregadas na confecção das drogas83
.
O uso de drogas psicoativas, até o início do século XX, envolvia dois
diferentes caminhos: o uso médico, destinado a aliviar sintomas, distúrbios e patologias
mentais, e o uso recreacional, que modificava o comportamento normal e produzia estados
alterados de consciência. Após terem as drogas surgido como promissores medicamentos,
82
Como o Bispo de Manila, Monsenhor Charles Henry Brent (1862-1929), que teve papel fundamental da articulação da primeira conferência internacional sobre drogas de Xangai, em 1909. 83
CARNEIRO, Henrique. Filtros, Mezinhas e Triacas: As Drogas no Mundo Moderno. São Paulo: Xamã, 1994, p. 51.
32
despertando grande interesse da classe científica, acabaram chamando a atenção da
população que foi se afastando do discurso e do controle médico para um uso hedonista, de
prazer e recreação84.
Na atual política de controle de drogas, portanto, têm em sua origem
aspectos religiosos econômicos e sociais, muito embora na atualidade seja mais perceptível
o discurso oficial medico. Não como se deixar de analisar o quadro dentro de um contexto
mais amplo, que leva, na atualidade, á coexistência de drogas proibidas, de consumo
semiclandestino, por um lado, e de substancias “terapêuticas” legais, fabricadas pelas
grandes indústrias multinacionais, cuja diferenciação é feita por critérios políticos-
legislativos e sofre a influência de “atitudes sócias que determinam quais drogas são
admissíveis e atribuem qualidades éticas aos produtos químicos”85.
Os conflitos decorrentes do comercio do ópio entre China e Inglaterra,
ocasionaram a guerra do ópio entre essas duas potências, e marcaram o inicio de debates
internacionais sobre o controle dessa e de outras substancias psicoativas no inicio do
século XX.
A conferencia de Xangai teve uma grande importância na criação do sistema
proibicionista, esboçando um sistema de cooperação internacional em assuntos de droga,
inspirando a primeira convenção sobre o ópio de 1912.
A primeira convenção sobre o ópio foi realizada em 1912, em Haia,
incentivada pelos Estados Unidos da America, que pressionava pela implementação da sua
política a nível internacional sobre a proibição das drogas, que explicitamente exigia a
limitação da produção do ópio e ópiaceos (Morfina), incluindo pela primeira vez a cocaína.
Estabeleceu-se a necessidade de cooperação internacional no controle de narcóticos,
restringindo-se seu uso lúdico, apenas permitido o uso médico86.
84
MUSTO, David. One hundred years of cocaine. Westport: Auburn House, 2002. 85
ESCOHOTADO, A. Historia de las drogas. Madrid: Alianza Editorial, 1996. 86
Rodriguez, Luciana Boiteux de Figueiredo. Controle penal sobre as drogas ilícitas: o impacto do proibicionismo no sistema penal e na sociedade. Tese de Doutorado. Universidade de são Paulo: Faculdade de Direito. São Paulo 2006, p. 38.
33
Em 1995, é assinada a 2ª convenção internacional sobre o ópio, que
significou um grande passo a frente no controle das drogas narcóticas, ao determinar aos
governos nacionais a submissão de estatísticas anuais sobre a produção o consumo e
fabrica de drogas á recém-criada “Permanent Central Opium Board”, implementa-se assim o
primeiro sistema de monitoramento de drogas a nível internacional87.
Alguns anos depois, em 1931, foi elaborada a 1ª Convenção de Genebra
destinada a limitar a fabricação e regulamentar a distribuição dos estupefacientes ou drogas
narcóticas, que limitou a fabricação mundial de drogas para finalidades médicas e
científicas, e restringiu as quantidades de drogas disponíveis em cada estado e território,
sendo vetado aos países signatários que excedessem a fabricação ou importação das suas
necessidades de narcóticos previstas. Cinco anos depois, em 1936, foi assinada a 2ª
Convenção de Genebra, direcionada especificamente à supressão do tráfico ilícito de
drogas perigosas, que entrou em vigor em 1939, na qual as partes se comprometeram a
efetivar medidas para prevenir a impunidade de traficantes e a facilitar a extradição por
crimes de tráfico88.
Com a criação das Nações Unidas em 1945, após o fim da 2ª Guerra
Mundial, foram estabelecidas as linhas mestras do controle internacional de drogas vigente
até os dias de hoje, tendo sido concluídas três convenções, ainda hoje em vigor.
A primeira Convenção das Nações Unidas sobre o tema foi a Convenção
Única sobre Entorpecentes de 1961. Ela instituiu um amplo sistema internacional de
controle e atribuiu a responsabilidade aos estados partes da incorporação as medidas ali
previstas além de ter reforçado o controle sobre a produção, distribuição e comércio de
drogas nos países nacionais, e proibido expressamente o fumo e a ingestão de ópio, assim
como a simples mastigação da folha de coca e o uso não médico da cannabis.
A política proibicionista defendida pela ONU vem sendo questionado por
alguns países europeus, que decidiram dar outros rumos às suas políticas internas, por
87
Idem. Op. Cit. 2006, p. 39. 88
Idem. Ibidem. 2006, p. 39
34
reconhecerem os excessos do modelo vigente. Porém, os países em desenvolvimento
continuam seguindo a política proibicionista por várias razões, dentre elas a grande
influência norte-americana e o medo de sanções econômicas previstas para o caso do não
cumprimento de tratados internacionais89.
Desde 1912, quando a comunidade internacional criou o primeiro instrumento
multilateral de controle de drogas, treze instrumentos internacionais foram discutidos,
redigidos, assinados e ratificados pela maioria dos países do mundo, que decidiram adotar
uma estratégia comum para lidar com o problema das drogas. No entanto, poucos
resultados práticos foram alcançados, pois, apesar da proibição, se mantém a produção, o
tráfico e o consumo de substâncias em todos os países do mundo.
Diante desse quadro, há que se questionar a política internacional
repressora, e destacar a necessidade de se respeitar as situações específicas de
determinadas comunidades e países, levando em consideração seus elementos culturais,
étnicos e principalmente econômicos, ao invés de se manter um sistema uniforme e
repressivo, que não tem atendido, em absoluto, aos objetivos a que se propuseram, e que
vem causando tantos efeitos colaterais perversos90.
O modelo proibicionista de controle de drogas opõe-se aos demais modelos
alternativos por seu fundamento jurídico-moral, unido ao sanitário-social, e constitui hoje o
modelo internacional imposto a todos os países pelas Nações Unidas por meio de tratados
internacionais vinculantes, que sujeitam os países não aderentes a sanções internacionais
econômicas. Foi implementado em oposição ao total liberalismo que existia até o início do
século XX, e caracteriza-se pelo controle da oferta, da produção e do consumo. Busca
dissuadir o uso de determinadas substâncias através da coação e da ameaça de punição,
em especial com pena de prisão, e tem por objetivo alcançar o ideal da abstinência91.
Assim, em tese, o modelo proibicionista pode ser estendido a todo tipo de
consumo considerado como impróprio, inclusive o álcool e o tabaco, sendo o mais
89
Idem. Ibidem. 2006, p. 45. 90
Idem. Ibidem. 2006, p. 45. 91
Idem. Ibidem. 2006, p. 46.
35
comentado exemplo a Lei Seca nos Estados Unidos, que vigorou por mais de dez anos,
mas não conseguiu diminuir as fortes raízes do consumo social de bebidas alcoólicas.
Naquela época, o crime organizado teve enormes lucros e nunca se consumiu tanto álcool
nos EUA. Não obstante, enquanto durou a proibição, a intensidade da repressão levou
muitos à prisão por uso de álcool. O fracasso desse tipo de política, marcada pela
intransigência, levou à liberação do consumo de bebidas alcoólicas, enquanto a tese
proibicionista se voltou para os estupefacientes, por influência comercial e política92.
Na Europa, é citado o caso do Gin Act inglês de 173693 que equivalia a uma
proibição indireta pela via fiscal, com o aumento da carga de impostos, tendo por objetivo
tornar o produto tão caro que os pobres não poderiam consumi-lo em excesso94.
No século XVII, a Rússia executava quem quer que fosse flagrado portando
tabaco, sendo que em 1650 o Sultão do Império Otomano decretava a pena de morte aos
fumantes, assim como na Alemanha, em 1691 eram os fumantes condenados à morte95.
O discurso punitivo que fundamenta o modelo considera a proibição como
única opção para se lidar com os malefícios da droga. Trata-se de uma escolha simples em
teoria, mas extremamente difícil na prática, pois se presume, sem nenhuma base empírica,
que a interdição pela lei penal, sob ameaça de pena, fará as pessoas mudarem seus
hábitos, gostos e escolhas e deixar de consumir determinadas substâncias, apenas pelo
fato destas serem ilícitas96.
Diz-se, portanto, repousar o modelo proibicionista sobre o fundamento moral
diretamente trazido da moral protestante do século XIX, que vê na abstinência um ideal de
virtude, não sendo à toa que os principais sistemas proibicionistas tenham se inspirado no
92
Idem. Ibidem. 2006, p. 47. 93
A mania Gin foi um período na primeira metade do século 18, quando o consumo de “Gin” aumentou rapidamente na Grã-Bretanha , especialmente em Londres. Muitas pessoas overconsumed e a cidade teve uma epidemia virtual de extrema embriaguez, o que provocou a indignação moral e uma reação legislativa que alguns comparam com as modernas guerras de drogas. O Parlamento aprovou cinco atos principais, em 1729, 1736, 1743, 1747 e 1751, projetado para controlar o consumo de “Gin”. 94
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Droit de la drogue. Paris: Dalloz, 2000, p. 95-96. 95
SZASZ, Les rituels de la drogue. Paris: Payot, 1976, p. 219, apud in: CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. op. cit, p. 95. 96
Idem. Op. Cit. 2000, p. 96.
36
catecismo das igrejas anglicanas. Como bem analisa Caballero, a “tese de abstinência”
idealiza a figura de um cidadão “modelo”: religioso, abstêmio, sem vícios e que vive
tranquilamente em sociedade. Contudo é de difícil realização prática, pelo dado
antropológico de que as pessoas sempre consumiram algum tipo de droga. Por mais que se
considerem certas virtudes sociais de comportamentos socialmente regrados e
conformistas, não há como se impor um modelo ideal a toda uma sociedade97.
As bases da primeira lei que proibiu o uso de drogas nos EUA estão
diretamente ligadas não só à crescente preocupação dos norte-americanos, mas também
tiveram um motivo adicional: a proibição, em 1905, do uso não médico do ópio nas Filipinas,
um protetorado norte-americano na Ásia. Foi a partir daí que os EUA lançaram uma
campanha mundial para o controle internacional sobre os narcóticos, com várias motivações
declaradas: a conciliação com a China, visando a incrementar as relações comerciais com
aquele país; e a suposição ainda atual de que o controle da produção e do tráfico nos
países produtores poderia bloquear o consumo de drogas em território americano. Tal
postura levou os EUA a apoiarem a realização de encontros e conferências internacionais,
tal como a Conferência de Xangai em 1909, e depois em Haia, onde doze nações
assinaram uma convenção na qual se comprometiam a restringir e controlar a circulação de
entorpecentes.
Transform drug policy foundation (TDPF) define a proibição como sendo um
paradigma de política global que criminaliza a produção, a oferta e o consumo de algumas
drogas especificas na busca pela eliminação das drogas da sociedade98.
Desde que foi declarada, a “guerra às drogas” tornou-se praticamente
unanime na abordagem internacional da questão das substancias psicoativas ilegais. A
política proibicionista é considerada necessária para reduzir o consumo de drogas e, desta
maneira, reduzir também os males causados por este consumo.
97
Rodriguez, Luciana Boiteux de Figueiredo. Ibidem. São Paulo 2006, p. 49. 98
TDPF – Transform Drug Policy Foundation. After the war on drug: options for control. Bristol: 2009.
37
Rodrigues aponta que, desde de 1972, a política de guerra as drogas iniciada pelo então presidente dos estados unidos, Richard Nixon, tratava as drogas como uma doença social. Neste contexto, o estado deveria ser o responsável por “curar” a sociedade deste mal, através da repressão aos consumidores e narcotraficantes. O objetivo desta política é uma sociedade livre das drogas, uma sociedade “limpa”
99.
Partindo da noção de estigma, Goffman faz referencia a criação da palavra
estigma pelos gregos, definida como sinais corporais com os quais se procurava evidenciar
alguma coisa de extraordinário ou mau sobre o status moral de quem os apresentavam,
para o autor, o estigma caracteriza uma situação na qual o individuo está inabilitado para a
aceitação social plena. Desta maneira, os discursos que apresentam uma visão
preconceituosa, repressora e, por vezes, moralistas, visando exercer influencia na opinião
pública também são responsáveis pela estigmatização do usuário. Na visão de Mota,
“predominam no imaginário as representações estereopitadas do usuário atreladas a
loucura, á violência e ao crime100.
Dessa forma, emerge “o sentido de que a droga é hoje a única causa dos
problemas que, por outras razões, sempre estiveram presentes na historia da humanidade”,
como apontam Bucher e Oliveira 101.
Dentre a maioria dos programas repressivos destaca-se a aplicação de
políticas atuando em duas frentes, a redução da oferta e a redução da demanda de drogas.
No Brasil, segundo o conselho nacional antidrogas (CONAD), a política
nacional sobre drogas no que se refere á redução da oferta é em parte disposta a seguir:
Resolução nº 3/gsipr/ch/conad, de 27 de outubro de 2005. As ações continuas de repressão devem ser promovidas para reduzir a oferta das drogas ilegais e/ ou de abuso, pela erradicação e apreensão permanentes estas produzidas no país, pelo bloqueio do ingresso das oriundas do exterior, destinadas ao consumo interno ou ao mercado internacional e pela identificação e desmantelamento das organizações criminosas
102.
99
Rodrigues, Thiago. Política das drogas e a lógica dos danos. Revista Verve, São Paulo, Nu-Sol/ PUC- SP, nº 3, 2003. 100
Gofman, E. Estigma. Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. Rio de Janeiro: LTC, 1988. 101
Bucker, R; Oliveira, S.R.M. O discurso do “combate ás drogas” e suas ideologias. Revista Saúde pública, v.28, n.2, p. 137-154, 1994. 102
CONAD – Conselho Nacional Antidrogas. Política Nacional Antidrogas. 2005. Disponível em: HTTP://www.senado.gov.br/documentos_diversos_legislação/documentos_diversos_legislação.html. acesso em: 19 de setembro de 2012.
38
O segundo método de atuação bastante utilizada pela política antidrogas tem
por finalidade reduzir a demanda de drogas, ou seja, a ação é realizada de modo a atingir o
consumidor de drogas. A eficácia desse tipo de política depende fundamentalmente do grau
da elasticidade-preço da demanda pela droga. Diversos estudos comprovem que o
consumidor de drogas é sensível ás mudanças de preços.
Outro fator que atua como determinante na eficácia dessa política reside na
capacidade da repressão de gerar diminuição da demanda com a alta de preço da droga,
isso porque, com o aumento da repressão, o risco envolvido para o consumidor através do
aumento nos preços. Contudo, conforme Kopp, defensores dessa hipótese não consideram
o fato de que o que o aumento nos preços da droga incitaria a entrada de novos traficantes
no mercado103.
Ao se referir sobre a política de redução da demanda de drogas Husak, relata
que o uso de drogas lícitas, principalmente tabaco, apresentou diminuição mesmo sem a
“contribuição” do sistema de justiça criminal104. As evidencias para o Brasil corroboram a
visão do autor, segundo o Ministério da saúde, em 2009 o consumo de cigarros entre jovens
brasileiros caiu cerca de 50% nos últimos 20 anos, em 2008, 14, 8% dos jovens entre 18 e
24 anos eram fumantes, em 1989 esse percentual era de 29%. A mesma tendência é
verificada em outras faixas etárias, em 1989, 35% da população adulta era fumante, em
2008 esse índice caiu para 15,2%105.
De acordo com a ONDCP (Office of National Drug Control Policy), os custos
econômicos do abuso de drogas nos estados unidos foram estimados em US$107,5
bilhões. No mesmo trabalho, afirma-se que o crescimento mais rápido dos custos das
drogas veio do aumento das atividades do sistema judiciário, e que despesas em serviços
103
Koop, P. Economia da droga. Bauru: EDUSC, 1998. 104
Husak, D. Drugs and Rights. New Jersey: Cambridge University Press, 1992. 105
Ministério da Saúde. Cai Consumo de Tabaco entre Jovens. INCA – Instituto Nacional de Câncer. 2009. Disponível em: < http://bvsms.saude.gov.br/bvs/sus/pdf/abril/consumo_tabaco_jovens_0704.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2012.
39
de saúde e os custos de mortalidade precoce cresceram as taxas relativamente baixas106.
Segundo a ONDCP US$15.069 bilhões serão disponibilizados no ano fiscal de 2010 para o
governo federal americano sustentar a atual política de drogas, o que representa um
aumento de 1,5% em relação ao ano fiscal anterior. Deste montante, a maior parcela, cerca
de 26,6%, foi destinado a interdição das drogas, os gastos com tratamento e prevenção
representaram, respectivamente, cerca de 23,7% e 10,6%, além disso, aproximadamente
24,8% do total foi destinado para a imposição da lei e 14,3% foi direcionado para despesas
internacionais de controle de drogas. Em outras palavras, US$9.901 bilhões serão gastos
em 2010 na redução da oferta de drogas (65,6%) e US$5.168 bilhões na redução da
demanda (34,4%).
No Brasil, de acordo com uma estimativa do departamento de informática do
SUS (DATASUS)107, o governo gastou cerca de US$35 milhões no ano de 2003 em custos
relacionados ao consumo de bebidas alcoólicas e drogas em termos de saúde pública, a
estimativa baseada nas despesas diretas e indiretas incorridas em 2003 em tratamento
médico, na perda de produtividade de trabalhadores que são usuários de drogas e nos
prejuízos sociais causados por óbitos prematuros provocados pelo uso de drogas. Neste
mesmo estudo apontam-se as principais causas de internações decorrentes do uso de
drogas; o consumo de álcool responde por 84,5% das 44.680 internações, o uso de cocaína
é responsável por 4,6% e o restante, 10,9%, decorre do abuso de outras substancias
psicotrópicas108.
Luksetich e White fazem uma abordagem diferente referente ao caso de
Heroína. Eles partem da distinção entre os custos inevitáveis e os custos que poderiam ser
106
ONDCP – Office of national drugs control policy. The economics cost of drug abuse in the united states, 1992-2002. Washington DC: Executive office of the president. Publicação Nº 207303, Dezembro de 2004. 107
DATASUS é o nome do departamento de informática do Sistema Único de Saúde do Brasil. Trata-se de um órgão da Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde com a responsabilidade de coletar, processar e disseminar informações sobre saúde. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/DATASUS>. Acesso em: 22 de setembro de 2012. 108
UNODC – United Nations Office on Drugs and Crime. Economic and social consequences of drug abuse and illicit trafficking. World Drug Report 2005. Viena: 2005. Disponivel em: < http://www.unodc.org/documents/wdr/WDR_2008/WDR_2008_eng_web.pdf>. Acesso em: 23 de setembro de 2012.
40
evitados com mudança de política. Segundo os autores, como o preço da heroína é alto
porque a droga é ilegal, todos os custos sociais que resultam do seu alto preço são custos
evitáveis, dentre eles estão á desnutrição entre usuários e os crimes de propriedade
cometidos para financiar o hábito. Os elevados lucros obtidos com o trafico da droga
financiam a corrupção e o armamento dos traficantes, assim sendo, estes custos também
devem ser considerados como decorrentes do caráter ilegal do mercado. Destaca-se ainda
os custos decorrentes dá perda de qualidade do produto:
Se heroína fosse legal, seria do interesse do vendedor manter a qualidade; como resultado o numero de mortos por overdose De acidentes de overdose e adulteração de heroína com substancias perigosas seria menor se heroína fosse legal
109. Além disso os
custos do sistema judicial são claramente custos que poderiam ser evitados
110.
Para Husak, em sua avaliação á política proibicionista, elenca alguns pontos
importantes desse sistema:
1- O comercio de drogas criou enormes oportunidades para o crime
organizado;
2- Os vultosos lucros têm feito à generalização da corrupção inevitável;
3- O interesse de minimizar a disponibilidade tem desencorajado o uso de
drogas ilegais para propostas medicinais;
4- Devido a ilegalidade, não há um controle de qualidade para as drogas,
outras substancias acrescentadas ás misturas podem fazer mais mal que a
droga em si;
5- Uma longa historia de desinformação e distorção sobre os perigos das
drogas tem levado os usuários a se tornarem céticos e desconfiados da
precisão dos avisos veiculados pelos especialistas em drogas;
A atual política de drogas certamente leva em consideração que a forma mais
eficaz de controle da criminalidade, é adotando uma política de condenação e de punição
do demandante e do ofertante, elevando os riscos da pratica desse crime.
109
“IF heroin were legal, it would be in the interest of the Sellers to maintain a consistent quality; therefore, the number of deaths from accidental overdoses and heroin adulterated with dangerous substances would be much fewer if heroin were legal”. 110
Luksetich, W. A; White, M.D. Crime and Public Policy: An Economic Approach. Boston. Little, Brown and company, 1982.
41
No entanto, essa política falha ao desconsiderar que ao condenar o mercado
a ilegalidade, também contribui para o aumento dos lucros auferidos pela venda da droga,
bem como, acaba por selecionar os participantes do comercio, pois os indivíduos que
enxergam os incentivos neste negocio são justamente aqueles dispostos a quebrar leis,
inclusive através de crimes violentos.
Na visão de Cooter e Ulen, a política publica repressiva contribui para o
aumento da criminalidade. Segundo esses autores:
A restrição da oferta e o consequente aumento de preços das drogas no mercado ilegal não levam a uma significativa redução do consumo pelo usuário, pois este apresenta uma demanda inelástica. Além disso, causam um aumento do montante de crime que o usuário precisa praticar de modo a manter o seu hábito
111.
No estudo do caso da heroína, Luksetich e White, alertam que o aumento da
imposição da lei sobre os traficantes resulta no aumento do total gasto com a heroína, isso
ocorre porque a demanda pela droga é relativamente inelástica, permitindo que a elevação
dos custos e riscos de ofertar a droga sejam transferidos ao consumidor através do
aumento dos preços. Este aumento dos gastos com a heroína contribui para elevar a
criminalidade de duas maneiras, os crimes contra a propriedade e a corrupção; o primeiro
ocorre pela necessidade do usuário de financiar seu hábito, e o segundo devido á maior
disponibilidade de recursos para os traficantes112.
Em alguns casos especiais a repressão pode ser eficaz, principalmente
quando consegue limitar a entrada de novos consumidores no mercado. No entanto muitos
estudos apontam que a repressão é ineficaz, no sentido de não alcançar de fato a redução
do consumo, já que afeta marginalmente o nível de preços, e também por aumentar a
criminalidade.
As décadas de proibicionismo não trouxeram, no entanto, a erradicação do
consumo. Pelo contrário, o mercado negro instaurado pelo banimento legal dos psicoativos
tornou-se uma pujante economia negociadora de compostos produzidos, transportados,
111
Cooter, R; Ulen, T. Law and Economics. Pearson Education, 2004. 112
Luksetich, W. A; White, M.D. Ibidem. 1982.
42
vendidos e usufruídos na clandestinidade. A violência trazida na esteira das máfias
narcotraficantes e as consequências individuais do uso de substâncias adulteradas e
ministradas sem segurança produziram vozes críticas dentro de Estados proibicionistas. O
combate às drogas passou a ser visto por alguns grupos de médicos e cientistas sociais,
europeus, australianos e estadunidenses em sua maioria, como uma guerra de impossível
conclusão que deveria ser substituída por uma outra ótica que procurasse não investir no
improvável (o fim universal do consumo), mas em alternativas que buscassem minimizar os
perigos para aqueles que optaram pela ebriedade. Essa visão reformista, genericamente
conhecida como redução de danos, pretende buscar formas de administrar o hábito de
utilizar drogas psicoativas, diante da percepção de que o contrário é tarefa quixotesca e
politicamente intencionada113.
3.2 DANOS PROVOCADOS PELA POLÍTICA REPRESSIVA
O dano provocado pela política repressiva deve ser avaliado ao longo da
historia. De certa forma é um dano incalculável e irreparável.
O ataque ao consumo e ao trafico de drogas contribuiu mais para o aumento
do consumo e do trafico do que propriamente para sua redução. Contribuiu mais para o
aumento da criminalidade, em decorrência do combate as drogas, para o aumento das
tragédias sócias, mortes de traficantes, policiais, usuários e os não usuários de drogas. A
política de combate ás drogas adotada pelo sistema repressivo, só aumentou os gastos
públicos, formando e contratando mais policiais, armamentos, tecnologias e técnicas
sofisticadas de combate.
113
Rodrigues, Thiago. Política de drogas e a lógica dos danos: Abstinência como fim. Revista Verve, São Paulo, Nu-Sol/ PUC- SP, nº 3, 2003.
43
Os imensos recursos gastos na erradicação da produção, repressão aos
traficantes e criminalização dos usuários não foram capazes de reduzir a oferta nem de
reduzir o consumo de drogas.
Essa tática de guerrilha utilizada por essa política contribuiu para o
surgimento de outras organizações criminosas e da migração da produção para outras
áreas.
Esse sistema apesar de desencadear um efeito desastroso dificultando os
usuários ao acesso a medidas de saúde pública capazes de reduzir riscos a sua saúde,
como e o caso da contaminação pelo vírus da HIV/ AIDS, overdose, e outros riscos
recorrentes do uso de drogas, também tem um efeito desastroso em termos sociais,
econômicos e políticos.
A claramente um desvio de foco pelo sistema repressivo, no que diz respeito
ao combate a redução da demanda e da oferta, para se direcionar ao individuo, violando os
seus direitos e liberdades, encarcerando dezenas de milhares de pessoas, enchendo as
prisões, destruindo famílias, sem reduzir a disponibilidade de drogas ilícitas ou o poder das
organizações criminosas.
O que há de se fazer com as organizações criminosas que a própria política
criou? O que há de se fazer com a corrupção que o trafico sustenta? Como reduzir os
danos que o trafico de drogas causou as pessoas e a sociedade em geral? A política
repressiva tornou-se um problema maior do que a própria droga. Melhor ainda ele tornou-se
um problema maior, deixando-nos um legado de uma sociedade destruída pela violência,
pela injustiça, pela mentira. Ele nos deixa uma sociedade doente, mas mesmo assim insiste
nessa política mentirosa e perigosa, não se contentando com simples organismo doente
que se tornou a nossa sociedade, mas sim com a destruição total dela.
Considera-se, com base em dados estatísticos das Nações Unidas, que a
política proibicionista, além de não ter conseguido “proteger” a saúde pública, serviu de fator
agravante na panepidemia da AIDS, diante do alto número de usuários de drogas injetáveis
que foram contaminados em decorrência do compartilhamento de seringas, por fazerem uso
44
da droga na clandestinidade. Esse “fracasso” ocorreu tanto nos países ricos, que possuem
toda a estrutura necessária, inclusive financeira, tanto de repressão quanto de saúde,
quanto nos menos desenvolvidos, nos quais as consequências danosas foram ainda mais
graves114.
A ideologia da política proibicionista é um tanto paradoxal, ou seja, ela busca
diminuir o consumo e o trafico, criminalizando essas condutas, e se utiliza da política de que
se consegue diminuir a criminalidade, criminalizando condutas, mas na verdade ele acabou
por potencializar esse crime.
Por mais paradoxal que possa parecer a, proibição se tornou uma grande
aliada do trafico de drogas e do seu consumo descontrolado, e que a economia da droga foi
dinamizada pela proibição.
A proibição também permitiu a criação de um mercado paralelo, onde circula
o capital ilícito, contribuindo cada vez mais para o enriquecimento dos traficantes. E esse
enriquecimento por parte dos traficantes trás a necessidade de se tornar licito o dinheiro
ilícito, por isso se utilizam do mecanismo da lavagem de dinheiro, contaminando os bancos
e favorecendo a corrupção.
Além de não se apresentar apropriado à solução de um problema de saúde
pública, nem ter fundamentos sólidos, mas emocionais e simbólicos, o proibicionismo causa
impactos negativos no tecido social. Na ótica dos países em desenvolvimento em geral, e
especialmente no Brasil os impactos sociais são muito graves, podendo ser elencados da
seguinte forma115:
1- Na saúde pública: ausência de controle e adulteração das
substâncias consumidas o que gera riscos graves à saúde dos
consumidores; o alto nível de contágio do vírus HIV e outras doenças entre
usuários de drogas injetáveis na marginalidade; a dificuldade de
114
Política de Drogas, cultura do controle e propostas alternativas. Disponível em:< http://www.ibccrim.org.br/site/comissoes/politicaDrogas.php>. Acesso em: 28 de setembro de 2012. 115
Idem. Ibidem. Acesso em: 28 de setembro de 2012.
45
implementação de políticas de redução de danos aos dependentes inseridos
na ilegalidade e oposição do proibicionismo aos modelos mais atuais de
ajuda ao viciado; o contínuo enfrentamento do sistema penal pelos adictos
que fazem uso das substâncias, mesmo à margem da lei; aumento no
número de mortes em decorrência das disputas e da repressão ao tráfico de
drogas.
2- No sistema jurídico-constitucional citam-se: o reforço excessivo do
sistema policial em detrimento do sistema judicial; a utilização de meios
penais e processuais extraordinários, violadores de princípios e garantias
constitucionais; as medidas de exceção destinadas ao grande tráfico são
aplicadas aos pequenos e médios traficante-viciados, que lotam as
penitenciárias; desumanização das penas e do sistema penitenciário;
superlotação carcerária.
3- Na ótica socioeconômica podem ser ainda adicionados: aumento da
vigilância, controle e violência imposta aos mais desfavorecidas, que são
suspeitos de tráfico, até prova em contrário, o que leva à discriminação;
favorecimento do envolvimento de jovens com o crime, desagregação
familiar; incremento do tráfico de armas; incremento das possibilidades de
lavagem de dinheiro; a alta dos preços derivada da ilegalidade torna cada vez
mais poderosa as organizações de traficantes; aumento da corrupção nos
poderes públicos e na polícia, em especial nos países em
desenvolvimento; aumento da violência e do número de homicídios nos
grandes centros urbanos.
O sistema proibicionista acabou por criar três fenômenos cujo o impacto na
sociedade brasileira e marcante, que são: a criminalização da pobreza, a criminalização da
política e a politização do crime.
46
A criminalização da pobreza se refere a um fenômeno claro e visível em que
os membros mais pobres da sociedade brasileira são identificados por atores estatais e
atores quase estatais (a polícia, em especial a polícia militar, agentes do sistema legal,
agentes carcerários e milícias) como criminosos ou potencialmente criminosos e, com base
nisto, são alvos de extorsão, prisão e detenção arbitrárias, violência física e até mesmo
execução sumária116.
No que tange a política de repressão ás drogas ele criou esse fenômeno para
estabelecer um perfil do usuário e do traficante de drogas. O usuário de drogas
normalmente são pessoas com uma condição econômica e social boa, e os traficantes são
aquelas pessoas cujo, as condições econômicas e sociais lhe são desfavoráveis. E isso
percebe-se pelo numero de encarceramento de pessoas portadores de pequenas
quantidades de drogas mas que lhes são imputados o crime de trafico de drogas, e que são
a grande maioria jovens pobres.
Não há um trabalho de investigação por parte da policia para combater os
esquemas de trafico de drogas, a grande maioria dos casos que envolvem porte de
entorpecentes deriva da prisão em flagrante. Por isso é bem nítido as pessoas selecionadas
nesses casos: jovens negros, pobres e pardos, e em regra primários.
Na maioria dos casos de flagrante, há apenas uma única testemunha que é o
policial, cuja a palavra e supervalorizada pelo judiciário por possuir fé pública.
A criminalização da política e politização do crime são fenômenos
indissociáveis, que caminham juntos para a desgraça social, econômica de um pais. Com a
repressão do trafico de drogas houve uma migração de políticos para o crime, recebendo
apoio dos traficantes em suas campanhas, participando na lavagem de dinheiro sujo, e
facilitando a ação dos traficantes. E também houve uma migração dos criminosos, entrando
116 A Criminalização da Pobreza: Relatorio sobre as causas Economicas, Sociais e cultuais da Tortura e outras formas de Violência no Brasil. Disponivel em: «http://www.omct.org/files/2010/10/20938/addressing_the_criminalisation_of_poverty_brazil_por.pdf». Acesso em: 16 de Janeiro de 2013.
47
para a vida política. Tudo isso contribuindo cada vez mais para o fracasso do sistema
proibicionista.
3.3 POLÍTICA DE REDUÇÃO DE DANOS
A repressão ás drogas é uma guerra perdida que precisa ser substituída por
uma política que não vise acabar com o consumo, mas minimizar o sofrimento e os danos
decorrentes do seu consumo.
Essa proposta de redução de danos aparece como alternativa ao modelo
proibicionista, que procura garantir a saúde pública, por meio de ações que tentam reduzir
os danos causados pelo consumo de drogas licitas e ilícitas, bem como para praticas
sexuais de risco para DST/AIDS, com esclarecimentos e orientações ou invés de proibição
e repressão.
Diante do insucesso de políticas repressivas e da contestação de que o
fenômeno drogas é parte inerente de todas as sociedades. Dessa forma, e necessária uma
postura pragmática para tratar com a questão, que considere as suas variáveis
socioculturais e que coloque em foco o sujeito que se encontra em situação de
vulnerabilidade social, que por suas práticas, no consumo de drogas, no compartilhamento
de seringas e instrumentos para o consumo, ou até mesmo no sexo desprotegido, estão
mais expostos a riscos e danos.
Este pensamento leva a crer que é mais eficiente pensar o sujeito que possui
comportamento de risco, possibilitando a ele reduzir os danos e os riscos associados as
suas práticas, ao invés de tentar eliminá-las da sociedade, premissa já fracassada por uma
gama de estratagemas de políticas públicas de saúde. Portanto, o reconhecimento de que
grande número de pessoas pode compor grupos de risco na questão do uso e consumo de
48
drogas e de práticas sexuais de risco, reforça a adesão por parte do governo de políticas
públicas que reconheçam e aceitem a realidade da diversidade dos modos de vida117.
É importante lembrar que a política de redução de danos não se posiciona,
nem contra e nem a favor ao uso drogas, ela se foca em diminuir os prejuízos causados
pelo uso de drogas. Essa política consiste em substituir a condenação e a repressão, por
tratamento dos usuários de drogas, ou seja, consiste na suspensão da sentença
condenatória de prisão sob a condição de que o usuário procure tratamento do seu vício.
Com frequência, o exercício destas práticas de risco causa muitos danos ao
próprio sujeito e à comunidade em que está inserido. Estes danos são ligados a uma maior
probabilidade de ocorrência de overdose, de transmissão de doenças sexualmente
transmissíveis, do vírus da AIDS, do vírus das hepatites, do descarte de seringas usadas
em locais públicos, o crime do tráfico, aquisição de drogas ilícitas, entre outros118.
A redução de danos surge na Holanda na década de 80, com o objetivo de
reduzir os danos decorrentes do uso de drogas. Ela enfrenta o problema da droga como
parte integrante da sociedade e da cultura dos povos, então em vez de acreditar na
abstinência como a única forma de saída para o problema da droga, como acredita os
defensores do proibicionismo, o sistema de redução de danos acredita na redução dos
riscos e dos danos causados pelo uso indiscriminado da droga.
A redução de danos “corresponde a um conjunto de estratégias de saúde
pública que têm por objetivo reduzir e prevenir as consequências negativas associadas ao
uso de drogas”119, disseminando intervenções orientadas para minimizar os danos à saúde
117
FEFFERMANN, M.; FIGUEIREDO, R. Redução de Danos Como Estratégia de Prevenção de Drogas Entre Jovens, Boletim do Instituto de Saúde, nº 40, São Paulo, Instituto de Saúde, 2006. Disponível em: <http://www.ip.usp.br/portal/images/stories/Nepaiãods/reduo_de_danos.pdf>. Acesso em: 23 de setembro de 2012. 118
FONSECA, E.M; BASTOS, I.F. Políticas de Redução de Danos em Perspectiva: Comparando as Experiências America, Britânica e Brasileira. In: ACSELRAD, G. Avessos do Prazer: Drogas, Aids e Direitos Humanos, Ed. Fio Cruz, Rio de Janeiro, 2005. Disponivel em: <http://www.elizemassard.com/FonsecaANdBastos2005.pdf>. Acesso em: 23 de setembro de 2012. 119
Idem. Ibidem. Acesso em: 23 de setembro de 2012.
49
e, também, danos sociais e econômicos relacionados ao consumo de drogas e a práticas
sexuais de risco, sem necessariamente coibir os comportamentos120 121.
A política de redução de danos propõe um conjunto de ações alternativas de
prevenção e de terapia, que não excluem ou segregam usuários de drogas, mas os
integram em uma perspectiva de tratamento que visa uma convivência menos danosa o
possível com o consumo de drogas, deixando a abstinência não como meta única ou pré-
requisito, mas sim como uma meta possível de ser atingida com o desenvolvimento de
minimização dos riscos122.
O objetivo da redução de danos é abordar pessoas que exercem práticas de
risco, como usuários de drogas e profissionais do sexo, e educá-los para práticas seguras,
sem interferir necessariamente na execução ou não da prática, visando o controle da AIDS,
da hepatite e de outras doenças patógenas do sangue e do sexo123.
A proposta de uma redução de danos decorrentes do uso das drogas vai
além de ser uma alternativa à abstinência, uma vez que se ocupa do manejo seguro de uma
gama de comportamentos de risco e dos possíveis danos associados a eles, de modo a não
se restringir ao julgamento do certo e do errado, do bom ou do ruim, mas sim na
120
ALVES, V.S. Modelos de Atenção À Saúde de Usuários de Álcool e Outras Drogas: Discursos Políticos, Saberes e Práticas, Cadernos de Saúde Pública, 25 (11), Rio de Janeiro, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-311X2009001100002&script=sci_arttext>. Acesso em: 23 de setembro de 2012. 121
QUEIROZ, I.S. Os Programas de Redução de Danos Como Espaços de Exercício de Cidadania dos Usuários de Drogas, Psicologia Ciência e Profissão, vol 21. Nº4 Brasília, 2001. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1414-98932001000400002&script=sci_arttext>. Acesso em: 23 de setembro de 2012. 122
CAMPOS, M.A.; SIQUEIRA, D.J.R.; BASTOS, F.I. Drogas e Redução de Danos: Abordagens Para Pessoas Vivendo com HIV e Aids. In: PINHEIRO, R.M.; SILVEIRA, C.; GUERRA, E. (org.) Drogas e Aids – Prevenção e Tratamento, Fundação do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2001. Apud in: Alcântara Anacleto, Aline Ariana. REDUÇÃO DE DANOS E SAÚDE MENTAL. Universidade Tecnológica Federal do Paraná Câmpus Dois Vizinhos. Disponível em: <http://anais.unicentro.br/cis/pdf/conferencias/Aline.pdf>. Acesso em: 23 de dezembro de 2012. 123
PAES, P.C.D.; OLIVEIRA, M.W. Educação no Programa de Redução de Danos: Alienação ou Práxis Educativa, Revista Brasileira de Educação, nº6, 2004. Apud in: Alcântara Anacleto, Aline Ariana. Redução de Danos e Saúde Mental. Universidade Tecnológica Federal do Paraná Câmpus Dois Vizinhos. Disponível em: <http://anais.unicentro.br/cis/pdf/conferencias/Aline.pdf>. Acesso em: 23 de dezembro de 2012.
50
identificação se determinado comportamento é seguro ou inseguro, se é favorável ou
desfavorável124.
Segundo Queiroz125 os argumentos que fundamentam as razões éticas e
humanitárias das ações de redução de danos, se apoiam na ideia de que:
1- Não é aceitável eticamente abandonar ou segregar sujeitos que
exercem práticas de risco se eles não querem ou não estão motivados a
mudar de comportamento;
2- A proposta de redução de danos mantém o sujeito dentro de uma
rede de assistência e saúde pública, poupando-o de uma marginalização
ainda maior;
3- A redução de danos propicia uma chance maior de integração do
sujeito à sociedade, o qual se encontra, na maioria das vezes, à margem do
social;
4- Suas ações se constituem como um caminho a ser percorrido,
caminho este que pode levar a eliminação da prática de risco;
5- De acordo com as políticas públicas de saúde é fundamental oferecer
ao público um leque de alternativas de ajuda, passando por baixas
exigências, até as altas exigências, tornando-se, assim, passível de
responder a toda demanda de necessidades dos sujeitos;
6- Essas possibilidades de atuação propiciam ao sujeito se manter na
rede de saúde pública, possibilitando a criação de um vínculo com a equipe
de saúde, o que pode ajudar na motivação à mudança de comportamento;
7- As ações de redução de danos auxiliam na prevenção da AIDS e
outras doenças sexualmente transmissíveis, diminuindo custos para saúde
pública;
124
QUEIROZ, I.S. Os Programas de Redução de Danos Como Espaços de Exercício de Cidadania dos Usuários de Drogas, Psicologia Ciência e Profissão, vol 21. Nº4 Brasília, 2001. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1414-98932001000400002&script=sci_arttext>. Acesso em: 24 de setembro de 2012. 125
Idem. Ibidem. Acesso em: 24 de setembro de 2012.
51
8- As políticas públicas devem estar sempre baseadas no coletivo,
considerando fatores que sejam coerentes com a diversidade e a
coletividade.
A política pública de redução de danos muda o discurso rígido defendido
pelos proibicionistas, de uma sociedade livre das drogas, para um discurso mais flexível, de
uma sociedade protegida do uso de drogas ilícitas e do uso indevido de drogas licitas.
O programa de redução de danos possui algumas estratégias para a sua
efetiva implementação, tendo em conta a realidade cultural, social, econômica e política de
casa pais. Estas estratégias podem ser:
1- Programas de Troca de Seringas (PTS), os quais objetivam a redução
da transmissão do vírus HIV, hepatites e outras doenças de transmissão
parental, entre usuários de drogas injetáveis (Ópios), evitando que indivíduos
já infectados transmitam diferentes vírus e descartem seringas possivelmente
contaminadas em locais públicos126. O programa se propõe a fazer troca de
seringas usadas, por seringas novas estéreis, disponibilizar kits para o uso
mais seguro de drogas.
2- Manutenção por metadona é uma estratégia mais difundida em
países onde o consumo de heroína se faz mais presente e tem como objetivo
utilizar a metadona – um opiáceo sintético – que diminui os sintomas da
fissura e da abstinência da droga, substituindo a pura heroína, que também
pertence à classe de opiáceos (FONSECA, 2005)127. Seu foco não é a
abstinência, mas sim a redução de riscos da dependência da heroína pela
manutenção do usuário em um tratamento, possibilitando uma diminuição
126
Alcântara Anacleto; Aline Ariana. REDUÇÃO DE DANOS E SAÚDE MENTAL. Universidade Tecnológica Federal do Paraná Câmpus Dois Vizinhos, p. 5-6. Disponivel em: < http://anais.unicentro.br/cis/pdf/conferencias/Aline.pdf>. Acesso em: 24 de setembro de 2012. 127
FONSECA, E. M. Políticas de Redução de Danos ao Uso Indevido de Drogas: O Contexto Internacional e Uma Análise Preliminar dos Programas Brasileiros, Dissertação, Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, 2005. Disponível em: <http://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/4604/2/734.pdf>. Acesso em: 24 de setembro de 2012.
52
dos efeitos adversos associados da droga, reduzindo também o envolvimento
de usuários em circuito ilícito de obtenção de drogas.
3- Prescrição de drogas, amplamente utilizada nos programas
brasileiros de redução de danos, pelo aumento dos usuários de “crack” no
país. Esta estratégia visa à substituição do “crack” fumado em cachimbos,
pelo “crack” fumado misturado aos cigarros de maconha, o famoso
“mesclado”, o que acaba diminuindo a quantidade de “crack” e
consequentemente os danos causados pela droga128. Entende-se que esta
ação possui sucesso efetivo na redução dos sintomas da fissura causada
pela falta da droga no organismo dos usuários dependentes, servindo
também de atrativo para os usuários de drogas terem acesso até a
possibilidade de tratamento oferecida, além disso, esta se caracterizaria
como uma meta intermediária até a abstinência, possibilitando ao usuário
uma mudança em seu padrão de consumo, reduzindo gradualmente os
danos e a quantidade de drogas consumidas129.
4- Salas de uso seguro, disseminadas em cidades europeias,
caracterizadas por ambientes fechados, onde os consumidores encontram
disponíveis materiais para fazerem uso seguro da droga, como seringas
estéreis, preservativos, cuidados éticos e aconselhamento, porém não são
disponibilizadas drogas, estas devem ser trazidas por seus usuários130.
5- Redução de danos em presídios, uma estratégia altamente
condizente com a realidade do país, pela contestação de grande incidência
de transmissão do HIV dentro das prisões, que ocorre, geralmente, por meio
128
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE REDUTORAS E REDUTORES DE DANOS –ABORDA, Redução de Danos no Cotidiano, 2008. Disponível em: < www.aborda.com.br>. Acesso em: 24 de setembro de 2012. 129
ALVES, V.S. Modelos de Atenção À Saúde de Usuários de Álcool e Outras Drogas: Discursos Políticos, Saberes e Práticas, Cadernos de Saúde Pública, 25 (11), Rio de Janeiro, 2009. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-311X2009001100002&script=sci_arttext>. Acesso em: 24 de setembro de 2012. 130
Fonseca, E. M. <http://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/4604/2/734.pdf>. Acesso em: 24 de setembro de 2012.
53
de sexo desprotegido, compartilhamento de seringas e agulhas para injeção
de drogas, bem como para tatuagens, além de que esta população
carcerária, em quase sua totalidade, se encontra distante do acesso às ações
preventivas131.
Além disso, podem ser consideradas ações de programas de redução de
danos o mapeamento de regiões frequentadas pela população atingida pelos programas;
diagnóstico sorológico da infecção pelo HIV, coleta de sangue, papanicolau e escarro;
vacinas contra Hepatites, clínica de abordagem sindrômica de DSTs; orientação e
aconselhamento em relação à prevenção e ao tratamento de doenças, fornecimento de
insumos para prevenção e redução de danos; encaminhamentos para inserção dos sujeitos
em programas da rede assistencial de saúde, dispositivos sociais e inserção no trabalho132.
Resta comprovadas que destinar recursos a políticas de tratamento resultam
em menos custos sociais e alcançam maiores reduções de consumo do que políticas
voltadas para a imposição da lei. Rydell e Everingham estimaram que cada dólar adicional
investido no tratamento de abuso de substancias se economizam US$ 7, 46 do contribuinte
em custos sociais, e que o aumento dos esforços na imposição da lei custa cerca de 15
vezes mais do que o que seria gasto em tratamento para alcançar a mesma redução dos
custos sociais133
A partir de uma estimativa feita em 1997, Caulkins relata que se em 1992
tivesse ocorrido um aumento de um milhão de dólares dos gastos federais em imposição da
lei, este teria reduzido o consumo de cocaína em cerca de 53 kg a 93 kg, uma estimativa
131
FONSECA, E. M. Políticas de Redução de Danos ao Uso Indevido de Drogas: O Contexto Internacional e Uma Análise Preliminar dos Programas Brasileiros, Dissertação, Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, 2005. Disponível em: <http://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/4604/2/734.pdf>. Acesso em: 24 de setembro de 2012. 132
SILVA , S.M.; SPIASSI, A. L.; ALVES, D.C.; GUEDES, D.J.; LEIGO, R. O.; Redução de Danos: Estratégia de Cuidado Com Populações Vulneráveis na Cidade de Santo Andre – SP, Rev. Saúde e Sociedade, vol. 18, supl.2, 2009. Apud in: Alcântara Anacleto; Aline Ariana. REDUÇÃO DE DANOS E SAÚDE MENTAL. Universidade Tecnológica Federal do Paraná Câmpus Dois Vizinhos, p. 5-6. Disponivel em: < http://anais.unicentro.br/cis/pdf/conferencias/Aline.pdf>. Acesso em: 24 de setembro de 2012. 133
Rydell, C. P; Everingham, S. S, Controlling Cocaine: Supply versus Demand Program. RAND Corporation – Drug Policy Research Center, 1994. Apud in: Chitolina Santos, Lia. Economia das Drogas Ilegais: Teoria, Evidencias e Politicas Públicas. Monografia, Porto Alegre, 2009, P.76.
54
semelhante em relação aos gastos com tratamento para dependentes resultou em redução
de aproximadamente 97 kg a 119 kg. Isto ocorre porque o tratamento ataca diretamente a
demanda, enquanto que esforços de imposição da lei o fazem através do aumento dos
preços134.
O tratamento de substituição, como estratégia de redução de danos deve ser
visto como uma escolha voluntária pelo usuário, e não se confunde com a imposição do
tratamento como pena, que constitui estratégia proibicionista repressiva ligada ao ideal da
abstinência.
Os princípios e objetivos que definem o conceito de redução de danos e a
caracteriza como uma política de saúde pública direcionada as pessoas que se encontram
em situação de vulnerabilidade pelo exercício de práticas de risco, a afirma como uma
proposta que tem por finalidade mobilizar as pessoas para que adquiram uma maior
qualidade de vida independente de seus vícios ou práticas.
4 LEGALIZAÇÃO DAS DROGAS: ESTRATÉGIAS ALTERNATIVAS AO CONSUMO E AO
TRAFICO DE DROGAS
Os limites do presente trabalho não permitem a discussão de todos os
modelos antiproibicionistas, devido a sua extensão e polêmica, razão pela qual optei em
analisar os principais modelos, assim considerados, aqueles com soluções que se
contrapõem ao proibicionismo.
As estratégias alternativas apresentam-se como possíveis substitutos ao
modelo proibicionista e variam de acordo com o grau de oposição a este modelo, que são
134
Caulkins, S. P. Et al. How goes the “War on Drugs”?: An assessment of U.S. Drug programs and policy. RAND corporation - Drug Research Center, 2005. Apud in: Chitolina Santos, Lia. Economia das Drogas Ilegais: Teoria, Evidencias e Políticas Públicas. Monografia, Porto Alegre, 2009, P.76.
55
as seguintes: a legalização liberal, a legalização com forte controle estatal e a legalização
controlada.
É bom frisar que esses modelos, devem-se moldar as diversidades de cada
sociedade. De modo que não existe um modelo ideal de controle de drogas, mas sim o
modelo que mais se adéqua as diversidades geográficas, políticas, econômicas, culturais,
sociais e jurídicas de cada país.
Antes de começar a falar sobre a legalização propriamente, é mister fazer
referencia algumas estratégias muito utilizadas atualmente, usadas vários países,
principalmente europeus, e que se encontram em um processo de flexibilização do seus
sistemas repressivos de combate as drogas, tentando reduzir os danos causados por ela,
adotando uma postura humanista e racional.
Para se chegar hoje ao debate sobre a legalização de drogas, teve que existir
estratégias como, a despenalização e descriminalização do uso de drogas, e também a
despenalização de algumas condutas de comercio de drogas leves, e do seu cultivo.
De certa forma essas estratégias deu força ao debate de legalização,
ajudando-nos a pensar em estratégias mais humanas, e mais eficientes.
A Lei 11.343/06, considerando o fracasso do sistema penitenciário, a
desnecessidade do encarceramento do usuário de drogas, e o alto custo da manutenção da
prisão e direcionando todos seus esforços para aumentar a repressão ao tráfico de drogas,
despenalizou a conduta de porte de drogas para consumo pessoal.
Apesar de se mostrar um avanço, percebe-se neste modelo uma presença
rígida da proibição e da repressão, no que se refere a qualquer tipo de tráfico, com
aplicação da pena de prisão para as condutas equiparadas, sendo excluída apenas a
aplicação de pena de prisão para o usuário.
Já a estratégia da descriminalização do usuário em muito se distancia do
modelo despenalizador, possui em sua essência constitutiva a teoria defendida por, Louk
Hulsman, criminólogo holandês que questiona a existência do próprio sistema penal em
Penas Perdidas.
56
A expressão “penas perdidas”, utilizada por Louk Hulsman, é uma referência
ao fenômeno de uma progressiva “perda” das “penas”, uma vez que estas, carentes de
racionalidade, nada mais fazem que infligir sofrimentos desnecessários àqueles que caem
nas teias de um sistema penal, em desacordo com a legalidade. O encarceramento
constituiria nada mais que um sofrimento não criativo e desprovido de sentido, seletiva e
inutilmente imposto a certa categoria de pessoas135.
Ao defender a descriminalização, Hulsman reconhece o caráter utópico da
descriminalização total da droga, e por isso sugere que se proceda por etapas, começando
pela descriminalização do uso e da posse, como etapa prévia à exclusão das sanções
penais para a produção ou tráfico de drogas136.
Outro fundamento da descriminalização é o fundamento terapêutico,
defendida pelo Dr. Olivenstein. Contraria a criminalização de usuários de droga, ele
questiona a imposição de um tratamento aos usuários de drogas contra a sua vontade. Para
além da descriminalização do usuário, defende ele as políticas de redução de riscos. O Dr.
Olivenstein criticava a estratégia proibicionista que justifica a intervenção do sistema penal
por razões médicas, por considerar “que o critério para a proibição era dado por aquilo que
a sociedade, democraticamente, entendesse que assim deveria ser” 137.
Atualmente, diante do fracasso da política repressiva, têm crescido as
pressões pela descriminalização do uso de drogas, assim a maioria dos países da Europa
Ocidental já se adequou a esse modelo. A descriminalização de todos os tipos de drogas é
uma realidade hoje em Portugal, Itália e Espanha; enquanto que Bélgica, Irlanda,
Luxemburgo descriminalizaram somente a maconha, e o Reino Unido recentemente
desclassificou a cannabis, cujo usuário passou a ser controlado apenas pela polícia, sem
possibilidade de prisão.
135
Uma análise da obra "Em busca das penas perdidas", de Zaffaroni. disponivel em: < http://www.usinadeletras.com.br/exibelotexto.php?cod=32505&cat=Artigos&vinda=S> acesso em: 18 de outubro de 2012. 136
HULSMAN, VAN RANSBEEK. Évaluation critique de la politique des drogues. Déviance et société, 1983, p. 271 137
Luciana Boiteux Figueiredo Rodrigues. Ibidem. 2006, p.87.
57
O modelo português de descriminalização de drogas é um exemplo de
processo de descriminalização feito de maneira racional e cautelosa, por meio da
substituição de controle penal por um controle administrativo não punitivo.
A critica que se faz a esse modelo é que ao mesmo tempo em que prevê
tolerância aos usuários de droga, reprime o comercio, mantendo de certa forma a essência
do trafico de drogas que é a ilegalidade da sua economia. Por isso que essa estratégia não
possui armas suficientes para lidar com o problema da droga.
A descriminalização da posse de entorpecentes, apesar de não ser a solução
para todos os males do proibicionismo, além de adequar a norma penal à Constituição, tem
condições de resolver alguns problemas como a estigmatização do usuário, e a sua
perigosa relação com o sistema penal, além da redução da corrupção e da criminalidade.
Por outro lado, ressalte-se que a retirada do uso do controle penal deve ser acompanhada
da implementação de políticas de redução de danos, campanhas de esclarecimento e de
prevenção, devendo ser disponibilizado ao usuário gratuitamente o acesso a serviços de
saúde e ao tratamento da dependência138.
A despenalização de algumas condutas dos usuários, mais algumas
condutas de comercio de drogas leves, e do seu cultivo, configura-se numa tática de
ampliação da estratégia despenalizadora. Essa estratégia visa uma redução do controle
penal em prol de um maior controle social sobre a droga.
Essa experiência tem como base empírica a experiência concreta dos “coffee
shops” de Amsterdã, e da regulamentação da distribuição de droga com proibição da
publicidade. Ela se fundamenta na necessidade de afastar os consumidores de drogas
leves do mercado ilícito, autorizando as pessoas a plantar a “cannabis” para uso próprio.
Além de distanciar os consumidores do mercado ilícito, estará se reduzindo o lucro do
traficante, que explora o risco da proibição.
138
Luciana Boiteux Figueiredo Rodrigues. Ibidem. 2006, p.88.
58
Apesar da estratégia dos “coffee shops” em Amsterdã ser uma inovação para
o aprimoramento dos modelos alternativos, apresentam-se falhas graves no que tange ao
seu abastecimento.
A droga que é consumida nos “coffee shops” trata-se de uma droga legal,
em que o consumo se dá de forma livre, respeitando algumas regras impostas pelo estado
holandês, mas o abastecimento dos “coffe shops” se dá de forma ilegal, pelo simples motivo
de que o comercio de drogas na Holanda é proibido.
Essa estratégia adotada pelo governo holandês, do sistema dos “coffee
shops” não permite o desfazimento do comercio ilegal de drogas. Apesar da liberação do
comércio apenas da “cannabis”, essa estratégia ainda não altera a problemática do
mercado ilícito, o qual continua a ser combatido por meio do direito penal.
Com certeza não são estratégias capazes de acabar e solucionar o problema
da droga, mas são estratégias que nos fez pensar em modelos melhores, e mais eficientes.
Estratégias não para acabar com o problema da droga, mas para controlar, e regular esse
problema.
Por isso precisamos de modelos com o a capacidade de atacar tanto o
consumo, como também o comercio de drogas. É com esse intuito que eu passo a analisar
os modelos de legalização de drogas propriamente dito.
4.1 MODELOS DA LEGALIZAÇÃO DE DROGAS
A legalização das drogas surge como alternativa ao sistema proibicionista,
que em vez de declarar guerra às drogas, como uma política repressiva o fez, declaram
paz, implantando uma política pacifista, baseado na estratégia de controle, regulamentação
do consumo e do comercio de drogas.
59
A legalização não se confunde com a Liberalização total das drogas. A
liberação total das drogas prega a abolição de todas as leis restritivas, tanto as que proíbem
seu uso, como as que o admitem em determinadas circunstâncias.
E a legalização pressupõe controle, regulamentação, e sustenta a
substituição do controle penal por outras formas de regulação, que se subdivide em três:
legalização liberal, legalização com forte controle estatal, e a legalização controlada.
4.1.1 LEGALIZAÇÃO LIBERAL
A legalização liberal pressupõe a legalização da produção, da venda e da
circulação de droga, mas regulados pelas leis de mercado.
A legalização liberal, por sua vez, admite alguns controles estatais
semelhantes aos adotados com relação ao álcool e o tabaco, como por exemplo, a
proibição de vendas a menores de idade. É defendido por liberais como Milton Friedman,
propõe um tratamento as drogas igual ás mercadorias, mas com algumas especificidades.
Segundo ele, cada indivíduo ficaria responsável por si, e poderia escolher usar psicoativos.
Apenas quando o hábito de um indivíduo fosse prejudicial a outro, a lei seria acionada para
reparar danos. Em ambos os cenários, seriam mantidas as políticas destinadas a minimizar
os problemas com drogas psicoativas, tais como redução de danos139.
O modelo liberal por entender a droga como uma mercadoria especial que
necessita de maiores limitações, além das leis do mercado, como a proibição da
publicidade, sob pena de aumentar excessivamente a demanda. Considera-se necessário
também evitar eventuais práticas danosas à saúde por parte de empresas capitalistas,
descomprometidas, com objetivo único do lucro, que possam utilizar técnicas de marketing 139
Friedman, Milton. Prohibition and drug. Disponivel em: <http://www.druglibrary.org/special/friedman/prohibition_and_drugs.htm> acesso em: 18 de outubro de 2012.
60
para aumentar o consumo, sem levar em consideração a saúde dos consumidores, como
ocorreu com o cigarro140.
4.1.2 LEGALIZAÇÃO COM FORTE CONTROLE ESTATAL
A legalização com o forte controle estatal é defendido por Henrique Carneiro,
divergindo da desregulamentação defendida por Thiago Rodrigues.
Henrique Carneiro parte inicialmente da caracterização das drogas em “três
circuitos de circulação” na sociedade contemporânea: “o das substâncias ilícitas, o das
lícitas de uso recreacional e o das lícitas de uso terapêutico”. Sua proposta é de que os três
devem ser objeto de um tipo de empreendimento que não permita a intensificação do
estímulo contínuo ao consumo e, consequentemente, lucros sempre crescentes, inerentes
ao interesse privado, com a criação de um “fundo social”, “constituído com o faturamento de
um mercado legalizado e estatizado de produção de drogas psicoativas em geral, tanto as
ilícitas como as legais”.
Diz o autor, Henrique Carneiro:
O álcool já foi remédio, tornou-se droga proibida e voltou a ser substância de uso lícito controlado. Outras, como os derivados da Cannabis, que por milênios fizeram parte de inúmeras farmacopeias, foram objeto de uma proscrição oficial no século XX, a ponto de a ONU querer “erradicar” essa planta, assim como outras tais como a coca e a papoula produtora de ópio. Hoje a Cannabis, entretanto, tem uso medicinal reconhecido em muitos estados norte-americanos e em outros países
141.
Dentre o conjunto dos medicamentos, que totalizam em média cerca de 15%
dos orçamentos de saúde nos países centrais, se destacam os chamados de psicoativos,
que são os indicados para os estados de humor, como promoção da alegria e combate à
140
Idem. <www.druglibrary.org/special/friedman/socialist.html> acesso em: 18 de outubro de 2012. 141
Idem. <http://coletivodar.org/2010/03/exclusivo-texto-de-henrique-carneiro-sobre-alternativas-ao-proibicionismo/> Acesso em: 22 de outubro de 2012.
61
tristeza, para os problemas mentais, como ansiedade ou falta de concentração, para o
aumento do desempenho intelectual ou físico, para a tranquilização, sedação e analgesia,
para a excitação sexual, e outras formas.
Existem, três circuitos de circulação de drogas psicoativas na sociedade142:
1- O das substâncias ilícitas, num mercado paralelo e clandestino, cujo
volume é calculado em torno de 400 bilhões de dólares, basicamente os
derivados de algumas das plantas mais tradicionais da história da
humanidade: a coca, a canábis e a papoula. Cada vez mais cresce também
um número de centenas de moléculas sintéticas novas que vem sendo
desenvolvidas nos últimos anos em laboratórios clandestinos. O montante do
faturamento e as consequências sociais em geral associadas a essas drogas,
como a violência e alto índice de aprisionamento, decorrem não do efeito
específico das substâncias, mas sobretudo, da sua condição de ilegalidade.
2- O circuito das substâncias lícitas de uso recreacional, como o tabaco, as
bebidas alcoólicas e cafeínicas, é regido pela legalidade trazendo assim
problemas relacionados ao uso abusivo ou excessivo e seus efeitos sociais,
mas não uma violência intrínseca. É um mercado poderoso, de grandes
multinacionais associadas à indústria da alimentação, mas também conhece
micro produtores domésticos ou artesanais. Todas estas substâncias já foram
objeto de perseguição e tentativas de proibição, que, no caso do álcool,
provocaram os problemas ligados à chamada “lei seca” que vigorou de 1920
a 1933 nos Estados Unidos.
3- O circuito mais notável nas últimas décadas foi o das substâncias da
indústria psicofarmacêutica, chamados de remédios psicolépticos143,
142
Idem. <http://coletivodar.org/2010/03/exclusivo-texto-de-henrique-carneiro-sobre-alternativas-ao-proibicionismo/> Acesso em: 22 de outubro de 2012. 143
Também chamados de Sedativos, são as drogas que diminuem a dor e combatem a insônia, os estados de ansiedade e de agitação psicomotora. Muitos deles possuem efeito hipnótico, induzindo ao sono. Classificados também como hipnosedativos, são apropriados para os diversos tipos de agitação e ansiedade, mesmo nos casos de convulsão psicótica, embora não possuam efeitos
62
psicoanalépticos144 e psicodislépticos. Desenvolvido especialmente a partir
do segundo pós-guerra, é o mais rentável e o que mais tem crescido: é o de
circulação mais volumosa, com maior número de consumidores e com o
maior faturamento. Seus grandes fundamentos são o sistema de patentes, o
monopólio médico da prescrição, um mercado publicitário dirigido para quem
toma a droga, mas também corruptor de quem a ministra (laboratórios que
convencem médicos a receitarem os seus produtos). Sua outra contrapartida
indispensável é a proibição concomitante do uso de diversas plantas
psicoativas de uso tradicional que também podem ter funções
psicoterapêuticas em medicinas tradicionais tais como a canábis, a papoula e
a coca, que passaram a ser substituídas por pílulas farmacêuticas.
Hoje em dia deparamos com uma nova era industrial de aumento de tensões
e de sofrimentos psíquicos diversos e complexos, deixando de lado as plantas tradicionais,
contamos com centenas de moléculas puras para os mais diversos efeitos. A indústria
farmacêutica busca ampliar o seu monopólio, substituindo usos de plantas tradicionais por
fármacos patenteados, e colonizando cada vez mais a vida cotidiana, oferecendo novos
“remédios” para as mais diferentes esferas comportamentais.
A dependência de remédios, uma forma de consumo compulsivo chamada às
vezes popularmente de “hipocondria” é uma característica marcante da relação das
pessoas com as drogas. Por serem, por vezes, receitadas por um médico são chamadas de
“remédios”, mas o seu resultado é exatamente o mesmo de qualquer outro consumo
compulsivo, podendo levar a efeitos daninhos para o organismo e à dependência e
tolerância.
O uso de certos produtos farmacêuticos como drogas para outras finalidades,
que não as indicadas, devido a seus efeitos colaterais também é comum: xaropes para
antipsicóticos específicos. Disponível em: < http://www.coladaweb.com/drogas/drogas-psicolepticas-sedativos> Acesso em: 22 de outubro de 2012. 144
Psicoanalepticos ou estimulantes – produzem aumento da atividade cerebral, diminuem a fadiga, aumenta a percepção ficando os demais sentidos ativados.< http://tiposdedrogas-cristina.blogspot.com.br/> Acesso em: 22 de Outubro de 2012.
63
tosse com codeína, remédios para dor de cabeça como Optalidon, para mal de Parkinson
como Artane ou mesmo de analgésicos para combater dores mais psíquicas do que
propriamente orgânicas.
Muito além do simples e indefinível efeito farmacológico objetivo todo
remédio também é uma representação que se auto reforça por meio do efeito placebo
inerente a todo medicamento. O que se vende com o mercado de drogas são modos de
produção da subjetividade. Assim o fazem os usuários que as inserem em contextos
sociais, cerimoniais e até rituais. Também assim o consideram as agências publicitárias
que, ao promoverem álcool, tabaco ou remédios vendem estados de espírito, vendem
modelos de felicidade da alma, humor em pílulas. Mais do que venderem, exacerbam, pois,
conforme a hipnótica cantilena publicitária, só há requinte com um cigarro na mão, só há
festa com cerveja e decotes generosos, só há felicidade plena com o sono, a ansiedade e a
tristeza geridos por meio de doses de pílulas ou elixires145.
A própria técnica publicitária nasce, desde o final do século XIX, fortemente
ligada à venda de medicamentos, tônicos, fortificantes. Até hoje, o setor da venda de
drogas, seja álcool, tabaco ou remédios, representam uma das maiores fatias do mercado
publicitário internacional e brasileiro.
O uso de drogas na sociedade cresce sobretudo por meio dos remédios
legais, cuja publicidade incita a um consumo fetichizado e hipocondríaco, na busca de
panaceias químicas para mal-estares sociais e psicológicos146.
Uma política realmente democrática em relação às drogas psicoativas seria
aquela que legalizasse todas, submetendo-as a um mesmo regime, não importa se
remédios sintéticos ou derivados de plantas tradicionais, mas aumentasse a severidade dos
controles, distintos para cada substância. Toda publicidade em veículos de mídia
destinados ao público em geral deveria ser proibida e a fiscalização e punição para
145
Idem. <http://coletivodar.org/2010/03/exclusivo-texto-de-henrique-carneiro-sobre-alternativas-ao-proibicionismo/> Acesso em: 22 de outubro de 2012. 146
Idem. <http://coletivodar.org/2010/03/exclusivo-texto-de-henrique-carneiro-sobre-alternativas-ao-proibicionismo/> Acesso em: 22 de outubro de 2012.
64
consumos irresponsáveis, como ao volante, por exemplo, de álcool ou outras drogas,
deveria ser rígida.
Outra medida necessária seria a estatização da grande produção e do
grande comércio, de forma a evitar que corporações gananciosas dominassem o mercado e
para garantir que todos os lucros desse comércio fossem direcionados para fins sociais,
inclusive para programas de desabituação para os consumidores problemáticos que
necessitassem. Nesse sentido, além de uma política em favor dos genéricos e da quebra
das patentes, o estado deveria garantir a fabricação de todos os fármacos indispensáveis
oferecendo-os ao menor preço possível e aplicando os lucros obtidos no interesse social.
Um amplo programa de pesquisa com financiamento e destinação pública, poderia assim
estimular também o desenvolvimento de novos fármacos147.
Isso deveria se aplicar tanto aos remédios fisiológicos como aos psicoativos
da indústria farmacêutica, como também ao álcool, ao tabaco e às substâncias hoje
consideradas ilícitas. A legalização da maconha, da cocaína e de todas as drogas, sob
controle estatal do grande atacado e produção afastaria o atrativo para o crime organizado,
permitiria maior monitoramento dos usos problemáticos e encaminhamento dos
necessitados a tratamentos que poderiam ser financiados e oferecidos no serviço público de
saúde pela própria renda gerada pela venda legal.
Criar um fundo social não apenas resultado de tributos, mas do controle
econômico estatal de grande produção e circulação de drogas, remédios, bebidas e
cigarros. O conjunto do faturamento obtido poderia servir para custear o orçamento de
Saúde Pública.
O conjunto das drogas legalizadas acabaria com os efeitos nefastos do
chamado “narcotráfico”, encerraria a “guerra contra as drogas”, libertaria os prisioneiros
dessa guerra: em torno de metade da população carcerária tanto nos EUA como no Brasil.
O crescimento vertiginoso do encarceramento por drogas que vem servindo como a
147
Idem. <http://coletivodar.org/2010/03/exclusivo-texto-de-henrique-carneiro-sobre-alternativas-ao-proibicionismo/> Acesso em: 22 de outubro de 2012.
65
principal fonte de lucros para o sistema penal privado norte-americano e como mecanismo
de repressão social e racial contra os pobres e os afrodescendentes seria detido.
Reduziriam os danos sociais dos usos problemáticos de drogas e estes poderiam ser
amenizados. Potencializariam os usos positivos, tanto terapêuticos como recreacionais.
Os fármacos em geral, e os psicofármacos em particular, oferecem um
florescente futuro, com inúmeras novas moléculas podendo ser inventadas, além dos usos
diversos que já se podem fazer das substâncias existentes, o que amplia um repertório
capaz de ser usado para fins terapêuticos, lúdicos, recreacionais, de reflexão filosófica, de
autoconhecimento e de regulação humoral, mas também podendo ser usado de formas
autodestrutivas, excessivas, abusivas e descontroladas. Uma cultura da autonomia
responsável supõe o uso consciente do potencial de todos os fármacos, que, como os
alimentos, são os produtos da cultura material que ingerimos para finalidades úteis ao
nosso corpo.
Usar as “tecnologias de si” de forma construtiva significa por um lado acabar
com a “guerra contra as drogas” e o proibicionismo demonizante de certas substâncias,
mas, por outro, significa recusar os efeitos alienantes de uma cultura publicitária que faz da
saúde um negócio e da necessidade das drogas um mercado oligopólico global148.
4.1.3 LEGALIZAÇÃO CONTROLADA
O modelo de legalização controlada foi pensado como intermediário entre a
“proibição irrealista e a descriminalização irresponsável”, ou seja, foi pensada para substituir
a atual proibição das drogas, regulando a sua produção, o comércio de modo a evitar a
148
Idem. <http://coletivodar.org/2010/03/exclusivo-texto-de-henrique-carneiro-sobre-alternativas-ao-proibicionismo/> Acesso em: 22 de outubro de 2012.
66
idolatria e a demonização da droga, com o objetivo de minimizar possíveis abusos
prejudiciais á sociedade149.
Seus princípios básicos são: uso discreto, propaganda proibida, produção e
distribuição orientadas pelo Estado.
Essa proposta teve como idealizador Francis Callabero, que prevê a
comercialização de todas as drogas atualmente proibidas, incluindo a cannabis, a heroína e
a cocaína, dentre outros, os quais passariam a ser liberados não só para fins medicinais,
mas também recreativos, da mesma forma que o álcool e o tabaco hoje o são. Esse modelo
não tem o condão de modificar as características dos produtos. Eles continuam sendo
substancias psicoativas e perigosas para a saúde e para a sociedade, e suscetíveis de
abusos150.
Contrapondo ao modelo proibicionista, que fixa o ideal de abstinência, o
modelo de legalização controlada se baseia no ideal de tolerância e moderação, como
forma de conciliar o exercício da liberdade individual com a necessária proteção da saúde
pública.
Aos consumidores imoderados essa teoria apresenta duas distinções
importantíssimas que são: os abusos que causam danos somente ao usuário, e os abusos
que causam danos a terceiros e a sociedade. As pessoas que abusam das drogas
causando males a sua própria pessoa, sofreria uma sanção apenas moral, pois não
compromete a saúde de terceiros, nem a sociedade; e os que acarretam danos a outrem ou
149
“La légalisation contrôlée est un système qui vise à remplacer l’actuelle prohibition des drogues
par une réglementation de leur production, de leus commerce et de leur usage em vue d’en limiter les
abus préjudiciables à la société”. CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Droit de la drogue. Paris:
Dalloz, 2000, p. 131-132. Apud in: Luciana Boiteux Figueiredo Rodrigues. Controle Penal Sobre as
Drogas Ilicitas: Impacto do Proibicionismo no Sistema Penal e na Sociedade. Tese de
Doutorado. USP/SP, 2006, p.93
150 CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Droit de la drogue. Paris: Dalloz, 2000, p. 133. Apud in:
Luciana Boiteux Figueiredo Rodrigues. Controle Penal Sobre as Drogas Ilicitas: Impacto do Proibicionismo no Sistema Penal e na Sociedade. Tese de Doutorado. USP/SP, 2006, p. 94.
67
à sociedade, como é o caso de dirigir sob efeito da droga por exemplo, que devem ser
tratados de forma diferenciada pelo modelo proposto, que apresenta as medidas adaptadas
à periculosidade e ao risco do comportamento do usuário151.
Quanto ao seu fundamento sanitário social, pretende a estratégia acumular
as vantagens da redução dos riscos e da descriminalização, e ao mesmo tempo evitar os
respectivos inconvenientes, por meio da colocação à disposição do usuário de produtos e
utensílios com controle de qualidade, prevenindo as overdoses, a transmissão da AIDS e a
delinquência152.
Ao descriminalizar o uso, é proposta também a descriminalização de todo o
circuito do comércio de entorpecentes, sobretudo a produção e a revenda, com o objetivo
de deixar de alimentar o tráfico, o traficante de rua e as máfias. Entende Caballero que, uma
vez liberado da guerra às drogas, o Estado poderá se dedicar à luta civil contra o abuso das
drogas, na qual seria mais fácil o enfoque na prevenção, por meio da informação aos
consumidores sobre os perigos e os riscos do abuso de cada substância legalizada, além
de ser oferecida ajuda à desintoxicação153.
Respondem os autores que a opção pela legalização controlada não
abandona a via repressiva, pois entende que o direito penal pode ser utilizado para marcar
os limites entre os abusos prejudiciais à juventude e à sociedade. Porém, este não mais
exerceria um papel central como tem hoje no modelo proibicionista, pois sua tarefa seria
marginal e periférica, ao sancionar alguns acontecimentos abusivos extremos. Assim, o
direito penal seria substituído pelo direito administrativo, pelo direito comercial e pelo direito
tributário no controle dos circuitos de produção e de distribuição criados pela legalização,
considerados controles bem mais eficazes, com condições de dar um fundamento
econômico à íntegra do sistema154.
151
CABALLERO, Francis; BISIOU,Yann. Ibidem. 2006, p. 95. 152
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Ibidem. 2006, p.96. 153
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Ibidem. 2006, p. 97. 154
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Ibidem. 2006, p. 97.
68
O fundamento econômico deste modelo está na possibilidade de controlar a
oferta e a demanda da droga, considerando-se esta como uma mercadoria, e deixando uma
relativa liberdade de mercado aos operadores155.
Sobre este ponto, há uma diferença entre a proposta de Caballero e a visão
de Milton Friedman, conhecido defensor da descriminalização da droga sob a perspectiva
do liberalismo econômico. Friedman entende que a droga como mercadoria deve estar
sujeita às leis do mercado, ou seja, se baseia na liberdade do mercado, com base nas
ideias de Adam Smith, enquanto que Caballero insiste em uma maior intervenção estatal
sobre essas mercadorias156.
Quanto ao controle e as estratégias da legalização, Callabero impõe
restrições diversificadas para cada tipo de droga. Portanto, para cada nível de operação
poderia haver uma restrição específica e adequada, como o monopólio da produção, a
autorização para a distribuição, passando pela taxação dos produtos, a política de preços, o
racionamento, a interdição de venda a menores, a limitação da publicidade, e a obrigação
da informação ao consumidor157.
Considera o autor que as vantagens no plano econômico da Legalização
controlada seriam muitas, tais como a produção de produtos seguros e de qualidade por
preços inferiores ao mercado ilícito, o que ampliaria a capacidade estatal de lutar contra o
tráfico ilegal, assim como contra a lavagem de dinheiro da droga, que deixaria de ser a fonte
de produtos ilícitos. Além disso, os novos empregos criados no mercado formal do comércio
e da agricultura também seriam muito mais vantajosos, pois substituiriam os circuitos
paralelos do crime, bem como os impostos incidentes sobre as drogas reverteriam em
benefício do serviço social, para compensar os danos sanitários e sociais causados pelo
abuso das drogas legalizadas. Isso sem contar que os novos impostos, além de multas e
taxas recebidos, e a economia das vultosas quantias gastas na “guerra às drogas” levariam
155
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann, op. cit. 2006, p. 98. 156
FRIEDMAN, Milton. The drug war as a socialist enterprise. Disponível em <www.druglibrary.org/special/friedman/socialist.html>. acesso em: 16 de outubro de 2012. 157
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Ibidem. 2006, p. 99- 100.
69
a um aumento de receita do Estado, possibilitando maiores investimentos em saúde e
educação.
A intenção desse modelo é de uso clandestino e uso discreto. Assim, seria
proibido o uso de drogas em lugares públicos e ao volante, como também a proibição do
consumo por menores de idade.
O uso em público seria apenas punido com multa ou sanção administrativa,
evitando-se o recurso ao direito penal. Já com relação à interdição de uso da droga na
direção, ou no trabalho, em tarefas que demandem atenção, poderia haver a intervenção
penal, mas apenas como uma agravante no caso de homicídio culposo ou involuntário, ou
quando muito punido como hipótese de risco concreto à vida de outra pessoa158.
Nas palavras de Caballero:
Nesse aspecto se verifica a diferença entre “despenalização” e “legalização controlada”. Esta última conserva um direito penal, mais sofisticado, menos rigoroso, e melhor adaptado à periculosidade dos produtos. Ele visa tão somente a prevenir os comportamentos antissociais, e não a impor a ordem moral“
159.
Quanto à produção, este modelo implicaria no controle pelos Estados da
cultura, da fabricação, importação e exportação de estupefacientes, que ficariam
dependentes de um tipo de autorização estatal, com limitações de quantidades, e ainda
sujeitos a controle e fiscalização por parte da administração pública.
O controle sobre a cultura diz respeito às drogas naturais cultiváveis, como o
ópio, a coca e a maconha, e incluiria a necessidade de uma autorização estatal por meio de
um contrato, para o cultivo de tais produtos, que estariam sujeitos a limitações ao tamanho
do plantio. A remuneração aos cultivadores deve ser de mercado, não podendo ser
subsidiada, e regulada pela concorrência 160.
158
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Ibidem. 2006, p. 100. 159
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Ibidem. 2006, p. 101- 102. 160
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Ibidem. 2006, p. 102.
70
O controle sobre a fabricação se aplica às drogas sintéticas, como por
exemplos a metadona, MDMA; e semissintéticas, exemplos a morfina, heroína e cocaína,
que são produzidas industrialmente.
O autor ressalta ainda que o monopólio estatal não significa a estatização,
pois tais drogas podem ser produzidas pelas indústrias farmacêuticas mediante autorização
estatal. Situação semelhante já ocorre atualmente no caso de algumas substâncias que
recebem a autorização da ONU para serem fabricadas para fins medicinais, como
anfetaminas e opiáceos, que poderiam ser estendidas para fins não medicinais. Há também
uma empresa francesa, Francopia, que fabrica a heroína para distribuição aos viciados na
Suíça, por encomenda do governo161.
Destaca Caballero que a violação ou a fraude ao monopólio se puniria da
mesma forma em que hoje se pune o contrabando e a falsif icação de bebidas e de cigarro,
e ainda seriam definidas normas específicas para as substâncias consideradas mais
nocivas, visando o controle de qualidade, e impostas normas de fabricação. Além disso, a
cobrança de impostos sobre a produção seria diferenciada de acordo com sua
nocividade162.
O controle sobre a distribuição propõe-se a criação de um monopólio
nacional de distribuição para cada categoria de droga, no qual seria proibido qualquer
encorajamento ou propaganda dirigida à venda ou ao consumo, sendo o mercado
submetido a uma regulamentação estrita dos meios de promoção de vendas, aplicando-se a
teoria do comércio passivo, inclusive quanto à proibição de uso de marcas, proibidos todos
os procedimentos promocionais. Prevê-se também como meta, que o monopólio
implemente uma política de controle de preços, no qual a determinação do preço estaria
submetida apenas a indicativos de ordem sanitária, de forma a permitir a eliminação dos
traficantes do mercado 163.
161
Idem. Ibidem. 2006, p. 150. 162
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Ibidem. 2006, p. 102- 103. 163
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Ibidem. 2006, p. 103.
71
Como medida de proteção ao consumidor teria que haver informação
obrigatória sobre os riscos de abuso das drogas distribuídas, e a droga deveria ser
apresentado de acordo com a periculosidade do produto, constando a indicação de alertas
e contraindicações.
O modelo da legalização controlada leva em consideração as experiências
positivas inglesa, suíça e holandesa, e também a experiência negativa do sistema
proibicionista.
Em seu livro, Caballero ressalva que “a legalização controlada é uma
doutrina onde os princípios devem ser adaptados ao contexto de cada país e à
especificidade de cada droga” 164, ou seja, não é um modelo duro envolvido sobre uma
membrana de proteção, mas sim se trata de um modelo flexível e sujeito a adaptações,
inclusive quanto aos tipos de droga que devem ser ou não legalizados, o que se fará de
acordo com as necessidades de cada país, não havendo pretensão de se aplicar modelo
idêntico a todos os tipos de droga e países.
164
CABALLERO, Francis; BISIOU, Yann. Droit de la drogue. Paris: Dalloz, 2000, p. 156.
72
Considerações Finais
O século XIX ficou marcado por uma guerra pelas drogas declarada pela
Inglaterra ao império chinês, conhecida como a guerra do ópio, essa guerra fez com que o
ópio fosse a primeira droga proibida em 1912. No o século XX destacou-se pela guerra à
droga, declarada pelos nortes americanos, que acabou por estender a proibição as outras
drogas naturais, e mais recente foram proscritas as drogas sintéticas.
Os países latino-americanos conhecidos como sendo países produtores
foram colocados em uma guerra sem fim, com o objetivo de erradicar as drogas e de certa
forma as suas culturas ancestrais.
Passado quase um século das primeiras proibições, do ponto de vista da
saúde pública o modelo atual se revelou um autentico fracasso. Com a ajuda da proibição, o
mercado ilícito de drogas apresenta resultados impressionantes, tendo sido mantida a
circulação de mercadorias atendendo a uma demanda crescente por drogas. Do ponto de
vista da saúde pública a proibição dificultou o estudo do fenômeno das drogas, as
estatísticas são pouco precisas e os dependentes de drogas são tratados ora como
criminosos ora como doentes. A guerra as drogas desencadeou uma epidemia da AIDS,
devido a clandestinidade do compartilhamento de seringas pelos dependentes. Em
decorrência do proibicionismo os níveis de consumo de drogas tem subido em todos os
países do mundo, apesar dos esforços na tentativa de atingir um ideal de um mundo livre de
drogas.
Uma das mais graves consequências do proibicionismo em todo o mundo é o
aprisionamento em massa. A política repressiva da guerra às drogas tem gerado graves
distorções no sistema penitenciário de todo o mundo. Acarreta o aumento no número de
presos por crimes de drogas, não só em quantidade de pessoas presas por envolvimento
com tóxicos, como também em proporção de presos por drogas em comparação com outros
tipos de delitos.
73
O Brasil é um dos fieis seguidores da política repressiva, mas em níveis
diferentes em que existe nos estados unidos. Para além dos problemas de alto consumo de
drogas vividos pelos Estados Unidos, no Brasil ainda vive-se o problema do impacto do
proibicionismo na sociedade e no sistema penal.
O impacto do proibicionismo na sociedade e no sistema penal dificulta
estratégia como a redução de danos. Essa politica tem sofrido uma forte rejeição pela
potencia proibicionista, que insiste na tese da abstinência e na redução da oferta e da
demanda como estratégia única de combate à droga.
A política de redução de danos passou a coexistir com a despenalização do
usuário, dentro do modelo proibicionista, que continua mantendo forte controle sobre o
tráfico. Atualmente o continente europeu vem se destacando na implementação de
estratégias alternativas ao proibicionismo, desde a despenalização do usuário, passando
pela descriminalização levada a cabo por Portugal, Itália e Espanha, até a experiência
holandesa que despenalizou o cultivo e o pequeno comércio de cannabis.
Concluo o meu trabalho convicto que o sistema repressivo já não mais se
adéquo a realidade que nós infrentamos hoje no que se refere as drogas. O proibicionismo
não conseguiu atingir os seus objetivos, ou seja, a oferta de drogas não foi reduzida, o
consumo droga aumentou, a situação da saúde pública agravou-se, o sistema prisional está
superlotado e próximo à falência, aumentou a corrupção, e os grandes traficantes
continuam soltos; a circulação de dinheiro sujo não diminuiu; as drogas naturais foram
geneticamente modificadas e estão cada vez mais potentes. No Brasil em especial, houve
um grande crescimento da violência que esta intimamente ligada o combate ao trafico de
drogas, e à alta lucratividade do comércio ilícitas, uma grande epidemia de crack, com a
existência de cracôlandias em vários lugares do pais, as prisões estão cheias de
dependentes de drogas que se transformam em criminosos para sustentar seu vício, e a
violência na resolução dos conflitos ligados ao tráfico é generalizada.
Na década de 90, convergiram dois discursos: um pró-repressão, que prega
a redução da oferta e da demanda por meio do controle penal, visando a alcançar o ideal da
74
abstinência; e o discurso preventivo da redução de danos, pregando a moderação e o
controle do abuso, priorizando medidas preventivas e de reduzir o estigma do viciado.
Paralelamente, o discurso alternativo vai se destacando em oposição ao proibicionismo,
defendendo a legalização das drogas e a redução do controle penal.
A proposta de legalização das drogas como uma das proposta alternativas
apresentadas se baseia no ideal a regulamentação e controle do uso e do trafico de drogas
como meta para combater o abuso de drogas. A legalização das drogas não se trata de
apologia ao uso de drogas, mas sim ela surge em oposição ao modelo repressivo, como
alternativa para o combate ao uso e ao trafico de drogas.
O objetivo desse modelo não é a abolição total das drogas, porque a abolição
total das drogas é algo impossível de se conseguir, é uma utopia. Ela se presta a nos
auxiliar e ajudar a conviver com as drogas daqui para a frente, porque as drogas
permanecerão na nossa vida, e nós precisamos de uma política inteligente que pensa nos
nossos jovens, nas nossas crianças e na sua população.
Trago o modelo de legalização divido em três espécies de regulação, que
são: a legalização liberal, a legalização estatizante e a legalização controlada. Essas três
espécies permite um maior controle sobre o uso, o comercio, na implementação de políticas
sanitárias, na maior compreensão do fenômeno “Droga”, e em um maior combate as
drogas, com uma política mais humanitária e mais pacifica.
Muito embora nenhum sistema de controle de drogas esteja imune a críticas,
os modelos de legalização das drogas deverá adotar o respeito a princípios e garantias
individuais como base, e ter a melhoria do bem-estar dos indivíduos como meta, assim
como deve ter um enfoque preventivo preponderante, e superar a conotação militarista que
o tema drogas tem sido visto.
75
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