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  • Reviso de Literatura

    Castro, M.M.L.D.; Passos, S.R.L. Rev. Psiq. Cln. 32 (6); 330-335, 2005

    Entrevista motivacional e escalas de motivao para tratamento em dependncia de drogas

    MARCELLE M. LOBO DINIS CASTROSNIA REGINA LAMBERT PASSOS

    1 Mdica Psiquiatra. Aluna do Curso de Especializao em Assistncia a Dependentes de lcool e outras Drogas do Ncleo de Estudos e Pesquisa em Ateno ao Uso de Drogas (NEPAD) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

    2 Pesquisadora do Departamento de Epidemiologia e Antropologia do Instituto de Pesquisa Clnica Evandro Chagas da Fundao Oswaldo Cruz (IPEC /FIOCRUZ). Mdica psiquiatra do Ncleo de Estudos e Pesquisas em Ateno Uso de Drogas (NEPAD UERJ). Doutora em Sade Pblica.

    Endereo para correspondncia: Fundao Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) Departamento de Epidemiologia e Antropologia do Instituto de Pesquisa Clnica Evandro Chagas. Av. Brasil, 4365, Manguinhos 21045-900 Rio de Janeiro RJ. E-mail: [email protected]

    Resumo

    Objetivo: Identicar e rever os instrumentos que explorem a motivao como fator capaz de predizer o resultado de tratamento da dependncia de substncias psicoativas e que vm sendo utilizados na ltima dcada. Mtodo: Reviso bibliogrca abrangente de literatura cientca indexada sobre escalas que aferem o grau motivao. Resultado: Identicaram-se quatro instrumentos e suas propriedades psicomtricas, os dois primeiros com verses validadas em portugus: Rhode Island Change Assessment Questionnaire (URICA), Stages of Change Readiness and Treatment Eargness Scale (SOCRATES), Treatment Motivation Questionnaire (TMQ), Readiness to Change Questionnaire (RCQ). Concluso: A teoria motivacional vem sendo regularmente estudada na ltima dcada, permitindo avaliao pragmtica de seus parmetros por meio de escalas com validade e conabilidades que variam de boa a excelente.

    Palavras-chaves: Dependncia de drogas, motivao, entrevista motivacional, escalas.

    Abstract

    Objective: To identify and review tools used in specialized services to explore aspectos of motivation as a predictive factor of treatment outcome in drug-abusing patients. Method: Comprehensive literature review of scales used to assess the degree of motivation. Result: Four scales to evaluate stages of behavioural change related to motivation were identied and described, together with their associated psychometric properties Rhode Island Change Assessment Questionnaire (URICA), Stages of Change Readiness and Treatment Eargness Scale (SOCRATES), Treatment Motivation Questionnaire (TMQ), Readiness to Change Questionnaire (RCQ); The rst two have Portuguese validated versions. Con-clusion: Motivacional theory has been regularly studied in the last decade, allowing the denition of pragmatic evaluation parameters in scales with validity and reliabilities that vary from good to excellent.

    Key-words: Drug dependence, motivation, motivational interview, scales.

    Recebido: 13/06/2005 - Aceito: 03/10/2005

    Motivational Interview and scales used to assess the degree of motivation for treatment in drug abuse patients

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    Introduo

    A motivao caracteriza-se como processo dinmico segundo o modelo transterico, desenvolvido por Prochasca e Diclement (1983). Este modelo descreve os estgios de mudana comportamental por meio dos quais o indivduo transita de forma no linear, estando em tratamento ou no. Tais estgios so: pr-contem-plao, contemplao, determinao, ao, manuteno e recada.

    Um aspecto relevante a origem da inuncia da motivao que pode ser externa (presses, aes coercitivas) ou interna (motivao que vem do prprio indivduo) (Ryan e Plant, 1995).

    H controvrsias sobre a repercusso da maior gravidade da dependncia de substncias psicoativas e sua correlao com os nveis de motivao, que tanto podem aumentar a chance de recada em pacientes ambulatoriais e internados (Silva et al., 1995; Franken e Hendricks, 1999), quanto pode diminuir a probabili-dade de abandono de tratamento (Ryan e Plant, 1995; Carpenter et al., 2002).

    As comorbidades, tambm, podem inuenciar a resposta ao tratamento da dependncia por alterar a motivao. A depresso, por exemplo, pode interferir na motivao para a abstinncia de lcool e de outras drogas. Alcoolistas com sintomas depressivos graves mostravam-se mais motivados para uma mudana comportamental, provavelmente, por possurem maior percepo das conseqncias negativas da dependncia do lcool (Blume et al., 2001). Cahill et al. (2003) encon-traram uma correlao forte e direta entre depresso e motivao interna (p < 0,002), motivao externa (p < 0,01) e a busca de ajuda interpessoal (p < 0,01).

    A entrevista motivacional (EM) uma abordagem criada para auxiliar o sujeito a reconhecer seus proble-mas atuais e potenciais quando h ambivalncia quanto mudana comportamental e estimular o comprome-timento para a realizao dessa mudana por meio de abordagem psicoterpica persuasiva e encorajadora (Miller e Rollnick, 2001).

    Esta tcnica prope intervenes teraputicas individualizadas adequadas a cada estgio com vistas a aumentar a adeso ao tratamento e prevenir possveis recadas em pacientes com comportamentos considera-dos dependentes, transtornos alimentares, tabagismo, jogo patolgico, dependncia de substncias psicoativas, e, tambm, em comportamentos sadios com vistas promoo de sade (Miller e Rollnick, 2001; Oliveira e Malbergier, 2003).

    A interveno motivacional breve (IMB) tem importante funcionalidade por ser uma forma de aten-dimento concisa, baseada na EM, que objetiva alcanar a mudana comportamental do paciente e desencadear uma tomada de deciso e o comprometimento com a mudana (Miller e Rollnick, 2001). Neste tipo de inter-veno, utiliza-se um inventrio de estratgias oferecidas

    pelo entrevistador, ao paciente, para modicar seu com-portamento problema de modo responsvel.

    A IMB consiste em uma a trs sesses, que pos-suem impacto motivacional e precipitam mudanas de comportamento, sendo comparvel a tratamentos mais extensos em dependncia de drogas. Ela contm seis elementos: devoluo; responsabilidade pessoal do paciente; conselhos claros para mudana de hbito; seleo de uma abordagem especca de tratamento, mas ofertando estratgias alternativas; empatia do terapeuta; e reforo da auto-eccia da esperana do paciente (Millner e Rollnick, 2001).

    A atuao do terapeuta ao conduzir uma IMB pauta-se em cinco princpios estruturantes: promoo da auto-eccia, expresso de empatia, desenvolvimento de discrepncia, evitao de argumentao e acompa-nhamento da resistncia.

    Auto-eccia a crena de uma pessoa em sua capacidade de realizar ou de ter xito em uma tarefa especca. Ela pode ser considerada como elemento-chave na motivao para mudana e bom indicador de resultados de tratamento (Miller e Rollnick, 2001). De Weert-van Oene et al. (2001) justicam a auto-eccia como bom indicador quanto durao do tratamento. Pacientes com maior auto-eccia apresentam maior capacidade de enfrentar seus problemas relacionados dependncia de substncias psicoativas e, por isso, alcanam desfecho do tratamento mais rapidamente.

    Expressar empatia a capacidade de construo de aliana teraputica conseguida pela escuta reexiva e respeitosa e o desejo de compreender as esperanas e os receios do paciente. A aceitao dos limites do paciente facilita a ocorrncia para mudana comportamental.

    Desenvolver discrepncia consiste em ajudar o paciente a conscientizar-se dos custos de seu comporta-mento atual, relacionados dependncia de drogas, e de seus recursos pessoais para reformular seus projetos de vida. Blume et al. (2001) armam que quando pacientes dependentes de lcool conscientizam-se que os custos de sua dependncia sobrepem-se aos benefcios e prazeres da bebida, cam mais motivados em mudar seu comportamento. Perdas freqentes relacionadas s substncias psicoativas podem ser fatores preditivos para aumentar os nveis de motivao pessoal para mu-dana comportamental (Blume e Marlatt, 2000; Blume e Schmaling,1998).

    Evitar a argumentao signica evitar discusses contraproducentes acerca do diagnstico de dependn-cia de substncias psicoativas.

    Acompanhar a resistncia caracteriza-se por re-conhecer o estado motivacional do paciente e pautar as intervenes teraputicas individuais. Escalas que aferem o estgio de motivao do paciente tm sido construdas, na tentativa de aumentar a preciso e vali-dade da identicao do estgio atual de um paciente em particular e auxiliar o terapeuta na escolha da estratgia de tratamento mais adequada.

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    Este artigo objetiva identicar e revisar os instrumen-tos que exploram a motivao como fator capaz de predizer o resultado de tratamento da dependncia de substncias psicoativas e subsidiar a conduta teraputica.

    Mtodo

    A realizao deste trabalho consistiu de reviso biblio-grca abrangente de artigos nacionais e internacionais, que compreendeu o perodo de 1995 a 2004, publicados em revistas indexadas no MedLine, Lilacs e Embase, Scielo, Psyclite nas reas de toxicomania, psiquiatria e psicologia utilizando as palavras-chaves: dependncia de drogas, motivao, entrevista motivacional e escalas de avaliao, alm de livros especializados.

    Resultados

    Escalas de motivao para tratamento em dependncia de drogasDiversos estudos tm utilizado uma srie de instrumen-tos que avaliam o aspecto motivacional de mudana comportamental, entre eles: Rhode Island Change Assessment Questionnaire (URICA), Stages of Change Readiness and Treatment Eargness Scale (SOCRATES), Treatment Motivation Questionnaire (TMQ), Readiness to Change Questionnaire (RCQ). O nmero de artigos identicado por instrumento foi: URICA (7), SOCRATES (6), RCQ (3) e TMQ (2). URICA e SOCRATES so de domnio pblico, no envolvem problemas de copyright e podem ser utilizadas sem custo.

    URICA um questionrio de auto-preenchimento que no necessita de treinamento prvio, aplicado na populao adulta, contm 32 perguntas divididas em quatro subescalas, as quais abrangem os seguintes es-tgios de mudana comportamental: pr-contemplao, contemplao, ao e manuteno. H uma verso com 24 itens. O tempo necessrio para a aplicao da escala varia de cinco a dez minutos. Este instrumento investiga os estgios motivacionais de pacientes que procuram tra-tamento para a modicao de qualquer tipo de proble-ma comportamental e visa fornecer esta informao para ajudar a guiar as abordagens de tratamento adequadas. URICA encontra-se ainda em processo de validao em sua verso em portugus (Oliveira et al., 2003).

    Oliveira et al. (2003) aplicaram o URICA e o Short-form Alchool Dependence Data (SADD) em uma amostra de pacientes alcoolistas em servio especializado e observaram correlao positiva (r = 0,197; p = 0,031) entre o estgio de manuteno e maior gravidade de dependncia de lcool. A proposta de tratamento ofere-cida foi estimular a auto-eccia destes pacientes como forma de preveno recada.

    URICA considerado instrumento convel e de boa consistncia interna (Pantalon e Swanson, 2003)

    e validades concorrente e preditiva satisfatrias. Em uma amostra heterognea de pacientes dependentes de lcool, a varincia e a consistncia interna da escala foi aceitvel e variou de 0,8 a 0,84 e a validade preditiva foi encontrada em quatro dos cinco pers replicados (Carney e Kivlahan, 1995). Velsquez et al. (1999) encon-traram coecientes de conabilidade para as subescalas do URICA que oscilaram de 0,74 a 0,89. O coeciente alfa de Cronbach para a pontuao da subescala de prontido foi de 0,91.

    Vrias pesquisas tm sido realizadas utilizando o URICA a m de estimar os estgios motivacionais em pacientes psiquitricos com transtornos primrios rela-tivos ou no dependncia de drogas e/ou em comor-bidades. Henderson et al. (2004) avaliaram a validade preditiva dos estgios de mudana em dependentes de herona, como droga primria, usando o URICA para prever a adeso ao tratamento e amostras urinrias ne-gativas de herona e/ou cocana durante um perodo de 29 semanas. Esses pacientes tiveram acesso a materiais didticos sobre o assunto, participaram de terapias de grupo e cognitivo-comportamentais e de entrevistas motivacionais. A consistncia interna das subescalas do URICA mostrou-se adequada e variou de 0,71 a 0,88. O coeciente alfa de Cronbach oscilou de 0,71 a 0,93 para o URICA relativo a amostras de cocana urinria e 0,64 a 0,71 relativo a amostras de herona na urina. As pontuaes das subescalas da URICA resultaram em aumento signicativo da varincia capaz de predizer amostras urinrias negativas de herona e cocana e adeso ao tratamento. Aps o controle das variveis demogrcas, da gravidade de uso e da escolha da teraputica, a subescala de manuteno foi preditiva para a presena de amostras de urina livres de cocana e para a adeso ao tratamento, enquanto a subescala de contemplao foi preditiva para a obteno de amostras na urina livres de herona.

    SOCRATES, criada por William Miller, um instrumento auto-administrvel composto por 19 itens (verso recente), sendo as alternativas de resposta do tipo Likert, voltados para pacientes alcoolistas, com durao mdia de trs minutos. Abrange trs subesca-las: reconhecimento (capacidade de insight do paciente com relao ao consumo de lcool); ambivalncia e ao (evoluo do paciente naquele perodo de avaliao). A subescala reconhecimento abrange itens que investigam a preparao e determinao, a subescala ambivalncia engloba o item contemplao e a subescala ao inclui os itens ao e manuteno. Suas caractersticas psico-mtricas incluem boa conabilidade e boa consistncia interna (Miller e Tonigan,1996; Maisto et al., 1999; Maisto et al., 2003; Figlie et al., 2004).

    Miller e Tonigan (1996) utilizaram SOCRATES para estimar a motivao de uma amostra de alcoolistas com altos nveis de gravidade e de consumo de bebida, identicaram que esta escala possua uma estrutura de trs fatores: ambivalncia, reconhecimento e ao e

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    um instrumento de alta conabilidade (o coeciente de correlao intraclasse oscilou de 0,82 a 0,94).

    Em estudo de validade concorrente, conduzido em uma amostra de pacientes alcoolistas graves de instituies de atendimento primrio, Maisto et al. (1999) observaram que as subescalas de ambivalncia e de reconhecimento (AMREC) estavam correlaciona-dos aos nveis de gravidade do alcoolismo: as maiores pontuaes da subescala AMREC estavam diretamente correlacionadas freqncia e quantidade dos proble-mas clnicos decorrentes do consumo alcolico, e que a subescala ao (Taking steps) estava correlacionada mudana comportamental, com as maiores pontua-es relacionadas diretamente reduo de consumo alcolico e posterior manuteno desta reduo. Nos mesmos pacientes alcoolistas, aps um perodo de seis meses de tratamento, a subescala AMREC demonstrou boa validade preditiva: a AMREC manteve a mesma cor-relao estatisticamente signicativa com a gravidade e freqncia do consumo de lcool (expressa em nmero total e dirio de drinques em perodo de seis meses), o que no ocorreu com subescala taking steps, que estava relacionada positivamente com a sintomatologia de abstinncia, mas inversamente s conseqncias do consumo de bebidas alcolicas.

    Figlie et al. (2004) estudaram a consistncia in-terna e a estrutura fatorial da verso em portugus da SOCRATES (verso 8) em uma amostra ambulatorial de um centro especializado em gastrenterologia de de-pendentes de lcool, baseando-se na estrutura fatorial explicitada por Miller e Tonigan (1996) e Maisto et al. (1999). No estudo de Fligie et al. (2004), SOCRATES apresentou boa consistncia interna e conabilidade. Similarmente ao trabalho de Maisto et al. (1999), Fligie et al. encontraram uma estrutura de dois fatores no-independentes agrupados ao redor de dois diferentes conceitos, o AMREC e o conceito de ao, talvez em virtude da semelhana de conceitos entre ambivalncia e reconhecimento.

    Uma outra escala disponvel na literatura a TMQ. Trata-se de instrumento auto-administrvel, composto por 29 itens, que abrangem os motivos pelos quais o paciente procura e permanece no tratamento, distribudos pela avaliao de quatro reas: motivao interna, motivao externa, busca de ajuda interpessoal e grau de expectativa quanto ao resultado de tratamento (Cahill et al., 2003). Os itens variam em uma escala de cinco pontos, incluindo as opes no totalmente verdadeira a totalmente verdadeira. A TMQ apre-senta boa validade de construto, por demonstrar alta interdependncia entre as variveis presentes na escala (Ryan e Plant, 1995).

    Ryan e Plant (1995) aplicaram a TMQ em uma amostra de dependentes de lcool revelando que a mo-tivao interna estava associada com a maior adeso ao tratamento, principalmente se estivesse associada alta motivao externa.

    Cahill et al. (2003), utilizando tambm a TMQ com o intuito de estimar o grau de motivao em uma amostra de pacientes do sexo masculino dependentes de lcool e drogas, observaram no haver diferena sig-nicativa entre as pontuaes de motivao dos depen-dentes de drogas e de lcool anterior e posteriormente ao tratamento a que foram submetidos. Em ambos os grupos de pacientes, perceberam que as pontuaes da motivao externa, da motivao interna e da motivao para a busca de ajuda interpessoal no pr-tratamento mantiveram-se altas aps o trmino deste e que no decorrer do mesmo, somente a motivao externa mostrou-se em queda.

    RCQ um questionrio composto por 12 itens, que abrangem os estgios de mudana motivacionais: pr-contemplao, contemplao e ao. O estgio de manu-teno no abordado por esse instrumento porque, para indivduos abstmios, muitas das perguntas, desse ques-tionrio, no fazem sentido e conseqentemente o ques-tionrio pode apresentar um mau entendimento (Rumpf et al., 1999). Este questionrio foi desenvolvido para avaliar pacientes dependentes de lcool. Os itens variam em uma escala de cinco pontos abrangendo opes no concordo completamente a concordo completamente. Altas pontuaes nas escalas de contemplao e ao e baixas pontuaes na escala de pr-contemplao indicam maior prontido para mudana comportamental.

    A partir da proposta da referida escala, Rumpf et al. (1999) avaliaram os estgios de mudana por meio da aplicao da RCQ em duas amostras representativas de indivduos dependentes de lcool de um hospital geral e da populao geral. Observaram que os pacientes do hospital geral encontravam-se mais freqentemente no estgio de ao (p < 0,0001), ou seja, prontos para mu-dana de atitudes frente dependncia alcolica, quan-do comparados aos alcolicos da populao geral.

    Share et al. (2002) avaliaram a importncia da anlise custo-benefcio (balana motivacional) no incio do tratamento, a sua possvel inuncia nos estgios motivacionais e na tomada de deciso com relao ao tratamento de mulheres dependentes de lcool. Ao cor-relacionar as pontuaes da escala RCQ e a percepo custo-benefcio (balana motivacional), observaram que as mulheres com maiores pontuaes no estgio de pr-contemplao no se mostravam capazes de avaliar a relao custo-benefcio de suas atitudes de dependncia, apresentando menor diferena na relao custo-benefcio. Por outro lado, pacientes que apresenta-vam maiores pontuaes no estgio de ao, percebiam com menor intensidade os custos da mudana em seu comportamento alcolico e apresentavam maior dife-rena na relao custo-benefcio. Pacientes em estgio de contemplao no foram correlacionadas com as variveis da balana motivacional, embora percebessem melhor os benefcios de mudana da sua atitude com relao dependncia alcolica, quando comparadas s em estgio de pr-contemplao.

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    Defuentes-Merillas et al. (2002) avaliaram as pro-priedades psicomtricas da RCQ_D (verso alem) em duas amostras de pacientes: uma de pacientes depen-dentes de lcool e/ou drogas em tratamento em centro especializado e a outra de pacientes alcolicos infratores provenientes da justia.

    A estrutura fatorial da RCQ_D nessas duas amos-tras foi consistente com a estrutura fatorial da RCQ ori-ginal britnica. A consistncia interna foi satisfatria nos estgios: pr-contemplao ( 0,68); contemplao ( 0,7) e ao ( 0,81). Os estgios de mudana adjacentes mostraram maior intercorrelao quando comparados aos estgios no adjacentes. Como esperado, a amostra de pacientes dependentes em tratamento encontrava-se majoritariamente no estgio de ao.

    A estrutura fatorial da RCQ_D diferiu ligeiramente da estrutura fatorial da RCQ original, revelando duas es-truturas fatoriais: uma, bi-dimensional, responsvel pelo agrupamento dos itens referentes pr-contemplao e a contemplao; e a outra, unidimensional, responsvel pelo agrupamento dos itens referentes ao.

    O coeciente dos itens positivamente formula-dos referentes pr-contemplao foi pouco maior ( 0,83) comparativamente aos itens negativos ( 0,81).

    Concluso

    Identicou-se quatro escalas com parmetros psicom-tricos variando de bom a excelente, todas elas em con-

    dies de serem utilizadas para avaliao de tratamento e predio de adeso ao mesmo. Pelo menos duas delas (URICA e SOCRATES) j possuem verso em portugus com validade e conabilidade descritas.

    O conceito de estgios motivacionais, que foi sedimentado no incio da dcada de 1980, serviu de base para a construo de uma proposta de inter-veno teraputica (Entrevista motivacional) bem estabelecida e que vem sendo testada, internacional-mente, h pelo menos uma dcada e recentemente, tambm, no Brasil.

    Com base no exposto, preconiza-se a prtica de intervenes breves, por no-especialistas em depen-dncia de drogas, tanto em consultas de clnica geral, quanto em adolescentes, com o intuito de despertar ou aumentar a motivao para a abstinncia (Albernaz e Passos, 2001). A interveno breve em adolescentes usurios de substncias psicoativas foi mais efetiva em reduzir a prevalncia do consumo e os comportamentos de risco associados a este, comparado a uma orientao preventiva contendo informaes em folhetos (De Mi-cheli et al., 2004).

    Futuros desdobramentos deste trabalho incluem, em curto prazo, a avaliao da capacidade preditiva da URICA, a partir de sua utilizao em estudo ambula-torial em centros de tratamento para dependentes de droga no Rio de Janeiro e, em mdio prazo, viabilizar verses em portugus das escalas ainda no dispon-veis (RCQ e TMQ).

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