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IV Encontro Nacional da Anppas 4,5 e 6 de junho de 2008 Brasília - DF – Brasil ______________________________________________________ Manejo de Aguaje (buriti) na Comunidade de Parinari – Reserva Nacional Pacaya Samiria na Região de Loreto no Peru: uma proposta de pagamento por serviço ambiental carbono Ricardo Felix Santana (CNPq – UFPA/NAEA) Engenheiro Florestal, Mestre em Desenvolvimento Sustentável, Analista em C&T [email protected] Jesús Vacalla Ochoa Bacharel em Ciências Florestais, Técnico do Projeto Focal Bosques - IIAP [email protected] Angel Alejandro Salazar Vega PhD Ciências Agrícolas e Florestais, Coordenador do Projeto Focal Bosques - IIAP [email protected] Marcos Ximenes Ponte Dr. Engenharia Aeronáutica e Mecânica, Prof. Adjunto NAEA/UFPA, Diretor Executivo do IPAM [email protected] Resumo Na Amazônia Peruana, os humidales são comunidades de palmeiras com predominância de Mauritia flexuosa ou aguaje (buriti) e são conhecidos como aguajales (buritizais). Os ecossistemas de humedales fluviais se caracterizam por terem as terras inundadas periodicamente como resultado do transbordo dos rios. O aguaje é um fruto importante na alimentação para o morador de Loreto no Peru. e seu consumo ocorre na forma de fruta fresca, sucos e sorvetes, apresentando uma demanda crescente. Na Comunidade de Parinari, os irmãos Emilton e Heraclites Flores Simon desenvolveram e utilizam desde 1999, a colheita do aguaje por meio de um instrumento denominado “subidor” no qual evita o corte e permite aproveitar os 40 anos de produção média que tem essa palmeira. Essa pratica foi estendida para a comunidade e hoje todas as famílias em Parinari parcelaram seus aguajales e desenvolveram praticas de manejo sustentável. A falta de incentivos pelo manejo sustentável do aguaje impede que a população tenha uma visão de longo prazo alentadora para a extração racional da palmeira. Os preços recebidos pela venda de aguaje e outros produtos em áreas manejadas de maneira sustentável são os mesmos que aqueles que provem de zonas desflorestadas. O pagamento pelo serviço ambiental carbono pode ser uma alternativa para complementar os benefícios para verdadeiros gestores dos recursos. Palavras-chave Aguaje, Parinari, pagamento por serviço ambiental carbono, sistemas agroflorestais.

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IV Encontro Nacional da Anppas 4,5 e 6 de junho de 2008 Brasília - DF – Brasil ______________________________________________________

Manejo de Aguaje (buriti) na Comunidade de Parinari – Reserva Nacional Pacaya Samiria na Região de Loreto no Peru: uma proposta de pagamento por serviço

ambiental carbono

Ricardo Felix Santana (CNPq – UFPA/NAEA) Engenheiro Florestal, Mestre em Desenvolvimento Sustentável, Analista em C&T

[email protected]

Jesús Vacalla Ochoa Bacharel em Ciências Florestais, Técnico do Projeto Focal Bosques - IIAP

[email protected]

Angel Alejandro Salazar Vega PhD Ciências Agrícolas e Florestais, Coordenador do Projeto Focal Bosques - IIAP

[email protected]

Marcos Ximenes Ponte Dr. Engenharia Aeronáutica e Mecânica, Prof. Adjunto NAEA/UFPA, Diretor Executivo do IPAM

[email protected]

Resumo Na Amazônia Peruana, os humidales são comunidades de palmeiras com predominância de Mauritia flexuosa ou aguaje (buriti) e são conhecidos como aguajales (buritizais). Os ecossistemas de humedales fluviais se caracterizam por terem as terras inundadas periodicamente como resultado do transbordo dos rios. O aguaje é um fruto importante na alimentação para o morador de Loreto no Peru. e seu consumo ocorre na forma de fruta fresca, sucos e sorvetes, apresentando uma demanda crescente. Na Comunidade de Parinari, os irmãos Emilton e Heraclites Flores Simon desenvolveram e utilizam desde 1999, a colheita do aguaje por meio de um instrumento denominado “subidor” no qual evita o corte e permite aproveitar os 40 anos de produção média que tem essa palmeira. Essa pratica foi estendida para a comunidade e hoje todas as famílias em Parinari parcelaram seus aguajales e desenvolveram praticas de manejo sustentável. A falta de incentivos pelo manejo sustentável do aguaje impede que a população tenha uma visão de longo prazo alentadora para a extração racional da palmeira. Os preços recebidos pela venda de aguaje e outros produtos em áreas manejadas de maneira sustentável são os mesmos que aqueles que provem de zonas desflorestadas. O pagamento pelo serviço ambiental carbono pode ser uma alternativa para complementar os benefícios para verdadeiros gestores dos recursos. Palavras-chave Aguaje, Parinari, pagamento por serviço ambiental carbono, sistemas agroflorestais.

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1. Introdução

O aguaje (buriti – Mauritia flexuosa) constitui uma das espécies mais importantes

para a alimentação e refugio da fauna silvestre e de valor econômico para os habitantes locais da

Reserva Nacional Pacaya Samiria – RNPS (INRENA, 2000). Devido à técnica de colheita mais

usada consistir no corte das palmeiras fêmeas, muitos dos aguajales (buritizais) próximos as

comunidades estão sendo intensamente depredados. É por isso que na atualidade os extratores

devem deslocar-se a distâncias de até 10 km para acessar áreas produtivas. Ante este panorama,

os esforços que realizam os moradores locais para coletar aguajes estão incrementando,

aumentando de maneira proporcional os custos de extração (Bejarano & Piana, 2002).

O Plano Mestre da RNPS (INRENA, 2000) considera a elaboração e execução de

planos de manejo para o uso sustentável de aguaje como uma das estratégias fundamentais para

a recuperação deste recurso. Diante da demanda atual de frutos e considerando que a extração

de aguaje pode contribuir e melhorar os níveis de vida das populações locais é necessário

desenvolver e difundir técnicas de colheita que não destruam as palmeiras produtoras, a fim de

diminuir os níveis atuais de corte e de manutenção do recurso a distancias onde seu

aproveitamento seja rentável. O manejo de florestas assegura continuidade na produção, maior

rentabilidade, menores riscos e maiores oportunidades de mercado para o produto manejado

sustentavelmente, e, ao mesmo tempo, mantendo a cobertura florestal da área, retendo a maior

parte da diversidade florestal original e causando menor impacto na fauna silvestre. Além disto, as

florestas (e os aguajales) prestam serviços ambientais ajudando o equilíbrio climático regional e

global devido à manutenção dos ciclos hidrológicos e a retenção de carbono (Bejarano & Piana,

2002).

O aguaje é um produto de consumo massivo na região amazônica. Pesquisas de

mercado mostram um ingresso diário médio na cidade de Iquitos de 20.000 kg a 40.000 kg em

época de baixa e alta produção respectivamente, sendo sua demanda maior que a oferta. A maior

parte da produção consumida em Iquitos origina-se na bacia do rio Marañón (frutos de melhor

qualidade e tamanho) e do rio Itaya (produção alternativa em épocas de escassez com frutos de

menor tamanho e de escasso conteúdo de polpa (Penn 1999, Ramírez 1998). A venda de frutos

desta palmeira se realiza nos mercados de Iquitos, onde são consumidos frescos e como insumo

para a preparação de bebidas e sorvetes (Bejarano & Piana, 2002; Castillo, 2005..).

2. Acomunidade de Parinari

A comunidade de Parinari foi estabelecida em 1800 pelo padre Cruz Murayari e

nove famílias na desembocadura da quebrada de Parinari com o rio Marañón. Em 2003 contava

com 57 famílias e 233 habitantes. Inicialmente a comunidade se localizava na margem direita do

rio Marañón (Figura 1), porém em pouco tempo a queda da margem provocado pela força do rio

3

causou a mudança para a margem direita da quebrada de Parinari, onde se encontra até hoje

(Castillo, 2005).

Fonte: Castillo, 2005, p. 7.

Figura 1 – Localização da Comunidade de Parinari na RNPS, região de Loreto – Peru.

2.1. Características da área

A área da comunidade de Parinari se caracteriza por apresentar temperaturas

elevadas e fortes precipitações. A temperatura média anual é de 26o C com uma precipitação

anual em torno dos 3.000 mm (INRENA, 2000). As principais atividades econômicas

desenvolvidas pela comunidade são a agricultura, a caça e o extrativismo florestal madeireiro e

não madeireiro (Castillo, 2005).

A agricultura se baseia principalmente na produção de mandioca e banana,

espécies que se cultivam todo o ano nas restingas altas e médias que resistem a inundação. A

caça se baseia na captura de mamíferos grandes, como o sajino, huangana e veado vermelho,

mas também se capturam espécies de menor tamanho, como macacos, motelo e aves. De todas

as atividades extrativas realizadas pelas famílias da comunidade de Parinari a extração de chonta,

matérias de construção (apenas madeira roliça) e frutos (na maioria de aguaje) são os de maior

importância econômica (Bejarano & Piana, 2002; Castillo, 2005).

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2.2. Sistemas agroflorestais e o manejo dos aguajales

Um dos objetivos dos membros da comunidade de Parinari é colher aguaje em

áreas próximas ao centro do povoado. Para isso se optou por duas opções:

• manejo de aguajales com o uso de subidores evitando o corte das palmeiras;

• estabelecimento de plantações em combinação com cultivos anuais (milho), bianuais

(mandioca, pituca, sachapapa, etc) e permanente (banana, manga, guaba, chonta, etc)

formando sistemas de produção agroflorestal.

Mantendo uma diversidade de cultivos em sistemas agroflorestais tropicais tem-se

uma grande vantagem em favorecer o potencial econômico e ecológico do sistema e de servir

com um sistema natural para o controle de pragas. O sistema radicular superficial do aguaje atua

como fonte de nutriente e estabilizador de solos em áreas suscetíveis a erosão. O aguaje fornece

um variado número de produtos e subprodutos como chonta, almidón e suri (Rinchophorus

palmarum) e suas folhas servem para fazer esteiras e os pecíolos para cercas. As mudas de

aguaje podem crescer em uma ampla variedade de tipos de solo, podendo incorporar-se a

sistemas que utilizam espécies. As palmeiras adultas, devido a sua altura, produzem pouca

sombra, alem do que, não se conhecem enfermidades que a ataque. Entre as desvantagens do

aguaje em sistemas agroflorestais podemos mencionar (Bejarano & Piana, 2002; Castillo, 2005):

• O grande período até que se alcance a fase adulta e comece a frutificar (8-10 anos);

• Suas raízes superficiais podem competir por espaço com outras espécies incorporadas ao

sistema.

A diversidade de componentes dos sistemas agroflorestais deve assegurar a

subsistência e proporcionar benefícios econômicos ás famílias enquanto esperam que as

palmeiras de aguaje produzam frutos. Se estes benefícios não são percebidos como suficientes,

os membros da comunidade podem decidir abandonar ou converter estes sistemas em novas

chacras1. Em sistemas agroflorestais o aguaje, por ser uma espécie heliófila e de porte elevado

(alturas de até 40 m), deve ocupar o estrato superior do dossel. Os sistemas agroflorestais que

utilizam aguaje podem incorporar grande número de espécies entre outras: milho, banana,

mandioca e abacaxi (Bejarano & Piana, 2002; Castillo, 2005).

2.3. Pagamento pelos serviços ambientais da floresta

O fim de uma floresta, de um mar, ou de uma espécie, não é apenas o

desaparecimento de um eventual valor mercantil, mas, sobretudo, o fim de determinadas funções

em um meio natural (Veiga, 1994). Os recursos naturais e os serviços ambientais, historicamente,

1 Denominação dada as áreas de cultivo anual, bianual e perenes, destinado ao auto-consumo e a venda do excedente

(Nota do autor).

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apresentam baixo custo ou são de livre acesso, ocasionando que os custos privados de bens e

serviços não refletem os verdadeiros custos sociais de seu uso, e menos ainda a previsão da

manutenção e a conservação dos recursos naturais e dos serviços ambientais. Essa realidade

leva ao manejo ineficiente, em detrimento dos processos ecológicos que sustentam a vida, e o

pagamento pelos serviços ambientais vem se mostrando uma ferramenta importante na mudança

do modelo de desenvolvimento predominante (Espinoza et al., 1999).

O estabelecimento de mercado de serviços ambientais contribui de diferentes

maneiras para o desenvolvimento sustentável no meio rural, e, em alguns casos, seu âmbito de

benefícios transcende o nível local e adquire importância regional e global, como no caso da

mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. O pagamento pelos serviços ambientais no meio

rural contribuirá com o melhoramento da qualidade de vida e a superação dos aspectos

assinalados pela Comissão Brundtland para alcançar o desenvolvimento sustentável (Espinoza et

al., 1999):

a) o fomento de novas formas de organização social em torno da conservação, uso

e valoração dos recursos naturais; e

b) o melhoramento da capacidade da biosfera de absorver os efeitos das atividades

humanas, por exemplo, mediante a conservação e o melhoramento dos

sumidouros de gases de efeito estufa.

A ação livre das forças de mercado é considerada, por muitos, como a grande

responsável pela maioria dos danos aos ecossistemas da Amazônia. Destacam-se, nesse

contexto, as “falhas de mercado” no processo de desenvolvimento da Amazônia, definidas como

as formas e situações nas quais os mercados deixam de considerar, em suas funções alocativas e

distributivas, o amplo conjunto de custos e benefícios ambientais das atividades econômicas na

Região. No entanto, o poder do mercado pode ser canalizado para que os objetivos de

desenvolvimento ambiental sejam atingidos, por meio de uma abordagem de incentivos

econômicos no processo regulatório. Modificando-se os incentivos que os agentes econômicos

dispõem num determinado contexto histórico, pode-se levar a uma coincidência entre a melhor

escolha privada com a melhor escolha social (Haddad & Rezende, 2002).

No caso dos bens privados, os mercados funcionam adequadamente na sua

alocação, os quais são caracterizados pela exclusividade2 e pela rivalidade3 no consumo. Os

bens ambientais tendem a ser não-excludentes e divisíveis, ou indivisíveis e não-excludentes.

Assim, muitos bens ambientais, por se assemelharem mais a bens públicos (não-excludentes,

indivisíveis e sem rivalidade) do que a bens privados, não conseguem desenvolver mercados para

avaliações monetárias apropriadas. As florestas, dependendo dos direitos de propriedade, podem

2 A exclusividade significa que quem não desejar pagar o preço de mercado é excluído do seu consumo.

3 O bem é dito rival quando pode ser subdividido, de tal forma que quem consome pode excluir os outros dos seus

benefícios.

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ser incluídas nos bens privados ou bens públicos ou quase públicos (Haddad & Rezende, 2002).

Mas mesmo nas florestas particulares existem limitações para o uso. Um exemplo é a previsão da

Reserva Legal e Área de Preservação Permanente – APP de acordo com o Código Florestal no

Brasil. No Peru, não existe a figura da floresta particular, todas as florestas são públicas, sendo

possível a concessão para exploração florestal. No Brasil, esse instrumento de concessão é novo.

O 1º lote de concessão florestal acontecerá na Floresta Nacional do Jamari, localizada nos

municípios de Itapuã do Oeste e Cujubim no Estado de Rondônia. O processo está em fase de

habilitação das empresas com previsão de encerramento até o fim do primeiro semestre de 2008.

O pagamento por serviços ambientais e a preocupação com as mudanças

climáticas estão dentro da complexidade que a sociedade contemporânea está vivendo. Não se

trata de um problema, mas sim de múltiplos problemas que se interligam por meio de diversas

disciplinas (dimensões econômica, ambiental, sócio-cultural e político/institucional). Esse processo

ocorre em várias escalas (local, regional, nacional, continental e global) e diferentes atores estão

envolvidos. Abordagens disciplinares e tomadas de decisão clássicas falham em endereçar

assuntos complexos adequadamente (Rotmans, 2001).

3. Metodologia

O manejo de sistemas agroflorestais e o pagamento por serviço ambiental por

evitar a emissão de carbono com a manutenção da floresta em pé são problemas complexos e,

para serem operacionalizados, necessitam de investimentos de médio e longo prazo. Para isso,

se faz necessário um planejamento com o uso de estudos prospectivos para o planejamento e a

busca da tomada de decisão adequada. O uso da Avaliação Integrada – AI4 surge como uma

alternativa metodológica interessante. A AI é uma abordagem interdisciplinar, com o explicito

propósito de melhorar a informação política e o suporte à tomada de decisão. A idéia básica da AI

é combinar, interpretar e comunicar conhecimentos de diferentes disciplinas científicas.

Dois tipos de métodos de AI podem ser distinguidos: métodos analíticos e métodos

participativos. Os métodos analíticos da AI incluem basicamente análise de modelos, análise de

cenários e método de incerteza e risco. O grupo de métodos participativos, no entanto, envolve

uma pletora de métodos, variando de painéis de expectativas, método delphi, jogos, exercícios

políticos e grupos focais. Um uso sofisticado de vários métodos é necessário, para satisfazer

suficientemente as ambições associadas com a AI. Um modelo de AI da mudança climática ajuda

a simular a intricada dinâmica do sistema climático humano, no qual numerosas interações e

retornos ocorrem (Rotmans, 2001).

A análise prospectiva proposta por Godet (2007) está dentro desta abordagem de

AI e é composta por três grandes etapas de análise: a construção da base, varrer o campo dos 4 A Avaliação Integrada é um processo multi- ou interdisciplinar de elementos estruturando o conhecimento de várias

disciplinas científicas de uma maneira que todos os aspectos relevantes de um problema complexo são considerados nas

suas mutuas coerências para o beneficio da tomada de decisão (Rotmans, 2001, p. 21).

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possíveis e reduzir as incertezas, e a construção dos cenários. A construção da base é

subdividida em três etapas: delimitação do sistema, determinação das variáveis-chaves e

condicionantes (análise estrutural) e estudo da estratégia dos atores. Nesse artigo se abordarão a

delimitação do sistema de manejo florestal sustentável e o pagamento pelo serviço ambiental por

evitar a emissão de carbono com a manutenção da floresta em pé na Pan-Amazônia, com dados

do estudo de caso na Comunidade Indígena de Parinari, na Reserva Nacional Pacaya Samiria –

RNPS, na Região de Loreto, no Peru.

A delimitação do sistema consiste na elaboração de um diagnóstico orientado

(análise de dados e informações secundárias, revisão da literatura técnica e especializada, e

estudos de caso), de acordo com o modelo teórico definido, que permite encontrar um conjunto de

variáveis quantitativas e qualitativas que o caracterizem o mais exaustivamente possível. Foi

utilizada uma adaptação da Metodologia do Carbono Social (Rezende e Merlin, 2003), baseada na

abordagem de Meios de Vida Sustentável (Chambers e Conway, 1992; Ahmed e Lipton, 1997),

como orientadora do diagnóstico onde são propostas sete dimensões de análise ou capital: social,

humano, financeiro, natural, biodiversidade, infra-estrutura e carbono.

4. Análise e Resultados

Nos anos setenta, a Amazônia se converte em um objetivo econômico do governo

de vários países da Pan-Amazônia, com destaque para o Brasil e Peru, que detêm juntos

aproximadamente 611 milhões de hectares (equivalente a 69% das florestas da América do Sul)

(FAO, 2002). A chamada “selva amazônica” (“Hylaea” ou Amazonía sensu lato) corresponde a

uma região ecológica caracterizada por sua selva tropical, densa e úmida (Eva & Huber, 2005)

(Figura 2). Esse tipo de floresta encontra-se na Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru,

Suriname e Venezuela, cobrindo essencialmente as bacias do Rio Amazonas e do Rio Tocantins.

As estimativas de sua superfície oscilam entre os cinco milhões e sete milhões de quilômetros

quadrados. A floresta amazônica não é homogênea, tanto a nível local, como também nas amplas

zonas ecológicas com identidade própria (Martino, 2007).

A sub-região da América do Sul tropical constitui a maior concentração de floresta

pluvial tropical do mundo, com cerca de 8,5 milhões de km2 na bacia do Amazonas e 850 mil km2

no complexo da bacia do Orinoco e Paraná. Essa cobertura florestal cobre 64% do território da

América do Sul (FAO, 2002). Eva & Huber (2005) propõem uma delimitação para a Amazônia com

cinco sub-regiões (Amazônia, Andes, Planalto, Guiana e Gurupi) com uma área total de oito

milhões de Km2 (Tabela 1). A cobertura vegetal predominante é a floresta úmida que ocupa 5,7

milhões de km2 (70%) (Tabela 2).

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Fonte: Eva & Huber, 2005.

Figura 1 – Delimitação da Amazônia proposta pela CE/OTCA – Amazônia sensu latíssimo (em vermelho) – composta de uma sub-região de Amazônia sensu stricto (linha pontilhada)

e quatro regiões periféricas: Andes, Planalto, Guiana e Gurupí.

Tabela 1 – Sub-regiões que compõem a Amazônia sensu latissimo.

Sub-região Superfície (km2) % de superfície total Amazônia 5.569.174 68 Andes 555.564 7 Planalto 864.951 11 Guiana 970.161 12 Gurupí 161.463 2 8.121.313 100 Fonte: Eva &Huber, 2005.

Tabela 2 – Cobertura da terra na Amazônia sensu latíssimo.

Cobertura da terra Total (km2) Percentagem (%) Floresta úmida 5.720.323 70,4 Floreta tropical xerófila 325.635 4,0 Florestas inundáveis 234.510 2,9 Agricultura 937.470 11,5 Pradarias e formações arbustivas 815.907 10,0 Solo com vegetação escassa ou dispersa

86.108 1,1

Corpos de água 1.360 0,0 Total 8.121.313 100,0

Fonte: Eva &Huber, 2005.

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A quantidade de CO2 fixa em um hectare de floresta varia de acordo com a

cobertura vegetal predominante. Nas florestas de transição no norte de Mato Grosso e Rondônia

(Brasil) alcançam 120-150 ton/ha, nas florestas úmidas do Alto Solimões e Rio Negro (Brasil) está

em torno de 190-200 ton/ha e na região dos aguajales (buritizais) no Rio Marañon (Peru) vão a

450 ton/ha (Alvarado et. al. 2006; Castillo, 2005).

Os diversos agentes econômicos que interagem nos processos de uso dos

recursos naturais geraram conflitos e uma rápida alteração da paisagem nas últimas décadas,

exemplificado pelo processo de desmatamento e degradação observado na Pan-Amazônia. O

desmatamento começou na parte superior da bacia do Amazonas no Peru, Bolívia e Colômbia,

estendendo-se sucessivamente para a parte superior. No Brasil, o desmatamento começou na

borda da região amazônica, no nordeste e sudeste, progredindo rapidamente até o norte e

noroeste, seguindo as rodovias e cursos dos rios. De 1990 a 2000 ocorreu um desmatamento

anual médio no Peru de 2.610 km2,totalizando 80.000 km2. No mesmo período, o Brasil

apresentou taxa recorde de desmatamento anual de 23.000 km2. Nos últimos três anos, no

entanto, ocorreu uma redução de mais de 50% na taxa anual (11.224 km2 em 2006/2007) O

desmatamento acumulado chega a 700.000 km2 na Amazônia Brasileira (Ministério do Meio

Ambiente, 2007).

4.1. Emissões de carbono do Brasil e Peru

O Brasil apresenta um perfil de emissões diferente daqueles dos países

desenvolvidos, em que as emissões provenientes da queima de combustíveis fósseis representam

a maior parte. Em 1994, as emissões brasileiras de CO2 foram estimadas em 1.030 Tg,

destacando-se o Setor Mudança no Uso da Terra e Florestas, com 75% das emissões, seguido do

setor energia com 23% (Tabela 3).

No Peru, as emissões nacionais de CO2 equivalentes, em 2004-2005, são

estimadas em 119.550 Gg, o que significa que as emissões aumentaram aproximadamente 20%

em relação a 1994. (98.800 Gg de CO2 equivalente). Destaca-se, também o setor de mudança do

uso da terra e florestas, com 48% das emissões, seguido do setor de energia com 21% e

agricultura com 19% (Tabela 3).

4.2. O manejo de aguaje na Comunidade Indígena de Parinarina, região de Loreto – Peru

Na Amazônia Peruana, os humidales (áreas úmidas) ocupam uma superfície de

13.908.807, sendo que, 3,1 milhões de ha (22%) são comunidades de palmeiras com

predominância de Mauritia flexuosa ou aguaje (buriti) e são conhecidos como aguajales (buritizais)

(Figura 2). Os ecossistemas de humedales fluviais se caracterizam por terem as terras inundadas

periodicamente, como resultado do transbordo dos rios. Esses ambientes integram a Convenção

sobre Áreas Úmidas conhecido como Convenção Ramsar (Castillo, 2005; Alvarado et. al. 2006).

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Tabela 3 – Resumo das Comunicações Nacionais (Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa) do Brasil e Peru.

Gases CO2 (Gg) CH4 (Gg) N2O (Gg) CO2 eq (Gg) País Brasil Peru Brasil Peru Brasil Peru Brasil Peru Total Nacional 1.029.706 88.584 13.173 966 550 34 1.476.839 119.551 Energia 236.505 24.226 401 48 9 0,55 247.716 25.340 Processos Industriais 16.870 7.839 3 14 0,25 21.273 7.917 Agropecuária 10.161 579 503 34 369.311 22.547 Mudança do Uso da Terra e Florestas 776.331 56.519 1.805 12 12 0,15 817.956 56.827 Tratamento de resíduos 803 327 12 20.583 6.860 Fonte: MCT, 2004 e CONAM, 2005.

Figura 3 – Aspecto do dossel de um aguajale destacando uma palmeira de aguaje.

O aguaje é um fruto importante na alimentação para o morador amazônico e seu

consumo ocorre na forma de fruta fresca, sucos e sorvetes, apresentando uma demanda

crescente. O pecíolo e folhas são usados como material de construção de casas rurais e das

folhas jovens se retira fibra para confecção de redes e utensílios domésticos. As sementes são

úteis para a confecção de artesanato. Sua importância não se limita à economia local, pois os

aguajales desempenham um papel importante na cadeia trófica dos bosques amazônicos, devido

o fruto do aguaje ser um alimento importante de espécies como: majaz (Agouti paca), sajino

(Tayassu tajacu), huangana (Tayassu pecari), sacha vaca (Tapirus terrestris) e outras espécies de

aves e peixes. O aguaje é hospedeiro do “Suri” (larva do R. palmarum), importante fonte de

proteínas e óleos para os ribeirinhos (Castillo, 2005).

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A cultura extrativista das populações na Amazônia Peruana comporta uma colheita

de aguaje mediante o corte das palmeiras, gerando um impacto negativo na capacidade

reprodutiva da espécie, por efeito da morte das plantas fêmeas que são as que produzem os

frutos, além de estar causando a necessidade de um maior tempo para localizar palmeiras com

frutos (maior tempo para a colheita). Para se ter um parâmetro da dimensão do impacto causado

pela exploração do aguaje, somente a cidade de Iquitos consome 21,9 t/mês do fruto, o que

equivale a 461 palmeiras colhidas/dia (Castillo, 2005). Em aguajales densos foram encontradas

280 árvores/ha e em aguajales mistos 72 árvores/ha (Alvarado et al., 2006).

Na margem direita do rio Marañon, dentro da Reserva Nacional Pacaya Samiria –

RNPS se encontra a localidade de Parinari. Neste povoado, constituído por 57 famílias mestiças

preferencialmente, os irmãos Emilton e Heraclites Flores Simon (Figura 3) desenvolveram e

utilizam desde 1999, a colheita do aguaje por meio de um instrumento denominado “subidor” o

qual evita o corte e permite aproveitar os 40 anos de produção média que tem essa palmeira

(Castillo, 2005). Essa prática foi estendida para a comunidade e hoje todas as famílias em Parinari

parcelaram seus aguajales e desenvolveram práticas de manejo sustentável.

Figura 3 – Família Flores responsável pelo desenvolvimento do “subidor”

No entanto, essa passagem de um modo não sustentável para um modelo

sustentável de exploração dos aguajales não ocorreu de forma harmônica e rápida, muito pelo

contrário, vários foram os conflitos que surgiram quando a prática tradicional foi questionada. Os

formuladores da nova proposta chegaram a ser ameaçados, de acordo com entrevista com os

irmãos Flores. Somente quando a comunidade verificou as vantagens econômicas (menor tempo

para colheita e uma colheita de melhor qualidade) a nova prática foi aceita.

Os aguajales estão proporcionando os mais altos benefícios por captura e

manutenção de carbono que qualquer outro ecossistema amazônico, sendo o solo o componente

que apresenta maior armazenamento de carbono. Alvarado et. al. (2006) encontram no aguajal

12

denso 484,52 tC/ha e 424,72 tC/ha para aguajales mistos, o que é bem superior a outros

ecossistemas na Amazônia. Além disso, os aguajales estão funcionando como sumidouros de

carbono a uma taxa de 0,90 tC/ha/ano.

4.2.1. Análise de recursos na Comunidade de Parinari

Como pode ser observado no heptágono, a comunidade possui boas condições

para a implementação de um projeto de pagamento por serviço ambiental carbono pelo manejo do

aguaje, porém, existem limitações no recurso infra-estrutura e no recurso carbono. A Figura 4

mostra a representação esquemática da Metodologia do Carbono Social na Comunidade Indígena

de Parinari.

4,00

4,71

4,50

3,903,90

2,14

2,83

0

1

2

3

4

5

6

Capital Biodiversidad

Capital Recursos Naturales

Capital Social

Capital HumanoCapital financiero

Capital Infraestructura

Capital Carbono

Fonte: Elaborado pelo autor.

Figura 4 – Representação esquemática da metodologia do Carbono Social na Comunidade de Parinari – Peru.

4.2.1.1. Recurso Biodiversidade

As comunidades naturais estão em bom estado de conservação, sendo visível uma

grande quantidade de aves e primatas ao longo da Quebrada de Parinari. Existem partes

desmatadas ao longo do curso do rio conhecidas como chácaras, onde são desenvolvidas as

atividades agropecuárias, correspondendo a menos de 5% da área desmatada.

4.2.1.2. Recurso Natural

A Comunidade de Parinari está utilizando os “subidores” (Figura 5) para colheita

dos frutos de aguaje, o que minimiza os impactos da exploração. Existem plantios de aguaje

isolados ou consorciados com outras espécies (Figura 6). Porém, ainda não foi possível impedir a

entrada de moradores de outras comunidades nos limites de Parinari, que fazem pesca

predatória, principalmente de paiche (pirarucu), e retirada ilegal de madeira.

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Figura 5 – Colheita de aguaje utilizando o “subidor”.

Figura 6 – Área de plantio de aguaje com sete anos.

4.2.1.3. Recurso Social

A comunidade se encontra organizada, existindo uma hierarquia de comando. Há

responsáveis pela segurança, distribuição de leite, saúde, energia, além de um coordenador geral.

Além disso, existe uma associação que foi criada há cerca de um ano para poder captar recursos.

Em geral, a resolução dos conflitos que afetam a comunidade é solucionada coletivamente.

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Existem alguns problemas de confiança entre os membros que não se constitui em impedimento

para o desenvolvimento das atividades.

4.2.1.4. Recurso Humano

Existe uma escola de ensino fundamental e uma escola básica que atendem a

todas as crianças que vivem na comunidade. Foi informado que o problema de evasão escolar é

muito pequeno, mas como não existe uma escola de ensino médio, os jovens são obrigados a

parar de estudar ou ir para outra comunidade que possua escola. O número de adultos

analfabetos é alto e entre os jovens observaram-se analfabetos funcionais, ou seja, apenas

sabiam escrever o próprio nome, mas não são capazes de interpretar um pequeno texto. Existe

apenas uma responsável pala farmácia comunitária que distribui remédios para os moradores,

quando disponíveis. Se houver qualquer problema mais sério é necessário se deslocar para

outras localidades. Não existe assistência técnica regular, o que não impede o desenvolvimento

de práticas sustentáveis pelos moradores, como é o caso do “subidor”. Porém, em vários

momentos projetos de capacitação ocorreram por iniciativa de ONG’s e do governo.

4.2.1.5. Capital Financeiro

A economia local é baseada na agricultura de subsistência e no extrativismo,

principalmente de aguaje e madeira, além da pesca e caça. Não existem linhas de crédito para a

comunidade e a principal fonte de geração de renda é a venda do aguaje e do excedente da

produção agropecuária. Outra fonte de renda é a venda da mão-de-obra em outras comunidades

e cidades próximas (Iquitos e Nauta). Como já foi colocado, o manejo dos aguajales pela

comunidade de Parinari é feito de forma sustentável com impacto minimizado, existindo um plano

de manejo.

4.2.1.6. Capital Infra-Estrutura

Por ser uma comunidade isolada situada na margem esquerda do rio Marañon,

Parinari sofre com a precariedade do transporte fluvial disponível. No ano de 2006, apenas 20%

da produção de aguaje foi comercializada devido à interrupção de duas linhas de empresas de

transporte da região5. Durante o período de trabalho de campo o Governo Regional iniciou um

serviço de transporte para atender as comunidades ribeirinhas no transporte de mercadorias, o

que deve ajudar na saída da produção. Não existe serviço de fornecimento de água potável e a

comunidade se abastece na Quebrada de Parinari. Existe um grupo gerador diesel que fornece

energia, mas o seu funcionamento ocorre somente quando existe disponibilidade de combustível.

Todas as casas são servidas pelo sistema de energia elétrica e as ruas são

iluminadas, quando o grupo gerador está funcionando. Existe a escola de ensino fundamental e

ensino básico que estão em boas condições, mas necessitando de reparos. As duas possuem

área onde são plantadas espécies frutíferas e realizadas práticas pedagógicas partindo da 5 Informação oral dada pelo Sr. Emilton Flores durante entrevista.

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realidade dos alunos. No entanto, existe uma visível falta de material para os estudantes, apesar

da inegável dedicação dos três professores que lecionam (Figura 8).

Figura 8 – Aula bilíngüe nas margens do rio Marañon onde são abordados temas da realidade dos alunos, nesse caso a questão da pesca.

As habitações são de madeira e palha. Os equipamentos agrícolas principais são

motos serras e canoas com motor tipo “peque-peque” para transporte de pessoas e mercadoria.

Um bote de maior dimensão foi adquirido com recurso de um projeto, mas ainda não estava

funcionando. A administração dos recursos desse projeto foi fonte de conflito e colocou em jogo a

confiança em alguns membros. Estava em construção um posto de vigilância para controlar a

entrada de moradores de outras comunidades e diminuir a exploração ilegal de paiche e aguaje.

São usados instrumentos de trabalho comuns no campo para trabalho na lavoura e na pecuária.

4.2.1.7. Capital Carbono

O ecossistema dos aguajales é de extrema importância para a manutenção dos

estoques de carbono das florestas, devido à alta quantidade encontrada em cada hectare,

alcançando 484 tC/ha. Porém, atividades que visem o desmatamento evitado não são elegíveis no

Protocolo de Quioto, portanto, não existe ainda uma regulamentação para orientar a venda deste

serviço ambiental, o que leva a valores baixos que são pagos pela tonelada de CO2 não emitido

pela manutenção da floresta (entre US$ 3,00 e US$5). Para a realidade da comunidade de

Parinari os custos de transação são altos para permitir que se dê início a um processo de venda

do serviço, o que pode mudar a partir da identificação de financiadores que estejam dispostos a

incorporar nos custos do pagamento pelo serviço essa despesa ou mesmo uma ajuda

governamental nesse sentido. Pelas práticas que já são desenvolvidas na comunidade, e do que

foi respondido durante a reunião com a comunidade, há um grande interesse no tema e no

desenvolvimento do projeto, sendo necessário, no entanto, um fortalecimento das instituições

comunitárias no sentido de aumentar a confiança dos moradores.

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5. Discussão A Comunidade de Parinari possui características típicas das populações da

Amazônia, apresenta baixos níveis de educação, grande quantidade de pessoas migrantes ou

mestiças, número médio alto de filhos, etc. A falta de incentivos pelo manejo sustentável do

aguaje impede que a população tenha uma visão de longo prazo alentadora para a extração

racional da palmeira. Os preços recebidos pela venda de aguaje e outros produtos em áreas

manejadas de maneira sustentável são os mesmos daqueles que provêem de zonas

desflorestadas.

Existe ainda uma falta de regularidade no transporte, altos preços de frete dos

produtos e uma grande quantidade de intermediários na comercialização. Além disso, o fruto

transportado possui aproximadamente 95% de seu peso relacionado às sementes. Um

processamento e venda da poupa agregaria valor e diminuiria a necessidade de volume

transportado. Essas características constituem ameaças para a comunidade. Todo o esforço feito

até o momento na manutenção da floresta em pé não está se transformando em melhoria na

renda dos moradores. O pagamento pelo serviço ambiental carbono pode ser uma alternativa para

complementar os benefícios para os verdadeiros gestores dos recursos.

Outro ponto importante é quanto ao direito de propriedade no caso da Comunidade

Indígena de Parinari. A área está dentro do limite da Reserva Nacional Pacaya Samiria, de

responsabilidade do Instituto Nacional de Recursos Naturais – INRENA. O órgão alega que

qualquer contrato de venda de serviço ambiental dentro das Unidades de Conservação deverá ter

o INRENA como beneficiário que definiria o destino dos recursos. Esse ponto de vista é contrário

a um fundamento básico do PSA os pagamentos devem chegar aos que manejam diretamente o

recurso natural, sob pena de não se alcançar os objetivos pretendidos.

O estudo tenta iniciar uma discussão sobre os possíveis futuros do pagamento por

serviço ambiental carbono pela manutenção da floresta, em decorrência do manejo florestal

sustentável e a conservação, delimitando o sistema e procurando identificar as variáveis-chaves.

Estudos prospectivos na região Pan-Amazônica ainda são raros e, para o setor florestal,

praticamente inexistente. A sua disseminação poderá auxiliar em uma melhor tomada de decisão

na alocação de recursos e definição de políticas públicas.

Um dos efeitos principais da intervenção do trabalho foi à organização e decisão

desta comunidade para elaborar um projeto de pagamento pelo serviço ambiental carbono. Os

membros da comunidade de Parinari já estão batendo em portas de diferentes instituições para

pedir informação e assistência técnica, principalmente para alcançar esta meta. Isto apresenta

uma grande oportunidade para instituições como o Instituto de Investigações da Amazônia

Peruana – IIAP, o INRENA, como chefia da Reserva Nacional Pacaya Samiria – RNPS, ONG´s,

entre outros, para desenvolver de um modo combinado um projeto piloto sobre PSA carbono

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nesta comunidade, e que isto sirva como experiência para outras comunidades localizadas na

bacia do rio Marañón.

Os dados iniciais levantados na Comunidade de Parinari, e uma revisão de estudos

de caso no Brasil, mostram que o PSA carbono precisa de uma estruturação jurídica e

institucional, que no caso do Peru e do Brasil ainda está em formação. No Brasil o Congresso

Nacional estuda Projetos de Lei para regulamentar o mercado de carbono e o pagamento pro

serviços ambientais e o Peru anunciou a criação do Ministério do Meio Ambiente em abril de 2008,

mostrando que ambos os países estão desenvolvendo ações internas para adequação do uso dos

recursos das florestas, mas não se observa uma ação no sentido de trabalhar em conjunto para a

gestão das florestas da Pan-Amazônia.

Outro ponto que se destaca é a assimetria de dados de desmatamento anual das

florestas nos diferentes países. A proposta de cooperação entre o Brasil e o Peru no uso de dados

do Sistema de Proteção da Amazônia – SIPAM é uma iniciativa que se concretizada poderá

auxiliar na diminuição dessa disparidade de informação.

6. Conclusões e Implicações A comunidade de Parinari reflete as mudanças que vêm ocorrendo nas últimas

décadas na região de Loreto no Peru, e em outras áreas da Pan-Amazônia. A maior inserção dos

recursos naturais da floresta tropical Sul-Americana nos mercados globalizados trouxe a rápida

mudança da paisagem, em algumas partes, e a massificação do consumo e dependência das

populações locais, refletido na urbanização acelerada.

A carência de políticas governamentais de desenvolvimento baseadas em

necessidades reais da Pan-Amazônia ocasionou respostas variadas e, em muitos casos,

indesejadas. Várias foram às seqüelas deixadas nas comunidades locais e na base de recursos

naturais. O manejo diferenciado dos aguajales pela comunidade de Parinari é um exemplo das

possibilidades de uso dos recursos, mantendo-se a base de recursos naturais e intensificação da

participação dos moradores.

O PSA carbono surge dentro de uma perspectiva de desenvolvimento que leve em

conta as dimensões econômicas, sociais e ambientais e que promova a manutenção da floresta

em pé. O PSA carbono seria um incentivo a adoção de sistemas produtivos que minimizem a

poluição e a alteração da cobertura vegetal. O que em geral se verifica nos países amazônicos, é

uma falta do Estado, principalmente nas frentes de ocupação e desmatamento. Para o sucesso de

programas e projetos de desenvolvimento rural, tal como o de PSA carbono, essa realidade tem

de se modificar e o Estado deve passar a ser indutor de práticas sustentáveis. Essa ação tem de

vir vinculada a outras políticas públicas, tais como: educação de qualidade, saneamento, saúde,

segurança e direitos.

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As negociações que estão acontecendo em torno das florestas tropicais e da

noção de desmatamento evitado são de interesse direto dos países da Pan-Amazônia. Brasil e

Peru, maiores detentores de floresta na América do Sul, poderão ser beneficiados por projetos de

PSA carbono com a conservação e manejo sustentável de suas florestas. Porém, muitas

indefinições terão de ser solucionadas para uma efetiva viabilidade da redistribuição eqüitativa dos

benefícios gerados pelos serviços ambientais.

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