MOTIVAÇÕES AJURÍDICAS NO DIREITO TUTELAR … · construção da motivação judicial Joana...
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MOTIVAÇÕES AJURÍDICAS NO DIREITO TUTELAR EDUCATIVO : um estudo empírico sobre a
construção da motivação judicial
Joana Morgado Margarido
Comentador: Professor Doutor Carlos Alberto Poiares
Faculdade de Direito da UNL
11 Dezembro 2013
INTRODUÇÃO
• No ano de 2009/2010, desenvolvi um estudo empírico, na área da Psicologia Forense, que pretendeu explorar o complexo processo decisório judicial no Direito Tutelar Educativo.
• A nossa hipótese prendeu-se, na altura, com a possibilidade de o juiz apreciar a
inocência ou a culpabilidade do menor, bem como a veracidade ou falsidade dos depoimentos prestados, através das manifestações comportamentais, verbais e não verbais, exteriorizadas quer pelo menor acusado, quer pela vítima, quer pelas testemunhas.
• Foi utilizada uma grelha de observação, construída em 2005 pelo Professor
Carlos Poiares, que contempla alguns dos indicadores comportamentais mais discutidos na literatura científica, procedendo-se, posteriormente, à leitura das decisões finais proferidas, numa tentativa de conhecer os alicerces da motivação e convicção que compuseram cada decisão judicativa.
ENQUADRAMENTO TEÓRICO
1. Psicologia Forense: Estuda todos os ramos e caminhos prosseguidos pelo Direito no momento em que transpõe as fronteiras do seu conhecimento e experiência e colide com os espaços habitados pela Psicologia.
2. Uma condenação exige do juiz que reúna as provas suficientes em como aquele indivíduo praticou determinado acto. E que prova é essa? De todos os meios probatórios previstos na lei, a prova testemunhal, pelo menos no Direito Tutelar Educativo, é a mais frequente. E não é só a mais frequente como, por vezes, a única.
3. Psicologia do Testemunho: preocupada com a falta de rigor dos depoimentos apresentados em audiência de julgamento, procurou estudar todos os enviesamentos dos processos psicológicos que são ativados pelas testemunhas, vítimas e arguidos e tentou tornar o mais objetivo possível aquilo que não passa de uma versão dos factos.
4. Depois, a Psicologia transferiu a sua lupa para o próprio decisor.
A exatidão na descrição dos factos e a deteção da mentira nos depoentes não bastava para garantir que a decisão fosse a mais acertada, a mais correta, a mais justa. Outra personalidade tinha de ser estudada: o juiz.
1. Psicologia das Motivações Extralegais ou Ajurídicas do sentenciar: Partindo dos depoimentos produzidos em tribunal, a Psicologia tentou desvendar os métodos aplicados pelo juiz para valorar os discursos proferidos, tentou encontrar as suas inseguranças, captar a sua intuição, controlar a interferência das suas paixões, preferências, simpatias e antipatias.
2. O estudo das motivações ajurídicas parte, então, do testemunho/depoimento realizado/prestado pelos diferentes atores que comparecem nas audiências de julgamento e procura validar a hipótese de o juiz ser influenciado, no seu processo de tomada de decisão, por características pessoais e por determinados comportamentos (verbais e não verbais) manifestados por aqueles.
3. Investigadores, por todo o mundo, escolheram a sua área de atuação, desenharam as suas metodologias e avançaram com os seus resultados.
Alguns estudos considerados mais relevantes: 1. Alguns autores dedicaram-se a validar a hipótese de os juízes estarem sujeitos a
distorções nos processos psicológicos básicos quando estão a recolher as provas (Guthrie, Rachlinski & Wistrich, 2009; Dhami e Ayton, 2001).
2. Outros validaram a existência de fatores arbitrários na construção da convicção judicial (Stephenson, 2003; Ebbesen & Konecni, 1985), como é o caso da aparência física.
3. Porter & Brinke (2009) puseram em causa a capacidade dos juízes avaliarem a credibilidade dos depoentes (denominado de credibility assessment). Os resultados demonstraram que os julgadores dão grande importância a sinais estereotipados sobre a culpa e a mentira, como o nervosismo, as pausas no discurso, o evitamento às questões colocadas e a ausência de contacto visual.
4. Bell & Loftus (1989) validaram empiricamente a hipótese de que a credibilidade é atribuída a depoentes que recordam um maior número de detalhes, mesmo que sejam pormenores irrelevantes para o objeto do processo.
5. Miller & Burgoon (1982) revelaram que as zonas do corpo capazes de denunciar com maior rigor a mentira são as mãos e os pés, contudo, apuraram que a maioria dos julgadores releva para a deteção da mentira manifestações como a ausência de contacto visual, o nervosismo, a lentidão nas respostas dadas, gestos excessivos, o engolir em seco, postura corporal rígida, sorrisos forçados, etc.
ESTUDO EMPÍRICO: APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Metodologia
• Avaliação do comportamento verbal (CV) e não verbal (CNV) revelado pelos depoentes em tribunal • Observação da actividade exegética realizada pelo sentenciador
• Estudo realizado em cenário real • Dois observadores independentes • Grelha de Análise das Motivações Ajurídicas do Setenciar (GAMAS), Poiares (2005) • 20 itens de CV e 20 itens de CNV de resposta dicotómica :
Objectivo
CV Clareza Lógica
Hesitações Discurso rápido
Coerência Incoerência
etc
CNV Postural corporal rígida
Postura agressiva Desmotivação
Firmeza Desembaraço na resposta
Tiques etc
42 menores 3 de sexo feminino (7,1%)
25
4
2
3
1 7 Portugal
Guiné
Cabo-Verde
Angola
França
NS/NR
Naturalidade
Caracterização da população de menores
1 4
16
8
13 13 anos
14 anos
15 anos
16 anos
17 anos
Idade
26
16 Africana
Caucasiana
Etnia
26
16 Reincidentes
Não reincidentes
Reincidência
Menores – Crimes e apreciação judicial
23%
23%
14%
10%
7%
5%
18% Roubo
Ofensa à integridade física
Ameaça
Porte de arma proibida
Furto
Crime de dano
Outros
Crimes
Menores – Crimes e apreciação judicial
18
16
4
4 Acompanhamento Educativo
Internamento
Tarefas a favor da comunidade
Absolvição
Medidas aplicadas
0%
25%
50%
75%
100%
Prova documental
Prova pericial
Prova testemunhal
Não
Sim
Provas obtidas
Menores – Comportamentos Verbais
0%
20%
40%
60%
80%
100%
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
Não apresentou Apresentou
Comportamentos mais produzidos: coerência (CV13) insiste na versão mesmo quando contraditado (CV15)
Comportamentos menos produzidos: recurso a apelos emocionais (CV6) invocação de locus de controlo interno (CV7) desorganização discursiva (CV9) contradição muito acentuada (CV17) responde antes de formulada a pergunta (CV18) risos (CV19) verborreia (CV20);
Menores – Comportamentos Não Verbais
0%
20%
40%
60%
80%
100%
21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40
Não apresentou Apresentou
Comportamentos mais produzidos: postura corporal rígida (CNV21) rapidez/desembaraço na resposta (CNV27) auto-confiança (CNV30) olhar frontal (CNV34)
Comportamentos menos produzidos: gesticulação (CNV 32) riso (CNV39) entusiasmo no depoimento (CNV40)
Menores – Comportamentos vs Credibilidade
Significância dos comportamentos em relação à credibilização X2 < 0.05 (Pearson Chi-square)
24 menores credibilizados (57.1%)
São tendencialmente credibilizados quando NÃO apresentam:
-Invocação de locus de controlo externo (CV8); -Discurso agressivo (CV12); -Gesticulação (CNV32); -Olhar que percorre todos os actores (CNV35) -Alonga as pernas (CNV38)
São tendencialmente credibilizados quando apresentam:
-Coerência (CV13) -Esfrega muito as mãos (CNV36)
Caracterização das vítimas
19 vítimas 7 do sexo feminino (36,8%) Todas de nacionalidade Portuguesa
17
2
Caucasiana
Africana
Etnia Idade
Danos sofridos
35%
27%
15%
15%
8% Danos corporais
Perda de bem material
Danos morais
Perda de bem monetário
Danos corporais que obrigaram à hospitalização
11 4
4 Menores
Maiores
NS/NR
Vítimas – Comportamentos Verbais
Comportamentos mais produzidos: pensa sobre as questões que considera duvidosas (CV4) discurso adequado (CV10) coerência (CV13) insiste na versão mesmo quando contraditado (CV15)
Comportamentos menos produzidos: discurso desadequado (CV11) discurso agressivo (CV12) responde antes de formulada a pergunta (CV18) verborreia (CV20)
0%
20%
40%
60%
80%
100%
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
Não apresentou Apresentou
Vítimas – Comportamentos Não Verbais
0%
20%
40%
60%
80%
100%
21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40
Não apresentou Apresentou
Comportamentos mais produzidos: olhar frontal (CNV34) esfrega muito as mãos (CNV36)
Comportamentos menos produzidos: postura agressiva (CNV23) risos (CNV39)
Vítimas – Comportamentos vs Credibilidade
Significância dos comportamentos em relação à credibilização X2 < 0.05 (Pearson Chi-square)
15 vítimas credibilizadas (78.9%)
São tendencialmente credibilizados quando NÃO apresentam:
-Hesitações (CV3) -Discurso rápido e sem dúvidas (CV5) -Contradições frequentes (CV16) - Rapidez/desembaraço na resposta (CNV27) - Insegurança (CNV29) - Movimentação frequente do corpo (CNV 31)
São tendencialmente credibilizados quando apresentam:
- Pensa sobre as questões que considera duvidosas (CV14) - Firmeza (CNV26) - Olhar frontal (CNV34) - Esfrega muito as mãos (CNV36)
58 testemunhas 35 do sexo feminino (60,3%)
Caracterização das testemunhas
31
11
6
4
6 Funcionário público em exercício de funções
Relação familiar com o arguido
Membro de forças de segurança
Relação familiar com a vítima
Outros
Profissões
0%
20%
40%
60%
80%
100%
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
Não apresentou Apresentou
Comportamentos mais produzidos: clareza (CV1) lógica (CV2) discurso adequado (CV10) insiste na versão mesmo quando contraditado (CV15)
Comportamentos menos produzidos: desorganização discursiva (CV9) discurso desadequado (CV11) discurso agressivo (CV12) incoerência (CV14) contradição muito acentuada (CV17) risos (CV19)
Testemunhas – Comportamentos Verbais
0%
20%
40%
60%
80%
100%
21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40
Não apresentou Apresentou
Comportamentos mais produzidos: auto-confiança (CNV30)
Comportamentos menos produzidos: postura agressiva (CNV23) desmotivação/desinteresse (CNV24) tiques (CNV33) riso (CNV39)
Testemunhas – Comportamentos Não Verbais
Testemunha – Comportamentos vs Credibilidade
Significância dos comportamentos em relação à credibilização X2 < 0.05 (Pearson Chi-square)
Dado: 39 testemunhas credibilizadas (67.2%)
São tendencialmente credibilizados quando NÃO apresentam:
- Entusiasmo no depoimento (CN40)
São tendencialmente credibilizados quando apresentam:
- Firmeza (CNV26)