METACOGNIÇÃO EM PRÁTICAS COLABORATIVAS NUMA COMUNIDADE DE B-LEARNING: um estudo de caso

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Universidade de Aveiro 2014 Departamento de Educação Departamento de Comunicação e Arte Sânnya Fernanda Nunes Rodrigues METACOGNIÇÃO EM PRÁTICAS COLABORATIVAS NUMA COMUNIDADE DE B-LEARNING: um estudo de caso

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  • Universidade de Aveiro 2014

    Departamento de Educao Departamento de Comunicao e Arte

    Snnya Fernanda Nunes Rodrigues

    METACOGNIO EM PRTICAS COLABORATIVAS NUMA COMUNIDADE DE B-LEARNING: um estudo de caso

  • Universidade de Aveiro 2014

    Departamento de Educao Departamento de Comunicao e Arte

    Snnya Fernanda Nunes Rodrigues

    METACOGNIO EM PRTICAS COLABORATIVAS NUMA COMUNIDADE DE B- LEARNING: um estudo de caso

    Tese de Doutoramento apresentada Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessrios obteno do grau de Doutor em Multimdia em Educao, realizada sob a orientao cientfica do Doutor Antnio Augusto Freitas Gonalves Moreira, Professor Associado do Departamento de Educaoda Universidade de Aveiro e da Doutora Ana Jorge Balula Pereira Dias, Professora Adjunta da Escola Superior de Tecnologia e Gesto de gueda (ESTGA) da Universidade de Aveiro.

    Apoio Financeiro da FCT Ref. SFRH/BD/62470/2009.

  • Dedico este trabalho a minha famlia e a todos os meus amigos que de perto ou de to longe me apoiaram na feitura deste trabalho.

  • o jri

    presidente Professor Doutor Paulo Jorge dos Santos Gonalves Ferreira Professor do Departamento de Eletrnica, Telecomunicaes e Informtica da Universidade de Aveiro

    Professora Doutora Maria da Costa Potes Franco Barroso Santa-Clara Barbas Professora Coordenadora da Escola Superior de Educao do Instituto Politcnico de Santarm Professora Doutora Maria Cristina Coelho de Carvalho Azevedo Gomes Santos Silva Professora coordenadora da Escola Superiora de Educao do Instituto Politcnico de Viseu

    Professora Doutora Maria Joo da Silva Ferreira Gomes Professor Auxiliar do Instituto de Educao da Universidade do Minho Professora Doutora Maria Jos de Miranda Nazar Loureiro Investigadora do CIDTTFF da Universidade de Aveiro Professora destacada no Centro de Competncias TIC da Equipa de Recursos e Tecnologias Educativas da Direo Geral de Educao (ERTE/DGE)

    Professora Doutora Ana Jorge Balula Pereira Dias,

    Professora Adjunta da Escola Superior de Tecnologia e Gesto de gueda (ESTGA) da Universidade de Aveiro (Orientadora)

  • agradecimentos

    A Deus e a Espiritualidade Maior a quem me confio completamente.

    minha famlia brasileira, que continua a apoiar-me do outro lado do oceano e compreende todos estes anos de ausncia, inspirando-me a seguir em frente com os meus estudos.

    Aos amigos Slvia, Delminda Lopes e Antnio Lopes e Lindinha Rodrigues, integrantes de minha famlia portuguesa, pelo apoio incondicional, sem os quais no teria condies emocionais de levar este projeto a cabo.

    Ao meu orientador, Dr. Antnio Moreira que neste sete anos e meio de convivncia, somando o mestrado e o doutoramento, partilhou e ajudou a construir aprendizagens que extrapolam uma sala de aula presencial.

    A minha co-orientadora Dr. Ana Balula que aceitou orientar este doutoramento um ano depois de iniciarmos a coleta de dados, acreditou neste projeto e foi de um apoio incomensurvel na concluso de um trabalho desta magnitude.

    Aos docentes e doutorandos das edies de 2009 e de 2010 do PDMMEDU, que aceitaram participar desta investigao que no teria sido possvel de realizar sem os seus testemunhos.

    Aos colegas do Laboratrio de Contedos Digitais (LCD) pelos momentos de partilha ao longo destes quatro anos, em especial destaco o companheirismo de Margarida Lucas e Jaime Ribeiro, colegas do Mestrado em Multimdia em Educao, pela amizade consolidada no decorrer destes sete anos e solidificada no processo de escrita deste documento. A Ticiana Trz, pela amizade e carinho nos momentos de partilhas no LCD, na biblioteca e pelos momentos de sintonia emocional criados entre almoos, jantares e chazinhos no fim de tarde. A Vnia Carlos e Maria Joo Pinheiro, pela amizade e companheirismo vividos nos dias de trabalho no LCD. A Dr. Maria Joo Loureiro, coordenadora do LCD, pelas ideias que revitalizaram o LCD, aproximando bolseiros e docentes, componentes desta equipa.

    Ao CCTIC, atravs da organizao de momentos cientficos com a equipa do LCD e pelos momentos de convvio partilhados. Deixo um agradecimento especial a Dr Maria Jos Loureiro, pela amizade e acolhimento nestes momentos em que reunia a equipa do LCD e brasileiros integrados nesta calorosa famlia lcdiana, nos fazendo sentir acolhidos e integrados.

    Ao apoio do Dr. Francisl Neri Costa nos momentos de crises e dificuldades na anlise com o software WebQDA.

    Aos amigos Pedro Teixeira, Sofia Nascimento, Arminda Martins, Maria Jos Silva, Alexandre Silva e demais componentes da Famlia Silva, Paula Silva, a Luciana Mesquita, Vtor Dinis, Vtor Dias, Lisneti Castro, Decio Diniz, Ana Filipa Gomes, Regina Gomes, Ana Azevedo, Flvia Pessoa e Inez Silva pelo apoio e amizade constante nas diferentes fases de construo deste trabalho.

    Ao meu grupo de trabalho dos fins de semana no Porto (Evalumo e Jua), que so tambm integrantes de minha famlia portuguesa afetiva.

  • palavras -chave

    Metacognio; Pessoa; Tarefa; Estratgias de Aprendizagem; B-learning, Ensino Superior; Prticas Colaborativas; Comunidade de Aprendizagem Online.

    resumo

    Nesta tese apresenta-se um estudo sobre a metacognio em prticas colaborativas numa comunidade de b-learning no ensino superior. O referencial terico adotado desenvolveu-se com o intuito de reunir as discusses sobre a metacognio, o b-learning, a comunidade de aprendizagem colaborativa e as comunidades de prticas no ensino superior. Com base nesse referencial terico desenvolveu-se um estudo emprico sobre a metacognio analisada numa comunidade de b-learning tendo como estudo de caso o Programa Doutoral em Multimdia em Educao da Universidade de Aveiro (edies 2009 e 2010). O estudo, que envolveu 7 docentes e 17 alunos das referidas edies do programa doutoral, teve como uma das suas finalidades verificar a perspetiva do aluno sobre o processo de aprendizagem vivido, das posturas que assume, das estratgias a que recorre para interagir nas comunidades de aprendizagem no mbito do Programa Doutoral em Multimdia em Educao (PDMMEDU), que funciona na modalidade b-learning. Os dados foram obtidos atravs de inqurito por questionrio realizado com os alunos e de sesses de focus group com alunos e docentes. A partir da anlise dos resultados obtidos sob o referencial terico que lhes serviu de enquadramento, procurou dar-se resposta s questes orientadoras do estudo: i) Encontramos evidncias de pensamento ou processos metacognitivos nas comunidades de b-learning que se instalaram nas Unidades Curriculares (UC) do PDMMEDU? ii) Que percees da aprendizagem nas comunidades de b-learning tm os estudantes? iii) Que sentimentos afluem da interao com o grupo de trabalho e com toda a turma? Qual a perceo que os docentes tm sobre a temtica e que evidncias podero fornecer sobre a possibilidade de desenvolvimento de processos metacognitivos no mbito das respetivas UCs? iv) Que relao pode ser observada entre os elementos motivadores da aprendizagem dos alunos e a participao nas UC? Do resultado da anlise dos dados obtidos atravs do inqurito por questionrio realizado com os alunos e das sesses de focus group com alunos e docentes identificou-se o perfil metacognitivo dos alunos, uma avaliao da experincia no programa doutoral, as novas posturas assumidas e alteraes nos cenrios profissionais. Por fim, so feitas sugestes para investigao futura com a proposta de sesses de trabalho onde se desenvolvem competncias metacognitivas por parte de alunos envolvidos em cursos de ps-graduao em ambientes online.

  • keywords

    Metacognition; Person; Task; Learning Strategies; b-learning; Higher Education; Communities of Practice; Learning Online Communities.

    abstract

    This thesis presents a study of metacognition in collaborative practices in a community of b-learning in Higher Education. The theoretical approach adopted aims to bring together the discussions regarding metacognition, b-learning, collaborative learning communities and communities of practice. Based on the theoretical framework developed, an empirical study on metacognition was held, in which a b-learning community was studied, namely the case of the Doctoral Program in Multimedia in Education (PDMMEDU) offered by the University of Aveiro (2009 and 2010 editions). The study, which involved 17 students and 7 teachers of these editions of the doctoral program, had as one of its purposes to verify the students perspective on the learning process experienced, the attitudes taken, the strategies used to interact in the learning community in the PDMMEDU. Data were gathered through questionnaires carried out with students and focus group sessions with students and teachers. From the analysis of the results obtained and based on the theoretical framework, the research questions guiding the study were sought to o be answered: i) Is there evidence of thought or metacognitive processes in b-learning communities, especially in the subjects of PDMMEDU? ii) Which are the students perceptions as to learning in b-learning communities? iii) Which feelings arise from the interaction with the group and the whole class? What is the teachers perception on the theme and which evidences can they provide as to the possibility of developing metacognitive processes within their subjects? iv) What relationship can be observed between the motivating factors of student learning and participation in the subject? The results of the data analysis, it was possible to identify: i) the students' metacognitive profile, ii) how the participants evaluate their experience in PDMMEDU, iii) the new posture/attitude assumed by them, as well as iv) the changes in their professional settings. Finally, suggestions are put forward as to future research, i.e. the organization of workshops, where metacognitive skills can be developed by students of postgraduate courses in online environments.

  • I

    NDICE

    I. APRESENTAO DO ESTUDO..... 3

    1. MOTIVAO E RELEVNCIA DO ESTUDO.. 3

    2. QUESTES DE INVESTIGAO DO ESTUDO.. 5

    3. ORGANIZAO DA TESE. 6

    II. ENQUADRAMENTO TERICO... 9

    1. METACOGNIO: reflexividade sobre as atividades cognitivas.. 11

    1.1 O conceito de Metacognio..... 16

    1.1.1 Perspetiva Histrica... 17

    1.1.2 O termo metacognio: compreenso e representaes tericas.... 21

    1.1.2.1 A metacognio e a cognio: aproximaes e diferenas.... 21

    1.1.2.2 Metacognio enquanto processo de tomada de conscincia... 25

    1.2 Dimenses da Metacognio.. 27

    1.2.1 Modelo Global de Monitorizao Cognitiva (MGMC) de Flavell. 27

    1. 2.1.1 Conhecimento Metacognitivo........

    28

    1.2.1.1.1 A Pessoa (Conhecimento sobre pessoa/a(s) pessoa(s) .. 30

    1.2.1.1.2 A Tarefa (Conhecimento sobre tarefas) ... 31

    1.2.1.1.3 A estratgia (Conhecimento sobre estratgias) .. 32

    1.2.1.1.4 A interao entre as variveis 33

    1.2.1.2 Experincias metacognitivas..... 37

    1.2.1.3 Objetivos... 42

    1.2.1.4. As aes ou Estratgias metacognitivas. 43

    1.2.2 Monitorizao, controlo ou autorregulao cognitiva Competncias metacognitivas

    46

    1.3 A metacognio em contextos educativos formais..

    49

    1.3.1. Importncia da metacognio para a aprendizagem. 50

    1.3.2 A docncia na perspetiva da incluso da metacognio nas prticas

    educativas..

    51

    2. O B-LEARNING E AS COMUNIDADES DE APRENDIZAGEM ONLINE: conceitos,

    caractersticas e funcionalidades .

    55

  • II

    2.1 A Web Social . 55

    2.2 O Ensino Superior com as TIC 59

    2.3 O b-learning .. 60

    2.3.1 As dinmicas de uma comunidade de b-learning 66

    2.4 Comunidades de Aprendizagem Colaborativa (CAC) . 77

    2.4.1 Interao na CAC. 79

    2.4.2 A moderao e o e-moderador. 82

    2.4.3 Cenrios das Comunidades de Aprendizagem Online 86

    2.5 Aprendizagem em Comunidades de Prtica. 91

    2.5.1 Conceitos e estrutura... 91

    2.5.2 Modos de pertena em comunidades de prtica. 91

    2.6 Conexes e relaes entre Metacognio e a Modalidade B-learning. 95

    III. METODOLOGIA.. 99

    1. INTRODUO... 101

    2. PRESSUPOSTOS DO ESTUDO.. 101

    2.1 Modo de investigar: o percurso da investigao 101

    3. CARACTERIZAO DO CASO EM ESTUDO. 106

    3.1 Caracterizao dos participantes no estudo...

    107

    a) Os alunos.. 107

    b) Docentes 114

    4. RECOLHA E TRATAMENTOS DOS DADOS.. 115

    4.1. Fase 2 - Recolha e tratamento de dados 116

    4.1.1. Etapa 1 Focus Group. 116

    4.1.2 Etapa 2 Inqurito por questionrio. 122

    4.2 Descrio da Fase III - Tratamento, anlise e interpretao dos dados. 125

    4.2.1 O WebQDA.. 126

    4.2.2 Categorias e subcategorias do estudo.. 130

    4.2.3 Validao 131

    IV. ANLISE DOS DADOS 133

  • III

    1 PERFIL METACOGNITIVO DOS DOUTORANDOS 135

    1. 2 Anlise da Macrocategoria Pessoa... 135

    1. 2. 1 Declarativo...... 135

    1.2.1.1 Expressividade na comunicao..... 136

    1.2.1.2 Perodo de estudo.. 140

    1.2.1.3 Preferncia na interao TIC 141

    1.2.1.4 Autonomia... 143

    1.2.1.5 Avaliao conhecimento contedos das UC. 146

    1.2.1.6 Avaliao conhecimento da web 2.0. 151

    1.2.1.7 Autoapreciao participao nas atividades 153

    1.2.1.8 Influncia de outros elementos/atores nos textos produzidos .... 161

    1.2.1.9 Concees pedaggicas.. 162

    Perceo dos docentes pelos alunos 162

    Mediao docente. 163

    Perceo dos alunos e o perfil de aprendizagem dos alunos pelos docentes

    165

    Conscincia de aprendizagem.. 167

    Avaliao nas UC. 168

    Feedback.. 170

    1.2.2 Processual. 172

    1.2.2.1 Ritmo nas atividades. 173

    1.2.2.2 Antecipao das atividades.. 174

    1.2.2.3 Planificao das atividades.. 175

    1.2.2.4 Gesto do tempo.... 176

    1. 2.3 Contextual .. 177

    1.2.3.1 Formas de reagir s discusses.... 177

    1.3 Anlise da Macrocategoria Tarefa 183

    1.3.1 Estruturao das disciplinas pelos docentes atividades, orientao cognitiva e conceo pedaggica....

    184

    1.3.2 Compreenso das atividades.. 186

    1.3.2.1 Facilidades na compreenso das atividades e das finalidades... 188

    1.3.2.2 Dificuldades na compreenso das atividades e das finalidades. 192

    1.4 Anlise da Macrocategoria Estratgias de

    aprendizagem.

    193

  • IV

    1.4.1 Autorregulao da aprendizagem... 194

    1.4.2 Gesto da Aprendizagem 197

    1.4.3 Autoavaliao - Relao entre ensino e aprendizagem 199

    1.4.4 Reflexo sobre o processo... 201

    1.4.4.1 Liberdade e tempo para snteses reflexivas.... 201

    1.4.4.2 Componentes de correo das atividades. 203

    1.4.4.3 Reorganizao do conhecimento - reviso das atividades e correo de

    trajetos aps feedback dos pares..

    203

    2 META-AFETIVIDADE.. 205

    2.1 Afetividade Negativa 205

    2.1.1 Dinmicas aluno-grupo........ 207

    2.1.2 Dinmicas grupo-grupos...... 209

    2.1.3 Falta de/Pouco conhecimento sobre os temas das UC.... 213

    2.1.4 Dificuldades relativas ao programa. 214

    2.2 Afetividade Positiva.. 216

    2.2.1 Motivaes para aprendizagem e Expectativas em relao ao

    PDMMEDU

    216

    2.2.2 Resoluo de problemas...... 218

    2.2.3 Balano geral da afetividade positiva nas edies.. 221

    3 AVALIAO DO PDMMEDU. 222

    3.1 Aspetos positivos... 222

    3.1.1 Avaliao da gesto das atividades pelos docentes... 223

    3.1.2 Avaliao da explorao das TIC nas UCs 224

    3.1.3 Avaliao das aprendizagens geradas no PDMMEDU mudanas

    identificadas pelos doutorandos e pelos docentes sobre os doutorandos

    ao final do ano curricular correspondente a cada

  • V

    edio.. 224

    3.1.4 Avaliao Metacognitiva do Programa Doutoral 227

    3.2 Aspetos Negativos.. 227

    3.2.1 Lacunas.. 228

    3.2.2 Sugestes/ Propostas de mudanas de certos aspetos do

    PDMMEDU....

    230

    3.2.3 Atividades Ps-ano curricular. 230

    V. CONSIDERAES FINAIS 233

    1. Concluses sobre esta investigao.. 235

    2. Limitaes do estudo.. 241

    3. Proposta de Estudos futuros 242

    REFERNCIAS CONSULTADAS 243

    ANEXOS.. 259

  • VI

    LISTA DE ACRNIMOS

    CA Comunidades de Aprendizagem

    CAC Comunidades de Aprendizagem Colaborativa

    CV Comunidades Virtuais

    DE Departamento de Educao

    DECA Departamento de Comunicao e Arte

    DMME Desenvolvimento de Materiais Multimdia para a Educao

    EAD Educao a Distncia

    ES Ensino Superior

    FCT Fundao para a Cincia e Tecnologia

    IES Instituio de Ensino Superior

    LCD Laboratrio de Contedos Digitais

    MAC Multimdia e Arquiteturas Cognitivas

    MGMC Modelo Global de Monitorizao Cognitiva

    MIE Metodologias de Investigao em Educao

    MMA Multimdia e Acessibilidade

    MME Mestrado em Multimdia em Educao

    PDMMEDU - Programa Doutoral em Multimdia em Educao

    SIG Sistema de Informao Geogrfica

    SIME Seminrio de Investigao em Metodologias de Investigao

    TCED Tecnologias de Comunicao para a Educao

    TIC Tecnologias de Informao e Comunicao

    UA Universidade de Aveiro

    UC Unidades Curriculares

  • VII

    NDICE DE QUADROS

    Quadro I Diferenciao entre as componentes da Metacognio.. 30

    Quadro II Categorias da Meta afetividade... 40

    Quadro III Dimenses em que se realiza a organizao da experincia

    educacional online. 78

    Quadro IV Histrico de funcionamento do PDMMEDU at os dias atuais e

    perodo escolhido para o estudo. 106

    Quadro V Identificao dos alunos/edio e respetivas razes de no

    frequncia das UC do PDMMEDU.. 108

    Quadro VI Mapa da Formao Acadmica dos Alunos da edio de 2009

    participantes desta investigao. 112

    Quadro VII Mapa da Formao Acadmica dos Alunos da edio de 2010

    participantes desta investigao. 113

    Quadro VIII Identificao dos docentes e respetivas unidades curriculares

    lecionadas em 2009 e/ou 2010 .. 114

    Quadro IX Fases e etapas da investigao .. 115

    Quadro X Sesses de Focus Groups realizadas no decorrer da

    investigao. 118

    Quadro XI Sesses de focus group com os alunos participantes de

    2009.. 119

    Quadro XII Sesses de Focus Group com os docentes participantes da

    investigao. 120

    Quadro XIII Categorias, Subcategorias e Valores da escala Likert com cinco

    categorias.. 123

    Quadro XIV Categorias, Subcategorias e Valores da escala Likert com quatro

    categorias.. 123

  • VIII

    Quadro XV Categorias, Subcategorias e Valores da escala de avaliao de

    frequncia. 124

    Quadro XVI Aplicao dos questionrios com os alunos participantes da edio

    2009.. 125

    Quadro XVII Categorias da Metacognio. 130

    Quadro XVIII Categorias de Meta-afetividade... 131

  • IX

    NDICE DE FIGURAS

    Figura 1. Mapa Conceptual dos conceitos e teorias principais da metacognio com respetiva legenda

    20

    Figura 2. Processos da Metacognio relativos ao sujeito construtor de saberes.

    26

    Figura 3. Variveis do Modelo Global de Monitorizao Cognitiva de Flavell..

    27

    Figura 4 Componentes do Metaconhecimento ou Conhecimento Metacognitivo (Flavell & Welman, 1977).

    28

    Figura 5 Movimentos entre os processos cognitivos e as operaes metacognitivas.

    30

    Figura 6 - Esquema ideolgico sobre o conhecimento metacognitivo, de Lawson (1984), adaptado de Ribeiro (2003)..

    34

    Figura 7 Esquema das aes na execuo das tarefas que refletem competncias metacognitivas ...

    36

    Figura 8 Esquema do processo de atuao das estratgias metacognitivas. 43

    Figura 9 Esquema das fases que se do nas operaes cognitivas e metacognitivas.

    44

    Figura 10 Mapa das relaes e diferenciaes entre as estratgias cognitivas e estratgias metacognitivas..

    44

    Figura 11 Dimenses da Metacognio.. 46

    Figura 12 Metacognio e as dimenses evidenciadas no MGMC de Flavell..

    48

    Figura 13 As 4 componentes do processo de autorregulao da aprendizagem

    48

    Figura 14 - O Tringulo Didtico de Chevallard (1991) 58

    Figura 15 Os momentos de ensino-aprendizagem do modelo de b-learning, destacados por Marques (2005 citado por Macedo, 2009)..

    71

    Figura 16 Etapas ou nveis do modelo de e-moderao de G. Salmon 84

    Figura 17 Organograma de conceitos relacionados com o processo da Mediao.

    86

    Figura 18 Processo demonstrativo de um bom funcionamento pedaggico de um frum.

    88

    Figura 19 Processo resumido das etapas a ter presentes no processo 88

  • X

    pedaggico dos fruns

    Figura 20 Organograma dos modos de presena de uma Comunidade de Prtica..

    92

    Figura 21 Infraestrutura do elemento Engajamento.. 92

    Figura 22 Mapa Concetual dos Modos de pertena numa comunidade de prtica.

    94

    Figura 23 Esquema conceitual de caractersticas e elementos inerentes ao processo e aprendizagens metacognitivas.

    97

    Figura 24 Fontes Internas desta investigao representadas no WebQDA... 126

    Figura 25 Ns em rvore com as categorias e referncias desta investigao no WebQDA

    127

    Figura 26 Matrizes criadas no webQDA..... 128

  • XI

    NDICE DE GRFICOS

    Grfico 1 Comparao dos alunos da populao das edies 2009 e 2010 do PDMMEDU e amostra da investigao

    109

    Grfico 2 Comparao por gnero dos alunos da amostra da investigao das edies 2009 e 2010 do PDMMEDU..

    109

    Grfico 3 Comparao da faixa etria entre os alunos das edies 2009 e 2010 participantes da investigao.

    110

    Grfico 4 Distribuio da formao acadmica dos alunos participantes das edies 2009 e 2010.

    110

    Grfico 5 - Distribuio dos alunos participantes da edio 2010 pela ps-graduao.

    111

    Grfico 6 - Distribuio dos alunos participantes das edies 2009 e 2010 pela ocupao profissional..

    112

    Grfico 7 Formas de comunicao mais confortveis para os alunos Oralidade/ Escrita (Inqurito Q2.a edies 2009 e 2010)..

    136

    Grfico 8 Ocorrncias codificadas na categoria Expressividade na comunicao, nas subcategorias de 1. nvel Comunicao Oral e Comunicao escrita (Focus Group edies 2009 e 2010).

    137

    Grfico 9 Ocorrncias codificadas nas subcategorias de 2. nvel em que se divide a subcategoria Comunicao escrita (Focus Group edies 2009 e 2010)...

    137

    Grfico 10 Ocorrncias codificadas nas subcategorias de 2. nvel em que se divide a subcategoria Comunicao escrita, por gnero dos participantes (Focus Group edies 2009 e 2010) .

    138

    Grfico 11 Ocorrncias codificadas nas subcategorias de 2. nvel em que se divide a subcategoria Comunicao escrita, por faixa etria dos participantes (Focus Group edies 2009 e 2010)..

    138

    Grfico 12 Ocorrncias codificadas nas subcategorias de 2. nvel em que se divide a subcategoria Comunicao escrita, por rea acadmica dos participantes (Focus Group edies 2009 e 2010) ....

    139

    Grfico 13 Resultados relativos ao perodo de estudo mais produtivo para os alunos (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010)...

    140

    Grfico 14 Opes dos participantes no uso das tecnologias (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010)

    141

  • XII

    Grfico 15 Ocorrncias codificadas na categoria Tipo de interao com as

    TIC, subcategoria Descoberta e partilha (Focus Group - edies 2009 e 2010). 142

    Grfico 16 Respostas dos alunos quanto sua dependncia em relao s

    orientaes dadas pelos docentes (Inqurito por Questionrio edies 2009 e

    2010) .... 143

    Grfico 17 Respostas dos alunos participantes sobre a sua autonomia

    (Inqurito por Questionrio - edies 2009 e 2010). 144

    Grfico 18 Avaliao do grau de conhecimento dos contedos abordados nas

    UCs atravs da necessidade de fazer pesquisas admitida pelos alunos

    participantes (Inqurito por Questionrio - edies 2009 e 2010). 147

    Grfico 19 Ocorrncias codificadas na categoria Grau de conhecimento dos

    contedos abordados nas UC, subcategoria Recorrer a pesquisas (Focus

    Group - edies 2009 e 2010). .... 148

    Grfico 20 Respostas dos alunos participantes quanto ao conhecimento que

    possuam sobre os contedos/temas trabalhados (Inqurito do Questionrio

    edies 2009 e 2010) 149

    Grfico 21 Ocorrncias codificadas na categoria Grau de conhecimento dos

    contedos abordados nas UC, subcategoria Conhecimento sobre os contedos

    das UCs no final do PDMMEDU (Focus Group - edies 2009 e 2010).. 150

    Grfico 22 Percentagem de respostas dos alunos participantes em relao ao

    seu conhecimento sobre as tecnologias 2.0 (Inqurito por Questionrio

    edies 2009 e 2010)..... 151

    Grfico 23 Ocorrncias codificadas na subcategoria Conhecimento sobre os

    contedos das UCs no final do PDMMEDU, nas subcategorias de 2. nvel

    Conhecimento das TICs e Uso das TICs (Focus Group edies 2009 e 2010).. 152

    Grfico 24 Ocorrncias codificadas na subcategoria Uso das TICs, por gnero

    dos participantes (Focus Group edies 2009 e 2010). 153

    Grfico 25 Ocorrncias codificadas na subcategoria Conhecimento sobre os

    contedos das UC no final do PDMMEDU, nas subcategorias de 2. nvel 153

  • XIII

    Conhecimento das TICs e Uso da TICs, por faixa etria dos participantes

    (Focus group edies 2009 e 2010)

    Grfico 26 Grau de participao dos alunos inquiridos nas atividades

    desenvolvidas nas UCs (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010).. 154

    Grfico 27 Ocorrncias codificadas na categoria Participao nas atividades

    definidas nas UCs (Focus Group edies 2009 e 2010). .. 154

    Grfico 28 Ocorrncias codificadas na categoria Autoapreciao da

    participao, por subcategoria (Focus Group edies 2009 e 2010)... 155

    Grfico 29 Frequncia da tomada de iniciativa dos participantes nas atividades

    (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010)... 156

    Grfico 30 Frequncia na colaborao nas atividades por parte dos alunos

    inquiridos (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) 158

    Grfico 31 Ocorrncias codificadas na subcategoria Frequncia na

    colaborao nas atividades, por subcategoria de 2. nvel (Focus Group

    edies 2009 e 2010) ............... 159

    Grfico 32 - Influncia de outros elementos/atores nos textos publicados pelos

    alunos participantes (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) .. 161

    Grfico 33 - Ocorrncias codificadas na categoria Concees pedaggicas, na

    subcategoria Perceo da mediao do docente (Focus Group edies 2009 e

    2010) .. 163

    Grfico 34 Ocorrncia de debate sobre avaliao negativa da mediao

    docente (Focus Group edies 2009 e 2010).. 164

    Grfico 35 - Ocorrncia de discusso sobre os critrios de avaliao por edio

    (Focus Group edies 2009 e 2010).. 168

    Grfico 36 Ocorrncia por faixa etria no focus group sobre os critrios de

    avaliao . 169

    Grfico 37 Ocorrncia de discusso sobre os tipos de feedback vividos pelos 171

  • XIV

    alunos (Focus Group edies 2009 e 2010) .

    Grfico 38 Representao das formas de agir quanto ao ritmo s atividades

    (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) 173

    Grfico 39 Ocorrncia discusso sobre o ritmo das atividades (Focus Group -

    edies 2009 e 2010) .. 174

    Grfico 40 Reao dos alunos sobre a antecipao s atividades (Inqurito por

    Questionrio edies 2009 e 2010) 174

    Grfico 41 Reao dos alunos sobre a planificao das atividades (Inqurito por

    Questionrio edies 2009 e 2010) . 175

    Grfico 42 Reaes aos debates na comunidade pelos alunos (Inqurito por

    Questionrio - edies 2009 e 2010) .. 178

    Grfico 43 Cuidados dos alunos ao responder s questes dos debates online

    (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) . 179

    Grfico 44 Decises tomadas pelos alunos na reao s atividades mediante o

    tempo (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010). 180

    Grfico 45 Avaliao da gesto das decises relativas s atividades (Inqurito por

    Questionrio edies 2009 e 2010) 181

    Grfico 46 Ocorrncias de discusso sobre a Tarefa (Focus Group - edies 2009 e

    2010).. 184

    Grfico 47 Ocorrncias de discusso sobre a compreenso das atividades (Focus

    Group edies 2009 e 2010) ... 187

    Grfico 48 Representao da facilidade de compreenso evocada por cada UC do

    PDMMEDU (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) .. 188

    Grfico 49 Perceo da finalidade das atividades nas UCs do PDMMEDU

    (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) . 189

    Grfico 50 Ocorrncias de discusso sobre a compreenso das finalidades das

    atividades por gnero dos participantes (Focus Group edies 2009 e 2010).. 190

    Grfico 51 Ocorrncias de discusso sobre a compreenso das finalidades das

    atividades por faixa etria dos participantes (Focus Group edies 2009 e 191

  • XV

    2010) .

    Grfico 52 Estratgias cognitivas adotadas pelos alunos (Inqurito por

    Questionrio - edies 2009 e 2010) . 195

    Grfico 53 Ocorrncias de discusso sobre as estratgias cognitivas adotadas

    pelos alunos (Focus Group edies 2009 e 2010) . 196

    Grfico 54 Formas adotadas pelos alunos para gerirem a aprendizagem nas

    UCs (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) .. 197

    Grfico 55 Avaliao da compreenso e gesto das atividades nas UCs do

    PDMMEDU/ (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) 199

    Grfico 56 - Avaliao das aes adotadas como contributo para bons resultados

    na aprendizagem (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010)

    . 200

    Grfico 57 Frequncia da existncia de liberdade e tempo para reflexes sobre

    o processo (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010).... 202

    Grfico 58 Frequncia das oportunidades de reviso das atividades e/ou ideias

    (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) ................ 204

    Grfico 59 Representao da presena ou ausncia de desmotivao no

    PDMMEDU pelas alunas da edio de 2010... 206

    Grfico 60 Ocorrncia de questes internas como razes para desmotivao

    no PDMMEDU nas edies estudadas. 206

    Grfico 61 Ocorrncia de problemas de relacionamento no grupo como razes

    para desmotivao (Inqurito por Questionrio - edies 2009 e 2010)

    .... 207

    Grfico 62 Ocorrncia de desmotivao ligada a reaes em relao ao

    desempenho de colega (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010)

    . 208

    Grfico 63 Dificuldades na participao mediante a presena de problemas

    com colegas (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) . 209

  • XVI

    Grfico 64 Ocorrncia de tratamento negativo diferenciado entre os pares

    (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) 210

    Grfico 65 Ocorrncia de dificuldade na gesto de ideias no grupo (Inqurito

    por Questionrio edies 2009 e 2010) 210

    Grfico 66 Dificuldades de relacionamento como causa de desmotivao

    (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) .. 211

    Grfico 67 Ocorrncia de discusso sobre problemas intra- e intergrupal (Focus

    Group edies 2009 e 2010) . 212

    Grfico 68 Ocorrncia de ausncia de conceitos para realizao de atividade

    (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) 213

    Grfico 69 Ocorrncias de discusso sobre as dificuldades relativas ao

    programa (Focus Group edies 2009 e 2010) 214

    Grfico 70 Formas de reverter a falta de conceitos para a realizao das

    atividades (Inqurito por Questionrio edies 2009 e 2010) .. 218

    Grfico 71 Utilizao do espao para a soluo das dificuldades (Inqurito por

    Questionrio edies 2009 e 2010) .... 220

    Grfico 72 Ocorrncia de discusso sobre avaliao da explorao das TIC no

    PDMMEDU (Focus Group edies 2009 e 2010) . 224

    Grfico 73 Ocorrncias de discusso sobre o desenvolvimento de novas

    aprendizagens (Focus Group edies 2009 e 2010)... 225

    Grfico 74 Percentagem de respostas sobre a questo do PDMMEDU permitir

    uma boa regulao da aprendizagem (Inqurito por Questionrio, edies 2009

    e 2010)..... 227

  • Universidade de Aveiro Captulo I Apresentao do Estudo

    1

    I. APRESENTAO DO ESTUDO

  • Universidade de Aveiro Captulo I Apresentao do Estudo

    3

    1. APRESENTAO DO ESTUDO Este captulo se prope a contextualizar a investigao realizada, assim como seu objeto de

    estudo centrado na metacognio em prticas colaborativas numa comunidade de b-learning.

    O captulo est organizado nas seguintes sees: motivao e relevncia do estudo, questes

    de investigao e apresentao e organizao do documento.

    2. MOTIVAO E RELEVNCIA DO ESTUDO Ao iniciar os estudos em Pedagogia em 1999, apresentaram-me a rea da educao imbricada

    num complexo referencial terico, centrada em estudos da antiga histria da educao, das

    suas dimenses, dos seus reflexos na sociedade, da sua associao com a prpria histria da

    humanidade. A Pedagogia estuda, retrata, reflete, representa e contribui para a mudana na

    postura dos homens, na sua forma de pensar e as teorias que a sustentam.

    Ao longo da licenciatura, fiz quotidianamente uma reflexo sobre a praxis dos docentes

    daquele grau de estudo, sustentados nesta ou naquela teoria pedaggica da qual emergia a

    sua prtica docente. Alguns aceitavam as teorias cognitivas e scio-interacionistas, mas no

    assimilavam os princpios que suportavam estas teorias e recaam nos velhos hbitos,

    mantendo um modo de trabalho pedaggico meramente transmissivo. Refletiam-se nas suas

    atividades orientaes de trabalho um tanto confusas. Ns, os alunos, sem alcanarmos

    plenamente a abordagem pedaggica na qual as docentes se fundamentavam, respondamos

    com aes em que se misturavam aspetos da memorizao e alguma autonomia cognitiva.

    Neste contexto, no nos ensinaram a aprender sozinhas, autonomamente, ou em grupo. Os

    trabalhos de grupos aconteciam resultando numa colcha de retalhos com o contributo

    individual de cada aluno. E a autonomia? Na maioria das vezes, ficava-se pelas orientaes dos

    professores sobre as tarefas, sem grande diversidade e variabilidade quanto aos produtos que

    iam emergindo. Contudo, nos debates em sala de aula refletia-se o que Paulo Freire levou uma

    vida a defender: uma educao para a vida, que encontra a vida e que reflete a vida, uma

    educao mais ajustada aos novos tempos, que percebe que h novas formas de aprender e

    que o mundo e o homem mudaram em muitos aspetos.

    Rejeitamos certas prticas docentes, adotando as novas teorias da educao mais condizentes

    com os novos contextos de ensino e de aprendizagem, coerentes com o novo estudante que

    est nos atuais espaos educativos, embora com alguma fragilidade no prprio momento de

    atuar nestes novos e velhos espaos.

  • Universidade de Aveiro Captulo I Apresentao do Estudo

    4

    Como forma de enfrentar estas mesmas fragilidades, continuei os estudos a nvel de

    especializao, onde situei o novo aluno dentro da perspetiva das mudanas da vida social,

    que implicavam pais separados, crianas em famlias desestruturadas, crianas com

    dificuldades de aprendizagem. Do outro lado, confrontei a escola, os pais e o papel do

    supervisor para enfrentar os novos dilemas trazidos por este novo aluno para os espaos

    educativos. Diante destas questes, deixei desafios que cabem ao supervisor educacional

    assumir para fazer da escola ou de outros espaos onde atua, um espao democrtico, ativo e

    reflexivo, onde as pessoas que compem uma comunidade escolar diagnosticam,

    problematizam e tentam encontrar solues para os novos e velhos problemas com os alunos.

    Entretanto, sabia que o princpio de tudo estava na formao, seja do professor, do pedagogo

    ou do supervisor e na continuidade desta formao em diferentes contextos: formao

    continuada, projetos, investigao, formao ps-graduada. No mbito da investigao do

    mestrado1, tentei revelar as expetativas que os alunos do programa da edio investigada

    levaram para sua formao ps-graduada. Identificamos o que mudava na perceo que os

    alunos tinham do ensino e da sua aprendizagem no contexto em que ocorreu o mestrado: em

    modalidade b-learning e com a experimentao de ferramentas da Web social. E para colmatar

    o trabalho, sendo uma das minhas preocupaes a relao entre universidade-escola-

    sociedade, procurei verificar o que os alunos do mestrado conseguiram fazer a nvel de

    experincias com as ferramentas da Web social nas escolas em que trabalhavam naquele

    perodo, a abertura da escola para estas experincias, a existncia de um parque informtico

    que tambm as permitissem, a adeso de colegas em trabalhos colaborativos e

    interdisciplinares que envolvessem este tema. Os arguentes da dissertao de mestrado

    deixaram como desafio a continuidade de estudos com esta natureza avaliativa. E assim, foi

    nascendo a ideia que deu origem ao projeto da investigao agora finalizado.

    Tambm contriburam para o surgimento do interesse em torno do estudo da metacognio

    dois trabalhos ligados a questo do questionamento: uma dissertao de mestrado (Barros,

    2008) e uma tese de doutoramento (Nri de Sousa, 2006). Nestes estudos, nasceu o interesse

    em investigar os alunos como foco do ensino, acentuando a preocupao com a aprendizagem

    e cuja (meta) cognio precisava ser focalizada, entendida e estimulada. Na verdade, queria

    que os alunos olhassem para a sua experincia de aprendizagem e a analisassem

    objetivamente, problematizando-a, confrontando com seus saberes, com seu conhecimento

    tcito. Via os alunos como seres autnomos, capazes de debater as estratgias de

    1 Rodrigues, S. F. N. (2009). Novos significados desenvolvidos na formao de professores: contributo da ps-graduao em multimdia da Universidade de Aveiro para outras percepes da prtica profissional. Dissertao do Mestrado em Multimdia em Educao. Disponvel em: http://hdl.handle.net/10773/3741

  • Universidade de Aveiro Captulo I Apresentao do Estudo

    5

    aprendizagem propostas pelos docentes com seus pares e decidindo as formas de realizarem.

    Verificar isto mais uma vez numa comunidade educativa, era a oportunidade de verificar:

    1. Como os alunos atuavam numa comunidade de aprendizagem para solucionar problemas

    surgidos quanto a realizao de certas atividades;

    2. Como discutiam as formas de realizarem as atividades nos espaos de comunicao

    privilegiados pelas unidades curriculares (UC) onde estas aconteceram;

    3. As existncias de dificuldades para realizar estas atividades e como solucionavam-na;

    4. Como se apercebiam do que estavam aprendendo (na condio de aprendente do seu

    aprender gerando conscincia sobre a sua aprendizagem) e como poderiam transpor os

    novos conhecimentos para as suas realidades profissionais;

    5. A existncia de problemas relacionais e a implicao na realizao dos trabalhos do

    grupo;

    6. As expectativas de aprendizagem trazidas e as atendidas pelo Programa Doutoral.

    2. QUESTES DE INVESTIGAO DO ESTUDO

    A partir das ponderaes acima, elaborou-se um conjunto de questes sobre as quais esta

    investigao se desenvolveu:

    Encontramos evidncias de pensamento ou processos metacognitivos nas

    comunidades de b-learning que se instalaram nas Unidades Curriculares (UC) do

    PDMMEDU?

    Que percees da aprendizagem nas comunidades de b-learning tm os estudantes?

    Que sentimentos afluem da interao com o grupo de trabalho e com toda a turma?

    Qual a perceo que os docentes tm sobre a temtica e que evidncias podero

    fornecer sobre a possibilidade de desenvolvimento de processos metacognitivos no

    mbito das respetivas UCs?

    Que relao pode ser observada entre os elementos motivadores da aprendizagem

    dos alunos e a participao nas UCs?

    Estas questes levaram eleio da principal finalidade desta investigao que verificar a

    perspetiva do aluno sobre o processo de aprendizagem vivido, das posturas que assume, das

    estratgias a que recorre para interagir nas comunidades de aprendizagem no mbito do

    Programa Doutoral em Multimdia em Educao (PDMMEDU), que funciona na modalidade b-

    learning. Pensamos que um estudo incindindo no primeiro ano curricular do programa poderia

  • Universidade de Aveiro Captulo I Apresentao do Estudo

    6

    oferecer os dados de entrada dos alunos: identidade, motivao e perspetivas em relao ao

    curso que iniciaram. Diante disso, elegemos os seguintes objetivos:

    a) Em relao aos dados recolhidos junto dos alunos:

    Identificar a perceo que os alunos (das edies de 2009 e 2010) tm do processo de

    aprendizagem desenvolvido durante o 1. ano curricular do Programa;

    Confrontar as suas espectativas em relao aprendizagem que esperavam

    desenvolver na experincia formativa do doutoramento, verificando o que se

    concretizou ao final do 1 ano curricular;

    Identificar sentimentos que surgem da interao no grupo de trabalho e com os

    demais grupos;

    Identificar as formas de aprender [estratgias (Meta) cognitivas] dos alunos do

    Programa doutoral.

    b) Em relao aos dados recolhidos junto dos professores

    Identificar a estruturao e abordagem pedaggica das respetivas UCs;

    Identificar o efeito do feedback na correo das atividades e formas de atuao na

    resoluo de conflitos no grupo, quando e se tivessem surgido;

    Identificar a perceo dos alunos quanto a sua aprendizagem e atuao colaborativa

    online na UC que lecionam.

    3. ORGANIZAO DA TESE

    Esta tese encontra-se organizada em cinco captulos. Depois da presente introduo (Captulo

    I), passou-se ao Captulo II Enquadramento Terico, no qual clarificamos teoricamente o

    conceito de Metacognio, a evoluo histria do fundamento da Metacognio at

    chegarmos ao entendimento do Modelo Global de Monitorizao Cognitiva, de Flavell, onde se

    clarifica as categorias principais da Metacognio, Pessoa, Tarefa e Estratgias de

    Aprendizagem. Dando um leve relevo a dimenso conativa da aprendizagem, no referencial

    terico, enfoca-se tambm as emoes e o seu impacto na aprendizagem. Numa perspetiva

    das experincias metacognitiva, que enfoca o foro das emoes, identificou-se categorias de

    meta-afetividade que permitem uma identificao de afetividades negativas e positivas. Ainda

    neste captulo, enfoca-se o ensino a distncia no Ensino Superior, o b-learning, as

    comunidades de aprendizagem colaborativa e as comunidades de prticas, evidenciando

    aspetos centrais de uma comunidade de aprendizagem colaborativa, o aluno, o docente, a

    maneira como o professor concebe as atividades de aprendizagem, a moderao no espao

    por todos os membros, a participao do aluno, do docente, a dinamizao das atividades e

  • Universidade de Aveiro Captulo I Apresentao do Estudo

    7

    comunicao na comunidade por todos os membros, o feedback docente, os ambientes onde

    se formam as comunidades de aprendizagem online, tais como as redes sociais.

    No Captulo III Metodologia, justificam-se as opes metodolgicas adotadas para responder

    s questes de investigao, onde recorremos a uma metodologia de cariz misto para o estudo

    exploratrio, onde pretendeu-se desenvolver e captar reflexes e ideias a cerca da perceo

    que os alunos das edies 2009 e 2010 do PDMMEDU tinham da sua aprendizagem, os fatores

    que facilitaram ou dificultaram as relaes vividas nesta experincia formativa. Tambm

    justificamos a opo pelo estudo de caso, onde valorizamos a natureza descritiva e

    interpretativa em relao aos dados. Apresentamos as tcnicas de recolha de dados, onde

    emergem o inqurito por questionrio e recorremos a sesses de focus group, para dar voz aos

    participantes desta investigao, alunos e docentes, onde esperava-se captar a diversidade de

    percees e confrontos. A seguir apresentamos as tcnicas de anlise, onde sobressaem a

    anlise estatstica (dados do questionrio) e a anlise de contedo (dados do focus group).

    Encerramos este captulo com uma breve apresentao do objeto de estudo e uma breve

    caracterizao estatstica dos participantes.

    No Captulo IV Anlise dos Dados, apresentou-se os dados obtidos a partir do Inqurito por

    Questionrio e do focus group, previamente tratados, onde passou a descrio e interpretao

    dos dados organizados a partir dos seguintes eixos de anlise: as macrocategorias da

    Metacognio: Pessoa, tarefa e Estratgias de Aprendizagem; As macrocategorias da meta-

    afetividade: afetividade positiva e afetividade negativa; e avaliao do programa aspetos

    positivos e negativos, lacunas e sugestes de melhoramento.

    No captulo V Concluses, retomou-se as questes de investigao e a partir destas

    elabormos as snteses conclusivas relacionadas a esta investigao. A seguir, passamos s

    limitaes da investigao. Finalizmos este captulo com propostas de trabalhos futuros.

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    9

    II- ENQUADRAMENTO TERICO

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    11

    1. METACOGNIO: reflexividade sobre as atividades cognitivas

    O que representa a metacognio? A possibilidade para aquele

    que aprende de se distanciar do que faz, das situaes nas quais

    est implicado a fim de compreender os meios, as entradas e as

    sadas, de ter assim conscincia da sua conscincia, de se

    mostrar capaz de pensar o pensamento (Develay, 1999, p.08).

    A educao debrua-se, entre outros temas, sobre as mudanas de diversas ordens na

    sociedade e as repercusses nos comportamentos dos sujeitos. Numa forma de atualizao, a

    educao tem os seus objetivos e metas redefinidos para chegar at este sujeito e oferecer-lhe

    formao ao nvel das suas necessidades. As teorias da aprendizagem que primeiro avanaram

    neste propsito foram as baseadas na aprendizagem ativa2, com reforos tericos baseados

    nas teorias cognitivas em que se reconhece the active, reflective, and social nature of

    Learning (Brown & Campione, 1996, p.21).

    Com a revoluo cognitiva, promovida pelos estudos sobre a aprendizagem ativa desde o incio

    do sculo XX, os sujeitos aprendentes so vistos como construtores ativos de conhecimento,

    capazes de identificar conhecimentos e sentimentos sobre o seu processo de aprendizagem e

    com diferentes predisposies para aprender, sendo que a compreenso dos contedos

    assume grande nfase (Brown & Campione, 1996). Comeava-se, ento, a combater a nfase

    dada memorizao e a derrubar o conceito de dons inatos aos sujeitos. Passava-se a

    perceber que o sujeito aprendente possui uma mente capaz de aprender, especialmente

    influenciado pelas interaes em experincias educativas em contextos formais e informais ao

    longo da sua vida.

    Autores como Freinet, Claparde, Dewey, Decroly, Makarenko (pedagogos da educao nova,

    tericos da educao que na passagem dos sculos XIX e XX), foram defensores de uma

    pedagogia da descoberta em que eram valorizadas as atividades de descoberta, a liberdade

    criadora, a sede de justia social e o trabalho em grupo. As suas teorias e experincias

    centram-se nas capacidades cognitivas e interessaram-se por problemticas, como as da

    motivao, individualizao, socializao, cooperao, abertura de fronteiras disciplinares

    afastando-se completamente da lgica da memorizao. Na perceo destes tericos, o aluno

    chamado para o centro do processo de aprendizagem (Develay, 1999).

    2 Entende-se aprendizagem ativa como perspetiva adotada por uma pedagogia e didtica que se fundamentam no desenvolvimento cognitivo, em que o sujeito da aprendizagem atua ativamente no processo de aprender, uma vez que a didtica estimula a sua capacidade reflexiva, sua capacidade de saber pensar. Est centrada no aluno e no meramente informativa e, para tal, prope-se a oferecer ao aprendente situaes de aprendizagem onde ele problematiza temas, evoca aprendizagens anteriores e faz ligaes com situaes atuais, demonstrando um ciclo de reflexo em que assenta a sua aprendizagem (cf. Berbel, 1998).

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    12

    A cincia cognitiva evoluiu e desenvolveu os estudos centrados nos fatores motivacionais para

    a aprendizagem, assim como os estudos que se centram nos processos metacognitivos, que

    englobam um pouco dos estudos anteriores (Ribeiro, 2003). Esta rea tambm recebeu

    inmeros contributos da rea das neurocincias cognitivas. As mudanas de perspetivas

    cognitivas e abordagens pedaggicas, atualmente, fazem parte dos debates entre polticos,

    investigadores e educadores sobre as necessidades educativas atuais e os meios de ao

    educacional para atend-las. As medidas adotadas so acompanhadas de discusses sobre as

    prticas educativas dos docentes e processos de ensino e de aprendizagem adequados de

    forma a mobilizarem um desenvolvimento qualitativo do aluno e que lhe d a oportunidade de

    uma interveno social e democrtica consciente. Para isso, recusam-se prticas repetitivas e

    centradas na memorizao para combater as dificuldades cognitivas e sociais dos alunos e a

    viso dos alunos como um grupo homogneo sem caractersticas diferenciadas.

    Observa-se um abandono gradual do modelo tradicional de educao pautado no vis de

    transmisso/receo do conhecimento, advindo de uma maior conscincia de que atravs da

    mera repetio a escola atende frugalmente s exigncias da atualidade. Do mesmo modo, h

    uma intensa presso sobre as mudanas necessrias nos espaos educativos para que

    impulsionem a formao de pessoas com capacidades intelectuais que colaborem para o

    desenvolvimento e sustentao de sociedades mais democrticas. Para Berbel (1998), os

    espaos educativos devem potenciar saberes que no se prendam a realidades temporrias,

    que se desatualizam, mas desenvolver a capacidade de pensar relativo a qualquer contedo e

    em contextos variveis, uma vez que novos saberes surgem contnua e ininterruptamente.

    Desta forma, as pessoas estariam preparadas para intervirem num mundo em mudana, cujos

    paradigmas culturais, sociais, polticos e educacionais esto constantemente em crise, em

    confrontos ou em reformulaes.

    Na viso de Salema (2005, p.12) as competncias que deveriam ser desenvolvidas pelo

    Cidado3 do sculo XXI, para uma melhor atuao neste contexto, seriam: (re) conceptualizar

    situaes, resolver problemas, procurar solues inovadoras e adequadas ao contexto,

    capacidade de anlise, organizao, planeamento, sntese avaliao e controlo de processos e

    produtos. Souza (s/d) considera importante que haja linguagens e processos que ajudem os

    aprendentes a tornarem-se autnomos, desenvolvendo as competncias anteriormente

    defendidas e necessrias na interao com um mundo mais dinmico e paradoxal. Salema

    3 Reala-se o termo Cidado com a inicial maiscula pelo realce que dado nos documentos oficiais (como

    UNESCO) ao papel do cidado do sculo XXI papel este que cada vez mais pleno de poderes relativos a uma maior autonomia, mais criatividade, mais conscincia de direitos e deveres e do relacionar-se com o outro em sociedade.

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    13

    (2005), assim como Berbel (1998), concorda que a formao dos sujeitos do novo contexto no

    pode deter-se em programaes para serem simplesmente absorvidas, devendo propiciar

    condies de assimilar, racionalizar as mudanas e a apropriao de novos conhecimentos,

    fazendo uso de uma grande mobilidade intelectual para intervir consciente e criticamente no

    prprio contexto (Salema, 2005, p.12).

    Percebem-se as dificuldades dos espaos educativos para atenderem tais exigncias. Apesar

    dos inmeros estudos sobre a transversalidade e integrao curricular (estudos multiculturais,

    estudos sobre inovaes didticas e tecnolgicas), muitos espaos educativos no

    conseguem nem parecem possuir algum grau de autonomia para atualizarem os seus

    conhecimentos diante das necessidades prementes na sociedade que emerge nos tempos

    atuais. Notamos que diante destas condies, estes espaos falham na misso de mobilizar o

    desenvolvimento do pensar e, assim, promover atividades cognitivas reflexivas na

    aprendizagem.

    Entretanto, acreditamos que os espaos universitrios so os loci com alguma autonomia para

    proceder s alteraes necessrias em termos de formao inicial e ps-graduada de

    professores. Esta formao deve preparar o professor para um agir consciente nos contextos

    sociais, permeados de novos desafios e exigncias com implicao para sua prtica

    profissional. Na formao, o professor deveria estudar intervindo nestas mudanas. Por isso,

    estes loci, atravs dos seus cursos, podem-se antecipar nas discusses, na preparao de

    profissionais para as grandes reviravoltas que assolam a nova era, na investigao de prticas

    consonantes com os desafios que os professores e o espaos educativos enfrentam, cujo

    desafio maior fomentar a capacidade de pensar o seu tempo.

    A capacidade de pensar pode ser mobilizada atravs de atividades cognitivas reflexivas, em

    que os alunos so estimulados a envolverem-se significativamente com o processo,

    mobilizando conhecimentos pr-existentes ou procurando informaes que no possuem, de

    modo a analisarem melhor os saberes com os quais interagem e de modo a intervir nos

    processos de forma consciente e crtica (Salema, 2005). Isto exige um posicionamento

    pedaggico docente ativo e ao que se passa no desempenho dos alunos e que lhe permita que

    a avaliao da aprendizagem realmente demonstre que os alunos esto a aprender. Ou seja,

    deveria haver na formao de professores o desenvolvimento de competncias para conceber

    mecanismos de aprendizagem, de modo que o professor, ao mobilizar suas estratgias de

    ensino, pusesse em prtica atividades promotoras de uma cognio refletida e reflexiva, que

    mobilizam processos de aprendizagem significativa, respeitando a diversidade individual nos

    alunos.

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    14

    O processo de aprendizagem tambm deveria interessar ao aprendente, uma vez que ele, ao

    internalizar o processo, identifica as suas capacidades e dificuldades cognitivas, consciente do

    que sabe e do que no sabe. A partir da sua apropriao do processo, ele tende a conseguir

    identificar e superar dificuldades, buscando ajuda, recorrendo a variadas fontes de informao

    para construir novo conhecimento. O aprendente ao perceber o processo de aprendizagem,

    olhando para as suas complexidades, desenvolve algum entendimento, alguma clareza em

    relao ao processo. Consequentemente, estas noes e percees podem ajud-lo a superar-

    se nos processos de autoformao e formao dirigida por docentes ou em contextos

    informais da sua vida.

    Salema (2005) acredita que deveria ser dada mais ateno aos aspetos da dimenso

    interpretativa das relaes que o aluno desenvolve com o ensino, o currculo, o sistema e a

    sociedade. O conhecimento destas interpretaes poderia esclarecer as dificuldades que o

    aluno apresenta durante o processo de aprendizagem e a forma como lida com o processo de

    conhecer. O aluno perceberia as dificuldades vividas no processo de aprendizagem

    desenvolvendo a conscincia do que est a aprender, mas reconhecendo a sua capacidade

    para ultrapassar as referidas dificuldades. Entretanto, esta autora (Salema, 2005) relembra o

    confronto existente entre, por um lado, os estudos que defendem a mensurabilidade da

    inteligncia no desempenho escolar (algo esttico e normalizado) e que no envolve esforos

    para modificar o funcionamento cognitivo na aprendizagem; e, por outro lado, os estudos que

    defendem a modificabilidade da inteligncia atravs de estratgias de ensino e de

    aprendizagem, que ajudem a melhoria do desempenho cognitivo. Gardner (1985) um dos

    proponentes e defensores desta ltima perspetiva de aprendizagem, sustentada pela sua

    investigao focada nas inteligncias mltiplas (Salema, 2005).

    Feuerstein (1980, citado por Salema, 2005), psicopedagogo e discpulo de Piaget, desenvolveu

    tambm a Teoria do Enriquecimento Instrumental, cuja orientao promover a autonomia e

    a flexibilidade do pensamento, como formas de propiciar um melhor desempenho cognitivo.

    Na sua teoria, a mente vista como uma estrutura e um estado de flexibilidade do aprendente

    no seu processo de aprender, que poderia alterar-se em qualquer momento da vida de uma

    pessoa a partir da interao dos sujeitos aprendentes com o mundo e da qualidade de

    experincias de aprendizagem mediadas (Feuerstein, 1980, citado por Salema, 2005). Por

    outras palavras, um todo (o organismo, a mente, o prprio crebro) transforma-se cada vez

    que uma das suas partes passa por alguma transformao. Efetivamente, Feuerstein (1980,

    citado por Salema, 2005) acreditava que poderia ser aumentado o potencial cognitivo humano

    por este ser um sistema aberto e, portanto, a se verificarem mudanas estruturais na cognio

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    15

    humana (PEI, s/d; Salema, 2005; Souza, s/d). Tambm acreditava que todos so capazes de

    aprender e que a inteligncia pode ser impulsionada pela mediao nas experincias do

    cotidiano e nas atividades (in) formais e formais de aprendizagem. Com esta teoria, o autor

    (Feuerstein, 1980, citado por Salema, 2005) contraps a teoria de que a mente um sistema

    fechado e fixo, atribudo como um dom ao ser humano (Souza, s/d).

    Goleman (2010) acredita que as emoes tambm alteram o nosso sistema cognitivo,

    modificando-o e estruturando-o. Assim, a resposta s emoes nas vrias condies de vida

    social gera uma resposta emocional, que, uma vez processada, gera comportamentos e

    conhecimentos, formando aquilo que ele denomina de inteligncia emocional e que tambm

    gera uma inteligncia social.

    Todas estas teorias (defendidas por Goleman (2010); Gardner (1985); Feuerstein (1980); Piaget

    (1974), Vygotsky (1991), entre outros, citado por Salema, 2005; Develay, 1999) as novas e

    anteriores teorias do desenvolvimento cognitivo podem ser reunidas naquilo que as

    assemelha, isto , na centralidade do aluno no processo de aprender o que se opem ideia

    de mensurabilidade da inteligncia, sem que se leve em conta o que ajuda o aluno a aprender

    a pensar no potencial de aprendizagem contnuo estimulado na interao com o mundo.

    A sociedade de informao, em que nos encontramos, coloca ao cidado um duplo problema:

    1. Gerir o crescimento contnuo da imediata partilha de informao produzida, dentro

    da capacidade redutora da memria;

    2. E interagir com contedos estanques e descontextualizados da realidade

    patrocinados por experincias educativas apartadas da realidade.

    Com efeito, tal fato exige que se prevejam novas formas de ensinar, de aprender e de pensar,

    tendo como respostas amplos debates e o surgimento de inmeras experincias que apostam

    em novos cenrios de aprendizagem e novas formas de aprender, assim como novas formas

    de gerir a informao e o conhecimento em ambientes formais e informais de aprendizagem

    (Souza, s/d). A aposta ser, por isso, em entender e explorar uma teria que se foca no processo

    de compreender o processo de aprendizagem, vivido em primeira pessoa pelo prprio

    aprendente, a que d-se o nome de Metacognio, e que tambm se prope a ajudar os

    aprendentes a tornarem-se autnomos.

    Todo o prembulo em torno das teorias acima discutidas uma forma de ver que o conceito

    que a seguir abordaremos envolve relaes entre educao e instruo, pedagogia e didtica,

    filosofia e pedagogia em prol dos alunos (Develay, 1999). Ter ainda influncias nas reas

    fundamentais da aprendizagem escolar, como comunicao e compreenso oral e escrita e na

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    16

    resoluo de problemas (Valente, Salema, Morais & Cruz, 1989 apud Ribeiro, 2003, p.110) e

    na motivao (Jones, 1988 apud Ribeiro, 2003).

    Assim, vamos identificando o benefcio dos estudos sobre a metacognio por se sustentarem

    em experincias educativas que refletem sobre o ato de aprender do ponto de vista dos

    alunos, onde estes assumem posies de destaque no processo. Tambm vamos reunindo

    teorias que permitam a implementao de espaos educativos destinados ao pensar sobre o

    pensar e sobre o aprender. Nestes cenrios, o aluno poder perceber o valor de aprender ao

    ver as suas aprendizagens detetveis e representadas, mediadas pela ao do professor ou por

    metodologias e tecnologias adotadas por este.

    Para entender a teoria da Metacognio, pr-anunciada, questionamos: O que representa a

    metacognio? Qual sua relao com o processo de ensino e de aprendizagem? Como que o

    aprendente vivencia a metacognio? Como se posiciona o docente diante da dinmica da

    aprendizagem metacognitiva? Quais so as implicaes para o desempenho das suas funes?

    Por que debater sobre a metacognio?

    Acreditamos na importncia de haver cada vez mais cursos, formao e investigao

    direcionados a estas questes com o intuito de formar pessoas autodirigidas e independentes

    a partir da implementao de estratgias de aprendizagem, como atividades de reflexo. Estes

    estudos permitem sermos mais sensveis em relao aprendizagem do aluno e forma com

    que ele identifica e procura superar as suas dificuldades. Encerramos este tpico informando

    que algumas das perguntas acima formuladas serviro de mote para o desenvolvimento da

    fundamentao terica do presente estudo e que suportaro o prprio raciocnio desenvolvido

    na interao com a reviso de literatura efetuada.

    1.1 O conceito de Metacognio

    No basta fazer e saber, mas preciso saber como se faz para

    saber e como se faz para fazer. (Doly, 1999)

    Ao pensar no processo de aprendizagem, reconsiderando aes, podemos estar a proceder a

    metacognio, ou mais precisamente, a uma atividade ou avaliao metacognitiva. Explicar

    esta operao de forma simples seria dizer que o sujeito prope questes para o seu processo

    de aprender diante de atividades propostas na sala de aula, sendo a isto estimulado ou no.

    Quando ele submetido ao processo de realizar uma atividade, coloca questes a si mesmo, o

    que pode ocorrer de forma inconsciente ou consciente, tal como: o que prope a atividade? O

    que sei sobre este assunto? Tenho dificuldades em resolv-la? Quais os passos a que devo

    recorrer para responder questo e/ou ultrapassar a dificuldade? A opo por uma dada

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    17

    estratgia levar a um raciocnio correto? Assim, a ateno a estas questes e as estratgias a

    que se recorre para desenvolver o aprender, podem ser vistas como um resumo de uma

    operao metacognitiva.

    O exemplo acima indica a forma como realizamos reflexes cognitivas em torno do processo

    de aprender e que, neste processo, mobilizamos processos internos intrnsecos que podem

    ajudar a identificar e ultrapassar as dificuldades surgidas na interao com novos saberes,

    novos conhecimentos. Esta viso do processo que tem o sujeito no centro do processo da

    aprendizagem apoia a viso de um processo de aprendizagem que pode ser modificado ao

    longo do seu desenvolvimento. Cooper (2009), Doly (1999), Grangeat (1999) e Ribeiro (2003),

    autores que estudam a metacognio, concluem que no uma tarefa simples propor

    conceitos e a compreenso sobre a metacognio. Para iniciar o entendimento mais

    aprofundado deste conceito procedeu-se a uma reflexo sobre a origem do termo, que se

    apresenta de seguida.

    1.1.1 Perspetiva Histrica

    O tema da metacognio recente na literatura psicolgica e pedaggica (Grangeat, 1999;

    Marini, 2006; Ribeiro, 2003) e tem seus primeiros registos na literatura cientfica em estudos

    realizados por americanos e canadianos, nos anos 70, relacionados com a memria em

    crianas em situao de insucesso na aprendizagem e em crianas sobredotadas (Cooper,

    2009; Doly, 1999; Peixoto, 2006).

    Foi introduzido na Psicologia por John H. Flavell (Cooper, 2009; Figueira, 2003; Livingston,

    1997; Ribeiro, 2003). Outro protagonista nos primeiros estudos da metacognio Ann Brown

    (1981), que d um significado prprio a este termo quando refere que a metacognio is

    realy a new term for an old idea, i.e., learning to learn, ou seja, a aglutinao de

    metaconhecimento e controlo (Figueira, 2003, p.01-02).

    Para Brown e Baker (1986,p.32), o termo significaria literalmente transcending knowledge,

    ou seja, a compreenso de qualquer processo cognitivo. neste perodo que Flavell (1977) e

    seus colaboradores comearam a desenvolver estudos relacionados com a metacognio,

    nomeadamente em relao metamemria. Tambm j se reconheciam certos

    comportamentos relacionados com o processo de aprendizagem, quando alguns

    investigadores comearam a observar que determinados alunos demonstravam compreender

    a finalidade da tarefa, planificavam a sua realizao, avaliavam todo o percurso de

    desenvolvimento da mesma e alteravam-na de acordo com as suas prprias necessidades (cf.

    Flavell & Wellman, 1977 apud Ribeiro, 2003).

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    18

    Os primeiros estudos sobre a metacognio eram de natureza comparativa, incidiam sobre a

    procura de estratgias de aprendizagem que visassem melhorar o funcionamento da memria

    (Doly, 1999). Com base nestes trabalhos, Flavell & Wellman (1977) sugeriram que o

    conhecimento metacognitivo se desenvolve atravs da consciencializao, por parte do

    sujeito, do modo como determinadas variveis interagem no sentido de influenciar os

    resultados das atividades cognitivas (Ribeiro, 2003). Efetivamente, desde o incio do sculo

    passado, pedagogos e psiclogos demonstravam estar conscientes de que o estudo e a leitura

    envolvem um tipo de atividades denominadas de metacognitivas (Doly, 1999; Ribeiro, 2003),

    sendo disto exemplo alguns estudos como os que se realizavam sobre leitura reflexiva e

    identificao de erros na leitura, que hoje assumem a denominao de metacompreenso

    (Brown, 1995 apud Doly, 1999). Portanto, desde o incio do sculo XX j se processavam

    estudos com pressupostos da metacognio, tal como referem Fry e Lupart (1987 apud

    Figueira, 2003).

    Os estudos de metacognio incorporaram vrios contributos da Psicologia, nomeadamente

    aos que se referem a produtos e processos cognitivos, que defendiam uma aprendizagem mais

    ativa e a importncia da aprendizagem reflexiva. Estes contributos apoiam-se na viso

    dialgica do desenvolvimento cognitivo humano, sustentados em duas vises (Fonseca, 2008,

    p.08):

    Viso construtivista inspirada em Piaget, que visa a conceo centrpeta,

    significativa e estruturada do conhecimento e no a pura acumulao acrtica de dados

    da informao.

    Viso co construtivista - inspirada em Vygotsky, que refora a construo centrfuga do

    conhecimento com base em interaes sociais interiorizadas e mediatizadas,

    envolvendo um dilogo intencional entre indivduos experientes e inexperientes.

    Segundo Lefebvre-Pinard (1983), Piaget e Vygotsky abordaram a questo do

    controlo/regulao das aes e do pensamento, assim como a sua evoluo (Figueira, 2003).

    Entretanto, Weinert (1987) relembra que a mxima socrtica s sei que nada sei e reflexes

    de Spinoza em torno do ato de conhecer if somebody knows something, then he knows that

    he knows it, and at the same time he knows that he knows that he knows j refletiam

    pressupostos metacognitivos (Figueira, 2003, p.01). Outras experincias remotas, envolvendo

    pressupostos da metacognio, so identificadas por Figueira (2003, p.02), nomeadamente:

    Nos questionrios introspectivos de Baldwin (1909), para examinar estratgias

    de estudos dos alunos (Cavanaugh & Perlmutter, 1982);

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    19

    Na experincia de induo da leitura refletida de Dewey (1910 apud Brown,

    1987, p.02) para quem aprender a pensar seria questionar, investigar,

    recapitular, testar, descobrir algo de novo ou ver o que j se conhece de uma

    outra forma.

    Tal como Perraudeau (2000), Fonseca (2008) identifica os mtodos que estudam a reflexo do

    aluno sobre seu prprio funcionamento cognitivo, destacando dois autores essenciais e a

    relao que fazem com o processo de tomada de conscincia:

    Piaget (1976)4 com a teoria da consciencializao, cujo conceito-chave do processo

    a abstrao reflexiva. A questo da tomada de conscincia tambm est parcialmente

    identificada na sua teoria (Doly, 1999; Saleme & Queiroz, 2009).

    Flavell (1977) terico da metacognio, cujas pesquisas se centram no conhecimento

    da atividade cognitiva do indivduo. Para este autor, todo o processo da metacognio

    remete para a tomada de conscincia e a importncia da reflexo, como se perceber

    de seguida.

    Estas duas teorias diferem entre si, porque, na teoria desenvolvimentista de Piaget, o processo

    d-se numa transio da inteligncia sustentada no corpo (e portanto suportada por

    conhecimentos prticos) para uma inteligncia cognitiva (sustentada em conhecimentos

    abstratos). Quando atinge este estdio, o aluno capaz de explicar o que compreendeu e qual

    a estratgia que utilizou na operao cognitiva, o que pode ser percebido como tomada de

    conscincia.

    Com base no que foi referido at o momento, criou-se um mapa conceptual, onde constam

    alguns dos tericos aqui mencionados e que ainda surgiro neste captulo, com

    representaes da metacognio no que se reporta ao ensino, cognio e a aprendizagem:

    4 Piaget o segundo contributo fundador da metacognio. Embora o termo metacognio ainda no esteja

    presente nas suas teorias, procurou remontar as origens (gnese) dos conhecimentos, procurando distinguir as razes dos vrios conhecimentos.

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

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    Fig. 1. Mapa Conceitual da Metacognio5

    Este mapa tambm serve de ligao para os prximos subcaptulos, onde sero apresentados

    os elementos relativos metacognio que sero abordados neste trabalho: a terminologia, os

    conceitos e dimenses, os tericos e as alas representativas do conceito, a relao entre

    cognio e a metacognio e transversalmente a todos estes elementos, os aspetos do ensino

    e da aprendizagem.

    5 Mapa concetual elaborado no https://bubbl.us/.

    Categoria Teorias subjacentes

    Elementos da Dimenso Aprendizagem

    LEGENDA

    Tema principal

    Tericos Principais e

    Contemporneos

    Categoria Tericos

    Dimenso da Metacognio

    Elementos da Dimenso Ensino Representantes das teorias

    Teorias

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    21

    1.1.2 O termo metacognio: compreenso e representaes tericas

    Investigando a etimologia da palavra metacognio, compreende-se o termo pela origem dos

    seus componentes o prefixo meta significa ir alm de, que alguns autores consideram

    como necessrio para a tomada de conscincia, para ir alm da cognio, isto , da

    linguagem, do pensamento, da memria (Portilho & Dreher, 2009). Por outras palavras, a

    metacognio est para alm da competncia de conhecer o prprio ato de conhecer, ou em

    outras palavras, tomar conscincia, analisar e avaliar como se conhece (Ribeiro, 2003 apud

    Rela & Manfredini, 20056). Para Brown (1987, apud Ribeiro, 2003) comeam aqui as

    indefinies na literatura em torno da metacognio, pois persiste a dificuldade em

    estabelecer a distino entre o que meta e o que cognitivo, que, para esta autora, se trata

    de um termo singular para um problema multifacetado.

    Entre as definies acima, optamos pela definio de Portilho & Dreher (2009) para os termos

    que do significado metacognio, por revelar maior entendimento do conceito criado por

    Flavell. Entretanto, pretendemos desintrincar no prximo tpico as aproximaes e as

    diferenciaes entre a metacognio e a cognio, constatando seus relevos e distines.

    1.1.2.1 A metacognio e a cognio: aproximaes e diferenas

    Nosso stimo sentido (Nisbett & Schucksmith, 19867)

    A cognio representa o conhecimento do aluno sobre um dado assunto, tema ou rea de

    interesse e est intimamente ligado forma como nos relacionamos com o mundo. um tipo

    especfico de representao dos objetos e fatos e, num sentido lato, a qualquer tipo de

    representao da informao proveniente do meio, incluindo todos os tipos de representaes

    multidimensionais (Kuhl & Kraska, 1989, apud Ribeiro, 2003, p.110). Para Flavell, Miller &

    Miller (1993, p.02), a cognio ser more unequivocally inteligent processes and products of

    the human mind, processo onde se verifica a mobilizao da informao e onde outros

    componentes interatuam: os vrios tipos e nveis de processos, as estratgias combinadas, o

    conhecimento e a representao (Salema, 2005). O conceito (cognio) subdivide-se em

    processos como o da assimilao, da acomodao e da abstrao. Conforme Magalhes (2002,

    p.32), os estudos sobre a cognio passam, ento, pela anlise, no s do que se passa na

    mente do aprendente, mas tambm por uma reflexo sobre o contexto em que se insere a

    aprendizagem, as atividades desenvolvidas e os instrumentos utilizados.

    6 Rela, E. & Manfredini, M.L. (2005). Metacognio (Publicao: 27/05). (Blog). Disponvel em:

    http://metacognicao.blogspot.com/ 7 Apud Figueira (2003).

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

    22

    A metacognio, conforme Flavell et al. (1993, p.03), reflete a relao entre aquilo que o aluno

    sabe sobre uma dada atividade (cognio) e a forma como vai resolv-la. o conhecimento

    do prprio conhecimento, a avaliao, a regulao e a organizao dos prprios processos

    cognitivos (Ribeiro, 2003, p.110). uma operao em que o sujeito decide o que fazer com

    certas abstraes para responder a um novo processo cognitivo.

    Yussen (1985 apud Doly, 1999) reala que o objeto de estudo da metacognio so os

    processos mentais em torno dos quais se gera uma atividade mental e se percebe os

    conhecimentos sobre a cognio e os produtos da cognio como conhecimentos

    armazenados na memria e que guiam a atividade cognitiva os metaconhecimentos. Tais

    conhecimentos, como refere Yussen (1985), auxiliam na perceo dos produtos cognitivos, ao

    promoverem a identificao daquilo que se sabe e (tambm com relao ao funcionamento da

    resoluo de uma dada tarefa e as funes mentais) que ajudam, por exemplo, ultrapassar

    uma dificuldade, estar atento ou compreender algo lido.

    De acordo com Weinert (1987 apud Ribeiro, 2003, p.110), as metacognies podem ser

    consideradas cognies de segunda ordem: pensamentos sobre pensamentos,

    conhecimentos sobre conhecimentos, reflexes sobre aes. Por sua vez, Grangeat (1999),

    Peixoto (2006) e Ribeiro (2003) consideram a metacognio uma operao mental como um

    discurso ou uma reflexo de segundo nvel sobre a cognio, o que significa, para aquele que

    aprende, desenvolver conhecimentos sobre a maneira como ele prprio constri os seus

    conhecimentos. Flavell (1976) reconhecia a metacognio como Cognio sobre a cognio

    (Doly, 1999; Figueira, 2003), o que significa o conhecimento dos prprios processos

    cognitivos, produtos ou qualquer coisa relacionada a eles, isto , o aprendizado das

    propriedades relevantes da informao ou dos dados (Davis, Nunes & Nunes, 2005, p. 211).

    Flavell (1981 apud Flavell et al., 1993, p.150), em relao ao conceito de metacognio, refere

    ainda que: It has usually been broadly and rather loosely defined as any knowledge or

    cognitive activity that takes as its object, or regulates, any aspect of any cognitive enterprise. It

    is called metacognition because its core meaning is 'cognition about cognition.

    Lawson (1984 citado por Ribeiro, 2003), ao analisar como o conhecimento metacognitivo se

    encontra relacionado com os processos cognitivos, observa que o ato de refletir envolve a

    avaliao do curso/fluxo da cognio, que inclui a anlise do progresso em termos de planos,

    monitorizao e modificao da cognio. Isto sugere que nos tornamos conscientes da nossa

    conscincia e faz da cognio o objeto da nossa cognio atravs da operao dos processos

    executivos, constantemente regulados. uma espcie de monitoramento ativo e

    consequente regulao e orquestrao desses processos em relao aos objetos cognitivos ou

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    dados sobre os quais eles incidem, usualmente a servio de alguma meta ou objetivo

    concreto (Flavell, 1976, p.232, apud Davis et al., 2005, p. 211).

    Na mesma direo, a metacognio pode ser entendida como:

    Corpo de conhecimentos e modos de compreenso que incidem sobre a prpria

    cognio. (Yussen, 1985 apud Doly, 1999, p.22);

    Atividade mental por meio do qual outros processos mentais se tornam alvo de

    reflexo (Davis et al.,2005, p.211);

    Conhecimento que o sujeito tem sobre o seu prprio conhecimento, dos prprios

    processos e produtos cognitivos (Figueira, 2003);

    Controlo activo, a regulao e a orquestrao desses processos (Doly, 1999, p.22);

    Conscincia da maneira que a tarefa gerida para atingir o objetivo e obter sucesso

    (Salema, 2005);

    Conhecimento dos prprios processos cognitivos que se do na atividade intelectual

    (Perraudeau, 2000);

    Faculdade de planificar, de dirigir a compreenso e de avaliar tudo o que foi

    aprendido (Ribeiro, 2003, p.109).

    Flavell (1968) explica, ainda, o processo em que se observa a metacognio:

    Pratico a metacognio (metamemria, metaaprendizagem, metaateno,

    metalinguagem etc.) quando me dou conta de que tenho mais dificuldade em aprender

    A que B; quando compreendo que devo verificar pela segunda vez C, antes de aceit-lo

    como um fato... metacognio () todo o movimento que a pessoa realiza para tomar

    conscincia e controle dos seus processos cognitivos (Portilho, 2009, p.52).

    Cooper (20098) retoma as investigaes de Flavell (1976), onde este situa a etimologia da

    metacognio, sustentando os significados do termo, como podemos ver abaixo:

    In his 1976 article, Flavell recognized that metacognition consisted of both monitoring

    and regulation aspects. It was here that the term metacognition was first formally used in

    the title of his paper. He defined metacognition as follows: In any kind of cognitive

    transaction with the human or non-human environment, a variety of information

    processing activities may go on. Metacognition refers, among other things, to the active

    monitoring and consequent regulation and orchestration of these processes in relation to

    8 Cooper, 2009. Consultado em: http://www.lifecircles-inc.com/Learningtheories/constructivism/flavell.html

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    the cognitive objects or data on which they bear, usually in service of some concrete goal

    or objective." (Cooper, 20099).

    Lafortune et al. (1998, p.16) destacam tambm a definio de Flavell (1979) que refere a

    metacognio como um connaissance que chaque personne a de son propre processus

    cognitif, mais aussi lutilisation de ces connaissance pour effectuer la gestion de ses

    processus mentaux.

    Flavell et al. (1993, p.150) completa o que j se referia sobre a metacognio, referindo que:

    This refers to the segment of your acquired world knowledge that has to do with

    cognitive matters. It is the knowledge and beliefs you have accumulated through

    experience and stored in long-term memory that concern not politics or football or

    electronics or needlepoint or some other domain, but the human mind and its doings.

    Sobre a obra de Flavell (1976), Cooper (200910) reala as caractersticas da metacognio:

    metacognition is intentional, conscious, foresighted, purposeful, and directed at

    accomplishing a goal or outcome. Por sua vez, Portilho e Dreher (2008) ressaltam que a

    metacognio exige que se procure conhecer como, porqu e para qu se dispe desses

    processos cognitivos na hora de aprender. J Livingston (199711) refere-se metacognio

    como higher order thinking which involves active control over the cognitive processes

    engaged in learning e reala:

    Activities such as planning how to approach a given learning task, monitoring

    comprehension, and evaluating progress toward the completion of a task are

    metacognitive in nature. Because metacognition plays a critical role in successful

    learning, it is important to study metacognitive activity and development to determine

    how students can be taught to better apply their cognitive resources through

    metacognitive control (Livingston, 199712

    ).

    Para Hacker (1998) a Metacognio to include the knowledge of one's own cognitive and

    affective processes and states as well as the ability to consciously and deliberately monitor and

    regulate those processes and states (cf. Cooper, 200913). Portanto, a metacognio incorpora

    significados como: a emergncia da possibilidade para aquele que aprende de se distanciar do

    que faz, das situaes nas quais est implicado a fim de compreender os meios, as entradas e

    as sadas(Develay, 1999, p.8); Mtodos de trabalhos relacionados com os contedos de

    ensino e com a construo da inteligncia do aluno (Grangeat, 1999); [a]capacidade de auto-

    9 Cooper, 2009. Consultado em: http://www.lifecircles-inc.com/Learningtheories/constructivism/flavell.html

    10 Cooper, 2009. Consultado em: http://www.lifecircles-inc.com/Learningtheories/constructivism/flavell.html

    11 Livingston. (1997). Consultado em: http://gse.buffalo.edu/fas/shuell/cep564/metacog.htm

    12 Livingston. (1997). Consultado em: http://gse.buffalo.edu/fas/shuell/cep564/metacog.htm

    13 Pesquisas sobre Teorias da Aprendizagem em Psicologia Educacional. Pesquisado em: http://www.lifecircles-

    inc.com/Learningtheories/constructivism/flavell.html

  • Universidade de Aveiro Captulo II Enquadramento Terico

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    regular a prpria aprendizagem, ou seja, planificar que estratgias se podem utilizar em cada

    situao, aplic-las para controlar o processo, avali-los para detectar possveis falhas e, como

    consequncia, transferir isto para uma nova situao (Freire et al., 2004, p.57).

    Nos autores anteriormente referidos, sublinhamos que os posicionamentos sobre a

    metacognio encontram convergncia no significado que se direciona para a tomada de

    conscincia sobre a prpria aprendizagem. Terminamos estas representaes tericas

    reunindo uma ltima representao terica, com base em Portilho & Dreher (2009), que veem

    a metacognio como um processo individual, e que permite a cada pessoa perceber o seu

    prprio processo de aprender comprometido consigo e com o outro, como se passa a explicar.

    1.1.2.2 Metacognio enquanto processo de tomada de conscincia

    J vimos em Portilho & Dreher (2009) que a importncia de conhecer o prprio conhecer,

    visando a uma aprendizagem com compreenso, repleta de sentidos (negativos ou positivos

    Este processo sujeito s emoes passa pela identificao (consciencializao) dos saberes e

    dos no-saberes, que refletem as facilidades e as dificuldades no processo de aprender,

    gerando reaes e envolvimentos afetivamente positivos ou negativos com a aprendizagem

    podendo este processo tornar-se ativo e reflexivo ou frustrante e bloqueador.

    Ainda assim, antes de compreender o significado de tomada de conscincia, importa

    conceber a conscincia, enquanto processo e suas causalidades. Assim, a conscincia um

    instrumento da mente para saber que existimos, quem somos e aquilo que pensamos

    (Damsio, 2010, p.20). Para Doly (1999, p.19), conscincia a capacidade de reflexo, de

    desdobramento do sujeito que o fundamenta enquanto sujeito epistemolgico, isto ,

    construtor de saberes e garante da sua verdade. Assim, a conscincia sobre e da

    aprendizagem detm-se nos processos internos do pensamento (Peixoto, 2006), sobre os

    prprios processos cognitivos que se do em toda a atividade intelectual (Perraudeau, 2000),

    ou funciona como capacidade de saber o que se quer conhecer () e habilidade de explicar

    como ela realizada (Silva et al., 201014). Piaget (1974 apud Doly, 1999, p. 19), ao definir o

    desenvolvimento da inteligncia, utilizava a expresso tomada de conscincia para explicar

    as modalidades de passagem da inteligncia prtica, de natureza sensrio-motor ter xito

    () inteligncia abstrata de natureza cognitiva e operatria, que adquiriu a capacidade de

    compreender o que faz e resulta..

    14

    Silva et al., 2010. Consultado em: http://www.efdeportes.com/efd142/o-estudo-da-cognicao-e-da-metacognicao.htm

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    Doly (1999, p.19), por sua vez, esclarece que a tomada de conscincia funciona como um

    reaproveitamento das competncias construdas em contextos diferentes dos da

    aprendizagem, destacando a importncia da transferncia que funciona como

    desdobramento da aprendizagem. Alm disso, esta autora (Doly, 1999) acredita que o

    aprendente ao tornar-se num sujeito consciente da sua forma de aprender deixaria de ser um

    consumidor de saberes para ser um construtor de saberes. Assim, a tomada de conscincia, na

    tica de Damsio (2010), Doly (1999), Peixoto (2006) e Perradeau (2000) expressa por

    desencadear uma espcie de clareza sobre fatos, processos, aes na empresa cognitiva.

    Para Jucks & Paus (2010), esta tomada de conscincia e a sua representao demonstram o

    quo co