MAIARA PATTI GAULEZ - UFSCar€¦ · Orientação: Prof. Dr. Andrea Rodrigues Ferro Sorocaba 2016 ....

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CAMPUS SOROCABA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA MAIARA PATTI GAULEZ EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE POR MEIO DA ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME PARA O PERÍODO 2003-2012 Sorocaba 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS

CAMPUS SOROCABA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

MAIARA PATTI GAULEZ

EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE POR MEIO DA ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME PARA O PERÍODO

2003-2012

Sorocaba

2016

1

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS

CAMPUS SOROCABA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

MAIARA PATTI GAULEZ

EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA ANÁLISE POR MEIO DA ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME PARA O PERÍODO

2003-2012

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Economia para

obtenção do título de Mestre em

Economia.

Orientação: Prof. Dr. Andrea Rodrigues

Ferro

Sorocaba

2016

Gaulez, Maiara Patti

Eficácia do sistema prisional brasileiro: uma análise por meio daabordagem da economia do crime para o período 2003-2012 / Maiara PattiGaulez. -- 2016. 55 f. : 30 cm.

Dissertação (mestrado)-Universidade Federal de São Carlos, campusSorocaba, Sorocaba Orientador: Andrea Rodrigues Ferro Banca examinadora: Adelson Martins Figueiredo, Daniel Ricardo deCastro Cerqueira, Marcelo Justus dos Santos Bibliografia

1. Economia do Crime. 2. População carcerária. 3. System GMM. I.Orientador. II. Universidade Federal de São Carlos. III. Título.

Ficha catalográfica elaborada pelo Programa de Geração Automática da Secretaria Geral de Informática (SIn).

DADOS FORNECIDOS PELO(A) AUTOR(A)

4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha família.

5

AGRADECIMENTO

Agradeço a Universidade Federal de São Carlos pelas conquistas acadêmicas.

Agradeço a CAPES pelo apoio financeiro.

Agradeço a minha orientadora Prof. Dr. Andrea Rodrigues Ferro pelas diretrizes

na condução do meu trabalho.

Agradeço a todos os professores da UFSCar pelas experiências trocadas.

Agradeço ao meu noivo por todo apoio, motivação e contribuições.

Agradeço a minha família, que sempre será a base de tudo.

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RESUMO

GAULEZ, Maiara. EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO: UMA

ANÁLISE POR MEIO DA ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME PARA O

PERÍODO 2003-2012. 55 f. – Universidade Federal de São Carlos, Sorocaba, 2016.

O objetivo desta dissertação é quantificar e analisar o efeito marginal da punição por meio

do encarceramento no Brasil, a partir da abordagem da Economia do Crime proposta por

Becker (1968). Essa punição seria eficaz se, a partir dela, fosse possível reduzir a

reincidência criminal e possibilitar a reinserção desses indivíduos na sociedade. Com isso,

o número de crimes não só reduziria pelo indivíduo criminoso que mudará de atividade,

como também, daqueles propensos ao crime ao terem seus incentivos alterados. Dessa

forma, busca-se entender se o aumento no número de presos reduziu a criminalidade,

neste caso investigada por meio da taxa de homicídios. Questiona-se se a pena por

privação de liberdade reduz o número de homicídios no Brasil. O período analisado foi

de 2003 a 2012, em que houve certa estabilidade na taxa de homicídio, mas com

proporção de população carcerária crescente. Este aspecto motivou esta investigação

sobre a referida relação. Por meio de modelos econométricos estimados pelo system

GMM, a variação da taxa da população carcerária mostrou-se estatisticamente

significativa, mas com e valor irrisório do coeficiente como uma determinante na taxa de

homicídio, indicando efeito praticamente inexistente desse tipo de punição em reduzir os

homicídios praticados durante o período.

Palavras-chave: Economia do Crime; População carcerária; Taxa de homicídios; System

GMM.

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ABSTRACT

The purpose of this master degree thesis is to analyze the marginal effect of punishment

through incarceration for Brazil based on the approach of Economics of Crime proposed

by Becker (1968). This punishment would be effective if it was possible to reduce the

recidivism and if it was possible the reintegration this individuals into society.

Thereat, the number of criminal reduces for two reasons, first some individuals would

change the activity and second some individuals wouldn’t choose this activity, because

their incentives changed. We seek to understand whether the increase in the number of

prisoners has reduced crime (measured by the homicide rate). Therefore, we discuss

whether the penalty of liberty deprivation is the best incentive to reduce the number of

homicides in Brazil. The study period was from 2003 to 2012. During this period, the rate

of homicides was stable while the rate of prison population rose. This is the motivation

for studying the relations among those variables. We adopted econometric models

estimated by the System GMM and their results show that the prison population

coefficient is statistically significant but it has very low magnitude values, pointing out

the ineffectiveness of this kind of punishment in reducing homicides along that period.

Keywords: Economics of Crime; Prison population; Homicide rate; GMM-SYS.

8

LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Estatísticas descritivas das variáveis utilizadas no modelo. ......................... 39

Tabela 2– Resultados das estimações por GMM-SYS ................................................... 42

Tabela 3 – Matriz de correlação entre variáveis do modelo ........................................... 54

Tabela 4 – Resultados das estimações EF, EA e GMM-DIF ......................................... 55

LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Síntese da análise dos resultados das estimações por GMM-SYS .............. 44

LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Número e taxa de homicídios no Brasil de 2003 a 2012. ............................ 30

Gráfico 2 – Taxas de homicídio nos estados brasileiros em 2003 e 2012 ...................... 31

Gráfico 3 – Variação da taxa de presos e de homicídio entre 2003 e 2012. ................... 34

Gráfico 4 – Variação da taxa de detenção e de homicídio entre 2003 e 2012. ............... 36

LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Taxa de homicídio nos estados brasileiros em 2003 (esquerda) e 2012

(direita) ........................................................................................................................... 32

9

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 10

CAPÍTULO 1 – A ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME E SEUS

DESDOBRAMENTOS: UMA REVISÃO DA LITERATURA ................................... 15

CAPÍTULO 2 – ELEMENTOS PARA ANÁLISE EMPÍRICA DA VARIAÇÃO DA

TAXA DE HOMICÍDIOS ENTRE AS UNIDADES DA FEDERAÇÃO..................... 23

2.1. Metodologia e procedimentos ......................................................................... 24

2.2. A variável dependente: taxa de homicídios ..................................................... 29

2.3. As variáveis explicativas e de controle ........................................................... 33

CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DOS RESULTADOS EMPÍRICOS: O QUE PARECE

EXPLICAR A VARIAÇÃO NA TAXA DE HOMICÍDIOS ENTRE 2003 E 2012? ... 41

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 46

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 50

APÊNDICE .................................................................................................................... 54

10

INTRODUÇÃO

O objetivo desta dissertação é quantificar e analisar o efeito marginal da punição

por meio do encarceramento no Brasil, a partir da abordagem da Economia do Crime

proposta por Becker (1968). São objetivos específicos: (1) discutir como a teoria

econômica trata o fenômeno da criminalidade e da punição; (2) investigar as diferentes

formas de se tratar empiricamente os efeitos do encarceramento sobre a criminalidade; e

(3) analisar empiricamente os determinantes da evolução das taxas de homicídio entre as

unidades da federação brasileira.

O crime é um fenômeno estudado por diversas áreas do conhecimento. Na teoria

econômica, seus precursores foram Smijel (1965), Fleisher (1966), Ehrlich (1967) e

Becker (1968) que analisaram o crime como atividade econômica na qual o indivíduo

escolhe alocar seu tempo e recursos entre a atividade legal ou ilegal, de forma a

maximizar sua utilidade esperada. Esta escolha depende de algumas variáveis como o

retorno de cada atividade, as chances de ser pego e condenado, a severidade da punição,

os custos e benefícios psicológicos, caso opte pela atividade ilícita, entre outras variáveis

socioeconômicas e demográficas, justiça criminal e criminógenos, tais como gênero,

idade, desemprego e gasto com segurança, que também influenciam a tomada de decisão

do indivíduo, como evidencia Ehrlinch (1973).

O crime é uma atividade que traz externalidades negativas, não apenas monetários

– como roubo e furtos ou a perda de capital humano, causada por homicídios –, mas

também custos de perda de bem-estar, redução da confiança e da sociabilidade entre

pessoas, efeitos colaterais psicológicos (como traumas pós-violência), desagregação dos

núcleos familiares e dos círculos de convívio etc. A sociedade deve buscar minimizar

esses custos por meio de gastos com segurança, que podem modificar a probabilidade de

11

punição, e de sanção adequada para cada crime, cujos incentivos a cometê-lo são

alterados.

Dentre as punições existentes, Becker argumenta que a melhor forma de

minimizar os custos é por meio de multas, as quais seriam simples transferência de renda.

Assim, o criminoso pagaria todos os danos físicos, materiais e psicológicos da sua vítima.

O problema surge quando o crime é violento ou quando o criminoso não possui a renda

para pagar essa multa. Neste caso, a punição que prevalece é a privação de liberdade. Ele

também argumenta que o período correto para que o criminoso cumpra sua pena

corresponderia ao custo do seu crime, medido em salários que o mesmo receberia se

estivesse trabalhando. Desta forma, ele permaneceria preso durante um período de tempo

equivalente à renda que receberia, exatamente o custo referente ao crime que cometeu.

No Brasil, aproximadamente 70% dos crimes previstos têm como punição a pena

privativa de liberdade (REZENDE, 1999). Punições alternativas, como prestação de

serviço comunitário ou pagamentos de compensação são utilizados apenas em casos no

qual o crime cometido foi sem intenção, no entanto, mesmo estas punições mais brandas

tiveram apenas 25% de seu cumprimento em 20131. Apesar de ser a principal punição

utilizada pela legislação brasileira, a privação de liberdade aparentemente não tem se

mostrado adequado ao objetivo de reduzir os crimes, o que pode ser visto a partir das

taxas criminais do país que crescem todos os anos. Além disso, os custos desse tipo de

punição são extremamente elevados. Em valores de 2006, o custo mensal estimado pelo

Centro de Estudos em Carcerários Aplicados da Universidade de São Paulo era de R$

1.500,00 em presídios das unidades federativas. 2 Em dezembro de 2012, foram

1 Dados retirados da Folha de São Paulo disponível em

http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/04/1615765-em-sao-paulo-83-nao-cumprem-penas-fora-da-

prisao.shtml.

2 Dados disponíveis em http://www.gecap.direitorp.usp.br/index.php/noticias/44-custos-da-

prisionalizacao-7-informacoes-basicas-sobre-encarceramento. Acesso em 17 de abril de 2016.

12

registrados no Sistema Penitenciário de Informações do Ministério da Justiça (InfoPen) a

existência de 513.713 presos para 310.243 vagas, apresentando, portanto, um déficit que

chega a 203.470 (equivalente a 1,66 presos por vaga).

Um dos primeiros trabalhos empíricos que buscou entender a relação entre a

punição prisional e o incentivo aos crimes, contra pessoa e contra o patrimônio, foi

publicado por Levitt (1996). Nesse trabalho, o autor estimou, para os estados americanos,

o quanto se reduz a criminalidade quando é retirado um criminoso da rua ao se condená-

lo à prisão. Os resultados mostram que, em média, um criminoso a menos nas ruas

corresponde a uma redução de aproximadamente dez crimes em um ano. Araujo Junior

et al. (2014), por sua vez, analisaram essa relação com dados brasileiros. A partir da

estimação pelo Método Generalizado dos Momentos (GMM) para a taxa de homicídios3.

Seus resultados mostraram uma redução irrisória na taxa de homicídio quando se aumenta

um presidiário no sistema.

Do ponto de vista normativo, um sistema penitenciário eficaz deve garantir os

direitos humanos do presidiário, sua integridade física e moral (SARUBBI E

REZENDE,1997), sendo capaz de levar a redenção do preso e, portanto, a sua não

reincidência no crime (NUNES, 2005).

O aumento das taxas de criminalidade no Brasil ocorreu de forma considerável a

partir da década de 80. De acordo com os dados do Departamento de Informática do SUS

(DATASUS), o número de homicídios aumentou mais de 300% da década de 1980 para

2012. Com isso, dentre as principais preocupações dos brasileiros, a segurança ainda é a

3 O foco em homicídio existente nos trabalhos nacionais (e nesta dissertação também), se dá por dois

motivos. O primeiro é que o homicídio é a modalidade criminal cuja punição não permite penas alternativas,

somente o encarceramento prisional. Isto é importante, portanto, quando se quer avaliar a eficácia do

sistema prisional. O segundo motivo é que os dados de crime contra o patrimônio não são uniformemente

disponibilizados entre as diferentes unidades da federação. Todavia, por meio dos dados do Sistema Único

de Saúde (SUS), que são padronizados e centralizados nacionalmente, é possível obter “óbitos por

homicídio”.

13

segunda maior preocupação, ficando atrás apenas da saúde, segundo a pesquisa do

Instituto Datafolha, em agosto de 20144.

Assim sendo, chega-se a seguinte pergunta: a pena por privação de liberdade causa

redução na taxa de homicídios no Brasil? É possível perceber que na última década houve

certa estabilidade na taxa de homicídios, quando comparada a duas décadas anteriores,

enquanto do número de presos aumentou consideravelmente.

São poucas as bases de dados que trazem informação das condições

socioeconômicas dos indivíduos presos, dificultando entender o motivo pelo qual o

criminoso opta por uma atividade ilícita. Faltam também informações oficiais das

condições de cada um dos presídios no Brasil (LEMGRUBER, 2002 e ARAÙJO JUNIOR

et al., 2014). O acesso aos presídios é extremamente restrito à população civil e, em

função disso, são poucos os trabalhos – na área de economia – que buscam entender o

real perfil dos presos – o que os levam a cometer o crime e principalmente, se esse tipo

de pena realmente reduz a criminalidade.

Dessa forma, este trabalho buscou aprofundar na análise da relação entre o número

de presos e a criminalidade ao utilizar outro método de estimação, o system GMM, e ao

incluir outras variáveis importantes na determinação da criminalidade de acordo com a

abordagem de economia do crime proposta por Smijel (1965), Fleisher (1966), Ehrlich

(1967) e Becker (1968).

Os capítulos a seguir estão ordenados de forma a tentar responder aos objetivos

específicos desta pesquisa. No primeiro capítulo faz-se uma breve revisão da literatura,

elucidando os princípios da teoria de economia do crime, que teve origem com a

abordagem de Becker (1968), e seus avanços a partir dos trabalhos subsequentes, em

particular os trabalhos de natureza empírica. No segundo capítulo é apresentada a

4 Notícia disponível em http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2014/08/seguranca-e-2-maior-

preocupacao-dos-brasileiros-segundo-pesquisa.html. Acesso em 3 de novembro de 2014.

14

metodologia e as características e a evolução dos dados que são utilizados nesta

dissertação. No terceiro capítulo são expostos e discutidos os resultados obtidos por meio

de análise econométrica. Por fim, são feitas as devidas considerações finais.

15

CAPÍTULO 1 – A ABORDAGEM DA ECONOMIA DO CRIME E SEUS DESDOBRAMENTOS: UMA REVISÃO DA LITERATURA

O objetivo deste capítulo é discutir o fenômeno da criminalidade sob a perspectiva

da Teoria Microeconômica, explicando o modelo teórico desenvolvido a partir de 1968 e

as contribuições e questões trazidas ao longo do tempo por trabalhos empíricos que

buscaram mensurar as relações de causalidade propostas teoricamente.

Devido à complexidade que envolve o comportamento criminoso, diversas áreas

do conhecimento, como sociologia, medicina, economia, dentre outras, buscam entender

os determinantes que levam o indivíduo a cometer o crime. Segundo Cerqueira e Lobão

(2004) a discussão econômica sobre criminalidade, até os precursores da teoria de

economia do crime – Smijel (1965), Fleisher (1966), Ehrlich (1967) e Becker (1968),

aparece em Adam Smith que observou que os crimes e a demanda por segurança eram

motivados pelo acumulo de propriedades, William Paley que analisou os fatores

condicionantes das diferenças entre crimes e sanções e Jeremy Bentham que se ocupou

com o cálculo das respostas ótimas dadas pelas autoridades e o comportamento criminoso

(CERQUEIRA e LOBÃO, 2004).

Atualmente, as abordagens que explicam a criminalidade, segundo Cano e Soares

(2010), podem ser divididas em (i) patologias que levam o indivíduo cometer crimes; (ii)

o crime como uma atividade racional, maximizadora de lucro; (iii) o crime como

subproduto de um sistema social deficiente; (iv) o crime como consequência da

desorganização social; (v) o crime como função de fatores situacionais ou de

oportunidade. Esta dissertação se limitará a utilização da abordagem da Economia do

Crime proposta por Becker (1968).

16

Gary Becker introduziu a teoria microeconômica no mencionado fenômeno

social, enxergando a criminalidade como um mercado no qual o indivíduo, que é por

pressuposto um ser racional, escolhe alocar tempo e recursos nas atividades lícita ou

ilícita de forma a maximizar sua utilidade esperada. A utilidade esperada com a atividade

criminosa depende dos ganhos monetários e psicológicos advindos e da capacidade de se

fazer cumprir a lei (law-enforcemet), por meio da probabilidade de apreensão e

condenação e pela severidade da punição adotados por um país ou estado. A utilidade

esperada dos ganhos monetários e psicológicos difere entre as pessoas a depender da

idade, educação, família, entre outros, e é o que classifica o perfil do indivíduo em relação

ao risco (propenso, neutro ou avesso) (BECKER, 1968). A utilidade esperada depende

dos ganhos com a atividade escolhida, no caso a ilegal, e o tempo que se aloca em

atividades de lazer:

𝐸𝑈(𝑋𝑠, 𝑡𝑐) = ∑ 𝜋𝑠𝑈(𝑋𝑠, 𝑡𝑐)𝑛𝑠=𝑎 (1)

Onde, 𝐸𝑈(𝑋𝑠, 𝑡𝑐) é a utilidade esperada dos ganhos de uma dada uma atividade

no espaço 𝑠 e o tempo alocado nas atividades c, 𝜋𝑠é a probabilidade do espaço s.

Por essa razão, é possível entender o crime por meio de uma análise custo-

benefício. O indivíduo pondera os custos e os benefícios atrelados à atividade criminal e

comete o crime caso o segundo seja maior que o primeiro. De acordo com Jorge, Lemos

e Santos Filho (2008), o indivíduo cometeria o crime se:

BMON + BP > Cmat + nw + Cp + θ (F + γ) (2)

17

Onde, BMON é o retorno monetário da atividade criminal, BP é o retorno

psicológico da atividade criminal, Cmat é o custo material para o planejamento e

execução do crime, nw é o custo de oportunidade – devido a perda de rendimento por

parte da atividade lícita que o indivíduo abriu mão em favor da ilícita, Cp é o custo

psicológico da atividade criminal – como medo, culpa, custo moral, etc., θ é a

probabilidade de apreensão e condenação, F é o tipo de punição e γ representa a

condenação efetiva (JORGE et al 2008. p. 19).

Dessa equação é possível deduzir que alterações na probabilidade de apreensão e

condenação, na severidade da punição ou no custo de oportunidade da atividade ilegal

(por meio de mudanças nos salários do mercado de trabalho e da taxa de desemprego)

podem mudar os incentivos a se cometer um crime. Consequentemente, a reincidência

também é influenciada por essas mesmas variáveis. A escolha de cometer o crime após

sofrida uma punição tem menores custo de execução, devido à experiência adquirida com

a atividade criminal (learning by doing), de risco moral e de oportunidade da atividade

ilegal – a reinserção no mercado de trabalho com bons salários é mais difícil em

comparação aqueles que não são punidos (EHRLINCH, 1973 e ARAUJO JUNIOR e

FAJNZYLBERG, 2001b).

A maioria dos trabalhos econômicos que buscam entender a criminalidade têm

como pressuposto a racionalidade por parte do indivíduo que faz a escolha entre a

atividade lícita ou ilícita. No entanto, não são apenas variáveis econômicas, estruturais e

sociais que influenciam a tomada de decisão: crimes contra a integridade da pessoa, como

o homicídio, normalmente são influenciados também por variáveis psíquicas, as quais

não são tratadas explicitamente nos modelos econômicos (EHRLINCH, 1973). Assim

sendo, os crimes poderiam ser divididos em dois grupos: (i) os chamados crimes

lucrativos (ou econômicos), como roubo, tráfico, estelionato e etc., que se encaixam

18

completamente na racionalidade criminal; (ii) os crimes não lucrativos (ou não

econômicos), como homicídio, estupro, tortura, etc. que envolvem principalmente

variáveis psíquicas, mas podem se encaixar, em parte, na racionalidade criminal

(BECKER, 1968). Apenas as variáveis p (probabilidade de apreensão e condenação) e f

(severidade da punição) resultam no mesmo efeito em ambas formas de crimes.

Em um de seus primeiros trabalhos empíricos Ehrlinch (1973) investigou os

componentes das equações simultâneas de oferta e demanda na determinação do crime

para os estados americanos nos anos de 1940, 1950 e 1960. Foram incluídas variáveis

sócio econômicas como rendimento médio das famílias, percentual de famílias que

ganham menos do que o salário médio, população não branca, homens entre 14 e 24 anos,

taxa de desemprego, anos de estudo, taxa de urbanização, entre outras. A investigação da

importância dessas variáveis na determinação da criminalidade e a inserção de outras

características tornou-se a grande motivação dos estudos que vieram a seguir.

A significância estatística e o sinal dessas variáveis mudam muito entre os

trabalhos, a depender do tipo de crime e método de estimação utilizado. No Brasil existem

poucos trabalhos que investigam a diferença na determinação do crime contra pessoa

devido à falta de dados em abrangência nacional e a subnotificação dos boletins de

ocorrência. Beato Filho (1998) analisou os coeficientes de correlação entre as variáveis

socioeconômicas, crimes violentos e roubos em Minas Gerais no ano de 1991 e encontrou

que a correlação é sempre maior em relação ao roubo, ou seja, a influência das variáveis

socioeconômicas é maior em crimes contra o patrimônio, embora também influenciem o

crime contra pessoa. Fernandes e Lobo (2003) tentaram entender essa dinâmica com os

dados da Região Metropolitana de Salvador de 1993 a 1999. De acordo com seus

resultados não existe grande diferença entre os coeficientes encontrados em crimes contra

pessoa e contra o patrimônio.

19

Recentemente, as pesquisas buscaram investigar se essa inconstância dos

resultados encontrados entre os trabalhos se deve a diferença na influência das variáveis

socioeconômicas a depender do ciclo de vida do indivíduo, assim como já sugerido, mas

não testado por Ehrlinch (1973). Um desse trabalhos foi o de Araújo Junior e Fajnzylber

(2001a). Seus resultados mostram que a importância dessas variáveis na determinação da

escolha entre a atividade legal e ilegal mudam a depender do estágio de vida do indivíduo.

A relação da idade com a taxa de homicídio mostrou-se em forma de "U" invertido, sendo

o seu máximo atingido entre 30 e 32 anos. Em relação as variáveis socioeconômicas, a

renda, o desemprego e a desestrutura familiar (representada por famílias chefiadas por

mulheres solteiras) é positiva em relação a criminalidade. A renda mostrou-se significante

apenas na faixa de idade entre 27 e 29 anos, o desemprego tem influência até 41 anos de

idade e a desestrutura familiar é importante até os 32 anos. A variável de justiça criminal,

representada pela taxa de policiais, não pode ser analisada corretamente devido ao fato

de sua fonte de obtenção subidentificar os policiais dentre a população ocupada5. Outro

trabalho que segue nessa direção é o de Andrade e Lisboa (2000), que também criaram

coortes para analisar a influência das variáveis socioeconômicas na taxa de homicídio ao

longo do ciclo de vida dos indivíduos em Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, entre

1981 a 1997. No entanto, não encontraram um padrão comum da frequência do homicídio

entre as coortes e os estados no período estudado. As variáveis econômicas mostram

comportamento cíclico, com sinais esperados e maiores significâncias estatísticas nas

idades mais jovens.

Um dos primeiros trabalhos que buscou entender a correlação entre número de

presos e criminalidade foi o de Levitt (1995). Detectou um efeito de simultaneidade

5 O número de policiais foi retirado das informações de atividades de trabalho das Pesquisas Nacionais

por Amostra de Domicílio. Apesar da pesquisa ser considerada representativas a nível estadual, a variável

de atividade de trabalho não é representativa por apresentar um número muito grande de atividades com

pequena amostra para cada uma delas.

20

(endogeneidade), entre as taxas de diversos crimes e o número de presos. Para resolver

esse “problema” ele introduziu no modelo a variável instrumental “variação no valor da

superlotação dos presídios sob supervisão da Corte dos Estados Unidos”, o que reduziu o

viés na estimação dos coeficientes pelo método dos MQO (Mínimos Quadrados

Ordinários). As elasticidades encontradas foram -0,423 e -0,321 para crimes violentos e

contra o patrimônio, respectivamente. A variável “número de policiais” apresentou sinal

positivo, mas estatisticamente não significativo. Renda per capita e desemprego tiveram

resultados diferentes em função do tipo de crime: em crimes violentos, “renda” mostrou-

se significativa, enquanto “desemprego” não; no caso de crimes contra propriedade, o

resultado foi inverso. Com esse trabalho Levitt concluiu que a liberação de um preso, nos

presídios analisados, aumenta, em média, quinze crimes por ano, sendo dessa forma, a

punição por privação de liberdade é eficaz nos Estados Unidos.

Gainsborough e Mauer (2000) analisaram os dados dos Estados Unidos na década

de 90, em um período que a taxa de aprisionamento crescia, enquanto as taxas de

criminalidade se reduziam. Segundo esses autores, os estados que tiveram maior aumento

no número de presos não foram aqueles que tiveram maior redução na criminalidade,

dessa forma, eles concluem que o aumento na taxa de presos se deve principalmente a

mudanças em decisões policiais: aumento de presos por tráfico de drogas, sentenças mais

longas (o que aumentou o número de presos, enquanto a taxa de detenção reduziu nesse

período) e o aumento de presos sobre custódia. Para os autores, a redução da taxa de crime

se deve à melhora das variáveis socioeconômicas (renda e taxa de desemprego), redução

do tráfico de drogas e novas abordagens de policiamento, como a redução no porte de

armas de fogo.

21

Bandyopadhyay, Bhattacharya e Han (2010), em trabalho mais recente,

contribuíram para a análise da influência da taxa de encarceramento na redução da

criminalidade ao estimarem seu modelo a partir do Método Generalizado dos Momentos

(GMM, na sigla em inglês), que permitiu a utilização de variáveis endógenas sem

provocar viés na estimação. Os resultados encontrados a partir dos dados das áreas

policiais da Inglaterra e do País de Gales entre 1992 e 2008 foram robustos, sendo que a

elasticidade estimada de crimes contra o patrimônio em relação ao aumento da população

carcerária foi de -0,27 e de crimes contra pessoa foi de -0,21. Em seu modelo também foi

incluída a variável “taxa de detenção”, para entender a influência da probabilidade de

aprisionamento e condenação na redução da criminalidade, apresentando sinal esperado

e significância estatística.

Araujo Junior et. al (2014) publicaram um dos trabalhos mais recentes sobre o

efeito do encarceramento. Os autores analisaram a taxa de homicídio dos estados

brasileiros entre 2005 e 2010, comparando os resultados por meio dos estimadores de

dados em painel por Efeito Fixo, Efeito Aleatório e GMM, sendo o último mais robusto.

A taxa de população carcerária apresentou, como esperado, uma relação negativa com a

taxa de homicídio, porém, o coeficiente encontrado foi muito pequeno, próximo de zero,

não sendo possível identificar se essa variável realmente influência a taxa de homicídio.

A taxa de homicídio defasada (“inércia criminal”) tem uma relação positiva na taxa de

homicídio corrente e é significativa a 10%. A taxa de gasto com policiamento também foi

significativa com sinal negativo, isto é, quanto maior o gasto com policiamento menor a

criminalidade. A inércia criminal tem se mostrado importante na determinação da

criminalidade: ela representa o quanto do crime atual é explicado pelo crime passado,

podendo captar a dificuldade de se deixar a atividade ilícita e da reinserção do indivíduo

no mercado de trabalho (após ser preso), além da própria reincidência criminal.

22

Portanto, o que se percebe neste capítulo é que, embora inovadora, a abordagem

proposta por Becker (1968) traz grandes desafios empíricos, a começar pela construção

das variáveis proxy da probabilidade de punição e do efeito dúbio da renda em relação ao

crime. Por outro lado, ele pode ajudar na compreensão desse fenômeno com outro ponto

de vista, o que permite auxiliar no entendimento dos determinantes da escolha do ínvido

pela atividade ilícita e na elaboração de políticas de combate ao crime.

23

CAPÍTULO 2 – ELEMENTOS PARA ANÁLISE EMPÍRICA DA VARIAÇÃO DA TAXA DE HOMICÍDIOS ENTRE AS UNIDADES DA FEDERAÇÃO

Este capítulo tem como objetivo apresentar o modelo proposto por Becker (1968)

e Ehrlich (1973), assim como os procedimentos metodológicos e as especificações

utilizadas na análise empírica. Também se ocupará em apresentar as variáveis utilizadas,

suas especificações e respectivas bases de dados.

O modelo proposto nesta pesquisa busca entender o efeito marginal da pena por

privação de liberdade na redução da criminalidade, ou seja, quanto um preso a mais no

sistema penitenciário brasileiro reduz a taxa de homicídios, variável proxy da

criminalidade.

Existem relativamente poucos trabalhos que investigaram essa problemática no

mundo e, principalmente, no Brasil. Além disso, os resultados encontrados divergem em

relação aos determinantes da criminalidade, como mencionado anteriormente. Portanto,

esta dissertação busca aprofundar esta investigação ao utilizar outros métodos de

estimação, diferente do proposto por Levitt (1996), e a outras especificações, diferente

das apresentadas por Junior et al. (2014). Esse trabalho agrega contribuição ao utilizar o

estimador GMM-SYS, que melhora os instrumentos quando os dados utilizados

apresentam N grande e t pequeno, e ao inserir um proxy para a variável probabilidade de

apreensão de condenação, que é muito importante na determinação da escolha do

indivíduo entre a atividade legal e ilegal.

Os dados aqui utilizados estão dispostos em forma de painel, contendo os 26

estados brasileiros e o Distrito Federal no período de 2003 a 2012 (10 anos). A escolha

desse período se deve a limitação da disponibilidade dos dados. Os dados da população

penitenciária, que são obtidos do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias

24

(InfoPen), tem sua série iniciada em 2003 e se estende até 2012 (informação mais atual

encontrada durante o período desta pesquisa).

2.1. Metodologia e procedimentos

Como exposto anteriormente, no modelo proposto por Becker (1968) e Ehrlich

(1973), o indivíduo escolhe alocar seu tempo e recursos na atividade legal ou ilegal a

depender de condições socioeconômicos, demográficos, de justiça criminal e

criminógenos, de forma a maximizar sua utilidade esperada. Porém a utilidade esperada

não pode ser mensurada por ser não observável, dessa forma, o produto da escolha tomada

pelo indivíduo, que são os registros dos crimes (no caso desse trabalho representado pelo

crime de homicídio), pode ser utilizado como proxy da oferta agregada dos crimes

cometido pelos delinquentes.

Por outro lado, a “demanda” dos crimes pela sociedade (isso porque o crime é

visto como uma atividade, apresentando demanda e oferta) pode ser explicada pela

especialização dessa atividade ao longo do tempo, com ganhos de produtividade e com

baixa probabilidade de apreensão e condenação (fatores de ampliação da procura). A

demanda agregada é inserida no modelo através do crime defasado, da seguinte forma:

tx_hom𝑖,𝑡 = 𝛼tx_hom𝑖,𝑡−1 + β1presos𝑖,𝑡 + θ𝐱𝑖,𝑡 + ε𝑖𝑡 com |𝛼| < 1 (3)

Onde

ε𝑖𝑡 = η𝑖 + ν𝑖,𝑡 (4)

Em que tx_homi,t é a taxa de homicídio em logaritmo no local i no período

t, presosi,t, é a taxa da população carcerária (variável explicativa de interesse do modelo),

𝐱i,t é a matriz composta por variáveis explicativas de controle, ηi é o efeito fixo de estado

e νi,t são os erros aleatórios. Pressupõe-se que

25

E[η𝑖] = E[ν𝑖,𝑡] = E[η𝑖ν𝑖,𝑡] = 0 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝑖 = 1,… ,𝑁 𝑒 𝑡 = 2, … , 𝑇 (5)

O procedimento metodológico inicia-se com a estimação dos dados em painel pelo

modelo de Efeito Fixo e Efeito Aleatório, sem a inclusão da variável dependente defasada.

Os resultados dessas estimações são apresentados no apêndice. Para verificar a existência

de características sociais, culturais, políticas, entre outras, que são não observáveis e

estáveis ao longo do tempo entre os estados foi utilizado o teste de Hausman. O resultado

do teste de Hausman indica que a melhor especificação é de efeito fixo, corroborando

com os estudos com dados brasileiros que não refutaram, até então, a hipótese da

existência de efeitos fixos não observados. Dessa forma, as estimações desses modelos

tiveram o intuito verificar a necessidade de considerar o efeito fixo nos modelos

dinâmicos.

Em seguida, foram estimados os modelos dinâmicos. Estes permitem a inserção

da variável dependente defasada, que é importante por motivos teóricos, mencionados

anteriormente – a aprendizagem e a reincidência – e estatísticos, devido a existência de

efeito autoregressivo de ordem 1, i.e., AR(1), na série de homicídio. Além disso, permite

a utilização de variáveis endógenas no modelo. Os estimadores mais indicados no caso

de modelos dinâmicos são os estimadores Diference GMM (ARELLANO e BOND,

1991) e System GMM (ARELLANO e BOVER, 1995 e BLUNDELL e BOND, 1998).

O método de estimação, sugerido por Arellano e Bond (1991), o Diference GMM,

propõe que se utilize variáveis defasadas pelo menos em dois períodos como instrumento

para o modelo de primeira diferença. O modelo de primeira diferença possibilita que o

efeito fixo, η𝑖, da equação 3, seja eliminado o que acaba com a correlação entre η𝑖 e a

variável dependente, de acordo com o procedimento sugerido por Anderson e Hsiao

26

(1981). Segundo Windmeijer (2000), para amostras finitas a estimação em dois estágios

é mais eficiente do que em um estágio.

∆tx_homi,t = α∆tx_homi,t−1 + β1∆pesosi,t + 𝜃∆𝑿𝑖,𝑡 + ∆ν𝑖,𝑡 (6)

Além das condições 5 e 6, pressupõe-se, para a condição inicial, tx_hom𝑖,1, que

E[tx_homi,1ν𝑖,𝑡] = 0 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝑖 = 1,… ,𝑁 𝑒 𝑡 = 2,… , 𝑇 (7)

Para simplificar a descrição da estimação do Diference GMM vamos considerar

um modelo AR(1) geral dado por

𝑦𝑖,𝑡 = 𝛼𝑦𝑖,𝑡−1 + η𝑖 + ν𝑖,𝑡 (8)

A estimação pelo Diference GMM apresenta 𝑚 = 0,5(T − 1)(T − 2) condições

de momentos lineares 𝛼

E[tx_homi,t−s∆ν𝑖,𝑡] = 0 𝑝𝑎𝑟𝑎 𝑡 = 3,… , 𝑇 e 𝑠 ≥ 2 (9)

Podemos escrever a equação acima da forma restrita

E[𝐙𝑖′�̅�𝑖] = 0 (10)

27

Onde �̅�𝑖 é um vetor (𝑇 − 2) de (∆𝑣𝑖,3, ∆𝑣𝑖,4, … , ∆𝑣𝑖,𝑇 e 𝐙𝑖 é a matriz 𝑚 x 𝑁(𝑇 −

2) de instrumentos dada por (foram omitidos os subscritos i)

𝒁𝑖 = [

𝑦𝑖 0 0 ⋯ 0 ⋯ 00 𝑦1 𝑦2 ⋯ 0 ⋯ 0. . . ⋱ . ⋯ .0 0 0 ⋯ 𝑦1 ⋯ 𝑦𝑇−2

]

O Diference GMM minimiza a distância quadrática de (�̅�′𝐙𝐀𝑁𝒁′�̅�) por alguma

matriz 𝐀𝑁. Onde 𝒁′ é uma matriz 𝑚 x N(T − 2), �̅�′ é um vetor N(T − 2). A estimação

de 𝛼 é dada por

�̂�𝑑𝑖𝑓 = (�̅�−1′ 𝐙𝐀𝑵𝒁′�̅�−1)

−1�̅�−1′ 𝐙𝐀𝑵𝒁′�̅� (11)

Posteriormente, Blundell e Bond (1998) demonstraram que o estimador Diference

GMM tem propriedades fracas quando a variável dependente é aleatória, pois os níveis

passados guardam pouca informação sobre as mudanças futuras da variável, tornando os

instrumentos, que são as variáveis defasados, fracos. Nesses casos o System GMM

(ARELLANO e BOVER 1995) é mais eficiente ao utilizar mais defasagens como

instrumentos para 𝑦𝑖,𝑡. Assumindo que

E[∆tx_hom𝑖,2η𝑖] = 0 (12)

Com 𝑇 − 2 condições de momentos, tem-se

E[∆tx_hom𝑖,𝑡−1𝜀𝑖𝑡] = 0 para𝑖 = 1,… ,𝑁 𝑒 𝑡 = 3,… , 𝑇 (13)

28

Sendo possível usar a primeira diferença das variáveis como instrumentos para as

equações em nível. A estimação System GMM é análoga a descrita anteriormente,

utilizando a nova matriz de instrumento, dada por

𝒁𝑖+ =

[ 𝑍𝑖 0 0 ⋯ 00 ∆𝑦2 0 ⋯ 00 0 ∆𝑦𝑖3 ⋯ 0. . . ⋯ 00 0 0 ⋯ ∆𝑦𝑖,𝑇−1]

A consistência das estimações dos modelos dinâmicos são testadas a partir do teste

de Sargan que analisa a validade do conjunto dos instrumentos utilizados e o teste

Arellano-Bond para identificar existência de autocorrelação serial nos erros

(ARELLANO e BOND, 1991), a existência de autocorrelação implicaria que a taxa de

homicídio defasada em 𝑡 − 2 é endógena ao erro em 𝑡 − 1, fazendo com que ∆𝜀𝑖𝑡 ≠

0, ou seja, os instrumentos sejam inválidos. Não rejeitar a hipótese nula no teste de Sargan

e de Arellano-Bond (para a primeira e segunda ordem) indica que os instrumentos são

robustos e que não existe autocorrelação serial nos erros.

Os resultados obtidos através da estimação do Diference GMM, que não é o

estimador mais indicado para o modelo apresentado, e os dados utilizados encontram-se

no apêndice e os resultados do System GMM são apresentados e discutidos no capítulo

seguinte. As diferentes especificações apresentadas utilizam o GMM-SYS em dois

estágios com correção para heterocedasticidade e uso de controle de efeito fixo no tempo.

As variáveis consideradas endógenas são a taxa de homicídio defasada, taxa de população

carcerária e a taxa de detenção, as demais variáveis não tem sustentação teórica para

serem tratadas como endógenas.

29

2.2. A variável dependente: taxa de homicídios

A escolha da variável taxa de homicídios por 100 mil habitantes como proxy para

criminalidade ocorre por dois motivos. Primeiro, pelo homicídio ser a modalidade

criminal cuja punição não permite penas alternativas, somente o encarceramento

prisional, e segundo por existirem dados de abrangência nacional e periodicidade desse

tipo de crime (o que não ocorre com o crime contra o patrimônio).

Existem duas grandes fontes de dados que reportam os crimes ocorridos: (i)

boletins de ocorrência (BO) registrados pela polícia civil em cada unidade da federação

e (ii) certidões de óbitos registradas pelos Institutos Médico Legal e disponibilizada pelo

Ministério da Saúde através do Sistema de informações de Mortalidade (SIM).

A primeira fonte possui informações de todos os tipos de crimes, como roubo,

furto, homicídio e etc. No entanto, esses dados não estão disponíveis em âmbito nacional

e sua forma de registro pode variar entre as unidades da federação. Outro problema

encontrado é a subnotificação dos BO, pois nem todos os crimes são reportados. É por

esse motivo que a maioria dos trabalhos científicos brasileiros utiliza as informações

advindas da segunda fonte, que só reporta o crime de homicídio. As informações do SIM

são disponibilizadas com abrangência nacional, seguem padrão de coleta e registro de

dados internacional (CID) e apresentam menor subnotificação (PIQUET e

FAJNZYLBER, 2001; JORGE, LEMOS e SANTOS FILHO, 2008).

No período de análise desse trabalho, 2003 a 2012, a taxa de homicídio variou

muito pouco entre os anos (menos de 1%), a menor taxa foi em 2005 e a maior em 2012,

de 25,8 e 29,1, respectivamente. O Gráfico 1 ilustra o comportamento número e da taxa

de homicídios no período.

30

Gráfico 1 – Número e taxa de homicídios no Brasil de 2003 a 2012.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do TCU e DATASUS.

Apesar das taxas de homicídio brasileiras não terem variado muito ao longo da

década de 2000, ficando próxima de 27 por 100 mil habitantes, sendo importante

mencionar a redução da taxa de homicídio de 2003 a 2015, que teve grande influência

devido a Lei 10.826 de Desarmamento. Por meio do Gráfico 2 é possível perceber que a

variação da violência entre os estados não permaneceu constante. Houve aumento tanto

do limite superior quanto do limite inferior da taxa de homicídios entre os estados de 2003

para 2012. A maior taxa passou de 55,3 para 64,3 mortos por cem mil habitantes, um

aumento de 16,8%, e a menor taxa de 11,8 para 12,7, um aumento de 7,8%. Alagoas, que

antes encontrava-se na sexta posição, passou a ser o estado mais violento, com o aumento

da sua taxa de homicídio em 81,5%, enquanto Pernambuco, que em 2003 era o estado

mais violento, em 2012 passou a ocupar a décima posição, ao apresentar redução de 33%

dessa modalidade de crime (ver Figura 1).

24

25

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2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Ta

xa

Mil

ha

res

N° de homicídios Taxa de Homicídio

31

Gráfico 2 – Taxas de homicídio nos estados brasileiros em 2003 e 2012

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do TCU e DATASUS.

10

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17

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18

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0 20 40 60

Piaui

Santa Catarina

Maranhao

Rio Grande do Norte

Bahia

Tocantins

Paraiba

Rio Grande do Sul

Amazonas

Ceara

Minas Gerais

Para

Acre

Sergipe

Goias

Parana

Brasil

Roraima

Mato Grosso do Sul

Distrito Federal

Mato Grosso

Amapa

Alagoas

Sao Paulo

Rondonia

Espirito Santo

Rio de Janeiro

Pernambuco2003

13

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Santa Catarina

Sao Paulo

Piaui

Rio Grande do Sul

Minas Gerais

Maranhao

Tocantins

Mato Grosso do Sul

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Rio de Janeiro

Brasil

Roraima

Parana

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Mato Grosso

Rio Grande do Norte

Distrito Federal

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Pernambuco

Amazonas

Paraiba

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Sergipe

Bahia

Ceara

Goias

Espirito Santo

Alagoas

2012

32

Figura 1 – Taxa de homicídio nos estados brasileiros em 2003 (esquerda) e 2012

(direita)

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do TCU e DATASUS.

Sete estados ficaram menos violentos. São Paulo foi o principal, saiu da quinta

posição para vigésima sexta, com redução de 57,8% na taxa de homicídio, seguido por

Rio de Janeiro - que saiu da segunda posição para décima oitava, com redução de 46,2%

-, Pernambuco - já mencionado anteriormente -, Mato Grosso do Sul - que saiu da décima

posição para vigésima, com redução de 16,2% -, Rondônia - que saiu da quarta posição

para décima quarta, com redução de 15,2% -, Espírito Santo - que apesar de ter subido

uma posição, de terceiro para segundo, apresentou redução de 7%, e Mato Grosso - que

saiu da oitava posição para décima quarta, com redução de 0,6%.

Porém, as maiores variações entre esses anos ocorreram no sentido do aumento

da violência. A Bahia apresentou aumento de 160% na taxa de homicídio: passou de

vigésimo terceiro estado mais violento para quinto – sua taxa de homicídio era de 16,1

em 2003 e em 2012 passou para 41,9. Outros estados que tiveram aumento considerável

foram Rio Grande do Norte - com aumento de 148%, saiu da vigésima quarta posição

para a décima terceira -, Paraíba - com aumento de 128,7%, saiu da vigésima posição para

33

a oitava -, Ceará - com aumento de 121,7%, saiu da décima oitava posição para a quarta

- e Amazonas - com aumento de 103,3%, saiu da décima nona posição para nona.

2.3. As variáveis explicativas e de controle

As variáveis explicativas e de controle utilizadas no modelo estão divididas em

quatro blocos: determinantes socioeconômicos, demográficos, justiça criminal e

criminógenos. Em relação aos determinantes socioeconômicos foram utilizadas as

variáveis de renda e desigualdade, obtidas por meio da Pesquisa Nacional por Amostra

de Domicílios (PNAD) e do Censo Demográfico de 2010, ambas realizadas pelo IBGE.

Para o determinante demográfico será empregado o percentual da população masculina

jovem de cada estado, também obtido através dessas fontes. Com relação aos

determinantes de justiça criminal, foram utilizadas a taxa de população carcerária por 100

mil habitantes, uma proxy para punição (número de presos em relação ao número de

criminosos) e a variável taxa de policiais por 100 mil habitantes, retirados do InfoPen. Já

como determinante criminógeno adotou-se a taxa de óbitos por uso de álcool e drogas por

cem mil habitantes obtidos através DATASUS. A seguir são detalhadas todas as variáveis

explicativas utilizadas nesse modelo:

(1) Taxa de População Carcerária: esta variável é construída pela razão entre o

número de presos e a população total do estado por 100 mil habitantes. É esperado que,

mantendo-se a sentença constante para qualquer tipo de crime, um aumento exógeno da

criminalidade resultará em um aumento proporcional da população carcerária.

Durante o período analisado, o número absoluto de presos aumentou 114%, a taxa

de encarceramento por cem mil habitantes foi de 135 em 2003 para 265,8 em 2011 (ver

Gráfico 3). O crescimento do número de presos foi bem maior do que o aumento no

número de homicídios, de apenas 2%. A partir dos dados disponíveis, não é possível

separar o número de presos por tipo de crime cometido, o que seria mais indicado para a

34

estimação do modelo. Esse fato limita de forma considerável a análise empírica da

eficácia do sistema prisional.

Gráfico 3 – Variação da taxa de presos e de homicídio entre 2003 e 2012.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do InfoPen e DATASUS.

Os estados que apresentaram maior aumento na taxa de encarceramento foram

Minas Gerais, Goiás e Espírito Santo, que não são os mesmos que apresentaram maior

crescimento na taxa de homicídio. Não parece existir uma relação direta entre os estados

que tiveram aumento na taxa de homicídio com variações na taxa de encarceramento no

mesmo período de tempo, como também, no período anterior, ou seja, o aumento da

criminalidade hoje influenciando mudanças na população presa amanhã. Isto pode ser

explicado pelo aumento no número de presos por outros crimes que não homicídio.

É importante ressaltar que as informações disponibilizadas pelo InfoPen são

informações compiladas pelos órgãos de segurança pública, ou seja, não há garantia de

-100%

0%

100%

200%

300%

400%

500%

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ns

variação da taxa de presos 2003/2012 variação da taxa de homicídio 2003/2012

35

que, entre os estados, os registros utilizam a mesma forma de metodologia ou

classificação das informações. Além disso, existem "saltos" nas informações de um ano

para o outro que não são justificados6.

(2) Taxa de Detenção: essa variável é construída pela razão entre o número de

presos e o número de crimes cometidos, nesse caso, homicídios, em um dado período de

tempo para cada estado, como mostrado a seguir:

detencãoi,t =nº de presos

nº homi,t−1 (5)

Onde nº homi,t−1 é o número de homicídios no estado 𝑖 defasado em um e dois

períodos de forma ad-hoc.

A taxa de detenção representa, de acordo com o modelo proposto, a probabilidade

de apreensão e condenação do crime, uma das variáveis relacionada aos custos do crime

– quanto maior a probabilidade desta, maior o custo de escolha da atividade ilegal. Esse

custo está relacionado ao quanto o criminoso deixará de ganhar, em termos monetários,

tanto na atividade legal quanto ilegal, no período que estiver preso; ao risco moral,

sofrimento causado a ele mesmo, família e amigos; e a dificuldade da reinserção no

mercado de trabalho com salário compatível após o cumprimento da punição.

O aumento da punição reduz a criminalidade por dois motivos: primeiro, por

simplesmente retirar o criminoso da rua, impossibilitando-o, temporariamente, de

cometer outros crimes; em segundo lugar, por aumentar o custo do crime. Esses dois

efeitos não podem ser separados, o que dificulta o entendimento da real influência dessa

variável na redução da criminalidade (EHRLINCH 1973 e 1975).

6 Por exemplo, Mato Grosso possuía 6.802 presos em 2003 depois reduziu para 4.684 em 2004 e subiu

novamente para 7.221 em 2005. Assim como Santa Catarina, que em 2003 tinha 6.693 presos, em 2004

passou para 13.016 e em 2005 reduziu novamente para 9.570.

36

A probabilidade de punição também aumentou no período de referência em 9.7%,

entre 2003 e 2011 (ver Gráfico 4), porém, isso se deve ao fato de que houve pouco

aumento no número de homicídios (7,3% entre 2001 e 2009) enquanto o número de presos

aumentou consideravelmente (114%). Os estados que apresentam maiores taxas de

detenção são Acre, com taxa de 21,5, e Santa Catarina, com taxa de 19,9. Aqueles que

mais aumentaram a probabilidade de punição foram São Paulo, que passou da taxa de

punição de 6,3 em 2003 para 32,6 em 2011 e Minas Gerais, que foi de 2,3 para 12,5.

Gráfico 4 – Variação da taxa de detenção e de homicídio entre 2003 e 2012.

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do InfoPen e DATASUS.

(3) Renda: a renda considerada nesta dissertação é a renda média dos domicílios

por estado, que foi corrigida pelo IPCA a valores de 2014. De acordo com a teoria, existe

um efeito duplo dessa variável, o primeiro representa o custo de oportunidade da atividade

legal, que tem uma relação inversa com o crime, ou seja, quanto menor a renda que o

indivíduo pode aferir no mercado legal, maior é o incentivo a escolha pela atividade

-100%

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variação da taxa de detenção 2003/2012 variação da taxa de homicídio 2003/2012

37

ilegal. O segundo efeito é o pay-off do crime, e apresenta uma relação direta com a

criminalidade, isso porque, quanto maior for a renda por parte das vítimas, em uma dada

região, maior a criminalidade (ARAUJO JUNIOR E FAJNZYLBER, 2001b). O resultado

final depende de qual dos efeitos é mais forte, o que pode ser influenciado pela proxy

escolhida.

Aparentemente, os estados com maior renda média dos domicílios são aqueles que

apresentam menor taxa de criminalidade, ou seja, o efeito esperado é uma relação inversa

entre a renda e a criminalidade, a partir dos dados utilizados.

(4) Desigualdade de Renda: adotou-se o Índice de Gini como indicador de

desigualdade. Foi inicialmente introduzida no modelo para lidar com o efeito duplo da

renda, pois controlaria a correlação contrária entre renda e criminalidade, fazendo com

que esta mostrasse apenas o efeito do ganho com o crime (FLEISHER, 1966). No entanto,

a variável por si só tem efeito sobre a criminalidade ao indicar a proximidade

(convivência no mesmo território) de indivíduos com rendimentos muito diferentes

(FAJNZYLBER, LEDERMAN E LOAYZA 1999). De qualquer forma, é esperada uma

relação direta, quanto maior a desigualdade, maior a criminalidade.

(5) Taxa de desemprego: a taxa de desemprego é a razão entre o número de

desempregados e a PEA (população economicamente ativa) e é inserida no modelo com

uma defasagem. Segundo Freeman (1994), o desemprego tem efeito defasado no tempo

no aumento da criminalidade, em seu trabalho ele testou o efeito dominante dessa variável

ao inserir no modelo a taxa de desemprego em 𝑡 e em 𝑡 − 1, obtendo sinal negativo no

momento corrente e positivo no momento defasado, o que demonstra a existência de

defasagem na influência dessa variável no aumento da criminalidade.

De qualquer modo, o desemprego também tem efeito ambíguo. Um aumento em

sua taxa reduz a possibilidade de ganho com a renda do mercado legal, o que diminui o

38

custo de oportunidade da atividade ilícita e aumenta a criminalidade. Por outro lado, esse

aumento causa redução da renda local, o que diminui os ganhos com a atividade ilegal e

reduz a criminalidade (EHRLINCH, 1973).

(6) Utilização de álcool e drogas: como proxy para essa variável foi utilizado o

número de mortes ocasionadas pelo uso de álcool e drogas registradas no SIM por cem

mil habitantes, com base na metodologia criada por Cerqueira (2014)7. O aumento do

número de pessoas que ingerem álcool e drogas e a facilidade em obtê-los parece ser uma

das principais razões que mantém elevada a taxa de criminalidade, principalmente a taxa

de crimes violentos, durante os anos 2000 (CERQUEIRA 2014).

A disseminação da cocaína foi um dos fatores significativos para o aumento da

criminalidade, principalmente no homicídio de jovens, nos anos 80, nos Estados Unidos

(GROGGER E WILLIS 1998). No Brasil, existem muitos trabalhos que discutem essa

questão nas áreas de ciências sociais, psicologia e ciência política, contudo, poucos

trabalhos analisam a questão do ponto de vista da abordagem de economia do crime

proposta por Becker. Beato Filho et al. (2001), investigaram a influência do mercado de

drogas em Belo Horizonte, MG, preocupando-se com sua espacialização em aglomerados

(clusters) com alto uso de drogas e a violência. Seus resultados mostram que o tráfico de

drogas aumenta a violência sistêmica, o que gera maiores taxas de homicídio. A influência

do tráfico na criminalidade é extremamente alta por interferir diretamente na escolha pela

atividade ilegal. A atratividade dos ganhos fáceis e ascensão social no meio de

convivência induzem o aumento de "gangues" por onde ele passa (SHIKIDA e BORILLI,

2007 e SCHAEFER E SHIKIDA, 2009).

7 As subcategorias utilizadas do CID-10 são: F100-109, F110-119, F120-129, F140-149, F160-169, F190-

199, R780-789, T400-409, T438-449, X420-429, X450-459, X620-629, Y150-Y159, Y900-Y909 e

Y911-Y919.

39

Logo, é esperado que quanto maior a taxa de uso de drogas e álcool maior a

criminalidade.

(7) Proporção de homens jovens na população: é o número de homens entre 15 e

29 anos dividido pelo total da população. Praticamente todos os trabalhos que testam

empiricamente o modelo de economia do crime controlam a variação da taxa de

homicídio pelo sexo e/ou pela idade. A incidência da ocorrência de crimes é maior sobre

a população de homens em idade "jovem" tanto por parte dos indivíduos que cometem o

crime, quanto por suas vítimas (ANDRADE E LISBOA 2000, ARAÚJO JUNIOR E

FAJNZYLBER, 2001a). Dessa forma, espera-se que quanto maior a proporção de homens

jovens na população, maior a criminalidade.

É interessante notar, a partir da Tabela 1, a grande heterogeneidade entre os

estados brasileiros de algumas variáveis utilizadas no tempo e no espaço.

Tabela 1 – Estatísticas descritivas das variáveis utilizadas no modelo.

Variável Dimensão Média Desvio-

padrão Mínimo Máximo

Taxa de Homicídios overall

28,92

11,71 10,19 71,39

between 10,35 12,03 54,62

within 5.,60 9,02 47,09

Taxa de Pop. Carcerária overall

199,87

117,93 29,31 513,79

between 107,54 51,33 412,89

within 52,25 48,01 391,23

Taxa de Detenção overall

8,26

5,51 1,03 32,63

between 4,89 1,67 20,42

within 2,68 (3,40) 22,94

Uso de álcool e drogas overall

3,67

1,80 0,43 8,75

between 1,67 0,85 6,76

within 0,74 0,69 5,88

Desigualdade de Renda overall

0,51

0,03 0,41 0,59

between 0,03 0,44 0,56

within 0,02 0,44 0,57

Homens Jovens overall

14,71

1,02 11,78 17,84

between 0,85 12,52 16,01

within 0,58 12,97 16,54

40

Variável Dimensão Média Desvio-

padrão Mínimo Máximo

Taxa de desemprego overall

9,40

2,51 3,38 16,64

between 1,96 5,34 13,48

within 1,61 3,84 14,71

Renda overall

2555,46

862,19 209,17 6236,96

between 818,93 1660,67 5550,56

within 308,49 618,78 3316,87

Fonte: elaboração própria a partir dos dados das fontes citadas.

Espera-se que as variáveis taxa de homicídio defasada, uso de álcool e drogas,

desigualdade de renda e homens jovens, apresentem coeficientes com sinal positivo, e as

variáveis taxa de população carcerária e taxa de detenção, apresentem coeficiente com

sinal negativo. As variáveis taxa de desemprego e renda possuem relação ambígua com a

criminalidade, como descrita anteriormente, podendo apresentar sinal positivo ou

negativo. Os resultados obtidos através do procedimento metodológico descrito neste

capitulo encontram-se a seguir.

41

CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DOS RESULTADOS EMPÍRICOS: O QUE PARECE EXPLICAR A VARIAÇÃO NA TAXA DE HOMICÍDIOS ENTRE 2003 E 2012?

Neste capítulo são apresentados os resultados obtidos pelas estimações

econométricas e os respectivos testes de hipóteses. Aqui se confronta os resultados

esperados e os resultados obtidos, cuja análise permite inferir sobre os determinantes da

variação das taxas de homicídios entre as unidades da federação entre 2003 e 2012.

Os resultados empíricos variam muito de pesquisa para pesquisa, a depender da

especificação do modelo, do tipo de dado (cross-section, séries de tempo ou painel) e do

método de estimação, como exposto na literatura discutida ao longo dos Capítulos 1 e 2.

A existência de viés de variável omitida (que ocorre devido a complexidade

multidimensional desse fenômeno), a ausência de dados e, por vezes, a necessidade de

limitação da inclusão de variáveis explicativas em consequência do baixo número de

graus de liberdade, podem viesar os parâmetros estimados.

A inclusão da taxa de homicídio defasada pode ajudar no entendimento da

criminalidade a longo prazo e a controlar possível dinâmica na geração dessa variável.

Os modelos GMM permitem não apenas a inclusão da variável dependente defasada

como também, a utilização de variáveis explicativas endógenas ao modelo. O modelo

dinâmico estimado através do System GMM tona os instrumentos utilizados mais

consistentes.

Os resultados das especificações utilizadas estimadas a partir do GMM-SYS são

apresentados na tabela 1. Os testes de Sangan e de Arellano-Bond (autocorrelação de

primeira e segunda ordem indicam que os instrumentos utilizados são válidos. A

especificação GMM incluí todas as variáveis descritas no capitulo 2, a GMM2 elimina da

estimação a taxa de detenção, devido a autocorrelação encontrada entre a taxa de

42

população carcerária essa variável (a matriz de correlação encontra-se no apêndice), e,

por fim, o GMM3 elimina a taxa de detenção e a taxa de desemprego em t da estimação,

por essa segunda mostrar-se altamente correlacionada com a taxa de desemprego em 𝑡 −

1.

Tabela 2– Resultados das estimações por GMM-SYS

Variável dependente: taxa de

homicídios por cem mil habitantes GMM-SYS GMM-SYS2 GMM-SYS3

Taxa de Homicídios (t-1) 0.7021 *** 0.6825 *** 0.8031 ***

(4.39) (5.03) (6.94)

Taxa de Pop. Carcerária -0.0001 -0.0001 ** -0.0001 ***

(0.26) (1.97) (2.58)

Taxa de Detenção -0.0055

(0.26)

Uso de álcool e drogas -0.0013 -0.0049 -0.0049

(0.12) (1.08) (1.1)

Desigualdade de renda 1.3295 *** 0.9066 ** 0.3785 *

(2.85) (2.03) (1.72)

Homens jovens -0.0052 -0.0146 -0.009

(0.31) (1.01) (0.7)

Taxa de desemprego𝑡 0.0025 0.0059 *

(0.49) (2.03)

Taxa de desemprego𝑡−1 0.0064 0.0039 0.0035

(1.32) (1.04) (1.23)

Renda -0.0001 ** -0.0001 ** -0.0001 *

(1.97) (2.19) (1.79)

Teste de Sangan 1 1 1

Teste AR(1) 0.0099 0.0161 0.0088

Teste AR(2) 0.3306 0.3107 0.5002 Fonte: Elaboração própria por meio do software Stata 12.1.

Notas: Estimativa em dois estágios com correção paa heterocedasticidade e uso de controle de efeito fixo

no tempo. As variáveis instrumentais são a taxa de população carcerária e a taxa de detenção. Os

resultados entre parênteses representam o desvio-padrão e os asteriscos a estatística do p-valor (* p <

0,10, ** p < 0,05 e *** p < 0,01).

Como observado, algumas variáveis não se mostram estatisticamente

significativas, ao nível de 10% a taxa de homicídio defasada, a desigualdade de renda, e

a renda são significativas em todas as especificações.

Os resultados obtidos do coeficiente da inércia criminal variaram entre 0,68 e

0,80, segundo Fajnzylber, Lederman e Loaya (1999), que pesquisaram essa variável para

de 45 países, obtiveram como resultados que o crime defasado varia entre 0,5 e 0,9, ou

43

seja, entre 50% a 90% do crime atual tem influência do crime passado. Dessa forma, os

resultados encontrados neste trabalho se encontra dentro do intervalo esperado e é

compatível com as evidências empíricas internacionais.

A variável taxa de população carcerária, variável de interesse desse trabalho,

apresentou significância a 10% nos modelos GMM-SYS2 e GMM-SYS3, quando retirada

a variável taxa de detenção. O sinal encontrado foi o esperado, no entanto, não é possível

afirmar que um aumento no número de presos reduz a taxa de homicídio devido ao baixo

valor do coeficiente encontrado, no qual o valor zero encontra-se dentro do intervalo de

confiança.

A desigualdade de renda apresentou sinal esperado e com coeficiente com valores

elevados, comparados de forma relativa às outras variáveis, esta demonstra alta influência

na determinação das variações na taxa de homicídio. Por outro lado, a variável renda

apresentou baixo valor do coeficiente encontrado, repetindo o ocorrido com a variável

taxa de população carcerária (o valor zero está incluído no intervalo de confiança), e sinal

negativo, representando o custo de oportunidade do mercado de trabalho.

A seguir, são comparados, na medida do possível, os resultados encontrados nesta

pesquisa com outros trabalhos que buscaram estimar a influência do aumento do número

de presos na redução da criminalidade. A dificuldade de comparação se deve as diferentes

metodologias utilizadas e as diferentes bases de dados.

Levitt (1996), foi um dos primeiros trabalhos a analisar essa relação, a diferença

das variáveis utilizadas (retiradas do censo carcerário dos EUA) e a estimação por

variável instrumental, dificulta muito a comparação. Seus resultados mostram que o

aumento da população carcerária reduz todos os tipos de crimes nos estados americanos

entre 1971 e 1993. Os coeficientes encontrados foram -0,4 para crimes violentos e -0,3

para crimes contra o patrimônio. Posteriormente, Shekita (2015) analisou os dados dos

44

EUA entre 2000 e 2013, reproduzindo a metodologia utilizada por Levitt (1996), e obteve

resultado distinto, a variável de população carcerária não se mostrou estatisticamente

significativa.

Os trabalhos que se aproximam do método de estimação utilizado nesse trabalho,

são o de Bandyopadhyay, Bhattacharya e Han (2010) e Araujo Junior et al. (2014). O

primeiro analisou os dados da Inglaterra e do País de Gales entre 1992 e 2008. Seus

resultados, obtidos por meio da estimação GMM-DIF, mostraram alta influência do

aumento da população presidiária na redução do crime, as elasticidades encontradas

foram de -0,27 para crimes contra o patrimônio e -0,21 para crimes contra pessoa.

O segundo trabalho de Araujo Junior et al. (2014), um dos únicos estudos

realizados com dados brasileiros, encontrou significância estatística no coeficiente da

taxa de população carcerária para os estados brasileiros, entre os anos de 2005 e 2010,

com coeficiente de -0,026, o que, segundo os autores, representa baixa eficácia do sistema

prisional brasileiro. Como a fonte dos dados de população carcerária utilizados no

trabalho desses autores é a mesma deste trabalho, seus dados apresentam as mesmas

limitações encontradas nessa pesquisa: não é possível separas os presos por tipo de crime

e o a confiabilidade do número de presos reportados é duvidosa.

O Quadro 1 apresenta o resumo da análise dos resultados obtidos.

Quadro 1 – Síntese da análise dos resultados das estimações por GMM-SYS

Variável A que se refere Sinal

Esperado

Sinal

Obtido Comentário

Taxa de homicídios defasada Inércia da criminalidade. + + Significativa.

Taxa de população carcerária Probabilidade de punição. - - Significativa

em alguns

casos.

45

Variável A que se refere Sinal

Esperado

Sinal

Obtido Comentário

Taxa de Detenção Probabilidade de punição. - - Não

significativa.

Uso de álcool e drogas O aumento do número de

pessoas que ingerem álcool

e drogas e a facilidade em

obtê-los parece ser uma das

principais razões que

mantém elevada a taxa de

criminalidade

+ + Não

significativa.

Desigualdade de renda Indica a proximidade

(convivência no mesmo

território) de indivíduos

com rendimentos muito

diferentes

+ + Significativa.

Homens jovens Perfil demográfico mais

provável de cometer delito.

+ - Não

significativa.

Taxa de desemprego O desemprego tem efeito

ambíguo. Um aumento em

sua taxa reduz a

possibilidade de ganho com

a renda do mercado legal, o

que diminui o custo de

oportunidade da atividade

ilícita e aumenta a

criminalidade. Por outro

lado, seu aumento causa

redução da riqueza de um

dado local, o que diminui

os ganhos com a atividade

ilegal e reduz a

criminalidade.

+ - + Não

significativa.

Renda Maior custo de

oportunidade por um lado,

porém renda maior pode se

relacionar com patrimônio

acumulado maior

(benefício monetário).

+ - - Significativa.

O efeito do

custo de

oportunidade

predominou.

Fonte: elaboração própria

As variáveis socioeconômicas e de punição têm efeito menor do que o esperado

(ou mesmo estatisticamente nulo). Por outro lado, a inércia apresenta-se estatisticamente

significante e com grande magnitude, trazendo a seguinte conclusão: “quanto mais se

mata mais se tende a matar”. Ou seja, o ambiente social, ao se tornar mais violento, produz

efeitos deletérios que vão além do momento presente – eles afetam o futuro.

46

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve como objetivo principal analisar o efeito marginal de um preso

sobrea criminalidade, representada pela taxa de homicídio, no Brasil, no período 2003 a

2012, por meio da abordagem da Economia do Crime proposta por Becker (1968). No

primeiro capítulo foi feita a revisão da literatura, descrevendo os princípios da teoria de

economia do crime e seus avanços empíricos a partir dos trabalhos aplicados

subsequentes. No segundo capítulo foram apresentados os procedimentos metodológicos

e a evolução dos dados utilizados nas variáveis dependente e explicativas dos modelos.

No terceiro capítulo foram expostos e discutidos os resultados obtidos por meio da análise

econométrica efetuada.

O problema da criminalidade é um dos grandes obstáculos atuais para o

desenvolvimento socioeconômico do país. As pesquisas empíricas realizadas até o

presente parecem indicar que o aumento do número de presos reduz a criminalidade,

principalmente em países desenvolvidos como os Estados Unidos e Inglaterra. Entretanto,

para o Brasil, essa relação é pouco significativa ou, ao menos, ainda não é clara

(particularmente no caso de homicídios).

Os resultados encontrados apresentaram significância estatística e sinal esperado

para a variável taxa de população carcerária nas especificações GMM-SYS2 e GMM-

SYS3, no entanto, o intervalo de confiança, dos coeficientes encontrados, incluiu o zero.

As variáveis taxa de homicídio defasada, a desigualdade de renda e a renda mostraram-

se estatisticamente significativas.

Dessa forma, é possível levantar algumas conjecturas acerca dos dados e do

sistema criminal nacional, em particular para os homicídios dolosos, além da própria

aplicação deste tipo de modelagem econométrica para o caso brasileiro:

47

(i) A baixa influência da variável taxa de população carcerária pode ocorrer devido

à utilização do número total de presos como proxy, os dados existentes não permitem

discriminar o tipo de crime, dessa forma, a comparação é feita entre os homicídios

cometidos e os indivíduos presos por todo tipo de crime. O “descasamento” entre a

variação no número de presos e a variação da taxa de homicídios entre os estados

corrobora com a possibilidade de o aumento no número de presos estar ocorrendo por

condenações devidas a outros crimes que não o homicídio. A inexistência de pesquisas

sobre a população carcerária inviabiliza o entendimento das condenações por tipo de

crime, o entendimento das condições socioeconômicas dos criminosos e suas motivações.

Pode-se dizer que está é a maior limitação para o estudo da eficácia do sistema prisional

brasileiro;

(ii) A Existência de alta correlação entre a taxa de população carcerária e a taxa

de detenção demonstra a necessidade de se criar uma melhor proxy para a probabilidade

de apreensão e condenação. Além disso, as duas variáveis apresentam restrições: o

número de presos, retirado do InfoPen são reportados pelos diretores dos

estabelecimentos penais, podendo apresentar diferença de metodologia entre os estados,

em alguns casos não são reportados o número de presos encarcerados nas unidades

policiais; a taxa de detenção foi criada misturando-se uma variável de fluxo, número de

homicídios, com uma variável de estoque, número de presos. A falta de dados melhores

e com maior diversidade limita a análise dos resultados apresentados nesta e em outras

pesquisas.

(iii) A alta importância da inércia criminal, cuja variação explica entre 70% a 80%

da variação da criminalidade corrente, pode demonstrar, em parte, o viés de variável

omitida. Essa variável também representa a alta reincidência ou a demora na resposta da

mudança de políticas de combate ao crime. De qualquer forma, a redução na importância

48

dessa variável depende de mudanças das leis penais e da política de segurança pública. A

existência da sensação de impunidade pode ser um dos grandes fatores para o aumento

da taxa de homicídios;

(iv) Pessoas que são presas têm dificuldade de conseguirem emprego por causa da

ficha criminal, do baixo nível de escolaridade formal e da pouca experiência profissional.

Altos níveis de reincidência mostram que a punição como privação de liberdade não foi

eficaz em desencorajar a criminalidade. As políticas públicas têm mostrado pouco suporte

para a educação das crianças, programas de aconselhamento e tratamento para ex-

criminosos (GAINSBOROUGH E MAUER, 2000 p. 26);

(v) O encarceramento maciço implica custos econômicos e sociais, de acordo com

o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2014, 1.26% do PIB brasileiro, em 2013,

foi destinado ao gasto com segurança, isso sem contar o gasto privado e as perdas

advindas do crime. Os recursos empregados com segurança pública necessitam melhor

gestão, de modo que o encarceramento possa reduzir a criminalidade.

Em suma, os resultados obtidos nesta dissertação indicam que, apesar de suas

limitações, o aumento no número de presos não reduziu o número de homicídio nos

estados brasileiros durante o período estudado. Todavia, é necessário levar em

consideração as limitações discutidas (limitação dos dados, da construção das variáveis e

da necessidade de incorporar outras variáveis que influenciam na determinação da

criminalidade)3e. Infelizmente a limitação imposta pelo tipo de dados disponibilizado

pelas autoridades brasileiras e pelos graus de liberdade necessários à estimação impedem

de se adicionar mais e melhores variáveis explicativas ou de controle no modelo estimado.

Entretanto, é a partir de trabalhos desta natureza e da respectiva divulgação pública que

se explicita a necessidade de melhoria na qualidade de informação a respeito dos delitos,

dos processos e dos criminosos capturados e encarcerados. Não há base de dados

49

sistematizada e comparável sobre tipo de crime, perfil socioeconômico do criminoso,

penalidades impostas etc. Esse passo é um dos vários necessários para que o sistema

criminal brasileiro seja mais efetivo e que a sensação de impunidade e de que “o crime

compensa” seja minimizada no país.

50

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54

APÊNDICE Tabela 3 – Matriz de correlação entre variáveis do modelo

Taxa de

Homicídios

Taxa de

Pop.

Carcerária

Taxa de

Detenção

Uso de

álcool e

drogas

Desigualdade

de renda

Homens

jovens

Taxa de desemprego

𝑡

Taxa de

desemprego𝑡−1

Renda

Taxa de Homicídios 1

Taxa de Pop. Carcerária 0.0494 1

Taxa de Detenção -0.4118 0.777 1

Uso de álcool e drogas 0.1445 0.0043 -0.0598 1

Desigualdade de renda 0.0678 -0.2162 -0.2828 0.1804 1

Homens jovens -0.1159 -0.1137 -0.0961 -0.3323 0.3043 1

Taxa de desemprego𝑡 0.2814 -0.148 -0.3337 -0.1038 0.3681 0.2632 1

Taxa de desemprego𝑡−1 0.2642 -0.1014 -0.2921 -0.0935 0.3261 0.253 0.7866 1

Renda 0.0011 0.5312 0.4522 0.2341 -0.1582 -0.4347 -0.0558 0.0012 1 Fonte: elaboração própria por meio do software Stata 12.1

55

Tabela 4 – Resultados das estimações EF, EA e GMM-DIF

Variável dependente: taxa de

homicídios por cem mil habitantes EF EA GMM

Taxa de Homicídios (t-1) - - 0.6338 ***

- - (2.93)

Taxa de Pop. Carcerária 0.0005 0.0010 *** 0.0010

(1.65) (3.06) (0.12)

Taxa de Detenção -0.0163 *** -0.0238 *** -0.0014

(3.78) (4.69) (0.32)

Uso de álcool e drogas 0.0337 0.0213 *** -0.0086

(4.39) (2.8) (0.67)

Desigualdade de renda -0.1691 -0.0738 0.3014

(0.46) (0.23) (1.00)

Homens jovens -0.0166 -0.0170 * -0.0167

(1.62) (1.66) (1.41)

Taxa de desemprego𝑡 0.0053 0.0030 0.0033

(1.19) (0.86) (0.73)

Taxa de desemprego𝑡−1 0.0039 0.0025 0.0029

(0.79) (0.56) (0.74)

Renda 0.0001 ** 0.0001 ** 0.0001

(2.61) (1.98) (1.34)

Teste de Hausman 0,000

Teste de Sangan 1

Teste AR(1) 0.0051

Teste AR(2) 0.6271 Fonte: Elaboração própria por meio do software Stata 12.1.

Notas: ¹ Todas os coeficientes foram estimados de forma robusta para heterocedasticidade.

² Os resultados entre parênteses representam o desvio-padrão e os asteriscos a estatística do p-

valor (* p < 0,10, ** p < 0,05 e *** p < 0,01).