Matéira mundo Música
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É manhã de uma terça-feira. Acordo. Sempre ligo o com-
putador de manhã para ouvir música enquanto me preparo
para ir ao trabalho. Neste dia em particular, vi na internet
que haveria um debate na Livraria Cultura sobre coletivismo
no mercado da música independente. Os dois debatedores:
Pablo Capilé, um dos fundadores do Circuito Fora do Eixo,
grupo que nasceu com o intuito de estimular a circulação de
bandas pelo país e a troca de experiências entre produtores
de diversos locais; e Tathiana Nunes uma das integrantes do
Coquetel Molotov, grupo que, entre outras coisas, organiza o
Festival No Ar: Coquetel Molotov. O que os dois têm em co-
mum? Vêem no coletivismo uma forma ideal para trabalhar
com o mercado indie. Mas o que importa mesmo é o que eles
têm de diferente.
Antes de falar sobre como foi o debate, é importante
situar o leitor leigo nesta área. O Fora do Eixo foi criado no
ano de 2005 e de lá pra cá tem ganhado bastante visibili-
dade, se tornando uma espécie de lugar comum quando
se fala de música independente. Como grupo organizado,
defende uma série de premissas que acredita ser essenciais
para o desenvolvimento deste mercado. Do outro lado te-
mos o Coquetel Molotov, também referência entre os indies,
que defende outro modelo de gestão, totalmente diferente
do Fora do Eixo. Este confronto, pelo menos no que se refere
às ideias, é apenas um exemplo da segmentação que existe
hoje entre os indies. Acontece que antigamente só existiam
dois caminhos: ou a banda estava numa gravadora ou fora
dela. Aí você pode estar pensando: “oras, e hoje também, ou
a banda está em uma gravadora ou é independente”. Correto,
mas existem diversas formas de ser independente, e estes
modelos estão hoje em conflito, cada um quer defender o
seu peixe, como diz o dito popular.
Um fato que demonstrou bem toda esta agonia que
existe no meio independente foi uma entrevista com Capilé
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no site O Inimigo. Foram centenas de comentários recebidos,
repercussão em toda a internet e até em jornais impressos,
como no caso do Diario de Pernambuco, que publicou no dia
2 de fevereiro uma matéria abordando o tema mais preva-
lente nos comentários desta entrevista, o fato das bandas
pagarem para tocar em alguns festivais. Durante os meses
de janeiro e fevereiro de 2010 não se falava em outra coisa
nos subterrâneos espaços de convivência de músicos inde-
pendentes a não ser nesta entrevista e nos comentários que
se sucederam. Por estes e outros motivos decidi ir ao famig-
erado debate que aconteceu na Livraria Cultura, no bairro do
Recife, no dia 23 de março de 2010. A mediação ficou a cargo
de Alex Antunes, jornalista, músico, produtor, entre outras
facetas.
Cheguei bem cedo ao auditório da Livraria Cultura, a
ponto de presenciar uma conversa informal entre os dois de-
batedores. Apesar do clima descontraído, senti sim, sintomas
daquele conflito que falei ali em cima, cada um querendo
defender o peixe do seu modelo de trabalho. E de fato du-
rante todo o evento eles se alfinetaram cordialmente. Mas
após uma intervenção que fiz no debate e citei este possível
conflito entre os dois, Tathiana prontamente negou qualquer
chance de existir isto, afirmando inclusive que já trabalhou
em parceria com Capilé. É como numa relação diplomática:
dois países se odeiam, mas precisam fazer negócios. O termo
odiar pode ser exagerado, mas serve como analogia.
Do lado dos músicos, uma pergunta de um garoto re-
sumiu esta
agonia atual
das bandas in-
dependentes. Ele disse que
tinha uma banda e que
diante de tantos
modelos difer- entes para
‘fazer acon- tecer’ não sabia onde
encaixá-la. As pessoas estão confusas. Hoje, com a fa-
cilidade de divulgação pela internet, os caminhos são muitos,
mas parece que isto ao invés de ajudar, atrapalha. Os músicos
ainda não se acostumaram com o período pós-majors e ain-
da estão perdidos quanto ao o que fazer neste cenário atual
repleto de possibilidades. É uma ironia natural o fato de que
sempre foi desejo dos músicos independentes um mercado
que não houvesse regras a seguir, um mercado plural, no qual
circulasse infinitas idéias e ideais, e quando isto acontece, fica
todo mundo perdido sem saber o que fazer.
É como se as bandas sentissem falta das gravadoras, pois
eram pelo menos um ideal a seguir. Hoje o trabalho é bem
maior, é preciso trilhar o próprio caminho, sem saber o que
vem pela frente, dando um passo de cada vez e aguardando
o resultado. Os modelos prontos se foram. É hora de experi-
mentar, criar novos caminhos e isto nunca é fácil de fazer. É aí
que as vozes agonizam pedindo a volta de um lugar comum.
Mas não, ele não voltará. E sim, isto é muito bom!
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