MOVIMENTOS SOCIOTERRITORIAIS: UMA CONTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA PARA O ESTUDO DOS MOVIMENTOS DE LUTA...

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MOVIMENTOS SOCIOTERRITORIAIS: UMA CONTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA PARA O ESTUDO DOS MOVIMENTOS DE LUTA PELA TERRA NO PERÍODO DE 2000-2007 Nivea Massaretto [email protected] Elenira de Jesus Souza [email protected] Bernardo Mançano Fernandes [email protected] Universidade Estadual Paulista – campus de Presidente Prudente Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo Resumo Este artigo é resultado de um trabalho coletivo realizado no NERA - Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária. Apresentamos uma reflexão atualizada de nossa prática, expondo nossos procedimentos metodológicos para debate e contribuição na pesquisa em Geografia Agrária. Os trabalhos e pesquisas realizados em Geografia carregam vários conceitos de outras áreas como a Sociologia, Antropologia, Economia, dentre outras. Um exemplo desses conceitos é o de movimento social, no qual muitos geógrafos resgatam o conceito da sociologia. Com o desafio de superar esse conteúdo sociológico dentro da Geografia, construímos um novo conceito, o de movimento socioterritorial. A Geografia tem como objeto de estudo o espaço e cabe a nós, geógrafos, partirmos de uma análise a partir do espaço e de sua transformação em território. Neste trabalho faremos uma exposição dos debates acerca da construção do conceito de movimento socioterritorial. Apresentaremos os resultados obtidos no período de 2000 a 2007, que mostram a importância que os movimentos socioterritoriais têm diante de um projeto de reforma agrária, uma vez que a forma de pressão que esses movimentos exercem é fundamental para a implementação do processo de reforma agrária e, consequentemente, de acesso do camponês à terra.

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MOVIMENTOS SOCIOTERRITORIAIS: UMA CONTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA PARA O ESTUDO

DOS MOVIMENTOS DE LUTA PELA TERRA NO PERÍODO DE 2000-2007

Nivea Massaretto

[email protected]

Elenira de Jesus Souza

[email protected]

Bernardo Mançano Fernandes

[email protected]

Universidade Estadual Paulista – campus de Presidente Prudente

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

Resumo

Este artigo é resultado de um trabalho coletivo realizado no NERA - Núcleo de Estudos, Pesquisas e

Projetos de Reforma Agrária. Apresentamos uma reflexão atualizada de nossa prática, expondo

nossos procedimentos metodológicos para debate e contribuição na pesquisa em Geografia Agrária.

Os trabalhos e pesquisas realizados em Geografia carregam vários conceitos de outras áreas como

a Sociologia, Antropologia, Economia, dentre outras. Um exemplo desses conceitos é o de

movimento social, no qual muitos geógrafos resgatam o conceito da sociologia. Com o desafio de

superar esse conteúdo sociológico dentro da Geografia, construímos um novo conceito, o de

movimento socioterritorial. A Geografia tem como objeto de estudo o espaço e cabe a nós,

geógrafos, partirmos de uma análise a partir do espaço e de sua transformação em território. Neste

trabalho faremos uma exposição dos debates acerca da construção do conceito de movimento

socioterritorial.

Apresentaremos os resultados obtidos no período de 2000 a 2007, que mostram a importância que

os movimentos socioterritoriais têm diante de um projeto de reforma agrária, uma vez que a forma de

pressão que esses movimentos exercem é fundamental para a implementação do processo de

reforma agrária e, consequentemente, de acesso do camponês à terra.

Considerações teóricas a respeito dos movimentos socioterritoriais

A conceitualização de movimento socioterritorial implica em constante revisão bibliográfica e

esforço de reflexão teórica, reforçada sempre em colóquios com o orientador e outros pesquisadores,

pois é necessário para a construção de conceitos amplos debates e é o que estamos promovendo

durante o período deste relatório.

O primeiro ensaio produzido sobre este tema foi publicado em 1991, por meio de uma

reflexão epistemológica acerca da interação sujeito-espaço (FERNANDES, 1991). As primeiras

reflexões a respeito do conceito de movimentos socioterritoriais datam da segunda metade da

década de 1990 e resultaram na publicação do artigo “Movimento Social como Categoria Geográfica”

(FERNANDES, 2000). Essas reflexões receberam contribuições do geógrafo francês Jean Yves

Martin, resultando na publicação dos textos: “Movimento socioterritorial e globalização: algumas

reflexões a partir do caso do MST” (FERNANDES, MARTIN, 2004) e “Movimento socioterritorial e

movimento socioespacial” (FERNANDES, 2005).

Os movimentos socioterritoriais são todos aqueles que têm o território como trunfo, ou seja, o

que dá identidade a esses movimentos é o fato de que o componente espacial se apresenta como

elemento mediador, sendo o próprio espaço uma relação, os movimentos socioterritoriais se

caracterizam pela disputa de territórios. A luta só existe porque o espaço se apresenta não como

base onde se fixam objetos, ou como uma área ou sítio a ser delimitado, ficando a partir de então

sobre a tutela de um grupo. A mobilização existe porque há uma identidade do grupo com o espaço,

é isto que permite o movimento sobreviver e atuar em espaço alheio, quando o espaço ainda se

constitui como território de outrem. Nossa proposta da construção do conceito de movimentos

socioterritoriais tem como principal característica o estudo das transformações que ocorrem no

espaço geográfico, bem como das relações sociais e ações produzidas pelos diversos movimentos e

em diversas escalas. Nossa pretensão ao trabalharmos a conceitualização de movimentos

socioterritoriais é colaborar para o desenvolvimento da ciência geográfica.

Quando refletimos sobre a questão do espaço, destacamos o geógrafo Milton Santos, autor

que realiza uma série de estudos relacionados a este tema. O conceito de espaço, estudado por

Santos, é fundamental para os estudos geográficos e é neste ponto que consideramos residir a

importância da construção do conceito de movimento socioterritorial, pois se trata de uma análise

geográfica dos movimentos sociais, tendo o espaço como uma importante categoria de análise.

Santos afirma que:

O espaço deve ser considerado como um conjunto de relações realizadas através de funções e de formas que se apresentam como testemunho de uma história escrita por processos do passado e do presente. Isso é, o espaço se define como um conjunto de formas representativas de relações sociais do passado e do presente e por uma estrutura representada por relações sociais que estão acontecendo diante dos nossos olhos e que se manifestam através de processos e funções. O espaço é, então, um verdadeiro campo de forças cuja a aceleração é desigual. Daí porque a evolução espacial não se faz de forma idêntica em todos os lugares (SANTOS, 1996, p. 122).

A reflexão do autor nos ajuda a entender a importância do estudo do espaço na análise do

surgimento e ações dos movimentos socioterritoriais, no conhecimento do processo histórico que

envolve a luta e a resistência desses movimentos e qual a identidade que estes possuem com o

espaço almejado e conquistado.

Nossa proposta de colaborar para a construção do conceito de movimento socioterritorial,

está embasada na idéia de ter no espaço e no território as ferramentas fundamentais para interpretar

os movimentos sociais numa perspectiva geográfica. Ter uma leitura mais geográfica significa pensar

nos lugares onde os movimentos instauram suas ações de combate e conflito e quais as

transformações que produzem nesses espaços e futuramente na sua transformação em território.

Movimentos socioterritoriais e movimentos socioespaciais

Queremos enfatizar, mais uma vez, que movimento social e movimento socioterritorial são um

mesmo sujeito coletivo ou grupo social que se organiza para desenvolver uma determinada ação em

defesa de seus interesses, em possíveis enfrentamentos e conflitos, com objetivo de transformação

da realidade. Portanto, não existem “um e outro”. Existem movimentos sociais desde uma

perspectiva sociológica e movimentos socioterritoriais e/ou movimentos socioespaciais desde uma

perspectiva geográfica.

O espaço, o território, o lugar, as relações sociais e as escalas das ações nos ajudam a

compreender os movimentos socioespaciais e socioterritoriais e seus processos geográficos.

Espacialização e territorialização constituem dois processos geográficos capazes de contribuir para o

entendimento das ações dos movimentos. A espacialidade e a territorialidade são propriedades

desses movimentos, cuja análise é essencial para consolidar um arcabouço analítico de estudos de

suas ações e sua estrutura na geografia.

A espacialidade representa o fato de que determinados movimentos sociais têm o espaço

como trunfo, daí esses movimentos receberem a denominação de movimento socioespacial. A

territorialidade, por sua vez, representa os movimentos que têm como um de seus objetivos

principais a conquista da terra/teto/território, a exemplo do MST e do MTST (Movimento dos

Trabalhadores Sem Teto), dando origem à denominação movimento socioterritorial. Neste ponto, é

fundamental explicar as diferenças e semelhanças entre estes dois tipos de movimentos: os

movimentos socioterritoriais têm suas existências determinadas pela conquista e defesa de seus

territórios; os movimentos socioespaciais têm suas existências determinadas pela conquista de

espaços produtores de relações sociais. Esta é a diferença principal entre os movimentos. A

semelhança está no fato de que os movimentos socioterritoriais também constroem espaços

produtores de relações sociais, como por exemplo, educação, energia, água, saúde, etc.

Fernandes ressalta as particularidades dos movimentos que possuem o espaço ou território

como objeto de disputa política da seguinte forma:

Partimos do pressuposto que movimentos socioterritoriais são todos os que têm o território como trunfo. Todavia, muitos movimentos não têm esse objetivo, mas lutam por

dimensões, recursos ou estruturas do espaço geográfico, de modo que é coerente denominá-los de movimentos socioespaciais. (Fernandes, 1997, p.61)

Para o autor, há uma diferença de perspectiva entre os movimentos que não carregam a

denominação de socioterritoriais e os movimentos que têm todas as características para serem

denominados como sendo socioterritoriais. A diferença seria, então, de abordagem, já que os

movimentos socioterritoriais seriam, para a Geografia, o mesmo que os movimentos sociais para a

Sociologia, vistos de outra perspectiva.

Isto não significa dizer que achamos que esses problemas não tenham algo de comum, mas

que cada caso é um caso específico e que somente um olhar vertical sobre cada movimento, suas

razões, limites e potencialidades, pode nos dizer algo sobre sua verdadeira identidade.

Isso significa dizer que o que dá identidade aos movimentos socioterritoriais é o fato de que o

componente espacial se apresenta como elemento mediador, sendo o próprio espaço uma relação. A

luta só existe porque o espaço se apresenta não como base onde se fixam objetos, ou como uma

área ou sítio a ser delimitado, ficando a partir de então sobre a tutela de um grupo. A mobilização

existe porque há uma identidade do grupo com o espaço, é isto que permite o movimento sobreviver

e atuar em espaço alheio, quando o espaço ainda se constitui como território de outrem. O espaço

passa ser entendido como um campo onde coexistem várias territorialidades conflitantes.

Entendendo que o território é construído a partir do espaço geográfico, acreditamos que a

conflitualidade que existe neste processo está preenchida de intencionalidade, que é uma

propriedade do pensamento e da ideologia e se realiza por meio das relações sociais no processo de

produção do espaço assim como na tarefa analítica de compreensão desse processo. Fernandes

afirma que:

A intencionalidade expressa, portanto, um ato político, um ato de criação, de construção. Este ato político exprime a liberdade da criação, da significação e da interpretação. Esta é uma forma de construção do conhecimento. Os sujeitos utilizam suas intencionalidades criando, construindo, produzindo suas significações dos conceitos, suas interpretações ou “enfoques” da realidade, evidenciando aspectos de acordo com interesses, definindo seus espaços e seus territórios, concretos e abstratos, materiais e imateriais. As interpretações, enfoques, pontos de vista ou abordagens acontecem por meio das intencionalidades que representam interesses de diferentes classes organizadas em diversas instituições. Embora esta questão me pareça evidente, penso ser importante lembrá-la: os estudiosos, pesquisadores e outros profissionais trabalham os conceitos e as teorias de acordo com a intencionalidade dessas instituições (FERNANDES, 2008, p. 03).

Portanto, para haver estas transformações, resistências no espaço, a intencionalidade é

elemento essencial para a concretização desse fato.

O que queremos com esta proposta é oferecer aos movimentos uma compreensão da

importância de sua história, do processo de criação de cada um e também defender a luta dos

camponeses, servindo de forças para que continuem lutando e resistindo a um modelo cheio de

contradições. Enfatizamos ainda que a luta do movimento socioterritorial não termina quando o

território é conquistado, neste momento se inicia uma nova luta, mais intensa ainda, de resistir e

produzir no território, reivindicando as infra-estruturas, os instrumentos para se trabalhar na

agricultura, enfim, os movimentos possuem uma luta contínua.

Neste mesmo sentido de luta contínua, queremos deixar claro que não estamos apresentando

aqui um conceito pronto e acabado, pois, na ciência os conceitos estão sempre em construção, é a

partir do uso e dos questionamentos dos conceitos lançados que estes serão altamente debatidos

para que se chegue a alguma coisa pronta.

Metodologia da CATEGORIA Movimentos Socioterritoriais

As informações dos movimentos socioterritoriais são sistematizadas no Banco de Dados da

Luta pela Terra – DATALUTA – e compõe a “Categoria Movimentos Socioterritoriais”. Esta categoria

é composta por um sistema integrado de informações referente ao registro das ocupações de terra

realizadas por diversos movimentos socioterritoriais. Os dados são organizados a partir das

seguintes fontes: Comissão Pastoral da Terra - CPT; Ouvidoria Agrária Nacional – OAN, que fazem

registros de ocupações em escala nacional. E dados dos seguintes grupos de pesquisa que fazem

registros de ocupações em escala estadual: Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma

Agrária – NERA, para o Estado de São Paulo; Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA, para o

Estado de Minas Gerais e Laboratório de Geografia das Lutas no Campo – GEOLUTAS, para o

Estado do Paraná. Após o levantamento e a confrontação dos dados, iniciamos a conferência das

informações obtidas sobre os movimentos socioterritoriais, seguindo algumas etapas. No NERA

cadastramos movimentos socioterritoriais que atuam no campo e na cidade, todavia neste trabalho

daremos ênfase somente aos movimentos do campo.

Com base nestas fontes, realizamos a classificação dos movimentos socioterritoriais,

procurando compreender suas participações no processo de espacialização e territorialização da luta

pela terra no Brasil e os seus modelos de organização e ação.

Para que possamos ter uma leitura mais detalhada da questão agrária brasileira, assim como

compreendermos as diferentes formas de territorialização, trabalhamos com algumas possibilidades

de análise. Para o estudo dos movimentos socioterritoriais trabalhamos com três tipos de análise:

espacial, apresentando a distribuição regional dos movimentos através das espacializações e das

territorializações; escalar, por meio de leituras das ações em escalas nacional, macrorregional,

estadual, microrregional e municipal; temporal – periódica, através de estudos de períodos de

governo, anual, semestral, trimestral, mensal etc. Neste trabalho, utilizamos apenas os dois primeiros

tipos. Os dados obtidos são representados em tabelas e mapas, de modo a possibilitar diferentes

leituras das ações dos movimentos socioterritoriais.

Participação dos movimentos socioterritoriais na espacialização da luta pela terra no período

de 2000 – 2007

Atualizando o registro dos movimentos socioterritoriais do campo, verificamos o aumento do

número de movimentos que tiveram pelo menos uma ocupação neste período. Até 2006, registramos

86 movimentos socioterritoriais e ao inserir os dados de 2007 contabilizamos 93 movimentos,

conforme apresentado no quadro abaixo.

Quadro 01 – Brasil – Número e nome de movimentos socioterritoriais que realizaram ocupações por ano no período 2000 - 2007

2000

17 Movimentos Socioterritoriais CONTAG, COOTERRA, CPT, CUT, FAF, LOC, MBUQT, MLST, MLT, MST, MT, MTB,

MTR, MTRST, MTRSTB, MTRUB, UFT 2001

15 Movimentos Socioterritoriais ACUTRMU, ASA, ATUVA, CONTAG, CPT, CUT, LOC, MAB, MLST, MLSTL, MLT,

MSST, MST, MT, MTR 2002

14 Movimentos Socioterritoriais CCL, CETA, CLST, CONTAG, CPT, LCC, LCP, LOC, MAST, MCC, MCST, MST,

RACAA-SUL, USST 2003

38 Movimentos Socioterritoriais CAR, CETA, CLST, CONTAG, CPT, CUT, FERAESP, FETRAF, GRUPO XAMBRE, LCP,

LOC, MAB, MAST, MLST, MLT, MLTRST, MMA, MNF, MSO, MSST, MST, MSTA, MTA, MTAA/MT, MTB, MTBST, MTL, MTR, MTSTCB, OLC, OTC, QUILOMBOLAS,

SAF, SINPRA, ST, STL, UAPE, VIA CAMPESINA 2004

34 Movimentos Socioterritoriais ACRQBC, ADT, ARTS, CETA, CONTAG, CPT, CUT, FAF, FETRAF, LCP, MAB, MAST,

MLST, MLT, MPA, MPT, MSONT, MSST, MST, MTB, MTD, MTL, MTR, MTRSTP, MTS, MTST, MTV, MUST, MUT, OLC, OTC, QUILOMBOLAS, SINTRAF, VIA CAMPESINA

2005

25 Movimentos Socioterritoriais ACRQBC, AMPA, CETA, CONTAG, CPT, CUT, FAF, FST, LCP, MAST, MCNT, MLST, MLT, MPA, MPRA, MST, MTD, MTL, MTR, MUB, OAC, OLC, MTA, QUILOMBOLAS,

TUPÃ 3E 2006

31 Movimentos Socioterritoriais ACRQ, CONLUTAS, CONTAG, CPT, CUT, FAF, FERAESP, FETRAF, FRUTO DA

TERRA, FUVI, GRUPO DE SEM TERRAS, LCP, LOC, MAB, MAST, MBUQT, MATR, MLST, MLT, MPRA, MPST, MST, MTD, SINTRAF, MTAA/MT, MTL, OITRA,

QUILOMBOLAS, TUPÃ 3E, UNIDOS PELA TERRA, VIA CAMPESINA 2007

32 Movimentos Socioterritoriais ACAMPADOS, ACRQ, ASTECA, ASTST, CETA, CONAQ, CONLUTAS, CONTAG, CPT,

CTV, CUTFAF, FERAESP, FETRAF, LCP, MAB, MAST, MLST, MLT, MLUPT, MPA, MPRA, MPST, MST, MTB, MTL, MTRST, OITRA, OLST, QUILOMBOLAS, UNITERRA,

VIA CAMPESINA

Total no período1 = 93 movimentos socioterritoriais Fonte: DATALUTA - Banco de Dados de Luta pela Terra, 2008. www.fct.unesp.br/nera

Classificamos os movimentos através das regiões em que promovem suas ações, ou seja, se

o movimento socioterritorial atua em uma microrregião, sua classificação será de movimento

socioterritorial microrregional. Seguindo a classificação do IBGE, teremos as seguintes

classificações: municipal, microrregional, mesorregional, estadual, macrorregional e nacional.

1 Para calcular o total de movimentos socioterritoriais que participaram no período, comparamos ano a ano somente os movimentos socioterritoriais que realizaram ocupações. Essa comparação não é acumulativa, ou seja, não é realizada a partir da soma do número de movimentos apurados durante o período de 2000-2007.

Estiveram presentes na organização de famílias em ocupações entre os anos de 2000 a

2007, com maior intensidade, entre outros, seis movimentos socioterritoriais: MST, CONTAG, MLST,

FETRAF, OLC e CUT.

Verificamos que durante o período analisado, 2000-2007, houve significativa baixa e

significativa alta do número de movimentos socioterritoriais. De 2000 a 2002, houve o declínio do

número de movimentos. Ainda estamos pesquisando se estes movimentos realmente acabaram, não

existem mais, ou apenas cessaram suas ações e continuam realizando algum tipo de projeto que

não sejam as ocupações.

Entre 2002 a 2003 houve um aumento significativo do número de movimentos que passou de

14 para 38. Isso talvez possa estar associado com processo de refluxo entre os anos de 2000 a

2002, por causa da medida provisória 2109-52 que criminalizava as ocupações de terra, neste

período os movimentos poderiam estar se fortalecendo para que em 2003 pudessem realizar

maiores ações e por isso houve um aumento significativo do número de movimentos socioterritoriais.

De 2003 a 2005 houve um recuo no número de movimentos, de 38 em 2003, para 34 e 25, nos anos

de 2004 e 2005, respectivamente. Estamos realizando estudos para sabermos se essa diminuição

está associada com algum tipo de projeto do Governo Federal, que faz com que diminuam o número

de ocupações e consequentemente diminua a força do movimento ou se está relacionado à

cessação ou ao fim desses movimentos, que podem ter conseguido atingir seus objetivos e não

promovem mais ações. Este também seria um estudo que realizaríamos para a continuação deste

nosso projeto, já que ainda não podemos fazer nenhuma afirmação com certeza.

Com o auxílio do gráfico 01, observamos que de 2001 a 2002, houve diminuição de

ocupações e número de famílias, isso pode estar relacionado às eleições presidenciais, em 2002,

que ocorreu um “Tratado de Paz” para a campanha eleitoral de Luis Inácio Lula da Silva. Depois das

eleições de 2002, que elegeram Lula, do Partido dos Trabalhadores, em 2003, houve intenso

processo de manifestações e ocupações, tanto que o ápice dessas manifestações foi em 2004, onde

registramos o maior número de famílias por ocupação, sendo 118.225 presentes em 702 ocupações.

Essas manifestações se intensificaram neste período, pois os movimentos estavam confiantes com a

reforma agrária que o então presidente eleito, Lula, havia prometido.

Notamos também que durante o período analisado, o número de ocupações e de famílias em

ocupações permaneceu com a mesma média, exceto nos anos de 2001 e 2002 e que conforme

aumenta o número de ocupações, o número de famílias também aumenta, embora nos últimos três

anos o número de famílias tenha diminuído. Em 2003, com a posse de Lula, houve um aumento

expressivo do número de movimentos assim como o das manifestações, sendo o ano de 2004

bastante marcante no número de ocupações, 702 e de famílias, 118.225 mil. Contudo, neste mesmo

ano o número de movimentos socioterritoriais diminuiu e voltou a crescer a partir de 2006.

Com base na tabela 01, podemos verificar a intensidade da espacialização de cada

movimento socioterritorial na luta pela terra. Entre estes movimentos o MST foi responsável pela

organização de 376.214 mil famílias em ocupações, realizando o correspondente a 64,5% das

ocupações de terra do período. Em segundo lugar, a CONTAG organizou 49.917 mil famílias, o que

representa 8,55%. Em terceiro lugar, com 2,10%, a MLST, com 12.304 mil famílias, em quarto lugar

com 1,7% e 9.909 mil famílias o FETRAF, em quinto lugar com 1,65% a OLC com 9.572 mil famílias

e em sexto lugar com 1,45% e 8.417 mil famílias a CUT.

Tivemos ainda no universo da análise, 20.895 mil famílias ou 3,06% que realizaram ações

conjuntamente, ou seja, se juntaram a outro movimento socioterritorial para realizar a ocupação de

terra. Registramos 66.538 mil famílias ou 11,4% na categoria outros e 29.404 mil famílias ou 5,04%

realizadas por movimentos socioterritoriais que não foram informados (ver tabela 01).

Analisando esta mesma realidade por estado, verificamos alta concentração do número de

famílias em ocupações em seis unidades federativas: Pernambuco, São Paulo, Bahia, Paraná, Minas

Gerais e Pará. Juntos estes estados reúnem 344.785 mil famílias, valor que corresponde a 59,12%

do total de ocupações contabilizadas no período. Deste total, participaram cada uma das unidades

federativas com os seguintes percentuais: Pernambuco 16,45% ou 95.879 mil famílias, São Paulo

13,03% ou 76.044 mil famílias, Bahia 7,91% ou 46.139 mil famílias, Paraná 7,33% ou 42.923 mil

famílias, Minas Gerais 7,22% ou 42.122 mil famílias e Pará 7,14% ou 41.678 mil famílias.

Através do mapa 1, observamos a importância do MST, pois é o movimento mais

territorializado e é o que apresenta maior número de famílias em ocupações, com destaque para os

Estados de Pernambuco, São Paulo, Paraná e Bahia. A CONTAG também está territorializada em

vários estados, mas não possui tanta expressividade de famílias quando comparado ao MST.

Percebemos a concentração de famílias em ocupações nos Estados da Região Nordeste e Centro-

Sul.

Considerações finais

As pesquisas realizadas durante o período de 2000-2007 contribuíram para o entendimento

das causas do surgimento dos movimentos socioterritoriais na luta pela terra e a importância que

estas organizações têm diante de um projeto de reforma agrária, uma vez que a forma de pressão

que esses movimentos exercem é fundamental para a implementação do processo de reforma

agrária e, consequentemente, de acesso do camponês à terra. Sendo as ocupações de terra a

principal forma de acesso à terra do campesinato (FERNANDES, 2001) e considerando o papel

fundamental desses movimentos na organização dos camponeses para esta finalidade.

Essa pesquisa resultou em um avanço importante na construção conceitual de movimentos

socioterritoriais, ou seja, na leitura geográfica desses movimentos que tem em seu trunfo o território.

Colaborando também, mesmo que timidamente, no avanço da ciência geográfica nos estudos

agrários. É atrás de avanços cada vez mais significativos dentro desse campo que entendemos

necessário o prosseguimento dessa pesquisa, aprimorando o seu recorte e seus objetivos.

Também se faz importante entender a razão da descontinuidade das ações dos movimentos,

em que os movimentos param de atuar em determinados anos e voltam a se espacializar e

territorializar em outros anos. Esse fato é importante para sabermos os motivos dessas ocorrências.

Entendemos que são movimentos que absorvem e/ou sofrem interferências do meio político que os

circundam, ou seja, a conjuntura política e social do país certamente exerce influência na

continuidade ou não, bem como, nos modos de ação desses movimentos.

Cabe ressaltar o DATALUTA como principal banco de dados que registra as diversas

informações acerca dos movimentos socioterritorias e suas ações, bem como, seu vanguardismo, no

estudo das continuidades e cessações. Além, é claro, na busca da originalidade do conceito de

movimento socioterritorial.

Referencial Bibliográfico

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