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SSeemmiinnáárriioo PPrreessbbiitteerriiaannoo ddoo NNoorrttee
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SSOOLLAA SSCCRRIIPPTTUURRAA -- AA DDOOUUTTRRIINNAA RREEFFOORRMMAADDAA DDAA AAUUTTOORRIIDDAADDEE SSUUPPRREEMMAA
DDAASS EESSCCRRIITTUURRAASS
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Trabalho monográfico realizado sob a
orientação do Professor: Walter Tavares
para cumprir as exigências do Seminário
Presbiteriano do Norte, com o fim de obter
grau do curso: Bacharel em Teologia.
RReecciiffee,,
AAggoossttoo ddee 22000066
3
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à minha amada mãe,
Maria José Pereira Leite.
4
AGRADECIMENTOS
Sou imensamente grato ao Senhor pela oportunidade de servi-lo, sobretudo de
servi-lo na IPB, uma Igreja séria e comprometida com a Palavra da Verdade e sua
Pregação.
Sou grato ao Presbitério Litorâneo de Pernambuco pela confiança que expressaram
ao outorgar-me trabalhos tão sérios. Senti o peso da atribuição, mas ao mesmo tempo senti
o apoio nas orações. A Comissão Executiva, bem como de todos os conciliares.
Sou grato ao Conselho da Igreja Presbiteriana de Pontezinha, porque são servos de
Deus, são exemplos na Igreja, de pessoas empenhadas e preocupadas com o Reino.
Sou grato ao meu tutor o Rev. Jasom Rodrigues, ao Pastor Adalberon de Carvalho
Garret e ao Pastor Paulo Chagas um grande amigo.
Sou imensamente grato à Congregação Presbiteriana de Prazeres, porque com ela
tenho aprendido muito mais do que em qualquer seminário, e tem me ensinado o que é ser
pastor.
Sou grato aos meus pais e meu irmão porque nas horas de aperto eles sempre
vieram ao meu socorro.
5
FOLHA DE APROVAÇÃO
__________________________________
Orientador Prof.: Rev.Walter Tavares
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...............................................................................................................7
BASE CONFECIONAL................................................................................................10
I – AS ESCRITURAS NA HISTÓRIA DA IGREJA.................................................11
1.1. O que é Cânon?.........................................................................................................11
1.2. Critérios para se Reconhecer o Cânon......................................................................14
1.3. Amadurecimento do Cânon......................................................................................15
1.4. O Consenso Quanto ao Cânon..................................................................................17
1.5. A Fixação do Cânon...............................................................................................18
1.6. A Importância das Escrituras para os Pais da Igreja................................................19
1.7. As Escrituras na Igreja: Segunda metade do século II.............................................22
1.8. As Escrituras na Igreja do III e IV Séculos..............................................................23
1.9. As Escrituras no Período medieval...........................................................................25
1.10. O Resgate das Escrituras no Período da Reforma Protestante...............................28
1.11. A Igreja no período do Puritanismo (Westminster)................................................31
1.12. A Doutrina da Autoridade das Escrituras nas Confissões de Fé............................32
II – A DOUTRINA REFORMADA DA AUTORIDADE DAS ESCRITURAS......34
2.1. A Base da Autoridade das Escrituras.......................................................................35
2.2. A Inspiração das Escrituras......................................................................................37
2.3. A Inerrância das Escrituras......................................................................................46
III - AS ESCRITURAS SOB A ÓTICA DO MUNDO CONTEMPORÊNEO........54
3.1. As Escrituras sob a ótica liberal e neo-ortodoxa......................................................56
3.2 As Escrituras sob a ótica do Relativismo e do Pluralismo Pós-Moderno.................65
3.3 As Escrituras Versus “Novas Revelações”................................................................71
CONCLUSÃO................................................................................................................78
APÊNDICE.....................................................................................................................81
REFERÊNCIA...............................................................................................................84
7
INTRODUÇÃO
“Certamente a Igreja de Cristo esteja atravessando um dos seus mais difíceis períodos da
história, no que diz respeito à acolhida do seu padrão de fé e prática: As Sagradas
Escrituras. No seio do que se conhece como a igreja evangélica, fruto da Reforma do
Século XVI, nunca se citou tanto a Bíblia, como atualmente; nunca se falou tanto da Bíblia,
como atualmente; nunca se divulgou tanto a Bíblia como nos dias atuais. Paradoxalmente,
nas igrejas filhas da Reforma, nunca se desrespeitaram tanto a Palavra de Deus como
atualmente; nunca ela foi colocada como fonte secundária de informação, como
atualmente; nunca ela teve porções inteiras consideradas desatualizadas, ou pertinentes
apenas aos leitores originais, como atualmente; nunca ela foi alvo de tanto questionamento,
quanto aos autores dos livros e aos períodos nos quais foi escrita, quanto nos dias de hoje.
Essas são situações encontradas não no segmento liberal/racionalista, mas dentro da Igreja
Evangélica, das denominações que se auto-intitulam conservadoras na fé e prática e que se
propõem a ser as mais fervorosas e cheias do Espírito Santo de Deus”. 1
Assim em nossos dias, a importância da Autoridade e Suficiência das Escrituras
tem sido abordada por muitos estudiosos. E sempre foi alvo de discurssões ao longo da
história. O historiador Nichols, descrevendo sobre este assunto afirma:
“Mesmo depois da formação do cânon, reconhecido oficialmente pelo concílio de
Catargo em 397 d.c., ocorreram várias discurssões a respeito de acréscimo de livros a
este cânon, e uma supervalorização das tradições igualando-a ao mesmo nível da
autoridade das escrituras”. 2
A resposta dos Reformadores a estas questões foi Sola Scriptura. Essa foi à
doutrina fundamental da reforma do século XVI, em contraposição à doutrina Católica
Romana de uma tradição oral apostólica, a qual na prática havia se igualado a autoridade
das Escrituras.
É nesse sentido que Sola Scriptura - A Doutrina Reformada das Escrituras vem
atender uma necessidade de reafirmação de princípios e ensinamentos fundamentais ao
desenvolvimento de uma igreja sadia em doutrina e que honre, realmente o nome de Cristo.
A doutrina que me proponho a considerar neste trabalho foi de fundamental
importância na Reforma Protestante do Século XVI. Em contraposição, por um lado, à
doutrina católica romana de uma tradição oral apostólica e, por outro lado, ao misticismo
dos assim chamados entusiastas ou reformadores radicais, os Reformadores defenderam a
1 Disponível em: www.solanoportela.net
2 Robet Hastings Nichols, História da Igreja Cristã, São Paulo, Cultura Cristã, 1997, p.41.
8
doutrina da autoridade suprema das Escrituras. Essa foi, portanto, a resposta deles à
autoridade da tradição eclesiástica e do misticismo pessoal.
A autoridade suprema das Escrituras também é uma doutrina puritano-
presbiteriana. A ela os puritanos tiveram que apelar freqüentemente na luta que foram
obrigados a travar contra as imposições litúrgicas da Igreja Anglicana. A Confissão de Fé
de Westminster professa a referida doutrina em três parágrafos do seu primeiro capítulo.
No quarto parágrafo, ela trata da origem ou fundamento da autoridade das Escrituras:
“A autoridade da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obedecida, não
depende do testemunho de qualquer homem ou igreja, mas depende somente de Deus (a
mesma verdade) que é o seu Autor; tem, portanto, de ser recebida, porque é a Palavra de
Deus”. 3
O parágrafo V aborda a questão da certeza ou convicção pessoal da autoridade das
Escrituras:
“Pelo testemunho da Igreja podemos ser movidos e incitados a um alto e reverente
apreço pela Escritura Sagrada; a suprema excelência do seu conteúdo, a eficácia da sua
doutrina, a majestade do seu estilo, a harmonia de todas as suas partes, o escopo do seu
todo (que é dar a Deus toda a glória), a plena revelação que faz do único meio de
salvar-se o homem, as suas muitas outras excelências incomparáveis e completa
perfeição são argumentos pelos quais abundantemente se evidencia ser ela a Palavra de
Deus; contudo, a nossa plena persuasão e certeza da sua infalível verdade e divina
autoridade provém da operação interna do Espírito Santo que, pela Palavra e com a
Palavra, testifica em nossos corações”. 4
O décimo e último parágrafo desse capítulo confere às Escrituras (a voz do Espírito
Santo) a palavra final para toda e qualquer questão religiosa, reconhecendo-a como
supremo tribunal de recursos em matéria de fé e prática:
“O Juiz Supremo, pelo qual todas as controvérsias religiosas têm de ser determinadas, e por
quem serão examinados todos os decretos de concílios, todas as opiniões dos antigos
escritores, todas as doutrinas de homens e opiniões particulares; o Juiz Supremo, em cuja
sentença nos devemos firmar, não pode ser outro senão o Espírito Santo falando na
Escritura”. 5
3 Confissão de Fé Westminster, Cap. I, seção IV, p.6.
4 Confissão de Fé Westminster, Cap. I, seção X, p.11.
5 Ibid.p.11.
9
Em dias como os que estamos vivendo, em que cresce a impressão de que o
evangelicalismo moderno (particularmente o brasileiro) manifesta profunda crise teológica,
eclesiástica e litúrgica, convém considerar novamente essa importante doutrina reformado-
puritana. Convém uma palavra de alerta contra antigas e novas tendências de usurpar ou
limitar a autoridade da Palavra de Deus.
Martin Lloyd-Jones nos indica “que a maior lição que a Reforma Protestante tem
a nos ensinar é justamente que o segredo do sucesso, na esfera da Igreja e das coisas do
Espírito é olhar para trás”. 6 Tal é o propósito deste Trabalho.
6 D. Martin Lloyd-Jones, Rememorando a Reforma, p.56.
10
BASE CONFECIONAL
Confissão de Fé Westminster
Capítulo I
DA SAGRADA ESCRITURA
Seção - VI. Todo o conselho de Deus concernente a todas as coisas necessárias para a
glória dele e para a salvação, fé e vida do homem, ou é expressamente declarado na
Escritura ou pode ser lógica e claramente deduzido dela. À Escritura nada se acrescentará
em tempo algum, nem por novas revelações do Espírito, nem por tradições dos homens;
reconhecemos, entretanto, ser necessária a íntima iluminação do Espírito de Deus para a
salvadora compreensão das coisas reveladas na palavra, e que há algumas circunstâncias,
quanto ao culto de Deus e ao governo da Igreja, comum às ações e sociedades humanas, as
quais têm de ser ordenadas pela luz da natureza e pela prudência cristã, segundo as regras
gerais da palavra, que sempre devem ser observadas7.
7 Confissão de Fé de Westminster, Cap. I, seção VI, 1999, p.8.
11
CAPÍTULO I
AS ESCRITURAS NA HISTÓRIA DA IGREJA
A Doutrina da Suficiência das Escrituras está diretamente relacionada á Sola
Scriptura, que expressa a Autoridade Suprema das Escrituras, quanto ao conhecimento da
verdade de Deus para salvação. Ideal defendido pelos os reformadores. O compromisso da
reforma para com Escrituras é Enfatizar A Autoridade e Suficiência da Bíblia. Uma vez
que Bíblia é a palavra de Deus tem a autoridade do próprio Deus. Como a firma
Kirschner:
“As palavras de Martinho Lutero ecoam pelos séculos como testemunho, dos mais
eloqüentes, de atitudes de submissão e obediência incondicionais à palavra de Deus
escrita. Ainda homens como Melhancton, Zwínglio, Calvino, Knox e outros, basearam
todos os seus esforços e obra num fundamento comum: Sola Scriptura, - não ao Papa,
Bispos Concílios ou tradição”.
Assim disse agostinho: “O que a Escritura diz, Deus Diz!”. 8
1.1 O que é Cânon?
“Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Cristo Jesus, a pedra
angular”. 9
A palavra “Cânon” tem raízes tanto na língua hebraica quanto na língua grega. No
Hebraico, era a palavra traduzida por “Cana de medir” (Ez 40.3,5-7) e no Grego é a idéia
de “régua”, “instrumento para medição” e também “regra” (2 Co 10.13,15; Gl 6.16).
Na história da Igreja, essa palavra passou a ser usada para se referir á lista de livros
sagrados como sendo “padrão” ou a “regra” de fé e prática para os cristãos. Isto é, o
instrumento que mede, avalia a Fé e a conduta.
8 John Armstrong, “A Autoridade das Escrituras” em Sola Scriptura, p. 95.
9 Bíblia Sagrada, Almeida Revista e Atualizada, Sociedade Bíblica do Brasil, São Paulo, 2002.
12
A Bíblia usada nas igrejas protestantes é uma coleção de 66 livros. A “Bíblia
Católica”, além dos 66 livros, inclui (no antigo testamento) os livros chamados “apócrifos”
10. Já que a lista que deveria formar o cânon nunca caiu do céu, mas foi resultado de um
processo histórico de seleção, com podemos saber qual das duas está correta?
A Igreja Católica Romana a essa pergunta apelando para a infalibilidade da Igreja.
Sua teologia coloca a igreja no mesmo patamar de autoridade que a Bíblia. Portanto, ela
diz que a igreja criou, estabeleceu o cânon.
Esse argumento parece cômodo porque elimina qualquer dúvida do coração dos seus fiéis.
Se eles confiam na igreja, podem confiar no cânon estabelecido por ela. A igreja
protestante, como só crê na inerência das Escrituras, é contrária a doutrina da infalibilidade
da igreja. Por isso, em vez de firmar com os católicos que a igreja criou ou estabeleceu o
cânon, ela recorda que a igreja a penas identificou, ou seja, reconheceu o cânon. Em outras
palavras, ela não se coloca na posição de quem determina qual livro é inspirado por Deus e
qual não é. Ela apenas reconhece a inspiração. Mas para isso ela depende do senhor.
Não cremos que a igreja tenha errado embora os homens que fazem parte dela
pudessem ter errado por serem falíveis. No entanto, sabemos que a providência divina
dirigiu a escolha da igreja; isto é, assegurou que os livros fossem incluídos sem tornar a
igreja infalível. 11
O fato de havido uma seleção não significa que os livros bíblicos anteriormente não
estivessem agindo como norma ou regra de fé e prática. Há um sentido em que já havia um
cânon dentro da igreja, pois o Antigo Testamento era tido como lei divina (cf. Ef 5.19; Cl
3.16; 2Tm 3. 14-17) e os livros do Novo Testamento, mesmo não compilados, já edificava
o povo de Deus. A Igreja de Cristo Jesus não nasceu e depois resolveu montar uma
10
Apócrifos, significa escondido, mas tecnicamente a expressão se refere a esses livros que têm certo valor
mas não fazem parte do texto sagrado. 11
“Aposição histórica é que o Espírito Santo, que presidiu á formação de cada livro, também lhe dirigiu a
seleção e incorporação, continuando assim a dar cumprimento á promessa do Senhor de que ele guiaria os”.
13
enciclopédia de livros edificantes. Ela é um edifício que possui um fundador e um
fundamento. O fundador é Cristo e o fundamento são os escritos dos profetas e apóstolos
(Ef.2.20). Isto significa que a Igreja nasceu alicerçada nesses livros cujos nomes ela
posteriormente reuniu em uma lista, para evitar confusões e heresias.
Conforme afirmado anteriormente, “ao falarmos do cânon bíblico usamos sempre o
termo “reconhecimento”, não “estabelecimento”, isto porque o Cânon não foi estabelecido
por um decreto, ou por vontade de um concílio independentemente de uma visão histórica;
o que de fato aconteceu foi o reconhecimento oficial do que já era prática comum, a
aceitação dos 27 livros do Novo Testamento como palavra de Deus”. 12
Como diz R.C
Sproul: “A Igreja não estabeleceu o Cânon, mas o reconheceu e submeteu-se ao seu
governo”.13
1.2 Critérios para se Reconhecer o Cânon
Reconhecer o Cânon não foi uma tarefa simples. Primeiramente, porque muitos
livros espúrios tinham de ser eliminados, os quais vinham em nome dos apóstolos. 14
Em
segundo lugar, havia os livros edificantes e bem aceitos nas igrejas mas que se colocavam
em posições inferiores aos escritos apostólicos, sendo considerados subcanônicos. 15
Foram usados três critério para manter na lista apenas os livros inspirados:
12
Hermisten Maia Pereira da Costa, A Inspiração Inerência das Escrituras, p. 32. 13
R.C. Sproul, “O Estabelecimento da Escritura” em: Sola Scriptura, p. 70. 14
“Um exemplo de pseudepígrafo do Novo Testamento, O Evangelho de Tomé foi provavelmente escrito no
primeiro século e afirma relatar a vida de Jesus dos 5 aos 12 anos, o qual continha uma relação dos milagres
fúteis realizados pelo menino Jesus, tais como moldar pássaros com barro e, então, fazê-lo voar. Encerando-
se com o episódio do encontro de Jesus com os doutores no templo de Jerusalém. Ele tem ralação com o
Evangelho de Tiago e o de Pedro todos recusado pela igreja cristã como falsos em sua autoria e mensagem.
Apoiada na autoridade apostólica e pala coerência doutrinária a igreja não teve dúvida em recusá-los. 15
E o caso dos escritos dos chamados “pais apostólicos”: Pastor hermas, Didaquê, 1 e2 Epístola de
Clemente aos Coríntios, Epístola de Barnabé, etc.
14
1.2.1 Apostolicidade
Este foi o critério mais importante. Para ser reconhecido como parte do cânon do
Novo Testamento, qualquer livro teria de ser escrito por um dos apóstolos ou
alguém que houvesse convivido com eles. Marcos, embora não fosse apóstolo, foi
companheiro de Pedro de quem ouviu o que veio a registrar em seu evangelho.
Lucas fez cuidadosa pesquisa e recebeu a sanção de Paulo, pois este citou o seu
Evangelho como sendo escrituras (1Tm 5.18). Pedro endossa Paulo e as “demais
Escrituras” (2Pe 3.15,16).
A autoridade apostólica era essencial. O historiador Kelly diz que:
“O critério que veio a prevalecer em última instância foi o da apostolicidade. Se
não fosse provado que um livro era de autoria de um apóstolo ou que possuía a sua
aprovação, ele era terminantemente rejeitado, por mais que fosse edificante ou
popular entre os fiéis”. 16
1.2.2 Aceitação e utilização das Igrejas17
Após serem lidos pelas igrejas (Cl 4.16; 1Tm 5.27; 1Tm 4.13), os livros tinham de
receber delas ampla aceitação. Não só aceitação, mas o seu uso na liturgia das
igrejas era evidência de sua canonicidade. Um livro como o Pastor de Hernas
poderia ser considerado bom para leitura individual e privada, mas não era incluído
na liturgia como sendo Palavra Infalível de Deus. Alguns livros passaram
facilmente por este critério devido ao conhecimento e aceitação das igrejas, outros
já não.
16
KELLY, J.N.D. Doutrinas Centrais da fé Cristã, p.44. 17
“Esse critério era secundário em relação ao anterior. Mas era importante porque foi à igreja que Jesus
concedeu [pastore-mestres]”.
15
1.2.3 Coerência doutrinária
O terceiro critério era que o ensino do livro em questão fosse coeso com o restante
das Escrituras, evidenciando a unidade da mensagem de Salvação. O Espírito de
Deus não se contradiz. Portanto, qualquer livro que ensinasse alguma doutrina
contrária ao ensino dos profetas e apóstolos, era rejeitado.
1.3 Amadurecimento do Cânon
Qual era a lista legítima mais antiga dos livros do Novo Testamento? Alguns
acreditam que o Cânon Muratoriano é o mais antigo, ele data do início de segundo século.
Este cânon exclui a epístola aos Hebreus, Tiago, e as duas Epístolas de Pedro, mais
incluem o Apocalipse de Pedro e Sabedoria de Salomão. O termo composto, Novo
Testamento não é usado até 170-200 depois da morte e ressurreição de Cristo. O termo é
usado pela primeira vez por Tertuliano.
É considerado freqüentemente que Orígenes, que viveu no terceiro século, é o
primeiro teólogo sistemático. Ele questionou a autenticidade de 2 Pedro e 2 João. Ele
também nos fala, baseado em suas viagens que havia igrejas que recusaram usar 2 Timóteo
porque a epístola fala de um “mistério”, ao escrever a respeito de Janes e Jembres,
atribuindo este relato a uma tradição oral judaica (veja 2 Tm 3:8). O livro de Judas também
foi considerado suspeito por alguns, porque inclui uma cota de livros apócrifos, contendo
uma posição a respeito de corpo de Moisés, também derivado de tradição oral judaica
(Judas9) 18
.
18
Dispoível em, www.tradblogs.com.br/filosofante/images/orgenes.pdf
16
Passando ao quarto século, Eusébio, o Bispo de Cesárea, considerado, o “Pai da
História da Igreja”, lista como livros de autenticidade inspirada duvidosa: Tiago, Judas, 2
Pedro, e 2 e 3 João. Apocalipse de João era totalmente Rejeitado.
O Códice Sinaiticus, é o mais antigo e completo manuscrito do Novo Testamento
que nós temos hoje. Ele foi descoberto no monastério Cristão Ortodoxo de São Catherine
no monte Sinai. É datado como sendo do quarto século e contém os 27 livros pertencentes
ao Novo Testamento moderno e também inclui Barnabé e o Pastor de Hermas.19
Durante o quarto século, o Imperador Constantino, insatisfeito com a controvérsia
entre cristãos e Arianos com relação à Divindade de Cristo. Porque o Novo testamento não
tinha sido definido claramente, ele investiu para se definir a lista de livros e fechar o cânon
do Novo testamento. Crendo que assim ajudaria na resolução do conflito. Destarte traria
unidade religiosa para o império dividido. Porém, no quinto século o códice Alexandrinus
inclui 1ª e 2ª Clemente indicando que as disputas em relação à lista de livros do cânon
ainda não estavam em todos os lugares firmemente resolvidas.
1.4 O Consenso Quanto ao Cânon
Com o passar do tempo a Igreja discerniu quais os livros eram verdadeiramente
inspirados e quais não eram. Esta era uma luta prolongada que aconteceu durante vários
séculos. Como parte do processo de discernimento, a Igreja esteve em vários momentos
junta em concílios. Estes vários concílios da igreja confrontaram uma variedade de
assuntos para decidir e confirmar o qual já foi aceito dentro da igreja. Os concílios não
decidiram como cânon além do que tinha se tornado verdade patente e tinha praticado da
igreja Cristã.
19
Disponível em: www.bl.uk/onlinegallery/themes/asian
africanman/codex.html.
17
Os conselhos nos proporcionam registros específicos nos quais a igreja falou
claramente e em uníssono sobre o que constitui Escrituras. Entre os muitos concílios que se
encontraram durante o primeiro quatro séculos, dois são particularmente importantes neste
contexto:
1.3.1 O Conselho de Laodicea se encontrou na Ásia Menor aproximadamente 363
d.c. Este é o primeiro concílio que claramente listou os livros canônicos que temos
no presente, Antigo e novo Testamentos, com exceção do Apocalipse de João. O
concílio de laodicea declarou que deveriam ser lidos só os livros canônicos que a
igreja listou. Suas decisões foram aceitas amplamente na Igreja Oriental.
1.3.2 O terceiro Conselho de Catargo se reuniu no norte da África
aproximadamente 397 d.c. Este concílio, assistido por agostinho, tinha uma lista
extensa dos livros canônicos de ambos os testamentos Antigo e Novo. Os vinte e
sete livros do Novo Testamento atual foram aceitos como canônicos. O concílio
também asseverou que estes livros deveriam ser lidos na igreja como Palavra de
Deus em detrimento de todos os outros. Este concílio foi aceito amplamente como
fidedigno no Ocidente.
1.5 Fixação do Cânon
De acordo com F. F. Bruce:
"Os primeiros passos no sentido da formação de um cânon de livros cristãos havidos como
dotados de autoridade, dignos de figurar ao lado do cânon do Velho Testamento, a Bíblia
do Senhor Jesus e Seus apóstolos, parece haver sido tomados por volta do começo do
segundo século, época em que há evidência da circulação de duas coleções de escritos
cristãos na Igreja”. 20
20
F.F. BRUCE. Merece Confiança o Novo Testamento?, p.31.
18
O quarto século viu a fixação definitiva do cânon dentro dos limites a que estamos
acostumados, tanto no setor Ocidental como no Oriental da cristandade. Apenas no quarto
século é que o termo cânon passou a designar os escritos sagrados.
Numa carta de Atanásio, a trigésima nona, do ano 367, dirigida a seu bispos, está uma lista
dos livros da Bíblia, a primeira a conter os 27 livros do Novo Testamento como os temos
hoje. Destes ninguém deveria tirar, nem a eles acrescentar coisa alguma. Esta carta foi
muito importante para as igrejas gregas no Oriente, quanto à aceitação do cânon, e sua
influência logo se fez sentir na Igreja Latina, pois sabemos que as Igrejas do Oriente e do
Ocidente divergiam quanto aos livros canônicos. Assim o Apocalipse de João era aceito no
Ocidente, mas não no Oriente, Hebreus e Tiago eram aceitos no Oriente, mas não no
Ocidente. Jerônimo e Agostinho acataram a orientação dada por Atanásio.
O cânon apresentado por Atanásio prevaleceu sobre o de Euzébio de 26 livros e
obteve a vitória final daí por diante.
Os Concílios de Hipona (393) ao norte da África e o de Cartago (397), ratificaram
este cânon, proibindo o uso de outros livros pelas igrejas, como Didaquê, Pastoral de
Hermas e Epístola de Barnabé. Foi a Igreja, que guiada por Deus, formou o cânon,
determinando depois de longos debates que livros deveriam ser rejeitados e que livros
deveriam ser recebidos.
1.6 A Importância das escrituras para os Pais da Igreja
O período que se estende da era apostólica até meados do II século é muito
importante para nosso estudo, pois, embora os livros do Novo Testamento já existissem,
não havia ainda um cânon oficial do Novo Testamento. Compreendendo momo a igreja
retirava seu ensinamento e como ela julgava a validade dos ensinos é necessário voltarmos
19
para os assim chamados “Pais Apostólicos”. Kelly lista os principais: “Clemente de Roma,
Inácio, Policarpo, o autor de II Clemente, „Barnabé‟, Hermas, e os apologistas gregos
Aristides, Justino, Taciano, Atenágoras, Teófilo” 21
. Para estes homens o cristianismo
implicou em um complexo de fé e prática. Para Clemente os escritos que vieram a formar
o cânon das escrituras era “regra da nossa tradição” 22
, em Justino, “seguindo a Deus e aos
ensinos provenientes d‟Ele”23
, esse ensinos provenientes de Deus estavam contidos
pressupõe Justino, nos escritos apostólicos que remontava aos ensinos do próprio Cristo.
Sendo Ele o mestre supremo, as autoridades imediatas que comprovam fatos sobre Sua
pessoa e Sua mensagem eram: os profetas, que haviam anunciado Seu ministério, e os
apóstolos, que testemunharam tudo que Ele ensinou quando estava aqui na terra ou após
Sua ressurreição. Essa dupla fonte de ensino, os escritos do Antigo Testamento e os
escritos dos apóstolos, eram bem recorridas nesse período. Policarpo, que foi discípulo de
João, exortando aos filipenses para que aceitasse as Escrituras como padrão de fé escreve
“o próprio Cristo, juntamente com os apóstolos que nos pregaram o evangelho e os
profetas que anunciaram com antecedência a vinda de nosso Senhor, foram quem
anunciaram” 24
.
Na época de Justino, conforme Kelly, o Antigo Testamento não pertencia aos
judeus mas aos cristãos, esta idéia era compartilhada universalmente. Aqui os cristãos
estavam utilizando um método de exegese que até hoje é utilizado. “As Escrituras
interpretam as Escrituras”, eles estavam confirmando os ensinamentos da igreja com os
escritos do Antigo Testamento, este precedente foi aberto pelos apóstolos e até pelo
próprio Cristo ao citar o Antigo Testamento em seus ensinos confirmando o cumprimento
de uma profecia ou para citar um fato histórico. Os Pais Apostólicos estavam lendo as
21
KELLY, J.N.D. Doutrinas Centrais da fé Cristã, p.22. 22
Ibid.p.24. 23
Ibid.p.22. 24
Ibid.p.22.
20
Escrituras (Antigo Testamento) com os olhos cristãos e interpretando-as segundo esta
ótica.
A norma doutrinária na Igreja do segundo século, conforme os Pais Apostólicos
eram as Escrituras (Antigo Testamento) e os ensinos dos apóstolos que veio mais tarde
formar o Novo Testamento. Clemente escreveu:
“Os apóstolos receberam por nós o evangelho da parte do Senhor Jesus Cristo... Portanto,
armados de sua incumbência e estando plenamente assegurados por intermédio da
ressurreição de nosso Senhor Jesus Cristo, confirmados na “Palavra de Deus com a plena
convicção do Espírito Santo, eles avançaram com as boas novas””. 25
Na época de Justino, a idéia de que os ensinos de Cristo haviam sido confiados aos
apóstolos e estes tinham a incumbência de proclamá-los, estava explicitamente corrente na
Igreja. Conforme afirmou Hermas, “era mediante os apóstolos que o Filho de Deus era
pregado por todo o mundo”, 26
. Inácio, uma geração antes havia estabelecido a
conformidade ao Senhor e a Seus apóstolos. Papias fez o máximo para se aproximar do
ensino de Cristo indagando aos “anciãos”. Outro indício de que o ensino dos apóstolos era
a regra de fé e prática na Igreja desse período, juntamente com o Antigo Testamento, é o
alto prestígio que é dado as epístolas paulinas e aos evangelhos, material que já estava
escrito e era usado nos cultos e pelos fiéis. Policarpo por exemplo, considerava a carta de
Paulo aos filipenses como: “o alicerce de sua fé”, 27
. Para Justino, “os evangelhos deviam a
sua autoridade ao fato de serem as „memórias‟ dos apóstolos” 28
.
O que estamos vendo reflete, de conformidade com as citações destes pais
apostólicos, que nesse período a Igreja mantinha os ensinos dos apóstolos como sendo a
fiel exposição daquilo que Cristo ensinou. E era esse padrão de ensino, que estabelecido
nas cartas ou nos evangelhos dos apóstolos, que incorporado na proclamação do Antigo
Testamento mencionado acima ou não, eles consideravam o ensino derivado dos apóstolos
25
KELLY, J. N.D. Op. Cit. p. 23. 26
Ibid., p. 23. 27
Ibid., p. 24. 28
Ibid., p. 25.
21
como sendo originado de Cristo.
Destarte, podemos concluir que a Igreja no período dos Pais Apostólicos,
depositava total confiança naquele ensino derivado do Antigo Testamento, e no ensino dos
escritos apostólicos, tirando daí o fundamento para sua fé.
D. Kelly, afirma que; “reconhecidamente, não há indício algum de crenças ou práticas
existentes no período que não tenham sido comprovados nos livros conhecidos mais tarde
como Novo Testamento”, 29
. Crendo nessa afirmação podemos concluir que nesse período
a pureza da Palavra de Deus era a regra de fé e prática de Sua Igreja, preservada
providencialmente por Deus para que não houvesse contaminação de qualquer outra fonte
que não fosse o próprio Deus se revelando aos “homens”.
1.7 As Escrituras na Igreja: Segunda metade do século II
Na 2ª metade do II século a igreja passou a valorizar o testemunho apostólico como
autoridade de valor elevado, embora o Antigo Testamento continuasse tendo seu prestígio.
Isso aconteceu pelo fato da igreja ter reconhecido os escritos apostólicos como canônicos,
sendo colocados ao lado do Antigo Testamento como Escritura inspirada. A igreja nesse
período, estava fazendo a distinção clara do que era revelação escriturística e o que era
simples tradição. Esse amadurecimento do cânon veio motivado pelas disputas entre a
igreja e as diversas seitas gnósticas. Os gnósticos estavam utilizando as Escrituras de forma
distorcidas para atingir seus próprios fins, e para isso eles recorriam a uma suposta tradição
apostólica misteriosa, para apoiar suas especulações, além de escreverem ensinamentos
pseudoepigrafados dos Apóstolos com a intenção de trazer credibilidade aos mesmos.
Na prática, onde se acharia esse testemunho ou tradição apostólica para representar
29
KELLY, J. N.D. Doutrinas Centrais da Fé Cristã. p. 24.
22
fielmente os ensinos dos apóstolos? Como fez Papias, recorreu às reminiscências dos
apóstolos. Para Irineu a tradição apostólica também fora depositada em documentos
escritos, conforme escreve: “o que os apóstolos inicialmente proclamaram, mediante a
palavra falada, passou mais tarde, por vontade de Deus, a ser transmitido por eles nas
Escrituras”, 30
. Embora, o cânon não havia sido definido ainda na segunda metade do II
século, a igreja, conforme fica demonstrado acima, nutria a fé nos ensinos dos apóstolos,
tendo a consciência que estes eram normativos pra sua vida porque era a Palavra de Deus
revelada e já escrita, apesar de não estar organizada como hoje.
1.8 As Escrituras na Igreja do III e IV Séculos
No III e IV séculos, embora a autoridade das Escrituras não tenha sido diminuída, a
tradição foi muito valorizada. Em parte pelo fim da ameaça gnóstica, e em parte como
resultado dos desdobramentos na vida institucional da igreja. A autoridade doutrinária da
igreja continuava sendo a revelação original dada por Cristo e comunicada à igreja por
Seus Apóstolos. Essa era a tradição divina ou apostólica. É a este respeito que Cipriano no
IV século se referiu ao dizer: “a raiz e fonte da tradição do dia do Senhor” e da “origem e
fonte da tradição divina”, 31
, e Atanásio, no IV século, apontou para “a tradição... que o
Senhor deu e os apóstolos proclamaram”, 32
. Essa tradição estava incorporada nas
Escrituras que era a pedra fundamental da igreja.
As Escrituras desfrutava de autoridade absoluta na igreja nesse período, como fica
claro nas citações de Kelly:
30
KELLY, J.N. D. Doutrinas Centrais da Fé Cristã. P.28. 31
Ibid.p.28. 32
Ibid.p.29.
23
“É praticamente desnecessário deter-se na autoridade absoluta atribuída às
Escrituras como norma doutrinária. Era a Bíblia, declarou Clemente de Alexandria
por volta de 200 A. D., que, conforme interpretada pela igreja, constituía a fonte do
ensino cristão. Seu grande discípulo Orígenes foi um biblicista radical que recorreu
vez após outra às Escrituras, como o critério decisivo para a determinação do
dogma. Ele afirmou que a igreja extraía seu material catequético dos profetas, dos
evangelhos e dos escritos dos apóstolos; também entendia que a fé da igreja era
escorada pelas Sagradas Escrituras, com o apoio do bom senso. „As Escrituras
santas e inspiradas‟, escreveu Atanásio um século depois, „são plenamente
suficientes para a proclamação da verdade‟; enquanto seu contemporâneo, Cirilo de
Jerusalém, formulou: „... com respeito aos mistérios divinos e salvadores da fé,
nenhuma doutrina, por mais banal que seja, pode ser ensinada sem o apoio das
divinas Escrituras... Porque nossa fé salvadora encontra sua força não em
raciocínios fantásticos, mas naquilo que se pode provar a partir da Bíblia‟. Mais
tarde, no mesmo século, João Crisóstomo instou sua congregação a não procurar
qualquer outro ensino que não os oráculos de Deus; tudo era direto e claro na
Bíblia, e era possível extrair dela todo conhecimento necessário. No Ocidente,
Agostinho declarou que „no ensino claro das Escrituras, encontramos tudo o que diz
respeito à nossa crença e conduta moral‟, um pouco depois, Vicente de Lérins (a.C.
450) aceitou como axioma que o cânon das Escrituras era suficiente, aliás, mais do
que suficiente, para todos os propósitos,” 33
.
Destarte, podemos perceber que a igreja desse período está profundamente convicta
de que as Escrituras eram normativas para sua vida, e que os ensinos dos apóstolos
juntamente com o Antigo Testamento e os ensinos de Jesus Cristo eram “a Revelação”
divina.
A importância que foi dada às Escrituras nesse período se evidencia também, pelo
fato do uso que os Pais da Igreja faziam dela. “O próprio credo, de acordo com Cirilo de
Jerusalém, Agostinho e Cassiano, era um compêndio das Escrituras”, 34
, com essa
declaração, Cirilo chama a nossa atenção para o uso exaustivo que Agostinho e Cassiano
faziam das Escrituras. É tão evidente o uso das Escrituras como a regra da igreja nesse
período que Cirilo na controvérsia cristológica usa como recurso final o ensino da Bíblia,
ele diz: “o propósito das Escrituras divinamente inspiradas, como um todo”, 35
. Teodoreto
33
KELLY, J.N.D. Op. Cit., p.31. 34
Ibid.p.34. 35
Ibid.p.36.
24
patenteou sua posição com a seguinte afirmação: “Devo obediência apenas às Sagradas
Escrituras”, 36
.
O que podemos concluir é que a igreja no período dos séculos III e IV cria que a revelação
em sua plenitude era mantida nas Sagradas Escrituras.
1.9 As Escrituras no Período medieval
As Escrituras Sagradas estavam presentes na igreja desse período como autoridade
máxima e inerrante. Para o Papa Leão Magno, “as Escrituras eram as palavras do Espírito
Santo”, 37
. Gregório Magno, a respeito da inerrância das Escrituras, escreveu: “Seja crido
fielmente que o Espírito Santo é o autor do Livro. Aquele, portanto, que ditou as coisas a
serem escritas, escreveu estas coisas... As Escrituras são as palavras do Espírito Santo”, 38
.
O Escolástico e grande influenciador de Martinho Lutero, Boaventura argumenta que: “a
Bíblia estabelecia a verdade, e sustentava o princípio formal da Reforma; Sola Scriptura”,
39. Com este princípio, ele expressava o lema do movimento no seio da igreja que
começava a nascer, e que depositava nas Escrituras Sagradas a confiança de que ela era a
única fonte fidedigna para reger a vida. Os nominalistas não eram diferentes quanto as
Escrituras, conforme James Boice: “Abelardo, apesar de todas as suas heresias, nunca
questionou as Escrituras canônicas” 40
. Guilherme de Occam escreveu que não devemos
acreditar naquilo que “nem se contém na Bíblia, nem pode ser inferido por necessária
conseqüência manifesta”, 41
. Com essa declaração fica claro que Occam, não cria em outra
fonte normativa para a igreja, senão a Bíblia e somente a Bíblia é que era a fonte de ensino
da igreja e dos fiéis.
36
Ibid.p.36. 37
Ibid.p.36. 38
BOICE. James M. O Alicerce da Autoridade Bíblica. p. 36. 39
Ibid.p.36. 40
Ibid.p.36. 41
Ibid.p.36.
25
De modo semelhante à Occam, o pré-reformador John Wycliff, chamava a Bíblia
de, “Palavra de Deus explicite e implicite”, 42
. De acordo com Wycliff, na Bíblia estava
contida a revelação de Deus de forma clara, explicita e também por inferência podemos
abstrair os ensinamentos para questões que a Bíblia não trata tão claramente, daí
concluirmos que Wycliff concebia a idéia da doutrina da suficiênéia das Escrituras.
Wycliff, deu ênfase cada vez maior na autoridade das Escrituras em detrimento da do papa
e da tradição eclesiástica. Ele concordava com o que Tertuliano tinha escrito, de que “as
Escrituras pertencem à igreja, e por isto devem ser interpretadas dentro dela e por ela” 43
.
Para Wycliff, “se a verdadeira igreja é composta de predestinados, e não de poderosos
eclesiásticos, e se as Escrituras pertencem a esta igreja, conclui-se que é necessário traduzir
a Bíblia ao vernáculo, à língua comum do povo, devolvendo-a assim a este”, 44
. Wycliff
fez oposição a autoridade papal e o considerava como o anticristo, lutou até o fim de sua
vida para que a Bíblia fosse devolvida aos fiéis. Depois de sua morte, por sua influência a
Bíblia foi traduzida para o inglês. E foi também pela mesma influência que a Inglaterra se
viu invadida pelos “pregadores pobres”, ou lolardos. No começo, os principais lolardos
eram pessoas que tinham estudado com Wycliff em Oxford. Parte da obra destes primeiros
lolardos constituiu-se em traduzir as Escrituras para o inglês, como Wycliff tinha
recomendado, e em percorrer o pais pregando-a. Assim como as de seu mestre, as
doutrinas do lolardismo eram claras, taxativas e revolucionárias. “A Bíblia deveria ser
colocada à disposição do povo no vernáculo, as distinções entre clero e os leigos, com base
no rito de ordenação, eram contrárias às Escrituras”, 45
.
Neste mesmo período surge também John Huss, defendendo a autoridade infalível
da Bíblia, declarando assim como Wycliff que: “a autoridade final é a Bíblia, e que um
42
Ibid.p.36. 43
GONZALEZ, Justos L. A Era dos Sonhos Frustrados - Uma História Ilustrada do Cristianismo. Vol. 5. p.
87. 44
GONZALEZ, Justos L. Op. Cit., p. 87. 45
GONZALEZ, Justos L. Op. Cit., p. 89.
26
papa que não se conforme a ela não deve ser obedecido” 46
. Concordando com o que
Guilherme de Occam tinha dito, ao declarar que: “nem o papa nem o concílio, mas
somente as Escrituras eram infalíveis”, 47
. Sob a influência de Huss surgiram vários grupos
que seguiram seus ensinos, às vezes divergindo em algum ponto ou ênfase, como por
exemplo: os Taboritas, "insistiam em que tudo o que não estivesse na Bíblia deveria ser
rejeitado" 48
. Contra eles os Hussitas diziam que “somente deveria ser rejeitado o que
contradissesse os ensinos claros das Escrituras”, 49
. Estes grupos e outros lutaram entre si
sempre que era possível, mas diante da ameaça de perseguição, eles tiveram que se unir
contra um inimigo comum. Isto os levou a um acordo em quatro artigos, e o primeiro e
mais importante deles é que, “fossem pregado por todo o reino da Boêmia a Palavra de
Deus”, 50
. As declarações destes pré-reformadores servem, com certeza, para nos mostrar a
evidência de que nesse período as Escrituras Sagradas foram, mais uma vez a base, para
cristãos sinceros no seio da Igreja nortear-se nas verdades bíblicas.
Ainda na Idade Média, uma controvérsia serviu para elucidar a autoridade das
Escrituras na Igreja. Essa controvérsia se deu em torno da discussão sobre razão e fé. A
síntese ou harmonização da fé e razão na igreja, não defendia que a filosofia e a teologia ou
a revelação natural e a revelação especial ensinavam a mesma coisa ou estavam em pé de
igualdade em termos de autoridade, mas, apenas que não eram incompatíveis. Tomás de
Aquino ensinava que: “as doutrinas cristãs salvífica se aprendiam somente a partir da
revelação na Bíblia”, 51
.
46
Idem, Ibid.p. 98. 47
GONZALEZ, Justos L. Op. Cit., p. 104. 48
Ibid., p. 105 49
Ibid., p. 105 50
Ibid., p. 105 51
BOICE. James M. O Alicerce da Autoridade Bíblica. p.36.
27
Essa idéia, a fé e a razão, não são necessariamente opostas entre si. Encontra-se
também em Agostinho e na Igreja Primitiva. Conforme as palavras do próprio Agostinho
“creio a fim de entender” 52
Sem dúvidas a Igreja Medieval cria na inerrância e autoridade
das Escrituras. Conforme vimos nesse ponto a igreja nessa época lutou por convicções que
redundaram em dar mais autoridade às Escrituras, ou melhor em reconhecer a autoridade
que ela já tem.
1.9 O Resgate das Escrituras no Período da Reforma Protestante
Os reformadores adotaram sem questionar e sem reservas as Escrituras como
autoritativas em todas as questões de doutrina e da vida. Crendo que Deus é o autor da
Bíblia, viam em suas páginas o ensino do próprio Deus para Sua Igreja, rejeitando assim a
autoridade papal e dos concílios. Deus, para os reformadores é constatemente descrito
como o autor das Sagradas Escrituras. Para entendermos um pouco a visão que a igreja
estava tendo a respeito das Escrituras, queremos nos deter na compreensão de Lutero e
Calvino, quanto a este assunto.
O nominalismo de Occam exerce influência direta sobre o reformador Lutero. A
separação entre razão e a fé, feita por Guilherme de Occam, capacitou Lutero a romper os
laços do sistema escolástico de salvação que mantiveram o reformador até então cativo. A
exegese nas Escríturas levou Lutero ao despertamento para a fé evangélica. Ele estudara
sob os nominalistas em Erfurt e Wittenberg, mas foi o estudo da Bíblia que produziu a
compreensão evangélica.
52
Ibid.p. 36.
28
Na Dieta de Worms (1521), acusado de herege e sendo pressionado para se retratar
por causa de suas doutrinas, Martinho Lutero respondeu:
“A não ser que eu seja convencido de erro pelo testemunho da Escritura ou - visto que
não dou valor à autoridade não provada do papa e dos concílios, por ser claro que eles
muitas vezes erraram e freqüentemente se contradisseram - por um raciocínio evidente,
continuo convencido pelas Escrituras, às quais apelei e minha consciência foi feita
cativa pela Palavra de Deus, não posso e não quero retratar-me de qualquer coisa, pois
agir contra a nossa consciência não é coisa segura nem permitida a nós”, 53
.
Por essa declaração fica muito claro que para Lutero a autoridade máxima e
verdadeira é a Palavra de Deus, somente ela é apta para corrigir ou embasa qualquer
posicionamento teológico.
Do relatório de Eck sobre o debate na disputa de Leipzing (1519), são usadas suas
palavras como acusação ao reformador que diz: “...um concílio, visto constar de homens,
pode errar; que não se prova pela Sagrada Escritura a existência de um purgatório”..., 54.
Como fica explicitamente claro, para Lutero, aquilo que não era provado nas Escrituras
não tinha razão de ser como autoritativo, pois, os concílios não eram autoridade para fazer
normativa uma doutrina.
Para Calvino, “os escritos dos apóstolos são oráculos que foram recebidos de Deus.
Logo devemos aceitar tudo quanto foi entregue nas Escrituras, sem exceção. A crença,
Deus é o autor de todas as Escrituras, precede toda doutrina”, 55
.
Em suas Institutas Calvino diz:
“...[a Escritura] mostra que Deus, o Pai, assim como a Si nos reconciliou em Seu Cristo...
A Escritura, porém, tira [sua] exortação da fonte verdadeira, quando não somente preceitua
53
BETIENSON, H. Documentos da Igreja Cristã. p.304. 54
BETTENSON, h Op. Cit., p. 291. 55
BOICE, James M. Op. Cit., p. 40.
29
referir nossa vida a Deus, [seu] autor...”, 56
.
Quanto à intercessão atribuída aos chamados santos no Romanismo, que não se
fundamenta no ensino das Escrituras. Calvino escreve, "Ora, na Escritura [não] consta nada
[disso]” 57
.
A respeito da predestinação, Calvino diz “procura outro conhecimento da
predestinação que [aquele] que na Palavra de Deus se expõe, de não menor insânia é que
alguém queira ou avançar por [lugar] sem caminho, ou ver na escuridão” 58
. Esta citação
nos mostra que o juiz da doutrina da predestinação, para Calvino, não era os concílios ou a
igreja ou qualquer outra autoridade, senão a Palavra do Senhor. Calvino, cria que fora do
ensino da Palavra de Deus, era escuridão, era procurar caminho onde não existia, conforme
suas palavra:
"Se junto a nós prevaleça este pensar: que a Palavra do Senhor é o caminho único que nos
conduz a investigar tudo quanto é justo d‟Ele sustentar-se, é a luz única que à frente nos
fulja para bem perceber o que quer que a respeito d‟Ele convém considerar-se, de toda
temeridade facilmente nos conterá e coibirá. Pois [isto] saberemos; onde primeiro os
limites da palavra hajamos excedido, fora do caminho e em trevas nos é o curso, no qual se
haja necessariamente muitas vezes de vagar sem rumo, de resvalar, de tropeçar” 59
.
Calvino, aqui, deixa claro para nós a importância que a palavra de Deus tem, e a
importância que a ela foi atribuída neste período da igreja que compreendeu a Reforma,
cujo um dos lemas principais foi “Sola Scriptura” e concomitantemente o movimento
Iluminista da época proclamava o “ad fontes”, ou seja, um retorno às fontes, um retorno às
Escrituras Sagradas. A “Sola Scriptura” da Reforma assinalou o ensino que a igreja
reformada assimilou que a única fonte de fé e prática eram as Escrituras, o Antigo e o
Novo Testamento.
56
CALVINO, João. As Institutas. V lll, p. 146. 57
Ibid., p. 342. 58
Ibid.p. 386. 59
CALVINO, João. Op. Cit., p. 386.
30
Verificando a importância que Lutero e Calvino deram as Escrituras, podemos ter
uma boa visão do ensino a respeito da Palavra de Deus nesse período. Embora só tenhamos
nos detido no ensino da igreja reformada, pois é a que nos interessa no presente estudo.
1.11. A Igreja no período do Puritanismo (Westminster)
Reuniu-se na Abadia de Westminister, Inglaterra, pelo Grande Parlamento, uma
grande e ilustre assembléia nacional de teólogos e civis, de 01 de julho de 1643 a 22 de
fevereiro de 1648. Reuniu-se a Assembléia, numa época de terrível efervescência política e
agitação religiosa da história, na Inglaterra e na Europa, época marcada pela luta em prol
da liberdade de consciência, de ambições aberrantes e dolorosas; protestantes e católicos se
empenhavam na Guerra dos Trinta Anos. Na Holanda se desfechava os debates entre
calvinistas e arminianos.
A Assembléia estabeleceu quatro grandes princípios:
a) autoridade das Escrituras;
b) a soberania de Deus;
c) os direitos da consciência; e,
d) a jurisdição exclusiva da Igreja em sua esfera de ação. Tal era a importância das
Escrituras para os teólogos de Westminister, que eles a destacaram com tanta
proeminência.
Guilherme Kerr diz que:
“O primeiro princípio, o da autoridade suprema das Escrituras estabelecido logo no início
da Confissão é um exemplo entre muitos outros de verdades apresentadas com tal
felicidade de expressão e propriedade de termos que dificilmente poderia ser melhorado” 60
.
60
KERR, Guilherme. A Assembléia de Westermister. p.20.
31
1.12. A Doutrina da Autoridade das Escrituras nas Confissões de Fé
Confissão de Fé de Westminster 61
CAPÍTULO I
DA ESCRITURA SAGRADA
IV. A autoridade da Escritura Sagrada, razão pela qual deve ser crida e obedecida, não
depende do testemunho de qualquer homem ou igreja, mas depende somente de Deus (a
mesma verdade) que é o seu autor; tem, portanto, de ser recebida, porque é a palavra de
Deus.
A Confissão de Fé Escocesa 62
CAPÍTULO 19º
A AUTORIDADE DAS ESCRITURAS
Cremos e confessamos que as Escrituras de Deus são suficientes para instruir e aperfeiçoar
o homem de Deus, e assim afirmamos e declaramos que a sua autoridade vem de Deus e
não depende de homem ou de anjo. Afirmamos, portanto, que os que dizem não terem as
Escrituras outra autoridade a não ser a que elas receberam da Igreja são blasfemos contra
Deus e fazem injustiça à verdadeira Igreja, que sempre ouve e obedece à voz de seu
próprio Esposo e Pastor, mas nunca se arroga o direito de senhora.
Segunda Confissão de Fé Helvética 63
CAPÍTULO 1º
Da Sagrada Escritura como a verdadeira Palavra de Deus
Escritura Canônica. Cremos e confessamos que as Escrituras Canônicas dos santos
profetas e apóstolos de ambos os Testamentos são a verdadeira Palavra de Deus, e têm
suficiente autoridade de si mesmas e não dos homens. O próprio Deus falou aos patriarcas,
aos profetas e aos apóstolos, e ainda nos fala a nós pelas Santas Escrituras.
61
Confissão de Fé de Westminster, 6ª Edição, São Paulo: Editora Cultura Cristã, p.10. 62
A Confissão de Fé Escocesa, disponível em, http://www.luz.eti.br/do_confissaoescocesa1560.html. 63
Elaborada em 1562 por Heinrich Bullinger, publicada em 1566 por Frederico III da Palatina, adotada pelas
Igrejas Reformadas da Suíça, França, Escócia, Hungria, Polônia e outras.
32
E nesta Escritura Sagrada a Igreja Universal de Cristo tem a mais completa exposição de
tudo o que se refere à fé salvadora e à norma de uma vida aceitável a Deus; e a esse
respeito é expressamente ordenado por Deus que a ela nada se acrescente ou dela nada se
retire. 64
Confissão Belga 65
ARTIGO 5
A AUTORIDADE DA SAGRADA ESCRITURA
Recebemos todos estes livros, e somente estes, como sagrados e canônicos, para regular,
fundamentar e confirmar nossa fé. Acreditamos, sem dúvida nenhuma, em tudo que eles
contêm, não tanto porque a igreja aceita e reconhece estes livros como canônicos, mas
principalmente porque o Espírito Santo testifica em nossos corações que eles vêm de Deus,
como eles mesmos provam. Pois até os cegos podem sentir que as coisas, preditas neles, se
cumprem.
64
Segunda Confissão de Fé Helvética, disponível em,
http://www.unifil.br/teologia/arquivos/segconfihelvetica.doc, 65
Confissão de Fé Belga. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana. p. 07.
33
II CAPÍTULO
A DOUTRINA REFORMADA DA AUTORIDADE DAS ESCRITURAS
No ano de 1521, o ex-monge Martinho Lutero foi colocado diante do Imperador, de
vários oficiais importantes do poder temporal, além de um seleto time de altos membros do
clero, durante um concílio na cidade de Worms. As acusações eram contra os seus escritos,
muitos dos quais haviam se tornado polêmicos por combater ensinamentos heréticos do
papa, além de práticas errôneas do clero e do povo. A pergunta que lhe fizeram era simples
e direta (“Estás pronto a se retratar dos livros escritos, ou não?”), mas complexa quanto aos
seus desdobramentos. Será que ele estava disposto a ser banido do império e ser proibido
de imprimir suas obras só para defender os livros que havia escrito?
A sábia e ousada resposta de Lutero àqueles líderes terminou com as seguintes palavras:
A não ser que eu seja convencido de erro pelo testemunho da Escritura ou - visto que
não dou valor à autoridade não provada do papa e dos concílios, por ser claro que eles muitas vezes erraram e freqüentemente se contradisseram - por um raciocínio evidente, continuo convencido pelas Escrituras, às quais apelei e minha consciência foi feita cativa pela palavra de Deus, não Posso e não quero retratar-me de qualquer coisa,
pois agir contra nossa consciência não é coisa segura nem permitida a nós. É esta a minha posição. Não posso agir diversamente. Deus me ajude. Amém.
66
Essas palavras vieram de alguém que compreendia a autoridade das Escrituras.
Alguém que fora convencido pelo Espírito de que a Bíblia é a palavra infalível de Deus, e
único padrão para a nossa vida. Na Reforma Protestante, em geral, a doutrina da autoridade
das Escrituras veio em contraposição à doutrina católico-romana de uma tradição oral
apostólica, a qual, na prática, havia se igualado à autoridade da Bíblia Sagrada. A
expressão Sola Scriptura (Somente as Escrituras) surgiu com a finalidade de afirmar a
autoridade suprema das Escrituras, a única autoridade infalível, à palavra final em questões
de fé e prática.
66
BETIENSON, H. Documentos da Igreja Cristã. p.304.
34
O Apóstolo Paulo escrevendo a Timóteo Lembra:
“Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a
correção, para a educação na justiça” (2Tm 3.16). 67
O Princípio cristão da Autoridade bíblica significa que Deus é o autor da Bíblia, e
deu-a para dirigir a crença e o comportamento do seu povo. Nossas idéias a respeito de
Deus e a nossa conduta devem ser medidas, testadas e, onde necessário, corrigidas e
ampliadas de acordo com a Bíblia, como padrão de referência. Autoridade é também o
direito de ordenar. A palavra escrita por Deus, em sua verdade e sabedoria, é o meio que
Deus escolheu para exercer o seu governo sobre nós, e as Escrituras são instrumentos do
Senhorio de Cristo sobre a igreja. A obra das Escrituras na Igreja é ilustrada pelas sete
cartas do Apocalipse (Ap 2.3).
O ponto de vista Católico Romano a respeito da Bíblia tem comprometido sua
autoridade única, combinando-a com a tradição da Igreja. Os Católicos Romanos aceitam a
Bíblia como verdade da por Deus, mas instem em dizer que a Bíblia é incompleta sem a
interpretação oficial da Igreja, conforme esta é dirigida pelo Espírito. No passado, a
autoridade que a Igreja que a Igreja se arrogava sobre a Bíblia, levou-a a desencorajar ou a
proibir que os cristãos comuns lessem as Escrituras. Atualmente a Igreja Católica Romana
encoraja a todos os cristãos a ler a Bíblia.
Muito protestantes consideram a Bíblia como tendo a sua autoridade conteúdo
subjetivo ou na experiência ou intuição de seus autores humanos. A pressuposição central
(neste caso) é a de que a Bíblia permanece fundamentalmente um livro humano e não uma
revelação Divina. A Bíblia é uma guia para suas experiências religiosas, mas não é
claramente distinta de outras fontes, tais como de movimentos políticos e forças sociais.
Muito freqüentemente, a Bíblia é substituída por vozes que se opõem a ela.
67
Bíblia Sagrada, Almeida Revista e Atualizada, Sociedade Bíblica do Brasil, São Paulo, 2002.
35
O Protestantismo Histórico aceita as Escrituras como única revelação escrita de
Deus. Elas são inspiradas ou “sopradas” por Deus (2Tm 3.16), o que as distingue de todas
as outras palavras. Como resultado, as Escrituras são infalíveis e verdadeiras em tudo que
afirmam. São suficientes e contém tudo o que é necessário saber para a salvação e a vida
eterna. São claras, de modo que uma pessoa sem preparação especial pode entender aquilo
que Deus exige, sem a intervenção de um intérprete oficial.
As Escrituras Canônicas são a voz de Deus no mundo. Têm a autoridade e o direito
de ordenar, que corresponde ao seu autor divino. Por essa razão, submetemos às Escrituras
nossos pensamentos e padrões morais. Foi através do reconhecimento de que a Bíblia não
pode estar sujeita a qualquer pessoa ou grupo, por nobre que sejam que os Reformadores
libertaram suas consciências das tradições e autoridades humanas.
2.1. A Base da Autoridade das Escrituras
Porque defendemos a autoridade das escrituras? Porque Deus é quem lhe confere a
autoridade. A Confissão de Fé de Westminster afirma que a autoridade bíblica não
depende do testemunho de qualquer homem ou igreja, mas depende só de Deus. Sabemos
que Deus é o autor da Bíblia então ele é base de sua autoridade. Toda a Escritura exala a
autoridade dada por Deus. “Não é possível ler o Antigo Testamento sem sentir que por
toda a parte se declara que ele é a Palavra de Deus. As frases “disse o Senhor”, falou o
Senhor”, “veio a Palavra do Senhor” são de fato usado 3.808 vezes no Antigo
Testamento”. 68
Os escritores do Novo Testamento citaram constantemente o Antigo
Testamento a fim de estabelecer a autoridade deste. E o próprio Novo Testamente foi
elaborado por autores que sabiam que escreviam a palavra vinda de Deus (1Ts 2.13).
68
D. Martin Lloyd-Jones, Autoridade, p.65.
36
A defesa da autoridade das Escrituras não nos faz bibliólatras. Não enxergamos o
livro como ele fosse nosso Deus, mas como instrumento pelo qual conhecemos esse Deus.
Portanto, o nosso meio de defender a autoridade das Escrituras é para que o conhecimento
de Deus não seja distorcido. Afinal, o retrato de Deus nas Escrituras é correto, nítido. Por
isso reconhecemos a autoridade das Escrituras.
A igreja tanto reconhece essa autoridade, que até dá testemunho de suas evidências.
Seus preceitos morais são perfeitos, existe harmonia dos vários livros, unidade de
propósito, doutrinas não contraditórias, profecias que foram cumpridas por exatidão, a
precisão, clareza e profundidade dentro de um relato, etc. Tudo isto mostra por que depois
de muitos ataques no decorrer dos séculos (pessoas em busca de erros para desacreditá-las)
a Bíblia Sagrada permaneceu intacta na sua veracidade e relevância.
Ainda assim, com todos esses quesitos mencionados no parágrafo acima, não
podemos convencer qualquer incrédulo acerca da autoridade das Escrituras. Os argumentos
poderosos e convincentes da própria Escritura fortalecem a fé daquele que já é Cristão,
mas não tem significado espiritual para o incrédulo. Embora funcionem como aspecto
apologético (de defesa da fé), essas características singulares das Escrituras não são
capazes de fazer pessoas ouvirem o seu ensino. É aí que entra o testemunho interno do
Espírito Santo.
37
2.2. A Inspiração das Escrituras
A revelação consiste numa verdade absolutamente desconhecida que é transmitida
exclusivamente por Deus e determinados homens, por Ele vocacionados e qualificados,
não somente a transmiti-la como a recebê-las em termos humanos. 69
Difere da inspiração
factual que se fundamenta em algo que aconteceu na história e que é transmitido também
por Deus através da memória do homem, preservando-a, porém de enganos que possa
deturpar a verdade. Assim, pode-se distinguir que a história da criação, registrada no
Gênesis constitui uma revelação feita a Moisés; enquanto os fatos que o mesmo profeta
registra em Êxodo são uma inspiração factual. 70
A plenitude da revelação divina se
verificou em Cristo, quando tomou sobre si mesmo carne humana, e será revelada outra
vez, quando ele voltar em glória (cf. Lucas 2.32; 1 Pedro 1.13) Evidente que se há uma
revelação, a iniciativa deve estar em Deus. Pois mesmo os pensamentos, íntimos do
homem, ninguém, exceto o próprio homem pode comunicar (1 Co. 2.11); e como disse
Irineu: “O Senhor ensinou-nos que ninguém pode conhecer a Deus, a não ser que o próprio
Deus seja seu professor; isto é sem Deus, Deus não pode ser conhecido”. 71
Deus veio de fato em nosso auxílio; abrimos as páginas da Bíblia e nos deparamos
com uma sensação absolutamente distinta de tudo o que experimentamos, lendo os mais
exímios mestres da literatura; Lendo as Escrituras nos deparamos com um mundo de
entidades e valores superiores que nos elevam e nos enchem de contentamento
indescritível, dando-os a conscientização irresistível de veracidade divina que expressam
veracidade que transcendem todo o conhecimento adquirido pelo filosofar do saber
humano, pois nos conduz a avaliação da vida em termos plenos e eternos; descortina-nos
visões deslumbrantes da virtude que enobrece o homem e desenvolve uma equação
69
MELO, Roderick C., Havendo Deus nos Falado, p.13. 70
Idéia defendida por Roderick C. De Melo, Havendo Deus nos Falado, p.84. 71
Ibid.
38
indubitável que determina a finalidade para qual existe. 72
Quando nos referimos à inspiração das Escrituras, estamos mencionando que elas
são de origem divina. Pessoas a escreveram movida pelo Espírito Santo, e de tal modo
dirigidas por ele, que tudo o que foi registrado por eles nas Escrituras constitui-se em
revelação autoritativa de Deus. Não somente as idéias gerais ou fatos revelados forma
registrados, mas as próprias palavras empregadas foram escolhidas pelo Espírito Santo,
pela livre instrumentalidade dos escritores. Assim, a Bíblia distingue-se de todos os demais
escritos humanos, pois cada palavra é a própria Palavra de Deus; e, portanto infalível e
inerrante. Convém observar que a inspiração distingue-se da revelação especialmente
quanto ao Propósito: enquanto o propósito da revelação é a comunicação de verdades que
aprouve a Deus transmitir, o propósito da inspiração é assegurar a infalibilidade do registro
daquilo que foi revelado. 73
a) Evidências da Inspiração
As evidências da inspiração podem ser dividas em indiretas, fatores externos, e
diretas fatores internos escriturísticos. Uma das evidências indiretas da inspiração das Escrituras é
a singularidade de sua unidade, que é incontestável, principalmente quando se considera a sua
diversidade. Quarenta autores das mais variadas classes, culturas e posições sociais, entre
os quais pastores, pescadores, legisladores, reis, médicos, sacerdotes, governadores e
fariseus, a maioria dos quais nunca viu um ao outro face a face, foram instrumentos para
composição destas Escrituras. Estes autores também viveram em tempos muito diversos,
abrangendo mais de dezesseis séculos. Os tipos de escritos são os mais variados possíveis,
incluindo livros históricos, biográficos, profético, éticos, poéticos, tratando de assuntos
incrivelmente diversificados, abrangendo desde a criação do mundo, até a consumação dos
72
Ibid. Pg 85. 73
Paulo Anglanda, Sola Scriptura, pg 50,51.
39
séculos. Não obstante de tudo isto, a bíblia é essencialmente um livro. Trata de uma mesma
história, da redenção; converge para uma mesma pessoa: Cristo, e, por mais que se busque,
não se encontra qualquer real contradição ou incoerência entre todos os seus ensinos,
relatos e exortações. Quanto a profundidade do conteúdo das Escrituras é tão sobrenatural
e contrário aos pensamentos do homem que também se constitui forte evidência da sua
origem divina.
Como escreveu Ryle:
“A Bíblia ousadamente trata de assuntos que vão além do conhecimento humano, quando um homem é deixado por conta própria. Trata de coisa que são misteriosas e invisíveis: a alma, o mundo vindouro e a eternidade, profundidades estas que nenhum homem pode sondar. Todos os que têm procurado escrever a respeito destas coisas sem possuir iluminação proveniente da Bíblia, fizeram um pouco mais que provar a sua própria ignorância... Quão obscuros estavam os pontos de vista de Sócrates, Platão. Cícero e Sêneca! Um bom aluno de Escola Dominical de nossos dias conhece mais verdades espirituais do que aqueles sábios juntos”.
74
Apenas as Escrituras fornece explicação razoável a respeito da origem, estado e
propósito do homem e do mundo que vive. O homem não poderia inventar um Deus trino,
santo, justo, soberano, independente, onipotente, onisciente, onipresente, longânimo,
misericordioso e amoroso como o Deus que a Bíblia revela. 75
O homem não conceberia a
si próprio como totalmente corrompido e plenamente culpado por causa do pecado, como a
Bíblia o descreve. As Escrituras são imensuravelmente sobresselente a qualquer outro
escrito religioso. Parece-nos que tais escritos foram permissão de Deus ao surgimento de
tais “revelações”, apenas fortalecem a idéia desta superioridade e inspiração das Escrituras.
76 Paulo Anglada escrevendo sobre as evidências indiretas da inspiração, quanto ao poder
das Escrituras afirma:
74
RYLE, J. C., A Inspiração das Escrituras, IN: Anglada, em seu livro Sola Scriptura, p.51. 75
Ibid, p.51 76
RYLE, J.C., A Inspiração das Escrituras, p.52.
40
“As Escrituras reivindicam ser o instrumento de uma obra sobrenatural que pode ser efetuada no coração de qualquer ser humano. Ele afirma ser o poder de Deus para a salvação de todo aquele que nela crê. Afirma que a sua mensagem pode vivificar mortos espirituais, regenerando-os em novas criaturas em Cristo Jesus. Ela afirma ainda que tais pessoas são resgatadas não apenas da culpa como também do domínio do pecado, os quais demonstram isso passando a oferecer os seus membros não como instrumento de iniqüidade, como outrora. mas como instrumento de justiça. Pode-se constatar tais asseverações? Em caso positivo, tal livro só pode ser de origem divina, isto é, inspirado por Deus. Qual é a resposta? Basta olhar para a vida de Paulo, de Pedro, de Agostinho. John Bunyan, de John Newton, Whitefield, de Wesley, e de milhares e milhares, os quais, como o endemoninhado gadareno, foram tão radicalmente transformados pela instrumentalidade deste livro, sendo trazidos à sobriedade, que tomam-se irreconhecíveis, quando comparados ao que outrora haviam sido” .
77
Avaliando com cuidado a história ao longo do tempo, percebemos o quanto as
Escrituras tem promovido transformações em pessoas, independente de qualquer que seja a
diferença entre elas. Além destas evidências indiretas da inspiração, a doutrina da
inspiração das Escrituras também se fundamenta nas evidências diretas as quais são
suficientes e incontestáveis. Uma destas evidências encontra-se no ensino de Jesus. Nos é
claro e dissipa qualquer dúvida a reverência do próprio com relação a Palavra de Deus. Em
Mateus 5: 17-18. Ele afirma, referindo-se aos livros do Antigo Testamento, que nem um i
ou til passará da lei, até que tudo se cumpra. Em João 10:35, lê-se que a “Escritura não
pode falhar”. 78
(Lc 24.44). Também, os próprios profetas do Antigo Testamento
reivindicam falar pa1avras de Deus. É por isso que freqüentemente introduzem suas
profecias com as expressões: “assim diz o Senhor”, “ouvi a palavra do Senhor”, ou
“palavra que veio da parte do Senhor”. 79
Vários textos do Antigo Testamento são citados
sendo atribuídos a Deus ou ao Espírito Santo. (Hb 3.7ss “Assim diz o Espírito Santo...”.) A
inspiração bíblica deveria ser definida nos mesmos termos teológicos que definem a
inspiração profética: a saber, como processo inteiro (multiforme, não há dúvida, em sua
forma psicológica, como foi a inspiração profética), por meio do qual Deus moveu os
homens que havia movido e preparado (cf. Jr 1.5; GI 1.15) para escrever exatamente o que
Ele queria que fosse escrito afim de comunicar as instruções de salvação ao seu povo e,
77
ANGLADA, Paulo, Sola Scriptura, p. 52-53. 78
Evidência utilizada por Paulo Anglada. Em Sola Scriptura, p. 53. 79
Ibid.
41
através dele, ao mundo. 80
Desse modo, a Escritura inspirada é a revelação escrita, assim
como os sermões dos profetas eram revelação falada. 81
Existem ainda algumas referências
explicitas que fortalece a doutrina da Inspiração divina. Os apóstolos Paulo e Pedro a
ensinam claramente nos dois textos considerados clássicos sobre assunto. Em 2 Timóteo
3.16, Paulo afirma que toda a “Escritura é inspirada por Deus”. E Pedro, em 2 Pedra 1.20-
21, explica que “nenhuma profecia das Escrituras provém de particular elucidação; porque
nunca jamais qualquer profecia foi dada pó vontade humana, entretanto, homens santos
falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo”. Deve-se salientar, portanto, que
quando se trata de evidências, o registro bíblico de auto-revelação de Deus na história da
redenção não é meramente testemunho humano a revelação, mas a própria revelação. 82
A
inspiração das Escrituras era parte integral no processo de revelação, pois nelas Deus deu a
Igreja sua obra de salvação na História e sua interpretação autoritária do lugar da Igreja no
plano eterno. 83
As evidências indiretas e diretas, portanto apresentadas nesta seção
demonstram claramente a inspiração das Escrituras e sua importância.
b) Natureza da Inspiração
A idéia da Escritura canônica remonta aos escritos de Moisés sobre a lei de Deus no
deserto (Êx 34.27-28; Dt 31.9,10,24,25). A verdade de todas as declarações - histórias ou
teológicas - que as Escrituras fazem e sua autoridade como palavra de Deus são aceitas
sem discussões ou questionamentos em ambos os Testamentos. O cânon aumentou, mas o
conceito de inspiração, o qual pressupõe a idéia de canonicidade, foi plenamente
desenvolvido desde o início e é imutável ao longo das Sagradas Escrituras. Alguns fatores
devem ser esclarecidos portanto para se afirmar que e toda a Escritura é inspirada por
80
PACKER. J. I., A Origem da Bíblia. p..52. 81
Ibid., p.52. 82
PACKER. J. I., A Origem da Bíblia. p..52. 83
Ibid., p.52.
42
Deus. Inicialmente asseveremos que os autores bíblicos não escreveram mecanicamente,
pois as Escrituras não foram “psicografadas” ou “pneumagrafadas”. Tais conceitos de
inspiração são encontrados no Talmuld, em Filo e nos Pais da Igreja, mas não na Bíblia. A
direção e controles divinos, sob os quais os autores bíblicos escreveram, não eram uma
força física ou psicológica, e não diminuía - antes, pelo contrário, aumentava - a liberdade,
e espontaneidade e a criatividade daquilo que escreviam. Em alguns casos é possível, que
os autores nem tivesse consciência que estivessem escrevendo inspirados pelo Espírito
Santo. Em outros, os autores bíblicos não foram muito mais do que copistas, visto que
apenas transcreveram as palavras de Deus, como exemplo em Gênesis 22.15-18, Êxodo
20.1-17; e Isaías 43. Os diversos livros bíblicos da Bíblia revelam claramente as
características culturais, intelectuais, estilísticas e circunstanciais dos diversos autores. Os
autores bíblicos, embora secundários, não foram instrumentos passivos nas mãos de Deus.
A superintendência do Espírito não eliminou de modo algum as características e
peculiaridades individuais. 84
O fato de que, na inspiração, Deus não obliterou a
personalidade, estilo, perspectiva e condicionamento cultural do escritor não significa que
seu controle sobre eles fosse imperfeito ou que, no processo de registrar por escrito a
verdade que tinha transmitir, inevitavelmente a distorcessem. 85
O extremo oposto de
inspiração mecânica é o que se convencionou chamar de inspiração dinâmica. Trata-se de
um conceito racionalista que influenciou o método histórico crítico de interpretação, e que
reduz a inspiração à iluminação. Segundo este conceito, os autores bíblicos foram apenas
homens iluminados. A excelência dos seus escritos deve ser atribuída à influência
santificadora no caráter, mente e palavras deles, devido à comunhão profunda com Deus
ou pela convivência com Jesus, e não a uma ação sobrenatural e ímpar do Espírito Santo.
Paulo Anglada, mostrando o erro de tal concepção descreve:
84
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura, p. 55. 85
PACKER, J.I., A Origem da Bíblia, p. 57.
43
“Mas tal concepção reduz as Escrituras à mesma categoria dos livros judaico-cristãos,
distinguindo-se deste meramente quanto ao grau de iluminação. Tal doutrina despoja a
Bíblia do seu caráter sobrenatural e autoritativa. Torna-a falível e admite a possibilidade de
erros no seu conteúdo”. 86
A inspiração dos escritos bíblicos, não deve ser igualada com a inspiração das
grandes obras da literatura. 87
A idéia bíblica da inspiração não se relaciona com a
qualidade literária do que é escrito, mas como sua característica de ser revelação e escrita.
88 A concepção bíblica e genuinamente reformada quanto à natureza da inspiração das
Escrituras é que a inspiração foi orgânica. Este conceito defende que o Espírito Santo, o
autor primário das Escrituras, dirigiu, guiou e supervisionou os autores secundários, a fim
de garantir que tudo quanto escrevessem como canônico fosse isento de erro e
correspondesse perfeitamente à revelação de Deus. A liberdade com a qual os escritores
do Novo Testamento citam o Antigo Testamento é considerada provam que de eles
aceitavam a inspiração destes textos. Assim as palavras das Escrituras são as próprias
palavras de Deus, a parte dos homens na produção das Escrituras foi meramente transmitir
o que havia recebido. 89
A doutrina da inspiração orgânica explica-se do mesmo modo que
outras doutrinas bíblicas, através da sobrenatural harmonia entre a soberania de Deus e a
responsabilidade humana. Nas palavras de Boettner:
“A obra do Espírito Santo na inspiração não deve ser considerada mais misteriosa do que
sua obra nas demais esferas da graça e providência. O primeiro exercício da fé salvadora na
regeneração da alma, por exemplo, é, ao mesmo tempo, uma obra induzida pelo Espírito
Santo e um ato livremente escolhido da pessoa”. 90
c) Extensão da Inspiração
A posição daqueles que declara que as Escrituras contém a palavra de Deus, é que
quanto as Escrituras são de inspiração parcial. Afirmam que nem todo o conteúdo do cânon
é inspirado. Esta é a posição dos teólogos liberais influenciados pelo deísmo e pelo
86
ANGLADA, Paulo. Sola Scriptura, p. 58. 87
PACKER, J.I., A Origem da Bíblia, p. 58. 88
Ibid. 89
Ibid. pp. 53,54. 90
BOETTNER, Loranine, Studies ini Theology, p. 25; Citado por Paulo Anglada, em So1a Scriptura, p.56.
44
racionalismo do século XVIII. Posição também defendida por Marcião, no segundo século
de nossa era, bem como todos os que rejeitavam o cânon, neste mesmo período. Paulo
Anglada comentando sobre esta posição descreveu:
“O mais grave é que, atribuindo a si próprios o direito de delimitar o que é ou não
inspirados nas Escrituras, as defensores da inspiração pardal, se constituem cama juizes da
palavra de Deus. Contudo, a fragilidade de tais juizes se evidencia na hora de determinarem
sobre que parte das Escrituras são inspiradas. Para uns, só as porções doutrinárias. Para
outros. Só o Novo Testamento. Outros, só reconhecem a inspiração das palavras de Jesus.
Enquanto há os que rejeitam passagens sobrenaturais. Existem outros ainda, que chegaram
a aceitar como inspirado somente o Sermão do Monte”. 91
Conforme observou Gerhard Maier, de Tübingen, depois de cerca de duzentos anos
de pesquisas, a escola histórica-crítica obviamente não conseguiu definir afinal qual seria o
suposto cânon dentro do cânon. 92
Como bem afirmou Berkhof “aceitar quaisquer das
formas de inspiração parcial das Escrituras é, praticamente, ficar sem Bíblia”. 93
Outra forma
distorcida de avaliar a extensão da inspiração é daqueles que defendem a inspiração mental
das Escrituras. Esta é uma tentativa de conciliar a doutrina da inspiração com a suposta
falibilidade das Escrituras. Os que conservam esta posição acreditam que as Escrituras são
inspiradas por Deus, porém isto significa apenas que os pensamentos forma inspirados, não
o registro desses pensamentos. Posição similar são dos que conciliam o criacionismo
bíblico com evolucionismo “científico”. Porém, é vã a tentativa de querer conciliar
incredulidade e fé, é sem dúvida, desesperadora a situação daqueles que, pela
incredulidade, rejeitam a doutrina da inspiração verbal das Escrituras, e tentam inutilmente
construir outra rocha na qual possa agarrar-se. 94
A doutrina verbal das Escrituras equivale à expressão, inspiração plenária.
Doutrina defendida pelos teólogos reformados de Princeton, como Charles e Alexander
Hodge, os quais afirmavam com isto que as Escrituras são completamente inspiradas e,
91
ANGLADA, Paulo, Sola Scriptura. p.57. 92
De acordo com Eino Ronald Muller, O Método Histórico-Crítico; Uma Avaliação, p. 256. 93
BERCKHOF, Luis, introducion a la Teologia Sistemática, p.171. 94
Posição defendida por ANGLADA, Paulo, Sola Scriptura. p.57.
45
portanto livre de erro. O termo verbal passou a ser usado, explica Barris, para preservar o
mesmo sentido, e evitar deturpações daqueles que querem usar o termo plenária
significando apenas que “todas as partes da bíblia de gênesis a apocalipse, forma de algum
modo produzidas por Deus, sem que contudo sejam necessariamente de origem divina”. 95
A doutrina da inspiração das Escritas de modo verbal se baseia em fatos como estes que
passamos a descrever. Jesus cria na inspiração verbal das Escrituras fica evidente,
especialmente em Mateus 5.17-18, quando afirma, referindo-se aos livros do Antigo
Testamento, que nem um i ou til passará de lei, até que tudo se cumpra. A atitude de Jesus
para com as Escrituras é a mesma em João 10.34 e 35, onde baseia sua argumentação em
apenas duas palavras do Antigo Testamento: Sois Deuses, e conclui afirmando que “as
Escrituras não podem falhar”. O mesmo ocorre em Mateus 22:43-45, quando Jesus
fundamenta toda a sua exegese e conseqüentemente argumento em Salmo 110: 1: Senhor.
E ainda, o apóstolo Paulo também demonstra, na sua prática exegética, a mesma confiança
na doutrina da inspiração verbal das Escrituras. Em Gálatas 3.16, seguindo o mesmo
princípio exegético de Jesus, ele também fundamenta sua argumentação em uma só
palavra, ou melhor no número (singular) de uma palavra: descendente e não descendentes.
As Escrituras, portanto, tem natureza divina humana: são a Palavra de Deus escrita
em linguagem humana, por pessoas em pleno uso de suas faculdades. Mas de tal modo
dirigidas pelo Espírito Santo que tudo o que registraram como canônico foi preservado do
erro, constituindo-se revelação infalível e inerrante de Deus ao homem.
95
HARRlS, R. L., Inspiration and Canonicity of the Bible, p. 19-20.
46
2.3. A Inerrância das Escrituras
Ao afirmarmos que a Bíblia é inspirada por Deus, que ela é produto divino humano,
que Deus usou homens em sua totalidade, que os levou a registrarem até mesmo as
palavras que deveriam usar, estamos afirmando também que Deus os preservou de
cometerem erros em seus escritos. A isto damos o nome de Inerrância, que é o ensino da
própria Escritura a seu respeito que afirma que nela não há erros ou contradições (cf. João
10.35; 17.17; Colossenses 1.5; 2Timóteo 2.15; Tiago 1.18). Contudo, deve ser esclarecido
que a ausência de erros é sobre os originais hebraicos e gregos. Por mais fiel que seja uma
tradução ou versão das Escrituras ela não pode afirmar ser a última palavra escriturística
isenta de erros ou distorções, pois há traduções que possuem sérios erros. Também não
quer dizer que os escritores sagrados não cometeram erros em suas vidas. Na 1ª carta de
Paulo aos Coríntios, fica evidente que o apóstolo escreveu uma carta anterior chamada de
carta perdida, que certamente não foi inspirada por Deus, pois Ele não a preservou até os
nossos dias (1 Co 5.9). O exemplo clássico de sua inerrância é o fato de ter sido escrita
num período de 1600 anos, por cerca de 40 escritores diferentes, de épocas diferentes, em
lugares diferentes, e que, apesar de tudo isso, ela é toda verdade e nela não há contradição.
Nenhum outro livro possui essa característica. A Inspiração do Texto Sagrado é uma
qualidade intrínseca-ela é porque é. 96
A Declaração de Chicago a respeito da Inerrância Bíblica deixa bastante claro a
inerrância das Escrituras. James Montgomery Boice esclarecendo sobre esta declaração
escreveu:
“Declaração durante uma consulta de três dias de duração, realizada em Chicago, nos Estados Unidos. Aqueles que subscreveram a Declaração Resumida e os Artigos desejam expressar suas próprias convicções quanto à inerrância das Escrituras e estimular e desafiar uns aos outros e a todos os cristãos a uma compreensão e entendimento cada vez maiores desta doutrina. Reconhecemos as limitações de um documento preparado numa conferência
96
PICKERlNG, Wilbur Gilberto Nonnan. Canonicidade do Novo Testamento.
47
rápida e intensiva e não propomos que esta Declaração receba o valor de um credo. Regozijamo-nos, no entanto, com o aprofundamento de nossas próprias convicções através dos debates que tivemos juntos, e oramos para que esta Declaração que assinamos seja usada para a glória de Deus com vistas a uma nova reforma na Igreja no que tange a sua fé, vida e missão”.
97
Esta declaração sobre a inerrância das Escrituras, esclarece nosso entendimento a respeito
dela e adverte contra sua negação. Declaram estar convencidos de que negá-la, é ignorar o
testemunho dado por Jesus Cristo e pelo Espírito Santo, e rejeitar aquela submissão às
reivindicações dá própria palavra de Deus, submissão esta que caracteriza a verdadeira fé
cristã. Ainda declaram entender que é dever de todo o cristão, fazer esta afirmação diante
dos atuais desvios da verdade da inerrância entre nossos irmãos em Cristo e diante do
entendimento errôneo que esta doutrina tem tido no mundo em geral. Esta Declaração
consiste de três partes: uma Declaração Resumida, Artigos de Afirmação e Negação, e uma
Explanação. Porém, destacaremos apenas dois pontos, que consideramos mais propícios a
nosso foco. A primeira parte a destacar na declaração de Chicago é a breve da Doutrina.
1. Deus, sendo Ele Próprio a Verdade e falando somente a verdade. Inspirou as
Sagradas Escrituras a fim de, desse modo, revelar-se à humanidade perdida.
Através de Jesus Cristo, como Criador e Senhor, Redentor e Juiz. As Escrituras
Sagradas são o testemunho de Deus sobre Si mesmo.
2. As Escrituras Sagradas, sendo apropria Palavra de Deus, escritas por homens
preparados e supervisionados por Seu Espírito. Possuem autoridade divina infalível
em todos os assuntos que abordam: deve ser cridas, como instrução divina, em tudo
o que afirmam: obedecidas, como mandamento divino, em tudo o que determinam;
aceitas, como penhor divino, em tudo que prometem.
3. O Espírito Santo, seu divino Autor, ao mesmo tempo no-las confirma através de
Seu testemunho interior e abre nossas mentes para compreender seu significado.
97
Ibid.
48
4. Tendo sido na sua totalidade e verbalmente dadas por Deus, as Escrituras não
possuem erro ou falha em tudo o que ensinam, quer naquilo que afirmam a respeito
dos atos de Deus na criação e dos acontecimentos da história mundial, quer na sua
própria origem literária sob a direção de Deus, quer no testemunho que dão sobre a
graça salvadora de Deus na vida das pessoas.
5. A autoridade das Escrituras fica inevitavelmente prejudicada, caso essa inerrância
divina absoluta seja de alguma forma limitada ou desconsiderada, ou caso dependa
de um ponto de vista acerca da verdade que seja contrário ao próprio ponto de vista
da Bíblia; e tais desvios provocam sérias perdas tanto para o indivíduo quanto para
a Igreja.
Esta declaração traz consigo princípios que os reformadores defenderam, não
ferindo a integridade das Escrituras. A segunda parte que passamos a destacar na
declaração de Chicago que prossegue com uma explanação da doutrina da Inerrância das
Escrituras, aonde além de afirmá-la, busca explicá-la num conceito mais amplo. A
explanação inicia-se com a seguinte afirmação: Esta explanação apresenta uma descrição
de um esboço da doutrina, na qual se baseia nossa breve declaração e os artigos.
Descreveremos um breve comentário aqui, de apenas parte desta explanação, que trata
especificamente da inerrância: Criação, Revelação e Inspiração; Infalibilidade, e também
inerrância, Interpretação.
No primeiro ponto destaca-se a criação, revelação e Inspiração. E inicia-se
mostrando que o Deus Triúno, que formou todas as coisas, e que a tudo governa pela
Palavra de Sua vontade, criou a humanidade a sua própria imagem para uma vida de
comunhão consigo mesmo, tendo por modelo a eterna comunhão da comunicação dentro
da Divindade. Como portador da imagem de Deus, o homem deve ouvir a Palavra de Deus
dirigida a ele e reagir com a alegria de uma obediência em adoração. Além da auto-
revelação de Deus na ordem criada e na seqüência de acontecimentos dentro dessa ordem,
desde Adão os seres humanos têm recebido mensagens verbais d‟Ele, quer diretamente,
49
conforme declarado nas Escrituras, quer indiretamente na forma de parte ou totalidade das
próprias Escrituras. A declaração segue ainda, mostrando que quando Adão caiu, o Criador
não abandonou a humanidade ao juízo final, mas prometeu salvação e começou a revelar-
Se como Redentor numa seqüência de acontecimentos históricos centralizados na família
de Abraão e que culminam com a vida, morte, ressurreição, atual ministério celestial e a
prometida volta de Jesus Cristo. Dentro desse arcabouço, de tempos em tempos Deus tem
proferido palavras específicas de juízo e misericórdia, promessa e mandamento, a seres
humanos pecaminosos, de modo a conduzi-los a um relacionamento, uma aliança, de
compromisso Mútuo entre as duas partes, mediante o qual Ele os abençoa com dons da
graça, e eles. A primeira parte da declaração prossegue descrevendo o argumento da
inerrância das Escrituras:
“Moisés, que Deus usou como mediador para transmitir Suas palavras a Seu povo à época do
êxodo, está no início de uma longa linhagem de profetas em cujas bocas e escritos Deus
colocou as Suas palavras para serem entregues a Israel. O propósito de Deus nesta sucessão de
mensagens era manter Sua aliança ao fazer com que Seu povo conhecesse Seu Nome, isto é,
Sua natureza, e tantos preceitos quanto os propósitos de Sua vontade, quer para o presente, que
para o futuro, Essa linhagem de porta-vozes proféticos da parte de Deus culminou em Jesus
Cristo, a Palavra encarnada de Deus. Sendo Ele um profeta (mais do que um profeta, mas não
menos do que isso), e nos apóstolos e profetas da primeira geração de cristãos. Quando a
mensagem final e culminante de Deus. Sua palavra ao mundo a respeito de Jesus Cristo, foi
proferida e esclarecida por aqueles que pertenciam ao círculo apostólico, cessou a seqüência de
mensagens reveladas. Daí por diante, a Igreja devia viver e conhecer a Deus através daquilo
que Ele já havia dito, e dito para todas as épocas. No Sinai, Deus escreveu os termos de Sua
aliança em tábuas de pedra, como Seu testemunho duradouro e para ser permanentemente
acessível, e ao longo do período de revelação profética e apostólica levantou homens para
escreverem as mensagens dadas a eles e através deles. Junto com os registros que celebravam
Seu envolvimento com Seu povo, além de reflexões éticas sobre a vida em aliança e de formas
de louvor e oração em que se pede a misericórdia da aliança”. 98
Este argumento mostra a realidade teológica da inspiração, que a elaboração de
documentos bíblicos corresponde à das profecias faladas: embora as personalidades dos
escritores humanos se manifestassem naquilo que escreveram, as palavras foram
divinamente dadas. Assim, aquilo que as Escrituras dizem, Deus diz; a autoridade das
Escrituras é a autoridade de Deus, pois Ele é seu derradeiro Autor, tendo entregue as
98
Ibid.
50
Escrituras através das mentes e palavras dos homens escolhidos e preparados, os quais,
livre e fielmente, “falaram da parte de Deus movidos pelo Espírito Santo” (2 Pe 1.21).
Devem-se reconhecer as Escrituras Sagradas como voz autêntica de Deus, e, portanto
inerrânte, em virtude de sua origem divina.
No segundo ponto, a declaração destaca a infalibilidade, inerrância e interpretação
das Escrituras. Inicia-se mostrando que as Escrituras Sagradas, na qualidade de Palavra,
inspirada de Deus que dá testemunho oficial acerca de Jesus Cristo, pode ser
adequadamente chamadas de infalíveis e inerrantes. Estes termos negativos possuem
especial valor, pois salvaguardam explicitamente verdades positivas. A palavra Infalível
significa a qualidade de não desorientar nem ser desorientado e, dessa forma, salvaguarda
em termos categóricos a verdade de que as Santas Escrituras são uma regra e um guia
certo, seguro e confiável em todas as questões. Prossegue ainda que semelhantemente, a
palavra inerrante significa a qualidade de estar livre de toda falsidade ou engano e, dessa
forma, salvaguarda a verdade de que as Santas Escrituras são totalmente verídicas e
fidedignas em todas as suas afirmações. E afirmam:
“Afirmamos que as Escrituras canônicas sempre devem ser interpretadas com base no fato de que são infalíveis e inerrantes. No entanto, ao determinar o que o escritor ensinado por Deus está afirmando em cada passagem, temos de dedicar a mais cuidadosa atenção às afirmações e ao caráter do texto como sendo uma produção humana. Na inspiração Deus utilizou a cultura e os costumes do ambiente de seus escritores, um ambiente que Deus controla em Sua soberana providência; é interpretação errônea imaginar algo diferente. Assim deve-se tratar história como história, poesia como poesia, e hipérbole e metáfora como hipérbole e metáfora, generalização e aproximações como aquilo que são, e assim por diante. Também se deve observar diferenças de práticas literárias entre os períodos bíblicos e o nosso: visto que, por exemplo, naqueles dias, narrativas são cronológicas e citações imprecisas eram habituais e aceitáveis e mio violavam quaisquer expectativas, não devemos considerar tais coisas como falhas, quando as encontramos nos autores bíblicos. Quando não se esperava nem se buscava algum tipo específico de precisão absoluta, não constitui erro o fato de ela existir”.
99
Assim a declaração em seu segundo ponto mostra acertadamente que as Escrituras
são inerrantes, não no sentido de serem totalmente precisas de acordo com os padrões
atuais, mas no sentido de que validam suas afirmações e atingem a medida de verdade que
99
Ibid.
51
seus autores buscaram alcançar, pois a veracidade das Escrituras não é negada pela
aparição, no texto, de irregularidades gramaticais, ou ortográficas, de descrições
fenomenológicas da natureza, de relatos de afirmações falsas, ou as aparentes
discrepâncias entre uma passagem e outra. Porém, a declaração mostra que não se deve
ignorar aparentes incoerências. Mas a solução delas, onde se possa convincentemente
alcançá-las, estimulará nossa fé, e, onde no momento não houver uma solução convincente
disponível, significativamente daremos honra a Deus, por confiar em sua garantia de
que sua Palavra é verdadeira, apesar das aparências em contrário, e por manter a confiança
de que um dia se verá que elas não eram enganos.
Para os defensores da inerrância bíblica, é relevante, que nesta batalha renomada a
cerca da bíblia, nenhum fato novo a respeito da Bíblia tem levado a questão a reaparecer
em foco. 100
Os opositores de um conceito elevado da Bíblia voltam-se em última análise,
não às novas descobertas da ciência ou na história, nem a novos dados da psicologia ou
astrofísica. 101
Pelo contrário como da boca do liberal Harold De Wolf, em Theology of the
Living Church, que alista uma série de contradições entre uma passagem bíblia e outra,
como prova final da errância das Escrituras.102
De modo semelhante, entre os evangélicos,
Dewey Beegle faz exatamente a mesma coisa com seu argumento clássico contra a
inerrância, tirando das discrepância aparentes entre Reis e Crônicas, e doutras passagens
bíblicas com referências paralelas. 103
Estes conceitos foram cuidadosamente revirados por
Jerônimo e Agostinho na sua correspondência há dezesseis séculos. 104
Os Medievalistas,
Lutero e Calvino, e seus seguidores nas Igrejas da Reforma, bem corno os Escolásticos
100
KANTZER. Kenneth S., O Alicerce da Autoridade Bíblica. p.172. 101
WOLF. L. Harold De, A Theologv of lhe Living Church, p. 68-7. Citado por Kenneth S. Kantzer, em, O
Alicerce da Autoridade Bíblica p. 172. 102
Ibid. 103
BEEGLE, Dewey M., Scripture, Tradition and Infabilitity. p. 97-175. Citado por Kenneth S. Kantzer, em,
O Alicerce da Autoridade Bíblica p. 172. 104
Agostinho, Letters em The Father of the Church, p.98. Citado por Kenneth S. Kantzer, em, O Alicerce da
Autoridade Bíblica p. 172.
52
Ortodoxos dos Séculos: XVII, XVIII e até XIX renovaram o debate. 105
, A novidade da
questão não reside em qualquer fato novo mas, sim, num modo novo de encarar os dados e
numa renovação contemporânea renovada e intensificada a respeito da inspiração da
Bíblia. 106
Fica-nos claro, portanto, que a Bíblia está livre de erros, uma vez que foi entregue
pelas mãos de Deus. O salmista diz o seguinte: “A lei do Senhor é perfeita... Os estatutos
do Senhor são dignos de confiança... Os preceitos do Senhor são justos... O temor [objeto
de referência, chamado, a Palavra de Deus] do Senhor é puro” (19:7-9). A última
característica significa “sem defeito”. Será que nós imaginávamos de outra forma, sabendo
que a Bíblia é o sopro de Deus? (2 Timóteo. 3: 16), “toda Escritura é inspirada por Deus”
e, “pois a profecia nunca teve sua origem na vontade humana, mas os homens falaram de
Deus sendo levados pelo Espírito Santo” (2 Pedro. 1:21 ). - O verbo grego para “sendo
levados” algumas vezes descreve o efeito que o vento faz em um barco a velas. A Bíblia
não caiu do céu pronta. Homens escreveram, mas com sua forma de escrita, com toda
variedade de vocabulário e estilo próprio, o Espírito Santo, pela sua palavra e exposição,
foi determinante para o resultado da Palavra. Os autores humanos foram levados pelo seu
poder, assegurando que o produto seria sem defeito. Conseqüentemente, como a Fé
Reformada insiste, a Bíblia é infalível e absolutamente digna de confiança. Na medida em
que defendemos aquilo que, segundo cremos, é a instrução do nosso Senhor quanto à
inerrância da autoridade Bíblica, não estamos saindo para conquistar e destruir. 107
105
WALYOORD, John F., lnspiration and lnterpretation e Roberty Preus, lmpiration os Scripture, Citado por
Kenneth S. Kantzer, em, O Alicerce da Autoridade Bíblica p. 172. 106
KANTZER. Kenncth S., O Alicerce da Autoridade Bíblica. p. 173. 107
Ibid.p.181.
53
Pelo contrário, somos testemunha que procuramos compartilhar, convencer e
persuadir nosso irmão em Cristo a segui-lo, nesta área de obediência á sua palavra escrita,
assim como todas as demais áreas. 108
III CAPÍTULO
AS ESCRITURAS SOB A ÓTICA DO MUNDO CONTEMPORÊNEO
Neste último capítulo, somos levados às necessidades da igreja contemporânea de
resgatar o conceito reformado, e antes disso, bíblico, da Autoridade das Escrituras, pois
mesmo que não seja negado explicitamente à Bíblia a autoridade que lhe é devida na
formulação de fé e na condução da prática eclesiástica, em alguns círculos evangélicos isso
tem sido feito, e quando não se têm negado teologicamente, a prática cotidiana da igreja o
tem feito. Daí o desafio em discorremos sobre três frentes de ataque à Autoridade das
Escrituras presentes na maioria das Igrejas evangélicas brasileiras, frentes estas, que não
têm encontrado resistências em determinadas comunidades e têm sorrateiramente destruído
a base da fé evangélica professada por todos que se dizem integrantes da Igreja do Senhor.
Lembramos somente que não são apenas estes aspectos doutrinários infiltrados nas
igrejas que estão solapando a Autoridade das Escrituras, mas que esses, a nosso ver, têm
um potencial destrutivo maior pelo fato de não se apresentarem de forma alarmante, não
chamando a atenção da igreja e assim, não despertando desconfiança nem adversários
ágeis para combatê-lo os rapidamente. Estou me referindo aqui aos perigos propostos pelo
liberalismo e a neo-ortodoxia; pela filosofia pós-moderna cada vez mais abrangente na
sociedade e por último, o resultado do movimento carismático, onde as “novas revelações”
assumem o papel que é exclusivo das Sagradas Escrituras.
108
KANTZER. Kenncth S., O Alicerce da Autoridade Bíblica. p.181.
54
3.1. As Escrituras sob a ótica liberal e neo-ortodoxa.
Uma enxurrada de livros de linha teológica controvertida tem surgido nas livrarias
evangélicas brasileiras, sendo uma novidade a ser consumida, mas infelizmente, sem
nenhum senso crítico por parte dos leitores. Refiro-me ao grande numero de publicações de
linha liberal e neo-ortodoxa que têm sido divulgada e fornecida aos membros de nossas
igrejas, que inadvertidamente têm consumindo este material e têm trazido para dentro das
Igrejas Evangélicas brasileiras uma doença que precisa ser erradicada.
Foi com Bacon e Descartes que os alicerces da ciência moderna e o individualismo
foram lançados, e estes se tornaram como pilares importantes da era moderna. A razão
assume o papel de norma de averiguação da verdade para toda a sociedade, e dizia-se,
segundo Alister McGrath citado no livro Pós-modernidade, novos desafios da fé cristã,
que ela “era capaz de nos dizer tudo o que necessitamos saber sobre Deus e sobre o mal”.
109 O período do século XVIII foi marcado por reações ao intelectualismo e formalismo
frios da teologia, mas também, por outro lado houve uma persistente e particularmente
forte reação contra a influência dominante da Escritura e da tradição eclesiástica na
dogmática, e contra as doutrinas que se ensinavam nos credos históricos da igreja; e assim,
a razão se encarregou de abrir novas sendas, não bloqueadas pela autoridade. “Se
derrubaram as antigas barreiras, e a apostasia racionalista apareceu alarmantemente
comum dentro da Igreja”. 110
O problema maior surgiu devido ao ataque paulatino que a
Escritura começou a sofrer, onde “alguns autores diziam que várias partes da Escritura
possuíam diversos graus de inspiração, e podia ser que os graus inferiores (como detalhes
históricos) contivessem erros. Outros escritores, como Schleiermacher, foram além,
109
SALINAS, Daniel; ESCOBAR, Samuel. Pós-modernidade, novos desafios à fé cristã. (São Paulo: ABU,)
1999. p.16. 110
BERKHOF, Louis. Introduccion a Ia teologia sistematica. Michigan: Evangelical Literature League,
1932. p.83.
55
negando totalmente o caráter sobre natural da inspiração”, 111
e é exatamente por ele que
começaremos nosso estudo aqui.
3. 1. 1. O leitor como norma.
No final do século XVIII, devido à influência de Emanuel Kant, 112
206 o
racionalismo tomou de conta da pregação e das doutrinas básicas da fé cristã como o
pecado original, a expiação substitutiva de Cristo, a justificação pela fé, a trindade, as duas
naturezas de Cristo, tudo isso decorrente da forma como estavam encarando as Escrituras.
Por incrível que pareça, foi contra essa postura filosófica e teológica que Friedrich D. E.
Schleiermacher, 113
da Universidade de Berlim se levantou. Mas, como nos adverte Brian
Schwertley:
“O problema é que SchIeiermacher tinha uma concepção errônea das Escrituras: cria na Bíblia não como auto revelação de Deus aos homens, mas como um registro da experiência religiosa subjetiva de santos preeminentes. O resultado foi a defesa de que a pregação deve derivar da consciência do pregador, identificar-se com a consciência religiosa do povo, apesar de nutrir-se da Escritura, principalmente do NT. Para Schleiermacher, pregar não é expor e aplicar a Escritura, mas transmitir uma consciência religiosa, e o alvo da pregação não é doutrinário, mas o viver cristão (a experiência). Dessa forma, ele concordava com o racionalismo em que o conteúdo da pregação deve ser obtido subjetivamente, mas tendo como ponto de partida, não o racional, mas o religioso”.
114
Schleiermacher tinha um conceito que chamava de Speeches, onde a essência da
religião achava-se no nosso senso de dependência absoluta, “esta idéia fica sendo um tipo
de denominador comum da experiência religiosa e também uma régua para medir todos os
demais ensinamentos cristãos. Armado com ela, Schleiemiacher pôs-se ao trabalho de
111
VIRKLER. Hermenêutica avançada. p.51. 112
Immanuel Kant (1724-1804) foi o fundador teorético do liberalismo religioso, pois foi sobre suas idéias
que grande numero de teólogos liberais edificaram suas teologias. Criou uma nova apologia pela religião na
obra Crítica da Razão Pura (1781) onde a ciência fica muda diante da religião, mas na Crítica da Razão
Prática (1788), somente pela razão, tentou fundamentar os conceitos de Deus, liberdade e imortalidade,
tornando a religião ética, característica básica do liberalismo. 113
Schleiermacher é conhecido como o pai do liberalismo teológico e com ele surgiu à pregação modernista
que vemos hoje onde se substitui a Palavra objetiva de Deus pela experiência religiosa subjetiva. 114
SCHWERTLEY, Brian. O modernismo e a lnerrância Bíblica. São Paulo: Os Puritanos, 2000. p.07.
56
reinterpretar a gama total da doutrina cristã”. 115
Já Roger Olson declara: “sem dúvida, Schleiermacher tinha na mais alta estima as
Escrituras e a grande tradição dos ensinos da Igreja. Mas também considerava que a
experiência religiosa tinha muito mais autoridade”. 116
Para Schleiermacher, a Bíblia não
passa do registro das experiências religiosas das comunidades cristãs primitivas; servindo
somente para fornecer um padrão para os interpretes modernos entenderem a relevância de
Jesus Cristo para aquele determinado momento da história. A Bíblia não é
sobrenaturalmente inspirada e muito menos infalível.
Uma das implicações da teologia de Schleiermacher, afirma Stanley Gundry, foi
que: “A localização da fé já não se acha naquilo que Deus diz (a revelação divina) nem
naquilo que Deus faz (a redenção na história), mas primariamente naquilo que o homem
experimenta”. 117
É interessante vermos a crítica feita por Colin Brown, pois conforme ele,
“Schleiermacher nem sequer ensaiou qualquer discussão detalhada da experiência religiosa
do Novo Testamento. Pelo contrário, pressupõe que o senso de dependência absoluta é o
fator comum da experiência religiosa, sem mais nem menos”. 118
Na realidade a teologia
liberal relocaliza a autoridade da Escrituras para experiências religiosas que a Bíblia
inspirava e não no seu conteúdo dogmático ou na sua inspiração nem ainda na natureza
corno revelação especial da parte de Deus. 119
Em reação a esta onda de ataques contra a Inspiração das Escrituras, foi que A. A.
Hodge e Benjamim Warfield escreveram um famoso ensaio sobre a inspiração da Bíblia
onde a doutrina da inspiração é colocada como a linha divisória entre a teologia ortodoxa e
a liberal. Eles “defendiam a inerrância das Escrituras que eram verbalmente inspiradas”. 120
115
BROWN, Colin. Filosofia e Fé Cristã. São Paulo: Vida Nova, 28 edição, 1999. p. 79. 116
OLSON, Roger. História da teologia cristã. São Paulo: Vida, 2001. p. 562. 117
GUNDRY, Stanley. Teologia Contemporânea. São Paulo: Mundo Cristão, 1983. p. 18. 118
BROWN. Filosofia e Fé Cristã. p. 82. (Grifo do autor) 119
GUNDRY. Teologia Contemporânea. p. 28 120
Ibid.p.29.
57
Hodge destaca o erro de Schleiermacher, onde a conclusão lógica da teoria de
Schleiermacher é de que:
“A Bíblia não tem autoridade normativa como regra de fé. Ela não contém nenhuma doutrina revelada por Deus e deve ser recebida como verdadeira em seu testemunho. Contém apenas os pensamentos de homens santo; as formas nas quais suas percepções, sem auxilio supranatural, revestem as instruções devido a seus sentimentos Religiosos”.
121
Desta forma, o AT é produto da “consciência religiosa” de homens que viveram sob
uma rude condição cultural, e não tem nenhuma autoridade para nós. O NT é produto da
“consciência religiosa” de homens que experimentaram a influência santificadora da
presença de Cristo entre eles. 122
Estes, porém, eram judeus e pensavam de maneira
judaica. Familiarizados com as cerimônias da antiga dispensação, habituados a pensar em
Deus como acessível somente através do sacerdócio, demandar expiação pelo pecado e
regeneração de coração a prometer certas recompensas e formas de bem-aventuranças num
futuro estado de existência. A proposta liberal é que a base da fé deixe de ser a revelação
objetiva para ser experiência pessoal. Hodge conclui sua exposição sobre Schleiermacher
afirmando:
“Na Igreja, pois, o cristianismo sempre foi considerado um sistema de doutrina. Os que crêem nessas doutrinas são cristãos; os que rejeitam são, segundo o critério da Igreja, infiéis ou hereges. Se nossa fé é formal ou especulativa, assim será nosso cristianismo; se ela é espiritual e viva, assim será nossa religião. Mas nenhum equívoco pode ser maior do que divorciar religião da verdade e fazer do cristianismo um espírito ou vida distinto das doutrinas que as Escrituras apresentam como objetos da fé”.
123
E é exatamente por isso que Gresham Machen afirma não se surpreender que o
liberalismo seja totalmente diferente do cristianismo, pois a base deste não é a mesma do
outro. Um é baseado na Bíblia tanto no seu pensamento quanto na sua vida, o outro é
baseado nas emoções diversificadas de homens pecadores, 124
e com certeza, as emoções
humanas não é o alicerce sólido sobre o qual construiríamos nossas casas doutrinárias e
éticas.
121
HODGE. Teologia Sistemática. p. 133. (Grifo do autor). 122
Ibid.p.133. 123
Ibid.p. 134. 124
MACHEN, J. Gresham. Cristianismo e liberalismo. p.83.
58
3.1.2. O mito da desmitologização.
Um outro representante liberal que levou às ultimas conseqüências a sua disposição
em “contextualizar” a mensagem das Escrituras, e “dar uma mãozinha” para que ela seja
aceita pelo homem moderno foi Rudolf Bultmann. 125
Ele “elaborou a sua teologia a partir
de premissas de que o homem moderno não crê em milagres, e portanto a Bíblia deve ser
desmistificada”. 126
Para Batista Mondin, Bultmann é atormentado pelas exigências da fé e
da razão, e que nesta dialética, a primeira sai sistematicamente derrotada, 127
ou como
explica Colin Brown: “Ele combina um ceticismo radical com um existencialismo pouco
diluído”. 128
Bultmann difere dos liberais em desmitificação não significar eliminação do
mito, mas a sua interpretação através de uma hermenêutica particular, onde este é utilizado
como instrumento auxiliar na compreensão da existência humana. 129
Se para Schleiermacher exigir que o homem moderno aceite o relato bíblico sem
que este seja um mito é exigir um sacrificium intellectus, 130
e é nisto que se constitui o
problema das pessoas não aceitarem a pregação, crê ele. Já Bultmann propõe sua própria
definição sobre o que venha a ser mito de forma que na sua concepção: “a mitologia é
aquela forma de linguagem figurada em que aquilo que não é deste mundo, aquilo que é
divino, é representado como se fosse deste mundo, e humano; „ além‟ representado como o
„aqui e agora‟” 131
ou seja, mito é a descrição do transcendente com um invólucro terreno,
das coisas divinas em categorias de linguagem humana. 132
A desmitologização é então:
“um método de hermenêutica que procura extrair a noz da significância compreensiva da
125
Rudolf Bultmann nasceu em 20 de agosto de 1884, em Wiefeldstede em Oldenburgo, Alemanha. Ensinou
em Marburgo desde 1912 até 1916 e depois em Breslau até 1920, passando por Giessen e voltando para
Marburgo em 1921 onde ficou até 1951. Há quem considere Bultmann um neo-ortodoxo, e não um liberal no
sentido estrito do termo. 126
SALINAS; ESCOBAR. Pós-modemidade, novos desafios à fé cristã. p.19. 127
MONDIN, Batista. Os grandes teólogos do século XX. São Paulo: Paulinas, 1979-1980. p.
134. 128
BROWN. Filosofia e Fé Cristã. p.126. 129
ALMEIDA, Abraão Pereira de. Tratado de teologia contemporânea. Rio de Janeiro: CP AD, 1980. p. 84. 130
GUNDRY. Teologia Contemporânea. p.50. 131
Ibid.p. 50. 132
MONDIN. Os grandes teólogos do século XX. p.131.
59
casca de uma cosmovisão antiquada”. 133
Sproul comenta que: “ele oferece-nos um cânon aqui e agora, que reduz o cânon
original pelo método crítico radical da tesoura e da cola. Para que o Evangelho seja
relevante para o homem moderno, deve o intérprete vir ao texto com uma compreensão
prévia que Bultmann descobriu por conveniência na filosofia de Martin Heidegger”. 134
Esse pensamento de Bultmann de que a Bíblia não possui uma linguagem
„atualizada‟ se infiltrou nos mais distintos círculos teológicos, como vemos expresso em
um encarte distribuído pela editora católica Paulus, quanto o autor comenta:
“É preciso estar atento para não cair no fundamentalismo, ou seja, tomar a Bíblia ao pé da letra. A idéia que os judeus tinham de história, por exemplo, não é a mesma que nós temos; quando lemos os livros históricos, não é o caso de buscar neles descrições históricas dos fatos como encontramos nos livros de historia atuais. A narrativa da criação do mundo em seis dias, assim, não pode ser lida como relato histórico: trata-se de um mito usado para descrever a presença amorosa e poderosa de Deus na criação e sustentação do universo”. 135
Esta tentativa de reinterpretar, ou reescrever as Escritura para ajustá-la ao
pensamento da época, faz com que as pessoas deixem à autoridade inerente a ela e se
agarrem na autoridade espúria de terceiros, como afirma Brian Schwertley: “as pessoas não
estão mais seguindo o dogmatismo das Escrituras, mas o dogmatismo dos teólogos
incrédulos”. 136
O ataque de Bultmann à Autoridade das Escrituras se dá quando ao examinar
os documentos do Novo Testamento com o pressuposto de que milagres são impossíveis,
ele fez da história matéria de especulação, onde toda a história de Cristo e dos apóstolos
toma-se impossível porque as testemunhas que depuseram declarando acontecimentos
milagrosos são desacreditadas, não mais consideradas dignas de crédito no relato da vida e
doutrina de Cristo. E assim, por não termos nenhuma testemunha digna de confiança para
133
GUNDRY. Teologia Contemporânea. p.50. 134
BEEKE; ARMSTRONG; HORTON. Sola Scriptura. p. 79. (Grifo do autor) 135
BAZAGLIA, Paulo. Primeiros passos com a Bíblia. São Paulo: Paulus, 2001. p.31. (Grifos meus). 136
SCHWERTLEY. O modernismo e a lnerrância Bíblica. p.16.
60
nos informar o que realmente aconteceu, não sobra nada na Bíblia que a Igreja possa
confiar como autoritativo.
Harvie Conn não titubeia ao declarar que “a desmitologização destrói o fundamento
do cristianismo na história. A religião da Bíblia se converte em uma religião baseada em
mitos”, 137
e uma religião baseada em mitos não pode requerer para si a possessão da
verdade revelada quando a fonte destes mitos é esta revelação. Bultmann mina a autoridade
das Escrituras, mas destrói todo o cristianismo como conseqüência.
3.1.3. Ortodoxo, mas nem tanto.
O último destes teólogos racionalistas não é um liberal, pelo contrário, era
considerado pelos próprios liberais muito mais ortodoxo; no entanto, a teologia de Karl
Barth 138
possui falhas seriíssimas, pois “A Bíblia não é a palavra de Deus, apenas a
contém. Por isso ela pode ser criticada à vontade”. 139
Barth foi o precursor do movimento
chamado neo-ortodoxia, um fenômeno do século XX caracterizado pela posição
intermediária entre os pontos de vista liberal e ortodoxo. Ela “rompe com a opinião liberal
de que a Escritura é tão-só produto do aprofundamento da consciência religiosa do homem,
mas detém-se antes de chegar à perspectiva ortodoxa da revelação”. 140
Segundo Abraão de
Almeida, este movimento, a exemplo do liberalismo, “nega verdades básicas do
cristianismo, a começar pela rejeição das Escrituras como divinamente inspiradas por
Deus”. 141
No entanto, há quem veja pontos positivos na teologia de Barth, pois para
Batista Mondin, o que se destaca como o grande mérito da teologia barthiana “é o de
137
CONN, Harvie M. Teologia contemporanea en el mundo. Subcomision Literatura cristiana de la iglesia
cristiana reformada. p.41 (a tradução do espanhol é minha). 138
Karl Barth nasceu na Suíça, lecionou teologia nas universidades de Gottingen, Munique e Bonn, mas foi
demitido desse ultimo posto pelo governo de Hitler em 1935 e ainda teve seus diplomas de teologia anulados.
Com a derrota de Hitler ele recupera a cátedra em Bonn, e depois vai para Basiléia, aposentando-se em 1961. 139
ALMEIDA. Tratado de teologia contemporânea. p. 63. 140
VIRKLER. Hermenêutica Avançada. p. 52. 141
ALMEIDA. Tratado de teologia contemporânea. p. 75.
61
reconhecer como única norma absoluta, tanto da reflexão teológica quanto da pregação e
da ação, a revelação divina tal como foi conservada na Sagrada Escritura”. 142
Já Pierre
Courthial discorda diametralmente dele ao declarar que “o defeito maior e radical do
pensamento de Karl Barth reside por certo exatamente neste ponto; sua doutrina não-
escriturística da Escritura”. 143
“Segundo Barth”, diz Pierre Courthial, “quando estudamos
a Bíblia, temos haver primeiramente com um testemunho escrito, que não coincide
automaticamente com a revelação, que apenas a atesta, e é nisso que consiste o limite”. 144
O estudo da Bíblia para Barth não nos garante o contato direto com a revelação,
visto que a Escritura não é esta revelação, mas o testemunho dela, ou ainda nas palavras do
próprio Barth:
“Os profetas e os apóstolos são aí “primeiras testemunhas” ou as “testemunhas diretas da
revelação”. Sua função passiva consiste no fato de que, diferentemente de todos nós e de
todos os demais homens, eles viram e perceberam de maneira única o evento sem igual da
revelação em seu contexto histórico. Em seu aspecto ativo a função das primeiras
testemunhas consiste no fato de que, diferentemente de todos nós e de todos os demais
homens, foram eles incumbidos de dar a público a revelação - tal como a receberam - ao
resto do mundo, isto é, a nós mesmos e a todos os outros homens”. 145
Assim, de acordo com Barth, praticamente não existe diferença entre o nosso
testemunho e o testemunho dos apóstolos. A única diferença é que os profetas e apóstolos
foram testemunhas primárias, ou “testemunhas diretas da revelação” assim como o fato de
que este testemunho é obra do Espírito Santo, que guiou, dirigiu, inspirou os autores
bíblicos, mas o “testemunho do Espírito nos é dado nas testemunhas humanas e por meio
das testemunhas humanas escolhidas por ele (Mt 10.19-20; Jo 14.26)”. 146
A alegação está
no fato de que se o testemunho foi dado por homens, à linguagem usada foi humana, e
como tudo que vem do homem, esta linguagem não pode ser considerada infalível, assim o
142
MONDIN. Os grandes teólogos do século XX. p. 46. 143
COURTHIAL, Pierre. O conceito Bartiano das Escrituras. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana. p. 06. 144
Ibid.p. 07 145
Ibid.p. 07. 146
Ibid.p.08.
62
testemunho pode muito bem conter erros, devido à influência humana no registro.
Cremos que a Bíblia não é o cenário onde a revelação se pode produzir, ao
contrário, a Bíblia faz parte da revelação de Deus; ela é a revelação. Ricardo Gondim
citando Shaeffer nos adverte para a realidade de que:
“Algo está profundamente errado quando professores de seminários evangélicos usam os métodos da alta crítica para estudar as Escrituras... Algo está profundamente errado quando um líder evangélico muda suas posições quanto à inteira autoridade das Escrituras, endossa os métodos da neo-ortodoxia existencialista e ridiculariza aqueles que sustentam a inteira autoridade das Escrituras chamando-os de “fundamentalistas obscurantistas””.
147
Talvez a principal crítica que Colin Brown faz a doutrina pregada por Barth é que
“na própria natureza do caso, quando se trata da questão do conhecimento de Deus,
devemos, começar com o dado primário da fé cristã - a revelação que Deus fez de si
mesmo na Sua Palavra. É à luz da Palavra de Deus que devemos julgar nossas idéias
preconcebidas, e não vice-versa”. 148
E por fim, John F. MacArthur chega à conclusão que
exprime exatamente a nossa posição, de que “quando a inspiração das Escrituras depende
de experiências subjetivas, e quando a Bíblia não é a última palavra, o que acontece? Não
há autoridade bíblica! Você pode receber tanta „revelação‟ das coisas que estão sendo
escritas e ditas hoje, quanto se recebe da Bíblia”. 149
A neo-ortodoxia contradiz a
autoridade da Palavra pela autoridade da razão, ou da consciência e ainda da experiência, e
assim, usurpa de Deus a prerrogativa única de ser Ele mesmo Deus Soberano.
147
GONDIM, Ricardo. Fariseus e Saduceus, hoje, 23. 148
BROWN. Filosofia e Fé Cristã. p. 164. 149
MACARTHUR, John F., Jr. Os Carismáticos. Um panorama doutrinário. São Jose dos Campos: Fiel,
1998.
63
3.2 O Relativismo e o Pluralismo Pós-Moderno
Pode parecer que este assunto contradiga o anterior, pois não poderíamos colocar o
modernismo e o pós-modernismo de forma que coexistam no mesmo tempo, mas é
exatamente isto que está acontecendo, visto que mesmo que ainda estejamos sofrendo
algumas conseqüências do modernismo, no mundo, em especial entre os jovens, os
conceitos modernos não têm tanto valor assim para o pensamento deles. O que acontece é
que estamos vivendo um período de transição, onde o moderno e pós-moderno
compartilham e disputam espaço na sociedade. Mas estes dois pensamentos não são em
nada compatíveis, já que o pós modernismo surge, justamente, para contrapor o
pensamento moderno, como afirma Héber Campos:
“O mundo pré-moderno e o moderno possuíam uma verdade objetiva. O primeiro cria em
verdades transcendentais, enquanto que o segundo não; mas ambos criam em padrões,
mesmo que diferentes. O pós-modernismo luta contra a verdade objetiva. Para ele não
existe padrão absoluto de verdades”. 150
A melhor definição de pós-modernismo, se é que podemos falar em definição no
contexto pós-moderno, é a dada no livro Pós-modernismo, de Salinas e Escobar, onde
juntam o pós-modernismo e o comparam ao modernismo, dizendo:
“Ao passo que a modernidade era um manifesto de auto-suficiência humana e de
autogratificação, o pós-modernismo é uma confissão de modéstia e até de desesperança.
Não há verdade, há apenas verdades. Não existe a razão suprema, somente há razões. Não
há uma civilização privilegiada (nem cultura, crença, norma e estilo), há somente uma
multidão de culturas, de crenças, de normas e de estilos. Não há uma justiça universal, há
apenas interesses de grupos. Não existe uma grande narrativa do progresso humano, há
apenas histórias incontáveis, nas quais as culturas e os povos se encontram hoje. Não existe
a realidade simples nem uma grande realidade de um conhecimento universal e objetivo,
existe uma incessante representação de todas as coisas em função de tudo o mais”. 151
Ao entendermos tal afirmação, não há como negar a diferença, onde no período
anterior, era a razão a base para todo o conhecimento, e agora, esta razão é questionada
como válida e até negada em seus aspectos. As conseqüências desta mudança de
150
CAMPOS, Héber Carlos de. O pluralismo pós-moderno. Em, Fides Reformata, vol 2, n° 1, jan/jun, 1997.
p.25. 151
SALINAS; ESCOBAR. Pós-modernidade, novos desafios à fé cristã. p. 25.
64
pensamento são as mais variadas possíveis, e dentre tantas, Campos destaca que com a
chegada do pós modernismo “houve a queda dos padrões morais anteriormente
estabelecidos e começou a questionar-se de maneira muito mais clara a necessidade de
haver uma verdade objetiva”. 152
3.2.1. Tudo é verdade, nada é verdade.
Como já declarei anteriormente, o pensamento pós-moderno surge em reação ao
modernismo, mas surge especificamente em reação aos estruturalistas, 153
e que daí o
descontrucionismo que pregam, segundo Stanley Grenz, “o significado não é inerente ao
texto em si”, e acrescenta que para os desconstrucionistas ou pós-estruturalistas, este
significado “emerge apenas à medida que o interprete dialoga com o texto”. 154
Stanley
traça sua analise afirmando que “uma vez que o significado de um texto depende da
perspectiva de quem dialoga com ele, são muitos os seus significados, como são muitos
também os seus leitores (ou leituras)”, 155
dessa forma, a propostas é abandonar a busca
pela verdade e nos contentarmos com a interpretação, e as interpretaçôes e verdade obtidas
são tantas quantos os leitores. Ao discorrer sobre o método de desconstrução de textos
onde todas as interpretações são igualmente válidas, ou igualmente sem significado
(dependendo do seu ponto de vista),
Salinas e Escobar esclarecem:
152
CAMPOS. O pluralismo pós-moderno. p. 06. 153
Os estruturalistas pregam que a linguagem é uma construção social e as pessoas desenvolvem textos na
tentativa de prover estruturas de significado que as ajudarão a dar sentido ao vazio de sua experiência, assim,
a literatura nos equipa com categorias que nos auxiliam a organizar e compreender nossa experiência da
realidade. 154
GRENZ, Stanley J. Pós-modernismo: um guia para entender a filosofia do nosso tempo. São Paulo: Vida
Nova, 1997. p. 22. 155
GRENZ, Stanley J. Pós-modernismo: um guia para entender a filosofia do nosso tempo. São Paulo: Vida
Nova, 1997. p. 22.
65
“Isto tem repercussões importantes no campo da hermenêutica bíblica. Se toda
interpretação está condicionada culturalmente, então nenhuma interpretação pode ser
descartada, e a nenhuma interpretação se deve dar o status de uma verdade objetiva.
Rechaçar uma interpretação pressupõe que se tenha algum critério que permite fazer
isso, mas se uma interpretação é apenas uma entre muitas possíveis outras
interpretações, não têm sentido argumentar em favor de seu valor único ou
contrariamente à validade (ou falsidade) da interpretação de outra pessoa”. 156
Em um aspecto mais amplo, a rejeição de absolutos levou o mundo pós-moderno a
repudiar qualquer conceito de verdade que pretenda ser universal. Eles reagem a qualquer
proclamação de verdade com cautela e desconfiança, pois encaram a verdade como um
instrumento de apoio para sistemas repressivos, e assim, qualquer verdade que pretenda ser
absoluta deve ser erradicada, incluindo-se o que na terminologia pós-modernista se
conhece como metanarrativas. 157
As metanarrativas são marcos de referência gerais que
dão sentido à totalidade da vida e que dão um significado ao lugar que ocupamos no amplo
sistema das coisas. Também podem ser entendidas como narrativas generalizantes que
asseguram a provisão de marcos universais para o discernimento de significado. Exemplos
de metanarrativas são o marxismo, a democracia liberal capitalista e o mito moderno do
progresso autônomo, é um sistema que abrange completamente o pensar e o viver uma
concepção total do mundo e da humanidade. 158
Neste caso, a Bíblia pode ser considerada uma metanarrativa em que os cristãos
afirmam basear a sua fé. Uma metanarrativa com pretensões universais, que pretende
contar a verdadeira história do mundo e impor a todos uma forma de crer, agir e pensar.
Isto não é aceito pelo mundo pós-moderno, pois as metanarrativas são rejeitadas como
autoritárias, porque “impõem o seu próprio significado de forma fascista”. 159
Os pós-
modernos se lançam em oposição à teoria da correspondência da verdade, 160
e com isso,
156
SALINAS; ESCOBAR. Pós-modernidade, novos desafios à fé cristã. p.28. 157
Ibid. p. 30. 158
Ibid.p.30. 159
Ibid.p.31. 160
A teoria da correspondência da verdade é a crença de que a verdade consiste na correspondência entre
proposições e o mundo “lá fora” (GRENZ. Pós-modernismo. p. 237).
66
essa rejeição “conduz não somente ao ceticismo, que solapa o conceito de verdade objetivo
de modo geral; ele mina também as reivindicações cristãs de que nossas formulações
doutrinárias apresentam a verdade objetiva”. 161
Em hipótese alguma pretendemos fazer
apologia aos métodos e concepções modernas, e esta forma de pensar pós-moderna, tem
corroído o princípio bíblico e cristão da autoridade das Escrituras. A forma como se pode
combater este pensamento em voga não é um retomo ao racionalismo, pois como vimos
antes, ele também pode ser bastante pernicioso, nem é o momento de ser saudosista,
achando que “o modernismo é que era bom”, mas somos desafiados diante dessa nova
realidade a dar respostas.
Campo nos mostra uma saída para vivermos neste mundo pluralista, quando
conclama todos os cristãos a “educar seus filhos e o povo de Deus a não terem medo de
expressar a sua fé na verdade da Palavra de Deus”, pois, segundo ele, “estaremos minando
o conceito de verdade se todas as verdades são igualmente verdadeiras”. 162
3.2.2. Opinião ao invés da norma.
No entanto, o problema do pluralismo nos conduz a outro problema pós-moderno
que igualmente ameaça a autoridade das Escrituras, ele é um parente próximo do
pluralismo, anteriormente descrito, chamado relativismo. Esta posição nos diz que tudo o
que podemos saber acerca das realidades são, unicamente, as relações entre suas diferentes
partes, o que assim quer dizer que todo conhecimento é relativo. Não existem absolutos,
normas ou critérios objetivos e independentes para a verdade. Tudo é relativo ao momento
e à pessoa. 163
Afirmam eles que partindo do fato de que a verdade é um fenômeno coletivo
e que encontra sua concretude somente na comunidade onde ela está inserida, não podemos
161
GRENZ. Pós-modernismo. p. 237. 162
CAMPOS. O pluralismo pós-moderno. p. 26. 163
SALINAS; ESCOBAR. Pós-modernidade, novos desafios à fé cristã. p. 37.
67
falar em verdade, mas verdades, e não podemos falar em verdade superior a outra verdade,
mas todas são colocadas em pé de igualdade diante da sociedade.
Na era pós-moderna, devido este conceito de verdade relativa, nenhuma religião
tem o direito de declarar-se detentora da verdade reguladora, diante da qual, as outras
podem ser avaliadas e declaradas falsas, nem muito menos inferiorizá-Ias. No entanto, o
pós modernismo se gaba de atribuir a todas as religiões o mesmo sentimento presunçoso de
possuidora da verdade, mas que, no final das contas, todas são igualmente nulas, pois todas
as religiões foram criadas iguais. 164
Stanley Grenz no ensina que a verdade pós-moderna está intimamente ligada à
comunidade de que participa o indivíduo e uma vez que são muitas as comunidades, as
verdades existentes serão iguais a esse número. Ele ainda alega que a conseqüência desta
filosofia é que ela “implica um tipo radical de relativismo e pluralismo”. 165
Não há mais
no período pós-moderno padrões comuns para os quais as pessoas possam apelar em seus
esforços para medir, julgar ou valorizar idéias, opiniões ou opções de estilo de vida.
Extinguiu-se a lealdade a uma fonte única de autoridade e a um poder abalizador de
pensamentos ao qual todos poderiam recorrer. Isto toma os pós-modernos tão desconfiados
diante da verdade universal ao ponto deles ficarem convencidos de que não há mais nada a
descobrir, e que o máximo a que ainda se pode chegar é a uma miríade de interpretações,
que na sua maioria são conflitantes, e/ou “uma infinidade de mundos criados pela
linguagem”. 166
O abandono da crença na verdade universal implica, inevitavelmente, na perda de todo
critério final, para, usando esta norma, avaliarmos a realidade e ainda a interpretação feita
dela. 167
164
Ibid.p. 35. 165
GRENZ. Pós-modernismo. p. 33 166
Ibid. p. 238. 167
Ibid. p. 238.
68
Héber Campos adverte sobre algo sério no que diz respeito a muitos segmentos do
cristianismo pós-moderno ter mudado o paradigma básico da busca pela verdade objetiva
da Palavra de Deus para a “verdade” da experiência. Segundo ele, “Se o paradigma da
verdade de Deus não é levado em conta, e aceitamos o paradigma da experiência, não
poderemos negar as experiências de outros grupos religiosos não-cristãos como válidas e
como fonte de autoridade”. 168
Não podemos nos deixar enfeitiçar pela proposta relativista
e pluralista do pós-modernismo, e negarmos com isso a autoridade suprema da Escritura.
Em determinar o que cremos e praticamos em nossas comunidades eclesiásticas, pois ao
abandonarmos à Sagrada Escrituras, trocando-as por experiências, ou qualquer outra fonte
de autoridade, estaremos dando margem para que outros grupos, igualmente, conclamem
suas fontes de autoridade, e caiamos assim na armadilha pós-moderna do relativismo
teológico. 169
Assim, o desafio cristão diante do pós-modernismo, não é o retomo ao
racionalismo, como já foi afirmado anteriormente, mas vivenciar a Bíblia como verdade
que o mundo pressupõe não mais existir, ou que pelo menos não pode ser mais encontrada.
A autoridade Bíblica precisa não somente ser defendida, pregada, mas vivenciada nesta
sociedade, para que a solução da angustia provocada pela falta de paradigmas seja sanada
no encontro com a Palavra de Deus.
168
CAMPOS. O pluralismo pós-moderno. p. 15. 169
SALINAS; ESCOBAR. Pós-modemidade, novos desafios à fé cristã. p. 47. E ainda GRENZ. Pós-
modernismo. p. 239.
69
3.3 As Escrituras Versus "Novas Revelações"
Na atualidade percebemos que alguns fatos tem influenciado a vida da Igreja, e um
desses fatos, é a ênfase em “Novas Revelações”. Fato este, que tem comprometido os
princípios já revelados por Deus, nas Escrituras, e trazendo questionamentos a verdades
como a suficiência e a autoridade das Escrituras. Esta é a realidade do panorama religioso
brasileiro, que tem passado por grandes transformações. Evidentemente entre os
evangélicos, os que defendem um sistema doutrinário que se conflita com o que as
Escrituras pregam. Neste ponto nosso enfoque concentra-se nas “novas revelações”, que
são tendências doutrinárias que encontram espaço e aceitação dentro das igrejas
evangélicas e têm provocado uma mudança substancial na mentalidade dos cristãos em
relação a aspectos importantes da doutrina e da vida cristã. Aqui não estamos diretamente
preocupados com as teologias liberais e neo-ortodoxas que têm dominado o cenário
contemporâneo das igrejas européias e americanas, mas especificamente alguns grupos de
Neopentecostais. Necessário faz-se destacar que todas estas Igrejas trazem consigo
verdades bíblicas, e algumas delas até negligenciadas por cristãos mais conservadores. 170
Contudo, a abordagem bereana de avaliar tudo por meio das Escrituras deve sempre
governar toda a análise cristã de doutrinas que se apresentem como bíblicas. 171
As igrejas
neopentecostais têm certas semelhanças com as igrejas de qual eles surgiram, as Igrejas
pentecostais, mas com características peculiares. 172
Quanto à avaliação do
neopentecostalismo, Jorge Noda em um de seus artigos, falando sobre avaliar estas
revelações descreve:
Muitos cristãos sinceros recebem com reservas a iniciativa de se fazer uma análise do
neopentecostalismo. Talvez seja o receio de se empreender uma perseguição
“preconceituosa ou até mesmo promover oposição à própria obra de Deus. Esse receio não
é infundado, pois perseguição, preconceito e intolerância têm sido promovidas em nome da
170
NODA, Jorge Issao, Artigo: Reforma Protestante e as Escrituras. 171
Ibid. 172
SAYÃO, Luiz Alberto T., Uma Avaliação Sociológica do Pentecostalismo e do Neopentecostalismo.
70
verdade religiosas. Mas isso não deve nos levar ao extremo, fazendo-nos crer que não
existe necessidade de identificar e denunciar o erro. De fato, há diversas razões que nos
levam a estudar de forma crítica o neopentecostalismo. Uma atitude de completa abertura
não é recomendada nas Escrituras. Pelo contrário, as advertências são tantas e tão fortes
que não podem de maneira nenhuma deixar de ser ouvidas. Antes de tudo, é importante
lembrar as advertências da própria Palavra de Deus. Todos os textos a seguir demonstram a
necessidade do povo de Deus estar atento aos desvios que podem acontecer realmente
acontecem: Mt 7:15-23; Mt 24:11; Mt 11:32; At 17:11; Jd 3; 1 Jo 4:1: 2 Pe 2:1-3; FI 4:17-
19. Todas estas advertências, e muitas outras, foram inspiradas por um Deus onisciente,
conhecedor das inclinações do coração humano e dos desígnios malignos e destruidores de
Satanás. Tal ênfase bíblica torna injustificável a negligência de uma boa parte dos líderes
responsáveis pelo rebanho do Senhor no que se refere à infiltração de falsos ensinos”. 173
Apesar do crescimento numérico espantoso dos evangélicos no Brasil, poucos
ousariam afirmar que a igreja goza de maturidade espiritual. É perceptível dentro da
comunidade evangélica a mesma dicotomia entre religião estabelecida e religião popular
observada na Igreja Católica Romana. 174
Enquanto as chamadas denominações históricas
confessam oficialmente a fidelidade à ortodoxia e ortopraxia, a crença e prática nas
milhares de comunidades ditas evangélicas brasileiras, apresentam um considerável desvio
para tendências mais liberais e místicas 175
A ausência quase que completa de doutrina
bíblica sólida, discipulado, disciplina, orientação ética, tem dado à igreja brasileira uma
reputação de igreja do “jeitinho” 176
O relativismo parece estar afetando radicalmente a
identidade evangélica, pois tem incluído aos ensinamentos bíblicos, outros obtidos através
de “revelações” que contradizem os conceitos bíblicos. As novas Igrejas são como alguns
se autodenominam “pronto socorro espiritual”. 177
As Igrejas são grandes, feitas para
multidões abertas o dia inteiro em locais movimentados, onde não há relação comunitária e
o fiel vai apenas para buscar “a benção”, ou talvez dizer “comprar” a benção já que a
relação não meritória diante de Deus, tão enfatizada no protestantismo histórico, foi
173
NODA, Jorge Issao, Artigo: Reforma Protestante e as Escrituras. 174
Ibid. 175
Ibid. 176
Ibid. 177
SAYÃO, Luiz Alberto T., Uma Avaliação Sociológica do Pentecostalismo e do Neopentecostalismo
Contemporâneo, p. 92.
71
substituída por uma relação do tipo “toma lá e dá cá,” 178
, tornando-se difícil encontrar uma
igreja evangélica onde não exista influência das doutrinas neopentecostais. Nenhuma das
doutrinas neopentecostais, como a de “novas revelações”, ganharia tanto espaço dentro das
igrejas evangélicas se estas estivessem bem nutridas com a Palavra de Deus. 179
Os falsos
ensinos e as novas revelações tentam oferecer aos homens um meio fácil e rápido de
resolver seus problemas. Entretanto o neopentecostalismo não deixa de ter seus pontos
positivos, mas no cômputo geral, tem trazido sérios prejuízos para a vida individual dos
crentes e para a igreja como comunidade. 180
Deve se destacar, portanto, que as “novas
revelações” com seus novos conceitos, ameaçam a autoridade e suficiência das Escrituras,
conceitos estes inegociáveis a Igreja contemporânea, trazendo sérios prejuízos aos cristãos
pelo fato de por em dúvida a revelação escriturística. E, além disto, a igreja tem sofrido
outro mal, que tem se apresentado como outra fonte de autoridade divina fora do âmbito
das Escrituras, e tem se alastrado. É a emoção, quando degenerada em emocionalismo. Isto
quase inevitavelmente conduz ao misticismo. Na esfera religiosa, freqüentemente é dado
um valor exagerado à intuição, ao sentimento, ao convencimento subjetivo, Quando tal
ênfase ocorre, facilmente esse sentimento subjetivo de convicção, pessoal e interno, é
explicado misticamente, em termos de iluminação espiritual e revelação divina direta, fato
este que este diretamente ligado as “novas revelações”. Faz-se necessário, entretanto
destacar que Deus outrora tenha se revelado por esses meios. Ele de fato o fez. Foi, em
parte, através desses meios que a revelação especial foi comunicada à Igreja e registrada no
cânon pelo processo de inspiração. Por isso agora não precisamos mais desse meios para
entendermos quais os conceitos de Deus para o homem. O que deve observar é que este
misticismo hoje copia, forja essas formas reais de revelação do passado, para reivindicar
178
Ibid, p. 92. 179
Ibid. 180
NODA, Jorge Issao, Artigo: Reforma Protestante e as Escrituras.
72
autoridade que na verdade não é divina, mas humana, quando não diabólica. Estas
tendências não são de modo algum novas? Eis as palavras do Senhor através do profeta
Jeremias:
“Assim diz o Senhor dos Exércitos: Não deis ouvido às palavras dos profetas que entre vós profetizam, e vos enchem de vãs esperanças; falam as visões do seu coração, não o que vem da boca do Senhor... Até quando sucederá isso no coração dos profetas que proclamam mentiras, que proclamam só o engano do próprio coração?. O profeta que tem sonho conte-o como apenas sonho; mas aquele em quem está a minha palavra. fale a minha palavra com verdade. Que tem a palha com o trigo? diz o Senhor (Jr 23.16,26,28)”.
181
Séculos depois o Apóstolo Paulo enfrentou o mesmo problema. Ele próprio foi
instrumento de revelações espirituais verdadeiras, inspirado que foi para escrever suas
cartas canônicas. Nessa condição, ele sabia muito bem o que eram sonhos, visões,
revelações e arrebatamentos. Mas, ainda assim, advertiu aos Colossenses, dizendo:
“Ninguém se faça árbitro contra vós outros, pretextando humildade e culto dos anjos,
baseando-se em visões, enfatuado sem motivo algum na sua mente carnal” (Cl 2:18). Tanto
Jesus como os apóstolos advertem a Igreja repetidamente contra falsos profetas que trazem
“novas revelações” fora do âmbito das Escrituras, os quais ensinam como se fossem
apóstolos de Cristo, mas que não passam de enganadores. Sempre que tal coisa ocorre, a
autoridade das Escrituras é ameaçada bem como a sua suficiência. Quanto à degeneração
das emoções, não se pode esquecer que pelo fato das emoções terem também sido
corrompidas pelo pecado, tende sempre a usurpar, a competir com a autoridade das
Escrituras, chegando mesmo freqüentemente a suplantá-la 182
. Na época dos Reformadores
não foi diferente. Eles combateram grupos místicos por eles chamados de entusiastas, que
reivindicavam autoridade espiritual interior, luz interior, revelações espirituais adicionais
que suplantavam ou mesmo negavam a autoridade das Escrituras. 183
Esta tem sido
igualmente uma das características mais comuns das seitas modernas, tais como
181
NODA, Jorge Issao, Artigo: Reforma Protestante e as Escrituras.
182
Ibid. 183
NODA, Jorge Issao, Antigo: Reforma Protestante e as Escrituras.
73
mormonismo, testemunhas de Jeová, adventista do sétimo dia, etc. Entre os movimentos
pentecostais e carismáticos também não é incomum a emoção degenerar em
emocionalismo, produzindo um misticismo usurpador da autoridade e a suficiência das
Escrituras. 184
Fenômenos sobrenaturais destes tipos estão sendo relatados a todo o
momento na Igreja. Ouve-se muito sobre sinais e maravilhas e novas revelações, o que
levam cristãos a os buscarem, como comprovação da presença de Deus entre os homens.
185 Surgem líderes, religiosos com a capacidade de realizar esses fenômenos e curas e
milagres praticados, bem como as palavras de revelação proferidas, são colocados como
atestados inequívocos de que procedem de Deus. Podemos definir fenômeno como;
maravilha; ou pessoa ou coisa que tem algo de anormal ou extraordinário. Faremos neste
ponto uma fenomenologia, que seria então o estudo do que é extraordinário de maravilhas.
Fenômenos sobrenaturais fazem parte da história revelada e registrada das intenções de
Deus como o homem, nas Escrituras. 186
A aceitação deles como realidade faz parte de
uma compreensão correta da vida, sem a qual caímos em um falso racionalismo, que
caracterizam as pessoas que não temem a Deus. 187
Contudo deve-se entender que a
simples conotação de um fenômeno não é prova da presença da aprovação de Deus na vida
dos realizadores ou recebedores, somos conscientizados, pela Palavra de Deus, de que é
necessário exercer julgamento, examinar essas coisas com muito mais profundidade e
termos discernimento quanto aos fenômenos e quanto aos operadores de maravilhas. 188
Discernir os espíritos, novas revelações, verificar se a fenomenologia observada provém de
Deus ou não, é procurar aferir a questão do ponto de vista de Deus. 189
Este é o grande
184
De autoria de Paulo Anglada em seu livro Sola Scriptura, p. 65-66. 185
PORTELA, F. Solano, Avaliando as Manifestações Sobrenaturais, p. 21. 186
Id. 187
Id. 188
PORTELA, F. Solano, Avaliando as Manifestações Sobrenaturais, p. 41. 189
Ibid, p.50.
74
alicerce da fé cristã. 190
A palavra de Deus é verdade proposicional e objetiva. Fazendo a
avaliação das manifestações sobrenaturais, Solano Portela descreveu:
“A aplicação e iluminação subjetiva do Espírito Santo de Deus, no coração de cada crente. complementa, mas não anula ou sobrepõe à objetividade das Escrituras. Certas verdades bíblicas mostram a âncora de conhecimento que temos em Deus: Ele não é contraditório (2 Tm 2.13) e é impossível que ele venha a mentir (Hb 6.18; Tt 1.2). Podemos considerar que o teste é válido até hoje. No último livro da Bíblia, e no seu último capítulo (22.18-21), temos um aviso já antes dado em Dt 4.2 - nada deve ser subitraído nem pode ser adicionado à palavra de Deus. Será que vamos rotular apenas como uma “coincidência”, o fato de essa declaração ocorrer no final das Escrituras, nos últimos versículos de Apocalipse, ou temos aqui uma declaração oportuna da parte de Deus? Se alguém se propõe a ensinar alguma “nova revelação” ou a palavra “recebida do espírito”, muito cuidado, pois apesar de poder estar fazendo maravilhas, até predizendo o futuro, sua “conexão direta” esta em desacordo com a própria palavra, que se coloca como auto suficiente e final para a nossa instrução. Deus pode nos estar testando, mas, pelos seus próprios critérios, o profeta é falso”.
191
O resultado de movimentos como o neopentecostalismo, é a subordinação das
Escrituras à experiência e a relegação da Bíblia a uma posição de fonte secundária do
conhecimento. Pois onde impera o ávido desejo pelo inusitado e pelo extraordinário, as
Escrituras vão ficando pra trás. Isto não significa que Deus não se manifeste de forma
extraordinária, mas que estas manifestações não devem ser buscadas de forma que venham
a suprimir as Escrituras Sagradas e nem mesmo contradizer à mesma. A hermenêutica do
neopentecostalismo, não é nova, pois ela representa o aproveitamento desintelectualizado
de velhas idéias místicas que sempre flutuaram destrutivamente no seio da Igreja. 192
A
descrição que René Pache faz do pensamento Quaker do século XVI, e como parece uma
descrição contemporânea de movimentos como este:
“A “luz interior” dos Quakers representa uma dissociação das Escrituras da ação iluminada do Espírito Santo, nos corações. Este é um perigo que temos que enfatizar... Os Quakers consideravam a “luz interior” como sendo o testemunho final do Espírito Santo à experiência individual. Esta atitude praticamente predispôs alguns a diminuir o papel e autoridade das Escrituras. Alguns chegaram a dizer que as escrituras não eram na realidade necessárias. Além disso, uma “inspirada” declaração de um irmão em uma congregação, recebida à mesma validade que a do texto sagrado”.
193
Pache continua a sua exposição apontando os grupos que, nos dias de hoje, emitem
190
Id. 191
Ibid, p.51. 192
Ibid, p.59. 193
PACHE, René, The Inspiration and Authority of Scripture (Chicago: Moody Press, 1969) pp. 318-319.
75
pronunciamentos semelhantes, dando “proeminência excessiva ao Espírito Santo em suas
devoções, demonstrando intensa preocupação com os dons, com situações de êxtase e com
profecias. Estes têm a conseqüente tendência de negligenciar as Escrituras”. 194
É inegável
que a experiência é um dos fatores determinantes da hermenêutica do neopentecostalismo,
em adição às Escrituras Sagradas. 195
Conseqüentemente, a teologia é construída não
apenas nos dados das Escrituras, mas na apreensão dos fenômenos e na interpretação do
que Deus estaria revelando por meio desses. 196
O Teólogo C. Peter Wagner, que abraçou
com igual fervor tanto o movimento neopentecostal, como as proposições
pseudocientíficas do movimento de crescimento das Igrejas, aconselha a Igreja a “...
reexaminar as escrituras à luz da experiência e reavaliar sua teologia de acordo com a
mesma”. 197
Esta ousada afirmação que coloca as Escrituras na subordinação total à
experiência e em segundo plano como fonte da teologia sã, coloca em dúvida a sua
suficiência e abre a porta a uma visão meramente pragmática determinantes do conteúdo e
dos métodos a serem utilizados. Nas palavras de Wagner, como aplicação prática dessa
hermenêutica no campo de crescimento das Igrejas e seus entrelaçamentos com a visão
neopentecostal da epistemologia espiritual, convicções fluidas e posições mutantes, de
acordo com as situações experimentadas: “A teoria de crescimento da Igreja se apóia em
uma abordagem fenomelógica que sustentam as suas conclusões teológicas um pouco mais
em tentativas experimentais, estando aberto para reavaliá-las quando necessário à luz do
que for aprendido por meio das experiências.” 198
Não são apenas as novas revelações e a
experiência que são determinantes da hermenêutica neopentecostal. Mesmo sendo estes
fatos inadequados e destrutivos e assim ofensivos à igreja contemporânea, mas também, o
fato de uma vez aberto a porta para que novos fatos sejam recebidos e para que aplicações
194
Ibid.p. 319. 195
PORTELA, F. Solano, Avaliando as manifestações Sobrenaturais, p. 59. 196
Ibid. 197
WAGNER, C. Peter, estratégias Para o Crescimento da Igreja, p. 41, citado por Solano Portela, p. 59. 198
Ibid.
76
sejam retiradas do texto e do contexto bíblico temos também o surgimento de inferência
que levam as conclusões totalmente destituídas de base bíblicas, para as questões do
cotidiano. 199
A proliferação de heresias é evidente ao se tornar volúvel o conhecimento
bíblico, e as Escrituras perdem a exclusividade como única fonte de vida. Entretanto, a
autoridade final para o cristão deve ser a Palavra de Deus, que vem do Criador como
palavra unificadora da sua aliança. 200
Ainda, percebemos que Deus se mostra através de
seus atributos. A criação: a revelação natural (cf. SI 19: 1-4 e Rm 1: 18-20). Uma versão da
sua lei moral foi registrada em nosso coração: a consciência (cf. Rm 2: 14-15), “uma espiã
de Deus em nosso peito”, “uma embaixadora de Deus em nossa alma”, como os puritanos
costumavam chamá-la. 201
A própria pessoa de Deus, o ser de Deus, revela-se de modo
especialíssimo no Verbo encarnado, a segunda pessoa da Trindade (cf. Jo 14.19; CI 1.15 e
3.9). Mas, visto que Cristo nos fala agora pelo seu Espírito por meio das Escrituras, e que
as revelações da criação e da consciência não são nem perfeitas e nem suficientes por
causa da queda, que corrompeu tanto uma como outra, a palavra final, suficiente e
autoritativa de Deus para esta dispensação são as Escrituras Sagradas. 202
Deve-se salientar
que a autoridade e a suficiência das Escrituras são inerentes. Elas não dependem de homem
ou mesmo do testemunho da Igreja, estes apenas a evidenciam. Porém como vimos na vida
da Igreja contemporânea alguns fatores que tem tentado suplementar esta verdade.
Poderíamos resumir e identificar algumas fontes usurpadoras da autoridade e suficiência
das Escrituras: a tradição (degenerada em tradicionalismo), a emoção (degenerada em
emocionalismo e profecias), a razão (degenerada no racionalismo). 203
Aqui destacamos as
novas revelações, que tem sido um elemento bastante enfatizado, que fazem com que a
autoridade e a suficiência das Escrituras sejam questionadas, diminuídas e até mesmo
199
PORTELA, F. Solano, Avaliando as Manifestações Sobrenaturais, p. 60. 200
ARMSTRONG, John H., em, Sola Scripture, p. 94. 201
PACKER, I. J., Entre os Gigantes de Deus: Uma Visão Puritana da Vida Cristã, p. 115. 202
Ibid. 203
Ibid.p. 63.
77
suplantadas. 204
Os Reformadores ao professarem a doutrina da autoridade das Escrituras
evidenciaram que por serem divinamente inspiradas, elas são verídicas em todas as suas
afirmativas. Segundo a doutrina da Autoridade Bíblia, as Escrituras são a fonte infalível de
informação que estabelece definitivamente qualquer assunto nelas tratado: a única regra
infalível de fé e de prática, o supremo tribunal de recursos ao qual a Igreja pode apelar para
a resolução de qualquer controvérsia religiosa. Não havendo espaço para novas revelações,
pois as Escrituras são suficientes para conhecimento da Salvação. A palavra de Deus é a
suficiente comunicação verbalizada Dele às criaturas pensantes, e disto provém a sua
autoridade, por isso não precisamos de novas revelações. John H. Armstrong falando as
Escrituras descreve:
“Ela é verbalizada tanto no modo indicativo como no modo imperativo e particularizada em relação a cada pessoa a quem ela é enviada. As analogias humanas mais próxima a estas são as autoridades de legislação decretada por regente absoluto, e as ordens emitidas por um comandante militar supremo, pois em ambos os casos o que é pronunciado, é ao mesmo tempo, o que a pessoa com autoridade disse (na ocasião em que as leis ou ordens foram anunciadas inicialmente) e também o que ele diz e no presente momento desde que suas leis, ou ordens continuem a ser aplicadas a todo aquele que se mantém sob autoridade aqui e agora”.
205
204
Ibid. 205
PACKER, J, I., The Authority the Bible, p.3, citado, por: John Armstrong, em Sola Scriptura. 93.
78
CONCLUSÃO
Ao término deste trabalho monográfico sobre a Autoridade e Suficiência das
Escrituras chegamos a algumas conclusões, aos quais resumimos expressando o resultado
de nossa pesquisa e argumentação:
1) É verdade que a Igreja Católica Romana baseia sua fé e prática na Tradição, mas não é
verdadeira a sua reivindicação de que esta Tradição é o que os Pais da Igreja criam. Pois
eles não tinham o conceito de Tradição como Igreja Católica Apostólica Romana tem hoje,
mas sim, tinha o conceito de tradição como sendo a doutrina pregada pelos apóstolos.
Assim, a Igreja Católica Apostólica Romana baseia sua fé não nos escritos dos Pais, mas
no Magistério Eclesiástico e na palavra Papal que é assim como a Bíblia, infalível.
2) Não existe nada mais salutar do que termos símbolos de fé para transmitir as doutrinas
sempre cridas pela Igreja, mas o lugar deles é corno sempre foi desde sua confecção, sob a
autoridade bíblica e eles só têm autoridade na medida em que ref1etêm a luz das
Escrituras, do contrário, não têm autoridade normativa na igreja. Dessa forma, não
podemos ir a Bíblia para encontrar base para nossos símbolos de fé, mas o contrário,
encontramos nossos símbolos de fé na verdade bíblica.
3) A autoridade das Escrituras foi afirmada e defendida por Jesus e pelos apóstolos, de
forma que Jesus transferiu seu prestígio e autoridade para os escritos do VT e para seus
ensinamentos no NT investiu de autoridade os apóstolos para transmitirem sua mensagem.
Igualmente os apóstolos viam o A T como norma de fé e prática da Igreja e testemunharam
da autoridade dos seus escritos dentre eles mesmos.
79
4) A Bíblia tem autoridade porque se deriva de Deus, seu autor primário, e não de
doutrinas criadas pela igreja. A implicação lógica e direta da autoria divina é que o texto
não contém erro em nenhum aspecto que se proponha a tratar, pois do contrário, teríamos
dificuldades em reconhecer o que seria ou não autoritativo para a comunidade cristã.
Diante de todos os argumentos é somente através do testemunho interno do Espírito Santo
aos nossos corações que somos convencidos da autoridade escriturística para nossas vidas
e para o que devemos crer.
5) Reconhecemos os avanços hermenêuticos do racionalismo, mas igualmente, não
podemos deixar de destacar que ele se tomou “urna espada” dúbia, pois usurpou a
autoridade escriturística relocando-a para o leitor, onde ele interpreta existencialmente, ou
até se acha no direito de retocar a Bíblia, retirando os “mitos” nela contidos. Por mais que
a teologia neo-ortodoxa possa parecer correta, ela se toma ainda mais perigosa, pois
negando a inspiração bíblica, retira dela o que a autentica corno a autoritativa Palavra de
Deus.
6) Advertimos do perigo de se adaptar ao pensamento pós-moderno, pois mesmo que tenha
seu lado positivo, as suas teorias de desconstrução, metanarrativas e a sua visão relativista
e pluralista da verdade põem em risco a autoridade das Escrituras.
7) Mesmo sem julgarmos se os dons são contemporâneos ou não, as profecias como
descritas pelos carismáticos não condizem com o modelo bíblico, e mesmo que estes não
neguem a autoridade Bíblica para a Igreja como a única regra de fé e prática, baseiam suas
doutrinas muito mais nestas “novas revelações” do que nas Escrituras, e por fim, crendo
nestas doutrinas, buscam nas Escrituras a base para fundamenta-1a:, posição que gera uma
80
teologia enferma e de muita confusão. Com vista a contribuir a um retomo à crença na
Autoridade das Escrituras corno foi pregado pelos apóstolos e por Cristo, e defendida até
com a própria vida pelos reformadores, recomendamos:
Tomar cuidado para não cair no engano de pensar que o modelo liberal e neo-
ortodoxo não é tão pernicioso assim, mas procurar combatê-lo veementemente pois ele
ainda não está morto, mas tem ressurgido disfarçadamente em nossas comunidades, e a
única maneira de combatê-lo é através da própria Escritura, de forma racional, mas
encarando-a como a única fonte de autoridade disponível na Igreja para reclamarmos
diante de qualquer tribunal teológico. Mesmo que o pensamento pós-moderno negue uma
verdade universal e objetiva, confessar a Verdade bíblica como autoritativa para todos e
não somente para a Igreja, isto implica no compromisso cristão de vivenciar esta Verdade
de forma prática, não somente de aparência, pois somente assim, o indivíduo pós-moderno
irá reconhecer a autoridade bíblica para sua vida.
Olhando para a situação de muitas Igrejas em nossos dias, percebemos a
necessidade de uma volta à Palavra de Deus como autoridade máxima e única e suficiente
fonte de vida. A questão crucial que se apresenta diante da igreja evangélica brasileira é: se
ela confessará e lutará pelo princípio da reforma protestante: Sola Scriptura, que significa
ter as Escrituras como a revelação definitiva de Deus para o homem, onde Ele (Deus)
registra a sua vontade para toda a sua criação. Este princípio fundamental entre os cristãos,
tem sido negociado e em muitas ocasiões substituídos, e ainda acrescentados por princípios
extraídos de experiências como percebemos ao longo deste trabalho. Assim, a única
maneira de se reaver o conceito bíblico da sua autoridade no contexto pós-moderno é tão
somente educarmos nossos crentes a continuarem crendo na Verdade revelada nas
Escrituras. Que Deus, pois, tenha misericórdia de nós e continue nos abençoando, falando-
o através desta que é a única fonte autoritativa para a Sua Igreja, a Sagrada Escritura.
81
APÊNDICE
A Igreja Brasileira na Pós-modernidade206
O pensamento Pós-Moderno esvaziou a religião formal. Na Pós-Modernidade, a religião
deixou a dimensão pública e restringiu-se à esfera privada. Na tentativa de se libertar de
uma cultura religiosa com padrões morais absolutos, o indivíduo pós-moderno criou uma
religiosidade interiorizada, subjetiva e sem culpa.
As pessoas querem optar pela sua “preferência” religiosa sem ser importunadas por
opiniões contrárias. Os critérios que orientam essas escolhas são todos íntimos e
subjetivos. Semelhantemente, também não tentarão impor sua nova opção de fé a ninguém.
Na Igreja, o que antes era convicção, hoje é opção. Os mandamentos divinos passaram a
ser sugestões divinas. A igreja é orientada por aquilo que dá certo e não por aquilo que é
certo. O pragmatismo missionário e o “novo poder” da igreja (político, econômico,
tecnológico, etc) esvaziou o significado da oração e seu espaço na tarefa da igreja.
Confiamos mais em nossos recursos e menos em Deus, superestimamos o poder de César e
subestimamos o poder de Deus. As ferramentas ideológicas e tecnológicas tornaram-se
mais eficientes que a comunidade e a comunhão.
Entendo que a versão evangélica da pós-modernidade seja o neopentecostalismo e seus
famigerados congêneres. O neopentecostalismo possui diversos traços de continuidade
cultural com o catolicismo popular latino-americano. Continuidade que muitas vezes
desemboca em sincretismo e no reforço de práticas e concepções corporativistas. O
protestantismo, por sua vez, é a religião da escrita, da educação cívica e racional. Favorece
uma cultura política democrática e promove uma pedagogia da vontade individual.
Entende-se por “protestante” ou “protestantismo” todo o conjunto de instituições
religiosas surgidas em conseqüência da Reforma Religiosa do século XVI nas suas
principais vertentes que são a luterana e a calvinista e que procuram manter os princípios
básicos que formam o princípio protestante da liberdade: a justificação pela fé, a “sola
scriptura”, o livre exame da Bíblia e o sacerdócio universal de todos os crentes.
Hoje em dia é difícil incluir entre os protestantes alguns setores do pentecostalismo e,
principalmente, do neopentecostalismo brasileiro. Esta é a opinião do Dr. Ricardo Mariano
207que analisou os modernos movimentos neopentecostais e segundo ele:
206
Isaías Lobão Pereira Júnior Pastor da Igreja Batista Independente no Planalto. Professor da Faculdade
Teológica Cristã do Brasil (FTCB) e da Faculdade Teológica das Assembléias de Deus (FATAD). Bacharel
em História pela Universidade de Brasília, é membro da Fraternidade Teológica Latino-Americana, setor
Brasil (FTL-B).
82
O neopentecostalismo, o responsável pela “explosão protestante”, à medida que passa a
formar sincretismos, a se autonomizar em relação à influência das matrizes religiosas
norte-americanas, a promover sucessivas acomodações sociais, a abandonar práticas
ascéticas e sectárias, a penetrar em novos e inusitados espaços sociais e a assumir o status
de uma grande minoria religiosa, cada vez menos tende a representar uma ruptura com a
cultura ambiente. Tende, pelo contrário, a mostrar-se menos distintivo, mais aculturado,
mais vulnerável à antropofagia brasileira e, portanto, cada vez menos capaz de modificar a
cultura que o acolheu e na qual vem se acomodando.
O neopentecostalismo, pelo contrário, provêm da cultura religiosa do catolicismo popular,
corporativista e autoritário. É a religião da lábia, do engano e da corrupção. Ele favorece
o analfabetismo bíblico. Esta nova religiosidade evangélica é um tipo de ocultismo,
recheado de citações bíblicas. O Neopentecostalismo há muito deixou de ser evangélico,
tornando uma outra forma de expressão religiosa, distante do pensamento protestante e
reformado.
Uma das rupturas mais sérias do Neopentecostalismo com o pensamento protestante, é o
uso da Bíblia. No Protestantismo a Bíblia é sua última autoridade, não a tradição ou
personalidades importantes ou mesmo a experiência espiritual, enquanto que o
Neopentecostalismo enfatiza o uso mágico da Escritura. Para os neopentecostais, a Bíblia é
mais um oráculo a ser consultado do que a única regra de fé e prática.
Em Brasília, um jornal local publica semanalmente um anúncio estranho: “Revela-se por
Professia” (sic). A promessa por trás dessa mensagem é a solução imediata dos problemas,
dos encostos e das maldições, tal como as inúmeras videntes que infestam os grandes
centros urbanos. Normalmente nestas sessões, a vidente se posta diante do pedinte com
uma Bíblia aberta. A intenção é encontrar “na palavra” a solução para os problemas. Os
versos bíblicos são interpretados fora de contexto, sempre na busca de uma “palavra de
bênção”.
No neopentecostalismo, as doutrinas bíblicas foram rejeitadas e substituídas por um falso
evangelho centralizado no homem. Boa parte da pregação neopentecostal é um mero
exercício de auto-ajuda, com a intenção principal de acalmar a consciência pecaminosa
com promessas de riqueza e bem-estar. Contudo, o mandamento para todos os ministros
cristãos, ainda continua sendo, prega a palavra (I Timóteo 4:1), em lugar disso, os
pregadores se transformaram em animadores de auditório.
207
MARIANO, Ricardo. O futuro não será protestante. Comunicação apresentada na USP na Jornada
sobre Alternativas Religiosas na América Latina. 1998.
83
Nossa tarefa apologética para esta era pós-moderna é restaurar a confiança na verdade. A
Bíblia continua sendo a Palavra de Deus. A Bíblia é um documento inspirado da revelação
divina, quer este ou aquele indivíduo receba ou não o seu testemunho. Devemos, pois,
respeito e obediência à Bíblia, não por ser letra fixa e estática, mas porque, sob a
orientação do Espírito Santo, essa letra é a Palavra viva do Deus vivo dirigida não só ao
crente individual, mas à Igreja em geral.
A igreja precisa rever sua atuação, olhando para o Senhor Jesus e lançando-se
humildemente de volta às Escrituras, resgatando sua identidade e o seu chamado. Se
abrirmos mão da Palavra de Deus como verdade absoluta, correremos sérios riscos diante
de uma sociedade sem referenciais, mas principalmente diante de um Senhor zeloso que
rege a história e têm em suas mãos todo o domínio e todo o poder.
84
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