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MORCEGOS NEOTROPICAIS BIOLOGIA, ECOLOGIA E TÉCNICAS DE COLETA ROBERTO LEONAN MORIM NOVAES

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MORCEGOS NEOTROPICAIS BIOLOGIA, ECOLOGIA E TÉCNICAS DE COLETA

ROBERTO LEONAN MORIM NOVAES

Apostila básica

ROBERTO LEONAN MORIM NOVAES

Rio de Janeiro

2008

MORCEGOS NEOTROPICAIS BIOLOGIA, ECOLOGIA E TÉCNICAS DE COLETA

Esta é uma obra independente e foi desenvolvida para fins educacionais, não sendo autorizada a sua

reprodução e comercialização. A distribuição digital é feita gratuitamente pelo autor e Projeto Pró-Morcegos.

_______________________________________________________

QUEM SOMOS?

O Projeto Pró-Morcegos é uma organização de ação ambiental que surgiu em

2004 no Rio de Janeiro com a finalidade de promover pesquisas sobre a biologia,

conservação e ecologia dos morcegos do Brasil. Além do desenvolvimento de pesquisas

científicas o Projeto oferece cursos, palestras e aulas em universidades, empresas,

órgãos públicos e organizações privadas. Este projeto é independente e sem fins

lucrativos, que visa apenas conscientizar e informar a população sobre a importância

de se preservar esses animais para se manter um ecossistema equilibrado.

COORDENAÇÃO

Luis Fernando Menezes Jr.

Ana Carolina Duarte

PESQUISA E AÇÃO AMBIENTAL

Roberto Leonan Morim Novaes

COLABORAÇÃO

Ana Cristina Façanha

Carla Clarissa Nobre de Oliveira

Carolinne Isabella Dias Gomes

Flávio Augusto Pereira Mello

Mariana Vieira Pinto Aguiar

PROJETO PRÓ-MORCEGOS Tel.: (21) 3624 0628

E-mail: [email protected] www.promorcegos.org

PROJETO PRÓ-MORCEGOS

Índice

I Aspectos gerais sobre a Ordem Chiroptera...................................................................1 Introdução.................................................................................................................2 Classificação..............................................................................................................2 Nota biológica............................................................................................................3 Distribuição...............................................................................................................4 Morfologia..................................................................................................................5 Ecolocalizador............................................................................................................7 Taxonomia.................................................................................................................8 Evolução....................................................................................................................9 Referências bibliográficas.......................................................................................11 II Introdução aos morcegos neotropicais........................................................................15 Referências bibliográficas.......................................................................................17 III Hábitos alimentares e importância ecológica...........................................................18 Introdução...............................................................................................................19 Frugivoria e dispersão de sementes.......................................................................19 Nectarivoria e polinização......................................................................................21 Insetivoria e controle de pragas.............................................................................22 Piscivoria e controle de populações........................................................................23 Carnivoria e controle de populações......................................................................24 Hematofagia............................................................................................................25 Referências bibliográficas.......................................................................................26 IV Raiva em quirópteros..................................................................................................33 Introdução...............................................................................................................34 Patogenia.................................................................................................................34 Sintomatologia em mamíferos................................................................................35 Sintomatologia em morcegos hematófagos............................................................35 Sintomatologia em morcegos não hematófagos.....................................................36 Referências bibliográficas.......................................................................................37 V Abrigos diurnos............................................................................................................39 Introdução...............................................................................................................40 Abrigos naturais......................................................................................................40 Abrigos artificiais....................................................................................................42 Referências bibliográficas.......................................................................................45 VI Reprodução..................................................................................................................49 Introdução...............................................................................................................50 Monoestria...............................................................................................................51 Poliestria.................................................................................................................51 Gestação..................................................................................................................52 Referências bibliográficas.......................................................................................53 VII Conservação...............................................................................................................56 Introdução...............................................................................................................57 Conservação dos morcegos do Brasil......................................................................58 Refêrencias bibliográficas.......................................................................................60 VIII Técnicas de coleta....................................................................................................62 Introdução...............................................................................................................63 Métodos de captura.................................................................................................63 Triagem...................................................................................................................69 Referências bibliográficas.......................................................................................74

I

ASPECTOS GERAIS SOBRE A ORDEM CHIROPTERA

Reino: Metazoa

Filo: Chordata

Classe: Mammalia

Ordem: Chiroptera

Subordem: Megachiroptera

Subordem: Microchiroptera

INTRODUÇÃO

Os morcegos são animais noturnos e os únicos mamíferos capazes de

realizar um vôo mecânico verdadeiro, sendo isso possível graças às grandes

adaptações que estes animais sofreram nos membros anteriores (HILL &

SMITH, 1988). Pertencem à ordem Chiroptera, que provém do grego “Cheir”

(mão) e “Pteron” (asa), que indica que suas asas são, na verdade, uma mão

altamente modificada (PERACCHI et al., 2006). Chiroptera é a segunda maior

ordem entre os mamíferos, possuindo 1113 espécies (SIMMONS, 2005), sendo

ultrapassada apenas pela ordem dos roedores (Rodentia).

CLASSIFICAÇÃO

Embora alguns autores considerem que a Ordem Chiroptera possua uma

origem monofilética (SIMMONS, 1994; HUTCHEON & KIRSCH, 2006), os

quirópteros, como também são chamados, são divididos em duas subordens

distintas, Megachiroptera e Microchiroptera. A primeira é encontrada

exclusivamente no Velho Mundo, e compreende uma única família

(Pteropodidae) com 42 gêneros e 185 espécies, enquanto a segunda está

amplamente distribuída por todo o globo, envolvendo 17 famílias, 157 gêneros

e 928 espécies (SIMMONS, 2005).

Classificação taxonômica dos Chiroptera

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NOTA BIOLÓGICA

Megachiroptera

Dentre os Megachiroptera estão os maiores morcegos conhecidos, sendo o

maior de todos o Pteropus vampyrus (raposa-voadora). Este morcego, nativo de

algumas ilhas da Ásia e Oceania, pode apresentar uma envergadura de 1,7

metros e ter até 1,5 quilos (KUNZ & JONES, 2000). Apesar do grande tamanho,

estes morcegos são frugívoros, podendo apresentar também hábitos

nectarívoros em menor freqüência. Além disso, não possuem ecolocalizador e

guiam-se unicamente pela visão, que na maior parte das espécies é bem

desenvolvida (NOWAK, 1994). A maioria das espécies de Megachiroptera tem

olhos grandes e focinho alongado próprio para o consumo de frutos e néctar

(PERACCHI et al., 2006).

Microchiroptera

Nesta subordem se encontra o menor de todos os morcegos,

Craseonycteris thonglongyai. Conhecido como morcego-abelha, habita as

florestas do sudeste da Ásia, sendo encontrado principalmente na Tailândia.

Pesa 2g e tem uma envergadura de asas de cerca de 10cm (HILL & SMITH,

1981). Os Microchiroptera apresentam um tamanho relativamente pequeno se

comparados aos grandes morcegos frugívoros do Velho Mundo. Neste grupo se

encontra a maior diversidade de morcegos e a maior variedade de hábitos

alimentares (PERACCHI et al., 2006). Estão amplamente distribuídos por todo

globo, habitando todos os continentes. Os Microchiroptera apresentam um

sistema de ecolocalização que auxilia na locomoção e na procura e captura de

alimentos (ARITA & FENTON, 1997; GRIFFIN, 2001). Mesmo possuindo um

complexo ecolocalizador os microquirópteros não descartam o uso da visão. A

maior parte das espécies possui um campo visual bem desenvolvido e bastante

usual.

3

DISTRIBUIÇÃO

Morcegos estão amplamente distribuídos por todo o globo e ocupam quase

todos os ambientes terrestres, sendo encontrados em todos os continentes,

exceto em algumas ilhas do Pacífico e regiões muito frias como as calotas

polares ou regiões de altitude extrema (HILL & SMITH, 1988). Os

Megachiroptera têm ocorrência restrita e são encontrados na Ásia, África,

Oceania e diversas ilhas dos oceanos Índico e Pacífico. Por outro lado os

Microchiroptera são distribuídos por todos os continentes e diversas faixas

insulares (DRUMMOND, 2004).

Aqui no Brasil encontramos apenas os morcegos da subordem

Microchiroptera com 168 espécies distribuídas em nove famílias (REIS et al.,

2007; MIRANDA et al., 2007). São elas: Emballonuridae, Vespertilionidae,

Molossidae, Mormoopidae, Noctilionidae, Furipteridae, Thyropteridae,

Natalidae e Phyllostomidae. Segundo JONES (2002), a maior diversidade e

abundância de quirópteros está localizado nos trópicos, sendo ainda maior nos

neotrópicos, e por isso essas regiões recebem o nome de Hotspots.

Esquematização de gradientes de cores aplicado ao grau de riqueza de morcegos. Branco: Nenhuma espécie por 500km² / Vermelho: 120 espécies por 500km².

(original de JONES, 2002)

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MORFOLOGIA

Os quirópteros apresentam uma das mais ricas variedades de formas

entre os mamíferos, apresentando fisionomias e morfologia bem diferenciadas.

A maior parte dos morcegos tem tamanho corporal pequeno, apresenta o corpo

coberto por pêlos, sendo estes muito finos, podendo ser mais ou menos densos

ou alongados, dependendo da espécie. A coloração pode variar bastante, e,

embora predomine um padrão oscilante entre o marrom-escuro e pardo

acinzentado, há morcegos amarelos, completamente brancos, vermelhos,

pretos, alaranjados e até mesmo multicoloridos (GRAHAM, 1994)

As asas dos morcegos são, na verdade, uma adaptação especial dos

membros anteriores e são formados pelos braços, mãos e pelo prolongamento

da pele (chamada de patágio). Os dedos das mãos são constituídos

basicamente pelos mesmos ossos de uma mão humana, porém sofreram um

notável alongamento, mais precisamente no segundo, terceiro, quarto e quinto

dedos. Os ossos do antebraço (ulna e rádio) também sofreram um alongamento

e juntamente com o braço (úmero) são responsáveis por pouco menos da

metade da extensão das asas no seu comprimento. O conjunto ósseo das asas é

leve e a maior parte dos músculos se concentra no antebraço do animal. Desde

os ombros até os membros posteriores há um prolongamento da pele, o

patágio, composto por uma fina camada de tecido conectivo envolvido

superficialmente por uma também fina pele elástica e bastante irrigada. É

esse conjunto que dá forma à asa do morcego. Apenas o polegar fica fora do

prolongamento do patágio. Algumas espécies possuem uma membrana

prolongada entre os membros posteriores chamada de uropatágio.

Os membros posteriores dos morcegos sofreram diversas adaptações, e

com isso não se tornaram capazes de sustentar o próprio corpo como em outros

mamíferos (NEUWEILER, 2000). Em decorrência da adaptação ao vôo, as pernas

dos morcegos não possuem uma estrutura óssea que favoreça a locomoção

íntegra. A curvatura do joelho possui uma rotação inversa a dos demais

mamíferos, de tal forma que a rótula se encontra voltada para trás em relação

ao corpo. Ao mesmo tempo, tornou-se vantajosa a postura de repouso com a

cabeça voltada para baixo, possibilitando ao morcego abandonar o ponto de

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pouso e se deixar cair para iniciar o vôo, sem gasto de energia com impulsos

para cima (NEUWEILER, 2000).

Uma questão interessante nesse comportamento de repouso é que os

morcegos desenvolveram um mecanismo de contra-peso por meio de um

dispositivo de “trava” automático ativado pelo próprio peso do animal, que faz

com que os tendões dos dedos mantenham estes involuntariamente

tensionados, sem contrações musculares, permitindo ao morcego suportar o

peso do corpo de cabeça para baixo com um gasto bastante reduzido de

energia, o que é bastante vantajoso e oportuno (NEUWEILER, 2000).

A anatomia interna dos morcegos é basicamente igual a dos outros

mamíferos placentados, embora possa haver algumas diferenciações quanto ao

sistema digestório, especialmente estômago e intestino, que são os mais

adaptados a dietas específicas.

Em resposta ao ecolocalizador, alguns Microchiroptera desenvolveram

uma pequena estrutura no rosto denominada de folha nasal. Acredita-se que a

folha nasal atue como um receptor para as ondas emitidas pelo seu biosonar.

Outra estrutura, chamada Trago (tragus), encontrada em todos os

microquirópteros, atua também como um receptor do ecolocalizador. O trago

fica localizado na entrada do pavilhão auricular dos morcegos e constitui-se de

uma protuberância cartilaginosa bem maleável.

Morfologia externa (http://www.morcegolivre.vet.br)

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ECOLOCALIZADOR

Além da visão, os Microchiroptera utilizam outra ferramenta para

auxiliar no vôo e na procura de alimentos, o ecolocalizador. Existem duas

teorias que abordam o surgimento do ecolocalizador. A primeira defende que

os morcegos teriam desenvolvido a eco-orientação como uma resposta à

captura de insetos na escuridão, quando tais mamíferos começaram a

desenvolver atividade de vôo, necessitando de um mecanismo que auxiliasse

na percepção e perseguição dos insetos predados (NEUWEILER, 2000;

SPEAKMAN, 2001). A segunda teoria, mais difundida no meio científico, defende

que o sistema de ecolocalização teria surgido não como uma adaptação ao

comportamento alimentar, mas como uma adaptação à escuridão do ambiente

cavernícola adotado num segundo estágio da evolução (FENTON, 1992). A

grosso modo, o ecolocalizador constitui-se de ondas de alta freqüência

produzidas por estalidos feitos na laringe dos morcegos. Estas ondas são

emitidas freqüentemente enquanto o morcego voa e, ao se chocar com algum

corpo (objeto, planta ou animal), retornam e são receptadas pelo tragus e pela

folha nasal (nos morcegos que possuem). As ondulações das ondas são

codificadas e transportadas ao cérebro, onde o animal obtém informações sobre

a textura, distância, forma e tamanho do corpo no qual as ondas se chocaram.

A partir destas informações o morcego conseguirá encontrar possíveis presas

para alimentação e o possibilitará desviar de objetos a sua frente enquanto

voa .

Devido ao seu hábito alimentar os morcegos insetívoros são os que

possuem o ecolocalizador mais sensível, já que para capturar insetos em pleno

vôo o morcego necessita de uma grande capacidade para localizá-los

(SCHNITZLER & KALKO, 2001).

Representação do ecolocalizador dos morcegos: envio das ondas, choque com um corpo, retorno e recepção.

(http://www.morcegolivre.vet.br)

7

TAXONOMIA

Fazer a identificação precisa das espécies de morcegos é uma tarefa

complexa, porém existem diversos caracteres que auxiliam na identificação

destes animais. Externamente os caracteres mais comuns adotados pelos

pesquisadores são, a pelagem (coloração e comprimento), o comprimento do

antebraço e até mesmo a forma do tragus (DIAS, 2007). Mesmo assim, a

identificação usando apenas essas características pode não certificar

verdadeiramente a espécie, e trabalhos que fazem a identificação da espécie

unicamente por morfologia externa acabam se tornando pouco relevantes. A

forma que garante maior precisão na identificação é a análise de caracteres

internos, principalmente o crânio e fórmula dentária (DIAS, 2007; SCATENA,

2006) e em menor freqüência são feitas análises genéticas (BAKER et al., 2003).

Atualmente, há muitas controvérsias quanto à descrição de espécies e

validades nomenclaturais. Além disso, a taxonomia de quirópteros está

baseada em descrições antigas, que necessitam de revisões taxonômicas

detalhadas, como feito para espécies do gênero Artibeus (DAVIS, 1984;

MARQUES-AGUIAR, 1994).

Diferenciação de espécies por análise craniana

A. Xeronycteris vieirai. B. Lonchophylla bokermanni.

Foto: Marcelo R. Nogueira

Diferenciação de espécies pela pelagem do uropatágio.

Artibeus lituratus (esquerda) Artibeus fimbriatus (direirta)

Foto: Daniela Dias

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EVOLUÇÃO

A história evolutiva dos morcegos ainda é bastante discutida, existindo

teorias variadas sobre a origem e os percursos evolutivos pelos quais

transitaram os primeiros morfo-morcegos. Os estudos em torno dos registros

fósseis indicam que os morcegos já possuíam um grau de diferenciação dos

outros mamíferos há cerca de 60 milhões de anos, no período Eoceno, quando

os mamíferos se encontravam em processo de transição evolutiva em

diferentes estágios. Há muitos registros fósseis de morcegos (SIMMONS &

GEISLER, 1998; SIMMONS et al., 2008), entretanto, mesmo os mais antigos

fósseis encontrados, datando de estágios diversos do Eoceno, já apresentam

uma estrutura morfológica similar dos morcegos atuais, com presença de uma

estrutura óssea, inclusive dos membros superiores para a formação das asas,

semelhante dos morcegos conhecidos nos dias de hoje (NEUWEILER, 2000;

NOWAK, 1997). Estudos de exemplares fósseis bem conservados mostram que

no período Eoceno os morcegos já apresentavam membrana alar

(HABERSETZER & STORCH, 1987), e detalhes da articulação dos ombros com o

alargamento da escápula para a inserção de músculos de vôo evidenciam que

naquele período os morcegos já realizavam a atividade de vôo batido

(HABERSETZER & STORCH, 1987; NORBERG, 1989). A teoria mais aceita no

meio científico defende o surgimento dos primeiros morcegos a partir do

memento em que começaram a surgir alterações comportamentais no nicho de

forrageamento e hábitat de um pequeno mamífero insetívoro de hábitos

noturnos, terrestre e com tendências arborícolas (HILL & SMITH, 1988; NOWAK,

1997). De acordo com esta teoria, o pequeno mamífero teria gradativamente

transitado para o nicho arborícola. Dessa alteração, modificações adaptativas

foram surgindo e assim, para compensar a habilidade de captura de insetos à

noite, o pequeno animal passaria a ganhar um comportamento saltador. Este

comportamento, pouco a pouco, num longo estágio, transitaria para o

comportamento planador, surgindo daí a tendência ao vôo, com modificações e

adaptações da membrana alar e estrutura óssea, para permitir a captura de

insetos que transitavam próximo aos ramos das árvores onde tais mamíferos

se encontravam (SPEAKMAN, 2001).

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Além disso, estudos mais aprofundados sobre a anatomia dos morcegos

fizeram surgir uma outra teoria sobre a evolução da ordem Chiroptera,

segundo a qual os morcegos tiveram duas origens evolutivas distintas (origem

polifilética), sugerindo que um grupo teria evoluído a partir dos primatas e o

outro da ordem Insectivora (SPEAKMAN, 2001; PETTIGREW, 1986; NEUWEILER,

2000). No entanto, seja qual for a origem evolutiva, os morcegos são grandes

exemplos do sucesso evolutivo de um grupo adaptado aos diversos tipos de

nichos e ambientes, e sua ampla abrangência geográfica evidencia esse

aspecto. A ordem dos quirópteros está atualmente distribuída por todos os

continentes, em praticamente todos os ecossistemas terrestres e regiões geo-

climáticas. Trata-se de um dos grupos mais representativos dos mamíferos,

não só pelo número de espécies catalogadas, mas também pela abundância de

indivíduos existentes, existindo espécies que formam as maiores colônias de

mamíferos do mundo (NOWAK, 1994).

Representação evolutivas dos morcegos: origem monofilética a partir de um pequeno mamífero arborícola.

(http://www.tparents.org)

Onychonycteris finneyi (SIMMONS et al., 2008)

Paleochiropteryx tupaiodon (SIMMONS & GEISLER, 1998)

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14

II

INTRODUÇÃO AOS

MORCEGOS NEOTROPICAIS

SOBRE AS FAMÍLIAS NEOTROPICAIS

Nos neotrópicos existe apenas a subordem Microchiroptera, contendo

dez famílias: Emballonuridea, Furipteridae, Molossidae, Momoopidae,

Natalidae, Noctilionidae, Phyllostomidae, Thyropteridae, Vespertilionidae

(SIMMONS, 2005). Destas famílias, seis são endêmicas do Novo Mundo:

Furipteridae, Mormoopidae, Natalidae, Noctilionidae, Phyllostomidae,

Thyropteridae, dentre as quais, estão presente todos os hábitos alimentares da

Ordem Chiroptera.

A fitofagia (ingestão de partes vegetais), por exemplo, é praticada por

grande parte das espécies de Phyllostomidae, sendo esta família a principal

responsável pela dispersão de sementes e polinização de flores, especialmente

em zonas áridas (PERACCHI et al., 2006).

A insetivoria é praticada por espécies de todas as famílias encontradas

em regiões neotropicais. A maior parte das espécies são insetívoras e formam

as maiores colônias de morcegos do planeta, com milhares de indivíduos

(GRAHAM, 1994). A insetivoria é de inestimável importância para o controle de

pragas e populações de insetos nos neotrópicos (LONG, 1996).

A piscivoria, consumo de peixes e artrópodes marinhos, é praticada por

duas famílias, Noctilionidae e Vespertilionidae, e são importantes no controle

de populações de peixes e artrópodes (BORDIGNON, 2006).

A carnivoria e a hematofagia são praticadas por espécies da família

Phyllostomidae. Morcegos carnívoros podem consumir anfíbios, répteis, aves,

pequenos roedores e até mesmo outros morcegos (PERACCHI et al., 2006). Os

morcegos hematófagos pertencem à subfamília Desmondontinae, e são os

principais responsáveis pela disseminação de raiva em herbívoros domésticos

(MAYEN, 2003).

A região neotropical é considerada a maior zona biodiversa do mundo, e

isso também se aplica aos quirópteros. Das dezoito famílias de morcegos

existentes no planeta, nove estão presentes nos neotrópicos, com cerca de 290

espécies (HUTSON et al., 2001).

16

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17

III

HÁBITOS ALIMENTARES

E IMPORTÂNCIA ECOLÓGICA

INTRODUÇÃO

Os morcegos podem apresentar hábitos alimentares muito variados, e

essa diversidade de dietas não é encontrada em nenhum outro grupo de

mamíferos. São utilizados como alimento insetos e outros artrópodes, frutos,

sementes, folhas, flores, pólen, néctar, pequenos vertebrados e sangue

(PERACCHI et al., 2006), por isso os quirópteros são considerados animais de

extrema importância para a manutenção do meio ambiente.

A maior parte das espécies de morcego existentes nos neotrópicos é

insetívora, com representantes de todas as famílias encontradas aqui. No

entanto, os morcegos mais abundantes possuem hábitos frugívoros, sendo

esses pertencentes a uma única família, Phyllostomidae (REIS et al., 2007).

FRUGIVORIA E DISPERSÃO DE SEMENTES

Os morcegos frugívoros encontrados aqui no Brasil e em todo o Novo

Mundo pertencem a uma única família, Phyllostomidae. Estes morcegos

podem consumir uma grande variedade de frutos, infrutescências, folhas,

sementes e outras partes vegetais (ZORTÉA, 2007). GARDNER (1977) cita 95

espécies vegetais sendo consumidas por uma única espécie frugívora (Artibeus

jamaicensis). Entre os principais frutos consumidos estão os das famílias

Piperaceae, Solanaceae, Cecropiaceae e Moraceae (MELLO, 2002; PASSOS &

SILVA, 2003; PASSOS et al., 2003; PASSOS & GRACIOLLI, 2004; MELLO, 2006).

Alguns estudos indicam que morcegos têm preferência por frutos macios e

carnosos (PASSOS et al., 2003; NOVAES et al. no prelo), o que pode estar ligado

ao valor nutricional deles (MORRISON, 1980) e ao paladar (HERRERA, 1982).

Por possuir grande mobilidade (BERNARD & FENTON, 2003), e não

destruírem as sementes ingeridas (FLEMING & SOSA, 1994), morcegos

frugívoros são considerados importantes na dispersores de sementes (MELLO

et al., 2008), o que é crucial na dinâmica e regeneração de florestas

(WHITTAKER & JONES, 1994).

Morcegos costumam utilizar trilhas e caminhos abertos no interior das

matas como rota de locomoção, e com isso as sementes que atravessam o tubo

19

digestivo desses morcegos são eliminadas junto com as fezes durante o vôo,

gerando novas plantas (BARRESE, 2005). Os frutos maiores, que possuem

sementes impossíveis de serem ingeridas, acabam sendo carregadas pelos

morcegos para serem comidas em locais longe da planta mãe, e após o

consumo da polpa os morcegos abandonam a semente (NOVAES et al. no prelo).

Por possuir um comportamento voador, morcegos são capazes de ultrapassar

barreiras geográficas difíceis ou impossíveis para outros mamíferos e por isso

conseguem, em pouco tempo, disseminar uma grande quantidade de sementes

em uma vasta área.

Alguns vegetais co-evoluíram com os morcegos (quiropterocoria),

desenvolvendo estruturas especiais e infrutescências atrativas aos morcegos,

facilitando a sua dispersão (BARRESE, 2005). Um exemplo de planta

quiropterocórica são as Piperaceae (especialmente o gênero Piper), que

segundo MELLO (2002), são os principais recursos alimentares de Carollia

perspicillata. Outros exemplos de quiropterocoria e interações específicas são

as plantas Solanaceae (especialmente Solanum) e os morcegos Sturnira lilium

(MELLO, 2006), Moraceae (especialmete Ficus) e Cecropiaceae com espécies dos

gêneros Artibeus, Platyrrhinus e Chiroderma (NOGUEIRA & PERACCHI, 2002;

2003; ZORTÉA, 2007).

Artibeus lituratus Foto: Roberto Novaes

Carollia perspicillata Foto: Roberto Novaes

Ficus (Moraceae) Foto: Marco Mello

Piper (Piperaceae) Foto: Roberto Novaes

Sturnira lilium Foto: Marco Mello

Solanum (Solanaceae) Foto: Marco Mello

Espécies de morcegos freqüentes no Brasil e as principais plantas utilizadas como ali-mento por elas.

20

NECTARIVORIA E POLINIZAÇÃO

Morcegos nectarívoros (ou polinívoros) pertencem à família

Phyllostomidae e são os principais dispersores de pólen, sendo responsáveis

por grande parte da reprodução de diversas espécies de flores (SAZIMA et al.,

1999; SILVA & PERACCHI, 1999). Essas espécies têm especial destaque na

polinização de plantas raras e endêmicas, como Dyssochroma viridiflorum,

solanácea epífita e endêmica da Mata Atlântica (SAZIMA et al., 2003), e

Pticairnia albiflos, bromeliácea rara e endêmica de afloramentos rochosos no

Rio de Janeiro (WENDT et al., 2001). A dispersão de pólen é quase de total

exclusividade dos Chiroptera já que aves, como os beija-flores, têm sua

atividade alimentar restrita à parte do dia, enquanto morcegos têm longa

atividade desde o crepúsculo até o amenhacer. Acredita-se que algumas flores

noturnas co-evoluíram com os morcegos, desenvolvendo estruturas atrativas

especiais e adaptadas à morfologia destes morcegos, adaptação que é chamada

de quiropterofilia (TSCHAPKA et al., 1999; STROO, 2000; FENSTER et al., 2004).

As flores que fazem parte da síndrome da quiropterofilia normalmente

apresentam cores mais claras, odor atrativo, e nectários desenvolvidos que

facilitem o acesso dos morcegos ao seu interior. Esse mutualismo é mais

comum do que parece, já que mesmo morcegos de dieta predominantemente

frugívora ou até mesmo onívora acabam por utilizar as flores como fontes de

nutrição (SILVA & PERACCHI, 1999). Parte das flores nortunas, principalmente

de zonas áridas, dependem quase que exclusivamente dos morcegos para sua

reprodução (SORIANO et al., 2000), sendo os morcegos nectarívoros os

principais agentes polinizadores de cactáceas presentes nestes ambientes

(PETIT, 1995; NASSAR et al., 1997).

Glossophaga soricina Foto: Roberto Novaes

Bombacaceae Foto: Roberto Novaes

Espécie de morcego com ampla distribuição no Brasil, sendo muito comum em áreas florestais e ambientes urbanos; e uma espécie de bombacácea, planta considerada como quiropterofílica

21

INSETIVORIA E CONTROLE DE PRAGAS

A maior parte das espécies possui hábito alimentar insetívoro

(ALTRINGHAM, 1996). Todas as famílias presentes na região neotropical

apresentam espécies com dieta parcial ou exclusivamente composta por

insetos, de inúmeras Ordens: Diptera, Lepidoptera, Orthoptera, Coleoptera,

Hemiptera, Hymenoptera, Isoptera, Neuroptera, Odonata, entre outras

(DEBELICA et al., 2006; DECHMANN et al., 2006).

Apesar do termo “insetívoro”, os morcegos com essa dieta podem

consumir outros artrópodes, como aracnídeos, diplópodos e quilópodos

(ALTRINGHAM, 1996). Morcegos insetívoros, podem consumir o dobro do seu

peso em insetos em uma única noite e por isso são os principais controladores

naturais de artrópodes (ROMANO et al., 1999), sendo extremamente

importantes para a agricultura e o meio ambiente. LONG (1996) cita que a

introdução de morcegos em zonas rurais reduziu drasticamente as pragas

agrícolas, possibilitando a diminuição no uso de agrotóxicos.

ROMANO et al. (1999) estimaram o consumo de cerca de 385kg de

insetos/noite por uma colônia com aproximadamente 64.000 morcegos

molossídeos da espécie Tadarida brasiliensis, e segundo ALTRINGHAM (1996),

essa mesma colônia é responsável por consumir 13.000 toneladas de insetos

durante o verão.

Analisando os hábitos alimentares das espécies insetívoras, é possível

observar a incidência de diversas ordens de insetos que podem ser prejudiciais

à sociedade, tanto como pragas urbanas, quanto agrícolas. A grande

quantidade de insetos consumidos por noite indica que morcegos são de

inestimável importância para o controle das populações desses insetos e das

pragas causadas por eles.

Molossus molossus Foto: Marco Mello

Eptesicus brasiliensis Foto: Roberto Novaes

Espécies consideradas “comuns” na maior parte do território brasileiro. São freqüententemente capturadas em áreas florestais e urbanas e são consideradas como grandes contro-dores de insetos e pragas.

22

PISCIVORIA E CONTROLE DE POPULAÇÕES

Na região neotropical existem duas espécies piscívoras (ou ictiófagas

como citam alguns autores): Noctilio leporinus (Noctilionidae) e Myotis vivesi

(Vespertilionidae). Estas espécies se alimentam de alevinos de água doce ou

salgada, ártropodes aguáticos e terrestres (ALTENBACH, 1989; BORDIGNON,

2006). Dentre os muitos peixes consumidos por estes morcegos, estão os das

famílias Clupeidae, Atherinopsidae, Mugelidae, Englaulidae, Centropomidae e

Carangidae, e dentre os artrópodes utilizados na alimentação estão

principalmente os das Classes Insecta, Crustacea e Arachnida (BORDIGNON &

FRANÇA, 2002; BORDIGNON, 2006).

Devido à plasticidade de seus hábitos alimentares e ao metabolismo

acelerado, o que os leva consumo de grandes quantidades alevidos por noite

(BORDGNON, 2006), morcegos piscívoros são de grande importância ambiental,

já que são grandes controladores de população, seja de peixes ou de

artrópodes.

No Brasil, há registro apenas para Noctilio leporinus, que costuma ser

visto em ambientes costeiros, principalmente baías, prais de baixo

hidrodinamismo, lagoas e lagos.

Noctilio leporinus Foto: Marco Mello

Noctilio leporinus tem ampla distribuição em território brasileiro, porém poucos estudos sobre sua biologia e ecologia foram feitos.

23

CARNIVORIA E CONTROLE DE POPULAÇÕES

Dentre todas as famílias, apenas Phyllostomidae apresenta espécies com

uma dieta carnívora. O comportamento alimentar de tais morcegos é baseado

no consumo de pequenos vertebrados como pequenos roedores, anfíbios

(Anuros), pequenas aves, e até mesmo outros morcegos (PERACCHI et al., 1982;

FENTON, 1992; ESBÉRARD & BERGALLO, 2004; BORDIGNON, 2005; OPREA et al.,

2006). No entanto, boa parte das espécies carnívoras também podem consumir

artrópodes regularmente (PERACCHI & ALBUQUERQUE, 1976) e eventualmente

frutos (UIEDA et al., 2007) e por isso, muitas vezes são consideradas onívoras.

Segundo FENTON et al. (1992), morcegos pertencentes à guilda dos

animalívoros são indicadores de ambientes preservados, e por isso raros em

ambientes urbanos e áreas fragmentadas.

Sendo assim, os morcegos que compõem este grupo são responsáveis,

juntamente com outros animais, pelo controle das populações de pequenos

vertebrados e artrópodes de áreas florestais.

Chrotopterus auritus Foto: Marco Mello

Tonatia bidens Foto: Marco Mello

Vampyrum spectrum Foto: Maricélio Guimarães

Os morcegos carnívoros brasileiros pertencem à subfamília Phyllostominae. Chroropterus auritus e Tonatia bidens, possuem grande distribuição, ocorrendo em grande parte do país. Já Vampyrum spectrum possui distribuição restrita, com ocorrência predominante no ecossistema amazônico.

24

HEMATOFAGIA

O mais especialista e restrito dos hábitos alimentares dos morcegos, e o

que mais gera polêmica e discussão é a hematofagia, uma dieta sustentada

pela ingestão de sangue. Dentre as mais de mil espécies de morcegos

existentes no mundo (SIMMONS, 2005), apenas três possuem esse

comportamento alimentar peculiar. Diphylla ecaudata é a que possui os

hábitos mais especializados, consumindo apenas o sangue de aves de médio e

grande porte (GREENHALL et al., 1984). Outra espécie, Diaemus youngi, é a

espécie mais rara, e com ocorrência restrita. Ataca preferencialmente aves,

mas pode consumir sangue de cabras e gado eventualmente (GREENHALL &

SCHUTT JR., 1996; PERACCHI et al., 2006). Das três espécies hematófagas,

Desmodus rotundus é mais comum e abundante, com ampla distribuição em

toda América do Sul e América Central (GREENHALL et al., 1983). Este

morcego se alimenta de sangue de mamíferos, especialmente porcos, cavalos e

gado, e é responsável pelos eventuais ataques a humanos (AGUIAR, 2007).

O ataque desses morcegos consiste em um pequeno ferimento feito com os

incisivos (BERNARD, 2005). A saliva destes animais possui enzimas (Draculina)

que inibem a coagulação do sangue, e dois canais em cada lado da língua lhes

permitem ingeri-lo (CIPRANDI et al., 2003). Cada morcego ingere de 15 a 25 ml

de sangue por noite e um animal parasitado poderá ser visitado durante a

noite por mais de um morcego (PERACCHI et al., 2006). Devido às propriedades

anticoagulantes e anestésicas de sua saliva, os morcegos hematófagos vêm

ganhando espaço em diversas pesquisas nas áreas da farmacologia e

toxicologia.

Desmodus rotundus Foto: Marco Mello

Diphylla ecaudata Foto: Carolinne Dias-Gomes

Morcegos vampiros não são muito comuns em zonas urbanas, sendo mais comumente encon-trado em áreas florestais e rurais. As três espécies de vampiro ocorrem no Brasil.

25

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32

IV

RAIVA EM QUIRÓPTEROS

INTRODUÇÃO

A enfermidade mais comumente associada aos morcegos é a Raiva,

doença virótica aguda e letal (BREDT et al., 1998). Diversas espécies de pelo

menos três famílias (Phyllostomidae, Molossidae e Vespertilionidae) já

tiveram a Raiva diagnosticada (ALMEIDA et al., 1994; CUNHA et al., 2006).

A Raiva quando transmitida por morcegos hematófagos, principalmente

Desmodus rotundus, pode trazer grandes prejuízos à percuária da América

Latina devido à contaminação de herbívoros domésticos (GREENHALL et al.,

1983; ACHA & MÁLAGA-ALBA, 1988). O vírus rábico parece ter encontrado nos

morcegos hematófagos o melhor e o mais eficiente veículo de propagação, uma

vez que estes agridem diariamente outros animais usados como alimentação e

até mesmo outros morcegos nas interações sociais (BREDT et al., 1998).

MAYEN (2003) alerta sobre o impacto do vírus rábico sobre a saúde

pública, entretando, a vacinação de animais domésticos reduz o risco de

epidemia, e mesmo os morcegos sendo potenciais transmissores da Raiva

(CUNHA et al., 2006), acredita-se que eles não oferecem grandes riscos à

sociedade de um modo geral.

PATOGENIA

O vírus da Raiva ataca o sistema nervoso central de mamíferos e, para

que haja a infecção, ele deve entrar em contato com a corrente sangüínea do

animal, seja por meio de uma ferida, corte, mordedura, arranhão ou contato

com líquidos corpóreos contaminados (BERNARD, 2005). Um dos locais de maior

concentração do vírus são nas glândulas salivares do animal, o que aumenta a

possibilidade de transmissão por contato da saliva contaminada (BREDT et al.,

1998; BERNARD, 2005). É bom enfatizar que não só morcegos são vetores da

Raiva, pelo contrário, a maior partes das infecções são constatadas em

carnívoros silvestres e domésticos, embora qualquer animal de sangue quente

seja susceptível à Raiva, em menor ou maior grau (BREDT et al., 1998).

34

SINTOMATOLOGIA DE RAIVA EM MAMÍFEROS

Um mito comum é de que morcegos são imunes ao vírus, porém isso não é

verdade (BERNARD, 2005). Segundo BREDT et al. (1998), em quirópteros a

Raiva apresenta três fases: prodrômica, excitativa e paralítica.

A fase prodrômica possui curta duração, de 2 a 3 dias, caracterizada pelos

sinais iniciais da doença. O animal apresenta pequenas alterações

comportamentais como hiperexcitabilidade à luz, ruídos, deslocamentos de ar

e outros fatores externos.

Na fase excitativa os sintomas são os mais associados à doença. Durante

esta fase, encontram-se exacerbados os sinais de hiperexcitabilidade

observados durante a fase prodrômica e o animal pode se tornar agressivo. A

fase excitativa pode durar de 3 a 7 dias, quando a transmissão do vírus é mais

freqüente.

SINTOMATOLOGIA EM MORCEGOS HEMATÓFAGOS

E COMPORTAMENTO SOCIAL

A sintomatologia da raiva em morcegos hematófagos, especificamente em

D. rotundus, é relativamente bem conhecida. O comportamento e os sintomas

mais freqüentes são: atividade alimentar diurna, hiperexcitabilidade,

agressividade, tremores, falta de coordenação dos movimentos, contrações

musculares e paralisia. No começo da enfermidade, os indivíduos doentes

afastam-se da colônia, deixam de realizar asseio corporal, seus pêlos tomam-se

desalinhados e sujos. Tremor generalizado pode ser observado em vários deles.

Feridas frescas são freqüentes e provocadas por agressões de seus

companheiros sadios a cada tentativa de reintegração ao grupo, de onde são

expulsos violentamente. O morcego enfermo perde a capacidade de voar e pode

cair ao chão. A incapacidade de vôo é o primeiro sintoma motriz observado nos

morcegos raivosos, porém isto não os impede de caminhar pelo chão ou pelas

paredes (BREDT et al., 1998).

Num estágio mais avançado da doença os morcegos infectados começam a

ter mais dificuldades de caminhar e de sustentar seu corpo sobre os pés e

35

polegares das asas. Sinais de desidratação são percebidos e há um aumento

gradativo dos sintomas paralíticos, com maior intensidade nas asas do que nas

extremidades posteriores. A morte do indivíduo pode ocorrer cerca de 48 horas

após o aparecimentos dos sintomas.

SINTOMATOLOGIA EM MORCEGOS NÃO HEMATÓFAGOS

Nestes morcegos a raiva manifesta-se principalmente sob a forma

paralítica sem a visualização da fase excitável. Há alguns relatos de casos de

morcegos insetívoros americanos voando e perseguindo outros morcegos, casos

atribuídos a indivíduos raivosos em fase agressiva. Em outras regiões, não há

relatos semelhantes. Relatos de paralisia das asas e retenção urinária foram

descritos para a espécie Tadarida brasiliensis, no Estado do Texas, EUA. A

paralisia progressiva das asas dificulta o vôo e em uma fase mais adiantada

da doença os morcegos deixam de voar. Nessas situações os morcegos podem

deixar de sair para se alimentar, ou quando fora do abrigo, enfrentam

dificuldades para retomar. Morcegos encontrados em locais não habituais, no

chão, sobre móveis, pendurados em cortinas, paredes, janelas e muros, têm

grandes chances de estarem contaminados pelo vírus da Raiva, assim como

aqueles que estejam voando durante o dia (BRASS, 1994; BREDT et al., 1998).

No Brasil, 48,1% das espécies infectadas com vírus rábico são insetívoras, 18,5% são frugívoras, nectarívoras e hematófagas somam 11,1% cada, carnívoras 7,4% e onívoras 3,7%. Mesmo assim, devido ao seu hábito alimentar, os morcegos vampiros ainda são os principais transmissores do vírus rábico para outros animais.

(BREDT et al., 1998)

Segundo UIEDA et al. (1996), cerca de 27 espécies de morcegos já foram diagnosticadas com Raiva no Brasil, no entanto, em 80% dos casos a transmissão para humanos é feita por cães e gatos (CUNHA et al., 2005).

36

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38

V

ABRIGOS DIURNOS

INTRODUÇÃO

Morcegos passam a metade de suas vidas dentro dos abrigos, por isso não

é surpreendente que as condições e eventos relacionados aos abrigos tenham

um papel importante na ecologia e evolução deles (KUNZ,1982). Os abrigos

provém locais para acasalamento, criação de filhotes, interações sociais e

digestação alimentar, além de protegerem os morcegos das adversidades

climáticas e de predadores (KUNZ, 1982; KUNZ & MCCRACKEN, 1996). Assim, as

condições de um abrigo têm influência direta sobre as taxas de natalidade e

mortalidade, tornando-o especialmente importante para a sobrevivência de

uma espécie (KUNZ, 1982).

Normalmente, fatores como estabilidade da temperatura ambiente,

umidade e luminosidade, determinam a ocupação (BREDT et al., 1998).

A ecologia dos abrigos de morcegos pode ser vista como uma interação

complexa de adaptações fisiológicas, comportamentais, morfológicas e

respostas demográficas (KUNZ, 1982), que podem envolver a fidelidade a um

mesmo abrigo (ESBÉRARD et al., 2003), ou comportamento nômade, o que pode

variar de acordo com a espécie ou com as condições ambientais do local.

São muitos os abrigos diurnos utilizados por morcegos, desde folhas, ocos

de árvores e cavernas (BROOKE, 1987; SIMMONS & VOSS, 1998; TRAJANO &

GIMENEZ, 1998), até forros de casas e frestas de edifícios (PERACCHI et al.,

2006).

ABRIGOS NATURAIS

Ambientes florestais oferecem ilimitados recursos de hábitat, entre os

quais abrigos com diferentes características, que são escolhidas de acordo com

a espécie de morcego ou mesmo o hábito alimentar. Morcegos de todos os

hábitos alimentares utilizam refúgios naturais (FENTON et al., 2000; PERACCHI

et al., 2006) e praticamente todas as famílias que ocorrem nos neotrópicos

possuem espécies que já foram encontradas se abringando em locais naturais

(SIMMONS & VOSS, 1998), não só em ambientes florestais, como em perímetros

urbanos.

40

Ocos de árvore

Freqüentemente morcegos são encontrados se abrigando em ocos de

árvores de inúmeras espécies (KUNZ, 1983), e em praticamente todas as

guildas alimentares há espécies que já foram encontradas se abrigando neste

tipo de refúgio (SIMMONS & VOSS, 1998). FENTON et al. (2000) indicaram a

presença do morcego filostomídeo frugívoro Sturnira lilium em ocos de árvore

em Belize. Morcegos insetívoros das família Emballonuridae, Molossidae,

Phyllostomidae e Vespertilionidae também já foram capturados em cavidades

em árvores e troncos ocos (SIMMONS & VOSS, 1998; BIANCONI & PEDRO, 2007;

FABIAN & GREGORIN, 2007). O morcego piscívoro Noctilio leporinus também já

foi reportado se abrigando dentro do tronco de árvores ocas (HOOD & JONES

JR., 1984). Morcegos carnívoros e onívoros são comumente encontrados dentro

de árvores (NOGUEIRA et al., 2007), já morcegos hematófagos não costumam

utilizar estes abrigos (GREENHALL et al., 1983; AGUIAR, 2007), exceto Diaemus

youngi.

Folhas

Muitos morcegos, de todos os hábitos alimentares, se abrigam sob as

folhas de árvore (KUNZ, 1983), no entanto esse tipo de refúgio ainda é mais

comum entre morcegos de dieta frugívora (BROOKE, 1987; NOVAES et al. no

prelo). Comumente morcegos frugívoros são vistos se abrigando em folhas de

árvores em zonas urbanas (NOVAES et al. no prelo) e ambientes florestais

(SIMMONS & VOSS, 1998). Algumas espécies frugívoras desenvolveram

habilidades especiais para construções de tendas (KUNZ et al., 1994), e esse

tipo de abrigo consiste no dobramentos de folhas de plantas, formando uma

espécie de cabana, onde os morcegos se abrigam sob elas (KUNZ, 1983; KUNZ &

MCCRACKEN, 1994; KUNZ et al., 1994).

O uso de folhas como abrigo já foi reportado também para morcegos

insetívoros, principalmente das famílias Emballonuridae e Phyllostomidae

(SIMMONS & VOSS, 1998), além de outras espécies carnívoras, onívoras

(NOGUEIRA et al., 2007) e nectarívoras (PERACCHI et al., 2006).

41

Cavernas

De todos os abrigos naturais usados pelos quirópteros, as cavernas são as

mais comuns e associadas aos morcegos (EZZELL, 1992), e espécies de

absolutamente todas as famílias e hábitos alimentares já foram capturados em

ambientes cavernícolas (KUNZ, 1983; PERACCHI et al., 2006).

Dentre as várias guildas alimentares, os insetívoros e hematófagos

mantém presença destacada nesses ambientes (PERACCHI et al., 2006),

seguidos por carnívoros e onívoros (NOGUEIRA et al., 2007), nectarívoros

(COELHO, 2005) e frugívoros (ZORTÉA, 2007).

BREDT et al. (1999) encontraram 22 espécies de morcegos habitando

cavernas do Brasil central. TRAJANO & GIMENEZ (1998) listaram 13 espécies

em uma única caverna no sudeste do Brasil. ESBÉRARD et al. (2005) citam

presença confirmada de 29 espécies distribuídas em sete famílias em cavernas

de um único fragmento de Cerrado.

Além da grande diversidade, algumas cavernas abrigam as maiores

colônias de morcegos do mundo. Nos neotrópicos essas colônias são compostas

por morcegos insetívoros das famílias Molossidae e Vespertilionidae e podem

abrigar mais de 60.000 morcegos (GRAHAM, 1994).

ABRIGOS ARTIFICIAIS

Morcegos são bem adaptados aos ambientes urbanos e em algumas

cidades a diversidade é consideravelmente alta (REIS et al., 2002) e por isso

esses animais são vistos comumente se abringando em edificações humanas

(PERACCHI et al., 2006).

Boa parte dos morcegos encontrados nas cidades são insetívoros, e talvez

isto aconteça porque estes morcegos costumam forragear perto de postes de

iluminação para se alimentar dos insetos atraídos pelas luzes (LEE &

MCCRACKEN, 2002). E apesar de haver muitos morcegos frugívoros em cidades

(REIS et al., 2002), esses costumam ocupar abrigos naturais na maioria dos

casos, diferente de morcegos insetívoros, que representam cerca de 75% das

ocupações de abrigos artificiais por morcegos (ESBÉRARD, 2003).

42

Minas, porões e pontes.

Por manter características físicas semelhantes aos ambientes

cavernícolas, minas e porões também podem ser potenciais abrigos para

quirópteros (JOHNSON et al., 2006). Na maioria dos casos, os morcegos que

ocupam esses ambientes são insetívoros, mas morcegos de outros hábitos

alimentares também podem ser encontrados (BREDT et al., 1998).

Segundo PERACCHI et al. (2006), morcegos de todos os hábitos alimentares

já foram observados se abrigando e minas e porões e NOGUEIRA & POL (1998),

constataram a coabitação de duas espécies insetívoras, Rinchonycteris naso

(Emballonuridae) e Noctilio albiventris (Noctilionidae) se abrigando sob uma

ponte no sudeste do Brasil. Nos EUA, grandes colônias de morcegos

insetívoros da família Vespertilionidae se abrigam sob pontes durante

períodos sazonais (GRAHAM, 1994).

Forros, frestas e outros abrigos.

Muitas casas possuem morcegos usando componentes das edificações

como abrigo, e a maior parte desde morcegos possui dieta insetívora, embora

quirópteros com outras dietas também sejam encontrados nesses locais.

YEE (2000) cita a coabitação de seis espécies de morcegos com diferentes

hábitos alimentares - os insetívoros Saccopteryx bilineata (Emballonuridae) e

Myotis nigricans (Vespertilionidae), o frugívoro Carollia perspicillata

(Phyllostomidae), o nectarívoro Glossophaga soricina (Phyllostomidae) e os

hematófagos Desmodus rotundus e Diphylla ecaudata (Phyllostomidae) - todos

dividindo o mesmo abrigo em uma construção humana. ESBÉRARD (2003)

reporta também a utilização do forro e frestas de uma casa pelo morcego

insetívoro Molossus rufus (Molossidae) e pelo onívoro Phyllostomus hastatus

(Phyllostomidae).

E segundo REGIDOR et al. (2003), uma grande colônia do molossídeo

Tadarida brasilensis abriga as frestas de uma represa na Argentina,

indicando a grande adaptabilidade dos morcegos em ocupar diversos tipos de

abrigos.

43

Chaminé

Frestas nas telhas

Forro

Vão no telhado

Morcegos são extremamente versáteis quanto à habitação e uso de abrigos. Boa parte das casas com forro possuem colônias de morcegos se abrigando em seu interior e segundo ESBÉRARD (2003) 75% dos morcegos em que habitam construções humanas são insetívoros e pertencentes às famílias Molossidae e Vespertilionidae. Edificações humanas constituem bons locais para moradia de morcegos, e normalmente os morcegos abrigados nos forros utilizam chaminés, frestas nas telhas e vãos no telhado para entrada e saída. É bom ressaltar que morcegos são animais silvestres e por isso protegidos pela Consituição Federal, e por mais que possam ser inconvenientes e trazer prejuízos para proprietários de casas com morcegos no forro, sua retirada, apanha ou destruição é crime previsto por lei e implicará em multa ou reclusão.

44

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48

VI

REPRODUÇÃO

INTRODUÇÃO

Os morcegos, assim como outros mamíferos placentados, apresentam

desenvolvimento do embrião no corpo da fêmea, o que ofere condições

adequadas ao seu desenvolvimento como temperatura, fluxo constante de

nutrientes e proteção imunitária (NEUWEILER, 2000). Algumas espécies

possuem adaptações de armazenamento de esperma para induzir a época de

fecundação e o nascimento do filhote em períodos sazonais favoráveis

(BALMORI, 1999). Após o nascimento, o cuidado parental e a lactação

demandam, juntamente com a gravidez, um alto custo energético pela fêmea,

necessitando um incremento de energia durante o período de gestação e

lactação (VOIGT, 2003). Por esta razão, os ciclos reprodutivos nos quirópteros

parecem estar associados à disponibilidade de alimentos e às condições do

ambiente no qual estão inseridos (ZORTÉA, 2003; OLIVEIRA, 2007).

O aparelho reprodutor dos morcegos é bastante similar a dos outros

mamíferos, no entanto possui algumas peculiaridades surgidas de adaptações

fisiológicas e etológicas (BALMORI, 1999). Dentro do grupo dos quirópteros há

tantas diferenças reprodutivas de acordo com as espécies e famílias que pode-

se dizer que esta Ordem retém grande parte das variações reprodutivas da

Classe Mammalia (FRAZER, 1969; BALMORI, 1999). A maturação das gônadas

acontece graças aos hormônios gonadotrópicos secretados pelo glôbulo interior

da hipófise, que por sua vez são controladas pelos centros neurosecretores do

cérebro (hipotálamo). Os ciclos reprodutivos e as características sexuais

secundárias estão regulados da mesma forma, influenciando os demais

estímulos externos através do córtex cerebral (KOLB, 1971; BALMORI, 1999).

O orgão reprodutor dos machos compreende um par de testículos, vários

pares de glândulas, um sistema condutor de esperma e um orgão copulador

(pênis). Na maior parte das espécies os testículos só descem ao escroto no

período reprodutivo para facilitar a espermatogênese, permanecendo interno

em uma cavidade abdominal durante a maior parte do repouso sexual. O orgão

reprodutor feminino é formado por ovários, ovidutos, útero e vagina. Possuem

dois ovários como os outros mamíferos e o útero é bastante variável de acordo

com a espécie (BALMORI, 1999).

50

Muitos morcegos possuem também glândulas odoríferas que são usadas

em atividade de acasalamento (PERACCHI et al., 2006). Além disso, em muitas

espécies há formações sociais de grupos reprodutivos e de haréns (KUNZ et al.,

1983), caracterizados pela hierarquia de dominância (WILKINSON, 1990).

A maior parte do conhecimento sobre a reprodução dos quirópteros

neotropicais está concentrado na América Central, em estudos de FLEMING et

al. (1972), GANNON & WILLIG (1992), TSCHAPKA (2005) e CHAVERRI & KUNZ

(2006). No Brasil, estudos no Cerrado e Caatinga foram conduzidos por WILLIG

(1985), ZORTÉA (2003), e na Mata Atlântica por MELLO & FERNANDEZ (2000),

GOMES & UIEDA (2004), COSTA et al. (2007). O período reprodutivo dos

quirópteros neotropicais é variável de acordo com o ambiente e a espécie, com

morcegos se reproduzindo uma ou mais vezes por ano.

MONOESTRIA

A monoestria é caracterizada por um único pico de nascimento de filhores

por ano para uma determinada espécie (RACEY & ENTWISTLE, 2000).

Normalmente esse padrão reprodutivo está ligado às condições ambientais ou

fisiológicas, acontecendo em um períodos determinados e por isso é chamada

de monoestria sazonal.

A monoestria sazonal já foi registrada, entre outras espécies, para o

morcego fitófago Anoura geoffroyi (Phyllostomidae), estando diretamente

interligada à variação climática e disponibilidade de recursos (ZORTÉA, 2003).

WILLIG (1985) também encontrou monoestria sazonal para o morcego píscivoro

Noctilio leporinus.

POLIESTRIA

De maneira geral, a poliestria pode ser subdividida em três tipos

diferentes. Poliestria bimodal e estro pós-parto, que é caracterizada pela

estação reprodutiva apresentando dois picos de nascimento em um mesmo ano

e a fêmea se apresentando fértil e receptiva logo após o parto; poliestria

bimodal, que apresenta estação reprodutiva com dois picos de nascimento por

51

ano e poliestria multimodal, apresentando um comportamento contínuo, com

reprodução durante todo o ano (FLEMING et al., 1972; WILSON, 1973;

NEUWEILER, 2000; RACEY & ENTWISTLE 2000). A maior parte dos morcegos

fitófagos apresenta poliestria bimodal (WILLIG, 1985; TSCHAPKA, 2005;

CHAVERRI & KUNZ, 2006). Já morcegos hematófagos apresentam poliestria

assincrônica, em um padrão de tempo indefinido (TADDEI et al., 1991; ALENCAR

et al., 1994).

GESTAÇÃO

Normalmente as fêmeas têm um único filhote por parição, mas fêmeas de

alguns vespertilionídeos, especialmente o gênero Lasiurus, podem parir de

dois a cinco filhotes em uma única parição (PERACCHI et al., 2006).

Morcegos fitófagos costumam ter uma gestação de três a cinco meses,

variando de acordo com a espécie. Já morcegos insetívoros possuem gestações

mais curtas, de dois e três meses. Os morcegos hematófagos são os que

possuem a gestação mais longa, em torno de sete meses (SCHMIDT, 1988),

talvez relacionado ao seu metabolismo. A grande maioria das espécies dá a luz

a um filhote por gestação, entretanto há alguns registros de gêmeos, apesar de

raros (PERACCHI et al., 2006).

Fêmea grávida de Glossophaga soricina Foto: Roberto L.M. Novaes

Morcegos dão a luz à filhotes pesando de 15% a 25% do peso da mãe, considerados grandes para recém nascidos. O filhote nasce sem pêlos e sem capacidade de vôo e de se defenderer sozinho, e por isso permanece agarrado ao corpo da mãe. Com cerca de seis semanas o filhote já adqüire capacidade de vôo. Morcegos alcançam a maturidade sexual entre um e dois anos de vida, dependendo da espécie.

52

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55

VII

CONSERVAÇÃO

INTRODUÇÃO

A região neotropical é considerada a mais biodiversa do planeta, inclusive

em quirópteros, com cerca de 290 espécies (HUTSON et al., 2001). Mesmo assim

é a que sofre mais com a fragmentação florestal, redução de ecossistemas e

destruição de hábitats por influência antrópica, feita através da extração de

madeira e outros recursos naturais, expansão agropecuária e especulação

imobiliária.

OCHOA (2000) indica que a extração de madeiras em regiões neotropicais

afeta consideravelmente a diversidade de mamíferos, e se torna ainda mais

acentuado em comunidades de morcegos. Segundo REIS et al. (2003), a

fragmentação florestal é uma das principais causas da redução da diversidade

de quirópteros.

HUTSON et al. (2001) constataram que para a região neotropical, 45

espécies de morcego são consideradas vulneráveis, 10 estão em perigo e uma

está criticamente em perigo de extinção.

STATUS FAMÍLIA VU EP CR

Emballonuridae 2 1 0 Mormoopidae 1 0 0 Phyllostomidae 24 4 0 Natalidae 1 0 0 Furipteridae 1 0 0 Thyropteridae 1 0 0 Vespertilionidae 11 3 1 Molossidae 4 2 0

TOTAL 45 10 1

Tabela feita a partir dos dados indicados por HUTSON et al. (2001). Status de conservação e nº de espécies: Legenda:

VU = Vulnerável EP = Em perigo CR = Criticamente em perigo

57

CONSERVAÇÃO DOS MORCEGOS DO BRASIL

O Brasil é o quinto maior país do mundo e ocupa quase metade da

América do Sul, sendo o primeiro país em diversidade biológica do planeta

(MITTERMEIER et al., 1997), acolhendo cerca de 14% da biota mundial

(LEWINSOHN & PRADO, 2002). Aqui se encontra também a maior diversidade

de mamíferos (REIS et al., 2006). Porém, todo esse patrimônio biológico corre

sérios riscos, já que as aceleradas taxas de extinção de espécies, muitas antes

mesmo de serem conhecidas pela ciência, acaba por reduzir a diversidade

gênica e ameaçar o equilíbrio ecológico (BERGALLO et al., 2000; RAW, 2003;

MACHADO et al., 2005).

Das 168 espécies de morcegos registradas no Brasil (MIRANDA et al.,

2007; REIS et al., 2007), cinco são consideradas vulneráveis pelo IBAMA

(2003), embora AGUIAR & TADDEI (1995) reconheçam nove espécies brasileiras

como vulneráveis e sugiram a sua inclusão na lista oficial. Além disso há

outras 26 espécies na categoria Deficientes em dados (MACHADO et al., 2005),

e esses números podem representar uma subestimativa dos números reais de

espécies ameaçadas de extinção, já que aspectos importantes da taxonomia e

biologia dos quirópteros ainda é desconhecido ou mal compreendido. Essa

escassez de informações constitui forte limitação às iniciativas de conservação

das espécies (DIAS, 2007).

A maior parte das espécies ameaçadas de extinção no Brasil, são

endêmicas e pertencentes à família Phyllostomidae, uma das famílias de

maior importância ecológica para o Brasil (PERACCHI et al., 2006; REIS et al.,

2007). De maneira geral, as principais ameaças aos morcegos brasileiros são

constituídas pelo desmatamento e fragmentação florestal (REIS et al., 2003),

na Mata Atlântica pela especulação imobiliária e plantio de monoculturas; no

Cerrado e Pantanal pela expansão agropecuária e na Amazônia pela extração

de madeira e outros recursos naturais e queimadas para implantação de

pastagens.

58

A tabela abaixo mostra a lista das espécies de morcegos ameaçados de extinção do Brasil, informando o hábito alimentar, status e a consideração por autor. Legenda: VU = vulnerável.

Considerados por:

Família / Espécie Hábito

alimentar Status

AGUIAR & TADDEI (1995)

IBAMA (2003)

Emballonuridae Saccopteryx gymnura Insetívoro VU X Phyllostomidae Chiroderma doriae Frugívoro VU X Lichonycteris obscura Nectarívoro VU X Lonchophylla bokermanni Nectarívoro VU X X Lonchophylla dekeyseri Nectarívoro VU X Platyrrhinus recifinus Frugívoro VU X X Vampyrum spectrum Carnívoro VU X Vespertilionidae Lasiurus ebenus Insetívoro VU X X Lasiurus agregius Insetívoro VU X Myotis ruber Insetívoro VU X X

Total: 10 espécies

Das 10 espécies consideradas como ameaçadas de extinção por AGUIAR & TADDEI (1995) e IBAMA (2003), quatro são endêmicas do Brasil, Lonchophylla

bokermanni, Lonchophylla dekeyseri, Platyrrhinus recifinus e Lasiurus ebenus (REIS et al., 2007) e por isso se encontram em condições ainda mais delicadas.

As espécies endêmicas de Mata Atlântica e Cerrado, como Platyrrhinus recifinus e Lonchophylla dekeyseri merecem especial atenção, já que porções pequenas destes ecossistemas se encontram protegidas, enquanto a maior parte está em declínio e sofrendo grande ação antrópica.

Platyrrhinus recifinus Foto: Roberto L.M. Novaes

59

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61

VIII

TÉCNICAS DE COLETA

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos o número de pesquisa envolvendo morcegos vem

crescendo significativamente, e com isso se faz necessária a adoção de métodos

de captura mais eficientes e obtenção de informações mais detalhadas.

Morcegos são capturados em vôo ou em seus abrigos e o sucesso da captura

está relacionado com o método usado de acordo com as características da

espécie que se deseja capturar (KUNZ & KURTA, 1988), além do conhecimento

sobre seus comportamentos e hábitos (DALQUEST & WALTON, 1970).

Normalmente o método usado para captura de morcegos em regiões

tropicais é feito através de redes de neblina (FINDLEY & WILSON, 1983;

HEIDEMAN & HEANY, 1989). No entando, outros métodos também são usados

como as harpas ou harp traps (KUNZ & ANTHONY, 1977). Por possuírem alto

custo e serem de difícil manuseio as harpas são pouco utilizadas, e por isso

neste capítulo serão abordados apenas os métodos de captura com redes de

neblina.

MÉTODOS DE CAPTURA

Grande parte das pesquisas feitas nas regiões neotropicais utilizam as

redes de neblina como o principal método de captura (HODGKISON et al., 2002),

e alguns estudos indicam que o sucesso desse método está ligado com à altura

em que as redes são armadas em relação ao solo (COSSON, 1995; BERNARD,

2001; KALKO & HANDLEY, 2001). Algumas espécies costumam voar acima da

copa das árvores enquanto outras forrageiam próximo ao solo (PERACCHI et al.,

2006). É partir desta análise que devem ser escolhidos o método e o local onde

as redes de neblina serão armadas.

As redes são utilizadas, na maioria das vezes, para capturar morcegos

durante o vôo, ou em menor freqüencia saindo de seus abrigos (KUNZ &

KURTA, 1988). Essas redes são de baixo peso e compactas, além de serem de

fácil transporte e montagem em campo (KUNZ & KURTA, 1988). No entanto,

HANDLEY (1967) comenta que o seu grande potencial como ferramenta para

estudos ecológicos é mal explorado.

63

Redes de neblina são feitas de malha de nylon extremamente fino (cerca

de 20mm) e coloração escura, sendo a maioria de cor preta. São dividas em

quatro compartimentos horizontais, formando espécies de bolsas onde o

morcego fica preso. As redes possuem amarras em suas extremidas laterais

que são colocadas em varas na vertical para a sua sustentação. As redes mais

usadas possuem nove metros de comprimento por dois e meio de altura,

embora redes maiores ou menores também possam ser usadas. Se utilizadas

com cuidado e guardadas de forma adequada costumam ser duráveis.

Ilustração e foto das bolsas da rede de neblima usada para captura de morcego durante o vôo. O animal fica preso dentro do compartimento, onde parmanece até a sua retirada. As vistorias de rede devem ser feitas em intervalos de tempo curtos, para evitar que o animal se enrosque demais na rede, facilitando sua retirada, se o intervalo de vistoria for muito longo o animal pode danificar a rede ou até mesmo morrer por exaustão ou estresse.

Glossophaga soricina Foto: Roberto L.M. Novaes Adaptado de KUNZ & KURTA (1988)

A rede é colocada na vertical, presa com ajuda de varas. As bolsas, como evidenciado na figura, ajudam a prender o morcego. Ilustração adaptada de JONES et al. (1996)

64

As redes podem ser armadas em diferentes locais, estando relacionados à

espécie que se deseja capturar ou com o tipo de trabalho que ser queira fazer.

A maior parte dos trabalhos de diversidade feitos em áreas florestais na região

neotropical são conduzidos com uso de redes de neblina armadas em trilhas na

mata, clareiras ou em frente à abrigos previamente identificados (SIMMONS &

VOSS, 1998; FENTON et al., 2001; ESBÉRARD et al., 2006). Mesmo assim, as

redes de neblina podem ser armadas em muitos ambientes como bordas de

mata, sobre cursos d’ água, próximos a pontos de alimentação e até mesmo na

copa das árvores (KUNZ & KURTA, 1988).

Trilhas, clareiras e bordas de mata.

Este método é especialmente eficaz para captura de morcegos fitógafos, já

que estes costumam forragear mais baixo, em oposição aos morcegos

insetívoros que costumam voar mais alto (BERNARD, 2001; PERACCHI et al.,

2006). As redes de neblina são armadas perpendicularmente às trilhas,

cruzando clareiras ou paralelamente às bordas de mata, visando otimizar a

captura de morcegos que normalmente utilizam esses espaços como rotas de

vôo.

Em ambientes florestais as redes são armadas normalmente sob árvores, o que é especialmente eficaz para a captura de morcegos frugívoros. Já a maior parte das espécies insetívoras forrageiam acima da copa das árvores, além disso possuem um ecolocalizador mais sensível, sentindo a rede com mais facilidade, dificultando assim a sua captura.

Adaptado de KUNZ & KURTA (1988) Adaptado de JONES et al. (1996)

65

Capturas em abrigos

A maior parte das coletas feitas em abrigos são destinadas à captura de

morcegos insetívoros devido à dificuldade de capturá-los durante o vôo. Pórem

morcegos de todos os hábitos alimentares são capturados em seus abrigos

(SIMMONS & VOSS, 1998). Este método consiste na colocação da rede em frente

à abertura do abrigo, natural ou artificial, na hora de saída dos morcegos. Esta

forma de captura é especialmente importante em levantamento de espécies de

determinadas áreas, pois acaba por otimizar as capturas, incrementando o

número de espécies animalívoras, mais difíceis de serem capturadas em vôo

livre.

Para a captura de morcegos em abrigos é necessário que as principais saídas do refúgio sejam cercadas por redes de neblina. As figuras ilustram o cercamento com redes de neblina de uma casa usada como abrigo por morcegos e colocação de redes ao redor de uma planta usada como refúgio. Em alguns casos a coleta de morcegos em abrigos pode ser feita manualmente ou com ajuda de puçá.

Ilustrações adaptadas de KUNZ & KURTA (1988).

66

Coleta sobre coleções de água

Muitos estudos indicam a associação de algumas espécies de morcegos à

cursos d’água (NOGUEIRA et al., 1998). Este comportamento é evidenciado

principalmente para espécies insetívoras (ADAMS et al., 2003) e em alguns

casos a água se torna um fator primordial para a ocorrência de uma

determinada espécie (HOOD & JONES JR., 1984; MEYER et al., 2005). Por isso a

coleta sobre cursos d’água ou em torno de coleções de água torna-se um

método muito importante, principalmete para estudos de diversidade de

espécies. Este método consiste em armar a rede de neblina cruzando um

determinado espelho d’água, paralelamente ou perpendicularmente, ou rodeá-

lo com redes de neblina.

Existem diversas formas de se armar redes sobre cursos de água, variando conforme as características do ambiente. As metodologias usadas podem influenciar diretamente o número de captura e até mesmo a diversidade de espécies capturadas.

Ilustrações adaptadas de KUNZ & KURTA (1988).

67

Coletas de dossel

Parte das espécies de morcegos insetívoros, principalmente das famílias

Molossidae e Emballonuridae, forrageiam acima das copas das árvore

(PERACCHI et al., 2006). Até mesmo espécies animalívoras da família

Phyllostomidae costumam forregear na copa das árvores, se alimentando de

pequenos artrópodes no alto das folhas (NOGUEIRA et al., 2007). Para a captura

destes morcegos se faz necessário a adoção de um método diferenciado, que

consiste em armar as redes de neblina no alto das árvores. Para esté método é

necessário a utilização de cabos, cordas e roldanas, além de uma montagem

específica. Existem guias especiais que ensinam o passo-a-passo para a

montagem desse tipo de método (KUNZ & KURTA, 1988; VON MATTER, 2001;

HODGKISON et al., 2002).

Apesar da montagem deste método não ser fácil, ele garante bons resultados, já que possibilita a captura de espécies que são praticamente impossíveis de serem capturadas com redes armadas em solo.

Ilustração adaptada de VON MATTER (2001).

68

TRIAGEM

Após a captura do morcego, alguns procedimentos básicos são conduzidos

para obtenção de dados. Em estudos taxonômicos as espécies capturadas são

sacrificadas e levadas para o laboratório onde são fixadas em formol 10% e

conservadas em álcool 70% para posteriormente serem analisadas

morfologicamente (DIAS, 2007). Porém, em estudos ecológicos os morcegos

normalmente não são sacrificados, e as informações sobre eles são obtidas

ainda em campo.

Retirada do morcego da rede

O primeiro passo após a captura de um morcego é a sua retirada da rede.

Se feito corretamente, com cuidado e cautela, esse método não traz nenhum

prejuízo ao animal, nem danifica a rede. Para evitar a mordida, este

procedimento deve ser feito com a utilização de luvas de raspa de couro. O

morcego deve começar a ser retirado pelos mebros posteriores, e por último as

asas. Existem várias técnicas para manipulação de morcegos, porém eles só

devem ser exercidas por um profissional experiente e vacinado contra a raiva.

Retirada de Artibeus lituratus da rede. A retirada deve ser feita a partir dos membros inferiores a fim de facilitar a liberação do animal. O corte da rede dever ser feito em último caso, não sendo necessário na maioria dos casos.

Foto: Roberto L.M. Novaes

Método para imobilização segurando as asas para trás. Este método não machuca o animal e permite a sua manipulação sem permitir que ele se movimente demasiadamente e tente uma mordida defensiva.

Vampyressa pusilla

Foto: Roberto L.M. Novaes

69

Identificação e medição

Os morcegos ficam contidos dentro de sacos de pano até serem feitos os

processos de triagem, evitando assim o estresse do animal. A medição é feita

com ajuda de paquímetro e as medidas são anotadas em milímetros. Como já

citado nesta apostila, as medidas são caracteres primordiais para identificação

de uma espécie, e em campo as principais medições feitas são do antebraço,

tíbia, cabeça, comprimento total e falanges. Com as medidas anotadas é

possível se chegar até o nível específico de alguns grupos de morcego com a

utilizações de chaves de identificação, como as de VIZZOTO & TADDEI (1973),

EMMONS & FEER (1997) e GREGORIN & TADDEI, (2002).

Medição do antebraço de Artibeus lituratus. Essa medida pode ser essencial na determinação de uma espécie, porém, devido a sobreposição de medidas, em alguns casos somente as análises taxonômicas permitem se chegar ao nível mais específico.

Foto: Ana C. Façanha

Medição da cabeça de Platyrrhinus recifinus. Apesar desta medida não ser muito usual, ela pode dar indícios sobre a espécie ou idade do animal.

Foto: Roberto L.M. Novaes

70

Sexagem, estágio reprodutivo e determinação de idade

A determinação do sexo e estágio reprodutivo de morcegos é de grande

importância para o conhecimento dos períodos reprodutivos e suas relações

com as condições do ambiente em que vivem (OLIVEIRA, 2007). Segundo RACEY

(1988), as fêmeas são subdivididas em três grupos: Grávida, quando o

abdomêm está proeminente e o feto palpável; Lactante, quando as mamas

estão secretantes; e Inativas, quando não há nenhum desses caracteres

visíveis. Já os machos são classificados apenas quanto a posição dos testículos

(escrotado ou abdominal) (BALMORI, 1999). Já a idade é determinada através

do grau de ossificação das epífises (ANTHONY, 1988; COSSON et al., 1983).

Morcegos com epífises totalmente cartilaginosas são classificados como filhote

com epífises apresentando médio estágio de ossificação, porém com regiões

ainda cartilaginosas são classificados como jovem (ou subadulto) e os com

epífises totalmente ossificadas são classificados como adulto (KUNZ, 1988).

Artibeus lituratus com mamas lactantes. Normalmente essa característica é visível, no entanto poder haver a necessidade de palpação ou de leve pressão na mama.

Foto: Roberto L.M. Novaes

71

Marcação

Muitas pesquisas ecológicas utilizam marcações temporárias ou

permanentes. Este recurso é especialmente útil para estudos de movimentação

(BERNARD & FENTON, 2003) e deslocamento (COSTA et al., 2006).

Os métodos de marcação temporária mais utilizados são furos no

dactilopatágio, que de acordo com a posição indicam uma numeração e a

descoloração de pêlos, mais utilizada para estudos comportamentais (SILVA et

al., 2007).

Já as marcações permanentes mais utilizadas são as anilhas metálicas e

numeradas presas no antebraço no animal, as coleiras plásticas numeradas

(ESBÉRARD & DAEMON, 1999), e os métodos de marcação por chip ou

dispositivo guia e localização por radiotelemetria (MELLO et al., 2008). Esses

métodos costumam ser mais usuais, pois permitem avaliar padrões de

movimentação e migração, além de estimar a área e o tempo de vida de um

animal. É importante ressaltar que a marcação pode trazer prejuízos aos

animais, e a utilização de marcações permanentes deve ser feita com muito

critério por pesquisadores experientes. Os dados dos animais capturados e

marcados devem ser anotados em uma planílha de informações que deve ser

guardada e consultada após alguma recaptura.

Morcego marcado com coleira plástica numerada. Este método não costuma trazer grandes prejuízos ao animal, no entanto a sua colocação deve ser feita com cuidado e critério. Após a marcação os morcegos são liberados no próprio local.

Carollia perspicillata

Foto: Roberto L.M. Novaes

72

Planilha de informações para morcegos capturados

73

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AGRADECIMENTOS

APOIO E PARCERIA

À Carolinne I. Dias Gomes pela leitura, sugestão e revisão dos textos. Ao Dr. Marco A.R. Mello (www.casadosmorcegos.org) por ceder algumas fotografias para ilustrar essa apostila. À toda equipe do Projeto Pró-Morcegos, em especial a Flávio Zen Mello por todo apoio à pesquisa e ação ambiental.

NOVAES, R.L.M. 2008. Morcegos neotropicais: biologia, ecologia e técnicas de coleta. Apostila básica. Projeto Pró-Morcegos. 85p.

Rua Quaxima, 45, Madureira. CEP 21310-250, Rio de Janeiro,

RJ, Brasil. Tel.: (21) 3624 0628

[email protected] www.promorcegos.org

ROBERTO LEONAN MORIM NOVAES Laboratório de Mastozoologia

Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. [email protected]

BIOLOGIA, ECOLOGIA E TÉCNICAS DE COLETA

Morcegos sempre foram vítimas de mitos e crendices populares, o que lhes

atribuiu má fama, criando uma corrente de preconceitos e inverdades em

torno deles. A sociedade moderna não consegue enxergar através do medo e

da aparência obscura desses animais, não percebendo o valor real que eles

têm para o equilíbrio da vida. Grande parte da dinâmica de regeneração

florestal acontece graças à dispersão de sementes feita por morcegos

frugívoros, e uma parcela significativa das pragas urbanas e agrícolas é

controlada por morcegos insetívoros. Esta apostila foi desenvolvida com o

intuito de demonstrar a importância ecológica e econômica dos morcegos.

Seu conteúdo é constituído por aspectos básicos sobre a biologia e ecologia

dos quirópteros da região neotropical, além de um capítulo sobre métodos

de coleta e pesquisa com morcegos, o que é de grande valia para novos

estudantes de Biologia. Desta forma, trabalhos de pesquisa e ação ambiental

estão sendo incentivados, revertendo a corrente de preconceito para a

corrente da consciência ambiental e do pensamento racional.

ROBERTO LEONAN MORIM NOVAES

MORCEGOS NEOTROPICAIS

Rio de Janeiro Tel.: (21) 3624 0628

[email protected] www.promorcegos.rg3.net