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MARISLEI DE SOUSA ESPÍNDULA BRASILEIRO REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE AIDS DE IDOSOS INFECTADOS PELO VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA ADQUIRITA (HIV): RISCOS E RECONSTRUÇÕES BELO HORIZONTE 2004

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  • MARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO

    REPRESENTAESSOCIAISSOBREAIDSDEIDOSOSINFECTADOSPELOVRUSDAIMUNODEFICINCIAADQUIRITA(HIV):

    RISCOSERECONSTRUES

    BELOHORIZONTE2004

  • Livros Grtis

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  • MARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO

    REPRESENTAESSOCIAISSOBREAIDSDEIDOSOSINFECTADOSPELOVRUSDAIMUNODEFICINCIAADQUIRITA(HIV):

    RISCOSERECONSTRUES

    DissertaoapresentadaaoCursodeMestradodaEscoladeEnfermagemdaUniversidadeFederaldeMinasGerais,comorequisitoparcialobtenodottulodeMestreemEnfermagem.

    Orientadora:Prof(a).Dra.MARIAIMACULADADEFTIMAFREITAS

    BELOHORIZONTE2004

    2

  • 3

    Brasileiro,MarisleideSousaEspndula,B823rRepresentaessociaissobreAidsdeidososinfectadospeloHIV:riscosereconstrues.MarisleideSousaEspndulaBrasileiro.BeloHorizonte,2004.137p.Dissertao.(Mestrado).Enfermagem.EscoladeEnfermagemdaUFMG.1.Sndromedeimunodeficinciaadquirida/sadecoletiva2.Idoso/psicologia3.Sexualidade4.Sadedoidoso5.PromoodasadeI.TtuloNLM:WC503CDU:616.988053.9

  • UNIVERSIDADEFEDERALDEMINASGERAIS

    ESCOLADEENFERMAGEM

    MESTRADOEMENFERMAGEM

    REPRESENTAESSOCIAISSOBREAIDSDEIDOSOSINFECTADOSPELOVRUSDAIMUNODEFICINCIAADQUIRITA(HIV):

    RISCOSERECONSTRUES

    MARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO

    Dissertao defendida e aprovada em 28 de janeiro de 2004, pela Comisso

    Examinadoraconstitudapelosprofessores:

    ___________________________________________________________

    Dra.MARIAIMACULADADEFTIMAFREITASORIENTADORA

    ______________________________________________________________

    Dra.AIDFERREIRAFERRAZ

    ______________________________________________________________

    Dr.FRANCISCODEASSISACRCIO

    4

  • DEDICATRIA

    AoamadoesposoEmdioBrasileiro,maiorestimuladorde

    minhatrajetriaequemsempremefezacreditarquemeus

    sonhosnoeramimpossveis.

    AosnossosqueridosfilhinhosVinciuseJenucy,portodas

    asalegriasquemefortalecemaexistncia.

    5

  • AGRADECIMENTOESPECIAL

    Querotestemunharespecialmenteaminhagratidoereconhecimentoexemplarorientadora,

    ProfessoraDraMariaImaculadadeFtimaFreitas(Peninha),

    pelaconstantedisponibilidadeultrapassadanosvriosencontros;

    peloprofissionalismoeamorosidade;

    pelasliesprivilegiadasepresenacarinhosa;

    peloconhecimentoehumildade;

    pelasexpectativaspositivasqueenvolvemainvestigao;

    pelapacinciamesmonaexaustodotrabalho;

    pelasoportunas,pertinenteseestimulantesobservaes;

    pelamaneiracomoestimulaaindependnciadequemorienta;

    pelasinspiraesdecoragem,determinao,ousadia,humildadeedisciplina.

    Exemploaserseguidocomoeducadoraemulher,semprelhesereigrata.

    6

  • AGRADECIMENTOS

    PrimeiramenteagradeoaDeus,intelignciasuprema,causadetodasascoisas.

    Aosmeuspais,IvaldoEspndulaeAnaRamos, responsveisporminhaformao afetiva,

    intelectualemoralesminhasirmsMariaRita,NilamareNiusleypelafora.

    DivinaClia,irm,companheiraincondicionalquesempremeestimuloueresguardou.

    LciaPinho,pelasabedoriacomquesimplificaosproblemasmaiscomplexos.

    IsolinaAssis,maiorestimuladoraedoadoradebonssentimentosnashorasdifceis.

    SaletePontiere,pelamaneirasbriaeinspiradapelaqualconduztodasassuasaes.

    s professoras Maria de Lourdes Corsino Peres e Ldia Milano, pelos inspiradores

    momentosdeafastamentodoobjetodeestudo,eProf(a)BeatrizNeta,peloconstanteapoio.

    Ao HDT(Hospital de Doenas Tropicais), nas pessoas de Clia Rita e Magnlia, pela

    amizadeeseriedade.

    AosilustresprofessoresdoMestrado: Dra.AidFerreiraFerraz,Dra.AndraGazzinelli

    Corra de Oliveira, Dra. Anzia Moreira Faria Madeira, Dra. Dacl Vilma Carvalho, Dr.

    Francisco Carlos Flix Lana, Dr. Jorge Gustavo Velsquez Melndez, Dra. Maria Flvia

    Carvalho Gazzinelli, Dra. Marilia Alves, Dra. Marisa Antonini Ribeiro Bastos, Dra. Roseni

    Rosngela de Sena, semos quais no seria possvel trilhar esse novo caminho comotimismo e

    perseverana.Aoseficientesamigosdocolegiado:Silvia,LucileneeEduardo.

    scolegasdoMestrado,semasquaisnoseriapossveloaprendizadoemequipeassociadoao

    desejodesetrabalharcompersistncia.

    7

  • Universidade Paulista, em especial Sandra Lcia e Andr Vasconcelos pela

    confianaeconstanteamizade.

    UniversidadeCatlicadeGois eaoProfessor Dr.NicolauHeck, pelalutaconstantea

    favordaeducaodequalidade.

    SecretariaMunicipaldeEducaodaPrefeituradeGoinia,naspessoasdaDra.Walderez

    Loureiro, Snia e ao Ncleo doEAJA, por suapermissoeautorizao paraa realizao deste

    Mestrado.

    AoProfessorPedroWilsonePinheiroSales,peloapoioaestapesquisa.AopessoaldoCentro

    deApoioaoDoentedeAids,naspessoasde Sirlene e Rocha eaoCondomnioSolidariedade, na

    pessoadeMrcia,peloauxlioemissoincondicional.

    Agradeoprofundamenteaos sujeitosparticipantesdestapesquisa, deixoesteestudopara

    futurasreflexes.Omeusinceroagradecimentopelaconfianaquetiveramemcompartilharcomigo

    seussentimentos,suasemoesesuasexperinciasdevida.Atodos,omeusinceroagradecimento

    comvotosdepazesade.

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  • CAMPANHADAFRATERNIDADE2003

    Respeiteoidoso;

    Aprendacomele;

    Escuteassuashistrias;

    Respeiteosseusdireitosemfilasedentrodosnibus;

    Sejaeducadoeatenciosoaofalarcomele;

    Abraceo;

    Senteaoseulado;

    Sorrialhesempre;

    Pealheconselhos;

    Respeiteseusvalores.

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  • LUZESDOENTARDECER

    Conservacontigooscompanheirosidosos,comaalegriadequemrecebeudavidaohonroso

    encargodereter,juntodocorao,asluzesremanescentesdoprpriogrupofamiliar.Refletenaqueles

    quetepreservaramaexistnciaaindafrgil,nospanosdobero,nosqueteequilibraramospassos

    primeiros,nosqueteafagaramossonhosdameniniceenaquelesoutrosqueteauxiliaramapronunciar

    onomedeDeus.Jqueatravessaramocaminhodemuitosjaneiros,pensanoherosmosilenciosocom

    queteensinamavalorizarostesourosdotempo,nasdificuldadesqueterovencidoparaseremquem

    so,nosuorquelhesalterouaslinhasdafaceenaslgrimasquelhesalvejaramoscabelos.Equando,

    porventura,temostremazedumeoudesencanto,escutalhesapalavracombondadeepacincia.No

    estaro, decerto, a ferirte esimprovavelmentealgomurmurandocontra dolorosas recordaes de

    ofensasrecebidas,desaudadesfiliais,quetrancamnopeito,afimdenocomplicaremosdiasdos

    seresquelhessoespecialmentequeridos.Amaerespeitaoscompanheirosidosos!Soelesasvigas

    queteescoramotetodaexperinciaeasbasesdequehojetelevantasparaseresquems...Auxiliaos,

    quantopuderes,porquantopossvelque,nodiadaexistnciahumana,venhasigualmenteaconhecer

    obrilhoeasombraqueassinalamnomundo,ahoradoentardecer(MEIMEI).

    10

  • SUMRIO

    RESUMO...............................................................................................................................................13

    ABSTRACT.............................................................................................................................................14

    IINTRODUO................................................................................................................................15

    1.Oproblemadepesquisa.................................................................................................................15

    2.Justificativa....................................................................................................................................21

    3.Objetivo.........................................................................................................................................22

    IIMETODOLOGIA...........................................................................................................................23

    1. Tipodeestudo............................................................................................................................23

    2. Referencialtericometodolgico..............................................................................................23

    3. Sujeitosdapesquisa...................................................................................................................29

    4. Cenriodapesquisa...................................................................................................................30

    5. Instrumentodacoletadeinformaes.......................................................................................31

    6. Anlisedasinformaescoletadas............................................................................................32

    IIIANLISEDASENTREVISTAS................................................................................................35

    1. Aapresentaodosentrevistadosedosresultados...................................................................35

    2. As representaes sociais de pessoas idosas em torno da infeco pelo

    HIV............................................................................................................................................38

    OsncleosperifricosdasrepresentaesemtornodainfecopeloHIV....................44

    Aidsnocncer.................................................................................................45

    DescrenanoSistemadeSade.............................................................................47

    Tratamentodifcil..............................................................................................51

    11

  • Depresso................................................................................................................54

    Aexignciademudaremoshbitosdevida..........................................................57

    A nopreveno antes e o uso do preservativo depois do

    diagnstico..............................................................................................................60

    Otrabalho................................................................................................................64

    Disposioparafalarmais.....................................................................................67

    Osncleosmaisprximosdocentro...............................................................................69

    AAidsnoteriaqueacontecercomigo..............................................................69

    normal:maisumadoenadevelho...............................................................71

    OssintomascomoconscinciadaAids.................................................................74

    Dupladiscriminao:servelhoeestarcomAids..................................................76

    Aidsessetremnotemcura.................................................................................82

    2.3.Oncleocentral.................................................................................................................87

    2.3.1.Aidsameaaconstantedemorte......................................................................87

    IV.CONSIDERAESFINAIS..........................................................................................................92

    V.REFERNCIASBIBLIOGRFICAS............................................................................................96

    VI.ANEXOS.........................................................................................................................................102

    12

  • REPRESENTAESSOCIAISSOBREAIDSDEPESSOASIDOSASINFECTADASPELOHIV:RISCOSERECONSTRUES

    MARIAIMACULADADEFTIMAFREITASMARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO

    RESUMO

    Esteestudosepropeadiscutirasrepresentaes sociais elaboradaspornovepessoascomidadeacimade60anos,soropositivasparaHIV/Aids.Apesquisafoirealizadanoperodode2002a2003,nomunicpiodeGoiniaGoisealgunsmunicpios prximos:AparecidadeGoinia, RioVerde,Piracanjuba,EdiaeSantaRosa.OestudofoipautadocombaseemAbric(2000),buscandoseacessaroscontedossignificativossobreaexperinciadadoena.Metodologicamentefoiutilizadaaanlise de discurso, atravs de entrevistas, proposta por Dubar (1998), que fez emergir blocostemticos,deacordocomatrajetriadogrupo.Aanlisedestesdiscursospermitiuaidentificaodevriosncleos,umdeles,bastantecentralergido,cujaimagemadequeaAidsameaaconstantedemortee,circundandoessencleo,houtrosmaisdistanteseflexveis,cadaumcomseusistemaperifrico:Aidsessetremnotemcura;Aidsnocncer;depresso,otratamentodifcil,dupladiscriminao:servelhoeestarcomAids.Osresultadosmostramqueavivnciadaspessoascomidadeacimade60anoscomHIV/Aidsdifcil,comaimagemquefazemdesimesmascomopessoasquevivememconstanteameaademorte,daosofrimentopsquico,aumentandoadepressoeagravandoossintomas. Podeseafirmar queopreparodosprofissionais para lidaremcomessaspessoascondiosinequanonparafavorecerahumanizaodocuidado,diminuindoonmerodeinjustiasemortes.

    Palavraschave: Terceira idade HIVSndromedaImunodeficincia Humana RepresentaesSociais.

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  • SOCIALREPRESENTATIONSABOUTAIDSFROMPEOPLEABOVE50YEARSINFECTBYHIV:RISKSANDRECONSTRUCTIONS

    MARIAIMACULADADEFTIMAFREITASMARISLEIDESOUSAESPNDULABRASILEIRO

    ABSTRACT

    Thestudyproposesthediscussionofthesocialrepresentationselaboratedby9elderlypeopleabove50yearswhoaresoropositivesforHIV/Aids.Theresearchconductedfrom2002to2003inGoiniaGoisandsomesurroundingtowns:AparecidadeGoinia,RioVerde,Piracanjuba,EdiaandSantaRosa.ThestudywasbasedonAbric(1998),lookingformeaningfulcontentsaboutthediseaseexperience. Methodologically weusedsomeprinciples of discourseanalysis throughinterviews assuggestedbyDubar(1998)somethemeunitsderivedfromtheseinterviewsaccordingtotherouteofthegroup.Thespeechanalisyslallowedustoidentifymanynucleus,oneofthemrathercentralanrigid.ItsstatesthatAidsisaconstantdeathmenaceandsurroundingthisnucleos,therearothersmordistantandflexible,eachonewithitsperifericsystem:Aidsisuncurable;Aidsisnotcncer;depression;thetreatmentisdifficult;doubleprejudice:beingoldandhavingAids.TheresultsshowthatelderlypeoplelivingwithAidshaveadifficultlife.Theyportrayaselfimageasthosewholive under a constant death threat, hence the psychic suffering, raising depression and makingsymptomsworst.Wecanassuresthatthepreviousproffessionalskillstodealtodealwiththesepeopleconstitutesasinequanonconditiontofavourhumancare,cuttingdownthenumberofinjusticesandprepaturedeath.

    Keywords:ThirdageHIVAcquiredImmunodeficiencySyndromeSocialRepresentations.

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  • I.INTRODUO

    Fome, misria e Aids vodisputar as manchetes da imprensainternacionalsobreopas.Fomeemisriaporqueasproduzimosh muito tempo. Aids porque tem, aqui, a mesma cara damisria.Amaioriaricatratase,ospobressimplesmentemorrem.

    HerbertdeSousa,oBetinho(1993)

    1.Oproblemadepesquisa

    Adiscussosobre a terceira idade complexa e deve ser investigada comoumconceito

    historicamenteconstrudoporqueenvolve,deformadiretaouindireta,diversosaspectos,taiscomo:o

    biolgico,oafetivo,opsicolgicoeprincipalmenteosocial.

    A terceira idade apresentase como uma questo emevidncia no somente na realidade

    brasileira, masprovavelmenteemtodoomundo. Preocupaodohomememtodosos tempos, a

    velhicetemvencidoosdesafios,orasendodiscriminada,oravalorizada.Desdeapocadosgrandes

    senadoresromanos,respeitadosporsuasabedoria,oenvelhecimentotemmerecidoespecialateno,

    aindamaisapartirdosanosde1970,quandoaexpectativadevidadaespciehumanavemmostrando

    umaumentosemprecedentesnotempomdiodevidadaspessoas.Ferrari(2000,p.98)afirmaqueo

    serhumanojchegahojeaumamdiade75anosemaisempasesdesenvolvidos.

    15

  • Assim,chegaraumaidadeavanadajnomaisprivilgiodepoucaspessoas.Masa

    preocupao,deacordocomOliveira(1999,p.32),nocomalongevidadehojeexperimentada

    pormuitos,mascomaboaqualidadedevida,sonhadaportodos,queprivilgiodealguns.

    Nestabuscaporumamelhorqualidadedevida,quandoapolticanacionalparaoidosoatravs

    doestatutodoidoso,surgecomopontodepartidaparaavalorizaodosmaisvelhos,questesdiversas

    sobreaterceiraidadeso,cadavezmais,objetodeinteressedospesquisadoresdasreasdasade,da

    educao,dodireitoedascinciassociais,incluindoseaasquestesligadasprevenoeaocontrole

    doHIV/Aids1.

    Certamente,estapreocupao,nocomaimortalidade,mascomamanutenodavida,torna

    semaisevidente,quandosurgeemcenaobinmioenvelhecimentoxAids.Seaspessoaspassarama

    vislumbrarumamaiorexpectativadevida,apartirdadcadade70,aAidssurgenadcadade80como

    umasombraparatodasasidades.

    Aspessoascomidadeacimade60anos,quandoinfectadascomoHIV,tendemamanifestaros

    efeitosdaimunodepressodeformamaisaceleradaqueaspessoasjovens,porquetm,acrescidos

    Aids, os efeitos de outras doenas que freqentemente aparecem com a idade. Alm disso, h

    desinformao, preconceitos edificuldades deacessoaosServiosdeSade, oqueprovavelmente

    contribuiparaoaumentodoscasos.

    Quantodesinformao,mdicosdoHospitaldaUniversidadedeChicagorelatamquemuitos

    profissionaisqueatendemidososnoconseguemassociarAidsepessoasidosas,poisaquestoda

    percepodorisconoexisteaoseolharessapopulao"(DIXON,1997,p.53).

    NoBrasil,emestudorealizadonaFaculdadedeCinciasMdicasdaSantaCasadeSoPaulo,

    pesquisadoresverificaramque, emborapoucofreqentesemhospitais gerais, casosdeAidsesto

    ocorrendoemidososecomaltondicedemortalidadedecorrente,muitasvezes,pornosecogitareste

    diagnsticoduranteaavaliaoclnica(GORZONI,1997,p.67).Taiscomportamentosdecorrem,

    provavelmente,dopreconceitoedeidiaserrneassobreainfecopeloHIV,tantodosprofissionais

    comodepessoasmaisvelhas.Naprtica,asrepresentaesqueunseoutrostmsobreasdoenas,em

    1 O agente etiolgico da AIDS (Sigla, em ingls: acquired immuno deficiency syndrome que significa Sndrome daImunodeficincia Adquirida) foi identificado por Luc Montagnier, em 1983, na Frana, que o denominouLAV(lymphoademopathtassociatedvrus)eporRobertGallo,nosEUA,quechamouodeHILVIII(HumanTcell lymphotropicvrustypeIII).Em1988,ocomitinternacionalparataxonomiadevrusatribuiuaosretrovrusisoladosnaFranaenosEUAadesignaocomum deHumanImmunodeficiencyVrus HIV,diantedaconclusodequeelestinhamcaractersticasbastantesemelhantes,naverdade,eramomesmovrus(MINISTRIODASADE,2002).

    16

  • geral, e, emespecial, sobre a Aids, parecemter grande importncia, tanto noquese refere

    prevenocomonocontroledainfeco,dentretantosoutrosfatores.Aanlisedasrepresentaes

    sociais sobre esses aspectos pode ser de imensa utilidade para a Gerontologia, pois possibilita a

    identificaodemodoscompartilhadosdepensaredeatuaremrelaoaesseprocesso,aocaracterizar

    osconhecimentosecrenasdosgrupossociaisarespeitodele.

    AlmdoscitadosprofissionaisquenotmadevidapercepodoriscodaAidsemrelaoaos

    idosos,haindaoutrosprofissionaisdasadequeestoutilizandoumdiscursopreventivoparaaAids,

    masquesemostradistantedarealidadeespecficadessafaixaetria.Porfim,essequadrocompletase

    comofatodequeaocultaododiagnsticospessoasmaisvelhasumaconstante,especialmente

    quandosetratadeinfecopeloHIV.

    CorroborandocomosdadosdoMinistriodaSade(BRASIL,2001,p.13)osquaisapontam

    quecercade55%daspessoascomAidscomidadeacimade60anosforamcontaminadasporvia

    sexual,umestudoquantitativo,transversaleretrospectivorealizadoporVasconcelosetal.(2001)a

    respeitodoperfilepidemiolgicodosclientesHIV/Aidscomidadeacimade60anosmostrouqueos

    parceirosnemsempretmsuasmulherescomoparceirassexuaisnicas,poisde15homenscasados,

    participantesdapesquisa,cincoerambissexuais,sendoaviadeexposiomaiselevadaasexual.Nesse

    estudoencontrousetambm:aumentononmerodecasosemmulheres,principalmenteascasadas;

    aumentodonmerodeheterossexuais;predomniodebaixaescolaridade;aumentodonmerodecasos

    nafaixaetriaemestudo;subregistronospronturioseviasexualcomomaiorfontedeexposio

    (VASCONCELOS,2001,p.257).

    UmoutroestudoquantitativosobreoperfilepidemiolgicodaAidsemindivduosacimade60

    anosrevelouasuacomposio:homemidoso,patriarca,bissexualsemconhecimentodafamlia;a

    idosa, fiel no casamento, que contraiu Aids do marido que mantinha relaes extraconjugais; o

    homossexual masculino definido desdea juventude; o idosoquesecontaminouaps a viuvezou

    separao(SANTOSetal.,1997,p.123).OestudodeSantos,concludoem1997,contribuiu,deuma

    formageral,paraqueseconhecesseoperfildaspessoasinfectadaspeloHIVecomAidse,certamente,

    paraadefiniodepolticasdepreveno.Noentanto,aspessoasaindacontinuamsendoinfectadas.

    SegundoosdadosdoMinistriodaSade(BRASIL,2001,p.14),

    o percentual de pessoas contaminadas na faixa etria entre 50 e 59 anoscresceu de 5,4% para 6,6% (no grupo feminino) e de 6% para 7% (no

    17

  • masculino), registrandoat agora15.263casosemumtotal de210.447notificaes,sendoque55%secontaminaramporviasexual.

    At setembrode2003,segundoosdadosdoMinistriodaSade(BRASIL,2003,p.01)o

    nmerodecasosaumentou:foramnotificados277.153casosdeAidse25.076napopulaoacimade

    60anos.Diantedessecontexto,explicaseaimportnciadeselevaremconsideraoatradeidoso

    sexualidadeAidscomoobjetodeestudosmaisaprofundados,tambmnoqueserefereainvestigaes

    psicossociais,quevalorizemacompreensodarealidadesocial.

    Muitos autores da rea da Psicologia e Sociologia, tais como Moura e Jacquemin (1991),

    Barbosa (2002), Ferreira (1994), Joffe (2002), Loyola (1994), e do Direito, como Brasileiro &

    Brasileiro(2000),Ferreira(1999),tmsevoltadoparaotemaAids,porm,poucoaindafoiestudado

    sobreesseacontecimentonavidadepessoasidosas.Entreelesesto:Gorzoni(1997),queestudoua

    Aidsempessoasacimade60anos,eNoritomi(1997),quedescreveuamortalidadedeidososcom

    AidsnacidadedeSoPaulo.

    AlgunsestudosquesevoltamparaaAidsemidososesto,porm,centradosnocarterobjetivo

    doacontecimento.Emgeral,soestudosepidemiolgicos,comooscitadosanteriormente,almdode

    Santosetal(1997),queretrataoPerfildaAidsemindivduosacimade60anos,eodeVasconcelos

    (2001)sobreoPerfilepidemiolgicodosclientesHIV/Aidscomidadeacimade60anos.Essesso

    estudosquetrazemadimensodaproblemticacoletiva,fundamentalparaoconhecimentoeparaa

    definiodeaes,masfaltamoutrosquediscutamadimensodossignificadosedasrepresentaes

    sobre a infeco pelo HIV, que ancoram as atitudes e os comportamentos das pessoas para se

    preveniremesecuidarem.

    NaausnciadevacinasedeumacuraefetivaparaaAids,apesardeonmerodepessoascom

    idadeacimade60anoscomAidsestaraumentando,humvaziodeconhecimentosistematizadosobre

    essegrupoquantossuasrepresentaessociaisrelacionadasinfecopeloHIV.

    Dapartegovernamental,comoobjetivodeatenderestesegmentodapopulao,foiinstitudaa

    PolticaNacionaldoIdoso,atravsdaLein.8.842,de04/11/94,regulamentadaatravsdodecreton.

    1948,de03dejulhode1996.AlgumascampanhasdeprevenocontraaAidsemidososvmsendo

    organizadasemcumprimentoaoArtigo10docaptuloIV,quevisaa

    18

  • garantiraoidosoaassistnciasade,nosdiversosnveisdeatendimentodo Sistema nico de Sade; alm de prevenir, promover, proteger erecuperar a sade do idoso, mediante programas e medidasprofilticas(BRASIL,2002).

    Almdisso,oEstatutodoIdosolanadoemsetembrode2003visaassegurarosdireitosdas

    pessoasidosas(BRASIL,2003).Nosepodeesquecerque,diantedosavanosdatecnologiaeda

    atenosade,aspessoasdaterceiraidadevivemumanovarealidadenuncaantesexperimentadaem

    outras pocas, nesse perodo da vida (CARVALHO & ALMEIDA, 2003, p.114). A reposio

    hormonal,acolocaodeprtesepeniana,aofertademedicamentos,comooViagraeoUprima,

    dentre o usodenovas tecnologias, melhoramaqualidade devidae prolongamavidasexual das

    pessoas acima dos 50 anos, trazendo, indiretamente, o aumento das doenas sexualmente

    transmissveis,incluindoseainfecopeloHIV.

    Porm,mesmocomaocorrnciadecasosecomastentativasgovernamentaisdeinformar

    populaosobreosriscosdainfeco,parecequeasociedade,emgeral,aindaacreditaqueaspessoas

    maisvelhasnocorremoriscodeseinfectarem.Provavelmente,hnoimaginriosocialumarelao

    entresexualidade,riscoeAidseanegaodaatividadesexualdepessoasacimade60anos.Essa

    relaofazcomquesejadifcilaceitaraidiadoriscoparaessaspessoas.Destartecorreseumgrande

    risco,semimaginlocomopossvel.AsdiscussesdetemasreferentesAidssemprefazememergir

    imagens,conceitosecategoriasqueremetemaoqueasociedadeconsideraperigoso.Comoento

    representadooriscorealouimaginriodoperigodaAidspelaspessoascomidadesuperiora50anos

    infectadaspeloHIV?

    Assim,valeindagar:comovivemaspessoascomidadeacimade60anosinfectadaspeloHIV?

    QuerepresentaessobreAidstmasmulheres,porexemplo,comidadeacimade60anos,casadas,

    heterossexuaisequesecontaminaramporviasexual,quepodemestarcontribuindoparaoaumentoda

    infeconessegrupodapopulao?

    Dentrodestaperspectiva,asperguntasanteriormentelanadaslevaramaumaquestocentral

    propostaparaopresentetrabalho:comoaumento,pelomenosvirtual,daspossibilidadesdemelhoria

    daqualidadedevidadaspessoas idosase, conseqentemente, denovaspossibilidades derelaes

    afetivas,sexuaisesociais,paraestaspessoasquejconhecemseu status sorolgico,aAidsaparece

    comoimpedidoradessaspossibilidadesouelanoincorporadacomopreocupao,sendoconsiderada

    comoinexistente?

    19

  • Afinal,onmerodepessoascomidadeacimade60anosinfectadascomHIV/Aidsest

    aumentandonoBrasilenoseconsideradeformaefetivaasubjetividadedessaspessoas.Que

    representaessobreHIV/Aidsexistemnessegrupo?

    Aquisurgeoutraquesto:comodelimitarasfaixasetriasdosindivduoscomAids,parase

    saberapartirdequeidadeelessoconsideradosidosos?

    Simes(1994,p.19)esclareceque,empasesconsideradosdeprimeiromundo,aOrganizao

    MundialdaSadeconsideracomomeiaidade:de45a59anos;idosos:de60a74anos;ancio:de75

    a90anos;evelhiceextrema:de90anosemdiante.

    JnoBrasil,oInstitutoBrasileirodeGeografiaeEstatsticadefinecomolimitedivisrioentre

    adultoeidosoaidadede60anos(IBGE,2000),independentementedaqualidadedevidaoudos

    desgastesfsicos(enfermidades,acidentes)ementais(viuvez,divrcio,estresse)doindivduo.

    Noentanto, estabeleceroinciodaterceiraidade,quecorresponderiasfaixasacimade60

    anos, tornase complexo, devido necessidade de se considerar a individualidade de cada um.

    comumencontrarpessoasqueaos50anosjapresentamsintomasdevelhiceeoutrasque,aos80anos,

    ainda atuamvigorosamente na profisso, no esporte e na vida afetiva, de formaativa, livres dos

    problemasassociadosaoenvelhecimento. EmGoinia,porexemplo,pessoascommaisdesessenta

    anosj somaioria emalgumasacademias deginstica, eemalgumasaulas, elaschegama90%

    (IDOSOS.DiriodaManh,Goinia,2002,p.8).

    Dessemodo,diantedanecessidadedaescolhadeparmetrosparaoestabelecimentodasfaixas

    etrias,esteestudoutilizaroconceitodeHazzard(1990),umautoramericanoqueconsideraaterceira

    idadedavidaassimsubdividida:osjovens(Youngold),de54a65anos;osadultos(middleold),de

    66a74anos;osvelhos(oldold)de75a84anos,eosmuitovelhos(veryold),de85anosparacima.

    Assim,paraesteestudo,optouseporconsideraraspessoasacimade60anosdeidadequeestose

    aproximandodafasedevidarelacionadaterceiraidade.

    Estabelecidostaisparmetros,retornaseaquestodoaumentodopercentualdeidososcom50

    anosoumais,contaminadospeloHIV,paraosquaisimprescindvelumaatenoespecialrelativa

    promoodasade,nosseusaspectosobjetivosesubjetivos.Nessesentido,aprincipalcontribuio

    pretendidacomestetrabalhoaprofundaroconhecimentoarespeitodasrepresentaessociaissobrea

    Aids,considerandoascomopartefundamentaldasformasdeagiredesecuidardaspessoas.

    20

  • AprticanotrabalhoquotidianodestapesquisadoraaolidarcomquestesrelativasSade

    do Adulto e Idoso mostra, emgeral, umanegao do risco, tanto por parte dos usurios dos

    serviosdesade,quantodosprofissionaisqueatendemosidosos.Esteumassuntonoabordadoou

    abordadocomoinformaogeneralizada,quesecentranaprescriodecondutas,semconsideraro

    contextodevidadessaspessoas.Paraosprofissionaisdesade,umaabordagemcoletivaouindividual

    que extrapole a informao tcnica e biologizante dasadeainda difcil. Eles tendema prestar

    assistncia, fundamentados embases biolgicas e de interveno teraputica medicamentosa, sem

    incluremumaabordagemmaisampla,contextualizadaeinterdisciplinaraessegrupodepacientes.

    2.Justificativa

    Oliveira(1999),Ferreira(1999)eDuarte(1996)alertamparaaimportnciaeaurgnciados

    estudosligadosaoenvelhecimento/Aids.Sendoescassaaliteratura,emgeral,sobrecuidadosdesade

    centradosnaespecificidadedessafaixaetria,tornasepertinenteesteestudo,principalmentenoque

    tangeaocuidadocomasade,tantonaprevenoquantonocontroledainfecopeloHIV.

    Para discutir estas questes, parece fundamental ouvir pessoas dessa faixa etria que esto

    vivenciandoainfecopeloHIVparacompreendersuasrepresentaessobreadoena,antesedepois

    de sua prpria infeco. Pressupese assim, teoricamente, conforme Jodelet (1989), que

    representaessociaisembasamasprticassociaise,aomesmotempo,vosendotransformadaspor

    essasprticas.

    No que se refere a uma doena infectocontagiosa, que tem como uma das formas de

    transmissoocontatosexual,valelembraraimportnciadeseconstruirumaportedeconhecimentos

    que fundamentem aes de promoo, preveno e controle, o qual inclua aspectos psicossociais

    relativosaosacontecimentosnavidadepessoascommaisde50anosdeidade.

    Oaprofundamentodasquestesquerelacionamidias,crenas,imagensevaloressprticas

    sociais, sobressaicomoumeixofundamentalquepoder subsidiarodesenvolvimentodeaesde

    prevenodoHIV/Aidse,aomesmotempo,contribuirparaadiscussodosdireitosdaspessoasna

    terceira idadeeparaseuacessoaosserviosdesade.Esperase,tambm,contribuir, mesmoque

    indiretamente,paraadiscussodemodelosdepromoosadevoltadosparaosidosos,quepossam

    21

  • serrealizadosemparceriasentreacomunidade,asuniversidades,osserviosdeatenobsica

    sade,especialmenteosdoProgramadeSadedaFamlia(PSF)queestsendoimplantadono

    Pas.

    Esperaseainda,comestudosdessanatureza,participardaconstruodareflexosistematizada

    naEnfermagemqueatuanosdiversosnveisdeatenosade,buscandoseincluiraintegralidade

    dasaesdeprevenoecontroledoHIV/Aidscomoeixocentraldessaatuao.

    3.Objetivo

    Analisarasrepresentaessociaisdepessoascomidadeacimade60anosportadorasdo

    HIV/Aids,compreendendocomoaexistnciadessainfecoestrepresentadapelosujeitoquesofre

    adoena,parabuscarapoiarformasnovasdepromoo,prevenoecontroledainfeco.

    II.METODOLOGIA

    No verdade que a mente humana no tenha passado porqualquerdesenvolvimentodesdeostemposprimitivoseque,emcontrastecomosavanosdacinciaedatecnologia,sejahojeamesmaqueeranosprimrdiosdahistria(FREUD,1974).

    1.Tipodeestudo

    Oestudofoideabordagemqualitativa, centradonaexpressodasubjetividadedossujeitos,

    utilizandoseateoria dasrepresentaes sociais. Naanlise foramaplicadasaspropostasdeAbric

    (2000,p.35)paraquemasrepresentaessociaissoelementosqueseestruturamemtornodeum

    22

  • ncleo central e de ncleos perifricos para a sistematizao do conhecimento na busca do

    aprofundamentodoobjeto.

    Napesquisaqualitativa, soextradosos resultados, comoopinies, atitudes, sentimentos e

    expectativas, itens que no podem ser quantificados, por seremdiferentes de pessoa para pessoa

    (SEVERINO, 2000). A pesquisa qualitativa possibilita essa viso, uma vez que o objetivo dos

    investigadoresqualitativostentarcompreendermelhorocomportamento,asexperinciashumanase

    oprocessomedianteoqualaspessoasconstroemsignificados,representaes,imagensesmbolos.

    2.Referencialtericometodolgico

    Todo indivduo se desenvolve em uma realidade social, com necessidades e significados

    culturais que moldam os prprios valores e que se expressam no quotidiano, por meio de

    representaessociaisconstrudas,nosensocomum,nasinteraes,nasideologiasenosmodosde

    viverdaspessoas.

    Seja teoria, conceito, categoria analtica ou explicativa, o importante que a expresso

    representao social vem sendo de importncia primordial para se compreender a relao

    sujeito/objeto,principalmentequandosetratadasubjetividade,dasingularidadeedosensocomumdo

    cotidianodaspessoas.

    Estudos de Spink (1996) revelam que as representaes sociais podem ser includas em

    diferentes camposdeestudos, comoosociofilosfico, odapsicologia cognitiva eodapsicologia

    social. Noprimeiro, destacase o contexto ideolgico emque os fatos se passam; no segundo, o

    processocognitivodeapreensoeconceituaodosobjetos;noterceiro,osconceitoseimagensque

    constituemcategoriasexplicativasdeobjetos,elaboradas, veiculadaseconsolidadasnocursodas

    comunicaes(conversaes)cotidianas,passandoainteragircomoconhecimentoprticodosenso

    comum.

    Depois de Durkheim, que buscava explicaes para os fatos sociais, utilizouse do termo

    representaes,masnoaprofundouoconceitonemasuautilizaonasociologia,SergeMoscovicifoi

    oprimeiroautorautilizaraexpressorepresentaessociais,delimitandoseucampodeestudoao

    mbitodaPsicologiaSocial.Forgas(1981)afirmaqueMoscovicinoconceitua,masassinalaquea

    nooderepresentaosocialremetea:

    23

  • um conjunto de conceitos, afirmaes e explicaes originadas noquotidiano, no curso de comunicaes interindividuais. Elas soequivalentes, em nossa sociedade, aos mitos e sistemas de crenas dassociedades tradicionais; elas podem ser vistas como uma versocontemporneadosensocomum(FORGAS,1981,p.27).

    Osindivduosparecemelaborarumraciocniocomum,pelofatodepartilharemosmesmos

    problemas sociais. A psicologia social possui como enfoque a construo social da realidade,

    valorizandoosaspectoscognitivoseoutrosquebuscamacentuarasdimensessociais.Assim,valoriza

    eacreditaqueosfatoresinternosdopensamento,bemcomoapercepo,aassimilao,aelaboraoe

    aorganizaodeidiasexercemumafunorelevantenaformaodeconceitos.Estesresultam,pois,

    darepresentaoemrelaoafatoresexternosmediadapelalinguagem,isto,pelafala,atravsdas

    interaessociaisqueseestabelecementreindivduosemseusdilogosformaiseinformais:

    As prticas cotidianas, revestidas das conversas do diaadia, esto semprefirmadas em observaes que transformam as pessoas em autodidatas ouenciclopdicosinterlocutores.Naverdade,asobservaeseostestemunhosdodiaadia originamse dos relatos de decises polticas ou de operaesmilitares,deexperinciascientficasoudeinvenestcnicas,dedescobertas,deinvenes,enfim,detodaaredederealizaeshumanas,anunciadasporjornalistas, cientistas, tcnicos e polticos. Estes relatos, cuidadosamenteelaborados,fazempartedomundododiscursoeparecemmuitodistantesdodomniocomum,entretanto,aosereminteriorizadospassamafazerpartedomundodasconversaes,comoocasodosgenesoudostomos,quetantocirculamemnossasimagens,nossasfalasenossoraciocnios(MOSCOVICI,1978,p.52).

    Desta forma, as representaes sociais ocorrem de maneira dinmica, interagindo com as

    condiessociaisconcretas,asformasorganizacionaisdasociedade,osatoresesuasprticassociais,

    que produzem formas especficas de conhecimento. So assim determinadas e determinantes das

    condiessociais,sendoafalasuareveladoraprimordial.Adescontraodasconversas,aforados

    argumentosencontradosnocalordasdiscussesdefimdetarde,vodandoaosfaladores,aomesmo

    tempo,umacompetnciaenciclopdicasobreostemasdadiscusso,assimexplicadaporMoscovici:

    medida que a conversa coletiva progride a elocuo regularizase, asexpressesganhamempreciso.Ecadaumficavidoportransmitir oseusabereconservarumlugarnocrculodeatenoquerodeiaaquelesqueestoaocorrente,cadaumdocumentaseealicontinuanopreo(MOSCOVICI,1978,p.52).

    24

  • ParaJodelet (1989),quearriscouafazeroqueMoscovici recusou(GUARESCHI,1996,

    p.16), isto , definir as representaes sociais, elas so umsaber prtico, isto , uma formade

    conhecimentosocialmenteelaboradaepartilhada.Moscovici,nessesentido,diz:

    Cada um de ns, enquanto homem comum fora de sua profisso comportasedamesmamaneiradiantedetodosesses documentosquesoparansosartigosdeumjornal,umacidentenarua,umadiscussonumcafounumclube,umlivrolido,umareportagemtelevisada,etc.Nadanosimpeaprudnciadoespecialistaounosprobedereuniroselementosmaisdsparesquenossotransmitidos,deinclulosoudeexclulosdeumaclasselgicadeacordo com as regras sociais, cientficas e prticas de que dispomos. Afinalidade no ampliar o conhecimento, estar ao corrente, no serignorante, nem ficar fora do circuito coletivo. Desse trabalho mil vezescomeado, repetido e deslocado de um ponto para outro da esfera, osacontecimentos e as surpresas que captama ateno doorigems nossasrepresentaessociais(MOSCOVICI,1978,p.55).

    Goffman(1999)revelaqueaexpressividadedoindivduoenvolveaexpressoqueeletransmite

    e a expressoque emite para a sociedade. Essa expressose transmite atravs de palavras e a

    linguagemocanaldecomunicaoedeinteraoentre oshomens,constituindosenamaneira de

    familiarizarsecomonovo.

    Sobopontode vista dadinmicadafamiliarizao comonofamiliar, Moscovici (1986)

    esclarece que as representaes sociais envolvemdois processos: a objetivao (transformao do

    abstratoemalgoquasefsico)eaancoragem(amarrao).

    A objetivao consiste na classificao, nomeao e na integrao do nofamiliarquiloquejfazpartedanossacompreensodomundo.Aproduodeesquemas,quesooriundosdanaturalizaodoconceito,eaancoragemestoinscritosnaconversa,nousodaspalavras,esobretudo,naquiloqueelasrepresentam:seusreferentes(objetosfsicosousimblicos).Aspalavraseaestruturaoqueasmesmastmentre si, nassituaes decompreensodomundo pelo pensador amador, so um indicador importante dasrepresentaes,namedidaemqueexprimemsistemasdeasseresmoraisedesaberprticodosensocomum(MOSCOVICI,1986,p.17).

    BergereLuckmann(1998),enfatizandoaimportnciadasconversasdodiaadia,consideramnas

    oveculomaisimportantedaconservaodarealidade.Paraeles:

    25

  • Podese considerar a vida cotidiana do indivduo em termos dofuncionamentodeumaparelhodeconversa,quecontinuamentemantm,modifica e reconstri sua realidade subjetiva. A conversa significaprincipalmente,semdvida,queaspessoasfalamumascomasoutras.Istononegaoricohalodecomunicaonoverbalqueenvolveafala.Entretanto,afala conserva uma posio privilegiada no aparelho total da conversa. importanteacentuarcontudo,queamaiorpartedaconservaodarealidadenaconversaimplcita,noexplcita.Amaiorpartedaconversanodefineemmuitaspalavrasanaturezadomundo.Aocontrrio,ocorretendoporpanodefundoummundoquetacitamenteaceitocomoverdadeiro.Assimumatrocadepalavras, comoporexemplo, bem,est nahoradeir paraaestao etimo,querido,passeumbomdianoescritrio,implicaummundointeirodentrodoqualestasproposies, aparentemente simples, adquiremsentido.Emvirtudedestaimplicao,atrocadepalavrasconfirmaarealidadesubjetivadessemundo(BERGERELUCKMANN,1998,p.2023).

    Assimsendo,podeseafirmarqueasinteraesancoramasrepresentaes,objetivamnaspor

    meiodossignos,quesoaspalavrasparaestesautores.Nopresenteestudo,asrepresentaessociais,

    socompreendidascomouminstrumentoparamelhorapreenderasubjetividadedaspessoascomidade

    acimade60anoscomHIV/Aids,apoiandosenanecessidadedeserecuperaronvelsimblicodas

    prticasdosatoressociaisenvolvidoscomoobjetodeestudo.

    As representaes sociais permitem no somente compreender e explicar a realidade, mas

    tambmguiamoscomportamentoseasprticas.Masqualamelhormaneiraparaseconheceroobjeto

    darepresentao?

    OpesquisadorfrancsJeanClaudeAbricpropeateoriadoncleocentral:

    A Teoria do Ncleo Central foi elaborada a partir da hiptese onde aorganizaodeumarepresentaoapresentaumacaractersticaparticular:noapenasoselementosdarepresentaosohierarquizados,mas,almdisso,todarepresentaoorganizadaemtornodeumncleocentral,constitudodeumoudealgunselementosquedo representaooseusignificado(ABRIC,2000,p.31).

    Essateoriasugerequesepodeconhecercommaisparticularidadeocarteressencialdeuma

    determinadarepresentao.Istopossveldescobrindosuaestrutura,definindoaposioquecadaum

    dosatributosdeimagemocupaeidentificandoaquelesqueconstituemoncleocentraleosquefazem

    partedosistemaperifrico. Essaidentificaopropiciaconhecerosatributosdeimagemquefazem

    partedessencleoequesoresponsveispeloprprioreconhecimentodoobjetorepresentado.

    26

  • ONcleoCentralumsubconjuntodaimagem,compostoporalgunsdoselementosconstituintesdessaimagem(atributos).Essesatributoscentraisgarantemimagemoseupoderderepresentaodoobjeto,comoummodelo.Seoselementoscentraisestoausentesdarepresentao(imagem)oobjetonomaisreconhecido(ABRIC,2000,p.31).

    Asimagenscriadaspodemsemoverouficarimveisepodem,tambm,tornaremsergidasou

    flexveis,dependendodasdiferenasdesujeitoparasujeito.

    Moscoviciconcordaquetodarepresentaocompostadefigurasedeexpressessocializadas:

    Conjuntamente, uma representao social a organizao de imagens elinguagens, porqueela reala e simboliza atos e situaes que nos tornamcomuns.Encaradadeummodopassivo,elaapreendidaattulodereflexo,naconscinciaindividualoucoletiva,deumobjeto,deumfeixedeidiasquelhesoexteriores.Aanalogiacomumafotografiacaptadaealojadanocrebrofascinante,adelicadezadeumarepresentao,porconseguinte,comparadaaograudedefinioenitidezticadeumaimagem.nessesentidoquenosreferimos,freqentemente,representao(imagem)doespao,dacidade,damulher,dacrianadacincia,docientista,eassimpordiante.Abemdizer,devemosencarladeummodoativo,poisseupapelconsisteemmodelaroque dado do exterior, na medida em que os indivduos e os grupos serelacionamdeprefernciacomosobjetos,osatoseasituaesconstitudospormiradesdeinteraessociais(MOSCOVICI,1978,p.2526).

    CelsoPereiradeS,outroestudiosodasrepresentaessociais,assimfalasobreestasociedade

    pensante:

    Naperspectivadapsicossociologiadeumasociedadepensante,osindivduosno so apenas pensadores de informaes, nem meros portadores deideologias ou crenas coletivas, mas pensadores ativos que, medianteinumerveisepisdioscotidianosdeinteraosocial,produzemecomunicamincessantemente suas prprias representaes e solues especficas paraasquestes que se colocam a si mesmos. Da mesma forma que se trata asociedade como um sistema econmico ou um sistema poltico, cabeconsiderlatambmumsistemadepensamento(S,1996,p.28).

    ValiososestudossobrerepresentaessociaiseAidstmcontribudoparaoconhecimentoda

    relao sujeito/objeto. Entre eles, estudos realizados por Joffe (2002, p. 300) sobrerepresentaes

    transculturaisdaAids,emcomunidadessulafricanasebritnicasnafrica,revelaramanegaodos

    sujeitoscomumfortesentimentodeeuno,noomeugruposobreofatoquedeaAidstenhase

    originadonocontinenteafricano.Opensamentobastantefreqentedequeadoenanuncairme

    atingir,semdvida,umfatorrelevante.Aoutilizarasrepresentaessociaisnareadapsicologia

    socialemrelaoaoHIVnumestudocomjovenssulafricanos,aautorapercebeuque:

    27

  • aoescolherpesquisaroprocessodeelaboraoderepresentaes(aoinvsdo contedo das representaes) a partir de estudos de caso emprofundidade(aoinvsdosmuitoscasosqueseriamnecessriosparaacessaronveldeconscinciacoletiva)focalizouamicroescaladasinteraes,ondeasrepresentaesassumemocarterderepertrios(JOFFE,2002,p.299).

    OutrotrabalhobastantesignificativofoiodaantroplogaSniaBarbosa,quefezumestudode

    casosobrearepresentaodasexualidadedasidosasdeOlinda/PEeconstatouqueagrandemaioria

    dasmulheresentrevistadasjouviufalardasDST,noentanto,porterempoucafreqncianaatividade

    sexual,nosepreocupammuitocomaprevenoaelas(BARBOSA,2002,p.7).

    Destaforma,asrepresentaesdirecionamaao,ouseja,omodopeloqualosindivduos

    vemarealidadedeterminaasuaformadeestarnomundo.Assim,pressupesequeasmaneirasdese

    preveniremoudesecuidaremapsainfeco,estonocernedasubjetividadedaspessoasquevivema

    experinciadeterHIV/Aidscomidadeacimade60anos.Talexperinciavemcarregadadecrenase

    valoresquedefinemoseucomportamentodiantedaenfermidade.

    Muitas vezes, no cotidiano, as pessoas somente percebem o risco e a gravidade de uma

    enfermidadequandosoporelaacometidaseseantesnohaviarisco,nemdeadoecimento,coma

    doena,oriscovisualizadocomosendodemorte(SILVA,2000,p72).Destaforma,asatitudesdas

    pessoasfrenteaumaenfermidadegrave,mesmoquesejaumapandemia,nemsemprevmcomuma

    percepodequepodem,umdia,seinfectar,levando,porvezes,neglignciaquantoaosmodosde

    preveno.

    Assimsendo,acreditasequeateoriadasrepresentaessociaistornaseadequadaaoestudodo

    objetodestainvestigao,porconsiderarapeculiaridadeeasubjetividadedossujeitosportadoresdo

    HIV/Aidscomidadeacimade60anos.

    3.Sujeitosdapesquisa

    Comoobjetivodeseobtermaterialverbalqueindiqueasrepresentaessociaisdepessoas

    comidadeacimade60anoscomHIV/Aidsforamentrevistadoscincohomensequatromulheres,que

    obedeceramatrscritrios:primeiro,teridadesuperioracinqentaanos;segundo,sersoropositivo

    paraHIV/Aidseterceiro,concordaramemparticipardoestudo.Umformulriodeconsentimentolivre

    eesclarecido(ANEXOD),contendoasinformaessobreoestudoeascondiesdeparticipao,foi

    apresentado aos participantes para ser assinado. No houve nenhuma resistncia por parte dos

    28

  • entrevistados,quesedispuseramafalarsobresimesmos,salvaguardandosuasidentidades,com

    usodecdigosparaaanliseeapresentaodosresultados.

    ApsaautorizaodoComitdeticadoHospitaldeDoenasTropicaisHDT2deGoinia,

    Gois,paraarealizaodapesquisa,(ANEXOAeB)edoComitdeticadaUFMG(ANEXOC),

    foi feita umabusca aonomedas pessoas no livro de registro do servio, segundoos critrios j

    estabelecidosanteriormente(ANEXOG).Localizadososendereosregistradosnolivro,foimarcada

    umavisitaaessaspessoas,quandoforamconvidadasaseincluremespontaneamentenoestudo,aps

    consentimentolivreeoesclarecimentosobreoobjetivoeocarterticodapesquisa.Ossujeitosforam

    entrevistados comdata, horrio e local definidos previamente pelos participantes, cabendolhes o

    direitodenoseexporanenhumtipodeconstrangimento.

    4.Cenriodapesquisa

    EmGoinia,capitaldoEstadodeGois,deacordocomosdadosdoSistemadeInformaode

    AgravosdeNotificaoemGois(SINAN/GO),atagostode2002,eram136oscasosnotificadosde

    pessoasacimade60anoscontaminadas(GOIS,2002,p.6),numapopulaode1.073.490habitantes,

    e o Hospital de Doenas Tropicais a principal instituio que atende portadores de doenas

    infectocontagiosas(ANEXOI).

    MuitosdospacientesqueestoregistradosnoHDTalichegaramcomodiagnsticopositivo

    paraHIV(feitonocentrodereferncia/Goinia)e,quandonoestointernados,retornamparal,

    periodicamente,parareceberemassistncia,medicamentosepreservativos.Ospacientesaliatendidos

    sopessoasdediferentesnveissociaiseeconmicos,ealgunsdelesmoramemcidadesdointerior,

    prximasCapital,taisso:AparecidadeGoinia,RioVerde,Piracanjuba,EdiaeSantaRosa.Seno

    possuemparentes e no tmcondies de se hospedarem, ficampor alguns dias no Condomnio

    Solidariedade,umainstituiogovernamentaldeapoioaosportadoresdeHIV/Aids.Htambmem

    2 HDT Sigla do Hospital de Doenas Tropicais Dr. Anuar Auad, que atende portadores de HIV/Aids, hansenase,tuberculose,ttanoereferncianacionalemdoenasinfectocontagiosas.Fundadoemjaneirode1977noespaofsicodoantigoHospitaldoPnfigo.SeantesafunobsicadoHDTeraretirardoconvviosocialosdoentesdevarolaesfilis,hojecontacomUTIeatendeemmdiaseismilpacientes/mserealizacercadesetemilexameslaboratoriais/msempacientesinternosouatendidosambulatorialmente(RELATRIODEGESTO,2001).

    29

  • GoiniaoCentrodeApoioaoDoentedeAids(CADA)umainstituiofilantrpicaquefornece

    cestasdealimentos,auxliojurdicoeacomodaes.

    5.Instrumentodecoletadeinformaes

    Asinformaesforamobtidasemdiscursooral,faceaface,medianteentrevistaabertaeem

    profundidade,comousodegravadorefitacassete.

    Realizouse, inicialmente um levantamento dos dados disponveis no HDT apenas para

    identificarosnomesdaspessoascomdiagnsticoparaHIV/Aidsquepudessemsercontactadaspara

    participardapesquisa.Considerandoseafalacomoreveladoradasconstruesefetivadasnarealidade

    social,utilizouseaentrevistacomoinstrumentoparaacoletadeinformaes,demodoagarantira

    compreenso das representaes sociais de pessoas com idade acima de 60 anos sobre Aids. A

    entrevistaviabilizouoacessosinformaesqueconsubstanciaramoobjetodesteestudo.

    DeacordocomopensamentodeMinayo(1996,p.109),oquetornaaentrevistainstrumento

    privilegiadodecoletadeinformaesparaascinciassociaisapossibilidadedeafalaserreveladora

    decondiesestruturais,desistemasdevalores,normasesmbolos(sendoelamesmaumdeles)e,ao

    mesmo tempo, ter a magia de transmitir, atravs de um portavoz, as representaes de grupos

    determinados,emcondieshistricas,scioeconmicaseculturaisespecficas.

    Antes de ligar o gravador, foi pedido o consentimento ao entrevistado, comomencionado.

    Todososparticipantesdapesquisaforaminformadossobreosobjetivosesobreoaspectovoluntrioda

    participao, compreservaodoanonimato, eaindasobreodireitodeseretiraremdoestudoem

    qualquermomentosemsofreremnenhumapressoouprejuzo,emcumprimentoPortaria196/96e

    tambmreconhecendoqueapesquisadecunhosociolgico,antesdetudo,umaformadeexpressara

    visoeahistriadevidadaspessoas,sendonecessriomanterorespeitoprofundoporelas,dacoleta

    anlise.

    Lakatos e Marconi (1990) afirmamqueaentrevista deveser entendida comoumdilogo

    livre. Para isso, foi elaborado o seguinte roteiro preliminar de memorizao (RPM) para o

    pesquisador, comquestes referentes ao modo comoo sujeito pensa e sente o acontecimento do

    HIV/Aids:

    30

  • 1. Eu gostaria que o(a) senhor(a) me falasse sobre a Aids. Comoo(a) senhor(a) est

    vivendo?

    Foramutilizadospontosdememorizao:

    2. Quantotemposabedodiagnstico?

    3. Comoestvivendodepoisdodiagnstico?

    4. Comoestotratamento?

    5. Ecomosoasrelaescomafamlia,comosamigos,como(a)companheiro(a)oucomo

    (a)namorado(a)?Easrelaesnotrabalho?

    6. Queperspectivaso(a)senhor(a)temparaaprpriavida?

    Dasreflexescolhidasnodiscursoforamidentificadasasrepresentaesqueossujeitostmem

    tornodainfecopeloHIVoudaAids.

    Aconfidencialidadefoigarantidapelautilizaodeumcdigo;e,paramanteroanonimatoe

    sigilo dos sujeitos participantes doestudo, conformeoque dispea Portaria 196/96doConselho

    NacionaldeSade(BRASIL,1996),estesforamrebatizadosde:Entrevistado1,2ou3...ouE1,E2,

    E3...)eossegmentosdefalaforamnumeradossucessivamentecomoS1,S2,S3...,parapublicaodos

    resultados.

    Em mdia, foi feita uma entrevista por dia, com o tempo de aproximadamente cinqenta

    minutoscada,procedendoseimediatamenteescutadetodaaentrevista,seguidadatranscrioliteral

    decadauma,emseparado,pelaprpriapesquisadora,jnumprocessodeanlisebuscandoosentido

    global do relato de cada entrevistado. Foi feita uma entrevista com cada sujeito e a interao

    pesquisadora/sujeitosedeudeformatranqila.

    Aquantidade deentrevistas foi estabelecida pelocritrio desaturaoqueexigiu queuma

    anlisepreliminarfosserealizadaduranteacoleta:asuspensosedeuquandohouverepetiodasfalas

    dossujeitos.

    31

  • 6.Anlisedasinformaescoletadas

    Aanlisedocontedodosrelatosrefleteumavisodemundo.Essavisodemundoedesi

    mesmosednaentrevistaemformadetrajetria.

    ApalavratrajetriatemsuaorigemdoLatim(trajectoreoqueatravessa+ia)esignifica

    linhadescritaoupercorridaporumcorpoemmovimento,oquenodiferedetrajeto,tambmdo

    Latim(trajectupassagem)esignificaespaoquealgumoualgotemdepercorrerparairdeum

    lugaraoutro,trajetria,percurso(TRAJETRIA,In:FERREIRA,1999,p.1698).Destaforma,para

    compreenderanoosociolgicadetrajetriabuscouseasidiasdosocilogofrancsClaudeDubar

    (1998).

    Para Dubar (1998, p.5) apud Silva (2000, p. 32), a trajetria diferenciada em duasabordagens:

    umachamadadetrajetriaobjetivadefinidacomoseqnciadas posies sociais ocupadas durante a vida, medida porcategorias estatsticas comtendncia a umageneralizao eoutra,trajetriasubjetivaquedizrespeitoaoenredopostoempalavraspelaentrevistabiogrficaeformalizadopeloesquemalgico, reconstrudo pelo pesquisador por meio da anlisesemntica.

    Assim,quandoosujeitoexpe,atravsdodiscurso,suavidaoubiografia,estrelatandoseu

    prprio trajectu, isto o seu percurso. Para compreender como esse percurso acontece, o qual

    compreendepassadoepresente,Dubar(1998)sugereessareconstruopelopesquisadorpormeiode

    anlisedesignificaoedarepresentaodosentidodosenunciados:

    Tratasedadisposioparticular,numdiscurso,dascategoriasestruturantes do relato, segundo as regras de disjuno econjunoquesupremaproduodesentido...umaformaderesumo da argumentao, extrado da anlise do relato e dadescobertadeumoumaisenredos,edosmotivospelosquaisosujeitoestnumasituaoemqueelemesmoestsedefinindo,a partir de acontecimentos passados, aberto para umdeterminadocampodepossveis,maisoumenosdesejveisemaisoumenosacessveis(DUBAR,1998,p.5).

    Assim,pelorelatopossvelextrairoenredoeajustificativaqueosujeitoforneceemseu

    discursoenquantoeleaindaestemprocessodedefinio.

    Fundamentandosenalgicadatrajetriasubjetiva,buscouse,atravsdaanlisedanarrativa,

    umadesconstruoeumareconstruodosdiscursos,extraindo,destaformaascategoriasdeanlise.

    32

  • Apsatranscrioliteraldosdepoimentosdosparticipantes,foramrealizadas,combasena

    teoria das representaes sociais, a leitura e a releitura deles, atentandoseparao processode

    leiturahorizontaldecadaentrevista,procurandosenocontedodotextoasinformaesrelativass

    representaesparaumaprimeiracategorizaoemprica,medianteostemasabordadospeloprprio

    sujeito.

    Destaforma,foipossvelelaboraraanlisedosrelatos.Assim,otextofoidivididoemfrases,

    porcontedoespecfico,representadasporsegmentosouseqnciasdefala(S1,S2...),osfatos(F1,

    F2...)easjustificativas/explicaesquedoparaestes(J1,J2...)queforamnumeradosemseguida.

    Cadaentrevistadofoiidentificadoconformejfoidescrito(E1,E2...).Logoaps,todosossegmentos

    coincidentes em torno de um mesmo objeto do discurso foram agrupados, nomeandose

    provisoriamentecadagrupodesegmentos,quandosebuscouasegundacategorizaoemprica.

    Com base na categorizao emprica, foi feita uma leitura transversal do conjunto de

    entrevistas, mediante a organizao do contedo em blocos temticos, sendo considerados os

    reagrupamentos de cada entrevista e comparados s conjunes e as disjunes do conjunto de

    entrevistas.

    NessesentidoFreitas(2003)2orientaosseguintespassos:

    Primeiropasso:atranscrioliteraldaentrevistagravada,atentandoseparaafidelidadedas

    expressesdosujeito.

    Segundopasso:aleituraverticaldecadaentrevistatranscritaparaumaprimeiraaproximao

    docontedodesta.

    Terceiropasso:aelaboraodeumpargrafoquesintetizeocontedodafaladosujeito.

    Quarto passo: o retorno entrevista para uma primeira anlise horizontal buscando as

    seqnciasdefala,colocandoentreparntesesaofinaldecadaassuntoanumeraocorrespondente,

    S1,S2,S3...paraseqncias;P1,P2,P3paraaspersonagens;F1,F2,F3paraosfatoseJ1,J2,J3para

    justificativas.Cadaseqnciacorrespondeumtematratado,naordemcomquesofalados.Issoquer

    dizer que a pessoa pode voltar a um determinado tema/assunto e a numerao em ordem de

    aparecimento.

    2 FREITAS, Maria Imaculada de Ftima. Anlise de Trajetria. Faculdade de Enfermagem, UCG, GoiniaGO:Comunicaopessoal:junhode2003.

    33

  • Quintopasso:anomeaodecadaseqnciacomocontedomaisimportantedela.Ao

    finalseterosttulosprovisriosdasseqncias,podendocomparar,apsteranalisadotambmas

    outrasentrevistasseestotratandodetemascomuns(ANEXOE),reagrupandoos.

    Sexto passo: aps a primeira categorizao (anlise da estrutura das falas) proceder a

    identificaodosncleoscentraiseperifricosdasrepresentaes(ANEXOL).Nessemomentobuscar

    as etapas sugeridas por Abric (1997): busca da estrutura e do ncleo central; identificao das

    ligaes;evidencializaodoselementoscentrais;verificaodacentralidadeeanlisedaorganizao

    (ABRIC,1997,p.26).

    Stimopasso:aelaboraodeumesquemaquepermitaidentificarquaissoosncleoscentrais

    equaisosperifricos, bemcomoosistemaperifricoqueossustentam.Assim possvelanalisar

    profundamentecadancleoeseusistemajuntoaostericos,isto,desenvolveratemtica,citando

    autores,fundamentando,apresentandoasfalasdaspessoassobreotema,dialogandocomosautores.

    Essaanlisepermitiuumadesconstruoeumareconstruododiscurso,apartirdoqualfoi

    possvelextrairascategoriasempricasetericasdeanlise(ABRIC,2000,p.30),queexpressamas

    representaessobreosdiferentesobjetosdosdiscursoselaboradospelosindivduos,isto,sobreseus

    valores,sentimentos,(ANEXOF),significadosejulgamentos,enfim,sobreasrepresentaessociais

    emtornodainfecopeloHIVdepessoascomidadeacimade60anoscomAids.

    IIIANLISEDASENTREVISTAS

    Nosetenhapordifcilescaparmorte,porquemuitomaisdifcil escapar maldade; ela corre mais ligeira que a morte(SCRATES,1969,p.49).

    Nestecaptulo,propeseaapresentarosresultadosdapesquisadecampo,comadiscussodas

    representaes sociais elaboradas por pessoas com idade acima de 60 anos soropositivas para

    HIV/Aids.Noprimeiromomento,foifeitaumadescriodascondiesmateriaisdosentrevistados

    34

  • (ANEXOH);nosegundomomentosoapresentadaseanalisadasasrepresentaes sociais em

    tornodainfecopeloHIV,isto,osncleoscentraiseseussistemasperifricos.

    1.Apresentaodosentrevistadosedosresultados

    AsentrevistasforamrealizadascompessoassoropositivasparaHIV/Aids,internadasemum

    hospitalpblicodeGoinia,noperodode2002a2003.Osentrevistadossoemnmerode09(nove),

    queoptaramemconcederaentrevistanoprpriohospitalemqueestavaminternados,noCADA3eno

    CondomnioSolidariedade4.

    a)Idade/Escolaridade/AtividadeProfissionalAfaixaetriadosentrevistados,pocado

    estudo,variavaentre62(cinqentaedois)e65(sessentaecinco)anos,todoscomoprimeirograu

    incompleto,oquenodiferedoqueapresentadonaliteratura,principalmenteemrelaosmulheres.

    Vermelho,BarbosaeNogueira(1999,p.8)afirmamemseuestudoqueagrandemaioriadasmulheres

    (75%)exibiunveldeescolaridadebaixoesomente8%atingiunvelsuperior.

    Quantosmulheres,todasquatroentrevistadassodonasdecasa.Entretanto,emrelaoaos

    homens,hosquemantmrelaessexuaiscomoutroshomens,osquaisrepresentavamnopassadoo

    maiornmerodeinfectadosecomnveldeescolaridadesuperior,eagoraseapresentamcomnvelde

    escolaridadeprimrio. Dentreeles, um cabeleireiro, ooutro lavradoreo terceiro auxiliar de

    serviosgerais.Doshomensheterossexuais,umlavradoreooutronotemprofissodefinida.

    Tais informaes mostram que, no grupo de pessoas participantes desta pesquisa, h o

    predomniodonvelprimriodeescolaridade,comdiferentesidades,apontandoparaumacoerncia

    comoquadroatualdaepidemiologiadaAidsnoBrasil,isto,tmapenasescolaridadeprimria,

    baixopoderaquisitivo,vivememcidadespequenas(BRASIL,2001).

    b)SexoecategoriasdetransmissosexualDogrupoestudadoparticiparamnovepessoas:

    quatromulheresheterossexuaisecincopessoasdosexomasculino,sendoquedoisapresentaramse

    comoheterossexuaisetrsdizemfazersexocomhomens.

    3CentrodeApoioaoDoentedeAids/GoiniaGOONG4UmainstituiogovernamentaldeapoioaosportadoresdeHIVcarentesquevmdointeriorenotmondesehospedar.

    35

  • Levantamentos estatsticos do Ministrio da Sade (BRASIL, 2001) indicam maior

    crescimentodenotificaodeinfecoentremulheresdoquedeoutrosgrupossexuais.Essedado

    mudouosrumosdasestratgiasdecampanhas,assimcomoaslinguagensadotadas.

    Empesquisadivulgadaemmaiode2002peloProgramaNacionaldeDSTeAidsdoMinistrio

    daSade(BRASIL,2002),aAidscresceentreosheterossexuaisediminuientreosusuriosdedrogas.

    OsdadosrevelamqueatransmissodeAidsporrelaesheterossexuaisrespondepor80,8%doscasos

    dadoenaentreasmulheresepor40%doscasosentreoshomens.Em2000,asrelaesentrepessoas

    desexodiferenteforamresponsveispor79,3%doscasosentreasmulheresepor35,2%entreos

    homens.Nogrupoparticipantedopresenteestudo,ascategoriasdeexposio,hetero,homo,paraos

    homenseheteroparaasmulheresestorepresentadas,mostrandoastendnciasjconfirmadaspelo

    MinistriodaSade,nosestudoscitados.Chamaaateno,sobretudo,aexpansodainfecoem

    mulheresnafaixaetriaacimados50anos.

    c)EstadoCivileformadecontgioOgrupodeentrevistadosdapresentepesquisacomposto

    desolteiros,vivosoudesquitados,isto,semvnculocomumparceiroestvelecompredominncia

    deinfecoporviasexual. ExatamentecomonasexpectativasdoMinistriodaSade,encontrouse

    umnmeromaiordepacientescontaminadospelaviasexual(oitodeles)eumapessoaqueacredita

    tambmtersidoporestavia,masnotemcertezaportersidousuriadedrogas.

    Quantoaousodopreservativo,amaioriarevelaquenofaziausodepreservativoequese

    infectouporviasexual.AinfecopeloHIV(VrusdaImunodeficinciaHumana)passveldeatingir

    homens e mulheres de qualquer idade, cor e condio social, religio e nacionalidade, sendo o

    comportamentosexualaprincipalviadetransmisso(PARKERetal.1994a).

    Aformadecontgiodivididaporcomportamentosexual,nestainvestigao,estapresentada

    noquadroaseguir:

    QuadroIOESTADOCIVILEAFORMADECONTGIOPart. Pormeioderelaesheterossexuais PormeioderelaeshomossexuaisdesprotegidasE1 Pormeioderelaeshomossexuais, masnosabe

    exatamente de quem se infectou, porque tevemltiplosparceiros.

    E2 Acredita que foi por transfusodesangue,mas o marido faleceu com Aids, no tem

    36

  • certezadaorigemdainfeco.Infereseafonterelaosexual.

    E3 Por meio de relaes homossexuais com umparceiroetemcertezadisso.

    E4 Acredita que foi por relaes sexuais. Afamlia lida com drogas e diz no saberexatamenteafontedecontgio.Infereseafonterelaosexual.

    E5 Por meio de relaes homossexuais, mas noexplicitaisso,apenasdizquetemumparceirocomquem se relaciona, que no soropositivo edesconhecesuacondio.

    E6 Acreditaquefoiporrelaessexuaiscomosegundomarido,maserausuriadedrogas.Infereseafonterelaosexual.

    E7 Por meio de relaes sexuais com outrasmulheres que no a sua esposa, mas noexplicitaisso,deformaclara.

    E8 Pormeioderelaescomparceirosdomesmosexo,apesardeterrelaescommulheres.Nosabedequem se infectou, mas insiste que teve relaessexuaiscommltiplosparceiros.

    E9 Acreditaqueseinfectoudeumparceiromaisjovem, mas tem dvidas a esse respeitoporqueserelacionoucomoutrohomemqueserecusavaausarpreservativo.

    Diantedoexposto,arelaocommaisdeumoucommltiplosparceirosestpresenteem

    E1,E3,E4,E7,E8,E9.DestesapenasE3temcertezadecomoecomquemsecontaminou;os

    outrosdizemnosaberexatamentecomosecontaminaram.Todoselestiveramrelaessexuais

    desprotegidas,ouseja,semousodopreservativo.

    SegundooBoletimEpidemiolgicodoMinistriodaSade(BRASIL,2001),dosvintemil

    novoscasosporano,trsmilsodepessoasacimade60anos,sendo27,4%doscasosportransmisso

    heterossexual;17,0%homossexual;9,7%bissexual;18,1%porusodedrogasinjetveis.

    Amaioriadosentrevistadosconfirma,assim,situaesdeexposioaovrusHIV,sobretudo

    aquelasrelacionadascomrelaessexuaiscommltiplosparceiros.

    d) Tempo decorrido da Infeco relevante destacar que todos os participantes, ao

    adoecerem, em algum momento, viveram a experincia da internao hospitalar, entretanto, os

    entrevistadosforamunnimesemdizerquenotinhamcertezaquantoaotempodecorridodainfeco.

    37

  • Lembramsedadatadodiagnstico,masnoexatamentequandoseinfectaram,oquedificulta

    identificarseelesseinfectaramhpoucotempoelogoadoeceramouseestocomovrushmais

    tempo.Seaprimeirahipteseforverdadeira,podesignificarqueosujeitocomidadeacimade60anos

    maissuscetveleporissoadoecerapidamente;seasegundapremissaforreal,podesignificarque

    essaspessoasestocomovrushmuitotempoetmsobrevividoaeleathoje.

    2.Asrepresentaessociaisdepessoascomidadeacimade60anosemtornodainfeco

    peloHIV

    NesteestudobuscasediscutircomoaexistnciadoHIV/Aidsestrepresentadanosujeito

    que sofre a doena. A opo pela Teoria das Representaes Sociais (MOSCOVICI, 1978) e,

    basicamente,abuscadoncleocentraledosistemaperifrico(ABRIC,2000,p.35),isto,oque

    fixo,duro,masnoimutvel,eoquemveleflexvelnasrepresentaesemtornodaexperincia

    dadoena,permitiuaidentificaodasrepresentaesdosportadoresdeHIV/Aidscomidadeacima

    de60anos. Assim, foi possvel compreender comoas representaes sociais estorefletindoo

    cotidianodessessujeitos.

    As representaes dos sujeitos a respeito da Aids provavelmente tm origem nas

    informaes oriundas das vises cientfica (profissionais da Sade, Por meio de palestras e

    campanhas),religiosa(naigrejaetemplos)emiditica(campanhaspublicitrias)(ANEXOJ).

    DeacordocomHerzlich&Pierret(1992),porexemplo,aAids,comofenmeno,remete

    maneira como esta doena identificada na mdia e como a mesma classifica os seus

    acontecimentos.Atravsdessamesmamdia,aAidssetornouumobjetodetomadadeposio,de

    enfrentamentoedeclivagens,tantocoletivas,quantoindividuais.Parker(1994b)tambmevidencia

    queopapeldasrepresentaesnotrajetodaepidemianoBrasilfoitantooumaisimportantequea

    Aids,poisapareceuprimeirocomofenmenonamdia.Noentanto,necessriosalientarquetais

    representaesestonocernedetodasasquestesreferentesaoprocessosadedoena,institudos

    culturalmente. Os costumes religiosos, as informaes cientficas, alm do constante

    bombardeamento de idias atravs da mdia precisam ser repensados para que o trabalho de

    prevenoultrapasseoslimitesdamerainformao.Asbarreirasculturais,arraigadasnosncleos

    duros das representaes, esto repletas de significados e merecemdiscusso a fimde que os

    38

  • conceitoseosprconceitossejamquestionadosnasinteraesentreprofissionaiseclientes,no

    interiordafamlia,nosveculosdecomunicaodemassaetc.

    Aseguir,apresentamseasrepresentaessociaisdepessoascomidadeacimade60anosa

    respeitodainfecopeloHIV/Aids,encontradasnosdiscursosdossujeitos.

    Esquema1RepresentaesdossujeitosemtornodaAids

    Essesncleosnosoestticosepodem,atravsdeumsinergismomultifatorial,semoveRde

    formacentrpeta(deforaparadentro)oudeformacentrfuga(dedentroparafora).

    39

    normal:maisumadoenadevelho

    OssintomascomoconscinciadaAids

    Noteriaqueacontecercomigo

    Ameaaconstantede

    morte

    Aexignciademudaremoshbitosdevida Trabalho

    Depresso

    Disposioparafalarmais

    Aidsnocncer

    DescrenanoSistemadeSade

    Tratamentodifcil

    Aids:essetremnotemcura

    Prevenoantesdedepois

    Dupladiscriminao

  • Ao receber o diagnstico, o sujeito com idade superior a 50 anos, em processo de

    envelhecimentoeportador,podeexpressartodasessasrepresentaesouelaspodemestarfixas

    nomeioemquevive,atravsdalinguagemcientfica,religiosaoumditicaesocompartilhadas

    nasatitudes,nasfalasdocotidianoenossilncios.

    SegundoAbric,(1994),citadoporSouzaFilho,(2000,p.147),noafreqnciacomque

    umdadoelemento aparece que ir definir sua posio em termos de centralidade ouenquanto

    elemento perifrico, mas sim o fato desse elemento dar significado a outros elementos mais

    freqentes.Talconsideraosetornaparticularmenteimportantequandoselevaemcontaqueas

    representaessociais podemsertransformadascombaseemnovasprticas oueventossociais,

    impostospelomeioexterior.

    DeacordocomAbric(1994),apudCostaeAlmeida(2000,p.259),precisoconhecerno

    apenas o contedo de uma representao social, mas, sobretudo, como ele est organizado e

    estruturado,ouseja,quelugarcadaelementoocupanaestruturadarepresentao.Istoporqueo

    conhecimentodoselementosmaisestveis,rgidosecentraisdarepresentaoedoselementosmais

    flexveisquepermitircompreenderainteraoentreofuncionamentoindividualeascondies

    sociais nasquais osatoressociais evolueme, conseqentemente, oferecer pistassobrequala

    melhor forma de intervir, no sentido de provocar mudanas das representaes. No caso das

    representaessociaisdepessoassoropositivasarespeitodoHIV/Aids,foramencontradosncleos

    maiscentraiseoutrosmenoscentrais,cadaumcomseusistemaperifrico,osquaisserodivididos

    didaticamenteemtrsgrandescategorias,aseguir:

    a) Asrepresentaesemtornododiagnstico: ameaaconstantedemorte;ossintomascomo

    conscinciadaAids;descrenanoSistemadeSade;Aidsnocncer;noteriaqueacontecer

    comigo(negao,aAidsestnooutro).

    b) As representaes em torno do tratamento: tratamento difcil, convivncia com a Aids;

    depresso; Aids: esse trem no tem cura; o distanciamento/renomeao da Aids; a no

    prevenoanteseousodopreservativodepois;aexignciadesemudaremoshbitosdevida.

    c) Asrepresentaesemtornodasinteraessociais:duplopreconceitoservelhoeestarcom

    Aids;otrabalho;normal,maisumadoenadevelho;ossentimentosdesvelados,disposio

    parafalarmais.

    40

  • Aanlise dasrepresentaes sociais complexa. No suficientereunilas, umaapsa

    outra, ediscutir cadaumateoricamentedeformavertical ouhorizontal, mastridimensionalou

    espiralar.OprprioMoscovici(1978)refereseaTeoriadasRepresentaesSociaiscomoelsticae

    complexa,porqueresultantedemiradesdeinteraessociais.Assim,fazsenecessrioesclarecer

    queaestruturadarepresentaonohorizontal,osncleosnosoformadosparalelamente,masde

    formadinmicaenolinear.

    Numa primeira fase de anlise emergiram das falas dos sujeitos trs grandes categorias

    (diagnstico,tratamentoeinteraessociais).Entretanto,numasegundafasedecompreenso,percebe

    seque,parasecompreenderaestruturadasrepresentaesprecisoanalislasdosncleosperifricos

    paraocentral,oquemuitasvezesaparentafaltadeconexodiretacomascategorias.Todavia,issono

    significa dizer que elas noestejam ligadas entre si, comonuma teia (ANEXOL) emaranhada e

    multifacetada,numadimensodeprofundidade.

    SegundoosestudosdasRepresentaesSociais(MOSCOVICI,1978;ABRIC,2000,SPINK,

    1996), os ncleos perifricos so passveis de mudana, so menos rgidos, ou seja, podem ser

    alcanados, modificados oumesmoseremextintos comotempo, comotrabalhodeeducaoem

    sade.Osncleosmaisprximosdocentrosomaisinflexveis,menosacessveisscampanhasde

    preveno e conscientizao, mas, no decorrer do tempo, atravs de constantes interaes e

    acompanhamentodequemconheabemasrepresentaessociaisdessaspessoas,essasrepresentaes

    podemserrompidas.Oncleomaiscentraldetodosaameaaconstantedemorteprovavelmentes

    sereliminadodoimaginriodossujeitosquandosedescobriremacuraouavacinacontraaAids.

    Aanlisedasfalasdoconjuntodasrepresentaessociais,atravsdosncleosmaisperifricos

    paraomaiscentral,permitiuevidenciar,demaneirahierarquizada,aseguinteseqnciacentrpeta:

    Osncleosmaisperifricos:a)Aidsnocncerb)descrenanoSistemadeSadec)

    tratamento difcil d) depressoe) Aexigncia de semudaremos hbitos de vida f) no

    prevenoanteseprevenodepoisg)trabalhoh)convivnciacomaAids,i)disposioparafalar

    mais.

    41

  • Osncleosmaisprximosdocentroa)noteriaqueacontecercomigob)normal,

    maisumadoenadevelhoc)ossintomascomoconscinciadaAidsd)dupladiscriminao:ser

    velhoeestarcomAidse)Aidsessetremnotemcura.

    Oncleomaiscentrala)Aidsameaaconstantedemorte.

    A anlise do material discursivo possibilitou acessar informaes acerca do contedo das

    representaessociaisdaAids.Dessaforma,podeseafirmarquehimagensnegativasepositivasa

    respeitodaAidseconstituemelementosqueestruturamessarepresentaoerefletemumcontedo

    maisnegativoquepositivo,noqualaAidsrepresentadacomoumaameaaconstantedemortees

    nopiorporquenoumcncer.

    AsimagensnegativasemtornodainfecopeloHIV/Aidsforam:Aidsameaaconstantede

    morte;Aidsessetremnotemcura;descrenanoSistemadeSade;tratamentodifcil;depresso;

    noteriaqueacontecercomigo;ossintomascomoconscinciadaAids;dupladescriminao:servelho

    eestarcomAids.

    Jaspositivasforam:Aidsnocncer;aexignciadesemudaremoshbitosdevida;no

    prevenoanteseprevenodepois;convivnciacomaAids;disposioparafalarmais;normal,

    maisumadoenadevelho.

    Quandoossujeitos revelaram, emsuasfalas, teremseinfectadocomovrusHIVequea

    maioriadelespassoupelodiagnstico,tratamentodifcile,nasinteraessociaissofreramomedo,

    inclusivedamorte,opreconceito,adepressoeaprenderamaconvivercomaAids,provavelmente

    essasrepresentaes sedoaolongodotempodeformamodificada, porque, nodecorrer desuas

    vivncias, novasinformaes, conhecimentos, opinies,teorias,experinciasforampartilhadascom

    outrossujeitosportadoresdeHIV/Aids, comosprofissionais,comamigoseoutraspessoasdoseu

    crculosocial. Essasexperinciasmaisremotas(conhecimentoj estruturado),aoseremlembradas,

    associamseecombinamseanovasinformaesrecebidasdomeioexteriorquevooriginarnovas

    experincias e novas representaes sociais. A esse processo de integrao cognitiva do objeto

    conhecidodenominaseancoragem(MOSCOVICI,1978).Parecequearevelaodasrepresentaes

    sociaisdessessujeitossobreasexperinciasadquiriramtraosnegativosepositivos,quesetornam

    conflitos interiores, podendosersalutares paraquepossahavermudanasdeconcepes, atitudes,

    opinies,enfim,dasprpriasrepresentaes,asquaisserodiscutidasaseguir,emseusncleosmais

    perifricos.

    42

  • 2.1.Osncleosperifricosdasrepresentaesemtornodainfecopelo

    HIV

    Os ncleos considerados perifricos so mais acessveis s argumentaes das outras

    pessoas,scampanhaseducativas,porquenosotorgidos.Aseguirserpossvelperceberque,a

    representaodequeaAidsnotemcura,apesardeserumarepresentaoforte,podesereliminada

    quandoacurafordescobertaouquandoaAidsnomaissignificarmorteiminente.

    2.1.1. Aidsnocncer

    Esquema2Aidsnocncer

    Osegundoncleo central encontradonaanlise referese idia de que a Aids no

    cncer.

    43

    Aidstemconsolo

    Poderiaserpior Jvimuitagentecomcncer,mascomAidsno

    Aidstemtratamento

    Aidsnocncer

    Cncerpiorporquemutila,tirapedao

    AidstemsadaAidsnotirapedao

  • Oselementosperifricosquecirculamessencleocentralso:Cncerpior,porque

    mutila,tirapedao;Aidspelomenostemsada;temconsolo;notirapedao;Aidstem

    tratamento,poderiaserpior;jvimuitagentecomcncer,comAidsno.

    ArepresentaoqueossujeitosdapesquisafazemdaAidsseconstruiusocialmentepela

    comparaoaocncer,considerandoaumaimagempositiva.Deummodogeral,asrepresentaes

    dossujeitosacercadaAidsengloba,nessecontexto, imagensmiditicasecientficas.Suasfalas

    revelam:

    Ctemquelevantaracabeaecontinuar,porqueissonoofimdomundo,piorumCncerquetematadeumahoraproutra,n?(E1)

    Euachoqueapiordoenaqueexisteocncer.(E6)

    Pelomenosnumumcncer.Porqueessetremoseguinte,adoutorafalouqueseeutomarosremdiosdireitinhos,ocoquetel, eunumsaro,maistemcura.Possoviverdedezavinteanos,agorasefosseumCncer,cmexeuacabou,ocncerfatal.(E7)

    Euvoufalarproc:ela(aAids)umadoenadiferente,numigualaumcncer.(E8)

    Ocncervistocomoumadoenadegenerativa,quedesfiguraseusportadoresequemata,

    semapelo.Mesmoemseconsiderandoque,namdiaenashistriascontadasentreaspessoas,de

    quetambmaAidsmutilante,ossujeitosconhecedoresdoseudiagnstico,vivendocomAids,j

    agregaraminformaeseexperinciasqueasfizeramreconstruirasimagenssobreaprpriadoena.

    Porm, com relao ao cncer, mantmrepresentaes mais rgidas, negativas, que servemde

    comparaocomaAids,resultandoemumaformadereconfortoparaaprpriasituao.Aliadoa

    isto, h, aindauma imagemreforada, inicialmente pela mdia, dequea Aids era umadoena

    estrangeira,deartistas,pessoasfamosas,dehomossexuais.Oqueestranhopertenceaooutro,que

    noseparececomigo,quenoviveigualamim.Essasrepresentaeslevaramaoscomportamentos

    deriscoeaopreconceitoreforadocontraoshomossexuaiseportadoresdeAids.

    Aesserespeito,Costa(1992)afirmaque

    j no se ouve mais dizer que a Aids um cncer gay. No entanto, opreconceito sexualpermanece. Continuaseadescreveraspossibilidades derealizao afetivosexual homoerticas como doena, anomalia, neurose,

    44

  • perverso,incidncia,etc.Comisso,querendoouno,criamseproblemasmoraisgravesparamuitosindivduoscomessetipodeinclinaosexual,quevorefletirsenaformacomoreagemdiantedoriscodeinfecopeloHIV(COSTA,1992,p.20).

    Destaforma,podeseafirmarqueossujeitosrelacionamocncercomaAids,colocandoas

    numaescaladerepresentaodegravidadedasdoenas,provavelmentedevidoaofatodequea

    Aidsumadoenanovaeocncerumadoenaconcretizadacomoperigosa,quemata.Assim,a

    Aidssetorna,paraeles,maisaceitvelqueocncer,quetirapedaoefatal.Poroutrolado,o

    cncernoenfrentaproblemascomodesvelamento,mashsempreumoutromaisdoentequeele.

    Ossujeitosexpressam,destaforma,asuareaofrenteinfeco,expressandooseumecanismode

    defesaaofalarquehsituaespioresqueaAids,nocaso,ocncer.

    2.1.2.DescrenanoSistemadeSade

    Esquema3DescrenanoSistemadeSade

    45

    Mdicoexaminaenoachanada

    NodassistnciaadequadaNopedemexame

    deHIV

    DescrenanoSistemadeSade

    Parareceberbenefciotemqueestaraleijado

    NingumdesconfiaquevelhopodeterAids

  • OatoderepresentaradescrenanoSistemadeSadefoiapoiadonoseguintesistema

    perifrico:mdicoexaminaenoachanada;nopedemexamedeHIV;ningumdesconfia

    que velho pode ter Aids; para receber benefcio temque estar aleijado; no d assistncia

    adequada.

    Ainternei,depoissadohospitalecontinuavaamesmadiarriaeperdadeapetite[...]omdiconoachavanada[...]nopedianada.(E1)

    Eutavadoente,doente,tododiafaziaumexamediferente,enada.(E2)

    Eutivequelevartantodocumentoaquidohospital,ajuntamdicamuitorigorosa,eufiqueiumanoencostado[...] eutavamuitofraco,agoraeuestouaquipratomarsangueeesperaroresultado[...]ajuntamdicanoajuda,ssetivermorrendo.(E3)

    Euestouruimfazdias,mascadqueelesresolveram?.(E4)

    Precisariadarmaisassistncia.(E5)

    Meuirmoficouruim,deutoxoplasmose,meningite,tuberculose,elefoienopassoulnapercia.difcil.Eutenteiarrumarumbenefcio,maspransque portadors se tiver morrendoemcimadeumacama, temqueestardeficiente.(E6)

    Fuinummdico,fuinoutro,eletirouradiografia.Oremdioqueeuestavatomandoparecequeeraerrado[...]Disseramqueeraherpesequeprecisavadeotorrino.Afoiqueeufuinootorrinoeelemeindicouparaodoutorquepediuoexamedessetremqueoceisfala.Eufiqueinohospitalonzedias,eunovioexame,adotorasfalou,nomemostrou.(E7)

    Sevocnocorreratrs,vocvaiadoecerevaimorrer.Igualela(amdica)explicou:avocvaichegarnumpontoquevocnovaiescapar,porqueadoenaamonta,tomaconta.Euqueriaqueamdicapassasselogo,porqueelafalou que quando eu comeasse a tomar os remdios ia melhorar tudo, iamudartudo.(E8)

    Do ponto de vista da teoria das representaes sociais, no so todas as experincias

    (pessoaiseprofissionais)queascompem,masaquelasqueforamganhandosentidoeimportncia

    para os indivduos conforme as suas necessidades e interesses. Os sujeitos, ao narrarem suas

    dificuldadesparaseremtratadosecuidados,mesmoquandonoestimuladosatal,provavelmente

    expressamcontedosquepassaramporumprocessodetriagem,deorganizao,seleoecriao

    deimagemarespeitodoatendimentodosprofissionaisedosServiosdeSadequeso,sobretudo,

    46

  • negativas.Porm,considerandoqueaAidsvemsepopularizandohquaseduasdcadas,nose

    justificaadesatenodestes,mesmoporque

    em1997, a Coordenao Nacional das DST/Aids explicita formalmente asdiretrizes bsicas para a assistncia ao portador, publicando o manualAconselhamentoemDST,HIVeAidsDiretrizeseProcedimentosBsicosque, atentoaosdireitoshumanos,asseguraqueatestagemdevesersemprevoluntria,confidencialesigilosa.Comaexpansodaepidemia,tornaramsefundamentaistantoaampliaodaofertadatestagem(comaconselhamento)no sentido da preveno, quanto da assistncia, favorecendo o tratamentoprecoce, adiminuiodehospitalizaeseoaumentodaqualidadedevida(FERREIRA,1999,p.57).

    Arepresentaodossujeitosdequeomdiconosabeoqueeletemenemoencaminha

    corretamente paraa definio dodiagnstico. Formase, dessemodoumciclo vicioso, noqual

    pareceseincluirofatodequeomdiconoacreditaqueoidosopossaestarinfectadocomoHIVe,

    porisso,nopedeoexameimediatamentediantedosprimeirossintomas.Opacientetambmno

    acreditanomdico,porquenoatendidocomogostariaounegaodaprpriacondio.Desta

    forma, semseuproblemaresolvido, semcondies e nemconhecimento para resolver sozinho,

    caminhaparaoagravamentodossintomas,culminando,muitasvezesnamortedosujeito.Criamse,

    destamaneira,representaesdedescrenanoSistemadeSade.

    Nasfalasdossujeitos,explicitamseodescasoeofatodenosecogitarodiagnsticode

    HIVemidosos,almdoexcessoderigordajuntamdicaparaaliberaodaaposentadoria.

    Nessesentido,valerefletirsobreaafirmaodeRamos(1992,p.84):

    ArespostasocialAidsreconhecidamentederejeio,atravsdopnicoedopreconceito.Emboraodebatesobreotemajestejaamplamentedifundidopelos meios de comunicao, o que se observa nos servios de sade adesinformaoeodespreparodeseusprofissionaisparalidarcomoproblema.Estefato,associadocriseexistentenosetor,agravaasituao.

    Aanlisedasfalasdosentrevistadosapontaparaasseguintesrepresentaesnoatendimento

    spessoascomidadeacimade60anos,comosesegue:

    a)Mdicooprofissionalquenodescobreoqueeletem,masdremdio.

    Omdiconopediuexame,fuimesmopelaminhacabea,osmdicosnopedianada,fiztodotipodeexame,fuinummdico,fuinoutro.(E1)

    47

  • Ajuntamdicanoajuda,ssetivermorrendo.(E6)

    b)Psiclogoaparecesemprecomoalgumqueorienta,defende,explicaeacalma.

    Apsiclogaexplicoutudo.(E1)

    Eu tomoos medicamentos direitinho, s vezes eu peoajuda a psicloga

    tambm.(E5)

    c)Assistentesocialalgumqueouveeexplica,nafaladeumdosentrevistados:

    EufuinoCais.Chegueil, falei tudocomaassistentesocial. [...] Queeuachavaqueeutavacomessetrema.Aeladisse:venhaamanhcedoquevocvaiassistirumapalestra.A,fuidemanhcedinhoassistirapalestraequandoeuviapalestrafalei:ah!tudooqueelafalounapalestraeutenhotudinho.(E1)

    d)Enfermeiroeoutrosprofissionaisdaequipedeenfermagemnoaparecemnasfalasde

    formaexplcita, mas relacionados aocumprimento dehorrio de mediao, na fala de umdos

    entrevistados:

    Eutinhaquetomaroremdiooitohoras,ontemfuitomareranovehoras.(E2)

    Assim, nas falas nasquais emergiramrepresentaes sobreosprofissionais desadeno

    atendimentospessoascommaisde50anosinfectadaspeloHIV,podeseafirmarqueh uma

    distnciaentreoesperadopeloclienteeorealizadoporalgunsprofissionais,oquereforaoncleo

    centraldedescrenanoSistemadeSade.

    Nessesentido,valeriaperguntaracercadasrepresentaesquetmosprofissionaisdesade

    sobreaAidsna3aidade,aprofundandooconhecimento.Aqui,podesepressupor,porexemplo,que

    estestrazemavelharepresentaonaqualosidososnoseriamincludos,umarepresentaoque

    correntenasociedade.Osprpriosidososacreditamqueissonoiriaacontecercomigo,porque

    provavelmentealgodooutro,sobretudodosmaisjovens. Essedesacreditardoriscocomidade

    48

  • acima de 60 anos, de ambas as partes, parece ser um elemento de peso no processo de

    constituiodasrepresentaessociaistantodopacientequantodoprofissionaldasade.

    SegundoMagalhes (2002), oprofissional dasade temarepresentaodequeoidoso

    poderterarteriosclerose,masnoAids,reforadapelavisodequeoidosonopraticasexo:

    As pessoas j possuemessas informaes e h umconsenso que o idosopassardeformanaturalportodosessesprocessosatqueamortechegue.Noentanto,oquenoseesperaqueessaseqnciasejaquebradaviolentamentepelainfecodeumvrus,tipoHIV,quetrazemsuahistriaamensagemdefatalidaderpida.Almdisso,podecarregarconsigoaimagemdepuniopelaassociao ao sexo. Esperase reumatismo, arteriosclerose e no Aids(MAGALHES,2002,p.47).

    Assim,fazsenecessrioreelaborarcontinuamenteotrabalhodepreveno,quetambm

    da ordemde repensar o que est constitudo culturalmente, buscando ultrapassar os limites da

    simples informao, construindo atividades de educao em sade que sejam eficazes para

    profissionaisepopulao.

    SegundoABRIC(2000),oprocessodemudanadeumarepresentaosocialpodeocorrer,

    entreoutrasformas,pelaintegraoprogressivanoncleocentraldeesquemasativadospornovas

    prticasparaformarumnovoncleocentral(transformaoprogressiva).Nosetrata,portanto,de

    meramudanadecomportamento,masderevisaroscostumes,osconceitoseasprticasalienadas

    deconscientizao.Tratasedeaesdemdioelongoprazovoltadasparaorespeitoeabuscada

    sadeparaessaspessoaseasoutrastambm.

    49

  • 2.1.3. Otratamentodifcil

    Esquema4Otratamentodifcil

    Sustentandoestencleoaparecemosseguinteselementosperifricosarespeitodotratamento:

    cansativo; enjoativo; faz mal; muitos remdios; causamdepresso; dependncia; solta o

    intestino.Porm,mesmosendodifcil,melhoratudo;mudatudo;aumentaotempodevida;d

    paraesperaracura.

    Esseparadoxovividopelosentrevistados,natentativa,semprefrgil,demanteraadesoao

    tratamentomedicamentoso.Osrelatosexplicitamessasrepresentaes:

    Mesmoquetomeoremdio,vaidecaindo...Seeufossemaisnovoseriaoutracoisa.(E1)

    Eutrateicincoanostomandoremdiosemfalharumdia(ocoquetel).Masaelemuitoforte,temquetomarcomleite.Omiracepeumazulcompridoassim,tomeielemaisdeano.Eleseguraoestmago,maissoltaointestino.Eu

    50

    Enjoativo

    Dependncia

    Soltaointestino

    Melhoratudo

    Aumentaotempodevida

    Muitosremdios

    Dparaesperaracura

    Mudatudo

    Causadepresso

    Cansativo

    Fazmal

    Otratamentodifcil

  • tenhoumproblemamuitosrio.Eutenhoquetomarosremdioscomleite,masaquinotemleite.Omdicofalouquetenhoquetomaroitohorasdamanheoitodanoite.Ontemeufuitomaroremdioeranovehoras.(E2)

    s vezes a gente temdesdedepresso, porqueoprprio medicamento, ocoquetelqueagentetomacausaessadepresso.Todososdiasterquetomarummontederemdio,ummontedecomprimidos.muitodifcil,inclusivetemmuitosportadoresquemorremporquedesistemdotratamentoporquecansativo,enjoativo,dnuseas.Agentetemqueinsistir,issooquetdandocerto.Eutomoosmedicamentosdireitinho,svezeseupeoajudaapsiclogatambm.Atqueumdiatenhacura,umavacinadetantosemtantosmeses,oualgumacoisaquecontroleessadoena,porqueassimosofrimentomenor.(E5)

    svezeseuficofraca,quandoeuprodetomarosremdios.Tomomeusremdiosdireitim,maistemveizquemeddepresso.svezestlnofundodopooesubodenovo.(E6)

    Esseremdionomepertence.Adoutorafalouqueseeutomarosremdiodireitinho,ocoquetel,eunumsaro,maistemcura.(E7)

    Amdicadissequequandoeucomearatomaroremdiovaimelhorartudo,vaimudartudo.(E8)

    Eupretendotomarosremdiosdireitinho,euqueroficarcurada.(E9)

    Semundialmenteestimasequeapenas1%dototal daspessoasinfectadaspeloHIVtem

    acessoaotratamentoeaosmedicamentos(TORRES,1997),mesmoessaspessoasvivemdemaneira

    difcil o quotidiano do tratamento, com todos os efeitos colaterais, mesmo sabendo que os

    medicamentostrouxerammelhoriaparasuasvidas,livrandoosdadecadncia.

    Apesardenoaparecercommuitafreqncianafaladosentrevistados,adecadnciaum

    fator importante e que est implcito na vida dos sujeitos pesquisados. A dependncia do

    medicamento aparece nas falas deles pois, a Aids, acimade tudo, representa adependncia do

    medicamento que dever ser tomado at o fim da vida. A idade como um complicador, a

    persistnciadeefeitoscolaterais,osentimentodeimpotncia,fazemcomqueeles,muitasvezes,

    queiramdesistir. Entretanto, vivemo dilema de saber que os antiretrovirais representam uma

    chancedesobrevivncia.Osprpriosprofissionaisdasadecuidamdepassaressarepresentaoa

    respeitodomedicamento,queasalvaoparatudo.Adoutorafalouqueseeutomarosremdio

    direitinho,ocoquetel,eunumsaro,maistemcura,afirmaE7.achancedemelhoraroudeno

    51

  • morrertorpido.Destaforma,ocoquetelvistocomoumaformademelhorareprolongara

    vida,fazendotolerarotratamento.

    Com a chegada dos antiretrovirais, a infeco pelo HIV passou a ser encarada pelos

    profissionaiscomoumadoenacrnica,emqueoinfectadotemquesesubmeteratratamentose

    tomarosmedicamentostodososdias.Comisso,odiagnsticodeinfecopeloHIVdeixoudeser

    consideradouma"sentenademorte".

    No entanto, de acordo com o Ministrio da Sade, assim como se constatam estudos

    cientficos sobre o tema, umdos maiores obstculos enfrentados pelos portadores de HIV o

    preconceito;muitaspessoasdeixemdefazerosexamesparasabersetmovrus,impedindoo

    comeodotratamentooumesmo