LETÍCIA JARDIM TEIXEIRA A SUSTENTABILIDADE E O...
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA - UDESC CENTRO DE
ARTES - CEART DEPARTAMENTO DE MODA
LETÍCIA JARDIM TEIXEIRA
A SUSTENTABILIDADE E O APOCALIPSE DA INDÚSTRIA TÊXTIL:
DESENVOLVENDO UMA COLEÇÃO SUSTENTÁVEL SEM ABRIR MÃO DA
ESTÉTICA
FLORIANÓPOLIS, SC
2016
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LETÍCIA JARDIM TEIXEIRA
A SUSTENTABILIDADE E O APOCALIPSE DA INDÚSTRIA TÊXTIL:
DESENVOLVENDO UMA COLEÇÃO SUSTENTÁVEL SEM ABRIR MÃO DA
ESTÉTICA
Trabalho de Conclusão apresentado ao
Curso Bacharelado em Moda com
Habitação em Design de Moda do Centro
de Artes da Universidade do Estado de
Santa Catarina como requisito parcial
para obtenção do grau de Bacharel em
Moda.
Orientador: Dr. Lucas da Rosa
FLORIANÓPOLIS, SC
2016
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LETÍCIA JARDIM TEIXEIRA
A SUSTENTABILIDADE E O APOCALIPSE DA INDÚSTRIA TÊXTIL:
DESENVOLVENDO UMA COLEÇÃO SUSTENTÁVEL SEM ABRIR MÃO DA
ESTÉTICA
Trabalho de Conclusão de curso, Curso de Bacharelo em Moda com Habilitação em
Design de Moda/ Centro de Artes/ Universidade do Estado de Santa Catarina,
Bacharelado em Moda.
Banca Examinadora
Orientador: _______________________________________________
Professor Dr. Lucas da Rosa
Universidade do Estado de Santa Catarina
Membro: _______________________________________________
Professor Dr. José Alfredo Beirão Filho
Universidade do Estado de Santa Catarina
Membro: _______________________________________________
Professora Dra. Icléia Silveira
Universidade do Estado de Santa Catarina
FLORIANÓPOLIS, SC
2016
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“Cada um exerça o dom que recebeu para
servir os outros, administrando fielmente a
graça de Deus em suas múltiplas formas.”
(1 Pedro 4:10)
“Portanto, quer comais quer bebais, ou façais
outra qualquer coisa, fazei tudo para glória de
Deus.”
(1 Coríntios 10:31)
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AGRADECIMENTOS
Agradeço, antes de tudo, a Deus, que me tomou no colo e me deu tudo o que eu
preciso, desde a inspiração até a vida eterna. Este trabalho foi dedicado a Ele; uma
pequena obra de gratidão por Seu amor.
Também à minha família, que sempre me apoiou em minhas decisões acadêmicas,
sofreu comigo e sorriu comigo.
Ao meu orientador Lucas da Rosa, que, estando eu ainda na quinta fase, aceitou ser
meu mentor nesta caminhada, e que me proporcionou muito conhecimento e ajuda,
de um jeito simples e alto-astral.
Aos professores da Udesc, por me incentivarem a buscar o meu melhor, pelas
palavras de conforto, encorajamento e repreensão, pela paciência e por todos os
“tijolinhos” na minha casa de conhecimento.
À professora Mary Neusa, que foi um anjo enviado do céu, que teve paciência nos
momentos difíceis e sempre me disse que tudo ia dar certo quando eu sentia estar
tudo desabando.
À Rádio Novo Tempo, que proporcionou o material de estudo bíblico gratuitamente,
que fez parte do embasamento tanto da parte teórica quanto da parte criativa.
A todos que oraram por mim, este trabalho também é mérito de vocês.
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RESUMO
O presente trabalho busca mostrar a que ritmo anda a indústria da moda
atualmente, suas origens, seus motivos e suas consequências, assim como busca,
também, propor novas soluções para problemas antigos, através da sustentabilidade
social e ambiental, de modo que todos saiam ganhando em saúde e qualidade de
vida, assim como propõe, de maneira humilde, um modelo empresarial que vise a
justiça e a equidade, que será posto em prática com a coleção, ao final.
Palavras-chave: apocalipse; indústria; sustentabilidade; imperialismo; eco-friendly.
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ÍNDICE DE IMAGENS
Figura 1 – Painel Lifestyle .........................................................................................38
Figura 2 – Painel Imagético .......................................................................................39
Figura 3 – Trendboard ..............................................................................................40
Figura 4 – Cartela de cores .......................................................................................41
Figura 5 – Mapa da coleção.......................................................................................43
Figura 6 – Croqui 1 + desenho técnico......................................................................44
Figura 7 – Croqui 2 + desenho técnico......................................................................45
Figura 8 – Croqui 3 + desenho técnico......................................................................45
Figura 9 – Croqui 4 + desenho técnico......................................................................46
Figura 10 – Croqui 5 + desenho técnico....................................................................47
Figura 11 – Croqui 6 + desenho técnico....................................................................48
Figura 12 – Croqui 7 + desenho técnico....................................................................49
Figura 13 – Croqui 8 + desenho técnico....................................................................49
Figura 14 – Croqui 9 + desenho técnico....................................................................50
Figura 15 – Croqui 10 + desenho técnico..................................................................51
Figura 16 – Croqui 11 + desenho técnico..................................................................51
Figura 17 – Croqui 12 + desenho técnico..................................................................52
Figura 18 – Croqui 13 + desenho técnico..................................................................52
Figura 19 – Croqui 14 + desenho técnico..................................................................53
Figura 20 – Croqui 15 + desenho técnico..................................................................54
Figura 21 – Croqui 16 + desenho técnico..................................................................55
Figura 22 – Croqui 17 + desenho técnico..................................................................55
Figura 23 – Croqui 18 + desenho técnico..................................................................56
Figura 24 – Croqui 19 + desenho técnico..................................................................57
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Figura 25 – Croqui 20 + desenho técnico..................................................................57
Figura 26 – Croqui 21 + desenho técnico..................................................................58
Figura 27 – Croqui 22 + ficha técnica.........................................................................59
Figura 28 – Croqui 23 + ficha técnica.........................................................................60
Figura 29 – Croqui 24 + desenho técnico..................................................................61
Figura 30 – Mapa do desfile.......................................................................................62
Figura 31 – Produção do desfile................................................................................63
Figura 32 – Mini planejamento de modelagem..........................................................65
Figura 33 – Ficha técnica de modelagem – vestido com mangas.............................66
Figura 34 – Plano de corte – vestido com mangas....................................................68
Figura 35 – Teste de modelagem da manga.............................................................69
Figura 36 – Editorial para o OCTAmag com o vestido com mangas.........................70
Figura 37 – Ficha técnica de modelagem – vestido sem mangas.............................72
Figura 38 – Plano de corte – vestido sem mangas - forro.........................................73
Figura 39 – Plano de corte – vestido sem mangas – Tecido externo........................74
Figura 40 – Protótipo do vestido sem mangas – foto 1..............................................75
Figura 41 – Protótipo do vestido sem mangas – foto 2..............................................76
Figura 42 – Ficha técnica de modelagem – conjunto.................................................79
Figura 43 – Plano de corte – Conjunto – Tricoline.....................................................81
Figura 44 – Plano de corte – Conjunto – Liocel.........................................................82
Figura 45 – Plano de corte – Conjunto – Sarja..........................................................83
Figura 46 – Coleção NUMINIS look 1 foto 1..............................................................85
Figura 47 – Coleção NUMINIS look 1 foto 2..............................................................86
Figura 48 – Coleção NUMINIS look 2 foto 1..............................................................87
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Figura 49 – Coleção NUMINIS look 3 foto 1..............................................................88
Figura 50 – Coleção NUMINIS look 3 foto 2..............................................................89
Figura 51 – Coleção NUMINIS look 2 foto 2..............................................................90
Figura 52 – Coleção NUMINIS entrada da formanda foto 1......................................91
Figura 53 – Coleção NUMINIS entrada da formanda foto 2......................................92
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SUMÁRIO
1 Introdução ....................................................................................................12
1.1 Apresentação do tema ..............................................................12
1.2 Caracterização do problema de pesquisa..................................14
1.3 Objetivos ....................................................................................16
1.3.1 Objetivo Geral .................................................................16
1.3.2 Objetivos Específicos ......................................................16
1.4 Justificativa ................................................................................16
1.5 Procedimentos Metodológicos ..................................................17
1.5.1 Metodologia da pesquisa ................................................17
1.5.2 Metodologia de projeto de produto de moda ..................18
1.6 Estrutura do Trabalho ................................................................18
2 Fundamentação Teórica ..............................................................................20
2.1 O livro do Apocalipse e a abordagem historicista......................20
2.1.1 O primeiro cavaleiro ........................................................20
2.1.2 O segundo cavaleiro .......................................................21
2.1.3 O terceiro cavaleiro .........................................................22
2.1.4 O quarto cavaleiro ...........................................................23
2.2 O apocalipse na indústria ..........................................................24
2.2.1 O imperialismo do fast-fashion .......................................25
2.2.2 As consequências sociais e ambientais .........................27
2.3 Sustentabilidade e soluções.......................................................30
3 Book de coleção ...........................................................................................37
3.1 Público-alvo................................................................................37
3.2 Conceito.....................................................................................38
3.3 Parâmetros de moda .................................................................39
3.4 Cores .........................................................................................40
3.5 Materiais.....................................................................................42
3.6 Mapa da coleção........................................................................42
3.7 Croquis.......................................................................................44
3.8 Mapa do desfile..........................................................................61
3.9 Produção do desfile....................................................................62
3.9.1 Cabelo e maquiagem.......................................................62
11
3.9.2 Trilha sonora....................................................................63
4 Desenvolviento do produto..........................................................................64
4.1 Primeiro look...............................................................................64
4.1.1 Modelagem do primeiro look............................................64
4.1.2 Confecção do primeiro look.............................................67
a Corte...........................................................................................67
b Costura.......................................................................................68
4.2 Segundo look..............................................................................70
4.2.1 Modelagem do segundo look...........................................71
4.2.2 Confecção do segundo look............................................73
a Corte...........................................................................................73
b Costura.......................................................................................75
4.3 Terceiro look...............................................................................77
4.3.1 Modelagem do terceiro look.............................................77
4.3.2 Confecção do terceiro look..............................................80
a Corte..........................................................................................80
b Costura.......................................................................................83
4.4 Apresentação OCTA Fashion 2016............................................84
5 Considerações finais.....................................................................................92
6 Referências....................................................................................................95
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1. Introdução
Todos os dias, novas notícias chegam a nossos ouvidos: um rio que foi
poluído, um desastre natural, uma fábrica que colidiu, animais que foram mortos - ou
sofreram mutações por conta da poluição - e por aí vai. O que poucos de nós
sabemos é que a moda é a segunda maior poluidora do mundo, e só perde para a
indústria do petróleo em desastres naturais, e também que os pesticidas e químicos
encontrados na plantação do algodão - que é o começo da cadeia produtiva do
vestuário - pode sim ter influência na nossa saúde, e causar doenças como câncer.
"The alarming thing is that not only is fashion using a huge amount of natural resources and creating staggering environmental impacts, these natural resources and this impact is often not even measured. "
[O alarmante é que não só a moda está usando uma quantidade enorme de recursos e criando impactos ambientais enormes, como estes recursos naturais não podem nem ser medidos.] (MORGAN, ROSS, 2015, tradução pela autora.).
O trabalho a seguir propõe-se a destrinchar os problemas e suas alternativas
de soluções disponíveis para o consumidor, mas principalmente para a pequena
empresa, o iniciante no negócio; alternativas para fazer prosperar, e não causar
dano.
1.1 Apresentação do tema
O processo criativo de designers de moda passa por várias etapas, podendo
variar a direção que se toma, dependendo do criador; porém, o mais comum ponto
de início é a definição do tema. É ele que segue de guia. O tema, porém, pode ser
um tanto brando, como é o caso do atual - Sincronicidades. A partir de tal tema,
cada acadêmico faz suas ramificações e tem seu próprio processo de pesquisa,
para chegar ao sub-tema, ou, como será tratado aqui, o tema da coleção.
Para entender o tema da coleção do presente trabalho, tem-se o ponto de
partida em Carl Jung, já que o livro "Sincronicidades" é de autoria dele. Jung foi um
contemporâneo de Sigmund Freud, tendo primeiramente adotado os mesmos
métodos e filosofias, para chegarem a divergências mais para a frente, quando cada
um adotou seus próprios meios, dividindo a psicologia da época em duas.
Jung, portanto, é autor de vários livros, e entre eles está "Psicologia e
Religião", que trata de como a religião é importante ou não, na construção da psique
do homem, enquanto explora os sonhos, que é a "marca" do autor, por explorar o
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subconsciente, as simbologias, os arquétipos, etc. O nome da coleção, numinis, é
uma forma do latim de um termo que Jung usa em seu livro: numinoso. "Uma
experiência ou um efeito dinâmico não causados por um ato arbitrário. [...] Qualquer
que seja a sua causa, o numinoso constitui uma condição do sujeito, e é
independente de sua vontade". (JUNG, 1978, p. 09) Como o livro trata tanto de
religiões ocidentais quanto orientais, logo no começo não se usa o nome "Deus"
para este ser numinoso, nem qualquer outra denominação. A autora, porém, está
inserida em um contexto cristão ocidental, portanto, recorreu ao livro da Bíblia, e lá,
encontrou um assunto cada vez mais recorrente e que cada vez mais toma as telas
do cinema: o Apocalipse.
Durante os estudos do livro do Apocalipse, chegou-se a um tema muito
interessante, e ao mesmo tempo muito cheio de referências visuais e simbologias:
os quatro cavaleiros do apocalipse, que se encontram no capítulo 6 do livro. Em
relação ao livro em si, por ser muito cheio de simbologias que se repetem, há muitas
teorias diferentes sobre ele, por não ser "claramente" escrito por sua mensagem
como o resto do novo testamento. Porém, a abordagem que aparenta ser mais
científica e lógica aos olhos da autora é a abordagem história, que faz um páreo com
acontecimentos reais em ordem cronológica.
Ao mesmo tempo, não se pode ignorar os tempos de crise do Brasil, mas, sob
uma visão mais abrangente, as crises do próprio sistema imperialista como indústria.
É em tempos em que o consumo é freado - seja por problemas econômicos, por
epidemias - que o mercado sofre, e o país inteiro sofre, assim como aconteceu com
tantos outros países nas grandes crises que arremataram o sistema econômico de
um país.
Utilizando-se da expressão popular, juntou-se a fome com a vontade de
comer: já era um desejo inicial que o trabalho de conclusão tivesse como
problemática o modo atual de produção do fast-fashion, com suas mãos-de-obra
exploratórias, enquanto varre toda a "sujeira" para baixo do tapete. Ao longo dos
estudos e das orientações com os professores, surgiu a ideia: por que não falar
sobre o apocalipse que a indústria sofre atualmente?
Então, quanto mais soluções se buscava, mais problemas - e novas soluções
para eles - surgiam, pontos de vista que não têm visibilidade e, portanto, não
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chegam ao público consumidor em geral, resultando no não-conhecimento das
explorações, poluições ao meio ambiente e ao próprio corpo humano; o que, por sua
vez, acarretam na não-pressão às empresas, como detentoras dos processos de
produção.
1.2 Caracterização do problema de pesquisa
Atualmente, o sucesso do fast-fashion como sistema de produção e consumo
deve-se a alguns fatores determinantes. Primeiro, o fato de ser exatamente isso: um
sistema de produção e consumo, não só de produção. Um sistema que produz
quantidades e variedades enormes de roupas, sapatos e bolsas não pode sobreviver
em um mundo sem demanda, já que grande parte da população mundial
(aproximadamente vinte e dois por cento, segundo pesquisas do Banco Mundial em
2012) mal tem poder aquisitivo para se alimentar. Segundo, é o volume massivo de
propaganda de moda, que embute todo tipo de valor que todos buscam em seus
produtos, como se comprar uma bolsa ou um sapato de certa marca fizesse o(a)
consumidor(a) mais feliz, realizado, bonito(a) ou confiante. O modo incessante e
insistente com que somos expostos a esse tipo de apelo visual faz com que
acreditemos nisso mesmo sem querer acreditar, mesmo enquanto o consciente sabe
que uma calça jeans não é sinônimo de sensualidade, ou que um xampu não vai
deixar você com cabelo de top model. Terceiro e mais importante, são os preços
baixos e os prazos curtos: você tem o que você (acha que) quer, na hora que quer,
ou pelo menos não espera quase nada para ter (cerca de um dia a uma semana, no
máximo.).
Porém, pouca gente sabe que tais preços baixos são a causa do sofrimento e
até morte de milhões de pessoas no mundo inteiro. Enquanto a gigante do
fastfashion "precisa" vender uma camiseta a cinco dólares, quem sofre é o lado mais
fraco da corrente: os produtores. É bom que reflitamos: se uma empresa precisa
vender uma peça a cinco dólares, pelo menos metade do preço é gasto com
material. Sobra dois dólares e cinquenta por peça. Ela ainda precisa ser fabricada,
acabada, fretada (do outro lado do mundo, porque a mão de obra vem de países
como a Índia), embalada, e ainda há o salário de todos os estilistas,
administradores, da sede da empresa, do marketing, e muitos outros custos diluídos
nas peças. Agora voltemos à questão por trás desses números: quanto você acha
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que ganha uma trabalhadora na Índia, que não tem outra opção de emprego, que
precisa produzir cinco mil camisetas iguais em uma semana? Muito pouco. Abaixo -
muito abaixo - do humanamente razoável para se ter uma vida digna. Nossa
indústria, porém, por conta de ser o motivo dos danos, também possui grande
potencial para a mudança:
A moda liga indivíduos de diferentes origens demográficas, grupos
socioeconômicos e nacionalidades e os atrai para um movimento a favor da
mudança. Mas a moda também tem uma relação complexa com sistemas
mais abrangentes, como economia, ecologia e sociedade. [...] A
sustentabilidade talvez seja a maior crítica que o setor da moda já
enfrentou, pois desafia a moda em seus detalhes (fibras e processos) e
também em relação ao todo (modelos econômicos, metas, regras, sistemas
de crenças e valores). Assim, tem potencial para transformar o setor pela
raiz, influenciando a todos que nele trabalham e a todos que lidam
diariamente com a moda e os produtos têxteis - embora a natureza
transformadora do sistema que a sustentabilidade possui seja ignorada com
demasiada frequência, em nome da execução de ajustes mais diretos em
detalhes operacionais. (FLETCHER, GROSE. 2011,p.08).
Sabendo-se que este é um modelo altamente rentável em níveis de lucros
financeiros, é muito improvável que tais gigantes mudem de estratégia. Porém, a
internet tem fornecido informação para cada vez mais pessoas, e uma parte delas
pressiona as empresas, mas não é a grande massa. Por um lado, pede-se valores
morais, mas por outro, somos ensinados a querer comprar cada vez mais - é só ver
todos os filmes e séries que tratam de fazer comprar como um tipo de "terapia" - e
tais empresas nos oferecem coisas cada vez mais baratas, nós necessitando ou não
delas. Por outro lado ainda temos um certo preconceito com coisas sustentáveis,
porque a imagem que o público recebe do assunto ainda é aquela paleta terrena, de
verde, bege e marrom, com tecidos que irritam a pele por não receber tratamento,
ou quentes de mais, por serem feitos de garrafas pet. E o mesmo acontece com
acessórios: bolsas e cestas de cipó, de plástico, de materiais reciclados inúmeros,
onde a estética morre.
Sendo assim, o seguinte trabalho pretende responder à pergunta: Como desenvolver
uma coleção de vestuário feminino que atenda tanto a requisitos sustentáveis
quanto a requisitos estéticos?
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1.3 Objetivos
1.3.1 Objetivo geral
Desenvolver uma coleção de vestuário de moda festa que atenda a tantos requisitos
sustentáveis possíveis, conservando fatores razoáveis de estética e tempo.
1.3.2 Objetivos específicos
• Discutir o imperialismo como sistema de produção e suas consequências;
• Descrever a sustentabilidade e todas as suas especificações;
• Examinar o livro do Apocalipse e sua teoria de equiparação histórica;
• Detalhar cada cavaleiro e suas simbologias;
• Considerar soluções já disponíveis no mercado para os problemas da
sustentabilidade;
• Desenvolver a coleção de moda, buscando solucionar tais problemas;
• Verificar os limites e possibilidades do sistema econômico atual.
1.4 Justificativa
A presente pesquisa fez-se necessária a partir dos problemas crescentes do
mundo causados pela produção e consumo desenfreado, que faz com que se
empurre custos cada vez mais para baixo, fazendo com que a base da pirâmide
fique cada vez maior e cada vez mais explorada, além de também explorar o planeta
em si, em seus recursos naturais, não respeitando seus limites.
Apesar da aparente preocupação de milhares de consumidores, ainda é muito
raro que se veja a seguinte cena: A pessoa vê uma roupa que adora na vitrine, e
gosta do preço também. Prova, adora. Chega no caixa, vê a etiqueta e diz: "Espera,
isso aqui não foi feito de um modo digno. Não vou comprar." Na maior parte do
tempo, a culpa é colocada na vítima (ou seja: você convence seu consumidor a
comprar o máximo possível, não fornece informação nenhuma de como o produto é
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feito, e justifica sua falta de mudança com o argumento de que o consumidor não
pede por mudança, então ele é parte do crime.) e as coisas continuam as mesmas,
um ciclo vicioso de produção, exploração e consumo, que deveria começar a ser
mudada por quem detém a produção, por ter todo o domínio das técnicas de
criação, enfesto, costura, distribuição, merchandising.
Sendo assim, a atual pesquisa se justifica e se entende necessária por
pretender responder a uma demanda estética e ao mesmo tempo moral da
sociedade, no setor da produção do vestuário, focando no setor de festas, para
provar com fortes argumentos que a sustentabilidade pode, sim, ter uma estética
incrível.
1.5 Procedimentos Metodológicos
1.5.1 Metodologia da pesquisa
Quanto à finalidade da pesquisa, as duas maiores são a aplicada e a básica.
A básica resume-se em pesquisa teórica do começo ao fim, enquanto a aplicada
exige uma experimentação final da teoria. Portanto, a finalidade do seguinte trabalho
é aplicada, por testas e confirmar ou não suas teorias ao final, com a realização da
mini coleção.
Quanto aos objetivos, trata-se de um objetivo descritivo, por ser
fundamentado em pesquisa e experimentação, porém não ter nenhum levantamento
de entrevistas feitas pela autora, nem visitações a instituições, e também por não
criar uma tese completamente nova - o trabalho, aqui, apenas se apropria de muitos
estudos alheios (por meio de livros, documentários, artigos, revistas, etc) para dar
uma nova visão sobre o assunto, e não um assunto completamente novo.
Quanto aos procedimentos, tem-se uma pesquisa experimental, por ter sua
experimentação em laboratório (o laboratório de confecção) sob condições
controladas e pode alterar tais condições (alterar a modelagem, alterar o tecido,
alterar os aviamentos).
Quanto à natureza, trata-se de uma pesquisa qualitativa, por não ter foco em
dados quantitativos (como as pesquisas do IBGE) e sim em quantitativa, tendo como
foco questões subjetivas e não matemáticas.
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E, finalmente, quanto ao local, tem-se o laboratório, retomando, mais uma
vez, os motivos da pesquisa experimental.
1.5.2 Metodologia de projeto do produto de moda
Partindo de um tema de coleção, o processo criativo se intensifica, e, por
consequência, a pesquisa também. São produzidos mapas mentais adicionais,
painéis mood (que dão o clima desejado à coleção), painéis de tendência, painel
imagético (que conta a história da coleção, e este deve ser feito apenas um), cartela
de cores, e muitos outros painéis que o criador pode julgar necessário para se ter
apoio na hora da criação. Junto com tais painéis, é encorajado que se mantenha um
sketchbook durante toda a criação da coleção, que nada mais é do que (geralmente)
um caderno em tamanho que o criador desejar - no presente caso, A5 - com todas
as referências que ele deseja adicionar, seja suas pesquisas teóricas, seja imagens
de revista ou imagens impressas, fotos de alguma textura, cores, tecidos, sementes;
enfim, o que o criador julgar necessário em suas pesquisas e criação. O sketchbook
é, acima de tudo, um registro e exercício de criatividade do autor, que tem liberdade
para se expressar e documentar seus impulsos e ideias em tal caderno.
Já na sétima fase do curso, começa-se a produzir opções: cento e cinquenta
croquis com todo tipo de variedade de saias, ombros, mangas, golas, cinturas, etc.
Ao final, são escolhidos os três que vão para a passarela, e, a partir destes três, é
começado o processo de modelagem e produção de peças-piloto, a correção das
modelagens e, finalmente, a produção dos três looks finais.
1.6 Estrutura do Trabalho
Logo no início da fundamentação teórica, o capítulo O livro do Apocalipse e a
teoria histórica apresentará melhor o tema da coleção, explicando, em seus
subtítulos, cada cavaleiro e suas significações, além de introduzir o tema da coleção
ao tema prático da indústria têxtil.
Depois, teremos O apocalipse na indústria em sequência, apresentando e
discutindo as crises que a indústria vem passando e também suas práticas atuais.
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Em seus subtítulos, procura explicar como as coisas chegaram onde estão e por
quê.
E, por fim, fecha-se a fundamentação teórica com Sustentabilidade e
soluções , que propõe soluções acessíveis e de curto prazo para problemas
latentes, principalmente para produtores e iniciantes no ramo.
Segue-se à fundamentação teórica o book da coleção, que é o resumo de todos os
procedimentos criativos iniciais, e o desenvolvimento do produto, que concentra
todas as imagens de processos de confecção, experimentação, fotos, e todo o tipo
de documento de registro do produto em si.
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2 Fundamentação Teórica
2.1 O livro do Apocalipse e a abordagem historicista
O livro do Apocalipse é o preferido de muita gente, enquanto recebe desprezo
de outros, por ter muita simbologia e ser difícil de ser interpretado. Há quem diga
que é tudo literal, que as bestas, cavaleiros e todas as simbologias sejam reais; e há
quem afirme ao contrário: grande parte do livro é simbólico. Por conta de tanta
confusão, quando se fala em"Apocalipse", a primeira imagem que vem à cabeça são
as catástrofes, um armagedom sangrento de filmes hollywoodianos em que todos
morrem e nada sobra da Terra. Porém, é extremamente difícil que se diga o que é
verdade ou não sem pelo menos estudar o livro, imagine então sem nunca nem ter
lido.
A seguir, serão apresentados, em subtítulos, cada cavaleiro, com suas
peculiaridades e semelhanças, suas simbologias e seus acontecimentos.
Lembrando, é claro, que este é um ponto de vista, que foi considerado interessante
pela autora e digno de nota. Todos foram tirados do capítulo 6 do apocalipse (em
inglês, Revelation) e os números pequenos nas citações apresentam os versículos.
A bBíblia Sagrada em si apresenta várias impressões, então é mais fácil de nos
orientarmos pelos capítulos e versículos, que podem ser checados e comparados
com a versão que outras pessoas tem, já que as páginas mudam.
No capítulo anterior, João (o autor do livro do Apocalipse) vê Deus com um
livro escrito por dentro e por fora em suas mãos. O livro é selado por sete selos, e
conteria a história de toda a humanidade, do que veio e do que há de vir. O único
digno de abrir tal livro é Jesus, porque pagou o preço com seu sangue. Os selos,
portanto, não se abrem sozinhos: é o Cordeiro que os abre. Os seres viventes são
os seres citados em Apocalipse 4, que estão em volta do trono de Deus. Dito isso,
prossigamos.
2.1.1 O primeiro cavaleiro
O primeiro cavaleiro é o que parece ser o único "cara legal" da história: nada
de sangue, nada de mortes, nada de fome. Ele é vestido de branco, e tem uma
missão vitoriosa, como é dito no livro do Apocalipse, nos versículos 1 e 2: "1Vi
quando o cordeiro abriu um dos sete selos e ouvi um dos sete seres viventes
21
dizendo, como se fosse voz de trovão: Vem! 2Vi, então, e eis um cavalo branco e o
seu cavaleiro com um arco, e foi-lhe dada uma coroa; e ele saiu vencendo e para
vencer."
Dois versículos rápidos e sucintos, mas com muita simbologia e "imagens": a coroa,
o arco e flecha, o branco, o cavalo. Sobre o assunto do primeiro cavaleiro, Oliveira et
al. (2015, p. 18) afirmam que:
Esta imagem é um belo símbolo das vitórias do evangelho no primeiro
século. [...] Estima-se que havia 5 milhões de cristãos, apenas dentro do
Império Romano, no primeiro século da era cristã. Assim, podemos
comparar a abertura deste primeiro selo, com o período da igreja de Éfeso,
[...].
Ou seja, o primeiro cavaleiro é equiparado à igreja de Éfeso, que faz um link
com a carta à igreja de Éfeso (o que justificaria a cronologia, pois é a primeira carta
dos anjos (que começa no capítulo 2 do Apocalipse e vai até o fim do capítulo 3) e
que, por sua vez, tem seu páreo nos primeiros anos do evangelho,
aproximadamente os primeiros cem anos da igreja, como eles também descrevem
em seu guia:
Sua localização era privilegiada, talvez por isso tenha recebido o nome de
'Éfeso', que significa 'desejável.' [...] A presença destes líderes [dos
discípulos] ajudou na manutenção de uma doutrina pura e zelo missionário.
Foi um período de grande crescimento para o evangelho. (OLIVEIRA et al.
2015, p. 09).
Sendo assim, tem-se a coroa como simbologia de vitória, e o arco e flecha
como simbologia de conquista, por seu longo alcance. Em recapitulação, o primeiro
cavaleiro foram tempos de pureza de doutrina, de coisas desejáveis e prosperidade
da palavra, de vitória. Em uma palavra: pureza.
2.1.2 O segundo cavaleiro
O segundo cavaleiro é quando as coisas começam a ficar complicadas. Ele
vem nos versículos 3 e 4 do capítulo 6, como podemos ver: "3Quando abriu o
segundo selo, ouvi o segundo se vivente dizendo: Vem! 4E saiu outro cavalo,
22
vermelho; e ao seu cavaleiro, foi-lhe dado tirar a paz da terra para que os homens se
matassem uns aos outros; também lhe foi dada uma grande espada."
O segundo cavaleiro vem com as simbologias do vermelho, da espada, da
morte. São simbologias fortes e impactantes, mas ao mesmo tempo muito atuais
desde que o mundo é mundo. No mesmo guia, é descrito: "Este cavaleiro bem
pode representar o Império Romano, na pessoa de seus imperadores, durante
as terríveis perseguições que foram movidas contra cristãos, vítimas da
intolerância para com sua fé em Deus." (OLIVEIRA et al., 2015, p. 18, grifo
presente na revista.). Assim como o primeiro selo, este também tem
correspondência a uma igreja das cartas dos anjos: Esmirna, que corresponde a
todo o período de perseguição, de 100 a 313 d.C. Também é apontado que é uma
igreja boa, por ter mantido seu amor e fé em Deus até o final, mesmo que isso
resultasse em morte.
2.1.3 O terceiro cavaleiro
O terceiro cavaleiro vem depois de toda vitória e toda matança, e ele é preto.
Seus versículos, porém, são menos curtos e mais ricos em simbologia, como
podemos ver nos versículos 5 e 6 do capítulo 6 do Apocalipse:
5Quando abriu o terceiro selo, ouvi o terceiro ser vivente dizendo: Vem!
Então, vi, e eis um cavalo preto e o seu cavaleiro com uma balança na mão.
6E ouvi uma como que voz no meio dos quatro seres viventes dizendo: Uma
medida de trigo por um denário; três medidas de cevada por um denário; e
não danifiques o azeite e o vinho.
Este cavaleiro é mais difícil de entender: o que o ser vivente diz não faz
sentido! Ou pelo menos, não parece fazer. Porém, é bom dar um passo de cada vez
e ir por partes. Primeiramente, o cavalo é preto, que é o oposto direto do branco: ou
seja, aqui nós temos a poluição total do evangelho e da doutrina, quando o
cristianismo foi declarado oficial pelo império, porém, como ainda não tinha a maioria
do povo como praticante, incorporou, por causa de C onstantino, características do
paganismo, ao invés de ocorrer o contrário: "O espírito de comercialização e
materialismo envolveu o cristianismo e várias doutrinas pagãs penetraram na igreja
cristã. Foi um período de trevas morais, apostasia e erros doutrinários" (OLIVEIRA et
al., 2015, p. 19).
23
Em segundo momento, temos a figura da balança, que na Bíblia segue como
sinônimo de julgamento e justiça, o que serve como sinal de advertência, e entra em
concordância temática com as frases seguintes, que não parecem fazer sentido.
Um denário era o que geralmente se ganhava por um dia de trabalho. Um
denário, portanto, poderia comprar tanto uma medida de trigo quanto três medidas
de trigo, fosse qual fosse a medida. Ou seja, de um certo modo, os menos
afortunados consumiam mais cevada do que trigo, por ser um terço do preço. Seu
valor era muito menor. O trigo, por sua vez, simboliza a pureza (mais uma vez),
enquanto a cevada simboliza algo que é de fácil alcance, abundante, mas em
qualidade muito inferior, apesar de ser parecido com o trigo. Mais uma vez, a
mensagem da pureza se repete.
Quanto ao azeite e ao vinho, temos a explicação no guia: "O azeite é símbolo
do Espírito Santo (Zacarias 4:2-6) e o vinho símbolo do sangue de Cristo (Mateus
26:27-29; Coríntios 11:25)" (OLIVEIRA et al., 2015, p. 19). Portanto, a última
mensagem é que não se danifique o povo de Deus, que se protejam e se guardem.
2.1.4 O quarto cavaleiro
Chegamos ao último cavaleiro, que amedronta tanta gente, e ele está nos
versículos 7 e 8:
7Quando o Cordeiro abriu o quarto selo, ouvi a voz do quarto ser vivente
dizendo: Vem! 8E olhei, e eis um cavalo amarelo e o seu cavaleiro, sendo
este chamado Morte, e o Inferno o estava seguindo, e foi-lhes dada
autoridade sobre a quarta parte da terra para matar à espada, pela fome,
com a mortandade e por meio das feras da terra.
Enquanto o segundo cavaleiro também mata, este aqui é a Morte em si, ou
seja, o efeito é em escala maior e mais cruel. Em algumas bíblias é possível que o
cavalo seja descrito como pálido (que não recebe sol - a luz da justiça - , que é
doente, que se esconde nas trevas e não ganha cor), então esta é a conotação aqui
usada. Aqui, o período profético se compreende pela Idade Média, que também é a
idade das trevas, a idade sem luz, e também é caracterizada principalmente pelas
mortes de tantas pessoas inocentes por conta de perseguições, então muito sangue
cristão também foi derramado: "Nestes 12 séculos, fiéis filhos de Deus (Valdenses,
24
Albigenses, Hugenotes, etc) foram mortos pela espada, fome e através de animais
selvagens. Milhares de inocentes seguidores de Cristo pagaram com a própria vida
a sua fidelidade à verdadeira fé. (OLIVEIRA et al., 2015, p. 120). Também temos a
fome com os problemas que tomaram as plantações e a mortandade com a peste
negra. Em resumo, o quarto cavaleiro é a representação da Idade Média e sua
dizimação humana.
2.2 O apocalipse na indústria
Olhemos agora para o presente. O que nós temos na indústria é um desejo -
e isso não se pode negar, em uma visão macro - geral por consumo, mais e mais.
Muitas vezes, não é nem uma decisão racional: você olha para aquela calça e
pensa: "Eu preciso! É igualzinha àquela que a fulana estava usando no programa
tal!" O consumidor vítima da moda não para e pensa, considera se ele realmente
precisa do produto, do óculos, da calça, da bolsa: ela é bonita, está barata, eu
quero, eu vou levar, mesmo que eu tenha mais quinze bolsas em casa. Isso, porém,
não foi construído de um dia pro outro, e pode ser muito bem ilustrado por Nicolau
Sevcenko em seu livro que compara o avanço tecnológico industrial com uma
montanha russa, e a separa em três fases. Vamos passar rapidamente por cada
uma delas:
A primeira é a da ascensão contínua, metódica e persistente que, na
medida mesma em que nos eleva, assegura nossas expectativas mais
otimistas, nos enche de orgulho pela proeminência que atingimos de
menoscabo pelos nossos semelhantes, que vão se apequenando na exata
proporção em que nos agigantamos (SEVCENKO, 2001, p. 14).
Esta primeira fase, correspondente à primeira subida, quando não houve
nenhuma descida ainda na montanha-russa, refere-se aos primeiros avanços na
tecnologia europeia (que, coincidentemente ou não, aconteceram por conta da
indústria têxtil e seus teares) e suas expansões, explorando mão-de-obra e recursos
naturais, gerando lucro e sem se preocupar e nem pensar no que estava
acontecendo. O positivismo empurrava todos para a frente, enquanto empurrava, ao
mesmo tempo, muitos para baixo.
A segunda é a fase em que num repente nos precipitamos numa queda
vertiginosa, perdendo as referências do espaço, das circunstâncias que nos
25
cercam e até o controle das faculdades conscientes. Poderíamos interpretar
essa situação como um novo salto naquele processo de desenvolvimento
tecnológico, em que a incorporação e aplicação de novas teorias científicas
propiciaram o domínio e a exploração de novos potenciais energéticos de
escala prodigiosa (SEVCENKO, 2001, p.15).
A segunda fase, portanto, refere-se à exploração e descoberta de novos tipos
de energia, hidroelétrica e termoelétrica, no século XX. O autor também fala sobre
as tecnologias que possibilitaram o extermínio de milhares de pessoas na Primeira
Guerra Mundial, ganhando escalas inimagináveis mais tarde, na Segunda Guerra.
A terceira fase na nossa imagem da montanha-russa é a do loop, a síncope
final e definitiva, o clímax da aceleração precipitada, sob cuja intensidade
extrema relaxamos nosso impulso de reagir, entregando os pontos
entorpecidos, aceitando resignadamente ser conduzidos até o fim pelo
maquinismo titânico (SEVCENKO, 2001, p.16).
Aqui, ele está falando sobre como a avalanche das consequências e dos
empurrões "para frente" fizeram com que a indústria simplesmente continuasse
produzindo sem se importar com o que, a qual custo. O que parece é que a filosofia
"O que é um pingo para quem já está todo molhado?" aplicou-se pelo mundo
industrial inteiro, e depois de certo ponto ninguém mais sequer se importou de olhar
para trás e tentar reparar, ou parar passos futuros, ou pelo menos repensá-lo. A
sociedade tornou-se refém da tecnologia, sem mais questionar seus meios, tanto por
se acostumar com ela quanto por justificar seus meios pelos fins.
2.2.1 O imperialismo do fast-fashion
Depois da segunda revolução industrial, o mundo deu o que pode-se
considerar seu primeiro freio de consumo: geladeiras, fogões e roupas eram muito
legais, mas todo mundo já possuía um. O que aconteceu foi que a indústria tinha
muito mais a oferecer do que a demanda pedia, então começou-se a pensar em
como fazer as pessoas quererem mais do mesmo. Assim, nasce o marketing.
O marketing e a publicidade consistem em atividades e/ou produtos
polêmicos, sobretudo em sociedades onde existe grande desnível social e
onde nem sequer as necessidades básicas de toda a população estão
asseguradas. Julgamentos de valor acusam esses instrumentos das
sociedades capitalistas de manipular consciências e estimular o consumo
do supérfluo.
26
[...] Entretanto, não pode ser refutada a importância social da publicidade,
uma vez que ela invade nosso universo visual sem pedir licença. E um dos
aspectos que a faz tão poderosa, porque é detentora de um alto poder
de persuasão, é o fato de a publicidade, geralmente, articular mais de um
sistema de comunicação: trata-se de uma linguagem híbrida, sincrética, que
se apropria, no mínimo, de dois sistemas comunicacionais, o visual e o
verbal (RAMALHO, 2005, ps.149 e 150).
Durante a Segunda Guerra Mundial, em plena crise financeira da Alemanha
(um fator que se repete), nasce um líder. Ele não era o homem mais carismático,
mais forte e mais inteligente da nação, muito pelo contrário. Não tinha ideias que
foram aceitas de início também, porque exterminar minorias não é uma mensagem
que qualquer pessoa que se considere boa recebe e apoia. O que mudou, então? O
que fez tantos intelectuais, pais de família, médicos e políticos seguir Adolf Hitler,
seu partido e suas ideologias fascistas? Foi nessa época que a propaganda tomou
forma, e inundou ruas, casas e lojas. Para onde se olhasse, os valores do partido
eram misturado a valores sentimentais, como patriotismo, prosperidade e até amor.
Mais tarde, tais técnicas foram incorporadas ao mercado consumidor. Atrelar
sua marca, seu produto, a valores que você sabe ou supõe que ele procura, mas
sem ele saber o que você está fazendo. Marketing e propaganda puros. Com o
tempo, os apelos ficaram mais chamativos e mais eficazes, com a junção da
psicologia à brincadeira: agora, você coloca sua marca até em coisas que
teoricamente não têm a ver com sua finalidade - como cadernos da Coca-Cola,
mochilas da Barbie, etc. O mundo da moda tomou conta dos meios de comunicação:
"Com um imenso mercado consumidor disponível, e meios de produção em larga
escala viabilizados, torna-se importante para o sistema capitalista estimular a
competição das massas por meio da moda" (RAMALHO, 2005, p.84). Depois de um
tempo, as linhas que separam causa e consequência se misturam, ficam borradas, e
se produz por conta da demanda ao mesmo tempo que se cria demanda para
produzir.
Diante de uma demanda tão grande, em escala mundial por conta da
globalização, é de se considerar como as coisas são configuradas para atender à
demanda de número e tempo, seja em preço target, seja em número de peças.
Sabendo-se que a cadeia começa na plantação do algodão e termina nas lojas, é
27
um longo caminho a se percorrer. A globalização, porém, fez com que os que detêm
o poder econômico expandam seus horizontes, como aponta Nicolau Sevcenko:
A excepcional capacidade de mobilidade, de instalações, recursos, pessoal,
informações e transações é tal, que uma mesma empresa pode ter sua
sede administrativa onde os impostos são menores, as unidades de
produção onde os salários são mais baixos, os capitais onde os juros são
mais altos e seus executivos vivendo onde a qualidade de vida é mais
elevada. Em todos esses casos, as sociedades e os Estados por onde se
distribuem essas diferentes dimensões da empresa saem sempre perdendo.
É um jogo desigual, cuja dinâmica só tende a multiplicar desemprego,
destituição, desigualdade e injustiça. A tradução prática dessa receita é o
aumento da marginalidade, da violência, o declínio do espaço público e da
convivência democrática (2001, ps. 31 e 32).
Por conta da demanda (influenciada pelos próprios produtores), cria-se um
sistema que anda sempre na mesma direção, que não olha para os lados, que não
olha para o outro: tudo gira em torno do guarda-roupa perfeito, do sapato lindo, da
bolsa da moda. É investido cada vez mais para esconder a sujeira que é colocada
embaixo do tapete, mas já ganha volume demais para permanecer despercebida.
2.2.2 As consequências sociais e ambientais
As consequências, porém, por estarem muito longe dos olhos dos
consumidores de regiões desenvolvidas, são tomadas como não existentes. As
indústrias, obviamente, protegem ao máximo seus modos de produção e valores
pagos: seus representantes são cada vez mais "lisos" em suas respostas, muito
raramente respondendo ao que foi perguntado; quando muito, aparecem para
"prestar contas", com suas declarações com ideais de justiça, mas muitas vezes
vazias, porque não são aplicadas na vida real.
A consciência acerca de estilo, corte, tecido, cor e design é intensa e
universal, mas não inclui o mundo por trás dos cabideiros, a tecnologia por
trás do corte, a fibra por trás do tecido, a terra por trás da fibra ou a pessoa
na terra. Em suma, o verdadeiro impacto de nossas escolhas de vestuário
quase nunca é considerado ou notado (FLETCHER, GROSE. 2011,p.04).
A realidade nua e crua é que tais práticas acarretam em sérios problemas
ambientais e humanos. O documentário The True Cost - disponível no Netflix e em
28
lojas com a iTunes - [O Real Custo, traduzido para o português] trata exatamente
sobre tais consequências. No documentário de noventa e dois minutos, muitos
profissionais que entendem do assunto - como economistas, diretores executivos,
especialistas em meio-ambiente - falam sobre os impactos na saúde e na dignidade
das pessoas, e os impactos no meio-ambiente, o que acarreta, claro, nos humanos.
Durante o documentário, quando não havia um entrevistado falando, havia um
narrador, que contava e mostrava imagens enquanto falava, imagens chocantes. Um
dos maiores impactos ambientais e mais diretos ao ser humano, foi o seguinte:
With growing demand for material like cheap leather, Kanpur is now the
leather export capital of India. Everyday here, more than 50 million liters of
toxic wastewater pour out of the local tanneries. Heavy chemicals used to
treat the leather like chromium-6 flow into local farming and even drinking
water. In places like Kanpur, far from the eyes of the world, major western
brands are able to source cheap materials while avoiding accountability for
the growing cost of human health and the environment."
[Com a crescente demanda por materiais como couro barato, Kanpour é,
agora, a capital de exportação de couro da índia. Todos os dias aqui, mais
de 50 milhões de litros de água tóxica saem das tinturarias daqui. Químicos
pesados usados para tratar o couro, como o cromo-6, fluem para a
agricultura local e até para a água de beber. Em lugares como Kanpour,
distante dos olhos do mundo, gigantes marcas ocidentais buscam materiais
baratos enquanto evitam tomar sobre si a responsabilidade pelo custo
crescente da vida humana e do meio-ambiente.] (MORGAN, ROSS, 2015,
tradução pela autora).
O documentário mostra um rio muito grande e popular da Índia, o rio Ganga.
Esse rio está sendo poluído pelas empresas de couro, e são mostradas imagens de
crianças brincando no rio e de crianças tomando banho com a água que sai da
torneira. Depois, são mostradas pessoas do vilarejo com problemas nos rins por
conta do metal pesado. No final das contas, todas suas economias vão para
tratamentos médicos e remédios. Por conta de sapatos, bolsas e acessórios que
muitas vezes nós nem precisamos.
Outro grande impacto é o social. Tais grandes empresas precisam de
quantidade e de tempo diminuto, pressionando as manufatureiras a apressar e
diminuir custos. O resultado é que muita gente fica abaixo do esperado para se
29
viver, ganhando menos ou talvez dois dólares por dia, para trabalhar o dia todo
costurando, finalizando, pregando botões.
O documentário mostra a ativista Livia Firth, a co-diretora criativa da empresa
Eco-Age, falando sobre o assunto em um evento sobre meio-ambiente em
Copenhagen, na Dinamarca:
"If fast fashion didn't exist, we wouldn't need to have a summit in
Copenhagen to try and clean the mess of environmental destruction, social
justice destruction, that has been caused in the last 15 to 20 years of its
existence. Fast Fashion wants to produce fast, so the garment worker has
to produce faster and cheap. So, the garment worker is the only point of the
supply chain where the margins are squeezed. And you have these huge,
you know, companies, going to te factory in Bangladesh, place an order for
1,5 million jeans, for, you know, 30 cents each, 50 cents each; how do you
make it ethical? I don't know. But also, from the consumer point of view, is it
really democratic to buy a T-shirt for 5 dollars or pay 20 dollars for your
jeans? Or are they taking us for a ride? Because they're making us believe
that we are rich or wealthy because we can buy a lot. But in fact they are
making us poorer. And the only person who is becoming richer is the owner
of the Fast Fashion brand. So that makes me a little bit angry."
[Se o fast-fashion não existisse, nós não precisaríamos ter uma convenção
em Copenhagen para tentar limpar a bagunça da destruição ambiental,
social e a destruição da justiça, que foi feita nos últimos 15 a 20 anos de
sua existência. O fast-fashion quer produzir rápido, então o trabalhador tem
que produzir rápido e barato. Então, o trabalhador é o único ponto na cadeia
de fornecimento onde as margens são espremidas. E você tem essas
enormes, sabe, companhias, indo para a fábrica em Bangladesh, deixando
um pedido para 1,5 milhões de calças jeans, por, sabe, 30 centavos cada,
50 centavos cada; como você faz isso ser ético? Eu não sei. Mas também,
pelo ponto de vista do consumidor, é realmente democrático comprar uma
camiseta por 5 dólares ou pagar 20 dólares por uma calça jeans? Ou eles
estão tirando uma com a nossa cara? Porque eles estão nos fazendo
acreditar que nós somos ricos porque nós podemos comprar um monte.
Mas o fato é que eles estão nos fazendo ficar mais pobres. E a única
pessoa que está ficando mais rica é o dono da marca de fast-fashion. Então
isso me deixa um pouco brava (MORGAN, ROSS, 2015, tradução pela
autora).
30
Esta é uma fala de impacto para as pessoas que não sabiam da questão. O
documentário, porém, parece ter sido feito também para as pessoas que sabiam da
situação toda, mas não acreditavam ou não deixaram de comprar por isso. Assim,
com tantas imagens chocantes de crianças com problemas neurológicos de
cognição por culpa de pesticidas nas plantações de algodão, cenas da tragédia do
prédio que desabou e matou quase mil pessoas em Rana Plaza, uma fábrica de
roupas perto de Bangladesh.
Feita toda a destruição, exercida toda a publicidade e toda a propaganda, já
passou da hora de mudar.
2.3 Sustentabilidade e soluções
Uma das maiores perguntas quando se exige soluções é: "Mas o que EU
posso fazer? Olha lá o fulano, ganhando dinheiro com isso, como que eu posso
competir com isso? O fato é que todos têm que fazer sua parte: os consumidores em
pesquisar mais a fundo o que compram, mas, principalmente, os produtores, que
têm o controle do que entra e o que sai das fábricas e de como tudo é processado lá
dentro.
: Embora poucos duvidem de que o destino do meio ambiente tenha se
tornado uma questão primordial, não há consenso sobre a natureza e a
gravidade dos riscos envolvidos, nem sobre quando eles podem ocorrer. A
maioria de nós acredita que outras pessoas - os especialistas, de
preferência - resolverão os problemas e que poderemos continuar a viver
nossas vidas. [...] Por mais importantes que sejam esses estudos, o
trabalho de transformação precisa ser inciado, em toda parte, por pessoas
comprometidas com aquilo que fazem e conhecem melhor. Dependerá do
conhecimento compartilhado, das redes e dos manuais que apelam para o
instinto inato dos seres humanos de proteção e nutrição da vida
(FLETCHER, GROSE. 2011,p.04).
Os recursos ambientais também são grande parte da jogada. Eles, porém,
não durarão para sempre a não ser que medidas de sustentabilidade sejam
tomadas. Mike schragger, fundador e diretor executivo da The Sustainable Fashion
Academy [Academia de Moda Sustentável], comenta sobre o uso indiscriminado dos
recursos naturais:
31
Because they've been so abundant, these resources, it's been assumed that
they're going to be there forever. So I think business has not accounted for
them because it's only since the 1950s that we've really had this industrial
expansion at such a rate that we started to see exponential growth and
exponential use of natural resources.
[Porque eles tem sido tão abundantes, esses recursos, é pressuposto que
eles vão estar lá para sempre. Então eu acho que os negócios não têm os
medido porque foi apenas desde os anos 1950 que nós realmente tivemos
esta expansão industrial a tais taxas que nós começamos a ver crescimento
exponencial e o uso exponencial dos recursos naturais] (MORGAN, ROSS,
2015, tradução pela autora).
O que é, porém, sustentabilidade? Fala-se nisso há anos, e é como até
revirarmos os olhos quando ouvimos falar, porque a primeira coisa que vem à mente
geralmente é reciclagem de materiais e coisas com valor estético muito baixo. O fato
é que ninguém quer ter coisas feias ou de baixa qualidade no guarda-roupa! O que
não se pode fazer é focar tanto em um ponto, que se vá esquecer do outro.
: Em todos os setores econômicos, as conversas iniciais sobre
sustentabilidade trouxeram um sentimento de limitação, uma privação da
liberdade material que seria substituída pela adesão a normas rígidas. A
ideia de que a sustentabilidade augura um mundo menor é verdadeira, pois
conclama a menos desperdício, poluição, danos, devastação, solos
esgotados, trabalhadores envenenados, corpos de água moribundos, etc.
Mas não pessagia um mundo monocromático, feito de arroz e uniformes
marrons. A sustentabilidade é o precursor de mais diversidade e escolha, e
não menos. Proporciona trabalhos significativos, maior multiplicidade de
meios de ganhar a vida, restituição da produção local, um mundo mais
seguro e vidas que valem a pena viver (FLETCHER, GROSE. 2011,p.05).
Em sua significação mais literal, sustentável é algo que se sustenta. Ou seja,
ele não se esgota, é algo que tem a taxa de regeneração igual ou em rapidez
parecida com a taxa de extração. É por isso, inclusive, que as coisas feitas de
garrafas PET têm um ponto delicado: até que ponto tais peças apenas usam
descartes, e a partir de qual ponto elas geram demanda, porque os consumidores
passam a comprar mais garrafas de plástico para contribuir, ou as fábricas
encomendam PET para produzir a fibra?
32
Fibras cultivadas, como o algodão e o cânhamo, ou feitas de celulose de
árvores, como o liocel, podem estabelecer o equilíbrio crucial entre
velocidade de colheita e velocidade de reposição e são renováveis. Com as
fibras derivadas de minerais e petróleo, há um desequilíbrio bruto entre taxa
de extração e velocidade de regeneração (que, no caso do petróleo, é de
cerca de um milhão de anos); por isso, são descritas como não renováveis.
[...] Contudo, o caráter renovável da matéria-prima não garante
sustentabilidade, pois a capacidade de um material regenerar-se
rapidamente nos diz muito pouco sobre as condições em que é gerado - os
insumos de energia, a água e as substâncias químicas utilizados no campo
ou na fábrica, seu impacto sobre os ecossistemas e os trabalhadores no
seu campo ou na fábrica, seu impacto sobre os ecossistemas e os
trabalhadores ou seu potencial para uma vida longa e útil. O bambu é um
bom exemplo. As afirmações recentes sobre a sustentabilidade dos tecidos
de bambu baseiam-se apenas no crescimento vigoroso da planta e em sua
renovação rápida e constante. Mas a subsequente transformação da
celulose do bambu em viscose produz resíduos com grande impacto sobre
o ar e a água (FLETCHER, GROSE. 2011,p.14).
É importante que a mudança aconteça também nos materiais. A partir do
momento em que as mudanças estruturais (ou seja, pagar um salário digno, fazer
reciclagem da água na empresa, buscar os meios menos poluentes possíveis de
estamparia) foram feitas, é importante também que se mude os materiais, que são
elementos táteis e visíveis pelo consumidor. O consumidor, portanto, precisa poder
ver e tocar o tecido eco-friendly, e precisa saber por que ele foi uma opção melhor e
por que está pagando o preço que está pagando.
Sobre materiais, dois despontam na lista dos acessíveis e perceptíveis: o
algodão orgânico e o liocel. O liocel, infelizmente, não recebe atenção da indústria e
nem de propaganda e marketing. A ideia é realmente muito boa:
De fato, quantidade considerável de pesquisa e desenvolvimento vem
sendo realizada para trazer ao mercado novos tipos de fibras sintéticas
derivadas, ao menos em parte, de polímeros renováveis. [...] Uma fibra
renovável de baixo impacto, hoje consolidada no mercado é o liocel - uma
fibra de celulose regenerada feita de polpa de madeira. O liocel difere da
viscose (também celulose regenerada de polpa de madeira) pelo fato de
que a celulose em estado bruto é dissolvida diretamente em um solvente de
óxido de amina, sem necessidade de primeiro ser convertida em um
componente intermediário - um avanço que reduz de forma significativa os
33
níveis de poluição da água e do ar. A solução celulose/solvente é então
extrudada para formar as fibras, e o solvente é extraído quando elas são
lavadas. Nesse processo, mais de 99,5% do solvente são recuperados,
purificados e reutilizados, e uma vez que o óxido de amina é atóxico, o
pouco que resta de efluentes é considerado inofensivo. Como as fibras de
liocel são puras e brilhantes em estado bruto, não precisam ser
branqueadas antes do tingimento e podem ser coloridas com técnicas que
requerem pouca água, energia e substâncias químicas (FLETCHER,
GROSE. 2011,p.16).
Por conta de tal inovação e características, o liocel será usado na coleção, já
que o presente trabalho tem como finalidade não apenas falar sobre
sustentabilidade e o erro da indústria, mas também aplicar em algo bonito e viável
de ser feito e comercializado.
Logo que se ouve falar de algodão orgânico, porém, é possível se pensar "O
que eles inventaram agora? Até algodão orgânico? Que diferença faz?" Por também
não ser divulgado, e por não ser ponderado o que o algodão comum faz à saúde
humana, o algodão orgânico pode passar facilmente por desnecessário à maioria da
população. Outro problema é pensar no algodão orgânico como algo que sempre
será marrom, bege. Hoje em dia já existem muitos meios de tingir um tecido como
algodão orgânico sem usar químicos tóxicos e pesados, assim como também a cor
do algodão (desde o branco quase alvo até o marrom) depende do seu tipo e de
onde foi cultivado. Muitas ideias sobre o assunto estão equivocadas, e é sempre
bom aprender sobre novos materiais têxteis. Sobre o algodão orgânico, Larhea
Pepper - produtora de algodão orgânico e diretora administrativa - fala sobre as
considerações que precisam ser tomadas.
Many times consumers become aware of organic milk, or they have an
allergy. And so, interestingly enough, cotton, and what they put on their
body, even though the skin's the largest organ on your body, isn't even on
their radar screen because they're not getting the connection of 'Oh, I eat
this organic apple, therefore I'm not directly ingesting pesticides and
chemicals, or whatever the case may be'. But they don't get that direct
connection with clothing. So, you have to start looking in that bigger
community scope. That it is about our air, it's about our world, It's about our
planet, it's about our people. And so it is that awareness of - You may not
feel that you're having direct impact by buying this organic shirt, but the
34
impact you're having is in the bigger picture in the world at large, and
specially in the community where the cotton's grown."
[Muitas vezes, consumidores tomam consciência do leite orgânico, ou eles
têm uma alergia. Do mesmo modo, interessante, o algodão e o que eles
colocam sobre seu corpo, mesmo que a pele seja o maior órgão do nosso
corpo, não está nem em seus radares porque não estão tendo a conexão de
pensar "Oh, então eu como essa maçã orgânica, por consequência eu não
estou ingerindo pesticidas e químicos, ou o que quer que seja". Mas eles
não entendem tal conexão com a roupa. Então, você tem que começar a
olhar por uma dimensão maior de comunidade. É sobre nosso ar, é sobre
nosso mundo, é sobre nosso planeta, é sobre nossos povos. Então é essa
conscientização que - você pode não sentir que está tendo impacto direto
quando compra uma camisa orgânica, mas o impacto que você está
gerando está na maior figura, no mundo como algo maior, e especialmente
na comunidade onde este algodão foi plantado] (MORGAN, ROSS, 2015,
tradução pela autora).
Pelos mesmos motivos do liocel, o algodão orgânico também será usado na
coleção, acarretando mais valor ao produto e, acima de tudo, à consciência.
Passando para questões mais de fabricação, é importante que projetos
sociais sempre sejam ajudados por empresas, ou até incorporados. A empresa
Döhler, de Joinville/SC, tem - além da reciclagem da água - projetos sociais com
pessoas locais (em sua maioria mulheres, mas não por restrição) para ensiná-las a
trabalhar com economia criativa: as mulheres aprendem a fazer patchwork, capas
para garrafas de água, todo tipo de decoração que pode ser usada e vendida. Sobre
o artesanato, Sandra Ramalho compara com o que chama de "artesanato em série":
Consultando os dicionários, veremos que além de trabalho manual, exercido
no âmbito doméstico, da tradição do fazer, da associação do aspecto
artístico ao utilitário, também consta como uma das dimensões de
significado o fato de o produto artesanal não ser criado em série. Ao
contrário, como se vê "artesanato em série"! Com o advento da Revolução
Industrial, houve a valorização dos produtos manufaturados com as
superfícies mais regulares, consideradas "mais bem acabadas". Em
contraposição, produtos elaborados artesanalmente eram considerados
primitivos, rústicos, medievos, destinados ao uso dos que não tinham
acesso ao equivalente industrializado.
35
Mas o avanço dos meios de reprodução, e a conseqüente massificação de
produtos, geraram a falta de identidade. Houve o retorno da valorização dos
produtos rugosos, fruto da ação da mão do homem sobre eles.
Hoje há uma tendência, em alguns setores, de considerar que tudo o que é
hand made é superior. São produtos mais valorizados, porque são "mais
exclusivos (2005, ps. 95 e 96).
O Brasil, porém, costuma não dar valor ao artesanato. Muitas poderiam ser as
razões, mas a autora aponta que nós ainda estamos deslumbrados com a revolução
industrial e a eficácia e eficiência das máquinas, como Sevcenko também apontou,
como anteriormente citado. Um dos problemas pode ser, também, que o artesanato
permanece esteticamente estagnado: não se vê mudança e modernização nos
designs, não se vê pesquisa, por conta do preconceito de quem sabe, não querer
caracterizar como artesanato, e quem faz artesanato, não buscar inovação e
reciclagem estética.
Um bom argumento seria, também, que uma indústria em nível nacional e/ou
internacional não tem tempo e nem dinheiro para esperar um artesão terminar um
bordado ou uma aplicação, ou esperar que um material de acabamento seja
delicadamente finalizado por um artesão com décadas de experiência. O mercado,
porém, tem espaço para todos. Nada impede que uma empresa (como é a intenção
da autora) atue em um posicionamento de diferenciação - que não é exatamente
massa, mas ainda é acessível à maior parte do mercado, e tem características que o
diferenciam dos produtos mais baratos e com menos variedade - e tenha um
pequeno segmento de nicho. Uma boa ideia seria, por exemplo, oferecer serviços
exclusivos da marca, com bordadeiras associadas e com contrato de exclusividade
para com a empresa, que recebem os layouts já pré-estabelecidos do designer, e
reproduzem nas próprias roupas da marca, sob o pagamento de uma taxa - que, por
sua vez, não pode ser baixa, por motivos de exclusividade e artesanato. Não se
pode tirar o valor de algo feito à mão, um de cada vez:
Quando morei fora do Brasil, pude observar como a França trata a questão
do artesanato, especialmente no que se refere aos alimentos. E pude
constatar como nós ainda estamos deslumbrados com a Revolução
Industrial. [...] Enfim, tudo o que é feito por um artisan é mais caro do que
um produto equivalente industrializado, porque é personalizado e agrega
36
valor da ação da mão e da mente humana. É o preço da exclusividade ou,
no mínimo, da seletividade (RAMALHO, 2005, ps.97 e 98).
Por tais motivos acima citados, a autora pretende reduzir o máximo possível de
impactos sociais e ambientais em sua coleção, utilizando-se de materiais que são
amigáveis ao meio-ambiente, assim como de no mínimo um projeto social de
integração. O "apocalipse" da indústria pode e deve ser parado, e cabe a nós, novos
designers - a nova geração -, começar a mudar tudo isso.
37
3 Book de coleção
As imagens e textos a seguir apresentam o processo criativo de
desenvolvimento da coleção; processo que teve início em 2016/1, com a disciplina
de Projeto de coleção, e sofreu modificações durante as férias escolares e o início
de 2016/2, por motivos de que a autora considerou que a ênfase do trabalho teórico
(reforma na cadeia têxtil para a diminuição da poluição em todas as áreas) é mais
compatível com o primeiro cavaleiro do Apocalipse, que é o símbolo de pureza, de
modo mais resumido. Assim, os painéis foram modificados com vista no primeiro
cavaleiro, já que os looks da passarela seriam em branco.
3.1 Público-alvo
O público-alvo da coleção surgiu a partir de “requisições”. Como membro
ativo da Igreja Adventista do Sétimo Dia, a autora recebeu muitos pedidos de
mulheres que não conseguem encontrar roupas “de culto” (já que a IASD tem a
tradição de que seus membros usem roupas formais aos sábados, nas igrejas) para
elas e para suas filhas, já que tudo é “muito curto ou muito caro”. Pensando nesta
necessidade, a coleção foi pensada para mulheres adventistas de várias idades,
sendo que o estilo de vida dessa população normalmente se resume em uma
alimentação saudável, dando prioridade à comida caseira, o hábito de se reunir em
congregação – ao menos aos sábados. São mulheres que em sua maioria trabalham
e/ou estudam, e também têm seu tempo para a leitura da Bíblia. A seguir, é
apresentado o painel lifestyle.
38
Figura 1 - pinel Lifestyle
Produzido pela autora com imagens retiradas de: Pinterest.com
3.2 Conceito
Como já abordado anteriormente, a coleção foi desenvolvida com base nos
quatro cavaleiros do Apocalipse, com ênfase no primeiro cavaleiro, o branco.
Juntando essas informações ao estilo de vida, criou-se o painel conceito, -
mostrado a seguir - que apresenta simbolicamente os quatro cavaleiros com peças
de xadrez coloridas, e tem o primeiro cavaleiro com seu arco e flecha maior, em
destaque, e como plano de fundo tem um ambiente branco e minimalista.
39
Figura 2 - Painel imagético
Produzido pela autora. Imagens retiradas da pesquisa de imagem do Google e Deviant Art.
3.3 Parâmetros de moda
40
Tendo como referência a figura do cavaleiro e “esbarrando” em muitas
coleções com estética moderna e rica em formas e recortes, o painel de tendências
– ou trendboard – foi construído com imagens de referência para a coleção, que se
utilizou, em muitos looks, do ombro mais forte, dos cortes retos e em layering, que
consiste em sobreposições - o que tem tudo a ver com as armaduras medievais, por
exemplo - , conforme mostra a figura 3.
Figura 3 - Trendboard
Produzido pela autora. Imagens retiradas de Pinterest.com
3.4 Cores
As cores foram pensadas apenas baseadas no texto bíblico, com o “adicional”
do dourado, que foi inspirado na coroa, e foi usado no editorial como cor do arco e
flecha e das coroas do desfile, conforme afiura 4.
41
Figura 4 -Cartela de cores
42
3.5 Materiais
Os materiais usados foram baseados no próprio trabalho teórico, sendo eles o
algodão orgânico (que, por não sofrer química, veio em uma cor mais próxima do
off-white) e o liocel. O algodão orgânico utilizou-se sarja como tecido externo e
tricoline para forros. Foi comprado diretamente com a cooperativa Justa Trama, de
Porto Alegre. O liocel foi doado da Espanha por um tio, que mora lá, mantendo em
vista que o tecido, no Brasil, só se vende em tons de azul índigo ou marinho, e
sempre online.
3.6 Mapa da coleção
O mapa da coleção apresenta os vinte e cinco croquis escolhidos das centro
e cinquenta opções, coloridos. A ideia original da autora – na disciplina de Book
digital – era vetorizar todos os croquis no Adobe Illustrator e pintar digitalmente no
Adobe Photoshop, para haver uma unidade estética e também porque a autora julga
mais condizente com o próprio painel imagético, que é mais contemporâneo. A
seguir, o mapa de coleção, em ordem, na figura 5.
43
Figura 5 - mapa da coleção
44
3.7 Croquis
A seguir, são apresentados os croquis (figuras 6 a 25) com seus respectivos
desenhos técnicos e as cores utilizadas.
Figura 6 - Croqui 1 + desenho técnico
45
Figura 7 - croqui 2 + desenho técnico
Figura 8 - croqui 3 + desenho técnico
46
Figura 9 - Croqui 4 + desenho técnico
47
Figura 10 - Croqui 5 + desenho técnico
48
Figura 11 - Croqui 6 + desenho técnico
49
Figura 12 - Croqui 7 + desenho técnico
Figura 13 - Croqui 8 + desenho técnico
50
Figura 14 - Croqui 9 + desenho técnico
51
Figura 15 - Croqui 10 + desenho técnico
Figura 16 - Croqui 11 + desenho técnico
52
Figura 17 - Croqui 12 + desenho técnico
Figura 18 - Croqui 13 + desenho técnico
53
Figura 19 - Croqui14 + desenho técnico
54
Figura 20 - Croqui 15 + desenho técnico
55
Figura 21 - Croqui 16 + desenho técnico
Figura 22 - Croqui 17 + desenho técnico
56
Figura 23 - Croqui 18 + desenho técnico
57
Figura 24 - Croqui 18 + desenho técnico
Figura 25 - Croqui 20 + desenho técnico
58
Figura 26 - Croqui 21 + desenho técnico
59
Figura 27 - Croqui 22 + ficha técnica
60
Figura 28 - Croqui 23 + ficha técnica
61
Figura 29 - Croqui 24 + ficha técnica
3.8 Mapa do desfile
Dos vinte e cinco croquis, seleciona-se três looks, que são produzidos para o
desfile, da modelagem até a maquiagem e cabelo na hora do OCTA Fashion.
62
Figura 30 - Mapa do desfile
3.9 Produção do desfile
Cabelo e maquiagem foram planejados de acordo com o conceito de coleção
e também do público-alvo, sendo, assim, discreto, porém artístico. As referências
foram retiradas da busca no site Pinterest.com.
3.9.1 Cabelo e maquiagem
63
O cabelo e a maquiagem feitos no dia do desfile foram os mesmos realizados
para o editorial para o OCTAmag – Pontos brancos ao redor dos olhos, pele discreta
e batom nude rosado, e cabelo liso e dividido no meio. A autora julgou que o cabelo
ondulado ou cacheado e/ou dividido do lado daria uma aparência muito frágil,
levando em conta que os looks já carregam um toque feminino bem forte. A autora
também confeccionou três coroas douradas, que conversam com o tema da coleção.
Figura 31 - Produção das fotos e desfile. Fotografia por Guilherme Dimatos, Beauty por Andrey Batista e modelo Camila Becker.
3.9.2 Trilha sonora
A música escolhida pela autora para ser usada no desfile foi um trecho de
Requiem, uma peça de Wolfgang Mozart. É uma música que começa com tons
64
tensos e logo se ouve um coral potente e dramático. A letra é sacra, louva a
grandiosidade e santidade de Deus e também clama por salvação.
4 Desenvlvimento de produto
Os subcapítulos e subtítulos a seguir descrevem o processo de produção dos
looks escolhidos para o desfile, desde a concepção até os acabamentos.
4.1 Primeiro look
O primeiro look a ser desenvolvido foi o último da passarela, pois foi a roupa a
aparecer no editorial para o OCTA Mag, e precisava ficar pronto logo em setembro.
4.1.1 Modelagem do primeiro look
O desenvolvimento da modelagem iniciou-se em cima de uma base tamanho
42, seguindo a apostila feita pela Professora Doutora Icléia Silveira, fornecida para
os alunos na quarta fase do curso.
O primeiro desafio foi planejar a manga. Ela poderia ser feita em um único
molde “sanfona”, que deveria ser dobrada ou uma manga separada com tomas
aplicadas. Com a professora, foi decidido que uma manga separada e com tomas
aplicadas seria mais seguro e teria uma boa visualidade.
Em segundo lugar, foi necessário pensar em como fazer a prega fêmea atrás
sem que a costura aparecesse no meio. Foi feito, então, pela professora Mary
Neura, um "mini" molde em craft, recortado livremente para que a autora entendesse
como pderia ser feito. Esta orientação imrovisada foi essencial na hora do
desenvolvimento da modelagem em tamanho real mais tarde, em casa.
65
Figura 32 - Mini planejamento de modelagem. Fotografia tirada do caderno da autora.
Ao todo, desde a base até os moldes prontos com a margem de costura e
legendas, a autora levou duas aulas de modelagem e mais em torno de vinte horas
em casa para terminar. A maior dificuldade foi fazer as costas, pois foi necessário
colocar pesos em cima dos moldes dobrados para que se pudesse traçar o corte, e
fazer encaixar. Finalmente, o resultado foi de dezesseis moldes.
66
Figura 33 - Ficha técnica de modelagem - Vestido com mangas.
Produzido pela autora e entregue junto com a modelagem.
67
4.1.2 Confecção do primeiro look
a) Corte
Por conta da assimetria, os moldes foram cortados com o tecido aberto. O
liocel foi primeiramente passado, depois riscado e separado. O plano de corte foi
feito digitalmente, com as medidas exatas tanto do tecido quanto do molde
(figura34).
Um problema encontrado foi algumas manchas, relativamente grandes, que
pareciam ser decorrentes do empacotamento ou transporte do tecido, que veio da
Espanha. O vestido foi lavado depois de pronto.
Não foi usado algodão, pois nesta época a autora ainda esperava resposta
das empresas, com relação a cores e preços.
68
Figura 34 - Plano de corte - Vestido com mangas.
b) Costura
Antes de começar a preparar e realmente costurar o vestido, foi feito um
protótipo com viscose branca (tecido similar, muito parecido em textura e caimento)
das mangas. Neste momento, foi decidido adicionar um molde da "toma maior", para
que fosse até a "cabeça" da manga e não houvesse risco de aparecer. Também foi
decidido adicionar outra toma, que foi posteriormente adicionada ao desenho
técnico.
69
A entretela foi aplicada ao tecido com ferro de passar e papel craft, porque a
fusionadeira não estava funcionando.
Outra modificação foi feita no acabamento, quando se decidiu por forro
separado do externo, o que causou encurtamento da peça de aproximadamente
5cm.
Figura 35 - Teste de modelagem da manga. Produzido pela autora.
70
Figura 36 - Editorial para o OCTAmag com o vestido com mangas.
Produção de imagem pela autora. Fotografia por Guilherme Dimatos, beauty por Andrey Batista e Modelo
Camila Becker.
4.2 Segundo look
O segundo look a ser produzido foi o primeiro a entrar na passarela, pois
apresentou maior complexidade de modelagem e confecção do que o conjunto de
cropped top e saia midi.
71
4.2.1 Modelagem do segundo look
Construída sobre a mesma base do look anterior, esta modelagem foi
simétrica, o que representou um alívio para quem vos fala, já que o look anterior
apresentou dificuldades por ser assimétrico. Para a bainha, foi deixada uma margem
de 4cm, e seria decidido ao final se seria bainha embutida no forro ou separada,
como o primeiro look (figura 37).
Foram gerados quinze moldes, que seriam cortados em sarja branca de
algodão orgânico (tecido externo) e/ou liocel branco (forro).
Houve algumas alterações em relação ao primeiro desenho técnico, como: os
recortes passaram a ser aplicações e, por isso, ganharam pesponto; e os recortes
que seriam nas costas foram retirados, já que o cabelo da modelo cobriria, de
qualquer jeito, tal parte do vestido.
Ao todo, foram necessárias duas aulas de modelagem, uma aula de costura e
mais oito horas em casa para finalizar o trabalho de modelagem, e mais as
alterações que foram feitas durante o processo de prototipagem e montagem da
peça.
72
Figura 37 - Ficha técnica de modelagem - vestido sem mangas. Produzido pela autora e entregue junto
com a modelagem.
73
4.2.2 Confecção do segundo look
a) Corte
Por ser uma peça simétrica, foi cortada com o tecido dobrado, tanto no externo
quanto no forro. O plano de corte foi também feito digitalmente, com as medidas
certas (figra 39).
Figura 38 - Plano de corte - Vestido sem mangas - forro. Produzido pela autora.
74
Figura 39 - Plano de corte - vestido sem mangas - Tecido externo. Produzido pela autora
.
75
b) Costura
Primeiramente, foi feito um protótipo (figura 40 e 41) e colocado sobre o
manequim de moulage, para que fossem feitos os ajustes necessários. Ali, foram
notados alguns erros de modelagem, que foram arrumados, para enfim cortar
novamente no molde certo. Os moldes da saia (do tecido externo) foram
aproveitados para a peça final.
Figura 40 - Protótipo do vestido sem mangas - foto 1.
76
Figura 41 - Protótipo do vestido sem mangas - foto 2
A peça apresentou muitos desafios para ser feita, por conta de muitos
retrabalhos devidos a problemas na modelagem inicial, e por essa razão, muitas
alterações na modelagem foram feitas durante o processo. Como o liocel é um
tecido que se deforma de acordo com temperatura e também durante a costura,
77
alguns ajustes foram necessários. Foi decidido, ao final, que a bainha permaneceria
costurada com o forro, com margem de 1cm.
Foi também necessário cortar o molde das costas ao meio, porque havia
muito tecido sobrando. Também foi adicionado um pesponto horizontal nas costas,
para unir a parte da "saia" com a parte superior do vestido. A confecção desta peça
foi pausada por duas semanas para que se pudesse ser feito o terceiro look, pois
estava demorando muito. Depois de terminado o terceiro look, o vestido foi
retomado e termindo. Os pontos à mão na parte interna da peça foram feitos pela
aluna Aline Quaiatto, que ajudou quem vos fala.
4.3 Terceiro look
4.3.1 Modelagem do Terceiro look
O terceiro look, como mencionado anteriormente, foi também feito a partir da
base comercial I + 1 da apostila de modelagem da quarta fase do curso, e foi o
último look a ser confeccionado, constituindo-se de duas peças: um cropeed top e
uma saia midi de cós alto (figura 42).
A modelagem foi mais tranquila de fazer, e foi durante a construção que a
autora e a professora Mary Neusa perceberam que o problema da modelagem –e,
consequentemente, do encaixe – foi não ter compensado os 3cm da pence do busto
para a cava. Isso foi arrumado na base. Ao todo, levou-se uma aulas de costura e
uma aula de modelagem para finalizar todos os moldes, com indicação de fio do
urdume, tecidos de cada molde (foram usados os três na peça) e margens de
costura.
Agradecimento às alunas Aline Quaiatto e Luísa Wolf, que ajudaram com a
carretilhagem da base para os moldes e foram de enorme ajuda para a autora.
O total dos moldes do look – cropped top e saia, que foram cortados juntos –
foi de dezessete moldes.
78
79
Figura 42 - Ficha técnica de modelagem - Conjunto. Produzido pela autora e entregue com a modelagem.
80
4.3.2 Confecção do terceiro look
a) Corte
Na banca que aconteceu em outubro, na qual os croquis, desenhos técnicos e
peças prontas foram avalidos, foi sugerido pelo professor Lucas da Rosa que o
conjunto, no momento ainda não cortado e confecionado, apresentasse mais de um
tipo de tecido. Ele sugeriu que nos recortes – Prega, barra da saia, toma e
"pedacinhos" do decote – fosse um tecido diferente do resto, e a autora considerou
uma boa ideia, pois seria o look do meio, e faria uma boa "ponte" entre os
looks.Antes do corte, a autora precisou do auxílio da professora Mary Neusa para
especificar, nos moldes, em qual tecido cortar qual e quantas vezes. Por isso, os
moldes têm três opções de letras: "S" para sarja, "L" para liocel e "T" para tricoline,
juntamente com a indicação de vezes que seria cortado em cada tecido.
A sarja e o tricoline foram cortados com o tecido dobrado. O liocel, porém, por
haver apenas um pedaço pequeno do tecido – foram doados cinco metros pelo tio
da autora, e grande parte foi usado no vestido com manga), foi cortado aberto, como
mostrado nas figuras 43, 44 e 45.
81
Figura 43 - Plano de corte - Conjunto - Tricoline.
82
Figura 44 - Plano de corte - Conjunto - Liocel. Produzido pela autora.
83
Figura 45 - Plano de corte - Conjunto - Sarja.
b) Costura
A costura do conjunto foi a mais rápida dos três looks, tendo em vista que,
primeiramente, a autora recebeu ajuda da professora Mary Neusa (por conta dos
problemas de saúde da mesma, que causam tremuras e descontrole de alguns
84
músculos) com o cropped, e em segundo lugar porque os erros cometidos com as
modelagens anteriores serviram de alerta e conserto para este último trabalho.
Graças à prova com as modelos organizada pelo grupo do casting, da disciplina de
Produção de Desfile, foi possível ajustar as medidas do cós à modelo antes mesmo
de fechar a peça. O cós já estrava entretelado e costurado, mas foi possível fazer
ajustes. Por conta disso, porém, a costura do cós ficou desencontrado com as
pences das costas. De resto, entretanto, tudo saiu como planejado.
4.4 Apresentação OCTA Fashion 2016
No dia 12/11/2016 aconteceu o OCTA Fashion 2016, o qual a autora
participou. Seguem as fotos do evento (figuras 46 a 53).
85
Figura 46 - Coleção NUMINIS look 1 foto 1. Fotografia por Douglas Sielski.
86
Figura 47 - Coleção NUMINIS look 1 foto 2. Foto por Mynt Studio.
87
Figura 48 - Coleção NUMINIS look 2 foto 1. Fotografia por Douglas Sielski.
88
Figura 49 - Coleção NUMINIS look 2 foto 2. Fotografia por Douglas Sielski.
89
Figura 50 - Coleção NUMINIS look 3 foto 1. Fotografia por Douglas Sielski.
90
Figura 51 - Coleção NUMINIS look 3 foto 2. Fotografia por Douglas Sielski.
91
Figura 52 - Coleção NUMINIS - entrada da formanda foto 1. Fotografia por Douglas Sielski.
92
Figura 53 - Coleção NUMINIS entrada da formanda foto 2. Fotografia por Mynt Studio
.
5 Considerações finais
O presente trabalho foi escrito e idealizado com o intuito de juntar uma
estética mais urbana e cosmopolita a tecidos sustentáveis, desconstruindo o estigma
que se tem, principalmente em nosso país, de que tudo o que é sustentável tem que
ser verde, marrom, ou feito de material reciclado – esclarecendo que a autora não
tem nada contra isso, mas a ideia muitas vezes afasta o consumidor tradicional dos
produtos de moda com este "rótulo".
93
Vale a pena salientar que a moda não precisa ser cruel para ser atual,
tecnológica e bonita. A autora acredita que está a cargo de cada consumidor ter ou
não uma consciência limpa em relação ao que compra, vende, come e veste, e que
esta decisão pode – e deve – ser facilitada por formadores de opinião, designers e
principalmente por aqueles que detêm o poder sobre os meios de produção,
distribuição e venda de tais artigos.
Ao longo do tempo de desenvolvimento deste trabalho, porém, a autora
desconstruiu os próprios dogmas sobre exatidão e perfeição, que a acompanhavam
desde a infância. Um dos obstáculos ao longo da busca pela perfeição foi, por
exemplo, o caimento do tecido. Por não ser encontrado no Brasil, o caimento do
Liocel era desconhecido até o momento em que chegou o pacote vindo da Espanha.
O tecido, que se acreditava ter o caimento de uma sarja, mostrou-se extremamente
fluido, porém pesado, ideal para peças de verão. Foi, então, necessário o uso de
entretela colante para que se pudesse estruturar o primeiro vestido a ser
confeccionado. Pelo uso de tal aviamento, já se aumenta muito o tempo de
decomposição do material, por conter um elemento químico e não-biodegradável
acoplado à peça. Outra pequena frustração foi a questão das manchas, que todos
os tecidos – tantos o que veio da Europa quanto os dois que vieram de Porto alegre
– apresentaram algum tipo de mancha com cor de sujo, como se tivesse sido
pisado, rolado no chão ou caído em água suja.
Por outro lado, é muito reconfortante saber que, pelo Brasil inteiro, existem
cooperativas que investem no algodão orgânico e fazem contato direto com o
consumidor, facilitando o acesso e consumo de tais bens.
Durante todo o processo de um ano e meio – de agosto de 2015 até agora,
novembro/dezembro de 2016, os aprendizados e o processo criativo não parou. A
leitura de livros, o desenvolvimento de novas ideia e a pesquisa de tendências foram
constantes, que manteram coleção atualizada e a busca de materiais, corrente. O
conhecimento adquirido em todos os sentidos possíveis - desenho, pesquisa,
tecnologia, geração de alternativas, costura, modelagem, e, além disso, nas áreas
da vida cotidiana e também espiritual – foi precioso, e, como dito anteriormente, é
certo que não cessará com a conclusão do curso.
94
Além do que foi citado anteriormente, o projeto despertou, também, o desejo
pela mudança real e pela dedicação ao nicho adventista, por ser tão requisitado no
meio em que a autora vive, e ser um trabalho que traz satisfação e realização. O
processo de construção de uma coleção é muito mais intenso, minucioso e
construtivo do que o consumidor pode imaginar. Revela aspectos profissionais
desconhecidos – como, no caso da autora, o gosto pela modelagem plana – que
podem ser levados para a carreira, e que anteriormente estavam "adormecidos",
porque não havia necessidade de serem utilizados.
De forma geral, o presente trabalho significou descobertas, laços de
cooperação, contatos futuros e muitas desconstruções - seguidas de reconstruções.
A coleção NUMINIS, apresentada no OCTA Fashion 2016, foi o resultado prático da
fundamentação teórica, sendo exposta aos professores e ao público, com sucesso,
no dia 12/11/2016, através do desfile e também da OCTAmag, mostrando que é
possível fazer moda consciente sem abrir mão das tendências e do bom gosto.
95
6 Refrências
A Bíblia Sagrada. Traduzida em português por João Ferreira de Almeida, Revista e
Atualizada no Brasil. - Barueri, Sociedade Bíblica do Brasil, 1999, 896 p.
FLETCHER, K.; GROSE, L. Moda & Sustentabilidade - Design para mudança; São
Paulo, Senac, 2011.
MORGAN, A. ROSS, M. The true Cost. [Documentário - Vídeo]. Produção de
Michael Ross, direção de Andrew Morgan. Estados Unidos da América, 2015. Vídeo
digital, 92 min, cor, som.
OLIVEIRA, Arilton et al. APOCALIPSE - Guia de Estudos Bíblia Fácil. São Paulo,
Casa Publicadora Brasileira, 2015. 96 p.
RAMALHO, Sandra. Imagem Também de Lê; São Paulo, Rosaris, 2005.
SEVCENKO, Nicolau. Virando Séculos - A corrida para o século XXI: No loop da
montanha-russa; São Paulo, Companhia das Letras, 2001.