Lord Bronux - perse.com.br · sociais que me sustentam voltam a funcionar e eu como bom escravo...

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Dias de coveiro Lord Bronux

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Dias de coveiro

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Dias de coveiro

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Índice

Introdução ____________________________________ 4

Uma grande perda ______________________________ 8

O velho bar __________________________________ 16

A festa, a camisinha e as drogas ___________________ 25

Monólogos dolorosos ___________________________ 38

Evoluindo e falando merda _______________________ 46

Entre o rifle e a pá _____________________________ 57

Uma cela especial ______________________________ 64

Farda laranja _________________________________ 71

Dias na prisão ________________________________ 77

Apanhando __________________________________ 83

Cabeça raspada _______________________________ 85

A cura jurídica através da mentira __________________ 87

Boa conduta __________________________________ 91

Família, uma beleza repleta de erros _______________ 103

Minha família, com erros também _________________ 115

Vultos _____________________________________ 125

Dia de terapia ________________________________ 130

Mais perguntas, algumas, com respostas ____________ 134

Quem sou? __________________________________ 140

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Charlote, safada! _____________________________ 156

Perfurando olhos _____________________________ 170

Sanidade ___________________________________ 172

Curado, para sempre! __________________________ 174

Agradecimento e algumas bobagens________________ 176

Introdução

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Quantas vezes não se perguntou: Qual seu papel no

mundo ou o quanto tudo isso é ou não real? Vivemos em

um mundo de dúvidas e questões, que, em sua maioria

jamais serão respondidas. A questão sempre foi e será:

Como lidar com seus dilemas? Mas isso não importa, cada

um com, com o tempo, desenvolve seu próprio modo de

encarar a vida e suas milhares de dúvidas e caminhos.

Essa é a história de Eduardo, mas também pode ser a

minha ou a sua, nunca saberemos, pelo menos, não,

enquanto vivermos. Basta, então, encararmos a vida, essa

ressaca infinita, fruto de um porre de informações e

esperarmos pela morte, onde as dúvidas serão sanadas e

nosso objetivo de existência, comprido!

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Por que você fez isso?

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Uma grande perda

Já faz tempo que não escuto aquele latido! Lua tem se

isolado dos outros, passa o dia inteiro deitada. Já não se

alimenta, não corre, apenas aceita sua condição. Uma

pequena Beagle adoecida, cansada de tudo e todos, um

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animal que aceita a dor porque sabe qual será seu destino,

mas ela não se preocupa.

É impressionante o modo como animais doentes

parecem mais amigáveis do que a maioria dos humanos

com saudáveis.

Era uma tarde quente, Lua começou a deixar de comer,

correr e latir. Antes dela adoecer, não tinha dado conta do

quanto ela causava impacto no meu dia-a-dia. Mesmo

aqueles choros de madrugada fazem falta. Ás vezes,

acordo assustado e preocupado, “Será que ela está viva? ”

Penso eu.

As férias acabaram! As rotinas voltaram, as engrenagens

sociais que me sustentam voltam a funcionar e eu como

bom escravo pego minhas trouxas e vou trabalhar.

Nada é tão bom quanto antes! Sempre, a caminho do

serviço, fico olhando para as pessoas, alguns dizem que as

odeio, mas não é bem assim, só as fúteis, ou seja, a

maioria.

Estou lá, no ponto de ônibus, sentado, naquele banco

encardido e recostando minha cabeça em uma barra de

ferro, que, sustenta a pequena cobertura, não me importo

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com o que os outros estão pensando! Estou com o

uniforme da empresa, aqueles que fazem você parecer

importante mesmo não sendo. Faz três ou quatro meses

que não faço a barba e nem pretendo faze-la. O lance da

barba não é por estar na “moda”, minha barba não é

ajeitada! É um protesto pessoal, contra padrões de beleza e

de moda. Na verdade mais uma desculpa para ser feio e

preguiçoso.

É interessante como você pode pegar o mesmo ônibus

todos os dias, com as mesmas pessoas e nunca se quer

trocar uma palavra com uma delas. Sabe, eu olho para as

mulheres do ônibus, da rua, do mercado, das lojas, etc.

Olho para toda e qualquer, que eu considere atraente, mas

quase sempre o retorno negativo. Só que há uma mulher

em especial, sempre a vejo no ônibus, olhos castanho,

branca, como se estivesse morrendo e o mais importante:

Casada! Pois é, posso até olhar por ali e por aqui, mas meu

código moral me impede de flertar com qualquer mulher

que esteja demonstrando estar compromissada. Mesmo

assim, sempre, troco olhares com ela! Acho que ela gosta

ou minha barba realmente incomoda as pessoas, também

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pode ser os dois, mas enquanto não tenho resposta é

melhor viver as perguntas.

Chegando no serviço já é outro nível de tormento, como

algumas pessoas podem ser tão detestáveis? Acho que os

deuses se divertem rindo da minha tolerância aos seus

adoradores, como queria ter coragem de fazer metade

daquilo que já imaginei. Os astros idolatram minha agonia

e minha raiva. Dentro de uma empresa nada é totalmente

verdade! É como um cassino, todos estão jogando e se as

cartas ou os números favorecem alguém, do outro lado,

sempre há quem vá cair. Eu fui estupido ao trocar meu

serviço braçal por um escritório, aquilo é uma cadeia! Eu

sou um poeta, faço minha criatividade perambular pelos

ares, estar em um local fechado, de certo modo me

oprime. Mas eu preciso do meu serviço! Apesar de toda

aquela repetição monótona e das reclamações, que, de

hora em hora tenho que escutar, aprendi bastante por lá e

pretendo aprender ainda mais, pois me baseio em

experiência para se alcançar um nível de conhecimento

superior ou como um velho amigo sempre cita, “Devemos

abrir as portas do conhecimento”.

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Eu ainda não estou cursando faculdade e meu emprego é

de meio período! É bem provável que daqui alguns dias eu

vá para o exército e por Lúcifer, que eu seja dispensado! O

exército é o apogeu das mentiras, é tudo baseado em uma

falsa segurança. Não dependa dos outros para se proteger,

porque o humano há quem você confia sua vida é da

mesma espécie do que quer tira-la de você.

Minha sala é padrão de empresa, tudo de cor neutra,

coisas rotuladas e tudo etiquetado, coisas com nomes

complicados, protocolos complexos, entre outras coisas

que me cansam, pelo simples fato de pensar nelas. Meu

chefe, o Sr. Ferreira, já tinha cabelo grisalho e barba

também, estava sempre de terno!

Estava prestes a descer a escada quando ele me chamou,

“Que saco! ” Pensei. Fui até a enorme sala e me sentei.

—Eduardo, está com a gente a quanto tempo? Dois ou

três anos?

—Por ai!

—Sabe, vejo que você se esforça, mas precisa ter mais

atenção ao seu trabalho! Já não é a primeira vez que tenho

que conferir as suas planilhas...

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Eu, na verdade parei de prestar atenção no que ele estava

dizendo, só estava vendo ele abrindo e fechando a

mandíbula, mas não era capaz de entender os sons que

saiam dele ou eu não queria entender, eu estava cheio de

ser oprimido por aqueles ideais que eu não concordava ou

de seguir aquelas normas, umas mais ridículas que outras.

Aquilo nunca foi meu lugar, mas como eu já disse

“Preciso desse serviço!”.

—Sr. Ferreira, entendo que foi irresponsabilidade da

minha parte, mas estou trabalhando nisso.

Ainda bem que tenho qualidades de um psicopata, o que

torna certas coisas muito mais fáceis, como mentir muito

bem por exemplo.

—Tudo bem! Espero resultados de você! — Disse o

velho enquanto coçava sua barriga.

—Obrigado pelo conselho! — Disse e saí da sala.

Desci aquelas escadas, que, mesmo sendo poucas, me

irritavam, era só um andar. O andar da liberdade, já da

escada, via a porta de saída e meu coração já voltava a

bater. Quando abro aquela porta, me sinto como um urso

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saindo da sua caverna depois de seu longo período de

hibernação.

Esperar o ônibus de novo. O ônibus que pego para voltar,

na maioria das vezes está vazio, ou seja, eu posso me

sentar, de preferência no fundo e eu sempre o faço.

Normalmente leio um livro quando estou sentado no

ônibus, dessa vez eu estava lendo um livro sobre a história

do punk, não gostei muito, acho que prefiro escutar punk

do que ler sobre ele. Como sempre, as velhas começaram

a entrar no ônibus, pareciam até alguma criatura do

universo Star Wars, só que eu era capaz de compreende-

las. Parei de ler, coloquei meus fones de ouvido e passei o

resto da viajem escutando Ramones. Convenhamos,

ninguém merece ficar escutando fofoca alheia dentro do

ônibus, na verdade em nenhum local.

Quando chego no terminal, normalmente, vou embora a

pé pelo restante do caminho, isso porque odeio ter que

esperar por outro ônibus, são 10 ou 12 quadras, mas não

me importo!

Cheguei em casa e tive medo que meu cachorro tivesse

morrido, abri o portão de ferro, que rangia vez ou outra,

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fui para traz de casa, duas ou três moscas rodeavam a Lua.

Ela morreu!

Fui pegar a pá e um saco preto! Deixei para enterra-la a

noite, onde o número de curiosos é menor. Eu a coloquei

no saco preto e levei para um campo meio irregular, que,

ficava perto de casa, era uma área de proteção ou algo

assim, mas tinha mais lixo do que lixeiras costumam ter.

Cavei um buraco, coloquei ela dentro e fechei. Abri minha

garrafa de uísque e fui para casa, bebendo, “acho que não

vou trabalhar amanhã” pensei.

Tive problemas para dormir, estava com as mãos

calejadas e eu tinha acabado de raspar uma das feridas

acidentalmente. Não era a primeira vez que eu enterrava

um animal, enterrei muitos animais de estimação, meus e

da minha família, aparentemente tenho perfil de coveiro.

Eu sempre gostei desses dias de coveiro! É interessante

como os animais são capazes de aceitar a morte, enquanto

os humanos só sabem reclamar. Esses enterros me

lembram também, que: a vida não só está passando, mas

ela está correndo!

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Às vezes dias de coveiro não são tão literais, pois as

coisas que enterramos não precisam, necessariamente, ser

materiais. Podem ser sonhos, lembranças, oportunidades,

etc. Esses dias são piores que as tardes tediosas de

domingo!

Peguei meu celular, tinha algumas mensagens, mas

apenas uma merecia atenção! Era uma mensagem do

Victor, um velho amigo do colégio, gostávamos de

conversas mais intelectuais. Ele queria sair para beber,

conversar, por fim, dar combustível a nossa amizade,

combinamos de sair Domingo à tarde.

Estava chovendo e gotejava ao meu lado. Esse gotejar

me acordou, um pouco antes do meu celular, me levantei,

arrastei a cama e voltei a dormir. Acordei vinte minutos

depois, era umas sete horas, não estava no horário ainda,

mas meu telefone estava tocando!

O velho bar

—Alô— Atendi o telefone.

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—Oi, Edu?

Logo conheci a voz, meio rouca, era um conhecido meu,

mas nunca esperei por uma ligação dele.

—Sou eu mesmo! Tudo bem, Kevim?

—Bem — Ele deu uma longa pausa, tinha muito barulho

no fundo e ele parecia estar bêbado.

—Preciso conversar com você! Você parece ser um cara

inteligente!

—Okay! Onde você está?

— Estou naquele bar perto do antigo colégio.

—Já chego ai! — Logo desliguei o telefone.

De fato eu conhecia o bar, mas estava mais decadente do

que eu me lembrava. Eu e meus amigos costumávamos

comprar bebidas lá, quando estávamos cursando o ensino

médio, pelo menos quando quem estava atendendo era o

Billy ou como nós os chamávamos “Tio Billy”, ele era

bem avançado em idade.

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Eu tinha decidido ir ao bar a pé. Eu estava com um visual

peculiar, na verdade quase sempre estava me vestindo de

forma peculiar. No dia em questão estava de com uma

camisa xadrez, calça Jean e um chapéu “cata ovo” —

Nunca soube o nome certo desse tipo de chapéu! — As

pessoas estranhavam tudo isso, mas eu gosto e isso sempre

será maior que a opinião alheia.

O bar em sua maior parte era construído em madeira,

mas os cupins tomaram conta do lugar, teias de aranha,

ninhos de pássaros, mas na verdade isso não importava! O

bar fazia sucesso ainda, ele era tão antigo que poderia ser

usado como ponto de referência por qualquer um e o mais

importante é que você poderia beber muito pagando

pouco. Os bancos e mesas eram de madeira também, mas

pareciam melhor do que o resto do bar.

Logo me sentei ao do lado Kevim, ele estava naquelas

banquetas que ficam de frente para o balcão, eu até pude

entender, pois no lugar do velho Billy tinha uma ruiva

maravilhosa, ainda não tinha visto o rosto, mas esse bar já

ganhou um novo cliente.

—E ai Kevim, o que aconteceu? — Perguntei dando um

leve tapa no ombro dele.

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— É bom te ver cara!

— Digo o mesmo, mas você está acabado cara!

— Minha mulher, acho que vamos nos separar. Não

entendo cara, ela simplesmente parou de fazer as coisas,

ela fica o dia inteiro naquele celular, se ela trabalhasse eu

entenderia, mas ela fica o dia inteiro em casa e quando

chego eu tenho limpar tudo e fazer comida. Antes, bem até

você lembra o quanto dividíamos cada instante. Eu

confesso já brigamos muito, eu já vacilei muito com ela,

mas nunca a desprezei. — Ele fez uma pausa para beber.

—Mas Kevim, quando a Luiza começou com isso? Eu

lembro de quando saiamos, vocês eram tão felizes!

—Cara, já tínhamos terminado uma vez antes de nos

casarmos por causa de um amigo dela, não fui o culpado.

Esse amigo dela gosta dela desde a adolescência, amava

ela e depois que a Luiza voltou a falar com esse amigo a

nossa relação desabou. Agora aconteceu de novo! A Luiza

voltou a falar com ele e nosso casamento tá desabando.

Outro dia ela chegou em casa de madrugada, pude sentir o

cheiro do perfume diferente, perguntei a ela e ela me disse

que era dele, logo depois falou que iria morar com ele.

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— Não sou perito nisso, por isso e outras razões que

meus relacionamentos não passam de uma noite, na

verdade, dependendo quando estou pagando elas vão

embora depois do programa. — Rimos — Acho que

casamentos só dão certo quando são duas personalidades

opostas, sabe, gosto de dar um exemplo bem ridículo, mas

que resume meu pensamento, uma pessoa inteligente tem

que casar com uma burra, pois desse modo não haverá

competição.

O casamento, hoje em dia, é um investimento para o

divórcio, as pessoas não aceitam o fato de que todos

somos egoístas para algo. Seja egoísta! É da sua natureza,

mas aceite que os outros também o sejam, ou tente ser

feliz em um relacionamento de opostos como sugeri ao

Kevim, porém sempre haverá um lado que será submisso

ao outro. Não existe equilíbrio no amor, haverá dias em

que você terá que aceitar os açoites, mas terá outros que

você irá açoitar e tudo isso parece doloroso, tanto para o

açoitador quanto para o que é açoitado. A submissão, ao

meu ver, é o gesto mais nobre em um relacionamento, pois

uma pessoa está escolhendo ter dias de coveiro, enterrando