Mídias sociais na educação inteligência coletiva entre docentes e discentes

25
Mídias Sociais na Educação: inteligência coletiva entre docentes e discentes Tiago Alves Nogueira de Souza 1 (SOUZA, TAN) Ana Célia da Rocha Santos 2 (SANTOS, ACR) Resumo: Este estudo se propõe a compreender a maneira como as mídias sociais estão melhorando/interferindo no processo de aprendizado dos jovens do ensino fundamental e médio do Brasil. A metodologia, amparada em bases qualitativas e quantitativas, compreende leituras dirigidas sobre os fundamentos da chamada Web 2.0, em especial estudos de Pierre Lévy sobre Inteligência Coletiva, Cibercultura e Virtual, atualizando-os ao novo contexto das mídias sociais emergentes. Analisamos num segundo momento, para entender o comportamento e o perfil do usuário de internet no país, dados dos institutos de pesquisa Pew e Nielsen Online (2010), que compreendem o tempo gasto pelo brasileiro na web; e dados do instituto Nielsen Wire (2010), que consideram a maneira como os brasileiros utilizam/gerenciam suas redes sociais online e blogs. Contrapomos, num terceiro momento, o número de internautas ativos no país e em países desenvolvidos, com o intuito de entender o que torna possível ao Brasil estar entre as nações que mais passam tempo em redes sociais online e blogs. Por fim, a pergunta-chave que Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 1

Transcript of Mídias sociais na educação inteligência coletiva entre docentes e discentes

Page 1: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

Mídias Sociais na Educação: inteligência

coletiva entre docentes e discentes

Tiago Alves Nogueira de Souza1 (SOUZA, TAN)Ana Célia da Rocha Santos 2 (SANTOS, ACR)

Resumo:

Este estudo se propõe a compreender a maneira como as mídias

sociais estão melhorando/interferindo no processo de aprendizado

dos jovens do ensino fundamental e médio do Brasil. A

metodologia, amparada em bases qualitativas e quantitativas,

compreende leituras dirigidas sobre os fundamentos da chamada

Web 2.0, em especial estudos de Pierre Lévy sobre Inteligência

Coletiva, Cibercultura e Virtual, atualizando-os ao novo contexto

das mídias sociais emergentes. Analisamos num segundo

momento, para entender o comportamento e o perfil do usuário de

internet no país, dados dos institutos de pesquisa Pew e Nielsen

Online (2010), que compreendem o tempo gasto pelo brasileiro na

web; e dados do instituto Nielsen Wire (2010), que consideram a

maneira como os brasileiros utilizam/gerenciam suas redes sociais

online e blogs. Contrapomos, num terceiro momento, o número de

internautas ativos no país e em países desenvolvidos, com o intuito

de entender o que torna possível ao Brasil estar entre as nações

que mais passam tempo em redes sociais online e blogs. Por fim, a

pergunta-chave que buscamos responder é de que maneira os

estudantes e professores brasileiros podem se valer dessas

ferramentas para apreenderem e proverem uma melhor educação.

Palavras-chave: Mídias-sociais, Cibercultura, Inteligência-coletiva.

Abstract:

This study aims to understand how social media are

enhancing/interfering in the learning process of young people from

primary and secondary education in Brazil. The methodology,

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 1

Page 2: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

supported by qualitative and quantitative bases, includes readings

regarding the foundations of Web 2.0, in particular studies of Pierre

Lévy on collective intelligence, Cyberculture and Virtual, updating

them to the new context of emerging social media. To understand

the behavior and profile of internet users in the country, we

analyzed, at a second moment, data from the Pew and Nielsen

Online (2010) research institutes, which include the time spent by

Brazilian on Web; and data from the Institute Nielsen Wire

(2010) who consider the way Brazilian use/manage their online

social networks and blogs. We compare, at a third moment, the

number of active Internet users in the country and in developed

countries, in order to understand what makes it possible for Brazil

to be among the nations that spend more time online, on social

networks and blogs. Finally, the key question we seek to answer is

how the Brazilian students and professors can take advantage of

these tools to grasp and to provide a better education.

Palavras-chave: palavra-chave1, palavra-chave2, palavra-chave3

A Web Social

Recentemente, a internet vivenciou uma mudança nos paradigmas

de construção de web sites. O foco deixou de ser o site em si e passou a

ser o visitante, o usuário, o colaborador. Os sites deixaram de ter

características de portais, senhores da informação, e passaram a permitir -

cada vez mais - que todos os usuários tivessem voz, opinião e visibilidade

de forma igualitária. É justamente essa descentralização da informação

que permite a construção de redes sociais mais igualitárias (Recuero,

2008). A internet deu um grande passo para assumir de uma vez por

todas aquilo que assumiu como direito seu: a sociabilidade global.

Nesse mesmo período, surgiu uma nova definição para as atividades

virtuais: as mídias sociais. Embora seus primeiros empregos datem de um

tempo anterior ao da internet, somente agora, graças aos meios digitais,

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 2

Page 3: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

estes se potencializaram para trabalhar com a aldeia global em tempo

real. Hoje, há exemplos comuns de mídias sociais, tais como os blogs, os

microblogs, as redes sociais, os wikis1, os mundos virtuais, os jogos

sociais, além de incontáveis plataformas que possibilitam a interação e

participação entre os usuários.

Segundo dados dos institutos de pesquisa Pew e Nielsen Online

(2010), 22% do tempo total do usuário na web é gasto com redes sociais,

excluindo-se desta consideração, outras mídias sociais, como blogs e

wikis. Além disto, segundo o instituto Nielsen Wire (2010), 86% dos

usuários brasileiros de internet usam, tem ou gerenciam alguma rede

social ou blog.

Apesar do número de usuários de internet no Brasil ainda ser

pequeno quando comparado aos países desenvolvidos – 36,2% (ITU, 2009)

da população brasileira acessa à internet, contra 74,1% (Nielsen Online,

2009) dos Estados Unidos – o Brasil está entre os 10 países que mais

passam tempo em redes sociais online ou em blogs, ocupando a sexta

posição, com uma média de 5h03min por mês (Nielsen Wire, 2010).

Sabe-se que a cada nova mídia, novas maneiras de interação e de

cultura surgem. A educação dessa nova geração de jovens, que

desenvolveu-se com a internet presente no dia-a-dia, em lan-houses2, na

escola ou em casa, é diferenciada de alguma forma da geração anterior.

Com o número de usuário de internet em crescimento no Brasil e no

mundo, se faz necessário atentar-se a duas questões que concernem

tanto à sociedade atual como ao futuro da aldeia global: como os jovens

brasileiros estão utilizando as mídias sociais na construção de seus

conhecimentos; e como os professores poderiam utilizar essas

1 Ferramentas de criação e edição de textos colaborativos. O exemplo mais popular é a Wikipédia.2Estabelecimento comercial onde, à semelhança de um cyber café, as pessoas podem pagar para utilizar um computador com acesso à Internet

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 3

Page 4: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

ferramentas para melhorar o aproveitamento das aulas num ambiente

extra sala de aula?

Muitos acadêmicos consideram a internet como uma mídia muito

nova para ser estudada. Entretanto, seus efeitos já foram sentidos pela

sociedade há muito tempo. Não se deve compreender a sociedade da

informação como uma realidade atual no sentido de que ela acaba de

acontecer, mas no sentido de que ela já está em rumo há tempos. O barco

não saiu do porto há poucos instantes, ele já está no meio do oceano:

A escolha não é entre a nostalgia de um real datado e um virtual ameaçador ou excitante, mas entre diferentes concepções do virtual. A alternativa é simples. Ou o ciberespaço reproduzirá o mediático, o espetacular, o consumo de informação mercantil e a exclusão numa escala ainda mais gigantesca que hoje. Esta é, a grosso modo, a tendência natural das “supervias da informação” ou da “televisão interativa”; Ou acompanhamos as tendências mais positivas da evolução em curso e criamos um projeto de civilização centrado sobre os coletivos inteligentes. (Lévy, 1999: 117-118)

A partir das concepções de Pierre Lévy sobre inteligência coletiva

(1998), virtualidade (1999) e ciberespaço (2000), procuraremos a seguir

examinar as perspectivas acerca das mídias sociais no contexto da

educação de nível médio no cenário brasileiro, principalmente o grau de

importância que os jovens estão dando às, relativamente, novas formas

de obtenção de conhecimento.

Para melhor embasarmos este trabalho, realizamos pesquisa

empírica com 117 alunos, concluintes do ensino médio no ano de 2010, de

escolas das redes pública e paricular de ensino. As perguntas visaram

descobrir de quais meios os alunos se utilizam para adquirir informações,

de que maneira as mídias sociais se configuram como ferramenta na

educação e como eles se relacionam com os professores nesse ambiente

virtual.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 4

Page 5: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

A Ágora Virtual

Para Andreas Kaplan e Michael Haenlein (2010):

“as mídias sociais são um grupo de aplicações para Internet construído com base nos fundamentos ideológicos e tecnológicos da Web 2.0, e que permitem a criação e troca de Conteúdo Gerado pelo Utilizador (UCG).” (KAPLAN e HAENLEIN: 2010, online)

Apesar de ser um relato verídico do significado de mídias sociais

atual, deve-se levar em consideração que as mídias sociais surgiram muito

antes das plataformas online que levam o crédito desta nomenclatura: os

blogs, as redes de relacionamento, os wikis, etc.

As mídias sociais, protagonistas da chamada web 2.0, são um termo,

na verdade, mais amplo e antigo do que comumente se assume. Embora

seja empregado hoje como um sinônimo de atualidade, sua história pode

remontar-se através das ágoras3, as praças públicas das antigas cidades

gregas. O importante dessa descrição é observar que as mídias sociais

não são um fenômeno moderno: foram (e ainda são) uma condição para a

coexistência humana.

Pode-se entender melhor o conceito de mídias sociais ao isolar-se as

duas palavras e analisar-nas separadamente: por mídia, compreende-se

aquilo que realiza a mediação, ou seja, que faz a ligação, ou comunicação,

entre duas entidades – também chamados seres – comunicacionais. Em

seu livro Understanding media, Marshall McLuhan (1995), entende que os

meios atuam como extensões do corpo humano, permitindo que seus

pensamentos e ações atinjam proporções maiores. É, portanto, mídia,

qualquer coisa que faça a mediação de uma troca de informações,

unilateral ou não, entre dois ou mais agentes.

3 As ágoras eram locais aonde a população grega costumava socializar-se com os demais habitantes da Pólis. De

maneira semelhante, pode-se utilizar como exemplo os mercados públicos ou os banhos romanos.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 5

Page 6: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

Completando a terminologia, por "social" entende-se o que é

relativo à sociedade, à comunhão de duas ou mais pessoas em um terreno

que permita sua proliferação ideal e física. Recorramos novamento ás

praças públicas, templos e bibliotecas que existem a milhares anos já

mediavam a comunicação da sociedade há muito tempo: o que há de

novo na moderna concepção de "mídia social"? A tecnologia. As ágoras

são, neste momento, virtuais (Lévy, 1998): os locais de troca de

informações estão desterritorializados. Não existe um aqui, agora,

definido em termos de fronteiras geográficas. O aqui, agora, pode ser em

qualquer lugar, a qualquer momento.

Essas ágoras virtuais são mais suscetíveis a uma forma de

comunicação do tipo molecular (Lévy, 1998). A comunicação molecular

contrapõe-se às formas de comunicação molares. Entende-se por formas

de comunicação molares aquelas que interpretam todos os receptores

como uma massa única, ou seja, os meios de comunicação de massas

(jornal, rádio, televisão). Os meios moleculares interpretam os receptores

individualmente, entendendo suas características próprias como seres

humanos.

Se, nas ágoras antigas, os seres humanos eram compreendidos

como indivíduos, graças a seus nomes, características físicas e

pensamentos distintos, hoje, nas ágoras virtuais, os usuários,

navegadores, surfistas da web, são tratados individualmente através de

seus avatares, perfis e endereços eletrônicos digitais. O meio digital

permite um alcance de nível global, mantendo, entretanto, as

características pessoais de um diálogo, ou melhor, de um multílogo (Lévy,

1998).

As mídias sociais podem ser compreendidas como espaços virtuais

onde a troca de informações é caracterizada de maneira não hierárquica.

Não existe um grande emissor que detém o poder das informações, nem

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 6

Page 7: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

existe um único meio de enviá-las. O repasse de informações ocorre de

forma igual para todos, de maneira colaborativa, onde o homem é emissor

e receptor ao mesmo. É a comunicação muitos-para-muitos.

O poder de disseminação das informações, entretanto, varia

consideravelmente de individuo para individuo. Deve-se atentar, portanto,

que o que está sendo democratizado com as mídias sociais são as

ferramentas. Quanto maior o prestígio do indivíduo, maior a sua

capacidade de atingir um grande público. Por outro lado, no cenário das

mídias sociais, o fator capital influencia cada vez menos no prestígio do

emissor, pois a ferramenta é igual tanto para o apresentador de TV, como

para o estudante de ensino médio.

É inegável, todavia, que o alcance de um apresentador seja maior

que o de um estudante. Isso ocorre pelo fato de que o apresentador

carrega consigo parte da sua aparição na TV para a web - fator este que

não é decisivo. O ciberespaço desenvolveu uma forma de pontuar as

personalidades da web de acordo com os seus feitos para a comunidade.

Essa pontuação é conhecida como whuffie, karma, ou ainda como mérito.

Qualquer que seja a forma pela qual atenda, essa pontuação

representa um capital social (Dias, 2009). Quanto mais ativo o usuário,

quanto mais contribuições, quanto maior os benefícios que trouxer para a

comunidade, maior seu capital social. Por este motivo, o apresentador de

tv, em caráter inicial, terá inegavelmente um alcance maior do que o do

estudante, mas apenas no começo de sua atividade. Se as contribuições

1 Tiago Alves Nogueira de SOUZA, BacharelandoUniversidade Federal de Alagoas (UFAL)Departamento de Comunicação [email protected]

2 Ana Célia da Rocha SANTOS, BacharelandoUniversidade Federal de Alagoas (UFAL)Departamento de Comunicação [email protected]

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 7

Page 8: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

do estudante forem maiores que as do apresentador na web, com o

desenrolar do tempo, a popularidade do desconhecido deverá ultrapassar

a do apresentador.

Porém, existem ressalvas: o capital social funcionará apenas, no

caso do estudante, em suas áreas de interesse. Este fenômeno ocorre

porque existe uma tendência na web de se aprofundar cada vez mais na

chamada cultura de nichos.

Na era das comunicações de massas, bastava participar ativamente

de transmissões midiáticas para que o agente se tornasse popular, uma

vez que existiam poucas formas de se conseguir conteúdo. A internet

propicia uma forma diferente de absorção de informações: a notícia não é

mais remetida em direção ao consumidor, o movimento se torna oposto –

é o consumidor quem busca as informações de interesse pessoal.

No ambiente virtual, o chamado navegador se apresenta ao usuário

essencialmente vazio, ou numa única página. O indivíduo é responsável

pelos passos seguintes. Dessa maneira, ele deverá primar pelas notícias

de seu interesse, encontrando, neste movimento, seus formadores de

opinião. Hoje, dentro de sua área de atuação, acredita-se um adolescente

pode ter o mesmo poder de influência que um apresentador de TV, ainda

que este seja um fenômeno, atualmente, pouco teorizado e que merece

maior atenção da comunidade científica.

É importante analisar que essas mudanças também se refletem no

dia-a-dia. Os extremistas estão equivocados: a internet não está ditando o

modo de agir dos usuários. Menos ainda, o modo de agir da sociedade

constrói o conteúdo da internet isoladamente. Existe um intercâmbio entre

os dois fatoers, as mudanças ocorrem em conjunto, uma vez que ambos

se configuram como seres midiáticos.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 8

Page 9: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

Ao observar-se, por exemplo, o estereótipo da “garota popular” das

escolas, pode-se notar algumas mudanças na juventude. Enquanto no

passado sua popularidade se limitava à escola onde estudava, ou à sua

rua, com as mídias sociais ela busca exercer sua influência até onde seus

próprios limites possibilitarem. Seu capital social é o número de amigos e

de pessoas que a conhecem. Existe uma necessidade real de aparecer

para um número cada vez maior de pessoas, que se reflete na web. Por

sua vez a web amplia seu mundo real, garantindo-lhe cada vez mais

possibilidade de interação em diversos locais. Para este grupo de pessoas,

a internet já não é mais uma questão de escolha, não existe distinção

entre o real e o virtual. A simbiose existe.

A inteligência coletiva brasileira

Quando se fala da internet brasileira, ela é automaticamente

associada ao bom humor e à hospitalidade inerente ao país. Embora falar

de tal maneira represente um estereótipo do povo brasileiro, é importante

observar que o “boom” da internet no Brasil coincidiu justamente com o

aparecimento da web 2.0 e das mídias sociais.

O Brasil entrou numa web bem diferente daquela que os países

desenvolvidos desembarcaram nos anos 90. Enquanto muitos dos usuários

desses países tiverem resistência às mídias sociais, os brasileiros as

abraçaram com força. Os blogs, apesar de não serem utilizados em larga

escala pelos brasileiros, representam uma força significativa. O serviço de

microblogging, entretanto, está surgindo como a mais nova sensação

brasileira: apesar do número de usuários no Brasil ser pequeno quando

comparado com países desenvolvidos, o número de brasileiros nestes

serviços é consideravelmente grande.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 9

Page 10: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

Dados levantados pela Com Score (2010) demonstram que o Brasil é

o país que mais utiliza, proporcionalmente, o Twitter no mundo. Se

considerar-se o volume total de visitas que o Twitter recebe, os Estados

Unidos indubtavelmente representam o maior índice, totalizando mais de

30% dos acessos do microblog no mundo. Entretanto, ao comparar-se o

número de acessos com o número de pessoas presentes na rede, os

Estados Unidos ficam com pouco mais de 12% dos acessos. O Brasil, por

outro lado, totaliza um quarto desta estatística.

Das várias mídias sociais que entraram para a agenda brasileira,

talvez a que mais tenha mudado e destruído paradigmas na educação

brasileira tenha sido a wiki. Esse sistema permite a criação de uma

coleção de documentos em hipertexto4 na web, de maneira colaborativa,

onde as pessoas podem criar, editar e excluir conteúdo.

Em nossa pesquisa, fica clara a presença desta ferramenta no dia-a-

dia do alunado brasileiro: questionados se já utilizaram alguma ferramenta

social do tipo wiki para procurar informações sobre seus estudos no

colégio, 96,49% dos alunos da rede privada responderam

afirmativamente, como pode ser conferido no quadro abaixo. Desse

percentual, 80,70% responderam que sempre utilizam wikis em seus

estudos. Na rede pública, o número é menor, mas bastante expressivo:

86,67% responderam que utilizam os wikis.

Quadro 1: Questionário

Rede da Escola

Você já utilizou alguma ferramenta social do tipo wiki (exemplo: Wikipédia) para procurar informações sobre seus

estudos no colégio?

Sim, sempreSim, mas com pouca

frequênciaNão, nunca

Pública 51,67% 35,00% 13,33%

4Texto em formato digital, onde outros conjuntos de informação como textos, palavras, imagens ou sons são agregados.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 10

Page 11: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

Privada 80,70% 15,79% 3,51%

Neste contexto, não pôde ser identificado qualquer mudança no

conteúdo da web ou como este se apresenta, porém é visível uma

mudança na estrutura de como as informações seriam compiladas, como

um grande documento que comtesse de todo o conhecimento humano.

Os filtros de que Pierre Lévy (1998) falava que seriam necessários

para encontrarmos a “agulha”, conhecimento, no “palheiro”, internet,

deixaram de ser utopia e hoje fazem parte do nosso dia-a-dia. Foram os

documentos compilados em wikis que permitiram a disseminação dos

conhecimentos para essa geração.

Por este motivo, entendemos a importância do incentivo por parte

dos professores, ao seu alunado, para que sejam desenvolvidos novos

tópicos e novas wikis em conjunto, fomentando a inteligência coletiva na

sala de aula. Outra ferramenta que se configura pertinente e útil neste

contexto são os hotsites5, em formato de wiki, onde os alunos construiriam

uma espécie de diário de classe, baseado no conhecimento e na pesquisa

de cada aluno individualmente que, ao agregar esses conhecimentos, se

resultasse num espaço, ou ciberespaço, do saber daquela determinada

classe.

A verdade é que muitos dos colaboradores dos projetos wikis entram

por vontade própria e aprendem praticamente sozinhos a editar e criar

conteúdo. Não existe uma alfabetização digital, muito menos uma

5 Também chamado Micro-site ou Mini-site: pequeno site planejado para apresentar e destacar uma ação ou conteúdo pontual

e específico.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 11

Page 12: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

alfabetização virtual, colaborativa, no ensino brasileiro. Neste sentido, os

cibercolaboradores se apresentam como autodidatas.

Pessoas autodidatas, em sua maioria, enfrentam alguma dificuldade

no início de seu processo de aprendizado. Para se tornar um bem-sucedido

autodidata, faz-se necessário uma grande carga de leitura e pesquisa

sobre o tema estudado, de forma a suprir-se a ausência de um professor

ou mestre, o qual traria a resposta de forma mais fácil e objetiva.

Entretanto, a internet, hoje, possui mecanismos para uma busca otimizada

das informações, através de filtros e classificações, facilitando o

autodidatismo no século XXI.

Considerando este novo contexto, não é surpreendente a resposta

do alunado à seguinte questão: “Quando você tem dúvidas sobre uma

determinada matéria, a qual desses meios você recorre? ”. Na rede

particular, 40,74% dos alunos recorrem à internet antes mesmo do

professor. Na rede pública, o número de alunos que recorrem primeiro à

internet ultrapassou o número de pessoas que recorrem aos livros, com

25% e 20%, respectivamente. Todavia, deve-se admitir que certas

especificidades técnicas e sócio-econômicas atribuem uma relevância

particular à informação dada pelo professor na rede pública de ensino.

Ainda que, no Brasil, existam ações como o Programa Banda Larga

nas Escolas, que atende atualmente a 47.204 instituições de ensino

públicas urbanas de todo o país, segundo a Anatel - cerca 72,75% dos

estabelecimentos municipais, estaduais e federais localizados em zona

urbana brasileira - a maneira como este acesso se dá ainda é voltada ao

entretenimento, visto que estes alunos não são orientados a utilizar a

internet de maneira construtiva: se deparam com a novidade, a enxurrada

de informações que lhes é oferecida – porém não conseguem filtrar

habilmente o que lhes seria pertinente.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 12

Page 13: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

Por um lado, dentre os alunos da rede particular de ensino, o

deslumbramento inicial com a Grande Rede já foi superado, estimulando

estes a apreender novas maneiras de se utilizar da ferramenta para a

busca de soluções visando a socialização de informações e do acesso,

bem como o oferecimento de serviços e de informações a partir dos

recursos já disponibilizados, e permitindo, desta maneira, a criação de

novas aplicações a partir das peculiaridades do novo veículo.

O aluno da rede pública, todavia, ainda se surpreende com a

imediaticidade na troca de informações, onde pessoas que nunca se

conheceram trocam e ampliam seus conhecimentos, contribuindo para

otimizar o acesso aos recursos da Rede.

Neste sentido, podemos identificar a seguinte situação: ainda

interligado mundialmente através da internet, o alunado brasileiro,

especialmente nas escolas da rede pública, continua o mesmo: a

inovação tecnológica com a massificação da internet não o levou a uma

mudança de paradigma ou comportamento, mas sim permitiu um novo

suporte para que as mesmas pessoas pudessem continuar se relacionando

através das mídias sociais.

Quadro 2: Questionário

Quando você tem dúvidas sobre uma determinada matéria, a qual desses meios você recorre?

Professor Colega Pai/Mãe Livros Internet

Privada 22,22% 24,07% 5,56% 7,41% 40,74%

Pública 35,59% 15,25% 3,39% 20,34% 25,42%

Estamos presenciando um aumento significativo no número de

autodidatas no mundo inteiro, ao mesmo passo em que o papel do

professor/mestre, no sentido clássico do professor como proprietário do

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 13

Page 14: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

saber, mas extramamente útil na acepção da palavra, diminui. A

desvalorização do professor, entretanto, não é um fenômeno recente,

advém de cada nova revolução do conhecimento.

McLuhan, ainda em 1964, advertia que o número de estudantes

desistentes tendia a crescer, devido à frustração em relação à sua

participação no processo de ensino. Um professor que não passa o

conteúdo corretamente a seus alunos estará fadado a ser substituído

pelos vários serviços que a internet dispõe. As mídias sociais estão tendo

um papel fundamental neste processo.

Deve-se entender, entretanto, a desvalorização do professor no

sentido de detentor do conhecimento: ele não pode competir em

conhecimento com as ferramentas que a internet dispõe 24 horas por dia,

atualizadas a cada segundo, seus e-books, vídeo aulas, blogs e

enciclopédias virtuais, por exemplo. A aula deixa de ser propriedade do

professor e passa a ser propriedade dos alunos, que podem alterar e

modificar os assuntos, sendo instigados a pesquisar e a criticar a matéria.

Esta concepção pode justificar a inquietação do aluno na sala de

aula tradicional, relatada por diversos professores durante nossas

entrevistas: o ambiente lhe é desfavorável. Todos são tratados

igualmente, como uma massa. A sala de aula tradicional é um ambiente

molar; a internet, molecular. Neste sentido, consideramos que o professor

deve adotar uma postura mais aberta aos questionamentos, instigar os

alunos à discussão, seja em plataformas reais, como grupos de discussão

em sala de aula, ou virtuais, em plataformas como o Formspring6, que

permite quês questionamentos sejam feitos, inclusive, anonimamente.

Mídias Sociais para Educação

6 Consiste num perfil pessoal onde usuários da web podem fazer e responder perguntas.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 14

Page 15: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

É sabido que o homem só consegue sobreviver em comunidade, mas

no passado as fronteiras geográficas castraram boa parte da sociabilidade

do homem: hoje não mais. As únicas fronteiras são a economia e a

educação. O homem não tem mais de desenvolver capacidades molares:

ele pode terceirizar as técnicas que não são de seu interesse ou que não

são da sua área - ao mesmo tempo em que, se lhe for de interesse

aprendê-las, assim o fará em pouquíssimo tempo graças ao conteúdo

online.

A abrangência que se procura hoje é a abrangência da percepção,

da visão, do saber se é possível, não a abrangência do conhecimento em

si. O homem deve estar ciente das possibilidades nas mais diversas áreas,

mas não precisa deter o conhecimento específico para si: a web fornece

essas ferramentas de terceirização. É observável que o que se procura em

um profissional, atualmente, é que ele detenha a especialização típica da

manufatura, mas que também tenha o conhecimento do produto por

inteiro, como o artesão. O artesanato digital funciona em regime de

colaboração em tempo real.

Praticar a colaboração online estimula os alunos, uma vez que eles

podem visualizar a construção do seu conhecimento a cada segundo. Em

nosso questionários, indagou-se, ainda, se, caso o professor estivesse

presente em alguma mídia social, o alunado utilisaria este meio para

sanar dúvidas e; segundo, se os alunos procurariam interagir com seus

colegas para discutir os assuntos das aulas nas mídias sociais.

Quadro 3: Questionário

Rede da Escola

Se o seu professor estivesse presente em alguma mídia social, você usaria este meio para tirar dúvidar e tentar compreender

melhor o assunto?

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 15

Page 16: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

Sim Não

Privada 70,18% 29,82%

Pública 85,00% 15,00%

Procuraria interagir com os colegas e discutir o rendimento das aulas?

Privada 85,00% 15,00%

Pública 81,13% 18,87%

Pode-se observar uma grande necessidade da presença dos

professores nas mídias sociais, especialmente nas redes públicas de

ensino, onde a formação dos alunos carentes demanda maior atenção,

tendo em vista as precárias estruturas que comumente acometem as

instituições.

Os alunos buscam significação naquilo que aprendem. Anseiam ver

uma aplicação prática dos seus estudos no dia-a-dia. Construir blogs,

responder comentários, até mesmo ensinar seus colegas torna-se uma

experiência prazerosa na busca pelo saber. Os termos “cola” e “cópia”

precisam ser reavaliados. Deve-se ensinar aos alunos, principalmente, as

habilidades de pesquisa, crítica e de ensino. Pode-se, por exemplo, criar

um hotsite de recuperação/revisão na web onde os próprios alunos sejam

instigados a responder às dúvidas e questionamentos dos colegas.

Configura-se numa pertinente sugestão, ainda, que o professor

empenhe-se em transformar a própria sala de aula numa mídia social,

num ambiente onde a comunicação se transforme numa ferramenta de

ensino, tal qual a ágora representou para a política da antiga Grécia, visto

que as mídias sociais já fazem parte do dia-a-dia do alunado, que está

acostumado a emitir opinião pública.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 16

Page 17: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

Estamos diante de uma nova geração, que não nasceu numa época

de privacidade e de poucas possibilidades de comunicação. O jovem atual

já nasceu num meio onde os celulares eram comuns e com internet banda

larga, e os efeitos possíveis deste fenômeno merecem ser estudados de

forma mais aprofundada. Mesmo nos locais mais pobres, existe a figura da

lan-house, que conecta os jovens à internet - e, em especial, às mídias

sociais virtuais.

Direcionar essas ferramentas, que hoje são usadas para o

entretenimento, ao conhecimento ainda é um desafio. Mas a chave não

está em retirar o entretenimento, mas em tornar a própria educação numa

atividade prazerosa. Os jogos sociais, por exemplos, tem se configurado

numa ferramenta valiosa para uma educação sadia.

Quando questionados sobre o uso das mídias sociais nos estudos do

colégio, as respostas foram muito semelhantes entre os alunos de ambas

as redes de ensino:

Quadro 4: Questionário

Você já utilizou alguma mídia social para procurar informações sobre seus estudos do Colégio?

Rede de Ensino

Sim, sempre

Sim, mas com pouca frequência

Não, nunca

Privada 36,84% 50,88% 12,28%

Pública 36,67% 51,67% 11,67%

Diante destes dados, compreendemos que os jovens devem ser

ensinados também em termos de colaboração. Muito se discute em

ferramentas colaborativas, em trabalhar em equipe, em liderança, porém

a forma de avaliação aplicada na maioria das escolas restringe o aluno ao

trabalho individual, a avaliações em que a consulta aos colegas é passível

de punição. Deve-se primar pelo estímulo à colaboração mútua, à

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 17

Page 18: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

participação, interação, em que ambas as partes contribuam de maneira

equilibrada.

O que esta pesquisa sugere, portanto, é que se encoraje os alunos

no sentido de trabalharem em grupo, onde, através da inteligência

coletiva, possam fazer uma atividade de qualidade muito superior à que

seria feita individualmente. As várias mentes devem trabalhar de maneira

tal que se configurem numa só, uma verdadeira inteligência coletiva,

através da colaboração real e virtual, tanto na sala de aula como no

ciberespaço.

Dá-se voz, desta maneira, a uma convergência. Permite-se uma

educação compatível com a realidade das mídias sociais. O novo cenário

já não é mais uma questão de escolha. Os efeitos da internet podem ser

sentidos em cada centímetro da sociedade, mas ainda há os que teimam

pela antiga sociedade da informação estática. O próprio mundo é o meio.

Os docentes estão em fase de atualização. Assim também está a

sociedade contemporânea. Independentemente do que o futuro reserve, o

fato é que a humanidade jamais viu avanços tecnológicos em tão alta

velocidade como a atual. Das duas uma: ou a forma de ensino dos dias de

hoje se obsoletiza, ou o professor. A escolha, mais uma vez, pertence a

todos, pois, na sociedade, tudo se cria a partir do coletivo.

Referências Bibliográficas

Dias, Cris. (2009), “Capital Social / Whuffie”, Em: Para Entender a

Internet, Organizado por: Juliano Spyer. Brasil: S.e., 1ª Edição.

Lévy, Pierre. (1998), A Inteligência Coletiva. São Paulo: Editora Loyola,

5ª Edição.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 18

Page 19: Mídias sociais na educação   inteligência coletiva entre docentes e discentes

Lévy, Pierre. (2000), Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 2ª Edição.

Lévy, Pierre. (1999), O que é o Virtual? São Paulo: Editora 34

Mcluhan, Marshall. (1995), Os Meios de Comunicação como Extensões

do Homem. São Paulo: Editora Cultrix, 10ª Edição.

Nielsen Wire. (2010). “Social Networks/Blogs Now Account for One in

Every Four and a Half Minutes Online”. Nielsen Wire. Acessado em

15 de Junho de 2010.

http://blog.nielsen.com/nielsenwire/online_mobile/social-media-

accounts-for-22-percent-of-time-online

S.a. (2010). “How The World Spends Its Time Online”. Visual

Economics. Acessado em 5 de julho de 2010:

http://visualeconomics.com/how-the-world-spends-its-time-online_2010-

06-16

S.a. (2009). “Internet Usage Statistics for the Americas”. Internet

World Stats. Acessado em 21 de Junho de 2010.

http://www.internetworldstats.com/stats2.htm

S.a. (2010). “Social Media”. Wikipedia. Acessado em 7 de julho de

2010: http://en.wikipedia.org/wiki/Social_media

Recuero, Raquel. (2008), Redes Sociais na Internet. Porto Alegre: Editora Sulina, 1ª

reimpressão.

Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação 19