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NÚCLEO DE SAÚDE DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA BEATRIZ LIMA COSTA Políticas Educacionais e Transtorno de Déficit de Atenção-Hiperatividade PORTO VELHO-RO 2018

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NÚCLEO DE SAÚDE

DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

BEATRIZ LIMA COSTA

Políticas Educacionais e Transtorno de Déficit de Atenção-Hiperatividade

PORTO VELHO-RO 2018

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BEATRIZ LIMA COSTA

Políticas Educacionais e Transtorno de Déficit de Atenção-Hiperatividade

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Psicologia como

exigência parcial para obtenção do título de

mestre em Psicologia pela Universidade

Federal de Rondônia – (UNIR).

Linha de pesquisa: Psicologia Escolar e

Processos Educativos

Orientadora: Dra. Iracema Neno Cecilio Tada

PORTO VELHO-RO 2018

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AGRADECIMENTOS

Quero agradecer a minha mãe, Mônica, que me incentivou a mudar de

estado, que estava do meu lado em todos os momentos me apoiando

incondicionalmente. Agradeço também ao meu pai, Wagner, e a minha “boadrasta”,

Bianca, que cuidam de mim mesmo longe e sempre buscam incentivar meu

crescimento pessoal e profissional. E aos meus irmãos, Carolina, Pedro e Luiza, que

fazem minha vida mais feliz.

Agradeço ao meu companheiro, amigo e amor, Eurípedes, pois não importa a

situação, está ao meu lado, me encorajou, enxugou tantas lágrimas nas horas de

desânimo e sempre me coloca para cima.

Agradeço a minha família que é um suporte fundamental. Especialmente à Tia

Estela e Tio Ary, que me receberam em Porto Velho como se fosse uma filha. Meus

primos Felipe e Patrick, que fizeram os meus dias menos solitários.

Agradeço ao Gerson, que me acolheu em Rio Branco e cuidou da minha

Amélie enquanto estive fora.

Iracema Tada, minha orientadora, não sei como expressar a minha gratidão, o

quanto que eu apreendi não somente sobre psicologia, mas sobre a vida com seus

exemplos e prática, não poderia ter encontrado pessoa melhor para trabalhar.

Obrigada por ter aceitado me orientar e por toda a paciência dedicada.

Agradeço aos professores do MAPSI, que contribuíram para a minha

formação. As minhas colegas de mestrado, foi um prazer compartilhar com vocês as

aulas, as angústias e os aprendizados.

Agradeço às professoras Ana Maria e Marilene Proença, por terem aceitado o

convite para as bancas de qualificação e defesa. Contribuíram muito com suas

experiências e sabedorias.

Agradeço às minhas amigas e aos amigos que estão sempre presentes, com

mensagens, ligações e orações.

Agradeço à Amélie por alegrar meus dias.

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Enfim, agradeço muito a todos e a todas que contribuíram durante a

realização deste trabalho direta ou indiretamente. Esta não é uma realização só

minha, mas também de vocês. A jornada teria sido impossível sem esse apoio!

Obrigada.

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RESUMO

Considerando o crescimento de diagnósticos em crianças de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade e a criação de políticas educacionais sobre como a escola deve agir com esses alunos, surgiu o interesse de estudar as políticas públicas educacionais voltadas para o TDA-H no âmbito escolar, norteado pela Psicologia Histórico-Cultural, que postula o desenvolvimento cultural das crianças e divide a atenção em natural e voluntária. A primeira, involuntária, que não é controlada conscientemente, e a segunda, uma função psicológica superior, desenvolvida por meio de interação com pares mais capazes. O objetivo da pesquisa foi: analisar as Leis e Projetos de Leis (PLs) no âmbito federal, estadual e municipal que tratam do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade no contexto escolar, utilizando uma aproximação ao materialismo histórico dialético como método, considerando a totalidade das produções legislativas, o momento histórico e cultural no qual se encontram. As principais fontes dos dados foram os sites das casas legislativas brasileiras e a página da Associação Brasileira do Déficit de Atenção, com a seleção de 29 textos, 10 Leis e 19 Projetos de Lei, no intervalo de 2010 a 2017, posteriormente foram excluídas seis PLs, pois já haviam sido arquivadas e uma Lei, por não tratar do TDA-H no contexto escolar. Para a análise dos dados, foram elaborados primeiramente três eixos de análise, para apresentar os dados de maneira empírica: desvendando a produção de Leis e PLs, apresentando quantitativamente os dados, a qual esfera (nacional, estadual ou municipal) e região geográfica (norte, nordeste, centro-oeste, sul, sudeste) pertencem e o partido do autor proponente; a (in)compreensão sobre o TDA-H na forma da lei, descreve os conceitos de TDA-H apresentados nas Leis, PLs e justificativas e se tem abordagem médica, psicológica ou pedagógica, e a judicialização do não aprender, mostrando as proposições nas Leis e PLs para o enfrentamento da queixa escolar de desatenção no âmbito escolar. Em seguida foram elaboradas duas unidades de análise: atenção e desatenção, e políticas educacionais e queixa escolar. Na análise, verificou-se que as Leis e PLs são semelhantes em relação as suas recomendações ao que deve ser feito com os alunos com suspeita de TDA-H, incentivam a busca de laudos, diagnósticos, e tratamentos destes estudantes na rede de saúde, sem proposições que realmente visam ao desenvolvimento da atenção voluntária, causam a culpabilidade do aluno por problemas de um sistema educacional falido, sem promover aprendizagem e uma educação de qualidade desalienante.

Palavras-chave: Psicologia Histórico-Cultural. Políticas Educacionais. Educação

Básica. Atenção Voluntária. Déficit de Atenção. Hiperatividade. TDA-H.

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ABSTRACT

Considering the growth of the diagnosis of Attention Deficit Disorder and Hyperactivity Disorder in children and the creation of educational policies on how the school should deal with these students, the interest arose to study public education policies for ADHD children in school, guided by Historical-Cultural Psychology that postulates the cultural development of children and divides the attention in involuntary attention and voluntary attention. The first one, involuntary, which is not consciously controlled, and the second one, which is a higher psychological function, developed through interaction with more able peers. The aim of the research was to analyze Laws and Draft Laws that deal with Attention Deficit / Hyperactivity Disorder in the school context, at federal, state and municipal levels, using an approximation to the dialectical historical materialism as a method, considering the totality of the legislative productions, the historical and cultural context they are in. The main source of data was the websites of the Brazilian legislative houses and the page of the Brazilian Association of Attention Deficit, with the selection of 29 texts, 10 Laws and 19 Draft Laws, published from 2010 to 2017, six PLs were excluded, since they had already been archived and one Law, for not treating ADHA in the school context. The following three axes analysis were elaborated for the examination of the data: unraveling the production of Laws and Draft Laws, presents quantitatively the data related to its sphere (national, state, municipal), geographic region (north, northeast, center-west, south, southeast) and the political party of the proposing author; the (in)comprehension about ADHD in the form of the law, describes the concepts of ADHD used in the Laws, Drafts of law and justifications, and if it has a medical, psychological or pedagogical approach, and the judicialization of not learning, shows the propositions in the legal texts on how the school should deal with the complaint of inattention. Then the two units of analysis are: attention and inattention, and educational policies and school complaint. Through the analysis it has been verified that the Laws and Draft Laws are very similar in relation to how they recommend students with symptoms of ADHD should be treated, as encouraging them to research for medical reports, diagnosis, and treatment through the health system, without propositions that are in fact committed to the development of the voluntary attention of these children, causing the students‟ guilt over problems of a failed educational system without promoting learning and quality education.

Keywords: Historical-Cultural Psychology. Educational Policies. Basic Education. Voluntary Attention. Attention Deficit. Hyperactivity. ADHD.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Movimento dialético do desenvolvimento infantil........................................73 Figura 2. Quantidade Leis e Projetos de Leis propostas por ano............................90

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1. Total das Leis e Projetos de Leis levantadas divididos de acordo com o âmbito das propostas. ...............................................................................................91 Quadro 2. Leis e Projetos de Leis divididos de acordo com as regiões de cada proposta......................................................................................................................91 Quadro 3. Leis e Projetos de Leis divididos de acordo com os partidos políticos de seus proponentes.......................................................................................................92 Quadro 4. Panorama geral das Leis e Projetos de Leis divididos por ano, localidade, número, autor e partido político..................................................................................93 Quadro 5. Panorama geral das Leis e Projetos de Leis divididas quanto às informações analisadas..............................................................................................94 Quadro 6. Panorama geral das Leis e Projetos de Leis com suas ementas ............95 Quadro 7. Apresentação da definição de TDA-H contida nas Leis e PLs.................97 Quadro 8. Apresentação das ações da escola com o aluno com TDA-H contidas nas Leis e PLs.................................................................................................................100

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LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS

ABDA - Associação Brasileira do Déficit de Atenção

ABRAPEE - Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional

ADHD – Attention Deficit Hyperactivity Disorder

AEE - Atendimento Educacional Especializado

ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária

APA - American Psychiatric Association

BVS - Biblioteca Virtual em Saúde

CFP - Conselho Federal de Psicologia

CID - Código Internacional de Doenças

DSM - Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais

EUA - Estados Unidos da América

GATAC - Grupo de apoio ao TDA-H do Acre

GEDA - Grupo de Estudos do Déficit de Atenção

IFAC - Instituto Federal do Acre

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC – Ministério da Educação

PDT- Partido Democrático Trabalhista (PDT)

PEN - Partido Ecológico Nacional (PEN)

PHC - Psicologia Histórico-Cultural

PL – Projeto de Lei

PMDB - Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PMDB - Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMBD)

PP - Partido Progressista (PP)

PPS - Partido Popular Socialista (PPS)

PR - Partido da República (PR)

PSB - Partido Socialista Brasileiro (PSB)

PSD - Partido Social Democrático (PSD)

PSDB - Partido da Social Democrática Brasileira

PT - Partido dos Trabalhadores (PT)

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PTB- Partido Trabalhista Brasileiro (PTB)

PTC - Partido Trabalhista Cristão (PTC)

PTN - Partido Trabalhista Nacional

PTN - Partido Trabalhista Nacional (PTN)

RR – Roraima

RS – Rio Grande do Sul

SNAP – IV - Swanson, Nolan e Pelham-IV

SUS – Sistema Único de Saúde

TEA - Transtorno do Espectro Autista

THA-H - Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade

UFAC - Universidade Federal do Acre

UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro

CNP – Congresso Nacional de Psicologia

APAF – Assembleia de Políticas Administrativa e de Finanças

UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

BIRD - Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento

CHADD - Children and Adults with Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder

TGD – Transtornos Globais do Desenvolvimento

NCLB – No Child Left Behind

UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul

ADD - Attention deficit disorder

AD/HD – Attention deficit / Hyperactivity disorder

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 14

2. POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS ............................................................................ 20

2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS: CONTEXTUALIZAÇÃO E DEFINIÇÃO ............................... 20

2.2 POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL E A PSICOLOGIA ................................... 27

3. TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO/HIPERATIVIDADE ..................................... 44

3.1 CONCEPÇÃO HEGEMÔNICA E BIOLOGIZANTE DO TDA-H .................................. 44

3.2 PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL E O DESENVOLVIMENTO DA ATENÇÃO

56

3.2.1 Breve histórico da Psicologia Histórico-Cultural (PHC) .............................. 57

3.2.2 Visão de Homem ............................................................................................... 61

3.2.3 Principais conceitos da PHC para o desenvolvimento do psiquismo ....... 64

3.2.4 Psicologia Histórico-Cultural e desenvolvimento da atenção .................... 68

3.2.5 O papel da escola no desenvolvimento da atenção voluntária ................... 71

4 MÉTODO ............................................................................................................................... 82

5. CONCRETO CAÓTICO - DESCRIÇÃO EMPÍRICA ........................................................... 89

5.1 DESVENDANDO A PRODUÇÃO DE LEIS E PLS ............................................................. 89

5.2 A (IN)COMPREENSÃO SOBRE O TDA-H NA FORMA DA LEI ...................................... 94

5.3 A JUDICIALIZAÇÃO DO NÃO APRENDER ........................................................................ 99

6. UNIDADES DE ANÁLISE – CONCRETO PENSADO ...................................................... 108

6.1 ATENÇÃO E DESATENÇÃO .............................................................................................. 108

6.2 POLÍTICAS EDUCACIONAIS E QUEIXA ESCOLAR ...................................................... 123

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS: ATENÇÃO VOLUNTÁRIA, CONSTRUÇÃO DO

FRACASSO ESCOLAR E POLÍTICAS EDUCACIONAIS ........................................................ 135

REFERÊNCIAS ................................................................................................................................ 140

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INTRODUÇÃO

A temática de políticas públicas educacionais e Transtorno de Déficit de

Atenção-Hiperatividade (TDA-H) foi escolhida a partir de uma experiência acadêmica

vivida no ano de 2016, na qual participei de um evento intitulado “1º seminário sobre

medicalização na educação no Estado do Acre”, realizado pelo curso de psicologia

da Universidade Federal do Acre (UFAC) em parceria com o Instituto Federal do

Acre (IFAC).

O evento tinha como objetivo discutir a educação de uma perspectiva menos

individualizante, falar sobre diversidade, inclusão escolar, medicalização nos

processos educativos e atuação dos profissionais envolvidos na educação. O

público-alvo era de alunos de psicologia, pedagogia, licenciaturas e cursos da

saúde.

As conferências e mesas-redondas trataram sobre os temas propostos, com

profissionais de diferentes áreas, com visões distintas sobre aprendizagem,

desenvolvimento e uso de medicamentos por crianças e adolescentes em processo

de escolarização.

A conferência de abertura chamou minha atenção. O título era “Políticas

Públicas e Medicalização na Educação: avanços e desafios”, proferida pela Profª Drª

Marilene Proença Rebello de Souza, da Universidade de São Paulo – Presidente

Eleita da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE).

Durante a sua fala, destacou questões voltadas à temática da medicalização,

entre elas: a preocupação com a quantidade de diagnóstico e medicação

administrada para crianças cada vez mais novas, o interesse da indústria

farmacêutica nas pesquisas que envolvem os transtornos de desenvolvimento e

aprendizagem, e o crescimento do consumo de Metilfenidato (anfetamina utilizada

nos medicamentos para “tratamento” do TDA-H), no Brasil e na região Norte, entre

outros pontos.

Após a apresentação, foi aberto o espaço para perguntas. Um participante do

evento, que se apresentou como pai de uma criança diagnosticada com TDA-H,

pediu a palavra e leu a Lei no. 3.112, de 29 de Dezembro de 2015, do estado do

Acre, que trata da identificação, do diagnóstico, acompanhamento integral e

atendimento educacional escolar para estudantes da educação básica com

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Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade – TDA-H. O interessante e, ao

mesmo tempo, preocupante foi perceber que ninguém, ali presente, tinha

conhecimento a respeito da Lei apresentada, mesmo ela estando diretamente ligada

à temática do evento.

A discussão foi calorosa, pois o participante mencionou pesquisas realizadas

por profissionais da área da saúde e, especialmente, divulgadas através do site da

Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA), que apoiam o uso de

medicamentos, e a intervenção escolar no processo de aprendizagem, enquanto a

palestrante mencionou outras fontes que tratam o tema de maneira diferente, até

com certa desconfiança sobre a veracidade dos diagnósticos e da existência do

próprio transtorno.

Após esta experiência, fiz a mim mesma alguns questionamentos e, para

compreender o fenômeno, decidi realizar a minha pesquisa de mestrado a respeito

desse tema, com o objetivo geral: analisar as Leis e Projetos de Leis brasileiras no

âmbito federal, estadual e municipal que tratam do Transtorno de Déficit de Atenção-

Hiperatividade no contexto escolar, tendo como objetivos específicos: traçar um

perfil da legislação: quem propôs, quando e porquê; identificar qual conceito de

TDA-H é apresentado nos textos legais e de que áreas são esses conceitos; qual a

proposta de intervenção das Leis e PLs para o âmbito educacional.

Além dos questionamentos apresentados, outras perguntas surgiram: por que

precisamos de uma Lei para garantir educação para essas crianças, se educação é

um direito fundamental, obrigatório, gratuito, garantido pela Constituição Cidadã de

1988 (BRASIL, 1988)? O que acontece dentro dos muros da escola, ou fora deles,

com esses alunos que não estamos enxergando? Pode-se imaginar como a escola

vai atender esta demanda? O diagnóstico irá ajudar no processo de escolarização

dessas crianças, ou poderá atrapalhar?

Existem trabalhos como, por exemplo, Patto (1990; 1992); Collares e Moysés

(1994, 1996); Angelucci et. al. (2004); Bock (2002); Dincao e Meira (2016);

Mezzalira, Silva e Guzzo (2014), entre outros, que tratam sobre a complexidade do

fenômeno do fracasso escolar e denunciam a biologização, psicologização e

patologização, do não aprender, conectados a problemas de desenvolvimentos e/ou

neurológicos, culpabilizando, assim, exclusivamente a criança, pelo insucesso

escolar. Além de apresentar traços de preconceito, quando o aluno não tem uma

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situação financeira considerada favorável e uma família “estruturada” (a família

tradicional composta por pai, mãe e irmãos) presente na escola.

Essas pesquisas também mostram que, atualmente, a escola espera um

aluno padrão, que seja educado, calmo e assertivo durante as quatro horas que ele

ficar em sala de aula, e os que fogem desse modelo tem sido facilmente

encaminhados para neuropsicólogos, psicólogos, psicopedagogos, neurologistas,

com o objetivo de encontrar o motivo de seu comportamento inadequado,

desconsiderando que este comportamento possa ser em decorrência de uma

didática inapropriada ou de uma dificuldade pontual que poderia ser sanada na

própria escola.

Esse fenômeno é conhecido como medicalização da educação, uma situação

do dia a dia escolar – como desatenção, inquietação, ou dificuldades no processo do

aprender – é transformada em patologia. Buscam-se explicações biológicas para

esses entraves. Atualmente, existem movimentos de resistência, dentro da

psicologia escolar, do Conselho Federal de Psicologia (CFP), da Associação

Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE), como exemplo, o Fórum

sobre Medicalização da Educação e da Sociedade1, com sete anos de atuação na

luta contra o processo da medicalização, por valorização dos direitos humanos,

direito a saúde, respeito às diferenças, entre outras pautas.

O Forúm sobre Medicalização da Educação e da Sociedade como fruto de

sua atuação tem a publicação “Recomendações de práticas não medicalizantes para

profissionais e serviços de educação e saúde” (2011), e o CFP a cartilha que trata

sobre o tema: “Não à medicalização da vida” (2012), que fazem parte das

campanhas que buscam combater essa prática. Apesar de não ser um tema novo,

estudado desde os anos 1980, continua sendo motivo de preocupação – ainda é

muito atual.

Sabemos que as políticas públicas existem para garantir os direitos sociais

constitucionais, de acordo com as demandas da população, então temos alguns

movimentos que podem inspirar a criação de políticas educacionais, como a Lei

3.112, do estado do Acre. Um exemplo de movimento é a Associação Brasileira do

1 “No Brasil, a crítica e o enfrentamento dos processos de medicalização ainda são muito incipientes.

É neste contexto que se constitui o Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade, que tem como objetivos: articular entidades, grupos e pessoas para o enfrentamento e superação do fenômeno da medicalização, bem como mobilizar a sociedade para a crítica à medicalização da aprendizagem e do comportamento.” Disponível em: <http://medicalizacao.org.br/manifesto-do-forum-sobre-medicalizacao-da-educacao-e-da-sociedade/>.

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Déficit de Atenção (ABDA), fundada em 1999, que busca informar a sociedade sobre

o tema, discutir direitos, entre outros pontos em sua página na internet e por meio de

seus oito Núcleos nas cidades de: Belo Horizonte/MG, Brasília/DF, Florianópolis/SC,

Porto Alegre/RS, Rio Branco/AC em parceria com o Grupo de apoio ao TDA-H do

Acre (GATAC), São Paulo/SP, Rio de Janeiro/RJ e Vitória/ES. Pela fala do

participante o GATAC foi o grupo que buscou apoio político para que o governo de

Acre aprovasse a Lei do TDA-H.

É importante ressaltar que estas associações (ABDA e GATAC) apresentam

um viés biologizantes para compreensão do TDA-H e defendem o uso de

medicação. No site da ABDA são apresentadas cartilhas sobre o “transtorno” e

cartilhas sobre legislação e jurisprudência, apoiando medidas exclusivas e

diferenciadas para os alunos diagnosticados com TDA-H. Entretanto, sem tratar do

assunto sob outras óticas, apresentar medidas alternativas, ou sequer mencionar

questões de fracasso escolar que considerem a precariedade de ensino, entre

outras questões que fazem parte da constituição da triste realidade da educação

brasileira. O foco é por meio da compreensão de que a criança não aprende por ter

problemas de atenção e concentração, necessitando, portanto, dos medicamentos

para que possa aprender.

A psicologia deve compor comissões que atuem na construção de políticas

educacionais, temos muito a contribuir nesse processo de criação, pois a psicologia

escola e educacional apresenta uma leitura sobre o processo de ensino,

aprendizagem e educação escolar.

Nos anos 1980, a psicologia escolar rompeu com a crença da Teoria da

Carência Cultural, apresentando teorias críticas, ressignificando o fracasso escolar,

caminhando contra a medicalização, buscando compreender a escola como um

sistema complexo, que engloba o sistema educacional como um todo, a sociedade,

a politica, a infraestrutura, o sucesso e o fracasso escolar dos alunos,

compreendidos como resultado de todas estas interações internas e externas aos

muros da escola, que influenciam o ensinar e o aprender.

O Transtorno de Déficit de Atenção-Hiperatividade é um tema delicado, não

só devido aos muitos pontos de vista científicos em torno dele (médico, psicológico,

pedagógico, histórico-cultural, entre outros), mas, especialmente, por ser um termo

incorporado a uma sociedade que exige que sejamos “multifuncionais”, capazes de

realizar muitas atividades simultaneamente, que nos apresenta, cada vez mais cedo,

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às tecnologias que proporcionam um turbilhão de informações, sem limites e, em

contrapartida, oferece a mesma escola com pedagogia ultrapassada, atividades

desinteressantes, sem considerar que estamos em um momento muito diferente e

novo, apresentando-se sem atrativos para essas crianças da era pós-moderna.

Diante disso, realizei buscas por trabalhos com as palavras-chaves: Políticas

Educacionais e Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade e Políticas Públicas

e Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade nas plataformas de dados

Scielo, Pepsic e Biblioteca Virtual em Saúde. Como consequência, levantei um

número pequeno de produções científicas que abordam o tema relacionando o TDA-

H e as Leis e PLs.

Portanto, é relevante academicamente pesquisar um tema que possui pouca

produção, que pode causar um impacto social tanto para os alunos quanto para as

escolas. O essencial é iniciar um debate a respeito destas políticas públicas

educacionais, principalmente refletir se é através delas que vamos garantir

educação de qualidade, inclusiva, que respeite as diferenças entre os alunos, não só

em relação ao comportamento, mas também a maneira como aprendem.

Dessa forma, realizei esta pesquisa documental, com o método que busca a

aproximação ao materialismo histórico dialético, com o intuito de apresentar o

fenômeno, todas as suas faces, compreender seu caráter dinâmico, histórico,

cultural, realizando uma análise do processo e não apenas dos produtos. Para isso,

o texto foi divido em duas seções teóricas: Políticas Públicas Educacionais e

Transtorno de Déficit de Atenção-Hiperatividade.

A seção de Políticas Públicas Educacionais está subdividida em duas

subseções. A primeira é Políticas Públicas: contextualização e definição, que

tem como objetivo apresentar ao leitor o que são as políticas públicas educacionais,

e contextualizar como são definidas para que servem e como forças externas – por

exemplo a indústria farmacêutica – podem influenciar na sua elaboração. No

segundo momento, na subseção Políticas Educacionais no Brasil e a Psicologia,

explicamos a realidade brasileira de políticas educacionais e como a psicologia

como ciência contribuiu para a sua formação.

A seção sobre TDA-H foi subdividida em duas subseções. A primeira é a

respeito de TDA-H, intitulada Concepção Hegemônica e Biologizante do TDA-H,

que apresenta a visão hegemônica difundida na sociedade atual que trata o TDA-H

como transtorno. A segunda, intitulada Psicologia Histórico-Cultural e o

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desenvolvimento da atenção, apresenta ao leitor a Psicologia Histórico-Cultural,

seus principais conceitos e as contribuições da Psicologia Histórico-Cultural para a

compreensão do desenvolvimento da atenção como uma função psicológica

superior. Na sequência, apresento o percurso metodológico, análise e discussão dos

dados, finalizando com as considerações finais.

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2. POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS

Essa seção será dividida em duas subseções. Na primeira subseção

apresento a definição de políticas públicas, as influências da indústria farmacêutica e

do fenômeno da medicalização na criação da legislação. Na segunda subseção

apresento a contribuição da psicologia nesse âmbito, o contexto das políticas

educacionais no Brasil e como as pesquisas nessa área podem auxiliar na

construção de legislações.

2.1 POLÍTICAS PÚBLICAS: CONTEXTUALIZAÇÃO E DEFINIÇÃO

Nesta subseção apresento a definição de políticas públicas, como o

fenômeno de medicalização e a indústria farmacêutica podem interferir nos textos

legais.

Para aprofundar o tema, é necessário entender o termo políticas públicas.

Para isso, é importante salientar que “não existe uma única, nem melhor, definição

sobre o que seja política pública” (SOUZA, 2006, p. 24). Porém, existe um ponto

comum em todas as definições que é:

[...] “colocar o governo em ação” e/ou analisar essa ação (variável independente) e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações (variável dependente). A formulação de políticas públicas constitui-se no estágio em que os governos democráticos traduzem seus propósitos e plataformas eleitorais em programas e ações que produzirão resultados ou mudanças no mundo real (Idem, p. 26).

Existem também elementos principais das políticas públicas, que mesmo

dentro das diversas teorias e definições convergem nesses aspectos:

A política pública permite distinguir entre o que o governo pretende fazer e o que, de fato, faz; A política pública envolve vários atores e níveis de decisão, embora seja materializada através dos governos, e não necessariamente se restringe a participantes formais, já que os informais são também importantes; A política pública é abrangente e não se limita a leis e regras; A política pública é uma ação intencional, com objetivos a serem alcançados;

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A política pública, embora tenha impactos no curto prazo, é uma política de longo prazo. (Idem, p. 36)

Além disso, as Políticas Públicas não estão relacionadas a uma só área de

estudo (como a ciência política), pois elas “repercutem na economia e nas

sociedades, daí por que qualquer teoria da política pública precisa também explicar

as inter-relações entre Estado, política, economia e sociedade” (Idem, p. 25).

Compreendendo essa perspectiva de que o tema é amplo e deve ser

estudado por outras áreas, farei uma análise do mesmo dentro do viés da

Psicologia, utilizando autores e definições que são difundidas nessa perspectiva.

Portanto, irei definir as Políticas Públicas como normas que nortearão as ações da

sociedade e do poder público, que podem ser sistematizadas em forma de

documentos como: leis, cartilhas, diretrizes, entre outros. Silva e Barroco (2015, p.

24) definem as políticas públicas como,

[...] o meio pelo qual é feito um projeto da gestão pública. Também se entende que elas podem orientar as realizações em dadas áreas da gestão sendo que os Programas e Projetos indicam como, quando, onde são desenvolvidas e a quem se destinam.

Portanto, as políticas devem traduzir os desejos da população, transformando

suas necessidades em programas, projetos, buscando um consenso e definindo “[...]

quem decide o quê, quando, com que consequências e para quem” (TEIXEIRA,

2002, p. 2). Silva e Barroco (2015, p. 23) destacam que,

Elas expressam as complexas formas como os homens se relacionam entre si e com o mundo, respondem às contradições que emergem e se avolumam dessas relações. Dito de outro modo, elas não se põem à parte do modo de produção e de reprodução da vida estabelecidos. A vida na contemporaneidade, mais que em outros períodos históricos, se mantém com base em dada forma organizativa orientada por documentos ou leis. (grifo meu)

Diante do exposto, deve-se considerar que as políticas não estão fora de

contexto: elas são criadas de acordo com a necessidade, com o momento histórico

em que se encontra a sociedade – no caso em questão, a nossa sociedade

capitalista, sendo os políticos, os responsáveis por sua elaboração. Tais

documentos irão direcionar as nossas ações e, além disso, ditarão regras a serem

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seguidas. De acordo com Silva e Barroco (2015), a legislação busca manter o status

quo, o controle social, sem promover grandes transformações e melhorias de vida

para a população.

Voltando este olhar para a realidade brasileira, que viveu o período da

ditadura militar (1964-1985), com apenas 33 anos de democracia reestabelecida, e

30 anos da promulgação da Constituição Democrática de 1988, somos um país que

faz parte do grupo “em desenvolvimento e de democracia recente ou recém-

democratizado” (SOUZA, 2006, p. 20), localizado na América Latina e que não tem

conseguido “formar coalizões políticas capazes de equacionar minimamente a

questão de como desenhar políticas públicas capazes de impulsionar o

desenvolvimento econômico e de promover a inclusão social de grande parte de sua

população” (Idem, p. 21).

Essa é a realidade do Brasil. O contexto cultural tem seu peso e, segundo

Collares, Moysés e Ribeiro (2013, p. 17), na atualidade, as pessoas que não se

adaptam aos modelos socialmente impostos facilmente são:

Classificadas como doentes, as pessoas tornam-se pacientes e consequentemente consumidoras de tratamentos, terapias e medicamentos, que transformam o próprio corpo e a mente em origem dos problemas que, na lógica patologizante, deveriam ser sanados individualmente. As pessoas é que teriam problemas, seriam disfuncionais, pois não se adaptam, seriam doentes, pois não aprendem, teriam transtornos, pois são indisciplinadas. Vivemos a Era dos transtornos. (grifos das autoras)

Essa é a realidade que se impõe sobre nós, contribuindo para a alienação,

reforçando estereótipos de que o problema não é do sistema econômico, que nos

força a trabalhar até a exaustão para consumir sempre mais; a falha não está no

sistema escolar, na avaliação pedagógica e nas políticas escolares, mas no aluno

tido como doente em função de possuir algum transtorno. O problema não é tratado

como social, mas individual e na tentativa de adequação recorremos aos

diagnósticos médicos buscando a prescrição de remédios, buscando soluções

paliativas que contribuem para o não enfrentamento das questões sociais, políticas e

educacionais. Infelizmente, a era dos transtornos se faz presente. Devemos resistir

dentro das possibilidades que temos de atuação, seja por meio da elaboração de

pesquisas, na participação da construção das políticas públicas ou trabalhando no

dia a dia escolar.

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Outra questão cultural que influencia diretamente na construção de políticas

públicas de saúde e o consumo de medicamentos é o conceito de saúde e doença,

que determina como a política pública de saúde ou educação se estruturará, e

consequentemente irá regular “[...] esse complexo sistema de fatores que demarca,

de maneira sistemática, o conjunto de instituições, de práticas institucionais e de

saberes que orientam as práticas do sistema de saúde” (TEMPORÃO, 2013, p. 71).

Isso quer dizer que vão direcionar de maneira decisiva o que deve ou não ser

considerado doença e ser tratado através da saúde pública, favorecendo ou não os

processos de medicalização da educação e da sociedade.

Por medicalização, concordo com a definição do Conselho Federal de

Psicologia que a define como um fenômeno social que “busca causas orgânicas

para problemas de diferentes ordens” (CFP, 2015, p. 8), afirmando ainda que,

[...] o processo por meio do qual as questões da vida social – complexas multifatoriais e marcadas pela cultura e pelo tempo histórico – são reduzidas a um tipo de racionalidade que vincula artificialmente a dificuldade de adaptação às normas sociais a determinismos orgânicos que se expressariam no adoecimento do indivíduo. Assim, não se fala das precárias e sofríveis condições de trabalho, quando se observa o adoecimento do professor, mas sim foca-se na doença, hoje conhecida como burnout1; não se fala de indivíduos questionadores, mas de portadores de “transtorno opositor desafiador”. (Idem, p.11)

Esse fenômeno pode envolver, segundo Temporão (2013, p. 72), no mínimo

três dimensões, que são a econômica, médica e política/social. Isso quer dizer que

construímos – ao passar dos anos, com avanços e retrocessos – uma “consciência

alienada de prescritores e pacientes. Com essa consciência alienada que buscamos

defender os direitos constitucionais que nos são negados, talvez com uma

percepção distorcida do que seria o ideal “[...] a transformação das pessoas em

consumidores acríticos de produtos e de medicamentos” (Idem, p. 78).

É desse contexto que a indústria farmacêutica se alimenta. Segundo o CFP

(2012), este é um dos setores que mais gera receita no mundo, perdendo apenas

para a indústria bélica, influenciando por meio de lobby os políticos, que podem

aprovar e criar leis que favorecem tratamentos, distribuição de medicamentos e a

medicalização da vida.

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Quero aqui chamar atenção para a participação da indústria farmacêutica no

processo de formulação das políticas educacionais, pois é uma indústria forte, que

movimenta cifras milionárias. Como denuncia Passos (2016), ao destacar o lobby

que a indústria faz com os políticos por meio de várias estratégias, sendo a principal

delas doação para campanhas, garantindo, assim, que seus interesses sejam

atendidos. Como exemplo, a autora menciona a Bancada do medicamento que seria

“uma estrutura informal que, segundo críticos, auxilia os grandes laboratórios

internacionais a defenderem seus interesses no parlamento” (p. 114). Podemos,

então, compreender o nível de interferência que essa indústria exerce em nossa

política:

Nas eleições passadas, as empresas de capital nacional doaram nominalmente para 27 candidatos à Câmara Federal, fora os repasses direcionados aos partidos. Destes, 19 foram eleitos. A Hypermarcas foi a que mais investiu (R$ 6,2 milhões), seguida pela Geolab (R$ 1,39 milhão), Eurofarma (R$ 1,02 milhão) e União Química Farmacêutica Nacional (R$ 890 mil). (PASSOS, 2016, p. 115)

Não só os políticos recebem incentivos financeiros, como também os

médicos, que serão os prescritores das drogas para a população. Segundo

Benasayag (2013), a indústria farmacêutica é mais poderosa do que podemos

imaginar ou mensurar, denunciando o marketing por ela promovido para que seus

medicamentos sejam escolhidos pelos médicos na hora de tratar os seus pacientes.

Para que isso ocorra, existe um plano muito bem estruturado, envolvendo médicos,

para criar as demandas, via o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos

Mentais (DSM) e diagnósticos. As pesquisas, que são apresentadas em congressos,

reforçam a eficácia dos medicamentos – estudos estes, financiados com capital da

indústria farmacêutica, realizados com famílias de baixa escolaridade, que recebem

incentivo financeiro para participarem das pesquisas e, consequentemente,

encobrirem os possíveis efeitos colaterais do remédio. São diversas as estratégias,

mas o fato preocupante é que o aumento de diagnóstico está relacionado com essas

estratégias de marketing, com o medicamento deixando de ser “um bem social para

ser uma mercadoria” (Idem, p.151).

Essas estratégias, de lobby e financiamento da indústria farmacêutica, são

conhecidas dos próprios governantes para incentivar a criação de leis que

medicalizam a sociedade e a educação. Por meio desse incentivo, os políticos

redigem requerimentos para a realização de audiências públicas, com o objetivo de

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apresentar justificativas para a criação das novas legislações, convidando

profissionais de diversas áreas que possam contribuir neste debate.

Como exemplo de requerimento que se preocupa com o tema, temos o

Requerimento 196/2015 (BRASIL, 2015) de autoria dos deputados federais Shéridan

(Partido da Social Democrática Brasileira – PSDB – RR) e Osmar Terra (Partido do

Movimento Democrático Brasileiro - PMDB – RS) direcionado a Comissão de

Seguridade Social que requer:

[...] a realização de audiência pública para instruir o PL 8324/14 que altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências, para instituir medida destinada à prevenção do uso inadequado de psicofármacos em crianças e adolescentes, e debater a importância do diagnóstico precoce no tratamento das doenças psíquicas. (BRASIL, 2015, p. 1)

No texto do Requerimento 196/2015 à Comissão de Seguridade Social e da

Família (BRASIL, 2015, p.2), é reafirmado que “[...] É sabido que existe um forte

interesse dos laboratórios – com lobby poderosíssimo – para que essa

medicalização se torne cada vez mais acentuada”, o requerimento foi aprovado, em

audiência pública realizada no dia 24 de novembro de 2015, posteriormente

arquivado conforme as normas da Câmara dos Deputados “Art. 258. Da reunião de

audiência pública lavrar-se-á ata, arquivando-se, no âmbito da Comissão, os

pronunciamentos escritos e documentos que os acompanharem”2 (CÂMARA DOS

DEPUTADOS). Talvez não seja interessante debater a medicalização, sabendo-se

que é um setor tão rentável, para alguns, e que os medicamentos atualmente têm

silenciado problemas que a sociedade não é capaz de vencer, como o fracasso

escolar. Souza (2011, p. 234) analisa que:

[...] partimos do pressuposto teórico de que o discurso oficial expressa uma concepção de educação e de sociedade. Ou seja, nos bastidores de uma política pública gesta-se uma direção a ser dada àqueles que a ela se submetem. Embora muitas vezes tais concepções não sejam explicitadas aos professores, aos pais e aos alunos, o projeto de sociedade, de homem e de mundo presente nas políticas educacionais imprime uma série de valores e de diretrizes que passam a constituir as relações interpessoais e institucionais.

2 Normas Regimentais sobre Audiência Pública. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-

legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cft/audiencias-publicas/Normas%20Regimentais>.

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Portanto, junto desta concepção de sociedade, os textos legais também

apresentam “[...] uma determinada compreensão sobre os sujeitos e sua

subjetividade” (GONÇALVES, 2010, p. 21). Se tratam de subjetividade, a Psicologia

deveria participar ativamente de suas formulações, no entanto, os profissionais que

mais tem atuado nesse âmbito são “do direito, da sociologia, da assistência social,

da economia” (idem), até mesmo profissionais da saúde, como os médicos, têm

exercido mais influência neste campo que os psicólogos.

A possibilidade da participação social no cenário político e na construção de

textos legislativos data do período da redemocratização e da Constituição brasileira

de 1988 (BRASIL, 1988), os cidadãos podem ir além das eleições, podem, por meio

da representação via conselhos de classe, sindicatos e outras organizações sociais,

construírem um canal de comunicação com os governantes para a formulação de

uma política pública que visa mudança e garantia de direitos movimentando todas as

instâncias sociais ligadas ao tema:

Fomentar arenas de debate de temas como saúde e educação em blogs, fóruns online, associações e grupos fortalece ideias e conceitos e é um pressuposto da construção de uma política pública horizontal. Formar redes de profissionais interessados no tema e que possam pensar as políticas públicas existentes de forma crítica e propositiva auxilia diretamente na reformulação delas. Ir a reuniões profissionais e colocar em pauta a questão da medicalização, propor rodas de conversa sobre o tema com seus colegas de trabalho, todas essas são atividades que geram e fomentam a real política pública. (CFP, 2015, p. 59).

Portanto, o ideal seria que estivéssemos ocupando estes espaços, que são

nossos por direito, para promover um debate multiprofissional sobre os temas que

são de interesse social e da psicologia. Segundo Souza e Cunha (2015, p. 246), “a

discussão política do lugar institucional da psicologia enquanto ciência e profissão,

estrutura-se na perspectiva do compromisso social e na participação de psicólogos

em políticas públicas”. Para que essa atuação seja efetiva, as autoras citam

instâncias por meio das quais a psicologia participa no cenário nacional de decisões,

criação de políticas e regulamentação da profissão, são elas: CFP e os Conselhos

Regionais (que são no total 17). Essas duas instâncias formam o chamado Sistema

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Conselhos de Psicologia; o CFP se apoia no Congresso Nacional de Psicologia3

(CNP) e na Assembleia de Políticas Administrativas e de Finanças (APAF)4 para

articular nacionalmente a atuação do psicólogo.

É importante destacar que o Brasil é o país que mais possui leis no mundo,

todavia é onde menos os cidadãos conseguem efetivamente usufruir dos seus

direitos (LEONARDO; ROSSATO; CONSTANTINO, 2016). Portanto, as políticas

públicas se referem “[...] a direitos iguais em uma sociedade desigual”

(GONÇALVES, 2010, p. 20) dividida em classes e regida pelo mercado.

Compreendendo essa realidade as políticas públicas “[...] devem reconhecer a

realidade social estruturada sobre a desigualdade e contribuir para a sua superação”

(Idem, p.20).

Essa contextualização das políticas públicas é similar a das políticas voltadas

para a educação, mas devido a particularidades da história das políticas

educacionais, decidi reservar uma subseção para apresenta-las.

2.2 POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO BRASIL E A PSICOLOGIA

Nessa subseção será apresentado o contexto das políticas educacionais no

Brasil, como foram construídas, qual a contribuição das pesquisas na área

educacional para a construção da legislação e a participação da Psicologia nesse

processo. Além de ressaltar as influências do cenário internacional na política

nacional.

Segundo Angelucci et. al. (2004, p. 53), podemos considerar o período de

1940-1955 como o início das pesquisas educacionais, incentivadas por órgãos

governamentais e o “[...] reconhecimento oficial da importância da pesquisa na

condução da política educacional”. Nesse primeiro momento, “[...] cabia aos

pesquisadores trazer subsídios práticos à formulação e avaliação de ações oficiais

3 “O Congresso Nacional de Psicologia – CNP – é uma instância que articula nacionalmente os psicólogos em torno de discussões para a elaboração de teses que se constituem em princípios para a ação dos Conselhos, nacionalmente” (SOUZA; CUNHA, 2015, p. 250).

4 “A assembleia de Políticas Administrativas e de Finanças – APAF – é composta por delegados dos dezessete Conselhos Regionais de Psicologia do Brasil e do Conselho Federal de Psicologia que se reúnem semestralmente. Tal assembleia tem como finalidade sistematizar as ações previstas no CNP, implementando condições necessárias para a execução das ações unificadas, resoluções e inserções na psicologia” (SOUZA; CUNHA, 2015, p. 250).

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no campo da educação escolar”. Como consequência deste movimento, a psicologia

entra por esta porta, com a contribuição através da avaliação psicológica e dos seus

saberes voltados para os processos de ensino e de aprendizagem, “[...] O primado

da psicologia no entendimento do fracasso escolar é, portanto, marca de origem da

pesquisa” (Idem, grifo das autoras).

O segundo período é de 1956-1969, com a criação do Centro Brasileiro

Educacional, faz com que a pesquisa permaneça como meio para atingir fins

governamentais. Porém, com a ideologia nacional-desenvolvimentista adotada pelo

governo ditatorial da época, as pesquisas têm o objetivo de traçar um perfil da

população, para favorecer a criação de políticas educacionais que atingissem os

objetivos dos governantes, que passam a investir na educação por acreditar na

Teoria do Capital Humano, esperando colher frutos desse investimento, sendo a

educação um assunto técnico (ANGELUCCI et. al., 2004, p. 53).

Nos anos de 1970- 1975, as bases que orientam as pesquisas educacionais

continuam a ser positivista-experimental,

[...] cresce, entre os projetos financiados, a pesquisa sobre elaboração de currículos e avaliação de cursos ou programas em função do mercado de trabalho, tendo em vista o planejamento curricular em estreita relação com as necessidades de mão-de-obra. (Idem, p. 55).

Portanto, o objetivo destas pesquisas era solucionar os problemas que o

governo enfrentava com o número de analfabetos para garantir mão-de-obra

qualificada e satisfazer as necessidades do mercado. Diante desta demanda, os

objetos das pesquisas educacionais ficaram limitados a apenas três ênfases

“avaliação de currículos e programas; construção de instrumentos de avaliação e

pesquisa; características de estudantes ou do ambiente de que provêm”

(ANGELUCCI ET. AL., 2004, p. 55), com a finalidade de traçar o perfil da população

escolar e otimizar o processo educacional para que fosse eficaz.

Apesar de esta ser a realidade esmagadora na primeira metade dos anos 70,

buscar apenas soluções imediatas para o número de analfabetos e o excesso de

matrículas nas escolas públicas, na segunda metade desta década, surgiram os

primeiros sinais de mudança no estilo das pesquisas educacionais, com o

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desenvolvimento de mais trabalhos com uma abordagem qualitativa, com enfoque

para o interior das escolas e, também, para:

[...] a burocratização e sua influência sobre a qualidade do trabalho docente; a distância entre a cultura escolar e a cultura popular nos termos do pressuposto da carência cultural; a inadequação do material didático; a discriminação das diferenças no interior das escolas, sobretudo nas classes especiais (Idem, p. 56).

Mesmo com o início de pesquisas voltadas para a escola, com uma ótica

diferente, neste período, o Brasil sofria forte influência da Teoria da Carência

Cultural ou privação de cultura. A base dessa teoria consistia em que o fracasso

escolar dos alunos com baixo poder aquisitivo, era devido a sua privação cultural e

condições de vida precária, na suposição de que a falta de condições adequadas

material, emocionais, financeiras, prejudicariam o desenvolvimento do aluno,

apostando na existência de alguma deficiência ou atraso de ordem cognitiva,

emocional, da linguagem, entre outras.

A Teoria da Carência Cultural não só explicava o fracasso escolar, isentando

a escola e o sistema educacional de qualquer culpa, como também influenciava na

criação de políticas educacionais, causando um forte impacto nacional, “[...] na

formação dos professores, nas práticas pedagógicas, nos programas e nas políticas

educacionais” (SAWAYA, 2002, p. 199).

Neste período, as pesquisas utilizavam um modelo experimental, que

produzia como resultado uma percepção de incapacidade por parte da criança pobre

em aprender e assimilar conteúdos, apenas reforçando a Teoria da Carência

Cultural que já estava enraizada no imaginário educacional brasileiro, que

continuava a se agarrar as concepções erradas a respeito da “natureza dos

problemas e de sua solução” (PATTO, 1988, p. 73).

Segundo Patto (idem), tinha-se muito a fazer no âmbito das pesquisas

educacional para romper com posturas conservadoras, seria necessário buscar um

referencial teórico-metodológico para uma compressão coerente e fiel de acordo

com a complexidade que exigia o tema do fracasso escolar.

Nos anos 1980, iniciou-se uma ruptura temática e teórica, neste ciclo de

culpabilização do aluno, apresentado anteriormente, com pesquisas com uma

orientação crítica “[...] o „fracasso escolar‟ foi ressignificado: de fracasso dos alunos

na escola ele passa à produção da escola.” (ANGELUCCI ET. AL., 2004, p. 57,

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grifo meu). A ruptura temática é mudar o foco da psicologização do fracasso escolar

para buscar no sistema educacional as causas para os índices de reprovação e

evasão escolar essa renovação possibilitou “também uma ruptura política, ao

superar a concepção do papel social da escola, segundo a qual a educação escolar

estaria à frente das reformas sociais” (PATTO, 1988, p. 76).

A Psicologia, neste momento, de reabertura política busca se reestruturar,

acompanhando o novo cenário (SOUZA, 2010), como exemplos temos:

[...] pesquisadores da escola começaram a procurar acuidade conceitual para chegar ao tecido da cotidianidade escolar em busca das formas como nela seus agentes fazem a história da educação e são feitos por ela no bojo de uma sociedade de classes profundamente desigual (ANGELUCCI ET. AL., 2004, p. 57).

A psicologia escolar crítica busca abandonar a Teoria da Carência Cultural e

compreender o fracasso escolar como um fenômeno complexo, com uma trama

relacional envolvendo aluno, sociedade, escola, políticas educacionais, bases

curriculares, formação e atuação docentes, precarização da docência, preconceito,

entre tantos outros temas que perpassam esta realidade.

Segundo Souza (2010, p. 131), “dois grandes marcos de discussão devem

ser mencionados pelo fato de terem consequências tanto na legislação educacional,

quanto na elaboração de determinadas políticas públicas em Educação”, o primeiro

seria as pesquisas que analisaram o contexto escolar de maneira crítica, criando o

termo exclusão da escola5, para se referir a população que não teve acesso ao

estudo e, exclusão na escola6, se referindo a alunos que estavam inseridos no

sistema, mas que não se beneficiaram da educação. Além destes termos, a autora

destaca a desigualdade regional encontrada no Brasil.

O segundo marco em relação à pesquisa educacional nos anos 1980 seria a

percepção de que “o grande problema não se centrava nos altos índices de

abandono da escola, conforme se acreditava a partir de dados oficiais, mas sim na

repetência” (SOUZA, 2010, p. 131).

Porém, mesmo essas novas perspectivas,

5 Grifo meu.

6 Grifo meu.

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[...] não se generalizou; lado a lado com estudos da realidade escolar [...] três tendências se configuraram: continuaram as tentativas de encontrar as causas das dificuldades de aprendizagem e de ajustamento escolar no desenvolvimento psíquico do aprendiz; num mesmo relato de pesquisa a política educacional antidemocrática e o aprendiz eram simultaneamente responsabilizados pelos maus resultados do ensino, o que configurava um “discurso fraturado”; concepções críticas e não-críticas da escola na estrutura econômico-social capitalista passaram a conviver num mesmo projeto, o que indicava apropriação superficial da nova referência teórica. (ANGELUCCI et. al., 2004, p. 57, grifo dos autores)

Isso quer dizer que nos anos 80 temos o momento de ruptura, mas também

de repetição, o entendimento a respeito do fracasso escolar só fez com que

somássemos esse fato à falta de infraestrutura das escolas, definindo que a escola

não estava preparada para receber o aluno real, ou mesmo afirmando que o aluno

não teria condições de vida incompatíveis com o aprendizado, sem promover

mudanças concretas, apenas costurando retalhos de um discurso que se dizia

inovador a um antigo cenário, configurando-se em “um discurso fraturado” conforme

análise das autoras transcritas acima (Idem, 57).

Mais tarde, por meio de outras pesquisas, as explicações reducionistas sobre

o fracasso escolar com base na Teoria da Carência Cultural, a culpabilização do

aluno por não aprender devido a problemas de ordem biológica, social e psicológica,

serão comprovadas como falsas e injustas, autoras como Patto (2015; 2005) e

Collares e Moysés (1996) realizaram pesquisas sobre estes temas, com uma

orientação teórica e metodológica diferente, pautada na estrutura da vida cotidiana

de Agnes Heller7 comprovaram que o fracasso escolar é um fenômeno atravessado

por diversas questões de preconceito racial e de classe, problemas de infraestrutura

da educação brasileira, da atuação pedagógica, uma trama muito mais complexa do

que se poderia imaginar.

Diante deste cenário apresentado, da constituição histórica das políticas

públicas em educação pode ser considerado segundo Kassar (2011, p. 42) “[...] que

as políticas públicas brasileiras tendem a amadurecer com o fortalecimento da

democracia, pós-Constituição de 1988”, um exemplo é que a educação “passa a ser

apresentada como um Direito Social” (Idem, p. 46) garantido por lei, reafirmado no

texto da Constituição Cidadã de 1988 (BRASIL, 1988) no Art. 6º “São direitos sociais

7 HELLER, Agnes. O Cotidiano e a História. 6. Ed. São Paulo: Editora Paz e Terra S/A, 2000.

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a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a

segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência

aos desamparados, na forma desta Constituição”, de responsabilidade do estado

“[...] por meio das políticas educacionais, a garantia do atendimento desse direito.”

(ZIBETTI; PACÍFICO; TAMBORIL, 2016, p. 19).

As Políticas Educacionais buscam garantir o acesso à educação de qualidade

para todos os usuários “[...] visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu

preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL,

1988, p. 117), então através da educação deveríamos desenvolver o cidadão e

qualificá-lo para o mercado de trabalho, mas a sociedade capitalista não oferece

oportunidades iguais de acesso para todos ao canal de desenvolvimento que seria a

educação.

Segundo Oliveira e Souza (2013, p. 203):

O intuito das proposições é de atingir diretamente o estudante, visando apresentar soluções às dificuldades de apropriação da leitura e da escrita bem como interferir no conjunto de atitudes consideradas inadequadas para o aprendizado dos conteúdos escolares. Tais tendências têm sua expressão maior no formato de Projetos de Lei que hoje tramitam em diferentes instâncias legislativas do país e que pretendem, se aprovados, criar um conjunto de ações visando diagnosticar, tratar, dar apoio de diversas modalidades aos estudantes considerados portadoras de dificuldades para aprender e comportar-se na escola. (grifo meu)

Leonardo, Rossato e Constantino (2016, p. 51) reforçam essa análise ao

afirmarem que as políticas educacionais irão implicar “em ações que afetam

diretamente os processos de aprendizagem e de desenvolvimento de nossas

crianças e adolescentes” ditando as regras a serem seguidas nas escolas.

Portando, a legislação voltada para a escola interfere diretamente em seu

funcionamento, no destino dos estudantes e no seu dia a dia. Os responsáveis

diretos pela elaboração das leis não fazem parte da realidade educacional, e tendem

a ser facilmente influenciados por ações como o lobby, discutido na subseção

anterior (p. 20, 21) ou, não trabalham em conjunto com as pessoas que vivenciam a

realidade de nossas escolas para elaboração das mesmas.

Entretanto, representantes de conselhos – como o CFP ou associações como

a ABRAPEE – buscam participar, contribuir e interferir em certas decisões, mas não

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é sucesso garantido. Um exemplo é dado por Oliveira e Souza (2013, p.205) “[...] na

década de 2000, o retorno às explicações organicistas para justificar as dificuldades

de escolarização. Caminhando na contramão das discussões presentes no campo

da Educação”, mesmo com pesquisas que mostram o contrário, o aluno ainda é

exclusivamente culpabilizado por não aprender, essas são as bases que irão dar

suporte para os textos legais.

No caso do processo de escolarização brasileira existe a barreira do

retrocesso para as explicações biologizantes, o fato que acontece “[...] numa

sociedade de classes, na qual crianças são tratadas desigualmente de acordo com

seu grupo social” (PROENÇA, 2002, p. 191). Portanto, o preconceito se faz presente

que, segundo Collares e Moysés (1996, p. 26), são “mitos que emperram a maior

parte das discussões e inviabilizam propostas de mudança”, o discurso está

contaminado com juízos, crença e preconceitos. É comum na perspectiva

biologizante a culpabilização da vítima, neste caso o aluno por suas dificuldades, e

nos levando ao processo de medicalização:

Crianças não aprendem porque são pobres, porque são negras, porque são nordestinas, ou provenientes de zona rural; são imaturas, são preguiçosas; não aprendem porque seus pais são analfabetos, são alcoólatras, as mães trabalham fora, não ensinam os filhos. (COLLARES; MOYSÉS, 1996, p. 26)

Não podemos fechar os olhos para o fato de que a educação “além de ser

concebida como um “Direito Social”, [...] é também valorizada como formadora de

uma “cultura da modernidade” e/ou como foco importante para o desenvolvimento

do capitalismo” (KASSAR, 2011, p. 50, grifos da autora). Podemos perceber que o

acesso a esse direito social não é universal e perpetua o que está posto para seus

usuários:

À medida que se deposita sobre a educação a expectativa de desenvolvimento da nação através da iniciativa individual, pelo incremento do capital humano, elege-se como propulsor de desenvolvimento econômico aquilo que é, em verdade, resultado deste direito de cidadão, que vigora ou não em função do modelo político adotado [...] (DIDACO, 2011, p. 43).

Mesmo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LBD/Lei nº

9.394/96), que estrutura e regulamenta a educação nacional, prometendo ensino

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público e de qualidade (BRASIL, 1996), não se consegue garantir essa qualidade.

Segundo Mezzalira, Silva e Guzzo (2014, p. 127), a LBD não assegura “acesso à

educação de qualidade capaz de proporcionar a emancipação humana”. Isso quer

dizer que no discurso afirmamos esse direito, entendemos a importância da

educação “para a humanização dos sujeitos”, mas “historicamente temos enfrentado

muitos obstáculos que nos impedem de construir processos educacionais capazes

de garantir a todos os estudantes o acesso ao conhecimento” (ZIBETTI; PACÍFICO;

TAMBORIL, 2016, p. 18).

Entre os obstáculos, podemos pensar na função da escola, ou seja, a

socialização do saber escolar, promovendo desenvolvimento do pensamento crítico.

Todavia, segundo Duarte (2001, p. 29), atualmente, infelizmente ela prepara “[...] os

indivíduos para aprenderem aquilo que deles for exigido pelo processo de sua

adaptação às alienadas e alienantes relações sociais que presidem o capitalismo

contemporâneo”, contribuindo para a manutenção do que está posto. Além deste

obstáculo, o próprio modelo educacional parece inapropriado:

Dado o caráter ineficaz e seletivo da educação brasileira, marcada por políticas educacionais comprometidas com a manutenção das relações de poder da sociedade capitalista, observamos o crescente aumento da demanda pelo tratamento de crianças que apresentam fracasso escolar nos consultórios psicológicos e em serviços de saúde. (DINCAO; MEIRA, 2016, p. 138)

Essa afirmação destaca a manutenção do status quo da medicalização da

educação, como os profissionais da área buscam no aluno a culpa pelo fracasso

escolar, que na verdade é apenas resultado do sistema falido de educação no qual

ele está inserido (PATTO, 2015; 2005; COLLARES; MOYSÉS, 1994, 1996).

Segundo Leonardo, Rossato e Constantino (2016, p. 53), o Brasil ainda está

tentando romper em “cumprir com as metas mundiais” e alcançar números para

efetivamente oferecer ensino de qualidade que proporciona a emancipação do

sujeito “para os alunos avançarem em seu processo de aprendizagem e

desenvolvimento humano”.

Quanto se fala em cumprir metas mundiais é necessário explicar que,

segundo Kassar (2011), existe uma relação entre as políticas públicas brasileiras,

não apenas para a área da educação, e as convenções internacionais que o

governo decide apoiar; elas estão ligadas à “internacionalização da economia” (p.

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47) e ao capital estrangeiro que interfere nas decisões nacionais, “portanto,

agências, como o Banco Mundial, além de presentes no direcionamento de políticas

econômicas, também marcam forte presença nos debates sociais” (p. 48). Devemos,

então, reconhecer que existe uma relação entre as políticas educacionais e os

interesses econômicos mundiais e governamentais.

Quando nos voltamos, especificamente, à educação, ao tratarmos das políticas públicas, não podemos deixar à margem a relação entre Capital e Estado, que se dá mediante a reformulação programática e prática da relação entre políticas públicas, constituição estatal e sociabilidade, de modo a conduzir uma política internacionalista global. Desse modo, uma das principais tendências que pode ser notada nos estudos das políticas públicas é justamente o seu financiamento por organismos internacionais (SILVA, BARROCO, 2015, p. 27).

O estado, atualmente, tenta conciliar a agenda internacional e as demandas

da sociedade para definir as políticas “a partir do seu caráter contraditório: na

medida em que procura atender às demandas sociais por meio de políticas

compensatórias, “colabora” para a expansão do capital nas suas várias expressões”

(DEITOS; SOBZINSKI, 2015, p. 111, grifo das autoras) favorecendo o mercado.

Quanto à agenda internacional, são várias as instituições que influenciam as

políticas educacionais na América Latina. Blasco (2012, p.1) realizou um trabalho de

revisão bibliográfica e dados em plataformas online sobre entidades que “coletam,

processam e distribuem informações no campo da política educativa, administração

escolar e gestão na América Latina”. Em sua pesquisa, o autor constatou que as

agências internacionais exercem muita influência em nossas políticas educacionais,

com o marketing superando o sentido crítico, alertando para as análises

apresentadas por agências internacionais que são essencialmente quantitativas e

que nem sempre os valores representam a realidade. Além disso, destaca que

algumas pesquisas são financiadas por entidades que podem ter ganhos com os

resultados publicados, denunciando um conflito de interesses.

Na sua linha do tempo, ele afirma que a Organização das Nações Unidas

para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), nos anos 80, foi a entidade com

maior influência nas políticas mundiais; já na década de 90, o Banco Mundial é que

exerceu um papel central nas políticas educacionais à nível mundial e financiou

projetos, especialmente em países em desenvolvimento. Na América Latina, a

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entidade que faz um papel similar é o Banco Internacional para Reconstrução e

Desenvolvimento (BIRD).

Deitos e Sobzinski (2015, p.112) destacam ainda que,

No Brasil, é possível perceber claramente o delineamento realizado por organismos internacionais na elaboração das políticas educacionais, nesse sentido, a apreensão dos documentos do Banco Mundial nos permite analisar a forma que as políticas são encaminhadas em nosso país, na medida em que seguem as deliberações dos organismos internacionais no que remete à educação em sua totalidade. De fato tais políticas educacionais são evidentemente elaboradas por organismos voltados aos interesses econômicos e que afastam dessa forma a demanda da sociedade. [...] Percebe-se que na definição das políticas educacionais ocorrem embates que marcam diferentes interesses, mas geralmente os interesses ligados aos anseios da classe dominante tendem a serem atendidos.

Devemos fazer a análise dessas influências, além das entidades

internacionais, temos paralelamente a participação estrangeira em decisões

nacionais, como exemplo, segundo Passos (2016, p. 118), “a primeira versão da Lei

de Patentes chegou ao Congresso Nacional redigida em inglês, enviada diretamente

por Washington, tamanho o interesse dos Estados Unidos no assunto”. Oliveira e

Souza (2013, p. 216) afirmam que temos Projetos de Lei que “são traduções de

projetos norte-americanos veiculados pelas Associações que se organizam para

realizar lobby na defesa de seus interesses”. O objetivo não é o de assegurar o bem-

estar das crianças, nem o aprendizado, mas manter o mercado aquecido e aumentar

a demanda.

Mais uma vez, o capital que pesa mais nas decisões políticas

desconsiderando “o espaço escolar como local de aprendizagem, de transmissão

de cultura e locus de atividade não cotidiana” (SILVA; BARROCO, 2015, p. 31) que

deveria visar à emancipação do aluno, desenvolver suas habilidades e

potencialidades, de maneira a superar a alienação a qual ele é submetido por meio

da sociedade, meios de comunicação, tecnologia, e outros.

Portanto, as relações estabelecidas nas escolas acabam sendo atravessadas

por acontecimentos políticos que ocorrem fora de seus muros, mas influenciam

diretamente o seu funcionamento como, por exemplo, a instituição de classes de

aceleração, política de inclusão, entre outras, que vem de cima para baixo, sem

muitas explicações sobre como a escola deve por em prática as novas normas, ou

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quais ações pedagógicas devem ser tomadas para que sejam colhidos frutos

positivos de uma política educacional que, em muitos casos, desconhece a realidade

escolar, mas almeja por resultados e rapidamente (SOUZA, 2007).

Além das questões econômicas, devemos considerar a falta de continuidade

que existe nas políticas educacionais. A cada nova eleição, são feitas modificações

nas escolas, em suas direções, desconsiderando o que foi realizado anteriormente e

propondo o de sempre para escola que passa, segundo Silva e Barroco (2015, p.

32):

Assumindo excessiva e descontínua cor partidária, movendo-se e metamorfoseando-se a cada período de mandato, dependendo da esfera a qual se atrelam (municipal, estadual, federal). Elas deixam de ser espaço e meio para se regular a vida societária negociada pela coletividade, para ser meio de manutenção de poderes instituídos, sem que se resguarde minimamente um grau de autonomia no tocante aos seus objetivos gerais. A ruptura com o já realizado e o contínuo recomeçar são consequências previstas.

Diante de todas essas controvérsias, devemos compreender que existe uma

seletividade na política, que atualmente ela não busca “transformar, de fato, uma

dada região a partir de uma ação necessária e coletiva, corroborando com um

contexto no qual a sociedade civil está distante, ou desqualificadamente

representada” (Idem, p. 26, grifo dos autores).

Um exemplo destas políticas educacionais que chegam à escola sem aviso

são as que serão analisadas neste trabalho, voltadas para o Transtorno de Déficit de

Atenção/Hiperatividade (TDA-H). Como mencionado na introdução, a experiência da

discussão de uma legislação voltada para o TDA-H no âmbito escolar durante o

evento da UFAC apresentou outra questão sensível: quem deve atender esse aluno

com dificuldades escolares? No próprio seminário, recebemos a resposta: a

educação inclusiva, o atendimento educacional especializado (AEE).

Porém, na Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da

Educação Inclusiva (BRASIL, 2008, p. 6) e no decreto nº 7.611, de 17 de novembro

de 2011 (BRASIL, 2011, p. 1) que “dispõe sobre a educação especial, o atendimento

educacional especializado e dá outras providências”, ambos definem como usuários

do AEE os alunos com “deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas

habilidades/superdotação”. Os transtornos globais do desenvolvimento estão

relacionados com o transtorno do espectro autista (TEA), e caso nos sobre dúvidas

em relação ao entendimento sobre o termo deficiência desta Lei, na Lei Nº 13.146

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que Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da

Pessoa com Deficiência, 2015) fica determinado que:

Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Portanto, o TDA-H não está amparado por essa legislação. Segundo

Leonardo, Rossato e Constantino (2016, p. 47) “toda legislação e toda política

pública emanam de forças que se contrapõem, que se contradizem, de grupos que

se organizam e criam tensões e pressões”. Um exemplo disso são os grupos e/ou

associações como a Associação Brasileira de Déficit de Atenção – ABDA, Grupo de

Apoio ao TDA-H do Acre – GATAC, no Brasil, Children and Adults with Attention-

Deficit/Hyperactivity Disorder (CHADD), nos Estados Unidos, que se dizem

associações sem fins lucrativos que buscam informar e auxiliar pessoas com TDA-H.

Essas entidades pressionam pela elaboração de leis que abordem o transtorno no

ambiente escolar, como as que são objeto de estudo deste trabalho.

A pressão exercida por tais grupos para que a justiça solucione problemas de

escolarização das crianças é um processo de judicialização do ensino. Quer dizer

que buscam por meio do sistema judiciário solucionar um problema de ordem social,

escolar, que poderia e deveria ser resolvido dentro dos muros da escola.

Gostaria de ressaltar que esse fenômeno de judicialização do não aprender

de crianças que possuem algum diagnóstico, laudo ou dificuldade de aprendizagem

ocorre há algum tempo nos Estados Unidos da América (EUA) – país que influencia

o Brasil em diversos aspectos, como relatado anteriormente. Nos EUA, a educação

já é regida por duas legislações que englobam crianças com TDA-H, segundo

cartilha publicada no site da Children and Adults with Attention-Deficit/Hyperactivity

Disorder (CHADD8) intitulada “Direitos Educacionais para crianças com TDA-H em

Escolas Públicas”9. São elas: Seção 504 da Lei de Reabilitação de 1973 (chamada

8Ver também Direitos Educacionais. Disponível em: <http://www.chadd.org/Understanding-ADHD/For-Parents-Caregivers/Education/Educational-Rights.aspx>.

9As traduções são de responsabilidade da autora.

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Seção 504) e a Lei de Educação de Indivíduos com Deficiências (chamada IDEA) de

1990, garantindo atenção especial para esses alunos.

A CHADD10 em sua página explica que na Seção 504 as crianças com TDA-H

podem ser elegíveis, pois o transtorno limita substancialmente suas atividades, e no

texto original os elegíveis são pessoas que tem limitação substancial nas atividades

diárias, como falar, andar, respirar. Porém, em 2008, foram adicionadas mais

atividades diárias como: leitura, concentração, pensamento e comunicação. Na Lei

IDEA, que apresenta 13 categorias de deficiência, as crianças estariam no grupo

“outros comprometimentos de saúde” e/ou “desordens emocionais”; “dificuldade de

aprendizagem”. Em ambas, as crianças recebem uma educação diferenciada, além

de haver brechas que foram encontradas para que as crianças com TDA-H se

encaixem em seus critérios.

Segundo Caliman (2008), existe também a resolução 370, definiu o TDA-H

como um problema de saúde pública, no ano de 2004, e instituiu o dia 7 de

setembro como o dia do TDA-H. Na apresentação da resolução, o TDA-H é definido

como “desordem crônica neurobiologia”11, que pode atingir tanto crianças como

adultos, causando diversos danos em suas vidas pessoais e profissionais.

O Brasil pode caminhar para o mesmo destino, pois segundo o Decreto nº

6.571/2008, que dispõe sobre o AEE, apresenta as seguintes definições de seus

usuários:

Art. 1º Para a implementação do Decreto nº 6.571/2008, os sistemas de ensino devem matricular os alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas classes comuns do ensino regular e no Atendimento Educacional Especializado (AEE), ofertado em salas de recursos multifuncionais ou em centros de Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos. (BRASIL, 2009, p.1, grifo meu)

O público pode buscar uma brecha nesta definição para que crianças com

TDA-H sejam incluídas na educação especial por apresentarem um transtorno, mas

com base no CID 10, os transtornos globais do desenvolvimento englobam: autismo

infantil ou atípico, síndrome de Asperger ou de Rett, outro transtorno desintegrativo

da infância, transtorno com hipercinesia associada a retardo mental e a

10

Ver mais em: <http://www.chadd.org/Understanding-ADHD/ForParentsCaregivers/Education/Section-504.aspx>.

11

Ver mais em: <https://www.congress.gov/bill/108th-congress/senate-resolution/370/text>.

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movimentos estereotipados e outros TGD não especificados do desenvolvimento.

Mas as crianças com TDA-H não possuem a deficiência intelectual que segundo o

Compêndio de Psiquiatria se caracteriza “por inteligência abaixo da média,

significativa, e comprometimento no funcionamento adaptativo” (SADOCK;

SADOCK; RUIZ, 2017, p. 291), não sendo, portanto, público-alvo do AEE.

Voltando à realidade norte-americana, por influenciar a realidade brasileira, na

administração de Barack Obama, em 2001, foi apresentado o Ato “Nenhuma criança

deixada para trás” (No Child Left Behind – NCLB – Act). Segundo Fulton, Sheffler e

Hinshow (2015) esse Ato exige que as escolas apresentem números positivos de

desempenho de seus alunos, assim, ganham incentivos e prêmios, o que pode

causar um crescimento no número de diagnósticos, pois justifica o atraso e

dificuldade de aprendizagem dos alunos.

Entre as crianças de baixa renda, diagnósticos de TDAH podem ser apropriados para compensar falta de recursos escolares, incluindo turmas maiores e poucos serviços de saúde mental. No entanto, as preocupações devem ser de que alguns desses diagnósticos não foram baseados em avaliações cuidadosas, dadas as limitações das crianças de baixa renda ao acesso a especialistas (Idem, 1079).

Essa situação das crianças de baixa renda como alvos das ações de políticas

escolares, podendo prejudicar seu desempenho, ao invés de auxiliar, nos remete ao

livro Preconceito no Cotidiano Escolar (COLLARES; MOYSÉS, 1996), no qual as

autoras desenvolveram uma pesquisa que tinha “como objetivo o estudo das

opiniões dos diretores e professores sobre as causas do mau rendimento escolar”

(p. 30). As falas das diretoras e professoras mostraram que no dia a dia escolar

existe preconceito em relação à cor e ao status socioeconômico dos alunos,

utilizando palavras como “muito carente”, “tem convulsão”, “tem mancha no cérebro”,

“família louca” (p. 116), “é todo tortinho”, “criança com problemas de parto” (p. 117),

“é aquele tipo sujinha”, “ela é tapada” (p. 118) e a crença de que doenças

atrapalham a aprendizagem.

As autoras Collares e Moysés (1996) chamam de “preconceitos travestidos de

ciência” (p. 107). Concluem que, segundo os funcionários da escola, “no mundo da

escola brasileira só existem problemas nas crianças e na família. Afastados esses, o

que pensar?” (p. 139). A resposta é a fala da entrevista 23: “Se não tem doença

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nenhuma, problema nenhum em casa, então é a índole dela” (p. 139). As autoras

fazem um alerta:

É importante ressaltar que todo esse sistema de preconceitos encobre um promissor mercado de trabalho para várias profissões, com a proliferação de clínicas para tratamento de “distúrbios” e de “dificuldades de aprendizagem”. Porém, há um interesse econômico muito maior, o das indústrias farmacêuticas. Existem remédios comercialmente disponíveis cuja ação jamais foi comprovada. Apenas se comprovam efeitos colaterais, prejudiciais. (Idem, p. 108, grifo das autoras).

Essa questão da medicação de criança sem necessidade não é exclusividade

do Brasil. Nos Estados Unidos da América, esse problema também se faz presente,

o que nos leva a outra ação política mencionada pelos autores Fulton, Sheffler e

Hinshow (2015) é a sanção das leis de medicação psicotrópica, em 14 estados

americanos, entre os anos de 2001 a 2009, devido ao grande número de

diagnósticos dados as crianças e a influência da escola nesse processo:

Direcionam os conselhos de escolas públicas a adotarem políticas para proibir os funcionários da escola de praticar uma ou mais das seguintes ações: recomendar que uma criança tome uma medicação psicotrópica, exigir que uma criança tome um medicamento psicotrópico como uma condição de inscrição, ou usar a recusa dos pais em medicar a criança como base única para uma acusação de negligência (p. 1075).

O contraponto da legislação medicalizante existe, pois o problema é atual e

de saúde pública. Os autores trazem em seu trabalho a seguinte conclusão:

As reformas de incentivo da NCLB foram associadas a mais diagnósticos de TDAH entre os grupos de criança de baixa renda de escolas públicas, consistente com o aumento das pressões da NCLB, exigindo um progresso anual adequado em direção à proficiência acadêmica para este subgrupo. Em contraste, leis de medicação psicotrópica que proíbem escolas públicas de recomendar ou exigir o uso de medicamentos foram associadas a menos diagnósticos de TDAH, já que essas proibições podem indiretamente reduzir os diagnósticos. Pesquisas futuras devem investigar se as crianças mais afetadas por essas políticas recebem diagnósticos apropriados ou estão sendo diagnosticadas em excesso por motivação da NCLB ou negligenciadas por causa de leis de medicação psicotrópica (Idem, 1081).

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O Brasil segue o mesmo caminho. Segundo Temporão (2013), a

judicialização do ensino leva à medicalização, esse desejo de que algo seja feito por

crianças com dificuldades de aprendizagem a qualquer preço deveria nos servir

como um alerta.

[...] um poder dominante pode se legitimar através da promoção de crenças e valores, naturalizando e universalizando tais crenças, de modo a torna-las auto evidentes e aparentemente inevitáveis. E ao mesmo tempo denegrindo ideais que possam desafiá-la, excluindo formas rivais de pensamento e obscurecendo a realidade social de forma conveniente para si. [...] o mito é construído pela eliminação da qualidade histórica das coisas. No mito as coisas perdem a lembrança de sua produção. A função do mito é esvaziar o real. O mito é uma fala despolitizada (Idem, p. 77).

O preocupante é o discurso destas instituições, GATAC, ABDA, CHAAD. A

política educacional, seja pautada em uma crença medicalizante da vida, faz esse

trabalho sem escutar outros especialistas que não coadunam com essa visão

patologizante da não aprendizagem. Os que estão inseridos no debate apoiam a

judicialização do não aprender, com uma visão biológica do desenvolvimento; falta

abordar o tema de maneira diversa. Inclusive, piadas são feitas a respeito dos que

apresentam novas perspectivas para o tema, com o objetivo de eliminar falas

divergentes, “obscurecendo a realidade social de forma conveniente para si” (Idem,

p. 77), com uma compreensão que o dia a dia escolar está recheado de

preconceitos e juízos de valor, tirando do sistema sua responsabilidade que de

acordo com análise de Collares e Moysés (1996),

A mesma corrente filosófica que sustenta essa visão de mundo – o positivismo – é a que permeia a sociedade burguesa, principalmente em termos de cotidiano; não há conflitos, então, e tudo é rapidamente assimilado e transformado em senso comum. (Idem, p. 28, grifo das autoras)

Essa é a corrente utilizada na fundamentação de muitas pesquisas que tratam

sobre o TDA-H, que é foco desta pesquisa, como apresentado no trabalho de Leite

(2015), Leite e Rebello (2014) e Leite (2010). Falta, portanto, que os grupos sociais

que buscam intervenção do Estado na questão do TDA-H e dos políticos que irão

pensar nas leis o contato com um olhar que considera o desenvolvimento cultural

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das crianças, como faz a teoria escolhida para realização da análise deste trabalho,

a Psicologia Histórico-Cultural que:

[...] entende o processo educativo como principal mediador entre a história dos instrumentos e signos desenvolvidos e aperfeiçoados pelo homem em sua totalidade histórico-social, podendo a criança somente humanizar-se na medida em que tem as condições de se apropriar do já adquirido, e ainda, que esta atividade de humanização não se dá de modo espontâneo, natural, ou biologicamente maturacionista, muito menos em um campo “neutro”, mas numa sociedade de classes, no caso da burguesa, com tudo que isso possa implicar (SILVA; BARROCO, 2015, p. 29).

Para conhecer melhor o TDA- H, apresentarei duas abordagens teóricas a

seu respeito nas próximas seções.

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3. TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO/HIPERATIVIDADE

Esta seção será divida em duas subseções. Na primeira subseção, será

apresentada a visão mais difundida a respeito do Transtorno de Déficit de

Atenção/Hiperatividade, suas características, seu diagnóstico, possíveis causas e

tratamento, apoiadas em um ponto de vista biologizante dos comportamentos. Ao

final, analisarei criticamente e levantarei questionamentos a respeito destes

conceitos.

Na segunda subseção, apresento o mesmo transtorno, porém na perspectiva

da Psicologia Histórico-Cultural, com destaque para o desenvolvimento da atenção

voluntária e o fenômeno da medicalização no contexto escolar.

3.1 CONCEPÇÃO HEGEMÔNICA E BIOLOGIZANTE DO TDA-H

Nesta subseção, o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade será

apresentado a partir de sua origem médica, mostrando a trajetória de sua criação, o

seu diagnóstico e tratamento, bem como, questionamentos sobre essa concepção

hegemônica sobre o TDA-H.

Para iniciar, gostaria de justificar o nome da subseção, na maioria das

publicações científicas disponíveis atualmente temos a apresentação de uma visão

biológica do TDA-H, com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos

Mentais (DSM) como principal fonte de informação dos profissionais que realizam os

diagnósticos. Leite (2010; 2015) em suas pesquisas de levantamento da produção

cientifica nacional e internacional sobre o tema, de 1999-2008 e posteriormente de

1994-2012 confirmou essa realidade. Nos dados levantados no período de 1999-

2008, identificou que:

[...] Dos artigos encontrados nas publicações de periódicos, tanto da área de Psicologia quanto de Medicina, a respeito do TDAH, todos traziam um enfoque organicista do Transtorno, ou seja, pautam-se na ideia de que há alguma disfunção de ordem biológica que implica na ocorrência do TDAH. Apresentam o DSM-IV como referencial para o diagnóstico e enfocam a respeito dos aspectos neuropsíquicos do transtorno. (LEITE, 2010, p. 25)

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Na pesquisa realizada cinco anos após a publicação dos dados acima, no

intervalo de 1994, ano de publicação do DSM-IV, até 2012, com base em artigos da

Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), das áreas de Psicologia e Medicina, a autora

verificou que:

Ainda sobre os artigos alocados na categoria TDAH, vale destacar os dados encontrados em algumas das categorias. Dentre os que debatiam a respeito da etiologia do transtorno, a grande maioria (30 artigos) trazia estudos que indicavam fatores genéticos como principais responsáveis pelas causas do transtorno. Dentre as características do TDAH, o que mais se abordou (44 artigos) foram os aspectos neurológicos – atividade cerebral, diferenças entre hemisférios, volume cerebral, etc. – dos sujeitos diagnosticados com TDAH. Em alguns dos artigos que discorriam sobre os aspectos neurológicos, foi possível encontrar afirmações sobre a etiologia genética do transtorno. A respeito da categoria tratamento, 30 artigos faziam referência explícita ao uso de medicamentos como forma de tratamento. (LEITE, 2015, p. 27)

O que também fortalece este cenário é a própria história da criação do TDA-

H, segundo Caliman (2010) e Leite (2010) o principal autor sobre o tema é Russell

A. Barkley12: “Ele é quem melhor representa a direção neurológica cognitiva da

interpretação clínica e histórica do transtorno” (CALIMAN, 2010, p.51); “este autor

parece ser uma referência nos estudos hegemônicos sobre o transtorno” (LEITE,

2010, p.26). Barkley, em 2002, publicou o Manual para Diagnóstico e Tratamento do

Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, fazendo parte do grupo de autores

estrangeiros que dissemina esta visão biologizante do TDA-H.

Além dele, Leite (2010, p. 27) apresenta como fonte de informação Luis

Augusto Rohde13, “autor brasileiro também muito consultado, que, inclusive, realizou

publicações com autores norte-americanos” sobre o TDA-H. Portanto, temos muitos

trabalhos disponíveis em periódicos nacionais e internacionais, como verificou Leite

(2010; 2015), em sites, como o da Associação Brasileira do Déficit de Atenção

12

O autor possui um site (http://www.russellbarkley.org/) onde se apresenta como “dedicado à educação e pesquisa em TDA-H” com informações “baseadas na ciência”, atua como professor de psiquiatria e tem livros publicados sobre o tema.

13Luis Augusto Rohde também possui um site (http://larohde.com.br/), atualmente é professor de

psiquiatria. “Participou do grupo de trabalho para definição dos critérios diagnósticos de TDAH e

Transtornos Disruptivos da DSM-5 da Associação Americana de Psiquiatria. É Presidente da World

Federation of ADHD‖.

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(ABDA)14, que fornece informações, artigos e outros links para pesquisa sobre o

TDA-H. Porém, sua maioria realizados por médicos, com uma visão totalmente

orgânica sobre a desatenção e hiperatividade.

O TDAH foi constituído na economia biomédica da atenção, característica das últimas décadas do século XX. Ao mesmo tempo, ele pertence a um período que extrapola a criação de seu conceito diagnóstico e o vincula à história do sujeito cerebral. Sendo parte de um processo mais geral de somatização e cerebrização da identidade, ele pertence à história da constituição das biologias morais das vontades e da atenção. (CALIMAN, 2010, p. 59)

Portanto, o TDA-H possui uma história. Apresentarei, a seguir, uma descrição

breve do seu surgimento até os dias atuais para que possamos compreender esse

fenômeno da medicalização de comportamentos normais. Leite (2010) e Caliman

(2010) apontam os estudos de George Still como os primeiros sobre o tema, que

datam de 1902. Segundo Caliman (2010, p.49) a nomenclatura “criança TDAH”

apareceu na literatura médica na primeira metade do século XX.

O TDA-H durante sua construção foi conhecido por muitos nomes e à medida

que avançaram as “pesquisas” incorporou outros diagnósticos psiquiátricos em seu

bojo:

[...] foi batizada e rebatizada muitas vezes. Ela foi à criança com defeito no controle moral, a portadora de uma deficiência mental leve ou branda, foi afetada pela encefalite letárgica, chamaram-na simplesmente de hiperativa ou de hipercinética, seu cérebro foi visto como moderadamente disfuncional, ela foi à criança com déficit de atenção e, enfim, a portadora do transtorno do déficit de atenção/hiperatividade. Desde os últimos 20 anos do século XX, ela é marcada por um defeito inibitório que afeta o desenvolvimento das funções executivas cerebrais. (CALIMAN, 2010, p. 49, grifo meu)

A encefalite letárgica que é parte da história do TDA-H, segundo Leite (2010)

e Caliman (2010), ocorreu no período de 1917 e 1918 como uma epidemia nos

Estados Unidos da América (EUA), com crianças apresentando sequelas de

impulsividade, hiperatividade, sem comprometimento cognitivo, apenas alterações

comportamentais, possivelmente causadas por lesões cerebrais.

14

Disponível em: <http://tdah.org.br/>.

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Posteriormente, a teoria da lesão cerebral como causa de comportamentos

hiperativos é questionada, então passaram a chamá-la de lesão cerebral mínima.

Segundo Rohde e Halper (2004), essa nomenclatura perdurou até os anos 40, Leite

(2010) aponta que neste mesmo período surgem os estudos que indicam o uso de

medicamentos para tratar o comportamento hiperativo.

Segundo Caliman (2010), no ano de 1957, o TDA-H foi novamente rebatizado

como síndrome do impulso hipercinético. Já em 1960, passa a ser conhecida como

síndrome da criança hiperativa. Rohde e Halper (2004) e Leite (2010) afirmam que,

neste mesmo período, os questionamentos sobre a existência da lesão cerebral

continuam, então passam a classificar os comportamentos do TDA-H como uma

“disfunção cerebral mínima” não mais uma lesão.

A questão da lesão é totalmente ultrapassada nos anos 60, e a causa dos

comportamentos disfuncionais passa a ser decorrente de um déficit neurofisiológico.

No final dos anos 70, o diagnóstico deixa de centrar-se na hiperatividade e passa a

focar na desatenção ocorrendo nova ampliação do transtorno do déficit de atenção

que pode acontecer com ou sem o comportamento hiperativo (CALIMAN, 2010).

Segundo Leite (2010, p. 29), nos anos 80 “a hiperatividade tornou-se o

transtorno psiquiátrico infantil mais estudado nos Estados Unidos. A ênfase dos

estudos era desenvolver critérios diagnósticos específicos”. Nesse mesmo período,

temos a publicação do DSM-III, apresentando os critérios diagnósticos do TDA-H

com ou sem hiperatividade e a publicação da primeira Lei nos EUA que defendia

“que crianças com TDAH tenham o direito de frequentar classes especiais na

escola”.

Nos anos 90, avançam pesquisas que indicam que crianças com TDA-H

apresentam algum problema no funcionamento de seu cérebro localizado no lobo

frontal, ou que este seja menor comparando com os cérebros “normais”, até mesmo

diferença nos tamanhos dos lobos esquerdo e direito foram consideradas como

possíveis causas para o transtorno, ocorrendo a ampliação da divulgação para o

tratamento medicamentoso nesse período (LEITE, 2010).

Segundo Caliman (2008), no ano de 1994, com a publicação do Manual

Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) IV é quando o TDA-H é

definido como o conhecemos hoje:

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A compreensão dos mecanismos cerebrais e causais do transtorno tornou-se prioridade. Russell Barkley passou a ser uma das autoridades mais importantes do campo. Em suas mãos, a investigação genética, o estudo neuroquímico dos sistemas neurotransmissores, a análise do sistema inibitório cerebral e a investigação laboratorial animal foram sistematicamente integradas à pesquisa do TDAH. Nesta constelação de acontecimentos, o diagnóstico do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade, tal como é descrito pelo discurso neurobiológico atual, teve sua aparição oficial ao ser incluído no DSM IV, publicado em 1994. O TDAH foi legitimado, popularizado, universalizado e tornou-se motivo de polêmica na época, proclamada pelo governo americano como a “década do cérebro”. (CALIMAN, 2009, p. 138, grifo da autora)

A autora destaca ainda que nessa longa caminhada da definição do

transtorno, o grande problema era legitimar seu diagnóstico:

A existência do transtorno e a validade do diagnóstico dependiam da descoberta de suas bases biológicas e cerebrais e dos cálculos de seu potencial de risco. No discurso da legitimidade do transtorno, além da comprovação dos males causados pelo TDAH e de seu potencial de risco e, em certo sentido, mais importante do que eles, está o argumento sobre suas causas físicas. Trata-se não apenas de demonstrar que o transtorno “causa” danos ao sujeito, mas que ele, o transtorno, é “causado” por aspectos biológicos, genéticos e cerebrais. Tais suscetibilidades biológicas não são os únicos fatores influentes no desenvolvimento da patologia, mas são, sem dúvida, os mais importantes. [...] O argumento pode ser assim resumido: o diagnóstico do TDAH é real porque, em certa medida, é visível e biológico, e descreve uma condição maligna. (CALIMAN, 2008, p. 560, grifo da autora).

Esse percurso histórico pode ser compreendido por esta necessidade de

legitimação, que só é possível, segundo a visão médica psiquiátrica, se causas

biológicas e genéticas puderem ser comprovadas. Segundo Caliman (2008, p. 560),

“Foi também durante as décadas de 80 e 90 que a interpretação neurobiológica do

transtorno tornou-se amplamente aceita”.

Atualmente, as pesquisas estão voltadas para a hereditariedade do TDA-H

(LEITE, 2010). Hoogman et. al. (2017) realizaram uma publicação no The Lancet

onde afirmam ter encontrado áreas menores no cérebro dos participantes do estudo

com diagnóstico de TDA-H, ao compararem os exames de imagem de 1713

participantes com TDA-H com 1529 participantes do grupo controle, com média de

idade de 14 anos.

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O fato de o TDA-H ter mudado tantas vezes e englobado tantos transtornos

juntos levanta suspeitas entre os pesquisadores, que utilizam a trajetória da criação

do TDA-H para “denunciar a volatilidade de um transtorno que, em menos de um

século de vida, mudou de classificação mais de 10 vezes, e ridicularizam a pretensa

clareza e unificação do discurso neurológico” o TDA-H é uma fronteira “obscura

entre as desordens nervosas definidas e indefinidas, entre as disfunções da vida

normal e da patológica” (CALIMAN, 2010, p. 49):

[...] Como o TDAH, os diagnósticos guarda-chuva agrupados em sua história fizeram parte do processo através do qual a ciência médica iniciou seu discurso sobre a saúde mental de pessoas que não eram nem drasticamente mal desenvolvidas nem mentalmente deficientes. Elas eram mal adaptadas. Os diagnósticos incluídos na história do TDAH são aqueles que fortaleceram o processo de patologização dos indivíduos incapazes de satisfazer as expectativas morais,

políticas e econômicas da sociedade na qual viviam. (Idem, p. 50)

Podemos perceber que mesmo para os pesquisadores do TDA-H, durante a

sua história não estava óbvio, qual seria a causa dos comportamentos considerados

disfuncionais, nem como poderiam ser evitados, mas isso não impediu as pesquisas,

a medicação das crianças e a culpabilização das mesmas por suas dificuldades

escolares.

Na atualidade, segundo Rohde, Barbosa, Tramontina e Polanczyk (2000, p.

11) “o transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDA-H) é uma síndrome

psiquiátrica de alta prevalência em crianças e adolescentes”. Existe uma divergência

quanto a este dado, segundo Sadock, Sadock e Ruiz (2017), a incidência do

diagnóstico de TDA-H seria de 5 a 8% entre crianças na idade escolar, o que não

significaria uma alta prevalência. De acordo com o DSM-V (AMERICAN

PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014) a incidência do TDA-H seria de 5% nas

crianças e 2,5% nos adultos. Leite (2015) afirma que o TDA-H tem se tornado muito

comum no cotidiano escolar, principalmente na 1ª etapa escolar/1º ano escolar,

momento que têm ocorrido os diagnósticos, não nos esquecendo que nessa fase o

estudante está sendo alfabetizado, não sendo fácil aprender a ler e escrever,

conforme analisa Facci (2007), discussão essa que farei na subseção posterior.

Segundo a American Psychiatric Association (2014), a última versão do DSM

– DSM 5 – levou 12 anos para ser finalizada, oferece critérios mais flexíveis para

enquadrar os pacientes e traz também tratamentos e manejo para serem aplicados.

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O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade é apresentado na categoria

Transtornos do Neurodesenvolvimento, fora do grupo Transtorno Específico da

Aprendizagem, com as seguintes características:

O TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento definido por níveis prejudiciais de desatenção, desorganização e/ou hiperatividade-impulsividade. Desatenção e desorganização envolvem incapacidade de permanecer em uma tarefa, aparência de não ouvir e perda de materiais em níveis inconsistentes com a idade ou o nível de desenvolvimento. Hiperatividade-impulsividade implicam atividade excessiva, inquietação, incapacidade de permanecer sentado, intromissão em atividades de outros e incapacidade de aguardar - sintomas que são excessivos para a idade ou o nível de desenvolvimento. Na infância, o TDAH frequentemente se sobrepõe a transtornos em geral considerados "de externalização", tais como o transtorno de oposição desafiante e o transtorno da conduta. O TDAH costuma persistir na vida adulta, resultando em prejuízos no funcionamento social, acadêmico e profissional. (p. 32, grifo do autor)

Para aprofundamento do tema, passaremos para seu processo diagnóstico, é

relevante considerar que o diagnóstico é realizado por médicos, com tendência a

uma biologização do comportamento das crianças, que acabam por culpa-las pela

sua desatenção, sem muitas vezes questionar o funcionamento do seu cotidiano

escolar, a metodologia desenvolvida em sala de aula, ou mesmo se em casa esse

aluno tem uma rotina, organização, entre outras atitudes que poderiam auxiliar na

sua aprendizagem e desenvolvimento.

Uma das ferramentas utilizadas para classificar as doenças entre os médicos

é o Código Internacional de Doenças (CID), que segue na sua décima edição. O

início deste trabalho data de 1840, nos Estados Unidos, onde foi feito um censo para

registrar a frequência das doenças mentais. Em 1880, foram divididas sete

categorias de classificação, o objetivo do estudo era puramente estatístico. No

século XX, o exército e a associação de veteranos de guerra produziram a mais

completa categorização de distúrbios mentais e, em 1948 a Organização Mundial de

Saúde fez uma seção só para Transtornos Mentais no CID-6 (ARAUJO; LOTUFO

NETO, 2014).

Além do CID, que classifica as doenças, o Manual Diagnóstico e Estatístico

de Transtornos Mentais (DSM) também está disponível para auxiliar. Ele é publicado

pela American Psychiatric Association (APA), a sua primeira publicação ocorreu em

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1953. Atualmente, considerado o documento com as nomenclaturas mais atuais dos

transtornos, apresenta um modelo descritivo, que apresenta características de cada

uma das patologias, auxiliando a atuação clínica dos médicos, o manual

compreende o diagnóstico de uma perspectiva behaviorista, baseada em

observação e inferências (ARAUJO; LOTUFO NETO, 2014).

Caliman (2009) afirma que o DSM foi uma tentativa de um grupo de

pesquisadores para validar o saber psiquiátrico com o objetivo de “construir um

sistema diagnóstico baseado em evidências científicas neutras, compatível com

várias teorias” (p. 136). Porém, a autora afirma que “havia uma direção a ser

seguida, uma clínica a ser reafirmada e um método a ser priorizado” (idem).

Podemos compreender, então, que não existe uma neutralidade, a busca por

confirmar a existência ou não de patologias leva as transformações que o manual

sofre a cada edição, ampliando ou reduzindo as características diagnósticas.

Outras ferramentas para o diagnóstico listadas no DSM-V (SADOCK;

SADOCK; RUIZ, 2017) são colher a história médica e pediátrica do paciente, aplicar

o Swanson, Nolan e Pelham-IV (SNAP-IV) (MIRANDA et. al. 2011).

Segundo Miranda et. al. (2011, p. 2), o SNAP-IV é uma ferramenta aceita

entre os médicos para embasar o diagnóstico de TDA-H, construído a partir dos

sintomas listados no Manual de Diagnóstico e Estatística - IV edição (DSM-IV) “com

a tradução validada pelo Grupo de Estudos do Déficit de

Atenção da UFRJ - GEDA e pelo Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência

da UFRGS”.

Essa ferramenta é questionada por Moysés e Collares (2013) e Moysés

(2010) por não apresentar adaptação das perguntas à idade de quem as responde,

com perguntas frágeis, como por exemplo, “Responde perguntas de forma

precipitada antes de serem terminadas?”. Depende... Se for o primeiro aluno da

classe, ele é muito inteligente, se é o que dá problema, ele é hiperativo”, ou “Tem

dificuldade em brincar ou envolver-se em atividades de lazer de forma calma?”

(MOYSÉS, 2010, p. 20). Essas perguntas comprovam como esse questionário é

uma ferramenta de rastreio delicada, que deveria ser revista e questionada.

De acordo com Sapia (2013) e Leite (2015), o diagnóstico de TDA-H vem

crescendo, pois é uma saída mais fácil para “solucionar” os problemas de

desatenção, inquietação e aprendizagem que ocorrem na escola ou em casa. Na

pesquisa de Sapia (2013, p. 79), durante entrevista com os médicos neurologistas

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responsáveis por realizarem os diagnósticos em Rondônia, foi relatado que eles não

receberam embasamento teórico sobre as dificuldades de aprendizagem durante

sua graduação e como “os encaminhamentos por parte da escola, de alguma

maneira influenciam os neurologistas” não hesitando em receitar Ritalina® para seus

pacientes-estudantes.

Além de sofrerem influência por parte do encaminhamento escolar, diante da

sua formação positivista, com uma concepção de homem dual, saudável/doente,

normal/anormal, o diagnóstico se embasa também em exames de imagem e

questões genéticas, na busca de problemas funcionais no cérebro, de acordo com

as expectativas amparadas em concepções maturacionistas do desenvolvimento

(LEITE, 2015). Assim, não consideram as condições concretas do processo de

ensino e aprendizagem e a constituição das relações promotoras de histórias de

insucesso escolar.

Uma vez encaminhado para o médico, fechado o diagnóstico de TDA-H,

inicia-se o tratamento do TDA-H. Segundo Sadock, Sadock e Ruiz (2017, p. 1176),

[...] A terapia farmacológica é considerada o tratamento de primeira linha para TDAH. Os estimulantes do sistema nervoso central são a primeira escolha de agentes levando-se em conta que têm maior eficácia, e os efeitos colaterais geralmente são toleráveis [...]

Portanto, a primeira escolha é o medicamento, como já mencionado

anteriormente, a criança é avaliada descolada de seu contexto, por médicos, com

apoio da escola, por meio de relatórios que destacam a desatenção e o

comportamento agitado do estudante durante as aulas, sem abordar como acontece

o processo de ensino e de aprendizagem.

As drogas aprovadas pela Food and Drugs Administration - agência federal do

Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos da América - são

bem conhecidas para a terapia medicamentosa do TDA-H, os exemplos mais

comuns são: Concerta®; Ritalina®, ambos cloridrato de metilfenidato (SADOCK;

SADOCK; RUIZ, 2017); Venvanse®, dimesilato de lisdexanfetamina (AMERICAN

PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). Essas medicações podem causar efeitos

colaterais nas crianças, como cefaleia, insônia, perda de apetite e efeito rebote,

esses são os mais comuns (SADOCK; SADOCK; RUIZ, 2017; AMERICAN

PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). Apesar dessas possibilidades, o tratamento

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medicamentoso ainda é a primeira opção dos médicos e desejado pelos

educadores. Em alguns casos desses efeitos colaterais, são utilizados outros

medicamentos para abrandá-los. Sadock, Sadock e Ruiz (2017, p. 1179)

apresentam um exemplo dessa situação:

[...] Uma variedade de estratégias foi sugerida para crianças e/ou adolescentes com TDAH que respondem favoravelmente ao metilfenidato, para os quais a insônia se tornou um problema significativo. As estratégias clínicas para o tratamento de insônia incluem o uso de difenidramina (25 a 75 mg), baixas doses de trazodona (25 a 50 mg) ou adição de um agente adrenérgico como a guanfacina. Em alguns casos, a insônia pode atenuar de maneira espontânea depois de alguns meses de tratamento.

Consequentemente, teremos estudantes “mais tranquilos” nas escolas,

chegando inclusive a dormirem durante as aulas, mas sem atrapalhar, que é isso

que a escola deseja. Outro problema pouco discutido é a respeito do mecanismo de

ação do Metilfenidato que, de acordo com Moysés (2010, p. 21), é:

[...] Exatamente o mesmo que o da anfetamina e cocaína: aumenta a concentração de dopamina nas sinapses. Quando aumenta a concentração de dopamina, que, lembrem-se, é um dos neurotransmissores do prazer, a sensibilidade a todos os prazeres da vida que liberam um pouquinho de dopamina diminui bastante e, por isso, vai-se em busca de mais e mais estímulos que deem o prazer que só a droga é capaz de fazer. Discute-se qual é a consequência para a anatomia do sistema nervoso central em crianças com esse aumento absurdo de dopamina. Existem dados de que, quando se retira o Metilfenidato em adultos, aumenta a incidência de drogadição às cocaínas.

Mesmo com essa possibilidade de aumentar a drogadiação entre crianças

que utilizem o medicamento, segundo o Boletim de Farmacoepidemiologia do

Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (2012), a

caracterização do consumo do Metilfenitado no Brasil, entre 2009 a 2011, nos

mostra que o consumo do medicamento só cresce. Rondônia foi o estado com maior

consumo; e menor no Acre e Amazonas.

Segundo o Portal de Saúde do SUS, o Brasil é o segundo consumidor

mundial de Ritalina®, no site da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA,

2013) temos a informação do aumento do consumo em “75% em crianças com idade

de 6 a 16 anos”. O curioso é que a procura pelo medicamento cresce nos períodos

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letivos e decresce nas férias. Podemos levantar a hipótese de que as crianças só

apresentam TDA-H na escola? Pois, na atualidade, elas passam boa parte do tempo

em frente a televisores, tablets, smartphones, com muita concentração.

É interessante que os sintomas desaparecem fora do ambiente escolar,

descumprindo o que DSM-V (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014,

p.61), afirma sobre os sintomas de TDA-H devem:

[...] estar presentes em mais de um ambiente (p. ex., em casa e na escola, no trabalho). A confirmação de sintomas substanciais em vários ambientes não costuma ser feita com precisão sem uma consulta a informantes que tenham visto o indivíduo em tais ambientes. É comum os sintomas variarem conforme o contexto em um determinado ambiente. Sinais do transtorno podem ser mínimos ou ausentes quando o indivíduo está recebendo recompensas frequentes por comportamento apropriado, está sob supervisão, está em uma situação nova, está envolvido em atividades especialmente interessantes, recebe estímulos externos consistentes (p. ex., através de telas eletrônicas) ou está interagindo em situações individualizadas (p. ex., em um consultório). (grifo meu)

A primeira questão a ser levantada é que os ambientes nos quais a criança

com TDA-H frequenta, na maior parte do tempo, são sua casa e a escola. Na escola,

o adulto indicado para auxiliar nesse processo diagnóstico será a professora, no

entanto, pesquisas com professoras de Coutinho et. at. (2008), Reis e Camargo,

(2008), Seno (2010), Landskron e Sperb (2008) analisam que durante a sua

formação elas não tiveram contato com esse transtorno, logo não sabem quais

características comportamentais a criança deveria apresentar e muito menos como

atuar para que o aluno aprenda.

Além disso, voltamos às pesquisas de Collares e Moysés (1994, 1996), Patto

(2015) que mostram como o fracasso escolar é produzido e reproduzido dentro das

escolas, como mitos e crenças sobre a família do aluno e de sua situação

socioeconômica como determinantes para a promoção de incapacidades para a

aprendizagem do conteúdo escolar por parte deste aluno. Com esse cenário antigo,

que é tão atual, como a professora pode ser a fonte de informação para realização

do diagnóstico?

A segunda questão é sobre a etiologia do transtorno. Segundo Leite (2010),

atualmente, as pesquisas estão voltadas para descobrir a característica hereditária

do TDA-H, e temos definições que usam as palavras “hereditária” e “genética” para

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se referir ao transtorno, temos exemplos a seguir, “É um transtorno neurobiológico,

de causas genéticas, [...] sua manifestação tende a diminuir com a idade e com o

uso de medicação” (SENO, 2010, p. 334), “histórias familiares, genótipos e estudos

de imagens neurológicas indicam evidencias que dão suporte a uma base biológica

para o transtorno” (SADOCK; SADOCK; RUIZ, 2017, p.1170),

O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por sintomas de desatenção, inquietude e impulsividade. Ele é chamado às vezes de DDA (Distúrbio do Déficit de Atenção). Em inglês, também é chamado de ADD, ADHD ou de AD/HD. (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DO DÉFICIT DE ATENÇÃO – ABDA - http://tdah.org.br/)

Porém, essas afirmações podem ser contestadas, porque no próprio DSM-V

(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 61) afirma-se que “Não há

marcador biológico que seja diagnóstico de TDAH”, mas mesmo sem certeza se o

transtorno é genético, a informação é difundida na comunidade, através de

pesquisas que se apoiam nas definições apresentadas:

Ainda não está claro quais são as causas diretas e imediatas do TDA/H, apesar dos avanços científicos e tecnológicos no domínio das técnicas de imagens neurológicas e genéticas. Existe a promessa de esclarecer esta questão num futuro próximo. A maioria dos pesquisadores suspeita que a causa do TDA/H é genética ou biológica, apesar de reconhecer que o ambiente da criança, ajuda a determinar seus comportamentos específicos. (MIRANDA ET. AT. 2011, p. 5, grifo meu)

A causa para o possível transtorno não é conhecida, está no âmbito da

suspeita. Os exames de imagens mencionados como fonte de informação para

fechamento do diagnóstico também são questionáveis:

Como grupo, na comparação com pares, crianças com TDAH apresentam eletrencefalogramas com aumento de ondas lentas, volume encefálico total reduzido na ressonância magnética e, possivelmente, atraso na maturação cortical no sentido póstero-anterior, embora esses achados não sejam diagnósticos. (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 61)

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O DSM-V afirma que os achados em imagem não são determinantes para o

diagnóstico, que seria essencialmente clínico. Moysés (2010) explica que o objetivo

dos exames de imagem é captar as células em funcionamento, portanto, durante o

exame é preciso ativar a área avaliada. No entanto, se a criança a ser examinada

possui dificuldades de aprendizagem causadas por um transtorno, como por

exemplo, na área da leitura, e durante o exame ela deve ler algo, já podemos

imaginar que o resultado confirmará o que a escola, a família e o próprio aluno já

sabem/acreditam, que ela não é boa leitora. Logo, a imagem não confirma a

existência do transtorno:

[...] o exame detecta a causa de não saber ler ou detecta a consequência no cérebro de não saber ler? Porque, se eu não sei ler, quando me dão uma tarefa que usa a linguagem escrita, eu olho um pouco, e depois saudavelmente desligo e minha atenção diminui; aí, a atividade em minha área cerebral responsável pela leitura e escrita diminui, o que é muito saudável, não é? Porque seria um processo obsessivo-compulsivo ficar olhando aquilo lá sem saber decodificar... (MOYSÉS, 2010, p. 18)

Diante de todos estes aspectos apresentados nesta subseção, acredito ser

possível afirmar que o TDA-H possui uma história, etiologia, diagnóstico, que são

frágeis, nos levando à próxima subseção, na qual o TDA-H será apresentado por

meio da leitura da Psicologia Histórico-Cultural (PHC), considerando o

desenvolvimento da atenção segundo trabalhos de Vigotski e da perspectiva

materialista histórico dialética do desenvolvimento humano.

3.2 PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL E O DESENVOLVIMENTO

DA ATENÇÃO

A escolha de estudar o Transtorno de Déficit de Atenção-Hiperatividade na

perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural (PHC) é em função dos pressupostos

teórico-metodológicos desta abordagem, que compreendem o desenvolvimento das

funções psicológicas superiores – como a atenção voluntária – considerando “suas

raízes sociais”, “constituindo-se como traço imanente do desenvolvimento cultural da

humanidade” (MARTINS, 2011, p. 112). Entender o TDA-H por meio desta teoria nos

leva a repensar a atenção voluntária e abandonar a crença de que ela seria algo

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próprio do ser humano, de sua natureza biológica e maturacional, como apresentado

na subseção anterior.

Nessa subseção, buscarei apresentar o contexto em que nasce a PHC, como

compreende o homem, seu desenvolvimento, a constituição do psiquismo e o

desenvolvimento da atenção voluntária como uma função psicológica superior.

3.2.1 Breve histórico da Psicologia Histórico-Cultural (PHC)

Segundo Bock (2015, p. 45), a Psicologia Histórico-Cultural rompe com o

positivismo, “abandonando a pretensa neutralidade [...], a enganosa objetividade do

cientista, [...] criando a possibilidade de uma ciência crítica à ideologia até então

produzida”. Para conhecer essa teoria, é importante ter contato com o momento

histórico em que os principais escritos foram elaborados, pois os conhecimentos

sempre estão relacionados com a política e o momento histórico em que os

pesquisadores se encontram inseridos.

Os principais pensadores da Psicologia Histórico-Cultural são Lev

Semenovitch Vigotski15, fundador, e seus primeiros colaboradores, Alexis

Nikolaevich Leontiev e Alexander Romanovich Luria (LEONTIEV, 1999). Segundo

Shuare (1990), Vigotski foi o fundador da psicologia marxista, um pesquisador muito

à frente de seu tempo. Morreu jovem, com 38 anos, mas foi extremamente

produtivo: com menos de dez anos de atuação e pesquisa na psicologia, “(...)

escreveu por volta de 180 trabalhos, 135 foram publicados” (LEONTIEV, 1999 p.

425).

Os fundamentos filosóficos e metodológicos da Psicologia Histórico-Cultural

são o materialismo histórico dialético, partindo de pensamentos marxistas, apresenta

uma nova concepção de homem, de desenvolvimento humano, considerando a

dimensão histórica e social no desenvolvimento do psiquismo (FRANCO, TULESKI,

EIDT, 2016; TOMIO, FACCI, 2009).

Os escritos desta teoria datam do período da revolução Russa, que é o

momento histórico de instalação do socialismo no país, um novo modelo econômico,

15

O nome de Vigotski é encontrado em textos que fazem referência a ele com grafias diferentes.

Segundo Duarte (2007), podemos encontrar: Vigotski, Vygotsky, Vigotskii, Vygotski, Vigotsky, optei por usar a grafia Vigotski por ser a escrita que prevaleceu nos textos estudados para a elaboração desta seção, porém, será preservado em citações e referências bibliográficas a grafia original adotada por cada autor.

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que prioriza a educação e demanda uma produção científica que harmonize com o

novo regime, precisando de uma psicologia que supere a visão de homem

apresentada pelo capitalismo e compreenda esse novo homem social (TUNES,

PRESTES, 2009; PRESTES, 2010).

O autor que pensa esse novo homem é Vigotski, como afirma Shuare (1990),

ele utiliza o método de Marx, o materialismo histórico dialético, em seus estudos

provocando uma reviravolta na ciência psicológica. Antes dele, outros autores

tentaram utilizar o método e conceitos de Marx nas pesquisas desenvolvidas nos

laboratórios de psicologia, mas sem sucesso.

O desejo de Vygotski, [...] era abordar o estudo da mente utilizando-se do método de Marx, opondo-se frontalmente à utilização de citações e junções ecléticas entre os clássicos marxistas e as teorias psicológicas ocidentais, como tentativa de construção de uma psicologia marxista (TULESKI, 2008, p. 36).

Vigotski divide a psicologia em velha e nova psicologia. A velha psicologia

seria idealista, que entende que as ideias e o pensar criam a realidade; a nova

psicologia seria materialista, experimental, porém ainda sem considerar as questões

históricas e dialéticas na formação do homem (LEONTIEV, 1999; TULESKI, 2008).

Para ele, essas correntes tendiam a compreender os fenômenos psicológicos

de maneira reducionista, incapazes de descrever a consciência humana. Seu

objetivo não era criticar outros teóricos, mas sim fazer a síntese, a superação, a

partir dos estudos anteriores aos seus, que explicavam os fenômenos até certo

ponto. Ele pretendia romper esses limites e acreditava que só seria possível

utilizando um novo método de pesquisa (SHUARE, 1990; LEONTIEV, 1999;

TULESKI, 2008).

Segundo Gonçalves (2015, p. 62), a dialética como pensamento e método,

utilizada na psicologia inaugurada por Vigotski, seria justamente uma crítica à “[...]

separação entre objetividade e subjetividade. E, ao mesmo tempo, da consideração

da historicidade como característica fundamental de todas as coisas.” O aspecto

marxista na metodologia “representa uma alternativa à visão dominante objetivista,

que reduzia ou excluía a subjetividade do processo social ou a apresentava como

uma essência do sujeito individual” (GONÇALVES, 2015, p. 63).

Podemos destacar que o tema central das pesquisas de Vigotski eram:

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O estudo da história da formação das funções psíquicas superiores na ontogênese e da filogênese como formações construídas sobre a base de funções psíquicas elementares, que atuam de forma mediada através de instrumentos psicológicos, converteu-se no tema central das investigações de Vigotsky e seus colaboradores. (LEONTIEV, 1999, p. 449)

Portanto, essa teoria não congrega com linhas que se apoiam apenas no

desenvolvimento biológico, nas etapas maturacionais para explicar comportamentos.

Para compreender o homem e seu desenvolvimento, considera a cultura, a história

da humanidade, as suas interações sociais: “isso implica uma concepção de sujeito

alternativa a visão liberal [...] Ao sujeito individual, racional e natural do liberalismo

opõe-se o sujeito social, ativo e histórico do materialismo histórico dialético”. Como

postula Gonçalves (2015, p. 56), nossos aprendizados e comportamentos dependem

das vivências compartilhadas com pares superiores mais preparados.

Vale salientar que existem dois pontos que tornam as pesquisas de Vigotski

relevantes na atualidade: o primeiro é o uso de fatos, metodologias e hipóteses

concretas, que se confirmaram por meio de experimentos, também em estudos

posteriores realizados por outros pesquisadores. O segundo é o teórico-

metodológico, que foi desenvolvido na sua época, mas é perfeitamente aplicado na

lógica do mundo moderno. Diante disso, o seu trabalho não pode ser considerado

como finalizado (LEONTIEV, 1999).

Apesar de todos estes pontos que comprovam como a PHC foi pioneira em

sua época, apresentando uma teoria inovadora para compreender o homem, o

mundo e seu desenvolvimento, não foi simples compartilhar este conhecimento,

pois:

O simples fato de essa teoria ter sido produzida na Rússia pós-revolucionária, mantida isolada do mundo ocidental sob o manto ideológico de décadas de guerra fria, é suficiente para traduzir o imenso desafio de seus intérpretes e dos críticos destes intérpretes ao empreenderem esta tarefa. [...] ter consciência da margem de interpretações deixada para comentários fantasiosos ou equívocos teóricos. (TULESKI, 2008, p. 22)

Devido a esta relação com a Rússia pós-revolucionária, os textos de Vigotski

não foram bem vistos pelo mundo capitalista, segundo Tuleski (2008), Prestes

(2010) e Duarte (2007), o material foi “editado” para que a relação da teoria com o

Marxismo e com a instalação do regime comunista na Rússia fosse apagada. Na

década de 90, as traduções norte-americanas, que posteriormente chegaram ao

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Brasil, do livro intitulado Pensamento e Linguagem, passaram por este processo

(TULESKI, 2008; DUARTE, 2007).

Para Tuleski (2008, p. 24, grifo da autora), estas traduções que visam adaptar

a teoria de Vigotski ao capitalismo, são a “[...] “seleção” de textos e ideias

vygotskianas” escolhidas pelos tradutores, com a justificativa de “retirada de trechos

repetitivos16 e de discussões polêmicas dos textos originais” que conduzem “a uma

simplificação, e excessiva abstração das ideias do autor”. Causando interpretações

equivocadas sobre a teoria, pois somos apresentados a versões “[...] difundidas por

seus interpretes” (DUARTE, 2001) e não aos originais.

Essas versões editadas se utilizam de outros autores para explicar Vigotski,

como Piaget, Bakhtin e Wallon (TULESKI, 2008). Segundo Duarte (2001, p. 218),

usar teorias diversas, como a de Piaget, para explicar a Psicologia Histórico-Cultural

pode não ser a melhor opção por causar uma interpretação inadequada da teoria,

“[...] uma ideia bastante difundida no meio educacional brasileiro: a de que tanto

Vigotski como Piaget seriam construtivistas”, uma interpretação rasa e frágil do que

seria o social dentro da PHC.

Outro ponto que merece atenção dos leitores da PHC é a tradução dos

termos dos manuscritos originais, em russo, para outros idiomas. Na tese de Prestes

(2010), a autora aponta traduções equivocadas, ou inadequadas de alguns termos

que podem até mesmo causar uma interpretação errada, colocando “[...] a teoria

histórico-cultural na “caixinha” das teorias de aprendizagem”. Ela afirma que “[...] não

são raros os momentos nos quais os tradutores pecam, alterando o texto original e

tendo pouco cuidado com o sentido daquilo que Vigotski diz com muita clareza no

russo.” (PRESTES, 2010, p. 184, grifo da autora).

Tuleski (2008) analisa que, a partir dos anos 2000, ocorreu uma melhora

qualitativa no quesito tradução das obras de Vigotski, com a nova versão de

“Pensamento e Linguagem”, intitulada de “A Construção do Pensamento e da

Linguagem”, que possibilitou o acesso ao texto na íntegra, com uma preocupação

dos tradutores em respeitar as ideias originais do autor. Porém, ela afirma que os

16

No “Prólogo do Tradutor” da versão em português de “A construção do pensamento e da

linguagem”, editado pela Martins Fontes, o tradutor Paulo Bezerra, defende que muitas das repetições nos textos de Vigotski “foram escritos ou ditados por Vigotski já em fase terminal da tuberculose [...]. Por outro lado, algumas (não todas!) das repetições devem-se ao próprio estilo polêmico de Vigotski, à forma às vezes sinuosa da sua reflexão”. Vigotski apresenta ao leitor pesquisas de outros autores, seus pontos fortes e frágeis, e qual seria a superação da PHC em relação às mesmas.

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tradutores ainda “[...] precisam avançar significativamente no sentido de considerar

suas bases marxistas, superando visões fragmentadas e superficiais” (p. 26).

Atualmente, a tradução considerada mais próxima dos originais são as versões em

espanhol dos textos de Vigotski (TULESKI, 2008).

Por último, vale destacar que, segundo Prestes (2010, p. 110), a produção

escrita de Vigotski foi publicada no formato de livros, após sua morte, consistindo da

reunião de “[...] artigos, textos e estenografias de aulas proferidas ou discursos em

eventos científicos”, portanto “publicadas ao gosto de cada organizador” (p. 111).

Assim sendo, estudar a Psicologia Histórico-Cultural pode representar um

desafio pela necessidade de conhecer o contexto do autor primeiramente, para

poder compreender seu método de investigação, o materialismo histórico-dialético.

Além disso, não se esquecer de que seus textos apresentam uma construção muito

própria, com a apresentação de pesquisas de outros estudiosos, como por exemplo,

Piaget, para posteriormente trazer a síntese ao leitor e a sua análise a respeito do

tema investigado. E, em alguns casos, temos que vencer a barreira da tradução, e

leitura em língua estrangeira (espanhol) na tentativa de nos aproximarmos ao

máximo do material original (escrito em russo).

Nas próximas subseções, serão apresentados os principais conceitos da

PHC, a construção do psiquismo e o desenvolvimento da atenção voluntária para

que possamos compreender o Transtorno de Déficit de Atenção – Hiperatividade

para além das perspectivas organicistas. Iniciarei pelo tópico de como a PHC

compreende o homem.

3.2.2 Visão de Homem

A visão do homem moderno dentro do capitalismo e liberalismo é, segundo

Bock (2015, p. 50), de um ser livre, “sujeito de sua vida”, essa afirmação impulsiona

a crença em um “sujeito individual”, com desejos, que é produtor e consumidor,

reforçando o valor da subjetividade.

Porém, com o avanço do capitalismo essa visão se torna contraditória, pois

ao mesmo tempo em que o sistema quer que o sujeito acredite que é livre, que faz

suas escolhas, que é um ser individual e único, o Estado precisa que ele seja

controlado, enquadrado, treinado para estar a serviço do capital. A psicologia nasce

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dessa necessidade de controle, de enquadrar o homem em padrões criados

socialmente, para a produção de uma explicação para o fenômeno psicológico que

seja capaz de fornecer teorias que direcionem o desenvolvimento do homem,

determinando o normal e o anormal (BOCK, 2015).

Compreender que a Psicologia como ciência surge com este objetivo de

encaixar o homem dentro de modelos criados por nós como grupo social, do que é

ideal e normal, nos auxilia a fazer crítica posterior aos espaços que ela ocupa e a

serviço de quem ela está. Salientando, também, que seu surgimento está

diretamente ligado ao momento histórico do século XIX, assim como o cenário social

se modifica, ela se transforma e evolui de acordo com os interesses da ciência, do

governo e da sociedade.

Consoante Bock (2015, p. 22), o ano da instituição da Psicologia como ciência

é 1875, uma ciência racional “experimental, empírica, quantitativa”, que enxergava o

homem com uma perspectiva mecanicista e determinista:

A Psicologia tem sua história “colada” aos interesses dos grupos dominantes. Estivemos sempre produzindo conhecimentos e traduzindo-os em uma Psicologia aplicada, de forma a permitir o aumento do controle sobre os grupos sociais, a ampliação da capacidade produtiva dos trabalhadores, a distribuição de crianças de forma homogênea ou heterogênea nas classes, para garantir aprendizado e disciplina, a seleção do homem certo para o lugar certo, a higienização moral da sociedade, o controle do comportamento, a classificação e a diferenciação. A história da Psicologia, como ciência e profissão, se confunde nos diferentes momentos da organização social com os interesses de determinados grupos sociais e lança mão de seus instrumentos e saberes para responder a esses interesses (Idem, p. 35).

Existe uma dificuldade de romper com essa história, pois os interesses dos

grupos dominantes patrocinam e movimentam a produção de grande parte da

ciência, tanto nacionalmente quanto internacionalmente. O modelo econômico

vigente determina o que é relevante de ser pesquisado. Um bom exemplo dessa

realidade foram as duas grandes Guerras Mundiais que “[...] trouxeram o

desenvolvimento dos testes psicológicos, instrumentos que viabilizaram essa prática

diferenciadora e categorizadora da Psicologia” (BOCK, 2015, p. 36) com o objetivo

de selecionar melhor os soldados para postos mais adequados, enquadrando-os em

padrões determinados.

No âmbito nacional a situação não foi diferente:

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[...] a Psicologia brasileira pôde responder adequadamente aos interesses de grupos dominantes, no Brasil. Tornou-se uma profissão classificatória e diferenciadora. Aptos ou não aptos, saudáveis ou doentes, adequados ou inadequados, competentes ou incompetentes, com potencial ou não, enfim, quase toda nossa intervenção tem-se orientado para classificar e com isso contribuir para construir estigmatizações e discriminações (BOCK, 2015, p. 37).

Seguindo este modelo que compõe sua fundação e sua história, existe dentro

da ciência psicológica a tendência de “naturalizar o que é social [...] tomar como

padrão de normalidade o que é eminentemente social” (BOCK, 2015, p. 37). O que

é considerado atualmente como ideal/normal/saudável é criado por uma sociedade

capitalista, que espera explorar de todas as formas as potencialidades do homem

em prol do mercado. Qualquer característica que não esteja de acordo com este

padrão esperado deve ser tratada com remédios, submetida à terapia, considerada

um transtorno, para que seja novamente enquadrada no perfil do homem capitalista

ideal.

Com o objetivo de romper com essa psicologia, Vigotski postula que o homem

deve ser compreendido por meio de sua atividade principal, prática, “[...] é

precisamente aí que jazem as leis fundamentais e as unidades iniciais da vida

psíquica do homem” (LEONTIEV, 1999, p. 438). Portanto, o homem é “ao mesmo

tempo natureza e história desta natureza” (TOMIO; FACCI, 2009), ele transforma e é

transformado.

Para esta compreensão parte-se de uma concepção de:

[...] homem como ativo, social e histórico; a sociedade, como produção histórica dos homens que, através de seu trabalho, produzem sua vida material, como fundada em contradições que se expressam nas ideias; e a história, como o movimento contraditório constante do fazer humano, no qual, a partir da base material, deve ser compreendida toda produção de ideias, incluindo a ciência e a Psicologia. (BOCK, 2015 p. 24, grifo meu)

Diante disto, na Psicologia Histórico-Cultural, o homem é produto e produtor

da sociedade e da história, com uma relação dialética, na qual a todo momento

modifica e é modificado pela natureza e sociedade que o cercam.

Vigotski introduz o tempo na psicologia, o historicismo é um dos conceitos-

chave de seu trabalho. Portanto, o desenvolvimento psíquico acontece em um meio

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cultural, através de instrumentos construídos pelos homens, que se convertem em

processo biológico (SHUARE, 1990).

Essa conversão é explicada na lei principal de desenvolvimento, a lei de

internalização:

[...] cujo fator determinante está posto nas relações sociais de produção que colocam as condições para a superação do comportamento direto, imediato, para o comportamento cultural mediatizado por instrumento (ferramentas) e signos (simbólicos). (TULESKI; EIDT, 2016, p. 44).

Dessa forma, a “aquisição das particularidades humanas, (...) dos

comportamentos complexos culturalmente formados, demanda a apropriação do

legado objetivado” (MARTINS, 2016, p. 14), o que é do âmbito das relações

interpsíquicas, no meio externo, social, por meio da internalização tornam-se

intrapsíquicas, internas, psicológicas. Essa compreensão histórica do psiquismo,

produzido socialmente, proporciona a visão dinâmica do mesmo, mostrando que

está em constante transformação estrutural e funcional (SHUARE, 1990).

Essa visão de homem rompe com a apresentada na subseção anterior, na

PHC o biológico não é desconsiderado, porém, ele não é o único determinante do

desenvolvimento humano, a maturação não é o ponto de partida e o ponto final. As

interações sociais, a cultura, o tempo e a história vão influenciar diretamente a

aprendizagem, que posteriormente resultará no desenvolvimento e transformação do

biológico. Assim, serão apresentados no próximo tópico os principais conceitos da

PHC para o desenvolvimento do psiquismo.

3.2.3 Principais conceitos da PHC para o desenvolvimento do

psiquismo

A Psicologia Histórico-Cultural apresenta definições de conceitos importantes

para a sua compreensão: instrumento, signo, atividade, conceitos espontâneos,

conceitos científicos, funções psíquicas elementares, funções psíquicas superiores e

zona de desenvolvimento próximo ou iminente.

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Iniciando com a diferença entre instrumentos e signo na teoria de Vigotski,

temos que os instrumentos são “criações artificiais da humanidade” para mediar

ações entre o homem e a natureza, homem e a atividade laboral, são dirigidos para

fora, ampliando o seu poder de ação por meio dessas ferramentas, por exemplo,

mapas, escrita, língua, entre outros (LEONTIEV, 1999, p. 451).

Os signos são diferentes dos instrumentos, pois estão voltados para dentro do

indivíduo, ambos possuem a função de mediação, “uma vez que o domínio da

natureza e o domínio de si estão inter-relacionados” (MARTINS, 2016, p. 44).

Porém, o signo promove mudanças internas, não no objeto da ação, é o universo

simbólico que possui significado (SHUARE, 1990; LEONTIEV, 1999; MARTINS,

2016).

De acordo com Martins (2016, p. 15),

Ao introduzir o conceito de signo, o autor postulou que o ato especificamente humano apresenta-se na qualidade de ato institucional, uma vez que entre a resposta da pessoa e o estímulo do ambiente interpõe-se o novo elemento designado signo. O signo então opera como um estímulo de segunda ordem que, retroagindo sobre as funções psíquicas, transforma suas expressões espontâneas em expressões volitivas.

Estes instrumentos (ferramentas) e signos (simbólicos), criado pelo homem,

irão mediar a atividade e é ela que desenvolve o psiquismo, mas é importante

destacar que nem tudo que o sujeito faz é considerado atividade, para ser

considerado como atividade tem que ser impulsionada por uma “intencionalidade e

buscar responder a uma necessidade [...]. Assim, a primeira condição de toda

atividade é a necessidade” (MARTINS, 2016, p. 45).

Segundo Leontiev (2001) e Martins (2016), alguns tipos de atividade são

principais em certos períodos do desenvolvimento e são elas que promovem

mudanças no psiquismo. Elas não acontecem de maneira isolada, estão em

andamento atividades com papel principal e subsidiário ao mesmo tempo como, por

exemplo, o brincar na vida do pré-escolar é a atividade principal, porém, ao mesmo

tempo em que brinca, a criança desenvolve outras habilidades, como a de receber

instruções para poder realizar a brincadeira, aprende a usar a sua imaginação por

meio da manipulação dos brinquedos, desenvolve sua atenção voluntária e

principalmente aprende a função social das pessoas ou objetos por meio do jogo.

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De acordo com Chaves e Franco (2016), nessa fase chamada de pré-escolar

(3-6 anos)17, a criança já superou a fase onde a atividade objetal manipulatória é a

principal e passa para o jogo, com objetos e/ou com as pessoas ao seu redor. Nesse

momento, cresce seu interesse pela função social dos objetos, para descobrir para

que servem exatamente. Um exemplo de jogo dessa fase é o jogo protagonizado

e/ou jogos de papéis, onde a criança “[...] penetra um mundo mais amplo,

assimilando-o de forma eficaz. Ela assimila o mundo objetivo como um mundo de

objetos humanos reproduzindo ações humanas com eles” (LEONTIEV, 2001, p. 59).

O momento seguinte na vida da criança, após a fase pré-escolar, é o início da

vida escolar, começa a atividade de estudo, que passa a ser a atividade principal,

por meio da qual acontecerá o aprendizado de novos conceitos científicos. Mas isso

não significa que o brincar deixou de ser uma atividade para essa criança, apenas

agora não será central, funcionando como um papel subsidiário (LEONTIEV, 2001).

Existe uma conexão entre as etapas, à medida que vai se desenvolvendo a

criança vai mudando as atividades principais e o lugar que ocupa na vida em

sociedade e, o que foi atividade principal, passa ser atividade subsidiária para que a

próxima se estabeleça. Assim, as funções psíquicas superiores vão surgindo, a cada

momento de acordo com as necessidades, e a atividade dominante que produz as

transformações no psiquismo.

Como mencionado anteriormente, estas atividades precisam de uma

necessidade para se desenvolverem. Podemos dividir a necessidade, também

chamada de motivo, em dois tipos: os motivos compreensíveis e os motivos

realmente eficazes.

Os motivos compreensíveis têm curta duração, ocorrem em circunstâncias

diretas, utilizando a atividade de estudo como, por exemplo, estudar para um teste

escolar é um motivo, mas será passageiro. Depois de realizar o teste, o estudo

também cessará. Os motivos realmente eficazes são mais constantes, de duração

prolongada, se comparados aos motivos compreensíveis. Eles não dependem de

situações causais e imediatas, por exemplo, cursar uma faculdade. O motivo para tal

atividade é, após concluir o curso, ingressar no mercado de trabalho, mas será

alcançado a logo prazo, ao final de anos de dedicação (MARTINS, 2016).

17

Para maiores informações sobre a periodização do desenvolvimento do psiquismo humano ver MARTINS, L.M.; ABRANTES, A.A.; FACCI, M.G.D. (Org.) Periodização histórico-cultural do desenvolvimento psíquico: do nascimento à velhice. Campinas, SP: Autores Associados, 2016.

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67

Todo o desenvolvimento psíquico acontecerá posterior às aprendizagens,

durante cada uma das etapas do desenvolvimento psíquico. De acordo com as

atividades principais e subsidiárias, neoformações vão sendo desenvolvidas, com o

auxílio do social e de pares superiores mais capazes. Segundo Leontiev (2001), é

importante ressaltar que as atividades principais estarão de acordo com o contexto

social e histórico de cada homem, por isso não podemos dividir o desenvolvimento

por idades fixas.

Devemos considerar que, além do contexto social e histórico, o biológico é a

base sobre a qual eles irão atuar. Assim, partindo de vivências externas,

construímos o mundo interno e as funções psicológicas básicas desenvolvidas em

funções psicológicas superiores, tudo a partir das interações sociais que

experimentamos (FACCI, 2004).

Nas interações com os pares mais capazes aprendemos conceitos, que

podem ser espontâneos, que não são sistematizados, se originam da experiência e

do dia a dia, e conceitos científicos, que se constituem na vida escolar,

apresentados por meio da instrução escolar. Os conceitos científicos têm um

caminho diferente de formação dos espontâneos, vão do abstrato para o concreto,

não existindo uma divisória entre eles, se comunicando durante o seu

desenvolvimento (VIGOTSKII, 2001).

Vigotsky (2009) explica que os conceitos científicos dependem de “(...) um

tecido conceitual já amplamente elaborado e desenvolvido por meio da atividade

espontânea do pensamento infantil” (p. 269) e que, portanto, durante o processo de

aprendizagem escolar, não está livre das influências do pensamento infantil e das

experiências vividas pela criança.

Durante o seu estudo do desenvolvimento dos conceitos, observou que os

conceitos científicos evoluem mais rapidamente que os espontâneos, a explicação

seria que os conceitos espontâneos corresponderiam ao desenvolvimento real/atual

da criança, dependendo de experiências subjetivas para se desenvolverem,

podendo levar tempo para serem significados, enquanto os científicos estão na zona

de desenvolvimento próximo e com a ajuda de um instrutor a criança é capaz de

compreendê-los (LEONTIEV, 1999).

Como exemplo desta diferença de desenvolvimento, Vigotsky (2009) afirma

que é mais fácil uma criança definir o que é a Lei de Arquimedes do que o que é

irmão, pois o segundo termo não passou por uma explicação formal, por meio de

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formulação científica, para facilitar a sua definição. É, na realidade, carregado

experiência pessoal, dificultando a sua explicação em palavras. O que tem a dizer

sobre um termo, não pode expressar sobre o outro.

Segundo Vigotski, “a estrutura psíquica não é uma aquisição tardia do

desenvolvimento, mas seu pressuposto” (MARTINS, 2011, p. 72). Nessa estrutura

desenvolvida por meio de todos esses processos citados anteriormente que se

desenvolvem as funções psíquicas superiores. Diante disso, podemos concluir que a

aprendizagem precede o desenvolvimento, por meio dela o biológico se

desenvolverá, e novas funções serão aprendidas, como a atenção voluntária, que

será apresentada na próxima subseção.

3.2.4 Psicologia Histórico-Cultural e desenvolvimento da atenção

Como apresentado na subseção anterior, normalmente são utilizados a

biologização e a naturalização dos comportamentos humanos e os fenômenos

psicológicos para explicar as condutas inadequadas das crianças. Na pesquisa de

Leite e Rebello (2014, p. 65), um levantamento de artigos nas bases de dados

Medline, SciELO e Lilacs podem comprovar essa situação atual no panorama das

pesquisas,

(...) à compreensão da função psicológica atenção a partir de uma concepção de desenvolvimento de cunho biologizante (...) tendo como compreensão predominante aquela que entende o desenvolvimento como decorrente especialmente do amadurecimento orgânico independentemente do intercâmbio social neste processo.

Os trabalhos que se utilizam dessa abordagem acreditam neste

amadurecimento físico, que com o avanço da idade e maturação do cérebro a

atenção voluntária irá funcionar, como que ativada por uma chave, de liga e desliga,

sem dar a devida importância para a participação das interações com pares mais

capazes para que a atenção se desenvolva.

A psicologia histórico-cultural, diferentemente das teorias biológicas,

considera a atenção como uma função psicológica superior que dever ser trabalhada

e desenvolvida ao longo da vida, entende o chamado Transtorno de Déficit de

Atenção/Hiperatividade de maneira diferente ao que comumente é difundido entre a

comunidade científica (EIDT, TULESKI, 2010; MEIRA, 2012; SIGNOR, 2013).

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Segundo Eidt e Tuleski (2010), a atenção se desenvolve em estágios.

Possuímos uma atenção natural, instintivo-reflexo, que seria inata, não aprendida,

de duração curta, sob esta base construímos o sistema de atenção artificial, seletiva,

voluntária que deve ser sustentada de maneira consciente, para realizar

atividades/tarefas organizadas. Essa atenção é motivada pelos adultos, pelo mundo

material, através da internalização de instrumentos culturais.

A principal característica da atenção, assim como de toda função psíquica

superior, é seu aspecto voluntário, e segundo Vygotski (2012, p. 151) “(...) todas as

funções psíquicas superiores são relações internalizadas de ordem social, são o

fundamento da estrutura social da personalidade. Sua composição, estrutura

genética e modo de ação, em uma palavra, toda a sua natureza é social”18. O que

acontece nas interações sociais é posteriormente transferido para nosso psicológico,

modificando o biológico, e criando novas maneiras de atuação.

O desenvolvimento da atenção voluntária se inicia na mais tenra idade, com a

criança aprendendo a controá-la e esse controle para Vigotski é o que distingue o

homem dos animais (MARTINS, 2012):

Diferentemente da atenção involuntária; mobilizada pelas propriedades dos objetos e, portanto, subjugada aos ditames de condições externas; a atenção voluntária tem origem em motivos e finalidades estabelecidos conscientemente pelo indivíduo em face das exigências das atividades empreendidas. Por conseguinte, seu desenvolvimento não se realiza a partir da atenção em si mesma, mas do lugar que a atenção passa a ocupar em relação ao pensamento à memória, aos afetos etc., ou seja, das interrelações e interdependências funcionais requeridas pela atividade cultural. Nesse sentido, seu desenvolvimento é, ao mesmo tempo produto da complexificação da vida social e condição indispensável à sua existência (p. 126).

Vygotski (2012) postula que o desenvolvimento da atenção está relacionado

com a capacidade da criança de organizar a sua conduta, que se inicia desde as

primeiras interações com sua mãe, quando ela chama a atenção para determinados

objetos ou situações em seu entorno, e com o foco em suas indicações e gestos vai

ocorrendo o desenvolvimento cultural e social da atenção. Para estudar este

fenômeno, o psicólogo russo criou situações em que as crianças precisassem

dominar a atenção por meio de estímulos-meio externos, verificando como a 18

As traduções feitas são de responsabilidade da autora.

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atenção voluntária se desenvolve, buscando encontrar a origem da formação das

funções psicológicas superiores por meio do desenvolvimento cultural.

Nas experiências para compreender a atenção voluntária, participaram

crianças de diferentes idades, e o adulto era quem mediava as tarefas. Dessa

mediação, a criança aprendia o que deveria observar para obter êxito nos

experimentos, aplicando essa mesma atenção voluntária nos próximos testes, sem

cometer novos erros. Assim, Vigotski verificou como o processo de desenvolvimento

da atenção voluntária ocorre em cada idade, começando com crianças bem

pequenas, avançando até os adultos. Este experimento constiu em fazer perguntas,

porém, as respostas: sim, não, e as cores, branco e preto, eram proibidas, usar uma

mesma cor para responder perguntas em sequência também.

Foram realizadas as primeiras etapas com as crianças menores, elas erraram

muitas respostas; na etapa seguinte, as crianças receberam cartolinas com cores

variadas, entre elas a cor branca e preta, para auxiliá-las nas respostas. Com isso,

passaram a errar menos, pois tinham o auxílio das cartas, poderiam excluir as cores

proibidas, branco e preto, e organizar as demais para evitar respostas repetidas, as

cartas funcionaram como instrumentos mediadores da atenção (VYGOTSKI, 2012).

À medida que o estudo se repete, as crianças utilizam cada vez menos as

cartas, com mais consciência do processo realizado, assim, mostrando que o

processo realizado no meio interpsíquico, passa ao intrapsíquico, dominando a

atenção através do auxílio de estímulos externos. Esse processo também auxilia no

desenvolvimento de respotas mais difíceis, por exemplo, a pergunta “são vermelhos

os tomates?”, como não pode apenas dizer sim, a criança responde “são verdes

quando não estão maduros” (VYGOTSKI, 2012, p. 218).

Com esse experimento, Vigotski comprova que a atenção voluntária é

ensinada, a criança aprende no que/o que deve ser seu foco. Assim,

compreendendo que a atenção voluntária pode ser desenvolvida, na interação com

o outro, não sendo, portanto, inata, questiono qual a participação do professor nesse

processo? A função do professor é “um grande desafio: desenvolver nos alunos

capacidades intelectuais durante o processo de apropriação de conhecimentos de

forma que os saberes adquiridos sejam utilizados com êxito e atuem como

mediadores da relação dos indivíduos com a realidade” (ABRANTES; MARTINS,

2006, p. 2).

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Vamos agora focar na idade escolar, como mencionado na subseção anterior:

é nessa idade onde acontecem a maioria dos diagnósticos de TDA-H. Segundo

Leontiev (2001), na idade pré-escolar as crianças estão na fase em que o brincar é a

atividade principal, e sua interação é dividida em dois grupos, com sua família, e as

pessoas que estão fora deste grupo. A relação com a família que irá mediar como a

criança irá se relacionar com os demais. Assim como a família também poderá ser

modelo para as brincadeiras de faz de conta que ela brinca.

O jogo e as brincadeiras são o primeiro momento de aprendizagem da criança,

ela aprende com os adultos, pais, professores, os imitando, como deve se comportar

e o que deve fazer em determinadas situações simbólicas, que depois podem ser

transferidas para seu mundo real, o papel dos adultos nesta fase é bem importante

para auxiliar a criança a descobrir as funções de objetos, funções sociais, relações

sociais, entre outras. Portanto essa fase é um momento de preparação para a

transição da atividade principal, o jogo, para a atividade de estudo, e o lugar que

essa criança ocupa na sociedade. A disposição, o desenvolvimento e o

envolvimento psíquico da criança para a fase escolar depende da etapa anterior

(MARTINS; FACCI, 2016).

Segundo Leontiev (2001), a criança deve ser preparada para sua vida escolar,

pois ela terá que interagir com os colegas, terá tarefas para fazer, obrigações,

ocupará um novo papel social, além existe não só uma cobrança por parte da família

para que aprenda e apresente um bom desempenho, como também da sociedade,

pois espera-se que em determinada idade seja capaz de desempenhar certas

atividades, ou tenha determinados conhecimentos. É função da sociedade, família e

escola, auxiliar nesta preparação. Na próxima subseção, será apresentado como a

escola pode agir para promover o desenvolvimento da atenção voluntária.

3.2.5 O papel da escola no desenvolvimento da atenção voluntária

Como mencionado anteriormente, na vida da criança existem vários momentos

de transição e crise, cada um deles será determinante para os períodos de viragem,

as neoformações irão se constituir como resultados destes períodos. Isto quer dizer

que a criança irá ter novos comportamentos devido às situações sociais que

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vivenciará, resultando em uma nova criança, que ocupa um lugar novo na sociedade

e exige mudança no mundo a sua volta.

Segundo Tuleski e Eidt (2016, p. 55), “[...] a crise retrata a necessidade de

continuidade do processo de desenvolvimento. Superá-la significa empreender

movimento na situação social de desenvolvimento da criança”. Portanto, a entrada

da criança na escola será vivenciada de maneira única, “[...] dependendo do caráter

concreto em que se manifestam (situação social de desenvolvimento)” (Idem, p. 54),

da forma como serão constituídas com a criança as novas relações com pessoas

que não faziam parte do seu convívio familiar – professores, colegas de sala de

aula, merendeiras, inspetor de pátio, entre outros atores escolares.

Leontiev (2001) afirma que, ao adentrar na pré-escola, mudanças importantes

ocorrerão no modo de vida da criança, sendo que as relações sociais desenvolvidas

com sua família, a base das relações que ela irá imprimir na escola e a entrada

nesse novo contexto exige não só que ela se transforme, mas também o seu grupo

social a trate de maneira diferente, pois como analisam Tuleski e Eidt (2016, p. 56):

[...] se a criança modificou-se de modo radical, será inevitável que reestruture todo o sistema de relações no qual ela estava inserida. Deverá haver uma desintegração da situação social de desenvolvimento anterior e uma nova situação social deve construir-se.

As autoras, Tuleski e Eidt (2016, p. 57) criaram um diagrama (figura abaixo)

para representar o desenvolvimento infantil, mostrando como existem interseções

entre os momentos de desenvolvimento, demonstrando que “a periodização do

desenvolvimento opera numa espiral dialética, envolvendo avanços e recuos, saltos

e paralisações”, afirmando que “nesse processo são produzidas as neoformações e

gestadas as atividades-guia de cada período”.

No diagrama, podemos perceber que existe uma conexão entre as fases. Não

são divisões rígidas, existe uma comunicação entre os momentos, eles são fluidos.

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Figura 1 – Movimento dialético do desenvolvimento infantil

Fonte: Tuleski; Eidt, 2016, p.57.

Trataremos agora de dois momentos em especial: a idade pré-escolar (3 a 6

anos), cuja a atividade principal é do jogo (jogo de papéis) e a idade escolar (7 a 12

anos), na qual a atividade principal é a atividade de estudo (LAZARETTI, 2016;

MARTINS; FACCI, 2016).

Segundo Lazaretti (2016), algumas mudanças e desenvolvimentos acontecem

com a criança na fase anterior, chamada de primeira infância, na qual a atividade

principal é a objetal manipulatória:

Como consequência, assistimos às mudanças provocadas no desenvolvimento da criança na primeira infância, sendo essas as mais significativas e os fundamentos para a nova atividade-guia no período pré-escolar: a aparição da tendência da atividade independente; o domínio de um círculo bastante amplo de atividades, com os objetos acessíveis para isso; a aquisição das formas fundamentais da linguagem como meio de relação social. (Idem, p.129)

Para que essas mudanças no desenvolvimento ocorram, é necessário que se

tenha “correta organização do ensino na educação infantil que garanta situações

propiciadoras de aprendizagem e de desenvolvimento das crianças” (LAZARETTI,

2016, p. 130, destaque da autora).

A brincadeira de papéis é, para as crianças, a oportunidade de representar e

aprender ações dos homens e como usar os instrumentos de maneira correta,

criando novas representações e signos. Os brinquedos não mudam, porém, passam

da fase de manipulação, para receberem um novo significado – significado social e

cultural – que os homens atribuem a eles e a criança, por meio do mundo da

brincadeira, aprende as regras e que nem sempre seus desejos podem ser

satisfeitos. Nesse momento, a criança precisa da orientação dos adultos, ou pares

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mais capazes, pois está aprendendo a brincar, e trabalhando suas funções

superiores que estão em fase de germinação, como a atenção voluntária

(LEONTIEV, 2001).

Lazaretti (2016, p. 142) explica que:

Dessa nova formação, origina-se o controle consciente da conduta, que então, pela constante regulação das ações externas, dá origem ao controle dos processos internos. A criança começa a dirigir sua percepção, sua memória seu pensamento e atenção. A realização dos diferentes tipos de atividade provoca um salto qualitativo em seu desenvolvimento: aumenta o poder de concentração e a estabilidade da atenção; a duração do tempo de conservação da retenção de um material na memória e o enriquecimento da imaginação.

Portanto, este é o desenvolvimento cultural das funções psicológicas

superiores defendido por Vigotski, que atuará sobre o biológico, com o jogo

direcionado pelos adultos, pais, professores, entre outros pares, várias funções vão

sendo trabalhadas simultaneamente. Podemos voltar ao diagrama de Tuleski e Edit

(2016), apresentado anteriormente, para compreender que é um movimento

dialético, que avança e retrocede. Por mais que a atenção voluntária não seja

predominante na fase pré-escolar, não podemos ignorar a necessidade de

desenvolvê-la, como mencionado anteriormente. Possuímos a atenção natural e

precisamos por meio de atividades concretas direcionar e auxiliar a criança para

educar e desenvolver essa função.

Inicialmente, essa atenção será organizada por meios auxiliares. A fala é um

deles, as indicações verbais dos pares mais capazes que vão organizar a utilização

da atenção voluntária e, ao dominar a fala, a criança adquire mais autocontrole

sobre essa função psíquica superior (VYGOTSKI, 2012; LAZARETTI, 2016).

Consoante Lazarette (2016, p. 142), na fase pré-escolar, a atenção voluntária

não é a função predominante, pois não é ideal para a idade que a escola proponha

“atividade repetitivas, monótonas e mecânicas”. Porém, o ensino deve se estruturar

de maneira consciente, dinâmica e coerente buscando manter “a atenção infantil em

um nível suficientemente alto”. Para isso, faz-se necessário que os atores escolares

como um todo busquem “conhecer sobre as características de desenvolvimento da

criança, as premissas de cada atividade principal” (Idem, p. 145), para que esse

conhecimento fosse o guia no momento de escolha das atividades desenvolvidas

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em sala de aula, com o objetivo de potencializar os processos de aprendizagem que

irão gerar desenvolvimento.

O bom ensino, segundo Lazarette (2016, p. 145), deve “garantir a

apropriação, em cada indivíduo, dos elementos culturais necessários a sua

formação omnilateral, tendo como referência a objetivação alcançada pelo gênero

humano”.

Na sequência da fase pré-escolar, temos a fase escolar: a criança passa por

uma transição, em que ocorre a crise dos sete anos “constituindo-se em uma etapa

do desenvolvimento infantil com características bastante peculiares”, a característica

mais marcante desse período é a diferenciação entre o interior e exterior da

personalidade da criança: ela começa a ter autocontrole e formar as funções

psicológicas superiores. “Outra peculiaridade desse período do desenvolvimento

refere-se ao fato de a criança começar a atribuir significado a suas vivências e

distinguir seus sentimentos” (MARTINS; FACCI, 2016, p. 155).

O jogo e a brincadeira não satisfazem mais a criança, ela passa a desejar ir à

escola, mudam suas necessidades e motivos (MARTINS; FACCI, 2016). Nesse

momento, a criança começa a querer descobrir quais as causas e razões para as

coisas, quer aprender a ler e escrever, para começar a descobrir o mundo com

autonomia, essa curiosidade deve ser transformada em motivos para ir à atividade

de estudo (ASBAHR, 2016).

Sobre a formação dos motivos, para Leontiev (2001) e Asbahr (2016), quando

os alunos iniciam a escola, o principal motivo são questões afetivas, querem agradar

e satisfazer os pais, a professora, posteriormente esse motivo compreensível deve

se transformar em um motivo realmente eficaz, que é o de aprender, adquirir os

conhecimentos. Esse é um dos desafios da educação, auxiliar nessa relação afeto

intelecto. Asbahr (2016) explica que,

A criança começa a estabelecer uma hierarquia de motivos e a controlar seu comportamento. Fortalecem-se as necessidades mediatizadas, especificamente humanas. É o salto qualitativo do desenvolvimento humano, uma vez que a criança está aprendendo a controlar seu comportamento, seu pensamento e a superar a primazia das necessidades biológicas presentes até pouco tempo atrás (p.175).

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A atenção voluntária faz parte destes comportamentos que a criança está

aprendendo a controlar na fase escolar, além disto, precisa também subordinar seus

desejos as obrigações. Portanto, nas séries iniciais a criança deveria ser ensinada

toda esta gama nova de comportamentos, habilidades que esperamos que ela

desempenhe, “todas as transformações, iniciadas na atividade de jogo, consolidam-

se na atividade de estudo dependendo da qualidade das mediações pedagógicas”

(Idem, p. 125), a participação dos professores nesse momento é indispensável, com

atividades que tenham um objetivo, com uma prática pedagógica intencional, que

proporcione momentos para exercitar a atenção voluntária.

A atividade principal da fase escolar é a atividade de estudo, atividade esta

que será ensinada pelos adultos, portanto devemos sempre lembrar que a criança

sabe o que se espera dela. Para Leontiev (2001, p. 61), ela tem consciência de que

agora irá estudar, terá responsabilidade, deveres a cumprir. Porém, “estas

exigências só adquirem um sentido real, psicologicamente eficaz, quando ela

começa a estudar”, por mais preparada que esteja, só quando a vivência escolar se

inicia é que de fato ela irá ressignificar as relações e o lugar que ocupa na

sociedade, não podemos exigir que o aluno esteja pronto no seu primeiro dia de

aula. Nesta nova fase, os contatos na escola com a professora, colegas, diretor,

entre outros, passam também a influenciar as relações do círculo mais íntimo

(usualmente a família).

Diante destas mudanças, segundo Martins e Facci (2016, p. 163), “a criança

precisa estabelecer uma nova rotina de estudo em casa e na escola” até mesmo

para organizar seu material e seu tempo. As autoras ressaltam que nem sempre os

pais e professores tem paciência durante essa transição, até a criança compreender

a nova dinâmica escolar.

Segundo Asbahr (2016), é preciso considerar que a atividade de estudo é

constituída de diversas ações (ler, recortar copiar), mas que nem sempre estas

ações irão contribuir para a formação da criança, podem ser apenas operações

mecânicas que irão promover grandes mudanças. Ela destaca que a principal

função da nova atividade principal é a “constituição de neoformações psicológicas,

tais como consciência e o pensamento teórico” (p. 173), ressaltando que a criança

precisar aprender esta nova atividade, não é, portanto, um comportamento natural.

Davídov e Márkova (1987, p. 324) postulam que atividade de estudo envolve

não apenas o desenvolvimento cognitivo, mas também o desenvolvimento moral, da

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motivação e vontade, “o conteúdo principal da atividade de estudo é a assimilação

dos procedimentos generalizados de ação na esfera dos conceitos científicos e

mudanças qualitativas no desenvolvimento psíquico da criança”. O aluno aprenderá

a ter controle sobre suas ações e a desenvolver também o pensamento teórico.

Portanto, na fase escolar, a atividade de estudo funciona com o objetivo de orientar

o desenvolvimento das neoformações e das novas relações “em direção ao objeto

de estudo, em direção a si, em direção ao outro”19 (Idem, p. 331).

Diante do exposto, podemos perceber que a criança está em formação nas

fases pré-escolar e escolar, que a cada nova etapa os adultos que a cercam e/ou os

pares mais capazes que devem auxiliar o seu processo de aprendizagem para que

assim aconteça o desenvolvimento das funções psíquicas superiores, que são fruto

das vivenciais sociais e culturais. Mas por que a educação contemporânea tem

dificuldades para compreender que o desenvolvimento ocorre de maneira dialética?

Ou mesmo, por que a criança não é preparada para a vida escolar, mas espera-se

que ela se desenvolva bem, tenha bom comportamento e concentração?

Apresentarei alguns pontos que podem ser as respostas dessas perguntas.

Primeiramente, devemos compreender que o trabalho educativo tem como

produto a reprodução da humanidade, dos signos e instrumentos usados pela

sociedade, mas sendo reproduzido em cada indivíduo. Além disso, com o modelo

econômico atual, a educação escolar passa a ser a forma socialmente dominante de

educação (DUARTE, 2007). Isso quer dizer que, atualmente, quando se pensa em

educação, a primeira coisa que idealizamos é uma educação formal, conhecimentos

científicos, apresentados no modelo tradicional em sala de aula.

Seguindo esta linha, as teorias do desenvolvimento se baseiam nessa crença

de que a aprendizagem acontece no ambiente escolar, na idade escolar. Vigotskii

(2001) apresenta três teorias do desenvolvimento: a primeira seria a teoria que o

desenvolvimento precede a aprendizagem – primeiro o indivíduo amadurece, depois

aprende e, no momento certo, a maturação faz acontecer a aprendizagem; a

segunda teoria é que desenvolvimento é aprendizagem, assim como uma sombra,

os dois estão diretamente relacionados, desenvolvem-se de forma idêntica; e a

terceira teoria seria uma mistura das duas anteriores. A escola atual se baseia

19

As traduções feitas são de responsabilidade da autora.

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nessas abordagens, ou em uma mistura de teorias que não seguem os mesmos

fundamentos:

A concepção de construção de conhecimentos pelas crianças em situações de interação social foi pesquisada, com diferentes enfoques e abordagens, por vários autores, dentre eles: Jean Piaget, Lev Semionovitch Vygotsky e Henry Wallon. Nas últimas décadas, esses conhecimentos que apresentam tanto convergências como divergências, têm influenciado marcadamente o campo da educação. Sob o nome de construtivismo reúnem-se as idéias que preconizam tanto a ação do sujeito, como o papel significativo da interação social no processo de aprendizagem e desenvolvimento da criança (BRASIL, 1998, p .22).

O fragmento acima foi retirado da Referencial Curricular Nacional para a

Educação Infantil, uma mostra de como os teóricos com conceitos e definições

diferentes são apresentados como construtivistas, baseando a educação em uma

abordagem que defende o desenvolvimento biológico com antecessor à

aprendizagem, que defende fases divididas por idades cronológicas bem

estabelecidas. Tudo isso é a base para atuação dos profissionais da educação. Esta

é uma das respostas às questões apresentadas anteriormente: a escola acredita

que seu aluno por estar na idade ideal para aprender, está maduro biologicamente

falando e pronto para se adequar as exigências que lhe serão feitas.

Porém, Vigotskii (2001) postula que o desenvolvimento e a aprendizagem se

relacionam, mas não se produzem em simetria, que a aprendizagem irá preceder o

desenvolvimento, “[...] a aprendizagem escolar orienta e estimula processos internos

de desenvolvimento” (p. 116). Além disso, o autor também afirma que quando a

criança está em processo de aprendizagem, é o momento em que surge a zona de

desenvolvimento proximal proporcionando o desenvolvimento. Assim, a educação

deveria focar a potencialidade do aluno que se encontra em estágio germinativo, que

está por se consolidar, com auxílio de pares mais capazes essas atividades serão

incorporadas do campo interpsíquico para o intrapsíquico, promovendo, dessa

forma, por exemplo, a formação de uma função psicologia superior, que não se

desenvolveria sem auxílio do professor ou da parceria com um colega mais capaz,

pois são características humanas e não naturais construídas historicamente,

portanto o “[...] ensino bom é o que se adianta ao desenvolvimento” (p. 114).

Além das questões teóricas que norteiam a educação brasileira e da

incompatibilidade com o pensamento de Vigotski, é importante levantar mais um

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fato: Martins e Facci (2016) fazem uma crítica ao sistema educacional nacional,

afirmando que ele é resultado de um processo histórico que “não surgiu com o

intuito de ser „escola‟, de ensinar seus alunos, mas como espaço de cuidado, onde

os pais que precisam trabalhar pudessem deixar seus filhos” (p. 166, grifo das

autoras). Por isso, até uma determinada idade, o conceito de escola permanece o de

socializar, deixando de lado o questionamento:

[...] a que ponto a qualidade da atividade na qual a criança se insere está contribuindo para o acesso ao conhecimento e para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Entendemos que não se trata de a criança deixar ou não de ser criança, de se finalizar a infância, mas sim de pensar uma escola que realmente invista no desenvolvimento máximo de potencialidades dos estudantes. (Idem, p. 165)

Esse questionamento é pertinente, como explicado anteriormente, para que a

criança desenvolva suas funções psíquicas superiores, como memória, percepção,

pensamento simbólico, atenção voluntária. É necessário que as atividades propostas

na escola tenham o objetivo de desenvolver essas habilidades, não podem ser

aceitas atividades sem finalidade de atingir esta meta. Segundo Martins (2016, p.

26):

[...] a escolarização orienta a edificação das funções psíquicas superiores e elas, concomitantemente, sustentam de forma cada vez mais ampla e rica o próprio sucesso da escolarização. A prática pedagógica compreendida dessa maneira assenta-se na articulação interna entre condições objetivas de ensino e condições subjetivas de aprendizagem expressa nos distintos períodos da vida.

Portanto, a prática pedagógica deve ser consciente, com o objetivo de auxiliar

as crianças nesse processo de desenvolvimento. Vygotski (2012) postula que a

atenção voluntária pode ser ensinada, aprendida e desenvolvida pelas crianças por

meio de situações concretas, como ele mesmo comprovou em seus experimentos,

em que, inicialmente, os participantes não sabiam no que exatamente deveriam

focar sua atenção. Entretanto, depois de ensinados a utilizarem os signos e

instrumentos disponíveis, não erravam mais suas respostas.

O que devemos reforçar e defender, é que os alunos não cheguem à escola

prontos, não significa que estar em uma determinada idade lhe caracteriza com

todos as funções desenvolvidas, “os processo naturais são uma função determinada

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pelos processos artificiais” (idem p. 259), o que falta na maioria das situações é uma

orientação, um modelo, uma estimulação, para que, assim, a criança possa agir,

posteriormente, sozinha.

O ideal seria adotar os princípios apresentados por Davídov e Márkova (1987,

p. 332)

[...] cada período evolutivo não é estudado isoladamente, mas do ponto de vista das tendências gerais de desenvolvimento, tendo em conta as idades anteriores e seguintes; as peculiaridades da idade (quadros cronológicos e conteúdo) eles não são estáticos, mas são determinados por fatores histórico-sociais, por exigências da sociedade; cada idade tem reservas de desenvolvimento, que podem ser mobilizadas se organizarmos de maneira especial as atividade da criança em relação à sua realidade circundante; a passagem de uma idade para outra e as neoformações psíquicas são determinadas pela mudança nos tipos de atividade principal, na situação social de desenvolvimento, nas interações da pessoa com o meio.

Baseando o ensino nesses princípios, seria mais simples cumprir o papel do

professor postulado por Asbahr (2016, p. 180) “propor tarefas de estudo que

possibilitem aos estudantes a reconstrução do movimento dialético do pensamento”.

Além disso, a autora ressalta a importância do docente selecionar atividade que

promovam autonomia para resolver situações-problema e, principalmente, dar

preferência para atividades realizadas em grupo, considerando a teoria de zona de

desenvolvimento proximal, em que os alunos podem também aprender com seus

pares, tornando o ensino mais atrativo. “A motivação social advinda do(a)

professor(a) diminui no decorrer da escolarização, mas aumenta o papel do grupo

de amigos no processo de desenvolvimento e formação dos motivos” (Idem, p. 176).

Pensando no TDA-H dentro deste entendimento proposto por Davídov e

Márkova (1987) e Asbahr (2016), devemos observar que a criança não deve ser

avaliada apenas por sua idade biológica. É preciso considerar que a atenção

voluntária é ensinada na escola, então dentro do ambiente escolar o professor pode

buscar maneiras de auxiliar nesse desenvolvimento, a atividade de estudo é um

meio para isso.

Dessa forma, as propostas de ensino devem fugir da memorização mecânica

e focar no desenvolvimento do pensamento teórico, na resolução de situação-

problema, na autonomia do aluno, reconhecendo que a falta dessa organização no

ensino acaba por causar o desinteresse das crianças, causando problema de

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indisciplina, que atualmente é diagnosticado como TDA-H, com tendência deste

aluno normal, ser encaminhado para o AEE por força da lei.

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4 MÉTODO A construção do conhecimento demanda, então, a apreensão do „conteúdo‟ do fenômeno, prenhe de mediações históricas concretas que só podem ser reconhecidas à luz das abstrações do pensamento, isto é, do pensamento teórico (MARTINS, 2015, p. 36, grifo da autora).

Após realizar leituras e compreender que a teoria da Psicologia Histórico-

Cultural não poderia ser desligada de seu método e de suas bases materialista

histórico dialética, compreendendo que o sistema econômico capitalista determina o

cenário no qual ocorrem os fenômenos sociais, optei por me dedicar a desenvolver

uma aproximação ao método materialista histórico dialético em minha pesquisa.

Chamo de aproximação por compreender que o método escolhido exige um

aprofundamento teórico, abstrações que talvez o curto período do mestrado não me

permita realizar. Mas dediquei-me muito às leituras, buscando ser o mais fiel

possível aos procedimentos metodológicos, com a consciência de que o ensino

formal nos educa para desenvolver um pensamento simplificado, que busca

respostas imediatas para observações e, na maioria das vezes, resulta apenas na

descrição dos fenômenos, sem de fato propor mudanças para o que está posto, nem

fazer uma crítica que visa iniciar uma revolução.

Nagel (2015, p. 19) destaca o quanto é difícil realizar este tipo de pesquisa,

pois pensamos em “método à moda da sociedade burguesa”, isso quer dizer que os

fenômenos são olhados como se existisse uma sistematização linear para os

acontecimentos, exatamente o contrário do materialismo histórico dialético:

A busca metodológica para Marx consiste, exatamente, em desvendar o movimento, identificar quais são as condições de existência de uma determinada formação social, dar conta da luta que os homens travam entre si, explicar como e porque os homens produzem e satisfazem necessidades. [...] reconhecer o homem como transformando continuamente sua natureza, um movimento perene acionado pelas contradições. (Idem, p. 24)

O método materialismo histórico dialético não possui etapas, passos, a serem

seguidos, como em uma análise quantitativa, ou regras inflexíveis:

Muitos pesquisadores tratam do método reduzindo-o a um conjunto de regras que, ao serem aplicadas no processo de pesquisa, os

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levarão à obtenção dos resultados desejados. Assim, o método fica restrito à técnica, não promovendo a compreensão de uma concepção metodológica como corpo teórico integrado. (MASSON, 2007, p. 105)

O materialismo histórico dialético requer que se faça uma relação entre o

método e a teoria escolhida “o „método‟ materialista histórico e dialético está

intimamente vinculado a uma postura, uma concepção de mundo, um modo de ser e

agir.” (DEITOS; SOBZINSKI, 2015, p. 102 grifo dos autores). Devido a isso, na

seção de Psicologia Histórico-Cultural, foram apresentadas algumas das

definições/termos da teoria, para facilitar esta compreensão de mundo e de homem

que faz a interligação do método com a mesma.

Portanto, devemos considerar que “dessa forma, quando optamos por uma

concepção metodológica não podemos desconsiderar os postulados teóricos que lhe

dão sustentação, pois nenhum princípio metodológico está „autossustentado de

abstrações desencarnadas‟” (MASSON, 2007, p. 105, grifos da autora).

Busco verificar o fenômeno das políticas educacionais voltadas ao TDA-H em

sua totalidade, sem desconsiderar a história que é o cenário deste movimento, as

tramas sociais, o contexto cultural e, principalmente, com um olhar crítico, fazer

proposições de mudança e reflexões para esta realidade.

Tenho como objetivo geral analisar as Leis e Projetos de Leis no âmbito

federal, estadual e municipal que tratam do Transtorno de Déficit de

Atenção/Hiperatividade no contexto escolar e, como objetivos específicos, traçar um

perfil da legislação: quem propôs, quando e porquê; identificar qual conceito de

atenção é apresentado nos textos legais e de que áreas do conhecimento são esses

conceitos; e averiguar qual a proposta de intervenção das Leis e PLs para o âmbito

educacional/escolar.

No estudo das políticas educacionais, Masson (2012, p. 2) destaca que o

método tem grande relevância:

A análise de artigos e relatórios de pesquisa sobre políticas educacionais indica que os referenciais teóricos que fundamentam as pesquisas são fatores determinantes no sentido de configurar análises mais ou menos abrangentes, com maior ou menor nível de conceptualização e generalização, com maior ou menor potencial de constituir-se em uma análise crítica.

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No campo das políticas educacionais, as pesquisas não têm apresentado

aprofundamento nas “questões metodológicas e as discussões sobre referenciais

analíticos e sobre fundamentos epistemológicos” (Idem, p. 8). Além disso, a autora,

por meio de um levantamento de dissertações e teses que utilizaram o materialismo

histórico dialético tratando de políticas educacionais, concluiu que são poucos os

trabalhos que apresentam este enfoque.

Deitos e Sobzinski (2015, p. 112) consideram “importante na pesquisa sobre

políticas educacionais a contribuição do materialismo histórico e dialético com o

intuito de desvelar a política educacional em sua essência”, avaliando “o embate de

forças pelo qual é definida e implementada uma política educacional”.

Para Deitos e Sobzinski (2015) e Masson (2007; 2012), o método materialista

histórico dialético seria ideal para a análise de políticas educacionais, pensando o

seu objetivo de analisar o fenômeno em sua totalidade e movimento considerando

as contradições existentes, sem perder de vista que o capitalismo é que coordena

toda a movimentação política e social, “de fato tais políticas educacionais são

evidentemente elaboradas por organismos voltados aos interesses econômicos e

que afastam dessa forma a demanda da sociedade” (DEITOS; SOBZINSKI, 2015, p.

112).

Masson (2007, p. 106) afirma que o método pelo método e sua apresentação

em uma pesquisa não “contribuirá para a transformação da realidade, porém sem a

clareza dos fundamentos de um método para a explicação da realidade torna-se

mais difícil a tarefa de compreensão e transformação do real”. Os autores Deitos e

Sobzinski (2015, p. 112) apontam que a compreensão das políticas educacionais

dentro do método de Vigotski aplicado à psicologia pautada em Marx, contribui para:

a) [...] apreender o significado da política a partir da compreensão da lógica capitalista; b) não separação entre método e teoria, importância da epistemologia marxista como relação entre as categorias da dialética materialista e da obra marxista; c) proposição de análise da política a partir de uma totalidade social; d) busca da apreensão da realidade, a partir da perspectiva de totalidade, das mediações presentes nas partes específicas, a fim de se perceber as contradições presentes; e) captar as políticas numa perspectiva de totalidade que requer estabelecer mediações entre partes específicas com o intuito de perceber as determinações recíprocas e as contradições entre elas; f) busca desvelar a política em sua essência, o que pressupõe considerá-la como expressão da correlação de forças presentes no processo de definição e implementação; g) procura articular a singularidade, a particularidade e a

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universalidades, pois uma política educacional é sempre um recorte, uma singularidade que ganha significado na particularidade de um momento histórico e é concebida nas determinações mais universais que advém do sistema orgânico do capital, a partir de suas contradições nos campos científico, tecnológico, econômico, cultural, ético-político e educacional; h) que busca compreender a essência das determinações sócio ontológicas para delimitar os limites e possibilidades sociais (e educacionais) para a superação da autorreprodução do capital.

Dentro do método, Vigotsky (2009) propõe uma análise que considere o

movimento dos fenômenos, que devemos compreender que tudo está em constante

movimento, promovendo modificação e sendo modificado ao mesmo tempo,

cortando com um pensamento dual, que vê fenômenos sociais como sólidos e

delineados:

Esta pode ser qualificada como análise que decompõe em unidades a totalidade complexa. Subentendemos por unidade um produto da análise que, diferente dos elementos, possui todas as propriedades que são inerentes ao todo e, concomitantemente, são partes vivas e indecomponíveis dessa unidade. A chave para explicar certas propriedades da água não é sua fórmula química, mas o estudo das moléculas e do movimento molecular. [...] A psicologia que deseje estudar as unidades complexas precisa entender isso. Deve substituir o método de decomposição em elementos pelo método de análise que desmembra em unidades. Deve encontrar essas propriedades que não se decompõem e se conservam, são inerentes a uma dada totalidade enquanto unidade, e descobrir aquelas unidades em que essas propriedades estão representadas num aspecto contrário para, através dessa análise, tentar resolver as questões que se lhe apresentam. (p. 8)

Na tentativa de seguir esta análise, proposta pelo autor as unidades de

análise foram determinadas pensando no indivisível e vital para o fenômeno das

políticas educacionais que tratam do TDA-H no âmbito escolar. Segundo Asbahr

(2011, p. 104), podemos definir as unidades como “o produto da análise que possui

todas as propriedades inerentes ao todo, parte indecomponível do todo que o

explica por representar sua essência”.

De acordo com Masson (2012) e Asbahr (2012), o materialismo histórico

dialético entende que o concreto é o ponto de partida para a pesquisa, sendo ele

chamado de visão caótica, real caótico, ele é a partida, e com a análise, abstrações

e mediações teóricas podemos fazer o caminho do abstrato ao concreto pensado.

Pois à primeira vista os fenômenos apresentam apenas o superficial, existindo muito

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mais que compõem este todo. Duarte (2000, p. 84) define que a pesquisa pautada

no materialismo histórico dialético vai além das aparências e descrição:

A essência do fenômeno na sua forma mais desenvolvida não se apresenta ao pesquisador de forma imediata, mas sim de maneira mediatizada e essa mediação é realizada pelo processo de análise, o qual trabalha com abstrações. Trata-se do método dialético de apropriação do concreto pelo pensamento científico através da mediação do abstrato. A análise seria um momento do processo de conhecimento, necessário à compreensão da realidade investigada em seu todo concreto.

O que é a totalidade dentro deste método? Segundo Deitos e Sobzinski

(2015), “analisar totalidade, a partir da concepção materialista histórica e dialética,

requer a apreensão da realidade em suas contradições e antagonismos, ou seja,

analisar o conjunto de fatos estruturados, o todo à unidade complexa não

cognoscível imediatamente” (p. 106) e dentro do contexto das políticas educacionais

as contradições estão marcadas pelo governo, que tende a manter o status quo,

capitalismo, atender os interesses da classe dominante, portanto é um jogo de

forças, sempre em movimento.

Para poder atender ao meu objetivo, realizei uma pesquisa documental,

levantando as Leis e Projetos de Lei sobre o TDA-H no âmbito escolar, embasada

na literatura da psicologia histórico-cultural, buscando entender por que existem

esses documentos legais voltados à educação de alunos que apresentam falta de

atenção, diagnosticados com TDA-H.

A pesquisa documental, segundo Sá-Silva, Almeida e Guindani (2009), é

considerada de grande relevância, pois apresenta uma vasta compilação de dados,

os quais não podem ser compreendidos fora do contexto histórico e social do qual

fazem parte sua elaboração e vigência. Quando o material coletado não possui um

tratamento prévio, como Leis e PLs, é classificado como um documento de primeira

mão, sem interpretações. Silva et. al. (2009, p. 4556) classificam documentos como

“[...] todas as realizações produzidas pelo homem que se mostram como indícios de

sua ação e que podem revelar suas ideias, opiniões e formas de atuar e viver”.

O critério de inclusão para a seleção do material foi de Leis e Projetos de Leis

que abordassem o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade no contexto

escolar, sendo descartados documentos que não mencionassem a escola e a

educação, no sentido da educação escolar formal, em suas ementas.

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Os documentos que compõem o corpus da pesquisa são Leis e Projetos de

Leis, nacionais, estaduais e municipais, datadas entre 2010 – ano do Projeto de Lei

nacional que trata sobre o TDA-H no campo da educação (BRASIL, 2010) – até

janeiro de 2017, por ser o prazo para a coleta de dados, considerando o período de

dois anos estipulado pelo MEC para a duração de um curso de mestrado, coletados

por meio das fontes online disponibilizadas, no âmbito federal, os sites da Câmara20

e do Senado21, onde encontramos o banco de dados de legislação, que

disponibilizam não só as matérias nacionais, como também as estaduais e

municipais.

No âmbito estadual, a busca foi realizada por meio do site do Planalto

(http://www4.planalto.gov.br/legislacao) que direciona para os sites das Assembleias

Legislativas dos estados, sendo visitados os 26 sites estaduais, mais o site do

Distrito Federal (DF), que constam na página do Planalto Federal. Posteriormente,

também foram visitados os sites das câmaras municipais das 26 capitais e do DF.

Utilizei as palavras-chave “Transtorno de Déficit de Atenção”, “TDAH” e

“hiperatividade” para fazer o primeiro levantamento nestes sites.

Como fonte de dados, utilizei também a cartilha da Associação Brasileira do

Déficit de Atenção (ABDA), intitulada Direito dos Portadores de TDAH (Doutrina e

Jurisprudência), disponível no site da ABDA (http://www.tdah.org.br/) e, na mesma

fonte, acessei a seção intitulada Leis municipais e estaduais sobre TDAH, bem

como a tabela intitulada Leis e Projetos de Lei sobre o TDAH.

Foram levantados no total 29 textos legislativos, divididos entre 10 Leis e 19

PLs, com anos de publicação variados, no intervalo de 2010 a 2017, posteriormente

foram excluídas seis PLs, pois já haviam sido arquivadas e uma Lei, por não tratar

do TDA-H no contexto escolar. Como ferramenta para organizar os dados, Silva et.

al. (2009) sugerem que, após a coleta, o material seja dividido em quadros ou fichas,

utilizando na análise a categorização dos dados. Como inspiração, utilizei o trabalho

de Oliveira e Souza (2013) que trabalharam com legislações e quadros para

apresentarem seus dados brutos. Portanto, foram elaborados quadros com os dados

iniciais: ano, casa legislativa/local, site, número do Projeto de Lei/Lei,

autor/partido/situação, ementa e obrigações da escola.

20

<http://www2.camara.leg.br/>

21 <http://www12.senado.leg.br/hpsenado>

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Para realizar a análise dos dados, com a finalidade de responder meus

objetivos, dividi os conteúdos das Leis e Projetos de Lei levantados dos sites, em

categorias de análise, sem perder a categoria da totalidade concreta que segundo

Benitez (2014, p. 8) é “explicitar, de um objeto de pesquisa delimitado, as múltiplas

determinações e mediações históricas que o constitui. A historicidade dos fatos

sociais consiste fundamentalmente na explicitação da multiplicidade de

determinações”.

Após a elaboração dos quadros por categorias, analisei os conteúdos

criticamente, com o aporte teórico da PHC. Considerando que o ponto de partida

será o “real imediato” para o “concreto pensado”, segundo Asbahr (2011), a análise

na verdade é um movimento, com etapas, do concreto caótico, que são os dados em

si, posteriormente a descrição analítica e teórica, para depois haver a “reconstrução

do concreto mediado pelas abstrações” (p. 105). Assim, seguindo o procedimento,

passando as fases: real aparente, mediações abstratas, retornando ao real

aparente, com a construção do novo e propondo a transformação (MARTINS, 2015,

p. 40).

Diante dos dados coletados, construí as seguintes categorias para a

descrição empírica e defini estes eixos de análise: a) Desvendando a produção de

Leis e PLs: foi analisado o número total de Leis e PLs – apresento

quantitativamente as legislações por esfera nacional, estadual e municipal, por

região geográfica e por partido político proponente; b) A (in)compreensão sobre o

TDA-H na forma da lei: onde descrevo os conceitos de TDA-H apresentado ou

subentendido nas Leis e PLs aqui analisadas, se tem uma abordagem médica,

psicológica ou pedagógica; e c) A judicialização do não aprender: aqui apresento

as proposições para enfrentamento da queixa escolar no âmbito escolar.

Para as unidades de análise, defini: a) atenção e desatenção e b) políticas

educacionais e queixa escolar. Essa escolha foi feita após a leitura de Psicologia

Histórico-Cultural e a leitura dos dados caóticos. Ao final, busco, como sugerido por

Asbahr (2011), superar a mera descrição do fenômeno.

Na próxima seção, apresento a análise dos dados, dividida conforme

explicado anteriormente: primeiro a descrição empírica, teórica e desenvolvimento

das unidades de análise.

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5. CONCRETO CAÓTICO - DESCRIÇÃO EMPÍRICA

Nesta seção, apresento o chamado concreto caótico que segundo Masson

(2012) e Asbahr (2012) são os dados em si, o primeiro olhar sobre fenômeno, sem

passar pelas abstrações mediadas pela teoria. Dessa forma, os dados serão

apresentados divididos em categorias para melhor compreensão, como expliquei na

seção anterior ao definir as seguintes categorias: a) Desvendando a produção de

Leis e PLs: foi analisado o número total de Leis e PLs; b) A (in)compreensão sobre o

TDA-H na forma da Lei; e c) A judicialização do não aprender.

5.1 DESVENDANDO A PRODUÇÃO DE LEIS E PLS

Nessa categoria, apresento quantitativamente as legislações por esfera

nacional, estadual e municipal, por região geográfica e por partido político

proponente. Na busca por meus dados, utilizei a internet como ferramenta principal,

acessando os sites oficiais da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, das

Assembleias Legislativas dos estados e do Distrito Federal, bem como das câmaras

municipais das 26 capitais mais o DF. A busca se fez com as mesmas palavras-

chave “transtorno de déficit de atenção”, “TDAH” e “hiperatividade”.

No site da Câmara dos Deputados (Portal da Câmara dos Deputados),

acessei a aba intitulada “atividade legislativa”, onde estão disponíveis os textos

legais. No site do Senado Federal, a pesquisa foi realizada na aba intitulada

“atividade legislativa”, por intermédio da plataforma Rede de informações

Legislativas e Jurídicas (LexML Brasil). Achei relevante fazer busca no site próprio

da LexML, para verificar se encontraria mais algum dado; posteriormente, fui nas

páginas das Assembleias Legislativas dos estados, sendo visitados os 26 sites

estaduais, mais o site do Distrito Federal (DF), que constam na página do Planalto

Federal, e os sites das câmaras municipais das capitais brasileiras mais o DF.

Além das plataformas digitais citadas, utilizei a cartilha da Associação

Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA) intitulada Direito dos Portadores de TDAH

(Doutrina e Jurisprudência), disponível no site da ABDA (http://www.tdah.org.br/)

e, na mesma fonte, acessei a seção intitulada Leis municipais e estaduais sobre

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TDAH, bem como a tabela intitulada Leis e Projetos de Lei sobre o TDAH. Uma

das proposições que foram coletadas, do município de Anapólis, continha apenas

um Projeto de Lei, de 2013, sem numeração. Isso me levou ao site da Câmara

Municipal de Anápolis22 em busca da numeração da PL, porém, não encontrei a

matéria, mas encontrei a Lei Nº 3.895/2016 que estava em meus critérios de

inclusão e, por isso, faz parte da pesquisa. Isso mostra que o próprio site da ABDA

não está atualizado e alguns materiais encontram-se incompletos. O site da ABDA

foi escolhido por ser uma associação no âmbito nacional que tem site e livros

publicados sobre o TDA-H e pode exercer influência ou ser consultada pela

sociedade como fonte de informação.

Após o levantamento, cheguei ao total de 29 textos, entre Leis e PLs, foram

excluídos, sete legislações por já terem sido arquivadas e não estarem mais em

tramitação. Totalizando, portanto 22 textos, nove Leis e 13 PLs, com anos de

publicação variados, no intervalo de 2010 a 2017. Sendo 2010 o ano da proposta da

legislação nacional sobre o TDA-H nas escolas (BRASIL, 2010), e 2017 o ano de

finalização da coleta dos dados. A figura 1 ilustra a quantidade de textos propostos a

cada ano.

Figura 1- Quantidade de textos propostos por ano

Fonte: Sites da Câmara Federal, Senado Federal, Câmara Legislativa das capitais e ABDA.

22

Ver mais em: <https://www.anapolis.go.leg.br/>.

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Posteriormente, dividi os materiais coletados de acordo com o âmbito ao qual

se referem (nacional, estadual e municipal), resultados apresentados no quadro 1.

Quadro 1. Total das Leis e Projetos de Leis levantadas das fontes mencionadas anteriormente, divididos de acordo com o âmbito das propostas.

Âmbito da Lei ou PL Quantidades

Nacional 3

Estadual 7

Municipal 12

Total 22

Fonte: Quadro construído pela pesquisadora.

Na busca por verificar qual a região brasileira onde mais foram feitas

propostas sobre o TDA-H para o cenário escolar, construí o quadro 2. Para incluir a

esfera nacional, classifiquei a região de acordo com a localidade a qual o político

proponente representa. O Centro-Oeste foi o que mais apresentou propostas, as

demais regiões possuem uma média similar de proposições.

Quadro 2. Leis e Projetos de Leis levantadas das fontes mencionadas anteriormente, divididos de acordo com as regiões de cada proposta, as de Leis e PLs nacionais foram

classificadas de acordo com a região que o político proponente representa.

Região da Lei ou PL Quantidades

Norte 3

Nordeste 3

Centro-Oeste 7

Sudeste 4

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Sul 5

Total 22

Fonte: Quadro construído pela pesquisadora.

Na busca por conhecer quais são os partidos políticos atuantes nessa

causa,apresento o quadro 3, destacando que uma das proposições foi elaborada por

dois políticos de partidos diferentes, a Lei 7354/2016, do município do Rio de

Janeiro, proposta por Nilvaldo Mulim (PR), Tio Carlos (DEM), devido a isto a

somatória de propostas por partido totaliza 23.

Quadro 3. Leis e Projetos de Leis levantadas das fontes mencionadas anteriormente, divididos de acordo com os partidos políticos de seus proponentes.

PARTIDO POLÍTICO Total de proposições

por partido

Democratas (DEM) 1

Partido da República (PR) 3

Partido Democrático Trabalhista (PDT) 2

Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMBD) 1

Partido dos Trabalhadores (PT) 3

Partido Ecológico Nacional (PEN) 1

Partido Popular Socialista (PPS) 1

Partido Progressista (PP) 2

Partido Social Democrático (PSD) 2

Partido Socialista Brasileiro (PSB) 1

Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) 1

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Partido Trabalhista Cristão (PTC) 1

Partido Trabalhista Nacional (PTN) 2

REDE 1

Solidariedade (SDD) 1

TOTAL 23

Fonte: Quadro construído pela pesquisadora.

Finalizo essa subseção, apresentando um panorama sobre os dados gerais

dividido em dois quadros (quadro 4 e quadro 5) a respeito das legislações

selecionadas, na tentativa de mapear a construção da legislação e o seu movimento

de criação/proposição e efetivação.

Quadro 4. Panorama geral das Leis e Projetos de Leis levantadas das fontes mencionadas anteriormente, divididos por ano, localidade, número, autor e partido político.

Nº ANO Localidade Leis e PLs Autor/Partido Político

1. 2010 Nacional PL 7081/2010 Gerson Camata (PMDB/ES)

2. 2010 Santa Cataria LEI Nº 15.113 Gelson Merísio (PSD)

3. 2011 Distrito Federal PL 514/2011 Celina Leão (PP)

4. 2012 Rio de Janeiro Lei Nº 5.416/12 Tio Carlos (DEM)

5. 2012 Piauí PLO 221/2011 Fabio Núñez Novo (PT)

6. 2012 Pirenópolis (GO) Lei nº712/2012 Jovelino Moreira (PSD)

7. 2013 Teófilo Otoni(MG) Lei nº 6.631 Rômulo Barreiros/PSB

8. 2013 Recife (PE) PLO 233/2013 Eriberto Rafael (PTC)

9. 2013 Viamão (RS) Lei Nº4165/2013 Silvio Roberto Streit Junior (PTB)

10. 2015 Nacional PL 4027/2015 Marcelo Belinati (PP)

11. 2015 Acre LEI N. 3.112 Raimundinho da Saúde (PTN)

12. 2015 Amazonas PL Nº269/2015 Dermilson Chagas (PEN)

13. 2015 Distrito Federal PL 641/015 Agaciel Maia (PR)

14. 2015 Distrito Federal PL 260/2015 Professor Reginaldo Veras (PDT)

15. 2015 Vitória (ES) PL 198/2015 Vinícius Simões (PPS)

16. 2016 Nacional PL 5289/2016 João Derly (REDE)

17. 2016 Fortaleza (CE) Lei Nº 10502 Eulogio Alves de Melo (PDT)

18. 2016 Rio de Janeiro Lei Nº 7354/2016 Nivaldo Mulim (PR) Tio Carlos (DEM)

19. 2016 Anápolis (GO) Lei Nº 3.895 Prof. Maria Geli Sanches (PT)

20. 2016 Distrito Federal PL 870/2016 Agaciel Maia (PR)

21. 2017 Manaus (AM) PL 054/2017 Felipe Souza (PTN)

22. 2017 Porto Alegra (RS) PLL 125/17 Aldacir Oliboni (PT) Fonte: Quadro construído pela pesquisadora.

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Quadro 5. Panorama geral das Leis e Projetos de Leis levantadas das fontes mencionadas anteriormente, quanto às informações analisadas.

Nº ANO Localidade Leis e PLs Informações

1. 2010 Nacional PL 7081/2010 Texto da PL e voto em separado

2. 2010 Santa Catarina LEI Nº 15.113 Texto da Lei

3. 2011 Distrito Federal PL 514/2011 Texto da PL e justificativa

4. 2012 Rio de Janeiro Lei Nº 5.416/12 Texto da Lei

5. 2012 Piauí PLO 221/2011 Texto da PLO, justificativa, relatório e voto

6. 2012 Pirenópolis (GO) Lei nº712/2012 Texto da Lei

7. 2013 Teófilo Otoni (MG)

Lei nº 6.631 Texto da Lei

8. 2013 Recife (PE) PLO 233/2013 Texto de PLO e justificativa

9. 2013 Viamão (RS) Lei Nº4165/2013 Texto da Lei

10. 2015 Nacional PL 4027/2015 Texto PL e justificativa

11. 2015 Acre LEI N. 3.112 Texto da Lei

12. 2015 Amazonas PL Nº269/2015 Texto da PL

13. 2015 Distrito Federal PL 641/015 Texto PL e justificativa

14. 2015 Distrito Federal PL 260/2015 Texto da PL e justificativa

15. 2015 Vitória (ES) PL 198/2015 Texto da PL

16. 2016 Nacional PL 5289/2016 Texto da PL e justificativa

17. 2016 Fortaleza (CE) Lei Nº 10502 Texto da Lei

18. 2016 Rio de Janeiro Lei Nº 7354/2016 Texto da Lei

19. 2016 Anápolis (GO) Lei Nº 3.895 Texto da Lei

20. 2016 Distrito Federal PL 870/2016 Projeto de PL e justificativa

21. 2017 Manaus (AM) PL 054/2017 Texto PL e justificativa

22. 2017 Porto Alegre (RS) PLL 125/17 Texto PLL e exposição de motivos

Fonte: Quadro construído pela pesquisadora.

Na próxima subseção irei apresentar mais detalhes dos textos trazendo as

definições utilizadas nas propostas.

5.2 A (IN)COMPREENSÃO SOBRE O TDA-H NA FORMA DA LEI

Nesta subseção, trago os conceitos de TDA-H apresentados ou

subentendidos nas Leis e PLs com suas ementas (Quadro 5), para que possamos

compreender o que pretendem e, posteriormente, a definição de TDA-H e

desatenção escolhida por cada uma delas, a fim de analisar a qual abordagem está

relacionada, se médica, psicológica ou pedagógica, por meio de recortes das

definições apresentadas (Quadro 6).

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Quadro 6. Panorama geral das Leis e Projetos de Leis levantadas das fontes mencionadas anteriormente com suas ementas.

Nº Leis e PLs Ementas

1. PL 7081/2010 Dispõe sobre o diagnóstico e o tratamento da dislexia e do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade na educação básica.

2. LEI Nº 15.113 Dispõe sobre a implantação do Programa de Identificação e Tratamento do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade na rede estadual de ensino e adota outras providências.

3. PL 514/2011 Dispõe sobre o atendimento alternativo aos alunos, que apresentarem distúrbios do déficit de atenção com hiperatividade, matriculados nas escolas do ensino fundamental, da rede pública de ensino do Distrito Federal.

4. Lei Nº 5.416/12 Dispõe sobre as diretrizes adotadas pelo Município para realizar a orientação a pais e professores da Cidade do Rio de Janeiro sobre as características do transtorno do déficit de atenção –TDA.

5. PLO 221/2011 Institui a Politica de Promoção da Aprendizagem – Proap – no âmbito das redes estaduais de saúde e de educação e dá outras providências.

6. Lei nº712/2012 Dispõe sobre as medidas para identificação e tratamento de Dislexia e TDAH nas Redes Municipais e Privadas.

7. Lei nº 6.631 Dispõe sobre o diagnóstico e tratamento da Dislexia, do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade – TDAH, dentre outros distúrbios de aprendizagem, na educação básica e determina outras providências.

8. PLO 233/2013 Dispõe sobre os procedimentos a serem adotados para detectar, acompanhar e auxiliar o aluno portador do transtorno do déficit de atenção - tdah, na rede pública municipal de ensino e dá outras providências.

9. Lei Nº4165/2013

Dispõe sobre as diretrizes adotadas pelo município para a orientação a pais e professores sobre as características do transtorno do déficit de atenção – TODA e dá outras providências.

10. PL 4027/2015 Acrescenta o art. 26-B na Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, para instituir programas de diagnóstico, esclarecimentos, tratamento e acompanhamento do Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade – TDAH.

11. LEI N. 3.112 Dispõe sobre a identificação, o diagnóstico, acompanhamento integral e atendimento educacional escolar para estudantes da educação básica com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade – TDAH

12. PL Nº269/2015 Institui o programa de diagnóstico de TDAH – Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade nas Escolas Públicas do Estado do Amazonas.

13. PL 641/015 Dispõe sobre a implantação nas escolas da rede de ensino pública e particular do Distrito Federal, programas de diagnóstico, esclarecimento, tratamento do transtorno de déficit de atenção com hiperatividade – TDAH e do Distúrbio

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de Processamento Auditivo Central – DPAC.

14. PL 260/2015 Dispõe sobre o direito à igualdade de condições para o aluno com necessidades educacionais especiais e TDAH – Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, assegurando-lhe a opção de realização de provas em locais especiais acompanhados por profissionais de escola.

15. PL 198/2015 Dispõe sobre as diretrizes do diagnóstico, tratamento, acompanhamento dos alunos de escolas situadas neste município que possuem transtorno do déficit de atenção/hiperatividade

16. PL 5289/2016 Estabelece preceitos para o aperfeiçoamento da política educacional brasileira dos sistemas públicos de ensino, para a permanência e o sucesso escolar de alunos com distúrbios, transtornos e/ou dificuldades de aprendizagem, e dá outras providências.

17. Lei Nº 10502 Estabelece as diretrizes básicas para o diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos alunos das escolas da rede pública municipal de ensino, portadores de Transtorno do Déficit de Atenção com ou sem Hiperatividade – TDA/H

18. Lei Nº 7354/2016

O programa de diagnóstico e tratamento do transtorno do déficit de atenção e hiperatividade – TDAH e dá outras providências.

19. Lei Nº 3.895 Institui o processo de identificação, diagnóstico, tratamento e acompanhamento de transtornos de aprendizagem no município de Anápolis e dá outras providências.

20. PL 870/2016 Dispõe sobre a obrigação das escolas públicas e privadas, no âmbito do Distrito Federal, a disponibilizarem cadeiras em locais determinados aos portadores de Transtornos de Déficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH

21. PL 054/2017 Dispõe sobre as medidas a serem adotadas para identificar, acompanhar e auxiliar o aluno portador de TDAH e/ou dislexia na Rede Pública e Privada de Ensino do Município de Manaus e dá outras providências.

22. PLL 125/17 Institui a Política Municipal de Atenção Integral aos Educandos com Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) no Município de Porto Alegre.

Fonte: Quadro construído pela pesquisadora.

Gostaria de ressaltar alguns dos termos utilizados nas ementas, especial

ênfase é dada ao diagnóstico, identificação, tratamento e

acompanhamento/acompanhamento integral do aluno com possível TDA-H. A rede

de ensino mais visada é a rede pública, poucas são as proposições que se voltam

ao ensino privado. Além disso, devemos observar que em algumas propostas

utilizam a expressão “portadores de TDA-H”.

No quadro 6, apresento as definições de TDA-H utilizadas nos textos legais.

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Quadro 7. Apresentação da definição de TDA-H contida nas Leis e PLs.

Nº Leis e PLs Definição de TDA-H

1. PL 7081/2010 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

2. LEI Nº 15.113 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

3. PL 514/2011 De acordo com Sérgio Bourdon Cabral, o Distúrbio do Déficit de Atenção/Hiperatividade (DDAH) remonta a 1902, quando o médico inglês, George Still identificou crianças com alterações de comportamento que não poderiam ser explicadas por falhas educacionais ou ambientais. Sam Goldstein e Michael Goldstein, no livro “Hiperatividade – como desenvolver a capacidade de atenção da criança”, afirmam que a hiperatividade é um problema que não tem cura e que deve ser administrado, diariamente, na infância e na adolescência. Apontam, ainda, suas características – desatenção, agitação, excesso de atividade, emotividade, impulsividade e baixo limiar de frustração (dificuldade para adiar recompensas) – que interferem na integração da criança, com os pais, com a família, com os professores e com pessoas da comunidade, prejudicando o desenvolvimento de sua personalidade e o seu desempenho escolar.

4. Lei Nº 5.416/12 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

5. PLO 221/2011 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

6. Lei nº712/2012 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

7. Lei nº 6.631 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

8. PLO 233/2013 Segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDF), o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que aparece na infância (ocorre em 3 a 5% das crianças) e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ainda segundo a ABDF ele é reconhecido oficialmente por vários países e pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Em alguns países, como nos Estados Unidos, portadores de TDAH são protegidos pela lei quanto a receberem tratamento diferenciado na escola. O presente Projeto de Lei tem por objetivo detectar possíveis sintomas, diagnosticar, acompanhar e auxiliar o aluno portador do Transtorno do Déficit de Atenção (TDAH) na Rede Pública Municipal de Ensino, através de uma ação conjunta entre professores, coordenadores, diretores e profissionais de saúde.

9. Lei Nº4165/2013

Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento

10. PL 4027/2015 O Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade –

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TDAH – ocorre como resultado de uma disfunção neurológica no córtex pré-frontal (parte do cérebro responsável por manter e produzir concentração). Quando pessoas que têm TDAH tentam se concentrar, a atividade do córtex pré-frontal diminui, ao invés de aumentar (como no caso de pessoas que não têm o distúrbio). Os problemas causados pelo TDAH são: fraca supervisão interna, pequeno âmbito de atenção, distração, desorganização, hiperatividade, problemas de controle de impulso, dificuldade de aprender com erros passados e falta de previsão, entre outros.

11. LEI N. 3.112 Art. 3° Educandos com TDAH, que apresentam alterações no desenvolvimento da leitura e da escrita ou instabilidade na atenção que repercutam na aprendizagem, devem ter assegurado o acompanhamento específico voltado a sua dificuldade, da forma mais precoce possível, pelos seus educadores no âmbito da própria escola na qual estão matriculados, podendo contar com apoio e orientação da área de saúde, da assistência social e de outras políticas públicas existentes no Estado.

12. PL Nº269/2015 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

13. PL 641/015 O TDAH -Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade ocorre como resultado de uma disfunção neurológica no córtex pré-frontal (parte do cérebro responsável por manter e produzir concentração). Quando pessoas que têm TDAH tentam se concentrar, a atividade do córtex pré-frontal diminui, ao invés de aumentar (como no caso de pessoas que não têm o distúrbio).

14. PL 260/2015 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

15. PL 198/2015 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

16. PL 5289/2016 Diversos autores consideram o distúrbio de aprendizagem como psiconeurogênico, resultante de disfunções do sistema nervoso central. Esses distúrbios são intrínsecos e, presumivelmente, se devem a uma disfunção do sistema nervoso central, não

sendo resultantes de condições deficientes ou influências ambientais. Em relação às características dos indivíduos com distúrbio de aprendizagem, podem ser identificadas, de um modo geral, algumas comuns, como déficit de atenção, falhas no desenvolvimento e nas estratégias cognitivas para a aprendizagem, dificuldades na habilidade motora, dificuldade perceptual e problemas no processamento da informação recebida, dificuldade na linguagem oral e escrita, dificuldade na leitura, dificuldade em raciocínio matemático e comportamento social inapropriado. Quanto aos transtornos de aprendizagem, importante citar o que traz a Classificação Internacional de Doenças (CID 10 - F81): transtornos

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específicos do desenvolvimento das habilidades escolares são “transtornos nos quais as modalidades habituais de aprendizado estão alteradas desde as primeiras etapas do desenvolvimento.

17. Lei Nº 10502 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

18. Lei Nº 7354/2016

Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

19. Lei Nº 3.895 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

20. PL 870/2016 Sabe-se que crianças com TDAH são capazes de aprender, mas tem dificuldades de concentração na escola devido ao impacto que os sintomas têm sobre um bom desempenho nas atividades.

21. PL 054/2017 Não apresenta definição, nem texto disponível de justificativas para tal levantamento.

22. PLL 125/17 O transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico crônico, de origem genética, que aparece na infância e acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Chamado também de distúrbio do déficit de atenção, as pessoas que têm o distúrbio apresentam características especiais e diferenciadas. Ao mesmo tempo em que a inteligência, a criatividade e a intuitividade se apresentam de forma vigorosa, a desatenção, a impulsividade e a hiperatividade impedem o indivíduo de realizar todo o seu potencial.

Fonte: Quadro construído pela pesquisadora, com os dados selecionados das Leis e PLs.

Na maioria das Leis e PLs, podemos perceber que as definições adotadas

são mais da área da saúde, considerando a desatenção como uma desordem,

deficiência, distúrbio. Infelizmente, não tive acesso a todas as justificativas, em que

normalmente encontramos informações relacionadas ao entendimento do

parlamentar sobre o tema da Lei. A seguir, apresento a última categoria referente

aos dados em si, do concreto caótico.

5.3 A JUDICIALIZAÇÃO DO NÃO APRENDER

O objetivo é apresentar as proposições para enfrentamento da queixa escolar

de desatenção, especificamente o que cada legislação espera que a escola faça em

relação às crianças para auxiliá-las. Elaborei o Quadro 7 com o número de cada

política e recortes das proposições que considerei mais importantes de serem

repensadas dentro do viés da Psicologia Histórico-Cultural.

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Quadro 8. Apresentação das obrigações da escola com o aluno com TDA-H contidas nas Leis e PLs.

Nº Leis e PLs Proposições para as escolas

1. PL 7081/2010 Art. 3° As escolas de educação básica devem assegurar as crianças e aos adolescentes com dislexia e TDAH o acesso aos recursos didáticos adequados ao desenvolvimento de sua aprendizagem. Art. 4° Os sistemas de ensino devem garantir aos professores da educação básica cursos sobre o diagnóstico e o tratamento da dislexia e do TDAH, de forma a facilitar o trabalho da equipe multidisciplinar de que trata o art 2°.

2. LEI Nº 15.113 Art. 1º Fica autorizado o Governo do Estado a implantar o Programa de Identificação e Tratamento do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade - TDAH, na rede Estadual de Ensino, com ênfase para o Ensino Fundamental. Art. 2º O Programa de que trata o art. 1º deve ser aplicado na capacitação permanente do corpo docente com o objetivo de identificar os sintomas do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade - TDAH.

3. PL 514/2011 I - É obrigatório o entendimento alternativo aos alunos do ensino fundamental, da rede pública de ensino, que apresentam distúrbio do déficit de atenção em hiperatividade, II - A Secretaria de Estado de Educação definir as estratégias de intervenção junto aos alunos diagnosticados como “imperativos”; III- A Secretaria de Estado de Educação orientar as instituições educacionais, capacitar os professores envolvidos e conscientizar os pais das diferenças comportamentais dos filhos da importância de seu envolvimento no processo educativo.

4. Lei Nº 5.416/12

I – orientações a professores, coordenadores, diretores escolares e todo e qualquer agente educacional público do Município, fornecidas e ministradas por profissionais de saúde gabaritados, contendo os aspectos globais do TDA e suas implicações, com o objetivo precípuo de identificar possíveis portadores do transtorno entre os alunos do ensino fundamental; II – encaminhamento dos possíveis casos de TDA pela diretoria do equipamento de ensino público municipal do qual façam parte, para diagnóstico e tratamento nos equipamentos do Sistema Único de Saúde – SUS; III – tratamento diferenciado e adequado nos equipamentos de ensino fundamental municipais, em consonância com a sintomatologia do distúrbio, para os alunos que sejam diagnosticados como portadores de TDA;

5. PLO 221/2011 O projeto visa contribuir para a promoção da aprendizagem dos alunos por meio de identificação, diagnóstico, tratamento e acompanhamento dos alunos com distúrbios de aprendizagem e déficits visuais e auditivos. A ideia é que a PROAP seja

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desenvolvida de forma integrada com o Programa Saúde na Escola (PSE) e com o Sistema Único de Saúde (SUS). Dentre as ações de assistência aos alunos, a proposta pretende identificar, no ambiente escolar, os casos prováveis de distúrbios de aprendizagem e déficits visuais e auditivos; diagnosticar e tratar o problema; bem como acompanhar o desempenho escolar do aluno após o tratamento. De acordo com a lei, consideram-se distúrbios de aprendizagem a dislexia, a síndrome de Irlen, os distúrbios de aprendizagem relacionados à visão (Darvs), disgrafia, discalculia, disortografia e o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade.

6. Lei nº712/2012

Parágrafo único – A efetivação do previsto no caput deste Artigo refere-se à realização de exames e avaliações psicopedagógico nos alunos matriculados no 1º ano do Ensino Fundamental, em alunos já matriculados na rede, com o advento desta Lei, e em estudantes de qualquer série admitidos por transferência de outras escolas que não pertençam à rede pública e/ou privada do Município. Art. 2º – As medidas previstas por esta Lei deverão abranger a capacitação permanente dos educadores para que tenham condições de identificar os sinais da dislexia e TDAH - Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade nos estudantes.

7. Lei nº 6.631 Art. 3º - Fica assegurado o diagnóstico e tratamento da Dislexia, do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), dentre outros distúrbios de aprendizagem, em toda a Rede Municipal de Ensino, com acesso aos recursos didáticos pertinentes ao desenvolvimento do aluno. Parágrafo único – O Município, através da Secretaria Municipal de Saúde e Educação, fomentará a criação de Associação de Pais, a fim de que possam compartilhar experiências e condutas aplicáveis, visando proporcionar melhor qualidade de vida aos portadores de tais distúrbios. Art. 4º - A Secretaria Municipal de Educação cadastrará os alunos através de encaminhamento realizado pela equipe multidisciplinar, organizará cursos, campanhas educativas, seminários e atividades pedagógicas; visando capacitar os profissionais da rede pública municipal de ensino a identificar e abordar estes transtornos.

8. PLO 233/2013 I - capacitação e orientação aos professores, coordenadores e diretores da Rede Pública Municipal de Ensino, fornecidas e ministradas por profissionais de saúde, credenciados ou integrantes da rede municipal, sobre os aspectos globais do TDAH e suas implicações, com o objetivo de identificar possíveis sintomas desse transtorno no comportamento do aluno; II - consultar os pais ou responsáveis pelo aluno, esclarecendo-os sobre os possíveis sintomas do TDAH, para

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que possam se manifestar, por escrito, concordando ou não com a realização dos exames e caso seja necessário, inicio do tratamento; III - encaminhamento dos possíveis casos de TDAH, através da diretoria da escola ao profissional competente, para diagnóstico e tratamento nas unidades de saúde pública do município, observado o disposto no inciso anterior; IV - acompanhamento adequado ao aluno portador do TDAH, em consonância com a sintomatologia, de acordo com as recomendações clínicas e pedagógicas, durante todo período escolar;

9. Lei Nº4165/2013

Art. 1 - Orientações aos professores, coordenadores, diretores escolares e todo e qualquer gente educacional público do município, fornecidas ministradas por profissionais de saúde especializados, contendo os aspectos globais do TDA e suas implicações, com objetivo identificar possíveis portadores do transtorno nas escolas de ensino fundamental Art. 2 - Encaminhamentos para diagnóstico e tratamento dos possíveis casos de TDA pela diretoria da escola ao sistema único de saúde - SUS Art. 3 - Tratamento diferenciado e adequando nos estabelecimentos de ensino do municipal os alunos diagnosticados como portadores de TDA

10. PL 4027/2015 Art. 26-B. É obrigatório a implantação de programas de diagnóstico, esclarecimentos, tratamento e acompanhamento do Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), nas escolas públicas e particulares de ensinos infantil e fundamental. Realizar encontros periódicos na escola entre a equipe multidisciplinar e os responsáveis pelo aluno diagnosticado com o transtorno, para acompanhamento do tratamento e possíveis esclarecimentos de dúvidas que porventura vierem a surgir;

11. LEI N. 3.112 Parágrafo único. O acompanhamento integral previsto no caput compreende a identificação precoce, encaminhamento para diagnóstico, apoio educacional na rede de ensino, bem como apoio terapêutico especializado na rede de saúde. Art. 2º As escolas da educação básica, da rede pública e privada, com o apoio da família e dos serviços de saúde existentes, devem garantir o cuidado e a proteção ao educando com TDAH visando seu pleno desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, contando com as redes de proteção social existentes no Estado, de natureza governamental ou não governamental. Art. 3° Educandos com TDAH, que apresentam alterações no desenvolvimento da leitura e da escrita ou instabilidade na atenção que repercutam na aprendizagem, devem ter assegurado o acompanhamento específico voltado a sua dificuldade, da forma mais precoce possível, pelos seus educadores no âmbito da própria escola na qual estão matriculados, podendo contar com apoio e orientação da área

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de saúde, da assistência social e de outras políticas públicas existentes no Estado. Art. 4° Necessidades específicas no desenvolvimento do estudante serão atendidas pelos profissionais da rede de ensino em parceria com profissionais da rede de saúde.

12. PL Nº269/2015

Art. 2.º A Secretaria Estadual de Educação, nos casos da rede estadual de educação, e a Secretaria Municipal de Educação, nos casos da rede municipal de educação, viabilizarão o treinamento de diretores, pedagogos e professores da rede pública, que atuam com as crianças, em cuja idade escolar, sejam diagnosticados com sintomas de Hiperatividade, através de parceria com a Secretaria Estadual e Municipal de Saúde, fornecerão profissionais especializados na área, tais como psicólogos, fonoaudiólogos, psiquiatras, entre outros, para o treinamento dos profissionais de educação, na condução do processo ensino-aprendizagem para crianças com diagnóstico de TDAH. Art. 3.º Cada instituição de ensino deverá oferecer pelo menos, uma sala, em cada escola, onde o professor tenha condições de acompanhar as crianças com diagnóstico de TDAH. Art. 4.º No início do ano letivo, os professores, deverão observar os alunos, e encaminhá-los à classe com professores especializados

13. PL 641/015 Art. 2 –Os programas consistindo na orientação periódica aos professores, coordenadores, diretores e demais funcionários da escola, através de pesquisas multidisciplinar (pedagogos, psicopedagogos, psicólogos, pediatra, psiquiatras, neurologistas, fonoaudiólogos, sociólogos, assistente sociais, entre outros integrantes da rede pública estadual de saúde), sobre os aspectos do TDAH e DPAC e as consequências, como identificar os e como lidar com os alunos diagnosticados.

14. PL 260/2015 Art. 1 - Esta lei trata sobre normas específicas de educação, assegurando o aluno matriculado em estabelecimentos privados e públicos do Distrito Federal, com necessidades educacionais especiais e TDAH - transtorno do déficit de atenção hiperatividade o direito de opção a realização de provas em locais especiais sobre a supervisão de um profissional de educação.

15. PL 198/2015 I- Promover orientações a professores, coordenadores, diretores escolares e todo e qualquer a gente educacional, contendo os aspectos globais do TDA/H e suas implicações, com objetivo precípuo de identificar possíveis portadores do transtorno; II- Tratamento diferenciado e adequado nas escolas em consonância com a sintomatologia do distúrbio, para os alunos que sejam diagnosticados como portadores de TDA/H; IV - Acompanhamento do aluno portador de TDA/H durante todo período do curso fundamental com recomendações

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clínicas escolares quando da transição para o ensino médio.

16. PL 5289/2016 Em relação às características dos indivíduos com distúrbio de aprendizagem, podem ser identificadas, de um modo geral, algumas comuns, como déficit de atenção, falhas no desenvolvimento e nas estratégias cognitivas para a aprendizagem, dificuldades na habilidade motora, dificuldade perceptual e problemas no processamento da informação recebida, dificuldade na linguagem oral e escrita, dificuldade na leitura, dificuldade em raciocínio matemático e comportamento social inapropriado.

17. Lei Nº 10502 § 1° São diretrizes de que trata o caput deste artigo: I - orientação a professores, coordenadores, diretores, funcionários e alunos, ministradas por profissionais especializados, sobre o Transtorno do Déficit de Atenção com ou sem Hiperatividade -TDA/H; II - encaminhamento de possíveis casos de TDA/H para diagnóstico e tratamento em Centros de Atenção Psicossocial (CAPS); III - acompanhamento adequado nas respectivas unidades escolares, aos alunos diagnosticados como portadores de TDA/H, durante todo o período dos cursos fundamental e médio; IV - conscientização aos envolvidos no universo do portador de TDA/H, como pais, responsáveis e familiares;

18. Lei Nº 7354/2016

Art. 1º - Fica instituído, no Estado do Rio de Janeiro, o Programa de Diagnóstico e Tratamento do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH. Parágrafo único. O Programa incluirá Atendimento Escolar Especializado, em caráter preventivo, que terá início na educação infantil, nas creches e pré-escolas, assegurando os serviços de educação especial aos educandos que, após diagnóstico médico, evidenciem a necessidade de atendimento especial, conforme o Art. 23, inciso II, da Constituição Federal. Art. 2º - Entende-se por Atendimento Escolar Especializado o processo educacional definido por proposta pedagógica, que assegure recursos e serviços educacionais especiais, visando apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, em consonância com a sintomatologia do distúrbio, de modo a proporcionar educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentem necessidades especiais através de adequação curricular e um plano de estudo, em todas as etapas do ensino fundamental e médio, garantindo, à pessoa portadora de TDAH, integração no contexto socioeconômico e cultural, conforme o disposto nos artigos 1º inciso III e 206 inciso I da Constituição Federal e nos artigos 5º e 15 do Decreto 3.298, de 20 de dezembro de 1999, da Presidência da República, que institui as Diretrizes da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência.

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19. Lei Nº 3.895 Art. 3 º - O Programa previsto por esta Lei deverá abranger a capacitação permanente dos educadores para que tenham condições de identificar os sinais da dislexia e TDAH - Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade nos estudantes, bem como realizar as flexibilizações curriculares com avaliações diversificadas que contemplem as habilidades, atendendo as necessidades educacionais específicas no desenvolvimento do estudante. I - A Secretaria Municipal da Educação em articulação com outras Instituições de Ensino da Educação Básica e Superior deverão estabelecer parcerias entre si e outros órgãos de natureza governamental e não governamental para a oferta dos cursos de capacitação aos professores. II – As Instituições de Ensino Pública e Privada deverão ofertar uma equipe multidisciplinar de apoio para a realização da identificação precoce e a orientação para um efetiva inclusão destes alunos com Dislexia e TDAH - Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade, bem como o Atendimento Educacional Especializado (AEE), realizado, preferencialmente, na sala de recursos multifuncionais da própria escola ou em outra escola de ensino regular, no turno inverso da escolarização, quando detectada a necessidade por meio das avaliações psicopedagógicas. III - No início do ano letivo, pais e alunos deverão ser entrevistados para que a escola tenha melhor possibilidade de fazer uma identificação precoce de algum transtorno de aprendizagem. IV – Cada estudante diagnosticado deverá ter um portfólio contendo as entrevistas, laudos médicos, as avaliações psicopedagógicas, relatórios pedagógicos do desenvolvimento durante o ano letivo, que deverá acompanhar, obrigatoriamente o educando no decorrer de sua vida acadêmica.

20. PL 870/2016 Art. 1-As unidades escolares públicas e privadas, no âmbito do Distrito Federal, ficam obrigadas a disponibilizar em suas salas de aula, assentos na primeira fila aos alunos com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH assegurando seu posicionamento afastado de janelas, cartazes, e outros elementos, possíveis potenciais de distração. Art. 2- Para o atendimento ao Art.1º, será necessário a apresentação, por parte dos pais ou responsáveis pelo aluno, de laudo neurológico comprovante de TDAH. Parágrafo único: É direito do aluno diagnosticado, por laudo emitido por neurologista, à atividade e provas durante o ano letivo, em local diferenciado e com maior tempo para a sua realização. Art. 3- As escolas das redes públicas e privada, deverão prever e prover na organização de suas classes, flexibilização e adaptações curriculares que considerem o significado prático e instrumental dos conteúdos básicos, metodologia de ensino e

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recursos didáticos diferenciados e processos de avaliação adequado ao desenvolvimento dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, em consonância com o projeto pedagógico da escola, respeitada a frequência obrigatória.

21. PL 054/2017 Art. 5º- As Instituições de Ensino deverão possuir ao menos um profissional habilitado na área pedagógica para realização de avaliação precoce, elaboração de portfólio, encaminhamento a outros serviços necessários e mediação do processo ensino-aprendizagem, assim como o acompanhamento junto a educadores para que estes se tornem capacitados para lidar com as medidas a serem adotadas pela escola.

22. PLL 125/17 V – o atendimento especializado de educandos com TDAH, com flexibilizações curriculares e avaliações diversificadas que contemplem as necessidades educacionais específicas ao seu pleno desenvolvimento; Art. 4º Ficam as instituições públicas ou privadas de educação infantil ou fundamental obrigadas a manter profissional habilitado na área pedagógica para a realização de avaliação precoce e acompanhamento do educando diagnosticado com TDAH no decorrer da sua vida escolar. Parágrafo único. O profissional habilitado referido no caput deste artigo deverá organizar e manter portfólio contendo laudos médicos, avaliações psicopedagógicas e relatórios pedagógicos do desenvolvimento durante o ano letivo dos educandos com TDAH.

Fonte: Quadro construído pela pesquisadora, com os dados selecionados das Leis e PLs.

São muitas atribuições novas para a escola, gostaria de ressaltar a repetição

de alguns textos, como por exemplo, na PL 054/2017 e na Lei Nº 3.895 possuem

redação igual quanto à elaboração de um portfólio contendo as informações e

avaliações dos alunos com diagnóstico de TDA-H, verifiquei na PL 054/2017 e na

Lei nº712/2012 o mesmo texto em relação à realização de entrevistas com os pais e

alunos no ato da matrícula para identificar possíveis transtornos de aprendizagem.

Ainda com relação ao Quadro 7, chama a atenção que em todas as propostas

há planejamento para educação continuada dos professores, bem como, cursos

para a equipe de educação com o objetivo de capacita-los sobre o tema. Além disso,

nos textos da Lei 712/2012, PL 260/2015, PL 870/2016 e PLL 125/17, é proposta a

realização de avaliações flexíveis e adaptadas aos alunos com diagnóstico de TDA-

H.

Outro ponto em comum das proposições é o retorno do profissional de saúde

para trabalhar em conjunto com a escola. Em todos os textos são mencionadas as

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parceiras que devem ocorrer entre a saúde e a educação, ou por meio de equipe

multidisciplinares que irão trabalhar juntamente com a escola, ou para ministrar

cursos para os funcionários da educação com noções básicas sobre o TDA-H, para

acompanhar o aluno, entre outras funções.

Considerando que o fenômeno estudado está em constante movimento, duas

das proposições selecionadas foram vetadas durante o processo de coleta e

organização dos dados desta pesquisa, a PLO 233/201323 e PL 198/201524, devido a

isto, nenhuma das duas fará parte da próxima seção de análise. Totalizando, assim,

20 proposições entre Leis e PLs.

Na seção seguinte, apresento as unidades de análise, revisitando o material

coletado com a mediação da teoria da Psicologia Histórico-Cultural.

23

A matéria foi vetada pelo prefeito por ser considerada invasão de competência por criar atribuições para órgãos municipais o que é de exclusiva atribuição do prefeito, mas a proposta veio do Poder Legislativo. Outro motivo para o veto foi o Art.3 da proposição, que determinava que caso o aluno com TDA-H fosse transferido deveria ser encaminhada à nova escola toda a documentação falando de sua condição (RECIFE, 2013), esse artigo foi considerado invasivo “pode ferir a intimidade do aluno” (conforme ofício nº 50/16-gp/SEGOV de 31/08/16 publicado no diário oficial do município nº 101/16 de 03/09/16, ver mais em: <http://200.238.101.22/docreader/docreader.aspx?bib=R20160903&pasta=Setembro\Dia%2003>).

24

Vetada por motivos de invasão de competência, pois a proposta é do Poder Legislativo, mas é atribuição do executivo. Além disso, é afirmado que os gastos não foram atribuídos corretamente, e que a Secretaria Municipal de Saúde (SEMUS) já possui uma Lei que ampara estes usuários, a Lei 6562/2006 que em seu Artigo 1º determina que ―Fica Executivo autorizado a realizar na rede de escolas públicas do Município de Vitória, por meio de equipe multidisciplinar, o prognóstico, diagnóstico e tratamento dos distúrbios de aprendizagem.” (VITÓRIA, 2006). Disponível em: <http://www.cmv.es.gov.br/Arquivo/Documents/PL/PL1982015/980888-16344921112016.pdf>.

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6. UNIDADES DE ANÁLISE – CONCRETO PENSADO

Nesta seção, apresento os dados descritos na seção anterior, agora

mediados pela teoria da Psicologia Histórico-Cultural, divididos em duas unidades de

análise que se constituem como a parte indecomponível do todo a fim de explicar o

fenômeno das Leis e Projetos de Leis que versam sobre o TDA-H na escola

conforme apresentei no método: a) atenção e desatenção e b) políticas

educacionais e queixa escolar.

6.1 ATENÇÃO E DESATENÇÃO

A escola – entendida como instituição social concreta, integrante de um sistema sociopolítico concreto – apresenta-se como vítima de uma clientela inadequada. (COLLARES; MOYSÉS, 1996, p. 27)

A primeira unidade de análise tem como objetivo explicitar o conceito de

desatenção, como foi construído e, consequentemente, o fenômeno do TDA-H nas

legislações brasileiras coletadas, por meio da Psicologia Histórico-Cultural.

Partindo do conceito de atenção voluntária difundido na Psicologia Histórico-

Cultural, Vygotski (2012) afirma ela ser uma função psicológica superior, que deve

ser desenvolvida e trabalhada com a criança desde a mais tenra idade.

Devemos sempre lembrar que quando nos referimos à atenção, temos dois

focos: a atenção natural e a atenção voluntária. A atenção natural, segundo Eidt e

Tuleski (2010), é instintivo-reflexa: nascemos com essa habilidade, é de curta

duração, estimulada por objetos externos, por exemplo, quando um bebê interage

com o mundo a sua volta estimulado por meio de instrumentos externos e alheios a

sua vontade. Quando nos referimos à atenção voluntária, atenção artificial, a sua

principal característica é ser eletiva, facultativa, ela é motivada pelo mundo exterior.

Mas é a internalização de instrumentos culturais, nesse momento o biológico

(atenção natural), que sofre modificações devido às interações sociais, promovendo

neoformações, e o desenvolvimento da atenção voluntária, como função psicológica

superior.

Portanto, a atenção que utilizamos no trabalho e/ou na escola é facultativa, e

devemos aprender a utilizá-la. O desenvolvimento desta função psíquica superior irá

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depender de nossas interações sociais. Segundo Tuleski e Edit (2016), o

desenvolvimento humano é dinâmico, seu movimento é dialético, isso quer dizer que

para avançar uma etapa, às vezes precisamos retroceder, enfrentar períodos de

crise, para posteriormente acontecer o salto de desenvolvimento.

Sendo assim, o desenvolvimento acontece por meio de interação entre pares,

com o social atuando sobre o biológico, transformando as funções básicas em

funções psicológicas superiores (FACCI, 2004).

Diante disto, Vygotski (2012) defende que as experiências vividas no campo

interpsíquico, passam para o campo intrapsíquico, é o social agindo sobre o

biológico, por meio da Lei de internalização, que é “a superação do comportamento

direto, imediato, para o comportamento cultural mediatizado por instrumento

(ferramentas) e signos (simbólicos)” (TULESKI; EIDT, 2016, p. 44).

Assim, acontece na formação da atenção voluntária, todos estes processos

são necessários para que ela se desenvolva. Vygotski (2012) comprovou este

fenômeno por meio de experimentos, realizados com crianças, nos quais os

participantes deveriam realizar tarefas sem auxílio externo, que exigiam que sua

atenção voluntária fosse eficaz, mas cometiam muito erros. Posteriormente, ele

introduz instrumentos para mediar a execução e auxiliá-las nas tarefas, tudo isso

com as instruções de um par mais capaz que pôde se utilizar da linguagem para

direcionar o processo. Os resultados mostraram que as crianças, ao final da tarefa,

não precisam mais dos instrumentos, pois no meio intrapsíquico já foram capazes de

exercer a atenção voluntária sem necessitar dos instrumentos de apoio para tal.

A atenção voluntária, portanto, é uma função psíquica superior, que deve ser

desenvolvida, porém o conceito mais difundido sobre ela é um conceito biológico,

“decorrente especialmente do amadurecimento orgânico” conforme análise de Leite

e Rebello (2014, p. 65), reforçando a crença que alguma falha no desenvolvimento

do indivíduo acarreta os problemas de desatenção ou TDA-H.

Se considerarmos essa perspectiva como verdadeira, estaríamos ignorando

uma série de fatores que nos constituem como sociedade. Atualmente, a exigência é

estar conectado com um mundo virtual, realizando múltiplas tarefas simultâneas,

com máximo de desempenho e rapidez. Como podemos esperar, crianças

equilibradas, com baixa energia, dispostas a sentar em carteiras escolares por

quatro horas, pacientemente? Isso nos remete à crença de homem que a sociedade

capitalista tem e quer nos impor.

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Segundo Bock (2015), dentro da cultura capitalista, somos incentivados a crer

em uma autonomia, que somos únicos, podemos fazer escolhas e devemos,

consequentemente, preencher as exigências do capital, do mercado, de realizar

diversas tarefas com excelência, consumir e consumir. Caso estejamos fora deste

padrão, devemos ser medicados e tratados para segui-lo.

O grande problema da atualidade é este: a crença de que devemos estar

dentro dos padrões impostos pela sociedade. Esse fenômeno resulta na

medicalização, “busca causas orgânicas para problemas de diferentes ordens”

(CFP, 2015, p. 8), estamos individualizando questões sociais, a sociedade apresenta

muitos estímulos, exige atenção para diversas atividades simultaneamente, o

problema não é individual e sim social.

Dessa falha nasce o fenômeno de desatenção e, consequentemente, o

diagnóstico de TDA-H. No quadro 7 (p. 94) na apresentação das definições

consideradas para a construção das Leis e PLs podemos perceber que todas as

proposições, que apresentavam documento com definições do transtorno, têm base

médica, biológica, considerando a atenção uma habilidade inerente ao ser humano,

que deve funcionar nos momentos apropriados, como por exemplo:

Sam Goldstein e Michael Goldstein, no livro “Hiperatividade – como desenvolver a capacidade de atenção da criança”, afirmam que a hiperatividade é um problema que não tem cura e que deve ser administrado, diariamente, na infância e na adolescência. Apontam, ainda, suas características – desatenção, agitação, excesso de atividade, emotividade, impulsividade e baixo limiar de frustração (dificuldade para adiar recompensas) – que interferem na integração da criança, com os pais, com a família, com os professores e com pessoas da comunidade, prejudicando o desenvolvimento de sua personalidade e o seu desempenho escolar. (DISTRITO FEDERAL, 2011, p. 2, grifo meu)

O Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade – TDAH – ocorre como resultado de uma disfunção neurológica no córtex pré-frontal (parte do cérebro responsável por manter e produzir concentração). Quando pessoas que têm TDAH tentam se concentrar, a atividade do córtex pré-frontal diminui, ao invés de aumentar (como no caso de pessoas que não têm o distúrbio). Os problemas causados pelo TDAH são: fraca supervisão interna, pequeno âmbito de atenção, distração, desorganização, hiperatividade, problemas de controle de impulso, dificuldade de aprender com erros passados e falta de previsão, entre outros. (BRASIL, 2015, p. 2, grifo meu)

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O transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) é um transtorno neurobiológico crônico, de origem genética, que aparece na infância e acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Chamado também de distúrbio do déficit de atenção, as pessoas que têm o distúrbio apresentam características especiais e diferenciadas. Ao mesmo tempo em que a inteligência, a criatividade e a intuitividade se apresentam de forma vigorosa, a desatenção, a impulsividade e a hiperatividade impedem o indivíduo de realizar todo o seu potencial. (PORTO ALEGRE, 2017, p. 1)

As proposições acima encontram-se em consonância com as definições

tradicionais como as apresentadas na seção dois, Transtorno de Déficit de

Atenção/Hiperatividade, no item 2.1- Concepção Hegemônica e Biologizante do

TDA-H (p.18), em que os autores definem o transtorno como sendo de origem

biológica, disfunção cerebral, genético (SADOCK; SADOCK; RUIZ, 2017,

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, ROHDE; BARBOSA;

TRAMONTINA; POLANCZYK, 2000). São proposições que se apoiam em bases que

consideram exclusivamente o biológico, gostaria de destacar aqui a proposição PL

641/2015:

O TDAH -Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade ocorre como resultado de uma disfunção neurológica no córtex pré-frontal (parte do cérebro responsável por manter e produzir concentração). Quando pessoas que têm TDAH tentam se concentrar, a atividade do córtex pré-frontal diminui, ao invés de aumentar (como no caso de pessoas que não têm o distúrbio). (DISTRITO FEDERAL, 2015, p. 3)

A proposição apresenta uma definição biológica, mas posterior a essa

definição afirma:

[...] Ainda assim uma das coisas que muitas vezes enganam clínicos inexperientes ao tratar desse distúrbio é que as pessoas com TDAH não têm um âmbito pequeno de atenção para tudo. Geralmente, pessoas que sofrem de TDAH conseguem prestar muita atenção em coisas que são bonitas, novidades, coisas altamente estimulantes, interessantes ou assustadoras. (DISTRITO FEDERAL, 2015, p. 4, grifo meu)

Apresenta-se, então, a solução para o problema da desatenção, se a escola

adaptar seus conteúdos para que sejam apresentados de forma “bonitas, novidades,

coisas altamente estimulantes, interessantes” (DISTRITO FEDERAL, 2015, p. 4)

como a própria PL afirma ser o que prende a atenção dos alunos, o problema estaria

sanado.

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Moysés (2010), Moysés e Collares (2013) questionam a veracidade destas

informações em relação ao TDA-H ter origem genética, porque o TDA-H não possui

marcadores genéticos comprovados, logo não pode ser definido como

genético/hereditário, os exames que podem comprovar a disfunção cerebral, são

exames de imagem, também são questionados, pois irão captar o funcionamento do

cérebro, se a criança não desenvolveu sua atenção voluntária, não irá conseguir

realizar as atividades propostas, apenas comprovando que tem uma dificuldade, não

um transtorno. O mau funcionamento não é cerebral e sim adquirido pela falta de

oportunidade/qualidade nas situações sociais para desenvolvimento da atenção

voluntária.

Para que esse desenvolvimento aconteça, precisamos nos voltar para dois

quesitos essenciais no desenvolvimento cultural da criança para a vida escolar: a

formação da atividade de estudo e os motivos realmente eficazes. O

desenvolvimento infantil se divide na Psicologia Histórico-Cultural de acordo com a

atividade principal/atividade guia de casa fase da vida e as idades cronológicas.

Segundo Tuleski e Eidt (2016, p. 50),

[...] a atividade-guia possibilita: a) o surgimento, no interior de sua própria estrutura, de novos tipos de atividade; b) a formação ou reorganização dos processos psíquicos (neoformações), produzindo as principais mudanças psicológicas na personalidade infantil em cada fase.

Considerando a atividade principal e as idades, a Psicologia Histórico-Cultural

divide as fases em: primeiro ano de vida, a atividade principal é de comunicação

emocional; primeira infância, atividade objetal manipulatória; idade pré-escolar,

atividade de jogo e; idade escolar, atividade de estudo (TULESKI; EIDT, 2016,

LEONTIEV, 2001, MARTINS; FACCI, 2016), posteriormente seguindo até a fase

adulta25.

Segundo Martins e Facci (2016), a fase que antecede a idade escolar é a pré-

escolar, quando a atividade de jogo é a principal, com a criança aprendendo sobre

as regras sociais, os instrumentos e os signos, através do jogo. Com o passar do

25

Não irei discutir todas as fases pois não é foco nesta seção, para mais informações sobre as etapas buscar TULESKI, Silvana Calvo; EIDT, Nadia Mara. A periodização do desenvolvimento psíquico: atividade dominante e a formação das funções psíquicas superiores. In: MARTINS, Lígia Márcia; ABRANTES, Angelo Antonio; FACCI, Marilda Gonçalves Dias (Org.) Periodização histórico-cultural do desenvolvimento psíquico: do nascimento à velhice. Campinas: Autores Associados, 2016, p. 35-61.

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tempo o interesse pelo jogo diminui, “dando lugar ao estudo” (p. 158), pelo o fato da

criança encontrar-se agora em um ambiente diferente de sua casa, ela está na

escola, nesse momento é o início da transição da atividade de jogo para a atividade

de estudo.

O mais importante sobre esta transição é compreender que a criança precisa

ser preparada para a vida escolar, Leontiev (2001) ressalta que nesse momento ela

irá assumir um novo papel social, novas responsabilidades, e a família e a

sociedade têm expectativas a respeito de seu aprendizado e desenvolvimento,

portanto é necessário um tempo de adaptação para a criança, com a nova rotina,

responsabilidades/obrigações e, também, para a família.

Além da passagem da idade pré-escolar para a idade escolar, temos outro

ponto que é essencial na vida escolar da criança, os motivos pelos qual ela deve

estudar, ir à escola, se interessar por este novo mundo. Segundo Leontiev (2001) e

Asbahr (2016), as questões afetivas são as principais quando se inicia a vida

escolar, receber afeto dos pais, da professora, esse é motivo que deve ser

transformado em um motivo realmente eficaz, duradouro, a criança deve

posteriormente querer aprender, alcançar objetivos a longo prazo por meio do

estudo, como um trabalho, uma faculdade, entre outros.

O êxito nessa transição não parece ter sido alcançado, as pesquisas sobre

fracasso escolar, preconceito no cotidiano escolar nos provam isso (PATTO, 1990,

1992; COLLARES; MOYSÉS, 1994, 1996). O fenômeno do fracasso escolar é o

resultado de múltiplas questões sociais, falta de infraestrutura, professores

explorados consequentemente desmotivados, alunos que não foram preparados

para a vida escolar, entre outros, mas ainda insistimos em culpabilizar as crianças e

as famílias pelo insucesso escolar.

Collares e Moysés (1996) relatam em sua pesquisa o quanto as famílias de

baixa renda, negras, não nucleares, sofrem com julgamentos no ambiente escolar,

as Lei e Projetos de Leis coletados em sua maioria são voltados para a escola

pública, apenas cinco - Lei Nº 712/2012, Lei Nº 3.112, Lei Nº 3.895, PL 870/2016 e,

PLL 125/17 - fazem menção a escola privada:

Art. 2º - Para os fins desta Lei, são considerados educandos os alunos matriculados regularmente em instituições públicas ou privadas de educação infantil ou fundamental com sede no Município de Porto Alegre. (PORTO ALEGRE, 2017, p. 1, grifo meu)

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Art. 1º – O Município adotará medidas para Identificação e Tratamento da Dislexia e TDAH - Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade na Rede Municipal e Privada de Educação, objetivando a detecção precoce e acompanhamento dos estudantes com os distúrbios. (PIRENÓPOLIS, 2012, p. 1, grifo da Lei)

Art. 2º As escolas da educação básica, da rede pública e privada, com o apoio da família e dos serviços de saúde existentes, devem garantir o cuidado e a proteção ao educando com TDAH visando seu pleno desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, contando com as redes de proteção social existentes no Estado, de natureza governamental ou não governamental. (ACRE, 2015, p. 1, grifo meu) Art. 4°. O Centro Municipal de Apoio à Diversidade - CEMAD, e/ou Departamento de Inclusão da Subsecretaria Estadual de Educação que receber encaminhamentos, deverá avaliá-los e se necessário fazer o encaminhamento ao CAPS, ou outra instituição de saúde, para que seja feito o tratamento do discente. Parágrafo único. Se encaminhado para coordenador e/ou diretor de Escola Particular, a família deverá ser informada para que haja o devido diagnóstico e tratamento e posteriormente entregue à escola uma devolutiva por meio de relatório dos profissionais. (ANÁPOLIS, 2016, p.1, grifo meu) Art. 1º As unidades escolares públicas e privadas, no âmbito do Distrito Federal, ficam obrigadas a disponibilizar em suas salas de aula, assentos na primeira fila aos alunos com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH assegurando seu posicionamento afastado de janelas, cartazes e outros elementos, possíveis potenciais de distração. (DISTRITO FEDERAL, 2016, p.1, grifo meu)

Esse recorte é interessante, pois o aluno da rede municipal será encaminhado

para o CAPS, enquanto o aluno da rede privada a família é que decidirá as medidas

para o tratamento (ANÁPOLIS, 2016). Existe escolha para alunos da rede privada,

mas não para os da escola pública. É um retrocesso o discurso de que as famílias

devem acatar a decisão da escola como Lei, sem possibilidade da opinião de outros

profissionais a respeito dessa suposta disfunção.

A proposição do Distrito Federal (2016) é curiosa, pois passa a impressão que

o que pode distrair o aluno são “janelas, cartazes e outros elementos, possíveis

potenciais de distração” (p. 1). Que elementos poderiam ser esses? Devemos

considerar essa medida como uma maneira de restringir a interação desse aluno,

pois não poderá escolher onde deve sentar e o professor será o detentor do poder

de escolha. É mais uma maneira de marcar o aluno como o que tem dificuldades e

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um rótulo (diagnóstico), o que Souza (2010) classifica como exclusão na escola,

com alunos inseridos no sistema educacional, sem se beneficiarem dele, o relevante

é refletir se essa ação efetivamente auxilia o processo de escolarização desse

aluno.

Além de a função da escola não ser essa, a Psicologia Histórico-Cultural

entende que a função da escola é “é a transmissão da cultura humana elaborada,

com a mediação do professor, o qual tem papel central na organização do ensino de

maneira que possibilite ao estudante apropriar-se dessa cultura” (ASBAHR, 2016, p.

173), e a educação segundo a Pedagogia Histórico-Crítica tem o objetivo de

fomentar “a autonomia intelectual e moral através justamente da transmissão das

formas mais elevadas e desenvolvidas do conhecimento socialmente existente” com

o auxílio do professor e de seus pares (DUARTE, 2001, p. 36).

Nas proposições levantadas, a escola deixa de exercer seu papel, para

“diagnosticar”, “identificar” e “tratar” alunos com dificuldades de aprendizagem, como

podemos verificar nos destaques abaixo:

Art. 3º - Fica assegurado o diagnóstico e tratamento da Dislexia, do Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), dentre outros distúrbios de aprendizagem, em toda a Rede Municipal de Ensino, com acesso aos recursos didáticos pertinentes ao

desenvolvimento do aluno. (TEÓFILO OTONI, 2013, p.1) Art. 1º. Seja acrescentado o art. 26-B e seus parágrafos na Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, com as seguintes redações: Art. 26-B. É obrigatório a implantação de programas de diagnóstico, esclarecimentos, tratamento e acompanhamento do Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), nas escolas públicas e particulares de ensinos infantil e fundamental. Realizar encontros periódicos na escola entre a equipe multidisciplinar e os responsáveis pelo aluno diagnosticado com o transtorno, para acompanhamento do tratamento e possíveis esclarecimentos de dúvidas que porventura vierem a surgir. (BRASIL, 2015, p.1).

Nestes termos, a escola deixa de exercer a sua função de socializar o saber

escolar e passa a ser um grande espaço para triagem de alunos com dificuldades de

aprendizagem, sem considerar que esta dificuldade pode ser atribuída às políticas

educacionais inadequadas, infraestrutura precária e corpo docente sobrecarregado e

adoecido, como discutido por Patto (2015; 2005) e, Collares e Moysés (1994, 1996),

devemos considerar que atualmente as Leis e PLs não têm cumprido seu papel, de

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promover inclusão social e amortecer as desigualdades social (SOUZA, 2006), ao

invés disso as proposições, como as coletadas aqui, estão apenas mantendo o que

já está posto para as crianças tidas com dificuldades escolares, marca-las, separa-

las, seja em cadeiras específicas, salas de AEE, laudos, entre outros.

Gostaria de ressaltar que esta última proposição apresentada acima vai além,

pois seu objetivo é alterar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em sua

ementa a proposta é “Acrescenta o art. 26-B na Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de

1996, para instituir programas de diagnóstico, esclarecimentos, tratamento e

acompanhamento do Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade – TDAH”

(BRASIL, 2015, p.1), tornando obrigação da educação nacional realizar avaliações

de alunos com possíveis dificuldades de aprendizagem e encaminha-los a saúde.

As proposições tratam muito mais de fazer uma triagem para identificar o

aluno “desatento” e com dificuldades do que buscar uma solução para o problema,

que analise aspectos pedagógicos e de funcionamento escolar, desconsiderando as

denúncias sobre o crescimento alarmante de diagnóstico de TDA-H na atualidade

(SAPIA, 2013; LEITE, 2015, LEITE, 2010).

Outro ponto que merece atenção é com relação à atribuição dada aos

professores e diretores para triarem os alunos com TDA-H como podemos verificar

abaixo:

Art. 4° Os sistemas de ensino devem garantir aos professores da educação básica cursos sobre o diagnóstico e o tratamento da dislexia e do TDAH, de forma a facilitar o trabalho da equipe multidisciplinar de que trata o art 2°. (BRASIL, 2010, p.1) Art. 2º O Programa de que trata o art. 1º deve ser aplicado na capacitação permanente do corpo docente com o objetivo de identificar os sintomas do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH. (SANTA CATARINA, 2010, p.1) II - A Secretaria de Estado de Educação definir as estratégias de intervenção junto aos alunos diagnosticados como “imperativos”; III- A Secretaria de Estado de Educação orientar as instituições educacionais, capacitar os professores envolvidos e conscientizar os pais das diferenças comportamentais dos filhos da importância de seu envolvimento no processo educativo. (DISTRITO FEDERAL, 2011, p.1, grifo da PL)

Mesmo que os professores recebam qualificação, essa não é sua função, e

seu olhar, muitas vezes, é atravessado pelo preconceito, deixando as crianças

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rotuladas desassistidas, por realizarem as “profecias auto-realizadoras” (Collares;

Moysés, 1996, p. 56). Nesse caso, o aluno com um suposto diagnóstico é

considerado pelo professor, como caso perdido desde o início do ano letivo e isso se

confirmará ao final do ano “mais que previsão dever-se-ia falar em definição da

futura aprendizagem da criança” (Idem, p.59). Além dessa análise feita por Collares

e Mosyés (1996), pesquisas desenvolvidas por Coutinho et. al. (2008); Reis e

Camargo (2008); Seno (2010) e Landskron e Sperb (2008) comprovam que o

professor não tem conhecimento suficiente para triar o aluno com algum suposto

diagnóstico.

Diante disso solicitar laudos, portfólios com as informações sobre as crianças,

entrevistas com os pais no ato de matrícula, para identificar possíveis casos de

desatenção, hiperatividade, é mais uma maneira de excluir estes alunos, e

definitivamente terminar com as possibilidades de uma vida escolar saudável:

Art. 5°. Os relatórios de educação e saúde, sendo de identificação, diagnóstico, avaliação, tratamento e acompanhamentos, quando solicitado, deverão fazer parte do Histórico Escolar do discente. (ANÁPOLIS, 2016, p. 2) Art. 5.º No ato da matrícula, os pais deverão avisar a escola, no caso do aluno já ter o diagnóstico de TDAH.” (AMAZONAS, 2015, p. 1)

Parágrafo único. O profissional habilitado referido no caput deste artigo deverá organizar e manter portfólio contendo laudos médicos, avaliações psicopedagógicas e relatórios pedagógicos do desenvolvimento durante o ano letivo dos educandos com TDAH. (PORTO ALEGRE, 2017, p.3)

Art. 2 - Para o atendimento ao Art.1º, será necessário a apresentação, por parte dos pais ou responsáveis pelo aluno, de laudo neurológico comprovante de TDAH. Parágrafo único: É direito do aluno diagnosticado, por laudo emitido por neurologista, à atividade e provas durante o ano letivo, em local diferenciado e com maior tempo para a sua realização. (DISTRITO FEDERAL, 2016, p.1) II - A Secretaria Municipal da Educação deverá ofertar uma equipe multidisciplinar de apoio para a realização do diagnóstico da Dislexia e TDAH - Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade e também para a orientação da reintegração destes alunos. III - No ato da matrícula, pais e alunos deverão ser entrevistados para que a escola tenha melhor possibilidade de fazer uma identificação precoce de algum transtorno de aprendizagem. (PIRENÓPOLIS, 2012, p.1) I - No ato da matrícula, pais e alunos deverão ser entrevistados para que a escola tenha melhor possibilidade de fazer uma identificação precoce de algum transtorno de aprendizagem;

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II - Cada estudante diagnosticado deverá ter um portfólio contendo as entrevistas, laudos médicos, as avaliações psicopedagógicas e relatórios pedagógicos do desenvolvimento durante o ano letivo, que deverá acompanhar obrigatoriamente o educando no decorrer de sua formação; III- Ocorrendo pedido de transferência deverá ser anexado à documentação, em papel timbrado, constando comunicado com assinatura do diretor da escola ou seu eventual substituto, informando a situação do aluno portador do TDAH, para que a próxima instituição de ensino que o receber proceda com a continuidade do acompanhamento. (AMAZONAS, 2017, p. 2)

Essa rotulação do comportamento das crianças, seja a desatenção, ou a

hiperatividade, é o que chamamos de biologização, “processo de transformar

questões sociais em biológicas” (COLLARES; MOYSÉS, 1996), no caso do TDA-H

juntamente com o fenômeno de medicalização, que é:

[...] o processo por meio do qual as questões da vida social – complexas multifatoriais e marcadas pela cultura e pelo tempo histórico – são reduzidas a um tipo de racionalidade que vincula artificialmente a dificuldade de adaptação às normas sociais a determinismos orgânicos que se expressariam no adoecimento do indivíduo. (CFP, 2015, p.11)

Ao biologizar e medicalizar os comportamentos, segundo Collares e Moysés

(1996), estamos culpabilizando a vítima, que neste cenário é o aluno, e isentando o

sistema de toda a responsabilidade, a autoras chamam de “patologização do

processo ensino-aprendizagem” (p. 28). A escola não exerce a função de

desalienação e emancipação do aluno, para que ele se aproprie dos conhecimentos,

e o responsabiliza por isso. Segundo Duarte (2007) e Patto (1988), a função da

educação deveria ser de emancipação, de desalienar o sujeito, para que por meio

da apropriação dos conceitos científicos ele possa fundamentar as suas atitudes.

A educação escolar, ao mediatizar a relação entre cotidiano e não-cotidiano na formação do indivíduo, forma nesse indivíduo necessidades cada vez mais elevadas, que ultrapassam a esfera da vida cotidiana (a esfera das objetivações genéricas em-si) e situam-se nas esferas não-cotidianas da prática social (as esferas das objetivações genéricas para-si). (DUARTE, 2007, p. 7)

Nesse sentido, a escola deveria evitar a reprodução da “cotidianidade

alienada” (Idem, p. 53) emancipando o aluno, para que ele seja um ser crítico, que

faz uma relação consciente entre os conceitos aprendidos e a realidade social,

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pensando de forma crítica, é a educação que irá transformar a prática social. Para

que isso se concretize, precisamos de uma prática pedagógica intencional, de um

educador consciente que tenha determinado “os objetivos e os valores que norteiam

a sua prática educativa” (Idem, p. 55), pois o trabalho educativo pode ser alienado,

não pensado, buscando apenas a reprodução da humanidade e formar indivíduos,

sem considerar “para que tipo de sociedade, para que tipo de prática social” (Idem,

p. 51).

Esse processo é alienação e manutenção do status quo é perceptível, pois

são poucas as Leis e PLs que abordam de maneira acanhada o desenvolvimento do

aluno, ou o sucesso escolar, o objetivo maior é realizar o diagnóstico precoce para

que esse aluno receba auxílio, mas terapêutico, do Sistema Único de Saúde, de

equipe multiprofissional, abordando pouco o trabalho pedagógico em si e o

desenvolvimento da atenção, temos como exemplo:

V – o atendimento especializado de educandos com TDAH, com flexibilizações curriculares e avaliações diversificadas que contemplem as necessidades educacionais específicas ao seu pleno desenvolvimento. (PORTO ALEGRE, 2017, p.3)

Art. 3º As escolas de educação básica devem assegurar às crianças e aos adolescentes com dislexia e TDAH o acesso aos recursos didáticos adequados ao desenvolvimento de sua aprendizagem. (BRASIL, 2010, p.1)

I – planejamento necessário para o favorecimento do desenvolvimento e aprendizagem do aluno, levando-se em conta as mobilizações indispensáveis ao atendimento das necessidades educacionais especiais de cada um, voltadas para a permanência e o sucesso escolar daqueles alunos com distúrbios, transtornos e/ou dificuldades de aprendizagem. (BRASIL, 2016, p.1)

É relevante destacar que a proposição menciona necessidades educacionais

especiais. Em seu texto, a proposição afirma “o processo de inclusão educacional da

Educação Especial e da Educação Básica” (BRASIL, 2016, p. 1), garantindo

atendimento no AEE para alunos com dificuldades de aprendizagem, mas nem

mesmo os autores que defendem a existência do TDA-H como transtorno hereditário

cerebral (Rohde; Barbosa; Tramontina e Polanczyk, 2000; Sadock; Sadock e Ruiz,

2017) fazem menção à deficiência, atrasos cognitivos, como as Leis e PLs se

referem aos alunos:

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Parágrafo único. O Programa incluirá Atendimento Escolar Especializado, em caráter preventivo, que terá início na educação infantil, nas creches e pré-escolas, assegurando os serviços de educação especial aos educandos que, após diagnóstico médico, evidenciem a necessidade de atendimento especial, conforme o Art. 23, inciso II, da Constituição Federal. Art. 2º Entende-se por Atendimento Escolar Especializado o processo educacional definido por proposta pedagógica, que assegure recursos e serviços educacionais especiais, visando apoiar, complementar ,suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, em consonância com a sintomatologia do distúrbio, de modo a proporcionar educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentem necessidades especiais através de adequação curricular e um plano de estudo, em todas as etapas do ensino fundamental e médio, garantindo, à pessoa portadora de TDAH, integração no contexto socioeconômico e cultural, conforme o disposto nos artigos 1º inciso III e 206 inciso I da Constituição Federal e nos artigos 5º e 15 do Decreto 3.298, de 20 de dezembro de 1999, da Presidência da República, que institui as Diretrizes da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. (RIO DE JANEIRO, 2016, p. 2) Parágrafo único O Município, através da Secretaria Municipal de Saúde e Educação, fomentará a criação de Associação de Pais, a fim de que possam compartilhar experiências e condutas aplicáveis, visando proporcionar melhor qualidade de vida aos portadores de tais distúrbios. (TEÓFILO OTONI, 2013, p. 1) Art. 1º Ficam estabelecidas nesta norma as diretrizes doravante adotadas pelo Poder Executivo para realizar o encaminhamento para diagnóstico, tratamento e o acompanhamento dos alunos da rede de ensino fundamental do Município do Rio de Janeiro, portadores de Transtorno do Déficit de Atenção, doravante denominado TDA. (RIO DE JANEIRO, 2012, p.1) Art. 1º - Ficam estabelecidas nesta Lei, medidas a serem adotadas, com o auxílio dos professores, coordenadores, diretores e demais membros da equipe multidisciplinar da Rede Privada e Pública de Ensino, para identificar, acompanhar e auxiliar o aluno portador de dislexia e/ou Transtorno do Déficit de Atenção - TDAH. §1º Estas medidas se darão através de um sistema de identificação, objetivando a detecção precoce e o acompanhamento dos estudantes com os distúrbios acima mencionados, com a realização periódica de exames e avaliações psicopedagógicas nos alunos matriculados, preferencialmente com auxílio de médicos, psicólogos e/ou fonoaudiólogos. §2º Acompanhamento Educacional Especializado, realizados por mediadores da área de Educação na própria sala de aula. (AMAZONAS, 2017, p. 1)

As proposições denominam os alunos portadores de TDA-H termo que

utilizamos para nos referirmos às pessoas com deficiência, o que não é o caso. As

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Leis e PLs vão além se utilizando dos termos “inclusão”, “reintegração” e

“integração”, mostrando que a desatenção do aluno é percebida como uma

deficiência e ele precisa ser reintegrado à sociedade:

VI – A conscientização de toda a comunidade escolar sobre cuidados, atenção e inclusão de educandos com TDAH e o amplo fornecimento dessas informações. (PORTO ALEGRE, 2017, p. 2) II - A Secretaria Municipal da Educação deverá ofertar uma equipe multidisciplinar de apoio para a realização do diagnóstico da Dislexia e TDAH – Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade e também para a orientação da reintegração destes alunos. (PIRENÓPOLIS, 2012, p. 1)

Como foi ressaltado no início dessa seção, a atenção é uma função

psicológica superior que deve ser desenvolvida, principalmente por meio da

interação com pares, as proposições exigem acompanhamento integral, o

atendimento alternativo e salas especiais para estes alunos como solicitado. Estas

salas são as mesmas do Atendimento Educacional Especializado, que de acordo

com a legislação vigente (BRASIL, 2009) é para o público com deficiência, que não

contempla os alunos com TDA-H.

Vygotski (2012) postula que a atenção é aprendida por meio de situações

concretas e Duarte (2007) ressalta que o trabalho educativo pode ser determinante

no desenvolvimento da capacidade de concentração em determinadas tarefas, a

solução para o problema da desatenção deveria ser mais exposição a situações

adequadas para desenvolvê-la e não a segregação, como proposto.

Além disso, devemos considerar que para que o desenvolvimento cultural se

efetive devemos considerar a zona de desenvolvimento proximal, postulada por

Vigotskii (2001), que seria estimular a criança a desenvolver

potencialidades/conceitos que estão em estado germinativo, não trabalhar o que já

está consolidado, e sim o que virá. Para isso é necessário que pares mais capazes

auxiliem esse momento, mediando o desenvolvimento.

Existe ainda, algumas propostas para adaptação do currículo escolar e oferta

de “recursos didáticos diferenciados” (PL 870/2016), assim como locais de prova

diferenciados, avaliações que acessem diversas habilidades e mais tempo para a

realização das mesmas (PL 870/2016, PL 260/2015, LEI Nº 3.895, PLL 125/17).

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Essas proposições, além de exigirem salas, profissionais da saúde na escola,

equipe multidisciplinar, decretam que as crianças com diagnósticos devem ser

avaliadas de maneira diferenciada, com mais tempo para realizar as avaliações.

Será que a maneira como são feitos os processos avaliativos é ideal até mesmo

para os alunos normais? Ou o procedimento é obsoleto e inadequado para todos?

Essas propostas deveriam ser para todos os alunos, pois, de acordo com

Asbahr (2016), não é ideal esperar que crianças da mesma idade tenham

exatamente o mesmo desenvolvimento ou apresentem funções psicológicas

superiores em mesmo nível. O desenvolvimento cultural é diferente para cada

criança, considerando novamente a zona de desenvolvimento proximal, cada criança

pode estar com conceitos distintos em diferentes estágios germinativos, nivelar os

alunos de forma genérica não é ideal. Para Vigotskii (2001), o desenvolvimento e

aprendizagem estão ligados, mas não são simétricos, avaliar as crianças como

fazemos na atualidade não é aceitável, nem para as que apresentam alguma

dificuldade nem para as ditas normais.

Todo este panorama de como o fenômeno da desatenção se transforma em

TDA-H, nos mostra o peso do sistema econômico em nosso dia a dia, pois se não

tivéssemos a indústria farmacêutica movimentando milhões, patrocinando

pesquisas, profissionais de saúde e políticos essas proposições, possivelmente, não

estariam em pauta.

Além disso, devemos lembrar que o cenário cultural em que se passa o

fenômeno do TDA-H é um cenário de adoecimento, o consumo de medicamentos é

aceitável na sociedade capitalista do século XXI. Para Moysés, Collares e Ribeiro

(2013), as pessoas que não se encaixam no padrão socialmente estabelecido de

“normalidade” recorrem, ou são forçados, como as crianças, a consumirem

medicamentos para se encaixarem nos padrões. O medicamento que deveria ser

um bem social é uma mercadoria, um produto (BENASAYAG, 2013), perdendo a

função de tratar doença e passando a ser uma contenção de comportamentos

indesejáveis, reafirmando que vivemos a Era dos transtornos (MOYSÉS;

COLLARES, 2013, p. 42):

Nas sociedades ocidentais, é crescente a translocação para o campo médico de problemas inerentes à vida, com a transformação de questões coletivas, de ordem social e política, em questões

individuais, biológicas. Tratar questões sociais como biológicas

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iguala o mundo da vida ao mundo da natureza. Isentam-se de responsabilidade todas as instâncias de poder, em cujas entranhas são gerados e perpetuados tais problemas.

A medicalização e biologização da desatenção, transformada em transtorno,

isenta o sistema econômico, educacional, político e social de responsabilidades com

a criança que não desenvolveu a atenção voluntária, culpabilizando exclusivamente

o aluno, com as mais diversas justificativas, atravessadas por questões de classe,

gênero e preconceito.

A próxima unidade de análise trata relação entre as políticas educacionais e o

fracasso escolar e como todo este apanhado já apresentado nas Leis e PLs se

relacionam.

6.2 POLÍTICAS EDUCACIONAIS E QUEIXA ESCOLAR

Nesta unidade de análise, vou contextualizar o campo das Políticas

Educacionais no Brasil e a relação com o fenômeno da Queixa escolar, no que

tange ao TDA-H, buscando compreender o que está por trás desse fenômeno de

medicalização da educação por “força” das Leis e PLs.

É essencial para compreender a criação das Lei e PLs que tratam sobre o

TDA-H no contexto escolar qual a função de uma política pública, para que e para

quem. Segundo Souza (2006), Silva e Barroco (2015) e Teixeira (2002), são as

matérias legais que devem reger a nossa sociedade, que definem como devemos

agir em sociedade e, no caso das políticas educacionais, vêm para garantir os

direitos sociais à educação gratuita de qualidade.

Leonardo, Rossato e Constantino (2016) afirmam que no Brasil esse

panorama é precário, pois, embora seja o país com mais legislações no mundo,

mantém a desigualdade social. O mesmo entendimento tem Souza (2006),

Gonçalves (2010) e Silva e Barroco (2015), ao afirmarem que apesar de nossa

democracia ser jovem, não conseguimos promover igualdade social, apenas

mantemos o status quo e o controle social. Por status quo devemos entender que

vivemos em uma sociedade capitalista, onde quem detém o capital explora os

demais, por meio da escola promovem uma educação para manutenção da

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alienação, sem uma educação crítica, que forme sujeitos capazes de fazer uma

revolução.

Os sujeitos que não se enquadram nesse panorama são considerados

doentes, problemáticos, com transtornos ou disfunções. Collares, Moysés e Ribeiro

(2013) fazem a denúncia, os que não se enquadram nos padrões sociais são

excluídos e rotulados, é mais simples para o sistema escolar e político se eximir de

responsabilidades por esse aluno, ele passa a ser assunto da saúde, como discuti

na seção anterior, o não aprender é justificado por meio do laudo e a educação

segue ilesa. Não podemos ser ingênuos, pois a circunstância na qual se desenvolve

essa narrativa é da sociedade ocidental moderna definida por Moysés e Collares

(2013, p. 48):

Vivemos em uma sociedade permeada por problemas coletivos, sociais, em grande parte política e economicamente gerados e perpetuados e que historicamente geram as desigualdades de inserção social, de etnia, de gênero, que caracterizam as sociedades através dos tempos. Vivemos um tempo que a medicalização avança a largos passos sobre todas as esferas da vida, ocultando desigualdades ao transformá-las em problemas individuais, inerentes ao sujeito, geralmente no plano biológico. O mesmo processo desqualifica as diferenças que nos caracterizam e constituem – somos todos diferentes, em modos de ser, agir, reagir, pensar, afetar e ser afetado, em modo de aprender.

É muito mais fácil culpabilizar o aluno que não aprende por sua suposta

desatenção do que repensar o sistema educacional, sistema esse construído e

pautado ao longo de sua história pela Teoria do Capital Humano e Teoria da

Carência Cultural. Sendo a Teoria do Capital Humano a que visa mão de obra para

o mercado capitalista e menos gasto para o Estado, a qualificação dessa mão de

obra é feita com uma educação básica (ANGELUCCI, ET. AL., 2004; KASSAR,

2011), e a Teoria da Carência Cultural que prega que os alunos com pouco acesso à

cultura, de baixa renda, não irão se desenvolver cognitivamente na escola, por

privação de cultura,

A crença na incompetência das pessoas pobres é generalizada em nossa sociedade. Às vezes, nem mesmo os pesquisadores munidos de um referencial teórico-crítico estão livres dela. Como veremos, mesmo quando voltam os olhos para a escola e o ensino numa sociedade de classes e neles identificam inúmeras condições que podem por si só explicar as altas taxas de reprovação e evasão, continuam a defender as teses da teoria da carência

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cultural. O resultado é um discurso incoerente que, em última instância, acaba reafirmando as deficiências da clientela como principal causa do fracasso escolar. (PATTO, 2015, p. 74)

Essa crença está enraizada no imaginário social. Seria a educação a

ferramenta que poderia diminuir o impacto das desigualdades, impostas pela divisão

de classes, e romper com ciclos de exclusão das famílias pobres. Entretanto, como

analisa a autora:

Dizem para o oprimido que a deficiência é dele e lhe prometem uma igualdade de oportunidades impossível, através de programas de educação compensatória que já nascem condenados ao fracasso quando partem do pressuposto de que seus destinatários são menos aptos a aprendizagem escolar. Mesmo assim, fazem renascer, com esses programas a esperança na justiça social, mais uma vez graças ao papel democratizante atribuído a escola compensatória que supostamente reverterá as diferenças ou deficiências culturais e psicológicas de que as classes “menos favorecidas” seriam portadoras. (Idem, p. 74, grifo da autora)

É exatamente o que presenciamos nas Leis e PLs sobre o TDA-H, não

encontramos proposições sobre como acabar com a desatenção dos alunos durante

as aulas, ou desenvolver a atenção voluntária, como sabemos ser possível por meio

de estudos, como os de Vygotski (2012), sobre o desenvolvimento da atenção

voluntária. Nas ementas apresentadas, no quadro 5 (p. 87) as propostas são apenas

de tratamento, atendimento alternativo, especializado, acompanhamento, mas nada

é alusivo à possiblidade de desenvolver a atenção voluntária deste aluno e alcançar

um pleno desenvolvimento e sucesso escolar.

No cenário apresentado, podemos constatar alguns pontos: a concentração

de proposições é datada de 2015, de maioria municipal, concentrada no centro-

oeste, sem predominância entre partidos. O marco inicial escolhido foi o ano 2010,

pois é o ano da PL 7081/2010 (BRASIL, 2010), nacional, apresentada por Gerson

Camata (PMDB/ES), é a proposição mais completa, pois fornece vários documentos

que a complementam entre eles votos das comissões, pareceres requerimentos,

entre outros. Um dos votos merece atenção especial, do deputado Nazareno

Fonteles, médico, do Partido dos Trabalhadores (PT), da Comissão de Educação e

Cultura, que votou contra a proposição (quadro 5, p. 87):

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Questões como a dislexia, a disgrafia, os transtornos de déficit de atenção com ou sem hiperatividade não podem ser analisados na dimensão individual quando se inserem em um problema muito mais complexo que é a relação de aprendizagem que diz respeito a um conjunto de fatores muito mais abrangente do que o suportado na esfera individual. Não é por acaso que um dos ramos especializados da psicologia que é a psicologia escolar desde a década de 80 alerta para a impropriedade de se abordar os problemas de aprendizagem na escola a partir da responsabilização da criança ou adolescente e, muitas vezes, da sua família ou de sua condição social, com a finalidade de justificar um problema na relação criança-escola que é um problema inerente às opções que se fazem de funcionamento desse próprio sistema. (BRASIL, 2011, p. 3)

Apesar de não ser a maioria dos parlamentares que compreende a dimensão

do fenômeno do TDA-H, alguns são capazes de considerar outras vertentes e ir

além do que está posto. O próprio deputado destaca que a psicologia escolar vem

alertando “para a impropriedade de se abordar os problemas de aprendizagem na

escola a partir da responsabilização da criança ou adolescente” ou de “sua família”

(Idem, p. 3). Os trabalhos de Patto (2015, 2005) e Angelucci et. al. (2004) expõem

como a psicologia escolar vem se inserindo no campo educacional através de suas

pesquisas, apresentam as várias faces desse cenário, como a falência da educação

brasileira em todos os aspectos, a falta de investimento na Educação, professores

sobrecarregados, políticas horizontais, falta de infraestrutura, entre outros fatores,

colaboram para o não aprender.

Diante desta realidade Souza e Cunha (2015, p. 249) avaliam que:

A concepção teórica que nos permite analisar o processo de escolarização - e não os problemas de aprendizagem - desloca o eixo da análise do indivíduo para a escola, inserindo o conjunto de relações institucionais, históricas, inter-relacionais, pedagógicos e políticas que se fazem presentes e constituem a vida diária escolar. Ou seja, os aspectos psicológicos são parte do complexo universo da escola, encontrando-se imbricados nas múltiplas relações que se estabelecem no processo pedagógico e institucional presentes na escola.

A classe de psicólogos também exerce atuação na construção de políticas

públicas por meio de seu conselho federal (CFP), conselhos regionais, fóruns, entre

outros. No contexto da psicologia escolar e medicalização da educação, o Fórum de

Medicalização da Educação e da Sociedade merece destaque nessa luta:

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[...] Coletivo de profissionais que se propõe a discutir formas de atuação na contramão da lógica medicalizante que caracteriza, em boa parte dos casos, os encontros entre ambas as áreas. O grupo é formado por profissionais de Antropologia, de Fonoaudiologia, de Medicina, de Pedagogia e de Psicologia. Para além das

especificidades de cada campo de atuação. (Medicalização da Educação e da Sociedade, 2011)

Existe uma luta diária na tentativa de difundir o conceito de fracasso escolar,

e todas as questões envolvidas, mas ainda nos deparamos com proposição como a

PL 4027/2015 (BRASIL, 2015) denuncia as dificuldades da educação em solucionar

problema dos alunos diagnosticados com TDA-H e propõe mudanças para a LDB,

como apresentado na ementa “Acrescenta o art. 26-B na Lei nº 9.394, de 20 de

dezembro de 1996, para instituir programas de diagnóstico, esclarecimentos,

tratamento e acompanhamento do Transtorno de Déficit de Atenção com

Hiperatividade – TDAH.” (BRASIL, 2015, p.1). Essa proposição assim como as

demais apresenta o que Patto (2015, p. 64) nos alerta quanto as dificuldades de

aprendizagem:

A explicação das dificuldades de aprendizagem escolar articulou-se na confluência de duas vertentes: das ciências biológicas e da medicina do século XIX recebe a visão organicista das aptidões humanas, carregada, como vimos, de pressupostos racistas e elitistas; da psicologia e da pedagogia da passagem do século herda uma concepção menos heredológica da conduta humana – isto é, um pouco mais atenta às influências ambientais – e mais comprometida com os ideais liberais democráticos. A ambiguidade imposta por essa dupla origem será uma característica do discurso sobre os problemas de aprendizagem escolar e da própria politica educacional. (grifo meu)

As Leis e PLs apresentam essas vertentes ressaltadas por Patto (2015) mas

preciso alertar para a dificuldade em ter acesso a algumas delas, mesmo sendo

textos legais e públicos, não são todas as proposições que apresentam justificativas,

fundamentando a sua crença sobre o TDA-H, como podemos ver no quadro 6 (p.

88). Algumas das definições não estão explícitas, foi preciso selecionar recortes do

que se aproximassem da definição do transtorno como na PL 870/2016 “Sabe-se

que crianças com TDAH são capazes de aprender, mas tem dificuldades de

concentração na escola devido ao impacto que os sintomas têm sobre um bom

desempenho nas atividades” (DISTRITO FEDERAL, 2016).

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Nos textos que apresentam justificativas não encontramos citações de

autores que sustentem as definições, os autores mencionados foram Sérgio

Bourbon Cabral, psiquiatra, Sam Goldstein e Michael Goldstein, autores do livro

Hiperatividade - Como Desenvolver a Capacidade de Atenção da Criança, afirmando

que o TDA-H “não tem cura e que deve ser administrado, diariamente” (DISTRITO

FEDERAL, 2011, p.2) na PL 514/2011, e por fim na PL 5289/2016 se fala “Diversos

autores consideram o distúrbio de aprendizagem como psiconeurogênico, resultante

de disfunções do sistema nervoso central” (BRASIL, 2016, p. 2) e “Esses distúrbios

são intrínsecos e, presumivelmente, se devem a uma disfunção do sistema nervoso

central, não sendo resultantes de condições deficientes ou influências ambientais”

(BRASIL, 2016, p. 3), não é explicitado de onde essas informações foram colhidas,

nem quais profissionais auxiliaram na construção desses textos.

Essa perspectiva nos remete ao alerta de Temporão (2013, p. 77) “no mito as

coisas perdem a lembrança de sua produção. A função do mito é esvaziar o real”,

pois as definições são nebulosas, seguem uma única vertente biologizantes e

medicalizante, sem apresentar outros horizontes. Em oposição a estas vertentes,

temos a Psicologia Histórico-Cultural, que baseada nos estudos de Vigotski postula

que a aprendizagem precede o desenvolvimento, quer dizer que as experiências

vividas no campo social, entre pares que modificam o biológico, é o desenvolvimento

cultural, se pautando em uma só ótica para determinadas medidas e imposições.

É necessário refletir quem será beneficiado com essas medidas, os alunos? A

educação? A escola? Na verdade essas legislações estão “obscurecendo a

realidade social de forma conveniente para si” (Idem, p. 77), mascarando todo um

sistema falido de educação, deixando a conta a ser paga pelos seus usuários,

constituindo-se mais como uma proposição para “cumprir com as metas mundiais”

(LEONARDO, ROSSATO E CONSTANTINO, 2016, p. 53) e apresentar números em

pesquisas políticas.

A influência da agenda mundial em nossas políticas educacionais é

denunciada por Blasco (2012), que alerta para a apresentação de números que

geram investimentos. Portanto, os resultados é que interessam, como na política

americana, segundo Fulton, Sheffler e Hinshow (2015) os números positivos

garantem prêmios e investimentos financeiros, o objetivo não é política educacional

que visa desenvolvimento, aprendizagem e emancipação.

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Um exemplo sobre a geração de números e índices é a PL 221/2011 “§5º - O

acompanhamento do desempenho escolar do aluno imediatamente após o

tratamento será realizado por um período de seis meses e terá como objetivos

avaliar a efetividade do tratamento e gerar indicadores de desenvolvimento da Proap

e do PSE” (PIAUÍ, 2011, p. 2), sendo a Proap a Política de Promoção a

Aprendizagem e o PSE o Programa Saúde na Escola. Outro exemplo é a PL

641/2015 (DISTRITO FEDERAL, 2015, p. 7):

O presente projeto visa, em suma, o diagnóstico precoce e tratamento dos transtornos de aprendizagem, otimizando o rendimento escolar e o aprendizado, reduzindo os índices de reprovação e evasão escolar na Rede Pública de Ensino do Distrito Federal.

O acompanhamento é para confirmar números e a eficácia do tratamento de

saúde. Nesse caso, reduz-se o número de reprovações e evasão, pois o aluno será

acompanhado pela rede de saúde, por meio do laudo força a sua aprovação,

justifica a desatenção e não aprendizagem, com encaminhamentos para o AEE

termina a sentença, pois se desconsidera a atenção voluntária como postulado pela

Psicologia Histórico-Cultural que, segundo Vygotski (2012), é uma função

psicológica superior, que deve ser desenvolvida, considerando o desenvolvimento

cultural da criança, onde o social atuará para que o biológico se desenvolva, e não

cumprindo com os objetivos da educação.

Os objetivos da educação são de socializar o saber escolar, mas, segundo

Duarte (2007), sua principal função é a mediar “a apropriação das características

humanas objetivadas e a objetivação individual mediada pelo que foi apropriado” (p.

26). É a apropriação do gênero humano que é “a síntese, em cada momento

histórico, de toda a objetivação humana até aquele momento” (Idem, p. 26), porém

não apenas isso. Na educação deve existir a luta contra a alienação, não se pode

apenas reproduzir esse gênero humano sem promover revoluções, saber que essa

luta se refere a garantir que todos possam atingir o máximo de desenvolvimento do

gênero humano, que só é possível por meio da individualidade para-si, segundo

Duarte (2007, p. 29):

A categoria de indivíduo para-si sintetiza, em nossa reflexão, as possibilidades máximas de desenvolvimento livre e universal da

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individualidade que são geradas pelas condições objetivadas da sociedade atual. É importante esclarecer que trata-se de um processo contraditório, pois sendo essas condições de formação da individualidade para-si, geradas numa sociedade estruturada com base nas relações sociais de dominação, essas mesmas condições são geradoras também das possibilidades de muitas e profundas formas de alienação

A escola deveria estar buscando essa educação desalienante, com as Leis e

PLs do TDA-H aprovadas, mais uma vez, receberá proposições verticais, que são

elaboradas por pessoas de alto escalão, que não conhecem a realidade escolar,

mas impõem sobre o corpo docente/administrativo e corpo discente regras que

acreditam ser eficientes, obrigam a implementação de medidas e ações que não

representam a função da escola, de socializar os conceitos científicos.

Um aspecto apresentado na Lei 3895 (ANÁPOLIS, 2016, p. 2) é o incentivo

de parcerias para a realização de pesquisas na temática de transtornos de

aprendizagem “Art. 9°. O Poder Público Municipal firmará parcerias com instituições

de ensino superior, para a formulação de pesquisas e projeto de extensão voltados

para os Transtornos de aprendizagem.”. Esse tipo de pesquisa que auxilia na

criação de políticas públicas, por meio de seus resultados, pode apenas confirmar a

necessidade ou o sucesso da política educacional, a fim de reforçar a existência do

transtorno como de origem biológica ou com sorte se pautará em uma vertente

crítica, proporcionará uma análise realista sobre a temática e resultará em

investimentos concretos para melhorar a escolarização dos alunos que têm

problemas de desatenção, já que a legislação apresentada busca apenas identificar

o aluno, incentivar diagnósticos e enviar para rede de saúde, pouco se fala da

educação, e nada se fala de como pode se desenvolver suas funções psíquicas

superiores.

Essas proposições vazias como as analisadas nesta subseção fazem parte

do que constitui a tendência do sistema capitalista: “Não ser capaz de lidar com os

grandes problemas educacionais: nos países pobres até hoje a universalização da

escolarização básica não deixou de ser um direito apenas proclamado pelas

constituições, não sendo realizado realmente” (DUARTE, 2007, p. 50), o Brasil se

inclui nesse contexto cultural e social, essa manutenção da crença que temos de

alunos doentes, favorece o mercado dos laudos e a indústria farmacêutica.

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O nosso país é o segundo maior consumidor de Ritalina®, no site da Agência

Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA, 2013) a informação do aumento do

consumo é de “75% em crianças com idade de 6 a 16 anos” e no Boletim de

Farmacoepidemiologia, do Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos

Controlados (2012), entre 2009 a 2011, o consumo do medicamento cresceu, sendo

Rondônia o estado com maior consumo. É necessário pensar que essa mesma

indústria segundo o CFP (2012) é a que mais gera lucros, e com isso pode fazer o

lobby com os políticos e estruturar o que Passos (2016) chama de Bancada do

medicamento. Mas como é feito o lobby?

Nas eleições passadas, as empresas de capital nacional doaram nominalmente para 27 candidatos à Câmara Federal, fora os repasses direcionados aos partidos. Destes, 19 foram eleitos. A Hypermarcas foi a que mais investiu (R$ 6,2 milhões), seguida pela Geolab (R$ 1,39 milhão), Eurofarma (R$ 1,02 milhão) e União Química Farmacêutica Nacional (R$ 890 mil). (Idem, p. 115)

É uma compra de políticos por meio de doação para suas campanhas. Como

pode-se retribuir a essa doação? Um exemplo são as legislações aqui analisadas.

Primeiramente, a sociedade precisa acreditar que existe uma necessidade, isso se

faz por meio da cultura, das crenças, isso é feito por meio do marketing, segundo

Benasayag (2013, p. 150) “criar uma necessidade ou um problema, para brindar

com uma solução através de um novo produto”, um exemplo apresentado pelo autor

são as pesquisas de saúde desenvolvidas nos EUA, os resultados apresentados

“vão ajudar a indústria, a comercialização de produtos e vão orientar os médicos a

fazer determinado diagnóstico” (Idem, p. 149).

O crescente diagnóstico de TDA-H, desconsiderando as condições concretas

do cotidiano escolar, está seguindo a risca essa receita, que Benasayag (2013,

p.150) chama de “plan maestro” (Idem, p. 150), que envolve médicos, para

pesquisar e produzir o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais

(DSM) e pesquisas que legitimam a existência de doenças bem como a eficácia dos

remédios no tratamento dessas supostas doenças, juntamente com a mídia,

distorcendo possíveis efeitos colaterais, exaltando eficácia, agora podemos

acrescentar nesse plano as legislações que incentivam o diagnóstico de distúrbios.

O incentivo para a busca de diagnóstico irá ocorrer com o apoio da própria

escola, pois de acordo com as proposições é a direção ou o professor que devem

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fazer o encaminhamento ou o diagnóstico, como discuti na seção anterior, para que

a criança tenha um suposto benefício, que seria o de atendimento educacional

especializado, adaptação curricular, provas diferenciadas, existindo assim, um

ganho para a escola, em não se responsabilizar por esse aluno, já que ele possui

uma disfunção, um ganho secundário para a família, pois um laudo pode explicar as

dificuldades do filho, mas só quem perde será o aluno, que ficará rotulado e

esquecido nos bancos escolares.

Não existe um acordo entre as proposições enquanto ao que deve ser feito

com o aluno, mostrando a falta de compasso entre as intervenções assim como o

entendimento sobre como solucionar o problema da desatenção, enquanto

proposições defendem a inclusão do aluno no Atendimento Educacional

Especializado ou se referem a necessidades especiais (Lei Nº 7354/2016, PL

054/2017, PL 260/2015, Lei Nº 3895, PL 870/2016, PLL 125/2017) temos a PL

514/2011 que defende que “Para exercer suas funções com competência todos

devem ser preparados, inclusive para evitar encaminhamentos desnecessários. O

aluno hiperativo não deve ser encaminhado ao ensino especial” (DISTRITO

FEDERAL, 2011, p.1, grifo meu). Como mencionado anteriormente os alunos que

tem dificuldade com a atenção voluntária não fazem parte da clientela definida pela

Lei do AEE (BRASIL, 2008, 2011).

No decreto Nº 7.611 que “dispõe sobre a educação especial, o atendimento

educacional especializado” (BRASIL, 2011, p. 1) define a clientela do AEE como

“§ 1o Para fins deste Decreto, considera-se público-alvo da educação especial as

pessoas com deficiência, com transtornos globais do desenvolvimento e com altas

habilidades ou superdotação”, lembrando que as deficiências são: visual, auditiva,

intelectual, física e múltiplas e os transtornos referem-se ao Transtorno do Espectro

Autista.

Outro ponto relevante é que temos propostas de criação de vínculos entre

poder público e privado para a efetivação das Leis “Art 6º - Fica o Executivo

autorizado a realizar convênio com entidades públicas e particulares para a

realização dos cursos previstos no art. 3º desta lei” (PIAUÍ, 2011, p.4); “Art. 5º -

Ficará o Município incumbido, em firmar parcerias e convênios com instituições e

associações” (TEÓFILO OTONI, 2013, p. 1); “Art. 2º Para a concretização das

diretrizes previstas nesta Lei, o Poder Executivo poderá firmar parcerias e celebrar

convênios ou instrumentos congêneres com instituições públicas ou privadas.”

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(FORTALEZA, 2016, p.1), pode significar um avanço, uma aliança entre setores, ou

apenas mais uma maneira de enganar a população por meio de contratos corruptos,

como é na atualidade a política brasileira.

Um aspecto que chamou atenção foi a data em que algumas proposições

foram sancionadas como: Lei 4165/2013, data de aprovação seis de dezembro de

2013 (VIAMÃO, 2013), Lei 3112, data de aprovação 29 de dezembro de 2015

(ACRE, 2015), Lei 3895, de 28 de dezembro de 2016 (ANÁPOLIS, 2016), são datas

incomuns por estarem próximas aos períodos de férias e recesso, sendo assim teria

pouca engajamento e participação popular nas seções em que foram aprovadas.

A participação popular e a pressão que pode exercer sobre o poder público é

perceptível, no evento de medicalização da educação, realizado no Acre, em 2016,

pela Universidade Federal do Acre em parceria com o Instituto Federal do Acre, que

foi o embrião desta pesquisa, verificamos um exemplo, pois o grupo de pais de

crianças com TDA-H – GATAC, foi apontado como o maior incentivador da Lei 3112

(ACRE, 2015), assim como temos a ABDA que fomenta informações em seu site

sobre o transtorno e legislações que devem ser procuradas pelos pais para

garantirem o direito dos filhos nas escolas. É necessário pensar criticamente se

essas legislações irão promover a aprendizagem dessas crianças, ou se apenas

visam amenizar a falta de investimento na educação pública e amortecer o

sucateamento da educação, incentivando a medicalização do não aprender e mais

seriamente incentivando a judicialização desse processo.

A judicialização do ensino é o processo de buscar por meio da instância

jurídica solucionar problemas escolares. Nos EUA, esse processo já acontece, como

apresentei na subseção 1.2 sobre Políticas Educacionais no Brasil e a Psicologia, o

ensino de crianças com TDA-H é regido por duas legislações: Seção 504 da Lei de

Reabilitação de 1973 (chamada Seção 504) e a Lei de Educação de Indivíduos com

Deficiências (chamada IDEA) de 1990, que garantem um atendimento educacional

diferenciado para os alunos com TDA-H. Mas a questão primordial não é ser contra

uma educação adaptada, ou melhor, para esses alunos, é compreender que a

medicalização do ensino, a culpabilização do aluno pelo fracasso da escola e

legislações que o forcem a se tratar não solucionam o seu problema, não promovem

a aprendizagem, que deveria ser o objetivo maior da educação escolar.

Diante disso, precisamos avançar muito ainda, para que as legislações não

sejam apenas cópias de políticas internacionais, visando números, desconsiderando

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todo o contexto social, cultural, e acima histórico, no qual se desenvolvem o

fenômeno da desatenção, TDA-H e fracasso escolar. Sem transferir

responsabilidade social, de um sistema defasado, que precisa de regeneração

urgente, para os alunos. Na próxima seção, apresento as considerações finais com

o objetivo de fazer um apanhando geral, com proposições para futuras ações e

pesquisas.

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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS: ATENÇÃO VOLUNTÁRIA, CONSTRUÇÃO DO

FRACASSO ESCOLAR E POLÍTICAS EDUCACIONAIS

Não há produção do novo sem a reprodução do que já foi construído historicamente.

(DUARTE, 2007, p. 49)

A temática do Déficit de Atenção – Hiperatividade que me encontrou, a

proposta incialmente era realizar um trabalho muito diferente desse material final,

mas a vivencia acadêmica de estar em um evento cientifico que foi o I Seminário

sobre Medicalização na Educação no Estado do Acre, organizado pelo curso de

Psicologia da Universidade Federal do Acre e pelo Instituto Federal do Acre, onde foi

discutida uma temática tão importante, medicalização da educação e o fracasso

escolar, culminando com a apresentação da Lei Nº 3.112 (ACRE, 2015) por um

membro da plateia, despertou a minha curiosidade que se transformou

posteriormente em meu tema de pesquisa nesse mestrado - a medicalização da

educação por meio dos documentos legais, tendo como objetivos: analisar as Leis e

Projetos de Leis no âmbito federal, estadual e municipal que tratam do Transtorno

de Déficit de Atenção/Hiperatividade no contexto escolar e, como objetivos

específicos: Traçar um perfil da legislação: quem propôs, quando e porquê;

Identificar qual conceito de atenção é apresentado nos textos legais e de que áreas

do conhecimento são esses conceitos e; Averiguar qual a proposta de intervenção

das Leis e PLs para o âmbito educacional/escolar.

Todo esse trajeto acompanhado pelo estudo de Psicologia Histórico-Cultural,

que infelizmente até o início do processo de mestrado era desconhecida para mim,

mas que a cada leitura e releitura fez todo sentido, por ser uma abordagem teórica

que não compõe sem a sua história de surgimento e a compreensão das bases

Marxista nela presente (TULESKI, 2008). Além de toda a preocupação na seleção

de textos que apresentassem traduções adequadas sem os recortes que foram

feitos nas publicações e limpezas das traduções (PRESTES, 2010), assim como a

escolha do método foi feita por compreender que não poderia separar a teoria de

sua metodologia.

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Para desenvolver uma aproximação materialismo histórico dialético foi difícil

apreender a fluidez com que o método analisa os fenômenos, pois Vigotsky (2009)

postula que devemos considerar o movimento, a totalidade, a incompletude do que

vamos estudar. Romper com paradigmas que são ensinados desde o primeiro

trabalho científico na graduação, sobre cumprir regras rígidas, dividir certo e errado,

é muito difícil.

Entretanto, com o movimento da pesquisa, coleta de dados, construção dos

eixos de análise: a) Desvendando a produção de Leis e PLs; b) A

(in)compreensão sobre o TDA-H na forma da lei; e c) A judicialização do não

aprender até encontrar as unidades de análise; a) atenção e desatenção e b)

políticas educacionais e queixa escolar, percorri o caminho como acontece no

desenvolvimento cultural, “numa espiral dialética, envolvendo avanços e recuos,

saltos e paralisações” (TULESKI E EIDT, 2016, p. 57) vivenciando cada fase para

dar um salto para o momento seguinte.

A compreensão de homem da Psicologia Histórico-Cultural onde ele é “ao

mesmo tempo natureza e história desta natureza” (TOMIO; FACCI, 2009), em um

movimento dialético, ao mesmo tempo em que determina a cultura, a cultura o

determina, diferentemente do homem construído no ideal capitalista, que é um ser

individual, que explora os recursos ao seu redor, onde a divisão de classes, a

exploração e exclusão de uns, constrói o patrimônio de outros, e que todo esse

cenário cultural interfere diretamente na escolarização da população, meio pelo qual

deveríamos diminuir os abismos sociais, mas que infelizmente não tem acontecido,

foi um grande desafio para mim.

O levantamento das Leis e Projetos de Leis mostrou que temos muita

repetição, pouca inovação, que as propostas não são para melhorar a educação,

formar alunos críticos, pois a “educação é a formação do indivíduo enquanto ser

essencialmente social e histórico” (DUARTE, 2007, p. 16), mas além de formar

sujeitos dentro deste gênero humano, deve também incentivar à crítica a sociedade

capitalista, promovendo a quebra de ciclos, para se transformar em uma “educação

que contribua para a superação das relações sociais de dominação” (idem). As Leis

e PLs são muletas, que estão se apoiando na cultura de culpabilização e

medicalização na educação para se livrarem de sua responsabilidade de oferecer

educação de qualidade e gratuita, apenas reforçando a alienação dos alunos, que

aprendem o básico para o mercado de trabalho, mas não para ir, além disso,

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retornando para a Teoria do Capital Humano, formar mais trabalhadores,

conformados com as relações de dominação, e a Teoria da Carência Cultural, as

origens dos alunos e suas dificuldades determinam o seu valor e sua capacidade de

apender, é um retrocesso.

Entendo a atenção como uma função psicológica superior que segundo os

estudos de Vygotski (2012) é dividida em atenção primária e atenção voluntária,

definindo que “a história da atenção da criança é a história de desenvolvimento de

sua conduta organizada” (p. 213), assim para ele a atenção voluntária é

desenvolvida por meio do desenvolvimento cultural da criança, quando passa de

“operações não-mediadas a mediadas” (p. 224), mediadas por signos, instrumentos

e principalmente mediadas por pares mais capazes. Portanto para Vygotski (2012) o

social que transformará o biológico, e a aprendizagem precederá o desenvolvimento.

Quando me refiro a pares mais capazes, devemos considerar que a prática

pedagógica escolar intencional segundo Duarte (2007) é que promove a

aprendizagem efetiva, por meio dela o aluno deixa de ser alienado e compreende

que faz parte de um sistema de dominação, que necessita que ele permanecesse

anestesiado, ocupando seu lugar, e com essa consciência ele possa romper com

isso. Para que o processo de alienação se mantenha temos a escola real, onde o

professor não tem como exercer um ato pedagógico intencional que resulta na

alienação do trabalho educativo, “a alienação do trabalhador perante o processo

gerará também a alienação no que se refere ao produto, no caso, à formação do

indivíduo educando” (DUARTE, 2007, p. 56).

Com este processo em vista, o fenômeno atual de desatenção, falta e/ou

falha no desenvolvimento da atenção voluntária nos remete à falta de oportunidade

para desenvolver essa função psíquica superior, os pares mais capazes, no caso os

adultos – que no âmbito da escola são os professores – não estão exercendo sua

participação no desenvolvimento da atenção voluntária dos alunos e estes não estão

sendo preparados para desenvolver a atividade de estudo, e consequentemente

para a vida escolar.

Segundo Leontiev (2001), a criança tem com atividade principal a atividade de

jogo, na fase pré-escolar, a transição para a atividade de estudo deve acontecer

com auxílio, pois o aluno sabe que a sociedade espera que ele aprenda os

conteúdos científicos, se desenvolva, mas para isso ele também deve ser ensinado

como exercer esse novo papel social. Isso não acontece em nossa realidade, o

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fenômeno do TDA-H nos comprova isso, a escola espera um aluno ideal, que venha

pronto, siga regras, preste atenção, mas não está preparada para o aluno real, que

tem que aprender uma infinidade de regras, desenvolver a atividade de estudo e a

atenção voluntária e vive um momento de crise que requer superação e

desenvolvimento.

A legislação para o TDA-H nas escolas apenas busca identificar as crianças,

propor tratamento de saúde, aplicar avaliações diferentes, entre outras ações, mas

não incentiva ações para o desenvolvimento da atenção voluntária, de atualização

do fazer pedagógico, por uma atuação consciente, que segundo Duarte (2007, p. 58)

consiste em “uma prática pedagógica escolar voltada para a formação da

individualidade para-si” que visa à formação de um sujeito consciente, não alienado.

É interessante para o sistema escolar, político e social, não assumir a

responsabilidade por essas crianças com dificuldades, que posteriormente

apresentam um laudo de TDA-H, para a escola, terminaria com os problemas de não

aprender, pois a justificativa seria o transtorno, não a qualidade do ensino, no campo

político manter os alunos medicados significa menos cidadãos conscientes de seus

direitos. Assim, não exigem investimentos em educação e infraestrutura, e social, a

sociedade já aceitou seu status de consumidora de remédios, fechando os olhos

para as falhas e sobrecargas causadas pelo sistema econômico que nos adoece,

medicar e enquadrar as crianças em padrões socialmente aceitos é menos

trabalhoso.

O objetivo deste trabalho não é ser contra as legislações, nem contra o auxílio

às crianças que possuem qualquer dificuldade em dominar e fazer uso da atenção

voluntária, mas sim uma tentativa de mostrar que sem uma revolução em como nos

relacionamos, como auxiliamos as crianças no desenvolvimento cultural e como

sucumbimos a uma sociedade de consumo será cada vez mais difícil contribuir para

que nossas crianças desenvolvam a atenção voluntária, capazes de sustentar por

horas o foco em uma só atividade, a fim de apreender por meio do processo de

escolarização o saber escolar. Pois esse não é o perfil de nossa sociedade

capitalista ocidental, estamos sempre conectados por meio de tecnologias que nos

apresentam um número alto de informações, uma rotina que exige que várias tarefas

sejam feitas simultaneamente; o mercado determina um nível de formação

impossível de alcançar, toda essa cultura nos empurra para um abismo de

multitarefas, com cada vez menos atenção para uma só atividade.

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O ideal seria a transformação ocorrer como um todo em nossa sociedade,

para que a criança desde o princípio seja exposta a situações e relações no meio

interpsíquico que promovam aprendizagem para posteriormente serem incorporadas

ao campo intrapsíquico, “que se dirija aos indivíduos reais não apenas no que diz

respeito ao que eles são, mas principalmente àquilo que eles podem vir a ser”

(DUARTE, 2007, p. 30).

Não é perceptível na legislação essa consideração do que os alunos podem

aprender e se desenvolver. A produção legal apresenta textos bem semelhantes

quanto as suas proposições, realizando audiências públicas com profissionais que

apresentam apenas um lado a respeito do tema, desconsiderando tantas pesquisas

que mostram dados contrários, como as de Patto (1990; 1992); Collares e Moysés

(1994, 1996); Angelucci et. al. (2004); Bock (2002); Dincao e Meira (2016);

Mezzalira, Silva e Guzzo (2014), ignorando os artigos que tratam do número

alarmante de diagnósticos – Sapia (2013) e Leite (2015). O mais grave é saber que

a campanha de parlamentares, os quais fazem as matérias legislativas, pode ter

sido patrocinada por indústrias que tem um ganho direto com esse tipo de

legislação, portanto, é interessante exigir diagnósticos e tratamento.

É necessário incentivar mais pesquisa na área de políticas educacionais, que

se utilizem da Psicologia Histórico-Cultural e materialismo histórico dialético, visando

difundir as ideias e conceitos de Vigotski, na busca por uma revolução real, temos

que continuar pesquisas que mostrem que o caminho é o ato pedagógico intencional

e consciente, juntamente com uma infraestrutura de qualidade e uma sociedade e

política que dão suporte neste processo de individualização para-si.

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REFERÊNCIAS

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