Linguagem Corporal
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PUC MINAS – PRO-REITORIA DE EXTENSÃO - NÚCLEO EDUCA TIVO Projeto – Formação de Gestores Administrativos e Pe dagógicos da Educação
Infantil
Linguagem corporal e afetividade para uma educação plena e sensível Dinéia Domingues 1, Júlia Costa Gallo 2 e Marlon Russo Sbampato 3
RESUMO A formação profissional tem importantes repercussões no atendimento à criança na
escola. Partilhada, a formação em serviço contribui para a necessária compreensão e o
aprimoramento das ações pedagógicas. No caso deste projeto, as condições materiais e
simbólicas propostas concorrem para que as profissionais da escola infantil se tornem cada vez
mais saudáveis, seguras e comunicativas em meio ao exercício das funções, atuando de forma
desejada e comprometida e para que se construam relações de crescimento e liberdade, fundadas
na autonomia e no compromisso pessoal e social com a educação e os sujeitos implicados. Com
base metodológica da Psicomotricidade Relacional, este projeto de formação propõe arranjos e
encontros anuais/quinzenais ou semestrais/semanais para vivências lúdicas e do movimento. O
desenvolvimento dessas ações vem mostrando como o encontro com a percepção e sentidos das
práticas profissionais partilhados promovem saúde e bem-estar psicossocial.
PALAVRAS-CHAVE: educação; formação, trabalho.
APRESENTAÇÃO DO PROJETO
Depois da última oferta, com foco no fortalecimento da gestão administrativa da escola
infantil, desenvolvido em Contagem-MG, uma nova oferta do projeto “Formação de Gestores
Administrativos e Pedagógicos da Rede Conveniada de Educação Infantil” foi iniciada em Belo
Horizonte, em resposta às demandas das profissionais da rede comunitária conveniada ao sistema
municipal de ensino. A oferta foi implementada incorporando referências da Psicomotricidade
Relacional, de modo a incidir nas relações e vividos do trabalho, manifestos como vivência
1 Psicóloga, mestre em Educação; coordenadora do Projeto no Núcleo Educativo da Pro-reitoria de Extensão da PUC Minas. 2 Graduanda em Psicologia na PUC Minas, extensionista no Projeto 3 Graduando em Psicologia na PUC Minas, extensionista no Projeto.
corporal, experimentada entre as profissionais de educação infantil. A atividade extensionista foi
a oportunidade de uma prática possível em psicologia e psicomotricidade, de modo que se
desenvolvam habilidades de fazer intervenções de uma perspectiva clínica, relativa ao sofrimento
dos sujeitos, colocando a serviço da educação a bagagem de conhecimento acumulada na
formação acadêmica e no exercício profissional. A prática proporciona ao extensionista
experimentar e refletir sobre o que é atender grupos e intervir, enriquecendo as formas de
observar, documentar e aprimorar o exercício profissional. Com esse tipo de experiência
formativa aprendemos a planejar propostas e distribuir as práticas ao longo do tempo do processo
de formação. Com a prática sob supervisão, melhoramos as formas de confrontar idéias sobre o
decorrido, de escrever e sistematizar o trabalho, acompanhados desde a escrita e estrutura do
texto, até nas decisões sobre as formas de comunicar o que queremos sobre a prática e a reflexão
sobre o que fazemos e como fazemos. A formação profissional, que é tema desse projeto, gerou
monografia de graduação e artigos para eventos acadêmicos; disseminamos o conhecimento
teórico sobre formação e atuação do psicólogo que temos construído. A memória do projeto por
escrito e em vídeo nos fez reconhecer como são importantes as formas de documentar o que
fazemos nas práticas de formação, favorecem voltarmos ao já feito, refletindo sobre o acontecido,
gerando novos conhecimentos e compreensão das práticas. Confrontamos impressões sobre a
prática e compreendemos o ocorrido com apoio dos modelos teóricos que norteiam as ações;
articulamos e sustentamos argumentos e, refletimos, assim fazemos ciência. Tudo isso a extensão
acadêmica proporciona, pela articulação das várias ações de formação em Psicologia, em
Psicomotricidade Relacional e em Educação Infantil, envolvendo estagiários, gestores
governamentais e não-governamentais atuando juntos. Uma das extensionistas do projeto
percebeu a potência do campo teórico e fez a escolha pela área de formação após atuar na
extensão, acreditando que assim poderá se preparar melhor para atender as demandas da atuação
profissional. Isso demonstra como o intercâmbio de experiências e formação na extensão é de
grande importância, tornando-se precioso para formar profissionais habilitados e qualificados.
Em 2008, iniciamos nova versão do projeto com eixo na gestão pedagógica da escola, no
sistema municipal de ensino da capital. Nessa etapa, especificamente, o objeto da formação
continuada foi a linguagem corporal e sua dimensão afetiva para uma educação plena e sensível.
Passaram pelo estágio, desde então, diretamente, três estagiários contratados pelo projeto do
Núcleo Educativo da Pró-reitoria de Extensão e cerca de dez outros, indiretamente envolvidos
por meio de estágios obrigatórios da universidade, além de professores coordenadores de
programas e projetos do Núcleo e de profissionais da Educação Infantil da rede conveniada ao
sistema municipal de ensino, em formação continuada.
Os profissionais participantes do projeto extensionista atuam em creches comunitárias
filiadas ao “Movimento de Luta Pro-creches de BH”, entidade de defesa do atendimento na rede
sem finaliddes lucrativas e conta com o apoio da Secretaria de Educação do município. Todos os
envolvidos, escolas, ong e universidade são parceiros no fórum de Educação Infantil local e
preconizam formação e valorização profissional como requisito para uma escola de qualidade,
que atenda a infância como tempo de direitos. Uma Educação Infantil de qualidade inclui além da
formação, ambiente físico adequado, gestão compartilhada e ação pedagógica centrada na
infância.
No âmbito do projeto, os estagiários de Psicologia buscaram nos estudos e autores
psicomotricistas a reflexão sobre os desafios à ação pedagógica:
Toda pedagogia que não se renova, esclerosa-se rapidamente, e as “inovações” cedo perdem-se numa rotina mais ou menos disfarçada, na segurança do “já feito”, na facilidade do “previsto”, que justamente protegem da inovação. (LAPIERRE e AUCOUTURIER, 1986, p. 7)
DESENVOLVIMENTO/METODOLOGIA
De acordo com o desenvolvimento e a metodologia construídas para o projeto, este foi
organizado em torno de encontros semanais, com arranjos para vivências lúdicas e reflexivas em
torno das práticas do trabalho em escolas infantis e outras, da experiência das profissionais da
educação infantil, professoras e coordenadoras pedagógicas. Os encontro têm três momentos
básicos e interdependentes: de sensibilização, vivencial e de ressignificação das experiências
profissionais.
Uma grande pesquisadora da Educação Infantil brasileira nos leva a pensar sobre a
infância e a escola:
A gente tem que se reapropriar da nossa própria história e entender que criança eu fui para, a partir daí, saber que tipo de criança eu gostaria de formar.(Kramer, 2005, p.7 )
Concordamos com Kramer, que lembra que para acolher a criança na escola com a
qualidade necessária é preciso que as profissionais saibam que tipo de crianças elas foram, que
infância tiveram, quais fatores, lugares, tempo, sensações, sentimentos e, principalmente, quais
relações constituíram por meio das suas primeiras experiências humanas e de infância. A
rememoração de vividos, as relações com as figuras parentais e outras pessoas significativas na
infância e na vida, é o principal meio que a formação utiliza para ajudar a reconhecer os
sentimentos que propulsionam os fazeres pessoais e profissionais dessas pessoas.
Para que as profissionais da educação infantil soubessem mais sobre elas mesmas, foi
necessário espaço e tempo para a escuta partilhada e um atendimento diferenciado e sensível às
suas necessidades profissionais. Como espaço de formação para descobertas íntimas, humanas,
profissionais e valiosas, nosso objetivo foi fazer com que cada profissional se debruçasse sobre
suas próprias lembranças, sobre os contornos relacionais de suas experiências, sobre as repetições
infantis, sobre o corpo sensível e as memórias da infância, reconhecendo e rememorando as
primeiras relações e trocas no mundo. A abordagem é clínica, voltada à experiência sensível, mas
a ancoragem é profissional, voltada aos modos de presença no trabalho com as crianças.
É pensando em tudo isso que constitui o sujeito educador, que o projeto prevê, também,
tempo para a reflexão sobre as formas como pensam, trabalham, convivem com crianças
pequenas no cotidiano do atendimento nas escolas infantis, espaços públicos que têm por
finalidade promover desenvolvimento e assegurar proteção integral às crianças, de forma
complementar à atuação da família. É essa a essência do trabalho, constatada em depoimentos e
observações que documentamos em vídeo. A postura acolhedora do projeto provoca novas
percepções da própria vida e experiências. Ressiginificando as próprias histórias, transformam-se
condutas de trabalho e outras. Tem sido possível notar como as professoras e coordenadoras
pedagógicas desse grupo, se tornam mulheres cada vez mais sensíveis e capazes de acolher e
trabalhar com dignidade e em busca de realização profissional. Essas mudanças acontecem não
por acaso, mas por posturas e escolhas cada vez mais conscientes, de fazer de espaços como o do
trabalho, lugar onde em que se pode buscar prazer e satisfação.
Para a criança, a instituição educacional deve ser um lugar de bem estar biopsicossocial,
um espaço onde tenha o direito de ser bem acolhida, educada, respeitada, socializada, e, acima de
tudo, amada pelos adultos com quem convive. Para a concretização de atendimento educacional
co essas características, acreditamos ser necessário que os profissionais da educação infantil
reconheçam esses mesmos valores em suas vidas. É trazendo esses valores para a própria vida
que esses profissionais podem fazer diferente, uma educação inovadora, mais humanizada, mais
personalizada e autônoma, ou seja, cuidar e educar com qualidade da vida e com os direitos de
todos sendo levados em consideração. Pensamos e percebemos como relações calcadas no
sentimento manifesto, no respeito, na pessoalidade e no convívio permitem que crianças e adultos
carreguem dentro de si as condições para conviverem com gosto pela experiência em
coletividade. Com oportunidades de tecerem uma melhor convivência, constroem
harmonicamente convívio e aprendizagens, como estamos vivendo em cada passo da formação,
em que somos todos responsáveis.
Lapierre e Aucouturier (1986) nos convidam a pensar que a escola não é o único lugar de
cultura e de educação. O que importa é desenvolver a disponibilidade e o espírito crítico da
criança ao nível de suas práticas sociais, para que sua autonomia intelectual não seja exercida
somente em face das matérias escolares, mas na própria vida e na sociedade. Vemos aí a
compreensão da educação ampliada, coerente com a visão das crianças como sujeitos ativos, em
desenvolvimento e conectados aos próprios desejos. Ativos nos movimentos e expressões da vida
com suas curiosidades, as crianças são mais capazes de se tornarem adultos seguros e despertos,
de seu tempo.
Para que a experiência da infância possa ser bem vivida na escola, contribuindo
positivamente para o desenvolvimento, é necessário um adulto tranquilo, responsável, seguro e
sensível, capaz de guiar e dar suporte às descobertas da infância, sem se angustiar com as
descobertas infantis. O projeto sustenta e acolhe as demandas do adulto em suas questões
pessoais e profissionais relacionadas às forma de ver, ser e agir no mundo, pois somos humanos e
estamos em constantes transformações e crescimento. Neste projeto, pensamos e incidimos pela
qualidade da experiência da infância na escola infantil.
A criança precisa ter oportunidade de se expressar com o corpo, interagir com a natureza e não só ficar presa em uma cadeira diante de um quadro negro. (Kramer, 2005, p.7 )
O Projeto de Formação de Gestores da Educação Infantil instiga e propõe refletir sobre as
ações pedagógicas e sua compreensão como movimento e ação humana de caráter lúdico e de
socialização na primeira infância. Na formação, espaço e tempo de escuta diferenciada, os
profissionais são chamados a se expressar, a reconhecer e a ressignificar papéis profissionais e
vividos pessoais, experimentando criatividade e autonomia frente ao próprio trabalho.
Exploramos a expressão em linguagem corporal, afetiva e emocional para uma educação plena,
sensível, segura e de qualidade para as crianças, partindo da busca do adulto pela realização
pessoal e profissional. A experiência mostra como as profissionais têm experimentado com maior
satisfação as relações institucionais, interpessoais com os adultos e as crianças. O movimento, a
socialização, a exploração do mundo e as vivências pulsionais são veículos pelos quais se propõe
a reconstrução da identidade e dos sentidos do fazer profissional. Ao viver, rememorando,
reapresentando suas práticas sociais, desde quando eram crianças, e passando por momentos
significativos de suas vidas, as professoras e coordenadoras pedagógicas reexperimentam em
seus corpos como é ser no mundo, pertencer ao grupo, sentir-se em meio social. Ao dispor com
seus corpos a reapresentar esses vividos, reaprendem formas de ser, de amar, de expressar, de
trabalhar e de se posicionarem perante seus próprios sentimentos. Ao passar por tais experiências
no percurso formativo, reeducam-se, como trazem em relatos orais, escritos e visuais de seu
trabalho, de sua vida familiar, etc. E são reeducadas em suas relações com os outros. Expressar,
comunicar, desejar, criar, inovar, ter autonomia e independência são algumas das possibilidades
de exploração das potencialidades humanas que podem servir às experiências cotidianas de
mulheres, homens, estudantes e profissionais.
Experimentando os jogos psicomotores, professoras e coordenadoras pedagógicas
mostram-se corporalmente sensíveis às necessidades humanas, suas próprias e daqueles com
quem convivem no grupo de formação, nas escolas. Observamos ao longo da formação como
essas vivências possibilitam e viabilizam experiências mais plenas e seguras com a infância, com
o trabalho na escola e outras, pessoais. Mostram como é possível, com ajuda do projeto, que se
tornem adultos corporalmente mais sensíveis e confiantes em seus fazeres no mundo profissional
e pessoal.
As vivências psicomotoras envolvem o corpo no trabalho, o corpo como expressão, como
fonte de criatividade, de autonomia e de aprendizado, o corpo como morada da formação
humana. Orientamos vivências corporais, conversas e elaborações sobre a infância como uma
forma possível para construir e fundamentar boas práticas na educação infantil. É a partir das
vivências em Psicomotricidade Relacional, que as brincadeiras, as conversas, as experiências em
grupo ou individuais se tornam importantes ao logo do caminho que percorrem no projeto. Cada
encontro traz inúmeras constatações, reelaborações, construções, novas possibilidades de
interação e reflexões. Nascem daí novos olhares sobre a prática educacional, que tem como
objetivo uma escola de cada vez mais qualidade para as crianças.
Cabe a nós olhar para ao nosso cotidiano e pensar que não podemos mudar o mundo, mas podemos mudar o nosso mundo. (Kramer, 2005, p.8 )
Refletimos que propor uma intervenção a partir de vivências é tocar em questões pessoais
e profissionais, algumas com significados e marcas profundas nas trajetórias pessoais. Atuamos
como se colocássemos uma lupa nas relações que permeiam o convívio em trabalho na escola; às
vezes a lupa é colocada em outras experiências, do campo pessoal. A expressão ajuda a construir
novas relações com o trabalho, a rever e, na medida do possível, fortalecer laços, se tornarem
mais confiantes e sensíveis às necessidades da infância, dos adultos e às próprias.
Nessas observações das vivências compartilhadas nos encontros de formação, percebemos
como as profissionais passam por problemas relacionados com o trabalho em meio a outros
conflitos de ordem pessoal e social, que interferem diretamente na prática e atendimento às
crianças. A contribuição da psicologia, por meio da escuta clínica, parece necessária e viável para
a saúde psíquica e para a vida intersubetiva.
Para nós, estudantes e profissionais da psicologia, é relevante atuar em um projeto de
formação que tem como objetivo acolher a pessoa, o profissional de educação infantil,
proporcionando as condições para que possam se ver distantes da instituição educativa, mas
ligadas a ela, trabalhando conflitos de ordem pessoal e institucional. O objetivo é contribuir para
a melhoria da vida por meio do trabalho e, consequentemente, para a melhor prática educacional.
Reconhecemos nas falas das professoras e coordenadoras que, ao ressignificar o trabalho,
ressignificam a vida pessoal, ganham a afirmação de existir, conquistam autonomia e
espontaneidade por meio e em meio ao trabalho. Consideramos que educar está associado às
vivências mais próprias de cada individuo, construídas em relação com outros. Por isso,
refletimos, educar é envolver-se em afetividade, é antes de mais nada cuidar das relações, é
existir em sociedade e poder integrar-se a ela com autonomia e confiança.
As referências teóricas da psicomotricidade relacional e da pedagogia da infância nos
levaram à reflexão sobre os adultos e sobre os aspectos infantis presentes em suas vidas, que
recuperamos a partir das vivências psicomotoras. As práticas profissionais partilhadas e revistas
pelas professoras têm nos levado a reconhecer e valorizar ambientes, espaços, materiais, rotinas,
ações e, sobretudo, profissionais capazes de promover melhoria à educação infantil oferecida às
crianças.
A proposta das vivências corporais, ponto de partida da intervenção, tem o intuito de
oferecer espaços amplos e fartos de materiais que contribuam para a construção e expressão
pessoal adulta; possibilitando se expressarem de forma livre e autônoma, com a oportunidade de
adentrar ao mundo simbólico através de brincadeiras. A psicomotricidade relacional tem recursos
para apoiar a criatividade e a autonomia, partindo do desejo como o norte das relações. A partir
das brincadeiras e jogos corporais lúdicos, os conflitos afetivos, psíquicos e emocionais
emergem, possibilitando ao sujeito, acompanhado, retrabalhar, ou seja, tomar consciência dos
conflitos que permeiam suas experiências entre adultos e crianças, em busca de referências de
bem-estar psicossocial. Rememoradas, retrabalhadas, tais experiências contribuem para modos
mais sensíveis e seguros para acolher as crianças e construírem melhores relações institucionais,
reinventando formas de relacionar no cotidiano da escola infantil.
Com a participação de cada integrante e todos nós, o grupo toma corpo, passa a ter uma
vida própria, cada integrante se colocando responsável pela sua presença, pela sua prática, pelo
movimento e atividade que coloca à disposição nas trocas e relações. Como a via da intervenção
é lúdica, através de brincadeiras com materiais não-estruturados, as pessoas se movem ao
encontro da infância, recuperam e partilham memórias afetivas, experiências que cada uma teve
quando criança. As brincadeiras são livres e construídas a partir das experiências pregressas de
vida de cada uma, ou seja, cada uma brinca inspirada pela forma que brincava enquanto era
criança. A partir desses momentos despertam-se e posteriormente serão partilhadas reflexões e
aprendizados de seus vividos pessoais rememorados. Cada participante do grupo reencontra suas
experiências infantis mais íntimas e observamos como isso traz a elas a possibilidade de produzir
novos significados para o que viveram, tanto em vida pessoal, relacionada às vivências familiares
e questões existenciais, quanto àquelas mais recentes, do trabalho na escola infantil. Aos poucos
observamos em seus relatos como percebem e integram suas parcelas de responsabilidade na
educação das crianças.
As vivências corporais, com base na psicomotricidade relacional, seguidas das conversas
e elaborações sobre a infância vivida e pessoal, têm sido oportunidade para pensar, falar e
partilhar as visões sobre a infância e as crianças que atendem nas escolas. Aos poucos,
percebemos que começam a acreditar numa possível construção e fundamentação de uma boa
prática da educação infantil, e construída por elas mesmas. É a partir das vivências em
Psicomotricidade Relacional, que as brincadeiras, as conversas, as experiências em grupo e
individuais se tornam importantes, é o que temos visto ao longo do caminho percorrido. Cada
encontro é uma constatação, uma elaboração, uma construção, uma reinvenção da vida e da
profissão, fazendo nascer novos olhares sobre as práticas educacionais, a escola, a criança, a
professora, o trabalho, tendo por norte o direito das crianças a uma boa escola onde viver a
infância.
A prática deste projeto confirma os fundamentos que ancoram nossa intervenção, que não
só a criança tem o poder de aprender com o desejo de agir e de se afirmar no mundo. É
necessário, também, que os adultos, os profissionais de educação infantil e outros, tenham
oportunidade de sentir, de se conscientizarem das posturas corporais e institucionais, de como se
apresentam para o trabalho. A formação continuada, no caso deste projeto, acrescenta a
possibilidade, a habilidade de poder dizer sobre o desejo de realização no trabalho. Com ajuda
dessa prática formativa, a experiência pessoal contribui para tornar possível uma educação das
crianças imersa em maior afetividade e desejos, sujeitos sensíveis uns aos outros, como também
reconhecem LAPIERRE e AUCOUTURIER:
Para nós, a aquisição de conhecimento se situa não como uma meta em si, mas como parte integrante de uma dinâmica de afirmação da pessoa no seio de um grupo social. O desejo de aprender é apenas um dos componentes secundários do desejo de agir, do desejo de ser. A expressão abstrata também não passa de um outro meio de afirmação que vai tomar progressivamente o lugar da expressão motora, ao assegurar a continuidade e assumir todo o conteúdo simbólico.(LAPIERRE e AUCOUTURIER 1986 p. 69)
Finalmente, pensamos que a compreensão das experiências pessoais e profissionais
partilhadas no projeto geraram novos aprendizados sobre essas próprias experiências, o que
advém do próprio sentimento sobre elas e não de um outro lugar fora do corpo e das emoções que
experimentamos sobre aspectos de nossas vidas e trabalho. Reinventadas, acarretam prazer em
aprender e partilhar, em cuidar e educar, reconhecemos.
Referências Bibliográficas
LAPIERRE, André; AUCOUTURIER Bernard. A Simbologia do Movimento. Porto Alegre: Arte Medicas, 1986
KRAMER, Sônia, Entrevista : Aprendendo com a criança a mudar a realidade. Revista Criança do professor de Educação Infantil, pág. 5, 6, 7, 8. Abril/2005