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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA N.º 1129/2018 – LJ/PGR Sistema Único n.º 200204/2018 PET 7670 (CONTRARRAZÕES EM AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO NOS AUTOS DE MEDIDA CAUTELAR) RECORRENTE: Luiz Inácio Lula da Silva RECORRIDO: Ministério Público Federal RELATOR: Edson Fachin Excelentíssimo Senhor Ministro Edson Fachin, I – Resumo das contrarrazões: II – A decisão agravada não merece reforma - a presente medida cautelar não deve ser conhecida já que perdeu seu objeto. III – Ainda que conhecida, a presente medida cautelar deve ser re- jeitada pois o recurso extraordinário interposto pelo requerente é inadmissível e não ostenta plausibilidade jurídica. III.a Considerações gerais III.b Alegação de afronta aos artigos 5º, XXXVII e LIII, 93, IX e 109 da Constituição Federal (ofensa ao juiz natural). III.b.1 Violação reflexa à Constituição, que enseja análise fático probatório e não possui repercussão geral. III.b.2 A competência da 13 a Vara para processar e julgar a ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR se justifica pelo fato de que essa ação imputa a Luiz Inácio Lula da Silva o crime de corrupção passiva por ter recebido vanta- gem indevida em troca de manter em vigor o es- quema criminoso que vitimou a Petrobrás; tal vantagem foi debitada da conta corrente geral de propinas havida entre o Grupo OAS e agentes do PT, a qual era alimentada com va- lores oriundos de propinas vinculadas a contratos do grupo com a Petrobrás. III.c Alegação de afronta aos artigos 5º, XXXVII e 37, caput, 127, caput e 129, I da Constituição (violação às normas consti- tucionais que vedam juízo de exceção e definem as atribuições do Ministério Público) III.c.1 Violação reflexa à Constituição, que enseja análise fático-probatório e não possui repercussão geral. Gabinete da Procuradora-Geral da República Brasília/DF Documento assinado via Token digitalmente por PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA RAQUEL ELIAS FERREIRA DODGE, em 31/07/2018 15:45. Para verificar a assinatura acesse http://www.transparencia.mpf.mp.br/validacaodocumento. Chave D911223F.D8F072D9.A1E376B3.FBEF73FA

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

N.º 1129/2018 – LJ/PGR Sistema Único n.º 200204/2018

PET 7670 (CONTRARRAZÕES EM AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO NOS AUTOS DE MEDIDA CAUTELAR) RECORRENTE: Luiz Inácio Lula da SilvaRECORRIDO: Ministério Público FederalRELATOR: Edson Fachin

Excelentíssimo Senhor Ministro Edson Fachin,

I – Resumo das contrarrazões:

II – A decisão agravada não merece reforma - a presente medidacautelar não deve ser conhecida já que perdeu seu objeto.

III – Ainda que conhecida, a presente medida cautelar deve ser re-jeitada pois o recurso extraordinário interposto pelo requerente éinadmissível e não ostenta plausibilidade jurídica.

III.a Considerações gerais

III.b Alegação de afronta aos artigos 5º, XXXVII e LIII, 93, IXe 109 da Constituição Federal (ofensa ao juiz natural).

III.b.1 Violação reflexa à Constituição, que enseja análisefático probatório e não possui repercussão geral.

III.b.2 A competência da 13a Vara para processar e julgar aação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR se justificapelo fato de que essa ação imputa a Luiz Inácio Lula daSilva o crime de corrupção passiva por ter recebido vanta-gem indevida em troca de manter em vigor o es-quema criminoso que vitimou a Petrobrás; tal vantagem foidebitada da conta corrente geral de propinas havida entre oGrupo OAS e agentes do PT, a qual era alimentada com va-lores oriundos de propinas vinculadas a contratos do grupocom a Petrobrás.

III.c Alegação de afronta aos artigos 5º, XXXVII e 37, caput,127, caput e 129, I da Constituição (violação às normas consti-tucionais que vedam juízo de exceção e definem as atribuiçõesdo Ministério Público)

III.c.1 Violação reflexa à Constituição, que enseja análisefático-probatório e não possui repercussão geral.

Gabinete da Procuradora-Geral da RepúblicaBrasília/DF

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III.c.2 Suspeição do magistrado de primeiro grau já en-frentada e rejeitada pelo STF, no julgamento do agravo re-gimental n. 1097.947, sendo, portanto, matéria preclusa. Omesmo raciocício se aplica à alegação de suspeição dosmembros do MPF.

III.d. Alegação de afronta ao artigo 5º, LVII da Constituição(violação ao princípio constitucional da presunção de inocên-cia)

III.d.1Violação reflexa à Constituição, que enseja análisefático probatório e não possui repercussão geral.

III.d.2 A condução coercitiva de Luiz Inácio lula da Silva,assim como a divulgação de trechos de suas conversas tele-fônicas interceptadas, não configuraram tratá-lo como cul-pado antes da sua condenação. Ambas foram decretadaspor decisões judiciais devidamente motivadas, fundadas noentendimento do Juízo a quo de que: (a) a condução coer-citiva era necessária para neutralizar risco à própria integri-dade física do conduzido e para assegurar o resultado útildo processo; (b) deve ser dado publicidade a diálogos rele-vantes para a investigação, após o encerramento da diligên-cia – posição esta, aliás, defendida tradicionalmente peloJuízo a quo e também pelo MPF, que foi autor do pedidode resultou no levantamento do sigilo neste caso.

III.e Alegação de afronta aos artigos 5º, LV e LIV, e 93, IX daConstituição Federal (violação ao princípio da ampla defesa)

III.e.1Violação reflexa à Constituição, que enseja análisefático probatório e não possui repercussão geral

III.e.2 O requerente confunde “direito à ampla defesa”com “direito à defesa ilimitada”, exercida independente-mente de sua utilidade prática para o processo, em razão domero “querer” das partes. O juízo a quo, como destinatáriodas provas que era, indeferiu motivadamente aquelas cujaprodução reputou impertinente ou desnecessária, fazendo-onos estritos termos do art. 400, §1º do CPP.

III.f. Alegação de afronta aos artigos 5º, XXXIX e 93, IX daConstituição Federal (violação ao principio da legalidade)

III.f.1. Violação reflexa à Constituição, que enseja análisefático probatório e não possui repercussão geral

III.f.2

III.f.2.a O requerente enxerga atipicidade onde não há,já que, para “receber” vantagem indevida e, assim, pra-ticar o crime de corrupção passiva, nos termos do art.317 do CP, não é necessário que o corrupto tenha, for-malmente, a posse ou propriedade do bem o fato, sendoessas não raras vezes dissimuladas, como se dá no casodos autos. Há material probatório farto de que o GrupoOAS concedeu a Luiz Inácio Lula da Silva a posse e apropriedade de fato do apartamento 164-A, triplex, noCondomínio Solaris, Guarujá/RJ, bem como a respec-tiva reforma para adaptá-lo, somente não lhe tendotransferido o bem formalmente como um ardil voltadoa ocultar o crime de corrupção passiva anterior.

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III.f.2.b. O recebimento indevido, por Luiz Inácio Lulada Silva, de bem imóvel e de sua reforma se deu em re-tribuição a um conjunto de atos de ofício por ele prati-cados na então condição de Presidente da República,em especial a indicação e manutenção, em cargos de di-reção da Petrobrás, de pessoas comprometidas com atode corrupção.

III.f.2.c. Os atos de corrupção passiva praticados porLuiz Inácio Luiz Inácio Lula da Silva são distintos emesmo anteriores aos atos de lavagem por ele pratica-dos, não havendo que se falar em dupla punição pelomesmo fato.

III.g Afronta aos artigos 5º, XLV e XLVI, e 93, IX da CR (au-sência de individualização da pena).

III.g.1Violação reflexa à Constituição, que enseja análisefático-probatório e não possui repercussão geral

III.g.2 Diante de vetoriais consideradas negativas, a penadeverá se afastar mais ou menos do mínimo legal em dire-ção ao termo médio, prestigiando-se, assim, o princípio daindividualização da pena, exatamente tal qual feito peloacórdão condenatório.

IV – Conclusões: desprovimento do agravo regimental e da me-dida cautelar.

A Procuradora-Geral da República, vem apresentar contrarrazões ao agravo regi-

mental interposto contra a decisão, proferida pelo Ministro Relator, que julgou prejudicada

Medida Cautelar em que Luiz Inácio Lula da Silva pretendia atribuir efeito suspensivo ao

recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal, proferido nos

autos da apelação criminal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR.

I – Resumo Fático

Em 24 de janeiro de 2018, a 8a Turma do Tribunal Regional Federal da 4a Região

julgou as apelações interpostas nos autos da ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR,

pelos réus Luiz Inácio Lula da Silva, Agenor Franklin Magalhaes Medeiros, José Adelmário

Pinheiro Filho e Paulo Tarciso Okamotto, pelo Ministério Público Federal e pela PETRO-

BRÁS, contra a sentença proferida pelo Juízo Federal da 13a Vara Criminal da Seção Judiciá-

ria de Curitiba/PR, que, no que interessa à presente peça, condenou Luiz Inácio Lula da

Silva à pena privativa de liberdade de nove anos e seis meses de reclusão, bem como cento e

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oitenta e cinco dias-multa, calculados cada um à razão de cinco salários-mínimos vigentes ao

tempo do último ato criminoso (i) por um crime de corrupção passiva, nos termo do art. 317

do CP, com a causa de aumento do §1º do mesmo artigo, pelo recebimento de vantagem inde-

vida do Grupo OAS em decorrência do contrato do Consórcio CONEST/RNEST com a Pe-

trobrás e (ii) por um crime de lavagem de dinheiro, previsto no art. 1º, caput, inciso V, da Lei

n.º 9.613/1998, pela ocultação e dissimulação da titularidade de bem imóvel.

Como resultado do julgamento das apelações, o TRF-4 proferiu acórdão em que

condenou Luiz Inácio Lula da Silva à pena de 12 (doze) anos e 01 (um) mês de reclusão pe-

los crimes acima referidos.

Contra essa decisão, a defesa do ora requerente interpôs embargos declaratórios,

aos quais, em 26 de março de 2018, foi dado parcial provimento pela 8a Turma do TRF4, mas

sem efeitos infringentes. Novos embargos foram opostos por Luiz Inácio Lula da Silva, os

quais não foram conhecidos pela 8a Turma do TRF4.

Após interpor recursos especial e extraordinário contra o acórdão do TRF4, Luiz

Inácio Lula da Silva apresentou Medida Cautelar ao Presidente do Tribunal requerendo que

fosse atribuído efeito suspensivo aos mencionados recursos extremos, o que, todavia, foi in-

deferido em 4 de maio de 2018.

Em seguida, Luiz Inácio Lula da Silva ajuizou Medida Cautelar perante essa

Suprema Corte pedindo a concessão de efeito suspensivo ao recurso extraordinário interposto

contra acórdão condenatório proferido pelo TRF-4.

O requerente argumentou estarem presentes os requisitos do periculum in mora

(decorrente do eventual cumprimento provisório da condenação) e do fumus bonis iuris (pro-

babilidade de que seu recurso extraordinário seja acolhido pelo STF), já que sua condenação

apresentaria as seguintes máculas:

(i) Afronta aos artigos 5º, XXXVII e LIII, 93, IX e 109 da Constituição Fede-

ral. Alegou que a 13a Vara da SJ de Curitiba não seria o juízo natural para processar e julgar a

ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR, já que esta não teria fatos conexos ou conti-

nentes aos delitos relativos à Petrobrás. Sustentou verificar-se “a usurpação sistemática de

competência do Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR, pois, a cada nova fase da Opera-

ção Lava Jato, com a chancela do Tribunal Regional de Revisão e ignorando as regras cons-

titucionais, construiu artificialmente a prorrogação de sua competência com base em

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simulacro de conexão instrumental (...). Além disso, dado o reconhecimento da falta de cone-

xão com o amplo esquema de fraude às licitações deflagrado na Estatal, é materialmente in-

competente a Justiça Federal: as imputações deduzidas neste feito não integram as

atribuições previstas no artigo 109 da Constituição da República”.

(ii) Afronta ao artigo 5º, XXXVII da CR – Ainda o juízo de exceção: falta de

imparcialidade do magistrado. Alegou que o Juiz titular da 13a Vara da SJ de Curitiba teria

demonstrado envolvimento pessoal com a causa ao longo do seu processamento;

(iii) Afronta aos artigos 37, caput, 127, caput e 129, I da Constituição – Viola-

ção decorrente da atuação de Procuradores da República. Alegou que o requerente não

teria sido “tratado com a impessoalidade que se impunha aos membros do Ministério Pú-

blico; foi considerado inimigo, não em razão dos fatos típicos a ele efetivamente imputados,

mas por causa da convicção desses agentes institucionais, revelada ao público em atos de

intolerável fanfarrice”.

(iv) Afronta ao artigo 5º, LVII da CR - Violação ao princípio da não culpabi-

lidade. Luiz Inácio Lula da Silva alegou que, no curso do processo, as autoridades que o con-

duziram o teriam tratado como culpado antes mesmo de sua condenação; citou como

exemplo a condução coercitiva alegada ilegal, bem como a indevida autorização judicial para

divulgação de conversas telefônicas interceptadas em ramais usados pelo Requerente;

(v) Afronta aos artigos 5º, LV e LIV, e 93, IX da CR – Processo indevido e

ilegal: violação à ampla defesa. Alegou que, “Ao longo da instrução criminal, o Juiz (i)

cerceou a defesa do requerente ao indeferir a produção de provas; (ii) deferiu a produção de

prova documental sem conceder à defesa prazo razoável para análise; (iii) impediu arbitra-

riamente a gravação das audiências, garantia processual que integra o conceito de ampla

defesa; (iv) indeferiu, a seu talante, a inquirição das testemunhas a respeito de acordos de

colaboração premiada celebrados no exterior, autorizando que elas respondessem apenas o

que julgassem conveniente e permitindo que elas se negassem até a dizer se tais acordos res-

peitavam as balizas formais diplomáticas; (v) suprimiu a fase de diligências complementares

prevista no artigo 402 do Código de Processo Penal; e (vi), ao indeferir a juntada de docu-

mentos colhidos de ação penal supostamente conexa, promoveu prejuízo imensurável à de-

fesa, perpetuando a disparidade de armas entre esta e a acusação”.

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(vi) Afronta ao artigo 5º, XXXIX da Constituição Federal. Alegou violação ao

princípio da legalidade: o crime do “caso a caso”. Sustentou que o TRF4, ao confirmar a

condenação de Luiz Inácio Lula da Silva, teria conferido interpretação indevidamente ampla

ao crime de corrupção passiva previsto no art. 317 do CP, ferindo, com isso, o princípio cons-

titucional da legalidade;

(vii) Afronta aos artigos 5º, XXXIX e LVII, e 93, IX da CR – Corrupção vir-

tual: violação ao princípio da legalidade sob outro enfoque. Sustentou que tal violação te-

ria se dado pelos seguintes motivos: (a) a sentença e o acórdão condenaram o requerente por

ter recebido vantagem indevida - consistente em apartamento triplex, no condomínio Solaris,

Guarujá/RJ -, mas, ao mesmo tempo, reconheceram que tal imóvel não foi transferido para a

sua titularidade. Com isso, inovaram e “inventaram” um novo verbo para o tipo inscrito no

art. 317 do CP; (b) o requerente foi condenado por crime de corrupção passiva embora não

tenha sido comprovada a relação entre o suposto recebimento da vantagem e a prática, por

ele, de um ato de ofício pertencente a sua esfera de atribuições; (c) o crime de lavagem de di-

nheiro a que foi condenado o requerente constitui mero exaurimento de crime de corrupção

anterior, de modo a condenação por ambos os crimes consiste em indevido bis in

(viii) Afronta aos artigos 5º, XLV e XLVI, e 93, IX da CR – Individualização

da pena. Sustentou que, no julgamento da apelação, a pena-base da corrupção passiva teria

sido artificialmente majorada quase quatro vezes acima de mínimo legal, com a exclusiva fi-

nalidade de evitar a prescrição da pretensão acusatória. Alegou que“Aplicaram-se ao cálculo

várias vezes os mesmos elementos e circunstâncias, em flagrante bis in idem; além disso, a

Corte Regional decidiu exasperar a punição recorrendo ao retórico “contexto muito mais

amplo e, assim, de efeitos perversos e difusos”, quando, na verdade, deveria ater-se aos cri-

mes efetivamente imputados: um único ato de corrupção, e outro, de lavagem”.

Por fim, o requerente sustentou que o recurso extraordinário ao qual pretendia

fosse atribuído efeito suspensivo teria matéria de repercussão geral, na medida em que estaria

fundamentado em definição que transcende os seus interesses subjetivos.

Pediu, ao final, “o deferimento de efeito suspensivo ao recurso, aplicando-se o §

5º do art. 1.029, bem como o parágrafo único do art. 995, ambos do CPC, c.c. os artigos 294

e 300 do mesmo diploma processual, suspendendo-se, por consequência, os efeitos das de-

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cisões recorridas e inviabilizando a execução provisória da pena até o julgamento final do

caso pelo Supremo Tribunal”.

Em 22 de junho de 2018, a Vice Presidente do TRF4 inadmitiu o recurso extraor-

dinário interposto por Luiz Inácio Lula da Silva, por considerar que as alegações nele conti-

das, ora demandavam análise do arcabouço fático probatório, ora consistiam em violação

meramente reflexa à Constituição – ambos inviáveis em sede de recuso extraordinário.

Diante da decisão de inadmissão do recurso extraordinário pelo TRF4, o Ministro

Edson Fachin, no mesmo dia 22 de junho, proferiu decisão em que julgou prejudicada a refe-

rida Medida Cautelar.

Contra essa decisão, Luiz Inácio Lula da Silva interpôs o presente agravo regi-

mental, em que, após alegar ser possível ao STF a concessão de efeito suspensivo a recurso

extraordinário inadmitido pelo Tribunal de origem, pediu “a imediata RECONSIDERAÇÃO

da r. decisão para que o pedido cautelar de concessão de efeito suspensivo ao recurso extra-

ordinário interposto na Apelação Criminal nº 5046512-94.2016.4.04.7000/PR seja subme-

tido à e. Segunda Turma ainda na Sessão Extraordinária do dia 26.6.18 e, ao final, seja a ele

dado provimento. Caso assim não entenda V. Exa., pede-se a imediata submissão deste

agravo, bem como do pedido liminar formulado na medida cautelar, também na sessão de

amanhã, 26.6.18 da c. Segunda Turma do STF; última antecedente ao recesso forense”.

Logo em seguida, o Ministro Edson Fachin proferiu despacho em que não recon-

siderou a decisão agravada, submeteu o julgamento do agravo regimental ao Pleno do STF e

abriu vistas à PGR para manifestação.

Dessa forma, a Procuradora-Geral da República passa, a seguir, a expor as razões

pelas quais entende que o agravo regimental e o pedido cautelar manejados nos presentes au-

tos devem ser rejeitados.

II – A decisão agravada não merece reforma - a presente medida cautelar não deve serconhecida já que perdeu seu objeto.

Conforme acertadamente sustentou a decisão agravada, não seria viável con-

ferir-se efeito suspensivo a recurso extraordinário inadmitido pelo Tribunal de origem, tal

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qual se deu com o recurso extraordinário interposto por Luiz Inácio Lula da Silva, donde

decorre que a presente medida cautelar perdeu seu objeto.

Aliás, diante do juízo negativo de admissibilidade do mencionado RE, falece a

essa Suprema Corte competência para processar e julgar a pretensão de lhe conferir efeito

suspensivo. É que apenas com a admissão do recurso extraordinário é que se abriria a jurisdi-

ção do STF para conhecer dessa pretensão, nos termos do art. 1029-§5-inc. III do Código de

Processo Civil – aplicável ao processo penal por força do art. 3º do CPP12. Nesse sentido é a

jurisprudência do STF:

“Conforme já assentado na decisão recorrida, o ajuizamento perante esta Corte de açãocautelar para que se conceda efeito suspensivo a recurso extraordinário apenas é cabívelnos casos em que tal insurgência tenha tido juízo positivo de admissibilidade na ori-gem. In casu, não se verifica a ocorrência desse requisito, pelo que se mostra manifesta-mente incabível a presente ação. Incidem, portanto, as Súmulas 634 e 635 do STF, asquais assim dispõem: (...). (...) Outrossim, anoto que tal providência resta mantida tam-bém sob a vigência do CPC/2015, cujo art. 1.029, § 5º, I, prevê que 'O pedido de conces-são de efeito suspensivo a recurso extraordinário ou a recurso especial poderá serformulado por requerimento dirigido [...] ao tribunal superior respectivo, no períodocompreendido entre a publicação da decisão de admissão do recurso e sua distribuição,ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-lo'.” (AC 4204 AgR, Re-lator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgamento em 2.5.2017, DJe de 17.5.2017)

Sabe-se, é certo, que em situações excepcionais, o STF tem conhecido de medi-

das cautelares voltadas a conferir efeito suspensivo a recurso extraordinário inadmitido pelo

Tribunal a quo, quando, além de restar demonstrado estar-se diante de um evidente risco de

dano de difícil reparação, forem demonstradas a teratologia do acórdão impugnado, ou a

sua manifesta contrariedade à orientação jurisprudencial pacífica deste Tribunal Supe-

rior. Veja-se:

Questão de ordem em ação cautelar. Efeito suspensivo a recurso extraordinário não ad-mitido pelo tribunal de origem. Agravo de instrumento pendente de julgamento. Medida

1 (…).§ 5o O pedido de concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário ou a recurso especial poderá serformulado por requerimento dirigido:I – ao tribunal superior respectivo, no período compreendido entre a publicação da decisão de admissão dorecurso e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-lo;II - ao relator, se já distribuído o recurso;III – ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, no período compreendido entre ainterposição do recurso e a publicação da decisão de admissão do recurso, assim como no caso de orecurso ter sido sobrestado, nos termos do art. 1.037.2 Esse dispositivo legal inserto no novo Código de Processo Civil positivou o entendimento jurisprudêncialpacífico no STF e STJ e plasmado nas Sumulas 634 e 635 do STF no sentido de que apenas com a admissão dorecurso extremo junto ao Tribunal competente é que se inaugura a jurisdição das Cortes Superiores.

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cautelar concedida para suspender os efeitos do acórdão recorrido. Em situações excepci-onais, em que estão patentes a plausibilidade jurídica do pedido – decorrente do fato de adecisão recorrida contrariar jurisprudência ou súmula do STF – e o perigo de dano irre-parável ou de difícil reparação a ser consubstanciado pela execução do acórdão recor-rido, o Tribunal poderá deferir a medida cautelar ainda que o recurso extraordináriotenha sido objeto de juízo negativo de admissibilidade perante o tribunal de origem e oagravo de instrumento contra essa decisão ainda esteja pendente de julgamento. Hipóteseque não constitui exceção à aplicação das Súmulas 634 e 635/STF. Precedente:AC 1.550/ RO. Suspensão dos efeitos do acórdão impugnado pelo recurso extraordiná-rio, até que o agravo de instrumento seja julgado. Liminar referendada em questão de or-dem. Unânime. [AC 1.770 QO, rel. min. Gilmar Mendes, j. 18-9-2007, 2ª T, DJ de 19-10-2007.]

Entretanto, não há, sob qualquer aspecto, como qualificar de teratológicas, ou

manifestamente contrárias à jurisprudência do STF, a sentença e o acórdão unânime do TRF-

4, que condenaram Luiz Inácio Lula da Silva, pois está-se diante de duas decisões judiciais,

inclusive uma tomada à unanimidade por órgão jurisdicional colegiado, que, tendo a seu dis-

por uma ampla gama de material probatório produzido ao longo da investigação e instrução

judicial, entenderam estar presentes provas robustas de que Luiz Inácio Lula da Silva prati-

cou crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Ainda que se possa, no plano das ideias, discordar-se das razões subjacentes a

cada uma dessas decisões, não há como dizer que elas são teratológicas, a permitir a supera-

ção do que prevê o art. 1029-§5-inc. III do CPC, com o consequente conhecimento e deferi-

mento, pelo STF, de medida cautelar voltada a conferir efeito suspensivo a recurso

extraordinário inadmitido na origem. Tais razões tampouco contrariam a jurisprudência dos

Tribunais Superiores.

Aqui, e para finalizar, registre-se que a superação indiscriminada e injustificada

do teor do art. 1029-§5-inc. III do CPC, implica “precipitar o pronunciamento da instância

ad quem, subvertendo o regular compasso procedimental, bem como a ordem sistêmica

predisposta no cipoal normativo, sendo essa a exegese que se pode extrair da súmula 634

do c. Supremo Tribunal Federal3”.

Justamente a fim de se evitar que tal subversão ocorra, a possibilidade de o STF

apreciar pedido de efeito suspensivo relativo a recurso extraordinário inadmitido na origem

deve estar reservada a situações excepcionalíssimas, em que se esteja diante de acórdão con-

3 Trecho da decisão proferida em 11 de junho de 2018 pelo Ministro Felix Fisher ao apreciar pedido de tutelaprovisória ajuizado no STJ por Luiz Inácio Lula da Silva, visando a atribuição de efeito suspensivo a RecursoEspecial por ele interposto contra o acórdão condenatório do TRF4 (o mesmo cujos efeitos o requerentepretende sejam sobrestado na presente medida cautelar).

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denatório evidentemente teratológico, ou afrontoso à jurisprudência do STF, o que não acon-

tece no presente caso.

III – Ainda que conhecida, a presente medida cautelar deve ser rejeitada pois o recursoextraordinário interposto pelo requerente é inadmissível e não ostenta plausibilidade

jurídica.

III.a. Considerações gerais

Ainda que conhecida – em razão do provimento do agravo regimental contra a

decisão que a inadmitiu -, a presente medida cautelar deve ser rejeitada. É que ela pretende a

atribuição de efeito suspensivo a recurso extraordinário que não apresenta chances de êxito,

quer por ser inadmissível, quer por ser improcedente.

Com efeito, embora o recurso extraordinário não tenha eficácia suspensiva ex

lege4– donde decorre que o acórdão recorrido produz efeitos desde a sua publicação - , a ju-

risprudência dos Tribunais pátrios, ancorada nos artigos 1029 e 995-parágrafo único do CPC,

tem admitido a sua atribuição por decisão judicial do Tribunal recorrido ou dos Tribunal Su-

periores sempre que, cumulativamente5:

(i) o recurso extraordinário for admissível (ou seja, viável juridicamente pela pre-

sença dos seus pressupostos extrínsecos e intrínsecos);

4 Conforme se extrai do art. 995 do CPC.5 Confira-se: Pedido de concessão de efeito suspensivo e o sobrestamento, na origem, em face do

reconhecimento de repercussão geral pelo STF. Arts. 543-B, § 1º, do CPC, e 328-A, do RISTF. SúmulasSTF 634 e 635. Jurisdição cautelar que deve ser prestada pelos tribunais e turmas recursais a quo, inclusivequanto aos recursos admitidos, porém sobrestados na origem. Para a concessão do excepcional efeitosuspensivo a recurso extraordinário, é necessário o juízo positivo de sua admissibilidade no tribunalde origem, a sua viabilidade processual pela presença dos pressupostos extrínsecos e intrínsecos, aplausibilidade jurídica da pretensão de direito material nele deduzida e a comprovação da urgênciada pretensão cautelar (...). Para os recursos anteriores à aplicação do regime da repercussão geral ou paraaqueles que tratem de matéria cuja repercussão geral ainda não foi examinada, a jurisdição cautelar desteSupremo Tribunal somente estará firmada com a admissão do recurso extraordinário ou, em caso de juízonegativo de admissibilidade, com o provimento do agravo de instrumento, não sendo suficiente a suasimples interposição (...). Compete ao tribunal de origem apreciar ações cautelares, ainda que o recursoextraordinário já tenha obtido o primeiro juízo positivo de admissibilidade, quando o apelo extremo estiversobrestado em face do reconhecimento da existência de repercussão geral da matéria constitucional neletratada. Questão de ordem resolvida com a declaração da incompetência desta Suprema Corte para aapreciação da ação cautelar que busca a concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário sobrestadona origem, em face do reconhecimento da existência da repercussão geral da questão constitucional nelediscutida. [AC 2.177 MC-QO, rel. min. Ellen Gracie, j. 12-11-2008, P, DJE de 20-2-2009.]

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(ii) os fundamentos de mérito dele constantes forem plausíveis a indicar a proba-

bilidade do seu acolhimento;

(iii) o cumprimento provisório do acórdão recorrido puder causar dano irrepará-

vel, ou de difícil reparação6 (periculum in mora).

No presente caso, admite-se haver um dos requisitos necessários à concessão do

efeito suspensivo pleiteado na medida cautelar em comento, a saber, o periculum in mora.

É que o perigo de dano irreparável pode ser considerado implícito diante do fato

de que o imediato cumprimento do acórdão do TRF4 conduzirá à manutenção do encarcera-

mento provisório de Luiz Inácio Lula da Silva7.

Por outro lado, não estão presentes os outros dois requisitos necessários à conces-

são de efeito suspensivo pleiteado por Luiz Inácio Lula da Silva, já que, conforme restará

demonstrado adiante, o recurso extraordinário por ele interposto não preenche condições mí-

nimas de admissibilidade e, além disso, está fundado em argumentos que não apresentam

plausibilidade jurídica.

Com efeito, pelo o que se infere dos termos da medida cautelar ajuizada por Luiz

Inácio Lula da Silva, o recurso extraordinário a que se pretende atribuir efeito suspensivo

foi interposto com base no art. 102-inc. III-“a” da CF/88, sob a alegação de que o acórdão

condenatório do TRF violou diversos dispositivos constitucionais (p. ex., os que plasmam di-

versos princípios insculpidos no art. 5º da CF/88).

Entretanto, a simples leitura das razões postas na medida cautelar ora em co-

mento demonstra que o mencionado recurso extraordinário, sob o pretexto de que o acórdão

do TRF4 recorrido violou normas da CF/88, funda-se, em grande parte, em supostas viola-

ções a normas infraconstitucionais, sendo a violação à Constituição, quando muito, mera-

mente reflexa.

Assim, como o recurso extraordinário em foco traz violações meramente reflexas

ou indiretas à Constituição, impõe-se a sua inadmissão, na esteira da jurisprudência pacífica

do STF8, ou, se for o caso, a sua conversão em recurso especial, tal qual autoriza o art. 1033

6 Pedido de Tutela Provisória nº 001350, Relator Ministro Herman Benjamin, publicado em 06/10/2017.

7 Vale lembrar, aqui, a execução provisória da pena imposta ao ora requerente, decorrente justamente, dacircunstância de que o ornamento jurídico brasileiro não confere eficácia suspensiva aos recursos extremos (REe RESP), foi recentemente tida por constitucional pelo Pleno do STF, quando do julgamento do HC n. 152752.

8 Nesse sentido: "Embargos de declaração no recurso extraordinário com agravo. Conversão dos embargos

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do CPC, segundo o qual “se o Supremo Tribunal Federal considerar como reflexa a ofensa à

Constituição afirmada no recurso extraordinário, por pressupor a revisão da interpretação

de lei federal ou de tratado, remetê-lo-á ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento

como recurso especial”.

Além disso, parte das supostas violações à Constituição trazidas pelo recurso ex-

traordinário interposto pelo requerente reflete, em verdade, o seu inconformismo com a aná-

lise feita pelo Juízo sentenciante e pelo TRF4 a respeito do acervo probatório constante dos

autos da ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR. E, em razão desse inconformismo,

pretende o requerente que o STF, no bojo do recurso extraordinário em foco, reexamine pro-

vas e fatos, o que, a toda evidencia, e nos termos da Súmula 279 do STF9, é incabível;

lembre-se que a lógica subjacente à sistemática dos recursos excepcionais impõe que o

exame levado a efeito pelos Tribunais Superiores fique adstrito às questões de direito, já que

os temas de índole fático probatória exaurem-se com o julgamento nas vias ordinárias.

Além de inadmissível pelos dois motivos acima referidos10, o recurso extraordiná-

rio interposto por Luiz Inácio Lula da Silva deve ser inadmitido, ainda, por lhe faltar reper-

cussão geral – erigida à requisito de admissibilidade recursal pelo art. 102, §3º da CF/88,

seguido pelo art. 1035 do CPC11.

declaratórios em agravo regimental. Direito administrativo. Concurso público. Reserva de vagas parapessoas com deficiência. Surdez unilateral. Deficiência auditiva. Não caracterização. Princípios dalegalidade, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Ofensa reflexa. Fatos e provas.Reexame. Legislação infraconstitucional. Análise. Impossibilidade. Precedentes. 1. Embargos de declaraçãorecebidos como agravo regimental. 2. A afronta aos princípios da legalidade, do devido processo legal, daampla defesa ou do contraditório, dos limites da coisa julgada ou da prestação jurisdicional, quandodepende, para ser reconhecida como tal, da análise de normas infraconstitucionais, configura apenas ofensaindireta ou reflexa à Constituição Federal. 3. Esse entendimento foi reafirmado no julgamento do ARE nº748.371/MT, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJe de 1º/8/13, sob o rito da repercussão geral. 4.Inviável, em recurso extraordinário, o reexame dos fatos e das provas dos autos e a análise da legislaçãoinfraconstitucional de regência. Incidência das Súmulas nºs 279 e 636/STF. 5. Agravo regimental nãoprovido. (...) Verifica-se do excerto transcrito que o Tribunal de origem concluiu, com base nos fatos e nasprovas dos autos, bem como na legislação infraconstitucional de regência, pela impossibilidade de oagravante concorrer às vagas destinadas às pessoas com deficiência, porquanto a surdez unilateral não seenquadraria no conceito de deficiência auditiva prescrito no art. 4º, inciso II, do Decreto nº 3.298/99. Assim,para divergir desse entendimento, seria necessário reexaminar o conjunto fático-probatório dos autos eanalisar a legislação infraconstitucional pertinente, para o que não se presta o recurso extraordinário.Incidência das Súmulas nºs 279 e 636/STF." (ARE 889316 ED, Relator Ministro Dias Toffoli, SegundaTurma, julgamento em 30.6.2015, DJe de 21.8.2015)

9 Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário.

10 Ausentes os requisitos de admissibilidade do recurso extraordinário, (...) caberá ao relator negar-lheseguimento, com evidente prejuízo da existência de repercussão geral, nos termos do art. 323 do RISTF c/cart. 557 do CPC, pois a repercussão geral é qualidade só concebível em recurso a que não falte condição préviade admissibilidade. [RE 577.838 AgR, voto do rel. min. Cezar Peluso, j. 8-9-2009, 2ª T, DJE de 9-10-2009.] 11 Art. 1.035. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinárioquando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral, nos termos deste artigo.

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Segundo tais dispositivos, apenas aqueles recursos extraordinários que tratem de

questões constitucionais relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico,

que ultrapassem os interesses subjetivos da causa, vão à apreciação da Suprema Corte, dando

origem a precedentes que resolvem questões jurídicas em tese.

Ocorre que as irresignações trazidas por Luiz Inácio Lula da Silva em seu re-

curso extremo não apresentam relevância capaz de transcender os interesses subjetivos do re-

corrente e afetar inúmeras outras pessoas que estejam em situação semelhante. Tampouco tal

recurso traz questões cuja resolução dependa da análise do direito em tese e não de fatos es-

tritamente relacionados à causa concreta ora posta à apreciação judicial. Trata-se, em ver-

dade, de recurso que versa sobre questões afetas unicamente à situação processual do ora

requerente, e isso ficará ainda mais claro no tópico seguinte desta peça.

Percebe-se, portanto, que o recurso extraordinário interposto por Luiz Inácio

Lula da Silva é inadmissível, o que, por si só, e na esteira da jurisprudência do STF, conduz

ao indeferimento do pedido de efeito suspensivo formulado nestes autos, por lhe faltar um

dos requisitos.

Além disso, ainda que, em tese, o recurso extraordinário em tela fosse conhecido

por essa Suprema Corte, ele está fundado em argumentos que não apresentam plausibilidade

jurídica, não apresentando viabilidade de êxito. Também por isso, deve ser indeferido o pe-

dido de efeito suspensivo apresentado pelo requerente.

Passa-se, a seguir, a enfrentar pormenorizadamente cada uma das alegações re-

cursais deduzidas por Luiz Inácio Lula da Silva, demonstrando-se, de modo sucessivo (i)

que elas não são passíveis de serem analisadas em sede de julgamento de recurso extraordi-

nário (o que conduz à inadmissibilidade deste), (ii) e, em seguida, que não apresentam plausi-

bilidade jurídica (o que conduz à improcedência do recurso).

§ 1oPara efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou não de questões relevantes do ponto devista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo.§ 2o O recorrente deverá demonstrar a existência de repercussão geral para apreciação exclusiva pelo SupremoTribunal Federal.§ 3o Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar acórdão que:I - contrarie súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal;II – revogado.III - tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da ConstituiçãoFederal.

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III.b. Alegação de afronta aos artigos 5º, XXXVII e LIII, 93, IX e 109 da Constituição Federal (ofensa ao juiz natural)

III.b.1.

Luiz Inácio Lula da Silva inicia argumentando que a sentença e o acórdão con-

denatórios (i) teriam violado o princípio constitucional do Juiz natural porque estariam igno-

rando que a 13a Vara Federal da Seção Judiciária de Curitiba não seria competente para

processar e julgar a ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR, já que esta não traria fatos

conexos ou continentes aos delitos relativos à Petrobrás – únicos que, segundo decidido reite-

ramente pelo STF, justificariam a competência daquele Juízo; (ii) e o art. 109 da CF/88, pois

as imputações feitas na ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR não se inseririam no rol

constitucional de competências da Justiça Federal.

Primeiramente, registre-se que alegação de violação ao princípio do Juiz natural e

às regras constitucionais de competência é incabível em sede de recurso extraordinário, por

refletir, na verdade, violação meramente reflexa à Constituição – aqui, a violação direta, caso

ocorresse, seria a dispositivos da legislação infraconstitucional (por exemplo, aos artigos 69 e

70, 76, 77 e 78 do CPP).

Ademais, a análise dessas alegações demandaria o revolvimento do conjunto fá-

tico-probatório subjacente aos autos, o que também não é cabível nessa sede recursal extraor-

dinária (súmula n. 279 do STF).

O STF, em situações semelhantes, tem negado seguimento a recursos extraordiná-

rios fundados em violação ao princípio do juiz natural:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÕES CIVIS PÚBLICAS.IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. "OPERAÇÃO LAVA JATO". DISTRIBUIÇÃOPOR PREVENÇÃO. CONTROVÉRSIA DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIONAL. IN-CURSIONAMENTO NO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. RE-CURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.INCIDENTE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOSADVOCATÍCIOS NO JUÍZO RECORRIDO. IMPOSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃODE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NESTA SEDE RECURSAL. ARTIGO 85, § 11,DO CPC/2015. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA SEGUI-MENTO. (RE 1046857/PR, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 05/06/2017).

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÕES CIVIS PÚBLICAS.IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. "OPERAÇÃO LAVA JATO". DISTRIBUIÇÃO

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POR PREVENÇÃO. CONTROVÉRSIA DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIONAL. IN-CURSIONAMENTO NO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. RE-CURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.INCIDENTE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOSADVOCATÍCIOS NO JUÍZO RECORRIDO. IMPOSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃODE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NESTA SEDE RECURSAL. ARTIGO 85, § 11,DO CPC/2015. RECURSO DESPROVIDO. (RE 1046885/PR, Rel. Min. Luiz Fux, DJ06/02/2018).

Também falece a tais alegações a repercussão geral necessária ao conhecimento

do recurso extraordinário nesse ponto: ora, definir se a ação penal n. 5046512-

94.2016.4.04.7000/PR seria, ou não, de competência da 13a Vara da SJ de Curitiba e da Jus-

tiça Federal interessa, apenas e tão somente, aos respectivos réus – sendo certo que não se

está diante de “questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico

que ultrapassem os interesses subjetivos do processo”, tal qual exige o art. 1035, §1º do CPP.

As alegações ora examinadas não são passíveis de serem conhecidas em sede de

recuso extraordinário, portanto. Todavia, apenas para argumentar, ainda que elas sejam co-

nhecidas, é certo que elas devem ser rejeitadas.

III.b.2.

III.b.2.a. Competência da Justiça Federal para processar e julgar a ação penal

Sobre o tema, saliente-se, de início, que as alegações referentes à competência do

juízo já foram rebatidas e rejeitadas nas sedes processuais próprias, quais sejam, os respecti-

vos autos de exceções de incompetência12.

Também por isso, absolutamente inadequado que o requerente, inconformado

com as decisões proferidas ao longo dos mencionados incidentes processuais, resolva renovar

a discussão em sede de recurso extraordinário.

De todo modo, eis um breve resumo da razões que justificam a competência da

13a Vara da SJ de Curitiba/PR – e da Justiça Federal - para processar e julgar a ação penal n.

5046512-94.2016.4.04.7000/PR.

Com efeito, a ação penal em tela tem por objeto imputações de que vantagens in-

devidas acertadas em contratos da Petrobrás com o Grupo OAS teriam sido direcionadas ao

12 Autos n. 5051562-04.2016.4.04.7000 e 5053657-07.2016.4.04.7000.

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Presidente Luiz Inácio Lula da Silva em razão de seu cargo, estando-se diante, portanto, de

crime praticado por agente público federal.

Essa circunstância justifica a competência da Justiça Federal para processar e jul-

gar a referida ação penal, independentemente de a vítima, no caso, ser uma sociedade de eco-

nomia mista (cuja eventual situação de vítima de crimes não atrai, por si só, a competência da

Justiça Federal).

III.b.2.b. âmbito de competência da 13a Vara da SJ/PR

Quanto à competência da 13a Vara da Seção Judiciária de Curitiba/PR, re-

lembre-se, aqui, que, segundo a jurisprudência do STF, tal Juízo é prevento para:

(a) os feitos abrangidos pela chamada “Operação Lava Jato”, entendidos como

aqueles que tenham por objeto crimes praticados no âmbito do esquema criminoso que vitimou

a PETROBRAS;

(b) os feitos que, ainda que não tenham como objeto crimes imediatamente relacio-

nados à referida empresa estatal, apresentem relação de conexão com a mencionada Operação e

tenham sido praticados no Paraná.

Tal entendimento resulta da interpretação conjugada das decisões proferidas pelo

STF nos autos da questão de ordem no Inquérito n. 4.13013 e do Habeas Corpus n. 132.295/PR14.

No caso da ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR, a competência da 13a

Vara da Seção Judiciária de Curitiba/PR para processá-la e julgá-la é indubitável diante dos

critérios definidos pelo STF, acima resumidos.

III.b.2.c. Breve resumo do esquema no bojo do qual os crimes objeto do ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR foram praticados

Com efeito, no curso da chamada Operação Lava Jato, foram colhidas provas de

um grande esquema criminoso de corrupção e de lavagem de dinheiro, no âmbito da empresa

Petróleo Brasileiro S/A – Petrobras.

13 Julgamento ocorrido no Pleno do STF em 23/09/2015, em Inquérito de relatoria do Ministro Dias Toffoli.14 Julgamento ocorrida no Segunda Turma do STF, em 02/08/2016, em HC de Relatoria do Ministro Teori

Zavascki.

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

As maiores empreiteiras do Brasil, especificamente a OAS, Odebrecht, UTC, Ca-

margo Correa, Techint, Andrade Gutierrez, Mendes Júnior, Promon, MPE, Skanska, Queiroz

Galvão, IESA, Engevix, SETAL, GDK e Galvão Engenharia, formaram um cartel através do

qual, por ajuste prévio, sistematicamente frustraram as licitações da Petrobras para a contrata-

ção de grandes obras, e pagaram sistematicamente propinas a dirigentes da empresa estatal

calculadas em percentual sobre o contrato.

O ajuste prévio entre as empreiteiras eliminava a concorrência real das licitações

e permitia que elas impusessem o seu preço na contratação, observados apenas os limites má-

ximos admitidos pela Petrobrás (de 20% sobre a estimativa de preço da estatal).

Os recursos decorrentes dos contratos com a Petrobrás, que foram obtidos pelos

crimes de cartel e de ajuste de licitação crimes do art. 4º, I, da Lei nº 8.137/1990 e do art. 90

da Lei nº 8.666/1993, eram então submetidos a condutas de ocultação e dissimulação e utili-

zados para o pagamento de vantagem indevida aos dirigentes da Petrobrás para prevenir a sua

interferência no funcionamento do cartel. A prática, de tão comum e sistematizada, foi des-

crita por alguns dos envolvidos como constituindo a "regra do jogo".

Receberam propinas dirigentes da Diretoria de Abastecimento, da Diretoria de

Engenharia ou Serviços e da Diretoria Internacional, especialmente Paulo Roberto Costa, Re-

nato de Souza Duque, Pedro José Barusco Filho, Nestor Cuñat Cerveró e Jorge Luiz Zelada.

Surgiram, porém, elementos probatórios de que o caso transcende a corrupção - e

lavagem decorrente - de agentes da Petrobrás, servindo o esquema criminoso para também

corromper agentes políticos e financiar, com recursos provenientes do crime, partidos políti-

cos.

Aos agentes e partidos políticos cabia dar sustentação à nomeação e à permanên-

cia nos cargos da Petrobrás dos referidos Diretores. Para tanto, recebiam remuneração perió-

dica.

Entre as empreiteiras, os Diretores da Petrobrás e os agentes políticos, atuavam

terceiros encarregados do repasse das vantagens indevidas e da lavagem de dinheiro, os cha-

mados operadores.

Assim, constatou-se a existência de uma grande organização criminosa, em que

há um núcleo integrado pelos dirigentes das empreiteiras, outro pelos executivos de alto es-

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calão da Petrobrás, um terceiro pelos profissionais da lavagem e o último pelos agentes polí-

ticos que recebiam parte das propinas.

Em meio a esse amplo quadro criminoso, ação penal n. 5046512-

94.2016.4.04.7000/PR tem por objeto uma fração desses crimes.

III.b.2.d. Objeto da ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR – crimes praticados no âmbito do esquema que vitimou a Petrobrás

O objeto da mencionada ação penal é a imputação de crimes praticados no âmbito

do esquema criminoso que vitimou a Petrobrás, no qual contratos desta entidade com uma

das suas principais fornecedoras, a Construtora OAS, gerou vantagem indevida que, dentre

outros, foi direcionada a Luiz Inácio Lula da Silva, à época Presidente da República e apon-

tado como o grande responsável pela manutenção do referido esquema criminoso.

A denúncia é clara ao relatar elos entre os contratos da Construtora OAS firmados

com a Petrobras (destacadamente nos Consórcio CONEST/RNEST em obras na Refinaria do

Nordeste Abreu e Lima - RNEST e CONPAR, em obras na Refinaria Presidente Getúlio Var-

gas - REPAR) e a vantagem ilícita obtida por Luiz Inácio Lula da Silva em razão de tais

contratos.

Confira-se síntese da denúncia15:

“Em nova grande síntese, alega o Ministério Público Federal que o ex-Presidente da Re-pública Luiz Inácio Lula da Silva teria participado conscientemente do esquema crimi-noso, inclusive tendo ciência de que os Diretores da Petrobrás utilizavam seus cargospara recebimento de vantagem indevida em favor de agentes políticos e partidos políti-cos.

A partir dessa afirmação, alega o MPF que, como parte de acertos de propinas destinadasa sua agremiação política em contratos da Petrobrás, o Grupo OAS teria concedido, em2009, ao Ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada na entrega do apartamento164-A do Edifício Solaris, de matrícula 104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá/SP,bem como, a partir de 2013, em reformas e benfeitorias realizadas no mesmo imóvel,sem o pagamento do preço. Estima os valores da vantagem indevida em cerca de R$2.424.991,00, assim discriminada, R$ 1.147.770,00 correspondente entre o valor pago eo preço do apartamento entregue e R$ 1.277.221,00 em benfeitorias e na aquisição debens para o apartamento.

Na mesma linha, alega que o Grupo OAS teria concedido ao ex-Presidente vantagem in-devida consubstanciada no pagamento das despesas, de R$ 1.313.747,00, havidas no ar-mazenamento entre 2011 e 2016 de bens de sua propriedade ou recebidos como presentesdurante o mandato presidencial.

15 Síntese feita por ocasião do recebimento da denúncia pelo Juízo da 13a Vara da SJ/PR.

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Em ambos os casos, teriam sido adotados estratagemas sub-reptícios para ocultar as tran-sações.

Estima o MPF que o total pago em propinas pelo Grupo OAS decorrente das contrata -ções dele pela Petrobrás, especificamente no Consórcio CONEST/RNEST em obras naRefinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras naRefinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, alcance R$ 87.624.971,26.

Destes valores, R$ 3.738.738,00 teriam sido destinados especificamente ao ex-Presi-dente.

É a síntese da denúncia."

Segundo apurado ao longo das investigações, houve o acerto do pagamento de

vantagem indevida pela Construtora OAS nos contratos da Petrobrás com o Consórcio CO-

NEST/RNEST, em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST, e no Consórcio

CONPAR, em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, no montante de cerca

de R$ 87.624.971,26, correspondente a 3% sobre a parte correspondente da Construtora OAS

nos empreendimentos referidos16.

Do total de propina originária dos contratos RNEST e REPAR, R$ 13,5 milhões

eram destinados ao PP, R$ 6 milhões ao PSDB e R$ 16 milhões ao PT - Partido dos Traba-

lhadores. A parte do PT, por sua vez, alimentou uma conta corrente geral de propinas entre

o Grupo OAS e agentes do mencionado partido político.

16Paulo Roberto Costa, ouvido em juízo, confirmou ter recebido vantagem indevida da Construtora OAS,inclusive nos contratos relativos à Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e à Refinaria do NordesteAbreu e Lima (RNEST), e que teria tratado inclusive desta questão com os acusados Agenor FranklinMagalhães Medeiros e JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO.Em semelhante sentido, Pedro José Barusco Filho, gerente executivo da Área de Serviços e Engenharia daPetrobrás entre 2003 e 2011, confirmou ter recebido vantagem indevida da Construtora OAS, inclusive nocontratos relativos à Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR). Afirmou ter havido acerto de propina noscontratos da Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), mas que saiu da empresa antes de recebê-la.Declarou que tratava de propina com o acusado Agenor Franklin Magalhães Medeiros e que tinha conhecimentode que João Vaccari tratava a parte do partido com JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIROFILHO.Agenor Franklin Magalhães Medeiros, encarregado especificamente dos contratos da Construtora OAS com aPetrobrás, confirmou que JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO interferiu junto ao Governo Federal paraque a OAS passasse, ao final de 2006, a ser convidada para grandes obras na estatal. Também declarou que oscontratos envolviam pagamento de propinas de 2% a agentes públicos e agentes políticos e que os contratos naRefinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR) e na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST) foram obtidosmediante ajuste fraudulento de licitação.Declarou que no contrato da CONPAR, na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), a vantagem indevidaaos agentes públicos e políticos ficou a cargo da Odebrecht e da UTC Engenharia, desconhecendo o depoente osdetalhes de como isso foi feito. No caso dos contratos da CONEST/RNEST, na Refinaria do Nordeste Abreu eLima (RNEST), confirmou que houve ajuste de 2% de propinas sobre o valor dos dois contratos, que elas sedestinavam aos agentes da Petrobrás e aos agentes políticos e que parte dos valores foram pagos pela Odebrechte parte pela OAS.Do total das propinas, dezesseis milhões de reais foram destinados ao Partido dos Trabalhadores, através deJoão Vaccari ('Aí é onde está, 13 milhões e meio mais 6 milhões e meio totalizam 20, para os 36 sobraram 16milhões para o PT, e assim foi feito, Léo esteve em contato com João e ficou decidido que 16 milhões de reais,por conta da nossa parte na Rnest, seriam para o PT').

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Do total, R$ 3.738.738,00 foram destinados especificamente a Luiz Inácio Lula

da Silva, mediante a disponibilização ao ex- Presidente do apartamento 164-A, triplex, do

Condomínio Solaris, de matrícula 104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá/SP17.

Sobre o tema, veja-se o que disse em juízo José Adelmário Pinheiro Filho,

vulgo Leo Pinheiro, presidente da OAS à época dos fatos18:

“Segundo declarado em Juízo por José Adelmário Pinheiro Filho, vulgo Leo Pinheiro(presidente da OAS à época dos fatos), a Construtora OAS passou a participar de ajustesfraudulentos de licitação por volta de 2007 ou 2008 e que o Grupo OAS participou do es-quema criminoso que vitimou a Petrobrás, tendo pago, de maneira frequente, vantagemindevida aos Diretores da Petrobras, inclusive nos contratos da Refinaria Presidente Ge-túlio Vargas (REPAR) e da Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST).

Também declarou que parte dos pagamentos era direcionada a agentes ou partidos políti-cos.

Afirma que, quanto ao contrato na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima (RNEST), teriasido procurado diretamente por João Vaccari Neto para pagamento de 1% do valor docontrato para o Partido dos Trabalhadores. Afirmou não se recordar especificamente se omesmo ocorreu no contrato na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR). Revelou,em seguida, que o pagamento de vantagem indevida ao Partido dos Trabalhadores inter-mediado por João Vaccari Neto era controlado por uma conta corrente informal, de débi-tos e créditos, junto à OAS.

Os créditos eram gerados por contratos com a Petrobrás, mas também por contra-tos fora da Petrobrás com o Governo Federal. José Adelmário Pinheiro Filho tambémdeclarou que foi procurado em 2009 por João Vaccari Neto para que fosse verificado se aOAS poderia assumir os empreendimentos imobiliários da Bancoop. Afirma que o negó-cio era interessante à OAS Empreendimentos Imobiliários que pretendia ampliar a suaatuação em São Paulo e nas grandes capitais. No entanto, quanto ao empreendimentoimobiliário no Guarujá, João Vaccari Neto teria lhe dito que haveria uma unidade da "fa-mília do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva", a fim de convencê-lo a assumir um em-preendimento que não ficava em qualquer capital.

Após a aprovação pelo setor técnico da OAS Empreendimentos, concordou em assumiras obras. José Adelmário Pinheiro Filho ainda declarou que encontrou-se com João Vac-cari Neto em maio ou junho de 2014 e restou acertado com ele que a diferença depreço entre a unidade simples e o apartamento triplex, bem como os custos da re-forma do apartamento e igualmente do Sítio em Atibaia, seriam abatidos da menci-onada conta geral de propinas que o Grupo OAS tinha com o Partido dos

17 Para ser mais exato, o ex-Presidente, quando o empreendimento imobiliário estava com a BANCOOP,pagou por um apartamento simples, nº 141-A, cerca de R$ 209.119,73, mas o Grupo OAS disponibilizou a ele,ainda em 2009, o apartamento 164-A, triplex, sem que fosse cobrada a diferença de preço. Posteriormente, em2014, o apartamento teria sofrido reformas e benfeitorias a cargo do Grupo OAS para atender ao ex-Presidente,sem que houvesse igualmente pagamento de preço. Estima o MPF os valores da vantagem indevida em cerca deR$ 2.424.991,00, assim discriminada, R$ 1.147.770,00 correspondente à diferença entre o valor pago e o preçodo apartamento entregue e R$ 1.277.221,00 em benfeitorias e na aquisição de bens para o apartamento. Namesma linha, o Grupo OAS concedeu ao ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada no pagamento dasdespesas, de R$ 1.313.747,00, havidas no armazenamento entre 2011 e 2016 de bens de sua propriedade ourecebidos como presentes durante o mandato presidencial.18 Trecho extraído da sentença condenatória.

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Trabalhadores. João Vaccari Neto confirmou essa possibilidade somente em um se-gundo encontro com José Adelmário Pinheiro Filho.

Também seriam abatidos outros custos de empreendimentos do BANCOOP, passivosocultos - segundo ele, que foram assumidos pela OAS.

Ao final do depoimento de José Adelmário Pinheiro Filho, ele, respondendo a perguntada Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, confirmou que a diferença de preço do imóvel eo custo das reformas seriam abatidos das dívidas de propinas do Grupo OAS com o Par-tido dos Trabalhadores e ainda relatou um encontro com o ex-Presidente em junho de2014 na qual foi por ele indagado sobre o pagamento de propinas a João Vaccari Neto noexterior e ainda foi por ele orientado a destruir eventuais provas escritas sobre as propi-nas.

Assim, para resumir, a vantagem indevida do crime de corrupção passiva a que

Luiz Inácio Lula da Silva foi condenado nos autos da ação penal n. 5046512-

94.2016.4.04.7000/PR foi debitada da conta corrente geral de propinas entre o Grupo OAS

e agentes do Partido dos Trabalhadores, conta essa, por sua vez, alimentada com valores

oriundos de contratos do Grupo com a Petrobrás.

A respeito dessa conta corrente geral, transcreve-se, abaixo, esclarecedor trecho

do voto (vencedor) proferido pelo Desembargador Federal João Pedro Gebran Neto no julga-

mento das apelações interpostas nos autos da ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR:

“É desnecessário estabelecer relação direta entre o valor investido no imóvel e a propina pagapela OAS a agentes do Partido dos Trabalhadores, parcialmente materializada e transferida aoapelante a título pessoal.

A denúncia não se baseia em suposta relação direta entre os valores utilizados para o paga-mento de propina e os contratos da Petrobras com a OAS, especificamente Consórcio CO-NEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no ConsórcioCONPAR em obras na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, mas, sim, em razão de-les. São coisas diversas. Um é o motivo pelo qual houve o acerto de corrupção; outra é irre-levância da origem dos recursos utilizados para tal mister, pois, como se disse, além de odinheiro ser bem fungível, o pagamento de corrupção não pressupõe necessariamente que suaorigem seja ilícita. Melhor dizendo, a corrupção poderia ser paga inclusive com recursos pes-soais de LÉO PINHEIRO.

É inegável a ocorrência dos crimes de cartel e fraude a licitações pelas empresas do cha-mado 'clube' das empreiteiras em desfavor da Petrobras. Com mais detalhes, é pertinentea contextualização dada na sentença:

(…).

Ora, o liame pretendido pela defesa inexiste e seria até mesmo irrelevante, pois não seperquire a respeito da origem dos recursos para fazer frente ao apartamento e aos respectivosgastos de personalização. Havia um caixa único e dele eram pagos os agentes públicos e polí-ticos.

Crimes dessa espécie não passam recibo e, em regra, os valores de propina passam aolargo da contabilidade oficial. Além disso, a corrupção não ocorre somente com recursosilícitos.

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De todo o modo, é necessário, aqui, fazer um esclarecimento com relação à expressão'caixa único' utilizada. Embora sirva para ilustrar a forma como a OAS organizava os va-lores espúrios subtraídos da Petrobras por licitações fraudulentas, o termo não deve serentendido como uma conta regular em instituição bancária.

No âmbito da 'Operação Lava-Jato' verificou-se que cada construtora - em consórcio ouisoladamente - tinha uma forma diferenciada de administrar tais valores, destacadamentecom a finalidade precípua de esconder sua origem. Algumas com contas no exterior emnome de offshore, outras com contabilidade paralela, de maneira que não é razoávelexigir-se, como quer a defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, que os valores de propinasfossem lançados na contabilidade oficial.

Havia, sim, a aparência de correção nos pagamentos de contratos das obras assumidaspela OAS, mas sua destinação utilizava-se de subterfúgios. Dentre as técnicas identifica-das, por exemplo, é possível referir a subcontratação de outras empresas com capacidadetécnica duvidosa ou, muitas vezes, sem corpo de empregados compatível ou com objetocontratual inexistente.

O exemplo acima não exaure todas as condutas e técnicas. Mas o importante é firmar quehavia uma 'conta corrente' extraoficial, na qual eram lançados créditos e débitos sem que,porém, recebesse ativos. Ou seja, quando se fala em 'conta corrente' ou 'caixa único',quer-se dizer que o acerto era meramente informal; simplesmente um encontro de contas,sem que se identifiquem depósitos ou saques em instituição oficial.

Desse acerto de contas com relação aos R$ 16 milhões destinados ao PT, adveio a dife-rença de preço para o apartamento triplex - acrescido das benfeitorias e do mobiliário”.

O apartamento triplex concedido a Luiz Inácio Lula da Silva, assim como outras

vantagens destinadas ao ex presidente e apuradas em ações penais próprias, consistiu em re-

tribuição pela sua atuação em prol de garantir o funcionamento do esquema que lesou a Pe-

trobrás, ou, nas palavras do ex-Senador da República DELCÍDIO DO AMARAL GOMEZ,

houve “uma contraprestação pelo conjunto da obra” de Luiz Inácio Lula da Silva, uma

contraprestação não específica pelas contratações de obras públicas ilicitamente direcionadas

da Petrobrás, em ambiente cartelizado, às empresas do Grupo OAS.

Diante disso, está claro que a ação penal ora em comento, por ter por objeto cri-

mes praticados em detrimento da Petrobrás, é de competência do Juízo da 13a Vara da SJ/PR,

nos termos do que definido pela jurisprudência do STF.

III.b.2.e. A ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR é conexa a diversas outras açõespenais em trâmite perante a 13a vara da SJ/PR

Somando-se ao argumento posto no tópico anterior, tem-se que a competência da

13ª Vara da SJ/PR para processar e julgar a ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR se

justifica, ainda, porque ela é conexa, nos termos do art. 76 do Código de Processo Penal, a di-

versas outras ações penais que tramitam ou tramitaram naquela Vara.

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Há conexão estreita da ação penal em foco, por exemplo, com os crimes que fo-

ram objeto da ação penal n. 5083376-05.2014.404.7000, na qual foram condenados, também

pelo Juízo da 13a Vara da SJ/PR, por corrupção e lavagem de dinheiro, os dirigentes da OAS

José Adelmário Pinheiro Filho e Agenor Franklin Magalhães Medeiros pelo pagamento de vanta-

gem indevida e ocultação e dissimulação dela ao Diretor da Petrobrás Paulo Roberto Costa em

contratos do Consórcio CONPAR e do Consócio RNEST/CONEST.

Essa mesma contratação e os mesmos acertos de propina, repita-se, geraram

créditos que beneficiaram Luiz Inácio Lula da Silva, sendo, portanto, a conexão ainda mais

estreita do que a verificada em relação aos demais casos abrangidos na denominada Operação

Lava Jato.

Diante de todo o exposto, conclui-se que:

a) A ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR decorre do aprofundamento,

desdobramento e fracionamento da persecução promovida diante do grande e complexo es-

quema criminoso no âmbito da Operação Lava Jato, de modo que há evidente e indissociável

conexão instrutória (artigo 76, III do Código de Processo Penal) com várias outras investiga-

ções e ações penais em curso na 13a Vara da SJ/PR, o que impede a separação dos diversos ca-

sos, sob pena de perda relevante de compreensão do conteúdo geral;

b) Há conexão subjetiva por concurso (art. 76, I, do CPP), pois diversos réus na

ação penal 5046512-94.2016.4.04.7000/PR figuram como acusados, réus ou condenados em

outras acusações oferecidas pelo MPF na Operação Lava Jato, em curso na 13a Vara da SJ/PR;

c) A conexão determina, no caso, a reunião dos processos no interesse da instru-

ção processual perante o juízo prevento, que é o da 13ª Vara Federal de Curitiba; e

d) O Juízo da 13ª Vara é, aliás, aquele que tem maior conhecimento e mais proxi-

midade com as provas até então colhidas.

III.c. Alegação de afronta aos artigos 5º, XXXVII e 37, caput, 127, caput e 129, I da Constituição (violação às normas constitucionais que vedam juízo de exceção e definem as atribuições do Ministério Público)

III.c.1.

Afirma Luiz Inácio Lula da Silva, também, que (i) um“juiz de exceção” teria

conduzido o feito com parcialidade e em prejuízo da ampla defesa, desrespeitando as balizas

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do devido processo legal, (ii) não teria sido tratado com a seriedade e a impessoalidade que

se impunham aos membros do Ministério Público, tendo sido considerado inimigo “não em

razão de fatos típicos efetivamente imputados, mas por causa da convicção desses agentes

institucionais”.

Tais alegações também são incabíveis em sede de recurso extraordinário, por re-

fletirem, na verdade, violação meramente reflexa à Constituição – aqui, a violação direta,

caso ocorrente, seria a dispositivos da legislação infraconstitucional (por exemplo, artigos

254, do CPP e 145, inciso IV, do CPC do CPP). Além disso, a análise dessas alegações de-

mandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório subjacente aos autos, o que também

não é cabível nessa sede recursal extraordinária (súmula n. 279 do STF).

O STF tem negado seguimento a recursos extraordinários fundados em alegações

semelhantes às ora analisadas:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO.PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EXCEÇÃODE IMPEDIMENTO E SUSPEIÇÃO. JUIZ EXCEPTO. IMPARCIALIDADE. COM-PROVAÇÃO. ADOÇÃO NAS RAZÕES DE DECIDIR DOS ARGUMENTOS EXPEN-DIDOS PELO PARQUET. LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. OFENSAREFLEXA. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO JÁ CARREADOAOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 279/STF. PRINCÍ-PIOS DA AMPLA DEFESA, DO CONTRADITÓRIO E DO DEVIDO PROCESSO LE-GAL. MATÉRIA COM REPERCUSSÃO GERAL REJEITADA PELO PLENÁRIO DOSTF NO ARE Nº 748.371. CONTROVÉRSIA DE ÍNDOLE INFRACONSTITUCIO-NAL. OFENSA INDIRETA À CONSTITUIÇÃO. MULTA DO ARTIGO 557, § 2º, DOCPC/1973. APLICABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.(ARE 746620 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em14/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-134 DIVULG 27-06-2016 PUBLIC 28-06-2016)

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUSPEIÇÃO DEJUIZ. EXCEÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. MATÉRIA INFRACONSTITUCIO-NAL. REEXAME DE FATOS E PROVAS E DE LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCI-ONAL. SÚMULAS 279 E 636 DO STF. JULGAMENTO POR TURMA COMPOSTAPOR JUÍZES CONVOCADOS. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DO JUIZNATURAL. INEXISTÊNCIA. Para se chegar a conclusão diversa daquela a que se che-gou no acórdão recorrido seria necessário o reexame das provas dos autos, o que é ve-dado na esfera do recurso extraordinário, de acordo com a Súmula 279 do SupremoTribunal Federal. Nos termos da orientação firmada neste Tribunal (RE 597.133, rel.Min. Ricardo Lewandowski), não ofende o princípio constitucional do juiz natural o jul-gamento de recurso por órgão fracionário composto majoritariamente por juízes convo-cados. Agravo regimental a que se nega provimento.(AI 815344 AgR, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em

PET 7670 (CONTRARRAZÕES EM AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO NOS AUTOS DE MEDIDA CAUTELAR) 24

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25/09/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-211 DIVULG 25-10-2012 PUBLIC 26-10-2012)

Também falece a tais alegações a repercussão geral necessária ao conhecimento

do recurso extraordinário nesse ponto: ora, definir se o Juiz de piso que conduziu a ação pe-

nal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR, bem como os Procuradores da República que nela

atuaram, agiram, ou não, com imparcialidade e seriedade, respectivamente, interessa, apenas

e tão somente, aos respectivos réus – sendo certo que não se está diante de “questões relevan-

tes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses

subjetivos do processo”, tal qual exige o art. 1035, §1º do CPP.

As alegações ora examinadas não são passíveis de serem conhecidas em sede de

recurso extraordinário, portanto. Todavia, apenas para argumentar, ainda que elas sejam co-

nhecidas, é certo que elas devem ser rejeitadas.

III.c.2.

Saliente-se, de início, que a alegação referente à suposta parcialidade do Juízo Fe-

deral de primeiro grau já foi analisada e rejeitada nas sedes próprias, quais sejam, os respecti-

vos autos de exceções de suspeição19.

As exceções também foram rejeitadas por unanimidade pelo Egrégio Tribunal

Regional Federal da 4ª Região:

"PROCESSUAL PENAL. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. 'OPERAÇÃO LAVAJATO'.REITERAÇÃO DE PEDIDOS JÁ ANALISADOS EM FEITOS ANTERIORES. NÃOCONHECIMENTO.

1. Considerando, portanto, que os argumentos da defesa dos excipientes já foram exami-nados nos autos tombados sob os nºs 5032506-82.2016.4.04.7000, 5032521-51.2016.4.04.7000, e 5032531-95.2016.4.04.7000, e que a mera indicação de 'fatos no-vos' que versam sobre fundamentos já analisados não reabre a discussão sobre matéria jádecidida, verifica-se que presente feito revela-se mera reiteração de pedido, sendo incabí-vel seu conhecimento nesta Corte.

2. Exceção de suspeição não conhecida." (Exceção de suspeição 5051592-39.2016.4.04.7000 - Rel. Des. Federal João Pedro Gebran Neto - 8ª Turma do TRF4 - un.- j. 08/03/2017).

"PROCESSUAL PENAL. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. 'OPERAÇÃO LAVAJATO'.ATOS DO PROCESSO. DEVER DE FUNDAMENTAR. ARTIGOS PUBLICADOS.IMPARCIALIDADE NÃO CARACTERIZADA. INEXISTÊNCIA DE ANTECIPAÇÃO

19 Autos n. 5051592- 39.2016.4.04.7000 e 5053652-82.2016.4.04.7000.

PET 7670 (CONTRARRAZÕES EM AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO NOS AUTOS DE MEDIDA CAUTELAR) 25

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OU INTERESSE NA CAUSA. PUBLICAÇÃO DE MATÉRIAS JORNALÍSTICAS.IMPROCEDÊNCIA DA EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO CRIMINAL.

1. Não gera impedimento do magistrado, tampouco implica em antecipação do juízo demérito, a externalização das razões de decidir a respeito de diligências, prisões e recebi -mento da denúncia, comuns à atividade jurisdicional e exigidas pelo dever de fundamen-tar estampado na Constituição Federal.

2. A determinação de diligências na fase investigativa, como quebras de sigilo telemáti-cos e prisões cautelares não implica antecipação de mérito, mas sim mero impulso pro-cessual relacionado ao poder instrutório.

3. A ampla cobertura jornalística à investigação denominada de 'Operação Lava- Jato',bem como a manifestação da opinião pública, favoráveis ou contrárias, para as quais omagistrado não tenha não acarretam a quebra da imparcialidade do magistrado.

4. Considerações do magistrado em texto jurídico publicado em revista especializada arespeito da Operação Mãos Limpas (Itália) têm natureza meramente acadêmica, descri-tiva e informativa e não conduz à sua suspeição para julgar os processos relacionados à'Operação Lava-Jato', deflagrada,

inclusive, muitos anos depois.

5. O art. 256 do Código de Processo Penal prevê que a suspeição não poderá ser decla-rada nem reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der motivo paracriá-la, evitando assim ações deliberadas com o objetivo de afastar o magistrado dacausa. Hipótese em que representação de corréu em face do Excepto perante a Procura-doria-Geral da República por crime de abuso, não gera suspeição.

6. Exceção de suspeição que se julga improcedente." (Exceção de suspeição 5053652-82.2016.4.04.7000 - Rel. Des. Federal João Pedro Gebran Neto – 8ª Turma do TRF4 -un. - j. 08/03/2017).

Luiz Inácio Lula da Silva interpôs recurso extraordinário contra o acórdão do

TRF4, que julgou a exceção de suspeição por ele ajuizada e que foi rejeitado pelo Vice Presi-

dente do Tribunal. Contra tal decisão monocrática, o ora requerente interpôs agravo regimen-

tal junto ao STF (n. 1097.947), tendo a sua 2a Turma, no dia 23/03/2017, proferido acórdão

de rejeição ao recurso. Confira-se a respectiva ementa:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ALE-GAÇÃO DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E QUEBRA DE IMPARCIALIDADEDO JUIZ SINGULAR. OFENSA REFLEXA. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. DES-PROVIMENTO. 1. O art. 93, IX, da Constituição Federal não determina o exame pormenori-zado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos dadecisão. Precedentes. 2. A jurisprudência desta Suprema Corte assentou que a discussãoacerca de eventual violação ao princípio do juiz natural, quando o exame da pretensãorecursal depender de prévia análise de normas infraconstitucionais, não admite proces-samento extraordinário, eis que a ofensa, se existente, seria indireta à Constituição Fe-deral. 3. Agravo regimental desprovido.

Assim, percebe-se que o STF, ao julgar o agravo regimental n. 1097.947, já se

pronunciou sobre a alegação de parcialidade do Juízo de primeiro grau, tendo se negado a co-

PET 7670 (CONTRARRAZÕES EM AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO NOS AUTOS DE MEDIDA CAUTELAR) 26

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nhecê-la em sede de recurso extraordinário precisamente por considerar que ela é uma ofensa

constitucional meramente reflexa.

Trata-se, portanto, de matéria inequivocamente preclusa, sendo absolutamente

impróprio que o requerente, inconformado com as decisões proferidas ao longo dos mencio-

nados incidentes processuais, inclusive com uma proferida por órgão colegiado dessa Su-

prema Corte, resolva renovar a discussão no recurso extraordinário interposto contra o

acórdão condenatório do TRF4, a que se pretende conferir efeito suspensivo por meio da Me-

dida Cautelar que ora se analisa.

Por fim, considerando que a alegação, feita por Luiz Inácio Lula da Silva, de

que “não foi tratado com a seriedade e a impessoalidade que se impunham aos membros do

Ministério Público” é, do ponto de vista jurídico, similar à alegação de que “o Juízo de piso

foi imparcial”, e como esta última foi definitivamente tida como não passível de ser discutida

em sede de recurso extraordinário, é certo que o mesmo destino há de ser dado à primeira: o

não conhecimento.

III.d. Alegação de afronta ao artigo 5º, LVII da Constituição (violação ao princípio constitucional da presunção de inocência)

III.d.1.

Também argumenta o requerente que, no curso da ação penal n. 5046512-

94.2016.4.04.7000/PR, teria sido tratado como culpado antes mesmo de sua condenação.

Isso teria se dado, por exemplo, quando da sua condução coercitiva, bem como quando houve

autorização judicial para divulgação de conversas telefônica interceptadas em ramais usados

pelo requerente.

Assim como ocorre com as outras alegações recursais já examinadas anterior-

mente, a presente sustentação também não é passível de ser conhecida em sede de recurso ex-

traordinário, por refletir violação meramente reflexa à Constituição – aqui, a violação direta,

caso ocorrente, seria a dispositivos da legislação infraconstitucional (como à Lei n. 9296/96 e

ao art. 260 do CPP). Além disso, a análise dessas alegações demandaria o revolvimento do

conjunto fático probatório subjacente aos autos, o que também não é cabível nessa sede re-

cursal extraordinária (súmula n. 279 do STF).

PET 7670 (CONTRARRAZÕES EM AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO NOS AUTOS DE MEDIDA CAUTELAR) 27

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O STF, em situações semelhantes à presente, tem negado seguimento a recursos

extraordinários:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. RESPONSABI-LIDADE CIVIL DO ESTADO. CONDUÇÃO COERCITIVA À DELEGACIA DE POLÍ-CIA. USO DE ALGEMAS. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. NECESSIDADE DEREVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO–PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBI-LIDADE. SÚMULA 279 DO STF. AGRAVO DESPROVIDO. (ARE 1122087/SP, Rel. Min.Luiz Fux, DJ 19/04/2018)

"Trata-se de recurso extraordinário, manejado com arrimo na alínea a do permissivo constitu-cional, contra acórdão que assentou, in verbis: “PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSOEM HABEAS CORPUS. 1. OPERAÇÃO CASTELO DE CARTAS. CRIMES DE COR-RUPÇÃO PASSIVA E FRAUDE À LICITAÇÃO. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA DE-CLARADA NULA NA ORIGEM. IMPUGNAÇÃO ÀS PROVAS ILÍCITAS PORDERIVAÇÃO. ART. 157, § 1º, DO CPP. 2. BUSCA E APREENSÃO, PRISÃO TEMPORÁ-RIA E CONDUÇÃO COERCITIVA. MEDIDAS LASTREADAS NAS INTERCEPTAÇÕESTELEFÔNICAS ILÍCITAS. AUSÊNCIA DE FONTE INDEPENDENTE. 3. RECURSO EMHABEAS CORPUS PROVIDO EM PARTE 1. É direito constitucional do réu ter as provasobtidas por meios ilícitos expurgadas do processo a que responde, sendo igualmente inadmis-síveis, nos termos do art. 157, § 1º, do CPP, as provas que derivam da prova ilícita, razão pelaqual devem ter o mesmo destino. As provas derivadas apenas podem ser mantidas nos autosnos casos em que não ficar evidenciado o nexo de causalidade, ou seja, quando não ficar con-figurada a derivação, ou quando demonstrado que poderiam ser obtidas por uma fonte inde-pendente, cabendo ao Magistrado justificar. 2. Manifesta a derivação da medida oraimpugnada das interceptações telefônicas consideradas ilegais, não se tratando, portanto, deprova independente conforme afirmado pelas instâncias ordinárias, uma vez que não há men-ção à existência de provas outras ou mesmo de outra linha investigativa, que não tenha deri-vado diretamente das interceptações ilícitas. A indissociabilidade das medidas se revela porsimples leitura do pedido de "busca e apreensão, prisão temporária e condução coercitiva", oque denota, sem maior esforço intelectivo, a ilicitude da prova por derivação, conformedispõe o art. 157, § 1º, do CPP. 3. Recurso em habeas corpus provido em parte, para reconhe-cer a ilegalidade por derivação da diligência de "busca e apreensão, prisão temporária e con-dução coercitiva", devendo ser desentranhado dos autos o resultado das referidas medidas.Determino, outrossim, ao Magistrado de origem que analise a ilicitude de eventuais outrasprovas derivadas e, por consequência, verifique a validade da denúncia, diante da exclusãodas provas ilícitas por derivação.” (Doc. 5, fls. 40-41). Não foram opostos embargos de de-claração Nas razões do apelo extremo, sustenta preliminar de repercussão geral e, no mérito,aponta violação aos artigos 5º, LIV, LVI e LXVIII, 93, IX, 105, I, c, e 105, II, a, da Constitui -ção Federal. [...] Demais disso, a jurisprudência desta Corte é uníssona no sentido de que averificação de ofensa aos princípios da legalidade, do livre acesso à justiça, do devido pro-cesso legal, da ampla defesa, do contraditório e da motivação das decisões judiciais, bemcomo aos limites da coisa julgada, quando dependente do reexame prévio de normas infra-constitucionais, revela ofensa indireta ou reflexa à Constituição Federal, o que, por si só, nãodesafia a instância extraordinária.

Nesse sentido, os seguintes julgados: (…).

Outrossim, divergir do entendimento do Tribunal a quo, quanto à ilicitude e impossibili-dade de utilização das provas produzidas (artigo 5º, LVI, da Constituição Federal), de-mandaria o reexame do conjunto fático probatório dos autos. Não se revela cognoscível,em sede de recurso extraordinário, a insurgência que tem como escopo o incursiona-mento no contexto fático-probatório engendrado nos autos, porquanto referida pretensãonão se amolda à estreita via do apelo extremo, cujo conteúdo se restringe à discussão

PET 7670 (CONTRARRAZÕES EM AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO NOS AUTOS DE MEDIDA CAUTELAR) 28

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eminentemente de direito, face ao óbice erigido pela Súmula 279 do STF. Nesse sentido:[…]" (RE 1081532/PR, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 02/05/2018).

Tal qual ocorre com as demais alegações antes examinadas, também falece à ale-

gação objeto deste tópico a repercussão geral necessária ao conhecimento do recurso extraor-

dinário nesse ponto: ora, definir se Luiz Inácio Lula da Silva foi, ou não, tratado como

culpado ao longo de processo penal interessa, apenas e tão somente, a ele – sendo certo que

não se está diante de “questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou ju-

rídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo”, tal qual exige o art. 1035, §1º

do CPP.

Dessa forma, a alegação ora examinada também não é passível de ser conhecida

em sede de recuso extraordinário. Todavia, apenas para argumentar, ainda que seja conhecida,

é certo que ela deve ser rejeitada.

III.d.2.

Alega Luiz Inácio Lula da Silva, repita-se, que, em violação ao princípio consti-

tucional da presunção de inocência, foi tratado como culpado antes mesmo da sua condena-

ção pelas autoridades que conduziram a ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR. Para

exemplificar, o requerente cita duas situações: a sua condução coercitiva e o levantamento do

sigilo de conversas telefônicas interceptadas.

No que se refere ao instituto da condução coercitiva, sabe-se que no último dia 14

de junho de 2018 o Pleno dessa Suprema Corte, no julgamento das ADPFs n. 395 e 444, por

6 votos a 5, decidiu pela inconstitucionalidade da medida para fins de interrogatório, tal qual

prevista no art. 260 do CPP.

Essa decisão, todavia, não tem o condão de invalidar os interrogatórios de inves-

tigados conduzidos coercitivamente nos termos do art. 260 do CPP, realizados antes de 14 de

junho de 2018, de que é exemplo o ocorrido com o ora requerente.

Nesse sentido, o Ministro Gilmar Mendes enfatizou, em seu voto vencedor nos

autos das referidas ADPFs, que a decisão nelas proferidas não tem o condão de desconstituir

interrogatórios realizados até o julgamento, mesmo que o interrogado tenha sido coercitiva-

mente conduzido para o ato. Diante disso, afirmou que não existe “necessidade de debater

PET 7670 (CONTRARRAZÕES EM AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO NOS AUTOS DE MEDIDA CAUTELAR) 29

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qualquer relação dessa decisão com os casos pretéritos, inexistindo espaço para a modula-

ção dos efeitos da decisão."

Assim, o fato é que, à época em que a condução coercitiva de Luiz Inácio Lula

da Silva foi determinada pelo Juízo da 13a Vara da SJ de Curitiba, a saber, em 29/02/2016, tal

instituto ainda não havia sido declarado inconstitucional pela Suprema Corte, estando respal-

dado não apenas pelo art. 260 do CPP, mas, também, pelo poder geral de cautela titularizado

pelo Juízo criminal.

Assim, a determinação de diligências ou mesmo a condução coercitiva de investi-

gados ou decretação de prisões na fase pré processual fizeram parte do cotidiano jurisdicio-

nal, não podendo ser consideradas, como quer o ora requerente, antecipação de culpa.

No caso específico da condução coercitiva determinada em face de Luiz Inácio

Lula da Silva, o exame dos autos demonstra que ela resultou de decisão judicial devida-

mente fundamentada, proferida em atendimento a pedido formulado pelo MPF, com base

na interceptação telefônica de diálogos travados por investigados, indicando suposta intenção

de associados do requerente de, em certa medida, obstarem qualquer diligência em seu desfa-

vor.

Em face disso, o Juízo da 13a Vara da SJ de Curitiba, apoiado em sua livre con-

vicção, considerou que a condução coercitiva de Luiz Inácio Lula da Silva seria necessária

à investigação até então em curso20. O Juízo de primeiro grau, inclusive, determinou a adoção

de cautelas pela autoridade policial com a finalidade de evitar a exposição do conduzido.

Aqui, vale brevemente registrar, que o termo do depoimento prestado por Luiz Inácio Lula

da Silva (constante da Petição nº 5007401-06.2016.4.04.7000/PR) revela que ele foi devida-

mente acompanhado pelos advogados Roberto Teixeira, Cristiano Zanin Martins e Rodrigo

Ferrão, bem como que, em nenhum momento lhe foi negado, mesmo que parcialmente,

manter-se em silêncio.

Parece oportuno, ainda, citar trecho da sentença condenatória proferida em desfa-

vor do ora requerente, que bem demonstra a necessidade da condução coercitiva:

“67. Este Juízo, a pedido do MPF, deferiu autorização para condução coecitiva do ex-Presidente em 29/02/2016, (evento 3), do processo 5007401-06.2016.4.04.7000.

68. A decisão está amplamente fundamentada.

20

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69. Além dos fundamentos expressos na decisão, é necessário destacar que, pela ocasiãode sua prolação, não foi possível invocar razões adicionais quanto à necessidade da me-dida e que eram decorrentes do resultado da interceptação telefônica do ex-PresidenteLuiz Inácio Lula da Silva e de seus associados realizada no processo 5006205-98.2016.4.04.7000 e então mantida em sigilo.

70. Com efeitos, alguns dos diálogos sugeriam que o ex-Presidente e associados toma-riam providência para turbar a diligência, o que poderia colocar em risco os agentes poli-ciais e mesmo terceiros.

71. Exemplificadamente, diálogo interceptado como o de 27/02/2016, entre o ex-Presi-dente Luiz Inácio Lula da Silva e o Presidente do Partido dos Trabalhadores, no qual oprimeiro afirma ter ciência prévia de que a busca e apreensão seria realizada e revela co-gitar 'convocar alguns deputados para surpreendê-los', medida que, ao final, não ultimou-se, mas que poderia colocar em risco a diligência. Em decorrência, a autoridade policialresponsável pela investigação consignou em um dos autos de interceptação (auto de in-terceptação telefônica 054/2016, processo 5006205-98.2016.4.04.7000):

'O monitoramento identificou que alguns grupos sindicais e agremiações partidá-rias estão se mobilizando na tentativa de frustrar possíveis medidas cautelares. Es-sas medidas possivelmente ameaçam a integridade física e moral tanto dosinvestigados quanto dos policiais federais envolvidos.

Assim sendo, sugere-se que sejam adotadas cautelas e procedimentos para evitaros riscos identificados.'

72. Não desconhece este Juízo as controvérsias jurídicas em torno da condução coerci -tiva, sem intimação prévia.

73. Mas, no caso, a medida era necessária para evitar riscos aos agentes policiais que rea-lizaram a condução e a busca e apreensão na mesma data.

74. Observa-se, ademais, que o tempo mostrou que a medida era necessária, pois houvetumulto no Aeroporto de Congonhas, para onde o ex-Presidente Luiz Inácio Lula daSilva foi levado para depoimento, decorrente da convocação de militantes políticos parao local a fim de pressionar as autoridades policiais. Isso restou evidenciado na referidadata e ainda foi objeto de afirmação expressa no termo de depoimento por ele prestadona condução coercitiva (evento 3, comp 75, conforme se verifica em diversos trechos,como 'É uma manifestação favorável, de apoio ao presidente, que está vindo em direçãoao local', 'Viu, Presidente, tem muita muita gente que veio em apoio ao senhor').

75. A mesma convocação de militantes partidários ocorreu quando da realização do inter-rogatório judicial na presente ação penal, tendo havido a necessidade da adoção de meca-nismos especiais de segurança para prevenir tumultos e conflitos.

76. Então a condução coercitiva foi medida que estava justificada no contexto e o tempolhe deu ainda mais razão.

77. Ainda que se possa eventualmente discordar da medida, há de se convir que conduziralguém, por algumas horas, para prestar depoimento, com a presença do advogado, res-guardo absoluto à integridade física e ao direito ao silêncio, não é equivalente à prisãocautelar, nem transformou o ex- Presidente em um 'preso político'. Nada equivalente auma 'guerra jurídica'”.

Assim, na ótica do magistrado de primeiro grau, havia claro e concreto risco, não

só à segurança, mas à própria investigação, a justificar a necessidade da condução coercitiva

de investigados, inclusive a de Luiz Inácio Lula da Silva, de forma concomitante. Diante

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disso, percebe-se que tal medida foi decretada com fins nitidamente cautelares, o que afasta

a procedência da alegação, feita pelo ora requerente, de que ela, na verdade, representou tra-

tamento do ex presidente como culpado antes da sua condenação. Ora, se a medida foi decre-

tada para fins cautelares, ela, por lógica, não configura antecipação da pena, mas, apenas,

instrumento voltado a assegurar o resultado útil do processo.

Também não representou violação ao princípio da presunção de inocência a cir-

cunstância de o Juízo da 13a Vara Federal da SJ de Curitiba/PR ter levantado o sigilo de parte

da interceptação de conversas telefônicas mantidas por Luiz Inácio Lula da Silva.

Com efeito, embora seja possível que, no plano exclusivo das ideias, discorde-se

do acerto do levantamento do sigilo de tais comunicações, é certo que ele resultou de de-

cisões judiciais devidamente motivadas21, proferidas a requerimento do MPF, e que refletem

o posicionamento jurídico do Juízo competente acerca do tema.

Trata-se, aliás, de entendimento jurídico que já vinha sendo adotado pelo mesmo

Juízo em outras situações pretéritas e completamente estranhas à figura do ex-presidente - o

que, por si só, fragiliza a lógica de conjecturas, feitas em diversas ocasiões ao longo do pro-

cesso pela defesa do requerente, de que o levantamento do sigilo se deu no intuito de perse-

guir Luiz Inácio Lula da Silva, de prejudicá-lo politicamente, e de tratá-lo como culpado

antes da condenação.

Sobre o tema, confira-se o que disse o Juízo da 13a Vara Federal da SJ de Curi-

tiba/PR no Ofício 700001743752, por ele encaminhado ao STF no âmbito da Reclamação n.

23.457:

“g) foram juntados aos autos e, por conseguinte, publicizados apenas diálogos considera-dos juridicamente relevantes para a investigação criminal e os demais, quer protegidospor sigilo profissional ou eminentemente privados, foram resguardados em arquivos ele-trônicos não publicizados e que deverão ser submetidos, após o contraditório, ao procedi-mento de inutilização;

h) há diálogos selecionados pela autoridade policial como relevantes e que parecem sereminentemente privados, mas em realidade contém aspectos relevantes para a investiga-ção, como aqueles que indicam que o sítio em Atibaia está no poder de disposição da fa-mília do ex-Presidente e não do formal proprietário;

i) a praxe deste Juízo sempre foi o de levantar o sigilo sobre processos de intercepta-ção telefônica, inclusive para diálogos relevantes para a investigação, após o encer-ramento da diligência, o que não discrepa da prática adotada em outros Juízos e,

21 Decisões proferidas em 16/03/2016 e 17/03/2016 nos autos do processo 5006205- 98.2016.4.04.7000.

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aparentemente, também por este Egrégio Supremo Tribunal Federal, conforme,salvo melhor juízo, precedente acima referido; e

j) a competência, focada a investigação nas condutas do ex-Presidente, para decidir sobreo pedido de levantamento de sigilo sobre o processo, que continha diálogos relevantespara investigação criminal de condutas do ex-Presidente, era deste Juízo, em 16/03,quando o ex-Presidente não havia ainda tomado posse como Ministro.

O levantamento do sigilo não teve por objetivo gerar fato político-partidário, polêmicasou conflitos, algo estranho à função jurisdicional, mas, atendendo ao requerimento doMPF, dar publicidade ao processo e especialmente a condutas relevantes do pontode vista jurídico e criminal do investigado do ex-Presidente Luiz Inácio Lula daSilva que podem eventualmente caracterizar obstrução à Justiça ou tentativas deobstrução à Justiça (art. 2º, §1º, da Lei nº 12.850/2013).

Para sintetizar esses atos e tentativas, relembro aqui o diálogo acima transcrito do ex-Presidente no qual, ao referir-se aos responsáveis pelos processos atinentes ao esquemacriminoso da Petrobrás e ao que deveria ser feito em relação a isso, disse, sem maiorespudores, que 'ELES TÊM QUE TER MEDO'. Não se trata de uma afirmação que nãogere naturais receios aos responsáveis pelos processos atinentes ao esquema criminosoda Petrobrás."

Assim, repita-se, o levantamento do sigilo de parte da interceptação de conversas

telefônicas mantidas por Luiz Inácio Lula da Silva foi motivado pelo entendimento judicial

de que deve ser dado publicidade a diálogos relevantes para a investigação, após o encerra-

mento da diligência – posição esta, aliás, defendida também pelo MPF, que foi autor do pe-

dido de resultou no levantamento do sigilo.

Como dito, discordando-se ou não desse entendimento, não há como reputá-lo re-

sultado de uma indevida antecipação da culpa atribuída a Luiz Inácio Lula da Silva. Tal ila-

ção, além de equivocada, resulta de teses – bastante utilizadas pela defesa - que não

encontram respaldo na realidade dos autos.

III.e. Afronta aos artigos 5º, LV e LIV, e 93, IX da Constituição Federal (violação ao princípio da ampla defesa)

III.e.1.

Luiz Inácio Lula da Silva diz, em sua peça, que teria sido submetido a um pro-

cesso penal ilegal, marcado por diversas violações ao princípio da ampla defesa.

Mais uma vez, o ora requerente traz tema que não é passível de ser conhecido em

sede de recurso extraordinário.

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Segundo jurisprudência clássica e bastante conhecida do STF, a alegação de vio-

lação ao princípio do devido processo legal – à ampla defesa e ao contraditório - não enseja

o cabimento de recurso extremo ao STF, por refletir, na verdade, violação meramente reflexa

à Constituição – aqui, a violação direta, caso ocorrente, seria a dispositivos da legislação in-

fraconstitucional. Ademais, o exame dessa alegação demandaria o revolvimento do conjunto

fático probatório subjacente aos autos, o que também não é cabível nessa sede recursal extra-

ordinária (súmula n. 279 do STF).

O STF, em situações semelhantes à presente, tem negado seguimento a recursos

extraordinários:

AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO NO RECURSO EXTRAORDINÁ-RIO. INSUFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO QUANTO A ALEGAÇÃO DE EXIS-TÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. OFENSA CONSTITUCIONAL MERAMENTEREFLEXA. REAPRECIAÇÃO DE PROVAS. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA 279 DOSTF. 1. A obrigação do recorrente em apresentar formal e motivadamente a preliminar de re-percussão geral, que demonstre sob o ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, arelevância da questão constitucional debatida que ultrapasse os interesses subjetivos dacausa, conforme exigência constitucional e legal (art.102, § 3º, da CF/88, c/c art. 1.035, § 2º,do CPC/2015), não se confunde com meras invocações desacompanhadas de sólidos funda-mentos no sentido de que o tema controvertido é portador de ampla repercussão e de sumaimportância para o cenário econômico, político, social ou jurídico, ou que não interessa únicae simplesmente às partes envolvidas na lide, muito menos ainda divagações de que a jurispru-dência do Supremo Tribunal Federal é incontroversa no tocante à causa debatida, entre outrasde igual patamar argumentativo. 2. Recorrente condenado pela prática da conduta descrita noartigo 298, caput, do Código Penal Militar (desacato a superior). A necessidade de revolvi-mento do conjunto fático-probatório impede o acolhimento do recurso extraordinário, umavez que incide o óbice da Súmula 279 desta CORTE. 3. Inviável o exame das alegações deviolação ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada ou aos princípiosdo acesso à justiça, da legalidade, do contraditório, da ampla defesa e do devido pro-cesso legal quando imprescindível o exame de normas infraconstitucionais. Ofensa me-ramente indireta ou reflexa às normas constitucionais. 4. Esta CORTE entendeu, nojulgamento do AI 791.292-QO-RG/PE (Tema 339), que a Constituição da República exigeacórdão ou decisão fundamentados, ainda que sucintamente. A fundamentação do acórdão re-corrido se ajusta às diretrizes desse precedente. 5. Agravo interno a que se nega provimento.(ARE 1049511 AgR, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, jul-gado em 04/04/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-072 DIVULG 13-04-2018 PUBLIC16-04-2018) (grifo nosso)

Ademais, a alegação de violação ao devido processo legal e à ampla defesa não

revela repercussão geral, requisito necessário ao conhecimento do recurso extraordinário

nesse ponto. Esse é o entendimento do STF plasmado no “Tema 660”, infra:

Alegação de cerceamento do direito de defesa. Tema relativo à suposta violação aos prin-cípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido pro-cesso legal. Julgamento da causa dependente de prévia análise da adequada aplicação das

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normas infraconstitucionais. Rejeição da repercussão geral.(ARE 748371 RG, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 06/06/2013,ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-148 DIVULG 31-07-2013 PUBLIC 01-08-2013 )

E, como se sabe, nos termos do art. 1035-§7º do CPC, e segundo jurisprudência

do STF22, as decisões proferidas pelo STF que neguem a repercussão geral a determinado

tema têm eficácia vinculante erga omnes, valendo para todos os casos que tratem de questão

idêntica.

Assim, a alegação ora examinada não é passível de ser conhecida em sede de re-

cuso extraordinário. Todavia, apenas para argumentar, ainda que ela seja conhecida, é certo

que ela deve ser rejeitada.

III.e.2.

III.e.2.a.

Com efeito, o ora requerente sustenta que o juiz, ao longo da instrução processual

ocorrida no bojo da ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR, teria lhe cerceado o di-

reito à ampla defesa, por ter indeferido provas requeridas na resposta à acusação.

Ora, o ora requerente confunde “direito à ampla defesa” com “direito à defesa ili-

mitada”, exercida independentemente de sua utilidade prática para o processo, em razão do

mero “querer” das partes. Enquanto o primeiro direito é, de fato, albergado pela ordem jurí-

dica pátria, o segundo, não apenas não se encontra nela previsto, como é por ela rechaçado.

Nas palavras de Douglas Fischer e Eugênio Pacelli, “a ampla defesa não pode ser confun-

dida com a possibilidade de a defesa escolher a forma que entender mais adequada para a

prova, mesmo que sem qualquer utilidade prática. Ampla defesa não é o que a defesa quer,

mas o que pode fazer à luz da concretização de todos os princípios constitucionais no pro-

cesso penal. Portanto, não está em jogo apenas a ampla defesa, mas também o devido pro-

cesso legal (que é devido pra ambas as partes), em que um dos princípios reguladores

também é a celeridade processual23”.

22 Nos termos do art. 543-A, § 5º, do CPC e dos arts. 326 e 327 do RISTF, a decisão do STF relativa àinexistência de repercussão geral valerá para todos os casos que versem sobre questão idêntica. [AI 728.180AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 10-8-2010, 2ª T, DJE de 1º-10-2010.]

23Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência, 5ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 860.

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Aliás, segundo se infere do art. 400, §1º do CPP, no sistema processual penal bra-

sileiro o juiz é o destinatário da prova e, nessa condição, pode recusar a realização daquelas

que se mostrarem irrelevantes, impertinentes ou protelatórias - desde que, óbvio, fundamente

sua decisão.

No caso dos autos, a defesa de Luiz Inácio Lula da Silva deduziu, em sua res-

posta à acusação, inúmeros pedidos de produção de provas. O julgador, então, no exercício

do seu livre convencimento, examinou cada uma das pretensões defensivas, indeferindo-as

motivadamente, nos seguintes termos24:

“Analiso os requerimentos probatórios:

i - 'Seja determinado ao MPF: que anexe a estes autos (i) cópia de todas as propostas dedelação premiada e eventuais alterações ou modificações apresentadas pelos Senhores:Pedro da Silva Corrêa de Oliveira Andrade Neto; Delcídio do Amaral Gomez; FernandoAntônio Falcão Soares; Pedro Barusco Filho; Milton Pascowitch;Ricardo Ribeiro Pes-soa; Walmir Pinheiro; Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura; Augusto Ri-beiro Mendonça;Eduardo Hermelino Leite; Mario Frederico de Mendonça Goes;AntonioPedro Campello de Souza Dias; Flávio Gomes Machado Filho; Otavio Marques de Aze-vedo; Paulo Roberto Dalmazzo; Rogério Nora de Sá; Nestor Cuñat Cerveró; Paulo Ro-berto da Costa; e Dalton dos Santos Avancini; (ii) a íntegra dos termos de colaboraçãofirmados com os citados delatores e, ainda, eventuais depoimentos complementares (to-dos); (iii) todos os áudios e vídeos relativos às delações premiadas celebradas com os ci-tados colaboradores, inclusive de eventuais depoimentos complementares; (iv) que tragaaos autos o Laudo de Perícia Criminal Federal nº 368/2016-SETEC/SR/DPF/PR, que foireferido no item 171 da denúncia mas não foi anexado à peça; (v)que traga aos autos oacordo de delação premiada firmado com Sérgio Machado e todos os seus anexos, depoi-mentos, vídeos,uma vez que o material foi mencionado no item 34 da Denúncia mas nãoinstruiu a peça; (vi) sejam anexados aos autos os termos de colaboração premiada - comtodos os anexos e declarações- firmados com os seguintes colaboradores, que foram refe-ridos na Denúncia mas não instruíram aquele petitório: Pedro da Silva Corrêa de OliveiraAndrade Neto (anexo 14), Fernando Antônio Falcão Soares (anexo 45), Pedro José Ba-rusco Filho (anexos 46,47), Milton Pascowitch (anexo 48, 53, 54), Ricardo Ribeiro Pes-soa (anexos 51, 52), Walmir Pinheiro (anexo 55), Fernando Antônio GuimarãesHourneaux de Moura (anexo 71), Augusto Ribeiro de Mendonça Neto (anexo 78, 79, 97,287), Eduardo Hermelino Leite (anexo 80), Mario Frederico de Mendonça Goes(anexo81), Flávio Gomes Machado Filho (anexo 84), Otavio Marques de Azevedo (anexo 85),Paulo Roberto Dalmazzo (anexo 86), Rogério Nora de Sá (anexo 87), Julio Gerin de Al-meida Camargo (anexo 125), Antonio Pedro Campello de Souza Dias (anexos 82 e 83) eDalton do Santos Avancini (anexo288);'

Observo que a denúncia já está instruída com cópias de acordos de colaboração firmadose termos de colaboração específicos.

Então a Defesa deve esclarecer a quais acordos ou termos de depoimento se refere e queestariam faltando, discriminadamente. Prazo de cinco dias.

Desde logo, defiro o requerido para que o MPF promova a juntada, em cinco dias doLaudo de Perícia Criminal Federal nº 368/2016-SETEC/SR/DPF/PR, e para esclareça se

24 Evento n. 114 da ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000.

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dispõe de 'propostas' escritas para a colaborações premiadas celebradas no âmbito desteJuízo. Prazo de cinco dias.

ii - 'Seja determinado à PETROBRAS, que encaminhe para estes autos (i) cópia de todasas atas de reuniões ordinárias e extraordinárias do seu Conselho de Administração e doseu Conselho Fiscal, incluindo eventuais anexos, no período compreendido entre1º/01/2003 a 16/01/2016;

(ii) cópia de todas as atas de reuniões ordinárias e extraordinárias da Comissão de Licitaçãoda Companhia no mesmo período e, ainda, de pareceres manifestações emitidos pelo órgãonesse período; (iii) cópia integral dos processos administrativos relativos aos 3 contratosindicados na Denúncia69; (iv) o histórico funcional completo,incluindo, mas não se limi-tando, a informações sobre a data de admissão e forma de admissão, todos os cargos ocu-pados, e órgãos envolvidos na designação de cada cargo exercido na Companhia pelasseguintes pessoas: Delcídio do Amaral Gomez, Nestor Cuñat Cerveró, Paulo Roberto daCosta e Pedro Barusco; (v) todos os elementos relativos aos pagamentos realizados pelaCompanhia ao Grupo OAS em relação aos três contrato sindicados na Denúncia, inclu-indo, mas não se limitando, aos respectivos comprovantes de pagamento, com a indica-ção das datas, locais e meios usados para a realização de tais pagamentos;(vi) cópia deeventuais auditorias financeiras e jurídicas relativas aos três contratos indicados na Den-úncia;'

A pretensão de juntada, no período de 2003 a 2016, de todas as atas de reuniões de Con-selho de Administração, Conselho Fiscal e das dezenas de Comissões de Licitação da Pe-trobrás, não se justifica.

Provas tem um custo e o objeto da denúncia é determinado, relativo a três contratos. Adocumentação da Petrobrás é, portanto, a pertinente aos três contratos e não a todas asatas de reuniões dos órgãos colegiados da Petrobrás em treze anos. Observo, ademais,que a denúncia contém vários documentos relativos aos três contratos celebrados pelaOAS, em consórcio, com a Petrobrás, inclusive os relatórios sobre as auditorias internasrealizadas pela Petrobrás e que foram aparentemente ignorados pela Defesa (v.g. evento3, arquivos comp115, comp141 e comp142).

Considerando, de todo modo, a sentença prolatada na ação penal conexa 5083376-05.2014.4.04.7000/PR, na qual esses contratos foram examinados, forme a Secretariamídia com o conteúdo eletrônico dos eventos 205, 251, 269, 633 e 634 daquela ação pe-nal e afete-se a este processo eletrônico, disponibilizando cópia às partes. Junte a Secre-taria diretamente no processo eletrônico cópia dos seguintes documentos constantes nosseguintes eventos daquela ação penal evento 1, out6, out40, out42, out 66, out 69, out76e out77. Assim, indefiro a juntada de todas as atas de órgãos colegiados da Petrobras emtreze anos assim como todas as atas de comissões de licitação da empresa em treze anos.Caso desses documentos, haja alguns específicos pertinentes, poderá a Defesa discrimi-nar e esclarecer a relevância para eventual nova decisão do Juízo. Prazo de cinco dias.

Relativamente à documentação dos três contratos especificados na denúncia, concedo àDefesa o prazo de 10 dias para eventuais requerimentos de documentos complementaresalém daqueles cuja juntada foi ora determinada.

Defiro desde logo a intimação da Petrobrás, na pessoa de seus defensores, para a jun-tada:

a) do histórico funcional completo, incluindo, mas não se limitando, a informações sobrea data de admissão e forma de admissão, todos os cargos ocupados, e órgãos envolvidosna designação de cada cargo exercido na Companhia pelas seguintes pessoas: Delcídiodo Amaral Gomez, Nesto Cuñat Cerveró, Paulo Roberto da Costa e Pedro José BaruscoFilho; e b) relação sintética com os pagamentos efetuados, indicando valor, data e meio

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de pagamento, relativamente aos dois contratos com o Consórcio RNEST/CONEST e ocontrato com o Consórcio CONPAR.

Prazo de vinte dias para a Petrobrás.

iii. 'Seja determinado à BANCOOP, que encaminhe aos autos: (i)relação de todos os em-preendimentos que foram transferidos ao Grupo OAS; (ii) informação de outros em-preendimentos que foram transferidos as empresas do ramo da construção civil diversasda OAS; (iii) o histórico da transferência desses empreendimentos, incluindo, mas não selimitando, à participação do Ministério Público e eventual(is) homologação(ões)judicial(is) e, ainda, a análise por outros órgãos de controle; (iv) o histórico da cota-parteda Segunda Defendente no empreendimento Mar Cantábrico;'

Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado.É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias.

iv. 'Seja determinado ao CONDOMÍNIO SOLARIS que encaminhe para estes autos (i) cópiade todos os registros de entrada e saída dos Defendentes no Edifício Navia até a presente data- seja por meio de imagens, seja por meio de anotações; (ii) cópia das petições iniciais e rela-tórios sobre o status atual das ações de cobrança de condomínio relativas às unidades de pro-priedade da OAS; (iii) relação de todos os moradores e prestadores de serviços registrados noperíodo compreendido entre 2009 até a presente data;'

Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado.

Como a medida requerida tem custos, deve a Defesa primeiro esclarecer se arcará com oseventuais custos da requisição de dessa informações e documentos.

Deve ainda a Defesa esclarecer o motivo de requisição de cópia de todas as iniciais eações de cobrança de condomínio relativas às unidades de propriedade da OAS, quandono presente feito pertinente apenas um apartamento.

Deve ainda esclarecer o que pretende com a relação de todos os moradores e prestaçãode serviços, já que há questões de privacidade envolvidas.

É ônus da parte apresentar requerimentos determinados, completos e justificados diantede requerimentos probatórios extensos e custosos.

Prazo de cinco dias.

v. 'Seja determinado à GRANERO, que encaminhe para estes autos cópia de todas ascorrespondências e contrato(s) firmado(s) em relação ao acondicionamento do acervopresidencial relativo ao Primeiro Defendente;'

Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado.Observo ainda que o contrato de armazenagem discutido no feito já está nos autos (fl.134 da denúncia), devendo a Defesa melhor esclarecer o que pretende.

É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias.

vi. 'Seja determinado à FAST SHOP S/A que encaminhe para estes autos cópia de notasfiscais relativas a todas as compras realizadas pelo Grupo OAS no estabelecimento noperíodo compreendido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016;'

Não cabe impor à empresa privada o ônus de encaminhar cópia de todas as compras rea-lizadas por empresas do Grupo OAS em treze anos.

Deve a Defesa esclarecer o que pretende e caso insista deverá indicar endereço e repre-sentante a ser provocado, além de empresas e CNPJs do Grupo OAS cujas notas fiscaispretende requisitar. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados, completos ejustificados, máxime diante de requerimentos probatórios extensos e custosos. Prazo decinco dias.

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'vii. 'Seja determinado à KITCHENS COZINHAS E DECORAÇÕES LTDA. que enca-minhe para estes autos cópia de notas fiscais relativas a todas as compras realizadas peloGrupo OAS no estabelecimento no período compreendido entre1º/01/2003 a16/01/2016;'

Não cabe impor à empresa privada o ônus encaminhar cópia de todas as compras realiza-das por empresas do Grupo OAS em treze anos.

Deve a Defesa esclarecer o que pretende e caso insista deverá indicar endereço e repre-sentante a ser provocado, além de empresas e CNPJs do Grupo OAS cujas notas fiscaispretende requisitar. É ônus da parte - e a Defesa sabe disso - apresentar requerimentosdeterminados, completos e justificados, máxime diante de requerimentos probatórios ex-tensos e custosos. Prazo de cinco dias.

'viii. Seja determinado à TALLENTO CONSTRUTORA LTDA. que informe se houvealgum contato feito com a empresa pelos Defendentes e, em caso positivo, encaminhe aestes autos cópia de eventual correspondência e seu objeto;'

Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado.É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias.

'ix. Seja determinado à OAS que informe se (i) contratou palestras de outros ex-Presiden-tes da República do Brasil e, caso seja positiva a resposta, indique os eventos e valoresenvolvidos; (ii) se fez doações a outros ex-Presidentes da República do Brasil ou a enti-dades a eles relacionadas e, caso seja positiva a resposta, indique as datas e valores en-volvidos;'

Deve a Defesa, para viabilizar a prova, indicar endereço e representante a ser provocado.É ônus da parte apresentar requerimentos determinados e completos. Prazo de cinco dias.

'x. Seja determinado à PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA que encaminhe para estes autos in-formações relativas às 84 missões empresariais realizadas pelo Primeiro Defendente no cargode Presidente da República entre os anos de 2003 a 2010, incluindo os destinos e os partici -pantes;'

As oitenta e quatro missões empresariais realizadas pelo ex-Presidente não constituemobjeto da denúncia e aparentam ser prova custosa e de duvidosa relevância. Deve a De-fesa melhor esclarecer a pertinência e relevância da prova, além de, se insistir, indicarendereço e representante a ser provocado. É ônus da parte apresentar requerimentos de-terminados e completos. Prazo de cinco dias.

'xi. Seja determinado ao CONGRESSO NACIONAL que (i)informe o status de todos osprojetos de lei apresentados pela Presidência da República entre os anos de 2003 a 2010,constando, dentre outras coisas, as emendas apresentadas e eventual quórum de aprova-ção; (ii) encaminhe a estes autos cópia integral do relatório final e de todos os documen-tos relativos à 'CPMI do Mensalão';'

Deve a Defesa esclarecer a pertinência e a relevância da apresentação de todos os proje-tos de lei apresentados pela Presidência em dez anos, emendas apresentadas e quórum deaprovação, já que a prova aparenta ser custosa e de duvidosa relevância.

Quanto ao segundo requerimento, o relatório final da CPMI dos Correios está disponívelem http://www.senado.gov.br/comissoes/CPI/RelatorioFinalVol1.pdf desnecessária a re-quisição. Quanto à juntada de todos os documentos relativos à CPMI, deve a Defesa es-clarecer a quais documentos se refere e a pertinência do requerido. Prazo de cinco dias.

'(xii) Seja determinado ao TCU, que encaminhe para estes autos (i)cópia de todos os pro-cedimentos relativos às contas e auditorias da Petrobras relativos ao período compreen-

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dido entre 1º/01/2003 a 16/01/2016, com eventuais pareceres dos auditores e decisõesproferidas nesses procedimentos;'

Deve a Defesa esclarecer a relevância e a pertinência do requerido. A denúncia re-porta-se a três contratos e obras da Petrobrás e não a todos. Inviável requisitar junto aoTCU todos os procedimentos de fiscalização de contas e auditoria da Petrobrás em trezeanos. Prazo de cinco dias.

'(xiii) Seja determinado à CGU que encaminhe para estes autos (i)cópia de todos os pro-cedimentos relativos às contas e auditorias da Petrobras relativos ao período compreen-dido entre 1º/01/2003a 16/01/2016, com eventuais pareceres dos auditores e decisõesproferidas nesses procedimentos;'

Deve a Defesa esclarecer a relevância e a pertinência do requerido. A denúncia re-porta-se a três contratos e obras da Petrobrás e não a todos. Inviável requisitar junto àCGU todos os procedimentos de fiscalização de contas e auditoria da Petrobrás em trezeanos. Prazo de cinco dias.

'(xiv) Seja determinado à empresa PLANNER TRUSTEE que (i)informe a relação con-tratual mantida com a empresa OAS em relação ao Condomínio Solaris, incluindo, masnão se limitando, os recursos disponibilizados para a construção do empreendimento, asgarantias envolvidas e, ainda, o status da operação e, ainda, (ii) encaminhe aos autos có-pia dos documentos correspondentes;'

Deve a Defesa esclarecer a relevância e a pertinência do requerido, por se tratar de provaaparentemente custosa e estranha ao objeto da acusação. Se insistir, indicar endereço erepresentante a ser provocado. É ônus da parte apresentar requerimentos determinados ecompletos. Prazo de cinco dias.

Em relação aos requerimentos em xv, xvi, xvii, deve a Defesa indicar endereço e repre-sentante a ser provocado das três empresas de auditoria. Mais uma vez é ônus da parteapresentar requerimentos determinados e completos.

'(xviii) Seja determinada a realização de prova pericial multidisciplinar a fim de identifi -car (i) se houve desvio de recursos da Petrobras em favor de seus agentes em relação aostrês contratos indicados na Denúncia; (ii) quem seriam os beneficiários dos recursos des-viados; e, ainda, (iii) se houve algum tipo de repasse desses eventuais recursos desviadosem favor dos Defendentes;

'(xix) Seja determinada a realização de prova pericial econômico financeira a fim de apurar(i) se a OAS utilizou diretamente de recursos eventualmente ilícitos oriundos dos trêscontratos firmados com a Petrobras indicados na Denúncia na construção e eventuaisbenfeitorias realizadas no empreendimento Condomínio Solaris ou, ainda, para paga-mento da empresa Granero para armazenagem do acervo presidencial; (ii) os prejuízoseventualmente causados à UNIÃO em virtude dos eventuais desvios verificados em rela-ção a esses três contratos indicados na Denúncia;'

'(xxi) Seja determinada a realização de prova pericial no Condomínio Solaris a fim deapurar (i) a data em que o empreendimento foi finalizado; (ii) a situação das unidades doempreendimento,inclusive no que tange ao registro no Cartório de Registro de Imóveis;(iii) as alterações eventualmente realizadas na unidade164-A após a finalização do Con-domínio Solaris; (iv) o valor da unidade 164-A e das alterações eventualmente realizadasno local; (v) eventual posse da unidade 164-A pelos Defendentes;'

Examino os requerimentos em xviii, ixi e xxi em conjunto.

A ampla defesa, direito fundamental, não significa um direito amplo e irrestrito à produ-ção de qualquer prova, mesmo as impossíveis, as custosas e as protelatórias. Cabe ao jul-gador, como dispõe expressamente o art. 400, §1º, do CPP, um controle sobre a

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pertinência, relevância e necessidade da prova. Conquanto o controle deva ser exercidocom cautela, não se justificam a produção de provas manifestamente desnecessárias ouimpertinentes ou com intuito protelatório. Acerca da vitalidade constitucional de tal regralegal, transcrevo o seguinte precedente de nossa Suprema Corte:

'HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO DE PROVA. SUBSTITUIÇÃO DO ATO CO-ATOR. SÚMULA 691. 1. Não há um direito absoluto à produção de prova, facultando oart. 400, § 1.º, do Código de Processo Penal ai juiz o indeferimento de provas imperti-nentes, irrelevantes e protelatórias. Cabíveis, na fase de diligências complementares, re-querimentos de prova cuja necessidade tenha surgido apenas no decorrer da instrução.Em casos complexos, há que confiar no prudente arbítrio do magistrado, mais próximodos fatos, quanto à avaliação da pertinência e relevância das provas requeridas pelas par-tes, sem prejuízo da avaliação crítica pela Corte de Apelação no julgamento de eventualrecurso contra a sentença. 2. Não se conhece de habeas corpus impetrado contra indeferi-mento de liminar por Relator em habeas corpus requerido a Tribunal Superior. Súmula691. Óbice superável apenas em hipótese de teratologia.

3. Sobrevindo decisão do colegiado no Tribunal Superior, há novo ato coator que desafiaenfrentamento por ação própria.' (HC 100.988/RJ - Relatora para o acórdão: Min. RosaWeber - 1ª Turma - por maioria - j. 15.5.2012)

Assim, as provas requeridas, ainda que com cautela, podem passar pelo crivo de relevân-cia, necessidade e pertinência por parte do Juízo.

O controle da pertinência é ainda mais relevante no caso de prova pericial, já que esta écustosa e demorada. Daí a previsão específica do art. 184 do CPP:

'Art. 184. Salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a autoridade policial ne-gará a perícia requerida pelas partes, quando não for necessária ao esclarecimento da ver-dade.'

As três perícias requeridas são impróprias.

A acusação é singela. Transcrevo novamente da decisão de recebimento da denúncia:

'A partir dessa afirmação, alega o MPF que, como parte de acertos de propinas destinadasa sua agremiação política em contratos da Petrobrás, o Grupo OAS teria concedido, em2009, ao Ex-Presidente vantagem indevida consubstanciada na entrega do apartamento164-A do Edifício Solaris, de matrícula 104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá/SP,bem como, a partir de 2013, em reformas e benfeitorias realizadas no mesmo imóvel,sem o pagamento do preço. Estima os valores da vantagem indevida em cerca de R$2.424.991,00, assim discriminada, R$ 1.147.770,00 correspondente entre o valor pago eo preço do apartamento entregue e R$ 1.277.221,00 em benfeitorias e na aquisição debens para o apartamento.

Na mesma linha, alega que o Grupo OAS teria concedido ao ex-Presidente vantagem in-devida consubstanciada no pagamento das despesas, de R$ 1.313.747,00, havidas no ar-mazenamento entre 2011 e 2016 de bens de sua propriedade ou recebidos como presentesdurante o mandato presidencial.

Em ambos os casos, teriam sido adotados estratagemas subrreptícios para ocultar as tran-sações.

Estima o MPF que o total pago em propinas pelo Grupo OAS decorrente das contrata -ções dele pela Petrobrás, especificamente no Consórcio CONEST/RNEST em obras naRefinaria do Nordeste Abreu e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras naRefinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR, alcance R$ 87.624.971,26.

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Destes valores, R$ 3.738.738,00 teriam sido destinados especificamente ao ex-Presi-dente.'

Pela primeira perícia, pretende a Defesa que os peritos informem se houve desvio de re-cursos da Petrobrás em relação aos três contratos da Petrobrás com o Grupo OAS e separte deles foi destinado ao ex-Presidente.

Pela segunda perícia, quer a Defesa que seja verificado se há é possível estabelecer umrastro financeiro entre os valores recebidos do Grupo OAS e os recursos utilizados paraconstrução do Edifício Solaris ou para pagamento das benfeitorias do apartamento oupara pagamento da armazenagem.

Para ambas as perícias requeridas, não há afirmação, em princípio, na denúncia de queexatamente o dinheiro recebido pelo Grupo OAS nos contratos com a Petrobrás foi desti-nado especificamente em favor do ex-Presidente. Dinheiro é fungível e a denúncia nãoafirma que há um rastro financeiro entre os cofres da Petrobrás e os cofres do ex-Presi-dente, mas sim que as benesses recebidas pelo ex-Presidente fariam parte de um acertode propinas do Grupo OAS com dirigentes da Petrobrás e que também beneficiaria o ex-Presidente. Então a perícia, além de inapropriada, seria inócua pois a acusação não se ba-seia em um rastreamento específico.

A prova é de natureza documental e oral, não é pericial.

Quanto ao requerimento de apuração dos prejuízos sofridos pela Petrobrás nos contratoscom o Grupo OAS, não faz ele parte da acusação. O prejuízo apontado decorreria da prá-tica do cartel e ajuste fraudulento de licitação, imputações que não foram realizadas con-tra o ex-Presidente.

Relativamente a terceira perícia pretendida, é ela desnecessária ou inadequada para defi-nir a data da finalização do empreendimento ou para verificar o registro de imóveis doprédio e principalmente para definir 'eventual posse da unidade 164-A pelos Defenden-tes'.

Esses fatos demandam prova de natureza documental e oral e não pericial.

Enfim, indefiro as três perícias requeridas porque impróprias ou inadequadas aos finspretendidos ou mesmo impertinentes ou irrelevantes.

'(xx) Seja determinada a realização de perícia documentoscópica na 'Proposta de AdesãoSujeita à Aprovação' firmada entre a Primeira Defendente e a BANCOOP a fim de apurar(i) eventual alteração no tocante à indicação da unidade mencionada, (ii)especificar omomento em que foi realizada essa eventual alteração e, ainda, (iii) a autoria dessa even-tual alteração; 'Antes de apreciar o requerido, deve o MPF informar se dispõe do originaldos documentos e questão (fl. 96 da denúncia) e se positivo deve depositá-los em Juízoem cinco dias.

'(xxii) Seja determinada a realização de prova pericial no material compreendido no'Contrato de Armazenagem' indicado na Denúncia a fim de apurar se são 'bens pessoaispertencentes a Luiz Inácio Lula da Silva', como afirma da Denúncia, ou se diz respeito aparte do acervo presidencial do ex- Presidente Luiz Inácio Lula da Silva,na forma defi -nida pela Lei nº 8.394/91.'

Antes de apreciar o requerido, considerando que a própria Defesa afirma que seriam'bens pessoais pertencentes a Luiz Inácio Lula da Silva' e considerando que, no contexto,deve existir uma relação desses bens e a indicação de sua origem, deverá a Defesa apre-sentar a relação desses bens e esclarecer a sua origem, a fim de viabilizar a prova reque-rida. Prazo de dez dias.

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Além dos diversos requerimentos probatórios, arrolou trinta e sete testemunhas, com doisSenadores, dois deputados federais, o Ministro da Fazenda e um Ministro do TCU entreoutros.

Relativamente às testemunhas residentes no exterior, deve a Defesa, sob pena de preclu-são, demonstrar a imprescindibilidade em cinco dias, nos termos do art. 222-A do CPP”.

A mera leitura da decisão acima permite que facilmente se conclua que o Juízo a

quo motivou cada indeferimento de pedido de prova formulado pela defesa de Luiz Inácio

Luiz Inácio Lula da Silva da Siva, fazendo-o no exercício do que lhe permite o art. 400-§1º

do CPP. Em suma, os pedidos indeferidos foram aquelas que o julgador reputou impertinen-

tes, em especial, diante da ausência de correlação entre o que a defesa queria provar e a acu-

sação objeto do processo.

Pretender-se, agora, em sede de recurso extraordinário, instar a Suprema Corte a

substituir a avaliação feita pelo Juízo a quo, sob o pretexto de que esta avaliação não está de

acordo com a pretensão defensiva, ofende-lhe o direito à ampla defesa, é algo que desvirtua o

conteúdo desse direito, o que, por óbvio, não pode ser admitido.

III.e.2.b.

Diz Luiz Inácio Lula da Silva, ainda, que teria havido violação ao princípio da

ampla defesa porque o Juízo a quo “deferiu a produção de prova documental sem conceder à

defesa prazo razoável para análise”.

De início, note-se que essa questão específica foi submetida à analise do TRF4

por meio de Habeas Corpus (n. 5021284- 34.2017.4.04.0000/PR), ao qual foi negado segui-

mento.

No caso, pretendia a defesa do ora requerente que o Juízo a quo lhe tivesse con-

cedido 90 dias para analisar o material juntado aos autos pela Petrobrás, a pedido da própria

defesa.

Em primeiro lugar, trata-se de prazo que não tem previsão legal; além disso, a de-

fesa e a acusação tiveram o mesmo tempo para examinar o material juntado aos autos, sendo

certo que ele era inédito para ambas as partes.

Ademais, embora seja certo que tal documentação era extensa e o seu exame de-

mandaria tempo, é igualmente certo, por outro lado, que seria irrazoável, como queria a de-

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fesa, sobrestar-se a ação penal então em curso até a aferição a integralidade da documentação

solicitada.

Aliás, como bem destacou o Desembargador Federal João Pedro Gebran Neto no

voto (vencedor), que proferiu no julgamento das apelações interpostas nos autos da ação pe-

nal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR. “Analisando detidamente as razões de apelação,

muito embora passados aproximadamente cinco meses da decisão proferida na audiência

registrada no evento 736 (em 20/04/2017, computando-se bem mais que os noventa dias

solicitados, portanto) não se identifica argumentações expressivas acerca da documenta-

ção juntada pela Petrobras. As alegações são apenas genéricas, não havendo este Tribu-

nal, diante de tal contexto, de se dedicar a revisar todo o material para atestar a

pertinência de determinada informação e eventualmente a existência de alguma nulidade,

sem que a própria defesa tenha se desincumbido de tal ônus de modo eficaz. Se não pelo

amor à teoria das nulidades, nada justifica a discussão. Os contratos relativos às imputa-

ções estão acostados aos autos e a análise da documentação solicitada pela própria defesa

não observa prazo especial, porquanto, repita-se, ausente previsão legal. Ao contrário do

que requerido - exame da documentação diretamente na sede da assistente -, a prova efetiva-

mente foi por outro meio produzida e não é passível de oposição a pretensão de prazo que a

parte requerente entende razoável (não inferior a noventa dias)”.

III.e.2.c.

Outra suposta violação ao princípio da ampla defesa, alegada por Luiz Inácio

Lula da Silva, reside na circunstância de que o Juízo a quo teria impedido“arbitrariamente

a gravação das audiências”.

Na hipótese, a defesa pretendia realizar gravação por conta própria da audiência

do interrogatório de Luiz Inácio Lula da Silva, realizado em 10/05/2017, apesar de tal audi-

ência, como se sabe, ser oficialmente gravada pela própria Justiça Federal. Tal pretensão

fundou-se no entendimento da defesa de que a forma como se dá a gravação oficial do inter-

rogatório, pela Justiça Federal, prejudicaria Luiz Inácio Lula da Silva.

Ao indeferir tal inusitado pleito, assim fundamentou o juízo a quo:

1. Designada audiência de interrogatório de Luiz Inácio Lula da Silva para 10/05, às 14:00.

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A Defesa do acusado na petição do evento 772 requer a alteração da forma de captaçãodas imagens da audiência para que seja registrado o que se passa em todo o recinto e nãoapenas o depoimento do acusado.

Comunica ainda que pretende gravar, em áudio e vídeo, a audiência.

2. No termo de 04/05/2017, solicitei esclarecimentos da Defesa de Luiz Inácio Luiz Iná-cio Lula da Silva da Silve e oportunizei manifestação das demais partes. Em petição doevento 793, esclareceu como pretende realizar a gravação. O MPF, em petição do evento792, manifestou-se contrariamente à pretensão da Defesa.

A Defesa de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, em petição do evento 794, mani-festou-se contrariamente à pretensão da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva.

3. Não assiste razão à Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva em afirmar que a forma degravação dos depoimentos em audiência resulte em prejuízo aos acusados.

A câmara é focada no depoente, acusado ou testemunha, porque se trata do elemento pro-batório relevante e que será avaliado pelos julgadores das várias instâncias.

Não há qualquer intenção de prejudicar o acusado ou sugerir a sua culpa com esse foco,tanto assim que o depoimento das testemunhas, que não sofrem qualquer acusação, é re-gistrado da mesma forma.

Aliás, esse é um procedimento não deste Juízo, mas de toda a Justiça Federal da 4ª Re-gião, de gravar os depoimentos com o foco no depoente.

Por outro lado, se é certo que o novo Código de Processo Civil tem norma prevendo apossibilidade de gravação da audiência por qualquer das partes independente de autoriza-ção judicial (art. 367, §6º), também é correto que o Código de Processo Penal não temequivalente previsão legal.

O que há no CPP é somente a previsão legal de gravação audiovisual, sempre que possí -vel, dos depoimentos (art. 405 do CPP). Se o CPP tem norma específica, não se aplicasubsidiariamente o CPC no ponto.

Ademais, considerando que os depoimentos já são gravados, fica sem muito sentido aaplicação subsidiária do art. 367, §6º, do CPC no processo penal.

Nem tudo que é pertinente ao processo civil é igualmente pertinente ao processo penal, jáque o objeto deste normalmente envolve questões mais delicadas, acusações criminais demaior impacto e repercussão do que questões cíveis.

Rigorosamente o art. 367, §6º, do CP, precisa ainda ser melhor avaliado pelas Cortes deJustiça, pois a previsão nele contida contrasta com as praxes habituais dos Tribunais, in-clusive do Supremo

Tribunal Federal, que proíbem que as sessões sejam gravadas em áudio e vídeo pelas par-tes, admitindo somente a gravação oficial.

Além disso, não se ignora que o acusado Luiz Inácio Lula da Silva e sua Defesa pretendemtransformar um ato normal do processo penal, o interrogatório, oportunidade que o acusadotem para se defender, em um evento político-partidário, tendo, por exemplo, convocado mili-tantes partidários para manifestações de apoio ao Ex-Presidente na referida data e nessa ci-dade, como se algo além do interrogatório fosse acontecer.

Assim, há um risco de que o acusado e sua Defesa pretendam igualmente gravar a audi-ência, áudio e vídeo, não com finalidade privadas ou com propósitos compatíveis com osadmitidos pelo processo, por exemplo permitir o registro fidedigno do ocorrido para fina-lidades processuais, mas sim com propósitos político-partidários, absolutamente estra-nhos à finalidade do processo.

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A gravação pela parte da audiência com propósitos político partidários não pode ser per-mitida pois se trata de finalidade proibida para o processo penal.

Também necessário ressalvar que não houve consenso entre as partes acerca da gravaçãopretendida pela Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, tendo havido oposição tanto do Mi-nistério Público Federal como da Defesa de JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO,este acusado, aliás, com tantos direitos como o ex-Presidente.

Na esteira do que afirmam o Ministério Público e a Defesa de JOSÉ ADELMÁRIO PI-NHEIRO FILHO, permitir que um profissional contratado pela parte registre a audiênciapoderia colocar em risco o sigilo da comunicação entre os advogados e entre os represen-tantes do MPF, pois diálogos paralelos poderiam ser captados, e ainda geraria o risco deexposição desnecessária da imagem das pessoas presentes e que já informaram que nãodesejam que suas imagens sejam gravadas e expostas na ocasião.

Assim sendo e com base no art. 251 do CPP, indefiro o requerido na petição do evento772. Será mantida a forma de gravação atual dos depoimentos, focada a câmara no depo-ente, pois é o depoimento a prova a ser analisada, e fica vedada a gravação em áudio evídeo autônoma pretendida pela Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva.

Apesar disso, para evitar qualquer afirmação equivocada de que se pretende esconderalgo na audiência, informo que será efetuada, na referida data, uma gravação adicional deimagens do depoimento do acusado Luiz Inácio Lula da Silva, não frontal, mas lateral-mente e que retratará a sala de audiência com um ângulo mais amplo. Tal gravação ofi-cial será igualmente disponibilizada no processo às partes. Ciência ao MPF, Assistente deAcusação e Defesas.

4. Dispõe o art. 296 da Consolidação Normativa da Corregedoria Regional da Justiça Fe-deral da 4ª Região:

'Art. 296. Durante os trabalhos da audiência, os Juízes deverão adotar as medidas neces-sárias para evitar a captação sonora ou audiovisual, salvo na hipótese de concordânciadas partes e sempre de modo a não prejudicar o normal desempenho da função jurisdici -onal.'

Em vista do ali exposto e de experiência negativa anterior em outra ação penal, na qualconteúdo de depoimento de acusado foi transmitido para veículos de imprensa antesmesmo do fim da audiência, informo às partes, MPF, Assistente de Acusação e Defesas,que será vedado o ingresso, em 10/05/2017, na sala de audiência com aparelhos ceLuizInácio Lula da Silvares.

Ciência ao MPF, Assistente de Acusação e Defesas.

Ora, alegação da defesa de que a gravação do interrogatório pela própria Justiça

Federal prejudicaria Luiz Inácio Lula da Silva dispensa maiores comentários, diante da falta

de fundamento a sustentar tal pretensão. Lembre-se que, há anos, as Varas e Comarcas de to-

dos o país, incluindo as vinculadas ao TRF4, realizam a gravação, por meios próprios, de

suas audiências, sem que tal fato jamais, até onde se sabe, tenha causado qualquer prejuízo às

partes, muito pelo contrário.

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A ideia de que a gravação oficial do interrogatório de Luiz Inácio Lula da Silva

poderia lhe ser prejudicial e que, por isso, se faria necessário que a própria defesa realizasse a

gravação, não encontra respaldo na realidade.

III.e.2.d.

Luiz Inácio Lula da Silva também sustenta que o seu direito à ampla defesa teria

sido ferido porque o Juízo a quo “indeferiu, a seu talante, a inquirição das testemunhas a

respeito de acordos de colaboração premiada celebrados no exterior, autorizando que elas

respondessem apenas o que julgassem conveniente e permitindo que elas se negassem até a

dizer se tais acordos respeitavam as balizas formais diplomáticas”.

Aqui, relembre-se o que se disse anteriormente: no sistema processual penal pe-

nal brasileiro, a prova é dirigida ao convencimento do juiz e a ele cabe, na administração do

processo, identificar a relevância e pertinência das provas pretendidas pelas partes.

No caso ora analisado, verifica-se, inicialmente, que havia uma orientação dos

advogados dos colaboradores para que estes não se manifestassem, em suas oitivas, sobre

acordos no exterior25. Além disso, algumas perguntas que a defesa de Luiz Inácio Lula da

Silva pretendia fazer aos colaboradores não pareciam pertinentes ao processo. Diante disso, o

magistrado a quo instou a defesa para que indicasse por que pretendia aquela prova, ao que

obteve a seguinte reposta: "eu não sou obrigado a adiantar a vossa excelência a estrategia

de defesa26".

25OPERAÇÃO LAVA-JATO'. HABEAS CORPUS. CABIMENTO. PROVA. DEPOIMENTOS.EXCEPCIONALIDADE. UTILIDADE DO PROCESSO. TERMOS DE COLABORAÇÃO ACESSO.PROTEÇÃO POR SIGILO. PERTINÊNCIA COM A DENÚNCIA. JUÍZO INSTRUTÓRIO.COLABORADOR. DEPOIMENTO EM JUÍZO COMO TESTEMUNHA. COMPROMISSO. CORRÉU.DIREITO AO SILÊNCIO. EXCEPCIONALIDADE. LEI Nº 12.850/2013. RÉU. OUTRA AÇÃO PENAL.INEXISTÊNCIA DE PERTINÊNCIA MATERIAL. 1. (...) 5. Inexiste direito da parte a termos de colaboraçãorelativos a fatos não pertinentes ao processo em que foi denunciado e protegidos por sigilo. 6. O sigilo sobre ostermos de colaboração e documentos de outros processos tem por finalidade proteger a própria investigação,cabendo ao juízo de primeiro grau a adequada ponderação. 7. O sistema processual brasileiro não admite aoitiva de corréu na qualidade de testemunha ou, mesmo, de informante, exceção aberta para o caso de corréucolaborador, conforme Lei nº 12.850/2013. 8. O corréu colaborador poderá depor em juízo, inclusivecompromissado em dizer a verdade, seja pela expressa disposição constante no art. 4º, § 14 da Lei nº12.850/2013, seja para atestar a veracidade de suas declarações e assim fazer valer os benefícios previstos noacordo. 9. Não há impedimento a que réu em outra ação penal sirva como testemunha do juízo, quando osdelitos imputados as partes não guardam correlação entre si. 10. Eventual direito ao silêncio do réu tem naturezapessoal e não se mostra agredido com o testemunho a respeito de fatos imputados em outras ações penais. 11.Ordem de habeas corpus denegada. (TRF4, HABEAS CORPUS Nº 5036273- 16.2015.404.0000, 8ª Turma,minha relatoria, por unanimidade, juntado aos autos em 20/11/2015).26 Evento 388 da ação penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR

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Note-se que, não sendo óbvia a relevância e pertinência da prova, como era o

caso, seria obrigação da defesa indicar os motivos pelos quais entende que ela deve ser pro-

duzida. Não o fazendo, mostra-se irrepreensível a decisão judicial do Juízo a quo, que indefe-

riu os questionamentos relativos a colaborações no exterior.

Em verdade, percebe-se que a resposta dada pela defesa ao questionamento do

magistrado foi apenas retórica, pois nem em alegações finais, nem no recurso de apelação (ou

seja, quando não haveria mais razão para ocultar uma suposta “estratégia de defesa”) apare-

ceram as justificativas para a prova pretendida. Assim, a alegação de violação à ampla defesa,

no ponto, é impertinente.

III.e.2.e.

Alega Luiz Inácio Lula da Silva, ainda, que teve seu direito à ampla defesa pre-

judicado porque o Juízo a quo “suprimiu a fase de diligências complementares prevista no

artigo 402 do Código de Processo Penal”.

Conforme se extrai dos autos, na fase de diligências finais pretendeu a defesa sa-

ber junto à Construtora OAS e à OAS Empreendimentos quais seriam as empresas que reali-

zariam auditoria sobre elas e, na sequência, que informassem eventual conhecimento de

algum ilícito praticado por Luiz Inácio Lula da Silva, bem como se teria havido alguma ir-

regularidade na transferência do empreendimento Solaris da Bancoop para a OAS Empreen-

dimentos.

Como pontuado pelo juízo monocrático, a inclusão do apartamento no plano de

recuperação judicial da empresa OAS ou mesmo as auditorias realizadas na empresa em nada

alteram os fatos imputados ao apelante Luiz Inácio Lula da Silva, uma vez que a acusação

posta nos autos é de recebimento do apartamento como parte do pagamento de propina

oriunda dos contratos da Petrobrás. O fato de o apartamento não estar formalmente registrado

em nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não quer dizer que a ele não pertença, e

a instrução demonstrou que esta foi a forma utilizada para camuflar a real propriedade do

bem.

Assim, por entender que as provas pretendidas não tinham qualquer potencial de

interferir na apuração da verdade dos fatos, o magistrado de piso, motivadamente, indeferiu a

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sua produção. O ora requerente, inconformado, pretende que essa Suprema Corte substitua a

avaliação feita pelo Juízo a quo – o que não pode ser aceito.

III.e.2.f.

Por fim, ainda quanto à alegação de que sua ampla defesa teria sido violada ao

longo da ação penal em comento, sustenta Luiz Inácio Lula da Silva que “ao indeferir a

juntada de depoimentos colhidos de ação penal supostamente conexa, promoveu prejuízo

imensurável à defesa, perpetuando a disparidade de armas entre esta e a acusação”.

A juntada dos depoimentos pretendida pela defesa foi indeferida pelo magistrado

a quo por que (i) não demonstrada a relevância e pertinência da prova e (ii) a instrução já ha-

via se encerrado e as respectivas alegações finais já haviam sido apresentadas. Tais motivos

são irrepreensíveis.

Ademais, as novas provas pretendidas não traziam características próprias das di-

ligências complementares da fase do art. 402 do CPP, a qual é reservada às provas surgidas

no curso da ação, sobre as quais as partes não tinham conhecimento ou delas não poderiam

dispor. Sobre o tema, veja-se o quanto afirmado pelo Desembargador Federal João Pedro Ge-

bran Neto no voto que proferiu no julgamento das apelações interpostas nos autos da ação

penal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR:

“ Em 23/02/2017 e muito antes de inaugurada a fase do art. 402 do CPP da ação ora emjulgamento, a defesa já havia juntado rol de testemunhas no evento 80 da Ação Penal nº5063130- 17.2016.404.7000/PR. A contar de então, seguiram-se debates a respeito dapertinência de relevância de uma ou outra testemunha, tendo o juízo exercido a pondera-ção que lhe confere o art. 400, § 1º, da Lei Processual Penal.

Nada obstante as audiências somente terem iniciado em 03/07/2017, não haveria obstá-culo para que a própria defesa, nesta ação penal que ora se examina, tivesse juntado idên-tico ou no mínimo semelhante rol de testemunhas no momento adequado, de maneiraque não poderá alegar a nulidade em razão de pedido extemporâneo, provocado por suaprópria omissão.

Equivale dizer, pertinentes ou não os testemunhos, não há amparo no art. 402 do Códigode Processo Penal para que se admita a juntada de prova de interesse da defesa e a res-peito da qual tinha prévio conhecimento e tempo hábil de requerê-la, inclusive em res-posta à acusação.

Não o fazendo, não pode a defesa exigir que, após encerrada a instrução, a ação penalseja ampliada para deferir o que já poderia ter sido requerido, notadamente em se tra-tando de depoimentos que classifica como tão essenciais, mas que já seriam de conheci-mento antes mesmo da fase de diligências complementares.

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De toda maneira, os depoimentos incorporados à apelação ou mesmo as razões recursaisnada demonstram ou esclarecem com relação aos fatos especificamente imputados, de-vendo-se entendê-los, no máximo, como abonatórios de conduta”.

III.f. Alegação de afronta aos artigos 5º, XXXIX e 93, IX da Constituição Federal (violação ao principio da legalidade)

III.f.1.

Afirma Luiz Inácio Lula da Silva, também, que a sua condenação teria se dado

em violação ao princípio da legalidade, já que (i) ela teria se baseado em interpretação inde-

vidamente ampla ao crime de corrupção passiva previsto no art. 317 do CP; (ii) a sentença e o

acórdão condenaram o requerente por ter recebido vantagem indevida, mas, ao mesmo

tempo, não teria reconhecido que a suposta vantagem (imóvel) não foi transferida para a sua

titularidade. Com isso, teriam inovado e “inventado” um novo verbo para o tipo inscrito no

art. 317 do CP; (iii) não teria sido comprovada a relação entre o suposto recebimento da van-

tagem e a prática, por ele, de um ato de ofício pertencente a sua esfera de atribuições; (iv) o

crime de lavagem de dinheiro a que foi condenado constituiria mero exaurimento de crime de

corrupção passiva anterior. Mais uma vez, sem razão o requerente.

Tais alegações – violações ao princípio da legalidade - também são incabíveis em

sede de recurso extraordinário, por refletirem violação meramente reflexa à Constituição –

aqui, a violação direta, caso ocorrente, seria a dispositivos da legislação infraconstitucional

(ao art. 317, no caso). Aplica-se, neste ponto, a Súmula 636 do STF, segundo a qual “não

cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade,

quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucio-

nais pela decisão recorrida”.

Além disso, a análise dessas alegações demandaria o revolvimento do conjunto

fático-probatório subjacente aos autos, o que também não é cabível nessa sede recursal extra-

ordinária (súmula n. 279 do STF).

A jurisprudência do STF é pacífica no sentido de que a análise acerca da adequa-

ção típica dos fatos integrantes da persecução criminal não dispensa o reexame aprofundado

do conjunto probatório, impróprio em sede de recurso extraordinário. Confira-se:

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AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. MATÉ-RIA CRIMINAL. REJEIÇÃO DA QUEIXA-CRIME. ART. 142, III, CÓDIGO PENAL. MA-TÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA REFLEXA. AUSÊNCIA DETIPICIDADE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICOPROBATÓRIO. INVIABILI-DADE. SÚMULA 279/STF. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. É inviável o pro-cessamento do apelo extremo quando sua análise implica rever a interpretação de normasinfraconstitucionais que fundamentaram a decisão a quo. A afronta à Constituição, se ocor-rente, seria apenas indireta. 2. O necessário reexame de fatos e provas no tocante à ausênciade tipicidade da conduta inviabiliza o conhecimento do recurso extraordinário. Entendimentoda súmula 279/STF. 3. Agravo regimental não provido. (ARE 998893 AgR, Relator(a): Min.EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 18/12/2017, PROCESSO ELETRÔNICODJe-022 DIVULG 06-02-2018 PUBLIC 07-02-2018).

AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. PENAL EPROCESSUAL PENAL. CRIME DE FRAUDE NA LICITAÇÃO. ARTIGO 90 DA LEI8.666/1993. CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA E FALSIDADE IDEOLÓGICA. ARTI-GOS 317 E 299 DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ARTIGO 5º, LIV ELV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA, DO CONTRA-DITÓRIO E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. OFENSA REFLEXA AO TEXTO DACONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ARTIGO 5º, LVII, DACONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. ALEGA-ÇÃO DE UTILIZAÇÃO DE PROVAS ILÍCITAS. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTODO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA279 DO STF. OFENSA AOS ALEGADA VIOLAÇÃO AO ARTIGO 93, IX, DA CONSTI-TUIÇÃO. INEXISTÊNCIA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.(ARE 1076325 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 23/03/2018,PROCESSO ELETRÔNICO DJe-070 DIVULG 11-04-2018 PUBLIC 12-04-2018)

Também falece a tais alegações a repercussão geral necessária ao conhecimento

do recurso extraordinário nesse ponto: ora, definir, no caso concreto, se restaram ou não de-

monstrados o recebimento de vantagem indevida por parte de Luiz Inácio Lula da Silva, ou

a prática de ato de ofício necessário à configuração do crime de corrupção passiva, interessa,

apenas e tão somente, ao ora requerente – sendo certo que não se está diante de “questões re-

levantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interes-

ses subjetivos do processo”, tal qual exige o art. 1035, §1º do CPP.

As alegações ora examinadas não são passíveis de serem conhecidas em sede de

recurso extraordinário, portanto. Todavia, apenas para argumentar, ainda que elas sejam co-

nhecidas, é certo que elas devem ser rejeitadas.

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III.f.2.

III.f.2.a.

Inicialmente, Luiz Inácio Lula da Silva alega afronta ao artigo 317 do CP, uma

vez que foi condenado por receber vantagem indevida consistente em imóvel, mas a sentença

e o acórdão reconheceriam que ele nunca teria tido a sua propriedade ou posse, isto é, que o

bem nunca teria ingressado em sua esfera patrimonial. Por isso, a sua conduta seria atípica,

não preenchendo as elementares previstas no art. 317 do CP.

Ora, o requerente enxerga atipicidade onde obviamente não há, já que, para “rece-

ber” vantagem indevida e, assim, praticar o crime de corrupção passiva previsto no art. 317

do CP, não é necessário que o corrupto tenha, formalmente, a posse ou propriedade do bem.

Na verdade, o que se vê na prática é justamente o contrário: para mascarar a cor-

rupção, a posse ou propriedade do bem dado como vantagem indevida são ocultadas ou dissi-

muladas mediante a prática de uma série de ardis, não havendo atribuição formal das mesmas

ao agente corrompido.

No caso ora sob exame, há material probatório farto nos autos da ação penal n.

5046512-94.2016.4.04.7000/PR no sentido de que o Grupo OAS concedeu a Luiz Inácio

Luiz Inácio Lula da Silva da Silva a posse e propriedade de fato apartamento 164-A, tri-

plex, no Condomínio Solaris, no Guarujá/RJ, bem como a respectiva reforma para adaptá-lo

aos interesses do beneficiário.

Consta dos autos, ainda, que o Grupo OAS custeou a aquisição de mobiliário

feito sob medida para o referido imóvel, tudo de acordo com os interesses da família de Luiz

Inácio Lula da Silva. Em troca, o ex-presidente manteve em pleno vigor o esquema de cor-

rupção que, por anos, saqueou os cofres da Petrobrás.

Eis o resumo das provas documentais constantes dos autos, que respaldam a afir-

mação de que o apartamento triplex foi atribuído ao ex-presidente27:

"a) nos próprios documentos de aquisição de direitos sobre unidade do Residencial Mar Can-tábrico subscritos por Marisa Letícia Lula da Silva, já havia anotações relativas ao aparta-mento triplex, então 174, como se verifica na 'Proposta de adesão sujeita à aprovação'rasurada, com original e vias apreendidas tanto na BANCOOP como na residência do ex-Pre-sidente Luiz Inácio Lula da Silva;

27 Resumo extraído da sentença condenatória.

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b) entre os documentos de aquisição de direitos sobre unidade do Residencial Mar Cantá-brico, foi aprendido 'termo de adesão e compromisso de participação' na residência doex-Presidente e que, embora não assinado, diz respeito expressamente à unidade 174, acorrespondente ao triplex;

c) Luiz Inácio Lula da Silva e Marisa Letícia Lula da Silva pagaram cinquenta de setentaprestações, sendo a última delas paga em 15/09/2009;

d) a BANCOOP transferiu em 27/10/2009 os direitos sobre o Empreendimento Imobiliá-rio Mar Cantábrico à OAS Empreendimentos que o redenominou de Condomínio Sola-ris;

e) todos os cooperados com direito a unidades determinadas tiveram que optar, no prazode trinta dias contados de 27/10/2009, por celebrar novos contratos de compromisso decompra e venda com a OAS Empreendimentos ou desistir e solicitar a restituição de di-nheiro;

f) Luiz Inácio Lula da Silva e Marisa Letícia Lula da Silva não realizaram na época ne-nhuma opção, também não retomaram o pagamento das parcelas e, apesar de termos dedemissão datados de 2009 e de 2013, afirmam, em ação cível de restituição de valorespromovida em 2016, que só requereram a desistência em 26/11/2015;

g) A OAS Empreendimentos ou a BANCOOP jamais promoveram qualquer medida paraque Luiz Inácio Lula da Silva e Marisa Letícia Lula da Silva realizassem a opção entreformalização da compra ou da desistência, nem tomaram qualquer iniciativa para reto-mar a cobrança das parcelas pendentes;

h) A OAS Empreendimento vendeu a terceiro o apartamento 131-A, correspondente aoantigo 141-A, indicado no contrato de aquisição de direitos subscrito por Marisa LetíciaLula da Silva;

i) A OAS Empreendimentos desde 08/10/2009 jamais colocou a venda o apartamento164-A, triplex, Edifício Salinas, Condomínio Solaris, no Guarujá.

j) documentos internos da OAS Empreendimentos apontam que o apartamento 164-A es-tava reservado;

k) O Jornal OGlobo publicou matéria em 10/03/2010, com atualização em 01/11/2011,ou seja, muito antes do início da investigação ou de qualquer intenção de investigação,na qual já afirmava que o apartamento triplex no Condomínio Solaris pertencia a LuizInácio Lula da Silva e a Marisa Letícia Lula da Silva e que a entrega estava atrasada;

l) a OAS Empreendimentos, por determinação do Presidente do Grupo OAS, o acusadoJosé Adelmário Pinheiro Filho, vulgo Léo Pinheiro, realizou reformas expressivas noapartamento 164-A, triplex, durante todo o ano de 2014, com despesas de R$1.104.702,00, e que incluiram a instalação de um elevado privativo para o triplex, insta-lação de cozinhas e armários, demolição de dormitório, retirada da sauna, ampliação dodeck da piscina e colocação de aparelhos eletrodomésticos;

m) a OAS Empreendimentos não fez isso em relação a qualquer outro apartamento noCondomínio Solaris, nem tem por praxe fazê-lo nos seus demais empreendimentos imo-biliários;

n) mensagens eletrônicas trocadas entre executivos da OAS relacionam as reformas doapartamento 164-A ao ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a Marisa Letícia Lula daSilva, tendo elas ainda sido feitas na mesma época em que feitas reformas em sítio deAtibaia frequentado pelo ex-Presidente; e

o) depois da prisão cautelar de José Adelmário Pinheiro Filho em 14/11/2014 e da publi-cação a partir de 07/12/2014 de matérias em jornais sobre o apartamento triplex, Marisa

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Letícia Lula da Silva formalizou junto à BANCOOP, em 26/11/2015, a desistência deaquisição de unidade no Residencial Mar Cantábrico."

Após considerar tais provas documentais, em conjunto com as dezenas de depoi-

mentos prestados por testemunhas e colaboradores ao longo da instrução probatória, o De-

sembargador Federal João Pedro Gebran Neto, no voto (vencedor) que proferiu no

julgamento das apelações interpostas nos autos da ação penal n. 5046512-

94.2016.4.04.7000/PR, concluiu o seguinte:

“(...) há provas suficientes de que a unidade triplex do Condomínio Solaris estava desti-nada a Luiz Inácio Lula da Silva como vantagem, apesar de não formalmente transferidaporque sobreveio a 'Operação Lava-Jato' e a prisão de empreiteiros envolvidos, dentreeles, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO. De todo o exposto, é possível se concluir:

(a) João Vaccari Neto solicitou a LÉO PINHEIRO que a OAS assumisse empreendimen-tos da BANCOOP, pois a cooperativa estava em graves dificuldades financeiras e com asobras paralisadas;

(b) após análise de viabilidade comercial, a OAS decidiu assumir o empreendimento doGuarujá/SP, desde já ciente de que uma das unidades pertenceria ao réu Luiz Inácio Lulada Silva;

(c) foi realizada assembleia de condôminos para ratificação do contrato com a OAS, paraa qual foi expedida notificação, nos idos de 2009;

(d) a ex-Primeira Dama firmou contrato originalmente com a BANCOOP, mas não o re-novou com a OAS, embora também não tenha formulado em tempo adequado o pedidode rescisão do contrato;

(e) em 2010 foi publicada reportagem, em veículo de comunicação de grande circulaçãonacional, noticiando que a unidade triplex, já àquele tempo, pertenceria ao ex-Presidente;

(f) visitas foram realizadas pessoalmente pelo ex-Presidente e sua esposa (fevereiro de2014), bem como por esta e seu filho Fábio (agosto de 2014), no apartamento no Gua-rujá/SP. Na primeira ocasião foram discutidas as reformas que a unidade deveria sofrer,sendo que na segunda oportunidade estas foram vistoriadas;

(g) o apartamento triplex foi objeto das reformas previstas, em consonância com projetosapresentados e aprovados pelo apelante Luiz Inácio Lula da Silva e sua esposa, e elas fo-ram efetivamente custeadas pela OAS Empreendimentos, sendo este fato absolutamentefora dos procedimentos usuais da empresa;

(h) das visitas à unidade participaram dirigentes da empresa OAS, empregados desta,empregados de empresas subcontratadas, além dos réus. Tais pessoas, de modo unânime,confirmaram não apenas a ocorrência das visitas, mas a forma como foram agendadas,datas e detalhes da reforma;

(i) o responsável pela Construtora Tallento, encarregada da reforma, confirmou os fatos,embora não soubesse precisar detalhes sobre a titularidade do bem;

(j) ainda que algumas das testemunhas não soubessem certificar a 'propriedade ou titula-ridade' do triplex, tinham conhecimento por terceiros de que o mesmo pertenceria ao ex-Presidente. A ausência de conhecimento pessoal deve ser entendida como decorrente daprópria natureza dos fatos, porque não se pretendia dar publicidade. Todavia, testemu-

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nhas diretamente envolvidas nos fatos e corréus foram assertivos quanto ao real destina-tário do imóvel;

(k) os altos dirigentes da empresa OAS não apenas tinham ciência dos fatos, como osconfirmaram em juízo, destacadamente JOSÉ ADELMÁRIO, AGENOR, PAULO GOR-DILHO e ROBERTO MOREIRA;

(l) os interrogatórios desses réus, corroborados por diversas provas, são uníssonos sobrea reserva do apartamento, a realização das reformas e a customização conforme projetoapresentado e aprovado pelo ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua esposa (Ma-risa Letícia) por ocasião de apresentação pessoal que JOSÉ ADELMÁRIO e PAULOGORDILHO fizeram na residência do casal em São Bernardo do Campo;

(m) as reformas da unidade se concretizaram de modo excepcional e customizado, o quepressupõe que não estavam sendo feitas para o público em geral, mas para pessoa deter-minada.

Isto é, com natureza bastante diferente daqueles chamados apartamentos decorados;

(n) a OAS administrava uma 'conta de propina', cujos recursos eram destinados ao Par-tido dos Trabalhadores, nos moldes do que foi praticado por outras empreiteiras no co-nhecido 'clube', fato este provado nestes autos (evento 847), bem como nas mais de duasdezenas de outros processos cujo mérito já foi julgado por esta 8ª Turma;

(o) há prova material relativa à troca de informações, email e mensagens de celular, cor-roborando as palavras dos diversos réus, em especial de JOSÉ ADELMÁRIO PI-NHEIRO FILHO;

(p) não foi produzida contraprova que infirme as alegações do réu JOSÉ ADELMÁRIOou que levem à rejeição da premissa de existência de prova acima de dúvida razoável;

(q) o contexto dos fatos, as provas, as regras de experiência e a lógica não permitem che-gar a outra conclusão, salvo a de que o apartamento pertencia ao ex-Presidente Luiz Iná-cio Lula da Silva, ora apelante, cuja titularidade e posse somente não foram transferidasa tempo e modo por força da própria 'Operação Lava-Jato' (que se iniciou publicamenteem março de 2014) e da prisão de diversos empreiteiros em novembro de 2014, dentreeles, JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO;

(r) João Vaccari Neto orientou LÉO PINHEIRO sobre o abatimento da conta geral depropinas dos valores da diferença de preço entre a unidade simples e o triplex, o custeioda reforma, a compra de mobiliários e utensílios somente em um segundo encontro.Também seriam abatidos outros custos de empreendimentos do BANCOOP, passivosocultos que, segundo ele, foram assumidos pela OAS.

(s) o réu Luiz Inácio Lula da Silva, em razão do cargo, atuou diretamente para a manu-tenção de agentes públicos que tinham por missão manter o esquema de financiamentopolítico com propinas decorrentes de contratos firmados pela Petrobras com grandes em-preiteiras;

(t) o réu Luiz Inácio Lula da Silva, também em razão do cargo, teve para si destinado oimóvel triplex do Guarujá/SP, como pagamento de corrupção, correspondente à diferençade preço entre a unidade originalmente compromissada (apartamento 141) e a unidade fi-nal, somado aos custos de personalização (reforma e mobiliário);

(u) dentro desse contexto, deve ainda ser considerado que boa parte dos fatos (diga-se, osmais essenciais, como reformas, compra de utensílios e mobiliário) ocorreu no ano de2014, no decorrer da 'Operação Lava-Jato'.

Assim, verifica-se das provas carreadas aos autos que o apelante Luiz Inácio Lula daSilva tinha ciência de que, apesar da aquisição inicial da unidade 141, tinha reservada

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para si a unidade triplex (164-A, do Edifício Salinas, Condomínio Solaris), sem que ti-vesse vertido recursos para tal aquisição. O réu e familiares estiveram nesta unidade soli -citando modificações estruturais, adaptações (inclusive a instalação de um elevador),edificações, aparelhamento com móveis e utensílios, reformas estas que não apenas fo-ram feitas, mas foram posteriormente vistoriadas.

Ainda a revelar a intenção do agente, há prova quanto à apresentação dos projetos de re-formas ocorridas no imóvel residencial do apelante, com a aquiescência sobre os proje-tos, que levaram a efeito as modificações, como confirmaram LÉO PINHEIRO ePAULO GORDILHO em seus depoimentos.

Inquestionável, ainda, que a empreitada foi realizada às expensas da empresa OAS EM-PREENDIMENTOS, sem que tenha havido qualquer pagamento pelo apelante. Ao revés,houve a autorização de lançamento destas despesas, pelo Diretor Financeiro do partidopolítico, na conta corrente de recursos ilícitos originários da Petrobras.

Este singelo resumo de alguns dos fatos, complementado por tudo aquilo que restouacima dito sobre as provas materiais e testemunhais, permite chegar a uma conclusão se-gura, acima de dúvida razoável, de que o ex-Presidente agiu dolosamente ao receber van-tagem indevida”.

Assim, o fato de o mencionado imóvel ter sido destinado indevidamente a Luiz

Inácio Lula da Silva, apesar de não ter passado formalmente à sua posse ou propriedade, já é

suficiente a configurar o “recebimento de vantagem indevida”, nos termos do art. 317 do CP.

Note-se, aliás, que se está diante de situação em que a posse ou propriedade do mencionado

imóvel foi dissimulada, o que levou à condenação do ora requerente também pelo crime de

lavagem de ativos.

Sem razão, portanto, Luiz Inácio Luiz Inácio Lula da Silva da Silva quanto a

esse ponto.

III.f.2.b.

III.f.2.b.1. Posição do STF sobre o tema

O ora requerente também alega afronta ao artigo 317 do CP, por não ter sido com-

provada a relação entre o suposto recebimento da vantagem e a prática, por ele, de um ato de

ofício pertencente a sua esfera de atribuições.

Inicialmente, relembre-se que, em julgamento proferido em 19 de maio de 2018

nos autos da Ação Penal n. 996, a 2a Turma do Supremo Tribunal Federal entendeu que, para

a configuração do crime de corrupção passiva, deve haver um nexo entre a vantagem inde-

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vida recebida e a possível prática de atos de ofício por parte do funcionário público corrom-

pido.

Nesse mesmo julgamento, a segunda Turma consolidou a posição de que a indi-

cação de pessoas para cargos públicos e/ou a concessão de apoio político para a perma-

nência destas nesses cargos, em troca do recebimento d e vantagem indevida, configura

ato de ofício para fins d o crime de corrupção passiva . Essa posição se mostra bem repre-

sentada no trecho do voto proferido pelo Ministro Ricardo Lewandowski quando do julga-

mento da AP n. 996:

“Na hipótese, cuidando-se o agente público de membro do Congresso Nacional, penso que oato de ofício a ser aferido para fins de configuração da corrupção passiva deve ser conside -rado dentro de um contexto mais amplo que o simples exercício do voto do parlamentar narespectiva Casa Legislativa.

Isso porque, consoante o modelo constitucional vigente, as atividades parlamentarestranscendem a mera análise e proposição de atos legislativos, abrangendo, também, emrazão do denominado sistema de freios e contrapesos, a fiscalização e o controle dos atosdo Poder Executivo, incluídos os da administração indireta, conforme preceitua o art. 49,X, da Constituição Federal.

E, nessa perspectiva, à vista das peculiaridades de nosso regime presidencialista, tais fun-ções podem também compreender a participação ativa do parlamentar tanto na formaçãodo governo, mediante indicação de pessoas para preenchimento de cargos, quanto na in-fluência das próprias decisões governamentais, por meio do penhor de apoio político aochefe do Executivo, garantindo-lhe a indispensável sustentabilidade, diante da miríadepartidária peculiar à nossa ainda jovem democracia (atualmente, existem 35 partidos po-líticos em atividade no país e 73 novas siglas em processo de criação).

(…).

Em suma, filio-me àqueles que entendem que, para configuração do crime de corrupçãopassiva de parlamentar, o exercício efetivo da influência política decorrente do cargopode consubstanciar ato de ofício desse agente público, sempre, no entanto, à luz dascircunstâncias do caso concreto”.

Justamente à luz desse entendimento, o STF condenou o Deputado Federal Nel-

son Meurer a 13 anos e nove meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de

dinheiro.

III.f.2.b.2. A atuação de Luiz Inácio Lula da Silva para garantir a existencia do esquemaque vitimou a Petrobrás

A posição firmada no julgamento acima referido aplica-se, totalmente, ao caso

concreto ora analisado. É que, neste, restou comprovado que Luiz Inácio Lula da Silva

atuou diretamente na nomeação e na manutenção de PAULO ROBERTO COSTA, RE-

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NATO DUQUE, NESTOR CERVERÓ e JORGE ZELADA nas Diretorias de Abasteci-

mento, Serviços e Internacional da PETROBRAS, com ciência e anuência acerca do uso dos

cargos para a arrecadação, junto a empresários com contratos públicos, de propinas para dis-

tribuição a agentes e partidos políticos.

Com efeito, no intuito de conquistar o apoio de grandes bancadas na Câmara dos

Deputados e de contemplar os interesses arrecadatórios e escusos do Partido dos Trabalhado-

res – PT, Luiz Inácio Lula da Silva e JOSÉ DIRCEU passaram a distribuir as principais Di-

retorias da PETROBRAS, notadamente de Abastecimento, de Serviços e Internacional.

Passa-se a discorrer sobre tais fatos, os quais, repise-se, encontram respaldo em

provas constantes dos autos da ação penal em foco, em especial provas testemunhais, todas

citadas na sentença e acórdão condenatórios, às quais se remete o leitor. Conforme, aliás, bem

saliente o voto condutor do acórdão condenatório, “a farta prova testemunhal não pode ser

desmerecida, sobretudo porque no âmbito dos grupos que se dedicam à atividade criminosa

não se registram estatutos. O chamado 'clube' das empreiteiras, com regras cifradas, talvez

seja exceção, mas, ressalte-se que, tal ambiente de delinquência somente foi possível de se

identificar em razão da extrema importância que trouxe o instituto da colaboração premiada

no combate ao crime organizado. É inimaginável que houvesse prova material da influência

política do ex-Presidente no esquema para nomeação de agentes da Petrobras. Isso não des-

qualifica, porém, os testemunhos - alguns ricos em detalhes - colhidos junto a participantes

diretos ou indiretos dos fatos, alguns colaboradores, outros não”.

Inicia-se salientando-se que o próprio Luiz Inácio Lula da Silva admitiu que, em

seu Governo, era sua a palavra final para a indicação de nomes de Diretores da PETRO-

BRAS:

“Juiz Federal:Certo.

Parece que o senhor já respondeu, mas para ficar claro então, era a presidência da repú-blica que enviava e indicava o nome do presidente e dos diretores da Petrobras para oconselho de administração da empresa?

Luiz Inácio Lula da Silva:O Presidente da República, depois de ouvir os partidos, as ban-cadas e os ministros, indicava o conselho da Petrobras, indicava as pessoas.

Juiz Federal:A palavra final era da presidência da república?

Luiz Inácio Lula da Silva:A palavra final não, a indicação final era do conselho da Petro-bras.

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Juiz Federal:A indicação para o conselho da Petrobras, a palavra final dessa indicaçãoera da Presidência da República?

Luiz Inácio Lula da Silva:Era, porque senão não precisava ter presidente.

Juiz Federal:Perfeito.Isso envolvia não só os presidentes da Petrobras, mas também osdiretores?

Luiz Inácio Lula da Silva:Toda a diretoria da Petrobras.28”

Alguns elementos de prova, como o depoimento prestado por Delcídio do Amaral

perante a Procuradoria da República em São Paulo, demonstram a proximidade de Luiz Iná-

cio Lula da Silva nos assuntos da Petrobrás29:

“QUE LULA se reunia com diretores da PETROBRAS também; QUE não sabe ao certoa assiduidade, mas tem certeza que LULA se reunia com tais diretores, com o objetivo deconvencer os diretores de quais eram os projetos de relevo para o Governo; QUE isto eraimportante para que não houvesse discordância e LULA fazia este processo de convenci-mento dos Diretores, o que era essencial para que os projetos fossem aprovados; QUELULA teve contato direto com os diretores, por exemplo, no caso da RNEST; QUE serecorda que houve uma reunião específica de LULA com alguns diretores e com o presi-dente da PETROBRAS sobre a RNEST; (...) QUE LULA participava diretamente dasgrandes discussões da companhia e dos grandes projetos; QUE mais do que outros presi-dentes, LULA tinha noção clara dos projetos que eram mais estratégicos e que eram polí-ticas de governo; QUE LULA participou da definição dos projetos das grandes refinarias,como Abreu e Lima; QUE a decisão de Abreu e Lima foi uma decisão e um projeto degoverno; QUE LULA usou a PETROBRAS como um instrumento e uma política de go-verno clara; (...)”

Luiz Inácio Lula da Silva e JOSÉ DIRCEU acataram a indicação de PAULO

ROBERTO COSTA para o cargo de Diretor Superintendente da TRANSPORTADORA BRA-

SILEIRA GASODUTO BOLÍVIA BRASIL S/A – TBG, empresa subsidiária da PETRO-

BRAS, sendo o Partido Progressista – PP contemplado, ainda, com a Diretoria de

Abastecimento da PETROBRAS, definindo-se que, a partir daquele momento, o Diretor RO-

GÉRIO MANSO passaria a atender ao partido em comento, repassando-lhe recursos.

Referido Diretor, contudo, não concordou em se utilizar do cargo para obter re-

cursos ilícitos das empresas contratadas pela PETROBRAS em favor do Partido Progressista,

manifestando a JOSÉ JANENE, PEDRO CORRÊA e PEDRO HENRY, representantes da

agremiação política, que apenas prestaria satisfações a JOSÉ EDUARDO DUTRA, então

Presidente da Estatal, permanecendo, mesmo depois da intervenção de JOSÉ DIRCEU, reti-

cente quanto a isso.

28 Trecho do interrogatório de Luiz Inácio Lula da Silva, reduzido a termo no evento 885)- destacamos.29 Termo de depoimento juntado à denúncia (evento 3 – COMP65).

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Assim, ventilou-se, no âmbito do Partido Progressista – PP, a substituição de RO-

GÉRIO MANSO por PAULO ROBERTO COSTA, o qual, recentemente nomeado para atuar

na TBG, angariava, à época, em meio a um cenário de queda do orçamento da empresa, cerca

de R$ 200 mil em vantagens indevidas por mês.

Após o comprometimento de PAULO ROBERTO COSTA perante PEDRO COR-

RÊA e JOSÉ JANENE em tutelar os interesses espúrios da agremiação política no âmbito da

PETROBRAS, o Partido Progressista pleiteou perante JOSÉ DIRCEU a mudança do Diretor

de Abastecimento da Estatal.

Entretanto, sozinho, o então Ministro da Casa Civil não logrou êxito em nomeá-

lo. Devido à demora na nomeação de PAULO ROBERTO COSTA, que também envolvia

pleitos não atendidos de outros partidos que estavam se dispondo a integrar a base aliada

(PTB e PV), as três agremiações obstruíram a pauta da Câmara dos Deputados por cerca de 3

meses30.

Na sequência, restou agendada, por JOSÉ DIRCEU, uma reunião com o ex-Presi-

dente Luiz Inácio Lula da Silva, em que presentes PEDRO CORRÊA, PEDRO HENRY,

JOSE JANENE, ALDO REBELO e o Presidente da PETROBRAS à época, JOSÉ EDU-

ARDO DUTRA.

Naquela oportunidade, Luiz Inácio Lula da Silva pressionou JOSÉ EDUARDO

DUTRA para que o Conselho de Administração da Estatal procedesse à nomeação de

PAULO ROBERTO COSTA ao cargo almejado, caso contrário demitiria e trocaria todos os

seus Conselheiros, ao que, finalmente, aproximadamente 06 meses após a sua indicação pelo

Partido, PAULO ROBERTO COSTA restou nomeado ao cargo31.

Ressalte-se, nesse contexto, que a designação de PAULO ROBERTO COSTA ao

cargo, com a aprovação e a atuação direta do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ocor-

reu por insistência do Partido Progressista –PP, ao qual havia sido prometida a Diretoria de

Abastecimento como forma de angariar recursos. Havia uma ampla transparência entre as fi-

30 Nesse sentido, diversas notícias jornalísticas publicadas à época demonstram que, efetivamente, houve otrancamento da pauta no primeiro semestre de 2004, por manobra da oposição, que ganhou o apoio fundamentalde três partidos da base.31 Esses aspectos restaram sublinhados de maneira pormenorizada, em seus depoimentos judiciais, por PEDROCORRÊA, ALBERTO YOUSSEF e DELCÍDIO DO AMARAL, que destacaram, ainda, por oportuno, o diretoenvolvimento do ex- Presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que a nomeação de PAULO ROBERTOCOSTA para um dos principais cargos no âmbito da PETROBRAS. Esses depoimentos foram transcritos eanalisados pela sentença e acordao condenatórios.

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guras políticas envolvidas nesse processo de substituição dos agentes quanto ao verdadeiro

intuito nele imbricado: a arrecadação de propinas para o zelo dos interesses do partido que

lhe dava suporte.

Em seu interrogatório, Luiz Inácio Lula da Silva admitiu que sabia que a nome-

ação de PAULO ROBERTO COSTA foi um pleito do Partido Progressista. A atuação de Luiz

Inácio Lula da Silva no processo de nomeação de PAULO ROBERTO COSTA restou ressal-

tada, ainda, à época, por reportagens jornalísticas baseadas em relatos dos agentes políticos

envolvidos no estratagema criminoso.

De maneira semelhante, a nomeação de RENATO DUQUE para a Diretoria de

Serviços da PETROBRAS proveio da interferência e do poder político de Luiz Inácio Lula

da Silva.

Em meio ao sistema de loteamento de cargos públicos organizado por Luiz Iná-

cio Lula da Silva e JOSÉ DIRCEU, cabia a SÍLVIO PEREIRA, com o auxílio de FER-

NANDO MOURA, organizar o processo de distribuição e submetê-lo à aprovação daqueles,

sintetizando, então, as funções disponíveis, nomes indicados para preenchê-las e os respecti-

vos “padrinhos” políticos, assim como era responsável por entrevistar os pretensos ocupantes

desses cargos.

Nesse sentido, LICÍNIO DE OLIVEIRA MACHADO, sócio da empreiteira

ETESCO, solicitou a FERNANDO MOURA que apresentasse RENATO DUQUE a SÍLVIO

PEREIRA, eis que teria interesse em assumir a Diretoria de Serviços da PETROBRAS.

Aceita a pré-indicação, em reunião realizada entre SÍLVIO PEREIRA, LICÍNIO

MACHADO e RENATO DUQUE, esse se comprometeu a, em assumindo a Diretoria de Ser-

viços da PETROBRAS, zelar pelos interesses do Partido dos Trabalhadores – PT e de seus

representantes, notadamente mediante a arrecadação de propinas de empresas e empreiteiras

contratadas pela Estatal em decorrência de licitações realizadas e contratos que seriam cele-

brados sob sua coordenação.

SÍLVIO PEREIRA, então, levou a indicação de RENATO DUQUE para Luiz

Inácio Lula da Silva e JOSÉ DIRCEU, os quais, anuindo com a escolha, efetivada segundo

suas diretrizes e critérios, providenciaram que ela fosse concretizada perante o Conselho de

Administração da PETROBRAS.

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As etapas do processo de nomeação de RENATO DUQUE ao cargo de Diretor de

Engenharia da Estatal foram mencionadas por MILTON PASCOWITCH perante o Juízo de

primeiro grau , oportunidade em que afirmou:

“Ministério Público Federal:- Além do senhor Pedro Barusco, o senhor mencionou que osenhor conheceu o ex-diretor Renato Duque. Depoente:- Conheci, conheci bastante.

Ministério Público Federal:- O senhor sabe como foi a indicação dele para o cargo de di -retor?

Depoente:- Bom, eu convivia razoavelmente bem com o Fernando Moura e, logo após aeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, começou a indicação das pessoas queiriam ocupar os cargos na Petrobras, o Renato Duque foi indicado por um empresárioamigo do Fernando Moura, Licínio Machado da Construtora Etesco, isso foi levado aoSílvio

Pereira e aí acho que andou pelos trâmites políticos a mais, esse currículo deve ter sidoentregue ao grupo que determinava essas indicações, e do que saiba na hora onde houveuma reunião, onde o José Dirceu acabou indicando o nome do Renato Duque numa dis-puta de dois ou três nomes, eu não sei.”

(trecho do depoimento de MILTON PASCOWITCH, reduzido a termo no evento 417)

Corroborando esses aspectos, tem-se, ainda, o registro de reunião entre Luiz Iná-

cio Lula da Silva e JOSÉ EDUARDO DUTRA, em 17/01/2003, data próxima à nomeação

de RENATO DUQUE para a Diretoria da PETROBRAS ligada ao Partido dos Trabalhadores

– PT. Em sentido semelhante, verifica-se a realização de encontro formal de RENATO DU-

QUE com MARCELO SERENO, Chefe da Assessoria Especial de JOSÉ DIRCEU, realizada

em 24/01/2004, sábado. Ainda sobre a vinculação da nomeação de RENATO DUQUE ao

Partido dos Trabalhadores, impende mencionar a ciência de Luiz Inácio Lula da Silva:

“Juiz Federal:A nomeação do senhor Renato de Souza Duque tinha apoio de algum par-tido, por exemplo, do partido dos trabalhadores?

Luiz Inácio Lula da Silva:Eu disse, eu disse agora, pela informação que eu tenho deveter sido do PT e de outras pessoas.32”

Em seu interrogatório judicial, Luiz Inácio Lula da Silva admitiu um encontro

pessoal com RENATO DUQUE. Admitiu ainda que esse encontro aconteceu após “boatos

nos jornais de corrupção e conta no exterior”, o que evidencia que esse encontro aconteceu

após o início de 2014, quando já em curso ostensivas fases da Operação Lava Jato.

Ora, qual a relação entre um ex-Presidente da República, que havia deixado o

cargo há mais de quatro anos, e um ex-Diretor da PETROBRAS? Por que Luiz Inácio Lula

32 Trecho do interrogatório de Luiz Inácio Lula da Silva, reduzido a termo no evento 885.

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da Silva buscou saber sobre contas no exterior de RENATO DUQUE? A única explicação,

em consonância com a denúncia, é a intrínseca relação de Luiz Inácio Lula da Silva com os

crimes praticados na PETROBRAS, inclusive no toca aos benefícios direcionados a agentes

públicos ligados ao seu partido.

Nesse sentido, observa-se que Luiz Inácio Lula da Silva buscou JOÃO VAC-

CARI NETO para intermediar o encontro. Ora, por qual motivo Luiz Inácio Lula da Silva

procurou exatamente o ex-tesoureiro do Partido dos Trabalhadores para intermediar um en-

contro com o ex- Diretor da PETROBRAS? JOÃO VACCARI NETO já foi condenado por

ser o operador de repasses de propinas no interesse do Partido dos Trabalhadores, decorrentes

de contratos da PETROBRAS. Em tese, não existe relação oficial entre tesoureiro de partido

político e diretor de Estatal pública. Novamente, a melhor explicação, em consonância com a

denúncia, é que VACCARI era próximo de RENATO DUQUE precisamente porque era o in-

termediador de propinas. Ciente dessa relação, Luiz Inácio Lula da Silva se valeu do ex-

tesoureiro para se reunir com RENATO DUQUE.

Ao se reconhecer a ciência sobre a proximidade entre JOÃO VACCARI NETO e

RENATO DUQUE, torna difícil afirmar desconhecimento sobre as atividades ilícitas destes,

pelas quais já restaram condenados. Talvez por isso, em um primeiro momento em seu inter-

rogatório, Luiz Inácio Lula da Silva negou saber da relação entre os dois. Porém, em se-

guida, caindo em flagrante contradição, reconheceu que sabia e que se valeu de VACCARI

para agendar encontro com RENATO DUQUE.

No que tange à nomeação de NESTOR CERVERÓ para a Diretoria Internacional

da PETROBRAS, vinculada ao compromisso de atender interesses da bancada do Partido dos

Trabalhadores – PT, notadamente a arrecadação de vantagens indevidas para a agremiação

política, tem-se que o comando do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva se fez ainda

mais forte.

A assunção do cargo por NESTOR CERVERÓ se deu após a indicação política

de DELCÍDIO DO AMARAL, em conjunto com ZECA DO PT e com os demais integrantes

da bancada desse partido no Mato Grosso do Sul. O próprio DELCÍDIO DO AMARAL con-

tou com apoio político para ser nomeado ao quadro diretivo da PETROBRAS.

Entretanto, em maio de 2005, quando vieram a público graves fatos ilícitos que

envolviam o pagamento de propina a funcionários públicos e a agentes políticos em troca de

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favorecimentos em licitações dos CORREIOS, assim como a partir do aprofundamento das

investigações, que revelaram o estarrecedor esquema do “Mensalão”, sobreveio significativa

perda de apoio político pelo Governo Luiz Inácio Lula da Silva. O PP se encontrava bas-

tante fragilizado sobretudo em decorrência da revelação do envolvimento de seus líderes, es-

pecialmente JOSÉ JANENE, PEDRO CORRÊA e PEDRO HENRY, no estratagema

criminoso desvelado.

Também em virtude dos reflexos da CPI dos CORREIOS, DELCÍDIO DO AMA-

RAL se encontrava em um momento político bastante conturbado.

Nesse contexto, Luiz Inácio Lula da Silva buscou o apoio do PMDB para supe-

rar a crise política e de governabilidade que o afetava, mediante a redistribuição de cargos na

Administração Pública, o que culminou na concessão de uma importante pasta governamen-

tal, o Ministério de Minas e Energia.

Assim, à época, com a anuência de Luiz Inácio Lula da Silva, que possuía inte-

resse em alavancar a captação de recursos ilícitos em favor de agentes políticos do PMDB,

PAULO ROBERTO COSTA passou a representar os interesses dessa agremiação política na

arrecadação de propinas por intermédio da Diretoria Abastecimento da PETROBRAS.

De maneira semelhante, NESTOR CERVERÓ, também com o aval de Luiz Iná-

cio Lula da Silva, passou a representar os interesses do PMDB na arrecadação de propinas

de empresários contratados pela Diretoria Internacional da PETROBRAS.

Já em 2007, buscando o apoio do PMDB para a manutenção da CPMF, Luiz Iná-

cio Lula da Silva atuou ativamente para substituir NESTOR CERVERÓ por JORGE ZE-

LADA na Diretoria Internacional da PETROBRAS, alocando-o, em decorrência dos grandes

valores por ele anteriormente arrecadados em favor do PT, na Diretoria Financeira da BR

DISTRIBUIDORA, como forma de agradecimento.

Embora não tenha adentrado nos detalhes, o próprio ex-presidente Luiz Inácio

Lula da Silva reconheceu por ocasião de seu interrogatório nesses autos que a substituição

de NESTOR CERVERÓ por JORGE ZELADA se deu por reivindicação do PMDB.

A ingerência de Luiz Inácio Lula da Silva quanto aos cargos de poder e estraté-

gicos para as atividades desempenhadas pela PETROBRAS não se resumiu à nomeação de

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importantes Diretores, alcançando, ainda, o posto de maior relevância no quadro da Estatal, a

sua Presidência.

Nesse aspecto, confira-se especial atenção ao depoimento de JOSÉ SÉRGIO GA-

BRIELLI DE AZEVEDO perante o Juízo a quo, oportunidade na qual declinou, expressa-

mente, que, tanto o convite para assumir a Diretoria Financeira da PETROBRAS, quanto o

convite para galgar ao cargo de Presidente da Estatal, foram elaborados, diretamente, pelo en-

tão Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva33.

Assim, não obstante o Estatuto Social da PETROBRAS preveja, em seu artigo

20, que cabe ao Conselho de Administração a nomeação dos Diretores e Presidente da Com-

panhia, sua atuação se mostrou engessada às escolhas políticas e estratégicas do ex-Presi-

dente Luiz Inácio Lula da Silva.

Repise-se: PAULO ROBERTO COSTA, RENATO DUQUE, NESTOR CER-

VERÓ, todos já condenados por corrupção, foram nomeados Diretores durante o Go-

verno de Luiz Inácio Lula da Silva.

Destarte, resta comprovada a atuação e a influência de Luiz Inácio Lula da Silva

no âmbito da PETROBRAS, mormente por meio da nomeação e manutenção de seus Direto-

res, que permitiam o funcionamento ótimo do estratagema criminoso idealizado, garantindo a

governabilidade corrompida, a perpetuação do poder de grupos políticos específicos, sobre-

tudo do Partido dos Trabalhadores – PT, e o enriquecimento ilícito dos integrantes dessa or-

ganização, notadamente mediante o arrecadamento de propinas.

Conforme registrado pelo Desembargador Federal João Pedro Gebran Neto, no

voto (vencedor) que proferiu no julgamento das apelações interpostas nos autos da ação penal

n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR:

33“Ministério Público Federal:- Certo. O senhor tinha alguma vinculação com algum partido político?Depoente:- Sim, sim, eu sou membro fundador do Partido dos Trabalhadores desde 1981, 82.Ministério Público Federal:- O senhor disse que foi presidente da Petrobras de junho de 2005 a fevereiro de2012, e antes desse período o senhor ocupou alguma diretoria na Petrobras? Depoente:- Fui diretor financeiroda Petrobras de 2003 a 2005.Ministério Público Federal:- Certo. Quando o senhor se tornou diretor financeiro, quem fez o convite para osenhor se tornar diretor financeiro da Petrobras? Depoente:- O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente José Eduardo Dutra.Ministério Público Federal:- E quando o senhor se tornou presidente da Petrobrás, quem fez o convite parao senhor se tornar presidente da Petrobras? Depoente:- O presidente Luiz Inácio Lula da Silva . (trecho do depoimento de JOSÉ SÉRGIO GABRIELLIDE AZEVEDO, reduzido a termo no evento 607) – grifamos.

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“há cristalina comprovação da capacidade de influência do ex-Presidente no processo de no-meação dos agentes políticos da Petrobras e sua ciência a respeito do esquema criminoso.Apesar de sua negativa com relação a isso, há clara delineação dos bastidores de indicações eos movimentos de agremiações partidárias na tarefa de manter pessoas de 'confiança' que pu-dessem levar adiante o projeto de financiamento político.

(…) Não passa despercebida, portanto, a capacidade de influência do ex-Presidente noprocesso de nomeação dos agentes políticos da Petrobras e sua ciência a respeito do es -quema criminoso. Apesar da sua negativa, há singular delineação dos bastidores de indi-cações e os movimentos de agremiações partidárias na tarefa de manter pessoas de'confiança' que pudessem levar adiante o projeto de financiamento político.

Há prova acima de dúvida razoável de que o ex-Presidente foi um dos articuladores - se-não o principal - do amplo esquema de corrupção. As provas aqui colhidas levam à con-clusão de que, no mínimo, tinha ciência e dava suporte àquilo que ocorria no seio daPetrobras, destacadamente a destinação de boa parte da propina ao Partido dos Trabalha-dores para financiamento de campanhas políticas.

Episódios como a nomeação dos diretores da Petrobras Paulo Roberto Costa, Nestor Cer-veró e Jorge Zelada, entre outros, não deixam margem de dúvidas de sua intensa ação do-losa no esquema de propinas. Delcídio do Amaral (evento 388) confirmou o estreitorelacionamento do réu Luiz Inácio Lula da Silva com empreiteiras e, mais especifica-mente, com a OAS e com o corréu JOSÉ ADELMÁRIO (…).

(…)

“Havia, nessa esteira, inequívoca ciência do réu com relação aos malfeitos havidos na es-tatal. Ademais disso, dele dependia a continuidade e eficácia do esquema milionáriode financiamento de campanhas eleitorais, de maneira que a sua capacidade de de-cisão e conhecimento dos efeitos e da abrangência do esquema espúrio, mostrou-sefundamental.

Não se cuida, pois, de mero intermediário dos atos de corrupção, mas, sim, do próprioavalista e comandante do 'sistema', a quem se atribuía capacidade política para determi-nar a nomeação de agentes públicos que levassem adiante o projeto criminoso. No ponto,é digna de registro passagem da sentença:

834. Examinadas todas as provas materiais, os depoimentos das testemunhas e osinterrogatórios dos acusados é possível exarar conclusões.

835. Foi provado o esquema criminoso que vitimou a Petrobrás e que envolviaajustes fraudulentos de licitação e o pagamento de vantagem indevida a agentes daPetrobrás, a agentes políticos e a partidos políticos.

836. Tratava-se de um esquema criminal complexo e que envolvia a repartição devantagem indevida entre agentes da Petrobrás, agentes políticos e partidos políti-cos.

837. Executivos chaves dentro da Petrobrás, como no caso Paulo Roberto Costa eRenato de Souza Duque, eram mantidos na estatal como Diretores com a obriga-ção de, além de desempenhar suas funções normais, arrecadar recursos para agen-tes políticos e partidos políticos, que, por sua vez, os garantiam nos cargos. Noprocesso, também arrecadaram recursos em benefício próprio.

838. O ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinha um papel relevante no es -quema criminoso, pois cabia a ele indicar os nomes dos Diretores ao Conselhode Administração da Petrobrás e a palavra do Governo Federal era atendida.Ele, aliás, admitiu, em seu interrogatório, que era o responsável pordar a última palavra sobre as indicações, ainda que elas não fosse ne-

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cessariamente sua escolha pessoal e ainda que elas passassem por mecanismos de controle: […].

Quando se fala em competência para indicação de conselheiros e diretores da Pe-

trobras, por certo não se está a fazer menção à competência formal, aquela de quem efetiva-

mente expede o ato, até porque, em casos como este, o ato de ofício reside na esfera política

de atuação do agente. Contudo, pelo que já foi apurado e inclusive admitido pelos servidores

nomeados - alguns em acordo de colaboração premiada -, tinham eles total conhecimento das

entranhas do esquema montado e nele exerciam papel fundamental. Aliás, justamente em face

da predisposição em aderir às práticas ilícitas é que foram nomeados.

Dessa forma, Luiz Inácio Lula da Silva, valendo-se do seu cargo assim como da

sua posição no cenário político nacional, não apenas orquestrou todo o esquema de arre-

cadação de propinas oriundas da PETROBRÁS por diversos partidos, como também

atuou para que seus efeitos se perpetuassem, nomeando e mantendo em cargos de dire-

ção da mencionada empresa estatal pessoas comprometidas com atos de corrupção e

que efetivamente se corromperam e se omitiram em seu dever de ofício de impedir o re-

sultado criminoso.

Em troca da comprovada atuação exercida por Luiz Inácio Lula da Silva para

permitir o esquema criminoso que vitimou a Petrobrás e beneficiou empreiteiras, inclusive a

OAS, foram-lhe concedidas vantagens indevidas - no caso ora examinado, um bem imóvel

(em 2009) e a sua reforma (em 2014).

A respeito da causa do recebimento da vantagem indevida por Luiz Inácio Lula

da Silva, relevante citar trechos da sentença condenatória:

“852. Definido que o apartamento 164-A, triplex, era de fato do ex- Presidente Luiz InácioLula da Silva e que as reformas o beneficiavam, não há no álibi do acusado Luiz InácioLula da Silva o apontamento de uma causa lícita para a concessão a ele de tais benefí-cios materiais pela OAS Empreendimentos, restando nos autos, como explicação única,somente o acerto de corrupção decorrente em parte dos contratos com a Petrobrás.

853. Provado, portanto, o crime de corrupção.

854. O Grupo OAS, dirigido por José Adelmário Pinheiro Filho, mantinha uma contacorrente geral de propinas com agentes do Partido dos Trabalhadores e que era alimen-tada por créditos provenientes de contratos celebrados pelo Grupo OAS com o GovernoFederal.

855. Alguns desses créditos foram provenientes dos aludidos contratos da ConstrutoraOAS, no âmbito do Consórcio CONEST/RNEST, no montante de dezesseis milhões de

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reais, como parte de vantagem indevida acertada no total de cerca de 2 ou 3% sobre o va-lor do contrato.

856. O ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi beneficiado materialmente por débitosda conta geral de propinas, com a atribuição a ele e a sua esposa, sem o pagamento dopreço correspondente, de um apartamento triplex, e com a realização de custosas refor-mas no apartamento, às expensas do Grupo

OAS.

857. Como foi provado o crime de corrupção, inclusive que o ex- Presidente Luiz InácioLula da Silva foi direta e materialmente beneficiado, a discussão a respeito da suficiên-cia ou não da prova oral para determinar se ele tinha ou não conhecimento do papelespecífico dos Diretores da Petrobrás na arrecadação de propinas passou a ser re-dundante.

858. Não importa que a conta geral de propinas tenha sido formada por créditos de acer-tos de corrupção em outros contratos do Governo Federal. É suficiente para estabelecer onexo causal que o contrato da Petrobrás com a Construtora OAS, no âmbito do Consór-cio CONEST/RNEST, tenha também originado crédito na conta geral.

859. Os créditos de propina e a conta corrente geral de propinas visavam estabeleceruma relação vantajosa do Grupo OAS com o Governo Federal, com parte deles tendoorigem em contrapartidas específicas.

860. No caso em questão, os responsáveis pelos acertos de corrupção e pagamentos daspropinas, José Adelmário Pinheiro Filho e Agenor Franklin Magalhões Medeiros,afirmam que as vantagem indevidas nos contratos da Petrobrás eram uma "regrade mercado" e que não necessariamente estariam vinculadas a uma contrapartida espe-cífica.

861. Não obstante, entre as causas dos pagamentos em questão, ambos afirmam quehouve alteração nos procedimentos da Petrobrás, que passou a convidar a ConstrutoraOAS para grandes obras a partir de 2006 ou 2007, o que a habilitou a ingres-sar no "clube" das empreiteiras que ajustavam fraudulentamente as licitações.

(…).

874. Entretanto, não há como qualificar os créditos e pagamentos no presente caso, quetêm origem em contratos da Petrobrás e destino em benefício material ao ex-Presidente comocaracterizando alguma espécie de doação eleitoral.

875. É evidente, outrossim, pela relação mantida entre o Grupo OAS e o Governo Fede-ral, que os pagamentos não foram realizados para atender simplesmente a agentes doPartido dos Trabalhadores e, sim, para atender agentes do Partido dos Trabalhadores queocupavam cargos na cúpula do Governo Federal,entre eles o então Presidente Luiz InácioLula da Silva.

876. Então trata-se de pagamentos efetuados a agente público federal por solicitação oucom aprovação deste, o que configura crime de corrupção e não outro crime ou condutalícita.

877. Parte dos benefícios materiais foi disponibilizada em 2009, quando a OAS Em-preendimentos assumiu o empreendimento imobiliário, e parte em 2014, quando das re-formas e igualmente, quando em meados de 2014, foi ultimada a definição de que opreço do imóvel e os custos das reformas seriam abatidos da conta corrente geral da pro-pina, o que teria ocorrido, segundo José Adelmário Pinheiro Filho, em reuniões havidasem 09 e 22 de junho de 2014.

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878. Foi, portanto, um crime de corrupção complexo e que envolveu a prática de diver-sos atos em momentos temporais distintos de outubro de 2009 a junho de 2014, aproxi-madamente.

879. Parte do acerto de corrupção ocorreu ainda durante o mandato presidencial, ou seja,quando Luiz Inácio Lula da Silva ainda detinha a condição de agente público federal.

880. Mesmo tendo parte dos benefícios materiais sido disponibilizada posteriormente,durante o ano de 2014, tendo eles origem em créditos decorrentes de contratos da Cons-trutora OAS celebrados em 10/12/2009, considerando aqui somente os contratos do Con-sórcio CONEST/RNEST, configuram vantagem indevida disponibilizada em razão docargo de agente público federal, não só para o então Presidente, mas para os igualmentebeneficiários executivos da Petrobrás.

881. Não importa que o acerto de corrupção tenha se ultimado somente em 2014, quandoLuiz Inácio Lula da Silva já não exercia o mandato presidencial, uma vez que as vantagenslhe foram pagas em decorrência de atos do período em que era Presidente da República.

(…)

890. (…). É certo que, provavelmente, o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva não ti-nha conhecimento de detalhes e nem se envolvia diretamente nos acertos e arrecadaçãode valores, pois tinha subordinados para tanto, mas tendo sido beneficiado material-mente de parte de propina decorrentes de acerto de corrupção em contratos da Petro-brás, ainda que através de uma conta geral de propinas, não tem como negarconhecimento do esquema criminoso.

891. Não se deve olvidar que o esquema criminoso era complexo, com vários participan-tes e, embora coubesse aos Diretores da Petrobrás ou aos operadores realizar os acertosde corrupção, a sua permanência no cargo dependia de sua capacidade em arrecadar re-cursos aqueles que os sustentavam politicamente, entre eles o então Presidente”.

Presente, portanto, todas as elementares do tipo inscrito no art. 317 do CP, sendo

aplicável, ainda, a causa de aumento prevista no parag. 1º do mencionado dispositivo legal.

III.f.2.c.

O ora requerente também alega afronta ao artigo 317 do CP porque o crime de la-

vagem de dinheiro a que foi condenado constituiria mero exaurimento de crime de corrupção

passiva anterior, em relação ao qual também foi condenado, de modo que estaria sendo inde-

vidamente responsabilizado duplamente por um mesmo fato. Mais uma vez, não tem razão o

requerente.

Sabe-se que, assim como Luiz Inácio Lula da Silva, não raras vezes investiga-

dos ou réus por crimes de lavagem de capitais, quando também o são pelos crimes anteceden-

tes que lhes geraram a riqueza lavada (em hipóteses fáticas configuradoras da chamada

autolavagem), alegam que o fato de serem responsabilizados por tentarem dissimular ou

ocultar a riqueza por eles obtida ilicitamente, conferindo-lhe aparência de legalidade, consti-

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tui uma indevida tentativa de responsabilizá-los por fatos posteriores impuníveis, ou que con-

figuram mero exaurimento do crime anterior (o que deveria levar à absorção desses fatos pelo

delito antecedente, sob pena de estar diante de dupla punição por uma mesma conduta, fe-

rindo, com isso, o princípio do ne bis in idem).

Sobre o tema, esclareça-se, de início, que a tanto a doutrina quanto a jurisprudên-

cia brasileiras admitem a possibilidade de o autor do crime antecedente ser responsabilizado

também pela lavagem do dinheiro recebido a título de propina (autolavagem). Tratando-se de

ponto pacífico, sobre ele não se tecerá maiores considerações nesta sede.

A controvérsia que ainda circunda o tema reside, todavia, em se definir se é pos-

sível, ou não, punir-se a autolavagem quando o momento consumativo do crime antece-

dente coincidir com o momento consumativo do crime de lavagem; ou seja, quando uma

mesma conduta consumar o crime antecedente gerador dos ativos ilicitos e o crime de lava-

gem desses ativos.

É o que ocorre, por exemplo, quando aquele que praticou a corrupção passiva já

recebe as vantagens indevidas de modo disfarçado ou dissimulado.

Para alguns – inclusive para o MPF -, está-se diante, nessa hipótese, de situação

clássica, legítima e possível, de concurso formal impróprio (art. 70 do CP, segunda parte), em

que se pune um mesmo agente, segundo as regras do concurso material, quando ele, mediante

uma só conduta, pratica dois crimes diversos de modo doloso e com desígnios autônomos.

Esse é o entendimento, por exemplo, do Ministro Ricardo Lewandowki, manifestado no voto

que proferiu no recente julgamento, pela 2a Turma do STF, da Ação penal n. 99634. Con-

fira-se:

“Gostaria de deixar essa premissa bem esclarecida em meu voto: admito a coexistência daprática dos crimes de corrupção passiva e lavagem por um mesmo agente, mas desde que secomprove a realização de dolos distintos para cada um desses delitos. Em outras palavras,não aceito a imposição de dupla punição automática advinda de um único fato delituoso, senão estiverem devidamente comprovados os distintos dolos”.

(…).

“Um réu só pode ser condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro se verifi-cada a ocorrência de dolos distintos. Isto é, deve ficar devidamente demonstrada, e nãoimplícita, a vontade livre e consciência de realizar o branqueamento de capitais, com oescopo de limpar o dinheiro sujo”.

34 Julgamento ocorrido em 29 de maio de 2018, cujo acórdão ainda pende de publicação.

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Para outros, punir-se o sujeito ativo da corrupção passiva também pela prática de

lavagem de capitais consistiria em indevida dupla punição por um mesmo fato; sob essa

ótica, a punição da autolavagem pressuporia, sempre, a prática de atos de ocultação autôno-

mos e distintos do crime antecedente, que já deve estar consumado35”. Foi o que decidiu o

Pleno do STF ao julgar os Sextos Embargos Infringentes na Ação Penal n. 470 (caso mensa-

lão), cujo acórdão segue abaixo:

EMBARGOS INFRINGENTES NA AP 470. LAVAGEM DE DINHEIRO. 1. Lavagemde valores oriundos de corrupção passiva praticada pelo próprio agente: 1.1. O rece-bimento de propina constitui o marco consumativo do delito de corrupção passiva, naforma objetiva “receber”, sendo indiferente que seja praticada com elemento de dissimu-lação. 1.2. A autolavagem pressupõe a prática de atos de ocultação autônomos do pro-duto do crime antecedente (já consumado), não verificados na hipótese. 1.3. Absolviçãopor atipicidade da conduta. 2. Lavagem de dinheiro oriundo de crimes contra a Admi-nistração Pública e o Sistema Financeiro Nacional. 2.1. A condenação pelo delito delavagem de dinheiro depende da comprovação de que o acusado tinha ciência da origemilícita dos valores. 2.2. Absolvição por falta de provas 3. Perda do objeto quanto à im-pugnação da perda automática do mandato parlamentar, tendo em vista a renúncia doembargante. 4. Embargos parcialmente conhecidos e, nessa extensão, acolhidos para ab-solver o embargante da imputação de lavagem de dinheiro.

Ocorre que, no presente caso concreto, a situação fática posta nos autos não

atrai a controvérsia, acima resumida, que ainda existe em torno do tema da autolava-

gem.

É que os atos de corrupção passiva praticados por Luiz Inácio Lula da Silva são

distintos e mesmo anteriores aos atos de lavagem por ele executados , não havendo a preten-

dida confusão entre os dois crimes, aventada pela defesa. Ou seja: está-se diante de atos dis-

tintos, praticados com dolos distintos, configurando típica situação de concurso material.

35 Esse entendimento está bem resumido no voto do Ministro Cézar Peluso, citado pelo Ministro Luiz RobertoBarroso no voto que proferiu no julgamento dos mencionados embargos infringentes: “Tanto o Ministro Relatorquanto o ilustre Revisor salientaram que, no julgamento do Inq. nº 2471, do qual foi Relator o Ministro RicardoLewandowski, esta Corte reconheceu a possibilidade de imputação simultânea, ao mesmo réu, do delitoantecedente do crime de lavagem. Com efeito, trata-se de uma hipótese possível, mas que depende, a meu ver,da demonstração de atos diversos e autônomos daquele que compõe a realização do delito antecedente .Nesse sentido, por exemplo, um crime de corrupção que se opere pelo superfaturamento de obras públicas temcomo fato essencial do seu cometimento a adulteração dos orçamentos e dos preços atribuídos aos insumos daobra, e, com a atribuição de um preço superior ao verdadeiro, é que se dá a fraude, o que não significa que aocultação do verdadeiro preço do produto seja parte do processo de lavagem [...] Em suma, considero possívela hipótese da chamada autolavagem, se, por exemplo, alguém recebe um dinheiro ilicitamente, ao invés deusá-lo por si, incumbe outrem de, em nome deste, adquirir-lhe bem ou bens, caso em que pratica duasações típicas distintas, a do primeiro crime, consistente em receber licitamente, e a do segundo, que é aocultação do produto do primeiro crime”. (fls. 53.787-53.788)

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Com efeito, parte dos benefícios materiais indevidos foi disponibilizada de fato a

Luiz Inácio da Silva em 2009, desde a transferência do empreendimento imobiliário da

BANCOOP para a OAS Empreendimentos em 08/10/2009, com ratificação em 27/10/2009.

Outra parte lhe foi destinada em 2014, quando das reformas e igualmente, quando em meados

de 2014, foi ultimada a definição de que o preço do imóvel e os custos das reformas seriam

abatidos da conta corrente geral da propina, o que teria ocorrido, segundo José Adelmário Pi-

nheiro Filho, em reuniões havidas em 09 e 22 de junho de 2014.

Segundo afirmou ao Juízo a quo José Adelmário Pinheiro Filho: "o apartamento

era do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde o dia que me passaram para estudar os

empreendimentos da BANCOOP, já foi me dito que era do Presidente Luiz Inácio Lula da

Silva e de sua família, que eu não comercializasse e tratasse aquilo como uma coisa de pro-

priedade do Presidente".

Por outro lado, a real titularidade do imóvel foi mantida oculta mediante diversos

atos comprovados de ocultação e dissimulação (como fraudes documentais nos documentos

de aquisição), de 2009 até pelo menos o final de 2014, ou mais propriamente até a presente

data, tudo com perfeita ciência de Luiz Inácio Lula da Silva.

Aliás, era clara a preocupação de Luiz Inácio Lula da Silva em não se vincular

nem ao apartamento nem às reformas que nele foram feitas, justamente a fim de manter

oculta sua relação com o bem. Nesse sentido são as declarações de José Adelmário:

“Em julho ou agosto de 2014, eu não sei se foi por iniciativa nossa ou por iniciativa da famí-lia do presidente, que queriam retornar para visitar o apartamento triplex, eu comuniquei, eufui lá no instituto e o presidente me disse 'Olha, tem campanha eleitoral, não vai ficar bom,não vai ficar bem eu comparecer, está muito próximo da campanha, isso vai ser explorado,teria algum problema de ir, meu filho iria com a dona Marisa e você mandaria alguém' e tal,eu de novo me ofereci e fui, e visitamos, estava tudo ok, eles aprovaram tudo que estava...”

Sobre o ponto, confira-se trecho da sentença condenatória:

“893. A atribuição a ele de um imóvel, sem o pagamento do preço correspondente e comfraudes documentais nos documentos de aquisição, configuram condutas de ocultação edissimulação aptas a caracterizar crimes de lavagem de dinheiro.

894. A manutenção do imóvel em nome da OAS Empreendimentos, entre 2009 até pelomenos o final de 2014, ocultando o proprietário de fato, também configura conduta deocultação apta a caracterizar o crime de lavagem de dinheiro.

895. A agregação de valor ao apartamento, mediante a realização de reformas dispendio-sas, mantendo-se o mesmo tempo oculta a titularidade de fato do imóvel e o beneficiário dasreformas, configura igualmente conduta de ocultação apta a caracterizar o crime de lavagemde dinheiro.

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896. Embora sejam condutas de ocultação e dissimulação talvez singelas, a sofisticaçãonão constitui elemento necessário à caracterização do crime de lavagem de dinheiro (acomplexidade não é inerente ao crime de lavagem, conforme precedente do RHC80.816/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma do STF, un., j. 10/04/2001).

897. Não vislumbro concomitância ou confusão entre os crimes de corrupção e de lavagem.

898. O imóvel foi atribuído de fato ao ex-Presidente desde a transferência do empreendi-mento imobiliário da BANCOOP para a OAS Empreendimentos em 08/10/2009, com ra-tificação em 27/10/2009. Repetindo o que disse JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIROFILHO, 'o apartamento era do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde o dia que mepassaram para estudar os empreendimentos da BANCOOP, já foi me dito que era do Pre-sidente Luiz Inácio Lula da Silva e de sua família, que eu não comercializasse e tratasseaquilo como uma coisa de propriedade do Presidente'. A partir de então,através de condu-tas de dissimulação e ocultação, a real titularidade do imóvel foi mantida oculta até pelomenos o final de 2014 ou mais propriamente até a presente data.

899. De forma semelhante, os acertos de corrupção remontam a 2009, durante a contrata-ção pela Petrobrás do Consórcio CONEST/RNEST, ainda que a definição final da utili-zação de parte dos créditos em benefício do ex-Presidente tenha ocorrido posteriormente,em meados de 2014.

900. Mesmo considerando a definição final do acerto de corrupção em junho de 2014,prosseguiram as condutas de ocultação e dissimulação, inclusive com as reformas até ofinal de 2014, pelo menos, ou mais propriamente até a presente data.

901. Também tendo presente esses fatos, as condutas de ocultação foram posteriores ouse estenderam temporalmente mesmo após a consumação dos últimos atos relativos aodo crime de corrupção.

902. Não há, portanto, confusão entre corrupção e lavagem, tendo esta por antecedente ocrime de corrupção.

No mesmo sentido é o voto proferido pelo Desembargador Federal João Pedro

Gebran Neto no multi citado julgamento das apelações interpostas nos autos da ação penal n.

5046512-94.2016.4.04.7000/PR:

“Sustenta a defesa, em tese alternativa, que à corrupção e à lavagem de dinheiro deve-seaplicar o entendimento segundo o qual esta é mero exaurimento daquela.

(…).

A norma possui objeto muito claro, não apenas o de criar mais um tipo penal, mas, tam-bém, o de estabelecer a natureza autônoma do crime de lavagem de dinheiro com relaçãoao seu antecedente, no caso, já exaurido pela disponibilização de créditos em favor deLuiz Inácio Lula da Silva em 2014.

Nos crimes de corrupção, cabe recordar, o efetivo pagamento sequer é essencial ao tipopenal. Nessa conjugação de balizas, é impensável admitir-se, como regra geral, que o ato- posterior, autônomo e sem necessária relação com o antecedente - tendente a ocultar oudissimular a origem ilícita de dinheiro já incorporado ao patrimônio do agente seja meroexaurimento da corrupção.

Caso contrário, equiparar-se-ia aquele que recebe dinheiro da corrupção e nada mais faz,com aquele que busca - com nova conduta - incorporar o proveito do crime dando-lhe aaparência de legalidade. Neste caso, diferentemente daquele citado no item 3.4.2.4 (Land

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Rover Evoque de Paulo Roberto Costa), há condutas que extrapolam a tipificação docrime antecedente, de modo que não se pode tratá-las como seu mero desdobramento.

Demais disso, constatou-se a ocorrência de operações de compensação entre contas dediferentes empresas do Grupo OAS (OAS EMPREENDIMENTOS S.A. e CONSTRU-TORA OAS LTDA.), como forma de repassar as vantagens indevidas e dificultar o ras-treamento dos valores ilícitos. Isso, por si só, caracteriza a técnica de lavagem por meramovimentação, intitulada de mescla, como destacado em razões finais do órgão de acusa-ção.

Embora seja singela a técnica utilizada, pelo menos com relação aos últimos atos, a ma-nutenção de bem em nome de terceiro - em particular com o encobrimento da verdadepela própria incorporação do empreendimento habitacional - caracteriza ato de lavagemde dinheiro.

Não fosse o farto conjunto probatório e os atos posteriores na tentativa de fazer desapare-cer qualquer vínculo jurídico com o imóvel (denúncia do contrato e exclusão do impostode renda) o álibi seria satisfatório, porque não se poderia, em uma situação normal, sus-peitar da razão de permanência do imóvel em nome da construtora até a destinação final.Contudo, reforce-se, o triplex nunca foi comercializado ou oferecido a terceiros, semcontar o elevado e incomum investimento em melhorias do imóvel.

Nesse sentido, anotou o Ministério Público Federal que 'consistiu na ocultação do beneficiá-rio dos valores decorrentes da prática criminosa. Tanto o triplex permaneceu em nome daOAS, quanto as obras e o mobiliário foram contratados em nome da empresa, tendo sido con-tra ela emitidas as respectivas notas fiscais. E isto basta à configuração do crime de lavagem.Importante também trazer dados do processo que demonstram a perfeita ciência do ilícito e apreocupação de Luiz Inácio em não se vincular nem ao apartamento nem às reformas que fo-ram feitas'.

Assim, as diversas condutas de ocultação da titularidade do imóvel praticadas por

Luiz Inácio Lula da Silva, caracterizadoras da lavagem de ativos, estenderam-se tempo-

ralmente mesmo após a consumação dos últimos atos relativos ao crime de corrupção pas-

siva. Há, portanto, condutas autonomas e distintas, aptas a caracterizarem crime de corrupção

passiva e lavagem de capitais, de modo que não há que se falar em dupla punição por um fato

único.

III.g. Afronta aos artigos 5º, XLV e XLVI, e 93, IX da CR – Individualização da pena.

III.g.1.

Assim como ocorre com as outras alegações recursais já examinadas anterior-

mente, a presente também não é passível de ser conhecida em sede de recurso extraordinário,

por refletir, na verdade, violação meramente reflexa à Constituição – aqui, a violação direta,

caso ocorrente, seria a dispositivos da legislação infraconstitucional.

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Além disso, a análise dessas alegações demandaria o revolvimento do conjunto

fático-probatório subjacente aos autos, o que também não é cabível nessa sede recursal extra-

ordinária (súmula n. 279 do STF).

O STF, em situações semelhantes à presente, tem negado seguimento a recursos

extraordinários:

“EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Matéria criminal. Au-sência de prequestionamento. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356 da Corte. Ofensa reflexaà Constituição. Configuração. Precedentes. Dosimetria de pena. Ausência de repercussão ge-ral. Recebimento da denúncia. Ausência de fundamentação. Inexistência de violação do art.93, IX, da Lei Maior. Precedentes. Agravo regimental não provido. 1. Não se admite o re-curso extraordinário quando os dispositivos constitucionais que nele se alega violados não es-tão devidamente prequestionados. Incidência das Súmulas nºs 282 e 356/STF. 2. O Tribunal aquo decidiu a matéria com base no Código de Processo Penal. É pacífica a jurisprudência no

sentido de que a ofensa ao princípios do contraditório e da ampla e do devido processo legal,quando depende, para ser reconhecida como tal, da análise de normas infraconstitucionais,não configura ofensa direta e frontal à Constituição da República. Portanto, a violação daConstituição, se ocorresse, seria indireta ou reflexa. Precedentes. 3. O STF concluiu pela au-sência de repercussão geral de questões relativas à dosimetria de pena (AI nº 742.460/RJ, Re-lator o Ministro Cezar Peluso, DJe de 25/9/09). 4. É firme a jurisprudência da Corte nosentido de que as questões relativas à individualização da pena configuram ofensa reflexa aotexto constitucional, por demandar exame prévio da legislação infraconstitucional. 5. É pací-fica a jurisprudência da Corte no sentido de que o recebimento da denúncia, por não ser atodecisório, não reclama fundamentação. Precedentes. 6. Agravo regimental não provido.”(ARE 845.341-AgR/DF, Rel. Min. Dias Toffoli – grifos meus).

Ademais, como se dá com as demais alegações antes examinadas, também falece

à alegação objeto deste tópico a repercussão geral necessária ao conhecimento do recurso ex-

traordinário nesse ponto.

Assim, a alegação ora examinada também não é passível de ser conhecida em

sede de recuso extraordinário. Todavia, apenas para argumentar, ainda que ela seja conhecida,

é certo que ela deve ser rejeitada.

III.g.2.

A defesa alega que, no julgamento da apelação: (i) a pena-base relativa ao crime

corrupção passiva teria sido artificialmente majorada quase quatro vezes acima de mínimo le-

gal com a exclusiva finalidade de evitar a prescrição da pretensão acusatória; (ii) que não te-

riam sido analisadas individualmente as circunstâncias judiciais do caso concreto, o que

gerou a fixação da pena “em bloco”; (iii) a função pública ocupada pelo requerente ao tempo

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da suposta prática do crime de corrupção passiva seria elementar do tipo, não podendo ser va-

lorada como uma circunstância judicial negativa.

Tais argumentos não impõem melhor sorte ao recorrente.

Inicialmente, assinale-se que se está diante de crimes praticados por ex-Presi-

dente da República no âmbito do maior escândalo de corrupção que o Brasil já conheceu – e

um dos maiores da história mundial. Trata-se de caso que demanda uma punição proporcional a

essas características.

É preciso compreender que a lei tem parâmetros mínimos e máximos, pois as con-

dutas ostentam graus de censura. Se há um caso na história em que as penas deveriam se apro-

ximar da máxima, é este. Exatamente por isso, diante dos contornos dos crimes praticados por

Luiz Inácio Lula da Silva, era de se esperar que as penas aplicadas, após a análise das cir-

cunstâncias judiciais, tenham se aproximado do maior patamar de gravidade previsto pelo le-

gislador.

Tendo isso em mente, o acórdão condenatório apreciou individualmente as cir-

cunstâncias judiciais previstas no art. 59 do CP, explicando a análise negativa ou positiva

feita acerca de cada uma delas. Não há que se falar, portanto, em fixação da pena “em bloco”

ou de violação aos incisos XLV e XLVI do artigo 5º da CF.

Percebe-se que quatro circunstâncias judiciais foram consideradas negativas pelo

acórdão condenatório. Diante disso, pretende a defesa que a pena resulte do aumento objetivo

de 1/6 por cada circunstância negativa. Tal método, entretanto, tem sido reiteradamente afas-

tado pela jurisprudência dessa Corte Regional e dos Tribunais Superiores, pois a dosimetria

da pena não está sujeita a critérios puramente matemáticos, cumprindo ao Julgador definir o

quanto será necessário para a correta prevenção e reprovação do delito, conforme o grau de

reprovabilidade da conduta do réu.

A diretriz foi estabelecida pela Ministra Rosa Weber, que consignou que "A dosi-

metria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não es-

tabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da

pena. Cabe às instâncias ordinárias, mais próximas dos fatos e das provas, fixar as penas

[...] Tanto a concorrência de diversas vetoriais negativas como a existência de uma única

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vetorial negativa de especial gravidade autorizam pena base bem acima do mínimo legal"

(RHC n. 101.576/SP, Primeira Turma, Relª. Minª. Rosa Weber, julgado em 26/6/2012)36.

Não se pode mensurar de forma matemática o aumento da pena-base com amparo

apenas no número de circunstâncias judiciais, “pois a lei confere ao julgador certo grau de

discricionariedade na análise das circunstâncias judiciais, de modo que o que deve ser ava-

liado é se a fundamentação exposta é idônea e proporcional, autorizando a fixação da pena-

base no patamar escolhido.”37

Assim, diante de vetoriais consideradas negativas, a pena deverá se afastar mais

ou menos do mínimo legal em direção ao termo médio, prestigiando-se, assim, o princípio da

individualização da pena, exatamente tal qual feito pelo acórdão condenatório. Aqui, cite-

se trecho do voto vencedor:

“Se, até o presente julgamento, para praticamente nenhum dos condenados a pena foi fi-xada sequer em seu grau médio (no caso, 7 anos), tenho que no presente caso esse limitedeve ser no mínimo atingido (o que, aliás, ainda é uma aplicação bastante tímida das ve-toriais do art. 59 do CP). Certamente a maior reprovabilidade da conduta sobressai daalta posição que o réu ocupava no sistema republicano”.

Aplicando tal diretriz, o acórdão condenatório do TRF4, ao proceder à analise dos

vetores previstos no art. 59 do CP, considerou como desfavoráveis ao requerente a culpabili-

dade, as circunstâncias dos crimes, a motivação e as consequências. Agiu com acerto o TRF4.

Com efeito, a culpabilidade – circunstância judicial que, ao fim e ao cabo, é o

principal vetor a guiar a dosimetria da pena-, no presente caso, deve ser avaliada negativa-

mente, já que a conduta do requerente é revestida de altíssima censurabilidade.

Luiz Inácio Lula da Silva praticou crimes de corrupção passiva e de lavagem de

capitais valendo-se do cargo de Presidente da República, chefe maior da nação, ou seja,

aquele que deve ter maior retidão na sua conduta e conduzir o país com zelo, eficiência e,

acima de tudo, probidade. Ao usar o cargo para obter vantagem financeira, e, em contrapar-

tida, viabilizar a ocorrência de um dos maiores esquemas de corrupção da história mundial,

Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou desprezo pelos ideias republicanos que prometeu

36Seguindo essa linha são as recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça por sua Quinta Turma – AgRgno REsp 1405233/PA, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe01/08/2017 e Sexta Turma – AgRg no AREsp 1074646/DF, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSISMOURA, SEXTA TURMA, julgado em 09/05/2017, DJe 15/05/2017.37 HC 316.907/PE, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 21/05/2015, DJe 02/06/2015.

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cumprir como Chefe de Estado e, com isso, frustrou as expectativas de milhões de brasilei-

ros, que nele depositaram confiança ao o elegerem.

Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito para o mais alto cargo do Executivo Federal

com um ferrenho discurso anticorrupção, alardeando sua honestidade e prometendo combate

aos dilapidadores dos cofres públicos. Elegeu-se em virtude de sua retórica de probidade e re-

tidão.Tais fatos elevam sobremaneira o grau de censurabilidade da conduta do recorrente e

devem ser punidos à altura.

Ademais, a consciência da ilicitude é inegável, já que Luiz Inácio Lula da Silva

se valeu de sofisticados mecanismos financeiros para ocultar a corrupção que praticou e para

praticar o crime de lavagem de capitais, em meio a complexa organização criminosa. Ade-

mais, em face da posição que ocupava e da alta remuneração percebida, o requerente estava

numa posição social muito privilegiada dentro da sociedade brasileira. E, ciente de que a pro-

pina que recebeu era parte de um esquema de corrupção na PETROBRAS, o domínio, ainda

que parcial, sobre as consequências prejudiciais à Estatal é evidente.

As circunstâncias em que se desenvolveram os fatos criminosos também são

desfavoráveis a Luiz Inácio Lula da Silva. Como dito, os crimes ora examinados foram alta-

mente sofisticados, ocorreram por anos, mediante engenhoso esquema para ocultar a proprie-

dade da vantagem indevida atribuída ao requerente.

Além disso, e o mais importante: apesar de se estar diante, aqui, de um crime de

corrupção passiva e de um crime de lavagem de dinheiro, é certo que eles são parte inte-

grante de um cenário criminoso muito maior, a saber, de um nefasto esquema ilícito que viti-

mou a Petrobrás e outros órgãos da Administração Pública Federal por anos e que alcançou -

em grau de sofisticação, em magnitude do dano, em impacto social, em grau de perversão

moral - dimensões inéditas na história do mundo.

Foi somente em razão da atuação de Luiz Inácio Lula da Silva, comprometida

com seus interesses particulares, que tal esquema ilícito foi capaz de assumir essas propor-

ções. Ele, conforme exposto à exaustão ao longo da peça, foi responsável diretamente por no-

mear, para altos cargos da Petrobrás, pessoas sabidamente comprometidas com atividades de

corrupção, atuando, ainda, para manter tal situação. Essas circunstancias tornam os crimes

cometidos pelo ex-presidente de rara gravidade.

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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA

Os motivos dos crimes também ensejam avaliação desfavorável ao requerente.

In casu, é evidente que o motivo dos crimes constituiu a ambição de enriquecimento desme-

dido e manutenção no poder, comprometendo o correto funcionamento do processo decisório

da Petrobras, bem como interferindo e promovendo o desequilíbrio no sistema econômico e

político do país.

No entanto, não se pode desconsiderar que os crimes de corrupção e lavagem de

capitais praticados por Luiz Inácio Lula da Silva, sendo parte de um cenário criminoso

maior, têm também uma outra motivação: manter o esquema de cartel e corrupção na Petro-

brás funcionando. Assim, os crimes se retroalimentavam, com motivações cíclicas: a corrup-

ção era importante para que o cartel existisse; o cartel era importante para conseguir recursos

para pagar a propina. Os motivos dos crimes, umbilicalmente ligados à manutenção do es-

quema ilícito, devem, portanto, ser valorados negativamente.

O mesmo se diga em relação às consequências dos crimes. A danosidade de-

corrente dos crimes perpetrados por Luiz Inácio Lula da Silva extrapolam os contornos típi-

cos, bem como alarmam sobremaneira a sociedade, irradiando resultados significativos.

Trata-se de crimes que contribuíram sobremaneira para o descrédito da sociedade

em relação a licitações públicas e ao sistema democrático, ainda mais considerando o evolvi-

mento do dirigente máximo da nação.

Veja-se, ainda, que não procede a alegação da defesa de que a função pública ocu-

pada por Luiz Inácio Lula da Silva ao tempo da prática do crime de corrupção passiva é ele-

mentar do tipo inscrito no art. 317 do CP, não podendo ser valorada como uma circunstância

judicial negativa.

O tipo legal em referência possui como elementar a condição de funcionário pú-

blico, e não, obviamente, a de ocupante do cargo de Presidente da República. Esta última con-

dição, quando presente, justamente por não ser elementar do tipo de corrupção e ser relevante

para que se afira, por exemplo, o grau de reprovabilidade da conduta criminosa, pode ser valo-

rada pelo Juízo de modo a impactar, positiva ou negativamente, na avaliação das circunstancias

judiciais.

Ora, não há como se sustentar que os desvios praticados pelo Presidente da Repú-

blica devam ser tratados, sob o ponto de vista da censurabilidade e consequências que dele de-

correm, do mesmo modo que os desvios incorridos por qualquer outro agente público. A

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responsabilidade e o poder associados à figura do Presidente da República não apenas sugerem,

mas impõem que eventuais crimes de corrupção por ele praticados sejam punidos com um ri-

gor acima da média.

Portanto, comprovada a existência de graves e diversas circunstâncias judiciais

amplamente desfavoráveis ao condenado, a fixação da pena-base consideravelmente acima

do mínimo legal é medida que se impõe, de forma que a pena fixada pelo acórdão recorrido

não merece qualquer redimensionamento.

Pesando de maneira intensa contra o recorrente gravíssimas e inúmeras conse-

quências judiciais, as quais não encontram precedentes no sistema jurídico brasileiro, a san-

ção penal fixada no acórdão recorrido deve ser mantida, vez que se mostra mais proporcional

e adequada à prevenção e repressão do crime.

IV- Conclusão

Ante todo o exposto, a Procuradora-Geral da República requer o não provimento

do agravo regimental interposto contra a decisão que julgou prejudicada Medida Cautelar em

que Luiz Inácio Lula da Silva pretendia obter a atribuição de efeito suspensivo ao recurso

extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal, proferido nos autos da

apelação criminal n. 5046512-94.2016.4.04.7000/PR.

Na hipótese de o agravo regimental ser provido e a Medida Cautelar ser conhe-

cida, requer-se a sua rejeição, já que o recurso extraordinário a que se pretende seja conferido

efeito suspensivo é inadmissível e improcedente.

Brasília, 26 de julho de 2018.Raquel Elias Ferreira DodgeProcuradora-Geral da República

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