MA14 U18
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MA14 - Unidade 18
Aplicaes das Congruncias
Semana de 24/10 a 30/10
A seguir, daremos algumas aplicaes da noo de congruncia.
Exemplo 1. Vamos mostrar que o nmero de Mersenne M83 = 283 1 no primo, apesar de 83 ser primo.
De fato, temos que
28 = 256 89 mod 167216 7921 72 mod 167232 5184 7 mod 167264 49 mod 167Da, segue-se que
283 = 26421623 49 72 8 1 mod 167,
o que implica que 283 1 divisvel por 167.Exemplo 2. Vamos provar neste exemplo o resultado de Euler que arma
que o quinto nmero de Fermat F5 = 225 + 1 no primo.
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2 MA 14 Unidade 18
Note inicialmente que, da igualdade 641 = 5 27 + 1 e, do Corolrio 2da Proposio 3, Unidade 17, segue-se que 54228 1 mod 641. Disto eda igualdade 641 = 54 + 24, temos que 54 228 + 232 0 mod 641, logo1 + 22
5 0 mod 641, o que mostra que 641|F5.Exemplo 3. Critrios de divisibilidade por 2, 5 e 10.
No Captulo 4, discutimos critrios de divisibilidade por 2, 5, e 10. Re-
visaremos aqui estes critrios usando a noo de congruncia.
Notando que 10 0 mod 2, 10 0 mod 5 e 10 0 mod 10, temos que
ni10i 0 mod 2, mod 5, mod 10; i 1;
portanto, dado um nmero n = nrnr1 . . . n0, na base 10, temos que
n n0 mod 2, mod 5, mod 10,
o que nos diz que n divisvel por 2, 5 ou 10 se, e somente se, n0 divisvel
por 2, 5 ou 10. Da decorrem os critrios que apresentamos na Proposio 1
e no Problema 3, da Unidade 3.
Exemplo 4. Critrios de divisibilidade por 3 e 9.
Vamos revisar estes critrios j apresentados no Unidade 3.
Como 10 1 mod 3, mod 9, segue-se que ni10i ni mod 3, mod 9.Isto mostra que, se n representado na base 10 como nrnr1 . . . n0, ento
n nr + nr1 + + n0 mod 3, mod 9,
o que prova que n divisvel por 3 ou 9 se, e somente se, nr+nr1+ +n0 divisvel, respectivamente, por 3 ou por 9.
Isto justica a famosa regra dos noves fora", que se enuncia como se
segue:
Para vericar se um dado nmero divisvel por 3 ou por 9, somam-se
os seus algarismos, desprezando-se, ao efetuar a soma, cada parcela igual
a nove. Se o resultado nal for 0, ento o nmero divisvel por 9. Se o
resultado for um dos algarismos 0, 3 ou 6, ento o nmero divisvel por 3.
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Aplicaes das Congruncias 3
Exemplo 5. Critrio de divisibilidade por 11
Como 10+1 0 mod 11, pelo Corolrio 2 da Proposio 3, Unidade 17,temos que 102n 1 mod 11 e 102n+1 + 1 0 mod 11.Seja n = nr n5n4n3n2n1n0 um nmero escrito na base 10. Temos,ento, que
n0 n0 mod11n110 +n1 0 mod11n210
2 n2 mod11n310
3 +n3 0 mod11. . .
Somando, membro a membro, as congruncias acima, temos que
n+ n1 + n3 + n0 + n2 + mod 11Portanto, n divisvel por 11 se, e somente se, n 0 mod 11, o queequivale a
n1 + n3 + n0 + n2 + mod 11.Assim, acabamos de provar que um nmero natural divisvel por 11 se, e
somente se, a soma dos seus algarismos de ordem par for congruente, mdulo
11, soma dos seus algarismos de ordem mpar.
Exemplo 6. Prova dos nove.
A prova dos nove um teste que se realiza nas quatro operaes para
detectar erros de contas. Como exemplo, suponhamos que efetuamos a mul-
tiplicao a b, obtendo o resultado c, cuja exatido queremos vericar.Suponha que na base 10 tenhamos
a = anan1 . . . a1a0, b = bmbm1 . . . b1b0, c = crcr1 . . . c1c0.
Aps ter posto os noves fora em a0 + a1 + an, obtm-se o algarismo a.Fazendo o mesmo para b e c, obtemos os algarismos b e c. Efetua-se a
multiplicao a b e pem-se os noves fora, obtendo c. Se c 6= c, ento,certamente, foi cometido um erro na operao. A justicativa a seguinte:
c c a b a b c mod 9,
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4 MA 14 Unidade 18
com c < 9 e c < 9.
Caso c = c, nada podemos armar quanto exatido da operao efe-
tuada, mas podemos garantir que a nossa conta tornou-se mais convel por
ter passado por um teste.
Exemplo 7. Todo nmero da forma an = 22n(22n+1 1), onde n 1, nasua representao decimal, ou termina em 28 ou termina em a6, onde a um
algarismo mpar. Em particular, todo nmero perfeito par termina de um
desses modos.
De fato, recorde que, pelo Problema 2, Unidade 15, temos que
a2k+2 = 256a2k + 240 16k e a2k+1 = 256a2k1 + 60 16k.
Faremos agora a anlise dos ltimos dois algarismos de 16n ao variar de
n em N.Temos que
16 16 mod100162 56 mod100163 96 mod100164 36 mod100165 76 mod100166 16 mod100,e, da para a frente, esses nmeros se repetem ciclicamente.
Portanto, para todo n N, os dois ltimos algarismos de 16n so daforma b6, onde b mpar.
Observe agora que a2 = 96, logo, da forma a6, onde a mpar. Vamos
provar, por induo sobre n, que o mesmo ocorre para todos os nmeros da
forma a2n. Suponha que a2n termina em a6, onde a um algarismo mpar;
logo,
a2(n+1) = 256a2n + 240 16n 56 a6 + 40 16n (50 + 6)(10a+ 6) + 40(10b+ 6) 10(6a+ 3 + 4) + 6 10c+ 6 mod 100,
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Aplicaes das Congruncias 5
onde c um algarismo. O resultado, portanto, segue-se neste caso, pois o
nmero 6a+ 3 + 4 mpar.
Observe agora que a1 = 28; logo, termina em 28. Vamos provar por
induo sobre n que o mesmo ocorre para todos os nmeros da forma a2n+1.
Suponha que a2n1 termina em 28. Logo,
a2n+1 = 256a2n1 + 60 16n 56 28 + 60 16n 56 28 + 60(10b+ 6) 68 + 60 28 mod 100,Exemplo 8. Vamos mostrar que, dado um nmero natural m N, existeum nmero de Fibonacci un tal que m|un.De fato, sejam r1, r2, . . ., respectivamente, os restos da diviso de u1, u2, . . .,
por m. Como, para todo i, tem-se que 0 ri < m, segue-se que existem, nomximo, m2 pares ri, ri+1 distintos. Portanto, dentre os pares r1, r2; r2, r3;
. . . ; rm2+1, rm2+2 existe pelo menos um par que se repete. Seja k o menor
ndice para o qual rk, rk+1 se repete. Vamos mostrar que k = 1.
Suponha, por absurdo, que k > 1. Seja rl, rl+1 o par que repete rk, rk+1.
Como
rk1 uk1 = uk+1 uk rk+1 rk = rl+1 rl ul+1 ul = ul1 rl1 mod m,segue-se que o par rk1, rk igual ao par rl1, rl, o que contradiz a minima-
lidade de k.
Decorre da e do Problema 1, Unidade 11, que existem innitos nmeros
de Fibonacci divisveis por m. Deduz-se, ainda, que, dado um nmero primo
p qualquer, existe um nmero de Fibonacci divisvel por p; ou seja, na de-
composio dos nmeros de Fibonacci em fatores primos aparecem todos os
nmeros primos.
Problemas
1. a) Usando o fato de que 100 divisvel por 4, 25 e 100, ache critrios de
divisibilidade por 4, 25 e 100.
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b) Considerando que 1000 divisvel por 8, 125 e 1000, ache critrios de
divisibilidade por 8, 125 e 1000.
2. Mostre que um nmero na base 10 divisvel por 6 se, e somente se,
a soma do algarismo da unidade com o qudruplo de cada um dos outros
algarismos divisvel por 6.
3. Usando o fato de que
103 + 1 0 mod 7, mod11, mod13,
prove o seguinte critrio de divisibilidade por 7, 11 e 13:
Um nmero n = nr . . . n2n1n0, escrito na base 10, divisvel por 7, 11 ou
13, se, e somente se,
n5n4n3+n11n10n9+ n2n1n0+n8n7n6+ mod 7, mod11, mod13.
Gauss, um Prncipe da Matemtica
Carl Friederich Gauss (1777-1855) foi um dos maiores matemticos de todos
os tempos.
Gauss nasceu em Brunswick, Alemanha, lho de uma modesta famlia
e manifestou o seu gnio na mais tenra idade, aprendendo a ler sozinho e
demonstrando uma habilidade mpar em realizar complicados clculos men-
tais.
Bem jovem ainda, Gauss resolveu o chamado Paradoxo do Binmio.
Desde Newton, conhecia-se o desenvolvimento
(1 +X)n = 1 + nX +n(n 1)
2X2 +
n(n 1)(n 2)6
X3 +
onde n um nmero real, no necessariamente natural, quando, nesse caso,
a soma da direita pode ser innita. Tratar somas innitas com a aritmtica
usual apresenta muitas armadilhas; por exemplo, tomando n = 1 eX = 2,obtm-se
1 = 1 + 2 + 22 + 23 + ,
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Aplicaes das Congruncias 7
o que, claramente, um absurdo.
Gauss, ento, de modo revolucionrio para a poca, reconhece a necessi-
dade de introduzir a noo de convergncia para sries innitas e mostra que
vale a igualdade do binmio, no sentido de que o lado esquerdo representa a
soma innita do lado direito, quando esta ltima converge, dando tambm os
valores de X para os quais a srie convergente para n, nmero real positivo
dado. No contente, Gauss, em 1812, realiza o estudo da convergncia da
srie hipergeomtrica,
1 +ab
cX +
a(a+ 1)b(b+ 1)
c(c+ 1)
X2
2!+a(a+ 1)(a+ 2)b(b+ 1)(b+ 2)
c(c+ 1)(c+ 2)
X3
3!+ ,
que engloba, para valores particulares de a, b e c, as funes logartmica,
trigonomtricas e vrias outras funes que aparecem em Fsica e Astrono-
mia. Este trabalho uma obra prima de rigor matemtico, ultrapassando,
nesta matria, os gnios de Newton, Euler e Lagrange, e iniciando, assim,
a importante rea da Anlise Matemtica, que seria, ulteriormente, desen-
volvida pelos talentos de Abel, Cauchy, Weierstrass e Dedekind.
Aos dezessete anos, Gauss decide incursionar na Aritmtica, com o pro-
jeto de esclarecer, completar e desenvolver o que os seus predecessores haviam
realizado. Em 1798, aos 21 anos, Gauss produz uma das obras primas de toda
matemtica, o livro Disquisitiones Arithmeticae, que seria publicado somente
em 1801. No livro, Gauss introduz a noo de congruncia; desenvolve a teo-
ria dos resduos quadrticos, demonstrando a profunda Lei da Reciprocidade
Quadrtica; estuda as formas quadrticas binrias, deduzindo, dentro de um
quadro bem mais geral, o teorema de Fermat, que assegura que todo nmero
primo da forma 4n+ 1 se escreve como soma de quadrados de dois nmeros
naturais; e, na ltima seo, deduz o belo e famoso teorema que diz que um
polgono regular com um nmero primo n de lados, inscrito no crculo,
construtvel com rgua e compasso se n um nmero primo de Fermat.
Em 1799, em sua tese de doutorado na Universidade de Helmstedt, Gauss
demonstra o Teorema Fundamental da lgebra, que havia sido enunciado por
vrios antecessores, mas jamais provado completamente. Foi, tambm, um
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dos primeiros a utilizar os nmeros complexos para provar resultados no
triviais em Teoria dos Nmeros.
A partir de 1807, Gauss foi diretor do observatrio de Gttingen, dando
contribuies fundamentais Matemtica aplicada, Astronomia e Fsica.
Uma das maiores contribuies de Gauss Astronomia foi determinar, com
grande preciso, a rbita do planeta Ceres, que havia, recentemente, sido des-
coberto em uma posio incmoda para a observao. Os clculos de Gauss
permitiram que os astrnomos o reencontrassem numa outra posio prevista
por ele. Em Fsica, foi um dos criadores da teoria do eletromagnetismo;
inventou, como subproduto dos seus estudos, o telgrafo eltrico, contribuiu
para o estudo da capilaridade e para a ptica.
EmMatemtica pura - sem a menor sombra de dvida, a sua maior paixo
-, deu contribuies teoria das probabilidades e foi um dos criadores das
geometrias no-euclidianas, da geometria diferencial, das funes de varivel
complexa, da topologia e da teoria algbrica dos nmeros.
Gauss teve o poder de mudar os rumos da matemtica a partir dos seus
trabalhos revolucionrios, apresentados com extremo rigor e grande conciso
e elegncia. Por isso, foi considerado, pelos seus contemporneos e pelas
geraes que se sucederam, um prncipe da rainha das cincias.