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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO 1 EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DE UMA DAS VARAS CÍVEIS DA COMARCA DE ITU/SP LIMINAR – URGENTE “Meio dia, pouco mais ou menos. Baixou os olhos encandeados, procurou descobrir na planície uma sombra ou sinal de água. Estava realmente com um buraco no estômago. Endireitou o saco de novo e, para conservá-lo em equilíbrio, andou pendido, um ombro alto, outro baixo. O otimismo de Sinhá Vitória já não lhe fazia mossa. Ela ainda se agarrava a fantasias. (...) Se achassem água ali por perto, beberiam muito, sairiam cheios, arrastando os pés.” Vidas Secas – Graciliano Ramos O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, pelas Promotoras de Justiça ao final assinadas, vem respeitosamente perante Vossa Excelência, em defesa da coletividade consumidora, no plano difuso, com fundamento no artigo 129, III, da Constituição Federal, nos artigos 81, parágrafo único, inciso I; 82, inciso I e 83, todos da Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), e na Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública), propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA, COM PEDIDO DE LIMINAR

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

1

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DE UMA DAS VARAS CÍVEIS

DA COMARCA DE ITU/SP

LIMINAR – URGENTE

“Meio dia, pouco mais ou menos. Baixou os olhos encandeados, procurou descobrir na planície uma sombra ou sinal de água. Estava realmente com um buraco no estômago. Endireitou o saco de novo e, para conservá-lo em equilíbrio, andou

pendido, um ombro alto, outro baixo. O otimismo de Sinhá Vitória já não lhe fazia mossa. Ela ainda se agarrava a fantasias. (...)

Se achassem água ali por perto, beberiam muito, sairiam cheios, arrastando os pés.” Vidas Secas – Graciliano Ramos

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO, pelas

Promotoras de Justiça ao final assinadas, vem respeitosamente perante Vossa

Excelência, em defesa da coletividade consumidora, no plano difuso, com fundamento

no artigo 129, III, da Constituição Federal, nos artigos 81, parágrafo único, inciso I; 82,

inciso I e 83, todos da Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), e na Lei

nº 7.347, de 24 de julho de 1985 (Lei da Ação Civil Pública), propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA, COM PEDIDO DE LIMINAR

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em face de:

a) MUNICÍPIO DA ESTÂNCIA TURÍSTICA DE ITU, pessoa jurídica de direito público,

inscrita no CNPJ sob o nº 46.634.440/0001-00, com sede na Avenida Itu 400 Anos,

s/nº, Bairro Itu Novo Centro, CEP 13.303-500, Itu/SP, representada por seu Prefeito

Municipal ANTÔNIO LUIZ CARVALHO GOMES;

b) AGÊNCIA REGULADORA DE SERVIÇOS DELEGADOS DO MUNICÍPIO DA

ESTÂNCIA TURÍSTICA DE ITU – AR-ITU, ente da administração pública municipal

submetida a regime autárquico especial, criada por meio da Lei Municipal nº

1.115/2009 com personalidade jurídica própria, inscrita no CNPJ sob nº

11.442.000/0001-68, com sede na Rua Dr. José de Paula Leite de Barros, 191, Centro,

CEP 13300-035, Itu/SP, representada por seu Superintendente MAURÍCIO GERALDO

DA SILVA DANTAS;

c) ÁGUAS DE ITU EXPLORAÇÃO DE SERVIÇOS DE ÁGUAS E ESGOTO S.A., pessoa

jurídica de direito privado constituída na forma de sociedade anônima,

concessionária do serviço de água e esgoto do Município de Itu, inscrita no CNPJ sob

nº 08.455.185/0001-30, com sede na Rua Bartira, 300, Vila Leis, Itu/SP, CEP 13309-

210;

pelos fatos e fundamentos a seguir descritos.

I. DOS FATOS E FUNDAMENTOS

Em virtude da notória escassez de água no Município de

Itu, situação alarmante que permeia há anos a cidade, mas que nos últimos meses se

agravou de forma drástica, prejudicando toda a população e também outros serviços

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públicos fundamentais, calamidade que coloca em risco, invariavelmente, a saúde e

até mesmo a vida dos cidadãos, o Ministério Público instaurou Inquérito Civil (nº

45/2014, cujas principais peças instruem esta inicial) com o fim de apurar

responsabilidades na prestação desse serviço público essencial.

A urgência na tomada de medidas ao menos paliativas para

minorar tal problema de falta d’água, em curto prazo, sem prejuízo de medidas mais

apropriadas para sanar tal recorrente problema (e por certo de longo prazo), levou à

expedição de duas recomendações ao Município de Itu, instando-o a, dentre

outras ações:

a) expedir decreto de situação de emergência ou de calamidade

pública, diante do grave caso de escassez e racionamento de água, sem

previsão a curto prazo de solução satisfatória;

b) requisitar administrativamente o uso da propriedade privada,

assegurando-se ao proprietário indenização ulterior na hipótese de

ocorrência de danos à propriedade requisitada, visando à utilização de

águas superficiais e subterrâneas decorrentes de outorgas

particulares existentes no Município de Itu;

c) requerer junto ao Departamento de Águas e Energia Elétrica do

Estado de São Paulo – DAEE a suspensão das outorgas de direito de

uso de águas expedidos para particulares, cujas vazões sejam

significativas, e a concomitante outorga, enquanto durar a situação de

calamidade pública;

d) instar a concessionária Águas de Itu a captar a água desses

reservatórios (águas subterrâneas ou superficiais) para

distribuição e abastecimento público, seja por meio dos reservatórios

públicos já existentes, seja por transporte com caminhões pipa e, ainda,

transposição para as estações de tratamento de água mais próximas,

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atendidos os atos administrativos para regulamentar a requisição

administrativa;

e) expedir decreto executivo proibindo qualquer autorização, licença,

alvará ou liberação de qualquer novo empreendimento imobiliário,

de qualquer natureza e sob qualquer denominação, sejam loteamentos

urbanos ou rurais, abertos ou fechados, residenciais ou industriais,

decorrentes de parcelamento ou desmembramento do solo ou

caracterizações como condomínios verticais ou horizontais ou

incorporações imobiliárias, enquanto não se regularizar

minimamente a oferta de abastecimento de água do Município;

f) Observar, na execução e implantação de obras emergenciais, toda a

legislação ambiental pertinente (leis, portarias e resoluções dos órgãos

ambientais competentes), bem como as necessárias licenças (prévia, de

instalação e operação), outorgas, estudos e relatórios de impactos

ambientais, e quaisquer outros procedimentos aplicáveis;

g) Rever suas “tratativas” com particulares para captação de águas haja

vista a desnecessidade de qualquer acordo ou anuência desses

particulares diante da prevalência do interesse público sobre o privado

e do poder supremo da Administração Pública;

h) Zelar pelo princípio da impessoalidade, haja vista a existência de

dezenas de outorgas a particulares que podem ser suspensas, revogadas

ou limitadas, especialmente aquelas cujas autorizações de uso já

expiraram, conforme tabelas apresentadas pelo DAEE;

i) Implementar ampla e efetiva fiscalização sobre os pontos de captação

de água irregulares, cujas outorgas estão vencidas, bem como sobre

pontos clandestinos, viabilizando-se até mesmo a reversão das outorgas

para o Município, sem prejuízo de aplicação de sanções cabíveis.

O Município tomou apenas algumas medidas, como a

proibição de autorizações para novos loteamentos pelo prazo ínfimo de 120 (cento e

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vinte) dias e a requisição administrativa sobre apenas quatro poços de um único

particular e alguns reservatórios superficiais de água também particulares, conforme

decretos nº 2.124/2014, 2.125/2014, 2.123/2014 e 2.132/2014.

Todavia, tais medidas são insuficientes. Não foi decretada

situação de emergência ou estado de calamidade e as requisições para reversão de

outorgas particulares para uso de água não foram ampliadas, em que pese a

existência de mais de trezentos poços artesianos instalados na cidade. E a proibição

para novos loteamentos, como dito, será por apenas cento e vinte dias.

Frise-se, por oportuno, que no período de março de 2013 a

agosto de 2014, mês em que foi expedido o decreto que proibiu autorizações para

novos loteamentos, 28 (vinte e oito) novos empreendimentos, dentre

loteamentos e condomínios verticais e horizontais, foram aprovados pelo

Poder Público. Destes, 09 (nove) foram autorizados após fevereiro de 2014, quando

se agravou a estiagem que assola o Município e teve início o racionamento de água,

sendo que 01 (um) deles foi autorizado APÓS A RECOMENDAÇÃO EXPEDIDA PELO

PRESENTE ÓRGÃO.

O processo de autorização e expedição de alvará para

implantação e obras em loteamentos e condomínios depende de aprovação do

Município, baseado em diretriz de água e esgoto expedida pela concessionária Águas

de Itu a cada empreendimento. De outro lado, é de responsabilidade da Agência

Reguladora fiscalizar a atuação da concessionária ré.

O aumento vertiginoso de aprovações de loteamentos nos

últimos meses revela que os réus têm agido de maneira negligente na análise da

viabilidade da implantação de novos empreendimentos no Município, o que

certamente agravará ainda mais a drástica situação na qual nos encontramos, caso

nenhuma medida seja adotada para que a legislação pertinente seja cumprida.

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Aliás, em ofício enviado pela Agência Reguladora, admite-se

que o crescimento vertiginoso do Município, apontado com sendo de 5% (cinco

por cento) ao ano, supera a média nacional e é motivo de preocupação, na medida em

que evidentemente impacta negativamente o sistema de abastecimento de água

local, que se revelou insuficiente para atender a população já existente.

A grave crise que se instalou em Itu acaba ferindo tanto

preceitos de ordem urbanística – haja vista o direito ao ordenamento municipal e

capacidade de expansão dentro das possibilidades minimamente razoáveis de oferta

de serviços básicos, como a água – quanto direitos fundamentais dos consumidores,

conforme princípios da Política Nacional das Relações de Consumo, dentre os

quais a racionalização e melhoria dos serviços públicos (art. 4º, VII, do Código de

Defesa do Consumidor) e o direito básico do consumidor à adequada e eficaz

prestação dos serviços públicos em geral (art. 6º, inciso X, do Código de Defesa do

Consumidor);

Não por menos, a norma que disciplina as concessões e

permissões da prestação de serviços públicos, regimes previstos no artigo 175 da

Constituição Federal, estabelece que toda concessão pressupõe a prestação de

serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, sendo assim considerado

aquele que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência,

segurança, atualidade, generalidade, cortesia na prestação e modicidade das

tarifas (art. 6º e § 1º da Lei nº 8.987/1995).

Portanto, incumbe diretamente à concessionária e

supletivamente ao Município, ente concedente, prestar serviço adequado,

dentro dos ditames da legislação vigente, das normas técnicas aplicáveis e do

contrato de concessão (art. 31, inciso I, da Lei nº 8.987/1995). E a autarquia Agência

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Reguladora, de seu turno, em que pesem as multas aplicadas à concessionária,

não zelou eficazmente para a devida prestação do serviço público.

Na mesma esteira, as normas de ordem pública estampadas no

Estatuto da Cidade estabelecem que a política urbana tem por objeto ordenar e

gerenciar a função social da cidade, confrontando o direito de propriedade, tendo

por diretrizes, entre outras, a garantia a uma cidade sustentável para as presentes

e futuras gerações, e a ordenação e controle do uso do solo de forma a evitar o

uso excessivo ou inadequado em relação à infraestrutura urbana (art. 2º, incisos I e

VI, alínea “c”, da Lei nº 10.257/2001).

E não se pode afastar que a garantia de uma vida saudável

perpassa pelo acesso igualitário à água, a qual, conforme fundamentos da Política

Nacional de Recursos Hídricos (art. 1º e incisos da Lei nº 9.433/1997), é um bem

de domínio público, recurso natural limitado. E que em situações de escassez, o

uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a dessedentação

de animais. Mesmas disposições elencadas na Política Estadual de Recursos

Hídricos (art. 1º da Lei Estadual nº 7.663/1991): a água é recurso natural

essencial à vida, ao desenvolvimento econômico e ao bem-estar social.

A desídia do Poder Público, da Agência Reguladora e da

Concessionária Águas de Itu na prevenção e precaução contra o

desabastecimento fere os objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos

(art. 2º da Lei nº 9.433/1997), que são: assegurar à atual e às futuras gerações a

necessária disponibilidade de água, em quantidade e qualidade adequadas; a

utilização racional dos recursos hídricos; e a prevenção e a defesa contra eventos

hidrológicos críticos.

Para agravar a situação, além da desordenada expansão

urbana, com autorizações descabidas de novos empreendimentos imobiliários, seja

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para habitação, seja para comércio ou indústria, sem o necessário lastro em suficiente

oferta do serviço de água, os constantes eventos realizados no Município trazem fluxo

enorme de pessoas que, direta ou indiretamente, acabam elevando o consumo de

água, já tão escassa, no Município.

Assim, considerando que a água é um bem público

inalienável e inapropriável por particulares, decorrendo mera outorga de direito de

uso de recursos hídricos, dentre estes as águas superficiais e as subterrâneas,

outorga essa condicionada às prioridades sociais, consumo humano e

dessedentação animal (arts. 5º, inciso III; 11 a 14 da Lei nº 9.433/1997), sendo

passíveis de aplicação de sanções pelo uso inapropriado (arts. 9º a 12 da Lei Estadual

nº 7.663/1991), incumbe aos réus tomarem medidas concretas para sanar ou ao

menos minorar a crise de desabastecimento de água.

Soluções mágicas, evidentemente, não existem. Não se descura

da situação climática adversa de falta de chuvas. Porém, isso não isenta o Poder

Público Municipal, a autarquia responsável pela fiscalização de concessões (AR-

Itu) e a concessionária Águas de Itu de buscarem soluções para minorar a

problemática da escassez de água, que não é inédita no Município.

A situação atípica de intensa estiagem tem se sentido

presente em TODOS os Municípios da região, nos quais, porém, não existe

desabastecimento de água tão severo como em Itu. Isso demonstra a

irresponsabilidade dos gestores da coisa pública que há anos vêm relegando a

segundo plano os investimentos em soluções mais duradouras para o fornecimento

de água para a população. As notícias reiteradamente veiculadas isso demonstram.

Falta de planejamento, de investimentos, de vontade política.

Grassam, ao contrário, bravatas, promessas vazias, chacotas de “lenda” à escassez do

precioso líquido em Itu. Isso porque, o Prefeito Municipal, em declarações aos meios

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de comunicação no início de sua gestão, asseverou que “a falta d’água em Itu é coisa

do passado”!

Medidas paliativas foram anunciadas, porém fundadas na

aquisição de água bruta em reservatórios e Municípios vizinhos. Isto é, a

concessionária estaria “comprando” água – cujo custo operacional corre-se o risco

de ser repassado à população que sequer recebe o serviço de qualidade, a fim de

adequar o “equilíbrio econômico-financeiro” do contrato de concessão.

Entretanto, conforme bastante aqui exposto, lastreado em toda

legislação pertinente e nos estudos técnicos e laudos apresentados, descabe a

compra de água quando é possível, em situações emergenciais, a requisição

administrativa sobre áreas particulares para captação direta de águas

superficiais ou profundas, destinando o uso primordial para o consumo

humano.

Além disso, descuidam os réus do princípio da

economicidade, previsto no artigo 70 da Constituição Federal, regente também

da Administração Pública, na medida em que é muito mais barato, econômico, menos

dispendioso, a captação de águas já disponíveis e que têm natureza jurídica de bem

público, competindo à concessionária tratá-la adequadamente para distribuição. Cabe

a responsabilidade aos réus de buscarem os resultados esperados – antes tarde do

que nunca – com o menor custo possível, unindo qualidade, celeridade e menor

onerosidade à sociedade na prestação do serviço e no trato da coisa pública.

Por que comprar água se existem dezenas de poços artesianos

e represas “particulares” que podem ser requisitados administrativamente,

revertendo a outorga em favor do Município para destinar a água à população? Por

que pagar por um bem público inalienável? Por que não utilizar dos instrumentos do

direito administrativo para fazer valer o princípio da supremacia do interesse público

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sobre o particular, garantidas, é verdade, a continuidade das atividades

industriais e comerciais, porquanto as requisições podem ser parciais, sem

prejudicar a atividade econômica local?

O problema está posto e demasiadamente o Município

esperou a seca total para tomar providências, embora desde fevereiro do

corrente ano a situação já fosse de conhecimento geral e debate pelos entes

públicos, e desde novembro do ano passado o racionamento já houvesse sido

implantado.

Importa buscar soluções urgentes. Porém não pode a

premência servir de escusa para medidas excessivamente onerosas, repise-se,

correndo o risco das despesas serem repassadas aos consumidores.

A inércia dos réus e dos administradores públicos, que há

tempos já vinham cientes do constante agravamento da crise de abastecimento,

apenas demonstra a incapacidade de gestão, desídia, descaso, menosprezo com o

sofrimento da população, podendo-se até falar de ações dolosas visando criar

situação de tamanha calamidade que justificasse posterior atuação milagrosa de um

ente salvador ou ações fundadas em dispensa ou inexigibilidade de licitação.

Dentre as medidas possíveis, a menos onerosa é a requisição,

parcial ou total, sem prejuízo da atividade exercida, por prazo determinado e

de forma escalonada, de outorgas de direito de uso de recursos hídricos,

especialmente em situações de premente necessidade de água para atender a

situações de calamidade decorrentes de adversidades climáticas, bem como para

atender a usos prioritários de interesse coletivo, quando não se disponha de

fontes alternativas (art. 15, incisos III e V, da Lei nº 9.433/1997), sempre atentos,

porém, à qualidade da água.

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Em que pesem tais diretrizes normativas – de ordem pública e

inquestionáveis, dada a essencialidade desse serviço público – fato notório é que

algumas regiões de Itu chegam a ficar por uma semana sem suficiente

abastecimento de água, em desconformidade evidente com as normas legais

aplicáveis.

Está demonstrada a ineficiência do serviço de abastecimento

de água, pois, embora divulgadas na imprensa medidas destinadas à resolução do

problema, continuam chegando diariamente à Promotoria reclamações de

consumidores acerca da falta de água em suas residências.

Paralelamente à busca de soluções alternativas à oferta de

água, está a restrição da demanda e, nesse passo, na esfera das competências

municipais está a gestão da política urbana orientada pela ordenação e controle do

uso do solo, de forma a combater e evitar a perda de capacidade de produção de

água em qualidade e quantidade adequadas (art. 21, inciso II, alínea “a”, da Lei

Complementar Municipal nº 2/2010).

Destarte, um dos instrumentos para essas finalidades é a

restrição, limitação ou proibição da implantação de novos loteamentos e

incorporações imobiliárias, bem como a necessidade de estudo e relatório de

impacto de vizinhança que deve abordar, entre outros aspectos, a previsão de

demanda no consumo de água e esgoto (arts. 49, 50, 51, inciso XIV, 127 e 209,

todos da Lei Complementar Municipal nº 2/2010).

Em que pese tenha a Municipalidade proibido, via decreto, a

instalação de novos loteamentos na cidade pelo prazo de apenas 120 dias,

prorrogáveis, entendemos ser a presente ação o meio mais adequado para

determinar que essa proibição dure até que seja comprovado, por peritos

técnicos, que a cidade possui infraestrutura suficiente para suportar um

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aumento vertiginoso da demanda de água, e não que seja deixada tal decisão a

mera discricionariedade administrativa, na medida em que, mesmo após a

decretação do racionamento, em fevereiro de 2014, nove empreendimentos

foram autorizados na cidade, sendo que um deles o foi após a expedição de

recomendação pelo autor, apenas dois dias antes da resposta a ela ser protocolada

nesta Promotoria de Justiça.

Diante, pois, da gravidade que a situação representa, seria

temerário deixar ao mero deleite da discricionariedade administrativa a prorrogação

desse prazo, ou até mesmo a revogação do citado decreto por um simples ato

administrativo unilateral.

Entende-se, destarte, que como forma de melhor resguardar o

imparcial interesse público, a proibição da instalação de novos empreendimentos na

cidade perdure até que esta se encontre estruturada quanto ao regular abastecimento

de água, a receber novos investimentos, e não fique à sorte da conveniência e

oportunidade da administração pública local, cuja postura até o momento se revelou

irresponsável, na medida em que, mesmo ciente da recorrente escassez de água,

continuou aprovando a implantação de novos loteamentos e condomínios.

O controle do uso exacerbado da água,

proporcionalmente, pode ser feito também evitando-se a concentração de

demanda em eventos de grande porte que reiteradamente vêm se realizando

no Município.

A Lei Municipal nº 1.205/2010 dispõe expressamente

acerca da obrigatoriedade de prévia autorização do poder público para realização de

eventos de longa duração e de grande concentração de pessoas, o que está sendo

desrespeitado pela própria Administração Pública:

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“A realização de eventos de longa duração e de grande concentração de pessoas abertos ao público, com ou sem a cobrança de ingresso, em propriedade particular ou em área pública, de qualquer gênero musical, com som mecânico, eletrônico ou ao vivo, dentro ou fora do perímetro urbano, dependerá de prévia autorização do Poder Público Municipal e obedecerá ao disposto nesta Lei”. (art. 1º da Lei Municipal nº 1.205, de 5 de julho de 2010)

Essa mesma norma estabelece que são considerados grandes

eventos aqueles com duração acima de quatro horas e afluxo superior a cinco mil

pessoas:

Art. 1º ........................................ § 1º - Considera-se evento de longa duração para fins de aplicação da presente, aquele que tiver previsão superior a quatro horas, assim declarada pelos seus promotores ou realizadores no requerimento da respectiva Licença. § 2º - Considera-se evento de grande concentração de público para fins de aplicação da presente, aquele que tiver previsão superior a 5.000 (cinco mil) pessoas, assim declarada pelos seus promotores ou realizadores no requerimento da respectiva Licença. (art. 1º da Lei Municipal nº 1.205, de 5 de julho de 2010)

O Plano Diretor do Município da Estância Turística de Itu

(Lei Complementar Municipal nº 770/2006), em seu artigo 25, dita as diretrizes

para o abastecimento de água do Município, entre elas: ampliação da rede de

abastecimento para atingir 100% da população, controle da expansão de ocupações

nas áreas de macrozona de desenvolvimento para fomentar o bom uso, manejo e

conservação do solo e das águas, garantia da qualidade dos recursos hídricos

destinados ao abastecimento público, criação de alternativas para o abastecimento

de água com uso de águas profundas e redução paulatina das perdas na rede de

abastecimento de água (incisos I, II, III, IV e XI).

Da mesma forma, o Regulamento dos Serviços Públicos de

Água e Esgoto do Município de Itu, implementado por meio do Decreto Executivo

Municipal nº 1.771/2013, em seu item 13.3, estabelece ser dever da Concessionária

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do serviço público de abastecimento de água prover abastecimento

emergencial aos usuários afetados quando a interrupção do serviço for

superior a vinte e quatro horas.

Certo é que essa situação de estiagem mais severa não pode

ser tomada como caso fortuito ou força maior, haja vista o histórico dos índices

pluviométricos da região, situação de total conhecimento do Poder Público, dos

seus dirigentes, da autarquia especial AR-Itu e da empresa concessionária

Águas de Itu, conforme vasta documentação que instrui esta inicial, e que, dessa

forma, não pode ser utilizada como escusa para o regular cumprimento das

obrigações na boa prestação do serviço público, vez que se trata de risco

inerente ao serviço concedido (nos termos de responsabilidade previstos no item

5.2 do Contrato de Concessão nº 146/2007, firmado em 23.07.2007).

II. DOS PEDIDOS LIMINARES

Desnecessário ressaltar a urgência imposta pela grave crise

de falta d’água em Itu. Bairros há que chegam a ficar por mais de uma semana sem

receber uma gota do precioso líquido.

Escolas estão sem abastecimento, deixando alunos e

professores sem poderem utilizar banheiros, sem beber água, sem poder fazer suas

higienes pessoais. Até a merenda escolar teve que ser substituída por alimentos

industrializados.

Hospitais, clínicas e laboratórios também estão sendo

afetados, havendo notícia inclusive de centros de diálise que pararam o atendimento

devido à falta de água para limpeza e manutenção de seus equipamentos.

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O Poder Executivo Municipal não decretou, mas é evidente o

estado de calamidade pública instalado em nossa cidade.

Chega-se ao descalabro de afirmar que o rodízio está sendo

observado e que apenas algumas regiões mais altas estariam demorando para

receber água, sendo tais áreas supridas por meio de caminhões-pipa.

Mentiras e falácias. As centenas de reclamações que a

Promotoria de Justiça vem recebendo de cidadãos ituanos comprovam cabalmente o

descaso com a população, existindo casos de falta d’água por mais de dez dias!

O arcabouço jurídico amplamente exposto nas fundamentações

acima são mais do que suficientes para justificar a concessão de medidas liminares.

Nem se poderá arguir invasão no campo da discricionariedade

da Administração Pública, uma vez que a inércia desse poder justifica o ativismo

judicial para garantir o cumprimento da lei e, notoriamente, preservar o princípio da

dignidade da pessoa humana, que está sendo vilipendiado diuturnamente.

A Lei n. 7.783, de 28.6.89, em seu art. 10, define como serviços

essenciais: o de água, de energia elétrica, gás e combustíveis; o de saúde; o de

distribuição e comercialização de medicamentos; o funerário; o de transporte

coletivo; o de captação e tratamento de esgoto e lixo; o de telecomunicações; o

relacionado com substâncias radioativas; o de tráfego aéreo; o de compensação

bancária e o de processamento de dados ligados a esses serviços.

Resta claro, dessa forma, que o serviço de abastecimento de

água é serviço público lato sensu, devendo o prestador ser responsabilizado como tal.

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Argumentar-se-á que o Executivo Municipal editou decretos

visando à proibição de novos loteamentos e a requisição administrativa sobre áreas

de captação de água.

Repise-se: são medidas insuficientes; nada de concreto está

sendo feito. Cabe aos réus demonstrarem a efetividade de ações.

Além disso, apenas recaíram as requisições sobre parte ínfima

de pontos de captação de águas profundas (apenas quatro), quando se tem

conhecimento da existência de centenas de poços artesianos instalados, vários deles

com grandes vazões. Também há dezenas de barragens de águas superficiais, mas

apenas algumas foram requisitadas. E quanto à proibição de novos loteamentos, o

prazo ínfimo de 120 dias em nada auxiliará no resguardo contra a elevação da

demanda de água.

Por se tratarem de medidas legislativas – das quais corre-se o

risco de ficarem apenas como papel, como letra morta, além do risco de poderem

ser revogadas a qualquer momento – não se tem nenhuma garantia de efetividade,

de pronta resposta à crise.

Não se pode olvidar, por oportuno, que a Emenda

Constitucional n. 19/98 acrescentou expressamente aos princípios constitucionais da

administração pública o princípio da eficiência.

Todos somos destinatários finais da água fornecida pelo Poder

Público, centralizada ou descentralizadamente.

O consumidor não tem meios coercitivos, a não ser a via

judicial, para obrigar o prestador de serviços a fornecer regularmente a água à

sua moradia, bem essencial à vida humana. Como destinatário final, o consumidor

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é hipossuficiente e vulnerável. Há sensível desigualdade entre o prestador do serviço

de fornecimento de água e o consumidor, eis que não dispõe a coletividade de

mecanismos de controle sobre a forma de captação, tratamento e distribuição de água

para uso doméstico.

Cabe ressaltar que o pedido liminar está sendo formulado na

própria inicial da ação civil pública em razão da economia processual e diante do

permissivo legal, artigo 12, da Lei nº 7.347/85.

A par disso, o artigo 84, § 3º, do Código de Defesa do

Consumidor, estabelece de forma clara e objetiva que “Sendo relevante o fundamento

da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é licito ao

juiz conceder a tutela liminarmente...”.

Por conseguinte, estão presentes os requisitos legais para

a concessão da liminar.

Assim, como medidas liminares, requer-se a Vossa Excelência a

imposição das seguintes obrigações de fazer e não fazer contra o Município, a Agência

Reguladora e a Concessionária Águas de Itu, sob pena de responsabilidade civil,

criminal e administrativa de seus gestores e diretores, sem prejuízo da apuração de

atos de improbidade administrativa:

a) Com relação à adequação do crescimento e expansão urbanos à grave

situação de falta d’água, nos termos da Política Nacional de Recursos

Hídricos, Lei nº 9.433/1997, artigo 311; Lei Complementar Municipal nº

2/2010, artigo 21, incisos I e II, alínea “a”2; e artigos 51 e 523; bem como

1 Art. 31. Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, os Poderes Executivos do Distrito Federal e dos municípios

promoverão a integração das políticas locais de saneamento básico, de uso, ocupação e conservação do solo e de meio ambiente com as

políticas federal e estaduais de recursos hídricos. 2 Art. 21. Consoante aos objetivos gerais da política urbana, expressos no art. 3º, o ordenamento territorial, obedece às seguintes

diretrizes:

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atendendo às disposições do Plano Diretor Participativo do Município de Itu: a

proibição de qualquer autorização, licença, alvará ou liberação de

qualquer novo empreendimento imobiliário, de qualquer natureza e sob

qualquer denominação, sejam loteamentos urbanos ou rurais, abertos ou

fechados, residenciais, comerciais ou industriais, decorrentes de parcelamento

ou desmembramento do solo ou caracterizações como condomínios verticais

ou horizontais ou incorporações imobiliárias, por prazo indeterminado,

enquanto não se regularizar a oferta de abastecimento de água do

Município, com qualidade comprovada, e não se faça mais presente o

racionamento de água, devidamente comprovado por meio de estudos

técnicos por prazo não inferior a um ano que demonstrem a capacidade

de fornecimento de água frente à demanda da população, sob pena de

nulidade do ato administrativo e multa de R$ 100.000.000,00 (cem

milhões de reais), a ser revertida para o Fundo Estadual dos Interesses

Difusos Lesados, por cada autorização ou licença expedida, sem prejuízo

da responsabilidade pessoal, civil, criminal e administrativa, do agente

autorizante e do Chefe do Executivo Municipal;

b) Visando a evitar o aumento desmensurado de consumo de água do

Município com a vinda de pessoas de outras cidades e regiões para shows,

festas, apresentações, eventos culturais, esportivos, religiosos, profissionais,

de qualquer ordem ou denominação, onerando ainda mais a população

residente que arcará ainda mais com a falta d’água: a proibição de realização

ou autorização de quaisquer desses eventos dentro do âmbito do

I - planejamento do desenvolvimento da cidade, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do município, de

modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;

II - ordenação e controle do uso do solo, de forma a combater e evitar: a) a perda de capacidade de produção de água em qualidade e quantidade adequadas;

3 Art. 51. Será exigida apresentação EIV/ RIV para os seguintes empreendimentos ou atividades públicas ou privadas, para se obter licença ou autorização para parcelamento, construção, ampliação, alvará de utilização:

Art. 52. O EIV/RIV deverá ser elaborado de forma a permitir a avaliação dos impactos benéficos e dos adversos que um

empreendimento ou atividade causará na sua vizinhança, incluindo análise, no mínimo, das seguintes questões: ...............

XIV - demanda no consumo de água e esgoto.

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Município de Itu, seja por particulares, seja pelo Poder Público, entre

aqueles tipificados como grandes eventos, nos termos da Lei Municipal

nº 1.205/2010, tais como festas do peão, festas “rave”, encontros religiosos,

simpósios, feiras, desfiles, shows musicais e artísticos, eventos esportivos de

qualquer natureza, enquanto não se regularizar a oferta de abastecimento

de água de qualidade no Município e não se faça presente o

racionamento de água, devidamente comprovado por meio de estudos

técnicos por prazo não inferior a um ano que demonstrem a capacidade

de fornecimento de água frente à demanda da população, sob pena de

multa de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), a ser revertida para o

Fundo Estadual dos Interesses Difusos Lesados, por cada evento realizado,

sem prejuízo da responsabilidade pessoal, civil, criminal e

administrativa, do agente autorizante e do Chefe do Executivo Municipal,

configurando, ainda, ato de improbidade administrativa dos agentes

responsáveis;

c) Impor a imediata tomada de ações concretas para, dentro das

possibilidades aventadas de requisição de outorgas particulares e reversão

para uso do Poder Público em favor da população: ampliação das

requisições administrativas, de forma temporária, parcial e escalonada,

de uso da propriedade privada, sem prejuízo da atividade

comercial/industrial, nos locais em que exista a captação de águas

profundas ou superficiais, notadamente aquelas de elevada vazão

(superior a 5m³ de água por dia, conforme Portaria DAEE nº 2292/2006, art.

3º) e cuja destinação não seja o uso primordial para consumo humano e

dessedentação animal, nos termos dos relatórios encaminhados pelo

Departamento de Água e Energia Elétrica do Estado de São Paulo – DAEE, a

teor dos documentos anexos, haja vista a desnecessidade de qualquer

acordo ou anuência desses particulares, ou de indenização pelo uso da

água, diante da prevalência do interesse público sobre o privado e da

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supremacia da Administração Pública, determinando-se a captação da

água desses pontos (águas subterrâneas ou superficiais) para

distribuição e abastecimento público, seja por meio dos reservatórios

públicos já existentes, seja por transporte com caminhões pipa e, ainda,

transposição para as estações de tratamento de água mais próximas,

atendidos os atos administrativos para regulamentar a requisição

administrativa, observado o adequado tratamento para consumo, e zelando

pela indenização posterior ao particular apenas em caso de comprovado

dano à propriedade, sob pena de, em caso de omissão, multa diária de R$

1.000.000,00 (um milhão de reais), a ser revertida para o Fundo Estadual

do Interesses Difusos Lesados, sem prejuízo da responsabilidade pessoal,

civil, criminal e administrativa, dos diretores da empresa concessionária,

do superintendente da Agência Reguladora e do Chefe do Executivo

Municipal;

d) tomar providências efetivas visando ao regular e contínuo

abastecimento de água potável, minimamente previsto, ainda que em

esquema de rodízio, a todos os bairros do Município, seja por meio da

entrega de água pela rede de abastecimento, seja pela entrega direta à

população por meio de caminhões-pipa, sob pena de, em caso de omissão,

multa de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a ser revertida para o Fundo

Estadual dos Interesses Difusos Lesados, para cada ponto residencial ou

comercial que permaneça por mais de 48 horas sem recebimento de

água, sem prejuízo da responsabilidade pessoal, civil, criminal e

administrativa, dos diretores da empresa concessionária, do

superintendente da Agência Reguladora e do Chefe do Executivo

Municipal.

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III. DOS PEDIDOS

Diante de todo o exposto, requer-se a Vossa Excelência:

1) O recebimento da inicial, com os documentos que a instruem, sem prejuízo da

juntada de documentos em continuação, haja vista a limitação de capacidade

do sistema digital;

2) Concedidas as liminares acima, a teor do artigo 94 do Código de Defesa do

Consumidor, publicação de edital em órgão oficial, a fim de que

interessados possam intervir no processo como litisconsortes;

3) Sem prejuízo do item acima e ainda com fundamento no artigo 94 do CDC,

expedição de ofício aos órgãos de comunicação social do Município,

informando a propositura da presente ação, para conhecimento de

interessados e, principalmente, da população tutelada neste processo;

4) Após a concessão da liminar, ordenar a citação dos réus para, querendo,

contestar a ação no prazo legal, sob pena de revelia;

5) Dispensar o autor do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos,

desde logo, à vista do disposto no artigo 18 da Lei nº 7.347/1985 (Lei de

Ação Civil Pública) e no artigo 87 da Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do

Consumidor);

6) Determinar sejam as intimações do autor feitas pessoalmente, mediante

entrega e vista dos autos na Promotoria de Justiça, conforme artigo 236, §2º,

do Código de Processo Civil, artigo 224, inciso XI, da Lei Complementar

Estadual nº 734/1993, e artigo 203 da Lei nº 8.069/1990;

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7) Deferir a produção de todas as provas em Direito admitidas, notadamente a

testemunhal, o depoimento pessoal e a juntada de documentos novos, bem

como o benefício da inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º,

inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor;

8) Ao final, julgar procedente a presente ação civil pública para confirmar os

pedidos acima formulados, condenando-se os réus ao cumprimento das

obrigações ali descritas;

9) Condenar os réus ao pagamento das custas e despesas processuais.

Dá-se à causa o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).

Aguarda-se deferimento.

Itu, 29 de agosto de 2014.

ANA HELENA DE ALMEIDA PRADO P. DE CAMPOS Promotora de Justiça

MARIA PAULA PEREIRA DA ROCHA Promotora de Justiça Substituta

JULIANO DE CAMARGO Assistente Jurídico do Ministério Público