Lutas Sociais No Mundo

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EEEFM "PROFª MARIA OLINDA OLIVEIRA DE MENEZES" Nome:_____________________________________________ __ Turma : _____ HISTÓRIA – Profª Vaneska Godoy de Lima Lutas Sociais e Revoluções LUTAS SOCIAIS NO MUNDO GREGO E ROMANO A maior diferença entre a organização política e religiosa do mundo grego e romano e a da Antiguidade Oriental (egípcia e mesopotâmica), e a do posterior mundo feudal, está no fato de que a atividade política e religiosa não se misturava: política era coisa dos homens, terrena, e a religião era coisa do espírito, do plano das idéias. Nesse sentido, o mundo grego e romano foi o que mais desenvolveu e concretizou a atividade política como a arte dos homens em administrar a pólis, a cidade. A grega e a romana foram as primeiras culturas a tratarem a política de forma racional e não divina ou sagrada. Na pólis ateniense, o regime político transitou da monarquia a democracia; em Roma, da monarquia a república. Nosso mundo ocidental atual tem como base a idéia e a prática política greco-romana, na qual o poder político é independente do religioso. Mas quem construiu a democracia e a república no mundo greco-romano? De certa maneira, foram as pressões sociais, principalmente dos comerciantes e pequenos proprietários gregos (os georgói) e romanos (os plebeus), sobre os grupos dominantes: eupátridas em Atenas e patrícios em Roma. Isso porque na medida em que Atenas e Roma expandiam o comércio marítimo pelo Mediterrâneo, aumentava o poder econômico dos comerciantes e mercadores, que pouco a pouco passavam a exigir maior participação nas decisões políticas tradicionalmente concentradas nas mãos dos grupos dominantes, as oligarquias. Exigiam também o direito de voto nas assembléias que decidiam sobre a administração da pólis ou da cidade romana, e o de indicar ou eleger seus próprios representantes políticos, como os Tribunos da Plebe, entre os romanos. Os conflitos entre comerciantes em ascensão social e as oligarquias dominantes da Grécia Antiga ocorreram entre 400 e 300 a.C. Foi nesse contexto, em Atenas principalmente, que o regime político caminhou gradativamente da monarquia oligárquica para a democracia, o governo dos atenienses. Embora excluísse as mulheres, escravos e estrangeiros dos direitos políticos e sociais, signi cava um avanço, pois não diferenciava a população conforme a renda, como nos regimes políticos anteriores. Estabelecia- se pela primeira vez na história da humanidade uma democracia direta, na qual os cidadãos atenienses votavam diretamente, em praça pública (ágora), as Na Roma Antiga, as lutas sociais dos plebeus por maiores direitos ocorreram entre 500 e 200 a.C., em plena fase da república. A plebe era composta por diferentes camadas sociais: pequenos proprietários, comerciantes, artesãos e camponeses romanos. A diferença com os gregos é que, nessa fase, a república romana iniciava sua expansão não só marítima e comercial mas, sobretudo, territorial e colonial pelo Mediterrâneo. E, devido a essa expansão colonial, a plebe dos pequenos proprietários e camponeses acabou sendo prejudicada economicamente pela produção colonial e pelo crescimento do uso da mão-de-obra escrava estrangeira. Por outro lado, a plebe dos comerciantes e artesãos cresceu

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  EEEFM "PROFª MARIA OLINDA OLIVEIRA DE MENEZES"

Nome:_______________________________________________

Turma: _____

                                                 HISTÓRIA – Profª Vaneska Godoy de Lima 

Lutas Sociais e Revoluções

LUTAS SOCIAIS NO MUNDO GREGO E ROMANO

A maior diferença entre a organização política e religiosa do mundo grego e romano e a da Antiguidade Oriental (egípcia e mesopotâmica), e a do posterior mundo feudal, está no fato de que a atividade política e religiosa não se misturava: política era coisa dos homens, terrena, e a religião era coisa do espírito, do plano das idéias. Nesse sentido, o mundo grego e romano foi o que mais desenvolveu e concretizou a atividade política como a arte dos homens em administrar a pólis, a cidade. A grega e a romana foram as primeiras culturas a tratarem a política de forma racional e não divina ou sagrada. Na pólis ateniense, o regime político transitou da monarquia a democracia; em Roma, da monarquia a república. Nosso mundo ocidental atual tem como base a idéia e a prática política greco-romana, na qual o poder político é independente do religioso.

Mas quem construiu a democracia e a república no mundo greco-romano? De certa maneira, foram as pressões sociais, principalmente dos comerciantes e pequenos proprietários gregos (os georgói) e romanos (os plebeus), sobre os grupos dominantes: eupátridas em Atenas e patrícios em Roma. Isso porque na medida em que Atenas e Roma expandiam o comércio marítimo pelo Mediterrâneo, aumentava o poder econômico dos comerciantes e mercadores, que pouco a pouco passavam a exigir maior participação nas decisões políticas tradicionalmente concentradas nas mãos dos grupos dominantes, as oligarquias. Exigiam também o direito de voto nas assembléias que decidiam sobre a administração da pólis ou da cidade romana, e o de indicar ou eleger seus

próprios representantes políticos, como os Tribunos da Plebe, entre os romanos.

Os conflitos entre comerciantes em ascensão social e as oligarquias dominantes da Grécia Antiga ocorreram entre 400 e 300 a.C. Foi nesse contexto, em Atenas principalmente, que o regime político caminhou gradativamente da monarquia oligárquica para a democracia, o governo dos atenienses. Embora excluísse as mulheres, escravos e estrangeiros dos direitos políticos e sociais, significava um avanço, pois não diferenciava a população conforme a renda, como nos regimes políticos anteriores. Estabelecia-se pela primeira vez na história da humanidade uma democracia direta, na qual os cidadãos atenienses votavam diretamente, em praça pública (ágora), as Na Roma Antiga, as lutas sociais dos plebeus por maiores direitos ocorreram entre 500 e 200 a.C., em plena fase da república. A plebe era composta por diferentes camadas sociais: pequenos proprietários, comerciantes, artesãos e camponeses romanos. A diferença com os gregos é que, nessa fase, a república romana iniciava sua expansão não só marítima e comercial mas, sobretudo, territorial e colonial pelo Mediterrâneo. E, devido a essa expansão colonial, a plebe dos pequenos proprietários e camponeses acabou sendo prejudicada economicamente pela produção colonial e pelo crescimento do uso da mão-de-obra escrava estrangeira. Por outro lado, a plebe dos comerciantes e artesãos cresceu economicamente com a expansão colonial romana pelo Mediterrâneo, e começou a liderar o conjunto da plebe, exigindo mais direitos sociais e políticos. Iniciou-se, então, na Roma Antiga, o período das revoltas sociais.

R E V O L T A S D A P L E B EPERÍODO CONQUISTAS

494 A 471 a. C

Num ato de protesto, a plebe retirou-se para o Monte Sagrado e só retornou a Roma quando os patrícios aceitaram sua proposta de ter um Tribuno da Plebe que defendesse seus interesses na Assembléia. No entanto, em 471 a.C., os plebeus instalam a Assembléia da Plebe, composta somente por elementos da sua camada social, dai retirando seus tribunos representantes na Assembléia Maior, a Centuríata.

450 a 449 a. C

Ocorreu quando os patrícios, pressionados novamente pela plebe, procuraram resolver os problemas redigindo as leis que antes não eram escritas. Estabeleceram, assim, a Lei das Doze Tábuas que, no entanto, manteve o poder nas mãos dos patrícios, a escravidão por dividas e a proibição do casamento entre patrícios e plebeus.

445 a.C

Marca a conquista, pelos plebeus, da liberdade de casamento com os patrícios, por meio da Lei Canuléia. Destaque-se que para os patrícios a proibição do casamento era uma forma de manter em suas mãos o poder político e o poder sobre as terras.

367 a 366 a.C

Depois de muitas pressões, a plebe conquistou o fim da escravidão por dividas graças à Lei Licínia, que também limitava as posses particulares das terras anexadas pelo governo por meio das guerras. Até aproximadamente 300 a.C., a plebe conquistou também o direito político de eleger e participar de cargos públicos e administrativos exclusivos dos patrícios, como o Consulado e o Pro consulado (governador de Província). Contudo, o Senado continuava sendo de exclusividade dos patrícios.

5ª Nesse momento, foi conquistada a vitória mais importante da plebe: a aceitação pelos patrícios de que as leis

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287 a 286 a.C votadas na Assembléia da Plebe fossem válidas para todo o Estado romano.

Os irmãos Caio Graco e Tibério Graco, ambos de origem nobre, estavam entre os representantes da plebe. Tibério, eleito tribuno em 134 a.C., propôs uma lei agrária que limitava a extensão das propriedades dos nobres romanos. Reprovado pelos nobres e abandonado pela plebe, foi morto

antes de colocar em vigor a reforma agrária. A Caio, designado tribuno em 133 a.C., coube aplicar a reforma proposta pelo irmão. Representando os interesses da plebe, conseguiu reformas sociais que descontentaram os patrícios, que o perseguiram politicamente até seu suicídio, em 121 a.C.

REVOLUÇOES BURGUESAS E POPULARESVejamos, agora, quais foram e como se deram as

revoltas sociais nos séculos XVII e XVIII, em pleno contexto de formação do capitalismo industrial na Europa.

As lutas sociais e políticas ocorridas no período do feudalismo já foram objeto de desde o trabalho servil, a formação das monarquias feudais até a crise feudal do século XVI. Abordaremos, neste item, as duas revoluções políticas e sociais mais importantes historicamente: a Revolução Inglesa

do século XVII e a Revolução Francesa do século XVIII. Consideradas revoluções burguesas, tiveram intensa participação popular e representaram a ruptura política com o absolutismo e econômica com o mercantilismo do Antigo Regime. Provocaram a instalação de uma monarquia parlamentar na Inglaterra e a república na França. O capitalismo liberal, que buscava a liberdade comercial acima de tudo, foi impulsionado por uma burguesia em ascensão.

A Revolução Inglesa do século XVII

A Inglaterra do século XVII configurava-se como um Estado organizado, aparentemente unido sob o cetro real. A base da economia era a agricultura. O campo concentrava a maioria da população. A produção têxtil ganhava importância: surgiam as primeiras fábricas manufatureiras de tecidos. A criação de rebanho ovino expandia-se em especial nos condados mais ricos. Arrendar terras para grandes criadores de ovelhas tornou-se um excelente negócio para os latifundiários, os quais pagavam alto preço por elas e cercavam as terras comunais onde pastava o gado de seus habitantes. Com isso, porém, milhares de cidadãos que antes tiravam seu sustento dessas terras viram-se expulsos das mesmas e praticamente reduzidos à miséria. O carvão mineral tornou-se o combustível mais utilizado nas casas londrinas e largamente adotado nas fundições e fábricas de armas, cerveja, sabão. O crescimento na procura desse mineral passou a exigir maior organização e investimentos, praticamente inviabilizando a extração pelos grupos artesanais e mesmo proprietários fundiários. Os grandes comerciantes londrinos, que dispunham de capital para investir, assumiram o monopólio dessa atividade. A chegada de novos capitais ao campo, para compra ou arrendamento de terras, alterou profundamente as relações no mundo rural. Os novos proprietários e os grandes arrendatários transformaram seus dependentes em mercadoria com a finalidade de aumentar seus lucros. As dificuldades pelas quais passava a aristocracia abriram espaço para o surgimento de novos grupos - comércio, advocacia, grandes arrendamentos, criação de ovelhas, média nobreza rural- capazes de lutar por seus próprios interesses e com peso crescente na vida do pais.

Porém, se do ponto de vista econômico a Inglaterra estava em pleno processo de desenvolvimento do capitalismo comercial, manufatureiro e industrial, a estrutura jurídica e política era ainda semifeudal. A monarquia absolutista, regime político em vigor, estava fragilizada em meio ao descrédito e descontentamento das classes emergentes. A manutenção dos privilégios para a Coroa e a nobreza dava-se à custa de impostos, pagos por aqueles que não se beneficiavam do sistema.

As forças sociais e políticas dividiam-se. Ao lado do rei estavam a alta nobreza proprietária de terras e o clero anglicano e católico. Ao lado do Parlamento, encontravam-se os pequenos proprietários, a burguesia mercantil e manufatureira e, por vezes, a nova nobreza, com forte apelo do puritanismo, versão inglesa do protestantismo. A Revolução Inglesa teve como cenário as divergências políticas entre o absolutismo real, anglicano e católico e o parlamento puritano no governo de Carlos I (1625-1640). As tentativas do rei em aumentar os impostos provocaram a revolta da população. Por outro lado, a monarquia procurava afastar a nova nobreza da corte e ampliar os privilégios dos pares. Face aos protestos do Parlamento, o rei Carlos I o dissolveu, convocando outro, também logo dissolvido por se negar a permitir novos impostos. Entre 1640 e 1642 o novo Parlamento convocado depôs o primeiro-ministro, revogou os impostos decretados pelo rei e estabeleceu que somente o Parlamento poderia se autodissolver. Entre 1642 e 1648, iniciou-se uma violenta guerra civil entre os partidários do rei e os partidários do Parlamento. A criação do Novo Exército Modelo, por Cromwell, no qual promoções se davam por mérito, aumentou a participação popular dentro do exército e foi decisiva para a vitória do Parlamento. O rei Carlos I, derrotado, foi preso e condenado à decapitação pública.

Entre 1648 e 1658, instalou-se a República de Cromwell. Fazendeiro e senhor rural, além de puritano devoto, Cromwell era membro do Parlamento e tinha sido o comandante do exército parlamentarista. Cromwell esmagou violentamente os grupos radicais no interior do exército que defendiam uma república justa e igualitária social-mente aliada a uma profunda religiosidade cristã. Esses grupos eram conhecidos como niveladores, pois pretendiam nivelar as condições sociais e defendiam a população pobre das cidades e do campo, bem como a total liberdade religiosa e a igualdade perante a lei; e cavadores, que se opondo à propriedade particular do solo, propunham sua posse comunitária.

PURITANISMO  O puritanismo é, originalmente, uma orientação espiritual característica da Grã Bretanha, fundada sobre a suprema 

autoridade da Escritura, a adesão à doutrina da predestinação e o repúdio da vida mundana encarnada na frivolidade dos Stuart. 

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Surgido por volta de 1564, influenciado por Calvino e Zwingli  Bullinger, o puritanismo exerceu grande in-fluência durante o reinado de Elizabeth I. Perseguidos pela alta comissão eclesiástica criada em 1583, os puritanos imigraram em grande parte para a  Holanda e  depois  para os  Estados Unidos.  Na  Inglaterra,  os  puritanos  arrebanharam alguns  elementos  das  classes  mais influentes da sociedade inglesa; criticaram as concepções ultra-episcopais de Jaime I e exerceram um papel considerável na revolução da Inglaterra, combatendo, ao lado do Parlamento, Carlos I (Cromwell), sendo dissolvidos com a restauração, em 1660. O puritanismo, ao considerar a riqueza como símbolo de eleição, contribuiu para a formação da burguesia capitalista na Inglaterra e nos Estados Unidos e para o florescimento dos regimes parlamentares.

 GRANDE ENCICLOPÉDIA LAROUSSE CULTURAL. v. 20. São Paulo: Nova Cultural, 1998, p. 4837.ANGLICANISMO Religião oficial da Inglaterra desde o reinado de Elizabeth, o anglicanismo nasceu não de um movimento de idéias, mas 

da política religiosa de Henrique VIII, cujos episódios da vida conjugal provocaram um sério desentendimento com o papado. Em 1534, o Ato de Supremacia deu ao rei o poder de chefe supremo e "único" da igreja da Inglaterra. Em sua origem, a Igreja Anglicana foi, portanto, apenas uma dissidência católica. Mas a ruptura com Roma favoreceu a pene-tração das idéias luteranas, cuja influência se concretizou através do Book of Comon Prayer, que, depois, não ficaria isento de influências calvinistas. Na verdade, a reforma anglicana apareceu como uma via intermediária entre o catolicismo, de que conserva, com a hierarquia, as formas   exteriores   do   culto,   e   o   protestantismo,   cujos   grandes   princípios   doutrinais  mantém.   Com  esse   duplo   valor,   ele desempenha um papel de primeiro plano na aproximação das igrejas.

 GRANDE ENCICLOPÉDIA LAROUSSE CULTURAL. v. 2. São Paulo: Nova Cultural, 1998, p. 309.

Os posicionamentos assumidos pelos niveladores e cavadores tornaram-se um incômodo para as classes sociais dominantes. Ambos os grupos foram afastados da República de Cromwell e do Parlamento. Cromwell tornou-se lorde-protetor da Inglaterra e transformou o regi-me em ditadura. Seu poder assumiu um caráter cada vez mais personalista, só tolerado devido aos sucessos obtidos interna e externamente contra a Holanda e a Espanha pela marinha inglesa. Com a morte de Cromwell, seu filho, Richard, o sucedeu como lorde-protetor, cargo do qual abdicaria depois de se mostrar incapaz de compatibilizar as correntes políticas inglesas. Em 1660, por meio de golpe militar, derrubou-se a república e instalou-se uma monarquia parlamentar, chamada de Restauração. Carlos

II, herdeiro de Carlos I, assumiu o trono. No entanto, quando Jaime II tentou restaurar o absolutismo e o catolicismo na Inglaterra, o parlamento liderado pela burguesia e pela nova nobreza reagiu violentamente. Em 1689, Jaime II foi derrubado e se instalou definitivamente na Inglaterra uma monarquia constitucional e parlamentar, fundada na Declaração de Direitos, a Bill of Rights. Essa foi a chamada Revolução Gloriosa de 1688-89.

Como vimos, durante o processo revolucionário na Inglaterra, a participação popular mais radical foi afastada, enquanto outras camadas dominantes em ascensão social tomaram o poder, o que evidencia claramente como a luta social e política construiu as relações de poder, econômica e cultural numa sociedade.

A REVOLUÇÃO FRANCESA DE 1789 (SÉCULO XVIII) Tal qual a Inglaterra da primeira metade do século

XVII, a França até 1789 estava mergulhada numa monarquia absolutista típica do Antigo Regime. Os reis Luís XIV, XV e XVI chegaram no auge do poder absolutista. O governo, com sua política mercantilista, intervinha direta-mente no comércio e na economia, mantendo o monopólio colonial. A Igreja Católica era fortíssima aliada do poder real tanto na política econômica interna quanto na ex-terna, sobre as colônias na América. No entanto, na segunda metade do século XVIII, a França começou a passar por graves crises econômicas, sociais e políticas que, somadas, resultaram na Revolução de 1789. Essas crises foram:

• Financeira: havia enormes gastos para manter os luxos da nobreza e da corte real. Os nobres e o clero não pagavam impostos. Houve também muito prejuízo com a participação em guerras, como a dos Sete Anos contra a Inglaterra, e no apoio à Guerra de Independência das colônias norte-americanas entre 1776 e 1782. Além do mais, a França comprava produtos manufaturados, principalmente da Inglaterra, sua grande e mais desenvolvida rival. Isso gerava grande prejuízo na balança comercial, levando o Estado a aumentar os impostos para a maioria da população como forma de sustentar seus gastos descontrolados.

• Econômica: anos seguidos de péssimas colheitas, agravadas por problemas climáticos, levaram à subprodução agrícola e conseqüente elevação dos preços, e ao aumento considerável da miséria e da fome entre os camponeses no

meio rural e entre os trabalhadores urbanos. A miséria social crescia assustadoramente, enquanto o Estado Absolutista aumentava os impostos sobre a população para custear suas despesas financeiras.

• Política: o Estado Absolutista centralizador não tomava providências enérgicas para resolver a violenta crise econômica e financeira pela qual passava a França. O poder real mostrava-se in-sensível à crise, e desde 1614 governava sem convocar os Estados Gerais, assembléia que reunia os representantes dos três estados sociais: o primeiro estado, a nobreza; o segundo estado, o clero; e o terceiro estado, o povo ou todos aqueles que não pertenciam ao primeiro e ao segundo estados. O terceiro estado, do qual faziam parte desde camponeses, trabalhadores urbanos, pequenos proprietários e comerciantes até a burguesia mercantil e industrial, constituía mais de 80% da população. Os Estados Gerais foram convocados em 1789 pelo rei Luís XVI para ajudar a tirar a França da crise. E foi aí que teve início o processo revolucionário.

• Social: como vimos, a crise financeira, econômica e política refletiu-se gravemente sobre a população, ou seja, sobre o terceiro estado. camponeses, trabalhadores urbanos, pequenos proprietários e comerciantes estavam bastante descontentes com a condição de empobrecimento. A média e a alta burguesias também estavam inconformadas em manter, pagando pesados impostos, os privilégios do primeiro e do segundo estados. A situação era insustentável.

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Poderíamos acrescentar a todas essas crises a difusão de idéias iluministas francesas e inglesas por pensadores e escritores, como John Locke, Montesquieu, Rousseau, Diderot e Voltaire, que defendiam basicamente o fim do absolutismo político, da intervenção do Estado na economia, do mercantilismo e questionavam radicalmente a influência da religião na política, pois eram anticlericais. Essas idéias de contestação à ordem estabelecida vieram se somar ao caldo revolucionário em que vivia a França da segunda metade do século XVIII.

No trecho abaixo, retirado da Declaração da Independência de 1776, das treze colônias inglesas da América do Norte, fica bem evidente a presença das idéias iluministas do inglês John Locke (1623-1704). Essa declaração certamente ficou conhecida nos meios revolucionários francesas.

São verdades incontestáveis para nós: que todos os homens nascem iguais; que lhes conferiu o Criador certos direitos inalienáveis, entre os quais o de vida, o de liberdade e o de buscar a felicidade; que para assegurar esses direitos se constituíram entre os homens governos cujos poderes justos emanam do consentimento dos governados; que sempre que qualquer forma de governo tenda a destruir esses fins, assiste ao povo o direito de mudá-la ou aboli-la, instituindo um novo governo cujos princípios básicos e organização de poderes obedeçam normas que lhes pareçam próprias para promover a segurança e a felicidade gerais.

O PROCESSO REVOLUCIONÁRIO NA FRANÇA

Dentro do processo revolucionário francês, podemos encontrar várias revoltas e revoluções (algumas aconteceram ao mesmo tempo): uma Revolta Aristocrática, uma Revolução Burguesa, uma Revolução Popular e uma Revolução Camponesa. Vejamos cada uma delas.

• Revolta Aristocrática entre 1786 e 1789: ocorreu quando o rei Luís XVI, pressionado pela grande crise financeira, decidiu estender ao clero e à nobreza (primeiro e segundo estados) a cobrança de impostos que só era obrigatória ao terceiro estado. As elites reagiram fortemente contra esse procedimento do Estado Absolutista, pois queriam manter seus privilégios intocáveis. Enfim, a aristocracia privilegiada rebelou-se contra as medidas econômicas do rei. Isso fez com que Luís XVI convocasse os Estados gerais, formado pela assembléia dos três estados em conjunto, para que se aprovasse a cobrança dos impostos ao primeiro e segundo estados. Foi a Revolta Aristocrática que impulsionou o processo revolucionário na França.

• Revolução Burguesa: ocorreu durante todo o período revolucionário, entre 1789 e 1799. A alta burguesia industrial em ascensão social e econômica pertencia ao terceiro estado e

tinha poucos direitos políticos. Sua postura era antiabsolutista, mas muitas vezes defendeu a monarquia parlamentar durante o processo revolucionário. Sua posição política variava conforme seus interesses econômicos. Foi a camada social que mais conquistas obteve com a revolução, principalmente com o liberalismo econômico resultante da crise do Estado forte e do mercantilismo colonial. A alta burguesia na França constituía o chamado grupo dos girondinos e politicamente esteve à frente da monarquia constitucional da primeira fase, da República Girondina na segunda fase, e do Diretório e do Consulado na quarta e quinta fases da revolução, porém não sem resistência social das camadas menos favorecidas: ou seja, quando a burguesia chegou ao poder e passou a ser a ordem estabelecida, deixou de ser revolucionária.

• Revolução Popular: foi uma revolução de caráter urbano que teve nos sans-culottes, sobretudo de Paris, a liderança da massa empobrecida. Os sans-culottes eram os trabalhadores da cidade, como operários, artesãos, pequenos proprietários e principalmente desempregados. Sua participação ocorreu durante todo o processo revolucionário, mas as conquistas populares foram poucas e passageiras. Sua maior presença deu-se entre 1789 e 1794 junto com os jacobinos, pertencentes às camadas médias urbanas. Nessa fase, foram aprovadas algumas medidas bem populares: a abolição da escravidão nas colônias francesas; a Lei do Máximo, que estabelecia um limite máximo para preços e salários; e a organização de um exército revolucionário e popular. Em 1792, na fase mais radical e popular da revolução, o rei Liberal condenado por traição à pátria e guilhotinado publicamente. O mesmo aconteceu com todos aqueles que, de certa forma, eram contrários à Luís XVI, por estar negociando a invasão da França com países inimigos em guerra, como a Inglaterra, a Prússia e a Rússia, foi República Jacobina.

• Revolução Camponesa: foram inúmeras revoltas dirigidas principalmente contra a opressão e os privilégios feudais no campo. Em 1789, com a derrubada de Luís XVI, camponeses do interior da França invadiram e saquearam muitas das grandes propriedades, chegando a , matar alguns aristocratas rurais. Essa revolta ficou conhecida como a Noite do Grande Medo. No entanto, a Revolução Camponesa acabou se esvaziando, na medida em que se suprimiram os direitos feudais e foi feita a divisão das grandes propriedades de terra, durante o processo inicial revolucionário, o que possibilitou a formação de numerosa classe de pequenos proprietários rurais. Os dez anos do período revolucionário, entre 1789 e 1799, foram de intensa luta de classes, política e social. As revoluções se alternaram, dependendo da força social de cada grupo em luta, num jogo social e político de avanços e recuos, mas que marcou profundamente a história do mundo ocidental. A ordem estabelecida foi posta em xeque e uma nova visão política se descortinou: o povo tinha que ser considerado pelos governantes, caso contrário o trono poderia ser derrubado e os altares abalados...

AS REVOLUÇÕES DO SÉCULO XX CONTRA A ORDEM CAPITALISTA Neste item, estudaremos principalmente a Revolução

Russa de 1917 e a Revolução Espanhola de 1936. Foram revoluções de grande participação popular, que se pronunciaram abertamente contra a ordem capitalista da primeira metade do século XX. Revoluções apoiadas por

grandes parcelas da população que buscaram instalar uma sociedade mais justa e igualitária, uma sociedade socialista e anarquista, que se opusesse ao capitalismo vigente. Foram revoluções de grande influência internacional, principalmente a russa.

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A REVOLUÇÃO RUSSA DE 1917

• Antecedentes: Antes de 1917, o imenso Império Russo estava passando por grave crise política, econômica e social.• a Rússia constituía um poderoso império, do leste europeu à Ásia, e os custos de manutenção eram gigantescos; • vigorava o czarismo de Nicolau II, com o apoio da aristocracia rural, da burguesia, das tropas de elite do exército e da Igreja Ortodoxa russa; • só em fins do século XIX iniciou-se o processo de industrialização com exploração da mão-de-obra operária e camponesa;

• a participação da Rússia na Primeira Guerra provocou aumento da crise econômica e social e a organização de inúmeros movimentos políticos e sociais de oposição ao czarismo decadente, como o dos socialistas revolucionários, dos marxistas (bolcheviques e mencheviques) e da burguesia constitucionalista. Também ocorriam numerosas greves e motins militares;

• os bolcheviques, socialistas revolucionários e organizações de trabalhadores exigiam a saída da Rússia da Primeira Guerra, considerada por eles uma guerra imperialista, motivada por interesses meramente capitalistas. Duas grandes revoluções fizeram parte da Revolução Russa de 1917: a Revolução de Fevereiro e a Revolução de Outubro.

• Revolução de Fevereiro: grande movimento político, social e militar que uniu toda a oposição, derrubou o czarismo e instalou um governo provisório, liderado pela burguesia constitucionalista (os cadetes), tendo Kerenski à sua frente.

• criação do Exército Vermelho, comandado por Trotski, para enfrentar os inimigos internos da revolução (a burguesia, os nobres e os militares reacionários) e os inimigos externos (a Inglaterra, a França e os Estados Unidos). Em decorrência dessa medida, houve três anos de guerra civil violenta na Rússia;

• estabelecimento de uma Economia de Guerra (NEP) como forma de acelerar o desenvolvimento industrial e social na Rússia;

• instalação de uma nova organização econômica e social que buscava atingir a igualdade eliminando a propriedade privada da terra, das máquinas e das fábricas, por meio de um Estado forte e socialista. Essa sociedade estava fundamentada teoricamente no marxismo, nas idéias socialistas de Karl Marx e Friedrich Engels. Nesse sentido, foi uma revolução comunista e proletária, que se propunha, efetivamente, a instalar os trabalhadores no poder;

• criação da URSS — União das Repúblicas Socialistas Soviéticas — estabelecendo um decreto de autodeterminação das nacionalidades antes submetidas ao Império Russo.

O exemplo da revolução proletária russa espalhou-se por todo o mundo ocidental e oriental. Inúmeros Partidos Comunistas se formaram em vários países, buscando organizar e dirigir os trabalhadores para uma revolução social e política que retirasse

o poder dos capitalistas. No Brasil, em 1922, foi fundado o Partido Comunista do Brasil, o PCB. Significativamente, o símbolo dos comunistas era uma bandeira vermelha, uma foice e um martelo entrecruzados, demonstrando a força dos trabalhadores do campo e da cidade no projeto socialista.

Os princípios da Revolução Russa serviram de modelo a outras revoluções de caráter socialista pelo mundo. A Revolução Chinesa de 1947, a instalação de um Estado socialista nos países do leste europeu e a Revolução Cubana de 1959 são alguns exemplos.

Com a morte de Lênin, em 1924, iniciou-se uma disputa interna pelo poder no Partido Comunista Russo entre Trotski, partidário do comunismo internacional, e Stalin, partidário do comunismo num só país. Venceram as teses de Stalin, e Trotski foi expulso da URSS. Iniciou-se, então, a Era Statinista, entre 1924 e 1954, caracterizada ao mesmo tempo por grande desenvolvimento industrial e econômico e por uma política altamente centralizadora e militarista. Todos os opositores do regime stalinista foram considerados traidores da revolução.

Após a Segunda Guerra Mundial, em 1945, a União Soviética despontou como líder do bloco dos países socialistas, principalmente do leste europeu, onde ela mesmo havia se empenhado em implantar a revolução. No entanto, organizava-se outro bloco, o capitalista, liderado pelos Estados Unidos. Instaurou-se, assim, a chamada Guerra Fria, que durou até 1991 com a decadência da União Soviética e o fim de um Estado que se propôs socialista, mas se transformou numa máquina burocrática e autoritária, que economicamente não resistiu à pressão capitalista e aos gastos com a cor-rida armamentista-nuclear com os Estados Unidos.

Enfim, a Revolução Russa tinha um projeto social generoso de implantação de uma sociedade sem injustiças e comandada pelos trabalhadores. No entanto, os novos grupos no poder, mesmo anticapitalistas, desviaram-se para o autoritarismo e a burocracia, engessando todo um projeto altamente revolucionário, proposto como alternativa concreta contra as injustiças do capitalismo e a exploração do homem pelo homem. Foi uma experiência social e política que marcou profundamente o século XX.

• A GUERRA CIVIL ESPANHOLA DE 1936

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Se a Revolução Russa foi uma rica experiência socialista, a Guerra Civil Espanhola foi uma tentativa histórica de implementar pela primeira vez num país um projeto anarquista. A Espanha, desde 1923, foi dominada

politicamente por um grupo militar que derrubou um governo constitucional e instalou uma ditadura que reconhecia o rei Afonso XIII. Essa ditadura do General Primo de Rivera tinha ligações muito próximas com o fascismo italiano de Mussolini.

Em abril de 1931, a república sucedera à monarquia. Havia cinco anos que a Espanha era uma república: cinco anos perturbados (...) e onde se haviam sucedido dois anos de governo da esquerda, depois dois anos de governo da direita, de 1934 a fevereiro de 1936. Em fevereiro de 1936, as eleições gerais reconduzem ao poder as esquerdas coligadas: é a vitória da Frente Popular. Uma onda de agitação social e desordem alarma os proprietários, os ricos, os militares e a Igreja. No dia 18 de julho de 1936, estoura uma sublevação militar que fracassa parcialmente; concebida para triunfar em vinte e quatro horas, não atinge seu objetivo. A guarda civil permanece leal, a marinha continua fiel ao governo; sua atitude é decisiva pois, vigiando o Estreito de Gibraltar, impede que os insurretos transfiram do Marrocos Espanhol para a Península Ibérica os regimentos marroquinos com que eles contavam. A Catalunha e as províncias bascas, gratas à república por lhes haver reconhecido a autonomia, colocam-se ao lado do governo de Madri. Mas este já não tem exército, que se bandeou para os amotinados. Arma-se o povo; milícias improvisadas   criam  dificuldades,   durante   semanas,   às   tropas   regulares,   incapazes   de   alcançar   uma   vantagem  decisiva.  A operação que devia durar algumas horas, durará três anos. A guerra intensifica-se e generaliza-se.

 RÉMOND, René. O século XX, 3. ed. São Paulo: Cultrix, 1982. p. 114-5. Começou uma violenta Guerra Civil que só terminou

em 1939, com a vitória das forças do general Franco. Republicanos, anarquistas e comunistas com grande apoio popular e até de voluntários vindos dos mais diferentes países organizaram um exército popular, armando grande parte da população. Do outro lado, as forças do general Franco eram

financiadas militarmente pelas elites espanholas, pela Igreja e pelo fascismo italiano e nazismo alemão. Esquadrilhas alemãs bombardeavam alvos não-militares, cidades, vilas e povoados, como aconteceu na cidade de Guernica, que foi fortemente retratada na pintura de Picasso.

Picasso estava em Paris quando soube do bombardeio da cidade de Guernica, pelos fascistas, em 28 de abril de 1937. Ao tomar conhecimento de todos os detalhes da chacina, começa a pintar com faria e emoção. Em seu espírito certamente já fervilhavam as idéias que mais tarde o levaram a escrever: "O que vocês pensam que seja um artista? Um imbecil feito só de olhos, se é pintor, ou de ouvidos, se é músico, ou de coração em forma de lira, se é poeta, ou mesmo feito só de músculos, se trata de um pugilista?  Muito  ao  contrário,  ele  é  ao  mesmo tempo um ser  político,   sempre  alerta  aos  acontecimentos   tristes,  alegres, violentos, aos quais reage de todas as maneiras. Não: a pintura não é feita para decorar apartamentos. É um instrumento de guerra para operações de defesa e ataque contra o inimigo". E como instrumento de guerra ele usou o pincel: em branco e preto retratou todo o horror de homens, mulheres e crianças, mutilados, de forma magistralmente trágica. E criou Guernica. Conta-se que Abetz,  embaixador de Hitler  em Paris,  ficou tão  impressionado com a obra,  que teria perguntado a Picasso, aparentando desinteresse: - É obra sua? - Não. Sua - replicou o artista com frieza (...). O final da guerra encontra a vida de Picasso novamente transformada (...). Recusa-se a voltar à Espanha enquanto perdurasse o regime franquista, e faz um contrato com o Museu de Arte Moderna de Nova York para que proteja e conserve Guernica até a queda do fascismo espanhol, quando então a obra deverá ser cedida à terra natal do pintor. 

CARRASCO, Walcir. Picasso. São Paulo: Abril, 1977. p. 20-2. (Coleção Mestres da Pintura). A URSS deu pouco apoio aos rebeldes republicanos,

enquanto países carast3s corno Inglaterra, Estados Unidos e França fizeram vistas

grossas ao acontecimento, devido à forte direção dos radicais de esquerda no processo. Populações civis foram dizimadas, chegando a um saldo de um milhão de mortos, numa das guerras mais violentas do século XX, na qual houve grande participação popular na luta por um país mais justo. Foi o último suspiro de um projeto anarquista, duramente abafado pelas forças conservadoras das elites dominantes.