Mas o brasil não parou, continua batalhando, as construções de discursos e imagens da política...

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0 Sinara Carneiro de Oliveira “Mas o Brasil não parou, continua batalhando”: As construções de discursos e imagens da política nacional nos folhetos populares baianos (1950 – 1980) Universidade do Estado da Bahia Conceição do Coité 2010

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Sinara Carneiro de Oliveira

“Mas o Brasil não parou, continua batalhando”: As construções de discursos e imagens da política nacional nos

folhetos populares baianos (1950 – 1980)

Universidade do Estado da Bahia Conceição do Coité

2010

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Sinara Carneiro de Oliveira

“Mas o Brasil não parou, continua batalhando”: As construções de discursos e imagens da política nacional nos folhetos populares baianos

(1950 – 1980)

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Banca Examinadora da Universidade do Estado da Bahia, como exigência para obtenção do grau de Licenciado em História.

Orientador: Prof. Rogério Souza Silva

Universidade do Estado da Bahia Conceição do Coité

2010

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Banca examinadora

Conceição do Coité___ de___de_____

________________________________ Prof. Orientador Rogério Souza Silva

________________________________

Prof. ________________________________

Prof.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a meu professor orientador Rogério Souza Silva pelos ensinamentos, disposição

e paciência na construção deste trabalho. A Fabiane Pinto, Maiara Gordiano e Kécia Dayana,

pelo apoio amigo, pelos debates, leituras e opiniões do texto. Àqueles que contribuíram

indiretamente, Nilva e Diógenes, pelo afeto; A meu pai Godoval e meu irmão Galvane pela força

diária e ao meu avô Samuel Ramos, pela torcida e atenção. A minha Tia Suely de Oliveira

sempre presente nos meus estudos. Ao meu noivo Hernando Cunha, pelas tantas viagens para

fazer pesquisa e, principalmente pela paciência e compreensão, agradeço também pelo apoio da

sua família. A minha irmã Luciana Carneiro, também estudante de História, pelo seu

companheirismo, sempre me ajudando em tudo que preciso, tem participação direta neste

trabalho, por ter sido a pessoa que despertou em mim a curiosidade do trabalho com cordel, que

fez leituras do meu texto e opinou sobre ele. E por fim, a minha mãe Gerusa, que por forma

malabarísticas fez de tudo pelo meu curso e por esta monografia, a você minha mãe dedico este

trabalho.

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RESUMO

Este trabalho analisa a Literatura de Cordel produzida na Bahia, captando nela elementos políticos e também interligados, elementos de cunho social através de suas múltiplas linguagens (escrita/visual) e formas (história/poesia/ficção) que revelam contextos em que estão inseridas, possibilita leituras de um ponto de vista diferente do tradicional, em sentido inverso analisamos a história de baixo para cima, percebida por sujeitos e segmentos das classes populares. Este trabalho compreende a análise da política nacional, dos fatos que estes folhetos relatavam e os significados que lhe atribuíam poetas e ouvintes, que muito pode nos dizer sobre o mundo ao seu redor. Através do folheto lê-se uma época, o período deste trabalho são as décadas de 1950 e 1980, os autores baianos trabalhados são José Gomes, o Cuíca de Santo Amaro, Rodolfo Coelho Cavalcante e Minelvino Francisco da Silva. Palavras-chaves: folheto popular – política

ABSTRACT

This paper analyzes Cordel Literature produced in Bahia, picking up her and political elements also interconnected elements of social through its multi-language (written / visual) and forms (history / poetry / fiction) that show the contexts in which they operate, allows readings from a different point of view of traditional, conversely analyze history from the bottom up, perceived by individuals and segments of classes. This work includes the analysis of national policy, the facts that these leaflets and the meanings attributed to poets and listeners, who can tell us much about the world around them. Through the leaflet reads a time period of this study are the 1950 and 1980, the authors worked in Bahia are José Gomes, Opossum Santo Amaro, Rodolfo Coelho Cavalcante and Minelvino Francisco da Silva. Keywords: leaflet popular – policy

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ____________________________________________________6 CAPÍTULO 1: A Literatura de Cordel como fonte histórica _________________13 CAPÍTULO 2: “Os embromadores do povo”: Denúncia, crítica política e social nos folhetos populares _________________________________________________23 CAPÍTULO 3: “O Dragão do fim da Era”: O cordel no combate ao perigo comunista no Brasil________________________________________________39 CAPÍTULO 4: “A vaca política”: imagens e discursos políticos nos folhetos religiosos ________________________________________________________57 Considerações Finais _______________________________________________73 Referências Bibliográficas ___________________________________________76 Fontes___________________________________________________________80

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INTRODUÇÃO

“Os heróis fazem a história, mas também a fazem os anti-heróis e os vilões. E o anti-herói mais fascinante será antes de mais nada, o próprio povo, na sua luta diária para sobreviver num mundo as vezes cheio de miséria, pobreza e outros males. O cordel concentra a história disso tudo.”1

A literatura popular em verso - escrita num dado período e lugar sobre os mais diversos

assuntos, acaba por registrar acontecimentos, fatos, crenças, eventos sociais, políticos e

econômicos de uma época. Acreditando que nela contém poesia, história e ficção, mas que

trazem elementos que revelam sua contemporaneidade, possibilitando leituras do contexto em

que estão inseridas.

Os folhetos de cordel têm espaço de criação vasto no Brasil. Desde fins do século XIX

essa literatura surgiu na península Ibérica e por volta do século XVI chega ao Brasil por meio dos

colonizadores portugueses. Aqui a produção do cordel foi favorecida pela interiorização de

máquinas impressoras na região. A maioria da população que apreciava os cordéis era composta

por analfabetos. Sobre essa relação verso impresso e oralidade, Ana Maria Galvão, em seu

trabalho realizado em Pernambuco, mostra que a leitura dos folhetos era coletiva, feita em voz

alta e intensiva, sendo, portanto, a própria estrutura do texto – versos curtos e rimas - de fácil

compreensão, favorecendo as relações entre analfabetos e semi-analfabetos proporcionando

práticas de letramento. Os depoimentos da sua pesquisa indicam a alfabetização por intermédio

do cordel.2

Gilmário Brito, em Culturas e linguagens em folhetos religiosos no Nordeste: inter-

relações escritura, oralidade, gestualidade, visualidade, coloca que:

1CURRRAN, Mark J. História do Brasil em cordel. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,1998.p. 28.

2 GALVÃO, Ana Maria de Oliveira. “Ler e ouvir folhetos de cordel em PE: 1930 – 1950”. Tese de Doutoramento da Faculdade de Educação da UFMG, 2000.

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É importante salientar que esse texto poético articulava, além de gravuras, outras linguagens: a vocalidade, o canto, a música, os desafios, a recitação coletiva, os gestos e as “performances” que no caso nordestino, constituíam-se como um conjunto de estratégias que facilitavam a memorização/transmissão de histórias, idéias, costumes, valores, moral, crenças, possibilitando múltiplas formas de incorporações pautadas em palavras chaves, que voltavam para oralidade, formando verdadeiras interconexões a partir das matrizes poéticas de tradições orais/escritos/iconografias.3

A narrativa dos folhetos tomou proporções de “jornal do povo”, considerando a

disposição do seu texto mais acessível do que o texto jornalístico em prosa. Assim, foi se

afirmando como uma criação independente em relação à literatura oficial, institucionalizada da

época.

Para os habitantes do interior, o cordel desempenhava uma importante função

Dada a ausência, na maioria dos casos, de meios alternativos de informação e divertimento, os autores e poetas cantadores do cordel continuaram a desempenhar papel necessário na vida diária. Só à medida que novas estradas e os veículos de comunicação social principiaram a alcançar o interior, na década de 1950, esse quadro começou a mudar.4

Questionando em O que é literatura popular? Joseph M. Luyten defende que em

qualquer literatura, seja ela portuguesa grega, alemã, são sempre encontradas manifestações

poéticas, que ao longo dos anos foi cedendo lugar a prosa e, quando chegamos ao século XX, a

poesia comparada as outras manifestações literárias ocupam pouco espaço.

“A grande razão desse fato é que as sociedades humanas, quando são iletradas, tem como único recurso a memória para guardar aquilo que acham importante.” 5

3 BRITO, Gilmário Moreira. Culturas e linguagens em folhetos religiosos no Nordeste: inter-relações escritura,

oralidade, gestualidade, visualidade. São Paulo, 2001. Tese (Doutorado) – Universidade Católica de São Paulo, p. 255. 4 SLATER, Candace. A vida no barbante: a literatura de cordel no Brasil. Rio de Janeiro.: Civilização Brasileira, 1984, p. 26. 5 LUYTEN, Joseph M. O que é literatura popular. 4 ed. São Paulo. Editora Brasiliense, 1987, p. 7.

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Daí a tendência em ordenar as mesmas mensagens em forma poética ritmada para facilitar

a memorização.

O autor apresenta uma análise da literatura de cordel no Brasil e as influências que sofreu

ao entrar em contato com o universo urbano politizado das grandes cidades. Antes praticamente o

único veículo de informação das camadas populacionais do interior do Brasil, com o êxodo rural,

o cordel passa a ser portador de reivindicação de cunho social e político.

Com essas mudanças no meio da produção do cordel, influenciada pela modernização-

urbanização, muitos escritores argumentaram que este tipo de literatura estava em decadência, o

que de fato nunca ocorreu, pois mesmo concorrendo com os novos meios de comunicação a

produção de folhetos não pára, o que houve foi uma mudança de temas e muitos dos seus leitores

continuaram sendo fieis à informação dos versos. Até hoje há muitos folheteiros ativos, como

referência, Franklin Maxado. Américo Pellegrino Filho em seu artigo Literatura de cordel

continua viva no Brasil, defende a idéia de que esta literatura não morreu e esta completando

cerca de cem anos bem vividos.

Argumenta-se que este gênero da poesia popular impressa, que ocorre especialmente no

nordeste, passou a ser valorizado por estudiosos ou intelectuais brasileiros, depois de um artigo

de Orígenes Lessa na Revista Anhembi, publicado em dezembro de 1955, e talvez principalmente

depois de outro artigo, do estudioso francês Raymond Cantel, publicado no Lê Monde no ano de

1969. Afirma que a partir da década de 70, o assunto se espalhou pelos estudiosos brasileiros.

O autor discute que para além da previsão apressada da morte dos livretos populares, o

interesse repentino e a falta de embasamento e pesquisa levaram à mudança de nome. No

contexto popular onde livretos são criados, vendidos e lidos, o nome é “folheto” ou “folheto de

trovador” como alguns se autodenominavam, estes têm em média oito páginas. É considerado

“romance” ou “historia” quando a narrativa, é mais longa e exige dezesseis a trinta e duas ou

mais páginas. A denominação cordel tem origem erudita, influência de Portugal, e acabou

chegando ao vocabulário de autores populares. Segundo o autor criou-se também este

neologismo, como “cordelista” e “cordelismo”, que estão longe do padrão terminológico popular.

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Mark Curran, em História do Brasil em cordel6 procura analisa como o valor informativo

do cordel o fez comentador ímpar de cem anos da história nacional. Em seu trabalho mostra a

produção do cordel em diferentes épocas. Discute sobre o valor documental dessa literatura, sua

importância enquanto meio de expressão popular e sua função jornalística, vindo a registrar cem

anos da história brasileira em folhetos populares. Curran fala, então, de uma história do Brasil

que não é oficial, contada nos folhetos de feira produzidos pelas camadas mais humildes da

sociedade brasileira.

Sobre o período aqui analisado, afirma que a modernização e as mudanças ocorridas no

Brasil a partir dos anos 50 afetaram bastante os cordéis. Sua forma tradicional de escrita seria

mantida, no entanto vozes engajadas passariam a falar do mandato de Vargas, crescimento da

esquerda, os governos de Jânio Quadros e de João Goulart e o Regime Militar.

Maria Ângela Faria Grilo, fala sobre o caráter informativo do cordel, segundo a autora ao

mesmo tempo que representam uma forma de literatura, informam sobre os acontecimentos da

época. O poeta faz uma espécie de reportagem, mas sempre introduzindo novos elementos que os

diferenciam dos jornais. Nesse sentido, o folheto de cordel se transforma numa rica fonte de

pesquisa para a história, para a sociologia, para a antropologia e para a literatura. 7

Há, sem dúvidas, trabalhos que valorizam o cordel como registro, documento e memória

da história brasileira, mas ainda existe uma carência de trabalhos históricos, sendo que a maioria

dos estudos se desenvolve na área da Linguagem, Educação e Literatura. Neste intento buscar-se-

ia mostrar aqui o valor histórico do folheto popular.

A literatura de folhetos tem sido mais valorizada entre literatos, são poucos os trabalhos

de cunho histórico que problematizam essa fonte como reveladora de um contexto. Dessa forma,

a proposta é problematizar os versos, questioná-los, historicizá-lo, compreender o que expressam

e quando não explícitos vislumbrar e apreender o que de fato está representando.

Tratamos mais especificamente sobre as representações da política nacional nos folhetos

populares, compreendendo as décadas de 1950 a 1980.

Elegemos três cordelistas e o critério utilizado para a escolha foi a preferência por

escritores que tiveram como espaço de produção a Bahia. Assim, com base no levantamento feito

6 CURRRAN, Mark J. História do Brasil em cordel. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,1998. 7GRILLO, Maria Ângela de Faria. A literatura de Cordel na sala de aula. In: Ensino de História: conceitos, temáticas e metodologias. Martha Abreu e Rachel Soihet organizadoras. Editora: Casa da Palavra, 2003,p. 121.

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na Biblioteca Renato Galvão pertencente ao Museu da Casa do Sertão/UEFS, optamos, pelos

cordelistas de maior número de folhetos disponíveis.

Os autores de cordéis aqui analisados são: Cuíca de Santo Amaro de Salvador, cujos

cordéis escolhidos correspondem a década de cinqüenta até o ano de 64, ano da sua morte;

Rodolfo Coelho Cavalcante, que residiu também na capital, escreveu com freqüência na década

de 60; e por fim, sobre os anos 70 são analisados os folhetos de Minelvino Francisco da Silva, de

Itabuna. A questão das décadas em destaque deve-se ao fato destes escritores terem produzidos

mais folhetos nestes períodos, mas a analise aqui não está restrita à década de maior freqüência

de escrita, por exemplo, além da dos anos 60, Rodolfo Coelho Cavalcante escreveu nas décadas

de cinqüenta e setenta também.

A escolha de três autores deve-se então a questão do período da escrita, se

complementam na questão temporal, eram os escritores baianos mais ativos na época; na temática

e na escrita, há pontos em que se assemelham como em outros se distanciam, o que intensifica

ainda mais a analise, a escolha de mais de um autor acalora a discussão permitindo questionar em

que pontos convergem ou divergem, proporcionando opiniões distintas. E também a questão

espacial, a Bahia é rica na produção de folhetos, no entanto pouca atenção tem sido dada aos

cordéis desta região se comparado aos estudos sobre outros estados nordestinos.

É relevante pontuar que cada escritor tem influências diferentes, podem apresentar hábitos

de diferentes segmentos sociais. É importante considerar que seu texto pode ter diferentes

significados para autor, ouvinte e leitor. E é esse também um dos motivos da escolha de não

apenas um autor, na possibilidade de avaliar diferentes versões que sirva para fazer comparações

ou ponte.

É, sobretudo devido às fontes que se atribui a escolha de data e autor. A maior disposição

de cordéis desses autores viabiliza este trabalho.

Importante mencionar que estes folhetos, por mais que se assemelhem aos jornais

diferenciam-se deles entre outros aspectos, por não ter a obrigatoriedade do relato diário. Os

cordelistas escreviam com certa espontaneidade e também oportunamente quando percebiam que

o tema do folheto poderia lhe render boa vendagem. Por esse motivo os folhetos não são lineares,

pode ocorrer a escrita de dois ou mais exemplares sobre um dado assunto, como também algum

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fato ficar isento de escrita, o que também pode ocasionar uma leitura, um fato não escrito pode

também ter significados implícitos.

Neste trabalho, as fontes documentais utilizadas foram do tipo escritas e iconográficas. As

fontes escritas deste trabalho são, sobretudo, os folhetos de cordel de Cuíca de Santo Amaro,

Rodolfo Cavalcante e Minelvino Francisco, que inscritos num tempo e espaço, inseridos dentro

de um contexto, produziram versos pelos quais é possível visualizar imagens políticas e também

sociais de uma época.

Para tal também foram imprescindíveis as fontes bibliográficas sobre o cordel, em

especial as obras biográficas sobre seus autores que deram aparato a esta pesquisa mostrando a

origem destes autores, a vida familiar, escolar, o trabalho, nos dando base para interpretar suas

posições e anseios.

“A biografia é hoje certamente considerada uma fonte para se conhecer a historia. A razão mais evidente para se ler uma biografia é saber uma pessoa, mas também sobre a época, sobre a sociedade em que ela viveu.”8

Assim, Auxiliaram este trabalho fontes bibliográficas como A presença de Rodolfo

Coelho Cavalcante na moderna literatura de cordel de Joseph Mark Curran; Vida e luta do

Trovador Rodolfo Coelho Cavalcante de Eno Theodoro Wanke; Ele o tal, Cuíca de Santo Amaro

e Noticias biográficas do poeta popular Cuíca de Santo Amaro de Edilene Mattos. Obras ligadas

ao histórico do cordel como História do Brasil em cordel de Mark Curran e A vida no barbante:

a literatura de cordel no Brasil, essas obras foram essenciais na realização deste estudo

possibilitando o diálogo dos traços biográficos dos autores e seus escritos.

Também fundamentaram este trabalho, as fontes iconográficas. As capas dos folhetos, que

oferecem uma visualização do escrito, da história narrada, além dessa conexão visual e escrito,

traz em si uma mensagem completa, não precisam necessariamente do texto para confirmá-la.

A provocação feita por este estudo de analisar um contexto histórico através do cordel,

tomando-o como fonte que relatam o momento pelo qual passava o país e tal como ele era

percebido pelo povo, construídos por estes sujeitos e sendo práticas do grupo social em que

8 BORGES, Vavy Pacheco. (org.) PINSKY, Carla Bassanezi. Fontes Históricas. São Paulo:Contexto, 2005, p. 215.

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estavam inseridos, está organizada da seguinte forma: no primeiro capítulo fazemos uma

discussão teórica sobre a literatura de cordel como fonte histórica; no segundo capítulo

analisamos em essência a critica política e social dos folhetos de Cuíca de Santo Amaro; no

terceiro, o posicionamento político de Rodolfo Coelho Cavalcante escrevendo em combate ao

comunismo; no quarto e último capitulo são colocados os elementos político-religiosos de

Minelvino Francisco da Silva. A analise periódica destes capítulos tem como momento inicial a

morte de Getúlio Vargas até fins do período militar no Brasil. Por fim, são postas as

considerações finais à analise do contexto histórico nacional visto através de folhetos populares

escritos na Bahia.

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Capítulo 1: A Literatura de Cordel como Fonte Histórica

Alguns estudos historiográficos têm caminhado no sentido de romper com a idéia

aristocrática da cultura, tradicionalmente posto que as classes populares eram desprovidas do

saber (sem cultura) e nada mais eram consideradas como “camadas inferiores dos povos

civilizados”9. Atualmente, com a ampliação do sentido de cultura, ao tentar compreender tudo o

que pode ser apreendido de uma sociedade, ocorre o que Peter Burke denomina por “descoberta

do povo”, lado aos estudos em volta do clássico, acadêmico e científico, passa-se a reconhecer

seus correspondentes populares, suas múltiplas criações e recriações e suas variações em épocas e

sociedades passam a ser vistos como objeto de explicação histórica.

Com este alargamento de campo de estudo há, utilizando a expressão de Le Goff, uma

“revolução documental”10 do estudo de história, fugindo da investigação feita essencialmente de

documentos de arquivos. Com o campo ampliado a Nova História tende a valorizar o informal.

Esse trabalho está situado na História Cultural, campo de pesquisa vasto que agrega

problemáticas a começar pelo próprio conceito de cultura. O olhar histórico antropológico dado

por Clifford Geertz sobre este termo é instigante, defendendo em seus ensaios um conceito de

cultura essencialmente semiótico:

“Acreditando como Max Weber, que o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias e a sua analise; portanto, não como uma ciência experimental em busca de leis, mas como uma ciência interpretativa, à procura do significado”.11

Em a Interpretação das culturas, apresenta a prática de descrição densa - o fazer

etnografia - como uma tentativa de construir uma leitura em busca de significados, de algo que

nos parece estranho ou inexplícito, ou que possa ser observado em campos rotineiros, como

9 GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela inquisição. Tradução Maria Betânia Amoroso, São Paulo: Companhia das Letras, 200, p.3. 10LE GOFF, Jacques et al. A Nova História. Trad. Ana Maria Bessa. Lisboa: Edições 70, p. 10. 11 GEERTZ, Clifford: A interpretação das culturas, Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1989. p.4.

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observar rituais ou escrever um diário. Para Geertz, a cultura não é um poder ou algo ao qual

podem ser atribuídos casualmente os acontecimentos sociais, os comportamentos, as instituições

ou os processos; ela é um contexto, algo dentro do qual podem ser descritos de forma inteligível -

isto é, descritos com densidade.12

Colocado os embates presentes no campo da história cultural importa salientar que entre

as suas múltiplas abordagens é na Cultura Popular que esse trabalho está mais especificamente

situado. A fonte aqui utilizada são Folhetos de Cordel, literatura popular em verso, que tem

espaço de criação histórico vasto no Brasil desde o início do século XX.

O poeta de cordel escrevia o que se passava sobre um dado período e lugar, suas

narrativas curtas e de grande carga oral facilitava a memorização fazendo com os versos

circulassem como uma espécie de jornal, já que estes eram escassos e seu formato em prosa mais

difícil para serem compreendidos num segmento da sociedade de maioria analfabeta.

Hoje essas narrativas representam um registro, documento e memória da história

brasileira e uma possibilidade de estudo dos significados que estes sujeitos partilhavam, aqui em

particular referimo-nos a segmentos da população baiana que apreciavam os cordéis escritos

entre nos anos de 1950 a 1980.

Pontuo que se trata do estudo de certo segmento das classes populares para não

homogeneizá-la de todo, considerando uma série de condições diversas de moradia,

comportamento, trabalho, crenças e de gênero entre os populares. Com base no que Thompson

alerta em Costumes em comum sobre as generalizações da “Cultura popular”, segundo o qual, se

esvaziam se não postas firmemente dentro de contextos históricos específicos, sendo o próprio

termo “cultura”, utilizada como um consenso faz com que passe despercebidas as contradições

sociais e culturais ou certas oposições existentes dentro do conjunto13.

Para este trabalho é particularmente importante a discussão das obras de Mikhail Bakhtin,

Carlo Ginzburg e Robert Darton, historiadores culturais com linhas de pesquisas que em muitos

aspectos convergem. Estes embasam e norteiam esta pesquisa, compreender suas metodologias é

imprescindível.

Através da obra de um letrado, Bakhtin consegue assimilar toda a cultura popular do

12 GEERTZ, 1989, op. Cit., p.10. 13THOMPSON, Edward P. Costumes em comum: estudos sobre a cultura popular tradicional. Trad. Rosaura Eichemberg. São Paulo: Companhia das Letras, 1998,p. 17.

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período, mostrando existir uma influência recíproca entre as classes subalternas e a dominante.

Em A Cultura Popular no Renascimento e na Idade Média o objeto de estudo de Bakhtin é

François Rabelais, homem singular no seu tempo, e seus escritos subverte os valores oficias da

época tornando possível perceber a multiplicidade de manifestações de uma cultura

marginalizada.

Procurando compreender o fato de Rabelais ser o menos popular, menos compreendido e

estimado entre os escritores da literatura mundial, Bakhtin mostra que os seus contemporâneos e

quase todo o século XVI tinham uma postura exatamente oposta, até mesmo por estarem

inseridos em meio às tradições populares, literárias e ideológicas da época. Mas nota que a

unidade, as imagens e elementos constitutivos do mundo Rabelaisiano a partir do século XVI e

principalmente após o XVII aparecem totalmente incompatíveis.

A solidão particular de Rabelais deve-se ao fato de não se ajustar aos cânones e regras da

arte literária vigente desde o século XVI14. Bakhtin reclama a interpretação dada pelos homens

dos séculos seguintes a Rabelais, sua essência não foi inteiramente evidenciada, estudados à luz

das regras culturais, estéticas e literárias da época moderna. No que diz respeito aos seus

contemporâneos, estes não podem fornecer uma resposta aos nossos problemas, uma vez que para

eles, esses problemas não existem.

Bakhtin diz que compreender as imagens rabelaisianas - em grande parte enigmáticas - só

é possível através de um estudo que considere a profundidade das suas fontes populares, pois

suas imagens são perfeitamente posicionadas dentro da evolução milenar da cultura popular.

Estuda minuciosamente a multiplicidade das manifestações- risos, espetáculos, obras cômicas

orais ou escritas, festas, vocabulário familiar e grosseiro- sobre o universo Rabelaisiano.

Notando a base popular dos escritos de Rabelais, Bakhtin escreve sobre a diferença capital

entre os cânones grotesco e clássico, que na realidade histórica viva, nunca foram estáticas nem

imutáveis, ao contrário, sempre houve entre os dois cânones muita forma de interação, luta,

influências recíprocas, entre cruzamentos e combinações. Este trabalho foi publicado em 1965

sua teoria de reciprocidade entre a cultura da classe subalterna e a classe dominante influenciou

gerações vindouras e mais fortemente Carlo Ginzburg que a partir de Bakhtin formula sua teoria

de circularidade cultural.

14 BAKHTIN, Mikhail. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais. Trad. Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Hucitec; Brasília: Editora da UnB, 1987.

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O conceito de cultura popular é conflitante. O trabalho de Ginzburg O queijo e os vermes

publicado na década de 1970, define que entende como classe popular um, “conjunto de atitudes,

crenças, códigos de comportamento próprios das classes subalternas num certo período

histórico”15 afirma ser este sentido emprestado da antropologia cultural, uma vez que formulado

o conceito de cultura primitiva admite que estes indivíduos tido como povos inferiores possuem

cultura.

Coloca que os estudiosos das tradições populares estão em desvantagem em relação ao

trabalho dos antropólogos, pois ainda hoje a cultura das classes subalternas é predominantemente

oral e estes estudiosos precisam servir-se, sobretudo de fontes escritas, Ginzburg critica que estas

fontes são duplamente indiretas, por serem escritas e provavelmente ligadas à cultura dominante

chegando a história das classes subalternas até nós através de filtros que a deformam.

A partir dessas discussões formula uma visão original da cultura popular definida pela

oposição à cultura letrada e pela relação que com ela mantém. Quebra com essa dicotomia ao

propor sua concepção de circularidade cultural, quando num movimento dialógico move-se de

baixo pra cima, como de cima pra baixo como comprova nesta obra com a experiência de

Domenico Scandella, o Menocchio.

Em que consiste o trabalho de Ginzburg? Não usa um intelectual como Bakhtin, mas um

moleiro, sujeito das classes subalternas, que sabia ler e escrever, foi acusado e queimado pela

inquisição por propagar suas idéias e visão de mundo não-cristã. Ginzburg procura entender

como um simples moleiro formulara estas idéias o contexto permite afirmar que a invenção da

imprensa lhe proporcionou o contato com livros e a reforma lhe deu aparato para ousar a falar

suas idéias entre contemporâneos, esses fatores foram importantes, contudo não justificam de

todo a originalidade dos pensamentos de Menocchio, a documentação utilizada por Ginzburg e

que responde a essa inquietação, trata-se dos dois processos abertos contra ele quinze anos de

distância um do outro (o volume de seu processo se destacava entre os demais), além dos

documentos inquisitoriais há outros que indicam suas atividades econômicas e vida familiar, além

de registro do próprio Menocchio e uma lista parcial de suas leituras.

Sabia ler e lia livros proibidos pela igreja, mas a chave da questão não está somente em

saber quais livros tinha acesso, mas como os lia, de maneira inconsciente interpunha entre ele e a

página, não raro deformando a leitura, variando numa rede de filtros que ligava a cultura da

15 GINZBURG, 2006, op.cit., p. 3.

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página impressa à uma cultura oral:

Foi o choque entre a pagina impressa e a cultura oral, da qual era depositário, que induziu Menocchio a formular- para si mesmo em primeiro lugar, depois aos seus concidadãos e, por fim, aos juízes- as “ opiniões [..] [que] saíram da sua própria cabeça”16.

Outro importante trabalho que enfrenta as dificuldades de estudar o popular é O grande

massacre de gatos de Robert Darton, formado por ensaios, resultantes de um trabalho que preza o

diálogo entre a história e a antropologia e particularmente, as estratégias interpretativas de

Clifford Geertz.

O autor se propõe a analisar as maneiras de pensar na França do século XVIII, através do

universo simbólico captar a sua acepção. Enquadra seu trabalho na história cultural, como ele

coloca, sua tendência é etnográfica, uma abordagem antropológica da história, como uma ciência

interpretativa na busca de significados.

Para entender a maneira como as pessoas comuns entendiam o mundo. Robert Darton tem

por base o exame de uma coleção de textos, como uma versão primitiva de Chapeuzinho

Vermelho que compõe sua primeira análise História que os camponeses contam: o significado de

Mamãe Ganso. Para Robert Darton, apesar desses contos não poderem ser datados com precisão

de um documento histórico eles são uma das poucas pontes de entrada no universo mental dos

camponeses nos tempos do Antigo Regime. O autor sugere buscar a opacidade dos textos, como

faz ao tentar explicar o massacre de gatos. Segundo ele, entender qual é a piada, no caso de uma

coisa tão pouco engraçada como uma matança ritual de gatos, é o primeiro passo no sentido da

“captação” da cultura17.

Bem coloca que aqueles que se voltam ao trabalho de campo deparam com a questão de

que os outros povos são diferentes e pensam de outra maneira e para compreender sua maneira de

pensar é preciso captar a diferença. Darton alerta contra a falsa impressão de familiaridade com o

passado. Lembra que o que era sabedoria proverbial para nossos ancestrais permanece

16 GINZBURG, 2006, op.cit., p.73 17 DARNTON, Robert. O grande massacre de gatos, e outros episódios da história cultural francesa. Trad. Sônia Coutinho. 4. ed. Rio de Janeiro: Graal, 2001. p. 335.

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completamente opaco para nós e tenta explorar essas visões de mundo pouco familiares a dois

séculos de diferença que o separam de seu objeto de estudo.

Problematizando em quais aspectos a discussão dessa obras estão ligadas aos propósitos

deste estudo colocamos aspectos comuns que une os escritos de Bakhtin a Ginzburg, como o fato

de não separar a cultura popular e erudita em compartimentos estanques. Nota-se o movimento

circular em torno da literatura de folhetos, pelos seus temas e enredos como estes transitam entre

o erudito e o popular e do popular ao erudito, escrevendo sobre crimes, desastres naturais,

acontecimentos sobrenaturais chegando até política, economia e eventos de grande repercussão.

De modo geral, pode-se afirmar que o poeta de cordel, não limitado a descrever a realidade de

maneira artística tinha também consciência de seu papel de informar. De acordo com Ronald

Daus, citado por Grilo18 ao dizer que “os folhetos tornam públicos acontecimentos sensacionais,

traduzem as notícias da imprensa da capital para a linguagem do habitante do sertão, e as

interpretam como público gostaria de ouvi-lás, mudando-as muitas vezes e dando-lhes novas

funções e significados”.

Em O grande massacre de gatos de Robert Darton, destacamos a noção de leitura19 e

relembrando a influência de Geertz para o autor com conceito de cultura semiótica ”como

sistemas entrelaçados de signos interpretáveis” motivando leitura de algo em busca de

significados, Robert Darton defende que pode-se ler um ritual ou uma cidade, da mesma maneira

como se pode ler um conto popular ou um texto filosófico. De forma que analisa a cidade como

um texto através de um burguês provinciano que ao descrever a sua Montpellier é possível captar

o que entendia por vida urbana. Outro ensaio é feito por meio de uma rica série de cartas que o

comerciante Jean Ranson escreveu entre 1774 e 1785, leitor assíduo de Rousseau, essas cartas

demonstram como o rousseauismo foi absorvido no modo de vida burguês provinciano, sob o

antigo regime.

A questão da leitura de folhetos é precisamente curiosa, numa cultura em que a oralidade

é predominante e composta em sua maioria de analfabetos e semi-analfabetos. A leitura era feita

em voz alta, coletiva e intensiva, a própria estrutura do texto, com versos curtos e rima também

facilitava sua compreensão, em muitos casos chegava-se a decorar verso, havia situações em que

18 GRILO, 2003.op. cit. P. 118 19 Inegavelmente presente nas obras de Bakhtin e Ginzburg, ambos trazem a discussão em suas obras.

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utilizava-se as palavras escritas e impressa, favorecendo as relações entre analfabetos e semi-

analfabetos proporcionando a estes práticas de letramento20.

Como já foi dito muitos poetas tinham consciência do seu papel de informar, além do

próprio conteúdo do cordel tinham preferência em utilizar a capa final dos folhetos para fazer

anúncios, propagandas, homenagens e mensagens pessoais, que demonstram a variedade de

linguagem e informações que podem ser apresentadas num cordel. Um exemplo é o folheto de

Rodolfo Coelho Cavalcante “A menina de doze anos que está falando com a Santa no Ceará”

escrito em 1970, mesmo não tendo não de comum com o conteúdo escrito dentro do cordel, o

autor aproveita o espaço final e utiliza para fazer um protesto:

Abaixo o analfabetismo!

O analfabeto coitado, Tenho muita pena dele Em vez dele andar montado O letrado monta nêle Jamais condene você O analfabeto, coitado, Dê-lhe uma carta de ABECÊ Que êle se torna educado

É um protesto de Rodolfo Cavalcante pelo reconhecimento dos escritos dos cordelistas -

causa pela qual brigou em toda sua trajetória, e também um discurso político pela alfabetização.

São varias as estratégias dos cordelistas para expressar suas opiniões, noticiar, fazer

propagandas, protestos. Tinham essa preocupação em diversificar, pois sabiam que seus folhetos

eram bem vindos por muitos sujeitos e alguns grupos sociais baianos, para alguns inclusive, o

cordel representava a única fonte de informação ao qual tinham acesso, seja pela forma escrita ou

pelo seu valor mais fáceis de adquirir.

O período referente a esse estudo, décadas de 1950 à 1970, é cronologicamente recente.

No entanto, este período da nossa história soa para muitos uma realidade distante, senão mal

compreendida. Problematizando o “Breve século XX” em A Era dos Extremos, Eric Hobsbawm

afirma que um dos fenômenos mais característicos e lúgubres do final do século XX, é a

20GALVÃO, op.cit.

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destruição do passado, dos mecanismos sociais que vinculam nossa experiência pessoal à das

gerações passadas. Quase todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo,

sem qualquer relação orgânica com o passado público da época em que vivem. Lembra o ofício

do historia doe em lembrar o que os outros esquecem, mais importante que nunca no fim do

segundo milênio21. Os folhetos de cordel é, pois, uma das formas de explorar este período, ao

mesmo tempo que torna possível analisar o seu significado para alguns segmentos das classes

populares.

A literatura de cordel como acreditavam seus leitores, era mais confiável do que qualquer

outro meio de comunicação que tinham acesso, ou pelo menos o mais fácil de ser compreendido,

sua função de “jornal do sertão” é percebido nas palavras de Rodolfo Coelho Cavalcante em

entrevista a orígenes Lessa:

“O sertanejo sabe dizer pelo rádio ou por ouvir dizer os acontecimentos importantes. Mas só acredita quando sai no folheto...Se o folheto confirma, aconteceu...” 22

O que valida a literatura de cordel como fonte para estudos históricos? Este

questionamento se insere no centro da discussão em torno da narrativa histórica acalorada nas

décadas de 1970 e 1980 no despontar da “Nova História” quando é colocado em questão muitos

paradigma tradicionais, entre os quais o debate teórico da história e da literatura.

A literatura é compreendida para além de um fenômeno estético, é também uma

manifestação cultural, mesmo sem a intenção de se “escrever história” muitos aspectos que ficam

nas entrelinhas do texto é digno de leitura de uma época, um povo, que de um modo ou de outro

motivam a arte literária e muito revela sobre ela e as condições em que foram produzidas.

Mostrando como o contrário pode acontecer Nicolau Sevcenko A literatura como missão

falando das grandes mudanças ocorridas em todos os setores da sociedade brasileira em torno do

século XIX e XX, coloca, “Mudanças que foram registradas pela literatura, mas, sobretudo

mudanças que se transformaram em literatura”23, ou ainda, “os textos artísticos se tornaram aliás

21 HOBSBAWN, Eric J. A era dos extremos: O breve Século XX: 1914 – 1991. Companhia das Letras, 1994, p 13. 22BAHIA. Antologia Baiana de Literatura de Cordel. Salvador: Secretaria da Cultura e Turismo, 1997. 23 SEVCENKO, Nicolau. Literatura como Missão: tensões sociais e criação cultural na Primeira República. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.p. 286.

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termômetros admiráveis dessa mudança de mentalidade e sensibilidade”24, mostra como contexto

histórico e literatura dialogam, tornando um parte do outro.

Outro ponto de vista a ser analisado é o de Sidney Chalhoub e Leonardo Afonso Pereira, a

proposta é historicizar a obra literária como é feito nos ensaios que compõe “A História Contada:

capítulos de historia social da literatura no Brasil”, são analisadas obras de Machado de Assis,

José de Alencar, Jorge Amado, todos enfatizam caráter histórico da obra literária:

Em suma, é preciso desnudar o rei. Tomar a literatura sem reverencias, sem reducionismos estéticos, dessacralizá-la, submete-la ao interrogatório sistemático que é uma obrigação do nosso ofício. Para os historiadores a literatura é, enfim, Testemunho Histórico25.

Para os autores qualquer forma de literatura, seja ela uma poesia, conto ou romance é uma

evidência histórica objetivamente determinada, digna como os documentos “oficiais”-

inventários, atas, alforrias, etc., de serem questionadas, exploradas e analisadas. Sendo válido

também para a investigação do sujeito, tentando perceber o que testemunha, o que coloca entre o

que diz e o real. Na perspectiva desses autores é preciso buscar a lógica social do texto.

Partimos agora para o ponto de vista de um lingüista sobre a história. Em O texto histórico

como artefato literário Hayden White deixa sua marca em considerar (como o próprio título

sucinta) as narrativas históricas como ficções verbais de conteúdos tanto inventados como

descobertos e no que diz respeito a forma, considera serem mais comuns com seus equivalentes

na literatura do que seus correspondentes nas ciências, concepção que ele próprio admite que esta

“fusão de consciência mítica” e da história ofenderá historiadores e teóricos literários que em sua

concepção de literatura contrapõe história à ficção ou do fato à fantasia.

Os documentos históricos, segundo White, não são menos opacos do que os textos

estudados pelo crítico literário e tampouco é mais acessível o mundo figurado por esses

documentos:

24 SEVCENKO, 2003. Op. Cit. .p. 287. 25 CHALHOUB, Sidney, PEREIRA,Leonardo Afonso M.(org). A história contada: Capítulos de Históri social da

literatura no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. p. 7.

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O que tudo indica é a necessidade de revisar, na discussão de formas narrativas como a historiografia, a distinção convencionalmente estabelecida entre o discurso poético e o discurso em prosa, e de reconhecer que a distinção, tão antiga quanto Aristóteles, entre história e poesia tanto obscurece quanto ilumina as duas áreas. Se há um elemento do histórico em toda poesia, há um elemento da poesia em cada relato histórico do mundo26.” (grifo meu)

No mesmo ensaio fala da relutância em considerar as narrativas “com o que elas

manifestantes são: ficções verbais, cujos conteúdos são tão inventados como descobertos, e cujas

formas tem mais em comum com suas contrapartidas na literatura que na ciência27, numa análise

ao que chama por ficção verbal não tira o valor do discurso histórico, acredita que nele possa ter

elementos de imaginação e ficção da mesma forma que em qualquer outro tipo de conhecimento.

Na literatura de cordel estão a poesia, história e ficção, mas sob qualquer forma revelam a

contemporaneidade, possibilitando uma gama de leituras.

26 WHITE, Hayden. Trópicos do discurso: ensaios sobre a crítica da cultura. [Trad. De Alípio Correia F. Neto]. São Paulo: EDUSP. 1995. P. 114. 27 WHITE, 1995, op. Cit., p.98.

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Capítulo 2: “Os embromadores do povo”: Denúncia,

crítica política e social nos folhetos populares.

Os folhetos de cordel são para nós registro de uma época, os seus autores se empenhavam

a passar para a população os fatos que estavam acontecendo em suas cidades, estados ou no país.

Mesmo o que não era escrito propositalmente na intenção de divulgar nos é revelador, estes

sujeitos por estarem envolvidos numa realidade histórica que era comum a seus contemporâneos,

queriam mostrar a novidade do fato, não objetivavam primordialmente descrever seu tempo para

servir de fonte para um futuro diferente. Com pretensão ou não era o que estavam fazendo, sendo

porta-vozes populares de uma época conturbada.

A Bahia sempre apresentou um número significativo de cordelistas que escreviam na

capital e no interior, lembrando que estes versos circulavam muito além dos locais de sua

produção, como exemplo maior uso esta pesquisa que tem dois cordelistas que escreviam seus

versos em Salvador e um em Itabuna entre as décadas de cinqüenta a início dos anos oitenta, no

entanto o local de consulta das fontes (o cordel) foi na cidade de Conceição do Coité, no Arquivo

Particular de Carlos Neves, onde foi encontrado alguns exemplares que não constava na coleção

da Biblioteca da Casa do Sertão, local onde encontrei a maioria dos folhetos aqui trabalhados.

Destes cordelistas baianos, nenhuma figura parece tão enigmática como Cuíca de Santo

Amaro, ia com facilidade de homem sincero ao controverso, seus folhetos eram esperados com

ansiedade por uns e temidos por outros, Rodolfo Coelho Cavalcante em: Cuíca de Santo Amaro:

o poeta popular que conheci, relata após a morte do autor:

Muita gente da política De Cuíca tinha medo Pois o seu estro era fogo Que derretia rochedo Quem mal ato praticasse Que terminava o segredo

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Alguns jornais, revistas e trabalhos acadêmicos escreveram sobre sua biografia, já

mostravam este lado sarcástico de cuíca, cabe aqui analisar seu discurso nos folhetos que

envolviam política, alvo maior do autor.

Cuíca de Santo Amaro era um apelido que acabou sendo seu nome artístico. Só assim

ficou sendo conhecido em toda Bahia, seu nome verdadeiro é José Gomes, provavelmente seu

nome fictício dá-se pela sua relação com o município de Santo Amaro, pra onde viajava com

freqüência em sua juventude.28

Cuíca nasceu em 1907 na cidade de Salvador. Ainda pequeno seus pais se separaram e ele

foi criado pela sua madrinha de batismo. Não concluiu seus estudos, sendo aluno dos Frades

Capuchinos da Piedade, comentava que a eles devia a sua boa caligrafia pelos tantos exercícios

cobrados pelos severos professores.

Os únicos empregos fixos que teve foi numa tinturaria Portuguesa e na Companhia

Circular de bondes. Foi para as feiras onde vendia vários tipos de quinquilharias, em 1935,

conheceu sua mulher D. Maria do Carmo e para sustentar sua família passou a revender folhetos

da “Pernambucana”, uma barraca do Mercado Modelo, que vendia com exclusividade os folhetos

do paraibano João Martins de Athayde.

A partir daí fazia folha volante, versos em quadra ou sextilha, inicialmente sobre jogos,

depois para propaganda. A população apreciava as folhas volantes e por ser um meio barato os

donos de lojas o procuravam para propagandear seus produtos.

Quando Cuíca começou a escrever folhetos, a maioria deles foi destinado à Getúlio

Vargas, a quem tinha grande admiração por olhar para o povo trabalhador. Se a política de

Vargas era trabalhista o papel que Cuíca se propôs foi o de defensor do povo, a capa final dos

seus folhetos era um espaço bastante explorado pelo autor, num deles logo após a morte de

Vargas, escreve em convite ao “povo”:

28 Os dados biográficos aqui apresentados, foram retirado do livro “Ele o tal. Cuíca de Santo Amaro”, de Edilene Matos.

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AVISO PÚBLICO

Os trabalhadores baianos convidam o povo em geral para assistir a missa que mandarão

celebrar na Igreja d São Francisco às 8h da manha do dia 24 do corrente em sufrágio da alma

do saudoso presidente Vargas.

(O povo não deve faltar)

Cuíca de Santo Amaro

Vale aqui um paralelo com o texto “O samba na roda”29 de Alessandra Cruz, uma parte da

pesquisa analisa às representações do trabalho nos sambas de Salvador. Sobre este aspecto,

problematiza como a crítica do samba enfrentava o discurso ideológico da poética populista de

Getúlio Vargas entre os anos de 40 e 50 em formar um tipo brasileiro de homem trabalhador que

venceria a pobreza pelo seu trabalho e a disciplina. Os sambas que analisa debocha e ridiculariza

a ideologia do trabalhismo que o trabalho proporcionaria ascensão social “trabalhar e batalhar por

uma nota curta”.

A posição de Cuíca de Santo Amaro é curiosa ao mesmo tempo em que divulgava a

política de Vargas como exemplo a ser seguido, produzia folhetos incentivando o povo a pensar

na sua posição de pobre e trabalhador explorado não importando se era a favor ou não da política

Varguista, era uma característica do autor ser contraditório.

Em Os embromadores do povo, folheto onde se dispõe a denunciar as falcatruas política

nos discursos anteriores à eleição, é bastante apelativo, mostra a seus conterrâneos as estratégias

utilizadas pelos candidatos para “embromá-los”, era uma forma de alertar a população que

estariam se beneficiando momentaneamente, pois passada as eleições acabaria também o

prestígio do povo somente lembrado nessa época.

Investe na xilogravura, trazendo a imagem de um político fardado, para reforçar sua

condição social conseguida pela exploração do povo, assim como sua barriga grande representa

fartura e a boa vida dessas pessoas, os braços suspensos mostram a euforia dos discursos

enganadores a expressão facial passa a idéia de esforço, de empenho em mostrar-se honesto aos

29 CRUZ, Alessandra C. “O samba na roda”. Samba e cultura popular em Salvador. 1937-1954.

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seus eleitores. O escrito e visual neste folheto estão em harmonia com a mensagem passada a

mesma crítica que traz a sua xilogravura é percebida em linguagem escrita.

Através dos seus comícios Começam a nos embromar Dizem ao povo analfabeto Eu vou lhe ajudar Eu tenho um lugarsinho Pra você trabalhar

Porque muito eleitor É forçado ao vender Vende o voto ao candidato Porque precisa cumer Mais sabe que mais tarde Bastante vai sofrer

Nunca se viu num plenária Se debater um problema Para tirar o povo De tão difícil dilema Que é a fome que roe! Como se fosse pastema

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Sua linguagem ferina atingia seu alvo, Cuíca de santo Amaro foi detido inúmeras vezes

por sua ousadia em falar o que entendia, para tal não fazia rodeios, sua linguagem era direta,

vestia-se de fraque, chapéu de coco enfeitado com pena de pavão para trabalhar, seu modo de

vestir além de atrair o tornava uma figura ainda mais sarcástica. Gritava à população baiana o

último escândalo ou notícia nova, seu ponto de trabalho era próximo ao Elevador Lacerda.

Não diferente dos outros cordelistas aqui trabalhados tinha também seu lado conservador,

fazia seu discurso moralista, usando bastante da sua linguagem satírica.

O folheto “O namoro no cinema” ilustra bem sua posição, dentre as mudanças decorrentes

da revolução das comunicações, tem-se uma abertura aos locais de lazer como foi o caso do

cinema que começou ter a presença feminina. Além de um novo ambiente era também o local de

novidades que passava a interferir no comportamento das novas gerações, as mulheres passaram

Fonte 1: Cuíca de Santo Amaro declamando folheto. In: www.enciclopedianordeste.com.br

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a seguir as modas das atrizes de Hollywood, mudar o estilo dos cabelos, e fumar, ato até então do

homem30. Era o confronto do sistema patriarcal com a modernização que chegava a Bahia.

Entre 1945 e 1955 o “sonho americano” penetrava no país, dando suporte às iniciativas culturais que visavam a atualizar o país com relação à modernidade dos centros industrializados. Adotaram-se suas tendências e seus temas: o cosmopolitismo – em lugar do folclórico e do ruralista; o romance psicológico – em relação à literatura regionalista exarcebada; a renovação da linguagem da imprensa – em substituição às matérias literárias nacionalizantes; a profissionalização de um teatro preocupado com a arte pela arte – sem finalidades propagandísticas; o cinema industrializado e o surgimento da televisão31.

As queixas destes maus comportamentos começaram a ser denunciadas por toda parte

pelos homens, segmentos conservadores da sociedade se opunham a onda modernizadora e

criticavam impiedosamente.

Aqui na Bahia, Cuíca denunciava a libertinagem deste ambiente. Definia o cinema como

Todos sabem que o cinema É um antro de perdição Traz o sujeito assassino Faz o sujeito ladrão É um livro onde as donzelas Aprendem a prostituição Faz saber com suas denúncias o que as mocinhas e os rapazes fazem no local, diz que o

cinema é um pretexto para a libertinagem, alarma os pais com as suas conclusões.

Cuíca se autodenominava como o defensor do povo. Em 1958, Cuíca decide candidatar-se

a vereador pelo PTB, só consegue 39 votos, o que atribui ao fato de ser um homem sem posses,

era um simples folheteiro. Sua campanha política teria ficado restrito à contracapa de seus

folhetos, ser vereador para Cuíca era uma forma de legitimar sua condição de defensor do povo.

30 BESSE, Susan K. Modernizando a desigualdade. Restauração da ideologia de gênero no Brasil, 1914 – 1940. Edusp, 1999. 31 MENDONÇA, Sônia Regina. As bases do desenvolvimento capitalista dependente: da industrialização à

internacionalização. In: LINHARES, Maria Yedda (org), história Geral do Brasil, 9 ed, Rio de janeiro: Elsevier, 1990, p. 346.

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Segundo Edilene Matos a ligação de Cuíca com os políticos da Bahia foi a mais

contraditória possível, atacava e defendia de acordo com seus interesses.

No ano da sua candidatura lança o inconformado folheto Bagunça no pleito eleitoral,

descreve um cenário de confusão que se ocorreu na capital no dia da votação, a confusão entre

eleitores e mesários, denuncia que os eleitores não tinham o que beber, sofriam fome e agonia,

mães de família com os filhos chorando, barulho infernal. Todo esse cenário de confusão,

segundo ele é devido a nova reforma eleitoral com a tal cédula única.

A reforma que Cuíca menciona ocorreu em 1955, abaixo diz a lei:

Lei nº 2.582 – De 30 de agosto de 1955 Institui a cédula única de votação O Presidente da República: Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguite lei:

[ ... ] Art. 6.° Havendo coincidência de eleições para Presidente e Vice-Presidente da República com eleições para preenchimento de outros cargos, o eleitor irá ao gabinete indevassável duas vezes: a primeira para assinalar na cédula única os nome dos candidatos de sua escolha; depois de votar com a cédula única o eleitor receberá do presidente da mesa a sobrecarta oficial com a qual voltará ao gabinete indevassável para votar nos mais candidatos.

[ ... ]

Rio de Janeiro, 30 de Agosto de 1955; 134º da Independência e 67º da República. João Café Filho. Prado Kelly. O folheto de Cuíca, é então um testemunho do que teria ocorrido na prática com a nova

lei, segundo o que descreve no seu folheto não houve organização duas estrofes resumem bem o

seu posicionamento

Foram as senha distribuídas Com toda inteligência Para quem as impertinências Só chamava aqueles Da sua preferência (...)

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Os semi-analfabetos Com esta inovação Digo...a cédula única Na hora da votação Como é natural Só pode fazer confusão Além de mostrar-se irritado com a nova Lei, observamos também o inconformismo com a

sua iminente derrota, que versos deixam por revelar, chama o eleitor de degenerado por trocar seu

voto por dinheiro, A muita gente pobre/ Estes ambiciosos/ Não votam para gente pobre, neste

momento tudo indica que refere-se a sua própria figura, sua própria condição de trabalhador

pobre, em seguida, com tom de desilusão questiona-se: porque fui me candidatar? Passada as

eleições locais, Cuíca volta a falar de política, o inicio da década de 60 vai escrever sobre os

governos de Jânio Quadros e de João Goulart.

Em 1961, marcava o cenário nacional Jânio Quadros assumindo a presidência, vários

eram os comentários a respeito da sua figura e da sua vitória, segundo a definição Skidmore,

Quadros entrou no cenário político como um corpo estranho, por excelência, por não estar ele

definitivamente identificado como um líder anti-vargas (embora ninguém o considerasse jamais

um Getulista) foi visto como um tipo capaz de transcender as linhas estabelecidas do conflito.

Isto pareceu, então, muito mais possível devido à sua bandeira eleitoral carismática. 32

Ainda com base em Skidmore, a análise da política Quadros como sendo populista ou

não, há dificuldades em responder, mas é certo que tinha característica deste estilo, como o

candidato dinâmico, presente e que passava confiança a seus eleitores. Aqui na Bahia, os cordéis

são uma prova cabal dessa confiança que Quadros passava ao povo brasileiro.

Cuíca, falando sobre A retumbante vitória de Jânio Quadros traz neste folheto expressões

que mostram essa boa expectativa, no seu caso em particular nota sua relação com a classe

trabalhadora ao falar da trajetória de Quadros coloca que conquistando a confiança do homem

trabalhador, Jânio Quadros consegui se eleger.

Quanto ao marechal Teixeira Lott, coloca que este não poderia ganhar, mesmo sendo um

homem honesto, mas o considera “estar bem entrosado/ para dirigir militar”. Cuíca também

32SKIDMORE, Thomas. Brasil de Getúlio a Castelo. 14. ed. Rio de Janeiro. Paz e Terra, 2008, p. 231.

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descreve o “berreiro” dos eleitores de Lott, os que perderam dinheiro, viviam em palanques que

agora estavam cabisbaixos.

Sobre o povo baiano, diz que muitos votaram em General Lott, por uma questão política

estadual na pretensão de se vingar do governador.

Neste folheto traz duas preocupações com a renovação da máquina administrativa e

principalmente, a cobrança em olhar o povo nordestino, a cobrança é uma característica marcante

em Cuíca que não deixa se entusiasmar de todo, pois mesmo confiante nas mudanças que poderia

ocorrer com o governo Quadros lembra que vai cobrar o que foi prometido, isso fica claro nos

versos abaixo

Agora compete ao Jânio Depois que se elegeu Se lembrar do nortista Do povo que sofreu Jânio deve se lembrar Daquilo que prometeu Essa cobrança de Cuíca aconteceu. Depois da renúncia de Quadros ele lança o folheto

Jânio Quadros e suas... em que vai mostrar o descontentamento com o ato do presidente, faz

muitas lamentações, afirmando o povo brasileiro como sofrido principalmente o pobre residente

na Bahia, passagem que concorda com o velho ditado de que o pobre vive de teimoso, no caso

dos brasileiros ( em maior grau o nortista) vive entregue à sua sorte. Cuíca diz que mesmo assim

restava uma esperança, pois tinha uma fé duradoura, utiliza palavras como certeza e convicção

para reiterar a expectativa que tinham no homem da vassoura como chefe da nação, que, no

entanto quando começou a guiar o país se pôs a cometer desatinos, fala da exoneração de muita

gente dos seus empregos e da tentativa do presidente pagar a divida externa.

Em tom irônico diz que:

Para que o Brasil Levantasse sua moral E perante as nações Ficasse no pedestal O presidente Jânio Quadros Decretou a lei cambial

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Depois comenta das conseqüências desastrosas com o custo de vida subindo

assustadoramente, o aumento da exploração, o preço do transporte. É interessante notar a suas

colocações, numa passagem, por exemplo, diz que o operário vive em aflição “pois é que tem que

pagar/ A dívida da nação” desacreditado diz que essa dívida nunca vai ser paga pois com tanta

ganância só tende a aumentar

Este povo brasileiro Que reside cá no norte Estes pobres operários Que elegeram um homem forte Entregues a própria sorte Aproveitando todos os espaços do cordel para expressar sua indignação, coloca na página

final do folheto A marcha da vassoura, o nome da música “O teu cabelo não nega” onde assina

sua autoria Letra D’ele o tal – Cuíca de Santo Amaro

A Marcha da Vassoura

A sua vassoura não nega! oh Jânio Ninguém jamais a pode quebrar Feitiço n’ela não pega o! Jânio Enquanto ela funcionar (Bis) (CORO) Oh! Que dureza Para o operário Jânio diz ser necessário Subiu o açúcar, carne e feijão Para poder Pagar a dívida da nação Quanta aflição A sua vassoura não nega etc.

Ironiza o peso dos planos de Jânio Quadros em quitar a dívida externa do país sobre o

trabalho do operário, sendo este o que mais passaria dificuldade com a elevação de preços, outra

vez Cuíca se põe ao lado do trabalhador.

No governo de Quadros foram feitas músicas colocando-o como o varredor de toda

“sujeira” existente no país, a música principal da sua campanha, era de Maugeri Neto, chamava-

se “Varre, varre, varre, varre vassourinha”, em um trecho da música diz; Varre, varre, varre, varre

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vassourinha/ varre, varre a bandalheira!/ Que o povo já ta cansado/ De sofrer dessa maneira/

Jânio Quadros é a esperança desse povo abandonado.”

Depois de lançar esse folheto mostrando o descontentamento do povo com a

renúncia de Quadros, publica o cordel sobre A posse de Jango Goulart .

Em resumo, pode-se afirmar que houve um violento debate sobre a sucessão de Quadros

após sua renúncia, mesmo estando claro pela constituição de 1946, que o procedimento a ser

seguido era que o vice-presidente substitui o Presidente, mas também dizia que, no caso de

ausência do vice, o presidente da câmara dos deputados seria o próximo da linha sucessória.

Os militares se dividiam quanto a posse de Goulart, por outro lado a opinião pública

crescia a favor da sua posse como sucessor legal, era a chamada opinião “legalista”, onde

estavam inclusas as forças populares, lideradas por estudantes esquerdistas, líderes trabalhistas e

intelectuais. A dois de setembro, o congresso adotou a emenda instituindo um sistema

parlamentarista. Os militares compreenderam que não poderiam sobrepor-se à divisão existente

no próprio exército e nem ignorar a reação pública à sua tentativa de veto, o parlamentarismo

teria sido uma solução de emergência. 33

Cuíca não detalha os problemas da sucessão de Quadros, relata até numa posição um tanto

romântica dos acontecimentos que a democracia e a legalidade teriam vencido, elogia a larga

visão das forças militares que respeitaram a constituição, e os dois de modo geral contribuíram

para que o Brasil voltasse a tranqüilidade sem ter que derramar sangue, o momento escapa ao

folheto da agitação que realmente havia ocorrido.

Moniz bandeira discorre sobre a turbulência do período

Goulart, no entanto, recebeu do congresso um poder mutilado, enfraquecido, quando a situação do Brasil mais exigia um governo forte, cntralizado, para efetuar as mudanças que o desenvolvimento do capitalismo reclamava. A renúncia de Quadros expressara essa necessidade. Ele julgara a constituição estreita, inadequada, e tentou traumatizar a Nação, com aqueles gestos, a fim de compelir o congresso aproveitou a oportunidade para dar o golpe e reduzi-los, com a emenda parlamentarista, cujo hibridismo sacramentava o impasse constitucional. Nem Goulart nem o Conselho de Ministros, aprovado pelo congresso, tiveram forças assim, para enfrentar a situação, que a espiral inflacionária deteriorava34.

33 Skidmore,2008. op. Cit. P. 252 a 265. 34 BANDEIRA, Moniz. O governo João Goulart. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 1977, p. 43 a 44

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Cuíca nesses primeiros versos do folheto vai então falar da aprovação por parte de civis e

militares pela posse de Goulart, sem, contudo, apontar as desavenças.

Civis e militares Num gesto consciente Resolveram dar posse Ao vice presidente Para que o Brasil Aonde sempre para frente Logo em seguida já começa a criticar pontos desfavoráveis de ter no país um regime

parlamentar, acusando de ser contrário aos trabalhadores e também ao direito do eleitor e,

sobretudo, tira a força do presidente da nação, questionando do que vale ser presidente para

outros governar, interessando exclusivamente para quem é parlamentar.

Cuíca agora em toma mais satírico fala da mudança na constituição com a adoção desse

processo, argumentando que o Brasil desde o descobrimento sempre foi dirigido por homens de

ética, sem precisar de parlamento e sobre este atribui uma crítica.

Eu lendo minuciosamente A sagrada escritura Vi através Daquela literatura Que a nova lei É uma pequena ditadura

É importante notar que o povo se encontrava à par do era o sistema de governo

parlamentarista, até a tomada de posse Cuíca narra com tranqüilidade e como já foi dito, até em

tom um pouco romântico. Mas depois dirige críticas ao governo parlamentarista, este teria sido

articulado por uma pequena elite, segundo Skidmore foi um recurso, uma solução para a crise

política, foi o resultado de longa campanha de um pequeno grupo de partidários do sistema

parlamentarista35, de fato, o folheto mostra em outros termos esse descontentamento do povo, que

ainda não se encontravam dentro do sistema imposto É uma pequena ditadura, analisava Cuíca.

No período do mandato de Goulart, Cuíca escreveria um outro folheto bastante polêmico

narrando a briga entre David Nasser e Brizola.

35 Skidmore,2008. op. Cit. P.260.

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Brizola companheiro de Goulart, tinham juntos entrado para o PTB em 1945, dois anos

mais tarde foram eleitos deputados estaduais. Foi Deputado Federal, prefeito de Porto Alegre e

governador do Estado. Aparece em 1961 no cenário nacional ajudando seu cunhado na

“Campanha da legalidade” que empreendeu na intenção de mobilizar o país para a posse de

Goulart.

Com a aceitação de Goulart pelo parlamentarismo, Brizola se opunha ao cunhado. Se por

um lado Goulart tentara uma política de conciliação entre o PTB e PSD, a estratégia de Brizola

era de confronto. Representava no PTB os militantes mais esquerdistas “os nacional

revolucionários”36

Incontente com o posicionamento do presidente, Brizola lhe aplicaria criticas constantes.

Se a esquerda o atacava, a direita conspirava para derrubá-lo.

David Nasser conhecido jornalista dos anos 50 e 60, era escritor da Revista O Cruzeiro

atacava constantemente presidente João Goulart e mais assiduamente Brizola, defendia o

posicionamento da direita no país.

Como defensor da direita atacava a esquerda, sendo seu alvo predileto Brizola

Num de seus artigos criticava pesadamente Brizola, era intitulado “Resposta a um pulha”,

chamando-o de demagogo e fazendo provocações. Irritadíssimo com a edição e tendo

consciência de que a Revista o Cruzeiro era reconhecida nacionalmente, Brizola prometia vingar-

se dos ataques de Nasser, como de fato fez. Ao encontrá-lo no aeroporto Galeão atingiu o

jornalista com um soco de surpresa.

Os jornais da época junto com a revista O Cruzeiro divulgava o ocorrido, e Cuíca com

folheto David Nasser e Brizola alarmava o fato à população baiana. Cuíca se posicionava a favor

de Nasser e de sua função de jornalista, defende Nasser:

Mesmo esbofeitado O Nasser se dá ao luxo De revelar falcatruas Do deputado gaúcho Demonstrando ao brasileiro Que agüenta com o repucho

36 Retirado In: FERREIRA, Jorge. Nasce um líder as esquerdas. In: http//www.revistadehistória.com.br.

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Esse “agüenta com repucho” insinuado por Cuíca, foi o fato de David Nasser continuar a

atacar Brizola e agora em tom muito mais irônico e sugestivo, neste posto vale uma semelhança

entre o modo de escrita de David Nasse e Cuíca de Santo Amaro, talvez por essa identificação

defenda ferozmente no seu folheto o jornalista de O cruzeiro.

Na revista O cruzeiro de 18 de Janeiro de 1964, David Nasser dava sua resposta a nível

nacional, escreve sobre o fato:

O Coice do Pangaré37

“Humilhado com a mão ida para o Ministério da Fazenda, onde repetiria, certamente, os

desmandos que praticou no governo do Rio Grande do Sul – percebendo que cada dia perde

terreno com o aumento da resistência democrática, o Deputado Leonel Brizola perdeu a cabeça

– e resolveu quebrar a minha, é a explosão natural de todo primário.”

Sobre a iminência de um golpe, Nasser faz provocações sobre o que pode acontecer se a direita

toma o poder, faz insinuações à revolução:

“Volto a repetir: vocês estão em pânico. A hora final se aproxima para os profetas da revolução.

Não tarda o momento em que o furacão do civismo varra este país. Até então, suportaremos,

estoicamente as agressões pelas costas e esperamos, com paciência franciscana, que o veneno

democrático dê cabo dos ratos.”

Sentenciava Cuíca:

Acontece que o David Nasser Que apanhou barbaramente No seu modo de entender Pensa diferente Continua ele a atacar Brizola e o presidente

37 Revista O Cruzeiro, de 18 de Janeiro de 1964. Encontrada a Biblioteca Monsenhor Renato Galvão do Museu da Casa do Sertão/ UEFS.

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Nasser que é carne de cabeça Como ninguém ignora Continua botar do Brizola Os seus poderes prá fora Isso todo dia! Toda noite! Toda hora Esse era o tipo de folheto que Cuíca de Santo Amaro mais apreciava fazer, abusar do seu

tom irônico. Parecia encontrar realmente em Nasser uma referencia de escrita, pois em questão de

valores, se dedicava mesmo a escrever para o povo e sobre ele. Interessava ao seu publico leituras

de ordem cotidiana, no folheto A discussão da carne verde com pão que escreve na década de

50, a discussão começa com a carne interrogando ao pão por que havia deixado o povo na mão, o

pão apontaria que a causa toda da exploração é o Juscelino presidente da nação

E ele o Kubtschek Que se diz o soberano E vai como se diz Por debaixo do pano Tomando muito dinheiro Em mão de americano

Com extrema facilidade Cuíca atacava qualquer gesto de político que viesse a atingir

diretamente a mesa do povo, para que o povo saiba “que não é culpa do açougueiro”, tinha uma

visão ampla de mundo, num outro folheto chamado Dívida de funcionário nunca termina, critica

o aumento dos preços e a imobilidade do salário

Até caixão de defunto Onde vai ser enterrado Já subiu também de preço Quando é bem acolchoado Sobe palma, e capela Mais não sobe o ordenado Dos três autores aqui estudados Cuíca é o mais destemido, não tinha medo de ser detido,

pois já havia virado hábito, narrava a realidade da Bahia e não lhe importava a quantos isso

atingia, todos na Bahia daquela época já ouvira falar em Cuíca de Santo Amaro Ele, o Tal como

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gostava de ser lembrando, viraria personagens das obras de baianos como Jorge Amado e Dias

Gomes. Cuíca morre no ano de 1964, grande perda para o cordel como lastimava Rodolfo Coelho

Cavalcante.

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Capítulo 3: “O Dragão do fim da Era”: O cordel no

combate ao perigo comunista no Brasil

A década de 1950, em rápida analise, fora marcada pela modernização e por uma série de

mudanças ocorridas no Brasil, versava o poeta “O Brasil não para”38 e nos anos 60 o mandato

janguista, o crescimento da esquerda no país e o conseqüente golpe por lideranças militares

nacionais marcariam uma década conturbada dando um novo rumo a todos os setores da

sociedade brasileira.

A análise política deste período é minuciosa e ricamente conhecido pelos estudos de

historiadores como Thomas Skidmore, jornalistas como Elio Gaspari e outros consagrados

estudos desse período, tentando compreender o significado dessas transformações para classes

mais abastadas da sociedade utilizamos os Folhetos de Cordel de Rodolfo Coelho Cavalcante.

Cavalcante não é baiano de nascimento como Cuíca de Santo Amaro e Minelvino

Francisco da Silva. De acordo com a proposta desse estudo analisaremos apenas folhetos que

tiveram como espaço de produção a Bahia nos anos de 60 a 80, Rodolfo Cavalcante morou a

maior parte de sua vida em Salvador e foi na capital que se assumiu cordelista de profissão e

produziu a maioria dos seus folhetos.39

Alagoano, nascido em 1919, é filho de operários. O trabalho e o vício de seu pai em

bebidas alcoólicas, fez com que familiares de dispusessem a criar por certo período Rodolfo e

seus irmãos. Rodolfo foi adotado por sua avó dona de uma “Escolinha de ABC” foi quando

aprendeu a ler, gosto que seria desenvolvido pelo grande apreço que tinha por jornais a seu avô

atribui os primeiros incentivos com os versos.

Retorna à casa de seus pais aos oito anos de idade, matriculado numa escola estudava pela

manhã e o resto do dia vendia frutas, tapioca e “pegava frete”. Com o pai desempregado Rodolfo

sai definitivamente da escola para trabalhar como camelô. Por várias vezes fugiu de casa na

38 Verso do folheto Independência do Brasil. 39 Os dados biográficos do autor foram retirados do livro “ de Eno Teodoro Wanke, o autor denomina sua obra como uma biografia-reportagem-pesquisa, porque primeiro se baseia nas próprias narrativa de Rodolfo Cavalcante, falando da sua trajetória na vila operária alagoana até se firmar como folheteiro em Salvador, daí por diante, baseia-se em pesquisas documentais a exemplo do primeiro estatuto de uma associação de trovadores de cordel e da reportagem sobre cordelistas.

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companhia de seu irmão mais novo, ora motivados pelas ameaças do pai ora pelo medo de

apanhar da mãe quando a desobedeciam, numa dessas fugas foi ser artista de circo – que tinha

platéia significativa naqueles anos, era uma opção de diversão popular se comparado ao teatro -

familiarizava-se com os espetáculos.

Por volta de 1938, foi professor primário na cidade de Porto Alegre (do Piauí), mesmo

com sua pouca escolaridade foi considerado apto para dar aulas. Nesta localidade ouvia tantas

histórias sobre o boi Labirinto que se propôs a fazer uma rima a seu respeito, era seu primeiro

folheto.

Sempre inquieto Rodolfo prosseguiu em suas andanças, foi a Parnaíba, Sobral e Fortaleza.

Em 1939 decide voltar para a casa da sua família em Maceió. Foi nesta viagem que adquiriu em

Parnaíba um lote de folhetos de João Martins de Athayde, iniciando assim sua carreira de

vendedor de versos. Rodolfo e seu irmão Ari, voltariam a sair de casa, desta vez montaram uma

“troupe” de teatro de fantoches encomendando-os a Sinézio Alves40 e saíram de cidade em

cidade, numa dessas andanças conheceu e casou com Hilda Moreira de Freitas de início houve

relutância por parte dos pais que não queriam sua filha com um “artista de circo”. Casado,

Rodolfo decidiu parar de viajar, essa decisão vai se efetivar principalmente depois do nascimento

dos filhos.

Com a sua instalação na Bahia em 1945 “suas andanças terminam, sua produção se firma

e ele sobe em sua carreira profissional.”41. Na década de 1940 e 1950 o governo de Getúlio

Vargas foi um dos assuntos mais constante nos folhetos de Rodolfo Cavalcante sua deposição,

campanha eleitoral e reeleição. A sua morte assim como a de Castelo Branco, anos mais tarde,

lhe rendeu mais de um folheto.

Na produção dos cordéis, o próprio Rodolfo era quem o montava , fazia a dobragem -

dizia-se especialista em folhetos de oito páginas - colagem e grampeamento, pagava somente pela

impressão, uma das principais Tipografias que comentava Rodolfo era a “Tipografia Moderna”

no Pelourinho, imprimia, editava jornais e folhetos, no “ABC dos seus benfeitores” cita a

Tipografia Santa Bárbara em Salvador e seu proprietário Orlando como o maior editor dos seus

folhetos. É importante registrar a importância do aumento do aparecimento das máquinas

40 Sinézio Alves é um importante xilógrafo baiano, autor de inúmeras capas dos poetas conterrâneos. 41WANKE, Eno Teodoro. Vida e luta do trovador Rodolfo Coelho Cavalcante (biografia). Rio de Janeiro: Folha Carioca, ed. 1983, p. 106.

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impressoras e das tipografias deste período, aumentava a produção destes folhetos espalhando por

toda a Bahia, sobretudo nas regiões interioranas.

Rodolfo toma o cordel como profissão, a Praça Visconde do Cairu era o seu local de

trabalho, aproveitava o espaço movimentado para fazer a propaganda dos seus folhetos, e nisso

sua experiência em espetáculos de circo sem dúvida o tivera ajudado a dramatizar e seus

momentos de camelô teria ajudado a propagandear muito bem seus folhetos.

Fonte 2: Rodolfo Coelho Cavalcante, Salvador, BA, 1985. In: CURRAN, Mark J. História do Brasil em cordel. Edusp, São Paulo, 1998. P. 253.

Que tipo de folheto vendia Rodolfo? Produzia folhetos de todos os tipos, a um certo

ponto da sua carreira seria exceção folhetos “licencioso e sexualistas”. Discursava que seus

folhetos eram moralistas e fazia isso em prol da educação do povo baiano. Na Bahia versos com

conotação pornográfica eram comuns e bem vendidos, Rodolfo reclama essa normalidade, mas

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também já os tinha escrito, produzira versos com duplo sentido, em alguns casos usava do

pseudônimo de Zé Pindoba e afirmaria que teria se arrependido e que os teria produzido pela sua

necessidade financeira o que sugere que estes tipos de folhetos tinham boa vendagem, ocorre que

Rodolfo toma partido contra a escrita desse tipo de folheto.

A causa mais evidente dessa negação aos folhetos licenciosos encabeçada por Rodolfo

seria sua experiência religiosa. Com a família teve educação católica, converteu-se ao

protestantismo e em seguida para o espiritismo “Faço meus versos, minhas histórias, todas com

fundo moral. O mundo está precisando disso, sou pelo espiritualismo e não é possível que as

coisas continuem com estão”. Levaria a frente seu propósito a ponto de ser pauta em 1955 no

Primeiro Congresso de Trovadores e Violeiros que ele presidia.

Rodolfo dizia não gostar de política, no entanto muitos de seus folhetos são sobre a

política nacional e é correto afirmar que os escrevia com certa freqüência.

No folheto O que Jânio Quadros está fazendo pelo Brasil, narra a vitória de Jânio

Quadros e descreve a situação de um país que desde os anos 50 com a morte de Vargas

encontrava-se “em desordem” segundo sua óptica, Dutra não resolveu a situação e Kubitscheck

“Foi um governo gigante/ Entretanto a ladroeira / Avassalou bastante”.

Nesse folheto nos permite visualizar a esperança que grande parte da população via na

figura de Jânio Quadros, percebemos o efeito da propaganda política desse governo com a

vassoura como símbolo da sua campanha. Interessante notar seu reflexo. Em seu discurso

Rodolfo coloca todo um ambiente de corrupção e a vassoura Janguista seria a responsável em

eliminar os políticos desonestos e oportunistas. Na mesma linha de pensamento que seu

companheiro Cuíca de Santo Amaro, Rodolfo escreve sobre Jânio Quadros.

Sobre seus feitos escreve:

Cortou os funcionários De várias repartições Porque eles não cumpriram As suas obrigações Muitos deles ocupavam Três empregos, não ligavam Nenhuma de suas funções

E também os militares Que estavam no exterior Ganhando sem fazer nada

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Em posto superior (...)

Atacava a política de Kubitscheck, no tocante a Brasília insiste nesta questão por

concordar que o presidente tentava desvencilhar atenção a outros problemas de cunho econômico

e social com a construção da nova capital.

Enquanto o senhor Juscelino Só para Brasília olhava Tudo isso acontecia E ele pouco ligava Era emitindo dinheiro E o povo brasileiro A cada dia agonisava

Segundo Maria Victoria de Mesquita Benevides, a inflação foi a principal fonte de

oposição à política econômica do governo, principalmente por parte da “direita”, tornando-se

também um dos elementos da propaganda Janista que pregava a “estabilidade de preços ,

política de austeridade para todas as classes” etc., levando à vitória o candidato das forças

oposicionistas em 196042.

Subiu xarque, subiu pão Subiu arroz e café Leite, mnteiga e farinha E o querozene até Subiu transporte e feijão

Logo em seguida a crítica que tece ao governo no Kubitschek coloca a sua expectativa

pelo governo de Jânio

De acordo com meus cálculos Eu creio que o presidente Ao depois de controlar O Brasil perfeitamente As coisas irão baixar

42 BENEVODES, Maria Victoria de Mesquita. O governo Kubitschek: desenvolvimento econômico e estabilidade

política, 1956 – 1961. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979, 3º ed. P. 234-235.

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Acreditava que Jânio iria corrigir ou controlar os erros de Kubitschek, essa visão do

governo Juscelino Kubitschek era um posicionamento quase comum, apesar do dinamismo de

Juscelino Kubitschek, era acusado de corrupto e economicamente inepto, permitindo uma

inflação até então inédita na História do Brasil43.

Os cordelista revelam em seus folhetos o dia-a-dia, experiências e sentimentos do povo.

Se neste folheto transparece as expectativas em torno do governo Quadros, o seu folheto seguinte

escrito em 1961 revela uma situação comum de seus contemporâneos, o impacto da sua renúncia.

Pelo folheto intitulado A renúncia do Ex-Presidente Dr. Jânio Quadros é possível afirmar

que não diferente dos outros estados brasileiros, os baianos também estavam aturdidos com o ato

do presidente e mais ainda aqueles que depositavam confianças em ser um governo prospero.

Cavalcante procura justificativas a postura do presidente “o problema real/ da sua

renúncia/ foi a linha democrática/ cuja lhe causou denuncia” e sobre os rumores da sua ligação

com Cuba “não era “imperialista/nem “esquerdista” , em verdade” e da condecoração do

presidente com a Ordem do Cruzeiro do Sul considerada a maior condecoração brasileira dada a

estrangeiros, versa:

Se ele condecorou A embaixada dos cubanos Condecorou cidadãos Europeus, americanos. Na “esquerda” ou na “direita” Aplicava uma receita De acordo com os seus planos

Acreditava que era uma estratégia de governo e que seu jeito arrojado e destemido fizera

com isso levar o Brasil a frente, e, sobretudo seus versos tem o intuito de driblar os comentários

da possível ligação que estabelecia com a esquerda.

Além da questão política, Rodolfo demonstra satisfeito com as medidas de cunho moral

adotadas por Quadros, o que para seus críticos e adversários soava como uma maneira de

desvencilhar e fugir dos reais problemas pelos quais passava o país é tomado por Cavalcante

como uma regularização dos costumes da decência e da moral.

43 SILVA, Francisco Teixeira da. A modernização autoritária: Do golpe à redemocratização 1964/1984. In: LINHARES, Maria Yedda (org), Historia Geral do Brasil, 9 ed, Rio de Janeiro: Elsevier, 1990, p. 356.

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Os desfiles de maiôs Rigorosamente se impôs O respeito principal (...) Jânio queria acabar Com o jogo, certamente, Achando que a jogatina É um comércio indecente (...)

Identificara-se com as medidas de quadros, como já é sabido Cavalcante se colocava

como um homem conservador e seus folhetos se direcionam nesse momento ao contra-ataque à

nova sociedade que despontava, no pós-guerra tanto homens como mulheres começavam a deixar

os cabelos crescer, os jovens se identificavam com o Rock e vivia-se o período de maior

liberdade sexual da história humana44.

Em contrapartida Cavalcante escreve o folheto Cabeludos de ontem e cabeludos de hoje

em que faz um paralelo entre os cabeludos do tempo de Moisés, em que Isac, Abraão, Jeremias,

Salomão e até “Cristo – o redentor querido/ como todo Nazareno/De parte simples, sereno/Tinha

o cabelo comprido!” aponta que foi em Londres então que surgiram essas idéias avançadas e

modas depravadas

Começando pelos Beathes Quase todos os cantores Deixaram crescer cabelos, Suas barbas e podores, Dando para mocidade Maus exemplos, na verdade, De eróticos corruptores

Coloca que todos os cabeludos são marginais contrários a moral dos antigos. Estes

desviam as moças de família e não tem civismo. Cavalcante julga necessário a criação de uma lei

na qual combatam os cabeludos que estão levando a pátria ao abismo. A xilogravura indica os

modernismos da época, juventude despojada e cheia de estilo que em nada agradava àqueles que

prezavam a sociedade moralista.

44 GASPARI, Elio. A Ditadura envergonhada. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 213.

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Havia setores da sociedade brasileiras bastante tradicionais em choque neste momento de

modernização, não aceitava as mudanças e as atitudes da juventude, o posicionamento de

Rodolfo Coelho Cavalcante é mais um elemento que comprova esse enfrentamento da tendência

liberal dos jovens e o conservadorismo secular. Neste mesmo sentido escreve As modas

escandalosas de hoje em dia, mostrando a moda depravada da nova geração com a infância

corrompida que lê “Revista sexual/ É a primeira leitura/ Fantasma, zorro, coyote/ E a sua

literatura.

Critica a moda que da ao homem feminilidade e em caminho inverso a masculinização da

mulher, nos seus versos questiona

Alguém diz: ele ou ela? Só parece uma mocinha... Com a calça apertadinha Passeiando de chinela Moça com calça de homem

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Numa falta de respeito... Essa inversão dos papeis é retratada na xilogravura do folheto, ofendia os setores

moralizadores da sociedade, e, sobretudo, aos homens e seus discursos de defesa à submissão

feminina, essa “inversão” provoca reações a sociedade machista.

O novo comportamento feminino aturdia os moralistas, dentre os quais Cavalcante era um

porta-voz inflamado, os atos das mulheres eram duramente criticados, o namoro, o vestido

decotado, pinta o rosto, cabelo, boca “pinta até as unhas do pé”, faz comparação da mulher com a

“cabra macho”, fumando seu cigarro “Hollywood” e respondendo o marido. Retrata também o

comportamento de um casal perante a família É o rapaz na janela/ com a moça se beijando/ na

presença dos pais dela.

O governo que se formara em 1964 no Brasil trouxe efeitos dramáticos principalmente em

se tratando das liberdades públicas suspensas à população brasileira. Caracterizava-se pelo seu

dirigismo conservador e anticomunista, observa Elio Gaspari

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Produto da guerra fria, esse pensamento político projetou-se sobre a direita brasileira como uma utopia planejadora, centralista, acompanhada por uma visão catastrófica de desordem administrativa e do caráter errático do voto popular. Essas características davam-lhe uma essência ao mesmo tempo racional e autoritária.45

Mais precisamente sobre O golpe de Estado de 1964 na Bahia mostra que “Também aqui

como o restante do Brasil, este golpe de Estado incidiu sobre uma realidade caracterizada pelas

contradições e conflitos típicos de uma sociedade de base essencialmente tradicional em um

momento crucial de seu processo de modernização”46.

O governo militar, como notamos, é constante nos folhetos de Cavalcante, no entanto

escreve com mais intensidade no que tange à política de combate anticomunista.

O folheto que mais expressa seu posicionamento de critico feroz a doutrina comunista é

O dragão do fim da Era faz uma apologia ao livro apocalipse da Bíblia, segundo qual de um

sinal do céu surge um grande Dragão vermelho, que tinha sete cabeças e dez chifres e, sobre as

cabeças , sete diademas47, para Cavalcante esse Dragão do fim da Era é o comunismo que nefasto

e com o rótulo de socialismo vai se infiltrando nos países democráticos, ataca também com base

na passagem bíblica que descreve o caráter trapaceiro do Dragão “que precipitando na terra o

grande Dragão, a antiga serpente, chamado de Diabo e Satanás, que engana todo mundo”48.

Dessa forma, Cavalcante coloca que com sua noção precária o comunismo agita a classe

operária, coloca tudo não passa de utopia, que comunismo é anarquia e também a doutrina do

ateísmo. Em tom irônico questiona ”Porque os cubanos vivem da Rússia fugindo?!/Em Moscou

lê-se a notícia, que há gente escapolindo...” outro feito do Dragão é o muro de Berlim.

Sobre o comunismo no Brasil, Cavalcante argumenta que entre os estudantes entra

sorrateiramente, na política encontra a melhor guarida iludindo o moço de bem, na lavoura

semeia infelicidade, também “assalta-se bancos e seqüestram embaixadores”, nesse ponto faz

referencia ao seqüestro do embaixador americano no Brasil. Segundo Skidmore, o rápido apoio

dado aos militares após o golpe de 64 pelos Estados Unidos, também sua tradicional posição de

45 GASPARI, 2002. p. 211. 46 Ferreira, Muniz Gonçalves. O golpe de Estado de 1964 na Bahia. 47 Apocalipse 3:12, Bíblia Sagrada. 48 Apocalipse 9: 12, Bíblia Sagrada.

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principal investidor e parceiro comercial do Brasil foram os motivos no qual o transformaram

num alvo natural da oposição nacionalista. Em 4 de setembro no Rio de Janeiro seqüestraram o

embaixador americano Charles Burke Elbrick, daí os seqüestradores passaram a fazer exigências

ao triunvirato militar que governava o país.

“Os seqüestradores pertenciam a ALN e ao MR- 8, movimento revolucionário cujo nome

se inspirava na data de 8 de outubro, que lembra a morte de Che Guevara”.49 (204)

Eu duvido que o barbudo Que se chama Fidel, Não esteja nas Américas Demonstrando seu papel Como mandado da Rússia. Para isso tem astúcia Esse cubano infiel

Não sou contra o Americano, Esse povo que auxilia As Nações para o progresso Dentro da Democracia É ela a grande defesa, Verdadeira fortaleza Contra toda tirania!

Na narrativa do folheto Independência do Brasil, de 1972, o sentido de “independência”

inicialmente despretensiosa, parece tratar de uma homenagem ao processo de separação Portugal

e Brasil. Faz reverência a alguns grandes nomes como Tiradentes valendo-lhe a comparação de

mártir com Jesus Cristo50.

Na seqüência do texto há saudações a D. Pedro como bravo e destemido imperador; ao

hino nacional e dois de julho, em seguida uma retrospectiva romantizada da independência “D

49 Skidmore, op. Cit. P. 204. 50 A religiosidade é um aspecto importante nos folhetos populares, não raro são encontrados elementos bíblicos nos versos.

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Pedro naquele instante/Desembainhou a espada” ações e cenários de amor e bom serviço a pátria

“Foi no riacho Ipiranga/sete de setembro o dia”.

Que tipo de história política fazia Rodolfo Coelho Cavalcante? Percebemos que seu

discurso faz parte de um senso comum. O período em que escrevia se fazia uma história ainda

voltada para grandes nomes, datas e descrição pormenorizada dos fatos e acontecimentos

simbólicos. Pois sabe-se como os contextos dizem muito do resultado final de uma produção,

lembremos da história do Brasil feita por Vanhagen a linearidade a reverência a datas, nomes e

fatos a grande quantidade de dados, fazendo dessa forma uma história superficial e cheia de

limitações, a busca de referências do passado para uma nação recém-independente que trouxesse

orgulho concretizou a necessidade de “uma história que realizasse um elogio do Brasil, dos seus

heróis portugueses do passado distante e recente que expressas confiança incondicional em seus

descendentes”51 . Logo, as referências eram o homem branco e o Estado Imperial, em conclusão,

eram medidas para o Brasil continuar português .

A ideia de “Independência do Brasil” que Rodolfo Coelho Cavalcante traz no título do

folheto perpassa os feitos de D. Pedro “Mas o Brasil não parou/continua batalhando” é quando

menciona o advento da república, ressaltando o período militar no país. Mas é em 64 que de fato

houve a conquista da independência e da ordem e a suposta desordem seria o comunismo.

Em sessenta e quatro o ano Surge a negra subversão Pelos falsos brasileiros Que usavam de traição Pelo comunismo civil Para levar o Brasil Ao vale da perdição

Para com as forças armadas e seus gloriosos presidentes que livrou o Brasil das “ondas

perigosas”, mas no final do folheto homenageia o “progresso altaneiro” que passa o país, mais

uma vez Castelo Branco e seu denodado civismo, Costa e Silva o presidente da grande revolução

e Médice pelo seu governo o Brasil foi visto pelo mundo inteiro, sua meta pelo progresso.

51 REIS, José Carlo. As identidades do Brasil: de Vanhagen a FHC – 9.ed. ampl. – Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007.

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Mesmo em folhetos que não se dirigiam diretamente a política, ficam implícitas algumas

idéias do autor no sentido de estar a par com o governo ditatorial, por exemplo, no folheto

Deveres dos brasileiros em conservar o Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em resumo

Cavalcante vem reclamar a pouca atenção dada as cidades históricas, clama ao povo o dever que

estes tem em colaborar com o governo ajudando a zelar do seu patrimônio.

O que Rodolfo versa que deve ser conservado? São objetos móveis, mobília, pratarias e

imagens; valor histórico das igrejas conventos , fortalezas, casas residenciais , são exemplos

usados a Bahia com o conjunto Pelourinho, a cidade de Ouro Preto com seus templos religiosos

para não esquecer a história de Tiradentes e dos bravos inconfidentes, cidades como Porto Seguro

“celeiro da pátria” com seus templos seculares e São Cristovão com suas igrejas e casarões.

Logo, o que toma como proteção ao patrimônio é o Patrimônio edificado escrito em 1978.

A defesa do Patrimônio Artístico e histórico é referente basicamente ao patrimônio

edificado: igrejas, conventos e a bens materiais, mobílias e imagem, e essa era a visão de

patrimônio que se tinha por esse período.

As políticas públicas voltada para a proteção patrimonial no Brasil é de responsabilidade

do poder federal e segundo Pedro Paulo Funari e Sandra Pelegrine as políticas de proteção tem

cambiado de acordo com os conceitos de identidade nacional dos governos que se sucedem no

poder52.

No caso do período ditatorial com a carta constitucional de 1967 elegeu jazidas e sítios

arqueológicos como bens a serem preservados, até então considerados apenas como locais de

valor histórico.

Em 1968 com o Ato Institucional cinco (AI. – 5), com o endurecimento da censura por

parte do governo, obras foram proibidas e/ou sofreram intervenções.

Segundo Pelegrine e Funari, os anos que se seguiram ao AI- 5, às iniciativas foram

limitadas ao controle do comércio de obras de arte antigas, a locação de repartições públicas em

imóveis de valor histórico e o incentivo à produção artística e literária relacionada aos valores

nacionais e regionais.

52 SANDRA, P.A. Pedro Paulo Funari. O que é patrimônio Cultural e material? São Paulo: Brasiliense, 2008 (Coleção Primeiros Passos; 331)

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Na década de 70, contexto deste folheto, cogitou-se a possibilidade de inserção de

matérias ligadas ao patrimônio nacional nos currículos escolares, quando também foi pensada

articular a preservação patrimonial com o fomento artístico.

Dessa forma, em 1973 o governo federal implanta o Programa de reconstrução das

cidades históricas, voltada para recuperação de bens edificados também para o turismo e

comércio em cidades consideradas tradicionalmente culturais, principalmente no nordeste. neste

folheto Rodolfo pede aos prefeitos e também ao povo para colaborar com o governo.

Muitas cidades históricas Tem faltado proteção Dos próprios filhos da terra Por falta de comunhão Com o órgão nacional Que é base fundamental De toda orientação Em 79 a concepção de patrimônio foi alargado, por meio do MEC criou-se a Fundação

Nacional Pró-Memória para realização de programas e projetos culturais reconhecidos bens de

origem popular principalmente centrando na questão da diversidade cultural étnica e religiosa do

Brasil.

A maior preocupação que demonstra no folheto é para com os bens de “pedra e cal”,e

algumas lições de civismo o que indica quanto as suas idéias estavam atreladas a concepção de

Patrimônio adotada pelo governo militar:

As crianças brasileiras Envie esta mensagem: Honrai os antepassados Na presença de uma imagem De um busto erigido Com perfeita homenagem A ilustração da capa do folheto também faz referência ao patrimônio edificado é a

imagem da Cruz do Pascoal de 1743 em Salvador.

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As igrejas, os conventos E as velhas fortalezas Tem o seu valor histórico De incalculável riqueza(...) A imagem representa um bem que precisa ser governado, segundo a óptica do período, é

um bem de “pedra e Cal”.

Pensando sobre esta visão tradicional essas lições de civismo implícita nos discursos

destes folhetos, é importante comentar o trabalho A política como espetáculo: a reinvenção da

história brasileira e a consolidação dos discursos e das imagens integralistas na revista Anauê

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de Rogério Souza Silva, que mostra a construção de discursos e uma reinvenção da cultura e do

passado histórico pela revista Anauê.

Através da analise da revista que tinha circulação nacional, buscava-se divulgar os

princípios da Ação Integralista Brasileira e do seu líder Plínio Salgado, como solução aos

problemas brasileiros da década de 1930. Para tal, aproveitou-se a grande circulação da revista

para explorar o movimento, seus discursos e imagens para propagar a unidade do integralismo e a

pluralidade regional e cultural do país.

Sua estratégia ao tradicional era de que “na medida em que o movimento precisava

aparecer como parte da natureza da sociedade brasileira, era necessário buscar nas raízes

históricas do país justificativas para a sua existência e colocar o seu líder ao lado de figuras de

vulto da história oficial.”53

Nos folhetos analisados, que datam 64 e anos posteriores mostram que Cavalcante se

posicionava a favor do governo militar, notamos também que a sua maior preocupação é

descrever estes governos e seus feitos, não fala de outros aspectos como a repressão, por

exemplo. Como poderíamos entender esse posicionamento do autor? É possível dizer que sua

colaboração com o governo ditatória deve-se ao fato deste governo ter como característica a

rigidez que pudesse frear as novas idéias de uma juventude ansiosa por mudanças – lembrando

que Cavalcante era um homem conservador - e, sobretudo, era o governo capaz de afastar o

perigo comunista que é algo de combate do autor, o que significa dizer que seu propósito maior

não é defender o governo militar em si, mas qualquer força que fosse capaz e barrar o

crescimento do comunismo no país.

Um de seus folhetos que foi escrito durante o governo de Artur Costa e Silva O encontro

de Castelo Branco com Getúlio Vargas no céu de 1968 exatamente no ano da morte de Castelo

Branco, o cenário do encontro como traz no titulo é o céu, Vargas a esperar o seu compatriota

para leva-lo Jesus, forma todo um cenário com luz, arcanjos, procurando mostrar a benevolência

dos dois ex-presidente com a salvação assegurada.

O diálogo parte de uma pergunta de Vargas, questionando Castelo Branco o que havia

acontecido depois da sua morte, a partir daí “Castelo Branco” vai elencando em seqüência os

53 SILVA, Rogério Souza. A política como espetáculo: a reinvenção da história brasileira e a consolidação dos discursos e imagens integralistas na revista Anauê! Ver.Bras.Hist.vol.25 no 50 São Paulo July/Dec.2005.

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insucessos dos governos posteriores, em contraposição ao bom momento que estavam

vivenciando com um governo forte e com o comunismo enfraquecido sem penetração no país. A

religião era o meio utilizado por Cavalcante para justificar a rigidez do governo militar, usa

elementos bíblicos para sustentar sua argumentação a respeito da forma ditatorial de governo,

numa estrofe faz um arranjo da interpretação de Jesus pelas ações de Castelo Branco em que diz

Disse Jesus: -Na verdade Você foi bastante austero Entretanto, foi preciso... Por isso lhe considero Quem não sabe governar É governado, sem par Merecia ser severo! Além da defesa do moralismo político Cavalcante se preocupava em apoiar as medidas do

governo, o espaço da capa final também foi usado com esse propósito, por exemplo, o folheto

Drama das inundações em Salvador escrito em maio de 1971, traz os seguintes recados à

população

COLABORE COM O GOVERNO:Imposto é progresso.É dever de todo cidadão brasileiro fazer a sua DECLARAÇÂO DE BENS. E pagar o seu imposto de renda desde que ganhe anualmente, mais de CR$ 5.040,00. PLANTE QUE O GOVERNO GARANTE. Procure se informar na secretaria de Agricultura, nas prefeituras, nos bancos como adquirir a ajuda do governo para a sua lavoura. Plante agricultor, que o governo garante. Pelos folhetos, o lado cruel da ditadura militar não é mencionado, evitam o assunto, seus

versos relatam fatos políticos como os programas de governo, a austeridade dos seus governantes,

suas boas realizações; Na economia, divulgam como no exemplo a cima, iniciativas em prol da

população pobre e a garantia de apoio à esta classe, no que se refere aos elementos de cunho

social observamos que são camuflados os atos repressivos, centrando em discussões moralista,

como o ataque ao comportamento da nova geração, principalmente no que diz respeito às

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mulheres. Os novos ambientes, a moda, todo tipo de “modernismo” era criticado com afinco,

confrontavam a nova geração com a geração conservadora da qual Rodolfo Coelho Cavalcante

fazia parte e se empenhava em seus discursos em combater os novos modismos.

Notamos, contudo, que a maior preocupação de Rodolfo Coelho Cavalcante era propagar

a forma de governo que bloqueasse o crescimento da esquerda e do comunismo no país. A

ditadura apresentava-se como uma fortaleza a essas idéias de um governo forte e rígido que

tivesse esse poder de frear o crescimento do “Dragão do Fim da Era”. Motivo maior que faz

Cavalcante versar o período com astúcia de quem sabe o que estava fazendo, era pela sociedade

séria e organizada que pretendia os militares a dedicação de Cavalcante, para tal a sua

religiosidade e também dos seus conterrâneos será necessária para justificar a agudez do Regime

pois este seria o único capaz de combater o “comunismo ateu”.

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Capítulo 4: “A vaca política”: imagens e discursos políticos nos folhetos religiosos

Cuíca de Santo Amaro escreveu sobre a política, preocupado em denunciar a corrupção e

mazelas ocasionadas pelo descaso político. Cavalcante teve como guiador da sua escrita a

preocupação com o ataque comunista, o nosso outro cordelista, também com estilo particular de

ver o mundo, nos mostra o que seria um misto de discurso, imagem, política e religiosidade nos

folhetos.

Minelvino Francisco da silva nasceu na Bahia, no municipio de Mundo Novo, mais

precisamente na fazenda Olhos d’Água no ano de 1926. Foi criado no municipio de jacobina

onde aprendeu a profissão de garimpeiro de ouro, diamante e cristal.54

Minelvino aprendeu a ler com cordel. No intervalo do trabalho com um exemplar de O

romance do pavão misterioso ia aprendendo a ler, atento a leitura dos seus companheiros.

Com o tempo foi apreciando cada vez mais a literatura. Foi bastante infleunciado pelo

cordelista João Martins de Athayde, seu primeiro folheto é publicado no ano de 1949 em

jacobina, era um tipo de circunstancial de folhetos em que versava sobre um acontecimento, neste

caso, um acidente A enchente de Miguel Calmon e o desastre do trem de Agua Baixa, o folheto

teve uma boa vendagem dando ao aprendiz de cordelitas empenho a escrever novos versos.

O poeta casa-se em 1953 com Antonia Pereira Aleimida com quem tem sete filhos, dos

quais três morreram.

Minelvino produz folhetos intensamente a partir do ano de 1949, eram assuntos diversos ,

sendo sempre escritos em sextilhas ou septilhas.

54Os dados Biográficos do autor foram retirados da obra: MATOS, Edilene. Minelvino Francisco da Silva. São Paulo. Hedra, 2000. (Biblioteca de Cordel)

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Fonte 3: Minelvino Francisco da silva em Itabuna/BA. In: HTTP//WWW.itabuna.com.br

Como já foi colocado, a maioria dos cordelista baianos tinham por característica a

religiosidade forte, Mielvino em particular, faria da sua reliogiosidade sua principal marca, ele

mesmo se considerava um eleito por Deus para desempenhar sua missão especial de comunicar a

sua palavra tendo por base os Dez Mandamentos.

O próprio Minelvino se intitulou de “Trovador Apóstolo”, seus folhetos tem grande carga

religiosa e discurso moralizante, a forte fé marcou sua produção artística, de modo a ter presença

constante nos seus escritos a figura de Jesus Cristo, da Virgem Maria e de Santos.

Seus folhetos trazem essa frequencia, são alguns títulos: Apariçao de Nossa senhora das

dores e a Santa Cruz de Monte Santo; Aparição e milagre de Nossa Senhora Aparecida;

Explicação aos romeiros e a mudança das promessas; Vida de São Cristovão, são alguns

exemplos, e é importante notar que mesmo aqueles que não falam diretamente de religião, trazem

seus elementos impregnados no corpo do texto.

Além de desenvolver a escrita propriamente dita do cordel, Minelvino era xilógrafo55

55 Os dados Biográficos do autor foram retirados da obra Ele, oTal, Cuíca de Santo Amaro, de Edilene Matos.

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Minelvino é considerado o introdutor, na bahia da xilogravura.

Segundo a definição de edilene mattos, xilogravura é:

Técnica de gravura em relevo sobre madeira, a xilogravura necessita, para a sua confecçao, que seja desbastado um desenho inscrito em suporte de madeira, para depois, untado com tinta, calcá-lo contra uma folha de papel. As partes escavadas, que não receberam tinta de impressão, constituirão os claros da estampa. (MATTOS, p. 20. 2000.)

O também cordelista Franklin Maxado reitera que a arte da xilogravura desenvolveu-se

para ilustrar os folhetos populares tornando os impressos mais atraentes56. O mesmo autor fala

que a xilogravura proliferou-se com os artistas utilizando madeiras locais, como exemplo, o

Cedro, Umburana, a Caraca da Cajá, o Pereiro, a Imbuia, a Peroba, entre outras.

Franklin Maxado, diz que a profissão de xilógrafo, não existia. E os primeiros “tacos” ou

“carimbos” não eram assinados, perdendo-se muitos nomes importantes.57

Com as xilogravuras minelvino ilustrou seus folhetos com também dos seus

companheiros como Rodolfo Coelho Cavalcante, ilustrando constantemente os folhetos do seu

companheiro, também fazia a impressao dos seus próprios livros devido o surgimento na Bahia

de máquinas impressora, indo da produção manual até a elétrica.

Em 1979, sofreu um acidente com uma dessas máquinas perdendo três dedos, como um

“trovador apóstolo” deu a sua gráfica o nome Gráfica Milagre de Jesus, a baixo uma xilogravura

de Minelvino que ilustra bem a carga religiosa dos seus folhetos

56 Franlkin maxado, p. 12. 57 Maxado, p.13

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Minelvino se torna ainda mais devoto, quando começa a participar de romarias de Bom

Jesus da Lapa, indo anualmente ao local, destaca-se entre os romeiros por se propor a fazer

benditos e hinos sacros, mesmo quando seus folhetos não tinham caráter religioso, colocava em

capa ou no final dos folhetos pedidos e preces.

Segundo Edilene Matos, Minelvino se instala em Itabuna no sul da Bahia, apresentando

em 1956 um projeto à Câmara Municipal propondo a denominação de Rua dos Trovadores a uma

das vias pública da cidade, residindo nela até 1999, ano da sua morte.

A política nacional interessava a Minelvino, publica folhetos nessa direção, mesmo com

sua base religiosa não poupava palavras para escrever sobre a corrupção atacando políticos

desonestos, dedica um folheto inteiro para falar da roubalheira existente nas eleições.

Nesse folheto a leitura imagem texto é particularmente interessante, o folheto é intitulado

“História da vaca política” sendo a xilogravura a imagem da vaca com o nome de prefeitura perto

dos seus ubres, insinuado que assim como o leite que a vaca proporciona é farto, rico em

nutrientes, também a prefeitura e outros cargos do governo são desejadas por fornecer verbas tão

desejadas como um bezerro deseja e se alimenta nos ubres de uma vaca. O teor crítico da sua

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xilogravura é completo, se observarmos que não se trata de uma simples vaca, é um animal forte,

pesado e seus ubres cheios.

No texto faz uma alusão da figura da vaca enquanto fornecedora de leite, estando a vaca

prefeitura com o ubre cheio e os políticos doidos para nela mamar. Fala que estes ubres é motivo

de muita confusão, a agitação de comício em comício, ou autos-falantes, coloca os discursos de

garantia de água, luz no período da eleição e a critica as promessas hipócritas e crescentes por

parte dos candidatos, emprego, dentistas gratuitos e até avião a cada um.

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Depois de tantas promessas e da realização das eleições, em tom irônico mostra o que

entende por política denunciando a manipulação do pobre, somente valorizado na hora do voto

Os que perderam o peito Da vaca ficam zangados Dizendo: lutemos tanto E esses cabras safados Votaram pro seu fulano Gastemos sem resultado Ah meus cinqüenta cruzeiros Que eu dei a um eleitor Para votar pra mim E o infeliz traidor Foi votar pra seu fulano Candidato inferior Em seguida, elogia a desenvoltura do prefeito José Almeida Alcântara que se elegeu pela

primeira vez em 1959, segundo o jornal Memória Grapiuna é Considerado o maior líder

carismático da história de Itabuna, além de prefeito, Alcântara foi deputado estadual. Na época

obteve uma votação estrondosa, se elegendo com muita facilidade58 é o que escreve na matéria

Alcântara, o maior fenômeno eleitoral da história de Itabuna.

Essa popularidade insinuada pelo jornal encontra fundamento no folheto de Minelvino

que diz

O senhor José Alcântara É nosso digno prefeito Que luta por Itabuna Fazendo todo direito Porque o povo o elegeu Um cidadão de conceito

Minelvino lança em 1954 o folheto Carta de Getúlio onde narra a carta-testamento escrita

pelo presidente antes da sua morte. Reproduzindo essa carta para a leitura e informação de seus

conterrâneos diz estar cumprindo o seu dever, começa o folheto aclamando pelos Brasileiros e

58 Memoria Grapiuna é um projeto da Fundação Jupará com patrocínio da rádio Morena FM 98.7 e jornal A Região.

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trabalhistas, e numa visão bastante positiva de Getúlio Vargas, transforma numa linguagem

simples a carta.

Segundo Skidmore, a reação do povo surpreendeu seus oponentes, uma onda de simpatia

por Getúlio envolveu o país. Autentica ou não a carta-testamento foi aceita imediatamente pelo

povo. Terminara a indecisão de Getúlio entre uma política ortodoxa ou nacionalista. Sua carta

suicídio era o apelo nacionalista mais vigoroso que jamais fizera59.

Minelvino faz a transcrição da carta-testamento de Getúlio justificando que o motivo que

levou Vargas a causar sua própria morte teria sido as aflições que havia passado para garantir o

bem do povo brasileiro, assim relata

O nosso Getúlio Vargas Quando viu que não podia Dar direitinho à pobreza O que sempre pretendia Sentiu bastante tormento E escreveu num momento O que seu peito pedia. Passa na xilogravura a imagem de um homem sereno

59 Op. Cit. P. 180 de Getúlio a Castelo

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Nessa passagem, notamos na expressão nosso a referência que tinham em Getúlio como

pertencente ao povo, uma figura paternal principalmente no que se atribui à classe pobre e

trabalhadora alvo da sua política. É também possível visualizar a eficácia desta, uma vez que

percebemos através deste folheto como essas classes acreditavam piamente que a pretensão maior

de Vargas era dar “direitinho à pobreza”.

Seu posicionamento à favor de Vargas fica evidente neste folheto, produz uma imagem do

presidente bastante benevolente, cuidador dos pobres, trabalhadores, a quem dedicou sua vida e

também a sua morte, passaria à seus conterrâneos com este folheto, uma mensagem sofrida e ao

mesmo tempo serena de Vargas, tudo em prol do povo. Nenhum desajuste do seu governo foi

mencionado ou pelo menos diante da circunstância da sua morte não seriam lembrados.

O trovador apóstolo escreve em 1976 o folheto informativo sobre a Morte do Ex-

presidente Juscelino Kubitschek. Pela xilogravura abaixo, notamos o tratamento do presidente

como um herói nacional seu retrato é de um busto erigido, como costumavam pousar e postar na

história tradicional.

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Metade do folheto é dedicado a descrição do acidente e a outra a narração da sua chegada

ao céu. Faz uma descrição celestial, da alma voada ao céu guiada por um clarão até chegar a

Santa Mansão, a recepção por São Pedro lhe guiando até Jesus Cristo, quando lá chega

humildemente encontra Castelo Branco, este aos seus pés ajoelhou e pediu perdão por ter cassado

seu mandato, Juscelino perdoou, mas indagou:

Já tirou da tua lista Aquela má compreensão Que lá na nossa Nação Eu nunca fui comunista?

A pretensão do autor neste momento é “defender” Juscelino Kubitschek, anular o mal

entendido de que seria comunista.

A resposta de castelo Branco é dizer que compreendia que Juscelino havia sido inocente e

que gostava mesmo era do progresso, essa sua suposta resposta, demonstra a idéia que o autor

tinha do comunismo como oposição ao progresso, ao tentar unir inimigos políticos, todos agora

arrependidos dos seus pecados, pelo estigma maior das suas desavenças que seria o comunismo.

Se aproximavam para saudar Juscelino o Marechal Costa e Silva, Getúlio Vargas e Gregório.

Gregório, chefe da guarda pessoal de Vargas, teria sido o mandante de um atentado contra

Carlos Lacerda, jornalista e político de forte oposição a Getúlio Vargas. Condenado, teve no

governo JK pena reduzida. No folheto o encontro entre esses dois foi cordial, o Tenente Gregório

pergunta por Carlos Lacerda se este já havia mudado, se a língua estava menor, diz por ele estar

esperando para as contas acertar, neste momento a paz celestial da narração é interrompida pelo

discurso de rancor por parte de Gregório.

Em seguida, o diálogo se volta ao governo Médice, Juscelino passa a fazer o balanço, diz

ter sido um governo honesto e menciona a criação do FUNRURAL, mas foi nas mãos de Ernesto

Geisel que deixou o Brasil que já fazia realizações como a aposentadoria para idosos.

O folheto tem fim, com as palavras de Juscelino

Juscelino disse: irmão O povo está desumano O partido MDB Está com um fogo tirano Naquela edição passada A ARENA foi derrotada E entrou foi pelo cano

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Este folheto em especial mostra o posicionamento de Minelvino (assim como Rodolfo

Coelho Cavalcante) em à favor da rigidez política e do moralismo do governo militar.

A narrativa que faz entre os ex-presidentes passa uma imagem positiva bastante amistosa,

passa ao povo essa convicção que somada às suas aspirações políticas e a sua carga religiosa

materializa no folheto aquilo que julga acontecer, e neste aspecto há que se apontar o caráter

móvel e circular dos folhetos já que estes serão repassados à população baiana e farão de forma

explicita ou não surtir efeitos, Candece Slater fala que os folhetos não apenas registram

acontecimentos como desempenham papel ativo na formação destes. A história do cordel tende a

moldar sua matéria-prima ao mesmo tempo que é moldada. Mesmo escrito depois da morte de

Juscelino, já em 1976, dos folhetos trabalhados este é o que mais permite visualizar o

posicionamento do autor sobre o período militar.

A vitória de Lomanto Júnior sobre Valdir Pires para o governo do Estado em 1962, foi

tema de folheto de Minelvino. Narra com entusiasmo a conta dos votos com Valdir Pires com

vantagens nas urnas da capital, por outro lado do sul até o sertão Lomanto conseguia uma frente

bastante favorável ganhado às eleições, em tom apelativo Minelvino pede para fazer construções

para o povo trabalhar, falando da difícil condição do operariado, pede também pela construção de

hospitais para amparar os pobres do local, pois os que existem não encontram vagas.

Conservador, Minelvino pede também pra fechar os jogo que só traz miséria, tortura e

tormento, para comemorar a vitória do seu candidato, Minelvino termina o folheto com um

trocadilho

Ai seu Lomanto Seu feijão fulorou Ai seu Valdir O seu piri se quebrou Sobre o governo de Lomanto Júnior, Muniz Gonçalves Ferreira ressalta que se constitui

como resultado do triunfo da coalizão UDN-PTB sobre o candidato do PSD, Waldir pires das

eleições de 1962. Segundo Muniz Ferreira a eleição de Lomanto foi sustentada pelos círculos

conservadores da política e da sociedade civil baiana da época tendo como “padrinho” eleitoral

Juaracy Magalhães, governador, político da UDN e adversário de João Goulart, de igual

importância de analise e que não ajudam a entender o posicionamento de setores das classes

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populares a favor de Lomanto Júnior é a analise trazida pelo sociólogo Antonio Sergio Alfredo

Guimarães, citada por Muniz Ferreira:

Enquanto Waldir buscava apoiar-se nas mesmas forças que sustentavam politicamente o governo Goulart – a organização sindical camponesa e a pequena burguesia reformista-, Lomanto Júnior encontrava na burguesia agrária e na oligarquia, apavoradas com as perspectivas de reformas de base, e nos demais setores burgueses o sustentáculo para as suas aspirações políticas sem descuidar-se, entretanto, de procurar nas massas populares os votos de que precisava60.

Minelvino escreve o folheto O governo Médice e os agradecimentos dos trabalhadores do

Brasil, Médice é tratado por Minelvino como homem enviado de Deus que veio trazer a paz ao

Brasil para civis e militares, não desprezando nobre e pobres como um homem santo faz. Coloca

novamente entre os benefícios que trouxe à população o FUNRURAL e a aposentadoria

Conheceu toda massada No preço do boi em pé Deu uma forte trancada Dando uma chance a pobresa Ter sua carne na mesa Salvando dessa embrulhada O FUNRURAL programa de Assistência ao Trabalhador Rural que consiste na prestação

de benefícios como aposentadoria por velhice; aposentadoria por invalidez; pensão; auxílio-

funeral; serviço de saúde; serviço de social61.

O governo Médice foi embalado nos mais altos índices de crescimento econômico da

história do país, calçado na entrada maciça de capitais estrangeiros e no arrocho salarial, e em

um mercado internacional em expansão, proclama o “Milagre Brasileiro” como o patamar inicial

60 FERREIRA, Muniz Gonçalves. O Golpe de Estado de 1964 na Bahia. Salvador: UFBA. 61 Lei complementar Nº 11, de 25 de Maio de 1971, Institui o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural

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de um crescimento acelerado e ininterrupto que somente mostraria sinais de fraqueza ap congo do

governo de Ernesto Geisel62.

O folheto data a passagem do governo Médice para Geisel, e seu desfecho é imbuído de

agradecimentos a Médice, pela aposentadoria, pelos benefícios a sociedade rural e a baiana de

modo geral com a baixa do preço da carne.

A baixa da carne fresca é motivo para folheto e trata também de um outro folheto

mencionando as grandezas do governo Médice.

. A xilogravura mostra o povo em desespero e logo abaixo a tabela da carne fresca.

Comunica à população baiana os benefícios com a baixa da carne que o presidente Médici

presenteia todo o país

Alegra o povo baiano Principalmente a pobreza Que nunca mais comeu carne E está na maior fraqueza Para todos nós melhorou

62 Modernização autoritária

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Que o presidente mandou Carne para nossa mesa

Anuncia que aqueles que não obedecerem a tabela terá o açougue fechado, inconformados

muitos açougueiro querem ir até o presidente. Minelvino fala que devido o preço, quem mora na

zona rural acaba sofrendo pois Quando chega na cidade/ É feliz quem acha osso a correria

começa as cinco da manhã para comprar carne pro almoço e para a janta. A lei causa irritação

também por parte dos fazendeiros que não querem vender o boi ao preço pedido.

Médice seria novamente assunto do folheto de Minelvino, dessa vez escreve um

especialmente sobre a aposentadoria, segundo a lei já mencionada do FUNRURAL seu artigo 4º

institui:

. Art. 4º A aposentadoria por velhice corresponderá a uma prestação mensal equivalente a 50% (cinqüenta por cento) do salário-mínimo de maior valor no País, e será devida ao trabalhador rural que tiver completado 65 (sessenta e cinco) anos de idade

Os velho estão contente E dão graças todo dia Primeiramente a Jesus E a Santa Virgem Maria E o ex presidente Médice Que deu essa garantia

Logo em seguida aponta as dificuldades que havia para se aposentar, precisa de um

“pistolão”, diz que como Presidente Geisel faz uma observação, teve este compaixão Aposentar

por idade/ Não importa a profissão, pois com a mudança é só chegar no INPS (Instituto Nacional

de Previdência Social) levar documento e fazer aposentadoria, afirma Minelvino criando uma

imagem de bastante tranqüilidade e facilidade na aposentadoria, tenta passar essa cordialidade

também na xilogravura.

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Em Minelvino, por ele mesmo ilustrar sua capas a interconexão entre o visual e o escrito é

ainda mais forte. A literatura de cordel apresenta muitos tipos de linguagens e de leituras que

acabam por revelar maneiras de ver o mundo, seja de um sujeito ou do coletivo em que está

inserido, lembrando ser esses tipos de linguagem por estes sujeitos e grupos que estão

historicamente situados no tempo e espaço. A esse respeito Gilmário Moreira coloca que

A visualidade do folheto não se restringe apenas às imagens de capa, as narrativas poéticas escritas em versos retêm, em grande medida, aproximações a tradições oralmente transmitidas através de leituras, cantorias, recitações e declamações de versos mediante rima e ritmo, para a veiculação de contos, cantos, crenças, rezas, valores, costumes a m coletivo que articula além de gestos e performances, construções de imagens literárias. Esse processo de produção/transmissão dessa linguagem visual difere da leitura silenciosa, individual, praticada do texto escrito, mas aproxima-se do cinema em sua fase inicial.63

63 BRITO, op. Cit. p. 241

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Na questão escrita podemos dizer que Minelvino faz um misto da linguagem político-

religiosa. Associadas, é assim que o autor justifica e embasa seu pensamento, anseio e posições.

Pode-se afirmar que esse tipo de linguagem é bem recebida entre seus conterrâneos, a

religiosidade é um elemento importante que compõe a vida social nordestina, faz parte do dia-a-

dia deste povo e não poderia escapar ao folheto.

Sobre a vertente política, Minelvino se coloca assim como Rodolfo Coelho Cavalcante

como defensor do regime Militar em termos de segurança, ao afastar o perigo comunista e

sustentar o ideal de uma sociedade rígida. Minelvino quantitativamente escreve menos folhetos a

respeito da política nacional em relação a Rodolfo Cavalcante. Em caráter mais informativo,

percebemos que o alvo maior do seus escritos foi o Governo Médice, divulgando seus feitos.

Lucia Lippi Oliveira em seu artigo Cultura e identidade Nacional no Brasil do século XX,

trabalha os períodos da história brasileira neste século identificando em cada um a questão da

busca por uma identidade nacional. Sobre o período correspondente a segunda metade do século,

escreve que para além da repressão e da censura, os governos militares procuraram também

ganhar o apoio da sociedade para seus projetos, da o exemplo da criação da Assessoria Especial

de Relações Publicas (AERP) da presidência da república, em 1968. Os militares instituíram essa

agência com o objetivo de redefinir um projeto nação através da propaganda. Cita a campanha

publicitária do “Brasil: ame-o ou deixe-o” que expressa com clareza a idéia dos governos

militares, mas diz a autora que não sensibilizou muito a população que respondeu com a ironia “o

ultimo a sair, apague a luz...”

A autora trabalha a diversidade e riqueza das manifestações populares no Brasil desta

década. Devido às múltiplas manifestações culturais, diz que neste período não se fala mais da

existência de dois Brasis (o rural e o urbano), mas de vários Brasis. Contextualiza ainda que este

novos tempos são mesmo caracterizados como uma “terceira geração industrial”, comandada pela

informática, telecomunicações, etc.

Rodolfo e Minelvino, tinha como ponto comum a defesa da sociedade rígida. Outro

aspecto que unia os autores era a defesa do povo, discutem questões salariais, alimentícia,

trabalhista, tudo que viesse reclamar a difícil condição da população baiana, com a qual se

identificavam e eram porta-vozes. Curiosamente, os três têm folhetos com tema comum: A

carestia.

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Sou eu mesmo a marreteira Que marreto todo dia No Brasil de canto a canto Principalmente à Bahia Quer saber qual é seu nome? O meu nome é carestia (MINELVINO, A marreta da carestia) Bacalhau não tem tabela Vende lá como quiser De dezoito a vinte e cinco Como ele quem poder O pobre vive chorando O rico sempre zombando Isto mesmo é ele que (CAVALCANTE, ABC da carestia) Outra coisa minha amiga A você eu esclareço Quem dizer que coma gesso Porque a farinha De trigo subiu de preço

(CUÌCA, Discussão da carne verde com o pão)

Esse trabalho teve por intuito aprofundar a questão da Literatura de Cordel como fonte

histórica, mostrando a sua importância para certos setores da sociedade baiana na metade do

século XX. E hoje representa para nós um veículo de estudo histórico, memória e testemunho de

uma época.

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Considerações Finais

Esse trabalho que se propôs a analisar a literatura de cordel como objeto de estudos

históricos, sendo estes folhetos resultados (móveis) de práticas sociais historicamente construídas

por indivíduos e grupos, e também historicamente inseridos no tempo e no espaço. Pensando no

seu caráter ativo na sociedade baiana nos propomos a analisar através das linguagens do cordel

visual/escrito as possibilidades ler o que os nossos conterrâneos a décadas atrás tinham como

concepção de mundo. Especificamente neste trabalho o estudo centrou-se na forma como

retratavam a política nacional e sua repercussão na Bahia.

Os três autores de cordel eleitos para este trabalho produziram na Bahia durante as

décadas de 1950 a 1970, em seqüência da produção os folhetos de José Gomes, o Cuíca de Santo

Amaro, Rodolfo Coelho Cavalcante e Minelvino Francisco da Silva nos proporcionou uma visão

de baixo para cima dos fatos políticos e unidos a estes muito nos revelam sobre questões sociais

do período que datam desde a morte de Getúlio Vargas até fins da ditadura no governo Geisel.

Cada autor com um jeito bastante peculiar de interpretar, Cuíca de Santo Amaro com

linguagem bastante direta, escrevia contra políticos, homens corruptos, tinha um tom satírico nos

seus versos, conseguia com facilidade ser irônico e também contraditório, não tinha assunto

predileto, escrevia com prazer aquilo que presenciara ou que ouvira dizer que despertasse

curiosidade de seu leitor, por isso seus temas variavam bastante, aparece nos seus folhetos o

governo Getúlio, defendendo seus ideais do Trabalhismo, Governo Juscelino Kubitschek, Jânio

Quadros João Goulart e questões de cunho moral, como a feminização do homem e em sentido

inverso a masculinização da mulher que atacava impiedosamente, transparecendo o período de

modernização pelo qual estava passando a Bahia na década de 1950 e não era partidário.

Rodolfo Coelho Cavalcante quantitativamente foi o que mais escreveu sobre política,

principalmente sobre a década de 1960, curioso notarmos nos seus folhetos que mesmo sendo

óbvio que tinha afinidades com o governo ditatorial, por suas características conservadoras, salta

aos olhos que sua maior “missão” não é fazer a propaganda desse período, mas ficar ao lado da

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forma de governo que combatesse o crescimento comunista no país, a Ditadura Militar lhe dava

esta certeza.

Cuíca sarcástico, o Rodolfo anticomunista, Minelvino se caracteriza pelo seu

conservadorismo religioso, “o Trovador apóstolo”, assim se considerava, acreditava que seu

papel na sociedade baiana era o de informar junto com os acontecimentos da época a fé cristã, a

religiosidade muito presente nos folhetos nordestinos é traço marcante na escrita desse autor, seus

folhetos mais trabalhados aqui datam a década de 1970, não ignorava a ditadura, e escrevia com

devoção sobre o governo de Médice.

Interessante notar, que os autores aqui analisados, não fazem distinção a uma história que

seria nacional e outra local, pelo contrário mostram como estão intrinsecamente ligadas, e não

esta determinada a surtir os efeitos do que acontece em âmbito nacional, passivos aos mandos da

elite política como também prova o contrário, se a questão da carestia afeta a população baiana

como também outras partes do país, isso tende a chegar ao governo federal mesmo que esta

responda ou não a estes problemas. Neste ponto trazemos a discussão de A Invenção do Nordeste

e outras artes de Durval Muniz Alburqueque Junior, que nos ajuda pensar sobre essa região que

também tem o cordel ligado à sua imagem. O autor vem como o título sugere discutir essa

invenção que segundo ele é, sobretudo, discursiva. Trata-se da invenção imagético discursiva do

Nordeste, desconstruindo a idéia de um lugar que sempre existiu e de como fosse um dado

natural do espaço geográfico.

O nordeste vitimizado, pobre, atrasado, seco, de pessoas fanáticas, faz parte de um

discurso que segundo Alburqueque Júnior, não é meramente construído pelo “de fora” da região

Sul, ao qual é colocado como subordinado, em contraposição, antimoderno. Mostra que esse é

também um preconceito interno, reproduzidos pelos seus próprios discursos e por seu próprio

povo, que justifica a postura das elites, a indústria da seca, etc. O autor defende que a ideia de

popular se confunde com as de tradicional e antimoderno. Fazendo com que a elaboração

imagético discursiva do Nordeste tenha enorme poder de impregnação nas camadas populares.

Além do texto propriamente dito, as iconografias presente na capa dos folhetos também

foram aqui analisadas como fonte independente, não necessariamente precisa do texto escrito

para passar a mensagem. As imagens dos cordéis provocam segundo Franklin Maxado eram as

xilogravuras que tornavam o texto atraente, aguçando a curiosidade do leitor.

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Este estudo procurou reforçar a literatura de Cordel como fonte histórica e popular,

permitindo visualizar pelos discurso se imagens, leituras de uma época, de valores implícitos em

versos que se pretendiam despretensiosos mas que estavam embebidos de estereótipos. Ler além

do texto, perceber as situações históricas e tentar encontrar significados como propõe Geertz,

dessa forma que ocorreu a investigação da posição da qual falava o autor, por isso de baixo pra

cima, entender o que seus versos queriam dizer sobre um todo, as bibliografias foram colocadas

nessa intenção de dialogar, dispensando a idéia tradicional de comprovar o popular com o

clássico, com o acadêmico.

Há sem dúvidas trabalhos que valorizam o cordel como registro, documento e memória da

história brasileira, mas há uma lacuna em relação aos trabalhos históricos, muitos estudos se

desenvolvem na área da Linguagem, Educação e Literatura. Neste intento buscou-se mostrar aqui

seu valor histórico, como a sociedade tomava e interpretava o momento que vivenciavam, nas

décadas de 1950 a 1980.

Este trabalho é relevante por analisar a história a partir da perspectiva popular - seus

poetas são do povo e o representam nos seus versos. E essa talvez possa ser a grande contribuição

deste trabalho, dar voz e visibilidade a estes sujeitos históricos e sua rica produção por muito

marginalizada.

(...) Sou eu m

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