Literatura Ii

1
MATÉRIA DE CAPA CLASSIFICADOS VEÍCULOS ESTADO DE MINAS D O M I N G O , 8 D E O U T U B R O D E 2 0 0 6 2 PNEUS LANTERNAGEM E PINTURA CHAVES AR CONDICIONADO DISTRIBUIDOR REPRESENTANTE OFICINA IMPORTADOS MOTOR REVISÃO HIDRÁULICA REVISÃO GERAL, TROCA TÉCNICA DE ÓLEOS E FILTROS P/ VEÍCULOS NACIONAIS E IMPORTADOS. ( ) AV. BIAS FORTES 954 FONE: 31 3222-8822 SEGUROS ASSORA DANIEL CAMARGOS Quando chauffer ainda não tinha se aportuguesado e virado chofer, em 1913, Lima Barreto escreveu o conto Um e ou- tro, que narra a história de Lola e seu de- sejo pelo motorista de um automóvel de luxo, batizado pelo autor de ‘Pope’. O doutorando em literatura comparada Ulysses Maciel analisou a presença de ele- mentos técnicos na literatura e usou o conto de Barreto como objeto de análise. “O automóvel é um símbolo de status que Lola busca alcançar. Se pensarmos que na época eram pouquíssimas pes- soas no Rio de Janeiro que possuíam um automóvel de luxo, é interessante perce- ber a ironia de Lima Barreto com o des- lumbre da sociedade”, ressalta Maciel. Barreto lança mão do olhar de Lola, uma espanhola que era sustentada pelo amante, e descreve o automóvel como “aquela magnífica máquina, que passava pelas ruas que nem um triunfador, era bem a beleza do ho- mem que o guiava; e, quando ela o tinha nos braços, não era bem ele quem a abraçava, era a bele- za daquela máquina que punha nela ebriedade, sonho e a alegria singular da velocidade”. O ‘chau- ffeur’e a máquina se confundiam no de- sejo de Lola, que acreditava que “o carro era como os membros do outro”. ÚLTIMA VEZ Já na cama à espera de saciar o desejo o ‘chau- ffeur’ informa que não dirige mais o ba- dalado ‘Pope’ e sim um corriqueiro táxi. A última frase do conto dá a exata idéia da reação de Lola: “Deitou-se a seu lado com muita repugnância, e pela última vez”. Is- so aconteceu porque a protagonista con- siderava o táxi um automóvel sujo, cho- calhante, mal pintado e feito com folha- de-flandres. Maciel destaca que é comum o automóvel ganhar aspectos humanos quando é usado na literatura. “Compara se a potência do motor com a virilidade do motorista, o farol com os olhos”, exem- plifica o doutorando. Já em Macunaíma, o índio herói brasi- leiro de caráter controverso criado por Má- rio de Andrade descreve a gênese do auto- móvel. Macunaíma diz que no princípio era uma onça parda que perseguia uma ti- gresa preta e que colocou quatro rodas no pé, tomou óleo de mamona, comeu um motor e mordeu dois vagalumes e assim se transformou na máquina automóvel. O herói sem caráter ia além e constatou que a onça teve uma ninhada enorme com machos e fêmeas e, por isso, as pessoas di- zem “um forde” e uma chevrolé”. Se a tese de Macunaíma não é correta, é possível acreditar na história que conta Ot- to Schneider, na Revista de Automóveis, de novembro de 1955. Otto era o redator prin- cipal da revista e narra a saga do primeiro automóvel que desembarcou no país: “Um carro a vapor, enorme, complicado, com fornalha, chaminé e caldeira”. Para apresentar a novidade, José do Patrocínio, que trouxe o veícu- lo, levou jornalistas e poetas, entre eles Olavo Bilac, que gostou tanto que pediu para apren- der. Porém, deixou o carro bater em uma árvore e de- pois cair em um buraco da estrada velha da Tijuca. A revanche do automóvel se da- ria em forma de tese, defenestrada pelo escritor Ru- bem Fonseca no site portallite- ral.terra.com.br, que hospeda a página do autor. O escritor diz que quando Ford lan- çou o modelo T, “as Cassandras” afirma- ram que a ficção estava com os dias con- tados. “Dentro de pouco tempo, todas as pessoas teriam automóvel e usariam o carro para passear, fazer compras, namo- rar em vez de ficarem em casa lendo”. Po- rém, ele diz que muitos escritores fica- ram em casa escrevendo e muitos leito- res lendo e a literatura sobreviveu. A his- tória se repetiu com o cinema e a inter- net. A literatura permanece. Para desfilar na ficção, automóvel é humanizado e empresta suas características ao motorista. Indústria automobilística já foi acusada de matar a literatura nacional Belo Jaguar XK-140 foi estampado na capa da edição que narra acidente de Olavo Bilac com o primeiro automóvel importado FOTOS REPRODUÇÕES / CAPAS DA REVISTA DE AUTOMÓVEIS / DISTRIBUIDORA IMPRENSA LTDA Olhos de farol e peito de aço Revista tinha crônica de Rubem Braga c m y k c m y k CYAN MAGENTA AMARELO PRETO CYAN MAGENTA AMARELO PRETO

description

bacanas

Transcript of Literatura Ii

Page 1: Literatura Ii

MMAATTÉÉRRIIAA DDEE CCAAPPAA

CLASSIFICADOSVEÍCULOS

E S T A D O D E M I N A S ● D O M I N G O , 8 D E O U T U B R O D E 2 0 0 6

2

PNEUS

LANTERNAGEM EPINTURA

CHAVES

AR CONDICIONADO

DISTRIBUIDOR

REPRESENTANTE

OFICINA IMPORTADOS

MOTORREVISÃO

HIDRÁULICA

REVISÃO GERAL, TROCA TÉCNICA

DE ÓLEOS E FILTROS P/ VEÍCULOS

NACIONAIS E IMPORTADOS.

( )AV. BIAS FORTES 954 FONE: 31 3222-8822

SEGUROS

ASSORA

DANIEL CAMARGOS

Quando chauffer ainda não tinha seaportuguesado e virado chofer, em 1913,Lima Barreto escreveu o conto Um e ou-tro, que narra a história de Lola e seu de-sejo pelo motorista de um automóvel deluxo, batizado pelo autor de ‘Pope’. Odoutorando em literatura comparadaUlysses Maciel analisou a presença de ele-mentos técnicos na literatura e usou oconto de Barreto como objeto de análise.“O automóvel é um símbolo de statusque Lola busca alcançar. Se pensarmosque na época eram pouquíssimas pes-soas no Rio de Janeiro que possuíam umautomóvel de luxo, é interessante perce-ber a ironia de Lima Barreto com o des-lumbre da sociedade”, ressalta Maciel.

Barreto lança mão do olhar de Lola,uma espanhola que era sustentada peloamante, e descreve o automóvel como“aquela magnífica máquina, que passavapelas ruas que nem um triunfador, erabem a beleza do ho-mem que o guiava;e, quando ela o tinhanos braços, não erabem ele quem aabraçava, era a bele-za daquela máquinaque punha nelaebriedade, sonho e aalegria singular davelocidade”. O ‘chau-ffeur’e a máquina seconfundiam no de-sejo de Lola, queacreditava que “ocarro era como osmembros do outro”.

ÚLTIMA VEZ Já nacama à espera de saciar o desejo o ‘chau-ffeur’ informa que não dirige mais o ba-dalado ‘Pope’e sim um corriqueiro táxi. Aúltima frase do conto dá a exata idéia dareação de Lola: “Deitou-se a seu lado commuita repugnância, e pela última vez”. Is-so aconteceu porque a protagonista con-siderava o táxi um automóvel sujo, cho-calhante, mal pintado e feito com folha-de-flandres. Maciel destaca que é comumo automóvel ganhar aspectos humanosquando é usado na literatura. “Comparase a potência do motor com a virilidade

do motorista, o farol com os olhos”, exem-plifica o doutorando.

Já em Macunaíma, o índio herói brasi-leiro de caráter controverso criado por Má-rio de Andrade descreve a gênese do auto-móvel. Macunaíma diz que no princípioera uma onça parda que perseguia uma ti-gresa preta e que colocou quatro rodas nopé, tomou óleo de mamona, comeu ummotor e mordeu dois vagalumes e assimse transformou na máquina automóvel. Oherói sem caráter ia além e constatou quea onça teve uma ninhada enorme commachos e fêmeas e, por isso, as pessoas di-zem “um forde”e uma chevrolé”.

Se a tese de Macunaíma não é correta, épossível acreditar na história que conta Ot-to Schneider, na Revista de Automóveis, denovembro de 1955. Otto era o redator prin-cipal da revista e narra a saga do primeiroautomóvel que desembarcou no país:“Um carro a vapor, enorme, complicado,com fornalha, chaminé e caldeira”. Paraapresentar a novidade, José do Patrocínio,

que trouxe o veícu-lo, levou jornalistase poetas, entre elesOlavo Bilac, quegostou tanto quepediu para apren-der. Porém, deixouo carro bater emuma árvore e de-pois cair em umburaco da estradavelha da Tijuca.

A revanche doautomóvel se da-ria em forma detese, defenestradapelo escritor Ru-bem Fonseca nosite portallite-

ral.terra.com.br, que hospeda a página doautor. O escritor diz que quando Ford lan-çou o modelo T, “as Cassandras” afirma-ram que a ficção estava com os dias con-tados. “Dentro de pouco tempo, todas aspessoas teriam automóvel e usariam ocarro para passear, fazer compras, namo-rar em vez de ficarem em casa lendo”. Po-rém, ele diz que muitos escritores fica-ram em casa escrevendo e muitos leito-res lendo e a literatura sobreviveu. A his-tória se repetiu com o cinema e a inter-net. A literatura permanece.

Para desfilar na ficção, automóvel é humanizado e empresta suas características aomotorista. Indústria automobilística já foi acusada de matar a literatura nacional

Belo Jaguar XK-140 foi estampado na capa da edição que narra acidente de Olavo Bilac com o primeiro automóvel importado

FOTOS REPRODUÇÕES / CAPAS DA REVISTA DE AUTOMÓVEIS / DISTRIBUIDORA IMPRENSA LTDA

Olhos de farol e peito de aço

Revista tinha crônica de Rubem Braga

cmyk

cmyk

CYA

NM

AG

ENTA

AM

ARE

LOPR

ETO

CYAN MAGENTA AMARELO PRETO