MANUAL EM PORTUGU+èS - SOCIEDADE E CULTURA FRANCESA - REVISTO - CAP. 1 A 6
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História de França - 1750-1995 – Sociedade e Cultura
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HISTÓRIA DE FRANÇA
1750 - 1995
SOCIEDADE E CULTURA
História de França - 1750-1995 – Sociedade e Cultura
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ÍNDICE
CAPÍTULO 1 – O TERRITÓRIO FRANCÊS – SÉCULO XIX – XX ...................................................... 4
Permanências e Mudanças (1945-1995) ............................................................................................... 14
CAPÍTULO 2 – A ORIGINALIDADE DEMOGRÁFICA ...................................................................... 32
A França: um caso particular ................................................................................................................ 32
O Percurso Singular da França ............................................................................................................. 34
As diferenças perante a morte ............................................................................................................... 35
As razões do recuo da mortalidade ....................................................................................................... 37
A evolução da fecundidade ................................................................................................................... 40
A primeira revolução contraceptiva (século XIX) ................................................................................ 42
A segunda revolução contraceptiva ...................................................................................................... 45
As estruturas lentamente alteradas ........................................................................................................ 48
Perturbações na actividade .................................................................................................................... 50
A tradição da imigração ........................................................................................................................ 53
O contributo demográfico ..................................................................................................................... 53
Geografias da imigração ....................................................................................................................... 54
Os problemas de integração .................................................................................................................. 54
Uma população envelhecida ................................................................................................................. 56
A precocidade do envelhecimento ........................................................................................................ 57
A questão das reformas ......................................................................................................................... 57
Os desafios do envelhecimento ............................................................................................................. 59
CONCLUSÃO ........................................................................................................................................... 60
CAPÍTULO 3 – A CHEGADA DO CAPITALISMO INDUSTRIAL ..................................................... 62
As Premissas da Revolução Industrial .................................................................................................. 62
Conclusão Geral .................................................................................................................................... 81
CAPÍTULO 4 – CRESCIMENTO E CRISES EM FRANÇA NO SÉCULO XX ................................... 83
Os paradoxos da “Belle Époque” .......................................................................................................... 84
A Primeira Guerra Mundial e suas Consequências ............................................................................... 86
A França – Homem Doente da Europa ................................................................................................. 91
O período de crescimento ..................................................................................................................... 95
CAPÍTULO 5 – A FRANÇA DOS NOTÁVEIS 1815-1879 ................................................................. 106
A França dos Notáveis - Lexico .......................................................................................................... 107
O Universo do Povo e das Classes Médias ......................................................................................... 108
O Pequeno Mundo do Notáveis .......................................................................................................... 116
Os notáveis e o Estado. As necessárias adaptações ............................................................................ 123
A monarquia de Julho – 1830-1848: Apogeu do poder dos notáveis... e das perturbações ............... 124
CAPÍTULO 6 – A QUESTÃO OPERÁRIA DO SÉCULO XIX ........................................................... 130
Contornos e Diversidade de uma Classe em Gestação ....................................................................... 130
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A Condição Operária .......................................................................................................................... 135
A revolta dos canuts no muro dos federados ...................................................................................... 142
O Impulso do Movimento Operário sob a Troisième République ...................................................... 147
Actividades propostas ......................................................................................................................... 154
CAPÍTULO 7 - A ENTRADA NA SOCIEDADE DE CONSUMO ......... Error! Bookmark not defined.
História social da França: 1880-1980 ........................................................ Error! Bookmark not defined.
Democratização e persistência de uma sociedade rural Malthusiana (1870-1940) .... Error! Bookmark
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Recomposição social da França durante os Trinta Gloriosos ................ Error! Bookmark not defined.
A França como sociedade de consumo. O equipamento da França e a vida caseira .. Error! Bookmark
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CAPÍTULO 8 – LITERATURA E SOCIEDADE, O EXEMPLO DO SÉCULO XIX . Error! Bookmark
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"Um templo erguido pelo espírito humano à verdade e à virtude" ............ Error! Bookmark not defined.
A batalha romântica ................................................................................... Error! Bookmark not defined.
Guerras Bizarras......................................................................................... Error! Bookmark not defined.
O Panteão dos inclassificáveis ................................................................... Error! Bookmark not defined.
CAPÍTULO 9 – EDUCAÇÃO, CULTURA E CIÊNCIA. DE 1840 ATÉ FINAIS DO SÉCULO XX
.................................................................................................................... Error! Bookmark not defined.
As Revoluções do Século XIX .............................................................. Error! Bookmark not defined.
As Mudanças Contemporâneas .............................................................. Error! Bookmark not defined.
Conclusão :............................................................................................. Error! Bookmark not defined.
CAPITULO 10 – FIM DE SÉCULO ......................................................... Error! Bookmark not defined.
Quadro da França 1981-1995 ................................................................. Error! Bookmark not defined.
As Crises da França ............................................................................... Error! Bookmark not defined.
A França em Movimento ....................................................................... Error! Bookmark not defined.
Conclusão ............................................................................................... Error! Bookmark not defined.
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CAPÍTULO 1 – O TERRITÓRIO FRANCÊS – SÉCULO XIX – XX
**************
A estes desequilíbrios Paris – província que são uma constante na história contemporânea do território
francês, a Revolução industrial veio acrescentar outros desequilíbrios igualmente importantes em ambos
os lados de uma linha diagonal imaginária que se poderia traçar entre Le Havre e Marseille. A indústria
desenvolveu-se sobretudo no leste, estimulando o crescimento demográfico e as cidades. É lá que são
organizados os grandes centros industriais, (Saint-Étienne, Le Creusot, Lyon, Mulhouse...), ao ponto de
dominar por vezes o conjunto de vida de uma região (Nord-Pas-de-Calais, Lorraine). A oeste, pelo
contrário, as regiões permaneceram afastadas da revolução industrial, com excepção de alguns pequenos
centros muito isolados. A actividade agrícola foi durante muito tempo essencial, fechando-se
frequentemente em práticas rotineiras (Sud-Ouest, Bretagne), enquanto declinavam o artesanato e a
pequena indústria no meio rural, vítimas da concorrência das produções da grande indústria, facilmente
encaminhadas pelos caminhos-de-ferro. Estas regiões não puderam reter a sua população e alimentaram
fortes correntes de êxodo para a capital ou para os centros industriais do norte e do leste. Essencialmente
dominadas pelas actividades terciárias, do comércio ou da administração, as suas cidades foram a
imagem desta marginalização económica progressiva, com excepção de algumas metrópoles provinciais
(Nantes, Bordeaux, Toulouse...), funcionando ligeiramente como retransmissões regionais de grandes
sociedades capitalistas que se dizia frequentemente "parisienses", e que desenvolviam a sua estratégia à
escala de um mercado nacional, progressivamente unificado.
É arbitrário apresentar separadamente as consequências geográficas da revolução industrial e as da
revolução dos caminhos-de-ferro, mesmo se é necessário proceder assim, nos parágrafos seguintes, para
a clareza da exposição. Os dois fenómenos estão com efeito estreitamente ligados. A grande indústria
pôde desenvolver-se apenas em ligação com os progressos dos transportes ferroviários. Unicamente este
novo modo de transporte podia assegurar-lhe, a um preço não dissuasivo, abastecimentos maciços em
produtos energéticos e matérias-primas. Organizados racionalmente em redes que cobriam o conjunto do
país, os caminhos-de-ferro apoiavam também o desenvolvimento da produção oferecendo-lhe mercados
em todas as regiões, e um acesso fácil aos principais portos marítimos para as exportações. Estimulavam
directamente ainda a indústria pelas encomendas do carvão necessário para a tracção, do material
rolante, dos carris e de todos os equipamentos necessários às vias, nas quais a quilometragem aumentou
constantemente até à Primeira Guerra Mundial.
Os mapas 5, 6 e 7 permitem constatar o desigual desenvolvimento da indústria no território francês
desde o fim do século XVIII hà grande crise económica entre as duas guerras. A sua leitura requer
contudo alguma prudência, na medida em que não figura o centro industrial que constitui a aglomeração
parisiense, cujo peso não cessou de reforçar-se. Já muito activo no meio do século XIX, conhece um
vigoroso desenvolvimento nas décadas que se seguem, beneficiando largamente da sua posição ao
centro do sistema do caminho-de-ferro francês. Afectando durante longos meses as grandes regiões
industriais do norte e do leste ocasionando importantes estragos, a guerra de 1914-1918 aumentou ainda
as funções industriais da capital: construções automóveis e aeronáuticas, indústria química...
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A revolução ferroviária
No final do século XVIII, numa França ainda compartimentada, onde cada região vivia numa relativa
autarcia, o artesanato e a pequena indústria estavam ligeiramente presentes, utilizando os recursos locais,
para responder às necessidades imediatas das populações: têxtil, trabalho da madeira, pequena
metalurgia... Em certos locais, melhor fornecidos que outros em recursos energéticos e minerais, a
inovação tecnológica, a mobilização dos capitais e o espírito de empresa de certos meios já tinham dado
nascimento a concentrações industriais de grande envergadura: trabalho da lã em redor de Lille e Rouen,
algodões em Mulhouse, seda em Lyon; metalurgia perto das bacias carboníferas ou as jazidas de ferro
em Saint-Étienne, Creusot... Por toda a parte, o desenvolvimento da produção defrontava-se com a
insuficiência dos meios de transporte e do seu custo excessivo.
A estrada (fig. 8) não permitia mais encaminhar grandes quantidades de produtos industriais - ou
agrícolas – através de grandes distâncias, a um preço não dissuasivo, tinham-se fundado grandes
esperanças, a partir do século XVII, sobre a utilização dos rios, estes "caminhos que andam". Mas os
homens permaneciam tributários dos seus caprichos e sobretudo dos seus traçados que não
correspondiam sempre às necessidades da economia. Esforçou-se por conseguinte por dominar os
débitos e as cheias para facilitar a navegação, mas a grande ambição foi sobretudo ligá-los entre si por
canais, a fim de constituir uma verdadeira rede navegável (fig. 9). A técnica fez neste domínio muitos
progressos desde a construção do canal de Briare (1642), unindo as bacias do Loire e do Seine, pelo vale
do Loing, ou a realização do canal do Midi (1681) entre Toulouse e o porto de Sète. O canal do Centre
entre Saône e o Loire foi terminado em 1794, enquanto se prosseguia a realização do canal de
Bourgogne entre Saône e a bacia do Seine, via Yonne, elemento essencial para assegurar a continuidade
de navegação sobre uma das grandes linhas de força do território francês, ligando os portos do Basse-
Seine (Rouen e Le Havre) a Marselha, servindo ao mesmo tempo as duas cidades mais povoadas do
país, Paris e Lyon. Outros projectos adiaram o seu início por motivo das perturbações da Revolução e do
Império. Esperava-se bastante do desenvolvimento económico do país, muito mais que dos caminhos-
de-ferro.
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No domínio ferroviário, a França acusava um atraso bastante nítido em relação à Inglaterra. O novo
modo de transporte suscitava múltiplas controvérsias, o entusiasmo de uns que respondem ao
cepticismo, ou mesmo a honesta hostilidade de outros. Compreende-se por conseguinte que as vias
ferroviárias primeiro tivessem sido concebidas como "afluentes da via fluvial". Tal foi o caso, em 1827,
da primeira inauguração entre elas, da ligação das minas de carvão de Saint-Étienne ao porto de
Andrézieux pelo Loire. Os vagões que a compunham, puxados por cavalos, encaminhavam o carvão até
à via fluvial navegável mais próxima possível. Alguns anos mais tarde, é para atingir o Rhône e, depois,
a clientela leonesa, que foi aberta outra via com partida de Saint-Étienne. Esta oferecia desempenhos
claramente superiores com a utilização das locomotivas a vapor para a tracção dos comboios. Este
progresso decisivo explica a concorrência entre vias fluviais e as vias ferroviárias que guiou rapidamente
a vantagem do caminho-de-ferro. Mas esperando a constituição verdadeira de uma rede de caminho de
ferro, a urgência do desencravamento provocou a construção de outras linhas deste tipo para ligar certos
centros industriais à rede navegável. Tal foi, por exemplo, em 1857 ainda, o caso dos 17 Km de
caminhos-de-ferro financiados pelos proprietários das minas de Carmaux para transportar o carvão até á
cidade próxima Albi, onde embarcações que navegam sobre o Tarn e o Garonne asseguravam
seguidamente a sua expedição para regiões mais remotas.
Se o caminho-de-ferro constituía uma inovação essencial para o transporte das mercadorias, abria
também novas perspectivas para a deslocação das pessoas. A multiplicação das iniciativas privadas
colocou rapidamente temíveis problemas jurídicos e políticos que foram arbitrados, essencialmente, pela
lei de 1842. Foi admitido que a construção da via e a sua exploração fossem deixadas ao capital privado,
por meio de concessões atribuídas pelos poderes públicos, nas quais são definidos com precisão os
caracteres técnicos das obras e o material, a consistência dos serviços, as regras financeiras e a política
pautal. Ao Estado reservava-se por conseguinte um papel essencial: é ele que definia o traçado das
linhas e a organização geográfica das redes, conservando a seu cargo as expropriações e os trabalhos
necessários para o estabelecimento das plataformas que deviam receber as vias e as construções de
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exploração. Pôde assim impor normas técnicas uniformes, em especial um espaçamento semelhante das
vias sobre todas as linhas, que permitia aos comboios circular sobre o conjunto do território explorado
por concessionários diferentes. Do mesmo modo os poderes públicos impuseram uma tarifação que
visava não desfavorecer as regiões menos activas ou difíceis de servir. Velou igualmente pela
manutenção de tarifas pouco elevadas para o transporte de certas mercadorias de primeira necessidade
mais pesadas e de fraco valor à tonelada (carvão, cereais) o que permitia encaminhá-las, sem estar a
aumentar excessivamente os seus preços de venda, para regiões que não as produziam, ou que as
produziam insuficientemente.
Estas disposições jurídicas e financeiras, alteradas ao longo dos anos, permitiram bastante rapidamente a
organização de uma verdadeira rede: 4.000 Km em 1850, 17.000 em 1870, 40.000 em 1913 (fig. 10, 11,
12 e 13). Os concessionários agruparam-se em seis grandes companhias sobre uma base geográfica:
Norte, Leste, PLM (Paris-Lyon-Mediterranée), Midi, Paris – Orléans e Oeste. Cada uma, com excepção
da Companhia do Midi, tinha uma grande estação na capital, ou partia de uma linha radial soberana com
destino à província. Em Paris, com efeito, a ideia de criar uma estação central comum tinha sido
abandonada, impondo aos viajantes e às mercadorias difíceis transbordos para passar de uma rede para
outra. Só a Companhia do Midi continuava a ser inteiramente regional, organizando-se em redor de uma
das raras transversais da rede francesa, ligando Bordeaux a Sète.
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Os poderes públicos e os engenheiros do Estado que tinham imposto esta centralização da rede de
caminho-de-ferro não fazendo mais do que apenas de ter em conta os grandes fluxos de mercadorias e
de viajantes que existiam até então. Preocupados em responder às necessidades, tinham retomado o
esquema das estradas, e a estrela caminho-de-ferro concebida pelo engenheiro Legrand reproduzia a
estrela rodoviária do Antigo Regime, reconduzida oficialmente em 1811 (fig. 8). Não houve por
conseguinte, nessa época, uma vontade de pôr em causa a organização do território herdada dos séculos
precedentes. Esta lógica ilustra perfeitamente a perenidade de uma escolha de centralização, que se
inscreve de maneira coerente num território já unificado politicamente. A França pôde assim, a partir da
origem, dotar-se de uma rede de caminho-de-ferro hierarquizada e coerente, o que não foi o caso de
outros países, como a Alemanha, cuja unidade territorial ainda não era real, e que tardou em harmonizar
as numerosas redes herdadas dos cortes políticos anteriores.
Em França, a decisão de atribuir uma prioridade aos grandes eixos já largamente frequentados,
procedentes da capital, respondia também a imperativos de rentabilidade económica. Para incentivar os
capitais privados a investir na aventura do caminho-de-ferro, era necessário deixar-lhes antever uma
remuneração interessante. Isto não era, evidentemente possível, a não ser sobre os itinerários onde se
podia captar tráfegos importantes, o que permitiria amortizar bastante rapidamente as despesas de
estabelecimento das linhas, e realizar substanciais benefícios da sua exploração. Esta preocupação de
rentabilidade, de resto foi confirmada pela prioridade que foi atribuída à aposta em serviço das linhas
que servem Paris ou o eixo PLM (mapa 1850), enquanto que outros itinerários no entanto retidos na lei
de 1842 não encontravam concessionários. A linha Bordeaux-Sète encontrou-se nesta situação,
atravessando uma região pouco activa, oferecendo medíocres perspectivas de tráfego, arriscava-se para
além de ser vítima da concorrência do canal do Midi e do seu prolongamento para Bordeaux por um
canal lateral a Garonne, com a construção em curso (1838-1856).
Se houve revolução do caminho de ferro - o que é inegável -, ela referiu-se sobretudo às tonelagens
transportadas e à rapidez das viagens. A organização geral do território francês não foi perturbada
fundamentalmente, pelo contrário. Equipando primeiro os eixos já mais frequentados ou os que serviam
as novas regiões industriais, o caminho-de-ferro apenas reforçou as linhas de força já antigas.
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Localmente, em contrapartida, certas cidades retomaram o seu desenvolvimento graças à sua posição
sobre as novas vias ferroviárias ou à sua intersecção (Vierzon) enquanto que outros sofreram por ter
recusado o caminho-de-ferro (Romorantin) ou relegados a uma estação extremamente distante da sua
periferia (Tours, Orléans).
As consequências geográficas indirectas do equipamento ferroviário do país foram contudo
consideráveis. Em algumas décadas, a França estava coberta por vias ferroviárias. Em nome da equidade
territorial e dos princípios da justiça distributiva, os poderes públicos prestaram grande atenção ao servir
o conjunto das regiões e de cada departamento. Necessitaram-no para vencer a oposição das companhias
concessionárias que temiam comprometer as suas contas de exploração - e os dividendos dos seus
accionistas - aceitando construir e explorar linhas secundárias, cuja rentabilidade não era assegurada, em
zonas ligeiramente povoadas e pouco activas. Estas reservas foram vencidas apenas ao preço de
importantes garantias financeiras atribuídas pelo Estado, em especial em 1879, aquando do Plano
Freycinet que previa acrescentar múltiplas ramificações às redes já existentes.
Uma nova distribuição dos homens e das actividades
Pela sua organização geográfica e pela política tarifária que lhe foi imposta, a rede de caminho de ferro
permitiu a constituição de um grande mercado nacional. Encaminhando por toda a parte, grandes
quantidades e a custos muito fracos em relação aos transportes rodoviários, os produtos agrícolas e
industriais, perturbou completamente as regras do jogo económico anterior. Cada região foi então
confrontada com uma viva concorrência, que revelou fortes disparidades nas estruturas das produções
agrícolas e industriais. Travadas até então no seu desenvolvimento, porque demasiado exclusivamente
tributárias de mercados locais demasiado estreitos, certas actividades puderam desenvolver-se
rapidamente escoando as suas produções no conjunto do país. Outras, pelo contrário, que se mantiveram
relativamente protegidas no seu isolamento, não podendo opor-se a produtos concorrentes fabricados
noutros locais em condições muito mais favoráveis. Operou-se então, em todos os domínios, uma
profunda redistribuição dos homens e das actividades, na origem de numerosas especializações
regionais.
Especializações agricolas e turisticas
Enquanto as trocas foram caras e limitadas, esforçou-se por produzir em cada região tudo o que era
necessário à alimentação dos habitantes. Com sucessos desiguais e nos limites que impunham
certamente as condições naturais, os sistemas de culturas e de criação eram pouco diferenciados. Mesmo
quando as especializações se afirmaram, continuava-se no âmbito de uma policultura bastante variada.
Era com efeito demasiado arriscado abandonar certas produções indispensáveis, porque os
abastecimentos externos podiam faltar em certos anos, no caso de más colheitas nas regiões de onde
eram fornecidas. No Bas-Languedoc, por exemplo, que era fornecido de cerais pelo Midi de Toulouse,
graças ao canal do Midi, os intendentes temiam um abandono demasiado sistemático das superfícies
cultivadas em proveito da viticultura, e tentaram limitar este movimento.
Estes temores foram levantados progressivamente com a generalização dos transportes ferroviários. Em
cada região, pôde-se então jogar o mapa das especializações agrícolas, melhor adaptadas às condições
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naturais e às estruturas das explorações, sem estar a correr o risco de faltarem outros produtos essenciais
que podiam obter-se doravante no conjunto do país, ou mesmo no estrangeiro, e encaminhar sem
dificuldade por um custo de transporte razoável.
Entre as especializações mais espectaculares que quase conduzem a uma monocultura, pode-se citar o
Basse-Normandie e o Bas-Languedoc. No primeiro caso, trata-se do abandono das culturas em proveito
dos pastos permanentes destinados à criação de bovinos para a produção de leite. Perto de Paris, as
necessidades diárias da capital em produtos lácteos que deviam ser consumidos rapidamente (leite ou
queijos frescos, queijos de massa mole tipo Camembert...) foram determinantes. A especialização seguiu
bastante rapidamente a abertura das vias ferroviárias, como foi também o caso no Bas-Languedoc na
viticultura. Nesta região, a vinha impôs-se quase por toda a parte às expensas de outras culturas logo que
se pôde expedir o vinho em grandes quantidades para o conjunto do país, e em especial para a região
parisiense onde importantes armazéns de vinhos se estabeleceram perto das estações do PLM e de Paris-
Orléans que recebiam os comboios do Midi. Beneficiando de condições muito favoráveis à cultura da
vinha, as produções languedoquianas fizeram então pesar grossas ameaças sobre vinhedos mais
setentrionais, menos favorecidos. Entre estes, os que tiveram êxito a manter-se fizeram-no ao preço de
uma reconversão para vinhos de qualidade (Champagne, Bourgougne, Bordelais...), adoptando videiras
e técnicas de vinificação das quais frequentemente se provou o interesse previamente, sem, no entanto,
estar generalizado.
Nem todas as regiões estiveram em condições de proceder àquelas especializações, que supunham
frequentemente importantes capitais, uma modificação das estruturas agrárias e a organização de
circuitos comerciais adaptados. Algumas, tendo desvantagens pela sua qualidade ou pelas condições
climáticas menos favoráveis, não puderam opor-se à concorrência de produções provenientes de regiões
mais favorecidas, nas quais se obtinham rendimentos muito superiores. Outras foram incapazes de
reagir, porque os proprietários e os empresários não tiveram vontade ou meios de fazer face às novas
condições de mercado para melhorar e reconsiderar o seu sistema de cultura.
As especializações locais e regionais não foram limitadas à agricultura. Facilitando as viagens, o
caminho-de-ferro contribuiu também para o desenvolvimento de actividades turísticas em lugares que
beneficiavam de condições climáticas favoráveis a pedido da clientela, ou de recursos de águas
propícios ao desenvolvimento do termalismo. A doçura dos Invernos no litoral mediterrânico, ao leste de
Maures, fez deste um dos maiores lugares do turismo aristocrático europeu, chamado depois de "Cote
d’Azur", logo que as vias ferroviárias tornaram o acesso fácil. É em redor das estações de caminho-de-
ferro que se desenvolveram as grandes estações, às vezes criadas ex-nihilo, como Cannes. Outros
exemplos deste tipo são igualmente famosos e o seu desenvolvimento data geralmente do Segundo
Império: Biarritz, Deauville, Dieppe... Nessa época, e até à guerra de 1914-1918, fugia-se dos litorais
julgados demasiado quentes no verão, e a clientela dos hotéis e palácios ganhava, sempre pelo caminho-
de-ferro, as cidades de águas como Evian, Aix-les-Bains ou Vichy.
A revolução ferroviária, ao mesmo tempo que uniformizava os modos de vida e de consumo, induzia ou
amplificava por conseguinte mutações numerosas que acentuavam os contrastes e as disparidades no
espaço francês. É no domínio industrial que as diferenças regionais acusaram mais pesadas
consequências. O mapa que se desenhou então parece largamente tributário da desigual distribuição dos
recursos energéticos e das matérias-primas. Mas aquilo não explica tudo, como frequentemente se dizia,
negligenciando outros factores, cujos trabalhos históricos recentes mostram a sua importância.
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Especializações industriais
A primeira revolução industrial foi largamente tributária da energia que provem da combustão do
carvão, dominada graças à máquina a vapor. Parecia por conseguinte judicioso, a fim de evitar custos de
transportes inuteis, utilizar esta energia nos próprios locais de produção. Ainda era necessário que
capitais importantes fossem investidos nas regiões onde se encontravam as jazidas de carvão, e fossem
valorizados por grupos sociais preocupados em inovações técnicas, abertas ao espírito empreendedor.
Explica-se assim o desenvolvimento precoce dos primeiros grandes centros industriais sobre as bacias
carboníferas de Saint-Étienne e Creusot. A mina, as fábricas metalúrgicas e as construções eram
verdadeiros países negros, densamente povoados por trabalhadores que viviam às portas das fábricas. É
em Creusot que se deu o desenvolvimento de uma das grandes e raras dinastias de grandes industriais
franceses, a dos Schneider.
Na segunda metade do século XIX, estes centros foram suplantados progressivamente pelo
desenvolvimento de uma verdadeira "região industrial", a cavalo sobre os departamentos do Norte e do
Pas-de-Calais. No prolongamento da bacia carvoeira belga, pôs-se em exploração uma importante jazida
da qual a produção passou de 1 para 20 milhões de toneladas entre 1850 e 1900, para atingir 27 milhões
de toneladas em 1913 e um recorde de 35 milhões de toneladas em 1929, o que representava nestas duas
datas dois terços da produção nacional, mobilizando alguns 150.000 mineiros. Sobre esta jazida, de
Valenciennes a Béthune, desenvolveram-se a siderurgia e a metalurgia bem como numerosas indústrias
derivadas. De qualquer forma uma nebulosa industrial e urbana única na França, onde se misturavam as
fábricas e as cidades operárias. Em relação estreita com o País negro, a indústria têxtil conheceu um
desenvolvimento excepcional na aglomeração próxima de Lille-Roubaix-Tourcoing.
Muito diferente aparece a região industrial de Lorena que beneficiava no entanto da presença de uma
bacia carvoeira e de uma grande jazida de minério de ferro. A tradição antiga das forjas, em redor dos
grandes capitães de indústria como Wendel, foi contrariado no seu desenvolvimento pelas ameaças
geopolíticas que não cessaram de pesar sobre esta França de Leste. A Alemanha anexou a bacia
carbonífera e uma grande parte das minas de ferro em 1871, e a presença desta fronteira nova não foi
propícia aos investimentos industriais. O temor de um novo conflito militar era com efeito dissuasivo e
revelou-se fundado quando as hostilidades retomaram em 1914. O regresso à França das províncias
anexadas não aliviou as apreensões no contexto incerto entre as duas guerras. Uma "política de
glacis(verniz)" limitou os investimentos industriais ao essencial, ou seja às actividades siderúrgicas,
porque não se podia tratar noutro lugar importante a produção local de um minério de ferro de fraco
teor. Mas o ferro fundido e o aço produzidos na Lorena, não eram geralmente transformados no lugar;
preferia-se encaminhá-lo para as fábricas metalúrgicas situadas dentro do país, em especial na região
parisiense, distante de eventuais incursões inimigas no caso de nova guerra.
Ao lado destes grandes centros industriais, tributários das mais importantes jazidas carvoeiras e
localizados consequentemente na parte este de França, muitos outros nasceram, numa dependência
menor dos recursos do subsolo: trabalho do algodão em redor de Mulhouse e dos Vosges lorenos,
igualmente na Normandia em redor do porto de Rouen, indústrias leonesas da seda, da mecânica e da
química estreitamente solidárias nas suas produções e nas suas inovações... Nestes lugares, o papel dos
homens, a sua aptidão a encontrar capitais, a tomar riscos, foram preponderantes.
Os contrastes com a França do Oeste, permaneceram no que diz respeito á revolução industrial, não é
menos que impressionante. A mediocridade dos recursos naturais não pode ser minimizada, mas não
explica tudo. A indústria vegetou onde poderia existir o seu desenvolvimento, mesmo quando estes
recursos existiam (Decazeville, Carmaux) ou quando outras oportunidades foram adiadas, como o
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equipamento hidroeléctrico dos Pirinéus por exemplo, a partir do fim do século XIX. As burguesias
locais tiveram a sua parte de responsabilidade na ausência de vida industrial. Frequentemente muito
unidas na possessão da terra, que lhes conferia um grande prestígio social, e nos rendimentos muito
desiguais de acordo com as regiões e os períodos, não marcaram nenhum gosto pela aventura industrial.
Incontestavelmente, os capitais, quando existiam, investiram-se em colocações fundiárias e imobiliárias,
ou foram drenados pelas redes bancárias para serem investidos noutros locais (na grande indústria do
Norte e do Leste, nos caminhos de ferro, nos empréstimos nacionais ou internacionais...).
Com muitos matizes locais, foi ainda mais acentuada a clivagem existente no território francês. O Leste
industrial e dinâmico atraía a indústria e os homens que se concentravam em cidades de crescimento
rápido. No Oeste pelo contrário, a agricultura permanecia a actividade dominante, insuficiente para reter
os habitantes. Estas regiões transformaram-se rapidamente em reservas demográficas para a França
industrial e urbana. Mas reservas que se opuseram desigualmente: na Bretanha e sobre as suas margens,
a manutenção de uma forte natalidade compensou por muito tempo as perdas causadas pela emigração;
no Sudoeste, pelo contrário, a pouca natalidade não permitiu manter os efectivos de população, cujo
declínio foi ainda mais inquietante quando acompanhado por um rápido envelhecimento.
Amplificando tendências antigas (a centralização, a oposição Paris- Província), gerando novas
disparidades e importantes contrastes (as especializações regionais, a segmentação Leste Ocidental), a
revolução do caminho-de-ferro e a revolução industrial que conjuga os seus efeitos por conseguinte
alteraram profundamente a organização do território francês entre o início do século XIX e a Segunda
Guerra mundial. Mas curiosamente, perante estas perturbações inscritas no espaço, as estruturas
territoriais da administração demonstraram uma notável inércia. Embora os poderes públicos
desempenhem um papel cada vez maior na vida económica e social do país.
A inércia das estruturas territoriais da administração
Gerindo um território cuja unidade política praticamente era assegurada a partir do período
revolucionário, o Estado continuou a ser muito centralizado na França, deixando competências limitadas
às autarquias locais: comunas e departamentos. Os poderes continuaram a ser concentrados nas mãos do
Estado, que assegurava o exercício através das suas administrações parisienses ou através dos seus
representantes na província, e mais particularmente nos prefeitos, representantes directos do governo em
cada departamento.
Após numerosas reformas, duas grandes categorias de colectividades locais impuseram-se na vida do
país: as comunas e os departamentos. As primeiras, particularmente numerosas, mais de 36.000,
mantiveram-se apesar das mudanças que as afectavam, algumas que perderam maciçamente os seus
habitantes e não conservaram mais que um fraco número, outros, pelo contrário, encontravam-se
incorporadas em conjuntos urbanos muito mais vastos. A partir da Terceira República, foram geridas por
conselhos municipais eleitos por sufrágio universal, designando livremente no seu seio – excepto Paris
até 1977 -, um presidente da câmara municipal. Este último assegurava a execução das suas decisões, no
domínio de competências limitado que lhe era reconhecido pela lei, e sob o controlo do prefeito. Quanto
aos departamentos, nos quais o corte no entanto muito contestado originalmente permaneceu de uma
notável estabilidade, a sua "liberdade" era ainda bastante reduzida. É com efeito o prefeito que
assegurava a execução das decisões tomadas pelos conselhos gerais eleitos.
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A centralização do Estado, o controlo estreito que não cessou de exercer sobre as assembleias comunais
e departamentais, foram potentes factores de unidade para o território francês. Resultou também assim
numa certa uniformização; as mesmas disposições que regulamentavam por vezes em detalhe a vida
diária dos homens e das empresas foi imposto por toda a parte. Foi do mesmo modo para o uso da língua
francesa, para o sistema educativo, que contribuíram para privilegiar um modelo cultural às expensas
das identidades regionais. Tudo isto termina com efeito por dar a sua legitimidade ao departamento.
Denunciado como uma divisão artificial, impôs-se progressivamente como uma referência obrigada pelo
"pensar" o espaço francês. É neste quadro que funcionavam a maior parte das administrações, o que
impunha deslocações frequentes ao “chef-lieu”(cidade); é neste quadro também que se efectuava o
recrutamento dos professores e que se organizava a vida associativa, quando esta foi autorizada. O
reforço de solidariedades sociais e geográficas deu-lhe frequentemente uma identidade: se se persistir
em dizer-se gascon, provençal ou auvergnat, o uso espalhou-se também a apresentar-se como Tarnais,
Audois, ou Lozérien, ou mesmo, mas mais dificilmente, Mosellan ou Finistérien.
*
* *
Nos anos que se seguiram à Segunda Guerra Mundial, enquanto se empreendia em condições difíceis a
reconstrução económica do país, uma atenção nova foi levada à organização territorial herdada dos
séculos precedentes. Tentando compreender retrospectivamente a lógica, são denunciados os seus
defeitos, vistos como obstáculos à modernização do país. Em 1947, num livro com um título provocante,
J.F. Gravier opunha “Paris e o deserto francês”, regiões do oeste reclamavam a sua parte do crescimento
económico e recusavam-se a ver perpetuar o seu papel de simples reserva demográfica. Mesmo o
Estado, tendo-se tornado omnipresente após as nacionalizações e as grandes reformas sociais da
Liberação, questionava o seu modo de funcionamento e as estruturas territoriais que lhe serviam de
retransmissores na província: os departamentos. Comprometia-se então, por todos os meios, a uma
reflexão nova, preludio de importantes reformas que tiveram por nome: ordenamento do território,
regionalização, descentralização.
Permanências e Mudanças (1945-1995)
A partir de 1945, em condições frequentemente muito difíceis, recomeçar-se-á a reconstrução da França.
Era necessário não somente reparar os prejuízos que a guerra tivesse causado ao aparelho produtivo e
aos grandes equipamentos, mas também recuperar atrasos que se tivessem acumulado durante os anos
30. Nos numerosos sectores (minas de carvão, siderurgia...), o objectivo foi primeiro reencontrar os
níveis de produção e os desempenhos de 1929, ou seja antes do início da grande crise económica. Era
apenas uma etapa necessária e devia-se também, ao mesmo tempo, preparar o futuro para um vasto
esforço de modernização e de equipamento. A amplitude da tarefa exigia uma mobilização de todas as
forças do país ao serviço de objectivos precisos. Tal foi o objecto dos primeiros "planos de
modernização e de equipamento", dos quais Jean Monnet foi o iniciador e o responsável.
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Da reconstrução ao planeamento do território
O Plano era com efeito um método de trabalho original, num país que continuava a ser muito unido à
iniciativa privada, ao lado de um sector nacionalizado que fortemente se estendeu em 1945-1946, com a
tomada de controlo pelo Estado de numerosas empresas: minas de carvão, electricidade, transporte
aéreo, grandes bancos e companhias de seguros, fábricas automóveis confiscadas à L. Renault... Tantos
sectores chave, que completavam as nacionalizações já efectuadas antes da guerra na indústria de
armamento (construções aeronáuticas) e os transportes ferroviários, onde as grandes companhias
privadas tinham sido agrupadas numa sociedade nacional única, a SNCF. Os poderes públicos detinham
por conseguinte as alavancas essenciais da economia nacional. Restava utilizá-los de maneira coerente e
coordenada, atribuindo-lhes objectivos a médio e longo prazo.
A ideia que J. Monnet defendeu, foi a de uma concertação permanente entre todos os actores da vida
económica e social. Uma reflexão comum sobre os grandes problemas do país, a troca de informações
sobre as ambições e os projectos de cada um, devia permitir libertar algumas grandes orientações de
interesse geral que, após aprovação pelo Parlamento, constituiriam uma espécie de contrato cuja
execução impor-se-ia como "ardente obrigação", de acordo com a expressão do general de Gaulle.
"A produção devia ser ajustada às necessidades sob penalidade de grandes desequilíbrios económicos e
sociais. Ajustamentos também precisos ao mesmo tempo que um esforço também massivo numa época
onde o computador não existia, não podia ser decidido e controlado por alguns funcionários nem
deixado à apreciação de milhares de empresários. Era necessário agir de maneira mais precisa e mais
liberal ao mesmo tempo, e obter da iniciativa privada que se dobrasse face às exigências do interesse
geral. Melhor meio não seria o de associar todas as forças do país à procura deste interesse geral que
não detinha receitas próprias, mas naqueles em que cada um detinha uma parte. Estamos de acordo que
o importante era definir sobretudo um método de acção e que este método seria essencialmente
democrático.
A filosofia do plano francês era clara no meu espírito, e não me restava mais que dar-lhe uma forma
prática: seria um método de convergência na acção e o meio para cada um situar o seu esforço em
relação ao de todos.”
J. Monnet, Mémoires, Fayard 1976.
As comissões do Plano trabalharam primeiro de maneira sectorial, definindo para cada grande domínio
económico objectivos quantitativos. Dos primeiros resultados obtidos, no início dos anos 50, novas
questões se impuseram. Tratava-se doravante de organizar o crescimento reencontrado, de atribuir-lhe
objectivos mais qualitativos de "desenvolvimento económico e social", de repartir os meios e os frutos
entre as diferentes categorias sociais, mas igualmente dentro do território francês. Não era suficiente
fixar apenas o número de quilómetros de estradas a serem construídas ou o montante dos investimentos
destinados à produção de energia. Devia-se igualmente proceder a escolhas que comprometiam a vida
futura do país: arbitrar por exemplo entre a melhoria das estradas nacionais e a criação de uma rede de
auto-estradas, decidir se era preferível lançar a construção de grandes fábricas hidroeléctricas ou instalar
centrais térmicas que funcionavam com petróleo importado. Todos os casos, retornavam a uma
preocupação nova, a da distribuição geográfica destes investimentos e a reorganização espacial de um
aparelho produtivo com a sua modernização em curso. A investigação da eficácia económica implicava
que o esforço iria prioritariamente para as regiões que tivessem beneficiado da revolução industrial
desde hà um século, ou poder-se-ia encarar uma distribuição mais equitativa em proveito das que tinham
sido marginalizadas progressivamente?
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A reflexão que se iniciou sobre este tema conduziu a uma espécie de consensos para denunciar os
inconvenientes de uma organização territorial herdada do passado, que se revelava mal adaptada às
aspirações da sociedade francesa e aos novos desafios que a economia devia enfrentar. Num concenso
quase unânime, vozes mais diversas levantaram-se para denunciar o peso excessivo de Paris, a
fragilidade de certas regiões, a dimensão insuficiente dos departamentos, concebidos de modo que os
habitantes pudessem ir à cidade principal e retornar no mesmo dia, numa época onde se circulava à
velocidade dos cavalos... Se as críticas eram convergentes, as soluções propostas diferiam fortemente e
chamavam a arbitragens difíceis. Os governos demasiado instáveis da Quarta República satisfizeram-se
frequentemente por medidas empíricas, ao golpe por golpe, por falta de tempo ou por temor dos riscos
políticos aos quais teriam exposto escolhas mais audaciosas.
Os pilares económicos e sociais
A partir dos meados dos anos cinquenta, observadores lúcidos sabiam efectivamente que o crescimento
económico da França passava pela abertura das fronteiras. A prazo, podia-se temer que o processo de
descolonização em curso não se saldasse pela perda parcial ou completa do império colonial o que
provocou um recesso timorato sobre o hexágono, que teria hipotecado qualquer esperança de
modernização económica. Em muitos domínios com efeito (aeronáutica, construções mecânicas...), a
indústria francesa possuía vantagens científicas e técnicas notáveis para desenvolver produtos novos de
grande qualidade. Mas o mercado interno, só, era demasiado intricado para amortizar os investimentos
necessários ao seu fabrico. Quantos aviões civis de tipo Caravelle, cujo primeiro voo teve lugar em
1955, podiam absorver enquanto não existia ainda uma companhia aérea interna? Alguns, talvez uma
dezena, para as linhas europeias da Air France. Ora, considerava-se que seria necessário vender pelo
menos trezentos exemplares deste tipo de aparelho para assegurar a rentabilidade dos meios para
levarem a efeito a sua produção comercial em série. Era necessário por conseguinte tentar exportar ou
renunciar a desenvolver uma indústria francesa da aeronáutica.
O recurso à exportação passava pelo abandono das políticas proteccionistas efectuadas desde o fim do
século XIX, ou seja também, por outro lado, pela abertura das fronteiras francesas à entrada de produtos
estrangeiros. Ora, na conjuntura da época, o sistema produtivo francês não estava em condições de
enfrentar a concorrência de um mercado internacional dominado pela potência agrícola e industrial dos
Estados Unidos. Escolhe-se por conseguinte uma solução mais sábia, a de um alargamento do mercado
interno a alguns países vizinhos que recusavam também a concorrência selvagem e preferiam atribuir-
lhe regras mais respeitosas dos interesses de cada um. Foi por conseguinte, em 1957, com o tratado de
Roma, uma construção europeia a seis que foi decidida apesar das pressões americanas em prol do
comércio livre e a recusa da Grã-Bretanha.
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A construção européia
A construção europeia era uma possibilidade para a economia da França mas também um formidável
desafio. No âmbito relativamente protegido desta "pequena Europa", ninguém ignorava com efeito que a
agricultura e a indústria iam ser expostas à concorrência dos países vizinhos. Era necessário por
conseguinte preparar activamente os prazos europeus e preencher importantes atrasos que afectavam a
produtividade e a competitividade das explorações agrícolas e das fábricas francesas Na agricultura,
reformas de estruturas tornavam-se urgentes mas defrontavam-se com o peso das tradições e de potentes
conservadorismos. Na indústria, os bloqueios eram numerosos também, porque a modernização não se
poderia fazer sem concentrações ou alianças novas entre empresas muito agarradas á sua independência.
A redução dos preços de custo era indispensável para enfrentar a concorrência. Isto passava certamente
por uma melhor organização da produção e das economias de escala, mas também por uma redução dos
custos das matérias-primas, da energia e da mão-de-obra. As soluções não faltavam; muitos reclamavam
por uma nova organização geográfica das actividades.
É nos portos que se encontravam doravante os produtos energéticos e as matérias-primas menos caras
(petróleo, carvões americanos, minério de ferro sueco ou brasileiro...). Poder-se-ia, em nome unicamente
da rentabilidade económica, expor-se a produção nacional de carvão ou minério de ferro á concorrência
de importações maciças, após tê-la incentivado a assegurar a reconstrução do país no imediato do pós-
guerra? Mais, não se correria também o risco de atrair assim a grande indústria para a zona portuária, às
expensas da sua localização interna tradicional, do norte ou da Lorena. Quanto aos portos, não estavam
em condições de fazer face a fortes aumentos de tráfego mais assegurados por grandes navios
especializados (navios de minério, petroleiros). Só alguns podiam esperar receber os equipamentos
necessários, mas a custo de pesados investimentos. Os poderes públicos encontravam-se assim
pressionados a prestar a sua ajuda financeira e reconsiderar globalmente o sistema portuário do país,
designando os sítios a serem modernizados antes de mais nada.
Quanto à mão-de-obra, porquê continuar a atrair à aglomeração parisiense e às regiões já
industrializadas? Esta estava organizada para fazer triunfar as suas reivindicações, e as suas condições
de vida nestas grandes concentrações urbanas (alojamentos, transportes...) justificavam salários muito
mais elevados que na província, para uma qualificação igual. Ora, os progressos dos transportes
internos, os transportes rodoviários sobretudo, não tornavam impossível a transferência de certas
actividades para regiões que continuavam a ser rurais, cuja juventude aspirava já apenas "a viver e
trabalhar no país", em vez de emigrar para a capital ou as bacias de industrialização antiga. As
exigências da competitividade industrial não pareciam, por conseguinte, mais incompatíveis com certas
aspirações sociais, que exprimir-se-ão mais vigorosamente em 1968. Ainda era necessário que esta
redistribuição da indústria fosse preparada correctamente, que fossem instauradas as estruturas de
acolhimento indispensáveis: zonas de actividades, infra-estruturas de transporte, de conexões
telefónicas, formação da mão-de-obra... Tudo isto não podia ser realizado de uma vez e por todo o lado,
logo era de se esperar que os poderes públicos concentrassem os seus esforços nalguns sítios. Mas como
escolher entre todas as cidades e as regiões candidatas sem estar a suscitar vigorosos protestos, que se
transfeririam de imediato ao plano político?
As reinvidicações regionais
A aspiração à mudança e á renovação era grande nas províncias que não tinham conhecido a revolução
industrial e que pareciam condenadas a um declínio inegável. Desde a guerra, viam multiplicar-se as
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iniciativas para parar este processo em nome de um regionalismo moderno que não tinha mais nada a
ver com o que tinha prosperado anteriormente na nostalgia do Antigo Regime, e que definitivamente se
tinha comprometido com o regime Vichy. Notáveis, chefes de empresas, sindicalistas agrícolas,
universitários... estudavam doravante as potencialidades da sua região e as condições necessárias ao seu
desenvolvimento económico. Entre os mais activos, porque animados também pela vontade de defender
uma identidade cultural ameaçada, os Bretões tomaram as iniciativas mais espectaculares num Comité
de estudos e ligações dos interesses bretões (CELIB). Por toda a parte, as forças vivas da província
mobilizavam-se para recusar a lógica que tinha conduzido a uma concentração parisiense julgada
excessiva e insalubre, e a formação de um "deserto francês".
Os disfuncionamentos do Estado
Ao passar a ser gradualmente "Estado providência", o Estado encontrava-se investido de funções cada
vez mais pesadas (saúde, educação, protecção social...), às quais os seus serviços parisienses não podiam
mais fazer face. Era necessário encarar quer a desconcentração destes serviços, quer uma verdadeira
descentralização. A desconcentração consistia em fazer tratar na província, por representantes do
Estado, uma parte dos processos que "subiam demasiado sistematicamente" para as administrações
centrais. A descentralização era uma solução mais audaciosa, pela qual o Estado abandonaria algumas
das suas competências em proveito de assembleias locais.
A escolha não era consensual e as suas implicações políticas fizeram hesitar todos os governos. Nos dois
casos, as soluções encaradas iam junto com uma interrogação sobre a necessidade de reconsiderar os
distritos administrativos herdados do passado, comunas e departamentos. Estes eram particularmente
criticados e muitas administrações que os julgavam inadaptados, tinham procedido a agrupamentos que
aumentavam a mesma autoridade "regional". Tal era há muito tempo o caso das academias, colocadas
sob a responsabilidade de reitores, representando o ministro da Educação nacional. Era necessário
generalizar e harmonizar estas práticas criando distritos maiores, "regiões", mais conformes com as
novas missões económicas e de ordenamento do território que incumbiam aos poderes públicos? Se sim,
quanto? A criação de regiões implicava o desaparecimento dos departamentos, herança da Revolução
francesa? Se devessem sobrepor-se, não se corria o risco de tornar a administração ainda mais pesada e
mais difícil de gerir?
O papel decisivo da Quinta República
Responder a estas aspirações múltiplas em prol de uma nova organização do território tornava-se cada
vez mais urgente. Certamente, nos anos 50, numerosas decisões tinham sido tomadas, e seguidas de um
início de aplicação. Mostravam contudo uma grande prudência para não chocar todos os que temiam
quebrar com práticas antigas, e sofriam sobretudo de uma ausência de coordenação. A instauração da
Quinta República foi uma etapa decisiva: um poder forte, utilizando o referendo para confirmar
regularmente a sua legitimidade, impôs em alguns anos reformas essenciais fazendo frente às vagas de
protesto que não pararam de se sublevar. Grandes operações de ordenamento do território, de reforma
administrativa e inícios de regionalização abriram o caminho a mutações espectaculares que, apesar da
crise económica anterior, deram ao espaço francês uma organização sensivelmente bastante diferente da
que lhe tinha sido imprimida pela revolução industrial do século XIX.
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"De modo a que o nosso país repartisse as suas estruturas e rejuvenesça a sua figura, o meu governo
[... ] vai empreender múltiplas e vigorosas intervenções." Indubitavelmente o conjunto de tudo o que era
realizado impunha provas a todos. Mas via-se o resultado: para a nação uma prosperidade
notavelmente acrescida, para cada um uma melhoria sensível do seu destino, para a França a
confiança em si própria recuperada e a consideração externa reaparecida. Enquanto o país trabalha, é
a mim, primeiro, que pertence dar à soma do que se faz um carácter de ambição nacional, de exigir que
o interesse comum passe acima das rotinas e pretensões das categorias. É verdadeiro que nada de que é
feito e dito para servir a causa nacional desarma a oposição de qualquer interesse específico. Os
organismos sócio-profissionais, acusando ao mesmo tempo o meu poder, por cláusula de estilo e
partido tomado, de se unir aos abusos do passado e de negligenciar as reformas, são, basicamente,
hostis às mudanças que correm o risco, para os possuidores de restringir os seus privilégios, para os
sindicatos de tirar substância às suas reivindicações. Vê-se por conseguinte certos líderes de empresa
impulsionar no sentido da dúvida e da desconfiança os órgãos de informação dos quais dispõem graças
ao seu dinheiro e obstruir o saneamento económico atrasando as concentrações úteis, até mesmo, às
vezes, vendendo preferivelmente o seu negócio a estrangeiros. Vê-se as federações e associações
agrícolas multiplicar os protestos, indo até desencadear, aqui e lá, os comandos de "militantes" que
barram estradas e quebram quadrados. Vê-se os sindicatos operários acusar "o poder gaulista" de
procurar asfixiá-lo, de fazer "a política dos monopólios" e de dedicar os trabalhadores a serem as
vítimas. Contudo, a adesão popular às intenções e a autoridade do general de Gaulle é tão larga e tão
profunda que as agitações dos meios especializados perturbam apenas, no total, o trabalho da nação.”
Charles de Gaulle, Mémoires d’espoir, tome 1, Plon, 1970.
As políticas de desenvolvimento do território
Até 1975, a política de ordenamento do território da Quinta República desenvolveu-se num contexto de
forte expansão económica. Tratava-se então de acompanhar o crescimento e de redistribuir mais
equitativamente os frutos no território francês, sob a forma de grandes equipamentos (transportes,
serviços públicos de saúde ou de ensino...). Estimulando a actividade de certas regiões pela criação de
empresas novas e de empregos, não se lesava os outros, cujo desenvolvimento já antigo parecia
prosseguir de maneira mais espontânea, sem ajuda específica dos poderes públicos. Criado em 1963 e
estando directamente ligado ao Primeiro ministro, o DATAR (Delegação do ordenamento do território e
da acção regional) incluiu à sua conta acções já lançadas e medidas pontuais adoptadas pelos governos
da Quarta República, mas integrou-o numa política coerente, repousando sobre uma visão global do
território francês e do seu futuro. Assim foi confirmada a vontade de lutar contra os grandes
desequilíbrios leste-oeste e Paris-província. Instituído em 1955, o controlo das criações e as extensões de
locais industriais na região parisiense tornou-se mais estrito e foi estendido às actividades terciárias. Do
mesmo modo, as empresas que decidiam instalar-se na metade ocidental do país continuaram a
beneficiar de prémios e isenções fiscais. Mas estas medidas dissuasivas ou incitantes foram associadas a
projectos muito mais precisos, indicando claramente os pólos e os eixos ao redor dos quais os poderes
públicos desejavam reorganizar o território nacional.
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O ajustamento da região parisiense
Ao centro do dispositivo, Paris e a sua região. O discurso muito negativo tido previamente, acusando a
região parisiense de esterilizar a vida provincial, foi abandonado. A ambição gauliense de tornar à
França o seu lugar de grande potência supunha que o país possuisse uma capital de classificação
internacional, capaz de rivalizar com as outras grandes metrópoles do mundo. No contexto de expansão
económico e demográfico da época, foi fácil demonstrar que o forte crescimento da região parisiense
não era incompatível com o desenvolvimento do conjunto do território nacional. Ainda era necessário
controlar e ajustar este crescimento, o qual se considerava que provocaria pelo menos uma duplicação da
população antes do ano 2000, ou seja a instalação de 7 a 8 milhões de habitantes suplementares. E
tratava-se de uma estimativa mínima, que se baseava na hipótese que todas as outras aglomerações do
país veriam igualmente o número dos seus habitantes multiplicados por dois. Com base nestas previsões,
era necessário por conseguinte "preparar a região de Paris para o futuro", arranjá-lo e dotá-lo dos
grandes equipamentos indispensáveis ao seu funcionamento diário e ao seu papel de grande capital
nacional e mundial. Tal foi objecto, a partir de 1964, do plano director de ordenamento e urbanismo da
região de Paris apresentado pelo delegado do governo ao distrito de Paris, Paul Delouvrier.
Especialização da cidade de Paris nas funções "mais finas, mais nobres, mais únicas", reorganização do
subúrbio em redor de alguns pólos urbanos secundários, cujas várias cidades novas, instauradas por
novas ligações ferroviárias formavam um centro regional expresso (RER), grandes equipamentos de
classe internacional (palácio dos Congressos, novo aeroporto em Roissy...). A organização actual da
região Île-de-France é directamente procedente deste programa, que sofre certamente algumas
modificações e se compôs com a crise após 1975, mas cuja filosofia não foi posta em questão.
As Metrópoles de equilíbrio
Ao mesmo tempo que se dava à capital os meios para fazer face ao seu crescimento, o desenvolvimento
da província era concebido ao redor de algumas das grandes aglomerações que receberam o estatuto de
"metrópoles de equilíbrio". Em número de oito (Lille-Roubaix-Tourcoing, Metz, Estrasburgo, Lyon,
Marseille, Toulouse, Bordeaux e Nantes), a sua escolha não tinha nada de revolucionário na medida em
que, pelas suas funções, constituía já o nível superior do reforço urbano do país (fig. 14). Dotando-o de
equipamentos de elevado nível (universidades, centros de investigação, grandes centros hospitalares...),
os poderes públicos desejavam fazer verdadeiras capitais de província, oferecendo às populações que
viviam na sua zona de influência os serviços comparáveis aos que se encontravam exclusivamente em
Paris. Atraem igualmente actividades industriais e terciárias "descentralizadas" ou inteiramente novas,
que se esperava virem a tornar-se "pólos de crescimento", cujo dinamismo manter-se-ia seguidamente
por ele mesmo e difundir-se-ia na região circundante. É, por exemplo assim que, nesta perspectiva foram
dirigidas para Toulouse as actividades ligadas à aeronáutica e ao espaço, enquanto que para relançar a
economia marselhesa e apoiar o tráfego do porto, foi decidido o vasto ordenamento de uma zona
industrial-portuária, à Fos-sur-Mer, cuja peça soberana devia ser uma enorme fábrica siderúrgica
integrada.
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O sucesso desta política passava pela melhoria das relações destas metrópoles de equilíbrio com Paris,
onde continuavam a ser concentradas, perto do poder político, as sedes sociais das grandes empresas, os
grandes bancos... Resultou um pouco paradoxalmente um reforço da organização muito centralizada dos
sistemas de transporte, porque foram primeiro as rotas radiais que foram reforçadas com a construção
das primeiras auto-estradas, a melhoria dos serviços dos caminhos-de-ferro por comboios de negócios
rápidos, instaurando a rede de linhas aéreas internas confiadas, em 1960, a uma sociedade nacional, a
Air inter... (figs. 15 e 16).
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Em todas as metrópoles de equilíbrio, confrontadas com mutações muito rápidas, foi necessário lançar
grandes operações de urbanismo directamente inspiradas nas soluções retidas na região parisiense:
cidades novas em periferia (Villeneuve-Ascq em Lille, o Isle-Abeau em Lyons, o Mirail em
Toulouse...), perímetros de renovação nas zonas centrais para o estabelecimento de novos "centros
direccionais" (Le Part-Dieu em Lyon, Mériadeck em Bordéus...).
Enquanto o território francês se reorganizava assim em redor da sua capital e das metrópoles de
equilíbrio, outros grandes estaleiros de ordenamento do território eram iniciados: extensão e
redesenvolvimento completo dos seis grandes portos mais activos, que se tornaram "portos autónomos",
para fazer face ao desenvolvimento do tráfego e às novas condições do transporte marítimo,
equipamento turístico integrado em todo o litoral Languedoc- Roussillon, com enormes estações novas
(Le Grande-Motte, Le Cap d’Agde...), preparação de uma operação semelhante sobre a costa da
aquitânia...
Intervencionismo e liberalismo
Entre 1960 e 1975, a França transformou-se num imenso estaleiro, organizado pelo Estado que tinha
definido as grandes opções, mas cuja realização era deixada largamente ao sector privado, que procedeu
a reestruturações à medida dos mercados que lhe eram confiados. Desta época data a formação de
potentes grupos imobiliários, de grandes sociedades de construção e obras públicas... É que, em todos os
sectores, a amplitude dos investimentos a realizar excedia as possibilidades das empresas industriais ou
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terciárias. Entre elas conjungaram os seus meios procedendo a concentrações que deram nascimento a
grandes grupos que desenvolveram seguidamente uma estratégia internacional.
Deixando assim o papel essencial à iniciativa privada, os poderes públicos expunham-se ao risco de não
realizar senão em parte o seu programa de ordenamento do território, apesar de múltiplos estímulos
financeiros. Deveriam, por exemplo, realizar-se grandes esforços para atrair as sociedades siderúrgicas a
Fos-sur-Mer, numa região desprovida de verdadeira tradição industrial e possuindo poucas fábricas
susceptíveis de consumir o ferro fundido e o aço que se tencionava produzir em abundância. Do mesmo
modo, nem todas as metrópoles de equilíbrio ofereciam as mesmas vantagens no entender do capital
privado. Algumas atraíram sem dificuldade muitas empresas novas ou estabelecimentos
descentralizados (Lyon), enquanto que, outras eram penalizadas pela sua situação geográfica, uma má
imagem de marca ou pela ausência de passado industrial. Para iniciar um novo dinamismo, foi
necessário mobilizar empresas públicas ou controladas pelo Estado (Toulouse). Além disso, certas
cidades que não tinham sido escolhidas como metrópoles de equilíbrio, tiveram êxito a impor-se como
tais, pela vontade dos seus eleitos e/ou quando actividades inovadoras decidiram instalar-se (Grenoble,
Montpellier, Nice).
Às custas de ajustamentos permanentes, as grandes orientações da política de ordenamento do território
definidas no início dos anos sessenta, não foram mantidas, pelo menos globalmente, num longo período
de crescimento económico até 1975. Quanto aos resultados, pareciam responder bastante aos objectivos
que tinham sido definidos. Que teria sido sem a acção voluntarista do poder público? O primeiro
responsável do DATAR, não se subtraía à pergunta, cuja resposta suscitará sem dúvida um dia o
interesse dos historiadores.
"O objectivo da política de ordenamento do território lançada nos anos 60 foi também de ordem
quantitativa, pôr um termo à expansão parisiense, industrializar a França ao sudoeste da linha do
Havre-Marseille, parar ou mesmo inverter as migrações da província para Paris, desenvolver as
grandes metrópoles como contrapontos à influência parisiense, proteger e arranjar as zonas rurais
mais frágeis [... 1." Os resultados desta política são largamente positivos [...] Fundados e apoiados por
uma vontade política forte, [ela] atingiu os seus objectivos apesar de alguns malogros e sem que fosse
possível distinguir com precisão o que retorna por ela própria e o que deve ser atribuído à evolução
expontânea que teria afectado de qualquer modo o território.”
O. Guichard1, Propositions pour l‘aménagement du territoire
La Documentation française, 1986.
A crise
É a reversão brutal da conjuntura no meio dos anos 70 que impôs por toda a parte a paragem dos
projectos de ordenamento ou da sua reorientação. O agravamento das dificuldades, no domínio do
emprego em especial, alterou fundamentalmente a ordem das prioridades. Muito mais grave e longa que
1 Olivier Guichard, homme politique français, très proche du général de Gaulle. Premier responsable de la DATAR, il fut l’artisan des
grandes mesures d’aménagement du territoire décidées dans les années soixante. C’est à lui que J. Chirac, devenu Premier ministre de
«cohabitation» sous la présidence de F. Mitterrand, entre 1986 et 1988, confia la mission de rédiger un rapport sur l’aménagement du
territoire (Propositions pour l‘aménagement du territoire, La Documentation française, 1986).
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se tinha pensado em 1974-1975 aquando do primeiro choque petrolifero, a crise afectou desigualmente o
território francês, tomando em contrapeso a política de ordenamento do território. Inicialmente,
esforçou-se por fazer face ao golpe por golpe e às suas manifestações. Na frente da multiplicação dos
encerramentos de fábricas e dos despedimentos, na frente do encerramento de certos estaleiros, utilizou-
se os meios e os instrumentos que até lá tinham sido destinados para favorecer a criação de empresas na
França do Oeste: prémios, isenções fiscais, para manter a actividade ou ajudar à reconversão atraindo
novos investidores.
"A partir de 1974-1975 […] a política de ordenamento do território desencaminhou-se. E duplamente:
por um lado o DATAR serviu de "canadair" a incêndios sociais devidos às situações económicas que o
poder público não tinha previsto nem arranjado e que não pôde rectificar; de outra parte a situação das
regiões francesas tinha evoluído profundamente, os instrumentos que o DATAR tinha instaurado
tornaram-se ineficazes e obsoletos... “
O. Guichard, op. cit.
Regionalização e descentralização
Perante a crise, todas as soluções clássicas inspiradas nos grandes modelos económicos pareceram
ineficazes ou muito insuficientes. Na França, como nos países vizinhos, o Estado pareceu desamparado,
e isto foi ainda mais sensível que até então, de maneira às vezes autoritária ou tecnocrática, impondo
escolhas bem precisas, em nome do interesse geral. Era necessário renunciar a esta forma dirigista muito
centralizada, cuja política de ordenamento do território constitui um bom exemplo, e deixar jogar mais
livremente o mercado e a iniciativa privada? Devia-se, pelo contrário, ir mais adiante ainda, aumentar o
papel dos poderes públicos e proceder por exemplo a novas nacionalizações? O debate foi vivo e as duas
políticas foram experimentadas sucessivamente, ao preço de uma alternância política essencial na vida
do país.
Primeiro foi dada prioridade às soluções liberais preconizadas por Valéry Giscard de Estaing, após a sua
eleição à presidência da República, em 1974; mas a sua aplicação encontrou-se contrariada pela subida
de desemprego que não permitiu ao Estado desacoplar-se realmente. A chegada ao poder de François
Mitterrand, em 1981, impôs outra lógica, que começou por uma extensão do sector público e
importantes medidas de reactivação nos sectores industriais mais ameaçados (minas de carvão,
siderurgia, têxtil...). A partir de 1983-1984, foi necessário definir-se outras estratégias, navegando
dificilmente entre uma gestão social da crise e a vontade de retornar à economia francesa o crescimento
e competitividade. Crescimento e competitividade que levavam a gerir de maneira "mais ofensiva" o
declínio de certos sectores "tradicionais", concentrando ao mesmo tempo os esforços em novos
domínios de actividade que privilegiam a investigação científica e as elevadas tecnologias (informática,
robótica, biotecnologias...). Nada indica, em 1995, após várias mudanças de maioria política, que se
progredisse muito nesta via, apesar de incontestáveis sucessos.
Pondo em risco as políticas estatais efectuadas até então, a crise incitou a explorar outros procedimentos
de gestão e de decisão. Foram então privilegiadas as soluções que tinham sido experimentadas apenas
com muitas reservas, a regionalização e a descentralização.
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A criação de regiões
A partir dos seus inícios, a Quinta República tinha privilegiado uma gestão muito centralizada dos
negócios do país, que se inscreve numa longa tradição francesa. A personalidade do chefe do Estado e a
sua concepção do exercício do poder tiveram mesmo o efeito de reduzir o debate democrático e de
confiar responsabilidades acrescidas a funcionários qualificados, que foram designados pejorativamente
como "tecnocratas". Esta lógica levou por conseguinte a recusar qualquer verdadeira descentralização,
ou seja qualquer transferência de competências em proveito de assembleias locais. Para assegurar maior
eficácia ao Estado, cujos serviços centrais não podiam mais fazer face às suas múltiplas tarefas, escolhe-
se por conseguinte antes aumentar as responsabilidades dos seus representantes na província: prefeitos,
tesoureiros–pagadores, reitores...
Em 1964, de maneira autoritária, apesar de múltiplas oposições, foram criadas neste sentido novos
distritos administrativos (21 seguidamente 22) que agruparam vários departamentos e foram colocados
sob a autoridade de um "prefeito de região", mais especialmente encarregado das questões relativas à
vida económica. Esta forma, que não punha em questão, no imediato, a existência dos departamentos,
retomava essencialmente o que tinha servido durante dez anos para definir os quadros de estudos para a
elaboração de programas de acção regionais. Entrando no direito francês quase sub-repticiamente, sem
consulta das populações em causa, nunca foi posto em causa apesar das suas imperfeições, e pareceu
dever impor-se duravelmente, da mesma maneira que os departamentos após a sua criação, há dois
séculos (fig. 17).
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É com base nestas circunscrições que deviam ser estudados doravante os numerosos dossiers e aplicadas
as decisões relativas directamente à vida dos cidadãos. Ora, estes não eram representados junto dos
prefeitos da região, se não por uma comissão consultiva que não elegiam, ao contrário do que se passava
nas comunas e nos departamentos para os conselheiros municipais e os conselheiros gerais. Foi
necessário esperar por 1972 de modo que um funcionamento ligeiramente mais democrático fosse
assegurado, ao mesmo tempo que, nos seus limites anteriores, estes "distritos administrativos regionais"
tornavam-se oficialmente "regiões". O perfeito conservava um papel essencial, mas duas assembleias
foram criadas ao mesmo tempo, com competências e meios mais vastos, mas ainda muito limitados. O
conselho regional, instância de deliberação, era composto de personalidades já eleitas na região para
outras funções (deputados, senadores, conselheiros gerais ou municipais), enquanto o Comité
Económico e Social tinha um papel consultivo, e reunia os representantes dos diferentes meios sócio-
profissionais.
A redistribuição de competências entre o Estado e as colectividades territoriais
Consequência da crise incitando a prestar uma atenção nova às realidades locais e à vontade política de
favorecer a descentralização conjugou-se, em 1981-1982, para encorajar uma reforma essencial na
história da França. Sem tocar na forma das comunas e departamentos, herdado de uma longa história,
nem ao das recentes regiões, o Parlamento decidiu transferir para estas diferentes "autarquias"
competências que anteriormente eram asseguradas pelo poder central. A transferência dos meios
financeiros e humanos devia ir junto com o das competências.
Foram necessários longos anos para levar a efeito esta reforma, cujos desenvolvimentos não estão
terminados, o Estado pode em qualquer momento decidir renunciar a outras prerrogativas e transferi-lo a
colectividades melhor colocadas para tomar a sua retransmissão. A descentralização fez-se acompanhar
por uma reorganização dos poderes nos diferentes distritos. Reterá sobretudo, de disposições jurídicas
complexas, o papel acrescido que foi confiado aos presidentes dos conselhos gerais e regionais. A si
incumbe doravante a execução das decisões tomadas por estas assembleias, um poder essencial que
previamente era confiado aos prefeitos.
É neste contexto institucional inteiramente novo que funciona doravante a gestão do território francês e
que se elaboram as políticas de ordenamento. Parecia por conseguinte terminada a época onde as
decisões eram impostas autoritariamente pelo poder central. No entanto, o Estado conserva atribuições
muito importantes, e a maior parte dos processos que instrui têm implicações territoriais essenciais
(construção de estradas, instauração de grandes equipamentos...) que dialogam em concertação e
cooperação com as autarquias. Existem para isso procedimentos contratuais frequentemente complexos
onde cada parte expõe os seus projectos, faz parte das suas reservas, antes que as escolhas sejam
efectivamente realizadas. Nestes procedimentos, é ele que desempenha o papel essencial, porque a cada
cinco anos, pela duração do plano nacional, o Estado e as regiões esforçam-se por coordenar as suas
acções e de contribuir conjuntamente com uma parte dos seus meios. O Estado deve fazer prevalecer o
interesse geral do país, a região dos seus habitantes e o seu território para chegar à assinatura de um
"contrato de plano Estado-região", fixando os seus respectivos compromissos para os anos vindouros.
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As recentes mutações
A crise económica agravada e o novo equilíbrio do poder entre estado e a autarquia territorial teve
efeitos sensíveis na evolução do território francês durante a década 1985-1995 (fig. 18).
A reconversão das antigas regiões industrializadas
A partir de 1983-1984, ou seja quase dez anos após as primeiras manifestações da crise, foi admitido
que era em vão, esperar manter em actividade fábricas, em sectores sobre os quais tivesse parado,
durante décadas, a prosperidade do país. Sob os golpes da concorrência internacional exacerbada pela
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mundialização das trocas, uma parte importante do aparelho produtivo francês estava condenada. Nas
minas de carvão, na siderurgia, no têxtil..., foi necessário tomar medidas draconianas, tentando ao
mesmo tempo atenuar as consequências sociais e locais. Condenando assim numerosos locais industriais
podia-se fazer incidir os esforços sobre os que pareciam ainda rentáveis, mas nos quais era necessário
investir maciçamente para manter a sua competitividade.
Latente desde já longos anos, a crise afectou muito duramente então as regiões mais antigamente
industrializadas do país, as que, trinta anos mais cedo, pareciam reunir as maiores vantagens de
desenvolvimento. Elaborando em 1984 o mapa dos "pólos de conversão" (fig. 19), os poderes públicos
indicavam claramente que era necessário doravante ajudar utilizando meios (subvenções, isenções
fiscais...) que previamente tinham sido utilizadas para desenvolver a França do oeste, no âmbito da
política de ordenamento do território.
O dinamismo tecnopolitano
Indo assim ao socorro das regiões industriais do norte, do leste, Creusot..., tinha-se em conta o "balanço"
espectacular do território francês. Com efeito, ao mesmo tempo, a França do Midi e a do oeste, que
tinham beneficiado das ajudas ao desenvolvimento desde o início dos anos 50, pareciam opor-se melhor
à crise. Dotadas de equipamentos recentes, de um bom enquadramento terciário, tinham acolhido
actividades que sofriam menos na conjuntura. Algumas mesmo testemunhas de um verdadeiro
dinamismo sobre o qual se tinha grandes esperanças para o futuro. Isto verificava-se sobretudo nas
grandes aglomerações, ou as suas periferias imediatas.
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Em Nice, Lyon, Grenoble, Montpellier, Toulouse, Bordeaux, Nantes ou Rennes, em graus diversos, a
associação do ensino superior, a investigação científica e as indústrias de baixa tecnologia induziam
processos de desenvolvimento originais em sectores mais na vanguarda mas frequentemente muito
competitivos no plano internacional: informática, robótica, biotecnologias, actividades aeronáuticas e
espaciais... Em redor de algumas grandes fábricas, via-se proliferar uma nebulosa de pequenas e médias
empresas inovadoras, que se agrupavam em "parques de actividade" de um novo tipo que emprega
pouco trabalhadores mas muitos engenheiros, de técnicos e quadros. Qualificou-se este movimento de
"tecnopolitanos", o que permitiu imediatamente identificar como "tecnopolos" as cidades cujo
crescimento apoiava.
Um estudo atento da localização dos tecnopolos sublinha a importância de dois factores de localização.
O fenómeno produz-se apenas em grandes aglomerações, nas quais se encontrava já reunido um
importante potencial universitário, científico e técnico. Estas "jazidas de matéria cinzenta" parecem
doravante também essenciais ao desenvolvimento económico tal como foram as jazidas de carvão ou de
matérias-primas no século passado. Ora, numerosos casos, resultam da acção de ordenamento do
território efectuada previamente pelos poderes públicos em prol das metrópoles de equilíbrio (fig. 20)
mas outro factor intervêm para explicar o favor do qual parecem gozar as principais aglomerações
meridionais. Independentes dos recursos do subsolo, que induz fracos fluxos de mercadorias, as
actividades tecnopolitanas parecem com efeito muito sensíveis à qualidade do seu ambiente.
Ensolaradas, na proximidade das margens mediterrânicas ou nas montanhas nevadas, muito apreciadas
para lazer, dão incontestáveis vantagens ao Midi. Além disso, as cidades destas regiões possuem ricos
patrimónios culturais e permaneceram geralmente ao abrigo dos danos da grande indústria do século
XIX. O seu "atraso" económico, que parecia há pouco uma deficiência, torna-se hoje uma vantagem.
Pelo contrário, apesar de incontestáveis potencialidades, muitas metrópoles setentrionais não beneficiam
de uma imagem de marca também favorável para realizar as suas ambições tecnopolitanas. A indústria
frequentemente legou-lhes uma herança difícil de gerir, e o ordenamento de zonas de actividades novas
passaram primeiro por um tratamento dispendioso de vastas licheiras industriais e urbanas. Quanto à
aglomeração parisiense, permanece um caso específico e reúne um potencial tecnopolitano excepcional,
único na França, valorizado bem no Sul em redor da escola Politécnica, da Universidade científica de
Orsay e das instalações do Comissariado para a energia atómica sobre o planalto do Saclay. Lá existem
no entanto, ao norte e a leste, nos velhos subúrbios industriais, difíceis problemas de reconversão e de
crise social.
Se se elaborar o balanço destas dinâmica territoriais contemporâneas, a impressão que domina em
relação aos anos 50 e 60 é a de uma "França oposta", para a qual se falou mesmo de "vingança do Sul".
Neste domínio, a prudência impõe-se contudo. Por potentes que sejam, as tendências actuais
frequentemente são amplificadas ou simplificadas para fins mediáticos. Seria necessário que se
mantivessem e amplificassem durante longos anos para alterar profundamente os traços fundamentais e
as disparidades do espaço francês, em função dos quais se tinha desenvolvido a política de ordenamento
do território nos anos 60.
Metropolização e grandes redes de transporte
Aos desequilíbrios regionais antigos que permanecem perceptíveis através de numerosos índices
(densidades, estruturas demográficas...) e onde resta a mais importante oposição Paris-província que
mantêm a centralização da vida de relação em redor da capital (figs. 21 e 22), acrescentam-se hoje
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fenómenos reveladores de novas disparidades dentro de cada região. As dinâmicas actuais, e em especial
o processo tecnopolitano, referem-se essencialmente a algumas grandes aglomerações que se estendem
desmedidamente numa mancha de óleo devido á peri - urbanização. Esta metropolização verifica-se por
toda a parte no mundo e reforça-se actualmente, apesar das possibilidades novas de dispersão dos
homens e das actividades que oferecem os progressos dos transportes e as telecomunicações.
As metrópoles não vivem em autarcia. Solidárias e concorrentes, mantêm entre elas relações complexas
que se materializam por movimentos diários de homens e mercadorias frequentemente de fraco peso
mas de grande valor. O seu funcionamento e o seu futuro dependem por conseguinte largamente da sua
inserção em redes de relações rápidas: grandes rotas de auto-estrada, TGV, linhas aéreas. Ora, estas
redes instauraram-se desde o início dos anos 80 de acordo com lógicas territoriais que não são mais as
da França hexagonal, mas as da Europa unida. Tomando um sólido adiantamento na técnica do TGV, a
França oferece, à sua capital e a algumas das suas grandes metrópoles, sólidas vantagens para enfrentar a
competição com as suas homólogas europeias. O território nacional encontrava-se ligeiramente na
margem da grande "barbatana dorsal europeia", às vezes qualificada de "banana azul", que vai da Itália
do Norte à bacia de Londres, via Alemanha renana. A formação de uma estrela de TGV em redor de
Paris compensa em parte esta deficiência (fig. 23). Da capital francesa, atinge-se hoje em pouco tempo,
e em condições notáveis, não somente o coração da maior parte das grandes cidades regionais, mas
igualmente o das grandes cidades europeias, das quais Londres, desde a abertura do túnel sob a Mancha,
e num futuro próximo, Bruxelas, Amsterdão, Turim, ou Barcelona.
*
* *
O território, cujas linhas de força futuras desenham-se hoje, organiza-se por conseguinte à escala da
Europa. Tecnopolos, metrópoles, redes de transporte modernas e grandes ligações..., em tudo isto, qual
parte atribuir aos poderes públicos e às políticas de ordenamento do território? Desde o início dos anos
80, o governo francês parece ter adormecido os grandes princípios voluntariosos que tinham guiado a
sua política de ordenamento do território no início da Quinta República. Em relação às autarquias locais,
mostrou contudo uma atenção constante às mudanças geográficas que se operavam no país. Mas a sua
acção geralmente limitou-se a tentar corrigir os efeitos negativos, acompanhando ao mesmo tempo os
dinamismos por toda a parte e onde estes se manifestavam.
Ao contrário das metrópoles de equilíbrio designadas autoritariamente há pouco, os tecnopolos
afirmaram-se fora de qualquer reconhecimento oficial. Tudo se passou como se se tivesse entregado ao
livre jogo dos actores da vida económica e por iniciativa das colectividades territoriais investidas de
novas competências desde o início da descentralização. Assim desenvolveu-se uma emulação, ou
mesmo uma competição entre as regiões e as principais metrópoles, cada uma esforça-se por atrair nela
as novas actividades, trazendo empregos e penhores de desenvolvimento futuro.
Esquartejado entre instituições europeias cujas prerrogativas eram reforçadas e colectividades territoriais
que utilizam plenamente as suas novas competências, o Estado pôde parecer um espectador do momento
nestas recomposições territoriais. Não detinha menores instrumentos potentes para orientá-lo, graças ao
controlo dos grandes planos directores de auto-estradas ou TGV, ao controlo do mapa universitário, ou
às escolhas que lhe incumbiam nas "deslocações" para à província de serviços públicos estabelecidos na
capital. Em 1993-1994, após uma década no curso da qual tinha podido medir todas as dinâmicas
territoriais, apreciando as vantagens e as deficiências das diferentes metrópoles ou das cidades com
pretensões tecnopolitanas, pareceu oportuno tirar conclusões. Tal foi sem dúvida objecto do grande
debate nacional sobre o ordenamento do território prometido pelo 1º Estado em 1993, que foi concluído
pelo voto de uma "lei de orientação para o desenvolvimento do território", em 1995.
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Tendo em conta as disparidades antigas e as novas dinâmicas, o Estado e as colectividades novas devem
hoje conciliar duas lógicas por vezes contraditórias. Devem-se fazer acompanhar das suas próprias
políticas o que parece ir no sentido de uma retoma económica favorável ao emprego: grandes infra-
estruturas, equipamento das grandes metrópoles... Mas, ao mesmo tempo, em nome da solidariedade,
devem atenuar as consequências territoriais velando por preservar frágeis equilíbrios ecológicos e
sociais numa grande parte do espaço francês, nas zonas rurais em especial, que parecem ameaçadas de
marginalização rápida, ou mesmo de "desertificação". A gestão de tais contradições entre a eficácia
económica e a preservação de certo equilíbrio geográfico, percebido como indispensável à qualidade da
vida, não cessou de ser o meio de todas as políticas de ordenamento do território. Podia-se enfrentá-lo
eficazmente nos anos de crescimento mas diferentemente numa conjuntura de crise.
QUESTÃO
A partir dos diferentes mapas que acompanham este capítulo, analise a permanência e as mutações na
organização do território francês depois do fim do século de XVIII
TÓPICOS DE DISSERTAÇÃO
1. Com ajuda de exemplos precisos compare a organização territorial de França e dos seus principais
vizinhos europeus durante os séculos XIX e XX.
2. O papel dos poderes publicos na distribuição de homens e actividades no território francês nos
séculos XIX e XX.
3. Pode-se considerar o desenvolvimento regional como uma " ideia nova " depois de Segunda Guerra
Mundial?
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CAPÍTULO 2 – A ORIGINALIDADE DEMOGRÁFICA
Todos os historiadores concordam: a população europeia cresceu fortemente no século XIX e muito
pouco no século XX. De 1800 a 1900, a população mundial aumenta 77% e a do Velho Continente
aumenta 114%. A situação altera-se no século XX: em 1914, a actual União Europeia possui 190
milhões de habitantes, sendo 11,3% da população mundial; em 1995, conta com 372,4 milhões de
habitantes, o que não representa mais de 6,5% da população do planeta.
Qual é o papel da França na evolução demográfica europeia? No último século (séc. XIX), a França tem
um ritmo de crescimento considerado o mais lento da Europa, ainda que depois do fim da Segunda
Guerra mundial, fosse o menos mau exemplo para os seus vizinhos da Comunidade Europeia. Logo,
demograficamente, a França ocupa uma posição original na Europa.
A França: um caso particular
A implementação dos recenseamentos (quinquenais de 1831 a 1936, com periodicidade variável depois
de 1946) permite conhecer o ritmo de crescimento demográfico francês. Consideramos então dois
grandes períodos:
- de 1801 a 1946, a população francesa aumenta 43% passando de 28,2 milhões de habitantes para
40,4 milhões. Este aumento, que se estendeu durante perto de um século e meio, é bem fraco. É certo
que a França sofreu com as guerras. Por exemplo, a Primeira Guerra mundial provoca 1,5 milhões de
mortos e provoca um déficite na natalidade (durante quatro anos, o número de nascimentos é reduzido
para metade). Mas a debilidade do crescimento natural em tempo de paz não permite a recuperação: a
França de 1946 é menos povoada que a de 1911 (41,5 milhões) !
- a partir de 1946, houve um sobressalto. Em 44 anos, a população francesa ganha 16,1 milhões de
pessoas, aumentando 39,9%. Este crescimento, o mais forte da história nacional, opera-se sobretudo
entre 1946 e 1964; actualmente, afrouxou2.
Esta situação não acontece sem uma consequência sobre a posição da população francesa na Europa.
Em vésperas da Revolução, a França (28,5 milhões de habitantes nas actuais fronteiras) ocupa o
primeiro lugar com a Rússia na Europa. Perto do primeiro conflito mundial, a situação mudou; a França
não consegue melhor que o quinto lugar, ultrapassada pela Rússia (em 1800), juntamente com os
Estados Alemães (1855), a Austria-Hungria (1870), o Reino Unido (1892) e a Itália já não está muito
longe.
2 Em 1/Janeiro/95, a França metropolitana conta com 58 027 000 habitantes.
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É evidente que a França se retrai: 17% da população europeia em 1789, 9.2% em 1914 (isto sem incluir
a Alsace-Lorraine no território nacional!). A situação estabiliza no início do século XX e melhora depois
da Segunda Guerra mundial: 11,3% da população europeia em 1995.
Este declínio relativo pesa na história da França. O país encabeça a Europa aliada durante a Revolução e
o Império, mas em seguida não se consegue opôr sozinha à subida da Alemanha. Não consegue sustentar
as correntes de emigração, o que explica em parte que linguisticamente, o inglês suplante o francês.
Nas últimas décadas do século XIX, a originalidade do comportamento francês inquieta as esferas
dirigentes e a direita. Os populacionistas receiam uma perda do poder económico, político e militar. Por
isso, lançam uma campanha de natalidade. Para eles, a diminuição da natalidade deve-se, em grande
parte, ao enfraquecimento do sentimento religioso. Este ponto de vista exaspera os republicanos. É a
razão pela qual o socialista Adolphe Landry procura alongar o debate propondo-se descrever e explicar
as etapas de todo o crescimento demográfico na Europa. Num artigo publicado em 1909, ele expõe pela
primeira vez a teoria da transição demográfica.
A transição marca a passagem de um antigo regime demográfico caracterizado por taxas elevadas de
natalidade e de mortalidade (na ordem de 40%) para um regime demográfico moderno tendo uma
natalidade e uma mortalidade baixas. Compreende duas fases: em primeiro lugar, a mortalidade diminui,
desde que a natalidade se mantenha, o crescimento natural 3 aumenta.
Depois, a curva da natalidade diminui desde que mortalidade continue a diminuir, o crescimento natural
enfraquece depois de ter conhecido um máximo no início da segunda fase. Este modelo geral toma
formas distintas consoante o país.
Em toda a Europa do Noroeste (que inclui a França), a baixa da mortalidade é confirmada na segunda
metade do século XVIII. A diminuição da fecundidade acontece tardiamente - em 1890 em Inglaterra,
Alemanha e Hungria e em 1900 na Áustria, 1910 em Itália e em Espanha.
A diferença entre a baixa da mortalidade e a da fecundidade sustenta a formidável expansão
demográfica da Europa no século XIX. Ajudada ao mesmo tempo pelo esforço da sua população e da
revolução industrial, o Velho Continente torna-se o centro do mundo. A Europa alimenta um fluxo de
emigração; 36 milhões de pessoas deixam a Europa entre 1871 e 1915. O fim do ciclo transicional, nos
anos trinta, marca o início do recuo demográfico europeu.
A originalidade da transição francesa tem a sua precocidade. Desde o fim do século XVIII, a
fecundidade diminui sensivelmente. A primeira consequência é a escassez dos excedentes naturais ao
longo do século XIX. O melhor período situa-se na Restauração com um crescimento anual superior a
5% (6,9% entre 1820-1824). Este máximo faz uma má figura comparando com o crescimento inglês
(quase superior a 10%) e com o crescimento alemão (que varia entre 10,2 e 14,8% entre 1871 e 1914).
Para a história demográfica de França, a Segunda Guerra Mundial marca uma ruptura importante. Nos
anos seguintes, a fecundidade aumenta sensivel e duravelmente, enquanto a mortalidade continua a
baixar. Logo, o saldo natural atinge os níveis recordes: até 1973, é constantemente superior a 5%, o
máximo que se atinge é 8,7% no ano de 1948
3 O crescimento natural é a diferença entre a natalidade e a mortalidade.
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O Percurso Singular da França
A baixa da mortalidade
A dimensão
Os demógrafos não gostam das taxas brutas de mortalidade que reflectem tanto a estrutura por idades
como o estado sanitário de uma população4.
Preferem estudar as variações e a esperança de vida à nascença5.
Dos meados do século XVIII até hoje, a esperança de vida mais que triplicou, passando de
aproximadamente 25 anos para mais de 75 anos. Mas a progressão não é linear: ao avanço relativamente
modesto do século XIX, sucede um grande salto no século XX. De facto, a duração média de vida
aumenta de 1790 a 1830 (um ganho de quinze anos), depois estagna entre 1830 e 1880. A partir de 1880,
a marcha do progresso retoma. As guerras de 1914-1918 e de 1939-1945 não interrompem o impulso.
Os demógrafos notam um enfraquecimento do aumento nos anos sessenta mas, muito rapidamente (anos
70), a curva volta a subir. Hoje, a vida média é de 73,6 anos para os homens e 81,8 anos para as
mulheres.
Portanto, os anos de 1880 representam uma viragem na história da mortalidade. Um novo regime
acontece, caracterizado por uma maior regularidade e uma nítida tendência para diminuição dos óbitos.
As crises alimentares desaparecem, as grandes epidemias rareiam. A peste já não existe em França desde
1720. A cólera substitui-a nos pensamentos. Em 1832, esta nova doença provoca perto de 100 000
mortos (dos quais o chefe do governo Casimir Périer) sobretudo em Paris e no Norte. Os ataques
seguintes provocam numerosas perdas: de novo, perto de 100 000 mortos em 1849 e 143 000 entre
1854-1855 (o Nordeste e o Midi mediterrâneo foram particularmente afectados). Os regressos ulteriores
são poucos mortíferos. A varíola atinge seriamente em 1871 (200 000 vítimas). A gripe espanhola de
1918-1919 fecha a série multissecular das grandes epidemias.
Mas de que se morre no século XX? Para cada morte, o médico que a atesta estabelece um boletim
anónimo que indica as características sociodemográficas do falecido e a causa ou causas da morte. Nessa
base, o INED6 reconstitui as séries homogéneas e contínuas das causas de morte depois de 1925. Estes
dados subestimam a importância do alcoolismo e do tabagismo, factores agravantes das doenças
consideradas como causas imediatas da morte. Mas permitem observar uma profunda modificação das
causas de morte.
O século XX é o século da vitória contra as doenças infecciosas. A tuberculose, as pneumonias e mesmo
a gripe fazem menos vítimas que no passado. As infecções no aparelho circulatório e do sistema nervoso
também diminuem. Mas hoje, este tipo de doenças volta a preocupar: o recrescimento da tuberculose
nos meios mais desfavorecidos e sobretudo, o aparecimento da SIDA preocupam a população e os meios
médicos.
4 Em condições sanitárias iguais, uma população jovem tem uma taxa bruta de mortalidade muito mais fraca do
que uma população envelhecida
5 A esperança de vida é a média da esperança de vida de uma geração que sujeita qualquer sua vida aos quocientes
de mortalidade por idade do ano de observação.
6 O Instituto nacional de estudos demográficos (INED) é um instituto de investigação criado em 1945. Estuda os
problemas demográficos e difunde os conhecimentos na revista População.
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Embora diminuindo apreciavelmente, as doenças cardiovasculares representam a primeira causa de
morte. No essencial, trata-se de doenças degeneradas naqueles que têm erros de comportamento
(superalimentação, alimentação demasiado rica em matérias gordas, sedentarismo).
Estabilizado depois dos anos sessenta, a mortalidade devido a tumores está quase a tornar-se a primeira
causa de morte. Os cancros do tubo digestivo estão a diminuir ao passo que aumentam os tumores no
aparelho respiratório, sobretudo nos homens. O aumento do tabagismo não é estranho a esta evolução.
A mortalidade devido ao alcoolismo estagnou actualmente depois de um “impulso” entre 1950 e 1970.
Os franceses bebem muito: o equivalente a 19 litros por habitante (contra 10 litros dos belgas e 14 dos
alemães). O álcool provoca a cirrose do fígado, certos cancros (do esófago e da boca, por exemplo), as
doenças cardiovasculares e as mortes violentas. Pode-se considerar como a terceira causa de morte.
A mortalidade por acidente tem hoje o nível de 1925, o que quer dizer que a sua quota no nível de
mortalidade decadente é um engano. Este tipo de morte diz mais respeito aos homens do que às
mulheres. Os acidentes na estrada matam aproximadamente 10 000 pessoas por ano. O aumento
ocorrido depois de 1972 (16 617 mortes nesse ano) deu lugar a medidas tomadas pelas entidades
públicas: limites de velocidade e a obrigação de colocar o cinto de segurança (1973), criação de uma
licença temporária (1992). De aqui em diante, o suicídio faz mais prejuízos do que a estrada. Haverá
uma relação entre o suicídio e o desemprego? As duas curvas evoluem paralelamente de 1976 a 1985 e
em seguida divergem. O fenómeno é por conseguinte complexo, porque cada suicida é um caso
particular. No entanto, os factores culturais e sociais são importantes, os imigrantes magrebianos
suicidam-se menos; os prisioneiros, os jovens chamados ao serviço militar e também os trabalhadores
estão abaixo da média nacional.
Em resumo, a mortalidade geral baixa de forma quase constante. A sua estrutura encontra--se assim
fortemente alterada.
As diferenças perante a morte
A idade da morte mudou completamente. No antigo regime demográfico, morria-se muito jovem
(metade das mortes ocorria antes dos 5 anos) ou velhos. Hoje, morre-se velho (1% de mortes antes da
idade de 5 anos, a maioria entre os 75 e os 90 anos).
O desaparecimento da mortalidade infantil é um fenómeno considerável, «o mais importante das
sociedades humanas ». Em 1789, mais de uma criança entre quatro (27,8%) morria antes do seu
primeiro aniversário. Este número baixa durante a primeira parte do século XIX (14,4% em 1845). Os
demógrafos interrogam-se se este dado é independente a todo o progresso médico. Trata-se de uma
diminuição da morte prematura dos bébés, do progresso na luta contra a varíola (em 1796, Jenner
descobre a vacina), duma melhoria na alimentação que permite às mulheres levar melhor a sua gravidez
até ao fim e às crianças resistirem melhor às doenças infecciosas ? Não se trataria de mais uma
consequência da extensão das práticas contraceptivas: “As famílias têm menos filhos, mas serão agora
mais preciosos e mais bem tratados?” Não haveria depois do fim do século XVIII, uma menor virulência
das doenças infecciosas (logo uma alteração de ordem biológica)? As condições climáticas alteram-se na
mesma época, os contrastes térmicos atenuam-se. No meio século seguinte, a mortalidade infantil
estagna. O desenvolvimento industrial do Segundo Império, a acumulação urbana não permite uma
melhoria das condições de higiene. Com os anos 1890, começa uma fase de baixa irreversível e forte da
mortalidade infantil: 17,0% em 1891-1895, 0,61% em 1994. A vulgarização dos ganhos da revolução
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de Pasteur, o desenvolvimento do aleitamento artificial com uma melhor higiene iniciam este retrocesso.
Entre as duas guerras, os progressos retardam-se, mas retomam a um ritmo acelerado após o segundo
conflito mundial (5% em 1950).
A queda da mortalidade infantil explica em grande parte os progressos da esperança de vida. Hoje, os
ganhos de vida média obtêm-se por um retrocesso da mortalidade das pessoas idosas.
Com efeito, todos os grupos de idades aproveitam dos sucessos ganhos na luta contra a mortalidade.
Morrer entre os 1 e os 15 anos é uma excepção: de 1920 a 1985, os riscos de morrer entre os 1 e os 4
anos têm de ser divididos por 20! A evolução é menos favorável entre os 15-25 anos. A circulação
automóvel (nomeadamente as motas) gera novos riscos, sobretudo para os rapazes. Depois dos 25 anos,
o declínio da mortalidade retoma mas a um ritmo menor que nas idades mais jovens. A vacinação contra
a gripe (divulgação de uma vacina polivalente no início dos anos 70), uma melhor informação sobre as
doenças cardíacas, um acompanhamento médico mais rigoroso salva muitas vidas humanas.
Mas, em todas as idades, a mortalidade masculina é superior à mortalidade feminina. O século XIX
inventa a sobre-mortalidade masculina. Até 1880, as mulheres podem esperar viver 1,5 a 2 anos mais
que os homens. Desde esta data, o desvio aumenta: 4,1 anos em 1913; 5,5 anos em 1950; 8,2 anos em
1994. Hoje, a sobre-mortalidade masculina francesa situa-se entre a mais elevada do mundo. O sexo
forte não é por conseguinte aquele em que se acredita. O demógrafo Roland Pressat considera que são
dois anos de esperança de vida a vantagem "biológica" do sexo feminino. De facto, a mortalidade
infantil é um facto mais frequente nos rapazes. Na realidade, o desvio actual vem das diferenças de
mortalidade entre os 50 e os 80 anos. E, sem dúvida, os factores sociais intervêm:
- os riscos profissionais atingem mais os homens. A sobremortalidade masculina caracteriza as
sociedades industriais modernas;
- as mortes violentas, nomeadamente os suicídios, acontecem geralmente com homens;
- as diferenças de comportamento têm um lugar importante. O tabagismo e o alcoolismo, males
sociais que apareceram no séc. XIX, encontram-se mais frequentemente associados aos homens. Isto
aumenta fortemente os riscos de mortalidade. Um grande fumador tem 11 vezes mais riscos de
morrer de cancro dos brônquios que um não-fumador. Geralmente, as mulheres têm mais cuidado
com o seu corpo do que os homens. Recorrem mais frequentemente aos cuidados médicos e
aproveitam assim as melhorias sanitárias.
A sobremortalidade masculina provoca um desequilíbrio dos sexos nas idades elevadas: com 80-84
anos, existem duas vezes mais mulheres do que homens. Este desequilíbrio aumenta: numa sociedade
envelhecida, as mulheres não podem senão ocupar um lugar crescente.
A morte não marca igualmente todas as regiões francesas. O mapa das desigualdades geográficas apenas
se alterou em dois séculos. Os Departamentos que apresentam a esperança de vida mais fraca situam-se
no Oeste, no Norte e no Nordeste enquanto que a vida média é mais longa em Vendée e em Languedoc-
Roussillon. Estão em causa os tipos de vida, nomeadamente os hábitos alimentares. Na Idade Média, um
mapa das desigualdades face à morte ter-se-ia assemelhado ao da subalimentação (a fome era muita). Na
época contemporânea, este mapa retoma o consumo de álcool, mais elevado nas franjas setentrionais do
território. A natureza e a quantidade das gorduras consumidas entram também em conta. As gorduras de
origem animal frequentemente utilizadas no Norte parecem mais nocivas que as gorduras de origem
vegetal consumidas no Sul.
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Até 1880 -1890, as cidades assinalam-se por uma mortalidade mais elevada que no campo7.
A acumulação humana e uma higiene deplorável contribuem para isso. Com os progressos sanitários do
fim do século (instalada a rede de esgotos e o abastecimento de água potável), as duas taxas (urbanas e
rurais) aproximam-se. A continuação da evolução faz com que hoje a cidade detenha uma vantagem de
dois anos em esperança de vida. Embora frequentemente poluídas, as cidades dispõem de uma melhor
infra-estrutura médico- hospitalar. Além disso, a sua estrutura social não se assemelha à do campo.
Já no início do séc. XIX, a esperança de vida varia muito em função da classe social. Assim, aos 40
anos, um proprietário pode esperar viver ainda mais 31,7 anos, um notável ou um burgês industrial 31,1
anos, um pequeno empregado 27,4 anos e um operário 25,3 anos. Os estudos sobre as desigualdades
sociais relativamente à morte continuam a interessar os investigadores. Mostram que desvios muito
sensíveis existem de acordo com a profissão exercida. Assim, para o período 1980-1989, o risco de
morte de um professor ou de um engenheiro é, entre os 35 e os 75 anos, três vezes menor do que um
manobrador. Um professor, que deixa de trabalhar aos 55 anos, pode esperar passar mais 23,5 anos de
reforma enquanto que um operário, reformado aos 60 anos, não disporia mais do que 9 anos. Estes
desvios importantes revelam o fracasso relativo das medidas tomadas após a Segunda Guerra Mundial.
Ao generalizar a Segurança Social, os poderes públicos procuravam dar a cada um, qualquer que seja a
sua classe social, as mesmas possibilidades de se tratarem. O objectivo não foi atingido. No entanto, a
conclusão merece ser matizada: se a Segurança Social não existisse, estas diferenças seriam certamente
muito maiores.
Podemos considerar três fenómenos para explicar estes dados:
- as condições gerais de vida e de trabalho diferentes de um grupo para o outro. Os ritmos de trabalho
(por exemplo, os 3 x 8) contrariam os ritmos biológicos. Os ritmos de trabalho usam o corpo, a sua
monotonia esgotam-no. O cansaço físico deixa poucos lazeres. Os salários menores levam à
habitação em apartamentos estreitos e ruidosos;
- o comportamento. As respostas às tensões da vida social não são as mesmas. Os executivos preferem
os lazeres e o desporto enquanto que, os trabalhadores refugiam-se mais frequentemente no álcool.
Com as cirroses do fígado e a tuberculose, o risco de morrer entre os 35 e os 60 anos é 10 a 15 vezes
mais elevado nos operários que nos quadros superiores
- a educação - um bom nível de conhecimentos melhora a prevenção.
Esta sobremortalidade das classes modestas trava o retrocesso geral da mortalidade.
As razões do recuo da mortalidade
Na história dos progressos registados na época contemporânea, reencontra-se o momento decisivo nos
anos 1880.
7 Depois dos dados do recenseamento de 1821 e as estatísticas das mortes registadas de 1816 a 1826, a
taxa de mortalidade sobe para 36,1% para as cidades e 23,7% para o campo.
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Até à esta data, o papel de relevo no alongamento da vida média deve-se:
- à economia. A produção agrícola aumenta, tornando possível uma melhoria da alimentação. Assim,
em 1870, a França produzia duas vezes mais trigo e três vezes mais batatas que no início da
Restauração. O nível de vida sobe lentamente entre 1860 e 1914, o poder de compra dos
trabalhadores teria progredido entre 25 a 30 %. A extensão das vias de comunicação permite um
melhor abastecimento e participa por conseguinte numa melhoria das condições de vida;
- aos poderes públicos. Estimuladas pelos higienistas8, muitas autoridades municipais adoptam
serviços para limpar o lixo e as ruas. No Segundo Império, o Barão Haussmann areja Paris
construindo largas avenidas, demolindo bairros insalubres. Ao proceder assim, destrói lares
potenciais de epidemias (a cólera encontra um meio favorável nas barracas e nas pensões
parisienses) e repele para os subúrbios os operários, classe trabalhadora mas perigosa para a
burguesia.
A medicina desempenha ainda um papel secundário mas vibrante. A auscultação, facilitada pelo
estetoscópio (invenção de Laennec em 1817), o desenvolvimento dos termómetros melhora o
diagnóstico. A cirurgia progride graças às guerras imperiais. As novas ligaduras (como aquelas de
Velpeau) reforçadas pelo gesso a partir de 1861, imobilizam o membro ferido. O éter e o clorofórmio
chegam em 1847 às salas de operação. No Segundo Império, a química nascente permite um progresso
da farmacopeia (com Claude Bernard). No entanto, o enquadramento médico deteriora-se a partir de
1860. É que o número de “oficiais de saúde” (técnicos de saúde não diplomados) diminui. Estes homens,
de formação sobretudo prática, exercem a sua "arte" nas regiões rurais, deixando os meios aristocráticos
e burgueses aos médicos mais instruídos e bem melhor formados.
Após 1880, engrena-se um grande movimento de retrocesso da mortalidade. Os progressos da medicina
têm um papel preponderante. Na origem situa-se a revolução de Pasteur. Louis Pasteur (1822-1895) é
um precursor. Demonstra o erro da geração espontânea, emite as regras da anti-sepsia (eliminação dos
germes responsáveis pelas infecções) e funda a assepsia (protecção do organismo contra os germes
infecciosos). Os seus trabalhos sobre os micróbios abrem um novo caminho. Nos anos 1880-1890,
cientistas identificam os micróbios que originam a peste, a difteria, a tosse convulsa. Estes micro-
organismos enfraquecidos são utilizados nas vacinas desenvolvidas no fim do século. Desde 1945, a
medicina colocou-se à hora americana e realiza progressos a três níveis:
- o diagnóstico melhora. Agora, a radiografia e o recurso às análises em laboratório são práticas
correntes. A imagem médica (ressonância magnética nuclear desde 1981), os testes (para a
despistagem do cancro) e as biópsias facilitam o desenvolvimento do diagnóstico;
- a terapêutica avança. A partir de 1945, a chegada dos antibióticos (como a penicilina, a cortisona, a
hidrocortisona) é uma verdadeira revolução na luta contra as doenças infecciosas. A quimioterapia
faz avançar a luta contra os tumores. Em farmacologia, o génio genético permite a obtenção de
produtos de uma grande pureza: a cimétidine, desenvolvida em 1977, diminui em 90% o recurso à
cirurgia no tratamento das úlceras do estômago
- a cirurgia progride sempre. Com os anos 50, começa o período dos transplantes e dos transplantes de
órgãos. Desde 1962, o laser é adoptado por numerosas especialidades.
8 os higiénistas, entre os quais se encontram muitos médicos, procuram melhorar a saúde pública,
lutando contra os factores nocivos à saúde.
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O olhar sobre a medicina muda. As campanhas que se abrem ao exterior na segunda metade do século
XIX (extensão das vias de comunicação de interesse local) acolhem mais facilmente “a civilização
técnica”. Os médicos pastoriens demonstram a sua eficácia. A morte deixa de ser considerada como o
prolongamento natural da doença. As décadas passam, a morte não se integra mais na vida. Esconde-se.
Hoje, morre-se no hospital, longe do lugar de vida que é a casa.
A medicalização teve por conseguinte efeitos muito rápidos. Sem dúvida os poderes públicos não são
estranhos a este facto. A Terceira República democratiza progressivamente a sociedade e oferece aos
cidadãos uma igualdade de oportunidades em matéria de instrução e saúde.
A higiene ocupa um lugar privilegiado na escola primária laica, gratuita e obrigatória, criada por Jules
Ferry. Torna-se matéria obrigatória ao lado da moral, da história e da instrução cívica. A escola
desempenhou provavelmente um papel importante na divulgação dos ganhos da revolução de Pasteur.
O Estado favorece o equipamento hospitalar. Os hospitais aumentam as suas capacidades de
acolhimento e prosseguem a sua medicalização iniciada no fim do século XVIII. Os arquitectos ouvem
os desejos dos cirurgiões (caso do hospital Cochin inaugurado em Paris em 1893). Depois da Primeira
Guerra Mundial, as salas de operações recebem melhores iluminações; são reconstruídas e renovadas
após 1945. Um esforço especial é feito no domínio das urgências: criação dos SAMU em 1953.
No século XIX, o Estado mexe com os seus princípios liberais legislando no domínio da saúde. Depois
de 1865, os médicos insurgem-se contra a forte mortalidade dos bébés. A derrota de 1870-1871 acelera a
tomada de consciência da diminuição da natalidade francesa. Reduzir a mortalidade de todos os jovens,
é contrariar a diminuição da natalidade. O Estado organiza por conseguinte uma política da saúde. A Lei
Roussel de 1874 protege as crianças colocadas em amas. Uma lei de 1902 exige dos médicos a
declaração das doenças contagiosas e impõe a vacinação anti-varíola. Em 1905, um texto legislativo
restringe as fraudes alimentares.
Os poderes públicos avançam a passos medidos para a criação da segurança social. Uma lei de 1893 cria
a assistência médica gratuita que confia a cada hospital os cuidados de um sector geográfico. Nos vinte
anos seguintes, o número de pessoas que beneficiam desta assistência médica gratuita admitidas no
hospital aumenta 79 %. Em 1898, a lei força os proprietários de empresas de risco a suportar as despesas
médicas e hospitalares dos trabalhadores feridos num acidente do trabalho. Os empregadores cobrem-se
com seguros -acidente. A partir da Lei Loucheur (1928), o sistema de seguros sociais estende-se a uma
parte crescente da população. A Lei do 4 de Outubro de 1945 cria a Segurança Social. Medidas
posteriores têm influências não negligenciáveis: o programa de saúde perinatal contribui para diminuir a
mortalidade infantil nos anos 70; as revalorizações das pensões de reforma, a gratuitidade dos cuidados
para os reformados menos afortunados relançam a baixa da mortalidade nas idades elevadas (fim dos
anos 60).
Actualmente, a crise económica reina e não permite mais o aumento das despesas sociais de saúde. A
hora é de economia. Em Junho de 1993, o Ministério dos Assuntos Sociais propõe um plano de
economias em duas vertentes: diminuição em cinco pontos na taxa de reembolso dos segurados sociais,
e de acordos com os médicos para que aligeirem as suas facturas. Mas o défice da Segurança social
aumenta, apelando a reformas muito mais profundas.
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A evolução da fecundidade
Os factos
QUESTÕES
- Como podem ser encontrados estes dados?
- Descreva a evolução global da fecundidade na Europa Ocidental.
- Procure hipóteses explicativas.
- Qual é o lugar da fecundidade francesa?
A taxa bruta de natalidade foi sensível à estrutura por idades, os demógrafos preferem-no ao indicador
conjuntural de fecundidade, chamado também como soma dos nascimentos reduzidos. Este cálculo
teórico dá o número médio de crianças que uma mulher poria ao mundo se, na ausência de mortalidade,
tivesse, em cada idade da sua vida, a fecundidade do momento9 .
A comparação sobre as condições da fecundidade dos diferentes países da Europa Ocidental deixa
aparecer semelhanças: baixa até á Segunda Guerra Mundial mas com ritmos variados, retomados nos
anos que seguem (baby boom) e baixa de novo a partir de 1965. No entanto, as divergências triunfam.
No século XIX, observam-se grandes desvios entre as curvas; juntam-se em 1925 e separam-se
seguidamente mas dentro de um intervalo menor que no século anterior; a França, última da classe até
1925 (reencontra-se certamente a precedência francesa em matéria de baixa da fecundidade), torna-se a
primeira após o segundo conflito mundial.
9 - o seu cálculo desenrola-se em dois tempos:
- primeiro, cálculo de uma taxa de fecundidade por idade. Para um ano dado, obtem-se trazendo os
nascimentos procedentes de mãe de uma idade x ao efectivo total das mães que têm esta idade x. Por
conseguinte, este cálculo efectua-se para cada idade fértil da mulher, ou seja por 15 anos, 16 anos. Até
aos 49 anos; seguidamente, efectua-se a soma de todas as taxas de fecundidade por idade.
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A curva francesa merece uma análise mais exaustiva. Um longo século XIX (que prossegue até 1942)
que se caracteriza por uma forte baixa iniciada nos anos 1760-1770. O indicador conjuntural passa de
5,5 crianças em 1750 para 2 no final dos anos 30. A baixa da fecundidade francesa apresenta por
conseguinte duas originalidades: a sua precocidade e o seu ritmo sustentado. No entanto, a evolução não
é linear: a fecundidade reduz-se rapida e regularmente até 1855, estagna entre 1855 e 1880, cai
seguidamente como o conjunto da Europa do Noroeste. Uma conclusão se impõe: a especificidade
francesa estende-se durante 80 anos (1800-1880).
Após a Segunda Guerra mundial, abre-se um longo período de retoma, o primeiro da época
contemporânea! Em 1948, a França reencontra o nível de fecundidade de 1890 (3 crianças por mulher).
Não se trata por conseguinte de uma fase clássica de recuperação de pós-guerra (como é o caso em
1920). A partir de 1955, uma mudança de calendário prolonga os efeitos do baby boom, casamentos
mais precoces, maternidades avançadas. O movimento inverte-se em 1965. A curva de fecundidade
orienta-se duravelmente em baixa ainda que um patamar seja atingido nos anos 80 (1,8-1,9 criança por
mulher). Doravante, a renovação das gerações já não está assegurada. Mas a situação não poderia
parecer catastrófica; por um lado, porque a França porta-se menos-mal que os seus vizinhos (1,21
criança por mulher em Itália em 1993); por outro lado, e sobretudo porque a descendência final das
gerações 1950-1955 se aproxima do limiar de 2,1 crianças10
.
Mais inquietante é a evolução recente, dado que o índice conjuntural estabelece-se em 1,65 para 1993 e
1994, de modo que, doravante, cinco países da União Europeia precedem a França: a Suécia (cujo índice
conjuntural estabelece-se em 2,09 em 1992), a Irlanda, a Noruega, o conjunto País de Gales – Inglaterra
e Dinamarca.
As diferenças regionais e sociais existem. No início da Monarquia de Julho, a França das famílias
numerosas acantona-se nos países católicos do Oeste (Bretanha, Vendée) e nas zonas montanhosas. A
França malthusienne é implantada na Normandia e no meio do Sudoeste. Um mapa da Belle Époque não
indicaria uma mudança profunda. Um crescimento de uma matéria fértil setentrional forma-se ao norte
do Loire, os departamentos industrializados (Norte, Pas-de-Calais, Sena inferior) juntam-se às zonas de
forte fecundidade, a Normandia deixa de ser uma região pouco fecunda. No Sul, o malthusianisme
estende-se para os Pirinéus, Maciço Central e o Mar Mediterrâneo. O século XX não muda esta imagem.
Mas a baixa recente faz desaparecer as regiões de baixa fecundidade; o crescente fértil esbate-se, a
França uniformiza-se.
A mesma observação vale para a fecundidade social. Os Notáveis mostraram a via da limitação
voluntária dos nascimentos, imitados seguidamente pelas outras camadas da sociedade. A divulgação
faz-se por conseguinte de acordo com o fenómeno dito de capilaridade social. Até 1900, a curva social
da fecundidade tem a forma de um U de ramos desequilibrados: os operários detêm a fecundidade mais
elevada e precedem os grandes burgueses; são os empregados que têm menos crianças.
Actualmente, dois fenómenos acontecem: por um lado, o segundo ramo do U esbate-se; por outro lado,
as disparidades entre categorias sociais desaparecem.
10 A descendência final calcula-se adicionando as taxas de fecundidade por idade duma mesma geração observadas durante
os 35 anos que dura a vida fecunda de uma mulher. Trata-se duma medida real da fecundidade mais justa que o indicador
conjuntural que não considera o calendário da procriação no interior de uma geração.
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A primeira revolução contraceptiva (século XIX)
As variações da fecundidade respondem a factores complexos difíceis de identificar. Faltam os
testemunhos directos, a contracepção pertence à intimidade dos casais. Além disso, não é fácil explicar
uma atitude colectiva enquanto que as bases duma família são da inteira responsabilidade da vontade
individual.
A primeira revolução contraceptiva desenrola-se fora de qualquer inovação médica ou tecnológica.
Descansa sobre a vontade deliberada dos casais franceses de ter menos filhos. Mas como? Os
mecanismos reguladores da fecundidade são três: o nível da nupcialidade (ou seja a frequência do
celibato definitivo11
e a idade á data do casamento), o espaçamento dos nascimentos e a contracepção
d’arrêt (significa que as famílias após terem um certo numero de filhos por eles decidido decidem
parar). Os infanticídios e os abortos desempenham um papel muito secundário na redução da dimensão
das famílias.
No início do século XIX, são as jovens solteiras e as viúvas que, à vergonha pública de um nascimento
ilegítimo, preferem o recurso às abortadeiras ou aos médicos ilegais. Um século depois, as casadas
fornecem o maior contingente das mulheres que abortam. Assim, o aborto tende a ser banalizado nos
meios urbanos. Por essa razão, não se trata "de um meio vulgar de limitação dos nascimentos". Jacques
Dupâquier considera que, apesar da nítida progressão dos anos 1900-1914 (talvez uma duplicação), o
número anual de abortos seria na ordem de 60.000 na véspera da Primeira Guerra Mundial. Isto
representa no máximo 8% da recusa de maternidade.
Os infanticídios são ainda mais difíceis de identificar. É delicado avaliar o seu número. Quantas crianças
morrem por acidente voluntariamente provocado? De acordo com os arquivos judiciais, este crime,
preferencialmente rural, tem um nítido recuo após 1890. O infanticídio refere-se sobretudo a raparigas
jovens (menos de 30 anos), analfabetas, de condição modesta. Portanto, corrige mais os desvios de
comportamento dos solteiros que os erros da contracepção conjugal.
Até à Revolução, o casamento, o mais social dos acontecimentos demográficos, foi o princípio auto-
regulador das populações. No antigo regime demográfico, havia adequação entre a dimensão da
exploração e a da família. Casava-se apenas se se pudesse estabelecer sobre uma terra livre. Aquando
das grandes crises, a mortalidade golpeava com força, o que liberava numerosas terras; nos meses que
seguiam, a curva dos casamentos subia seguida alguns tempos depois pela dos nascimentos. Em período
de elevadas águas demográficas, as terras eram ocupadas, os jovens não podiam estabelecer-se; por
conseguinte, casavam-se pouco ou mais tarde, e os nascimentos eram pouco numerosos. Assim, graças
ao número variável de jovens solteiros, a sociedade adaptava o número de famílias às necessidades
económicas do momento.
No século XIX, as regiões católicas fazem ainda do casamento tardio uma arma contraceptiva. Em 1831,
o Noroeste, o Norte e o Sul do Maciço Central têm uma proporção importante de solteiros definitivos e
uma idade elevada no casamento. Nos países "laicos", é a contracepção que controla os nascimentos.
A fraca fecundidade do Sudoeste deve-se ao espaçamento dos partos resultante da prática generalizada
do aleitamento materno. A estrutura complexa da família facilita esta forma de aleitamento. A família
tradicional domina; permite a coabitação sob o mesmo tecto dos pais, de um filho casado e dos filhos.
Imobilizada por amamentar o seu filho, a mãe é substituída nos campos por um membro da família.
11 Os demógrafos estimam que as pessoas solteiras com 50 anos ou mais têm poucas hipóteses de se casar; tratam-
se dos celibatários definitivos.
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Famílias não hesitam em contratar um empregado, durante o período em que os filhos crescem. Sabe-se
que este longo aleitamento (o desmamar acontece no fim do segundo ano) protege a vida da lactente. As
mulheres do Sudoeste preferem por conseguinte uma fecundidade bem-sucedida a uma fecundidade
elevada.
Durante o Primeiro Império (1804-1814), os Normandos recorrem mais à contracepção d’arrêt. O meio
mais simples, o melhor a fazer... e o mais difícil para evitar os nascimentos continua a ser a abstinência.
Documentos atestam que, em alguns meios burgueses católicos, o marido e a sua esposa têm quartos
separados. O ascétismo sexual tem limites, o Senhor encontra algumas consolações junto das criadas. A
utilização do preservativo, antivenério no século XVIII e anticoncepcionais no século XIX, não excede
provavelmente os círculos das prostitutas. A técnica mais usada é o coito interrompido, como nos
mostram os inquéritos efectuados por contemporâneos. No casal, o homem assegura por conseguinte a
responsabilidade da contracepção.
Estas diversas estratégias de controlo da fecundidade combinam-se, completam-se, relacionam - se pelo
menos no início do século XIX. Nas décadas seguintes, a contracepção d’arrêt continua e o adiamento
do casamento perde importância. De resto, as raparigas casam-se cada vez mais jovens. Contudo, seria
falso pensar que os casais planificam rigorosamente a sua descendência. Com uma mortalidade elevada
na primeira infância, é impossível calcular exactamente o número de filhos desejados. Existiria por
conseguinte uma forma familiar flexível susceptível de se adaptar às circunstâncias económicas
(dificuldades conjunturais) e demográficas (morte de um filho jovem), ao meio geográfico, ao meio
social, aos desejos pessoais.
Mas, mais que o como, é o porquê que intriga os historiadores demógrafos. Duas perguntas se colocam:
porquê o percurso singular da França no domínio da fecundidade? Porquê a baixa generalizada após
1880?
A primeira baixa acontece numa sociedade largamente rural e mal alfabetizada, e trata-se de um
fenómeno regional. Esta diminuição desenrola-se por conseguinte em condições económicas, sociais e
culturais muito diversas. Também não há uma mas várias respostas possíveis.
O declínio da mortalidade aumenta a população e cria um desequilíbrio entre o número de homens e a
quantidade de recursos disponíveis. O mecanismo auto-regulador do casamento mostra os seus limites: é
travão insuficiente quando a mortalidade se reduz consideravelmente. A contracepção substituiria esta
insuficiência. Assim seja, mas a Bretanha, densamente povoada, ignora a contracepção. O retrocesso da
mortalidade em idade precoce sobrecarrega as famílias que, face à dificuldade em criar os seus filhos,
reduzem a sua fecundidade. Os demógrafos estabelecem uma relação entre a pausa que ocorre na baixa
da mortalidade infantil e a tímida retoma da natalidade no Segundo Império. Mas a mortalidade não
diminui apenas na França.
Será necessário culpar os costumes de herança? No Norte, a igualdade prevalece enquanto que no Sul
existe um sistema desigual, o conjunto dos bens materiais e simbólicos que pertencem só a um filho,
geralmente o rapaz mais velho. Le Play e Leroy - Beaulieu acusam a divisão igualitária instaurada pela
legislação revolucionária e o Código Civil de ter levado os casais a ter menos crianças a fim de evitar as
divisões successórias. Na realidade, os notários solicitados pelos pais de família contornam a legislação
subestimando o valor dos bens fundiários e por conseguinte a parte que pertence aos irmãos mais novos.
Será importante recordar que a chegada da contracepção no Sudoeste é anterior à promulgação do
Código Civil?
Será necessário voltarmos para outra singularidade francesa, a aposta na ama? Aleitamento pelas amas
pratica-se em todos os meios urbanos: 10 a 12% das crianças são criados por amas. As mulheres que
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renunciam ao aleitamento dos seus filhos correm o risco de rapidamente engravidar. Para evitar muitas
gravidezes, os casais urbanos adoptariam então a contracepção. A explicação é mais válida para as
cidades, pioneiras na baixa voluntária da fecundidade, que para o meio rural.
Será que o filho ocupa um lugar mais importante na família? Philippe Ariès, foi o primeiro que
estabeleceu uma ligação entre a "grande revolução demográfica do século XIX" e "a ideia que se faz da
criança na família". O historiador americano Edward Shorter acredita numa concepção evolutiva do
sentimento da infância. Esta visão etnocêntrica deixa supôr que as mães do Antigo Regime
abandonavam a sua descendência, o que não era o caso. A manutenção de uma forte mortalidade
infantil, o trabalho que extenua as crianças nas minas e as fábricas perturbam a bonita imagem de um
século XIX favorável à infância.
Qual é o lugar da Igreja na história da fecundidade? Para ela, a procriação é o único objectivo do
casamento, o que condena a procura do prazer e as relações extraconjugais. Jean – Louis Flandrin
considera por conseguinte que "sob pena de heresia, a contracepção não podia ser considerada senão
fora do casamento.” Não acredita que os jovens possam viver castamente o seu prolongado celibato.
Estudos recentes confirmam este ponto de vista. O celibato representaria um laboratório de experiências
proibidas que teriam passado seguidamente para a cama conjugal com a erotização do casal.
A subida da ilegitimidade, da qual a frequência duplica no século XIX, confirma o retrocesso da
autoridade moral da Igreja. A razão empurra os dogmas. A vida racionaliza-se num país herdeiro do
Século das Luzes. O cálculo domina sobre a negligência. A fecundidade deixa de ser um dom de Deus.
A Revolução acelera a transformação dos comportamentos. Preconizando a liberdade individual,
despoja a sexualidade e a procriação dos constrangimentos que pesavam sobre elas. Resulta na mistura
de culturas, o que facilita a circulação das ideias, a divulgação de práticas novas.
Após 1880, a segunda fase de baixa tem por quadro uma sociedade mais urbanizada e alfabetizada,
transformada pela industrialização e dominada pela burguesia.
A França enriquece. André Armengaud atribui a baixa da fecundidade das populações do Leste
Aquitânio ao crescimento do nível de vida. A extensão da facilidade teria segregado uma mentalidade
nova pouco favorável às famílias numerosas. Ávida de ascensão social, a pequena e média burguesia
privilegia a educação dos seus filhos. Ora, a educação custa caro. As crianças, que se têm tornado uma
carga económica, não são muitas. É necessário citar a famosa frase do liberal Jean-Baptista Say:
"*Assim, será conveniente incentivar os homens a fazer antes poupanças do que filhos"?
A extensão das vias de comunicação (o Plano Freycinet data de 1879)12
, o recrutamento militar (que se
tornou obrigatório em 1889) e a escola abrem aos jovens rurais novos horizontes. O trabalho e a
poupança são elevados à linha de virtudes. A previdência entra na cama conjugal.
O casal ele mesmo se altera. O estatuto da mulher encontra-se valorizado. Também as mulheres aceitam
mais dificilmente ser isoladas no papel de reprodutoras. Na formação dos casais da Belle Époque, o
novo erotismo nasce com o desenvolvimento do flirt. O jovem casal cria um espaço privado e escapa ao
pesado controlo social assegurado tradicionalmente pela família, pela vizinhança, pela comunidade e
pela Igreja.
12 O Plano Frecynet permite a conclusão da rede ferroviária e o desenvolvimento das vias navegáveis.
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A segunda revolução contraceptiva
Quadro da página 64
Chega depois o baby boom, ou seja 20 anos após a retoma da fecundidade.
As razões do baby boom são um mistério. Seria o efeito da política de natalidade seguida desde 1939: o
Código da família (1939), a integração das prestações familiares no sistema geral da Segurança social
(1945), a criação de subsídios pré-natais e pós-natais, um seguro de maternidade (1945-1946), a
instituição de um quociente familiar que conduz à redução substancial de impostos, à redução sobre as
tarifas de alguns serviços públicos (como a SNCF)? Mas o baby boom não é um fenómeno
especificamente francês dado que toca a maior parte dos países europeus e americanos apesar de
legislações familiares diferentes. Não seria antes a política familiar que reflectiria um novo
comportamento? O individualismo, característica do século XIX, apaga-se face à subida dos valores
familiares. Os diversos seguros instaurados são construídos sobre o princípio da solidariedade. O
espírito calculista recua. Um vento de optimismo sopra nos anos que seguem ao cataclismo da Segunda
Guerra Mundial.
Em toda a Europa, a situação altera-se a partir de 1965. A segunda revolução contraceptiva
medicalisada, apoia-se sobre progressos tecnológicos (Quadro 1). Agora, a aposta na prática da
contracepção depende das mulheres.
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QUESTÕES
- Qual é a população estudada?
- Qual é a importância dos métodos contraceptivos utilizados?
- Classifique estes métodos.
- Qual é a influência da idade na sua utilização?
- Existe sempre o desejo de ter filhos?
Em 1988, duas em cada três mulheres utilizam um método contraceptivo. Mas menos de 2% das
mulheres se arriscam a estar grávidas sem desejar realmente. Uma mulher em cada duas usa meios
modernos de contracepção (pílula ou esterilização). O resultado é notável porque a lei Neuwirth que
liberaliza a contracepção foi votada apenas no fim de 1967 e realmente aplicada em 1973. Até esta data,
a legislação proíbe a prescrição, a divulgação e a utilização dos métodos contraceptivos (a lei de 31
Julho 1920). Uma mulher em cada três recorre à pílula que é o método preferido dos jovens (50,9%
entre os 20-24 anos). A velha técnica du retrait (coito interrompido) tem cada vez menos adeptos. A
campanha para o uso dos preservativos ia começar justamente após a realização do inquérito, devido à
subrepresentação deste método13
.
As práticas contraceptivas evoluem com:
- o tempo. Em relação a 1978, a contracepção médica progride. Pílula e sobretudo a esterilização
ganham terreno enquanto que o coito interrompido torna-se secundário;
- a constituição da família. Os métodos contraceptivos interessam aos casais que coabitam e aos casais
que deram à sua família a dimensão desejada. Assim, a contracepção torna-se um comportamento
feminino permanente, interrompido quando uma gravidez é desejada. Hoje, é necessário querer ter
um filho. Ontem (primeira revolução contraceptiva) era necessário não querer ter um filho.
Estas técnicas muito seguras permitem aos casais dominar a sua fecundidade. São completadas pela
legislação da interrupção voluntária de gravidez. A Lei Veil, votada em 29 Novembro 1974, confirmada
em 31 Dezembro 1979, torna caduca a lei de 1920 que restringe o aborto. Este último texto, inadaptado
aos hábitos contemporâneos, não impedia os abortos clandestinos em condições deploráveis, nem os
abortos no estrangeiro (Grã-Bretanha, Países Baixos) para as mulheres mais afortunadas. Doravante, a
IVG é autorizada num estabelecimento hospitalar até à décima semana de gravidez. O número de
abortos, estável até a 1985 (ronda os 250.000 por ano) está actualmente em ligeiro retrocesso: 225.000
em 1993.
O resultado da baixa recente da fecundidade é uma redução e uma concentração da dimensão das
famílias. A norma é dois filhos. A proporção dos casais sem crianças permanece fraca e estável; as
famílias de um e de sobretudo duas crianças aumentam fortemente enquanto que para além de três
crianças, o número cai rapidamente.
13 Um inquérito feito em 1994 mostra que a difusão dos preservativos aumentou consideravelmente depois de 1988: 58% das
mulheres com idades entre 20 e 24 anos utilizaram-nos contra 23% seis anos antes. Os preservativos são daqui em diante o
método de contracepção mais correntemente utilizado desde os primeiros relatórios sexuais. A sua utilização torna-se
frequente em casa das pessoas que não vivem juntas.
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A interpretação desta nova baixa levanta muitas questões. Será que a tendência de fundo iniciada no fim
do século XVIII continua após o parêntese do baby boom? Será que a fecundidade controlada entra
numa fase de flutuações cíclicas? Esta última hipótese é privilegiada pelos economistas, nomeadamente
os da escola americana. Para John Graumon, a fecundidade estaria ligada ao mercado de trabalho: as
gerações que têm dificuldades para entrar na vida profissional diminuiriam a sua fecundidade enquanto
que as gerações que se inserem com menos dificuldades teriam uma descendência mais numerosa.
Robert Easterlin pensa que uma geração se comporta reagindo contra uma situação que viveu na sua
infância; assim, os filhos únicos dos anos 20 deram ao baby boom uma forte expansão, os jovens
nascidos de 1945 para 1964 reduzem os seus filhos. Mas a próxima retoma faz-se esperar. As análises
sobre as mudanças sociais e culturais parecem mais convincentes.
Em 1964, chegam à idade adulta as primeiras gerações do baby boom. Estas novas gerações não
conhecem nem a guerra, nem as dificuldades económicas antes da guerra. Vivem a expansão dos Trinta
Gloriosos que altera o seu modo de vida. Terminam as pesadas tarefas domésticas que tomavam muito
tempo e prendiam as mulheres em casa. A chegada dos aparelhos electrodomésticos e a melhoria
sensível do poder de compra aligeiram os trabalhos domésticos e dão tempo. O ensino progride a passos
de gigante para as gerações femininas do pós-guerra. Dispondo de tempo e um nível de formação mais
elevado, as mulheres entram maciçamente na vida activa. Antes de fundar uma família, procuram
começar uma carreira interessante. Até aos anos 60, as mulheres adaptam o seu trabalho ao calendário
da sua maternidade, hoje as mulheres adaptam a sua fecundidade às exigências do desenrolar da sua
carreira.
Doravante, a responsabilidade de ter um ou dois filhos leva cada vez menos as mulheres a abandonar a
sua profissão. A questão coloca-se para três filhos... ou mais. Poderá dizer-se que o emprego feminino
tem uma incidência lamentável no nível da fecundidade? O facto de que, numa família, a taxa de
actividade feminina diminuiria à medida que aumenta o número de filhos mostra que é difícil conciliar a
vida profissional e as responsabilidades familiares. Assim, a influência da actividade profissional é
evidente mas difícil de precisar. A baixa recente da fecundidade refere-se a todos os países
industrializados, e contudo, a frequência da actividade feminina varia muito de um país para outro.
O estatuto da mulher altera-se e o da sociedade também. Com o desenvolvimento dos meios de
comunicação de massa, os comportamentos tornam-se homógeneos (as famílias numerosas estão
ausentes das séries emitidas na televisão). Os casais têm lazeres e os feriados; numa sociedade lúdica, a
criança é entendida como um peso.
Os factores económicos, frequentemente referidos para explicar a redução da natalidade, não têm uma
incidência directa. Com efeito, em 1964, nenhum acidente conjuntural acontece. Mas o formidável
crescimento durante os Trinta Gloriosos permitiu construir uma sociedade protegida e segura que fez
com que o filho perdesse a sua função económica. Para os pais, o jovem já não é um produtor em
potência (a incerteza ligada ao desemprego reforça esta ideia), nem um seguro contra os riscos da
doença e a velhice. A criança guarda sobretudo uma função afectiva. E, nas famílias, les enfants-rois não
podem ser muitas. Esta sociedade protectora e a má conjuntura não incentivam os riscos; ora, ter uma
criança, é aceitar uma responsabilidade a longo prazo.
Louis Roussel considera que a nossa sociedade entrou na era do désinstitutionnalisé e do efémero.
Socializados num contexto desmobilizador de paz e de abundância, as gerações do pós-guerra
interessam-se apenas a curto prazo. De facto, desde meados dos anos 70, o casamento conhece uma crise
visível. O número de uniões legais diminui: a taxa de nupcialidade passa de 7,8 % em 1970 para 6,2%
em 1980 e 4,4% em 1994. O número de divórcios aumenta: um divórcio para dez casamentos em 1980,
mais de um divórcio para três casamentos (38,6 %) em 1991. A população que coabita cresceu
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fortemente nos anos 80. Um recente inquérito do INED deixa transparecer que a vida em comum tenta
cada vez menos as pessoas. Seria prematuro diagnosticar um descontentamento com a vida a dois; sem
dúvida que os jovens procuram construir um casal sólido, como no passado, mas sem estar a aceitar
compromissos; são ajudados na sua maneira de agir pelo facto da sociedade aceitar mais facilmente as
rupturas que antes. O número de nascimentos fora de casamento aumenta: 11,4% do conjunto dos
nascimentos em 1980; 31,8% em 1991. Tendo em conta as concepções antes do casamento, mais da
metade das mães de hoje concebem a sua primeira criança fora do casamento. A França tem assim uma
das proporções de nascimentos fora de casamento mais elevadas da União Europeia
Por conseguinte, a vida social altera-se por completo. Com o controlo da fecundidade, a actividade
sexual deixa de estar dependente do casamento. Desde o início dos anos 80, existe uma dissociação entre
relatórios sexuais e a vida a dois (a subida do celibato tardio confirma-o). Tornadas economicamente
autónomas, as raparigas já não têm necessidade da protecção jurídica oferecida pelo estatuto da mulher
casada. É verdade que a igualdade dos casais casados e os casais que coabitam, em matéria de protecção
social, não incita o casamento.
Assim, três fases marcam a história demográfica contemporânea: 1800-1880, a fecundidade francesa
apresenta um perfil singular; 1880-1945, a natalidade europeia aproxima-se da de França; 1945-1995, o
saldo natural negativo na Alemanha, em equilíbrio no Reino Unido, é positivo em França. Estas
diferentes fases têm, certamente, consequências para as estruturas da população e na sociedade.
As estruturas lentamente alteradas
Avaliação dos movimentos
Geografia populacional
A França tem uma das populações menos densas da Europa ocidental: 105 habitantes por quilómetro
quadrado (363 habitantes nos Países Baixos mas 78 em Espanha). Este dado esconde grandes
disparidades: apenas 7 de cada 22 regiões estão acima da média nacional. A região parisiense, o Norte e
a Alsácia urbanizadas e industrializadas detêm as densidades mais fortes. As zonas menos povoadas
correspondem à França rural e envelhecida (Maciço Central, Alpes, alguns departamentos do Sudoeste).
Este desequilíbrio geográfico, agravado em dois séculos, custa caro: a manutenção dos serviços
públicos, a conservação das vias de comunicação pouco utilizadas, perda de espaço e de tempo em
lugares demasiado povoadas.
Na Belle Époque, os departamentos que têm um saldo migratório excedente são industrializados (Sena e
região parisiense, Meurthe-et-Moselle, Rhône) ou beneficiados pelo crescimento de uma grande cidade
(Loire Atlântico, Haute-Garonne, Gironde). Dois factos importantes acontecem no fim dos anos 70. Por
um lado, a mobilidade dos Franceses diminui. Por outro lado, os fluxos migratórios invertem-se. Com
efeito, com a crise económica, o Norte e o Nordeste perdem habitantes. A região mediterrânica e, mais
geralmente, as metrópoles do Sul atraem graças ao clima (a Côte d’Azur e Languedoc- Roussillon
formam a cintura ensolarada da França), uma indústria que pede mais pessoal qualificado e menos
matérias-primas (os engenheiros e técnicos preferem o Sul), alguns brilhantes resultados (indústria
aerospacial em Toulouse), com serviços melhor assegurados (TGV; rotas aéreas). As zonas
tradicionalmente deficitárias que vão da Bretanha a Cévennes passando pelo Sudoeste apresentam um
saldo positivo devido ao regresso dos reformados.
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Dois factos coexistentes explicam as modificações na geografia da população: o êxodo rural e a
urbanização.
De acordo com a definição adoptada pela Estatística geral da França em 1846 e utilizada até 1954, uma
comuna urbana conta com pelo menos 2.000 habitantes aglomerados no chef-lieu. Esta definição não
distingue população rural e população agrícola, mas permite comparações.
A época contemporânea é caracterizada por uma dinâmica de crescimento urbano. É uma ruptura em
relação ao Antigo Regime: no século XVIII, os ímpetos urbanísticos são curtos (uma geração no
máximo) e de fraca intensidade (o melhor possível, um crescimento de 0,85% por ano).
O processo urbanístico parece espectacular: no Primeiro Império, mais de quatro em cada cinco
Franceses habitam no campo; hoje, não existe mais que um sobre quatro. Contudo, é lento em relação
aos países da Europa do Norte: pela primeira vez em 1931, a população urbana francesa excede a
população rural; o fenómeno aconteceu 80 anos mais cedo na Grã-Bretanha.
O crescimento urbano é irregular. Até 1946, o impulso é pouco vigoroso; é mais sustentado no Segundo
Império, período de industrialização (excede 1,5% por ano), e de 1921 a 1931. Depois de 1946, durante
os Trinta Gloriosos, a urbanização acelera. A vaga aumenta até 1968: de 1962 a1968, a taxa de 2% de
crescimento anual é ultrapassada pela primeira vez na história (o ritmo é o da Grã-Bretanha durante a
primeira revolução industrial). Após 1968, o ritmo diminui. O refluxo faz-se sentir sobretudo entre 1975
e 1982, o crescimento passa a ser mais rápido nas comunas rurais do que nas comunas urbanas. O último
recenseamento de 1990 assinala uma nova aceleração na urbanização em proveito da aglomeração
parisiense e das cidades do Midi.
Desde o século XIX, a população urbana é duplamente concentrada. Por um lado, existe uma dissimetria
entre o leste Urbano e o Oeste rural (o limite é uma linha que liga Cherbourg a Marselha). Por outro
lado, e sobretudo, o corpo urbano francês tem uma enorme cabeça (Paris e a sua aglomeração agrupam
um sexto da população) e membros delicados (Lion e Marselha excedem pouco mais do milhão de
habitantes). Esta situação é única na Europa: na Alemanha e no Reino Unido, vários centros
desenvolvem-se simultaneamente. Resulta de uma longa tradição de centralização, o poder político, a
administração central, as sedes das grandes empresas industriais e financeiras que se encontram
implantadas em Paris que é também uma capital intelectual.
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, os poderes públicos pensam no ordenamento do território
criando metrópoles de equilíbrio (reforço das capitais regionais), lançando uma política das cidades
médias (melhoria do equipamento urbano), construindo cidades novas (para descongestionar os grandes
aglomerados populacionais, oferecendo todos os serviços e todos os tipos de empregos).
Assim, as cidades aparecem como "devoradoras de espaço". Desde o século XIX, asfixiam nos seus
muros e estendem-se pelas comunas circundantes (criação de subúrbios). Em 1860, Paris anexa
Ménilmontant, Belleville, Montmartre, Auteuil, Vaugirard. As cidades são também "devoradoras de
homens". No século XIX, enchem-se de emigrantes, sendo o saldo natural frequentemente deficitário.
Na Belle Époque, a melhoria da higiéne e da saúde pública permite um retrocesso da mortalidade
enquanto que o contributo de jovens adultos mantém a natalidade: a cidade julga-se também pelo
excedente natural. Este saldo positivo adicionado aos efeitos do êxodo rural e à extensão territorial
assegura a explosão urbana de 1946 a 1968. A «rurbanisation» observada entre 1975 e 1982 revela "um
mundo ao contrário": as cidades fornecem o excedente natural, o campo beneficia do excedente
migratório. É que, desde 1846, o mundo rural perdia habitantes.
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A importância do êxodo rural francês no século XIX deve relativizar-se. Certamente, desvitaliza o
campo (são os jovens adultos que partem) e golpeia mais as regiões de montanha, a Bretanha e o Norte.
Mas não tem uma extensâo muito importante: entre 1872 e 1911, refere-se a 2.800.000 pessoas. A
situação é outra na Grã-Bretanha, onde o êxodo rural é ao mesmo tempo mais precoce e mais intenso.
Ali, a rápida industrialização consome uma mão-de-obra abundante. Assim, milhões de camponeses
encontram-se transportados para um mundo radicalmente diferente. Gérard Noiriel encontra nesta
oposição a razão do particularismo malthusiano francês. De um lado, comunidades rurais e artesanais
estáveis que se protegem tendo poucos filhos. Por outro lado, miseráveis, retirados das suas raízes,
abandonados, que, sem projectos de futuro, não dominam a sua fecundidade. Após 1945, juntamente
com a progressão da indústria, o êxodo rural aumenta em França. Entre 1954 e 1968, 4.340.000 pessoas
abandonam o campo. Desde há vinte e cinco anos, o despovoamento rural atenua-se. Mas este fenómeno
tende a terminar; a urbanização difusa progride: hoje, os camponeses representam menos de um quarto
da população rural!
Desde o século XIX, as razões para deixar a sua aldeia não se alteram. São de ordem económica e social.
A terra desempenha um papel repulsivo. No século XIX, os usos comunitários desaparecem, o
artesanato rural resiste com dificuldades face à grande indústria. A extensão das vias de comunicação e a
chegada do capitalismo abrem à agricultura a economia de mercado: os agricultores tornam-se chefes de
empresas que têm a preocupação da rentabilidade. Indubitavelmente, a cidade atrai. Oferece empregos
(o último afrouxamento do êxodo rural é contemporânea da crise económica). O trabalho urbano
desenrola-se num horário fixo e assegura rendimentos não aleatórios. Emigrar para a cidade, é também
promessa de maior liberdade, de lazer abundante e variado, de saídas fáceis. Esta imagem, dada a partir
do fim do século XIX pela escola, pelo serviço militar e pelos jornais, atraiu e ainda atrai os jovens
camponeses.
Estas mudanças no espaço geográfico acompanham-se de profundas mudanças nas actividades da
população.
Perturbações na actividade
Os demógrafos definem a população activa como o conjunto das pessoas com idades de pelo menos 16
anos que exercem uma profissão ou que procuram uma. Devido a definições variáveis, é difícil seguir a
evolução da população activa no século XIX. Poderia ser de 14,8 milhões de pessoas em 1866. O
recenseamento de 1906 dá 21,4 milhões (incluindo a Alsácia-Lorena) e o de 1990 encontra 25,11
milhões (excluindo os militares do contingente). Este crescimento atingirá o seu apogeu em 2003 com
26,6 milhões de activos. O empurrão registado após a Segunda Guerra mundial explica-se com:
- a chegada ao mercado de trabalho das gerações do baby boom;
- a presença de activos estrangeiros vindos aquando dos Trinta Gloriosos;
- a chegada dos "pés pretos": 400.000 activos da Argélia;
- o início das reformas pouco numerosas ( grupos mortos em 1914-1918 e entre as duas guerras).
Durante o século XIX, o emprego feminino conhece fortes variações. Aumenta a partir do Segundo
Império (a parte das mulheres na população activa passaria de 31,4% em 1866 à 38,3% em 1906). Os
transportes, os correios, o comércio e a indústria (sobretudo têxtil) contratam uma mão-de-obra feminina
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enquanto que a domesticidade baixa. A frequência da actividade feminina duplica após a Segunda
Guerra mundial. Existe a influência da legislação social que favorece a manutenção das mães no lar
(subsídio de salário único) e a quase inexistência do trabalho a tempo parcial. As mulheres entram no
mercado de trabalho antes dos 20 anos, fazendo os trabalhos menos qualificados. Param a sua vida
profissional para criar as suas crianças e, aos 40 anos, retomam-na. Mas, depois de uma geração, a
actividade feminina apresenta características radicalmente alteradas. A sua taxa aumenta sensivelmente
(+ 13.6% entre os dois últimos recenseamentos). O aumento da população activa entre 1982 e 1990
deve-se unicamente à chegada das mulheres. As mulheres casadas ocupam um lugar crescente. Contudo,
ainda que cada vez mais profissões se abram às mulheres, não há ainda uma verdadeira mistura de
profissões. Por fidelidade ao seu papel tradicional na família, as mulheres trabalham sobretudo nos
serviços médicos e sociais, na educação (muitas são professoras). Mais frequentemente que no passado,
chegam a postos de responsabilidade (quadros médios e superiores).
Esta subida da actividade feminina resulta de vários factores. O nível de instrução aumenta. O aumento
do sector terciário e o desenvolvimento do trabalho a tempo parcial favorecem o emprego das mulheres.
A chegada da sociedade de consumo e a explosão dos riscos do desemprego levam os casais a procurar
um segundo salário.
Em números absolutos, o crescimento da população activa é inegável. Mas os dados relacionados
oferecem uma outra imagem: 52,1% da população está activa em 1906, 44,3% em 1990. Este
crescimento relativo dos inativos fundamenta-se no envelhecimento e na dimunuição da vida activa que
acontece nas duas extremidades. O alongamento da escolaridade14
faz entrar mais tardiamente os jovens
na vida profissional. Assim, em 1990, 14,9% dos rapazes entre 14 e 19 anos trabalham; eram 42,8% em
1968. Nas idades elevadas, a taxa de actividade cai: a idade da reforma diminui (é fixada nos 60 anos
desde 1 Abril de 1983), as profissões independentes de reforma tardia (agricultores, pequenos
comerciantes) perdem a sua importância numérica, a pré-reforma aumenta ao passar a ser um dispositivo
bastante frequente para evitar despedimentos.
Profundas mudanças sectoriais relativas à população activa acontecem após a Segunda Guerra Mundial.
Durante 80 anos (1866-1946), nenhuma perturbação teve lugar. Certamente, a população activa agrícola
diminui mas continua a ser mais numerosa; o sector secundário progride mas a crise iniciada em 1929
quebra o seu impulso; o sector terciário inicia a sua subida. Em resumo, até 1946 a França permanece
uma república de pequenos produtores e empresários onde a grande indústria se impõe dificilmente. A
mudança torna-se revolução após 1946.
O sector primário desmorona. Interessa hoje a 1,25 milhão de pessoas, mas a concorrência da União
Europeia e os acordos do GATT levam a uma continuação da baixa.
O sector secundário sofre dificuldades económicas, reestruturações e os lucros de produtividade. A
indústria têxtil, em retrocesso desde o início do século, acentua o seu retrocesso (27% entre 1982 e
1990). Os pilares da segunda industrialização (siderurgia, construções navais, construção automóvel)
caem. Alguns ramos progridem: a transformação das matérias plásticas, a tipografia – imprensa –
editoras. A electricidade, os paraquímicos, a metalurgia e a electrónica mantêm-se.
O sector terciário não cessa de progredir: os serviços ocupam hoje mais de dois em cada três activos! O
ensino, a saúde e a administração central representam os sectores mais dinâmicos, enquanto que o
número de empregados e comerciantes diminui. Este empurrão reflecte ao mesmo tempo a subida da
urbanização, o desenvolvimento da sociedade de consumo, a extensão do Estado - providência e da
desindustrialização.
14 um decreto de Janeiro de 1959 torna a escolaridade obrigatória até aos 16 anos.
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Estas rápidas transformações aumentam a parte dos assalariados na população activa (76,5% em 1968 e
86,9% em 1990) e aproximam a França dos outros países ocidentais.
Estes últimos anos são caracterizados por um forte aumento do número de desempregados. Os tempos
mudam... Após a Segunda Guerra mundial, abre-se um período cheio de emprego com uma pequena
vertente de pessoas à procura de emprego (o seu número oscila entre 200.000 e 300.000 pessoas). Em
1968, um primeiro aumento acontece; o governo responde criando o ANPE (Agência Nacional Para o
Emprego). Com a crise, o desemprego aumenta: 3.251.000 pessoas à procura de emprego em Junho de
1995. O desemprego apresenta disparidades:
- sociais. Toca mais às mulheres, aos jovens, aos estrangeiros, às pessoas idosas e menos diplomadas;
- geográficas - as regiões do Norte perdem empregos; o Languedoc-Roussillon recebe migrantes mas
não dispõe de ofertas de trabalho suficientes. A Alsácia é região francesa menos tocada pelo
desemprego.
Os aspectos do desemprego actual são multiformes, o que torna o problema ainda mais complexo. Três
causas essenciais devem ser valorizadas:
1. A questão da mão-de-obra. A tentação é grande em explicar a falta de empregos pelo número
excessivo da população activa. Com efeito, o mercado de trabalho é rígido: os activos franceses são
frequentemente pouco propensos à mobilidade e os empregos oferecidos não correspondem sempre
aos empregos pedidos.
2. A questão dos mercados. Sem dúvida que a procura de produtos é insuficiente. A política monétaria
contem a inflação mas não aumenta o poder de compra. Seria desejável desenvolver a produtividade
e as exportações, mas a crise internacional, o nacionalismo económico reina.
3. A questão do custo do trabalho. As empresas substituem o capital ao trabalho. Para contratar,
reclamam a diminuição das cobranças sociais, a desindexação dos salários.
Perante a diversidade do problema, as respostas são pluridireccionais. Duas séries de medidas são
tomadas relacionadas com:
- o trabalho. Os governos sucessivos esforçam-se em dividi-lo (redução da idade da reforma para 60
anos; duração semanal de 39 horas; trabalho a tempo parcial incentivado) e de torná-lo menos
rígidos (flexibilidade de serviços facilitada). A formação inicial aproxima-se do mundo das
empresas: por exemplo, criação de bacharelatos profissionais;
- o tratamento social do desemprego. São feitos esforços para inserir os jovens no mercado de
trabalho: criação dos TUC (trabalhos de utilidade colectiva) em 1984, dos ESTE (contratos
emprego-solidariedade) em 1990, os contratos iniciativa-emprego (1995). Todos os contratos
banalizam o tempo parcial e cortam os salários. Os mais velhos são empurrados para a vida inactiva
pelo desenvolvimento das apostas em pré-reforma. Um subsídio de desemprego está previsto; é
financiado pelo UNEDIC. Os poderes públicos vêm em ajuda àqueles e aquelas que são excluídas
deste subsídio de desemprego: o RMI (rendimento mínimo de inserção), instaurado em 1988,
abrange 950.000 pessoas em Julho de 1995.
A subida do desemprego custa cada vez mais caro à colectividade nacional. Ela gera também uma
sociedade cada vez mais heterogénea. Perante o trabalho, existem doravante três categorias de pessoas:
as que dispõem de um emprego a tempo inteiro, aquelas (em progressão constante) que ocupam um
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emprego precário ou parcial as e as que não têm nada. Como pode evoluir uma sociedade que não chega
a utilizar as capacidades dos jovens?
A tradição da imigração
A França apresenta outra originalidade: a precocidade da imigração. Enquanto que a Europa alimenta
uma verdadeira onda de emigrantes (sobretudo após 1840), a França é uma terra de acolhimento. É só
depois da Segunda Guerra mundial que a Europa do Oeste recebe imigrantes15
:
Primeiro a Grã-Bretanha, o Benelux, a Alemanha do Oeste e alguns anos depois, da Espanha, Itália,
Portugal e Grécia. A imigração desempenha um papel importante na renovação da população francesa:
"A França de hoje não contaria apenas mais de 45 milhões de habitantes e o crescimento da população
francesa teria sido reduzido quase em metade desde a Segunda Guerra Mundial”. A presença de
mulheres estrangeiras com elevada fecundidade retarda a baixa da natalidade. A chegada de jovens
adultos trava o envelhecimento. Hoje, uma pessoa em cada cinco nascida na França tem pelo menos um
familiar imigrado durante os últimos cem anos.
O contributo demográfico
Num determinado período, existem ciclos de imigração. As fases de afluxos coincidem com o
desenvolvimento da actividade económica. Primeira a grande vaga acontece entre 1851 (menos de
400.000 estrangeiros em França) e 1881 (1 100 000 estrangeiros); é a época da primeira industrialização.
Após a Primeira Guerra Mundial, a economia enfaixa as suas feridas e chama imigrantes cujo número
quase triplica em dez anos (2.700.000 estrangeiros contados em 1931). Com os Trinta Gloriosos, a
imigração recomeça: o recenseamento de 1975 dá 3.440.000 estrangeiros. As fases de estagnação ou de
baixa situam-se em dois períodos de dificuldades económicas (por exemplo 1931-1946). A estabilização
relativa entre 1891 e 1911 (+ 29.700 estrangeiros) é mais aparente do que real, a progressão das
naturalizações esconde a da imigração. O fraco aumento desde 1975 (3.580.000 estrangeiros em 1990)
está ligado à crise económica.
Trata-se por conseguinte de uma imigração de trabalho e não uma imigração de povoamento como nos
Estados Unidos. As relações que ela tem com o movimento natural confirmam este ponto de vista. No
fim dos anos 30, o saldo natural é deficitário e contudo quase 40.000 estrangeiros deixam a França em
cada ano. Após a Segunda Guerra Mundial, o baby boom rectifica a fecundidade mas o ritmo da
imigração recorda o dos anos 20. O movimento migratório tenderia por conseguinte a acentuar os efeitos
dum movimento natural.
Também a população estrangeira é superactiva (a taxa de actividade estabelece-se em 66 %). Esta mão-
de-obra exerce os trabalhos menos apreciados pelos cidadãos franceses. No século XIX, numerosos
trabalhadores imigrados realizam tarefas industriais penosas, frequentemente em condições insalubres
(casos da indústria química). Em 1990, a situação não mudou muito: os imigrantes ocupam sempre a
parte inferior da escala dos ofícios (56% entre eles são operários e 21% empregados). Para a economia
15 O conceito de estrangeiro refere-se a uma situação jurídica susceptível de mudança (o estrangeiro pode tornar-se Francês
por aquisição). O conceito de “imigrante” está baseado numa verdade intangível: ter nascido no estrangeiro. Portanto, um
imigrante é estrangeiro quando chega a França mas este imigrante pode tornar-se um Francês.
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francesa, oferecem as vantagens de uma mão-de-obra formada (por conseguinte pouco dispendiosa para
a Educação nacional), móvel, barata.
Geografias da imigração
Em todas as épocas, uma forte maioria de estrangeiros pertence a um pequeno grupo de diversas
nacionalidades. No século XIX, os imigrantes são Europeus que vêm dos países vizinhos. Os Britânicos,
maioritários na monarquia de Julho, desaparecem face aos Belgas (46,7% dos estrangeiro em 1876)
depois os Italianos (dominantes a partir de 1901). Estas deslocações prolongam as migrações internas.
Como estas últimas, "desenrolam-se numa curta escala e por iniciativa das comunidades rurais ou
artesanais". Nos anos 1880, os poderes públicos começam a canalizar os fluxos migratórios e a tentar
controlá-los em função das necessidades do mercado de trabalho. Após a Primeira Guerra Mundial, o
leque das nacionalidades abre-se à Europa central (os Polacos tornam-se a segunda comunidade
implantada em França) e ao Médio Oriente. Depois da Segunda Guerra, a área de recrutamento orienta-
se para a Europa do Sul (nomeadamente Portugal) e a África do Norte (o Magrebe). A parte das
nacionalidades não originárias da União Europeia cresce constantemente (63,7% em 1990). Os poderes
públicos tentam organizar e planificar as entradas graças ao ONI – Office National de l’Emmigration -
criado em 1945. Mas a lentidão administrativa e as necessidades urgentes da economia originam a
imigração clandestina a partir dos anos 60.
De início, a imigração de vizinhança conduz à instalação de estrangeiros nas zonas transfronteiriças.
Com a chamada da industrialização, os novos recém-chegados fixam-se no Norte e no Leste. Hoje, os
estrangeiros continuam a implantar-se nas regiões industrializadas. Dois em cada três estrangeiros
habitam na região parisiense, Rhône-Alpes ou a Provençe – Côte d’Azur. O outro pólo de implantação é
a grande cidade, susceptível de fornecer empregos.
Esta dupla concentração, espacial e urbana, acentua os riscos de xenofobia.
Os problemas de integração
Os problemas da questão da integração dos imigrantes colocam-se tardiamente. A primeira preocupação
dos líderes da Terceira República é de unificar a nação francesa fazendo recuar particularismos locais.
Em 1879, a república consagrou a sua história com a adopção do 14 de Julho como festa nacional
(recordação da fraternidade do povo francês), da Marselhesa como hino nacional (recordação da luta do
povo francês contra o invasor, ou seja o estrangeiro). As leis de Jules Ferry impõem uma mesma língua,
desenvolvem a instrução, incentivam a divulgação da escrita, facilitam a leitura dos grandes jornais que
participam na homogeneização nacional. O recrutamento obriga cada Francês a defender a sua pátria.
Doravante, há os "eles" (os estrangeiros) e "nós" (os franceses). A questão dos estrangeiros encontra-se
colocada tanto mais que o seu número cresce rapidamente (a barreira do milhão é ultrapssada em 1881).
A Lei de 1889, o "Primeiro Código da Nacionalidade" impõe o jus soli (direito do solo) em detrimento
do jus sanguinis (nacionalidade adquirida por filiação). Concede a nacionalidade francesa aos
estrangeiros que casaram com um Francês, estipula que as crianças filhos de estrangeiros nascidas na
França e domiciliadas no território são na sua maioria francesas, autoriza a naturalização de qualquer
estrangeiro que tenha vivido em França durante pelo menos dez anos seguidos.
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No entanto, o problema dos estrangeiros não está resolvido. Nos períodos de crise, os movimentos
xenófobos reforçam-se. Os estrangeiros são acusados de tomar o trabalho dos Franceses (século XIX),
de criar o desemprego (hoje). São cometidas violências: pelo menos oito Italianos foram mortos nas
salinas de Aigues-Mortes em Agosto de 1893, incêndios e agressões contra lares de imigrantes em
Provençe-Côte d’Azur (anos 80). Estes movimentos xenófobos escondem os sucessos da integração. O
número de naturalizações aumenta desde o fim século XIX: 111.000 pessoas adquiriram a nacionalidade
francesa em 1993. 31.000 Casamentos mistos foram registados em 1992. Quanto mais antiga é a
comunidade, mais fácil é a sua integração. Para ali chegar, os imigrantes devem superar deficiências
escolares, profissionais e culturais. A assimilação também é frequentemente um feito da segunda
geração.
Contrariamente à Grã-Bretanha e à Alemanha (até 1993), a questão da imigração na França é utilizada
para fins políticos. Desde 1945, os poderes públicos hesitam sobre o caminho a seguir. Por razões
económicas e demográficas, a França começa por favorecer imigração famíliar (lei de 1945). Em 1974,
o desemprego cresce; o governo suspende a imigração e concede uma ajuda ao regresso. Os socialistas
regularizam a situação dos imigrantes clandestinos e tornam possíveis os reagrupamentos familiares (lei
de Outubro de 1981). Perante a subida da extrema-direita que faz de imigração o tema central das suas
campanhas eleitorais, os líderes políticos moderados propõem medidas mais severas. Assim, o governo
Balladur, procedente das eleições legislativas de Março 1993, promete uma "imigração zero". A
aquisição do cartão de cidadão torna-se mais difícil; os reagrupamentos familiares só são autorizados
após dois anos de residência e são proibidos aos que são polígamos e aos que não dispõem de recursos
suficientes. Este mecanismo completa uma nova lei sobre a nacionalidade francesa votada em Julho de
1993. As regras de atribuição, que definem os Franceses de nascimento, não são alteradas no conteúdo:
qualquer pessoa nascida com pelo menos um familiar francês ou nascida em França com, pelo menos,
um parente ele mesmo nascido em França, é francesa. Estas são as regras de aquisição de nacionalidade
que se encontram algumas vezes alteradas. A nacionalidade francesa adquire-se por naturalização, por
declaração (o casamento misto concede a nacionalidade apenas após um prazo de dois anos de vida
comum), por reintegração (casos das pessoas nascidas nos territórios ultramarinos que se tornaram
independente), por efeito colectivo (a aquisição da nacionalidade francesa pelos pais já não se estende às
crianças menores). As crianças nascidas na França de dois pais estrangeiros são estrangeiras. Não têm
possibilidade de passar a ter automaticamente a nacionalidade francesa na maioridade. A nova lei exige
deles uma declaração a subscrever entre os 16 e os 21 anos. A aquisição da nacionalidade francesa passa
por conseguinte por uma diligência voluntária.
A questão da imigração continua actual. Qual o caminho a escolher? O caminho da integração não é
fácil: a religião, as mentalidades, os costumes, hoje a maneira de viver o dia-a-dia das maiorias
imigradas é diferente da dos Franceses e mesmo dos imigrantes europeus de ontem. A via da exclusão
arruinaria a imagem da França e não resolveria em nada as dificuldades económicas e sociais. Nenhuma
solução encarada recolheria a aprovação unânime dos Franceses. Uma solução pede certamente tempo,
paciência e tolerância. Ou, para evitar qualquer aumento xenófobo, seria necessário uma resposta
urgente.
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Uma população envelhecida
A realidade da idade alterou-se profundamente. Os sexagenários de hoje não se assemelham aos do
século XIX. Podem esperar viver muito mais tempo e melhor, o seu ambiente familiar alterou-se. Apesar
disso, os historiadores e os demógrafos continuam a reflectir em relação às pessoas idosas de 60 anos e a
avaliar a importância do envelhecimento. Este fenómeno observa-se facilmente numa pirâmide das
idades. Uma base estreita e um vértice pesado indicam que as jovens gerações não são numerosas,
contrariamente às mais velhas.
Quadros da página 75
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QUESTÕES
- Observe as pirâmides: porquê a escolha das datas? Qual é a origem dos dados?
- Descreva e compare o comportamento geral das pirâmides (forma, distribuição de acordo
com o sexo, regularidade). Tratam-se de populações jovens?
- Analise o detalhe: procure as "classes cheias" e as "classes ocas", avançe com hipóteses
explicativas.
A precocidade do envelhecimento
Até à Segunda Guerra mundial, o motor do envelhecimento é a baixa fecundidade. Esta reduz a
alimentaçao da base da pirâmide e por conseguinte diminui a proporção dos jovens (envelhecimento
pela base). A baixa da mortalidade beneficia em primeiro lugar os jovens (ver a queda da mortalidade
infantil após 1890) e, por conseguinte, aumenta o seu número. Hoje, após uma fase de rejuvenescimento
(baby boom) a população envelhece de novo. Certamente, a redução da fecundidade é importante mas é
o retrocesso da mortalidade das pessoas idosas que desempenha um papel primordial (envelhecimento
pela parte superior). Os ganhos obtidos na luta contra a baixa da mortalidade infantil têm mais um efeito
marginal para o prolongamento da esperança de vida.
Nos anos futuros, este envelhecimento virá por certo a acentuar-se. O alongamento previsível da duração
da vida humana e a chegada das classes pleines nascidas após 1945 conduzem um papy boom. As
projecções prevêem no futuro em 2040 entre 2 e 2,5 milhões de pessoas que têm 85 anos e mais; eram
200.000 em 1950!
O envelhecimento é muito desigual de acordo com as regiões, e os desvios aumentam desde 1975. Uma
menor fecundidade, um êxodo rural que leva os jovens, o regresso ao país para passar dias calmos na
reforma faz com que a França do Sul, enrugada, se oponha à França do Norte.
O envelhecimento da população francesa está estreitamente ligado à transição demográfica. O controlo
da fecundidade marca o seu início; é quase dizer que neste domínio, existe uma precedência francesa.
Na véspera da Primeira Guerra mundial, as pessoas idosas de 65 anos ou mais representam 5% da
população inglesa ou alemã; a França atingiu esta percentagem um século e meio mais cedo. Em 1946,
as proporções aproximam-se. Foi necessário meio século para que na Alemanha e na Inglaterra a fatia
das pessoas idosas passasse de 5 para 10% da população total. Por conseguinte, o envelhecimento da
população francesa é caracterizado pela sua precocidade e regularidade.
A questão das reformas
A França escolheu o sistema de reforma por distribuição, o que significa que os contribuintes (ou seja os
activos) pagam as pensões das pessoas que os precederam no mundo do trabalho. Mas o crescimento do
número de pessoas idosas, por conseguinte reformados, desestabiliza a relação contribuintes-
reformados. Este quociente diminui consideravelmente durante estes últimos anos, mas o pior está para
vir. A chegada à idade da reforma das gerações baby boom inflaccionará o denominador enquanto que o
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numerador crescerá ligeiramente antes de diminuir. A relação número de activos/número reformados
que é actualmente de 2,5 passará para 2 em 2005 e para 1,5 em 2040. Então, que fazer?
A primeira possibilidade e a mais tradicional das possibilidades é recorrer ao financiamento das
reformas. Duas possibilidades são propostas aos poderes públicos:
1. Aumentar as contribuições dos activos. Mas este corte tem limites: no estado actual, para fazer face
ao papy boom, seria necessário proceder a um aumento de 50 para 80 %. Trata-se que a margem de
manobra não pode ser avaliada porque depende em grande parte da evolução económica, difícil de
prever sobretudo a longo prazo. Um aumento da produtividade, um crescimento económico
sustentado permitiriam suportar um aumento das contribuições.
2. Reduzir as prestações. A medida é politicamente delicada para tomar: Seria necessário uma redução
compreendida entre um terço e metade! Esta baixa é parcialmente possível, por pequenos toques,
fragmentada por sectores. Doravante, no sector privado, o cálculo da pensão far-se-á sobre os vinte e
cinco melhores anos (e não sobre os dez melhores).
A segunda possibilidade é restringir o número de reformados. Para o efeito, um governo pode decidir
aumentar a idade da reforma. Mas será politicamente possível? É verdade que os jovens de hoje
chegarão aos 60 anos sem terem começado a sua vida activa aos catorze anos. As gerações ascendentes
poderiam por conseguinte compreender um aumento da idade da reforma mas aceitariam prolongar o
seu período de actividade sete a nove anos como seria desejável? A solução consiste em não atacar a
questão de frente. Duas possibilidades começam a ser exploradas:
- aumentar o número de anos de trabalho que permitem beneficiar de uma reforma à taxa máxima. O
sector privado desliza para os 40 anos de contribuição (160 trimestres) num fundo de pensões, em
vez de 37,5 anos (150 trimestres);
- desenvolver uma actividade a tempo parcial para além da idade da reforma. Esta medida teria um
duplo efeito: aumentar o volume das contribuições e diminuir o volume das prestações.
A terceira possibilidade consistiria em aumentar o número dos contribuintes, ou seja, dos activos
ocupados. Isso significa o retrocesso do desemprego (mas a curto e médio prazo não há motivos para
optimismo) ou um emprego crescente das mulheres (mas não seria actualmente em detrimento da
fecundidade?).
A quarta solução é rever o sistema das reformas. Certamente, começam a desenvolver-se as reformas
por capitalização. Antes de tudo, a distribuição e a capitalização são dois sistemas contrários. Um
descansa sobre a solidariedade, o outro valoriza o indivíduo. Com efeito, uma complementaridade é
possível e desejável. Por um lado, manter o sistema de distribuição, é participar num esforço de
solidariedade e é ter o sentimento de pertencer à comunidade nacional. Por outro lado, com a ajuda de
uma fiscalidade vantajosa, é possível subscrever as contribuições dos dois tipos de reformas. Actual
PER (Plano poupança reforma) que sucedeu em 1986 ao PEP (Plano de poupança popular) é uma
primeira medida.
A escolha não deverá ser efectuada dentre estas quatro propostas. As reformas a fazer estarão
provavelmente expostas a qualquer uma das orientações apresentadas.
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Os desafios do envelhecimento
O envelhecimento representa um triplo desafio: social, económico e ideológico. A questão do
alojamento das pessoas idosas põe-se sobretudo para a população com mais de 75 anos porque é a partir
desta idade que começam a existir os problemas de dependência. Os representantes da quarta idade
vivem muito pouco em comunidade, uma vez que apenas 12% entre eles adoptam este modo de
alojamento. As estruturas de acolhimento medicalizam-se porque as pessoas que entram na instituição
frequentemente perderam a sua autonomia, necessitam de cuidados e assistência. A solução alternativa
às pequenas unidades integradas nos locais é o apoio ao domicílio. A utilização da electrónica e o
desenvolvimento da domótica podem facilitar esta permanência em casa.
Sob pena de reservar estes alojamentos aos titulares de rendimentos elevados, não é socialmente
desejável deixar de financiar estes serviços pelos utilizadores. Desde 1982, a descentralização confia aos
departamentos a responsabilidade dos serviços médico-sociais. Um departamento tem a possibilidade de
receber ajudas eventualmente dos contratos de objectivos com o Estado. Mas a construção das estruturas
de acolhimento exige pesados investimentos que farão aumentar a fiscalidade local. Dois efeitos
secundários podem acontecer. O primeiro seria a criação de uma ajuda social diferenciada de acordo
com os departamentos. O segundo veria as cobranças fiscais aumentar excessivamente, o que levaria
empresas a procurar céus mais clementes; a partida de pessoas activas acentuaria então o
envelhecimento. O que está certo, é que a ajuda à velhice é um jazigo potencial de empregos: ajudas
domésticas, enfermeiros...
O envelhecimento afecta também o consumo e a poupança. Pensar que a idade da reforma é a do
consumo e não o da poupança é falso. Hoje, as pessoas idosas poupam mais que os jovens. Detêm
frequentemente um património que gerem às vezes de maneira timorata. Devido a uma longevidade
acrescida, a descentralização destes bens intervêm tardiamente, de modo que o património recebido pelo
herdeiro venha a arredondar uma fortuna e não a ajudar à sua constituição.
O consumo muda. Centra-se na esfera doméstica e da saúde. O equipamento da casa é melhorado, os
jornais e as revistas são copiosamente folheadas em detrimento da compra de aparelhos electrónicos e de
vestuário. As despesas de saúde aumentam mas selectivamente: o médico não especialista e o
enfermeiro são mais consultados enquanto que as análises médicas, as radiografias, as massagens são
menos pedidas. Assim, contrariamente ao que é frequentemente afirmado, o envelhecimento não
provoca um forte crescimento das despesas de saúde.
Questões ideológicas estão também em causa. Frequentemente o envelhecimento e o declínio estão
associados. O debate aparece no fim do século XIX. Opõe "néomalthusiens" e os "populationnistes". Os
primeiros preconizam a contracepção "no interesse das famílias, no interesse das crianças, no interesse
dos trabalhadores, no interesse das mulheres". Alguns entre eles chegam até a desejar uma "greve dos
ventres", o que privaria o capitalismo de trabalhadores e o exército de soldados. Os populationnistes
filiados na Aliança nacional para o crescimento da população francesa (criada em 1896 por Jacques
Bertillon) lançam campanhas contra a diminuição da natalidade. O seu discurso intensifica-se e
endurece-se entre as duas guerras: « Não ter voluntariamente um único filho é um crime contra o Estado
e a Sociedade mas também contra a própria criança». Assim, a noção de envelhecimento carrega-se de
um aspecto negativo e torna-se a nova arma de propaganda dos natalistas. Até 1880, o envelhecimento
tranquiliza: testemunharia progressos realizados na longevidade dos homens e das mulheres. No século
XX, consequência da diminuição da natalidade, preocupa. As suas consequências negativas são
desenvolvidas abundantemente pelos natalistes: a um país envelhecido falta entusiasmo e ideias; ele
excita o desejo das nações jovens e potentes; impede o pagamento de reformas suficientes. O discurso
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que diz respeito a cada indivíduo é eficaz e deixa vestígios no debate actual. Assim, Jacques Vallin
propõe que o montante da reforma seja ligado ao número de filhos criado.
CONCLUSÃO
Demograficamente, a época contemporânea distingue-se das precedentes: o homem consegue ao mesmo
tempo controlar melhor a sua mortalidade e a sua fecundidade. Neste contexto, a França segue um
caminho singular.
Até à Segunda Guerra Mundial, a sua população aumenta graças aos ganhos sobre a mortalidade. Se a
França se distingue, é pelo declínio precoce e rápido da sua fecundidade. Actualmente, é o único país no
mundo a contar menos nascimentos agora que há dois séculos.
A partir de 1945, acontecem profundas mudanças. A Europa junta-se à França: a sua fecundidade
desmorona, torna-se terra de imigração, a sua população activa ocupa cada vez mais empregos
terciários. Mas os mesmos problemas colocam-se ao conjunto da Europa Ocidental. Mas, na ausência de
uma política demográfica comum, compete a cada país definir as suas prioridades. Como no século XIX,
os dirigentes procuram satisfazer os seus eleitores. Também os problemas ligados à imigração e as
pessoas idosas os preocupam. Por exemplo, desde 1960, em valores médios, as despesas públicas
relativas à velhice multiplicam-se por seis, as relativas à maternidade por dois. Estas duas questões têm
uma resposta comum: a retoma da natalidade. Com efeito, mais nascimentos atenuariam a prazo o
envelhecimento. A experiência mostra que os imigrantes são aceites mais facilmente e assimilados em
populações com uma fecundidade satisfatória. Um aumento demográfico teria incidências positivas na
economia, a questão estender-se-ia à criação de empregos. Mas que fazer para incentivar a natalidade?
1. Reequilibrar os fluxos financeiros. Hoje, as famílias jovens com crianças estão financeiramente em
desvantagem enquanto que os reformados sem crianças são favorecidos. A solidariedade entre
gerações vai dos activos para os reformados; esta solidariedade deve ter duas vias, deve ser
retribuida. De uma forma mais geral, a sobretaxa dá trabalho e a sub-imposição do capital
incentivam a substituição de capital por trabalho, que é gerador de desemprego e que mantêm um
clima pouco favorável a uma natalidade brilhante. Sem dúvida, a pressão financeira deverá ser
repartida mais equitativamente e não conviria incentivar fiscalmente a população a ter mais filhos do
que a ter mais poupanças?
2. Ajudar os pais, e particularmente as mães. Mandar as mulheres para casa seria uma falsa solução; o
futuro não é o regresso ao passado. É necessário dar tempo às mães, o que exige a criação de
infantários e jardins-escolas, horários flexíveis, licenças parentais remuneradas, adaptações nas
carreiras profissionais (actualmente, os perfis são traçados para e pelos homens).
Tal política teria possibilidades de ter êxito porque - os inquéritos recentes atestam-no - o desejo de ter
filhos ainda existe.
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ORIENTAÇÕES DE REFLEXÃO
- A especificidade francesa vem de uma baixa precoce e rápida da fecundidade. Trata-se de um
fenómeno regional, o que impede de dar uma interpretação global a esta particularidade. Também
poder-se-ia aprofundar a questão efectuando um estudo sobre a geografia da primeira revolução
contraceptiva.
- A baixa da natalidade provoca o envelhecimento da população. O assunto é actualmente muito
debatido e centrado no problema redutor das reformas. Para ter uma visão mais global da questão,
poder-se-ia estudar os aspectos e as consequências do envelhecimento.
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CAPÍTULO 3 – A CHEGADA DO CAPITALISMO INDUSTRIAL
O problema da chegada do capitalismo industrial à França põe-se em termos quase ideológicos. Este
começou antes da Revolução francesa ou graças à Revolução, quem terá tido o mérito de fazer
desaparecer a velha ordem feudal, e assim facilitar o estabelecimento de um novo sistema económico e
social?
Falso debate, porque se constata a existência de um capitalismo comercial desde o século XVIII, não há
dúvida que a revolução industrial se opera ao longo do século de XIX. Vamos examinar sucessivamente
as razões da revolução industrial, depois então descrever o seu progresso.
As Premissas da Revolução Industrial
Algumas são na realidade velhas e anteriores ao século de XIX. No fim do Antigo Regime, produziram-
se, em França, um certo número de evoluções que não hesitaremos em qualificar como revolução.
Distinguiremos então:
— a evolução agrícola;
— a evolução demográfica;
— a evolução de mentalidades;
— o nascimento do capitalismo comercial prelúdio para o capitalismo industrial.
A evolução agrícola
Houve uma revolução agrícola em França? Os historiadores e economistas confrontam-se com isso há
muito tempo. Alguns, como Jean-Claude Toutain, constataram que, a longo prazo, o produto agrícola
francês tinha aumentado, e isto a partir da segunda metade do século XVIII: de 0,3% de 1700 a 1750
para 1,4% de 1750 a 1780. Da mesma maneira as produções cerealíferas teriam aumentado (de 6/1 a
8/1). Outros insistiram no desenvolvimento de novas culturas (milho, batatas) ou na introdução de novos
tipos de leguminosas (uso da alfafa, de nabos), outros enfim em recuperações, encorajados pelos éditos
reais (1761 e 1764). Hoje, com a controvérsia passada, concorda-se num certo número de pontos.
Certo é que, como mostrou Michel Morineau, não houve «revolução agrícola». As produções tiveram
pouco aumento, e as recuperações empreendidas nas terras marginais foram limitadas e precárias. Se
Saint-Jacob as estimou em 10% da superfície agrícola na Borgonha do norte, no Midi (Sul) de Toulouse,
Gascogne e Quercy, raramente ultrapassam 2 a 3%. Weuriesse também tinha mostrado, tal como J.
Estrague, que era moda exagerar este crescimento agrícola. Durante a segunda metade do século XVIII,
toda a gente discutia agronomia, a ponto de Voltaire falar «de agromania».
Porém, também seria um erro não levar em conta a soma do pequeno progresso registado. Se o esquema
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de Rostowien (o progresso agrícola graças a uma produtividade aumentada gera o êxodo rural e oferece
à indústria nascente uma abundante e boa força de trabalho) parece muito mecânico, não nega pelo
menos, que os campos registaram algum progresso. Se as ferramentas pouco evoluiram, os métodos de
cultura permitem, especialmente na França do Norte, rotações mais espaçadas. Quanto à França do Sul,
mantém-se agarrada à rotação bienal, porque tem melhor solo, culturas e clima. É certo que o milho não
foi descoberto no século XVIII, mas a sua difusão faz-se na Aquitaine e Gascogne na segunda metade
do século XVIII; porém oferece produções superiores ao trigo e permite assim a criação de pequenos
animais. As recuperações não são importantes, mas qualquer ganho marginal numa agricultura frágil
pode ter efeitos que a tornem menos-mal. No total, algo aconteceu nos campos franceses. Disto são
testemunho, as numerosas sociedades de agricultura que se criaram e se apaixonaram pela pesquisa
agronómica. A descoberta das receitas do agrónomo britânico Jethro Tull, mesmo que elas se venham a
provar ser erróneas, encorajou a prática de lavouras frequentes e o uso intensivo dos adubos naturais.
Marc Bloch constatou que aquele progresso tinha sido lento, mas não negou a sua existência. Em
resumo, Emmanuel Le Roy Ladurie avançou para a hipótese, de que uma melhoria climática teria
encorajado as colheitas.
Este progresso na agricultura teve algumas consequências demográficas importantes, e neste domínio
também o debate foi animado.
A evolução demográfica
No século XVIII, a França conhece um crescimento da sua população acima dos sete milhões de
habitantes. Com vinte e sete milhões de habitantes torna-se o país mais povoado da Europa.
Mais uma vez se fala novamente, de «revolução demográfica». Ela era devida à transformação das crises
demográficas. Até meio do século de XVIII, periodicamente, o país é abalado por crises, ou por
epidemias (a última peste na França data de 1720), ou por crises alimentares motivadas pela escassez.
Estas crises são caracterizadas por uma mortalidade forte, uma diminuição de nascimentos e
matrimónios e fenómenos de população errante como consequência de fortes deslocamentos de
populações. A população volta ao patamar de vinte milhões de habitantes recuperando um equilíbrio
precário, rapidamente abalado por uma nova crise. De uma maneira geral o país conhece uma
demografia natural.
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, J. Meuvret notou uma evolução no que respeita a estas crises
económicas de tipo antigo. A crise parece menos forte: não mata, mas empobrece. Numerosos estudos,
tanto na França do Norte como na França do Sul, permitiram verificar uma diminuição da mortalidade
infantil (a Norte) ou juvenil (a Sul). A peste foi extinta e a varíola controlada, graças à descoberta da
vacina de Jenner, em 1796, as grandes epidemias ficam mais raras. Uma legislação duradoura, que
também ordena a detenção em enfermarias dos mendigos, limita a sua propagação. O progresso
apreciável em matéria de higiene também para isso contribuiu. Em suma, uma alimentação mais
abundante e mais variada opõe-se à doença do corpo e, cria mecanismos de auto-defesa. Por
conseguinte, nota-se um aumento progressivo da esperança de vida, que do ponto de vista da aura das
mentalidades cria um efeito importante.
Mas o fenómeno essencial é a aparição de comportamentos demográficos novos. A França é, com efeito,
o primeiro país europeu a praticar o controle voluntário de nascimentos. A idade da mãe na altura do
nascimento do seu ultimo filho, que era até então de cerca de quarenta anos, baixa em certos meios, tal
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como na aristocracia e na classe média. Não há nenhuma dúvida que algumas mulheres exercem, daqui
em diante, um certo controlo na taxa de natalidade. Da mesma maneira os intervalos entre nascimentos
(intervalos inter genésicos) não correspondem mais aos intervalos normais de demografia natural: as
mães controlam os nascimentos até um óptimo desejado. Tudo isto revela o recurso a métodos de
limitação voluntária de nascimentos. «Os segredos fatais» chegam ao campo, ou os franceses tiveram o
sentimento de uma sobre-população ( «um mundo cheio», de acordo com a fórmula de Pierre Chaunu),
ou o predomínio das proibições religiosas diminuíram. Em todo o caso é à interrupção do coito (crime
de Onan) que as populações recorrem, enquanto começa a entrada da França na era demográfica
moderna. A Revolução Francesa apressa esta tendência de acusar a descristianização, como se
testemunha no desrespeito pela proibição religiosa com respeito às datas dos matrimónios (proibidos
durante o Advento e a Quaresma). De uma maneira geral, o século de XVIII marca-se por uma nova
visão do lugar do homem na terra. A passagem neste mundo deixa de vestir este aspecto fugitivo,
passageiro, efémero e simples momento, que prepara a vida futura, ou seja a vida eterna, para merecer
que se consagre mais interesse em ter um lugar essencial. Consequência do aumento da esperança de
vida, da melhoria, também, das condições de vida, tudo isto aliado resulta numa revolução de
mentalidades.
A evolução de mentalidades
O século XVIII devolve o céu à terra e, neste sentido, opera uma laicização de mentalidades. De alguma
forma suportado pelo utilitarismo inglês, a França descobre por sua vez que o homem não está só na
terra para preparar a sua salvação. Saint-Just proclamou: «felicidade é uma ideia nova na Europa!»
Este fenómeno verifica-se em paralelo com a evolução do pensamento económico. Até agora
influenciados pelo mercantilismo, os Estados tinham tendência a ‘voltar-se para dentro’ em nome de um
proteccionismo ansioso de uma balança comercial excedentária que só deveria permitir a acumulação de
metais preciosos.
Em meados do século XVIII, o movimento fisiocrático triunfa na França. A «seita», com teóricos como
Quesnay, Gournay, Mercier de la Rivière, Mirabeau, Dupont de Nemours, mas também com praticantes,
como Turgot, produz uma mudança completa no pensamento económico. Em nome da libertação da
terra, única fonte de riqueza (de concessão livre), eles preconizam as medidas que deverão causar o
nascimento de um individualismo agrário. Assim recomendam o abandono da servidão feudal
(nomeadamente da tarefa ou da milícia), a partilha das comunidades e proclamam uma nova concepção
do direito de propriedade simbolizada pela cerca das terras. Ao aldeão de comunidade eles opõem uma
propriedade individual absoluta, liberta de todas as funções sociais. Partidários da livre troca, querem
um Estado o menos intervencionista possível, e confiam nas leis naturais do mercado para regulação da
economia. Esta doutrina teve um grande sucesso. Encontra-se, por exemplo, na Enciclopédia de Diderot
e Alembert, e iria marcar o pensamento dos homens da Revolução francesa. Finalmente, ela inspirará
fortemente o pensamento liberal (nomeadamente por intermediário de Adam Smith) que iria dominar o
século XIX. Sobretudo e pela primeira vez, este pensamento marcará uma ruptura com as concepções
Cristãs que tinham até então prevalecido. Contando que a explicação de Max Weber seja verdade,
segundo a qual o Protestantismo encorajou a eclosão do capitalismo, não é menos verdade que, na
França do século XVIII, o Catolicismo, daqui em diante, deixa de ser um obstáculo.
Esta evolução acontece em paralelo com o retroceder do analfabetismo. Em 1780, a França não tem
mais que 60% de analfabetos. Assim, um número crescente de adultos alcança a leitura autónoma,
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despertando para a curiosidade, para o gosto da técnica vertida pelos livros, a brochura e o jornal. Disto
resulta um aumento de interesse pelas técnicas ao mesmo tempo que a iniciativa individual se refina.
Resulta, especialmente, a aparição de uma nova classe de homens empreendedores, motivados pela
pesquisa do lucro material. Deste modo constitui-se uma classe média, já frequentemente, aliada à
nobreza que, em França, ao contrário do que tem, muitas vezes, sido dito, não hesita em participar no
mundo dos negócios.
Claro que a Revolução e o Império iam apressar o processo. Enriquecido pela compra de bens nacionais
e dos fornecimentos aos exércitos, uma nova classe média emerge, a qual se alia a armadores e mestres-
ferreiros do Antigo Regime. Os direitos humanos e o Código Civil que libertam o indivíduo e a sua
propriedade, retira a actividade económica do velho sistema feudal que ainda não tinha morrido. Em
1791, a lei de Le Chapier proíbe toda a reacção colectiva, e completa um quadro legal favorável ao
crescimento capitalista. Todas estas condições vieram encorajar o advento do capitalismo comercial, ele
mesmo o precursor do capitalismo industrial.
O capitalismo comercial
O crescimento comercial e industrial na França no século XVIII depende de vários factores.
Primeiro da abundância monetária. Considerando que o século anterior tinha suportado uma deflação, a
produção de metais preciosos entra no século XVIII numa nova fase de actividade. Até 1740, ouro chega
especialmente da China, depois do Brasil, e isto até 1790. Pierre Léon estima que de 1720 a 1790, a
reserva mundial aumentou mais de 100%. Quanto á prata, é especialmente o México que a fornece em
quantidades crescentes, graças à descoberta de novos filões no Norte e à utilização de técnicas mais
aperfeiçoadas. No stock mundial verifica-se uma duplicação. Não devemos esquecer o desenvolvimento
do papel comercial, do qual falaremos a propósito do crescimento das técnicas comerciais.
A isto é necessário somar o grande facto que constitui o restabelecimento da estabilidade monetária. Na
França, o Édito de 1726, põe definitivamente fim ao longo período de mutações, estabelecendo uma
espécie de bimetalismo que se perpetuará até a Revolução, na base da moeda de ouro e os escudos de
prata. A consequência essencial será a grande subida dos preços que se operam no século XVIII e que
afecta todos os países europeus. Na França, é notável que a impulsão acontece em 1733. «São tempos de
lento crescimento, a decolagem difícil após a estabilização da moeda», escreve Ernest Labrousse. Vem
de seguida uma lenta ascensão que se prolonga durante um quarto de século, até 1763. O grande ímpeto
acontece nos dias seguintes à guerra, em seguida uma etapa de 1775 a 1780, antes que os preços caíssem
em 1788.
Outro factor do crescimento do capitalismo comercial reside nas políticas de comunicação e no
desenvolvimento de mercados. A este respeito, o pensamento fisiocrático, que recomendava um
desenvolvimento de trocas, contribuiu em muito na promoção destas políticas. Realmente, tanto o
comércio terrestre como o comércio marítimo têm um crescimento real.
A realização de um verdadeiro mercado requer progressos nas comunicações. Em 1660, um impulso
parte do poder central (Colbert). Esta política será compreendida e seguida no século XVIII. Os grandes
“intendentes”, como Orry e Trudaine, criam em 1747, a Escola de Engenheiros de Pontes e Pavimentos.
A “corvée”, (forma de trabalho gratuito que o servo devia ao seu senhor) estabelecida em 1738, para a
construção de estradas, é abolida em 1776 por Turgot e é substituída por um pagamento em dinheiro; ela
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é restabelecida após a sua queda, até ser definitivamente abolida em 1787. A evolução do orçamento das
Pontes e Pavimentos explica bem o esforço feito na época
1700: 771 200 libras
1715-1736: 3 000 000 libras
1770: 4000000 libras
1780: 6 900 000 livres
1786: 9 445 000 libras, ou seja temos no século XVIII, um crescimento de 213,3 %.
Da mesma maneira a técnica de estradas melhora: fortes substruturas assentes num solo de lastro e
pedregulhos, cobertas por uma camada arenosa, ligeiramente arredondada, de lado valetas, e sombreadas
por linhas de árvores. Também, desde 1750, Voltaire pouco dado a complacências, elogiou as estradas
francesas «merecedoras da Antiguidade», por seu lado, o viajante inglês Arthur Young estabeleceu uma
comparação com estradas do seu país, com a vantagem para as de França.
Nota-se, também, uma melhoria das vias fluviais, em 1789 a França dispõe de 40.000 quilómetros de
estradas, mais 1.000 quilómetros de canais, aos quais se somam 8.000 quilómetros de vias fluviais.
Contudo, o transporte permanece bastante lento, conferindo aos negócios um ritmo particular.
Acontecem variações muito grandes. Assim, entre Rouen e Paris, a subida requer em média doze dias,
mas tanto pode chegar a dez dias como ser necessário um mês. Depende do vento, do nível de água, de
congelação... Porém em geral produz-se uma certa aceleração.
De 1756 a 1786, por exemplo, ganham-se oito dias na viagem Paris-Toulouse que passa a requer oito
dias, considerando que antes eram necessários dezasseis. Todos estes progressos conferem ao mercado
interior, uma actividade maior, sendo disso testemunha o arrendamento de Estações (sinal óbvio de
relações múltiplas), passa-se de 1676 a 1777, um século, de 1.200.000 libras para 8.800.000 libras. Ao
mercado nacional, é especialmente preciso somar a intensidade das trocas inter-regionais e locais, que
são essencialmente de trigo e vinhos (depois virão os tecidos e o carvão). As grandes feiras
testemunham a intensidade destas trocas, com as feiras de Paris ou de Beaucaire.
Ao desenvolvimento do comércio terrestre é necessário somar o desenvolvimento do comércio
marítimo. O crescimento da frota francesa testemunha o crescimento deste comércio:
1664:· 350 navios
1683:· 550 navios
1704:· 700 navios
1743:· 1 943 navios
1787:· 5268 navios
Nunca o poder naval francês esteve tão perto do da Inglaterra (730.000 toneladas contra 890.000). Entre
1716-1720 e 1784-1788 o comércio externo francês aumentou 567%, progressão impressionante e
superior ao da Inglaterra.
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Os eixos deste comércio são:
— o Levante que representa 30% do tráfico francês. Trocam-se lençóis do Languedoc por algodão,
óleos, mas também trigo com a Barbarie. Este comércio é dominado pelos Provençais e pelos
Languedocienses, e sofre a concorrência da Itália do Sul e a Espanha oriental;
— o comércio do Norte (5 a 7%). Ele é fundamental para o armamento naval (madeira, linho, piche,
ferro, chumbo, contra sal);
— o comércio oceânico. É muito importante: 60 a 65% do tráfico. Faz-se em direcção às Ilhas
(Guadalupe, Martinica e especialmente São Domingues).
Este comércio está ligado ao desenvolvimento da cana do açúcar, e a partir de 1730, ao café. O tráfico
de escravos é um complemento importante para este comércio. Os portos do Oceano Atlântico, e
especialmente Bordéus e Nantes, organizam este comércio triangular. Carregado de bugigangas, os
navios deixam a França em direcção ao golfo de Guiné. Lá, eles trocam os seus bens por escravos que
revenderão na América por troca de algodão, de açúcar, de rum, de baunilha, de café... que trarão
finalmente de volta ao porto de saída. Nota-se também um progresso real com respeito à segurança,
como testemunham as despesas de seguro que, para uma viagem simples, é de 4 a 5% do frete e desce
no final do século para 1 a 2%. De igual forma constatam-se também, ganhos relativos à duração das
viagens. Mas não são só os mercados que se desenvolvem, pode-se notar também o progresso das
técnicas comerciais.
No século XVIII, assiste-se à modernização da estrutura bancária. Mais atrasado na França que na
Inglaterra ou nos Países Baixos, aparece, em 1776, com a criação da Caixa de descontos que prefigura o
Banco de França criado em 1800 por Bonaparte. Reforçada em 1778 por Necker que a põe nas mãos dos
grandes banqueiros de Paris, a Caixa de descontos tem grande sucesso até a Revolução.
O desenvolvimento do uso da letra de câmbio ia permitir um recurso mais frequente ao crédito.
Paralelamente assiste-se ao crescimento da actividade accionista na Bolsa. O mercado de valores de
Paris, nascido na rua de Quincampoix, subsiste depois do fracasso de Law, rua de Vivienne (1724).
Sobretudo, multiplicam-se as sociedades por acções, certamente menos numerosas que as sociedades de
pessoas, mas que oferecem á nobreza a oportunidade para participar nos negócios.
Todo este progresso não pode esconder que o essencial dos capitais provenientes do capitalismo
comercial é investido na compra de escritórios e de terras símbolos de poder social. Seria contudo
exagerado concluir que este crescimento comercial não teve efeito no desenvolvimento industrial.
Certamente, permanecem efeitos:
— a metalurgia medíocre que sofre de falta de combustíveis, florestas são devastadas, e a produção de
carvão, embora progrida (600 000 toneladas em 1789), permanece insuficiente;
— a falta de matérias-primas: se o cânhamo e o linho são providos pelo mercado nacional, é por outro
lado necessário importar lã (a Espanha, Barbarismo...) apesar da existência de um rebanho de 20
milhões de ovinos em 1789, e de algodão (a América e Levant);
— a produção está extremamente espalhada: a concentração em nebulosa prevalece sobre a
concentração em conjunto. O trabalho faz-se frequentemente em casa, fora de temporada ou depois dos
trabalhos no campo, antes da recolha para a fabricação;
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— o Mercado interno permaneceu a saída principal, o que será por muito tempo uma característica da
economia francesa;
— a iniciativa pública permanece importante e continua dominada pela tradição colbertista. O estado,
através das suas ordens, através das tarifas protectoras, pelo privilégio que ele concede de subtrair uma
indústria recém-nascida aos constrangimentos corporativistas, está presente em todos os lugares. Existe
na França um verdadeiro partido industrialista que confere ao capitalismo francês a originalidade da sua
especificidade.
— a invasão corporativa também é um impedimento que só desaparece em 1776 com a abolição das
corporações;
— Finalmente, o grande instrumento ainda é muito a força humana. Em 1771, o subdelegado de
Thiviers na generalidade de Bordeaux escreve: «a maioria dos fundidores e ferreiros trabalha sem
princípios; eles não têm mais que a rotina por guia; se o seu trabalho tiver sucesso, é resultado do acaso;
a sua ignorância obriga frequentemente a jogar fora, quer dizer a parar a fundição». Os ritmos de
trabalho são portanto muitas vezes muito lentos. Eles dependem dos caprichos da água, dos trabalhos de
campo… No entanto, é este capitalismo comercial que está na origem dos primeiros progressos
industriais.
O primeiro progresso industrial
Eles são marcados pelos progressos técnicos importantes. Estes são consequência de condições
económicas e sociais. O meio social é bastante estável, por forma a que a pesquisa possa ajustar-se ás
situações bem definidas, sendo ao mesmo tempo apto à mudança. Nota-se de facto uma certa
maleabilidade na sociedade que encoraja iniciativas. É necessário adicionar o papel do interesse:
interesse dos Estados mais do que nunca ansiosos de riqueza, mas também da burguesia em ascensão,
que descobre todo o lucro material que podem retirar das técnicas de produção. Todos estes apetites são
estimulados pelo crescimento demográfico que empurra ao consumo, pela extensão do mercado interno
e externo.
Há também os elementos intelectuais já evocados, como a ideia de progresso, fundados sobre uma
confiança absoluta do poder da razão como meios para dominar as forças da natureza, o que leva a um
optimismo conquistador. Para mais, a concepção nova de felicidade veio sustentar o impulso técnico.
Em resumo o século é caracterizado por um gosto marcado pela ciências experimentais.
A consequência mais visível é o crescimento da mecanização. Certamente, a maioria das invenções é
inglêsa, mas a França lança-se para uma verdadeira espionagem industrial que lhe permite a introdução
rápida destas nas suas fábricas. Em certos casos não são apenas introduzidas as invenções como são
aperfeiçoadas. Assim Vaucanson, em 1750, aperfeiçoa suas torres e moinhos de vento cujos movimentos
são regularizados mecanicamente e anunciam o trabalho automatizado de Jacquard (1801-1805). Da
mesma maneira regista-se progressos na papelaria (1798 a máquina de Robert) e na metalurgia. Não se
hesita em chamar estrangeiros: de inglêses, escocêses, a Suíços (Oberkampf)...
Resultados são um aumento de produções. No têxtil registra-se um ganho de tempo e força de trabalho
de 50% por exemplo. Na indústria das índias, o cilindro e especialmente a prensa imprime por dia até 5
000 metros de algodão por dia. Nas forjas de Wendel, em Lorraine, os altos fornos chegam a produzir 50
quintais de ferro por dia, considerando que a média ultrapassava dificilmente 15 a 20 quintais. Ao
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mesmo tempo, a concentração industrial desenvolve-se. Os grandes negócios de algodão e
especialmente telas pintadas da Normandia e da Alsácia são já fábricas modernas, concentradas,
mecanizadas, poderosamente providas de capitais. A fábrica de Oberkampf, de Jouy-En-Josas, fabrica
30 000 lenços por ano, imprimidos por 1 100 trabalhadores. Da mesma maneira em metalurgia, de
Wendel a Hayange e especialmente o Creusot que, na véspera da Revolução, se apresenta como uma das
empresas mais consideráveis e mais importantes da Europa, com o seu hall central com quatro fornos de
reverberação, quatro fornos, que permitem fundir ferro de massas de 12 000 libras de um unico
jacto(uma só vez).
No total, podemos ver que todas as condições estão reunidas para a passagem para a indústria de
capitalismo, a que se chamará revolução industrial!
A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
Neste domínio existe uma especificidade francesa: o inicio (take off) aconteceu depois que na Inglaterra
e especialmente mais progressivamente que na maior parte dos outros países industrializados.
O atraso em relação á Inglaterra explica-se essencialmente pelas condições históricas. Guerras da
Revolução e do império retardaram um processo largamente iniciado no fim do século XVIII. De 1790 a
1800 a classe média toma o poder, esmaga o movimento popular, e pode a partir de thermidor, (The
thermidorian reaction, Revolution of Thermidor, or simply Thermidor refers to the coup of 9
thermidor (27 July 1794) in which the Committee of Public Safety led by Maximilien Robespierre was
sidelined and its leaders arrested and guillotined, resulting in the end of the Reign of Terror. The new
regime, known as The Directory, introduced more conservative policies aimed at stabilizing the
revolutionary government.) relançar a actividade, mas não pode parar a guerra. Bonaparte toma então o
poder e reconcilia a herança do Regime velho com as conquistas revolucionárias. Traz assim a paz civil.
Assim para 1800-1810 o arranque também será possível: inovações técnicas, investimentos,
especialização das zonas industriais do Norte, do Leste, da Bacia Parisiense e mesmo do Massivo
Central. Mas tudo falha porque a guerra continua e o império acumula contrariedades depois de 1810 até
antes de desaparecer em 1815.
Quanto ao arranque francês, ao contrário do que acontecerá na Alemanha ou nos Estados Unidos ele
será lento e extremamente progressivo. Jamais as técnicas, as mais modernas da história quantitativa
conseguiriam descobrir este leve crescimento que levaria a economia francesa ao ritmo inglês. Partindo
do princípio do século XIX, a indústria francesa conhece um crescimento sustentado durante todo o
século, oscilando regularmente ao redor de 2,5% por ano: não alcança a Inglaterra mas não perde mais
terreno.
De acordo com M. Lévy-Leboyer, este fenómeno explicar-se-ia pelo facto que o mercado nacional se
teria formado tarde, não antes de 1860 pelo menos, com a revolução do caminho-de-ferro. Esta demora
explicar-se-ia pela fraqueza da demanda interior, ela mesma uma consequência do sucessivo fraco
crescimento demográfico (duas vezes menos forte que na Grã-Bretanha). Este mercado doméstico não
requer uma grande massa de bens de consumo então: ele está muito estagnado, é muito pouco elástico.
Para mais, o mercado internacional é controlado pelos inglêses e oferece poucas saídas à produção
francesa. Por exemplo, jamais os têxteis franceses exportarão mais do que um quinto da produção
durante a primeira metade do século. Finalmente, ele enfatiza a escassez de carvão que dificulta a
economia francesa (um décimo do inglês). Se bem que nunca encontraremos na indústria francesa, no
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sector de ponta, relé e motor de actividades, como o algodão ou os produtos estratégicos foram para os
ingleses. Mesmo se, dos sectores modernos, a partir do Segundo Império, os das minas, da metalurgia,
da química, venham a ultrapassar os 5% de crescimento anual, eles nunca têm sucesso a puxar todo a
produção industrial. Mas a indústria francesa achou um modo original. Ele apoia-se num mercado de
agricultura enorme e passivo que não conhece nenhuma variação brutal, senão esta tendência constante
para a inelasticidade. As cidades são negligenciadas: o crescimento urbano tão rápido do século de
XVIII é parado pela Revolução e o império, e só recomeça após 1860. No limite a mecanização não é
tão necessário na França como na Inglaterra, porque se pode recorrer á importante e numerosa mão de
obra rural, formada desde o Antigo Regime, barata e bem distribuida. Assim podemos aceitar a
cronologia da revolução industrial proposta por M. Lévy-Leboyer:
— um primeiro período que vai até 1840. O crescimento francês apoia-se num país rico em mão de obra
e aberto à revolução agrícola. Com um mínimo de técnicas inglêsas dá-se início ao crescimento francês
nas indústrias secundárias a jusante;
— um segundo período depois de 1840. Os preços agrícolas endireitaram-se e provocaram um apelo ao
consumo rural. O mercado tradicional evolui graças à revolução de caminho-de-ferro. As indústrias
primárias tornam-se por sua vez consumidoras de mão de obra e são controladas a jusante;
— de 1865 a 1890 a economia francesa conheceu um longo período de estagnação. O handicap
demográfico fez-se sentir, surge a crise agrícola, o comércio internacional é menos aberto, porque a
França não soube tirar proveito da abertura para o extremo-oriente que representou a abertura do canal
de Suez em 1869;
— finalmente, é necessário esperar por 1890 e pela Belle Epoque para que a economia francesa se
reconstruisse e assimilasse verdadeiramente a revolução industrial do século.
Passamos do mundo de Balzac para o de Zola. Esta tese destrói afirmações prévias minimizando o papel
do estado, frequentemente enfatizada a propósito do Segundo Império, não incriminando o tamanho das
firmas, tornando a via-férrea uma ferramenta comercial e sendo uma questão mais financeira que
industrial. No total, a França, velho país rural, conheceu um soube um muito original processo de
industrialização que explica, e isto até 1960, o compartilhamento da vida rural e da economia francesa.
O crescimento industrial
As flutuações cíclicas
Embora relativamente regular, o crescimento francês também se integra nos movimentos cíclicos que
convêm apresentar. Estas são as suas duas naturezas: por um lado de ciclos de comprimento longos
(ciclo de Kondratiev de cerca de meio século), por outro lado dos ciclos mais curtos postos em evidência
pelo francês Juglar Clemente. Podemos especificar esta cronologia da seguinte forma
Ciclos de Kondratiev:
1790-1848 Fase A de 1790 à 1815
Fase B de 1815 à 1848
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1848-1897 Fase A de 1848 à 1873
Fase B de 1873 à 1897
1897-1933 Fase A de 1897 à 1920
Fase B de 1920 à 1933
Estes ciclos são ritmados pelas crises industriais clássicas: 1847/1848; 1857; 1866; 1873; 1882/1884;
1890/1893; 1900; 1907; 1913 (cf. capítulo dedicado ás crises)
Todos os ciclos conheceram um sector líder, motor do crescimento económico. A primeira onda foi
impulsionada pelo sector têxtil, a segunda e a terceira onda foram impulsionadas pelas indústrias
pesadas de posses importantes (vias férreas), mais as que fornecem também equipamento das indústrias
produtoras de bens de consumo. No caso do modelo francês, o que é impressionante é o fenómeno da
diversificação, mas com a persistência de sectores tradicionais como o têxtil e a construção. Se
considerarmos apenas o momento onde a revolução industrial é uma realidade, quer dizer após 1840
podemos estabelecer o seguinte quadro:
Sectores em declinio Parte do sector no valor total em %
1845/1854 1905/19 13
Construção / Obras publicas (0,6 %) 23,2 13,2
Vestuário (1,6 %) 20,1 14,9
Têxtil (2,5 %) 19,8 16,5
Alimentação (1,2 %) 16 14
Química (3,5 %) 2,3 2
Sectores cuja parte aumenta
Produção de metais (5,2) 0,9 2,4
Transformação de metais (4) 3,9 12,7
Carvão (2,5) 0,5 2,7
Papel/cartão (3,7) 0,5 1,3
Imprensa (4,7) 0,3 1,2
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Este crescimento é marcado pela industrialização, ela mesma requer um certo número de factores, o
primeiro sendo a formação do capital cuja primeira condição é a estabilidade monetária.
Moedas correntes
A França tem a sorte de beneficiar, desde 1803, de uma estabilidade monetária consagrada pela criação
do franco germinal que vale 327,5 mgs de ouro para 9/10 CS de fim. O Banco de França criado em
1800, reformado em 1806, dispôs desde 1848, do monopólio da emissão monetária. O reinado do
padrão-ouro confere a este sistema uma credibilidade que encoraja a poupança. A descoberta de minas
de ouro e prata do oeste americano no meio do século, e mais as minas do Transvaal em 1890, assegura
uma oferta suficiente de moeda corrente para financiar o desenvolvimento económico mundial.
Impunha-se cada vez mais e em especial o uso da moeda fiduciária e escriturária:
Estrutura da massa monetária em França em %
1845 1885 1910
Moedas 82 52 33
Notas 8 29 23
Depósitos 10 19 44
Este progresso espectacular do banco moeda corrente confina o ouro á sua função de liquidez
internacional. O economista keynesian Triffin não hesitou em falar da eutanásia do ouro e da prata.
A demonstração mais óbvia disto é o desenvolvimento bancário.
Bancos
Em 1837, Laffitte cria o primeiro banco de negócios francês: A Caixa do Comércio e Industria. É
seguido por toda uma de rede de bancos empresariais gerada pelas solidariedades pessoais: bancos
judeus (Rothschild, Lazard, Malho...) ou protestantes (Verne...). Também são acrescentados bancos de
depósitos a estes bancos empresariais do qual o mais famoso é fundado em 1870, por Henri Germain: o
Crédit Lyonnais. Em 1913, dos primeiros 25 bancos no mundo, 10 são ingleses, 3 franceses (Crédit
Lyonnais é o terceiro Banco Mundial), 3 americanos e 2 alemãos. Estes bancos multiplicam as suas
filiais, também os seus depósitos aumentam, passando de 953 milhões em 1880 para 45 007 milhões em
1910. Os franceses muito tempo reticentes em contra da moeda corrente bancária acabam por terminar
fazendo as pazes com os seus bancos, dos quais eles tinham mantido recordações muito ruins (cf.
assignates da Revolução francesa) (O 'assignat' era uma moeda sob a Revolução Francesa. Na origem,
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tratava-se de um título de empréstimo emitido pelo Tesouro em 1789, cujo valor estava associado aos
bens nacionais. Os assignats tornam-se moeda em 1791, e as assembléias revolucionárias multiplicam a
sua emissão, o que leva a uma forte inflação. O curso legal dos assignats é suspenso em 1797.).
Este século é especialmente caracterizado por um desenvolvimento sem inflação. Certamente, havia um
aumento lento do nível de preços de detalhe, mas que foi compensado pelos aumentos de salários
correspondentes. Além disso, há que realçar uma diminuição no preço industrial (com algumas
excepções como objectos de consumo de elevados custos de trabalho). Estas diminuições são devidas
essencialmente ao progresso da produtividade, mas também outros factores contribuíram, como a
importante oferta ao nível do emprego ( «o exército industrial de reserva», de acordo com a fórmula de
Karl Marx), da poupança e baixa despesa pública (concepção de «o estado policia»), em resumo a
progressão lenta do poder de consumo do consumidor.
Formação do capital
Tais condições permitiram a formação do capital, especialmente desde que se multiplicam as formas
societárias de negócio. Até perto de 1860 são as sociedades limitadas por acções, que se espalham mais,
mas nesta altura suprime-se a autorização prévia, e há portanto um crescimento de sociedades anónimas
(de 4,3% em 1860 a 15,6% em 1906). Criam-se 155 sociedades anónimas por ano entre 1865 e 1869 e 1
200 entre 1910 e 1911. Porém, um capitalismo de tipo pessoal perdura na França, e sociedades em nome
colectivo ou de sociedades limitadas caracterizam ainda bastante os pequenos e médios negócios.
Ao mesmo tempo, assiste-se ao alargar do mercado de títulos. São os títulos de caminho-de-ferro que
alimentam essencialmente o mercado financeiro. Eles acostumaram os aforradores franceses a outros
investimentos que não só a aposentadoria (titulos públicos). Em 1900, as vias férreas representam 41%
do valor nominal e 47% em valor de bolsa das sociedades cotadas no mercado de valores de Paris.
Assim em 1897 o sector industrial representa dois terços de emissões de acções e dois quintos de
emissões de obrigações. Novamente devemos qualificar este quadro, enquanto recordando a parte
considerável que o autofinanciamento conserva.
Da mesma maneira, seria exagerado acreditar que todas as economias se orientaram para o mercado
financeiro. Os trabalhos de Pierre Léon e Adeline Daumards sublinham apenas que os activos móveis
aumentaram. Eles representam 69% das fortunas Parisienses em 1911 contra 55% em 1847. Dentro
destes, os investimentos acionários aumentaram. Em 1908-1911, eles formam mais de metade dos
activos móveis nessas mesmas fortunas (51,4%). De uma maneira geral, na França, o esforço de
investimento foi orientado principalmente para despesas de hospedaria e infra-estruturas de transporte.
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Investimentos
É particularmente óbvio considerar investimentos de base que dizem respeito aos transportes. O século é
caracterizado pela extensão de redes de via-férrea:
1840 1860 1900
Extensão mundial em quilómetros 8 845 106 311 749 793
Repartição mundial 100 100 100
França 4,7 8,9 4,9
(Não há um retrocesso da França, mas só um retrocesso relativo, que segue a construção da rede
americana e russa).
Para este crescimento do caminho-de-ferro evocam-se várias explicações. Sublinhou-se a importância do
actual Saint-Simonien (Saint-Simonianism was a French political and social movement of the first half
of the 19th century, inspired by the ideas of Claude Henri de Rouvroy, comte de Saint-Simon (1760–
1825). Saint-Simon has been "variously portrayed as a utopian socialist, the founder of sociology and a
prescient madman". His ideas, expressed largely through a succession of journals such as l'Industrie
(1816), La politique (1818) and L'Organisateur (1819–20) centered on a perception that growth in
industrialization and scientific discovery would have profound changes on society. He believed,
nonetheless, that society would restructure itself by abandoning traditional ideas of temporal and
spiritual power, an evolution that would lead, inevitably, to a productive society based on, and
benefiting from, a " ... union of men engaged in useful work", the basis of "true equality". These ideas
influenced Auguste Comte (who was, for a time, Saint-Simon's secretary), Karl Marx, John Stuart Mill,
and many other thinkers and social theorists.) que foi uma influência forte tanto em engenheiros como
em bacharéis. Na realidade, foi a procura do lucro que era o incentivo mais forte. No caso francês é
necessário também sinalizar a cooperação que é instituída entre o estado e as companhias privadas. À
partida o estado concedeu a linha (O Segundo Império fixa a duração da concessão em 99 anos) e se a
rede era explorada pelas sociedades privadas, os princípios do direito público foram preservados: só
foram concedidas vias-férreas a título temporário e permaneceram submetidas ao controle do estado.
Assim, em 1879, foi lançado pelo estado o Plano Freycinet que teve por objectivo o relançamento da
economia e que resulta na construção de numerosas linhas não rentáveis (as vias férreas eleitorais!)
Muitas destas redes conheciam dificuldades financeiras, e só as companhias do Norte, do Este e o PLM
tiveram uma administração quase equilibrada. Nos outros casos o Estado teve que intervir, até que teve
que comprar em 1908 a rede do Oeste. Não é de espantar que outras crises tenham tido origem nos
financiamentos da via-férrea. O facto é que este sector teve um papel fundamental. Ele induziu efeitos
sobre as outras indústrias. Não há qualquer dúvida que em França, até cerca do ano de 1880, os
caminhos-de-ferro tiveram um papel de primeira ordem para sustentar a procura de produtos
siderúrgicos e metalurgicos. Até perto de 1880 eles representam 13 a 18% da produção deste sector e 4 a
8% de um sector da transformação de metais. Por outro lado contribuíram para a realização de um
mercado nacional. Em contrapartida, é mais delicado determinar, como o afirmaram os engenheiros de
pontes e Pavimentos, que eles são mais económicos em relatção á utilização de outros transportes
(poupança social).
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Á conta dos investimentos no caminho-de-ferro será necessário não esquecer os investimentos
marítimos. Estes são concretizados primeiro pela construção de navios já aperfeiçoados. Passaremos da
nevegação á vela (os clippeers) para o uso de vapor (steamers) entre 1885-1890. Desde 1880, o uso de
aço é generalizado nas construções navais. A isto é necessário somar investimentos para o equipamento
de portos. Os trabalhos mais importantes dizem respeito aos portos de Marseille, o Havre, Dunkerque e
Bordeaux. Finalmente, não nos podemos esquecer da perfuração de canais maritimos. Saint - Simonien
de Lesseps dirige os trabalhos que têm sucesso na abertura do canal de Suez em 1869. Logo após,
envolver-se-á, sem sucesso desta vez, no projecto de perfuraração do istmo de Panamá. Todos os tipos
de investimento, embora alguns possam parecer arriscados, investimentos destinados a aumentar trocas.
REVISTO ATÉ AQUI!!! BONS ESTUDOS.
Trocas internacionais
O século pode encorajar só estas trocas. 11 são dominados pelo pensamento liberal e os autores grandes
(Smith, Stuart Mill, o Ricardo especialmente) proclame a superioridade do échangisme grátis. Inglaterra
se quer o campeão de um modo de divisão internacional de trabalho que condena todo o recurso a
proteccionismo. Neste domínio é compartilhada a França e hesitante. Ela soube uma fase liberal na
véspera da Revolução (tratado Eden, 1786), então um período de proteccionista longo até as 1860.
A esta data, a pessoa entra em uma fase liberal nova. 23 de Janeiro de 1860, o Segundo Império assinou
um tratado de comércio livre britânico isso suprimiu todas as proibições, isentou faz matérias-primas e
os produtos de comida de todos os direitos disto, fixo um máximo de 25% para os artigos fabricados, e
estabelecido a cláusula da nação mais favorecida. Este tratado foi seguido de doze outros acordos. Antes
do exemplo alemão um torneamento da opinião traz a Terceira República, de 1881, porém, voltar a
proteccionismo (lei de Méline em 1892, agravou em 1911). Resulta alguns da mesma maneira de
variações importantes no volume de trocas de França. De 1830-1840 este volume aumentou
consideravelmente até as 1870-1880. Então uma desaceleração até as 1896-1900, com uma reassunção
até a véspera da Guerra Grande. Estas trocas são essencialmente intereuropéenses. Até que a primeira
guerra a França especialmente importou carvão, Bélgica, Inglaterra e Alemanha. Venha então das
matérias-primas agrícolas (algodão), dos produtos de comida e em resumo dos produtos feitos (5% em
1860, 13% em 1913). She/it especialmente exportou alguns fizeram produtos (56% de exportações em
1860, 51% em 1913) para qual foi somado de produtos de alta qualidade (sedas, artigos de luxo...), dos
produtos têxteis e o material de transporte. Estas trocas comerciais exercitaram na economia um papel
duplicado de prática. Por um lado eles proveram saídas, e por outro lado eles submeteram o jogo da
economia a normas da competição internacional, com um proteccionismo relativamente moderado,
notavelmente em relação aos Estados Unidos e para a Alemanha. Um recente trabalho de Paul Bairoch
sublinha, ao contrário das ideias recebidas que este proteccionismo, longe de demorar o crescimento
económico, era pelo contrário um factor «de aceleração da expansão comercial, e [que] está dentro o a
maioria o proteccionista países europeus que este aqui eram mais rápidos». Daquele ponto de vista,
França ocupa uma posição mediana entre o campeão de Inglaterra do troca grátis e o proteccionista a
Alemanha. Outra originalidade francesa é a parte importante preservada por agricultura.
Colocações e vida nomeia da sociedade industrial
Em uns ganhos de maneira gerais de produtividade registrados evoluções revelam entre as fases
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diferentes da revolução industrial. O período 1840-1870 conheceu um dualist de crescimento com a
manutenção importante uma produção manual próximo aos sectores novos que emergente. O homem de
dor que vira o manual permanecerá uma realidade até para o fim do século de XIXe. De 1870-1913 os
movimentos de produção manuais atrás e o uso de máquinas tem a tendência para ficar difundido.
Ainda, esta evolução não interrompe o retrocedendo do sector primário, como os espectáculos a
distribuição da população activa:
Primário Secundário Terciário
1840/1845 51,9% 26% 22,2%
1866 49,8 % 27,9 % 22,3 %
1896 44,8 % 28,6 % 26,6 %
1906 42,7 % 28,2 % 28,1 %
Assiste-se a uma redução lenta do sector primário do qual é necessário sublinhar a importância porém,
especialmente se a pessoa compara isto com um dos outros países industrializou o europeu. Existe bem
um modelo francês. Este fenómeno explica a originalidade que presente a classe de funcionamento
francesa. Ela levará muitos tempos para puxar para si que cultiva ambiente. Ave de classe, só aceitarão
lentamente a cidade e o empreendimento. O trabalho industrial permanecerá quase uma tarefa
temporária, um momento da existência, um trabalho sazonal. Assim, durante todo o século de XIXe,
uma fracção da classe funcionamento stéphanoise voga entre os três sectores grossos de usos locais: o
armamento, minas e agricultura. Mas progresso de industria e a revolução agrícola superará estas
resistências.
A revolução agrícola
Este she/it de tempo tem mesmo lugar. As difusões mecânico e substância química disto é as razões
principais. Na cerealicultura a adopção de máquinas de notícias acelera debaixo do Segundo Império.
Misturador e hoppers primeiro, ceifeiro e mowers então. Em 1856, a pessoa contou só 50 000
misturador; o número dobro em seis anos. Em 1882 o ceifeiro e o mower ficaram comuns. Bater é vapor
terminado:
1852: 81 máquinas a vapor
1868: 2 253 máquinas a vapor
1873: 6 793 máquinas a vapor
Exibições, retorno de competições as máquinas familiares. A exibição de 1844 une 62 fabricando, eles
serão 805 em 1860!
O derramamento de adubos químico no Norte e a Bacia Parisiense. Em Normandy o fosfato de lima ou o
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sulfato de amoníaco adubo completo ou guano. O Sudoeste usa o fosfato ácido de lima, o cloreto de
potássio e o sulfato de lima. Dor de grade - meu tudo estes que fertilizam. Agricultura tira proveito do
progresso industrial e I'accumulations de capitais.
Da mesma maneira, se progride lentamente, os registros pedagógicos agrícolas, em 1870, a criação da
escola nacional superior de agricultura que é resolvida a Montpellier.
Finalmente, a abertura do mercado inglês permite dispor de algumas produções de excesso desde 1849.
Depois, durante anos sessenta, é outros tratados alguns anos que trocas grátis com a Bélgica em 1862, o
Zollverein e Itália (1864), Suíça, Suécia, Noruega, os Pagar-base e Espanha (1865), em resumo a
Áustria, Portugal e Turquia (1866). Estas políticas só serão repostas em questão da depressão grande de
anos 1880. Os produtos agrícolas surgem do mundo inteiro em portos, enquanto provocando uma queda
de cursos.
Os sectores diferentes são tocados mais ou menos, mas tudo reclamam de importações e perguntam um
retorno a proteccionismo. Lá Jules Méline faz novamente, votar, em 1884, uma legislação que protege
as produções francesas.
A pessoa sempre desejará saber sobre consequências desta mudança política. Não contribuíram para
quebrar a modernização da agricultura francesa que, muito protegido protegido de seu comércio
barreiras, poderia ceder daqui em diante ante a rotina e o malthusianisme económico? Ou este não era o
preço para pagar para economizar o modelo francês, quer dizer uma mistura de crescimento industrial
lento e contínuo com a persistência de um sector importar agrícola, criando um harmonioso e
equilibrado inteiro?
Realmente é só depois das 1890 que os habitantes de cidade prevalecem em cima da agricultura (1840
na Inglaterra). Os sacrificado de países, artesãos, manouvriers, que donos pequenos, jovem, se
encontram mais numeroso então em cidades, arrebatados por um mundo industrial que eles conhecem
mal e para qual as suas crianças não escaparão. No fim do século, migrações especializam-se em
algumas profissões do edifício, mas as partidas definitivas levam fora daqui em diante.
A migração sazonal, esta forma longa de resistência para a miséria de agricultura, vagueia
inexoravelmente para o êxodo de agricultura mais banal.
O crescimento urbano
A cidade expressa o desejo de uma promoção social. É primeiro espectáculo do sucesso e o
enriquecimento. A pessoa imagina a fascinação na que pode exercitar este espectáculo chorando os
desarreigou e o sem meios. Ao mesmo tempo, a cidade faz o papel de elevador social. Solidariedades e
facilidade deixadas pensam aquele poderá ter sucesso lá. Existiu em todos os modos de «Rastignac»
Ainda, a cidade é um espaço urbano e social muito duro para o fraco. Ao século de XIX, assiste-se à
deterioração da colocação urbana enquanto se põe o problema do alojamento. O centro se torna o espaço
da única classe média que organiza emblemas dos seus: lugares sociais, bancos, lojas de departamentos,
mercado de valores, próximo a edifícios símbolos administrativos do Estado. É o caso em Paris onde os
trabalhos do barão de Haussman estripam os distritos populares e rejeitam para a periferia os mais
desprivilegiado. Aí só permanecem ilhotas mais anti-higiénicas (o Pântano Parisiense por exemplo). A
crise do alojamento fica permanente, tal como a taxa de subidas de alugar. A pessoa conserta os distritos
velhos, mas é insuficiente. Nenhuma preocupação de conforto e sanidade governa estes trabalhos. Neste
domínio não há uma evolução durante todos os investigadores de período de anos 1880-1890 recupere
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com o mesmo medo as situações prévias. Michelle Perrot pode falar de «o fracasso da história urbana
com que goteja feiúra, sua espuma pegajosa e fria, sua promiscuidade pegajosa,.. ». Especialmente a
diferenciação da estrutura espacial e separações que resultam alguma fratura um certo número de diário
de solidariedades concreto previamente viveu pelo bairro de. É a dissolução de sociabilidade elementar:
mais de envolvimento para as festividades comuns, todo grupo tem modas de lazeres daqui em diante. A
pessoa pode mencionar a anemia progressiva do Carnaval Parisiense neste respeito. Ao mesmo tempo, a
polícia procura uma vez através de molestamento de his/her/its as profissões pequenas de. Da mesma
maneira as solidariedades domésticas se atenuam, é daqui em diante a atomização de habitantes de
cidade se afogada no anonimato da multidão. Neste mundo de pobre está incógnita disto. Estes distritos
vastos são quase o objecto de um lírio de ethnology novo fica situado fora do mundo civilizado porque
eles são entregados a eles, e o desenvolvimento de instituição policial será um de formas da reconquista
deles/delas. A pessoa pode falar da selva de cidade. Uma pesquisa na cidade industrial de Givors revelou
a existência de reais tiras de jovem por exemplo para 1850-1860. 11 não são necessários imaginar que
para como muito o pourrissoir urbano assombra as mentes. Só é de 1880 que isso aconteceu um cabo de
consciência de cada vez consequência do remorso social e o medo.
Em França é o tradicionalista escolar, se agrupou ao redor de Frédéric O Jogo e de revista de his/her/its
A reforma de bem-estar, isso lança o movimento. Um pouco mais e mais numerosos médicos dobram
nas maldições sociais: desemprego, a dissolução da família, o alcoolismo, a tuberculose. A pessoa pode
mencionar, no Momento Bonito, relatórios dos irmãos Bonnells em Profissões que matam e A Vida
trágica de trabalhadores, ou esses de Jacques Valdour. A pessoa começa a denunciar o trabalho de
crianças e a ausência de legislação protectora. Estes sentimentos de culpa e compaixão sempre geram
um réformatrice de acção atento para a melhoria do alojamento está por purificação disso que existe, ou
através de construções novas.
O medo faz um papel importante neste cabo de consciência. Muitos começam a ter medo do número
deste pobre recolheu estes distritos anti-higiénicos. A cólera não é tão distante, e em Lyons a febre
tifóide fica em estado endémico à véspera Guerra Maior. Ao mesmo tempo, a higiene pública se torna
uma disciplina principal da ciência médica Para alguns, como a PÁG., Leroy-Beaulieu escrevendo, «a
pergunta social é uma pergunta moral». Para eles é também esta situação, a consequência das
moralidades populares, a imprudência material, o irreligion, e a licença sexual... O episódio do Distrito
municipal é por exemplo, para o Doutor Bruken em 1887, «uma erupção de alcoolismo» para o Doutor
Legrain (1894), greves são «uma dificuldade fomentou o copo à mão» e cabeças de motim (Doutor
Boreila, 1898) «do hereditário do alcoolismo». Não está lá as verdadeiras razões para outros, e a
responsabilidade deve ser procurada na evolução urbana geradora de degenerações. Eles permanecem
porém uma vez minoritários isso liga criminalidade e prostituição à antropologia física. Em 1912, uma
investigação Parisiense que nota a frequência de tem contaminação de crianças em uma amostra de 442
phtisiqueses de trabalhadores, não hesite concluir à hereditariedade da dor. Desemprego também se
torna ele um carácter estranho adquiriu o pai ao filho com a debilidade física e o se desmoronar moral.
Este medo gera a exclusão. Desde que o Segundo Império Paris expele hospícios de incurável fora da
cidade. A cidade industrial deve ser a permanência de homens e as mulheres válidas, capaz trabalhar.
Nesta lógica que a cidade fabrica tem que responder melhor a este objectivo.
Fábricas de cidades
Eles respondem de cada vez a uma preocupação de racionalidade e realidade preocupações
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humanitárias. Não está surpreendendo para achar à sua origem o protestante rígido de Mulhouse ou os
católicos férvidos como o Montgolfiers ou o Pavins de Lafarge. Depois de 1830-1840 aumentam estas
cidades e a feira mundial de Paris, em 1867, eleva os quadros de um bom trinta entre eles São - Gobain
para Chauny, as Lojas marítimas para O Ciotat, forjas de Audincourt, o Peugeot perto de Montbeliard, o
glassworkses São - a Louis e até mesmo, em Paris, lojas de departamentos O Desminta o Jardineiro. Em
uma primeira vez, estes alojamentos respondem a uma necessidade há nem todo alojamento no local da
indústria nova instalou país por completo. Muito depressa, é uns meios para manter a força de trabalho
(Carmaux, Montceau - Les - Minas). Em resumo a cidade fabrica se matricula em um movimento maior,
o um do paternalismo que empreende levar A totalidade da existência de funcionamento em carga de
pólvora. O exemplo o mais terminado é o um do Schneiders ao Creusot, mas casos são múltiplos a
Anzin, O Combe Grande, Ponte - Para - Monção... He/it chega que estes alojamentos são vendidos a
trabalhadores como o organiza Jean Dolfüss para Mulhouse ou o Schneiders que concordam créditos a
longo prazo e se limitam para impor regras de alinhamento e fachada.
O debate grande é o um do alojamento social. Em umas realizações de maneira gerais nunca é à altura
de projectos. Em França a pessoa pode mencionar algumas realizações da Sociedade económica caridosa
exactamente debaixo do Segundo Império. A lei de 30 de Novembro de 1894 em habitações baratas
(HBM) teve que abrir uma fase nova; de 1895 a 1902 constrói a pessoa 1 360 casas e aproximadamente
sessenta sociedades se dedicarão disto. Em resumo, a estabilidade geográfica com rastros de alcance de
dificuldade ele cada vez mais no um de trabalho. A Revolução industrial modelou um habitat novo, e os
achados espaciais franceses se modificaram disto. Para como muito, a França permanece um país de
agricultura. Só, Paris, Lyons e Marseille são cidades grandes. Nada de comparável na França com o que
acontece na Inglaterra, na Alemanha ou para os Estados Unidos; o modelo francês se distingue lá
novamente pela estadia do hábitat de agricultura e o anexo para estilos de vida. Até mesmo depois que a
revolução industrial a França permanece o país de abaixo - prefectures. O peso de países pesará
novamente muito tempo na vida política, económica e social. A condição de funcionamento não incita,
menos caso de necessidade absoluta, abandonar países.
A transação social nova
Está ao redor de anos 1840 aquele se dá conta da evolução social. Da condição de funcionamento,
muitos reformadores de philantropeses (Villeneuve-Bargemont), de economistas, de médicos (Villermé)
preocupe das evoluções intervenientes. A muitos (o barão de Gérando) sente o pesar de uma sociedade
extinta, como a tendência é isto denunciar consequências de industrialização. lírios preocupam
frequentemente sobre o deterioração físico da raça. Em lyonnaise de região, ao redor 1850, incorporado
medem dez centímetros de menos entre os trabalhadores jovens que entre filhos de comerciantes. A
pessoa reforma um passementier ou um armeiro em dois para Saint-Etienne, e dois canutses em cinco.
Em outros casos é a decadência moral que os alerta. Assim eles nomeiam o aumento de criminalidade às
condições novas de vida e trabalho. Tons sublinham o crescimento das desigualdades sociais e prefigure,
com certamente um vocabulário diferente, críticas que o Karl Marx se dirigirá à sociedade capitalista.
De uma maneira geral a pessoa pode notar a elevação de fortuna nacional. Na realidade todos os
indicadores sublinham, entre o meio do século de XIX e 1914, um enriquecimento nacional. Assim,
depósitos de caixas económicas na França testemunham alguns:
1840-1849: 300,7 milhões de francos
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1904-1913 : 5 153 milhões de francos
Seja uma progressão de 1 613 %.
O valor de sucessão francês mediano passa a indicação 32 em 1826-1835 a 100 em 1904-1913.
Evidentemente, há desigualdades. Arquivos do espectáculo de inscrição que mais do meio dado francês
para o século de XIX e no Momento Bonito, sem realmente ter o menos transmitir. Em Lille, na véspera
da guerra, a sucessão de um meio industrial é tão forte quanto o um de 10 000 trabalhadores que A
divisão fundamental está entre rendas do capital e esses de trabalho. Ainda, iguale lá, a pessoa nota
progresso. Salários e tratamentos que só representaram 25% da renda nacional em 1860 conta para 38%
desta renda em 1913. A tese Marxista do pauperization absoluto é negada através de figuras. Anos 1890
marca uma volta. A diminuição de custos de produção graças à mecanização, a racionalização de
trabalho, permite banir pauperization na loja de acessórios. Despesas diversificam. Carne e vinho se
aparecem nas despesas de comida, como testemunha a pesquisa de orçamento doméstica disto. Claro
que, categorias todo sociais e profissionais não beneficiaram de Ia que mesma maneira de progresso
gerou pela revolução industrial.
Para o primeiro grau de vencedores, classe média. Isto conquistando classe, levar a fórmula de Charles
Morazé, acha a justificação de ascensão de his/her/its na desculpa de trabalho. «Classe média é uma
classe que trabalha», resuma Jean Jaurès. Aos olhos deles é dali em diante o sucesso, acessível a tudo,
querer é suficiente e saber. A concentração dos empreendimentos grandes que encorajam o subcontrate,
oportunidades para suceder oferta eles alguns e caminhos que dirigem à fortuna são múltiplos. É
frequentemente alguns artesãos inventivos, como Deflassieux que, o trabalhador simples, ache com
irmão de his/her/its, em 1849, um empreendimento para consertar máquinas da mina e fica mais rico
enquanto provendo o material a vias férreas. Porém, he/it não é certo exagerar esta mobilidade social.
He/it permanece, apesar do tempo, uma viscosidade de dinastia burguesa forte. Algum que gravatas
domésticas muito fortes reforçam se agrupa particularmente fechado como esses dos chefes têxteis do
Norte, I'Alsace ou lyonnaise de região. He/it parece, de uma maneira geral, que a abertura social que
tinha caracterizado começos da industrialização se fechou novamente muito depressa para 1840-1850.
Porém, ao redor de anos 1890, uma categoria nova acha uma oportunidade de promoção social: é os
engenheiros que, graças aos talentos deles/delas e oferece alguns exemplos de ascensão social rápida aos
méritos deles. De nomes de engenheiros partidos das escolas grandes (Politécnico, central eléctrica) se
apareça entre líderes de empreendimento: Navio carvoeiro de Amédée, Gustave Eiffel... Embora
submeteu muito cedo à pressão importante externa que só poderia assegurar a promoção das patentes
deles/delas em inovação que eles trouxeram para um sangue novo a elites que poderiam tender a retirar
em eles. A pessoa nota de uma maneira geral a fusão de elites. Assim a nobreza também participa neste
movimento e o quadro de uma nobreza estrangeiro para a mente de empreendimento, aposentado em
terras de his/her/its, é um clichê negado por factos. Sócios da nobreza não são raros a metallurgic ou
organizadores de sociedade mineiros (o marquês de Solages para Carmaux, de Ramel na bacia de
Alès...). Pelo contrário, bourgeoises não desconsideram a especulação fundamental. Lá o modelo francês
faz novamente, de cada vez da terra um penhor de segurança, de everlastingness e um sinal do sucesso
social. Herança de Regime de I'Ancien, a aquisição de um castelo e terras de his/her/its constitui a
melhor afirmação do sucesso do seu negócio. A compra de terras através de classe média tem um
carácter ostentoso. É necessário somar lá também, como lhe mostrou Adeline Daumard, a propriedade
de posse de bens imóveis. Estes representam 29% do recurso de sucessão em Paris em 1911, 31% em
Lyons, e 53% em Toulouse.
Para as aspirações ambíguas, com uma consciência colectiva fraca, as classes médias são difíceis de
cercar aos contornos indeterminados de composição heterogénea. Se os artesãos e os lojistas pequenos
são as vítimas da evolução económica (eles perdem a independência deles/delas e são competidos com
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pela produção de massa e o desenvolvimento de lojas de departamentos), por outro lado médicos,
advogados, os empregados são os vencedores de um mundo que chama cada vez mais nas perícias
deles/delas.
Para o baixo da balança, o camponês e funcionamento enlatam apparaftre como os esquecidos do
crescimento. Certamente, eles têm pagado para a revolução industrial da qual elas eram as vítimas
principais todo afectuosamente. Nenhuma desculpa nunca justificará o trabalho de crianças, a miséria
física e moral que eles tiveram que sofrer. A pessoa só pode avançar uma consolação magra, o sacrifício
deles não era colectivamente vão, desde que progresso deixou alguns, certamente mais para alguns que
para outros, mas globalmente industrielie de revolução tinham criado uma França mais rica.
Conclusão Geral
O imperialismo francês
Forte de certezas de do seu poder técnico, económico e financeiro, a França apressa-se à conquista do
mundo. Este aqui veste dois aspectos: logo meramente financeiro, logo político pela inclinação da
colonização.
Investimentos franceses fora de França em 1914
Total de investimentos, 45 bilhão de francos de qual:
— 41% na Rússia;
— 13% na América Latina;
— 9% na península ibérica;
— 7% na Turquia;
— 7% no Egipto e na Companhia de Suez;
— 6% no balcânico;
— 4% em norte a América;
— 8% nas colónia deles/delas.
Assim a França possui o segundo «império invisível» depois da Inglaterra (95 bilhão) mas bem antes da
Alemanha (29 bilhão).
Da mesma maneira, possui o segundo império colonial. Constituiu-se no meio de anos 1870, menos
para as necessidades económicas que pelas razões políticas. Se se excluir a Argélia e o Cochinchina,
colónias provêem pequeno e custo mais querido que eles trazem atrás. Do resto os investimentos
metropolitanos estão lá 3 bilhão fracos de francos em 1913, qualquer um só 8% dos investimentos
externos de francês. De razões outros que económico é invocado: pesquisa de uma compensação depois
da derrota de 1870-1871, vá de poder mais isso de riqueza, convicção na missão civilizando de França.
Assim a França faz a escolha da conquista colonial por razões que não são ligadas à revolução industrial.
Só previne este aqui encorajará o sucesso de expedição distante.
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CAPÍTULO 4 – CRESCIMENTO E CRISES EM FRANÇA NO SÉCULO XX
Relativamente aos outros países, a França encontrava-se um século à frente. Considerando que a França
antes de 1850 tentasse destronar a Inglaterra do seu primeiro lugar como potência, no princípio do
século XX ela não passa do quarto lugar ultrapassada largamente pelos Estados Unidos, Alemanha e
Inglaterra. Por isso a economia francesa, conhece depois do meio dos anos 1890 uma taxa de
crescimento semelhante à dos grandes países industrializados, esta taxa é crescente até 1913 e é esta
imagem de uma economia dinâmica que os contemporâneos mantêm e denominam de “Época Bela
(Belle Époque)”.
Porque é que a França, recuou durante o Século XX apesar do seu envolvimento pleno e total durante a
industrialização do “mundo avançado”? Para responder a esta primeira questão é necessário responder a
uma segunda: Quando é que ela recuou? Se é verdade que entre 1830 e 1850, as taxas de crescimento,
respectivamente dos Estados Unidos e da Alemanha são mais elevadas que as de França e Inglaterra, é
sobretudo durante o período chamado de “ grande depressão” (1870-1885) que estes dois países serão
ultrapassados.
No caso da França, a causa deste recuo, foi a incapacidade dos dirigentes, inclusivamente da classe
política de saber impulsionar a tempo as mudanças técnicas que os outros países souberam. Tais
transformações da produção, eram bem mais importantes que a guerra comercial que se tinha reiniciado
com a lei de alfândegas alemã em 1879.
É em muitas filiais que as mudanças necessárias vão estar conscientemente atrasadas e mesmo refreadas
por um patronato com medo de correr riscos que lhes parecem excessivos. Esta tendência encontra-se:
- Na siderurgia onde muitos empreendimentos que produziam ferro fundido não instalaram o
conversor Thomas-Gilchrist que permitia transformar os minerais fosfóricos de Lorraine (o minete) e
são forçados a fechar.
- Na química, onde o processo de produção electrolítica de alumínio não é explorado em França
entre 1886 e 1897 e ou o grande industrial francês não compreende o interesse da carboquímica que se
abre sobre a química dos colorantes.
- Para a electricidade, onde os concessionários da iluminação com gás recusam a energia nova.
Os poderes públicos participam no impedimento da modernização. Para os transportes, o estado, para o
plano Freycinet, prevê um crescimento da rede de caminhos-de-ferro que deverá apoiar o ambiente rural,
estes investimentos nunca foram rentáveis provocando um desfalque na economia nacional francesa isto
explica que um contemporâneo tenha declarado: “Imitamos um indivíduo que poria toda a sua casa em
portas e toda a sua propriedade em caminhos”. Enquanto a década 1880 irá ver a vitória da marinha a
vapor, o estado francês continua a construir massivamente os barcos à vela; e embora os subsídios a esta
indústria obsoleta tenha diminuído em benefício da construção de barcos a vapor, eles não
desapareceram antes de 1914.
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Os paradoxos da “Belle Époque”
O profundo retrocesso da França na hierarquia mundial não vai parar de ser conhecido.
Um período de aparente prosperidade durante os 20 anos que vão preceder a Primeira Guerra Mundial,
renovam a reputação do país que conhece assim uma prosperidade harmoniosa.
Apesar das taxas de crescimento, do produto nacional mais fraco que o dos seus grandes concorrentes, o
retorno à prosperidade apercebe-se no começo dos anos 1890. Em 1891, o investimento industrial e a
produção metalúrgica atingem níveis a que eles estavam previamente atentos; os preços recomeçam a
aumentar em 1896 e os lucros bancários estão em alta durante o período 1895-1901.
O crescimento económico acelera-se à medida que se aproxima a guerra. Se entre 1885 e 1905 o
aumento anual da produção industrial se tenha elevado em relação ao período precedente não foi mais
do que 1,95% ele alcança o nível de 4,19% entre os anos 1903-1913; os Estados Unidos ultrapassaram
estas taxas (5,7% entre o período 1890-1910) mas nos anos que precedem a guerra, a economia francesa,
cresce mais depressa que a economia alemã e deixa para trás as taxas inglesas (1,8% entre 1890 e 1910).
Este crescimento económico é devido à acumulação mais forte de capital visto que o investimento
representou entre 19% e 20% do produto nacional durante os anos 1865-1894 passando a 21% durante
os anos 1895-1913. Tal acumulação de capital começa também a induzir as mudanças na gestão das
empresas: os métodos adoptados tornam possíveis a curto ou médio prazo, a colocação dos preceitos
propostos por FW.Taylor. Tal acumulação requer em paralelo, o desenvolvimento de bancos regionais e
bancos empresariais (Banco da União Parisiense).
Uma das consequências deste crescimento, é a redução do deficit comercial (as taxas de cobertura
passam de 71% em 1870-1894 para 88% entre 1898-1913). Isto testemunha uma melhoria relativa na
posição da França nos mercados internacionais.
Esta acumulação de capital que acelera, significa que a passo da modernização, as indústrias tradicionais
sobre a qual assenta a economia francesa, representam mais de metade da produção industrial nacional,
os seus progressos condicionam toda a outra indústria. Conhece-se esta modernização na maioria das
filiais: o uso da máquina de costura, generaliza-se na confecção, a fabricação dos têxteis em linho
permitem o investimento e então a mecanização da industria do algodão, a industria alimentar com a
urbanização imprimindo conhecimento sobre um crescimento real, a industria relojoeira alarga a sua
produção nas mecânicas pequenas. A adaptação de certos empreendimentos é típica desta modernização:
Michelin foi fundada em 1832 e começa a produzir pneus em 1886; Panhard, antes de ser uma grande
empresa automóvel construía máquinas de madeira.
O crescimento era mais forte nos sectores que se encontravam naquilo que chamamos – certamente de
maneira abusiva – a segunda revolução industrial. A adaptação massiva de fornos Martin, e a partir dos
últimos anos do século XIX tal como os conversores Thomas-Gilchrist juntaram-se a um crescimento de
armamento, a uma renovação da construção ferroviária e ao aparecimento de carros e de bicicletas
permitindo a passagem duma taxa de crescimento da produção siderúrgica (aço) de 3% na década 1890
para 5,8% na década 1900.
Este período vê o aumento da produção de electricidade que quadruplica entre 1905 e 1913; esta
produção é essencialmente de origem hidráulica, um tal empreendimento impulsiona o crescimento de
equipamentos (Thomson-Houston. Scheneider) e permite que numerosas filiais adoptem este tipo de
energia motor.
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Uma outra indústria vê o dia nesta época e conhece em França um crescimento particularmente rápido: a
produção de automóveis passa de 1850 unidades em 1897 para 41000 em 1912, as firmas (Renault,
Peugeot) fazem passar este novo meio de transporte de status de objecto de luxo para o de gama “média-
alta”. O crescimento desta indústria metalúrgica impulsiona outras: as fábricas Michelin empregam 10
000 pessoas em Clermont-Ferrand em 1913.
O crescimento do sector secundário não se faz neste começo de século m detrimento de outros. O sector
terciário também emprega uma parte do crescimento da população activa; à parte de 310 000
trabalhadores no fim do primeiro decénio, encontramos 120 000 professores e outros tantos carteiros.
Finalmente o crescimento económico nota-se também na agricultura. Se os preços destes produtos são
orientados pela baixa, o crescimento da procura mundial e o crescimento da indústria permitem o
aumento da renda ao agricultor, especialmente com a reconversão para o elevar. Embora a produção
agrícola permanecesse fraca (a França é deficitária aos níveis das trocas agrícolas em cerca de 1/10 das
suas necessidades), este período vê o apogeu do emprego agrícola (8 a 9 milhões).
Apesar do seu crescimento, a economia francesa é tocada pelas crises cíclicas que atingem a economia
mundial até à primeira guerra mundial. Mas no princípio do século XX, estas perturbações são
atenuadas pela França. Por exemplo, considerando que a crise de 1900-1903 foi relativamente profunda
para os Estados Unidos (pânico de Richman) e na Alemanha, era menos profunda, em França apesar das
colheitas ruins que se avolumam, como nas crises de 1907 e 1913, elas limitam-se no hexágono, parando
momentaneamente o aumento dos preços.
O dinamismo económico recuperado, tem tendência a modificar a situação industrial do país. Não
provocou uma desertificação do território em benefício das cidades, mas acentuou as disparidades entre
regiões que conhecem uma expansão real que não é influenciada pela nova industrialização e que, ao
contrário vêm a velha industria desaparecer rapidamente.
Assim, várias regiões são o assento de um real crescimento industrial. A região parisiense onde
aparecem as cidades cogumelo concentra uma grande parte da indústria mecânica. A norte, em Lorraine
que já substituiu a indústria sob dominação alemã, procura a sua expansão já envelhecida. O
desenvolvimento da região Lyonnaise circundada por um lado pelo Forez e os montes Vivarais, e do
outro pelos vales alpinos, teve cada vez mais importância; os Alpes beneficiaram da indústria induzida
pela expansão das barragens e torna-se o local das indústrias modernas como a electrometalurgia e a
electroquímica.
Por outro lado, a metade ocidental do país tornou-se a “França da estagnação”. O desaparecimento da
produção de ferro fundido trouxe uma parte importante da siderurgia do maciço central. O Languedoc, o
Aquitaine, os Pirinéus, a Bretanha, aos quais é necessário juntar a Província da Córsega.
Duas regiões particularmente desertas viram as poucas indústrias que estavam implantadas desaparecer.
Estas regiões permaneceram fora das grandes correntes económicas e só preservaram um pouco de
glamour mantendo um potencial de desenvolvimento, como as cidades de Nantes e de Bordeaux e os
velhos centros mineiros do sul do maciço central (Decazeville, Carmaux, Alès). Aqui temos uma carta
económica de França que pouco se modificou no corrente século XX.
Se a “Belle Époque” foi um período paradoxal, é porque a expansão das rendas não acompanhou o
bónus do aumento de produção. A diminuição de preços permitiu até 1896 um aumento dos salários
reais, mas a inflação aparece no princípio do século e acelera com a aproximação da guerra. Os preços
que aumentam 15% entre 1897 e 1913 cortam ainda mais os salários; os anos da “Belle Époque” que
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conhecem o crescimento económico mais forte são também aqueles durante os quais se verifica a
diferença do que se passou durante meio século, os prémios da classe trabalhadora baixam.
A aparição do fenómeno inflacionista dá uma das chaves da expansão francesa durante os anos que
precederam Agosto de 1914. Embora o crescimento da produção de armamento aumente menos que a
produção siderúrgica durante esta fase, a defesa nacional passa de 34% para 41% entre 1890 e 1913 no
orçamento de estado. Por outro lado, a relançamento dos equipamentos ferroviários durante os últimos
anos antes da guerra tem como objectivo trazer as tropas o mais breve possível para as frentes. É
necessário saber que a indústria de armamento é uma das únicas juntamente com a indústria automóvel
para as quais a economia francesa é competitiva.
Efectivamente – e é o segundo paradoxo – fora das grandes cidades é que a França é irremediavelmente
ultrapassada pela Alemanha a nível económico. O crescimento francês não deve esconder que se este
país for o quarto poder económico do mundo, é o primeiro distante dos três. Em 1913 a França alcança
6,4% da produção industrial mundial apesar dos números de 15,7% para a Alemanha e de 14% para a
Inglaterra. A comparação é tanto mais flagrante se olharmos para as regiões mais dinâmicas da época:
- a França produz 4,7 milhões de toneladas de produtos siderúrgicos em 1914 contra 17,6% da
Alemanha e 7,9 da Inglaterra.
- A França produz 3,6% dos números empresariais mundiais na electrotecnia contra 31,6% da
Alemanha, os empreendimentos franceses desta fase são conquistados pelos empreendimentos alemães e
americanos (AEG e General Electric controlam Thomson-Houston, etc.).
- A química francesa que é composta por empresas muito pequenas não se sabe adaptar às
novidades técnicas que são a carboquímica e a química de síntese.
É pois um país que perdeu definitivamente o contacto com as primeiras potências económicas mundiais
que vai sofrer na guerra um terrível abalo das suas forças produtivas e em particular humanas.
É ao nível humano que encontramos a segunda razão da depressão francesa de 1850 a 1914. O
maltusianismo teve um peso importante em França durante o século XIX e aumenta no final do período.
A população francesa não aumenta mais do que 0,2% por ano entre 1896 e 1913 sem que o estado reaja
através dos políticos anti-maltusianos. Tem como resultado um crescimento da população activa de
0,2% por ano enquanto que os números correspondentes são de 1,4 para a Alemanha e 2,6 para os
Estados Unidos.
A Primeira Guerra Mundial e suas Consequências
A economia de guerra
Embora a preparação da guerra tenha um impacto na evolução da produção industrial, a concepção que
o conjunto da classe dirigente tem é correspondente à época precedente. Assim, o estado-maior prevê a
vitória em 10 semanas com o “plano 17”.
Desde Agosto de 1914, as necessidades da guerra vão revelar-se infimamente mais elevadas do que
previram. A título de exemplo, mencionamos que estava previsto a produção de 13 000 obus por dia
considerando que 100 000 seriam necessários desde o fim de Setembro e entre Agosto e Novembro de
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1914 faltavam 730 000 espingardas. O deficit de produção de armamento é aumenta sendo que uma
parte essencial do potencial industrial francês passa para controlo alemão durante a guerra.
Em consequência a economia deverá ser completamente reorganizada sendo denominada “economia de
guerra”. Esta reorganização terá uma influência considerável na continuação do século.
O primeiro facto desta nova organização vai ser a tomada em mãos da economia pelo Estado. Em tal
período, as necessidades do exército eram imperiosas, os pedidos de armamento pelo estado-maior – em
particular de Joffre – são as ordens. Os comandos não podem ser assegurados pelos seus arsenais, é
transmitido ao poder político que foi reorganizado com vista a obrigar o aparelho produtivo a produzir
com um único objectivo, a guerra. As principais industrias abandonam o regime de competição livre e
reagrupam-se no “comité de Forges” isso atribui ordens aos seus membros, os comandos do Estado,
organizando a sua produção. É o socialista Albert Thomas – secretário de Estado do Armamento que
assume este cargo de 1915 a 1917.
Até 1917, não podemos falar de controlo estatal visto que não é o Estado que dirige a produção nas
empresas. Por outro lado, em 1918, Clemenceau endurece os esforços de guerra, criando uma
administração que controla a produção, as trocas e organiza os transportes. Toda esta organização
conduz ao aparecimento do racionamento que significa que o Estado não deixa à sociedade civil o
estritamente necessário para a sua sobrevivência; outro resultado é que uma série de grandes empresas
produzem essencialmente armamento; a Renault fabrica cargas ligeiras, a Citroen os obus, Bréguet os
aviões e até o ourives Christofle é quem fabrica os cartuchos de obus. Alguns subsídios volumosos são
atribuídos a estes industriais com vista na modernização das suas empresas e na obtenção de lucros
elevados.
Mas o exército não necessita apenas de armas, é necessário que consiga viver; por isso o governo
requisita toda uma série de produtos (farinha, carvão...) e tem que fazer que estas retiradas não
provoquem a desorganização das trocas. Para fazê-lo, ele supervisiona os preços (1915) em alguns
impostos. O resultado desta reconversão é alcançado em 1918, a indústria francesa produz 261 000 obus
por dia e 10000 canhões por mês.
O financiamento desta produção e a reconversão industrial é a segunda função da economia da guerra.
As despesas da guerra não são cobertas em mais de 15% pelas rendas fiscais. É necessário mobilizar
maciçamente os recursos financeiros para fazer face às necessidades. Metade das credenciais que a
França tem sobre o estrangeiro estão liquidadas mas os recursos encontram-se através de 2 meios
principais. A parte essencial do financiamento directo da guerra provém do empréstimo; disto é lançado
um para pensão perpétua, todos os anos e ajusta-se durante o tempo do conflito. A emissão de “bens da
defesa nacional” para 33 milhões de francos. Por outro lado, 20% das despesas anuais são cobertas pelos
avanços da banca, o que visa a multiplicação por 5 da circulação simulada considerando que o poder de
compra é dividido por 3. Este crescimento explica, pelo menos em parte, a quantidade de empréstimos,
pois este aumento da circulação permite a compra de bens. Em resumo a guerra foi financiada em
grande parte pela inflação.
A terceira função da economia da guerra é a mobilização da mão-de-obra. Desde 1914, 3,6 milhões de
homens são mobilizados para a guerra. Isto desorganiza toda a economia (agricultura e indústria),
provoca o desemprego (1,9 milhões de homens em Outubro de 1914) e a queda da produção. Era
necessário encontrar activos em número suficiente com vista a fazer face às necessidades da economia
da guerra. Os trabalhadores mais qualificados são chamados para a produção (500 000 em 1917), o
trabalho feminino é encorajado, o emprego das mulheres aumenta em 30% e as fábricas não trabalham
apenas na sua produção. Contratam-se emigrantes belgas, espanhóis, norte-africanos e indochineses.
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A mobilização da mão-de-obra, consiste também em tentar manter a paz social e isolar aqueles que, em
França, são apelidados de “anarco-sindicalistas”. Apoiando-se sobre a fracção da Confederação Geral do
Trabalho (CGT) organizada ao redor de Léon jouhaux, Albert Thomas nomeou delegados nas oficinas
encarregues de permitir a solução pacífica dos conflitos. Apesar disto, uma tal política exigida pela
dureza das condições de vida e os males da guerra, uma série de greves vão explodir: 50 000
trabalhadores fazem greve em 1917 e 100 000 trabalhadores cessam trabalho nesse ano. Contam-se 100
000 grevistas em 1918.
Mesmo que a França aumente o desafio económico da guerra ela está enfraquecida.
Somente as empresas que produziram armamento, aumentaram a produção (a metalúrgica e a química
para, respectivamente 53% e 16%) mas de maneira geral, a crise é mais profunda pois a produção
industrial diminuiu 38% (39% na Alemanha) em 1920 em relação a 1913. Todas as produções de bens
de consumo diminuíram, o que indica a degradação das condições de existência da população. Da
mesma maneira que a produção agrícola baixa 40% em relação à que tinha estado em 1913.
A explosão da moeda corrente, tem como consequência um forte aumento dos preços que alcançam o
índice 340 em finais de 1918 (base 100 em 1913) a degradação era maior que na Alemanha pois o índice
neste país não era mais do que 217. O rendimento nacional da França foi de 328 milhões de francos em
1913 (preço de 1938). Esse mesmo rendimento não era mais do que 270 milhões em 1918. A diminuição
da produção durante a guerra ajustou-se às destruições propriamente ditas e que são consideráveis. Treze
departamentos foram atingidos e outros desapareceram por completo. As destruições contam-se a dois
terços do proveito nacional antes da guerra e as perdas totais devidas à guerra em 15 meses deste mesmo
proveito. As perdas humanas foram de 1,3 milhões de mortos durante os combates o que corresponde a
34% da população francesa, números recorde entre todos os países envolvidos e ao qual falta juntar 150
000 mortes devidas à gripe espanhola entre 1918 e 1921.
O estado de espírito da classe dirigente no fim da guerra é que a Alemanha perdeu uma guerra da qual é
responsável e que por isso deve assumir as consequências; “a Alemanha pagará” este será o slogan. A
comissão de restauração organizada pelo tratado de Versalles, fixa o montante de crédito sobre a
Alemanha em 132 milhões de marcos d’ouro donde 52% deverão ser pagos à França. O pagamento
previsto por um período de 30 anos, dura apenas de 1919 a 1931. Isto provoca a ocupação do Rhur de
Janeiro de 1923 a Abril de 1931 e será reorganizado de acordo com o plano Dawes em 1924 depois pelo
plano Young de 1 de Agosto de 1930. A título destes diferentes planos, a França recebe o equivalente a
9,58 milhões de marcos d’ouro o que corresponde a:
- 42% das somas totais que a Alemanha paga em função das restaurações.
- 57 milhões de francos 1928 são dois meses e meio do proveito nacional deste mesmo ano. Estes
números são necessários para comparar o montante total de restaurações efectuadas pela França, no
montante de 136,5 milhões de francos-1928 ao que falta juntar as pensões de guerra correspondentes a
um cruzamento de 1,6% a 2,3% do produto nacional de acordo com os anos.
Estas restaurações são doutro lado cortadas pelo reembolso das dívidas interligadas de 1927 a 1931,
sendo assim o montante global eleva-se para a França em 9,5 milhões de francos. O montante efectivo
do pagamento das restaurações sob as diferentes formas não suaviza as terríveis tensões que se exercem
sobre a economia francesa depois do fim da guerra.
A primeira guerra mundial, tanto para a França como para os outros países, foi um balanço nos
relatórios de Estado e da sociedade civil, em particular ao nível da economia. Se durante o século XIX
as forças políticas tiveram um certo peso no que concerne às estruturas económicas do país elas não
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alcançam conforme o velho slogan liberal “deixem fazer, deixem passar” nenhuma acção circunstancial
e o peso do estado no rendimento nacional é muito fraco. A partir do fim da primeira guerra mundial,
iremos ver os governos influenciar muito mais a marcha da economia. A guerra de 1914-1918 foi o
momento, sem dúvida essencial, durante o qual o Estado começou a controlar a produção da
distribuição, controlo que não afrouxa durante os anos 20 e que será definitivamente confirmado durante
os anos 30.
A crise monetária
Vimos como, durante a guerra, os avanços da Banca francesa em relação ao tesouro público e o
crescimento da corrente de circulação que se seguiu provocou uma forte inflação. Mas embora a
inconvertabilidade do franco tenha sido decretada desde o começo da guerra, o seu valor legal
continuava a ser o mesmo que o do franco germinal (322 mg d’ouro) e o governo do bloco nacional, que
quer dizer de direita, que saiu das eleições de Novembro de 1919, considerou este valor como eterno, de
facto, vai-se revelar ser ilusório desde que a Inglaterra em Março de 1919 e os estados Unidos em Julho
do mesmo ano vão deixar de sustentar isto.
O franco vai conhecer um grande deslize que só parou com a chegada ao poder de Raymond Poincaré
em Julho de 1926. Esta baixa do valor do franco vai ser muito mais profundo do que a herança
monetária da guerra, as reparações obrigaram o governo a aumentar as despesas públicas de 40% entre
1920 e 1922. Os compromissos resultantes da dívida e os pagamentos das pensões não permitem o
retorno ao equilíbrio orçamentário, e apesar da vontade do governo de desimpedir o Estado da economia
na perseguição do mito de retorno para a situação que prevaleceu antes da guerra.
Desde Março de 1919, a paridade do franco em relação ao dólar, que era par o franco germinal de 1
dólar para 5,18 francos aumenta para 10,87 francos. Um primeiro alerta vai ter lugar com a aparição da
crise económica de 1920-1921. Em Abril de 1920, o dólar alcançou 16,24 francos e, se tudo parecia ter
entrado na ordem em 1921, a ocupação do Rhur e as tensões que isto requer entre os aliados vão fazer
saltar o valor do dólar para 18,25 francos, depois para 28,74 francos e isto num clima de pânico. A
tensão cai com a intervenção da banca Morgan, mas a situação degrada-se profundamente sob o governo
do cartel de esquerda que chega ao poder a 11 Maio 1924. A deterioração do valor do franco, que não
correspondia mais ao movimento dos preços (no momento das eleições, podemos calcular que o valor
normal do franco encontra-se à volta de 13 francos por 1 dólar) vai novamente acelerar devido a muitas
razões. O presidente do conselho Edouard Herriot declara que o governo é vítima da “parede do
dinheiro”, ele denuncia a subida de capitais e a recusa de subscrever os empréstimos públicos. Para ser
justo, é necessário dizer, que se os ricos não têm confiança num governo que é suposto atacar o
capitalismo, este mesmo governo não vai evidências por si só. A história das políticas tentadas pelo
cartel de esquerda é um dos fracassos sucessivos onde cada medida de políticas económicas não faz
mais do que agravar em vez de restabelecer.
Limitemo-nos nos momentos mais marcantes. Desde a instalação do governo, Herriot tem dificuldade
em renovar os bens do tesouro, o que o leva a dissimular os avanços da banca francesa, não engana
qualquer pessoa, especialmente porque este recurso não faz mais do que valer-se dos empréstimos
atribuídos. Em Novembro de 1925, o governo de Painlevé propõe uma renovação obrigatória dos bens
do tesouro, o que significa que o estado não é capaz de honrar a sua assinatura. O dólar está a 25
francos. Em Abril de 1926, o ministro das finanças, Péret, propõe “uma contribuição voluntária para o
aumento do franco e o reembolso da dívida”. O dólar está a 34 francos. Em seguida o governo exige à
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Banca uma parte do seu encaixe e a 24 de Junho, o ministro Joseph Caillaux prevê um programa de
austeridade recusada pela “Câmara”. O dólar está a 41 francos, perdeu 65% do seu valor em relação a
1924.
A 21 de Julho de 1926, Poincaré é aceite pelo parlamento. Ele propõe um programa de austeridade que
compreende o aumento das taxas de desconto, dos direitos de alfândega, dos impostos indirectos, a baixa
de impostos sobre as rendas e o limite do deficit orçamentário. A sua política vai tornar-se uma
referência durante várias décadas. Em virtude da confiança que o capital faz a Poincaré, o franco
recupera 10% numa semana e 100% em 6 meses, em Dezembro de 1926, o franco estabiliza por volta
dos 25 francos por 1 dólar. A crise monetária acabou.
O alcance da paridade no princípio do Inverno de 1926 foi oficializada pela lei de 25 de Junho de 1928
que definiu um novo valor do franco a história manteve como franco Poincaré. Este último pesa 65,5 mg
de ouro a 9/100, corresponde a 1/5 do franco germinal e a paridade de 1$ = 25,53 francos. A
convertibilidade é restabelecida em barras de ouro.
Na realidade, o valor que a lei dá ao franco é mais baixo 10% o que corresponde à evolução dos preços,
não estava sem influenciar a evolução económica ulterior francesa. O aumento dos preços que tem lugar
durante a guerra continua até 1926, excluindo durante o ano de 1921 devido à crise internacional.
Esta inflação galopante que leva o preço bruto aos níveis 591 em Outubro de 1926 tem várias
consequências:
- é mais fraca que nos outros países (na mesma data, os preços estão ao nível 852 nos Estados
Unidos), o que entra no senso da melhoria da competitividade comercial da França.
- Entre 1913 e 1930, a dívida do Estado detida pelos particulares é desvalorizada de 995 milhões
de francos em 1928 (correspondente a 3 a 4 anos de renda nacional) à qual é necessário somar a
diminuição de interesses, para financiar a guerra, o Estado francês praticou a “eutanásia dos capitalistas”
teorizada por Keynes alguns anos mais tarde.
A fraqueza da produção francesa no dia seguinte à guerra terminar não permite fazer face às
necessidades da população, isto traduz-se por um comércio exterior totalmente desequilibrado. A taxa de
cobertura é de 32,2%. A reconstrução vai tocar juntamente a economia nacional, as dinâmicas
respectivamente da agricultura e da indústria que têm modalidades e motores profundamente diferentes.
A evolução da agricultura depende essencialmente dos pensadores do passado e da sua incapacidade de
adaptação a um modo de transformação mais rápido. Parte da população activa empregue na agricultura
baixa entre 1919 e 1931 de 38% para 32,5%. A dispersão das terras e as explorações muito pequenas são
os elementos dominantes. Uma tal evolução de estruturas produtivas permite um ligeiro crescimento da
produção (nível 103 em 1931 sobra a base 100 em 1913) e da produtividade (20% até 25% no mesmo
período), porém é muito mais lenta que nos outros países desenvolvidos (o rendimento por hectare é
superior 30% na Alemanha) e não previne uma degradação da suficiência nacional que passa de 85%
para 74.8% entre os anos de 1910 a 1913 e 1929 a 1931. O atraso agrícola da França agrava-se.
A reconstrução industrial traduz-se por um período de crescimento onde o ritmo foi influenciado de
maneira contraditória pelos movimentos monetários. A tendência expansionista vai-se verificar
plenamente até ao fim de 1920 em 2 anos, a produção industrial aumenta de 20% mas é interrompida em
1921 pela recessão internacional devido à reconversão industrial da economia de guerra. Durante este
ano negro, a industria perde tudo o que tinha ganho. O crescimento económico vai de seguida reaprender
mesmo que de maneira caótica. Os níveis de produção industrial de 1913 encontram-se em 1924.
Durante este período o crescimento é “puxado” pela melhoria do comércio exterior (as taxas de
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cobertura alcançam 105,5 em 1924) as exportações beneficiam da degradação do franco sem que as
indústrias tenham necessidade de integrar novas técnicas.
A estabilidade monetária de Poincaré faz sentir a modernização insuficiente do aparelho produtivo
francês o que provoca entre 1926-1927 uma depressão da produção industrial de 21%. Portanto o
crescimento recomeça a partir do meio de 1927 porque a estabilização monetária favorece o
investimento e o aumento de produtividade, apesar do valor do franco ser estável continua a favorecer os
produtos franceses. É esta modernização que o presidente do Conselho André Tardieu tem em vista,
quando no fim de 1929, faz adaptar o seu “Plano de ferramentas nacional”. Mas é demasiado tarde, a
crise está implantada, sensível na indústria têxtil e na indústria automóvel e o comércio exterior francês
não se pode manter a não ser pela elevação de barreiras aduaneiras que alcançam 15,5% em 1931.
Apesar dos problemas monetários, é evidente um forte crescimento entre 1921 até 1929, o produto
nacional aumenta 60,5%. Os anos 20 não serão uma idade de ouro por todo o mundo, vimos que isso
advém dos capitalistas. Quanto à condição trabalhadora, não é melhorada, o aumento dos salários são
constantemente anulados pela inflação. È assim que há o aumento de poder de compra de 1920 a 1922
neste último vai baixar progressivamente para se encontrar em 1926 a um nível mais baixo que em 1920.
O aumento de rendimento salarial não dura mais do que 4 anos de 1927 a 1931.
Estará a França à beira da grande crise? Uma analise de longo período indica-nos que a taxa de
crescimento anual entre 1913 e 1929 é semelhante à que o país conheceu no século XIX, a saber 1.8%.
Mas este julgamento esquece que a economia francesa levou muito tempo e que a vida económica
nacional tem um carácter muito mais convulsivo que não parece indicar a constância destas taxas de
crescimento durante um longo período. As taxas de crescimento de 5,4% no ano de 1924 a 1929 tem
para o senso um esforço de alcance tecnológico e por isso económica que vai bloquear e inverter os
acontecimentos dos anos trinta.
A França – Homem Doente da Europa
Apesar da paragem da expansão, a economia francesa será primeira vez atingida pela crise mundial
depois da descida do produto nacional começando no 2º semestre de 1930. É durante este ano que o
resultado nacional se torna um pouco estável, conforme relatório de 1929. As razões deste curto período
de estabilidade, durante o qual se verificou que a França era um país da “doce vida”, segura por uma
grande parte da reforma monetária de 1928 e a não evolução da moeda francesa nesta data. Mas a ilusão
da doce França dissipa-se depressa. O ano de 1931 conhece uma degradação muito limpa da situação. A
oscilação e a desvalorização da libra esterlina, em Setembro de 1931 precipitam a inflação mundial e a
esperança do crescimento económico francês.
Se o mercado de valores de Paris sofre com o mercado em relação a Wall Street, a tal ponto que no fim
de 1929 o anti-americanismo faz-se sentir pelo que está a acontecer do outro lado do Atlântico. Em
1930, a diminuição do mercado de valores de Paris alcança 25% nos finais de 1931, o índice das acções
francesas só corresponde a 40% dos níveis mais altos de 1929.
Sabe-se que a reacção do jogo de poder das grandes potências na depressão tem muitas medidas. Era por
um lado a verdadeira guerra aduaneira, à imagem das tarifas Smoot-Hawley posto em parte pelos
Estados Unidos, e monetária que prevê desvalorizações em cascata cujo momento mais significativo é o
fracasso da conferência de Londres em Julho de 1933. Por outro lado, numa 2ª vez, cada um dos países
pratica as políticas de aumento tentando provocar uma modernização do aparelho produtivo com vista a
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fazer face economicamente – e cada vez mais militarmente – às outras potências. Porém as políticas
económicas conduzidas pelo Estado francês parecem ter sido frequentemente mal ajustadas. Assim,
concluiremos que o profundo enfraquecimento da França na véspera da guerra 1939-1945, na
compreensão destes factos exige tomar em conta estas políticas.
A meta do franco forte
Embora a deterioração da actividade económica não tenha um carácter vertiginoso análogo ao que se
conhece dos Estados Unidos e da Alemanha, a situação da França não é menos dramática. As
exportações desmoronam-se, no 2º semestre de 1930, em 27%. De 1929 a 1932, o produto interno bruto
baixa de 17% na indústria automóvel, bastião da economia francesa, perde 1/3 da sua produção nesta
data. As empresas vêm os seus empreendimentos baixar e os bancos importantes abrir falência (Banco
nacional de crédito, Banco da União parisiense que será relançado em 1934)
Depois da estabilidade monetária em 1926-1928, a política financeira tem como objectivo, manter os
grandes equilíbrios com vista a proteger a moeda corrente. A crise e a chegada da esquerda nas eleições
de 1932 não modificam esta orientação principal. Os governos tentam limitar o “stock de dinheiro” em
circulação e de seguida após a Conferência económica de Londres e a oscilação da libra esterlina e do
dólar, o governo francês tenta mesmo tempo que outros países (Bélgica, Suíça, Países Baixos) limitar a
paridade do franco e sua convertibilidade formando o “Bloco de ouro”. Face às dificuldades, que se
agravam, o governo Lavai, em 1935, acentua esta política (a tal ponto que a inflação dos anos 30 é
associada ao nome deste Presidente do Conselho) baixando 10% dos salários dos funcionários e alguns
preços (electricidade, gás, alugueres).
A consequência de uma tal escolha, em 1934, eleva os níveis dos preços dos produtos franceses 20%
relativamente aos preços mundiais. Isto resulta numa deterioração do mercado comercial francês.
Embora o diferencial dos níveis dos produtos seja reduzido em 1935 a situação só se inverte com a
chegada da “Frente Popular”. Se tivermos em conta o comércio com o império colonial, as exportações
caem 61% entre 1929 e 1936, e as taxas de cobertura monetária do comércio exterior durante os anos de
1931 a 1938 não é mais do que 64%.
Esta política de Lavai não é suficiente para prevenir o equilíbrio orçamental porque a crise diminui as
receitas e aumenta o risco da queda financeira e da crise social, o que obriga a manter as despesas
públicas. È assim que o governo tem que encontrar recursos para salvar os bancos, financiar o trabalho
público, permitindo às empresas que se mantenham e auxiliar os desempregados. Mas isto não se faz
parando ou apressando, sem plano coerente, que vise ajudar o plano produtivo francês. Pelo contrário, a
perseguição do equilíbrio orçamental suspende o programa de construção da “habitação bom mercado” e
não sustenta a construção de barragens hidroeléctricas. A parte do orçamento dedicado à indústria e aos
transportes diminui considerando que já era fraco.
A deterioração económica obriga o governo, de certa forma em defesa, a praticar o deficit orçamental,
em 1935 corresponde a ¼ do orçamento de renda nacional. Tal situação contribui para o
desenvolvimento de suspeitas da opinião quanto à ilegalidade do governo sobre a utilização que faz aos
fundos públicos, esta suspeita alimentou vários escândalos que provocaram as crónicas em particular o
negócio de Stavisky que provocou a queda de muitos ministros.
Bem mais que para outros países, a actividade económica francesa é baseada, durante a crise, em
territórios que ela controla, este mercado, mesmo que não faça frente à crise, explica que não bloqueie o
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aparelho produtivo como na Alemanha e nos Estado Unidos. Parte do império das vendas francesas ao
exterior passa de 17,3% em 1929 para 31,3% em 1932-1936. A parte considerável que a agricultura tem
na economia francesa continua a fornecer uma saída importante na indústria é assim que o êxodo rural
se reduz. Se a inflação diminui, a população activa trabalhadora, crê, ou pelo menos mantém o poder de
compra dos que continuam em actividade. O poder de compra do salário semanal, apesar de uma
evolução desfavorável do ponto de vista nominal passou de 100 em Maio de 1932 para 119,7 em Julho
de 1935.
Se a influência estabilizadora do peso económico rural reduziu a queda, não tem ao contrário do slogan
nos anos 20, “salvem o franco” qualquer influência na economia francesa mostrando-se cada vez menos
capaz de beneficiar da queda provocada pelo “novo acordo” nos Estados Unidos”. Entre 1930 e 1935, os
preços agrícolas baixam 50% e o ganho agrícola em 28%. Tal situação devolve aos camponeses mais
imobilistas tanto do ponto de vista do progresso como da formação profissional. O investimento global
diminui fortemente, a produção de bens de equipamento baixa de 36% entre 1930 a 1935. Tal atitude,
que o Estado segue, indica a preocupação que os investidores têm que demoraram na introdução de
novas tecnologias, atitudes que por vezes se qualificaram de maltusianismo. Isto traduz-se ao nível do
estado de espírito simbolizado pela economia e sociedade americanas.
A depressão está ao nível da produção industrial na base 100 em 1928, esta última não é mais do que 85
em 1935. Mas a comparação com os outros países, é agora mais significativa, na mesma data, Alemanha
e Grã-bretanha aumentaram as suas produções de 1928 e os Estados Unidos aproximaram-se. O
enfraquecimento da França verificou-se também ao nível do emprego, o número de desempregados
quadruplica, mas sobretudo, a economia francesa não tem capacidade de fazer trabalhar uma parte
significativa da população activa, o emprego nas firmas produtivas passou de 18,2 a 16,3 milhões o que
significa que os ganhos de emprego que a França alcançou depois de 1896 são apagados.
A incapacidade de ultrapassar o objectivo do equilíbrio orçamentário, teve consequências na produção
de armamento. De 1931 a 1934, a ausência de perigo a curto prazo e a política inflacionista faz baixar a
parte das despesas militares no orçamento de Estado e é só em 1934 que o movimento se inverte. As
despesas de armamento vão passar de 3,3% para 5,8 % da renda nacional. Mas o crescimento do
orçamento militar vai ser pouco eficiente porque a indústria de armamento está pouco concentrada e o
orçamento continua a ser limitado pela preocupação de manter os grandes equilíbrios.
A frente popular: sombras e luzes
Para a esquerda, a crise tem como causa o pouco consumo. Esta ideia explica os acordos de Matignon de
Junho de 1936 e a política do governo de Léon Blum em Junho de 1937. Em seguida a estes acordos, os
salários nominais são aumentados em média 12%. As férias pagas são criadas e a lei instaura a semana
de 40 horas que será efectiva no jogo da indústria até ao fim de 1937. O Estado optou por atitude mais
dirigista, financia os trabalhos hidroeléctricos no quadro de um plano quinquenal e acorda empréstimos
de concessão para a construção de habitações. Os caminhos-de-ferro, ameaçados de bancarrota, são
reagrupados numa mesma sociedade (Sociedade nacional dos caminhos de ferro franceses – SNCF)
sendo nacionalizados, o mesmo se verifica nas empresas de armamento sendo que a sua consistência
técnica é aumentada. Paralelamente, o advento da frente popular é marcada por uma tentativa de
produção de armamento, as despesas militares aumentaram 25% em 1936. Em sequência do pacto
monetário concluído pelos Estados Unidos, Inglaterra e a França em 25 de Setembro de 1936, o franco
perde 30% do valor em relação ao franco Poincaré.
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Esta mudança de políticas nestes primeiros tempos parece coroada de sucesso. Os preços franceses são
inferiores ao do mercado mundial, as exportações aumentam de 20% em valor constante entre 1936 e
1938 e a produção industrial passa entre Abril de 1935 a Março de 1937 dos índices 76 para 94 (base
100 em 1931). O desemprego baixa sensivelmente de 712 000 para 478 000 em Setembro de 1937.
- Frente popular – Coligação dos partidos de esquerda que ocupam o poder em Junho de 1936, cujo
programa tem como base o combate à extrema-direita. Mas o advento da Frente popular é sobretudo
célebre por causa das vantagens sociais que previram os acordos de Matignon.
- Léon Blum (1872 – 1950) Chefe da minoria do SF10 que recusa, no congresso de Tours em 1920, a
adesão da Terceira internacional. Presidente do conselho do governo da frente popular em 1936-1937
será também o presidente do conselho sob a quarta república de Dezembro de 1946 a Janeiro 1947. Léon
Blum ficou na memória da sociedade francesa como o homem mais representativo da frente popular.
Mas a beleza é efémera. A política da frente popular provoca um desequilíbrio importante entre a oferta
e a procura, sendo traduzido por uma dinâmica inflacionista. Vários factores, estão na base de um
sensível crescimento da procura. O aumento do rendimento do trabalho, os grandes trabalhos e o
crescimento das despesas públicas. Porém a aplicação da lei das 40 horas diminui a flexibilidade da
mão-de-obra qualificada sem o que o dispositivo de formação possa ao mesmo tempo aumentar esta
parte da população activa. Especialmente nenhum impulso orçamentário e fiscal é determinado para o
investimento das empresas considerando que o patronato permanece muito desconfiado em relação à
situação política.
Nestas condições, a subida de preços atinge 32,1% em 1937. Provocando um desequilíbrio maciço do
comércio exterior porque a taxa de cobertura não é mais do que 56% em 1937. A tentativa de renovação
é quebrada. A produção industrial declina a níveis próximos de 1935, o desemprego ronda as 650 000
pessoas no ano de 1938. O enfraquecimento da economia francesa traduz-se por duas desvalorizações do
franco em Junho de 1937 e Maio de 1938. Nesta data o dólar vale 35,47 francos e a desvalorização da
moeda francesa vai continuar, ela perde então 28% entre esta última data e Setembro de 1939.
Este fracasso é significativo, com se pode observar, nos anos 30 para a França. Considerando que em
1939 a produção industrial francesa é muito punida, chega a atingir níveis que estavam próximos de
1928, a Grã-bretanha e a Alemanha alcançam o índice 130 no fim de 1939 (base 100 em 1928) e tendem
a modernizar o seu aparelho de produção. É neste último nível que reside o problema, em virtude de
várias empresas operarem um processo de concentração na segunda metade dos anos 30 (Michelin,
Boussac, Vallourec) e tal como outras Saint Goubain, não se empenharam na instalação de progressos
técnicos importantes, o elemento dominante do aparelho produtivo francês é a sua velhice que, em 1938,
chegou a níveis verdadeiramente catastróficos.
Grafico 1. A produção industrial dos 4 grandes países de 1929 a 1939
Nesta base, o crescimento da produção de armamento empreendido pela Frente popular não pode influir
para uma tendência da militarização da economia que sob a acção do governo Daladier e do seu ministro
Paul Reynaud a partir de 1938. O orçamento é reorientado sobre as despesas militares, a aplicação da
semana de 40 horas é suspensa nas fábricas de armamento. O imposto de renda é aumentado em 30%.
Tal política, permite triplicar as despesas militares em 1938 (9,6% da renda nacional). Mas este aumento
do poder económico da guerra é demasiado tardio e bem mais fraco que na Alemanha o que provoca um
desequilíbrio decisivo no poder militar entre os dois países. A título de exemplo, assinalemos que em
Agosto de 1939, a França pode fazer 984 aviões de guerra contra 3 228 para a Alemanha.
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A ocupação e o equilíbrio da guerra
É incontestável que uma parte do pessoal do governo de Vichy tem posições retrógradas e reaccionárias
em matéria económica baseada no ideal duma sociedade rural fundada pelo corporativismo camponês.
Mas outra parte deste pessoal quer desenvolver, apesar do pouco que se pode fazer, na modernização da
economia francesa. Tal opção modernista inscreve-se na criação dos “comités de organização”
controlados pelo Escritório central da repartição e da produção industrial (OCRPI). Este aparelho
administrativo obtém informações sobre as necessidades e recursos dos empreendimentos, distribuindo a
produção disponível e fixa as características que devem ter os diferentes produtos bem como os seus
preços. A meta desta organização é a de permitir à economia francesa fazer frente às necessidades do
ocupante sem provocar a desintegração chamada na época (polonização) do aparelho produtivo francês.
Se esta organização, que através de vários aspectos, anunciou a “economia concertada” e a planificação
conjunta no trabalho depois da guerra, permitiu nalguns sectores uma modernização tímida, ela não
pode, evitar que a Alemanha nazi antecipe uma parte considerável dos recursos económicos da França.
Esta punção vai tocar tanto os produtos e a moeda como a população activa. Por estes valores
produzidos a Alemanha exige um pagamento para a intervenção das suas tropas, os pagamentos totais
realizados durante os 4 anos de guerra é de 632 milhões de francos correntes (assinalemos a título de
comparação, que o rendimento nacional de 1938 é de 380 milhões de francos). O comércio entre a
Alemanha e a França está desequilibrada, isto permite à Alemanha obter 162 milhões de francos
suplementares. A título dos diversos títulos, a França transferiu para a Alemanha 378% do seu PNB.
A Alemanha requer que todos os anos um certo número de activos vá trabalhar no seu território. É assim
que em Novembro de 1943, 1 344 000 franceses e 44 000 francesas estão na Alemanha. Mas as
exigências da deslocação da força de trabalho para a Alemanha, são com passar dos anos, cada vez mais
completas se bem que Speer, ministro alemão do armamento exigiu no fim de 1943 que as fábricas
francesas trabalhem directamente para a Alemanha (acordo Speer-Bichelonne). Se juntarmos os
números dos prisioneiros de guerra e os efectivos das empresas sub contratadas, de acordo com vários
autores, a um número de 6 milhões de franceses trabalham para a Alemanha.
A guerra devastou a economia francesa. 74 Departamentos foram tocados, 23% do capital imobiliário tal
como parte importante das vias de comunicação foram destruídas. Calculamos que os danos devidos à
guerra correspondem a 2 ou 3 vezes o produto nacional de 1938. Embora sejam menos elevados que
durante a 1ª guerra mundial, as perdas humanas não são menos maçivas: 600 000 mortos e 214 000
pensionistas.
Por estas razões, se a produção agrícola se mantém quase a 80% do seu nível de 1938, a produção
industrial desmorona-se sobra a base 100 em 1938; caiu para 72 em 1941, 55 em 1943 e 44 em 1944. É
um país cuja capacidade produtiva é profundamente degradada saindo da guerra. Não parece exagerado
que a França se tenha tornado numa potência de 3ª ordem.
O período de crescimento
A transformação do território francês em campo de batalha, depois das punções realizadas pelo ocupante
alemão asfixiou a economia francesa. Vimos a dimensão da regressão da produção; as exportações
foram nulas em 1944 e não se pagou mais do 32% de importações em 1946, a massa monetária não tem
qualquer relatório em relação à quantidade das mercadorias que circulam. Como durante a 1ª guerra
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mundial as pressões exercem-se sobre a moeda e os preços mas o seu carácter explosivo é bem mais
sentido que em 1918 porque a economia francesa é muito mais fraca que nesta época. Por outro lado, a
situação social provoca privações na população durante estes 4 anos.
Repor a França em marcha e estabilizar a inflação
Em virtude da situação política e social parecer ameaçadora que o general De Gaulle16
, chefe do
governo provisório recusa o plano proposto pelo ministro das finanças Pierre Mendès France, análogo
àqueles que foram feitos na Bélgica e na Alemanha, consiste em converter a moeda, bloquear uma parte
e não dar créditos a não ser a empresas. O plano de estabilidade adoptado, menos severo, encalha. A sua
meta era um aumento maciço das rendas salariais (80% em 1944 e outro tanto em 1945) e relançar os
preços, em vista, da produção. Este aumento de oferta era sensível à paragem da inflação. Caso
contrário, o governo procede a um grande empréstimo em 1944 e à conversão de letras franco por franco
– o que deve excluir os lucros ilícitos – com vista a diminuir a quantidade monetária e a pressão
inflacionista. Claro que não pode compensar o enfraquecimento do franco durante a guerra, este último é
desvalorizado em 66% no natal de 1945 (1$ = 120 francos).
Esta política falha apesar da campanha conduzida pela Confederação geral do trabalho e do partido
comunista francês (PCF) para que a classe operária aumente a produção – a que chamam “batalha da
produção”. A subida dos preços agrícolas e dos salários continua a ser muito forte. A elevação contínua
do nível geral dos preços e a persistência do racionamento que atribui 200g de pão durante o verão de
1947 vincula o desenvolvimento das reivindicações. São eles que provocam as greves importantes
iniciadas em Maio 1947 como a da fábrica Renault de Boulogne-Billancourt
O momento decisivo da estabilidade começa no final de 1947 com a política de austeridade conduzida
pelo governo de Robert Schuman e seu ministro das finanças Robert Mayer. Este plano inclui a
liberdade dos preços, logo o seu aumento maciço, o aumento do imposto sobre a renda e uma nova
desvalorização do franco 48%. Esta última medida permite o restabelecimento do mercado de divisas. O
sucesso do plano Mayer consiste em que pela 1ª vez depois da guerra que os preços estabilizem entre
Fevereiro a Junho de 1948. Portanto a fraqueza do aparelho produtivo francês não permite ainda o
restabelecimento do comércio exterior, o franco continua a sofrer pressões da libra esterlina o que
agrava a situação. Isto provoca a desvalorização do franco em Outubro de 1948 e Setembro 1949.
Depois desta data, o dólar vale 350 francos e esta paridade será mantida até 1957.
A ajuda americana foi outro factor importante na estabilidade da economia francesa. Começa antes da
guerra e acaba sob a forma de acordo “ arrendamento” continuando em 1946 com o acordo “Blum-
Byrnes” e materializa-se sobretudo pelo plano Marshall. Quando este plano acaba, o revezamento é feito
com uma ajuda militar à causa da guerra da Indochina, vinda dos Estados Unidos depois da vitória de
Mao na China em 1949, uma luta contra o comunismo. A França obtém 2,6 milhões de dólares a título
de ajuda Marshall. A totalidade da ajuda civil foi de 4 milhões de dólares soma a comparar ao valor do
PIB francês em 1948, a saber 17 milhões de dólares. A ajuda americana dispensou duma austeridade
ainda mais forte que foi necessária para restabelecer o equilíbrio económico.
16 General Charles de Gaulle (1890-1970) Chefe principal das forças francesas que recusou a ocupação da França
pela Alemanha nazi. Presidente do governo provisório da República francesa de Junho 1944 a Janeiro 1946, data
da sua demissão. Fundador e 1º presidente da 5ª República de 1958 a 1969.
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Durante estes anos, os contemporâneos tiveram a impressão de estar à beira do abismo. Entre 1944 e
1949, os preços são multiplicados por 7 e termina em 1949, os salários são ainda inferiores aos níveis
que tinham em 1938. Por causa dos diferentes factores, que iremos ver, a economia francesa começa a
reconstituição, a pôr-se em marcha. Os estrangulamentos ao nível dos transportes em particular, são
elevados. A produção industrial recupera em 1947 – que é por isso um ano negro – seu nível de 1938 e
eleva-se em seguida de 7% para 8% por ano. O mesmo acontece com os salários onde o seu aumento só
começa em 1947. Finalmente o impulso da produção e as desvalorizações do franco não permitem além
do muito precário, de equilibrar o comércio exterior em 1950.
Dos anos ditos “gloriosos” que não foram 30
Como o jogo do mundo industrializado, a França conheceu um período relativamente longo durante o
qual a expansão parecia não parar. De 1949 a 1973, o produto interno bruto da França é multiplicado por
3 e a sua taxa de crescimento é próxima de 5% ao ano. A ruptura com os outros períodos durante os
quais as taxas de crescimento a longo prazo não passaram 2 a 3% ao ano, e aonde os ciclos económicos
eram profundos e dolorosos, parece definitivo. O aparelho produtivo moderniza-se rapidamente, de tal
maneira que a produtividade do trabalho aumenta a ritmos semelhantes às da produção.
As análises deste período de crescimento são numerosas, mas devemos suster tanto em França como nos
outros países. O Estado tem um lugar desconhecido até então fazendo da economia francesa uma
economia dirigida conforme teses de Keynes e de Beveridge. A parte da despesa pública no PIB era
menos do que 15% antes de 1914, mantendo 42% em 1947 passando a barra dos 50% na segunda
metade dos anos 50. O novo lugar das administrações públicas fixa-se nos primeiros anos depois da
guerra. Em primeiro lugar, a maioria das instituições financeiras (os grandes bancos, 60% das
companhias seguradoras) e uma parte importante do aparelho produtivo são nacionalizados (citemos o
sector da energia, os transportes e a empresa Renault). Por outro lado, a 30 Dezembro 1944, 4 e 19 de
Outubro de 1945, aparecem as leis que organizam as bases da Segurança Social, reagrupando as
seguradoras sociais, as mesadas domésticas e a protecção contra os acidentes de trabalho. Não
deveríamos subestimar a importância económica destes organismos desde 1971, as suas despesas
correspondiam a 29,4% das administrações públicas.
Com estes organismos temos uma parte essencial da construção do Estado-providência. A outra parte
contém todas as acções monetárias e orçamentais cuja meta é de se opor ao ritmo cíclico da actividade
económica e que, como veremos, serão utilizadas sistematicamente pelo Estado francês. O deficit
orçamental quase permanente é uma das manifestações desta acção e tem sucesso sobre a inflação,
qualquer que seja o ritmo estará presente e assim os salários nominais não diminuem nunca.
O deficit orçamental, o controle do crédito, a fixação pelo poder público da hierarquia das taxas de
interesse permitem compreender que o Estado tornou-se o piloto da economia.
O intervencionismo não se manifesta só no Estado-providência. O investimento e a procura são também
dirigidos pelo Estado. É o resultado das nacionalizações, mas também – é a originalidade francesa o
intervencionismo – da planificação lançada por Jean Monnet 17
em 1947. Esta planificação ainda hoje
17 Jean Monnet (1888-1979) Este homem político que nunca solicitou nenhum mandato efectivo teve uma
influência considerável sobretudo durante a 2ª guerra mundial e de imediato no pós guerra. Em particular ele
participou na organização da defesa dos aliados a partir de 1940 e na base da permanência em Londres do general
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existe pelo menos formalmente. Economia liberal, a França não se dota duma planificação imperativa à
imagem da URSS mas de uma planificação “activa” e “concertada”. Planificação activa porque ela
informa as empresas sobre o futuro económico previsível e incita-os a orientarem-se ela esperteza de
subvenções e comandos públicos, é o resultado das negociações entre representantes do patronato, os
sindicatos dos assalariados e da administração dentro das comissões de modernização. O plano é
quadrienal, o primeiro começa em 1974 e dura 5 anos ao abrigo da ajuda Marshall. Os 2 primeiros
planos são sobre a reconstituição da indústria pesada e suas infra-estruturas. A meta dos seguintes é o
desenvolvimento do jogo da economia, mas o seu peso escureceu com a aparição dos “prodromes”da
crise no fim dos anos 60. A planificação não é mais do que um instrumento pelo qual o Estado intervém
na economia e apagando a planificação não significa o dirigismo. Os créditos à indústria não diminuem
apesar de ser menor o Estatal apesar que as instituições financeiras dependerem da sua autoridade
(Caixa de depósitos, Crédito nacional, Crédito agrícola, etc.,) Calculamos que o financiamento público
da indústria privada não pare de crescer chegando a atingir 28% do investimento das empresas em 1974.
É neste quadro que o Estado tenta, nos anos 60, dar um impulso aos sectores que ele julga decisivos para
o futuro do país; é o caso da informática com o plano Calcul (1967-1971) e da siderurgia com a
convenção Estado-siderurgia (1966-1970) do Contrato profissional da construção naval (1968) do
programa espaço (1967-1970) e dos grandes programas aeronáuticos.
Tal vontade de modernização não pode realizar-se a não ser por uma distribuição desigual da renda
nacional com vista a favorecer o investimento. Se o nível geral do poder de compra dos salários foi
multiplicado por 2,5 entre 1950 e 1973, a sua hierarquia aumentou a fiscalidade e foi construída de tal
forma que os salários altos e as rendas do capital foram encorajados. Foi através destas medidas, em
favor da economia que a inclinação do seu peso foi importante em relação à fiscalidade indirecta. É por
isto que os historiadores L.Bouvier e F.Caron puderam dizer “o crescimento é desigual, mas é
crescimento graças à desigualdade, esta é a lógica”.
A comparação da economia francesa com a dos outros países desenvolvidos mostra que o ritmo de
crescimento da 1ª significa variedade. Se fizermos o paralelo com a RFA constatamos que a taxa de
crescimento do PNB da França é sensivelmente mais fraco durante os anos 50 (5% contra 7,7%)
enquanto que é mais forte nos anos 60 (5,8% contra 4,8%). A causa deste fenómeno é essencialmente de
ordem extra económica. Durante a década 1950, a França está quase em permanência com guerras que
conduzirão à descolonização do seu império em função das perdas humanas, estas guerras têm um custo
financeiro considerável. A guerra da Indochina custou 3 milhões de francos, esta soma é superior ou
igual a toda a ajuda americana que a França recebeu depois da segunda guerra mundial. Segundo as
estimativas, a guerra da Argélia custou entre 27 a 50 milhões de francos (em unidades monetárias
posteriores à reforma de 1960, ou um “novo franco” vale 100 “francos velhos”9 será entre 10% e 18%
do PIB de 1961. Tal punção financeira prejudicou a capacidade de investimento. Temos uma razão
principal do que este gráfico nos mostra, a saber somente em 1961, a taxa de investimento em França é
um pouco inferior à dos grandes países desenvolvidos, apesar que será cada vez mais superior durante os
anos 60.
Gráfico 2. A acumulação em França e nos grandes países industriais.
Outra razão desta mudança de ritmo da economia francesa consiste na sua internacionalização. Até ao
começo dos anos 60, a França é protegida atrás das barreiras aduaneiras particularmente elevadas. A sua
reconstrução efectua-se sobre a base do mercado constituído pela metrópole e pelo império, o comércio
De Gaulle a partir de 18 de Junho de 1940. Foi um iniciador da comunidade económica do carvão e do aço e
preside a alta autoridade desta instituição.
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exterior representa uma parte fraca do PNB (6%). Neste tipo de economia protegida, existem poucos
estímulos à modernização. A situação vai modificar-se radicalmente no início dos anos 60 com o acesso
das colónias à independência e a abertura das fronteiras dentro da CEE. O choque sobra a economia
francesa é extremamente profundo visto que o império recebe 42% das exportações francesas em 1952
apesar destes números não serem mais do que 10% em 1971, considerando os países que fazem parte do
império. A abertura da França à concorrência europeia obriga as empresas francesas a acelerar a sua
modernização, fabricando, a parte das exportações passam para 13% do PN em 1972. As empresas nos
anos 60, estão mais organizadas e esforçam-se no sentido da estabilidade política recuperada com o
advento da 5ª República.
Fora deste período, o crescimento francês não estava longe “dum fluxo tranquilo”, porém é necessário
que até à segunda metade dos anos 60, os acidentes do crescimento sejam as causas extra económicas.
O primeiro sobressalto teve lugar com a guerra da Coreia. A alta da demanda mundial implicou na vaga
do rearmamento que do ponto de vista da guerra provoca em França um aumento de inflação de cerca de
15% em 1952 e 1953 fazendo reaparecer o espectro inflacionista imediato ao pós-guerra. As medidas do
presidente do conselho Antoine Pinay18
na primavera de 1952, e em particular o seu famoso empréstimo
indexou o ouro parando esta inflação ao preço duma ligeira recessão com base no crescimento
económico mundial.
Os problemas dos anos 1956-1958 são bem mais graves. O deficit orçamental ocasionado pela
intensificação da “pacificação” da Argélia, o começo do aumento do investimento prevendo a abertura
das fronteiras na Europa e acessoriamente as medidas sociais adoptadas pelo governo de Guy Mollet
provocam graves desequilíbrios económicos. Os preços aumentam 14% ao ano e a taxa de cobertura do
comércio exterior desce abaixo dos 80% no fim do ano de 1956. A França terá que pedir ajuda aos
Estados Unidos e ao FMI. Face a esta situação, toda a panóplia das medidas de austeridade vão ser
levadas a cabo pelo governo de F. Gaillard e depois por Antoine Pinay, sob a autoridade do general De
Gaulle em seguida. Vejamos apenas 2 elementos, entre Julho de 1957 e Janeiro de 1958, os salários reais
baixam 5,5%, feito extraordinário e inigualável cumprido durante a crise até aos anos 80. Por outro lado,
todos estes equilíbrios obrigam a proceder a 2 desvalorizações: a primeira chamada “operação 20% é
feita em 2 tempos (Agosto e Outubro 1957), a segunda de 17,5 % foi feita por Antoine Pinay em
Dezembro de 1958. A primeira serve para diminuir os salários reais e assim os custos das empresas e
segunda a relançar as exportações.
A nova tendência inflacionista aparece com a chegada dos “repatriados” da Argélia (1 milhão de
pessoas) obrigam o governo e seu ministro das finanças Valery Giscard d’Estaing 19
a aplicar um plano
de estabilidade. Esta política vai reentrar na fase “prodromes” da crise económica mundial na segunda
metade dos anos 60, contribuindo assim o crescimento debilitado durante os anos 1965-1968. Está
compreendido entre 4,5% e 5% ainda que depois de 1961 oscilou entre 5 e 7%. Esta amena recessão do
governo Pompidou e seu ministro da economia e finanças Michel Debré, realizou um plano de aumento
muito moderado (0,4% do PIB) a meta é reforçar a competitividade da economia francesa pela limitação
dos preços e o aumento do investimento. Esta recessão proporciona os incidentes de Maio de 68, eles
18 Antoine Pinay (1891-1994) homem político de direita – chamado moderado depois da 2ª guerra mundial
– que endireitou as finanças e a moeda francesa em 1952 e tornou-se um símbolo político anti inflacionista.
19 Valéry Giscard d’Estaing – homem político de direita nascido em 1926. Ministro da economia e das finanças
debaixo das presidências dos presidentes Charles De Gaulle de 1962 a 1966 e de Georges Pompidou de 1969 a
1974, presidente da república de 1974 a 1981.
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mesmo obrigam o presidente Georges Pompidou 20
a desvalorizar o franco em 12,5% em 8 de Agosto de
1969.
Este período vai terminar para a França num ambiente eufórico; a desvalorização e um esforço
sistemático do Estado em favor do investimento permitem uma taxa média de crescimento durante os
anos de 1969 a 1973 de 5,9% o que corresponde a um nível mais elevado que o dos outros países (4,4%
em média)
De maneira geral, o período de crescimento económico do pós-guerra e particularmente nos anos 1960 a
1974 serão um período dinâmico para a economia francesa. Ela torna-se na 4ª potência económica do
mundo e no 3º exportador mundial. Modernizando a agricultura, que aumenta a sua produção anual de
3%, a França conhece um êxodo rural, a população agrícola passa de 5,1 milhões em 1954 a 2 milhões
em 1976, a França torna-se a exportadora principal de produtos agrícolas.
Apesar desta subida, o crescimento não permite passar a velha estrutura. Estes são particularmente
óbvios no comércio exterior. A partir da dispersão do império colonial, no início dos anos 60, a taxa de
cobertura das trocas industriais não param de se degradar, passando de 204% a 98% entre 1959 e 1969.
Isto indica que na maioria dos sectores de produtos manufacturados o aparelho produtivo francês tem
muito que fazer para fazer face à concorrência internacional. Por isso, é muito mais positivo nesta
matéria no final deste período. Com base na desvalorização de Agosto de 1969 e o esforço de
equipamento maciço realizado durante a presidência Pompidou, teve lugar uma correcção parcial da
balança industrial. Em 1973, a taxa de cobertura das trocas industriais chega a 107%.
No mesmo sentido, se certas filiais industriais são competitivas (indústrias de transporte, aeronáutica,
automóvel, agro-alimentar, metais não ferrosos), outras ficam gravemente deficitárias e mostram
dificuldades da economia francesa em erguer-se ao nível da nova tecnologia dos países mais
desenvolvidos electronicamente, com bons equipamentos e ao nível da informática. A concentração da
economia francesa é inferior à da indústria Alemã. Estas fraquezas ainda hoje são verdadeiras.
O desenvolvimento da França neste grande período de crescimento tem uma particularidade. Uma parte
importante da sua mão-de-obra saiu directamente do sector primário para o sector terciário sem a
passagem pelo secundário considerando que este último era geral para os outros países desenvolvidos.
Isto permitiu pelo menos equilibrar a balança comercial que estava deficitária.
A crise actual: A miragem ao “fundo do Túnel”
Vimos há pouco que a taxa de crescimento nos anos 1969-1973 não foi a mesma do período de crise.
Por isso estes anos são marcados pela desregularização económica que não deve nada ao aumento do
preço do petróleo. Se ao nível internacional a crise monetária tem sucesso no desmantelamento do
sistema postos em prática por Bretton Woods, em França traduz-se pelo crescimento da inflação durante
este período os preços aumentam 5,9% contra 3,8% durante os anos 1963-1969. Da mesma maneira que
a expansão ao nível internacional tem uma leitura em França apesar dos números elevados do
crescimento francês, o desemprego de 400 000 pessoas que surge em 1967 não pôde ser reabsorvido.
Isto significa que a economia francesa não ocupa a totalidade da sua população activa. Na realidade, um
outro sinal da crise apareceu mais cedo, é desde 1964-1965 que a produtividade do capital começa a
20 Georges Pompidou (1911-1974) acompanhou o general de Gaulle na sua acção até 1969, foi seu director de
gabinete em 1944 e seu primeiro-ministro de 1962 a 1968 até à sua morte provocada por leucemia.
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diminuir, podemos pensar que a progressão da inflação não é mais do que a resposta a esta primeira
causa.
Depois de então a crise não tem feito mais do que aprofundar-se, de 1974 a 1979, a taxa média de
crescimento anual do PIB é de 3,1% e o número correspondente para o período 1980-1987 é de 1,6%. O
desemprego que era um pouco inferior a 400 000 no início de 1973 é de 1,5 milhões em 1980, 2,5
milhões em 1985 e 3,3 milhões no final de 1993 sendo respectivamente 6,5%, 10,3% e 11,2% da
população activa. A fraqueza da criação de emprego é ainda mais significativa, não é mais do que 0,2%
por ano entre 1973 e 1980 (0,7% entre 1963 e 1973) e desde 1974 a indústria pede empregos. Tal como
nos outros países, o aprofundamento da crise não é linear pois faz-se de acordo com o ritmo das
recessões e dos relançamentos estes últimos fazem crer, periodicamente como nos disse o 1º ministro
Jacques Chirac 21
no final de 1975 que “vemos a luz ao fundo do túnel”.
O ritmo desta crise foi ditada pela evolução da economia mundial, mas as políticas conduzidas pelo
governo não foram sem efeito na marcha da economia do país.
O relançamento realizado pelo governo Chirac (1974-1976)
A recessão devido ao aumento dos preços do petróleo foi particularmente brutal entre o 2º trimestre de
1974 e o 2º trimestre de 1975, a produção industrial baixa de 10%, certas filiais como a indústria e os
automóveis foram particularmente tocadas (baixa de produção em 20%), o desemprego dobra e a
inflação atinge 12%. A França foi mais atingida que os outros países e as suas empresas arriscam a
asfixia. Para parar a crise, o governo Chirac tem de endireitar a situação com um plano de aumento de
44,6 milhões de francos, sendo 2,6% do PNB. Este plano relativamente importante é tanto mais
significativo que é realizado em 3 tempos durante o período de 1974-1975, as 2 primeiras tranches
mostram-se insuficientes para parar a degradação. Ajuda sobretudo a tesouraria das empresas, apenas
8,5 milhões de francos são utilizados nas mudanças do Outono de 1975.
O aumento parece ter sucesso porque o PIB cresce 5,2% em 1976 taxa que nunca tinha sido conhecida.
Mas esta passagem é acompanhada de 1 diferencial de inflação com os principais parceiros comerciais
(5% com a RFA) e por uma importante degradação do comércio exterior onde as taxas de cobertura
caiem para 90%. É por isto que Raymond Barre22
que sucede Jacques Chirac reordenou a política
económica da França no período de pesquisa da economia do país relativamente aos seus concorrentes
vizinhos.
21 Jacques Chirac nascido em 1932. Homem político gaullista que foi 1º ministro sob a presidência do presidente
Valérie Giscard d’Estaing (1974-1976) e também de François Miterrand na 1ª coabitação (1986-1988) eleito
presidente da república em Maio 1995
22 Raymond Barre (nascido em 1924). Economista e homem político do centro direita. 1º Ministro sob a
presidência de Giscard d’Estaing de 1976 a 1981.
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A gestão de Raymond Barre (1976-1981): austeridade e reestruturação
O 1º senso da política do governo de Raymond Barre é de dar às empresas meios de investir para que
elas melhorem o seu poder exportador. A intervenção do poder público é feito sobretudo em seu favor
com empréstimos bonificados e subsídios. Pelas mesmas razões, o governo pretendeu limitar a inflação
e o deficit orçamental para 1% do PIB. Agiu directamente sobre o comércio exterior desenvolvendo um
programa electro-nuclear cuja meta foi “diminuir a factura energética”, (em 1985 mais de metade da
energia consumida é de origem nuclear).
Desde a chegada ao poder, Raymond Barre vai apresentar um plano de austeridade, este último “radical”
conforme expressão da oposição da época em 1977. Noutros termos, a política do governo Barre é cada
vez mais parecida com uma lista de medidas limitantes do poder de compra dos assalariados pelo
aumento da fiscalidade e das cotizações sociais (a mais célebre foi a instauração duma cotização
suplementar à segurança social de 1% do montante dos salários em 1979) reduzindo os reembolsos de
despesas de doença, por outro lado, os preços bloqueados em 1976 são liberalizados. Inversamente a
economia fiscal é favorecida.
As reestruturações industriais significam o fecho de algumas empresas pouco rentáveis, qualificadas de
“ patos mancos”(Manufrance, Boussac, reparação naval Terrin). No mesmo sentido, o plano Davignon
de reestruturação da siderurgia europeia provoca 20 000 demissões e uma importante crise social.
As despesas públicas são mantidas a um nível elevado para ajudar o investimento mas também com
vista a manter a actividade económica numa medida onde aparecem as tendências de recessão. É
também que de 1977 a 1979, Raymond Barre lança os planos com base no aumento do SMIC (salário
mínimo interprofissional do crescimento) as atribuições familiares, as reformas, etc. Os pactos de
emprego em 1977, 1978 e 1979 concordam com os subsídios às empresas que contratam jovens.
Podemos resumir afirmando que este tipo de política que se baseia nas despesas públicas e também nas
retiradas obrigatórias fez do professor Raymond Barre um praticante do dirigismo.
No contexto internacional, esta política económica, tem efeitos incontestavelmente positivos sobre a
economia francesa até 1979, os outros países praticam um política de relançamento, a política do
governo de Raymond Barre permitiu recuperar alguns pontos do mercado (de 10,5% para 10,7% no
mercado da OCDE) e manter o investimento ao mesmo nível que nos anos 60. Este crescimento, (3,4%
ao ano) foi mais forte do que nos outros grandes países.
Mas o “segundo choque petrolífero” sancionou a fraqueza da política de relançamento da administração
Carter e doutros grandes países é o sinal de mudança a nível internacional. A economia francesa não se
encontra em ambiente favorável, vê a sua dinâmica dobrar brutalmente. Em 1980 as exportações
baixam, a taxa de crescimento do PIB cai para 1,3% e o poder de compra dos salários recua de 0,2% isto
é um dos primeiros passos depois da crise.
O fracasso político de relançamento do governo Mauroy (1981-1982)
Após a eleição de François Miterrand à presidência da república em Maio 1981, o governo vai envolver-
se numa política económica de relançamento pelo crescimento do consumo popular. Entre Maio de 1981
e Março de 1983, um certo número de medidas de carácter social são tomadas:
- são criados 226 000 empregos públicos
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- o SMIG é aumentado em 38%, as mesadas familiares em 28%
- a idade mínima é elevada
- a idade de reforma baixou para os 60 anos
- a semana do trabalho passa para 39 horas e a 5ª semana de feriado é acordada com os
assalariados
- toda uma série de medidas são tomadas com vista a favorecer o emprego de jovens
Estas transformações sociais, são supostas estenderem-se ao sector público a um certo número de
empresas do aparelho industrial e financeiro. Ao nível industrial, o Estado nacionaliza 5 grandes grupos
(Companhia Geral de Electricidade, Saint-Gobain, Thomson-Brandt, Rhône Poulenc, Péchiney-Ugine-
Kuhlman) e controla outras 2 (Dassault e Matra) e a siderurgia, ao nível do sistema financeiro, os
grandes grupos Paribas e Suez assim como 39 bancos são nacionalizados. O alargamento do sector
público deverá permitir o crescimento da produção, o investimento e como consequência a
competitividade do aparelho produtivo. Dali em diante, deve permitir responder ao crescimento da
procura.
Mas durante o período que o governo francês lança esta política de relançamento, os outros governos
sob a impulsão do governo Tatcher e a administração Reagan fazem uma política de purificação de
assassínio político. Conquanto que o poder de compra aumenta 5% em França, baixa na Grã-bretanha e
na RFA. O resultado foi um profundo desequilíbrio da economia francesa. Mesmo sob o ponto de vista
da expansão, os resultados são mais do que contrastantes; se a França regista um fraco crescimento do
PIB durante os anos 1981 (1,2%) e 1982 (2,5%) ainda que os outros países estejam em recessão, o
desemprego chega a 2 milhões em Novembro de 1981; entre 1980 e 1982 passa de 6,3% para 8,1% da
população activa, isto corresponde a uma evolução mais desfavorável do que nos outros países.
Registamos os seguintes desequilíbrios entre 1980 e 1982:
- O deficit orçamental passa de 1,1% para 2,77 do PIB ao qual é necessário juntar os outros deficit
públicos
- em relação aos outros países da OCDE , o diferencial da inflação passa de 1,4% para 4,8%
- ao nível do comércio exterior, a França perde parte do mercado e o deficit comercial cresce
1,4% para 3% do PIB
- a economia das empresas regista uma baixa importante (de 13% para 9% do valor ajustado) o
que diminui a sua capacidade de investimento.
Esta evolução acaba com a multiplicação de 3,5 da obrigação pública entre 1980 e 1984, as necessidades
são tantas que é necessário contrair em empréstimo “secreto” de 2 milhões de dólares à Arábia Saudita.
Neste período o franco desvalorizou-se 3 vezes por ocasião dos reajustamentos de paridade monetária
dentro do SME: Novembro de 1981 (3%), Junho de 1982 (5,75%) e Novembro de 1983 (2,5%). Na
realidade, as desvalorizações são mais fortes que não indicam números em cada reajustamento, o marco
é revalorizado.
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A política de rigor
Estes desequilíbrios exigem cada vez mais, a escolha entre duas políticas: tentar continuar a mesma
orientação isolando os mercados internacionais tanto para com os bens e serviços como para a moeda,
ou mudar política para poder honrar os acordos internacionais em particular o europeu ao qual a França
subscreveu durante muitos decénios. A internacionalização da economia francesa rende a primeira
solução mais perigosa. O Estado francês apesar da escolha política do partido comunista francês e uma
facção do partido socialista, entra numa política análoga à dos outros países, com a particularidade que a
França está a caminho de perder, de facto a política económica de 1981 a 1982 está em causa perante os
grandes países desenvolvidos.
Esta política de mudança evolui progressivamente. O 1º momento corresponde à declaração pelo 1º
ministro Pierre Mauroy na hora da 2ª desvalorização portanto sobre a necessidade duma “pausa nas
reformas” sendo que consistem em bloquear o preço dos salários. Estas medidas têm sucesso através do
desbloqueio progressivo dos preços, à desindexação dos salários. É também a partir deste momento, que
o governo desenvolve o mercado financeiro e aumenta as taxas de interesse com vista a atrair capitais
dos quais a economia francesa tem grande necessidade.
O segundo momento da mudança da política de intervenção com a adopção “duma política de rigor” em
21 de Março de 1983 com a 3ª desvalorização. Comporta uma diminuição das despesas públicas ao nível
do orçamento, das empresas nacionais e das colectividades organizando um crescimento de retiradas
obrigatórias O controle das mudanças é particularmente restrito e imposto. A redução das rendas
domésticas não é mais do que 60 milhões de francos.
A terceira etapa desta política tem lugar na primavera de 1984 sendo que o governo decide diminuir
subsídios às empresas. Esta orientação política é sinal de redução de emprego que estava previsto antes
de 1981 e que o governo de esquerda não tinha posto em prática. Muitas dezenas de milhar de
empregados são despedidos nas carvoarias, na siderurgia e nos estaleiros navais.
Esta política de “rigor” permite resolver os desequilíbrios que ameaçam a economia francesa; em 1986 a
inflação não é mais do que 3% (volta ao nível de 1967) desde 1985 o balanço dos pagamentos correntes
são equilibrados. Porém não pode apagar todas as sequelas dos desequilíbrios anteriores. Entre 1980 e
1986 a carga da dívida quadruplicou e a competitividade francesa está estagnada aos níveis dos produtos
manufacturados. O regresso ao equilíbrio é particularmente pesado para a sociedade:
- Apesar dos países do G7 ao redor da França beneficiem da “ajuda americana” a economia
francesa está estagnada.
- O poder de compra diminui durante o período 1983-1984 em 0,5% ao ano.
- O desemprego passa entre 1982 a 1985 de 8,4% para 10,5% da população activa (a barra de 2,5
milhões de desempregados é alcançada em princípio de 1986), considerando que uma série de
procedimentos (conversão de feriados, criação de trabalhos de utilidade colectiva TUC – paga 1/3 do
SMIC) diminuem o número de trabalhadores queixosos.
Na realidade os ganhos registados neste período é mais forte que os dos anos 1957 e 1958.
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A desinflação competitiva
No período que se seguiu – e até aos dias de hoje – a economia francesa foi pior que a dos outros países
ocidentais, a curva do PIB francês foi idêntica à dos países do G7. Claro que a crise ainda existe, a taxa
média de crescimento anual nos anos 1988 a 1993 não foi mais do que 1,9%. A política de desinflação
são um sucesso pois as taxas de inflação não são mais do que 3% ao ano no final dos anos 80 e desce
2% nos primeiros anos da década de 1990. Isto surge como uma autêntica surpresa, o comércio exterior
francês, depois de um grave deficit em 1989 foi excedentário a partir de 1992.
Mas estes sucessos relativos não significam um melhoramento das condições de vida da população. O
desemprego que não passou acima da barra dos 9% na continuação dos anos 1988-1990 mantendo os
11,3%. Esta taxa não deve esconder uma precarização do emprego sobre todo o período a tal ponto que
hoje reconhecemos que pelo menos 5 milhões de pessoas estão numa situação económica difícil,
resultado duma tendência de aumento da população. Foi para fazer face a esta situação que foi criado em
30 de Novembro de 1988 um rendimento mínimo de inserção (RMI) de 2 000 francos correspondente a
um pouco mais de 1/3 do SMIC.
Ao nível da evolução dos salários, todas as estatísticas concordam fazer da França um dos países
europeus onde a evolução do poder de compra é mais desfavorável e onde ao contrário a taxa de
margem das empresas faz da França um dos países do pelotão da frente de certa maneira, visto que a
taxa foi particularmente baixa nos anos de 1978 a 1985.
O sentido de uma tal evolução é que o estado francês – confundindo todos os países – depois dos anos
1984-1985 geriu a crise de uma forma muito rigorosa. Nesta gestão 3 elementos que procederam a
evolução internacional influenciaram o ritmo do crescimento económico francês:
- o “embelezamento” internacional no fim dos anos 80 permitiram um crescimento de 4,5% do
PIB francês em 1988, foi durante este período que se criou um novo imposto indirecto ( a contribuição
social generalizada – CSG) prometendo um futuro bonito.
- a queda do muro de Berlim e a reunificação da Alemanha acrescem a resposta dirigida à França
retardando a chegada da recessão
- a recessão que toca violentamente a França em 1993, fazendo o PIB recuar 0,8%
É necessário dizer que durante este último período, o Estado susteve a actividade económica o que não
impedirá de prosseguir a meta de “desinflação competitiva”. Dum lado, a obrigação do Estado continua
a crescer: a carga da dívida pública passa de 9,1% em 1986 para 11,7% em 1991. Por outro lado, os
déficit do jogo das administrações francesas conhecem um forte crescimento nestes últimos anos pois
passaram de 1,6% para 5,8% do PIB entre 1990 e 1994.
È verdade que a França não é muito original neste último domínio, mas isto significa que uma eventual
“saída da crise” não poderá surgir dos governos cujo slogan é “alto aos deficit públicos”. A presente
conjuntura faz os comentaristas deduzir que nos encontramos no início da fase ascendente dum novo
ciclo de Kondratieff, mas não será antes uma nova versão do “início do túnel”?
História de França - 1750-1995 – Sociedade e Cultura
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CAPÍTULO 5 – A FRANÇA DOS NOTÁVEIS 1815-1879
De Waterloo (1815) à queda de Mac Mahon (1879), a França está nas mãos de notáveis. Esta pequena
oligarquia - 200.000 pessoas no máximo - que agrupa a nobreza e a burguesia rica, acumula todos os
poderes a nível da economia, da política, da cultura. As outras categorias sociais são excluídas das
responsabilidades de elevado nível, o que gera frustrações e convulsões.
Os contemporâneos às vezes dão-se conta, tal como Tocqueville de espírito frio e ponderado, que
escreve que a França "tomou o andamento de uma companhia industrial, onde todas as operações se
fazem com o propósito do benefício que os accionistas podem retirar " Formulação feliz, pelo menos
para a monarquia de Julho à qual é aplicável, ligeiramente menos no Segundo Império, onde a sociedade
era demasiado complicada para entrar em cálculos de interesse simples, como aconteceu com os
notáveis durante muito tempo.
A hegemonia dos notáveis inscreve-se num período de transição entre o Antigo Regime e a democracia
capitalista. A França assimilou as principais conquistas da Revolução reexaminadas e corrigidas por
Bonaparte: são registadas em termos jurídicos no Código civil ou no código Napoleão, elaborado
durante o Consulado. Os princípios do código, objecto de um verdadeiro culto nas faculdades de direito,
são: a igualdade civil que recusa os privilégios nobiliárquicos, o carácter consagrado da propriedade, o
contrato como regra das relações sociais, a inferioridade das mulheres no casamento.
No plano económico, a França hesita longamente entre o Antigo Regime agrário, onde a terra constitui a
principal riqueza, e o capitalismo industrial que conhecemos hoje. Este longo período de latência é
desconhecido na história das principais potências de Ocidente. A Inglaterra escolheu francamente a
Revolução industrial no fim do Séc. XVIII, a Alemanha e os Estados Unidos por volta de 1880. Ao
contrário, a economia francesa é há muito tempo ambivalente: lá encontra-se um vasto sector arcaico
composto de minúsculas empresas agrícolas, artesanais, comerciais, mas também um sector brilhante
dominado pelos grandes capitalistas. Com efeito, a França converter-se-á francamente à economia de
tipo moderna apenas para 1950.
No plano político, os notáveis impedem qualquer evolução para a democracia mantêm as fórmulas que
lhes garantem uma influência exclusiva sobre o Estado: a monarquia censitária primeiro (1815-1848)
seguidamente a ditadura bonapartista como pio as hipóteses. A democratização relativa do regime
imperial finalmente é-lhes imposta, porque o ideal dos notáveis reside num liberalismo plutocrático23
onde reina a liberdade de expressão, mas onde o poder é reservado aos proprietários mais abastados. São
os historiadores de hoje que, com o retrocesso do tempo, vêem estas seis ou sete décadas como um
período de transição. Os contemporâneos evidentemente não tiveram consciência e o notável
considerava o seu reino como o resultado da história da França. De acordo com as teorias elaboradas
pelos historiadores orléanistes24
Guizot e Augustin Thierry425
, a França, que conheceu as tempestades
23 Plutocracia: reino do dinheiro. 24 Os orleanistas e os legitimistas são as duas principais correntes políticas entre as quais se dividiam os notáveis
(a que se juntaram mais tarde os bonapartistas). Os legitimistas são os partidários do ramo mais velho dos
Bourbons representados, século XIX, pelos dois irmãos de Louis XVI: Louis XVIII (1814-1824) e Charles X
(1824-1830), das quais os dois reinos formam a Restauração. Têm alguma nostalgia do Antigo Regime. Os
orléanistas são liberais, favoráveis a um respeito absoluto da Carta constitucional juntaram-se a Louis- Philippe
Orléans, primo de Charles X, quando da revolução de Julho de 1830. Após a revolução de Fevereiro de 1848, eles
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da Revolução e o Império, finalmente atingiu o porto. Defendem que o período anterior trouxe de bom:
os direitos do homem e a organização napoleónica centralizada, mas rejeita utopias, os democráticos são
desacreditados pelo uso abusivo da guilhotina, tanto quanto são os projectos megalómanos de
Bonaparte. Confia o seu destino aos "melhores", ou seja aos ricos. Os Franceses, sinceramente
convertidos à paz, podem doravante preocupar-se com a sua única prosperidade: "enriquecem pelo
trabalho e pela poupança", tal será o programa de Guizot.
É a descrição da sociedade francesa como um todo (notáveis excluídos) e sobretudo o quadro do destino
dos pobres que permite apreender os mecanismos pelos quais o notável assegurou o seu poder. As obras
grandes de romancistas da época, marcados pela subjectividade dos seus autores: Balzac, Stendhal,
Hugo, Flaubert, Zola, desenha um vasto fresco; a leitura das suas obras de ficção é insubstituível. Menos
brilhantes mas mais objectiva, são as investigações dos historiadores actuais permitem visualizar um
quadro mais exacto. Paradoxalmente, os notáveis – que no entanto conheciam efectivamente as
províncias ou se situavam as suas propriedades – ignoravam largamente as realidades sociais que se
transformavam sob os seus olhos e recusavam literalmente ver os novos problemas que nasciam à sua
frente. Também o período 1815-1879, onde a elite ao poder esperava gozar pacificamente da sua
hegemonia, é perturbada por graves emoções e revoluções periódicas. É claro que os notáveis franceses
revelaram-se incapazes de conduzir devagar a França plutocrática à democracia, comparativamente a
elite inglesa, que pelo contrário, efectivamente teve êxito. Nem as advertências de Tocqueville - sempre
ele -, profeta glacial do advento da democracia, lhes serviram para os levar à democracia. É verdade que
certos elementos do povo franceses, habitados às lembranças da grande Revolução, mostraram-se muito
mais incómodos que as classes laboriosas do Reino Unido. O face à face entre camadas populares não-
conformistas e uma oligarquia obstinada, assombrada pela lembrança permanente do temor de um
regresso ao Terror, podia gerar apenas um diálogo de surdos. É esta situação de intranquilidade que
forçou os notáveis, amantes da tranquilidade, a uma série de adaptações acrobáticas que constituem a
cadeia dos regimes do século XIX.
A França dos Notáveis - Lexico
Burguês: Burguês é aquele que tem reservas em oposição ao proletário que dispõe apenas da sua força
de trabalho. Estas reservas são quer materiais (capital), quer intelectuais (diplomas, capacidades).
Geralmente, permitem ao burguês obter um rendimento mais elevado que o da média da população.
Capitalista: membro da burguesia capaz de empreender e investir. O capitalista procura o lucro máximo
em vez dos seus ganhos na sua empresa. O gosto do lucro é comum a toda a burguesia, o sentido do
risco calculado é específico ao capitalista.
Código civil ou "código Napoleão": trabalho publicado por decreto em 1804 que estabelece as bases
jurídicas da França burguesa de acordo com 1789, rejeitando as ordens e os seus privilégios. O Código
lamentaram muito tempo o regime, ao mesmo tempo liberal e conservador, único estado da monarquia de Julho
(Louis- Philippe 1, 1830-1848). 25 François Guizot (1787-1874), intelectual protestante, aderiu primeiro à Restauração, na condição de o rei
respeitar a Carta. Seguidamente ficou um dos principais ministros de Louis-Philippe. Após 1840, fez triunfar uma
política resolutamente conservadora que foi a causa da revolução de Fevereiro de 1848. As suas obras históricas
sobre a revolução da Inglaterra e sobre a evolução da civilização francesa exerceram uma influência considerável.
Augustin Thierry (1795-1856) é um historiador mediano que escreveu Savoureux Considerer Les Temps
Merovíngiens.
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civil baseie-se no direito de propriedade, o princípio do contrato como regulador das relações sociais e a
inferioridade da mulher no casamento. Adoptados ou imitados numerosos em países, continua, em
princípio, em vigor na França mas foi alterado profundamente século XX.
Elite: no uso corrente, melhor. Na linguagem histórica e sociológica, grupo que detêm o poder (a elite
política).
Liberalismo: ideologia dominante ao XIX século.
O liberalismo político baseie-se em quatro grandes princípios:
1. O reino da lei que assegura a liberdade individual e exclui os actos arbitrários do poder.
Ninguém pode ser prosseguido a não ser que viole a lei;
2. A liberdade de expressão em especial matéria política e religiosa. O seu corolário é a liberdade
da imprensa;
3. A igualdade civil que proíbe os privilégios das ordens
4. Um sistema político constitucional que proíbe o absolutismo e se baseie em eleições periódicas.
Estas podem ser oligárquicos (sufrágio censitário) ou democráticos (sufrágio universal).
O liberalismo económico: doutrina que assegura a liberdade completa ao proprietário na sua empresa.
Qualquer intervenção do Estado em matéria económica e social é julgada perigosa.
No entanto, o Estado assegura as condições gerais que permitem a produção e a troca: segurança,
liberdade das comunicações, moeda. Em princípio, a liberdade das trocas deve ser total entre as nações;
no entanto, na prática, muito liberais aceitam a existência dos direitos aduaneiros.
Os políticos liberais são geralmente partidários do liberalismo económico e vice-versa. No entanto, há
algumas excepções.
Exemplos:
- os bonapartistas antes de 1860 são a favor do liberalismo económico mas aprovam o despotismo
imperial;
- os cristãos sociais (Lamennais, Lacordaire, Ozanam) são liberais em política mas querem medidas
sociais que protejam os trabalhadores.
Notáveis: no uso corrente, pessoas conhecidas e respeitadas numa região. Na linguagem da história, o
notável compreendem a nobreza e parte mais rico da burguesia que acumulam os poderes económicos e
políticos. A sua riqueza baseia-se mais na terra que sobre o negócio e a indústria.
O Universo do Povo e das Classes Médias
Os rurais
Durante todo o século XIX, a maioria da população francesa reside no campo enquanto que na Grã-
Bretanha, o efectivo dos citadinos excede o dos rurais a partir de 1850. Tal como hoje no terceiro
mundo, esta distribuição demográfica é uma necessidade que provem dos baixos rendimentos da
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agricultura. Para alimentar o país, é necessário que a maioria da população trabalhe o solo. Mas este
mundo rural é muito variado mais que hoje em dia, porque compreende uma importante franja não
campesina: os artesãos e trabalhadores (tecelões, ferreiros, charrons26
, carpinteiros), os pequenos
comerciantes, os vendedores, cujo conjunto dava à aldeia uma cor e uma animação agora desaparecidas.
O mundo campesino é apenas homogéneo. Qualquer generalização sobre a riqueza ou a pobreza dos
agricultores é falsa: existe com efeito, nos agricultores, uma hierarquia social, desde miseráveis os
trabalhadores agrícolas que possuem apenas os seus braços, até aos "galos de aldeia", ricos agricultores
que cultivam o seu domínio utilizando a força de trabalho de um pessoal assalariado. No entanto, a
originalidade principal das campanhas francesas em relação à maior parte dos países europeus é bem
perceptível: é a existência de uma categoria muito numerosa de pequenos proprietários campesinos.
Parentes dos trabalhadores pelo seu tipo de vida, são burgueses pela sua mentalidade, dedicados à tarefa
económica, unidos apaixonadamente aos seus bens. Em vez de melhorarem as técnicas agrárias, eles
esforçam-se em aumentar as suas posses de terra comprando propriedades a migrantes e amanham,
aquelas dos notáveis27
. Após muito tempo, acordaram de um temperamento orgulhoso e frio, eles
desconfiavam dos ricos mas tem de recorrer a eles como intermediários com as autoridades públicas. O
notável por conseguinte é temido ao mesmo tempo pela sua importância mas também respeitado pelos
serviços que pode prestar.
Se a França é um país de pequenos proprietários, também é um país grandes propriedades. Com efeito,
cerca de metade do solo francês não pertence aos camponeses mas sim a proprietários nobres e
burgueses. Estes exploram a terra graças a métodos variados, quer directamente através de um
empregado assalariado, quer – mais frequentemente – indirectamente confiando-a um agricultor ou
arrendatário. O agricultor paga um aluguer de dinheiro ao proprietário, senhorio que lhe dá uma parte
importante da colheita. O arrendamento caracteriza as regiões atrasadas, mal irrigadas pelas trocas
monetárias. Milhões de empresários e detentores de mão-de-obra dependem por conseguinte dos
notáveis para o seu emprego e para obterem rendimento.
As técnicas agrárias são de uma grande diversidade. A esse respeito, pode-se distinguir
aproximadamente duas em França separados por uma linha direita que vai do Cotentin ao lago de
Genebra. Ao Sul desta linha, é a França atrasada. O pousio bienal ou trienal mantêm-se bem como o uso
do arado28
em madeira já conhecida dos Romanos. A propriedade é frequentemente limitada pelos usos
colectivos29
como o direito de pastoreio que permite aos pobres utilizar os pousios de outro para pôr a
26 O termo "charron" refere-se à cor geralmente usada para pintar as rodas dos coches (charrons).
27 A superfície da pequena propriedade campesina francesa aumentou ao longo de todo o século XIX sobretudo às
custas das grandes propriedades nas regiões mais atrasadas.
28 O pousio, na agricultura antiga, era um descanso periódico da terra que permitia à mesma reconstituir-se. Ele
era geralmente bienal (um ano sobre dois) no sul Mediterrânico, e trienal (um ano sobre três) no Norte. As
culturas forrageiras (trevo, tremoço) e o emprego dos adubos fizeram-no gradualmente desaparecer. Laraire de
madeiras, instrumento utilizado na Antiguidade, vestígio dos sulcos estreitos e pouco profundos; opõe-se ao arado
metálico, mais sofisticado e mais eficiente graças à sua forma, empregado sobretudo no norte do país
29 Antes da Revolução de 1789, o direito de propriedade sobre as terras é limitado por usos colectivos. Mais
importante é o direito de pastoreio que obriga os proprietários a abrir os seus campos aos rebanhos dos seus
vizinhos após a colheita e durante o pousio. Estes usos são úteis aos pobres mas impedem os proprietários de
introduzir as modernizações nas suas terras. Proibições em teoria pela Revolução, estes usos, com efeito,
desapareceram lentamente durante do século XIX.
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pastar os seus animais. A economia monetária é pouco vasta, arrendamento é frequente, os empresários
procuram a independência produzindo uma vasta gama de produtos. Os sotaques (occitan, catalão,
bretão, bascos, da Córsega 30
são mais falados que o francês. O analfabetismo é muito frequente (100%
nas mulheres em certas regiões). Os notáveis são bastante indolentes, sem dinamismo em matéria de
agricultura.
A França evoluída da metade nordeste do país apresenta um quadro oposto. A instrução é desenvolvida
sobretudo em Alsácia-Lorena, onde foram introduzidas as escolas normais de professores, nascidas na
Alemanha. A agronomia, sob o impulso dos notáveis, desenvolve-se. O pousio desapareceu geralmente,
os adubos modernos e mesmo as primeiras máquinas agrícolas fazem o seu aparecimento. Os usos
colectivos desaparecem: os pobres sofrem, mas os grandes proprietários podem assim modernizar mais
livremente os seus domínios.
No entanto, por toda a parte o progresso é real, embora mais lento na parte sul Mediterrânica que ao
Norte. Uma inovação essencial melhora a vida das pessoas a cultura de batata que, graças aos seus
rendimentos excepcionais, põe termo à escassez. A última grande crise de subsistência é a de 1848.
Após esta data, só há algumas crises regionais, nas zonas montanhosas, entre 1850 e 1860. Geralmente,
não se sofre mais de fome na França século XIX, mas as recordações da escassez estão presentes e são
temidas. Estas transformações, mesmo quando são lentas, têm por corolário o êxodo rural 31
que começa
em datas diversas de acordo com as províncias. É um movimento progressivo e não uma revolução
rápida. As primeiras vítimas são os trabalhadores agrícolas, que os progressos resultam em rendimentos
menores e que os leva a serem atraídos pelos salários urbanos. Os artesãos, concorrentes da grande
indústria nascente, deixam também as aldeias bem como os camponeses dependentes: arrendatários e
agricultores pobres. Em contrapartida, os pequenos proprietários e os agricultores ricos das grandes
planícies de trigo mantêm-se muito mais tempo ligados à terra.
As campanhas conservam traços de civilização específicos. As línguas regionais são o veículo de uma
literatura oral que anima os idosos. É entre 1750 e 1850 que se situa o apogeu dos costumes, o
mobiliário e a arquitectura regionais próprios do campo, englobando uma rica gama de estilos
específicos. O "patriotismo local" importa mais e sobrepõe-se muitas vezes ao sentimento nacional.
Certamente, este está vivo nas províncias do Nordeste que conheceram a invasão em 1814 e 1815 (e
outra vez 1870) e que consideram úteis a existência de um exército nacional. Em contrapartida, o
sentimento patriótico é pouco desenvolvido nas províncias pobres32
.
Mais geralmente, nas regiões mais atrasadas: A Bretanha, Maciço central, Sudoeste, Pirinéus, Alpes, a
França e o seu Estado são considerados como um poder opressivo que emana dos ricos e não deveria ser
30 Os dialectos ocidentais, intermédios entre o francês e o espanhol, eram falados no terço meridional da França.
São provençal, languedoc, gascon e limousin conheceram o seu auge durante a Idade média com a literatura
trovadoresca. 31
O catalão próximo do occitan é falado nos Pirineus-Orientais e na Catalunha espanhola.
- O bretão é uma língua céltica parentesco do galês e do irlandês.
- O basco é uma língua original falada ao mesmo tempo em França e em Espanha.
- A Córsega é um dialecto italiano.
O êxodo rural para as cidades, movimento muito lento durante um século e meio, acelerou-se abruptamente após
1945. 32 A fraqueza do sentimento patriótico em numerosas regiões rurais manifestou-se quando da guerra franco-
prussiana de 1870-1871. Em contrapartida, o patriotismo tinha-se tornado muito firme no desenrolar da guerra de
1914-1918.
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aplicável unicamente a eles. Existe por conseguinte uma hostilidade ao Estado e o seu A, que às vezes se
confunde com o ódio do rico.
O reforço da administração desde a instituição dos prefeitos por Napoleão é frequentemente mal vivido.
Os poderes públicos, consideram estes rurais, não se recordam deles a não ser para exigir o seu sangue e
o seu dinheiro: o recrutamento e os impostos são odiados e procura-se escapar. O código florestal de
1827, que faz respeitar severamente o direito de propriedade, é percebido pelos camponeses como uma
infracção aos seus direitos e a sua existência. Com efeito, em numerosas províncias, tinham o hábito
ancestral de fazer pastar as suas manadas nas florestas privadas, e tirar madeira. Estes complementos ao
seu rendimento, indispensáveis para os pobres, são-lhes retirados33
. Resultam em inúmeros delitos
individuais e graves explosões colectivas. Os novos camponeses consideram-se por conseguinte como
contra a França moderna e têm tendência a rejeitar qualquer novidade. É um grave problema para os
notáveis que se apoiam sobre os poderes públicos e se esforçam por conseguinte de promover a cultura
francesa, a sua língua, o seu direito. Mas esta atitude anarquista é contrariada por um desejo de ascensão
social que existe nas famílias mais instruídas; para satisfazê-lo, é necessário levar as crianças a instruir-
se, fazer-lhes aprender francês, resumidamente integra-las na nação francesa. Os notáveis têm interesse
em apoiar-se sobre este desejo de progressos; fazem-no perseguindo ao mesmo tempo brutalmente a
tendência adversa.
O comportamento rural defronte da moral, da família e da religião, difere de acordo com as tradições
provinciais. Certas regiões são "cristandades" do tipo medieval, onde a religião católica está em toda a
vida social. A prática é comum aos dois sexos. Existe uma limitação dos nascimentos mas faz-se pelo
celibato frequente, não pela redução do número de crianças num casal. A atitude política é
frequentemente conservadora porque o sacerdote, que goza de um grande prestígio, presta o seu apoio
aos notáveis. Encontram-se estas zonas tradicionalistas na Bretanha e nas regiões vizinhas, em Alsácia-
Lorena, no País Basco, em Rouergue...
Outras regiões o catolicismo é praticado com menos fervor. A missa e os sacramentos são sobretudo
responsabilidade das mulheres. O padre está limitado às suas funções sacerdotais. A limitação dos
nascimentos faz-se pelo controlo dos relatórios sexuais, embora seja proibido pela Igreja. O poder dos
notáveis é frequentemente menos sólido que nas cristandades.
No entanto, o notável tem em geral a impressão efectivamente de controlar os seus camponeses. A
ausência de instrução dos rurais, os serviços pequenos que lhes presta, parece um compromisso de
submissão e de fidelidade. Assim são surpreendidos e quando os camponeses se comportam como
"selvagens", ou seja quando defendem violentamente os seus interesses e as suas tradições. Nos
Camponeses (1844), vasto fresco romanesco onde descreve os esforços dos rurais para conquistarem
direitos de proprietários citadinos, Balzac mostra-se muito consciente dos interesses antagónicos entre
rurais e notáveis.
33 A renovação de Paris deve-se ao barão Haussmann, prefeito do Sena (cf. capítulo sobre "a França dos caminhos
de ferro e o sufrágio universal").
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Povo e pequena burguesia das cidades.
As cidades desenvolvem-se durante este período mas a um ritmo geralmente moderado. A cidade de
Paris, considerada monstruosa à época, constitui a esse respeito uma excepção dado que a capital passa
de 700.000 habitantes em 1817 a quase dois milhões no fim do Segundo Império. Do mesmo modo
algumas metrópoles provinciais conhecem um desenvolvimento importante sob Napoleão III. Uma
higiene deplorável, a acumulação de casas, a miséria propiciam uma elevada mortalidade. As cidades
são chamadas "cemitérios" onde a população teria tendência a diminuir se a imigração rural não
mudasse num movimento em sentido contrário. Um bonito bairro moderno arejado estrutura durante o
segundo império mas camada popular não GR aproveitar, porque aumento custos de aluguer lança as
pessoas do centro para os subúrbios pobres. Os diversos grupos sociais estão lado a lado nas cidades,
mas as características distintas tornam facilmente perceptível (bem mais que hoje em dia) a pertença a
um ou outro meio. A diferença fundamental refere-se à esperança de vida: Mulhouse, no início do
século, os trabalhadores da indústria têxtil vivem em média 25 anos, os proprietários e quadros
superiores das empresas, 50 anos Recursos, instrução, costumes, opõe-se de uma classe para outra. Dois
critérios simples e muito aparentes permitem distinguir as categorias sociais: o alojamento e o vestuário.
A segregação pelo alojamento obedece a dois critérios que se sucedem no tempo. A separação tipo
antiga é vertical. Ela está reproduzida de maneira agradável em várias caricaturas da época (cf.
documento n° 2). Nos grandes edifícios urbanos que datam do XVIII ou os inícios dos XIX séculos, o
rés-do-chão frequentemente é ocupado por lojas e os pequenos alojamentos dos seus proprietários. O
primeiro andar é "o andar nobre"; é ocupado inteiramente por um único e grande apartamento dotado de
salas de recepção ricamente decoradas e com uma varanda imponente, é reservado para as famílias da
nobreza ou da burguesia rica. Os andares seguintes vêem o nível social seus locatários diminuir a
medida que se sobe: da burguesia média (ao segundo andar) até às águas furtadas ocupadas por
empregados ou idosos muito pobres sob o sótão do último andar. Um exemplo literário é fornecido por
Balzac no Pai Goriot onde o seu herói vai de andar em andar a medida que os seus recursos diminuem.
Este sistema, que se encontra em certos bairros do centro de Paris, separa os alojamentos das diversas
classes mas permite-lhes contudo encontrar-se e mesmo conhecer-se. Não é do mesmo modo que o novo
sistema de segregação, de caracter geográfico.
Cada vez mais, o século XIX vê desenvolver-se a homogeneidade social dos bairros: bairros distintos
situados frequentemente no oeste das cidades onde o preço do terreno e os alugueres são elevados,
bairros populares ao leste. Em Paris, os distritos do oeste entre o Palácio-Real e a Estrela, arejados,
limpos, luxuosos, são habitados por pessoas fáceis e, certamente, um imenso exército de empregados
mais numerosos que os seus proprietários. Na parte leste da cidade34
, de Paris onde o operário
periodicamente faz a sua habitação. O corte em dois da capital vê-se com uma clareza absoluta quando
dos dias de Junho de 1848 onde uma linha norte-sul que passa pela ilha da Cidade separa o oeste
burguês, aderente ao Partido da ordem, do leste operário, que se coloca do lado da revolta.
Mais nítida ainda é a segregação pelo vestuário. A esse respeito, a separação entre a burguesia e o povo
rebenta literalmente os olhos hoje em dia, as diferenças do trajar entre as classes altas são pouco
visíveis; nada como no século XIX em que o burguês (ou o nobre) de sexo masculino arvora um
verdadeiro uniforme preto ou sombrio: calças, casaco, redingote (é um casaco ¾ da época) e chapéu
alto. A bengala é um atributo de elegância do qual não se pode separar. Comportamento austero que
34 A ilha da Cidade, sobre o Sena, é o núcleo histórico de Paris, onde se encontra a catedral Notre-Dame e o
palácio de justiça.
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contrasta com os vestuários de tecidos refinados com brilhantes de tonalidade pastel que levavam as
pessoas da classe alta do século XVIII.
Os homens do povo, em contrapartida, apresentam mais variedade no seu comportamento, porque cada
ofício conservou os seus vestuários específicos: les couvre-chefs, os coloridos dos tecidos, o corte dos
vestuários varia de maneira surpreendente. Uma uniformização progressiva realiza-se contudo durante o
século porque a blusa e o boné, vestuários campesinos dos dias de feiras, são introduzidos na cidade
pelos migrantes provisórios ou definitivos, nascidos no campo. Blusa e boné tornam-se então os
emblemas da classe operária, como testemunham de inúmeras caricaturas e estampas.
Nas mulheres, os sinais de pertença à uma classe são igualmente visíveis mas ligeiramente mais subtis,
associando hábitos e comportamentos. As senhoras, ou seja as mulheres das classes altas, levam sempre
um chapéu para sair; é-lhes proibido pelos usos que andem sozinhas na rua, devem sempre ser
acompanhadas por um homem da sua família, uma amiga ou um empregado. Os modos femininos
alteram frequentemente durante do século. Os vestidos das senhoras da elevada sociedade ficam
incrivelmente dispendiosos e pouco práticos, durante o Segundo Império com enormes "crinolinas"
(tecido rígido usado nos vestidos) lançadas pela imperatriz Eugénia, que são cestos precinta dos de ferro
que dão jupon (saiote) e o pingamento (o cair do vestido) uma forma de coroa invertida. Com a
crinolina, as senhoras podem sentar-se apenas sobre vastos sofás em contrapartida, as mulheres
(subentendidas do povo), ainda que seguissem elas também a moda a partir dos anos 1840, saem
frequentemente com a cabeça descoberta. Ninguém se incomoda se saem sozinhas e sujeitas aos piropos
masculinos.
A ambição de ascensão social em famílias populares manifesta-se pela adopção, às vezes inadequada, de
comportamentos burgueses. Assim "canuts" (os que trabalhavam na industria têxtil em Lyon), chefes de
ateliers lionês (idem), portanto militantes do movimento operário, manifestam algumas ambições
burguesas usando, em dias de festa, um chapéu alto de proporções exageradas.
Os notáveis postos à parte, podem-se dividir em quatro categorias urbanas dos quais falaremos
resumidamente dado que outros capítulos deste livro abordam esta questão. Duas de entre elas
pertencem ao mundo operário: são as pessoas de ofício e proletariado da grande indústria nascente. Dois
podem ser classificados da burguesia: os comerciantes e artesãos de um lado, a burguesia diplomada do
outro.
Os trabalhadores de ofício são ainda muito numerosos, não alteraram muito desde o Antigo Regime. São
caracterizados pela sua competência profissional, adquirida às vezes aquando da volta da França dos
companheiros35
. Frequentemente instruídos, efectuam uma vida familiar regular e desenvolvem uma
cultura operária original que tem os seus livros, os seus jornais, as suas tradições. São estes
trabalhadores, honestos, orgulhosos, intransigentes, que Eugène descreve com admiração nos Mistérios
de Paris. São eles quem erigem os primeiros movimentos de entre ajuda ou de luta sindical e frequentam
o cabaret, que é como que um lugar de sociabilidade onde podem encontrar os camaradas e conviverem
com eles. O bairro mais conhecido que dá nascimento a este tipo de homem é faubourg Saint-Antoine,
35 As compagnonnages eram associações operárias em princípio proibidas, mas toleradas. Encarregavam-se da
formação profissional dos companheiros quando da volta a França graças a uma rede nacional que organiza o
acolhimento dos jovens trabalhadores. Eram também organismos de entre ajuda e, eventualmente, de resistência
ao patronato. As compagnonnages gradualmente têm desaparecido, desacreditados pelas querelas sangrentas entre
grupos rivais. Foram substituídos pelos sindicatos, tolerados após 1868, e autorizados pela lei de 1884.
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no leste de Paris36
. É lá que encontramos ébénistes, especialistas na arte do bronze, relojoeiros,
escultores, receptivos das ideias socialista, prontos a levantar barricadas quando do motim na capital.
Tolain, um dos fundadores da Primeira Internacional, sindicalista moderado, e Varlin, líder comunista
fuzilado em 1871 quando da semana sangrenta, são procedentes deste meio.
Os trabalhadores da grande indústria nascente, em contrapartida, não têm nem tradições, nem cultura
elaborada. Procedentes de famílias vindas recentemente do campo, perderam os traços culturais do seu
meio de origem sem adquirirem outros. Desprovidos de instrução, como princípios morais e sociais, são
incapazes de se organizar e ou conhecem períodos de desafogo relativo ou podem juntar-se às duas
extremidades, mas também longos períodos de desemprego, por conseguinte fases de miséria absoluta
eles têm apenas vida de família, o que escandaliza burgueses. A concubinagem, largamente praticada,
não assegura nenhuma segurança às mulheres que se entregam por vezes à prostituição ocasional. Esta
prática assegura um complemento de recursos a que se chama "o quinto quarto do dia". Este proletariado
desfavorecido chamou a atenção das classes instruídas que suscitaram numerosos inquéritos37
para o seu
destino. É temido pelo notável, não como um perigo revolucionário, mas como um fermento de
desagregação social que introduz a delinquência, o defeito e o alcoolismo na sociedade; é ele que se
designa correntemente sob a denominação de "classe perigosa"
Mas os políticos dos notáveis praticam às vezes a amálgama entre a "crueldade" de uns e o espírito
contestatário de outros. Assim Santo – Marco Girardin38
que declara, no Jornal dos debates de 1831: "Os
bárbaros que ameaçam a sociedade não estão no Cáucaso nem na Tartarie;" estão nos arredores das
cidades transformadoras [...] É necessário que a classe média saiba bem qual é o estado das coisas [... ]
ela tem abaixo de ela uma população proletária que se agita e que estremece sem saber que quer, sem
saber onde irá; que lhe importar? Elie está mal. Elie quer alterar. É lá onde está o perigo da sociedade
moderna; é lá que podem sair os Bárbaros que a destruirão "."
Mas a força armada dos notáveis supervisiona-o e, no mesmo ano 1831, Casimiro Périer39
defende que o
objectivo da Guarda nacional, milícia burguesa das cidades, é "armar a propriedade e a indústria contra
o que pode ameaça-la".
As fronteiras entre burgueses e trabalhadores situam-se no mundo do atelier e da loja. Os mestres –
artesãos, proprietários dos seus instrumentos e às vezes do seu atelier, compartilham a vida e o labor dos
seus trabalhadores mas com a esperança de fazer passar os seus filhos para a burguesia. O pequeno
comerciante efectua uma existência ligeiramente mais burguesa, de vida séria regulada pelo trabalho e
pela economia, da qual se encontra uma descrição cuidada na Casa Chai, obra de Balzac e, mas também
o contrário, por exemplo uma sátira cruel em Thérèse Raquin de Zola. As pessoas de boutique vêem-se
entre o desejo de se tornarem burgueses e o temor de voltar ao proletariado. É por isso que esta categoria
hesita entre as escolhas políticas dos notáveis ou do povo. Durante a regência de Louis-Philippe, os
comerciantes continuam a ser muito tempo fiéis "ao rei-cidadão"40
, mas em 1848, passam em massa para
36 . O Mistérios de Paris, novela popular Eugène Saber, falecida em 1842-1843, conheceu um imenso sucesso.
Desenvolveu o mito do bom trabalhador parisiense. Os detalhes que dá sobre condição social não são muito
exactos contrariamente aqueles que fornece a obra Balzac. 37 Os inquéritos mais conhecidos sobre a condição operária são os de Villermé (1840) e Play (1855), ambos
partidários de soluções paternalistas. 38 . Santo – marco Girardin (1801-1873), crítica literária, jornalista e político
39 Casímir Périer (1777-1832), rico bancário, foi ministro do Interior de Louis-Philippe em 1831. Restringiu
duramente as revoltas de Paris e de Lyon. Morreu da cólera em 1832. É de uma verdadeira dinastia cujos
membros re-encontra-se sob vários regimes. O seu neto foi presidente da República em 1894-1895.
40 ."O rei-cidadão": termo empregado para designar Louis-Philippe aquando da revolução de Julho de 1830.
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o lado dos revoltosos de Fevereiro que instauram a Segunda República. Do mesmo modo a loja
parisiense vota por Louis Napoleão Bonaparte em 1851; mas nos anos 1860, coloca-se maioritariamente
do lado da oposição republicano. Em 1871, aquando da Comuna, muitos mestre – artesãos e pequenos
comerciantes fazem o golpe de fogo contra Versailleses, reencontra-se o seu nome sobre as listas dos
conselhos de guerra Versailles que condenam revoltosos à prisão de Nova Caledónia.
É necessário por último sublinhar a importância de uma categoria social essencial que de que se esquece
frequentemente: a burguesia diplomada, chamada à época as "capacidades". Elie agrupa todos os que
podem aceder a um trabalho não manual graças à sua instrução aprovada pelo "baccalauréat", pela
licença ou um doutoramento. O seu destino é variável, indo da pobreza à vida fácil. A vida de Jules
Vallès' 41
, romancista e comunista, contada de maneira romancista no Titular do "baccalauréat", defende
que a trabalhador que deve comprar-se vestuários burgueses com um salário de operário. Ao oposto, os
grandes advogados líderes do partido republicano, como Jules Favre, Jules Grévy, Jules Ferry, atingem à
notoriedade e opulência. Nestes letrados, as profissões têm estatutos jurídicos diferentes. Os professores:
professores famélicos, os professores de Liceu mais prósperos, são geralmente funcionários ou agentes
das comunas. Os engenheiros e os jornalistas são assalariados. O prestígio das profissões liberais é
maior devido à sua independência: médicos, advogados, arquitectos. Os ofícios jurídicos gozam de uma
característica específica porque a faculdade de direito pode levar à fortuna ou servir de trampolim à uma
carreira política.
Certos membros das profissões liberais, advogados em especial, pertencem a famílias ricas e situam-se,
em política, no campo dos notáveis. No entanto, pequenos burgueses instruídos frequentemente
conservaram o culto da grande Revolução e não se sentem solidários com os ricos. Frequentemente
destacados das crenças religiosas, voltam-se para a fé nova, cuja divindade eles apelam de Ciência e
Progressos42
. Se os membros do Instituto podem obter o direito de voto sob durante a regência de Louis-
Philippe, mesmo se não pagarem o imposto é já um privilégio excepcional. Em geral, os notáveis não
apreciam os letrados sem fortuna em quem vêem sonhadores irresponsáveis. O general Bugeaud43
dá o
tom: "é porque um homem tem a capacidade que, se é pobre, desconfiarei dele".
Também os diplomados de condição modesta são excluídos tanto quanto possível da vida política. Certo
rancor mistura-se por conseguinte ao idealismo para orientar as capacidades para a esquerda. As
revoluções dos XIX séculos resultam essencialmente da aliança (às vezes conflituoso) dos trabalhadores
de ofício e as capacidades. Um tipo de militante intelectual assim é desenhado por Victor Hugo no
Miserável: Enjolras, letrado revolucionário implacável, é unida de maneira fanática "à Ideia", que dirige
o combate sobre a barricada aos lados de Gavroche, a criança do povo. É entre pequenos burgueses
instruídos que se encontram os chefes do partido republicano e os primeiros adeptos do socialismo; a
41 Jules Vallès (1832-1885), escritor e revolucionário, membro da Comuna de Paris (1871). Obrigado ao exílio em
Londres (1871-1883), escreveu duas novelas autobiográficas: A Criança e o Titular do "baccalauréat",
completados com a obra Insurgé após o seu regresso a França.
42 Durante o Segundo Império, os republicanos letrados são frequentemente partidários do positivismo, filosofia
preconizada por Auguste Conde (1798-1857) que anuncia o reino de uma sociedade fundada sobre a ciência.
Entre os seus discípulos, conta-se Jules Ferry, Gambetta e Littré, autores dum famoso dicionário.
43 O general Bugeaud (1784-1849) restringiu severamente a insurreição de Abril de 1834. Foi o principal
responsável pela conquista da Argélia sob a regência de Louis-Philippe
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burguesia diplomada fornecerá às revoluções dos séculos XIX os seus quadros, as suas perspectivas, os
seus programas.
Frequentemente disse-se que o XIX século é a era da burguesia, grande beneficiário da Revolução. Esta
ideia é apenas parcialmente exacta porque não é necessário esquecer a profunda interrupção que corta
em dois o mundo burguês. Dos dois lados, veste-se de preto; dos dois lados, têm o culto da seriedade, da
economia, honestidade. Mas só os proprietários mais os ricos associados no grupo do notáveis gozam
plenamente dos frutos da Revolução de 1789. Só eles participam no poder de Estado. As classes médias
vivem num outro mundo; a Terceira República representará consideravelmente a sua vingança e o seu
triunfo.
O Pequeno Mundo do Notáveis
Prelúdio Imperial
O nascimento dos notáveis situa-se sob a Revolução: a partir do Directório, o povo é excluído das urnas
e o reino dos ricos desenha-se. Napoleão esforça-se de ir mais adiante muito no mesmo sentido. Traça
de uma sociedade ideal, admiravelmente arranjada, na forma de pirâmide, cujo esquema, certamente, ele
ocupa a cimeira. Abaixo de ele, coloca seus marechais, seguidamente a sua nobreza; nos departamentos,
institucionaliza o notável, secundados por um exército de funcionários sacrificados onde figura o clero,
auxiliar ideológico polícia.
Napoleão nunca gostou das pessoas do povo (excepto quando são pertencentes às forças armadas).
Quando era apenas um jovem oficial, encarregado restringir um motim pré-revolucionário, Bonaparte
gritou em frente da multidão: _ "que pessoa honesta se afaste. Atiro apenas sobre canaille "Tornado
imperador, apenas alterou o sentimento:" "o verdadeiro povo" não são "vinte ou trinta mil peixeiras44
ou
pessoas desta espécie", os elementos sãos da população pertencem "às famílias mais consideráveis pela
sua existência anterior e presente, quer pela extensão das suas ligações e parentescos no departamento,
pelas seus bons costumes e suas virtudes públicas e privadas".
São estas " pessoas honestas " que terão o privilégio de eleger os candidatos ao Senado e ao Corpo
legislativo. Qual é o critério que define as qualidades desta elite? Não há hesitação: é a fortuna em cada
departamento, o Imperador faz por conseguinte elaborar a lista dos 600 proprietários que pagam mais
impostos, os notáveis. Certamente, o seu direito eleitoral ilusório nessa época de despotismo, mas é uma
honra ser assim distinguido. Napoleão quer conquistar estas pessoas com poder e utilizá-los ao serviço
do Estado. Além disso, o grande homem quer apagar as más lembranças da Revolução e reconciliar os
antigos partidos. Também as listas de notáveis compreendem a nobreza antiga, a nobreza nova, e a
burguesia rica, que são compradores de bens nacionais confiscados aos emigrados. O espírito desta
definição dos notáveis duraria apenas até a guerra de 1848.
44 Canaille uma pessoa malhonnête (desonesta). "canaille" (canalha): o baixo povo, a população. Um "poissarde":
uma comercial de peixes aos bailes, por extensão uma mulher de maneiras grosseiras e insolentes. Napoleão feito,
a propósito dos poissardes (vendedores de peixe), uma alusão indirecta ao papel das mulheres do povo nos vários
dias revolucionários, em especial as de Outubro de 1789.
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Os notáveis de acordo com a Carta – 1814-1848
Os notáveis da monarquia constitucional sob a Restauração (1814-1830) e a monarquia de Julho (1830-
1848) têm poderes muito consideráveis. Com efeito, a Carta confia-lhes o direito de eleger os deputados,
elemento principal do poder legislativo. Ao tempo Bourbons como Orléans, a doutrina oficial aparece a
posteriori ao observador actual como uma espécie de marxismo invertido, dado que considerava que o
Estado devia reflectir exactamente a realidade social; o poder político devia por conseguinte ser
confiado às classes que conheciam e dominavam o que era defendido pela Carta Constitucional. Em
conformidade, julga-se que só os proprietários têm as responsabilidades sociais reais, a instrução e a
moralidade que lhes permite exercer funções públicas de direcção. O povo, em contrapartida, é
considerado como uma criança menor incapaz de distinguir o bem do mal.
É destes princípios que decorre o sistema censitário. O censo, dando o direito de voto, afasta a ideia da
posse da terra considerada a riqueza essencial. Os proprietários fundiários estão presentes certamente
entre os eleitores.
O modo eleitoral e o modo de elegibilidade variaram de acordo com os regimes. Durante a Restauração,
o efectivo de notáveis é muito reduzido. No início do reinado de Louis XVIII, era necessário com efeito
pagar 300 F de impostos para ter o direito de voto, e 1.000 F para ser elegível; havia cerca de 100.000
eleitores. O advento da monarquia de Julho marca certo alargamento do corpo eleitoral dado que o cens
eleitoral é de 200 F, e o cens de elegibilidade de 500 F. em 1831, havia por conseguinte cerca de
200.000 eleitores; o notável e a sua família representavam cerca de um milhão de pessoas sobre uma
população de 31 milhões de habitantes. Mas esta ligeira democratização do corpo eleitoral não provoca
qualquer modificação importante na composição da Câmara dos deputados. Com efeito, 63% dos
deputados pagam mais de 1.000 F de cens. A assembleia eleitoral do departamento agrupa um grupo de
pessoas que se conhece bem. Na segunda parte Lucien Leuwen (1834-1842), Stendhal descreve
ferozmente todas as manobras que se podem desenrolar. Neste pequeno clube, os mais ricos e
proprietários, geralmente apoiados pelo prefeito, detêm uma forte influência sobre os outros eleitores
que dependem frequentemente deles nos seus negócios e a sua carreira.
Certamente, sob Louis-Philippe, o eleitorado dos conselhos municipais é muito mais largo, mas a
assembleia comunal tem poucos poderes dado que o presidente da câmara municipal é nomeado pelo
governo.
Após Fevereiro de 1848 e proclamação do sufrágio universal, que anula a lei que permite delimitar o
grupo dos notáveis elegíveis. Estes subsistem no entanto como uma realidade social essencial, que nunca
tivessem cessado ser.
Os notáveis: uma realidade social
Os notáveis existem de factos antes de serem definidos pelos seus direitos políticos. A sua riqueza
distingue-os dos outros Franceses. Com efeito, na França dos inícios do século XIX, o desvio entre os
patrimónios é enorme de 1 para 10.000 entre os extremos. Se a maioria dos Franceses dispõe de bens
irrisórios que o próprio fisco negligencia taxar aquando do seu falecimento, a pequena minoria de ricos,
em contrapartida, possui uma grande parte das fortunas. Em Paris, 1% das sucessões corresponde à 30%
da fortuna global, e encontram-se números da mesma ordem por toda a parte onde estudos precisos
foram feitos pelos historiadores. O sistema dos notáveis reflecte efectivamente esta extrema
concentração das riquezas.
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Esta fortuna é sobretudo imobiliária ela compõe-se de terras e edifícios urbanos. Os bens móveis
característicos do capitalismo, como contas banco, em acções e obrigações de sociedade, apostas de
empresa e de numerário, excederão os edifícios na fortuna global do país apenas durante a Terceira
República.
A riqueza ou a notabilidade, comum a todos os membros do grupo, não provem de uma mesma origem.
Ela é no conjunto mais antiga para a nobreza que para a elevada burguesia.
- Após a queda Napoleão a nobreza reencontra um lugar invejável na sociedade e no Estado. A nobreza
está enfraquecida certamente comparando com o que tinha durante o Antigo Regime. Ela perdeu os seus
privilégios e muitos emigrados tiveram as suas terras confiscadas e vendidas como bens nacionais. Ela
perdeu em parte o seu prestígio: classificada como militar por excelência no tempo dos reis, viu-se
suplantar, e com qual brio, pelos exércitos chegados da Primeira República e o imperador. Mas sob a
monarquia constitucional e o Segundo Império, a nobreza reside uma classe rica, sobretudo terrestre,
proprietário de vastos domínios.
A nobreza é ela mesma um conjunto dividido em estratos geológicos sucessivos. A antiga nobreza julga-
se a única e autêntica, compreende um grande número de famílias que aceitaram o Império, mais alguns
punhados de emigrados irredutíveis retornados em 1814. Mas há também os nobres recentes: a nobreza
imperial que se tenta fundir com a aristocracia do Antigo Regime haverá mais ou menos durante o
século XIX, os nobres criados pelos soberanos de acordo com Waterloo porque todos: Louis XVIII,
Charles X, Louis- Philippe e Napoleão III, deram “anobli” (enobreceram, deram nobreza) aos altos
empregados do Estado. Por último encontramos uma nobreza "subreptice" composta por burgueses que
adoptam um nome de terra onde acrescentam simplesmente uma parcela ao seu património, procurando
à sua volta fundir-se mais ou menos com a aristocracia anterior a 1789.
Com efeito, mesmo desprovida de privilégios, a nobreza – sobretudo se os seus títulos são antigos –
deslumbra sempre os burgueses porque o snobismo joga a seu favor. Ricos burgueses procuram
frequentemente um casamento com uma rapariga da aristocracia: um bonito título nobiliárquico pode
compensar um dote medíocre. Contrariamente, os nobres aceitam às vezes "redorer o seu brasão"
casando com uma rica burguesa, prática que cresce nos finais do século XVIII. Sob a Restauração, os
nobres povoam a administração, incluindo os empregos razoavelmente retribuídos que trazem um
rendimento apreciável aos que perderam uma parte das suas terras. Após 1830, grande número destes
voltam aos seus castelos e entregam-se frequentemente à agronomia. Conservam contudo fortes
posições no exército e na diplomacia.
A nobreza desempenha um papel essencial na vida de feira. Ocupa um lugar de primeiro plano nas
academias, mas também a literatura de vanguarda. Os principais autores românticos são nobres:
Chateaubriand, Lamartine e Vigny são de nobreza antiga, o pai Hugo pertence à nobreza de Império, a
família de Musset, sem dúvida roturière (Todos os que não eram nem nobres nem eclesiásticos),
pretende contudo ascender à nobreza, como testemunha o uso da partícula. Os valores da antiga nobreza:
moral fundada sobre a estética, sentidos da honra, despeitos do dinheiro, residem valores certos da
literatura. Mesmo escritores orientados à esquerda adoptam-no mais ou menos. É burguês cúpido,
egoísta, de espírito estreito, que caricaturam o mais de boa vontade possível número de escritores
franceses até a 1914. Os leitores de novelas, no entanto maioritariamente burgueses, adoram ver
retratada a sua classe nos seus livros preferidos. Stendhal, embora tendo o coração republicano, traçado
no Vermelho e Preto (1830) a silhueta do Sr. Valenod, burguês antipático e mesquinho. Pelo contrário, a
família Môle, pertencendo à alta nobreza, é dotada de refinamento e de uma elegante desenvoltura.
No entanto, o mundo dos notáveis compreende também um efectivo importante burguês, claramente
maioritário após 1830. Um grande número destes burgueses é, tal como os nobres, proprietários
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fundiários. A maior parte deles não concebe a ideia de capitalismo, da criação de riqueza comportam-se
como senhorios, e não como empresários. Existem detentores de terras desatentos e negligentes,
sobretudo na zona Mediterrânica. Contudo, a maior parte entre eles zela com cuidado aos seus interesses
Trata-se primeiro de exigir com exactidão, frequentemente com aspereza, o pagamento dos alugueres
devidos pelos seus agricultores. Mas os proprietários burgueses, se não raciocinam como o empresário
descrito por Marx no Capital, não são evidentemente indiferentes à sua prosperidade, nem à do país. Na
parte mais moderna da França, adoptam de boa vontade as novidades úteis. Os seus representantes nos
conselhos gerais dos departamentos e na Câmara dos deputados esforçam-se por melhorar a rede das
estradas e das vias fluviais que se multiplicam sob a monarquia de Julho e o Segundo Império,
contribuem para desenvolver a actividade económica, por conseguinte transformar a sociedade. Esta
acção progressista contradiz, sem que tomem consciência, a sua fixação à uma ordem estável e a
imobilidade desejada da hierarquia social.
Contrariamente aos accionistas do solo, os grandes negociantes e fabricantes procuram o lucro máximo
pela autofinanciamento e pela redução do preço custo. Os industriais formam, entre os notáveis, um
grupo minoritário, ligeiramente marginal, muito mais dinâmico e voltado para o futuro que os
proprietários de terras. Antes de 1848, alguns entre eles não pagam imposto suficiente para ser elegíveis
a cargos políticos. Se querem participar activamente na vida política, devem por conseguinte consagrar-
se uma parte dos seus recursos à compra de terras. Durante o Segundo Império onde o sufrágio universal
é mantido teoricamente, esta preocupação não é mais uma aposta; a sua importância e a sua autonomia
aumentam no ambiente saint-simonienne que cerca o Imperador (ver capítulo sobre a França dos
caminhos de ferro e o sufrágio universal).
Nos meios capitalistas, um lugar à parte deve ser dado aos banqueiros que detêm de longe as mais
gordas fortunas da época. Eles gozam de uma influência considerável nos governos de Louis-Philippe e
Napoléon III. Encontram-se no pessoal político dirigente da monarquia de Julho, com Laffitte e
Casimiro Périer, entre os construtores da rede ferroviária durante o Segundo Império com o Rothschild e
o Péreire.
Os quadros do Estado: magistrados, altos funcionários, oficiais superiores, pertencem quase sempre no
meio dos notáveis que possuem bens familiares terras ou partes de empresas, e o seu vencimento é
considerado apenas como um acréscimo ao rendimento. Na perspectiva da época, é necessário que os
principais empregados do Estado sejam ricos; escolhem-se em função dos seus bens. O seu modo de
vida faz honra e dá imagem do governo: uma parte do seu prestígio advém assim do Estado.
Nas margens inferiores do mundo dos notáveis encontram-se numerosos comerciantes comuns, oficiais
ministeriais (notários, escreventes) e alguns membros das profissões liberais (advogados, médicos).
Estas categorias que formam a parte superior das classes médias não fazem parte dos notáveis sob a
Restauração; a redução do custo do lugar de elegibilidade pelo censo deu-se em 1831, mas estes médios
não eram geralmente eleitos pelo mesmo com colegas de profissão, antes estavam os notáveis mais
ricos. Trata-se por conseguinte de um meio de transição entre os notáveis como tal e as camadas médias
e populares.
Género de vida e mentalidade dos notáveis
Os notáveis levam sem duvida um estilo de vida confortável. Possuindo casa de campo e casa de cidade,
uma residência parisiense para alguns, dispõem além disso serviçais domésticos, essencialmente
femininos, para servi-los. (Emprego de serviçais masculinos não é frequente, é um sinal de distinção.)
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Mas não seria necessário imaginá-lo no luxo e no despesismo: ele dá importância ao ideal burguês da
economia, bem como o respeito pelo trabalho.
O notável, como todas as camadas burguesas dos séculos XIX, aprecia a vida de família. As crianças são
objecto de cuidados afectuoso e de uma atenção constante. O chefe de família gosta e protege os seus
parentes, mas exige uma obediência absoluta. Os homens de idade madura detêm com efeito uma
autoridade pouco discutida sobre as mulheres e os jovens homens.
O código Napoleão põe a mulher sob tutela e ignora toda a criança, confiada ao poder paternal. A
mulher mande é uma menor que deve deixar ao seu marido a gestão dos seus bens, ainda que conserva
às vezes a propriedade teórica. Tem necessidade da autorização marital para exercer um emprego, e uma
procuração para assinar um acto oficial. A misoginia (ódio do desejo e do prazer, condenação da carne,
nojo do corpo, e poder absoluto do homem) latente deste sistema e destes costumes é inegável. Se o
papel materno é exaltado, tal só acontece à custa de responsabilidades que lhe cabem ou outras
qualidades.
A verdadeira qualidade da mulher é mesmo a devoção e o sacrifício. Deve procurar a felicidade e o
sucesso das suas crianças, o seu cônjuge, em detrimento das suas próprias aspirações.
A esse respeito o consenso é amplo entre legitimistas e liberais. Mas estes têm um ponto de vista
específico: mesmo se são pessoalmente agnósticos ou ateus, apreciam que a sua mulher e as suas
raparigas sejam piedosas. A religião é boa para as mulheres; o marido burguês considera que o padre é
um fiador da fidelidade da sua esposa, sobretudo se é bonita.
O casamento é o grande negócio de uma vida: negocia-se como um tratado de comércio e conduz um
contrato. O dote da esposa e os contributos do marido devem, em princípio, equilibrar-se, mais ou
menos. Geralmente, nem os impulsos do coração, nem os desejos da carne têm peso na decisão. A
mulher antes de casar, é suposta abdicar de prazer e manter a sua virgindade.
Os homens efectuam uma vida muito mais livre e procuram satisfações fáceis graças à prostituição e as
formas mais subtis de amor: entretêm-se com uma operária "grisette"45
, ou visitam actrizes (só para mais
abastados). É na literatura que desabrocham os amores e os adultérios: é necessário ver lá um reflexo da
realidade, ou antes a compensação de uma falta?
A instrução da mulher que pertence à sociedade não é inexistente, é no entanto de um nível
frequentemente baixo. As ordens religiosas que procuram formar boas mães de família e senhoras de
casa realizadas, não pessoas cultivadas.
É necessário concluir que as mulheres nobres ou burguesas são escravas inteiramente dependentes dos
homens da sua família? Não, porque existe alguns domínios onde a mulher pode exercer os seus
talentos. Primeiro na vida de relações. Os costumes franceses associam estreitamente os dois sexos na
vida mundana (contrariamente à o que se passa na Inglaterra com os clubes reservados aos homens). A
mulher do notável deve saber receber na sua feira, o seu castelo ou a sua residência rural.
A conversação com uma mulher espiritual é um prazer procurado por todos os homens de gosto; ser
recebido por uma hospedeira conhecida é um sinal de distinção social muito apreciado. A senhora de
casa, graças à sua função social, pode assim reganhar indirectamente uma parte do poder e de influência
que as instituições a ela recusam. Além disso, sempre piedosa por definição, deve imperativamente
devotar-se às actividades caritativas. Estas são filtradas: ajuda-se preferivelmente os "bons pobres"
honestos e apresentados.
45 Grisette: operária amável e coquette,(elegante/vaidosa) de costumes fáceis. O termo é hoje obsoleto
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No entanto, pensa-se que as instituições de beneficência da Igreja foram decapitadas pela Revolução e
como não há ainda Segurança social, dá-se conta que as obras de caridade das senhoras de bem e outras,
são uma necessidade social. Pode também considerar-se do ponto de vista do chefe de empresa: as
bondades distribuídas com discernimento pela sua esposa têm a virtude de atenuar os conflitos sociais
no domínio ou a fábrica.
Neste meio, a juventude prolonga-se até aos arredores da quarentena. Com efeito os jovens acedem
muito tardiamente às responsabilidades, contrariamente ao que se passava durante a Revolução e o
Império. Também não é nada surpreendente que deixam absorver pela importância da alma ou pela
amargura, o que não é estranho o sucesso do romantismo, seguida de ideias contestatárias em política.
O chefe de família notável considera-se como o paterfamilias no seu ambiente: empregados,
trabalhadores, vizinhos de condição modesta. Reina sobre uma espécie de feudo territorial onde faz
respeitar a sua autoridade e executar as suas ordens. Porque aos seus olhos, as pessoas do povo e da
burguesia modesta devem ser tratadas com uma firmeza benevolente, e são ocasionalmente punidos,
para seu próprio bem. A elite tem como ideal no poder, uma sociedade estável, ou pelo menos sem
mudanças rápidas. Cada um deve saber permanecer no seu lugar.
Exige-se o respeito dos subalternos, e em tempo comum, ele obtêm-se. Certamente, o rico considera que
tem deveres para com os seus inferiores, e certos proprietários tomam estes deveres seriamente. Mais
notáveis são sem dúvida os industriais protestantes Mulhouse (Koechlin, Dolfuss, Mieg) que financiam
e criam obras sociais, alojamentos operários, escolas para os pobres. Mas este paternalismo, julgado
excelente, não passa da teoria à prática. Quando se observa um juiz desumano e deputado quando da
discussão da lei sobre trabalho infantil46
(1840-1841). Em qualquer caso, os deveres para com os pobres
são preenchidos livremente e não dão nenhuns direitos às classes inferiores. Um dos principais líderes
orléanistes, Molé, declara: "Adula-se as classes pobres à tribuna, nos livros, nos jornais:" fala-se delas
como oprimidas; atribui-se-lhes direitos; dá-se-lhes esperanças "." Pensar sequer em direitos dos
trabalhadores: que insolência!
O consenso entre nobres e burgueses ricos é com efeito que o Estado não deve misturar-se com os
negócios dos proprietários. Os notáveis, legitimistas ou liberais, são adquiridos maciçamente ao
liberalismo económico (doutrina da Inglês Adam Smith e Ricardo, do Francês Bastiat e Dunoyer). O
poder deve deixar o proprietário e o trabalhador debater livremente o contrato de trabalho.
A ideia que o trabalhador, deixado só em frente do empregador, é como tivesse de pés e mãos atadas,
sobretudo em período de desemprego, não lhes parece não deplorável porque as baixas de salário
periódicas são consideradas como um mal necessário para a saúde da economia. Qualquer
regulamentação em prol dos assalariados, consideram os proprietários, não pode ser senão nefasta e pôr
em causa os relacionamentos e a harmonia que asseguram o bom funcionamento da produção e a troca.
Contudo, o liberalismo económico não deve ser doutrinário mas adaptado às realidades, ou seja aos
interesses dos empresários. É assim que os homens de negócios reclamam direitos aduaneiros elevados
46 A lei sobre o trabalho das crianças foi, até a 1848, a única lei social favorável aos trabalhadores. Elie tinha por
objectivo corrigir os abusos mais gritantes causados pela aposta no trabalho precoce das crianças. Na ocasião
manifestar a sua repugnância pelo destino dos seus jovens trabalhadores e pela indiferença de certos industriais da
Câmara dos deputados. De facto, foi pouco aplicada esta lei.
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para proteger os seus produtos da concorrência estrangeira47
. Do mesmo modo, os primeiros
construtores de vias ferradas obtêm do Estado condições incrivelmente vantajosas, dado que os poderes
públicos encarregam-se de uma grande parte dos seus investimentos deixando os benefícios da
exploração das redes às companhias privadas.
Esta dupla linguagem, esta hipocrisia, reencontram-se no domínio das associações profissionais. A
legislação revolucionária (lei do Chapeleiro, decreto de Allarde)48
que suprimiu as associações de
ofícios continuaria em vigor até 1884; era aplicável teoricamente às associações patronais assim como
os sindicatos operários. Mas na prática, há dois pesos e duas medidas. Antes de 1868, a constituição de
um sindicato operário é um delito punido pelos tribunais. Em contrapartida, o poder tolera a formação de
sindicatos patronais a partir do fim da Restauração e sobretudo sob a monarquia de Julho e o Segundo
Império.
Uma "reunião dos fabricantes" foi organizada em Lyon, em 1825, pelos fabricantes de tecido de seda; os
produtores de açúcar de beterraba formaram em Lille, em 1832, um "Comité dos fabricantes de açúcar
indígena" para lutar contra o açúcar das colónias; por último, celebra-o Comité das forjas (precedido em
1840 por um Comité aos interesses metalúrgicos), foi criado em 1864 (lista não limitativa). Criados para
manter um proteccionismo intransigente, estes Comités favoreciam também os acordos, a defesa do
nível dos preços, a divisão dos mercados: tantas infracções à ortodoxia liberal em nome do pragmatismo
e do interesse "geral"
Dureza para com os pobres, complacência para com eles mesmos, contracenso, o retracto que se acaba
de mostrar não é bom. Corresponde largamente à realidade. No entanto, o remorso social não está
ausente deste mundo de ricos. A extrema miséria dos trabalhadores da indústria preocupa alguns bons
espíritos, sobretudo a partir dos anos 1840. Os inquéritos, os estudos sobre o destino do proletariado
aparecem, frequentemente sob a égide oficial. Os trabalhos de Sismondi, Villermé, o Play descreve a
extensão do mal social, ainda que as soluções que propõem continuam a ser cuidadosas e conservadoras.
O Mennais49
seguidamente Ozanam é do "cristianismo social" que desperta uma minoria de católicos
para o problema operário. O socialismo utópico, que tem o mérito de recusar o ponto de vista liberal,
ainda que as soluções preconizadas são às vezes executáveis (aos nossos olhos) tem alguns sucessos nos
meios favorecidos pela fortuna: o santo-simoniens pertence frequentemente à elite. Vê-se mesmo júris
burgueses condenarem raparigas do povo a penas ligeiras ou mesmo a pagar atribuindo-lhes a culpa de
aborto ou de infanticídio, assina que uma certa sensibilidade romântica, apitoyée (com piedade) pela
miséria do povo, entra bastante no meio.
Outro domínio onde os notáveis sabem mostrar-se abertos é o da cultura. Se o retracto literário burguês é
o de um ser inculto e vulgar (o Sr. Prudhomme por Henri Monnier, 1857), esta caricatura, talvez válida
em parte no meio dos lojista, é errada quando considerada a elite. Os filhos de notáveis recebem uma
47 O proteccionismo reina sobre a economia francesa da Restauração até ao tratado de comércio livre assinado por
Napoléon III com a Inglaterra (1860) que desencadeou a indignação dos empresários, e um início de oposição ao
Império. 48
Recorda que os grandes textos da Revolução sobre as associações profissionais (decreto de Allarde, 2-17 de
Março de 1791, e lei o Chapeleiro, 14-l7juin 1791) abole as corporações, proibe qualquer associação profissional
e ilegaliza a greve. São completadas por uma série de medidas severas durante o Primeiro Império e a monarquia
constitucional até proclamação do "direito de coalição" (direito de greve) em 1864. Os sindicatos profissionais,
tolerados a partir de 1868, obtiveram um estatuto legal pela lei Waldeck-Rousseau em 1884. 49 O Mennais (1782-1854) foi o principal partidário do catolicismo liberal. Condenado pela Igreja em 1832,
evoluiu para o socialismo.
Ozanam (1813-1853) fundou a Nova Era em 1849 com o pai Lacordaire; é o primeiro aparecimento da
democracia cristã
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educação notável. Frequentam os cursos de tutores privados nas famílias mais ricas, mas frequentemente
são alunos dos liceus que pertencem à universidade do Estado, de instituição napoleónica. Alguns vão
para pequenos seminários, escola secundária destinada em princípio à formação dos eclesiásticos, mas
frequentado por um público bastante vasto. Lá aprendem o latim, sinal de distinção social que separa a
elite letrada da massa.
A França dos notáveis não é por conseguinte um país de nulidades satisfeitas. Bem pelo contrário: Paris
faz figura de capital intelectual, literária e artística da Europa. A ciência francesa participa com honra
nos progressos mundiais: as descobertas que tocam às matemáticas, à electricidade, à química orgânica,
a medicina são legião. A imprensa, às vezes de uma grande qualidade (o Globo, 1824-1832) exprime-se
no conjunto livremente, apesar dos processos que sofre, pondo à parte o período dictatorial dos inícios
do Império. Este desenvolvimento cultural notável não se pode limitar apenas à liberdade e ao
inconformismo. As exigências da liberdade intelectual, afirmadas amplamente pela burguesia face à
Igreja, são infalivelmente um fermento de desordem que mina do interior a ordem imóvel desejada pelos
ricos. Assinala-se frequentemente os dois processos por insulto aos bons valores intentados em 1857, um
contra Baudelaire, pela obra as Flores do Mal, outro contra Flaubert pela Madame Bovary, mas foram
limitações à liberdade de criação completamente excepcionais50
.
Os ensinos secundários e superiores estão reservados às classes altas e média alta, todos os regimes
estão de acordo com este ponto de vista até 1914. Em contrapartida, o ponto de vista do Estado sobre a
educação do povo variou muito no tempo, assim como a sua atitude para com a Igreja católica. Estas
duas questões serão abordadas mais adiante como veremos.
Os notáveis e o Estado. As necessárias adaptações
A influência dos notáveis sobre o poder público exerce-se ao mesmo tempo ao plano local e no plano
nacional. Sobre o seu terreno, os membros da elite são conhecidos pessoalmente; atraem todos os
olhares. Esta situação está clara até ao século XIX. No século XVIII, o senhor continuava quase ausente
e os camponeses tinham relações apenas com o seu representante. Hoje em dia, a direcção de uma
empresa industrial, que governa o emprego dos assalariados, é frequentemente um Comité anónimo que
reside distante (às vezes em Nova Iorque ou Detroit); o poder político encontra-se essencial em Paris,
dividida entre responsáveis que o cidadão comum não conhece. Pelo contrário, no séc. XIX, sabe-se a
quem dirigir-se se necessário: o notável é ser de carne e de sangue que distribui os empregos sobre as
suas terras ou na sua fábrica, que pode obter ou recusar empregos de solicitadores do Estado: procura e
ocupa por conseguinte as funções locais de presidente da câmara municipal e de conselheiro geral, mas
isto não é suficiente. Com efeito, em França, país com poder super centralizado desde Napoleão I
(contrariamente à Inglaterra), os notáveis são encarregues de controlar o poder central. Para a camada
inferior da elite, ter boas relações com o prefeito é uma necessidade.
Contrariamente, este último pode administrar correctamente o seu departamento apenas se atribui-se
com principais os proprietários. Os notáveis mais ricos e mais dotados procuram com paixão ser eleitos
50 A época do notáveis é sem dúvida aquela na qual os meios políticos e literários se encontram mais. Um grande
homem político e também escritor (Chateaubriand, Lamartine), ou historiador (Thiers, Guizot, Tocqueville).
Vários escritores famosos têm ambições políticas e às vezes são eleitos para as assembleias (Hugo, Vigny,
Georges Sand). A lembrança deste período explica as ambições literárias dos homens políticos franceses da
Terceira República aos nossos dias: o político crê-se obrigado a produzir novelas, ensaios, dos livros de história
para apoiar a sua reputação.
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deputados, porque a posição de deputado goza então de um grande prestígio (observem à passagem que
os deputados que figuram nas novelas de Balzac continuam quase heróis positivos, manifestamente bem
vistos do autor). Pela Câmara legislativa, o notável controla o Estado: citamos várias decisões favoráveis
à oligarquia, tomadas no domínio da manutenção da ordem, as associações, as alfândegas, a construção
das vias ferradas, etc., que ilustram a realidade deste controlo. Contudo, fracturas e diferenças
partidárias aparecem na classe do poder; são particularmente intensas no início do período, sob a
Restauração.
Legitimistas e liberais durante a Restauração - 1815-1830
De 1815 para 1830, o nobre e os proprietários legitimistas, partidários do ramo “aînée” (primogénito /
mais velho) Bourbons, são a classe predominante. Sem aderirem à ideologia do regresso puro e simples
ao Antigo Regime, desejam que o rei, a nobreza e a Igreja reforcem a sua influência na sociedade. Não
são favoráveis ao desenvolvimento da instrução popular porque povo que ignora parece-lhes mais fácil
de levar. Contam sobretudo com a influência moralizadora da Igreja sobre as classes trabalhadoras.
É que a Igreja católica goza dos favores do poder. Conhece então um notável renascimento. Está ligada
ao Estado pela Concordata de 1801, regime que subsistirá até 1905. Neste quadro, os padres são pagos
como funcionários e os bispos são nomeados pelo governo. Excedida pelas perseguições revolucionárias
e o conflito entre Napoleão 1 e o papa Pie VII, a Igreja é violentamente hostil às novas ideias e aliou-se
a Luís XVIII. O clero odeia o liberalismo, filho da Revolução.
O liberalismo político é em contrapartida a ideologia dominante da burguesia (alguns dos seus princípios
são aceites como inevitáveis pela nobreza). Os liberais são partidários convictos de um regime de
monarquia constitucional. A pessoa do rei não lhes interessa; de resto, no decorrer do século, não se
unem sinceramente a nenhuma das dinastias que se sucederam em França. O monarca, qualquer que
seja, parece-lhes simplesmente o garante da ordem e das liberdades ao mesmo tempo. Da Revolução,
guardam os princípios da igualdade civil e a liberdade de expressão, sobretudo em matéria de religião e
imprensa. Persuadidos que a Igreja católica deve ser acantonada firmemente no seu papel religioso,
tomam de boa vontade atitudes anticlericais. Contudo, à maneira de Voltaire, consideram que a religião
é boa para o povo a quem ensina a moral e o respeito da propriedade privada.
Várias vezes, durante a Restauração, os legitimistas e os liberais moderados chegam a entender-se no
âmbito da Carta constitucional. Contudo, os excessos e as inaptidões de Charles X conduzem à
revolução de 1830 onde os notáveis liberais, os intelectuais e o povo de Paris se reencontram unidos
contra os Bourbons. Desde o Consulado, não havia perturbação tão grave em França; doravante, o ciclo
revolucionário é reaberto, motins, revoluções, mudanças violentas vão suceder-se até 1871.
A monarquia de Julho – 1830-1848: Apogeu do poder dos notáveis... e das perturbações
O povo de Paris esperava muito com a queda de Charles X. mas a Revolução de 1830 foi, sabemo-lo,
confiscada pela alta burguesia liberal.
"A estas multidões, dito um jornalista da época, chama-se povo quando tem se necessidade deles e
depois já se trata por população." "O reino de Louis-Philippe representa o apogeu do poder dos notáveis
e o seu ideal, sempre lamentando continuamente." A alta burguesia põe a mão sobre o Estado que utiliza
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ao seu serviço. "Todos os poderes políticos, todas as franquias, todas as prerrogativas, todo o governo
encontraram-se fechados e como entalados nos limites estreitos desta única classe", escritos Tocqueville
após a queda de Louis-Philippe.
Inicialmente, os orleanistas desconfiam da Igreja que apoiou demasiado Charles X; favorecem-no menos
do que tinham feito no regime precedente. Mas à medida que o tempo passa, um movimento de regresso
ao catolicismo desenha-se nos meios ricos. O acordo entre o Estado e o catolicismo parece útil à
estabilidade. A sensibilidade religiosa reconquista gradualmente a elite rica no final do séc. XIX.
Contudo, os orleanistas estão mais abertos à instrução popular que os legitimistas. Guizot, o político
mais importante da época, protestando51
é verdadeiro, é um firme partidário da divulgação da instrução,
enquadrada pela religião cristã, factor de estabilidade. É objecto da lei Guizot de 1833 que obriga as
comunas, únicas ou associadas, a manter uma escola. Esta lei teve consequências consideráveis nas
quatro décadas seguintes; foi o principal factor da alfabetização dos Franceses antes da obra Jules Ferry
nos anos 1880.
Por conseguinte a França evolui, enriquece, os Franceses instruem-se. Mas esta atitude progressista tem
alguns limites. Não se faz nada em prol dos trabalhadores, e o poder recusa qualquer alargamento do
direito de voto. Também este período colecciona perturbações e as revoltas que pode-se classificar, de
acordo com a sua origem, em quatro categorias.
1. Problemas políticos relativamente benignos dentro do mundo dos notáveis. É primeiro a tentativa
de acção clandestina da duquesa de Berry para restabelecer o Bourbons (1832), seguidamente as
duas tentativas de tomada do poder pelo sobrinho Napoleão 1, Louis-Napoléon Bonaparte (1836
e 1840).
2. Muito graves revoltas dos republicanos em Paris (1831,1832, 1834) e em Lyon (1834). Elies é
restringido duramente, sem estar a contar a inábil tentativa de levantamento da sociedade secreta
dirigida por Blanqui (1839).
3. A primeira revolta operária (Lyon 1831, revolta dos “canuts” (os que trabalhavam na industria
têxtil em Lyon) com motivos estritamente sociais.
4. Perturbações campesinas, às vezes muito sérias mas sem perspectivas políticas, a propósito dos
novos impostos e o uso das florestas. Primeiro são localizadas em algumas regiões como
interminável a "guerra demoiselles" em Ariège52
. Por ocasião da grave crise económica do 1848,
estendem-se a todo o país.
51 Os protestantes formam uma pequena minoria de cerca de centena de milhares de pessoas, não obstante a sua
importância numérica é bastante grande na burguesia (notáveis e classes médias diplomadas). São geralmente
mais favoráveis ao ensino popular que os católicos. Apoiantes de Louis-Philippe, foram reticentes para com o
Segundo Império e estiveram entre os mais firmes os partidários da Terceira República. As regiões habitadas por
populações protestantes assinalam-se geralmente até hoje por um voto de esquerda.
52 A "guerra demoiselles" (1829-183 1) são a reacção dos camponeses de Ariège à proibição aos camponeses do
uso das florestas. Disfarçados de raparigas e mascarados, montanhistas contestatários ferem e às vezes matam
guardas florestais e os gendarmes, pilham as casas dos notáveis. As autoridades defrontam-se com a lei do
silêncio que prevalece nos camponeses, são estas perturbações tão difíceis de restringir. Esta revolta larvée (no
sentido figurativo, nojenta) retoma de maneira endémica de 1831 para 1872.
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Um desmoronamento seguido de um restabelecimento – 1848-1851
Embora precedida de perturbações campesinas e manifestações reformistas, a revolta parisiense de
Fevereiro de 1848 não foi à priori mais grave que todas as que a precederam. No entanto, o poder
rendeu-se e a Segunda República foi aceite em toda a França sem discussão. A dúvida sobre a
justificação do liberalismo económico e o direito do notáveis monopolizarem todos os poderes abalou
sem dúvida muitos espíritos. "A facilidade com que a facção do poder capitulou na frente do que era,
pareceu apenas um motim nem mais nem menos grave que outros explica-se em parte pela revolução
anterior ainda estar presente nas mentes" (Christophe Charles, História social da França ao o XIX'
século, 1991).
O remorso social fez a sua obra e proclamação do sufrágio universal masculino, em Fevereiro de 1848, e
foi aceite sem discussão pelo conjunto do país. As eleições legislativas de 1848 conduzem à Câmara
uma maioria de deputados que pertencem à burguesia diplomada. É o fim do monopólio político dos
notáveis?
Com efeito, a oligarquia ressurgia bastante rapidamente, mas sente-se ameaçada pelo movimento
operário em Paris e nas grandes cidades. Legitimistas e orleanistas reconciliam-se no "Partido da
ordem". O objectivo dos notáveis será doravante enquadrar um sufrágio universal aproveitando a
inexperiência dos eleitores. Às eleições presidenciais de 1848, a escolha de um candidato ao nome
prestigioso, Bonaparte, permite evitar a eleição de um candidato democrata. Nas eleições legislativas de
1849, os notáveis chegam a fazer "efectivamente" votar os camponeses da maioria dos departamentos
com a ajuda do clero. Esta adaptação às novas condições da vida política foi efectuada por conseguinte
de maneira notável.
Para o futuro, o problema do ensino popular parece crucial. É por isso que a Assembleia legislativa,
dominada pelo Partido da ordem, faz votar a lei Falloux (1850): um ensino livre, geralmente católico, é
criado; além disso o clero obtém um direito de controlo essencial sobre o ensino público. Os notáveis
esperam assim obter gerações de Franceses morais e apresentados.
O esforço dos notáveis e dos seus líderes não resolve contudo todos os problemas. A elite deve ainda
fazer face a três séries de situações conflituosas
- Em Paris, a revolta de Junho de 1848, um motim da fome dos trabalhadores desempregados, é
contida com um banho de sangue;
- Na província, no mediterrâneo e no centro da França, a organização do partido democrata –
socialista entre 1849 e 1851 que faz aceder aos movimentos campesinos a um nível político
desconhecido até então. A militância revolucionária toma formas messiânicas no campo, nas
vilas e nas regiões53
.
53 Durante a Segunda República, as campanhas francesas separam-se claramente em duas categorias. A maioria
entre elas segue docilmente o notável do Partido da ordem. Uma minoria importante no mediterrâneo e a norte do
Maciço central segue pelo contrário o "vermelho" democrata – socialistas; um "messianismo" popular
desenvolve-se: espera mudanças maravilhosas do ano 1852 onde devem ter lugar as eleições seguintes. A
decepção é dura para Vermelha após o golpe de Estado do 2 de Dezembro de 1851, de onde a violência das
reacções provinciais ao putsch bonapartista.
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- Na cimeira do Estado, o príncipe – presidente, Louis-Napoléon Bonaparte, joga um jogo pessoal
ligeiramente misterioso e aspira a um poder absoluto que preocupa os notáveis do Partido da
ordem.
O golpe de Estado do 2 de Dezembro de 1851 vem primeiro que não é nem de esquerda nem de
direita, não se sabe qual lado em que Louis-Napoléon vai "cair". Mas a importante revolta das
províncias democrata – socialistas em prol da república desencadeia um pânico nos
possuidores/proprietários. O chefe do Estado, tendo êxito abafando as perturbações, aparece
posteriormente como restaurador da ordem social então ameaçada pelo "Vermelha".
Adesão ao bonapartismo: uma das piores hipóteses - 1851-1870
Os notáveis assustados por todas as perturbações políticas e sociais da Segunda República aliam-se a
Louis-Napoléon Bonaparte sem entusiasmo. Embora a sua preferência fosse monarquia liberal mas sem
ter hipótese de controlar inteiramente estado, eles aceitam ditadura Bonaparte como uma necessidade
Napoleão III assegura-lhes de resto uma vingança inesperada. A operação não era evidente, porque antes
do golpe de Estado tinha-se organizado um partido bonapartista dirigido por militantes procedentes das
classes médias e a pequena burguesia instruída, prefigurando assim a elite política que devia dominar a
Terceira República. Mas Louis-Napoléon, numa preocupação de estabilidade, tinha absolutamente o
apoio dos notáveis. Abandonando pequenos burgueses aliados de Bonaparte, o imperador escolhe por
conseguinte os candidatos oficiais do Corpo legislativo entre homens completamente semelhantes aos
das câmaras de Louis- Philippe. Os notáveis (letrados) encontram-se por conseguinte acarinhados pelo
poder.
Contudo o Império, satisfaz mesmo os desejos dos notáveis, mas não corresponde completamente ao seu
ideal. Ao plano económico primeiro, o regime favorece o desenvolvimento de um capitalismo vigoroso,
e a nova elite económica revela-se muito mais dinâmica que os accionistas do solo que dominavam o
país antes de 1848. Os notáveis desejavam a tranquilidade e a paz: ora o Imperador considera que tem
necessidade de sucessos externos para manter o prestígio do seu nome. Lança-se por conseguinte em
campanhas belicistas cada vez mais arriscadas. Todos os domínios, provincialismo estreito do notável
Louis-philippards, sucede um mundialista ambicioso. Os empresários capitalistas investem na Europa e
nos Estados Unidos, constroem vias terrestres em Espanha, a Itália, Áustria. Toda esta agitação não
corresponde ao gosto da calma dos ricos da era orléanista.
Se a sua política externa não tivesse sido imprudente, pode-se pensar que Napoleão III teria tido êxito
numa transição calma para a democracia, que faltava na monarquia censitária. Com efeito, tendo em
conta o problema operário e o desenvolvimento das categorias instruídas, Napoleão III é conduzido de
atribuir mais liberdades aos partidos e mais direitos aos trabalhadores. Após 1860, o Império liberal
evoluiu por transição para uma fórmula parlamentarista parecida com a do Reino Unido que triunfou
durante a Terceira República.
Mas o regime lança-se na guerra com a Prússia (1870-1871). O Segundo Império resultou tal como o
primeiro na derrota. A Terceira República é proclamada (4 de Setembro 1870).
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O fim dos notáveis – 1871-1879
1871-1879: Embora a república esteja instalada nominalmente, os conservadores monárquicos têm a
maioria na Assembleia nacional. Oito anos de ilusões no decorrer dos quais os notáveis pensam poder
restabelecer o seu poder a todos os domínios mas tal não passa de uma pretensão, da qual vamos
resumidamente recordar as fases.
As eleições de Fevereiro de 1871, levadas a cabo enquanto que Prussiens ocupavam um terço do país, os
Franceses hostis à continuação da guerra votaram nos partidos conservadores cujos candidatos eram
partidários da paz. A Assembleia nacional por conseguinte é composta de representantes dos grandes
nomes da monarquia constitucional, “hobereaux” (pequenos nobres de província) legitimistas,
banqueiros orleanistas, nobres antes de 89, barões de Império, de grandes industriais e de ricos
proprietários fundiários: o Casimiro-Périer, de Broglie, Thiers retorna ao primeiro plano. A maior parte
deles queria restaurar a monarquia, mas não era para aquilo que tinham sido eleitos. Logo que a paz com
a Alemanha foi assinada, não havia necessidade dos conservadores no poder e as eleições parciais são
um sucesso para os republicanos no verão 1871
Contudo, notáveis como Broglie ou Mac-Mahon mantêm-se no poder até às eleições gerais de 1876.
Têm êxito a libertar o território e restringem a Comuna com base na força (Maio 1871). Efectuam uma
política muito favorável ao clero. Contrariamente, o anti clericalismo torna-se o traço principal do
partido republicano defendido pelos homens da burguesia diplomada.
Entre os anos de 1876 e 1879, as eleições que deram a maioria aos republicanos, os notáveis são
corridos do poder político; o seu reino termina com a demissão do presidente Mac-Mahon em 1879. A
elite sobe ao poder e desde 1815 não mais se mostrou capaz de orientar o sufrágio universal como fez
em 1848-1849.
A partir dos anos 1880, a França conhece um sistema sócio político novo que devia durar até a 1958 (o
episódio do regime Vichy excluído). Os poderes doravante são compartilhados os antigos notáveis (e os
novos capitalistas que lhes sucedem) conservam a riqueza e o poder económico. Oposto deles, o pessoal
político da Terceira República é composto sobretudo de membros da burguesia diplomada: advogados,
médicos, jornalistas, professores; tem a maioria nas Câmaras e ocupam o poder executivo. A nova elite
burgueses diplomados republicanos teve êxito ao integrar a grande massa dos cidadãos franceses na
democracia nacional, graças à acção da escola laica.
Os novos mestres do Estado não deixam de ser omnipotentes. Estes políticos têm o poder graças ao seu
mandato eleitoral, mas não podem usar a riqueza como meio de influência. Designam-se às vezes
também como notáveis (termo ainda utilizado hoje em dia), é porque são conhecidos bem no seu
distrito, tidos do prestígio, prestados serviços. Mas sendo menos ricos que os antigos notáveis, têm
muito mais responsabilidade nas funções políticas e querem custe o que custar evitar um malogro
eleitoral e põem-se por conseguinte apaixonadamente à escuta dos seus eleitores.
A pergunta das feiras e mercados, crucial nas campanhas, ilustra esta mudança. Ao longo de todo o
século XIX, os camponeses reclamaram a criação de novas feiras e mercados. O notável da monarquia
constitucional e o Império recusavam geralmente aceder esta pretenção tendo em conta: viam com efeito
nas feiras uma ocasião de imoralidade, (alcoolismo) e sobretudo de perturbações sociais e políticas. Pelo
contrário, os políticos da Terceira República criam em grande número estes ajuntamentos comerciais, à
grande satisfação dos rurais. Os novos notáveis republicanos, conservando ao mesmo tempo a ordem
social, esforçam-se por conseguinte de satisfazer os desejos do eleitorado. As suas relações com o povo,
cordiais, homens bons, um tanto demagógicos, contrastam com da morgue dos notáveis da monarquia.
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...mais bonitos restos
O desmoronamento dos notáveis após 1880 foi apenas político e seus filhos muitas vezes conservaram a
sua riqueza. Contudo, como a república não efectuou revolução social, conservaram também uma parte
do seu prestígio. É assim que se vê os eleitos republicanos casar com jovens raparigas nobres, união
benéfica para um advogado de extracção plebeia. Brio mundano dos aristocratas, cujo Proust descreve a
vida de relações fastidiosa à procura do tempo perdido, reside intacto. Muito novos notáveis da
república posicionavam-se em frente da porta das grandes feiras mundiais onde não podiam entrar.
Os descendentes dos notáveis conservam fortes posições no exército até aos inícios do século XIX, e na
diplomacia até a hoje. É a mesma política que lhes abre as suas portas na condição de adoptarem as
ideias democráticas. É assim que, durante a Quinta República, muitos descendentes de famílias notáveis
chegaram aos altos cargos do Estado: Giscard d' Estaing, Poniatowski, d' Ornano, de Broglie... Os
notáveis não gozam da hegemonia que tinham no tempo de Louis – Philippe, mas estão longe de ter
perdido regalias.
Numa França ainda rural onde o progresso económico e cultural se fazia lentamente, o notável, nobre e
grande burguês, não tinha concorrentes sérios. Até ao meio do século, gozavam de um poder
extraordinário em todos os domínios da vida social: economia, política e cultura. Unidos aos seus
privilégios e os seus direitos procedentes das perturbações de 1789, concebem um modelo de sociedade
imóvel onde cada um deve permanecer ao seu lugar, a ascensão social é reservada a alguns indivíduos
de talento. A sua obstinação em recusar as reformas parece posteriormente absurda e mesquinha, mas é
verdade que temos a vantagem sobre eles de conhecer a sequência no processo histórico...
Se foram eles que provocaram a sua ascensão social e política são eles que devem provocar a seu perda.
O seu gosto das ideias e o livre conhecimento, o seu desejo de melhorar a prosperidade nacional
permitiram o desenvolvimento económico e cultural do país e o desenvolvimento das camadas sociais
excluídas dos poderes de decisão. A contradição entre uma atitude económica e cultural aberta e um
comportamento político e social conservador está no meio do destino dos notáveis. Eles mesmo
desencadearam as catástrofes que deviam destruir o seu monopólio. A burguesia diplomada, aliada às
camadas populares, conseguiu reduzir o seu poder político, sem procurar despojá-los da sua riqueza.
Esta meia revolução está na base da democracia francesa actual.
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CAPÍTULO 6 – A QUESTÃO OPERÁRIA DO SÉCULO XIX
« La question des prolétaires est celle qui fera l’explosion la plus terrible dans la société, si les
gouvernements se refusent à la sonder et à la résoudre. » 54
Após 1831, Lamartine55
teve um pressentimento : devido à industrialização, o problema operário viria a
ser uma das questões centrais do século.
Claro que já existiam operários sob o Antigo Regime, mas a sua importância numérica era diminuta e
não constituía portanto um grande problema para o resto da sociedade. Esta classe não existia senão
após a “monarchie de Juillet56
”. Os operários formam uma classe social em pleno desenvolvimento.
Sujeitos a condições de trabalho e de vida particularmente difíceis, começaram a organizar-se e a lutar
para melhorar a sua sorte. Paralelamente, num contexto fortemente marcado pela memória da
Revolução, surgiram correntes de inspiração socialista que colocaram a temática da emancipação
operária no centro dos seus programas políticos.
O nascimento da questão operária, sobretudo no contexto francês do seculo XIX não pode limitar-se a
uma simples questão sociológica. Esta é necessária, mas como preliminar a um estudo mais amplo
englobando o desenvolvimento do movimento operário nos seus combates quotidianos, para tornar mais
suportável a condição dos trabalhadores e das suas lutas políticas e para transformar a sociedade
conferindo poder às classes trabalhadoras.
Contornos e Diversidade de uma Classe em Gestação
Classe homogénea ou painel de profissões?
O mundo operário francês do século XIX tem estas duas vertentes.
Classe homogénea? Certamente, se nos referirmos à situação dos operários nas estruturas sócio-
económicas da produção industrial capitalista. O operário não possuía senão uma fórmula tantas vezes
repetida como a sua força de trabalho. Quer se trate de um operário de um atelier artesanal, de um
mineiro altamente qualificado, de um operário das grandes fábricas ou de mão-de-obra de um estaleiro
de construção, os meios de produção utilizados não eram pertença própria. O seu emprego dependia de
54 Por ser uma citação optei por deixar o original, no entanto a minha proposta de tradução é: A questão do
proletariado é aquela que originará a mais terrível explosão dentro da sociedade, se os vários governos se
recusarem a sondá-la e a resolvê-la. 55 Alphonse de Lamartine (1790-1869), poeta romântico. Monárquico sob a Restauração, torna-se republicano e
desempenha um papel de primeiro plano na Revolução de 1848. 56 Monarquia de Julho
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um contrato negociado com um patrão. Tarefeiro ou trabalhador à peça, a sua remuneração era
proporcional à quantidade de produtos realizados. Pagos à hora, à jornada, à semana ou à quinzena, o
pagamento referia-se à tarifa de uma unidade de tempo de trabalho. Apesar de liberado em parcelas
possuía benefícios como o intervalo para as refeições tomadas no local de trabalho. Tratava-se em todos
os casos de um salário, pago pelo patrão.
O sentimento de pertença a uma classe, cujas raízes se encontravam na relação de produção salarial, era
reforçado pelo lugar que os operários ocupavam no seio da sociedade.
Salvo raras excepções, o salário era reduzido, por vezes demasiado. O operário encontrava-se no fundo
da escala de rendimentos. O seu modo de vida – alojamento, vestuário, nível de cultura e passatempos –
distinguia-se nitidamente do das outras categorias sociais da cidade. No tempo de Balzac tal como no de
Zola, ninguém confundia o operário com o assalariado, o funcionário ou com o comerciante e o
accionista.57
Este diferencial de riqueza erguia barreiras invisíveis mas sólidas entre os homens.
As classes médias e dominantes viviam ignorantes da realidade da condição operária. No melhor dos
casos elas lançavam olhares condescendentes e caridosos sobre a miséria alheia. Mais frequentemente,
elas não viam senão a justa sanção daqueles que pelo facto de não terem sabido merecer melhor sorte,
através do seu talento, do seu trabalho ou da sua própria gestão. Não podiam pôr-se em causa as
hierarquias naturais.
Toute contestation revêt vite dans I’esprit du bourgeois l’allure d’une sédition. Cela le confirme dans
une évidence: les classes laborieuses sont des «classes dangereuses »58
Qualquer contestação revestia rapidamente no espírito burguês o aspecto de uma revolta. As classes
trabalhadoras eram as “classes perigosas” e só a violência do Estado podia conter a ameaça que elas
representavam para a ordem. Era esta indiferença por parte da sociedade que o operário recebia
quotidianamente nas suas relações com o patrão, com o senhorio, com a administração ou com a força
política. O operário sentia por vezes a brutalidade na violenta repressão que acompanhava os seus
momentos de revolta. Sob um tal clima de hostilidade, os laços de solidariedade que o ligavam àqueles
que partilhavam da mesma realidade tendiam a tornar-se mais sólidos. Assim tomava forma, para uma
grande fracção do grupo a consciência de formarem uma entidade distinta do resto da sociedade. Logo,
não era a unidade dessa classe, mas a sua diversidade que se revelava de imediato. Diversidade de
ofícios, de iniciativas, de regiões, mas também de sexos, de idades, de origem... Em França, a
originalidade das condições de desenvolvimento da industria veio reforçar a diversidade do mundo
operário. Totalmente díspar do modelo inglês, frequentemente tomado como referência. Não havia
êxodo rural massivo: em 1906, 42,7% dos activos eram ainda camponeses enquanto apenas 28,2%
trabalhavam na indústria. Não houve uma revolução industrial brutal, tumultuante do panorama social,
mas antes uma evolução gradual, pautada por algumas fases de aceleração, como a do Second Empire.
57 Nota do tradutor: optei pelo emprego da palavra accionista, pois foi a que me pareceu mais adequada, no
entanto as definições que encontrei diziam “aquele que vive dos rendimentos” 58 De acordo com a expressão de L Chevalier na sua obra, Classe laboriosa, classe perigosa em Paris durante a
primeira metade do século XIX, Hachette, 1978 (rééd.)
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Domínio até 1880 do operário à moda antiga
Pelo menos até aos anos 1880 o mundo operário conservou os traços que o caracterizavam desde o
Antigo Regime.
Nas aldeias e nas povoações mantiveram-se prósperas as pequenas empresas de carácter artesanal. Os
progressos da agricultura e o enriquecimentos dos camponeses originaram uma nova demanda outrora
insatisfeita pelo trabalho doméstico do agricultor e sua família.Do ferreiro ao pedreiro, do seleiro ao
tanoeiro, subsistem milhares de empregos de trabalhadores independentes, ajudados por alguns
aprendizes e companheiros.
A uma maior escala, a da indústria, o meio rural permaneceu um quadro essencial - e muito tempo
subestimado - do crescimento económico do XIX. Sob o nome de fábrica, os contemporâneos
designavam um conjunto que incluía simultaneamente estabelecimentos urbanos e unidades de trabalho
dispersas pelas aldeias circundantes. Tratava-se de um fenómeno maciço e que se expandia por
numerosas regiões. Em 1850, os três quartos dos 50.000 trabalhadores das fiações e tecelagens da lã de
Reims encontravam-se disseminados pela região de Champagne. Em Lyon, este modo de organização da
produção, longe de enfraquecer, estendeu-se sob a monarquia de Julho. Traumatizado pela revolta dos
trabalhadores da seda – os canuts59
-, o patronato procurava assim limitar a sua concentração no meio da
cidade.
Para os mercadores fabricantes que distribuíam a matéria-prima, tal sistema apresentava outras
vantagens: à menor baixa de actividade, podiam desfazer-se sem problema de uma parte desta mão-de-
obra, de resto mal remunerada e não declarada devido ao trabalho das crianças. Aos agricultores
proprietários, a alternativa de abandono não se afigurava atraente, pois como se encontravam
firmemente enraizados, resistiam a abandonar a terra adaptando-se então ao complemento remuneratório
de origem industrial. Com efeito, este sistema doméstico não se referia apenas fiadores ou tecelãos a
tempo inteiro. Antes que os progressos da mecanização forçassem os industriais a concentrar a mão-de-
obra em grandes ateliers, esta espalhou-se pelos lares de agricultores. Para combater a ociosidade
durante a época-morta ou durante os longos serões de inverno, homens, mulheres e crianças dedicavam-
se à tecelagem. Reencontravam-se também camponeses nas actividades que, ainda que não tendo
disponibilidade o ano inteiro, se integravam bem nos ciclos agrários: pequenas fábricas de açúcar da
zona da beterraba no norte, pedreiras, fábricas de telha, fábricas da farinha, estaleiros de construção, etc.
Sem trabalho a nível local, era necessário deixar a aldeia, pelo menos temporariamente, seguindo
migrações sazonais que se perpetuavam, de geração em geração, às vezes durante séculos. Quando o
Outono chegava, os jovens partiam, sempre para o mesmo destino. Paris ainda guarda a lembrança do
limpa-chaminés da Savoia ou os pedreiros da Oca.
No âmbito francês, a entrada na condição operária não constituiu um desenraizamento brutal mas sim
um percurso que se desenrolou por várias gerações. Do estatuto de camponês passou-se ao de camponês-
trabalhador tendo no salário indústrial um simples suplemento. Seguidamente ao de trabalhador -
camponês que cultivava a sua peça em bruto dentro do atelier ou da mina. Por último, o trabalho
industrial tornou-se a única fonte de rendimento.
Nas cidades, sobretudo nas grandes, a classe operária estava em pleno crescimento. Isto não implicava
que perdesse rapidamente as suas antigas características. Há primeiro uma multidão de trabalhadores
ocupados em pequenos ofícios manuais ou jornaleiros. A maior parte dos recém-chegados, tentava
sobreviver em situações muito instáveis.
59 Canut era o nome atribuído aos operários das fábricas da seda de Lyon.
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Distinguiam-se assim das "pessoas com ofícios"60
, melhor integrados à vida urbana e herdeiros do
sistema das corporações desmanteladas em 1790. Eram trabalhadores, orgulhosos da sua qualificação
adquirida ao preço de uma longa aprendizagem. Tinham consciência de perpetuar as antigas tradições
onde se misturavam rituais sociais e às vezes religiosos Nestes ofícios, conservava-se também a
memória das lutas das gerações anteriores: os antigos sem -cuecas61
faubourgs operários parisienses de
1789 ou 1792 assim transmitiram a lembrança da sua participação nos grandes dias revolucionários. Os
revoltados de 1830 fariam do mesmo modo, motins, greves ou revoluções.
O quadro da actividade da maioria dos trabalhadores urbanos modernizou-se muito lentamente. Em
Paris, até ao fim do Segundo Império, apesar do desenvolvimento da indústria capitalista, da evolução
técnica e da concentração, os pequenos ateliers persistiam. Nomeadamente os ofícios da metalurgia ou
os ligados à "belle ouvrage" da indústria do luxo, da qual Paris continuava a capital europeia
incontestada. Em Lyon, no mesmo período, o mundo dos “canuts” (operários da seda) conservava a sua
antiga hierarquia. No fundo as dezenas de milhares de companheiros assalariados, às vezes proprietários
de um ofício; no topo, um pequeno número de mercador - fabricantes; entre os dois, milhares de chefes
de ateliers, proprietários de vários ofícios, exploravam um pequeno número de assalariados.
A estatística é eloquente: 3.343.000 assalariados e 1.126.000 patrões em 1876! A figura dominante do
operário da primeira metade do século é a do artesão.
O proletariado de fábrica da Belle Époque
A partir do Segundo Império instalaram-se as premissas de uma desestabilização do trabalho industrial
nas aldeias. O tratado de comércio livre com a Inglaterra favoreceu, a partir de 1860, a introdução no
mercado nacional de produtos manufacturados a preços inferiores. A realização da rede das grandes
linhas de caminho de ferro e o facto penetrar no meio do território agravou a concorrência entre as
regiões. Enquanto durou a prosperidade, as consequências pouco se fizeram sentir. Com o atraso das
actividades aquando da Grande depressão, entre 1873 e 1896, o panorama alterou-se.
Os mercados do artesanato aldeão reduziram-se, os proprietários não contratavam mais e, à sua morte, as
barracas frequentemente encerravam. Em muitos sítios, foi o fim dos mercadores - fabricantes e das suas
redes de camponeses - trabalhadores. As formas arcaicas de organização da produção, que continuaram
a ser utilizadas até lá, conheceram um declínio rápido. Não é necessário contudo subestimar as
capacidades de adaptação deste pequeno capitalismo. Assim, a introdução do mecanismo coexistiu com
a manutenção de actividades no domicílio no âmbito de uma nova divisão do trabalho. Por exemplo, no
fabrico industrial do sapato, enquanto que as primeiras operações de corte e de montagem se efectuaram
nas fábricas, a picadura permanecia um labor de carácter familiar.
No fim da depressão esboçou-se uma nova configuração da classe operária. Os industriais equiparam-se
de máquinas cada vez mais sofisticadas, a produtividade criava-se. A mecanização afectou os sectores a
60 O decreto Allarde — deve o nome ao deputado que o propôs — proibiu o sistema corporativo que enquadrava
as profissões urbanas durante o Antigo Regime. Assim favoreceu-se a liberdade económica e a concorrência que
haviam sido travadas pelas regras corporativas (1790). 61 Os sem-cuecas eram revolucionários que pertenciam ao pequeno povo parisiense. Desempenharam um papel
decisivo em 1792-1794 e designaram-se assim devido às suas calças que os distinguia dos burgueses e dos
aristocratas que levavam calças de perna estreita.
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motor das primeiras vagas de industrialização. o têxtil de maneira essencial. Em 1883, a França contava
33.900 ofícios manuais, contra 76.300 ofícios mecânicos, enquanto que na década anterior os primeiros
eram mais numerosos. A generalização dos ofícios circulares revolucionou a indústria das malhas, e a
generalização da máquina de costura, a indústria da confecção.
O trabalho organizava-se doravante no âmbito das grandes unidades de produção62
. Na véspera da
Primeira Guerra, Schneider empregava 20.000 metalúrgicos em Creusot.
Por volta de 1900, o fabrico do alumínio ou da borracha, electricidade, de cinema, automóvel,
construção aeronáutica... estiveram na viragem da segunda revolução industrial. A França
desempenhava um papel pioneiro. A maior parte destas "indústrias vedetas" excedeu rapidamente o
quadro artesanal para atingir o da grande empresa. Em 1914, a fábrica Renault, fundada em 1898 num
hangar, reunia 3.500 trabalhadores em Billancourt. A Companhia geral de electricidade de Ivry, ao Sul
de Paris, empregava 3.000 trabalhadores.
Uma nova "aristocracia operária", que beneficiou da generalização da escola obrigatória, instaurava-se.
Estes trabalhadores muito qualificados dominavam técnicas complexas e utilizavam máquinas
sofisticadas. Um posto de chefe de equipa ou de atelier coroava a carreira de uma minoria entre eles.
Todas estas actividades conservavam um número variável de operários, secundando estes trabalhadores
qualificados em tarefas diversas: entrevista, limpeza, transporte das peças e os instrumentos, etc. Em
alguns ateliers, ainda pouco numerosos em 1914, uma figura nova aparece: a do "similar", futuro
"trabalhador especializado" ou "OS" das cadeias de montagem da grande indústria século X. Alguns
industriais de vanguarda, como Renault ou Berliet, levaram a efeito assim os métodos de Ford e Taylor
após o envio de missões de estudo aos Estados Unidos.
Nas camadas inferiores do proletariado, os estrangeiros ocupavam um lugar notável. Tratava-se de um
carácter original da França que não conheceu verdadeira emigração e que, a partir do fim século X, não
encontrava no seu seio toda a mão-de-obra cuja indústria tinha necessidade. Era o resultado baixa da
natalidade e enraizamento campesino que travava o êxodo rural. Em 1914, os imigrantes representavam
quase 700.000 assalariados. Os Italianos e os Belgas eram mais numerosos, nomeadamente nas bacias
industriais do Norte e o Leste. Em período de desemprego, eram às vezes vítimas de campanhas
xenófobas. Tais como, em 1893, os motins anti-italianos de Aigues-Mortes, perto de Nîmes, que se
saldaram por uma vintena de mortes e uma centena de feridos...
A partir dos anos 1880, dos dois lados da linha Cherbourg- Marselha, desenhava-se um novo mapa da
França operária. O seu contorno simplificou-se consideravelmente. O tecido rural ou semi-rural das
pequenas empresas do Midi, do Oeste e o Centro, em grande parte, desapareceu. Em contrapartida, era
doravante em redor de quatro pólos essenciais - região parisiense, do Norte, do Leste e Lyon - que se
concentrava o essencial das actividades. Catorze departamentos reuniam então a metade dos assalariados
industriais.
A distribuição dos trabalhadores por grandes sectores de actividade evoluiu pouco. Em 1906, como em
1850, o têxtil era a primeira indústria de mão-de-obra. Os seus efectivos eram dez vezes mais numerosos
que os da química e representavam mais de 40% da população industrial. Seguiam-se os trabalhadores
da metalurgia (15 %) e os da construção (13 %). Os mineiros, com 5,6 %, eram os que se seguiam. Era
62 Em 1906, perto de 60 % dos assalariados da indústria trabalhavam ainda em estabelecimentos de menos de cem
empregados.
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no entanto na "boca preta" que se encarnava doravante - até após a Segunda Guerra mundial - a
representação simbólica da classe operária.
A Condição Operária
Tendo em conta sua diversidade e as transformações que sofreu durante o século, tentemos penetrar no
universo diário da classe operária.
Entre o "banho" do atelier e o temor do desemprego
Na barraca ou no atelier, à lâmina ou à fábrica, o dia de trabalho era tão mais longo quanto o
proprietário, graças à melhoria da iluminação, podia fazê-lo durar desde antes do nascer do dia até
depois do tombar da noite. Em 1840, o doutor Villermé considerava ser de treze horas a sua duração
efectiva63
. Sob o Second Empire, era de doze horas - pelo menos – na province e de onze horas em
Paris, com fortes variações sazonais e sectoriais. A partir de 1900, impôs-se a duração legal de dez
horas, mas apenas em 1919 o Parlamento adoptaria a jornada de oito horas, reclamada pelos sindicatos.
O lugar de trabalho era frequentemente insalubre e perigoso. Desde as descrições dos filantropos da
monarquia de Julho aos romances de Zola ou à evocação do "bagne de l’usine64
" pelos anarquistas dos
anos 1880, o período está repleto de denúncias deste inferno moderno. Em 1844, Flora Tristan visitou
Saint-Étienne:
"Nos ateliers de tecelagem tudo é fechado." Há falta de ar e o pouco que se encontra é viciado. O pobre
operário asfixia, o seu peito seca, fica doente, mas que importa ao fabricante. Esse não vê senão a
seda."65
Vinte anos mais tarde, Jules Simon descreveu uma fábrica têxtil: "A água cobre o chão pavimentado de
tijolos; o odor do linho e uma temperatura que excede às vezes vinte e cinco graus espalha em todo o
atelier um fedor intolerável. A maior parte dos operários, obrigados a tirar a maior parte do seu
vestuário, trabalham nesta atmosfera empestada, encarcerados entre as máquinas, apertados uns contra
os outros, os corpos em transpiração, os pés nus, tendo a água até aos tornozelos [... j” 66
Cada indústria gerava as suas doenças profissionais: infecções pulmonares, anemias, reumatismo devido
à humidade e ao frio, saturnismo dos trabalhadores do chumbo, etc. Todos os indicadores sanitários
punham em destaque um importante atraso da França em relação à Alemanha de 1900.
63 O Tableau de l’état physique et moral des ouvriers, de Louis-René Villermé (reedição EDI, 1989), foi um dos
primeiros grandes inquéritos oficiais sobre a condição operária em França. 64 Banho de fábrica 65 Flora Tristan, Journal du tour de France; citado na antologia: Mémoires de femmes, mémoires du peuple, Paris,
Maspéro, 1978, p. 42. Depois de ter levado uma vida de aventura, Flora Tristan (1803-1843) descobriu a miséria
dos trabalhadores e os ideiais de Saint-Simon. Em 1843, publicou L’Union ouvrière e cativou o proletariado com
as suas ideias, durante um tour de França. Morreu em Bordeaux, mas deixou o relato da sua viagem. 66 J. Simon, L’Ouvrière (1863). Citado par J. Bron, Histoire du mouvement ouvrier français, Paris, Éditions
ouvrières, 1968, tome 1, p. 38. Jules Simon (1814-1896) foi um dos chefes da oposição republicana a Napoleão
III. Sob o Second Empire publicou várias obras consagradas à condição operária.
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Ritmo acelerado, inexperiência dos novos trabalhadores, máquinas perigosas bem como o abuso do
álcool para “combater a fadiga” eram os responsáveis pelos acidentes de trabalho. Em 1905, as
estatísticas revelavam 260.000 acidentes de trabalho, dos quais 1500 foram mortais.
Eram as minas que apresentavam a mais elevada taxa de mortalidade. Lentamente, a poeira do carvão
destríai os alvéolos pulmonares: tuberculose, asma e silicose encurtavam a vida dos mineiros. Lá no
fundo, o perigo era constante. Inundações, emanação de gás carbónico ou derrocadas de terra causavam
a maioria das vítimas. Em Carmaux, entre 1856 e 1913, não decorreram mais de 5 anos sem acidentes
mortais; a média era de 2,6 mortos por ano. Por vezes, uma explosão de gás combustível mergulhava no
luto centenas de famílias.67
Em 1906, a catástrofe de Courrières, em Pás-de-Calais, fez 1200 mortes.
A racionalização da produção nas fábricas do fim do século não melhorou as condições de trabalho. Se o
atelier era por vezes melhor concebido e arejado, mais espaçoso e iluminado, a sujeição à máquina, a
exigência crescente de produtividade e os regulamentos minuciosos causavam novas alienações.
Para o operário, o termo da sua vida de trabalho coincidia normalmente com o termo da sua própria
existência. Só em 1910 o Parlamento aceitou votar a lei da reforma para os operários e agricultores.
Na falta de protecção social generalizada, a maioria dos operários vivia permanentemente sob o terror de
perder o emprego. Acidente, doença ou gravidez eram sinónimo de desemprego e de um amanhã incerto.
Os sectores que ignoravam a inactividade temporária ou sazonal eram raros. Até ao meio do século,
muitas máquinas eram accionadas pela força motriz da água. Se o nível do rio baixasse ou a colheita
fosse ameaçada tal significava o fecho do estabelecimento. A estas contingências técnicas adicionavam-
se as vontades da clientela. Durante o Second Empire os alfaiates, modistas e costureiras de Paris eram
privados de serviço durante cerca de quatro meses por ano. Os trabalhadores da construção tinham sorte
idêntica – neste caso devido às intempéries – durante a época-morta do Inverno.
Havia ainda grandes vagas de desemprego, que periodicamente destabilizavam a existência de todo o
mundo operário. As crises tinham efeitos catastróficos. Durante longos meses toda a vida económica
ficava paralisada. Em 1844-45 60% dos trabalhadores dos têxteis de Lille, 75% dos quais de Rouen;
perderam os seus empregos. Nos anos 18882-1886, durante a Grande Depressão, pelo menos 10% da
população industrial activa e perto de 20% dos trabalhadores da siderurgia estavam no desemprego.
Quanto aos outros, frequentemente, não conservavam os seus empregos senão sob pena de inactividade
parcial e consequente redução do seu salário.
O trabalho das mulheres e das crianças
A vida de operário começava muito jovem, sobretudo nas primeiras décadas da era industrial. Em 1840,
143.000 crianças trabalhavam na indústria, a maioria nos têxteis. Mas também eram numerosos os que
trabalhavam nas empresas de pequena dimensão, tal como nos ateliers domésticos.
A denúncia deste escândalo pelos filantropos conduziu às primeiras intervenções legislativas para limitar
o todo-poderio patronal. Em todo o caso, as diferentes leis – a primeira data de 1841 – foram muito mal
67 . O grisou (gás) formava bolsas nos veios do carvão. Ao entrar em contacto com o ar e com a chama das
lâmpadas dos mineiros, tornava-se combustível e provocava explosões terríveis. Uma verdadeira bola de fogo
corria então ao longo das galerias queimando tudo à sua passagem.
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aplicadas por motivos económicos e sociais. Foi necessário denunciar os interesses dos empregadores,
para quem essa mão-de-obra acarretava numerosas vantagens nos vários sectores de actividade. Com 12
anos, as crianças trabalhavam nas minas do Nord. O seu tamanho diminuto permitia que se
introduzissem por passagens estreitas, onde um adulto não caberia, e empurrar os vagões.
Em Lyon,” nas fábricas de impressão em tecido, cada trabalhador necessitava de um ajudante para
preparar a cor. Assim, escolhiam uma criança que podia ter entre 5 e 15 anos, pois a idade não era
importante, mas sim a força, e caso esta não existisse, a necessidade ou os maus-tratos substituíam-
na.”68
Também eram utilizados nos têxteis “ uma criança de seis anos, conta Jules Simon, pode enrolar
bobines, com oito anos pode trabalhar numa fábrica.”69
Os seus parcos rendimentos representavam
contribuições indispensáveis ao orçamento das suas famílias. “ Imaginem, prossegue o mesmo
testemunho, dois, três, quatro crianças entre os seis e os doze anos. Como poderiam alimentá-los com o
salário de um só homem? É necessário que contribuam, que tenham os seus rendimentos, como o pai e a
mãe.”
Na segunda metade do século, foi simultaneamente a elevação do nível de vida dos pais e a legislação
ou o melhoramento do controle nas empresas, que permitiram o desaparecimento progressivo da mão-
de-obra infantil.
As mulheres são relegadas para as funções menos qualificadas. Em França, a sua importância numérica
no seio da classe operária era uma das mais fortes da Europa: em média, um terço dos activos na
indústria. A tendência geral era de subida: de 1870 a 1914, os efectivos femininos dobravam na
metalurgia e triplicavam na química e indústrias alimentares. Mas o têxtil continuava a ser o principal
sector de emprego de mão-de-obra feminina. Eram cerca de 40% dos operários nacionais.
Com as suas 340 mulheres, para 100 homens e 40 crianças, as fábricas de Dolfuss-Mieg de Mulhouse
ilustravam bem a situação de todo o sector durante o Second Empire.70
O operário e a família
Nos textos católicos, defensores acérrimos dos bons modos, tal como nos dos filantropos, paternalmente
debruçados sobre o destino da classe operária, a descrição pessimista do dia-a-dia operário é um
verdadeiro lugar comum: concubinagem e prole numerosa, vida dissoluta e prostituição, crianças
ilegítimas e abandonadas à orfandade. Havia de tudo, sobretudo nas tranches mais pobres dos meios
populares, mas é caricatural reter este como sendo o quadro da vida familiar da classe operária na era
industrial.
Em Paris, sob a monarquia de Julho, a concubinagem estava na moda. Imoralidade? Certamente, sob a
perspectiva dos valores católicos que consideram o casamento um sacramento e proscrevem as relações
sexuais ocorridas fora dele. Mas é necessário rever este julgamento se considerarmos outros dados.
68 Madame Michel, Annales de la charité, 1845, citée par Jean Bron, op. cit. p. 41, 69 Citado por Claude Fohlen, dans : Histoire générale du travail, dirigée par L.H. Parias, Paris, 1960, tome III, p.
42. 70 No mesmo atelier, regra geral, o salário da esposa é metade do do marido, e o dobro do dos filhos.
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Muitos dos concubinatos eram estáveis e reproduziam, à sua maneira, o modelo dominante. Se não havia
oficialização da união era devido ao custo e à complexidade das formalidades a cumprir.
Alguns destes casais eram mais frágeis71
, e certas uniões ocasionais eram alvo de outros intentos: jovens
empregadas sustentadas por burgueses para evitar perdas de comodidade, por exemplo. Quanto à
prostituição, parece ter sido uma praga dos quarteirões pobres das cidades desde o início da revolução
industrial. Vilermé, deixou-nos uma comovente evocação desta praga, frequentemente citada: “Muitas
raparigas e jovens mulheres das manufacturas abandonavam quotidianamente o atelier por volta das 18
horas em vez de sair às vinte horas e percorriam as ruas na esperança de encontrar um estrangeiro que
provocavam com certo embaraço. Este expediente era tão conhecido quanto o gracejo, que nos permite
minorar o sentido das acções mais repreensíveis, e que se criou nos ateliers quando uma jovem saía do
trabalho antes da hora habitual, dizendo que ela iria então fazer o quinto 1/4 da jornada. “72
A proporção dos nascimentos ilegítimos era alta no sec. XIX, sobretudo nas grandes cidades e regiões
industriais. Era tão elevada, quanto o nível de qualificação dos trabalhadores era diminuto Em
Mulhouse, 50% dos filhos dos tecelãos nasciam fora do casamento, mas apenas 2,5% eram de
contramestres.
Miséria e desemprego, separação das concubinas aquando de uma gravidez não desejada, morte precoce
dos pais ou prostituição explicam a grande proporção de crianças abandonadas nas famílias pobres. Em
1835, na França de “Les Misérables” imortalizada por Vítor Hugo, registava-se o abandono de 121 000
Gavroche et Cosette73
(meninos de Paris). Quando estes sobreviviam – a mortalidade nos orfanatos era
muito elevada, estes “bastardos” e crianças encontradas eram presa fácil para todos os Thénardier sem
vergonha e industriais em busca de mão-de-obra infantil.
A desagregação da família, bem real na primeira fase de industrialização, não deve no entanto ser
subestimada. Existiam outros comportamentos conjugais. Com o tempo, tornam-se factor distintivo da
classe operária do resto da sociedade. Constata-se uma certa estabilidade da instituição familiar nos lares
de pessoas com profissão, trabalhadores bem enraizados numa profissão e nos seus bairros. Nas fábricas
de copos de Lyon do Second Empire, uma vez em cada duas, marido e esposa trabalham no mesmo
atelier. Na véspera da primeira guerra mundial – a propaganda sindical confirma-o – os valores da
família burguesa impunham-se. Isto acarretava consequências para a fecundidade dos lares.
Enquanto a França se tornava malthusiana no meio do sec. XIX, os operários conservavam o seu
comportamento face à natalidade. Sob o Second Empire, a taxa de natalidade nas cidades industriais
como Creusot, Lille ou Mulhouse era quase sempre superior a 40% enquanto no resto do país não
ultrapassava os 26%.
“Tende poucos filhos e sereis felizes”: era aos operários que a Liga da regeneração humana, criada em
1896, lançava campanhas sobre este tema. Uma Federação dos grupos operários neo-malthusianos foi
fundada em 1910 e as suas acções tiveram eco. As categorias profissionais qualificadas –
71 A lei Naquet reestabelecendo o divórcio foi votada em 1884. 72
Louis-René Villermé, op. cit., p. 230. 73 Termos utilizados na obra referida
O grande fresco romanesco dos Misérables consagrou Victor Hugo (1802-1885) como a consciência republicana
e popular do seu século. Uma multidão estimada de um milhão de pessoas — entre as quais se contavam
numerosos operários — participou nas suas exéquias. Cosette — jovem orfã, colocada sob o abrigo dos
Thénardier, que a maltratam e e a exploram, e depois recolhida pelo ancião Jean Valjean —, Gavroche — « titi
parisien, filho do ribeiro, gozão e rebelde, que morreu cantando junto à barricada — snão, com tantas outras
personages des Misérables, verdadeiros arquétipos dos meios populares da época..
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frequentemente mais instruídas – aderiam primeiro ao modelo de família restrita, símbolo de uma
existência mais livre. Graças à elevação do nível de vida, à escolaridade e à proibição do trabalho
infantil, o lugar destes cresceu no seio da família. Começou-se mesmo a desejar para eles um futuro
melhor. Assim, encontravam-se famílias numerosas apenas entre os mais desfavorecidos, que eram
também os menos interessados na contracepção.
“No princípio, todos os anos havia um bebé, conta Amédée; era esse o truque das famílias de
antigamente. O homem entrava bêbado, o vinho movia-o. Deitava-se. Punha-se em cima da sua mulher,
e no dia seguinte, ela tinha um bebé sobre a cómoda. Era assim, a vida. Não havia higiene.”74
Este comportamento, foi caindo em desuso.
Orçamento, consumo e alojamento
A totalidade do orçamento da maior parte das famílias era consagrado ao consumo. O posto primordial
era a alimentação que representava ¾ das despesas em 1840, e ainda quase 2/3 antes de 1914. A
expressão “ganhar o seu pão” era entendida no seu sentido literal. Metade do salário, era gasto nessas
compras, sob a monarquia de Julho. Ao longo do século, outros alimentos foram adquirindo
importância. Em 1900, o menu das famílias era mais rico e variado. Por vezes, a compra da carne
passava para o primeiro lugar, o consumo do vindo progrediu tal como o da manteiga, do queijo, do
açúcar, das frutas e dos legumes – e não somente o da batata!
O resto do orçamento repartia-se entre o alojamento e o vestuário cuja parte tendia a aumentar consoante
a progressão do nível de vida. Até à Commune, a roupa de Domingo e dos dias de festa era a mesma do
trabalho, a blusa, cuidadosamente lavada e passada a ferro. O proletário da Belle Époque vestia-se como
um burguês. Era uma maneira de participar nos prazeres da cidade e de se fundir no anonimato da
comunidade citadina.
O esbanjamento era política de uma minoria. Sob o Second Empire, um quarto dos operários parisienses
conseguiam “pôr um pouco de dinheiro de lado” para fazer face aos imprevistos do desemprego, da
doença, da deficiência, da velhice… O outro quarto conseguia equilibrar as receitas e as despesas, mas
metade estava endividada. É frequentemente na oficina do Mont-de-piété – “o prego” – ou na do
usurário que terminavam os bens de valor de família. Oito em cada dez operários morriam sem sucessão
no início do século e só uma elite operária – alguns metalúrgicos e ferroviários – chegavam, ao fim de
uma via de sacrifício, a deixar um pequeno património.
O pavor da indigência e da morte num hospício eram, nestas condições, a obsessão da maior parte dos
trabalhadores.
Nas cidades de importância média e nas aldeias, o habitat do operário pouco diferia do das outras classes
populares, mas nas aglomerações em plena expansão, sobre as quais se concentrava o êxodo rural, a
questão do alojamento tornava-se complicada. Este é outro factor revelador da precariedade da condição
de vida dos trabalhadores.
74 J. Caroux-Destray, Un couple ouvrier traditionnel, Anthropos, 1974, p. 42, citado na Histoire économique et
sociale de la France (sob a direcção de F. Braudel et E. Labrousse), IV, 1880-19 14, p. 512.
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Entre 1851 e 1876 a população de Roubaix (lanifícios) passou de 34 700 a 83 700 habitantes, a de Saint-
Étienne (minas) de 56 000 a 126 000. Este afluxo provocou uma penúria geral. Todas as soluções eram
boas, tanto que os alojamentos caros, vetustos e deixados sem uso, se revestiam de importância superior
à dos apartamentos dos quarteirões burgueses. Que sorte para os proprietários e especuladores sem
escrúpulos, os sinistros Monsieur Vautour caricaturados por Daumier75
! Os dormitórios estavam
sobrelotados. Construções miseráveis, sobre pranchas elevavam-se nos terrenos vagos da zona. Os
canuts empilhavam-se nas caves dos espaços entre casas da Croix-Rousse em Lyon76
. Eram bem
parecidas com aquelas do Norte, visitadas por Victor- Hugo:
« Un jour. je descendis dans les caves de Lille;
Je vis ce morne enfer,
Des fantômes sont là, sous terre, dans les chambres,
Blêmes, courbés, ployés ; le rachis tord leurs membres
Dans son poignet de fer »77
A insalubridade e a exiguidade estavam na origem de uma forte mortalidade infantil bem como de
epidemias frequentes. Em Lille, nos bairros operários, em 1850, um quinto das crianças morriam antes
de atingir um ano de idade, ¼ antes dos 3 anos e metade não atingia os vinte e quatro anos. Em Paris, a
cólera de 1832 fez mais de 18 000 vítimas e o inquérito oficial concluiu: “Lá, onde uma população
miserável se achava infundida em alojamentos sujos e exíguos, a epidemia multiplicou as suas
vítimas.”78
A febre tifóide matou 869 pessoas em 1873 e 3 352 em 1852. Um tributo de cerca de dois milhares de
vítimas foi pago de novo à cólera em 1844. Outras pragas eram endémicas: a tuberculose, a gripe ou a
coqueluche, estreitamente ligadas à falta de Sol e de aquecimento, bem como à humidade dos
alojamentos.
Como fazer face a estes problemas? Desde o Premier Empire79
, projectos utópicos, como as
“phalanstères80
” de Charles Fourier, propunham soluções de carácter comunista. Estas ideias tiveram um
certo eco, mas não se concretizaram. Na segunda metade do século, o patronato teve que repensar os
alojamentos colectivos devido a motivações diferentes. Pretendia fixá-los perto do local de produção a
mão-de-obra instável e ainda muito ligada à antiga condição de agricultor. Os alojamentos que foram
então construídos dispunham de algum conforto e de um jardim, como as habitações mineiras no norte
de França e sul da Bélgica. As cidades foram dotadas de comércio e equipamentos sociais dependentes
da fábrica: creches, escolas, e cursos profissionais, entre outros, tal como acontecia na cidade siderúrgica
75 Honoré Daumier (1808-1879) foi pintor, litógrafo, desenhador e escultor. Foi o seu imenso talento como
caricaturista, criticando os modos da burguesia triunfante sob a monarquia de Julho, que lhe conferiu a
notoriedade. 76
Em Lyon, « traboules » são « des ruelles étroites qui traversent un pâté de maisons.». 77 . Victor Hugo, «Joyeuse vie », Les Châtiments, 1853
Tradução : « Um dia desci às caves do Lille/Vi aquele morno inferno/ Os fantasmas estavam lá, sobre a terra, nos
quartos/ Pálidos, curvados, dobrados ; a coluna torcia os membros/ no seu punho de ferro » 78 P. Ariès et G. Duby, Histoire de la vie privée, t. IV, p. 358. 79 Primeiro Império 80 Palavra formada a partir de phalange”e (mona)stère. No sistema de Fourier, significa Comunidade, associação
de trabalhadores; sítio onde vivia e trabalhava essa comunidade (chamada também de falange). Grupo que vive
em comunidade; local onde esse grupo vive.
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de Creusot, dominada pela dinastia Schneider. Assim, de geração em geração, as famílias ficavam
ligadas à empresa, desde o nascimento até à morte. Desta forma, o patronato controlava também as
ideologias e tendências políticas dos seus funcionários.
Em muitos dos locais, a questão do alojamento subordinava-se a imperativos urbanísticos, desprovidos
de qualquer preocupação social. Os “grands travaux” de Haussman exemplificam-no. Em vez de um
emaranhado de ruas estreitas e tortuosas ele revestiu Paris de vastas avenidas ladeadas por construções
luxuosas. Colocados à mercê de especuladores, quarteirões inteiros foram esvaziados das suas classes
populares.81
Na Belle Époque, o começo da segunda revolução industrial acentuou a segregação racial do habitat. As
fábricas recuam para a periferia. Cidades e pavilhões de assalariados instalam-se nas suas proximidades.
Em Saint- Denis ou Aubervilliers – no norte de Paris – em Venissieux ou Villeurbanne – perto de Lyon
– os bairros urbanos estavam prestes a nascer.
Apesar da melhora do alojamento popular e dos esforços legislativos, em 1914, o problema estava ainda
longe de se resolver. Uma ou duas divisões mal iluminadas e mal aquecidas, parco mobiliário (contava
já com uma cama), sem sanitários nem água corrente, apenas com uma fonte na rua onde ir buscá-
la…por um aluguer que representava 10 a 20% do orçamento. Esta poderia ser a descrição sumária do
alojamento de um operário. Era o local onde se tomavam as refeições e onde se dormia. A intimidade
vivia-se noutros sítios.
Socialização, cultura e tempos livres
A precariedade da condição de operário e a necessidade de solidariedade acomodavam-se dificilmente
ao isolamento e ao individualismo.
Enquanto a industrialização não tinha tocado o modo de vida tradicional, as antigas formas de
socialização citadina ou corporativas perpetuavam-se. O operário, sobretudo se pertencente a uma
família nacional, não era excluído. Integrava-se nos complexos de relações de vizinhança e de
entreajuda e era parte integrante dos momentos de alegria e luto de toda a colectividade.
Era neste contexto que o apego dos trabalhadores ao catolicismo era mais notório. Manifestava-se nos
grandes festejos da vida (baptismo, casamento, funeral) ou nas datas marcantes do calendário religioso:
missa pascal, procissões e festas. A participação na missa dominical era inegável, consoante os locais.
Era menos frequente nos homens que nas mulheres. Mas um processo de descristianização popular teve
início após o Antigo Regime e a Revolução. Acentuou-se no século XIX, poupando algumas regiões
rurais e tornando-se um fenómeno massivo nos grandes centros industriais. O desenraizamento em
relação à cidade provocou o desapego à igreja. A fragilidade de enquadramento clerical nos novos
quarteirões, a conivência ostensiva da hierarquia com as classes dirigentes e o seu sustento nas correntes
políticas mais reaccionárias eram alguns dos factores decisivos que levaram os operários à indiferença e
mesmo à hostilidade face a religião. Em Denaia, em 1865, só 25% eram praticantes. Em Lille, não eram
mais de 10%. Mesmo nos momentos mais obscuros da revolução industrial, nem que fosse por poucas
horas semanais, à saída da fábrica, o operário procurava esquecer a sua condição e a dureza da sua
existência. A literatura naturalista, com Zola no papel principal, ilustrou abundantemente o tema do
81 Émile Zola (1872) escreveu um romance consagrado a este problema que intitulou de Curé.
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“cabaret”, lugar de perdição masculina. Em 1860, em Lille, estimava-se a existência de um
estabelecimento por cada 110 habitantes. Quarenta anos mais tarde, dois médicos censuravam: “Muitos
trabalhadores parisienses bebem quotidianamente mais de três litros de vinho!”82
As bebidas alcoólicas representavam mais de 10% do salário! Nos anos seguintes o alcoolismo urbano
começou a regredir.
O alheamento no álcool não pode por si só explicar o lugar que o cabaret ocupava no dia-a-dia do
operário. Era nestes momentos, em que escapava ao atelier para se abancar no café com os seus
companheiros, que o assalariado achava a sua identidade social e a sua consciência de classe. Entre a
fábrica e o casebre, a cidade operária não oferecia muitos outros lugares de convivência. Onde organizar
– senão lá – um banquete, uma festa, um casamento? Ao Domingo, marcava-se lá presença após o
passeio. Reencontravam-se lá para conviver e dançar, ainda que a sala dos fundos não tivesse o charme
dos “guinguettes des bords de Marne”83
dos impressionistas. Os clubes de passatempos – compreende
também os desportivos – instalavam-se. O norte era certamente a região onde esta forma de convivência
contribuiu mais largamente para a formação de uma cultura operária original. Em 1862, existiam em
Lille 173 sociedades de recreio – de canto, de arqueiros e besteiros, jogadores de cartas, de
“colounneux”84
, etc.
Antes da fundação dos sindicatos, os cafés eram também lugares de entreajuda e de resistência.
Trocavam-se informações sobre salários, situação das empresas e ofertas de emprego na localidade. O
jornal passava de mão em mão enquanto se comentavam as notícias do dia. Estas alimentavam os
debates sobre questões políticas e sociais e davam aos militantes a ocasião de propagar as suas ideias.
Entre palavras discretas, longe de ouvidos espiões, preparavam-se as greves e constituíam-se os
primeiros sindicatos.
A revolta dos canuts85
no muro dos federados
O movimento operário francês foi produto da revolução industrial e exprimiu a vontade de milhares de
trabalhadores de saírem da dura condição em que viviam. Produtos da revolução, ou melhor, um dos
seus componentes mais radicais, foram também os Montagnards86
, e sobretudo os sem-cuecas,
republicanos, portadores de reivindicações sociais igualitárias e convencidos da legitimidade da
insurreição para combater a tirania. Da Restauração aos primeiros tempos da Troixième Republique87
este dado é essencial para compreender os mais importantes e por vezes trágicos episódios da história
operária.
82 Discurso dos doutores Landouzy et Labbé, citado por Michèle Perrot dans Histoire économique et sociale de la
France, op. cit. p. 498 83 Cafés 84 Columbófilos - No norte, os pombos correio eram chamados de « coulons ». Criados por particulares,
participavam em concurso muito populares. 85 Canut era o nome atribuído aos operários das fábricas da seda de Lyon. 86 Creio que significa os dirigentes de esquerda conduzidos por Robespierre e Danton. 87 Terceira república
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A Geração dos Três Gloriosos
No início do século XIX, os trabalhadores não tinham qualquer possibilidade legal de exprimir
colectivamente as suas reivindicações. Aplicando rigorosamente os princípios liberais, a Revolução
proibiu as corporações e as coligações operárias (lei le Chapelier, 1791): as relações entre patrão e
assalariada eram então o resultado de um livre contrato entre indivíduos.
Em todo o caso, os operários conseguiram manter algumas das suas organizações.
Antiga tradição do mundo das profissões do Antigo Regime, o compagnonnage88
manteve-se aceso. Os
“compagnons”, agrupados em sociedades mais ou menos secretas, os “devoirs”, teceram por todo o país
sólidos laços de solidariedade. No coração do seu “tour de france89
” entreajudavam-se para conseguir
alojamento e emprego. A sua coesão e qualificação davam os meios necessários para defender os seus
salários e as suas condições de trabalho, através da greve dos trabalhadores ou da “mise en interdit”90
.
Todavia, as sociedades correspondiam a uma minoria de assalariados e a sua divisão em facções rivais
limitava o alcance das suas acções.
Graças às sociedades de socorros mútuos, alguns operários apoiavam-se poupando uma parte dos seus
recursos. Uma módica quota mensal alimentava uma caixa que, em caso de acidente, doença,
desemprego ou morte, beneficiaria o aderente ou a sua família. As autoridades toleravam-nos, por os
acharem inofensivos e úteis à boa ordem social. Mas, estreitamente vigiados pela polícia, eram
prontamente desmantelados se se desviassem do objectivo inicial.
Não existiam verdadeiras organizações político-operárias sob a Restauração.
O consumismo de Babeuf91
(1760-1797) apensas sobreviveu em pequenos e isolados círculos. Quanto
aos pensadores que colocam a verdadeira questão operária, são estrangeiros ao mundo do trabalho. Os
”socialistas utópicos” tinham uma consciência afiada das transformações que o capitalismo industrial
está em fase de conseguir e criticavam os traumatismos a que este submete as classes laborais, pelo que
sonhavam instaurar contra-sociedades ideais e igualitárias. Dois grandes nomes emergiram: Saint-Simon
(1760/1825) e Fourier (1772-1837). Surgido de uma prestigiada linhagem aristocrática, o primeiro
pensava que a revolução industrial devia conduzir a uma reorganização da sociedade em torno das
“classes produtivas”: os agricultores, os artesãos, os operários, os banqueiros, os sábios… Visando
substituir a “administração das coisas” pelo “governo dos homens” preconizava a planificação da
economia por um Estado saído apenas de produtores. Charles Fourier era um espírito visionário e
inspirado. O seu projecto de transformação social tinha lugar numa cosmogonia poética e matemática
que repousa sobre a “harmonia universal” e a “atracção apaixonada”. A humanidade devia repartir-se
em comunidades sociais harmoniosas – les “phalanstères” – organizadas sob um urbanismo planificado
e funcionando como cooperativas de produção e consumo.
88 Organização operária caracterizada por sociedades de ajuda mútua e de formação profissional. 89 Os compagnons de algumas profissões artesanais principalmente de construção fizeram uma volta a França de
vários anos para adquirir a compilação perfeita das técnicas da sua profissão. Esta jornada concluiu-se com a
construção de uma obra-prima. 90 Quando um patrão era « mis en interdit », os compagnons deixavam o atelier e ninguém mais aceitava
trabalhar para ele. Esta forma de luta pressupunha fortes laços de solidariedade e era acompanhada de violência
contra os operários que não cumpriam as instruções do « devoir ». 91 Gracchus Babeuf (1760-1797) assumiu o comando dos Jacobins sob o Directoire e deu a esse movimento um
carácter social igualitário A conspiração que ele organizou fracassou e conduziu-o sob o échafaud. As suas idéias
podem ser consultadas em Manifeste des égaux.
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Os utópicos pouco se preocupavam com os meios concretos de realização das suas teorias. Em torno das
suas ideias, constituíram-se os sectores de partdários cujo eco, entre os operários, acabou antes de 1830.
Isto não significa que estes fossem indiferentes face ao poder reaccionário. Apesar da ausência de
libertações reais sob o Império e a Restauração, a memória das fervorosas jornadas dos sem-cuecas da
Revolução não se perdeu nos bairros populares, sobretudo em Paris. As revoltas de Julho de 1830 são o
seu testemunho.
Nas ruas barricadas da capital, os operários estiveram nas primeiras linhas do levantamento dos Três
Gloriosos. Mas, para eles, a vitória foi uma dupla desilusão.
A sua frustração política foi grande após o confisco do movimento por Louis-Philippe d’Orléans. Os
republicanos burgueses partilharam este azedume ao tomar conhecimento da força da massa operária.
Nos quatro primeiros anos – muito agitados – da Monarquia de Julho, publicistas e teóricos debruçaram-
se sobre os problemas dos operários e procuraram juntar-se à causa. Na imprensa ou nos clubes, uma
primeira e frágil síntese se operou entre a República socialista e as aspirações operárias. Phjlippe Buchez
(1796-1865) Pierre Leroux (1797-1871) et Étienne Cabet (1788 -1856) encarnaram esta corrente
fortemente impregnada de valores cristãos.
Sob o plano social, as classes laborais esperavam ainda muito do novo regime. Mas as medidas
reclamadas tardavam. Com os Três Gloriosos começou um período de greves e de manifestações.
Numerosos conflitos se desencadearam, ligados à introdução do maquinismo: a resposta foi então a
destruição dos “mécaniques” ou “luddisme92
”. A defesa do nível de vida era outro motivo de luta.
Assim, os operários de Lyon, querendo aproveitar a retoma económica, pediram um aumento das tarifas
aos fabricantes. Em Novembro de 1831, após alguns meses de negociações vãs, 40.000 mineiros
revoltaram-se sob o grito “Viver livre a trabalhar ou morrer combatendo”, tomaram conta da cidade mas
tiveram que capitular quase de seguida face à chegada das tropas reais.
Este episódio não pôs termo à agitação social e política que continuou durante 2 anos pautados por
movimentos localizados e crises brutais – como as revoltas parisienses de Junho de 1832 das quais
resultaram oitocentas mortes.
A última grande vaga de revolta aconteceu em Abril de 1834. Começou em Lyon, por razões políticas e
sociais. As sociedades de socorros mútuos transformaram-se em verdadeiras sociedades de resistência
que organizavam e mantinham as acções reivindicativas. Um projecto de lei sobre associações procurou
neutralizá-las. Os trabalhadores responderam com uma greve geral. A repressão foi terrível: seiscentas
mortes. Nos dias seguintes a insurreição propagou-se a Paris, último trágico teatro desta vaga
reaccionária.
Apesar do fracasso, os levantamentos e sobretudo a revolta dos canuts foram imediatamente sentidos
como acontecimentos de porte considerável. Para o conservador Journal dés débats:” A insurreição de
Lyon revelou um grande segredo, aquele da luta intestina que tem lugar na sociedade entre a classe que
possui e a que não possui (…) Os bárbaros que ameaçavam a sociedade não estavam no Cáucaso nem
nas estepes da Tartária, mas nos arredores das nossas cidades.” 93
92 A palavra luddisme é de origem inglesa e relembra o nome do empreendedor da revolta operária contra as
máquinas acusadas de promover o desemprego. Estas formas de luta remontam ao Antigo Regime e eram
frequentes em França no início do século XIX. 93 Saint-Marc Girardin, Journal des débats, 8 décembre 1831.
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O movimento operário, honra constantemente a memória dos canuts de Lyon, primeiros mártires
sacrificados em prol da emancipação dos trabalhadores da era industrial.94
A Geração de Quarenta e Oito
Em Fevereiro de 1848, como em 1830, as classes populares parisienses formavam o grosso dos
batalhões de insurrectos que desafiavam Louis-Philippe. Desta feita, a República foi restaurada, e os
operários conseguiram impor no seio do governo provisório dois dos seus representantes: o socialista
teórico Louis Blanc e o modelador-mecânico Albert. Aproveitando o restabelecimento da liberdade de
associação e de imprensa, organizações e jornais socialistas multiplicaram-se. Sobre o fundo de crise
económica e de desemprego, estes colocaram, em Junho, a questão social no coração do debate político.
O “marchandage” – ou seja o recrutamento de mão-de-obra por via de intermediários – foi proibido. A
jornada legal de trabalho foi limitada a dez horas em Paris e onze na província.
Mas foi em torno do princípio proclamado de “direito ao trabalho” que se cristalizaram as mais vivas
afrontas entre burgueses republicanos, que controlavam as novas instituições e o movimento operário.
Em substituição do ministério do trabalho, criou-se a Comissão de Luxemburgo, simples lugar de estudo
sobre a questão social. Os ateliers nacionais, onde estavam regimentados os desempregados, não eram
senão uma caricatura dos “ateliers sociais” reclamados por Louis Blanc.
Apoiantes de Augusto Blanqui95
, alguns socialistas exigiram que as eleições fossem atrasadas, para dar
tempo à ideia de “República Social” para ganhar a provínicia.96
Estes em Abril, levaram à Assembleia
constituinte uma maioria republicana mais conservadora. Em Maio, na seguida de manifestações hostis à
Assembleia, os dirigentes socialistas foram presos. O movimento popular foi assim gravemente
enfraquecido num momento em que se exacerbavam as tensões.
A afronta teve lugar entre 23 e 26 de Junho, devido ao encerramento dos ateliers nacionais. A paisagem
de Paris é povoada por revoltas sangrentas. Revoltas de miséria, sem verdadeiras perspectivas, mas
impiedosamente reprimidas por Cavaignac: de 4.000 a 15.000 mortes entre os revoltosos (contra 1.000
na guarda nacional); 11.000 detenções e 3000 deportados para a Algéria…
As jornadas de Junho consagraram o divórcio entre o movimento operário e socialista e a Segunda
Republica. Os republicanos não puderam contar com a oposição por parte dos populares ao partido da
ordem e a Luís Napoleão Bonaparte, a partir de então mestres do jogo.
94La Complainte des canuts é com Le temps des cerises du Communard J.B. Clément — uma das canções mais
célebres da tradição revolucionária francesa. Termina com estes versos de cariz profético : «Mais notre règne
arrivera / Quand votre règne finira / Alors nous tisserons / Le linceul du vieux monde / Car on entend déjà la
révolte qui gronde ». 95 Apelidado de «l’Enfermé», Auguste Blanqui (1805-188 1) passou 36 anos da sua vida na prisão. Socialista, a
sua doutrina — chamada de «blanquisme» — caracterizava-se por uma concepção da luta pelo poder baseada na
conspiração e na acção de minorias de vanguarda. 96 Com o restabelecimento do sufrágio universal, a Segunda República permitiu aos operários – e
também às massas rurais mais numerosas e mais conservadoras – aceder às urnas. A desconfiança do sistema eleitoral « burguês » foi uma característica do movimento operários de extrema-esquerda que se encontra
sob formas diversas entre os « blanquistes », em Louise Michel e os anarquistas e nas correntes revolucionárias do
marxismo (o léninismo).
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A geração de la Commune
Sob o Império (Empire) autoritário, o movimento operário era estreitamente controlado pelo poder. A
permissão de trabalho tornou-se obrigatória, as sociedades de socorros mútuos ficaram sob tutela. As
greves eram raras e apenas algumas organizações secretas tentaram subsistir.
No início da década de 1860, o regime liberalizou-se e tentou ganhar o apoio das classes laborais. Se
esta mudança de atitude, não desprovida de outras intenções, não proporcionou a Napoleão III os
benefícios políticos esperados, deu ao movimento operário um impulso decisivo.
Em 1862, uma delegação oficial de 70 trabalhadores foi enviada à Exposição Universal de Londres. No
seu regresso, e à semelhança do que haviam constatado em Inglaterra, reclamaram a criação de
associações sindicais e o direito à greve.
Rapidamente, o movimento operário se organizou de forma autónoma. 1864 foi o ano da reviravolta. Em
Fevereiro, o Manifesto dos Sessenta reivindicava para os operários o direito de sufrágio97
. Em Maio,
num clima de agitação salarial, o direito de greve – com algumas limitações – foi reconhecido. Em
Setembro, os franceses tomam parte activa na criação em Londres, da Associação Internacional dos
Trabalhadores (AIT). Foi Karl Marz, quem elaborou os seus estatutos inaugurais, mas os dirigentes
franceses, como Tolain e Fribourg, foram sobretudo influenciados pelas teses de Proudhon98
:
apartidarismo, hostilidade às greves, ideal cooperativo. Entre 1868 e 1870, a secção francesa
Internacional, perseguida pela justiça, estava no seu apogeu. Ramificou-se a partir de 4 grandes centros:
Paris, Rouen, Lyon e Marseille – e manifestava-se aquando das greves que organizava. Aguerridos pelas
experiências de luta quotidiana, os seus militantes distanciaram-se do proudhonismo e surgiu uma nova
geração de dirigentes: Malon, Varlin.
Contribuindo para o seu reforço e difusão da consciência de classe e da combatividade social,
implantando o sindicalismo e as ideias sindicalistas, a AIT99
deu, em poucos anos, uma grande
maturidade política à massa laboral.
A Commune de Paris (18 de Março – 28 de Maio de 1871) primeira revolução operária do mundo,
cristalizou os seus avanços. Justificamos essa afirmação, sem entrar no detalhe dos acontecimentos
desses dois meses de combates trágicos.
A Commune tomou lugar na herança revolucionária que ligava intimamente, após 1792, a República e a
defesa da “Pátria em perigo”. Os parisienses sofreram um longo cerco. A sua revolta exprime a recusa
da capitulação ambicionada pela “Assemblée Versaillase100
” dominada pelos monárquicos.
98 . Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865) foi um dos teóricos que teve maior influência sob o movimento operário
francês.O seu primeiro livro Qu’est-ce que la propriété? (1840) (O que é a propriedade ?) onde pode encontrar-se
a célebre formula « A propriedade é um roubo » valeu-lhe de imediato uma grande notoriedade. Hostil ao Estado
e à centralização do poder ele preconiza uma sociedade formada de « companhias operárias » como se fossem
produtores associados. Vivamente combatido por Marx, foi considerado um dos primeiros pensadores da
anarquia. 99 Associação Internacional dos Trabalhadores 100 Assembleia de Versailles
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Mas os “communards”101
aprenderam com as revoltas do sec. XX. Eles pretendiam continuar donos da
sua revolução e queriam dotá-la de um conteúdo social. Quatro quintos dos revoltosos eram
trabalhadores da indústria. A Commune assentava sob uma rede de assembleias onde o povo de Paris
renovava as formas da democracia directa. Através das suas organizações – câmaras sindicais, clubes,
secções da internacional – manifestavam as suas exigências e reivindicações junto do Conselho.
Governo de facto desse Estado insurrecional, este contava 25 operários entre os seus 65 membros. As
forças políticas que a compunham pertenciam às diversas correntes de esquerda. Os republicanos como
Delescluzes e os socialistas blanquistes buscam as suas referências no modelo jacobino de quarenta e
oito102
. Como vingança, a minoria internacional – tais como Varlin, Malon, Frankel – tinha uma visão
mais inovadora e de mais larga intervenção política: a Commune devia-lhes o essencial das suas
reformas sociais.
Tomados pelo tempo e pela urgência da guerra civil, os communards lançaram ideias precursoras mas
não tiveram os meios suficientes para as pôr em prática. Esquecer estes constrangimentos conduziria à
não medição da dimensão exacta dos decretos favoráveis aos assalariados e às classes populares:
proibição do trabalho nocturno nas padarias, multas e impostos sobre os salários, requisição dos
alojamentos vagos, etc. O decreto de 16 de Abril, que previa a reposição em actividade, por parte dos
operários associados, dos ateliers abandonados pelos patrões, constituía uma medida de carácter
autenticamente socialista.
A ferocidade da repressão103
, implacável vingança de classe, era à medida da esperança que a Commune
originara, para além das fronteiras nacionais. Aquando da “semana sangrenta”104
, enquanto os últimos
combatentes tombavam, junto ao “Mur dês fédérés”105
a Commune era já uma lenda.
Até Outubro de 1917, nenhum outro espisódio histórico havia exercido tal fascínio sobre os
revolucionários de todos os continentes: pela primeira vez, durante dois meses, os “malditos da Terra”106
– para retomar a célebre fórmula de “L’Internacionale” escrito no dia seguinte ao do esmagamento da
Commune – foram os senhores do seu destino107
.
O Impulso do Movimento Operário sob a Troisième République108
Thiers exultava, em Maio de 1871: “O solo de Paris está repleto de cadáveres; este espectáculo terrível
servirá de lição.”
101 Partidários da Commune. 102 Quarante-huitard 103 Durante a Commune, o governo de Adolphe Thiers e a Assembleia eleita em Fevereiro recuaram para
Versailles. Daí o nome de «Versaillais» que os Communards atribuíram aos seus adversários. 104 “Semaine sanglante” 105 Os «fédérés» eram os soldados da Commune. Eles travaram o último combate no cemitério do Père Lachaise.
Os prisioneiros foram fuzilados ao longo de um dos seus muros e foram enterrados junto com outras vítimas de
execuções sumárias numa vala comum escavada a seus pés. Sob o nome de «Mur des fédérés», esse sítio tornou-
se, no início dos anos 1880, um dos primeiros « locais de culto » do movimento operário. No final do mês de
Maio, em celebração do aniversário da « Semana sangrenta » organizam-se lá imponentes celebrações. 106 “Damnés de la Terre” 107 Essa experiência efémera do poder operário bem como o seu fracasso estiveram na origem do aprofundamento
das teorias socialistas, sob orientação do Estado. Bakounine e os anárquicos encontraram aí a confirmação da
necessidade de “abolir”. Marx, na sua obra consagrada à Commune – La guerre civile en France (1871) –
precisou as suas teses sobre a “ditadura do proletariado”. Lenine retomou essa reflexão em L’État et la révolution,
escrita durante o ano 1917, altura na qual os bolcheviques tomaram o poder na Rússia. 108 Terceira República
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Mortos, prisioneiros e exilados, representavam no depois da queda da Commune, cerca de ¼ do
proletariado masculino da capital. O estado de sítio prolongou-se até Abril de 1876 em Paris, Lyon e
Marseille.
No entanto, faltava menos de uma década para que o movimento operário retomasse um lugar de
destaque na vida política e social. O triunfo dos republicanos, em 1879, fez-se acompanhar de medidas
de apaziguamento e reconciliação. Tomemos como tal a lei da amnistia de 1880- que permitiu o regresso
dos communards – e a de 1884, autorizando a criação dos sindicatos.
O desejo de integrar os operários na comunidade nacional era limitado mas real e deu às organizações de
trabalhadores maior liberdade de acção. Começava então, para o movimento operário, uma longa fase de
expansão e de lutas, que viria a conhecer, quer no plano sindical, quer no plano socialista, um primeiro
apogeu na Belle Époque.
A greve
Os anos de 1880-1914 foram um período de intensos conflitos sociais. Excepcionalmente antes de 1860,
mais frequentemente na véspera da Commune, a greve tornou-se o meio privilegiado da luta operária. O
número médio anual109
das paragens de trabalho passou de 186 nos anos 1880, a 1170 entre 1904 e
1913.
O número de grevistas multiplicou-se por dez de 1866 a 1911. O ano de 1906 atingiu o pico máximo:
um assalariado em cada 16 interrompia o trabalho por uma duração média de 24 dias. Estas
movimentações afectaram todo o tipo de estabelecimentos, e não apenas os maiores: um quarto dos
conflitos acontecia em fábricas de menos de vinte operários.
Os grevistas eram mais numerosos nos têxteis e construção, mas estes sectores são também os que
empregam mais pessoal. Os mineiros tinham a maior propensão para a greve: os seus confrontos com as
possantes companhias eram notícia e na opinião pública eles ganharam uma sólida reputação de
vanguarda proletária. Pensemos no sucesso do Germinal de Zola que glorifica os do Norte! Mas os
mineiros do Midi não ram menos combativos. Em Decazeville (Aveyron), o conflito começou em 1886,
com a a queda através de uma janela de um engenheiro denunciado pelos operários e continuou com
uma greve de 108 dias. Em 1892, a greve eclodiu em Carmaux após o despedimento do mineiro
socialista Calvignac, eleito presidente da cidade. A greve terminou vitoriosamente ao fim de 79 dias.
Algumas semanas mais tarde, a circunscrição tornou-se socialista. O novo deputado era um jovem
professor: Jean Jaurès.
A questão do salário era, num caso em cada dois, a origem da greve. Os outros motivos de conflito com
o patrão eram a jornada laboral e problemas ligados à disciplina e aos regulamentos do atelier. Em
período de depressão económica, as lutas tinham um carácter sobretudo defensivo, tratava-se de
preservar uma situação ameaçada. Os trabalhadores tornavam-se mais ofensivos à medida que a
prosperidade se instalava exigindo o melhoramento da sua condição e eram frequentemente atendidos.
As tomadas de greve acompanhavam assim os avanços de esquerda, como após o Affaire Dreyfus. Eram
também mais importantes na primavera, quando os estaleiros de construção retomavam o trabalho, e no
início do mês, quando o operário possuía recursos de subsistência. As grandes cidades ofereciam um
109 Números extraídos de Michelle Perrot, Les ouvriers en grève, Paris-La Haye, Mouton, 1974, tome 1, p. 67.
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território mais favorável: os trabalhadores em luta beneficiavam da mobilização dos assalariados das
outras empresas e da ajuda da população.
A greve era sobretudo uma questão masculina. As mulheres, mais vulneráveis, menos qualificadas e
mantidas num estado de minoria social aderiam pouco. Elas tinham contudo um papel activo nas lutas
operárias. Era frequente encontrá-las nos cortejos ou nas colectas para constituir caixas de apoio.
Confiava-se-lhes a tarefa de preparar as “sopas comunistas” que partilhavam os seus congéneres, num
ambiente de solidariedade. Terminadas por algum tempo as humilhações, a submissão e o silêncio, a
experiência de greve era um momento raro da vida do trabalhador, onde este experimentava a intensa
sensação de existência, sua e do próximo.
Apesar de reconhecida pela lei, a greve não era menos encarada pelo patronato como um atentado ao seu
poder na empresa. Os empregadores não hesitavam em recorrer a métodos enérgicos e por vezes até
violentos: despedimentos, fura-greves… Quanto às autoridades, estas consideravam frequentemente as
manifestações de greve como sendo problemas de ordem pública. A repressão pela polícia ou pela
armada era no entanto menos sistemática que sob os regimes precedentes. Presidentes de câmara ou
deputados tomavam por vezes o partido dos operários, intercedendo em seu favor junto do prefeito ou
do ministro. O emprego da força pública não se tornou no entanto menos frequente. O “massacre de
Fourmies”110
, aquando da greve do 1º de Maio 1891 pela jornada laboral de oito horas, fez 9 mortes e 33
feridos. Clemenceau, pela sua determinação anti-operária, foi denominado o “primeiro polícia de
França”111
. Ele decretou o estado de sítio para fazer fracassar a mobilização do 1º de Maio de 1906, e em
1908 destituiu 550 carteiros.
Era frequentemente em ocasião de greve, para atingir os seus objectivos e manter a combatividade
operária após o seu término, que nasciam os sindicatos.
O Sindicalismo
As primeiras “câmaras sindicais operárias” apareceram no final do Second Empire. Elram pouco
toleradas e a maior parte foi desmantelada após o fracasso da “Commune”. Elas reconstituíram-se
lentamente e com grandes dificuldades. Em 1880, o número de sindicalizados era estimado por volta de
64.000 distribuídos por menos de 500 organizações. A lei Waldeck-Rousseau de 1884 deu enfim
enquadramento legal aos “sindicatos ou associações profissionais”. Esta permitiu-lhes não somente
existir como operar reagrupamentos cada vez mais amplos. A sua criação não era sujeita a qualquer
autorização. Eles podiam possuir instalações próprias e recorrer à justiça.
O sindicato de profissão, que não reunia senão os trabalhadores que exercessem aquela mesma
profissão, era a célula base. Este tipo de organização concretizava a necessidade de concertação e de
troca de informação para estabelecer os cadernos reivindicativos comuns ao conjunto de trabalhadores
de um sector de actividade. Estávamos num quadro estritamente corporativo. Com o desenvolvimento
da grande indústria, a estrutura do sindicato passou a decalcar-se pela estrutura da empresa. Nas minas,
por exemplo, ele juntava todas as profissões do mesmo sítio: as do “fundo” como as do “dia”.
110 No primeiro de Maio, a pedido dos patrões da indústria dos lanifícios, a tropa investiu contra uma pequena
cidade manufactureira do Norte. Devido aos incidentes com os grevistas foi dada ordem aos soldados para
disparar sobre a multidão. Entre os mortos estavam duas crianças e quatro meninas. Este massacre teve um
impacto considerável sobre o país. 111 “Premier flic de France”
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A organização assentava frequentemente sobre a devoção de um estreito núcleo de militantes. Inscrever-
se num sindicato significava expor-se à repressão patronal: despedimentos, “listas negras”112
, etc. Os
responsáveis sindicais eram normalmente militantes enérgicos com convicções sólidas e com a alma
endurecida pelos fracassos ou pelas prisões. Era preciso ser bom orador para cativar um atelier indeciso,
interpelar o patrão ou o engenheiro a quem a massa operária não ousava sequer dirigir a palavra. Era
preciso saber jogar também com os fura-greves ou com a polícia.
Este contexto de insegurança da vida de militante explica o carácter efémero e convulsivo das primeiras
experiências sindicais. Nascidos sob a euforia da luta, o sindicato desaparecia por vezes aquando das
primeiras dificuldades, para renascer aquando de uma nova explosão de descontentamento.
A procura de uma unidade maior acompanhou o crescimento do sindicalismo. Os agrupamentos
efectuavam-se segundo dois modos diferentes: a federação de profissões e a bolsa de trabalho.
A maior parte das federações nacionais de profissões constituem-se progressivamente entre 1880-1890.
Como os sindicatos, elas referem-se a profissões especializadas: chapeleiros, moldadores de metal,
cordoeiros, fabricantes de luvas, etc. Este hermetismo tinha os seus inconvenientes cujo principal ponto
é levar as profissões vizinhas a discordar em pontos de importância menor. Sobretudo devido às suas
origens artesãs adaptaram-se muito mal às mutações da classe operária. No início do século XX os
sindicalizados aceitaram, com reticências, substituir a federação da profissão pela federação da indústria:
em 1909, a Federação da construção foi criada pela fusão das sete preexistentes deste ramo.
Fundar uma bolsa de trabalho, significava procurar resolver problemas concretos: onde se reunir? Como
organizar um centro de emprego? Onde prestar noções básicas de instrução ou de formação profissional?
Dito de outra forma, como escapar à vigilância policial e ao controle de emprego e de aprendizagem do
patronato?
A primeira bolsa foi fundada em Paris em 1887. O movimento tomou rapidamente a amplitude de 14
bolsas em 1892, 74 em 1901, e 157 em 1914, reunidas – a partir de 1892 – numa federação. A bolsa de
trabalho estava instalada num imóvel concedido pelo município. A sua administração era assegurada
pela união dos sindicatos aderentes. Esta concessão e esta presença na paisagem urbana, oficializavam,
aos olhos da população, a existência do sindicalismo. Ela permitia aos trabalhadores sair do seu
isolamento e dotar o coração da cidade de um lugar específico da sociabilidade operária.
A criação da Confederação Geral do Trabalho (CGT) no congresso de Limoges, em 1895, foi uma etapa
decisiva deste processo de unificação do sindicalismo operário. O seu objectivo era o de “unir sobre o
terreno económico sob laços de estreita solidariedade, os trabalhadores em luta pela sua emancipação
integral”. A sua vocação era portanto a de reunir sindicatos, federações de profissão e bolsas de trabalho.
A unidade sindical estava no entanto longe de terminar. Além da consciência de pertença de classe,
subsistia ainda um tenaz espírito corporativo e regionalista. Os mineiros, fortemente sindicalizados e
muito combativos, duvidavam da sua inserção na massa indistinta dos assalariados. Eles não se uniram à
CGT senão em 1908. A federação das bolsas de trabalho, orgulhosa da sua especificidade não aderiu
senão em 1902 após a morte do seu fundador, Fernand Peloutier.
No seio da CGT, podiam confrontar-se várias concepções da acção sindical. Os debates mais
importantes giravam em torno da relação entre sindicato e política. Os reformistas, à frente da possante
112 Para neutralizá-los e impedi-los de encontrar emprego, os patrões de um sector geográfico comunicavam entre
si as listas de nomes envolvidos. Esta prática desencorajava muitos assalariados tentados pelo sindicalismo,
sobretudo entre os menos qualificados.
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Federação do Livro, preocupavam-se essencialmente em melhorar as condições dos trabalhadores
através da negociação ou da greve. Os “colectivistas”, sob a influência de Jules Guesde, queriam
subordinar o sindicato aos imperativos políticos dos socialistas. Os sindicalistas revolucionários, enfim,
rejeitavam com energia igual ambas as concepções. Foram os libertaires (anarquistas) que sofreram as
influências de Bakounine e de Proudhon.113
À frente da CGT até 1914, eles recusavam toda a
dependência do sindicato face aos partidos.114
A carta de Amiens, adoptada pela Confederação em 1906,
consagrava a vitória desta concepção. A sua desconfiança face à política era profunda115
e conduziu-os a
tornar o sindicato o instrumento principal de luta de classes contra o Estado e o patronato, e no futuro,
“grupo de produção e repatição, base da organização social”. Fixando como objectivo a “emancipação
integral” dos assalariados, a CGT inscreveu-se sem reservas numa perspectiva revolucionária. A
estratégia preconizada era a “acção directa” dos produtores para preparar “a greve geral” que abateria o
capitalismo. Esta ideia expandiu-se nos anos 1880. A adopção do Primeiro de Maio116
como jornada de
luta e de solidariedade internacional relançou em cada ano a mesma perspectiva revolucionária. Após o
fracasso da greve de 1906, o sindicalismo perdeu as suas ilusões numa “grande tarde” de revolta, capaz
de abalar o “velho mundo”.
Na véspera da guerra, a CGT era a única confederação sindical francesa. Apesar disso, com 350.000
aderentes, ela não agrupava senão um terço dos sindicalizados. Muitos assalariados pertenciam a outro
tipo de organizações. Estas eram muitas vezes sindicatos isolados e independentes. Outros foram criados
pelo patronato para impedir a acção reivindicativa e conduzir as greves ao fracasso. Dinâmicos, após o
seu reagrupamento em 1904 na Federação dos Amarelos117
de França, declinaram depois de 1910. O
sindicalismo cristão encontra a sua origem na encíclica Rerum Novarum (1891), primeira abordagem da
questão operária pela Igreja. Condenando o socialismo e a luta de classes, denunciava a concentração de
riqueza entre as mãos de “um pequeno número de ricos e opulentos que impunham assim um jugo quase
servil à multidão infinita do proletariado”. O sindicalismo cristão, com os têxteis do Norte como bastião,
contava 25.000 a 30.000 adesões em 1912.
Com mais de um milhão de sindicalizados na véspera da guerra, a França estava em quarto lugar no rang
mundial, atrás do Reino Unido, da Alemanha e dos Estados unidos. Em todo o caso, a sua taxa de
sindicalização – a relação entre sindicalizados e assalariados – era nitidamente mais falível do que a
desses países ou da Europa do Norte.
A difícil unidade do socialismo francês
De 1880 aos primeiros anos do século, o socialismo francês estava dividido em seis tendências rivais. As
causas desse parcelamento escapavam na maioria à massa de trabalhadores que aderiram largamente aos
113 É por essa razão que esta corrente é por vezes referida por anarco-sindical. 114 A personalidade mais marcante da CGT, no início do século, era o seu secretário-geral de 1902 a 1909, Victor
Griffuelhes. O seu sucessor, Léon Jouhaux, sindicalista revolucionário, seguia linhas de orientação mais
reformistas e era apoiante da União Sagrada em 1914. 115 Texto da carta de Amiens citado no anexo do capítulo V tomo 1. 116 O Primeiro de Maio foi adoptado pela Internationale como jornada de luta em 1890. Comemora o massacre
dos operários de Chicago, em 1886, e o facto da jornada laboral de oito horas, reivindicação comum aos
assalariados do mundo inteiro. 117A origem da palavra “amarelos” que se opõe à cor vermelha da bandeira revolucionária é pouco conhecida. Na
linguagem corrente significa ainda fura-greves.
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ideais republicanos e sociais da doutrina. No terreno, era sobretudo a partir da combatividade e da
devoção de um círculo de militantes ou do enraizamento de uma personalidade local ou nacional que os
operários se reviam no socialismo. Assim se explica o enraizamento das primeiras municipalidades ou
dos primeiros deputados nas regiões operárias. O detalhe dos debates internos e das oposições fratricidas
entre dirigentes era então raramente essencial.
A tradição jacobina e blanquiste sobreviveram com Edouard Vaillant (1840-1914) e nas camadas de
militantes da Commune regressados do exílio.
Em torno de Paul Brousse (1844-1912) reuniam-se os partidários das reformas graduais para construir
um socialismo do possível – daí o nome de “possibilistes”. A sua acção concentrava-se na conquista das
municipalidades.
Jean Allemane (1843-1935), antigo communard, estava à cabeça de uma corrente anti-autoritária e
espontânea, inspirada em Proudhon e em Bakounine. A Armada, a Igreja e o Parlamento eram os
principais alvos.
Estas características encontravam-se nos grupos anarquistas que privilegiavam o papel das minorias
activas e empreendedoras. Entre 1892 e 1894 lançaram-se em espectaculares ataques assassinos, em
nome da “propagande par le fait”. A repressão que se abateu sobre eles repercutiu-se em todo o
movimento operário que se dissociou deste tipo de acção. Foi após estes fracassos que muitos
anárquicos se voltaram para o sindicalismo.
No esforço precoce de organização de um partido operário, são os “guedistes” que mais se aproximaram
do objectivo, ao criar em 1879, o partido operário francês. Apoiantes do jornalista Jules Guesde (1845-
1922) e de Paul Lafargue (1842-1911), foram os primeiros a difundir em França os ideais de Karl Marx.
Propagandistas mais do que teóricos, divulgaram o pensamento do autor da Capital, uma visão plena de
dogmatismo e de conceptualização. Convencidos da necessária superioridade do partido, consideravam
o sindicato como uma simples “corrente de transmissão”. Instalados sobretudo no Norte operário e no
Midi, obtiveram em 1898, 295.000 votos e doze deputados.
Os socialistas independentes, enfim, recusavam vergar-se à disciplina fanática das outras tendências.
Aristide Briand (1862-1932), Alexandre Millerand (1859-1943) e sobretudo Jean Jaurès (1859-1914), 3
deputados, são os mais visados deste corrente.118
Filósofo de formação, jornalista de talento e orador
potente, Jaurès destaca-se, pela sua posição excepcional nos rangs do socialismo francês. Deputado de
Carmaux, participou activamente nos combates dos mineiros da sua circunscrição. Este homem de acção
era também um grande intelectual, desejoso de conciliar os valores da república e do socialismo, o
patriotismo e a internacionalização. Lutou incansavelmente pela unidade socialista.
Após longos adiamentos, esta oif decididamente conseguida em 1902, sob a pressão da
“Internacionale”119
. A meta foi atingida com o nascimento da Section Française de l’ Internacionale
Ouvrière (SFLO) que reunia as principais famílias do socialismo francês.
118 O essencial das carreiras políticas de Briand e de Millerand divergem desde o início do século da história do
movimento operário. Em ruptura com a maioria dos socialistas, eles participaram em numerosos governos
burgueses. O primeiro foi eleito presidente do Conseil e Prémio Nobel da Paz e o segundo foi eleito Presidente da
República. 119 A primeira Internationale, minada por desentendimentos internos, foi dissolvida em 1876. A 2ª Internationale
foi constituída em 1899. Dominada pela social-democracia alemã, ela enfrentou na véspera da Primeira Guerra
Mundial oposições entre correntes reformistas e revolucionárias.
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Os progressos foram espectaculares. De 35.000 adesões em 1906, a SFLO passou a 75.000 em 1914. Na
mesma altura o seu número de eleitores elevou-se de 877.000 para 1.413.000 e o de deputados de 2 a
103. Graças à unidade interna, a SFLO tornou-se o segundo partido de França.
Para uma grande parte, a implantação socialista recortava a geografia operária do país (Norte, região
parisiense, Centro…) ela tocou também – no Midi principalmente – as regiões mais rurais, durante
muito tempo fiéis ao radicalismo. Este enraizamento completava-se sob a direcção de numerosos
municípios.
A SFLO antes de 1914 era cada vez mais dominada pelos seus eleitos. Na Câmara, o grupo de deputados
não contava senão um terço de operários. Permanecendo formalmente hostis à participação nos governos
burgueses, eles colaboravam activamente no jogo parlamentar. No discurso, exaltava-se ainda a
revolução, mas na prática, o reformismo era a regra.
Para a SFLO, como para o conjunto do socialismo europeu, a luta contra a guerra tornou-se a grande
questão política. Segundo uma moção votada em 1907 pela Internacionale, os operários deviam
“impedir a guerra por todos os meios que lhes parecessem os mais apropriados”. Assim, os socialistas
organizaram uma campanha, muito popular, contra a lei que elevava o serviço militar a 3 anos (1913).
Jean Jaurès combateu-a com uma energia sem igual. Antes e depois do atentado de Sarajevo, nas
reuniões, na tribuna da câmara ou nas colunas do seu jornal L’Humanité, as suas convicções pacifistas
permaneceram inflexíveis. Em 14 de Julho de 1914, quando a Europa estava na eminência do conflito,
ele organizou na SFLO a “greve geral contra a guerra”. O seu assassinato, dia 31 de Julho, arruínou as
esperanças de Paz. Em 3 de Agosto, a Alemanha declarou Guerra à França. No dia seguinte os
deputados socialistas votaram unanimemente pela Guerra. Dia 26, dois socialistas, um dos quais Jules
Guesde, entraram para o governo da União Sagrada.
As explosões profetizadas por Lamartine no início da Monarquia de Julho produziram-se. Estas foram
de uma extrema violência: 1831,1834, 1848, 1871.
Fracasso? Certamente, sob o plano político. A “revolução proletária” não triunfou em França. Os
levantamentos não foram, no entanto, em vão. Bom ou mau grado, a sociedade burguesa teve que ter em
consideração a questão operária.
Não houve no entanto alteração. Não deixou de se tratar a condição operária como uma condição
inferior. No melhor dos cenários, conseguiu-se, no espaço de uma geração, elevar a sua conotação na
hierarquia de profissões. Mas, ao longo do século, o destino dos trabalhadores sofreu uma nítida
melhoria. A legislação social que vigorava em 1914 serve de testemunho. A diferença considerável dar-
se-ia em 1936 (férias pagas, semana de 40 horas…).
As organizações sindicais e sociais conquistaram reconhecimento legal. Sem abandonar totalmente os
seus objectivos revolucionários, conseguiram encontrar o seu lugar específico no seio das instituições
republicanas.
O proletariado da Belle Époque conservava uma forte identidade de classe. A sua integração na
comunidade nacional estava bem consolidada: a Grande Guerra, a Frente Popular, a Resistência e a
Liberação deram uma importante contribuição a este processo.
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Actividades propostas
(Supressão dos quadros e gráficos ilustrativos da situação vivida então pela França industrial e
operária)
Lille em 1835
“ A cidade de Lille contava 22.281 pobres, socorridos ou susceptíveis de o ser em 1828. Como a
população de Lille, que não parecia crescer há vários anos, foi avaliada em 72.000 pessoas, seriam cerca
de 4 indigentes em cada 13 habitantes!
Os mais pobres habitavam nas caves ou nos celeiros. Estas caves não tinham qualquer comunicação com
o interior das habitações: abriam-se para as ruas e descia-se por uma escada que era habitualmente a
porta ou a janela. Eram abobadadas, de pedra ou tijolo, asfaltadas ou em paralelo, e todas tinham uma
chaminé, o que prova que eram construídas para servir de habitação. Normalmente tinham 6 a 6 pés e
meio de altura ao meio da abóbada e tinham de 10 a 14 ou 15 pés de lado.
Era nestes tristes e sombrias cómodos que comia, dormia e até trabalhava um grande número de
operários. O dia, para eles, chegava uma hora mais tarde que para os restantes, e a noite, uma hora mais
cedo.
O seu mobiliário ordinário era composto, com os objectos da sua profissão, por uma espécie de armário
ou prateleira para dispor os alimentos, uma sertã, um fogão de barro, algumas panelas, uma pequena
mesa, duas ou três cadeiras e um sujo leito cujos únicos adereços eram um colchão de palha e uma
coberta a cobri-lo. Não quero acrescentar nada ao detalhe das coisas repugnantes, que revelavam, ao
primeiro vislumbre, a profunda miséria desses infelizes habitantes, mas devo dizer que, nos vários leitos
de que falo, vi repousarem conjuntos de indivíduos dos sois sexos e de idades diferentes, a maior parte
sem camisa e de uma sujidade repulsiva. Pai, mãe, velhos, crianças, adultos comprimidos, apertados.
Paro por aqui….
E as caves não eram os piores alojamentos: não eram tão húmidas quanto se dizia. Cada vez que se
acendia a fogueira e eram aquecidas, quem se colocasse junto à chaminé, sentia uma corrente de ar seco.
Os piores alojamentos eram os celeiros, onde nada permitia evitar os rigores da temperatura, pois os seus
locatários, tão miseráveis quanto os das caves, não dispunham de meios para acender o fogo e se
aquecer no Inverno.
Um traço marcava este quadro: o dos cabarés da rua Etaques ou das ruas vizinhas, observados à noite, e
aos Domingos e Segundas-feiras, em 1835, durante a estação fria. Gostaria de ter entrado num desses
lugares, que observei apenas através das portas e das janelas, através do fumo do tabaco, como faziam os
habitantes desses bairros asquerosos, mas é evidente que, apesar da precaução que havia tido em vestir-
me da maneira menos suspeita possível, a minha aparição no meio deles teria aguçado a sua supresa, a
sua desconfiança. Muitos ficavam de pé, sem lugar para se sentar, e viam-se no meio de muitas
mulheres. Todos bebiam a detestável água-de-vida de uva ou cerveja. Quanto ao vinho, era de um preço
muito elevado para que pudessem suportá-lo. Contentei-me pois em seguir todos estes personagens na
rua, onde muitos paravam junto ao merceeiro para beber a água-de-vida, antes de entrar no cabaré, e
onde ouvia até mesmo as crianças dizerem as palavras mais obscenas.”
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Villermé, Tableau de l’état physique et moral dês ouvriers employés dans les manufactures de coton, de
laines e de soie.120
Perguntas
1. Compare a evolução dos principais postos operários em 1848, 1906 e 1982. Evidencie as
evoluções mais notáveis.
2. Como caracteriza, a partir dos extractos do texto 4, as condições de alojamento dos operários no
início da revolução industrial?
3. Qual o fenómeno evidenciado no último parágrafo do texto 4 (“Um traço…obscenas”) ?
Apoiando-se nos termos ou expressões utilizados pelo autor mostre como ele reagiu. Quais são, segundo
o seu ponto de vista, as explicações dessa praga?
3. La Commune de Paris
1. A repressão durante a semana sangrenta
“ E o sargento contou-me com todo o detalhe a terrível carnificina da corte marcial.
Depois da entrada das tropas, disparava-se cessar. Disparavam sobre os bosques, cujo verde da folhagem
se me afigurava repleto de gotas de sangue. Era um simples pelotão. Quatro por quatro. Contra a parede,
contra um banco. E os soldados lá iam, recarregavam tranquilamente as suas armas, passavam a palma
da mão sobre o canhão poeirento deixando os mortos para trás.
Disparava-se também ao longo do grande baixio, perto da escada de pedra que se alonga conduzindo à
grande avenida do Observatório, ao longo da balaustrada da esquerda.
- E todos aqueles cadáveres, que era feito deles?
- Todos os que foram atingidos na Quinta-feira, o dia em que vocês estiveram lá, foram recolhidos na
noite seguinte. Foram recolhidos por grandes carrinhas. Creio que foram transportados para
Montparnasse.
Lembrei-me da horrível cena. A montanha de mortos, os que tinham sido etingidos primeiro esmagados
sob o peso dos que vieram a abater-se sobre os seus cadáveres, toda aquela carne esburacada e sangrenta
sobre a relva coberta de sangue.
O sargento retomou o seu discurso. Ele contava detalhadamente o abate lugar por lugar, pelotão por
pelotão.
- E, perguntei-lhe eu, continuavam a disparar?
120 Villermé, Quadro do estado físico e moral dos operários empregados nas manufacturas do algodão, da lã e da
seda.
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O sargento lançou sobre mim um olhar de espanto. Estávamos, tanto quanto me lembro, na manhã de
Domingo, última agonia da batalha.
- Certamente, respondeu-me ele. Não paramos nunca, após ter entrado em Paris. Ah, vocês não viram
nada. Eu, comecei a ver aquilo desde a Cruz Vermelha, onde contornamos as barricadas por baixo da rua
de Rennes. Abatemos lá um grupo, eram sobretudo oficiais.
Bruscamente, começaram a gritar, atrás de nós. O sargento chegou-se à janela:
- Olha um bando de prisioneiros, disse sem se voltar. Levam-nos certamente para o Luxemburgo.
Os prisioneiros, que vinham do Colégio de França, eram cerca de cinquenta. Avançavam entre duas filas
de soldados. Todos marchavam a um ritmo acelerado. Tive tempo de ver as cabeças nuas, os braços
junto ao corpo, as faces pálidas e abatidas.
Três mulheres iam de braço dado. Uma multidão aos gritos seguia-os. Ouvi distintamente o grito feroz:
- Á morte. Á morte. Para o Luxemburgo.
- Levam grupos como este de quinze em quinze minutos, disse o sargento.
Testemunho recolhido pelo jornalista communard121
Maxime Villaume junto um sargento versaillais122
no dia 28 de Maio de 1871.
Termina aqui a matéria para SCF I
121 Partidário de La Commune. 122
Durante a Commune, o governo de Adolphe Thiers e a Assembleia eleita em Fevereiro recuaram para
Versailles. Daí o nome de «Versaillais» que os Communards atribuíram aos seus adversários