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    Investimento brasileiro noexterior: panorama econsideraes sobre polticaspblicas

    Mrcia Tavares

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    desarrollo productivo

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    Santiago, Chile, novembro de 2006

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    Mrcia Tavares integra a Unidade de Estratgias Empresariais e Investimento daDiviso de Desenvolvimento Produtivo e Empresarial da CEPAL. O contedodeste artigo resultado de estudos e entrevistas realizados no contexto de um programa de pesquisa sobre empresas transnacionais latino-americanas(translatinas) desenvolvido entre 2005 e o primeiro semestre de 2006 por essaUnidade. Em abril de 2006 a CEPAL publicou seu relatrio anual sobre

    Investimento Estrangeiro na Amrica Latina e no Caribe 2005 em que oinvestimento direto no exterior e as translatinas foram tema de destaque. Antegra do relatrio est disponvel em www.cepal.org. A autora agradece, porsuas inestimveis contribuies e pontos de vista, aos demais integrantes daDiviso de Desenvolvimento Produtivo e Empresarial, aos executivosentrevistados ao longo de 2005 no contexto da pesquisa da CEPAL, e aosrepresentantes do Governo Brasileiro que participaram em reunio convocada pela CEPAL em junho de 2006 para discutir os desafios da importnciacrescente do investimento brasileiro no exterior para os formuladores de polticas pblicas.

    As opinies expressas neste documento, que no passou por reviso editorialformal, so de responsabilidade exclusiva da autora e no coincidemnecessariamente com as da Organizao.

    Publicacin de las Naciones UnidasISSN impreso 1020-5179ISSN electrnico 1680-8754

    ISBN: 92-1-322982-8LC/L.2624-PN de venta: P.06.II.G.148Copyright Naes Unidas, novembro de 2006. Todos los derechos reservadosImpreso en Naciones Unidas, Santiago de Chile

    La autorizacin para reproducir total o parcialmente esta obra debe solicitarse alSecretario de la Junta de Publicaciones, Sede de las Naciones Unidas, Nueva York,N. Y. 10017, Estados Unidos. Los Estados miembros y sus institucionesgubernamentales pueden reproducir esta obra sin autorizacin previa. Slo se lessolicita que mencionen la fuente e informen a las Naciones Unidas de tal reproduccin.

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    ndice

    Resumo ........................................................................................5I. Introduo ...................................................................................7II. Breve histrico ...........................................................................9III. Fluxos e estoque de IBD a partir dos anos 1990 ..........11 IV. A experincia de empresas brasileiras com

    investimentos diretos no exterior : caractersticasgerais e casos selecionados ................................................19A. Caractersticas gerais ...........................................................19B. Casos selecionados...............................................................22

    V. Impactos do IBD: internacionalizao positiva ou savessas? .......................................................................... 29 A. Marco analtico.....................................................................29B. Estratgias e motivaes.......................................................31C. Resultados do processo para a empresa................................33

    VI. Polticas pblicas relacionadas ao IBD .............................35VII. Concluses ....................................................................... 41 Bibliografia .............................................................................. 43 Anexo 1 .............................................................................. 48

    Anexo 2 .............................................................................. 53 Srie Desarrollo Productivo: nmeros publicados ...............55

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    ndice de tabelas

    Tabela 1 Distribuio geogrfica de fuses e aquisies transfronteiras realizadas porempresas brasileiras, 1995-2004 ............................................................................... 16

    Tabela 2 Distribuio setorial das fuses e aquisies transfronteiras realizadas porempresas brasileiras, 1995-2004................................................................................. 17

    Tabela 3 Maiores projetos greenfield realizados no exterior por empresas brasileiras,2002-2004 .................................................................................................................. 17

    Tabela 4 Principais empresas brasileiras com investimentos produtivos no exterior,2004-2005 .................................................................................................................. 21

    Tabela 5 Impactos do IDE......................................................................................................... 30Tabela 6 Fatores de impulso e atrao para o investimento no exterior ................................... 31Tabela 7 Motivaes para a internacionalizao....................................................................... 33Tabela 8 Benefcios secundrios da internacionalizao....................................................... 34Tabela 9 Sugestes sobre como as polticas pblicas poderiam apoiar o IBD.......................... 36Tabela 10 Principais barreiras ao IBD......................................................................................... 37Tabela 11 Dificuldades relacionadas a polticas dos pases de origem e destino........................ 38

    ndice de quadros

    Quadro 1 Investimento brasileiro na Argentina ......................................................................... 15

    ndice de figuras

    Figura 1 Investimento direto no exterior, pases em desenvolvimento, 1970 a 2004................. 8Figura 2 Investimento brasileiro no exterior,1990 a 2005........................................................ 12Figura 3 Investimento direto no exterior (fluxos) como porcentagem do PIB,

    mdia 1990-2003 ....................................................................................................... 12

    Figura 4 Distribuio geogrfica do estoque de IBD, 2004 ..................................................... 14Figura 5 Distribuio setorial do IBD excluindo atividades financeiras e relacionadas,2001-2004................................................................................................................... 16

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    Resumo

    A partir do incio dos anos noventa o investimento direto noexterior (IDE) por parte de empresas brasileiras aumentousignificativamente. O fenmeno uma reao a fatores domsticos,regionais e globais, bem como fruto do amadurecimentoorganizacional e financeiro de algumas das maiores empresas do pas.O aumento do IDE brasileiro acontece em paralelo ao de outros pasesda regio e do mundo em desenvolvimento. No obstante, temcaractersticas prprias que so relevantes principalmente no que dizrespeito aos efeitos do IDE para o desenvolvimento produtivo doBrasil.

    Os impactos do investimento no exterior para o pas de origemso diversos e complexos. A anlise das motivaes para o IDE permite, no entanto, fazer algumas consideraes sobre efeitos provveis e pode contribuir para o debate sobre o que deve ser o papeldas polticas pblicas no Brasil diante desse aumento dainternacionalizao produtiva das empresas de capital nacional.

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    I. Introduo

    Os fluxos de investimento direto brasileiro no exterior (IBD) tmaumentado significativamente desde o incio dos anos noventa, embora nosem flutuaes significativas resultantes em grande parte de turbulnciasmacroeconmicas1. O fenmeno uma reao a fatores domsticos,regionais e globais, bem como fruto do amadurecimento organizacional efinanceiro de algumas das maiores empresas do pas. O aumento do IBDacontece em paralelo ao de outros pases da regio e do mundo emdesenvolvimento, como mostra a figura 1.

    O aumento dos investimentos no exterior de pases da sia emdesenvolvimento a partir do incio dos anos 1990 foi mais pronunciado doque o de pases latino-americanos, especialmente se se exclui o IDE feitoa partir dos centros financeiros do Caribe.2 Aproximadamente 67% dosfluxos totais de IDE de pases em desenvolvimento entre 1990 e 2004 foi proveniente da sia, e 30% da Amrica Latina e Caribe, dois teros dosquais provenientes dos centros financeiros da regio. As duas regiestiveram em comum alguns dos principais determinantes para ainternacionalizao, como o impulso dado pela concorrncia nosmercados domsticos e a necessidade de neutralizar assimetrias nas

    condies de acesso a mercados. Chama a ateno, no entanto, aimportncia atribuda no caso asitico ao apoio estatal internacionalizao, considerado pouco importante na Amrica Latina, deacordo com estudos de casos recentes encomendados pela

    1 A elaborao deste documento antecedeu a compra, pela Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), da mineradora canadense Inco em outubro de 2006

    aquisio, por aproximadamente 17,7 bilhes de dlares, levou a IDE brasileira a nveis sem precedentes, e a ultrapassar pela primeira vez o voluminvestimento estrangeiro direto (IED) recebido pelo Brasil. Confirma as tendncias identificadas e as concluses deste estudo.

    2 A comparao tem que ser lida com cuidado, tendo em vista que tambm h importantes fluxos de investimentos asiticos feitos a partir de jurisdies funcionam como centros financeiros.

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    Conferncia das Naes Unidas para o Comrcio e o Desenvolvimento (UNCTAD)3 (CEPAL,2006).

    Figura 1INVESTIMENTO DIRETO NO EXTERIOR, PASES EM DESENVOLVIMENTO, 1970 A 2004

    Fonte: UNCTAD FDI Database.

    Alguns dos principais fatores que definiram os padres de IDE latino-americano a partir dosanos 90 foram as polticas de abertura, desregulamentao e privatizao. A abertura dos mercados concorrncia exps as empresas aos nveis de competitividade das empresas transnacionais. Asempresas testaram sua capacidade de competir com essas empresas transnacionais em seusmercados domsticos e foram procura de novos mercados para seus produtos e servios. A profissionalizao da administrao de grandes empresas familiares e a privatizao de empresas

    estatais levaram busca mais agressiva de oportunidades, inclusive no exterio. Adesregulamentao criou novos mercados, como o de telefonia celular, dentro dos quais algumasempresas da regio se desempenharam muito bem regionalmente (CEPAL, 2006). De modo geral,os investimentos latino-americanos se deram globalmente em produtos e servios intermedirios, eregionalmente em bens e servios de consumo, padro descrito em maior detalhe abaixo em relaoao caso brasileiro.

    A experincia brasileira se conforma a essas caractersticas gerais mas encerra suas prprias peculiaridades. As prximas sees descrevem (i) brevemente, a histria do IDE brasileiro, ou IBD(seo II); (ii) os volumes fluxos e estoque de IBD e sua distribuio geogrfica e setorial a partir dos anos 90 (seo III); (iii) a experincia das maiores empresas brasileiras com investimentosno exterior (seo IV); (iv) impactos do IBD para o Brasil (seo V); e (v) consideraes sobre polticas pblicas relacionadas internacionalizao (seo VI).

    3 Como insumos para o Expert Meeting on Enhancing Productive Capacity of Developing Country Firms through Internationalization,realizado em Genebra, de 5 a 7 de dezembro de 2005, foram elaborados estudos de caso sobre Cingapura, China, Repblica da Coria,Malsia, Tailndia, ndia, Brasil, Argentina, Mxico e Chile, entre outros pases. Fatores motivadores dos investimentos desses pasesesto resumidos em CEPAL, 2006.

    020406080

    100120140160

    1970 1973 1976 1979 1982 1985 1988 1991 1994 1997 2000 2003

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    Pases em desenvolvimento

    Amrica Latina e Caribe Amrica Latina e Caribe excl. centros financeiros sia em desenvolvimento

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    II. Breve histrico

    freqente na literatura a definio de trs fases nodesenvolvimento do IBD: uma primeira, at 1982; a segunda entre1983 e 1992 e a terceira a partir de 1993. Na primeira fase, os protagonistas foram a Petrobras, empresas financeiras e empresas deconstruo. Os investimentos estrangeiros da Petrobras estavam

    motivados pela necessidade de encontrar fontes de petrleo paraabastecer o mercado domstico. A expanso dos bancos estavarelacionada s atividades de captao no mercado financeirointernacional para atender s necessidades do empresariado brasileiro.As empresas de engenharia e construo exploravam o conhecimento ecapacidade acumulados no desenvolvimento de grandes obras pblicasno Brasil. Conquistavam novos mercados para contrabalancear a quedada demanda pblica domstica. Essas companhias investiramfortemente em pases produtores de petrleo que, com a alta do preodo produto, aumentavam investimentos em infra-estrutura para suaexplorao (Lpez, 1999; Iglesias e Veiga, 2002). Alguns dos principais investidores no setor de manufaturas nesse perodo foram

    Copersucar (nos Estados Unidos), Gerdau (no Uruguay), Gradiente (noReino Unido) e Caloi (na Bolvia e na Colmbia) (Lpez, 1999).Entre o incio dos anos 80 e o incio dos anos 90, permaneceu a

    importncia dos setores financeiros e de petrleo. Os investimentos seconcentraram nos ltimos trs anos desse perodo, refletindo a baixacapacidade de investimento das empresas de capital brasileiro no perodo que coincide com a dcada perdida.

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    As manufaturas foram responsveis por aproximadamente 10% dos investimentos entre 1982e 1993 (Lpez, 1999). Alguns dos principais setores foram os de auto-peas, metalmecnica,txteis, ao eembalagens. Firmas menores passaram a investir, e cresceu a participao da Amrica do Sul comodestino dos investimentos (Lpez, 1999, Iglesias e Veiga, 2002).

    As reformas institudas a partir do incio dos anos 1990 bertura, desregulamentao, privatizaoevaram a um forte movimento de reestruturao da indstria brasileira, envolvendo por um lado, um shake-out de empresas menos competitivas e a internacionalizao para dentro e, por outro, a renovao de algumas empresas de capital nacional, que profissionalizaram suaadministrao, inovaram em produtos e organizao e diversificaram suas fontes de financiamento,com a entrada em mercados internacionais de capitais. A internacionalizao foi pea chave narenovao de muitas das grandes empresas brasileiras estatais, ex-estatais, e privadasqueenfrentavam o ambiente definido pelas reformas, conforme discutido em maior detalhe abaixo. Noentanto, at 1994 os altos ndices de inflao e a instabilidade na disponibilidade de capital e crditodificultaram o investimento estrangeiro, assim como o domstico, por empresas brasileiras.

    A estabilizao monetria a partir de 1994 facilitou o planejamento de mdio e longo prazo,mas no resolveu o problema do acesso a financiamento. Alm disso, at 1999, apesar da apreciaoda moeda brasileira que poderia ter favorecido o IBD em detrimento de exportaes, a expanso domercado domstico levou muitas empresas a voltarem-se para dentro. Apesar de crescentes, osinvestimentos no exterior, principalmente aqueles diretamente relacionados com as exportaes, permaneceram relativamente baixos em relao a outros pases, assunto tratado na prxima seo(Iglesias e Veiga, 2002, Da Rocha, 2003). A crise cambial e seus efeitos permitiram aumentar acompetitividade dos produtos brasileiros no exterior, incentivando o IBD de apoio s exportaes que permanece um componente importante do total (Iglesias e Veiga, 2002), mas desincentivandoos demais (Da Rocha, 2003).4 Na primeira metade da dcada de 2000, uma combinao de fatoreslevou a aumentos sem precedentes do IBD. Por um lado, verificou-se a maturao das estratgias deinternacionalizao de algumas das maiores empresas do pas. Por outro, algumas das grandesempresas que ainda no haviam investido no exterior de maneira significativa passaram a faz-lo.As sees seguintes descrevem com maior detalhe a experincia brasileira com o IDE, principalmente a partir dos anos 90, do ponto de vista dos fluxos agregados e de experincias dealgumas das maiores empresas brasileiras.

    4 No que se refere ao impacto do cmbio sobre o IDE, h que distinguir os investimentos associados s exportaes (operaes demontagem de partes, armazenagem e distribuio, assistncia tcnica e ps-venda); dos investimentos que no envolvem umcomponente exportador, e cuja localizao determinada pelo custo da produo no mercado domstico relativamente ao de mercadosno exterior. Os primeiros so diretamente e os segundos inversamente relacionados com o valor da moeda, tudo mais constante. Arelao, no entanto, no simples, e inmeros outros fatores influem nas decises de investimento e nos fluxos agregados.

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    III. Fluxos e estoque de IBD a partirdos anos 1990

    O Banco Central recolhe informaes sobre IBD de duas formasdistintas. Os dados sobre fluxos so coletados e divulgadosmensalmente de acordo com a metodologia da 5a edio do Manual deBalano de Pagamentos do Fundo Monetrio Internacional (FMI). Afonte para esses dados so os contratos de cmbio, registrados pelos

    bancos autorizados no Sistema de Informtica do Banco Central(Sisbacen). Os dados sobre estoques so coletados mediante o censo deCapitais Brasileiros no Exterior (CBE) realizado anualmente desde2001, por meio do qual se estima o estoque de IBD.

    A figura 2 mostra os fluxos de IBD entre 1990 e 2005. Em 2005,foram de aproximadamente 2.5 bilhes de dlares. A marcante quedaem relao a 2004 diz respeito atipicidade do IBD naquele ano. Comefeito, a operao por meio da qual a AmBev fusionou-se empresa belga Interbrew para formar a Inbev correspondeu a uma grande parcela dos investimentos no exterior naquele ano, entre outrosmotivos porque envolveu a compra, pela AmBev, do controle daempresa Labatt, do Canad, controlada pelo prprio grupo Interbrew.

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    Figura 2INVESTIMENTO BRASILEIRO NO EXTERIOR, 1990 A 2005

    0

    2 000

    4 000

    6 000

    8 000

    10 000

    12 000

    1990 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004

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    Fonte: Banco Central do Brasil.

    Em 2004, ltimo dado disponvel, o estoque de IBD estava estimado em 69.2 bilhes dedlares, 54,0 bilhes dos quais em participao de capital ou propriedade de ativos, e 15.2 bilhesemprstimos inter-companhia.

    Em termos do PIB, o Brasil tem um dos ndices mais baixos de IDE do mundo, abaixo damdia de outros pases em desenvolvimento e de outros da regio latino-americana. A figura 3mostra a mdia, para o perodo de 1990 a 2003, do IDE em termos de PIB para pases e grupos de pases selecionados. Tambm em termos de estoque, a relao IDE/PIB do Brasil ainda est abaixoda mdia dos pases em desenvolvimento, embora de maneira menos pronunciada do que para osfluxos, o que reflete os investimentos feitos por empresas como a Petrobras nas primeiras ondasde IDE de pases em desenvolvimento.

    Figura 3INVESTIMENTO DIRETO NO EXTERIOR (FLUXOS) COMO PORCENTAGEM DO PIB,

    MDIA 1990-2003

    0 0,5 1 1,5 2 2,5

    frica do Sul

    ndia

    Argentina

    Brasil

    Chile

    Colmbia

    Venezuela

    Mxico

    Amrica Latina e Caribe

    Pases em desenvolvimento

    Pases desenvolvidos

    Fonte: UNCTAD FDI Database.

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    O baixo volume, em termos relativos, do IBD em relao ao IDE de outros pases explicad por diversos fatores. Da Rocha (2003) menciona o fator geogrfico fronteiras marcadas poobstculos naturais a no ser no sul do pas; o fator lingstico so poucos os demais paseslusfonos; a questo da distncia cultural; e o ambiente macroeconmico. Iglesias e Veiga (2002que ressaltam que alm de pequeno em volume o IBD pouco diversificado, tambm chamam ateno para o ambiente macroeconmico que afetou a taxa de investimento global da economiareduziu a disponibilidade de capital e crdito e gerou incerteza sobre o futuro dos preos relativoComo mencionado acima, segundo os autores, a estabilizao a partir da segunda metade dos anonoventa no resolveu os problemas de financiamento, e o acesso ao mercado internaciona permaneceu restrito especialmente para as empresas menores. Iglesias e Veiga (2002) tambmressaltam o papel do perfil das exportaes brasileiras, concentradas em poucos produtoshomogneos, que dispensam investimentos em desenvolvimento de marca, controle de qualidade outros. De fato, alguns dos principais investimentos feitos em manufaturas dizem respeito a bens dcapital e bens intermedirios diferenciados ou bens de consumo, que levaram a investimentos emapoio a exportaes (trade and distribution ). Em setores como o de bens durveis, os baixos nveisde IBD esto associados alta participao do capital estrangeiro no Brasil (Coutinho, 2003). Umedio especial da Forbes Online sobre multinacionais brasileiras destacava os seguintes fatoresque explicariam em parte porque o IDE brasileiro relativamente pequeno: falta de uma polticoficial de crdito para financiar as operaes externas; razes estruturais (alto custo do capitalmenor capacidade de investimento, distncia dos principais eixos comerciais); razes histrica(protecionismo, dcadas de mercado fechado, sucesso de crises econmicas e cambiais e participao estatal da economia com incentivo ao investimento local); e culturais (falta de preparinternacional dos executivos, dificuldade com a lngua estrangeira, priorizao do curto prazocaracterstica de empresrios que operam em mercados instveis). A comparao com pases emdesenvolvimento de portes comparveis, como ndia e Mxico (ver figura 3) sugere que tamanho dmercado tambm influi negativamente no IBD como porcentagem do PIB.

    O Banco Central no divulga informaes sobre o destino setorial nem geogrfico dos fluxode IBD. No entanto, o censo de Capitais Brasileiros no Exterior (CBE), que computa os estoques dIBD, permite conhecer um pouco melhor a distribuio por pas e por setor de destino. O censo realizado por meio de declaraes eletrnicas obrigatrias para os residentes no Brasil quemantenham ativos em moeda, bens ou direitos no exterior de mais de 100.000 dlares. A granddeficincia dos resultados do censo para essa finalidade diz respeito s categorias caixa negra, ist, aos investimentos que vo, por um lado, aos centros financeiros do Caribe, e, por outro, aatividades como intermediao financeira e servios prestados principalmente s empresasrelacionados principalmente constituio deholdings . O destino final desses investimentos no pode ser identificado. Para 2004, 67% dos estoques de participao de capital estavam em jurisdies que funcionam como centros financeiros5 e, em termos de atividade produtiva, 88.9%estavam investidos em categorias de servios prestados principalmente s empresas,intermediao financeira e servios auxiliares. As figuras 4 e 5 mostram a distribuio geogrfica setorial, respectivamente, do estoque de IBD fora dessas categorias. As tabelas do Anexo 1 mostraos dados com maior detalhe.

    Mesmo excludas as jurisdies que funcionam tipicamente como centros financeiros, doisfatores impem cautela anlise da distribuio geogrfica do IBD. Por um lado, h jurisdiecomo Uruguai, Pases Baixos e alguns estados dos Estados Unidos, cuja legislao atraiinvestimentos por razes anlogas aos atrativos dos centros financeiros tradicionais. Por outro ladona figura 4 chama a ateno a importncia da Dinamarca como destino de IBD em participao dcapital. Esse dado ao menos em parte outra manifestao dos efeitos da transao mencionad

    5 Nesse caso, as jurisdies consideradas foram Antilhas Holandesas, Bahamas, Bermuda, Guernsey, Ilhas Cayman, LuxemburgIlhas Virgens Britnicas, Gibraltar, Liechtenstein.

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    acima envolvendo a AmBev e a Labatt, cuja controladora tinha sede na Dinamarca.6 Desconsiderados centros financeiros tradicionais, a Dinamarca, a Holanda e o Uruguai, os maioresreceptores de IBD brasileiro at o momento so Espanha, Estados Unidos, Argentina e Portugal. Adistribuio no surpreende: trata-se do maior mercado do hemisfrio e dos dois pases europeuscultural e linguisticamente mais prximos; e do vizinho e parceiro do Mercosul. No se pode perderde vista, no entanto, que essa distribuio refere-se a uma parcela muito pequena dos investimentostotais.

    O quadro 1 descreve o investimento brasileiro recente na Argentina.Figura 4

    DISTRIBUIO GEOGRFICA DO ESTOQUE DE IBD2004,

    Outros

    OutrosPortugal

    Pases Baixos(Holanda)

    Argentina

    Uruguai

    EstadosUnidos

    Espanha

    Dinamarca

    0%

    10%

    20%

    30%

    40%

    50%

    60%

    70%

    80%

    90%

    100%

    Participao de capital Emprstimos intercompanhia

    Fonte: Banco Central do Brasil, Capitais Brasileiros no Exterior.

    6 Ver Resultados do Primeiro Trimestre de 2005, AmBev.

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    Quadro 1INVESTIMENTO BRASILEIRO NA ARGENTINA

    Fontes : Seducidas por el riesgo Amrica Economa, 13 de janeiro 9 de fevereiro de 2006; Avanzadabrasilea en el mercado local, La Nacin, 20 de abril de 2005. La cerveza Quilmes ya pas a estartotalmente en manos brasileas, Clarn, 14 de abril de 2006; Maria Tereza Leme Fleury, AfonsoFleury, A Gesto por Competncias na Internacionalizao de Empresas, apresentao no V Workshopem Internacionalizao de Empresas COPPEAD/UFRJ, 25 de outubro de 2005.

    Os nmeros de fuses e aquisies transfronteiras realizadas por empresas brasileiras (tabel1) servem de indicador da distribuio geogrfica. Confirmam a importncia dos destinosmencionados acima, e ressaltam a predominncia de outros pases da Amrica Latina.

    Entre 1992 e 1996, o Brasil foi o terceiro maior investidor latino-americano na Argentina,depois do Chile e do Mxico, de acordo com dados do Centro de Estudos para a Produodo Ministrio da Indstria da Argentina (CEP, 1997). Segundo o CEP, os investimentosbrasileiros na Argentina nesse perodo teriam sido direcionados principalmente indstria,

    contrastando com o IBD a outros pases da regio. As principais transaes foram nossetores de bebidas e alimentos, txteis e automotriz (especialmente autopeas). O IBD na Argentina teve um aumento expressivo a partir da crise do final dos anos 90, incio dos anos2000, quando uma combinao de oportunidades na Argentina com a intensificao dosprocessos de internacionalizao de algumas das maiores empresas brasileiras levaram auma srie de aquisies de grande porte. Alm da proximidade geogrfica e da ligaoproporcionada pelo Mercosul, baixo preo dos ativos, menores custos de produo, taxa decmbio mais favorvel exportao para terceiros mercados, qualidade dos recursoshumanos e da atualizao tecnolgica.

    Entre as maiores aquisies feitas por empresas brasileiras na Argentina nos ltimosanos esto as seguintes:

    Entre 1992 e 1996, o Brasil foi o terceiro maior investidor latino-americano na Argentina,depois do

    a) compra da Swift Argentina pelo Grupo Friboi (transao que contou comfinanciamento pela linha de crdito especfica do BNDES ver abaixo), por US$ 200milhes (em 2005)

    b) compra da Loma Negra pela Camargo Corra por US$ 1,025 bilhes em abril de2005;

    c) compra do controle da Pecom pela Petrobras por US$ 1,126 bilhes em 2002;

    d) aquisio pela AmBev entre 2002 e 2006, do controle da Quilmes, por um valor totalprximo a US$ 1,8 bilhes.

    Um fator que tem sido ressaltado a capacidade dos empresrios brasileiros deaproveitarem as oportunidades geradas, dada sua familiaridade com ambientes de altorisco. Saber operar em contextos imprevisveis e turbulentos seria uma competnciadistintiva das empresas brasileiras no cenrio internacional (Fleury e Fleury, 2005; AmricaEconoma, 2006).

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    Tabela 1DISTRIBUIO GEOGRFICA DE FUSES E AQUISIES TRANSFRONTEIRAS REALIZADAS POR

    EMPRESAS BRASILEIRAS, 1995-2004 (NMERO DE TRANSAES)Pas 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 1995-

    2004Total 14 6 4 13 11 10 8 6 8 10 90Pases desenvolvidos 3 2 1 5 3 3 5 - 4 3 29Estados Unidos - - - 2 1 1 2 - 1 1 8Portugal - 1 - - - - 1 - 1 1 4Espanha - - - 1 2 1 - - - - 4Canad 1 - - - - 1 1 - - 1 4Reino Unido - 1 - 2 - - - - - - 3Pases em desenvolvimento 11 4 3 8 8 7 3 6 4 7 61

    Argentina 4 1 3 6 3 5 2 5 2 1 32Colmbia 1 - - 1 - - - - - 2 4Peru 2 - - - - - - - - 2 4Venezuela 1 2 - 1 - - - - - - 4Bolvia 1 - - - 1 1 - - - - 3

    Fonte : UNCTAD, base de dados sobre fuses e aquisies, divulgado em Sauvant, 2005.

    No que diz respeito distribuio setorial, no perodo de 2001 a 2004, investimentos destionadosa servios prestados principalmente s empresas, intermediao financeira, exclusive seguros e previdncia privada e atividades auxiliares da intermediao financeira corresponderam a entre 82%e 89% dos investimentos totais registrados pelo CBE. Aproximadamente 4%, consistentemente aolongo do perodo, foram destinados a comrcio por atacado e intermedirios do comrcio, traduzindoa importncia, no IBD, das operaes de apoio s exportaes. A figura 5 mostra a distribuio setorialdos investimentos no destinados aos setores mencionados, com a ressalva de que esses investimentoscujo setor e/ou atividade so identificveis por meio do censo correspondem a entre 7 e 13% dosinvestimentos totais realizados em cada ano.

    Figura 5DISTRIBUIO SETORIAL DO IBD EXCLUINDO ATIVIDADES FINANCEIRAS E

    RELACIONADAS, 2001-2004

    0%10%20%30%40%50%60%70%80%90%

    100%

    2001 2002 2003 2004

    Extrao e processamento depetrleo

    Construo

    Fabricao de produtos de metal

    Fabricao de artigos de borrachae plstico

    Extrao de minerais metlicos

    Agricultura, pecuria e serviosrelacionados

    Outros

    Fonte: Banco Central do Brasil, Capitais Brasileiros no Exterior.

    Dentro do estoque de IBD cujo destino setorial identificvel, aprecia-se a importncia dossetores de petrleo e construo, e a crescente importncia do setor de metais e de minerao, querefletem experincias de algumas das principais empresas brasileiras, descritas abaixo.

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    Tabela 2DISTRIBUIO SETORIAL DAS FUSES E AQUISIES TRANSFRONTEIRAS

    REALIZADAS POR EMPRESAS BRASILEIRAS, 1995- 2004(Nmero de transae s )

    Setor Nmero de transaesTotal 90

    Primrio 4Minerao 3

    Agricultura, silvicultura, pesca 1Manufaturas 53 Alimentos, bebidas e tabaco 12Metais e produtos de metal 12Petrleo e gs, refino de petrleo 7Qumica e petroqumica 6

    Servios 33Financeiros 10Comrcio 7

    Transporte, armazenagem, comunicaes 7Servios corporativos 7

    Fonte: adaptado de Sauvant (2005), com base em dados da base de fuses e aquisies daUNCTAD.

    Tabela 3MAIORES PROJETOSGREENFIELD REALIZADOS NO EXTERIOR POR EMPRESAS

    BRASILEIRAS, 2002-2004(MILHES DE US$)

    Empresa Valor Ano Pas de destino SetorPetrobras 1 300 2003 Venezuela Energia, petrleo e gsSondotecnica 1 000 2003 Portugal QumicaPetrobras 600 2002 Bolvia Energia, petrleo e gsPetrobras 400 2002 Bolvia Energia, petrleo e gsCompanhia Siderurgica Nacional 375 2004 Portugal Metais/mineraoSigma Pharma 359 2004 Portugal FarmacuticaOdebrecht 320 2003 Equador Energia, petrleo e gsPetrobras 285 2004 Argentina Energia, petrleo e gsPetrobras 200 2004 Argentina Energia, petrleo e gsMister Sheik 175 2002 Argentina RestauraoPetrobras 60 2004 Peru Energia, petrleo e gs

    Ambev 50 2003 Guatemala Alimentos e bebidasPetrobras 50 2002 Bolvia Energia, petrleo e gsRima Industrial 45 2002 Uruguai Metais/minerao

    Ambev 40 2003 Peru Alimentos e bebidas Ambev 40 2004 Peru Alimentos e bebidasMaritima 40 2002 Colmbia Energia, petrleo e gsCVRD 36 2003 Noruega Metais/mineraoPetrobras 35 2003 Argentina Energia, petrleo e gsPetrobras 34 2004 Ir Energia, petrleo e gs

    Fonte: adaptado de Sauvant (2005), com base em dados da OCO Consulting (www.locomonitor.com).

    As tabelas 2 e 3, que mostram a distribuio dos investimentos em projetos greenfield e emfuses e aquisies, respectivamente, oferecem um complemento aos dados do CBE. A primeira referse ao perodo 1995-2004; a segunda ao perodo 2002-2004.

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    Apesar desses indicadores, a hermeticidade dos dados sobre a grande maioria dos fluxos eestoque de IBD refora a importncia das experincias dos principais investidores brasileiros no exteriorcomo instrumento para a compreenso do fenmeno. Dessas trata a seo seguinte.

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    IV. A experincia de empresasbrasileiras com investimentosdiretos no exterior:caractersticas gerais e casosselecionados

    A. Caractersticas gerais

    Em 1994, havia seis empresas brasileiras (Souza Cruz,Petrobras, Sadia, Brahma, Usiminas, Aracruz Celulose) entre as50 maiores empresas transnacionais no financeiras de pases emdesenvolvimento, classificadas por seus ativos no exterior (veranexo 2) (UNCTAD, 1995). Em 2003, eram apenas trs: Petrobras,CVRD e Gerdau (UNCTAD, 2005). De acordo com dados tambm daUNCTAD, o grau de transnacionalidade (isto , a mdia da proporode ativos, emprego e vendas no exterior em relao a ativos, emprego,e vendas totais) das empresas brasileiras relativamente baixo,variando de 7% em 1995 a 15% em 2002, com um mximo de 19% em1999. A mdia para as 100 maiores transnacionais do mundo variouentre 51% e 58%, e a mdia das 50 maiores transnacionais de pasesem desenvolvimento variou de 32% a 49% (Sauvant, 2005). Assim,alm de comparativamente baixo em relao ao PIB, a timidez do IDE brasileiro se v tambm na presena internacional de suas grandesempresas.

    A tabela 4 apresenta um panorama das maiores empresas brasileiras com ativos produtivono exterior, classificadas por ordem de vendas em 2005. Antes de analisar as principais

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    caractersticas desse grupo de empresas, importante fazer algumas ressalvas. Em primeiro lugar, afalta de informaes pblicas sobre o volume de ativos no exterior impede a elaborao de umaclassificao confivel dos maiores investidores brasileiros. Assim, a lista da tabela 4 contmempresas que so grandes no Brasil e que tm algum investimento produtivo no exterior, ainda queseja pequeno em relao ao total de ativos. A presena produtiva internacional da Gerdau, porexemplo, muito superior da empresa siderrgica que a segue quase imediatamente na lista, aUsiminas. A lista no contempla, por outro lado, grandes empresas exportadoras que no tmoperaes produtivas no exterior. Exclui, por exemplo a Sadia, uma das empresas maisfrequentemente citadas como multinacional brasileira, mas cujos investimentos no exterior soessencialmente de distribuio. Finalmente, incluiu-se nessa lista algumas empresas de origem brasileira, com investimentos no exterior, que hoje fazem parte de grupos transnacionais, como ocaso da AmBev e da Embraco; e a Belgo-Mineira (hoje parte da Arcelor Brasil), uma empresa que parte de grupos transnacionais praticamente a partir de suas origens, mas que, como subsidiria brasileira, se internacionalizou. Vrias das outras empresas dessas listas, como Embraer e Usiminas,contam com participao minoritria de capital estrangeiro.

    Esses ltimos ponto refletem a dificuldade ou, melhor dizendo, a diversidade de maneiras -de se definir a nacionalidade de uma empresa. Alguns critrios possveis so a nacionalidade do

    capital controlador, o pas em que a empresa se estabeleceu legalmente, ou o de sua sede. Optar porqualquer dessas definies significa deixar de lado casos importantes de empresas de determinado pas que transferiram sua sede ou lanaram aes em bolsas de valores de outros pases, sosubsidirias de grupos internacionais apesar de terem origem nacional, vnculos estreitos com aeconomia nacional e caractersticas de empresa nacional, ou so controladas por investidoresfinanceiros de outros mercados (Golstein e Miroux, 2006). Optou-se, aqui, por uma definioampla, sem a pretenso, contudo, de se fazer uma anlise exaustiva, e conscientemente excluindogrupos como as PMEs, que merecem anlise especfica.

    A primeira constatao que se faz a partir dessa tabela a importncia das empresas derecursos naturais, Petrobras e Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e de materiais bsicos, comoao, cimento, papel e celulose. Em segundo lugar, nota-se a importncia de empresas estatais(a Petrobras) e ex-estatais (CVRD, Usiminas, CSN, Embraer). Nenhum dos dois aspectos surpreendente, dada a estrutura produtiva, as vantagens comparativas do pas e a histria de seudesenvolvimento industrial, em que o Estado teve forte participao principalmente at os anosnoventa, A terceira constatao que, conforme o padro identificado para as transnacionais latino-americanas em geral, onde se trata de produtos primrios e produtos ou servios intermedirios, osinvestimentos so feitos em nvel global e, quando se trata de investimentos em bens e servios deconsumo de massa, so mais freqentes os investimentos em nvel regional. No Brasil mais do queem outros pases da regio, as maiores empresas com investimentos no exterior esto maisconcentradas em bens e servios intermedirios do que em bens e servios de consumo de massa.

    No primeiro grupo, a localizao dos investimentos definida pela presena de recursosnaturais no caso de empresas que investem na extrao de petrleo ou minerais; ou pela necessidadede proximidade a grandes clientes, com os quais as empresas frequentemente j tm relaocomercial por meio de exportaes (por exemplo no caso da siderurgia) ou de fornecimento soperaes de subsidirias no pas de origem (por exemplo no caso das autopeas).

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    Tabela 4PRINCIPAIS EMPRESAS BRASILEIRAS COM INVESTIMENTOS PRODUTIVOS NO EXTERIOR 2004- 2005

    (M ilhes de dlares)Empresa Distribuio geogrfica dos

    investimentosa Setor Vendas

    totais(milhesde US$)(2005)

    AL AN EU AP OT

    Petrobras Petrleo 58 360,8 X X X X XCVRD Minerao 14 522,5 X X X X XGerdau Siderurgia 9 076,7 X X XUsiminas Siderurgia 5 571,3 X

    AmBev Bebidas 6 817,9 X XBelgo-Mineira Siderurgia 4 596,1 XCSN Siderurgia 4 288,3 X XEmbraer Aeronaves 3 902,0 X X XNorberto Odebrecht Engenharia e construo 2 723,9 X X X X XVotorantim Cimentos Cimento 2 021,5 XTAM Transporte areo 2 413,3 XKlabin Papel e celulose 1 156,2 XWeg Bens de capital 1 074,4 X X XEmbraco Componentes para

    eletrodomsticos860,7 X X X X

    Marcopolo Carrocerias para nibus 730,2 X X X X Andrade Gutierrez Construo Engenharia e construo 622,0 b X X X XCamargo Correa Cimentos Cimento 446,6 XQueiroz Galvo Engenharia e construo NDc XTigre Tubos e conexes ND X XSab Autopeas ND X X X

    Fonte: adaptado de CEPAL (2006) e atualizado com dados fornecidos pela revista Amrica Economa.a AL: Amrica Latina e Caribe; AN: Amrica do Norte; AP: sia e Pacfico; EU: Europa, OT: Outros.b Dado para 2004.c No disponvel.

    No grupo de bens de consumo de massa, so fatores determinantes do xito a capacidade ddiferenciao de produtos, penetrao da marca e de distribuio, muitas vezes em situae

    precrias de infra-estrutura. As empresas latino-americanas parecem ter vantagens em relao players transnacionais quando se trata de conquistar outro mercado latino-americano. Uma fonte devantagens parece ser a proximidade cultural, que permite compreender e conhecer os padres dconsumo locais. Outra diz respeito habilidade de funcionar em ambientes de alto risco commencionado acima, em contextos imprevisveis e turbulentos (Fleury e Fleury, 2005) e de precariedade institucional e de infra-estrutura. Esse tipo de vantagem tem sido destacado em relaa transnacionais de outros pases em desenvolvimento (Khanna e Palepu, 2005, por exemplo).7

    Essa concentrao fortemente regional dos investimentos em bens e servios de consumo dmassa pode indicar um processo incipiente de internacionalizao. No entanto, a vantagem de sabelidar com as idiossincrasias latino-americanas tambm parece ser tambm um ativo vulnervecomo mostram a incorporao de gigantes latino-americanos como a AmBev e a colombianBavaria a grupos transnacionais.

    7 Os autores sustentam que a necessidade de aprender a superar vcuos institucionais, definidos como a ausncia ou mafuncionamento das instncias intermedirias necessrias para aproximar vendedores de compradores em mercados em pases emdesenvolvimento confere s empresas desses pases vantagens em outros mercados.

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    B. Casos selecionados

    Os prximos pargrafos descrevem brevemente a experincia recente de empresas brasileiras

    nas seguintes categorias: recursos naturais; siderurgia; conglomerados; manufaturas intensivas emtecnologia (motores, nibus, avies); e bebidas. O objetivo desses relatos , ao oferecer um panorama dos investimentos pelas maiores empresas do pas, tornar mais concreta a discussodesenvolvida nas sees seguintes sobre os impactos do IBD e as questes que se impem aosformuladores de polticas pblicas.8

    a) Petrleo e minerao: guinadas nas estratgias da Petrobras e da CVRDA internacionalizao produtiva foi instrumento chave nas transformaes pelas quais

    passaram Petrobras e CVRD a partir da segunda metade dos anos noventa. Ambas, mas principalmente a Petrobras, tinham investido no exterior antes dos anos noventa, mas a partir deento, como reao a transformaes no mercado global para seus respectivos produtos e nos paradigmas de propriedade estatal e regulao no mercado interno, tiveram que renovar-se e com

    isso rever a forma em que a internacionalizao poderia contribuir para seus objetivos estratgicos. b) Alguns dos principais fatores por trs da reorientao estratgica da Petrobras foram: (i)

    maior disponibilidade de reservas em territrio nacional, fruto de investimentos em explorao,inclusive em guas profundas; (ii) um contexto de desregulamentao que desafiava a hegemonia daPetrobras em diversos segmentos do mercado nacional; e (iii) o desenvolvimento do qual aempresa foi agente de um mercado para o gs natural. Em sua estratgia de internacionalizao, aempresa passou do objetivo de garantir fontes de abastecimento em recursos naturais para omercado nacional (o principal objetivo dos investimentos da Petrobras no exterior nos anos setenta)a, crescentemente, buscar novos mercados e a integrao vertical, embora a explorao e produocontinuasse absorvendo grande parte de seus investimentos no exterior. Num primeiro momento, osfocos dos investimentosdownstream foram a Argentina onde a empresa comprou a Santa F, aPrez Companc, e realizou uma permuta de ativos com a Repsol YPF e a Bolvia. Maisrecentemente, e com patamares de produo de petrleo bruto muito superiores aos quedeterminaram os primeiros investimentos da empresa no exterior, a Petrobras passou a investir emcapacidade de refino nos Estados Unidos, e a reforar sua presena nos mercados de distribuio naAmrica Latina (comprando os ativos da Shell no Uruguai, na Colmbia e no Paraguai).9 Segundo oPlano de Negcios 2007-2011, que prev 12 bilhes de dlares de investimento no exterior nesse perodo, a estratgia atual de internacionalizao da Petrobras tem trs componentes:

    c) Estabelecer-se como empresa de energia integrada lder na Amrica Latina;(ii) agregar valor s exportaes do leo pesado brasileiro; e (iii) aplicar tecnologia de perfuraoem guas profundas na frica e no Golfo do Mxico. Entre os motivadores para ainternacionalizao da Petrobras esto (i) diversificar carteira; (ii) reduzir custo de capital;(iii) gerar fluxo de caixa em moeda forte; (iv) processar leo da Petrobras no exterior;

    (v) aproveitar expertise tecnolgica em lugares com perfil geolgico semelhante; (vi) aberturade novos mercados aos produtos brasileiros e (vii) contribuir para o crescimento e rentabilidadeda Petrobras (Petrobras, 2006a, b).

    Em um processo de certa forma inverso, a CVRD, depois de ter realizado investimentos em processamento de minrios na Europa, nos Estados Unidos e no Oriente Mdio passou,especialmente a partir de 2001, a se concentrar em seucore business , a minerao, e seusinvestimentos no exterior tm sido crescentemente de busca de recursos naturais. A empresa, uma

    8 A no ser onde expressamente especificado, a fonte para essas informaes so relatrios anuais e pginas web das empresas.9 Em 21 de junho a Petrobras anunciou a sada do segmento de distribuio de combustveis na Bolvia (Gazeta Mercantil , 2006).

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    das lderes no mercado mundial de minrios, tem como parmetros competitivos outras gigantetransnacionais, mais diversificadas tanto em termos geogrficos quanto de produto. Por meio dnovos investimentos em diversos continentes, a CVRD no s tem diversificado a localizao dseus ativos mas tambm seu portfolio de produtos, adotando uma visomulticommodities . Aempresa tem investido na explorao e produo de cobre e ouro no Chile e no Peru, mangans outros minerais no-ferrosos no Gabo, minerais no-ferrosos na Monglia, carvo emMoambique, entre outros. Em 2005, 37% do oramento da empresa para pesquisa edesenvolvimento estava destinado ao exterior (De Paula, 2005). Os motivadores para a estratgiatual de internacionalizao da CVRD so (i) ampliao da fronteira de crescimento(ii) competio com principais players mundiais; (iii) diversificao de risco; e (iv) reduo dcusto de capital (CVRD, 2006).

    d) SiderurgiaUm fator que parece ter infludo negativamente no grau de internacionalizao das

    siderrgicas brasileiras o fato de que o pas foi um dos primeiros a abrir o setor ao capitalestrangeiro. A Arbed adquiriu participao na Belgo-Mineira em 1921. A Mannesman iniciou produo de ao no pas em 1952 e Nippon Steel, Kawasaki e Finsider foram parceiros do Estadna Usiminas a partir de 1956 e na CST a partir de 1976. Hoje, pode-se argumentar que a presenda Nippon Steel na Usiminas e da Arcelor na Belgo-Mineira (agora Arcelor Brasil) limitam escopo da internacionalizao produtiva dessas empresas (De Paula, 2005b). Com efeito, aoperaes internacionais da Usiminas limitam-se a participaes minoritrias em empreendimentooperados pelo Grupo Techint, nos quais a Usiminas tem um papel de aportador de tecnologia. ABelgo-Mineira, por outro lado, praticamente restringiu-se Argentina.10 Sua principal operao forado Brasil a da Acindar, em que adquiriu partipao em outubro de 2000. Ao longo dos anosrealizou investimentos adicionais nessa mesma empresa e adquiriu, por seu intermdio, aLaminadora Fortunato Bonelli. Em 2005 anunciou a inteno de alienar alguns dos seus ativoargentinos, especialmente relacionados produo de tubos.

    O capital estrangeiro chegou tarde, no entanto, ao ciclo de privatizaes da indstriasiderrgica nos ano noventa, do qual a CSN foi objeto e a Gerdau sujeito. As experincias deinternacionalizao dessas duas empresas foram impulsionadas por fatores comuns, emborfrequentemente de maneiras muito diferentes. Para ambas, foi significativo o movimento deconsolidao que se dava na indstria siderrgica em nvel mundial, e que criava presso potamanho. Ao mesmo tempo, tanto no Brasil como em outro pases, a intensificao da poltica dconcorrncia contribua para que esse crescimento fosse feito internacionalmente, e abriaoportunidades para operaes transfronteiras. A Gerdau sentiu esse ltimo fator sob a forma dresistncia por parte das autoridades de defesa da concorrncia em aprovar, j em 1994, a aquisida Pains. Embora isso no tenha impedido novas e importantes aquisies pela Gerdau no Brasinos anos seguintes (e a aquisio da Pains foi eventualmente aprovada), contribuiu para intensificaa importncia da produo no exterior em sua estratgia futura de crescimento. A CSN, por outrlado, e quase uma dcada depois, teve numa restrio imposta pela Comisso Europia fusArbed-Aceralia-Usinor uma oportunidade de investir na Europa. Em 2003 comprou, em Portuga50% da Lusosider, que opera em parceria com a Corus, detentora dos 50% restantes. Assim comoaquisio da Heartland Steel, nos Estados Unidos, a Lusosider opera como finishing facility , processando ao bruto. Permite CSN diversificar sua produo e agregar valor s exportaes.

    As duas operaes internacionais da CSN so ao menos em parte motivadas pelo fato de quea aplicao de direitos antidumping, salvaguardas e direitos compensatrios ainda sodesproporcionalmente altos nesse setor (De Paula, 2005b) e especialmente nos segmentos de maiovalor agregado. Por meio de suas operaes nos Estados Unidos e em Portugal, a empresa consegu

    10 Em junho de 2000 a empresa adquiriu uma fbrica de arames, com ativos no Canad, Chile e Peru. Tratava-se, no entanto, de um parte pouco representativa da estrutura da empresa.

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    garantir mercados para a produo brasileira de fornece placas e bobinas laminadas a quente, com avantagem do baixo custo de produo no Brasil, e ao mesmo tempo operar como player local(passando por cima de barreiras comerciais) nos segmentos de maior valor agregado. As operaestambm permitem atender de maneira mais eficiente aos clientes nesses mercados.

    A expanso produtiva da Gerdau a mais significativa entre as siderrgicas brasileiras. Em

    geral seguiu um padro pelo qual a empresa entrava nos mercados por meio de exportaes elentamente as substituiu, pelo menos parcialmente, por meio da produo local. Foi um processogradual que iniciou com pequenas operaes conservadoras, como a aquisio da LAISA noUruguay em 1980, cresceu em complexidade e abrangncia ao longo do tempo. Entre 1989 e 1998 aempresa realizou diversas aquisies no Cone Sul Argentina, Chile y Uruguay e no Canad.Em 1997 fez uma importante aquisio na Argentina. Em 1999, voltou-se ao mercado os EstadosUnidos, comprando 75% da AmeriSteel e, por meio dessa, da Birmingham Southeast. Em 2002fundiu suas operaes na Amrica do Norte e subsequentemente aumentou sua participao naempresa resultante e comprou participao na North Star Steel. Tambm ampliou sua participaona Amrica Latina por meio de investimentos na Colmbia e no Chile. Em janeiro de 2006, voltou-se para a Europa, onde comprou a espanhola Sidenor, por meio da qual tambm adquiriu 58% daAos Villares, no Brasil.

    e) Os conglomerados: diferentes padres de diversificaoOs principais conglomerados brasileiros adotaram estratgias diferentes de crescimento, com

    combinaes e intensidades diferentes de diversificao setorial, integrao vertical, einternacionalizao (Camargo Corra, 2006). Odebrecht e Andrade Gutierrez se diversificaramsetorialmente no Brasil, mas se internacionalizaram essencialmente no setor de engenharia econstruo. O fizeram de forma que o setor externo viesse a representar grande parte de suasreceitas. Os processos de internacionalizao da Votorantim e Camargo Corra so mais recentes eainda menos expressivos, mas mais diversificados em termos setoriais. Para ambas, o setor decimento um dos eixos da internacionalizao.

    Embora Camargo Corra e Queiroz Galvo tambm tenham se internacionalizado nasatividades de engenharia e construo, as empresas brasileiras mais internacionalizadas nesse setor

    so a Odebrecht e a Andrade Gutierrez, que ocupam os lugares 21 e 91, respectivamente, do rankingmundial de empreiteiras internacionais do Engineering News Record (ENR) para 2006 (ENR,2006).

    O primeiro grande projeto da Odebrecht for a do pas foi uma planta hidreltrica no Peru,iniciada em 1979. A empresa teve importante participao em servios relacionados explorao e produo de petrleo em diversas regies do mundo, incluindo frica e ndia, a partir dos anosoitenta. Em 19888 a empresa adquiriu a empresa Jos Bento Pedroso & Filhos em Portugal, pasonde realizou importantes obras e onde participa em concesses de servios pblicos. Um processoslido de internacionalizao comeou nos anos noventa. O primeiro contrato nos Estados Unidosveio em 1991 e foi seguido por vrios outros, que hoje levam a uma receita acumulada de1.6 bilhes de dlares nesse pas. O primeiro contrato no Oriente Mdio ocorreu no incio dos anos2000. Ao longo dos anos noventa, a empresa desenvolveu uma carteira de obras que iam desdeshoppings a plantas hidreltricas em diversos pases da Amrica Latina. Hoje, aproximadamente umtero dos empregados da Odebrecht Engenharia e Construo, e 75% de sua receita acumulada,esto ou provm do exterior (CEPAL, 2006; Odebrecht, 2006).

    O primeiro contrato internacional da Andrade Gutierrez foi no Congo em 1983. Hoje 60%das receitas da empresa so realizadas fora do Brasil. Em 1988 a empresa adquiriu a Zagope, emPortugal, por meio da qual tem realizado importantes obras naquele pas e na frica, alm de participar, como a Odebrecht, em concesses de servios pblicos. A empresa tambm temreforado sua atuao na Amrica Latina.

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    A internacionalizao do grupo Votorantim comeou pela rea de cimentos. Em 2001 aVotorantim Cimentos comprou a St. Marys Cement Inc., no Canad, por US$ 680 milhes. A StMarys era uma das principais produtoras de cemento e outros materiais de construo, fornecend principalmente para os mercados do Canad e dos Estados Unidos. Em 2003, a empresa adquiri50% da Suwannee American Cement, com sede na Flrida. Em seguida, a Votorantim adquiriu dua plantas da Cemex nos Estados Unidos. Um dos principais motivos da internacionalizao na rea dcimentos era diversificar mercados e reduzir custos de capital (New York Times, 2004). Desdeento, alm de outros investimentos em cimento, inclusive na Bolvia, o grupo Votorantim investiuem um projeto de minerao de zinco no Peru, por meio de participao em uma empresa qudispe tambm de uma carteira ampla de prospeco para a minerao de outros metaisA empresa dispe tambm de terminais porturios na Blgica e na Austrlia.

    Comparada com os demais conglomerados, a estratgia de crescimento do grupo CamargoCorra envolve relativamente maior diversificao de negcios e menor internacionalizao integrao vertical (Camargo Corra, 2006). O grupo iniciou a produo internacional no setotxtil por meio do controle da Santista Txtil, que em 1995 adquiriu a empresa Grafa S.A. nArgentina. Em 1999 comprou, por meio da Grafa, a Machasa S.A. no Chile. As operaes dSantista Txtil no Chile se beneficiam de melhor acesso a mercado proporcionado pelos acordos d

    livre comrcio desse pas com os Estados Unidos e a Unio Europia. O Acordo de Livre Comrcida Amrica Central e Repblica Dominicana com os Estados Unidos (CAFTA) dever motivainvestimentos da Santista nessa regio (Santista Txtil, 2005). Em 2006, a Santista Txtil fofusionada com a empresa espanhola Tavex, de ativos e funes complementares. Uma dasmotivaes, do ponto de vista da Santista Txtil, para essa operao foram os ganhos em termos dmenor custo de capital, maior acesso a financiamento e menor risco-pas proporcionados pelo fatde a matriz estar sediada na Espanha (Camargo Corra, 2006).

    No setor de cimentos, a Camargo Corra adquiriu, em abril de 2005, a argentina Loma Negramaior produtor de cimento do pas, por aproximadamente US$ 1 bilho, como mencionado nquadro 1 acima. Por meio dessa empresa, a Camargo Corra dobrou sua capacidade de produo dcimentos. A estratgia da Camargo Corra nessa operao parece ser motivada por uma lgicdiferente da da Votorantim (que investiu inicialmente nos mercados mais estveis da Amrica do Norte). A Camargo Corra apostou no dinamismo do mercado argentino aps anos de recesso. Nentanto, reduzir a dependncia do ciclo econmico brasileiro, e a possibilidade de queda do risc pas, estiveram igualmente por trs do que foi o incio da internacionalizao no grupo nesssegmento. Assim como suas congneres, a Camargo Corra tem investido em concessesrodovirias e construo principalmente na Amrica Latina e frica, regies prximasculturalmente. O carter de regies em desenvolvimento oferece grandes oportunidades de expanse a perspectiva de maiores margens de lucro que compensariam os maiores riscos associado(Camargo Corra, 2006).

    f) Manufaturas intensivas em engenharia: Weg, Marcopolo, EmbraerApesar da diversidade de porte, estrutura, produto e origens da Weg, Marcopolo e Embraer

    um panorama da experincia dessas trs empresas permite identificar fatores comuns de afetam

    definem suas estratgias: as barreiras comerciais e necessidade de diversificar riscos.O principal produto da Weg so motores eltricos para a indstria. Durante grande parte da

    histria da empresa, o produto era padronizado e o mercado internacional atendido por meio dexportaes. Fornecia um produto simples, confivel, de baixo custo. Em 1999 tinha 79% domercado brasileiro e exportava 29% de sua produo. Tinha filiais comerciais na Europa, sia Estados Unidos, estabelecidas entre o final dos anos 70 e os anos 80. Diferentemente de outraempresas brasileiras, a Weg teve desde cedo uma estratgia de exportaes, no sentido de que nse limitava a exportar excedentes. Isso lhe permitiu um gradual processo de conhecimento de outromercados. Uma das razes principais de levar as atividades produtivas ao exterior foi diminuir

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    risco associado instabilidade da economia brasileira. Como a empresa dependia de um nico produto e concentrava a maioria de suas vendas no mercado domstico, buscou crescer maisfortemente fora do pas do que dentro. A produo no exterior permitiu a diversificao de produtose o desenvolvimento de modelos menos padronizados e mais especficos s necessidades dosgrandes produtores de mquinas.

    A internacionalizao produtiva da WEG comeou em 1994 por meio de um acordo com aCorradi, na poca lder em motores eltricos na Argentina. Se intensificou a partir de 2000, com aaquisio da Morbe, fabricante de motores para eletrodomsticos, seguida pela da Intermatic,tambm na Argentina. Em 2000 a Weg adquiriu a diviso de motores eltricos da ABB, na Cidadedo Mxico. As operaes no Mxico se expandiram com a aquisio da diviso de motores daMABE em 2002 e com a inaugurao de uma nova planta em 2005. Em 2006 comprou 30% damexicana Voltran e criou uma empresa de comercializao de transformadores. O incio da produo na Europa deu-se com a aquisio, em 2002, da Efacec Universal Motors, el fabricantelder de motores en Portugal. Em 2005, a Weg inaugurou uma fbrica na China. Um dos principaisfatores por trs dessa intensificao da produo internacional reduzir o risco cambial (afirmaodo Diretor de Relaes com Investidores para Valor, 2006). Esse fator tambm de extremarelevncia para a atual estratgia de internacionalizao da Marcopolo.

    A Marcopolo responsvel por mais da metade dos nibus produzidos no Brasil, e exporta amais de 60 pases. Nos anos noventa, comeou a estabelecer operaes de montagem fora do Brasil,o que permitia evitar os altos custos de transporte do produto montado, especialmente para destinosalm-mar. Em 1990 estabeleceu uma planta em Portugal para atender ao mercado europeu. Em1997, comeou a produzir na Argentina. Essa operao, que chegou a produzir 100 unidades aoms, sofreu severamente os efeitos da crise argentina e suspendeu a produo at 2005. Em 2000 aMarcopolo estabeleceu uma operao no Mxico, que evoluiu para uma joint venture com aDaimler-Chrysler. En 2001, se estabeleceram plantas na Colmbia e na frica do Sul. A partir de2005, a apreciao do Real afetou negativamente a competitividade das operaes no exterior, baseadas em exportaes de peas e partes produzidas no Brasil. A empresa comeou, ento, amodificar sua estratgia, para depender cada vez menos da exportao de peas do Brasil, econcentrar-se cada vez mais na produo nos mercados de destino.

    A Embraer se destaca, entre as multinacionais brasileiras em manufaturas intensivas emengenharia, por estar entre as maiores players mundiais em seu produto. Atualmente a empresa amaior fabricante mundial de avies comerciais de menos de 110 assentos. A histria de apoio estatalno apenas na propriedade da empresa mas no investimento em pesquisa e desenvolvimentotecnolgico ao longo de vrias dcadas; e as transformaes da empresa aps sua privatizao, em1994, definem sua trajetria de xito. As vendas da Embraer so essencialmente exportaes feitas a partir do Brasil, embora grande parte dos componentes dos avies sejam fabricados fora do pas.Seus primeiros investimentos fora do Brasil foram em ativos de suporte tcnico e comercial nosEstados Unidos e Europa. No incio da dcada de 2000, a empresa iniciou uma nova fase em suaexpanso internacional, com o objetivo de expandir sua presena nos mercados da China, EstadosUnidos e Europa. Barreiras tarifrias e exigncias de contedo local especialmente nas licitaes para fornecimento de equipamento militar motivaram a expanso da produo fora do Brasil. Em2002 a empresa estabeleceu uma joint venture com a empresa AVIC II, para produzir o avio ERJ-145 na China, criando-se a Harbin Embraer Aircraft Industry (HEAI). A HEAI produz algunscomponentes e realizaria operaes de montagem. Parte desses investimentos foi motivada pelasaltas barreiras tarifrias e a condies impostas para a compra de avies da empresa. Ainda em2002, a Embraer realizou investimentos em manuteno e outros servios em Nashville, nosEstados Unidos. Em 2004 estabeleceu uma operao de montagem na Flrida, o que lhe permitiu participar de licitaes realizadas pelo setor militar dos Estados Unidos. Tambm em 2004 adquiruem Portugal a OGMA Indstria Aeronutica de Portugal S.A., uma ex-estatal portuguesa dedicada manuteno de avies (CEPAL, 2006, Goldstein, 2005; 2002).

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    g) Bebidas: AmBev, a multinacional verde e amarela?Antes da fuso da Brahma e da Antrtica em 1999, a primeira havia realizado investimento

    na Argentina (Compaa Cervecera Brahma Argentina e Maltera Pampa) e na Venezuela(Compaa Cervecera Nacional). Mas o verdadeiro impulso internacionalizao veio com a fusem 1999. A expanso internacional da AmBev comeu no Cone Sul, com duas operaes n

    Uruguay em 2000: a aquisio, em parceria com a Danone, de participao na Salus; e a aquiside 95.4% da Cervecera y Malteria Paysand S.A. (Cympay). Em 2001, adquiriu a CervecerInternacional no Paraguai. Em 2002 entrou em uma aliana estratgica com a Quilmes, naArgentina. Ao longo dos anos a AmBev adquiriu o controle da Quilmes.

    Em paralelo internacionalizao no segmento de cervejas, a AmBev realizou investimentona distribuio de refrigerantes, em parceria com a PepsiCo, o que permitia empresa gerasinergias na distribuio de cervejas e refrigerantes. Em 2002 a empresa voltou-se para a AmricCentral, iniciando uma joint venture com a Central American Bottling Corporation (CabCorp),distribuidora da PepsiCo, para produzir cerveja na Guatemala e atender a regio. Em 2004 a AmBeadquiriu 51% da Embotelladora Dominicana (Embodom), maior engarrafadora PepsiCo naRepblica Dominicana, com planos de construir uma nova cervejaria. Finalmente, em 2003, empresa entrou na regio andina por meio da construo de uma planta e da compra de ativos nPeru e no Ecuador. Em 2004, a AmBev adquiriu a Labatt Brewing Company Ltd, do Canad, jcomo parte da operao que levaria unio da AmBev com a Interbrew, da Blgica, para formar InBev. A operao dava AmBev 42% do mercado canadense, uma plataforma de exportaes paro mercado dos Estados Unidos e acesso a capital a custos mais baixos. Tudo isso, no entanto, agorno mbito da InBev (Wilkinson, 2004).

    Longe de representar o universo de empresas brasileiras que investem no exterior, aexperincia daquelas mencionadas acima, que esto entre as maiores investidoras, servem dilustrao para tornar menos abstratas as consideraes que sero feitas a seguir. Apesar dadiversidade das experincias, permitem afirmar que fatores chave na internacionalizao produtivdessas empresas so os riscos relacionados sua origem brasileira (entre outros) e barreiras, oassimetrias, comerciais. Os casos da AmBev e da Santista Txtil mostram a vulnerabilidade dessaempresas uma vez expostas aos desafios da concorrncia internacional e a necessidade de associase a empresas transnacionais uma vez atingido determinado nvel de crescimento einternacionalizao.

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    V. Impactos do IBD:internacionalizao positiva ous avessas?

    A. Marco analticoO IDE pode gerar impactos positivos e negativos para o pas de

    origem. A tabela 5 resume os principais impactos potenciais, com baseem pesquisa feita no incio dos anos noventa pelo Centro das NaesUnidas sobre Empresas Transnacionais (UNCTC) naquela realizada pela CEPAL em 2005.

    Uma avaliao dos efeitos lquidos encerra uma dificuldade principal: a definio do contrafactual: o que teria acontecido naausncia do investimento. Uma viso esttica poderia dar margem a preocupaes como a de exportao de empregos: o investimento noexterior se daria em detrimento do investimento no pas. No entanto, partindo das premissas de que as empresas, e o pas, operam em umregime de livre mercado; de que as empresas investiro onde puderem produzir competitivamente, extrair lucro e maximizar a rentabilidade

    para seus acionistas; e de que se no forem competitivas, sairo domercado, compreende-se que a internacionalizao via IDE frequentemente uma necessidade para a sustentabilidade esobrevivncia de muitas empresas. A preocupao portanto umafalcia. Iglesias e Veiga (2002) sintetizam da seguinte forma:

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    o investimento exterior nem sempre uma escolha e () nas circunstncias da concorrncia emalguns mercados e produtos, pode se tranformar em uma necessidade para muitas firmasdomsticas. Conseqentemente, a no realizao desses investimentos pode acarretar perda dedinamismo dessas empresas sob presso da concorrncia internacional, ocasionando impactosnegativos sobre o emprego e a competitividade da economia. A comparao que deve ser feita paraa anlise da convenincia ou no do investimento , portanto, entre as perdas e ganhos de uma

    situao sem investimento versus as perdas e ganhos de uma situao com investimento direto noexterior. Nessa comparao, os efeitos negativos sobre o emprego e o balano de pagamentos doinvestimento no exterior podem ser menores do que na situao de perda de competitividade e demercados das firmas domsticas.

    Tabela 5IMPACTOS DO IDE

    Positivos Negativos

    Balana de pagamentosCrescimentoReceitas, maior valor agregadoExportaes, divisasExposio a melhores prticasDesenvolvimento profissional

    Acesso a tecnologiaEmprego, spillovers positivos na comunidadeDemonstrao da capacidade tecnolgica do Brasil,efeito carto de visitaDesenvolvimento de profissionais com capacidadeinternacionalOportunidades de intercmbio cultural, comercial,tecnolgicoOportunidade de expanso de negcios defornecedores locais, criao de clusters

    Balana de pagamentosMenos investimentos locaisMenor gerao de empregosMenor contribuio para a formao do PIB emenor receita com impostos

    Fonte: Naes Unidas (1993), pesquisa da CEPAL.

    Dito isso, h circunstncias em que a internacionalizao via investimentos produtivos defato uma soluo second best, em que o investimento no exterior investimento desviado e nocriado, para fazer uma analogia com a teoria do comrcio internacional. A hiptese que sesustenta aqui que isso o caso quando os motivos do investimento so imperfeies nosambientes de negcios do pas de origem ou do mercado de destino, e no fatores relacionados svantagens comparativas e competitivas da empresa. Ou, melhor dizendo, quando essas imperfeiestm um papel significativo nas estratgias de internacionalizao, que so invariavelmentedeterminados por um conjunto de fatores.

    A tabela 6 identifica fatores que impulsam o IDE ( push factors ) ou o atraem ( pull factors ),separados em fatores de criao de investimentos e de desvio. Os primeiros dizem respeito aomovimento natural pelo qual empresas competitivas crescem em mercados atraentes ou expandemsuas reservas de recursos naturais, criando investimentos; os segundos referem-se a imperfeiesnos mercados de origem ou de destino.

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    Tabela 6FATORES DE IMPULSO E ATRAO PARA O INVESTIMENTO NO EXTERIOR

    Fatores de criao Fatores de desvio

    Impulso(Push)

    Vantagens comparativas e competitivasdo pas de origem (recursos naturais,produo eficiente, qualidade)

    Custos ou riscos relacionados ao ambientede negcios domstico: instabilidadecambial, altas taxas de juros, efeitos dorisco-pas sobre o custo do capital, etc.

    Atrao(Pull)

    Mercados consumidoresRecursos naturais

    Barreiras tarifrias e no-tarifrias Assimetrias criadas por acordos regionaisou bilaterais.

    Fonte: elaborao prpria.

    A internacionalizao baseada principalmente em push factors de desvio tem sido chamadade internacionalizao s avessas (Kupfer, 2006):

    A internacionalizao s avessas um movimento (...) no qual as empresas deslocam produo para o exterior no como um extravasamento de uma situao favorvel, mas visando fugir de condies negativas de custos ou de acesso a recursos produtivos no pas de origem.

    Seria ambicioso demais tentar responder pergunta sobre se o IBD principalmente savessas ou no. No entanto, as respostas pesquisa da CEPAL permitem responder a uma pergunta mais modesta: os fatores negativos so significativos nos processos deinternacionalizao das grandes empresas brasileiras? As sees seguintes procuram responder essa pergunta.

    importante lembrar que independentemente da motivao para o IDE e de sua natureza(criao ou desvio de investimentos), esse tende a gerar importantes efeitos positivos para o pas dorigem sob a forma de acesso a tecnologia, exposio a melhores prticas, desenvolvimentoempresarial e de recursos humanos, entre outros, que precisam ser considerados quando se est avaliar a convenincia do apoio internacionalizao.

    B. Estratgias e motivaesAo investir no exterior a maioria das grandes empresas brasileiras tm buscado expandir seu

    acesso a recursos naturais ou seu acesso a mercados, ainda que em ltima instncia o processo dinternacionalizao tenha sido motivado por fatores estratgicos mais complexos.11

    Os investimentos em busca de recursos naturais tiveram por objetivo o abastecimento do prprio mercado domstico como no caso nas primeiras fases da internacionalizao da Petrobrou como instrumento de expanso de mercados como no caso da internacionalizao recente dCVRD.

    Os investimentos no exterior feitos em busca de mercado podem ser classificados, de maneirsimplificada, em trs categorias: (i) os investimentos que facilitam a insero das exportaes emdeterminado mercado, o que Iglesias e Veiga (2002) chamam detrade and distribution que, comomencionado acima, correspondem a uma parcela importante do IBD cujo setor ou atividade sidentificveis; (ii) investimentos que visam produzir localmente; e (iii) entre as duas categoriaanteriores, investimentos por meio dos quais se agrega valor a exportaes brasileiras, comoperaes de processamento de matrias primas da CVRD e da Petrobras mencionados acima, o

    11 Em alguns casos a internacionalizao feita em busca de outros ativos, como acesso a informao para inovao (Arbix, SalernoDe Negri, 2005) conhecimento e tecnologia, mas pelo menos entre as grandes empresas que so o objeto deste estudo, as estratgiadeterminantes so de busca de recursos naturais ou mercado. Por outro lado, ainda h pouco investimento brasileiro que buscareduo de custos de produo para atender a terceiros mercados.

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    finishing facilities da CSN nos Estados Unidos e em Portugal ou as operaes de montagem de partes produzidas no Brasil, como foi o caso da Marcopolo at recentemente.

    Os investimentos da primeira categoria tm relao direta com as exportaes brasileiras. Os dasegunda e terceira so instrumentos para que uma empresa coloque em determinado mercado um produto que no pode ser exportado competitivamente, por caractersticas do prprio produto e barreiras

    naturais que encarecem o transporte (o custo relativo do transporte do cimento; o custo de transportealm mar de nibus da Marcopolo; a necessidade de proximidade ao cliente no mercado de autopeas emotores industriais); por questes relativas ao ambiente de negcios no pas de origem (instabilidadecambial, altos custos de produo, carga tributria); ou por questes relativas ao ambiente de negciosno pas de destino (formas vrias de protecionismo: tarifas, antidumping, direitos compensatrios,salvaguardas, polticas de favorecimento de fornecedores locais). Mudanas no contextomacroeconmico, regulatrio, de polticas comerciais e outros podem levar a uma transferncia deatividades de produo do Brasil para fora, substituindo exportaes, da mesma forma em que podemlevar ao aumento do investimento estrangeiro no Brasil.

    H, no entanto, motivaes de carter estratgico que esto por trs da busca de recursos naturaisou mercados. Entre esses esto, em primeiro lugar, a simples necessidade de crescer, quando fatorescomo a poltica de concorrncia impedem o crescimento da produo domstica (como no caso doexemplo da Gerdau-Pains mencionado acima) ou quando a natureza do produto ou condiesassociadas ao mercado de destino impedem que o mercado seja atendido exclusivamente porexportaes. Em segundo lugar, est a necessidade de gerenciar riscos de diversas naturezas: risco-pas,risco cambial, risco de flutuao de margens de determinados produtos ou segmentos, entre outros. Emterceiro lugar, e associado ao segundo, est o desafio, para algumas empresas que atuam globalmente ecompetem com empresas transnacionais consolidadas, de se aproximar em termos de condies deacesso a capital e mercados de suas concorrentes. Nesse conjunto de fatores podemos identificar comofatores de desvio as questes associadas aos riscos (que afetam a competitividade da empresa) e a barreiras comerciais nos mercados de destino (que afetam a competitividade dos produtos).

    As experincias descritas na seo anterior evidenciam a importncia desses fatores nasestratgias das principais transnacionais brasileiras. As respostas pesquisa da CEPAL realizada em2005, para a qual se entrevistaram executivos de 43 empresas latino-americanas, tambm destacamesses fatores. Alm das motivaes primrias de buscar mercados e recursos naturais, e excluindoinvestimentos experimentais (investimentos pequenos e de baixo risco destinados a testar a capacidadeda empresa de operar fora do pas), os demais fatores motivadores para a internacionalizao produtivamencionados pelas empresas entrevistadas podem ser agrupados em trs categorias: neutralizarassimetrias comerciais; diversificar risco e outros (ver tabela 7).

    Sete das 14 empresas entrevistadas mencionaram fatores referentes a assimetrias comerciais(estar presente em blocos comerciais pra se proteger de medidas protecionistas imprevistas, evitartarifas, explorar o acesso a mercado de pases que tm acordos de livre comrcio com os grandesmercados). Seis das 14 identificaram a necessidade de diversificar riscos, de diversas formas (comomencionado acima, risco-pas, risco cambial, risco de flutuao de margens de determinados produtosou segmentos, entre outros). Dentre as oito empresas que no citaram o fator risco como motivador,

    cinco citaram a diversificao de riscos como um dos dois principais benefcios da internacionalizaovia IDE (ver seo 5.C), o que permite acreditar que esse fator seja motivador de futuros investimentos por parte dessas e outras empresas.12 Esses fatores so citados tambm por Tanure (2005), Iglesias eVeiga (2002) e por observadores como Kupfer (2006) e Nakano (2005).

    12 Quando se indagou sobre dificuldades para realizar IDE, as respostas s perguntas formuladas pela CEPAL em alguns casos disseramrespeito a dificuldades de operar como empresa brasileira de modo geral, que induziam ao investimento no exterior. Entre elasestavam, alm dos fatores de risco mencionados, polticas agressivas de contrapartidas comerciais pelos mercados de destino (quegeram distores ao exigirem insumos produzidos localmente, encarecem o produto final ao exigir migrao para o pas de destino de

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    Tabela7MOTIVAES PARA A INTERNACIONALIZAO

    Neutralizar assimetrias comerciais estar dentro de grandes blocos econmicos, para escapar de

    barreiras comerciais que possam surgir de imprevisto; ter acesso a grandes mercados por meio de plataformas de

    exportao em pases que tm acordos de livre comrcio com essesmercados;Diversificao de riscos

    reduzir a dependncia do mercado brasileiro; diversificao de risco: riscos econmicos e polticos do pas de

    origem, risco de ter portfolio concentrado em um nico produto; aumentar ingressos em moeda forte, reduo deexposure cambial; constituir umhedge natural contra flutuaes de margens em

    segmentos integrados verticalmente; reduzir os custos de capital pela reduo do risco.

    Outros limitar a entrada de concorrentes no Cone Sul; evitar o crescimento do maior concorrente; aproveitar sinergias com as plantas brasileiras, diante de uma

    oportunidade de aquisio; abertura de mercado para a venda de assistncia tcnica; oportunidade de compra; explorar oportunidades de crescimento regionais; proximidade com o cliente para desenvolver produtos; operar com as vantagens de player local.

    Fonte: Pesquisa da CEPAL.

    Essas informaes sugerem que, se no se pode afirmar que a internacionalizao das maioreempresas brasileiras s avessas, posto que so complexos os conjuntos de fatores quedeterminam a estratgia de internacionalizao, no se pode desconsiderar a importncia dos fatorede desvio nas estratgias de internacionalizao.

    C. Resultados do processo para a empresa

    Alm dos ativos determinantes das estratgias de internacionalizao via IBD, a conquista dmercado (e portanto o aumento de receitas) e/ou de recursos naturais, h benefcios secundrios serem colhidos desses processos. A tabela 8 sintetiza as respostas dadas na pesquisa realizada pelCEPAL, sobre os benefcios secundrios (no necessariamente menos importantes):

    Tabela 8BENEFCIOS SECUNDRIOS DA INTERNACIONALIZAO

    partes que poderiam ser produzidas no Brasil); e protecionismo (na ausncia do qual o mercado seria abastecido por exportae brasileiras.

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    Gesto do risco melhoria na percepo de risco da empresa, com conseqente reduo

    dos custos de captao no financiamento de operaes; maior estabilidade nos resultados pela diversificao geogrfica e/ou de produto;

    gerao de caixa em moeda forte; reduo doexposure em custos e moedas; reduo da exposio ao Custo Brasil; disperso de riscos econmico/financeiros de maneira geral.

    Proximidade ao cliente/mercado proximidade ao cliente, especialmente quando os processos de

    negociao e compra so longos e complexos; proximidade ao mercado e informao em tempo real; maior conhecimento da realidade internacional.

    Crescimento: posicionamento como lder de mercado; rapidez na conquista de mercado; maior escala, aumento da capacidade.

    Gesto/recursos humanos oportunidade de crescimento para os profissionais da empresa; contribuio para o desenvolvimento de competncias gerenciais; desenvolvimento de colaboradores estratgicos; acesso a um amplo universo parabenchmarking e identificao de

    melhores prticas; acesso a ou incorporao de novas tecnologias, aprendizado.

    Outros participao ativa e no passiva em processos de consolidao; possibilidade de complementaridade industrial (produtos fabricados no

    Brasil vendidos fora, produtos fabricados fora vendidos no Brasil).Fonte: Pesquisa da CEPAL.

    Novamente, o fator risco aparece de forma destacada. Por outro lado, a tabela pe em evidncia benefcios para a empresa que tendem a gerar externalidades positivas para o pas: aprendizado, acesso atecnologia, desenvolvimento profissional, alm, naturalmente, da simples expanso das empresas.

    Embora, como se mencionou acima, seja extremamente difcil avaliar rigorosamente os efeitoslquidos para um pas do aumento de seu IDE, as consideraes feitas nesta seo permitem algumasconcluses. Em primeiro lugar, os efeitos negativos do IDE parecem limitar-se possibilidade de desviode investimentos como reao a imperfeies no mercado de origem ou no mercado de destino. Noentanto do ponto de vista do pas de origem, a internacionalizao nesses casos uma soluo mais doque um problema. a alternativa perda de competitividade de uma empresa nacional e possivelmente sua eventual sada do mercado. Aliado aos diversos efeitos positivos do IBD destacados acima, essefato permite afirmar que um pas tem muito a ganhar do que a perder com a internacionalizao produtiva. No entanto, no se pode ignorar o componente de desvio de investimentos que asestratgias e motivaes das empresas permitem inferir. Assim, uma poltica de apoio internacionalizao tem um duplo desafio: eliminar as barreiras internacionalizao, e ao mesmotempo minimizar os fatores de desvio tais como definidos acima, de forma a maximizar os benefcioslquidos do IBD para o pas.

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    VI. Polticas pblicas relacionadasao IBD

    O apoio ao IDE em outros pases tem tomado diversas formas,desde a identificao de oportunidades ao financiamento direto eseguro contra riscos polticos (ver Iglesias e Veiga, 2002). Comomencionado na introduo, o apoio governamental ao IDE foifundamental para a expanso das transnacionais dos pases da sia em

    desenvolvimento. Na Amrica Latina, embora tenha havido em geraluma flexibilizao das restries s sadas de capital e importantes programas de apoio s exportaes, h muito pouco apoio ativo ao IDE propriamente dito. Com efeito, a questo sobre se deve ou no havertais polticas em contextos de escassos recursos pblicos (financeiros,humanos, tcnicos), inclusive para apoiar o investimento no pas, sensvel e os benefcios esperados do apoio precisam ser concretos eclaros.

    Idealmente, as polticas de apoio internacionalizao estariamintegradas de forma estratgica s polticas de desenvolvimentoindustrial, e produtivo de modo geral. importante, para tanto, quehaja coordenao entre os rgos competentes e uma viso clara daimportncia e do potencial do IBD que se busca promover para osobjetivos estratgicos de desenvolvimento do pas, evitando promovera internacionalizao pela internacionalizao. Um paralelo pode sertraado com os desafios atuais das polticas de promoo deinvestimentos estrangeiros, onde se torna cada vez mais importante terclareza sobre o potencial dos investimentos estrangeiros para asestratgias do pas, dos tipos de investimento com maior potencial edos ativos necessrios para atrai-los (CEPAL, 2006).

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    No que se refere ao contedo das polticas, importante, por um lado, que vise minimizar osfatores de desvio: em outras palavras, que esteja inserida no contexto de esforos que visemmelhorar o ambiente de negcios do pas e o acesso a mercados. As respostas dadas pelosempresrios brasileiros entrevistados pela CEPAL reforam a importncia deste ponto. Quando sesolicitaram sugestes de polticas pblicas para facilitar o IBD, predominaram respostas que sereferiam a temas mais horizontais, relacionados estabilidade e transparncia das regras, liberalizao do comrcio e acesso a mercados, e a fatores que afetam as condies de produo noBrasil (ver tabela 9).

    Tabela 9SUGESTES SOBRE COMO AS POLTICAS PBLICAS PODERIAM

    APOIAR O IBD

    Estabilidade e transparncia das regras Regras claras, transparncia, agncias reguladoras operando bem, mar