Livro de MASSIN-1997-Historia Da Musica Ocidental

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Livro de Historia geral da Música organizado por Jean Massin e Brigitte Massin, com a colaboração de diversos autores em capítulos do livro.

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  • hoje numerosos e excelentes dicionrios e enciclopdias de msica com ensinamentos os mais variados, mas sem dvida mais raramente conduzem-nos a uma verdadeira histria dessa arte at os nossos dias, em sua maravilhosa trajetria atravs dos sculos: seus encontros, desenvolvimentos, o surgimento dos homens que no cessam de invent-la e reinvent-la.

    Quisemos aqui traar uma histria da prtica e da esttica musicais, de seus instrumentos e regras hoje variveis, de seus compositores, sobretudo aqueles a quem foram dedicados, em virtude da grandeza de sua genialidade criativa, grandes captulos.

    Mas quisemos igualmente que esta Histria da msica "ocidental" com suas evolues e mesmo com suas revolues especficas, no ficasse dissociada da histria geral: histria poltica, socioeconmica, cultural e religiosa, preocupando-nos assim em esclarecer as situaes scio-histricas da msica ao longo dos sculos.

    Destinada a todos os leitores, a todos os apaixonados pela msica, os praticantes ou ouvintes, a todos aqueles que querem saber mais, esta histria se abre, antes que se comece o seu relato, com um "Lxico musical explicativo", um pouco como se entrega em mos a chave de uma fbrica.

    HISTRIA DA MSICA OCIDENTAL

  • JEAN & BRIGITTE MASSIN

    HISTORIA DA MSICA OCIDENTAL

    Traduo ngela Ramalho Viana

    Carlos Sussekind Maria Teresa Resende Costa

    EDITORA NOVA FRONTEIRA

  • Ttulo Original: Histoire de la Musique Occidentale Messidor - Temps Actuels, 1983

    Fayard/Messidor - Temps Actuels, 1985 para edio no ilustrada.

    Direitos de edio da obra em lngua portuguesa no Brasil adquiridos pela EDITORA NOVA FRONTEIRA S.A.

    Rua Bambina, 25 - Botafogo C E P : 22251-050 - Rio de Janeiro - R J - Brasil

    Tel: 537 8770 - Fax: 286 6755 http:://www.novafronteira.com.br

    Equipe de produo Leila Name

    Regina Marques Sofia Sousa e Silva

    Michelle Chao Mareio Arajo

    Edio de originais Antnio Monteiro Guimares

    Csar Benjamin

    ndice onomst ico Isabel Grau

    Nana Vaz de Castro Pedro de Moura Arago

    Reviso Ana Lcia Kronemberger

    ngela Pessoa Marcelo Eufrasia

    Projeto grfico e editorao eletrnica Silvia Negreiros

    C I P - BRASIL. CATALOGAO-NA-FONTE S I N D I C A T O N A C I O N A L D O S E D I T O R E S D E L I V R O S

    M371h Massin, Jean Histria da msica ocidental / Jean 8c Brigitte Massin ; traduo de Maria

    Teresa Resende Costa, Carlos Sussekind, Angela Ramalho Viana. - Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1997

    Traduo de: Histoire de la musique ocidentale ISBN 85-209-0907-8

    1. Msica - Histria e crtica. I . Massin, Brigitte. II . Ttulo.

    97-1719. C D D 780.9 C D U 78(091)

    SUMRIO

    SOBRE OS COLABORADORES xiii

    PREFCIO xvii Brigitte e Jean Massin

    LXICO MUSICAL EXPLICATIVO 1 Os instrumentos, a orquestra, as vozes 3

    Philippe Beaussant, com a colaborao de Jean-Yves Bosseur e Jean Massin O solfejo e a harmonia 45

    Michle Reverdy As formas e os gneros musicais 63

    Philippe Beaussant, com a colaborao de Brigitte e Jean Massin e de Marc Vignal

    A notao e a interpretao 99 Jean-Yves Bosseur

    Primeira Parte DAS ORIGENS CRISTS AO SCULO XIV 123

    1. Pensar a msica na Idade Mdia 125 Franoise Ferrand

    2. Os primeiros cnticos da Igreja 135 Franoise Ferrand

    3. Tcnica e notao do canto gregoriano 141 Michel Hugh

    4. A liberdade e a brecha: tropos, seqncias, dramas litrgicos 151 Franoise Ferrand

  • vi Historia da msica ocidental

    5. A msica profana nos sculos XII e XIII 161 Franoise Ferrand

    6. A polifonia, desde seus primordios at o fim do sculo XIII 185 Franoise Ferrand

    7. A Ars Nova e Guillaume de Machaut 195 Franoise Ferrand

    Segunda Farte

    OS SCULOS XV E XVI 209 8. A msica no sculo XV 211

    Bernard Gagnepain 9. A msica no sculo XVI: Europa do Norte, Frana, Italia, Espanha 235

    Jean-Pierre Ouvrard 10. A msica luterana no sculo XVI 289

    Marc Vignal 11. A msica inglesa no tempo dos Tudor e dos primeiros Stuart 293

    Jean-Franois Labi

    Terceira Parte O SCULO XVII 313 12. Situao scio-histrica da msica no sculo XVII 315

    Ivo Supicic 13. Claudio Monteverdi (1567-1643) 327

    Jean-Ives Bosseur 14. As invenes italianas do esprito barroco 341

    Philippe Beaussant 15. A msica barroca da Frana "clssica" 359

    Philippe Beaussant 16. Heinrich Schtz (1585-1672) 385

    Marc Vignal 17. A msica alem entre Schtz e Bach 393

    Marc Vignal 18. A msica inglesa depois de Cromwell: Henry Purcell 399

    Jean-Franois Labi

    Quarta Parte

    A PRIMEIRA METADE DO SCULO XVIII 409 19. Situao scio-histrica da msica no sculo XVIII 411

    Ivo Supicic

    Sumrio vii

    20. Antonio Vivaldi (1678-1741) 423 Ivo Supicic

    21. Domenico Scarlatti e a msica instrumental italiana 433 Stphane Golet

    22. A msica vocal italiana de Pergolesi a Cimarosa 441 Jean-Fanois Labie

    23. Johann Sebastian Bach (1685-1750) 453 Philippe Beaussant

    24. Georg Friedrich Haendel (1685-1759) 477 Jean-Franois Labie

    25. Jean-PhiHppe Rameau (1683-1764) 493 Philippe Beaussant

    26. A Querelle des Boujfons 501 Stphane Golet

    Quinta Parte

    O SCULO XVIII: SEGUNDA METADE 507

    27. O nascimento de uma nova linguagem musical 509 Marc Vignal

    28. A formao de um novo pblico e suas conseqncias musicais 513 Marc Vignal

    29. As novas correntes musicais de 1750 a 1780 525 Marc Vignal

    30. Caracterizao do "classicismo" vienense 545 Marc Vignal

    31. Joseph Haydn (1732-1809) 557 Marc Vignal

    32. Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791) 567 Brigitte e Jean Massin

    33. A msica da Revoluo Francesa 583 Grard Gefen

    Sexta Parte

    NO LIMIAR DO SCULO XIX 597

    34. Ludwig van Beethoven (1770-1827) 599 Jean Massin

    35. Weber e seus contemporneos germnicos 623 Brigitte Massin

  • vi Histria da msica ocidental

    36. Franz Schubert (1797-1828) 631 Brigitte Massin

    37. A pera italiana de Cherubini a Rossini 647 Jean-Franois Labi

    Stima Parte

    OS FILHOS DO SCULO 659 38. Situao scio-histrica da msica no sculo XIX 661

    Ivo Supicic 39. A pera italiana: Donizetti, Bellini, Verdi 673

    Jean-Franois Labi 40. A msica francesa: o reinado de Eugne Scribe 689

    Stphane Goldet 41. Hector Berlioz (1803-1869) 699

    Brigitte Massin 42. Felix Mendelssohn (1809-1847) 713

    Brigitte Massin 43. Robert Schumann (1810-1856) 721

    Brigitte Massin 44. Frdric Chopin (1810-1849) 737

    Dominique Bosseur 45. Franz Liszt (1811-1886) 745

    Dominique Bosseur 46. Richard Wagner (1813-1883) 757

    Dominique Bosseur

    Oitava Parte

    A SEGUNDA METADE DO SCULO XLX 771 47. Viena, da valsa opereta 773

    Stphane Goldet 48. Anton Bruckner (1824-1896) 777

    Marc Vignal 49. Johannes Brahms (1833-1897) 783

    Stphane Goldet 50. A msica francesa: Offenbach, Gounod e Bizet 793

    Stphane Goldet 51. Csar Franck, os "franckistas" e Chabrier 805

    Grard Gefen

    Sumrio 1X1

    52. A msica russa: de Glinka ao "Grupo dos Cinco" 819 Michle Reverdy

    53. Modest Mussorgski (1839-1881) 825 Michle Reverdy

    54. Piotr Tchaikovski ( 1840-1893) 831 Michle Reverdy

    55. A msica tcheca: Smetana, Dvork 837 Michle Reverdy

    56. Grieg e os msicos escandinavos 843 Stphane Goldet

    Nona Parte

    A VIRADA DO SCULO XX 847 57. Hugo Wolf (1860-1903) 849

    Stphane Goldet 58. Gustav Mahler (1860-1911) 857

    Marc Vignal 59. Richard Strauss (1864-1949) 869

    Stphane Goldet 60. Dois antigos e um moderno: Reger, Pfitzner, Busoni 879

    Stphane Goldet 61. A pera italiana: depois de Verdi, Puccini 885

    Jean-Franois Labi 62. Scriabin e seus contemporneos russos 895

    Michle Reverdy 63. Jean Sibelius (1865-1957) 901

    Marc Vignal 64. Claude Debussy (1862-1918) 907

    Michle Reverdy 65. Os contemporneos franceses de-Debussy 917

    Michle Reverdy 66. Maurice Ravel (1875-1930) , 925

    Michle Reverdy 67. A msica espanhola: Albeniz, Granados, Manuel de Falla 933

    Michle Reverdy 68. A msica inglesa 939

    Jean-Franois Labi

  • X Historia da msica odental

    Dcima Parte

    A PRIMEIRA METADE DO SCULO X X 945

    69. Erik Satie, o "Grupo dos Seis" 947 Michle Reverdy

    70. Jancek, Martinu, Kodly: a Europa Central 957 Michle Reverdy

    71. Bela Bartk (1881-1945) 963 Michle Reverdy

    72. maneira de prembulo "Escola de Viena": msica atonal, dodecafnica, serial 973 Marc Vignal

    73. Arnold Schnberg (1874-1951) 979 Marc Vignal

    74. Alban Berg (1885-1935) 987 Michle Reverdy

    75. Anton Webern (1883-1945) 995 Jean-Yves Bosseur

    76. A gerao de 1900 na Alemanha 1003 Stphane Goldet

    77. Igor Stravinski (1882-1971).... 1011 Jean-Yves Bosseur

    78. Serguei Prokofiev (1891-1953) 1023 Philippe Olivier

    79. Dimitri Chostakovitch (1906-1975) 1033 Philippe Olivier

    80. Os compositores da Amrica Latina 1043 Michle Reverdy

    81. Charles Ives e seus contemporneos norte-americanos 1047 Jean-Yves Bosseur

    82. Edgar Varse (1883-1965) 1053 Michle Reverdy

    Dcima Primeira Parte

    O JAZZ 1063

    83. Pode-se dizer o que o jazz7. 1065 Jacques B. Hess

    84. Uma poesia pica coletiva: negro spirituals 1071 Jacques B. Hess

    Sumrio

    85. Mscaras e pilhagens: os minstrels 1077 Jacques B. Hess

    86. Um canto de desamparo: o blues 1081 Jacques B. Hess

    87. Uma msica de salo e de saloon: o ragtime 1087 Jacques B. Hess

    88. Das cidades e dos homens: os avatares de uma grande arte 1095 Jacques B. Hess

    89. Revoltas e interrogaes: o free jazz e agora 1105 Jacques B. Hess

    90. Pequena histria do rock'n'roll H H Thierry Chtain

    Dcima Segunda Parte

    A SEGUNDA METADE D O SCULO X X 1123 Brigitte Massin, com contribuies de Jean-Yves Bosseur, Michel Chion, Michle Reverdy e Marc Vignal

    91. Os iniciadores H25 92. A nebulosa de Darmstadt 1143 93. A revoluo eletroacstica 1165 94. O grande ateli europeu H83 95. Os provocadores 1201 96. Prospectiva de um labirinto 1215

    INDICE ONOMSTICO (COMPOSITORES) 1235

  • X I U

    SOBRE OS COLABORADORES

    Philippe Beaussant Diretor do Instituto de Msica e Dana Antigas, musiclogo, autor de obras sobre Couperin, Rameau e Lully, bem como de romances e ensaios; produtor da Radio-France.

    Dominique Bosseur Doutor em Letras, professor-assistente da Universidade da Crsega; com colabo-raes em diversas obras e revistas consagradas esttica contempornea.

    Jean-Yves Bosseur Doutor em Letras, professor-pesquisador do Centre National de Recherches Scientifiques [Centro Nacional de Pesquisas Cientficas], compositor, co-fundador do grupo Intervalles, autor com D. Bosseur de Rvolutions musicales.

    Thierry Chtain Jornalista, colaborador regular da revista Rock and Folk, do Libration e da Anne du Rock.

    Michel Chion Compositor, musiclogo, ensasta, diretor de filmes, crtico da Cahiers du Cinma, antigo membro do Groupe de Recherches Musicales [Grupo de Pesquisas Musi-cais] do INA, autor de diversos livros sobre a msica e o cinema.

    Franoise Ferrand Professor-conferencista da Universidade de Rouen, autor de vrias obras e estudos sobre a poesia lrica, a cano e a esttica musical da Idade Mdia e incio da Re-nascena.

  • xiv Histria da msica odental

    Bernard Gagnepain Professor de histria da msica pr-clssica e de paleografa musical do Conserva-trio Superior de Msica de Paris. Diretor do Seminrio Europeu de Msica An-tiga (Bruges).

    Grard Gefen Escritor, produtor da Radio-France, colaborador das revistas Compact e La Lettre du musicien. Autor de uma obra sobre Wilhelm Furtwangler.

    Stphane Goldet Produtora da France-Musique, colaboradora regular da revista Avant-Scne Opra. Autora de uma obra consagrada a Hugo Wolf e de outra sobre o Quarteto de cor-das no sculo XX.

    Jacques B. Hess Responsvel pelo curso de histria do jazz na UER de Msica e Musicologa de Paris-Sorbonne (Paris-IVe).

    Michel Hugh Conferencista sobre paleografa musical na Sorbonne, diretor da seo de musicologia do Instituto de Textos.

    Jean-Franois Labi Historiador da msica, especialista em historia da arte barroca, produtor da Radio-France, colaborador regular das revistas Avant-Scne Opra e Diapason. Publicou uma importante obra dedicada a Haendel.

    Philippe Olivier Crtico musical do Libration, colaborador da Radio-France, autor de La Musique au quotidien.

    Jean-Pierre Ouvrard Professor da Universidade Franois Rabelais em Tours, autor de muitas obras e artigos sobre a cano francesa polifnica do sculo XVI, colaborador regular ou ocasional de diversos conjuntos e instituies de msica antiga.

    Michle Reverdy Compositora, professora de anlise do Conservatrio Superior Nacional de Msi-ca de Paris, produtora da France-Culture, autora de dois livros sobre a obra de Olivier Messiaen.

    Sobre os colaboradores xv

    Ivan Supicic Presidente da Sociedade Internacional de Musicologa, redator-chefe da Inter-national Review of the Aesthetics and Sociology of Music, professor da Academia Musical de Zagreb e professor-associado da Universidade de Cincias Humanas de Strasbourg.

    Marc Vignal Crtico musical, produtor da France-Musique; autor de livros sobre Mahler e Si-belius, autor de uma importante obra sobre Haydn.

  • X V l l

    PREFCIO

    Por que e para quem? Por que seno para satisfazer uma necessidade que de incio foi nossa (s existe trabalho vlido sob essa condio) e que sabemos ser a necessidade de muitos? A de explorar os oceanos da msica e conhec-los melhor, para neles encontrar ainda mais alegria.

    Uma necessidade de todas as pocas: ter algum dia havido, em milnios, uma sociedade humana sem msica? No entanto, de maneira mais premente, uma ne-cessidade de nossa poca. Por uma razo capital: a arquitetura, a escultura e a pintura requerem o espao como dado primordial de sua existncia; a msica re-quer o tempo. Numa s olhadela podemos apreender a totalidade do quadro mais vasto, ou at do conjunto dos afrescos do teto da Capela Sistina (uma apreenso muito insuficiente, claro, e que pede uma contemplao mais longa, com o exa-me de cada detalhe); mas impossvel que uma s "escutadela" nos fornea a to-talidade da mais breve obra musical que se possa imaginar (um nico som s poderia constituir um fato musical no seio de praias de silncio que o cercassem). "A msica por vezes se apossa de mim como um mar", dizia Baudelaire. Como o mar, ela solicita nosso embarque para uma navegao, de curso mais longo ou mais curto. Qualquer msica (mesmo circular ou repetitiva) exprime, de certo modo, uma histria a que devemos estar atentos do comeo ao fim.

    Essa durao necessria da ateno explica por que, dentre todos os mundos da arte, o mundo da msica no o mais imediatamente fcil de penetrar em profun-didade. Mas, o fato de a msica ser a arte da durao tambm explica, sem dvida, por que seu lugar no pra de crescer, nem pra sua necessidade de se afirmar, num universo em que vivemos cada vez mais em funo do tempo, dos horrios cronometrados e dos relgios de ponto, da durao psicolgica e de uma evoluo

  • xvi Histria da msica ocidental

    acelerada da histria. Pouco a pouco, j se vo cerca de dois sculos, nossos valores se inverteram, passando do absoluto em si para o relativo, que exige outros tipos de perfeio, do ser imutvel para o tornar-se, da fixidez para o movimento, do esttico para o dinmico, da eternidade para a histria. O que cada um de ns atualmente sabe que, mais ainda do que seu corpo, a matria primordial do homem seu tempo. Da nossas angstias e nossas revoltas; da tambm nossas aspiraes e as novas formas de nossas sensualidades, nossas ternuras e nossas alegrias. Da a maior necessidade e a maior presena da msica hoje em dia: a um s tempo, ela exorciza e transfigura nossa obsesso com o tempo que escoa.

    A msica est em nossa vida por toda parte (a ponto de, vez por outra, sua presena superar nossa necessidade, nos lugares pblicos: quanto mais gostamos de msica, mais sentimos necessidade de saborear tambm o silncio). Ela vem solicitar-nos atravs do rdio, da televiso, do cinema, do disco, da fita cassete: uma s exibio da Nona Sinfonia na telinha e um s filme de Bergman sobre A flauta mgica atingem mais ouvintes e conquistam mais apaixonados, talvez, do que 180 anos em todos os teatros de pera e sales de concerto do mundo: o disco ressuscitou para ns centenas de obras-primas, at ento reservadas apenas aos "ratos" de biblioteca e aos ratos propriamente ditos, ou, pelo menos, to-somente ao prazer de uns raros conhecedores. A esse impulso da difuso musical corres-ponde um maior desenvolvimento da atividade e da prtica musicais. Os mal-humorados viviam repetindo que a proliferao do disco fonogrfico e, mais espe-cificamente, a revoluo do long-play condenariam extino a espcie dos instrumentistas no profissionais; foi o contrrio que se constatou. O mesmo acontecer, provavelmente, com o disco a laser e o compact disc.

    Atendo-nos a isso, o atual avano da msica pareceria estar ainda por demais ligado a motivaes socioculturais, se de pronto no acrescentssemos o essencial: a msica uma necessidade do corao e da imaginao e, se principalmente uma necessidade de nossa poca, porque atende ainda mais s necessidades do corao e da imaginao de nossos contemporneos. A funo sacralizadora da msica algo a que os seres humanos da pr-histria j recorriam. Sua funo estimulante, ns a conhecemos desde que existem msicas guerreiras. A funo ertica da msica encontrada nas festas, nos banquetes e nas bodas de todas as pocas e lugares. Quanto sua funo pacificadora, ns a conhecemos desde os antigos mitos de Orfeu, desarmando as divindades infernais com seu canto, e de Davi, tocando para o rei Saul a fim de acalmar seus acessos de melancolia furiosa. Mas o papel desempenhado pela msica em nossa vida vai muito mais longe, quando lhe abrimos nossa mais secreta porta (Beethoven seria o primeiro a pro-clam-lo com plena conscincia): ela a mediadora que nos reconcilia com ns mesmos, nos d acesso quela regio ntima, l no fundo de ns, onde enfim en-contramos nosso eu (consciente e inconsciente, s vezes reconciliados como que por milagre) em plena liberdade.

    Prefcio xix

    Na medida em que nossa civilizao torna-se mais abstrata, mais funcional, mais coletiva, mais programada (por um processo que seria indispensvel aprimo-rar, sob diversos aspectos, mas que seria intil rejeitar, a tal ponto a trajetria global simultaneamente inelutvel e vlida), mais experimentamos a necessidade de multiplicar e aprofundar os recursos de nossa fantasia e de nossa singularidade. Uma das maravilhas da msica que ela o poderoso meio de uma comunho em cujo seio cada um se sente abenoadamente solitrio e nico. A sensualidade de uma clarineta ou de um violoncelo, a respirao meldica de um canto, o inespe-rado de uma modulao imprevisvel que recria toda a luz da paisagem, o surgi-mento de um ritmo que nos arranca do desgaste de nossos cansaos, o brilho sbito de um timbre ou o suntuoso adensamento de uma complexidade harm-nica, que nos revelam que ainda no havamos chegado ao fim de nossa emoo ou nossa alegria como prescindir de tudo isso?

    A msica tem o poder, duplo e singular, de nos desligar de todos os entraves externos e de nos ligar a todo o devir do Universo, atravs de nosso prprio ma-go. Ela no se ope nossa civilizao; permite-nos viver nela na liberdade, que sempre preciso reconquistar, de nossas ternuras e nossos sonhos, nossos desejos e nossos mpetos.

    Ora, paradoxalmente, enquanto se multiplicam de maneira prodigiosa a escuta e at a prtica da msica, muitos de seus amantes, sobretudo entre os apaixonados mais recentes, procuram algum, no raro em vo, a quem se dirigir para melhor conhecer sua histria e suas tcnicas. O excesso de erudio douta os desanima, o excesso de facilidade dos apanhados superficiais os deixa famintos. Eles querem partir para a descoberta, mas com que mapas podem orientar-se para empreender a explorao da regio encantada onde reina essa sereia, a msica, ainda por de-mais desconhecida, embora nos tenha fascinado de passagem? No entanto, quanto mais amamos, mais queremos conhecer, pois pressentimos que, quanto melhor conhecermos, ainda mais profundamente poderemos amar.

    Por isso, esperamos que este trabalho no seja inteiramente intil. "Obra de divulgao?" Sim, se fizerem questo, no sentido que o dicionrio Robert confere a essa frmula: "Adaptar um conjunto de conhecimentos tcnicos de maneira a torn-los acessveis ao leitor no especializado." Mas no esconderemos nossa repulsa por tal expresso e pelo ar de condescendncia com que ela acompa-nhada, quando articulada por bocas elitistas: em "divulgao" persiste o "vulgo", "essa palavra que a lngua francesa nos fornece, com tanta felicidade, para expri-mir aquela multido dotada de inmeras lnguas e pouqussimas cabeas" (d'Alembert). Pois ento, deixemos esse termo para os tcnicos culturais que lanam um olhar de cima para baixo sobre a pobre humanidade. No trabalha-mos para o vulgo, mas para o pblico mais valioso que h: os que tm fome e sede de conhecer e de amar.

  • X X Historia da msica ocidental

    Por que e para quem? perguntvamos no comeo. Desde que destinamos nosso primeiro trabalho em comum aos "beethovemanos leigos" j se vo hoje trinta anos , nenhum de ns dois parou de trabalhar na mesma direo. Tanto melhor se, nesse percurso, alguns especialistas tambm puderam encontrar do que se alimentar; quanto a esse aspecto, a competncia e a qualidade de nossos colabo-radores parecem-nos garantir ainda melhor essas provises. Mas trata-se, antes de mais nada, de nos preocuparmos com os "pees da msica" e de no nos dirigir-mos primordialmente aos grandes cavaleiros da equitao musical. Queremos ajudar cada um a encontrar as chaves que lhe permitam entrar em sua casa e sen-tir-se enfim vontade dentro da msica.

    A quem Franz Schubert optou por dedicar seu Trio em mi bemol? "Aos que nele encontrarem prazer." Que nos permitam oferecer esta Histria da msica ociden-tal, antes de mais nada, aos que nela encontrarem o caminho de sua alegria.

    Uma Histria da msica ocidental. Por que ocidental? Esse adjetivo, natural-mente, no esconde nenhuma segunda inteno poltica ou ideolgica. Se houvs-semos interrompido essa histria no sculo XIX, teramos falado de msica euro-pia; no sculo XX, porm, a prpria msica europia tornou-se inseparvel das influncias que vieram estimul-la de alm-mar, tanto do jazz quanto de um Charles Ives ou um John Cage.

    Outras interaes se exercem, outras aberturas hoje lhe chegam de muitas das tradies musicais asiticas e africanas. Duas razes nos fizeram decidir no abordar aqui esses estilos musicais magnficos, que nosso etnocentrismo ingnuo teria ou-trera chamado de "exticos" e que hoje aprendemos cada vez mais a admirar e amar.

    A primeira, que j seria suficiente, que as dimenses deste livro bem poderiam duplicar-se em funo disso, alm de se decuplicar o nmero de colaboradores, a tal ponto os trabalhos etnomusicolgicos se particularizam ao se aprofundar.

    A segunda que a maioria dessas tradies musicais apresenta mais uma con-tinuidade do que uma histria, pelo menos at seus contatos (benficos ou mal-ficos?) com a Europa. Ao contrrio, desde os primeiros cnticos cristos at a m-sica eletroacstica, h uma perptua sucesso de combates (no sangrentos, mas amide encarniados) entre um musical "antigo" e um "novo" onde o "novo" nunca demora muito a se tornar o "antigo" de um "novo" mais recente atravs do questionamento terico e da transformao prtica das formas e das intenes da composio e da execuo musicais. Fora da msica "ocidental", dificilmente encontraramos tamanha abundncia, quase permanente, de peripcias to signi-ficativas, de mutaes ou at de revolues, que, cada qual a seu turno, originaram obras que impuseram a admirao por sua originalidade ainda indita, e no por sua fidelidade ao venerado ensino dos mestres. Uma histria s possvel onde a investigao de uma mudana que se pretende um progresso vence uma tradio que se pretende imemorial.

    Prefcio xxi

    Um ltimo limite a esclarecer: comum convencionar-se que a "histria" su-cede "proto-histria" a ser datada do surgimento de textos escritos. Por isso que no se falar aqui da msica hebraica, da grega e da romana, embora elas estejam nas origens da msica medieval. Pedimos ao leitor, com muita insistncia, que no tome esse silncio como um indcio de desprezo: os celtas no tinham literatura escrita quando os latinos j a possuam, mas ningum jamais nos far dizer que a civilizao gaulesa era inferior romana!

    Se a geografia no lhe oferecesse a encarnao indispensvel, no haveria his-tria, mas to-somente uma idia platnica ou uma fico romanceada da hist-ria. Em contrapartida, o curso da histria impe geografia inmeras modifica-es, que vo desde o cultivo do solo at a urbanizao e, vez por outra, ao prprio traado dos cursos d'gua e do litoral. Do mesmo modo, retraar a histria da msica exige que falemos daquilo que a condiciona intrnsecamente: seus instru-mentos (dentre os quais a voz no o menos significativo), suas combinaes funcionais (como o solfejo), suas tcnicas, suas formas e seus gneros: em suma, sua gramtica e seu vocabulrio. Pois a msica uma linguagem, e todos os que se servem dela a entendem assim. "A lngua que falo compreendida no mundo in-teiro", disse orgulhosamente Haydn a Mozart.

    Posto que queramos oferecer este livro, antes de mais nada, aos amantes "lei-gos" da msica, fizemos com que a histria propriamente dita fosse precedida de um lxico musical comentado, mais ou menos como se faz a "entrega das chaves" de uma fbrica a seu destinatrio. O leitor, sobretudo se s tiver abordado a m-sica atravs dos discos e do rdio, talvez no o julgue intil, por nele encontrar prontamente a definio e a explicao dos termos tcnicos mais correntes e mais indispensveis. Ao longo dos captulos seguintes, os outros termos tcnicos que surgirem (muitas vezes em relao a um perodo histrico mais restrito, como a Idade Mdia, por exemplo) sero explicados e definidos quando de sua primeira meno.

    Tal como a da arquitetura, das artes plsticas ou da literatura, a histria da msica indissocivel da histria geral. Da histria poltica e, mais ainda, da so-cioeconmica, cultural e religiosa. Que a histria da msica seja indissocivel dela, entretanto, no significa que lhe esteja subordinada. Tal como a linguagem e as outras artes, a msica perderia qualquer valor especfico, qualquer importncia intrnseca, se fosse considerada como a superestrutura de tais ou quais infra-estru-turas. Um rio s obedece a suas prprias leis, mas determina seu curso em funo das configuraes e relevos que encontra. Assim, se ignorssemos tudo o que diz respeito ao luteranismo, um certo aspecto musical de Bach nos escaparia; desco-nhecendo tudo sobre a ascenso da burguesia no fim do sculo XVIII, a nova lin-guagem musical de Haydn, Mozart, Beethoven e Schubert se nos tornaria parcial-mente inexplicvel; ao ignorarmos tudo sobre o impulso romntico da poesia, as

  • xxii Histria da msica ocidental

    intenes expressivas de Berlioz, Schumann, Liszt e at j as de Beethoven e Schubert permaneceriam inacessveis.

    Demos, portanto, muita importncia ao esclarecimento das sucessivas situa-es scio-histricas da msica atravs dos sculos, quer em captulos especiais, quer no correr dos outros captulos. Fizemos tanto maior questo de insistir nes-sas ligaes quanto mais elas nos fazem apreender melhor a realidade humana da msica. Na teologia dos clrigos da Idade Mdia, a msica primordial era a dos anjos: ao 1er os comentrios extasiados de algumas pessoas sobre o "angelical" Mozart, tem-se a impresso de ainda estar nessa poca. No entanto, a msica no nos cai do cu nem de sabe-se l que inspirao quase divina e desencarnada. Ela feita por seres humanos que vivem sua vida, e que inventam ou executam com-posies no cerne de uma histria em que se acham imersos, querendo ou no, e da qual somente sua genialidade (ou seu talento, pelo menos) consegue emergir, a ponto de nos atingir atravs das eras. Sempre tendemos, com facilidade, a esque-cer a ganga de suores e cansaos, muitas vezes de decepes e humilhaes, de incompreenses e tambm de encontros fraternos, em cujo bojo se formam os diamantes da msica. Por isso que, se um ttulo excessivamente longo no trou-xesse o risco de ser um desservio difuso de nosso trabalho, teramos preferido intitular este livro de Histria da msica ocidental e de seus msicos.

    "No sei escrever poemas: no sou poeta", escreveu Mozart a seu pai. "No sei dispor minhas frases de um modo to artstico que elas disseminem alternada-mente sombra e luz: no sou pintor. No sei exprimir com gestos e pantomimas minhas idias e meus sentimentos: no sou bailarino. Mas sei faz-lo atravs dos sons: sou msico." E Beethoven: "O que trago no corao precisa sair, e por isso que escrevo!" Ou ainda, a propsito de sua Missa Solemnis: "Vinda do corao, que ela chegue ao corao!"

    As idias e sentimentos que Mozart exprime atravs dos sons no so as idias e os sentimentos de Bach; o que Beethoven traz no corao e que precisa sair no se encontra no corao de Haydn. Quando se fala em expressivo fala-se, necessaria-mente, em individual, e se o faz mais e mais medida que se acentua a evoluo histrica na qual a arte se distingue progressivamente do artesanato, de um lado, e da cincia, do outro. H que ter um senso esttico muito arcaico para gostar em bloco dos artistas de uma poca inteira ou de toda uma escola, de preferncia a qualquer outra. A galxia da arte constitui-se de tal maneira que nela s importam as primeiras pessoas do singular, podendo ser largadas de mo as obras sem origi-nalidade, repertoriadas pela erudio, mesmo quando o desgaste da memria e a falta de qualquer documentao condenam uma pessoa singular a nos permanecer annima, como o escultor das grandes esttuas da catedral de Naumburg.

    Descobrir a msica e, neste ponto, o adjetivo talvez no seja um excesso: a msica "ocidental" , acima de tudo, reconhecer que cada criador no se parece

    Prefcio xxiii

    com nenhum outro e insubstituvel, quer pelo que nos diz, quer pela maneira como no-lo diz (coisas que, alis, so uma s).

    Posto que a msica no uma entidade abstrata e coletiva, composta e prati-cada por crebros e mos intercambiveis, optamos deliberadamente, nesta hist-ria, por reservar um grande espao vida dos msicos. No simples a relao entre o que, num outro texto, propusemos chamar de "biografia vivida" e "biogra-fia criadora"; isso se liga fortemente aos dados scio-histricos e, de maneira ainda mais intensa, s fantasias do inconsciente; mas, seja qual for essa complexidade, parece-nos impossvel amar a msica, isto , amar os msicos, sem nada querer saber de sua vida e suas personalidades humanas globais. Ou seja, a importncia aqui atribuda s biografias no imputvel preocupao de distrair o leitor frivolo ou cansado.

    Por certo haver outros leitores, mais resistentes e mais vorazes, que lamenta-ro no encontrar nas pginas seguintes certos nomes, certas listas de obras e cer-tos esclarecimentos instrumentais ou tcnicos. Nossa primeira resposta que os limites necessrios de um livro j volumoso exigiam escolhas: porventura causar surpresa, numa "histria da literatura ocidental" do mesmo calibre, que no sejam mencionados, ou que sejam simplesmente citados de passagem, autores notrios como Jean-Baptiste Rousseau, tido como o maior poeta do sculo XVIII, Victor de Laprade, que cedo pertenceu Academia, enquanto Baudelaire e Nerval nunca fizeram parte dela, ou mesmo Sully Prudhomme, que recebeu um dos primeiros prmios Nobel de literatura?

    Insistimos, todavia, sobretudo num ponto: uma "histria" no pode e nem pretende ser um "dicionrio" ou uma "enciclopdia". Felizmente, no faltam enci-clopdias nem dicionrios de msica, alguns recentes e excelentes seno exaus-tivos, ao menos tendendo assintoticamente exaustividade. Se muitos de nossos leitores se descobrirem com o apetite aberto para neles ir buscar informaes com-plementares, ns nos felicitaremos por isso, como uma prova de que nosso traba-lho no foi em vo.

    A verdade que temos conscincia das orientaes e inflexes subjetivas que demos a este livro, ao conceber sua arquitetura, calcular as propores de suas partes e organizar a sucesso de seus captulos. Ao se proporem um objetivo an-logo, outros organizadores poderiam, com igual legitimidade, conceber outros i t i -nerrios, calcular outras propores e sublinhar outras etapas privilegiadas; reser-var duas vezes mais pginas para Donizetti ou Saint-Sans, por exemplo, e duas vezes menos para Schubert ou Varse. Esta Histria leva nossa marca; reivindica-mos nossa responsabilidade e no nos declaramos culpados.

    Do mesmo modo, fazemos ainda mais questo de reivindicar a escolha e subli-nhar a importncia da participao dos colaboradores que nos deram a honra e a amizade de nos conceder seu concurso. Elogi-los seria por demais pretensioso de

  • xxiv Histria da msica odental

    nossa parte: a qualidade de seus textos parece-nos bastar para isso, mais ainda do que a eminncia de seus ttulos.

    Foi de propsito que os desejamos numerosos e quisemos que suas contribui-es fossem, muitas vezes, mais considerveis que a nossa. No apenas para garan-tir por toda parte o mais alto nvel de competncia. No apenas para evitar, em tantas pginas, a monotonia de uma mesma escrita. Mas tambm para que nossa inevitvel subjetividade fosse temperada pela multiplicidade da subjetividade de-les: a imparcialidade de todos nunca pode ser assegurada seno pelas parcialidades sustentadas de cada um.

    Para haver sucesso e coerncia nesse tipo de jogo em equipe, era preciso, claro, zelar pelas articulaes entre os captulos e os ajustes dos acrscimos, dos esclarecimentos ou das aluses. Agradecemos vivamente a todos por se haverem prestado a isso de to bom grado. Mas era igualmente preciso zelar para que mui-tos pudessem falar de tal ou qual aspecto, cada um dentro de sua perspectiva pr-pria: diversas perspectivas de uma mesma esttua ou um mesmo edifcio, vistos por diferentes ngulos, no se contradizem, mas se completam. E o que nos im-portava mais do que tudo era que, ao trmino da montagem, todos se sentissem na completa liberdade de serem senhores dos textos por eles assumidos atravs de sua assinatura.

    "Uma obra-prima hospitaleira", dizia Victor Hugo: "Nela entro tirando o cha-pu, e acho belo o rosto de meu anfitrio." Todo o nosso esforo comum consistiu em balizar percursos, dispor esclarecimentos, desbastar acessos a essa hospitalida-de inmera, para que, entre tantas acolhidas oferecidas, cada um encontre as ami-zades e at os amores que lhe daro mais alegria de viver. A maravilha da msica que amamos est em que, por toda parte, em nosso trabalho, nossos trajetos e nossos sonhos num leito de hospital, que seja, e at entre os muros de um crcere , sempre podemos ouvi-la cantar no fundo do corao.

    BRIGITTE e JEAN MASSIN

    LXICO MUSICAL EXPLICATIVO

  • 3

    OS INSTRUMENTOS, A ORQUESTRA, AS VOZES

    OS INSTRUMENTOS DE SOPRO

    Neste tipo de instrumento, o som resulta da vibrao da coluna de ar contida em um tubo. Trs fatores intervm: o comprimento do tubo, a forma interior (ou "furo") do tubo e a produo do som.

    COMPRIMENTO DO TUBO A vibrao do ar contido em toda a extenso do tubo produz um som denomina-do "fundamental". Quando se modifica o comprimento do tubo, so obtidos sons de alturas diferentes, o que se faz com recurso a diversos procedimentos: Justaposio de tubos de diferentes comprimentos (flauta de P, rgo). Abertura de orifcios ao longo do tubo: quando todos os orificios esto tapados,

    o tubo produz o som "fundamental"; cada orifcio aberto ao longo do tubo, de alto a baixo, equivale a um encurtamento deste.

    Vara (trombone): quando puxada, o tubo alongado; quando recolhida, reduz-se o tamanho deste.

    Pistes: sistema complexo de derivaes que permite a passagem do ar por redes de circuitos de maior ou menor comprimento (trmpete, trompa).

    "FURO" Cnico (obo). Cilndrico (flauta).

    O comportamento da coluna de ar contida no tubo varia de acordo com a for-ma interior do mesmo. O enrolamento do tubo sobre si mesmo no tem qualquer influncia sobre o efeito vibratrio.

  • 4 Lxico musical explicativo

    PRODUO DO SOM Talvez seja o mais importante dos trs fatores; o que determina o "timbre" do instrumento. A vibrao do ar no tubo produzida quando o ar que o instrumen-tista expira entra em choque contra um obstculo. Desde as origens dos instrumen-tos de sopro, este fenmeno sempre foi produzido de trs maneiras, com variantes:

    1.0 bisel: o jato de ar expirado bate contra uma fenda talhada em bisel, a se rompe e separa-se em dois. (No o bisel que vibra, mas apenas o ar que contra ele se choca.) H duas variantes, que determinam dois tipos de flautas: a ponta (flauta vertical ou flauta doce, charamela, diversos tipos de tubo de rgo); a embocadura (flauta transversal ou transversa: neste instrumento, os lbios

    do excutante dirigem o jato de ar sobre a borda do orifcio feito no tubo).

    2. A palheta: constituda por uma lmina feita da madeira de cana, que se pe a vibrar sob o efeito do ar expirado. A palheta pode ser: simples, fixada a uma ponta (clarineta); dupla, feita de duas lminas, fixadas contiguamente e que vibram uma contra

    a outra (obo).

    3. A embocadura: um pequeno bocal, geralmente metlico, sobre o qual se apli-cam os lbios do instrumentista (trompa, trmpete). Neste caso, so os prprios lbios que fazem o papel de uma palheta dupla.

    FURO TUBO PRODUO DO SOM

    cni

    co

    ciln

    dric

    o

    orifi

    cios

    pist

    es

    >

    PALHETA bi

    sel

    embo

    cadu

    ra

    cni

    co

    ciln

    dric

    o

    orifi

    cios

    pist

    es

    > simpl

    es

    dupl

    a

    bise

    l

    embo

    cadu

    ra

    Flauta X X X Obo Come ingls X X X Fagote Clarineta X X X Saxofone X X X Trmpete X X 1 X X Trompa X X 1 X X Trombone X X 1 X X Tuba X X X Corneto X X X Trompa de caa X X 1

    Trmpete natural X X 1

    O trmpete, a trompa e o trombone tm, em quase toda a extenso de seu comprimento, a forma de um cilindro, que se abre progressivamente at o "pavilho".

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 5

    Famlia das flautas

    Flauta. Em francs, flte; em italiano/Zawto; em ingls, flute; em alemo Flte. Ins-trumento de tubo cilndrico, perfurado por vrios orifcios, em que a vibrao do som obtida por um "bisel". H duas famlias, conforme seja o tipo do bisel.

    Flauta doce. Flauta inglesa, flauta vertical; em francs, flte bec; em ingls, recor-der, em alemo, Blockflte. O som produzido por uma ponta provida de um diminuto orifcio que dirige o fio de ar para o bisel, como num apito. As mais antigas flautas desse tipo remontam ao Magdaleniano (10000 a.C). Da Idade M-dia at o comeo do sculo XVIII, as flautas doces, sempre de madeira, gozaram de grande popularidade. A literatura para a flauta doce muito rica at o incio do sculo XVIII, poca em que o instrumento comea a ofuscar-se diante da flauta transversa. A famlia das flautas doces inclui flautas baixo, tenor, alto, soprano e sopranino, todas com oito orifcios.

    Flauta transversa ou transversal. Flauta alem; em francs, flte traversire; em alemo, Querflte. O som produzido pelos lbios do flautista, que dirigem o jato de ar na direo de um orifcio feito lateralmente no tubo, que serve de emboca-dura; o instrumento deve ser colocado transversalmente boca do instrumentista e mantido em posio horizontal, e disso lhe vem o nome. Flautas deste tipo po-dem ser vistas em alguns baixos-relevos indianos que datam aproximadamente do sculo II a.C. Menos utilizada que a flauta doce durante a Idade Mdia e o Renas-cimento, a flauta transversa ou transversal desenvolveu-se sobretudo a partir do sculo XVII, e no sculo XVIII praticamente eliminou sua rival. Os primeiros aper-feioamentos da flauta transversa devem-se famlia Hotteterre (ca. 1700). Aos poucos, foi-lhe sendo acrescentada uma srie de chaves. Do incio do sculo XTX em diante, as flautas transversas passaram a ser feitas de metal (mas continuaram fazendo parte da famlia das "madeiras"!) e foram munidas de chaves e anis que facilitam o dedilhado. Theobald Bhm foi, por volta de 1830, o grande arteso responsvel pela metamorfose deste instrumento, que , entre todos os outros, a um s tempo o mais antigo e o que mais transformaes sofreu em sua estrutura. (Veremos adiante que, ao contrrio da flauta, o violino, por exemplo, um instru-mento que h sculos se mantm imutvel.) O sistema de Bhm foi, mais tarde, adaptado a outros instrumentos, particularmente ao obo.

    A flauta possui uma sonoridade doce e redonda, ampla no registro grave, pura no mdio, luminosa no agudo. o mais gil dos instrumentos de sopro.

    Flautim ou piccolo. Tem a metade do tamanho da flauta de concerto e toca uma oitava acima desta, com sonoridade radiosa e penetrante. o mais agudo dos ins-trumentos de sopro e, ao tocar fortissimo, pode dominar toda a orquestra. Seu nome completo em italiano flauto piccolo (pequena flauta), sendo designado, nessa lngua, apenas como piccolo ou como ottavino.

  • 6 Lxico musical explicativo

    Siringe ou Flauta de P. Em francs, syrinx. a flauta de P da Grcia antiga, cons-tituda em geral por nove tubos, desiguais em comprimento, unidos uns aos ou-tros e justapostos horizontalmente em ordem decrescente por tamanho. tam-bm chamada de flauta mstica ou flauta pastoril.

    Flajol. Em francs, flageolet. Pequena flauta doce, com quatro orifcios aparte da frente e dois na de trs, para os polegares.

    Famlia dos obos

    Obo. Em francs, hautbois; em italiano, oboe; em ingls, oboe; em alemo, Hoboe. Instrumento de palheta dupla, com tubo cnico provido de orifcios. muito antigo, conhecido em todo o Oriente, na frica e na Antigidade grega. Na Idade Mdia, o obo recebeu na Frana os nomes de chalumeau (charumela), chalemie, douaine (dulcina) e bombarde (bombarda). A bombarda bret (bombarde bre-tonne) , pode-se dizer, prima do obo. Foi na Frana que este instrumento se desenvolveu e aperfeioou-se: por isso, tomou na Europa o nome francs de haut-bois ("madeira alta", literalmente), por oposio a grosbois, instrumento grave da mesma famlia e ancestral do fagote. Como sucedeu com a flauta, foi um membro da famlia Hotteterre que, por volta de 1700, aperfeioou o obo e lhe deu suas caractersticas modernas; contudo, em meados do sculo XIX, esse instrumento recebeu, adaptados, certos elementos do mecanismo que Bhm concebera para a flauta.

    O obo um instrumento essencialmente meldico: menos gil que a flauta, tem um carter pastoril, por vezes melanclico, mas sabe ser tambm agreste e jovial. O timbre do obo impe-se a qualquer massa sonora de que ele faa parte.

    Corne ingls. Em ingls, English horn; em alemo Englisches Horn e, s vezes, Alto-boe; em italiano, corno inglese. A antiga designao francesa deste instrumento, hautbois de chasse (ou oboe da caccia em italiano, que daria em portugus "obo de caa"), era mais exata. O nome atual, traduzido do francs cor anglais (literalmente trompa inglesa), ilude: o instrumento nada tem a ver com a trompa. O corne ingls um obo grave, por sinal absolutamente semelhante em aspecto ao obo comum. mais longo (um metro em vez de sessenta centmetros) e termina com uma campana ou pavilho em forma de bulbo. A sonoridade do corne ingls doce, nostlgica, um tanto velada e muito expressiva. Com palheta dupla e registro uma quinta abaixo do obo, um parente do corne ingls o obo tenor (em francs, taille), muito usado em msica militar no passado. Esse tipo de obo grave foi fabricado na Inglaterra at o sculo XVIII com o nome de Vaux humane (do latim vox humana).

    Obo de amor ou oboe d'amore. Em francs, hautbois d'amour; em alemo, Liebes-oboe; em italiano e ingls, oboe d'amore. Instrumento intermedirio entre o obo

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 1

    e o corne ingls, utilizado no sculo XVIII. Com relao origem de seu nome, cf. mais adiante viola d'amore.

    Fagote. Em alemo, Fagott, em italiano, fagotto; em francs antigo, fagot, atualmen-te em francs basson; em ingls, bassoon. Instrumento de palheta dupla, com tubo cnico, que o baixo da famlia dos obos e, de modo geral, do conjunto das madeiras. O fagote deve seu nome ao comprimento de seu tubo (mais de dois metros). O tamanho levou os fabricantes a dobr-lo, o que fez com que ele tomas-se a forma de duas toras de madeira abraadas formando um fagot, que em francs significa feixe de lenha. Anteriormente, o fagote chamou-se, em francs, grosbois ("madeira grave") por oposio a hautbois ("madeira alta"). O fagote desenvolveu-se durante o sculo XVII, quando se tornou, juntamente com o obo, parte inte-grante da orquestra. A sonoridade do fagote poderosa, cheia, sobretudo no grave, bem timbrada, mais velada nos registros mdio e agudo. um admirvel baixo para o ensemble da famlia das madeiras, mas pode tambm mostrar-se encanta-doramente melanclico em solos.

    Contrafagote. Em francs, contrebasson; em italiano, contra fagotto; em ingls, dou-ble bassoon; em alemo, Kontra fagott. Instrumento de palheta dupla e furo cnico. Soa na oitava grave do fagote e faz, com relao a este, o papel que tem o contra-baixo em relao ao violoncelo.

    Cromorno. 1. Em francs, cromme; em alemo Krumhorn, em italiano, sforta. Ins-trumento de palheta dupla, parente do obo, bastante utilizado at o sculo XVII. A palheta vinha encerrada numa caixa em que o excutante soprava. O nome cro-morno prende-se ao fato do tubo deste instrumento ter sua parte inferior recurva (em ingls antigo, crump-horn, ou seja, trompa retorcida, literalmente). Os cro-mornos, de timbre suave e anasalado, formavam uma famlia que ia do soprano ao baixo. 2. Registro de rgo, cujo nome deriva do instrumento acima e que foi utilizado do sculo XVI ao sculo XVIII.

    Clarineta ou clarinete

    Instrumento de palheta simples e furo cilndrico, cuja origem pode ser atestada desde 2000 anos a.C. no Egito, nas ndias, em todo o mundo rabe e na Grcia, onde era conhecido por aulos. Na Idade Mdia, denominado charamela ou pelo nome francs chalumeau, tinha a palheta encerrada numa caixa onde o excutante soprava (cf. cromorno). Contrariamente flauta e ao obo, a clarineta s comeou a desenvolver-se a partir da metade do sculo XVIII e foi pouco usada at essa data.1 Por volta de 1700, um alemo de Nuremberg, de nome Johan Christoph

    Parecida com a clarineta, a salmoa foi um instrumento mais usado que ela antes que Derner a aperfeioasse.

  • 8 Lxico musical explicativo

    Derner, ao pr a palheta diretamente em contato com a ponta, suprimindo a caixa que a encerrava, criou de fato o instrumento. Vivaldi e Rameau figuram como inovadores, pois foram os primeiros a utilizar a clarineta em sua nova forma. No final do sculo XVIII, j aperfeioada, a clarineta ganhou de Mozart seus foros de nobreza e, no sculo XIX, o mecanismo concebido por Bhm para a flauta foi a ela adaptado.

    A clarineta o instrumento que possui maior extenso entre as "madeiras". As particularidades de sua concepo fazem com que tenha uma srie de registros especiais e que sua sonoridade altere-se sensivelmente com a altura do som (tessi-tura): charamela (grave), sonoro e caloroso; mdio, menos doce, mais desagrad-vel; clarino, luminoso; agudo, brilhante; superagudo, incisivo.

    O nome clarineta resulta da sonoridade de seu terceiro registro, que fazia lem-brar a de um pequeno trmpete, o clarino, instrumento de nome italiano usado no sculo XVIII, no tempo em que a clarineta estava sendo inventada.

    A famlia das clarinetas compreende, alm da clarineta comum: no registro agudo, a pequena clarineta ou requinta, e no registro grave, a clarineta alto, a clari-neta baixo ou clarone, e a clarineta contrabaixo, todas essas trs com forma seme-lhante de um saxofone. H ainda o cor de basset (em francs), corno di basseto (em italiano) ou Bassethorn (em alemo), surgido na Baviera em torno de 1770; este ltimo, pouco empregado hoje em dia, foi usado com freqncia por Mozart, que demonstrou especial predileo por ele, principalmente em suas obras ma-nicas, e dele se valeu at em seu Requiem.

    A clarineta um instrumento transpositor. Chamam-se assim os instrumentos que, por motivos histricos, fazem soar suas notas diferentemente das que esto escritas na partitura, ou seja, a nota natural e geradora do instrumento soa como o d notado, que valer como uma referncia para todas as demais. Desde Schn-berg, Prokofiev e outros, a tendncia que prevalece atualmente a de, cada vez mais, escrever os sons tais como so percebidos pelo ouvido.

    Saxofone

    Instrumento de palheta simples, furo cnico e construo metlica, o saxofone foi criado pelo belga Adolphe Sax em tomo de 1840. Por sua palheta simples, ele se assemelha clarineta, e pelo furo cnico, ao obo, mas o resultado sonoro nada tem a ver com o de qualquer desses dois. Utilizado por Rossini e Berlioz desde sua criao, somente na Frana o saxofone ganhou lugar nas orquestras, pelo menos at o incio do sculo XX. Mais tarde, a partir de 1920, tornou-se um dos principais instrumentos sofistas da msica de jazz. A sonoridade do saxofone clara e cheia, e sua agilidade pode mostrar-se extraordinria.

    H uma famlia completa de saxofones: sopranino, soprano, alto, tenor, barto-no e baixo. um instrumento transpositor.

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 9

    Saxhorne. Instrumento dotado de pistes inventado por Adolphe Sax em 1843; tambm ele constitui uma famlia e deve sua popularidade principalmente s ban-das de msica (orquestras de metais e percusses que tocam ao ar livre) militares e municipais. Em portugus tambm chamado de fliscorne.

    FAMLIA D O S S O P R O S

    A G U D O flautim soprano saxofone

    M D I O flauta obo clarineta saxofone alto

    M D I O G R A V E obo d'amore corne ingls

    Bassethorn ou cor de basset

    saxofone tenor

    B A I X O fagote clarineta baixo saxofone baixo

    Trompa

    Em francs, cor, em italiano, corno; em ingls, horn; em alemo, Horn. Instrumento metlico de furo cilindro-cnico, provido de embocadura e pistes. Como indica o nome que se d em portugus verso primitiva desse instrumento, bem como sua designao em francs e em italiano, a trompa tem sua origem em chifres (cornos) e nas presas de elefante (o poema medieval francs La Chanson de Rolland mencio-na o olifante, trombeta de marfim que os cavaleiros, de modo geral, levavam con-sigo) e nas grandes conchas de que era feita; esses materiais so utilizados ainda hoje, sobretudo no Oriente. Se a flauta sempre foi pastoril ou mgica, a trompa era essencialmente guerreira e aristocrtica (e ainda o na sia). Seja ela de madeira, terracota ou metal, encontrada em todas as civilizaes (o cornu romano), sempre com a mesma forma cnica que traz desde a origem. Para que tivesse um som mais profundo, o tubo sofreu diversos alongamentos. Se a trompa de caa (cor de chasse) fosse desenrolada teria 4,50m de comprimento; com seu tubo tantas e tantas vezes recurvado, ela apareceu por volta de 1600 na Frana.

    Na trompa natural, quando se modifica a presso dos lbios sobre a emboca-dura, obtm-se a srie dos harmnicos naturais, vale dizer, uma escala sonora mui-to imperfeita e muito incompleta. Mas foi desta maneira que a trompa existiu at o sculo XLX. E foi s em 1760 que um trompista inaugurou a tcnica dos "sons fechados", que permitia produzir uma parte dos semitons intermedirios. Para que se pudesse tocar em diferentes tonalidades, passou-se, a partir de 1770, a empregar roscas que alongavam (ou encurtavam) o tubo de acordo com a necessidade. Em 1813, o alemo Stlzel teve a idia de fixar no instrumento pistes que fe-cham ou abrem circuitos de diferentes comprimentos, dotando a trompa de roscas permanentes que lhe permitem abordar todas as notas. Da o nome da trompa moderna: "trompa cromtica de pistes".

  • 10 Lxico musical explicativo

    Alm de todas as facetas ligadas a suas antigas funes (evocaes de caa, de guerra, da floresta e da vida ao ar livre), a trompa tem um vasto campo expressivo nobre, potico e mesmo sonhador bem como um papel preciso na orques-tra, onde refora o registro mdio. um instrumento transpositor.

    Trmpete

    Em ingls trumpet; em francs trompette; em italiano, tromba; em alemo, Trompe-te. Instrumento metlico, com furo cilindro-cnico, munido de embocadura e pis-tes. Tanto a origem do trmpete, como sua estrutura e os problemas que trouxe aos fabricantes so parecidos com os da trompa. Existe desde os mais remotos tempos da Antigidade, na sia, no Egito, na Grcia e em Roma. Como a trompa, est ligado guerra, mas tinha uso mais cerimonial do que esta. No entanto, parece ter sofrido uma eclipse no experimentada pela trompa; s vamos reencontr-lo no Ocidente no sculo XIII, com o nome de "trmpete sarraceno", que faz supor tratar-se de um caso de importao. Reto no incio, tornou-se recurvo no scu-lo XVI e, at o sculo XVIII, participou mais do que a trompa da vida musical, ligado a todas as expresses de glria ou manifestaes do poder. Assim como a trompa, por volta de 1770 o trompet recebeu roscas e, aproximadamente em 1815, ganhou seus pistes, to caractersticos dele que, em portugus, tambm conhecido como pisto, sobretudo na msica popular.

    O trmpete no tem a sonoridade da trompa, mas o brilho uma propriedade sua. Ele gil e pode, melhor do que a trompa, executar toda uma sorte de trina-dos, arpejos e cadncias ornamentais. No entanto, capaz de mostrar grande do-ura quando tocado piano. Tambm um instrumento transpositor.

    Clarino. Pequeno trmpete de nome italiano bastante usado no sculo XVIII, com sonoridade mais aguda, porm mais doce que a do trompet. Foi provavelmente para este instrumento que Bach escreveu o Concerto de Brandenburgo n 2.

    Cometo

    1. Em italiano cornetto; em francs, cornet, em ingls, cometi; em alemo Cornett ou Zink. Instrumento de sopro que esteve em uso at o sculo XVII. Como o obo, tinha furo cnico, tubo com orifcios e era de madeira, mas estava provido de uma embocadura, como um trmpete. Com sonoridade doce e clara, foi o instrumento favorito dos italianos no sculo XVI e no incio do sculo XVII, at o desenvolvi-mento do violino, que o suplantou em seus empregos. Os cornetos estavam agru-pados em famlia, e os mais longos e graves, por lembrarem a forma da serpente, fizeram com que este nome fosse dado ao baixo do cometo. A serpente tambm chamada serpento era usada nas igrejas para dobrar a voz dos baixos e, at o sculo XIX, continuou sendo usada nos meios rurais.

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 11

    2. Registro de rgo: jogo de mutaes compostas que comporta cinco tubos por nota e imita a sonoridade do instrumento acima. O registro, destinado a tocar partes de solo, um dos mais belos do rgo clssico.

    Cometa de pistes. Instrumento provido de embocadura, furo cnico e pistes, que lembra bastante o trmpete, mas distingue-se deste por ter o furo mais grosso, o tubo mais curto e o pavilho maior. A sonoridade, um pouco vulgar, est de acordo com as propores, mas o instrumento gil, de fcil emisso, o que expli-ca sua popularidade em todos os orfees (corais populares mantidos pelas muni-cipalidades ou empresas privadas) no sculo XIX. De certa forma, caiu em desuso.

    Trombone

    Em ingls e italiano, Trompone; em alemo Posaune. Instrumento com embocadu-ra, furo cilindro-cnico e vara, cuja origem semelhante da trompa e do trm-pete. A "pr-histria" deste instrumento pouco difere da do trmpete, e o prprio nome atesta que tm a mesma filiao (tromba, em italiano). Por sinal, o nome alemo do trombone, Posaune, tambm uma deformao de buccina, nome la-tino do trmpete. Quanto ao seu antigo nome francs, sacqueboute (em portugus "sacabuxa"), surgiu de sua semelhana com uma arma de assalto que assim era chamada.

    Na origem, o trombone no passava de uma variante grave do trmpete. Mas, enquanto este ltimo se conservava imutvel, o trombone, com a inveno da vara no sculo XV, recebeu um tipo de aperfeioamento que o ps na dianteira. Da sua importncia em toda a msica polifnica que se fez do sculo XV ao sculo XVII. Johann Sebastian Bach ainda o utilizava para dobrar vozes em seus corais, mas, ao que tudo indica, tratava-se j de um arcasmo. O trombone viria a reaparecer com Mozart, Beethoven, Schubert e os romnticos.

    A vara, formada por duas partes que se encaixam, um recurso que, perrnitin-do facilmente o alongamento ou o encolhimento do tubo, d ao instrumento uma escala cromtica, que se interrompe, porm, no meio do seu registro, pela falta de algumas notas. Mas o manejo da vara mais difcil que o dos pistes que foram acrescentados trompa e ao trmpete no sculo XIX.

    O trombone o instrumento grave dos metais. Sua sonoridade tem um pode-rio e uma majestade que dominam toda a orquestra.

    Tuba

    Tem o mesmo nome em alemo, ingls, italiano e francs. De furo cnico, com embocadura e pistes, este instrumento grave, cujo nome vem do latim tuba (trmpete), apareceu no sculo XIX. Aperfeioado por Sax, o inventor do saxofo-ne, ele se parece com a trompa, mas o furo cnico em toda a extenso do tubo. A execuo da tuba relativamente simples, e seu emprego mais habitual limi-

  • 12 Lxico musical explicativo

    tado quase s ao papel de baixo da famlia dos metais, se bem que suas possibili-dades sejam mais variadas.

    Bugie. Em alemo, Flgelhorn; em ingls, flugel horn; em francs, bugie; em ita-liano, fli corno. Instrumento da famlia da tuba, que atua no registro mdio.

    Cornamusa ou gaita de foles

    Em francs, cornemuse; em ingls, bagpipe; em alemo Sackpfeife; em italiano, cor-namusa, piva ou zampogna. Instrumento de foles, que se destina a ser tocado ao ar livre. constitudo por vrios tubos com palhetas fixados em um saco, em geral feito de pele de carneiro, que armazena o ar. Um dos tubos destina-se ao sopro do excutante, os outros (prima e bordes) servem para produzir os sons diversifica-dos pelo escapamento do ar.

    Museta. Em francs, musette. Instrumento de foles, de origem francesa, pouco di-ferente da cornamusa; o tubo da folaria, com embocadura, foi nele substitudo por um fole que o tocador aciona com a mo direita. Muito em voga nos sculos XVII e XVIII, foi depois suplantado pelo acordeo. Deu o nome musette, dana fran-cesa que freqentemente acompanhava, de carter pastoril, ritmo varivel, sempre em trs partes.

    Regai Em francs, rgale. Instrumento de foles e teclado, espcie de rgo porttil, com palhetas metlicas e batentes, e de sonoridade rouca, que caiu em desuso no incio do sculo XVIII. Emprestou seu nome a um registro de rgo.

    Algumas invenes do incio do sculo XIX

    Acordeo. Em alemo, Akkordeon ou Ziehharmonika; em francs, accordon; em ingls, accordion; em italiano, fisarmnica. Instrumento porttil dotado de fole e palhetas livres metlicas, cuja ventilao, proporcionada pelo fole controlado ma-nualmente, produz sons que so selecionados pelo acionamento de um teclado. Posteriormente, o acordeo passou a ter dois teclados, o do acompanhamento e o do solo. Foi inventado por um austraco de nome Demian, que o patenteou em 1829, depois de muitas pesquisas, realizadas em diferentes pases, entre as quais as do alemo Friedrich L. Buschmann.

    Teve uso mais generalizado na msica popular, mas muitos compositores eru-ditos, entre os quais Jean Wiener, que escreveu um Concerto para acordeo, no desdenharam compor para esse instrumento.

    Harmnica ou gaita de boca. Em francs, alemo e ingls, harmonica. Pequeno instrumento de sopro, provido de palhetas livres metlicas, que se toca com a boca. Foi inventado por Friedrich L. Buschmann em 1828, um ano antes do acordeo.

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 13

    Harmonio ou rgo de sala. Em francs, ingls e alemo, harmonium. rgo de palhetas livres, com um ou dois teclados e pequeno nmero de registros, cuja folaria (se no for eltrico) acionada atravs de pedis. O harmonio foi inventa-do por Alexandre Debain em 1842. Na falta do rgo, um instrumento comum nas igrejas, e pode tambm ser visto em algumas residncias, mas distingue-se fundamentalmente do rgo pela ausncia de tubos.

    O RGO

    Diz-se que o rgo o rei dos instrumentos. Decerto o mais polivalente: a soma de tudo o que se pode fazer com os instrumentos de sopro. Por outro lado, o rgo o resultado mais refinado da combinao da cincia emprica com a engenhosi-dade artesanal. Fica-se perplexo quando se constata que, no fim da Idade Mdia numa poca em que a "mecnica" no existia, em que a cincia acstica estava por nascer, em que o arado ainda era uma ferramenta primitiva, em que nem o papel nem a imprensa sequer tinham sido imaginados, e em que todos os outros instru-mentos de msica estavam em sua infncia , o rgo j possua todas as carac-tersticas que tem hoje, com toda sua complexidade!

    DESCRIO

    Os principais elementos do rgo

    1. Afolara: os pulmes.

    2. Os tubos. No devemos fiar-nos naquilo que vemos: um grande rgo possui, por trs de sua fachada (a mostra) milhares de tubos que medem desde 10,40 me-tros de altura (32 ps) at um centmetro (3/8 de uma polegada). Os tubos acham-se agrupados por famlias, chamadas "registros" ou "jogos", que produzem a exten-so de uma escala cromtica completa.

    3. Os someiros. So um tipo de caixa que fica entre a folaria e os tubos. Os someiros recebem o "vento" (o ar) e o distribuem por canais alongados, ditos gravuras, onde existem furos destinados a receber, em cada um, o p de um tubo. Estes furos, se a tecla no for tocada, ficam fechados por vlvulas (sopapos).

    4. A consola, ou console. a pea que suporta os teclados ou manuais (estes em n-mero de um a cinco, ou, mais habitualmente, dois ou trs) e a pedaleira.

    5. A transmisso: complexo dispositivo mecnico que sai da consola e pe para funcionar trs sries de mecanismos: (a) comandos de registros: ao puxar um "re-gistro" (ou seja, acionar determinado puxador, no console) o organista faz passar o. "vento" pela gravura que corresponde a todos os tubos de uma mesma famlia;

  • 14 Lxico musical explicativo

    (b) comandos que ligam a tecla abertura dos sopapos: quando um "registro" puxado e o ar chega gravura correspondente a uma famlia de tubos, a tecla que for abaixada far "soar" o tubo que corresponde nota escolhida, enquanto os outros tubos permanecem silenciosos; (c) as cpulas dos manuais uns com os ou-tros. A transmisso, feita at o sculo XX por um prodigioso conjunto de pequenas varetas de madeira leve e fios de metal, das partes mais complexas desta fbrica de sons que o rgo. Hoje, feita por transmisso eltrica, o que permite ao organista manter-se a certa distncia dos tubos. Mas a transmisso eltrica, no dizer de alguns, no conserva todas as qualidades da transmisso mecnica.

    Os diferentes jogos

    No que diz respeito produo de sons, vamos reencontrar no rgo as principais caractersticas dos instrumentos de sopro. Os registros ou jogos distinguem-se de acordo com: (a) o modo como so produzidos os sons: tubo de palheta (cf. clari-nete) e tubos flautados ou tubos de boca (cf. flauta doce); (b) a forma dos tubos: cilndricos (largos ou estreitos) e cnicos. Os tubos so geralmente de metal (es-tanto e chumbo), s vezes de madeira.

    Por pertencer o rgo a esferas extremamente conservadoras, continua-se ain-da hoje a medir os tubos em ps e polegadas e a denominar um jogo segundo o comprimento de seu tubo mais alto. Por exemplo: um jogo de 32 ps (10,40m), um jogo de 16 ps, um jogo de 8 ps, um jogo de 4 ps. Um jogo de 8' soa de acordo com a nota escrita; um de 4' soa na oitava acima; um de 16' na oitava abaixo. Assim, se forem puxados os registros de 16' + 8' + 4', sero ouvidas trs oitavas tocadas simultaneamente por uma mesma tecla.

    Os jogos se dividem em trs grandes classes, de caractersticas bem definidas:

    1. Jogos de fundo on fundos do rgo. Tubos de boca de diferentes sries de tama-nho, cujos timbres so diferenciados pela maior ou menor largura do tubo, pelo tamanho da abertura de sua extremidade e por diversos artifcios, como pavi-lhes, "chamins" etc. Os principais jogos de fundo so: (a) montra (grandes tu-bos da fachada), (b) flautas (tubos largos, som doce e arredondado), (c) gambas (tubos estreitos, som mais incisivo) e (d) bordes (tubos fechados, som doce e velado).

    2. Jogos de mistura. Muitos tubos esto associados a uma mesma nota, que, quando tocada, se faz acompanhar por seus harmnicos, de modo a produzir uma sono-ridade mais rica: (a) "cheio" do rgo ou rgo pleno: trs a cinco fileiras de tubos para cada nota, acrescidas aos fundos do rgo, usado para obter-se uma sono-ridade rica, poderosa, brilhante; (b) cmbala: tutti menor que o anterior; (c) corne-ta: registro solista que tem de cinco a dez fileiras de tubos para cada nota e possui uma doce e variada gama sonora.

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 15

    3. Jogos de palheta. So aqueles em que uma lingeta de metal vibra contra uma ponta ou bico no interior do p do tubo. Possuem sonoridade vigorosa, de timbre alto, e podem ser empregados em solos ou como base para um grande tutti: (a) trompet; (b) cromorno; (c) museta.

    A arte do organista consiste, antes de tudo, em saber dosar, na registrao (es-colha dos registros), a afiana ou oposio dos jogos em funo da obra que in-terpreta.

    ETAPAS DA HISTRIA DO RGO

    A flauta de P, a siringe dos gregos e da Amrica do Sul, sugere que, desde os mais remotos tempos, j se pensava em um alinhamento dos tubos, que permitisse uma emisso sucessiva de diferentes sons. No entanto, o rgo de boca, tpico das mon-tanhas do Camboja e do Laos, uma cabaa munida de vrios tubos que soam simultaneamente. Seria esta a origem do rgo ocidental, que nos teria chegado atravs da China? O instrumento mais antigo mencionado na Bblia o rgo, e o primeiro de que h notcia vem do Egito, data do sculo III a.C. tinha folaria hidrulica. Em Bizncio e na parte oriental do Mediterrneo, desde longa data se tocava rgo, enquanto o Ocidente ainda o desconhecia. No sculo VIII, o impe-rador Constantino V ofereceu a Pepino, o Breve, um instrumento que talvez fosse um rgo; posteriormente, Carlos Magno mandou construir um instrumento pa-recido, que teria sido o primeiro rgo ocidental.

    Durante a Idade Mdia, foram usados pequenos rgos positivos ou portteis. A evoluo se fez no sentido do enriquecimento da sonoridade, quando, para cada nota, comeou-se a pr vrias fileiras de tubos para cantar simultaneamente: o aparecimento do tutti. Com a amplido das catedrais, o rgo avantajou-se, che-gando a ter 32 ps j no sculo XIV.

    No Renascimento, a evoluo foi inversa: buscaram-se jogos que fossem capazes de expressar o detalhe: veio a inveno dos someiros de registros, que permitem isolar um ou outro jogo, foram criados os jogos flautados e aprimoradas as palhetas.

    O sculo XVII o primeiro grande sculo do rgo, que alcana ento o seu equilbrio. Os tutti so aperfeioados e os jogos de mistura solistas tornam-se mais puros. Diversas tendncias surgem. Na Frana, o rgo rico de timbres, opondo aos elaborados jogos sofistas o brilho dos "cheios"; seu apogeu se d por volta de 1670-1700. Na Alemanha, prevalece um instrumento no to timbrado, porm mais homogneo e adequado polifonia, j com uma pedaleira mais desenvolvida. A Itlia se mostra mais tmida, com seu rgo ripieno, de um ou dois teclados e sem pedaleira independente. J a Espanha gosta das palhetas brilhantes, e a Ingla-terra segue a Frana.

    No sculo XVIII aperfeioou-se o rgo clssico, sem inovaes. No sculo XIX, o advento do romantismo trouxe profunda transformao. Aos registros claros e

  • 16 Lxico musical explicativo

    bem timbrados prefere-se uma concepo "orquestral", mais fundida, e, em certos casos, o "colossal". a poca do grande fabricante Cavaill-Coll (Notre-Dame de Paris, Saint-Sulpice, Sheffield, Amsterd), mas fato no to auspicioso tambm a poca em que "voltam moda" os rgos clssicos, muitas vezes des-figurados.

    Com o sculo XX, vieram numerosos aperfeioamentos tcnicos (a transmis-so eletropneumtica, por exemplo). Por outro lado, observa-se uma tendncia "neoclssica" bem ntida, restabelecidos os rgos antigos no estado primitivo, sem transformaes.

    Para concluir, preciso ter sempre em mente que cada rgo resulta de uma concepo particular e artesanal, e que no h dois instrumentos exatamente iguais, ainda que tenham sido obra de um mesmo fabricante: os rgos dependem do tamanho do lugar em que esto, de certas tcnicas particulares, do nmero de jogos e do equilbrio destes. Por isso, um organista deve sempre adaptar-se ao ins-trumento que vai tocar, mesmo se for executar as mesmas peas.

    OS INSTRUMENTOS DE CORDAS TANGIDAS

    O ancestral comum dos instrumentos de cordas tangidas parece ser o arco musi-cal. No entanto, na frica que se pode seguir com mais clareza o caminho que leva do arco musical harpa, por um lado, e guitarra, por outro.

    O arco musical encontrado na frica negra: a boca do msico ou uma cabaa serve como ressonador. Vrios arcos fixados numa mesma cabaa poderiam ser vistos como o embrio da harpa, bem como uma cabaa com uma corda distendida sobre ela poderia ser algo equivalente a uma guitarra elementar (monocrdia).

    Harpa

    Em alemo, Harfe; em francs, harpe; em ingls, harp; em italiano, arpa. Desde o terceiro milnio a.C. pode a harpa ser atestada em todo o antigo Oriente, bem como no Egito e na Sumria, ainda na forma de um arco musical de trs a sete cordas. Era o instrumento das mulheres e dos cegos no Egito, onde, no Novo Imprio, j se viam harpas com quatro cordas e medindo dois metros de altura. A harpa do rei hebreu Davi deriva, sem dvida, da harpa egpcia. No muito mais tarde, a forma em arco foi substituda pela forma triangular (Fenicia), que subsis-tiria. Mas o mundo islmico haveria de abandon-la. O Extremo Oriente a igno-rou. E o Ocidente antigo preferiu a lira. A partir da alta Idade Mdia, a har-pa reapareceu no mundo escandinavo, cltico e germnico. Entre os celtas (os primitivos habitantes da Irlanda e do Pas de Gales), a harpa jamais chegou a cair em desuso.

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 17

    A harpa permaneceu at o sculo XVIII como um instrumento secundrio, limitado ao diatonismo, apesar de alguns esforos no sentido de aperfeio-la. A harpa cromtica de pedal, que permite executar sustenidos e bemis, apareceu no fim do sculo XVII, mas seu uso s se difundiu na metade do sculo XVIII. Foi na Frana que tocar harpa se tornou moda (era o instrumento de Maria An-tonieta e de Madame de Genlis, uma virtuose da poca). Foi tambm na Frana que Sbastien rard, por volta de 1800, fez o aperfeioamento definitivo do ins-trumento.

    Teoricamente falando, o sistema da harpa simples: h sete pedis que permi-tem elevar ou abaixar em um semitom cada uma das sete notas da escala, de uma s vez, em todas as oitavas (em todos os ds, todos os rs, etc). Com suas 46 cor-das, a harpa tem extenso de seis oitavas e meia (quase tanto quanto o piano).

    A sonoridade da harpa quente, aveludada, luminosa; os arpejos, que lhe de-vem o nome, assentam-lhe particularmente bem, tanto quanto todas as formas de glissando, o que contribui para seu maior encanto e doura. , ao que se diz, um instrumento feminino... embora "o Harpista" seja um clebre personagem do Wilhelm Meister, de Goethe.

    Lira

    Em italiano lira; em ingls e francs, lyre. Instrumento de cordas tangidas ou de-dilhadas, conhecido em toda a alta Antigidade, na Mesopotamia, no Egito, na Palestina e sobretudo na Grcia, onde adquiriu seu nome. A lira era formada por uma carapaa de tartaruga que funcionava como caixa de ressonncia, de onde partiam dois chifres de cabra unidos por uma travessa. Foi feita primeiramente com sete e, mais tarde, com doze cordas. A mitologia atribui a inveno da lira a Apoio (como acontece com a flauta, cuja origem atribuda ao stiro Mrsias), que a teria transmitido a Orfeu, o qual, por sua vez, teria ensinado os homens a toc-la.

    Alade

    Em ingls, lute; em francs, luth; em italiano, liuto; em espanhol, laud; em alemo, Laute. O alade e a guitarra esto unidos por uma origem comum, por sinal obs-cura. Instrumentos arcaicos do gnero do alade e da guitarra foram encontrados em todos os continentes, mas provvel que fossem mais cultivados na sia (Chi-na e India). No Egito, esto representados nos baixos-relevos do Mdio Imprio. O alade (de fundo abaulado) e a guitarra (de fundo plano) apareceram na Idade Mdia mais ou menos na mesma ocasio, mas s o alade deixa clara sua origem mourisca (al'ud). Contudo, o desenvolvimento da guitarra na Espanha e seu nome medieval (guitarra moresca) parecem indicar a mesma filiao, apesar de observar-se certa conexo com a palavra grega cithare (ctara).

  • 18 Lxico musical explicativo

    O alade, cuja caixa tem a forma de uma pra cortada ao meio, dotado de pares de cordas, que podem ser em nmero de cinco, seis, dez e at quatorze. Foi um dos favoritos entre os instrumentos do Renascimento e do sculo XVII. Sua influncia sobre o desenvolvimento da msica mostrou-se considervel (tomada de conscincia da harmonia, desenvolvimento do canto solista acompanhado, nas-cimento da sute instrumental). A escrita para o alade fazia-se em um tipo espe-cial de notao denominado tablatura. No final do sculo XVII, o alade pouco a pouco entrou em declnio, at que foi suplantado pelo cravo no incio do sculo XVIII.

    A sonoridade do alade doce, cheia, sonhadora. , por excelncia, o instru-mento da msica intimista.

    Tiorba ou arquialade

    um alade de dimenses um pouco maiores, em cujo longo brao se assenta uma dupla srie de cordas: as do alade e outra srie de cordas mais compridas, que permitem a emisso de notas graves. Tais mudanas fizeram-se necessrias por causa do desenvolvimento do baixo contnuo no sculo XVII.

    Guitarrone

    Nome italiano de uma grande tiorba, de brao descomunal (dois metros); uma espcie de alade baixo que permitia acompanhamentos to densos como os do cravo (sculo XVII).

    Mandora ou alaudina

    Em francs, mandore; em italiano, mandola ou pandurina. Pequeno alade.

    Bandolim Em francs, mandoline; em ingls, mandolin; em italiano, mandolino. Instrumento descendente do alade, do qual conservou a forma e as cordas dispostas aos pares, que, no bandolim, so metlicas e tangidas com um plectro. Tambm chamado mandolim ou mandolina, o nico instrumento da famlia do alade que sobre-viveu, especialmente na Itlia, onde bastante popular desde o sculo XVIII. Exis-tem vrios tipos, com pequenas diferenas: bandolim napolitano, bandolim por-tugus, bandolim americano, etc.

    Guitarra ou violo

    Em espanhol, guitarra; em francs, guitare; em ingls, guitar, em italiano, chitarra; em alemo, Gitane. Mais conhecido como violo em Portugal e no Brasil, talvez o principal instrumento da msica popular brasileira. A origem da guitarra pa-

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 19

    recida com a do alade. Mas enquanto este se desenvolveu, principalmente nos sculos XVI e XVII, quando recebeu vrias melhorias, a guitarra conservou-se sem-pre mais simples. No deixou, porm, de ser tocada por grandes msicos dessa poca e foi muito popular em todas as classes sociais {"sitost lev ma guitare je touche", dizia Ronsard).1

    Diferencia-se a guitarra do alade pelo fundo plano, a largura da caixa e suas seis cordas simples. Possui sonoridade mais brilhante, dotada de grande diversi-dade de timbres e expresses, alm de facultar maior velocidade s execues. instrumento muito popular na Espanha, de onde saiu, durante o Renascimento, para difundir-se pela Frana e depois pela Europa. Mas seu repertrio essencial-mente espanhol. Paganini tocava guitarra com a mesma mestria que demonstrava ao violino.

    Vihuela

    Instrumento intermedirio entre o alade e a guitarra, com seis fileiras de cordas duplas. Durante o sculo XVI, antes de ceder lugar guitarra, foi o mais popular dos instrumentos na Espanha.

    OS INSTRUMENTOS DE CORDAS FRICCIONADAS

    O princpio da corda friccionada conhecido h muito tempo em toda a sia e no mundo rabe (rebab). Quanto sua apario no Ocidente, difcil saber-se ao certo: supe-se que no tenha sido posto em prtica na Antigidade greco-roma-na, no Egito ou no antigo Oriente Prximo. Na lenda, a inveno do arco atribu-da a Ravana, rei de Lanka e um dos heris do Ramayana, a clebre e lendria epopia indiana: , em todo caso, provvel que as cordas friccionadas tenham ori-gem asitica.

    Viela e rabeca

    com estes dois nomes que os instrumentos de arco aparecem nas uminuras e esculturas da Idade Mdia e, s vezes, tambm com os nomes de rota (do latim rota) ou giga (do francs gigue).

    A viela em francs, vile ou vielle; em latim medieval vcla; em ingls, tiddle tem o corpo plano, com o brao feito de uma pea presa a este corpo. preciso

    "Logo que me levanto, toco minha guitarra". Poeta renascentista francs do sculo XVI, Pierre de Ronsard (15241585) integrava o grupo dos poetes de La Pliade, com Joachim Du Bellay e cinco outros. Dito "o prncipe dos poetas", Ronsard influenciou significativamente os rumos da msica na Franca em meados do sculo XVI (Cf. adiante, neste livro, Parte II, "A msica no sculo XVI: Europa do Norte, Franca, Itlia e Espanha"). (N. T.)

  • 20 Lxico musical explicativo

    no a confundir com a viela de roda, na qual o arco substitudo por uma roda acionada por uma manivela: este, um instrumento bem mais primitivo, o que tocado pelo Leiermann o tocador de viela de roda , do ciclo de Lieder intitulado Winterreise [Viagem de inverno], de Schubert. A viela era o instrumen-to usado por pessoas de certa educao musical, pertencentes sociedade letrada medieval: abades, cavaleiros, trovadores, etc.

    J a rabeca (rebab, em rabe) em francs rebec, em espanhol, rubebe; em italiano ribecche; em alemo, Heine Geigen um instrumento sem brao, constitudo por uma pea inteiria em forma de pra, com trs ou quatro cordas. De carter popular, sobreviveu por muito tempo nos meios interioranos. Em portugus, o nome rebeca, ou rabeca, designa genericamente os ancestrais me-dievais do violino, mas tambm o instrumento do gnero do violino, mas de timbre mais grave, ainda em uso na msica popular de diversos pases, inclusive o Brasil (congadas, reisados, etc), aproximando-se, neste sentido tambm, do ingls fiddec.

    A famlia das violas

    Em ingls, viol; em alemo Gamba; em francs, viole. A viola um instrumento muito mais evoludo do que os dois ltimos e s apareceu no sculo XV. Trata-se, na verdade, de uma famlia completa:

    Viola de brao (viola da braccio) Descante de viola: espcie de viola sopranino, tem praticamente a mesma tessitu-

    ra do violino (em francs, pardessus de viole) Viola soprano: uma quarta mais baixo que o violino (em francs, dessus de viole) Viola alto: tem a mesma tessitura que a viola de orquestra atual (em francs, alto

    de viole)

    Viola da gamba (viole de gambe) Viola tenor: tessitura a meio-caminho entre a viola atual e o violoncelo (em fran-

    cs, taille de viole)

    Viola baixo: tem a mesma tessitura do violoncelo (em francs, basse de viole)

    Viola contrabaixo ou contrabaixo de viola (violone)

    As trs primeiras violas so tocadas com o instrumento mantido sobre os joe-lhos do msico. As trs outras ficam entre as pernas, sem encostar no cho, me-nos o violone, que se apia no cho. As violas tm seis cordas (na Frana, algu-mas vezes mais); o brao est dividido em trastes, como o da guitarra; o arco empunhado com a mo pelo lado de fora dele e voltada para baixo. Este instru-mento, sobretudo a viola baixo, tem uma sonoridade doce, delicada e extrema-mente sutil. Contou com fervorosos adeptos nos sculos XVII e XVIII; por longo

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 21

    tempo, essas violas foram preferidas ao violino. A famlia das violas freqente-mente era usada em consort (conjunto instrumental), um pouco como um quar-teto de cordas.

    Viola d'amore. Nome italiano de uma viola tenor dotada de seis cordas principais, tocadas com arco, e de outras cordas simpticas que vibram por ressonncia; disto resulta uma sonoridade suave e um tanto misteriosa. O nome lhe vem de sua ori-gem mourisca: deformao de viola da more ("de mouros", em italiano). Por ana-logia, o oboe d'amore, que tem, como a viola d'amore, o registro mediano e uma sonoridade velada, tomou este nome.

    A famlia do violino

    Em ingls, violin; em francs, violon; em italiano, violino; em alemo, Violine ou Geige. O violino apareceu por volta de 1520, mas os mais antigos instrumentos que chegaram at ns datam do fim do sculo XVI. A cincia emprica dos artesos de antigamente motivo de admirao quando se pensa que, aps sculos de pesqui-sa e trabalho que separam o violino assinado por Linardo em 1581 e os de hoje, nada se encontrou que valesse a pena mudar no instrumento: acrescenta-se ou corta-se um centmetro no comprimento, um ou dois milmetros na espessura, melhora-se o verniz e pronto. Qualquer tentativa de inovao mostrou-se intil: a forma, as dimenses, o peso, a estrutura, a montagem (h, no violino, 71 peas coladas) foram fixadas milimtricamente, em seus mnimos detalhes, h quatro sculos.

    Os grandes luthiers que asseguraram a predominncia do violino foram os ar-tesos italianos que viveram no sculo XVII na cidade de Cremona, onde trabalha-ram Andrea Amati e seus filhos, e depois Stradivari (1644-1737) e os sucessores destes ltimos.

    ELEMENTOS DO VIOLINO O tampo harmnico, construdo com madeira de pinho, tem trs milmetros de

    espessura, um contorno cortado com goiva e dois furos em forma de f, que so os ouvidos.

    O fundo construdo em madeira de bordo. As costilhas so os lados. A alma um pequeno cilindro de seis milmetros de dimetro, no colado, que

    une a parte interna do tampo ao fundo, e cuja localizao tem grande importn-cia para a sonoridade.

    O brao, feito de madeira de bordo, cortado numa pea nica em cuja extremi-dade h um acabamento em forma de voluta, herana do gosto barroco.

    O ponto, em madeira de bano, est colado na parte de cima do brao. As cravelhas, em bano, so as peas onde as cordas se enrolam e so afinadas.

  • 22 Lxico musical explicativo

    O cavalete, de madeira de bordo, a pea onde as cordas se apiam no centro do tampo: tem dois milmetros de espessura na aresta superior e talhado perfei-o; sua espessura e dimenses, calculadas milimtricamente, influem de maneira considervel na sonoridade: o cavalete que comunica as vibraes ao tampo.1

    As cordas so em nmero de quatro, das quais uma ou duas feitas de tripa de carneiro ou fio metlico; as cordas suportam uma tenso de trinta quilos e a presso sobre o cavalete de doze quilos.

    Os filetes decorativos contornam todo o tampo e so formados por 24 peas coladas.

    O arco, que h sculos mede exatamente 75 centmetros, tem uma espessura de seis milmetros no talo e 5,3 milmetros na ponta, feito em madeira de Pernam-buco. provido de crina de cavalo (o nilon revelou-se um fiasco...) e pesa 65 gramas. As crinas so recobertas de colofnio, uma resina obtida a partir da es-sncia de terebintina, o que lhes permite aderir s cordas e faz-las vibrar.2

    A sonoridade do violino mais rica e mais brilhante do que a das violas em voga no sculo XVII foi no s a causa de seu sucesso (na Itlia), como tambm da desconfiana que, por muito tempo, despertou nos msicos ("Nous appelons violes celles desquelles les Gentil-hommes, Marchantz et autres gens de Vertuzpassent leur temps... et le violon... pour conduire quelques noces ou mmeries", Philibert Jam-be de Fer, 1556).3 Foi na qualidade de instrumento para danas que o violino ingressou na corte, atravs de "Les 24 Violons du Roi".4 Depois disso, graas a Lully, o violino se imps orquestra por volta de 1660. Foram os italianos que lhe deram foros de nobreza, fazendo dele o instrumento de predileo do concerto. Sua supremacia afirmou-se desde ento, mantendo-se j h trs sculos, sem dar qualquer mostra de enfraquecimento.

    O violino se tocava antigamente de maneira bastante livre. A posio do instru-mento sob o queixo s se estabeleceu aos poucos. uma posio racional, mas quantas dificuldades, sobretudo para a mo esquerda! A mo direita est imobili-zada pelo manejo do arco, e o pulso da esquerda s serve como suporte; restam quatro dedos, que devem trabalhar numa posio recurvada, antinatural, virados ao contrrio, e tm de fazer tudo: "calibrar" a nota, dar-lhe os sons brilhantes dos vibratos, etc.

    No violino e nos instrumentos da mesma famlia, emprega-se a surdina, pequeno dispositivo de chifre ou metal que se coloca sobre o cavalete para atenuar as vibraes. Por analogia, este nome tambm dado ao pedal esquerdo do piano. O pizzicato o procedimento que consiste em pinar a corda com os dedos sem o recurso do arco. "Chamamos violas quelas de que se servem os gentis-homens, mercadores, e toda gente de bem, para passar seu tempo... e o violino... para acompanhar casamentos ou folias" (Philibert Perna de Ferro, 1556). (N. T.) Conjunto de 24 instrumentos da famlia do violino que existia na corte de Lus XTV, por ocasio da chegada da pera Frana. (N. T.)

    Os instrumentos, a orquestra, as vozes 23

    Viola. Em ingls, viola; em italiano, viola; em francs, alto; em alemo, Bratsche, de viola da braccio. A viola um violino mais avantajado e soa uma quinta abaixo do violino. Longe de ser um parente pobre, a viola tem individualidade, com seu tim-bre caloroso, algo velado, mais terno e mais predisposto melancolia do que o do violino.

    Violoncelo. Em italiano e ingls, violoncello, ou o diminutivo "cello"; em francs, violoncelle, em alemo, Violoncell. O violoncelo soa na oitava grave da viola, mas no reproduz em sua forma exatamente as propores do violino; seguro verti-calmente e apia-se no cho pelo espigo. Tem menos agilidade que o violino, mas uma grande extenso, e seu som aveludado, bem timbrado. Apesar destas quali-dades, o violoncelo teve dificuldade de destronar a viola baixo: em 1750, ainda no havia sido bem aceito na Frana. Foi Boccherini (cerca de 1765) que fez do violon-celo um instrumento apreciado e o imps para sempre.

    Contrabaixo. Em italiano, contrabasso, em francs, contrebasse, em ingls, double-bass; em alemo Kontrabass. Soa na oitava grave do violoncelo e serve, na orques-tra, para reforar a sonoridade de base. O instrumentista toca de p, e a extenso considervel dos intervalos que sua mo esquerda tem de abranger ao longo do brao do instrumento no permite grande velocidade. A fora e a robustez da so-noridade lhe do peso e valor.

    Alguns instrumentos mais raros

    Arpeggione. Nome italiano do instrumento de seis cordas e arco, inventado em 1823 pelo luthier vienense J.G. Staufer, que lhe deu o nome de guitare d'amour. Schubert escreveu para piano e arpeggione a Sonata D 821, que hoje faz parte do repertrio dos violoncelistas, j que o arpeggione no se conseguiu impor. tam-bm chamado de guitarra-violoncelo.

    Viola bastarda ou viola-lira. Instrumento antigo de cordas, parecido com a viola baixo, que possua de seis a sete cordas de tripa e de nove a 27 de metal, estas ltimas ditas "cordas simpticas". Entre 1766 e 1775, Joseph Haydn escreveu 175 obras para este instrumento, pelo qual se tomara de amores o prncipe Esterhazy, seu patro. o bartono da famlia das violas da gamba, intermedirio entre a viola tenor e a viola baixo.

    Tromba marina. Nome italiano de um instrumento de uma s corda, com apro-ximadamente dois metros de altura, tocado com arco, que produz somente os sons harmnicos, com timbre brilhante e metlico. Por causa de seu grande tamanho, foi objeto da cobia do "Bourgeois Gentilhomme", protagonista da comdie-ballet homnima de Molire.

  • 24 Lxico musical explicativo

    OS INSTRUMENTOS DE TECLADO

    comum, hoje em dia, falar-se do cravo como se ele fosse um "antecessor" do piano. Nada mais falso: so duas filiaes distintas em tudo. O prprio princpio do instrumento inteiramente diferente nos dois casos, como se pode perceber de imediato pelo quadro da pgina 25.0 piano suplantou o cravo porque correspon-dia melhor a certo tipo de sensibilidade prpria ao final do sculo XVTJI. Na verda-de, os dois coexistiram por algum tempo, mas isto no significa que o piano tenha nascido a partir do cravo. So apenas primos e tm um ancestral comum: um ins-trumento utilizado at hoje no Oriente e na Grcia, derivado da harpa e formado por uma base de madeira sobre a qual se acham distendidas algumas cordas. Estas podem ser arranhadas com a unha ou com um plectro, que pode ter formas dife-rentes e ser feito de materiais tambm diferentes. Trata-se do saltrio {psalterion) dos gregos (o nome grego deriva do prprio ato de arranhar). Com este formato e tocado deste modo, passou o saltrio ao Ocidente medieval. Entretanto, s