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1 Introdução Esse trabalho tem como objeto principal fazer um estudo bibliográfico de alguns critérios da abordagem intercultural no ensino de Língua Estrangeira Moderna (LEM – Língua Alemã). Objetiva-se, ainda, como compreender essa abordagem e a sua relevância no ensino da língua estrangeira para que seja possível intermediar, de maneira mais adequada, o ensino/ aprendizagem. A pergunta pertinente é: como observar um material didático sob a ótica da interculturalidade; ou como descobrir possibilidades de se trabalhar cultura em sala de aula. A abordagem intercultural no ensino de LEM, assim como a abordagem comunicativa, também privilegia a comunicação, a organização dos conteúdos em grupos temáticos. O aprendizado é interativo, o aluno aprende do seu colega e com o seu colega por meio de atividades trabalhadas na sala de aula. No entanto, a abordagem intercultural vai além da abordagem comunicativa, pois a primeira dá a liberdade ao aluno de “interpretar outras formas de pensamento, concepções e valores de uma cultura, tendo como pano de fundo a sua própria cultura, suas experiências pessoais” PIRES; ROHRNANN, (1990, p. 05, in MEIRELES, 2002, p.158). De modo ideal, na abordagem intercultural, portanto, todas as culturas estão “em pé de igualdade” na questão valorativa. A abordagem intercultural pressupõe uma compreensão ativa do outro. Pois, segundo BAKHTIN (VOLOSHINOV), (1995, p. 95) “Na realidade, não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes triviais, agradáveis ou desagradáveis”. É, portanto, ao conteúdo ideológico da palavra que nós reagimos. E nós só vamos entender e reagir àquelas palavras às quais associarmos algum tipo

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1

Introdução

Esse trabalho tem como objeto principal fazer um estudo bibliográfico de

alguns critérios da abordagem intercultural no ensino de Língua Estrangeira Moderna

(LEM – Língua Alemã). Objetiva-se, ainda, como compreender essa abordagem e a

sua relevância no ensino da língua estrangeira para que seja possível intermediar, de

maneira mais adequada, o ensino/ aprendizagem. A pergunta pertinente é: como

observar um material didático sob a ótica da interculturalidade; ou como descobrir

possibilidades de se trabalhar cultura em sala de aula.

A abordagem intercultural no ensino de LEM, assim como a abordagem

comunicativa, também privilegia a comunicação, a organização dos conteúdos em

grupos temáticos. O aprendizado é interativo, o aluno aprende do seu colega e com

o seu colega por meio de atividades trabalhadas na sala de aula. No entanto, a

abordagem intercultural vai além da abordagem comunicativa, pois a primeira dá a

liberdade ao aluno de “interpretar outras formas de pensamento, concepções e

valores de uma cultura, tendo como pano de fundo a sua própria cultura, suas

experiências pessoais” PIRES; ROHRNANN, (1990, p. 05, in MEIRELES, 2002,

p.158). De modo ideal, na abordagem intercultural, portanto, todas as culturas estão

“em pé de igualdade” na questão valorativa. A abordagem intercultural pressupõe

uma compreensão ativa do outro. Pois, segundo BAKHTIN (VOLOSHINOV), (1995,

p. 95) “Na realidade, não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas

verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes triviais, agradáveis ou

desagradáveis”. É, portanto, ao conteúdo ideológico da palavra que nós reagimos. E

nós só vamos entender e reagir àquelas palavras às quais associarmos algum tipo

2

de significado da nossa experiência pessoal. “Uma compreensão ativa não renuncia

a si mesma, ao seu próprio lugar no tempo, à sua cultura, e nada esquece” BAKHTIN

(VOLOSHINOV), (1992, p. 367). Pois: “A cultura alheia só se releva em sua

completude e em sua profundidade aos olhos de outra cultura” BAKHTIN

(VOLOSHINOV), (1992, p. 368).

Ao se estabelecer uma relação dialética entre a própria cultura e a cultura

alheia é possível perceber aspectos da própria cultura, que, até então, nem sempre

eram questionados ou se quer percebidos. Emitir valores ou questionar sobre

comportamentos de uma outra cultura, tendo como pano de fundo a própria cultura,

pode ser um exercício gratificante e enriquecedor. Pois,

Um pressuposto (quase) unânime nas mais diversas correntes de investigação da área é o reconhecimento de que cada pessoa, a partir do seu próprio sistema de orientação, partindo de um diferenciado background cultural, procurará interagir com idéias e valores que são utilizados na cultura estranha. Observamos uma tendência ao etnocentrismo, partindo da própria atitude/percepção em relação ao outro que levará a um movimento de rejeição/aproximação. (JANZEN, 1998, p. 140).

Se o professor de língua estrangeira conseguir, por meio da mediação

pedagógica, apontar caminhos para a compreensão ativa da realidade do outro, seus

alunos estarão mais aptos para estabelecer ligações entre a sua própria realidade e

a do outro, o que gera maior auto-conhecimento e um posicionamento crítico ante a

sua própria existência. Segundo JANZEN, (2002, p. 138). “A minimização do papel

do outro no ensino de Língua estrangeira Moderna - LEM - tem gerado dificuldades

pedagógicas, limitando o diálogo cultural e conseqüentemente a aprendizagem,

restringindo/ impossibilitando, muitas vezes, a ampliação dos horizontes constitutivos

de sentido do aluno”.

3

Por mais comunicativa que seja a proposta de um livro didático, ele vai

sempre trazer marcas culturais e ideológicas das pessoas que o elaboraram e do

país que se origina. Isso pode dificultar o aprendizado da língua estrangeira, porque

certos conteúdos estão distantes do universo cultural do aluno. Aprender uma língua

estrangeira é também aprender sobre a cultura das pessoas que usam essa língua.

Por isso, o papel do professor é muito importante, pois é ele quem vai mediar a

compreensão de particularidades culturais tanto do aluno quanto das pessoas do

outro país. A interculturalidade se dá a partir da identificação das diferenças culturais.

Ao confrontarmos a nossa cultura com a do outro, temos a oportunidade não só de

aprender sobre a cultura do outro, mas também de refletir sobre a nossa. E, com

isso, aprender a tolerar melhor as diferenças. Esse é um processo que não acontece

de um dia para outro, pois é preciso primeiro reconhecer que vivemos em

sociedades multiculturais, que as pessoas têm hábitos e comportamentos diferentes

umas das outras, que têm histórias de vida diferentes, mas, nem por isso, deixam de

ter seus valores.

4

CAPÍTULO - 1

1.1 - Cultura - Pressupostos Teóricos

Pensar em interculturalidade requer, em primeiro lugar, buscar uma definição

para o conceito de cultura. Esse conceito é um tema bastante discutido e

comentado, sendo já possível encontrar várias definições para o termo. O conceito

de cultura neste trabalho vai se basear no conceito de cultura definido pelo

antropólogo Geert Hofstede (1993) em seu trabalho ”Colaboração Intercultural:

Culturas – Organizações – Gerenciamentos” / “Interkulturelle Zusammenarbeit:

Kulturen – Organisationen - Management”, para o qual cultura é o conjunto de

conhecimentos, crenças e comportamentos de uma sociedade.

HOFSTEDE (1993, p. 18) explica a cultura como programação mental que

tem origem na sociedade. A cultura, vista como uma programação mental, tem sua

origem no ambiente que crescemos e onde aprendemos como nos comportar, como

nos vestir, os valores que orientam ou determinam os nossos julgamentos sobre o

certo ou o errado, o bom ou o ruim. Os tipos de alimentação ou até mesmo os

horários das nossas atividades são, na sua maioria, determinados socialmente. E

nós, como somos seres sociais, somos então programados desde a mais tenra

infância a desenvolver certos comportamentos e ações. Toda pessoa aprende

modelos de comportamento que movem as suas ações e reações diante do

conhecido e do estranho. “As fontes dos programas da nossa mente se geram em

5

ambientes sociais, nos quais fomos criados e colhemos as nossas experiências de

vivências.”1 (HOFSTEDE, 1993, p.17) Tradução da pesquisadora.

A fonte dessas programações mentais está na sociedade, na qual crescemos

e onde conseqüentemente acumulamos nossas experiências de vida. Por isso, essa

programação mental tem início na família ou no ambiente que crescemos e vai se

ampliando na convivência com outras pessoas, tais como vizinhos, escola, amigos

e, mais tarde, no trabalho e na convivência com um companheiro.

Cultura não é só o conjunto de conhecimentos adquiridos pelo ser humano

por meio de sua escolaridade, do seu contato com as artes e com a literatura. Nessa

definição, faz parte da cultura todo aprendizado que a pessoa adquire ao longo de

sua vida, desde os hábitos mais simples como: cumprimentos, hábitos alimentares,

de higiene, de lazer e o tratamento com o sexo oposto; a demonstração ou não dos

sentimentos também faz parte da cultura de uma pessoa.

A cultura é um fenômeno coletivo, pois se trata de comportamentos e

conhecimentos aprendidos em determinados grupos e categorias de pessoas, as

quais vivem num determinado local, no qual hábitos, conhecimentos e

comportamentos são compartilhados. O autor faz distinção entre grupo e categoria

de pessoas: de um grupo fazem parte as pessoas que têm contato umas com as

outras. De uma categoria fazem parte pessoas que têm pontos em comum, mas não

necessariamente têm contato umas com as outras. Essa distinção é relevante,

porque com isso se explicam comportamentos em determinados contextos sociais.

1 “Die Quellen unserer mentalen Programme liegen im sozialen Umfeld, in dem wir

aufgewachsen sind und unsere Lebenserfahrungen gesammelt haben.” (HOFSTEDE, 1993, p.17).

6

Por exemplo: nem todas as mulheres que nasceram no ano de 1960 são casadas,

têm filhos ou exercem uma profissão fora de casa. O conceito de uma programação

coletiva ‘des Geistes’ (aqui compreendido como um consenso coletivo) é baseado no

conceito de hábito desenvolvido pelo sociólogo francês Pierre Bordieu, para o qual

‘hábito’ é a prática de determinados comportamentos que realizamos sem

questionar. “Certos acontecimentos na existência humana geram um hábito; isso

quer dizer uma sistemática de disposições permanentes e transferíveis. Esse hábito

cria a base para ações e imaginações, as quais se orquestram sem necessidade de

própria regência.”2 (in, HOFSTEDE, 1993, p. 20) Tradução da pesquisadora.

Na primeira leitura pode parecer impróprio imaginar a cultura de uma pessoa

como alguma coisa programada; um programa pode nos remeter a uma máquina,

(que é algo logicamente programado para um determinado uso), pois isso parece

reduzir e limitar a criatividade humana. É como se fosse possível programar o

comportamento e as reações humanas; como se nós fôssemos um robô. No

entanto, ao longo da leitura, a sua teoria sobre cultura não demonstrou nada

reducionista; pelo contrário, ela reflete o comportamento de grupos culturais, as

intransigências humanas, o nosso comportamento diante do conhecido e do

estranho, o que conseguimos perceber quando interagimos com estranhos ou até

mesmo com pessoas que conhecemos. A cultura vista como uma programação

mental não significa que as pessoas reagem somente às programações culturais.

Pois, “o comportamento humano é apenas parcialmente pré-definido pelos

programas da mente: sempre existe a possibilidade de se desviar deles e reagir de

2 “Bestimmte Daseinszustände erzeugen einen Habitus, ein System permanenter und übertragbarer Dispositionen. Ein Habitus...dient als Basis für Praktiken und Vorstellungen, die sich ohne eigentlichen Dirigenten orchestrieren lassen.” (in, G. HOFSTEDE, p. 20).

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uma maneira nova, criativa, destrutiva ou inesperada.”3 (HOFSTEDE, p.18)

Tradução da pesquisadora.

A sócio-biologia, no campo da pesquisa, mostra que para alguns dos

comportamentos humanos são encontrados comportamentos equivalentes no

mundo animal (HOFSTEDE,1993, p.20). A interpretação de sentimentos como amor,

raiva, tristeza, ansiedade, insegurança e necessidade da companhia de semelhantes

são alguns exemplos desses sentimentos.

“A personalidade do indivíduo se baseia nas particularidades do seu caráter.

Este é em parte herdado por combinações singulares e individuais de genes e em

parte simplesmente adquirido.”4 (HOFSTEDE, (1993) p. 20) Tradução da

pesquisadora. Assim, personalidade e a cultura vão moldar o comportamento de

uma pessoa diante do estranho e do familiar, diante do previsível e do imprevisível.

Dessa maneira pode se concluir que cultura é o conjunto de conhecimentos

adquiridos por uma pessoa ao longo de sua vida, por meio do seu ambiente e suas

aprendizagens.

3 “Das Verhalten eines Menschen ist nur zum Teil durch seine mentalen Programme

vorbestimmt: er hat grundsätzlich die Möglichkeit, von ihnen abzuweichen und auf eine neue, kreative, destruktive oder unerwartete Weise zu reagieren.” (HOFSTEDE, p.18) .

4 “Persönlichkeit eines Individuums .gründet sich auf Charakterzüge, die teilweise durch die einmalige Kombination von Genen dieses Individuum ererbt und teilweise erlernt sind.” (HOFSTEDE, 1993, p. 20).

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1. 2 - MANIFESTAÇÕES CULTURAIS

Nenhuma cultura deve ser relativizada. Toda prática cultural é manifestação

viva de valores de uma sociedade. Comportamentos culturais são manifestações de

valores que têm suas práticas originadas em rituais, em figuras heróicas e em

símbolos. Portanto, “Antes de qualquer avaliação ou ação seria importante averiguar

profundamente o modo das diferenças culturais entre sociedades como também as

suas origens e as suas seqüelas.“5 (HOFSTEDE,1993, p.21) Tradução da

pesquisadora.

Símbolos são palavras, gestos, imagens ou objetos que têm um significado

para um determinado grupo cultural. Alguns exemplos de símbolos são: roupas,

bebida, música ou corte de cabelo etc. Esses símbolos têm geralmente uma vida

curta, pois são substituídos por outros. No entanto, existem símbolos que não são

passageiros, como por exemplo a cruz ou imagens de santos no catolicismo. Heróis

são pessoas vivas ou mortas, reais ou ficcionais, que têm seus valores

reconhecidos, seus comportamentos imitados e servem de modelo para

manifestação de comportamento. Os rituais são práticas individuais ou coletivas de

cunho social como: cumprimentos, o comportamento diante de outras pessoas

(hábitos sociais), cerimônias religiosas ou políticas.

Essas práticas comportamentais são facilmente reconhecíveis, no entanto

nem sempre ou dificilmente compreendidas. Pois a razão dessas práticas culturais

está nos valores que as movem: valores baseados em conceitos de bom e ruim, do

5 “Vor jeder Beurteilung oder Handlung sollte man sich über die Art der kulturellen Unterschiede zwischen Gesellschaften, sowie über ihre Ursprünge und Folgen informieren” (HOFSTEDE,1993, p.21).

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que é feio ou bonito, do sujo ou do limpo, do normal e do anormal, do lógico ou do

paradoxal, do racional e do irracional. O aprendizado de valores nem sempre é um

ato consciente. Estudos mostram que uma criança aos dez anos de idade já tem

grande parte desses valores firmados. Segundo HOFSTEDE (1993, p.33), “Para o

homem, muitos dos seus próprios valores não são conscientes, pois ele os adquiriu

muito cedo na sua vida. Conseqüentemente não são discutíveis e para os outros

não diretamente detectáveis.”6 Tradução da pesquisadora.

Cultura não é algo estático ou um pacote fechado, com um conteúdo

determinado e pronto para ser assimilado ou compreendido por uma pessoa. Cultura

é o conjunto de crenças, valores e conhecimentos, aceitos como um bem que

movem o comportamento, as ações e as reações das pessoas. São os

conhecimentos culturais de uma pessoa que a orientam em seus julgamentos. Não

existe uma só cultura numa sociedade ou país. Existem vários grupos culturais, que

interagem e dessas interações podem surgir mudanças significativas no

comportamento das pessoas. A cultura é, então, a soma desses valores, crenças e

comportamentos, baseados nos conhecimentos adquiridos ao longo da existência. A

bagagem cultural de uma pessoa vai também influenciar na sua compreensão de

mundo. Quanto maior for o contato entre as culturas, maior será a divulgação dos

diferentes conhecimentos e crenças. É também importante considerar que as

culturas não são homogêneas e estão em constante mudança.

6 “Viele der eigenen Werte sind dem betreffenden Menschen nicht bewuβt, weil er sie so früh

im Leben erworben hat. Man kann daher nicht über sie diskutieren, und für Auβenstehende sind sie nicht direkt wahrnehmbar” (in HOFSTEDE, 1993, p.33).

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As culturas têm várias origens; elas podem ser determinadas por regiões,

países, etnias, religiões, sexo, gerações, classes sociais ou grupos de trabalho.

Países são sociedades política e socialmente organizadas, mas seus membros

pertencem a grupos sociais diferentes. Elementos de identificação nacional de um

povo como a língua, a moeda o sistema escolar nem sempre integram as pessoas

culturalmente. A nacionalidade não é um dado suficiente para classificação cultural.

Por exemplo: um indígena, que nasceu e vive no Amazonas, e uma pessoa que

nasceu no Rio Grande do Sul ou uma pessoa que nasceu na Bahia são igualmente

brasileiros, mas isso não significa que eles têm a mesma cultura. No entanto, é

nesse contexto que surgem os estereótipos.

O Brasil é um bom exemplo de como os estereótipos são construídos.

Exemplos: todo brasileiro deveria ter, por via de regra, a pele morena, os cabelos

escuros e gostar de samba. O carnaval no Brasil é uma festa alegre e colorida, onde

todos brincam e dançam samba. E nós sabemos que isso não é verdade. Nem todos

os brasileiros têm essas características físicas ou o mesmo gosto por festas ou

músicas. O estereótipo do alemão no Brasil é outro exemplo: todo alemão, ao

contrário do brasileiro, tem pele e olhos claros, usa aquela roupa típica: calça de

couro curta com suspensórios, e gosta de tomar muita cerveja. No entanto: “Em

pesquisas a respeito de diferenças culturais, a nacionalidade – o passaporte – não é

um critério absoluto. Mas, freqüentemente se demonstra como o único critério

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utilizável para uma classificação.”7 (HOFSTEDE, 1993, p. 27) Tradução da

pesquisadora.

Esses estereótipos são instrumentos ideais para a reflexão sobre a cultura de

um povo. Com esses exemplos é possível perceber o grau das generalizações, pois

sabemos que nem todos os brasileiros têm aquelas características físicas, nem o

mesmo gosto por músicas ou festas. Não que essas imagens sejam falsas, mas

pessoas de uma mesma nacionalidade podem pertencer a grupos culturais distintos.

A cultura tem mais relação com idade, sexo, classe social, profissão ou geração.

Falar de cultura é falar de pessoas: onde elas vivem, como se relacionam,

quais são suas crenças, seu vestuário típico, como é o clima da região e o quanto

isso pode influenciar nos hábitos e até na profissão delas. Sabemos que elas têm

sexos e idades diferentes e que isso vai implicar comportamentos e interesses

diferentes. Sabemos também que elas pertencem a classes sociais diferentes, isso

significa profissões diferentes, oportunidades de formação diferentes. Com todas

essas diferenças não há como falar de uma só cultura, ou como determinar o quanto

cada item isoladamente contribui na formação de valores, nos hábitos, enfim, na

cultura das pessoas. A história política e social de cada povo irá contribuir na

formação de sua cultura. A história de uma nação vai influenciar na cultura de um

povo, pois a construção de valores se faz também historicamente. Pessoas de um

mesmo país desenvolvem estratégias de interesses comuns e coletivas para

trabalhar as relações de autoridade, a relação entre o indivíduo e a sociedade,

7 “Bei der Untersuchung kutureller Unterschiede ist deshalb die Saatsangehörigkeit – der

jeweilige Paβ – mit Vorsicht zu verwenden. Häufig ist sie aber das einzige brauchbare Kriterium für eine Klassifizierung” (HOFSTEDE, 1993, p.27).

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posturas para pessoas do sexo masculino e feminino, maneiras de resolver conflitos,

como trabalhar agressões e como os expressar sentimentos. Trata-se de estratégias

baseadas em valores de interesse individual e coletivo, que têm como objetivo

principal fixar regras de postura e estabelecer limites de comportamento.

Já que a cultura é manifestação de comportamentos que expressam

conhecimentos, crenças e costumes, a língua é o instrumento que auxilia/ possibilita

a comunicação entre as pessoas. Certamente ela não é o único instrumento da

comunicação, mas é, sem dúvida, um dos grandes instrumentos da comunicação

humana. Por essa razão a língua está no primeiro plano das relações humanas; e

ela será observada neste trabalho como um instrumento de comunicação entre as

pessoas. É com a língua que dizemos as nossas opiniões os nossos desejos.

Assim, a língua indiretamente espelha a nossa cultura. O interesse pelo

aprendizado de uma língua estrangeira é cada vez maior e as razões são várias;

elas vão desde motivações profissionais até os “hobbys”. Aprender uma língua

estrangeira pode ser uma ocupação prazerosa, que requer tempo e empenho, desde

que haja motivação para o seu estudo.

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CAPÍTULO 2

2. 1 - LÍNGUA E CULTURA

Os meios de comunicação, sobretudo a rede mundial de computadores,

permitem cada vez mais que as pessoas entrem em contato com outros povos,

outras culturas. A possibilidade de participar ou tomar conhecimento de

acontecimentos ou eventos em países distantes é cada vez maior. Poder se

comunicar ou interagir com pessoas de outros países e vice e versa oferece uma

troca de aprendizado constante e enriquecedora. Aqui, a língua é um dos maiores

agentes que possibilitam essa troca. É gratificante, nesses contatos, quando

podemos nos comunicar com as pessoas na língua delas, poder saber como elas

vivem e no que trabalham, quais são seus hábitos, como se divertem. No entanto:

“O encontro com outros conceitos de raciocinar e comportar tanto como a percepção de criações em culturas estranhas pode, sem dúvida, nos enriquecer. Porém, não raramente esse contato com o desconhecido cultural pode se tornar para nós problemático, porque põe em cheque o que para nós era evidente. Essa percepção estranha, pois, se torna em parte ou totalmente incompreensível ou até traz conflitos ou desentendimentos na convivência com os membros desta outra cultura.”8 (KNAPP e POTTHOF, 1990, p.62 - 63) Tradução da pesquisadora.

Esse confronto nos coloca diante de comportamentos e hábitos estranhos que

nem sempre conseguimos entender. Palavras ou gestos que para um determinado

8 Die Begegnung mit anderen Denk- und Verhaltensmustern und das Kennenlernen von

fremdkulturellen Schöpfungen können uns ohne Zweifel bereichern. Doch nicht selten kann der Kontakt mit kultureller Fremdheit für uns auch problematisch werden, indem sie das, was für uns selbstverständlich ist, infrage stellt, indem sie uns ganz oder teilweise unverständlich bleibt oder indem sie zu Miβverständnissen, gar zu Konflikten im Umgang mit Angehörigen der anderen Kultur führt.( Karlfried Knapp - Annelie Knapp – Potthoff, Interkulturelle Kommunikation, S.62/3).

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grupo cultural são um enunciado (BAKHTIN / VOLOSHINOV, 1995, Língua, Fala e

Enunciação) para outro podem causar estranhamento, uma vez que pessoas podem

ter seus comportamentos ditados por outros valores e por uma outra cultura. O

estranho pode criar conflitos e desentendimentos que os conhecimentos lingüísticos

não são suficientes para esclarecer. Esse tipo de problema é comum não somente

entre pessoas de países diferentes, isso é comum dentro do país.

A língua é um instrumento de comunicação que anda sempre de mãos dadas

com a cultura, mas nem sempre a língua é suficiente para esclarecer

desentendimentos de comunicação. Porque, geralmente, os conflitos de

comunicação entre pessoas de grupos culturais diferentes estão na cultura e não na

língua. Os elementos estranhos estão na linguagem extra-verbal, são

comportamentos ditados por outros valores que, muitas vezes, o interlocutor

desconhece. Como extra-verbal entende-se a entonação da voz, a linguagem

corporal ou o uso de expressões lingüísticas, pois esses são conhecimentos que

pessoas de uma mesma cultura dividem e que nem sempre tem consciência desse

fenômeno, (KNAPP et. al. 1990, p. 67).

Um exemplo de linguagem extra-verbal pode ser encontrado no filme

“Encontros e Desencontros”, de Sofia Coppola. Os dois protagonistas do filme são

americanos e não falam japonês; estão em Tóquio e hospedados no mesmo hotel.

Uma dessas personagens é um ator veterano que veio fazer uma propaganda de

uísque americano em Tóquio, seu nome é Bobby Harris, interpretado pelo ator Bill

Murray. Durante o trabalho, Bobby está sempre acompanhado por uma intérprete

que faz a mediação verbal (tradução dos idiomas) entre ele o diretor das filmagens.

Essa mediação apresenta-se confusa, dando a impressão ao expectador de que ator

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e diretor não estão sendo bem compreendidos um pelo outro por meio da intérprete.

No final das contas, quando ambos não conseguem se fazer entender (mesmo com

a ajuda da tradutora), é a linguagem corporal que resolve os problemas de

comunicação. Essa linguagem corporal é baseada no conhecimento de mundo

comum aos dois, e em símbolos feitos por sinais de mão e referências a

personagens de outros filmes conhecidas por ator e diretor; deve se frisar que eles

só se entenderam por já conhecerem os sinais segundo KNAPP, et. all. (1990, p.72).

Fica a impressão, no expectador, de que a intérprete não consegue fazer uma leitura

adequada do contexto (sócio) cultural que deve traduzir, ou melhor, ela não domina

o vocabulário desse meio. A sua tradução aparenta não dar conta de transpor todas

as informações que foram anteriormente dadas. A tarefa de mediar uma

comunicação entre duas línguas não é simples, porém possível desde que se tenha

conhecimento suficiente e consciência da relação entre cultura e língua. Ou seja, só

o conhecimento lingüístico não é suficiente para sustentar uma comunicação entre

pessoas de diferentes culturas.

Um trabalho intercultural pode ajudar a conscientização das diferenças

culturais. Ele vai procurar mostrar que existem várias culturas. Reconhecer a

diversidade cultural é o primeiro passo. Reconhecer que por de traz de cada cultura

existem valores que nem sempre podem ser compreendidos, mas que devem ser

tolerados. Pois só assim passaremos a ser mais tolerantes diante de situações

estranhas ou que não conseguimos compreender. Isso é também uma atitude de

reconhecimento das nossas limitações. Se o contato entre pessoas de culturas

diferentes é cada vez maior, vamos ter cada vez mais de aprender a conviver e

respeitar o estranho. Interculturalidade é também aquilo que não conseguimos

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compreender; é ir além da nossa programação mental para aceitar o desconhecido.

É, ao perceber o estranho, olhar para particularidades da própria cultura e conseguir

perceber que, se para mim o outro é o estranho, o mesmo deve acontecer com ele.

Só que daí o estranho sou eu. A principal relevância do estudo intercultural é a

conscientização da diversidade cultural, é aprender perceber e sentir as diferenças.

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2.2 - COMUNICAÇÃO INTERCULTURAL

Por comunicação entende-se uma interação interpessoal mediada por

códigos lingüísticos verbais e não verbais. A comunicação intercultural também é

uma interação interpessoal, só que entre pessoas de culturas diferentes, isto é,

pessoas que pertencem a diferentes grupos culturais. Segundo KNAPP et. al. em

“Comunicação Intercultural”, existem dois tipos bem definidos de comunicação, um é

chamado de comunicação intercultural e outro de comunicação intracultural.

Na comunicação intracultural os interlocutores pertencem a grupos culturais

diferentes, mas são pessoas que têm a mesma língua materna, a mesma

nacionalidade. Isso significa que, mesmo pertencendo a grupos culturais diferentes,

eles dividem um número considerável de conhecimentos extra-lingüísticos. Isso não

significa que exista uma perfeita compreensão das diferenças culturais entre os

interlocutores e que os conhecimentos lingüísticos sejam suficientes para esclarecer

possíveis conflitos e estranhamentos. Mas os problemas de comunicação que

possam ser observados nessas interações são classificados como intraculturais.

Pessoas que pertencem a um mesmo grupo cultural mesmo quando se

comunicam em uma língua estrangeira, que não seja um dialeto da sua, conseguem

fazer um uso bem maior de códigos extra-verbais. Elas fazem uso de conhecimentos

extra-lingüísticos que compartilham com naturalidade e, na maioria das vezes, nem

se dão conta desse fenômeno. Muitas coisas não são ditas, e nem precisam ser

ditas, elas estão pressupostas no diálogo. Esses conhecimentos facilitam a

comunicação, uma vez que a compressão de um enunciado está além da língua.

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Já na comunicação entre pessoas de língua e cultura diferentes essa

comunicação se dá, a princípio, por meio dos conhecimentos lingüísticos. Os

recursos da linguagem extra-verbal são bem mais reduzidos. As pessoas não

dividem os mesmos conhecimentos culturais, por vezes, as diferenças culturais são

tão grandes que eles não têm condições de compreender ou até mesmo de

perceber determinados comportamentos. Em uma comunicação intercultural o

diálogo tem de ser, com freqüência, interrompido para se esclarecer um conceito,

um gesto ou uma palavra que pode ter mais de um significado lexical ou

dependendo do contexto um outro significado. Os problemas surgem quando um

dos interlocutores pressupõe conhecimentos culturais que o outro não tem. E é

nesse momento que os estereótipos ganham espaços, pois toda pessoa só pode

fazer julgamentos e conclusões baseados no seu conhecimento de mundo. Em toda

comunicação existe o risco de acontecerem falhas de compreensão; no entanto, na

comunicação intercultural esse risco é bem maior. Esses problemas ocorrem por

causa das diferenças culturais, dos conhecimentos extra-lingüísticos.

Um exemplo que pode ilustrar uma situação de comunicação intra e

intercultural e algum conflito nela ocorreu em uma cerimônia de formatura, curso de

Letras da Universidade Federal do Paraná, ano 2005. Como é de costume, os

formandos fazem uma homenagem aos seus professores, com apresentação de

discurso dirigido aos mestres e posterior entrega de “lembrança”, ou presente, aos

mesmos. Na ocasião, após o discurso, onde se fazia uma alusão ao professor bravo,

foram entregues maçãs aos professores, sem, no entanto, fazer qualquer menção

verbal ou escrita ao significado do ato. Ora, para nós brasileiros está implícito no ato

de dar uma maçã ao professor um agrado, um afago ao mestre. Acontece que na tal

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cerimônia, entre os professores que receberam a maçã, estava uma alemã, que tem

total fluência em português. Mesmo lecionando em universidade brasileira e tendo

fluência no idioma, ela não compreendeu o significado do ato. Isso pôde ser

observado após a cerimônia, quando a mesma comentou se a entrega das maçãs e

a fruta por si remeteriam a algo como origem do mundo, Adão e Eva, ou outra coisa

do gênero, pois ela não havia compreendido muito bem o porquê de os formandos

haverem entregado tal fruta aos professores homenageados. Com esse exemplo

podemos perceber uma clara situação na qual um simples gesto tão enraizado na

nossa cultura e de significado claro para nós pode ser tão estranho à outra cultura,

mesmo quando todas as partes envolvidas possuem plenos conhecimentos da

língua comum utilizada. Estar preparado para se relacionar com o estranho faz parte

do aprendizado de uma língua estrangeira.

A avaliação do material bibliográfico mostra o quanto é importante o professor

de língua estrangeira refletir sobre cultura/ culturas. E não somente sobre a cultura

da língua que ensina, mas também sobre a cultura dos seus alunos. É o professor

que vai mediar o confronto entre a cultura de seus alunos e aspectos culturais da

língua alvo. É ele que vai apresentar/ ensinar aos seus alunos essa língua estranha,

falada por pessoas estranhas e que têm outros hábitos, outros comportamentos.

Comportamentos esses que muitas vezes são difíceis para os alunos compreender.

Esse confronto com o desconhecido pode provocar nos alunos atração ou, por

vezes, um medo que pode bloquear uma “aprendizagem prazerosa”, (CORACINI,

2003, p.124). Por isso, o professor deve estar apto para auxiliar seus alunos a

estabelecer uma relação de diálogo entre as culturas, assim o aprendizado da língua

estrangeira será também um instrumento para a construção de significados.

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CAPÍTULO – 3

3. 1 - O LIVRO DIDÁTICO E A DIDÁTICA INTERCULTURAL

Um elemento de grande relevância no ensino/ aprendizagem de LEM é o

material didático utilizado, como o livro didático, que orienta e auxilia tanto o

professor quanto o aluno. No entanto, o livro didático pode ter um significado bem

maior, pois ele é, na grande maioria das vezes, o primeiro contato mais concreto que

o aluno tem com a língua que se propôs a estudar. É com as informações contidas

no livro didático que o aluno vai formar suas primeiras impressões sobre a língua

estrangeira e sobre aspectos culturais das pessoas que falam essa língua. Todas as

informações contidas no livro didático fazem direta ou indiretamente referências aos

falantes da língua. O livro didático é, desta forma, um mediador cultural. Assim,

avaliar um material didático significa observar criteriosamente “qual a visão de

mundo/ aspectos culturais que ele apresenta” (AMATO, 2005, p. 44). Os livros

didáticos são instrumentos de ajuda e suporte no ensino e na aprendizagem. Por

isso eles devem merecer uma boa dose de atenção, sobre tudo dos professores,

que, como profissionais, devem estar aptos para interpretar seus conteúdos e avaliar

esse material de suporte.

No entanto, apesar de os livros didáticos serem elaborados por profissionais

experientes (pré-suposto) e capacitados que refletem sobre a língua, esses

profissionais fazem suas escolhas de conteúdos e método que vão utilizar baseados

na sua cultura. Dessa forma, os livros didáticos trazem marcas culturais dos seus

autores.

21

Os livros didáticos mais recentes normalmente definem como meta do ensino

entender, fazer-se entender, desenvolver a flexibilidade lingüística e a competência

comunicativa. Para atingir essas metas, a didática comunicativa parte de modelos de

comunicação do dia a dia entre os usuários e suas respectivas línguas mães.

Porém, segundo Bachmann, S. et. al. (1996), em “Tarefas e tipologia de exercícios

para a aprendizagem intercultural” (Aufgaben – und Übungstypologie zum

interkulturellen Lernen), para a didática intercultural os modelos da comunicação dia

a dia não são simplesmente transferíveis para uma situação lingüística intercultural;

pois o conhecimento específico da língua mãe não é suficiente para a outra língua/

cultura. E, numa comunicação bem sucedida, a aprendizagem intercultural não se

esgota em geografia contrastiva.

Segundo KNAPP, et. al. (1990, p. 67), a comunicação intercultural acontece

de maneira diferente que a comunicação entre falantes da mesma cultura, pois

esses se referem implicitamente a conhecimentos culturais iguais, que são o sistema

identificatório da mesma cultura e dos programas de comportamentos. Cada usuário

da língua mãe como falante, ouvinte ou leitor é possivelmente capaz de uma

interpretação correta de espaços livres ou contextos extra-verbais que a cultura

específica oferece. Já como falantes, leitores ou ouvintes de outras culturas faltam

para eles conhecimentos culturais para esse tipo de interpretação. E a falta desses

conhecimentos gera lacunas nas interpretações e nos julgamentos, o que pode

causar desentendimentos e até provocar aversões. Muita coisa pode ser aprendida

sobre a cultura da língua-alvo, mas não é possível aprender tudo; mesmo porque

nas aulas só é possível trabalhar com alguns exemplos. Por isso, para os autores

citados no parágrafo anterior, as principais metas de aprendizagem da didática

22

intercultural são: “capacidade de se orientar na cultura estranha e a capacidade de

se comportar lingüisticamente adequada numa situação intercultural”.

Para desenvolver a capacidade prática dessas habilidades devem ser

gerados certos processos de conscientização. As aulas de língua estrangeira devem

proporcionar aos alunos a oportunidade de refletir sobre as premissas de suas

interpretações e julgamentos; segundo BACHMANN, et. al. (1996, p.17), essas

premissas ou critérios estão na sua própria cultura. Pois são os conhecimentos

culturais que regulam e orientam na percepção e interpretação da realidade

estrangeira. Com as atividades de conscientização, os alunos devem desenvolver a

percepção para concepção de mundo de sua língua e cultura, e que a cultura deles

é só mais uma de muitas possíveis. A didática intercultural propõe um aprendizado

para além das fronteiras culturais, isto é, aprender a se comunicar mesmo quando

não é possível entender tudo daquilo que foi dito, visto ou lido.

23

3.2 – APRESENTAÇÃO DO MATERIAL DIDÁTICO

O Material didático “Tangram” existe no mercado desde a década de noventa

e foi usado em Curitiba por instituições como Instituto Goethe, Centro Europeu e no

CELEM do Colégio Estadual do Paraná (em algumas dessas instituições ele ainda é

usado). Trata-se de um material didático elaborado para jovens e adultos. O material

completo é composto por quatro volumes, contendo seis lições em cada um deles. O

livro de atividades está contido em cada volume, e os CDs para acompanharem as

atividades auditivas têm de ser adquiridos separadamente.

Para esse trabalho será usado o primeiro livro do material “Tangram aktuell”,

que faz parte das edições reelaboradas do material “Tangram”. A unidade re-

elaborada apresenta algumas alterações nas unidades temáticas, mas a principal

alteração foi na distribuição do número de lições em cada volume. O material re-

elaborado “Tangram aktuell” é composto de seis livros-texto, sendo que em cada

livro-texto também há livro de exercícios. Os CDs que fazem parte das atividades

auditivas do livro-texto têm de ser adquiridos separadamente. Já os CDs das

atividades do livro de exercício acompanham o livro, isso é, não precisam ser

comprados separadamente.

Segundo a apresentação do material “Tangram aktuell” (volume 1,) no próprio

livro didático, a sua elaboração segue os objetivos de ensino de língua estrangeira

sugeridos pelo Quadro Comum Europeu, ou seja: desenvolver as competências e

habilidades comunicativas no aprendiz. Essa foi a principal razão da escolha desse

livro para desenvolver essa parte do trabalho.

24

O Quadro Comum Europeu é um documento oficial, de caráter não dogmático

para o ensino de língua estrangeira, elaborado por cientistas da educação da União

Européia. Um dos objetivos desse documento é intensificar “uma comunicação

internacional realmente efetiva, levando em conta a identidade e as diferenças

culturais” (AMATO, 2005, pág. 36) dos aprendizes de língua estrangeira. Para levar

em conta a identidade e as diferenças culturais é necessário que os conteúdos ou as

unidades temáticas proporcionem a oportunidade de os alunos reconhecerem e

interpretarem aspectos culturais, além de dar a eles a oportunidade de falar sobre

hábitos e comportamentos. Certamente esse é um trabalho que vai além do livro

didático, e é neste momento que “o trabalho de um mediador é necessário para que

alguns aspectos da cultura estrangeira sejam ressaltados, para que haja uma

confrontação, e, assim, o aprendiz poderá agir como transmissor de sua própria

cultura.” (AMATO, 2005, pág. 53).

25

3.3 – FIGURAS E FOTOS NA DIDÁTICA INTERCULTURAL

Essa parte do trabalho será feita por amostragem. Para tanto, foram

escolhidas certas páginas, fotos ou figuras que ilustram e orientam algumas das

atividades do livro didático. A livre escolha parte do princípio de que o material

ilustrativo tem a função de trazer informações, despertar percepções ou interesses,

facilitar livres associações, comentários ou atividades propostas no livro. A parte

essencial na descrição livre de figuras ou fotos, segundo BACHMANN, et. al. (1996,

p. 12), é a variedade de comentários e interpretações que elas podem despertar

nos alunos. O resultado de uma atividade que pede para somente descrever uma

figura mostra que somos incapazes de descrevê-la sem ao mesmo tempo interpretá-

la, e que fazemos isso baseados nas nossas categorias de valores.

Um aspecto relevante observado no livro didático escolhido são os tipos de

ilustrações. A grande maioria das ilustrações e personagens do livro-texto são

figuras de desenho; existem poucas fotos autênticas de pessoas ou lugares. O

mesmo acontece com música ou textos literários. Uma ilustração pode ser

interpretada como uma maneira de se evitar a construção dos estereótipos. Para

BACHMANN, et. al. (1996, p. 12), a atividade de descrever e interpretar figuras é

uma das melhores maneiras para se reconhecer aspectos culturais, e assim refletir

sobre a escala de valores que orientaram as interpretações.

26

A página 1 do livro-texto (Figura 1) tem como tema cumprimentos formal e

informal. Ela traz como pano de fundo uma foto do aeroporto internacional de

Frankfurt. As personagens desta página estão chegando à cidade por via aérea;

uma delas é recepcionada por amigos e a outra é esperada por uma pessoa

desconhecida. Essas personagens vão reaparecer ao longo das lições. O aeroporto

é a porta de entrada na Alemanha - uma porta imponente, pois o avião não é um

meio de transporte comum e utilizado pela maioria dos brasileiros. A ambientação

dessa página é facilmente reconhecida e interpretada pelos alunos, porque para nós

FIGURA 1

27

seria esse o meio de transporte apropriado para viajar não só à Alemanha, mas a

qualquer país europeu.

Uma aula que tenha também o objetivo de trabalhar cultura é de grande

importância a descrição de figuras (como a feita acima), conforme informações em

“descrição de figuras”, BACHMANN, et. al. (1996, p.13); uma vez que essas

descrições são acompanhadas de interpretações.

Os itens apresentações e cumprimentos desta página, no entanto, deixam

lacunas quanto ao uso real da formalidade ou informalidade nos cumprimentos ou

tratamentos entre as pessoas. O uso do tratamento formal ou informal é definido

culturalmente; à primeira vista parece bastante compreensível para a maioria das

pessoas que as formas de cumprimentos e tratamentos variam de uma cultura para

outra, segundo KNAPP et. al. (1990, p.66). No entanto, nem sempre são oferecidas

oportunidades para o aprendiz de uma língua estrangeira refletir sobre a real

importância das formas de tratamento. Esse é mais um dos itens que faz parte do

conhecimento extra-verbal. Cumprimentos dão início a uma comunicação verbal, e

dirigir-se a uma pessoa de forma inadequada pode provocar interpretações

equivocadas, mal-endentidos ou, segundo BACHMANN, et. al. (1996, p.13), reforçar

pré-conceitos construídos por meio de estereótipos.

Existem sociedades que usam o tratamento formal também entre os

familiares, na qual é usual chamar os pais, avós ou tios de senhor ou senhora. A

formalidade neste caso é uma questão de respeito às pessoas mais velhas. Na

cultura alemã não existe o uso do tratamento formal entre familiares ou parentes,

isso não significa que não exista respeito às pessoas mais velhas. O uso do

28

tratamento formal não é somente uma marca de posição social ou respeito à idade,

ele pode ser o registro formal de um distanciamento que marca os limites de

intimidade entre as pessoas. No entanto, a recepção das pessoas que chegam ao

aeroporto não oferece a oportunidade suficiente, ao aluno, de interpretar outras

formas de tratamento entre os usuários daquela língua.

A atividade proposta na Figura 2 é orientada e ilustrada com fotos que tentam

explicar e resumir formas de apresentações e tratamento entre as pessoas. Usa-se

o formal e cordial em apresentações e formas de tratamento entre pessoas mais

velhas, e o informal entre jovens. A explicação que consta na Figura 2 é a seguinte:

formal + cordial: “Sr. e Sra.”; familiares, amigos e crianças: “você”. Trata-se de uma

simplificação que desconsidera as possíveis formas de tratamento entre as pessoas

e pode deixar lacunas de compreensão do uso da formalidade para os alunos de

alemão como língua estrangeira. As atividades escritas de completar o diálogo (na

FIGURA 2

29

Figura 2) são para as duas formas de apresentação: formal e informal. Já as fotos

da Figura 2 resumem as formas de tratamento, como se em todas as culturas fosse

normal o uso da informalidade entre os familiares. Também para KNAPP et. al.

(1990, p.67), a interpretação de comportamentos não compreendidos pode ainda

reforçar o julgamento dos estereótipos, dificultando, assim, a interação entre falantes

de culturas diferentes. As formas de tratamento fazem parte dos conhecimentos

extra-verbais entre falantes de uma mesma cultura, conhecimentos esses facilmente

transferidos para as comunicações interculturais.

O tratamento formal neste material didático merece destaque, uma vez que

na maioria das atividades dos livros os comandos são formais, e nas sugestões das

atividades orais também o são. Isto é, os alunos são tratados formalmente. Mas,

como foi observado, as informações das Figuras 1 e 2 não são suficientes para o

aluno compreender o uso da formalidade na outra cultura. Segundo KNAPP et. al.

(1990, p. 28), cumprimentos e tratamentos fazem parte dos conhecimentos extra-

linqüísticos e, portanto, precisam ser refletidos, trabalhados e até comparados no

aprendizado de uma língua estrangeira.

30

De onde o senhor/ a senhora vem?

FIGURA 3

31

A página 5 do livro-texto (Figura 3) traz no centro uma foto de uma sala de

aula, com alunos que vêm de países diferentes. A atividade proposta é a de os

alunos perguntarem e responderem uns aos outros de onde vêm. A parte superior

da página tem como pano de fundo o mapa dos continentes, na qual serão escritos

os países de cada continente. As atividades acabam por se transformar em uma

bela e descontraída aula de geografia, o que mostra também como, segundo

JANZEN (2002, p. 138), por meio do aprendizado de uma língua estrangeira se

constroem conhecimentos.

Essa é uma atividade que proporciona possibilidades de se trabalhar

aspectos culturais dentro da sala de aula. Pois o aluno tem a possibilidade de

reconhecer e interpretar situações possíveis ou imagináveis. Com essa atividade, o

aluno pode até julgar a importância desse conhecimento para o seu aprendizado.

Por exemplo, qual é a importância de eu saber como se pronunciam esses países

em alemão. Além disso, essa atividade pode ser estendida e adaptada para o

contexto dos alunos, que muitas vezes vêm de cidades ou estados diferentes. E,

quando o conteúdo informativo do material didático pode ser ajustado ou modificado

às necessidades ou ao contexto do aluno, esse material didático é “suporte e não

mais o ponto central da aula” (AMATO, 2005, p. 46).

A Figura 4 pode ser interpretada como uma extensão da Figura 3: ambas

possuem ambiente e algumas pessoas em comum. Na Figura 4 é possível ver,

avaliar e até julgar a qualidade da aula pelos instrumentos disponíveis como:

televisor, aparelhos de multimídia, mapas, número e idade dos alunos. A atividade

proposta nesta Figura é dar continuação à anterior. Com essa atividade, os alunos

32

dão informações pessoais sobre eles, tais como: estado civil, idade, se têm ou não

filhos, onde e quando nasceram, qual é a língua materna etc.

A atividade proposta na Figura 4, a princípio, pode parecer simples; no

entanto é significativa, pois dá a oportunidade para principiantes falarem e

fornecerem dados sobre sua origem, sua língua, sua idade e estado civil, e, assim,

situá-los culturalmente. Dessa forma, desde o início do curso, o aluno pode usar a

língua estrangeira para falar de si. Ele tem uma nacionalidade, uma língua e uma

cultura. Mesmo que as diferenças culturais ainda não estejam evidentes, este

momento pode ser o início da percepção e reconhecimento das diferenças culturais.

FIGURA 4

33

Falar sobre aspectos culturais em aula de língua estrangeira é também, e

principalmente, ter a oportunidade de falar, na língua estrangeira, sobre o país onde

nascemos. Mais uma vez, temos, segundo MENDES, 2002, in AMATO, 2005, p. 46,

conteúdos mediados por imagens e pela língua; conteúdo esse que pode ser

codificado e que apóia a recriação de conteúdos significativos para o aluno.

Outro aspecto cultural relevante no ensino/ aprendizado da língua estrangeira

são as festividades e datas comemorativas, um item que é, com freqüência,

negligenciado nos materiais didáticos. A atividade que tem por objetivo ensinar ou

memorizar os números de zero a dez pode, como a sugerida na Figura 5, despertar

no aluno reflexões sobre a passagem de ano na sua cultura: se essa data é motivo

de comemoração; se o é, como ela é comemorada; se é festejada em família, com

os amigos, com fogos de artifício; se é feita a contagem regressiva ou não. O aluno

tem, ainda, possibilidade de comentar em quais ocasiões, na sua cultura, é feita a

contagem regressiva de dez a zero.

FIGURA 5

34

Uma figura que provoque reflexões ou que desperte curiosidades no aluno

pode ser o início de novas descobertas e aprendizados. Descobertas e

aprendizados esses que podem auxiliar na compreensão não só de comportamentos

na cultura da língua alvo, mas também no reconhecimento de aspectos culturais da

língua materna, segundo BACHMANN, et. al. (1996, p. 11), em “aprendizagem da

percepção” - Wahrnehmungsschulung.

Números podem revelar qualidade de vida da população de um país quando

relacionados com o valor da moeda ou com o poder de consumo. Unidades

temáticas que incluem o valor de troca de moedas permitem ao aluno comparar e

formar opiniões sobre o seu poder de compra em relação a uma ou a outra moeda.

Esse tipo de unidade temática pode ser exemplificado com a Figura 6.

Quais são os tipos de julgamentos que podem surgir, quando se percebe que

o valor de compra da minha moeda é superior ou inferior à outra - é o valor do

trabalho ou o valor dos bens que são julgados.

35

No ensino/ aprendizagem de língua estrangeira, os números são significativos

quando associados com temas que trazem informações; pois permitem

comparações e, principalmente, provocam reflexões sobre os temas abordados.

Mas, para que isso aconteça, são necessárias informações que possibilitem

desenvolver interpretações sobre a moeda, o valor do trabalho, os bens de consumo

ou as necessidades de sobrevivência. Caso contrário, não existe uma aproximação

das realidades; e os números deixam de ser elementos que auxiliam “a ampliação

dos horizontes constitutivos de sentido do aluno” (JANZEN, 2002, p.138).

FIGURA 6

36

A densidade demográfica de uma cidade ou país pode ser outro elemento

significativo para se trabalhar interculturalidade. A relação pessoa e espaço físico,

quando aliada a certos comportamentos, revela regras para o uso de espaços

comuns ou privados; revela também outros comportamentos que nem sempre são

facilmente compreendidos, tais como: as leis do silêncio, a importância ou o uso de

parques ou praças, o tratamento que dado para o lixo etc.

Informações sobre o país da língua alvo, como as contidas na Figura 7,

oferecem a oportunidade de falar sobre o país do aluno e dão a oportunidade, se

não no momento, mas no futuro próximo, de interpretar ou aceitar melhor algumas

diferenças. Essas diferenças também são, muitas vezes, o resultado do espaço

físico que as pessoas dividem. Informações desse tipo podem servir ao aluno como

parâmetro para análise e interpretação de comportamentos, segundo BACHMANN

et. al. (1996, p.12).

FIGURA 7

37

Alimentação: locais, lanches e cardápios.

A Figura 8 é sugestiva porque traz informações sobre um local onde é

possível encontrar amigos e fazer um lanche. A foto da Figura 8 (autêntica), no

canto superior da página, mostra pessoas descontraídas, sentadas junto às mesas,

FIGURA 8

38

em frente ao que poderíamos chamar de lanchonete. Mas, pelo cardápio do local:

“Ricks´s Café”, que também se encontra na Figura 8, é possível perceber as

diferenças entre esse local e uma lanchonete no Brasil, por exemplo. Os tipos de

alimentos oferecidos pelo “Ricks´s Café” e o preço deles no cardápio são, quase que

automaticamente, interpretados, avaliados, comparados e questionados pelos

alunos. Isto é: segundo BACHMANN, et. al. (1996, p. 14), figuras são instrumentos

ideais para o trabalho que objetiva reconhecer hábitos culturais e gerar processos de

conscientização.

A atividade para fixar as estruturas de frases e o vocabulário da Figura 8

permitem ao aluno reconhecer e interpretar formas de tratamento nestes locais,

além de fazer escolhas, conforme seu paladar ou hábitos alimentares - como é

possível conferir na Figura 9.

FIGURA 9

39

Com o objetivo de trabalhar vocabulário de alimentos, a Figura 10 traz uma

propaganda de ofertas em um supermercado.

FIGURA 10

40

A propaganda da Figura 10 pode não ser autêntica (ou seja: não verídica,

apenas um exemplo criado para o livro), mas a sua semelhança com propagandas

de ofertas de supermercados é grande. Isso é suficiente para torná-la atrativa.

Descobrir como é nome dos produtos em alemão é questão de reconhecimento do

produto na foto (da Figura 10). Avaliar esses produtos, o seu consumo, sua origem

ou o preço deles sugerido nas ofertas acaba sendo uma conseqüência da atividade

proposta na Figura 10. As propagandas são informações que permitem

interpretações e sugerem, com freqüência, comparações ou avaliações entre

produtos, preços e consumidores.

Além disso, sabemos que trabalhos de propaganda não são simples

especulações de mercado. Pois, por detrás da propaganda existe um estudo de

mercado e consumo e de uma linguagem apropriada para esse mercado. Pelas

propagandas é possível, com freqüência, avaliar hábitos culturais de determinados

grupos de pessoas. Ninguém vai fazer propaganda de ovo de Páscoa em outubro,

nem tampouco de presentes para as mães depois do mês de maio. Panfletos de

propagandas podem tornar-se um material de apoio interessante para trabalhar

cultura em sala de aula. Pois eles são facilmente descritos e (emocionalmente)

interpretados. Segundo BACHMANN, et. al. (1996, p. 13), uma mesma figura pode,

ao ser descrita em uma atividade em sala de aula, ter várias leituras.

41

“Falem sobre a figura: onde a gente encontra...?”

Essas são as primeiras atividades sugeridas na Figura 11 - uma sugestão de

reconhecimento do ambiente e de onde podem ser encontrados os diferentes

produtos em um supermercado.

Apesar dos nomes estranhos não é difícil, para o aluno, reconhecer e falar

sobre esse ambiente: um supermercado. Trabalhar com unidades temáticas fornece

instrumentos para uma aula comunicativa, e figuras como a esta servem também

para reconhecer hábitos de consumo e de comportamentos. Talvez perguntas

pertinentes nesse momento sejam: que tipo de produtos podem ser encontrados nos

nossos supermercados? Como são distribuídos esses produtos dentro desses

estabelecimentos? As respostas podem revelar hábitos alimentares e de

comportamentos antes não refletidos. O que comemos e quando comemos são

FIGURA 11

42

também hábitos determinados culturalmente. Conforme HOFSTEDE, G., (1993,

p.21), descrever e interpretar figuras e falar sobre impressões que elas causam ou

sensações que elas nos provocam é revelar a nossa cultura; é também refletir sobre

os nossos valores.

Adivinhem que tipo de produto existe em uma loja de especiarias?

Uma loja de especiarias vai, facilmente, despertar a curiosidade, pois não é

um lugar visitado com freqüência pela maioria das pessoas. A pergunta sugerida

para a atividade da Figura 12 “Adivinhem que tipo de produto existe em uma loja de

especiarias?” é apropriada para um trabalho cultural, porque dá a oportunidade ao

aluno não só de trabalhar o vocabulário e algumas estruturas de frases, mas

também de reconhecer o que é uma loja de especiarias, que produtos são ofertados

FIGURA 12

43

nesses estabelecimentos e de fazer suposições sobre os seus consumidores. É

interessante pensar sobre o que leva uma pessoa a consumir produtos artesanais,

especiais ou importados.

Desta forma, as associações livres que surgirem desta tarefa não serão

somente uma maneira para trabalhar o vocabulário. Segundo BACHMANN, et. al.

(1996, p.12), a parte essencial desse tipo de atividade é a qualidade dos

comentários e reconhecimentos que dela vão surgir, comentários esses que são

interpretações ativas de valores culturalmente determinados.

44

Eletrodomésticos

Na Figura 13, os dados estatísticos fornecem algumas informações sobre

como estão equipadas as residências na Alemanha. O título “Haushaltsgeräte” -

aparelhos domésticos - inclui o carro, a bicicleta e o laptop, como pode se ver. A

atividade oral sugerida é fazer comparações com outros países. Uma atividade que

sugere comparações para trabalhar porcentagem pode e deve ser repensada em

uma proposta para uma aula intercultural. Novamente estamos trabalhando com

números; números esses que fornecem informações sobre consumo e até sobre o

status das pessoas. Refere-se aqui a status, pois, para muitas pessoas, carro,

computador ou alguns tipos ou modelos de eletrodomésticos nem sempre são só um

instrumento de trabalho ou lazer. Objetos de consumo revelam também valores

FIGURA 13

45

culturalmente atribuídos a bens materiais. Se adequadamente direcionado, o

conteúdo informativo da Figura 13 pode refletir a importância que esses bens

materiais têm na cultura do aluno e podem, eventualmente, ter na cultura dos

falantes da língua alemã.

Objetos usados

“Leiam os anúncios! O que os senhores podem comprar?” são as primeiras

frases de comando da Figura 14. Essa Figura, para nós brasileiros, nos remete aos

anúncios “classificados” - espaços em jornal nos quais encontramos anúncios de

compra e venda. A Figura 14 remete também ao comércio informal de produtos, que

FIGURA 14

46

está bastante disseminado nos meios de comunicação. Assim, ela revela o

comportamento de consumidores que buscam oportunidades de adquirir

mercadorias por preços mais acessíveis. Segundo informações contidas no livro

didático, “Tangram 1 A - Arbeitsbuch, p. 46”, “Inserat” é um jornal específico de

anúncios para compra e venda de objetos usados. Assim, a atividade sugerida no

livro (Figura 14) mostra um tipo de comportamento que acontece em lugares e

culturas diferentes. Ter a oportunidade de trabalhar com esses comportamentos é

utilizar-se do aprendizado de uma língua estrangeira para, segundo JANZEN (2002,

p. 138), construir conhecimentos.

47

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho de pesquisa mostrou o quanto é necessário ao professor refletir

sobre os conceitos de cultura para poder desenvolver um trabalho com língua

estrangeira.

Pois, além do aprendizado da língua propriamente dito, lecionar um idioma

estrangeiro é também oferecer ao aluno a oportunidade para reconhecer

comportamentos culturais, motivando-o a interpretar tais comportamentos. Assim, o

aluno compara as culturas, identificando e repensando a sua própria.

Ensinar uma língua estrangeira é, ainda, tornar o aluno apto a perceber que

nem tudo é possível de se aprender em sala de aula; e, por maior que seja a

dedicação e o empenho tanto dele quanto do professor, não é possível aprender

tudo ou entender tudo sobre o comportamento dos usuários da língua estrangeira.

Aprender uma língua estrangeira é aprender a desenvolver um olhar crítico

para a diversidade cultural. Trata-se de aprender que a diversidade cultural é um

fenômeno que existe também dentro de um país entre usuários de uma mesma

língua. A proposta de ensino intercultural é, essencialmente, aprender a ver, a sentir

e a identificar as diferenças culturais.

Nesse contexto, o livro didático é instrumento de auxílio e orientação no

processo de ensino (para o professor) e de aprendizagem (para o aluno). Aprender a

trabalhar com um livro didático pode não ser só uma questão de criatividade ou boa

vontade do professor. Às vezes, como profissionais, não conseguimos entender

porque determinadas atividades se encontram nesta ou naquela página, ou mesmo

48

porque elas foram escolhidas. Às vezes, ainda, não conseguimos ou não temos

conhecimentos suficientes para compreender e interpretar as intenções ou os

objetivos de uma determinada atividade, ou até mesmo avaliar as intenções ou a

importância de cada atividade. Portanto, é necessário ao profissional estar

consciente de suas limitações.

A forma como cada atividade pode ser abordada ou como cada figura de um

material didático é trabalhada ou, ainda, como ambas podem ser usadas para fazer

a ponte entre culturas depende muito do preparo do professor. As pessoas são

visuais e sensitivas e, por isso, cores, figuras, fotos, sons, músicas ou textos

literários chamam a atenção não somente pelas informações que trazem, mas

principalmente pelas lembranças, associações ou sensações que provocam.

O objetivo do ensino intercultural é desenvolver a sensibilidade nos

estudantes, de forma que os mesmos percebam a diversidade cultural. O

reconhecimento dessa diversidade auxilia na significação do aprendizado que

respeita as diferenças culturais. A cultura tem um papel muito importante na

formação de cada pessoa, ela “abre os horizontes e desenvolve o pensamento”

(FREIRE, 2000, p. 52 in AMATO, 2005). O foco da análise intercultural parte do

indivíduo; de como ele (aprendiz) consegue reconhecer as diferenças e contrastá-

las, levando sempre em consideração os valores individuais e coletivos que

determinam o comportamento de cada um. Os autores que auxiliaram na

fundamentação da pesquisa não fornecem “receitas” prontas para desenvolver

habilidades interculturais, mas apontam caminhos e indicam instrumentos de

reflexão, que certamente auxiliam o fazer pedagógico.

49

A interculturalidade no ensino de língua estrangeira é um processo de

aprendizado que deve acontecer junto com a aquisição da língua. O aprendizado

intercultural deve, ainda, fornecer subsídios para o aluno aprender a olhar para a

sua cultura e para a cultura, ou culturas, dos falantes da outra língua.

50

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SIGNORINI, I. (org.) Lingua(gem) e Identidade: Elementos para uma discussão no Campo Aplicado. 2ª reimp. ed. Campinas, SP: Mercado das Letras; São Paulo: Fapesp, 1998.

51

TANGRAM 1 A – Deutsch als Fremdsprache: Kurs- und Arbeitsbuch: Ismaning, Deutschland: Max Hueber Verlag, 1998. TANGRAM 1 aktuell – Kursbuch + Arbeitsbuch: Ismaning, Deutschland: Max Hueber Verlag, 2004. VENTURELLI, P. Um dia todos seremos Montag. Educar em revista. Curitiba – PR: UFPR, n. 20, p.107 - 126, 2002.

52

Die Unterrichtpraxis hat gezeigt, dass Lernende

mit TANGRAM sehr schnell in der Lage sind, die

neue Sprache aktiv und kreativ anzuwenden.

TANGRAM erreicht so die wesentlichen Ziele des

Referenzrahmens: Kommunikative Kompetenz

und sprachliche Handlungsfähigkeit.

TANGRAM aktuell erscheint in sechs Bänden

(PDF-Datei, 95 KB). Es lässt sich so ideal in das

Raster der im Referenzrahmen beschriebenen

Kompetenzniveaus einordnen und entspricht

somit genau Kursstrukturen, die sich am

Referenzrahmen orientieren.

Je zwei kurze Bände führen zu einer

Niveaustufe A1, A2 und B1. Jede Niveaustufe

wird mit einem intensiven Vorbereitung auf die

Prüfungen Start Deutsch 1 und 2 / Start

Deutsch 1z und 2z sowie auf das Zertifikat

Deutsch abgeschlossen.

Jeder Band enthält vier Lektionen Kursbuch und

Arbeitsbuch mit je einer integrierten Audio-CD

zum Arbeitsbuchteil. Diese Lerner-CD fördert

die Lernerautonomie, da die

Kursteilnehmer/innen so selbstständig

Hörverstehen und Phonetik im Arbeitsbuch

bearbeiten können.

Tangram aktuell 1, A1/1: Inhalt

161 KB, PDF-Datei

Tangram aktuell 1, A1/2: Inhalt

142 KB, PDF-Datei

Tangram aktuell 2, A2/1: Inhalt

69 KB, PDF-Datei

Tangram aktuell 2, A2/2: Inhalt

68 KB, PDF-Datei

Tangram aktuell 3, B1/1: Inhalt

116 KB, PDF-Datei

Tangram aktuell 3, B1/2: Inhalt

115 KB, PDF-Datei