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MUDANÇAS CLIMÁTICAS DE CURTO PRAZO: ANÁLISE DA TENDÊNCIA DOS REGIMES TÉRMICOS E HÍDRICOS E DO BALANÇO HÍDRICO NOS MUNICÍPIOS DE RIBEIRÃO PRETO, CAMPINAS E PRESIDENTE PRUDENTE (SP), NO PERÍODO DE 1969-2001 Márcia Helena GALINA Maria Juraci Zani dos SANTOS Paulo César SENTELHAS Introdução Indícios de mudanças climáticas, nas diversas escalas espaciais (pontual, local, sub- regional, regional ou zonal), vêm sendo anunciados e acompanhados com muita atenção e apreensão por grande parte da comunidade científica e, mais recentemente, passaram também a fazer parte da pauta de preocupações da mídia, da sociedade civil organizada e até mesmo da população em geral, nas diversas localidades do mundo. Certamente, o sistema climático deve se adaptar à evolução das concentrações de gases de efeito estufa para manter o balanço energético global. Isso significa que o clima está mudando nas diversas escalas espaciais e continuará a mudar na medida em que os níveis de gases de efeito estufa continuarem crescendo. Neste contexto, pesquisas envolvendo mudanças climáticas e conseqüentes alterações no balanço hídrico são de grande relevância, em especial para as localidades onde estas se realizam, pois a agricultura é um dos grandes esteios da economia e possui ligação direta com as condições climáticas. Se as lavouras são cultivadas em épocas de deficiência de água no solo, elas podem não vingar; se forem cultivadas tarde demais, deixam de crescer acompanhando o índice ótimo e, além disso, há a possibilidade do seu crescimento ser interrompido quando as chuvas cessarem. Em concordância com Jackson (1989, p. 86): “[...] As características da chuva e da demanda evaporativa exercem grande influência nas atividades humanas, não somente na agricultura, mas também no suprimento de água para usos domésticos e industriais”. No presente trabalho, procuramos investigar alterações significativas na escala local, no que diz respeito à tendência e variabilidade dos regimes térmicos e hídricos (decendiais, mensais e anuais), e à tendência e variabilidade dos elementos obtidos por meio do processa- mento do balanço hídrico climatológico seqüencial decendial e normal (deficiência, excedente e capacidade de armazenamento hídricos, além da evapotranspiração real e potencial), em três localidades do Estado de São Paulo, com intensa intervenção antrópica e com distintas características hídrológicas, climáticas, geológicas, geomorfológicas e biogeográficas: Ribeirão Preto, município situado na parte Norte-Nordeste do Estado de São Paulo,

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MUDANÇAS CLIMÁTICAS DE CURTO PRAZO: ANÁLISE DA TENDÊNCIA DOS REGIMES TÉRMICOS E HÍDRICOS

E DO BALANÇO HÍDRICO NOS MUNICÍPIOS DE RIBEIRÃO PRETO, CAMPINAS E PRESIDENTE

PRUDENTE (SP), NO PERÍODO DE 1969-2001

Márcia Helena GALINAMaria Juraci Zani dos SANTOS

Paulo César SENTELHAS

Introdução

Indícios de mudanças climáticas, nas diversas escalas espaciais (pontual, local, sub-regional, regional ou zonal), vêm sendo anunciados e acompanhados com muita atenção e apreensão por grande parte da comunidade científica e, mais recentemente, passaram também a fazer parte da pauta de preocupações da mídia, da sociedade civil organizada e até mesmo da população em geral, nas diversas localidades do mundo.

Certamente, o sistema climático deve se adaptar à evolução das concentrações de gases de efeito estufa para manter o balanço energético global. Isso significa que o clima está mudando nas diversas escalas espaciais e continuará a mudar na medida em que os níveis de gases de efeito estufa continuarem crescendo.

Neste contexto, pesquisas envolvendo mudanças climáticas e conseqüentes alterações no balanço hídrico são de grande relevância, em especial para as localidades onde estas se realizam, pois a agricultura é um dos grandes esteios da economia e possui ligação direta com as condições climáticas. Se as lavouras são cultivadas em épocas de deficiência de água no solo, elas podem não vingar; se forem cultivadas tarde demais, deixam de crescer acompanhando o índice ótimo e, além disso, há a possibilidade do seu crescimento ser interrompido quando as chuvas cessarem.

Em concordância com Jackson (1989, p. 86): “[...] As características da chuva e da demanda evaporativa exercem grande influência nas atividades humanas, não somente na agricultura, mas também no suprimento de água para usos domésticos e industriais”.

No presente trabalho, procuramos investigar alterações significativas na escala local, no que diz respeito à tendência e variabilidade dos regimes térmicos e hídricos (decendiais, mensais e anuais), e à tendência e variabilidade dos elementos obtidos por meio do processa-mento do balanço hídrico climatológico seqüencial decendial e normal (deficiência, excedente e capacidade de armazenamento hídricos, além da evapotranspiração real e potencial), em três localidades do Estado de São Paulo, com intensa intervenção antrópica e com distintas características hídrológicas, climáticas, geológicas, geomorfológicas e biogeográficas:

• Ribeirão Preto, município situado na parte Norte-Nordeste do Estado de São Paulo,

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no compartimento de relevo denominado “Cuestas Basálticas”, com Latitude média em torno de 21°10’ S e Longitude em torno de 47°48’W, ocupa uma área de 1.057 quilômetros quadrados, distante 330 quilômetros da capital do Estado. A principal rodovia de acesso é a Rodovia Anhangüera;

• Campinas, município situado na parte Centro-Leste do Estado, no compartimento de transição do relevo entre o “Planalto Atlântico e a Depressão Periférica”, com Latitude média em torno de 22°54’S e Longitude em torno de 47°04’ W, ocupa uma área de 980 quilômetros quadrados e fica a 90 Km da capital do Estado. Dentre as principais rodovias de acesso temos: Bandeirantes, Anhangüera, D. Pedro I, Santos Dumont e Marechal Rondom;

• Presidente Prudente, município localizado no extremo Oeste do Estado de São Paulo, no compartimento de relevo denominado “Planalto Ocidental”, com afloramentos de rochas pós-basálticas, cuja Latitude média é de 22°07’S e a Longitude é de aproximadamente 51°23’W. A principal via de acesso é a rodovia Raposo Tavares.

Figura 1- mapa de localização das áreas de estudo no estado de São Paulo

Após a identificação de alterações climáticas na escala local, procuramos analisar se estas são indícios de mudanças climáticas de curto prazo e detectar a tendência de tal processo.

Faz-se necessário esclarecer que, apesar da aceitação da abordagem dinâmica do

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clima, proposta por Sorre (1951) e sistematizada no Brasil por Monteiro (1971, 1973), o presente estudo não adota o paradigma do ritmo climático (gráficos de análise rítmica, cartas sinóticas do tempo, imagens de satélite ou ainda descrição evolutiva diária dos tipos de tempo nos anos-padrão), pelo simples fato dos objetivos do trabalho não se adequarem a tal abordagem.

ObjetivosA primeira parte da pesquisa teve como objetivo específico, a identificação de al-

terações significativas no regime das chuvas e na temperatura média, nas localidades de Ribeirão Preto, Campinas e Presidente Prudente, por meio da análise de regressão – método dos mínimos quadrados -, nas escalas decendial, mensal e anual, no período de 1969 a 2001.

Na segunda parte do trabalho, nosso objetivo principal foi analisar quais as conse-qüências das alterações constatadas no regime hídrico e na temperatura média para o balanço hídrico no solo. Nesta parte da pesquisa, trabalhamos com a variabilidade e a tendência dos elementos obtidos por meio do processamento do Balanço Hídrico Climatológico decendial e seqüencial para cada ano e localidade de estudo, estabelecendo, dessa forma, níveis de probabilidade de eventos adversos e utilizando os elementos gerados (deficiência hídrica - DEF>X, excedente hídrico - EXC>Y - e armazenamento hídrico - ARM<Z). Neste caso, além da análise de regressão - método dos mínimos quadrados - empregou-se também a média móvel (ordem 5) e a freqüência relativa como procedimentos estatísticos.

Fontes de Dados, Técnicas e Métodos

Na primeira etapa do trabalho, os dados meteorológicos empregados foram precipi-tação e temperatura média, da ordem decendial, mensal e anual. Tais dados foram coleta-dos junto às estações climatológicas de primeira ordem dos municípios em análise, sendo que os dados de Ribeirão Preto e Campinas foram obtidos junto ao Instituto Agronômico de Campinas, enquanto que os dados do município de Presidente Prudente foram obtidos junto à Universidade Estadual Paulista, Campus de Presidente Prudente, os quais foram provenientes de séries contínuas.

Numa segunda etapa da pesquisa, trabalhamos com os seguintes elementos meteoro-lógicos: evapotranspiração potencial, evapotranspiração real, armazenamento, deficiência e excedente hídricos, obtidos pela técnica do balanço hídrico climatológico decendial, segundo Thornthwaite; Mather (1955).

A formulação de Thornthwaite obteve popularidade mundial, em parte, porque exi-ge apenas o conhecimento da temperatura e da precipitação pluvial e, também, porque se apresenta como base para uma classificação mundial dos climas, levando em consideração o solo, a vegetação e os parâmetros atmosféricos.

No processamento do balanço hídrico, utilizamos softwares desenvolvidos no De-partamento de Ciências Exatas da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, da Universidade de São Paulo (USP), em Piracicaba, elaborado por Rolin, Sentelhas; Barbieri

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(1998). Esse método, aplicado em laboratório, considera que a variação do armazenamento de água do solo (ARM) é uma função exponencial, que envolve uma capacidade de água disponível (CAD - função de profundidade de exploração efetiva das raízes e características físicas do solo) e perda de água acumulada (negativo acumulado). Para a estimativa da eva-potranspiração potencial, os programas adotam o procedimento proposto por Thornthwaite (1948), o qual proporciona resultados confiáveis entre as latitudes de 40°N e 40°S.

Geralmente, quando se procuram verificar relações entre duas ou mais variáveis, na esperança de que qualquer relação encontrada possa ser usada no sentido de fazer estimativas ou predições de uma das variáveis particulares, aplica-se o método de regressão. No nosso caso, foi aplicado do método de regressão - mínimos quadrados, que consiste no ajuste de uma reta a um conjunto de pontos. As variáveis utilizadas foram: precipitação, temperatura, deficiência e excedente hídricos, todas em função do tempo. Adotou-se a seguinte equação:

em que: Y= observação; = média das observações;x= se o ponto da série temporal é representado como x=0, então os momentos espaçados serão assinalados como x= -1,-2, etc e +1, +2, etc. Se não houver ponto médio, então serão assinalados com x= -1,-3,-5, etc e +1, +2, +5, etc.

O procedimento estatístico da média móvel foi utilizado para o excedente hídrico e para a deficiência hídrica. Segundo Christofoletti (1989, p. 31), a média móvel fornece uma visão da tendência geral, procurando amenizar as variações isoladas, que surgem como sendo muito irregulares. As médias móveis são calculadas para se encontrar médias para grupos de valores sucessivos, principalmente compostos por valores que se repetem. No nosso caso, o intervalo de tempo mais indicado para a média móvel foi de 5 anos:

a+b+c+d+e/5b+c+d+e+f/5

e assim, sucessivamente, onde as letras representam as observações.Em se tratando da deficiência e do excedente hídricos, além da regressão dos mínimos

quadrados, aplicou-se, também, o procedimento da freqüência relativa para a determinação da concentração em milímetros para cada elemento e localidade estudada.

No caso do Armazenamento (Arm) < 50% da Capacidade (Cad), o procedimento da freqüência relativa foi utilizado com a finalidade de identificação dos meses com armaze-namento menor do que a metade da capacidade, no decorrer do período estudado.

No que se refere ao método, optamos pelo hipotético-dedutivo, por ser o mais ade-quado para a presente investigação.

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Síntese da Análise dos Resultados

Ribeirão Preto

Em linhas gerais, pode-se afirmar que, por meio da análise dos resultados dos procedi-mentos estatísticos, o regime pluviométrico do município de Ribeirão Preto sofreu queda na tendência da precipitação anual, ao longo dos 33 anos estudados (1969 a 2001), da ordem de 120,4 mm (figura 2). No que diz respeito à análise por decêndio, faz-se necessário destacar a brusca queda na tendência da quantidade de chuva nos três decêndios do mês de outubro, que foi responsável pelo montante de 90,2 mm na tendência da precipitação mensal.

Verificou-se ainda a influência do fenômeno El Nino, nesta localidade, nos anos de 1982-83 e depois em 1986-87, com precipitações anuais que superaram os níveis normais. Com relação a este fenômeno no Estado de São Paulo, Sentelhas et. all. (2000, p 16) afirmam:

No Estado de São Paulo, as conseqüências dos fenômenos El Niño e La Niña não são bem definidas, por estar a região Sudeste numa zona de transição, onde as conseqüências dos fenômenos são moduladas também pelas variações da temperatura do oceano Atlântico, de onde provém o vapor d’água trazido pelos ventos alíseos de SE. Assim, quanto maior a temperatura do Atlântico, maior é a injeção de vapores no continente e, conseqüentemente, maiores as possibilidades de chuva.

Figura 2- reta de tendência da precipitação anual em Ribeirão Preto (SP) no período de 1969-2001

Na análise da tendência da temperatura em Ribeirão Preto, com exceção dos meses de maio e agosto, os quais apresentaram discretas diminuições na tendência da temperatura média mensal (0,3°C e 0,2 °C, respectivamente), em todos os demais meses houve aumento

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na tendência da mesma. Os maiores aumentos na tendência da temperatura média mensal ocorreram de outubro a dezembro, com destaque ao mês de outubro, que apresentou o maior aumento na tendência da temperatura média decendial no primeiro e segundo decêndios, dentre todo período analisado (2,2°C e 2,6°C, respectivamente).

Com relação à análise na escala anual, constatou-se aumento na tendência da tem-peratura média anual em Ribeirão Preto da ordem de 0,5°C.

Figura 3- reta de tendência da temperatura média anual em Ribeirão Preto (SP) no período de 1969-2001

Depois do processamento do balanço hídrico seqüencial decendial, houve a preocu-pação de se analisar a variabilidade e a tendência da deficiência e do excedente hídricos. Em Ribeirão Preto, verificou-se aumento na tendência da deficiência hídrica em 49,68 mm e de brusca diminuição na tendência do excedente hídrico em 135,4 mm. Dentre as localidades estudadas, Ribeirão Preto foi a que apresentou maior queda na tendência da precipitação, fato que, conseqüentemente, refletiu o resultado de brusca queda na tendência do excedente hídrico.

Esta queda na tendência da precipitação justificou, também, o resultado obtido pelo processamento do balanço hídrico normal de Ribeirão Preto, no que diz respeito a evapo-transpiração real (quando a evapotranspiração ocorre abaixo de sua taxa potencial). A mesma evidenciou-se do primeiro decêndio do mês de junho até o primeiro decêndio de outubro.

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Figura 4- deficiências e excedentes hídricos anuais de Ribeirão Preto (SP) no período de 1969-2001

Figura 5- balanço hídrico normal de Ribeirão Preto de 1969 a 2001

Campinas

Na análise da tendência da precipitação por decêndio, em Campinas, destaque deve ser dado ao segundo decêndio do mês de dezembro, o qual apresentou aumento mais ex-pressivo na tendência da precipitação (62,4 mm), dentre todos os demais.

Na escala mensal, ficou visível o aumento na reta de tendência da precipitação de de-

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zembro a março e a diminuição de abril a novembro, com exceção do mês de maio. Destaque devem receber os meses de janeiro, fevereiro e março com aumentos de respectivamente 43,8 mm, 56,8 mm e 55,6 mm, na tendência da precipitação.

Finalizando a análise do regime pluviométrico de Campinas, verificou-se aumento de 78 mm na tendência da precipitação anual ao longo dos 33 anos analisados, sendo que os meses de janeiro, fevereiro, março e dezembro foram os que mais contribuíram para tal resultado. Em Campinas, assim como em Ribeirão Preto, também ocorreu a influência do fenômeno El Niño de 1982/83, anos em que as precipitações superaram os índices normais.

Figura. 6- reta de tendência da precipitação anual em Campinas (SP) no período de 1969-2001

Passando agora para a análise da tendência decendial da temperatura em Campinas, destaque deve receber o mês de setembro, o qual apresentou 1,4°C de aumento na reta, e também o mês de novembro, com um aumento da ordem de 1,5 °C.

Na análise do segundo decêndio, novamente aqui o mês de outubro merece destaque com um aumento de 2,8°C.

Quando a análise foi realizada na escala mensal, detectamos aumento na tendência da temperatura do mês de outubro até o mês de janeiro, sendo outubro com 1,2°C, novembro com 1,2 °C, dezembro com 0,8°C e janeiro com 0,9°C de aumento na tendência. Os demais meses não apresentaram grandes oscilações na tendência da temperatura.

Finalizando a análise da temperatura em Campinas, verificou-se aumento da ordem de 0,4°C na tendência anual para o período em questão.

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Figura 7 – reta de tendência da temperatura média anual em Campinas (SP) no período de 1969-2001

Quando se trata da questão dos elementos provindos da contabilização do Balanço Hídrico Seqüencial, observou-se que, na localidade de Campinas, devido ao aumento da tendência da precipitação anual em 78 mm, ocorreu expressivo aumento na tendência do excedente hídrico, da ordem de 114,7 mm. Este fato também se refletiu no Balanço Hídrico Normal de Campinas, ou seja, a evapotranspiração real ocorreu num intervalo bem menor quando comparado com o de Ribeirão Preto: do terceiro decêndio de julho até o primeiro decêndio de setembro. Com relação à deficiência hídrica, a mesma apresentou aumento não tão expressivo na reta de tendência (21,63 mm).

Figura 8- deficiências e excedentes hídricos anuais de Campinas (SP) no período de 1969-2001

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Figura 9- balanço hídrico normal de Campinas de 1969 a 2001

Presidente Prudente

Na análise da tendência da precipitação decendial de Presidente Prudente, ao longo da série temporal estudada, merece destaque o primeiro decêndio do mês de outubro, o qual apresentou uma significativa diminuição na tendência da mesma, da ordem de 65 mm.

Quando a análise da tendência da precipitação para a localidade de Presidente Pru-dente foi realizada na escala mensal, constatou-se que os meses com aumento na tendência foram: janeiro (30 mm), fevereiro (62,2 mm), março (46,8 mm) e abril (33,6 mm), enquanto que os meses com as mais expressivas quedas na tendência das chuvas foram: junho (20,2 mm), julho (44,6 mm) e principalmente, outubro (61,3 mm).

Finalizando a análise, constatou-se aumento na tendência anual da precipitação da ordem de 43,6 mm para o período de 1969 a 2001, em Presidente Prudente. Ao contrário do que verificamos nas duas outras localidades estudadas (Ribeirão Preto e Campinas), aqui o fenômeno El Niño não foi tão significativo no aumento das chuvas, nos anos de 1982/83 e 1987. Em Presidente Prudente, os anos mais chuvosos foram os de 1972, 1974, 1989 e 1998.

Na análise da temperatura média para o primeiro decêndio em Presidente Prudente, constatou-se que todos os meses apresentaram elevação na reta da tendência, com destaque especial para os meses de julho (2,9°C), setembro (2,6°C), outubro (2,8°C), novembro (2,7°C) e, finalmente, dezembro (1,6°C).

Na análise da tendência da temperatura média na escala mensal, constatou-se que, com exceção de maio e junho, todos os meses apresentaram aumento na tendência da temperatura. Vale a pena destacar que, a partir do mês de agosto até dezembro, o aumento na tendência foi bem mais acentuado quando comparado aos outros meses, variando de 1,5°C a 2,1 °C.

Para finalizar, observou-se aumento de 1,1°C na tendência anual da temperatura

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média para o município de Presidente Prudente, nos 33 anos analisados (1969 a 2001), ou seja, registrou-se aqui o maior aumento na temperatura média anual dentre as demais loca-lidades de estudo, lembrando que Ribeirão Preto apresentou aumento de 0,5 °C e Campinas aumento de 0,4 °C na tendência da mesma.

Figura 11- reta de tendência da temperatura média anual em Presidente Prudente (SP) no período de 1969-2001

Figura 10- reta de tendência da precipitação anual em Presidente Prudente (SP) no período de 1969-2001

Com relação à síntese dos resultados do processamento do balanço hídrico decendial seqüencial em Presidente Prudente, verificamos que o expressivo aumento na tendência da

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temperatura refletiu-se na deficiência hídrica, a qual apresentou aumento na tendência da ordem de 84,65 mm. Com relação ao excedente hídrico, conseqüentemente houve dimi-nuição na reta (25,3 mm).

No processamento do Balanço Hídrico Normal, na localidade de Presidente Prudente, a evapotranspiração real se evidenciou em três períodos diferentes do ano:

• do terceiro decêndio de maio até o terceiro decêndio de abril ,• do segundo decêndio de julho ao primeiro decêndio de setembro e;• do primeiro ao terceiro decêndio de outubroNos dois últimos períodos, a evapotranspiração real ocorreu com maior intensidade.Em Presidente Prudente, observamos que a evapotranspiração ocorreu abaixo de sua

taxa potencial, não somente nos meses de menor pluviosidade, mas também, em períodos adversos do ano. Neste caso, vale chamar atenção para o mês de outubro, o qual se evidenciou, especialmente, na localidade de Presidente Prudente, pela brusca diminuição na tendência das chuvas e expressivo aumento na tendência da temperatura, em todos os decêndios.

Figura 12- deficiências e excedentes hídricos anuais de Presidente Prudente (SP) no período de 1969-2001

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Figura 13- balanço hídrico normal de Presidente Prudente (SP) no período de 1969-2001

Considerações Finais

Por meio da análise da primeira parte dos resultados, constatamos que mudanças locais de curto prazo, no comportamento da tendência da chuva e da temperatura, encontram-se em andamento nas localidades de estudo: Ribeirão Preto, Campinas e Presidente Prudente, no período de 1969 a 2001.

Ribeirão Preto apresentou brusca diminuição na tendência das chuvas (120,4mm) e aumento na tendência da temperatura (0,5°C). Em Campinas, por sua vez, ocorreu aumen-to tanto na tendência das chuvas (78 mm) como na tendência da temperatura (0,4°C). Na localidade de Presidente Prudente, o que mais chamou a atenção foi o expressivo aumento na reta de tendência da temperatura, da ordem de 1,1°C.

Quando as médias térmicas e o regime das chuvas sofrem perturbações substanciais, o balanço hídrico do solo, conseqüentemente, tende a se adaptar às novas circunstâncias e a refletir tais alterações, como constatamos na segunda parte do trabalho, no estudo do balanço hídrico normal e seqüencial. Em Ribeirão Preto, por exemplo, verificamos aumen-to na tendência da deficiência hídrica em 49,68 mm e brusca diminuição na tendência do excedente hídrico, da ordem de 135,4 mm. Na localidade de Campinas, devido ao aumento da tendência da precipitação anual em 78 mm, houve aumento na tendência do excedente hídrico, da ordem de 114,7 mm. Finalmente, em Presidente Prudente, constatamos que, o expressivo aumento na tendência da temperatura refletiu-se na deficiência hídrica, a qual apresentou aumento na tendência da ordem de 84,65 mm. Quanto ao excedente hídrico, houve diminuição da ordem de 25,3 mm.

Indubitavelmente, São Paulo é o Estado com maior grau de ocupação do seu territó-rio, com o maior contingente populacional e o de maior nível de desenvolvimento, graças à rentabilidade do setor primário e ao desenvolvimento da indústria (MONTEIRO, 1976,

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p. 11). Por isso mesmo, este Estado tornou-se a porção do espaço geográfico brasileiro de maior grau de alteração e degradação do ambiente natural, graças à falta de gestão e pla-nejamento de ocupação e uso da terra, seja no campo ou na cidade, em todas as esferas da administração pública (municipal, estadual e federal), caracterizadas pelo atual modelo de economia e de consumo e pela completa ausência de políticas direcionadas para o desen-volvimento sustentável.

Nesse contexto, tanto as conseqüências da urbanização desenfreada e não planejada, como da instalação e do desenvolvimento de uma agricultura intensiva e predatória, colabo-raram para a retirada quase que total da vegetação nativa do espaço paulista, em especial nos locais onde se localizam metrópoles regionais, locais de maior adensamento populacional, como Ribeirão Preto, Campinas e Presidente Prudente. Segundo Francisco (1989, p. 64), em Presidente Prudente, a uma única reserva florestal ainda preservada restringe-se ao Morro do Diabo, no Pontal do Paranapanema.

Vale salientar que a vegetação nativa desempenha um importante papel na distribuição de energia e água no solo. Sua retirada certamente ocasionará desequilíbrios no processo de interceptação, infiltração, escoamento superficial e evapotranspiração, e daí a associação da retirada da mata ou floresta nativa a eventos adversos locais como, por exemplo: aumento das médias térmicas, modificação dos regimes pluviométricos, alteração do balanço hídrico e possíveis modificações no sistema de circulação local das massas de ar.

Outra questão preocupante, fruto do atual modelo econômico, é o lançamento indis-criminado de gases produtores do efeito estufa na atmosfera, como o dióxido de carbono, o ozônio, o metano e o óxido nitroso, oriundos na maioria das vezes da queima de combustí-veis fósseis e da biomassa. Segundo Tavares (2001, p. 64): “Apenas de dióxido de carbono são lançadas cerca de 23 bilhões de toneladas na atmosfera a cada ano, cerca do triplo das emissões ocorridas em meados do século XX”.

O clima é um dos sistemas mais sensíveis da Gaia, além de ser um componente onde o controle humano é insignificante. Então, podemos afirmar que as mudanças climá-ticas representam um dos maiores desafios para a civilização contemporânea. A busca por soluções sustentáveis e por medidas práticas de preservação ambiental, com o objetivo de restabelecer um novo equilíbrio entre fatores bióticos e abióticos nos Geossistemas, é um caminho longo e complexo, que exige dedicação e esforços integrados do governo (decisões políticas) e da sociedade civil.

Os diversos setores e agentes sociais assentados no contexto psicocultural do atual modelo de economia e consumo devem, primeiramente, tomar ciência das conseqüências do mesmo e, em seguida, assumir um papel preponderante no estabelecimento de um novo modelo de desenvolvimento, comprometido com desenvolvimento sustentável e, conse-qüentemente, com as gerações futuras.

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199Sociedade e Natureza na visão da Geografia

Referências

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