Mód 3 Apres Miguel Assis Raimundo CCP - Âmbito Subjectivo de Aplicação
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1
Maio de 2013
MIGUEL ASSIS RAIMUNDO
Professor da FDUL
Advogado
ÂMBITO SUBJECTIVO DE APLICAÇÃO DO CÓDIGO
DOS CONTRATOS PÚBLICOS
Os sujeitos de direito submetidos à contratação pública
Conteúdo
1. A distinção essencial: entidades adjudicantes e contraentes públicos
2. O n.º 1 do art. 2.º do Código
3. O n.º 2 do art. 2.º do Código
4. Entidades adjudicantes nos “sectores especiais”
5. Extensão do âmbito de aplicação: os arts. 275.º a 277.º do Código
6. Casos
7. Referências
2
1. A distinção essencial: entidades adjudicantes e
contraentes públicos
1. A distinção essencial: entidades adjudicantes e contraentes públicos
• Critério da distinção: incidência subjectiva e incidência objectiva;
contratos públicos-entidades adjudicantes (art. 2º) e contratos
administrativos-contraentes públicos (art. 3º)
• Consequências da distinção: às entidades adjudicantes aplica-se
o regime de formação dos contratos públicos, sejam administrativos
ou não (Parte II do Código) e aos contraentes públicos aplica-se o
regime substantivo dos contratos administrativos (Parte III do
Código), quer sejam quer não sejam adjudicados com base num
procedimento da parte II
3
1. A distinção essencial: entidades adjudicantes e contraentes públicos
• A distinção não é mutuamente excludente: pode existir, e
normalmente existirá, sobreposição entre a qualidade de entidade
adjudicante e a de contraente público
• O Código não esgota o universo dos contratos
administrativos: pode dizer-se que o Código estabelece o regime
substantivo da generalidade dos contratos administrativos com
objecto passível de contrato de direito privado e ainda dos contratos
de concessão de serviço e obra pública
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
4
• As categorias tradicionais do Direito administrativo são já insuficientes
para delimitar o âmbito de aplicação das normas sobre contratação
pública
• Contudo, sendo insuficientes, não são inúteis: primeiro porque
representam uma continuidade, são categorias familiares e que permitem
reduzir a incerteza da interpretação jurídica e aumentar a segurança
• São as entidades sobre as quais não se colocam dúvidas quanto à
sua integração no âmbito subjectivo de aplicação do Código, atenta,
sobretudo, a sua personalidade colectiva pública e a sua proximidade do
exercício do poder político (central, regional ou local)
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
São entidades adjudicantes:
a) O Estado;
b) As Regiões Autónomas;
c) As autarquias locais;
d) Os institutos públicos;
e) As fundações públicas;
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
5
São entidades adjudicantes: (…)
f) As associações públicas;
g) As associações de que façam parte uma ou várias das pessoas
colectivas referidas nas alíneas anteriores, desde que sejam
maioritariamente financiadas por estas, estejam sujeitas ao seu
controlo de gestão ou tenham um órgão de administração, de
direcção ou de fiscalização cuja maioria dos titulares seja, directa
ou indirectamente, designada pelas mesmas.
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
• O Estado: trata-se da pessoa colectiva Estado-Administração,
abrangendo toda a sua Administração directa, ou seja, os serviços
e organismos nele integrados, de carácter ou função
administrativos (Esteves de Oliveira/Esteves de Oliveira, 1998, 51),
incluindo também os órgãos de função não administrativa
(legislativa, judicial, Presidência da República) – Viana, 2007, 411-419;
• As Regiões Autónomas: pessoas colectivas territoriais, também
com Administração directa, nos mesmos termos do Estado
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
6
• As autarquias locais: pessoas colectivas territoriais, dotadas
igualmente de Administração directa (serviços não
personalizados); no Direito português, abrangem os municípios, as
freguesias, as regiões administrativas (ainda não implementadas).
• Os institutos públicos: são os serviços e fundos do Estado e
Regiões Autónomas, quando dotados de personalidade jurídica
(artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 3/2004, de 15.01).
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
• As fundações públicas: integradas pela Lei n.º 3/2004 no
conceito amplo de institutos públicos, surgem no Código com
autonomia. Já não se excluem as universidades organizadas sob a
forma de fundações, reguladas pela Lei n.º 62/2007, de 10.09
• As associações públicas: integradas na chamada
Administração autónoma do Estado, incluem entidades como as
comunidades de municípios e as ordens profissionais
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
7
• As associações de que faça parte alguma das entidades
anteriores, desde que sujeitas a influência dominante de alguma
delas.
• São exemplos as associações privadas representativas das
freguesias e dos municípios (ANAFRE e ANMP, respectivamente) e as
associações de desenvolvimento regional (DL n.º 83/99, de 19.03)
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
• Algumas notas adicionais (I):
Onde enquadrar os estabelecimentos do ensino superior público que
não tenham natureza de fundação (ainda hoje a maioria)? Nas referências
aos institutos públicos ou às associações públicas.
Onde enquadrar as entidades reguladoras independentes? A forma que
tem sido seguida para a sua organização é, quando não expressamente, pelo
menos implicitamente, a de institutos públicos de regime especial, pelo que
entram na referência a tais entidades contida no art. 2º/1.
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
8
• Algumas notas adicionais (II):
Como enquadrar as associações de municípios? De acordo com o Regime
Jurídico do Associativismo Municipal (RJAM), Lei 45/2008, de 27.08, a resposta
não é unívoca: tais associações podem ser de Direito público (Comunidades
Intermunicipais) ou de Direito privado (associações de fins específicos).
As CIM são pessoas colectivas públicas (associações públicas) e por isso
devem considerar-se abrangidas pelo art. 2º/1;
As associações de fins específicos têm a estranha norma do art. 37º/1/b) do
RJAM, que nada adianta, e é duvidoso se devem considerar-se abrangidas
pelo art. 2º/1/g) ou pelo art. 2º/2/a); são, sem dúvida, entidades adjudicantes.
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
• Algumas notas adicionais (III):
Como enquadrar as áreas metropolitanas? A Lei 46/2008, de 27.08 qualifica-as
expressamente como pessoas colectivas públicas que constituem uma forma
específica de associação de municípios, ou seja, de associação pública, pelo que
sempre serão de enquadrar no art. 2º/1, mesmo que haja dúvidas sobre se não
são, afinal, novos tipos de autarquia local.
Há que ter em conta, ainda, que dentro da margem atribuída ao legislador
nacional pelo legislador comunitário, as regiões autónomas portuguesas
estabeleceram regimes especiais.
2. O n.º 1 do artigo 2.º do Código
9
3. O n.º 2 do artigo 2.º do Código
3. O n.º 2 do artigo 2.º do Código
• A difícil consagração da noção de organismo de direito público
(ODP) no Direito interno dos Estados membros da União Europeia
(Viana, 2007, 434 e ss.)
• O artigo 3.º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 197/99, de 08.06, como
manifestação da resistência nacional à noção de ODP. Críticas da
Doutrina. Os dois momentos da interpretação dada pela
Jurisprudência nacional; a importância dos “Hospitais SA”
10
• A importância das decisões da Jurisprudência comunitária para a
consolidação do conceito:
Uma noção própria do Direito comunitário, que deve ser
interpretada e aplicada com autonomia face aos Direitos
nacionais;
Uma noção funcional, independente da natureza jurídica e
da distinção Direito público/Direito privado: atender à
substância e não à forma
3. O n.º 2 do artigo 2.º do Código
• Os elementos da noção de ODP:
1. Personalidade jurídica própria [art. 2º/2/a), corpo]; e
2. Criação específica para satisfação de necessidades de interesse geral, sem
carácter industrial ou comercial [art. 2.º/2/a)/i)]; e
3. Sujeição a influência dominante pública, através de qualquer uma das seguintes
formas [art. 2.º/2/a)/ii)]:
Financiamento maioritário por entidade do art. 2.º/1; ou
Sujeição a controlo de gestão por entidade do art. 2.º/1; ou
Existência de um órgão de administração, de direcção ou de fiscalização cuja
maioria dos titulares seja, directa ou indirectamente, designada por uma entidade
do art. 2.º/1.
3. O n.º 2 do artigo 2.º do Código
11
•É ponto fulcral: o que são “necessidades de interesse geral sem carácter
comercial ou industrial”?
• Sintetizando a Jurisprudência comunitária, o n.º 3 do art. 2.º dispunha:
“são consideradas pessoas colectivas criadas especificamente para
satisfazer necessidades de interesse geral, sem carácter industrial
ou comercial, aquelas cuja actividade económica se não
submeta à lógica do mercado e da livre concorrência.”
3. O n.º 2 do artigo 2.º do Código
Notas adicionais sobre a noção de ODP (I):
• O conceito de necessidades de interesse geral sem carácter industrial ou
comercial não exclui actividades que possam ser prestadas por empresas
privadas (Ac. Adolf Truley).
Em todo o caso: 1) a existência de concorrência é indício de a necessidade
ter carácter comercial; 2) as necessidades não comerciais, regra geral, não
se satisfazem mediante oferta de bens e serviços no mercado (Ac. BFI
Holding; Raimundo, 2007, 282)
3. O n.º 2 do artigo 2.º do Código
12
Notas adicionais sobre a noção de ODP (II):
• O conceito deve ser aferido tendo em conta todos os elementos de facto e de direito:
1) circunstâncias que presidiram à criação da empresa; 2) condições em que exerce a
sua actividade, como a falta de concorrência no mercado e a falta de ânimo de lucro
como objectivo principal; 3) a não assunção dos riscos da actividade, designadamente
por ter assegurada a cobertura de prejuízos; 4) existência de financiamento público
(Ac. Korhonen; Raimundo, 2007, 282)
3. O n.º 2 do artigo 2.º do Código
• As alíneas b) e d) do n.º 2 do art. 2.º - salvaguardar as
“redundâncias” ou “ODP em cascata”:
As entidades dominadas por organismos de direito
público são também elas organismos de direito público
• A alínea c) do n.º 2 do art. 2.º - previa associações de direito
privado com fins científicos e tecnológicos dominadas por
entidades do art. 2.º/1; foi revogada pelo DL 278/2009, de 2.11
3. O n.º 2 do artigo 2.º do Código
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• Algumas notas adicionais:
Como enquadrar os serviços municipalizados? O problema aqui é a
ausência de personalidade jurídica, que parece obstar à sua recondução à
categoria de organismo de direito público (art. 2º/2) e reconduzi-los à referência
do art. 2º/1 às autarquias locais, o que certamente torna ainda menos
atractiva a figura dos serviços municipalizados, em detrimento das empresas
municipais.
Como enquadrar as Instituições Particulares de Solidariedade Social
(IPSS)? A jurisprudência do STA sobre a aplicação do DL 59/99; necessidade
de uma apreciação casuística a propósito do art. 2º/2 e frequência da aplicação
do art. 275º do CCP.
3. O n.º 2 do artigo 2.º do Código
4. Entidades adjudicantes nos “sectores
especiais”
14
4. Entidades adjudicantes nos “sectores especiais”
• O Código unifica, num único diploma interno, a transposição dos regimes da
Directiva 2004/17/CE, relativa aos “sectores especiais” (água, energia,
transportes e serviços postais), e da Directiva 2004/18/CE, relativa aos
“sectores gerais”
• As noções de entidade adjudicante e de contraente público nos sectores
especiais não coincidem exactamente com as dos sectores gerais; nos sectores
especiais, a definição assenta numa nota funcional que se acrescenta à nota
subjectiva (Viana, 2007, 581), ou seja, não basta atender apenas à natureza e
actividade desenvolvidas pela entidade, sendo necessário atender também à
relação entre cada contrato e essa mesma actividade “de sectores especiais”
4. Entidades adjudicantes nos “sectores especiais”
• A noção de entidade adjudicante nos sectores especiais resulta
da articulação entre os arts. 7.º e 12º (correspondentes ao art. 2.º
para os sectores gerais);
• A noção de contraente público nos sectores especiais encontra-
se prevista no art. 8.º (corresponde ao art. 3.º para os sectores
clássicos)
• A definição das actividades dos sectores especiais encontra-se
no art. 9.º
15
4. Entidades adjudicantes nos “sectores especiais”
• O sistema é complexo, podendo dizer-se que existem três níveis de entidades
adjudicantes:
Entidades do art. 2.º/1 que exerçam actividades nos sectores especiais:
estão sujeitas ao regime geral da formação de contratos públicos;
Entidades do art. 2.º/2 que exerçam actividades dos sectores especiais:
estão sujeitas ao regime especial dos sectores especiais apenas na medida
em que os contratos digam respeito a essas actividades (art. 12º)
Entidades do art. 7.º/1: estão sujeitas (apenas) ao regime especial dos
sectores especiais, para os contratos que digam respeito a essas
actividades, não estando sujeitas a outras regras de concorrência.
5. Extensão do âmbito de aplicação: os artigos
275.º a 277.º do Código
16
5. Extensão do âmbito de aplicação: os arts. 275.º a 277.º do Código
• O Direito comunitário prevê que entidades não qualificadas como
“entidades adjudicantes” devam cumprir regras ou princípios de
contratação pública (arts. 3.º, 8.º e 63.º da Directiva 2004/18);
• Fundamento comum destas vinculações é o objectivo genérico de
assegurar a correcta aplicação dos dinheiros públicos,
designadamente que eles não são aplicados em desconformidade
com os princípios essenciais dos Tratados (igualdade, não
discriminação em razão da nacionalidade)
• O Código regula essas situações nos seus artigos 275.º a 277.º
5. Extensão do âmbito de aplicação: os arts. 275.º a 277.º do Código
• Há que distinguir três casos:
Contratos de empreitada e aquisição de serviços subsidiados em
mais de 50% por entidades adjudicantes (art. 275.º);
Contratos de empreitada celebrados com terceiros por
concessionários que não sejam entidades adjudicantes – pois os
concessionários que sejam entidades adjudicantes cumprem o
Código na sua totalidade – (art. 276.º);
Contratos de locação ou aquisição de bens móveis celebrados
por titulares de direitos especiais ou exclusivos no exercício de
actividades de serviço público (art. 277.º).
17
5. Extensão do âmbito de aplicação: os arts. 275.º a 277.º do Código
• Art. 275.º:
Aplica-se aos contratos de empreitada de valor igual ou superior a
€5.000.000 [art. 19.º/b), que remete para o art. 7.º/c) da Directiva 2004/18];
São também abrangidos os contratos de aquisição de serviços de valor
superior a €200.000 [art. 20.º/1/b), que remete para o art. 7.º/b) da Directiva
2004/18, na redacção actual], desde que complementares ou por outra
forma relacionados com um contrato de empreitada sujeito a procedimento
de formação por força do art. 275.º (ex.: contratos de elaboração de
projectos ou de aquisição de serviços de fiscalização da obra).
5. Extensão do âmbito de aplicação: os arts. 275.º a 277.º do Código
• Art. 275.º:
Devem ser considerados todos os tipos de subsídio, incluindo de
origem comunitária e não apenas nacional, que sejam directamente
destinados ao contrato de empreitada (Viana, 2007, 466);
Sendo aplicável o art. 275.º, a entidade financiadora deve velar
pelo cumprimento, e a entidade financiada deve cumprir, na
íntegra, as regras do Código relativas à formação do contrato
de empreitada financiado e do(s) conexo(s) contrato(s) de
aquisição de serviços.
18
5. Extensão do âmbito de aplicação: os arts. 275.º a 277.º do Código
• Art. 276.º:
Aplica-se aos contratos de empreitada de valor igual ou superior a
€5.000.000 [art. 19.º/b), que remete para art. 7.º/c da Directiva 2004/18]
Sendo aplicável o art. 276.º, o concessionário está (apenas) sujeito
ao cumprimento de algumas regras específicas:
Obrigação de publicação de anúncios (art. 276.º, n.ºs 1 a 4);
Regras especiais em matéria de prazos de entrega de
candidaturas e propostas (art. 276.º, n.ºs 5 a 7)
5. Extensão do âmbito de aplicação: os arts. 275.º a 277.º do Código
• Art. 277.º:
Aplica-se aos contratos de aquisição ou locação de bens móveis,
aparentemente de qualquer valor (já que a lei não restringe);
Sendo aplicável o art. 277.º, a entidade está (apenas) sujeita ao
cumprimento do princípio da não discriminação em razão da nacionalidade
(art. 277.º/1), o que reforça a interpretação de que se trata de contratos de
quaisquer valor (já que o princípio vale em todos os casos);
O art. 277.º/2 consagra uma regra destinada às entidades públicas:
quando atribuem um direito especial ou de exclusivo associado a um
serviço público devem publicitar a vinculação do art. 277.º/1.
19
6. Casos
6. Casos
• Caso 1: Ac. Wall, de 13.04.2010: ausência de controlo por autoridade pública, ausência de
financiamento maioritário e exercício de actividade com carácter industrial e comercial.
• “(…) embora a cidade de Frankfurt detenha 51% do capital da FES, essa participação não lhe permite
controlar efectivamente a gestão desta empresa. Com efeito, para serem adoptadas as decisões da FES
é necessária uma maioria de três quartos dos votos da assembleia-geral. Além disso, os restantes 49%
do capital da FES são detidos não por uma ou várias outras autoridades públicas, mas por uma empresa
privada (…). Além disso, a cidade de Frankfurt apenas dispõe de um quarto dos votos no seio do
conselho geral da FES. O facto de aquela cidade ter o direito de propor um candidato para o lugar de
presidente do conselho geral da FES, cujo voto prevalece em caso de empate de votos, não basta para
lhe permitir exercer uma influência determinante sobre esta.” (n.ºs 50 a 53, sobre o controlo efectivo)
• “(…) o órgão jurisdicional de reenvio salienta que mais de metade do volume de negócios da FES
provém de contratos sinalagmáticos relativos à eliminação de resíduos e à limpeza das vias públicas no
território da cidade de Frankfurt. Um relacionamento deste tipo deve ser equiparado ao que existe nas
relações comerciais normais, que se desenvolvem no quadro de contratos sinalagmáticos livremente
negociados entre cocontratantes. Aliás, pode deduzir-se da decisão de reenvio que a FES exerce as suas
actividades em situação de concorrência no mercado, como resulta, por um lado, do facto de retirar parte
substancial das suas receitas de actividades com autoridades públicas diferentes da cidade de Frankfurt
e com empresas privadas que operam no mercado e, por outro, da circunstância de ter sido colocada em
competição com outras empresas para obter a concessão em causa no processo principal. (n.ºs 55-56,
sobre financiamento e concorrência)
20
6. Casos
• Caso 2: Ac. Bayerische Rundfunk, de 13.12.2007: existência de financiamento maioritário.
• “(…) existe um financiamento maioritário pelo Estado quando as actividades de organismos de
radiodifusão públicos como os em causa no processo principal são financiadas maioritariamente através
de uma taxa que onera os detentores de um aparelho receptor, que é aplicada, calculada e cobrada
segundo regras como as que estão em causa no processo principal.” (n.º 50)
•“(…) no presente caso não há nenhuma contrapartida específica para o Estado, visto que (…) o
financiamento em causa no processo principal serve para compensar os encargos que surgem do
cumprimento da missão de serviço público do Estado que consiste em assegurar uma informação
audiovisual pluralista e objectiva dos cidadãos. Nesta medida, os organismos de radiodifusão em causa
no processo principal não diferem de outro serviço público que receba uma subvenção do Estado para
realizar a sua tarefa de serviço público.” (n.º 59)
6. Casos
• Caso 3: Ac. University of Cambridge, de 03.10.2000: financiamento maioritário.
• “Nem todos os pagamentos efectuados por uma entidade adjudicante têm como efeito a criação ou o
aprofundamento de um nexo específico de subordinação ou de dependência. Apenas as prestações de
financiamento ou de apoio, mediante auxílio financeiro sem contra-prestação específica, das actividades
da entidade em causa poderão qualificar-se de «financiamento público».” (n.º 21)
• “Pouco importa (…) que as actividades de carácter comercial se confundam, eventualmente, com as
actividades de ensino e de investigação da universidade. Com efeito, a entidade adjudicante tem
interesse económico na realização da prestação. É verdade que uma tal relação contratual pode ter
também como consequência uma dependência do organismo em causa em relação à entidade
adjudicante; todavia, (…) esta dependência tem natureza diversa da resultante de uma mera prestação
de apoio. Com efeito, deve, antes, assemelhar-se à existente nas relações comerciais normais nos
contratos de natureza sinalagmática livremente negociados entre as partes.” (n.ºs 24 e 25)
• a noção de financiamento público “(…) abrange as bolsas ou subvenções concedidas por uma ou várias
entidades adjudicantes para promoção de trabalhos de investigação e as bolsas destinadas a estudantes
pagas às universidades pelas autoridades regionais com o ensino a seu cargo e que abrangem os custos
de escolaridade de estudantes individualmente designados. Não constituem ao invés financiamento
público para efeito das referidas directivas os pagamentos efectuados por uma ou várias entidades
adjudicantes quer no âmbito de um contrato de prestação de serviços que abranja trabalhos de
investigação, quer como contrapartida da prestação de outros serviços, tais como perícias ou
organização de conferências. ” (n.º 26)
21
6. Casos
• Caso 4: Ac. Hans & Christophorus Oymanns, de 11.06.2009: necessidades de interesse
geral, financiamento (I).
• “(…) as caixas públicas de seguro de doença em causa são pessoas jurídicas de direito público, foram
criadas por lei para satisfazer especificamente necessidades que se prendem com a saúde pública, que
são necessidades de interesse geral, e estas necessidades não têm carácter industrial ou comercial, na
medida em que as prestações são fornecidas pelas referidas caixas sem fim lucrativo. Resta, pois,
examinar se, pelo menos, uma das condições alternativas previstas nas três hipóteses que constam do
artigo 1.°/9, 2º parágrafo, alínea c), desta directiva está preenchida (…)” (n.º 49)
• A Directiva “(…) não exige que a actividade dos organismos considerados seja financiada directamente
pelo Estado ou por outra entidade pública, para que a condição [do financiamento] esteja preenchida. Um
modo de financiamento indirecto é, pois, suficiente a este respeito” (n.º 51), citando Bayerische Rundfunk
• Cabe realçar, em primeiro lugar, que o financiamento das caixas públicas de seguro de doença em
causa no processo principal é assegurado, em conformidade com a legislação nacional pertinente, pelas
contribuições dos seus inscritos, incluindo as contribuições pagas em relação a estes últimos pelos
empregadores, pelos pagamentos directos das autoridades federais e pelos pagamentos compensatórios
entre estas caixas, resultantes do regime de compensação dos riscos. As contribuições obrigatórias dos
beneficiários constituem o financiamento amplamente maioritário das referidas caixas. (n.º 52)
6. Casos
• Caso 4: Ac. Hans & Christophorus Oymanns, de 11.06.2009: necessidades de interesse
geral, financiamento (II).
• “Em segundo lugar, resulta igualmente da decisão de reenvio que as contribuições dos beneficiários são
pagas sem contraprestação específica, na acepção da jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., neste
sentido, acórdão University of Cambridge). Com efeito, a estes pagamentos não está ligada nenhuma
contrapartida contratual concreta, na medida em que nem a obrigação de contribuição nem o seu
montante constituem o resultado de um acordo entre as caixas públicas de seguro de doença e os seus
inscritos, estando estes obrigados por força da lei ao pagamento da contribuição pelo simples facto da
sua inscrição, a qual também é legalmente imposta. Além disso, o montante das contribuições é
unicamente função da capacidade contributiva de cada beneficiário (…)”. (n.º 53)
• “Em terceiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio refere que, diversamente da taxa em causa no
processo que conduziu ao acórdão Bayerischer Rundfunk e o., já referido, a percentagem das
contribuições é fixada, no caso em apreço, não pelos poderes públicos, mas pelas próprias caixas
públicas de seguro de doença. Todavia, este observa, correctamente, que a margem de apreciação
destas caixas é extremamente reduzida a este respeito, na medida em que estas têm por missão
assegurar as prestações previstas pela regulamentação em matéria de segurança social. Assim, dado
que as prestações e as despesas que com elas se prendem são impostas por lei e que as referidas
caixas não exercem as suas funções com fim lucrativo, a percentagem das contribuições deve ser fixada
de tal modo que as receitas delas decorrentes não sejam nem inferiores nem superiores às despesas.
(n.º 54)
22
6. Casos
• Caso 4: Ac. Hans & Christophorus Oymanns, de 11.06.2009: necessidades de interesse
geral, financiamento (III).
• “Em quarto lugar, cumpre realçar que a fixação das percentagens das contribuições pelas caixas
públicas de seguro de doença carece, em todo o caso, da prévia autorização da autoridade pública de
supervisão de cada uma delas. Assim, a referida percentagem é, segundo a formulação do órgão
jurisdicional de reenvio, em alguma medida, fixada legalmente. No que respeita, por último, às outras
fontes de receitas destas caixas, os pagamentos directos das autoridades federais, embora em si
mesmos de menor importância, constituem indiscutivelmente um financiamento directo por parte do
Estado”. (n.º 55)
• “Por último, no tocante às modalidades de cobrança das contribuições, resulta da decisão de reenvio
que, na prática, a parte a cargo do beneficiário é retida no seu salário pelo seu empregador e é paga à
caixa pública de seguro de doença competente com a parte da contribuição a cargo deste último. Assim,
a cobrança das contribuições efectua-se sem qualquer possibilidade de intervenção dos beneficiários. O
órgão jurisdicional de reenvio refere a este respeito que a cobrança das contribuições é efectuada de
forma compulsória, com base em disposições de direito público.” (n.º 56)
6. Casos
• Caso 5: Ac. Adolf Truley, de 27.03.2003: necessidades de interesse geral, controlo (I).
• “(…) constituem de modo genérico necessidades de interesse geral sem carácter industrial ou
comercial, na acepção do artigo 1.°, alínea b), das directivas comunitárias relativas à coordenação dos
processos de adjudicação de contratos públicos, as necessidades que, por um lado, são satisfeitas de
modo diferente da oferta de bens ou de serviços no mercado e que, por outro, por razões ligadas ao
interesse geral, o Estado opta por satisfazer ele próprio ou em relação às quais pretende manter uma
influência determinante”. (n.º 50)
• “Ora, é inegável que os serviços mortuários e funerários podem ser considerados actividades que
obedecem efectivamente a uma necessidade de interesse geral. Por um lado, efectivamente, estas
actividades estão ligadas à ordem pública, na medida em que o Estado tem interesse manifesto em
exercer um controlo estrito sobre a emissão de certidões como as de nascimento e de óbito. Por outro
lado, razões evidentes de higiene e de saúde pública podem justificar que o Estado mantenha uma
influência determinante sobre estas actividades e adopte medidas como as previstas no § 10, n.° 1, da
WLBG, no caso de o funeral não ter sido organizado dentro de um determinado período de tempo após a
emissão da certidão de óbito. A própria existência de uma disposição deste tipo constitui, por isso,
efectivamente, um indício de que as actividades em causa são susceptíveis de satisfazer uma
necessidade de interesse geral. ” (n.ºs 51-53)
• “Nos termos de jurisprudência assente, a qualidade de organismo de direito público não depende da
importância relativa da satisfação de necessidades de interesse geral sem carácter industrial ou
comercial na actividade do organismo em causa” (n.º 56)
23
6. Casos
• Caso 5: Ac. Adolf Truley, de 27.03.2003: necessidades de interesse geral, controlo (II).
• “(…) sabendo que existem na Áustria mais de 500 empresas que operam na área dos serviços
funerários (…) o órgão jurisdicional de reenvio pretende, no essencial, saber se a existência de uma
concorrência desenvolvida permite, por si só, concluir pela ausência de uma necessidade de interesse
geral sem carácter industrial ou comercial ou se, em cada caso concreto, há que tomar em conta a
totalidade dos elementos de direito e de facto relevantes.” (n.º 58)
• “(…) exigir que não existam empresas privadas que possam satisfazer as necessidades para as quais
foi criado um organismo financiado ou controlado pelo Estado, pelas autarquias ou por outros organismos
de direito público, poderia esvaziar da sua substância o conceito de ODP. (…) sem ser destituída de
qualquer relevância, a existência de concorrência desenvolvida não permite, por si só, concluir pela
ausência de uma necessidade de interesse geral sem carácter industrial ou comercial. ” (n.ºs 59 e 61)
• “(…) a Bestattung Wien está directamente sujeita ao controlo da cidade de Viena, devido ao facto de
pertencer a uma sociedade - a WSH - cujo capital pertence na íntegra àquela autarquia. Por outro lado,
(…) o contrato de sociedade prevê expressamente que o Kontrollamt pode verificar não apenas o
balanço anual desta sociedade mas também «a gestão corrente sob os aspectos da exactidão dos
números, da regularidade, da procura de economias, da rentabilidade e da racionalidade». O mesmo
ponto do contrato de sociedade da Bestattung Wien autoriza, além disso, o Kontrollamt a visitar os locais
de exploração e as instalações desta sociedade, bem como a transmitir os resultados destes controlos
aos órgãos competentes e aos accionistas da sociedade e à cidade de Viena. Prerrogativas deste tipo
permitem, por isso, um controlo activo sobre a gestão da referida sociedade.
7. Referências
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7. Referências (Autores portugueses)
• AMARAL E ALMEIDA, J. - Os «organismos de direito público» e o respectivo regime de contratação: um caso
de levantamento do véu, in Estudos em homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano no centenário do
seu nascimento, vol. I, Lisboa, 2006, 633 e ss.
• AZEVEDO, BERNARDO – "Organismo de direito público - Uma categoria jurídica autónoma de direito
comunitário intencionalmente aberta e flexível", in PEDRO GONÇALVES (ORG.), Estudos de Contratação
Pública, vol. III, Coimbra: CEDIPRE, 2010, pp. 51-86.
• CAUPERS, J. – Âmbito de aplicação subjectiva do Código dos Contratos Públicos, in Cadernos de Justiça
Administrativa, (64), Julho/Agosto 2007, pp. 9-14.
• ESTEVES DE OLIVEIRA, M./ESTEVES DE OLIVEIRA, R. – Concursos e outros procedimentos de contratação
pública, Coimbra: Almedina, 2011.
• GUERRA TAVARES, G./MONTEIRO DENTE, N. – Código dos Contratos Públicos Comentado, Vol. I - Regime
da Contratação Pública, Coimbra: Almedina, 2009.
• LOPES MARTINS, L. – Aplicação do regime jurídico de empreitadas de obras públicas às Instituições
Particulares de Solidariedade Social - anotação ao ac. STA de 08.10.2002, proc. 1308/02, in Cadernos de
Justiça Administrativa, (55), Janeiro/Fevereiro 2006, pp. 17-35.
• MEDEIROS, R. – Âmbito do novo regime da contratação pública à luz do princípio da concorrência, in
Cadernos de Justiça Administrativa, 69, (Maio/Junho), 2008, pp. 3-29.
• RAIMUNDO, M. A. – As empresas públicas nos tribunais administrativos – Contributo para a delimitação do
âmbito da jurisdição administrativa face às entidades empresariais instrumentais da Administração Pública,
Coimbra: Almedina, 2007.
7. Referências (Jurisprudência)
• Acórdãos do Tribunal de Justiça (disponíveis em www.curia.eu.int):
Wall, de 13.04.2010, Proc. C-91/08
Bayerische Rundfunk, de 13.12.2007, Proc. C-337/06
Comissão/Alemanha, de 18.11.2004, Proc. C-126/03
Comissão/Espanha, de 16.10.2003, Proc. C-283/00
Korhonen, de 22.05.2003, Proc. C-18/01
Adolf Truley, 27.02.2003, Proc. C-373/00
Universale-Bau, de 12.12.2002, Proc. C-470/99
Agorà, de 10.05.2001, Procs. C223/99 e C-260/99
Comissão/França, de 01.01.2001, Proc. C-237/99
University of Cambridge, de 03.10.2000, Proc. C-380/98
BFI Holding, de 10.11.1998, Proc. C-360/96
Mannesmann, de 15.01.1998, Proc. C-44/96