Movimento Neopentecostal Brasileiro - David Allen Blendsoe

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CAPÍTULO 1 Desenvolvimento histórico Do pentecostalismo no Brasil O pentecostalismo brasileiro é formado por uma série de movimentos em constante mudança. Seu desenvolvimento ocorreu na medida em que seus adeptos começaram a propagar suporte bíblico às suas experiências sensoriais. Ao mesmo tempo, interagiram com outros pentecostais e com a sociedade dentro e fora de suas fronteiras geográficas. A avaliação feita por A. H. Anderson (2003) sobre um pentecostalismo global “multifacetado” se aplica bem a essa versão brasileira. Freston (1995, p. 120) divide a história pentecostal em três períodos ou “ondas” (i.e., waves). Outros estudiosos também seguiram sua terminologia e demarcações de tempo (ex., Mariano, 2005, p. 28-32; Kramer, 2005, p. 97; Oro & Semán, 2001, p. 182). No presente trabalho, também adoto esses termos e períodos de tempo previamente estabelecidos. Cáceres (2006, p. 55-58) declara haver benefícios e limitações na divisão do movimento em períodos distintos. Ele observa que, embora as divisões diferenciem as principais ênfases entre os períodos, elas não realçam a progressão e as interações sociais do pentecostalismo. As igrejas e suas denominações pertencentes aos sucessivos períodos foram construídas sobre as premissas das ondas anteriores, ao mesmo tempo que acrescentavam novos dogmas e práticas. Minha pesquisa confirma as ideias de Cáceres. Os grupos de cada onda defendem ensinamentos e práticas semelhantes, embora variem em outras características

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Desenvolvimento histórico Do pentecostalismo no Brasil

CAPÍTULO 1

Desenvolvimento histórico

Do pentecostalismo no Brasil

O pentecostalismo brasileiro é formado por uma série de movimentos em constante mudança. Seu desenvolvimento ocorreu na medida em que seus adeptos começaram a propagar suporte bíblico às suas experiências sensoriais. Ao mesmo tempo, interagiram com outros pentecostais e com a sociedade dentro e fora de suas fronteiras geográficas. A avaliação feita por A. H. Anderson (2003) sobre um pentecostalismo global “multifacetado” se aplica bem a essa versão brasileira.

Freston (1995, p. 120) divide a história pentecostal em três períodos ou “ondas” (i.e., waves). Outros estudiosos também seguiram sua terminologia e demarcações de tempo (ex., Mariano, 2005, p. 28-32; Kramer, 2005, p. 97; Oro & Semán, 2001, p. 182). No presente trabalho, também adoto esses termos e períodos de tempo previamente estabelecidos.

Cáceres (2006, p. 55-58) declara haver benefícios e limitações na divisão do movimento em períodos distintos. Ele observa que, embora as divisões diferenciem as principais ênfases entre os períodos, elas não realçam a progressão e as interações sociais do pentecostalismo. As igrejas e suas denominações pertencentes aos sucessivos períodos foram construídas sobre as premissas das ondas anteriores, ao mesmo tempo que acrescentavam novos dogmas e práticas. Minha pesquisa confirma as ideias de Cáceres. Os grupos de cada onda defendem ensinamentos e práticas semelhantes, embora variem em outras características

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quando comparados a alguns precursores e contemporâneos. O fato de Freston ter escolhido um termo que comunicasse fluidez pode caracterizar melhor o desenvolvimento do pentecostalismo, uma vez que a mistura de líquidos pode formar uma onda mesmo sendo composta de ingredientes comuns, embora distintos. A. H. Anderson (2003) atesta que uma das forças de expansão do pentecostalismo está na sua habilidade em se adaptar e tomar emprestado.

O uso do termo “onda” não é único no estudo do pentecostalismo brasileiro. Esse termo, juntamente com palavras similares como “carismático” e “neopentecostal”, podem tentar alguém a associar a implementação do pentecostalismo brasileiro com particularidades do movimento global ou de sua versão norte-americana (Anderson, AH 2003; Hawks, 2003).3 Embora existam semelhanças e, às vezes, interdependências, esta seção destaca particularidades do contexto brasileiro.

Este capítulo descreve o desenvolvimento do movimento pentecostal brasileiro desde seu início no século 20 até sua versão mais recente: o neopentecostalismo. São apresentados detalhes sobre personalidades, grupos e contribuições significativas que conduziram e, atualmente, persistem no neopentecostalismo, especialmente na IURD.

Pentecostalismo clássico

O pentecostalismo brasileiro começou a se difundir na segunda década do século 20 em duas regiões diferentes. O italiano Louis Francescon estabeleceu sua base no sudeste do país. Ao mesmo tempo, dois homens de origem sueca, Daniel Berg e Gunnar Vingren, trabalharam no norte do Brasil. No entanto, esses missionários compartilhavam outra importante conexão além do fato de terem ministrado durante o mesmo período no mesmo país. Antes de se mudarem para o Brasil, eles haviam se exposto à mesma igreja, sediada em Chicago, onde a mensagem pentecostal era pregada por William H. Durham (Mendonça & Prócoro em Kramer, 2001, p. 17).

3 A. H. Anderson, reconhecido por documentar descrições gerais, expansões e interpretações do fenômeno mundial do pentecostalismo, entende a singularidade da implementação regional e cita o pentecostalismo brasileiro como exemplo (Anderson, AH 2003).

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Organizada em 1907, Durham fundou e conduziu a North Avenue Mission (Missão da Avenida Norte) em Chicago. Sete anos antes de começar essa igreja, ele havia começado uma escola bíblica. Foi neste ambiente que William Seymor aprendeu a mensagem pentecostal, a qual ele levou à cidade de Los Angeles em 1906. Seymor, filho de um escravo livre, tem sido encarado como propagador indireto do pentecostalismo em 26 nações no período de dois anos (Anderson, AH 1997). Foi através do ministério de Durham, e de certa influência de Seymor, que os futuros fundadores das duas maiores denominações pentecostais existentes no solo brasileiro foram impactados (Romeiro, 2005, p. 31-34).

A primeira onda pentecostal, ou período clássico, começou por volta de 1910 e permaneceu até cerca de 1950 com o advento da segunda onda. Suas principais características eram o segundo batismo no Espírito Santo e o falar em línguas (Kramer, 2005; Mariano, 2005, p. 31; Oro & Semán, 2001, p. 182). Os usos e costumes também seguiram esses traços. Seus seguidores deveriam obedecer a tais normas comportamentais prescritas até sua entrada no céu ou o retorno de Cristo, o que viesse primeiro. A cura divina e os exorcismos, embora não impedidos, não eram o foco principal entre as igrejas (Sayão, 1999, p. 87-88). Entretanto, os fundadores da Assembleia de Deus (AD) gastaram muito de sua energia visitando os doentes e testificaram que o Senhor curara muitos através da eficácia da oração (Vingren em Chestnut, 1997, p. 28).

Grupos principais

A AD e a Congregação Cristã no Brasil (CCB) são as denominações mais visíveis que emergiram nesse período. É possível encontrar, na fundação dos dois grupos, a infame estratégia de crescimento pentecostal de fazer proselitismo entre os crentes das igrejas evangélicas de missão4 já

4 O termo “igrejas evangélicas de missão” se refere a igrejas brasileiras de denominações protestantes que existiam antes do século 20 e, consequentemente, do pentecostalismo. Popularmente conhecidas como “igrejas históricas”, grupos como luteranos, batistas, presbiterianos e metodistas se encaixam nessa classificação.

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existentes (Campos, 2005, p. 110). Essas duas denominações cresceram de maneira constante até a década de 1950 quando a elevada migração urbana e industrialização criaram ambiente favorável para que suas mensagens e igrejas se espalhassem exponencialmente (Chestnut, 1997; Kramer, 2005, p. 97).5 Embora suas histórias possuam semelhanças, sua estrutura eclesiástica e práticas diferem significativamente. As descrições a seguir apresentam suas distinções.

AssembleiA de deus

Daniel Berg e Gunnar Vingren, de origem sueca, sentiram um chamado do Senhor para pregar a mensagem pentecostal no Brasil. Numa reunião de oração em South Bend, no estado de Indiana. Eles receberam uma profecia para irem ao Pará. Sem saber a localização do Pará, logo descobriram que era um estado do norte do Brasil. Receberam dinheiro de um amigo para o transporte marítimo e partiram para a cidade de Belém em 10 de novembro de 1910. Ao chegarem, foram ajudados por um pastor batista que lhes providenciou hospedagem no templo de sua igreja. Quando os dois aprenderam português suficiente para se comunicar, começaram a propagar suas crenças pentecostais. Em 1911, ocorreu uma divisão entre eles e a igreja batista, o que resultou no começo da Missão de Fé Apostólica, com dezenove membros. Após 1914, o nome foi mudado para AD, assim como sua denominação parceira nos Estados Unidos (Proença, 2006, p. 100).

Os missionários suecos rapidamente desenvolveram uma liderança nativa entre os cidadãos simples e marginalizados (Freston, 1995, p. 122). Proença (2006, p. 100) menciona que, três décadas depois da chegada dos suecos no país, eram os brasileiros que conduziam a AD. Para dar continuidade à expansão, a sede passou de Belém para o Rio de Janeiro, um local de elevada migração urbana. Após 1934, missionários vieram

5 A AD e CCG, pertencentes ao período clássico do pentecostalismo, experimentaram um crescimento significativo durante a era moderna (começando em 1950 até o fim de 1970), também conhecida como segunda onda pentecostal. Esse fenômeno de expansão tardia também ocorreu em algumas igrejas da segunda onda pentecostal que viram um aumento significativo no período da terceira onda.

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dos Estados Unidos para prestar auxílio, mas sua influência era limitada em comparação com os suecos. Os missionários americanos pareciam ser mais materialistas que seus parceiros suecos, além de ter uma visão mais liberal das normas de comportamento pentecostais (Freston, 1995, p. 123). Eles também enfatizavam a educação teológica, algo que a liderança sueca e brasileira preferiu evitar, p. 123).

A AD tem crescido a ponto de se tornar o maior grupo pentecostal e a maior denominação evangélica no Brasil. Vingren recorda que os batismos cresceram de treze – quando o trabalho começou em 1911 – para 190 no terceiro ano. Ele também lembra que, por volta de 1930, a AD se orgulhava de possuir três templos e mil membros somente na cidade de Belém (em Chestnut, 1997, p. 28-29). Por volta do mesmo período, a AD também estava presente em todos os estados brasileiros e possuía autonomia quanto ao controle missionário estrangeiro (Freston, 1995, p. 122).

O último censo registra quase 8,5 milhões de integrantes da AD (IBGE, 2000). Esse número inclui membros afiliados à Convenção Geral e uma recente divisão, a Convenção de Madureira6, que estima contar com um terço dos seguidores da AD (Freston, 1995, p. 124). Mariano (2004, p. 123) observa que a denominação tem se adaptado razoavelmente a uma sociedade em mudança, o que facilita seu crescimento. Sua percepção é mais uma avaliação da denominação como um todo, mas se mostra verdadeira diante do contraste com a rival CCB.

O sistema eclesiástico da AD favorece a manutenção do crescimento desejado. Uma igreja-mãe situada em local estratégico supervisiona múltiplas congregações satélites espalhadas em uma região. O pastor da igreja-mãe serve como bispo com autoridade máxima sobre as decisões referentes aos que lhe estão sujeitos. Diáconos, obreiros e evangelistas se reportam a ele e servem como plantadores de igrejas e pastores leigos nas principais e menores congregações (Freston, 1995, p. 123). O pastor e sua assembleia se reportam a um líder mais elevado e sua respectiva

6 As igrejas da Convenção de Madureira defendem algumas características neopentecostais que levaram à sua separação da Convenção Geral. Para mais detalhes, veja a página 58.

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igreja, este supervisiona a AD em seu estado correspondente que, por sua vez, se reporta à sede nacional. A ascensão na liderança depende mais da qualidade do trabalho realizado na evangelização, cuidado e expansão de uma congregação do que de um status educacional ou cultural. Embora a AD possua alguns seminários residenciais, uma concessão recente, a maior parte dos pastores recebe seu treinamento mediante desenvolvimento ministerial prático acompanhado de estudos em um dos vários institutos bíblicos que a denominação oferece.

CongregAção Cristã no brAsil

O imigrante italiano Louis Francescon chegou aos Estados Unidos aos 20 e poucos anos de idade. Em 1903, ele recebeu o batismo por imersão em uma igreja presbiteriana (Milton, 2001, p. 15). Mais tarde, ele se submeteu ao ministério e tutela de Durham, onde experimentou o batismo no Espírito Santo (p. 15-16). Durham e outros profetizaram que Francescon levaria a mensagem pentecostal aos seus conterrâneos. Francescon cumpriu a profecia de evangelizar e levar o pentecostalismo aos italianos, primeiro nos Estados Unidos e depois na América do Sul. Sendo italiano, portanto fluente na língua materna, e chamado a pregar aos italianos, seu ministério focalizou-se nesse grupo imigrante onde quer que fosse. Após um breve período de ministério na Argentina e então em São Paulo, Brasil, Francescon se mudou para o estado do Paraná, onde começou sua missão em solo brasileiro. Ele presenciou onze conversões e o começo não oficial da CCB (p. 19-21). Depois de intensa oposição à sua mensagem entre a população, ele procurou refúgio em São Paulo.

O retorno de Francescon para São Paulo resultou no início oficialmente reconhecido da CCB. Na área de concentração italiana no bairro do Brás, ele se associou a uma igreja presbiteriana. O pastor deu a Francescon oportunidades para pregar, o que ele de bom grado fez em italiano. Ele contava com uma audiência entusiasmada até dar destaque ao batismo no Espírito Santo e ao falar em línguas. Depois de ser expulso da congregação presbiteriana, alguns membros simpáticos a ele o seguiram para formar uma nova igreja. Em junho de 1910, Francescon, juntamente

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com vinte seguidores, fundaram a CCB, apenas um ano antes da fundação da AD por Berg e Vingren (Anderson, JC 2005, p. 605-605; Chestnut, 1997, p. 29-30).

A CCB se espalhou principalmente através das redes de relacionamento familiar entre os imigrantes italianos residentes em ambientes agrários, especialmente no estado de São Paulo (Kramer, 2001, p. 17). A liturgia continuou a ser realizada em língua italiana até 1935 quando a igreja fez a transição para o português. Essa adaptação ao idioma nacional permitiu que a denominação alcançasse não só os italianos (Freston, 1995, p. 125). Francescon, reconhecido como o patriarca da denominação, nunca residiu permanentemente no Brasil. Ele fazia viagens periódicas dos Estados Unidos ao Brasil e desfrutava do papel de apóstolo-fundador.

A presença da CCB está altamente concentrada no estado de São Paulo e próxima ao Paraná. Suas igrejas se multiplicam de maneira mais efetiva em pequenos ambientes urbanos e rurais do que em grandes áreas urbanas, embora também possam ser encontradas nestas. Entre os anos 1936 e 1950, a CCB cresceu de 36.644 membros no Brasil para 132.297 (em Chestnut, 1997, p. 30-31). O censo recente (IBGE, 2000) registra aproximadamente 2,5 milhões de seguidores, tornando-a a segunda maior denominação pentecostal e segunda maior denominação evangélica no Brasil. Sayão (1999, p. 87) observa a impressionante presença da CCB, principalmente levando em conta o fato de ela ter mudado pouco sua metodologia ao longo dos anos se comparada a todas as denominações evangélicas.

A CCB possui peculiaridades que a distinguem de outros grupos. A interpretação radical da predestinação impede a igreja de realizar campanhas evangelísticas, usar mídia eletrônica e promover atividades fora do templo (Proença, 2006, p. 98). A denominação é uma reunião de congregações autônomas, onde cada uma é conduzida por anciãos e diáconos, sem qualquer reconhecimento ou presença de um pastor. A Bíblia é a única literatura admitida para uso e consulta por parte de sua membresia e liderança (Milton, 1995, p. 23, 29). Os costumes incluem a esperada participação na Santa Ceia, realizada uma vez por ano; a

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saudação de membros do mesmo sexo com o ósculo santo; a prática de orar de joelhos; a separação entre homens e mulheres nos cultos públicos e o uso do véu pelas mulheres durante os cultos. A CCB proíbe a formação de grupos de estudo por idade, assunto ou para o propósito de comunhão (p. 23-27).

Milton (1995, p. 23) observa que a CCB faz, regularmente, proselitismo entre os evangélicos de outras denominações, especialmente novos convertidos. Freston (em Siepierski, 2001, p. 39) considera o grupo o mais restrito de todas as denominações evangélicas no Brasil. Seus membros não consideram os outros evangélicos como irmãos em Cristo e são proibidos de se relacionar com eles de qualquer modo, a não ser com o propósito de fazer proselitismo (Milton, 1995, p. 62).

A posição da CCB sobre a salvação é sua característica mais alarmante. Milton (1995, p. 30) acha que a CCB é opressiva ao realçar seus costumes em detrimento da proclamação da salvação pela fé em Jesus Cristo. Ele destaca o fato de uma pessoa ser batizada o mais rápido possível quando tocada pelo Espírito Santo. Depois do batismo, os ensinamentos e práticas da igreja são explicados. Se um membro abandona a fé, e especialmente a CCB, perde sua salvação, com poucas chances de recuperá-la (p. 12).

Wagner (1973, p. 81-82, tradução) usa a CCB como denominação exemplar em seu livro que investiga o crescimento da igreja entre os pentecostais. Ele recomenda, entusiasticamente, esse grupo por seu compromisso com os dons espirituais, participação da membresia no ministério e o conceito de que “um ministro profissional é apenas um excesso de bagagem”. Além disso, ele compara o número de membros de uma CCB local em São Paulo com uma destacada igreja presbiteriana na mesma cidade, o que faz com que a última pareça pequena. A falha de Wagner em criticar ou, pelo menos, qualificar os ensinamentos e práticas da CCB antes de documentá-los, mostra sua ingenuidade e coloca em questão a contribuição desse trabalho para a pesquisa evangélica.

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Pentecostalismo da segunda onda

Os anos 1950 introduziram uma série de mudanças sociológicas no Brasil, incluindo a migração de trabalhadores sem capacitação para as crescentes áreas urbanas; o avanço da industrialização; a luta e resistência da nação à entrada em um mundo recém-globalizado; um repentino movimento nacionalista e um novo tipo de pentecostalismo. Antes dessa década, a CCB e a AD eram as principais manifestações pentecostais em solo brasileiro. Suas ênfases principais incluíam o segundo batismo no Espírito Santo, os dons do Espírito Santo, além dos usos e costumes. A resposta do pentecostalismo à era moderna trouxe o que foi classificado como segunda onda do movimento. Esse período se estendeu do início da década de 1950 até o começo do período neopentecostal no final dos anos 1970 (Freston, 1995; Kramer, 2001; Mariano, 2005).

Estudiosos diferenciam a segunda onda do pentecostalismo do período clássico por sua ênfase na cura divina (Mariano, 2004, p. 122-123; 2005, p. 31, 36; Mendonça, 1997, p. 157).7 No entanto, outras características presentes nessas igrejas conseguiram distanciá-las de seus antecessores pentecostais, o que também preparou o terreno para a terceira onda do pentecostalismo (i.e., neopentecostalismo). Os exorcismos parecem ocupar um papel de destaque entre as denominações que emergiram nessa era (Sayão, 1999, p. 88-90; Campos em Mendonça, 1997, p. 158; Chestnut, 1997, p. 37). Algumas igrejas proeminentes também reduziram as expectativas quanto ao comportamento da membresia e abriram paradigmas evangélicos relacionados aos locais de reunião, participação política e estilos de louvor.

Grupos principais

Embora outras denominações menores tenham surgido durante esse período, três merecem atenção por seu crescimento, inovações e influência

7 A cura divina também é a principal razão pela qual os brasileiros buscam o catolicismo popular e as religiões afro-brasileiras. Chestnut (1997) argumenta que o pentecostalismo compete com essas religiões como alternativa evangélica para a cura.

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no grupo evangélico e pentecostal. Cada uma teve seu início na região de São Paulo, espalhou-se bem pelo Sudeste e então se expandiu com variado sucesso pelo resto do país. O Brasil para Cristo (BPC) e a Igreja do Evangelho Quadrangular (IEQ, The Four-Square Church) procederam do mesmo movimento de cruzada realizado em tendas. A Igreja Pentecostal Deus é Amor (IPDA) também começou nesse período, porém com práticas mais separatistas e rígidas.

igrejA do evAngelho QuAdrAngulAr

Aimmee Semple McPherson é a fundadora canadense da denomi-nação sediada nos Estados Unidos The Four-Square Church. Ela trouxe ao Brasil uma variação de seu éthos pentecostal através de dois ex-atores americanos: Raymond Boatwright e Harold Williams. Estes dois homens realizaram reuniões em tendas onde destacavam a cura divina e levavam o drama dos exorcismos para mais perto das massas brasileiras (Proença, 2006, p. 115-116; Sayão, 1999, p. 88). Através de sua interdenominacional Cruzada Nacional de Evangelização, milhares de evangélicos e curiosos se reuniram debaixo de tendas, primeiramente na região de São Paulo e depois pelo Brasil. As reuniões na tenda ofereciam canções de louvor ao vivo com ritmos populares, sessões de cura e o discurso do batismo no Espírito Santo. Proença (2006, p. 116-117) observa como esses esforços de cruzada modificaram o campo evangélico, produzindo divisões em quase toda denominação pentecostal e não pentecostal.

Com o surgimento de novas igrejas a partir das reuniões na tenda e a oposição de alguns líderes pentecostais, Williams decidiu lançar em 1954 a Igreja da Cruzada, que foi oficialmente associada à sua parceira americana Four-Square Church no ano seguinte. A IEQ trouxe, ao povo brasileiro, sua mensagem simplificada em quatro tópicos (i.e., Jesus salva, Jesus batiza com o Espírito, Jesus cura, Jesus voltará), mantendo os métodos da Cruzada Nacional de Evangelização para conservar a identidade da igreja local. Suas estratégias incluíam grandes concentrações, divulgação pelo rádio, música ao vivo e liberalização dos rígidos usos e costumes.

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Alguns pesquisadores do pentecostalismo brasileiro destacam como a IEQ promoveu ou, pelo menos, demonstrou uma mudança significativa na mensagem pentecostal. Reily (em Romeiro, 2005, p. 41) observa que a ênfase nos quatro tópicos apresenta um reducionismo doutrinário, quase eliminando termos como justificação pela fé, encarnação e Trindade. Mendonça (1997, p. 158-159) acusa a IEQ de devastação contínua da mensagem do evangelho além de sua contribuição para uma nova forma de religião. A cura física e psicológica começou a tomar o lugar de temas mais clássicos como pecado e inferno (Freston, 1995, p. 126). Isaltino, (2004, p. 4) nota que a IEQ introduziu conceitos teológicos que mais tarde seriam aperfeiçoados no neopentecostalismo.

A influência da IEQ em termos de crescimento foi mais lenta do que seu impacto no cenário evangélico devido à sua afiliação americana e ao espírito nacionalista do Brasil durante as décadas de 1950 e 1960. Entretanto, a IEQ se tornou uma das denominações de mais rápido crescimento na década de 1980 e ganhou autonomia em relação à sede de Los Angeles em 1988 (Freston, 1995, p. 27). Mais de 1,3 milhão se declararam membros no censo de 2000 (IBGE, 2000). As características que facilitaram sua expansão e a penetração em um estrato social um pouco mais elevado incluíam o emprego de mulheres pastoras (compreendendo 35% do total da liderança pastoral) e o crescente envolvimento da liderança com a política desde sua emancipação da afiliação americana (Freston, 1995, p. 126).

o brAsil pArA Cristo

Ao imigrar do nordeste do Brasil para a cidade de São Paulo, Manoel de Mello, ex-diácono da AD, se envolveu na Cruzada Nacional de Evangelização, onde aprendeu o evangelismo de massa e as estratégias de cura de McPherson. Dentro da Cruzada, obteve reconhecimento nacional. Conhecido por sua pregação fervorosa, ministério de cura e modo de falar próprio do homem comum, milhares se reuniam para

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ouvi-lo pregar. Após acusações de charlatanismo8 ele deixou a Cruzada e iniciou a BPC em 1955.

A pessoa de Mello e sua denominação contribuíram para a diversi-ficação do campo pentecostal e evangélico de várias formas. Primeiramente, Mello foi o primeiro brasileiro a fundar uma denominação evangélica em solo nacional. Este feito contribuiu para sua popularidade, dado que o nacionalismo era crescente no Brasil. Em segundo lugar, ele também foi o primeiro a alinhar sua denominação com a arena política, mobilizando seus membros a votar em determinados candidatos em troca de favores. Terceiro, a BPC foi pioneira no uso de espaços seculares para grandes campanhas e ajuntamentos evangelísticos. Embora criticado naquele tempo por pastores de denominações históricas e por outros pentecostais, mais tarde essa prática seria aceita como normativa por muitos grupos evangélicos. Finalmente, Mello foi um dos pioneiros em usar o rádio e experimentar a televisão, propagando sua mensagem de cura e interagindo com milhões de ouvintes em âmbito nacional.

Os métodos pragmáticos e polêmicos de Mello também fizeram dele uma das primeiras figuras controversas do evangelicalismo nacional, um precedente que vários líderes do neopentecostalismo seguiriam mais tarde. Mello foi acusado de ter associado a BPC ao Conselho Mundial de Igrejas em 1969 para gerar fundos para seus projetos, mesmo discordando publicamente de sua teologia (Freston, 1995, p. 128).

Embora as cruzadas e as ondas do rádio levassem a pessoa e a mensagem de Mello pelo Brasil, a BPC era um fenômeno mais presente em São Paulo (Freston, 1995, p. 127). A BPC falhou em desenvolver sua própria identidade institucional fora da personalidade carismática de Mello, e essa foi uma das razões para a redução de sua membresia após a morte do fundador (Proença, 2006, p. 119). Apenas 175.618 se declararam membros da BPC no último censo (IBGE, 2000). Embora considerada como uma força insignificante no evangelicalismo contemporâneo, a

8 Charlatanismo não é apenas uma acusação feita pelas sociedades seculares ou evangélicas, mas um ato ilegal e passível de punição relacionado à exploração religiosa e/ou cura de cidadãos.

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BPC contribuiu grandemente para mudar normas metodológicas e mostrar como o sagrado pode interagir com o secular.

igrejA penteCostAl deus é Amor

Embora altamente facciosa e legalista, a IPDA é considerada um importante catalisador pentecostal que emergiu durante a segunda onda. Kramer (2001, p. 20) atribui a essa denominação o favorecimento da diversificação do pentecostalismo no Brasil. Outros estudiosos (Freston, 1995, p. 128; Chestnut, 1997, p. 38; Oro & Semán, 2001, p. 182) afirmam que a IPDA introduziu hábitos que se mantiveram em igrejas posteriores durante a era neopentecostal.

O fundador da IPDA, David Miranda, mudou-se com sua família do nordeste do Brasil para a região de São Paulo. Em sua nova cidade, ele se declarou convertido e se juntou à congregação da BPC. Mais tarde, passou pela IEQ e finalmente saiu em 1962 para dar início à IPDA. A partir de um pequeno espaço alugado em uma periferia de São Paulo, a igreja se multiplicou pela cidade e pelo Brasil, concentrando-se principalmente no Sudeste. A simplicidade e a educação primária de Miranda parecem ter afetado as características demográficas de suas igrejas. Geralmente, seus membros são mais pobres do que os de outras denominações pentecostais (Mariano, 2005, p. 196; Sayão, 1999, p. 89).

A IPDA faz investimentos consideráveis em rádio, provavelmente mais do que qualquer outra denominação. Freston (1995, p. 128) relata que existem cinquenta placas penduradas acima do púlpito na “sede mundial”, indicando os nomes das estações de rádio que transmitem os programas de Miranda. A denominação possui, no mínimo, quarenta estações de rádio próprias na América Latina, dedicando sua programação exclusivamente ao trabalho da igreja (Proença, 2006, p. 120). A IPDA também compra incontáveis horas de programação em estações de rádio particulares tanto no Brasil quanto em países vizinhos.

A IPDA eleva a cura divina a tal nível que os pesquisadores a rotularam de “agência de cura divina” (Mendonça & Velasques em

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Chestnut, 1997, p. 38, tradução). Localizada nas dependências da igreja-mãe em São Paulo, encontra-se uma sala de milagres que abriga muletas e outros objetos doados pelas pessoas curadas como gesto de gratidão (Proença, 2006, p. 120).9

Ao contrário da IEQ e BPC, as principais distinções da IPDA consistem em seu sectarismo e nas rígidas expectativas quanto ao comportamento. Uma leitura rápida do manual para membros e líderes da IPDA, chamado de regimento interno, não deixa dúvidas quanto às expectativas do grupo. Algumas regras mencionadas incluem a proibição de assistir à televisão; jogar futebol; possuir um pássaro engaiolado; cortar os pêlos do corpo, no caso das mulheres; participação em outras igrejas diferentes da sua. Além dessas proibições, ele descreve procedimentos sobre oferecer e pegar carona e acerca do vestuário adequado. O manual prescreve punições para desobediência que vão desde a suspensão até a excomunhão e restituição, caso necessário. Os membros só podem participar da ceia do Senhor depois de mostrar suas credenciais, atestado de frequência ao culto e confirmação da entrega dos dízimos.

É de notável importância o fato da IPDA ter ajudado a pavimentar o caminho para o discurso neopentecostal brasileiro, especialmente na IURD, com seu enfrentamento da Umbanda.10 Ao mesmo tempo que atacava, a IPDA também tomava emprestado práticas da umbanda, de outras religiões afro-brasileiras e do catolicismo popular, o que elevou o “sincretismo a novos patamares” (Chestnut, 1997, p. 38, tradução). Freston, (1995, p.

9 O uso de salas de milagres não é exclusivo da IPDA. Geralmente, essas salas são associadas ao catolicismo popular, atribuindo milagres a determinado santo que providenciou a cura ou a provisão necessária.10 Esta religião afro-brasileira começou nos anos 1920, reunindo práticas e dogmas de religiões africanas, do catolicismo e do kardecismo. Ela se espalhou rapidamente pelo Brasil nas décadas de 1950 e 1960, o mesmo período do início e avanço da segunda onda do pentecostalismo. A AD também experimentou crescimento significativo durante essa época. É interessante notar que Chestnut (1997) argumenta que o pentecostalismo compete com a umbanda e outras religiões afro-brasileiras na oferta de soluções para problemas comuns relacionados à pobreza, tais como doenças e desemprego.

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128, tradução) escreve: Muitos elementos [na IPDA] são antecipações da Igreja Universal do Reino de Deus: obreiros uniformizados, exorcismo no palco [diante da plateia], entrevistas com demônios, clamor ardente para fazer com que o demônio deixe sua residência.

O último censo revela que 774.830 pessoas são adeptos da IPDA (IBGE, 2000). A influência da igreja se estende de maneira mais ampla do que sua membresia, pois o rádio divulga as atividades da igreja para um grande número de ouvintes, e as regras para os membros promovem frequentes excomunhões. Lamentavelmente, a IPDA mais parece uma seita legalista com práticas sincretistas. Sayão (1999, p. 94) concorda com tal avaliação e exclui essa denominação da comunidade evangélica.

Antecedentes neopentecostais ou participantes?

Não há dúvidas sobre como as igrejas da segunda onda tais como IEQ, BPC e IPDA diversificaram o pentecostalismo e introduziram elementos preparatórios para as denominações da terceira onda. Por outro lado, Romeiro (2005, p. 51) observa que as igrejas supracitadas também permitiram em seu meio algumas práticas que os grupos neopentecostais introduziram e exibiram. Essa troca tem dificultado a determinação das linhas de distinção entre muitas igrejas da segunda e da terceira ondas. A. H. Anderson (1997) destaca que essa é uma situação típica dos pentecostais do Terceiro Mundo, uma vez que muitos dão rara importância à ideologia e teologia, apenas adotam o que ajudam seus adeptos e focalizam experiências sensoriais. Campos (1997, p. 50-51) reconhece a dificuldade em se separar, de maneira clara, as duas ondas, e usa a Casa da Bênção como exemplo. Esta denominação da segunda onda incorpora a maior parte dos elementos que também a qualificam como um grupo neopentecostal. Portanto, os grupos da segunda onda mencionados não apenas precederam o período neopentecostal, mas também cooperaram na adoção das inovações da onda posterior.

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movimento neopentecostal Brasileiro

renovAção CArismátiCA entre As igrejAs evAngéliCAs de missão

Outra diversificação no campo pentecostal brasileiro ocorreu nas décadas de 1960 e 1970 com a renovação carismática entre as igrejas evangélicas de missão já existentes. Diversas influências do movimento carismático internacional e das igrejas da segunda onda existentes causaram divisões dentro das igrejas não pentecostais.

A adoção de um éthos carismático resultou na divisão de igrejas evangélicas de missão e suas denominações, bem como o posterior surgimento de congregações independentes conhecidas como comunidades (Freston, 1999, p. 151). As igrejas resultantes dessa renovação carismática, conhecidas como renovadas, mantiveram estruturas e filosofias de ministério similares, ao mesmo tempo que acrescentaram elementos pentecostais. No entanto, a maior parte adotou uma visão mais liberal em relação aos usos e costumes pentecostais. Sayão (1999, p. 84) não considerou tais igrejas e suas denominações afiliadas como pentecostais clássicos, nem como grupos da segunda onda, mas como outra categoria de igrejas pentecostais. A Convenção Batista Nacional, formada basicamente a partir da histórica Convenção Batista Brasileira (CBB) em 1965, foi a maior denominação renovada a emergir. Atualmente, esse grupo possui cerca de 250 mil membros (Sayão, 1999, p. 89; Siepierski, 2001, p. 51-52). Denominações históricas tais como a CBB têm que levar em conta a realidade pentecostal majoritária dentro da sociedade evangélica brasileira. Elas tentam abordar essas forças e mensagens externas com variada capacidade de adaptação, lidando com sua hermenêutica de interpretação das Escrituras, mudanças sociais e suas próprias histórias (ex., Grupo Teológico 1996).

À luz da referida história da renovação brasileira, o termo “carismático” é definido de maneira diferente da usada por alguns pesquisadores fora do Brasil. Para eles, o termo se refere aos evangélicos que aceitam o segundo batismo no Espírito Santo que, geralmente, é acompanhado pelo falar em línguas. Eles também revelam grande entusiasmo pelos dons espirituais e experiências de adoração, embora mantenham sua membresia em igrejas

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afiliadas às principais denominações, que não são pentecostais nem renovadas (Anderson, AH 1987, p. 74; Bradfield, 1978; Grudem, 1994, p. 763; Stott, 1975a). No entanto, o equivalente brasileiro ao movimento carismático resultou na divisão de igrejas evangélicas de missão, o que implicou novas congregações, novas denominações e igrejas independentes, todas promovendo os valores pentecostais.

Período neoPentecostal

O final da década de 1970 prenunciou a terceira onda de igrejas, acarretando continuidades e descontinuidades no pentecostalismo brasi-leiro (Mattos, 2002). As igrejas afiliadas a esse movimento repre sentam o segmento que mais cresce no evangelicalismo brasileiro (Pereira & Linhares, 2006, p. 78). Embora o movimento da segunda onda tenha como ponto de origem e expansão nacional a região de São Paulo, a atual onda, neopentecostalismo, emergiu e se espalhou a partir do Rio de Janeiro com o início da IURD. A mudança para outra megacidade se deve ao fato dos principais colaboradores neopentecostais terem sido inicialmente influenciados pelo pastor canadense Walter Robert McAlister da Igreja de Nova Vida, sediada no Rio. Freston (1995, p. 130) observa que as igrejas da IURD estão mais concentradas no Rio de Janeiro e em São Paulo, confirmando o fato deste último não ter ido muito longe na adoção e compartilhamento das influências neopentecostais.

É difícil determinar o número exato de seguidores neopentecostais brasileiros, pois a terceira onda é considerada um movimento e não é associada a uma denominação em particular. Alguns estimam que seus adeptos representem mais de 42% da população pentecostal geral (em Pereira & Linhares, 2006, p. 84-85). De fato, essa estimativa poderia ser maior, uma vez que os ensinamentos e as práticas da terceira onda fluíram para igrejas da primeira e segunda ondas, além das históricas, fazendo com que se parecessem menos com suas denominações afiliadas e, algumas vezes, afastando-as lentamente.

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movimento neopentecostal Brasileiro

O neopentecostalismo se desenvolveu em uma fase da história socio-política brasileira diferente do pentecostalismo da segunda onda. Na metade da década de 1970, o país começou a transição do regime militar para um sistema democrático. O Brasil se rendeu à participação e dependência do capitalismo internacional (Mattos, 2002). Durante os anos 1980, a rápida migração urbana e estagnação econômica acarretaram riscos sociais complexos. Assentamentos informais começaram a surgir juntamente com a degradação de algumas áreas, resultando nas favelas, conhecidas por sua elevada densidade populacional, altas taxas de desemprego, alcoolismo e tráfico de drogas. A televisão se tornou um eletrodoméstico comum, oferecendo entretenimento, informação e cultura a toda a população. O recente progresso na economia e infraestrutura trouxe o Brasil ao novo milênio com uma classe média em crescimento, melhores oportunidades de educação e mais acesso aos bens de consumo que não eram viáveis para muitos no século anterior.

Definir o neopentecostalismo brasileiro é também uma tarefa desafiadora. Não existe uma teologia homogênea para a terceira onda, e suas igrejas associadas não parecem interessadas em desenvolvê-la (Mariano, 2005, p. 38; Romeiro, 2005, p. 87-88). Essas igrejas também seguem a tendência de diversificar o pentecostalismo iniciado pela segunda onda e pelas igrejas renovadas. Por outro lado, suas histórias, estruturas eclesiásticas, discursos e métodos oferecem características gerais que favorecem a distinção do neopentecostalismo dos períodos iniciais. Stålsett descreve o movimento por aquilo que as igrejas da terceira onda adotam e também pelo que não enfatizam. O neopentecostalismo é uma nova forma de religião pentecostal na qual a batalha espiritual, os exorcismos, as curas imediatas e a prosperidade pessoal neste mundo substituíram a tradi-cional ênfase pentecostal no falar em línguas; na moralidade pietista rígida; na segunda volta de Jesus e na salvação eterna (Stålsett, 2006a, p. 4, tradução).11

11 Stålsett incluiu esta avaliação em uma coletânea de ensaios sobre o pentecostalismo global, que contou com sua edição e colaboração. Ele fez menção à dissertação de Mariano que, mais tarde, se tornou base para a publicação de um livro considerado referência sobre o neopentecostalismo brasileiro (veja Mariano, 2005). Entretanto, a coletânea de Stålsett usou a manifestação brasileira do neopentecostalismo como base para uma descrição global e, além disso, dedicou três ensaios à IURD. Esses fatos mostram o escopo no qual o neopentecostalismo brasileiro tem interagido e contribuído para a atual situação pentecostal global.

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A sinopse de Stålsett inclui três características geralmente mencio-nadas pelos estudiosos em suas descrições neopentecostais (ex., Freston, 1995; Kramer, 2001; Mariano, 2005; Romeiro, 2005; Sayão, 1999). Em primeiro lugar, as igrejas adotam a teologia da prosperidade; a premissa de que os crentes, através da fé, desfrutam dos direitos da cura divina, saúde e sucesso (Harrell em Kramer, 2001, p. 187). Atrelada à teologia da prosperidade, a segunda característica está no fortalecimento da consciência e prática da batalha espiritual que traz consigo uma compatibilidade popular. Os obstáculos à prosperidade são atribuídos ao diabo, seus demônios e/ou forças negativas que eles trazem à vida de uma pessoa. Tais artimanhas incluem, mas não se limitam, ao olho gordo, práticas de feitiçaria, maldições hereditárias, avareza, comportamento promíscuo de um cônjuge e participação em religiões afro-brasileiras. Geralmente, o exorcismo assume um papel de iniciação ao libertar a pessoa dessas aflições, e a pessoa, uma vez liberta, adota rituais específicos para manter esses males longe de sua vida, ou da vida de um ente querido. Finalmente, a motivação quanto aos usos e costumes pentecostais e para manutenção de uma vida santificada diminui em razão dos ensinamentos sobre prosperidade. A busca da felicidade, realização e riqueza é colocada em plano semelhante ou superior à perseverança na salvação até o recebimento do lar celestial.

A característica citada acima sobre a batalha espiritual no neopente-costalismo brasileiro coloca em evidência o espiritismo12, especialmente as religiões afro-brasileiras, como um de seus principais inimigos. Algumas igrejas afiliadas aceitam a ideia de que o espiritismo é a causa primária do sofrimento provocado pelo demônio nos indivíduos e na sociedade. A IURD é um exemplo de grupo neopentecostal que elabora esse discurso, combate

12 Geralmente, o espiritismo se refere às religiões mediúnicas e suas práticas. No Brasil, o kardecismo é considerado uma de suas formas mais organizadas, atraindo muitos adeptos de classes profissionais. Religiões afro-brasileiras como candomblé, quimbanda e macumba são exemplos do baixo espiritismo. A umbanda – que é uma a síntese das religiões afro-brasileiras citadas, além do kardecismo e catolicismo – também se encontra em uma categoria mais popular. Embora os termos “alto” e “baixo” possam estar relacionados aos níveis socioeconômicos dos adeptos, este não é sempre o caso. Pessoas de classe alta também são conhecidas por buscar centros afro-brasileiros para obter conselho e assistência em tempos de crise.

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entidades afro-brasileiras específicas e liberta vítimas dessas influências através do exorcismo. Melander (2005, p. 164-165) acredita que muito da autoidentidade da IURD está atrelada à sua luta contra essas religiões. As igrejas da terceira onda, tais como a IURD, rejeitam o espiritismo e reagem agressivamente a ele. No entanto, Oro (1997) destaca as semelhanças das igrejas neopentecostais com seu inimigo, uma vez que elas se valem de símbolos parecidos, distribuem objetos similares, usam terminologia semelhante e competem pela mesma clientela.

Normalmente, as igrejas da terceira onda possuem outros traços distintos além das características previamente citadas. Em primeiro lugar, a estratégia da segunda onda quanto ao uso do rádio permanece, e é acrescida de um forte investimento em televisão. Segundo, as igrejas tomam emprestadas práticas do catolicismo popular e das religiões afro-brasileiras ao mesmo tempo que declaram guerra a tais instituições concorrentes (Sayão, 1999, p. 90). Em terceiro lugar, as denominações da terceira onda se organizam de maneira semelhante a uma corporação, geralmente contando com um ou alguns que representem a máxima autoridade executiva e espiritual sobre as igrejas afiliadas e seus seguidores. Quarto, os pastores de congregações locais estão mais acostumados ao estilo do contexto urbano, possuem um tom de pele mais claro e pertencem a uma classe socioeconômica um pouco mais alta do que os líderes da segunda onda (Freston, 1995, p. 120). Finalmente, a lealdade da membresia é mais dirigida à denominação como provedora de serviços do que um compromisso fraternal uns com os outros.

Grupos principais

Esta seção apresenta as principais denominações associadas ao neopentecostalismo brasileiro, embora os detalhes sejam restritos em razão da quantidade de grupos existentes. A IURD e a IIGD são destacadas como as duas maiores representantes. A INV também é incluída devido à sua influência preparatória sobre as duas denominações da terceira onda previamente mencionadas. A última seção menciona, de maneira geral, os outros grupos classificados como pentecostais da terceira onda.

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igrejA de novA vidA

Por um breve período de tempo, na década de 1950, McAlister e sua esposa serviram à AD e mais tarde à Cruzada Nacional de Evangelização. Frustrados com a rigidez do pentecostalismo e sua inabilidade em alcançar as classes média e alta, eles começaram a ministrar no Rio de Janeiro em 1960 (Mattos, 2002, p. 62-63). No final dos anos 1960, seu ministério evangelístico passou oficialmente para INV, sendo difundido para outras cidades na década de 1980. O desejo de McAlister em alcançar um estrato social mais elevado se tornou realidade, atraindo pessoas das classes média e média-baixa (Mariano, 2005, p. 52).

Somente 92.315 pessoas se declararam membros da INV no último censo nacional (IBGE, 2000). No entanto, essa denominação foi pioneira em aspectos que a tornaram catalisadora do campo pentecostal. Em primeiro lugar, nos anos iniciais, McAlister foi o primeiro pentecostal a usar a forma centralizada, episcopal, de governo (Mariano, 2005, p. 52). Segundo, o nível educacional, a competência nos negócios e as habilidades de levantamento de recursos de McAlister personificaram um tipo diferente de pastor pentecostal capaz de mobilizar liderança da classe média (Freston, 1995, p. 129; Mattos, 2002, p. 63). Em terceiro lugar, a INV não apenas investiu em rádio, mas acrescentou a televisão às suas estratégias de comunicação de massa; algo que somente a BPC tinha tentado, por algum tempo, até aquele ponto. Quarto, McAlister criou um ambiente no qual introduziu as mais recentes inovações pentecostais provenientes da América do Norte, expondo-as aos seus devotados líderes (Mattos, 2002, p. 63). Finalmente, a INV realçou, em “forma embrionária”, as principais características da terceira onda: batalha espiritual agressiva contra poderes demoníacos, prosperidade material através da contribuição financeira e poucas reservas com relação a motivações materialistas (Mariano, 2005, p. 51).

O exemplo de McAlister mostra a influência potencial que um missionário exerce sobre a futura liderança nacional. Pelo menos quatro líderes neopentecostais renomados estiveram sob seu ministério. Edir Macedo, co-fundador e atual líder principal da IURD, converteu-se e serviu como evangelista

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na INV. Romildo Ribeiro Soares, cunhado de Macedo e atual líder principal da IIGD, juntou-se à INV em 1968, onde também serviu como líder. Miguel Angelo, fundador da Cristo Vive em 1986, e Renato Suhett, bispo dissidente da IURD, também passaram pela INV e construíram suas denominações ao redor da estratégia de classe média semelhante à de McAlister (Kramer, 2001, p. 48). A tutela dos referidos pentecostais brasileiros nos conceitos emergentes da terceira onda começou sob a influência de McAlister (Mariano, 2005, p. 51).

Embora, cronologicamente, a INV pertença à segunda onda, ela é classificada como neopentecostal por várias razões. Em primeiro lugar, a igreja de McAlister foi oficialmente lançada no final dos anos 1960 e ganhou força no Rio de Janeiro durante a década de 1970, a década inaugural do movimento neopentecostal brasileiro. Segundo, a igreja teve origem na cidade do Rio de Janeiro da qual o pentecostalismo da terceira onda se espalhou para o resto da nação. Em terceiro lugar, a INV apresentou traços de caráter neopentecostais assumidos e usados como base ministerial por líderes proeminentes da terceira onda. Finalmente, a igreja teve como alvo e se adaptou a um segmento de classe média, um grupo quase inexplorado pelo pentecostalismo até aquela época. O foco em uma classe mais alta se mostrou significativo para as últimas denominações neopentecostais, seja para alcançá-la, seja para conduzir seus seguidores a tal patamar.

igrejA internACionAl dA grAçA de deus

Soares conheceu Macedo na INV em 1968. Posteriormente, ele se tornou seu cunhado, e ambos serviram como líderes na igreja de McAlister, sediada no Rio. Aparentemente, os dois desfrutavam de um relacionamento familiar de confiança, pois participaram do começo da Igreja Cruzada do Caminho Eterno com Roberto Augusto Lopes e os irmãos Coutinho em 1975.13 Quando os conflitos surgiram, Macedo, Soares e Lopes saíram e

13 Os detalhes precisos dos eventos ministeriais iniciais de Soares e Macedo, e consequentemente da IURD, foram reunidos por pesquisadores com poucos dados primários (Kramer, 2001, p. 48). Tavolaro (2007) apresenta a versão mais recente em sua biografia oficial autorizada por Macedo. Entretanto, Tavolaro parece ter fornecido uma visão parcial e melhor do que a verdadeira sobre o carismático e controverso líder (Marthe, 2007, p. 90).

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iniciaram, em 1977, o que mais tarde seria conhecida como IURD (Mariano, 2005, p. 55; Romeiro, 2005, p. 53). Inicialmente, Soares assumiu a liderança da igreja, mas, com o crescimento da denominação, não se achou à altura da personalidade de seu cunhado (Mariano, 2005, p. 56). Seu eventual desacordo com a direção da nova denominação levou ao seu afastamento em 1980. Os quinze pastores que compunham a IURD naquela época votaram, doze contra três, em favor de Macedo assumir como novo comandante (em Tavolaro, 2007, p. 114-115). Após perder o voto para Macedo, Soares saiu e estabeleceu a IIGD, a que preside atualmente como líder principal.

Como denominação neopentecostal, a IIGD se assemelha doutrinária e eclesiasticamente à IURD, porém é menos dinâmica e criativa (Fernandes & Stefano, 2001, p. 24-25; Kramer, 2001, p. 50). Soares (2001a, p. 26) acredita que o verdadeiro evangelho se manifesta através de milagres de cura, libertação de demônios e outras demonstrações de poder como estas. Romeiro (2005, p. 96-98), um estudioso da IIGD, considera Soares como principal porta-voz e difusor da ideologia do Faith Movement (Movimento da Fé) de Kenneth Hagin Sr. Os livros de Hagin Sr. são disponibilizados pela editora da IIGD, Graça Editorial.

A IIGD divulga sua mensagem, imagem e líder principal através de um forte investimento em televisão e programas de rádio. A instituição adquire cerca de cem horas de programação televisiva por semana em redes nacionais de televisão (Fernandes & Stefano, 2001, p. 24-25). A frequência da presença de Soares em horários nobres da televisão e estações populares de rádio não se iguala a nenhuma outra figura religiosa. Geralmente, a IIGD compra espaço na televisão para levar ao ar o Show da Fé antes das novelas populares brasileiras. A estratégia de mídia de Soares faz dele o líder evangélico brasileiro mais assistido pela população em geral. Geralmente, os programas apresentam um culto da IIGD que começa com um cantor popular evangélico conduzindo a música. Normalmente, Soares prega a mensagem e ora “em nome de Jesus” para que milagres aconteçam entre a plateia. O culto é concluído com testemunhos da plateia sobre curas imediatas e assuntos resolvidos. A maioria dos participantes da IIGD parece

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pertencer às classes média-baixa e baixa. O estilo moderado de pregação baseada, muitas vezes, em uma narrativa do Antigo Testamento, contrasta com o estereótipo pentecostal acalorado.

A liderança de alto nível da denominação consiste em um presbitério de doze que supervisiona a administração e as finanças da multifacetada organização. Mesmo assim Soares ocupa a mais alta posição e representa autoridade máxima na tomada de decisões (Romeiro, 2005, p. 64-65). A IIGD transfere seus pastores de um local para outro, o que os impede de exercer mandatos longos e estabelecer relacionamentos significativos com os fiéis (p. 65). Os evangelistas, que compõem o grupo pastoral potencial, e os outros obreiros leigos da igreja se reportam ao pastor da igreja afiliada. Estes, por sua vez, estão sujeitos ao pastor-líder do estado que se submete ao presbitério e a Soares.

O candidato ao pastorado deve ter a ordenação recomendada por seu pastor, pelo líder de estado e, em última instância, por Soares (Romeiro, 2005, p. 67). Embora não seja requerido que os pastores tenham treinamento teológico anterior à ordenação, a IIGD oferece sua própria escola de treinamento e investe no desenvolvimento cultural e pessoal de seus pastores (p. 68). A promoção pastoral e o salário dependem da lealdade institucional e conformidade, bem como da habilidade em atrair multidões e gerar contribuições. Existe um teto para os salários pastorais de modo a promover equidade para com os que servem em áreas urbanas maiores e mais ricas, geradoras de contribuições mais elevadas (p. 65-70).

Soares se preocupa com a expansão contínua e mantém controle pessoal sobre a IIGD. Ele motiva os líderes de estados a iniciarem novos trabalhos, mas é necessária sua aprovação prévia ao lançamento de um novo lugar (Romeiro, 2005, p. 65). A denominação se orgulha de possuir mais de 500 mil membros, com mais de setecentas igrejas afiliadas pelo Brasil (Fernandes & Stefano, 2001, p. 24-25). Cocarelli, assessor de Soares, presume que a IIGD enfrente dificuldades transicionais após a saída de Soares, pois ele construiu a organização em torno de seu carisma e controle (Romeiro, 2005, p. 83).

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igrejA universAl do reino de deus14

Criado em uma família católica e tendo experimentado, mais tarde, a umbanda, Macedo aceitou o convite para participar de um culto da INV realizado em uma sala alugada na Associação Brasileira de Imprensa, com cerca de quinhentos frequentadores. Ele testificou ter recebido um novo coração e ter encontrado o Senhor com a idade de 19 anos (Tavolaro, 2007, p. 81-82). Macedo continuou sob o ministério de McAlister e serviu como evangelista itinerante nas áreas mais pobres do Rio de Janeiro. Certamente, ele se familiarizou com as igrejas pentecostais clássicas e da segunda onda situadas no Rio, mas sua exposição inicial ao confronto com poderes demoníacos, cura divina, pensamento da prosperidade e levantamento de recursos financeiros veio de McAlister no contexto da classe média da INV (Mattos, 2002, p. 63-64).

Onze anos mais tarde, Macedo e Soares deixaram a INV. Uma possível razão para a saída de Macedo seria o elitismo da INV e a afinidade que ele possuía no serviço aos segmentos mais pobres da sociedade (Kramer, 2001, p. 49). Com uma passagem rápida por outra denominação pentecostal e tendo recebido ordenação pastoral do missionário Cecílio Carvalho Fernandes, Macedo, Soares, os dois irmãos Coutinho e Lopes fundaram a Igreja Cruzada do Caminho Eterno. Em 1977, houve um rompimento em relação aos irmãos Coutinho, de modo que Soares, Macedo e Lopes decidiram se separar deles e conduzir os cultos no prédio de uma antiga funerária. Esse lugar é reconhecido como berço da IURD e do neopentecostalismo no Brasil.

Tendo sua mais alta concentração de igrejas afiliadas no Rio e São Paulo, a IURD é reconhecida nacionalmente como uma denominação urbana. Seu ministério principal está concentrado nas diversas reuniões (i.e., cultos) oferecidas diariamente em cada templo. A IURD é considerada o pronto-socorro para os que precisam de um milagre. A denominação aluga e compra espaços para grandes reuniões ou então constrói seus

14 O capítulo 2 apresenta uma descrição mais elaborada da IURD, seus ministérios e detalhes de seu líder principal, Edir Macedo. Esta seção apresenta com pouca profundidade a IURD como principal grupo e catalisador no desenvolvimento histórico do pentecostalismo brasileiro.

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próprios templos no centro dos bairros. As grandes cidades também ostentam suas catedrais, uma das mais recentes inovações na estratégia da IURD (Gonçalves & Paixão, 1997, p. 115-116). Essas instalações consistem em estruturas grandiosas que oferecem um nível de conforto maior do que os templos situados nos bairros. Embora ofereçam a mesma série padrão de reuniões das demais afiliadas, as catedrais também servem como pontos de coordenação para os líderes. Geralmente, os pastores, ministros assistentes e seus obreiros ministram de três a cinco reuniões por dia, sete dias por semana, com foco em um tema que se repete no mesmo dia de cada semana.

Tal como acontece na maioria das denominações neopentecostais, não se pode separar a IURD de seu controverso e carismático líder conhecido como bispo Macedo. Ele conseguiu superar seu cunhado nas habilidades administrativas. Furre (2006, p. 41; 2007, p. 85-86) descreve Macedo como um diretor executivo geral de uma companhia multinacional, um estrategista militar implacável e alguém que detém autoridade papal sobre sua máquina religiosa. O estilo e mensagens de Macedo são repetidos e imitados não apenas pelos líderes da IURD, mas também por alguns externos à sua denominação, incluindo evangélicos pentecostais, não pentecostais e católicos (Mattos, 2002, p. 1). Certamente, ele tem contribuído de maneira significativa para promover a diversificação do evangelicalismo brasileiro.

Como a denominação neopentecostal renomeada, a IURD combina diversos argumentos pentecostais globais em seu discurso, incluindo exorcismo e os ensinamentos do Faith Movement (Movimento da Fé) de Hagin Sr. (Furre, 2006, p. 45; Mattos, 2002, p. 18). Macedo (2005a, p. 99) acredita que as implicações do evangelho se estendem a bênçãos físicas, financeiras e espirituais; entretanto, Satanás e seus demônios se opõem às intenções de Deus, usando várias estratégias para impedir o progresso familiar, profissional e pessoal de um indivíduo.

A obtenção de bênçãos divinas e a superação de barreiras demoníacas requerem, em muitos casos, o exorcismo, o exercício da fé e o cultivo de

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uma vida santificada conforme prescrita pela IURD (Macedo, 2006; Stålsett, 2006b, p. 199). A fé é manifestada através da confiança em Jesus como Salvador, declarando as promessas de Deus e levando uma vida de sacrifício a ele. Geralmente, o sacrifício é sinônimo de dízimos e ofertas. Macedo se refere às contribuições financeiras como uma aposta com Deus, o “sangue da igreja” e o meio de obter a atenção do Senhor (Barros & Capriglione, 1997, p. 93; Macedo, 1998, p. 98; 2000, p. 68). Frases simples e constantemente repetidas como “pare de sofrer”, “toma lá, dá cá” e “tá amarrado” respaldam o conteúdo teológico principal.

A IURD interage com a sociedade em diversos níveis, estendendo sua presença e fortalecendo uma reputação variada. Em suas reuniões, os líderes da igreja confrontam religiões afro-brasileiras ao orar contra suas entidades demoníacas e praticar exorcismos. Seus pastores também têm avançado os limites ao criticar católicos, outros pentecostais e igrejas evangélicas de missão. A IURD promove seus próprios candidatos políticos locais e nacionais, que, em contrapartida, favorecem o interesse da denominação. Macedo e sua liderança declararam “guerra santa” à rede de televisão mais popular do país, a Globo, que tem exposto as práticas da IURD. A insistência em pedir dinheiro, principalmente entre os fiéis pobres, é o tema mais repetido em uma reunião regular (Furre, 2006, p. 46).

A IURD evoluiu de uma reunião de igreja periférica em uma antiga funerária para uma denominação multifacetada. Sua mensagem e estrutura organizacional avançaram em 1980 quando o país experimentou dificuldades econômicas desalentadoras que levaram milhões de volta à pobreza, tornando a ascensão social algo praticamente inalcançável (Campos, 1996, p. 3-4). Edward (2004, p. 108) estima que a denominação tenha desfrutado um aumento de 100 mil pessoas a cada ano, somente no Brasil. O último censo revelou que mais de 2,1 milhões de brasileiros declararam lealdade à IURD (IBGE, 2000). Contudo, a liderança da IURD imagina que o número de adeptos seja muito maior, uma vez que muitos vivem em áreas pobres, ignoradas e de difícil acesso (Tavolaro, 2007, p. 243).

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A denominação mantém 4.748 templos e 9.660 pastores no Brasil e emprega outros 22 mil em agências afins que compõem a organização. Suas subsidiárias se expandem para áreas de mídia, consultoria, turismo, construção, segurança, transporte aéreo e imóveis (Tavolaro, 2007, p. 244-245). A IURD mantém cobertura de rádio em 75% do país e produz 240 horas de programação televisiva diária (p. 23, 239). Ela também imprime 2,3 milhões de cópias do jornal semanal FU que é distribuído nas igrejas afiliadas pelo Brasil (p. 238). Este periódico oferece informação referente aos interesses denominacionais, notícias nacionais e internacionais e mensagens pastorais de Macedo e outros líderes de alto escalão. Macedo é o dono majoritário da segunda maior empresa de televisão, Rede Record, que vale cerca de 2 bilhões de dólares (p. 161).

Macedo afirma que a IURD está presente em 172 países (Tavolaro, 2007, p. 245), embora pesquisadores estimem metade deste número (Corten, Dozon & Oro, 2003, p. 14). A mensagem e abordagem variam quando necessário, mas mantêm o ethos de tratar os males diários que impedem o sucesso e a felicidade dos indivíduos (veja Oro & Semán, 2001; Corten, Dozon & Oro, 2003, p. 13-45). O quadro pastoral, dentro e fora do Brasil, é composto basicamente por brasileiros. Macedo reside oficialmente em Miami, Flórida. No entanto, faz visitas frequentes ao Brasil e outros países para pregar em grandes reuniões e conduzir os negócios. Ele mantém contato, como bispo fundador e proeminente, com seus membros e com a população ouvinte em geral através de devocionais diários que vão ao ar em estações de rádio pelo Brasil.

outros

Geralmente, os pesquisadores estão de acordo sobre quais deno-minações relevantes representam o neopentecostalismo. A seguir serão mencionados alguns grupos para demonstrar a abrangência e diversidade do movimento. Duas denominações cujos fiéis representam mais as classes média e alta são a Comunidade Sara Nossa Terra (CSNT) e a Igreja Apostólica Renascer em Cristo (Iarc).

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A CSNT estima ter 100 mil membros, 900 pastores e 300 templos (Lima, M 2000, p. 90-91). Romeiro (2005, p. 58-59) encara a doutrina da quebra de maldição hereditária como característica principal.

A IARC atrai cerca de 50 mil seguidores por semana somente em São Paulo e outros milhares em seus 600 templos espalhados pelo país (Smith & Campos, 2005, p. 60; Veja, em Romeiro, 2005). A denominação administra diversas estações de rádio, um canal de TV e uma reconhecida gravadora. A estrela do futebol brasileiro Kaká e sua esposa foram membros da Iarc e, por muitos anos, contribuíram financeiramente com a denominação. A Iarc é reconhecida nacionalmente entre os evangélicos por seu megashow anual e pela multidenominacional Marcha para Jesus, que reúne aproximadamente 2 milhões de pessoas nas ruas de São Paulo (Stefano, 2007, p. 26).

No entanto, a Iarc tem lutado para manter uma imagem pública positiva sobre a responsabilidade financeira. O casal fundador e líderes principais Estevam e Sônia Hernandes foram condenados a servir por dez meses em uma prisão americana por causa do transporte ilegal de 56 mil dólares (Stefano, 2007, p. 24). Os escândalos públicos cercaram a denominação quando ex-membros foram entrevistados em programas populares de televisão, relatando a insistência da Iarc em recolher ofertas e tomar dinheiro emprestado dos membros. Investigações judiciais e o eventual confisco de propriedades pessoais revelaram ao público brasileiro a suntuosa riqueza dos Hernandes (Fernandes & Santos, 2004; Carneiro, 2006, p. 35-36).

Valdemiro Santiago, ex-líder da IURD por dezoito anos, fundou em 1998 a Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD) que se encontra em rápida expansão. A denominação afirma funcionar em mais de 500 templos pelo Brasil. Ela também declara ter crescido mais de 200% durante o ano de 2007 (Stefano, 2008, p. 19). Multidões lotam os 1.500 assentos da igreja-mãe em São Paulo, onde Santiago insiste em andar entre as pessoas, abraçando e tocando seus ouvintes. Muitos frequentadores levam fotos, comida e objetos de uso pessoal que são colocados sobre a plataforma para

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que Santiago ore ou toque neles. A maioria dos adeptos parece pertencer a um segmento socioeconômico mais baixo, posicionando a IMPD como outra concorrente da IURD e da IIGD.

A IMPD enfatiza a cura e os milagres, fazendo investimentos significativos em televisão e rádio. Romeiro (em Stefano, 2008, p. 22) compara seu foco em curas e milagres ao da IPDA e acredita que a IMPD continuará a crescer rapidamente por causa de sua liberdade quanto aos requisitos comportamentais e atenção doutrinária.

Rinaldo Luiz de Seixas Pereira, o surfista que se tornou pastor, iniciou a Igreja Bola de Neve no ano 2000. É provável que Romeiro (2005, p. 60-61) classifique este grupo como neopentecostal por ser uma divisão da Iarc. No entanto, a denominação parece sustentar uma teologia e conduta evangélica tradicionais, permitindo que os homossexuais frequentem somente se estiverem dispostos a mudar para um estilo de vida heterossexual. A linguagem do surf e a atmosfera descontraída atraem principalmente adolescentes e jovens adultos. Essa denominação possui 26 templos, a maior parte deles no estado de São Paulo (Pereira & Linhares, 2006).

Sem esgotar a lista de denominações neopentecostais, algumas ainda merecem atenção. A Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo começou em 1994 por Valnice Milhomens Coelho, ex-missionária da CBB na África do Sul. Antes de seu início, Coelho fundou em 1987 um ministério para a propagação dos ensinamentos da Escola Rhema, ligada a Hagin Sr. e ao Faith Movement (Movimento da Fé) (Romeiro, 2005, p. 59). Em 1995, o ex-bispo pertencente ao alto escalão da IURD, Renato Suhett, começou a Igreja do Senhor Jesus; porém, nos últimos anos, voltou à IURD e, atuando novamente como pastor. Um artigo da FU apresentou sua liderança em uma igreja afiliada à IURD em San Cosme, México (Reinauguração [s.d.]). O ex-líder da IURD Miguel Ângelo, também procedente da INV, iniciou em 1986 a Igreja Cristo Vive, sediada no Rio de Janeiro. Outras denominações pentecostais incluem a Comunidade da Graça, que começou em 1979, e a mais recente Comunidade Cristã Paz e Vida, que foi lançada em 1996, ambas sediadas em São Paulo.

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origens de alguns ensinamentos

Conforme demonstrado neste capítulo, o pentecostalismo brasi leiro tem sido um receptor do pentecostalismo norte-americano desde seu início. O movimento da primeira onda no Brasil alçou voo quando missionários americanos trouxeram a mensagem pentecostal. O pente costalismo da segunda onda obteve sua combustão inicial através da Cruzada Nacional de Evangelização e da IEQ com os discípulos de McPherson, Boatwright e Williams. O canadense McAlister introduziu as características embrionárias do neopentecostalismo sobre as quais os sucessores brasileiros construíram e se desenvolveram (Mariano, 2005, p. 51). Ao longo do movimento da terceira onda, denominações associadas interagiram com personalidades norte-americanas e ofereceram uma plataforma para seus ensinamentos no Brasil, porém em que medida o neopentecostalismo brasileiro deve ser considerado uma versão americana?

Os estudiosos atribuem o elemento da teologia da prosperidade encontrado no neopentecostalismo brasileiro ao Faith Movement (Movimento da Fé) norte-americano (ex., Campos, 2005; Filho, 2004, p. 16; Freston, 2001, 2005 e 2006; Kramer, 2001 e 2005; Mariano, 2003b e 2005; Miller & Yamamori, 2007, p. 175-176; Romeiro, 1999 e 2005; Sayão, 1999). Geralmente, os pesquisadores citam os seguintes líderes listados em ordem de frequência e contribuição: Kenneth Hagin Sr., Essek William Kenyon, Oral Roberts, T. L. Osborn, Kenneth Copeland e Benny Hinn. A. H. Anderson (2001b, p. 430; 2002) também reconhece o impacto do Faith Movement no cenário pentecostal global, incluindo a América Latina e, consequentemente, o Brasil.

O elemento neopentecostal brasileiro do exorcismo e da batalha espiritual agressiva também parece ter seus vínculos com os Estados Unidos. Macedo (2000, p. 35) reconhece, de maneira breve, essa correlação. Além disso, Mariano (2005, p. 143) menciona que, em 1994, C. Peter Wagner palestrou em uma conferência para a equipe brasileira da Rede Internacional de Batalha Espiritual. Esta reunião foi realizada na sede nacional da Iarc, com 1.600 participantes.

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Embora alguns elementos neopentecostais brasileiros estejam ligados a fontes norte-americanas, A. H. Anderson (2001b, p. 437) adverte, com razão, que não se deve considerar essas manifestações globais como um “produto ‘made in America’”. Ele ilustra sua afirmação ao referir-se às novas igrejas pentecostais africanas que também promovem ensinamentos sobre prosperidade (Anderson, AH 2002). Existem conexões entre o “movimento americano ‘health and wealth’”15 e o novo movimento pentecostal africano. Contudo, as igrejas africanas têm interpretado, tomado emprestado e remodelado as crenças e os conceitos americanos para um contexto radicalmente diferente. Portanto, A. H. Anderson (2001b; 2002) considera o pentecostalismo um fenômeno global tão abrangente quanto seu alcance geográfico, porém não de uma maneira “supracultural”. O pentecostalismo reage e se adapta conforme as cosmovisões e expressões culturais locais. Essa adaptação local a questões globais é comumente definida como glocalização (ex., Vanhoozer, 2006, p. 99).

Conexões globais e adaptações locais explicam por que discursos similares entre neopentecostais brasileiros também podem ser ouvidos em círculos americanos. Joyce Meyer (em Biema & Chu, 2006, p. 54, tradução), escritora e pregadora televisiva americana prosperity light, afirma: “Quem iria querer uma situação onde você fosse feio e miserável e mesmo assim tivesse que lutar muito para chegar ao céu?”. Soares (2001a, p. 26), líder da IIGD, faz uma declaração semelhante para validar o ensinamento sobre prosperidade: “Eu não conheço teologia da prosperidade. Eu conheço o verdadeiro evangelho. Agora, eu prego a prosperidade. Prefiro mil vezes pregar teologia chamada da prosperidade do que teologia do pecado, da mentira, da derrota, do sofrimento. Não creio na miséria”.

O movimento neopentecostal brasileiro tem incorporado de maneira rápida e pragmática algumas crenças, práticas e rituais de fontes norte--americanas e de ondas pentecostais brasileiras anteriores, adaptando e modificando-as conforme necessário (Mariano, 2005, p. 42). Miller & Yamamori (2007, p. 175-176) usam a IURD como exemplo. Eles declaram que a igreja recebe “inspiração” para seus ensinamentos de

15 Este termo é conhecido no Brasil como “saúde e prosperidade”.

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fontes norte-americanas, embora as comunique de maneira diferente para outro alvo cultural. Termos como “inspirado”, “incorporar”, “conectar” e “remodelar” resumem como o neopentecostalismo brasileiro se relaciona com as inovações pentecostais norte-americanas. Pesquisa pessoal e estudos realizados por outros atestam que o neopentecostalismo brasileiro não funciona como uma importação direta norte-americana, mas como um remodelamento de alguns ensinamentos.

neoPentecostalização de igrejas Previamente estabelecidas

O discurso neopentecostal continua a ganhar espaço em algumas igrejas evangélicas de missão que não sofreram divisão durante a renovação carismática. A Primeira Igreja Batista do Brasil, com 4 mil membros, uma igreja batista de referência na cidade de Salvador, serve como exemplo de uma igreja que se “(neo) pentecostalizou” e se separou da CBB (Siepierski, 2001, p. 56).

Não surpreende o fato de que muitas denominações da primeira e da segunda ondas, além da renovação carismática, também tenham sofrido influência neopentecostal. Siepierski (2001, p. 56-57) observa que, geralmente, os dramas que resultaram nas denominações renovadas estão ausentes na maioria dessas situações de neopentecostalização.

A altamente visível AD também tem lutado com razoável sucesso para manter longe as tendências da terceira onda. Alguns teólogos da AD têm tentado refutar os ensinamentos da terceira onda, escrevendo e educando os membros sobre seus perigos (veja Mattos, 2002, p. 36-41), mas Freston (1999, p. 152) observa que os líderes da AD mencionam temas como dinheiro e prosperidade nos cultos com mais frequência do que em tempos passados.

A Convenção Geral da AD excluiu um grupo de igrejas afilia das em 1989 por causa de práticas neopentecostais (Sierpierski, 2001, p. 56-57). Freston (em Siepierski, 2001, p. 57) estima que a nova convenção,

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conhecida como Madureira, levou consigo mais de um terço dos membros da AD quando saiu. A Convenção de Madureira revelou sua inclinação à terceira onda em 1990 quando seus pastores se aliaram a Macedo para dar início ao Conselho Nacional de Pastores do Brasil.

conclusão

A história do pentecostalismo brasileiro se divide em três períodos, ou ondas, distintos. O período clássico, ou primeira onda, em torno de 1910 a 1950, enfatizou principalmente o segundo batismo no Espírito Santo após a conversão, o falar em línguas e os usos e costumes. A AD e a CCB são as maiores denominações que vieram desse período e, atualmente, são as duas maiores denominações evangélicas do país. A segunda onda, embora construída sobre a onda anterior, diferiu por focalizar a cura divina, mostrando um forte interesse em demônios e exorcismo, e reduzindo os rígidos usos e costumes na maioria dos casos. A IEQ, BPC e IPDA são os grupos mais relevantes provenientes desse período, sendo a IPDA um grupo legalista e faccioso.

O neopentecostalismo, a atual terceira onda, começou em 1977 com o início da IURD. A INV lançou os fundamentos para a IURD e outros grupos neopentecostais ao introduzir alguns ensinamentos e métodos inovadores. Embora as igrejas neopentecostais mantenham algumas características em comum com seus antecessores pentecostais, suas distinções incluem a ênfase na prosperidade e batalha espiritual, além do favorecimento da redução dos usos e costumes. Outros traços consistem no uso extensivo de canais de mídia, um modelo mais corporativo de organização denominacional e, em alguns grupos, agressividade para com religiões afro-brasileiras. A IURD e a IIGD são as duas maiores denominações desse período, embora outros grupos também tenham crescido expressivamente (ex., Iarc, CSNT e IMPD).

O movimento neopentecostal brasileiro mostra semelhanças e interdependências com o pentecostalismo global e norte-americano. Não obstante, demonstra suas próprias peculiaridades e distinções locais. Este