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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ 6ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO E FUNDAÇÕES ____________________________________________________ 1 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4 EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ª SECRETARIA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU-Pr. “O ato de corrupção constitui um gesto de perversão da ética do poder e da ordem jurídica, cuja observância se impõe a todos os cidadãos desta República que não tolera o poder que corrompe nem admite o poder que se deixa corromper. Quem transgride tais mandamentos, não importando a sua posição estamental, se patrícios ou plebeus, governantes ou governados, expõe-se à severidade das leis penais e, por tais atos, o corruptor e o corrupto devem ser punidos, exemplarmente, na forma da lei” (Ministro Celso de Mello do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Processo nº 470 - Mensalão - Revista VEJA – edição 2290 de 10 de outubro de 2012, pág. 73). O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por seu Promotor de Justiça que ao final assina, no uso de suas atribuições junto à PROMOTORIA ESPECIAL DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO, com fulcro no artigo 129, inciso III, da Constituição Federal, artigo 25, inciso IV, letras "a" e "b", da Lei nº 8.625/93, artigos 1º e 5º, da Lei nº 7.347/85, e 17, da Lei nº 8.429/92, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

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6ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO E FUNDAÇÕES

____________________________________________________

1 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ____ª

SECRETARIA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE FOZ DO

IGUAÇU-Pr.

“O ato de corrupção constitui um gesto de perversão da

ética do poder e da ordem jurídica, cuja observância se

impõe a todos os cidadãos desta República que não tolera

o poder que corrompe nem admite o poder que se deixa

corromper. Quem transgride tais mandamentos, não

importando a sua posição estamental, se patrícios ou

plebeus, governantes ou governados, expõe-se à severidade

das leis penais e, por tais atos, o corruptor e o corrupto

devem ser punidos, exemplarmente, na forma da lei”

(Ministro Celso de Mello do Supremo Tribunal Federal no

julgamento do Processo nº 470 - Mensalão - Revista VEJA

– edição 2290 de 10 de outubro de 2012, pág. 73).

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO

DO PARANÁ, por seu Promotor de Justiça que ao final assina, no uso de suas

atribuições junto à PROMOTORIA ESPECIAL DE DEFESA DO

PATRIMÔNIO PÚBLICO, com fulcro no artigo 129, inciso III, da Constituição

Federal, artigo 25, inciso IV, letras "a" e "b", da Lei nº 8.625/93, artigos 1º e 5º,

da Lei nº 7.347/85, e 17, da Lei nº 8.429/92, vem, respeitosamente, perante

Vossa Excelência, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR ATO DE

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

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2 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

em face a:

NILTON APARECIDO BOBATO, brasileiro, casado, vereador, natural de

Panorama-SP, nascido aos 30/01/1967, filho de Vergílio Bobato e Ana

Conceição Bobato, inscrito no CPF/MF sob o nº 648.061.039-34, residente na Rua

Tamoios, nº 108, Jardim Tarobá, CEP 85856030, nesta cidade e Comarca de Foz

do Iguaçu-Pr;

MARIA JOSÉ DE SOUZA EL SAAD, brasileira, casada, ex-assessora

parlamentar, natural de Faxinal-Pr, nascida aos 24/06/1969, filha de Paulo

Caetano de Souza e de Sebastiana de Oliveira Rosa, portadora da Cédula de

Identidade R.G. nº 22.408.128-7 (SSPSP), e CPF/MF nº 120.757.468-69,

residente na Rua Bartolomeu de Gusmão, nº 766, apto 202, Bairro Centro, nesta

cidade e Comarca de Foz do Iguaçu-Pr; e

VALTAIR RODRIGUES DE PAULA, brasileiro, casado, ex-assessor

parlamentar, natural de Foz do Iguaçu-Pr, nascido aos 21/03/1966, filho de

Ederliria Rodrigues de Paula, portador da Cédula de Identidade R.G. nº

4.488.176-4 (SSPPR) e CPF/MF nº 648.154.049-68, residente na Rua Gávea, nº

1.756, Bairro Parque Morumbi IV, nesta cidade e Comarca de Foz do Iguaçu-Pr,

pelos fatos e fundamentos a seguir aduzidos:

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3 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

1. DOS FATOS:

A 6ª Promotoria de Justiça local instaurou o

Inquérito Civil Público nº MPPR 0053.12.000092-1 visando apurar suposto

descumprimento aos princípios da moralidade e proporcionalidade pela Câmara

Municipal de Foz do Iguaçu, uma vez que havia 75 (setenta e cinco) servidores

comissionados e apenas 32 (trinta e dois) concursados, caracterizando, assim,

prática de ato de improbidade administrativa.

Com isso, o Ministério Público propôs, em

fevereiro de 2012, a ação buscando obrigação de fazer, com pedido liminar, para

que a Câmara Municipal exonerasse tantos ocupantes de cargos comissionados

quanto bastassem para atender ao princípio da proporcionalidade e moralidade

administrativa, a fim de que o número de tais servidores não fosse superior ao de

providos por concurso público e também para se abstivessem de manter

funcionários nomeados em quantidade superior ao de efetivos.

Deste feito foram extraídas cópias integrais e

instaurados outros 16 (dezesseis) Inquéritos Civis Públicos (um para cada

vereador e outro para os servidores da direção da casa de leis), tudo com o

escopo de apurar a sobredita improbidade (possível excesso de cargos

comissionados na Câmara Municipal), bem como suposto desvio de função e/ou

servidores comissionados irregulares.

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4 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Com efeito, conforme declarações prestadas no

presente Inquérito Civil Público, verificou-se que LUCIANE DO PRADO

SANTOS, JAQUELINE MARTINS DE CASTRO, INÊS DE PAULA

PADILHA, MARIA JOSÉ DE SOUZA EL SAAD e VALTAIR

RODRIGUES DE PAULA foram nomeados para exercerem os cargos de

assessores parlamentares do gabinete do vereador NILTON APARECIDO

BOBATO, durante o seu mandato compreendido entre os anos de 2009 a 2012

(nomeações constantes no CD de fls. 32).

Contudo, da análise dos autos, em especial do

teor das oitivas, infere-se haver manifesto desvio de função por parte dos

assessores parlamentares MARIA JOSÉ DE SOUZA EL SAAD e VALTAIR

RODRIGUES DE PAULA, vez que não exerciam as atividades inerentes ao

cargo a que foram contratados.

A Resolução Legislativa nº 015, de

17/06/2003, que “dispõe sobre a organização administrativa da Câmara

Municipal de Foz do Iguaçu”, em seu artigo 9º, prevê que:

“Art. 9º. São atribuições do Assessor

Parlamentar:

I – prestar serviços ao vereador, em

atividades externas;

II – atender e prestar esclarecimentos a

pessoas que demandem ao gabinete;

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III – agendar compromissos do titular do

gabinete;

IV – elaborar e expedir as

correspondências do gabinete;

V – manter arquivo das correspondências

recebidas e expedidas pelo gabinete e de

outros documentos de interesse deste;

VI - efetuar o controle das pautas de

sessões e de proposições legislativas de

interesse do gabinete;

VII - assistir o titular do gabinete no

desempenho de suas atribuições;

VIII – organizar as reuniões promovidas

pelo gabinete, providenciando a pauta e os

convites aos participantes;

IX – executar outras tarefas determinadas

pelo titular do gabinete, inerentes as

atribuições deste”.

Em sede de depoimento (arquivo de áudio e

vídeo em CD-ROM anexo), MARIA JOSÉ DE SOUZA EL SAAD declarou

que era assessora parlamentar do vereador NILTON APARECIDO BOBATO

no período da legislatura 2009/2012 e que recebia R$ 5.100,00 (cinco mil e cem

reais) sem contar os descontos legais. Explanou que as funções inerentes ao

gabinete são divididas entre os assessores e que suas atividades estavam

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relacionadas à Mesa Diretora, assim como realizava visitas externas para atender

as demandas da comunidade.

Esclareceu que auxiliava o vereador em todos

os projetos, acompanhava a pauta, assistia às sessões, bem como visitava os

bairros e as secretarias de cultura e educação. Asseverou que nestas visitas colhia

reivindicações para posteriormente elaborar projetos de leis.

Declinou que o horário de trabalho era das

08hs00min às 14hs00min e no período vespertino efetuava atividades externas,

fazendo visitas e reuniões na comunidade.

À época da oitiva declinou: “a gente está

organizando a questão da legalização de alguns terrenos do Jardim Cláudia”,

(...) “a gente dá esse assessoramento entre Câmara e equipe técnica”,

“inclusive a gente visitou as famílias do Jardim Cláudia, para a gente montar

todo o ‘dossiê' da documentação para arrumar a ‘documentação’ daquela

área”. Ressaltou, por fim, que o projeto de regularização dos terrenos estava em

andamento há pelo menos dois anos.

Afirmou que realizava projetos de pesquisa

nos bairros da cidade. À título de exemplificação disse que caso visitasse uma

creche municipal e constatasse a falta de bebedouros, se reunia com o então

vereador para providenciar a confecção de um projeto de lei. Da mesma forma,

disse que se houvesse a solicitação de um redutor de velocidade, se dirigia ao

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local, tirava algumas fotos e analisava a real necessidade da instalação do

referido aparelho (fls. 07).

Em que pese declinar que permanecia no

gabinete no período matutino, contradizem suas alegações os depoimentos dos

demais assessores, os quais afirmaram que a ré não permanecia no gabinete, pois

exercia apenas atividades externas.

Ademais, não obstante tenha alegado que

fazia relatórios das visitas, inclusive tirava fotos dos locais, nada juntou aos

autos neste sentido.

VALTAIR RODRIGUES DE PAULA

também confirmou que era assessor parlamentar do vereador NILTON

APARECIDO BOBATO na legislatura 2009/2012, auferindo renda mensal de

R$ 4.200,00 (quatro mil e duzentos reais) líquidos.

Historiou que era responsável pelas atividades

institucionais e se dirigia à Câmara dos Vereadores para verificar quais eram as

demandas para posteriormente atendê-las.

Noticiou que verificava o andamento dos

processos juntos aos departamentos competentes, em atendimento às

determinações do vereador.

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Declarou que averiguava as reclamações dos

cidadãos e marcava as reuniões solicitadas pela comunidade. Afirmou que, à

época do depoimento, atendeu uma solicitação da associação de moradores do

bairro Jardim Copacabana, fornecendo barracas, iluminação pública e limpeza de

alguns terrenos para que fosse possível a realização de um evento.

Informou também que após às 14hs00min,

acompanhava o então vereador em reuniões, preparava a decoração do local

onde ocorriam os encontros (afixação de banners, instalação de som, etc.) e que

distribuía materiais de campanha eleitoral, assim como colocava adesivos nos

vidros dos veículos, tudo com finalidade eleitoreira.

Disse, ainda, que visitava com frequência a

secretaria de obras, por ser o local onde eram feitas as solicitações de

calçamentos, iluminação pública, retirada de árvores, etc. Ademais, ressaltou que

também ia ao FOZHABITA tentar regularizar alguns imóveis particulares

localizados no Jardim Cláudia.

Por fim, afirmou que, durante o exercido da

atividade de assessor parlamentar, desempenhou a função de vendedor

autônomo, operando no ramo de venda de colchões ortopédicos, cujas vendas

ocorriam no varejo e por catálogo.

Denota-se, assim, que conforme as

transcrições acima, os assessores parlamentares MARIA JOSÉ DE SOUZA EL

SAAD e VALTAIR RODRIGUES DE PAULA não desempenhavam as

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funções a eles inerentes, e sim, fazem assistencialismo ao vereador,

caracterizando uma evidente artimanha para promovê-lo politicamente.

Ressalta-se que a função de zelar pela

iluminação pública, fazer a limpeza de terrenos, instalar redutores de velocidade,

regularizar terrenos particulares, etc, não é típica do Poder Legislativo, mas sim

do Executivo.

Sendo o Prefeito a figura máxima do

Executivo no âmbito municipal, deve atender os anseios da população, reunindo-

se constantemente com a sociedade a fim de aferir as reivindicações coletivas.

Já o Poder Legislativo é responsável pela

elaboração e aprovação das leis. Além disso, tem como dever a fiscalização do

orçamento público e da administração do Poder Executivo.

Destarte, resta caracterizado o desvio de

função, id est, tudo acontecia com finalidade eleitoreira por parte de quem detém

o poder, ou seja, do Vereador NILTON APARECIDO BOBATO.

No tocante ao exercício de atividade

eleitoreira, depreende-se a ocorrência de tal irregularidade principalmente do

depoimento do assessor parlamentar VALTAIR RODRIGUES DE PAULA, o

qual afirmou que distribuía materiais de campanha do aludido vereador,

procedendo, inclusive, à colocação de adesivos nos veículos e ao fornecimento

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de barracas, concessão de iluminação pública e limpeza de terrenos para

realização de um evento em determinado bairro da cidade.

Imperioso mencionar o teor das declarações da

assessora parlamentar MARIA JOSÉ DE SOUZA AL SAAD no que atine ao

assistencialismo desempenhado, a qual informou que se dirige aos bairros para

averiguar e atender as demandas da população, alegando inclusive que era

responsável pela regularização de terrenos particulares no bairro Jardim Cláudia,

tudo com nítida estratégia eleitoreira.

O desvio de função é o desempenho pelo

funcionário público de serviços não inerentes ao cargo por ele ocupado.

Há dúvida, inclusive, se tais atividades foram

efetivamente prestadas pelos assessores parlamentares, tendo em vista a falta de

informações, freqüência e comprovação de eficiência em seu labor, já que suas

oitivas são confusas. Ademais, o labor não era realizado na Câmara Municipal,

mas sim nos bairros da cidade, o que, por certo, não é usual e causa estranheza.

Assim, é imperioso ressaltar que o trabalho

externo a ser desenvolvido por um assessor é mais do que fazer indicações nas

comunidades, devendo auxiliar o vereador no exercício das funções típicas do

Poder Legislativo.

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11 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Se assim fosse permitido, necessária a

autorização para contratação de 290 assessores nesta Comarca: um para cada

bairro do Município em tela.

Observa-se que as funções de assessor

parlamentar são por eles desempenhadas como cargos em comissão, de livre

nomeação e exoneração.

Há farta prova de que o então vereador,

desvirtuando a função pública dos cargos em comissão postos a sua disposição,

atribuiu aos seus ocupantes o exercício de atividades de natureza privada e em

proveito próprio, o que caracteriza, da mesma forma, ato ímprobo previsto no

artigo 9º, caput, e inciso IV, artigo 10, caput, e incisos I e XII, bem como artigo

11, caput, e inciso I, todos da Lei nº 8.429/92.

2. DOS FUNDAMENTOS:

2.1. DO DESVIO DE FINALIDADE:

A Carta Magna estabelece que os cargos em

comissão devem ser compatíveis com funções de confiança política para as quais

foram idealizadas. Infere-se desta assertiva que quando desprovidos destas

características configurar-se-á desvio de finalidade. Esta é a situação existente na

Câmara Municipal de Foz do Iguaçu-Pr.

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Leciona Celso Antônio Bandeira de Mello que

o desvio de poder se verifica:

“Quando o agente se serve de um ato para

satisfazer finalidade alheia à natureza do

ato utilizado. Há, em consequência, um

mau uso da competência que o agente

possui para praticar atos administrativos,

traduzida na busca de uma finalidade que

simplesmente não pode ser buscada ou,

quando possa, não pode sê-lo através do ato

utilizado1”.

A autoridade que pratica uma conduta com

objetivos diversos da lei está praticando ato de improbidade administrativa, vez

que o desvio de finalidade nada mais é do que simulação, tentativa de mascarar a

real intenção do administrador.

Ademais, preleciona a renomada doutrinadora

Maria Sylvia Zanella di Pietro2:

“O desvio de poder ocorre quando a

autoridade usa do poder discricionário

para atingir fim diferente daquele que a lei

1 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. 3. ed. São Paulo:

Malheiros, 1992. p. 126-127. 2 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 8. ed., São Paulo: Atlas, 1997. p. 211.

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fixou. Quando isso ocorre, fica o Poder

Judiciário autorizado a decretar a nulidade

do ato, já que a Administração fez uso

indevido da discricionariedade, ao desviar-

se dos fins de interesse público definidos na

lei”.

No presente caso, o Vereador NILTON

APARECIDO BOBATO se valeu de seus funcionários, remunerados pelo

Órgão Legislativo, utilizando-os em flagrante desvio de função, isto é, com fim

diverso daquele previsto no artigo 9º da Resolução Legislativa nº 15/2003, que

dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Foz do

Iguaçu, incidindo, desta forma, no tipo previsto no artigo 11º, caput, e inciso I,

da Lei de Improbidade Administrativa, conforme se verá adiante.

Neste diapasão, dispõe a doutrina3:

“(...) o desvio de poder é, por definição, um

limite à ação discricionária, um freio ao

transbordamento da competência legal

além de suas fronteiras, de modo a impedir

que a prática do ato administrativo,

calcada no poder de agir do agente, possa

dirigir-se à consecução de um fim de 3 SILVA, Jarly. O desvio de finalidade do administrador público sob a ótica dos princípios

constitucionais da impessoalidade e moralidade. Disponível em: <http://www.artigonal.com/direito-artigos/o-desvio-de-finalidade-do-administrador-publico-sob-a-otica-dos-principios-constitucionais-da-impessoalidade-e-moralidade-1602407.html>. Acesso em 05/12/2012.

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interesse privado, ou mesmo de outro fim

público estranho à previsão legal”.

A utilização de assessores parlamentares para

exercerem funções como “fazer visitas aos bairros”, “atender aos anseios da

comunidade”, “fazer campanha eleitoral”, “afixar adesivos em veículos” ou

“regularizar terrenos particulares” caracteriza, indiscutivelmente, desvio de

finalidade, à vista da ausência de adequação do fato ao seu fim legal.

Acrescenta, ainda, a sobredita lição:

“O poder foi conferido ao administrador

público para realizar determinado fim, por

determinados motivos e por determinados

meios, toda ação que se apartar dessa

conduta, contrariando o desejo da lei,

padece do vício de desvio de poder ou de

finalidade e, como todo ato abusivo ou

arbitrário, é ilegítimo.

(...)

O desvio de finalidade ou de poder é, assim,

a violação ideológica da lei, ou, por outras

palavras, a violação moral da lei,

colimando o administrador público fins não

requeridos pelo legislador, ou utilizando

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15 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

motivos e meios imorais para a prática de

um ato administrativo aparentemente legal.

O ato praticado com desvio de finalidade –

como todo ato ilícito ou imoral – ou é

consumado às escondidas ou se apresenta

disfarçado sob o capuz da legalidade e do

interesse público. Diante disto, há que ser

surpreendido e identificado por indícios e

circunstâncias que revelem a distorção do

fim legal, substituído habilidosamente por

um fim ilegal ou imoral não desejado pelo

legislador”.

Destaca-se que uma das formas previstas em lei

para punição do agente responsável por tais ilegalidades, objeto deste pedido, veio

regulamentada pela Lei nº 8.429/92, que complementou o artigo 37, § 4º, da

Constituição Federal, prevendo sanções de natureza não criminal para a prática de

atos de improbidade administrativa, divididos em três espécies, ou seja: os que

importam em enriquecimento ilícito (previstos no artigo 9º), os que causam lesão

ao erário (previstos no artigo 10) e os que atentam contra os princípios da

Administração Pública (previstos no artigo 11).

2.2. DOS ATOS QUE IMPORTEM EM ENRIQUECIMENTO ILÍCITO:

Reza o artigo 9º, caput, e seu inciso IV e XI,

da Lei nº 8.429/92:

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16 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

“Art. 9º: Constitui ato de improbidade

administrativa importando enriquecimento

ilícito auferir qualquer tipo de vantagem

patrimonial indevida em razão do exercício

de cargo, mandato, função, emprego ou

atividade nas entidades mencionadas no

artigo 1º desta lei, e notadamente:

(...).

IV - utilizar, em obra ou serviço particular,

veículos, máquinas, equipamentos ou

material de qualquer natureza, de

propriedade ou à disposição de qualquer das

entidades mencionadas no art. 1° desta lei,

bem como o trabalho de servidores públicos,

empregados ou terceiros contratados por

essas entidades;

XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu

patrimônio bens, rendas, verbas ou valores

integrantes do acervo patrimonial das

entidades mencionadas no art. 1° desta lei;”

Verifica-se que MARIA JOSÉ DE SOUZA

EL SAAD e VALTAIR RODRIGUES DE PAULA foram nomeados para os

cargos em comissão de assessores parlamentares, junto ao Gabinete do Vereador

NILTON APARECIDO BOBATO, sem que nunca tivessem exercido as

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17 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

funções relativas a esse cargo, sendo que os vencimentos foram utilizados em

proveito daqueles.

Com isso, os requeridos enriqueceram-se

ilicitamente, pois auferiram vantagem patrimonial indevida em razão do

mandato do Vereador NILTON APARECIDO BOBATO e dos cargos de

assessores parlamentares, consistente no desvio da remuneração paga pela

Câmara de Vereadores de Foz do Iguaçu-Pr para o (simulado) desempenho de

funções que deveriam ter sido realizadas pelos réus.

Ainda, ocorreu a incorporação ao patrimônio

dos requeridos de valores integrantes do acervo patrimonial da Câmara

Municipal. É que, como exaustivamente se afirmou, MARIA JOSÉ DE

SOUZA EL SAAD e VALTAIR RODRIGUES DE PAULA nunca

trabalharam efetivamente para as funções nas quais foram nomeados. E, em

tendo os réus se aproveitado de tal situação, vieram a incorporar, ilicitamente,

valores pertencentes à Casa de Leis local.

Os assessores réus receberam sem ‘trabalhar’,

enriqueceram ilicitamente à custa do erário e do suor do contribuinte, com

remunerações muito superiores à da maioria da população brasileira, que não

conta com o denominado "padrinho" ou "pistolão".

Assim sendo, os requeridos nunca

desempenharam as atribuições inerentes ao cargo para os quais foram nomeados,

aceitando participar de uma fraude contra a Administração Pública para atingir

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18 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

finalidades particulares, desrespeitando o artigo 15, da Lei nº 8.112/90, aplicado

analogicamente, in verbis: "efetivo desempenho das atribuições do cargo público

ou da função de confiança".

Destarte, ao fazerem promoção política para o

Vereador NILTON APARECIDO BOBATO, este também enriqueceu

ilicitamente, na medida em que deveria arcar com suas próprias despesas em

trabalhos políticos, e não utilizar os cargos públicos de assessores parlamentares

para esta função.

Trata-se de experiência corriqueira no Estado

brasileiro totalmente reprovável, tanto do ponto de vista da autoridade que

nomeia quanto da pessoa que aceita ser favorecido por tal ilicitude.

A conduta dos requeridos, logo, encontra plena

e perfeita caracterização nos termos do que dispõem o caput e os incisos IV e XI

do artigo 9º, da Lei de Improbidade Administrativa.

O enriquecimento ilícito dos réus ocasionou

notório prejuízo ao erário municipal, o qual desembolsou valores para o

pagamento de serviços inúteis, desempenhado pelos assessores do Gabinete do

ex-Vereador réu, não obstante a Câmara de Vereadores realizar o pagamento

desses comissionados.

A vantagem patrimonial obtida indevidamente

pelos requeridos e consequentemente o prejuízo da Casa de Leis local, segundo

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19 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Informação de Auditoria de fls. 34/40, foi de R$ 524.383,54 (quinhentos e vinte

e quatro mil, trezentos e oitenta e três reais e cinquenta e quatro centavos),

sendo: R$ 214.745,48 - MARIA JOSÉ DE SOUZA EL SAAD e R$

309.638,06 - VALTAIR RODRIGUES DE PAULA.

A evidente e reprovável conduta ilícita é

destacada nos seguintes julgados:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

CÂMARA MUNICIPAL. DESIGNAÇÃO

SIMULADA DE SERVIDORES. CARGOS

EM COMISSÃO. FALTA DE

PRESTAÇÃO REGULAR DE SERVIÇOS.

É procedente o pedido de ressarcimento,

formulado em ação civil pública, diante da

demonstração de que servidores

municipais, ocupantes, na época, de cargo

comissionado, não exerceram regularmente

suas funções. Nega-se provimento ao

agravo retido, rejeita-se a preliminar e

nega-se provimento aos recursos de

apelação” (TJMG, 4ª Câmara Cível, Apelação

nº 1.0035.00.003341-1/004, Relator DES.

ALMEIDA MELO, j. 06.09.2007, DJ

21.09.2007).

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20 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

“Constitucional/Administrativo Ação de

improbidade administrativa. Legitimação

ativa do Ministério Público e demais

condições acionárias presentes.

Cerceamento defensório inocorrente.

Empresa pública municipal - Contratação

de servidora sem a realização de concurso

público ou processo seletivo - Ausência de

efetivo exercício das funções respectivas,

apesar de assinado o ponto - Recebimento

dos salários - Infringência ao art. 37,

“caput” e inciso II, da CF -

Responsabilização de todos os envolvidos -

Penalidades bem impostas, incluso o

ressarcimento do erário - Procedência

parcial ampliada para total - Provimento

ao recurso ministerial e desprovimento dos

demais” (TJSP, 13ª Câmara de Direito

Público, Apelação com revisão nº

8944185100, Rel. Des. Ivan Sartori, j.

24.06.2009, DJ 18.08.2009).

Em razão disso, MARIA JOSÉ DE SOUZA

EL SAAD, VALTAIR RODRIGUES DE PAULA e NILTON APARECIDO

BOBATO ficam sujeitos às sanções previstas no artigo 12, inciso I, da referida

Lei nº 8.429/92.

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21 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

2.3. DOS ATOS CAUSADORES DE PREJUÍZO AO ERÁRIO:

A Lei nº 8.429/92 disciplina a repressão aos

atos de improbidade administrativa praticados por agentes públicos que

importam em enriquecimento ilícito, que causam prejuízo ao erário e que

atentam contra os princípios da administração pública, estabelecendo as sanções

aplicáveis aos seus autores, dentre elas, a de ressarcimento integral do dano.

O artigo 10º, caput, e incisos I e XII, do

aludido diploma legal prevê:

“Art. 10. Constitui ato de improbidade

administrativa que causa lesão ao erário

qualquer ação ou omissão, dolosa ou

culposa, que enseje perda patrimonial,

desvio, apropriação, malbaratamento ou

dilapidação dos bens ou haveres das

entidades referidas no art. 1º desta Lei, e

notadamente:

I - facilitar ou concorrer por qualquer

forma para a incorporação ao patrimônio

particular, de pessoa física ou jurídica, de

bens, rendas, verbas ou valores integrantes

do acervo patrimonial das entidades

mencionadas no art. 1º desta Lei;

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22 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

(...)

XII – permitir, facilitar ou concorrer para

que terceiro se enriqueça ilicitamente;”

Assim, pode-se dizer que, ao desempenharem

suas funções MARIA JOSÉ DE SOUZA EL SAAD e VALTAIR

RODRIGUES DE PAULA em flagrante ofensa a Lei de Improbidade

Administrativa, bem como à Carta Magna, o réu NILTON APARECIDO

BOBATO facilitou a incorporação de verba pública ao patrimônio destes, o que

resultou num enriquecimento ilícito, apesar da supracitada vedação legal.

Ora, se tais verbas legalmente não deveriam

ser suportadas pela Administração Pública, em razão das funções exercidas por

estes não serem as legalmente previstas (em flagrante desvio de finalidade),

referidos gastos configuram dano ao erário, gerando ao Poder Público o direito

de ser ressarcido do que ilicitamente pagou.

Desta forma, o requerido NILTON

APARECIDO BOBATO deu causa a pagamentos de verbas indevidas a tais

contratados, id est, o que representa perda patrimonial para a Administração

Pública (prejuízo aos cofres públicos) em razão deste possuir 02 (dois) dos 05

(cinco) assessores parlamentares que exercem diariamente funções de

assistencialismo no Município de Foz do Iguaçu, conforme declarações às fls.

06/10.

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23 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Não podem os contribuintes do Município de

Foz do Iguaçu arcar com este ônus, pois o povo não deve sustentar as

ilegalidades praticadas pelos seus governantes. Assim, como o requerido

NILTON APARECIDO BOBATO era o responsável pelas contratações ilegais

e pelos pagamentos das sobreditas verbas, bem como pelo prejuízo ao

patrimônio público do Município de Foz do Iguaçu, deve ele restituir o dano

causado ao erário.

Aliás, assim têm reconhecido a doutrina e a

jurisprudência:

"(...) o dinheiro público, exatamente por ser

res publica, há de ser gasto dentro da estrita

conformidade legal.

(...)

'Quem quer que utilize dinheiros públicos

terá de verificar seu bom e regular emprego,

na conformidade das leis, regulamentos e

normas emanadas das autoridades

administrativas competentes', ou seja: 'quem

gastar, tem de gastar de acordo com a lei'.

Isso quer dizer: quem gastar em desacordo

com a lei, há de fazê-lo por sua conta, risco e

perigos. Pois impugnada a despesa, a quantia

gasta irregularmente terá de retornar ao

Erário Público.

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24 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Não caberá a invocação, assaz de vezes

realizada, de enriquecimento ilícito da

Administração.

(...)

Se são 'nulos', ou, melhor expressão, 'não

convalidáveis', são retirados do mundo

jurídico, retroagindo os efeitos do

desfazimento ex tunc. Evidentemente, efeitos

padrônomicos ao ato, já acontecidos, não são

suscetíveis de eliminação. Daí por que os

terceiros de boa fé devem ser indenizados.

Entretanto, não bastará a invalidação

administrativa do ato, sem recomposição do

Erário, para se excluir a ação popular.

(...)

Demais disso, há que se enfatizar que,

suprimido do mundo jurídico o ato maculado

de ilegalidade, a conseqüência será a

reposição ao erário.

(...)

Aquele que praticou os atos terá agido por

sua conta, riscos e perigos4" (grifou-se e se

destacou).

“Como corretamente anotou o Min. Mílton

Pereira, ‘a escusar-se a responsabilidade do 4 FERRAZ, Sérgio e FIGUEIREDO, Lúcia Valle. op. cit. p. 93, 106-107.

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25 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

administrador público, pela salvaguarda de

que o empregado, em contraprestação,

prestou serviços, será construir um estranho

indene de impunidade em favor do agente

político que praticou ato manifestamente

contra a lei - nexo causal das obrigações da

relação de trabalho nascida de ato ilegal -

criando-se inusitada convalidação dos efeitos

de ato nulo. Será estimular o ímprobo a agir

porque, a final, aquela contraprestação o

resguardará contra ação de responsabilidade

civil.’

(...)

Está em questão um princípio: fazendo

tabula rasa da Constituição e da lei, pode o

administrador contratar impunemente, sem

concurso, ou em período defeso..., e ficar

tudo por isso mesmo? Pode cometer tais

ilegalidades gritantes e mandar a conta para

os cofres públicos? Pode ser a execução da

própria ilegalidade o bill de indenidade que

irá beneficiar o administrador ímprobo? Isto

é absurdo.

Se o administrador pudesse assim estar

garantido, poderia contratar impunemente

seus apaniguados para ardorosamente

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26 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

labutarem em sinecuras ou fazerem obras

que terceiros poderiam fazer melhor e mais

barato para a Fazenda5” (grifou-se e se

destacou).

É inquestionável que a contratação dos ditos

assessores para exercerem integralmente funções meramente assistenciais, em

desacordo com a legislação pertinente, importa em prejuízo ao erário, já que

qualquer diminuição do patrimônio público advinda de ato inválido caracteriza

dano e redunda no dever de ressarcir.

E é aí que se inclui o dever por parte do

requerido NILTON APARECIDO BOBATO em ressarcir a Administração

pelos prejuízos causados, consoante artigos 37, § 4º, da Constituição da

República e 4º e 5º da Lei Federal nº 8.429/92.

2.4. DA VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS QUE REGEM A

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:

A Constituição da República estabelece, em

seu artigo 37 que:

5 MAZZILLI, Hugo Nigro. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo. p. 161-162.

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27 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

“A administração pública direta, indireta

ou fundacional, de qualquer dos Poderes da

União, dos Estados, do Distrito Federal e

dos Municípios obedecerá aos princípios da

legalidade, impessoalidade, moralidade,

publicidade e eficiência e, também, ao

seguinte:”

Os princípios da legalidade, moralidade,

impessoalidade, publicidade e eficiência são as vigas mestras de orientação e

regulamentação da Atividade Administrativa em qualquer dos Poderes da

República.

Diógenes Gasparini, no que se refere ao

princípio da legalidade, leciona que:

“(...) a este princípio também se submete o

agente público. Com efeito, o agente da

Administração Pública está preso à lei e

qualquer desvio de suas imposições pode

nulificar o ato e tornar seu autor responsável

e, conforme o caso, disciplinar, civil e

criminalmente6”.

6 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 6.

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28 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Desta forma, cumpre asseverar que todo ato de

agente público deve ser realizado nos termos e limites da lei e da Constituição

Federal, pois ao administrador e à própria Administração somente é permitido

fazer o que a lei expressamente autorize.

De se registrar ainda que o princípio da

moralidade administrativa também restou lesado.

Ao tratar do tema, leciona a doutrina7:

“A moralidade administrativa é um

princípio informador da ação

administrativa, devendo se pautar na

consciência do administrador a vedação do

agir dissociado dos conceitos comuns,

ordinários, válidos, respeitando as

diferenças históricas do honesto e justo.

(...)

Tal princípio poderia ser identificado com

o da justiça, ao determinar que se trate a

outrem do mesmo modo que se apreciaria

ser tratado. O “outro”, aqui, é a sociedade

inteira, motivo pelo qual o princípio da

moralidade exige que, fundamentada e 7 SILVA, Jarly. O desvio de finalidade do administrador público sob a ótica dos princípios

constitucionais da impessoalidade e moralidade. Disponível em: ,http://www.artigonal.com/direito-artigos/o-desvio-de-finalidade-do-administrador-publico-sob-a-otica-dos-principios-constitucionais-da-impessoalidade-e-moralidade-1602407.html> Acesso em 05/12/2012.

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29 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

racionalmente, os atos, contratos e

procedimentos administrativos venham a

ser contemplados à luz da orientação

decisiva e substancial, que prescreve o

dever de a Administração Pública

observar, com pronunciado rigor e a maior

objetividade possível, os referenciais

valorativos basilares vigentes, cumprindo,

de maneira precípua até, proteger e

vivificar, exemplarmente, a lealdade e a

boa-fé para com a sociedade, bem como

travar o combate contra toda e qualquer

lesão moral provocada por ações públicas

destituídas de probidade e honradez”.

Ao agente público não basta agir

expressamente dentro da lei, exige-se que atue conforme a moralidade e

sentimento médio de justiça, de honestidade e de boa-fé. A contratação de 03

(três) assessores para funções meramente assistenciais é, inevitavelmente, ato

não apenas ilegal, mas ainda, absolutamente imoral.

O legislador ordinário seguiu o mesmo caminho,

ao estabelecer no artigo 4º da Lei nº 8.429/92, que os agentes públicos são

obrigados a velar pela estrita observância destes princípios.

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30 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Destarte, todo administrador público tem,

necessariamente, que ter sua conduta pautada pelo respeito a estes princípios,

deles não podendo se desviar, sob pena de anulação do ato cometido e de

punição pela prática de improbidade administrativa, conforme previsto no artigo

11, da Lei nº 8.429/92, que estabelece:

“Dos atos de improbidade administrativa

que atentam contra princípios da

administração pública:

Art. 11. Constitui ato de improbidade

administrativa que atenta contra qualquer

ação ou omissão que viole os deveres de

honestidade, imparcialidade, legalidade e

lealdade às instituições, e notadamente:”

No caso em exame, o requerido NILTON

APARECIDO BOBATO, no exercício do cargo de Vereador da Câmara

Municipal de Foz do Iguaçu, em razão de haver admitido e pago de forma

irregular duas pessoas no serviço público, ofendendo de morte a Lei de

Improbidade Administrativa, atentou contra os princípios da legalidade e

moralidade.

Ora, se houve inobservância da Constituição e

das leis nas nomeações e no exercício das funções, houve ilegalidade e, portanto,

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31 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

ofensa/atentado contra o princípio e o dever de legalidade, pois, como preleciona o

saudoso Hely Lopes Meirelles8:

"A legalidade, como princípio de

administração (CF, art. 37, caput, significa

que o administrador público está, em toda sua

atividade funcional, sujeito aos mandamentos

da lei e às exigências do bem-comum, e deles

não se pode afastar ou desviar, sob pena de

praticar ato inválido e expor-se à

responsabilidade disciplinar, civil e criminal,

conforme o caso.

A eficácia de toda atividade administrativa

está condicionada ao atendimento da lei.

Na Administração Pública não há liberdade

nem vontade pessoal. Enquanto na

administração particular é lícito fazer tudo

que a lei não proíbe, na Administração

Pública só é perimido fazer o que a lei

autoriza. A lei para o particular significa

‘pode fazer assim’; para o administrador

público significa ‘deve fazer assim’”.

8 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro 20. ed. São Paulo: Malheiros, 1995. p.

82/83.

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32 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Repise-se, NILTON APARECIDO

BOBATO não respeitou a Constituição e as leis, admitindo funcionários em

flagrante desvio de função, segundo seus critérios pessoais de escolha. Pior:

praticou atos vedados pela Constituição e pela legislação ordinária, ao nomear dois

assessores parlamentares para desempenharem funções distintas daquelas previstas

na legislação municipal.

Portanto, ofendendo-se o princípio e o dever de

legalidade, fica caracterizada a prática de ato de improbidade administrativa,

atentando contra os princípios da Administração Pública, previsto no artigo 11

da Lei nº 8.429/92.

2.5. DA EXIGÊNCIA DE DEDICAÇÃO EXCLUSIVA AO EXERCÍCIO

DE CARGO EM COMISSÃO:

Nesse instante, merece especial destaque a

condição que acompanha o exercício de cargo em comissão.

Preleciona o artigo 6º da Lei Complementar

Municipal nº 979, de 26 de janeiro de 2005:

"Art. 6º. O exercício de cargo em comissão

exigirá de seu ocupante integral dedicação". 9 Disponível em: http://www.leismunicipais.com.br/a2/pr/f/foz-do-iguacu/lei-complementar/2005/9/97/ lei-complementar-n-97-2005-dispoe-sobre-os-cargos-de-provimento-em-comissao-e-sobre-a-atribuicao-de-gratificacao-de-funcao-nos-orgaos-da-adminis-tracao-superior-e-centralizada-do-municipio-de-foz-do-iguacu-e-da-outras-providencias-2005-01-26.html (acesso em 26.06.2013).

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33 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Referida condição, ou exigência - como

elencou o legislador - impõe ao ocupante regime de integral dedicação ao cargo,

o que significa, em outras palavras, que não poderá desempenhar o ocupante

qualquer outra atividade além daquela prevista para o cargo exercido.

A atuação profissional do ex-assessor

VALTAIR RODRIGUES DE PAULA que, como declarou, além do exercício

do cargo em comissão, dedicava-se à atividade empresarial, atuando no ramo de

venda de colchões ortopédicos, constitui vítrea incompatibilidade com o

cumprimento das funções do cargo comissionado, por força do sobredito

imperativo legal.

Ressalta-se que referida profissão, de iniciativa

privada, exige também a dedicação integral à atividade desempenhada no

estabelecimento comercial, já que visa o sucesso financeiro.

Não bastasse a obscuridade com relação às

funções desempenhadas junto ao Gabinete do Vereador NILTON

APARECIDO BOBATO, no caso do ex-assessor VALTAIR RODRIGUES

DE PAULA, o descumprimento do regime de trabalho de dedicação exclusiva,

por si só, configura o ato ímprobo, destoante dos princípios da administração

pública.

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34 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

Cinge-se, ademais, à míngua de possível

referência à eventual (in)compatibilidade de horários: a proibição à realização de

outra atividade laboral é inquestionável, não havendo lacuna para a relativização

do adjetivo usado pelo legislador para expressar a intenção de que o ocupante do

cargo comissionado a ele deverá se dedicar totalmente, por inteiro.

Por oportuno, é necessário destacar que a

atividade profissional empreendida pelo ex-assessor VALTAIR RODRIGUES

DE PAULA não se enquadra nas exceções à regra de inacumulabilidade de

cargos e funções previstas na Constituição.

Ressalte-se, ainda, que a vedação à

acumulação de cargos ou à exigência de dedicação integral a função ocupada

justifica-se pela própria natureza do papel exercido: diz respeito à administração

e aos interesses da sociedade a ela vinculados. A execução das tarefas atribuídas

ao assessor parlamentar, portanto, deve ser traçada com exímio emprego do

tempo e esforço, e a execução simultânea de dois labores – sejam públicos ou

privados –, por óbvio, verifica-se prejudicial a este aspecto ideal.

3. DO PEDIDO:

Ante todo o exposto, o Ministério Público requer:

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ

6ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO E FUNDAÇÕES

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35 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

a) a notificação dos requeridos nos endereços supramencionados, para que,

querendo, apresentem manifestações nos termos do § 7º, do artigo 17, da Lei nº

8.429/92;

b) após as manifestações ou o decurso do prazo para apresentação das sobreditas,

seja recebida a petição inicial e determinadas as citações dos requeridos na

forma do § 9o, do precitado dispositivo legal, para, querendo, contestarem os

termos da presente, sob pena de revelia;

c) a notificação da Câmara de Foz do Iguaçu, na pessoa de seu Presidente, na

condição de pessoa jurídica interessada, para fins do artigo 17, § 3º, da Lei nº

8.429/92, isto é, para, caso queira, integrar a lide como litisconsorte ativo,

suprindo eventuais omissões e falhas contidas na inicial, bem como apresentar

provas de que disponham sobre os fatos;

d) o processamento da ação sob o rito ordinário, com as modificações

acrescentadas pela Lei de Improbidade;

e) a produção de todos os meios de prova em direito admitidos, em especial, o

depoimento pessoal dos réus, a juntada de novos documentos, a pericial e a

testemunhal, cujo rol será oportunamente apresentado;

f) a condenação dos requeridos nas sanções previstas no artigo 12, incisos I, II e

III, da Lei nº 8.429/92, em razão da prática autônoma de atos de improbidade

administrativa, que causou enriquecimento ilícito, prejuízo ao erário e ofensa aos

princípios informadores da Administração Pública;

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ

6ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO E FUNDAÇÕES

____________________________________________________

36 Inquérito Civil Público nº MPPR – 0053.12.000590-4

g) a condenação ao ressarcimento do valor de R$ 524.383,54 (quinhentos e vinte

e quatro mil, trezentos e oitenta e três reais e cinquenta e quatro centavos) pelos

requeridos;

Atribui-se à causa o valor de R$ 524.383,54

(quinhentos e vinte e quatro mil, trezentos e oitenta e três reais e cinquenta e

quatro centavos).

Termos em que se

Pede e espera deferimento.

Foz do Iguaçu, 02 de julho de 2013.

Marcos Cristiano Andrade

Promotor de Justiça

DOCUMENTOS ANEXOS:

Inquérito Civil Público nº MPPR 0053.12.000590-4 (01 volume).