Monografia Sobre Tempo Rural

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1 Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Ciências Jurídicas Departamento de Direito A questão do reconhecimento do tempo de serviço rural Acadêmica: Karine Volpato Galvani Orientadora: Profa. Dra. Magnólia Ribeiro de Azevedo Florianópolis, junho de 2000.

Transcript of Monografia Sobre Tempo Rural

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    Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Cincias Jurdicas

    Departamento de Direito

    A questo do reconhecimento do tempo de servio rural

    Acadmica: Karine Volpato Galvani Orientadora: Profa. Dra. Magnlia Ribeiro de Azevedo

    Florianpolis, junho de 2000.

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    I

    Ao meu pai, especialmente, minha me, Nana e ao Rubinho, pelo amor incondicional.

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    II

    Agradeo: Profa. Magnlia, pela orientao e exemplo de dedicao;

    ao Lali, e aos tios Paula, Hilsa, Evi e Tereza por, especialmente, terem colaborado com esta parte da minha histria;

    aos queridos colegas da Justia Federal de Florianpolis, pela amizade, auxlio e aprendizado.

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    TERMO DE APROVAO

    A presente monografia, intitulada A QUESTO DO RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIO RURAL, foi aprovada pela banca examinadora composta

    pelos membros subscritos, obtendo nota 9,8 (nove vrgula oito), tendo sido julgada adequada para o cumprimento do requisito legal previsto no artigo 9. da Portaria n.

    1.886/94 do Ministrio da Educao e Cultura (MEC) regulamentando pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) na Resoluo n. 003/95/CEPE.

    Florianpolis, 26 de junho de 2000.

    BANCA EXAMINADORA

    _____________________________________________

    Presidente: Profa. Dra. Magnlia Ribeiro de Azevedo

    ______________________________________

    Membro: Prof. MSc.Rafael Murilo Digicomo

    ________________________________________

    Membro: Juiz Federal Cludio Roberto da Silva

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    RESUMO

    Esta monografia tem como objeto o estudo da aposentadoria por tempo de servio do trabalhador rural, especificamente no que diz respeito ao reconhecimento do tempo de servio, independentemente de contribuio.

    Seu enfoque a anlise da precria situao do trabalhador rural em face das rigorosas condies normativas impostas para comprovao do exerccio da atividade rural.

    O trabalho busca, com base, especialmente, nos princpios de direito, apontar as principais ilegalidades contidas nas normas que visaram a regulamentao da concesso dos benefcios previdencirios estendidos ao trabalhador rural pela Constituio Federal de 1988, bem como demonstrar que a peculiariedade do trabalho rural uma questo multifacetria e que requer, tambm, no caso da concesso de direitos previdencirios, anlise diferenciada por todos os envolvidos nesta questo, inclusive dos legisladores.

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    SUMRIO

    SUMRIO...................................................................................................................01 INTRODUO...........................................................................................................03 CAPTULO I A APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIO...........................05 1.1 - Aspectos gerais..................................................................................................05

    1.2 - Consideraes preliminares...............................................................................10

    1.3 - A legislao previdenciria anterior Constituio da Repblica Federativa do

    Brasil de 1988 aspectos destacados.......................................................................10

    1.3.1 - A contagem do tempo de servio....................................................................11

    1.3.2 - O perodo de carncia.....................................................................................13

    1.3.3 - O incio do benefcio........................................................................................13

    1.3.4 - Valor do benefcio e a sua extino................................................................14

    1.3.5 - O abono de permanncia em servio.............................................................14

    1.4 - A aposentadoria por tempo de servio de acordo com a Lei n. 8.213, de 24 de

    julho de 1991 Plano de Benefcios da Previdncia Social - aspectos gerais..........15 1.4.1 - A contagem do tempo de servio....................................................................15

    1.4.2 - O perodo de carncia.....................................................................................16

    1.4.3 - O incio do benefcio e o seu valor..................................................................16

    1.4.4 - A extino do benefcio e o fim do abono de permanncia em servio..........17

    1.5 - A questo do direito adquirido............................................................................17

    CAPTULO II - O TRABALHADOR RURAL E APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIO...................................................................................................................24 2.1 - A questo da carncia........................................................................................27

    2.2 - A contagem recproca do tempo de servio.......................................................30

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    2.3 - Reconhecimento do tempo de filiao e averbao do tempo de servio.........32

    2.4 - A legislao previdenciria referente ao reconhecimento do tempo de servio

    rural a partir da Constituio da Repblica Federativa do Brasil de

    1988............................................................................................................................33

    CAPTULO III A PROVA DO TEMPO DE SERVIO RURAL.................................42 3.1 - Os instrumentos para comprovao do tempo de servio.................................42

    3.1.1 - A justificao judicial.......................................................................................42 3.1.2 - A justificao administrativa............................................................................44 3.2 - As exigncias feitas pela legislao com relao s provas a serem

    apresentadas para a comprovao do tempo de servio...........................................46

    3.2.1 - O incio de prova material...............................................................................46

    3.2.2 - A proibio da prova exclusivamente testemunhal.........................................49

    3.3 - As exigncias para comprovao do tempo de servio rural e os princpios de

    direito: a posio do Poder Judicirio.........................................................................51

    3.3.1 - O princpio do livre convencimento ou da livre apreciao da prova..............52

    3.3.2 - O princpio da busca da verdade....................................................................54

    3.3.3 - O princpio da legalidade.................................................................................56

    CONSIDERAES FINAIS.......................................................................................62 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...........................................................................65

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    INTRODUO

    A presente monografia tem como objeto o estudo da aposentadoria por tempo de servio do trabalhador rural, especificamente no que diz respeito ao reconhecimento do tempo de servio, independentemente de contribuio.

    Possui, desta forma, como marco divisrio, a Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, que modificou o sistema de previdncia social, estabeleceu normas de transio e deu outras providncias. Isto porque, por meio do disposto no artigo 7., inciso I, desta emenda, foi alterado o disposto no artigo 201 da Constituio Federal de 1988, que passou a tratar somente da aposentadoria por tempo de contribuio e extinguiu, em consequncia, o benefcio da aposentadoria por tempo de servio.

    O objetivo deste trabalho a anlise da precria situao do trabalhador rural em face das rigorosas condies normativas impostas para a comprovao do exerccio da atividade rural independentemente de contribuio e, por outro lado, a satisfao da exigncia da Resoluo n. 003/CEPE/95, para obteno do ttulo de bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina.

    Para sua elaborao utilizado o mtodo indutivo de abordagem e, no aspecto metodolgico, os dados bibliogrficos, os textos legais e as decises dos tribunais.

    O trabalho dividido em trs captulos. No primeiro captulo, feita, inicialmente, a contextualizao do benefcio da

    aposentadoria por tempo de servio dentro do todo do sistema previdencirio e a explicitao de conceitos necessrios compreenso do assunto abordado.

    Ainda, por meio da comparao entre a Consolidao das Leis da Previdncia Social de 1976 e 1984, so apresentadas as principais caractersticas e exigncias da legislao referente ao benefcio da aposentadoria por tempo de servio anteriormente Constituio Federal de 1988, bem como aspectos gerais da aposentadoria por tempo de servio na Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991.

    Ao final, aborda a questo do direito adquirido como garantia da aposentadoria com base nas leis que vigoravam na poca em que o benefcirio cumpriu os requisitos para sua obteno.

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    O segundo captulo, por sua vez, trata das principais questes havidas em razo da aplicao das normas para concesso da aposentadoria por tempo de servio para o trabalhador rural, como, por exemplo, a carncia e a contagem recproca do tempo de servio.

    Apresenta, ainda, um apanhado das principais normas previdencirias, incluindo portarias expedidas pelo Ministrio da Previdncia e Assistncia Social e Ordens de Servio expedidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social INSS, referentes ao reconhecimento por tempo de servio rural.

    No terceiro captulo, so apresentados, primeiramente, os instrumentos para a comprovao do tempo de servio, ou seja, as justificaes judicial e administrativa. Em seguida apresentado o exame das principais exigncias feitas pela legislao quanto qualidade das provas a serem apresentadas para a comprovao do tempo de servio rural, como o incio de prova material e a proibio da prova exclusivamente testemunhal.

    Por fim, apresentada anlise das exigncias para comprovao do tempo de servio rural em face dos princpios da livre apreciao da prova, da busca da verdade e da legalidade, bem como da posio do Poder Judicirio na deciso das questes abordadas.

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    CAPTULO I A APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIO

    1.1 Aspectos gerais

    Antes de se adentrar especificamente o estudo da aposentadoria do trabalhador rural, faz-se necessrio contextualizar o benefcio da aposentadoria por tempo de servio, dentro do todo do sistema previdencirio, bem como explicitar, preliminarmente, algumas definies importantes para a melhor compreenso do assunto abordado.

    A partir da Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 19881, a Previdncia Social brasileira passou por grande reforma. Isto porque no seu artigo 194, caput, a Carta Magna disps que a Seguridade Social compreendida por um conjunto integrado de aes destinadas a assegurar os direitos relativos sade, previdncia e a assistncia social. A Previdncia Social, portanto, passou a ser parte integrante deste todo que visa o bem-estar social.

    Segundo Wladimir Novaes Martinez2:

    Seguridade Social uma tcnica de proteo social, custeada solidariamente por toda a sociedade segundo a capacidade de cada um, que propicia universalmente a todos o bem-estar das aes de sade e dos servios assistencirios em nvel mutvel, conforme a realidade scio-econmica, e os das prestaes previdencirias, estas ltimas quando do nascimento, incapacidade ou invalidez, idade avanada, ou tempo de servio, priso ou morte, em funo das necessidades e no da capacidade dos destinatrios.

    1 BRASIL. Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988, promulgada em 05 de outubro de

    1988. No decorrer deste trabalho sero utilizadas as abreviaes Constituio Federal de 1988 e Carta Magna. 2 MARTINEZ, Wladimir Novaes. A seguridade social na Constituio Federal, So Paulo: LTr, p. 57

    e 84.

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    A Previdncia Social, por seu turno, continua o autor citado, o principal instrumento da Seguridade Social, que tem como objetivo propiciar os meios indispensveis subsistncia da pessoa humana quando esta no pode obt-los ou no desejvel auferi-los pessoalmente atravs do trabalho, por motivo de maternidade, nascimento, incapacidade, invalidez, desemprego, priso, idade avanada, tempo de servio ou morte - mediante contribuio, proveniente da sociedade e de cada um dos participantes.

    A Constituio Federal de 1988 disps, ainda, no seu artigo 201, que a Previdncia Social, ou seja, a previdncia de carter pblico3, seria organizada sob a forma de um regime geral. Assim, para regulamentar o previsto na Carta Magna, foram publicadas a Lei n. 8.2124, que disps sobre a organizao da Seguridade Social e instituiu o Plano de Custeio e a Lei n. 8.213, que disps sobre os Planos de Benefcios da Previdncia Social, ambas de 24 de julho de 1991 e que acabaram por consubstanciar o Regime Geral da Previdncia Social.5

    A aposentadoria por tempo de servio6, por seu turno, benefcio7 devido ao segurado da Previdncia Social, prevista nos artigos 52 a 56 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991.

    Para melhor compreenso do Regime Geral da Previdncia Social preciso, ainda, explicitar alguns conceitos importantes.

    3 Importante ressaltar que o presente trabalho trata da Previdncia Social, de carter pblico, prevista

    no artigo 201 da Constituio Federal de 1988, e no da previdncia privada, de carter complementar, prevista no artigo 202 da mesma Constituio e que ainda no foi regulamentada por lei. 4 BRASIL. Lei n. 8.212 e Lei n. 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, publicadas no Dirio Oficial

    da Unio em 25.07.1995. 5 Atualmente, o Regime Geral de Previdncia Social foi unificado, sendo regido somente pelo disposto

    no Decreto n. 3.048, de 06 de maio de 1999, que aprovou o Regulamento da Previdncia Social, publicado no Dirio Oficial da Unio em 07.05.1999 e republicado em 12.05.1999. 6 Aps a Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, publicada no Dirio Oficial da

    Unio de 16.12.1998, passou a ser aposentadoria por contribuio. 7 Prestaes so benefcios (valores em dinheiro) e servios (atendimentos). As prestaes em

    dinheiro devidas aos beneficirios aps o preenchimento dos requisitos legais podem ser classificadas segundo vrios critrios: a) nmero de pagamentos: nico e continuado; b) vontade do segurado: ausente e presente; c) tipo de titular: segurado, dependente; d) natureza da causa: comum e acidentria; e) contingncia protegida: tempo de servio ou incapacidade; f) durao: provisria (determinada ou no) e definitiva; g) essncia da atividade: comum e especial; h) valor da renda: proporcional ou integral. (MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princpios de Direito Previdencirio. So Paulo: LTr, 1995, p. 512) (grifou-se)

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    Os beneficirios da previdncia social so agrupados e classificados em segurados e dependentes, obrigatrios e facultativos8.

    Segurado certa pessoa fsica arrolado, s vezes descrito e qui definido na lei, normalmente um exercente de atividades profissionais, obrigatria ou facultativamente, abrangido pelo RGPS, contribuinte descontado ou individual e titular de direitos (prestaes), preenchidos os requisitos legais.

    Dependente, em consequncia, toda pessoa fsica vivendo s expensas do segurado, econmica ou financeiramente subordinado a esse filiado Previdncia Social.

    Necessrio, ainda, que se distinga os segurados facultativos e os segurados obrigatrios.

    Segurados obrigatrios so pessoas fsicas filiadas compulsoriamente, admitidas no Regime Geral da Previdncia Social por fora de lei, devendo aportar contribuies, sofrendo descontos em sua remunerao ou desembolsando os valores (contribuinte individual). Segurados facultativos, por seu turno, so pessoas fsicas, anteriormente seguradas obrigatrias ou no, admitidas na Previdncia Social por sua prpria vontade, necessariamente como contribuintes individuais.

    Por fim, necessrio primeiramente conceituar o trabalhador rural, para que se possa, aps, delimitar qual a classe de trabalhador rural abrangida por este trabalho.

    A Lei n. 5.889, de 08 de junho de 19739 conceitua empregado rural como toda pessoa fsica que, em propriedade rural ou prdio rstico, presta servios de natureza no eventual a empregador rural, sob a dependncia deste e mediante salrio.

    , pois, uma espcie de trabalhador rural regida pelas normas do Direito do Trabalho.

    A mesma lei diz, ainda, no seu artigo 3., que empregador rural a pessoa fsica ou jurdica, proprietria ou no, que explore atividade agroeconmica, em carter permanente ou temporrio, diretamente ou atravs de prepostos com auxlio de empregados.

    8 Os conceitos apresentados so de MARTINEZ, Wladimir Novaes. Idem, ibidem, p. 451.

    9 BRASIL. Lei n. 5.889, de 06 de junho de 1973, que estatui normas reguladoras do trabalho rural e

    d outras providncias, publicada no Dirio Oficial da Unio de 11.06.1973.

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    A Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, por sua vez, trata do trabalhador rural em vrios artigos (ex. dos artigos 48, 106, 143) e aspectos, mas no o conceitua expressamente, assim como fala genericamente de empregado (artigo 11, inciso I, letra a), mas no explicita as diferenas entre o empregado urbano e o rural.

    V-se, portanto, que de acordo com o disposto na Lei n. 5.889, de 08 de junho de 1973, empregado rural aquele que presta servios para empresa que explore atividade agroeconmica. O critrio , portanto, com relao atividade da empresa e no do empregado.

    Neste sentido dispe, tambm, a Smula n. 19610 do Supremo Tribunal Federal: Ainda que exera atividade rural, o empregado de empresa industrial ou comercial classificado de acordo com a categoria do empregador.

    Em concluso, embora possa haver um certo desequilbrio jurdico nesta situao, em razo de empregados que praticam a mesma atividade serem classificados em categorias diferentes, o critrio permanece o mesmo, ou seja, o empregado ser rural ou urbano tendo em vista o escopo da atividade desenvolvida pela empresa.

    Assim, definida a posio do empregado rural (espcie de trabalhador rural regido pelo Direito do Trabalho), faz-se necessrio, ainda, conceituar as outras categorias de trabalhador rural, previstas na Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, ou seja, o trabalhador autnomo, o equiparado a autnomo, o avulso e o segurado especial.

    O trabalhador autnomo definido pela prpria Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, no artigo 11, IV, a, como aquele que presta servio de natureza urbana ou rural, em carter eventual, a uma ou mais empresas, sem relao de emprego.

    O trabalhador equiparado a autnomo, quando for, como pessoa fsica, um pequeno produtor rural, bastante semelhante ao segurado especial referido no item VI do artigo 11, mas com a particularidade de contratar terceiros para ajud-lo tambm considerado trabalhador rural. H, ainda o trabalhador avulso, que se trata

    10 BRASIL. Supremo Tribunal Federal, Smula n. 196, publicada no SUDIM v. 1 01, p. 99.

    Informao obtida no item jurisprudncia do site do Supremo Tribunal Federal em 31.05.2000, no endereo www.stf.gov.br.

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    de trabalhador vinculado ou no a sindicato intermediador de mo-de-obra, prestador de servios a diversas empresas.11

    Desta forma, o requisito exigido tanto para o trabalhador avulso, como para o autnomo e equiparado a autnomo, para que sejam considerados trabalhadores rurais a comprovao do exerccio de atividade rural.

    Por fim, resta falar os segurados especiais, que so aqueles elencados no artigo 11, inciso VI, da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991.

    So segurados especiais, portanto, o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatrio rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exeram suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com auxlio eventual de terceiros, bem como seus dependentes, desde que trabalhem com o grupo familiar respectivo.

    Tendo em vista o objetivo deste trabalho, so conceituados, a seguir, alguns dos segurados especiais citados para melhor compreenso12:

    Produtor o empreendedor de atividade econmica em propriedade rural; parceiro o trabalhador rural que celebra contrato de parceria como proprietrio da terra e desenvolve explorao agropecuria, dividindo os lucros conforme o ajuste; meeiro o trabalhador rural que assina contrato de meao como proprietrio da terra e, da mesma forma, empreende atividade agropecuria, partilhando os rendimentos auferidos; arrendatrio

    aquele que obtm o uso da propriedade atravs de aluguel pago ao proprietrio do imvel rural. Neste ltimo caso, o valor da locao pode ser in natura, distinguindo-se da parceria ou meao em razo da inexistncia de riscos para o dono da rea rural. (grifou-se)

    Por fim, resta especificar que trabalhador rural ser a denominao utilizada neste trabalho, quando se fizer meno, de maneira geral, ao produtor, ao parceiro, ao meeiro e ao arrendatrio rurais que trabalhem individualmente ou em regime de economia familiar, na qualidade de segurados especiais da Previdncia Social.

    11 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentrios Lei Bsica da Previdncia Social. Tomo II. So

    Paulo: LTr, 1997, p. 95 a 97.

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    1.2 Consideraes preliminares

    A aposentadoria por tempo de servio foi inserida na legislao brasileira pelo Decreto n. 4.682, de 24 de janeiro de 192313. Neste decreto, chamado de lei, cunho-se o termo aposentadoria ordinria.

    Como o prprio nome traduz, o benefcio concedido ao segurado que cumprir os requisitos de ter trabalhado durante um grande nmero de anos na atividade e que este seja filiado Previdncia Social por um determinado tempo. De acordo com Wladimir Novaes Martinez14: benefcio tradicional do Direito Previdencirio, pelo menos desde 23.1.23, ressaltando, ainda, que houve poca em que, alm do tempo de servio era estabelecida tambm certa idade (...) A limitao da idade, no entanto, foi abolida pela Lei n. 4.160, de 28 de agosto de 1962.

    O autor citado define, ainda, no mesmo artigo, tempo de servio como sendo o perodo de filiao ao RGPS, ou a outros regimes, de exerccio de atividade ou manifestao de vontade e recolhimento de contribuio ou no, contemplado na lei ou no regulamento e at por equiparao vlida, real ou virtual, no presumido, suficiente para caracterizar o benefcio ou configurar sua expresso pecuniria.

    Percebe-se, portanto, que os requisitos trazidos pela legislao para a concesso da aposentadoria por tempo de servio, a partir da sua criao, levam em conta somente realidade do trabalhador urbano, uma vez que este benefcio s foi estendido ao trabalhador rural com o advento da Constituio Federal de 1988, que em seu artigo 7., estabeleceu a equiparao deste com o trabalhador urbano.

    1.3 A legislao previdenciria anterior Constituio Federal de 1988 aspectos destacados

    Diante das constantes modificaes da legislao previdenciria no Brasil, ir-se- utilizar como subsdio neste estudo as principais exigncias e caractersticas

    12 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Idem, ibidem, p. 100 e 101. 13

    BRASIL. Decreto n. 4.682, de 24 de janeiro de 1923, que criou, em cada uma das empresas de estrada de ferro existentes no pas, uma caixa de aposentadoria e penses para os respectivos empregados. Foi publicado no Dirio Oficial da Unio em 28.01.1923 e, embora se trate de decreto legislativo, tornou-se comum cham-lo de Lei Eloy Chaves.

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    contidas no disposto no Decreto n. 77.077, de 24 de janeiro de 1976 e o Decreto n. 89.312, de 23 de janeiro de 198415.

    1.3.1 A contagem do tempo de servio

    Entre os requisitos para a concesso do benefcio de aposentadoria por tempo de servio a condio essencial, claro, a comprovao do tempo de servio exercido. Neste respeito, a CLPS de 1976 e a CLPS de 1984 estabeleceram as normas utilizveis para a sua contagem, o perodo de carncia, bem como demais exigncias, de forma bastante semelhante, conforme se demonstrar a seguir.

    Ambas exigiam que o segurado tivesse, pelo menos, trinta anos de servio, para que pudesse pleitear o benefcio, (respectivamente, no caput dos seus artigos 41 e 33), sendo que a ele caberia a sua comprovao, nos termos exigidos pelas normas regulamentares em vigor (em ambas previsto no pargrafo segundo).

    A prova poderia ser feita, ainda, por meio de justificao administrativa ou judicial (explicitadas no itens 3.1.1 e 3.1.2 deste trabalho). A ressalva que se fazia nesta situao, entretanto, era no sentido de que em qualquer dos casos seria exigido incio de prova material, ou seja, que houvesse um comeo de prova documental que pudesse aliar-se prova testemunhal que, isoladamente, no seria aceita.

    Por outro lado, as citadas Consolidaes das Leis da Previdncia Social fixavam uma srie de outros requisitos que colaboravam com o pretendente do benefcio para que fosse comprovado o exerccio de trinta anos de atividade exigidos para a sua concesso.

    14 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Aposentadoria por tempo de servio na legislao atual e futura -

    Temas atuais de previdncia social. Wladimir Novaes Martinez (coord.). So Paulo: LTr, 1998, p. 301 a 317. 15

    BRASIL. Decreto n. 77.077, de 24 de janeiro de 1976, que expede a Consolidao das Leis da Previdncia Social, nos termos do artigo 6. da Lei n. 6.243/79, publicado no Dirio Oficial da Unio em 02.02.1976 e Decreto n. 89.312, de 23 de janeiro de 1984, que expede nova edio da Consolidao das Leis da Previdncia Social, publicado no Dirio Oficial da Unio em 24.01.1984.Para facilitao da compreenso, adotar-se- as denominaes CLPS de 1976, para o disposto no Decreto n. 77.077, de 24 de janeiro de 1976 e CLPS de 1984, para o disposto no Decreto n. 89.312, de 23 de janeiro de 1984.

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    Jeferson Daibert16 ao comentar acerca dos requisitos exigidos para contagem de tempo de servio, diz:

    Na conceituao de servio, a lei no se fixou exclusivamente na atividade ou trabalho a que se dedica o segurado, porque admitiu, na contagem do tempo de servio, certos perodos nos quais o segurado desempenhou atividades diferentes daquela sobre a qual incide a sua contribuio ao INPS, como considera, igualmente o lapso de tempo em que ficou inativo percebendo salrio-de-benefcio da previdncia e, ainda, considera tempo de servio o perodo em que, para no perder a qualidade de segurado contribuiu em dobro (...) O critrio, pois, do legislador foi considerar tempo de servio todos os perodos em que, vinculado ao instituto, como segurado, exerceu atividade subordinada ao sistema previdencirio, esteve em gozo de benefcio, prestou servio fora de sua atividade normal, de forma compulsria e, ainda, servios em atividade no vinculada ao regime previdencirio, cujo tempo por determinao especial de lei, tenha sido averbado e que ser computado na soma total, como o caso, por exemplo, do tempo de servio militar obrigatrio, e mesmo, o voluntrio, ainda que qualquer deles tenha sido prestado antes de possuir a qualidade de segurado.

    No caso daqueles que permaneciam espontaneamente vinculados Previdncia Social, houve modificao entre as legislaes, uma vez que na CLPS de 1976, nos termos do inciso III do artigo 128, o segurado facultativo, que se encontrasse na situao do artigo 11 (pagamento espontneo) e do autnomo, exceto o trabalhador avulso (artigo 7.), seriam obrigados a custear a Previdncia com o percentual de 16% (dezesseis por cento) do respectivo salrio-de-contribuio17. A CLPS de 1984, por sua vez, aumentou o percentual de contribuio, pois previu, nos seus artigos 9. e 122, inciso II, que a contribuio seria no percentual de 19,2% do salrio-de-contribuio.

    Por fim, importante ressaltar que mesmo que o segurado exercesse mais de uma atividade vinculada Previdncia Social o tempo contado para a aposentadoria seria somente de uma atividade exercida, quando concomitante.

    16 DAIBERT, Jefferson. Direito Previdencirio e Acidentrio do Trabalho Urbano. Rio de Janeiro:

    Forense, 1978. p. 234. 17

    Salrio-de-contribuio a remunerao do segurado, para efeito de previdncia social, ou, mais precisamente, a importncia sobre a qual incide a contribuio do segurado para a previdncia social. (LEITE, Celso Barroso. A previdncia social ao alcance de todos. So Paulo: LTr, 1997, p. 52)

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    1.3.2 O perodo de carncia18

    Nas CLPSs de 1976 e 1984, os artigos 41 e 33 dispuseram, respectivamente, serem necessrias, pelo menos, sessenta contribuies, ou seja, cinco anos de filiao Previdncia Social, para a concesso do benefcio.

    No caso de contagem recproca de tempo de servio19 em atividades pblicas e privadas deveria o funcionrio pblico que quisesse averbar o tempo de servio em atividade privada haver sido filiado por, pelo menos, cinco anos Previdncia Social ou, o contrrio, no caso de o empregado de atividade privada requerer contagem de tempo de servio pblico seria necessria tambm a anterior contribuio por cinco anos Previdncia Social.20

    1.3.3 O incio do benefcio

    Em ambas as CLPSs - 1976 (artigo 41, pargrafo terceiro) e 1984 (artigo 32, pargrafo primeiro)- era previsto o prazo de 180 dias para que o benefcio da aposentadoria por tempo de servio fosse requerido. Assim, quando a aposentadoria fosse requerida at 180 dias da data do desligamento do segurado, o benefcio lhe seria devido integralmente, a partir desta ltima data, ou seja, teria efeito retroativo ex tunc. Por outro lado, caso o segurado deixasse expirar este prazo, o benefcio seria devido somente a partir deste requerimento.

    Segundo Jefferson Daibert21 tratava-se de prazo decadencial, pois havia a perda do direito do benefcio retroativo. Mozart Victor Russomano22, por outro lado, com opinio com a qual se filia a autora, esclarece, que no havia espcie de perda do direito, uma vez que a prerrogativa do segurado permanecia inalterada, o que havia era somente a mudana da data de incio do pagamento do benefcio.

    18 Sinteticamente, nas palavras de MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentrios Lei Bsica da

    Previdncia Social. Tomo II. So Paulo: LTr, 1997, p. 430: Carncia o nmero mnimo de contribuies mensais exigidas para a fruio de determinada prestao. 19

    De acordo com MARTINEZ, Wladimir Novaes: Tanto quanto a converso caso particular da soma de tempo de servio (PBPS, art. 57, 5.), a contagem recproca espcie de adio de perodos submetidos a perodos distintos. Apresenta a particularidade de ser disciplinada por norma de superdireito (em relao aos diferentes regimes). No s se aplica ao RGPS, como comum a todos os regimes do servidor federal, distrital, estadual ou municipal (Idem, ibidem, p. 427). 20

    RUSSOMANO, ob. cit., p. 231. 21

    DAIBERT, ob. cit., p. 236.

  • 19

    O ltimo autor esclarece, ainda, que a partir da Lei n. 6.887, de 10 de dezembro de 1980,23 ficou excluda a possibilidade de retroao do benefcio, passando a valer somente o pagamento a partir da data do requerimento. Esta norma, por seu turno, foi revogada pelo disposto na Lei n. 6.950, de 04 de novembro de 198124, voltando a estabelecer que quando se tratasse de empregado sujeito Consolidao das Leis do Trabalho CLT, o benefcio seria devido a partir do seu desligamento, se requerido at 180 dias aps, bem como que no caso de o benefcio ser requerido aps este prazo, seria devido a partir da apresentao do requerimento (artigo 32, pargrafo primeiro, e artigo 33, pargrafo segundo, da CLPS de 1984).

    1.3.4 Valor do benefcio e a sua extino

    O valor do benefcio da aposentadoria igualmente tratado no artigo 41 e pargrafos da CLPS de 1976 e artigo 33 e pargrafos da CLPS de 1984. O seu clculo, no entanto, guarda relativa complexidade, especialmente, em virtude de ser o benefcio de aposentadoria por tempo de servio, benefcio mensal e de renda vitalcia. Por esta razo e, em virtude de no comprometer o fluxo do trabalho, o clculo no ser aqui explicitado.

    No que diz respeito extino do benefcio, esta se daria, preponderantemente, no caso de morte do beneficirio. Pode ocorrer, ainda, em caso de haver renncia, a requerimento do beneficirio, bem com em razo do cancelamento por parte do rgo previdencirio, na hiptese de comprovao de fraude na concesso do benefcio.

    1.3.5 O abono de permanncia em servio

    O abono de permanncia em servio um benefcio autnomo, ou seja, que no se incorpora aposentadoria ou penso, intimamente ligado aposentadoria

    22 RUSSOMANO, ob. cit., p. 232.

    23 BRASIL. Lei n. 6.887, de 10 de dezembro de 1980, que altera a legislao da Previdncia Social

    Urbana, publicada no Dirio Oficial da Unio em 11.12.1980. 24

    BRASIL. Lei n. 6.950, de 04 de novembro de 1981, que altera a Lei n. 3.087 de agosto de 1966, fixa limite mximo para salrio-de-contribuio previsto na Lei n. 6.332, de 18.05.1976 e d outras providncias, publicada no Dirio Oficial da Unio em 06.11.1981.

  • 20

    por tempo de servio, uma vez que se constitua num prmio para aqueles que, no obstante j houvessem cumprido os requisitos para obteno da aposentadoria por tempo de servio, preferiam continuar no exerccio da sua atividade.

    As CLPSs de 1976 e 1984 trataram, respectivamente, nos seus artigos 43, incisos I e II e 34, incisos I e II, a respeito dos beneficirios da sua concesso, prevendo o percentual de 25% (vinte e cinco por cento) do salrio-de-benefcio25, para o segurado com 35 (trinta e cinco) ou mais anos de atividade e 20% (vinte por cento) do salrio-de-benefcio, para o segurado que tivesse entre 30 (trinta) e 35 (trinta e cinco) anos de atividade.

    Previram, ainda, que o abono de permanncia em servio seria devido a contar da data do requerimento, bem como que no variaria de acordo com a evoluo do salrio do segurado, fazendo-se seu reajustamento na forma dos demais benefcios de prestao continuada.

    Jefferson Daibert26 lembra, ainda, que o abono de permanncia em servio poderia ser cumulado com auxlio-mensal ou auxlio-acidente.

    Por fim, a extino do benefcio se daria com o requerimento da aposentadoria por tempo de servio ou em virtude da aposentadoria por velhice.

    1.4 A aposentadoria por tempo de servio de acordo com a Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991 Plano de Benefcios da Previdncia Social - aspectos gerais

    1.4.1 A contagem do tempo de servio

    O artigo 52 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991 dispe que ser devida a aposentadoria por tempo se servio ao segurado que completar 25 anos de servio, se do sexo feminino, ou 30 anos, se do sexo masculino.

    Inicialmente, necessrio destacar que esta lei disps acerca do tempo mnimo para obteno do benefcio da aposentadoria por tempo se servio levando

    25 Salrio-de-benefcio o valor-base de clculo de renda mensal inicial dos principais benefcios de

    pagamento continuado. Importncia apurada a partir dos salrios-de-contribuio do segurado, sob a presuno de eles indicarem o nvel da fonte de subsistncia do trabalhador, substituvel pela prestao pecuniria (MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentrios Lei Bsica da Previdncia Social. Tomo II. So Paulo: LTr, 1997, p. 201) 26

    DAIBERT, ob. cit., p. 241.

  • 21

    em considerao o disposto no artigo 202, pargrafo primeiro, da Constituio Federal de 198827 que dispunha: facultada a aposentadoria proporcional28, aps trinta anos de trabalho, ao homem, e, aps vinte e cinco, mulher. Assim, a aposentadoria por tempo de servio com direito ao valor integral do benefcio seria obtida se completados 30 anos de servio pela mulher e 35 anos de servio pelo homem.

    1.4.2 O perodo de carncia

    O perodo de carncia para obteno do benefcio de aposentadoria por tempo de servio disposto no artigo 25, inciso II, desta lei, no seguintes termos: A concesso das prestaes pecunirias do Regime Geral de Previdncia Social depende dos seguintes perodos de carncia, ressalvado o disposto no artigo 26: (...) II aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo se servio e aposentadoria especial: 180 (cento de oitenta) contribuies mensais (redao da Lei n. 8.870/94)29.

    Observa-se, portanto, que o trabalhador, para fazer jus ao benefcio da aposentadoria por tempo se servio deve ter contribudo por, pelo menos, 15 anos, ou seja, trs vezes mais que na legislao anterior Constituio Federal de 1988 mencionada neste trabalho, que exigia apenas 60 contribuies mensais, o equivalente a 5 anos.

    A questo da carncia para a aposentadoria por tempo de servio do trabalhador rural requer maior anlise, que ser feita no prximo captulo.

    1.4.3 O incio do benefcio e o seu valor

    A data de incio do benefcio mencionada do artigo 54 desta lei, que faz, por sua vez, meno ao disposto no seu artigo 49, que trata da aposentadoria por

    27 A redao deste artigo foi modificada posteriormente pela Emenda Constitucional n. 20, de 15 de

    dezembro de 1998, conforme ser explicitado no captulo II deste trabalho. 28

    A aposentadoria proporcional aposentadoria facultada ao beneficirio que, j possuindo um nmero determinado de tempo de servio exigido pela lei, embora menor que aquele exigido para aposentadoria integral, pode requerer a concesso do benefcio, cujo valor ser calculado tendo por base o tempo de servio j exercido e comprovado. 29

    BRASIL. Lei n. 8.870, de 15 de abril de 1994, que altera dispositivos das Leis 8.212 e 8.213, de 24 de julho de 1991 e d outras providncias, publicada no Dirio Oficial da Unio em 16.04.1994.

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    idade. Assim, seguindo as mesmas regras da ltima, a aposentadoria por tempo se servio devida ao segurado empregado30, inclusive o domstico, a partir da data do desligamento do emprego, quando este for requerido at noventa dias aps o desligamento. No caso de o empregado no pedir o desligamento do emprego ou fazer o requerimento aps os noventa dias, o benefcio ser devido a partir da data do requerimento. Esta ltima regra devida a todos os demais segurados.

    Faz-se necessrio ressaltar que o direito ao requerimento do benefcio de aposentadoria por tempo se servio imprescritvel, uma vez que, ainda que solicitado muitos anos aps obteno dos requisitos, o seu incio ser contado a partir da data do requerimento, devendo a renda inicial ser atualizada at a data do incio do recebimento, como se houvesse sido recebida a partir da data do preenchimento dos requisitos.31

    Com relao ao valor do benefcio, trata o artigo 53 desta lei. Tem-se, portanto, que o valor da renda inicial de 70% do salrio-de-benefcio, acrescido a cada ano de filiao mais 6%, alm dos 25 anos, para as mulheres e 30 anos para os homens. Ambos at o mximo de 100%.

    1.4.4 A extino do benefcio e o fim do abono de permanncia em servio

    A extino do benefcio d-se de forma idntica quela exposta no item 1.3.4 deste captulo.

    O abono de permanncia em servio, embora tenha sido inserido entre os benefcios da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, no seu artigo 87, foi excludo pelo disposto na Lei n. 8.870, de 15 de abril de 1994.

    1.5 A questo do direito adquirido

    O direito adquirido um dos institutos que visam a dar segurana queles que esto subordinados a um determinado ordenamento jurdico. , pois, uma forma de garantir a manuteno do Estado Democrtico de Direito.32

    30 Segurados empregados so os segurados obrigatrios da Previdncia Social elencados no artigo 11,

    inciso I, letras a a g da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991. 31

    MARTINEZ, Wladimir Novaes. A aposentadoria por tempo de servio na legislao atual e futura - Temas Atuais de Previdncia Social. Wladimir Novaes Martinez (coord.) So Paulo: LTr, 1998, p. 303. 32

    BRASIL. Constituio Federal de 1988, artigo1..

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    No ordenamento jurdico brasileiro tratado como clusula ptrea33 pela Constituio Federal de 1988.34

    A relevncia do estudo deste instituto ocorre em razo da importncia da sua aplicao ao Direito Previdencirio, especialmente, no que diz respeito s aposentadorias. , desta forma, de suma importncia, neste trabalho, uma vez que o instituto do tempo se servio foi abolido com a edio da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, que passou a tratar somente do tempo de contribuio35.

    O conceito de direito adquirido foi inicialmente introduzido na legislao brasileira vigente, por meio do disposto no pargrafo segundo do artigo 6. da Lei de Introduo ao Cdigo Civil36: Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou algum por ele, possa exercer, como aqueles cujo comeo do exerccio tenha termo prefixo, ou condio preestabelecida inaltervel, a arbtrio de outrem.

    A Constituio Federal de 1988, por sua vez, prev, no inciso XXXVI, do artigo 5. que a lei no prejudicar o direito adquirido, o ato jurdico perfeito e a coisa julgada.

    Na doutrina jurdica brasileira, direito adquirido , para Rubens Limongi Frana37, a conseqncia de uma lei, por via direta ou por intermdio de fato idneo; conseqncia que, tendo passado a integrar o patrimnio material ou moral do sujeito, no se fez valer antes da vigncia da lei nova sobre o mesmo objeto".

    Jos Afonso da Silva38, por seu turno, ensina que:

    "Para compreendermos melhor o que seja direito adquirido, cumpre relembrar o que se disse acima sobre o direito subjetivo: um direito exercitvel segundo a vontade do titular

    33 Insuscetvel de modificao por meio de reviso ou emenda constitucional.

    34 BRASIL. Constituio Federal de 1988, artigo 60, pargrafo 4., inciso IV.

    35 Tempo-de-contribuio corresponde s mensalidades recolhidas ou devidas, efetiva ou

    presumidamente aportadas. Valendo o pagamento mensal em dia, em mora (quando no excepcionada), sob parcelamento ou mediante a indenizao da Lei n. 9.032/95, e at mesmo deduzida no benefcio concedido (PBPS, art. 115) MARTINEZ, Wladimir Novaes. A aposentadoria por tempo de servio na legislao atual e futura - Temas Atuais de Previdncia Social. Wladimir Novaes Martinez (coord.) So Paulo: LTr, 1998, p. 303. 36

    BRASIL. Decreto-Lei n. 4.657, de 04 de setembro de 1942, publicado no Dirio Oficial da Unio em 04.09.1942. 37

    FRANA, Rubens Limongi. Direito Intertemporal Brasileiro. So Paulo: Saraiva, 2000, p. 216. 38

    SILVA. Jos Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, So Paulo: Malheiros, 1990, p. 374.

  • 24

    e exigvel na via jurisdicional quando seu exerccio obstado pelo sujeito obrigado prestao correspondente. Se tal direito exercido, foi devidamente prestado, tornou-se situao jurdica consumada (direito consumado, direito satisfeito), extinguiu-se a relao jurdica que o fundamentava. Se o direito subjetivo no foi exercido, vindo a lei nova, transforma-se em direito adquirido, porque era direito exercitvel e exigvel vontade de seu titular. Incorporou-se no seu patrimnio, para ser exercido quando lhe conviesse. A lei nova no pode prejudic-lo, s pelo fato do titular no o ter exercido antes. "

    Srgio Pinto Martins39, em estudo especfico sobre a influncia do instituto do direito adquirido sobre a aposentadoria, ressalta, tambm, que necessrio que se faa a distino entre faculdade, expectativa de direito e direito adquirido. Expe, desta forma, que faculdade algo anterior ao direito adquirido, um meio de aquisio do direito. Neste passo, a expectativa de direito ocorreria quando o beneficirio ainda no houvesse reunido todas as condies para adquirir o direito, que no fez parte do seu patrimnio jurdico, nem pode ser exercitado de imediato. Na expectativa de direito h a esperana, a probabilidade de adquirir o direito no curso do tempo. O direito adquirido, por sua vez, importaria um fato consumado na vigncia da lei anterior.

    O autor citado esclarece, ainda, com o esclio de Agostinho Alvim que quando o efeito com que se conta, ou se espera, no entrou ainda para o patrimnio do titular, diz-se que h expectativa. Nesse caso, a lei nova poder impedir os efeitos que se aguardam. Assim, por exemplo, algum espera aposentar-se com trinta anos de servio, e conta j com vinte e nove, sobrevem uma lei segundo a qual so necessrios trinta e cinco anos para a aposentadoria. Esta lei atingir aqueles funcionrios que contavam com vinte e nove anos de servio, porque eles ainda no haviam adquirido o direito de aposentar-se. Tinham uma expectativa.

    Observa-se, portanto, que o que o direito visa proteger o direito futuro e no o direito passado, pois pretende ver continuado o respeito situao j incorporada ao patrimnio jurdico da pessoa. Isto porque o direito j da pessoa, em razo de esta j haver cumprido todos os requisitos para adquiri-lo e, por isso, j t-lo incorporado ao seu patrimnio jurdico, ainda que no integrada ao seu

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    patrimnio econmico, como na hiptese de a aposentadoria no haver sido requerida, apesar de a pessoa j haver obtido todas as condies para este fim.

    Em resumo, havendo direito adquirido, a norma nova deve respeitar a situao (direito) completamente constituda anteriormente a sua vigncia, sendo afastada, portanto, a sua incidncia. Assim, direito adquirido aquele que, j estando integrado do patrimnio do beneficirio, pode ser exercido a qualquer momento, no podendo, lei posterior, que discipline a matria de modo diferente, causar-lhe prejuzo.

    No caso da aposentadoria, se houver mudana nas regras para a sua concesso e o provvel beneficirio, nesta ocasio, j houvesse cumprido todas as condies para requer-la, pode-se dizer que esta pessoa possui direito adquirido concesso da aposentadoria de acordo com o prazo anteriormente previsto. Isto porque o segurado adquire direito aposentadoria no momento em que rene todos os requisitos para obt-la. A aposentadoria est regulada pela lei vigente naquele momento. As modificaes posteriores no se aplicam, pois caso houvesse retroatividade, atingiria o direito adquirido.40

    A prpria Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, no seu artigo 122, menciona hiptese de direito adquirido, pois dispe que se for mais vantajoso, fica assegurado o direito aposentadoria, nas condies legalmente previstas na data do cumprimento de todos os requisitos necessrios obteno do benefcio, ao segurado que, tendo completado 35 anos de servio, se homem, ou 30 anos, se mulher, optou por permanecer em atividade.

    A Lei n. 9.876, de 26 de novembro de 199941, tambm foi clara ao admitir o direito adquirido, no seu artigo 6., pois previu que: garantido ao segurado que at o dia anterior data de publicao desta lei tenha cumprido os requisitos para a concesso de benefcio o clculo segundo as regras ento vigentes.

    Interessante para a anlise do tema a verificao das decises obtidas na jurisprudncia do Supremo Tribunal Federal e que acabaram por solidificar o entendimento de que h direito adquirido - irrevogvel, portanto, por lei

    39 MARTINS, Srgio Pinto. Direito Adquirido e Reforma Previdenciria, Revista da Previdncia

    Social, Ano XXIII, n. 222, So Paulo: LTr, maio de 1999, p. 454 a 455. 40

    MARTINS, Srgio Pinto. Direito da Seguridade Social. So Paulo: Atlas, 1999, p. 69. 41

    BRASIL. Lei n. 9.874, de 26 de novembro de 1999, que modifica as normas de benefcio e custeio da Previdncia Social e d outras providncias, publicada no Dirio Oficial da Unio em 29.11.1999.

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    superveniente - concesso da aposentaria com base na lei vigente ao tempo em que o beneficirio cumpriu os requisitos necessrios para a sua obteno.

    Veja-se a seguinte deciso, bastante elucidativa:

    Direito adquirido. Aposentadoria. Se, na vigncia da lei anterior, o impetrante preenchera todos os requisitos exigidos, o fato de, na sua vigncia, no haver requerido a aposentadoria, no o fez perder o seu direito, que j estava adquirido. Um direito adquirido no pode transmudar em expectativa de direito, s porque o titular preferiu continuar trabalhando e no requerer a aposentadoria antes de revogada a lei em cuja vigncia ocorrera a aquisio do direito. Expectativa de direito algo que antecede sua aquisio; e no pode ser posterior a esta. Uma coisa a aquisio do direito; outra; diversa o seu uso ou exerccio. No devem ser confundidas. E convm ao interesse pblico que no o sejam, porque, assim, quando pioradas pela lei as condies da aposentadoria, se permitir que aqueles eventualmente atingidos por ela mas j ento com os requisitos para se aposentarem de acordo com a lei anterior, em vez de o fazerem imediatamente, em massa, como costuma ocorrer, com grave nus para os cofres pblicos, continuem trabalhando, sem que o Tesouro tenha que pagar, em cada caso, a dois: ao novo servidor em atividade e ao inativo. Recurso provido para conceder a segurana (Supremo Tribunal Federal. Acrdo de Recurso de Mandado de Segurana n. 11.395/PR, em que foi relator o Ministro Luiz Gallotti, julgado por maioria em 18.03.1965, publicado na Revista Trimestral de Jurisprudncia n. 33/255)

    Dos votos proferidos neste acrdo retiram-se, ainda, trechos importantes, uma vez que houve grande divergncia de opinies sobre a questo discutida. de se transcrever, por esta razo, alguns trechos que fundamentaram as opinies contrrias:

    Voto do Sr. Ministro Victor Nunes: (...) razovel o temperamento, que se tem estabelecido, ao princpio de que a aposentadoria se rege pela lei vigente ao tempo de sua decretao, a saber: a aposentadoria compulsria rege-se pela lei do dia em que deveria ter sido decretada. Do mesmo modo, quando o interessado requer a aposentadoria no regime da lei anterior e o decreto s vem a ser expedido na vigncia da lei nova os efeitos da aposentadoria so os da poca do

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    requerimento, desde que reunidos, ao tempo, os requisitos necessrios

    Voto do Sr. Ministro Evandro Lins: (...): A lei que regula aposentadoria a lei do tempo do requerimento.

    Observa-se, assim, que a questo pontual da discusso dava-se porque alguns ministros consideravam aplicvel aposentadoria, somente a lei vigente quando do seu requerimento, ou seja, o requerimento seria requisito para aquisio do direito. Isto porque, na poca, a redao da Smula n. 359 do Supremo Tribunal Federal era a seguinte: Ressalvada a reviso prevista em lei, os proventos da inatividade regulam-se pela lei vigente ao tempo em que o militar, ou o servidor civil, reuniu os quesitos necessrios, inclusive a apresentao do requerimento, quando a inatividade for voluntria (grifou-se), cujo possvel descumprimento fora levantado como questo de ordem durante a votao do acrdo, pelo ento Ministro Victor Nunes, que temia que a deciso, nos termos em que foi ementada, iria de encontro ao disposto na smula referida.

    Sobre a questo de ordem levantada, assim manifestou-se o Ministro Luiz Gallotti:

    Ainda hoje, no comeo da sesso, fiz um apelo ao eminente Ministro Victor Nunes quanto a esta matria de smulas. No me canso de aplaudir as Smulas, reconhecendo e proclamando sua grande utilidade. Mas assim como o gs utilssimo para vrios fins, tambm pode servir para matar. Do mesmo modo a Smula, se levada ao exagero, pode concorrer para a consolidao do erro, que corresponderia a morte de um direito. s vezes, no meu modesto modo de ver, uma deciso no est certa, mas, porque consta da Smula, somos levados a deixar que permanea.

    As decises posteriores, em sua maioria pautadas no acrdo citado, firmaram o entendimento do Supremo Tribunal Federal neste sentido, verbis:

    Funcionrio Pblico. Aposentadoria. Se na vigncia da lei anterior o servidor (no caso magistrado) preenchera todos os requisitos exigidos. O fato de, na sua vigncia, no haver requerido a aposentadoria, no o fez perder o seu direito, j que estava adquirido. Recurso extraordinrio conhecido, mas no provido.

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    (Supremo Tribunal Federal. Acrdo do Recurso Extraordinrio n. 62.361/SP, em que foi relator o Ministro Evandro Lins, julgado por unanimidade 12.11.1968, publicado na Revista Trimestral de Jurisprudncia n. 48/392)

    Magistrado. Aposentadoria com 25 anos. Direito a ela adquirido pela satisfao de todos os seus pressupostos, antes de a lei que os alterasse, ainda que exercitado aps o seu advento. Motivao. Precedentes. Recurso conhecido, mas no provido. (Supremo Tribunal Federal. Acrdo do Recurso Extraordinrio n. 67.680/SP, em que foi relator o Ministro Thompson Flores, julgado por unanimidade em14.11.1969, publicado na Revista Trimestral de Jurisprudncia n. 54/486)

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    CAPTULO II - O TRABALHADOR RURAL E A LEGISLAO REFERENTE AO RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIO

    O estudo da legislao previdenciria, no que diz respeito ao trabalhador rural, demonstra, inicialmente, a formao de uma linha divisria ocorrida com a promulgao da Constituio Federal de 1988, uma vez que esta equiparou o trabalhador rural ao trabalhador urbano e incluiu os trabalhadores rurais, garimpeiros42 e pescadores artesanais, que atuam individualmente ou em regime de economia familiar, entre os segurados abrangidos pela Previdncia Social. 43

    Entre as mais importantes inovaes tem-se, no entanto, aquela relacionada concesso de aposentadoria por tempo de servio ao trabalhador rural. O artigo 202 e pargrafo segundo da Carta Magna (posteriormente modificados pela Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 199844) dispuseram:

    assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefcio sobre a mdia dos trinta e seis ltimos salrios-de-

    42 Posteriormente, a Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998 modificou a redao

    do artigo 195 da Constituio Federal de 1988 para excluir o garimpeiro dentre os segurados mencionados pelo dispositivo. 43

    BRASIL. Constituio Federal de 1988, artigo 194. 44

    A redao atual do artigo 202 e do seu pargrafo segundo so as seguintes: O regime de previdncia privada, de carter complementar e organizado de forma autnoma em relao ao regime geral de previdncia social, ser facultativo, baseado na constituio de reservas que garantam o benefcio contratado, e regulado por lei complementar. Pargrafo segundo: As contribuies do empregador, os benefcios e as condies contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefcios das entidades de previdncia privada no integram o contrato de trabalho dos participantes, assim como, exceo dos benefcios concedidos, no integram a remunerao dos participantes, nos termos da lei.

    Da aposentadoria do trabalhador rural passou a tratar, tambm, em virtude da emenda citada, o pargrafo stimo, inciso II, do artigo 201, nestes termos: assegurada aposentadoria no regime geral de previdncia social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condies: II sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exeram atividades em regime de economia familiar, nestes includos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.

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    contribuio, corrigidos monetariamente ms a ms, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salrios-de-contribuio de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condies: I aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta para a mulher, reduzido em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exeram suas atividades em regime de economia familiar, neste includos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal;

    2. Para efeito de aposentadoria, assegurada a contagem recproca do tempo de contribuio na administrao pblica e na atividade privada, rural e urbana, hiptese em que os diversos sistemas de previdncia social se compensaro financeiramente, segundo critrios estabelecidos em lei.(grifou-se)

    Observa-se, portanto, que a Constituio Federal de 1988 garantiu aos trabalhadores rurais a proteo previdenciria na forma da aposentadoria por tempo de servio, mesmo no que se refere ao tempo de servio prestado antes da sua promulgao, ou seja, garantia do reconhecimento de tempo de servio destes trabalhadores sem a correspondente contribuio previdenciria, uma vez que esta, at ento, no era feita pelos trabalhadores rurais por no haver previso legal.

    Isto porque at a Constituio Federal de 1988 vigeu, neste aspecto, a Lei Complementar n. 11, de 25 de maio de 197045, que, no que diz respeito aposentadorias, previa apenas aposentadoria por velhice e invalidez, no mencionando aposentadoria por tempo de servio (artigo 2.). A mesma lei previa, ainda, em seu artigo 15, incisos I e II, como forma de custeio dos benefcios por ela concedidos, a contribuio de 2% (dois por cento) sobre o valor comercial dos produtos rurais, a ser recolhida pelo adquirente da produo (adquirente, consignatrio ou cooperativa) ou, ainda, pelo produtor, no caso de este industrializar os seu produtos.

    No havia, desta forma, qualquer outro tipo de contribuio, a qualquer ttulo e sem perodo determinado, destinada a benefcio de aposentadoria.

    O artigo 202 da Constituio Federal de 1988 foi, por sua vez, regulamentado pela Lei n. 8.213, de 21 de julho de 1991, que assim disps no seu

    45 BRASIL. Lei Complementar n. 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistncia

    ao Trabalhador Rural PRORURAL, publicada no Dirio Oficial da Unio em 26.05.1971.

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    artigo 10: Os beneficirios do Regime Geral de Previdncia Social classificam-se como segurados e dependentes, nos termos das sees I e II deste captulo. E, ainda, no artigo 11:

    So segurados obrigatrios da Previdncia Social as seguintes pessoas fsicas: (...) VII - como segurado especial: o produtor o parceiro, o meeiro e o arrendatrio rurais, o garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exeram suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxlio eventual de terceiros, bem como com seus respectivos cnjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 (quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. 1.. Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da famlia indispensvel prpria subsistncia e exercido em condies de mtua dependncia e colaborao, sem a utilizao de empregados.

    Como se pode ver, a lei elenca expressamente entre os segurados a categoria dos segurados especiais e, alm destes, inclui, tambm, os seus respectivos cnjuges ou companheiros e filhos maiores de quatorze anos como beneficirios, com a condio de que estes trabalhem, comprovadamente, com o respectivo grupo familiar, em condio de colaborao e mtua dependncia.

    A Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, trata dos benefcios devidos ao trabalhador rural no seu artigo 39, que dispe especificamente acerca da obrigatoriedade de concesso dos benefcios de aposentadoria por idade, aposentadoria por invalidez, auxlio-doena, auxlio-recluso e penso por morte e demais benefcios previstos na lei, desde que cumpridos os requisitos para sua concesso.

    Estes benefcios, de acordo com a mencionada lei, independem de contribuio prvia, exigindo-se apenas a comprovao do exerccio da atividade rural no perodo imediatamente anterior ao requerimento do benefcio, igual ao perodo de carncia do benefcio requerido.

    A aposentadoria por tempo de servio, por sua vez, foi o benefcio mencionado por esta lei que mais gerou conflitos quando da sua aplicao, especialmente com relao ao cumprimento do perodo de carncia, da contagem

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    recproca de tempo de servio e especialmente das formas de comprovao do exerccio da atividade rural. Esta ltima questo, por requerer maior anlise, ser apreciada no prximo captulo.

    2.1 A questo da carncia

    A carncia uma das questes mais discutidas com relao aposentadoria do trabalhador rural, por esta razo, importante que se esclarea de incio, com o esclio de Bruno Mattos e Silva46 que a exigncia da carncia para concesso de aposentadoria por tempo de servio estabelecida pela Lei n. 8.213/91 no retirou nenhum direito dos trabalhadores rurais. Pelo contrrio, mencionada lei at concedeu mais um: aposentadoria por tempo de servio, aps cumprida a carncia.

    Passa-se, desta forma, a analisar a legislao referente ao tema. O pargrafo segundo do artigo 55 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991

    disps, inicialmente, que, exceto para efeito de carncia, o tempo de servio do trabalhador rural, anterior data de incio de vigncia da desta lei seria contado independentemente de contribuio, nos termos de posterior regulamento.

    A regulamentao consolidou-se, por sua vez, com o Decreto n. 611, de 21 de julho de 199247, que disps, nos seus artigos 23 a 26, que no seria computado, para fins de carncia, o tempo de servio anterior a competncia de 1991. Disps, tambm, que, para fins de aposentadoria por tempo de servio, o perodo de carncia para o segurado especial contribuinte individual, seria de 180 contribuies mensais, contado a partir da data do efetivo recolhimento da primeira contribuio, sem atraso.

    O artigo 58, inciso X, deste decreto disps, por fim, que o tempo de servio do segurado trabalhador rural anterior competncia novembro de 1991, seria computado independentemente do recolhimento das contribuies.

    46 SILVA. Bruno Mattos e. Trabalhadores Rurais e Aposentadoria por tempo de Servio: a questo da

    carncia, Revista da Previdncia Social, Ano XXII, n. 216, So Paulo: LTr, novembro de 1988, p. 936. 47

    BRASIL. Decreto n. 611, de 21 de julho de 1992, que d nova redao ao Regulamento de Benefcios da Previdncia Social, aprovado pelo Dec. n 357, de 7 de dezembro de 1991 e incorpora alteraes da legislao posterior, publicado no Dirio Oficial da Unio em 22.07.1992.

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    A Lei n. 8.213, de 24 de julho de 199148 dispe, ainda, no seu artigo 143:

    O trabalhador rural, ora enquadrado como segurado obrigatrio do Regime Geral de Previdncia Social, na forma da alnea a do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei pode requerer aposentadoria por idade, no valor de 1 (um) salrio mnimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da vigncia desta Lei, desde que comprove o exerccio de atividade rural, ainda que descontnua, no perodo imediatamente anterior ao requerimento do benefcio, em nmero de meses idntico carncia do referido benefcio.

    Pode-se concluir, ento, a partir do disposto neste artigo, que a lei garante quele que no cumpriu os requisitos para aposentadoria por idade anteriormente a sua publicao (bem como atingiria a idade para aposentadoria antes de cumprir os requisitos para a aposentadoria por tempo de servio) a faculdade de requer-la, at 2006, comprovando apenas que exerceu atividade rural, ainda que de forma descontnua, durante os 15 anos anteriores ao requerimento, haja vista que o atual perodo de carncia exigido para a aposentadoria por idade de 180 meses.

    Bruno Mattos e Silva49 assim se manifestou sobre a questo: O rurais continuam com a mesma possibilidade de se aposentarem por idade que tinham antes da Lei n. 8.213/91, nos mesmos termos da LC n. 11/71, uma vez que o art. 143 da Lei n. 8.213/91 prev a possibilidade de aposentadoria por idade para os rurais que comprovarem o exerccio da atividade em perodo anterior ao requerimento, exatamente para suprir a carncia que eles no tem.

    Iracildo Binicheski50, comenta, tambm, a este respeito, que:

    Distinta e distinta tem que ser a investigao relativamente a quem j exercia a atividade hoje reconhecida como de Segurado Especial que somado este tempo com o decorrido aps os atuais Planos de Custeio e de Benefcio pode requerer a Aposentadoria por Tempo de Servio -, daqueles que podem habilitar-se apenas a benefcio decorrente

    48 Redao dada pela Lei n. 9.063, de 16 de junho de 1995, que dispe sobre o salrio mnimo, altera

    disposies das Leis 8.212 e 8.213, de 24 de julho de 1991 e d outras providncias, publicada no Dirio Oficial da Unio em 20.07.1995. 49

    SILVA. Bruno Mattos e. Trabalhadores Rurais e Aposentadoria por tempo de Servio: a questo da carncia. Revista da Previdncia Social, ano XXII, n. 216, So Paulo: LTr, novembro de 1998, p. 936. 50

    BINICHESKI, Iracildo. A aposentadoria por tempo de servio do segurado especial. Revista da Previdncia Social, ano XXII, n. 217, So Paulo: LTr, dezembro de 1998, p. 1033.

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    da idade, porque no implementam tempo suficiente para jubilao. Esta distino que a lei traa inteligente: aquele que, chegando idade de aposentao (55 ou 60 anos), apenas pode comprovar atividade ao longo do perodo mnimo de tempo (art. 282 do Decreto n. 612/92) (sic)51, ainda assim podem requerer suas aposentadorias por idade. Todavia, aqueles que exerceram a atividade ao longo dos anos necessrios (30 ou 35 anos), porque a Lei no excluiu os segurados especiais do direito, podem requerer suas aposentadorias por tempo de servio.

    Assim, diante das questes expostas, o que se pode observar que o pargrafo segundo do artigo 55 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, quando autoriza a contagem de tempo de servio rural, independentemente de contribuio, trataria apenas da contagem deste tempo de servio para fins de aposentadoria na rea urbana, ou seja, para contagem recproca de tempo de servio, uma vez que, nos termos exigidos pela lei, o trabalhador rural que sempre viveu no meio rural acabar por completar a carncia para a concesso da aposentadoria por idade antes de cumprir os requisitos para a aposentadoria por tempo de servio.

    Por fim, no Decreto n. 2.172, de 5 de maro de 199752, que aprovou novo Regulamento de Benefcios da Previdncia Social e suprimiu alguns dos direitos anteriormente concedidos ao trabalhador rural, conforme se demonstrar nos itens a seguir, pode-se aplicar raciocnio semelhante ao exposto acima.

    Disps o pargrafo primeiro do seu artigo 23: para o segurado especial, considera-se perodo de carncia o tempo mnimo de efetivo exerccio de atividade rural, ainda que de forma descontnua, igual ao nmero de meses necessrios concesso do benefcio requerido e, tambm, no pargrafo terceiro: No computado para efeito de carncia o tempo de atividade do trabalhador rural anterior competncia novembro de 1991.

    Diz, ainda, o pargrafo nico do artigo 25: Para o segurado especial no contribuinte individual, o perodo de carncia de que trata o 1. do art. 23 contado

    51 O nmero do artigo citado no existe no referido decreto, ainda assim, permanece a lgica do trecho

    transcrito, apenas devendo-se considerar que o perodo mnimo a que se refere seja o perodo de carncia. 52

    BRASIL. Decreto n. 2.172, de 5 de maro de 1997, que aprova o Plano de Benefcios da Previdncia Social, publicado no Dirio Oficial da Unio 06.03.1997. Este Decreto revogou totalmente o disposto no Decreto n. 611, de 21 de julho de 1992.

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    a partir do efetivo exerccio da atividade rural, mediante comprovao, na forma do disposto no art. 60.

    Por outro lado, no artigo 58, pargrafos terceiro e quarto, foi restringida, a partir de 14 de outubro de 1996, a utilizao do tempo de atividade rural anterior a 1991, independentemente de contribuio, somente para a obteno de aposentadoria por idade e benefcios de valor mnimo, nos termos dispostos no artigo 258 do mesmo decreto.

    Assim, considerando que o artigo 26 dispe que a carncia ser de 180 meses no caso de aposentadoria por idade e tempo de servio, pode-se concluir que:

    a) se o disposto no artigo 23, pargrafo primeiro e terceiro e no artigo 25, pargrafo nico, fossem aplicados conjuntamente para o trabalhador rural que sempre trabalhou no meio rural, este, independentemente de quanto tempo j tivesse trabalhado, s poderia se aposentar em 2006, ou seja, 15 anos contados a partir de 1991. Isto, no entanto, absurdo, pois no caso de o trabalhador rural j estar na proximidade da idade para obter o benefcio da aposentadoria por idade na ocasio da publicao da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, teria ainda que trabalhar durante os 15 anos da carncia para ter direito ao benefcio;

    b) por outro lado, se, como no raciocnio anterior, considerar-se que o pargrafo terceiro aplicvel somente quele trabalhador que visa a contagem recproca de tempo de servio (explicitada no item seguinte) lgico o disposto na lei.

    2.2 A contagem recproca do tempo de servio

    A Constituio Federal de 1988, em seu artigo 202, pargrafo segundo53, disps que para efeito de aposentadoria, assegurada a contagem recproca do tempo de contribuio na administrao pblica e na atividade privada, rural e

    53 A redao deste pargrafo foi modificada pela Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de

    1998 que assim passou a dispor: As contribuies do empregador, os benefcios e as condies contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefcios das entidades de previdncia privada no integram o contrato de trabalho dos participantes, assim como, exceo dos benefcios concedidos, no integram a remunerao dos participantes, no termos da lei.

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    urbana, hiptese em que as diversas entidades de previdncia social se compensaro financeiramente, segundo critrios estabelecidos em lei.

    A Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, conforme determinado pela Constituio Federal de 1988, estabeleceu os critrios para a contagem recproca de tempo de servio nos seus artigo 94 a 98. O caput do artigo 94 apenas repetiu o que j havia disposto a Constituio. O artigo 96, inciso V, por sua vez, disps que o tempo de servio do segurado trabalhador rural, anterior data de incio de vigncia desta Lei, ser computado sem que seja necessrio o pagamento das contribuies a ele correspondentes, desde que cumprido o perodo de carncia. Por fim, ressaltou o artigo 99, que o benefcio, resultante de contagem de tempo de servio seria concedido e pago pelo sistema ao qual o interessado estivesse vinculado ao requer-lo, e calculado na forma da respectiva legislao.

    O Decreto n. 611, de 21 de julho de 1992 - Regulamento dos Benefcios da Previdncia Social -, determinou, tambm, no seu artigo 202, que a aposentadoria por tempo de servio, na qual fosse utilizada a contagem recproca, seria concedida ao segurado do sexo feminino e masculino, respectivamente, a partir dos 25 e 30 anos completos de servio.

    A contagem recproca de tempo de servio suscitou algumas divergncias na sua aplicao, conforme se v nas decises transcritas abaixo:

    Aposentadoria Tempo de servio - Rural e Urbana Somatrio. A regra da reciprocidade prevista no pargrafo 2. do artigo 202 da Constituio Federal restrita ao tempo de contribuio na administrao pblica e na atividade privada. A referncia s espcies rural e urbana informa a abrangncia nesta ltima. A seguridade social com a universalidade da cobertura e do atendimento, bem como a alcanar a uniformizao e equivalncia dos benefcios e servios as populaes urbanas e rurais resulta do teor do artigo 194, submetendo-se tais princpios ao que previsto nos artigos 195, par. 5. e 59, os dois primeiros do corpo permanente da Lei Bsica Federal e o ltimo das Disposies Transitrias. A aposentadoria na atividade urbana mediante juno do tempo de servio rural somente devida a partir de 5 de abril de 1991, isto por fora do disposto no artigo 145 da Lei n. 8.213, de 1991, e na Lei n. 8.212/91, no que implicaram a modificao, estritamente legal, do quadro decorrente da Consolidao das Leis da Previdncia Social - Decreto n. 89.312, de 23 de janeiro de 1984.

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    (Supremo Tribunal Federal. Acrdo do Recurso Extraordinrio n.148510/SP, Relator Ministro Marco Aurlio, julgado por unanimidade em 31.10.1994, publicado no Dirio da Justia da Unio de 04.08.1995.)54

    Previdencirio. Aposentadoria por tempo se servio. Contagem recproca. O pargrafo 2. do art. 202 da CF/88, que estabelece os critrios para a contagem recproca do tempo de servio rural e urbano, para fins de aposentadoria, auto-executvel, motivo pelo qual deve ela ser considerada a partir da data da promulgao da Carta Poltica. (BRASIL. Tribunal Regional Federal da Quarta Regio. Acrdo na Apelao Cvel n. 93.04.06887/RS, relatora Juza Luiza Dias Cassales, julgado por unanimidade em 14.12.1995, publicado no Dirio da Justia da Unio de 07.12.1996. )55

    Assim, mesmo aps o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justia haverem decidido que a norma seria aplicvel somente a partir de 5 de abril de 1991, em virtude do disposto no artigo 145 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, os tribunais inferiores continuaram decidindo que a norma constitucional que tratou do assunto seria auto-aplicvel e, portanto, vigeria desde a promulgao da Constituio Federal de 1988.

    O Decreto n. 2.172, de 5 de maro de 1997, por seu turno, restringiu, no seu artigo 58, pargrafos terceiro e quarto, a possibilidade de contagem recproca de tempo de servio, por meio da utilizao do tempo de atividade anterior a 1991, independentemente de contribuio, somente para a obteno de aposentadoria por idade e benefcios de valor mnimo, a partir de 14 de outubro de 1996.

    2.3 Reconhecimento do tempo de filiao e averbao do tempo de servio

    Faz-se necessrio, por fim, esclarecer estes dois outros conceitos. Reconhecimento do tempo de filiao

    o direito que o segurado tem de ver reconhecido, em qualquer poca, o tempo de servio por ele exercido em

    54Tambm neste sentido o acrdo do Superior Tribunal de Justia no Recurso Ordinrio em Mandado de Segurana n. 11021/SC, relator Ministro Flix Fischer, julgado por unanimidade em 26.10.1999, publicado no Dirio da Justia da Unio de 22.11.1999.

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    atividade abrangida pela Previdncia Social, mas a qual no era exigida obrigatoriamente a filiao.

    Neste caso, em atividades outras, exigido o pagamento das contribuies no pagas, de acordo com normas especficas; para o trabalhador rural, no entanto, o reconhecimento independe do recolhimento destas contribuies, no perodo anterior novembro de 1991.

    A averbao do tempo de servio, por seu turno, consiste no registro, em documento hbil, em que se reconhece a filiao Previdncia Social, ou seja, servir como comprovao de tempo se servio.

    Assim, o tempo de servio do trabalhador rural, reconhecido administrativa ou judicialmente, ser averbado perante a Previdncia Social para fins de obteno dos benefcios a ele vinculados.

    O Decreto n. 2.172, de 5 de maro de 1997, vedou, tambm, no seu artigo 58, pargrafo quarto, a possibilidade de averbao do tempo de servio rural, independentemente de contribuio, anterior a 1991, conforme explicitado no item acima.

    2.4 A legislao previdenciria referente ao reconhecimento do tempo de servio rural a partir da Constituio Federal de 1988

    Com relao comprovao do tempo de servio, disps a Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, nos seguintes termos:

    Artigo 55. O tempo de servio ser comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, alm do correspondente s atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior perda da qualidade de segurado:

    2. O tempo de servio do segurado trabalhador rural, anterior data do incio de vigncia desta Lei ser computado independentemente do recolhimento das contribuies a ela correspondentes, exceto para efeito de carncia, conforme dispuser o regulamento.

    55Tambm neste sentido o acrdo do mesmo tribunal na Remessa ex officio n. 1993.04.17771/RS, relator Juiz Amir Finocchiaro Sarti, julgado por unanimidade em 04.01.1996, publicado no Dirio da Justia da Unio de 14.02.1996.

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    3. A comprovao do tempo de servio para os efeitos desta lei, inclusive mediante justificao administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, s produzir efeito quando baseada em incio de prova material, no sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo motivo de fora maior ou caso fortuito,

    conforme disposto no regulamento.

    Artigo 96. O tempo de contribuio ou de servio de que trata esta seo ser contado de acordo com a legislao pertinente, observadas as normas seguintes: (...) V o tempo de servio do segurado trabalhador rural, anterior data de incio da vigncia desta lei, ser computado sem que seja necessrio o pagamento das contribuies a ele correspondentes, desde que cumprido o perodo de carncia.

    No mesmo sentido dispunha o Decreto n. 611, de 21 de julho de 1992 no seu artigo 58: So contados como tempo de servio, entre outros:(...) X o tempo de servio do segurado trabalhador rural anterior competncia novembro de 1991, independentemente do recolhimento das contribuies.

    Em concluso, v-se que a legislao, at este momento, dispunha apenas que, cumprido o perodo de carncia, o trabalhador rural poderia computar o tempo de servio rural exercido anteriormente novembro de 1991, desde que efetivamente comprovado, para fins de obter o benefcio de aposentadoria por tempo de servio.

    A Medida Provisria n. 1.52356 editada em 11 de outubro de 1996, visou a alterar dispositivos da Lei n. 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991. Especificamente com relao ao trabalhador rural, a citada medida provisria atingiu frontalmente direitos seus, em razo de visar a modificao do artigos 4857, pargrafo segundo, do artigo 55 e artigo 96 e da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, para que passassem a vigorar com a seguinte redao:

    56 BRASIL. Medida Provisria n. 1.523, de 11 de outubro de 1996, que altera dispositivos das Leis n.

    8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991 e d outras providncias, publicada no Dirio Oficial da Unio em 12.10.1996. 57

    A redao original do artigo 48 e do seu pargrafo nico so as seguintes: A aposentadoria por idade ser devida ao segurado que, cumprida a carncia exigida nesta Lei completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, ou 60 (sessenta), se mulher, reduzidos esses limites para 60 e 55 anos de idade para os trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alnea a do inciso I e nos incisos IV e VII do art. 11. Pargrafo nico: A comprovao do efetivo exerccio de atividade rural ser feita com relao aos meses imediatamente anteriores ao requerimento do

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    Artigo 48. A aposentadoria por idade ser devida ao segurado que completar 65 anos de idade, se homem, e sessenta, se mulher, desde que tenha

    cumprido a carncia exigida nesta Lei e no receba benefcio de aposentadoria de qualquer regime previdencirio.

    Artigo 55. (...)

    2. O tempo de atividade rural anterior a novembro de 1991, dos segurados de que tratam a alnea a do inciso I ou do inciso IV do art. 11, bem como o tempo de atividade rural do segurado a que se refere o inciso VII do art. 11, sero

    computados exclusivamente para fins de concesso do benefcio previsto no art. 143 desta Lei e dos benefcios de valor mnimo, vedada sua utilizao para efeito de

    carncia, de contagem recproca e de averbao de tempo de servio que tratam os arts. 94 e 99 desta Lei, salvo se o segurado comprovar o recolhimento das

    contribuies relativas ao respectivo perodo, feito em poca prpria.

    Artigo 96. O tempo de servio anterior ou posterior obrigatoriedade de filiao previdncia social s ser contado mediante indenizao da contribuio

    correspondente ao perodo respectivo, com acrscimo de juros moratrios de um por cento ao ms e multa de dez por cento.

    Observa-se, desta maneira, que foi brusca a mudana havida em virtude da edio da Medida Provisria 1.523, de 11 de outubro de 1996. O legislador visou, especificamente, os perodos de filiao anteriores a 1. de novembro de 1991, pois a partir desta data, os trabalhadores rurais foram obrigados a contribuir Previdncia Social.

    de se salientar, ainda, que, nos termos da medida provisria, o exerccio de trabalho rural, naquele perodo, no serviria para cumprimento de perodo de carncia, contagem recproca, bem como para concesso de benefcios de valor superior ao mnimo, seno por meio da comprovao de recolhimento da contribuio em poca prpria, e, em conseqncia, que a nova norma pretendia beneficiar a todos os citados somente com as prestaes previstas pelo artigo 143 - auxlio-doena, aposentadoria por invalidez, auxlio-recluso, penso por morte e aposentadoria por idade ou as demais de valor mnimo.

    Ainda, em virtude desta mudana, houve a supresso do disposto no inciso V do artigo 96 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, que assegurava

    benefcio, mesmo que de forma descontnua, durante perodo igual ao da carncia do benefcio, ressalvado o disposto no inciso II do art. 143.

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    expressamente a contagem do tempo de servio rural sem que fosse necessria a comprovao do recolhimento de contribuies, exceto para o fim de carncia.

    Wladimir Novaes Martinez58 ao comentar sobre a edio da citada medida provisria opina:

    O dispositivo representa posio filosfica contrria a universalidade da seguridade social e solidariedade social, arrostando os dois princpios tcnicos e

    jurdicos correspondentes; poltica suicida ou estimuladora do xodo rural, inconstitucional por contrariar a equivalncia urbano-rural e cientificamente

    imprpria. A perseguio ao rurcola chega ao extremo de, sabidamente tratando de hipossuficiente, fixar seu direito no calcado na filiao (como acontece com todos

    os segurados), mas sim, no recolhimento, e , feito oportunamente (quando no ignora haver possibilidade de parcelamento e acrscimos legais). Uma soluo,

    talvez, materialmente necessria, mas um desastre jurdico.

    Estando assente, portanto, a inconstitucionalidade da referida medida provisria, em razo da ofensa provocada ao artigo 194, pargrafo nico, inciso I, 201 caput e pargrafo 1. e artigo 202, inciso I, da Constituio Federal de 1988, foi proposta Ao Direta de Inconstitucionalidade autuada sob o n. 1.664-4/DF, na qual o Supremo Tribunal Federal manifestou-se liminarmente59 acerca da aplicao do artigo 55, pargrafo 2., da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, nos seguintes termos60:

    Pela relevncia jurdica da argio de inconstitucionalidade por ofensa aos artigos 194, pargrafo nico, inciso I, 201 caput e pargrafo 1. e art. 202, inciso I, da

    CF, o Tribunal, apreciando medida liminar requerida em ao direta proposta pelo Partido Democrtico Trabalhista PDT, dos Trabalhadores PT e Comunista do Brasil PCB contra dispositivos da Lei 8.213/91, com redao dada pela Medida

    Provisria 1.523-11/97, o Tribunal deferiu o pedido para suspender, at deciso final da ao, a eficcia do art. 48 e do art. 107. Concedeu-se, ainda, a cautelar quanto o 2. do art. 55 para suspender a eficcia da expresso exclusivamente para fins de

    concesso do benefcio previsto no art. 143 desta Lei e dos benefcios de valor mnimo. Em relao ao inciso IV do art. 96 da citada Lei n. 8.213/91, o Tribunal deu

    interpretao conforme Constituio para afastar a aplicao do mencionado dispositivo no tempo de servio do trabalhador rural, no perodo em que ele esteve

    desobrigado de contribuir. Vencido, na extenso do deferimento o Min. Marco

    58 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Comentrios Lei Bsica da Previdncia Social. Tomo II. So

    Paulo: LTr, 1997, p. 325. 59

    O julgamento foi presidido pelo Min. Carlos Velloso e realizado pelo Plenrio em 13 de novembro de 1997. A publicao do texto da medida liminar concedida foi feita no Dirio da Justia da Unio de 19.12.1997. 60

    Informativo do Supremo Tribunal Federal, Braslia, 10 a 14 de novembro de 1997, n. 92, p. 1.

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    Aurlio, que suspendia todos os dispositivos objeto da ao. Ao Direta de Inconstitucionalidade 1.664-DF, rel. Min. Octvio Gallotti, 13.11.97.61

    Em 11 dezembro de 1997 foi publicada a Lei n. 9.52862 que resultou da converso da Medida Provisria n. 1.596-14, de 10 de novembro de 1997, esta, a ltima reedio da originria Medida Provisria n. 1.523, de 11 de outubro de 1996.

    Esta lei, no entanto, respeitada a suspenso da eficcia concedida liminarmente pelo Supremo Tribunal Federal, no alterou o disposto no artigo 48, pargrafo 2., do artigo 55 e artigos 96 e 107, todos da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991.

    A Ao Direta de Inconstitucionalidade n. 1.664-4/DF, at o momento final desta pesquisa, ainda aguarda julgamento de mrito, mantendo-se, assim, o inteiro teor da deciso liminar.

    A Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, regulamentou, ainda, os meios de comprovao do exerccio da atividade rural, elencando-os, no seu artigo 106, que se transcreve a seguir:

    Art. 106. Para comprovao do exerccio da atividade rural ser obrigatrio, a partir de 16 de abril de 1994, a apresentao da Carteira de Identificao e

    Contribuio CIC, referida no 3. do art. 12 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991. (Redao dada pela Lei n. 9.063/95).

    Pargrafo nico. A comprovao do exerccio da atividade rural referente a perodo anterior a 16 de abril de 1994, observado o disposto no par. 3. do art. 55 desta lei, far-se-, alternativamente, atravs de: (Pargrafo acrescido pela Lei n.

    9.063/95) I Contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdncia

    Social; II Contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;

    III Declarao do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS (Redao dada pela Lei n. 9.063/95);63

    61 As redaes dos artigos 96 e 107 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991 so as seguintes: Art. 96.

    O tempo de servio anterior ou posterior obrigatoriedade de filiao previdncia social s ser contado mediante indenizao da contribuio correspondente ao perodo respectivo, com acrscimo de juros moratrios de um por cento ao ms e multa de dez por cento e Art. 107. O tempo de servio de que trata o art. 55 desta Lei, exceto o previsto em seu 2., ser considerado para clculo do valor da renda mensal de qualquer benefcio os demais artigos citados j foram transcritos anteriormente. 62

    BRASIL. Lei n. 9.528, de 10 de dezembro de 1997, que altera dispositivos das Leis n. 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991 e d outras providncias, publicada no Dirio Oficial da Unio em 11.12.1997. 63

    O incisos desta lei possuam originariamente as seguintes redaes: III declarao do sindicato de trabalhadores rurais desde que homologada pelo Ministrio Pblico ou por outras autoridades

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    IV Comprovante de cadastro no INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar (Redao dada pela Lei n. 9.063/95);

    V Bloco de notas do produtor rural (Redao dada pela Lei n. 9.063/95)

    Neste sentido dispem ainda o artigo 105 que diz que a apresentao de documentao incompleta no constitui motivo para recusa do requerimento do benefcio e o artigo 108 que esclarece que observados os demais requisitos da lei a falta de documento poder ser suprida por meio de justificao administrativa perante a Previdncia Social.

    O Decreto n. 611, de 21 de julho de 1992, veio em seguida regulamentar a concesso dos benefcios concedidos na Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991. Inovou, no entanto, no seu artigo 60, exigindo que os documentos apresentados para comprovao do tempo de servio fossem contemporneos aos fatos a comprovar, bem como mencionassem data de incio e trmino.

    O Ministrio da Previdncia e Assistncia Social, diante da concesso do novo benefcio, editou vrias portarias, seguidas, tambm, de ordens de servio expedidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social INSS, visando a regulamentao e aplicao nos seus mbitos de atuao. Dentre estas normas, sero mencionadas aquelas que tratam das principais questes a serem abordadas neste trabalho, em ordem cronolgica, juntamente com a legislao federal publicada a este respeito.

    A Portaria do Ministrio da Previdncia e Assistncia Social n. 3.513, de 19 de agosto de 199664, foi editada com o intuito de regulamentar a comprovao do exerccio da atividade rural. No seu artigo 2. esclareceu que os documentos exigidos deveriam abranger o perodo a ser comprovado, bem como que seriam considerados como prova plena do exerccio da atividade rural, mesmo que de forma descontnua. Disse, tambm, no artigo 3., que a comprovao do exerccio de atividade rural do segurado especial, bem como de seu respectivo cnjuge, companheiro ou companheira, filhos maiores de quatorze anos e dependentes a estes equiparados, deveria ser feita mediante a apresentao de um dos

    definidas pelo CNPS; IV declarao do Ministrio Pblico. A lei possuia, ainda, a