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Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996 PONTOS CONTROVERTIDOS A arbitragem - meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia da sentença judicial – é colocada à disposição de quem quer que seja, para solução de conflitos relativos a direitos patrimoniais acerca dos quais os litigantes possam dispor.

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Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996

PONTOS CONTROVERTIDOS

A arbitragem - meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia da sentença judicial – é colocada à disposição de quem quer que seja, para solução de conflitos relativos a direitos patrimoniais acerca dos quais os litigantes possam dispor.

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Trata-se de mecanismo privado de solução de litígios, por meio do qual um terceiro, escolhido pelos litigantes, impõe sua decisão, que deverá ser cumprida pelas partes. Esta característica impositiva da solução arbitral (meio heterocompositivo de solução de controvérsias) a distância da mediação e da conciliação, que são meios autocompositivos de solução de litígios, de sorte que não existirá decisão a ser imposta às partes pelo mediador ou pelo conciliador, que sempre estarão limitados à mera sugestão (que não vincular as partes).

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• Diz-se que a arbitragem é meio alternativo de solução de controvérsias tomando-se como referência o processo estatal – meio heterocompositivo por certo mais empregado para dirimir conflitos. Carnelutti preferiu designar a arbitragem como equivalente jurisdicional, por entender que a jurisdição somente poderia ser exercida pelo Estado, reconhecendo ao juízo arbitral apenas semelhança com o método estatal de composição de lides.

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Faço aqui um alerta: a terminologia tradicional, que se reporta a “meios alternativos” parece estar sob ataque, na medida em que uma visão mais moderna do tema aponta meios adequados (ou mais adequados) de solução de litígios, não necessariamente alternativos que a maior parte das sociedades atingiu neste terceiro milênio), é razoável pensar que as controvérsias tendam a ser resolvidas, num primeiro momento, diretamente pelas partes interessadas ( negociação, mediação, conciliação); em caso de fracasso deste diálogo primário (método autocompositivo), recorrerão os conflitantes às fórmulas heterecompositivas ( processa estatal, processo arbitral).

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Sob este enfoque, os métodos verdadeiramente alternativos de solução de controvérsias seriam os hetercompositivos (processo estatal, seja estatal, seja arbitrial), não os autocompositivos (negociação, mediação, conciliação). Para evitar esta contradição, soa correta a referência a métodos adequados de solução de litígios não a métodos alternativos. Um sistema multiportas de resolução de disputas, em resumo, oferecerá aos litigantes diversos métodos, sendo necessário que o operador saiba escolher aquele mais adequado ao caso concreto

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Ao optarem pela arbitragem, duas são as possibilidades quanto ao órgão arbitral: ou nomeiam um único árbitro, ou entregam a um grupo de árbitros a solução do litígio; num caso ou noutro, pode o órgão arbitral ser constituído exclusivamente para resolver determinada controvérsia (arbitragem ad hoc) ou pode ser tal órgão pré-constituído (arbitragem institucional).

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Os poderes dos árbitros são conferidos pelos litigantes, tendo a lei ampliado sobremaneira a autonomia da vontade das partes (vide comentário ao art. 2°).

Por último, ficou claro que a arbitragem é mecanismo extrajudicial de solução de conflitos, de tal sorte que a intervenção do Poder Judiciário ou não existirá, ou então será invocada quando houver necessidade de utilizar a força diante de resistência de uma das partes ou de terceiros (condução de testemunhas, implementação de medidas cautelares, execução de provimentos antecipatórios ou execução de sentença arbitral).

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Embora não se confundam arbitragem, conciliação e mediação – o objetivo da primeira é a obtenção de uma solução imposta por um terceiro imparcial, enquanto as duas últimas visam a celebração de um acordo – convém lembrar que existem hoje, graças à popularidade que vêm alcançando os meios alternativos de solução de controvérsias, variações que devem ser levadas em consideração no momento de escolher o mecanismo que mais convenha aos litigantes para a solução de seus conflitos.

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• Assim, especificamente quanto à arbitragem, três variações vêm sendo empregadas com sucesso: a primeira, denominada med/arb, leva os litigantes a estabelecer as premissas para uma mediação que, não produzindo resultados, autoriza o mediador a agir como árbitro e proferir uma decisão vinculante; a segunda, conhecida como high-low arbitration, procura reduzir os riscos de um laudo inaceitável, estabelecendo as partes, previamente, limites mínimo e máximo para a autoridade do árbitro; a terceira variação leva as partes a optarem por uma arbitragem não vinculante, ou seja, se a decisão é aceitável para os litigantes, eles a cumprirão; em caso contrário, poderão utilizar o laudo em suas negociações futuras.

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CLÁUSULA ARBITRAL ESCALONADA

Muitas são as variações- ou combinações- entre os métodos de solução de litígios, graças ao desenvolvimento do sistema multiportas. Julgo, porém, importante deter a atenção sobre um mecanismo que vem sendo utilizado com alguma freqüência e que tem causado alguma frustração entre os operadores. Trata-se da cláusula arbitral escalonada, segundo a qual as partes avençam que se submeterão a procedimento de mediação (ou de conciliação, conforme seja o caso) e, não chegando a um acordo, instaurarão desde logo a arbitragem.

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• O primeiro ponto a tratar diz respeito à função de mediador e, subsequentemente, de árbitro, exercida pelo mesmo profissional. Explico: nem sempre fica claro no contrato celebrado pelas partes (onde a cláusula escalonada esteja inserida) se os contendentes têm alguma objeção quanto à dupla atividade que poderá ser exercida pelo profissional indicado para mediar a controvérsia. Não é recomendável que o mediador exerça, em caso de fracasso do método autocompositivo, a função de árbitro.

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• Durante o processo de negociação, as partes devem ter a tranqüilidade de poder revelar ao mediador ou conciliador os detalhes do contrato e suas expectativas de solução da controvérsia; não creio que as partes, sabendo que o profissional que tenta atingir a transação será eventualmente o juiz da futura demanda, possam tirar o melhor proveito do método autocompositivo: a percepção, pelo mediador ou conciliador, dos objetivos das partes e das possibilidades reais de composição (bottom-line objectives, expectativas mínimas para atingir um acordo) dependem da transparência das negociações, que ficará empanada se as partes mantiverem reservas, cautelas e reticências diante de um mediador que poderá transformar-se em juiz.

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O segundo ponto relevante diz respeito à obrigatoriedade da mediação (ou conciliação) antes da instauração da arbitragem, pois é muito comum que uma das partes, percebendo que o relacionamento com o adversário deteriorou-se de modo irreparável, instaure desde logo a arbitragem. O binômio tempo-urgência, por outro lado, pode exigir que uma das partes desde logo instaure a arbitragem (antecedida, eventualmente, de medida cautelar pleitada perante o juiz estatal), o que infringe, em última análise, a promessa contratual de submeter litígio primeiro à mediação/conciliação e, somente em caso de insucesso, passar à arbitragem.

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• Seria formalismo excessivo imaginar nulidade por conta instauração de arbitragem sem que as partes se submetam previamente ao procedimento autocompositivo escolhido. Diante da eventualidade de violação da avença contida na cláusula escalonada, poderá o árbitro, se perceber espaço para composição notando a necessidade de instaurar procedimento próprio, propor que as partes suspendam a arbitragem, remetendo os litigantes ao procedimento de mediação ou conciliação escolhido.

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• Se qualquer uma das partes discordar, nada impedirá que os árbitros, atendendo os ditames do § 4° do art. 21 da Lei de Arbitragem, tentem a conciliação das partes. Não havendo predisposição para a composição, restará claro que a superação da fase de mediação prevista na cláusula escalonada não terá provocado prejuízo algum, de modo que não haverá qualquer sombra de nulidade a macular o procedimento arbitral.

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3 ARBITRAGEM OBRIGATÓRIAA escolha do meio alternativo de solução de controvérsias é sempre voluntário, ou

facultativo, eis que não existe no Brasil a arbitragem obrigatória (abolida entre nós em 1866).

Há países, porém, em que ocorre em Portugal, onde o art. 211 da Constituição estabelece, de modo expresso, que “podem existir tribunais marítimos e tribunais arbitrais”, o que leva a doutrina portuguesa a afirmar que os tribunais arbitrais (tanto os voluntários como os necessários) integram a ordem judicial portuguesa, exercendo então os árbitros função jurisdicional. Em decorrência disto e por força do art.1.525 do Código de Processo Civil Português, o funcionamento de cada tribunal arbitral dito necessário será regulado pela lei especial que o criar, estando hoje em funcionamento, ao que se sabe, pelo menos quatro desses tribunais, para julgamento das seguintes causas: questões ligadas ao valor dos achados no mar, no fundo do mar ou por este arrojados, cuja propriedade reverta para o Estado; compensação a pagar aos proprietários de material e instalações requisitadas pelas juntas autônomas portuárias; fixação da indenização em caso de expropriação de bens ou direitos adquiridos através de investimento direto estrangeiro; e conflitos coletivos de trabalho referentes à celebração ou revisão de uma convenção coletiva aplicável a empresas públicas ou de capitais exclusivamente públicos.

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Também a Costa Rica reconhece a arbitragem obrigatória para questões ligadas à previdência social (demandas entre o Instituto Nacional de Seguros e o segurado a respeito do contrato de seguro) e para certas questões oriundas de admissão ou recusa de herdeiro em uma sociedade de responsabilidade limitada, entre outras.

Pode-se dizer, todavia, que a arbitragem obrigatória é instituto francamente em desuso, que tende a ser abolido nos sistemas mais evoluídos, sendo substituído tal mecanismo por tribunais ou juízos especializados.

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4 CAPACIDADE DE CONTRATAR Condição sine qua non para a utilização da arbitragem é a capacidade

dos contratantes, sem o que não pode ser firmada a convenção de arbitragem.

A capacidade jurídica consiste – como lembra Angelo Favata – “na aptidão de tornar-se sujeito de direitos e de deveres”, sendo tal capacidade do pressuposto de todos os direitos e obrigações. Esta aptidão genérica está estampada no art. 1° do Código Civil brasileiro, sendo certo que a capacidade jurídica da pessoa natural é limitada, já que uma pessoa pode ter o gozo de um direito, sem ter o seu exercício, razão pela qual seu representante legal é que o exercerá, em seu nome.

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• Também pode a capacidade sofrer restrições quanto ao seu exercício por força de outras concorrências, tais como a idade (maioridade ou menoridade), fatores físicos (toxicômanos) ou psicológicos (deficiência mental). A estes a lei denomina incapazes, dando-lhes proteção jurídica, que se realiza por meio da representação ou assistência, o que lhes possibilita o exercício de direitos.

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Considerando-se que a instituição de juízo arbitral pressupõe a disponibilidade do direito, não podem instaurar processo arbitral aqueles que tenham apenas poderes de administração, bem como os incapazes (ainda que representados ou assistidos). Isto significa que o inventariante do Espólio e o síndico do condomínio não podem, sem permissão, submeter demanda a julgamento arbitral; havendo porém, autorização (judicial, no caso do inventariante e do síndico da falência, ou da assembleia de condomínios, no que diz respeito ao condomínio), poderá ser celebrada a convenção arbitral. Sem autorização, será nula a cláusula ou o compromisso arbitral.

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Como se vê, os entes despersonalizados (universalidades dotadas de representação ativa e passiva como condomínios em edifícios, massas falidas, espólios, sociedades de fato). Desde que autorizados, podem valer-se da arbitragem, eis que têm capacidade de ser parte e de estar em juízo, nada impedindo que disponham de seus direitos.

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5 DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVELNão basta a capacidade para submeter aos árbitros um litígio: é

necessário ainda que a desavença diga respeito a direito patrimonial disponível.

A Lei de Arbitragem abandonou a fórmula preconizada pelo Código de Processo Civil (art. 1.072, revogado), que se reportava a direitos patrimoniais “sobre os quais a lei admita transação”, preferindo técnica superior. Agora, a remissão à disponibilidade do direito é objetiva e não oblíqua como ocorria na redação adotada pelo dispositivo indigitado do Estatuto de Processo

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Diz-se que um direito é disponível quando ele pode ser ou não exercido livremente pelo seu titular, sem que haja norma cogente impondo o cumprimento do preceito, sob pena de nulidade ou anulabilidade do ato praticado com sua infringência. Assim, são disponíveis (do latim disponere, dispor pôr em vários lugares, regular) aqueles bens que podem ser livremente alienados ou negociados, por encontrarem-se desembaraçados, tendo o alienante plena capacidade jurídica para tanto.

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De maneira geral, não estão no âmbito do direito disponível as questões relativas ao direito de família (em especial ao estado das pessoas, tais como filiação, pátrio, poder, casamento, alimentos), aquelas atinentes ao direito de sucessão, as que têm por objeto as coisas fora do comércio, as obrigações naturais, as relativas ao direito penal, entre tantas outras, já que ficam esta matérias todas fora dos limites em que pode atuar a autonomia da vontade dos contendentes.

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• Estas constatações não são suficientes, porém, para excluir de forma absoluta do âmbito da arbitragem toda e qualquer demanda que tanja o direito de família ou o direito penal, pois as conseqüências patrimoniais tanto num caso como noutro podem ser objeto de solução extrajudicial.

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• Dizendo de outro modo, se é verdade que uma demanda que verse sobre o direito de prestar e receber alimentos trata de direito indisponível, não é menos verdadeiro que o quantum da pensão pode ser livremente pactuado pelas partes (e isto torna arbitrável esta questão); da mesma forma, o fato caracterizador de conduta antijurídica típica deve ser apurado exclusivamente pelo Estado, sem prejuízo de as partes levarem à solução arbitral a responsabilidade civil decorrente de ato delituoso.

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• É neste sentido, portanto, que deve ser interpretado o art. 852 do Código Civil, ao vedar o compromisso arbitral para questões de estado, de direito pessoal da família e “de outras que não tenham caráter escritamente patrimonial”. Em outros termos, a edição do artigo em questão do Código Civil vigente nada acrescentou (e nada retirou) ao art. 1° da Lei de Arbitragem.

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• São arbitráveis, portanto, as causas que tratem de matérias a respeito das quais o Estado não crie reserva específica por conta do resguardo dos interesses fundamentais da coletividade, e desde que as partes possam livremente dispor acerca do bem sobre o que controvertem. Pode-se continuar a dizer, na esteira do que dispunha o Código de Processo Civil (art. 1.072, revogado), que são arbitráveis as controvérsias a cujo respeito os litigantes podem transigir.

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6 DIREITO DO TRABALHOAs causas trabalhistas também são, em princípio,

arbitráveis, não havendo necessidade de procurar na Lei qualquer menção específica ao Direito do Trabalho para que o mecanismo de solução de controvérsias seja aplicável também às questões laborais.

É bem verdade que não poucos estudiosos sustentam que a arbitragem é incompatível com o processo trabalhista brasileiro, pois a submissão do trabalhador à decisão arbitral significaria deixar o obreiro à mercê do empregador, com ampla possibilidade de fraude, tornando sem sentido o caráter protetivo do direito do trabalho.

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• Ainda parece predominar entre os juslaboralistas o entendimento de que os direitos trabalhistas não comportariam renúncia nem transação, sob pena de afronta ao disposto no art. 444 da Consolidação das Leis do Trabalho, sustentando-se, então, o princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas. Em conseqüência, a doutrina ainda dominante acaba sustentando uma ordem protecionista das regras inseridas na Consolidação das Leis do Trabalho, tudo de modo a fazer crer serem indisponíveis os direitos ali regulados, o que impediria a utilização da arbitragem.

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Outros, mesmo sustentando a possibilidade de se solucionarem questões trabalhistas por meio da arbitragem, preconizam legislação diferenciada, que deveria levar em conta – de forma mais acentuada – a diversidade do direito material controvertido.

Sugeriu Octávio Bueno Magano, ainda sob a égide do Código de Processo Civil, que para desimpedir-se o caminho da arbitragem trabalhista fosse editado ato legislativo que ressalvasse a inaplicabilidade das limitações constantes nos arts.1.035 do Código Civil (de 1916) e 1.072 do Código de Processo Civil (ambos referem-se a direitos sobre os quais se admita transação), preconizando que bastaria simples alusão à admissibilidade da arbitragem relativamente aos dissídios trabalhistas individuais ou coletivos para que se dissolvessem as restrições da doutrina acima referidas.

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• A Lei de Arbitragem não se reporta mais ao conceito de transigibilidade ancorando-se na disponibilidade do direito. Mas aqui nada mudou em relação às objeções postas pelos juslaboralistas. Acredito que a grande alteração recomendada por Octávio Bueno Magano acabou sendo trazida pela Constituição de 1988, cujo art. 114, § 1°, determina que “frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros”.

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Reconheceu o constituinte de 1988 que, pelo menos nas convenções coletivas, onde o âmbito de disponibilidade de direitos é extenso e patente, não haveria impedimento para a solução arbitral do litígio (antes, tudo recomendaria a solução pela via arbitral de um conflito de interesses que muitas vezes tem caráter exclusivamente econômico). E a voz dos operadores do direito laboral deve ser ouvida a respeito do assunto, especialmente quando os juízes experimentados recomendam a solução arbitral de conflitos coletivos, como fez Washington Luiz da Trindade, em parecer relativo aos conflitos gerados pela Lei 8.630/93 no que se refere ao trabalho de estiva em terminal privativo portuário. Lembra o antigo magistrado que a arbitragem poderá aproximar e conciliar interesses das partes insatisfeitas com as regras atuais de convivência, atestando que “em nenhum momento de nossa jurisprudência laboral rejeitou-se a arbitragem como fórmula conciliatória dos conflitos, de igual acontecendo com a mediação”. E conclui: “Não seria, pois, o tão comum na experiência estrangeira”.

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• Oportuno lembrar, ainda, que a legislação trabalhista brasileira, antes mesmo da Lei 9.307/96, já encapava a possibilidade de solução arbitral para conflitos decorrentes do exercício do direito de greve (Lei 7.783/89, art. 7°) e para litígios decorrentes da participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa (para o que preconiza o art. 4° da Medida Provisória 1.539-34, de 7.8.97, a utilização de arbitragem de ofertas finais, ou seja, deveria o árbitro restringir-se a optar pela proposta apresentada, em caráter definitivo, por uma ou outra parte).

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Quantos aos conflitos individuais, embora não se deixe de reconhecer o caráter protetivo do direito laboral, é fato incontestável que nem todos os direitos inseridos na Consolidação das Leis do Trabalho assumiriam a feição irrenunciável pregada pela doutrina especializada mais conservadora: se assim não fosse, não se estenderia o estímulo sempre crescente á conciliação (e à conseqüente transação), sorte que parece perfeitamente viável solucionar questões trabalhistas que envolvam direitos disponíveis através da instituição do juízo arbitral.

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• Nesta esteira, lembro a experiência representada pelo Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista Rural: na cidade de Patrocínio, Minas Gerais, levou-se a cabo experiência bem-sucedida de solução extrajudicial de controvérsias, mediante a ação conjunta dos sindicatos, com o apoio da então Junta de Conciliação e Julgamento local.

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• A interação destes órgãos resultou em interessante conselho de mediação que, na hipótese de não conseguir levar as partes a um acordo, permite a solução arbitral do litígio através de um juiz presidente (note-se que o procedimento foi criado antes do advento da Lei de Arbitragem).

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A experiência a respeito da arbitragem em matéria trabalhista e a jurisprudência que foi paulatinamente se formando sobre o tema confirmaram a arbitralidade dos conflitos laborais: alguns órgãos arbitrais institucionais dedicaram-se especialmente ( embora nem sempre exclusivamente) à arbitragem de conflitos trabalhistas, sendo inevitável que alguma controvérsia (ainda que incidental em relação à arbitragem) acabasse chegando ao Poder Judiciário.

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• Assim, várias decisões foram proferidas por juízes federais de São Paulo para conceder ordem em mandado de segurança garantindo a liberação de Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), eis que alguns gerentes da Caixa Econômica Federal não atribuíam à sentença proferida pelo juiz trabalhista indiretamente, tais sentenças reconhecem a validade da convenção de arbitragem que recaiu sobre relação de trabalho.

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• Por outro lado, acabou por solidificar-se a impressão de que não poderia haver qualquer restrição à solução arbitral de controvérsia trabalhista oriunda de relação jurídica finda, eis que tais controvérsia estariam ligadas exclusivamente a verbas indenizatórias, relevando-se a natureza disponível dos direitos em disputa.

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A dúvida, portanto, acerca da arbitralidade de controvérsias trabalhistas acaba sendo restrita às relações jurídicas ainda em curso, concluindo alguns estudiosos que em tais

casos não seria aceitável a solução arbitral por conta da natureza protetiva do Direito do Trabalho. Não me parece que tal restrição – genericamente posta- possa ser aceita, pois mesmo em sede de relações de trabalho em curso há largo espaço para a atuação da vontade dos contratantes, relevando-se aqui também a disponibilidade do direito.

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• Ainda uma última palavra sobre as restrições à arbitragem em matéria trabalhista: é indisfarçável uma certa antipatia (política, sobretudo!) dos doutrinadores juslaboralistas em relação à solução arbitral de conflitos especializados, e isto apesar da larga utilização do instituto em paragens estrangeiras. Nos Estado Unidos da América o instituto é de larguíssima utilização, sendo por todos reconhecida sua vantagem em relação à solução judicial dos conflitos. Chega-se mesmo a constatar que a arbitragem é o meio de solução de conflitos individuais de trabalho mais utilizado entre empregados sindicalizados e empregadores, tudo graças à tradição norte-americana que estimulou intervenção apenas subsidiária do governo nas relações trabalhistas.

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Diferentemente do que ocorreu no Brasil, os norte-americanos não receberam direitos, conquistaram-nos, de modo que os sindicatos restaram historicamente fortalecidos, o que decididamente não aconteceu em nosso país. Como resultado, nos Estado Unidos os sindicatos dão suporte ao empregado no momento em que se instaura uma disputa arbitral em face do empregador, equilibrando as forças entre os litigantes; no Brasil isto não ocorre, gerando forte desconfiança em relação a qualquer forma de resolver conflitos entre parte economicamente desiguais fora do Poder Judiciário. Oxalá possam os sindicatos, patronais e dos empregados, acostumaram-se nas convenções coletivas, a estabelecer uma forma de composição de conflitos através de órgão neutro: esta experiência já tem bons precedentes, como se constata dos dados oferecidos pelo Conselho Arbitral do Estado de São Paulo (Caesp), que tem atuado exatamente por força de disposições inter-sindicais, por meio das quais o órgão institucional em questão é eleito para resolver controvérsias trabalhistas. Os números são eloqüentes, eis que em cerca de dez anos de existência, o órgão arbitral em questão já tratou de mais de 26.000 causas, grande parte das quais versando sobre questões trabalhistas.

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Em conclusão, tanto para as questões ligadas aos direitos coletivos quanto para aquelas atinentes aos individuais (seja o litígio atinente à relação jurídica ainda em curso), pode incidir a Lei n° 9.307/96, cujos dispositivos são plenamente aplicáveis também à arbitragem trabalhista.