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E D I T O R I A L ÓRGÃO DA FUNDAÇÃO CHRISTIANO ROSA DISTRIBUIÇÃO GRATUITA PIQUETE, MAIO/2011 - ANO XIV - N o 172 O ESTAFETA Reprodução Quando todos achavam que não poderia piorar a descontrolada proble- mática do uso de drogas no país, eis que aparece mais um item no cardápio deste triste dilema: o óxi. Esta nova droga chegou ao país recentemente, nas regiões das fronteiras com a Bolívia e a Colômbia. Devastador, o óxi é conside- rado pior que o crack, pois vicia mais rapidamente. Nos últimos anos tem aumentado num ritmo alarmante o uso ilícito de drogas, tornando-se um grave problema de saúde pública em todo o mundo. Suas consequências e prejuízos não se restringem ao usuário, mas atingem também sua família, seus vizinhos, seu emprego e sua comunidade. Ao mesmo tempo surgem duas questões importantes: como lidar com alguém conhecido com problemas decorrentes do uso de drogas e, princi- palmente, o que fazer para prevenir o uso indevido em nossa própria família? Sabemos que a tarefa de prevenir o consumo não tem sucesso se for um esforço isolado. A situação que se apresenta é o principal exemplo da necessidade da “responsabilidade compartilhada”, ou seja, o envolvimento de diversas formas de atuação para que bons resultados sejam alcançados. Assim, a parceria entre as instituições oficiais e a família torna-se um dos principais núcleos da ação efetiva. E uma das principais formas de auxiliar a família a enfrentar o problema é a divulgação de informações corretas, atualizadas e isentas dos preconceitos sobre as drogas, e a prevenção do seu uso indevido, tão comum quando esse assunto vem à tona. Os jovens constituem a população mais suscetível ao consumo de drogas. Ao mesmo tempo, uma das mais efetivas formas de prevenir é o fortalecimento da interação positiva entre jovens e adul- tos. As propostas preventivas devem ser destinadas não apenas a prevenir o uso indevido de drogas, mas a resgatar toda uma dimensão humana desrespeitada. É uma tarefa difícil e complexa, pois envolve o restabelecimento de sentidos para a vida social, devolvendo valores e normas éticas baseadas no respeito à pessoa e às suas diferenças, bem como ao ambiente e às tradições culturais, religiosas e históricas. É este conjunto, com suas numerosas interfaces trans- culturais, que órgãos internacionais denominam “melhoria de qualidade de vida”, focalizando não o produto, nem o combate às drogas, mas sim, o homem enquanto cidadão, pessoa e sujeito ativo. Criada em 29 de outubro de 1810, a partir da coleção trazida por Dom João VI, com a vinda da família real portuguesa para o Brasil, a Biblioteca Nacional comemorou 200 anos de existência. De um acervo inicial de 60 mil peças, já àquela época, de valor inestimável, similar às melhores coleções reais europeias, a Biblioteca abriga hoje mais de 9 milhões de obras, sendo consi- derada pela UNESCO uma das dez maiores do mundo. No final do ano passado, durante a solenidade comemorativa da efeméride, o ministro da cultura, discursando sobre a data e a importância da leitura, afirmou que somente municípios que mantenham biblio- tecas públicas terão direito de receber verbas do Ministério. A medida foi detalhada por portaria ministerial e visa a garantir que os prefeitos invistam na sua manutenção. O Brasil é um país em que poucos têm acesso a livros e, por isso, poucos leem. Essa verdade, que já era conhecida dos brasileiros, recentemente foi confirmada pelo 1º Censo Nacional das Bibliotecas Públicas Municipais feito pela Fundação Getúlio Vargas para o Ministério da Cultura em 4905 cidades de todas as regiões, no ano passado. Os números são desanimadores. Em pelo menos 420 municípios a população não conta com nenhuma biblioteca pública. E nem o crescimento significativo dos investi- mentos feitos pelo governo federal, que aumentaram 1500% de 2003 a 2009, de R$6 “Um país se faz com homens e livros” milhões para R$95 milhões, reverteu a situação negativa. A principal razão apontada é a falta de estrutura dos municípios, além da neces- sidade de cumprir muitas exigências burocráticas. Mas é claro que por trás do problema há uma questão muito mais ampla, com raízes culturais econômicas e políticas, e é antiga na história do Brasil. A educação pública, em muitos municí- pios, ainda é encarada por administradores mais como despesa do que como processo de crescimento social. Tanto que foi necessário definir na Constituição o percentual mínimo do orçamento que deve ser investido no setor. À questão do custo se associa a falta de tradição de leitura dos brasileiros. Por isso, é preciso que, além de liberar verbas, o governo desenvolva projetos de distri- buição de livros e incentivo à leitura. E que eles não se restrinjam a bibliotecas. É preciso criar o hábito da leitura desde os primeiros anos na escola, com aulas específicas, profissionais preparados e acervo adequado. O país não pode cair na armadilha de limitar o processo educacional à transmissão de conhecimentos básicos. A educação precisa ser transformadora e formadora de cidadãos com a melhor bagagem cultural possível. Afinal, como ensinou Monteiro Lobato, “um país se faz com homens e livros”. Os livros são importantes tanto para a formação cultural como para a formação de uma pessoa como cidadã. É na biblioteca, em meio a todos os livros, que um mundo diferente é descoberto pelas crianças, adolescentes e adultos. Na foto, a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em 1910.

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EDIÇÃO 172 - ANO XIV

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E D I T O R I A L

ÓRGÃO DA FUNDAÇÃO CHRISTIANO ROSA

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA PIQUETE, MAIO/2011 - ANO XIV - No 172

O ESTAFETAReprodução

Quando todos achavam que nãopoderia piorar a descontrolada proble-mática do uso de drogas no país, eis queaparece mais um item no cardápio destetriste dilema: o óxi. Esta nova drogachegou ao país recentemente, nasregiões das fronteiras com a Bolívia e aColômbia. Devastador, o óxi é conside-rado pior que o crack, pois vicia maisrapidamente.

Nos últimos anos tem aumentadonum ritmo alarmante o uso ilícito dedrogas, tornando-se um grave problemade saúde pública em todo o mundo. Suasconsequências e prejuízos não serestringem ao usuário, mas atingemtambém sua família, seus vizinhos, seuemprego e sua comunidade.

Ao mesmo tempo surgem duasquestões importantes: como lidar comalguém conhecido com problemasdecorrentes do uso de drogas e, princi-palmente, o que fazer para prevenir o usoindevido em nossa própria família?

Sabemos que a tarefa de prevenir oconsumo não tem sucesso se for umesforço isolado. A situação que seapresenta é o principal exemplo danecessidade da “responsabilidadecompartilhada”, ou seja, o envolvimentode diversas formas de atuação para quebons resultados sejam alcançados.Assim, a parceria entre as instituiçõesoficiais e a família torna-se um dosprincipais núcleos da ação efetiva. E umadas principais formas de auxiliar a famíliaa enfrentar o problema é a divulgaçãode informações corretas, atualizadas eisentas dos preconceitos sobre asdrogas, e a prevenção do seu usoindevido, tão comum quando esseassunto vem à tona.

Os jovens constituem a populaçãomais suscetível ao consumo de drogas.Ao mesmo tempo, uma das mais efetivasformas de prevenir é o fortalecimento dainteração positiva entre jovens e adul-tos. As propostas preventivas devem serdestinadas não apenas a prevenir o usoindevido de drogas, mas a resgatar todauma dimensão humana desrespeitada. Éuma tarefa difícil e complexa, poisenvolve o restabelecimento de sentidospara a vida social, devolvendo valorese normas éticas baseadas no respeito àpessoa e às suas diferenças, bem comoao ambiente e às tradições culturais,religiosas e históricas. É este conjunto,com suas numerosas interfaces trans-culturais, que órgãos internacionaisdenominam “melhoria de qualidade devida”, focalizando não o produto, nem ocombate às drogas, mas sim, o homemenquanto cidadão, pessoa e sujeitoativo.

Criada em 29 de outubro de 1810, a partirda coleção trazida por Dom João VI, com avinda da família real portuguesa para oBrasil, a Biblioteca Nacional comemorou200 anos de existência. De um acervo inicialde 60 mil peças, já àquela época, de valorinestimável, similar às melhores coleçõesreais europeias, a Biblioteca abriga hojemais de 9 milhões de obras, sendo consi-derada pela UNESCO uma das dez maioresdo mundo.

No final do ano passado, durante asolenidade comemorativa da efeméride, oministro da cultura, discursando sobre a datae a importância da leitura, afirmou quesomente municípios que mantenham biblio-tecas públicas terão direito de receberverbas do Ministério. A medida foi detalhadapor portaria ministerial e visa a garantir queos prefeitos invistam na sua manutenção.

O Brasil é um país em que poucos têmacesso a livros e, por isso, poucos leem.Essa verdade, que já era conhecida dosbrasileiros, recentemente foi confirmadapelo 1º Censo Nacional das BibliotecasPúblicas Municipais feito pela FundaçãoGetúlio Vargas para o Ministério da Culturaem 4905 cidades de todas as regiões, no anopassado.

Os números são desanimadores. Em pelomenos 420 municípios a população nãoconta com nenhuma biblioteca pública. Enem o crescimento significativo dos investi-mentos feitos pelo governo federal, queaumentaram 1500% de 2003 a 2009, de R$6

“Um país se faz com homens e livros”milhões para R$95 milhões, reverteu asituação negativa.

A principal razão apontada é a falta deestrutura dos municípios, além da neces-sidade de cumprir muitas exigênciasburocráticas.

Mas é claro que por trás do problema háuma questão muito mais ampla, com raízesculturais econômicas e políticas, e é antigana história do Brasil.

A educação pública, em muitos municí-pios, ainda é encarada por administradoresmais como despesa do que como processode crescimento social. Tanto que foinecessário definir na Constituição opercentual mínimo do orçamento que deveser investido no setor.

À questão do custo se associa a faltade tradição de leitura dos brasileiros. Porisso, é preciso que, além de liberar verbas,o governo desenvolva projetos de distri-buição de livros e incentivo à leitura. E queeles não se restrinjam a bibliotecas. Épreciso criar o hábito da leitura desde osprimeiros anos na escola, com aulasespecíficas, profissionais preparados eacervo adequado.

O país não pode cair na armadilha delimitar o processo educacional à transmissãode conhecimentos básicos. A educaçãoprecisa ser transformadora e formadora decidadãos com a melhor bagagem culturalpossível. Afinal, como ensinou MonteiroLobato, “um país se faz com homens elivros”.

Os livros são importantes tanto para a formação cultural como para a formação de uma pessoa comocidadã. É na biblioteca, em meio a todos os livros, que um mundo diferente é descoberto pelas crianças,adolescentes e adultos. Na foto, a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, em 1910.

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Para os católicos o mês de maio é todovoltado para a exaltação e louvores a NossaSenhora. Ao longo da história da Igreja, osfiéis, lembrando-se das palavras de Maria“Todas as gerações me chamarão de Bem-aventurada, porque fez em mim grandescoisas o Todo-poderoso” (Lc1,48) erefletindo na grandeza da salvação, foramenriquecendo o seu manto com títulos quedemonstram a confiança e o amor para comEla.

A Igreja nos ensina que Maria é aMedianeira de todas as graças. Modeloperfeito de todas as virtudes, com seuexemplo aprendemos como imitar o seuFilho. Na imitação das virtudes de Mariase manifesta verdadeiramente nossadevoção. E essas virtudes nós encon-tramos nas páginas dos Evangelhos: aobediência, a humildade, a pureza decoração. Espelhando-se em seu exemplo, aIgreja dedica a Ela o mês de maio.

Maria Santíssima sempre foi veneradapelos piquetenses. O amor dedicado a Elamanteve os paroquianos fiéis à religiãocatólica, mesmo durante os muitos anos emque não havia padre residindo na freguesiade São Miguel. Nesse longo período apopulação se reunia frequentemente pararezar o terço. A devoção mariana foi ofermento de renovação espiritual, de trans-formação profunda de nossa comunidade ea manteve unida. De diferentes maneiras ospiquetenses buscavam demonstrar suadevoção a Nossa Senhora. Tradicio-

nalmente, no dia 31 de maio acontecia aCoroação de Nossa Senhora. Não se sabeao certo quando ocorreu a primeira delasem Piquete. Sabemos que a partir da che-gada do padre João Guimarães, em 1934, acada ano a festa crescia em número departicipantes. Concorreu para isto o trabalhoda Pia União das Filhas de Maria e dosCongregados Marianos. No final dos anos40, com a chegada das Irmãs Salesianas, afesta da Coroação de Nossa Senhora passoua acontecer, também, nas capelas do Hospitale de São José.

Durante o mês de maio, a imagem deNossa Senhora visitava as casas dasfamílias, especialmente das que pagavampromessas por graças alcançadas. Todas asnoites, na velha Matriz, havia reza do terço,ladainha cantada de Nossa Senhora, ofere-cimento de flores pelas crianças da CruzadaEucarística e do catecismo paroquial e abênção com o Santíssimo Sacramento. Emseguida, a imagem de Nossa Senhora eraconduzida em procissão, transportada numandor, geralmente levado por 4 Filhas deMaria ou por 4 Congregados Marianos auma casa, onde pernoitava. No dia seguinte,era costume a família anfitriã rezar o terço aomeio dia, em companhia da vizinhança. Ànoite, a imagem era reconduzida à Matrizpela família, vizinhos e devotos. Esse ritualera reproduzido todas as noites do mês demaio. O ápice dessa festa acontecia no dia31, na Matriz de São Miguel. Nessa ocasião,todas as famílias se reuniam para assistir à

coroação de Nossa Senhora como Rainhado Céu e da Terra. Num altar erigido na lateralda igreja, a imagem era entronizada. Adecoração do altar surpreendia pelo bomgosto e esmero. Dava gosto vê-lo cheinhode meninas vestidas de anjos, com suastúnicas, coroas e asas nas cores branca, azule rosa. Todos se emocionavam com a ofertade rosas e o som das vozes infantis. O pontoalto era a coroação propriamente dita. Umdos anjos, com voz quase divina, cantava ohino de louvor a Maria à medida que iacoroando a imagem. Colocada a coroa sobrea cabeça de Nossa Senhora, uma chuva depétalas de rosas era atirada pelos demaisanjinhos. Os sinos repicavam festivos,enquanto os presentes à cerimônia, com ocoração palpitando, tinham os olhosmarejados.

Certa vez, conta o professor ChicoMáximo, cronista das coisas piquetenses,numa coroação de Nossa Senhora, a igrejaMatriz de São Miguel estava mais cheia quede costume. Naquele ano houve umaparticipação comunitária maior que a dosanos anteriores. Após a coroação e aotérmino da cerimônia, dona Nair Porfírio,uma das Filhas de Maria, entoou o hino“Um terno adeus de saudade”, sendoacompanhada por toda a Igreja. Foi ummomento de grande emoção, uma -quecontagiou a todos, verdadeira catarse, daqual saíram todos para suas casas com aalma lavada e a devoção a Nossa Senhorafortalecida.

A coroação de Nossa Senhora

Imagem - Memória Foto arquivo Pro-Memória

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O ESTAFETA

GENTE DA CIDADEGENTE DA CIDADE

Página 3Piquete, maio de 2011

Vicente Cândido

A Redação não se responsabiliza pelos artigos assinados.

Diretor Geral:Antônio Carlos Monteiro ChavesJornalista Responsável:Rosi Masiero - Mtd-20.925-86Revisor: Francisco Máximo Ferreira NettoRedação:Rua Coronel Pederneiras, 204Tels.: (12) 3156-1192 / 3156-1207Correspondência:Caixa Postal no 10 - Piquete SP

Editoração: Marcos R. Rodrigues RamosLaurentino Gonçalves Dias Jr.

Tiragem: 1000 exemplares

O ESTAFETAFundado em fevereiro / 1997

Notas da Cidade

FCR proporciona bolsa de estudosA Web Cursos Informática e Profissiona-

lizantes está ministrando em uma sala daescola Leopoldo Marcondes de MouraNetto aulas de informática. Estão dispo-níveis os seguintes cursos: Operador deComputador, Profissionalizante em WEBDesigner, Designer Gráfico, AssistenteContábil, Secretariado Administrativo eAuto CAD.

A Fundação Christiano Rosa, reconhe-cendo a importância dos cursos para odesenvolvimento de jovens e adultos, selouparceria com o coordenador do curso,Vicente Alves da Silva Filho, e está propor-cionando gratuitamente dez vagas. Ametodologia de ensino utilizada, da Micro-vip: aulas de duas horas ministradas nostrês períodos. No mês de maio, 87 novosalunos se matricularam nos cursos disponí-veis, que terão duração de dois anos. Aofinal, os aprovados receberão certificadosde Operador de Computador, e outro de umafunção profissionalizante à escolha doaluno.

O Jongo de Piquete no 13 de MaioNo dia 13 de maio, em comemoração à

libertação dos escravos, o Grupo Jongo dePiquete promoveu, pelo terceiro ano, aMarcha Contra o Racismo e todo tipo depreconceito, que percorreu diversas ruas dacidade. Além dos jongueiros, participaramalunos das escolas municipal e estaduaisdo município, além das particulares Profes-sor Leopoldo Marcondes de Moura Netto eInstituto Educacional Cristão.

Este ano, contaram com o apoio doSindicato dos Metalúrgicos de Taubaté eRegião, que disponibilizou um carro-de-som.

À noite, uma grande roda de jongoaconteceu no Recinto de Festas MiguelPurcino Ferreira. Ao som do tambu docandongueiro e da puíta, a comunidadecantou e dançou até de madrugada. Noquiosque do recinto, foi servida canjiquinhacom costelinha de porco.

A comunidade jongueira se reunirá nodia 11 de junho, na casa do Mestre Gil, paraa tradicional reza do Terço dos Negros, emlouvor a Santo Antônio.

“Do Prata ao Amazonas, do mar àscordilheiras, cerremos as fileiras, soldadosdo Senhor!

O nome teu, Maria, ó Virgem Soberana,nos une e nos irmana, nos dá força e valor,nos dá força e valor!” (trecho do Hino dosCongregados Marianos)

Muito religioso, Vicente Cândido daSilva, desde a mais tenra idade tem NossaSenhora como luz e guia a iluminar seuscaminhos. Filho de José Cândido da Silva eErnestina Gonçalves da Silva, nasceu nobairro do Quilombo, em 1º de outubro de1930. É o mais velho de três filhos. Fre-quentou os primeiros anos de estudo numaescola rural, no bairro onde nasceu. Em1938, a família se mudou para Piquete. O paiveio trabalhar na fábrica de pólvora. Concluiuo curso primário no Grupo Escolar daFábrica, matriculando-se, a seguir, na EscolaIndustrial Masculina, no curso de Eletri-cidade. Refere-se a esse período de estudoscomo um dos melhores de sua vida. Aorganização da escola com seus diversoscursos, a disciplina dos alunos e o empenhodo coronel Monte, supervisionando tudo,ficaram em sua memória. Cita o diretor, pro-fessor Augusto Ribeiro e dos professoresLaércio Azevedo, João Ramos, José Evan-gelista, Faury, Miguel Médice, Léo, PedroMazza, Antenor Figueira... Na parte dasoficinas, Willi Vieth, no ensino da Mecânicade Máquinas, e Antônio Faustino, no deEletricidade, em que Vicente Cândido seespecializou. “Éramos sete os alunos doCurso: eu, Rosemar Jaime da Silva, ArmandoCâmara, Norival Ribeiro da Silva, JoãoDuran, Valdomiro Pereira e Chico Maga-lhães”. “A Fábrica investia muito na EscolaIndustrial, que era uma referência no ensinotécnico na região”, afirma, orgulhoso. Apósa formatura, o coronel Orlando da CostaCanário enviou os sete eletricistas recém-formados para um curso de aperfeiçoamentoem São Paulo que durou dois anos. Aoretornar, foi trabalhar na 5ª Divisão, cujomestre à época era Valdir Vianna e o diretoro coronel Canário. Vicente Cândido contaque, àquela época, a Fábrica investia pesadona formação de técnicos e que certa vez,após uma explosão no 3º Grupo, vieram unsalemães para instalar uma nova fábrica. Ossete ex-alunos do Industrial tiveram aulasbásicas de alemão, em Taubaté, a fim de que

aprendessem o básico daquele idioma. Após35 anos de trabalho, aposentou-se em 1981,mas foi convidado a continuar. Permaneceu,então, por mais dez anos na mesma função.

Vicente Cândido afirma que a família foisempre muito religiosa e que, certa vez, naantiga matriz de São Miguel, uma Filha deMaria chamou-lhe a atenção. Era Josefinade Oliveira Alves. Após dois anos de olha-res trocados e correspondidos, casaram-sea 10 de setembro de 1955. Desta uniãoresultaram duas filhas e cinco netos.

Católico fervoroso, é CongregadoMariano há 64 anos. Entrou para essaAssociação de leigos em 1946, quando opresidente era Luiz Vieira Soares e o PadreJuca o pároco. Há seis anos é presidente daCongregação Mariana Nossa SenhoraAuxiliadora e São Luiz de Gonzaga. Até anosatrás, a congregação era composta somentede homens. Com o fim da Pia União dasFilhas de Maria, passou a contar com aparticipação de mulheres. São trinta oscongregados atualmente, que se reúnemtodas as quintas-feiras, às 19h, no SalãoParoquial.

Aos 80 anos, Vicente Cândido mantém-se ativo. Às terças e quintas-feiras, faz um

trabalho de cate-quese com os meni-nos da Escolinha deFutebol Pirralhos:antes do treino,quem passa pelocampo, o vê, ao cen-tro, cercado pelosatletas – “Sem cate-quese, não há fute-bol”, é a regra. “Aparticipação é de100%!”

Seu Vicentenos faz lembrarque “Santidade eapostolado” sãoduas metas parauma transforma-ção cristã da so-ciedade humana.

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O ESTAFETA Piquete, maio de 2011Página 4

A informação do locutor darádio Aparecida dava conta deque a Festa dos Reis se daria nosdias finais do mês de janeiro de2011. Comunicava ele da partici-pação de cerca de 50 Folias deReis dos estados de São Paulo,Minas Gerais e Goiás, onde essatradição ainda é cultivada comomanifestação cultural do mês dejaneiro. Faz parte dos calendáriosdas comunidades de área rural,ou de origem das mesmas,mantendo-se, pela força de seusparticipantes, particularmentenos bairros das periferias dasáreas urbanas onde se con-centram grupos de populaçãoruralizada.

A oportunidade da infor-mação levou-me de volta à visitaque fiz a Sevilha na década de1980. Foi quando o locutoranunciou os shows noturnos dos dias daFesta de Aparecida, e citou o de encer-ramento com Renato Teixeira. Esse nomeprovocou-me a doce lembrança de terouvido do rádio receptor do motorista detáxi que me transportava em Sevilha, sobrea ponte do rio Guadarrama (semelhante aoParaíba pela largura e posicionamento nocentro da cidade), a voz de Elis Regina, comaquela emoção e sensibilidade cantando“Romaria”. Momento inesquecível vendo atorre da Catedral de Sevilha, torre elegantee afinada, com uma pequena figura femininamóvel no topo, movendo-se ao sabor dosventos a “Giralda” – (pelo que me lembreidos galantes galinhos de nossa matrizancestral). Fui em direção às ruínas de umaantiquíssima cidade romana nos arredoresde Sevilha. Bela visita para observar ostrabalhos em mosaico muito bem conser-vados e de fino lavor.

Peregrinei depois para a capela da Virgen

Sevilha, Olé!

de La Macareña, a Nossa Senhora dostoureiros, extraordinária imagem de porce-lana, cabelos naturais, olhos brilhantes evivos, o vestuário rico e coberto de pérolase pedras preciosas: diamantes, esmeraldas,rubis, e tudo o mais. Beleza de tirar o fôlego.Bem ao lado, a praça de touros. Felizmenteera janeiro – mês de inverno, não detouradas, pois não iria vê-las. Mas, melembrei do famoso filme “Sangue e areia”,feito com paixão, bons atores e cenáriosempolgantes, e que Madona retomou emluxuriante vídeo-clipe. Sensualisticamente.

Fui também às “Cuevas” cavadas nosmorros, onde vivem os ciganos e nosoferecem empolgantes espetáculos deTablado e flamengo. Dançarinas vibrantes,indumentárias belíssimas, cantores lamen-tosos às guitarras gitanas. E os saltos dossapatos a contrapontear e compassar asmelodias, muitas delas milenárias elendárias.

Andaluzia, das muitas lendase mistérios.

Agora, passado o tempo, Sevi-lha ressurge para mim, inesque-cível e imorredoura. E pensar queum golpe de sorte levou-me até lá,pois já havia ido a Granada, Cór-doba e muitas outras ao norte e aocentro do país. Estava pronta parasair de Madri para São Paulo.Tinha, porém, mais um dia todo.Como aconteceu sempre no i-nverno na Europa mediterrânea, achuva intermitente dificultava osmovimentos pela cidade. Madri émuito úmida no inverno. Fui aBarajas, o aeroporto. Dirigi-me aoguichê para comprar passagem.Para onde? Sevilha, apostei. – “Nãohá lugares. Todos reservados”,disse-me o atendente. Somente nalista de espera. Joguei novamentena sorte. Era véspera de Reis, data

de grande movimento na Espanha. Comemo-ração de reuniões familiares. Mais do queno Natal, dia de trocar presentes. Dei sorte,consegui o lugar desejado. Embarquei. Oavião foi passando pelos planaltos, depoisas colinas cobertas de olivais – e o solmediterrâneo iluminando aquelas terrassemiáridas e seus canais de irrigação. Visiteilindamente Sevilha, seus palácios e seusjardins fechados, os laranjais avermelhados,as ruas fervilhantes de um povo alegre, aCatedral e o túmulo de Colombo (mas dizemque ele não está lá, e sim na AméricaCentral), e vi toda a celebração dos Reis,uma festa familiar e popular rica de tradiçõese cultura. Um dos dias mais venturosos deminha vida. Voltei para Barajas, onde deixaraminha bagagem e embarquei para São Paulocom o coração iluminado e a cabeça incen-diada.

Dóli de Castro Ferreira

Catedral de Sevilha, Espanha

A preocupação em recuperar e preservaro meio ambiente tornou-se, nas últimasdécadas, prioridade cada vez maior de todosos povos do Planeta. Trata-se de umaquestão de sobrevivência de todas asespécies. Inclui-se, aí, o homem. Essapreocupação decorre de uma nova maneirade perceber o mundo e da relação direta dohomem com o meio em que vive. Ao olhar-mos para Piquete, observamos o quanto

somos privilegiados por residir nesse lugar.No entanto, é preciso um olhar maiscarinhoso para o meio ambiente. Temossérios problemas ambientais que precisamser equacionados, um trabalho de conscien-tização continuada deverá acontecer. Aeducação ambiental é o caminho parasolucionarmos esses problemas. Em suaessência, a educação ambiental é umaproposta de filosofia de vida que incorpora

valores éticos, democráticos e humanistas.Tem como ponto de partida o respeito peladiversidade natural e cultural, incluindo-se,aqui, as especificidades de classe, etnia,gênero, orientação sexual etc. Assim, buscaa melhoria da qualidade de vida e a distri-buição social do poder, reconhecendo,também, como formas de poder o acesso àinformação e ao conhecimento.

Piquete, um olhar cidadão

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O ESTAFETA Página 5Piquete, maio de 2011

Em 13 de maio de 1888, a Princesa Isabelsancionou a Lei Áurea, que aboliu oficial-mente o trabalho escravo no Brasil. O fim daescravidão foi o resultado das transfor-mações econômicas e sociais que come-çaram a ocorrer a partir da segunda metadedo século 19 e que culminaram com a crisedo Segundo Reinado e a consequentederrocada do regime monárquico.

A ruptura dos laços coloniais e aconsolidação do regime monárquico noBrasil asseguraram a manutenção daeconomia agroexportadora baseada naexistência de grandes propriedade rurais eno uso da mão-de-obra escrava do negroafricano. A escravidão e a sociedadeescravista que dela resultou foram marcadaspor um estado de permanente violência.

Desde os tempos coloniais, porém, osescravos negros reagiram e lutaram contraa dominação dos brancos por meio darecusa ao trabalho, de rebeliões, de fugas eformação de quilombos.

Ao longo do século 19, a legislaçãoescravista no Brasil sofreu inúmeras mu-danças como consequência das pressõesinternacionais e dos movimentos sociaisabolicionistas. A primeira alteração nalegislação ocorreu em 1850, quando foidecretada a Lei Euzébio de Queiroz, queextinguiu, definitivamente, o tráfico negreirono país. Foi uma solução encontrada pelogoverno monárquico brasileiro diante dasconstantes pressões e ameaças da Ingla-terra, nação que estava determinada a acabarcom o tráfico negreiro.

Em 1871, foi decretada a Lei Viscondedo Rio Branco. Conhecida também como Leido Ventre Livre, estabelecia que, a partir de1871, todos os filhos de escravos seriamconsiderados livres. Os proprietários deescravos ficariam encarregados de criá-losaté os oito anos de idade, quando poderiamentregá-los ao governo e receber indeni-zação. Com as leis de extinção negreira e deabolição gradual da escravidão, o trabalhocativo estava fadado a acabar.

O café e as transformações econômicasAs mudanças nas leis escravistas

coincidiram com profundas transformações

econômicas que o país atravessava. En-quanto a produção açucareira e os engenhosdo Nordeste entravam em franca deca-dência, a lavoura cafeeira dava novoimpulso à economia agroexportadora .

O café, plantado nas regiões do Rio deJaneiro, Vale do Paraíba e Oeste Paulista,passa a ser o principal produto de expor-tação brasileiro.

Quando a produção do café se expandiu,os cafeicultores tiveram que lidar com oproblema da escassez de mão-de-obra nalavoura. A compra de escravos, prove-nientes, sobretudo, das regiões econômicasdecadentes do Nordeste, não solucionou oproblema.

Os prósperos fazendeiros paulistastomaram as primeiras iniciativas visando asubstituir o trabalho escravo pelo trabalholivre. Houve incentivo à imigração europeiae fizeram as primeiras experiências deintrodução do trabalho assalariado naslavouras por meio do chamado Sistema deParcerias, em que os lucros da produçãoeram divididos entre os colonos e osproprietários.

A Campanha AbolicionistaNas regiões onde a lavoura se expandiu

e prosperou ocorreram importantes transfor-mações econômicas e sociais. A urbanizaçãoe a industrialização foram estimuladas demodo a provocar o surgimento de novosgrupos sociais com interesses distintosdaqueles ligados à produção agrícola.

Progressivamente, esses novos gruposcomeçaram a se opor ao regime escravista.O movimento abolicionista surgiu emmeados de 1870, a partir de ações individuaispromovidas por ativistas da causa, queincentivavam fugas e rebeliões de escravos.

Em 1879, um grupo de parlamentareslançou oficialmente a campanha pelaabolição da escravatura. Foi uma resposta àcrescente onda de agitações e manifes-tações sociais pelo fim da escravidão. NoParlamento, formaram-se duas tendências:uma moderada, que defendia o fim daescravidão por meio de leis imperiais. Seusprincipais defensores foram Joaquim Na-buco, José do Patrocínio e Jerônimo Sodré.

A outra tendência era mais radical, porquedefendia a ideia de que o fim da escravidãodeveria ser conquistado pelos própriosescravos por meio de insurreições e de lutasde libertação. Seus principais defensoresforam Raul Pompeia, André Rebouças eAntônio Bento. O movimento abolicionistaintensificou-se ganhando a adesão populare maior respeito. Nas cidades, era comum arealização de manifestações e comícios emfavor do fim da escravidão.

O governo monárquico promulgou, em1885, a Lei dos Sexagenários ou Lei Saraiva-Cotegipe, estabelecendo que depois decompletar 65 anos os escravos estariam emliberdade. A Lei recebeu fortes críticas e foirepudiada pelos abolicionistas, sob aargumentação de que eram poucos osescravos que atingiriam tal idade. Alémdisso, a lei beneficiaria os proprietários, jáque os liberaria de arcar com o sustento doscativos que chegassem à idade avançada.

A Lei ÁureaNo debate que se seguiu à promulgação

da Lei dos Sexagenários, ficaram cada vezmais evidentes as divergências entre as elitesdo país. Os prósperos cafeicultores paulis-tas, que já haviam encontrado uma soluçãodefinitiva para a substituição da mão-de-obraescrava pelo trabalho assalariado, seafastaram daqueles decadentes do Vale doParaíba e da aristocracia rural nordestina queainda resistia na defesa da escravidão.

Como já não dependiam do trabalhoescravo para continuar com o empreen-dimento agrícola, os cafeicultores paulistasse colocaram ao lado dos abolicionistas.

Em 13 de maio de 1888, o ministro JoãoAlfredo promoveu a votação de um projetode lei que previa o fim definitivo daescravidão. Os parlamentares represen-tantes dos interesses dos proprietários doVale do Paraíba se opuseram votando contra.Foram, no entanto, derrotados pela amplamaioria de votos a favor. Estava aprovada aLei Áurea. Na condição de regente do tronoimperial, a Princesa Isabel sancionou a novalei. O Brasil, porém, carrega o fardo históricode ter sido um dos últimos países do mundoa abolir a escravidão. AC

A abolição da escravatura

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O ESTAFETA

Edival da Silva Castro

Página 6 Piquete, maio de 2011

Crônicas Pitorescas

Palmyro MasieroMês de Maria

Insônia

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Acesse na internet, leia e

“O ESTAFETA”“O ESTAFETA”“O ESTAFETA”“O ESTAFETA”“O ESTAFETA”

O mês de maio é considerado o maisbonito do ano. Não discutimos. Das flores,dos noivos e... de Maria.

É tradicional a comemoração à VirgemSantíssima em nossas igrejas durante todoo transcorrer deste quinto mês. Segundo ojornal “A Ordem”, nº 75, “a devoção à VirgemAuxiliadora, aqui implantada, deve-se aofervor dos padres salesianos, que por aquideixaram indeléveis traços de sua pas-sagem”. Embora vivêssemos a condição deparóquia desde 1888, somente viemos a terpadre residente em nosso município em 1934,quando então surgiu a Congregação Ma-riana, somente para homens, cuja irmandadetinha ao peito transpassada uma fita azul.No ano seguinte, dia 24 de maio, foi criada aPia União das Filhas de Maria, somente paramoças. Todas vestidas de branco e, também,com faixa azul. De sua fundação até serextinta, as Filhas de Maria tiveram como suaúnica presidente a senhorita Maria deLourdes Ferreira, por um período de vida deuns trinta anos mais ou menos. Mais tarde,por 37, 38, nascia a Cruzada Eucarística,somente para meninas, de vestido branco efaixa amarela. Foram essas irmandades asresponsáveis pelas mais belas e purashomenagens a Maria, com lindas procissõespercorrendo as ruas da cidade, entoandocânticos de glória à Mãe Suprema.

Ao que nos consta, já não mais existema Pia União, a Cruzada, e resta apenas umpequeno número de Congregados Maria-nos. Formaram-se novas congregações comobjetivos mais caritativos que os de cultoapenas.

De acordo ainda com o ex-jornal pique-tense citado, e que depois passou a serórgão diocesano, “a pequena imagem daVirgem Auxiliadora”, venerada na sede daCongregação Mariana, devemo-la ao padreJoão Crippa. Justamente este padre nos traza vontade de contar um fato de certa formaengraçado. Não aconteceu com ele o caso,mas no mesmo ano em que esteve por aquiprestando seus serviços. Como não tínha-mos padre, praticamente a cada ano vinhaum ou mais trazer a luz da fé católica aosnossos munícipes, e no ano de 1903, quandose deu o acontecimento que vamos narrar,nossa cidade foi visitada por quatro deles:Pe. Seraphim, Pe. João Crippa, a quem já nos

referimos, o Pe. Pieroni e Pe. Mariano Portela.Foi com o primeiro deles que aconteceu...

Quem estiver algo desiludido pelo fatode estar difícil acontecer milagres atual-mente, pode consolar-se que a escassezvem de longe. Entremos na máquina dotempo da mente e processemos uma retroa-ção até o terceiro ano do vigésimo século.Na velha matriz comemorava-se o mês deMaria. O vigário designado para fazer estemês pio e festivo foi o padre SeraphimBoschetti. Um dos fracos do padre Seraphimera predicar. Adorava fazer uso da palavra eeloquentemente discorria sobre o assuntoa que se propunha. A cada noite, um novotema. Contritos, os fiéis ouviam a pregaçãosacerdotal.

Numa das noites, o padre Boschettitomou o rosário como tema de seu sermão.E lá se ouvia toda a histórica representaçãoe significado do mesmo, dos benefícios eindulgências que traz a quem o usa nasorações. Dissecava o assunto sobre todosos pontos e ângulos daquele fio de númerocerto de contas. Para encerrar toda suaverbosidade sobre o tema, querendo abalaros alicerces dos ali presentes, impres-sionando-os e pressionando-os contra aparede, o padre Seraphim lança comoarremate final de seu falário:

– Todos os devotos de Nossa Senhoratrazem consigo o terço. Eu também sempretrago o meu. Quereis ver?

Ah, meus amigos! Em que esparrela caiuo pobre padre por não ter sido presciente.Começou a busca do abençoado terço numpasseio pelos bolsos, calmo e confianteinicialmente, demudando gradualmente parao nervosismo pelo não aparecimento domesmo.

Na nave da igreja, os católicos pareciamfanáticos torcedores naquele mutismo deansiedade pelo gol, digo, pelo aparecimentodo rosário... E nada... No altar, aflito, suandoe sem qualquer pequeno recanto dovestuário clerical intocado, deu-se por fim opadre Boschetti por derrotado, e, comdesaponto, com resignação, encarou opúblico e arremessou-lhes:

– Bem, sempre o trago comigo, mas hojenão aparece. Paciência!

Encerrou a sermoneação.

A noite passada uma indesejável insônia

me envolveu. Liguei o computador. Sobre a

mesa do mesmo havia um livro: tratava-se

do Best-seller americano “O Ladrão de

Raios”, de Rick Riordan, que meu neto de

doze anos está lendo. Li o primeiro capítulo

e achei a história interessante, porém não

propícia para o momento. Fui à sala a fim de

ver TV, já que era hora da sessão Corujão. O

filme era escuro e violento. Desisti. Voltei ao

quarto, abri a janela que dá para o quintal;

talvez a brisa da noite pudesse suavizar

minha tormenta.

De olhos arregalados e ouvidos agu-

çados, passei a contar com ternura os tique-

taques que vinham da sala, de um relógio

de parede. A contagem estava alta quando

me lembrei de que na guarda da cama trago

um rosário. Talvez as Ave-Marias e os Pais-

Nossos pudessem me socorrer. Lancei mão

do mesmo. Beijei o crucifixo, fiz o sinal da

cruz e passei a orar. Começava o terceiro

mistério, quando devo ter adormecido.

A claridade da manhã despertou-me.

Ainda trazia o dedão da mão direita numa

das contas maiores do terceiro mistério.

Finalmente tinha dormido um pouco. Fora

uma noite longa, que se estendera pela

madrugada a fora. Já estava cheio de me

sentir vazio quando a Providência Divina

me fez lembrar do rosário. As seguintes Ave-

Marias fecharam minhas pálpebras e me

trouxeram o sono de volta e os Pais-Nossos

serviram para dissipar minhas vagas ideias.

Terminei de rezar o quarto e o quinto

mistérios. Em seguida, coloquei o rosário

de volta ao seu lugar de salvaguarda.

***************

Maio, mês de Maria“As mães da terra nunca

abandonam os seus filhos. O mesmofaz Maria, que tanto ama os seus filhosao longo da vida; com que ternura,com que bondade não irá Ela protegê-los nos últimos instantes, quando anecessidade é maior?”

São João Bosco

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O ESTAFETAPiquete, maio de 2011 Página 7

Quem quer que se interesse pela vidado Brasil surpreende uma tentativaescancarada de criar uma área de conflitoopondo elementos que, no atual momento,de forma alguma se confrontam: aprodução de elementos e a preservaçãodo meio ambiente.

Insto acontece porque o avançoacelerado da fronteira agrícola aconteceuquando o Planeta já se despertava para asmudanças climáticas e o progressocientífico já alcançava nível satisfatório.

Passando rapidamente os olhos porSão Paulo, surpreendemos em atividadeconsistente, além das Universidades, oInstituto Biológico, o Instituto deZootecnia, o Instituto Agronômico deCampinas, a APTA garantindo a pesquisa,enquanto a CATI se responsabiliza porlevar o conhecimento ao produtor.

Dias de Campo se multiplicam. Emqualquer reunião de agricultores e pecua-ristas, sejam leilões ou congressos, largoespaço é ocupado por palestras, painéis eoficinas, todos procurando fazer o produ-tor convencer-se de que a melhor opção éa dos sistemas sustentáveis de produção.

O Programa Globo Rural mostrou aepopeia de uma família de Carambeí (PR)que adquiriu terras no Maranhão. Empouco tempo, as casas que construírampara morar foram repassadas aosempregados, porque residências maisconfortáveis já haviam sido levantadas.

Paulistas, catarinenses e gaúchostambém se deslocaram para as novasfrentes, somando-se ao que de melhorencontraram nas novas paragens.

Migração da CompetênciaEmbrapa e Sebrae continuam dando os

arremates no surto de competência.O Brasil tem 850 milhões de hectares de

área. Com os quebrados podemos construir1.487.600 campos de futebol peladeiro paraos nossos meninos treinarem para a Copade 14.

O Japonesinho do Estilosantes (NovoCanal) sempre nos alerta para o crescimentoda população do mundo. Apresentandopainéis muito bem elaborados afirma que,em 1950, cada hectare do Planeta precisavaproduzir alimentos para menos de quatro (4)pessoas; em 2000, para mais de quatro (4)pessoas. Em 2050 cada hectare deveráalimentar sete (7) pessoas.

O Brasil registra a disponibilidade deágua de 43.028m³ per capta. Sua coberturaflorestal atinge 57,2% do território.

Segundo Andre Nasser, Instituto Ícone(Mercado Internacional), as nossas leisambientais são mais severas do que as dospaíses que compram os nossos produtos.Mas eles exigem que cumpramos as nossasleis. Além dos mais, a nossa mídia, quandonoticia os desmatamentos, não diz quemdesmatou e para quê. Os importadoresinterpretam que foram os agricultores epecuaristas que derrubaram a floresta e ospenalizam por isso. Nossas águas vêm deaquíferos renováveis, brotam da terra. Aschuvas os reabastecem periodicamente.

Existem países, nossos vizinhos, cujosrios dependem exclusivamente do degelodos Andes.

Em território brasileiro, o rio Amazonastem afluentes colossais. Mas seu volumed’água não ficará comprometido se deixar

de receber as águas do degelo?E a Ásia? O volume dos rios da Índia,

da China, do Paquistão, do Vietnã, asmonções, que regulam a produção agrícola,tudo depende do sistema do PlatôTibetano. Hoje, quem vai lá vai para rezar.

E se a China resolver empurrar para lásua população excedente?

Durante o reinado da soberana dasÍndias, a rainha Vitória da Inglaterra, trintamilhões de indianos morreram de fome porproblemas climáticos. Com seus atuais umbilhão e duzentos milhões de habitantes, aÍndia precisa refletir sobre a questão.

No Brasil, não existe área de conflitoentre a proteção ao meio ambiente e aprodução agropecuária.

O episódio lamentável da cheia do rioTaquari, que inundou trezentas fazendas,é lição aprendida.

As nascentes do Xingu e do Araguaiaestão sendo recuperadas.

Não se fala mais em degradação depastagens. O agropecuarista já aprendeuque a pastagem bem cuidada é lucro certoe permite o adensamento, maior número decabeças por hectare.

Quanto à nossa capacidade deaumentar a produção de grãos por hectare,os números não mentem jamais.

A fronteira agrícola brasileira expandiu-se rapidamente em uma geração. Já chegouaonde tinha de chegar. Agora é só ocuparos claros. Com tecnologia, comsustentabilidade.

E absolutamente dentro da lei –Duralex, sed lex.

Abigayl Lea da Silva

O Jongo e o 13 de MaioForma de expressão afro-brasileira, o

Jongo integra percussão de tambores edança coletiva. Acontece nos quintais epátios de fazendas, bem como nas festas desantos católicos, nas festas juninas e no 13de Maio, da abolição dos escravos.

O Jongo é uma forma de louvação aosantepassados, consolidação de tradições eafirmação de identidades. Tem raízes nossaberes, ritos e crenças dos povos africanos,principalmente os de língua bantu. Sãosugestivos dessas origens o profundorespeito aos ancestrais, a valorização dosenigmas cantados e o elemento

coreográfico da umbigada.No Brasil, o Jongo se consolidou entre

os escravos que trabalhavam nas lavourasde café e cana de açúcar, no Sudestebrasileiro, principalmente no Vale do Paraíbado Sul. Nos tempos da escravidão, a poesiametafórica do Jongo permitiu que ospraticantes da dança se comunicassem pormeio de “pontos”, que os capatazes esenhores não conseguiam compreender.Sempre esteve, assim, em uma dimensãomarginal, em que os negros falam de si, desua comunidade por meio da crônica e dalinguagem cifrada. Tambu, batuque, tambor,

caxambu. O Jongo tem diversos nomes e écantado e tocado de diversas formas,dependendo da comunidade que o pratica.

Proclamado Patrimônio CulturalBrasileiro em novembro de 2005 peloInstituto do Patrimônio Histórico e ArtísticoNacional, o Jongo foi registrado no Livrodas Formas de Expressão. O registro tevecomo base a pesquisa desenvolvida peloCentro Nacional de Folclore e CulturaPopular e teve como suporte a metodologiado Inventário Nacional de ReferênciasCulturais. A Fundação Christiano Rosaparticipou da elaboração deste inventário.

ReproduçãoFoto Arquivo Pro-Memória Foto Irerê Pereira

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O ESTAFETA Piquete, maio de 2011Página 8

Há 70 anos foi criada emPiquete a Biblioteca PúblicaMunicipal. Este fato, de sin-gular importância para a educa-ção e a cultura dos munícipes,foi obra do prefeito José Mon-teiro de Brito Júnior, por meiodo Decreto Lei nº 6 , de 20 defevereiro de 1941. Este decretoestava em consonância com oartigo 5º do Decreto Lei Federalnº 1202, de 8 de abril de 1939, eatendia aos termos da Reso-lução nº 114, de 1941, do Depar-tamento Administrativo doEstado. Por essa época, o paísse modernizava. Iniciava-se oprocesso de industrialização e precisava-sede mão-de-obra qualificada, e o governoGetúlio Vargas vinha priorizando a edu-cação. Segundo o governo federal, todasas cidades deveriam criar suas bibliotecas.

Piquete experimentou, por essa época,uma revolução sem precedentes na educ-ação promovida pela FPV, com a criação doDepartamento Educacional e seus cursos.Criada a biblioteca municipal, foi instaladanum anexo à prefeitura recém-inaugurada.Pelo decreto, era determinado que o funcio-namento da biblioteca seria das 14h às 17he das 19h às 22h, para que operários etrabalhadores pudessem consultá-la. Seuacervo foi formado com obras adquiridaspela Prefeitura mediante dotação orça-mentária e obras recebidas de Institutos eDepartamentos públicos, além de doações

A Biblioteca Municipal de Piquete

particulares. O cargo de bibliotecário foicriado nessa ocasião, com vencimento anualde 2:400$000 (dois contos e quatrocentosmil réis) e deveria ser exercido por pessoahabilitada.

O Decreto Lei entrava em vigor na datade sua promulgação e a primeira bibliotecárianomeada foi Maria de Lourdes Ribeiro. Apreocupação com o acervo da biblioteca eseu funcionamento era tanta, que o prefeitoLuiz Arantes Júnior, por meio do DecretoLei nº 21, de 8 de maio de 1944, criou aComissão Municipal de Biblioteca, com afunção de administrá-la. Essa comissãoreunia-se mensalmente para avaliação dasatividades e apresentação de relatórios.

Por muitos anos, a biblioteca manteve-se instalada no antigo prédio da Prefeitura.Foram também bibliotecárias, nas primeiras

décadas, Abília de Almeida,Elza Arantes, Clélia de CastroFerreira... Com o passar dosanos, deixou-se de priorizar aeducação. Consequentemente,a biblioteca municipal não maisrecebeu a atenção merecida.Dessa forma, a cada governo,era transferida de um lugar paraoutro. Tornou-se “itinerante”.Assim, a população parou defrequentá-la. Se perguntarmospara muitos professores ealunos onde ela se encontrainstalada atualmente, certa-mente não saberão informar.

Esse descaso para com asbibliotecas públicas é um fenômeno queocorre por todo o país. É notável que odescaso muito se dá, também, pela falta deatuação da população, que raramentefrequenta esses ambientes. Esse descasoreflete-se nos seus representante públicoslocais, que, por fim, resolvem dizer, comoutras palavras, que o benefício de umabiblioteca é insignificante se comparado aoseu custo.

Já nos alertava Monteiro Lobato: “Quemmal lê, mal escreve, mal fala, mal vê”. Quandose pensa em avançar na educação, não sepode deixar de lado a questão das biblio-tecas públicas, espaço vital para garantir oacesso à informação, o apoio à formaçãocidadã e o estímulo ao gosto e hábito daleitura.

Durante 500 anos o Brasil foi um paísfortemente marcado pela tradição cristã,principalmente pelo catolicismo, que,mesmo com a chegada de cristãos reforma-dos, continuou sendo hegemônico. Nasúltimas décadas, porém, ocorreu uma fortemudança no cenário religioso de nossanação, que tem causado forte impacto tantono meio católico como entre os cristãosreformados: o fenômeno neopentecostal.

O neopentecostalismo é uma formameio paganizada de cristianismo, muitocontestada entre os protestantes tradicio-nais e também pelos católicos mais cons-cientes, que transforma a religião, tanto acatólica como a protestante, em curan-deirismo, danças, pulos, pregações mora-listas e preconceituosas, shows musicaise arrecadações milionárias de doaçõesfeitas pelos fanáticos fiéis, que sãoconstantemente induzidos a pensar quesuas ofertas salvarão o mundo.

Essa nova forma de fenômeno religiosoproduz ídolos que estão acima de qualquerinstituição religiosa: são os padres,geralmente cantores, os apóstolos, osbispos e “bispas” e os profetas quearrastam multidões, prometendo “em nomede Jesus” a cura para todos os males e aprosperidade financeira; pedem, depois,

Dinheiro na sacola e sua vida decola!apenas uma ajudinha para as suas obraspoderem continuar, para seus programas ecanais de TV não saírem do ar.

Quando não fazemos uma doação, somostomados por um terrível sentimento deculpa; é como se fôssemos os responsáveispor todas as doenças que atingem aspessoas, ou pelas almas dos pecadores quevão para o fogo do inferno por estaremsendo privadas da pregação dessa gente.Pior que isso é quando pensamos queseremos vítimas da fúria divina por nãotermos feito uma bendita doação. Então láse vão 30 reais para determinada TV queprecisa fechar os benditos 100%, que nuncasão atingidos; 40 reais para a outra emissoraque sempre está comprando câmeras novaspara se modernizar; 50 reais para o pastorque não pode tirar seu programa do ar, pois,ao contrário, o Brasil se perde. Além dessasdoações todas, ainda fazemos algo mais –enviamos nosso rico ourinho e outras jóiasde valor para as intermináveis campanhasem prol de construções faraônicas desantuários e mais santuários que se multi-plicam por todos os lados, tanto entre oscatólicos como entre os evangélicos.

Com a fé sendo transformada em mega-eventos carismáticos regidos por astros eestrelas evangélicos e católicos, a genuína

tradição cristã dos protestantes com suaspequenas comunidades de crentes since-ramente zelosos com as Escrituras edesejosos de fidelidade a Deus, bem comoa dos católicos com uma longa e frutuosapresença nesta terra, que no início cha-maram de Terra de Santa Cruz, estãofortemente ameaçadas de extinção.

O neopentecostalismo, ao longo dotempo, tem-se mostrado uma porta de saídapara os fiéis tanto do Catolicismo como dasIgrejas protestantes tradicionais. Aspessoas que aderem a essa modalidade deexperiência religiosa geralmente nãopermanecem nela por um período muitodemorado. Grande parte de seus adeptosmigram, depois de um tempo, para o grupoque mais tem crescido no país, o daspessoas sem fé, sem religião.

É muito provável que o movimentoneopentecostal, fortemente presente nascomunidades protestantes e católicas doBrasil, faça com que nosso país, quedurante 500 anos foi uma nação de tradiçãocristã, se torne, em poucos anos, uma naçãohegemonicamente indiferente à religião eaos seus valores. Não são poucos os queacreditam que este será o legado doespetaculoso neopentecostalismo.

Pe. Fabrício Beckmann

Antigo prédio da Prefeitura, que por longo tempo abrigou aBiblioteca Municipal de Piquete

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