MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7...

215
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Instituto de Geociências MARIA CRISTINA OLIVEIRA SOUZA MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIA UM ESTUDO SOBRE CONTRIBUIÇÕES BRASILEIRAS DIANTE DE UM NOVO REGIME CLIMÁTICO CAMPINAS 2017

Transcript of MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7...

Page 1: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Instituto de Geociências

MARIA CRISTINA OLIVEIRA SOUZA

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIA

UM ESTUDO SOBRE CONTRIBUIÇÕES BRASILEIRAS

DIANTE DE UM NOVO REGIME CLIMÁTICO

CAMPINAS

2017

Page 2: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

MARIA CRISTINA OLIVEIRA SOUZA

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIA

UM ESTUDO SOBRE CONTRIBUIÇÕES BRASILEIRAS

DIANTE DE UM NOVO REGIME CLIMÁTICO

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA AO

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE

ESTADUAL DE CAMPINAS PARA OBTENÇÃO DO

TÍTULO DE MESTRA EM POLÍTICA CIENTÍFICA E

TECNOLÓGICA

ORIENTADORA: PROFA. DRA. ROSANA ICASSATTI CORAZZA

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL

DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA MARIA

CRISTINA OLIVEIRA SOUZA E ORIENTADA PELA

PROFA. DRA. ROSANA ICASSATTI CORAZZA

CAMPINAS

2017

Page 3: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CNPq, 131850/2015-6

Ficha catalográficaUniversidade Estadual de CampinasBiblioteca do Instituto de GeociênciasCássia Raquel da Silva - CRB 8/5752

Souza, Maria Cristina Oliveira, 1987- So89m SouMudanças climáticas e energia : um estudo sobre contribuições brasileiras

diante de um novo regime climático / Maria Cristina Oliveira Souza. –Campinas, SP : [s.n.], 2017.

SouOrientador: Rosana Icassatti Corazza. SouDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de

Geociências.

Sou1. Energia. 2. Gases de efeito estufa. 3. Mudanças climáticas. 4. Energia -

Planejamento. 5. Mudanças climáticas - Política governamental. I. Corazza,Rosana Icassatti,1968-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto deGeociências. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Climate change and energy : a study on brazilian contributionsregarding a new climate change regimePalavras-chave em inglês:EnergyGreen houses gasesClimate changeEnergy - PlanningClimate change - Governmental policiesÁrea de concentração: Política Científica e TecnológicaTitulação: Mestra em Política Científica e TecnológicaBanca examinadora:Rosana Icassatti Corazza [Orientador]André Tosi FurtadoKelli Angela Cábia Lima de MirandaData de defesa: 30-03-2017Programa de Pós-Graduação: Política Científica e Tecnológica

Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)

Page 4: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

PÓS-GRADUAÇÃO EM

POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

AUTORA: Maria Cristina Oliveira Souza

Mudanças climáticas e energia:

um estudo sobre contribuições brasileiras diante de um novo regime climático

ORIENTADORA: Profa. Dra. Rosana Icassatti Corazza

Aprovada em: 30 / 03 / 2017

EXAMINADORES:

Profa. Dra. Rosana Icassatti Corazza

Prof. Dr. André Tosi Furtado

Profa. Dra. Kelli Angela Cábia Lima de Miranda

A Ata de Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora,

consta no processo de vida acadêmica do aluno.

Campinas, 30 de março de 2017.

Page 5: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

AGRADECIMENTO

Agradeço primeiramente aos meus pais, por todo o apoio que sempre me deram e

pelo incentivo para eu nunca desistir.

Agradeço também a minha orientadora, Rosana Icassatti Corazza, por todos o

suporte e empenho que foram fundamentais para as pesquisas que resultaram nesta

dissertação. Além de orientadora, foi minha amiga e me mostrou como ser uma pesquisadora

e uma professora que nunca perde o encanto em lecionar.

Agradeço também a professora Carla Kazue Nakao Cavaliero e o professor André

Tosi Furtado, por aceitarem o pedido para participarem da minha banca de qualificação, seus

apontamentos foram essenciais para o desenvolvimento final desta dissertação.

Novamente agradeço o professor André Tosi Furtado e também a professora Kelli

Angela Cábia Lima Miranda por aceitarem o pedido para participarem da minha banca de

defesa do mestrado, com toda a paciência para lerem a minha dissertação completa e que

durante a arguição fizeram comentários que enriqueceram a minha dissertação.

Agradeço a todos os funcionários o Instituto de Geociências da Unicamp,

especialmente as funcionárias da secretaria da pós-graduação, Val e Gorete que sempre

estiveram solícitas para as minhas dúvidas, durante o mestrado.

Agradeço as minhas amigas do DPCT, Daniela Pinheiro, Luciana de Farias e

Jennifer Martínez, que estiveram dispostas a me ouvir em todos os momentos, vou levar

vocês para toda a minha vida!

Aos meus amigos e amigas que mesmo não entendo muito bem as minhas

pesquisas, sempre me apoiaram e não desistiram de mim, apesar de ouvirem sempre “hoje eu

não posso, preciso estudar! ”.

Agradeço a minha companheira felina, Ágata, que sempre esteve em cima da

minha mesa, quietinha, em todos os momentos em que eu fiquei trabalhando.

Agradeço aos docentes do DPCT, que atuaram de forma direta ou indireta na

minha formação.

Por fim, agradeço ao CNPq pela bolsa de mestrado concedida.

Page 6: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

RESUMO

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIA

UM ESTUDO SOBRE CONTRIBUIÇÕES BRASILEIRAS

DIANTE DE UM NOVO REGIME CLIMÁTICO

O tema geral desta dissertação diz respeito à interface entre mudanças climáticas e energia. A

dissertação consiste de um estudo das contribuições brasileiras, representadas pelas iNDCs – ou seja,

as metas de redução de Gases de Efeito Estufa (GEE) apresentadas pelo governo brasileiro por ocasião

da 21ª Conferência das Partes (COP 21), realizada em Paris em 2015, e dos desafios que a partir daí

seriam colocados para o setor de energia no país. O estudo é contextualizado de duas maneiras: de um

lado, pelo panorama global, caracterizado pela sistematização e construção de um consenso do

conhecimento científico sobre as mudanças climáticas e pela emergência de um novo regime climático

global; de outro, por um panorama nacional definido a partir da caracterização das contribuições do

Brasil para o problema das emissões, com a identificação e análise do perfil geral e setorial de

emissões de GEE do país. O estudo é refinado para o caso das emissões do setor de energia, que

permite identificar, a partir da análise de instrumentos selecionados de planejamento energético, que

as metas apresentadas pelo país em Paris para o setor de energia já estavam pelo menos em parte

presentes nas metas de planejamento desde 2007 e que as medidas associadas ao alcance de algumas

dessas metas – especificamente para o caso da eficiência energética – configuram muito mais medidas

fragmentadas do que efetivamente uma estratégia que aponta para os rumos para um futuro de baixo

carbono no setor de energia. Além disso, até onde se pode constatar dentro dos limites dessa

dissertação, essas medidas não podem ser identificadas como uma abordagem integrada e sistemática

da inovação tecnológica e não tecnológica.

Palavras-chave: energia; gases de efeito estufa; mudanças climáticas; energia - planejamento;

mudanças climáticas – política governamental

Page 7: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

ABSTRACT

CLIMATE CHANGE AND ENERGY

A STUDY ON BRAZILIAN CONTRIBUTIONS

REGARDING A NEW CLIMATE REGIME

The overall theme of this dissertation is the interface between climate change and energy.

This research is a study of the Brazilian contributions to the iNDC – or greenhouse gas

reduction goals – presented by the Brazilian government at the 21st Conference of Parties

(COP 21) in Paris in 2015, and the new challenges posed for the country’s energy sector.

This research is divided in three parts. On the first one, the global picture is characterized

through the systematization and construction of the ongoing consensus of scientific

knowledge on climate change and the emergence of a new global climate regime. On se

second one, a national panorama is described through the characterization of Brazil's

contributions to the emissions’ problem from an identification and analysis of the country's

general and sectoral greenhouse gas emissions profile. On the third part, this research

concentrates on the energy sector emissions’ case, which allows us to identify, from the

analysis of selected energy planning instruments, that the country's energy sector goals

presented at Paris were already partially present at the government’s planning goals since

2007 and that the policy measures associated with reaching some of these goals - specifically

the ones on energy efficiency - were much more fragmented than an actual strategy that points

to the direction of a low carbon future in the energy sector. Moreover, as far as can be seen

within the limits of this dissertation, these policy measures can’t be identified as an integrated

and systematic approach to technological and non-technological innovation.

Keywords: energy; green houses gases; climate change; energy-planning; climate change –

governmental policies

Page 8: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

LISTA DE FIGURAS

Figura 1.1 - Médias Globais de concentrações de gases de efeito estufa ................................ 30

Figura 1.2 - Emissões antropogênicas globais de gás carbônico............................................. 31

Figura 1.3 - Emissões antropogênicas globais por grupo de GEE entre 1970 e 2010 ............ 32

Figura 1.4 - Emissões antropogênicas acumuladas totais de CO2 a partir de 1870 (GtCO2) .. 35

Figura 1.5 - Emissões Globais de Gases de Efeito Estufa, diretas e indiretas, por Setores

Econômicos .............................................................................................................................. 37

Figura 2.1 - Emissões Acumuladas Totais de CO2 (MtCO2e), excluindo AFOLU (1850 -

1990) ......................................................................................................................................... 67

Figura 2.2 - Emissões Acumuladas de CO2 excluindo AFOLU (% global) (1850-1990) ..... 68

Figura 2.3 - Emissões Acumuladas de GEE (%) incluindo AFOLU (1990 - 2012) .............. 69

Figura 2.4 - Emissões anuais de GEE, incluindo AFOLU* (2012) ........................................ 73

Figura 2.5 - Ranking dos dez maiores emissores de GEE em 2012 (em Kt CO2e)................. 74

Figura 2.6 - Intensidade de emissões totais / PIB PPC¹e de emissões provenientes do

consumo de combustíveis fósseis para os 10 maiores emissores (2012) ................................. 82

Figura 2.7 - BRICS: Emissões totais de GEEs (MtCO2e) excluindo AFOLU (2012) ............ 83

Figura 2.8 - Emissões totais per capita de GEE, incluindo AFOLU (tCO2e per capita), em

2012 .......................................................................................................................................... 84

Figura 3.1 - Emissões totais de CO2e (Mt) GWP/AR5* no Brasil .......................................... 92

Figura 3.2 - Emissões totais de CO2e (Mt) GWP/AR5 excluindo MUT ................................ 96

Figura 3.3 - Emissões de CO2e (Mt GWP/AR5) para os setores selecionados* (1970 – 2014)

.................................................................................................................................................. 97

Figura 3.4 - Emissões de CO2e (Mt GWP/AR5) para MUT (1970-2014) ............................. 98

Figura 3.5 - Remoções de CO2e (t) GWP/AR5 (1990 - 2015) ................................................ 99

Figura 3.6 - Perfis das emissões de CO2e no Brasil: 1990 e 2014 ........................................ 100

Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária ...................................... 103

Figura 3.8 - Oferta interna bruta de energia no Brasil por fonte primária (1990 - 2014) .... 104

Figura 3.9 - Emissões de GEE do Setor de Energia por fonte primária ................................ 105

Figura 3.10 - Emissões de GEE no Brasil e no mundo entre 1990 e 2014 (Mt CO2e),

incluindo AFOLU ................................................................................................................... 106

Figura 3.11 - Emissões de GEE no setor de energia no Brasil em relação às emissões globais

de GEE (Mt CO2e) em 1990 e 2012 ....................................................................................... 108

Figura 4.1 - Crescimento da produção primária de energia no Brasil (1970-2014), em 103

tep ........................................................................................................................................... 126

Figura 4.2 - Fontes renováveis na produção de energia primária no Brasil (1970 a 2014) (em

tep e em %) ............................................................................................................................. 127

Figura 4.3 - Consumo total de etanol no Brasil, consumo de álcool anidro e hidratado (1970

– 2014) em 103m

3 ................................................................................................................... 132

Figura 4.4 - Produção total de etanol no Brasil, produção de álcool anidro e hidratado (1970

– 2014) em 103m

3 ................................................................................................................... 133

Figura 4.5 - Produção de Energia Hidráulica no Brasil, (1970 – 2014) em 103m

3 e % da

produção na Matriz Primária de Energia ................................................................................ 134

Page 9: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

Figura 4.6 - Capacidade Instalada versus Geração de Energia (1980 – 2000) (em número

índice) ..................................................................................................................................... 136

Figura 4.7 - Crescimento da produção de energia elétrica a partir de fontes primárias e

secundárias não renováveis no Brasil (1970 - 2014), em GWh ............................................. 138

Figura 4.8 - Matriz Primária de Energia, Brasil: fontes renováveis e não renováveis (1970 e

2014) (%) ................................................................................................................................ 139

Figura 4.9 - Oferta interna de energia primária: 1970-2015 (%) .......................................... 141

Figura 4.10 - Importação de energéticos fósseis pelo Brasil: 1970-2015 (103 tep) .............. 143

Figura 4.11 - Participação relativa do carvão vapor, carvão metalúrgico, gás natural e

petróleo na pauta de importação de energéticos fósseis pelo Brasil: 1970 e 2015 (% da

importação de energia) ........................................................................................................... 144

Figura 4.12 - Emissões de GEE do Setor de Energia por fonte primária .............................. 146

Figura 4.13 - Emissões de GEE do Setor de Energia pelo uso nos diferentes segmentos de

atividade (1990-2014)............................................................................................................. 148

Figura 4.14 - Evolução da participação das fontes primárias na geração de energia elétrica

(1990-2014) ............................................................................................................................ 149

Figura 4.15 - Emissões brasileira de GEE por setor (1990 – 2014) ...................................... 151

Figura 4.16 - Perfil de emissões de CO2 pela queima de combustíveis no Brasil e no mundo

em 2013, por fonte primária de energia .................................................................................. 152

Figura 4.17 - Perfil de emissões de CO2e pela queima de combustíveis no Brasil e no mundo

em 2013 .................................................................................................................................. 153

Figura 4.18 - Emissões de GEE do Setor de Energia por segmento de atividade (uso de

energia) ................................................................................................................................... 153

Figura 5.1 - Evolução Esperada da Estrutura da Oferta Interna de Energia......................... 162

Figura 5.2 - Fontes Renováveis na Matriz Energética Brasileira ......................................... 163

Figura 5.3 - Potenciais de Eficiência Energética até 2030 ................................................... 163

Figura 5.4 - Participação relativa das fontes no consumo final de energia em 2024 ........... 168

Figura 5.5 - Evolução da oferta interna de energia no horizonte decenal ............................ 170

Figura 5.6 - Composição relativa da oferta interna de energia por fonte (2015 – 2014) .... 170

Figura 5.7 - Matriz energética brasileira: energia renovável e não renovável ..................... 171

Page 10: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

LISTA DE QUADROS

Quadro 1.1 - Caminhos Representativos de Concentração no horizonte 2100

(Representative Concentration Pathways - RCPs) ............................................. 34

Quadro 2.1 - Emissões de CO2, correntes e acumuladas, população e Produto

Interno Bruto, por grupo de países, reunidos segundo a configuração inicial de

Kyoto (de 1990) .................................................................................................. 65

Quadro 2.2 - Emissões de CO2, correntes e acumuladas, população e Produto

Interno Bruto, por grupo de países, numa configuração “pós-Kyoto” ............... 77

Quadro 3.1 - Síntese das medidas complementares apresentadas pelo Brasil

no âmbito da iNDC, por setor ........................................................................... 117

Quadro 4.1 – Produção automobilística por combustível (2003 - 2014) em %

........................................................................................................................... 132

Quadro 5.1 - Objetivos dos Planos Decenais de Energia ................................ 164

Quadro 5.2 - Matriz Energética Primária 2024 ............................................... 169

Quadro 5.3 - Evolução da oferta de energia primária ..................................... 171

Quadro 5.4 - Aumento da Eficiência de Equipamentos Eletrodomésticos .... 175

Quadro 5.5 - Setor residencial: consumo de eletricidade e eficiência energética

........................................................................................................................... 179

Quadro 5.6 - Setor industrial: consumo de energia e eficiência energética ¹ .. 180

Quadro 5.7 - Setor industrial : Intensidade Energética .................................... 182

Quadro 5.8 - Setor industrial: consumo de eletricidade e conservação de

energia elétrica no setor industrial .................................................................... 182

Quadro 5.9 - Setor industrial : Intensidade Elétrica ........................................ 183

Page 11: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AFOLU

Agriculture, Forestry and Other Land Uses (Setores da agricultura, florestal e

outros uso da terra )

AR5 5th Assessment Report

BAU Business As Usual

BECCS

Bio-Energy with Carbon Capture and Storage (Bioenergia com Captura e

Sequestro de Carbono )

BEM Balanço Energético Nacional

BRICS Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

C&T Ciência e Tecnologia

CAIT Climate Analysis Indicators Tool

CCS Carbon Capture and Storage

CH4 Metano

CO2 Dióxido de carbono (gás carbônico)

CO2e Dióxido de carbono equivalente

COP Conferência das Partes

EPE Empresa de Pesquisa Energética

GEE Gases de Efeito Estufa

Gt Giga tonelada ( um bilhão de toneladas)

GTP Global Temperature Change Potential

GWP Global Warming Potential

HFC Hidrofluorcarboneto

IAA Instituto do Açúcar e do Álcool

iLPF Sistemas de Integração lavoura-pecuária-florestas

IMAZON Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia

iNDC

Intended Nationally Determined Contributions (Contribuição Pretendida

Determinada Nacionalmente)

IPCC

Intergovernmental Panel on Climate Change ( Painel Intergovernamental sobre

Mudanças Climáticas)

MME Ministerio de Minas e Energia

Mt Mega tonelada ( um milhão de toneladas)

MUT Mudança de Uso da Terra

N2 Óxido Nitroso

OMM Organização Meteorológica Mundial

ONU Organização das Nações Unidas

PBMC Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas

PDE Plano Decenal de Energia

PFC Perfluorcarbono

PNA Plano Nacional de Adaptação

PNE 2030 Plano Nacional de Energia 2030

PNMC Plano Nacional de Mudanças Climáticas

PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

PRCD Princípio da Responsabilidade Comum porém Diferenciada

RAN1 Primeiro Relatório de Avaliação Nacional do Painel Brasileiro de Mudanças

Page 12: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

Climáticas

RCP

Representative Concentration Pathways (Caminhos Representativos de

Concentração de GEE)

REDD+

Reduce emissions from deforestation and forest degradation, and foster

conservation, sustainable management of forests, and enhancement of forest

carbon stocks ( Redução de emissões decorrentes do desmatamento e da

degradação de florestas e conservação, do manejo sustentável e do aumento de

estoques de carbono nas florestas.

SEEG Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de Efeito Estufa

SF6 Hexafluoreto de enxofre

TSU Technical Support Unit (Unidade de Apoio Técnico )

UNFCCC

United Nations Framework Convention on Climate Change (Convenção do Clima

da ONU )

W/m2 Watts por metro quadrado

WBCSD World Business Council for Sustainable Development

WG1 Working Group I - AR5

WG2 Working Group II -AR5

WG3 Working Group III- AR5

WRI World Resources Institute

Page 13: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 15

Capítulo 1 – Sistematização do conhecimento científico sobre mudanças climáticas e

sugestões para a descarbonização: contribuições do IPCC/AR5 ....................................... 25

1.1. Sobre o IPCC, sua estrutura e funcionamento .................................................. 26

1.2. Causas e efeitos das mudanças climáticas, segundo o AR5 .............................. 29

1.3. Transformações necessárias e urgentes: intersetoriais e setoriais .................. 39

1.3.1. Vias de mitigação intersetoriais e suas medições............................................... 41

1.3.2. Transformações setoriais para mitigação de GEE ............................................ 46

1.4. Síntese e considerações finais ao capítulo .......................................................... 56

Capítulo 2 – A partilha das responsabilidades sobre o enfrentamento das mudanças

climáticas: mudanças na governança global do clima à luz de uma análise de emissões

históricas e correntes .............................................................................................................. 59

2.1. Regime climático de 1990 a 2009: emissões e os princípios do Protocolo de

Kyoto ................................................................................................................................ 63

2.2. Emergência de um novo regime climático a partir de 2009 ............................. 72

2.3. Velhos e novos conflitos no regime climático pós-Kyoto .................................. 81

2.4. Síntese e considerações finais ao capítulo .......................................................... 86

Capítulo 3 – Brasil: perfil das emissões e intenções apresentadas à COP21 .................... 89

3.1. Uma breve caracterização das emissões de GEEs do Brasil ............................ 91

3.1.1. Evolução das emissões totais de GEEs no Brasil no período de 1970 a 2014.. 92

3.1.2. Observações sobre as emissões do setor de energia ........................................ 101

3.1.3. Importância relativa das emissões do Brasil no panorama global ................ 105

3.2. Contribuição Pretendida Determinada Nacionalmente: a “iNDC” do Brasil ....

.............................................................................................................................. 110

3.2.1. A contribuição em termos de mitigação, adaptação e meio de implementação .

.............................................................................................................................. 112

3.2.2. Observações específicas sobre medidas setoriais............................................. 115

3.2.3. Observações sobre o estágio atual de implementação das metas ................... 118

3.3. Síntese e considerações finais do capítulo ........................................................ 119

Capítulo 4 – Mudanças recentes no setor de energia e emissões associadas ................... 124

4.1. Mudanças na energia primária no Brasil no período 1970-2014 ................... 125

4.2. Oferta interna: a intensificação da importação de combustíveis fósseis ....... 141

4.3. O perfil das emissões de GEE associadas à oferta e à demanda energética . 145

4.4. Observações finais ao capítulo .......................................................................... 154

Page 14: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

Capítulo 5 - Ações para reduções de emissão de GEE no setor de energia: mais

fragmentos do que estratégias integradas para uma descarbonização ........................... 157

5.1. Instrumentos de Planejamento Energético: PNE 2030 e PDEs ..................... 159

5.2. O futuro das fontes renováveis segundo os PDE´s .......................................... 166

5.3. A eficiência energética nos setores residencial e industrial ............................ 172

5.4. Observações finais ao capítulo .......................................................................... 185

Conclusões Finais .................................................................................................................. 188

REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 200

Page 15: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

15

INTRODUÇÃO

As mudanças climáticas compõem uma parte das questões que colocam a

humanidade diante das chamadas fronteiras planetárias (planetary boundaries), termo

proposto por Rockström et al (2009) para compreender a problemática ambiental

contemporânea numa perspectiva sistêmica, no sentido das interações entre os sistemas

naturais e antrópicos.1

“Fronteiras planetárias” representam um construto que denota os esforços de

cientistas (naturais e também sociais) de sintetizar o conhecimento contemporâneo com

respeito às interações entre o sistema terrestre e os sistemas socioeconômicos, numa tentativa

de comunicar e alertar um público mais amplo do que os convencionais circuitos acadêmicos

– e mesmo de policy making – de que as ações antropogênicas resultam em efeitos que

atingem toda a humanidade. É uma expressão que tem atravessado, em nossos dias, não

apenas as fronteiras disciplinares, aparecendo em palavras-chave, títulos e conteúdo de artigos

científicos publicados em periódicos e em apresentações de eventos acadêmicos, como

também os mais diversos fóruns de políticas públicas, em especial aqueles atinentes a

questões ambientais. É também uma expressão que reforça a ideia de que as ações de

mitigação devem ser globais e de que as responsabilidades pelas ações perante as mudanças

climáticas devem ser mais amplamente partilhadas.

As mudanças climáticas dividem com as demais fronteiras planetárias certas

características que tipificam a problemática ambiental contemporânea: são problemas

sistêmicos e complexos, com causalidades que não podem ser admitidas como unidirecionais,

apresentando ciclos de retroalimentação; suas fontes múltiplas, difusas, tornam difícil a

atribuição de responsabilidades (o que é fundamental à aplicação do princípio do poluidor-

pagador, que orienta grande parte das políticas ambientais); suas consequências são

cumulativas e se desdobram para além das fronteiras nacionais; há um sensível interregno

temporal entre a instalação das causas e a observações dos efeitos, o que coloca a dimensão

intertemporal como central na apreensão dos nexos causa-efeito, os quais são estabelecidos

1 Os autores definiram nove fronteiras planetárias ou limites planetários como sendo "o espaço operacional

seguro para a humanidade em relação ao sistema terrestre": 1) Mudanças climáticas; 2) Taxa de perda da

integridade da biosfera (que causa extinção de espécies); 3) Ciclos biogeoquímicos do fósforo e do nitrogênio; 4)

Esgotamento do ozônio atmosférico, 5) Acidificação dos oceanos; 6) Utilização da água doce; 7) Mudança no

uso da terra; 8) Carga atmosférica de aerossóis; e 9) Poluição química (como nuclear, poluentes orgânicos e

metais pesados). De acordo com os autores, a humanidade já ultrapassou quatro dessas fronteiras: as mudanças

climáticas; a taxa da perda de integridade da biosfera; as mudanças no uso da terra e a interferência do ciclo do

nitrogênio. Romper esses limites colocam em risco a própria existência humana (Rockström et al, 2009, p.472).

Page 16: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

16

com base em um conhecimento científico de fenômenos que estão nas fronteiras entre os

sistemas antrópicos e naturais, sujeitos a controvérsias científicas e a incertezas nem sempre

redutíveis a riscos probabilísticos; seus desdobramentos podem incorrer em irreversibilidade

de danos tanto para os sistemas socioeconômicos quanto para os sistemas terrestres

(CORAZZA, 1996; CORAZZA e BONACELLI, 2014).

Essas características justificam muitas das dificuldades enfrentadas quando o

objetivo é o de propor soluções para os problemas. No caso das mudanças climáticas, é

possível dizer que a origem dos gases de efeito estufa estão espalhadas por um número

praticamente incomensurável de fontes, estáticas e móveis, de difícil reconhecimento pontual.

São fontes difusas. Isso faz com que a aplicação do tradicional princípio do poluidor-pagador,

por exemplo, encontre muitas dificuldades.

Outra dificuldade é que, em face daquelas características, o que ocorre é a

necessidade – e urgência – para que sejam adotadas medidas de política antes da estabilização

do conhecimento científico e da possibilidade de mensuração econômica de custos e

benefícios, ou seja, para a adoção do princípio da precaução (O´RIORDAN & CAMERON,

2013).

A solução para o problema da distribuição de custos e benefícios, dentro dos

regimes climáticos, passa pela incorporação de princípios como o Princípio de

Responsabilidades Comuns, porém Diferenciadas (o PRCD) e o princípio das

responsabilidades históricas. São princípios que estão em jogo dentro da reconfiguração de

forças na transição para o novo regime climático pós-Kyoto.

A natureza global das mudanças climáticas faz com que sua solução passe

necessariamente por medidas que devem ser tomadas conjuntamente pelos países. Com essa

compreensão é que a Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas

(UNFCCC, na sigla em inglês para United Nations Framework Convention for Climate

Change) foi proposta, em 1992, por ocasião da Segunda Conferência das Nações Unidas

sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, conhecida como Rio 92.

Na UNFCCC, o objetivo geral de combater as mudanças climáticas deu origem a

sucessivas rodadas de negociações internacionais, nas quais os Estados nacionais, chamados

de “partes”, deveriam se comprometer com ações voltadas às finalidades de mitigação e de

adaptação, além de negociar os meios tecnológicos e financeiros para o alcance dessas

finalidades. Delegados dos Estados nacionais se reúnem periodicamente nas Conferências das

Partes (COPs), que ocorrem desde 1995 – a COP de Berlim. As questões que animam os

debates têm a ver com responder a questões tais como: o que fazer, como fazer, quem deve

Page 17: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

17

fazer, quando e com o recurso a quais meios (BUENO RUBIAL, 2016). As negociações se

intensificaram em especial a partir de 20072, quando a consolidação do conhecimento

científico sobre causas, efeitos e recomendações sobre o problema das mudanças climáticas

pelo IPCC foi laureado com o Prêmio Nobel da Paz.

O grande vilão, de acordo com a sistematização dos conhecimentos pelo IPCC,

seria, historicamente, a queima de combustíveis fósseis. Desde a Revolução Industrial, a

quantidade de CO2 se acumula de forma a levar a concentrações na atmosfera que tenderiam a

alterar o funcionamento do sistema climático. O problema se acelerou depois da Segunda

Guerra Mundial, com o avanço da industrialização em outras partes do planeta, aprofundando

e consolidando seu caráter intensivo na queima de combustíveis fósseis. Mais recentemente,

outros fatores, como o avanço do desmatamento em países como o Brasil e a Indonésia e

outras causas associadas a mudanças no uso da terra (MUT) passam a constituir elementos

explicativos para o problema.

O estudo desenvolvido no âmbito desta dissertação se coloca na interface entre

mudanças climáticas e energia.

A dissertação consiste de um estudo das contribuições brasileiras, representadas

pela iNDC – ou seja, as metas de redução de Gases de Efeito Estufa (GEE) apresentadas pelo

governo brasileiro por ocasião da 21ª Conferência das Partes (COP 21), realizada em Paris em

2015, e dos desafios que a partir daí seriam colocados para o setor de energia no país. O

estudo é contextualizado de duas maneiras: de um lado, pelo panorama global, caracterizado

2 O Relatório AR4, que antecedeu o AR5, foi publicado em 2007 e foi um dos principais documentos que

confirmaram que as ações antrópicas afetam os aumentos das emissões de GEE e as suas concentrações na

atmosfera, como também influencia nas mudanças climáticas do planeta: “As concentrações atmosféricas

globais de dióxido de carbono, metano e óxido nitroso aumentaram bastante em consequência das atividades

humanas desde 1750 e agora ultrapassam em muito os valores pré-industriais determinados com base em

testemunhos de gelo de milhares de anos. Os aumentos globais da concentração de dióxido de carbono se devem

principalmente ao uso de combustíveis fósseis e à mudança no uso da terra. Já os aumentos da concentração de

metano e óxido nitroso são devidos principalmente à agricultura.” (IPCC, 2007a, p. 26, disponível em:

https://www.ipcc.ch/pdf/reports-nonUN-translations/portuguese/ar4-wg1-spm.pdf). O Relatório AR4 serviu de

base para evidenciar cientificamente que os aumentos das emissões de GEE e as suas concentrações na

atmosfera possuem natureza antrópica, resultando em alterações climáticas: “Uma avaliação global dos dados

desde 1970 mostrou ser provável que o aquecimento antrópico tenha tido uma influência discernível em muitos

sistemas físicos e biológicos” (IPCC, 2007b, p.4). Além disso, o Relatório afirma que se os aumentos da

temperatura global ultrapassarem de 1,5°C a 2,5°C, o risco de extinção de espécies vegetais e animais aumentará

aproximadamente de 20% a 30%. O AR4 trouxe como novidade estimativas sistemáticas das magnitudes dos

impactos provenientes dos aumentos da temperatura média global e enfatizou que “O desenvolvimento

sustentável pode reduzir a vulnerabilidade à mudança do clima, aumentando a capacidade de adaptação e

aumentando a resiliência. Na atualidade [ano de 2007], contudo, poucos planos de promoção da

sustentabilidade preveem explicitamente a adaptação aos impactos da mudança do clima ou a promoção de

capacidade de adaptação” (IPCC, 2007b, p.26, disponível em: https://www.ipcc.ch/pdf/reports-nonUN-

translations/portuguese/ar4-wg2-spm.pdf.)

Page 18: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

18

pela sistematização e construção de um consenso do conhecimento científico sobre as

mudanças climáticas e pela emergência de um novo regime climático global; de outro, por um

panorama nacional definido a partir da caracterização das contribuições do Brasil para o

problema das emissões, com a identificação e análise do perfil geral e setorial de emissões de

GEE do país. O estudo é refinado para o caso das emissões do setor de energia, que permite

identificar, a partir da análise de instrumentos selecionados de planejamento energético, que

as metas apresentadas pelo país em Paris para o setor de energia já estavam pelo menos em

parte presentes nas metas de planejamento desde 2007 e que as medidas associadas ao alcance

de algumas dessas metas – especificamente para o (pouco significativo) avanço da presença

das fontes renováveis na matriz energética e para o caso da eficiência energética – configuram

muito mais medidas fragmentadas e pouco ambiciosas do que efetivamente uma estratégia

que aponta rumos para um futuro de baixo carbono no setor de energia. Além disso, até onde

se pode constatar dentro dos limites dessa dissertação, essas medidas não podem ser

identificadas com uma abordagem integrada e sistemática da inovação tecnológica e não

tecnológica.

A dissertação está estruturada em três partes, totalizando cinco capítulos, além

desta introdução e das conclusões.

Na primeira parte são apresentadas as contribuições do IPCC/AR5 para a

discussão sobre as mudanças climáticas. Esta parte é composta pelo primeiro capítulo,

intitulado “Sistematização do conhecimento científico sobre mudanças climáticas e sugestões

para a descarbonização : contribuições do IPCC/ AR5”, que apresenta uma contextualização

sobre os avanços da compreensão científica sobre causas e efeitos das mudanças climáticas a

partir dos documentos do 5º Relatório de Avaliação do IPCC, o chamado AR5 (sigla em

inglês para o 5th Assessment Report) e de suas propostas mais gerais de transformações

necessárias nas dimensões setoriais e intersetoriais a fim de superar as formas de produção e

consumo de alta intensidade de emissões de gases de efeito estufa (GEE). Deste modo o

capítulo busca compreender o panorama científico, como tem sido típico nas relações entre

Ciências Ambientais e diversas arenas de policies no ambientalismo contemporâneo, no qual

se dão as negociações multilaterais sobre os rumos da descarbonização da economia global.

A discussão final deste primeiro capítulo é relevante para a compreensão dos

desafios às transformações futuras no que tange à necessidade de redução dessas emissões no

país. Entende-se que esses desafios estão relacionados tanto às possibilidades de transição

para uma economia de baixas emissões de gás carbônico em particular, quanto de gases de

efeito estufa em geral, e também do ponto de vista de se repensar as possibilidades de

Page 19: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

19

desenvolvimento socioeconômico de modo a não comprometer a capacidade das gerações

futuras em satisfazer suas necessidades, ou seja, num sentido de um desenvolvimento

socioeconômico mais sustentável.

A segunda parte apresenta a discussão sobre as responsabilidades de cada país

para as mudanças climáticas e também o papel do Brasil neste cenário. Esta parte é composta

pelos capítulos 2 e 3 da dissertação.

A partir do momento no qual são sistematizados os conhecimentos científicos que

evidenciam que as ações antropogênicas, ou seja, aquelas causadas pela ação do homem,

influenciam e interferem na dinâmica do clima do planeta – objeto do primeiro capítulo desta

dissertação -, a comunidade internacional, especialmente sob os auspícios das Nações Unidas,

passa a formatar espaços para que se discutam formas de enfrentamento do problema.

O capítulo 2 é intitulado “A partilha das responsabilidades sobre o enfrentamento

das mudanças climáticas: mudanças na governança global do clima à luz de uma análise de

emissões históricas e correntes” e nele são apresentados e discutidos aspectos críticos dessas

negociações climáticas, que representam um avanço sobre a discussão científica sobre as

mudanças climáticas.

Neste sentido, é oferecida uma reflexão sobre dois “momentos” das negociações

sobre a problemática do clima nos fóruns mundiais da Convenção-Quadro das Nações Unidas

sobre as Mudanças Climáticas (United Nations Framework Convention on Climate Change –

UNFCCC) – as chamadas Conferências das Partes (COPs): o primeiro deles que vai de 1990 a

2009, que caracteriza o que Bueno Rubial (2016) chama de Regime do Protocolo de Kyoto, e

o período que se abre a partir de 2009, associado ao que a autora denomina de um novo

regime climático. Para esses períodos, a reflexão aportada pelo segundo capítulo procura

identificar uma reconfiguração dos arranjos entre os países, apoiada no reconhecimento de

uma mudança de perfil de emissões de países e de grupos de países, a fim de compreender

como o Brasil se posiciona nas negociações internacionais sobre as mudanças climáticas.

Observa-se, então, um rearranjo e novas coalizões de países, com a perda do papel de muitos

dos que compunham originalmente o Anexo I do Protocolo de Kyoto e a emergência de um

conjunto de países agrupados, para fins de negociação na ocasião da COP 15, em

Copenhague, em 2009, como BASIC: Brasil, África do Sul, Índia e China.

É neste contexto que emergem as contribuições, em termos de metas dos países

signatários da UNFCCC para o novo regime climático que deve substituir o Protocolo de

Kyoto e que tem como maior desafio, evitar o aquecimento global de mais de 2oC, conforme

advogam os cientistas reunidos no IPCC e que assinam o AR5. Para isto, tanto o Brasil como

Page 20: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

20

os demais países participantes da UNFCCC tiveram a responsabilidade de publicar suas metas

para a descarbonização de suas economias. O documento que contem as metas de

descarbonização do Brasil é a Contribuição Pretendida Determinada Nacionalmente (iNDC),

publicada pelo Ministério das Relações Exteriores.

Esse terceiro capítulo, intitulado “Brasil: perfil das emissões e intenções

apresentadas na COP 21”, está organizado em duas seções. Na primeira seção é apresentada e

discutida uma breve caracterização das emissões de gases de efeito estufa do Brasil, de modo

a permitir que se possa avaliar o problema, do ponto de vista de suas dimensões quantitativas

absolutas (o quanto se emite de gases de efeito estufa no país), da contribuição dos diferentes

setores para essas emissões e ainda da importância relativa do Brasil para as emissões de GEE

em escala global. Para tanto, recorreu-se à base de dados do Sistema de Estimativa de Gases

de Efeito Estufa (SEEG) do Observatório do Clima, que apresenta o registro das emissões de

GEE desde 1970. A segunda seção, por sua vez, apresenta as contribuições apresentadas pelo

Brasil para o alcance das metas globais de redução das emissões dos GEE, ou seja, a iNDC

brasileira apresentada por ocasião da 21ª Conferência das Partes, a COP 21, realizada em

Paris no final do ano de 2015. Para compor esta seção, foram levantados e analisados

documentos oficiais do Ministério das Relações Exteriores do Brasil para efeito de

compreensão do processo de consultas públicas para a elaboração das metas. Adicionalmente,

foram compiladas e sistematizadas as metas apresentadas pelo Brasil no âmbito de sua iNDC.

Também será visto quais metas de redução de GEE estão associadas a esses setores. Como se

analisa neste capítulo, essas metas são apresentadas de uma forma bastante genérica, sendo

que o documento iNDC não detalha as medidas para que essas metas sejam implementadas.

A terceira parte da dissertação apresenta um estudo sobre o setor de energia do

Brasil diante do panorama de reflexões sobre mudanças climáticas e as necessidades de

redução de gases de efeito estufa, apresentado nos três capítulos iniciais. Esta parte é

composta pelos capítulos 4 e 5 da dissertação.

O capítulo 4, intitulado “Mudanças recentes no setor de energia e emissões

associadas”, apresenta as mudanças da matriz primária de energia do Brasil, a fim que se

possa compreender o processo do aumento das emissões de GEE neste setor entre os anos de

1970 e 2014.

O capítulo está organizado em três seções. A seção 4.1 apresenta as mudanças na

composição da energia primária no Brasil no período de 1970 a 2014. Os dados para a

elaboração dos gráficos foram extraídos da base de dados do Balanço Energético Nacional

Page 21: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

21

(BEN). Foram recuperados e analisados, à luz de estudos de especialistas na área de energia,

dados sobre a produção primária de energia no país, agrupados por fontes renováveis e não-

renováveis, de forma agregada. A seguir, os dados foram desagregados segundo as fontes

primárias e secundárias renováveis em questão: energia hidráulica, biocombustíveis, lenha e

outras fontes primárias renováveis. Convém notar que as “outras fontes primárias renováveis”

incluem, por exemplo, a solar e a eólica, não havendo, portanto, dados desagregados para

essas fontes no BEN. Os casos do etanol e do potencial hidráulico foram examinados, tendo

sido caracterizado que, embora tenha havido um aumento da produção dessas fontes primárias

em termos absolutos, houve uma perda na participação relativa das fontes renováveis na

matriz primária, pois em 1970 o percentual correspondia a 78,66% e em 2014 passou a

representar somente 43,54%. Um exame um pouco mais detalhado evidencia que uma parte

relevante da necessidade de energia primária para suprir o fornecimento de energia elétrica

terminou por favorecer o uso de energias não renováveis, em especial o gás natural. Estes

resultados são mais bem compreendidos com a apresentação e análise da evolução da

estrutura da oferta interna de energia, em especial a partir de 2000.

A necessidade de suprir o fornecimento de energia elétrica a partir de fontes

fósseis se deu com o recurso, conforme se observa na seção 4.2, a um aumento nas

importações desse combustível, o que se traduziu numa mudança na estrutura da oferta

interna de energia.

A seção 4.3 recupera e apresenta o perfil das emissões de CO2 associadas à oferta

e à demanda energética, destacando o perfil setorial dessas emissões e qualificando-as tanto

em termos absolutos quanto relativos.

Por fim, o capítulo 5, intitulado “Ações para reduções de emissão de GEE no setor

de energia: mais fragmentos do que estratégias integradas para uma descarbonização”,

apresenta, a partir de uma análise de instrumentos selecionados de planejamento do setor de

energia, uma reflexão sobre dois temas relevantes para o futuro deste setor no sentido da

busca pela redução das emissões de GEE. São eles: o tema das perspectivas para as fontes

renováveis e o da busca pela eficiência no domínio da energia.

O capítulo está organizado em três seções. A primeira delas apresenta o PNE e os

PDEs selecionados para a análise proposta no capítulo, contextualizando esses documentos

dentro da proposta de planejamento energético e identificando seus objetivos. A segunda

seção busca identificar o papel atribuído às fontes renováveis dentro desses documentos de

planejamento, em seus respectivos horizontes temporais. Finalmente, a terceira seção

Page 22: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

22

apresenta as medidas levantadas, a partir dessa documentação, específicas para a busca da

eficiência energética – que corresponde a uma das metas da iNDC para o horizonte de 2030.

Há que se mencionar uma dificuldade em se recuperar informações específicas

sobre medidas que estariam na origem do aumento de eficiência esperado para vários dos

casos tratados pelos PDEs, mencionados ao longo da exposição do quinto capítulo. Esta

dificuldade impôs uma limitação ao exercício de análise, em particular restrito aos casos do

setor residencial e industrial, cada um deles com dificuldades específicas. Por esta razão, as

considerações finais apresentadas devem ser compreendidas levando-se em conta estas

dificuldades metodológicas e de análise.

Para a consecução dessa dissertação, recorreu-se a uma multiplicidade de

estratégias metodológicas. Uma revisão semi-sistemática da literatura foi realizada por meio

de artigos pesquisados no Sistema de Bibliotecas da Unicamp (SBU), Periódicos Capes, base

de periódicos científicos brasileiros Scientific Electronic Library Online (SciELO) e também

por meio do Google Scholar. Um levantamento e a correspondente análise documental

relativos ao AR5/IPCC deu origem à exposição e às reflexões apresentadas no primeiro

capítulo sobre o problema climático. Uma revisão documental sobre as emissões brasileiras de

gases do efeito estufa contou com estudo dos relatórios do Observatório do Clima. Já os

estudos sobre o setor de energia no Brasil foram realizados com base nos documentos de

planejamento energético: o Plano Nacional de Energia 2030 (PNE 2030) e os Planos Decenais

de Energia (PDE). A exposição sobre as metas brasileiras para a redução de gases de efeito

estufa no âmbito das negociações climáticas que deram origem ao Acordo de Paris – a iNDC

do Brasil – contou com informações levantadas em documentos do Ministério das Relações

Exteriores.

Nesta dissertação, também foram utilizadas seis diferentes bases de dados para a

busca e recuperação de informações quantitativas, com a elaboração e manipulação de

planilhas, quadros, tabelas e gráficos que proporcionaram as análises apresentadas nos

diversos capítulos.

A composição dos perfis de emissões no panorama global, apresentados no

segundo capítulo, foi realizada com base em dados coletados a partir da CAIT-WRI (Climate

Analysis Indicator Tool, disponibilizada pelo World Resources Institute), enquanto que o

detalhamento do perfil geral das emissões brasileiras e para o setor de energia, apresentados,

respectivamente, no terceiro e quarto capítulos, contou com a recuperação, tabulação e análise

de dados do SEEG (Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa), do

Page 23: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

23

Observatório do Clima. Os dados referentes ao setor de energia no Brasil foram obtidos a

partir do Balanço Energético Nacional (BEN), disponibilizado pela Empresa de Pesquisa

Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia (MME). Já os dados sobre PIB

e população (e alguns também sobre emissões) foram obtidos a partir da base de dados do

Banco Mundial (World Bank Data) e também do Departamento das Nações Unidas para

Assuntos Econômicos e Sociais (United Nations Department of Economic and Social Affairs -

DESA).

Finalmente, foi utilizado e elaborado um clipping de notícias com base nas

seguintes fontes: Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, Valor Econômico, Agência

Brasil, O Eco, Revista Pesquisa FAPESP, Deutsche Welle e Fundação Heinrich Böll para os

temas de mudanças climáticas, energia, negociações globais sobre o clima e sobre as iNDCs.

A utilização de textos jornalísticos se justifica pelo fato de que esses são temas

contemporâneos, com atualizações correntes.

Page 24: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

24

PARTE I

CONTRIBUIÇÕES DO IPCC/AR5

Capítulo 1 – Sistematização do conhecimento científico sobre mudanças climáticas e

sugestões para a descarbonização: contribuições do IPCC/AR5

Page 25: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

25

Capítulo 1 – Sistematização do conhecimento científico sobre mudanças climáticas e

sugestões para a descarbonização: contribuições do IPCC/AR5

Este capítulo representa uma contextualização sobre os avanços da compreensão

científica sobre causas e efeitos das mudanças climáticas a partir dos documentos do 5º

Relatório de Avaliação do IPCC, o chamado AR5 (sigla em inglês para o 5th Assessment

Report) e de suas propostas mais gerais de transformações necessárias nas dimensões setoriais

e intersetoriais a fim de superar as formas de produção e consumo de alta intensidade de

emissões de gases de efeito estufa (GEE).

Trata-se não apenas do reconhecimento de um panorama sobre a sistematização

atualizada do conhecimento científico aportado pelo IPCC sobre o problema das mudanças

climáticas, mas também sobre suas contribuições para entender os desafios que se colocam à

redução das emissões de GEE em termos de transformações futuras, tanto em uma abordagem

setorial quanto intersetorial. Como será visto, o documento apresenta muitos desses desafios

como relacionados às possibilidades de transição para uma economia de baixas emissões de

gás carbônico em particular, quanto de gases de efeito estufa em geral. Também se observam

recomendações de mudanças comportamentais e de estilos de vida, o que implica repensar as

possibilidades de desenvolvimento socioeconômico de modo a não comprometer a capacidade

das gerações futuras em satisfazer suas necessidades, ou seja, num sentido de um

desenvolvimento socioeconômico mais sustentável.

O capítulo está organizado em três seções. Na primeira seção será apresentado

um breve histórico dos estudos ambientais para revelar o panorama que se deu a criação do

IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), com é seu funcionamento e como se dá

a sua estrutura, elementos fundamentais para se entender os estudos das mudanças climáticas

de forma científica que possibilitaram que os países fizessem seus estudos de acordo com as

suas especificidades. Na segunda seção são apresentados as causas e efeitos das mudanças

climáticas de acordo com o AR5 que aponta quais as consequências antrópicas para o clima,

sobretudo para a emissão dos gases de efeito estufa. A terceira seção expõe em grandes linhas,

as principais medidas propostas no âmbito do AR5 a fim de promover a redução das

emissões, de acordo com o IPCC a fim de buscar uma consistência com a meta de aquecer

"apenas" 2ºC. O AR5 aponta para trajetórias intersetoriais e setoriais, que foram feitas através

dos cenários de referência (baseline), indicando como cada país pode mitigar as emissões de

GEE em medidas gerais, no âmbito do fornecimento de energia, como também para o setor de

transportes, edificações, indústria, agricultura, floresta e outros usos da terra (AFOLU) e

Page 26: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

26

assentamentos humanos, infraestrutura e planejamento do território. Por fim, as observações

finais do capítulo representam uma síntese do que foi discutido ao longo deste primeiro

capítulo, apresentando as suas principais conclusões.

1.1. Sobre o IPCC, sua estrutura e funcionamento

Os primeiros estudos ambientais modernos iniciaram-se após a Segunda Guerra

Mundial, como resposta aos temores que a radiação poderia produzir. A publicação do livro

"A Primavera Silenciosa" em 19633 de Rachel Carson, trouxe o debate do uso de pesticidas

sintéticos na agricultura. Em seu livro a autora explica os danos para a saúde humana do uso

desenfreado de produtos químicos.

Em 1972 ocorreu em Estocolmo, na Suécia, a Conferência das Nações Unidas

sobre o Ambiente Humano, para que houvesse um acordo internacional para redução da

emissão dos gases responsáveis pelas chuvas ácidas e também mitigar problemas como ilhas

de calor e inversão térmica e o secamento de rios e lagos. Este evento foi importante, pois

estabeleceu a base a agenda ambiental visando defender e melhorar o meio ambiente presente

para as gerações atuais e futuras.

Um dos resultados da Conferência de Estocolmo foi a criação, neste mesmo ano,

do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), para a coordenação de

todos os trabalhos da ONU relacionados ao meio ambiente.

Neste contexto, em 1988 foi criado pelo PNUMA e pela Organização

Meteorológica Mundial (OMM), o Painel Internacional de Mudanças Climáticas, o IPCC

(Intergovernmental Panel on Climate Change), cujo objetivo é estudar as causas e impactos

das mudanças climáticas no mundo, avaliando os resultados científicos realizados pela sua

equipe apresentando estratégias para a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. O

IPCC é vinculado à Convenção do Clima da ONU (UNFCCC – United Nations Framework

Convention on Climate Change) e sua sede fica em Genebra, na Suíça (FÓRUM

BRASILEIRO DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS, 2008).

Entre 2013 e 2014, o IPCC divulgou os relatórios de avaliação mais recentes

sobre as mudanças do clima (AR5 na sigla em inglês para 5th Assessment Report). São quatro

documentos principais, correspondentes aos documentos finais de cada um dos três grupos de

3 No Brasil, a primeira edição do livro Primavera Silenciosa ocorreu em 1964.

Page 27: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

27

trabalho (Working Groups) que compõem esse relatório de avaliação e o relatório completo

final:

Climate Change 2013: the physical science basis, produzido pelo Working Group I –

WG1 4

Climate Change 2014: impacts, adaptation and vulnerability, produzido pelo Working

Group II – WG25

Climate Change 2014: mitigation of climate change, produzido pelo Working Group

III – WG36

Climate Change 2014: synthesis report7

Os temas e tópicos avaliados no âmbito dos três WGs são apresentados nos três

parágrafos abaixo.8

O WG1, que conta com aportes sobretudo das ciências naturais, avalia os aspectos

físicos do sistema climático e suas alterações. Os principais tópicos avaliados incluem:

mudanças nos GEE e aerossóis na atmosfera; as mudanças observadas nas temperaturas do ar,

da terra e dos oceanos; níveis de chuva, mudanças em glaciares e mantos de gelo, níveis dos

oceanos e mares; perspectivas históricas e paleoclimáticas sobre mudanças climáticas;

bioquímica, ciclo do carbono, gases e aerossóis; dados de satélites e outros; modelos

climáticos; projeções climáticas; causas e atribuições de alterações do clima.

Por sua vez, o WG2 avalia a vulnerabilidade dos sistemas socioeconômicos e

naturais às mudanças climáticas, consequências positivas e negativas das mudanças climáticas

e as opções para adaptação a elas. Também leva em consideração as inter-relações entre

vulnerabilidade, adaptação e desenvolvimento sustentável. A informação avaliada é

considerada por setor (recursos hídricos; ecossistemas; alimentos e florestas; sistemas

costeiros; indústria e saúde humana) e por região (África; Ásia; Austrália e Nova Zelândia;

Europa; América Latina; América do Norte; Regiões Polares e Pequenas Ilhas).

4 O documento e outros detalhes sobre o trabalho do WG1 podem ser acessados no link:

http://www.climatechange2013.org/

5 Os materiais referentes aos trabalhos desse grupo podem ser acessados no link:

http://www.ipcc.ch/report/ar5/wg2/

6 Os documentos que reportam as contribuições desse grupo são acessados no link:

http://www.ipcc.ch/report/ar5/wg3/

7 https://www.ipcc.ch/report/ar5/syr/

8 As informações sobre temas e tópicos cobertos pelos especialistas dos três WGs foram levantadas a partir do

seguinte endereço: https://www.ipcc.ch/working_groups/working_groups.shtml

Page 28: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

28

Finalmente, o WG3 avalia as opções para mitigação das mudanças climáticas por

meio da limitação ou prevenção das emissões de GEE e pelo estímulo às atividades que os

removem da atmosfera. Os principais setores econômicos são levados em conta, tanto em

curto quanto em longo prazo. Os setores incluem energia, transporte, construção, indústria,

agricultura, atividades florestais e gestão de resíduos. Esse grupo analisa os custos e

benefícios das diferentes abordagens para a mitigação, considerando também os instrumentos

disponíveis e as medidas de política. A abordagem é mais voltada a soluções.

Cada Working Group reúne algumas centenas de autores, provenientes de muitos

países e áreas disciplinares específicas com contribuições relevantes para o entendimento dos

temas e tópicos mencionados anteriormente. Nesta última edição do AR, o WG1 contou com

259 autores, provenientes de 39 países; o WG2 com 308 autores, de 70 países; e o WG3 com

mais de 800 autores, de 37 países.

Esta formação reflete a própria organização do IPCC, cujas tarefas são realizadas

a partir dos três grupos de trabalho acima mencionados, além de uma Força-Tarefa (Task

Force) e de um Grupo de Tarefa (Task Group).

As atividades de cada Working Group e da Força-Tarefa são coordenadas e

administradas por uma Unidade de Apoio Técnico (Technical Support Unit - TSU), sendo

uma TSU para cada WG. As TSUs prestam apoio científico, técnico e organizacional aos

grupos de trabalho. Cada uma delas pode ser formada para fornecer apoio na preparação de

um relatório síntese (Synthesis Report) ou para qualquer outra Força-Tarefa constituída pelo

Painel.

De acordo com o IPPC, as TSUs:

Oferecem apoio para os co-presidentes e para os departamentos dos respectivos Working

Groups ou forças-tarefa ou ao presidente do IPCC, no que tange à preparação de

Relatórios Síntese, à elaboração de todos os produtos relevantes do IPCC, de acordo com

os princípios que regem o trabalho do IPCC.

Contribuem para a implementação do Protocolo IPCC voltado a questões como: lidar com

erros; estratégia de comunicação do IPCC; e a política de conflito de interesses, de acordo

com as responsabilidades contidas nesses documentos.

Participam, por meio dos seus dirigentes, do Comitê Executivo do IPCC, como membros

consultivos.

Page 29: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

29

Realizam quaisquer outras tarefas previstas pelos co-presidentes ou departamentos dos

Working Groups ou forças-tarefa ou pelo presidente do IPCC, a fim de auxiliá-los no

cumprimento das suas funções.

A TSU para o WG1 possui sede na França; a do WG2, na Alemanha; e a WG3, no

Reino Unido e Índia. A TSU da Força-Tarefa para inventários nacionais de gases de efeitos

estufa tem sede no Japão.9

Tendo compreendido a estrutura organizacional do IPCC, bem como das

atribuições de seus componentes para a elaboração do AR5, cabe observar os resultados

veiculados no âmbito deste relatório.

1.2. Causas e efeitos das mudanças climáticas, segundo o AR5

Os resultados divulgados pelo AR5 dizem respeito às contribuições levantadas e

sintetizadas pelos três WG.

No que diz respeito à avaliação elaborada no âmbito do Working Group I do

IPCC, é possível reconhecer o aporte de evidências e argumentos para as teses de que: i) as

mudanças verificadas no clima do planeta são reais; e ii) que elas são causadas em especial

pelo aumento das emissões de gases do efeito estufa.

As observações e os indicadores produzidos por trabalhos científicos sintetizados

pelo WGI para o AR5 evidenciam um sistema climático global em mudança. A Figura 1.1, na

página a seguir, mostra as concentrações de três importantes gases de efeito estufa - gás

carbônico (CO2, em verde), metano (CH4, em laranja) e óxido nitroso (N2O, em vermelho),

determinados a partir de ice core data (pontilhados) e de medidas atmosféricas diretas (linhas

cheias). As concentrações desses gases são estoques dessas substâncias na atmosfera e é

possível visualizar com clareza que as concentrações globais crescem de forma importante a

partir de 1850 e de forma muito acelerada a partir da década de 1950.10

9 Informações do IPCC. Cf. https://www.ipcc.ch/organization/organization_secretariat.shtml#2

10 A aceleração da liberação de gases de efeito estufa a partir de 1945 constitui o que Steffen, Crutzen & McNeill

(2007) chama de “grande aceleração”, que é um fenômeno caracterizado pelos autores como processos inter-

relacionados de mudanças dramáticas nos sistemas antrópicos e nos sistemas naturais. A “grande aceleração”

corresponderia a um segundo estágio do chamado “Antropoceno”, que, por sua vez, constitui a proposta dos

autores para uma revisão da cronologia geológica. O Antropoceno seria uma nova “época” geológica, uma Age

of Man, ou a “Era Recente do Homem” (STEFFEN,CRUTZEN & MCNEILL, 2007).

Page 30: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

30

Figura 1.1 - Médias Globais de concentrações de gases de efeito estufa

Nota: as concentrações de CO2 estão apresentadas em verde, as de metano em laranja e as de

óxido nitroso em vermelho. As linhas pontilhadas se referem a dados mensurados (ice core

data) e as linhas cheias são referentes a medidas atmosféricas diretas.

Fonte: IPCC (2014a, p. 3)

Por sua vez, as emissões antropogênicas11

globais de gás carbônico podem ser

conhecidas segundo suas principais fontes, reunidas na Figura 1.2, a seguir, em dois grupos:

de um lado, combustíveis fósseis, cimento e flaring12

; de outro, a atividade florestal e outros

usos da terra. Essas emissões dessas fontes ao longo do período de 1850 e 1970 são mostradas

na Figura 1.2 (página a seguir), no gráfico da esquerda, enquanto que as emissões acumuladas

de gás carbônico a partir dessas fontes e suas incertezas associadas são mostradas no gráfico

de bars and whiskers, à direita.

11 O gás carbônico tem sido considerado o principal gás dentre os seis gases de efeito estufa, que incluem

também o CH4 (metano), o N2O (óxido nitroso), os HCFs (hidrofluorcarbonetos), o PFC (perfluorcarbono) e o

SF6 (hexofluoreto de enxofre), além do vapor d´agua. Todas as emissões são convertidas em termos de sua

equivalência ao potencial de aquecimento global com relação ao CO2, razão pela qual o nome desta unidade de

medida é CO2e (ou seja, CO2 equivalente). As emissões antropogênicas de GEE são resultantes de um amplo

conjunto de atividades humanas, notadamente associadas à oferta e ao consumo de energia e às mudanças no uso

da terra para produção de alimentos e outros fins (IPCC, 2014b, p. 64).

12 Flaring é o nome dado à queima de gases em refinarias, plantas da indústria química e em unidades de

processamento de gás. A principal razão para a queima do gás diz respeito a razões de segurança associadas ao

alívio da alta pressão envolvida nos processos e equipamentos nesta indústria. Na extração de petróleo onshore e

offshore, o gás natural que vem à superfície juntamente com o petróleo extraído é às vezes queimado por causa

da ausência de gasodutos. Cf. https://www3.epa.gov/ttncatc1/dir1/c_allchs.pdf

Page 31: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

31

Figura 1.2 - Emissões antropogênicas globais de gás carbônico

Fonte: IPCC (2014a, p. 3)

A Figura 1.3, a seguir, apresenta as emissões antropogênicas dos GEE no período

compreendido entre 1970 e 2010. Conforme atesta o AR5, as emissões deste período

correspondem à metade das emissões antropogênicas acumuladas entre 1750 e 2010, o que

oferece uma imagem excepcionalmente reveladora de como o crescimento das emissões

antropogênicas se aceleram de forma avassaladora no período mais recente (IPCC, 2014b). O

relatório também afirma que os crescimentos populacional e econômico continuam sendo os

maiores intensificadores das emissões de CO2. Pode-se perceber isto ao visualizar que as

emissões de CO2 por combustíveis fósseis e processos industriais estiveram em franca

expansão desde 1970, demonstrando a urgência de se alterar as formas de consumo e

desenvolvimento da sociedade contemporânea.

Page 32: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

32

Figura 1.3 - Emissões antropogênicas globais por grupo de GEE entre 1970 e 2010

Fonte: IPCC (2014a, p. 5)

Diante das evidências aportadas pelos estudos científicos, o AR5 conclui que:

“As emissões antropogênicas dos gases de efeito estufa têm crescido desde a era pré-industrial,

amplamente determinadas pelo crescimento econômico e populacional, que agora estão

maiores que nunca. Isso tem levado a concentrações atmosféricas de dióxido de carbono,

metano e óxido nitroso sem precedentes pelo menos nos últimos 800 mil anos. Seus efeitos,

associados a outros determinantes antropogênicos, têm sido detectados por todo o sistema

climático e é extremamente provável que tenham sido a causa dominante do aquecimento

observado desde meados do século XX” (IPCC, 2014a, p.4)13

Além de sintetizar os esforços envidados por cientistas bem posicionados em seus

campos disciplinares para os temas avaliados, conforme já mencionado, o IPCC também se

empenhou, conforme Van Vuuren et al (2011), no estímulo à concepção, elaboração e análise

de cenários para conhecer as perspectivas futuras sobre as emissões dos GEE, sob a

consideração de diversas hipóteses com respeito aos desenvolvimentos econômico e

13 Tradução livre do original: “Anthropogenic greenhouse gas emissions have increased since the pre-industrial

era, driven largely by economic and population growth, and are now higher than ever. This has led to

atmospheric concentrations of carbon dioxide, methane and nitrous oxide that are unprecedented in at least the

last 800,000 years. Their effects, together with those of other anthropogenic drivers, have been detected

throughout the climate system and are extremely likely to have been the dominant cause of the observed

warming since the mid-20th century” (IPCC, 2014a, p.4) .

Page 33: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

33

tecnológico, à evolução das relações internacionais, com interesse particular aos

desdobramentos em termos de investimento, produção e consumo de energias não renováveis

e renováveis.

Ainda no âmbito do WG1, dentre outras elaborações, foram simulados quatro

diferentes cenários que incluem séries temporais do conjunto de emissões e concentrações de

gases de efeito estufa, aerossóis e gases quimicamente ativos, como também o uso da terra.

Essas simulações correspondem aos chamados Caminhos Representativos de Concentração de

GEE (RCPs na sigla para a expressão em inglês Representative Concentration Pathways).

Os RCPs são:

“cenários que incluem séries temporais de emissões e concentrações para o conjunto total dos

GEE e aerossóis e gases quimicamente ativos, bem como o uso da terra/cobertura da terra [...].

O termo “representativo” significa que cada RCP oferece apenas uma de muitas possibilidades

de cenários que levariam a uma característica forçante radiativa específica. O termo

“caminhos” (pathways) enfatiza que não apenas os níveis de concentração de longo prazo são

de interesse, mas também a trajetória tomada ao longo do tempo para alcançar aquele

resultado” (IPCC, 2014b, p. 1270).14

A forçante radiativa corresponde a:

“Diferença entre os fluxos radiativos (mensurado em W/m2) líquidos descendentes e

ascendentes nos níveis da tropopausa ou topo da atmosfera, devido a mudanças na fonte

externa de mudança climática, como por exemplo a mudança na concentração de CO2 ou na

incidência de radiação solar. Para os propósitos do WG3, a forçante radiativa é ainda definida

como a mudança relativa ao ano de 1750 e se refere a um valor médio global e anual. ” (IPCC,

2014b, p. 1269)15

Ou, ainda:

"razão entre a quantidade de energia solar que entra e que sai do nosso planeta, indicando o

quanto ficou armazenada no sistema terrestre de acordo com as concentrações de gases de

efeito estufa, partículas de aerossóis emitidas e outros agentes climáticos." (TOLEDO, 2013)

Os Caminhos Representativos de Concentração de GEE são em número de quatro,

cada um deles denominado a partir da sigla RCP seguida da forçante radiativa

14 Tradução livre do verbete Representative Concentration Pathways (RCPs), conforme consta do glossário do

relatório completo do WG3 (IPCC, 2014b, p.1270): “Scenarios that include time series of emissions and

concentrations of the full suite of greenhouse gases (GHGs) and aerosols and chemically active gases, as well as

land use / land cover (Moss et al., 2008). The word representative signifies that each RCP provides only one of

many possible scenarios that would lead to the specific radiative forcing characteristics. The term pathway

emphasizes that not only the long-term concentration levels are of interest, but also the trajectory taken over time

to reach that outcome (Moss et al, 2010)”.

15 Tradução livre do verbete Radiative forcing, a partir do glossário do relatório completo do WG3: “Radiative

Forcing is the change in the net, downward minus upward, radiative flux (expressed in W m – 2) at the

tropopause or top of atmosphere due to a change in an external driver of climate change, such as, for example, a

change in the concentration of carbon dioxide (CO2) or the output of the sun. For the purposes of this report,

radiative forcing is further defined as the change relative to the year 1750 and refers to a global and annual

average value.” (IPCC, 2014b, p.1269).

Page 34: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

34

correspondente. Os quatro RCPs, suas características, em termos das forçantes radiativas a

eles associadas e das concentrações de GEE) e suas consequências mais gerais (em termos do

aquecimento médio esperado e da variação dos níveis do oceano) são sintetizados no Quadro

1.1, abaixo.

Quadro 1.1 - Caminhos Representativos de Concentração no horizonte 2100

(Representative Concentration Pathways - RCPs)

Cenário Características Consequências

RCP

2,6

Pico na forçante radiativa em ~ 3 W /

(~ 490 ppm CO2 eq) antes de 2100 e

depois declínio para 2,6 W/m²

O aumento da temperatura terrestre poderia variar entre

0,3°C e 1,7°C de 2010 até 2100 e o nível do mar

poderia subir entre 26 e 55 centímetros ao longo do

século XXI

RCP

4,5

Estabilização em 4,5 W/m² (~ 650

ppm CO2 eq) após 2100

O aumento da temperatura terrestre seria entre 1,1°C e

2,6°C e o nível do mar subiria entre 32 e 63

centímetros

RCP

6,0

Estabilização em 6 W/m² (~ 850 ppm

CO2 eq) após 2100

O aumento da temperatura varia de 1,4°C até 3,1°C e o

nível do mar subiria entre 33 e 63 centímetros

RCP

8,5

Caminho crescente da forçante

radioativa levando a 8,5 W/m² (~

1370 ppm CO2 eq) em 2100

A superfície da Terra poderia aquecer entre 2,6°C e

4,8 C ao longo deste século, fazendo com que o nível

dos oceanos aumente entre 45 e 82 centímetros

Fonte: Elaboração própria a partir de Moss et al, 2008; Toledo, 2013; e IPCC, 2013.

No caso do cenário mais otimista, RCP 2,6, a previsão é de que o sistema terrestre

alcance um pico da forçante radiativa de cerca de 3 W/m2 antes de 2100, para declinar para

2,6 W/m2 a seguir, resultando em um acréscimo de temperatura entre 0,3°C e 1,7°C entre

2010 e 2100, ocasionando um aumento do nível do mar entre 26 e 55 centímetros ao longo do

século XXI. No cenário mais pessimista, RCP 8,5, o que se prevê é que o sistema terrestre

alcance uma forçante radiativa de 8,5 W/m², resultando em um acréscimo de temperatura

entre 2,6°C e 4,8°C no período de 2010 até 2100, com o aumento do nível do mar entre 45 e

82 centímetros ao longo do século XXI.

Desta forma, a partir desses estudos de cenários, é possível relacionar, por

exemplo, os aumentos das concentrações de GEE em geral e de CO2, em particular, com as

mudanças de temperatura esperadas, conforme se observa na Figura 1.4, mais abaixo.

Um aspecto que chama a atenção na observação da Figura 1.4, que coloca a

variação da temperatura média da superfície do planeta como uma função das emissões

acumuladas globais totais de dióxido de carbono (CO2) e das emissões antrópicas, é sua

perspectiva histórica. Como já mencionado, os modelos empregados pelo IPCC geram

resultados para cada Caminho Representativo de Concentração até o ano de 2100, que são

Page 35: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

35

representados na figura pelas linhas coloridas. Os resultados históricos, colhidos de evidências

para o período de 1860 a 2010, estão indicados pela linha preta. A pluma colorida ilustra os

resultados gerados pelos modelos do IPCC para os quatro RPCs. Destaque-se que a pluma

esvanece conforme se reduz o número de modelos disponíveis no RCP 8.5. Os pontos

representam as médias decenais, tendo sido etiquetadas algumas décadas selecionadas. As

elipses destacam o aquecimento antropogênico total em 2100 versus as emissões acumuladas

de CO2 entre 1870 e 2100. A elipse negra cheia representa as emissões observadas para 2005

e as temperaturas observadas na década 2000-2009.

Figura 1.4 – Emissões antropogênicas acumuladas totais de CO2 a partir de 1870 (GtCO2)

Notas: As linhas coloridas e a pluma laranja estão associadas a representações das relações entre as mudanças de

temperatura e as emissões antropogências de gases de efeito estufa (não apenas as relacionadas ao CO2). A linha negra indica os resultados históricos colhidos de evidências para o período de 1960 a 2010; alguns anos específicos são

destacados na figura. A elipse negra cheia representa as emissões observadas para 2005 e as temperaturas observadas na década de 2000. A linha azul escuro indica o caminho representativo de concentração RCP 2.6; a linha azul claro indica o

RCP 4.5. A linha laranja representa o RCP 6.0 e, finalmente, a linha vermelha representa o RCP 8.5. A pluma alaranjada

representa os níveis de incerteza associados pelos modelos do IPCC para os quatro RPCs, indicando mudanças de temperaturas associadas níveis de emissões antropogênicas de forma que a pluma se torna mais tênue na medida em que

diminui o número de modelos disponíveis para os cálculos no RCP 8.5. A linha e a pluma cinza estão associadas a

representações das relações entre as mudanças de temperatura e as emissões acumuladas de CO2, numa taxa de 1% aa. Como se observa, o aquecimento associado ao avanço dessas emissões é menor do que aquele observado quando se

tomam em conta o total das emissões antropogênicas.

Fonte: elaboração própria a partir de IPCC (2014a, p. 63)

Ou seja, a partir destas simulações de cenários, foi possível estabelecer relações

entre as emissões antropogênicas (geral, para todos os GEEs, e específicas, ou seja, apenas

para as emissões de CO2) e as mudanças esperadas de temperaturas. O aquecimento associado

Page 36: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

36

ao avanço das emissões totais é maior do que aquele observado quando se tomam em conta o

apenas as emissões de CO2.

Outro conjunto de esforços ainda empreendidos pelo IPCC cujos resultados são

veiculados pelo AR5 diz respeito aos impactos dessas mudanças de temperatura esperadas

como resultado da acumulação ou do aumento das concentrações de GEEs em geral e de CO2,

em particular. Os riscos previstos envolvem impactos severos, ubíquos e irreversíveis para as

pessoas, espécies e ecossistemas:

“A mudança climática irá amplificar os riscos existentes e criar novos riscos para os sistemas

naturais e humanos. Os riscos serão distribuídos de forma desigual e geralmente são maiores

para pessoas e comunidades desfavorecidas em países de todos os níveis de desenvolvimento.

Crescentes magnitudes de aquecimento aumentam a probabilidade de impactos graves,

generalizados e irreversíveis para as pessoas, espécies e ecossistemas.” (IPCC, 2014a, p. 64).

“A continuidade das altas emissões pode levar principalmente a impactos negativos para a

biodiversidade, os serviços dos ecossistemas e o desenvolvimento econômico e a amplificação

dos riscos para os meios de subsistência e para a segurança alimentar e humana.”16

(IPCC,

2014a, p. 64).

Com alto grau de confiança, o AR5 prevê riscos que se espalham por setores e por

regiões, incluindo quatro categorias principais. Em primeiro lugar, o risco de disrupção dos

meios de vida e da irrupção de problemas de saúde severos resultantes de tempestades,

aumento do nível do mar e inundações costeiras, enchentes em áreas urbanas e períodos de

calor extremo. Em segundo lugar, riscos sistêmicos devido a eventos de extremos climáticos

levando ao colapso de redes de infraestrutura e de serviços críticos. Em terceiro lugar, o risco

de insegurança alimentar e hídrica e perda de meios de vida e renda rurais, em particular para

as populações mais pobres. Finalmente, em quarto lugar, risco de perda de ecossistemas,

biodiversidade e bens, funções e serviços ecossistêmicos (IPCC, 2014a, p. 65).

O relatório AR5 detalha todos esses riscos, advertindo que, a fim de que o

aumento de temperatura global tenha chances de ficar limitado a 2o

C – uma espécie de

patamar crítico a partir do qual as mudanças climáticas alcançariam níveis muito dramáticos e

perigosos por sua magnitude, implicações e irreversibilidade – seria imperativo que as

emissões globais acumuladas estivessem limitadas a 1.000 Gt CO2e entre 2012 e 2100. Essa

limitação de emissões globais constitui o chamado Orçamento Global de Carbono (em inglês,

16 Tradução livre do original: “Climate change will amplify existing risks and create new risks for natural and

human systems. Risks are unevenly distributed and are generally greater for disadvantaged people and

communities in countries at all levels of development. Increasing magnitudes of warming increase the likelihood

of severe, pervasive and irreversible impacts for people, species and ecosystems. Continued high emissions

would lead to mostly negative impacts for biodiversity, ecosystem services and economic development and

amplify risks for livelihoods and for food and human security” (IPCC, 2014a, p. 64).

Page 37: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

37

Global Carbon Budget) que, portanto, diz respeito ao total de GEE que os países podem

emitir globalmente sem elevar a temperatura para além dos 2oC.

17 De acordo com as

estimativas do AR5, esse orçamento pode se esgotar em uma geração, ou seja, nos próximos

30 anos.

Para se ter uma ideia, dados mais recentes, indicam que em 2012, as emissões

globais alcançaram 44.815,54 Mt CO₂ e (ou seja, cerca de 44,8 Gt CO2e, o que equivale a

aproximadamente 4,5% do Orçamento Global de Carbono).

A contribuição dos diferentes setores econômicos para os níveis globais de

emissão constitui um dos focos da atenção do Working Group III – o WG3.

A Figura 1.5, apresenta os setores econômicos segundo suas contribuições para as

emissões globais de GEE, computadas para o ano de 2010, agrupados segundo sua

contribuição para essas emissões de forma direta ou indireta.

Figura 1.5 - Emissões Globais de Gases de Efeito Estufa,

diretas e indiretas, por Setores Econômicos

Nota: AFOLU é sigla usada para indicar Agricultura, Florestas e Outros Usos da Terra (Agriculture,

Forestry and Other Land Uses).

17 De acordo com depoimento de Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima, citado em

Verdélio (2015): "Dois graus é o limite considerado seguro, que ainda permite gerenciar os impactos sem

consequências muito graves [...]. Com 2ºC, teríamos consequências severas não só para a biodiversidade mas

para a população que depende de um ambiente natural bem conservado para sua subsistência, seja pela questão

da água, seja pela questão dos alimentos obtidos da natureza. [...]. Estamos falando de risco crescente para vida,

para qualidade de vida, para a economia e para o ambiente como um todo. ” Disponível em:

http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2015-11/proposta-do-brasil-para-cop21-pode-ser-melhor-

diz-observatorio-do

Page 38: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

38

Fonte: traduzido de IPCC (2014b, p. 9).

Os dados apresentados na figura indicam as emissões antropogênicas globais

totais de GEE (Gt CO2e/ano) por setor econômico. O disco interno representa as percentagens

das emissões de GEE diretas (como % das emissões antropogênicas totais de GEE) dos cinco

setores em 2010, enquanto o setor destacado evidencia os percentuais de emissões indiretas de

CO2 (também como % das emissões antropogênicas totais de GEE). Observe-se que as

emissões indiretas estão relacionadas a aquisição de eletricidade e calor na forma de uso final

de energia. Em outras palavras, o setor destacado mostra a contribuição dos setores usuários

de eletricidade e de geração de calor, que são responsáveis por 25% das emissões diretas.18

Portanto, os setores que contribuíram de forma direta para a emissão de GEE no

ano de 2010 no panorama global foram: geração de eletricidade e calor (25%); agricultura,

floresta e uso da terra (24%); indústria (21%); transporte (14%); outra energia (9,6%); e

construção (6,4%). Portanto, as emissões diretas associadas a energia (geração de eletricidade

e calor e “outra energia”) respondem por 34,6% das emissões totais.

Indiretamente, os setores usuários de energia e de aquecimento que mais

contribuíram naquele ano para as emissões globais de GEE foram: construção (12%);

indústria (11%); energia (1,4%); agricultura, floresta e uso da terra (0,87%); e transporte

(0,3%).

Em se considerando esse perfil setorial de emissões e as projeções do IPCC a

partir dos cenários mencionados anteriormente, o AR5 ressalta que a continuidade das formas

de produção e consumo prevalentes em nossos dias (associados ao que se convencionou

chamar de “BAU - Business As Usual”) não é uma alternativa. É imperativo transformar

radicalmente os setores econômicos que emitem os GEE:

“Sem um esforço adicional para se reduzir as emissões de GEE para além daqueles em vigor

hoje, o crescimento das emissões persistirá, impulsionado pelo crescimento das atividades

econômicas e populacional apesar das melhorias em tecnologias de fornecimento de energia e

de uso final” (IPCC,2014b, p. 49)19

.

18 “Outra energia” faz referência a todas as fontes de emissão de GEE no setor de energia, conforme definido

pelo IPCC (2014b), exceto eletricidade e produção de calor. Os dados de emissão do subsetor Agricultura,

Floresta e Outros Usos da Terra (AFOLU, na sigla para o termo em inglês Agriculture, Forestry and Other Land

Use). As emissões são convertidas em CO2e com base na metodologia do IPCC.

19 Tradução livre do original: “Without additional efforts to reduce GHG emissions beyond those in place today,

emissions growth is expected to persist, driven by growth in global population and economic activities despite

improvements in energy supply and end-use technologies” (IPCC, 2014b, p. 49)

Page 39: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

39

“Estima-se que o atraso nas medidas de mitigação para além de 2030 aumentará

substancialmente a dificuldade da transição para baixos níveis de emissões GEE a longo prazo

e restringirá a gama de opções coerente com a manutenção da variação de temperatura abaixo

dos 2ºC aos níveis pré-industriais ” (IPCC, 2014b, p. 12)20

.

Essas passagens ilustram o forte sentimento de urgência que dá a tônica ao AR5.

A noção de urgência para as transformações de caráter profundo na economia já se encontrava

no relatório anterior do IPCC, o AR4. O economista inglês, Sir Nicholas Stern, em 2006,

buscou estimar os custos, à época, das medidas de mitigação necessárias para enfrentar o

aquecimento global, publicadas no documento que ficou conhecido como Stern Review

(2009).

Stern (2009, p. xv) afirma que:

“Utilizando resultados de modelos econômicos formais, o Estudo estima que se não houver

ação, o total dos custos e o risco das mudanças climáticas será equivalente a uma perda de no

mínimo 5% do PIB mundial por ano, agora e para sempre. Se levarmos em consideração uma

gama mais vasta de riscos e impactos, as estimativas dos danos causados poderão aumentar

para 20% do PIB ou mais” 21

Já o AR5 afirma que em um cenário onde a economia mundial crescesse a uma

taxa entre 1,3 e 3% ao ano, o custo das medidas de mitigações representariam 0,06% do PIB

mundial anual. Porém este valor pode ser considerado irrisório ao se refletir sobre os

benefícios que a limitação do aquecimento global a 2ºC pode trazer. Benefícios que

abrangem, entre muitos outros, aspectos ambientais e as perdas evitadas em áreas como

saúde, desenvolvimento social, infraestrutura, segurança energética e também em termos de

vidas que poderiam ser poupadas.

1.3. Transformações necessárias e urgentes: intersetoriais e setoriais 22

O relatório AR5 apresenta medidas e trajetórias intersetoriais e setoriais para

mitigação das emissões de GEE e, sobretudo, para diminuir os impactos das mudanças

climáticas ao longo do século XXI.

20 Tradução livre do original: “Delaying mitigation efforts beyond those in place today through 2030 is

estimated to substantially increase the difficulty of the transition to low longer-term emissions levels and narrow

the range of options consistent with maintaining temperature change below 2 °C relative to pre-industrial

levels” (IPCC,2014b, p. 12)

21 Tradução livre do original: Using the results from formal economic models, the Review estimates that if we

don’t act, the overall costs and risks of climate change will be equivalent to losing at least 5% of global GDP

each year, now and forever. If a wider range of risks and impacts is taken into account, the estimates of damage

could rise to 20% of GDP or more.” STERN (2009, p. xv)

22 Esta seção do presente capítulo corresponde a uma compilação traduzida livremente, parafraseada e

comentada do item SPM 4.2 Sectoral and Cross-Sectoral Mitigation Pathways and Measures, do IPCC (2014b,

p. 17-26).

Page 40: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

40

A proposta de que as transformações apontadas são necessárias e urgentes se

fundamenta em um extenso conjunto de modelagem, simulações e construção de cenários,

que incluem três grandes conjuntos: cenários de referência (baseline), cenários de mitigação

sem captura e armazenamento de CO2 (daqui em diante CCS na sigla em inglês para Carbon

Capture and Storage) e cenários de mitigação com CCS. Os parágrafos a seguir apresentam

muito brevemente cada um deles.

De acordo com o IPCC (2014b), cenário de referência (baseline) é um estado

contra o qual a mudança é medida. Um período de referência é o período relativo ao qual as

anomalias são computadas. No contexto dos caminhos de transformação (os transformation

pathways, referidos anteriormente), o termo cenários de referência diz respeito àqueles

baseados no pressuposto de que não serão implementadas medidas ou políticas de mitigação

para além das que já estão em vigor e/ou estão legisladas ou planejadas para serem adotadas.

Desta forma, esses cenários não se destinam a conformar previsões sobre o futuro, mas a

representar construções contrafactuais que podem servir para destacar os níveis de emissões

que poderiam ocorrer sem mais esforços termos de políticas.

Por seu turno, os cenários de mitigação constituem uma descrição plausível do

futuro, com o relato de como o sistema estudado responde à implementação das políticas e

medidas de mitigação.

Finalmente, os cenários de mitigação com Captura e Armazenamento de CO2

(CCS na sigla em inglês para Carbon Capture and Storage) correspondem àqueles que

destacam o papel tecnologia CCS para reduzir as emissões de GEE, tornando possíveis as

comparações tanto com os cenários de referência, quanto com os de mitigação sem CCS. A

tecnologia CCS corresponde a processos nos quais uma corrente relativamente pura de CO2

de fonte industriais e energética é separada (capturada), condicionada, comprimida e

transportada para um local de armazenamento, de modo a isolar esse gás da atmosfera.

Foge ao escopo desta dissertação descrever métodos e detalhar os conteúdos

desses cenários. O relevante, para os objetivos propostos nos limites deste trabalho, diz

respeito aos resultados dos estudos sobre cenários de mitigação pois apontam para a

identificação de dois conjuntos de transformações, necessárias e urgentes, a fim de

transformar a economia – em termos globais – em direções de uma menor volume e

intensidade de emissões de gases de efeito estufa.

Page 41: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

41

Assim, o exame dos resultados desses cenários no âmbito do IPCC (2014b)

permitiu identificar dois conjuntos de transformações propostas para que os países em geral

possam avançar em direções de baixas emissões e baixas intensidades de gases de efeito

estufa. O primeiro deles se refere à dimensão intersetorial, incluindo aspectos gerais e a oferta

de energia. O segundo conjunto de transformações está relacionado a modificações no nível

dos setores, segundo o uso final de energia, compreendendo: transportes, edificações23,

indústria, agricultura, florestas e outros usos de terra (AFOLU) e assentamentos humanos,

infraestrutura e planejamento do território. São transformações que dizem respeito tanto à

estrutura produtiva quanto à busca por eficiência.

1.3.1. Vias de mitigação intersetoriais e suas medições

As propostas do IPCC/AR5 sobre as vias de mitigação intersetoriais são

relevantes para que se compreendam as medidas possíveis e plausíveis para se limitar as

emissões de GEE, por meio de políticas integradas e sustentáveis.

Nesta subseção, essas vias são apresentadas em dois conjuntos. No primeiro

conjunto, chamado de vias de mitigação intersetorais gerais, estão compreendidas

transformações propostas pelo documento num patamar mais genérico e transversal. O

segundo conjunto, por sua vez, chamado de mudanças intersetoriais específicas ao

fornecimento de energia.

Vias de mitigação intersetoriais gerais

De acordo com o AR5, em cenários de referência (baseline), as emissões de GEE

são projetadas para crescer em todos os setores, exceto para as emissões líquidas de CO2 com

AFOLU.

O relatório indica que as emissões do setor de fornecimento de energia continuem

sendo a principal fonte global de emissões de GEE – como demonstrado na Figura 1.5.

Espera-se ainda que haverá um aumento significativo das emissões indiretas para o uso da

eletricidade em edificações e no setor industrial. Os cenários de referência projetam o

aumento das emissões de GEE, excetuado o CO2 da agricultura (non-CO2 GHG agricultural

23 Estão incluídos nesta categoria edificações residenciais, comerciais, públicas e do setor de serviços, sendo que

as emissões para construção estão computadas no setor industrial (Cf. IPCC, 2014b, p. 22).

Page 42: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

42

emissions), enquanto prevê que as emissões líquidas de CO2 provenientes de AFOLU

diminuam ao longo do tempo.24

A literatura sobre o aprisionamento (lock-in) nas tecnologias e sistemas

vinculados ao uso dos hidrocarbonetos considera que há forças sistemáticas, tanto de natureza

técnica quanto institucional, que dificultam a mudança das trajetórias e dos sistemas

existentes UNRUH (2000).

Na discussão sobre as transformações necessárias e urgentes nos sistemas técnicos

e produtivos intensivos em fontes fósseis, o AR5 considera que a infraestrutura e os produtos

que contribuiriam para a diminuição das emissões de GEE na sociedade são hoje de

substituição muito difícil ou de alto custo. A “armadilha” que tem aprisionado a sociedade

nesse padrão tecnológico intensivo em combustíveis e matérias-primas fósseis tem a ver com

aspectos que, segundo o AR5, incluem o tempo de vida da infraestrutura, a diferença de

emissões associadas às alternativas e a magnitude do custo de investimento. O aprisionamento

da civilização atual nesse padrão é ainda mais reforçado por elementos de modificação muito

difícil, como ressalta o relatório: a infraestrutura e o ordenamento espacial. Tudo isso reforça

a necessidade da adoção de medidas ambiciosas e urgentes de mitigação.

Essas transformações se dariam por meio de uma transição para um caminho de

baixas emissões, na qual materiais, produtos e infraestruturas de longa vida e de baixas

emissões de GEE em seus ciclos de vida seriam objetos de investimentos urgentes e

importantes (IPCC,2014b, p. 18).

Nos cenários de mitigação do WG3, há uma forte interdependência entre o ritmo

de introdução de medidas de mitigação no fornecimento de energia, o uso final de energia e os

desenvolvimentos no AFOLU. Os setores envolvidos na oferta de energia, em seu uso final e

os setores da Agricultura, Florestal e aqueles envolvidos nas mudanças no uso da terra são

considerados de forma integrada para se pensar na mitigação. A distribuição do esforço de

mitigação entre os setores do AFOLU deve ser influenciada, segundo o documento, pela

disponibilidade e desempenho da Bioenergia com Captura e Sequestro de Carbono (BECCS,

sigla para a expressão em inglês Bio-Energy with Carbon Capture and Storage) e pelo

reflorestamento em larga escala. O documento não explica como isso pode ser feito, mas

24 As emissões líquidas de CO2 provenientes do AFOLU dizem respeito às emissões menos as remoções de CO2

do setor AFOLU, que inclui as terras florestadas e, em algumas das avaliações consideradas pelo WG3, o

sequestro de CO2 por solos agrícolas.

Page 43: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

43

salienta que as iniciativas de mitigação envolvendo e integrando os vários setores do AFOLU

deverão ser mais efetivas para a redução de GEE do que medidas setoriais isoladas.

Coerentemente com essa perspectiva sistêmica, o IPCC (2014b) advoga que as

estratégias de mitigação sistêmicas e intersetoriais bem projetadas são as medidas mais

eficazes para a redução das emissões do que um foco eventual em tecnologias individuais

e/ou setoriais. Para o sistema de energia, as medidas mais eficazes incluiriam uma mudança

para vetores de energia de baixo carbono (incluindo eletricidade de baixo carbono) e reduções

da demanda de energia em setores de utilização final de energia, sem comprometer o

desenvolvimento.25

Os cenários de mitigação voltados ao alcance da meta de concentração de 450ppm

de CO2e em 2100 mostram a necessidade de alterações no setor de fornecimento de energia

em escala global. Buscando coerência com essa meta de concentração, nestes cenários, “as

emissões globais de CO2 causadas pela oferta de energia são projetadas para diminuir nas

próximas décadas e são caracterizadas por reduções de 90% ou mais com relação aos níveis

de 2010 entre as décadas de 2040 e 2070”, de acordo com o WG3. Daí em diante, “em muitos

destes cenários, as emissões deveriam cair para baixo de zero” [ou seja, deveria haver captura

e estocagem de CO2] a fim de serem consistentes com a meta de concentração acima referida

(IPCC,2014b, p. 18).26

Também de forma semelhante a análises veiculadas por analistas no domínio das

transições para uma economia de baixo carbono, como Stern (2009) - que endossa que ignorar

as mudanças climáticas poderá prejudicar mais cedo ou mais tarde o crescimento econômico e

que, por outro lado, enfrentá-las coloca a possibilidade de um novo modelo de

desenvolvimento - o AR5 destaca que, para que as concentrações atmosféricas de CO2eq

fiquem entre os patamares de 450 até 500 ppm até 2100, são imprescindíveis mudanças

25 Os vetores de energia (de baixo carbono) incluem eletricidade e calor, em estados líquidos, sólidos e gasosos.

Na cadeia de fornecimento de energia, eles ocupam uma posição intermediária, ficando entre o fornecimento de

fontes primárias e aplicações de uso final. Desta forma, um vetor de energia é portando um transmissor de

energia. Por razões de conveniência e economia, vetores de energia têm se mostrado uma mudança contínua de

sólidos para líquidos, e mais recentemente, de líquidos para sólidos, tendência que deverá continuar. De acordo

com o IPCC (2014b) cerca de um terço dos vetores de energia final atingem os consumidores em forma sólida,

como carvão e biomassa, que são a principal causa de muitos problemas de poluição atmosférica locais,

regionais e internas associados ao uso doméstico tradicional. Além disso, um terço é consumido na forma

líquida, consistindo principalmente de produtos derivados do petróleo usados no transporte e o um terço final é

consumido através de redes de distribuição, na forma de eletricidade e gás. A participação de todos os vetores de

energia na rede de energia pode aumentar cerca de metade de toda a energia consumida em 2100.

26 “...global CO2 emissions from the energy supply sector are projected to decline over the next decades and are

characterized by reductions of 90% or more below 2010 levels between 2040 e 2070” (IPCC, 2014b, p.18).

Page 44: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

44

intersetoriais (conforme apontadas na próxima subseção), comportamentais e melhorias muito

importantes em termos de eficiência energética (IPCC, 2014b, p. 20).

Neste sentido, o relatório sustenta que as reduções na demanda de energia

fornecem mais flexibilidade para que se reduza a intensidade de carbono no setor de

abastecimento de energia, favorecendo a proteção contra riscos do lado da oferta (segurança

energética e desabastecimento, por exemplo) e evitando o aprisionamento em estruturas

carbono-intensivas. O AR5 ainda salienta que medidas que reduzam a demanda de energia,

por mudanças comportamentais e pelo aumento da eficiência, constituem estratégias de

mitigação de baixo custo.

A discussão sobre as medidas mais gerais para a mitigação de GEE numa

dimensão mais transversal é finalizada no AR5 pela consideração de que:

“O estilo de vida, comportamento e a cultura de uma sociedade têm uma influência

considerável sobre o uso da energia e sobre as emissões associadas, com elevado potencial de

mitigação em alguns setores, em particular quando há um complemento tecnológico e

alterações estruturais. Deste modo, as emissões podem ser reduzidas por meio da mudança de

padrões de consumo, como por exemplo, escolha de produtos mais duradouros e mudança do

uso de energia em residências e redução do desperdício de alimentos. Podem facilitar também

mudanças comportamentais, incentivos monetários e não monetários e ações para levar

informação para a sociedade. ” (IPCC, 2014b, p. 20).

Mudanças intersetoriais específicas ao fornecimento de energia

O fornecimento de energia, por seu caráter ubíquo e por afetar transversalmente

todos os setores da economia, é apresentado como foco de uma transformação intersetorial.

As medidas contempladas na transformação do fornecimento de energia

compreenderiam, de acordo com o AR5:

A descarbonização da oferta energética;

A atualização de plantas geradoras (envolvendo inclusive a mudança entre

combustíveis fósseis); e

As tecnologias de captura e armazenamento de gás carbônico.

Os desenvolvimentos históricos do fornecimento de energia dão origem aos

cenários de referência avaliados no AR5. Especificamente, esses cenários evidenciam

tendências de emissões diretas de CO2 do setor de fornecimento de energia com base em

dados históricos. De acordo com esses cenários, essas emissões deverão quase dobrar ou até

triplicar até 2050 em comparação aos níveis de 14,4 Gt CO2/ano computados em 2010.

Page 45: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

45

Observa-se que, na última década, as principais contribuições para o aumento das emissões se

deveram à crescente demanda energética e ao aumento da cota de carvão no mix de

combustíveis no panorama global. As implicações dessas tendências em termos de

aquecimento global e demais efeitos climáticos são da maior severidade.

Para reverter este quadro, o AR5 afirma que a descarbonização, ou seja, a redução

das emissões e da intensidade de carbono na geração de energia elétrica é a chave para uma

estratégia de mitigação de baixo custo para atingir a estabilização de 430 até 530 ppm de CO2.

O AR5 reporta, a partir das simulações rodadas para a caracterização dos cenários de

mitigação, que a descarbonização ocorreria mais rapidamente no âmbito da geração de

energia elétrica do que nos âmbitos da indústria, das edificações e dos transportes.

Neste sentido, dois caminhos se destacariam: o das energias renováveis e o da

energia nuclear.

No que respeita as energias renováveis, considera-se que estas constituiriam um

caminho evidente: o AR4 já demonstrara, em 2007, que o uso de tecnologias de energias

renováveis apresentava melhorias de desempenho e redução de custos. De acordo com o AR5,

as energias renováveis representaram em 2012, no panorama global, pouco mais da metade da

nova capacidade de geração de energia elétrica, sendo que as energias eólica, solar e hídrica

tiveram crescimento significativo. Por outro lado, o relatório destaca que existem entraves

para um maior uso das energias renováveis e que estes estão, principalmente, vinculados à

integração com os sistemas de energia preexistentes e com os custos associados que tendem a

variar de acordo com a tecnologia empregada, além das circunstâncias regionais (IPCC,

2014b, p. 20).

No caso da energia nuclear, o AR5 observa que, embora se trate de uma fonte

madura de baixa emissão de GEE, sua participação na produção global de eletricidade tem se

reduzido desde a década de 1990. Embora esta forma de energia ainda pudesse representar um

papel para a descarbonização, o AR5 aponta para barreiras e riscos existentes, que incluem:

riscos operacionais e preocupações associadas, riscos da mineração do urânio, riscos

financeiros e regulatórios, questões não resolvidas relacionadas à gestão e à disposição dos

resíduos, preocupações relacionadas à proliferação de armas nucleares, e aversão da opinião

pública. O AR5 ainda aponta que existem investigações sendo conduzidas para enfrentar essas

barreiras e riscos (IPCC, 2014b, p. 21).

Page 46: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

46

Naquilo que faz referência à atualização das plantas de fornecimento energético, o

AR5 também propõe uma importante redução do uso de usinas movidas a carvão,

substituindo-as por usinas mais modernas, altamente eficientes e alimentadas com gás natural

(IPCC, 2014b, p. 21).

Finalmente, no que diz respeito às iniciativas de captura e armazenamento de CO2,

isto é, às tecnologias de CCS, o AR5 propõe que estas poderiam ser empregadas de duas

formas, principalmente. Uma delas seria seu emprego visando a redução das emissões de GEE

no ciclo de vida das usinas de combustíveis fósseis. Para a implantação em larga escala deste

tipo de solução, seriam necessários incentivos econômicos, além de regulamentações bem

definidas com respeito às metas de curto prazo e com relação às responsabilidades de longo

prazo. A outra consistiria na tecnologia de bioenergia com captura e armazenamento de

carbono (BECCS, já mencionada anteriormente), que é conhecida também como "tecnologia

negativa em carbono". Porém, os desafios de se utilizar esta técnica estão nos riscos

associados com o montante à disposição de biomassa que é utilizado na unidade de captura e

armazenamento de carbono, bem como os riscos associados com a tecnologia de captura e

armazenamento em si (IPCC, 2014b, p. 21).

1.3.2. Transformações setoriais para mitigação de GEE

As transformações necessárias para a mitigação também são apresentadas por

setor, tomando em particular suas contribuições para o uso final de energia e suas emissões

diretas de GEE. Neste conjunto de transformações estão compreendidas as sugestões de

rumos mais específicos, atinentes a modificações de cinco “setores” em particular:

Transportes; Edificações; Indústria; Agricultura, Floresta e Outros Usos da Terra (AFOLU); e

Assentamentos Humanos, Infraestrutura e Planejamento do Território. As transformações

atinentes a cada um desses setores são apresentadas a seguir, em grandes linhas.

Transportes

O setor de transportes foi, em 2010, responsável por 27% do uso final de energia e

pela emissão direta de 6,7 GtCO2. O aumento das emissões deveu-se, de acordo com o AR5,

pelo crescimento do número de passageiros globais em todos meios de transporte e da

atividade global de cargas.

Page 47: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

47

De acordo com as projeções publicadas pelo AR5, até 2050 essas emissões do

setor de transporte dobrarão.

Com relação às possibilidades de transformar o setor de transportes a fim de

mitigar as emissões, é possível identificar, no relatório final do WG3 para o AR5, um

conjunto de medidas que envolvem mudanças técnicas e comportamentais que,

conjuntamente, poderiam reduzir em até 50% a demanda final de energia em 2050 com

relação às projeções do cenário de referência.

Dentre as medidas técnicas, o relatório inclui melhorias na intensidade de carbono

e de energia e desenvolvimento de infraestrutura. Do ponto de vista comportamental, são

mencionados o ciclismo e as caminhadas. É possível perceber que o que vincula esses dois

aspectos – o primeiro mais técnico, afeito a mudanças pelo lado da oferta; e o segundo de

natureza comportamental, que impacta sobretudo a demanda – tem a ver com um outro

conjunto de medidas salientadas pelo relatório: o planejamento integrado urbano; o

desenvolvimento orientado ao transporte, que comporte ciclismo e caminhadas; e

investimentos em infraestruturas, tais como sistemas ferroviários de alta velocidade (que

reduz em curto prazo a demanda por viagens aéreas).

Essas medidas são consideradas desafiadoras e seus resultados, incertos. Mesmo

assim, o AR5 avalia que elas poderiam contribuir para a redução de 20% a 50% das emissões

em 2050, na comparação com o cenário baseline.

Os problemas associados ao armazenamento de energia e à baixa densidade de

combustíveis de baixo carbono limitam as estratégias que visam reduzir a intensidade e a taxa

intensiva de carbono nos combustíveis. O AR5 faz referência a estudos setoriais na área de

transportes e mobilidade que avaliam que a mudança no uso de combustíveis de baixo

carbono poderá se dar em curto prazo e que irá crescer ao longo do tempo. O aumento da

participação de combustíveis a base de metano em veículos rodoviários e embarcações

comprovaria esta avaliação.

De acordo com o AR5, ao citar o uso de eletricidade produzidas por fontes de

baixo carbono, diz que em curto prazo será possível utilizar a eletricidade no transporte

ferroviário elétrico, já em curto a médio prazo, a utilização de ônibus elétricos, de veículos de

carga leves e de diciclos, como o Segway, e em longo prazo será possível utilizar

combustíveis a base de hidrogênio.

Page 48: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

48

Uma apreciação geral, portanto, é a de que, para o AR5, o avanço tecnológico

deverá ter um papel muito relevante para o aumento de medidas de mitigação, que se

beneficiarão pela disponibilidade comercial de novas alternativas de transporte e mobilidade,

além de outras formas de combustíveis, inclusive biocombustíveis líquidos e gasosos.

De acordo com o documento, as modificações em questão poderão trazer

benefícios no curto prazo para a saúde humana e para os processos de mitigação, como a

redução do transporte de emissões de partículas (incluindo o carbono negro27), do ozônio

troposférico e de precursores de aerossóis (incluindo NOx).

O tipo de veículo e o modo de transporte utilizado pela população podem gerar

variações significativas na relação custo-benefício das diferentes mensurações da redução de

carbono no setor de transportes. Em curto prazo, mudanças comportamentais e a melhoria da

eficiência de veículos (de cargas leves e pesadas e de embarcações) podem constituir medidas

de baixo custo e contribuir para a mitigação do problema.

As propostas do AR5 de mitigação para o setor de transportes admitem que as

escolhas para o setor de transportes podem ser diferenciadas de acordo com as características

e especificidades regionais. Além disso, considera que as características culturais e as

barreiras institucionais, legais e financeiras podem restringir a mudança comportamental e a

absorção de uma tecnologia de baixo carbono. Coerentemente com observações de Unruh

(2000) sobre o aprisionamento nos combustíveis fósseis e tecnologias de alta intensidade de

carbono (carbon lock-in), o AR5 também aponta que a absorção da tecnologia de baixo

carbono e a mudança comportamental podem ser restringidas de acordo com as barreiras

institucionais, legais, financeiras e culturais da sociedade.

Infraestruturas de transporte estabelecidas podem limitar as opções de

transferência modal e levar a uma maior dependência de certos veículos. Em alguns países da

OCDE, já é observada uma desaceleração de crescimento da demanda de veículos de cargas

leves. O investimento em sistemas de transporte público e uma infraestrutura de baixo

carbono pode evitar o lock-in de um setor de transportes intensivo em carbono,

principalmente em economias com altas taxas de crescimento urbano.

27 O termo carbono negro é usado para descrever uma forma inerte e ubíquoa de carbono condensado produzido

pela combustão incompleta de uma variedade de combustíveis fósseis e biomassa (ELMQUIST; GUSTAFSSON

& ANDERSSON, 2004).

Page 49: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

49

Uma forma específica sugerida que poderia gerar benefícios econômicos e sociais,

segundo o relatório, seria a priorização de uma infraestrutura para pedestres e a integração de

transportes não motorizados.

Ainda coerentemente com estudos que apontam determinantes mais complexos,

que conjugam elementos não redutíveis a aspectos especificamente econômicos e

tecnológicos, mas também institucionais e culturais, o AR5 elenca ainda outras estratégias

para dissociar as emissões de GEE do setor de transportes. Essas estratégias incluiriam a

redução da demanda por viagens, o incentivo a empresas de transportes de cargas a reduzir a

intensidade de carbono em suas operações logísticas, a substituição de modais e a melhoria de

acesso e da mobilidade para os cidadãos. Essas estratégias ainda contribuiriam para melhorar

a qualidade da saúde, alcançar maior segurança energética, reduzir custos e economizar

tempo. Essas estratégias deveriam ser promovidas por meio de políticas públicas em diversos

níveis de governo.

Edificações

O papel das edificações no panorama global de uso de energia e de emissões de

gases de efeito estufa é muito significativo. Incluindo as emissões diretas e indiretas de CO2,

em 2010 o setor de edificações foi responsável por utilizar cerca de 32% da energia final e

emitiu 8,8 Gt de CO2. Espera-se de acordo com os cenários de referência, que a demanda

energética projetada dobre e as emissões de CO2 aumentem entre 50% e 150% até a metade

do século XXI.

O AR5 pondera que, se por um lado, o crescimento da demanda energética é

resultado de melhorias em termo de saúde, mudanças de estilos de vida, acesso a serviços de

energia modernos e adequadas habitações e urbanização, por outro, há riscos significativos de

lock-in associados ao longo tempo de vida dos edifícios e as suas infraestruturas.

É reconhecido, no âmbito do relatório, que os recentes avanços em tecnologias, o

know-how e as políticas públicas tendem a promover oportunidades para se estabilizar ou até

mesmo reduzir, globalmente, a energia utilizada no setor de edificações até meados de 2050.

Consoante este reconhecimento, o AR5 aponta que a modernização de edificações seria a

chave para a mitigação em países com estoques de construção estabelecidos. Deste modo, a

redução do consumo de energia e aquecimento pode chegar a 50% e até 90%. Ao aliar

Page 50: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

50

estratégias de melhorias de desempenho e de custo, seria possível tornar atraente o custo da

modernização, chegando a níveis de custos líquidos negativos.

Ao lado da modernização tecnológica das edificações, assim como ocorre no caso

dos transportes, as recomendações que emergem dos resultados dos cenários de mitigação do

AR5 para o setor também conjugam considerações sobre mudanças de estilos de vida e

mudanças comportamentais, além de modificações na construção e na arquitetura.

Em países desenvolvidos, os cenários de mitigação do AR5 indicam que o estilo

de vida e as mudanças de comportamentos poderiam reduzir a demanda de energia em até

20% no curto prazo e em até 50% com relação níveis atuais até 2050. Já em países em

desenvolvimento, a integração de elementos de estilo de vida tradicional e de mudanças na

construção e na arquitetura poderia facilitar o fornecimento de altos níveis de serviços de

energia com uso de energia inferior àqueles projetados pelos cenários de referência (baseline).

De acordo com o AR5, a maior parte das opções para as edificações trariam

consideráveis benefícios para além da redução de custos com energia. Esses benefícios

incluiriam segurança energética, saúde (como são os casos das tecnologias de fogões movidos

a lenha mais limpos), resultados ambientais, produtividade no local de trabalho, geração

líquida de empregos e a redução dos níveis de pobreza energética. O AR5 menciona estudos

que calcularam o valor monetário desses benefícios que, frequentemente concluem que eles

superariam as economias de custos em termos de energia e também os próprios benefícios

climáticos.28

As políticas deveriam ser direcionadas a todas as fases de uma edificação e

também focar os ciclos de vida dos eletrodomésticos. Esse enfoque abrangente poderia trazer

ganhos para superar barreiras para o enfrentamento do lock-in, como são os casos do mercado

fragmentado e do inadequado acesso à informação e financiamento, que impedem a absorção

de oportunidades rentáveis do setor. Esse tipo de enfoque poderia, portanto, contribuir para

tornar as soluções de mitigação de mudanças climáticas em edificações um negócio atraente

para o setor privado.

28 “Energy poverty” é um conceito associado ao acesso à energia, que tem a ver com a provisão de serviços

energéticos modernos para todos. Esses serviços são definidos como o acesso dos domicílios à eletricidade e a

instalações de cozimento limpas (por exemplo, combustíveis e fornos que não causam poluição do ar nas

residências). Cf. http://www.iea.org/topics/energypoverty/

Page 51: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

51

Um ponto fundamental no setor de edificações se refere à eficiência energética.

Desde o AR4, há um desenvolvimento considerável de portfólios de políticas de eficiência

energética e são envidados esforços para sua implementação em muitos países. No setor, os

instrumentos mais eficientes para as reduções de emissões de GEE, ambiental e

economicamente, são os códigos de construção e padrões de eficiência para aparelhos

eletrodomésticos e eletrônicos. Em países desenvolvidos, medidas desse tipo vêm

contribuindo para uma redução ou estabilização da demanda total de energia no setor. A

adoção destes instrumentos, juntamente com outras medidas que visem a estender melhorias a

mais tipos de edificações e de eletrodomésticos, deveria ser, segundo o AR5, uma chave para

que propostas ambiciosas de metas climáticas possam ser atingidas.

Indústria

Incluindo as emissões diretas e indiretas de CO2, em 2010, o setor industrial foi

responsável globalmente por utilizar cerca de 28% da energia final e por emitir 13 Gt de CO2,

representando pouco mais de 30% das emissões mundiais de GEE. São, portanto, atualmente,

emissões maiores do que as dos setores de transporte e de edificações. Espera-se de acordo

com os cenários de referência, que a demanda energética aumente entre 50% e 150% até a

metade do século XXI.

Para evitar esse aumento seria necessário e urgente que as melhorias energéticas

fossem aceleradas significativamente.

Os resultados dos cenários de mitigação do AR5 indicam que investimentos na

modernização em larga escala do setor industrial poderiam reduzir a intensidade energética

em cerca de 25% em comparação com os níveis do ano de 2013, particularmente em países

nos quais esse setor ainda não experimentou nenhuma melhoria e em indústrias energo-

intensivas.

Neste setor, os custos de investimento inicial e a falta de informação são as

principais barreiras para implementação da eficiência energética.

Outros entraves apontados pelo relatório dizem respeito à falta de políticas e de

know-how, serviços e materiais para analisar a eficiência de produtos e processos.

Algumas das vias apontadas pelo AR5 para o melhoramento da eficiência

energética e para a redução das emissões de GEE no setor industrial incluem o aumento da

Page 52: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

52

eficiência na utilização de materiais, a reciclagem e a reutilização de materiais e produtos, a

redução global da demanda por produtos e serviços. Ao lado dessas vias, medidas de longo

prazo para a redução de emissões de GEE incluiriam a mudança para a eletricidade de baixo

carbono, novos processos industriais e inovações radicais de produtos.

A otimização de processos, recuperação, reciclagem e substituição de fluidos

(gases) refrigerantes (aqueles utilizados nos setores de ar condicionado e refrigeração) são

uma oportunidade de mitigar outros gases além do CO2, como o CH4, o N2O e os gases

fluorados. O AR5 adverte sobre a necessidade de se enfrentar as barreiras (como

concorrenciais e institucionais) para as medidas de implantação e efetivação dessas propostas.

As atividades de colaboração entre empresas e setores são apontadas pelo AR5

como alternativas para reduzir o uso de energia e consumo de materiais, além de proporcionar

a partilha de infraestruturas, informações e resíduos de utilização de calor em áreas comuns.

Para a mitigação de resíduos, opções importantes seriam a redução da quantidade

de resíduos, seguida por sua reutilização, reciclagem e recuperação de energia. Como apenas

cerca de 20% dos resíduos sólidos urbanos são reciclados globalmente, tecnologias de

tratamento de resíduos e de recuperação de energia poderiam reduzir a demanda por

combustíveis fósseis, de modo a representar efeitos diretos nas reduções de emissões de

eliminações de resíduos.

Agricultura, Floresta e Outros Usos da Terra (AFOLU)

Agricultura, Floresta e Outros Usos da Terra, ou simplesmente AFOLU, constitui

o setor que representa cerca de um quarto (~10-12 GtCO2e /ano) das emissões antrópicas

líquidas de GEE, sendo que as principais causas na origem dessas emissões são: i) o

desmatamento; ii) as emissões agrícolas de manejo do solo e de nutrientes; e iii) a pecuária

(IPCC, 2014b).

O AR5 indica que, em estimativas recentes, há um declínio dos fluxos de CO2 do

AFOLU, movimento este que resulta da diminuição das taxas de desmatamento e do aumento

da arborização. As projeções futuras são que as emissões de CO2 líquidas de AFOLU devem

Page 53: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

53

cair, em 2050, potencialmente para menos que a metade do nível observado em 2010. Antes

do final do século, o AFOLU deverá se tornar um sumidouro líquido de CO2 29

.

Para a segurança alimentar e para o desenvolvimento sustentável, o AFOLU

desempenha um papel central. As medidas de mitigação mais rentáveis apontadas pelo AR5

para aa silvicultura são o reflorestamento, o manejo florestal sustentável e a redução do

desmatamento. Já na agricultura, o relatório indica que as medidas de mitigação mais

rentáveis são a gestão de solos agrícolas, gestão de áreas de pastagens e a recuperação de

solos orgânicos.

Do lado da oferta, o potencial de “mitigação econômica” é estimado entre 7,2 a 11

GtCO2eq/ano em 2030.para esforços consistentes com os preços de até US$ 100 /tCO2e. O

relatório menciona estimativas de que cerca de um terço das emissões podem ser alcançadas a

um custo menor de US$ 20/tCO2e. Como nos casos dos outros setores, há barreiras

econômicas, tecnológicas, institucionais e culturais a serem enfrentadas para a implementação

das opções de mitigação existentes.

Do lado da demanda, as medidas incluem mudanças nas dietas e redução de

perdas na cadeia de oferta de alimentos. As estimativas sobre o potencial de mitigação

associado a essas medidas variam muito, devido a seu elevado grau de incerteza, sendo

consideradas entre 0.76 – 8.6 GtCO2e/ano no horizonte de 2050.

O WG3 avalia que as políticas governamentais que regem as práticas na

agricultura e na conservação e manejo das florestas são mais eficazes quando envolvem

medidas tanto de mitigação quanto de adaptação.

As opções de mitigação para o AFOLU podem ser vulneráveis às mudanças

climáticas, porém podem ser revertidas por meio da adoção sustentável de atividades de

redução das emissões de GEE como, por exemplo, o REDD+30

, associando os potenciais

29 Um sumidouro líquido de carbono se refere a algo absorve mais carbono do que emite, como é o caso da

floresta Amazônica que, de acordo com Espírito-Santo et al (2014), embora emita cerca de 1,9 bilhões de

toneladas de CO2 (por exemplo, pela respiração e decomposição de plantas), absorve uma quantidade maior de

CO2 por meio do crescimento e atividade fotossintética de sua flora.

30 “REDD+ é um incentivo desenvolvido no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança

do Clima (UNFCCC) para recompensar financeiramente países em desenvolvimento por seus resultados de

Redução de emissões de gases de efeito estufa provenientes do desmatamento e da degradação florestal,

considerando o papel da conservação de estoques de carbono florestal, manejo sustentável de florestas e aumento

de estoques de carbono florestal (+). ” (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE - BRASIL, 2016).

Page 54: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

54

econômico e social com a adoção de medidas como a conservação da biodiversidade e dos

recursos hídricos e redução da erosão do solo.

As barreiras para a bioenergia consideradas de acordo com o AR5 são a eficiência

dos sistemas bioenergéticos e a sustentabilidade das práticas utilizadas. Além disso, há uma

preocupação com as emissões de GEE oriundas da terra, com a conservação e os meios de

subsistência da biodiversidade, da segurança alimentar e dos recursos hídricos.

Ao priorizar o uso de plantar de baixo ciclo de carbono, como a cana-de-açúcar, a

gramínea Miscanthus31

ou o uso de resíduos de biomassa, é possível reduzir as emissões de

GEE. De acordo com o AR5, os resultados de mitigação mostram-se eficientes por meio de

sistemas "biomassa para bioenergia”32

, e também por meio da gestão sustentável do uso de

terra e de políticas de governança.

Em algumas regiões, opções específicas de bioenergia disponíveis, como fogões

melhorados, a produção de biogás em pequena escala e a produção de bioenergia constituem

alternativas para se reduzir as emissões de GEE e melhorar a qualidade de vida e da saúde no

contexto de um desenvolvimento sustentável.

Assentamentos humanos, infraestrutura e planejamento do território

O AR5 considera que a urbanização é uma tendência mundial que está associada

ao aumento da renda. Por sua vez, o aumento da renda urbana está correlacionado com o

maior consumo de energia e ao acréscimo de emissões de GEE. A partir de 2011, mais de

52% da população mundial passou a viver em áreas urbanas. Dados de 2006 mostram que o

consumo de energia em áreas urbanas foi de 67% a 76% e correspondeu a algo entre 71% e

76% das emissões de CO2 relacionadas ao uso de energia.

31 Uma variedade de gramínea que apresenta "alta eficiência energética e necessita de baixos investimentos

nutricionais, além de produzir biomassa em quantidades similares ou maiores que a cana-de-açúcar"

(ROSSETTO, 2012, p.3).

32 “As biomassas sempre foram utilizadas pelo homem como fonte de energia, porém nem sempre de maneira

sustentável, como o exemplo do desmatamento para produção de carvão. Atualmente, o interesse no uso das

biomassas como fonte de energia se deve ao fato da necessidade de redução da “pegada de carbono”, ou a

diminuição da emissão de gases de efeito estufa, a que todos os países deveriam estar interessados.”

(ROSSETTO, 2012, p.1)

Page 55: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

55

Do ponto de vista das projeções, espera-se que em 2050 a população urbana

aumente de 5,6 bilhões de pessoas para 7,1 bilhões de pessoas, representando cerca de 64% a

69% da população mundial.

O relatório observa que as cidades de países que não fazem parte do Anexo I, ou

seja, aquelas cidades cujos países estão em desenvolvimento e não possuem metas

obrigatórias de redução de emissão de GEE, frequentemente possuem maiores níveis de

consumo de energia em comparação à média das cidades dos países do Anexo I, que passaram

mais cedo pelos processos de industrialização e urbanização e que se comprometeram (em

tese e com exceções importantes) a reduzir suas emissões de GEE aos níveis de 1990.

As duas próximas décadas, de 2020 e 2030, representarão, segundo afirma o AR5,

uma janela de oportunidade para a mitigação em áreas urbanas, já que grande parte das áreas

urbanas nacionais deverão passar por um período significativo de crescimento neste período.

Espera-se que entre os anos de 2000 e 2030 a cobertura do solo urbano expanda-se de 56% até

310%. Os cenários analisados no âmbito do WG3 identificam que a maior parte do

crescimento urbano é esperada para cidades de pequeno e médio porte em países em

desenvolvimento.

Desta forma, o AR5 dá destaque às vias de redução de GEE focalizando políticas

para os espaços urbanos. Considerando que a trajetória de urbanização de cada país é

particular, o relatório advoga que suas propostas de mitigação serão mais eficazes quando

houver um pacote de instrumentos de política à disposição.

Algumas observações se destacam neste sentido, conforme se pontua nos

parágrafos abaixo.

Primeiramente, deve-se observar que, em áreas urbanas, a infraestrutura e a forma

urbana estão fortemente interligadas, juntamente com os lock-in de uso da terra, a escolha do

tipo de transporte, as habitações e o comportamento das pessoas. É por esta razão que

medidas de mitigação eficazes devem, segundo o AR5, envolver pacotes de políticas que se

reforçam mutuamente, incluindo a locação conjunta de áreas residenciais com áreas de altas

densidades de emprego, alcançando uma alta diversidade e integração dos usos do solo,

aumentando a acessibilidade e investimentos em transportes públicos e outras medidas de

gestão.

Page 56: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

56

Ao lado disso, o relatório observa que a maior parte das oportunidades de

mitigação com relação aos assentamentos humanos está em áreas de rápida urbanização, nas

quais a infraestrutura e a forma urbana ainda não estão “aprisionadas” (locked-in), mas nas

quais ainda há capacitações, ainda que limitadas, de governança, técnicas, financeiras e

institucionais.

Uma das barreiras enfrentadas para a implementação de instrumentos de

ordenamento do território para a mitigação para a mudança climática é que para isto ocorrer,

depende-se da capacidade financeira e governança de cada cidade.

Apesar de milhares de cidades estarem realizando planos de ação climática, o

impacto total sobre as emissões urbanas é ainda incerto, pois há pouca avaliação sistemática

sobre as implementações, e poucas ações e mensurações que possam contribuir para que se

saiba se e como as metas de redução serão alcançadas.

De acordo com o relatório AR5, em todo o mundo as áreas urbanas continuam a

defrontar com desafios que incluem assegurar o acesso à energia, limitando a poluição do ar e

da água, mantendo oportunidades de emprego e competitividade. Adverte que para que isto

seja possível é necessário que haja a implementação bem-sucedida de estratégias de mitigação

das alterações climáticas em escala urbana. Reconhece, ao lado disso, que em muitos dos

casos, a mitigação em escala urbana depende da capacidade de se relacionar os esforços de

mitigação para as alterações climáticas com a geração de outros benefícios locais.

1.4. Síntese e considerações finais ao capítulo

A discussão empreendida neste capítulo buscou evidenciar o avanço do

conhecimento técnico-científico representado pelas contribuições sintetizadas, no âmbito do

último relatório de avaliação do IPCC – o AR5, sobre causas antrópicas à origem dos GEE e

seus efeitos em termos de mudanças climáticas e sobre as vias consideradas necessárias para

rumar para um desenvolvimento socioeconômico de menor volume e intensidade de emissões

desses gases.

A mensuração das emissões antropogênicas dos gases de efeito estufa desde 1850

é importante para colocar o Homem como agente central responsável pelas mudanças no meio

ambiente que acarretam efeitos para as mudanças climáticas. Vale-se notar como as GEEs

entre os anos de 1970 e 2010 foram mais intensas do que no período compreendido entre

Page 57: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

57

1750 e 2010, ou seja, o crescimento econômico e populacional mais acentuado, intensificaram

as emissões de GEE.

O quadro composto neste capítulo sobre as contribuições do IPCC,

particularmente no caso de seu último relatório de avaliação – o AR5 – procura dar destaque à

sistematização dos avanços do conhecimento sobre as mudanças climáticas e à proposição de

medidas de mitigação de GEE em busca de um futuro de baixas emissões de carbono. Desta

forma, este capítulo apresenta uma síntese de resultados do IPCC/AR5 com relação a causas,

efeitos e, mais particularmente no âmbito do WG3, as vias de transformação necessárias para

a mitigação dos GEE, tanto setorial quanto intersetorialmente.

O AR5 evidencia a importância para que haja medidas intersetoriais e setoriais

para a mitigação das emissões de GEE. Estas medidas servem como base para que os países

desenvolvam seus próprios planejamentos para a mitigação de GEE como também o uso mais

eficiente dos seus recursos para a produção de energia.

Tratar desses aspectos, nos limites dessa dissertação, atende a três justificativas.

Em primeiro lugar, pelo fato do AR5 constituir uma sistematização do conhecimento

científico sobre o problema das mudanças climáticas, que constitui o pano de fundo para a

discussão aportada por esta dissertação. Em segundo lugar, por aportar os conhecimentos que

servem como base para a informação das negociações internacionais – cujos contornos atuais

são apresentados no segundo capítulo desta dissertação – e para as medidas de política a

serem adotadas em âmbito nacional pelas partes signatárias da UNFCCC, a cujo âmbito

pertence a discussão sobre as contribuições nacionais apresentadas pelo governo brasileiro ao

Secretariado da UNFCCC e que passam a integrar o Acordo em Paris, que coroou a

Conferência das Partes em 2015 e que constitui o objeto do terceiro capítulo desta dissertação.

Em terceiro lugar, pelo fato de apontar para a necessidade de mudanças setoriais e

intersetoriais necessárias e urgentes a fim de evitar um aquecimento climático importante,

incluindo medidas que servem como um balizamento para uma discussão das metas de

redução de GEE (apresentadas no capítulo 3) e de algumas das medidas previstas para o

alcance dessas metas, conforme será discutido no capítulo 5 desta dissertação.

Page 58: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

58

PARTE II

DAS MUDANÇAS NA GOVERNANÇA GLOBAL DO CLIMA

E ÀS METAS PROPOSTAS PELO BRASIL NA COP 21

Capítulo 2 - A partilha das responsabilidades

sobre o enfrentamento das mudanças climáticas:

mudanças na governança global do clima

à luz de uma análise de emissões históricas e correntes

Capítulo 3 - Brasil: perfil das emissões e as metas apresentadas à COP 21, em Paris

Page 59: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

59

Capítulo 2 – A partilha das responsabilidades sobre o enfrentamento das mudanças

climáticas: mudanças na governança global do clima à luz de uma análise de emissões

históricas e correntes

As mudanças climáticas compõem uma parte das questões que colocam a humanidade

diante das chamadas fronteiras planetárias (planetary boundaries), termo proposto por

Rockström et al (2009) para compreender a problemática ambiental contemporânea numa

perspectiva sistêmica, no sentido das interações entre os sistemas naturais e antrópicos.

Os autores definiram nove fronteiras planetárias ou limites planetários como sendo "o

espaço operacional seguro para a humanidade em relação ao sistema terrestre": 1) Mudanças

climáticas; 2) Taxa de perda da integridade da biosfera (que causa extinção de espécies); 3)

Ciclos biogeoquímicos do fósforo e do nitrogênio; 4) Esgotamento do ozônio atmosférico, 5)

Acidificação dos oceanos; 6) Utilização da água doce; 7) Mudança no uso da terra; 8) Carga

atmosférica de aerossóis; e 9) Poluição química (como nuclear, poluentes orgânicos e metais

pesados).

De acordo com os autores, a humanidade já ultrapassou quatro dessas fronteiras: as

mudanças climáticas; a taxa da perda de integridade da biosfera; as mudanças no uso da terra

e a interferência do ciclo do nitrogênio. Romper esses limites colocam em risco a própria

existência humana (Rockström et al, 2009, p.472).

Nas palavras de Rockström, a interdependência entre essas fronteiras faz com que elas

devam ser tomadas de forma sistêmica. Romper um dos sistemas naturais significa colocar em

risco os demais.

Conforme Marques (2016):

“É agora mais certo que nunca, sobre a base de muitas linhas de evidência,

que os homens estão mudando o clima da Terra. A atmosfera e os oceanos

aqueceram-se, fenômenos acompanhados por um aumento do nível do mar,

um forte declínio do gelo do Oceano Ártico e por outras mudanças

relacionadas ao clima” (MARQUES, 2016, p. 310).

“Fronteiras planetárias” constitui um construto que denota os esforços de cientistas

(naturais e também sociais) de sintetizar o conhecimento contemporâneo com respeito às

interações entre o sistema terrestre e os sistemas socioeconômicos, numa tentativa de

comunicar e alertar um público mais amplo do que os convencionais circuitos acadêmicos – e

mesmo de policy making – de que as ações antropogênicas resultam em efeitos que atingem

toda a humanidade. São expressões que têm atravessado, em nossos dias, não apenas as

fronteiras disciplinares, aparecendo em palavras-chave, títulos e conteúdo de artigos

científicos publicados em periódicos e em apresentações de eventos acadêmicos, como

Page 60: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

60

também os mais diversos fóruns de políticas públicas, em especial aqueles atinentes a

questões ambientais. São também expressões que reforçam a ideia de que as ações de

mitigação devem ser globais e de que as responsabilidades pelas ações perante as mudanças

climáticas devem ser mais amplamente partilhadas.

As mudanças climáticas partilham com as demais fronteiras planetárias certas

características que tipificam a problemática ambiental contemporânea: são problemas

sistêmicos e complexos, com causalidades que não podem ser admitidas como unidirecionais,

apresentando ciclos de retroalimentação; suas fontes múltiplas, difusas, tornam difícil a

atribuição de responsabilidade (o que é fundamental à aplicação do princípio do poluidor-

pagador, que orienta grande parte das políticas ambientais); suas consequências são

cumulativas e se desdobram para além das fronteiras nacionais; há um sensível interregno

temporal entre a instalação das causas e a observações dos efeitos, o que coloca a dimensão

intertemporal como central na apreensão dos nexos causa-efeito, os quais são estabelecidos

com base em um conhecimento científico de fenômenos que estão nas fronteiras entre os

sistemas antrópicos e naturais, sujeitos a incertezas nem sempre redutíveis a riscos

probabilísticos; seus desdobramentos podem incorrer em irreversibilidade de danos tanto para

os sistemas socioeconômicos quanto para os sistemas terrestres (CORAZZA, 1996;

CORAZZA e BONACELLI, 2014).

Alguns aportes dentro da literatura econômica buscam colocar contribuições canônicas

da Economia em coerência com essas características. O problema das mudanças climáticas foi

chamado por Nicholas Stern (2009), por exemplo, de “o maior problema de externalidades

negativas jamais enfrentado pela humanidade”: “A mudança climática é a maior falha de

mercado que o mundo já viu e interage com outras imperfeições do mercado” (STERN, 2009,

p.xviii).

O problema das externalidades negativas, cujos exemplos costumam trazer casos

localizados de poluição, são situações – incluídas na categoria mais genérica das falhas de

mercado – nas quais os benefícios da exploração de recursos são apropriados privadamente

enquanto que os custos são socializados (STERN, 2009). Um dos princípios mobilizados para

a correção desta falha é o princípio do poluidor-pagador, pelo qual os agentes responsáveis

pelos custos em questão devem ser responsáveis por sua internalização (devem, em outras

palavras, pagar pela solução do problema que causaram) (STERN, 2009).

A dificuldade é que, em face das características acima apontadas dos problemas

ambientais contemporâneos, o que ocorre é a necessidade – e urgência – para que sejam

adotadas medidas de política antes da estabilização do conhecimento científico e da

Page 61: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

61

possibilidade de mensuração econômica de custos e benefícios, ou seja, para a adoção do

princípio da precaução (O´RIORDAN & CAMERON, 2013).

A solução para o problema da distribuição de custos e benefícios, dentro dos regimes

climáticos, passam pela incorporação de princípios como o PRCD e o princípio das

responsabilidades históricas. São princípios que estão em jogo dentro da reconfiguração de

forças na transição para o novo regime climático pós-Kyoto.

A natureza global das mudanças climáticas faz com que sua solução passe

necessariamente por medidas que devem ser tomadas conjuntamente pelos países. Com essa

compreensão é que a Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas

(UNFCCC, na sigla em inglês para United Nations Framework Convention for Climate

Change) foi proposta, em 1992, por ocasião da Segunda Conferência das Nações Unidas

sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, conhecida como Rio 92.

Na UNFCCC, o objetivo geral de combater as mudanças climáticas deu origem a

sucessivas rodadas de negociações internacionais, nas quais os Estados nacionais, chamados

de “partes”, deveriam se comprometer com ações voltadas às finalidades de mitigação e de

adaptação, além de negociar os meios tecnológicos e financeiros para o alcance dessas

finalidades. Delegados dos Estados nacionais se reúnem periodicamente nas Conferências das

Partes (COPs), que ocorrem desde 1995 – a COP de Berlim. As questões que animam os

debates têm a ver com responder a questões tais como: o que fazer, como fazer, quem deve

fazer, quando e com o recurso a quais meios (BUENO RUBIAL, 2016). As negociações se

intensificaram em especial a partir de 200733

, quando a consolidação do conhecimento

33 O Relatório AR4, que antecedeu o AR5, foi publicado em 2007 e foi um dos principais documentos que

confirmaram que as ações antrópicas afetam os aumentos das emissões de GEE e as suas concentrações na

atmosfera, como também influencia nas mudanças climáticas do planeta: “As concentrações atmosféricas

globais de dióxido de carbono, metano e óxido nitroso aumentaram bastante em consequência das atividades

humanas desde 1750 e agora ultrapassam em muito os valores pré-industriais determinados com base em

testemunhos de gelo de milhares de anos. Os aumentos globais da concentração de dióxido de carbono se devem

principalmente ao uso de combustíveis fósseis e à mudança no uso da terra. Já os aumentos da concentração de

metano e óxido nitroso são devidos principalmente à agricultura.” (IPCC, 2007a, p. 26, disponível em:

https://www.ipcc.ch/pdf/reports-nonUN-translations/portuguese/ar4-wg1-spm.pdf). O Relatório AR4 serviu de

base para evidenciar cientificamente que os aumentos das emissões de GEE e as suas concentrações na

atmosfera possuem natureza antrópica, resultando em alterações climáticas: “Uma avaliação global dos dados

desde 1970 mostrou ser provável que o aquecimento antrópico tenha tido uma influência discernível em muitos

sistemas físicos e biológicos” (IPCC, 2007b, p.4). Além disso, o Relatório afirma que se os aumentos da

temperatura global ultrapassarem de 1,5°C a 2,5°C, o risco de extinção de espécies vegetais e animais aumentará

aproximadamente de 20% a 30%. O AR4 trouxe como novidade estimativas sistemáticas das magnitudes dos

impactos provenientes dos aumentos da temperatura média global e enfatizou que “O desenvolvimento

sustentável pode reduzir a vulnerabilidade à mudança do clima, aumentando a capacidade de adaptação e

aumentando a resiliência. Na atualidade [ano de 2007], contudo, poucos planos de promoção da

sustentabilidade preveem explicitamente a adaptação aos impactos da mudança do clima ou a promoção de

Page 62: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

62

científico sobre causas, efeitos e recomendações sobre o problema das mudanças climáticas

pelo IPCC foi laureado com o Prêmio Nobel da Paz.

Este capítulo é dedicado a apresentar e discutir aspectos críticos das negociações

climáticas, apresentando as discussões pré-Kyoto, como também as discussões pós-Kyoto,

com o rearranjo do agrupamento dos países, com a perda do papel de muitos dos países que

compunham originalmente o Anexo I do Protocolo de Kyoto e a emergência de um conjunto

de países agrupados, para fins de negociação na ocasião da COP 15, em Copenhague, em

2009, como BASIC: Brasil, África do Sul, Índia e China.

Neste sentido, com base em contribuições de autores bem posicionados na análise das

negociações sobre as mudanças climáticas, é oferecida, neste capítulo, uma contribuição para

a compreensão dos rumos das negociações mais recentes sobre as mudanças climáticas

(BUENO RUBIAL, 2016; VIOLA, 2009; VIOLA & BASSO, 2016; AMORIM, SANTOS &

ESTEVES, 2016). Essa contribuição consiste em colocar em perspectiva as emissões e

posições dos grupos de países relevantes para as negociações climáticas em dois momentos,

ou seja, no período de vigência do Protocolo de Kyoto e no período pós-Kyoto, que tem como

um marco o Acordo de Paris, em 2015. A caracterização dos perfis de emissão é realizada

com recurso a dados sobre as emissões dos países e grupamentos de países em questão,

coletados a partir da fonte CAIT – a Climate Analysis Indicators Tool, disponibilizada pelo

World Resources Institute, que constitui a principal e mais reputada base de dados sobre o

assunto.

Nesta contribuição, ganha destaque o contraponto entre o panorama de forças que

vigeu no contexto que originou a arquitetura do Protocolo de Kyoto (com as emissões

correntes e acumuladas associadas aos países do chamado Anexo I) e o panorama recente, no

qual se observa emergir novas metas de redução das emissões por outro conjunto de países –

o BASIC, com o apelo por uma nova forma de atribuição de responsabilidades para o alcance

dessas metas.

Neste novo panorama emerge o Acordo de Paris que desponta, como propõe Bueno

Rubial (2016), como uma abordagem bottom up para as negociações climáticas, na qual os

países – ou Partes, na terminologia das negociações – apresentam elas próprias suas metas de

redução de GEEs. Neste novo arranjo, além dos países originalmente agrupados no Anexo I,

também os emergentes, como é o caso do Brasil, devem assumem novas responsabilidades,

capacidade de adaptação” (IPCC, 2007b, p.26, disponível em: https://www.ipcc.ch/pdf/reports-nonUN-

translations/portuguese/ar4-wg2-spm.pdf.)

Page 63: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

63

consolidadas na forma das iNDCs (Intended Nationally Determined Contributions),

apresentadas por ocasião da Conferência das Partes – COP 21, em Paris no final de 2015.

O capítulo está organizado em três seções. Na primeira delas é apresentado o regime

climático de Kyoto, discutido à luz dos agrupamentos de países – e de suas respectivas

emissões históricas – no contexto da arquitetura que emerge na configuração do chamado

Anexo I. Na segunda seção, são apresentadas, cotejadas e discutidas as emissões de GEEs

referentes a novas configurações de países emergentes (BRICS e BASIC). Cotejar esses

dados, tanto do ponto de vista das métricas das emissões acumuladas como das emissões

correntes para esses blocos oferece, segundo se sustenta aqui, elementos para a composição de

um panorama dos conflitos envolvidos nas negociações internacionais sobre as mudanças

climáticas que se desdobram com o final do prazo de vigência do Protocolo de Kyoto. Neste

ponto, são problematizadas dificuldades, conflitos e consequências para a mudança do regime

climático. A terceira seção aporta uma discussão sobre alguns conflitos e tensões, antigos e

novos, que se apresentam a partir dessa reconfiguração do regime climático. Finalmente, as

considerações finais recuperam sinteticamente a discussão do capítulo e apresenta suas

principais conclusões.

2.1. Regime climático de 1990 a 2009: emissões e os princípios do Protocolo de Kyoto

A busca pela solução do problema das mudanças climáticas na forma de

negociações internacionais é compreendida pela construção de acordos que devem ser

assinados – um compromisso preliminar pelos delegados e/ou chefes de Estado por ocasião

das Conferências das Partes, e ratificados – isto é, transformados em Políticas Nacionais e leis

correspondentes pelos parlamentos dos países signatários.

A construção desses acordos significa a elaboração de princípios, normas, regras e

procedimentos para a tomada de decisões em torno das quais convergem as expectativas dos

agentes negociadores. Este é o conceito de Regime Internacional.

Bueno Rubial (2016) indica duas definições tradicionais para o conceito de

regime internacional:

Regimes internacionais podem ser definidos como “principios, normas, reglas y

procedimientos de toma de decisiones en torno de las cuales convergen las expectativas de los

actores”. (Krasner, apud Bueno Rubial, 2016, p. 78)

e/ou:

“procedimientos, normas o instituciones para ciertas clases de actividades que crean o aceptan

los gobiernos para regular y controlar las relaciones transnacionales e interestatales” (Keohane

& Nye, apud Bueno Rubial, 2016, p. 78)

Page 64: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

64

O regime climático seria, assim, uma forma específica de regime internacional,

voltado ao tema das mudanças climáticas, buscando sua normatização, regulação e controle

em escala transnacional.

Bueno Rubial (2016) analisa os princípios e normas que caracterizaram o regime

climático em dois períodos: entre 1990 e 2009, o Regime do Protocolo de Kyoto; e a partir de

2009, a emergência de um regime climático pós-Kyoto, que tem no Acordo de Paris um

marco nas negociações climáticas recentes.34

Esta seção, amparada em parte nas contribuições de Bueno Rubial (2016) e

também em outros autores (Viola, 2009, 2010; Viola e Basso, 2016; Chichilnisky, 2003), são

empregados dados sobre os perfis de emissões dos agrupamentos dos países segundo a

arquitetura do Protocolo de Kyoto, a fim de apresentar e discutir os princípios sob a égide dos

quais vigeu o regime desse Protocolo.

A configuração inicial do Protocolo de Kyoto, expressa pela reunião dos

principais países responsáveis historicamente pelas emissões acumuladas de gás carbônico,

responde, portanto, exatamente à ideia de uma atribuição justa de responsabilidades pela

mitigação dessas emissões.

Conforme é possível observar pelo Quadro 2.1, na próxima página, esses países

do Anexo I puderam, em grande parte por meio dos modos de desenvolvimento intensivos na

queima de combustíveis fósseis, angariar para si nada menos que 82,45% dos fluxos mundiais

de riqueza expressos pelo PIB – em comparação com os 17,55% que cabem a todos os países

do resto do mundo, em 1990, ano-base com relação ao qual o Protocolo de Kyoto previa

originalmente a necessidade de reduções das emissões globais.

34 O Protocolo de Kyoto de o Acordo de Paris pertencem às categorias de instrumentos que foram desenvolvidos

dentro do sistema das Nações Unidas em matéria de direito internacional a fim de permitir que os Estados

estabeleçam entre si direitos e obrigações. Um protocolo (protocol) é um documento assinado ao final de uma

Convenção, estabelecendo as intenções acordadas entre os delegados das Partes; um acordo (agreement) é o

instrumento que tem sido utilizado como documento para selar as decisões tomadas ao final de Conferências,

como é o caso das Conferências das Partes dentro da UNFCCC. Ambos os termos são utilizados de forma mais

ou menos livre e equivalente em negociações internacionais e de maneira menos formal do que a noção de

tratado (treaty), cuja não observância deve ter consequências previstas no próprio tratado, como sansões

comerciais e multas, por exemplo. Todos são termos que se referem a documentos que coroam decisões tomadas

em negociações internacionais. As definições dos termos chave empregados nas coleções de tratados das Nações

Unidas são encontradas em: https://treaties.un.org/Pages/Overview.aspx?path=overview/overview/page1_en.xml

Page 65: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

65

Quadro 2.1 - Emissões de CO2, correntes e acumuladas, população e Produto Interno Bruto,

por grupo de países, reunidos segundo a configuração inicial de Kyoto (de 1990)35

Indicadores

Acumuladas

(1850 - 1990) (1) *

Correntes (1990)

(1) * População

** PIB

***

Paí

ses

Anexo I (2)

80,94% 65,35% 21,93%

82,45%

Resto do Mundo 19,06% 34,65% 78,07% 17,55%

Fontes: Elaboração própria a partir da base de dados da * CAIT, ** United Nations - Department of Economic

and Social Affairs e *** World Bank

Notas: (1)

Emissões de CO2, excluindo AFOLU. (2)

Países do Anexo I, segundo a configuração original do Protocolo de Kyoto. (3)

Resto do Mundo: todos os países do mundo, excluindo-se os do Protocolo de Kyoto.

Por sua vez, a contribuição dos países do Anexo I para as emissões acumuladas de

CO2 na atmosfera no período de 1850 a 1990 foi de 80,94%, contra 19,06% de todos os

demais países. Além disso, a parcela da população mundial que se beneficiou dessa riqueza à

custa das referidas emissões é de 21,93% da população mundial, sem contar com outras

distorções distributivas desta “pegada carbônica” que poderiam ser ainda maiores se

eventualmente se levasse em conta as desigualdades na distribuição dos benefícios do

desenvolvimento dentro desses próprios países ditos desenvolvidos.

O crescimento econômico intensivo em combustíveis fósseis é o principal motor

das emissões acumuladas. Os países componentes do Anexo I, como grande parte dos países

da União Europeia, os Estados Unidos, o Canadá, a Federação Russa e o Japão, ainda são os

responsáveis pela maior parte dessas emissões, o que sugere um dever moral desses países nas

ações de mitigação dessas emissões.

Dessa forma, embora o problema das mudanças climáticas seja de natureza global,

a contribuição dos grupos de países não é igual. Assim, um dos princípios que rege o

Protocolo de Kyoto é o da Responsabilidade Comum, porém Diferenciada.

Bueno Rubial (2016, p. 80) explica que:

“o regime climático, seus propósitos e princípios, em particular o Princípio de

Responsabilidade Comum, porém Diferenciada (PRCD) constitui um modo de interpretar o

caminho para cumprir o propósito no qual os países desenvolvidos deveriam ter a liderança

35 A elaboração dos quadros 1.1 e 1.2 e a discussão relacionada foi inspirada por uma apresentação feita por

Graciela Chichilnisky, especialista em Economia do Meio Ambiente da Universidade de Columbia, em 2003; os

slides da conferência estiveram disponíveis no site da autora durante muitos anos, mas estavam inacessíveis

quando de nossa última consulta, em 07 de novembro de 2016. O site da Profa. Chichilnisky é acessível em:

http://www.chichilnisky.com/. Infelizmente, não foi possível tampouco localizar uma publicação da autora com

a correspondente discussão.

Page 66: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

66

tanto em matéria de redução de emissões como de provisão de meios para que os países em

desenvolvimento pudessem gerar suas próprias ações climáticas”.

Sampaio, Wold & Nardy (2003, p. 14-15) notam que o PRCD tem sua origem já

nos princípios de diversas negociações ambientais internacionais por ocasião da Rio 92:

“Este princípio tem sua formulação associada aos esforços dos países em desenvolvimento

para estabelecer critérios de compartilhamento da responsabilidade internacional pela solução

de problemas ambientais globais que levem em consideração a realidade socioeconômica dos

diferentes Estados. Historicamente, sua origem remonta às negociações travadas durante a

Conferência da ONU sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992, as quais resultaram

em sua inscrição nos quatro documentos fundamentais originados do encontro: a Declaração

do Rio, a Agenda 21, a Convenção-Quadro sobre Mudanças Climáticas e a Convenção sobre

Diversidade Biológica”.

Esse princípio é coerente com o que se observa em termos da contribuição dos

diferentes países para as mudanças climáticas, conforme é possível comprovar por meio de

diversas métricas.

Assim, é relevante que se note, ainda no Quadro 2.1, que em 1990 os patamares

das emissões correntes dos países do Anexo I ainda se mostravam muito superiores aos dos

países do resto do mundo. Deste modo, observa-se quão significativa foi a escolha do ano de

1990 como ano-base com relação ao qual as reduções das emissões futuras deveriam ser

computadas. E, também, quão significativa era a configuração do conjunto de países que

compunham o Anexo I do Protocolo de Kyoto, ou seja, sua arquitetura.

A Figura 2.1, a seguir, apresenta as emissões acumuladas totais dos países do

Anexo 1, individualmente, com o destaque para o papel dos Estados Unidos e dos 28 países

da União Europeia para o problema.

As emissões acumuladas são consideradas uma proxy da quantidade de “mudança

climática” causada pelo país, uma vez descrevem o total de emissões históricas de cada um

deles. Assim, trata-se de uma métrica utilizada justamente para compreender a extensão da

responsabilidade histórica de cada país pelo problema das mudanças climáticas36

.

São as emissões acumuladas década após década desde os princípios da

Revolução Industrial na Inglaterra, mas que atingem um patamar sem precedentes a partir do

segundo pós-guerra, que conferem às mudanças climáticas seu caráter de problema ambiental

intertemporal. No regime climático do Protocolo de Kyoto a responsabilidade por essas

emissões acumuladas historicamente cabe ao conjunto de poluidores – países – que integram

o Anexo 1. A responsabilidade pela mitigação das emissões correntes, todavia, precisariam

36 Deve-se notar que essa medida pode variar segundo a data de início escolhida e segundo a inclusão dos

diversos tipos de gases e setores. Por exemplo, uma eventual exclusão das emissões associadas ao uso da terra,

da agricultura e da atividade florestal pode minorar substantivamente as emissões de países como o Brasil e a

Indonésia.

Page 67: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

67

ser “distribuídas” entre os países que estão em sua origem, pelo menos de acordo com o

PRCD.

Figura 2.1 - Emissões Acumuladas Totais de CO2 (MtCO2e),

excluindo AFOLU (1850 - 1990)

Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da CAIT Climate Data Explorer. 2016.

Washington, DC: World Resources Institute. Disponível em: http://cait.wri.org/historical

Conforme salienta Bueno Rubial (2016, p. 80):

“Essa leitura foi enriquecida pelo princípio das responsabilidades históricas, originalmente

enunciado pelo Brasil no contexto das negociações do Protocolo de Kyoto, logo seguido pela

China e pela Índia”.

Nas palavras de Ribeiro (2002, p. 78):

“Ele [o princípio das responsabilidades históricas] está baseado na história de cada país,

relacionando o desenvolvimento econômico com o uso de combustível fóssil no passado, seja

para promover a Revolução Industrial, seja para mover motores a explosão, usados em

transporte, ou para a geração de energia elétrica. ”

Graças a esforços realizados por diversas instituições ao redor do globo, com o

desenvolvimento de métodos inventariar emissões correntes e contabilizar emissões

acumuladas, é possível conhecer as emissões específicas de CO2 (excluindo-se AFOLU) –

para um período bem mais extenso. A figura 2.2 (próxima página), mostra as emissões totais

acumuladas entre 1850 e 1990. Nota-se, então, que os principais emissores correspondem,

0 50000 100000 150000 200000 250000 300000

Estados Unidos

União Europeia (28)

Alemanha

Reino Unido

França

Japão

Canadá

Itália

Bélgica

Austrália

Países Baixos

Espanha

Áustria

Suécia

Dinamarca

Turquia

Suiça

Finlândia

Grécia

Noruega

Irlanda

Portugal

Nova Zelândia

Luxemburgo

Islândia

Page 68: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

68

neste período, aos Estados Unidos e à União Europeia, cujas contribuições chegam a 62,8%

do total das emissões globais de gás carbônico (CO2).

Figura 2.2 - Emissões Acumuladas de CO2

excluindo AFOLU (% global) (1850-1990)

Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da CAIT Climate Data Explorer. 2016.

Washington, DC: World Resources Institute. Disponível em: http://cait.wri.org/historical

Emissões acumuladas historicamente entre 1850 e 1990, mensuradas para o gás

carbônico, não sendo incluídas as emissões associadas à agricultura, ao setor florestal e a

outros usos da terra (AFOLU), é uma métrica para a contabilização das emissões associadas

às mudanças climáticas que faz um sentido particular dentro do regime climático do Protocolo

de Kyoto. Trata-se de uma abordagem para as negociações que leva em conta o problema da

queima de combustíveis fósseis, em especial nos países de industrialização pioneira e

avançada.

O uso dessa métrica reforça a ideia de que, do ponto de vista das relações

internacionais, os países que contribuíram de forma mais importante para as emissões globais

tenham responsabilidade diferenciada para promover as mudanças no sentido da desejada

busca pela baixa intensidade de carbono, seja do ponto de vista do desenvolvimento de

tecnologias ou inovações que propiciem a emergência ou a exploração de trajetórias

tecnológicas (ou de novos paradigmas, como advogam alguns, de baixa emissão de GEE),

seja no financiamento de iniciativas que proporcionem essas alternativas, ao lado da

promoção de estilos de vida coerentes com esse fim. Esses indicadores justificam e reforçam,

31,71% 31,10%

14,96%

8,63%

5,05% 3,18%

2,17% 1,46% 0,84% 0,58% 0,33% 0,00%

5,00%

10,00%

15,00%

20,00%

25,00%

30,00%

35,00%

Page 69: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

69

portanto, dois princípios de responsabilidade do regime de Kyoto: o PRCD e o Princípio das

Responsabilidades Históricas.

É verdade, entretanto, que essa métrica não proporciona um quadro mais

completo – e mais complexo – do problema. Os GEEs não se resumem ao CO2 e suas fontes

vão além da queima dos combustíveis fósseis. Observar outros indicadores, outras métricas,

ajuda a entender que o fenômeno das mudanças climáticas é influenciado pelas emissões de

gases de efeito estufa que vão além do gás carbônico.

Um exercício possível, por exemplo, é observar as emissões acumuladas incluindo

o uso da terra e a atividade florestal para os principais dez países emissores para o período de

1990 a 2012 (correspondente ao último período para o qual a CAIT disponibiliza os valores),

como proposto na Figura 2.3. Ali se observa que quase metade das emissões acumuladas entre

1990 e 2012 (48,56%) se originou em apenas quatro países/regiões: os EUA, a China, a União

Europeia e a Federação Russa.

Figura 2.3 - Emissões Acumuladas de GEE (%)

incluindo AFOLU (1990 - 2012)

Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da CAIT Climate Data Explorer. 2016.

Washington, DC: World Resources Institute. Disponível em: http://cait.wri.org

Ou seja, já no período de vigência do regime climático do Protocolo de Kyoto,

uma análise mais completa das contribuições dos diferentes países para o problema deixa

evidente que compromissos de redução de emissões centrados nos principais emissores

históricos – os países do Anexo 1, deixaria de fora uma quantidade demasiadamente grande

das emissões. Tendo em vista essa configuração do Anexo I e o fato de que Estados Unidos e

Austrália não aderiram ao Protocolo de Kyoto, Viola (2010) ressalta que nesse regime apenas

20% das emissões globais de GEEs estariam cobertas.

33,0%

15,8% 14,9%

11,9%

5,9% 4,7% 4,5% 3,9%

3,1% 2,0% 2,0%

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

Resto doMundo

EstadosUnidos

China UniãoEuropeia

(28)

FederaçãoRussa

Índia Brasil Indonésia Japão Canadá México

Page 70: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

70

Duas condições, então, se colocam enquanto avançam as negociações no regime

de Kyoto: de um lado a evidência de que outros países (fora do Anexo 1) começaram a ter

contribuições muito substanciais para as emissões globais; e, de outro, o fato de que enfrentar

o problema das mudanças climáticas requer grandes esforços – e investimentos – em

mitigação e em adaptação nas economias dos países em geral, e, sob esse regime climático,

em especial naquelas dos principais responsáveis pelas emissões dos GEEs.

Essas condições explicam, pelo menos em parte, a razão das dificuldades que

emergiram no panorama das negociações internacionais no percurso de uma história de quase

três décadas desde a criação do IPCC, em 1988. Conforme se observa no Quadro-síntese

apresentado no Apêndice I ,algumas dessas dificuldades são encontradas em momentos

críticos das negociações, como a situação particular da Rússia, a não ratificação do Protocolo

de Kyoto pelos Estados Unidos, a saída do Canadá das negociações em 2011 e os conflitos

envolvidos na necessidade de se estabelecer metas obrigatórias de redução de gases de efeito

estufa pelos chamados países emergentes a partir do momento em que suas emissões passam a

ser mais relevantes do que a de muitos dos países que pertenciam ao chamado Anexo I do

Protocolo de Kyoto.37

Com relação à situação da Rússia, Bueno Rubial (2016) fala que, em troca de sua

ratificação do Protocolo de Kyoto, a UE deve negociar o reconhecimento deste país como

uma economia de mercado, o que era necessário para destravar seu ingresso na Organização

Mundial do Comércio.

No que diz respeito às dificuldades colocadas pelos Estados Unidos, a autora

aponta que este país se ressentiu da ausência de outros países relevantes, como a China e a

Índia, nos compromissos quantitativos de redução de emissões sob a égide do Protocolo de

Kyoto. Embora tenha sido assinado por Bill Clinton em 1997, esta foi revogada por George

W. Bush em 2001. Sua eleição no ano anterior coroou uma plataforma que atribuía um papel

importante dos combustíveis fósseis para o crescimento do país e que, do ponto de vista das

negociações climáticas, reforçava a decisão política da não ratificação do Protocolo pelos

37 O Anexo I reúne os países industrializados membros da Convenção do Clima da ONU que tinham metas

obrigatórias de redução das emissões de GEE, aos níveis de 1990. São eles: Alemanha, Austrália, Áustria,

Bélgica, Bielo-Rússia, Bulgária, Canadá, Comunidade Europeia, Croácia, Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia,

Espanha, Estônia, Federação Russa, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Islândia, Itália, Japão, Letônia,

Liechtenstein, Lituânia, Luxemburgo, Mônaco, Holanda, Nova Zelândia, Noruega, Polônia, Portugal, Reino

Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, República Tcheca, Romênia, Suécia, Suíça, Turquia, Ucrânia e

Estados Unidos.

Page 71: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

71

Estados Unidos e que deixava claro que não aceitaria que toda a responsabilidade ficasse com

os países desenvolvidos.

Os mecanismos de mercado, que caracterizaram o Protocolo de Kyoto – como o

mercado de carbono – não foram incentivos suficientes para a participação do país. Os EUA

também alegaram que a arquitetura do Protocolo de Kyoto, com o PRCD e a designação de

um conjunto restrito de países com responsabilidades obrigatórias no Anexo I, constituiria um

regime ineficiente e pouco robusto em comparação com seus equivalentes no Protocolo de

Montreal, que entrou em vigor em 1989. Este último, voltado ao banimento das substâncias

que comprometiam a camada de ozônio, embora também reconhecesse uma diferenciação

entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, contemplava ações concretas para todas as

partes, com um cronograma restritivo e não somente para um conjunto de Estados (BUENO

RUBIAL, 2016, pp. 80-81).

Em 2009, Barack Obama encaminhou o Protocolo para ser ratificado pelo Senado

americano. Para os EUA há ainda mais um entrave: o acordo ideal, assim como Kyoto, é

“legalmente vinculante”, ou seja, tem peso de lei e deve passar pelo legislativo dos países.

Esta foi uma das razões, conforme afirma Ferreira (2011), pelas quais o Protocolo de Kyoto

não teria sido aprovado no Senado do país.

No que tange ao posicionamento do Canadá, de acordo com Schmeller (2011), em

dezembro de 2011, o Canadá se retirou do Protocolo de Kyoto, após o término da Conferência

das Partes em Durban, sob a alegação de que se permanecesse no Protocolo o país estaria

ameaçado a pagar multas no valor de 14 bilhões de dólares por não ter cumprido as metas de

redução de GEEs. Ademais, o país depende da extração de minerais, dentre eles o petróleo,

em especial de uma fonte não convencional (as areias betuminosas), cujas atividades de

extração e refino emitem altas concentrações de dióxido de carbono e outras substâncias

poluentes. Outra razão apontada pelo autor, análoga à interpretação de Bueno Rubial (2016)

sobre a posição dos EUA, foi o fato de que os maiores emissores de GEEs, China e Estados

Unidos, não terem aderido ao Protocolo.

Essas dificuldades podem ser mais bem compreendidas quando se considera a

historicidade do fenômeno que está na origem das mudanças climáticas, qual seja o avanço da

sociedade industrial alimentada energética e materialmente por insumos fósseis. Assim, em se

tomando em conta que as elevadas concentrações de GEEs nas camadas superiores da

atmosfera são o resultado cumulativo de emissões em tempos que vão até os princípios da

industrialização, isto poderia dizer que os países que se industrializaram primeiro devem ter

tido uma contribuição mais significativa para a amplificação do chamado “efeito estufa”

Page 72: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

72

induzido por atividades antrópicas. Em outras palavras, isso significaria dizer que a maior

parte dos estoques de GEEs teria sido acumulada a partir de fluxos que tiveram origem nos

países que se industrializaram primeiro. Isso é coerente, como já foi observado, com a

arquitetura do Protocolo de Kyoto, que colocou esses países no referido Anexo I,

congregando aqueles que deveriam ter ações obrigatórias para a mitigação das mudanças

climáticas.

Entretanto, o fenômeno histórico é dinâmico e, na medida em que outros países

avançam em seus processos de industrialização, modernizam sua agricultura, promovem o

avanço da exploração de seus territórios – incluindo a troca de florestas por pastagens ou por

agricultura – suas emissões correntes se tornam mais importantes.38

Ao longo de alguns anos,

suas emissões acumuladas também avançam. A mudança nos perfis de emissão de países que

estavam fora do Anexo I na arquitetura do regime climático de Kyoto se coaduna com novas

articulações entre as Partes, colocando em questão, como será visto na próxima seção, sua

eficácia, sua robustez e mesmo seus princípios.

2.2. Emergência de um novo regime climático a partir de 2009

As razões para a ineficácia e a falta de robustez do regime climático de Kyoto têm

a ver com o não engajamento de grandes emissores, a não ratificação do Protocolo por essas

partes, conforme mencionado na seção anterior.

Os conflitos que surgem entre as partes tem a ver com o ganho de importância das

emissões correntes (totais ou absolutas) e acumuladas recentes de alguns países que ficaram

de fora do Anexo 1.

Alguns aspectos das mudanças recentes nos perfis de emissão de gases de efeito

estufa podem ser observados pela contribuição dos principais países para as emissões totais,

incluindo AFOLU, na Figura 2.4.

A Figura 2.4 mostra os dez maiores emissores, apresentados como nove países

mais uma região, a União Europeia, composta por 28 países39

, num total, portanto, de 37

38 É interessante apontar que o grande avanço da industrialização no panorama mundial no segundo Pós-Guerra

corresponde, não por coincidência, ao crescimento exponencial das emissões globais de gás carbônico. Esse é o

período cognominado por Steffen et al (2007, 2015) de Great Acceleration.

39 “União Europeia 28” corresponde à atual configuração de países que integram a UE em sua configuração

econômica e política. Integram o grupo: Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia, Dinamarca,

Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia,

Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Polônia, Portugal, Reino Unido, República Tcheca, Romênia e Suécia (para

outras informações, cf. site oficial da União Europeia: https://europa.eu/european-union/about-eu/countries_pt).

Page 73: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

73

países. Os dados se referem às emissões anuais totais, que são conhecidas também como

emissões absolutas. As emissões absolutas correspondem às emissões correntes de cada um

desses países, ou seja, a quantidade de GEEs emitida pelo país (medida em MtCO2e) naquele

ano. É, portanto, um conceito de fluxo. O conceito de emissões absolutas (ou anuais totais ou

ainda correntes) é relevante porque seu cômputo através do tempo ajuda a explicar as

concentrações atmosféricas de GEEs. Essas concentrações, também reportadas em MtCO2e,

constituem o estoque desses gases na atmosfera, cujo aumento ao longo do tempo é o

responsável pelo fenômeno das mudanças climáticas induzidas por ações antrópicas.

Figura 2.4 - Emissões anuais de GEE, incluindo AFOLU* (2012)

* AFOLU – Agriculture, Forestry and Other Land Use

(Agricultura, Setor Florestal e Outros Usos da Terra)40

Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da CAIT – Climate Data Explorer. 2016.

Washington, DC: World Resources Institute. Disponível em: http://cait.wri.org/historical

Nota: os números em destaque correspondem aos valores acumulados.

40 Agricultura, Floresta e Outros Usos da Terra, ou simplesmente AFOLU, constitui o setor que representa cerca

de um quarto (~10-12 GtCO2e /ano) das emissões antrópicas líquidas de GEE, sendo que as principais causas na

origem dessas emissões são: i) o desmatamento; ii) as emissões agrícolas de manejo do solo e de nutrientes; e iii)

a pecuária (IPCC, 2014b)

69,7 % 61,8 %

78,6 %

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

Emissões absolutas de GEE (MtCO₂e‍ )

População (pessoas) PIB - Paridade do poder deCompra (Milhões Inter$(2011))

China Estados Unidos União Europeia (28) Índia

Federação Russa Indonésia Brasil Japão

Canadá México Resto do Mundo

Page 74: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

74

Deste modo, se os grandes emissores de GEEs ao longo da história

desempenharam um papel fundamental até agora para as mudanças climáticas, novos

poluidores passam a contribuir substantivamente para a determinação do clima do planeta no

futuro.

É possível constatar, analisando o gráfico, que trinta e sete países eram, em 2012,

os responsáveis por 69,7% das emissões globais de GEEs. Esses países, neste mesmo ano,

respondiam por 78,6% do PIB global e abrigavam pouco mais de 61,8% da população

mundial. Observa-se que já em 2012 a China aparecia como o principal emissor global de

gases de efeito estufa. A Índia foi naquele ano o quarto emissor global, depois da União

Europeia (28 países). A lista segue, na seguinte ordem: Federação Russa, Indonésia e Brasil

(que ficou, portanto, como o sétimo maior emissor em 2012).

Vale a pena examinar um pouco o ranking dos maiores emissores correntes,

conforme é possível observar na Figura 2.5, abaixo.

Figura 2.5- Ranking dos dez maiores emissores de GEE em 2012

(em Kt CO2e)41

Fonte: WorldBank Database (2017)

A ordem de classificação dos maiores emissores globais, em 2012, foi: China

(com 12,4 Gt de CO2e; o que equivalia a 23,25% do total global das emissões correntes

naquele ano), EUA (com 6,3 Gt; 11,84%), Índia (com 3,0 Gt; 5,6%), Brasil (também com

pouco menos de 3,0 Gt; 5,58%), Federação Russa (com 2,8 Gt; 5,23), Japão (com 1,5 Gt;

2,76%), Canadá (com pouco mais de 1 Gt; 1,92%), Alemanha (com 951 Mt; 1,77%), Congo

41 A base de dados do Banco Mundial apresenta as emissões por país em Kt de CO2e. As conversões das

unidades de medida para as massas de emissões podem ser entendidas da seguinte forma: 1Gt equivale a 109,

1Mt equivale a 106 e 1Kt equivale a 10

3 toneladas de CO2e. Fonte:

http://www.ipcc.ch/ipccreports/tar/wg3/index.php?idp=477

Page 75: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

75

(802 Mt; 1,49%) e Indonésia (com 780 Mt; 1,45%). Portanto, neste ano, o Brasil apareceu

como o quarto maior emissor global, respondendo por 5,6% das emissões totais em 2012.

Note-se que esses dez maiores emissores contribuíram, nesse ano, com 60,35% das emissões

globais.42

Evidentemente, se as emissões para os países da União Europeia forem agrupadas

para o conjunto dos países desse bloco, suas emissões continuarão a representar um volume

muito expressivo do total. O bloco ficaria, neste caso, com a terceira colocação e o Brasil

passaria a ser o quinto maior emissor corrente global de GEE.

Com o ganho de importância dessas emissões correntes, o princípio das

responsabilidades históricas que também reforçava o princípio de responsabilidades comuns,

porém diferenciadas (PRCD) sob o regime de Kyoto, perde sua força. Ribeiro destaca que:

“Países industrializados depois da Segunda Guerra Mundial [...] possuem uma

responsabilidade menor que os países da Primeira Revolução Industrial, já que emitiram muito

menos gases-estufa do que os demais industrializados. Não por acaso, [...] não estão entre os

países do anexo 1. A eles, porém, certamente caberá alguma restrição de emissão nos próximos

anos. Isso decorre tanto do avanço da industrialização em seus territórios, que em geral alojam

etapas da produção internacionalizada mais poluentes ou intensivas em consumo energético,

quanto da pressão dos Estados Unidos, o principal opositor da exclusão do controle de

emissões de gases-estufa por esse conjunto de países. Aliás, baseando-se nessa distinção

justificam sua recusa em ratificar o Protocolo de Kyoto. ” (Ribeiro, 2002, p. 78).

Para que se evite um nível de mudanças climáticas dramáticas, seria necessário,

de acordo com o AR5, que o nível de aquecimento global não ultrapassasse 2ºC. Neste

sentido, é evidente que todos os países identificados responsáveis pela maior parte das

emissões precisariam urgentemente reduzi-las.

As dificuldades já mencionadas – a oposição dos Estados Unidos, a retirada do

Canadá e outras posições reticentes de países integrantes do Anexo I – constituem resistências

a esses princípios que regeram as negociações internacionais sobre as mudanças climáticas no

período de vigência do Protocolo de Kyoto.

Analisando as mudanças em curso ao longo das negociações climáticas recentes,

Bueno Rubial (2016) salienta que essas dificuldades devem ser compreendidas, também,

como uma disputa pela liderança no regime climático.

Na visão de Bueno Rubial (2016), as dificuldades apontadas no engajamento dos

diferentes países, como Estados Unidos e Canadá, ao regime climático do Protocolo de Kyoto

têm a ver com uma disputa pela liderança nos rumos das negociações.

42 Nessa passagem foram utilizados dados sobre as emissões de GEE extraídas do WorldBank Database que, por

sua vez, disponibiliza dados extraídos da Emissions Database for Global Atmospheric Research (EDGAR), Joint

Research Centre da União Europeia. Essa base foi empregada excepcionalmente neste caso devido à

indisponibilidade, no momento da pesquisa, da CAIT/WRI, que estava fora do ar, para atualizações.

Page 76: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

76

A autora argumenta que a existência e a estabilidade de um regime internacional é

o resultado da manifestação de um Estado ou coalizão de forças hegemônicas, que conferem

ao regime suas características de robustez e de eficácia. Isso aconteceu com a União Europeia,

de acordo com Bueno Rubial (2016, p. 81), enquanto vigeu o Protocolo de Kyoto. A EU

exerceu um papel de liderança em sucessivas Convenções das Partes. Essa estabilidade do

regime climático do Protocolo de Kyoto começou a se fragilizar, ainda de acordo com a

autora, quando os Estados Unidos se mostraram interessados, sob a presidência de Obama, a

participar ativamente das mudanças das regras e a uma reinterpretação dos princípios (como o

PRCD e o das responsabilidades históricas) desse regime.

Em 2009, quando da COP 15, de Copenhague, uma nova coalizão de forças

começa a se estruturar, conforme observa Viola (2010). Diante da discussão sobre ampliação

das responsabilidades dos países emergentes, o BASIC tomou forma. Brasil, África do Sul,

Índia e China, países que apresentaram taxas de crescimento recentes importantes (assim

como a Federação Russa que, juntamente com os anteriores compõe o BRICS - sigla sugerida

por Jim O´Neill, economista do banco Goldman Sachs em 200143

).

Desta forma, a onda de crescimento econômico que atingiu uma parte dos países

que integravam o que foi chamado no quadro anterior de “Resto do Mundo”, levou também a

uma mudança da configuração dos países em termos de suas contribuições para as emissões

globais, como se observa no Quadro 2.2.

43 MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES – BRASIL (2016). Disponível em: <

http://brics.itamaraty.gov.br/pt_br/sobre-o-brics/informacao-sobre-o-brics>.

Page 77: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

77

Quadro 2.2 - Emissões de CO2, correntes e acumuladas, população e Produto Interno Bruto,

por grupo de países, numa configuração “pós-Kyoto”

Indicadores

Acumuladas

(1850 - 2012) (1) *

Correntes (2012)

(1) * População

** PIB

***

Paí

ses

Anexo I (2)

68,59% 44,82% 18,09% 63,25%

Resto do Mundo I (3)

31,41% 55,18% 81,91% 36,75%

Anexo I (excluindo a

Federação Russa)

61,08% 39,73% 16,07% 60,34%

BRICS 14,70% 41,28% 42,52% 20,58%

BASIC (4)

7,19% 36,19% 40,50% 17,66%

Resto do Mundo II (5)

24,21% 18,99% 41,41% 19,08%

Fontes: Elaboração própria a partir da base de dados da * CAIT, ** United Nations - Department of Economic

and Social Affairs e *** World Bank

Notas: (1)

Emissões de CO2, excluindo AFOLU. (2)

Países do Anexo I, segundo a configuração original do Protocolo de Kyoto. (3)

Resto do Mundo I: todos os países do mundo, excluindo-se os do Protocolo de Kyoto. (4)

BASIC – Brasil, Índia, China e África do Sul (5)

Resto do Mundo II = Total de Países – [(ANEXO I – Federação Russa) + BRICS]

Observando as emissões do BRICS, nota-se que, no ano de 2012 – o mais recente

para o qual as informações estão disponíveis – esse conjunto respondeu por 41,28% das

emissões correntes, embora por somente 14,7% das acumuladas.

As contribuições diferenciadas dos blocos de países para as emissões correntes e

acumuladas evidencia a crescente participação dos também chamados países emergentes para

os fluxos correntes de emissões de GEE em geral, e de CO2 em particular. Essa mudança no

perfil das emissões constitui um forte argumento nas negociações internacionais para que

esses países assumam metas obrigatórias de redução dessas emissões.

Essa reorganização de países em blocos também significou a aproximação, ou,

como sugere Viola (2010), uma nova coalizão de forças. Essa coalizão produziu o Acordo de

Copenhague que, conforme aponta o autor:

“declara que é necessário evitar o aumento de 2oC da temperatura média da Terra e deixa o

anexo final em branco para que os países definissem até o fim de janeiro de 2010 quais as

metas de mitigação a que se comprometeriam” (Viola, 2010, p. 19).

Viola (2010) salienta que, enquanto o regime de Kyoto cobria somente 20% das

emissões globais de GEEs, no Acordo de Copenhague essa cobertura chegava a 80%,

fundamentalmente em razão de um maior número de países apoiadores, incluindo EUA, UE,

Japão, Canadá, Austrália, Coreia do Sul, China, Índia, Brasil, África do Sul e Indonésia.

Embora não tendo sido legalmente vinculante, veio a se tornar a base para o novo acordo

global, que veio a ser estabelecido cinco anos mais tarde, em Paris, como será visto mais

adiante nesta dissertação.

Page 78: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

78

Estes foram o momento, 2009, e o lugar, Copenhague, que marcaram o início da

mudança não apenas na arquitetura do que virá a ser um novo acordo climático pós-Kyoto,

mas também uma mudança no regime climático, ou seja, numa nova relação de liderança.

Conforme observa Bueno Rubial (2016, p. 81):

“De 1992 a 2009 a liderança europeia plasmou sua abordagem ´de cima para baixo´ com

compromissos de mitigação estabelecidos pelo regime [climático] para os Estados

concretizados no Protocolo de Kyoto para os países desenvolvidos. O compromisso

internacionalmente assumido permitiu à União Europeia distribuir o peso de sua

autoproclamada liderança internacional entre seus Estados – ‘Partes’- por meio de um sistema

solidário de redução de emissões, com um papel relevante para o mercado e movido por alguns

atores que tiveram papel prioritário como a Alemanha e a Grã-Bretanha”.

O regime climático de Kyoto sofreu, de acordo com Bueno Rubial (2016), uma

desestabilização em 2009, com a determinação dos EUA de desempenharem um papel em sua

discussão, apontando para mudanças:

“[...] no momento em que os EUA se dispuseram a interromper a interpretação europeia do

regime [climático], questionou sua eficiência aderindo a uma leitura de regime no qual cada

Estado estabeleceria o que poderia, como poderia e como gostaria de contribuir, a partir das

NDCs – contribuições nacionalmente determinadas – como um veículo de ação climática.”

(Bueno Rubial, 2016, p. 82)

Essa nova abordagem para a ação climática, por meio das NDCs, foi consolidada

no Acordo de Paris. Antes de sua consolidação, essa abordagem vai tomando forma e

ganhando adesões ao longo das sucessivas Conferências das Partes.

Um momento importante nessas negociações ocorreu em Durban, na África do

Sul, durante a 17ª Conferência das Partes, em 2011, quando as Partes concordaram em fechar

um novo acordo no ano de 2015, na COP 21 em Paris, para suceder o Protocolo de Kyoto e

entrar em vigor a partir de 2020. O período entre 2015 e 2020, de acordo com o presidente do

IPCC Rajendra Pachauri, seria crítico, pois para que se avançasse rumo a um

desenvolvimento de baixo carbono, as emissões globais precisariam alcançar seu pico e

começar a cair. O intuito geral em Durban era, consistentemente com as contribuições

científicas consolidadas pelo IPCC, de elevar as ambições de redução das emissões e também

prever e adequar o financiamento de um desenvolvimento de baixo carbono nos países

desenvolvidos e nos países de menor desenvolvimento (FURH et al, 2013).

O documento final da COP 17, conhecido como Plataforma Durban, estendeu o

período de vigência do Protocolo de Kyoto, que expiraria no ano seguinte, 2012, para o

período de 2013 a 2015, quando seriam fechadas as negociações para um novo acordo

climático. As partes signatárias da Plataforma Durban deveriam apresentar metas de redução

de emissões de GEE até o ano seguinte, na Polônia, o que constitui um embrião para as

Page 79: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

79

iNDCs. Em Durban também foi reafirmada a concordância das Partes em estabelecer um

novo acordo climático em 2015.

Foi no transcorrer das negociações por ocasião da COP 19, em Varsóvia, na

Polônia, em 2013, que se consolidou a proposta, constante de seu documento final “Further

Advancing Durban Platform”, de que as Partes deveriam apresentar na COP 21, isto é, dali a

dois anos, seus documentos oficiais nos quais constariam suas “contribuições” (e não

“compromissos”) nacionais para a redução das emissões de GEE.

Conforme o §2b do documento, acorda-se a:

“To invite all Parties to initiate or intensify domestic preparations for their intended nationally

determined contributions, without prejudice to the legal nature of the contributions, in the

context of adopting a protocol, another legal instrument or an agreed outcome with legal force

under the Convention applicable to all Parties towards achieving the objective of the

Convention as set out in its Article 2 and to communicate them well in advance of the twenty-

first session of the Conference of the Parties (by the first quarter of 2015 by those Parties

ready to do so) in a manner that facilitates the clarity, transparency and understanding of the

intended contributions, without prejudice to the legal nature of the contributions;”

Portanto, as propostas nacionais ganham ali a terminologia “iNDC”. De acordo

com FURH et al (2013), essa terminologia resolve o desacordo entre os países desenvolvidos

e as economias emergentes sobre termos anteriormentes empregados nas negociações como

“compromissos para todos” (commitments to everyone) versus “compromissos apenas para

países desenvolvidos e ações voluntárias para países em desenvolvimento” (commitments for

developed countries only and voluntary actions for developing countries). Além disso, os

autores salientam que esta terminologia:

“aponta para uma questão sobre a qual todas as maiores economias e maiores emissores

estavam prontos para concordar: quaisquer que fossem as contribuições que os países estivesse

dispostos a fazer no contexto do acordo de 2015, essas deveriam ser apenas promessas ´de

baixo para cima´ e determinadas unicamente por aquilo que os países julgassem acomodar em

suas circunstâncias nacionais, e não se basear em necessidades urgentes de reduções globais de

emissões. ” (FURH et al, 2013, s.p.)

O documento oficial que fechou as negociações das 20ª Conferência das Partes,

em Lima, no ano de 2014, chamado “Chamamento de Lima para a Ação sobre o Clima” que

traduz um consenso sobre as regras básicas para as responsabilidades assumidas pelas Partes

para chegar ao novo acordo global no ano seguinte, em Paris. Neste documento, as Partes se

comprometem a apresentar suas propostas nacionais para a redução das emissões de GEE, ou

seja, suas iNDCs, até o mês de outubro de 2015 (ORTIZ, 2014).

Para chegar ao documento do novo acordo, as partes tiveram cerca de dois anos a

partir da COP19, portanto, para decidir e apresentar suas NDCs. Ao longo do ano de 2015 a

maioria das partes já havia apresentado suas NDCs ao Secretariado da UNFCCC, as quais

Page 80: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

80

foram discutidas na 21ª Conferência das Partes, que em Paris entre 30 de novembro e 12 de

dezembro de 2015.44

O documento final que sela as negociações da COP21 foi chamado de Acordo de

Paris (Paris Agreement), cujas determinações incluem:

Deter o aumento da temperatura global média do planeta abaixo de 2°C acima dos

níveis pré-industriais e empenhar esforços para limitar o aumento da temperatura a

1,5°C acima dos níveis pré-industriais, reconhecendo que isso reduziria

significativamente os riscos e impactos da mudança climática;

Aumentar a habilidade para adaptação aos impactos adversos das mudanças

climáticas e estimular a resiliência climática e o desenvolvimento com baixas

emissões de GEEs, de uma maneira que não ameace a produção de alimentos;

Tornar os fluxos monetários consistentes com um caminho direcionado à redução

das emissões de GEEs e ao desenvolvimento resiliente do ponto de vista climático"

(UNITED NATIONS, 2015).

As contribuições de cada país devem envolver a mitigação das mudanças

climáticas, a promoção de medidas de adaptação e ainda a geração de oportunidades

econômicas, num enfoque em que a busca pela construção de uma sociedade mais justa e

inclusiva aparece aliada ao estímulo à competitividade (PORTAL

ECODESENVOLVIMENTO, 2016). Ainda não há como dizer em que medida poderá haver,

contudo, a conciliação entre competição e cooperação entre os países na busca por um futuro

possível sob as mudanças climáticas.

Observando os rumos das negociações, como pontuado nesta seção, Bueno Rubial

(2016) argumenta que o novo regime climático que nasce a partir da COP 15 pode ser

facilmente caracterizado como bottom up, enquanto que o regime anterior, que vigeu entre

1992 e 2009, foi do tipo top down.

O que possibilitou a consolidação dessa abordagem, como argumentam Viola

(2010), Viola & Basso (2016) e Bueno Rubial (2016), foi a aliança entre os Estados Unidos e

o grupo BASIC, que se manteve desde Copenhague, em 2009, até Paris, em 2015.

44 Como já mencionado, os países – ou Partes - apresentam suas contribuições ao Secretariado da UNFCCC. De

acordo com as informações publicadas oficialmente no Paris Contributions Map (http://cait.wri.org/indc/#/), até

agora (07 de março de 2017), das 190 partes, 163 apresentaram suas contribuições, sendo que a União Europeia

submeteu uma NDC representando seus 28 países-membros. O Acordo de Paris estabeleceu (em seu par. 13) que

as partes devem apresentar suas contribuições (INDCs) “well in advance of COP 22, in Marrakesh” (UNITED

NATIONS FRAMEWORK CONVENTION ON CLIMATE CHANGE, 2017).

Page 81: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

81

2.3. Velhos e novos conflitos no regime climático pós-Kyoto

Sugere-se aqui a utilidade de três outras métricas para caracterizar as mudanças de

regime climático e apontar alguns possíveis conflitos que tenderiam a se cristalizar,

demandando eventualmente esforços de negociação e soluções.

Duas dessas métricas são propostas para avaliar e compreender as emissões dos

diferentes países/regiões em termos de sua intensidade de emissões: uma delas com relação à

intensidade de emissões do PIB (ton CO2e/milhões de US$ de PIB) e outra às emissões

provenientes do consumo de energia fóssil. A terceira, relevante do ponto de vista histórico,

tem a ver com a contribuição de cada país para o acúmulo (ou estoque) de GEEs na

atmosférica. Vamos a elas.

Do ponto de vista do nível de emissões de GEEs por PIB, trata-se de uma métrica

comum para a intensidade de emissões. É útil particularmente quando se examinam as

possibilidades de descarbonização de uma economia nacional ou de um sistema energético.

A figura 2.6, na próxima página, apresenta a intensidade de emissões totais de

GEEs e as emissões energéticas de GEEs do PIB para os dez principais países emissores. As

médias mundiais para as emissões totais pelo PIB e médias mundiais de emissões

provenientes do consumo de energias fósseis são, respectivamente, de 508,8 e de 375,2

toneladas de GEE (tCO2e) por milhão de US$ de PIB. Conforme se observa, as intensidades

variam entre os países.

Page 82: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

82

Figura 2.6 - Intensidade de emissões totais / PIB PPC¹e de emissões provenientes do

consumo de combustíveis fósseis para os 10 maiores emissores (2012)

Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da CAIT Climate Data Explorer. 2015.

Washington, DC: World Resources Institute. Disponível em: http://cait.wri.org

Notas: (1)

Produto Interno Bruto (PIB) em Paridade de Poder de Compra (PPC) per capita

Observa-se, ainda, que Indonésia, Rússia, China, Brasil e Canadá são os países

que estão acima da média mundial em termos de emissões totais de GEE por PIB. Entretanto,

quando se trata das emissões provenientes do consumo de combustíveis fósseis, os dados

mostram que Rússia, China e Canadá estão acima da média mundial, enquanto os 34 demais

países estão abaixo da média mundial.

O que explica essas diferenças tem a ver com fatores gerais – no caso a

quantidade de emissões do país e o tamanho da economia medida pelo seu PIB -, mas, o mais

relevante, depende de fatores específicos, como o mix de fontes energéticas na matriz primária

do país e a intensidade do uso de fontes fósseis para a geração de eletricidade e de calor, para

a manufatura (indústria) e para o transporte.

Isso explica, logicamente, porque muitos países direcionam suas políticas, seus

planos e iniciativas associadas para a redução de emissões focalizando aquelas relacionadas à

oferta interna e ao consumo de energia, enquanto outros devem se esforçar para reduzir as

emissões associadas a outros aspectos de sua economia. Nos casos da Indonésia e do Brasil,

por exemplo, cujas intensidades de emissões têm estado fortemente associadas ao

desmatamento e às mudanças no uso da terra, esses devem ser, evidentemente, focos

privilegiados, embora não necessariamente exclusivos, de suas políticas.

675,5 735,4

593,1

508,8

366,7

470,0

270,5

379,8

906,2

238,4

640,7 625,2 595,4

423,6 375,2

343,9 346,2

276,5 248,9

237,6

210,1 165,1

0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1000

FederaçãoRussa

China Canadá MédiaMundial

EstadosUnidos

Índia Japão México Indonésia UniãoEuropéia

(28)

Brasil

tCO₂e‍ /

Mill

ion

$ G

DP

Emissões Totais de GEE por PIB Emissões Energéticas por PIB

Page 83: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

83

Conforme se observa na Figura 2.7, as emissões totais de gases de efeito estufa

dos países emergentes se tornaram relevantes a ponto de ser muito difícil nas negociações

internacionais manter os chamados BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul –

com metas puramente voluntárias num novo regime pós-Kyoto.

Figura 2.7 - BRICS: Emissões totais de GEEs (MtCO2e) excluindo AFOLU (2012)

Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da CAIT Climate Data Explorer. 2016.

Washington, DC: World Resources Institute. Disponível em: http://cait.wri.org/historical

Esses países, que passaram por um período de crescimento acelerado, anterior à

crise de 2008, viveram uma mudança radical no perfil de suas emissões de GEEs.

Enfim, ao se considerar as mudanças trazidas pelo avanço da industrialização

sobre a composição recente das contribuições dos países em desenvolvimento (ou

emergentes) para as emissões correntes de GEE, concorda-se aqui os arranjos entre os países

em termos de atribuição de responsabilidades sobre as emissões acumuladas vão se tornando

progressivamente defasados. Portanto, as métricas apontadas permitem reforçar a ideia de que

o regime climático de Kyoto se tornou ineficaz, além de não poder ser considerado robusto.

Ainda que se considere a importância dos estoques históricos para uma

distribuição justa de responsabilidades entre os países, o vertiginoso aumento dos fluxos

recentes desses gases a partir do avanço da industrialização no mundo emergente recoloca a

questão da obrigatoriedade para os ajustes necessários nos países em desenvolvimento.

Encontra-se aí, portanto, uma forte evidência para as mudanças de regime climático para as

negociações, conforme já observado anteriormente.

Page 84: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

84

Entretanto, outras considerações devem se fazer pertinentes ao se considerar outra

métrica. Na Figura 2.8, a seguir, observamos as emissões totais de GEE per capita. Ao

analisar as emissões em base per capita, observam-se as contribuições para essas emissões em

nível individual por país. Observe-se que, com essa métrica, a ordem dos dez maiores

emissores se altera consideravelmente.

Figura 2.8 - Emissões totais per capita de GEE, incluindo AFOLU

(tCO2e per capita), em 2012

Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da CAIT – Climate Data Explorer. 2016.

Washington, DC: World Resources Institute. Disponível em: http://cait.wri.org/historical

Nota: “Mundo” corresponde às emissões médias mundiais.

Entre os dez principais emissores absolutos, apenas dois têm emissões per capita

abaixo da média mundial, o México e a Índia.

Canadá, Estados Unidos e a Federação Russa emitem mais que o dobro da média

global, que é de 6,76 tCO2e per capita. Além disso, as emissões per capita da Índia,

representam apenas um terço da média global.

Essas métricas – emissões correntes (absolutas totais e per capita) – são

relevantes tanto para a compreensão dos perfis das emissões dos países/regiões, que são

cruciais nas negociações internacionais, quanto para deslindar elementos relevantes para

identificar regiões prioritárias para a implementação de políticas que visem a redução das

emissões, ou seja, países que deveriam ser pioneiros na descarbonização de suas economias.

Além disso, deve ficar claro que um argumento que continua pertinente é o de que

as emissões históricas – ou seja, as acumuladas que respondem pela maior parte da

24,6

18,6

15,8

9,5 9,2 8,2 8,0 7,9

6,8 6,2

2,3

0

5

10

15

20

25

30

Canadá EstadosUnidos

FederaçãoRussa

Japão Brasil UniãoEuropeia

(28)

Indonésia China Mundo México Índia

Page 85: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

85

concentração desses gases na atmosfera – são resultado dos processos de desenvolvimento

industrial original, concentrados, por sua vez, nos países do Anexo I no regime de Kyoto.

Essas contribuições históricas continuam a explicar as concentrações atmosféricas de GEEs e,

por esta razão, o PRCD ainda faz sentido. As mudanças nas emissões correntes, ou seja, nos

fluxos de gás carbônico que se vão acumulando a partir do período mais recente, embora

importantes e merecedoras da mais alta atenção, não mudam essa realidade a ponto de revogar

a responsabilidade daquela pequena parcela da humanidade que tanto se beneficiou até então.

Essa realidade que salta aos olhos do observador não esgota, todavia, as

possibilidades analíticas que se abrem ao se examinar os indicadores apresentados no Quadro

2.2, mais acima. Observem-se, por exemplo, os dados relativos, ainda, às emissões correntes,

à população e ao PIB. Quanto às emissões correntes, embora as contribuições dos BRICS

tenham sido expressivas, se recolocarmos a Federação Russa no grupo dos poluidores mais

antigos, beneficiários históricos da queima dos combustíveis fósseis, temos que as emissões

correntes dos países do Anexo I (44,82%) ainda superam de forma significativa a dos países,

digamos, BASIC (36,19%). É possível afirmar que essa queima tem favorecido uma parcela

relativamente pequena da população mundial (os números correntes indicam pouco mais de

18%), contra os 40,5% da população mundial correspondente aos BASIC (novamente, sem

levar em conta os problemas distributivos internos aos países). O PIB de 2012, como se nota,

ainda ficou concentrado fortemente nos países do Anexo 1, que detiveram 63,25% do

montante global, enquanto que os BASIC detiveram apenas 17,66% do total.

A maior importância relativa das emissões correntes tanto para os países do

BRICS quanto do BASIC precisa ser avaliada levando-se em conta as tendências mais

recentes da divisão internacional do trabalho, com o estabelecimento de plantas industriais

nesses países, que recebem investimentos de multinacionais provenientes dos países centrais,

com o desenvolvimento – de forma muito desigual entre esses países – de etapas de

manufatura dentro das chamadas cadeias produtivas globais. Como é sabido, as estratégias

locacionais dessas empresas envolvem a busca por fatores como a mão de obra qualificada ou,

por vezes, simplesmente mais barata, a disponibilidade de recursos energéticos e fontes de

matéria-prima, além do acesso a mercados locais. Também são atraídas por aspectos

regulatórios e de policy, como incentivos fiscais, baixa regulamentação ambiental e do

trabalho, oferecimento de infraestrutura e outros benefícios pelos governos locais, dentre

outros (FEENSTRA, 1998).

Page 86: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

86

Algo análogo poderia ser dito com relação aos determinantes locacionais de

empreendimentos intensivos em emissões de GEEs. A este respeito, tem sido produzida uma

literatura dedicada ao que se convencionou chamar “vazamento de carbono” – carbon

leakage. De acordo com Eichner & Pethig (2011, p. 767)45

:

“Qualquer política nacional para reduzir emissões arrisca a aumentar os custos domésticos da

energia e então propicia a expansão das firmas em países que não se engajam em tais políticas.

Por esta razão, os esforços dos primeiros países serão compensados em alguma medida pelo

crescimento das emissões nos países lenientes”.

Isso implica a necessidade de que haja políticas domésticas em todos os países

para a redução das emissões. Num contexto em que apenas alguns países adotem políticas

para esse fim, aqueles que não o fizerem poderão se tornar “paraísos” para investimentos em

setores intensivos nessas emissões.

Num tal contexto, é bastante lógico supor que pelo menos parte das emissões

produzidas nos territórios que recebem esses investimentos não estão associadas a bens que

serão consumidos nesse próprio território, mas sim nos países importadores dessa produção.

2.4. Síntese e considerações finais ao capítulo

No capítulo 1 dessa dissertação, foram recuperadas e apresentadas contribuições do

Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas para a sistematização do conhecimento

científico em quatro dimensões: i) sobre a origem antrópica do problema; ii) sobre as relações

entre as emissões de GEE, suas concentrações na atmosfera e as mudanças climáticas; iii)

sobre os efeitos esperados dessas mudanças climáticas sobre os sistemas naturais e

socioeconômico; e iv) sobre os caminhos apontados para a mitigação do problema e para a

adaptação dos sistemas socioeconômicos às mudanças previstas.

Esse conhecimento, reunido, revisado e organizado de forma sistemática, conta com

uma perspectiva de sistêmica, ou seja, leva em consideração as interdependências entre os

sistemas naturais e socioeconômicos. Uma estratégia para enfrentar as dificuldades

metodológicas de colocar em síntese esses conhecimentos, como foi visto no primeiro

capítulo, é recorrer à análise de cenários. Os resultados gerados pelos exercícios de

cenarização, referidos no capítulo anterior, constituem a base de conhecimento científico

sobre as quais se dão as negociações internacionais para o enfrentamento do problema das

mudanças climáticas.

45 Tradução livre da seguinte passagem, dos autores: “Any national policy of curbing emissions is bound to raise

domestic energy costs and thus enables firms in nonabating countries to expand. For that reason, the effort of

abating countries will be offset to some extent by increasing emissions in nonabating countries”.

Page 87: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

87

Essas negociações são objeto da exposição e da reflexão deste segundo capítulo.

A discussão e a análise propostas por este capítulo devem oferecer elementos para a

compreensão dos rumos das negociações climáticas internacionais que têm levado a uma

reconfiguração da arquitetura do regime climático, com mudanças substantivas em termos de

liderança, de coalizão de países e de atribuição de responsabilidades.

A arquitetura do Protocolo de Kyoto colocava os países de industrialização primitiva e

aqueles que se industrializaram fortemente no período anterior ao ano de 1990 no chamado

Anexo I, com responsabilidades obrigatórias para o enfrentamento das mudanças climáticas,

tanto do ponto de vista do aporte de soluções tecnológicas, de recursos e do pioneirismo nas

políticas públicas, sobretudo as climáticas e as energéticas. O regime climático de Kyoto

abraçou os princípios de boa governança ambiental e social, como o princípio do poluidor-

pagador, o da precaução, o PRCD e o princípio das responsabilidades históricas. Na

“ausência” norte-americana devida a não-ratificação do Protocolo nos períodos dos governos

Bush, a liderança foi exercida pela União Europeia. Esta e outras ausências tendem a explicar,

como foi visto, a ineficácia, a falta de robustez e a instabilidade do regime climático de

Kyoto.

Na nova arquitetura que emerge a partir da COP 15, de Copenhague, novas coalizões

de interesse ganharam espaço e protagonismo, representadas sobretudo pela vontade de

participação do governo de Barack Obama – e que parece se ofuscar sob o governo Trump – e

pelo BASIC.

Observou-se, neste capítulo, que essa reconfiguração encontra justificativa em

mudanças nos perfis de emissões de países e de grupos de países. Por outro lado, os novos

interesses em coalizão parecem colocar em questão alguns dos princípios mais fundamentais

da Convenção da ONU sobre Mudanças Climáticas.

Por fim, discute-se que essa reconfiguração não deve ser considerada ela própria livre

de conflitos. A distinção entre fluxos e estoques continua sendo fundamental, uma vez que o

limite de aquecimento de no máximo 2ºC até o final do século XXI, que foi adotado como

meta global sobre a qual devem se dar os acordos internacionais para a limitação global das

emissões, implica que exista um máximo de concentração de emissões na atmosfera – um

estoque máximo. Esse máximo de concentração implica, por sua vez, limites às emissões –

fluxos máximos. Sendo esses fluxos uma categoria global, deve haver uma partilha entre os

países, ou seja: uma limitação dos fluxos de emissões de cada país a fim de compor os fluxos

totais e, daí suas contribuições específicas para o estoque máximo.

Page 88: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

88

O conflito deve ficar mais claro quando se considera a questão distributiva com

relação ao clima: o conceito de “Orçamento Global de Carbono” (Global Carbon Budget) que

implicaria limitar as emissões per capita a cerca de 1 a 3 toneladas por habitante ao ano no

horizonte de 2050 para que o planeta aqueça “apenas 2ºC” até o final do século. Assim como

PIB per capita é um valor médio que nada tem a ver com distribuição, o orçamento global de

carbono deve ser “distribuído” entre as nações. Este também é um aspecto fundamental para

se compreender as dificuldades das negociações internacionais sobre mudanças climáticas que

estão em curso e as que estão por vir.

Page 89: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

89

Capítulo 3 – Brasil: perfil das emissões e intenções apresentadas à COP21

A exposição e as reflexões sobre as negociações internacionais sobre mudanças

climáticas no contexto do regime do Protocolo de Kyoto e pós-Kyoto e seus resultados em

termos da emergência de um novo acordo climático – o Acordo de Paris - realizadas no

capítulo anterior representam o contexto para compreender a situação e o papel do Brasil.

Neste sentido, este capítulo avança nos estudos de compreensão da

responsabilidade do Brasil para o debate das mudanças climáticas, apresentando como

objetivo a identificação das emissões de GEEs do Brasil e quais são as medidas de mitigação

que o país espera promover através da sua Contribuição Pretendida Determinada

Nacionalmente (iNDC)

O capítulo está organizado em duas seções. Na primeira seção é apresentada e

discutida uma breve caracterização das emissões de gases de efeito estufa do Brasil, de modo

a permitir que se possa avaliar o problema, do ponto de vista de suas dimensões quantitativas

absolutas (o quanto se emite de gases de efeito estufa no país), da contribuição dos diferentes

setores para essas emissões e ainda da importância relativa do Brasil para as emissões de GEE

em escala global. Para tanto, recorreu-se a base de dados do Sistema de Estimativa de Gases

de Efeito Estufa (SEEG) do Observatório do Clima, que apresenta o registro das emissões de

GEE desde 1970. A segunda seção, por sua vez, apresenta as contribuições apresentadas pelo

Brasil para o alcance das metas globais de redução das emissões dos GEE, ou seja, a iNDC

brasileira apresentada por ocasião da 21ª Conferência das Partes, a COP 21, realizada em

Paris no final do ano de 2015. Para compor esta seção, foram levantados e analisados

documentos oficiais do Ministério das Relações Exteriores do Brasil para efeito de

compreensão do processo de consultas públicas para a elaboração das metas. Adicionalmente,

foram compiladas e sistematizadas as metas apresentadas pelo Brasil no âmbito iNDC.

Finalmente, as considerações finais recuperam sinteticamente a discussão do capítulo e

apresentam suas principais conclusões.

Como foi visto no capítulo anterior, as emissões de GEE do Brasil representam

uma parcela relativamente pequena do total global das emissões correntes de GEE, 5,58%

Page 90: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

90

para o ano de 201246

, correspondendo ao quarto ou quinto maior emissor de GEE no mundo

(a depender da inclusão ou não dos países da União Europeia como bloco).

Entretanto, é importante reconhecer que essas emissões cresceram de forma

importante no período recente, atingindo no ano de 2004 um pico de emissões brutas de 3,824

Mt CO2e e de emissões líquidas (descontando as remoções) de 3.404 Mt CO247

.

Outra observação importante, evidenciada neste capítulo, é que as emissões

associadas à Mudança no Uso da Terra (MUT), que englobam alterações no uso e cobertura

da terra (inclusive, portanto, o desmatamento), a queima de resíduos florestais e a calagem de

solos, representam a parcela mais substantiva das emissões totais do país. Em 1990, a MUT

era responsável por 66% das emissões correntes de GEE no Brasil. Embora essa participação

tenha caído para 40% em 2014, as emissões acumuladas da MUT no período foram muito

significativas. Conforme Brandão Jr. & Barreto (2016), entre 1990 e 2014, a MUT esteve na

origem de cerca de 56 bilhões de toneladas de CO2e, representando aproximadamente 65%

das emissões nacionais totais acumuladas no período. O desmatamento é a principal fonte de

emissões de GEE no conjunto da MUT. De acordo com os autores, apenas as queimadas no

bioma da Amazônia respondem por 43% das emissões do Brasil.

Excluindo-se a MUT, os setores de maior emissão correspondem,

respectivamente, à agropecuária e à energia. A agropecuária era responsável por 18% das

emissões brasileiras em 1990, enquanto a energia respondia por 12%. Em 2014, a

contribuição da agropecuária foi de 23% e a da energia, 26%. O aumento das emissões do

setor de energia foi, portanto, muito significativo e esteve associado ao aumento do uso de

combustíveis fósseis, em especial nos setores de transporte e elétrico48

.

Também será visto quais metas de redução de GEE estão associadas a esses

setores no conjunto das metas apresentadas pelo Brasil ao Secretariado da UNFCCC, ou seja,

a iNDC brasileira apresentada por ocasião dos preparativos para a COP21, em Paris, em 2015.

Como se analisa neste capítulo, essas metas são apresentadas de uma forma bastante genérica

e o documento iNDC não apresenta medidas para que sejam implementadas.

46 O Observatório do Clima traz a informação de que o Brasil ocupou, em 2015, o 6º lugar no ranking dos

emissores globais, atrás somente da China, EUA, Índia, Rússia e Indonésia, com 2,9% das emissões. C.f:

http://seeg.eco.br/pais/ 47

Idem.

48 As evidências para o setor elétrico são trabalhadas neste capítulo e retomadas no capítulo seguinte, juntamente

com observações para o caso do setor de transportes.

Page 91: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

91

2.1. Uma breve caracterização das emissões de GEEs do Brasil

O objetivo desta seção é apresentar e caracterizar o perfil das emissões de GEEs e

de CO2 no Brasil, tendo como foco privilegiado as contribuições do setor de produção/oferta

de energia. Adicionalmente, são observadas as emissões associadas aos setores energo-

intensivos, cujo estudo importa do ponto de vista das considerações necessárias para a

redução de emissões associadas não somente à oferta, mas também à demanda de energia.

Para tanto, são utilizados dados sobre emissões de GEEs em geral e de CO2 em

particular, privilegiando os recortes setoriais de interesse para compreender o perfil de

emissões associados a oferta e demanda de energia no Brasil. As fontes dos dados utilizados

são disponibilizadas pelo Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa

(SEEG) 49

, iniciativa do Observatório do Clima 50

que sistematiza as estimativas anuais das

emissões de GEEs no Brasil. Grande parte das análises dos dados apresentadas nesta seção

49 O SEEG – Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de Efeito Estufa - disponibiliza um portal na internet

para acesso tanto às estatísticas sobre as emissões quanto aos documentos analíticos. A produção dessas

estimativas respeita as diretrizes do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e são

baseadas nos dados coletados, sistematizados e publicados nos Inventários Brasileiros de Emissões e Remoções

Antrópicas de Gases do Efeito Estufa. A elaboração desses inventários por sua vez está a cargo do Ministério da

Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). O SEEG ainda conta com dados complementares baseados em

relatórios governamentais, institutos, centros de pesquisa, entidades setoriais e organizações não governamentais.

A base de dados do SEEG sobre emissões tem uma cobertura setorial que abrange os setores da Agropecuária,

Energia, Mudanças de Uso da Terra (MUT), Processos Industriais e Resíduos. O período coberto para os dados

analisados nesta dissertação abrange o período de 1970 a 2014 para esses setores, exceto para o setor de

Mudança de Uso da Terra, cuja série é disponibilizada apenas a partir de 1990. O Observatório do Clima

selecionou quatro instituições para a coordenação dos trabalhos técnicos de geração das estimativas: o Imazon,

responsável pelas estatísticas sobre mudança de uso da terra; o Imaflora, responsável pelos dados sobre a

agropecuária; o IEMA, que ficou responsável pelas estatísticas sobre energia e processos indústrias; e o ICLEI,

responsável pelos dados sobre resíduos. O suporte organizacional ao SEEG é dado pela Fundação Avina e pela

Fundação Getúlio Vargas. Quanto aos financiamentos, o SEEG conta ou contou com o apoio das seguintes

organizações: OAK Foundation, Fundación Avina, Latin American Regional Climate Iniciative (LARCI), ICs –

Instituto Clima e Sociedade, Climate and Land Use Alliance, Skoll Foundation e Fundação Porticus. A

coordenação geral do SEEG está a cargo do Eng. Tasso Azevedo que criou a metodologia estimativas inicial que

deu origem ao atual sistema implantado. O SEEG considera todos os gases de efeito estufa contidos no

inventário nacional como CO2, CH4 e N2O e os dados são apresentados também em carbono equivalente (CO2e),

tanto na métrica GWP (potencial de aquecimento global) como GTP (potencial de mudança de temperatura

global). Os dados incluem emissões, remoções e bunker (emissões por transporte internacional marítimo e

aéreo). Todos os dados do SEEG são disponibilizados em plataforma digital, onde pode-se consultar os dados

diretamente, assim como também obter por download a base de dados completa, com mais de 2 milhão de

registros, já preparada para consultas dinâmicas. Na plataforma online também é possível acessar infográficos

sobre as emissões de cada setor, notas metodológicas que explicam detalhadamente como o levantamento e

produção de dados são realizados e uma avaliação da qualidade dos dados. A partir de 2014 o SEEG passou a ser

adotado por coletivos de outros países. O primeiro SEEG implementado fora do Brasil foi o Peru. O SEEG

Global pode ser acessado pelo endereço: http://seeg.global.

50 O Observatório do Clima (OC) é uma entidade criada em 2002 na Fundação Getúlio Vargas que congrega, em

forma de rede, 30 organizações não governamentais de perfil sócio-ambientalista, com o objetivo de discutir a

problemática das mudanças do clima no contexto brasileiro.

Page 92: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

92

foram fundamentadas nos documentos produzidos também pelo Observatório do Clima com

respeito ao comportamento das emissões.

2.1.1. Evolução das emissões totais de GEEs no Brasil no período de 1970 a 2014

O histórico das emissões de GEEs, conforme mensuradas pela metodologia

sistematizada pelo SEEG, constitui o foco da análise nesta seção. Cabe, aqui, esclarecer a

natureza das atividades que estão à origem das emissões desses gases no Brasil, compondo,

por assim dizer, um perfil setorial dessas emissões.

A evolução das emissões totais é acompanhada desde 1970, no âmbito da

iniciativa SEEG e pode ser conhecida na Figura 3.1, abaixo.

Figura 3.1 - Emissões totais de CO2e (Mt) GWP/AR5* no Brasil

* Observação: os dados são apresentados nesta figura em Mt de CO2e. No texto que

segue as unidades são convertidas, quando necessário e para efeito de melhor

legibilidade em Gt de CO2e.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do SEEG (2016).

Quando se observam os dados sobre as emissões globais de GEE, medidas em Gt

GWP51

para todos os setores para os quais existem dados disponíveis, segundo o SEEG,

algumas considerações preliminares são inescapáveis.

51 A determinação do carbono equivalente (CO2e) é feita por dois métodos: o do GWP (Global Warming

Potential) e o GTP (Global Temperature Change Potential). Nesta dissertação, optamos pelo uso do GWP por

ser este o mais amplamente empregado, facilitando, portanto, diversos tipos de comparações e outras análises. A

apresentação e discussão técnica do significado desses métodos pode ser encontrada em

http://www.observatoriodoclima.eco.br/metodologia/

3.923,05

1.941,96

300

800

1.300

1.800

2.300

2.800

3.300

3.800

4.300

19

70

19

72

19

74

19

76

19

78

19

80

19

82

19

84

19

86

19

88

19

90

19

92

19

94

19

96

19

98

20

00

20

02

20

04

20

06

20

08

20

10

20

12

20

14

Page 93: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

93

Em primeiro lugar, nota-se que os dados são disponibilizados para os setores da

Agropecuária, Energia, Mudanças de Uso da Terra (MUT), Processos Industriais e Resíduos.

Para todos eles, exceto MUT, as estimativas cobrem o período de 1970 a 2014. As emissões

relativas a Mudanças de Uso da Terra estão disponíveis apenas a partir de 1990.

No período de 1990 a 2014, as emissões nacionais totais acumuladas de GEE

chegaram a cerca de 67 GtCO2e em GWP.52

O setor de MUT representou aproximadamente

dois terços desse total, sendo que 65% dessa parcela correspondem às emissões de GEE

provenientes do desmatamento da Amazônia. Portanto, o desmatamento da Amazônia

respondeu por 43% das emissões brasileiras no período. É por esta razão, portanto, conforme

salientam Brandão Jr & Barreto (2016, p. 9) “que a diminuição de GEE no Brasil deve

contemplar políticas nacionais de redução e combate do desmatamento. ”

No Brasil, assim como em outras partes do planeta, o desmatamento tem

precedido e acompanhado a conquista das sociedades sobre a natureza, como aponta Dean

(1996).53

No Brasil, ademais, é um problema secular, tendo seus princípios na própria

exploração da madeira que deu nome ao país. Mais recentemente, quando a questão do

desmatamento passa a ser vista também sob as lentes dos que examinam a questão climática,

observa-se que a destruição das florestas continua sendo um grande problema ambiental no

país. Observa-se, por exemplo, que entre 2002 e 2004 as emissões de GEE em MUT

cresceram extraordinariamente: 53,6%. Pode-se dizer que este crescimento foi resultado,

como aponta Delgado (2005), de uma "frouxidão da política agrária" onde a fiscalização e a

regulação do mercado de terras mostraram-se incapazes de aplicar o princípio da função

social da propriedade fundiária, ou seja, há uma concentração da propriedade fundiária em

latifúndios para a expansão agrícola. A legislação brasileira, conforme apontam Dias, Viera &

Amaral (2001), não apresenta um limite ao tamanho das propriedades.

A importância relativa das emissões associadas à mudança do uso da terra no

Brasil não pode ser minimizada. As emissões totais para os setores de energia, agropecuária,

processos industriais e resíduos somaram quase 1.2 Gt de CO2e (GWP) em 2014. O pico das

emissões totais de GEE no período de análise, como foi visto no gráfico das emissões totais,

mais acima, se deu em 2004, alcançando 3.9 Gt de CO2e. Naquele momento, apenas as

52 Cálculos realizados com base nos dados do SEEG.

53 DEAN, Warren. A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. 1. ed. São Paulo: Cia.

das Letras, 2004. 484 p. [1ª impressão 1996]

Page 94: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

94

emissões associadas à mudança do uso da terra atingiram 3.1 Gt de CO2e; todos os demais

setores, portanto, responderam por 0,9 Gt de CO2e.

Vale ressaltar que as emissões e a remoção resultantes da variação da parcela de

carbono presente na biomassa do solo e das vegetações se dão por meio de queimadas e

desmatamento. Marques (2016) apresenta a definição de desmatamento como “a remoção da

floresta e sua substituição por outra classe de uso da terra, tal como agricultura permanente ou

de rotação, gado, mineração ou água (usualmente de processamentos) ” (MARQUES, 2016, p.

80).

O autor identifica nove componentes importantes do que ele chama de "coalização

do desmatamento no Brasil" que são situações e atores que se interessam pela destruição das

florestas no país: 1) madeireiras, frigoríficos e empresas da soja e da pecuária, cuja atividade é

muito mais lucrativa de se desenvolver se houver desmatamento do que preservando o bioma;

2) comércio de madeira, minério, soja e outras commodities, como também os laboratórios e

as indústrias de mecanização rural, sementes transgênicas, agrotóxicos e fertilizantes; 3)

corporações petrolíferas e mineradoras; 4) indústrias eletro-intensivas, como alumínio e

cimento, gestoras e construtoras de usinas hidrelétricas e de estradas para a defluência da

produção agropecuária; 5) o parque sidero-metalúrgico do país, que produz ferro gusa a partir

de carvão vegetal; 6) o sistema financeiro que contribuiu para esta estrutura industrial; 7) O

Estado brasileiro, que "seja qual forem as coalizações partidárias no poder, mantidas que são,

em parte, pelas corporações que dominam os ramos de negócios mencionados" nos outros

itens (p.123); 8) A defesa do paradigma do "desenvolvimentismo" por parte da maioria dos

intelectuais e economistas, que creem que é possível conciliar a floresta amazônica com uma

economia de escala e 9) A colonização implementada pelo Instituto Nacional de Colonização

e Reforma Agrária (INCRA), segundo o qual há na Amazônia Legal 3.554 projetos onde

vivem 752 mil família em 76,7 milhões de hectares" (p. 125). Dados de 2012 do Incra

afirmam que o desmatamento derivado dessas regiões correspondeu a 18% do total desmatado

na Amazônia.

Embora não seja pertinente ao escopo desta dissertação investigar os elementos

colocados por Marques como determinantes do desmatamento, é possível especular que deva

existir algo como um círculo vicioso entre pobreza e desmatamento. Neste sentido, pode-se

propor, por exemplo, que o avanço da eletrificação e do uso de fogão a gás em regiões mais

remotas do país possam reduzir o uso da lenha para usos domésticos. Da mesma forma, é

possível imaginar que a produção do carvão vegetal, que como se sabe pode ter problemas

Page 95: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

95

com condições muito ruins de trabalho, incluindo denúncias de uso de trabalho infantil, seja

um caso em que esse círculo vicioso pode existir.54

Sobre as queimadas, Marques (2016) salienta um número alarmante, com base em

levantamento a partir de pesquisas realizadas por uma equipe de especialistas da Agência

Espacial Norte-Americana (NASA - National Aeronautics and Space Administration), que

constataram que 90% de todas as queimadas realizadas nas florestas do mundo são

intencionais. No Brasil, este resultado se mantém, já que apenas 10% das queimadas são de

origem não intencionais.

Assim, um breve exercício com a base de dados do SEEG permite concluir que a

exposição de uma série histórica completa para todos os setores para o período de 1970 a

2014 deve separar este último setor. A série histórica que o inclui deve, necessariamente, ser

apresentada em separado e iniciada em 1990 para evitar distorções.

Desta forma, excluindo-se as emissões associadas à MUT, obtém-se a trajetória

das emissões totais, referentes à soma dos demais setores para o período de 1970 a 2014,

conforme a Figura 3.2, na próxima página.

Essa trajetória revela que, à parte a evolução das emissões associadas ao uso da

terra, também as demais emissões tiveram um expressivo crescimento no Brasil no período,

passando de 323,1 para 1.162,1 Mt de CO2e, ou seja, uma taxa de crescimento de 359% entre

1970 e 2014.

54 Cf. http://reporterbrasil.org.br/2014/01/paulistano-usa-carvao-feito-com-trabalho-escravo-e-infantil/ e

http://www.folhavitoria.com.br/geral/noticia/2011/07/mafia-do-carvao-explora-trabalho-infantil-no-norte-do-

estado.html

Page 96: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

96

Figura 3.2 - Emissões totais de CO2e (Mt) GWP/AR5 excluindo MUT

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do SEEG, Observatório do Clima

Cabe, desde logo, indagar sobre o perfil setorial dessas emissões, o qual pode ser

conhecido nas Figuras 3.3 e 3.4, abaixo.

A Figura 3.3 revela que o setor que apresenta a segunda maior contribuição é o da

agropecuária.55

55 Chama a atenção o fato de que a base SEEG optou por apresentar as emissões do setor agropecuário

separadamente ao de uso da terra. Como foi visto anteriormente, a base CAIT, do WRI, apresenta essas emissões

associadas sob a sigla AFOLU.

323,102459

1162,051366

0

200

400

600

800

1000

1200

1400

19

70

19

72

19

74

19

76

19

78

19

80

19

82

19

84

19

86

19

88

19

90

19

92

19

94

19

96

19

98

20

00

20

02

20

04

20

06

20

08

20

10

20

12

20

14

Page 97: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

97

Figura 3.3 - Emissões de CO2e (Mt GWP/AR5) para os setores selecionados* (1970 – 2014)

(*): O setor de MUT será analisado individuamente

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do SEEG, Observatório do Clima.

Outra informação que chama a atenção é que o setor de energia, embora

permaneça na terceira colocação em suas contribuições para as emissões totais de GEE no

Brasil (ou em segundo lugar, caso se exclua MUT), foi paulatinamente se tornando mais

importante e, especificamente no período mais recente, cresceu expressivos 29,9% entre 2010

e 2014, quase se equiparando ao setor agropecuário em volume de emissões.

Evidentemente, as emissões relacionadas às MUT permanecem as mais relevantes

para explicar as emissões totais do Brasil. Na Figura 3.4, abaixo, nota-se que essas emissões –

que começaram a ser acompanhadas em 1990 – nunca deixaram de ser muito importantes,

mas apresentaram um comportamento peculiar ao longo dessas quase duas décadas e meia.

Em 1995, é possível discriminar um pico de 2.059,42 Mt de CO2e, com uma redução

subsequente que volta a dar lugar a volumes muito elevados entre 2003 e 2008, tendo

alcançado em 2004 o patamar elevadíssimo de 3.001,83 Mt de CO2e, para novamente

encontrar uma redução a partir de 2008.

Além do fato de as MUT responderem pela maior parte das emissões brasileiras,

como apontam Brandão Jr. & Barreto (2016), entre 1990 e 2014, apenas as queimadas no

bioma da Amazônia responderam por 43% das emissões do Brasil. É preço argumentar,

entretanto, que o uso agrícola da terra, que integra as MUT, tanto pode contribuir com

emissões quanto com a remoção de emissões de CO2.

482,104195 472,211292 487,947933

102,161935

89,837303

0

100

200

300

400

500

600

1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2014

Energia Agropecuária Processos Industriais Resíduos

Page 98: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

98

Figura 3.4 - Emissões de CO2e (Mt GWP/AR5) para MUT (1970-2014)

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do SEEG, Observatório do Clima.

Brandão Jr et al (2014), em documento elaborado para o IMAZON (Instituto do

Homem e Meio Ambiente da Amazônia), explicam que a maior parte da redução de emissões

de MUT entre 2005 e 20012 na Amazônia resultou em grande medida de políticas públicas:

“as políticas incluíram a criação de unidades de conservação, reconhecimento de terras

indígenas e a intensificação da fiscalização e aplicação de penas (incluindo a prisão de

envolvidos em crimes ambientais). A campanha do Greenpeace que resultou em um embargo

da compra de soja de áreas desmatadas a partir de 2006 também contribuiu para reduzir o

desmatamento” (BRANDÃO JR et al, 2014, p. 12)

Essa avaliação é coerente com o fato de que o setor de uso da terra pode contribuir

para a remoção de CO2 da atmosfera, sendo que as circunstâncias em que isso pode ocorrer

estão justamente relacionadas à proteção de florestas sob a forma de áreas protegidas

(BRANDÃO JR et al, 2014)56

. Esse efeito pode ser observado pela ampliação das remoções

de CO2 devido a mudança de uso da terra, conforme mostra a Figura 3.5, a seguir.

56 Além disso, o aumento da participação dos setores de energia e agropecuário para as emissões de GEE

também ajudaram a diminuir a participação relativa do setor de MUT para as emissões.

2.059,42

3.001,83

791,06

794,22

0,00

500,00

1.000,00

1.500,00

2.000,00

2.500,00

3.000,00

3.500,00

19

90

19

91

19

92

19

93

19

94

19

95

19

96

19

97

19

98

19

99

20

00

20

01

20

02

20

03

20

04

20

05

20

06

20

07

20

08

20

09

20

10

20

11

20

12

20

13

20

14

Page 99: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

99

Figura 3.5 - Remoções de CO2e (t) GWP/AR5 (1990 - 2015)

Fonte: SEEG, Observatório do Clima.

Brandão Jr et al (2014) apontam para o papel da concepção e implantação do

Plano Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC), em 2008, na redução do desmatamento da

Amazônia a partir de 2005 tenha sido uma das causas para que em 2012 houvesse um menor

nível de emissões desde a década de 1990, correspondendo a 776,5 de CO2e (Mt GWP).

Brandão Jr et al (2014, p. 8-9) indicam três momentos particulares:

“Em 2008, o Plano Nacional de Mudanças Climáticas estabeleceu as seguintes metas de

redução relacionadas às emissões de Mudança de Uso da Terra (MUT):

i) eliminar a perda líquida da área de cobertura florestal no Brasil até 2015;

ii) dobrar a área de florestas plantadas de 5,5 milhões de hectares para 11 milhões de

hectares em 2020, sendo 2 milhões de hectares com espécies nativas.

“Em 2009, a Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº 12.187/2009) estabeleceu um

compromisso voluntário de redução entre aproximadamente 36% e 38% das emissões

projetadas até 2020 [...].

“Em 2010, o Decreto nº. 7.390/2010 regulamentou a PNMC e estabeleceu as seguintes metas

específicas relacionadas às emissões de MUT:

i) reduzir em 80% a taxa anual de desmatamento na Amazônia em relação à média do

período 1996-2005;

ii) reduzir em 40% as taxas anuais de desmatamento do bioma Cerrado em relação à

média do período 1999-2008;

iii) expandir o plantio de florestas em três milhões de hectares.

“Portanto, o decreto reduziu a área proposta de plantio em relação à meta estabelecida em 2008

(5,5 milhões de hectares).”

Em 2012 ocorreu uma mudança bastante significativa que enfraqueceu o Código

Florestal: a Lei nº 12.651/2012, que anistiou parte do desmatamento ilegal processado até

2008 (quase 58% da área desmatada ilegalmente). Somado a este enfraquecimento, conforme

Page 100: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

100

analisam Brandão Jr et al (2014), está a posição dos governos estaduais e federal que desde

2010 reduziram 26 áreas protegidas na Amazônia, como forma de viabilizar a instalação de

hidrelétricas e estradas e ceder à pressão de ocupação (ao invés de remover e indenizar os

ocupantes das terras).

Não é demais voltar a comentar que, embora tenha se reduzido em termos

absolutos, essas emissões continuam sendo as mais importantes no perfil setorial do Brasil.

Para finalizar essa pequena incursão sobre o perfil setorial das emissões no Brasil,

é ainda interessante observar as mudanças relativas das emissões por setor em 1990, ano base

com relação ao qual as reduções das emissões deveriam ser realizadas pelos países signatários

do Protocolo de Kyoto, e 2014, último ano para o qual temos a disponibilidade de dados e ano

imediatamente anterior à celebração do Acordo de Paris.

Na Figura 3.6, a seguir, visualizam-se esses perfis relativos a esses dois momentos

no tempo, 1990 e 2014, para todos os setores já mencionados: agropecuária, energia,

mudanças de uso da terra, processos industriais e resíduos.

Figura 3.6 - Perfis das emissões de CO2e no Brasil: 1990 e 2014

Fonte: Elaboração própria a partir de Ferreira et al (2016), com a utilização da ferramenta infogr.am

57.

57 Ferramenta online para elaboração de infográficos disponível em https://infogr.am

Page 101: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

101

Se as emissões de GEE diminuíram para a MUT em termos relativos,

coerentemente outras fontes deverão representar um aumento relativo. Duas observações são

interessantes com relação às mudanças das contribuições relativas: em primeiro, o aumento da

participação de todos os demais setores; em segundo lugar, e o que mais interessa do ponto de

vista desta dissertação, o fato de que o aumento relativo mais expressivo das emissões se deu

justamente no setor da energia, que cresceu 14 pontos percentuais.

2.1.2. Observações sobre as emissões do setor de energia58

Ferreira et al (2016, p. 9), baseando-se nas estimativas do SEEG, comentam que59:

“O setor de energia foi o que apresentou a maior taxa média de crescimento anual no período

entre 1990 e 2014. As emissões do setor partiram de um patamar de 189,7 milhões de

toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2e) em 1990 para 479,1 milhões de toneladas

em 2014, superando as emissões da agropecuária e se consolidando como o segundo setor mais

emissor, atrás apenas de mudança de uso da terra."60

Examinando os cálculos dos autores, verifica-se que a série temporal por eles

empregada diz respeito àquela na qual os valores das emissões foram computados a partir do

cálculo dos GWPs do AR2. Nesta dissertação, estão sendo empregadas as séries temporais nas

quais as emissões são computadas a partir do cálculo dos GWP para os GEE imputados pelo

AR5. A razão para fazê-lo diz respeito ao entendimento sobre as melhores práticas indicadas

pelas organizações que difundem as metodologias, como o World Business Council for

Sustainable Development (WBCSD) e o WR1, e que são consistentes com o uso dos

potenciais de aquecimento dos gases recalculados, atualizados e publicados em função do

avanço de uma série de conhecimentos, como salienta Trotier (2015, p. 7):

“The updates to GWP values published by the IPCC can, and at times do, create confusion and

disagreement. Individuals that are new to GHG reporting may not understand the differences

between GWPs and may apply them inconsistently. This can artificially cause changes to an

assessment’s results that have nothing to do with real changes to activities. In terms

of voluntary accounting and reporting best practice, the World Business Council on

Sustainable Development/World Resources Institute (WBCSD/WRI)’s GHG Protocol provides

the most widely used and respected standard. An amendment to its “Corporate Standard”

states that companies “should use GWP values from the most recent Assessment Report, but

may choose to use other IPCC Assessment Reports”. However, because this amendment was

released in February 2013, several months before the release of the IPCC’s AR5, there is no

indication of whether the AR5’s GWP values with or without feedback effect are considered

58 A apresentação e a discussão dos dados sobre a evolução das emissões de GEE pelo setor de energia no Brasil,

inclusive com algumas comparações com as emissões globais, serão realizadas no capítulo 3, na seção 3.3.

59 FERREIRA et al (Org.) Documento de análise: emissões de GEE do setor de energia, processos industriais e

uso de produtos. IEMA, SEGG, Observatório do Clima, 2016. Disponível em:< http://seeg.eco.br/wp-

content/uploads/2016/09/FINAL-16-09-23-RelatoriosSEEG-PIUP_.pdf>

60 A energia ocupa a segunda ou a terceira colocação como setor de maiores emissões no Brasil, dependendo do

ano analisado.

Page 102: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

102

preferable. Several other authorities provide signs that point towards an increasingly

widespread use of GWP values without feedback. France’s Agence de l’Environnement et de la

Maîtrise de l’Énergie (ADEME), for example applies the GWPs without feedback in the latest

update to its “Base Carbone” tool. The EPA’s 2014 U.S. GHG Inventory also notes that AR5

GWP values without feedback have a calculation methodology that is more consistent with

those that were used in the AR4 report.”

O uso da métrica anterior por Ferreira et al (2016) tem a seu favor o argumento da

consistência intertemporal, se bem que essa questão poderia ser solucionada com a

atualização dos cálculos apresentados nos relatórios anteriores. Trotier (2015, p. 7) observa:

“In practice, the adoption of new GWP values has been fairly slow and cautious so far, as

national and international agencies emphasize year-over-year consistency and coherence

between reporting parties inventories. Organizations conducting their own GHG assessments

typically use AR4 GWPs, unless they previously used SAR GWPs and wish for subsequent

reports to be comparable.”

O aumento expressivo das emissões de GEE pelo setor de energia se dá num

contexto de expansão do uso de combustíveis fósseis no Brasil, mais especificamente por

conta do aumento expressivo da importância, em termos absolutos e sobretudo em termos

relativos, do uso do gás natural.

No período entre 1990-2014, conforme se observa na Figura 3.7, os combustíveis

de origem fóssil (petróleo e derivados, carvão mineral e gás natural) aumentaram sua

participação na oferta interna bruta de energia no Brasil, passando de 51% para 59%. Este

aumento deve-se sobretudo ao uso do gás natural a partir de 1999 para a geração de energia

em termelétricas, que fez saltar sua presença de 3% em 1990 para 14% em 2014.

Page 103: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

103

Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária

Fonte: FERREIRA et al. (2016).

O SEEG, com base nos dados do Balanço Energético (BEN), indica que as

emissões de CO2 , corresponderam a 71% das emissões de CO2e pelo setor de energia em

2014.

Na Figura 3.8 (próxima página), pode-se verificar a evolução da oferta interna

bruta de energia por fonte primária no Brasil. Pode-se notar a presença sempre expressiva na

oferta bruta do petróleo e seus derivados na composição da matriz brasileira. Além disso,

percebe-se o aumento da oferta bruta do gás natural a partir da década de 2000. Isto deve-se

ao fato de que o Brasil passou por uma crise energética que gerou o que ficou conhecido

como "apagão", neste período aumentou o uso de gás natural em termoelétricas para a

produção de energia, atitude que se manteve ao longo da década, visto que em 2012 o gás

natural ultrapassou a oferta interna bruta de energia hidráulica.

Page 104: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

104

Figura 3.8 - Oferta interna bruta de energia no Brasil por fonte primária

(1990 - 2014)

Fonte: FERREIRA et al. (2016).

Visto que no cenário de oferta de energia bruta a presença do petróleo e seus

derivados possui um papel de destaque, é possível concluir que esta fonte responde a maior

parte das emissões de CO2. No caso do Brasil, esta porcentagem é bastante elevada,

correspondendo a 71% das emissões em 2014, conforme a Figura 3.9. Sua participação

diminuiu se compararmos os dados de 1990, porém cabe destacar que grande parte deste

declínio é resultado da ascensão da participação do gás natural, visto que em 1990 ele

respondia por apenas 3% das emissões de CO2 e em 2014 passou a representar 17%.

Page 105: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

105

Figura 3.9 - Emissões de GEE do Setor de Energia por fonte primária

Fonte: FERREIRA et al. (2016).

Essa análise será mais detalhada na seção 4.3 do próximo capítulo.

Para este momento, no fechamento deste capítulo, cabe apontar para o fato que,

diante da necessidade da apresentação de metas de redução de emissões ensejada pela

assinatura pelo Brasil do Acordo de Paris, existem várias possibilidades para delinear alguns

rumos de desenvolvimento:

“A partir do panorama de emissões explorado neste relatório, e considerando as intenções e

potencialidades do país de contribuir para a mitigação das emissões de GEE, pode-se concluir

que diversas possibilidades técnicas se apresentam interessantes de serem estudadas. A opção

por modos de transporte mais eficientes, a expansão da geração elétrica a partir de energia

solar, eólica e de biomassa, a substituição de combustíveis fósseis por biocombustíveis ou

sistemas elétricos (combinados com a geração elétrica de baixo impacto ambiental), a redução

de perdas energéticas e materiais e o reuso de materiais na indústria, a adoção de tecnologias

de captura e armazenamento de gás carbônico, são algumas das soluções para as quais as

políticas públicas, buscando desenvolvimento sem comprometer a qualidade ambiental, podem

se atentar” (FERREIRA et al, 2016, p.75).

Esses rumos parecem despontar no documento oficial que apresentou, em

dezembro do ano de 2015 na Conferência das Partes (COP21), em Paris, a Contribuição

Pretendida Determinada Nacionalmente, ou seja, a iNDC do Brasil, apresentada na próxima

seção.

2.1.3. Importância relativa das emissões do Brasil no panorama global

Uma questão pertinente seria a de qual a importância relativa das emissões do

Brasil no panorama global, uma vez que os esforços para mitigação devem fazer sentido num

contexto em que os principais emissores devem responder pela maior parte das ações para o

enfrentamento do problema. Essa importância relativa pode ser aquilatada pela avaliação da

Page 106: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

106

participação percentual das emissões brasileiras nas emissões globais e pela evolução dessa

relação ao longo do tempo.

Em 2012, de acordo com os dados do WorldBank Database, a partir da base

EDGAR, a participação relativa das emissões totais de CO2e do Brasil, incluindo agricultura,

setor florestal e mudanças no uso da terra (AFOLU), para as emissões globais de GEEs foi de

5,58%.

Essa relação é muito volátil, por conta do papel importante representado pelas

emissões associadas ao uso da terra no Brasil. Por exemplo, nos anos de 1995 e 2004, essa

relação teria sido de cerca de 7% e 6,2% das emissões globais, respectivamente. Esses valores

correspondem aos dois picos das emissões do setor de MUT, conforme evidenciado mais

acima, e também aos picos correspondentes na Figura 3.10.

Figura 3.10 - Emissões de GEE no Brasil e no mundo

entre 1990 e 2014 (Mt CO2e), incluindo AFOLU

Fonte: AZEVEDO (2016)

De acordo com Azevedo (2016, p. 42):

“A evolução das emissões brasileiras de GEE em relação à dinâmica das emissões

globais pode ser dividida em quatro fases: entre 1990 e 1997, as emissões totais no Brasil

cresceram em um ritmo maior que as emissões globais; já no período de 1998 a 2004, as

emissões cresceram num ritmo similar ao das emissões globais; e, após 2005, elas se descasam

das emissões globais e apresentam uma forte redução, enquanto no resto do mundo elas

crescem. Um quarto período parece se formar após 2009 – curiosamente, após o lançamento da

Política Nacional sobre Mudança Climática. Desde então, as emissões pararam de cair e têm se

mantido relativamente estáveis, no entorno de 1,8 a 1.9 Gt CO2e. Nos últimos anos, as

emissões globais também passaram a desacelerar e pode[ria]m estar próximas de atingir o seu

pico.”

Page 107: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

107

Azevedo (2016) faz, neste texto, uma análise das emissões de GEE no Brasil, para

o período de 1970 a 2014, a fim de discutir as implicações da dinâmica das emissões para as

políticas públicas e para a iNDC brasileira ao Acordo de Paris. Seu texto, embora tendo sido

revisado pelas equipes redatoras dos relatórios analíticos e setoriais e de organizações

membro do Observatório do Clima, parece incorrer em alguns equívocos. A periodização

proposta pelo autor para a análise das emissões brasileiras com relação às emissões globais

carece de alguns cuidados. Especificamente, a periodização não oferece elementos para se

refletir sobre os dois picos de emissões no país, quais sejam, o de 1995 e o de 2003-2004, no

contexto da conjuntura econômica brasileira e das questões de política que poderiam explicar

tanto o avanço expressivo dessas emissões no período quanto sua subsequente retração. Os

picos de emissão, segundo se avalia aqui, tendem a ser de caráter conjuntural e não estrutural,

carecendo de maiores explicações no texto do autor.

Em se tratando de uma análise de mais longo prazo, englobando os 25 anos que

vão de 1990 a 2014, haveria que se separar o que há de conjuntural do que seria mais

estrutural. Uma possibilidade seria se “descontar” os efeitos de pico e visualizar, propõe-se

aqui, três períodos: um que iria de 1990 a 2003, no qual as emissões brasileiras cresceriam

num ritmo em geral maior do que as emissões globais; outro, de 2004 a 2009, no qual as

emissões brasileiras reduziram substancialmente; e finalmente, um período que parece ter se

iniciado entre 2009 e 2010, de estabilização das emissões brasileiras. Embora não caiba, no

escopo desta dissertação, procurar as causas para esses movimentos, é possível propor

algumas hipóteses para o comportamento das emissões brasileiras nesses períodos. Uma delas

seria, desde logo, como já mencionado, as dinâmicas conjunturais da economia brasileira,

com enfoque específico para os setores de maior emissão, como a agricultura, a pecuária, a

energia e os transportes. Outra hipótese se refere ao efeito das políticas que impactam

especificamente a MUT, como é o caso das políticas voltadas às Unidades de Conservação e

para as terras indígenas.

Outro aspecto que parece problemático na análise de Azevedo (2016) diz respeito

à sua visão prospectiva sobre as emissões globais. Como se vê na Fig. 3.10, as emissões

globais continuam a crescer após a crise econômica mundial de 2007, tendo mesmo se

acelerado entre 2009 e 2011. Não há nada neste comportamento das emissões globais que

pareça indicar que essas emissões estejam próximas de atingir seu pico. Conforme visto no

primeiro capítulo desta dissertação, os cenários do IPCC sobre os caminhos de emissão

apenas preveem possibilidades de redução das emissões de GEE quando consideradas

Page 108: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

108

mudanças muito radicais tanto em aspectos setoriais das economias, quanto nos intersetoriais,

inclusive mudanças muito significativas em estilos de vida e padrões de consumo.

Tomados os dois anos de referência, o de 1990 – ano-base para as metas de

redução colocadas originalmente pelo Protocolo de Kyoto – e o de 2012 – último ano para os

quais se encontram dados acessíveis na plataforma CAIT/WRI, é possível avaliar as

contribuições das emissões de GEE para as emissões globais. Na Figura 3.11, a seguir,

verifica-se que essa contribuição foi de 0,9% e de 1,34%, respectivamente, ou seja, um

crescimento de 0,44 pontos percentuais no período.

Figura 3.11 - Emissões de GEE no setor de energia no Brasil

em relação às emissões globais de GEE (Mt CO2e) em 1990 e 2012

Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados do CAIT/WRI,

com a utilização da ferramenta infogr.am

Nota-se, portanto, que no período de 1990 a 2014, ora as emissões brasileiras

cresceram em ritmo mais acelerado, ora cresceram em ritmo menos acelerado que as emissões

globais. Embora não caiba fazer especulações sobre o que determinaria esses ritmos a cada

momento, o que se sabe é que as emissões brasileiras foram muito à dinâmica de mudanças do

uso da terra.

Observou-se também um rápido crescimento das emissões do setor de energia no

período mais recente. Esta característica, como observa o Prof. Dr. André T. Furtado, do

DPCT-IG/Unicamp, já estava presente desde anos 1970.61

De fato, foi o petróleo que

alimentou o chamado “milagre” brasileiro, entre 1967 e 1973: um período de “petro-

61 Comunicação pessoal por ocasião do exame de qualificação desta dissertação.

Page 109: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

109

prosperidade”. Não apenas os combustíveis do crescimento econômico eram constituídos

pelos hidrocarbonetos, em especial o carvão e o petróleo, como o modo de financiamento

desse crescimento se baseava na ampla disponibilidade de liquidez nos mercados financeiros

internacionais, graças aos chamados petrodólares (FURTADO, 1985). As receitas dos países

exportadoras de petróleo, à época, circulando nas praças financeiras internacionais, eram

“recicladas” na forma de financiamento das políticas desenvolvimentistas do Terceiro Mundo.

Na década de 1970, quando já estavam claras as limitações ecossistêmicas

associadas à “petro-prosperidade”, outras dificuldades se interpuseram à continuidade do

crescimento econômico nos países que se industrializavam tardiamente dentro do modelo

petro-intensivo. Os choques do petróleo de 1973 e de 1979 expuseram também o

esgotamento do modelo de financiamento desse crescimento econômico, ou seja, a era da

reciclagem dos petrodólares nos circuitos financeiros mundiais que, com altíssima liquidez e

baixos juros, haviam franqueado o avanço da petro-prosperidade nos países periféricos,

desembocara, na década de 1980, na crise do endividamento do Terceiro Mundo, incluindo,

de forma especial, o Brasil (FURTADO, 1985).

Embora o Brasil tenha feito diversos esforços na década de 1970 para tentar

reduzir sua dependência com relação ao petróleo importado, que alimentava o avanço dos

setores modernos de sua economia (em especial com o ProAlcool e com a expansão da

produção de eletricidade primária a partir das hidroelétricas e da energia nuclear), o avanço da

industrialização não foi amparado por uma oferta interna suficiente de energia e, ao final da

década, cerca de metade da pauta de importação do país era constituída pelo petróleo

(FURTADO, 1985).

O uso de energias não renováveis, oriundas de fontes fósseis, tem ganhado maior

peso relativo na matriz energética brasileira, o que aponta não apenas no sentido oposto ao

histórico do setor no país, como também numa direção não desejável do ponto de vista da

eleição dos combustíveis que deveriam alimentar os rumos do desenvolvimento futuro. No

próximo capítulo, ele será o foco da análise.

Page 110: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

110

2.2. Contribuição Pretendida Determinada Nacionalmente: a “iNDC” do Brasil

Como foi visto no segundo capítulo desta dissertação, a terminologia de

“Pretendidas Contribuições Nacionalmente Determinadas” (iNDCs na sigla em inglês para

Intended Nationally Determined Contributions)62

emerge no contexto das sucessivas

negociações climáticas, consolidada de forma especial por ocasião da 19ª Conferência das

Partes (COP-19) ocorrida em 2013 em Varsóvia, Polônia. Nesta conferência ficou decidido

que os países deveriam trabalhar até o primeiro trimestre de 2015 em um documento

contemplando um novo acordo global em substituição ao Protocolo de Kyoto, expirado

naquele ano. O objetivo do novo documento: acordar, entre os representantes dos governos

das “partes”, objetivos, medidas e prazos para a mitigação e para adaptação aos impactos das

mudanças climáticas, incluindo a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE)

(BRASIL, 2015).

Nesta seção, procede-se à identificação e à apresentação das metas de

descarbonização da economia em geral e da matriz energética brasileira. O documento que

contêm as metas de descarbonização do Brasil é a Contribuição Pretendida Determinada

Nacionalmente (iNDC).63

No Brasil, o processo de preparação e submissão da iNDC teve início em 2013,

quando o país sugeriu, na Conferência de Varsóvia, que a iNDC fosse aberta para a consulta

da sociedade. A partir de junho de 2014, o Itamaraty realizou uma série de consultas nacionais

(presenciais e eletrônicas) com o objetivo de desenvolver o documento com contribuições da

sociedade. Deste modo, foi aberta uma oportunidade para que todos os setores e segmentos

interessados pudessem expressar suas opiniões. Assim, até onde se pode avaliar dentro dos

limites dessa dissertação, o processo pode ser chamado de bottom-up. A exiguidade das

informações para a análise, entretanto, parece justificar que mais pesquisas deveriam se

dedicar a elucidar, caracterizar e discutir esse processo.

62 Intended Nationally Determined Contributions – iNDCs – é uma expressão que pode ser traduzida como

“Contribuições Pretendidas, Determinadas em Nível Nacional ou Nacionalmente”, porém a tradução oficial do

governo brasileiro é “Pretendida Contribuição Nacionalmente Determinada” (ASSOCIAÇÃO O ECO, 2015).

Nesta dissertação, optou-se pela primeira forma, mais direta em nosso idioma.

63 O documento oficial que apresenta a contribuição brasileira à COP21 é intitulado “Pretendida Contribuição

Nacionalmente Determinada para consecução do objetivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre

Mudança Climática”, foi publicado em setembro de 2015 e está disponível em

http://www.itamaraty.gov.br/images/ed_desenvsust/BRASIL-iNDC-portugues.pdf

Page 111: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

111

Infelizmente, há apenas escassa documentação oficial sobre essas consultas e não

foi possível encontrar documentos analíticos sobre esse processo. Em abril de 2015 foi

publicado na página do Itamaraty um relatório das conclusões das consultas públicas

(MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES, 2015a).64

Esse documento relata, sem, entretanto, disponibilizar os materiais

correspondentes, que foram feitas consultas adicionais a atores da sociedade civil como

academia, setor privado, organizações não-governamentais – novamente, sem abrir as

informações sobre as identidades dos envolvidos – e de quadros técnicos de ministérios para

que a proposta apresentada pelo Brasil à COP 21 fosse robusta, como forma de ser ambiciosa

e justa, protegendo os interesses nacionais, interesses sociais e econômicos, geração de

emprego e desenvolvimento tecnológico.

O documento relata que o processo de consulta consistiu de uma consulta em duas

fases com uso de formulário eletrônico, disponibilizado no site do Itamaraty. Na primeira

fase, o formulário ficou disponível entre os dias 26 de maio e 18 de julho de 2014 (e

prorrogado até o dia 22 de julho a fim de possibilitar uma maior participação sociedade).

Depois de publicado um relatório preliminar, não localizado pela pesquisa desta dissertação,

foi realizada uma segunda fase, aberta até 28 de novembro de 2014. A consulta pública ainda

envolveu a possibilidade de envio de contribuições via e-mail e, ainda, reuniões presenciais

nas dependências no Ministério das Relações Exteriores, entre os dias 8 e 12 de setembro de

2015. O relatório informa que foram recebidos 200 respostas ao questionário (138 de

indivíduos e 62 de organizações ou instituições da sociedade civil organizada). As reuniões

presenciais foram gravadas e disponibilizadas no canal do Itamaraty no Youtube65

. Como

resultado desse processo, o Itamaraty publicou a iNDC brasileira no dia 27 de setembro de

2015.

Também consta da informação oficial que, para a formulação da iNDC brasileira,

houve a atuação de gestores e outros servidores dos quadros técnicos dos seguintes

ministérios: Ministério de Minas e Energia, Ministério da Agricultura, Ministério de Ciência e

64 Esse relatório, intitulado “Participação da sociedade civil no processo de preparação da Contribuição

Nacionalmente Determinada do Brasil ao Novo Acordo sobre a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as

Mudanças do Clima”, disponível em:

www.mma.gov.br/images/arquivos/clima/convencao/indc/Relatorio_MRE.pdf

65 No canal do Itamaraty no Youtube, as gravações das consultas constam de uma playlist que reúne diversos

vídeos sobre o assunto geral de meio ambiente. Disponível em: goo.gl/XI7eFX

Page 112: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

112

Tecnologia e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. São Ministérios que

têm responsabilidade os processos de inventariar e avaliar emissões de GEE e/ou sob cuja

alçada se encontram setores que emitem esses gases (PORTAL BRASIL, 2015).

Não foi possível identificar e avaliar, entretanto, dentro dos limites dessa

dissertação, quais foram as contribuições apresentadas por cada um desses atores sociais e

gestores públicos no âmbito dessas consultas. Oficialmente, a posição do Itamaraty, que é

responsável pelo documento oficial que apresenta as metas brasileiras, indica que estas são

fruto desse processo participativo.

Esse documento oficial sobre as iNDC brasileiras apresenta um escopo que inclui

mitigação, adaptação e meios de implementação para os objetivos propostos inicialmente na

COP 19 (de 2013, em Varsóvia, na Polônia, como mencionado) e também na COP 20

(realizada em Lima, no Peru, em 2014) para reduzir os impactos das mudanças climáticas,

com a redução da emissão dos GEEs. A iNDC brasileira foi apresentada à Secretaria da

UNFCCC em setembro de 2015 (MINISTERIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES, 2015b).

O documento oficial que apresenta a contribuição brasileira elenca o escopo

dessa contribuição, conforme compilado a seguir, de acordo com sua pertinência as seguintes

pontos: i) mitigação; ii) adaptação; e iii) meio de implementação. Esses pontos são

apresentados na subseção 3.2.1, a seguir. A subseção 3.2.2 traz observações específicas

quanto às medidas setoriais previstas pelo Brasil para suas intenções apresentadas na COP 21.

2.2.1. A contribuição em termos de mitigação, adaptação e meio de

implementação

Nas subseções abaixo são compilados os termos em que se consubstancia a

contribuição brasileira para mitigação, adaptação e meio de implementação.

i. Mitigação

Em termos de mitigação, o escopo da contribuição brasileira é apresentado em

duas partes: “contribuição” e “contribuição indicativa subsequente”. Como contribuição, o

Brasil apresenta a intenção de se comprometer com a redução das emissões GEEs em 37%

abaixo dos níveis de 2005, no horizonte de 2025. Como contribuição indicativa subsequente,

a proposta brasileira consiste na intenção de reduzir em 43% as emissões de GEE com relação

aos níveis de 2005, até o horizonte de 2030.

Page 113: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

113

Esta contribuição é consistente com níveis de emissão de 1,3 GtCO2e (GWP-100;

IPCC AR5) em 2025 e 1,2 GtCO2e (GWP-100; IPCC AR5) em 2030.

Com relação aos níveis de 1990, esta contribuição é consistente com reduções de

6% em 2025 e 16% em 2030 abaixo dos níveis de 1990 (1,4 GtCO2 e GWP-100; IPCC AR5).

De acordo com o documento oficial que reporta a iNDC do Brasil, a proposta

implica uma redução de cerca de 66% em termos de emissões de GEEs por unidade do PIB66

em 2025 e em 75% em termos de intensidade de emissões em 2030, ambas em relação a

2005.67

Ainda com relação à mitigação, é interessante observar:

Em termos de abrangência da contribuição: trata-se de uma intenção que abrange

todo o território nacional, para o conjunto da economia, incluindo os gases CO2,

CH4, N2O, perfluorcarbonos, hidrofluorcarbonos e SF6.

Quanto ao intervalo temporal: o ponto de referência (baseline) é o ano de 2005 e o

horizonte temporal inclui uma meta para o ano de 2025 e valores indicativos de

2030 apenas para referência.

No que se refere à métrica empregada para mensuração dos valores das emissões:

é utilizado o Potencial de Aquecimento Global em 100 anos (cuja sigla é GWP-

100, para o termo em inglês Global Warming Potential over 100 years) usando

valores estimados pelo IPCC e publicados no AR5.

Quanto às abordagens metodológicas: são fundamentadas em inventário para

estimativa e contabilização das emissões antrópicas GEEs e, conforme apropriado,

remoções, seguindo as diretrizes aplicáveis do IPCC.

Quanto às remoções de emissões: a iNDC do Brasil leva em conta o papel das

unidades de conservação e das terras indígenas como áreas de florestas manejadas,

em conformidade com as diretrizes aplicáveis do IPCC para estimar remoções de

gases de efeito estufa.

Quanto às possibilidades de transferências de reduções de emissões: o documento

oficial brasileiro limita as possibilidades de transferências de redução de emissões,

posicionando-se a favor do uso de mecanismos de mercado e outros que venham a

ser estabelecidos no âmbito das decisões da UNFCCC e colocando o Governo

Federal como instância decisória sobre quaisquer transferências de unidades de

redução de emissões obtidas em território nacional.

66 Trata-se, aqui, da intensidade de emissões que, de acordo com a metodologia proposta pelo AR5 do IPCC, é

mensurada por tCO2e (GWP-100) /GDP (estimada para cada US$ 1000 do ano-base de 2005).

67 O documento oficial para a iNDC do Brasil usou dados do Ipeadata como fonte para PIB de 2005 (site e data

de acesso referidos no documento: http://www.ipeadata.gov.br, acesso em 2/9/2015). Para as estimativas do PIB

em 2025 e 2030, o documento empregou dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Nota Técnica DEA

12/14: Cenário econômico 2050, consultado em agosto de 2014.

Page 114: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

114

ii. Adaptação

No documento que apresenta a iNDC brasileira, as ações em adaptação ganham

destaque no sentido da necessidade, diante das alterações climáticas previstas, de se contribuir

para a “construção de resiliência de populações, ecossistemas, infraestrutura e sistemas de

produção, ao reduzir vulnerabilidades ou prover serviços ecossistêmicos” (BRASIL, 2015, p.

3).

A preocupação central expressa no documento é com as populações mais carentes

e vulneráveis aos efeitos negativos da mudança do clima e há a declaração da intenção em

fortalecer sua capacidade de resiliência68

.

O principal instrumento para planejar as ações no sentido da adaptação é o Plano

Nacional de Adaptação (PNA), publicado em maio de 201669

. Apresentado como de

elaboração e implementação participativa, o PNA busca implementar um sistema de gestão de

conhecimento, promover pesquisa e desenvolvimento de tecnologias para adaptação,

desenvolver processos e ferramentas em apoio a ações e estratégias de adaptação, em

diferentes níveis de governo. Os itens considerados fundamentais como alvo das políticas de

adaptação compreendem as áreas de risco, a habitação, a infraestrutura básica, em especial

nas áreas de saúde, saneamento e transporte. Dentre as ações já existentes, o documento

oficial sobre as metas brasileiras destaca o monitoramento de eventos de precipitação extrema

em 888 municípios e a disponibilidade de um sistema de alerta antecipado, com planos de

ação para responder a desastres naturais. O documento ainda menciona a intenção de integrar

a abordagem da adaptação às políticas nacionais de desenvolvimento e às políticas públicas

em geral.

68 Entende-se por resiliência a medida da capacidade de um ecossistema absorver tensões ambientais sem mudar

seu estado ecológico, perceptivelmente, para um estado diferente (IBGE, 2002). O dicionário Aulete (versão

online) traz também uma conotação para resiliência (sentido figurativo) como “habilidade que uma pessoa

desenvolve para resistir, lidar e reagir de modo positivo em situações adversas”. Nos documentos voltados ao

tratamento da problemática das mudanças do clima tem apresentado o conceito de resiliência climática aplicado

aos sócio-ecológicos. Nesta acepção, a resiliência climática é definida como a capacidade de um sistema sócio-

ecológico de absorver estresses e manter suas funções diante de perturbações externas que lhes forem impostas

pelas mudanças climáticas, adaptando-se, reorganizando-se e evoluindo para configurações que melhorem sua

sustentabilidade no sentido de tornar-se menos vulnerável a impactos futuros (FOLKE, 2006).

69 Os documentos pertinentes ao Plano Nacional de Adaptação às Mudanças Climáticas, bem como o processo

envolvido em sua elaboração e as perspectivas para sua implementação podem ser acessados pelo sítio

http://www.mma.gov.br/clima/adaptacao/plano-nacional-de-adaptacao.

Page 115: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

115

iii. Meio de Implementação

O documento oficial brasileiro que apresenta a iNDC do Brasil salienta que,

embora a contribuição brasileira não seja condicionada ao apoio internacional, é desejável o

apoio dos países desenvolvidos com vistas a gerar benefícios globais.

No caso particular das ações adicionais visando ao alcance das metas para 2030, o

documento afirma que seriam obrigatórios aumentos em ampla escala do “apoio internacional

e dos fluxos de investimento, bem como do desenvolvimento, emprego, difusão e

transferência de tecnologias” (p. 4). Há uma menção especial à necessidade de se respeitar os

pagamentos internacionais no âmbito das atividades de REED+.70

Também merece destaque, no documento, a menção à cooperação Sul-Sul, para a

qual são esperadas ampliações nas áreas de “sistemas de monitoramento florestal; capacitação

e transferência de tecnologia em biocombustíveis; agricultura resiliente e de baixo carbono;

atividades de reflorestamento e de restauração florestal; manejo de áreas protegidas; aumento

de resiliência por meio de programas de proteção e inclusão social; apoio à capacitação para a

comunicação nacional e outras obrigações sob a Convenção, em particular aos países

lusófonos” (p. 4), com a instância, pelo Brasil, ao incremento dessas iniciativas por parte dos

países desenvolvidos e das organizações internacionais.

2.2.2. Observações específicas sobre medidas setoriais

Em termos globais, para que o planeta tenha uma chance de manter o aquecimento

abaixo dos 2oC com relação aos níveis pré-industriais – o que é estimado por cenários

consistentes com esse grau de aquecimento elaborados no âmbito do IPCC – são necessárias

ações como o uso sustentável da bioenergia, medidas em grande escala no setor de mudança

do uso da terra e florestas; e o aumento, na matriz energética mundial, por um fator de três a

quatro vezes em termos da participação de fontes de energia sem emissão ou com baixo nível

de emissões de carbono até 2050.

70 A REDD (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal ou, em inglês, Reducing

Emissions from Deforestation and Forest Degradation) é um conjunto de incentivos econômicos desenvolvido

pelo UNFCCC com o objetivo de reduzir as emissões de GEE derivadas do desmatamento e degradação

florestal. Na COP-15, realizada em Copenhague em 2009, o conceito de REDD foi ampliado para REDD+: com

o sinal "+", foi incluído o papel da conservação de estoques de carbono florestal, manejo sustentável de florestas

e aumento de estoques de carbono florestal. Na COP-19, realizada em Varsóvia em 2013, criou-se o "Marco de

Varsóvia para REDD+", documento que indica prover incentivos financeiros para países em desenvolvimento

que estejam implementando políticas que estão alinhadas ao REDD+ (ASSOCIAÇÃO O ECO, 2014;

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE - BRASIL, 2016).

Page 116: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

116

Diante dessas necessidades globais, a situação de partida do Brasil é apresentada

como muito favorável pelo documento oficial de apresentação da iNDC do Brasil:

“[...] o Brasil já tem um dos maiores e mais bem-sucedidos programas de biocombustíveis,

incluindo a cogeração de energia elétrica a partir da biomassa. É o país que alcançou os mais

expressivos resultados na redução de emissões por desmatamento, principalmente em função

da queda da taxa de desmatamento na Amazônia brasileira em 82% entre 2004 e 2014. A

matriz energética brasileira contém hoje 40% de energias renováveis (75% de renováveis na

oferta de energia elétrica), o que representa três vezes à participação média mundial – e mais

de quatro vezes à dos países da OCDE. Tudo isso já faz do Brasil uma economia de baixo

carbono. ” (BRASIL, 2015, p. 3)

Coerentemente, pelo menos no discurso, com a necessidade da redução dramática

na queima de combustíveis fósseis, a “visão de longo prazo” apresentada logo no início do

documento oficial sobre a iNDC do Brasil, lê-se:

Em conformidade com a visão de longo prazo de conter o aumento da temperatura média

global abaixo de 2°C em relação aos níveis pré-industriais, o Brasil envidará esforços para uma

transição para sistemas de energia baseados em fontes renováveis e descarbonização da

economia mundial até o final deste século, no contexto do desenvolvimento sustentável e do

acesso aos meios financeiros e tecnológicos necessários para essa transição. (BRASIL, 2015,

p.1)

Talvez em razão desta constatação, existe uma tensão, no documento, entre

considerações de caráter mais geral – as contribuições propriamente ditas – e as medidas que

envolvem necessariamente transformações setoriais para seu alcance. Esta tensão pode ser

observada, por exemplo, na medida em que o documento oficial sobre a iNDC do Brasil

explica que as metas apresentadas se aplicam ao conjunto da economia. Desta forma, admite a

existência de “caminhos flexíveis para atingir os objetivos de 2025 e 2030” (BRASIL, 2015,

p. 1), para, ao lado disso reconhecer a necessidade de focar esforços para a transição para

sistemas energéticos baseados em fontes renováveis, que estão em sintonia com os objetivos

da descarbonização da economia mundial até o final do século XXI, através de recursos

financeiros e tecnológicos que possibilitem tal transição.

Assim, sem abrir mão da ideia de que há flexibilidade nos meios para se alcançar

as contribuições pretendidas, o documento oficial sobre a iNDC brasileira também apresenta

medidas complementares de caráter setorial. Algumas delas, como se nota, trazem, de forma

mais direta ou indiretamente, implicações potenciais para o setor de energia. O quadro 3.1

abaixo, organizado a partir da compilação do documento oficial, sintetiza essas medidas.

Page 117: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

117

Quadro 3.1 - Síntese das medidas complementares apresentadas

pelo Brasil no âmbito da iNDC, por setor

Setor Medidas complementares

Energia 1. Aumentar a participação de bioenergia sustentável na matriz energética brasileira

para aproximadamente 18% até 2030, expandindo o consumo de biocombustíveis, aumentando

a oferta de etanol, inclusive por meio do aumento da parcela de biocombustíveis avançados

(segunda geração), e aumentando a parcela de biodiesel na mistura do diesel.

2. Alcançar uma participação estimada de 45% de energias renováveis na composição

da matriz energética em 2030, incluindo:

Expandir o uso de fontes renováveis, além da energia hídrica, na matriz total de

energia para uma participação de 28% a 33% até 2030;

Expandir o uso doméstico de fontes de energia não fóssil, aumentando a parcela de

energias renováveis (além da energia hídrica) no fornecimento de energia elétrica para ao

menos 23% até 2030, inclusive pelo aumento da participação de eólica, biomassa e solar;

Alcançar 10% de ganhos de eficiência no setor elétrico até 2030.

Florestal e de

mudança do uso

da terra

1. Fortalecer o cumprimento do Código Florestal, em âmbito federal, estadual e

municipal;

2. Fortalecer políticas e medidas com vistas a alcançar, na Amazônia brasileira, o

desmatamento ilegal zero até 2030 e a compensação das emissões de gases de efeito de estufa

provenientes da supressão legal da vegetação até 2030;

3. Restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de florestas até 2030, para múltiplos

usos;

4. Ampliar a escala de sistemas de manejo sustentável de florestas nativas, por meio de

sistemas de georeferenciamento e rastreabilidade aplicáveis ao manejo de florestas nativas, com

vistas a desestimular práticas ilegais e insustentáveis.

Agrícola Fortalecer o Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC) como a principal

estratégia para o desenvolvimento sustentável na agricultura, inclusive por meio da restauração

adicional de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas até 2030 e pelo incremento de 5

milhões de hectares de sistemas de integração lavoura-pecuária-florestas (iLPF) até 2030.

Industrial No setor industrial, promover novos padrões de tecnologias limpas e ampliar medidas de

eficiência energética e de infraestrutura de baixo carbono.

Transportes Promover medidas de eficiência, melhorias na infraestrutura de transportes e no transporte

público em áreas urbanas.

Fonte: Elaboração própria a partir de BRASIL (2015, p. 3-4).

Desta forma, observa-se a partir do Quadro 3.1, que para alcançar as metas

previstas pela iNDC brasileira, existe a previsão de um conjunto de medidas complementares

de caráter setorial. No que diz respeito à energia, objeto particular de interesse nesta

dissertação, identifica-se dois conjuntos de medidas complementares diretamente associadas

ao setor energético e dois conjuntos indiretamente ligados a ele.

Os dois primeiros conjuntos de medidas, que afetam o setor energético

diretamente, dizem respeito a metas quantificáveis com o horizonte de 2030, sendo eles: i)

aumento de participação de biocombustíveis na matriz energética brasileira para cerca de

18%; e ii) aumento da participação de energias renováveis nesta matriz para 45%. Como será

visto no capítulo 4, essas metas não representam nenhuma ambição para o avanço das fontes

renováveis na matriz energética do país, pois simplesmente mantêm sua participação relativa.

As medidas previstas no documento em análise para o alcance dessas metas que

afetam o setor energético diretamente são apresentadas no documento como se segue.

Page 118: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

118

Para o aumento da participação de bioenergia sustentável na matriz energética

brasileira para aproximadamente 18% até 2030, as medidas previstas são bastante genéricas e

consistem:

Na expansão do consumo de biocombustíveis, aumentando a oferta de etanol,

inclusive por meio do aumento da parcela de biocombustíveis avançados (segunda

geração); e

No aumento da parcela de biodiesel empregado na mistura do diesel.

Para o alcance de uma participação estimada de 45% de energias renováveis na

composição da matriz energética em 2030, são previstas as seguintes medidas:

A expansão do uso de fontes renováveis, além da energia hídrica, na matriz total

de energia para uma participação de 28% a 33% até 2030;

O aumento do uso doméstico de fontes de energia não fóssil, ampliando a parcela

de energias renováveis (além da energia hídrica) no fornecimento de energia

elétrica para ao menos 23% até 2030, inclusive pelo aumento da participação de

eólica, biomassa e solar;

O alcance de 10% de ganhos de eficiência no setor elétrico até 2030.

No que tange aos dois conjuntos de medidas que afetam indiretamente o setor

energético dizem respeito justamente a ganhos de eficiência em outros dois setores: o

industrial e o de transportes, ambos referidos no documento em análise de maneira apenas

genérica.

As medidas atinentes ao setor industrial são apresentadas genericamente como a

promoção de “novos padrões de tecnologias limpas” e a ampliação de “medidas de eficiência

energética e de infraestrutura de baixo carbono” (BRASIL, 2015, p. 4).

As medidas afetas ao setor de transporte são mencionadas como a promoção de

“medidas de eficiência, melhorias na infraestrutura de transportes e no transporte público em

áreas urbanas” (BRASIL, 2015, p. 4).

2.2.3. Observações sobre o estágio atual de implementação das metas

Em setembro de 2016 ocorreu o depósito do instrumento de ratificação do Acordo

de Paris pelo governo brasileiro, deste modo a Contribuição Pretendida Determinada

Nacionalmente (iNDC) deixou de ser pretendida e o governo passou a assumir o

compromisso de planejar ações que implementem os objetivos dispostos na, agora, NDC.

Page 119: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

119

Para isto, o Ministério do Meio Ambiente promoveu a elaboração de uma

Estratégia Nacional para a Implementação e o Financiamento da NDC do Brasil ao Acordo de

Paris.

De acordo com o Ministério do Meio Ambiente (2017):

“A elaboração da Estratégia Nacional será articulada entre o Governo Federal, Governos

estaduais e municipais, setores relevantes da economia e segmentos da sociedade, entidades

representativas, organizações não-governamentais, movimentos sociais e demais grupos

interessados, por meio do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima, em Diálogos Estruturados a

serem conduzidos ao longo do primeiro semestre de 2017, em Câmaras Temáticas no âmbito

do Fórum, o qual, em momento oportuno, divulgará o calendário para o processo de Diálogos

Estruturados.”71

O Ministério do Meio Ambiente publicou o Sumário Executivo e a versão integral

de um “documento-base” a ser discutido e aperfeiçoado a partir de uma consulta pública.72

Assim, o governo brasileiro espera que os setores mencionados acima pudessem discutir,

opinar e contribuir para as propostas apresentadas. A consulta pública a princípio ficaria

aberta até o dia 15 de março de 2017, mas o prazo foi estendido até o dia 30 de julho de 2017,

com a justificativa de se aumentar a participação da sociedade.

2.3. Síntese e considerações finais do capítulo

O objetivo deste capítulo foi identificar, expor e discutir o perfil das emissões de

gases de efeito estufa no Brasil, tanto em seus aspectos quantitativos, quanto qualitativos, ou

seja, com relação ao perfil setorial das emissões e ainda a indicação da importância relativa

das emissões brasileiras no panorama global. Tendo em vista este perfil e os aportes anteriores

da dissertação sobre os rumos das negociações internacionais sobre mudanças climáticas, são

apresentadas as metas brasileiras, na forma de suas iNDC – e, agora, NDC, para o Acordo de

Paris.

Nota-se que o volume total das emissões brasileiras para o período de 1990 e 2014

de acordo com a SEEG foi de 67 GtCO2e em GWP. Deste total, há o destaque para o setor de

Mudanças de Uso da Terra que representou 65% da parcela de emissões de GEE do país,

resultado principalmente do desmatamento da Amazônia, oriundo da exploração madeireira e

71 Até o dia 09 de março de 2017, o referido calendário ainda não havia sido disponibilizado.

72 O documento-base para esta consulta pública, intitulado “Documento-base para subsidiar os diálogos

estruturados sobre a elaboração de uma estratégia de implementação e financiamento da Contribuição

Nacionalmente Determinada do Brasil ao Acordo de Paris”, encontra-se disponível em:

www.mma.gov.br/images/arquivos/clima/ndc/documento_base_ndc_2_2017.pdf

Page 120: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

120

também do crescimento da expansão agrícola. Somente entre os anos de 2002 e 2004, as

emissões de GEE em MUT cresceram 53,6%.

Já para o setor de energia, as emissões de GEE no período entre 1990 e 2014

cresceram 2,52 vezes, saindo de um patamar de 189,7 MtCO2e para o de 479,1 MtCO2e,

respondendo no período pelo segundo maior crescimento das emissões, atrás apenas da MUT.

A análise dos dados sobre as emissões de GEE em geral e de CO2 em particular

para o Brasil coletados e sistematizados, a partir da base de dados do SEEG/Observatório do

Clima, permitiu, ainda notar um pico de emissões entre 2003 e 2004. Os relatórios do

Observatório do Clima (Brandão Jr. e Barreto, 2016; Azevedo, 2016; Ferreira et al, 2016)

demonstram que esse pico se deu em função do aumento das emissões em MUT. Brandão Jr.

e Barreto (2016) atribuem esse aumento ao ciclo das commodities e a uma "frouxidão da

política agrária". No entanto, é preciso notar que o ciclo recente das commodities se

desdobrou entre 2003 e 2013, com uma pequena reversão em 2008, não oferecendo a

possibilidade de estabelecer uma clara correlação com o comportamento das emissões e,

muito menos, um nexo causal. Conforme mencionado neste capítulo, os determinantes do

comportamento das emissões brasileiras no período de 1990 a 2014 não são elucidados pelos

autores mobilizados neste estudo, carecendo ainda de mais investigações. Desde logo, parece

claro que as hipóteses explicativas para esse comportamento devam incluir aspectos

conjunturais e estruturais da dimensão econômica (levando em conta, em especial, os setores

de mais alta emissão) e aspectos de políticas que afetam as emissões, como as voltadas às

Unidades de Conservação e às terras indígenas.

Ainda neste capítulo, foi traçado um perfil preliminar das emissões setoriais no

Brasil, que serão aprofundadas no capítulo seguinte. Nota-se que as emissões de CO2e do

setor energético cresceu 14 pontos percentuais entre 1990 e 2014, enquanto o setor MUT

diminuiu 24 pontos percentuais (Cf. Fig. 3.6). Provavelmente, este movimento pode encontrar

explicações, respectivamente, no aumento do uso de energias de fontes fósseis (como será

visto no próximo capítulo) e numa política voltada, num certo momento, à proteção de

Unidades de Conservação. Conforme acima mencionado, essa última hipótese precisa ser

problematizada e investigada em maior detalhe.

Com relação à Contribuição Pretendida Determinada Nacionalmente (iNDC),

apresentada pelo Brasil à COP 21, verificou-se que o documento brasileiro, organizado em

torno das questões da mitigação, da adaptação e dos meios de implementação, propõe metas e

faz referência a algumas medidas setoriais e intersetoriais para limitar as emissões de GEE a

Page 121: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

121

fim de ser consistente com a proposta global de limitar o aumento de temperatura no planeta a

2ºC até o final do século XXI com relação aos níveis pré-industriais.

As principais propostas pela iNDC do Brasil é a intenção de se reduzir as

emissões de GEE em 37% abaixo dos níveis de 2005 para o horizonte de 2025 e de reduzir

em 43% para o horizonte de 2030. As principais metas setoriais apresentadas foram: i) para o

setor de energia: alcançar a participação estimada de 45% de energias renováveis na

composição da matriz energética em 2030; ii) para o setor florestal e MUT: restaurar e

reflorestar 12 milhões de hectares de florestas até 2030, para múltiplos usos; fortalecer

políticas e medidas com vistas a alcançar, na Amazônia brasileira, o desmatamento ilegal zero

até 2030 e a compensação das emissões de gases de efeito de estufa provenientes da supressão

legal da vegetação até 2030 e ampliar a escala de sistemas de manejo sustentável de florestas

nativas, por meio de sistemas de georeferenciamento e rastreabilidade aplicáveis ao manejo de

florestas nativas, com vistas a desestimular práticas ilegais e insustentáveis; iii) para o setor

agrícola: Fortalecer o Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC) como

a principal estratégia para o desenvolvimento sustentável na agricultura, inclusive por meio da

restauração adicional de 15 milhões de hectares de pastagens degradadas até 2030 e pelo

incremento de 5 milhões de hectares de sistemas de integração lavoura-pecuária-florestas

(iLPF) até 2030; iv) para o setor industrial: promover novos padrões de tecnologias limpas e

ampliar medidas de eficiência energética e de infraestrutura de baixo carbono e v) para o setor

de transportes: Promover medidas de eficiência, melhorias na infraestrutura de transportes e

no transporte público em áreas urbanas.

Observa-se que as metas propostas pela iNDC são coerentes com as emissões de

GEE no Brasil, porém as propostas não são esclarecidas. Não se trata de uma apresentação de

medidas mais detalhadas. Entretanto, deve-se notar que em geral as iNDCs apresentadas pelos

signatários da UNFCCC também não foram detalhadas.

De acordo com a discussão deste capítulo conclui-se que o MUT é responsável

pela maior parte de emissões de GEE, porém ao analisar as metas da iNDC, observa-se que

ela engloba somente o bioma Amazônia e não outros que sofrem também com as ações de

desmatamento, como o cerrado.

Com relação às metas apresentadas no documento para as energias renováveis no

Brasil, observa-se que as intenções se restringem, como será demonstrado no próximo

capítulo desta dissertação, à manutenção das participações relativas atuais.

Page 122: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

122

O documento brasileiro é, ainda, extremamente sintético, o que dificulta sua

análise. Como foi dito acima, não há um detalhamento das medidas de mitigação ou de

adaptação, de forma que as lacunas abrem espaço para questionamentos sobre como as metas

podem ser alcançadas. Por exemplo, qual seria o papel da Agricultura, tanto em termos de

mitigação quanto de adaptação.

O fortalecimento do Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano

ABC) consta das medidas complementares como a principal estratégia para o

desenvolvimento sustentável e redução de GEE na agricultura, incluindo recuperação de

pastagens e o aumento de sistemas de integração lavoura-pecuária-florestas. Ainda assim,

caberia questionar o papel do uso do conhecimento científico, tecnológico e das inovações

para promover a adaptação de cultivares importantes para a agricultura brasileira, por

exemplo.

No setor da energia, cujo crescimento em termos de emissões foi muito

significativo, como será detalhado no próximo capítulo, há uma documentação disponível

para que se investigue um pouco mais detalhadamente como as metas poderão ser alcançadas.

Este será o objeto da análise que estará incorporada na parte III desta dissertação.

Page 123: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

123

PARTE III

SETOR DE ENERGIA

CONFIGURAÇÃO RECENTE, EMISSÕES ASSOCIADAS

E “AMBIÇÕES” PARA DESCARBONIZAÇÃO

Capítulo 4 - Mudanças recentes no setor de energia

e emissões associadas

Capítulo 5 – Ações para reduções de emissão de GEE no setor de energia:

mais fragmentos do que estratégias integradas para uma descarbonização

Page 124: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

124

Capítulo 4 – Mudanças recentes no setor de energia e emissões associadas

A matriz primária de energia no Brasil costuma ser reconhecida por seu caráter

fortemente renovável. No capítulo anterior, observou-se, entretanto, que nos últimos anos as

emissões associadas ao setor de energia se tornaram um grande vilão nacional em termos

dessas emissões. Como foi visto, este setor respondeu em 2014 por 26% das emissões de GEE

no país, enquanto que a MUT foi responsável por 42% das emissões. Em 1990, o setor de

energia contribuía com apenas 12% das emissões de GEE no Brasil. Isto quer dizer que as

emissões no setor da energia saíram de um patamar de 192.792.711 toneladas de GEE

(GWP/AR5) em 1990 e alcançaram em 2014, 482.372.908 toneladas de GEE (GWP/AR5).

Neste capítulo, o objetivo consiste em compreender as mudanças da matriz

energética brasileira no período entre 1970 e 2014. Esta é uma forma que facilita o

entendimento do aumento das emissões de GEE neste setor.

Para tanto, a metodologia empregada foi baseada, de um lado, no levantamento,

sistematização e análise de dados quantitativos sobre o setor de energia no Brasil, em especial

sobre a oferta interna de energia, a partir do Balanço Energético Nacional e, de outro lado,

numa pesquisa documental sobre planejamento energético no Brasil, em especial os Planos

Decenais de Energia (PDE) e os documentos analíticos publicados Sistema de Estimativa de

Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG).

O capítulo está organizado em três seções, além dessa breve introdução e das

conclusões.

A seção 4.1 apresenta as mudanças na composição da energia primária no Brasil

no período de 1970 a 2014. Os dados para a elaboração dos gráficos foram extraídos da base

de dados do Balanço Energético Nacional. Foram recuperados e analisados, à luz de estudos

de especialistas na área de energia, dados sobre a produção primária de energia no país,

agrupados por fontes renováveis e não-renováveis, de forma agregada. A seguir, os dados

foram desagregados segundo as fontes primárias e secundárias renováveis em questão:

energia hidráulica, biocombustíveis, lenha e outras fontes primárias renováveis. Os casos do

etanol e do potencial hidráulico foram examinados, tendo sido caracterizado que, embora

tenha havido um aumento da produção dessas fontes primárias em termos absolutos, houve

uma perda na participação relativa das fontes renováveis na matriz primária, pois em 1970 o

percentual correspondia a 78,66% e em 2014 passou a representar somente 43,54%. Um

exame um pouco mais detalhado evidencia que uma parte relevante da necessidade de energia

Page 125: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

125

primária para suprir o fornecimento de energia elétrica terminou por favorecer o uso de

energias não renováveis, em especial o gás natural. Estes resultados são mais bem

compreendidos com a apresentação e análise da evolução da estrutura da oferta interna de

energia, em especial a partir de 2000.

A necessidade de suprir o fornecimento de energia elétrica a partir de fontes

fósseis se deu com o recurso, conforme se observa na seção 4.2, a um aumento nas

importações desse combustível, o que se traduziu numa mudança na estrutura da oferta

interna de energia.

A seção 4.3 recupera e apresenta o perfil das emissões de CO2 associadas à oferta

e à demanda energética, destacando o perfil setorial dessas emissões e qualificando-as tanto

em termos absolutos quanto relativos.

Nas conclusões, serão sintetizados os resultados da investigação relativa a este

capítulo, procurando-se responder às perguntas que a guiaram.

As perguntas que este capítulo se propõe responder são: Que transformações

ocorreram recentemente no setor de energia no país a ponto de explicar essa mudança? Quão

renovável é a matriz primária brasileira? Qual é a importância das emissões de GEE associado

à produção e ao uso de energia no Brasil?

Assim, neste capítulo, procede-se à apresentação da matriz energética brasileira,

tanto em suas configurações atuais (2014) quanto em uma perspectiva histórica recente (1970

– 2014). É oferecida uma análise da composição relativa e dos papeis das fontes fósseis e das

renováveis nessa matriz ao longo do período. Para isto, é apresentada a composição da matriz

energética primária em termos de fontes renováveis e não-renováveis, analisando-se a

evolução tanto dos valores absolutos quanto percentuais de energia fóssil em de energia

renovável para o período em análise. Conforme será visto, as mudanças da configuração da

matriz energética tem implicações para o aumento das emissões de GEE no setor de energia.

3.1. Mudanças na energia primária no Brasil no período 1970-2014

No Brasil, o crescimento da produção de energia primária73

é documentado pelo

Ministério de Minas e Energia, que disponibiliza dados a partir de 1970, acessíveis por meio

do Balanço Energético Nacional (BEN)74

.

73 De acordo com Pinto Jr et al (2007), a energia primária é aquela proveniente da natureza em sua forma direta,

ou seja, sem que haja processos de transformação. São exemplos de fonte de energia primária: petróleo, carvão

Page 126: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

126

É possível observar o crescimento muito expressivo da produção primária de

energia: foi um crescimento de 5,6 vezes entre 1970 e 2014. O Brasil produzia, em 1970,

49.627 x 103 tep (sigla para tonelada equivalente de petróleo), sendo que 78% deste total era

representado por energia renovável. Em 2014, dos 72.633 x 103 tep, a participação das

renováveis, embora tenha crescido para 118.713 x 103 tep, sua participação relativa baixou

para 43%, conforme é possível observar pela Figura 4.1 abaixo.

Figura 4.1 - Crescimento da produção primária de energia no Brasil

(1970-2014), em 103 tep

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do BEN (dados consolidados).

Assim, observa-se que ao longo das décadas de 1970 e 1980, e se estendendo até

meados da década de 1990, as fontes renováveis eram preponderantes na produção interna de

energia. Isso pode ser explicado por decisões no âmbito das políticas nacionais e nas políticas

específicas para o setor energético que favoreceram o aproveitamento das dotações naturais

em termos de potencial hídrico. Além disso, houve intencionalidade na construção de outras

vantagens, como o desenvolvimento de competências locais na área do etanol, promovendo o

mineral,gás natural, energia hidráulica, lenha, resíduos de madeira e os produtos da cana de açúcar. A energia

primária é submetida a transformações gerando a energia secundária, que é a que será efetivamente consumida

pelo Homem, satisfazendo suas necessidades, como: eletricidade (gerada a partir de hidrelétricas, que são

movidas a energia hidráulica; termelétricas, que são movidas a combustíveis fósseis, calor geotermal, biomassa

ou fissão nuclear; usinas eólicas; e painéis fotovoltaicos); derivados de petróleo (como óleo diesel, óleo

combustível, gasolina, querosene e gás liquefeito de petróleo); biomassa moderna (como biogás de aterros e os

biocombusíveis); e calor de processo e de aquecimento distrital, obtido por combustão em caldeiras.

74 Os balanços energéticos, como lembram Goldemberg e Lucon (2008), são importantes ferramentas de análise

da situação de uma dada região, como um país, como é caso do BEN, num determinado período, geralmente um

ano. São “fotografias” que, comparadas periodicamente, ano a ano, permitem perceber a evolução da produção e

do consumo de energia, segundo suas diversas fontes. Os balanços energéticos nacionais para o Brasil são

disponibilizados pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), por meio do site: https://ben.epe.gov.br

10.590

153.920

39.037

118.713 49.627

272.633

0

50.000

100.000

150.000

200.000

250.000

300.000

NÃO RENOVÁVEL RENOVÁVEL TOTAL

Page 127: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

127

crescimento preferencial de unidades produtivas mais eficientes (SZMRECSÁNYI &

MOREIRA, 1991).

A afirmação brasileira da importância das fontes renováveis materializou-se,

então, na composição relativa das fontes renováveis com relação às não renováveis. A

composição da produção primária de energia renovável no Brasil segundo suas fontes pode

ser verificada na Figura 4.2.

Figura 4.2 - Fontes renováveis na produção de energia primária no Brasil

(1970 a 2014) (em tep e em %)

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do BEN (dados consolidados).

Com relação à produção primária de energia renovável, propõem-se aqui três

observações. A primeira delas diz respeito ao comportamento da participação das energias

renováveis na produção de energia primária no Brasil; a segunda tem relação com o aumento

da participação dos “produtos da cana”; e a terceira se refere ao comportamento da

participação da “energia hidráulica”.

Com relação à primeira observação, isto é, à participação das energias renováveis,

verifica-se que a energia renovável predominante na produção primária de energia até meados

de 1995 era a lenha e que, após este ano, os produtos derivados da cana-de-açúcar passaram a

ser predominantes. No início da década de 2000, a energia hidráulica se destacou, mas foi por

pouco tempo, visto que em 2002 os produtos derivados da cana-de-açúcar tornaram-se

novamente predominantes.

78,66% 43,54%

0,00%

10,00%

20,00%

30,00%

40,00%

50,00%

60,00%

70,00%

80,00%

90,00%

0

10.000

20.000

30.000

40.000

50.000

60.000

ENERGIA HIDRÁULICA LENHA PRODUTOS DA CANA

OUTRAS RENOVÁVEIS % na Matriz Primária

Page 128: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

128

A participação relativa das energias renováveis na matriz primária brasileira

diminui ao longo dos anos de 1970 e 2014, conforme mostra a Figura 4.2.

De acordo com Furtado & Scandiffio (2011), o Brasil importava cerca de 80% do

petróleo que consumia no início da década de 1970, numa conjuntura internacional de

reorganização dos países produtores e exportadores de petróleo que levou à restrição de sua

oferta e a quadruplicação de seu preço em 1973.

O projeto nacionalista, em especial na década de 1970, então apontava para a

necessidade do país de substituir sua dependência no petróleo importado. Para isto, o país

passou a investir em inovação tecnológica para exploração de petróleo no mar e também a

desenvolver parques geradores de energia a partir de energia hidráulica (FURTADO, 1996;

FURTADO & FREITAS, 2009).

“Em meados da década de 1980, quando o Brasil ainda importava praticamente a metade do

petróleo consumido, ocorre a descoberta de grandes reservatórios localizados em águas

profundas (mais de 400 metros de lâmina d’água) que viabilizavam a autossuficiência. Porém,

a tecnologia para produzir a tais profundidades não estava disponível internacionalmente.

Naquele momento se consolida o projeto de alcançar simultaneamente as metas da

autossuficiência com o de autonomia e até mesmo liderança tecnológica. O Procap (Programa

de Capacitação Tecnológica em Sistemas de Exploração em Águas Profundas) traduz esse

novo estágio da estratégia nacionalista.” (Furtado & Freitas, 2009, pp. 58-59)

Os autores se referem a este período, nas décadas de 1970 e 1980, no Brasil, em

que foram concebidas e implementadas políticas para o desenvolvimento tecnológico de

setores considerados estratégicos, como a informática, as telecomunicações, o de armamentos

e o de energia, com o objetivo de “aumentar o domínio local e a geração endógena de

tecnologia”, criar “campeões nacionais”, apoiando-se nas especificidades nacionais para gerar

tecnologias capazes de levar o país a “explorar oportunidades de negócios no mercado

nacional e, sobretudo, internacional” (Furtado & Freitas, 2009, p. 59).

A partir da década de 2000, a participação das fontes renováveis na produção de

energia primária sofre uma queda. No contexto do chamado “apagão”, o país optou pelo

investimento em usinas geradoras de termoeletricidade movidas a gás natural para

suplementar a energia derivada da energia hidráulica. Este ponto será objeto da atenção nesta

dissertação, mais adiante, ainda nesta seção.

A queda relativa da participação das energias renováveis na produção primária de

energia pode ser compreendida tendo-se em conta o valor dos investimentos, em geral, mais

elevados do que os das tecnologias energéticas convencionais (cf. Costa & Prates, 2005, por

Page 129: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

129

exemplo), e as dificuldades representadas pelos crescentes conflitos socioambientais e de

licenciamento de grandes projetos no setor de hidroeletricidade.

Com respeito à segunda observação, ou seja, em relação ao aumento da

participação dos “produtos da cana”, observa-se que a produção de etanol no país a partir dos

anos 70 se deu como uma estratégia de busca de uma maior autonomia energética do país,

diminuindo a dependência de importação de petróleo.

Neste sentido, a primeira iniciativa foi a criação do Proálcool em 1975. Shikida

(1997) sintetiza alguns aspectos do panorama peculiar que ensejou o advento deste Programa

e, portanto, para a emergência do que Furtado, Scandiffio e Cortez (2008) chamam de sistema

de inovação da agroindústria canavieira brasileira:

“A crise do petróleo gerou um “gargalo” no processo produtivo. [...] Contudo, a crise da

agroindústria canavieira acabou favorecendo a ‘orquestração’ de interesses que levou o país a

optar pelo Proálcool. [...] A ‘orquestração’ de interesses para viabilizar o Proálcool englobou

os empresários das usinas e destilarias, o Estado, o setor de máquinas e equipamentos e a

indústria automobilística. Para os usineiros tratava-se de diversificar a produção, de criar um

novo mercado diante das frequentes crises da economia açucareira, e diante também de um

parque produtivo que precisava avançar tecnologicamente e que estava com tendência à

sobrecapacidade. Para o Estado, os interesses nesse Programa resumiam-se nos seguintes

objetivos: economia de divisas; diminuição das desigualdades regionais de renda; crescimento

da renda interna; geração de empregos; e expansão da produção de bens de capital. Para o setor

de máquinas e equipamentos (indústria de bens de capital), o advento do Proálcool permitia

vislumbrar um quadro de continuidade do crescimento que havia sido iniciado ao final da

década de 60 e que atingiu o seu auge no período do ‘milagre’ econômico do país.

Especificamente para a indústria automobilística, a crise do petróleo obstaculizava, de certa

forma, a continuidade da política de transporte baseada em rodovias; e o carro movido a álcool

despontava como uma alternativa para a continuidade dessa política de transporte”. (Shikida,

1997, p. 158-159).

Neste período, a produção de etanol foi feita por novas destilarias anexas às

usinas de cana-de-açúcar que já existiam, ao contrário da segunda fase do Proálcool na qual

várias destilarias autônomas foram construídas (WALTER, 2009).

A primeira fase do Proálcool estendeu-se de 1975 a 1979, concentrando seus

esforços para a produção de álcool anidro para adição à gasolina, contribuindo para ser uma

alternativa para a capacidade ociosa75

que se instaurava na indústria canavieira (ANDRADE,

CARVALHO, SOUZA, 2009; SZMRECSÁNYI, MOREIRA, 1991). Nesta primeira fase, a

taxa de crescimento anual da produção de etanol foi expressiva, de 49%, sendo que a

produção em 1975 correspondia a 580 x 10³m³ e em 1979 alcançou 2.854 x 10³m³.

75 Capacidade ociosa, pois neste período houve uma superprodução de açúcar, o que ocasionava a diminuição do

preço do produto nas bolsas internacionais.

Page 130: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

130

A segunda fase do Proálcool (1980-1986), marcada pelo Segundo Choque do

Petróleo (1979-80), estimulou um segundo ciclo de investimento com o objetivo de triplicar a

produção interna de etanol até 1985 (FURTADO, SCANDIFFIO , CORTEZ, 2011). Com

isso, os objetivos do Proálcool foram ampliados para apoiar e estimular também a produção

do álcool hidratado, que seria utilizado como combustível em automóveis. Esta segunda fase

motivou também a produção de automóveis movidos a etanol no país, já que as montadoras

multinacionais instaladas aderiram ao programa, devido, sobretudo, aos preços controlados do

setor e aos subsídios aos veículos movidos a álcool (FURTADO, SCANDIFFIO & CORTEZ,

2011).

Dessa forma, coerentemente com a estratégia nacionalista de desenvolvimento

que dá destaque ao desenvolvimento autônomo de tecnologias em setores estratégicos no

Brasil, conforme mencionado anteriormente, as décadas de 1970 e 1980 também

testemunham a expansão de um aparato institucional para o desenvolvimento do setor

sucroenergético no país, com financiamento voltado para o avanço tecnológico, tanto no setor

industrial quanto com relação ao melhoramento de cultivares. Instituições públicas de

pesquisa, de financiamento, empresas privadas produtoras de açúcar e álcool, universidades e

empresas produtoras de bens de capital exerceram papeis relevantes para o aprendizado

tecnológico aplicado ao setor, numa configuração analisada por Furtado & Scanddifio (2011),

que permitiu aos autores falar num sistema de inovação setorial sucroalcooleiro. Os autores

apontam para os avanços no conhecimento científico e tecnológico proporcionado pelo

estreitamento das relações entre esses elementos do sistema e também se referem a desafios

para sustentar esses avanços, por exemplo, no caso da busca do etanol de segunda geração.

O fato é que as sinergias criadas pelas estratégias brasileiras no setor

sucroalcooleiro permitiram que se avançasse no sentido da substituição de combustíveis

fósseis em veículos automotores a partir da década de 1980, com os motores movidos a etanol

e, mais adiante, nos anos 2000, com os motores flex, como será mencionado mais adiante.

Como salientam Vazzoler e Bonacelli (2014), a difusão dos veículos movidos a

etanol se deu de maneira rápida, sendo que entre 1985 e 1986, cerca de 80% dos veículos

novos que chegavam ao mercado eram equipados com motores a álcool. Nesta fase, a

produção e o consumo de etanol hidratado experimentaram uma taxa anual de crescimento de

Page 131: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

131

31,79% e 51,52%, respectivamente, com uma produção de 7.863 x 103m

3 em 1986 e consumo

de 9.062 x 103m

3 no mesmo ano76.

Porém, durante a década de 1979-1989, os preços internacionais do petróleo

diminuíram vertiginosamente (contrachoque do petróleo), fazendo com que o etanol se

tornasse mais caro relativamente à gasolina, contribuindo para a desaceleração dos

investimentos no setor (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991).

A partir da década de 1990, as montadoras multinacionais optaram por produzir

em maior quantidade modelos e motores nos padrões internacionais, ou seja, na versão a

gasolina. Num contexto de abertura comercial, houve também a liberação da importação de

veículos automotivos, majoritariamente movidos a gasolina e a diesel, ao lado de políticas de

incentivo ao “carro popular”, desenvolvido para ser movido a gasolina. A abertura comercial

foi um dos aspectos que caracterizaram o período, conhecido por diversas iniciativas de

liberalização que desregulamentaram amplos setores da economia brasileira, dentre eles o

sucroenergético. Conforme observam Shikida & Perosa (2012, p. 244):

“o governo Collor promoveu a desregulamentação da maioria das cadeias agroindustriais

brasileiras, o que levou à extinção do IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool) e mudou

completamente a forma como o governo atuava na cadeia”.

Essas razões ajudam a explicar os movimentos do consumo e da produção do

etanol anidro e hidratado ao longo da década de 1990 até o início da década seguinte, como

ilustram as Figuras 4.3 e 4.4, respectivamente.

Na Figura 4.3, a seguir, observa-se que o consumo do etanol anidro começa a

crescer já no início da década de 1990. Esse tipo de álcool, como já mencionado, é utilizado

na mistura com a gasolina nos motores dos automóveis movidos “exclusivamente” a este

combustível. Paulatinamente, especialmente a partir de 1996-19977, é possível verificar uma

redução do consumo do etanol hidratado, coerentemente com um movimento de saída dos

consumidores do mercado de automóveis movidos a etanol.

76 Idem.

Page 132: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

132

Figura 4.3 - Consumo total de etanol no Brasil, consumo de álcool anidro e hidratado

(1970 – 2014) em 103m

3

Fonte: elaboração própria a partir do BEN (dados consolidados).

O avanço da produção de carros flex fuel no Brasil desde 2003 pode ser observado

pela consulta ao Quadro 4.1, a seguir. 77

Nota-se que a partir de 2006 a produção de

automóveis movidos exclusivamente a etanol foi suspensa, sendo que, neste mesmo ano, os

automóveis flex fuel alcançaram pela primeira vez uma participação maior de 50% na

produção total de automóveis no país. O dado mais recente da ANFAVEA aponta que 83%

dos automóveis produzidos no Brasil pertence à categoria flex fuel.

Quadro 4.1 – Produção automobilística por combustível (2003 - 2014) em %

Ano Gasolina Etanol Flex Fuel Diesel

2003 85% 2% 3% 10%

2004 73% 2% 14% 11%

2005 53% 1% 35% 11%

2006 37% 0% 53% 9%

2007 26% 0% 65% 9%

2008 20% 0% 70% 11%

2009 12% 0% 80% 8%

2010 18% 0% 72% 10%

2011 14% 0% 74% 12%

2012 12% 0% 80% 9%

2013 10% 0% 79% 11%

2014 8% 0% 83% 9%

Fonte: ANFAVEA. Anuário da Indústria Automobilística Brasileira (2016).

77 Em março de 2003 a VW comercializou o primeiro carro flex-fuel no Brasil, um Gol 1.6 (cf. Vazzoler &

Bonacelli, 2014, p. 125).

0

5000

10000

15000

20000

25000

30000

19

70

19

72

19

74

19

76

19

78

19

80

19

82

19

84

19

86

19

88

19

90

19

92

19

94

19

96

19

98

20

00

20

02

20

04

20

06

20

08

20

10

20

12

20

14

CONSUMO (Etanol Anidro) CONSUMO (Etanol Hidratado)

Consumo total de etanol

Page 133: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

133

Assim, o movimento que se observa do lado do consumo de etanol para o período

é congruente com a expansão da produção e uso de carros flex fuel. E, como não poderia

deixar de ser, também é coerente com o avanço da produção do etanol, anidro e hidratado,

apresentada na Figura 4.4.

Figura 4.4 - Produção total de etanol no Brasil, produção de álcool anidro e hidratado

(1970 – 2014) em 103m

3

Fonte: elaboração própria a partir do BEN (dados consolidados).

Assim, observa-se, do lado do produtor (Figura 4.4), um aumento persistente da

produção do álcool anidro desde o início da década de 1990. A produção de álcool hidratado

apresenta quedas entre 1997-8, ficando praticamente estagnada entre 2000 e 2003, a partir de

quando se verifica a retomada do aumento da produção, consistentemente com a introdução

dos veículos flex fuel.

Finalmente, a terceira observação que cabe fazer com relação à produção primária

de energia renovável, diz respeito ao comportamento da participação da energia hidráulica.

Sabe-se que o potencial hidráulico do país está entre os cinco maiores do mundo

(PORTAL BRASIL, 2011). Para a transformação deste potencial em energia hidráulica faz-se

necessário que investimentos sejam realizados. O papel das políticas específicas para isso não

pode ser de forma alguma minorado.

Conforme nota-se na Figura 4.5, na próxima página, ao longo do período de 1970

a 2014, a produção primária de energia hidráulica (103m

3) apresenta um crescimento regular

com uma queda abrupta de 12% entre os anos de 2000 e 2001. Uma nova expansão se inicia a

0

5000

10000

15000

20000

25000

30000

19

70

19

72

19

74

19

76

19

78

19

80

19

82

19

84

19

86

19

88

19

90

19

92

19

94

19

96

19

98

20

00

20

02

20

04

20

06

20

08

20

10

20

12

20

14

PRODUÇÃO (Álcool Anidro) PRODUÇÃO (Álcool Hidratado)

Produção total de etanol

Page 134: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

134

partir desta data até 2011 e uma persistente e importante retração desde então. A retração da

produção de energia hidráulica no Brasil entre 2011 e 2014 foi de 12,8%.

Figura 4.5 - Produção de Energia Hidráulica no Brasil, (1970 – 2014)

em 103m

3 e % da produção na Matriz Primária de Energia

Fonte: elaboração própria a partir do BEN (dados consolidados).

Como se pode notar, ao longo da década de 1970, a expansão da produção de

energia hidráulica foi de tal ordem a levar o país de uma situação inicial na qual esta fonte

representava pouco mais que 7% da matriz primária a 16,7% uma década mais tarde. Essa

expansão foi resultado de uma política de desenvolvimento que caracterizou a gestão militar,

principalmente no chamado II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento), de 1974, no

governo do general Ernesto Geisel, que tinha como proposta:

"imprimir novo rumo ao desenvolvimento brasileiro, ao priorizar o aumento da capacidade

energética e da produção de insumos básicos e de bens de capital, [que] representava uma

guinada de vulto no (sic) modelo anterior, vigente durante o período do ‘milagre’ de 1968-

1973, cuja prioridade residia nos bens de consumo duráveis” (FONSECA & MONTEIRO,

2007, p. 28-29).

Este plano estabeleceu a construção de grandes empreendimentos no Brasil como

a hidrelétrica de Itaipu e a de Sobradinho, que foram construídas no intuito de tornar o Brasil

menos dependente do petróleo importado, no contexto do primeiro choque do petróleo.

A participação desta fonte, entretanto, na produção primária de energia no país

diminuiu em um compasso muito importante na primeira metade da década de 1980 e apenas

retomou um movimento de elevação a partir de 1987, com a plena operação de Itaipu (entre

0%

2%

4%

6%

8%

10%

12%

14%

16%

18%

20%

0

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

35.000

40.000

19

70

19

72

19

74

19

76

19

78

19

80

19

82

19

84

19

86

19

88

19

90

19

92

19

94

19

96

19

98

20

00

20

02

20

04

20

06

20

08

20

10

20

12

20

14

ENERGIA HIDRÁULICA % na Matriz Primária de Energia

Page 135: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

135

1986 e 1987) e a progressiva entrada em operação das turbinas de Tucuruí (entre 1984 e

1991).

A partir do início da década de 1990, a liberalização econômica e a

desregulamentação do setor energético, instauradas pelo Programa Nacional de

Desestatização, caracterizado por um conjunto de ações que incluía a venda de estatais

produtivas, abrangendo as alienações de participação societária, concessões, permissões e

autorizações, bem como a transferência ou outorga de direitos sobre bens móveis e imóveis da

União foram colocadas como alternativas para a expansão do setor (BNDES, 2016).78

No caso do setor energético, houve uma reestruturação com o propósito declarado

de promover a ampliação do sistema energético e a redução das tarifas, com a adoção de um

modelo que se baseava em: em primeiro lugar, a desverticalização da indústria, distinguindo-

se segmentos monopolistas (regulados) – transmissão e distribuição – e não monopolistas –

geração, comercialização; em segundo lugar, a privatização e a instituição de um modelo

comercial baseado em comportamento competitivo dos agentes; e, finalmente, a regulação

técnica e econômica (independente) das atividades do setor (SAUER, 2002).

Porém, conforme salienta Sauer (2002), esta reestruturação não obteve o resultado

almejado, visto que as tarifas energéticas, especialmente para o setor residencial, tiveram um

aumento progressivo, que as vendas das concessões alcançaram baixos valores e que houve a

dispensa de mão de obra técnica qualificada, gerando perda de qualidade em atividades do

setor. Além disso, o autor ressalta que a reestruturação do setor energético tirou do Estado o

papel de orientador de políticas e de planejador em um setor essencial para a vitalidade da

economia e para o bem-estar da sociedade.

Dentro desse panorama de mudanças patrimoniais e institucionais, sobretudo

regulatórias do setor energético, houve um descompasso entre a capacidade instalada e o

aumento do consumo da energia elétrica, como pode-se observar na Figura 4.6, mais abaixo.

Sauer (2002) observa que, no período de 1991 a 2000, a demanda de energia

cresceu em média 4,1% a.a, enquanto a oferta cresceu a uma taxa anual de 3,3%. Conforme

analisa o autor:

78 Algumas informações nas quais se baseou esta análise são provenientes do site BNDES Transparente

(http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/Desestatizacao/).

Infelizmente, no momento da revisão desta parte da dissertação (10 de novembro de 2016), o site não se

encontrava mais no ar.

Page 136: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

136

“A defasagem entre a oferta e a demanda se acentuou a partir de 1995, superando os 10%

acumulados na década. A questão é clara: faltou expansão. A capacidade total de reservação se

expandiu abaixo do necessário, devido à falta de investimento em produção de energia

(usinas). Por um lado, as empresas estatais foram impedidas de investir, como parte do

cumprimento dos acordos do país com o FMI; por outro lado, o capital privado que aqui

aportou investiu preferencialmente, com a anuência do governo, em capacidade existente,

agregando pouquíssima nova capacidade ao sistema.” (Sauer, 2002, p. 5)

Figura 4.6 - Capacidade Instalada versus Geração de Energia (1980 – 2000)

(em número índice)

Fonte: Sauer (2002).

Como resultado da falta de investimento no setor energético, o país enfrentou um

racionamento de energia entre junho de 2001 e fevereiro de 2002. Neste período, o

racionamento chegou a 25% do consumo de energia elétrica no país, apesar de terem sido

normais as condições hidrológicas apresentadas nestes anos, com três anos de afluência acima

da média e dois anos abaixo da média (SAUER, 2002).

Sauer, Viera & Kirchner (2001) afirmam que no período de reestruturação do

setor, a expansão do sistema energético foi freada pelas características da política econômica

instaurada, a qual identificava os recursos empregados em investimento público como déficit

público. Havia, ainda, a justificativa de que o Brasil não gerava atratividade devido aos

"riscos da prestação desses serviços no país" (Sauer, 2002, p. 1).

O autor também destaca entre as causas que levaram ao racionamento de energia

elétrica ocorrido no Brasil em 2001 "a incapacidade de garantir os investimentos na

Page 137: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

137

expansão da capacidade de geração, conduzindo a uma progressiva deterioração da

confiabilidade" (Sauer, 2015, p. 147).

Para aliviar a crise energética, em julho de 2001, o governo divulgou o Plano

Emergencial de Redução do Consumo de Energia Elétrica79

, que permitiu o aumento das

tarifas de energia e também concedeu benefícios a investidores do setor elétrico para a

construção de usinas termoelétricas, com a socialização do risco cambial (SAUER, 2001).

Naquele mesmo ano de 2001, o governo federal criou a Comercializadora

Brasileira de Energia Emergencial (CBEE)80

, como forma de superar a crise energética e

reequilibrar a oferta e demanda de energia. Para isso, de acordo com Sauer (2015) criou-se um

"seguro apagão", com a contratação de energia proveniente de 48 usinas termoelétricas,

criando 1.829 MW. Os contratos com estas usinas foram encerrados de 2006.

Em 2004 foi introduzido no país um novo modelo institucional do setor elétrico

que iniciou a prática de leilões de energia elétrica, como forma de atender a demanda de

energia no país, utilizando como critério o menor preço por megawatt-hora (MWh) para a

definição das empresas vencedoras (PIRES & HOLTZ, 2012).

O resultado dessas novas formas institucionais favoreceu um aumento progressivo

e muito expressivo das fontes não renováveis na produção de energia elétrica no Brasil.

Conforme se observa na Figura 4.7, a seguir, o combustível que mais cresceu e que responde

pela grande parte do consumo de combustíveis fósseis na geração de energia elétrica no Brasil

foi o gás natural.

Este aumento deveu-se a incentivos do governo para geração de energia por fontes

renováveis como o PROINFA (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas), criado pela Lei

nº 10.438, de abril de 2002. Especificamente para os biocombustíveis, houve um apoio

intenso ao longo dos governos do presidente Luís Inácio Lula da Silva (2003-2010) para que

houvesse diminuição das importações de petróleo. Um exemplo disso foi a instituição, em

2004, por parte do governo da meta de "2% de mistura de óleos vegetais ao óleo diesel ...

[que] a partir de 2008 [torna-se] percentual [...] obrigatório, aumentando para 5% em 2013"

(Paulillo et al, 2007, p. 550).

79 Medida provisória nº 2.198-5, de 24 de agosto de 2001.

80 Em 2004 seu nome foi alterado para Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE)

Page 138: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

138

Figura 4.7 - Crescimento da produção de energia elétrica a partir de fontes primárias e

secundárias não renováveis no Brasil (1970 - 2014), em GWh

Fonte: elaboração própria a partir do Balanço Energético Nacional

A participação da energia hidráulica diminuiu ao longo dos anos 2000 tanto

devido a problemas de planejamento e gestão – incluindo investimentos, conforme destaca

Sauer (2015), como dificuldades com o equacionamento do processo de licenciamento

ambiental de projetos de novas hidrelétricas, o que certamente contribuiu para a redução do

ritmo da construção de novas usinas, conforme apontam Tancredi & Abbud (2013).

Embora esses autores se refiram a essas dificuldades mais recentes do setor

elétrico, é preciso observar que os princípios dessa crise já se colocavam na década de 1970,

como aponta Furtado (2015).

Furtado (2015) evidencia que a crise energética tem origem nos anos 1970,

quando para reduzir os efeitos causados pelo aumento dos preços do petróleo (Primeiro

Choque do Petróleo), o governo adotou medidas uma série de medidas estratégicas para tentar

contornar seus impactos extremamente negativos. À época, o papel do governo era de

planejar, executar e gerir grandes projetos em setores estratégicos, como o de energia,

contando, a seu favor, com uma exuberância nos mercados financeiros internacionais, que vai

deixar de existir já no final daquela década. Este protagonismo vai dando lugar a papeis no

0

20.000

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

140.000

160.000

180.000

GÁS NATURAL CARVÃO VAPOR

ÓLEO DIESEL ÓLEO COMBUSTÍVEL

GÁS DE COQUERIA OUTRAS SECUNDÁRIAS

OUTRAS NÃO RENOVÁVEIS URÂNIO CONTIDO NO UO2

Page 139: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

139

planejamento e na regulação do setor, principalmente a partir da década de 1990. No

planejamento energético, o autor salienta que as análises de planejamento não são integradas,

mas sim setoriais. Essa é uma limitação até mesmo do ponto de vista da integração entre

oferta e demanda de energia.

***

Nesta seção, foram propostos três conjuntos de observações a fim de compreender

as mudanças da matriz energética brasileira entre 1970 e 2014: o primeiro conjunto de

observações foi voltado ao comportamento da participação das energias renováveis na

produção de energia primária no Brasil; o segundo procurou articular elementos explicativos

para o aumento da participação dos “produtos da cana”; e o terceiro fez referência ao

comportamento da participação da “energia hidráulica” nessa matriz.

É notável como, entre 1970 e 2014, a matriz primária de energia no Brasil se

reconfigurou radicalmente. Em 1970, a participação das fontes renováveis nessa matriz era de

79%; em 2014, essa participação caiu para 44% e, portanto, as fontes não-renováveis

responderam por 56% da produção primária energia, conforme se observa na Figura 4.8,

abaixo.

Figura 4.8 - Matriz Primária de Energia, Brasil:

fontes renováveis e não renováveis (1970 e 2014) (%)

1970 2014

Fonte: elaboração própria a partir do BEN (dados consolidados).

21%

79%

NÃO RENOVÁVEL RENOVÁVEL

56%

44%

NÃO RENOVÁVEL RENOVÁVEL

Page 140: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

140

Essa perda de renovabilidade da matriz primária de energia no Brasil ocorreu,

conforme se pode observar ao longo desta seção da dissertação, a opções que levaram a um

dinamismo talvez reduzido do setor sucroenergético, a uma redução relativa da expansão da

hidroeletricidade e ao aumento expansão da oferta de energia elétrica a partir de combustíveis

fósseis, em especial o gás natural, usados na operação de um parque de usinas termelétricas.

Esses elementos explicativos poderiam ser articulados em torno de uma

argumentação mais geral, qual seja, a da perda da capacidade do Estado brasileiro em

comandar os rumos da expansão da oferta de energia, que encontrou um momento

privilegiado na década de 1970:

“desde que os preços do petróleo começaram a cair no nível internacional em meados dos anos

1980, a maioria das políticas de substituição engajadas durante o primeiro e o segundo choque

do petróleo foi abandonada. Essas mudanças foram endossadas pelas reformas liberais dos

anos 1990 que reduziram drasticamente a intervenção governamental no setor de energia”

(Furtado, 2009, p. 45) 81

Os efeitos das políticas liberais do início dos anos 1990, aliás, já haviam sido

reportados especificamente para o setor do petróleo por Furtado & Muller (1995), como fruto

de investigações voltadas aos estudos de competitividade à época.

Essa perda de capacidade de comando e de planejamento pelo Estado no Brasil

significou intensificar e aprofundar o lock-in não apenas da matriz elétrica brasileira, mas

também da matriz primária de energia no Brasil no padrão fóssil intensivo.

A atuação do governo no setor de energia teve um papel estratégico, nacionalista,

como foi mencionado nesta seção. Desde a década de 1970, as influências do mercado

internacional, em especial com relação ao comportamento dos preços do petróleo, passam a

constituir elementos-chave para as decisões no setor (FURTADO, 2015).

Entende-se que uma observação relevante a se fazer com relação à expansão das

fontes não renováveis que se observou nesta seção se produz, em parte, graças à possibilidade

da importação de energéticos, conforme é apontado na próxima seção.

81 Tradução livre do trecho do autor: “Since oil prices started to decline at the international level in the middle of

the 80’s, most of the substitution policies engaged during the first and the second oil shock were abandoned.

These changes were endorsed by the liberal reforms of the 90’s that drastically reduced Government

intervention in the energy sector.” (Furtado, 2009, p. 45)

Page 141: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

141

3.2. Oferta interna: a intensificação da importação de combustíveis fósseis

A evolução da oferta interna de energia primária contabiliza, além da produção

interna primária de energia, o saldo da balança comercial de energia (exportações menos

importações) e a variação de estoques. Essa evolução também revela o progressivo aumento

da dependência brasileira com relação às fontes fósseis de energia, conforme é possível

constatar na Figura 4.9, a seguir.

Figura 4.9 – Oferta interna de energia primária: 1970-2015 (%)

Fonte: elaboração própria a partir dos dados do BEN (dados consolidados).

A figura evidencia que no início da década de 1970 as duas principais fontes de

energia que respondiam pela oferta interna de energia primária no Brasil eram constituídas,

em primeiro lugar pela biomassa tradicional, representada pela lenha e pelo carvão vegetal e

que respondia por 47,3% da oferta primária e, a seguir, pelo petróleo e derivados, que

respondiam por 38,1%. Ao longo do período, observa-se a progressiva redução da presença

relativa da biomassa tradicional na oferta interna e uma predominância do petróleo e seus

derivados, cuja participação, embora sofrendo alguma variação, sempre se encontra em

patamares significativamente superiores a 30%, que corresponde ao limiar a partir do qual se

considera haver uma transição energética.

38,12

48,46

42,78

45,66

39,92

35,86

36,25

5,70 14,52

47,31

8,69

0,00

10,00

20,00

30,00

40,00

50,00

60,00

1970 1980 1990 2000 2005 2010 2015

%

ANO Petróleo e derivados Gás natural

Carvão vapor Carvão metalúrgico

Urânio (U3O8) e derivados Hidráulica e eletricidade

Lenha e carvão vegetal Cana-de-açúcar e derivados

Outras fontes primárias renováveis

Page 142: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

142

No início da década de 1970, o petróleo e seus derivados ultrapassaram a lenha e

o carvão vegetal como principal fonte na oferta interna de energia. A partir daí, observa-se um

processo de transição energética no Brasil com a progressiva substituição dessas fontes

primárias renováveis tradicionais pelo petróleo e seus derivados que, em 1980 chegou a

responder por 48,46% da oferta interna de energia.

Tolmasquim, Guerreiro & Gorini (2007) observam que, deste modo, o país

conseguiu ganhar eficiência energética, mas, por outro, a participação das fontes renováveis

na oferta interna de energia teve uma queda. Os autores observam que, ao longo da década de

1980, a importante participação do petróleo e seus derivados na oferta interna de energia do

país se deu, em parte, devido à redução dos preços do petróleo. Na década seguinte, os autores

associam esse predomínio das fontes fósseis ao aumento da abertura da economia ao mercado

externo.

Ainda observando a Figura 4.9, nota-se que a partir da década de 2000, a

participação do gás natural na matriz energética aumentou progressivamente, alcançando, em

2015, 14,5% da oferta interna de energia primária. Em 2000, esta participação era de 5,7%.

Conforme observado anteriormente, essa opção foi levada a cabo em especial com os

investimentos em usinas termelétricas no contexto da redução dos investimentos na produção

de energia hidrelétrica e de desregulamentação do setor elétrico nas décadas de 1990 e de

2000, cujos desdobramentos culminaram, por assim dizer, naquilo que ficou conhecido como

"crise do apagão" do início da década de 2000.

Essa mudança pode ser mais bem observada por meio da análise do

comportamento das importações de combustíveis fósseis pelo Brasil, ou seja, as quantidades

importadas (em 103 toneladas equivalentes de petróleo) no período de análise. Esses são os

dados apresentados na Figura 4.10, abaixo.

Page 143: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

143

Figura 4.10 – Importação de energéticos fósseis pelo Brasil: 1970-2015 (103 tep)

Fonte: elaboração própria a partir do Balanço Energético Nacional (BEN).

Os dados evidenciam um crescimento da ordem de 30 milhões de tep de petróleo

entre os anos 1970 e 1980. As importações caíram nas décadas seguintes; hoje as importações

de petróleo ficam em cerca de 15 milhões de tep ao ano. O que também chama a atenção no

que tange às importações de combustíveis fósseis pelo Brasil – e o que é importante salientar

no sentido de complementar a apreciação adiantada na seção anterior – é o aumento das

importações do gás natural, combustível empregado no abastecimento das usinas termelétricas

no país.

A Figura 4.10 evidencia que a expansão da participação absoluta (e relativa) do

gás natural na oferta primária de energia, conforme caracterizada anteriormente, foi

conseguida graças ao grande aumento das importações desse combustível, em especial a partir

do início da década de 2000. No início desta década, a importação de gás natural superou a de

carvão vapor; em meados da década, superou a importação de carvão metalúrgico; e

finalmente, entre 2014 e 2015, a importação de gás natural superou a de petróleo. Atualmente,

o Brasil importa pouco mais do que 15 milhões de tep de gás natural ao ano.

Essas transformações resultaram numa verdadeira reconfiguração das importações

de combustíveis fósseis no Brasil em 45 anos, conforme se pode constatar pela Figura 4.11.

Em 1970, 92% das importações de combustíveis fósseis pelo país correspondiam a petróleo,

sendo que os 8% restantes eram importações de carvão metalúrgico. Em 2015, apenas 34%

0

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

35.000

40.000

45.000

50.000

1970 1980 1990 2000 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

PETRÓLEO GÁS NATURAL CARVÃO VAPOR CARVÃO METALÚRGICO

Page 144: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

144

das importações de combustíveis fósseis se devem ao petróleo, o carvão metalúrgico responde

por 17%, o carvão vapor por 13% e o gás natural por 36% do total dessas importações.

Figura 4.11 – Participação relativa do carvão vapor, carvão metalúrgico, gás natural e

petróleo na pauta de importação de energéticos fósseis pelo Brasil:

1970 e 2015 (% da importação de energia)

Fonte: elaboração própria a partir do Balanço Energético Nacional (BEN).

Nesta seção, foram analisadas as mudanças atinentes ao aumento dos volumes e

da composição percentual das importações brasileiras de combustíveis fósseis. Foi possível

perceber que a evolução da oferta interna de energia primária, contabilizando a produção

interna primária de energia, o saldo da balança comercial de energia (exportações menos

importações) e a variação de estoques, revela, além de um progressivo aumento da

dependência brasileira com relação às fontes fósseis de energia, uma mudança no perfil do

país, como progressivamente dependente de importações de combustíveis fósseis nos últimos

45 anos, com destaque para o gás natural, para o carvão metalúrgico e para o carvão vapor.

Observou-se, ainda, que esta mudança foi mais características a partir de 2000.

É de se esperar que as mudanças na matriz energética e, mais especificamente, na

oferta interna de energia no Brasil tenham reflexos sobre as emissões do setor. O intuito da

próxima seção é conhecer essas emissões.

92%

8%

PETRÓLEO CARVÃO METALÚRGICO

34%

36%

13%

17%

PETRÓLEO GÁS NATURAL

CARVÃO VAPOR CARVÃO METALÚRGICO

Page 145: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

145

3.3. O perfil das emissões de GEE associadas à oferta e à demanda energética

Cabe, nos limites desta seção, apresentar o perfil das emissões de CO2e associadas

à oferta energética e a alguns aspectos do uso de energia por diversos setores (demanda),

salientando o perfil setorial dessas emissões e qualificando-as tanto em termos absolutos

quanto relativos.

Não cabe no escopo desta dissertação, por questões metodológicas e também em

função de necessidades de tempo e qualificação, a análise aprofundada das emissões relativas

ao uso da energia. Algumas análises neste particular podem ser encontradas no site do

SEEG82

.

A metodologia empregada para traçar esse perfil consiste da recuperação,

sistematização e análise de dados sobre emissões disponibilizadas pelo SEEG e também pelo

recurso a análises aportadas por um relatório específico sobre o tema preparado pelo

Observatório do Clima sobre as emissões associadas ao setor de energia.

De acordo com Azevedo (2016), o setor de energia, compreendido como

atividades que englobam tanto a produção como o consumo de energia elétrica e de

combustíveis, representou em 2016, 26% das emissões de GEE do país, constituindo a

segunda maior fonte de emissões, ficando atrás apenas de MUT, conforme mencionado no

terceiro capítulo desta dissertação.

Conforme diagnostica o autor, entre os anos de 1970 e 2014, este setor apresentou

o maior crescimento das emissões de GEE devido ao "aumento do consumo de gasolina e

diesel, [à] queda da participação do etanol e [ao] aumento de geração termelétrica no Brasil"

(AZEVEDO, 2016, p. 20).

A Figura 4.12 abaixo representa as emissões de GEE do setor de Energia por

fonte primária. São apresentados dados de emissão englobando a produção e o consumo de

cada setor: produção e consumo de petróleo, extração de petróleo e gás natural, produção e

consumo de gás natural, produção e consumo de carvão mineral, consumo de biomassa e

outros. O gráfico superior da figura x mostra o comportamento dessas emissões para o

período de 1990 a 2014, por fonte e mensuradas em MtCO2e, enquanto os dois gráficos da

parte inferior da figura mostram a composição das emissões totais para os anos de 1990 e

2014, segundo as mesmas fontes.

82 O SEEG disponibiliza diversos relatórios contendo análises setoriais em seu site oficial:

www.seeg.eco.br/analise-de-emissoes-de-gee-no-brasil-1970-2014

Page 146: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

146

Figura 4.12 - Emissões de GEE do Setor de Energia por fonte primária

Notas: *As emissões de CO2 e geradas pelo consumo de biomassa correspondem às

emissões de CH4 e N2O (as emissões líquidas de CO2 desses combustíveis são

consideradas nula). **Trata-se das emissões de CH4 e N2O das misturas de gasolina

automotiva com etanol anidro (gasolina C) e de diesel mineral com biodiesel (óleo

diesel).

Fonte: AZEVEDO (2016)

No gráfico superior, nota-se ao longo de todo o período o predomínio da produção

e consumo do petróleo como principal fonte emissora de GEE no período apresentado,

seguido do gás natural e do carvão mineral. Recentemente, observa-se a ascensão do gás

natural como fonte dos GEE: representava 3% das emissões em 1990 e passa a 17% das

emissões em 2014.

A figura 4.13,na próxima página, representa as emissões de GEE, mensuradas em

termos de Mt CO2e, devidas ao consumo de energia por diversos setores para o período de

1990 a 2014. Os setores avaliados são os seguintes: transportes, industrial, geração de

Page 147: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

147

eletricidade, produção de combustíveis, residencial, agropecuário, público e comercial. A

figura apresenta as emissões na forma de três gráficos. O gráfico de linhas, na parte superior

da figura, apresenta as emissões para os referidos setores ao longo de todo o período de 1990

a 2014, enquanto que os dois gráficos da parte inferior da figura mostram a composição

interna relativa das emissões segundo essas fontes emissoras setoriais.

Quando se observam as emissões de GEE associadas ao consumo de energia por

diversos setores, apresentadas nos três gráficos da Figura 4.13, percebe-se que o setor de

transportes sempre foi o principal emissor, tendo respondido, em 1990, por 45% do total das

emissões associadas ao uso da energia e, em 2014, a 46%. Além disso, como se observa no

gráfico de linhas dessa mesma figura, o crescimento das emissões absolutas desse setor foram

muito expressivas no período de 2009 a 2012 no Brasil. Certamente, esse aumento das

emissões do setor de transporte tem a ver com a opção do governo do período de fomentar o

setor automobilístico no país, inclusive com medidas fiscais.

De fato, de acordo com Azevedo (2016), as emissões do setor de transporte

cresceram majoritariamente no transporte individual de passageiros e no transporte de cargas,

principalmente por dois motivos: i) "aumento da quilometragem total rodada por automóveis

e motocicletas" entre 2006 e 2014 e ii) " queda da participação do consumo de álcool e o

aumento da demanda por gasolina a partir de 2009 devido à perda de competitividade do

etanol em relação à gasolina nos preços relativos ao consumidor final" (AZEVEDO, 2016, p.

22).

Page 148: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

148

Figura 4.13 - Emissões de GEE do Setor de Energia pelo uso

nos diferentes segmentos de atividade (1990-2014)

Fonte: AZEVEDO (2016)

Além disso, o Brasil possui uma grande dependência do transporte de carga no

modal rodoviário que, conforme evidencia o autor, irradia quatro vezes mais CO2e por tku83

em comparação ao modal ferroviário e cinco vezes mais que o modal hidroviário.

A segunda maior fonte de emissões pelo uso de energia ao longo de todo o

período foi o setor industrial, sendo que esta situação muda no último ano da série, quando as

emissões associadas ao uso de energia para a produção de eletricidade ultrapassam as

83 Tonelada-quilômetro útil (tku) é uma unidade de produção de transporte de carga que representa o

deslocamento de uma tonelada de carga (sem contar a massa do veículo) na distância de um quilômetro

(AZEVEDO, 2016, p. 23).

Page 149: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

149

emissões equivalentes do setor industrial. Assim, outra informação importante a notar na

Figura 4.13, acima – e que complementa a análise da figura anterior, diz respeito à aceleração

do aumento das emissões de GEE pelo consumo de energia na geração de eletricidade a partir

de 2011.

Portanto, em termos de emissões associadas ao uso de energia, o ranking dos

setores de maior emissão é representado (em 2014), em primeiro lugar, pelo setor de

transportes, em segundo pela produção de eletricidade e, em terceiro lugar, pelo setor

industrial.

Talvez não seja demais recuperar a análise: em termos absolutos, o setor usuário

de energia de maiores emissões de GEE em 2014 é o de transportes; em termos relativos, o

setor cujas emissões mais cresceram no período entre 1990 e 2014 é o de geração de

eletricidade.

Figura 4.14 - Evolução da participação das fontes primárias

na geração de energia elétrica (1990-2014)

Fonte: AZEVEDO (2016)

Page 150: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

150

A Figura 4.14, acima, apresenta a evolução da participação das fontes primárias

na geração de energia elétrica no Brasil no período de 1990 a 2014 na forma de três gráficos.

O gráfico de linhas, na parte superior da figura, apresenta a evolução da participação das

fontes primárias para todo o período apresentado, enquanto que os dois gráficos da parte

inferior da figura mostram a configuração da matriz primária de energia no Brasil em dois

períodos: 1990 e 2014.

Nota-se durante todo o período apresentado, a predominância da energia

hidráulica, responsável por grande parte do fator renovável da matriz energética brasileira. A

partir de 2011 houve um aumento do uso das energias fósseis (representado pelas

termelétricas), devido sobretudo a crise dos reservatórios das hidrelétricas.

De acordo com Azevedo (2016), as emissões de GEE no setor elétrico mais que

duplicaram entre 2011 e 2014, indo de 30,2 milhões de tCO2e para 82 milhões de tCO2e ,

resultado do aumento do uso das energias fósseis, conforme descrito no parágrafo anterior.

Para Ferreira et al (2016), as emissões brasileiras de GEE no setor energético

apresentaram a maior taxa de crescimento anual entre 1990 e 2014, indo de um patamar de

189,7 milhões de toneladas de CO2e em 1990 para 479,1 milhões de toneladas de CO2e em

2014, conforme é possível notar na Figura 4.15. É possível perceber por meio da Figura

abaixo, que o setor de energia ultrapassou as emissões de GEE da agropecuária entre 2012 e

2013, estabelecendo-se como o segundo setor mais emissor de GEE, atrás somente de MUT.

Page 151: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

151

Figura 4.15 - Emissões brasileira de GEE por setor (1990 – 2014)

Fonte: Ferreira et al. (2016)

Além disso, o Brasil apresenta uma diferenciação no panorama mundial na

questão de emissões associadas à queima de combustíveis. Enquanto que, no país, o petróleo

representa o mais significativo emissor, no mundo este papel é representado pelo carvão

mineral, conforme a Figura 4.16 abaixo.

Page 152: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

152

Figura 4.16 - Perfil de emissões de CO2 pela queima de combustíveis

no Brasil e no mundo em 2013, por fonte primária de energia

Fonte: Ferreira et al (2016).

Isto se explica pela predominância, no país, das hidrelétricas para a geração de

eletricidade, enquanto nos outros países, a predominância são as termelétricas alimentadas

ainda de forma importante a carvão.

Um perfil comparativo das emissões de GEE associadas ao uso de combustíveis

fósseis no Brasil e no mundo pode ser conhecido, conforme Ferreira et al (2016), pela

participação relativa dos setores que usam esses combustíveis. Os autores sintetizam dados de

2013 sobre as emissões de CO2e associadas aos setores de transportes, industrial, geração de

eletricidade, produção de combustíveis e outros, na Figura 4.17, a seguir. O gráfico da

esquerda nesta figura apresenta as participações relativas das emissões desses setores no total

das emissões de GEE no Brasil, enquanto que o da direita as apresenta para o mundo. Assim,

em se tratando do uso dos combustíveis fósseis, no mundo as três principais fontes de

emissões de GEE são, nesta ordem: geração de eletricidade (42% das emissões associadas ao

uso de combustíveis fósseis), transportes (23%) e industrial (19%). No caso do Brasil, os

principais setores usuários de combustíveis fósseis responsáveis por esse tipo de emissão são

o setor de transportes (46%), seguido do setor industrial (22%) e então o de geração de

eletricidade (17%).

Page 153: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

153

Figura 4.17 - Perfil de emissões de CO2e pela queima de combustíveis

no Brasil e no mundo em 2013

Fonte: Ferreira et al (2016)

Apesar de o setor de transportes representar a maior parcela de emissões de GEE

associadas à queima de combustíveis no Brasil, a geração de eletricidade apresentou o maior

aumento percentual entre 1990 e 2014. A Figura 4.18 mostra que em 1990, a geração de

eletricidade correspondia a 5% das emissões de GEE. Já no ano 2014, ela passou a

corresponder a 17% das emissões.

Figura 4.18 - Emissões de GEE do Setor de Energia por segmento de atividade

(uso de energia)

Fonte: Ferreira et al (2016)

Page 154: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

154

Conforme esperado, pelas observações feitas nas seções 4.1 e 4.2 deste capítulo,

comprova-se aqui que a expansão da oferta de energia no setor elétrico por meio do uso de

combustíveis fósseis apresentou um aumento tanto absoluto quanto em termos relativos das

emissões de GEE. É preciso ressaltar, ao lado disso, que este setor não foi o principal

responsável pelo aumento das emissões absolutas associadas ao uso da energia, papel que é

representado pelo setor de transportes.

3.4. Observações finais ao capítulo

Neste capítulo, procurou-se conhecer a reconfiguração da matriz energética e da

oferta interna de energia no Brasil no período de 1970 a 2014 e a correspondente mudança do

perfil de emissões de GEE associadas.

Observou-se que houve uma perda na participação relativa de energia renovável

na matriz brasileira, que representava 78,66% do total em 1970 e foi reduzida para 43,54%

em 2014. De forma correspondente, as fontes não renováveis passaram, no mesmo período, de

21% para 56% da matriz primária.

O aumento da importância relativa das fontes de energia não renováveis a partir

da década de 2000 foi resultado de mudanças institucionais e de mercado no setor de energia

no Brasil que levaram à implementação de usinas geradoras de termoeletricidade movidas a

gás natural, a fim de enfrentar a crise energética. Essa mudança – o aumento tanto em termos

absolutos quanto relativos pelo uso de usinas termelétricas – se refletiu numa reconfiguração

do perfil de emissões do setor de energia.

Este foi o principal fato explicativo para o aumento verificado nas emissões de

GEE no setor de energia, como se pode observar neste capítulo. Observou-se que ao longo de

todo o período compreendido entre 1990 e 2014, a produção e consumo do petróleo como

constituiu a principal fonte emissora de GEE no setor de energia, seguido do gás natural e do

carvão mineral. No período, observou-se a ascensão do gás natural como fonte dos GEE:

representava 3% das emissões em 1990 e passou a responder por 17% das emissões do setor

de energia em 2014.

Como foi visto, o setor de transportes representou a maior parcela de emissões de

GEE associadas à queima de combustíveis fósseis no Brasil e a geração de (termo)eletricidade

apresentou o maior aumento percentual entre 1990 e 2014.

Page 155: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

155

Ao lado disso, é preciso reconhecer algumas das limitações do estudo das

emissões brasileiras, conduzido ao longo deste capítulo. Desde logo, não foram tratados os

impactos das mudanças climáticas na geração hidroelétrica, que têm sido evidenciados pelas

consequências das crises hídricas recentes. Também não foram enfocadas as alterações na

matriz energética e na emergência de políticas que dizem respeito às energias renováveis para

eletricidade: a biomassa, a energia eólica e a solar fotovoltaica. Sem dúvida, esses são

assuntos da maior relevância para o tema das mudanças climáticas e energia e deverão

constituir objeto de maiores investigações numa agenda de pesquisa voltada à exploração dos

rumos futuros da energia no país e no mundo.

Outra limitação evidente do esforço aqui realizado diz respeito à investigação

necessária sobre as mudanças nos padrões de emissão de GEE no Brasil devidas ao uso da

energia no setor de transportes. Em termos das emissões de GEE geradas pelo uso de energia,

o setor de transporte é, de longo, o que mais emite no país. Foi visto, neste capítulo, que

embora tenha contribuído com um aumento de apenas 1% nas emissões totais de GEE, esse

aumento se dá sobre uma base muito grande, de 45% em 1990 para 46% em 2014. Em termos

absolutos, o avanço das emissões do setor de transportes foi de uma magnitude muito

importante. 84

Tendo em vista os aportes dos capítulos precedentes, ou seja: i) a noção de

urgência sobre a necessidade de mudanças setoriais e intersetoriais no sentido de buscar

soluções de baixo carbono – conforme a sistematização de conhecimentos elaborada pelo

IPCC/AR5, abordada no primeiro capítulo desta dissertação; ii) a busca por soluções

negociadas para a partilha internacional do orçamento global de carbono, no âmbito do novo

regime climático que emerge em especial da COP 21, abordada no segundo capítulo desta

dissertação; iii) as metas apresentadas pelo Brasil ao Secretariado da UNFCCC no âmbito

dessas negociações, conforme apresentadas no terceiro capítulo; e iv) o conhecimento sobre o

perfil das emissões associadas ao setor de energia, conforme o conteúdo tratado no presente

capítulo, cabe indagar sobre as medidas a serem tomadas no âmbito deste setor a fim de

alcançar as metas correspondentes.

Assim, colocam-se as questões: Em que medida o planejamento no setor de

energia está apontando para a necessidade de mudanças na oferta de energia (com o aumento

84 O Observatório do Clima disponibiliza uma análise das emissões de GEE da atividade de transportes, também

para o período de 1990 a 2014, especificando os casos dos transportes de cargas e de passageiros no Brasil, no

relatório de Ferreira et al (2016).

Page 156: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

156

das renováveis) e para mudanças no uso de energia (diminuindo a intensidade, aumentando a

eficiência)? Que medidas em especial são previstas para o alcance das metas previstas em

termos de eficiência energética no âmbito das iNDC? Haveria, nessas propostas, uma

perspectiva integradora entre oferta e demanda? Haveria a consideração de inovações

tecnológicas e não tecnológicas para o futuro energético do Brasil?

Estas são questões que guiam a investigação cujos resultados são apresentados no

capítulo 5 da dissertação.

Page 157: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

157

Capítulo 5 - Ações para reduções de emissão de GEE no setor de energia:

mais fragmentos do que estratégias integradas para uma descarbonização

No capítulo anterior, foi possível constatar que a partir nos anos 2000, a matriz

energética brasileira passou por uma transformação, sendo que as emissões de GEE derivadas

do setor energético assumiram um papel importante no cômputo das emissões totais desses

gases no país.

É importante salientar a diferença entre emissões do setor de energia e dos setores

usuários de energia. Como foi visto no capítulo anterior, uma transformação importante diz

respeito ao uso da energia. Neste sentido, como foi visto, em termos absolutos, o setor usuário

de energia de maiores emissões de GEE em 2014 é o de transportes; em termos relativos, o

setor cujas emissões mais cresceram no período entre 1990 e 2014 é o de geração de

eletricidade. Ou seja, embora tenha havido esta aceleração nas emissões de GEE na geração

de eletricidade, a queima de combustíveis fósseis no setor de transportes constitui uma fonte

muito importante de emissões no Brasil.

No terceiro capítulo desta dissertação, especificamente na seção 3.3, quando

foram apresentadas as medidas previstas no âmbito das iNDCs brasileiras para a COP 21, as

seguintes medidas foram identificadas especificamente para o setor de energia:

Aumentar a participação de bioenergia sustentável na matriz energética brasileira para

aproximadamente 18% até 2030, expandindo o consumo de biocombustíveis,

aumentando a oferta de etanol, inclusive por meio do aumento da parcela de

biocombustíveis avançados (segunda geração), e aumentando a parcela de biodiesel na

mistura do diesel.

Alcançar uma participação estimada de 45% de energias renováveis na composição da

matriz energética em 2030, incluindo:

Expandir o uso de fontes renováveis, além da energia hídrica, na matriz total

de energia para uma participação de 28% a 33% até 2030;

Expandir o uso doméstico de fontes de energia não fóssil, aumentando a

parcela de energias renováveis (além da energia hídrica) no fornecimento de

energia elétrica para ao menos 23% até 2030, inclusive pelo aumento da

participação de eólica, biomassa e solar;

Alcançar 10% de ganhos de eficiência no setor elétrico até 2030.

Page 158: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

158

Estas são, pois, metas específicas para o setor de energia, no âmbito da proposta

de redução de emissões de GEE do Brasil, apresentadas pelo governo brasileiro ao

Secretariado da UNFCCC por ocasião das negociações finais para o novo regime climático,

que segundo Bueno Rubial (2016) é inaugurado com a publicação do Acordo de Paris, em

2015.

O objetivo deste capítulo é, a partir de uma análise de instrumentos selecionados

de planejamento do setor de energia, apresentar uma reflexão sobre dois temas relevantes para

o futuro deste setor no sentido da busca pela redução das emissões de GEE. São eles: o tema

das perspectivas para as fontes renováveis e o da busca pela eficiência no domínio da energia.

A metodologia empregada para o alcance desses objetivos envolveu levantamento

e análise documental dos Planos Decenais de Energia (PDE). A justificativa para empregar os

PDEs reside no fato de eles constituem os instrumentos de planejamento que detalham metas

e definem medidas e projetos que serão executados nos dez anos subsequentes, ou seja,

colocam perspectivas de prazo mais curto e com revisões frequentes.

O capítulo está organizado em três seções. A primeira delas apresenta o PNE 2030

e os PDEs selecionados para a análise proposta no capítulo, contextualizando esses

documentos dentro da proposta de planejamento energético e identificando seus objetivos. A

segunda seção busca identificar o papel atribuído às fontes renováveis dentro desses

documentos de planejamento. Finalmente, a terceira seção apresenta as medidas levantadas, a

partir dessa documentação, específicas para a busca da eficiência energética – que

corresponde a uma das metas da iNDC para o horizonte de 2030.

Há que se mencionar uma dificuldade em se recuperar informações específicas

sobre medidas que estariam na origem do aumento de eficiência esperado para vários dos

casos tratados pelos PDEs, mencionados ao longo da exposição deste capítulo. Esta

dificuldade impôs uma limitação ao exercício de análise, em particular restrito aos casos do

setor residencial e industrial, cada um deles com dificuldades específicas. Por esta razão, as

considerações finais apresentadas devem ser compreendidas levando-se em conta estas

dificuldades metodológicas e de análise.

Adiantando aqui uma consideração final de natureza mais geral, observa-se que,

nos documentos de planejamento, até onde foi possível constatar, o avanço científico e

tecnológico e mesmo o emprego do conhecimento já disponível para a difusão em muitos

domínios – como alguns dos mencionados acima – não ganham, para dizer o mínimo – o

Page 159: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

159

mesmo tipo de atenção que recebem dentro das recomendações do AR5. Neste sentido, poder-

se-ia dizer, com relação às medidas examinadas, que, de forma geral, não apresentam uma

ambição em termos do avanço da participação das fontes renováveis e que não parecem

adotar uma perspectiva integrada, sistêmica, das medidas previstas para o alcance de uma

maior eficiência energética. Desta forma, salvo limites que podem ser atribuídos à presente

análise, essas medidas acabam configurando elementos pontuais, numa visão de planejamento

que carece de considerações sobre os rumos mais importantes que deveriam guiar as

mudanças do setor de energia nas próximas décadas em nosso país.

4.1. Instrumentos de Planejamento Energético: PNE 2030 e PDEs

A preocupação em garantir a oferta de energia adequada, utilizando as fontes

renováveis disponíveis no Brasil não ocorreu por acaso; foi reflexo da crise energética que o

país enfrentou entre 2001 e 2002, causada pela falta de planejamento e investimento em

geração de energia, como também pela total dependência da produção de energia elétrica a

partir de usinas hidrelétricas, resultando no racionamento do consumo naquele período.

Com isso, o Brasil começou a realizar estudos de planejamento do setor

energético, como vistas ao aumento do suprimento da eletricidade, ao desenvolvimento de

inovações tecnológicas, à redução dos custos de energia para os consumidores finais, à

geração de empregos e à redução dos impactos socioambientais (WWF, 2006).

O planejamento energético no Brasil

“é fundamental para assegurar a continuidade do abastecimento e/ou suprimento de energia ao

menor custo, com o menor risco e com os menores impactos socioeconômicos e ambientais

para a sociedade brasileira.” A falta de planejamento energético pode trazer consequências

negativas para o país, "com reflexos em termos de elevação de custos e/ou degradação na

qualidade da prestação do serviço, tais como racionamentos ou excessos de capacidade

instalada, produção ineficiente, etc" (MME; EPE, 2005, p.11).

Um dos métodos empregados para a realização dos estudos de planejamento foi a

concepção e análise de cenários85, método empregado para realizar projeções que são capazes

de nortear políticas energéticas diante de premissas e hipóteses variadas, “identificando ações

estratégicas, bem como as oportunidades e ameaças, forças e fraquezas, permitindo o

diagnóstico das competências a serem estimuladas” (MME; EPE, 2005, p.19).

85 Na análise de cenários, a incerteza é criativa e faz parte do processo, enquanto na previsão a incerteza é

continuamente não desejada. A metodologia de cenários, por ser mais flexível (admite mudanças estruturais)

permite uma análise qualitativa mais adequada em relação aos horizontes futuros. (MME; EPE, 2005, p.20)

Page 160: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

160

Os principais documentos divulgados pela Empresa de Pesquisa Energética

(EPE), responsável pela realização do planejamento energético no Brasil com o emprego de

estudos de cenários, são o Plano Nacional de Energia 2030 (PNE 2030) e os Planos Decenais

de Expansão de Energia (PDEs).

Estes estudos proporcionam uma visão técnica sobre as perspectivas de

desenvolvimento da matriz energética brasileira, informando a elaboração de políticas que

permitam a expansão da oferta energética no País em consonância com as perspectivas de

aumento da demanda global de energia, estimadas com o auxílio de projeções obtidas com o

recurso a metodologias de cenários.

Com relação ao tema geral desta dissertação – ou seja, a relação entre mudanças

climáticas e energia – é interessante notar que também se espera que esses estudos

proporcionem informação relevante sobre os caminhos para esse aumento da oferta de energia

se dê de forma compatível com as necessidades de estabilização das emissões do dióxido de

carbono e de óxido de nitrogênio, principais causadores do efeito estufa86. De acordo com

Goldemberg & Moreira (2005), as emissões dos gases de efeito estufa podem diminuir por

meio do aumento da participação de fontes renováveis na matriz energética brasileira, como

biomassa, eólica, solar e pequenas hidrelétricas na geração de energia elétrica.

A elaboração do Plano Nacional de Energia e dos Planos Decenais é realizada

pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), empresa pública vinculada ao Ministério de

Minas e Energia, tem por finalidade prestar serviços na área de estudos e pesquisas destinadas

a subsidiar o planejamento do setor energético. São documentos de planejamento que visam

um horizonte de dez anos de atuação.

Não cabe nesta dissertação fazer uma ampla exposição dos documentos, e sim

compreender como estão relacionadas suas projeções com as metas e medidas atinentes a uma

descarbonização do setor de energia segundo estas foram apresentadas pelo Brasil no contexto

das negociações internacionais que deram origem ao Acordo de Paris, ou seja, a iNDC

brasileira.

86 Um importante gás de efeito estufa é o metano. De acordo com Fearnside (2008), as represas hidrelétricas em

áreas tropicais liberam metano por decomposição anaeróbica (que ocorre em um ambiente sem oxigenação) no

fundo do reservatório, ou seja, neste caso ocorre com a decomposição de matéria orgânico no fundo dos lagos

das usinas. "O metano é liberado através de vários caminhos, inclusive por bolhas e difusão pela superfície, e é

liberado no transcurso da água pelas turbinas e vertedouros" (FEARNSIDE, 2008,p.4)

Page 161: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

161

O PNE 2030 e as metas brasileiras - iNDC

O PNE 2030 é o primeiro estudo de longo prazo orientado para o exame integrado

dos usos dos recursos energéticos realizado no âmbito do governo brasileiro, tendo sua

elaboração sido conduzida pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), associada ao

Ministério de Minas e Energia. O principal objetivo do PNE consiste em oferecer a

fundamentação para uma estratégia de expansão da oferta de energia no Brasil, com o

horizonte de 2030, de modo a atender prospectivas de demanda compreendidas a partir de

quatro cenários.

De acordo com Castro et al (2012,p.7):

"O PNE formula projeções da demanda por energia de longo prazo e estabelece os

parâmetros mais gerais da matriz energética necessária para o atendimento desta

demanda da forma mais eficiente possível em termos econômicos e ambientais”

O PNE 2030 tem a intenção de, no longo prazo, alcançar a sustentabilidade e a

integração dos recursos disponíveis, de acordo com La Rovere et al (2013). O PNE 2030 foi

publicado em 2007 e, a fim de que o planejamento seja atualizado, são publicados de forma

razoavelmente sistemática e periódica, idealmente a cada ano, os Planos Decenais, que são

apresentados sucintamente mais abaixo e analisados na seção seguinte, 5.2.

Para os objetivos desta dissertação, é relevante retomar as metas previstas pelas

“medidas complementares” na iNDC brasileira (já apresentadas no capítulo 3 desta

dissertação e compiladas no Quadro 3.1).

Constituem essas medidas complementares, para o setor de energia, apresentadas

na iNDC brasileira submetida no contexto das negociações climáticas que precederam o

Acordo de Paris:

1. Aumentar a participação de bioenergia sustentável na matriz energética brasileira para

aproximadamente 18% até 2030, expandindo o consumo de biocombustíveis, aumentando a oferta de

etanol, inclusive por meio do aumento da parcela de biocombustíveis avançados (segunda geração), e

aumentando a parcela de biodiesel na mistura do diesel.

2. Alcançar uma participação estimada de 45% de energias renováveis na composição da matriz energética

em 2030, incluindo:

Expandir o uso de fontes renováveis, além da energia hídrica, na matriz total de energia para

uma participação de 28% a 33% até 2030;

Expandir o uso doméstico de fontes de energia não fóssil, aumentando a parcela de energias

renováveis (além da energia hídrica) no fornecimento de energia elétrica para ao menos 23%

até 2030, inclusive pelo aumento da participação de eólica, biomassa e solar;

Alcançar 10% de ganhos de eficiência no setor elétrico até 2030.

Page 162: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

162

Uma primeira tática para observar as relações entre essas metas e aquilo que está

previsto nos documentos de planejamento energético pode ser a análise da projeção das

participações das diversas fontes de energia na oferta interna de energia no Brasil para o

horizonte 2030. Estas estão apresentadas no PNE 2030, publicado no ano de 2007.

Essa projeção pode ser conhecida na Figura 5.1, abaixo.

Figura 5.1 - Evolução Esperada da Estrutura da Oferta Interna de Energia

Fonte: MME; EPE (2007b).

Como é possível observar, para 2030 o PNE já previa que 18% da oferta interna

de energia fosse de derivados da cana-de-açúcar, que corresponde à primeira meta

apresentada como “medida complementar” para o setor de energia pelo Brasil na iNDC.

A este respeito, o PNE 2030 salienta uma estratégia geral para promover a

demanda dessas fontes: “Maior penetração dos combustíveis líquidos renováveis (etanol e

Page 163: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

163

biodiesel) em substituição a derivados do petróleo, usados principalmente nos setores

agropecuário e de transportes” (MME; EPE, 2007b, p. 64).

Uma segunda tática pode ser realizada pela observação das projeções sobre a

presença das fontes renováveis na matriz energética brasileira, conforme a Figura 5.2 permite

fazer.

Figura 5.2 - Fontes Renováveis na Matriz Energética Brasileira

Fonte: MME; EPE (2007b)

Conforme é possível notar, a meta de 45% de renováveis na referida matriz

corresponde, grosso modo, ao que estava previsto no documento de planejamento energético

de 2007 para o Brasil.

Uma terceira tática para cotejar as metas da iNDC com as projeções no PNE 2030

pode ser implementada identificando-se os potenciais esperados para o avanço da eficiência

energética no horizonte 2030, o que é feito na Figura 5.2, abaixo.

Figura 5.3 - Potenciais de Eficiência Energética até 2030

Fonte: MME; EPE (2007b)

Page 164: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

164

Ou seja, os ganhos de 10% de eficiência indicados pelo Brasil na iNDC já

estavam previstos em 2007, pelo PNE 2030.

Os PDEs – uma primeira apresentação

Os PDEs consistem de documentos de revisão do planejamento de longo prazo,

com horizontes de 10 anos. Idealmente, deveriam ser publicados anualmente. Como será

visto, esta tem sido uma dificuldade para os planejadores da EPE-MME.

Os objetivos de cada PDE podem ser observados no Quadro 5.1,a seguir.

Quadro 5.1 - Objetivos dos Planos Decenais de Energia

Objetivos

PDEE 2015

(MME;EPE, 2006)

Definir um cenário de referência para implementação de novas instalações de geração e

transmissão de energia elétrica, necessárias para atender ao crescimento dos requisitos

do mercado, segundo critérios de garantia de suprimento pré-estabelecidos, de forma

ambientalmente sustentável e minimizando os custos totais esperados de investimento,

inclusive socioambientais e de operação.

PDE 2016

(MME;EPE, 2007a)

PDE 2017

(MME;EPE, 2009)

PDE 2019

(MME;EPE, 2010)

Buscar o equilíbrio e a diversificação da matriz energética, levando em consideração a

disponibilidade de matérias primas, fontes primárias renováveis e não renováveis e os

impactos socioambientais e aspectos econômicos associados ao aproveitamento dessas

fontes. Além disso, busca-se o aprimoramento e a incorporação do conceito de

sustentabilidade a todas as fontes energéticas. Isto é, tornar, a cada ciclo, o PDE mais

sustentável, capaz de atender as metas setoriais sem ferir as metas ambientais brasileiras

apresentadas à Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre

as Mudanças Climáticas (COP15), em Copenhague.

PDE 2020

(MME;EPE, 2011)

Buscar o aprimoramento e a incorporação do conceito de sustentabilidade no tratamento

de todas as fontes energéticas. Isto é, fazer com que a estratégia de expansão da oferta

de energia se mostre, a cada ciclo de planejamento, mais sustentável, sendo capaz de

atender os objetivos setoriais em consonância com os propósitos de preservação do meio

ambiente. Além disso, atender a uma meta de emissões no setor energético compatível

com a meta de redução voluntária da emissão global projetada para 2020, na forma

estabelecida na Comunicação Nacional do Brasil na COP 15 e na Lei nº 12.187/09*.

Outros objetivos são segurança energética no atendimento da demanda, modicidade de

preços e tarifas, e universalização do acesso à energia.

PDE 2021

(MME;EPE, 2012)

Apresentar importantes sinalizações para orientar as ações e decisões, voltadas para o

equilíbrio entre as projeções de crescimento econômico do país e a necessária expansão

da oferta, de forma a garantir à sociedade o suprimento energético com adequados

custos, em bases técnica e ambientalmente sustentável.

PDE 2022

(MME;EPE, 2013)

PDE 2023

(MME;EPE, 2014)

PDE 2024

(MME;EPE, 2015)

(*) Trata-se da Lei que institui a Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC.

Fonte: PDEs do MME; EPE. Elaboração Própria.

Ao analisar os objetivos dos PDEs descritos no Quadro 5.1, percebe-se que eles

podem ser divididos em dois ciclos: PDE 2015 até PDE 2017, concebidos entre 2006 e 2009 e

os demais, PDE 2019 até PDE 2024, concebidos a partir de 2010. No primeiro ciclo de

Page 165: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

165

planejamento decenal, antes da COP 15, os PDEs trazem referência algo vaga sobre

sustentabilidade ambiental e custos socioambientais, constantes dos seus respectivos

objetivos. A partir de então, os objetivos dos Planos Decenais indicam que o plano energético

do país deve apresentar ações que respeitem as metas de redução de emissões de gases de

efeito estufa apresentadas pelo Brasil à Conferência das Partes em Copenhague.

Desta forma, para efeito de análise, será comparado o PDE 2019, PDE 2020, PDE

2023 e o PDE 2024. Os PDE´s de 2019 e 2020 apresentam metas setoriais que visam atender

as metas ambientais apresentadas pelo Brasil à Conferência das Partes da Convenção-Quadro

das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP15), em Copenhague, ao contrário dos

Planos Decenais de Energia anteriores que não possuíam tal comprometimento.

Os PDEs de 2023 e 2024 são os mais recentes na amplitude que compõe esta

pesquisa. Cabe destacar que o PDE 2025 (que abrangeria o período de 2016 até 2025) estava

previsto para ser publicado no ano de 2016, porém teve seu lançamento adiado.

Em reunião com o conselho de energia da Federação das Indústrias do Estado do

Rio de Janeiro (Firjan), o presidente da EPE, Luiz Augusto Barroso, afirmou que seria adiada

a publicação do PDE 2025 para a publicação subsequente, o PDE 2026. O motivo de acordo

com o Barroso é que o PDE 2025 encontrava-se defasado e que o documento PDE 2026

deveria incluir outras vertentes, como a Usina nuclear de Angra 3, cuja conclusão de sua

construção estaria prevista para 2022 (POLITO, 2016).

Neste mesmo ano, em novembro, durante o encontro Fórum Pernambuco e o

Setor Elétrico Nacional, Eduardo Azevedo, secretário de Desenvolvimento e Planejamento

Energético do Ministério de Minas e Energia também afirmou o adiamento do PDE 2025.

Segundo Azevedo, este adiamento deve-se para que haja a revisão da curva de crescimento

econômico esperada do país, com a adição de novas tecnologias, como smart grids, carro

elétrico, geração distribuída e armazenamento de energia.

Nas palavras de Azevedo:

"O documento era baseado em premissas que não são mais verdadeiras: uma

perspectiva de inflação que já não existia mais, um crescimento de mercado que não

existia mais; um investimento na cadeia produtiva que não existia mais. Por uma

questão de realidade, vamos deixar de publicar o PDE 2016/2025 para publicar, no

começo do ano que vem, o 2017/2016"

Page 166: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

166

Espera-se também que a publicação do PDE 2025 instaure um novo calendário de

publicação de documentos do EPE, para que a publicação dos PDEs ocorra sempre no

primeiro trimestre de cada ano e do PNE no começo do segundo semestre de cada ano

(CANAL ENERGIA, 2016).

Como o caráter do PDE é indicativo, o adiamento do PDE 2025 não representou

nenhuma punição para o governo.

Se o PDE 2026 incluir todas as novas variáveis afirmadas Barroso e Azevedo, ele

será um instrumento de planejamento energético muito mais realista, visto que o cenário

econômico tanto nacional como internacional sofreu mudanças significativas, que não foram

contempladas nos PDEs anteriores.

Pelo fato de serem estes, portanto, os instrumentos mais atualizados com relação

às atividades de planejamento no setor de energia, optou-se, nesta dissertação, a recorrer a

eles como fonte de investigação. Dada a multiplicidade de temas e questões que

potencialmente poderiam ser abordadas numa tal investigação e diante da necessidade de um

recorte analítico coerente com os objetivos dessa dissertação, dentro dos muitos temas

abordados nos PDEs, fez-se aqui duas opções analíticas:

Verificar o que se espera para o futuro das fontes renováveis dentro das propostas

dos PDES analisados

Verificar o papel da eficiência energética no planejamento energético, para os

setores residencial, industrial e de transportes (que são os setores para os quais

existem dados nos PDES analisados, que são os de 2019, 2020, 2023 e 2024.

Essas questões são objeto da exposição, respectivamente, nas seções 5.2 e 5.3

dessa dissertação.

4.2. O futuro das fontes renováveis segundo os PDE´s

Para efeito de avaliação, escolheu apresentar o que se espera na matriz energética

brasileira no PDE mais recente, o PDE 2024 (MME; EPE, 2015), pois este apresenta dados

atualizados.

De acordo com o PDE 2024 (MME; EPE,2015), é esperado que:

"para os próximos 10 anos [...] os países desenvolvidos passem por um processo de ajuste de

suas economias com gradual recuperação da atividade econômica. Por sua vez, os países

emergentes ainda continuarão contribuindo fortemente para o crescimento da economia

mundial, a despeito do arrefecimento das taxas de expansão das economias chinesa. Com

Page 167: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

167

relação à economia brasileira, após um período inicial de ajustes, admite-se como uma das

principais hipóteses do cenário o encaminhamento de soluções para os problemas de

infraestrutura, com consequente elevação dos investimentos e da produtividade total dos

fatores" (p.14).

O papel das termelétricas ainda é importante no decênio compreendido no PDE

2024, pois o documento afirma que há uma indicação em se expandir o parque gerador

elétrico através de termelétricas entre os anos de 2021 e 2024, esperando um total de geração

de 4.800 MW. Além disso, o documento cita a importância da participação das fontes

renováveis de energia, que contribuem "para o desenvolvimento sustentável das fontes de

geração, diretriz esta reafirmada pelo preço competitivo destas fontes demonstrado nos

últimos leilões de energia." (p.14)

Ainda no âmbito da geração de energia elétrica, previsão é da manutenção da

participação relativa das energias renováveis, a fim de assegurar a característica de uma

importante presença das fontes renováveis na matriz energética brasileira. De acordo com o

documento, isto só é possível por causa do preço competitivo que as fontes renováveis

obtiveram nos leilões de energia.

Para que o país se desenvolva com baixas emissões de carbono, o PDE 2024 se

propõe a fornecer medidas para o aumento da eficiência energética e ampliação da utilização

das fontes renováveis de energia na matriz elétrica brasileira, como será analisado na seção

5.3 deste capítulo.

Ao mesmo tempo em que o PDE 2024 preza por um aumento das energias

renováveis na matriz energética do Brasil, admite que o país deverá ter um papel relevante no

mercado mundial de petróleo, em razão da exploração das reservas de petróleo do Pré-Sal.

Em se tratado do gás natural, a projeção esperada da demanda supõe que os os

preços relativos entre o gás natural e o óleo combustível não se alterem de forma significativa.

Considerando a malha de gasodutos do país, no decênio representado no

documento, "a curva de oferta é capaz de atender toda a demanda de gás natural projetada,

considerando-se a manutenção da importação de gás natural boliviano nos níveis atuais, e de

GNL, através dos terminais já existentes" (p.16)

Espera-se também a expansão do mercado de etanol no país, alavancada pelo

aumento da frota de veículos flexfuel. Além disso, o PDE 2024 faz referência a três fatores

que deverão contribuir para o aumento da oferta de etanol: i) ocupação de capacidade ociosa

de moagem das unidades existentes; ii) expansão de capacidade de moagem e iii) implantação

Page 168: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

168

de novas unidades produtoras, embora em ritmo inferior ao histórico apresentado anterior a

este PDE. (p. 16).

A participação percentual esperada de biodiesel é de 7% ao longo de todo o

decênio. Ademais, o uso da biomassa de cana-de-açúcar para a geração de energia elétrica

apresenta ampliação.

A Figura 5.4 , a seguir, apresenta dois gráficos em formato de pizza para explicar

como se dará a participação das fontes energéticas no consumo final de energia para 2024.

Figura 5.4 - Participação relativa das fontes no consumo final de energia em 2024

Fonte: MME;EPE (2015)

No gráfico da esquerda, observa-se que a maior parte do consumo final de energia

consiste em derivados do petróleo.

Participação das fontes no consumo final de energia em 2024, resultado da

dependência de combustíveis fósseis da frota brasileira. Além disso, o “consumo de

eletricidade é a segunda maior fonte de consumo, isto é resultado das atividades de exploração

e produção de hidrocarbonetos e também da expansão da autoprodução na produção de

etanol” (p. 70)

O Quadro 5.2 abaixo apresenta a projeção da matriz energética brasileira para o

ano de 2024 em dados absolutos (10³ tep). Nota-se que as fontes não renováveis responderão

pela maior parte da energia na matriz brasileira.

Page 169: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

169

Quadro 5.2 - Matriz Energética Primária 2024

10³ tep

Petróleo 130.207

Gás Natural 52.327

Carvão Vapor 10.207

Carvão Metalúrgico 11.267

Urânio 6.986

Energia Hidráulica 51.786

Lenha 27.444

Produtos da Cana 68.532

Outras Fontes

Primárias 34.967

Total 388.353 Fonte: MME; EPE (2015)

Ao lado disso, a fim de que se mantenha a participação relativa das renováveis, é

preciso uma expansão correspondente das fontes renováveis. Isso pode ser observado nas

Figuras abaixo. O documento de planejamento, portanto, reflete a existência de projetos

voltados a uma expansão em termos absolutos das fontes renováveis de energia.

Assim, para a geração de energia elétrica, o PDE 2024 considera que haverá uma

expansão média anual de cerca de 10% da capacidade instalada das fontes renováveis de

energia (eólica, termelétricas a biomassa, pequenas centrais hidrelétricas e solar).

A geração de energia a partir da energia eólica é apresentada como sendo uma das

principais apostas para a expansão da matriz elétrica, visto que sua participação nos leilões de

energia de 2009, possibilitaram um preço mais competitivo para a instalação de parques

eólicos.

Além disso, o PDE 2024 considera a expansão de pequenas centrais hidrelétricas

(PCH), pois a tecnologia necessária já se encontra em um estado maduro, com custos

unitários estáveis.

A figura da próxima página apresenta a evolução esperada da oferta interna de

energia no horizonte decenal do PDE 2024. São apresentados dados para o ano de 2015 (ano

vigente do PDE 2024), 2019 (ano que marca o fim do primeiro quinquênio do PDE 2024) e

finalmente o ano de 2024, que marca o fim deste Plano Decenal de Energia.

Nota-se, na Figura 5.5, a expansão de “outras fontes renováveis”, que incorporam

a energia solar, a energia eólica e as PCHs. Para o ano de 2015, estas outras renováveis

Page 170: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

170

representavam 4,8% de toda a oferta interna de energia, já para o ano de 2024, o esperado é

que seja de 8,1%.

Figura 5.5 - Evolução da oferta interna de energia no horizonte decenal

Fonte: MME;EPE (2015)

Além disso, espera-se a redução da participação relativa do petróleo e seus

derivados na composição da oferta interna de energia, conforme apresentado na Figura 5.6,

indo de um total de 38% em 2015 para 34,9% em 2024. Resultado da expansão das outras

fontes de energia renovável, conforme apresentado na Figura anterior e também da expansão

do gás natural e dos derivados da cana-de-açúcar.

Figura 5.6 - Composição relativa da oferta interna de energia por fonte

(2015 – 2014)

Fonte: MME; EPE (2015)

Page 171: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

171

O PDE 2024 apresenta o que se espera da matriz energética brasileira em termos

de energia renovável e não renovável, conforme a Figura 5.7.

Figura 5.7 - Matriz energética brasileira: energia renovável e não renovável

Fonte: MME; EPE (2015)

Nota-se que durante o decênio não há alterações significativas na matriz, pois a

variação que ocorrerá será de cerca de 3 pontos percentuais, sendo que as energias renováveis

representarão em 2024, a 45,2% da matriz energética e as energias não renováveis

representarão 54,8% da matriz energética brasileira.

O PDE 2024 também salienta que ao término deste decênio o Brasil deve

conquistar o status de autossuficiente em energia:

“No decorrer das últimas décadas, a diferença entre a demanda total de energia e a produção

de energia primária vem mantendo uma trajetória decrescente. Consequentemente, ao longo

dos próximos 10 anos, o Brasil passa a registrar energia excedente em sua matriz energética, de

quase 100 milhões de tep em 2024, o que equivale a aproximadamente 20% da produção total

de energia no País. Em outras palavras, neste horizonte, o Brasil deixa de ser importador

líquido de energia e passa ao status de autossuficiente (p.437)”

Quadro 5.3 - Evolução da oferta de energia primária

Fonte: MME; EPE (2015)

Page 172: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

172

4.3. A eficiência energética nos setores residencial e industrial

Conforme mencionado, a iNDC apresentada pelo governo Brasileiro à UNFCCC

por ocasião dos preparativos para a COP 21 apresenta um conjunto de metas para o setor de

energia. Com relação à eficiência energética, a meta apresentada corresponde ao ganho de

10% de eficiência no setor elétrico até o ano de 2030.

A ABESCO (2017) observa que a eficiência energética pode ser entendida como a

ação que busca aperfeiçoar o uso das fontes energéticas, através do seu uso racional. Os

resultados dessa busca são enfatizados pelo documento “Plano Nacional de Eficiência

Energética (MME, 2011), segundo o qual eficiência energética:

“refere-se a ações de diversas naturezas que culminam na redução da energia

necessária para atender as demandas da sociedade por serviços de energia sob a

forma de luz, calor/frio, acionamento, transportes e uso em processos. Objetiva, em

síntese, atender às necessidades da economia com menor uso de energia primária e,

portanto, menor impacto da natureza”. (p.1)

Quanto às suas origens, os ganhos de eficiência energética podem decorrer de

duas fontes, ainda de acordo com o mesmo documento: i) a primeira delas se refere ao

"progresso autônomo”, identificado como aquele que “ocorre por iniciativa do mercado sem

interferência de políticas púbicas de forma espontânea, ou seja, através da reposição natural

do parque de equipamentos por similares novos e mais eficientes ou tecnologias novas que

produzem o mesmo serviço de forma mais eficiente” , ii) a segunda, por sua vez, se refere ao

"progresso induzido" que ocorre pela indução de políticas públicas (MME, 2011, p.1)

O conceito de eficiência energética presente nos PDEs está de acordo com esses

conceitos apresentados, pois de acordo com o PDE 2024 (MME; EPE, 2015, p.371):

“1. Eficiência energética está associada à quantidade efetiva de energia final

utilizada e não à quantidade mínima necessária para realização de determinado

serviço ou produção de um bem – o que se aproximaria de um potencial técnico.

2. O conceito de eficiência é aplicável tanto à manufatura, onde há um bem físico

cujo conteúdo energético pode ser delimitado, quanto para serviços, onde a energia

contida no serviço não é tão claramente definida, sendo mais próprio considerar a

energia requerida mínima para a prestação do serviço.”

Desta forma os PDEs sempre apresentam dados de conservação de energia para a

diferença entre "a projeção do consumo final de energia, incorporando ganhos de eficiência

energética, e o consumo de energia que ocorreria caso fossem mantidos os padrões

tecnológicos" sempre em relação ao ano anterior de publicação do PDE, ou seja, para o PDE

2024, que foi publicado em 2015, é definido como ano base, 2014 (MME; EPE, 2015, p.371).

Page 173: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

173

O PDE 2024 (MME; EPE, 2015, p.371) faz observações as seguintes observações

sobre a eficiência energética87:

“1. As premissas descritas e os resultados apurados consideram um mesmo volume

de saídas – produção física de bens industriais, prestação de serviços e conforto,

sendo variável apenas a quantidade de energia necessária à sua produção ou

realização”;

2. Não são consideradas mudanças de hábitos de consumo ou de regimes de

operação de equipamentos, mas apenas ganhos associados ao consumo específico de

cada equipamento ou processo avaliado. ”

Neste sentido, as políticas brasileiras orientadas à eficiência energética, mostram-

se fundamentais para utilizar os recursos disponíveis no país de forma eficiente, como

também integrar e aproveitar da melhor forma possível as fontes renováveis na matriz

energética, como forma de diminuir as emissões de GEE.

Os dados sobre conservação de energia apresentam sinteticamente o que se espera

que ocorra no decênio. Como cada PDE apresenta atualizações sobre cenários e cálculos

atuais sobre indicadores micro e macroeconômicos, a percentagem de energia conservada

tende a sofrer alterações, porém os PDEs não justificam quais as tendências de consumo

utilizadas.

Dentre os vários setores analisados pelos PDEs88

em termos de eficiência

energética, selecionaram-se aqui aqueles para os quais não houve mudanças nas metodologias

– em especial nas agregações setoriais, possibilitando a disponibilidade de dados ao longo do

tempo, apresentados nos documentos. Os setores que atenderam a esse critério foram o

residencial e o industrial, para os quais as análises são apresentadas, respectivamente, nas

subseções que se seguem.

i) Setor residencial

Os valores de consumo no setor residencial são apresentados em GWh pois não se

considera o uso de combustíveis neste setor.

87 Estas observações estão presentes em todos os Planos Decenais de Energia analisados.

88

Os PDEs consultados para a análise da eficiência energética foram o PDE 2019 e o PDE 2020, pois são os

primeiros a apresentarem metas setoriais que estivessem de acordo com as metas ambientais que o Brasil

apresentou na COP 15. Os PDE 2023 e o PDE 2024 também foram consultados, pois são os planos decenais

mais recentes de acordo com o âmbito desta dissertação.

Page 174: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

174

A análise da demanda energética neste setor sofreu alterações ao longo das

publicações dos PDEs.

Para o PDE 2019 foram utilizadas duas metodologias complementares. Uma delas

permite obter o consumo médio por consumidor residencial (CPC) e a projeção do número de

consumidores a partir da projeção da população. Neste caso, utilizou-se de forma agregada

dois indicadores: a relação entre o número de consumidores residenciais (NCR) e a população

(POP). A outra metodologia "baseou-se em uma análise desagregada da demanda por uso

final, que considera o número de domicílios, a posse média e o consumo específico dos

equipamentos – variável que internaliza possíveis ganhos de eficiência." (MME; EPE, 2010,

p. 261).

Essas duas metodologias foram utilizadas de forma paralela e através de um

processo iterativo que envolveu a calibragem de indicadores e o ajuste de parâmetros, foi

proporcionada a convergência de resultados.

Desta forma, o documento aponta três premissas para o cálculo da eficiência:

O cálculo da energia conservada tem por referência uma mesma base de

número de domicílios e atendimento pela rede elétrica;

Não são consideradas diferenças de posse e uso para o cálculo;

A energia conservada deve-se, exclusivamente, ao aumento da eficiência

dos novos equipamentos consumidores.

Através dessas premissas é possível perceber que o plano considera que os ganhos

de eficiência energética estão associados somente a troca ou renovação de equipamentos. Não

há uma previsão de medidas de políticas públicas que poderiam buscar eficiência de forma

mais abrangente nas residências, não se reduzindo a novos equipamentos, como por exemplo,

o incentivo a técnicas de edificações que incluíssem iluminação passiva, ventilação natural,

captação de energia solar para geração fotovoltaica visando o consumo residencial e a ligação

a redes inteligentes, etc.

Além disso, o documento afirma que os novos equipamentos a serem comprados

pelas famílias brasileiras seriam mais eficientes, com uma redução esperada de 10% no

consumo específico do novo equipamento em comparação com o consumo do equipamento

antigo no primeiro ano e um decréscimo de 0,5% ao ano nos anos subsequentes (MME; EPE,

2010, p. 262). No caso de chuveiros elétricos, o documento observa que, como regra, os

modelos mais eficientes também possuem maior potência elétrica; isso significa que a troca

Page 175: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

175

de chuveiros nas residências por modelos mais eficientes corresponderiam a modelos com

maior potência elétrica, implicando ao final um consumo maior de energia elétrica.

No ano seguinte, o PDE 2020, mantendo as premissas apresentadas no PDE 2019,

também trata dos ganhos de eficiência no setor residencial a partir da troca de equipamentos

eletrodoméstico (MME; EPE, 2011).

Neste setor observa-se que as medidas de eficiência energética estão apoiadas

somente na eficiência de eletrodomésticos, esquecendo-se de aplicar políticas públicas que

poderiam resultar em um consumo mais eficiente de energia ou aliando medidas de

infraestrutura para que houvesse a utilização de materiais de poderiam promover um

conformo térmico maior nas residências.

Conforme nota-se no Quadro 5.4, a seguir, o ganho de eficiência energia do

chuveiro elétrico é negativo, pois chuveiros mais eficientes são aqueles com maior potência,

que resultam em um consumo maior de energia elétrica.

Quadro 5.4 - Aumento da Eficiência de Equipamentos Eletrodomésticos

Equipamento

Ganho (%)

Origem do ganho de eficiência PDE

2020

PDE

2023

PDE

2024

Ar condicionado 5,1 0,2 0,2

Reposição tecnológica natural do estoque e ações dos

fabricantes com melhorias de eficiência impulsionadas

principalmente pelo PBE ¹ e PROCEL²

Geladeira 5,1 0,2 0,2

Freezer 5,1 0,2 0,2

Máquina de lavar roupas 5,1 0,2 0,2

Televisão 3 0,2 0,2

Lâmpadas 10,5 6,8 5,2 Substituição das lâmpadas incandescentes

Chuveiro Elétrico -4,9 -0,5 -0,5 Tendência de aquisição de equipamentos com maior

potência

¹ Programa Brasileiro de Etiquetagem

² Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica

Fonte: Elaboração Própria a partir dos PDEs (MME; EPE, 2010, 2011, 2012 e 2013).

O PDE 2020 afirma que a lenha, utilizada para aquecer diretamente os fogões será

substituída pelo GLP (gás liquefeito de petróleo) devido a melhorias de distribuição e ao

aumento da renda da população. Além disso, o gás natural aumentará sua participação nas

casas brasileiras devido ao aumento da malha de distribuição em áreas urbanas.

Page 176: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

176

O aumento da eficiência energética será resultado também da etiquetagem

compulsória dos equipamentos domésticos (selo Procel89

de economia de energia), mas por

outro lado, o aumento da renda das famílias proporcionará o aumento do consumo de

alimentos que demandam mais energias, como as carnes em geral.

Espera-se também que a utilização de sistemas de aquecimento solar seja

alavancada pelo Programa Minha Casa Minha Vida90

, onde a projeção esperada destes

equipamentos até 2014 foi de cerca de dois milhões de residências.

A Portaria nº 93 do Ministério das Cidades do dia 25 de fevereiro de 2010 no item

4, diretrizes para elaboração de projetos, subitem 4.4 diz que: "Preferencialmente, os projetos

de empreendimentos localizados nos municípios das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste

poderão contemplar sistemas de energia solar."

De acordo com essa portaria não é possível analisar quantitativamente o número

de residências que o programa Minha Casa Minha Vida almejava contemplar com

aquecimento solar.

Além disso, o Projeto de lei nº 1.484 de 200791

diz que em seu artigo 1º:

“ Com a finalidade de aumentar a energia gerada por fontes renováveis, sustentáveis

e descentralizadas, reduzir as emissões de carbono e as emissões de poluentes locais

geradas por estas edificações e reduzir a dependência das cidades de fontes de

energia externas fica instituída a obrigatoriedade de instalação de fonte subsidiária

de energia na forma de sistema de aquecimento solar de água nos imóveis

residenciais e comerciais construídos com recursos do FGTS, SBPE, FAT e OGU –

Orçamento Geral da União.” (BRASIL, 2009, p.8)

89 De acordo com o Centro Brasileiro de Informação de Eficiência Energética (2017) : “O Selo Procel de

Economia de Energia, ou simplesmente Selo Procel, tem como finalidade ser uma ferramenta simples e eficaz

que permite ao consumidor conhecer, entre os equipamentos e eletrodomésticos à disposição no mercado, os

mais eficientes e que consomem menos energia. Criado pelo Programa Nacional de Conservação de Energia

Elétrica – Procel, programa do Governo Federal executado pela Eletrobras, o Selo Procel foi instituído por

Decreto Presidencial em 8 de dezembro de 1993. A partir de sua criação, foram firmadas parcerias junto ao

Inmetro, a agentes como associações de fabricantes, pesquisadores de universidades e laboratórios, com o

objetivo de estimular a disponibilidade, no mercado brasileiro, de equipamentos cada vez mais eficientes. Para

isso, são estabelecidos índices de consumo e desempenho para cada categoria de equipamento. Cada

equipamento candidato ao Selo deve ser submetido a ensaios em laboratórios indicados pela Eletrobras. Apenas

os produtos que atingem esses índices são contemplados com o Selo Procel.”

90 De acordo com o Ministério das Cidades: “O Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) é o programa

habitacional do Governo Federal que dá acesso à casa própria aos brasileiros de baixa renda nas zonas urbana e

rural. É uma estratégia inovadora para prover moradia digna, ao mesmo tempo em que gera emprego e renda, por

meio do aumento do investimento no setor da construção civil.”

91 “Cria a obrigatoriedade de utilização como fonte subsidiária de energia, sistema de aquecimento solar de água

em imóveis financiados com recursos do SBPE, FGTS, FAT e do OGU - Orçamento Geral da União e dá outras

providências” (BRASIL, 2015).

Page 177: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

177

Como o programa Minha Casa Minha Vida prevê financiamento através de

subsídios e bancos públicos, se conclui que há a obrigatoriedade de se construir residências

com sistemas de aquecimento solar.

Porém sabe-se que o governo não conseguiu atingir a meta do PDE 2020 de dois

milhões de residências, pois este número ficou muito aquém do desejado, visto que dados de

2015 estimaram que o aquecimento solar beneficiou cerca de 896 mil pessoas nas unidades do

Minha Casa Minha Vida (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2015).

Além disso, em agosto de 2016, o Ministro das Cidades, Bruno Araújo afirmou

que o Ministério das Cidades queria tirar a obrigatoriedade da instalação de aquecimento solar

no programa habitacional com a justificativa de que a instalação só seria viável em algumas

regiões do Brasil, como Sul e Sudeste e que em outras regiões tornariam o valor final do

imóvel mais caro (VILLELA, 2016).

A obrigatoriedade da implantação de aquecedores solares no Programa Minha

Casa Minha Vida ocorreu desde a sua segunda fase, a partir de 30 de junho de 2012, para

empresas e entidades e também para família que se enquadram na faixa 1 do programa,

aquelas com renda de até R$ 1800,00 (VILLELA, 2016).

A obrigação da instalação de aquecimento solar realizado pelo programa Minha

Casa Minha Vida é uma iniciativa que gera criação de mercado, ou seja, cria-se uma demanda

para a produção de aquecedores solares. É uma política pública que promove o uso da energia

solar nos sistemas elétricos. Apesar de seu uso estar restrito apenas para os chuveiros

elétricos, nota-se de acordo com o Quadro 5.5 que um chuveiro de maior potência gasta mais

energia elétrica, por isso é importante o uso de outros tipos de energia para este aparelho.

Neste caso observa-se a demanda de mercado (demand pull), ou seja, quando a

inovação é realizada de acordo com as necessidades do mercado, neste caso, a necessidade é

encontrar outras formas de energia para suprir as necessidades da população e formas para a

diminuição do uso de energia derivada de fontes convencionais.

Camillo (2013) diz que as políticas ambientais possuem a hipótese de que as

fontes convencionais de energia provocam, externalidades negativas na sociedade ou no

consumo “que não refletem diretamente no mercado ou no preço cobrado pelo produto”

(p.16), justificando dessa maneira que as políticas públicas devem promover a utilização de

fontes renováveis de energia para neutralizar as externalidades negativas derivadas das fontes

convencionais.

Page 178: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

178

Além disso, de acordo com Nemet (2009), esta nova demanda proporcionada

pelos incentivos de políticas públicas, gera sinais de oportunidade de novos mercados aos

inovadores (empresas) e com isso, acaba criando incentivos para que eles invistam em

inovação.

No caso dos aquecedores solares, quanto mais casas utilizarem aquecedores

solares, menor será o custo unitário do equipamento, visto que a demanda possui um papel

direto que influencia os custos fixos unitários. Dessa forma, a justificativa do ministro para

extinguir a obrigatoriedade dos aquecedores solares por causa do seu alto valor não deve ser

aceita, demostrando assim, um retrocesso das políticas públicas voltadas para as energias

renováveis.

De acordo com Oliveira et al (2008, p.407):

“A substituição do chuveiro elétrico pelo aquecedor solar traduz-se em economia, em médio

prazo, principalmente para o usuário final, pois exige baixíssima manutenção e possui vida útil,

em média, superior a quinze anos, proporciona economia na conta de energia elétrica e

recupera o investimento num período de três a cinco anos.”

Ademais, em 2017 o programa Minha Casa Minha Vida ampliou o número de

famílias elegíveis ao programa ao ampliar o limite de renda mensal da faixa 3 de R$ 6500,00

para R$ 9000,00, incorporando assim, segmentos da classe média. Esta ação é uma enorme

oportunidade para se mudar o padrão de uso doméstico de energia elétrica, pois o chuveiro

elétrico, como já dito anteriormente, é um dos equipamentos que demandam mais energia.

O PDE 2023 continua apostando na eficiência de equipamentos mais eficientes

para os ganhos de energia. Neste sentido, o plano cita a regulamentação específica sobre

lâmpadas incandescentes (portaria interministerial nº 1.007, de 31 de dezembro de 2010), que

diz que as lâmpadas incandescentes no Brasil devem ser retiradas de circulação até 2017 e

também a eficiência de outros equipamentos que serão adquiridos pelas famílias

progressivamente.

Com a obrigatoriedade do selo Procel de eficiência energética, é esperado que os

novos equipamentos adquiridos pelas famílias sejam mais eficientes energeticamente. A

substituição de lâmpadas incandescentes por lâmpadas fluorescentes ou de Led garante um

ganho de 6,8% de eficiência energética, porém não é apresentado nenhuma medida para que

essa troca de lâmpadas possa ser realizada por maior parte das famílias brasileiras, seguindo a

tendência dos PDEs anteriores.

Page 179: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

179

No que tange o uso de combustíveis, o PDE 2024 diz que o uso final é

direcionado ao aquecimento direto (energia térmica), principalmente para o processamento de

alimentos. Neste ponto a previsão é a mesma apresentada pelos PDEs anteriores, sendo que a

expansão da malha de distribuição do gás natural favorecerá a diminuição do GLP e da lenha.

Após 2018, espera-se que o programa de instalação de SAS tenha continuidade,

até que o Brasil atinja 3m² de painel solar por residência que utilize o sistema de aquecimento

solar. O próprio documento cita que esta meta é considerada conservadora para a Europa em

2020.

O PDE 2024 ainda se alicerça nos ganhos positivos da troca do uso das lâmpadas

incandescentes nos domicílios brasileiros.

Quadro 5.5 - Setor residencial: consumo de eletricidade e eficiência energética

PDE 2019 PDE 2020 PDE 2023 PDE 2024

2010 2014 2019 2011 2015 2020 2014 2018 2023 2015 2019 2024

Consumo sem

conservação (GWh)

105.8

54

129.0

19

162.5

31

115.1

76

140.7

70

176.0

70

131.0

39

165.0

62

208.2

07

135.9

66

163.6

90

216.1

75

Consumo com

conservação (GWh)

105.5

38

126.7

87

156.5

46

114.6

76

137.8

75

169.2

81

129.9

83

154.8

79

189.9

34

135.3

46

156.2

67

197.1

93

Energia conservada

(GWh) 316 2.232 5.985 500 2.895 6.790 1.056

10.18

3

18.27

2 620 7.423

18.98

2

Energia conservada (%) 0,3 1,7 3,7 0,4 2,1 3,9 0,8 7,3 8,8 0,5 4,5 8,8

Fonte: Elaboração Própria a partir dos PDEs (MME; EPE, 2010, 2011, 2012 e 2013).

No Quadro 5.5, acima, pode-se observar que a energia conservada em 2023 e

2024 será bastante significativa, de 8,8 %. Esta conservação será realizada principalmente

pela eliminação do uso das lâmpadas incandescentes.

É surpreendente analisar que para o setor residencial os ganhos energéticos

ocorrerão apenas pela substituição de lâmpadas incandescentes por fluorescente ou de LED.

Em nenhum dos Planos Decenais de Energia avaliados foi possível encontrar políticas

públicas para a eficiência energética, tampouco medidas intersetoriais, como propostas pelo

AR5 do IPCC. Deste modo há a reiteração de como os PDEs são realizados apenas para

caráter indicativo.

Page 180: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

180

ii) Setor industrial

As estimativas de conservação de energia para o setor industrial incorporam os

resultados do BEU92 das edições de 1994 e 2004.

Deste modo é possível projetar a energia conservada em cada segmento industrial,

que é determinada pela

“resultante da diferença entre o consumo de energia, incorporando a evolução nos rendimentos

energéticos dos processos e usos finais, e o consumo estimado para um mesmo volume de

produção ou atividade setorial, caso não houvesse alteração no rendimento energético dos

equipamentos ”(MME; EPE, 2010,p.262)

Os PDEs apresentam os dados de consumo total de energia em duas medidas:

GWh e 10³ tep, tal distinção é realizada pois a medição em GWh é utilizada para o consumo

total da eletricidade, enquanto a medição por 10³ tep é utilizada para medir o consumo no

setor industrial de todas as energias, inclusive a eletricidade.

As projeções de consumo nas quatro versões analisadas do PDE são realizadas

tanto para o consumo sem conservação de energia como para o consumo com conservação de

energia, sendo que a diferença entre ambos equivale a energia conservada apresentada no

Quadro 5.6, tanto em GWh como em termos percentuais.

Quadro 5.6 - Setor industrial: consumo de energia e eficiência energética ¹

PDE 2019 PDE 2020 PDE 2023 PDE 2024

2010 2014 2019 2011 2015 2020 2014 2018 2023 2015 2019 2024

consumo sem conservação

(10 ³ tep)

88.538 119.705 157.605 119.321 158.210 206.389 117.988 145.978 173.057 111.659 135.062 167.770

consumo com conservação

(10 ³ tep)

87.778 116.672 150.691 117.939 152.237 192.580 117.259 141.732 163.730 111.567 131.591 159.017

Energia

conservada (10 ³ tep)

760 3.033 6.643 1.382 5.973 13.809 729 4.246 9.327 92 3.471 8.754

Energia

conservada (%)

0,9 2,5 4,2 1,2 3,8 6,7 0,6 2,9 5,4 0,1 2,6 5,2

(¹) Representa a conservação de energia total (incorporando à eletricidade também outras formas energéticas

utilizadas, sobretudo, para aquecimento direto e calor de processo).

Fonte: Elaboração própria a partir dos PDEs (MME; EPE, 2010, 2011, 2014 e 2015).

92 De acordo com o Ministério de Minas e Energia (2005, p.193), o Balanço de Energia Útil (BEU) é “um estudo

que permite processar as informações setoriais do Balanço Energético Nacional (BEN), de consumo de energia,

para obter estimativas da Energia Final destinada aos Usos Finais Força Motriz, Calor de Processo, Aquecimento

Direto, Refrigeração, Iluminação, Eletroquímica e Outros Usos e, com base nos rendimentos do primeiro

processo de transformação energética, estimar a Energia Útil”. Já a Energia Útil “é mensurada considerando os

usos finais, as formas de energia final e os setores de atividade contemplados no BEN (Balanço Energético

Nacional)”.

Page 181: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

181

Uma observação que salta aos olhos ao se analisar o consumo projetado de

energia para os horizontes decenais nos sucessivos PDEs é que parece ter havido uma

readequação das premissas sobre o crescimento do setor industrial, uma vez que os

crescimentos projetados do consumo de energia são diminuídos.

Ao observar a projeção da conservação energética global industrial, que abrange,

além da eletricidade, as fontes energéticas disponíveis para aquecimento direto e calor de

processo, os exercícios de planejamento decenal apresentam também algumas readequações.

Uma delas parece ser uma redução do otimismo em termos da projeção da energia conservada

entre o PDE 2020 e os de 2023 e 2024. Não está claro porque, entre esses PDEs, a

conservação de energia é progressivamente menor.

O documento do PDE 2019 explicita algumas das razões para a conservação da

energia global no setor industrial. Segundo ele, o setor com maior representatividade é o da

cerâmica, como uma conservação de 7,7%, sendo que o agregado industrial conservará 4,2%

em referência a energia final consumida, representando 6 milhões de tep. Ainda no PDE 2019,

salienta-se que os setores de ferro-gusa e aço, papel e celulose, alimentos e bebidas e cerâmica

representarão uma conservação de energia de 4 milhões de tep.

O PDE 2020 mantém a forma de análise presente no PDE anterior. De acordo

com o documento, é esperada para 2020 a conservação de 6,7% no que diz respeito à

demanda de energia final, representando cerca de 14 milhões de tep. Os setores que mais

conservarão energia são papel e celulose e cerâmica, alimentos e bebidas, ferro-gusa e aço,

pois estes setores representam 70% de toda a energia conservada para 2020, representando

cerca de 6 milhões de tep, com uma participação bastante representativa do setor de cerâmica,

com 1304% de ganhos de eficiência energética.

Para o horizonte de 2023, espera-se uma conservação de energia de 5,4%,

equivalendo a 9,3 milhões de tep, porém não há nenhuma menção sobre esta estimativa nem

com as alterações ao compararmos com o PDE anterior (esta tendência foi encontrada em

todos os PDEs analisados).

Finalmente para o PDE 2024, espera-se uma conservação de energia de 5,2%,

correspondendo a 8,7 milhões de tep.

Tanto o PDE 2023 quanto o PDE 2024 não apresentam justificativas mínimas

para a compreensão do processo e dos valores apresentados para as projeções de eficiência

energética.

Page 182: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

182

Em se tratando da intensidade energética do setor industrial como um todo, os

dados dos quatro PDEs analisados são apresentados no Quadro 5.7, mensurados em tep/106

R$.

Quadro 5.7 - Setor industrial : Intensidade Energética

PDE 2019 ¹ PDE 2020 ¹ PDE 2023 ² PDE 2024 ²

Intensidade Energética 2010 2014 2019 2011 2015 2020 2014 2018 2023 2015 2019 2024

Sem conservação 161.92 175.17 178.63 157.0 164.5 166.1 102.0 105.0 101.0 131.0 142.0 142.0

Com conservação 160.53 170.73 171.10 155.2 158.3 155.0 102.0 102.0 95.0 131.0 139.0 135.0

(¹): Para os PDEs de 2019 e 2020 os valores de Intensidade Energética foram mensurados por (tep/106R$ 2008)

(²) : Para os PDEs de 2023 e 2024 os valores de Intensidade Energética foram mensurados por (tep/106R$ 2010)

Fonte: Elaboração Própria a partir dos PDEs (MME; EPE, 2010, 2011, 2014 e 2015).

Os dados apresentam um comportamento que a primeira vista pode ser curioso,

por exemplo, no PDE de 2020 as projeções da intensidade energética do setor industrial são

de intensidades decrescentes em função da alteração do perfil, ou seja, a consideração sobre o

avanço dos setores industriais eletrointensivos. O que parece fazer sentido na interpretação

desses dados é algo tautológico: se os setores mais relevantes para o uso de energia são os

eletrointensivos, que se caracterizam por uma elevada intensidade energética, ali não se

observam, justamente por esta razão, reduções nessa intensidade.

Nos PDE 2020, 2023 e 2024 a intensidade energética é resultado do crescimento

da eficiência energética em todos os setores industriais a partir de 2015.

Os dados sobre o consumo de eletricidade e eficiência energética do setor

industrial são apresentados, por sua vez, no Quadro 5.8, a seguir.

Quadro 5.8 - Setor industrial: consumo de eletricidade e

conservação de energia elétrica no setor industrial

PDE 2019 PDE 2020 PDE 2023 PDE 2024

2010 2014 2019 2011 2015 2020 2014 2018 2023 2015 2019 2024 Consumo sem conservação

(GWh)

223.317 282.997 362.959 232.365 288.626 371.408 249.638 310.403 381.616 225.627 278.155 369.109

Consumo

com conservação (GWh)

221.663 278.434 353.716 231.036 281.266 354.688 247.731 299.592 356.508 225.627 272.081 355.664

Energia conservada

(GWh) 1.654 4.563 9.243 1.329 7.360 16.720 1.907 10.811 25.108 0 6.074 13.445

Energia conservada

(%) 0,7 1,6 2,5 0,6 2,6 4,5 0,8 3,5 6,6 0,0 2,2 3,6

Fonte: Elaboração Própria a partir dos PDEs (MME; EPE, 2010, 2011, 2014 e 2015).

Page 183: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

183

Em termos de consumo projetado para os horizontes decenais, os quatro PDEs

apresentam trajetórias crescentes. No entanto, o PDE 2024 se destaca por um ponto de partida

no qual o consumo de energia elétrica para o ano de 2015 é menor em termos absolutos do

que os pontos de partida dos PDEs de 2020 e de 2023. O consumo naquele ano é pouco

superior apenas ao de 2010, que é o primeiro ano do planejamento do PDE 2019. Parece,

portanto, ter havido uma readequação das premissas de crescimento no documento de

planejamento de 2024.

Ao lado disso, observa-se que os analistas-planejadores da EPE projetam

trajetórias bastante otimistas em todas as versões dos documentos de planejamento em termos

da conservação de energia, pois a percentagem de energia conservada cresce vertiginosamente

em todas as versões analisadas dos PDEs. Porém ao compararmos a projeção de energia

elétrica conservada do ano de 2023 para o ano de 2024, tanto em termos absolutos quanto

relativos, percebe-se uma grande queda. No PDE 2024, a mais recente analisado, não há

nenhuma menção às projeções atualizadas do PDE 2023, razão pela qual se torna difícil

explicar estes valores apresentados.

Outro indicador projetado pelos documentos de planejamento em análise é a

intensidade elétrica no setor industrial. Esta é medida em kWh/103R$, sendo que os dados

apresentados pelos PDEs são sistematizados no Quadro 5.9, a seguir. Para este exercício de

projeção, considerava-se que ao longo de 2001 até 2020 haveria um crescimento dos setores

mais afeitos apesar do aumento do consumo de eletricidade, isso se deve a alteração do perfil

dos setores industriais brasileiros.

A razão explicativa não é detalhada a não ser pela referência aos dados do BEU

conforme nota anterior.

Quadro 5.9 - Setor industrial : Intensidade Elétrica

PDE 2019 ¹ PDE 2020 ¹ PDE 2023 ² PDE 2024 ²

Intensidade Elétrica 2010 2014 2019 2011 2015 2020 2014 2018 2023 2015 2019 2024

Sem conservação 408.4 414.1 411.4 305.8 300.2 299.0 218.0 222.0 222.0 264.0 293.0 313.0

Com conservação 405.4 407.4 400.9 304.1 295.5 285.5 216.0 215.0 207.0 264.0 287.0 302.0

(¹): Para os PDEs de 2019 e 2020 os valores de Intensidade Elétrica foram mensurados por (kWh/10³R$ 2008)

(²) : Para os PDEs de 2023 e 2024 os valores de Intensidade Elétrica foram mensurados por (kWh/10³R$

2010)

Fonte: Elaboração Própria a partir dos PDEs (MME; EPE, 2010, 2011, 2014 e 2015).

Page 184: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

184

De acordo com o PDE 2019, a intensidade elétrica é ascendente em razão da

alteração do perfil dos setores industriais brasileiros, com um pequeno avanço relativo das

indústrias eletrointensivas e também da primarização de outros setores que proporcionam a

redução da expansão do valor agregado da indústria. Os ganhos setoriais percentuais de

eficiência elétrica em 2019 variam pouco, entre 2,4% e 2,7%, sendo que o aglomerado

industrial apresentará uma conservação de energia elétrica superior a 9 TWh .Os setores em

destaque são de papel e celulose, ferro-ligas, ferro-gusa e aço, cimento, todos com ganhos de

2,7%.

Já os setores que mais contribuem no total de energia elétrica conservada na

indústria são papel e celulose, siderurgia, não-ferrosos, produção de alimentos e bebidas, que

representam 5,2 TWh.

Nas projeções do PDE 2020, esperava-se um ganho de eficiência no consumo de

energia elétrica de 4,5% no agregado industrial em 2020, representando 16,2 TWh. Os setores

de maior destaque em conservação de energia elétrica eram os de ferroligas, ferro-gusa e aço,

não ferrosos, alimentos e bebidas e papel e celulose, que respondiam por 45% de toda a

energia conservada ou 7TWh. O setor com maior representatividade é o de ferroligas, com

ganhos de eficiência energética de 7%.

A justificativa para a trajetória descendente da intensidade elétrica é a eficiência

energética encontrada em crescimento contínuo em todos os segmentos industriais no

decênio.

Já o PDE 2023 esperava uma conservação de energia elétrica de 6,6% para o

horizonte 2023, que corresponderia a cerca de 25 TWh, valor bastante diferente do que aquele

apresentado no PDE anterior de 202293. Dos quatro PDEs examinados, este apresenta uma

análise industrial mais sucinta.

No PDE 2024, a conservação de energia elétrica esperada é de 3,6%,

representando 13 TWh.

Resta advertir, ainda, conforme já mencionado, que os dados para as projeções da

eficiência no setor industrial são provenientes do BEU – o Balanço de Energia Útil. A forma

de apresentação dos dados relativos à eficiência energética, com recurso a cálculos de 2005,

93 Esta pesquisa não apresenta a análise do PDE 2022, porém para efeito de comparação, para 2022 é esperado

uma conservação de energia elétrica de 4,9%, correspondendo a 19 TWh).

Page 185: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

185

no âmbito do Balanço de Energia Útil, recorre a cálculos e estimativas que não puderam ser

analisados dentro dos limites desta dissertação. Parece claro, ainda assim, que é atribuído um

papel muito limitado ao avanço tecnológico. Até onde se pode avaliar, considera-se que a

tecnologia não está se alterando, não estão recebendo investimento de tal modo que tragam

mudanças radicais, por isso, no movimento de patamares de eficiência, o ganho se dá apenas

de maneira incremental, sem o recurso a transformações significativas nos processos

industriais. Para um estudo mais aprofundado sobre os determinantes e as magnitudes da

eficiência energética e elétrica e a conservação de energia no setor industrial no Brasil, outras

investigações se fazem necessárias, incluindo não apenas a análise documental, que foi a

estratégia empregada nesta dissertação para esse assunto, mas também entrevistas com

analistas e planejadores, além de outros especialistas na matéria.

Aponta-se também que, ainda até o ponto em que foi possível investigar no

âmbito desta dissertação, os PDEs não incorporam considerações sobre inovações

tecnológicas e não tecnológicas significativas nos processos industriais.

Adicionalmente, ao longo dos documentos analisados, parece haver uma

coerência geral em termos dos movimentos de intensidade energética e eficiência no consumo

de energia elétrica industrial. Para a eficiência energética do consumo de energia elétrica

industrial, o documento diz que a trajetória descente é resultado da mudança do perfil dos

segmentos industriais brasileiros e não é mais significativo, devido ao avanço relativo das

indústrias eletrointensivas. Tal justificativa é coerente com o movimento ascendente da

intensidade energética, observado ao longo dos documentos.

4.4. Observações finais ao capítulo

O objetivo deste capítulo consistiu em, a partir de uma análise de instrumentos

selecionados de planejamento do setor de energia, apresentar uma reflexão sobre dois temas

relevantes para o futuro deste setor no sentido da busca pela redução das emissões de GEE.

São eles: o tema das perspectivas para as fontes renováveis e o da busca pela eficiência no

domínio da energia.

Page 186: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

186

Esses são dois temas que correspondem, conforme observou-se no terceiro

capítulo desta dissertação, a medidas complementares para o setor de energia na iNDC

brasileira.94

Na primeira seção foram apresentados os instrumentos de planejamento que foram

objeto da análise proposta no capítulo, ou seja, o PNE 2030 e os PDEs selecionados,

contextualizando esses documentos dentro da proposta de planejamento energético e

identificando seus objetivos; na segunda, buscou-se identificar o papel atribuído às fontes

renováveis dentro desses documentos de planejamento; e na terceira seção apresentou-se as

medidas levantadas, a partir dessa documentação, específicas para a busca da eficiência

energética nos diversos documentos PDEs.

Há que se mencionar uma dificuldade em se recuperar informações específicas

sobre medidas que estariam na origem do aumento de eficiência esperado para vários dos

casos tratados pelos PDEs, mencionados ao longo da exposição deste capítulo. Esta

dificuldade impôs uma limitação ao exercício de análise que, por isso, deve ter suas

conclusões apresentadas com as devidas ressalvas.

Conforme observou-se, e até onde foi possível avaliar dentro dos limites desta

dissertação, é possível afirmar que:

a) As metas apresentadas pelo Brasil para o setor de energia parecem ter seguido

determinações que desde 2007 (no PNE 2030) já estão contempladas pelos instrumentos

de planejamento energético no Brasil, não representando, portanto, desafios suplementares

às ambições, que são modestas, que já estavam previstas antes dos desafios à

descarbonização estarem presentes tanto nos documentos do 5º Relatório de Avaliação

(AR5) do IPCC e das resoluções firmadas entre os países por ocasião dos momentos

críticos das negociações internacionais, apresentados, respectivamente, nos capítulos 1 e 2

desta dissertação. As metas de crescimento para o conjunto das renováveis no Brasil são

apenas compatíveis com a manutenção de sua importância relativa atual que, como foi

visto no capítulo 4, é reduzida em comparação com a relevância que teve nos anos 1970.

b) As medidas mais específicas apresentadas pelos documentos de planejamento energético

com a finalidade de buscar a eficiência energética não configuram uma abordagem

integrada e/ou sistêmica para enfrentar os desafios da redução de GEE no setor de energia

no país; e

94 Cf. Quadro 3.1 nesta dissertação.

Page 187: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

187

c) As medidas apontadas nos documentos de planejamento energético (PDEs) não

incorporam abordagens de inovação tecnológica e não tecnológica mais ousadas para o

setor, que poderiam ser identificadas com elementos presentes, por exemplo, nas

sugestões do AR5 como medidas setoriais e intersetoriais para o enfrentamento das

mudanças climáticas, elencadas na seção 1.3 do primeiro capítulo desta dissertação. Como

visto, as medidas sugeridas pelo AR5 incluiriam, entre outras: a importante expansão das

renováveis (eólica e solar, de forma especial); o emprego de sistemas ferroviários de alta

velocidade (em especial para substituição parcial do transporte aéreo); o planejamento

integrado urbano, com aumento do uso de transporte coletivo e infraestrutura apropriada

para o transporte não motorizado, incluindo ciclismo e caminhadas; a substituição e

integração de modais em atividades de transporte, logística e mobilidade95

; o

desenvolvimento e aplicação sistemática de códigos de construção; maior emprego de

padrões de eficiência para aparelhos eletrodomésticos e eletrônicos; na indústria, a

partilha de infraestruturas, informação e calor em sítios comuns, a reciclagem de resíduos

na forma de integração de processos ao longo de cadeias produtivas e em especial em

distritos industriais, e o emprego de tecnologias de tratamento de resíduos com

recuperação de energia.

Nos documentos de planejamento, até onde foi possível constatar, o avanço

científico e tecnológico e mesmo o emprego do conhecimento já disponível para a difusão em

muitos domínios – como alguns dos mencionados acima – não ganham, para dizer o mínimo –

o mesmo tipo de atenção que recebem dentro das recomendações do AR5. Neste sentido,

poder-se-ia dizer, com relação às medidas examinadas, que, de forma geral, não apresentam

uma ambição em termos do avanço da participação das fontes renováveis e que não parecem

adotar uma perspectiva integrada, sistêmica, das medidas previstas para o alcance de uma

maior eficiência energética. Desta forma, salvo limites que podem ser atribuídos à presente

análise, essas medidas acabam configurando elementos pontuais, numa visão de planejamento

que carece de considerações sobre os rumos mais importantes que deveriam guiar as

mudanças do setor de energia nas próximas décadas em nosso país.

95 Conforme mencionado, a análise do setor de transporte não pertence ao escopo desta dissertação. Deve-se

reconhecer, por vários motivos tratados neste trabalho, que este é um setor da maior relevância quando se trata

de fazer diagnósticos e proposições para o enfrentamento das mudanças climáticas.

Page 188: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

188

Conclusões Finais

A natureza global das mudanças climáticas faz com que sua solução passe

necessariamente por medidas que devem ser tomadas conjuntamente pelos países. Com essa

compreensão é que a Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas

(UNFCCC, na sigla em inglês para United Nations Framework Convention for Climate

Change) foi proposta, em 1992, por ocasião da Segunda Conferência das Nações Unidas

sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, conhecida como Rio 92.

Na UNFCCC, o objetivo geral de combater as mudanças climáticas deu origem a

sucessivas rodadas de negociações internacionais, nas quais os Estados nacionais, chamados

de “partes”, deveriam se comprometer com ações voltadas às finalidades de mitigação e de

adaptação, além de negociar os meios tecnológicos e financeiros para o alcance dessas

finalidades. Delegados dos Estados nacionais se reúnem periodicamente nas Conferências das

Partes (COPs), que ocorrem desde 1995 – a COP de Berlim. As questões que animam os

debates têm a ver com responder a questões tais como: o que fazer, como fazer, quem deve

fazer, quando e com o recurso a quais meios (BUENO RUBIAL, 2016). As negociações se

intensificaram em especial a partir de 2007, quando a equipe responsável pela consolidação

do conhecimento científico sobre causas, efeitos e recomendações sobre o problema das

mudanças climáticas pelo IPCC foi laureada com o Prêmio Nobel da Paz.

O grande vilão, de acordo com a sistematização dos conhecimentos pelo IPCC,

seria historicamente a queima de combustíveis fósseis. Desde a revolução industrial as

quantidades de CO2 e outros gases de efeito estufa se acumulam de forma a elevar suas

concentrações na atmosfera, levando a alterações do funcionamento do sistema climático. O

problema se acelerou depois da Segunda Guerra Mundial, com o avanço da industrialização

em outras partes do planeta, que aprofundou e consolidou seu caráter intensivo na queima de

combustíveis fósseis. Mais recentemente, outros fatores, como o avanço do desmatamento em

países como o Brasil e a Indonésia e outras causas associadas a mudanças no uso da terra

passam a constituir elementos explicativos para o problema.

O estudo desenvolvido no âmbito desta dissertação se coloca na interface entre

mudanças climáticas e energia.

A dissertação consistiu de um estudo das contribuições brasileiras, representadas

pelas iNDC – ou seja, as metas de redução de Gases de Efeito Estufa (GEE) apresentadas pelo

governo brasileiro por ocasião da 21ª Conferência das Partes (COP 21), realizada em Paris em

Page 189: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

189

2015, e de alguns desafios que a partir daí seriam colocados para o setor de energia no país. O

estudo foi contextualizado de duas maneiras: de um lado, pelo panorama global, caracterizado

pela sistematização e construção de um consenso do conhecimento científico sobre as

mudanças climáticas e pela emergência de um novo regime climático global; de outro, por um

panorama nacional definido a partir da caracterização das contribuições do Brasil para o

problema das emissões, com a identificação e análise do perfil geral e setorial de emissões de

GEE do país. O estudo foi refinado para o caso das emissões do setor de energia, que permite

identificar, a partir da análise de instrumentos selecionados de planejamento energético, que

as metas apresentadas pelo país em Paris para o setor de energia já estavam pelo menos em

parte presentes nas metas de planejamento desde 2007 e que as medidas associadas ao alcance

de algumas dessas metas – especificamente para o caso da eficiência energética – configuram

muito mais medidas fragmentadas do que efetivamente uma estratégia que aponta rumos para

um futuro de baixo carbono no setor de energia. Além disso, até onde se pode constatar dentro

dos limites dessa dissertação, essas medidas não podem ser identificadas com uma abordagem

integrada e sistemática da inovação tecnológica e não tecnológica.

Neste sentido, o capítulo 1 apresentou um dos principais documentos que

serviram de base para a compreensão e discussão do papel do Homem perante as mudanças

climáticas, o 5º Relatório de Avaliação do IPCC, o AR5.

Neste capítulo, observou-se como a ONU, juntamente com a Organização

Meteorológica Mundial, iniciaram um processo de institucionalização do debate sobre as

mudanças climáticas, que se tornou fundamental para a sistematização do conhecimento sobre

a origem antrópica do problema, sobre seus possíveis efeitos sobre os sistemas naturais e

socioeconômicos e sobre as medidas necessárias para mitigá-lo e para conceber e

implementar ações para que as sociedades se adaptem às mudanças por vir.

Duas das contribuições mais fundamentais e mais recentes do IPCC dizem

respeito à necessidade de se evitar um aquecimento climático de mais de 2oC e, para isso, da

necessidade e urgência de transformações importantes, coordenadas, sistemáticas e conjuntas

(do ponto de vista de uma ação global) dos sistemas socioeconômicos para a redução dos

gases de efeito estufa.

O AR5 apresenta séries históricas de gás carbônico (CO2), como forma de

demonstrar que os avanços econômicos e a atividade industrial dos países resultaram em uma

maior emissão de gases de efeito estufa (GEE) além de colocar as emissões antropogênicas

como a principal causa das mudanças climáticas.

Page 190: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

190

Além disso, o AR5 apresenta-se como um documento diferenciado pois utilizou

simulações de cenários como forma de traçar as tendências que as emissões de GEE até 2100.

A contabilização sobre as quantidades que ainda podem ser emitidas de gases de

efeito estufa dá origem ao “Orçamento Global de Carbono” – o quanto ainda se pode emitir

globalmente desses gases a fim de evitar o aquecimento maior de 2oC. Este é um dos

“recursos comuns” da humanidade em nossos dias. Sua sobreexploração - ou seja, a

ultrapassagem desse limite – significaria uma tragédia climática.

Como distribuir esse orçamento global é objeto de negociações climáticas, nas

quais os princípios da responsabilidade comum, porém diferenciada e o das responsabilidades

históricas têm sido objeto de discórdia.

A partilha tem efeito sobre os custos a serem enfrentados pelos países para

desenvolver suas ações, como políticas de redução do desmatamento, mudanças no setor de

transportes e de planejamento energético como forma de mitigar as (e também de se adaptar

às) consequências que as emissões de GEE podem gerar no mundo.

Neste sentido é colocado que o desenvolvimento econômico deve apresentar

novas configurações, como por exemplo no investimento, produção e no consumo de energias

renováveis como forma de diminuir as emissões de GEEs.

As propostas do AR5 para as vias de mitigação intersetoriais e setoriais são

essenciais para se conduzir uma economia de baixo carbono, ou seja, aquela que promove a

diminuição dos GEE e também a utilização plena dos recursos econômicos e naturais de

forma sustentável.

A dificuldade em se chegar a um consenso nas Conferências das Partes da

UNFCCC é o resultado de se debater as prioridades que cada país considera para si e refletir

seu papel na configuração mundial.

Assim, a discussão empreendida no primeiro capítulo, buscou evidenciar o avanço

do conhecimento técnico-científico representado pelas contribuições sintetizadas, no âmbito

do último relatório de avaliação do IPCC – o AR5, sobre causas antrópicas à origem dos GEE

e seus efeitos em termos de mudanças climáticas e sobre as vias consideradas necessárias para

rumar para um desenvolvimento socioeconômico de menor volume e intensidade de emissões

desses gases.

Page 191: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

191

A mensuração das emissões antropogênicas dos gases de efeito estufa desde 1850

é importante para identificar no Homem o agente central responsável pelas mudanças no meio

ambiente que acarretam efeitos para as mudanças climáticas. Vale notar como as GEEs entre

os anos de 1970 e 2010 foram mais intensas do que no período compreendido entre 1750 e

2010, ou seja, o crescimento econômico e populacional mais acentuado, intensificaram as

emissões de GEE.

O quadro composto neste capítulo sobre as contribuições do IPCC,

particularmente no caso de seu último relatório de avaliação – o AR5 – procura dar destaque à

sistematização dos avanços do conhecimento sobre as mudanças climáticas e à proposição de

medidas de mitigação de GEE em busca de um futuro de baixas emissões de carbono. Desta

forma, este capítulo apresenta uma síntese de resultados do IPCC/AR5 com relação a causas,

efeitos e, mais particularmente no âmbito do WG3, as vias de transformação necessárias para

a mitigação dos GEE, tanto setorial quanto intersetorialmente.

O AR5 evidencia a importância para que haja medidas intersetoriais e setoriais

para a mitigação das emissões de GEE. Estas medidas servem como base para que os países

desenvolvam seus próprios planejamentos para a mitigação de GEE como também o uso mais

eficiente dos seus recursos para a produção de energia.

Tratar desses aspectos, nos limites dessa dissertação, atendeu a três justificativas.

Em primeiro lugar, pelo fato do AR5 constituir uma sistematização do conhecimento

científico sobre o problema das mudanças climáticas, que constitui o pano de fundo para a

discussão aportada por esta dissertação. Em segundo lugar, por aportar os conhecimentos que

servem como base para a informação das negociações internacionais – cujos contornos atuais

são apresentados no segundo capítulo desta dissertação – e para as medidas de política a

serem adotadas em âmbito nacional pelas partes signatárias da UNFCCC, a cujo âmbito

pertence a discussão sobre as contribuições nacionais apresentadas pelo governo brasileiro ao

Secretariado da UNFCCC e que passam a integrar o Acordo em Paris, que coroou a

Conferência das Partes em 2015 e que constitui o objeto do terceiro capítulo desta dissertação.

Em terceiro lugar, pelo fato de apontar para a necessidade de mudanças setoriais e

intersetoriais necessárias e urgentes a fim de evitar um aquecimento climático importante,

incluindo medidas que servem como um balizamento para uma discussão das metas de

redução de GEE (apresentadas no capítulo 3) e de algumas das medidas previstas para o

alcance dessas metas, conforme discutido no capítulo 5 desta dissertação.

Page 192: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

192

O segundo capítulo desta dissertação apresentou o processo de negociações e

debate que se desdobrou no longo do tempo a respeito da responsabilidade de cada país nas

emissões de GEEs que resultam em mudanças climáticas importantes no planeta. O capítulo

apresentou a evolução das negociações sobre as mudanças climáticas, evidenciando que, ao

longo do século XX, a constituição dos maiores emissores de GEE mudou levando a impasses

sobre a responsabilização de cada país neste contexto.

Observou-se, neste capítulo, que durante o século XX, houve uma reconfiguração

nos perfis de emissões de países e de grupos de países, resultando em mudanças significativas

em termos de liderança, de coalizão de países e de atribuição de responsabilidades.

A arquitetura do Protocolo de Kyoto colocava os países de industrialização

primitiva e aqueles que se industrializaram fortemente no período anterior ao ano de 1990 no

chamado Anexo I, com responsabilidades obrigatórias para o enfrentamento das mudanças

climáticas, tanto do ponto de vista do aporte de soluções tecnológicas, de recursos e do

pioneirismo nas políticas públicas, sobretudo as climáticas e as energéticas. O regime

climático de Kyoto abraçou os princípios de boa governança ambiental e social, como o

princípio do poluidor-pagador, o da precaução, o PRCD e o princípio das responsabilidades

históricas. Na “ausência” norte-americana devida a não-ratificação do Protocolo nos períodos

dos governos Bush, a liderança foi exercida pela União Europeia. Esta e outras ausências

tendem a explicar, como foi visto, a ineficácia, a falta de robustez e a instabilidade do regime

climático de Kyoto.

Discutiu-se também que essa reconfiguração não deve ser considerada ela própria

livre de conflitos. A distinção entre fluxos e estoques continua sendo fundamental, uma vez

que o limite de aquecimento de no máximo 2ºC até o final do século XXI, que foi adotado

como meta global sobre a qual devem se dar os acordos internacionais para a limitação global

das emissões, implica que exista um máximo de concentração de emissões na atmosfera – um

estoque máximo. Esse máximo de concentração implica, por sua vez, limites às emissões –

fluxos máximos. Sendo esses fluxos uma categoria global, deve haver uma partilha entre os

países, ou seja: uma limitação dos fluxos de emissões de cada país a fim de compor os fluxos

totais e, daí suas contribuições específicas para o estoque máximo.

O conflito deve ficar mais claro quando se considera a questão distributiva com

relação ao clima: o conceito de “Orçamento Global de Carbono” (Global Carbon Budget) que

implicaria limitar as emissões per capita a cerca de 1 a 3 toneladas por habitante ao ano no

horizonte de 2050 para que o planeta aqueça “apenas 2ºC” até o final do século. Assim como

Page 193: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

193

PIB per capita é um valor médio que nada tem a ver com distribuição, o orçamento global de

carbono deve ser “distribuído” entre as nações. Este também é um aspecto fundamental para

se compreender as dificuldades das negociações internacionais sobre mudanças climáticas que

estão em curso e as que estão por vir.

Para apresentar o papel do Brasil nesta nova reconfiguração de responsabilidades

climáticas, o terceiro capítulo caracterizou o volume de emissões de GEE do Brasil, que para

o período de 1990 e 2014 de acordo com a SEEG foi de 67 GtCO2e em GWP. Deste total, há

o destaque para o setor de Mudanças de Uso da Terra que representou 65% da parcela de

emissões de GEE do país, resultado principalmente do desmatamento da Amazônia, oriundo

da exploração madeireira e também do crescimento da expansão agrícola. Somente entre os

anos de 2002 e 2004, as emissões de GEE em MUT cresceram 53,6%.

Ademais, observou-se também um rápido crescimento das emissões do setor de

energia no período mais recente. Esta característica, como observa o Prof. Dr. André T.

Furtado, do DPCT-IG/Unicamp, já estava presente desde anos 1970. De fato, foi o petróleo

que alimentou o chamado “milagre” brasileiro, entre 1967 e 1973: um período de “petro-

prosperidade”. Não apenas os combustíveis do crescimento econômico eram constituídos

pelos hidrocarbonetos, em especial o carvão e o petróleo, como também o modo de

financiamento desse crescimento se baseava na ampla disponibilidade de liquidez nos

mercados financeiros internacionais, graças aos chamados petrodólares (Furtado, 1985). As

receitas dos países exportadoras de petróleo, à época, circulando nas praças financeiras

internacionais, eram “recicladas” na forma de financiamento das políticas

desenvolvimentistas do Terceiro Mundo.

Na década de 1970, quando já estavam claras as limitações ecossistêmicas

associadas à “petro-prosperidade”, outras dificuldades se interpuseram à continuidade do

crescimento econômico nos países que se industrializavam tardiamente dentro do modelo

petro-intensivo. Os choques do petróleo de 1973 e de 1979 expuseram também o

esgotamento do modelo de financiamento desse crescimento econômico, ou seja, a era da

reciclagem dos petrodólares nos circuitos financeiros mundiais que, com altíssima liquidez e

baixos juros, haviam franqueado o avanço da petro-prosperidade nos países periféricos,

desembocara, na década de 1980, na crise do endividamento do Terceiro Mundo, incluindo,

de forma especial, o Brasil (Furtado, 1985).

Embora o Brasil tenha feito diversos esforços na década de 1970 para tentar

reduzir sua dependência com relação ao petróleo importado, que alimentava o avanço dos

Page 194: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

194

setores modernos de sua economia (em especial com o ProAlcool e com a expansão da

produção de eletricidade primária a partir das hidroelétricas e da energia nuclear), o avanço da

industrialização não foi amparado por uma oferta interna suficiente de energia e, ao final da

década, cerca de metade da pauta de importação do país era constituída pelo petróleo (Furtado

(1985).

Com a apresentação das metas do Brasil publicadas na sua (i)NDC, em 2015 no

contexto dos preparativos para a COP 21 em Paris, é possível notar como as metas brasileiras

são coerentes com as emissões de GEE no Brasil, porém as propostas não são esclarecidas.

Não se trata de uma apresentação de medidas mais detalhadas. Entretanto, deve-se notar que

em geral as iNDCs apresentadas pelos signatários da UNFCCC também não foram

detalhadas.

De acordo com a discussão desse terceiro capítulo, conclui-se que a MUT é

responsável pela maior parte de emissões de GEE, porém ao analisar as metas da iNDC,

observa-se que ela engloba somente o bioma Amazônia e não outros que sofrem também com

as ações de desmatamento, como o cerrado.

Com relação às metas apresentadas no documento para as energias renováveis no

Brasil, observa-se que as intenções se restringem a manutenção das participações relativas

atuais.

Por isso a conclusão é de que documento brasileiro é, ainda, extremamente

sintético, o que dificulta sua análise. Não há um detalhamento das medidas de mitigação ou de

adaptação, de forma que as lacunas abrem espaço para questionamentos sobre como as metas

podem ser alcançadas.

Para compreender se as metas apresentadas pela (i)NDC foram condizentes com a

matriz energética do Brasil e a sua atual configuração, o capítulo 4 apresentou a oferta interna

de energia no Brasil para o período de 1970 a 2014.

Observou-se que houve uma perda na participação relativa de energia renovável

na matriz brasileira, que representava 78,66% do total em 1970 e foi reduzida para 43,54%

em 2014. De forma correspondente, as fontes não renováveis passaram, no mesmo período, de

21% para 56% da matriz primária.

O aumento da importância relativa das fontes de energia não renováveis a partir

da década de 2000 foi resultado de mudanças institucionais e de mercado no setor de energia

Page 195: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

195

no Brasil que levaram à implementação de usinas geradoras de termoeletricidade movidas a

gás natural, a fim de enfrentar a crise energética.

Este foi um dos fatos explicativos para o aumento verificado nas emissões de

GEE no setor de energia. Como se pôde observar, no entanto, este não foi o fato mais

importante. As emissões de GEE no Brasil são, de longe em sua maior parte, explicadas pela

Mudança no Uso da Terra, como já mencionado. Do ponto de vista do perfil geral das

emissões no país, excluindo-se MUT, os setores de maior emissão correspondem,

respectivamente à agropecuária e à energia. A agropecuária foi responsável por 23% das

emissões brasileiras em 2014 enquanto que a energia respondeu por 26%. Há que se notar que

as emissões do setor de energia podem ser mais bem compreendidas a partir não apenas da

geração, mas também do uso de energia. E, neste particular, o setor usuário de energia que

apresenta as maiores emissões é o de transportes, ficando a geração de energia elétrica com o

segundo lugar.

As seções 4.1 e 4.2 deste capítulo comprovam que a expansão da oferta de energia

no setor elétrico por meio do uso de combustíveis fósseis apresentou um aumento tanto

absoluto quanto em termos relativos das emissões de GEE. É preciso ressaltar, ao lado disso,

que este setor não foi o principal responsável pelo aumento das emissões absolutas associadas

ao uso da energia, papel que é representado, como salientado acima, pelo setor de transportes.

Ao lado disso, é preciso reconhecer algumas das limitações do estudo das

emissões brasileiras, conduzido ao longo deste quarto capítulo. Desde logo, não foram

tratados os impactos das mudanças climáticas na geração hidroelétrica, que têm sido

evidenciados pelas consequências das crises hídricas recentes. Também não foram enfocadas

as alterações na matriz energética e na emergência de políticas que dizem respeito às energias

renováveis para eletricidade: a biomassa, a energia eólica e a solar fotovoltaica. Sem dúvida,

esses são assuntos da maior relevância para o tema das mudanças climáticas e energia e

devem constituir objeto de maiores investigações numa agenda de pesquisa voltada à

exploração dos rumos futuros da energia no país e no mundo.

Outra limitação evidente do esforço aqui realizado diz respeito à investigação

necessária sobre as mudanças nos padrões de emissão de GEE no Brasil devidas ao uso da

energia no setor de transportes. Em termos das emissões de GEE geradas pelo uso de energia,

o setor de transporte é, de longo, o que mais emite no país. Foi visto, neste capítulo, que

embora tenha contribuído com um aumento de apenas 1% nas emissões totais de GEE, esse

aumento se dá sobre uma base muito grande, de 45% em 1990 para 46% em 2014. Em termos

Page 196: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

196

absolutos, o avanço das emissões do setor de transportes foi de uma magnitude muito

importante. 96

Ao lado desta transformação, pelo lado da oferta de energia, no caso, de

eletricidade gerada a partir de usinas termoelétricas movidas a gás natural, também é

importante salientar o aumento das emissões associadas ao uso da energia.

Como foi visto, o setor de transportes representou a maior parcela de emissões de

GEE associadas à queima de combustíveis fósseis no Brasil e a geração de (termo)eletricidade

apresentou o maior aumento percentual entre 1990 e 2014.

Finalmente, no capítulo 5, buscou-se apresentar a perspectivas dos instrumentos

de planejamento energético do país, o PNE 2030 e os PDEs sob a ótica de se discutir como

estes documentos apresentam as perspectivas das fontes renováveis na matriz energética

brasileira e como a eficiência é tratada no domínio da energia.

Constatou-se que há uma dificuldade em se recuperar informações que

comprovem os estudos referentes a eficiência energética, o que limita a análise dos dados

fornecidos nos documentos.

O que fica claro, ao longo dos documentos analisados, é que parece haver uma

coerência geral em termos dos movimentos de intensidade energética e eficiência no consumo

de energia elétrica industrial. Para a eficiência energética do consumo de energia elétrica

industrial, o documento diz que a trajetória descente é resultado da mudança do perfil dos

segmentos industriais brasileiros e não é mais significativo, devido ao avanço relativo das

indústrias eletrointensivas. Tal justificativa é coerente com o movimento ascendente da

intensidade energética, observado ao longo dos documentos.

No caso específico da análise sobre as perspectivas para o aumento de eficiência,

é preciso advertir para o fato de que os dados para as projeções da eficiência no setor

industrial são provenientes do BEU – o Balanço de Energia Útil. A forma de apresentação dos

dados relativos à eficiência energética, com recurso a cálculos de 2005, no âmbito do Balanço

de Energia Útil, recorre a cálculos e estimativas que não puderam ser analisados dentro dos

limites desta dissertação. Parece claro, ainda assim, que é atribuído um papel muito limitado

ao avanço tecnológico. Até onde se pode avaliar, considera-se que a tecnologia não está se

96 O Observatório do Clima disponibiliza uma análise das emissões de GEE da atividade de transportes, também

para o período de 1990 a 2014, especificando os casos dos transportes de cargas e de passageiros no Brasil, no

relatório de Ferreira et al (2016).

Page 197: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

197

alterando, não estão recebendo investimento de tal modo que tragam mudanças radicais, por

isso, no movimento de patamares de eficiência, o ganho se dá apenas de maneira incremental,

sem o recurso a transformações significativas nos processos industriais. Para um estudo mais

aprofundado sobre os determinantes e as magnitudes da eficiência energética e elétrica e a

conservação de energia no setor industrial no Brasil, outras investigações se fazem

necessárias, incluindo não apenas a análise documental, que foi a estratégia empregada nesta

dissertação para esse assunto, mas também entrevistas com analistas e planejadores, além de

outros especialistas na matéria.

Tendo em vista os aportes dos capítulos, ou seja: i) a noção de urgência sobre a

necessidade de mudanças setoriais e intersetoriais no sentido de buscar soluções de baixo

carbono – conforme a sistematização de conhecimentos elaborada pelo IPCC/AR5, abordada

no primeiro capítulo desta dissertação; ii) a busca por soluções negociadas para a partilha

internacional do orçamento global de carbono, no âmbito do novo regime climático que

emerge em especial da COP 21, abordada no segundo capítulo desta dissertação; iii) as metas

apresentadas pelo Brasil ao Secretariado da UNFCCC no âmbito dessas negociações,

conforme apresentadas no terceiro capítulo; e iv) o conhecimento sobre o perfil das emissões

associadas ao setor de energia, conforme o conteúdo tratado no presente quarto capítulo, cabe

indagar sobre as medidas a serem tomadas no âmbito deste setor a fim de alcançar as metas

correspondentes.

De acordo com as discussões apresentadas nos capítulos e os aportes realizados no

último capítulo desta dissertação, foi possível concluir que (de acordo com os limites

temporais desta dissertação):

a) As metas apresentadas pelo Brasil para o setor de energia parecem ter seguido

determinações que desde 2007 (no PNE 2030) já estão contempladas pelos instrumentos

de planejamento energético no Brasil, não representando, portanto, desafios suplementares

às ambições, que são modestas, que já estavam previstas antes dos desafios à

descarbonização estarem presentes tanto nos documentos do 5º Relatório de Avaliação

(AR5) do IPCC e das resoluções firmadas entre os países por ocasião dos momentos

críticos das negociações internacionais, apresentados, respectivamente, nos capítulos 1 e 2

desta dissertação. As metas de crescimento para o conjunto das renováveis no Brasil são

apenas compatíveis com a manutenção de sua importância relativa atual que, como foi

visto no capítulo 4, é reduzida em comparação com a relevância que teve nos anos 1970.

Page 198: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

198

Ao lado disso, os ganhos de eficiência (em termos gerais de 10% até o horizonte de 2030

para o país) também estavam previstos no documento de 2007.

b) As medidas mais específicas apresentadas pelos documentos de planejamento energético

com a finalidade de buscar a eficiência energética não configuram uma abordagem

integrada e/ou sistêmica para enfrentar os desafios da redução de GEE no setor de energia

no país; e

c) As medidas apontadas nos documentos de planejamento energético (PDEs) não

incorporam abordagens de inovação tecnológica e não tecnológica mais ousadas para o

setor, que poderiam ser identificadas com elementos presentes, por exemplo, nas

sugestões do AR5 como medidas setoriais e intersetoriais para o enfrentamento das

mudanças climáticas, elencadas na seção 1.3 do primeiro capítulo desta dissertação. Como

visto, as medidas sugeridas pelo AR5 incluiriam, entre outras: a importante expansão das

renováveis (eólica e solar, de forma especial); o emprego de sistemas ferroviários de alta

velocidade (em especial para substituição parcial do transporte aéreo); o planejamento

integrado urbano, com aumento do uso de transporte coletivo e infraestrutura apropriada

para o transporte não motorizado, incluindo ciclismo e caminhadas; a substituição e

integração de modais em atividades de transporte, logística e mobilidade97

; o

desenvolvimento e aplicação sistemática de códigos de construção; maior emprego de

padrões de eficiência para aparelhos eletrodomésticos e eletrônicos; na indústria, a

partilha de infraestruturas, informação e calor em sítios comuns, a reciclagem de resíduos

na forma de integração de processos ao longo de cadeias produtivas e em especial em

distritos industriais, e o emprego de tecnologias de tratamento de resíduos com

recuperação de energia.

Aponta-se, ainda até o ponto em que foi possível investigar no âmbito desta

dissertação, os documentos de planejamento energético analisados não incorporam

considerações sobre inovações tecnológicas e não tecnológicas significativas nos processos

industriais.

Também nesses documentos, até onde foi possível constatar, o avanço científico e

tecnológico e mesmo o emprego do conhecimento já disponível para a difusão em muitos

domínios – como alguns dos mencionados acima – não ganham, para dizer o mínimo – o

97 Conforme mencionado, a análise do setor de transporte não pertence ao escopo desta dissertação. Deve-se

reconhecer, por vários motivos tratados neste trabalho, que este é um setor da maior relevância quando se trata

de fazer diagnósticos e proposições para o enfrentamento das mudanças climáticas.

Page 199: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

199

mesmo tipo de atenção que recebem dentro das recomendações do AR5. Neste sentido, poder-

se-ia dizer, com relação às medidas examinadas, que, de forma geral, não apresentam uma

ambição em termos do avanço da participação das fontes renováveis e que não parecem

adotar uma perspectiva integrada, sistêmica, das medidas previstas para o alcance de uma

maior eficiência energética. Desta forma, salvo limites que podem ser atribuídos à presente

análise, essas medidas acabam configurando elementos pontuais, numa visão de planejamento

que carece de considerações sobre os rumos mais importantes que deveriam guiar as

mudanças do setor de energia nas próximas décadas em nosso país.

No que se refere aos documentos sobre a busca para uma maior eficiência

energética, apresentado pelo Ministério de Minas e Energia e pelo Observatório do Clima, nos

limites da análise aportada por esta dissertação, o que se identificou foi muito mais um

conjunto de medidas muito pontuais, como numa colcha de retalhos, não integradas dentro de

uma estratégia mais abrangente ou sistêmica, que levasse em conta as possibilidades – e a

necessidade – de avanços científicos e tecnológicos, e nem mesmo do uso de conhecimentos

já disponíveis inclusive em escala comercial, para o avanço da eficiência energética. Muito

menos para uma estratégia integrada e sistêmica de descarbonização no domínio da energia

em nosso país.

Page 200: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

200

REFERÊNCIAS

AMORIM, Alice; SANTOS, Maureen; ESTEVES, Paulo. BPC Policy Brief. 2016.

Disponível em:

<http://bricspolicycenter.org/homolog/uploads/trabalhos/7118/doc/367717299.pdf>. Acesso

em: 12 jan. 2017

ANDRADE, E. T. de; CARVALHO, S. R. G. de; SOUZA, L. F. de. Programa do Proálcool

e o etanol no Brasil. Disponível em: <http://www.uff.br/enzimo/arquivos/arqix001.pdf.>.

Acesso em: 19 mar. 2016.

ANFAVEA. Anuário da Indústria Automobilística Brasileira 2016. 2016. Disponível em:

<http://www.anfavea.com.br/anuario.html>. Acesso em: 6 nov. 2016

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS EMPRESAS DE SERVIÇOS DE CONSERVAÇÃO DE

ENERGIA (ABESCO). O que é Eficiência Energética? (EE). 2017. Disponível em:

<http://www.abesco.com.br/pt/o-que-e-eficiencia-energetica-ee/>. Acesso em: 12 jan. 2017.

ASSOCIAÇÃO O ECO. Entenda o que é REDD. 2014. Disponível em:

<http://www.oeco.org.br/dicionario-ambiental/27940-entenda-o-que-e-redd/>. Acesso em: 17

fev. 2016.

ASSOCIAÇÃO O ECO. O que são as INDCs. 2015. Disponível em:

<http://www.oeco.org.br/dicionario-ambiental/o-que-sao-as-indcs/>. Acesso em: 17 jun.

2016.

AZEVEDO,Tasso Rezende de. Análise das Emissões de GEE Brasil (1970 - 2014) e suas

implicações para políticas públicas e a contribuição brasileira para o acordo de

Paris.Documento síntese,SEGG, Observatório do Clima, 2016. Disponível em:<

http://seeg.eco.br/wp-content/uploads/2016/09/FINAL-16-09-23-RelatoriosSEEG-

PIUP_.pdf>. Acesso em: 20 out.2016

BALANÇO ENERGÉTICO NACIONAL - BEN. Séries Completas. 2015. Disponível em:

<https://ben.epe.gov.br/BENSeriesCompletas.aspx>. Acesso em: 22 out. 2016.

BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO - BNDES .

Desestatização. 2016. Disponível em:

<http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/D

esestatizacao>. Acesso em: 10 mar. 2016.

BRANDÃO JR. et al. Análise das Emissões de GEE no Brasil (1990 - 2012) Mudanças do

Uso da Terra. Documento de análise . SEEG, Observatório do Clima, Imazon, 2014.

Disponível em: <https://s3-sa-east-

1.amazonaws.com/arquivos.gvces.com.br/arquivos_gvces/arquivos/305/SEEG_UsoDaTerra.p

df>. Acesso em: 15 mar. 2016

Page 201: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

201

BRANDÃO JR., A.; BARRETO, P. (Orgs).Emissões GEE do setor mudança de uso da

terra. Documento de análise . SEEG, Observatório do Clima, Imazon, 2016. Disponível em:

<http://seeg.eco.br/wp-content/uploads/2016/09/16-09-16-RelatorioSEEG-MUT.pdf>. Acesso

em: 15 mar. 2016

BRASIL. Projeto de Lei N.1.484, de 2007 (da Câmara dos deputados) PL N.7678/2006.

Dispõe sobre a obrigatoriedade de utilização como fonte subsidiária de energia, sistema de

aquecimento solar de água em imóveis financiados com recursos do SBPE, FGTS, FAT e do

OGU - Orçamento Geral da União e dá outras providências. 2015. Disponível em:<

http://www.camara.gov.br/sileg/integras/1418981.pdf>. Acesso em: 12 jan. 2017

BUENO RUBIAL, María del Pilar, “El Acuerdo de París: ¿una nueva idea sobre la

arquitectura climática internacional?”, Relaciones Internacionales, nº 33, 2016, ps.75-95.

Disponível em:<https://repositorio.uam.es/handle/10486/676958>. Acesso em 10 de janeiro

de 2017

CAIT. Climate Data Explorer - Historical Emissions. 2016. Disponível

em:<http://cait.wri.org/historical>. Acesso em: 08 ago. 2016.

CAIT. Climate Data Explorer - Paris Contributions Map. 2017. Disponível

em:<http://cait.wri.org/indc/>. Acesso em: 07 março 2017.

CAMILO, Edilaine Venancio. AS políticas de inovação da indústria de energia eólica:

uma análise do caso brasileiro com base no estudo de experiências internacionais. 2013.

212 f. Tese (Doutorado) - Curso de Política Científica e Tecnológica, Unicamp, Campinas,

2013.

CANAL ENERGIA. PDE e PNE serão publicados apenas em 2017, informa MME. 2016.

Disponível em: <http://www.energia.sp.gov.br/2016/11/pde-e-pne-serao-publicados-apenas-

em-2017-informa-mme/>. Acesso em: 10 jan. 2017.

CARSON, Rachel. Primavera Silenciosa. São Paulo: Melhoramentos, 1964.

CASTRO, Nivaldo José de et al. Plano Decenal de Expansão de Energia - PDE 2020:

Análise do método, metas e riscos. Rio de Janeiro: GESEL UFRJ, 2012. (Texto de discussão

do Setor Elétrico n.44). Disponível em:

<http://www.gesel.ie.ufrj.br/app/webroot/files/publications/18_TDSE44.pdf. > Acesso em: 25

mar. 2016.

CENTRO BRASILEIRO DE INFORMAÇÃO DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA. Selo

Procel. 2017. Disponível em:

<http://www.procelinfo.com.br/main.asp?TeamID={88A19AD9-04C6-43FC-BA2E-

99B27EF54632}>. Acesso em: 15 fev. 2017.

CORAZZA, R. I. Inovação tecnológica e demandas ambientais: notas sobre o caso da

indústria brasileira de papel e celulose. Dissertação (mestrado) em Política Científica e

Tecnológica. DPCT-IG/Unicamp, 2016, cap. 2

Page 202: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

202

CORAZZA, R. I.; BONACELLI, M. B. M. Ciência, Tecnologia e Inovação para a

Sustentabilidade: reflexões em [retro][per]spectiva. In: Monteiro, M.; Dias, R. de B.; Campos,

C. de (Orgs.) Novos Horizontes em Política Científica e Tecnológica, São Paulo: Ed.

UFABC, 2014.

COSTA, Ricardo Cunha da; PRATES, Cláudia Pimentel Trindade. O papel das fontes

renováveis de energia no desenvolvimento do setor energético e barreiras à sua penetração no

mercado. BNDES Setorial, Rio de Janeiro, n. 21, p. 5-30, mar. 2005. Disponível em:

<https://web.bndes.gov.br/bib/jspui/bitstream/1408/2436/1/BS%2021%20O%20papel%20das

%20fontes%20renov%C3%A1veis_P.pdf>. Acesso em: 15 out. 2016

DEAN, Warren. A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. 1.

ed. São Paulo: Cia. das Letras, 2004. 484 p. [1ª impressão 1996]

DELGADO, G. da C. A questão agrária no Brasil, 1950-2003. In: JACCOUD, L. (org.).

Questão Social e Políticas Sociais no Brasil Contemporâneo. Brasília, IPEA, 2005. p.51-

90. Disponível em:< http://www.en.ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/livros/Cap_2-

10.pdf>. Acesso em: 15 mar.2016

DIAS, G. L. S.; VIEIRA, C. A. & AMARAL, C. M. Comportamento do mercado de terras

no Brasil – Proyeto "Mercado de Tierras Rurales". Santiago: CEPAL, 2001.Disponível

em:< http://repositorio.cepal.org/bitstream/handle/11362/4478/1/S01010083_pt.pdf>. Acesso

em: 02 out.2016

EICHNER, T., & PETHIG, R. (2011). Carbon leakage, the green paradox, and perfect future

markets. International Economic Review, 52(3), 767-805.

ELMQUIST, Marie; GUSTAFSSON, Örjan; ANDERSSON, Per. Quantification of

sedimentary black carbon using the chemothermal oxidation method: an evaluation of ex situ

pretreatments and standard additions approaches. Limnology And Oceanography:

Methods, [s.l.], v. 2, n. 12, p.417-427, dez. 2004. Disponível em:

<http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.4319/lom.2004.2.417/abstract>. Acesso em: 21 mar.

2016.

ESPÍRITO-SANTO, Fernando D. b. et al. Size and frequency of natural forest disturbances

and the Amazon forest carbon balance. Nature Communications, [s.l.], v. 5, p.1-6, 18 mar.

2014. Disponível em: <http://www.nature.com/articles/ncomms4434>. Acesso em: 05 mar.

2016.

FEARNSIDE, Philip M. Hidrelétricas como" fábricas de metano": o papel dos

reservatórios em áreas de floresta tropical na emissão de gases de efeito estufa.

Oecologia Brasiliensis, v. 12, n. 1, p. 11, 2008. Disponível

em:<https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/2880900.pdf>Acesso em: 08 maio. 2016.

FEENSTRA, R. C. (1998). Integration of trade and disintegration of production in the global

economy. The Journal of Economic Perspectives, 12(4), 31-50.

Page 203: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

203

FERREIRA et al (Org.).Emissões de GEE do setor de energia, processos industriais e uso

de produtos.Documento de análise. IEMA,SEGG, Observatório do Clima, 2016. Disponível

em:< http://seeg.eco.br/wp-content/uploads/2016/09/FINAL-16-09-23-RelatoriosSEEG-

PIUP_.pdf>. Acesso em: 20 out.2016

FERREIRA, Lilian. Em decisão histórica, EUA e China comprometem-se a cortar gases

estufa em pacto global. 2011. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/ciencia/ultimas-

noticias/redacao/2011/12/11/em-decisao-historica-eua-e-china-comprometem-se-a-cortar-

gases-estufa-em-pacto-global.htm>. Acesso em: 27 abr. 2016.

FOLHA VITÓRIA. Máfia do carvão explora trabalho infantil no Norte do Estado. 2011.

Disponível em: <http://www.folhavitoria.com.br/geral/noticia/2011/07/mafia-do-carvao-

explora-trabalho-infantil-no-norte-do-estado.html>. Acesso em: 02 mar. 2017.

FOLKE, Carl. Resilience: The emergence of a perspective for social–ecological systems

analyses. Global Environmental Change, S.l, v. 16, n. 3, p.253-267, ago. 2006. Disponível

em: <http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0959378006000379>. Acesso em: 11

maio 2016.

FONSECA, Pedro Cezar Dutra; MONTEIRO, Sergio Marley Modesto. O Estado e suas

razões: o II PND. Rev. Econ. Polit.,[s.l.], v. 28, n. 1, p.28-46, mar. 2008. Disponível em:

<http://www.scielo.br/pdf/rep/v28n1/a02v28n1.pdf>. Acesso em: 05 nov. 2016.

FÓRUM BRASILEIRO DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS. Cartilha sobre Clima e Energia.

2008

FURH, L. et al. . After COP 19 in Warsaw – Checkmate for International Climate

Politics. Heinrich Böol Stiftung – The Green Political Foundation.2013.Disponível em:

<https://www.boell.de/en/2013/12/03/after-cop-19-warsaw-checkmate-international-climate-

politics>. Acesso em: 9 mar. 2017.

FURTADO, André. A Crise Energética Mundial e o Brasil, in: Revista Novos Estudos

Cebrap, nº11, janeiro 1985, p. 17-29, São Paulo-SP. Disponível em:

<http://novosestudos.uol.com.br/v1/files/uploads/contents/45/20080623_a_crise_energetica.p

df>. Acesso em: Acesso em: 9 mar. 2017.

FURTADO, André; MULLER, Newton. Competitividade da indústria brasileira de

petróleo. Revista Brasileira de Energia, v. 4, n. 1, 1995.

FURTADO, André Tosi. A trajetória tecnológica da Petrobrás na produção

offshore. Espacios, v. 17, n. 3, p. 31-66, 1996.

FURTADO, Andre Tosi; CORTEZ, Luiz Augusto Barbosa; SCANDIFFIO, Mirna Ivonne

Gaya. "O sistema de inovação da agroindústria canavieira brasileira." Apresentado no

“VI Congresso Brasileiro de Planejamento Energético”, Salvador, 2008.

Page 204: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

204

FURTADO, André Tosi; FREITAS, Adriana Gomes. Nacionalismo e aprendizagem no

Programa de Águas Profundas da Petrobras. Revista Brasileira de Inovação, v. 3, n. 1

jan/jun, p. 55-86, 2009.

FURTADO, André Tosi. . Structural Changes in the Brazilian Energy Matrix. Terrae

(Campinas. Impresso), v. 6, p. 42-51, 2009.

FURTADO, André Tosi; SCANDIFFIO, Mirna Ivonne Gaya; CORTEZ, Luis Augusto

Barbosa. The Brazilian sugarcane innovation system. Energy Policy, v. 39, n. 1, p. 156-166,

2011.

FURTADO, André Tosi. Políticas de Inovação no setor elétrico brasileiro. Vitória: Edufes,

2015. 94 p.

GOLDEMBERG, José; MOREIRA, José Roberto. Política energética no Brasil. Estudos

avançados, v. 19, n. 55, p. 215-228, 2005. Disponível

em:<http://www.scielo.br/pdf/%0D/ea/v19n55/14.pdf>Acesso em: 08 mar. 2016.

GOLDEMBERG, José; LUCON, Jose. Energia, Meio Ambiente e Desenvolvimento. 3. ed.

São Paulo: Edusp, 2008. 400 p.

IBGE. Vocabulário Básico de Recursos Naturais e Meio Ambiente. 2014. Disponível em:

<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/vocabulario.pdf>. Acesso em: 19 out.

2015.

INTERNACIONAL ENERGY AGENCY. Energy poverty. 2016. Disponível em:

<http://www.iea.org/topics/energypoverty/>. Acesso em: 08 out. 2016.

IPCC – Intergovernmental Panel on Climate Change. Mudança do Clima 2007: A Base das

Ciências Físicas. Contribuição do Grupo de Trabalho I ao Quarto Relatório de Avaliação do

Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima.2007a. Disponível

em:<https://www.ipcc.ch/pdf/reports-nonUN-translations/portuguese/ar4-wg1-spm.pdf>

Acesso em: 30 jun. 2016.

______. Mudança do Clima 2007: Impactos, Adaptação e Vulnerabilidade. Contribuição

do Grupo de Trabalho II ao Quarto Relatório de Avaliação do Painel

Intergovernamental sobre Mudança do Clima.2007b. Disponível

em:<https://www.ipcc.ch/pdf/reports-nonUN-translations/portuguese/ar4-wg2-spm.pdf>

Acesso em: 30 jun. 2016.

______.Summary for Policymakers .2013. Disponível

em:<https://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar5/wg1/WG1AR5_SPM_FINAL.pdf>

Acesso em: 30 jun. 2016.

______. Climate Change 2014: Synthesis Report. Contribution of Working Groups I, II

and III to the Fifth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate

Change. Editado por The Core Writing Team et al. Cambridge/New York, Cambridge

Page 205: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

205

University Press/IPCC, 2014a. Disponível em: <https://www.ipcc.ch/pdf/assessment-

report/ar5/syr/SYR_AR5_FINAL_full_wcover.pdf>. Acesso em: 02 ago. 2016.

______.Climate Change 2014: Mitigation of Climate Change. Contribution of Working

Group III to the Fifth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate

Change. Editado por Edenhofer, Ottmar et al. Cambridge/New York, Cambridge University

Press/IPCC,2014b. Disponível em:<http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-

report/ar5/wg3/ipcc_wg3_ar5_full.pdf>. Acesso em: 02 ago. 2016.

______.Climate Change 2013:The Physical Science Basis.2015.Disponível em:

<http://www.climatechange2013.org/>. Acesso em: 02 out. 2015.

______.Climate Change 2014: Impacts, Adaptation, and Vulnerability.2015. Disponível

em: < http://www.ipcc.ch/report/ar5/wg2/>. Acesso em: 02 out. 2015.

______.Climate Change 2014: Mitigation of Climate Change.2015.Disponível em:

<http://www.ipcc.ch/report/ar5/wg3/>. Acesso em: 02 out. 2015.

______.Climate Change 2014: Synthesis Report.2015.Disponível em:

<https://www.ipcc.ch/report/ar5/syr/>. Acesso em: 02 out. 2015.

______.WORKING GROUPS / TASK FORCE.2015.Disponível em:

<https://www.ipcc.ch/working_groups/working_groups.shtml>. Acesso em: 02 out. 2015.

______.SECRETARIAT and TECHNICAL SUPPORT UNITS.2015.Disponível em:

<https://www.ipcc.ch/organization/organization_secretariat.shtml#2>. Acesso em: 02 out.

2015.

JANNUZZI, Gilberto de Martino. Políticas públicas para eficiência energética e energia

renovável no novo contexto de mercado: uma análise da experiência recente dos EUA e

do Brasil. Autores Associados, 2000.

KEOHANE, Robert, NYE, Joseph, Poder e Interdependência, Grupo Editor

Latinoamericano, Buenos Aires, 1988.

KRASNER, Stephen, Conflicto estructural. El tercer mundo contra el liberalismo global.

Grupo Editor Latinoamericano, Buenos Aires, 1989.

LA ROVERE, E. L., BURLE DUBEUX, C., PEREIRA JR, A. O., & WILLS, W. Brazil

beyond 2020: from deforestation to the energy challenge. Climate Policy, 13(sup01), 70-86,

2013.

MARQUES, Luiz. Capitalismo e Colapso Ambiental. 2. ed. Campinas: Editora Unicamp,

2016. 711 p.

[MDC] MINISTÉRIO DAS CIDADES. AQUISIÇÃO E ALIENAÇÃO DE IMÓVEIS

SEM PRÉVIO ARRENDAMENTO. 2010. Disponível em:

<http://sijut.fazenda.gov.br/netacgi/nph-

Page 206: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

206

brs?s1=@DOCN="000348696"&l=20&p=1&u=/netahtml/sijut/Pesquisa.htm&r=1&f=S&d=S

IAT&SECT1=SIATW4>. Acesso em: 12 jan. 2017.

______. Minha Casa, Minha Vida garante aquecimento solar para 896 mil pessoas em

todo o Brasil. 2015. Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/ultimas-noticias/3721-

minha-casa-minha-vida-garante-aquecimento-solar-para-896-mil-pessoas-em-todo-o-brasil>.

Acesso em: 15 jan. 2017.

______. O Programa. 2016. Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/habitacao-

cidades/programa-minha-casa-minha-vida-pmcmv/o-que-e>. Acesso em: 15 jan. 2017.

[MRE] MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES.. Informação sobre o BRICS.

2016. Disponível em: <http://brics.itamaraty.gov.br/pt_br/sobre-o-brics/informacao-sobre-o-

brics>. Acesso em: 31 ago. 2016.

______. Negociações na UNFCCC: relatório final da consulta à sociedade civil

brasileira. 2015a.Disponível em:< http://blog.itamaraty.gov.br/46-consulta-clima/133-

negociacoes-na-unfccc-relatorio-final-da-consulta-a-sociedade-civil-brasileira>. Acesso em:

10 nov. 2016.

______. Contribuição apresentada pelo Brasil às Nações Unidas (“iNDC”) para o acordo

sobre mudança do clima que será adotado na Conferência de Paris (COP-21). 2015b.

Disponível em:< http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/ficha-pais/11915-contribuicao-brasil-

indc-27-de-setembro>. Acesso em: 10 nov. 2016.

______. Pretendida Contribuição Nacionalmente Determinada para consecução do

objetivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. 2015.

Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/images/ed_desenvsust/BRASIL-iNDC-

portugues.pdf>. Acesso em: 14 maio 2016.

______. Participação da sociedade civil no processo de preparação da contribuição

nacionalmente determinada do Brasil ao novo acordo sob a Convenção- Quadro das

Nações Unidas sobre Mudanças do Clima. 2015c.Disponível em:<

http://www.mma.gov.br/images/arquivos/clima/convencao/indc/Relatorio_MRE.pdf>. Acesso

em: 10 nov. 2016.

[MME; EPE] MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA (MME); EMPRESA DE PESQUISA

ENERGÉTICA (EPE). Ministério da Integração Nacional. Agência de Desenvolvimento do

Nordeste. Aspectos Fundamentais de Planejamento Energético. Rio de Janeiro: EPE,

2005.

______.Plano Decenal de Expansão de Energia: 2006-2015; Brasília: MME; EPE, 2006.

304 p.

______.Plano Decenal de Expansão de Energia: 2007/2016; colaboração Empresa de

Pesquisa Energética – Brasília: MME; EPE, 2007a. 458 p.

______.Plano Nacional de Energia 2030. Brasília: MME; EPE, 2007b. 324 p.

Page 207: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

207

______.Plano Decenal de Expansão de Energia 2008/2017; colaboração Empresa de

Pesquisa Energética – Brasília: MME; EPE, 2009. 435 p.

______. Plano Decenal de Expansão da Energia 2019. Brasília: MME;EPE, 2010. 354 p.

______.Plano Decenal de Expansão de Energia 2020. 2. ed. Brasília: MME; EPE, 2011.

319 p.

______.Plano Decenal de Expansão de Energia 2021. 1. ed. Brasília: MME;EPE, 2012. 386

p.

______.Nota Técnica DEA 22/12. Projeção da demanda de energia elétrica para os

próximos 10 anos (2013-2022). Rio de Janeiro, 2012. Disponível em:

<http://www.epe.gov.br/mercado/Documents/S%C3%A9rie%20Estudos%20de%20Energia/2

0130117_1.pdf> Acesso em: 25 mar. 2016

______.Plano Decenal de Expansão de Energia 2022; colaboração Empresa de Pesquisa

Energética – Brasília: MME; EPE, 2013. 384 p.

______.Plano Decenal de Expansão de Energia 2023; colaboração Empresa de Pesquisa

Energética – Brasília: MME; EPE, 2014. 434 p.

______.Plano Decenal de Expansão de Energia 2024; colaboração Empresa de Pesquisa

Energética – Brasília: MME; EPE, 2015. 467 p.

[MME] MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA. Portaria Interministerial no 1.007, de 31 de

Dezembro de 2010. 2010. Disponível em:

<http://www.mme.gov.br/documents/10584/1139097/Portaria_Interministerial_nx_1008_201

0.pdf/e6cab7cb-f58d-4aa9-9ce9-8a6028718759>. Acesso em: 15 jan. 2016.

______.Plano Nacional de Eficiência Energética. 2011. Disponível em:

<https://goo.gl/7R8EFb>. Acesso em: 24 fev. 2017.

[MMA] MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE - BRASIL. REDD+. O que é REDD+.

2016.Disponível em:< http://redd.mma.gov.br/index.php/pt/redd/o-que-e-redd>. Acesso em:

10 jun. 2016.

_______. Plano Nacional de Adaptação. 2016. Disponível em:

<http://www.mma.gov.br/clima/adaptacao/plano-nacional-de-adaptacao>. Acesso em: 07 ago.

2016.

MOSS R, BABIKER M, BRINKMAN S, CALVO E, CARTER T, EDMONDS J,

ELGIZOULI I, EMORI S, ERDA L, HIBBARD KA et al Towards New Scenarios for

analysis of Emissions, Climate Change, Impacts, and Response Strategies,

Noordwijkerhout, IPCC Expert Meeting Report: The Netherlands. 2008.

NEMET, G. Demand-pull energy, technology-push, and government-led incentives for non-

incremental technical change, Research Policy 38, pp. 700-709, 2009.

Page 208: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

208

OBSERVATÓRIO DO CLIMA. Metodologia. 2016. Disponível em:

<http://www.observatoriodoclima.eco.br/metodologia/>. Acesso em: 15 out. 2016

OJEDA, Igor; WROBLESKI, Stefano. Paulistano usa carvão feito com trabalho escravo e

infantil. 2014. Disponível em: <http://reporterbrasil.org.br/2014/01/paulistano-usa-carvao-

feito-com-trabalho-escravo-e-infantil/>. Acesso em: 02 mar. 2017.

OLIVEIRA, Luiz F. C. de et al . Potencial de redução do consumo de energia elétrica pela

utilização de aquecedores solares no Estado de Goiás. Eng. Agríc., Jaboticabal , v. 28, n. 3,

p. 406-416, Set. 2008 . Disponível em:

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-

69162008000300002&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 12 jan. 2016

O'RIORDAN, T., & CAMERON, J. Interpreting the Precautionary Principle.

Routledge.2013

ORTIZ, F. COP 20: um acordo tardio, mas melhor do que nada. O Eco.2014. Disponível

em:< http: www.oeco.org.br/noticias/28832-cop20-1-um-acordo-tardio-mas-melhor-do-que-

nada>. Acesso em: 9 mar. 2017

PAINEL BRASILEIRO DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS (PBMC) .O Painel Brasileiro de

Mudanças Climáticas - PBMC.2016. Disponível

em:<http://www.pbmc.coppe.ufrj.br/pt/organizacao/o-pbmc>. Acesso em: 24 set.2016

PAULILLO, Luiz Fernando et al. Álcool combustível e biodiesel no Brasil: quo vadis?.

Revista de Economia e Sociologia Rural, v. 45, n. 3, p. 531-565, 2007. Disponível em

:<http://www.scielo.br/pdf/resr/v45n3/a01v45n3.pdf>. Acesso em: 29 mar.2016

PINTO JR, Helder Jr. (org.). Economia da Energia - fundamentos econômicos, evolução

histórica e organização industrial. Rio de Janeiro: Editora Elsevier, 2007.

PIRES, Adriano; HOLTZ, Abel. Sistema Elétrico Brasileiro: Expansão Hidrotérmica.

2012. Elaborado por CBIE. Disponível em: <http://www.cbie.com.br/arquivos/Leiloes de

Energia Elétrica_3.pdf>. Acesso em: 24 ago. 2016.

PIVETTA, Marcos. Extremos do clima. Pesquisa FAPESP, v. 210, p. 16-20,

2013.Disponível em:<http://revistapesquisa.fapesp.br/2013/08/13/extremos-do-clima/>.

Acesso em: 24 set.2016

POLITO, Rodrigo. Governo adia publicação de novo Plano Decenal de Energia para

2017. 2016. Disponível em: <http://www.valor.com.br/empresas/4751259/governo-adia-

publicacao-de-novo-plano-decenal-de-energia-para-2017>. Acesso em: 10 jan. 2017.

PORTAL BRASIL (Brasília). Brasil é o país que mais reduz emissões e tem proposta mais

ambiciosa da Cop, diz ministra. 2015. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/meio-

ambiente/2015/11/brasil-e-o-pais-que-mais-reduz-emissoes-e-tem-proposta-mais-ambiciosa-

da-cop-diz-ministra>. Acesso em: 22 jun. 2016.

Page 209: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

209

PORTAL BRASIL (Brasília). Potencial hidrelétrico brasileiro está entre os cinco maiores

do mundo. 2011. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/infraestrutura/2011/12/potencial-

hidreletrico-brasileiro-esta-entre-os-cinco-maiores-do-mundo>. Acesso em: 22 jun. 2016.

PORTAL ECODESENVOLVIMENTO (Ed.). Por que o Brasil precisa ratificar o Acordo

de Paris?: A ratificação precisa ser confirmada por meio de atos do Legislativo e do

Executivo. 2016. Disponível em:

<http://www.ecodesenvolvimento.org/posts/2016/posts/abril/por-que-o-brasil-precisa-

ratificar-o-acordo-de?tag=clima>. Acesso em: 13 maio 2016.

RIBEIRO, Wagner Costa. Mudanças climáticas, realismo e multilateralismo. Terra

Livre, São Paulo, v. 1, n. 18, p.75-84, 2002. Disponível em:

<http://www.agb.org.br/publicacoes/index.php/terralivre/article/view/144/135>. Acesso em:

21 ago. 2016.

ROCKSTRÖM, Johan et al. A safe operating space for humanity. Nature, [s.l.], v. 461, n.

7263, p.472-475, 24 set. 2009. Disponível em:

<http://www.nature.com/nature/journal/v461/n7263/pdf/461472a.pdf>. Acesso em: 10 out.

2015.

ROSSETTO, Raffaella. A bionergia, a cana energia e outras culturas energéticas. Pesquisa e

Tecnologia, [s. l.], v. 9, n. 1, p.1-6, 2012. Disponível em:

<http://www.aptaregional.sp.gov.br/acesse-os-artigos-pesquisa-e-

tecnologia/edicao2012/janeiro-junho-2/1198-a-bioenergia-a-cana-energia-e-outras-culturas-

energeticas/file.html> Acesso em: 13 abr. 2016.

SAMPAIO, José Adércio Leite; WOLD, Chris; NARDY, Afrânio. Princípios de Direito

Ambiental. Belo Horizonte: del Rey, 2003. 304 p.

SAUER, Ildo Luís. Energia elétrica: crise, diagnóstico e saídas. Revista Usp, [s.l.], n. 104,

p.8-12, 5 mar. 2015. Universidade de Sao Paulo Sistema Integrado de Bibliotecas - SIBiUSP.

http://dx.doi.org/10.11606/issn.2316-9036.v0i104p8-12. Disponível em:

<http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/106749>. Acesso em: 18 ago. 2016.

SAUER, Ildo Luís; VIEIRA, José Paulo; KIRCHNER, Carlos Augusto Ramos. O

racionamento de energia elétrica decretado em 2001: um estudo sobre as causas e as

responsabilidades . São Paulo: IEE-USP, 2001. Disponível em: <

http://www.iee.usp.br/sites/default/files/biblioteca/producao/2001/Monografias/ILDO-

Estudo%20sobre%20o%20Racionamento%2015-12-2001.PDF>. Acesso em: 6 ago. 2015

SAUER, Ildo. Um novo modelo para o setor elétrico brasileiro. Relatório técnico,

Universidade de Sao Paulo–IEE, 2002. Disponível

em:<http://www.labeee.ufsc.br/antigo/arquivos/publicacoes/sauer5.pdf>. Acesso em> 07 abr.

2016

Page 210: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

210

SCHMELLER, Johanna. Especialistas avaliam saída do Canadá do Protocolo de

Kyoto. 2011. Disponível em: <http://www.dw.com/pt-br/especialistas-avaliam-saída-do-

canadá-do-protocolo-de-kyoto/a-15599653>. Acesso em: 27 abr. 2016.

SEEG - Sistema de Estimativa de Gases de Efeito Estufa. Base de Dados de Emissões. 2016.

Disponível em:< http://seeg.eco.br/>. Acesso em: 15 mar. 2016

SEEG .Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa no Brasil 2015. 2016. Disponível em:

<http://seeg.eco.br/wp-content/uploads/2016/11/IMF-infografico-GEE-Brasil-2015.png>.

Acesso em 13 abril 2016

SHIKIDA, P. F. A. A evolução diferenciada da agroindústria canavieira no Brasil de

1975 a 1995. Piracicaba, 1997. 191p. Doutorado – ESALQ/USP.

SHIKIDA, Pery Francisco Assis; PEROSA, Bruno Benzaquen. Álcool combustível no Brasil

e path dependence. Revista de Economia e Sociologia Rural, [s.l.], v. 50, n. 2, p.243-262,

jun. 2012. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s0103-20032012000200003.

Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-

20032012000200003>. Acesso em: 05 maio 2016.

STEFFEN, Will; CRUTZEN, Paul J.; MCNEILL, John R.. The Anthropocene: Are Humans

Now Overwhelming the Great Forces of Nature. Ambio: A Journal of the Human

Environment, [s.l.], v. 36, n. 8, p.614-621, dez. 2007. Royal Swedish Academy of Sciences.

http://dx.doi.org/10.1579/0044-7447(2007)36[614:taahno]2.0.co;2. Disponível em:

<https://www.researchgate.net/profile/John_Mcneill4/publication/5610815_The_Anthropocen

e_Are_Humans_Now_Overwhelming_the_Great_Force_of_Nature_Ambio_A_J_Human_En

viron/links/0fcfd511e373d55e47000000.pdf>. Acesso em: 03 ago. 2016.

STEFFEN, Will et al. The trajectory of the Anthropocene: the great acceleration. The

Anthropocene Review. [s.l],v. 2, n.1,p. 81–98. 2015. Disponível em: <

http://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.1177/2053019614564785>. Acesso em: 10 out.2016

STERN, Nicholas. The Economics of Climate Change: The Stern Review. 6. ed. United

Kingdom: Cambridge, 2009. 692 p.

STONE, Daina k. et al. Section 3.2 VOC Destruction Controls in EPA air pollution

control cost manual. Air Quality Strategies and Standards Division of the Office of Air

Quality Planning and Standards, US Environmental Protection Agency, Research

Triangle Park, NC, v. 27711, 2002. Disponível

em:<https://www3.epa.gov/ttncatc1/dir1/c_allchs.pdf>. Acesso em: 20 nov. 2015.

SZMRECSÁNYI, Tamás; MOREIRA, Eduardo Pestana. O desenvolvimento da agroindústria

canavieira do Brasil desde a Segunda Guerra Mundial.Estudos avançados, v. 5, n. 11, p. 57-

79, 1991.

Page 211: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

211

TANCREDI, Marcio; ABBUD, Omar Alves. Por que o Brasil está trocando as

hidrelétricas e seus reservatórios por energia mais cara e poluente?2013. Disponível

em:<http://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/textos-

para-discussao/td-128-por-que-o-brasil-esta-trocando-as-hidreletricas-e-seus-reservatorios-

por-energia-mais-cara-e-poluente>. Acesso em: 25 jun. 2016

TOLEDO, Karina. Quinto relatório do IPCC mostra intensificação das mudanças

climáticas. 2013. Disponível em:

<http://agencia.fapesp.br/quinto_relatorio_do_ipcc_mostra_intensificacao_das_mudancas_cli

maticas/17944/>. Acesso em: 23 out. 2015.

TOLMASQUIM, Mauricio T.; GUERREIRO, Amilcar; GORINI, Ricardo. Matriz energética

brasileira: uma prospectiva. Novos Estudos - Cebrap, [s.l.], n. 79, p.47-69, nov. 2007.

Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/nec/n79/03.pdf>. Acesso em: 21 set. 2016.

TROTTIER, Sylvie. Understanding the Changes to Global Warming Potential (GWP)

Values. 2015. Disponível em: <https://ecometrica.com/assets/Understanding-the-Changes-to-

GWPs.pdf>. Acesso em: 21 out. 2016.

UNIÃO EUROPEIA. Países da UE. 2016. Disponível em: <https://europa.eu/european-

union/about-eu/countries_pt>. Acesso em: 05 ago. 2016.

UNITED NATIONS - DEPARTAMENT OF ECONOMIC AND SOCIAL

AFFAIRS. Population. 2016. Disponível em: <https://www.un.org/development/desa/en/key-

issues/population.html>. Acesso em: 06 ago. 2016.

UNITED NATIONS - FRAMEWORK CONVENTION ON CLIMATE CHANGE

(UNFCCC). Further advancing the Durban Platform.2014.

<http://unfccc.int/files/meetings/lima_dec_2014/in-session/application/pdf/cpl14.pdf>.

Acesso em: 09 mar. 2016

UNITED NATIONS. Paris Agreement. Paris: UNFCCC. 2015. Disponível em:

<https://treaties.un.org/doc/Treaties/2016/02/20160215%2006-03%20PM/Ch_XXVII-7-

d.pdf>.Acesso em: 14 maio 2016.

UNITED NATIONS - FRAMEWORK CONVENTION ON CLIMATE CHANGE

(UNFCCC). UNFCCC- 20 Years of Effort and Achievement.2016. <Disponível

em:<http://unfccc.int/timeline>. Acesso em: 09 abr.2016

UNITED NATIONS - FRAMEWORK CONVENTION ON CLIMATE CHANGE

(UNFCCC). Intended Nationally Determined Contributions (INDCs) .2017. <Disponível

em: <http://unfccc.int/timeline/>. Acesso em: 07 mar. 2017

UNITED NATIONS OFFICE OF LEGAL AFFAIRS TREATY SECTION. Overview. 2017.

Disponível em:

<https://treaties.un.org/Pages/Overview.aspx?path=overview/overview/page1_en.xml>.

Acesso em: 08 fev. 2017.

Page 212: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

212

UNRUH, Gregory C. Understanding carbon lock-in. Energy policy, v. 28, n. 12, p. 817-830,

2000. Disponível em: <

http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0301421500000707>. Acesso em: 03 maio

2016.

VAN VUUREN, Detlef P. et al. The representative concentration pathways: an overview.

Climatic change, v. 109, n. 1-2, p. 5, 2011. Disponível em:

<https://link.springer.com/article/10.1007/s10584-011-0148-z>. Acesso em: 03 out. 2015.

VAZZOLER, L. F. R.; BONACELLI, M. B. M.; CARNEIRO, Ana Maria; O

desenvolvimento de motores a álcool e bicombustível: concentração territorial e risco de

perda das vantagens de first commer, 06/2012, Revista Economia & Tecnologia, Vol. 8,

Fac. 2, pp.157-166, Curitiba, PR, Brasil, 2012

VAZZOLER, Luiz Fernando Rigacci; BONACELLI, Maria Beatriz Machado. Geração e uso

de etanol combustível: oportunidades e limites da tecnologia flex-fuel. Revista Gestão &

Conexões, Vitória, p.111-133, 2014. Disponível em:

<http://www.periodicos.ufes.br/ppgadm/article/download/8293/6118.>. Acesso em: 03 maio

2016.

VERDÉLIO, Andreia. Proposta do Brasil para COP21 poderia ser melhor, diz

Observatório do Clima. 2015. Disponível em:

<http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2015-11/proposta-do-brasil-para-

cop21-pode-ser-melhor-diz-observatorio-do>. Acesso em: 06 fev. 2016.

VILLELA, Sumaia. Ministério quer tirar obrigação de aquecimento solar no Minha

Casa, Minha Vida. 2016. Disponível em:

<http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2016-08/ministerio-quer-tirar-obrigacao-de-

aquecimento-solar-no-minha-casa-minha-vida>. Acesso em: 15 jan. 2017.

VIOLA, Eduardo. Brasil na arena internacional de mitigação da mudança climática. Rio

de Janeiro: Cindes, 2009. Disponível

em:<https://www.ipea.gov.br/agencia/bric/textos/100409_BRICViola1.pdf>. Acesso em: 12

jan. 2017

VIOLA, Eduardo. A dinâmica das potências climáticas e o Acordo de Copenhague. Boletim

da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica. Edição Especial n. 23-24. Jan. a ago.

2010. p. 16-22.

VIOLA, Eduardo; BASSO, Larissa. Wandering decarbonization: the BRIC countries as

conservative climate powers. Rev. bras. polít. int., Brasília , v. 59, n. 1, e001, 2016 .

Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-

73292016000100201&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 05 fev. 2017

WALTER, Arnaldo. Bio-Ethanol Development(s) in Brazil. Biofuels, [s.l.], p.55-75, fev.

2009. Disponível em: <http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/9780470754108.ch4/pdf>.

Acesso em: 17 abr. 2016.

Page 213: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

213

WORLD BANK OPEN DATA (Org.). World Bank Open Data. 2016. Disponível em:

<http://data.worldbank.org/>. Acesso em: 05 ago. 2016.

WWF. Agenda Elétrica Sustentável 2020: estudo de cenários para um setor elétrico

brasileiro eficiente, seguro e competitivo. (Série técnica: v.12). Brasília: WWF-Brasil,

2006.

Page 214: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

214

APÊNDICE I – Negociações climáticas e algumas de suas recomendações: eventos selecionados em uma breve linha do tempo

Apêndice I - Eventos selecionados em uma breve linha do tempo sobre as negociações climáticas e algumas de suas recomendações

Ano Evento Observações e/ou Recomendações

1988 Criação do IPCC A Organização Meteorológica Mundial (WMO) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) estabelecem o IPCC

(Intergovernmental Panel on Climate Change), que reúne centenas de cientistas de todo o mundo que oferecem apoio às negociações

internacionais e insights para gerir riscos de eventos extremos e desastres climáticos.

1990 IPCC/AR 1 "emissions resulting from human activities are substantially increasing the atmospheric concentrations of greenhouse gases"

2ª Conferência

Climática Global

Apelo para a negociação de um Acordo Global

Assembleia Geral

(ONU)

Estabelecimento do Comitê Intergovernamental de negociações para propor uma “Convenção-Quadro sobre Mudanças Climáticas”

1992 Rio 92 Uma Convenção das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas (United Nations Framework Convention on Climate Change – UNFCCC)

é aberta para assinaturas, ao lado das Convenções sobre Diversificação e sobre Diversidade Biológica

1995 COP 1 – Berlim Países que assinaram

a UNFCCC agora são “partes”. Com 196 “parties”, a UNFCCC é quase universal. As partes se reúnem

periodicamente (COPs), para negociar respostas

multilaterais ao desafio climático. Compromissos anteriores são considerados inaquados e o “mandato de Berlim” estabelece processo de

negociação para fortalecer os compromissos dos países desenvolvidos. Desta forma, são lançadas as bases para o Protocolo de Kyoto.

1997 COP 3 – Kyoto Em 2012, os países do Anexo 1 que ratificaram o Tratado de Kyoto, deveriam ter alcançado suas obrigações de limitação de emissões de

GEE estabelecidas para o primeiro período (2008–2012): 5% de reduções em relação aos níveis de 1990. Essas limitações estão descritas no

Anexo B do Protocolo. Já o Anexo 1 reúne os países industrializados, que têm metas obrigatórias de redução (responsáveis pelas

concentrações

atuais de GEEs; estoques x fluxos). Anexo B – metas de redução de GEEs: 5% com relação ao ano de 1990 (em geral); alguns países têm

metas de redução como percentagem das emissões de anos anteriores.

2001 COP 6 – Bonn Avanço: amplo acordo político nas regras operacionais do Protocolo de Kyoto

2001 COP 7 -

Marrakesh

Acordos de Marrakesh estabelecem o cenário para ratificação do P. de Kyoto: formalização dos mecanismos flexibilização: o mercado de

carbono, o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo e a Implementação Conjunta

2005 Mercado de

Carbono

Lançamento do EU Emission Trading – o primeiro e maior esquema de negociações

de carbono, pilar da política climática da União Europeia.

2005 Implementação

do Protocolo de

Kyoto

Sete anos depois do início de suas negociações, o Protocolo de Kyoto “enters into force” (é implementado). O Protocolo já havia sido

ratificado por 140 países, mas ainda não pelos EUA, Austrália, China e Índia. Neste momento, o Protocolo havia sido recém-

ratificado pela Rússia, mas, ao todo, países responsáveis por 55% das emissões globais ainda não haviam ratificado o Protocolo.

2006 MDL Abertura do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo aos negócios

Page 215: MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ENERGIArepositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/324987/1/Souza...Figura 3.7 - Oferta interna de energia no Brasil por fonte primária..... 103 Figura 3.8 -

215

Continuação - Eventos selecionados em uma breve linha do tempo sobre as negociações climáticas e algumas de suas recomendações (continuação)

2007 COP 12 – Nairobi

AR4

COP 13 – Bali

A COP realizada no Kenya SBSTA (Subsidiary Body for Scientific and Technological Advice) tem o mandato para implementar o

Programa de Trabalho

de Nairobi: endereçar-se aos impactos, vulnerabilidades e adaptação às mudanças climáticas. “É preciso conhecer aprofundadamente os

impactos quais regiões/populações são mais vulneráveis a eles e por meio de que medidas seria possível adaptar-se às mudanças”.

O Prêmio Nobel da Paz de 2007 foi dado conjuntamente ao IPCC e a Albert Arnold (Al) Gore Jr. “for their efforts to build up and

disseminate greater knowledge about man-made climate change, and to lay the foundations for the measures that are needed to counteract

such change"

Partes aceitam o Bali Roadmap, incluindo o Plano de Ação de Bali: novos rumos para as negociações climáticas, com cinco pontos a

serem desenvolvidos: Visão partilhada; Mitigação; Adaptação; Tecnologia e Financiamento

2008 COP 14 – Poznan

Joint

Implementation

Na Polônia, as pautas incluíram avanços em tecnologia (Poznan Strategic Programme on Technology Transfer e financiamento

(Adaptation Fund) para países em desenvolvimento.

Início do Mecanismo de Implementação Conjunta, que permite que um país com obrigações de redução (ou limitação) de emissões (sob

o P. de Kyoto) possa ganhar unidades de redução de emissões por meio da redução de emissões (ou de um projeto de remoção de emissões)

em outro país com um compromisso semelhante.

2009 COP 15 –

Copenhague

COP 16 – Cancun

o Acordo de Copenhague define que os países desenvolvidos se comprometam com 30 bilhões de dólares para financiamento rápido de

medidas para enfrentar as mudanças climáticas no período de 2010 a 2012.

Países fazem um pacote de medidas para auxiliar países em desenvolvimento no enfrentamento das mudanças climáticas: Green Climate

Fund; Technology Mechanism; e Cancun Adaptation Framework.

2011 COP 17 – Durban Na África do Sul, os Governos se comprometem a estabelecer um novo acordo climático em 2015 (por ocasião da

COP 21, em Paris, para o enfrentamento das mudanças climáticas): Ad hoc Working Group on the

Durban Platform for Enhanced Action

2012 COP 18 – Doha No Qatar, Países concordam em acelerar as negociações para pós-2015. Estabelecem a Emenda Doha,

que estende compromissos de Kyoto para além de 2012. Observações: última consulta (outubro de 2015): China e África do Sul

ratificaram; EUA, Canadá, Brasil, Índia e Rússia não; Nenhum país grande da Europa ratificou;

Inúmeros países da África subsaariana e insulares do Pacífico ratificaram (explicar no texto)

2013 COP 19 – Varsóvia

AR5

Partes estabelecem REDD (Reducing Emissions from Deforestation and forest D

países em desenvolvimento. Estabelecem a Mecanismo Universal de Varsóvia, para enfrentar perdas e danos causados por mudanças

climáticas de longo prazo.

É iniciada a publicação do 5 Relatório de Avaliação do IPCC. São publicadas: sua primeira parte: Working Group 1 – Ciência das

Mudanças Climáticas; segunda parte: Working Group 2: impactos, adaptação e vulnerabilidade.

2014 Climate Summit

COP 20 – Lima

Nova York sedia encontro de Ban Ki-Moon com líderes de Estados e Governos, representes de negócios, finanças, sociedade civil e líderes

locais para mobilizar ação e ambição sobre mudanças climáticas, como preparação para a COP 21.

Governos tiveram a oportunidade, no Peru, de fazer um último esforço coletivo para procurar avançar num acordo novo e significativo para

2015

Fonte: elaboração própria a partir das informações da UNFCCC (http://unfccc.int/timeline)