Nº 91 - Novembro 2014 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / r$ 15 O ... · Uma consagração que só é...

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Nº 91 - NOVEMBRO 2014 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15 CABO VERDE BRASIL E agora Dilma? O topo é a ambição Angola no Conselho de Segurança das Nações Unidas Cabo Verde enfrenta longos desafios económicos, o que não impediu de ser considerado o segundo país africano mais bem governado

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Nº 91 - Novembro 2014 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / r$ 15

CABO VERDE

BRASILE agora Dilma?

O topo é a ambição

Angola no Conselhode Segurança das Nações Unidas

Cabo Verdeenfrenta longos desafios económicos,o que não impediu de ser considerado o segundo país africano mais bem governado

África21– novembro 2014 1

Revista Africa21 200x275.indd 1 10/17/14 4:59 PM

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África21 Revista de Política, Economia e CulturaPropriedade Nova Movimento, LdaSociedade de Marketing, Comunicação e CulturaRua Frederico Welvitch, n.º 82Bairro do Maculusso – Luanda, [email protected] por MovipressUma divisão da Nova Movimento, Lda

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Representação no Brasil Belisan Editora, Comércio e Serviços Ltda [email protected]ção de Angola Adriano de Sousa, Alberto Sampaio, Carlos Severino,Luís Ramiro, António Dombele, Pedro Kamaka, Ruben Kamaxilu e Teixeira CândidoRedação de Portugal João Carlos, João Escadinha, Miguel Correia, Nicole Guardiola, Nuno Macedo e Teresa SoutoRedação do Brasil Carlos Castilho e João BelisarioColaboradores permanentes Almami Júlio Cuiaté (Bissau), Augusta Conchiglia (Paris), Charles Shorungbe (Lagos), Emanuel Novais Pereira (Maputo), Fernando Lopes Pereira (Bissau), Gláucia Nogueira (Praia), Itamar Souza (Nova Iorque), João Vaz de Almada (Maputo), Juvenal Rodrigues (São Tomé), Luís Costa (Washington), Manrique S. Gaudin (Buenos Aires), Natacha Mosso (Praia), Paul Cooper (Houston) e Rodrigues Vaz (Lisboa)

Colunistas Alves da Rocha, Conceição Lima, Corsino Tolentino, Fernando Pacheco, Germano Almeida, João Melo, José Carlos de Vasconcelos, Luís Cardoso, Odete Costa Semedo e Pepetela Fotografia Agência Angop, Agência Lusa, Agência France Presse, Arquivo

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Publicidade e assinaturas em Portugal Triangulaçã[email protected]@sapo.ptImpressão em Angola: ImprimarteEstrada Viana - Catete, Km 36 – Angola Francisco Nunes [email protected].: +244 931 696 890Impressão em Portugal: PrinTipoAlto da Boavista, Estrada de Paço de Arcos, nº 77Pavilhão 20 – 2735-197 CACÉMTelefone: (351) 214 906 020 Impressão no Brasil: Blue Print Gráfica Editora LtdaRua José Mendes de Souza, 7 – Sampaio Corrêa Saquarema/RJ – CEP 28990-000Tels.: 22 2654.7154 / 22 2654.1112Tiragem total: 11.000 exemplaresOs artigos assinados refletem a opiniãodos autores e não necessariamente da revista.Toda a transcrição ou reprodução, parcialou total, é autorizada, desde que citada a fonte.A correspondência deve ser dirigida à MovipressRua Frederico Welvitch, n.º 82Bairro do Maculusso – Luanda, Angola.Tel.: 244 912 442 453Portal www.africa21online.com

As ambições de Cabo Verde

Cabo Verde vislumbra um futuro promissor. Tem a possibilidade de se transformar num país mais desenvolvido e aspira tornar-se o mais bem governado em África. Mas até lá é preciso investimento e empenho para reforma e desenvolvimento de diversas áreas.

Gláucia Nogueira, Corsino Tolentino, Natacha Mosso e Miguel Correia

Plebiscito a Dilma Rousseff

Sitiada desde agosto pelos jiadistas do Estado Islâmico, a batalha pelo controlo da cidade síria de Kobani parece não ter fim. E a questão curda revela as fragilidades e incoerências da coligação liderada pelos Estados Unidos.

Nicole Guardiola

A vitória de Dilma na segunda volta das presidenciais foi à tan-gente. Para os próximos quatro anos, a Presidente reeleita promete reformas inevitáveis: reforma política, combate contra a corrupção e à inflação.

Carlos Castilho

A batalha pelo controlode Kobani

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Angola no Conselhode Segurança

sumÁrio

Com190 votos favoráveis dos 193 possíveis, a Assembleia Geral das Nações Unidas ele-geu Angola para integrar o Conselho de Segurança como membro não permanente durante dois anos.

Carlos Severino

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aos leitores

[email protected]

Os desafios de Cabo Verde Dizer que Cabo Verde é um caso de sucesso soa a muito pouco.

Quem o visitou há trinta anos ficava suspenso ao olhar as ilhas feitas de serras áridas e rochas, que o vento as varria com violência. Tempos a tempos, chovia mas a água teimava em cair no mar a escassos metros da praia. Mas quando a sorte sorria e a água

molhava as populações acontecia o carnaval, festejado por crianças e adultos que se rebolavam pelas ruas.

Chegada a independência em 1975 muitos cabo-ver-dianos e estrangeiros interrogavam-se se o país era viável. O vocábulo pontuava na boca de muita gente e também de dirigentes. Mas o «viabilizar» caiu em desuso muito rapidamente, substituído pelo «gota a gota, árvore a árvore».

Os anos foram-se esgotando e Cabo Verde foi-se construindo.

Criou-se muita coisa, desafios foram vencidos, e muitas transformações aconteceram na fragilidade da economia, da agricultura (num território que apenas dispõe de dez por cento de terra arável), e de escassos recursos naturais. A vida dos quinhentos mil habitantes, número semelhante aos que foram forçados a emigrar, foi melhorando pouco a pouco, passo a passo.

Em 2007, Cabo Verde começou a caminhar do grupo dos Países Menos Avançados para os de Rendimento Médio, uma mudança sustentada pelos indicadores de rendimento per capita, educação e saúde. Uma transição complexa porque a outra face da moeda levava à supressão de vários apoios de países doadores.

Ao entrar na quarta década de país independente, tem provas dadas no sistema político. Em Cabo Verde, os mandatos dos governos cumprem os prazos legais em paz, e a coabitação entre o primeiro-ministro, do PAICV, e o presidente da República, do MpD, verifica-se sem sobressaltos, como aliás é a situação atual, o que causará, seguramente, inveja aos santomenses.

E há agradáveis ironias. A pouca água que cai no arquipélago não impediu a construção de barragens, e o vento arrasador dá para alimentar os parques eólicos.

Mas ressalve-se que nem tudo está bem no segundo país africano mais bem governado. Há falhas para resolver com urgência. Disto tratam os nossos colaboradores cabo--verdianos nesta edição.

Carlos Pinto santos

aos leitores

Rubricas11 Antena2118 Gente74 Insumos88 Cults92 Livro do Mês94 Ver, Ouvir Ler

42 OPINIÃO Alves da Rocha

48 MOÇAMBIQUE Filipe Nyusi e Frelimo comemoram vitória Emanuel Novais Pereira

50 ÉBOLA O mundo em alerta Nicole Guardiola

54 SÃO tOMÉ E PríNCIPE Patrice trovoada vence as eleições Juvenal Rodrigues

58 GUINÉ-BISSAU Democracia discutida em Bissau Almami Júlio Cuiaté

60 ÁFrICA DO SUL Economia em crise Gaye Davis

69 AMÉrICA LAtINA Lutar contra os abutres financeiros Manrique S. Gaudin

83 LíNGUA POrtUGUESA Nova diretora do IILP João Carlos

Mohamed Yioussouf AdamgyCrime e violência não vêm no Alcorão

Nicole Guardiola

6 Entrevista

Crónicas57 Conceição Lima67 José Carlos de Vasconcelos85 Luís Cardoso96 João Melo

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Entrevista Mohamed Yioussouf Adamgy, diretor da revista islâmica Al-Furqán

O Islão é mal conhecido em muitos países e geralmente está associado na opinião pública às noções de guerra, radicalismo e terrorismo. Os cerca de 50.000 muçulmanos que vivem em Portugal, oriundos maioritariamente da Guiné- Bissau e de Moçambique, repudiam esta violência e também a manipulação caluniosa do Alcorão.

niCole Guardiola

“Quem conhece o Islão não parte para fazer a jiade”

ÁFRICA21. Nunca se falou tanto do Islão na imprensa lusófona. Como mu-çulmano e como intelectual, como ava-lia esta mediatização? MAHOMED YIOSSUF ADAMGY. Se se fala tanto na imprensa lusófona é por-que se fala, também, na imprensa interna-cional que, por sua vez, transmite, duma forma ou de outra, o que a CNN noticia. E quando se fala do Islão, fala-se só e sempre ligado à guerra, ao radicalismo e ao terrorismo.

Assistimos a uma monumental ma-quinaria mediática que caracterizou o sempre impreciso e mal definido «funda-mentalismo islâmico» como uma nova praga bíblica. A comunicação social inter-nacional preocupou-se em difundir (com pouco material de apoio) que as ações do dito Estado Islâmico são bárbaras, que as-sassinam pessoas, que raptam mulheres e que, sobretudo, impõem a lei islâmica às populações que conquistam. Mas apesar da muito real violência que existe em algu-mas zonas do mundo islâmico, há que re-cordar que a história do Islão não foi mais violenta que a de outras religiões e que se os media fossem objetivos veriam que estes

crimes não são muito piores do que as ações dos «civilizados» israelitas em Gaza, ou que os «civilizados» ataques com dro-nes que ordena o Presidente dos Estados Unidos no Paquistão e que deixam um trágico saldo de mortes de civis, crianças, mulheres e idosos, sem distinção.

A violência não é religiosa; é crimino-sa. O ódio cego não é islâmico, é um peca-do mortal. Está escrito no Alcorão «Quem matar uma pessoa, sem que esta tenha co-metido homicídio ou semeado a corrup-ção na terra, será considerado como se ti-vesse assassinado toda a humanidade; quem a salvar, será reputado como se ti-vesse salvado toda a humanidade.» (Alco-rão, 5:32.)

Como reage a comunidade islâmica, em Portugal e no seu país de origem, Moçambique? A maioria da comunidade islâmica (e mesmo os não-muçulmanos) em Portu-gal, Moçambique e em todo mundo con-dena estas atrocidades e este Estado islâmi-co que nada tem a ver com o Islão. Por outro lado, essa maioria pressente que há uma manipulação caluniosa dos Estados

Unidos e, por inércia, do Ocidente contra o Médio Oriente e o Islão, porque em nome de uma «democracia totalitarista» se invade e se bombardeia nações soberanas como Síria, Líbia, Iraque que foram arra-sadas e as suas economias devastadas.

A radicalização de jovens, de origem muçulmana ou recém-convertidos, que partem para fazer a jiade na Síria ou no Iraque, suscita alguma inquietação. Quer comentar? Quem conhece bem o Islão, certamente não parte para fazer a jiade na Síria ou no Iraque. Apesar de ser este o discurso de inúmeros ocidentais que aderiram ao Esta-do Islâmico (e são, pelos vistos, os seus di-rigentes no terreno) penso que são indiví-duos que por um motivo ou outro se sentiram marginalizados pela sua socieda-de, e que em vez de assumirem os seus in-sucessos, defeitos ou incapacidades, opta-ram por culpar toda a cultura ocidental, e que esse facto é aproveitado pelos angaria-dores de mercenários. Sem desculpabilizar estes indivíduos, posso vislumbrar quem está por detrás de tudo isto e sei que não é a religião. Nenhuma religião manda mas-sacrar inocentes. O que acontece é que a sociedade humana sofre as consequências da desinformação e mentiras, a verdade tem sido deformada por interesses econó-micos, os centros de poder no mundo…

Os muçulmanos em Portugal são pouco numerosos e pertencem aos vários ramos do Islão. Como se relacionam entre eles? Segundo a Comunidade Islâmica de Lis-boa, os muçulmanos são cerca de 50.000 em Portugal, originários sobretudo da Guiné-Bissau e Moçambique. A maioria é sunita. Há uma minoria chiita: a Comuni-

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dade Ismaelita com o seu templo em Lis-boa e a Comunidade Içna Achari com o seu lugar de culto em Almada. Todos rela-cionam-se entre eles.

E com os portugueses que professam outras religiões, nomeadamente os católicos? Os muçulmanos de Portugal convivem e têm relações de amizade, fraternidade e solidariedade, vivendo em paz com os seus irmãos de fé cristã e outras, pois os ensina-mentos do Alcorão assim os orientam.

Quando Deus diz: «Ó humanidade! Nós vos criamos de macho e fêmea e vos dividimos em tribos e nações, para que se conheçam uns aos outros.» (Alcorão, 49:13) não se está a referir apenas a conhe-cer um determinado nome ou tribo; a ex-pressão implica, numa interpretação mais lata e dirigida a toda a humanidade, a tro-ca de saberes e de conhecimentos e toda uma série de interações positivas.

Quero lembrar, por exemplo, o encon-tro com o Dalai Lama na Mesquita de Lis-boa, que reuniu budistas, muçulmanos, ju-deus, cristãos, hindus e bahha’is, e cuja notícia (na época) foi registada, na sua ínte-gra, na revista islâmica portuguesa Al Fur-qán. Recebemos na Mesquita de Lisboa as visitas dos Presidentes da República Portu-guesa, nomeadamente, o Dr. Mário Soares, o Dr. Jorge Sampaio e o Dr. Cavaco Silva, e os primeiros-ministros Sócrates e Passos Coelho. E tem havido eventos culturais com participação de várias religiões.

Tem sentido recentemente mais intole-rância, hostilidade? Em Portugal, felizmente temos poucos in-dícios de radicalização e de maior intolerân-cia. A maioria dos muçulmanos são portu-

A maioria muçulmana em Portugal pressente que há uma manipulação caluniosa dos Estados Unidos e, por inércia, do Ocidente contra o Médio Oriente e o Islão

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gueses, originários das ex-colónias e a nova geração já nasceu cá; por conseguinte, estão integrados. Mas não esqueçamos que o mundo se tornou uma aldeia global. Na Europa crescem os partidos extremistas e xenófobos. A televisão que entra quotidia-namente em casa das pessoas fala do Islão só e sempre ligado à guerra, ao radicalismo e ao terrorismo. Já há sinais de islamofobia, sobretudo na internet.

Diz que em matéria de direitos huma-nos um dos valores fundamentais do Islão é a justiça. Acha que uma ordem política e social injusta contribui para a emergência do chamado islão político e à sua radicalização? No clima de desespero em que vivem grandes massas de muçulmanos – e mais ainda da sua juventude – a saída violenta pode aparecer como uma tentação. Mas pergunta-se: é realmente esse um caminho de libertação para as empobrecidas e pros-tradas massas muçulmanas?

O escritor, psicólogo e politólogo de origem argentina Marcelo Colussi escreveu que num ambiente de pobreza, desempre-go e miséria «as populações dos países mu-çulmanos encontram-se num beco sem saída» e que «a arrogância e desprezo dos monarcas e ditadores no mundo islâmico e árabe adicionam mais combustível ao ódio e cólera das massas». De um ponto de vista sociopolítico, as razões principais deste fe-nómeno são o enorme vazio criado pela falta de propostas alternativas que acontece nestas sociedades, e a manipulação das po-pulações apelando a um fanatismo fácil de

MAHOMED YIOSSUF ADAMGY

Mahomed Yiossuf Mohamed Adamgy nasceu na Ilha de Moçambique em 1951, fez os estudos secundários em Nampula e reside em Portugal desde 1977. É um dos fundadores e diretor da Al Furqán (O critério do bem e do mal), uma Organização Islâmica Portuguesa, fundada em 1981, para a defesa, divul-gação e edição de estudos islâmicos em Portugal. A revista bimensal Al-Furqán é uma das poucas publicações portugue-sas que se dedica à exegese e reflexão sobre o Alcorão mas também à refuta-ção de muitas interpretações erradas e preconceitos existentes entre muçulma-nos e não muçulmanos.

Foi secretário (1985-87) da Direção da Comunidade Islâmica de Lisboa (CIL), fundada em 1968 por um familiar, Suleiman Valy Mamede (falecido em 1995 e conhecido entre os muçulmanos lusos como o «pai da grande mesquita» inaugurada em 1985) e empenhou-se no desenvolvimento das atividades cultu-rais da CIL e na abertura do diálogo in-ter-religioso mediante a organização de colóquios e a criação da Feira do Livro Islâmico que se realiza anualmente du-rante o ramadão.

Muçulmano sunita, considera-se in-dependente quer do ponto de vista teoló-gico quer em relação à CIL, atualmente presidida pelo Sheik David Munir. Como intelectual de nacionalidade portuguesa (como 70% dos muçulmanos residentes em Portugal) defende o reconhecimento do Islão como um dos pilares do chama-do universalismo cultural lusófono.

No clima de desespero em que vivem grandes massas de muçulmanos e sobretudo a juventude, a saída violenta pode parecer uma tentação

exacerbar. É ai onde começa a vislumbrar--se outra pergunta: a quem beneficia este fundamentalismo? Segundo o economista egípcio Samir Amin «imperialismo e fun-damentalismo cultural caminham juntos. O fundamentalismo de mercado diz: sub-vertam o Estado e deixem que os mercados à escala internacional manejem o sistema. Isto se conseguirá quando os Estados forem completamente desmantelados».

Por outro lado, todas as religiões po-dem comportar rasgos fundamentalistas. Proibir o uso do preservativo alegando que representa um «atentado à vida» como faz o Vaticano, no meio de uma pandemia de VIH como a que atualmen-te temos, não é por acaso um fundamen-talismo irresponsável? E o fundamenta-lismo não é só religioso.

Bombardear a população civil não com-batente com o pretexto de defender a «liber-dade» e a «democracia» não é uma forma extrema de sangrento fundamentalismo?

Nunca houve em Portugal grande inte-resse pela cultura islâmica. Agora mais pessoas estudam a língua árabe. Acha que pode contribuir para o reconheci-mento do Islão como parte da identida-de histórica portuguesa? A curiosidade pelo Islão cresceu após a Guerra do Golfo (1990) e os atentados de 11 de Setembro de 2001. A criação pela Al Furqán, em 1997, da Feira do Livro Islâ-mico nas instalações da Mesquita de Lis-boa (que se repete todos os anos durante a última semana do mês do Ramadão) foi, para muitos, a primeira oportunidade de entrar na Mesquita de Lisboa. As pessoas pensavam que se tratava de um lugar proibido e a feira veio quebrar este tabu. A Mesquita de Lisboa recebe, anualmente, muitas visitas de escolas de todo o país. Há aulas de árabe, gratuitas, ministradas pelo Imame da Mesquita, Cheik David Munir. Muitos não-muçulmanos frequentam es-sas aulas. Por outro lado, há já historiado-res e arqueólogos portugueses que se dedi-cam a investigar e divulgar os vestígios árabes e islâmicos em Portugal.

Ler entrevista na íntegra em www.africa21online.com

A violência não é religiosa; é criminosa. O ódio cego não é islâmico, é um pecado mortal

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Para realizar, basta acreditar

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Antena21

52 anos era a esperança de vida dos angolanos em 2013, que em 2000 não ia além dos 45

“Exortamos todos os países a seguir Cuba e Venezuela, que deram um exemplo louvável com a sua rápida resposta de apoio aos esforços para travar o ébola

BAN KI-MOON, secretário-geral da ONU

José Eduardo dos Santos defende estabilidade, pragmatismo e realismo, para continuar a progredir«Sem pressas, para não tropeçarmos». A expressão sintetiza o apelo do Presidente José Eduardo dos Santos à classe política do país para que esta assente a sua ação no prag-matismo e realismo, evitando a «retórica político-partidária», a fim de manter a estabilidade e possibilitar a continuidade dos progressos alcançados depois do fim da guerra, em 2002. O Presidente falava sobre o Estado da Nação na sessão de abertura de mais uma legisla-tura, a 15 de outubro, perante os 220 deputados da Assembleia Nacional.

José Eduardo dos Santos valorizou os progressos políticos, económicos e sociais verificados nos últimos doze anos, como a pacificação e reconciliação, a democrati-zação, a estabilidade macroeconómica, a reconstrução de infraestruturas e as melho-rias sociais, mas reconheceu que ainda resta muito por fazer. Como a principal crítica à atual governação tem a ver com os desequilíbrios sociais, o Presidente enumerou aquilo que considera serem os avanços registados nesse domínio. Entre eles, desta-cou a diminuição da pobreza em mais de 50%, a «revolução quantitativa» na educa-ção, a diminuição da taxa de mortalidade infantil e o aumento da esperança de vida.

Desconstruindo a leitura dominante relativamente ao posicionamento do país no ranking do índice de Desenvolvimento Humano, ainda muito baixo, Eduardo dos Santos preferiu sublinhar que, desde 2009, Angola foi o terceiro pais africano que mais progrediu nesse domínio, atrás apenas do rwanda e da Etiópia. Ele mostrou--se convencido de que, em duas décadas, o país estará situado entre as nações de índice de desenvolvimento humano elevado.

Na sua mensagem aos deputados, o Presidente alertou, entretanto, para a «urgente e inadiável» necessidade de diversificar a economia e ultrapassar a de-pendência em relação ao petróleo. Depois de mencionar as flutuações da produção petrolífera do país e a diminuição do preço do crude no mercado internacional como fatores que tornam imperiosa a diversificação económica, José Eduardo dos San-tos reiterou que o Governo vai continuar a apostar fortemente nas infraestruturas, a fim de atrair investimento privado, nacional e internacional. Isso, compreensivel-mente, leva tempo. Por isso, ele acrescentou que, «mesmo nas atuais condições», o país vai desenvolver programas dirigidos às áreas do cimento, têxteis, bebidas, açúcar, silos, produção de ovos e carne e pescas, para acelerar a redução da de-pendência em relação ao petróleo e diminuir as importações.

Forças Armadas Angolanas estão prontas a participar em missões de paz da ONUAs Forças Armadas Angolanas (FAA) estão preparadas para participar em missões de paz definidas pela ONU e outras instâncias inter-nacionais. A garantia foi dada pelo Chefe do Estado Maior General das FAA, Geraldo Nun-da. Assim, e depois de terem participado em missões de paz na república do Congo e na república Democrática do Congo, bem como na Guiné-Bissau, a próxima missão dos milita-res angolanos deverá ser a república Centro--Africana (rCA). Segundo o semanário Agora, publicado em Luanda, 1800 efetivos das FAA deverão partir para aquele país em data ainda a definir. A oposição exige que o Presidente José Eduardo dos Santos solicite autorização para o efeito à Assembleia Nacional, mas ain-da não se sabe se isso vai ser feito ou não.

As Forças Armadas Angolanas – uma das mais organizadas e capacitadas de África – estão a iniciar presentemente um processo de modernização e reequipamento. Novos meios, como helicópteros e navios-patrulha, estão a ser adquiridos em diferentes países, como rússia e Brasil, enquanto militares angolanos, de diversos ramos, estão a terminar a sua for-mação em vários países estrangeiros, entre os quais a rússia, Cuba, Portugal e Brasil, mas também no interior. O Instituto Superior técni-co Militar, por exemplo, inaugurado em 2008, já formou os primeiros 120 engenheiros milita-res, nas especialidades de informática, cons-trução e fortificações, engenharia mecânica e eletrotecnia.

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LUANDA

LOjAs AFRICANA Mutamba – rua rainha Ginga (junto à sede da Sonangol) Hotel Skyna (hall do hotel) Av. dos Combatentes (junto ao restaurante ritz) Shopping do Belas (junto à zona da restauração) Maianga – (junto à rotunda da Martal) - irá reabrir brevemente

OUTROs REvENDEDOREs Bombas Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro Bombas da Corimba Bombas Embarcadouro do Mussulo Casa dos Frescos Atrium - Junto ao Nova Vida Casa dos Frescos Baixa Mutamba Casa dos Frescos Brisas talatona - Junto à Universidade Oscar ribas Casa dos Frescos Conchas talatona - Junto à sede do Banco BIC Casa dos Frescos Vila Alice - Junto ao Cine Atlântico Cita Café dentro da Hyundai - rua rainha Ginga Pastelaria Vouzelense Gestoffice - Junto à Universidade Lusíada (Ex-Papelaria Fernandes) Greenspot - Dentro do supermercado Max (Morro Bento) Galeria Hotel Alvalade Hotel Epic Sana Mutamba Quiosque Las Palmas - dentro do Aeroporto Inter. 4 de Fevereiro Supermercado Valoeste Shopping Carmo – B. Marianga, perto da antiga Embaixada da África do Sul Galeria Hotel trópico Livraria Mensagem rua do 1º Congresso do MPLA Mutamba Livraria Nguvulu - Vila de Viana – Junto à Igreja Católica Star Angola (Viana) rua Comandante Valódia, prédio da Conservatória Livraria Sá da Bandeira – Maculusso Pastelaria Snack das Quatro - talatona Livraria Papelaria Mestria – Kinaxixi, junto à farmácia do Kina Xixi Supermercado Jofrabo – Maculusso, junto à Liga Africana Universidade Metropolitana Bairro Livraria Lello Mutamba - Perto da Sonangol Distribuidora News Praia do Bispo - Perto do Mausoléu

LUBANGO Livraria Lello Centro Comercial Millennium Livraria texto Editores

HUAMBO Ludim Centro Comercial – Cidade Alta - rua Imaculada Conceição Mercado Central da Baixa

BIÉ Praça da Pouca Vergonha

BENGUELA Supermercados Martins e Neves restaurante tudo na Brasa Pastelaria Flamingo CAB (Café da Cidade)

LOBITO Livraria Independência - Bairro 28, junto ao mercado

NAMIBE Futuro sem limites FASHION, Lda. Livraria texto Editores H30/cita na rua 14 de Abril

Postos de vendada Revista ÁfriCa21 “Angola tornou-se um dos grandes casos

de sucesso em ÁfricaRUssELL FEINGOLD, enviado especial dos EUA

para os Grandes Lagos e a rDC

Morreu Michael Sata,Presidente da Zâmbia O Presidente da Zâmbia Michael Sata, de 77 anos, faleceu a 28 de outubro em Londres, para onde tinha sido transportado uma sema-na antes para tratamento médico. Segundo a Constituição, é o vice--presidente Guy Scott, um branco filho de emigrantes britânicos, que assume a presidência interina. Guy Scott é o primeiro presiden-te branco no continente africano em vinte anos. Mas o ministro da Defesa, Edgar Lungu, é tido como o provável candidato da Frente Patriótica, o partido presidencial, às próximas eleições.

Católico, pai de oito filhos, Sata era chamado na Zâmbia de «o rei Cobra» pela sua língua afiada e a paciência ao serviço das suas ambições políticas. Próximo do «pai da independência», Kenneth Kaunda, eleito presidente da câmara de Lusaka em 1985, juntou-se à oposição antes das primeiras eleições pluriparti-dárias de 1991 e ocupou vários cargos ministeriais após a vitória do MMD de Frederick Chiluba. Fundou o seu próprio partido da Frente Patriótica para concorrer à presidência em 2001, mas só conseguiu ser eleito à terceira tentativa. Venceu o presidente ces-sante ruppiah Banda por 42% dos votos contra 35%.

Nas suas campanhas eleitorais Sata notabilizou-se pelos ataques contra a alegada hegemonia chinesa sobre a economia zambiana, centrada nas exportações de cobre. Populista, próxi-mo do zimbabueano robert Mugabe, prometia acabar com a corrupção e «mudar a Zâmbia em 90 dias» com uma lei obrigan-do as companhias estrangeiras a passar 25% das suas socieda-des para as mãos de empresários zambianos. Uma vez eleito mostrou-se menos radical, reconciliou-se com Pequim e intensi-ficou a cooperação económica e política com Angola. Acusado de autoritarismo e de querer restaurar o regime de partido único deixa um país em forte crescimento económico, devido ao eleva-do preço do cobre, mas com finanças públicas em mau estado e cerca de 60% da população na pobreza.

África21– novembro 2014 13

73%é a cifra de alfabetização dos adultos angolanos em 2014 “A paz e a estabilidade política são

bens preciosos, mas devemos garantir também a estabilidade económica sem a qual muito se pode perder

jOsÉ EDUARDO DOs sANTOs, Presidente da república de Angola

Fim de carreira para Oscar Pistorius O atleta Oscar Pistorius está na prisão desde 21 de outubro, dia em que a juíza thokozile Masipa o condenou a cinco anos de prisão efetiva pela morte da sua companheira reeva Steenkamp e a três anos de pena suspensa pelo uso de arma de fogo. Esperava recuperar a liberdade dentro de 18 meses, depois de cumprir a sexta parte da pena, de acordo com a lei penal sul-africana. Mas o Ministério Público decidiu recorrer da sentença que considerou «não provada» a intenção de matar e reteve apenas o crime de homicídio por negligência. Pistorius deverá ser julgado de novo por outro tribunal por homicídio premeditado.

As associações de defesa dos direitos das mulheres tinham pedido a revisão da sentença, estimando que a rápida libertação de Pistorius enviaria uma mensagem errada aos autores de violência contra as mulheres, crime de que a África do Sul é recordista mundial. A Federação Internacional de Atletismo informou que o homem mais rápido do mundo nos 400 m, apesar de ter sido amputado às duas pernas na infância, não poderá voltar às competições antes de cumprir a totalidade da pena a que fosse condenado.

Enquanto Pistorius aguarda na prisão a marcação do seu novo julgamento, a opinião pú-blica sul-africana foi abalada por outro crime que enlutou o desporto nacional. O guarda-redes Senzo Meyiwa recentemente nomeado «capitão» dos Bafana Bafana, a seleção nacional de futebol, morreu a 26 de outubro após ter sido baleado durante o assalto a uma residência em Vosloorus, pequena cidade a 20 quilómetros a sul de Joanesburgo. Segundo a polícia, Meyi-wa, de 27 anos, tentou impedir os ladrões de fugir com os telemóveis das pessoas presentes e foi alvejado com vários tiros; faleceu durante o transporte para o hospital.

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Vitória laica nas eleições na Tunísia Sem esperar pelos resultados oficiais, o partido islamista Ennahda reconheceu a derrota nas eleições legislativas de 26 de outubro na tunísia, e felicitou Béji Caïd Essebssi pela vitória da sua formação Nidaa tounès.

Criado há pouco mais de dois anos e incluindo desde sindicalistas de es-querda até políticos que serviram os anteriores regimes, o Nidaa tounès apelou ao voto útil contra o regresso dos islamistas ao poder e a sua estratégia resultou além das expectativas. Com 38% dos votos e 15 mandatos de vanta-gem sobre o Ennahda, que perdeu um terço dos mandatos que ocupava na Assembleia Constituinte, Nida tounés falhou contudo a maioria absoluta e deverá negociar a formação de uma coligação para governar. A tarefa não será fácil dada a bipolarização do novo Parlamento e a não existência de uma terceira força.

Mais de cinco milhões de eleitores, dos quais cerca de um milhão de novos eleitores, 15.000 candidatos (dos quais 52% de mulheres) para os 217 lugares no Parlamento, 20 partidos em competição e uma participação próxima dos 60% confirmaram a vitalidade da democracia tunisina. Preocupados com a si-tuação económica e social e com o recrudescimento da violência terrorista, os tunisinos esperam do próximo Governo que relance a economia e restaure a segurança.

Começou a campanha para as eleições presidenciais de 23 de novembro. Dado que o Ennahda não apresentou candidato e que vários postulantes reti-raram as suas candidaturas, o líder de Nidaa tounès, Béji Caïd Essebssi, de 88 anos, é desde já considerado como o futuro Presidente.

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14 novembro 2014 – África21

Angolanos são quase 24 milhões e meio A população angolana é de 24.383.301 pessoas, segundo os re-sultados preliminares do censo realizado este ano, de 16 a 31 de maio. Como desde 1970 que não era realizado qualquer censo no país, a estimativa andava em torno de 20 milhões de pessoas, mas o número foi largamente ultrapassado. Desse modo, Angola torna-se o 12.º país mais populoso de África. Mesmo assim, a densidade populacional continua baixa: apenas 19 pessoas por quilómetro quadrado.

De acordo com as informações avançadas, há mais mulheres do que homens, sendo estes apenas 96 para 100 mulheres. Por outro lado, 62,3% da população vive em áreas urbanas e 37,3% nas áreas rurais. A província mais populosa é Luanda, concen-trando 27% do total da população, enquanto a menos populosa é o Bengo (vizinha de Luanda), com apenas 1%. Huíla, Benguela, Huambo, Cuanza Sul, Bié e Uíge seguem-se a Luanda. Essas sete províncias representam em conjunto 72% da população angolana.

A cidade de Luanda é o município com mais habitantes: 2.107.646 pessoas. Mas se juntarmos a esse o número de habi-tantes dos municípios satélites (Viana, Belas, Cacuaco e Cazen-ga), a «grande Luanda» totaliza exatamente 6.443.213 pessoas, ou seja, quase um quarto da população do país.

Estes números foram adiantados em primeira mão pelo Presi-dente José Eduardo dos Santos, na sua mensagem sobre o Esta-do da Nação, proferida na Assembleia Nacional a 15 de outubro. Ele considerou que os resultados constituem uma base funda-mental para a elaboração de políticas públicas mais adequadas.

De notar que o primeiro efeito deste resultados é a diminuição do rendimento per capita dos angolanos. Assim, ao invés de 637.350,00 kwanzas por pessoa (cerca de 6400 dólares), esse rendimento é, na realidade, de 529.765,00 kwanzas (aproximada-mente 5300 dólares). Ou seja, e como escreveu em título o sema-nário económico Expansão, a 24 de outubro, «afinal estamos mais pobres com o censo».

Segundo alguns observadores, outra conclusão confirma a necessidade, defendida há muito tempo por várias vozes, de ela-boração de uma política de imigração seletiva, para colmatar a carência de recursos humanos, em quantidade e qualidade.

Por seu turno, o demógrafo João Lukombo criticou a ausência de dados etnolinguísticos entre os resultados preliminares avan-çados, ao contrário, segundo ele, do censo-piloto, realizado em 2013. Além da composição étnica da população, este último infor-mava, por exemplo, que a língua mais falada em Angola é o por-tuguês, apontado por 40% das pessoas como a sua primeira lín-gua. Os resultados completos do primeiro censo realizado após a independência de Angola deverão ser divulgados até novembro de 2015.

Blaise Compaoré, fora! «Demasiado é demasiado!» Foi com este grito que centenas de milhares de manifestantes saíram as ruas para impedir o Presi-dente do Burkina Faso, Blaise Compaoré, de aprovar a revisão da Constituição que lhe permitiria candidatar-se de novo em no-vembro de 2015 e permanecer no cargo por mais três mandatos de cinco anos.

Depois de uma jornada insurrecional, as Forças Armadas anunciaram a 30 de outubro que tomavam o poder até à realiza-ção das eleições de 2015. Depois de ter dito que permaneceria na Presidência até a eleição do seu sucessor, Compaoré aca-bou por anunciar a sua renúncia ao cargo, no dia 31.

A situação era confusa à hora de fecho desta edição, com os governos ocidentais e os vizinhos do Burkina Faso a fazerem pressão a favor de uma transição sem alteração da ordem insti-tucional. Os burquinabês dizem querer que a queda de Compao-ré sirva de exemplo para o Benim, Burundi, ruanda e rDC, cujos Presidentes são acusados de quererem também manipu-lar as respetivas Constituições para se manterem no poder.

Chegado ao poder em 1987 por um golpe de Estado que custou a vida ao líder carismático da revolução burquinabê thomas Sankara, Blaise Compaoré tinha sido eleito pela primei-ra vez em 1992. Cumpridos os dois mandatos de sete anos au-torizados pela Constituição, modificara a lei fundamental para se fazer eleger de novo em 2005 e 2010. Preparava-se para repetir a manobra, mas os burquinabês disseram «basta!».

“O radicalismo islâmico não deveria ser criminalizado mas tratado como o alcoolismo ou a toxicodependência

KAMALDEEP BHUI, professor de psiquiatriae epidemiologia da Universidade Queen Mary de Londres.

2,8 mil milhões eram os utilizadores da net no final de 2013; 801 milhões faziam-no em inglês, 649 em chinês, 222 em espanhol, 136 em árabe e 122 em português

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(por exemplo, material usado em abortos clandestinos, an-tibióticos ou vacinas injectáveis com agulhas infectadas) as tatuagens e piercings realizados em sítios sem respeito pelas normas de segurança; relações sexuais desprotegi-das, entre outros.

O VHB pode provocar também hepatite crónica, cirro-se e cancro do fígado. Adquire-se por contacto sexual com alguém infectado, através de partilha de seringas ou uso de agulhas infectadas utilizadas em tatuagens, piercings, acupunctura; transmite-se também da mãe para o bebé durante o parto ou pouco depois e ainda por contactos casuais (sempre que há contacto com sangue ou outros fluidos corporais e por exemplo feridas).

A esteatohepatite não alcoólica é uma situação tam-bém muito prevalente entre nós associada à obesidade, à diabetes e à dislipidémia. A maioria dos doentes são as-sintomáticos ainda que alguns se queixem de fadiga, mal--estar e desconforto abdominal nos quadrantes superio-res direitos. Habitualmente os doentes são referenciados à consulta de Hepatologia por apresentarem alterações analíticas como elevação de um parâmetro designado por ALT ou numa ecografia abdominal descrever-se esteatose hepática ou seja gordura no fígado. Estes doentes tam-bém podem evoluir para cirrose hepática.

O A, B, C das hepatites...O termo Hepatite significa inflamação do fígado e são

muitas as causas que podem provocar esta situação. En-tre as mais frequentes encontram-se: os vírus (vírus da hepatite A, B, C e D); o excesso de peso, a diabetes, o co-lesterol e os triglicéridos elevados no sangue responsáveis por uma situação designada por esteatohepatite não al-coólica; o consumo crónico e excessivo de álcool e as doen-ças auto-imunes.

O vírus da hepatite C (VHC) provoca na maioria dos ca-sos (cerca de 80%) uma infecção crónica que pode evoluir silenciosamente para a cirrose hepática, podendo essa pro-gressão fazer-se mais rapidamente quando existe também consumo de álcool, obesidade, diabetes ou outras infecções simultâneas como pelo vírus da hepatite B (VHB) ou vírus da imunodeficiência humana (VIH). Um fígado com cirrose provocada pelo VHC tem um grande risco de aparecimento de cancro do fígado.

São fatores de risco para a infecção pelo VHC o consu-mo de drogas ilícitas por via endovenosa ou intranasal (co-caína) ainda que uma única vez; as transfusões de sangue efectuadas antes de 1992 (quando se descobriu o anticor-po para o VHC que permite testar o sangue), os tratamen-tos/procedimentos parentéricos (injectáveis) realizados no passado quando não se usava material descartável

85 dos mais ricos do mundo (entre os quais nove mulheres) têm a mesma riqueza que os 3500 milhões mais pobres (50% da humanidade), segundo a revista Forbes

“Ébola é um espantalho que veicula todos os fantasmas das nossas sociedades

jÉRÔME MOUTON, chefe da missãode Médicos sem Fronteiras na Guiné-Conacri

Frágil vitória do partido presidencial nas legislativas ucranianasO presidente ucraniano Petro Porochenko não obteve nas elei-ções legislativas ucranianas de 26 de outubro a «maioria clara» que tinha pedido para levar a cabo o seu plano de paz com os in-surretos do leste. A elevada abstenção (47%) mostrou que os ucranianos têm uma confiança relat iva nos seus atuais dirigentes.

Segundo os resultados provisórios, a coligação liderada por Porochenko foi a força política mais votada (23%), seguida de perto pela Frente Popular do atual primeiro-ministro Arseni Iatse-niuk (21%). Porochenko apressou-se a proclamar que «os partidá-rios da solução militar são claramente minoritários». Mas se é verdade que os extremistas de Svoboda (6%) perderam cerca de metade dos votos obtidos nas eleições presidenciais, este recuo é compensado pelos 6% alcançados pelo Partido radical do sulfu-roso Oleg Liatchko (acusado de crimes de guerra pela Amnistia Internacional) e sobretudo pelos 13% de Samopovich, um partido

recém-criado e maioritariamente constituído por voluntários que combateram na frente do Leste.

Os grandes derrotados são os comunistas, que ficarão fora do Parlamento por terem recolhido menos de 5% dos votos, e Iulia timochenko, ex-rival de Porochenko nas eleições presidenciais, cujo partido obteve pouco mais de 5%, ficando atrás do Bloco da Oposição (ex-Partido das regiões do presidente deposto Ianoko-vich) que obteve 8%.

Por outro lado, os apoiantes de Iatseniuk pretendem que este conserve o cargo de primeiro-ministro, que Porochenko tinha previsto atribuir ao cabeça de lista da sua coligação, Vitali Kli-tchko, o popular presidente da câmara de Kiev. Vinte e cinco luga-res de deputados ficam por atribuir em representação das popula-ções do Donbass, que não puderam votar, mas os separatistas anunciaram que realizarão as suas próprias eleições em novembro.

16 novembro 2014 – África21

The New York Times defendefim do embargo americano a CubaO restabelecimento de relações diplomáticas entre os EUA e Cuba e o fim do embar-go americano contra a ilha mais populosa do Caribe foi defendido pelo influente diário The New York Times, em editorial publicado a 11 de outubro. A primeira medida pode ser tomada pelo Presidente norte-americano sem precisar do apoio do Congresso, mas a segunda exige mudanças legislativas nesse sentido.

O The New York Times assinala que a geração de cubanos exilados que defendia a manutenção do embargo está a desaparecer. Segundo uma pesquisa citada pelo jornal, 52% dos cubanos de Miami pensam que é tempo de terminar o bloqueio. O fim do embargo, acrescenta o The New York Times, permitiria aos EUA apoiar mais efi-cazmente reformas democráticas na ilha, além de diminuir o sofrimento da população cubana, devido à grave crise económica e social que enfrenta, em especial depois da queda do Muro de Berlim. Isso ajudaria também a conter uma nova onda migratória de cubanos ilegais que tentam chegar aos Estados Unidos por mar.

O jornal recordou algumas medidas tomadas por Barack Obama em 2009 a fim de flexibilizar o embargo, tais como a autorização para o envio de remessas financeiras para Cuba e a diminuição dos obstáculos tecnológicos para permitir o acesso a telefonia celular e a Internet em Cuba. Mas disse que os EUA podem fazer mais. Para o The New York Times, o primeiro passo deve ser a retirada de Cuba da lista de países que «apoiam o terrorismo». Cuba foi incluída nessa lista em 1982 por causa do seu apoio aos movimentos rebeldes que lutavam contra as ditaduras latino-americanas, mas es-ses movimentos já não existem (alguns deles estão atualmente no poder).

O reatamento das relações diplomáticas bilaterais entre os EUA e Cuba foi vigo-rosamente defendido pelo jornal. O mesmo lembrou que, para o efeito, a administra-ção não precisa do respaldo do Congresso. Note-se que, apesar do embargo, os dois países possuem sedes diplomáticas nas duas capitais, as quais funcionam como secções de interesse.

«Pela primeira vez em mais de meio século, mudanças na opinião pública norte--americana, bem como uma série de reformas em Cuba, tornam politicamente viável res-tabelecer as relações diplomáticas entre os dois países e acabar com um embargo insen-sato», escreveu o The New York Times, no seu editorial. O jornal vai mais longe. Para o articulista, a reaproximação com Cuba pode representar um importante legado da presi-dência de Obama no domínio das relações diplomáticas, terreno no qual o primeiro Chefe de Estado afro-americano enfrenta uma série de problemas e dificuldades.

Os islamistas mais perto do poder na Líbia O Parlamento e o Governo de Abdallah al--theni, reconhecidos internacionalmente mas refugiados em tobruk, no oeste do país, desde a tomada de trípoli em agosto pelas milícias islamistas de Misrata, deram o seu aval à operação «dignidade» lançada pelo general Khalifa Haftar para reconquis-tar a cidade de Bengazi e anunciaram a integração no exército nacional líbio de to-das as forças anti-islamistas. Mas apesar dos violentos combates em curso, a coliga-ção Fajr Libya, que agrupa as principais milícias antigovernamentais, continua a avançar em todas as direções. A Fajr Li-byia, que integra além das milícias de Mis-rata (próximas dos Irmãos Muçulmanos) as de Ansar al Charia, o grupo terrorista que controla Bengazi recentemente realia-do ao Estado Islâmico, não reconhece a legitimidade do governo de Al-theni e criou o seu próprio governo chefiado por Omar al-Hassi. A Líbia parece encaminhar-se para uma guerra convencional entre isla-mistas e anti-islamistas e os respetivos aliados internacionais.

ONU, União Europeia e Estados Uni-dos pedem um cessar-fogo imediato em Bengazi; União Africana e Liga Árabe apelam ao diálogo, lembrando aos líbios e aos seus vizinhos que não há solução militar para a crise; mas Egito e turquia continuam a apoiar os respetivos aliados. O Egito fornece armas ao governo «legíti-mo» e um enviado do Presidente turco recep Erdogan visitou as cidades contro-ladas pela Fajr Libya e teve conversações com Omar al-Hassi. Depois da visita, a transportadora aérea turca turkish Airli-nes anunciou o estabelecimento de uma ligação diária entre Istambul e Misrata. todos os voos para a Líbia estavam sus-pensos desde a tomada do aeroporto de trípoli em agosto.

620 milhõesde africanos não têm acesso a eletricidade, segundo a Agência Internacional da Energia “A geração internet é o alvo privilegiado

dos proselitistas do Estado Islâmico AsIEM EL DIFRAOUI, politólogo alemão de origem egípcia

África21– novembro 2014 17PALOP Business

“Outorga-se a amnistia total a todos os cidadãos condenados pelos tribunais da Guiné Equatorial por delitos políticos no exercício das suas atividades

TEODORO OBIANG, Decreto de 21 de agostoassinado pelo Presidente da Guiné Equatorial

Movimento internacional a favor do povo sarauíÉ um chamamento em defesa do povo do Sara Ociden-tal e da sua cultura, tão esquecidos pelo mundo mediá-tico. Personalidades da cultura, das artes e letras de diversos países, incluindo os de língua portuguesa, as-sociaram-se à causa, «com a força e o sentimento de contribuir para a realização de uma verdadeira paz para os sarauís e os povos da região» no norte de África. Numa carta de apelo, o grupo de promotores da iniciati-va refere que quer apenas fazer ouvir a voz do povo sarauí, entender as suas preocupações e fazer cumprir o direito internacional. Basta recordar que a 14 de no-vembro de 1975 começou para os sarauís uma triste história de guerra, exílio, êxodo e abuso dos direitos humanos mais básicos, como a vida, a liberdade e a autodeterminação.

Intelectuais, escritores, poetas, professores, jorna-listas e artistas estão entre os que apoiam este movi-mento de solidariedade. Exortam a Espanha (ex-país colonizador) e Marrocos (país ocupante) a assumirem o seu compromisso, de modo a não sepultar da sua agenda bilateral a questão sarauí. O chamamento aberto a novas adesões conta, entre outros, com a as-sinatura dos escritores Eugénia Neto, viúva de Agosti-nho Neto, e Luís Kandjimbo (Angola), Corsino Fortes e José Luís Hopffer (Cabo Verde), do historiador Julião Soares de Sousa (Guiné-Bissau), dos professores uni-versitários Pires Laranjeira e Salvato trigo (Portugal), de Armindo do Espírito Santo (São tomé e Príncipe), Edna Maria dos Santos (Brasil), e de Sheila Khan (Moçambique).

18 novembro 2014 – África21

CARLOs LOPEs O guineense Carlos Lopes, secretário executivo da Comissão Económica das Nações Unidas (UNECA) para África, recebeu, a 10 de outubro, o Lifeti-me Africa Achievement Prize, na categoria Ação para África, atribuído pela Millennium Excellence Foundation. Este prémio reconhece personalidades com ideais politi-camente visionários, que tenham contribuído para a trans-formação de África na transição de ditaduras para um sistema de governação democrática, promotor de ganhos impulsionadores do crescimento e desenvolvimento do continente. A UNECA considera que desde que Carlos Lopes assumiu funções «trouxe para a comissão uma visão cuja premissa é ‘Africa First’, no sentido de cinzelar o modelo de desenvolvimento de África». Um dos seus obje-tivos é «trazer para o sistema global a visão do desenvolvimento de África» e a «a voz do continente nas negociações internacionais de impacto sobre o seu futuro, das alterações climáticas à posição comum africana pós-2015».

MALALA YOUsUFZAI O mundo conheceu-a pela defesa do direito à educação das raparigas no Paquistão. O ativis-mo e o ganho da popularidade da jovem de 14 anos, na época, que começou por relatar num blogue anónimo a sua vida no nordeste do país, tornou-a alvo de um ataque dos talibãs. Ficou entre a vida e a morte obrigando-a a meses de recuperação num hospital do reino Unido. Aos 17 anos, Malala torna-se na pessoa mais jovem de sempre a rece-ber o Prémio Nobel da Paz. «Este prémio é mais que um pedaço de metal. É um encorajamento para continuar, para acreditar em mim, e saber que há mais pessoas que me apoiam nesta campanha». A jovem ativista dedicou o prémio a «todas as crianças sem voz, de forma a dar-lhes coragem». KAILAsH sATYARTHI O indiano (60 anos) partilhou o Nobel da Paz deste ano com Malala, devido ao seu empenho na educação das crianças do seu país, livrando--as do trabalho infantil, através da BBA, fundação criada por si. «Estou esperançado e acredito que o prémio ajude a dar mais visibilidade e atenção à causa das crianças mais negligenciadas e mais necessitadas». Kailash diz ser necessário que o mundo perceba que a escravatura infantil ainda existe, «um mal que é um crime contra a humanidade», e que todos temos a «responsabilidade de salvar e proteger as crian-ças do planeta». Com as suas iniciativas, estima-se que já tenha salvo 80.000 crianças das agruras do trabalho infantil.

DENIs MUKUNGERE MUKWEGE É no hospital de Panzi, em Bukavu, na república Democrática do Congo (rDC) que trabalha o mais recente galardoado com o Prémio Sakharov, com que o Parlamento Europeu distingue pessoas e organizações que lutam pela «liberdade de espírito» e pelos direitos humanos. O ginecologista (59 anos) operou, desde 1999, mais de 45 mil mulheres vítimas de violação, num país onde a violação é usada como arma. Nas suas intervenções internacionais, Denis Mukwege prefere não falar em núme-ros, mas relatar a sua experiência: «Vi vaginas onde espetaram pedaços de madei-ra, de vidro, de aço. Vaginas laceradas por lâminas de barbear, por facas, por baionetas. Vaginas queimadas com borracha em brasa, com soda cáustica. Vagi-nas em que deitaram gasolina e depois pegaram fogo».

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Boas e más notícias para Goodluck Jonathan O Presidente nigeriano anunciou oficialmente a sua candidatura a um segundo mandato nas eleições presidenciais de fevereiro e a presidên-cia antecipou o anúncio com a divulgação de boas notícias.

A primeira foi a conclusão de um acordo de cessar-fogo com o grupo terrorista Boko Haram que iria permitir a libertação das duzentas rapari-gas raptadas em abril em Chibock. Infelizmente, duas semanas mais tarde, as raparigas não fo-ram devolvidas às respetivas famílias e novos ataques atribuídos aos rebeldes islâmicos mos-tram que o cessar-fogo é ainda uma miragem. Segundo fontes locais, depois do anúncio do cessar-fogo os terroristas perpetraram novos atentados e continuam a raptar dezenas de mu-lheres no estado de Borno. O Chade e os Esta-dos Unidos confirmaram, no entanto, a existên-cia de negociações.

A segunda boa noticia, confirmada pela Or-ganização Mundial de Saúde é o fim do surto de ébola que foi declarado extinto no país mais po-puloso de África. Importado por um diplomata com dupla nacionalidade americana e nigeriana, que chegou a Lagos a 20 de julho procedente de Monróvia, o vírus contaminou 20 pessoas das quais oito faleceram. Um grupo de 150 «rastrea-dores de contactos» levou a cabo «um trabalho de detetive epidemiológico de categoria mun-dial», segundo a OMS, e conseguiu localizar 898 pessoas suscetíveis de terem contraído a doen-ça. Estas foram acompanhadas diariamente du-rante 42 dias, o dobro do tempo máximo de incu-bação. Passado este per íodo sem o aparecimento de novos casos as autoridades sanitárias declararam a Nigéria «livre de ébola», embora se mantenha o estado de alerta.

52 jornalistas foram mortos no mundo nos nove primeiros meses de 2014, dos quais 12 na Síria, segundo os Jornalistas Sem Fronteiras

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Angola • Cabo Verde • Portugal • África do Sul

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20 novembro 2014 – África21

CABO vERDE E A GOvERNAçãO

Os dados recentemente divulgados do Relatório Mundial da Competitividade, elaborado anual-mente pelo Fórum Económico Mundial, e do Ibrahim Index of African Governance (IIAG), da Fundação Mo Ibrahim, revelam Cabo Verde em rota ascendente em vários aspetos ligados à governação e ao desenvolvimento.

Refira-se, a propósito, que em agosto, no encerramento da cimeira EUA-África, que reuniu Chefes de Estado e de Governo de 50

APESAr DA FrAGILIDADE ECONÓMICA E DOS NOVOS DESAFIOS

Cabo Verde chega aos 40em fase ascendente

países, o Presidente norte-americano Barack Obama considerou Cabo Verde como um exemplo de democracia, liberdade e estabi-lidade para os países da África Ocidental, da África como um todo e, ainda, do mundo.

Nessa maré positiva, até no desporto o país soma pontos: em outubro a seleção na-cional de futebol passou para o 33.º lugar no ranking da FIFA, subindo oito posições, e ocupa o 4.º lugar no contexto africano, atrás

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Cabo Verde chega aos 40em fase ascendente

da Argélia, Costa do Marfim e Tunísia, sen-do o primeiro entre os PALOP.

Ao mesmo tempo, a vida nesta sociedade insular traz toda a complexidade da época con-temporânea: questões sociais como o desempre-go e as migrações, novos desafios da segurança interna e externa, a preservação do ambiente e as habituais disputas políticas, sobre um pano de fundo económico com muitas fragilidades ainda não resolvidas. As dificuldades do financiamen-

to das empresas, questões laborais e burocracia pesam negativamente nesta economia, para além da reduzida dimensão do seu mercado.

Numa balança que meça a sua performan-ce ao completar a quarta década de existência como Estado independente, Cabo Verde equili-bra-se entre ser país de desenvolvimento médio e uma série de desafios e urgências por resolver.

GláuCia noGueira, Corsino tolentino, nataCha Mosso e MiGuel Correia

22 novembro 2014 – África21

Cabo Verde, que no ano passa-do aparecia no Ibrahim Index of African Governance (IIAG)

em terceiro lugar, depois das ilhas Mau-rício e do Botswana, ultrapassou este último, ocupando agora o segundo lu-gar, que aliás, já fora seu em 2012. De resto, o país está no grupo dos que siste-maticamente são os cinco primeiros – que inclui ainda as Seychelles e a África do Sul. Esses países são os que apresen-tam as melhores performances em cada

uma das quatro categorias analisadas para constituir o ranking: desenvolvi-mento económico; desenvolvimento humano; segurança e estado de direito; participação e direitos humanos.

José Maria Neves disse pretender atin-gir o seu objetivo ainda nesta legislatura, que, aliás, encaminha-se já para o fim. Em declarações a África21, salientou: «Cabo Verde está muito próximo dos indicadores das Ilhas Maurício, o que permite a Cabo Verde aspirar a ser o primeiro.»

O primeiro-ministro manifestara essa ambição nas declarações que fez durante a apresentação de um outro ranking em que Cabo Verde aparece a melhorar a sua posição: o Relatório Mundial da Compe-titividade, divulgado pelo Fórum Econó-mico Mundial. Neste índice, que avalia 144 países, o país melhorou oito posi-ções, passando do 122.º lugar no ranking 2013-14 para 114.º na lista de 2014-15 (as ilhas Maurício passaram do 45.º para o 39.º lugar).

O primeiro-ministro cabo-verdiano afirmou, ao conhecer o ranking de 2014 da Fundação Mo Ibrahim sobre a governação em África, que a sua «grande ambição» é fazer com que Cabo Verde seja o país mais bem governado do continente.

GláuCia noGueira

Ambição de José Maria Neves

Governo de Cabo Verde pode ser ‘o melhor de África’

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CABO vERDE E A GOvERNAçãO

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POSIÇõES DOS PALOPNO íNDICE MO IBrAHIM

No ranking de 2013 da Fundação Mo Ibrahim, Cabo Verde aparecia em ter-ceiro lugar (76,7 pontos), tendo à frente as ilhas Maurício, com 82,9, e o Bots-wana, com 77,6. Entre os PALOP, São tomé e Príncipe vinha a seguir, com 59,9, na 12.ª posição. Moçambique ocupava a 20.ª posição e Angola a 39.ª, enquanto a Guiné-Bissau estava no 46.ª lugar, portanto entre os dez com pior pontuação. Este ano, ao mesmo tempo em que Cabo Verde sobe para o segundo lugar na tabela, Moçambique, devido à insegurança resultante dos conflitos entre a renamo e a Frelimo, passou para o 22.º (52,2). Angola pio-rou também a sua pontuação, estando agora no 44.º lugar (40,9), assim como a Guiné-Bissau (48.º posição, com 33,2 pontos). São tomé e Príncipe mantém--se, com 59,7 na 12.ª posição.

Num máximo de sete pontos, o país tem 3,68 no Índice de Competitividade Global 2014-2015, que é liderado pela Suíça com 5,7 pontos, seguida de Singa-pura, EUA, Finlândia e Alemanha, nos cinco primeiros lugares. No fim da lista, está a Guiné Conacri, enquanto Angola ocupa a 140.ª posição.

São 12 os pilares analisados, e em praticamente todos Cabo Verde melho-rou a sua posição, com exceção do que diz respeito à dimensão do mercado. Os 12 pilares dividem-se por três grandes áreas, a primeira relativa a «requisitos básicos» (instituições; infraestruturas; ambiente macroeconómico; saúde e educação fundamental); a segunda refe-re-se a «potenciadores de eficiência» (educação superior e formação; mercado de bens; mercado laboral; desenvolvi-mento do mercado financeiro; desenvol-vimento tecnológico; dimensão do mercado); e «fatores de inovação e sofis-ticação» (sofisticação dos negócios e inovação).

Cabo Verde ocupa o 91.º lugar no pilar de requisitos básicos; a 106.ª posi-ção quanto ao ambiente macroeconómi-co; e, na área da saúde e educação fun-damental, a 57.ª posição. Entre os aspetos mais problemáticos para o de-senvolvimento de negócios em Cabo Verde estão a burocracia, o acesso ao fi-nanciamento e a eficiência do mercado de trabalho.

País seguro No índice da Fundação Mo Ibrahim, o arquipélago teve muito boa avaliação nos quesitos de segurança e funciona-mento da lei e da justiça, áreas em que, internamente, a perceção não é assim tão positiva. Por exemplo, a criminali-dade tem aumentado nos últimos anos – desde meados de outubro, as Forças Armadas estão na rua a apoiar a polícia para garantir a segurança da capital do país –, ao mesmo tempo que a morosi-dade da justiça é um aspecto sob cons-tantes críticas.

José Maria Neves afirma que Cabo Verde continua a ser um país seguro, re-

lacionando a segurança e a estabilidade ao funcionamento das instituições, o res-peito pelas regras do jogo democrático, a independência dos tribunais, a liberdade de imprensa. Ou seja, «o funcionamento normal do Estado de Direito Democráti-co. E em Cabo Verde tudo isso funcio-na», afirma, admitindo, contudo, quanto à morosidade da justiça: «Temos um longo caminho a percorrer».

O governante relativiza a questão da criminalidade, referindo que apesar da percepção que se tem, os dados apontam para uma redução, considerando-se um certo horizonte temporal, embora, «se tomados os picos de criminalidade, te-nha-se a impressão de que é elevada». «As instituições policiais funcionam e há políticas públicas de combate seja à pe-quena como à grande criminalidade», sustenta. «Os indicadores não nos auto-rizam a falar em índices elevados de in-segurança em Cabo Verde», afirma Neves.

Por outro lado, uma das áreas em que tem havido grandes investimentos recebeu nota menos boa na avaliação. É o caso das infraestruturas, há cerca de uma década a receber forte apoio dos EUA através do programa Millenium Challenger Account (MCA), além de outros parceiros.

«Já investimos muito e Cabo Verde já avançou muito na área das infraestru-turas», refere o chefe do Executivo, apontando que, de facto, persistem problemas no acesso à água, à energia e ao saneamento (ultimamente, cortes de luz e água são frequentes e atormentam a população de várias cidades). «Temos que melhorar o nosso desempenho nes-ses domínios», diz José Maria Neves,

No índice Mo Ibrahim, Cabo Verde teve boa avaliação em segurança, funcionamento da lei e da justiça, áreas em que a perceção interna não é assim tão positiva

salientando que, ao elaborar o segundo pacote de apoio do MCA, em vigor até 2017, Cabo Verde teve como prioridade o setor da água e saneamento.

Nessa linha, esclarece, está a procu-rar-se melhorar o acesso à propriedade, no sentido de resolver determinadas questões fundiárias que por vezes opõem municípios, o poder central e também privados. «Eliminar determina-dos entraves nessa área facilitará a mo-dernização de infraestruturas e realiza-

Apesar dos investimentos em infraestruturas, persistem problemas no que diz respeito à água, à energia e ao saneamento

24 novembro 2014 – África21

AFErIr E INFLUENCIAr

A cada ano, desde 1979, o Fó-rum Económico Mundial analisa dados de várias organizações in-ternacionais, como o Banco Mundial ou o Fundo Monetário Internacional, e organiza uma sondagem com mais de 1400 empresários em todo o mundo, para apontar as virtudes e fra-quezas dos países nos quais operam. Por sua vez, a Funda-ção Mo Ibrahim, homónima do milionário sudanês que a criou em 2006, apoia a boa governa-ção e a l iderança em África. Desde 2007, elabora anualmente o índice Ibrahim, que visa contri-buir para que se possa medir o progresso. Em 2011, o ex-Presi-dente Pedro Pires foi galardoado por essa organização pelo seu papel no percurso político de Cabo Verde.

ção de investimentos», afirma. Refira-se que foi criado há alguns anos um siste-ma de informação geográfica com o ob-jetivo de modernizar toda a gestão dos solos em Cabo Verde, o que segundo o primeiro-ministro irá favorecer os inves-timentos e permitir que o país tenha ganhos em termos de competitividade.

Ampliar o mercado Entre os itens que definem a posição dos países nos rankings de desenvolvimento, a dimensão do mercado é um dado que joga contra Cabo Verde. País pequeno e com as contingências da insularidade, um alargamento dessa dimensão passa pela internacionalização das empresas

cabo-verdianas e pelo aumento das exportações.

«Aqui, temos um longo trabalho, para reforçar o setor privado nacional, aumentar os níveis de produtividade, para poderem competir no mercado internacional. O se-tor privado cabo-verdiano é frágil, com uma reduzida capacidade de autofinancia-mento e com níveis de gestão que precisam de ser qualificados. É um dos principais desafios que temos nos próximos tempos», disse, acrescentando que a inserção compe-titiva de Cabo Verde na economia global passa por um esforço comum das autar-quias, do Governo e das empresas.

A questão do acesso ao financiamen-to é «um dos maiores problemas», pois as empresas não têm capitais próprios e o custo do financiamento é muito elevado. Por outro lado, diz, só há condições para o financiamento de pequenas e microem-presas. Assim, defende o primeiro-minis-tro, as empresas privadas devem abrir-se à constituição de parcerias e alianças com outras empresas, a nível internacional, para poderem mobilizar recursos finan-ceiros, know-how e tecnologias.

O mercado só pode aumentar pela internacionalização das empresas cabo-verdianas e pelo aumento das exportações

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Muita água, pouca terra

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Presidente da República de Cabo Verde, Jorge Carlos Fon-seca, não comentou para a co-

municação social cabo-verdiana, nem para África21, os resultados obtidos pelo país nos dois rankings em que este aparece a melhorar posições e que leva-ram o chefe do Governo a exprimir a sua ambição de Cabo Verde ser o mais bem governado em África.

Porém, ao presidir à abertura do ano ju-dicial, a 17 de outubro, no Tribunal da Praia, Jorge Carlos Fonseca tocou num ponto que é uma das fragilidades apontadas na avaliação que se faz de Cabo Verde: a questão da justiça. «Apesar de todos os esfor-ços, investimentos e medidas, Cabo Verde não tem logrado obter melhorias significati-vas no que tange ao estado da justiça», decla-rou, citado pelo jornal A Semana.

Contudo, na visão do Presidente, ele próprio jurista e professor universitário nesta área, o percurso no seu conjunto é positivo, dado que aumentou o número de tribunais, procuradorias, magistra-dos, advogados e oficiais de justiça, en-tre outros aspetos.

Outra nota negativa do discurso do Presidente, na abertura do ano judicial, surge quando refere ter «a consciência clara de que a sociedade cabo-verdiana não está satisfeita com o desempenho do sistema de administração, que ela espera muito mais», como cita o jornal: «Os cidadãos, ao critica-rem a Justiça, também estão amiúde a ma-nifestar o seu descontentamento para com a Administração Pública».

Refira-se que a morosidade é um grande entrave ao funcionamento da justiça em Cabo Verde. Um relatório

recente do Conselho Superior do Minis-tério Público mostra o aumento do nú-mero de pendências de cerca de 87 mil para mais de 95 mil processos-crime; mais de 12 mil processos por decidir nos Tribunais de Comarca; e 735 processos pendentes no Supremo Tribunal de Justiça.

GláuCia noGueira

COABItAÇÃO

Vive-se atualmente em Cabo Verde, pela primei-ra vez, a situação de coabitação nas mais altas instâncias do Estado e Governo, de forças políti-cas diferentes. O atual Presidente da república, eleito em 2011, é conotado com o Movimento para a Democracia (MPD) – em cuja gestão foi ministro dos Negócios Estrangeiros, na década de 90 – enquanto o Governo está, pela terceira vez consecutiva, nas mãos do Partido Africano para a Independência de Cabo Verde (PAICV).

Embora o Chefe de Estado não governe, é facto que por vezes determinadas questões tra-zem à tona o antagonismo entre as duas forças políticas; noutros momentos, reconhecer os louros à outra parte pode encontrar resistências.

Para José Maria Neves, este facto não é perturbador, e o primeiro-ministro até considera que este elemento joga a favor de Cabo Verde, «por mostrar a maturidade das instituições e o funcionamento do Estado de direito democráti-co». refere que eventuais vetos ou pedidos de fiscalização da constitucionalidade são normais, e também aconteceram durante os mandatos dos Presidentes Pedro Pires e Mascarenhas Monteiro, sem que houvesse a situação de coabitação. GN

Jorge Carlos Fonseca avalia a justiçaO

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26 novembro 2014 – África21

O título é para receber com carinho o romance De Monte Cara Vê-se o Mundo, que o Germano Almeida escreveu na sua casa do Mindelo, ilha de São Vicente, de onde contempla aquele promontório de rosto humano e o mundo. Mas, o que quero dizer mesmo, é que o desenvolvimento de Cabo Verde chegou ao cruzamento de várias opções, todas elas complexas e com caráter de urgência. Os resultados nos setores da economia, diplomacia, educação, saúde, cultura, desporto, migrações e governação são notáveis, mas sabemos que as necessidades crescem mais depressa do que os meios de as satisfazer.

Corsino tolentino

conomia: Os desafios vencidos e as ameaças presentes. Com cerca de 500 mil residentes e outros

tantos emigrantes, Cabo Verde, que não é cabo nem é verde, bem podia ser um país mágico se não recebesse grandes doses de realismo da distância de todos os conti-nentes, da dispersão do território, dos so-mente 10% de terra arável, da escassez de outros recursos naturais e também das duras condições climáticas. Nascido e criado em terra adversa, o cabo-verdiano que sobreviveu fê-lo na integração de es-cravos e senhores, brancos e negros, cris-tãos e judeus, animistas e muçulmanos, ateus e crentes, optou pela independência na paz, consolidou instituições, criou um Estado de direito democrático para ser cumprido nas ilhas ou no estrangeiro, porque, com conhecimento de causa, re-cusou o destino da indignidade.

De 2014 vê-se Cabo Verde numa encruzilhada

Com pouca terra e muito Atlântico, os governantes investiram numa relação de honestidade com os recursos materiais e imateriais da nação. Desde 1975, mobili-zaram tudo e, como tudo não era muito, recorreram à solidariedade internacional em forma de ajuda pública e do investi-mento privado, mais daquela do que des-te. Em 2007, Cabo Verde iniciou a difícil transição do grupo dos Países Menos Avançados para o de Rendimento Mé-dio. Os indicadores determinantes desta mudança foram o rendimento por pes-soa, o nível de instrução e a saúde. Ou-tro indicador que deveria ter contado, mas não contou, é a vulnerabilidade eco-nómica. Seja como for e apesar da econo-mia vulnerável, o país tenta ser de rendi-mento médio e está na l inha do cumprimento da maior parte dos Obje-tivos de Desenvolvimento do Milénio.

Entretanto, nos últimos cinco anos a economia europeia engripou, o número de turistas diminuiu, os emigrantes envia-ram menos remessas, deixou de haver di-nheiro para investir na construção de ho-téis e segundas residências do setor imobiliário-turístico, e a economia de Cabo Verde estagnou, com uma taxa mé-dia de crescimento anual a rondar os 2,5% entre 2007 e 2012, e mesmo um período de recessão (-1,3%) em 2009. O desem-

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O país tenta ser de rendimento médio e está na linha do cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio

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são significativos e a lista tem de ser au-mentada: China, Luxemburgo, Portugal, Espanha e Estados Unidos são os princi-pais. Os parceiros multilaterais de maior peso são a União Europeia, o Banco Afri-cano de Desenvolvimento, as Nações Unidas, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional.

No entanto, é assinalável o facto de ha-ver protagonistas menores, cujo contributo é bem-vindo e depende, entre outros fato-res, da capacidade criativa e da coerência operacional do corpo diplomático. Estou a falar de Japão, Kuwait, Arábia Saudita, Angola e Brasil. Nas relações externas, a ação eficiente e a especialização profissional são ambições necessárias ao alargamento da rede de parceiros e doadores.

Contudo, a maior dificuldade existente neste fim de 2014 é a ausência de uma es-tratégia com objetivos, valores, princípios e meios partilhados entre o Estado, o gover-no e os diplomatas. Contudo, parece razoá-vel esperar do novo ministro dos Negócios Estrangeiros os ajustamentos imprescindí-veis e o aumento da produtividade da casa.

Educação, Saúde, Cultura, Desporto: marcas de prosperidade e exigência. A his-tória da educação em Cabo Verde começou com a igreja Católica a instruir escravos e a promover a escola primária e secundária. Depois de tentativas falhadas na Brava e em Santiago, foi ela que criou o primeiro semi-nário-liceu do país, na ilha de São Nicolau, que durou 125 anos (1892-1917) e formou a primeira elite cabo-verdiana. Em 1917, sucedeu-lhe o liceu nacional na ilha de São Vicente e só em 1960 foi construído mais um, dessa vez na Praia, ilha de Santiago.

Em 1975, Cabo Verde independente herdou pelo menos uma escola primária e um número variável de postos escolares em

prego principalmente de jovens e de mu-lheres disparou. Contra a reiterada pro-messa de um dígito, anda à volta de 16,5%, com até 35% na faixa etária de 15-24 anos. Para evitar o pior, o governo investiu recursos públicos alheios na cons-trução de estradas, barragens, aeroportos, portos e um programa para reduzir o défi-ce de habitação a que chamou Casa para Todos. Não tendo recursos próprios e sendo a conjuntura internacional desfavo-rável, o único caminho que restou foi o endividamento interno e externo. Em 2014, apesar de os principais índices mos-trarem tendência ascendente, Cabo Verde ainda é um país subdesenvolvido, do défi-ce e da dívida. A produtividade da ativida-de privada, o uso eficiente das infraestru-turas recém-construídas, a venda das Casas para Todos, o fornecimento regular da energia e a privatização das empresas do

transporte aéreo, dos portos e da produção de eletricidade e água são tarefas comple-xas e urgentes.

Neste contexto e dado o papel central que a banca terá de desempenhar no finan-ciamento das famílias e na mudança de pa-radigma de gestão dos recursos e das expec-tativas, a escolha displicente do governador do Banco Central é interpretada como sinal de inconsistência da governação. Por outro lado, o abandono de postos-chave por diri-gentes tem afetado a confiança no futuro.

Diplomacia: uma rica tradição à espera de mais profissionalismo. Bastará ver quem são os principais doadores bilaterais e os parceiros multilaterais para se ter uma ideia da natureza e dos princípios subja-centes à estratégia da política externa e das suas exigências em relação ao aparelho di-plomático. Os doadores bilaterais ainda

Nas relações externas, ação eficiente e especialização profissional são ambições necessárias ao alargamento da rede de parceiros e doadores

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Cabo verde iniciou transição do grupo dos Países Menos Avançados para o de Rendimento Médio

28 outubro 2014 – África21

cada município. Em todo o país havia dois liceus, um em Mindelo, ilha de São Vicen-te, e outro na Praia, ilha de Santiago, e a Escola Técnica do Mindelo. Desde então, os governos consideraram a educação esco-lar, tecnológica e científica como uma prioridade na execução da estratégia de va-lorização dos recursos humanos e das pes-soas para o desenvolvimento nacional e sustentável. Depois da independência na-cional, durante 25 anos, a alfabetização de adultos, a expansão da educação básica ele-mentar e a melhoria da oferta do ensino secundário foram as escolhas para as ilhas. Nesse quarto de século optou-se pela for-mação superior no estrangeiro.

Foi só no início do século XXI que emergiram as figuras do ensino superior e da universidade. Da educação pré-escolar à pós-universitária, três objetivos problemáti-cos estão em jogo: a qualidade do sistema

de ensino-aprendizagem, a equidade no acesso face à dispersão da população e, por fim, o custo da educação.

Por outro lado, resistindo a enormes pressões internas e externas, o Serviço Na-cional de Saúde contribui visivelmente para a melhoria do bem-estar da população e os resultados extraordinários em matéria de formação e valorização do capital humano.

Novidades na cultura. Até diz-se que ela atingiu a maioridade, deixando de ser vista como uma despesa de todos para o prazer de alguns para ser percecionada nas suas dimensões de produção e usufruto da riqueza nacional. A literatura perdeu o ex-clusivismo da representação da cultura ca-bo-verdiana e expande o universo dos escri-tores e poetas.

A tecelagem e a cerâmica puseram o ar-tesanato no primeiro plano da produção ar-tística enquanto a pintura, a escultura e o ci-nema conquistam espaço justo e, naturalmente, a língua ganha protagonismo. Não será por acaso que a emancipação cultu-ral coloca a questão da criação e comunica-ção de sentidos.

O diálogo sobre os usos e o estatuto do crioulo – língua nacional – e do português – língua oficial – tem hoje melhores condi-ções de progredir nos planos técnico e polí-tico do que há uma década. O teatro, a dança e a música ajudam a ver o Cabo Verde que vem aí e selecionar algumas per-guntas filosóficas sobre a educação, o civis-mo e o financiamento da criação artística. Mindelact, para o teatro, e Raiz di Polon, para a dança, são casos de estudo em uni-versidades. Sobre a música, a parte mais vi-sível da cultura cabo-verdiana, assinalo o papel que tem como cimento da nação.

Desporto: três belos exemplos. Somos poucos e as probabilidades de vencer são influenciáveis pela demografia. Isto quer dizer que quanto menos somos mais se exige de nós em termos de seleção de talen-tos, organização, criatividade e esforço. Vem isto a propósito da importância do comportamento no sucesso das estratégias pessoais ou coletivas.

Os treinadores Lúcio Antunes, primei-ro, e Rui Águas, a seguir, ousaram e conse-guiram convencer os melhores futebolistas

Foi só no início do século XXI que emergiram as figuras do ensino superior e da universidade

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O desemprego de jovens e mulheres continua a aumentar em Cabo verde

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cabo-verdianos a formarem os Tubarões Azuis, a seleção de todos nós para os emba-tes internacionais. A segunda lição diz res-peito ao aproveitamento, sem ressentimen-to, da experiência da Federação. E o terceiro elemento desse jeito de suar para ir mais longe consiste em construir uma visão co-mum e ter a companhia de todos os despor-tistas nacionais.

Migrações e Boa Governação: progres-sos e falhas. Cabo Verde formou-se no bojo das migrações dos continentes europeu e africano, assumiu a natureza de nação mi-grante e, na última década, evoluiu de país de emigrantes para a condição de terra de emigrantes e de imigrantes. O facto de as instituições nacionais lidarem bem com esta situação é um sinal de progresso.

Segundo os índices regionais e interna-cionais, a boa governação vai bem. Contu-do, o que parece uma falha grave é o apa-

rente pouco interesse do Governo em relação às tentativas do Instituto Nacional de Estatísticas e da Comissão de Estatística das Nações Unidas e do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimen-to) para criar um sistema fiável de recolha e tratamento de informação sobre a boa go-vernação. Se este processo for recuperado e o trabalho de casa for feito, 2015 poderá ver nascer em Cabo Verde um centro mundial de estatísticas sobre GPS (Governação, Paz e Segurança).

Descodificar os conceitos de boa go-vernação, paz e segurança significará agir mais consciente, solidária e eficazmente para vencer os grandes desafios locais e globais do desenvolvimento. É que a cri-minalidade e a insegurança estão a pôr em causa a principal riqueza do país: a liberda-de e a justiça.

Conclusão: ao longo dos 39 anos que nos separam de 1975, o ano da independência nacional, Cabo Verde manteve a paz, cons-truiu o Estado de direito, lançou a econo-mia, melhorou as condições de vida dos ci-dadãos, instituiu o multipartidarismo, fez eleições regulares e criou um regime políti-co estável. A evolução interna e a conjuntu-ra internacional desfavorável revelam difi-culdades estruturais e novas, que exigem

alterações profundas no modo de pensar a economia e de resolver tensões emergentes.

José Maria Neves já anunciou que dei-xará o cargo de presidente do PAICV (Par-tido Africano da Independência de Cabo Verde) no fim de 2014, devendo manter-se como primeiro-ministro até 2016, o ano das eleições. Por outro lado, a qualidade do diálogo entre o MpD (Movimento para a Democracia), principal partido da oposi-ção, e o PAICV, no poder, mostra pouca confiança existente entre ambos.

E no entanto, o país espera muito mais do que a mera alternância no poder. Para sair da encruzilhada, Cabo Verde precisaria de duas coisas: diálogo genuíno e pacto de regime abrangendo, por exemplo, a respos-ta à emergência económica, educação, di-plomacia e GPS.

Sem driblar a verdade, os cabo-verdia-nos e os seus partidos políticos são chama-dos para provarem o que realmente valem através das melhores respostas possíveis a estas perguntas: Como aumentar a produti-vidade individual e a produção nacional? Como conciliar mais segurança pública e mais liberdade? Como atrair conhecimen-to, habilidade e atitude inovadora de resi-dentes e emigrantes para um projeto de crescimento e bem-estar? Mas, haverá capa-cidade de liderança para tanto?

Território: dez ilhas, 4033 km2;Santo Antão, Sal, São Vicente, Santa Luzia (desabitada), São Nicolau, Boa Vista, Santiago, Maio, Fogo, Brava Capital: Praia, ilha de SantiagoLínguas oficiais: português e crioulo População: 499.000 habitantes e outros tantos emigrantesDensidade populacional: 81 habitantes por km2 Presidente da República: Jorge Carlos FonsecaGoverno: primeiro-ministro, José Maria NevesPIB: 1,9 mil milhões de dólaresPIB per capita: 3630 dólares Moeda: escudo cabo-verdiano, indexado ao euroIndependência: 5 de julho de 1975

Santo Antão

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Santa LuziaSão Nicolau

Boa Vista

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REPÚBLICA DE CABO vERDE

Santiago

A literatura perdeu o exclusivismo da representação da cultura cabo-verdiana e expande o universo dos escritores e poetas

30 novembro 2014 – África21

baixa densidade do tecido empresarial formal cabo-ver-diano, aliada a um elevado ín-

dice de informalidade, a dimensão das empresas, a qualidade da gestão e as perspetivas de atuação, sobretudo locais ou, em alguns casos, regionais, assim como a concorrência desleal são aponta-das como as principais debilidades do setor no arquipélago.

«São problemas sérios que têm afeta-do e, de que maneira, o funcionamento das micro e pequenas empresas. A solu-ção passa por reformas estruturais, a co-

meçar pela gestão do risco do país», ad-voga o presidente da Associação dos Jovens Empresários de Cabo Verde (AJEC).

Embora reconheça alguns avanços, Paulino Dias assevera, porém, que essas fraquezas, a par de outras, têm tido im-pacto na produtividade, na competitivi-dade, na mobilização de recursos finan-ceiros, humanos e organizacionais e no ritmo de crescimento das empresas ca-bo-verdianas, e, consequentemente, na criação de empregos pelo setor privado. Para o presidente da AJEC o caso das

Pequenas e Médias Empresas (PME), que em Cabo Verde representam 93% das empresas formais, é mais preocu-pante uma vez que elas enfrentam gran-des dificuldades.

«A primeira é, disparadamente, o acesso a financiamento. Os instrumen-tos de políticas públicas surgidas para minimizar o problema não se têm reve-lado eficazes, e a banca tradicional tem dificuldades em entender as especifici-dades deste segmento e de formular so-luções para atender as PME. Pratica-mente não existem soluções alternativas para financiamento de PME, como por exemplo, fundos de seed-capital, fundos de capital de risco, etc.», descreve o gestor.

Paulino Dias aponta igualmente o relacionamento com a máquina admi-nistrativa do Estado e os elevados custos de produção e de mão de obra e a pe-quenez e fragmentação do mercado in-

Apesar da sua evolução, o setor empresarial cabo-verdiano, dominado maioritariamente por pequenas e médias empresas, enfrenta, ainda, algumas fragilidades. O cenário exige mudanças legais, institucionais e até comportamentais

nataCha Mosso

Classe empresarial à procura da afirmação

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Cidade de Mindelo, Ilha de são vicente

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terno como fatores que dificultam o crescimento do setor empresarial.

«Determinadas áreas, como o paga-mento de impostos, a importação e expor-tação de mercadorias, licenças de constru-ção, entre outras, padecem ainda de muitas ineficiências, o que impõe custos extraordi-nários às PME que não têm uma estrutura administrativa para arcar com tais responsa-bilidades. A par disso, há os elevados custos de contexto, custos de se produzir em Cabo Verde. A eletricidade e água são das mais caras do mundo. As telecomunicações idem, embora aqui a tendência tenha vindo a ser de melhoria. O custo da mão de obra é bastante elevado, por conta de uma legis-lação laboral demasiadamente rígida e res-tritiva, tornando o mercado de trabalho em Cabo Verde um dos 25 mais ineficientes do

sas «a fazerem o seu trabalho de casa», começando por conquistar o mercado nacional e só depois ambicionarem a internacionalização. «Quando estiverem em condições de o fazer, o Governo es-tará disposto a prestar todo o apoio na internacionalização», garantiu o PM, lembrando que o seu Executivo criou o Fundo de Apoio à Internacionalização das Empresas cabo-verdianas (FAIE), em fevereiro de 2011. A par das medidas institucionais e legais, José Maria Neves pediu aos trabalhadores cabo-verdianos uma mudança no seu comportamento perante o trabalho, para que haja maior produtividade e, consequentemente, um tecido empresarial forte e competiti-vo, capaz de gerar riqueza e travar o desemprego.

Soluções Com vista a criar condições para o cresci-mento do tecido empresarial, o Governo tem vindo a implementar algumas medi-das como a criação do Novo Banco, Banco da Cultura, Fundo de Emprego e Formação Profissional, Regime Especial para as micro e pequenas empresas, a CVGarante, que é o Fundo de Garantia Mútua para empréstimos, sobretudo das micro e pequenas empresas e o Fundo de Competitividade.

A entrada em funcionamento do balcão único do investimento e do cen-tro internacional de negócios bem como investimentos nos domínios da energia, da água e do saneamento, no valor de 25 milhões de contos (cerca de 286 milhões de dólares) foram também medidas anunciadas pelo primeiro-ministro para alavancar o setor empresarial e torná-lo mais competitivo. Porém, a aprovação

do Regime Jurídico Especial para as Micro e Pequenas Empresas foi das me-didas que mais agradaram aos empresá-rios cabo-verdianos. Trata-se de um instrumento que facilita o relaciona-mento das PME com a administração pública, através da simplificação de procedimentos. Ainda assim, a medida não deixou de ser criticada pela classe empresarial, já que o seu âmbito, limita-do às empresas com até cinco funcioná-rios ou que facturam até 10 mil contos por ano (cerca de 115 mil dólares), deixa de fora um número significativo de PME. Outra medida é o licenciamento nas autarquias, para determinadas ativi-dades direcionadas para as PME.

Para Spencer Lima, a internacionali-zação é o caminho, o único capaz de fa-zer emergir no país empresas fortes, ca-pazes de exportar. Opinião corroborada pelo presidente da AJEC que pede ao Governo a definição de uma política clara nesta matéria, que mostre qual a visão a longo prazo, as prioridades e correspondentes responsabilidades de implementação, os recursos legais, insti-tucionais, organizacionais, financeiros, humanos e tecnológicos que serão aloca-dos para a internacionalização das em-presas nacionais.

Em julho, a AJEC deu a conhecer ao Governo uma nova proposta que visa simplificar os processos de acesso ao fundo de apoio à internacionalização, para que as micro e as pequenas empre-sas possam também tirar proveito do mesmo. A par disso, a AJEC pede que sejam harmonizados os procedimentos que são adotados nos países parceiros de Cabo Verde.

O presidente da AJEC defende ain-da outras medidas, nomeadamente, a promoção da concorrência entre os operadores do setor financeiro, estímulo à atração de novos operadores, por via de novos produtos e novas abordagens de financiamento ao setor privado, atra-vés de políticas públicas mais eficazes. Paulino Dias pede também maior quali-ficação dos recursos humanos e que, so-bretudo, haja um alinhamento entre a oferta formativa e as necessidades do mercado.

José Maria Neves aconselhou as empresas a fazer o trabalho de casa, começando por conquistar o mercado nacional e só depois ambicionarem a internacionalização

Para Paulino Dias, o caso das PME, que representam 93% das empresas, é o mais preocupante porque enfrentam grandes dificuldades

mundo, conforme o ranking Doing Busi-ness», enumera Paulino Dias.

Por sua vez, no início deste ano, o presidente da Câmara de Comércio, In-dústria e Serviços de Sotavento (CCISS), acusou o Governo de usar o nome do setor privado para «camuflar financiamento in-direto ao seu programa de investimento». Spencer Lima declarou, na altura, que a nível do setor privado existem vários pro-gramas, mas que nunca são canalizados para o setor. O presidente da CCISS de-nunciou a existência de concorrência des-leal por parte de empresas estrangeiras que «financiadas e apoiadas pelos seus gover-nos vêm cá concorrer com empresas cabo--verdianas que estão abandonadas e sem quem os apoie». Spencer Lima exigiu que o setor privado passe a ser protegido e que o Governo apoie as empresas que queiram internacionalizar-se.

Em resposta, o primeiro-ministro José Maria Neves aconselhou as empre-

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pequena tartaruga percorre rapida-mente o areal, num percurso nem sem-pre linear. Numa carapaça de poucos

centímetros, as esguias e desconcertantes pernas do animal que acabou de sair do ovo destacam--se. São elas que lhe dão vida, naqueles primeiros minutos de existência, e que lhe permitem esca-par aos predadores. Já dentro de água, ganha uma aparente segurança. E desaparece.

Nos últimos anos, Cabo Verde tem-se destaca-do no panorama internacional como um dos países que mais tem apostado nas boas práticas ambien-tais. A proteção às tartarugas caretta caretta são um exemplo. Mas as medidas têm abrangido múltiplas áreas, tornando o país numa referência mundial na área do ambiente.

Um exemplo que reflete a estratégia governa-mental é o recente prémio Green Projet Awards Cabo Verde, criado pelo Governo para estimular as boas práticas ambientais e que abrange cidadãos, empresas e associações. Na cerimónia de entrega dos prémios, em maio, o ministro cabo-verdiano do Ambiente, Habitação e Ordenamento do Territó-rio, Antero Veiga, deixou na sua intervenção a frase--chave em relação à posição do Governo face ao ambiente: «Um eixo transversal de governação».

E os premiados dão corpo aos passos seguidos no pequeno arquipélago.

A Fundação Tartaruga de Cabo Verde foi pre-cisamente o vencedor na categoria Recursos Natu-rais e Conservação com o projeto de proteção da espécie caretta carreta na ilha da Boa Vista. Iniciado em meados de 2008, o projeto tem contribuído para a redução da mortalidade das tartarugas, devi-do a trabalhos de conservação e de sensibilização das populações. Aos poucos, e de forma gradual, apesar de algumas resistências, estas têm sido envolvidas na sua proteção.

Na categoria Energias Renováveis, o vencedor foi a Empresa Cabeólica, com o Projeto de Eólica, o primeiro em larga escala no continente africano, e que já permitiu a Cabo Verde passar de 2% de ca-pacidade eólica instalada para 20%. Com estes re-sultados, Cabo Verde tornou-se num dos principais países na utilização da energia eólica, e mesmo o lí-der mundial, se a avaliação assentar na sua relação com o PIB gerado pelo país. A revolução energética chegou ao arquipélago, que desta forma explora e potencia aquele que é tido como um dos melhores ventos do mundo (é considerado forte dez meses por ano, de setembro a junho). O objetivo passa por atingir os 100% de utilização de energias renová-

Na vanguardadas boas práticas ambientais

Cabo Verde é um dos países do mundo que mais cresceu nos últimos anos na utilização da energia eólica e é atualmente o segundo na penetração deste tipo de energia, logo a seguir à Dinamarca. Tem quase 50 áreas protegidas e tem desencadeado inúmeros programas de proteção ambiental. No entanto, como muitos outros arquipélagos, está demasiado vulnerável às consequências das alterações climáticas, para as quais aliás pouco contribui.

MiGuel Correia

A revolução energética chegou ao arquipélago que explora e potencia um dos melhores ventos do mundo

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veis, meta que deverá ser materializada com a ajuda da União Europeia até 2020.

Também nas novas tecnologias quem levou o prémio foi o projeto de uma central elétrica, térmi-ca, eólica e solar, que apresenta um novo conceito da central elétrica, onde as energias eólica e solar são armazenadas a montante, estabilizando a produção de energia e garantindo também a potência da central. Mais uma aposta num ambiente sustentá-vel, num país que até há pouco tempo estava total-mente dependente do exterior.

A aposta nas energias renováveis como fator de desenvolvimento de Cabo Verde foi realçada recen-temente numa declaração de José Maria Neves à imprensa: «Até 2015, temos que lançar as bases para cumprirmos os objetivos do milénio; em 2020 tere-mos 100% de penetração de energias renováveis e em 2030 seremos um país desenvolvido».

Líder moral e na práticaCabo Verde é um dos dez destinos mais éticos do mundo para os turistas, segundo a organização Ethical Traveler. Uma das três categorias apreciadas é precisamente a proteção ambiental. E, nesta área, são diversos os passos dados, alguns aparentemente simples. Segundo as Nações Unidas, o plástico nos oceanos provoca danos em todo o mundo avaliados em 13 mil milhões de dólares, com a agravante de um saco demorar cerca de 500 anos a decompor-se. Também neste campo Cabo Verde deu já os seus passos e estabeleceu 2015 como meta para eliminar o plástico do país. Um dos primeiros do mundo a lançar essa meta.

No entanto, apesar de serem os países que me-nos contribuem para as alterações climáticas, são as pequenas nações insulares as mais prejudicadas com as suas consequências. Mas, curiosamente, são também alguns destes países, como Cabo Verde, que atualmente se estão a colocar na vanguarda da luta contra as suas influências na terra, questão in-ternacionalmente reconhecida. Os Barbados, uma pequena ilha das Caraíbas, foi este ano eleita pela ONU para as comemorações do Dia Mundial do Ambiente, celebrado a 5 de junho, precisamente pelo seu esforço na sua preservação.

Na altura, Christiana Figueres, Secretária Exe-cutiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas, realçou bem este fac-to na sua mensagem a propósito das comemorações do dia, destacando o esforço de pequenos países como «Cabo Verde, República Dominicana e Ja-maica» nos projetos de energia eólica e o facto de serem os líderes «morais e práticos» no combate às alterações climáticas.

tArtArUGA COMUM,UM DOS PAtrIMÓNIOS DE CABO VErDE

Cabo Verde é hoje um dos principais locais de nidificação das tartarugas caretta caretta, ou tartaruga comum, embora não lhe faltem outras de-nominações, como tartaruga-amarela, tartaruga-cabeçuda ou tartaruga--mestiça. As praias do arquipélago são visitadas entre junho e novembro pelos animais, praias estas que se apresentam como as terceiras mais visitadas do mundo por esta tartaruga para a desova.

No entanto, nos últimos meses tem havido registo de diversas tarta-rugas mortas na ilha da Boa Vista, o que alertou as autoridades. A crimi-nalização de quem abate tartarugas está em cima da mesa, para ser legislada em breve. Em causa estão alguns hábitos das populações lo-cais, que teimam em não abandonar certas práticas, como o consumo da sua carne e ovos. Isto, apesar da vigilância dos militares e do esforço de algumas instituições, como a Fundação tartaruga. também a venda da sua carne se revela tentadora, já que um quilo pode rondar os 800 escudos (9,2 dólares).

Mas a verdade é que o perigo para as tartarugas não está apenas em terra, onde apesar de tudo o trabalho de sensibilização já dá os seus frutos. Está no mar. São os barcos e a pesca que muitas vezes acabam por as ferir ou matar e hoje a tartaruga caretta caretta é uma espécie considerada em vias de extinção.

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nde se situa a cultura no contexto de desenvolvimento de Cabo Verde foi um dos objetivos de um estudo sobre o papel da cultura na economia do país, recentemente apresentado. Financiado pelo progra-

ma dos países ACP para a área cultural e financiado pela União Europeia, o estu-do teve como objetivo número um saber qual o peso deste setor no PIB. O rela-tório final, que não conseguiu indicar esse valor, conclui com a recomendação de se criar uma base de dados para mapear o setor.

Uma série de limitações na disponibilidade dos dados impediram o projeto de atingir o seu principal objetivo. Como comentou o ministro da Cultura, Mário Lúcio Sousa, durante a sessão de socialização do trabalho, há uma grande fragilidade relativamente aos dados neste domínio. Por exemplo, nem o Instituto Nacional de Estatística nem o Ministério das Finanças dispunham de informa-ções específicas sobre o funcionamento das empresas e agentes culturais que pu-dessem contribuir para o estudo.

Para estimar o contributo da cultura para o PIB seriam necessários dados pormenorizados sobre o Valor Acrescentado Bruto e salários por ramo de ativida-de económica, pelo que tal intenção revelou-se «impraticável», como se lê no documento. Apesar disso, e recorrendo a fontes que atuam no terreno, como produtores e empresários, chegou-se a obter dados que contrariaram as expectati-vas: por exemplo, se a informalidade atinge 88% do emprego em termos gerais em Cabo Verde, detetou-se que na cultura ela corresponde a 66%.

Direitos de autor lá fora As especificidades da realidade cabo-verdiana determinaram algumas alterações na metodologia, pois os parâmetros utilizados – de acordo com o Quadro de Estatísticas Culturais da Unesco, delineado para produzir estatísticas comparáveis internacionalmente – não se adaptavam ao caso concreto. Algumas categorias de atividades tiveram de ser alargadas, outras reduzidas. Por exemplo, foram incluí-das determinadas atividades ligadas ao património cultural imaterial que ocorrem fora dos domínios habitualmente considerados para este tipo de estudo – caso da gastronomia e métodos tradicionais de transformação alimentar.

Relativamente às atividades culturais em sentido estrito, o seu peso é estima-do, a partir de dados fornecidos pelo Ministério da Cultura, em 10,3% da força de trabalho nacional, embora a análise faça a ressalva de que este valor é muito elevado se comparado com outros países – à volta de 2% na Europa, de modo geral. Neste conjunto, a componente «Atuação e celebração» destaca-se como o mais importante domínio cultural, com quatro ocupações entre as seis maiores ocupações no setor da cultura (músicos; outros artistas e intérpretes criativos; dançarinos; cantores).

Quanto à produção musical, «um elemento fundamental de subestimação do papel económico da cultura em Cabo Verde resulta do facto de os músicos cabo--verdianos que gravam discos no estrangeiro optarem pela residência fiscal no país de acolhimento», indica o relatório. Ou seja, os seus direitos de autor não contri-buem para o Produto Nacional de Cabo Verde, ainda que uma parte dos seus rendimentos possa entrar no país sob a forma de remessa. Contudo, não é possí-vel saber quais remessas que estão relacionadas especificamente com a cultura.

GláuCia noGueira

As especificidades da economia da cultura

Corsino Fortes

Poeta a trabalhar

Corsino Fortes, poeta, é um dos grandes nomes da literatura de Cabo Verde e apontado por estudiosos como um autor que quebrou paradigmas da criação poéti-ca. Conduziu o processo de criação da Academia Cabo-Verdiana de Letras, fun-dada no ano passado, da qual é presiden-te. Como político, exerceu vários cargos no governo e na diplomacia, a seguir à in-dependência. Antes disso, formara-se em Direito em Lisboa, em 1966, e fora delegado do Ministério Público e juiz em Angola. Este-ve entre os criadores da Fundação Amílcar Cabral, que presidiu durante algum tempo, tal como a Associação dos Escritores Cabo-Verdianos.

Completou 80 anos no ano passado e, em entrevista a África21, disse pensar que já era um «poeta desempregado», mas que a poesia vinha-se impondo. «te-nho estado a trabalhar», garantiu o autor da tr i logia que inclui Pão & Fonema (1974), Árvore & Tambor (1986) e Pedras de Sol & Substância (2001), reunida sob o título A cabeça calva de Deus, publicado em 2001.

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As atividades culturais têm um peso estimado de 10,3% na força de trabalho de Cabo Verde

As especificidades da economia da cultura

Arménio Vieira

Camões para Cabo Verde

Arménio Vieira levou para Cabo Verde, em 2009, o primeiro Prémio Camões atribuído à literatura do país. É autor de uma obra multifacetada. Poemas e Mitografias são os seus primeiros l ivros de poemas. Os mais recentes, numa trilogia, são Bru-mário, Derivações do Brumário e Sequelas do Brumário. Publicou ainda dois roman-ces, O eleito do sol e No inferno, além de textos dispersos que aparecem em revis-tas literárias como Fragmentos, Boletim Imbondeiro, Vértice e Ponto & Vírgula, entre outras.

O escritor nasceu na cidade da Praia, em 1941. Foi integrante da geração dos anos 1960 da poesia cabo-verdiana, usualmente denominada «geração Seló», título de um efémero suplemento literário criado em 1962. Foi uma geração marcada por uma poesia de revolta e combate ao colonialismo português e ao regime sala-zarista. Pelo seu envolvimento com a luta de libertação, foi apanhado pela polícia política portuguesa, permanecendo dois anos na prisão.

Germano Almeida

Insatisfeito com a política cultural

Germano Almeida, escritor, advogado e pro-prietário da Ilhéu Editora, com sede em São Vicente, onde reside, é o autor cabo-verdiano mais divulgado internacionalmente. Natural da ilha da Boa Vista, retrata-a nas obras A Ilha Fantástica e A Família Trago, publica-das na década de 1990. O Testamento do Sr. Napumoceno da Silva Araújo, adaptado para o cinema, é das suas obras mais conhe-cidas, e marca a rutura com os tradicionais temas da fome e da emigração, introduzindo ao mesmo tempo na literatura cabo-verdiana um traço de humor e descontração que irá marcar toda a sua obra.

Germano Almeida escreve em língua portuguesa, e, do ponto de vista literário, vê a vantagem de, com isso, chegar-se aos leitores de Portugal, Brasil, Angola. recentemente, ao lançar o seu mais re-cente romance, Do Monte Cara Vê-se o Mundo, voltou a defender essa posição, afirmando em entrevista ao jornal portu-guês Diário de Notícias: «Com o crioulo não vamos longe, não saímos das ilhas». Por outro lado, afirma-se «defensor do ensino do crioulo rigoroso, mas o portu-guês tem de ser ensinado como uma lín-gua estrangeira, porque não é a nossa língua nacional».

Na mesma altura, declarou não estar satisfeito, «de forma alguma», com a políti-ca cultural de Cabo Verde, onde os políticos continuam a encarar as artes como «uma despesa» e não «um investimento».

Pedro Pires

Nunca em repouso

Pedro Pires, antigo primeiro-ministro e anti-go Presidente da república continua com uma agenda cheia mesmo depois de encer-rar a sua vida política. Como convidado em eventos internacionais ou como observador em eleições, entre outras atividades, a sua rotina, aos 80 anos, confirma o que comen-tou durante as celebrações do seu aniver-sário, no final de abril, quando um jornalista perguntou qual o segredo para a sua vitali-dade: «Estar sempre em atividade. Sabe, eu nunca estive desempregado...».

Nascido na ilha do Fogo em 1934, Pe-dro Pires estava na universidade, em Lis-boa, quando foi incorporado na Força Aérea Portuguesa, em finais dos anos 50. Deserta em 1961 e integra-se no Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde. Após quase uma década e meia de guerra, foi o representante do partido nas negociações que estabeleceram os termos da independência de Cabo Verde. O resto é a história do país nos últimos 40 anos. Ao concluir o seu segundo mandato como pre-sidente, foi galardoado pela Fundação Mo Ibrahim, em novembro de 2011, pela sua atuação como liderança em África. Passou então a presidir à Fundação Amílcar Cabral (FAC) e criou o Instituto Pedro Pires para a Liderança, voltado para qualificar jovens quadros.

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Aumentar a disponibilidade, nos pontos de venda, de bens essenciais produzidos no país é uma das estratégias do Plano Nacional de Desenvolvimento. Até 2017, Angola pretende desenvolver e manter um conjunto de infra-estruturas logísticas e de distribuição que possibilite o abastecimentode produtos nacionais em todas as províncias. Para além de aumentar o número de estabelecimentos comerciais, o PND vai assegurar a existência de reservas alimentares estratégicas, bem como incentivar o comércio rural e a criação de novos empregos.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO

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disputa para a escolha dos membros não permanentes, nos próximos dois anos, do Conse-

lho de Segurança da ONU aconteceu em 16 de outubro. Angola foi o país mais votado, com 190 votos favoráveis dos 193 possíveis. Os outros países esco-lhidos foram a Malásia, Venezuela, Nova Zelândia e Espanha. A Espanha, note-se, precisou de três votações para conseguir suplantar a Turquia por 132 votos contra 60. A unânime avaliação dos observadores internacionais é que Ancara foi vítima da sua hesitação em combater o Estado Islâmico.

A eleição para o Conselho de Seguran-ça é feita por voto secreto, pelo que nunca se sabe quem vota a favor ou contra. En-tretanto, segundo apurou a África21 junto de jornalistas em Washington, al-

guns diplomatas africanos desconfiam que o único voto expressamente contra a esco-lha de Angola foi do Rwanda, por causa das rivalidades entre os dois países relativa-mente ao Congo Democrático. Como se sabe, o Rwanda apoia os rebeldes que atuam no leste do Congo.

Houve ainda dois votos em países que não eram candidatos: o Congo e a Nigéria. Aquelas fontes disseram a esta revista que «os votos contra camuflados são comuns neste tipo de eleições».

Prestígio«Os Estados Unidos estão orgulhosos por terem apoiado a entrada do país no Conselho de Segurança. Também esta-mos entusiasmados porque, acredita-mos, [Angola] será um membro muito eficaz. Pensamos que podemos trabalhar

juntos em prol não apenas de África, mas de todo o mundo». Esta declaração de Russell Feingold, enviado dos EUA para os Grandes Lagos e a RDC, em entrevista publicada pelo Novo Jornal em 24 de outubro, confirma que a ima-gem externa de Angola está em alta.

O facto foi reconhecido pelo minis-tro angolano das Relações Exteriores, George Chikoti, que, surpreso pelo ex-pressivo número de votos favoráveis à entrada do país no Conselho de Segu-rança, comentou: «Isto significa que há

Prestígio externo, reticências internas

A eleição de Angola para membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas é o corolário do processo de construção de uma imagem positiva do país no exterior em curso nos últimos anos. Mas, internamente, os críticos e opositores mantêm as suas reticências em relação à governação.

Carlos severino

Angola foi o país mais votado com 190 favoráveis dos 193 possíveis

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«Uma vitória, mas também responsabilidade», comentou o ministro das Relações Exteriores, George Chikoti

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Aumentar a disponibilidade, nos pontos de venda, de bens essenciais produzidos no país é uma das estratégias do Plano Nacional de Desenvolvimento. Até 2017, Angola pretende desenvolver e manter um conjunto de infra-estruturas logísticas e de distribuição que possibilite o abastecimentode produtos nacionais em todas as províncias. Para além de aumentar o número de estabelecimentos comerciais, o PND vai assegurar a existência de reservas alimentares estratégicas, bem como incentivar o comércio rural e a criação de novos empregos.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO

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muita gente que olha para nós com muita responsabilidade. Mas também isso é o resultado da ação política de Angola».

Na sua entrevista ao Novo Jornal, o enviado especial dos EUA para os Gran-des Lagos e a RDC corroborou essa ava-liação. «Posso adiantar que estamos pro-fundamente impressionados com o vosso Presidente da República e com o minis-tro das Relações Exteriores, pelo tempo tremendo que investiram na promoção da paz nesta região», afirmou Russell Feingold, sem poupar as palavras.

De notar que nas semanas que ante-cederam a escolha dos novos membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o papel de Angola nos esforços de pacificação na África Central e nos Grandes Lagos já tinha sido elogiado, em outras ocasiões, por diferentes enti-dades, o que fazia prever que a sua elei-ção seria mais ou menos certa.

Entre tais entidades, destaca-se a em-baixadora norte-americana em Angola, Helena La Lime, que, após um encontro com o ministro angolano da Defesa, João Lourenço, declarou: «O meu país reco-nhece a liderança que Angola tem de-monstrado para alcançar a paz e a segu-rança no continente africano e, através do diálogo com as autoridades angolanas, vamos avançar e apoiar as iniciativas do Presidente José Eduardo dos Santos e do seu Executivo para as questões em África».

De igual modo, o embaixador da União Europeia, Gordon Kricke, elo-giou publicamente, durante uma visita à província do Kuando Kubango (sudeste do pais) em setembro, o papel de Angola na resolução dos conflitos regionais, em especial na região dos Grandes Lagos.

Também o enviado especial das Nações Unidas para os Grandes Lagos, o argelino Said Djinnit, que esteve em Luanda antes da votação para o Conse-lho de Segurança, manifestou a satisfa-

ção daquela organização pelo «dinamis-mo demons t r ado pe l a l ide r ança angolana em relação à resolução da si-tuação de instabilidade político-militar ainda reinante nos Grandes Lagos».

Eis o modo como o ministro das Relações Exteriores, George Chikoti, sintetizou a eleição de Angola para o Conselho de Segurança da ONU, como membro não permanente: «Uma vitó-ria, mas também responsabilidade». Óbvio e verdadeiro.

reticênciasOs opositores e os críticos do Governo receberam com pouco à-vontade a elei-ção de Angola para aquele órgão das Nações Unidas. Não sendo «politica-mente correto» manifestarem-se contra ela, alguns apressaram-se a considerar que a mesma expõe o país a um maior escrutínio por parte da comunidade in-ternacional, em especial no domínio da boa governação e do respeito pelos direi-tos humanos.

José Eduardo dos Santos na Assembleia Nacional um dia antes da eleição de An-gola para o Conselho de Segurança da ONU, convenceu os opositores e os críti-cos. Nesse discurso, José Eduardo dos Santos, apesar de reconhecer que o cresci-mento do país este ano será menor do que o inicialmente previsto, manteve o otimismo em relação à continuidade dos progressos registados sobretudo depois do fim da guerra, em 2002. Ele conside-rou ter havido avanços não apenas no campo económico, mas também no do-mínio do combate à pobreza. Enfim, alertou para a necessidade de aprofundar a diversificação da economia, como for-ma de diminuir a dependência do país em relação ao petróleo, cujo preço, note--se, tem vindo a cair significativamente no mercado internacional.

A resposta da oposição não se fez es-perar. Poucas horas depois do discurso do Presidente na Assembleia Nacional, o líder da UNITA, Isaías Samakuva, con-vocou a imprensa para, praticamente, atacar todo o documento, de alto a baixo. A conclusão do presidente do maior par-tido da oposição foi dramática: «Se no campo dos direitos e liberdades funda-mentais o regime regrediu, no campo da gestão das finanças públicas e de concre-tização do Estado de direito democrático a regressão enraizou-se e cresceu de tal forma que constitui já uma séria ameaça aos fundamentos da República de Ango-la», afirmou Samakuva.

É difícil saber até que ponto declara-ções deste tipo podem anular o efeito positivo, pelo menos em termos de imagem, do reconhecido prestígio inter-nacional do país e da sua recente escolha para membro não permanente do Con-selho de Segurança das Nações Unidas. Provavelmente, será diminuto, para não dizer mesmo inexistente. Não é, pois, mero acaso, que o líder da UNITA te-nha decidido realizar uma viagem ao exterior, para transmitir a mensagem da referida organização às chancelarias internacionais.

Como se diria na linguagem popu-lar, ele foi atrás do prejuízo. Resta saber se colherá alguma coisa, no fim dessa excursão.

Oposição espera maior escrutínio da comunidade internacional em relação à boa governação

Eleição para Conselho de Segurança atesta prestígio internacional de Angola

Para essas vozes, a política de paz defendida pelo Governo angolano é «ambivalente» e apenas «para inglês ver». Segundo elas, por exemplo, as au-toridades não têm promovido, interna-mente, uma reconciliação «autêntica». Por outro lado, acrescentam, «há ainda muitas questões em aberto a nível da governação interna, segurança e direitos humanos dentro de Angola». As men-cionadas reticências talvez sejam exage-radas e reflitam uma expectativa dema-siado idealista em relação à atitude da chamada «comunidade internacional». Mas, no mínimo, servem para sinalizar o descontentamento de setores impor-tantes da sociedade angolana relativa-mente aos rumos do país.

Nem sequer o discurso sobre o Esta-do da Nação, proferido pelo Presidente

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a opinião de alves da rocha

[email protected]

Professor Associado da Universidade Católica de Angola

Alves da Rocha escreve de acordo com a antiga ortografia

mbora não existam indagações estatísticas sobre a percepção da maioria da população

quanto aos subsídios aos combustíveis, acredito, no entanto, que desconhece que os preços dos derivados do petróleo não são os reais. Mas mes-mo assim, a população mais humilde e de rendi-mentos baixos queixa-se dos elevados preços desses combustíveis.

Será que os subsídios são uma situação normal do funcionamento das economias de mercado? Existem circunstâncias especiais em que os preços de determinados bens e serviços devam ser subsidia-dos? Quem na verdade acaba por pagar estes subsí-dios (nunca se deve esquecer que em Economia não há almoços grátis)? Serão, na verdade, úteis à econo-mia e mesmo aos sectores e pessoas beneficiadas? Que tipo de distorções as políticas de subsidiação de preços introduzem no funcionamento dos merca-dos e na repartição do excedente económico? Serão os subsídios a preços uma forma de melhorar a dis-tribuição do rendimento ou, pelo contrário e em determinadas circunstâncias, como é o caso dos combustíveis, pioram o acesso ao rendimento na-cional da parte dos mais pobres? Serão as franjas mais pobres da sociedade a beneficiarem dos subsí-dios aos preços dos combustíveis? Qual o custo de oportunidade dos subsídios aos preços dos combus-tíveis, já que sempre nos confrontamos com uma restrição económica fundamental que é a escassez de recursos? Como se constata, uma quase infini-dade de problemas, atestando a natureza complexa deste fenómeno dos subsídios e do contrário, ou seja, da des-subsidiarização.

A energia no seu sentido lato (electricidade, combustíveis) tem uma posição central no fun-cionamento dos sistemas económicos, pelos efei-tos a montante e jusante que exerce sobre o cres-cimento. Um dos vectores da competitividade estrutural das economias é a energia, disponibili-zada em quantidades suficientes e a preços de eficiência. E é através da electricidade, regular-mente assegurada, que se possibilita às empresas funcionarem com estabilidade, deslocando para outras áreas de gestão e organização recursos fi-nanceiros e capacidade de inovação. Manter as fábricas a funcionar na base de geradores é não só custoso, como representa alguma ameaça ao equilíbrio ambiental.

Os cálculos dos montantes dos subsídios Anualmente o Estado aloca, no seu orçamento geral, cerca de 5 mil milhões de dólares a título de subsídios aos combustíveis e com a finalidade de manter os respectivos preços de venda à eco-nomia (empresas, famílias e o próprio Estado) inalterados, independentemente do preço do pe-tróleo no mercado internacional. De resto é pelo diferencial entre este preço e o preço final do re-finado que se calculam os montantes dos subsí-dios. Sempre que os preços internacionais baixa-rem, o valor dos subsídios reduz-se, o que pode ser uma vantagem para as finanças do Estado. Só que para a economia não é nada bom, pois redu-zem-se as receitas em divisas e também as receitas fiscais, fundamentais para financiar o investi-mento público. E seguramente que esta redução

Os efeitos da reduçãodos subsídios orçamentais

aos preços dos combustíveisPeriodicamente, o tema dos subsídios aos preços dos combustíveis em

Angola é trazido para o centro dos debates económicos, haja em vista as implicações que eventuais reduções no seu montante acarretam.

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é inferior aos ganhos com a diminuição do montante de subsídios. Num ambiente interna-cional de subida sistemática dos preços do petró-leo, os subsídios tenderão a aumentar cada vez mais. Este processo tem de terminar. O desperdí-cio económico e o desaproveitamento social asso-ciados a 5 mil milhões de dólares anuais são muito elevados, ainda que a maior parte da po-pulação não tenha disto noção clara.

Mas a redução ou eliminação dos subsídios aos preços dos combustíveis passa por: uma subs-tancial melhoria da eficiência da refinaria de pe-tróleo (a construção da nova refinaria é a solução ideal), um funcionamento regular do sistema de produção e distribuição de electricidade (o au-mento da produção de electricidade de Cam-bambe, a construção da nova barragem de Laúca, no Kwanza Norte (um investimento público de mais de 3 mil milhões de dólares) e a melhoria da capacidade de outras barragens hidroeléctricas são sinais duma alteração estrutural na capacida-de de fornecimento de electricidade no futuro), uma aplicação socialmente rentável dos montan-tes dos subsídios a cortar (o mais fundamental é encontrarem-se aplicações alternativas com um valor social de retorno superior à perda social as-sociada a preços baixos dos combustíveis), um

gradualismo do processo de diminuição (aborda-gem discutível face a quem prefere um choque de oferta único, ainda que de proporções elevadas, para se reduzir espaço ao aparecimento de com-portamentos especulativos e prejudiciais ao pro-cesso de absorção dos impactos sobre a inflação) e uma compensação imediata do rendimento das franjas sociais mais desprotegidas da população.

Uma forma de se estimarem os custos de opor-tunidade destes subsídios é confrontar o seu valor com os gastos em educação e saúde, duas áreas im-portantíssimas do Índice de Desenvolvimento Hu-mano, no qual Angola tem tido um péssimo desem-penho ao longo dos anos. A despeito de as despesas sociais representarem, grosso modo, 32% das des-pesas públicas totais – e de se ter notado um incre-mento desde 2002 – a realidade quotidiana mostra uma qualidade destes serviços que sempre deixou a desejar, reclamando a população de parcos rendi-mentos por atendimentos mais de acordo com a sua condição de seres humanos iguais a quaisquer ou-tros. As despesas orçamentais com a educação as-cenderam, em 2013, a 4,5 mil milhões de dólares e com a saúde a 3,2 mil milhões, ou seja, bem abaixo dos 5 mil milhões de subsídios. O reforço orçamen-tal destes dois sectores tem de ser feito à custa da redução dos subsídios.

Um dos vectores da competitividade estruturaldas economias é a energia, disponibilizada em quantidades suficientese a preçosde eficiência

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O Estado angolano atribui, no seu orçamento geral, 5 mil milhões de dólares para subsídios aos combustíveis

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Promover o acesso dos cidadãos aos benefícios da cultura faz parte dos objectivos do Plano Nacional de Desenvolvimento. É também objectivo do PND valorizar as diferentes manifestações culturais, incluindo as línguas nacionais e a produção de artesanato, para consolidar uma identidade nacional assente na diversidade cultural. A meta do PND é aumentar o número de Casas de Cultura em diversas províncias e estimular a formação e a quali�cação de recursos humanos, ampliando o número de alunos matriculados nas escolas técnicas de artes.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

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desenvolvimento da campa-nha eleitoral acabou dando mais ênfase à escolha entre a

continuidade ou não do «petismo» no poder, do que ao debate sobre propostas de governo.

O petismo é um eufemismo surgido após 12 anos de permanência do Partido dos Trabalhadores na Presidência da Re-pública. O temor de que esta hegemonia se prolongasse por mais quatro anos le-vou os partidos conservadores e a alta classe média a apostar na candidatura

presidencial do senador e ex-governador do estado de Minas Gerais, Aécio Neves.

A polarização da campanha eleitoral na segunda volta das eleições brasileiras foi uma consequência do objetivo oposi-cionista de impedir a continuidade do modelo econômico baseado na redistri-buição de renda e redução das desigual-dades sociais no país.

Na reta final da campanha, as emoções superaram as ideias e o resultado foi a inten-sificação das acusações mútuas, fruto de denúncias de corrupção e do passionalismo

dos eleitores. Isto tudo acabou se refletindo no resultado final mais apertado desde que o ex-líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito Presidente em 2002, levando o Partido dos Trabalhadores ao poder.

Dilma ganhou por uma diferença de 3,28% dos votos válidos, cuja distribui-ção nacional mostrou duas tendências claras: uma de natureza geográfica e outra de cunho nitidamente socioeconômico.

A Presidente reeleita ganhou facil-mente em quase todos os estados da re-gião norte/nordeste do Brasil enquanto Aécio Neves venceu também com folga na região sul e no centro oeste do país. As grandes exceções foram os estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro, cujos re-sultados foram decisivos para a vitória do petismo a nível nacional.

No plano socioeconômico ficou tam-bém nítida a divisão entre ricos e pobres

No discurso da vitória, Dilma Rousseff definiu três objetivos imediatos: reforma política, combate à corrupção e à inflação

Vitória de Dilma Rousseff mantém o petismo no poder por 16 anosA Presidente Dilma Rousseff permanecerá no poder por mais quatro anos depois de duas votações nacionais qualificadas pelos analistas políticos como plebiscitos em vez de eleições

Carlos Castilho FLORIANÓPOLIS

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brasil

46 novembro 2014 – África21

nas preferências eleitorais dos brasileiros. Dilma ganhou nas regiões mais pobres, as mais beneficiadas pela política de redistri-buição de renda, mundialmente famosa pelo projeto Bolsa Família, um suplemen-to em dinheiro fornecido a 14 milhões de famílias brasileiras com renda inferior a 70 reais (29 dólares).

Já o candidato oposicionista contou com o apoio dos segmentos sociais de ren-da mais alta, concentrados especialmente nos estados industrializados do sul e na próspera região agrícola do centro-oeste brasileiro. Aécio Neves contou também com as simpatias dos grandes conglomera-dos jornalísticos e do sistema bancário do país, interessado no fim do controle estatal sobre o Banco Central do Brasil.

A vitória apertada da ex-guerrilheira Dilma Rousseff, mais a clara divisão dos eleitores por região e classe social, somados à polarização emocional, aumentou a preocupação com o futuro do país nos próximos quatro anos, quando a Presiden-te enfrentará uma conjuntura econômica difícil fruto da queda do Produto Interno Bruto (PIB) e da alta da inflação.

Analistas políticos como Alberto Di-nes, do Observatório da Imprensa, afir-mam que agora começa o «terceiro turno» (terceira volta) das eleições, numa previsão de que a batalha política entre governo e oposição vai continuar intensa. A preocu-pação com o futuro esteve muito nítida no primeiro pronunciamento da Presidente

Dilma após a vitória nas urnas, quando ela prometeu dialogar com a oposição e defi-niu três objetivos imediatos de sua nova administração: reforma política, combate à corrupção e à inflação.

A proposta da reforma política já circu-la no parlamento nacional há mais de dez anos, mas não avançou por desavenças en-tre os partidos. Dilma pretende agora supe-rar este impasse promovendo um plebisci-to nacional que procura incluir o cidadão comum no debate da crise de identidade e proliferação dos partidos políticos. No momento há 28 partidos com representa-ção na Câmara de Deputados e 18 presen-tes no Senado federal. Em sua maioria são legendas marcadas por interesses imediatis-tas com escassa densidade ideológica.

O combate à corrupção está relaciona-do à reforma política porque a maioria dos escândalos manipulados eleitoralmente pelos partidos está ligada a esquemas de captação ilegal de recursos financeiros re-sultantes do superfaturamento de obras públicas. O mais famoso de todos estes es-cândalos é o chamado «mensalão», denun-ciado em 2005, e que culminou com a prisão de importantes líderes do petismo. O partido da Presidente Dilma não é o primeiro e provavelmente não será o últi-mo a usar este recurso, mas foi o preço pago pelo PT por sua longa permanência no poder.

Já a questão econômica é o grande «calcanhar de Aquiles» da nova gestão Dil-

ma, porque combina fatores internos e ex-ternos ao país. Entre os fatores internos, o mais importante é a realização de um diagnóstico real da situação do país.

Ao longo dos quase oito meses de campanha eleitoral, o otimismo e o pessi-mismo dos eleitores variaram de forma aguda em relação ao futuro do Brasil devi-do a indicadores econômicos contraditó-rios. Em abril, a avalancha de dados nega-tivos sobre a inflação e o crescimento econômico provocou índices de pessimis-mo da ordem de 64% conforme levanta-mento do jornal Folha de São Paulo. Em setembro, o índice baixou para 50% e, nas vésperas da segunda volta, caiu para sur-preendentes 31%.

A Folha de São Paulo levantou a hipó-tese de que a queda do pessimismo e consequente aumento do otimismo teria sido gerada pela expectativa dos eleitores, tanto de Dilma como de Aécio, de que seu candidato venceria as eleições e recu-peraria a economia. Mas a justificativa não encontrou consenso entre os econo-mistas e nem entre os especialistas em pesquisas eleitorais.

Os fatores externos estão ligados prin-cipalmente à situação econômica na Ar-gentina e na China, os dois maiores par-ceiros comerciais brasileiros para produtos e serviços pouco, ou medianamente, in-dustrializados. No momento tanto argen-tinos como chineses estão reduzindo as importações por problemas domésticos. Isto pode dificultar a recuperação econô-mica brasileira e comprometer o programa de redistribuição de renda que ajudou a reeleger Dilma Rousseff e reativar o mer-cado interno e a produção nacional, res-ponsáveis pelo fato do Brasil ter passado incólume, até agora, pela crise financeira internacional.

A recuperação da economia brasileira está ligada à situação econômica da Argentina e China, os dois maiores parceiros comerciais do Brasil

No plano socioeconômico ficou nítida a divisão entre ricos e pobres nas preferências eleitorais dos brasileiros

África21– novembro 2014 47

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48 novembro 2014 – África21

moçambique

uase a conta-gotas, os resul-tados das eleições presidenciais, legislativas e das assembleias

provinciais de 15 de outubro foram sendo divulgados até 15 dias depois da votação, deixando Moçambique sob um manto de tensão e ansiedade, muitas vezes transfor-mado num profundo clima de suspeição.

localmente a apresentação dos dados nos 150 distritos do país.

Com a obrigatoriedade de apresentar os editais até 48 horas após o encerra-mento das urnas, muitas destas comissões acabariam por falhar este objetivo, atra-sando, por arrasto, o apuramento das comissões provinciais, que também não conseguiram honrar o seu compromisso legal de divulgação dos resultados até cinco dias após a votação. Embora exí-guos, os primeiros resultados apresenta-dos pelo STAE, que apontavam para uma vitória de Filipe Nyusi, com uma margem de mais de 60% da votação, as-sim como da Frelimo, provocaram a pri-meira reação do principal partido da oposição moçambicano, a Renamo, re-centemente saído de um braço-de-ferro com o atual Governo moçambicano, consubstanciado numa crise político-mi-litar de 17 meses, de que resultou um

Frelimo vence com danosno seu esmagadorpoder parlamentar

O candidato presidencial da Frelimo, Filipe Nyusi, é o vencedor das eleições gerais moçambicanas, que garantiram uma continuidade governativa ao seu partido, embora com um domínio parlamentar menos «retumbante». A Renamo, de Afonso Dhlakama, reforça o estatuto de líder da oposição, enquanto o emergente MDM cresce, mas menos do que o esperado.

eManuel novais Pereira MAPUTO

Se nos primeiros dois dias após o sufrágio o Secretariado Técnico de Ad-ministração Eleitoral (STAE) foi convo-cando a imprensa para divulgar os apu-ramentos preliminares, tal deixaria de acontecer quando eram conhecidos cer-ca de um terço dos resultados, passando as comissões distritais do órgão a fazer

moçambique

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número indeterminado de feridos e de mortos, incluindo civis.

«Não aceitamos os resultados destas eleições» assegurava no dia seguinte à votação António Muchanga, porta-voz da Renamo, declarando «uma vitória categórica» do seu partido. Estas afirma-ções seriam mais tarde amenizadas pelo próprio Afonso Dhlakama que, embora tenha classificado as eleições como «uma fantochada», sugeriu a criação de um Governo de Unidade Nacional com o atual Executivo. O histórico líder da Renamo garantiu também que não iria reacender o conflito armado na sequên-cia de uma derrota eleitoral, mantendo a promessa que fez antes da votação.

Os resultados provinciaisQuando já eram conhecidos os resulta-dos provinciais, interpunha-se à faixa vermelha da Frelimo, conquistada no extremo norte e a sul, a cor verde da Re-namo na região centro-norte de Moçam-bique, mas, no somatório nacional, Filipe Nyusi surgia com 57% do total de votos face a Afonso Dhlakama, com 36%, e a Daviz Simango, líder do MDM, que não ia além de 7% da votação.

Nyusi vencia assim nas províncias de Niassa e Cabo Delgado (norte) e com margens expressivas em Gaza, Maputo Cidade e Maputo Província, além de Inhambane (sul), enquanto Afonso Dhlakama liderava a contagem em Tete, Sofala, Zambézia e Manica (centro) e ainda em Nampula (norte).

A contagem das legislativas não alte-rava de forma significativa o cenário das presidenciais, à exceção de Tete, Nam-pula e Manica, que a Renamo perdia para a Frelimo. Atribuía-se à Freli-mo uma margem de 56% sobre a Rena-mo (33,8%) e o MDM (9,1%).

A confirmarem-se estes resultados no apuramento central da Comissão Nacional de Eleições (CNE), obrigada a divulgar os dados finais até 15 dias sobre a votação, a Frel imo poderá per-der até quase 50 deputados dos 191 que mantém atualmente, abandonando a maioria qualificada que, até aqui, lhe permitia alterar a Constituição moçam-bicana. O partido, que governa Moçam-bique desde 1975, mantém no entanto uma maioria absoluta, que lhe possibili-tará o domínio do Parlamento.

Projeções avançadas pela imprensa moçambicana apontam para que, de um total de 250 deputados, seja expectável que a Frelimo fique com 142, a Renamo conquiste 89 lugares (contra 51 nas elei-ções anteriores) e o MDM 19 assentos. Nas mesmas previsões, embora mais do que duplique o número de lugares – ti-nha até agora oito – o MDM vê gorada a sua expectativa de eleger 30 deputados.

Oposição reclama fraude generalizada Partindo para o sufrágio com uma altera-ção à Lei Eleitoral, que logrou no decor-rer da crise político-militar, e que acabou por aumentar a partidarização da CNE e do STAE, a Renamo aponta críticas seve-ras ao processo, que diz ter sido marcado por vários ilícitos e fraudes eleitorais, tais como atrasos na abertura de mesas de votação, enchimento de urnas e falsifica-ção de editais, além de intervenções «inti-midatórias» da polícia.

Se a revisão eleitoral permitia à Re-namo, assim como à Frelimo e ao MDM, introduzir um membro partidá-rio em cada mesa de votação – 17.010 no total –, tal acabaria por não se verifi-car em grande parte do território, o que gerou trocas de acusações entre a oposi-ção, que falava em atrasos deliberados

A possibilidade de se virem a repetir-se as eleições é um cenário afastado por analistas políticos e pela própria CNE

na emissão de credenciais, e o STAE, que acusava os partidos de incúria, por não terem respeitado os prazos legais para a inscrição dos seus membros.

Dois dias após a votação, as mis-sões de observação eleitoral estrangeiras, que, no seu todo, levaram cerca de 500 observadores para Moçambique, apre-sentavam as primeiras conclusões sobre o processo eleitoral em comunicados bas-tante próximos no seu teor: admitin-do algumas irregularidades e a fraca presença de membros dos partidos da oposição nas mesas de votação, conside-rava-se que os incidentes registados eram insuficientes para retirar credibilidade ao processo.

Em oposição, os relatórios das mis-sões de observação nacionais, que reu-niam o grosso do número de observado-

Afonso Dhlakama garantiu que não irá reacender o conflito armado na sequência de uma derrota eleitoral

A Frelimo que governa Moçambique desde 1975, mantém maioria absoluta, possibilitando-lhe o domíniodo Parlamento

res, cerca de 6000, apontavam exatamente para o contrário, afirmando que os resul-tados das eleições não são credíveis.

Perante uma Frelimo silenciosa, so-mente através da imprensa moçambica-na têm surgido posições que apontam para uma rejeição da sugestão de Afonso Dhlakama no sentido da formação de um Governo de Unidade Nacional, en-tre a Renamo e o partido atualmente no poder.

Entretanto, e como sugeriram algu-mas missões internacionais, as reclama-ções dos partidos da oposição já come-çaram a dar entrada nos tribunais e órgãos eleitorais, mas a possibilidade de virem a repetir-se as eleições é um cená-rio afastado por analistas políticos do país, assim como pela própria CNE, que garante que os ilícitos denunciados não têm dimensão para «impedir sequer a eleição de um deputado ou membro da assembleia provincial».

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50 novembro 2014 – África21

das coercivas aplicadas até agora (como o recolher obrigatório imposto a toda a população da Serra Leoa de 19 a 21 de setembro) não surtiram o efeito esperado, a chamada comunidade internacional decidiu intervir militarmente. Barack Obama anunciou o envio de 4000 mili-tares americanos para a Libéria, os britâ-nicos fizeram o mesmo para a Serra Leoa e os franceses para a Guiné.

Guerra ao vírus ou caça aos doentes? O recurso à força para isolar os doentes e proteger as equipas sanitárias corre o risco de agravar o que o socioantropólogo sene-galês Cheikh Ibrahima Niang descreve como o «défice de confiança entre os diri-gentes (dos países afetados) e os seus admi-nistrados, e entre o Ocidente e os povos

epidemia

Urgência mundial para travar o ébola

Foram precisos oito meses e mil mortos em África para que a OMS decretasse o estado de emergência pública face à epidemia do ébola. Mas o aparecimento dos primeiros casos de contágio nos Estados Unidos e na Europa em outubro lançou o pânico no chamado «mundo ocidental».

niCole Guardiola

ilustração de Cristina saMPaio

ébola já fez mais vítimas mor-tais na Guiné Conacri, Serra Leoa e sobretudo na Libéria que

os 15 surtos epidémicos registados em África desde a identificação do vírus, em 1976 no ex-Zaire, e as perspetivas não são animadoras. A ONU fala de 4000 a 5000 novos casos por semana já no próximo mês. Impedir a propagação do vírus virou paranoia com a consequente estigmatiza-ção de regiões e países inteiros.

Sob a pressão da opinião pública, caldeadas por uma imprensa que difunde as informações mais pavorosas, os gover-nos tomam medidas de «legítima defesa» (fecho de fronteiras, suspensão de voos e vistos, controlos sanitários nos aeropor-tos) que sujeitam os países mais afetados a um embargo de facto. E como as medi-

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África21– novembro 2014 51

africanos». Segundo Niang, a abordagem ocidental focaliza-se demasiado no vírus e nas formas de o combater. «A doença é efetivamente causada por um vírus mas a epidemia surge quando existe um contex-to social, político, cultural e histórico favo-rável à sua expansão», disse.

O biólogo belga Peter Piot, que identificou o vírus ébola em 1976, des-taca também as circunstâncias que con-tribuíram para fazer da epidemia em curso na África Ocidental a mais mortí-fera de sempre: «várias décadas de guerra civil, governos instáveis e/ou corruptos que geraram uma perda de confiança nas autoridades nacionais e nos seus co-laboradores estrangeiros, serviços públi-cos fragilizados, crenças populares forte-mente enraizadas acerca da origem da

doença e lentidão das respostas nacio-nais e internacionais à epidemia».

A Organização Mundial de Saúde (OMS) e as ONG como Médicos sem Fronteiras denunciaram desde o início das suas intervenções a negação da doença e a resistência às intervenções exteriores como a causa principal da explosão da epidemia. Esta resistência, que levava as populações a esconder os doentes e os mortos, ou a fugir quando apareciam veículos marcados com

aumentam e que a situação geral se degra-da nos países afetados.

Com efeito, a epidemia tem efeitos devastadores na Guiné Conacri, Libéria e Serra Leoa, que eram já os países mais po-bres da região e dos mais atrasados do mundo em termos de desenvolvimento humano (179.º, 175.º e 183.º, respetiva-mente, entre 187 países, segundo o relató-rio do PNUD de 2014), com sistemas de saúde fraquíssimos (um médico por cada

Urgência mundial para travar o ébola

A crise humanitária provocada pelo ébola exacerba as tensões sociais preexistentes e compromete a estabilidade política dos países mais afetados

a Cruz Vermelha, tende a tomar formas violentas, como o ataque contra um cen-tro de internamento em Monróvia, no mês de agosto, para «libertar» os doentes hospitalizados compulsivamente, ou o massacre, a 16 de setembro, na Guiné, de oito membros de uma equipa de «sensibi-lização». Os confrontos violentos podem multiplicar-se à medida que os mortos

10.000 habitantes na Guiné, um por cada 100.000 na Libéria).

A gravíssima crise humanitária provo-cada pelo ébola exacerba as tensões sociais preexistentes e compromete a estabilidade política. O Presidente da Serra Leoa, Er-nest Bai Koroma, disse nas Nações Unidas que o seu país está em risco de desaparecer, e o ministro liberiano da Informação, Lewis Brown, não descarta a eventualida-de do regresso à guerra civil que acabou em 2003.

Em Monróvia, capital do país mais afetado, a crise é mais aguda e atinge to-dos os níveis do Estado e da sociedade. Escolas fechadas sine die, economia para-lisada pelo êxodo dos quadros das gran-des empresas e pelo embargo de facto sobre o comércio externo, o desemprego

52 novembro 2014 – África21

explode e a fome instala-se. Os nervos estão à flor da pele e as forças de seguran-ça, esqueléticas, não podem ou não que-rem intervir: polícias e soldados abando-nam em massa esquadras e quartéis depois de assistirem à morte de vários colegas. Os profissionais de saúde quei-xam-se de não beneficiarem da mesma proteção que os voluntários estrangeiros, que operam nos centros de luta contra o ébola, e recusam-se a continuar a traba-lhar em maternidades e postos de saúde, onde tudo falta, até luvas e água potável. Em Freetown, os coveiros entraram em greve para exigir o pagamento de dois

meses de salários atrasados, cansados de se expor ao contágio, sem equipamentos adequados, por 100 dólares por semana e sem seguro de vida para as suas famílias.

O diagnóstico feito pela ONU em meados de outubro é dramático. Milha-res, talvez dezenas de milhares, de liberia-nos, serra-leoneses e guineenses vão morrer nas próximas semanas, vítimas do ébola e não só: paludismo, cólera, ou simplesmente de fome.

Que fazer? A medicina não oferece nenhuma resposta imediata. Os grandes laboratórios científi-cos estão a trabalhar a todo o vapor para testar fármacos e vacinas, tendo em vista o «mercado» dos países mais desenvolvidos, os únicos capazes de gastar dezenas de milhões em troca de uma segurança por vezes ilusória, como se viu com o vírus HN1 (da gripe aviária).

Se um remédio eficaz for descoberto em breve não chegará a tempo para salvar milhares de pobres africanos porque não há indústria capaz de o produzir em gran-de escala e a preços acessíveis. De momen-to, a OMS estuda todas as opções possíveis (transfusões de plasma sanguíneo, testes de deteção rápidos e baratos) para baixar a mortalidade, dos 50% atualmente regista-dos em África para os 20% observados entre os ocidentais contaminados e trata-dos nos países de origem.

Entretanto, os especialistas insistem sobre a necessidade de adaptar a luta con-tra a epidemia às condições específicas dos países afetados porque nada poderá ser

feito sem a cooperação das populações e muito menos contra elas.

O epidemiologista britânico David Heymann recorda que as epidemias ante-riores de ébola ou de outros vírus da mes-ma estirpe foram extintas quando estavam circunscritas a comunidades relativamente isoladas, mais organizadas e coesas, onde as autoridades locais dispõem de um ver-dadeiro poder. Foi o que aconteceu em Angola em 2004 e está a acontecer agora na República Democrática do Congo, onde o surto epidémico ocorrido em agosto está em vias de ser controlado de-pois de causar quatro dezenas de mortos.

As condições são radicalmente dife-rentes nas grandes metrópoles africanas como Freetown e Monróvia, onde além da promiscuidade e da situação sanitária catastrófica, todo o tipo de obstáculos – culturais, linguísticos, religiosos ou políti-cos – tornam a comunicação mais difícil. É, no entanto, possível atenuar os senti-mentos de injustiça e de revolta e melhorar as relações entre a população e as equipas sanitárias com bom senso, respeito e com-paixão pelas vítimas.

Para isso é preciso implicar mais as personalidades com autoridade moral no seio das comunidades e as mulheres (que representam mais de 60% das vítimas); in-sistir sobre o facto de que o ébola não é um «castigo» ou uma fatalidade, mas uma doença, nem sempre mortal, e que uma boa alimentação e a limpeza individual e coletiva são as melhores armas para travar a epidemia. Os centros de isolamento devem deixar de ser vistos como prisões onde os reclusos «desaparecem» sem deixar rasto, dando lugar às mais loucas especulações. A entrega dos corpos às famílias, devida-mente desinfetados e amortalhados, para reduzir o risco de contágio é uma medida que está a ser aplicada com sucesso em Co-nacri pela Cruz Vermelha guineense.

É urgente, sobretudo, uma mobiliza-ção geral para fazer chegar comida, água potável e assistência básica às populações «em risco». E África deve dar provas de solidariedade efetiva, em vez de sucumbir à paranoia de segurança que prevalece atualmente no Ocidente e que, como ad-verte agora a OMS, poderá ser mais mor-tífera do que o próprio vírus.

Polícias e soldados liberianos abandonam esquadras e quartéis após assistirem à morte de vários colegas

Os confrontos violentos podem multiplicar-se à medida que os mortos aumentam e a situação geral se degrada nos países mais afetados

ÁFrICA MOBILIZA-SECONtrA O ÉBOLA

A presidente da Comissão da União Afri-cana, Nkosazana Dlamini-Zuma, visitou os três países da África Ocidental no epicentro da epidemia de ébola na última semana de outubro, quando o número de casos registados se aproximava dos 10.000 e o dos mortos de 5000. Prome-teu o envio para a Guiné Conacri, Libéria e Serra Leoa de mil profissionais de saúde, dos quais 600 oferecidos pela África Oriental. Segundo a Organização Mundial de Saúde é preciso isolar pelo menos 70% das pessoas contaminadas para travar a propagação do vírus, mas até agora apenas 25% dos 50 centros de isolamento necessários estão a funcio-nar devido à falta de pessoal. Cuba, que já enviou 165 médicos e enfermeiros para a Libéria, o país mais afetado, vai enviar mais 65 para Serra Leoa e Guiné Conacri.

Na frente médica e científica, inves-tigadores franceses apresentaram um teste de deteção simples, barato e so-bretudo rápido (parecido com um teste de gravidez) que permite detetar a pre-sença do vírus em 15 minutos com apenas uma gota de sangue. A vacina foi elaborada por um laboratório cana-diano e será testada em África e Europa em novembro. Se os resultados forem positivos o laboratório compromete-se a fornecer milhões de doses no primeiro semestre de 2015.

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54 novembro 2014 – África21

dimensão da maioria absoluta do ADI para a renovação do Parlamento nacional surpreen-

deu. De acordo ainda com os resultados provisórios anunciados pelo presidente da Comissão Eleitoral Nacional, Victor Correia, a Assembleia é renovada com 33 assentos do ADI; 16 do MLSTP/PSD; 5 do PCD e, pela primeira vez; 1 da UDD.

A abstenção rondou os 28%. Os partidos e os analistas estão ainda a tentar perceber as causas profundas para tirar lições.

Para alguns analistas, o golpe fatal foi a fragmentação do MLSTP/PSD. Da cisão surgiram duas formações: o Partido da Esta-bilidade e Progresso Social (PEPS) e a Plata-forma Nacional para o Desenvolvimento de São Tomé e Príncipe (PND/STP).

Segundo os dados disponíveis, os vo-tos somados das três forças permitiria ao MLSTP chegar a pelo menos 20 deputa-dos. Com a agravante de que nenhuma das duas novas forças conseguiu assento na próxima assembleia. Surgiram há poucos meses, no período pré-eleitoral. Não tive-ram tempo de se afirmar.

O erro estratégico dos mentores desta divisão foi acreditar que a dispersão de votos evitaria maiorias absolutas e obriga-ria à formação de um governo de coliga-ção, em nome da estabilidade política, tema central do escrutínio. Esqueceram--se, contudo, que a contagem pelo méto-do d’Hondt favorece os que concentram maior número de votos.

Por outro lado, a penalização dos três partidos que suportaram o XV Governo Constitucional já se desenhava há algum tempo, porque individualmente trabalha-ram pouco ao longo dos cerca de dois anos.

são tomé e príncipe

A expressiva vitória do Ação Democrática Independente nas eleições legislativas e autárquicas está ainda a ser objeto de análise por forças políticas, observadores e analistas. Entretanto, houve denúncias de alguns fenómenos anormais, como o levantamento dias antes de cerca de dois milhões de dólares e a compra massiva de cartões de eleitores. Os observadores internacionais deram, contudo, visto bom ao complexo processo eleitoral.

Juvenal rodriGues SÃO TOMÉ

Fragmentação do MLSTP e arroz facilitaram vitória expressiva do ADI

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Patrice Trovoada

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Argumento: falta de dinheiro. Observado-res atentos faziam outra leitura: falta de imaginação, porque esperavam capitalizar, sobretudo, o desempenho do Governo.

Na atual conjuntura, o Executivo lide-rado pelo primeiro-ministro Gabriel Costa teve várias dificuldades. O primeiro obstá-culo foi não tomar contacto rapidamente com os dossiês. O XIV Governo liderado por Patrice Trovoada, após a queda por moção de censura e ter inviabilizado a for-mação de outro governo do ADI com outra figura como primeiro-ministro, não fez a transferência de pastas. Até discos rígidos de computadores das instituições ficaram completamente limpos.

Foi através de terceiros que o novo governo se inteirou de alguns projetos importantes. Tudo isso passou-se e, até agora, sem qualquer consequência ou res-ponsabilização judicial, apesar das denún-cias feitas pelo chefe do Governo cessante no Parlamento e as resoluções adotadas pelo poder legislativo.

A promessa da redução do preço do arroz para 13 mil dobras (cerca de um dó-lar) o quilo, um produto que o país não produz, também exerceu a sua influência. Foi tema musical da campanha do ADI. A franja da população mais pobre entende que este preço favorece-a mais do que comprar produtos locais como banana e fruta-pão para a sua dieta alimentar. O alerta feito pelos candidatos a primeiro--ministro no último debate organizado pela televisão local, segundo o qual este preço só seria possível com a doação feita pelo Japão, caiu em saco roto.

Devia-se, por outro lado, ter em conta a situação dos privados que comercializam este produto. A propósito, o partido vence-dor explorou também a polémica que esta-lou sobre a qualidade deste cereal importa-do feito por um privado e dirigente do PCD. O arroz japonês só permanece no mercado durante três meses. Este já é um desafio para o novo Governo: cumprir a promessa de manter o preço do arroz na-quele nível durante todo o ano.

Seja como for, quem vencesse as legisla-tivas conquistaria por arrastamento as au-tárquicas. Foi a primeira vez que se realiza-ram eleições simultâneas no país.

Nas autárquicas, o ADI venceu bem em quatro câmaras. Em Lobata registou-se um empate técnico entre o MLSTP e o ADI, mas o primeiro poderá liderar o dis-trito com o apoio do PCD. A exceção foi Caué em que o MLSTP/PSD venceu.

Na Região Autónoma, os principenses sabiam o que queriam. A União para a Mudança e o Progresso do Príncipe man-tém a hegemonia, embora com uma pe-quena oposição, devido à aplicação do mé-todo d’Hondt. Dos sete mandatos, dois foram para o MLSTP/PSD.

reaçõesOs responsáveis das principais formações derrotadas felicitaram o ADI e o seu líder pela vitória eleitoral. Para Patrice Trovoada, «assistimos a uma clarificação da situação política através do voto determinante da maioria dos santomenses a favor do ADI. Gostaria neste momento de chamar a aten-ção de todos, do ADI e da classe política santomense sobre essa grande responsabili-dade que recai sobre os nossos ombros».

«Numa campanha em que foram apre-sentados candidatos a primeiro-ministro, eu percebo que recai sobre os meus ombros uma grande expectativa, por parte de todos os santomenses que depositaram a sua confiança em mim. Volto a afirmar que serei o primeiro-ministro de todos os santo-menses», acrescentou.

O golpe fatal do MLStP/PSD foi a cisão do partido do poder, de onde surgiram duas novas formações partidárias

A promessa da redução do preço do arroz para um dólar o quilo, um produto que o país não produz, foi tema de campanha do ADI

Tomando-se em consideração que as referências feitas na campanha ao compor-tamento da bancada do ADI em abando-nar o Parlamento e protagonizar cenas de pugilato e insultos no hemiciclo pelos parti-dos que garantiam a sustentabilidade parla-mentar ao Governo não tiveram qualquer efeito no eleitorado, pode ser uma indica-ção de que a maioria dos votantes identifi-cou-se com esses comportamentos, reafir-mando que o país vive uma profunda crise de valores.

O terceiro fator, a impossibilidade do Executivo em cumprir atempadamente as promessas feitas a alguns setores sociais desfavorecidos, como a concessão de cré-ditos a pequenos empreendedores, pa-laiês (vendedoras de peixe) e pequenos agricultores; e a renovação da frota para os taxistas. Este assunto foi objeto de al-guma tensão entre o Executivo e os parti-dos da coligação.

O presidente do MLSTP/PSD prome-teu, por sua vez, que o seu partido «estará sempre na vanguarda na defesa dos interes-ses do povo de São Tomé e Príncipe», ape-sar de ter perdido as eleições. Jorge Amado anunciou que irá convocar um congresso extraordinário, após a avaliação dos resulta-dos eleitorais.

O MDFM/PL, que lamenta o resulta-do obtido, fez o seu congresso a 26 de outu-bro para «eleger o novo presidente e, conse-quentemente, em função dos estatutos do partido, os demais membros da sua direção central». É quase certo que haverá limpeza nos órgãos diretivos. Alguns nomes sonan-tes dos liberais teriam saltado para o ADI.

Segundo o presidente do PCD, os re-sultados ficaram aquém das expectativas. Xavier Mendes denunciou «a compra de cartões dos eleitores», um «fenómeno» que na opinião do seu partido «deve ter concor-rido para que os resultados fossem esses».

Patrice Trovoada tinha, por sua vez, acusado os partidos do arco da governação de terem levantado dias antes cerca de dois milhões de dólares.

Porém, para a CEN, há muito que não se assistia a «essa afluência, essa teimo-sia das pessoas em quererem votar. Se houve banho, ele foi muito disfarçado. Aos poucos vamos tirar esse fardo que mancha as nossas eleições», comentou Victor Correia.

Estabilidade e governação inclusiva são algumas das expressões mais ouvidas nos últimos dias. A sua materialização? Esperar para ver!

56 novembro 2014 – África2156 outubro 2014 – África21

África21– novembro 2014 57

partido Ação Democrática Independente venceu com maioria absoluta as legislativas de

12 de outubro em São Tomé e Príncipe, conquis-tando 33 dos 55 assentos na Assembleia Nacional. A robustez da vitória estendeu-se às autárquicas, tendo o partido de Patrice Trovoada juntado às câ-maras de Água Grande e de Mé-Zóxi as de Cantagalo e Lembá.

São Tomé e Príncipe ficou, lite-ralmente, colorido de azul e amarelo, antecipando um novo ciclo cujos ei-xos e contornos são aguardados com expectativa. Numa primeira leitura, os resultados do escrutínio de 12 de outubro favorecem a estabilidade go-vernativa, tão reclamada por todos os atores políticos como pressuposto para o continuamente adiado desen-volvimento do arquipélago.

Pela sua envergadura, o triunfo do ADI aponta para o cumprimento da legislatura, interrompendo o padrão da II República que não viu um só dos seus sucessivos governos encerrar o mandato de quatro anos.

O desfecho destas eleições representa um triunfo pessoal de Patrice Trovoada, regressado a São Tomé em período legal de campanha, pondo fim a um autoimposto exílio iniciado logo após o derrube, no parlamento, do XIV governo constitucional por ele liderado. O fervoroso acolhimento popular de que foi alvo à chegada não tem precedentes próximos e sugeriu que os que o condenaram como general co-barde fugitivo do campo de batalha não estavam em sintonia com o eleitor comum.

Tendo pairado, como um espectro sobre a vida política do país, Patrice Trovoada explorou inces-santemente, a partir de Lisboa, a queda do seu mi-noritário e intransigente governo como um assalto ao poder por forças não legitimadas pelo voto popu-lar. Num tabuleiro fragmentado e algo cacofónico, definiu os termos da contenda: ADI contra todos.

Diabolizou preferencialmente o Presidente da República, Manuel Pinto da Costa, a quem acusou de apadrinhar as forças políticas adversárias, agindo não como árbitro, mas sim como jogador.

Pediu oito anos para transformar São Tomé e Príncipe no Dubai de África. E fez reverberar a

promessa de que o arroz doado pelo Japão seria vendido à população por 13.000 dobras (menos de um dólar), caso vencesse as eleições.

Simultaneamente, foi dando indicações de que o ADI governaria de forma inclusiva, mobilizando competências e respeitando a esfera de atuação de

cada órgão de soberania. O ADI venceu as eleições e vai

reassumir as rédeas da governação em São Tomé e Príncipe. Pediu e obteve a maioria absoluta com um conforto além, quiçá, das suas próprias expecta-tivas. À sua espera está um país ainda crispado por divisões partidárias e querelas personalistas agravadas pelo clima de campanha.

Um país que quase não produz e cujos orçamentos dependem, em mais

de 80%, da assistência estrangeira. Um país em que 50% da população vive abaixo da linha de pobreza e 15% em pobreza extrema, com uma taxa de desemprego juvenil a rondar os 29%.

Que farão Patrice Trovoada e o ADI com esta vitória?

A crónica de Conceição Lima

O que fazer desta vitória?

[email protected]

Aqueles que condenaram Patrice Trovoada como um generalcobarde fugitivo do campo de batalha não estavam em sintoniacom o eleitor comum

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58 novembro 2014 – África21

guiné-bissau

inal dos novos tempos, da normalização institucional após as eleições gerais de abril/maio, que puseram termo ao regime de transi-

ção, o centro de gravidade da política deslocou-se para o Parlamento, que numa iniciativa muito rara nestas paragens, abriu as portas a líderes partidários, académicos, autoridades religiosas, especialistas de questões jurídicas, militares, agentes económicos, promotores sociais e culturais, para um exercício de reflexão sobre uma dúzia de temas, agrupados em três painéis: «O Estado, a prática política e as ideias», «Nação, sociedade e democracia», e finalmente «Que Constituição para a Guiné-Bissau?».

O ponto de partida foi o ano das primeiras elei-ções gerais multipartidárias, em 1994, embora a libe-ralização política de facto tenha começado nos finais dos anos 80, em consequência das mudanças que se seguiram à queda do Muro de Berlim. É certo que ninguém tem saudades do monolitismo, da ausência de liberdade e da penúria material da era do partido único. Porém, os guineenses também não estão satis-feitos com a fragilidade das instituições, a falta de autoridade do Estado e a péssima qualidade de vida da larga maioria da sociedade, que se seguiram ao advento do liberalismo económico e do pluralismo político. O que está mal? De quem é a culpa? Será de certas lacunas e ambiguidades da Constituição de 1984, apesar das suas sucessivas alterações, ou o pro-blema reside na sua interpretação e aplicação? Ou a democracia simplesmente não é viável num território onde medra a pobreza quase absoluta, como disse um deputado e conhecido empresário?

A reforma destinada a acabar com a agitação nos quartéis e a submeter os militares ao poder po-lítico é suficiente para apaziguar duravelmente o país, libertar as energias para a modernização e de-senvolvimento da economia? O que mais tem de mudar, e como? Nenhuma destas questões é uma

novidade, mas pela primeira vez muitas cabeças--pensantes juntaram-se em simultâneo num lugar tão solene como o salão da plenária da Assembleia Nacional Popular, para um diagnóstico, que embo-ra não sendo definitivo, teve o mérito de recolocar estes assuntos no centro das preocupações nacio-nais, para que sejam encontradas em tempo útil as soluções que merecem, o que permitiria ajustar a democracia guineense às exigências, cada vez mais urgentes, da sociedade atual e futura.

Para o efeito, uma série de medidas estão na forja e suscitam muita esperança. Grande parte delas são iniciativas do Parlamento ou passarão pelo crivo dos deputados. Há consenso de que a prioridade das prioridades, se assim se pode dizer, é a reforma do setor de Defesa e Segurança. Tem enormes custos fi-nanceiros, porque implica garantir o fundo de pen-sões e a reinserção social dos desmobilizados, e tam-bém mexe com a estabilidade geral, uma vez que requer a aposentação de toda uma geração de milita-res e ex-combatentes, cujas vidas se confundiam com a própria história e existência da Guiné-Bissau. Aqui, tal como na reforma da justiça, outra obra que não pode esperar e que condiciona tudo o resto, é funda-mental um corte com o passado.

A nomeação, em setembro, de um novo chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, com um perfil mais republicano e tecnicamente mais prepara-do, é um primeiro passo neste sentido, mas não basta. E o mesmo se pode dizer do recém-indigitado Procu-rador-Geral da República, Hermenegildo Pereira, um magistrado de reputação imaculada, que vai ter de navegar num mar de dificuldades e carências, de toda a administração pública. Isto levanta a questão da vulnerabilidade do Estado, da sua capacidade para gerar os recursos indispensáveis ao seu próprio fun-cionamento, um problema que continuará ainda por resolver em todos as esferas de atividade, enquanto

Os desafios da democracia

A construção da democracia é incompatível com violência política, instabilidade institucional e atraso socioeconómico, que marcaram os últimos vinte anos do país. Esta é uma das conclusões que se podem extrair de três dias de intervenções e debates em outubro.

alMaMi Júlio Cuiaté BISSAU

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África21– novembro 2014 59

não for levada até às últimas consequências a tão propalada reforma da administração do Estado.

Presidencialismo ou semipresidencialismo? Outra tarefa identificada pela maioria dos analistas locais como sendo não menos crucial para impulsio-nar o sistema democrático e estabilizar de vez o país, e que foi aflorada por diversos intervenientes no coló-quio, é a revisão da atual Constituição. Desde a V Legislatura (1994/99, a primeira multipartidária e que foi prolongada por causa da guerra civil) que es-tão em curso tentativas para tal, sem sucesso. A co-missão criada para o efeito concluiu o trabalho em 1999 e enviou o decreto para promulgação ao então Presidente interino, Malam Bacai Sanhá, que não o rubricou, e passou a batata quente ao seu sucessor eleito, Kumba Yalá, já noutra legislatura, e com outra comissão, que introduziu algumas emendas no de-creto de 1999, que de um modo geral limitavam al-guns dos poderes presidenciais. Kumba colocou o decreto na gaveta e não o assinou, até à sua queda em setembro de 2003.

A situação não mudou com os Chefes de Estado que se seguiram, o general Nino Vieira e novamente Bacai Sanhá, que morreram ambos antes do fim dos respetivos mandatos. Nova comissão de revisão foi criada, na VIII Legislatura, mas as suas recomenda-ções não passaram disso mesmo, porque o golpe de força de abril de 2012 veio interromper o seu manda-to. Resta saber o que se passará daqui em diante. Tanto mais que a revisão do início dos anos 90, que

abriu caminho ao multipartidarismo, consagrou, no aspeto relativo à organização do sistema de poder, um semipresidencialismo de pendor presidencial (o Chefe de Estado pode presidir ao Conselho de Mi-nistros quando achar conveniente), que para alguns estudiosos é fonte das tensões que sempre se verifica-ram nas relações entre a Presidência e o Executivo.

Alguns especialistas consideram que este bicefa-lismo, num contexto de disputa pelo poder, e a dife-rente leitura que os atores políticos fazem da lei magna guineense, é a causa número um dos conflitos e da crónica instabilidade do país, cuja expressão máxima foi a guerra civil de junho de 1998/maio de 99. Depois deste colóquio dos Vinte Anos da Demo-cracia, parecem estar criadas as condições para se aprofundar a questão e colocar sobre a mesa a escolha entre o regime presidencialista, dominante na África Ocidental (só a Guiné-Bissau e Cabo Verde são exce-ção) e o semipresidencialismo.

Para outros observadores, o problema não reside aqui, e entendem que a origem do «mal» da demo-cracia guineense está na governação, como defendeu o atual primeiro-ministro, Simões Pereira, não basta ser eleito e possuir maioria. O exercício do poder deve ser dialogante, partilhado e inclusivo, com res-ponsabilização e prestação de contas, o oposto do que tem sucedido até aqui. Outros, finalmente, acham que a verdade e a reconciliação nacional, que vai ser objeto de uma conferência em 2015, são o caminho mais indicado para a redenção da democracia na Guiné-Bissau.

Os guineenses não estão satisfeitos com a fragilidade das instituições e a falta de autoridade do Estado

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21 A reforma da Defesa é uma das prioridades do novo Governo

60 novembro 2014 – África21

África do sul

á destronada pela Nigéria como maior economia de África, o cresci-mento anémico da África do Sul

coloca o país muito atrás dos mercados dos seus parceiros emergentes. A situa-ção deve-se, em grande parte, a desequi-líbrios estruturais, políticas globais hesi-tantes, mas resulta também de agressões internas autoinfligidas, de que são exemplo a incoerência política e os tu-multos laborais no setor mineiro.

Ao fazer o seu discurso intercalar sobre o orçamento, Nhlanhla Nene, que substi-tuiu Pravin Gordhan na pasta das Finan-ças na remodelação governamental após as eleições de maio, disse que a África do Sul se encontra «num ponto de viragem» e que «a consolidação não pode ser adiada».

O Plano de Desenvolvimento Na-cional indica que é necessário um cresci-mento de 5% do PIB se o país quer dar resposta convenientemente aos proble-mas de pobreza, desemprego e desigual-dade. Mas um crescimento mais baixo significa que o Governo sul-africano tem gasto mais do que pode obter em receitas. O défice do orçamento é atual-mente de 153 mil milhões de rands (cerca de 14 mil milhões de dólares). O Tesouro estima que este possa au-mentar para 2,4 biliões de rands (220 mil milhões de dólares) em 2017/2018, ou seja, 45,9% do PIB.

Os passos anunciados pelo ministro das Finanças para emagrecer o orçamen-to incluem a manutenção das despesas

públicas nos níveis atuais e possíveis au-mentos de impostos, quando apresentar o próximo orçamento em fevereiro.

Nene reiterou que o apoio do Go-verno aos pobres – incluindo os quase 17 milhões de pessoas que dependem de subsídios sociais – não ficará compro-metido. «Não iremos equilibrar o orça-mento à custa dos pobres», afirmou.

Aos sindicatos da função pública, cujas exigências de aumento de ordena-dos forçaram o Governo a pedir empres-tado para assegurar as despesas salariais, o ministro disse que os constrangi-mentos do orçamento irão apenas per-mitir os aumentos necessários a contra-balançar o custo de vida. «Nas presentes circunstâncias económicas, é especial-

Alerta vermelho à economia

Ao baixar as previsões de crescimento de 2,7%, estabelecidas em fevereiro, para uns meros 1,4% do PIB, o novo ministro das Finanças da África do Sul, Nhlanhla Nene, traçou um quadro austero quando em outubro fez o seu discurso intercalar sobre o orçamento

Gaye davis JOANESBURGO

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Nhlanhla Nene, ministro sul-africano das finanças

África21– novembro 2014 61

mente importante manter um equilí-brio cuidadoso entre as despesas com o pessoal e outros recursos exigidos pelo funcionamento da administração pú-blica». Isto pode levar a um desentendi-mento com os sindicatos, que estão a pedir um aumento de 15% mesmo an-tes das negociações previstas para mar-ço próximo.

Nhlanhla Nene anunciou também uma injeção de capital de 20 mil mi-lhões de rands (1,8 mil milhões de dóla-res) na Eskom, a empresa paraestatal que produz e distribui toda a energia elétrica do país, dizendo que esse mon-tante será angariado através da venda de bens públicos não-estratégicos, que ele se recusou a identificar.

O aliado político do ANC, a federa-ção de sindicatos COSATU, mostra-se ideologicamente oposta à privatização e isto pode constituir outro ponto de conflito.

A Eskom está a tentar financiar um programa massivo para construir novas centrais de produção com o objetivo de ajudar a resolver a crise da energia e apoiar a economia. Mas os custos neces-sários excedem em muito as suas recei-tas. O Governo pretende que a empresa consiga cobrir o seu défice orçamental

mente em dificuldades financeiras e cuja administração enfrenta períodos conturbados.

Em março, a rede elétrica do país estava sob uma tensão tão grande, que a Eskom teve de agendar quebras de fun-cionamento do serviço (apagões), pela primeira vez desde 2008, para prevenir que a rede colapsasse, o que evidenciou um equilíbrio fraco entre fornecimento e procura de energia.

Apesar das greves laborais e de uma fraca força de trabalho terem atrasado a construção de novas centrais, as pri-meiras seis unidades de Medupi deve-rão começar a produzir energia em dezembro.

O discurso do ministro das finanças não fez referência à intenção do Gover-no de construir um conjunto de cen-trais nucleares, ou ao recente acordo assinado com a Rosatom, agência nu-clear pública da Rússia. Especialistas do setor industrial indicam que o in-vestimento seria de cerca de um bilião de rands (cerca de 91 mil milhões de dólares), o que os críticos dizem ser demasiado dispendioso.

Crise na economia e na políticaPartidos políticos e analistas receberam com agrado o diagnóstico austero de Nene, mas de imediato surgiram per-guntas sobre se os burocratas do Gover-no irão de facto aplicar os cortes pedidos pelo ministro. Pergunta-se igualmente se o Executivo terá vontade política para enfrentar a COSATU, quando tiverem lugar as discussões salariais no próximo ano.

A degradação económica da África do Sul ocorre numa altura em que o ANC está sob pressão política. As elei-ções locais previstas para 2016 podem resultar numa perda de algumas das maiores cidades do país, incluindo Joa-nesburgo e Tshwane (Pretória) na pro-víncia de Gauteng, onde o apoio ao ANC registou uma queda nas eleições nacionais de maio.

Em setembro, os ladrões de cabos de cobre desencadearam uma crise que

deixou largas faixas de Gauteng – centro económico do país – sem água durante quase três semanas. A situação foi agra-vada por falhas de gestão em assegurar planos de emergência para manter os reservatórios cheios, e enfatizou a liga-ção entre a eletricidade e o fornecimento de água.

Entretanto, o Presidente Jacob Zuma está igualmente sob pressão devido aos 246 milhões de rands (cerca de 22,5 milhões de dólares) em fundos públicos gastos na sua casa pessoal em Nkaldla no KwaZulu Natal. A transformação de uma moradia rural relativamente mo-desta numa luxuosa mansão com pisci-na, clínica, heliporto e um bunker ligado por elevadores e passagens às habitações superiores, não passou despercebida aos eleitores.

O provedor de justiça independente, Thuli Madonsela, indicou que Zuma deve pagar uma parte do dinheiro pago em serviços que não estejam diretamen-te relacionados com a sua segurança, mas o Presidente tem afirmado veemen-temente que não conhecia os detalhes do que estava a ser feito e não entende por que razão deve pagar. O seu arquite-to pessoal, Minenhle Makhanya, pode ser multado em 155 milhões de rands (cerca de 15 milhões de dólares).

O Presidente sul-africano enfrenta ainda um recurso judicial da decisão, tomada antes das eleições de 2009 que o levaram ao poder, de retirar mais de 700 acusações de extorsão, fraude e corrup-ção contra si. As acusações foram retira-das por se ter considerado que Zuma teria sido prejudicado no processo devi-do a interesses políticos que teriam ma-nipulado a situação contra si.

Tradução de Teresa Souto

Jacob Zuma está sob pressão devido aos 22,5 milhões de dólares em fundos públicos gastos na sua casa pessoal

Nhlanla Nene garante que o apoio governamental aos pobres, incluindo os 17 milhões de pessoas que dependem de subsídios sociais, não ficará comprometido

sem aumentar demasiado as tarifas da eletricidade.

O ministro deixou bem claro que não haverá novas garantias de dívida para empresas paraestatais descapitali-zadas, incluindo a companhia aérea nacional, a SA Airways, que está igual-

62 novembro 2014 – África21

oava para o Oriente complicado com ideias simples», confessou o ex-Presidente francês Charles de Gaulle nas suas Memó-

rias. O mesmo poderiam dizer, se fossem sinceros, muitos enviados especiais e comentadores políticos. O mosaico de povos, etnias, religiões, tribos e ideo-logias que constituem o Próximo Oriente, o Levan-te dos românticos e berço das três religiões mono-teístas, modelado por milénios de história e remodelado pelas potências colonizadoras ao longo do século XX é definitivamente irredutível a um punhado de «ideias simples».

A mais comum destas simplificações consiste em considerar o «povo curdo» de 40 milhões de membros como uma entidade única, animada do desejo comum de construir o seu próprio Estado,

solidária apesar das circunstâncias históricas que repartiram os curdos entre quatro dos Estados criados pelas potências colonizadoras do Próxi-mo Oriente após a I Guerra Mundial e o des-membramento do império otomano – a Turquia, onde representam cerca de 20% da população, Iraque (17%); Síria (10%) e Irão (7%).

Se há efetivamente uma identidade curda for-te, esta não se construiu no vazio mas em interação com os outros povos da região. Não árabes – como turcos e persas – os curdos foram como eles islami-zados no século VIII e integrados nos sucessivos califados até à criação do império otomano; são maioritariamente sunitas (80%) mas incluem mi-norias fiéis a todas as religiões pré-islâmicas (mani-queístas, zoroastristas, yazedis, judeus e cristãos). A sua língua, e maior traço de união, pertence ao mesmo grupo indo-europeu que as línguas persas; com variações regionais, escreve-se em três alfabe-tos: latino, cirílico e árabe.

A sua relação com os regimes dos países onde foram integrados foi sempre determinada pelo seu estatuto de minoria e pelo maior ou menor grau de reconhecimento da sua identidade cultu-ral, alternando períodos de relativa bonança com perseguições e massacres. Estas opções políticas criaram diferenças entre curdos turcos, iranianos, iraquianos ou sírios e, por vezes, divisões e confli-tos no interior de cada comunidade (o Curdistão iraquiano, sob proteção internacional desde a

médio oriente

A batalha de Kobani e o orgulho curdo Desde agosto, a batalha pela cidade síria de Kobani, sitiada pelos jiadistas do Estado Islâmico, desvia as atenções da imprensa internacional do que acontece no resto da Síria, do Iraque e do Próximo Oriente. A questão curda incomoda o Ocidente e revela as fragilidades e incoerências da coligação liderada pelos Estados Unidos.

niCole Guardiola

A relação dos curdos com os regimes dos países onde foram integrados foi sempre determinada pelo estatuto de minoria

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África21– novembro 2014 63

primeira guerra do Iraque, foi palco entre 1994 e 1998 de uma guerra civil entre seguidores do Partido Democrático do Curdistão (PDK), de Mustafa Barzani, e da União Democrática do Curdistão UPK de Jalal Talabani).

Estas divergências políticas, que os vários re-gimes da região e os respetivos aliados procura-ram sempre manipular para dividir os curdos e impedir a concretização do seu sonho de «Gran-de Curdistão» independente, foram agravadas pelas guerras do Iraque, a queda de Saddam Hussein e a guerra civil síria.

A segunda ilusão consiste em pensar que os ódios e alianças variáveis, forjados ao longo de um século à volta da «questão curda», desapareceriam de um dia para o outro face ao surgimento do chamado Estado Islâmico (EI) e à organização, pelos Estados Unidos, de uma «grande coligação» contra a «barbárie jiadista». O formidável (e escan-daloso) imbróglio suscitado pela «batalha de Ko-bani» provou precisamente o contrário.

Quando depois de conquistar parte da Síria, e de lançar em agosto uma grande ofensiva no Iraque, o EI avançou contra Erbil, a capital do Curdistão Iraquiano, os seus campos petrolíferos e os oleodutos que levam o crude até à Turquia, os Estados Unidos e os europeus, encabeçados pela França, reagiram de imediato. Era preciso, disseram, evitar um «genocídio» iminente dos cristãos e dos yazedis pelos jiadistas.

Mas o Ocidente não achou oportuno intervir para salvar Kobani quando os mesmos jiadistas cercaram a terceira maior cidade curda síria, fronteiriça com a Turquia.

Desde 16 de setembro, algumas centenas de combatentes do PYD (Partido da União Democráti-ca) de Salih Muslim, dos quais um terço de mulheres, defendem pé a pé e casa por casa a cidade contra os islamistas do EI, poderosamente armados com mate-rial capturado ao exército iraquiano após a tomada de Mossul. A menos de um quilómetro, os blindados turcos observam o desenrolar da batalha, filtrando os civis sírios que fogem dos combates e tratando de impedir os voluntários, curdos e não só, que se infil-tram através da fronteira para ir lutar ao lado dos seus «irmãos» de Kobani. Para o Presidente turco Recep Tayyip Erdogan, que recusou participar na coligação anti-Estado Islâmico, este e o PYD são farinha do mesmo saco, duas organizações terroristas.

A queda de Kobani era tida como inevitável e talvez desejável (o secretário de Estado norte--americano John Kerry disse que a cidade não ti-nha importância estratégica, e a França considerou que intervir na Síria contra os jiadistas fortaleceria o regime de Damasco) mas a heroica resistência dos defensores de Kobani acabou por vencer.

O presidente do Curdistão iraquiano, Massud Barzani, apelou à intervenção internacional e os EUA começaram a envolver-se na batalha arrastando con-sigo os «aliados» árabes, primeiro com bombardea-

A batalha de Kobani e o orgulho curdo

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O Ocidente não achou oportuno intervir para salvar Kobani quando os jiadistas cercaram a terceira maior cidade curda síria

64 novembro 2014 – África21

mentos (23 de setembro) e, um mês mais tarde, for-necendo armamento e material médico aos defensores de Kobani.

Só a Turquia se mantém de pedra e cal, critican-do as iniciativas americanas e negando a utilização da base da NATO de Incirlik pelos aviões da coligação. Para Erdogan, o PYD é um braço do PKK (Partido dos Trabalhadores Curdos) com o qual esteve em guerra durante 30 anos, e apesar do frágil processo de reconciliação iniciado em 2013 devido ao apelo de Abdullha Oçalan – líder histórico do PKK, o «Nel-son Mandela dos Curdos» preso desde 1999 –, aju-dar o PYD equivale a reforçar os «terroristas» do PKK e desestabilizar a Turquia.

A Turquia diz alto e bom som o que muitos aliados dos EUA na região também pensam: que há curdos «bons» e «maus» e que não devem ser tratados todos da mesma forma. O protótipo do curdo «sim-pático» é Massud Barzani, atual presidente do Cur-distão Iraquiano, amigo do Ocidente, de Erdogan e de Israel, e inimigo jurado do Irão e dos xiitas iraquia-nos no poder em Bagdade, que se faz chamar «pai dos curdos» e não esconde a ambição de vir a ser o pri-meiro presidente de um Estado curdo totalmente independente.

O PYD, que aproveitou a guerra civil na Síria para criar um embrião de Estado no norte do país, chamado Rojava, e se declara politicamente indepen-dente de Damasco e da oposição síria apoiada pela Turquia e o Ocidente, tem muitos adversários, mes-

mo entre os curdos e na Síria. Mas o pior é que o seu modelo de «autonomia democrática» aliando socia-lismo, laicidade, ecologia, feminismo e autogestão pode constituir, se tiver sucesso, um mau exemplo, para todos os curdos e os outros povos da região.

Por isso, Ankara quer acabar com o Rojava, dei-xando o Estado Islâmico fazer a «limpeza»; se não for possível exige em troca do seu apoio militar que o PYD rompa as relações com o PKK, reconheça a lide-rança do PDK de Massud Barzani e coloque os seus combatentes sob o comando do Exercito Sírio Livre.

Demasiado tarde? Apesar dos entraves turcos, Kobani resiste e o Pentágono afirma que os curdos controlam de novo a cidade; cada dia que passa au-menta o prestígio do PYD; o parlamento de Erbil reconheceu o Curdistão ocidental (Rojava) e deu luz verde ao envio de peshmargas (tropas curdas iraquia-nas) para Kobani através da Turquia; os Estados Unidos já falam diretamente com o PYD, conside-rando-o um ator incontornável da guerra contra o Estado Islâmico.

Na Turquia e na diáspora, a juventude curda ferve de admiração pelos heróis de Kobani; a atitude de Erdogan provocou manifestações de protesto que degeneraram em confrontos com a polícia e um saldo de dezenas de mortos. Só Oçalan, na sua prisão, acredita que a crise pode acelerar a solução definitiva da questão curda. É difícil prever como acabará a história, mas uma coisa é certa: o nome de Kobani ficará na história do povo curdo.

recep Erdogan recusou participar na coligação anti-Estado Islâmico porque considera que EI e PYD são duas organizações terroristas

O Presidente francês François Hollande e o Presidente do Curdistão Iraquiano, Massud Barzani, numa conferência de imprensa conjunta

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Educação e Formação a Crescer com ela

Pela diversificação da Economia, Intensifiquemosa Produção Agro-pecuária

Lunda - Norte, Terra de Esperança,a Semente que Germina para o Desenvolvimento do País

66 novembro 2014 – África21

O Plano Nacional de Desenvolvimento, PND, abrange um conjunto de acções para incentivar o desenvolvimento sustentável do sector hoteleiro e turístico no nosso país. São investimentos que vão garantir uma nova política para o sector, permitindo o surgimento de uma oferta turística diversi�cada que integre praias, património cultural, desporto, ambientes naturais e lazer. Como resultado, Angola vai aumentar o número de unidades hoteleiras, incrementando a criação de empregos no sector e o número de visitantes.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO

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embro-me de uma noite, durante a ditadura sala-zarista, em que conversando com uns colegas,

todos advogados num processo no Plenário – um tri-bunal especial para ‘julgar’, quer dizer: condenar, os que combatiam a tirania, e no qual os ‘juízes’ faziam o que a tenebrosa polícia política mandava... –, veio à fala uma das figuras gradas do regime, cujas malfeito-rias íamos passando em revista. E um dos circunstan-tes, ao rol delas acrescentou: «E ainda por cima é burro»... Então, de imediato, notei ou respondi com uma frase que haveria de repetir muito, e talvez por isso me lembre dessa primeira vez em que a disse: «Num fascista, a estupidez não é um defeito, é uma atenuante».

Claro que, assim sendo, manda a lógica concluir que a inversa também é verdadeira. Ou seja: «Num fascista, a inteligência não é uma qualidade, mas uma agravante». O que se aplica ao autor de qualquer crime. E com isto não estou a afirmar, ou sequer insinuar, que os sim-ples defensores de ideologias ou regimes desse tipo, ou de qualquer outro, só por isso devam ser conside-rados criminosos, pelo menos em sentido jurídico--penal, mesmo quando essas ideologias e esses regi-mes de facto o são.

Bom, mas essa é outra conversa e entrar por aí le-var-nos-ia longe. Ora, não estou aqui a escrever um ensaio curto, antes apenas uma crónica, na qual os lei-tores já saberão onde quero chegar. Embora uma cró-nica não tenha que chegar a sítio nenhum e algumas das melhores crónicas dos grandes cronistas tenham como assunto exatamente a falta de assunto... E já agora que falei em burrice, inteligência e avaliação de pessoas, recordo uma história que acho excelente e dá bem o retrato, num certo aspeto, da personalidade de um dos maiores poetas de sempre da nossa língua: So-phia (de Mello Breyner Andresen).

A autora do Livro Sexto parecia (quase) sempre ausente, distante, pouco atenta ao que se passava à sua volta, pairando. E era de facto muito distraída; ape-nas, no entanto, no dia a dia e para o acessório. Uma vez, numa roda de amigos, referindo-se um conheci-do político, um deles sublinhou a sua falta de caráter. A que outro contrapôs – «mas é muito inteligente». Sophia, que fumando o seu cigarro e vendo as bolas

de fumo dissolvendo-se no ar parecia não estar a ouvir nada e se tinha mantido sempre silenciosa, suspendeu o gesto de levar o cigarro à boca e disse, ou disparou: «Inteligentes são os cães».

Onde quero chegar, então, é a um dos piores ma-les das nossas sociedades, um dos que – se não o que – mais afeta a política e certos políticos, assim consti-tuindo um verdadeiro «cancro» da democracia; ou,

sob outro ângulo, pela forma como se propaga e como contamina, um «ébola» da democracia. Refiro-me à corrupção. E também quanto a ela, quanto à ânsia incontida de um cada vez maior enri-quecimento, sem olhar a meios, nem olhar à pobreza ou miséria circundan-tes, creio poder-se dizer o que antes deixei dito. Também quanto aos cor-ruptos, os que só pensam em aumentar as suas fortunas fabulosas, explorando e enganando os outros, ou pelo menos ignorando-os, tendo como único obje-

tivo a satisfação das suas ambições e o próprio jogo constante em que enriquecer cada vez mais se torna, também quanto a esses insisto, a estupidez só pode ser uma atenuante e a inteligência uma agravante.

Só que, em matéria de corrupção e fortunas fabulo-sas, é difícil alguém ir longe sendo burro; e para ir longe não é preciso ser inteligente mas esperto, ter jeito para os negócios & similares – e não ter escrúpulos. Por outro lado, a gravidade dos seus atos e a severa conde-nação que a todos os títulos merecem, cresce quando se trata de pessoas cujo passado, até cujas lutas travadas a favor de causas justas, criaram a expectativa de que se-riam dignos dele, passado, e delas, lutas, não se trans-formando em exemplos do pior de sociedades desuma-nas, com terríveis desigualdades e injustiças, na selva de uma economia de casino e de usura.

A crónica de josé Carlos de vasconcelos

A estupidez como atenuante

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A corrupção é um verdadeiro «cancro» da democracia; ou, pela forma como se propaga e como contamina, um «ébola» da democracia

68 novembro 2014 – África21

Consolidar a reforma do sector judicial, tornando-o mais ágil e moderno para garantir o acesso dos cidadãos ao direito e à justiça, é um dos propósitos do Plano Nacional de Desenvolvimento, PND. Entre os objectivos está o de assegurar a cidadania plena através da universalização do registo civil de nascimento e do acesso a documentos básicos como o bilhete de identidade. Com as acções do PND para esse sector, mais um milhão e meio de cidadãos e cidadãs passarão também a ter bilhete de identidade. Para além de modernizar e informatizar os serviços notariais, está previsto o aumento do número de conservadores e notários, bem como o de o�ciais de registo.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO

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om apenas onze votos contra, a Assembleia-geral da ONU pôs-se a favor dos mais fracos e

apoiou uma proposta argentina que promove a criação de um marco jurídi-co multilateral para regular os processos de reestruturação de dívida soberana.

Isso aconteceu a 9 de setembro, e teve a sua origem numa disputa entre o país sul-americano e um grupo dos chama-dos «fundos abutre», em que a Justiça dos Estados Unidos decidiu a favor des-tes últimos. Mas não é tudo. A 26 de setembro, outro órgão da ONU, o

Conselho de Direitos Humanos, deci-diu «investigar as atividades destes usu-rários internacionais e as consequências das suas ações sobre os povos do mun-do». Nesta instância, houve cinco votos contra e, como na primeira, os donos do derrotado NÃO foram comandados pe-los EUA. Nos dois casos, o SIM foi im-pulsionado pelos países sul-americanos.

Como chegou o tema à ONU? De-pois de ter permanecido quatro anos em estado de cessação de pagamentos (em default), a Argentina começou, a partir de 2004, a pagar pontualmente aos seus credores externos. Para tal, tinha chegado a uma bem-sucedida reestruturação da sua dívida. Agora, no entanto, e naquele que poderá ser caso único na história do capitalismo, um juiz de Nova Iorque impede o país de continuar a honrar os seus compromissos. Como tem feito desde há quase dez anos, a Argentina de-positou 539 milhões de dólares no Bank of New York. Isso correspondia a um dos pagamentos semestrais acordados com 92% dos credores, e o banco devia enviá--los a cidadãos de todo o mundo que compraram títulos da dívida argentina e

argentina

Um passo em frente contra os abutres

Pela primeira vez em muito tempo, ou na história da ONU, os países fracos atuaram em uníssono e perceberam que a agressão dos grandes especuladores globais – os fundos abutre – à Argentina era uma agressão a todos. Com a

oposição dos Estados Unidos e dos seus amigos do Norte, irão agora tentar «domesticar» os «usurários internacionais».

Manrique s. Gaudin BUENOS AIRES

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70 novembro 2014 – África21

participaram na sua reestruturação. Mas o juiz ordenou ao banco que retivesse o dinheiro. Como quer e precisa de conti-nuar a pagar, a Argentina decidiu recor-rer à ONU.

De qualquer forma, é preciso ir ainda um pouco mais atrás. Este processo que terminou com semelhante «aberração ju-rídica», como a qualificou o governo ar-gentino, começara em 2001, quando o país rebentou após uma década de orto-doxia neoliberal, com endividamento, privatização de bens do Estado, desregu-lação da economia e flexibilização do mercado laboral. Depois de três dias em que a desobediência civil acabou por ser acalmada a custo de uma trintena de

têm direito a que o seu título seja equipa-rado a qualquer outra oferta melhor que se faça aos 7,6% que não participaram no acordo, ou seja, aos fundos abutre. Nesse caso, a dívida passaria a ser de 500 mil milhões de dólares, quase 17 vezes as re-servas internacionais.

Um país que paga as suas dívidas, que tem crescido a ritmo sustentável e que acumulou reservas como nunca, não po-deria pagar e entraria em bancarrota.

A proposta de criação de um quadro jurídico multilateral chegou à ONU através do G77+China e estabelece que, à falta de mecanismos apropriados, o mundo deve intensificar os seus esforços para prevenir as crises de dívida. No de-bate ocorrido na Assembleia-geral das Nações Unidas, pairou um pensamento expressado dias antes pelo norte-ameri-cano Mark Weisbrot, diretor do Centre for Economic and Policy Research. O politólogo recordou que «na maioria dos países existem leis de falência conce-bidas para permitir que as empresas que têm dívidas que não podem pagar, pos-sam passar uma borracha e começar de novo, mas não existe um mecanismo assim para os países, pelo que os acordos de reestruturação, como o argentino, são uma boa forma de resolver proble-mas de dívida impagáveis». Segundo Weisbrot, prosseguindo-se o caminho traçado pela Justiça dos EUA, a sua sentença teria «um efeito devastador».

Enquanto as resoluções da ONU recebem apoios inesperados como o do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial, os abutres valeram-se dos seus bons amigos argentinos para dar início ao que o Governo chamou «o plano abutre da destabilização».

A campanha começou a 18 de setem-bro no diário La Nación e continuou nos dias seguintes com o seu colega Clarín.

O primeiro apresentou a impactante man-chete «Travão à compra de dólares limita venda de passagens aéreas». Explicava que a medida tinha sido tomada pela Ameri-can Airlines, que «limitou a 90 dias a compra antecipada de voos a partir de ou para Buenos Aires» e que «podia seguir-se--lhe empresas de turismo que não querem ficar com pesos, porque não sabem quan-do nem a que tipo de câmbio conseguirão transformá-los em dólares». O discurso manteve-se apesar da American Airlines ter continuado a vender bilhetes como sempre e do Governo ter esclarecido que não havia restrições para o pagamento de passagens aéreas nem de pacotes turísticos e que para esse efeito «vão-se entre 24 a 26 milhões de dólares por dia».

O Governo estava prevenido sobre a investida dos abutres e dos seus amigos locais. A Presidente Cristina Fernández de Kirchner fora avisada pelo ex-secretá-rio do Comércio dos EUA, Carlos Gu-tiérrez, hoje lobista dos fundos especula-tivos. Em agosto, antes de se dar a conhecer no seu novo papel, e para cair nas boas graças do Governo, Gutiérrez dissera que os fundos abutre lançariam um plano que visava desgastar a figura da Chefe de Estado, difundir uma onda de rumores para gerar instabilidade econó-mica e contratar jornalistas, políticos e sindicalistas para que atuassem contra o Governo. Tudo foi acontecendo como indicara Gutiérrez, e à tarefa dos media, somaram-se o dirigente sindical Luis Barrionuevo e o senador da oposição Er-nesto Sanz, que auguraram que «antes do fim do ano haverá uma explosão social» (Barrionuveo) e «haverá que ver como termina o Governo» (Sanz).

Tradução de Teresa Souto

O Governo argentino estava prevenido sobre a investida dos abutres e dos seus amigos locais

Um juiz de Nova Iorque impede um país de continuar a honrar os compromisos, o que poderá ser caso único na história do capitalismo

As resoluções da ONU receberam apoios inesperados vindosdo Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial

mortos, em apenas de uma semana a crise «comeu» cinco presidentes e o último dessa série patética decretou o default.

Ao fim de dois anos de um governo interino, assumiu a Presidência Nestor Kirchner, que em 2004 convidou os cre-dores a participar num processo de rees-truturação da dívida. Desse mesmo pro-cesso estiveram ausentes os fundos abutre à espera de poder reclamar montantes exorbitantes pelos seus títulos da dívida.

No entanto, a Justiça estado-uniden-se entendeu que o pedido deles era justo. O cumprimento da sentença obrigaria a pagar 1300 milhões de dólares a 1% dos abutres. Automaticamente, esse montan-te passaria a ser de 15 mil milhões de dólares, porque o pagamento deve esten-der-se a 7,6% dos titulares não reestrutu-rados. Esse valor equivale a 52% das re-servas do país. Mas isso não é tudo, porque o efeito cascata continuaria. Ao pagar-se os 1300 milhões, dispararia uma cláusula do acordo assinado com os cre-dores reestruturados, que estabelece que

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África21– novembro 2014 71DÁ O SALTO EM SAPO.AO

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72 novembro 2014 – África21

Alinhar a sensibilidade e o humanismo que se reque-rem na medicina, o rigor no

cumprimento das leis, próprio das ciências jurídicas, e as valências da economia na prestação de servi-ços de consultoria não é tarefa fá-cil. Mas é precisamente esse o de-safio da Crystal Solutions. Aliás, é o que tem desenvolvido desde que foi fundada há quatro anos. «Pe-gamos nesses três conceitos pa-ra criar uma empresa que apresen-te soluções inovadoras para a so-ciedade, e que se rege por uma conduta de transparência, onde os

valores éticos e morais são a base da nossa personalidade. Achámos pertinente criar algo que se identi-fica com aquilo que somos. Criar ideias claras, ideias que não dei-xem nenhuma dúvida, mas sempre olhando para aquilo que é a nossa realidade», explica Pedro da Silva, diretor-geral da Crystal Solutions, quando questionado sobre o surgi-mento da empresa.

Criada para ser uma empresa que responde às necessidades das organizações e dos gestores ango-lanos, com as suas especificida-des próprias, a Crystal Solutions

está assente em três pilares es-senciais: consultoria, serviços e investimentos.

No que diz respeito à consulto-ria, a empresa fundada por Pedro da Silva (MBA) e Augusto Maquen-go (PhD) prepara projetos para ban-cabilidade, estudos e análise de via-bilidade de investimentos, estraté-gias corporativas e análise econó-mica e financeira de projetos. Presta ainda serviços nas áreas de tecnolo-gia e inovação, formação e capaci-tação corporativa, comercialização e promoção. A Crystal Solutions de-dica-se igualmente à intermediação

Chama-se Crystal Solutions, foi fundada há quatro anos e assenta o seu trabalho em três pilares essenciais: consultoria, serviços e investimentos.

adriano de sousa

Há quatro anos a cuidar da saúde das empresas

Para Pedro da Silva, diretor-geral da Crystal Solutions, uma consultoria corporativa ajuda a potenciar os gestores e as empresas

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publirreportagem

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financeira em projetos de investi-mento e em participações.

Tal como um médico que es-cuta atentamente o paciente, de-senvolvem-se trabalhos adicio-nais sobre os sintomas, e os con-sultores, dentro do que é legal-mente exigido e aceitável, apre-sentam soluções economicamen-te viáveis às empresas. Como diz o próprio diretor-geral, «não há um formato standard de trabalho, não há modelos prontos; as soluções apresentadas ajustam-se à reali-dade de cada caso».

Na sua opinião, «hoje o empre-sariado angolano tem concorren-tes já com uma capacidade de in-vestimento e de conhecimento muito elevada. Estamos a falar de países com anos de tradição. Há empresas com mais de 100 anos de existência e com estruturas muito superiores às nossas. Neste cenário, pensamos que uma con-sultoria corporativa ajudaria a po-tenciar os gestores e as empresas no sentido de poderem equiparar--se aos concorrentes ou igualá--los. É bem verdade que muitos empresários vão para fora à pro-cura de parceiros, mas por desco-nhecimento de algumas práticas e técnicas inerentes ao próprio ne-gócio entram logo em desvanta-gem nessas parcerias», defendeu.

Principais serviçosAlém de prestar consultoria a inú-meras empresas que atuam no mercado nacional e internacional, a Crystal Solutions desenvolveu dois produtos tecnológicos e inovado-res que são um conjunto de três soluções integradas e interligadas: a Solução Oscarweb, a Solução PcCont e Serviços Tecnoconta, di-recionadas para as instituições fi-nanceiras não-bancárias.

Estas soluções têm contribuí-do para o melhoramento da eficá-cia e da eficiência das empresas,

sobretudo das que atuam nesse ramo.

Apercebendo-se da emissão por parte do Banco Nacional de Angola de um instrutivo que obriga as casas de câmbio a adotar o no-vo plano de contas das Instituições Financeiras (CONTIF) e a apresen-tar as informações operacionais e contabilísticas em ficheiros eletró-nicos em formato XML, a Crystal Solutions criou uma solução que atende a essas exigências. É o I’m Back Office, para o registo dos mo-vimentos diários. Um módulo de processamento contabilístico que já se encontra apto para responder às solicitações do BNA fornecen-do, mensalmente, os novos Mapas de Posição Cambial e, trimestral-mente, os Balanços Contabilísti-cos, segundo as regras do CONTIF, e envolvendo serviços de contabi-lidade prestados por técnicos alta-mente especializados e conhece-dores do novo normativo.

Como avançado acima, a solu-ção Oscarweb é, na verdade, um conjunto de três soluções, que in-terligadas tornam a vida dos ges-tores bem mais fácil. Para simplifi-car: a solução OSCAR é uma solu-ção ERP (Sistemas Integrados de Gestão Empresarial, do inglês Enter-prise Resource Planning) composta por três componentes integrados que fazem dela uma solução úni-ca no mercado. A OscarWeb (front office) é uma solução de balcões que funciona em ambiente web, com um interface amigo do utiliza-dor e extremamente funcional. Pa-ra além das operações de compra e venda de moeda, a solução de balcões contempla as várias ope-rações da atividade de uma agên-cia, como sejam os fluxos com ou-tras agências ou ainda a gestão de fundos de maneio de pagamento de despesas. Já o PcCont (Back office) é um software de contabi-lidade completamente integrado

Há quatro anos a cuidar da saúde das empresas

com a solução OscarWeb que elimina a duplicação de lança-mentos e permite o integral cum-primento dos requisitos do norma-tivo CONTIF.

A interligação do OscarWeb com o PcCont possibilita que os movimentos realizados sejam au-tomaticamente integrados na con-traparte. Assim é possível uma gestão efetiva dos valores dispo-níveis e informação just in time.

No PcCont são ainda realiza-das as restantes operações da empresa de uma forma simples e intuitiva. Antes da solução da Crystal Solutions, a maior parte dos softwares utilizados nas ca-sas de câmbio eram importados, só que, de tão sofisticados que eram, às vezes surgiam constran-gimentos ao se aplicarem à rea-lidade angolana. Havia excessi-va dependência desse software e muitos tinham até servidores nou-tros países. «O nosso software es-tá totalmente integrado quanto à nossa realidade, porque antes da sua conceção fez-se um estudo abrangente e complexo. Criámos algo completamente diferente, e para tal olhámos para fatores co-mo o nível educacional da popu-lação, a dimensão das empresas, as insuficiências tecnológicas do país ou os problemas de comuni-cação. Com esses dados criámos esta solução tecnológica à medi-da», conclui Pedro da Silva.

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74 novembro 2014 – África21

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OGE de Angola prevê receitas superiores a 40 mil milhões de dólaresO Conselho de Ministros angolano apreciou no final de outubro a proposta de Lei do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2015, que prevê receitas de quatro biliões de kwanzas (cerca de 40 mil mi-lhões de dólares) e despesas em torno dos cinco biliões de kwanzas (cerca de 50 mil milhões de dólares). Relativamente ao setor petrolí-fero, espera-se um crescimento de 9,2%, enquanto para o setor não petrolífero se projeta um aumento de 10,7%; daqui resulta uma es-timativa da taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 9,7%. O défice público está estimado em 7,6% do PIB.

Segundo o ministro das Finanças, Armando Manuel, apesar de a economia global continuar a ser caracterizada por alguma incerteza, Angola prevê um crescimento satisfatório para 2015. «Na perspetiva do curto do prazo, o Executivo tem acauteladas as medidas que per-mitem assegurar a estabilidade da economia», disse o ministro, em conferência de imprensa. A baixa do preço do petróleo, registado no mercado internacional, que obriga a «contenção» e «racionalidade» nas contas do próximo ano, levou o Executivo a ajustar a composição da despesa. Nesse sentido, prevê-se assegurar os programas de conti-nuidade, mas limitar a entrada de novos projetos, tendo em conta que a receita não petrolífera ainda não é suficiente para fazer face a uma perda significativa na receita petrolífera. No que respeita às despesas, o ministro indicou que o OGE de 2015 se concentrará na área social, que deverá corresponder a 34% da despesa total.

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Armando Manuel, ministro das Finanças

Emirates à conquista de África A transportadora aérea do Dubai, que assumiu por dez anos a gestão da angolana TAAG, mediante um acordo de parceria estratégica, revelou a intenção de aumentar a sua presença nos países africanos com a abertura de novas linhas, o aumento da frequência dos voos e da capacidade das aeronaves utilizadas para responder à procura crescente. Presente em África desde 1986, com a ligação Cairo-Dubai, a Emirates serve atualmente 24 destinos no continente, mas pretende aumentar a sua quota no mercado de maior crescimento do mundo, como afirmou o presidente da companhia Sheik Ah-med bin Saeed al-Maktum.

Desde 1 de outubro, a capacidade da linha Dubai--Abuja (Nigéria) foi aumentada com a afetação de maiores aparelhos. A 26 de outubro, a Emirates dupli-cou a sua oferta sobre a linha Dubai-Casablanca, criada a 1 de setembro, com dois voos diários, elevou para 49 voos semanais a frequência dos seus voos para a África do Sul, com quatro ligações diárias entre Dubai e Joa-nesburgo. Na mesma data, a entrada em serviço de um segundo A340 (com 14 lugares de primeira classe e 76 de Business Class) nos seus voos para as Maurícias per-mite à Emirates proporcionar a maior oferta para os clientes mais afortunados que procuram este destino considerado «de luxo», o mesmo acontecendo com as Seychelles, onde a frequência semanal foi aumentada de 12 para 14. Finalmente, os voos diários para Dar es Salam foram reforçados em quatro voos suplementares por semana.

A Emirates espera aproveitar as sinergias com a TAAG para desenvolver as interconexões regionais e conquistar partes do mercado africano atualmente deti-das pelas grandes companhias europeias e algumas africanas como a sul-africana SA Airways, a marroquina RAM e a Ethiopian Airlines. Todas estas companhias têm já Luanda nos seus roteiros, mas a Emirates, pri-meira companhia a operar em África com o A340, po-derá ganhar vantagem sobre a concorrência quando o novo aeroporto de Luanda estiver concluído e apto para receber o super-jumbo.

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A cada vez menos discreta Bolsa Internacional do Turismo de An-gola - Okavango tem-se agigantado a cada edição. Na edição de 2014, realizada entre 9 e 12 de outubro, ficou clara a tendência de crescimento e o espaço que o certame vem conquistando no cenário económico e social do país. Os números e factos falam por si.

Em 2014, houve 80 empresas expositoras (mais dez que na edição anterior). Em termos de área, foram este ano disponibiliza-dos perto de 6000 m2, enquanto em 2013 os expositores dispu-nham de um espaço bem mais reduzido. Outro facto digno de nota é a autonomia da Okavango em relação a outras feiras. Na primeira edição do evento, que na época se chamava “Bitur”, decorreu em simultâneo com a Feira Internacional de Minas de Angola (FIMA), e no ano seguinte acompanhou a primeira edição da Feira dos Municípios e Cidades. Nesta terceira edição foram dois pavilhões só para o turismo, sem holofotes nem protagonismo a partilhar.

«Uma realidade, um desafio, uma oportunidade, uma fonte de receitas e empregabilidade» foi o tema central do evento que tem como principal objetivo promover o desenvolvimento da indústria hoteleira. O fomento do turismo local, visando um maior conheci-mento do potencial paisagístico e de riqueza de cada uma das 18 províncias, sobretudo os monumentos históricos, e a promoção da gastronomia também esteve na lista dos objetivos delineados pelo Ministério da Hotelaria e Turismo.

Bolsa do Turismo de Angola ganha maior notoriedade

A Okavango contou com a participação de empresas ligadas ao setor do turismo, entre prestadoras de serviços, companhias aéreas, agências de viagens e turismo, empreendimentos turísticos e hote-leiros, entre outros setores vindos de Cabo Verde, Portugal, África do Sul, Moçambique e Espanha, além dos nacionais. Os debates não faltaram, com palestras sobre «O papel do associativismo nas dinâmicas sectoriais e locais», «Organização de destinos turísticos», entre outros temas.

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76 novembro 2014 – África21

Elevar os níveis de segurança alimentar e combater a pobreza é uma das prioridades do Plano Nacional de Desenvolvimento. Até 2017, o PND vai, entre outras acções, promover o desenvolvimento comunitário das aldeias rurais para assegurar a sua integração no resto do país. Serão 91 as aldeias rurais construídas ou requali�cadas, totalizando mais de 15 mil habitações. Para além disso, o PND vai valorizar o papel da mulher rural, estimular o associativismo e o cooperativismo e garantir o acesso dos camponeses ao microcrédito.

Um plano grandioso para umpaís que pensa em grande.

PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO

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FMI otimista em relação a Angola A economia angolana deverá registar um crescimento de 7% ao ano até ao final de 2015, afirmou o diretor-adjunto da institui-ção, Naoyuki Shinohara, no termo de uma visita a Luanda em outubro. O responsável do FMI disse que «o setor não-petrolífero de Angola desenvolveu-se de forma notável e es-peramos que a tendência se mantenha de for-ma a reduzir a dependência do setor petrolífe-ro e a continuar a investir nas atividades não petrolíferas». Considerando que a redução das receitas petrolíferas não deve afetar seriamente o desempenho da economia angolana baseada no planeamento a médio e longo prazo, Naoyuki Shinohara salientou que Angola deve permanecer firme na continuação deste processo porque está confrontada com inúmeros desafios, sendo os mais importantes a redução das desigualdades, da pobreza e do desemprego.

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Pressões sobre a OPEP para reduzir a produção A Organização dos Países Exportado-res de Petróleo, que se reunirá em Viena de Áustria a 23 de novembro, está sob pressão para reduzir a produ-ção de forma a suster a queda dos preços do crude que recuaram 27% desde junho. Responsável por cerca de um terço da produção mundial e em particular a Arábia Saudita, pri-meiro exportador, a OPEP tem até agora recusado fechar a torneira, considerando que a atual sobreprodu-ção, estimada em 600.000 barris/dia, e provocada pelo abrandamento da economia mundial e a redução das importações dos Estados Unidos, não justifica uma redução das quotas de produção dos países membros do cartel, que implicaria uma perda de partes de mercado em benefício de produtores não-membros.

Segundo os especialistas, assiste-se a um braço de ferro entre produtores convencionais, com custos de produ-ção relativamente baixos (entre 20 e 30 dólares/barril) e não convencionais, à cabeça dos quais se encontram os Estados Unidos, que lideram a produ-ção de gás e crude de xisto (shale) com custos marginais elevados (da ordem dos 80 dólares/barril). O preço atual é prejudicial aos países fortemente de-pendentes das exportações de petróleo entre os quais Angola, Nigéria e Argé-lia, que elaboraram os seus orçamentos para 2014 na base de preços superiores aos atualmente praticados nos merca-dos internacionais.

Grindod apresenta comboios de baixo consumo As carências existentes em matéria de transportes ferroviários em África e o desenvol-vimento de novos projetos mineiros de grandes dimensões no continente abrem óti-mas perspetivas para as empresas especializadas na produção de material ferroviário, como estimam os dirigentes do grupo metalúrgico sul-africano Grindrod. O grupo, cotado na Bolsa de Joanesburgo, apresentou ao público a 21 de outubro em Pretória o seu novo modelo de locomotiva económica, a GS7, que permitirá economizar entre 30 e 40% de combustível em relação aos modelos já existentes. A questão dos custos de exploração é particularmente importante para a concretização e a rentabilização dos planos de desenvolvimento do transporte ferroviário aprovados por vários países afri-canos, dada a importância dos investimentos necessários, a forte concorrência do transporte rodoviário e a existência de margens diminutas.

Utilização do gás no transporte marítimo A Argélia estuda a possibilidade de se lançar na comercialização e distribuição de GNL (gás natural liquefeito) como carburante para o transporte marítimo, anun-ciou o secretário-geral do Ministério da Energia durante um seminário internacio-nal organizado em outubro pela Naftal, filial da empresa pública de petróleo argeli-na SONATRACH. «Trata-se de uma tecnologia emergente que começa a ser utilizada em alguns países e que oferece perspetivas promissoras aos países que dis-põem ao mesmo tempo de importantes reservas de gás e de portos equipados para abastecer os navios de passagem», precisou Ahmed Messali.

Segundo os dirigentes da Naftal, as recentes conferências mundiais sobre o ambiente e o aquecimento global levaram a um consenso acerca da necessidade de aumentar a utilização de energias limpas no transporte marítimo. Segundo o COE da Naftal, Saïd Akretche, a empresa, que dispõe de seis postos de abastecimento de combustível para navios nos seus portos, já foi consultada por vários armadores in-teressados na utilização do GNL pelas suas frotas comerciais. Pela sua posição geo-gráfica na proximidade do Estreito de Gibraltar, por onde passaram em 2012 mais de 220.000 navios, e a extensão do seu espaço marítimo, a Argélia tem condições para se tornar num ator maior na utilização deste novo carburante no transporte marítimo, segundo previsões dos especialistas.

78 novembro 2014 – África21

Aumenta participação estrangeirana Projekta Angola Kuwait e Paquistão foram as duas novas presenças estrangeiras a registar na última edição da Projekta Angola, feira sobre construção civil, obras públicas, urbanismo e arquitetura, realizada de 23 a 26 de outubro. Em termos absolutos, a participação estrangeira aumentou cerca de 30%, sendo Portugal o país que continua a constituir a maior represen-tação externa no evento.

Sob o tema «Projetar o futuro, construindo o presente», a Projekta contou com a participação de 502 empresas nacionais e internacionais dos setores da construção, imobiliário, decoração e mobiliário. Entre as novi-dades apresentadas pelos expositores consta o Enerbiz Pré-pago, um pro-duto desenvolvido para o mercado angolano, destinado à gestão e medição inteligente de eletricidade, água ou gás. Entre os dois pavilhões, com uma área de 16.000 m2 de exposição, destacou-se também a Load, uma empre-sa que atua de forma especializada no planeamento, produção, transporte e montagem de hotéis modulares.

No âmbito da Projekta foi também realizada uma conferência sobre «A Construção e o Imobiliário em Angola», que teve como principal obje-tivo identificar os pontos comuns no contributo para o desenvolvimento da economia nacional, assim como as sinergias existentes e oportunidades que ambos os setores aportam entre si.

insumos

MAIOREs BANCOs Sete bancos de Angola e um de Moçambique estão entre os 100 maiores de África, em capital social, de acordo com a revista African Busi-ness. No ranking liderado pelo sul-africano Standard Bank, constam os angolanos BESA (na 26.ª posição e que anunciou a alteração do seu nome para Banco Económico, na sequência da reestruturação do portu-guês Banco Espírito Santo); Banco Angolano de Inves-timentos (29.º), Banco de Poupança e Crédito (32.º), Banco BIC (41.º), Banco de Fomento Angola (42.º), Banco Millennium Angola (74.º) e Banco Privado Atlântico (77.º). O Millenium bim, único de Moçambique na lista, encontra-se na 57.ª posição.

FALsIFICAçÕEs Mais de 50% dos medicamentos para o gado disponíveis em África são falsos ou de qualidade inferior, revelou a Aliança Mundial das Medi-cinas Veterinárias, à margem da 6.ª conferência pan--africana sobre a agricultura animal, que se realizou na última semana de outubro. Mais de 500 participantes debruçaram-se sobre os meios necessários para me-lhorar a criação de gado, setor essencial para impulsio-nar a segurança alimentar e os rendimentos dos pe-quenos agricultores. recomendaram a adoção de programas para baixar os preços dos medicamentos veterinários e controlar e reprimir o comércio de falsificações.

GÁs NATURAL Moçambique lançou a 23 de outu-bro um concurso público para a adjudicação de cinco novas concessões para a exploração do gás natural. As concessões incluem 15 blocos e cobrem uma su-perfície de 76.000 km2. Dois dos blocos oferecidos estão situados na bacia offshore do rio rovuma, perto da fronteira com a tanzânia, onde a companhia italia-na ENI e a americana Anadarko descobriram enor-mes jazidas de gás. Os outros são localizados em áreas ainda inexploradas.

TURIsMO EM ÁFRICA Com 56 milhões de visitan-tes em 2013, a indústria turística continua a crescer a bom ritmo. As previsões apontam para um aumento das receitas de 4% a 6% em 2014. Moçambique foi o quinto país mais visitado em 2013, atrás de Marrocos que recebeu 10 milhões de turistas, África do Sul (9,5 milhões), tunísia (6 milhões) e Argélia (2,7 milhões). Zimbabwe, Quénia, Uganda e tanzânia completam o ranking dos 10 países mais visitados. África repre-senta atualmente 3% do mercado mundial em termos de receitas mas deverá aumentar até 2030 a sua participação até 7%, devido sobretudo à captação de mais turistas asiáticos.

África21– novembro 2014 79

press release

n 5.ª EDIçãO DO CONGREssO & EXPO GLOBALCOM ANGOLAO iir Angola realizou a 5.ª Edição do Glo-balcom Angola, o congresso anual para o mercado de telecomunicações em Angola, realizado no Skyna Hotel em Luanda a 28 e 29 de outubro, que abordou os temas mais atuais do setor assim como casos práticos internacionais. Angola encontra-se num ponto de transição muito importante para o desenvolvimento das infraestruturas de te-lecomunicações, existindo uma demanda crescente para melhorar a cobertura do ní-vel de qualidade, dos serviços de valor acrescentado e respetivos preços. O Glo-balcom Angola visa sobretudo que os parti-cipantes possam trocar opiniões com os decisores do mercado, identificar as linhas mestras de crescimento e adquirir as me-lhores práticas internacionais.

n CIÊNCIA E INOvAçãO NOs CUANZAsO projeto «Uma Viagem ao Mundo da Ciên-cia, tecnologia e Inovação» chegou às esco-las das províncias de Cuanza Sul e Cuanza Norte em Outubro. Esta é uma iniciativa do Ministério da Ciência e tecnologia (MINCt), com a parceria do Ministério da Educação, que pretende sensibilizar os jovens para o estudo das áreas científicas. trata-se de um programa sociocultural, que integra a apre-sentação de peças de teatro nas escolas, para demonstrar aos jovens que as áreas das ciências e tecnologias são opções de carreira muito válidas e devem ser conside-radas para a escolha das suas profissões, no

futuro. O programa está ser implementado no país desde abril. Já passou por onze pro-víncias de Angola e chegou agora a vez de mais de 11 mil alunos, de doze escolas, das províncias do Cuanza Sul e Cuanza Norte, fazerem “Uma Viagem ao Mundo da Ciência, tecnologia e Inovação”.

n III CONGREssO INTERNACIONAL DE sALsA E KIZOMBAO Péd´Salsa organiza em Luanda, pelo ter-ceiro ano consecutivo, o Congresso Inter-nacional de Salsa e Kizomba, com o objeti-vo de juntar professores, alunos e amantes das danças afro-latinas, nacionais e interna-cionais, proporcionando assim a interação pela troca de experiências e a divulgação

da cultura angolana. Serão quatro noites de festas afro- lat inas e quatro dias de workshops de dança e visitas à cidade de Luanda. A exemplo do que acontece a nível mundial, os encontros de Salsa e Kizomba, atraem aficionados de diferentes culturas, que têm optado pela aprendizagem destes estilos de dança. Participam no congresso professores profissionais vindos de Gana, Quénia, África do Sul, Estados Unidos, Venezuela, Cuba, Portugal e Espanha, com uma larga experiência em danças de salão.

n sEMANA EMPREsARIAL PORTUGAL ANGOLANo âmbito da sua estratégia de internacio-nalização, a Fundação AIP, através da AIP – Feiras Congressos e Eventos, organizou de 20 a 27 de outubro a Semana Empresa-

rial Angola Portugal, na qual participam mais de 40 empresas portuguesas dos setores da construção imobiliário, energia, ambiente, segurança, decoração e mobi-liário. No início da semana, as empresas por-tuguesas visitaram a província de Benguela

para encontros com as autoridades e em-presários locais, trocando opiniões e expe-riências sobre as oportunidades de negó-cios e investimentos. A 22 de outubro decorreu o Encontro Empresarial Angola Portugal, promovido pela AICEP, Embai-xada de Portugal em Angola e Fundação AIP, que juntou empresários convidados dos dois países. No resto da semana, o programa dirigiu-se para a 12.ª edição da PrOJEKtA by Constroi Angola.

n NIDO APOIA CONTOs TRADICIONAIsA marca NIDO® patrocinou um áudio-livro com histórias infantis angolanas, da autora Cremilda de Lima, diri-gido a crianças com mais de quatro anos. Durante os meses de outubro e novembro, os consumidores encon-tram este CD de oferta debaixo da tampa das latas de leite NIDO®. Para a empresa, trata-se de uma possibili-dade de reforçar a ligação com a cultura lo-cal e apresentar às crianças sete histórias tipicamente angolanas, escritas e contadas com palavras da nossa terra, que envolvem gatinhos e gaivotas, imbondeiros e balões e até o Pai Natal. Para a autora Cremilda de Lima, «o CD é um presente para as crianças e para os pais e um veículo cultural para transportar as raízes angolanas até às gerações mais novas». O leite NIDO® é comercializado em Angola desde 1955, e, em 2012, a Nestlé Angola inaugurou a primeira fábrica de processamento de leite em pó NIDO no país.

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Dr. Eng. Amílcar SafecaAdministrador e Director Geral Adjunto

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Eng. Arlindo AlvesDirector de Transmissão e Core

MOVICEL

Dr. Arlindo LopesDtor. Geral Interino

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Dra. Naiole SantosAdministradora

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Eng. Helder FigueiredoAssessor TécnicoTPA - TELEVISÃO PÚBLICA DE ANGOLA

Dr. Francisco ArmandoDirector ComercialANGOLA TELECOM

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Dr. Adilson SantosDirector Fábrica de RedesANGOLA TELECOM

Eng. Marcos António ChavesLíder da Área de EngenhariaANGLOBAL

Dr. Arménio Pereira FerreiraDirector ComercialANGLOBAL

Com a participação de

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Aldred DreyerCTO - Chief Technology Officer

NBC - NAMIBIAN BROADCAST CORPORATION

Com a INTERVENÇÃO ESPECIAL de

> O caso da Migração da TDT da NBC na Namíbia

Expositores

80 novembro 2014 – África21

Realizou-se entre os dias 21 e 24 de Outubro, no Centro de Convenções de Talatona (Luanda), a 2.ª edição do Congresso da Clínica Girassol, o “Girassol 2014”. O evento apresentou como intenção primordial demonstrar que o avanço das tecnologias da saúde não pode e não deve afastar a necessidade premente de garantir uma prestação de cuidados de saúde humanizada. Daí o lema escolhido para o evento: “Cuidados de Saúde Rumo à Excelência: Tecnologia e Humanização”. A iniciativa foi um enorme sucesso, reunindo mais de 2000 participantes, um número que mais do que duplica a participação registada no 1.º Congresso da Clínica Girassol, há dois anos.

Sob o lema “Cuidados de Saúde Rumo à Excelên-cia: Tecnologia e Humanização”, o 2.º Congresso da Clínica Girassol reuniu este ano no Centro de

Convenções de Talatona mais de 2 mil participantes, pro-curando reflectir a filosofia da instituição de saúde que o suporta, que procura diariamente aliar as melhores tecno-logias da saúde aos valores da humanização e da proxi-midade com o doente.

Na abertura do «Girassol 2014», o Secretário de Es-tado da Saúde de Angola, Dr. Carlos Alberto Masseca, garantiu que os princípios adoptados para a organiza-ção desta iniciativa não poderiam estar mais em linha com as estratégias e as ideias do Ministério de Saúde de Angola: “este congresso enquadra-se em todo um esforço que tem vindo a ser feito pelo executivo, no sentido de melhorar a qualidade de vida dos angolanos e a qualidade dos serviços de saúde prestados à popu-lação. Os conteúdos e os objectivos deste congresso encaixam-se naquilo que está contido hoje no Plano Nacional de Desenvolvimento 2013-2017, no Plano Na-cional de Desenvolvimento Sanitário 2012-2025, bem

Congresso da Clínica Girassol, em Luanda

«Girassol 2014» aliou tecnologia e humanização na saúde

África21– novembro 2014 81

como na política seguida para a formação de quadros elaborada pelo executivo até 2030”.

O governante sublinhou que a circunstância do «Gi-rassol 2014» estar centrado em assuntos como a exce-lência de cuidados, a tecnologia e a humanização poderá ajudar a promover um debate aprofundado que conduza à solução “daquele que é, provavelmente, o maior dilema do sistema nacional de saúde; o grau de satisfação dos nossos concidadãos”. Para o Dr. Carlos Alberto Masse-ca, é também de elogiar e agradecer a energia que a So-nangol E.P. colocou no apoio a este congresso, enquanto maior empresa nacional, “com responsabilidades acres-cidas na sociedade”.

Na ocasião solene, o Presidente da Comissão Orga-nizadora do evento, Dr. António Pedro Filipe Júnior, ex-pressou o seu agrado pelo facto de a iniciativa ter atingido uma magnitude considerável, sendo já uma indiscutível referência no panorama angolano dos congressos multi-disciplinares e um acontecimento bianual que figura entre os mais importantes fóruns de transmissão de conheci-mento na área da Saúde: “o lema do nosso congresso sumariza os desafios colocados à prestação de cuidados de saúde neste século. Se, por um lado, a evolução tec-nológica gigantesca que se observa nos últimos anos tem acrescentado valor à melhoria no tratamento e diagnósti-co, por outro, este desenvolvimento não pode descurar o paciente enquanto ser humano, com todas as suas espe-cificidades”. O Dr. António Pedro Filipe Júnior sublinhou também, perante o Secretário de Estado da Saúde, “a disponibilidade da Clínica Girassol em participar no pro-cesso de alerta e preparação para eventuais casos de Ébola e outras epidemias e, acima de tudo, para partilhar

do ponto de vista do Ministério da Saúde no que tange à relevância de aspectos ligados à sustentabilidade do fi-nanciamento do Serviço Nacional de Saúde, à necessida-de de formação contínua dos técnicos de saúde e à mu-nicipalização dos cuidados de saúde em curso no país”.

Grande participação internacional e uma área de exposição ímparSegundo uma das porta-vozes do Congresso, este even-to ambicionou desde o início ser “um fórum de transmis-são de conhecimentos, onde os profissionais pudessem discutir e abordar questões ligadas ao saber em Saúde e às novas tecnologias. Por outro lado, tivemos sempre a preocupação de aliar as questões das novas tecnolo-gias à humanização, à forma como tratamos os nossos pacientes e lhes oferecemos um atendimento humaniza-do”. A porta-voz recorda que o 2.º Congresso da Clínica Girassol trouxe várias novidades, inclusive encontros com especialistas e uma enorme participação de conferencis-tas internacionais: “tivemos um total de 170 prelectores, 63 dos quais oriundos de 11 países do estrangeiros”. A mesma realçou ainda a alargada área de exposição que esteve ao dispôr dos congressistas: “connosco tivemos uma mega-exposição, com mais de 1500 m2 de área e por onde se distribuíram 32 expositores, disponíveis pa-ra apresentar serviços, equipamentos, medicamentos ou softwares diversos. Ou seja, uma amostra topo de gama do que de melhor se faz hoje pelo mundo fora, no campo das tecnologias da saúde”.

Já o Vice-presidente do «Girassol 2014», Prof. Joa-quim Van-Dúnem, destacou a pertinência e a actualidade dos tópicos que a organização escolheu para moldar es-te congresso: “o lema do «Girassol 2014» mesclou dois componentes relevantes das práticas na Clínica Girassol. Tecnologia sem considerar como foco principal o doente pode, no limite, ser uma fonte de violência e exposição anti-ética. Humanização tem sido o pilar que norteia toda a estratégia de desenvolvimento da Clínica Girassol e a tecnologia não faz sentido se não estiver ao serviço da Humanização”.

Para o Director Executivo do Congresso, Dr. Vasco da Silva, o evento conseguiu superar tudo aquilo que fora conquistado na primeira edição da iniciativa, realizada em 2012, não só devido ao maior número de congressistas que marcaram presença em Luanda, mas sobretudo por se ter focado numa matéria que é crítica para os sistemas de saúde de todo o mundo: “o grande avanço do Con-gresso da Clínica Girassol, em 2014, passou por trazer o conhecimento sobre a evolução das tecnologias da saú-de e a sua aplicabilidade, no sentido de facilitar o diagnós-tico. O desafio hoje, em todo o mundo, é conseguir gerar bons hospitais. E o que é que as pessoas consideram como um bom hospital? É aquele hospital que consegue diagnosticar rápido, para tratar bem”.

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nova diretora executiva do Instituto Internacional de Língua Portuguesa (IILP) assumiu funções em outubro e promete prosseguir os objetivos de defesa e promoção da

língua falada por mais de 250 milhões de pessoas no mundo. De-pois de estudar os dossiês lançados pelo seu antecessor, Marisa Guião de Mendonça debruça-se agora sobre as linhas de ação do seu mandato de dois anos (2014-2016) e a gestão de um magro orçamento de cerca de 315 mil dólares, que resulta das contribui-ções dos Estados-membros.

Este será um dos dilemas para esta professora formada na área do ensino do português, uma vez que alguns dos países não cum-prem atempadamente o pagamento das quotas anuais, perfazendo uma dívida que, no mandato anterior, ultrapassava 600 mil dólares. O exercício será envidar esforços de captação de recursos financeiros adicionais para dar resposta aos desafios do IILP.

Este é um dos alvos da sua deslocação ao Brasil, marco do início de um périplo que a levará a visitar os demais países do grupo, al-guns dos quais – reconhece –, atravessam «grandes dificuldades» económicas. Com os meios que conseguir mobilizar, Marisa Men-donça procurará executar os planos anuais, com enfoque nos proje-tos lançados pelo seu antecessor, o brasileiro Gilvan Müller de Oliveira. Entre estes destaca o projeto VOC (Vocabulário Ortográ-fico Comum), um dos suportes de vantagens múltiplas para a im-plementação do acordo de uniformização da grafia.

O portal do Professor de Português – Língua Estrangeira/Lín-gua Não Materna também faz parte dos programas a prosseguir, para o qual já foram realizadas várias ações de formação. O que se pretende com esta plataforma, como explica, «é a produção de unidades didáticas, que promovam o ensino-aprendizagem da lín-gua portuguesa numa perspetiva muito mais integradora e muito mais intercultural».

InternacionalizaçãoDepois de iniciar funções, Maria Mendonça fez a sua estreia em Braga (norte de Portugal), numa conferência que avaliou as perspe-

tivas da língua portuguesa no plano nacional e mundial. A iniciativa partiu de uma Comissão Temática de Promoção e Difusão do Português da CPLP, em parceria com a Universidade do Minho, visando contribuir para alavancar a participação da sociedade civil em prol da língua comum.

A diretora executiva considera que, além do seu valor económi-co, «a língua portuguesa está a crescer a nível internacional», não só em número de falantes. A quantidade de países interessados em aderir à CPLP pode ser igualmente um fator de crescimento, que, na sua opinião, será notório em África, em países como a Namíbia, o Zimbabwe, Botswana e África do Sul, onde funciona uma rede de ensino do português apoiada pelo Camões – Instituto da Coopera-ção e da Língua.

A internacionalização da língua faz parte das linhas de ação do IILP, que vai continuar a trabalhar para o seu uso em fóruns e orga-nizações internacionais, de acordo com as orientações do colóquio realizado há dois anos em Luanda.

Na conferência de Braga também participou Lucas Nguema Bang, vice-primeiro-ministro encarregado do setor social e ministro da Educação e Ciência da Guiné Equatorial, com quem Marisa Mendonça abordou o compromisso de adoção e ensino do portu-guês, por ser esta uma das condições para a admissão do país, em julho deste ano, como o nono Estado membro da CPLP.

A executiva está a desenvolver contactos a vários níveis para preparar uma primeira missão de «bons ofícios» a Malabo, prova-velmente em 2015, com o objetivo de avaliar a implementação do extenso protocolo estabelecido com o Governo de Teodoro Obiang Nguema. Mendonça considera que a adesão à CPLP criou condições para que «o português venha a ter um nível de aceitação elevada e possa ser uma língua de comunicação na Guiné Equatorial».

Expansão pelo potencial económicoO Instituto Internacional de Língua Portu-guesa, sedeado em Cabo Verde, quer conquis-tar crédito a nível mundial. A moçambicana Marisa Mendonça, que agora assume o cargo deixado pelo brasileiro Gilvan de Oliveira, vai prosseguir a missão pela expansão da língua comum.

João Carlos

A

língua portuguesa

Marisa Guião de Mendonça, nova diretora do IILP

Dr

84 novembro 2014 – África21

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u nunca estive no cristo redentor!, foi isso que disse a Carolina, a representante da editora que

me foi receber ao aeroporto Carlos Drumond, na es-perança de que me levasse lá ao cimo. Já tinha ido várias vezes ao Rio, em missão diplomática, e nunca havia tido essa possibilidade.

A última vez que tinha estado nesta cidade tinha sido por causa de uma sessão promovida pelo grupo Tortura Nunca Mais, em que a Resistência Timorense também foi agraciada com um prémio simbólico pela determinação da sua luta contra o invasor indonésio. Fiquei hospe-dado no Leblon, na casa de um diploma-ta, cujo porteiro, de todas as vezes que me via entrar pela porta principal, mandava--me subir pelas traseiras. Soube depois que era por onde entrava o pessoal do serviço doméstico que, na sua maioria, era negro. Aper-cebi-me então que o luso-tropicalismo é mais folclore que outra coisa. Nesta sessão também participou o escritor e cronista Luís Fernando, filho do Veríssimo, o grande autor brasileiro que escreveu Olhai os lírios do campo, uma obra-prima da literatura universal.

O diplomata brasileiro recomendou-me que falas-se com o cronista do Estado de São Paulo, para que escrevesse uma coluna sobre Timor, na sua página semanal que era lida pela maioria dos leitores. A me-lhor forma de quebrar o bloqueio imposto pelo Ita-marati, que pendia no seu histórico pragmatismo para o lado da Indonésia, um dos dragões asiáticos. Coisa que nem todos os funcionários respeitavam, como era o seu caso. Assim também o fizeram sena-dores, deputados, ex-presidentes, religiosos, académi-cos, estudantes, jornalistas e intelectuais.

Falou com Luís Fernando? perguntou-me, termi-nada a sessão, no caminho para Leblon. Disse-lhe que não, dado que após a minha alocução, fiquei sem fala por causa da emoção. Estava de tal forma surpreendi-do, com a atenção e o silêncio dos presentes, que me esqueci de falar com o escritor. Aprendi que um di-plomata deve ser frio e calculista. Desde então decidi que não seria essa a minha carreira. Não tinha ne-nhum sentido de Estado. Demasiado emocional.

Tive a possibilidade de me redimir, quando me encontrei com Luís Fernando Veríssimo, em Paris,

numa sessão promovida pela inesquecível Solange Parvaux, quando se comemorou o ano do Brasil em França. Nessa altura a questão de Timor já estava re-solvida. Falei com ele sobre o episódio do Rio. Sorriu. Sorri também, com graça. Como quando leio o que

escreve nas suas crónicas sobre o tem-po e o modo brasileiro.

Cardoso, agora não vai dar para ir, disse-me Carolina, por causa das obras de restauração, dado que nos próximos tempos haveriam de ter lugar na cidade maravilhosa a Copa e os Jogos Olímpi-cos. Expressei o meu desalento dizen-do que era mesmo uma grande malda-de o que os brasileiros estavam a fazer ao Cristo Redentor.

A segunda. A primeira foi a mu-dança da capital para o interior. Se al-

guém presenciou e é testemunha de uma boa parte da história recente do Brasil, como a brutalidade da dita-dura militar e a luta pela restauração da democracia, foi mesmo o Cristo Redentor.

Quanta alegria e quanta tristeza guardou nos seus olhos. Se lhe estavam a fazer uma lavagem ao rosto só se fosse para se esquecerem do desastre do Maracanã, no ano de 1950, quando o Brasil perdeu a Copa para o Uruguai.

Não tive nada a ver com isto!, uma frase que ouvi, citada por uma cidadã do Brasil, sobre o Maracanazo. Creio que a autoria pertence ao Cristo Redentor.

A crónica de Luís Cardoso

Cristo Redentor

[email protected]

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Expressei o meu desalento dizendo que era mesmo uma grande maldade o que os brasileiros estavam a fazer ao Cristo Redentor

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86 novembro 2014 – África21

A Nova Movimento – empresa angolana proprietária da África21 – montou um sistema de recolha de assinaturas regionalizado, a fim de poder atender melhor, com mais rapidez e de maneira mais vantajosa, os diferentes assi-nantes da revista.

Assim, as assinaturas serão recolhidas, conforme os casos, em três centros: Luanda, Lisboa e Rio de Janeiro. Com exceção dos assinantes de Angola e Bra-sil, todos os demais receberão o seu exemplar pelo correio a partir de Lisboa.

Como os custos de envio também são variáveis, conforme as re giões, o preço das assinaturas é igualmente regionalizado.

Eis, a seguir, um quadro explicativo, com a tabela de preços das assinaturas e com os detalhes acerca dos centros onde os pagamentos deverão ser feitos, conforme os endereços dos assinantes.

Seja assinante

TABELA DE ASSINATURASREGIÃO SEMESTRAL ANUAL BANCO SWIFT CONTA IBAN / AGÊNCIA AGENTEAngola KZ 6.000 KZ 10.000 Keve BRDKAOLU 809026 AO 06004700000080902615124 MovimentoBrasil R$ 120 R$ 200 ITAÚ 69854-5 Agencia 0532 BELISANPortugal € 20 € 35

Millennium BCP BCOMPTPL 45371872997 PT 50003300004537187299705 TriangulaçãoUnião Europeia € 30 € 55Resto do mundo USD 60 USD 100

Para começar a receber as revistas, basta enviar a ficha de assinatura, juntamente com o cheque ou o comprovativo do pagamento bancário, para os endereços abaixo indicados. Se preferir, pode escanear a ficha e o comprovativo do pagamento e enviá-los para os endereços eletrónicos indicados para cada local.Assinantes de Angola Assinantes do Brasil Assinantes de Portugal, Movimento, Lda BELISAN EDITORA, União Europeia e resto do mundoRua Frederico Welwitschia, n.º 82 Belisan Editora, Comércio e Serviços Ltda. - ME Triangulação, LdaBairro do Maculusso CNPJ     08.629.179/0001-52 Apartado 19059Luanda Estrada Rodrigues Caldas Nº 297 1990-999 LisboaAngola CEP 22.713-372- Taquara – Jacarepagua [email protected] Rio de Janeiro- RJ [email protected]: 912 442 453 [email protected] [email protected]

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CABO VERDE

BRASILE agora Dilma?

O topo é a ambição

Angola no Conselhode Segurança das Nações Unidas

Cabo Verdeenfrenta longos desafios económicos,o que não impediu de ser considerado o segundo país africano mais bem governado

q Desejo assinar a revista África21 por 6 mesesq Desejo assinar a revista África21 por um anoNome: ___________________________________________________________________________________________Morada: _________________________________________________________________________________________E-mail: __________________________________________________________________________________________Número de assinaturas:______ Início da(s) assinatura(s) (mês) _________________________________________Vou efetuar o pagamento através de:q Cheque n.º ___________________ _ do Banco _______________________ em nome de

q Movimento, Lda _____________ q BELISAN, Lda q Triangulação, Ldaq Transferência Bancária para

q Movimento, Lda _____________ q BELISAN, Lda q Triangulação, LdaNo valor de ______________________ (por extenso: _________________________________________________ )Assinatura _____________________________________________________________ Data ___/___/ __________

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88 novembro 2014 – África21

cults

Ogrupo de teatro Enigma foi um dos vencedores da edição deste ano do Prémio Nacional de Cultura de Angola,

iniciativa que visa distinguir a arte e a criatividade dos angola-nos, nas suas múltiplas formas de expressão, atendendo às di-versidades linguísticas e culturais do povo angolano. De acor-do com o júri do concurso, «com objetividade e liberdade de imaginação e fantasia, o grupo tem sabido recriar o mundo circundante, o homem, a vida social e os valores estéticos e morais, o que constitui o resultado de uma ideia criadora concreta realizada e plasmada, conforme as leis da linguagem artística específica, de forma integral e irrepetível».

Foram igualmente contemplados com o prémio Gabriel Tchiema (Música), João Mabuaka (Artes Plásticas), Grupo de Dança Tradicional Katyavala do Bailundo (Dança) e o Centro de Estudos do Deserto (CEDO), em Investigação em Ciências Humanas e Sociais. Na área de Cinema e Audiovisual, o pré-mio coube ao realizador Asdrúbel Rebelo da Silva, pelo con-junto da sua obra, que contra entre outros, os filmes Levanta, Voa e Vamos e Escrever a Vida, e o documentário Valeu.

Anunciados os vencedores do Prémio Nacional de Cultura

O jornalista e escritor Albino Carlos venceu na categoria de Literatura, pelo seu livro Issunje, publicado este ano.

«Esta distinção exige dos contemplados maior aposta na produção de obras com elevado grau de qualidade, bem como na excelência, tendo sempre em conta os traços identitários da cultura angolana», disse a ministra da Cultura, Rosa Cruz e Silva, durante o anúncio dos vencedores.

Gabriel Tchiema, vencedor na categoria de Música

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epetela manifestou a sua satisfação com a homenagem prestada aos ex-alunos da Casa dos Estudantes do Império (CEI), realizada pela União das Cidades Capitais de Língua

Portuguesa (UCCLA) em Coimbra, que assinalou o 70.º daquela que foi, entre 1944 e 1965, a residência de estudantes das então colónias portuguesas. Pepetela, também ex-estu-dante da CEI, mostrou-se «feliz» com o ato, que «apenas peca por tardio». Segundo o autor do romance Geração da Utopia, «já era tempo de a CEI ter tido o reconhecimento, para que as gerações futuras soubessem quanto representou para as independências dos nossos po-vos». Sobre o legado dos ex-alunos, adiantou que o sonho de independência para os países africanos de língua portuguesa «foi alcançado». No entanto, afirmou que «queremos mais do que as independências, porque os povos têm de sentir os seus benefícios de uma vida melhor, em sociedades mais justas».

Por sua vez, Irene Neto, filha do primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto (um dos homenageados), destacou «a convicção e a determinação invejável» dos ex--estudantes na luta pelas independências das então colónias. «Hoje, os tempos são outros, mas, no geral, todos os antigos associados da CEI cumpriram com os objetivos de luta pela liberdade e independências», salientou.

Durante o ato, foi realizado o colóquio «A importância da CEI na formação cultural dos seus associados», com a intervenção dos escritores Manuel Alegre, Pepetela, Manuel Rui Monteiro, Eugénia Neto, viúva de Agostinho Neto, Jorge Querido e Pires Laranjeira.

Casa dos Estudantes do Império

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Afonso Reis Cabral ganhou, por unanimidade, o Prémio Leya. Aos 24 anos, é o mais jovem escritor a receber o ga-

lardão. Foram a concurso 360 originais de autores de língua por-tuguesa enviados de 14 países. O romance de Afonso, O Meu Ir-mão, centra-se na relação de amor entre dois irmãos, um deles com a síndrome de Down.

Foi Manuel Alegre, presidente do júri, que fez o telefonema a anunciar a ótima notícia e a convidá-lo a ir à sede do grupo edito-rial para se encontrar com outros membros do júri. Quando chegou, uma hora mais tarde, estava o presidente do júri a infor-mar o vencedor da edição de 2014. Para Manuel Alegre, O Meu Irmão, é «um dos livros mais maduros e dos mais conseguidos do ponto de vista literário» de todas as edições do Prémio Leya.

Nas primeiras declarações sobre a razão da temática do seu romance, Afonso disse que «todos devem escrever sobre o que sabem e conhecem». Escreve desde os nove anos poesia, conto, e agora romance. Trabalhou como revisor em algumas editoras e atualmente é editor. Em 2005 editou o seu livro de poemas Con-densação. Sobre O Meu Irmão, revelou que «Já estava a escrever há

s Escultores dos Espíritos», episódio da série No Reino Se-creto dos Bijagós, filmado na Guiné-Bissau, tem despertado

o interesse de várias entidades, depois da estreia mundial em setem-bro na Fundação Calouste Gulbenkian, em Portugal. De acordo com a produtora Lx Filmes, o documentário tem sido solicitado para apresentação em várias universidades, por exemplo no Brasil, e foi selecionado para o Docs for Sale, um importante mercado inter-nacional que decorre durante o festival de Amsterdão, IDFA.

vence Prémio Leya 2014Afonso Reis Cabral

três anos e como a data limite de entrega do manuscrito terminava no fim de maio fiquei obrigado a finalizar».

O Prémio Leya, agora arrecadado por Afonso, tem o valor mais elevado dos prémios literários em língua portuguesa, cem mil euros (cerca de 128 mil dólares). Para os mais distraídos, in-forma-se que os manuscritos são lidos pelo júri em prova cega, ou seja, sem qualquer referência ao nome do autor.

Mas o que poucos sabiam era a ascendência de Afonso Reis Cabral. Nada mais, nada menos, Eça de Queirós, o seu trisavô. Disse Afonso: «Tento não pensar em qualquer tipo de herança porque isso angustia-me um bocado. Não quero atribuir qualquer responsabilidade à genética». E concluiu: «Felizmente, não tenho Eça de Queirós no nome».

Série sobre Bijagós na rota dos festivais internacionais

Além da Gulbenkian, a obra conta até agora com o apoio de várias instituições portuguesas, entre as quais a Fundação Portugal--África, mas também da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco). A equipa busca novos par-ceiros e financiamento para continuar a filmar por mais um ano os outros três episódios. A aposta é concorrer em festivais internacio-nais, revelam os realizadores, expectantes em relação às novidades para 2015.

Se as condições logísticas o permitirem, a equipa dirigida por Noémie Mendelle e Luís Correia espera retomar as filmagens em janeiro para a produção de um novo episódio, cuja temática resulta do fascínio dos autores pelo sagrado e pela natureza que carateriza as ilhas dos Bijagós, reserva da biosfera. A originalidade do seu pa-trimónio torna Bijagós uma das sociedades mais singulares e únicas, como refere o preâmbulo de apresentação do projeto. «Entre os Bijagós permanece uma visão do mundo em que homens, natureza e espíritos formam um sistema cooperativo onde tudo está interli-gado», lê-se no referido texto.

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Festival Internacional de Cinema de Cabo Verde termi-nou em19 de outubro, com a exibição do filme Cabo, do

realizador cabo-verdiano, Ivan Barbosa, residente na Holanda. Neste certame internacional de Santa Maria, no Sal, foram exibidos 81 filmes, dos quais foram selecionadas 34 películas, concorrendo para os diferentes prémios.

A curta metragem Terra Terra, da italiana Pala Zermar, foi o único filme produzido em Cabo Verde, mostrando vários aspetos da cultura cabo-verdiana. Presentes igualmente neste Festival de Cinema de Cabo Verde, a longa-metragem Pecado Fatal, do português Luís Diogo, ou ainda a longa-metragem documentário, I Love Kuduro, do realizador português Mário Patrocínio. 

Este Festival de Cinema de Cabo Verde, que chega à sua quinta edição com a exibição de 81 filmes, teve a sua primeira edição em 2010, com apenas cinco filmes, e tem como pro-motora a Viva Imagem.

10.ª edição do Festival de Jazz Itália-Moçambique, que começou no final de outubro com uma ronda de três espetáculos em Maputo, procurou

fomentar intercâmbios artísticos entre músicos dos dois países e assinalar o Acordo Geral de Paz de 1992, assinado em Roma.

Piero Borri & Valentina Bartoli e Puglia Jazz Factory foram os grupos italia-nos convidados para a edição de 2014 do festival, que contará com atuações dos moçambicanos Makazani Muthimiu, Tanselle e Elcides CarlosX, além de duas formações com músicos e estudantes da Escola de Comunicação e Artes (ECA), da Universidade Eduardo Mondlane e da Escola Italiana G. Falcone, de Maputo.

«O festival já se tornou um evento tradicional na agenda cultural de Maputo e é uma iniciativa que se carateriza pelo encontro das culturas dos dois países através da cultura universal que é a música Jazz», assinalou o embaixador de Itália em Moçambique, Roberto Vellano, durante uma conferência de imprensa.

Com um concerto no Hotel Cardoso, o festival abriu ao grande público em 31 de outubro, com atuações das bandas no África Bar e no Gil Vicente, res-petivamente, estando prevista, além de espetáculos individuais, uma jam ses-sion com todos os músicos.

Festival de cinema de Santa Mariaem Cabo Verde

O ministro cabo-verdiano da Cultura, Mário Lúcio Sousa, também músico, compositor e escritor, admitiu que os recur-sos financeiros para o setor não são muitos, mas garantiu que apoiará e estimulará iniciativas bem planeadas e executadas, sobretudo na área da formação.

Imagem do filme I love kuduro

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Itália-Moçambique

Festival de Jazz

A cantora moçambicana Tanselle

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92 novembro 2014 – África21

livro do mês

e várias formas trata-se efetivamente de um livro que chega na hora certa: o começo do desopilar depois da «tempestade» que foram os anos de guerra e das suas

naturais ressacas. Como diz o editor, «Uma coisa é certa, os ango-lanos vivem o dia a dia com muito sentido de humor, com muito desenrascanço, e como se já não houvesse amanhã.» Ora, de vá-rios modos, está tudo neste romance sobre a vida em Angola como ela é hoje. Fácil de ler, com uma escrita fluida e agradável, A Virgem olha com ternura para as personagens e para a cidade do Lobito, retratando o quotidiano angolano com verdade e muita frescura. Um romance divertido e animado que arranca boas e sonoras gargalhadas, porque se percebe à evidência que foi inspi-rado em factos reais e porque o autor sabe usar o picaresco de uma forma tão ousada como ingénua, diríamos mesmo naif no sentido literal do termo que é ingenuidade quase a virar para o que se chama kitsch, embora se saiba manter longe disso.

De alguma forma, este novo romance angolano prossegue nas linhas mestras da literatura angolana, continuando a evo-lução que ela tem sabido manter especialmente depois da in-

dependência, que é, como tem sido evidente, em cada época ir de encontro às necessidades próprias, isto é, é sempre uma lite-ratura necessária, correspondendo ao que a sociedade lhe exige e precisa.

Ao mesmo tempo crítica e compreensiva, a escrita de Tem-pestade Celestino reflete várias matrizes da sociedade angolana atual, pondo a nu as complicações familiares por causa da in-tervenção da família, mas reconhecendo as vantagens da soli-dariedade familiar, e denunciando a inveja como um mal que corrói o convívio mas aceitando-a como inevitável, aqui e agora, por causa das notórias clivagens sociais. Percebe-se, entretanto, que quereria condenar a atual propensão do angolano médio para dirimir litígios legais por tudo e por nada, mas não ousa ir muito além.

De uma forma geral, uma das grandes qualidades deste ro-mance está na qualidade dos diálogos a ressumarem autentici-dade, a saberem a genuínos, ajudados ainda pelo uso de termos em umbundu e outros do calão local, onde são notórios os sinais do inglês, como bisno para designar negócios, de business, e bradar

Um romance angolano, um romance necessário

A Virgem, de tempestade Celestino

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Apresentado como o mais divertido romance angolano dos últimos tempos, o livro A Virgem do escritor angolano Tempestade Celestino destina-se irrevogavelmente a um sucesso de vendas tão apetecido como merecido

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para significar irmão, de brother, entre muitos mais que felizmente não pedem licença aos fundamentalistas do Acordo Ortográfico que campeiam em Portugal.

Embora, como afirma o autor, a trama do livro seja baseada em factos reais, a verdade é que este livro foi nitidamente feito para defender uma tese simplista: a falta de prática de sexo provo-ca males irreversíveis que só a sua satisfação pode curar. E, pelo caminho, e aqui é a outra vertente principal da tese: o caminho para a felicidade é a paz e a concórdia, a reconciliação, que é uma mensagem irrevogavelmente positiva e também não deixa de ser uma mensagem necessária para a sociedade angolana atual.

A trama anda à volta da figura de Catarina, uma moça tão casta quanto bela, que aos trinta anos começa a sofrer de muitos males. O médico assistente aconselha-a a casar porque a virginda-de pode estar na origem das suas doenças. Aconselhada por uma amiga a aceitar o namoro do maestro Caquarta, quarentão suspei-to e padecendo de impotência, os males continuam levando o próprio marido a propor-lhe a intervenção de um amigo. Está claro, surgem as consequências, mas depois o amor faz ultrapassar todos os ciúmes e discórdias e, no final, como nos contos de fadas, vivem felizes para sempre.

Recorrendo a todo o momento aos provérbios mais inimagi-náveis e a ditados e sentenças populares que, no fundo, são co-muns a todos os povos, embora se nos apresentem aqui como sa-bedoria africana, o autor socorre-se também de máximas e citações da Bíblia que mostra conhecer vastamente.

Além do aspeto sociológico, que neste livro é de capital im-portância porque as famílias e os seus elementos principais estão

desde que sejam coisas práticas e que façam avançar. E, no fun-do, as famílias, por mais desavindas, acabam por se reconciliar e tudo acaba em abraços. Assim se praticasse também na política e as coisas teriam outro final. Não é por acaso que uma das figu-ras centrais do romance, a tia Nonjamba, vai para a política no final do enredo. Na verdade, a sua feição interventora em todas as quezílias familiares e com os estranhos só lhe aponta esse caminho.

A talhe de foice, o autor fala dos verdadeiros problemas, como a droga, mas aos jovens que por ela tinham sido levados também lhes aponta o caminho, aflora sem lhe dar muita importância o racismo que muitos emigrantes portugueses continuam a ter em Angola, e não deixa de falar no tema recorrente de todos os mais velhos de todas as épocas: no nosso tempo é que era bom, é que havia respeito, é que havia valores. Todos sabemos, porém, que isso só é verdade até certo ponto. A verdade é que os tempos são outros e outros os valores. Que podem até nem ser melhores.

A literatura angolana continua, portanto, no seu papel de lite-ratura necessária. O romance A Virgem é, de vários modos, um livro necessário e de algum modo fundamental para compreender os angolanos e a sua situação hoje.

A VirgemTempestade CelestinoGuerra e Paz, 2014, Lisboa

tEMPEStADE CELEStINO

Nome de guerra, pseudónimo literário de Celestino Jerónimo. O autor é natural do Lobito, licenciado em relações Interna-cionais pela Universidade Lusíada, Pólo de Benguela. Fez os estudos primários na Igreja Evangélica da Canata e aprimo-rou o gosto pelas letras, na década de 80, ao cumprir o servi-ço militar obrigatório. Foi repórter do semanário Kilamba (ex--jornal O Lobito), onde publicou artigos, poemas, crónicas e contos. Foi membro da UJA – União dos Jornalistas Angola-nos e da Brigada Jovem de Literatura de Benguela. Foi pro-fessor de Biologia na Escola Saydi Vieira Mingas, a mesma escola, então D. Afonso Henriques, onde foi aluno, nos anos 1974/1975, dos conceituados Dr. Grabulho, Dr. Cola e Dr. Cruz. É funcionário público na Empresa de Águas e Sanea-mento do Lobito.

Um romance divertido e animado que arranca boas e sonoras gargalhadas

delineados com grande acutilância, haverá outros aspetos, entre os quais o linguístico, em que há que reparar, além do que referi a propósito da influência do inglês. O caso da palavra Kupapata é exemplar. Designação das motos que concorrem com os táxis no transporte de pessoas e bens, os seus motoristas são, antes, de mais sinónimo de desenrascanço. Por sinal, tudo começou no Lobito, nas páginas do jornal Kilamba, onde a personagem principal de uma banda desenhada de Pio Mariano dos Santos, se chamava Kupapata.

A descrição da Praça do Kalumba – uma espécie de Roque Santeiro do Lobito – como microcosmos da sociedade angolana nas suas grandezas e misérias, é igualmente exemplar como ca-racterização, e a história dos patronímicos da região tem um sabor muito especial e merece uma análise detalhada. Trata-se, no fundo, de ver as palavras como conceitos adaptáveis a tudo,

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Os historiadores e diversos investigadores sempre se espantaram com a facilidade e precisão com que a Alemanha nazi conseguia identificar os judeus europeus. Ainda hoje há peças de um enorme puzzle por encaixar. Mas há algumas certezas: Já existia a tecnologia Hollerith de cartões perfurados da IBM e com a ajuda dos sistemas Hollerith desta empresa, adaptados às necessidades dos clientes e sob constante atualização, Hitler foi capaz de automatizar a perseguição aos judeus. A IBM e o Holocausto é a narrativa surpreendente da aliança estratégica da IBM com a Alemanha nazista, que teve início em 1933, nas primeiras semanas da ascensão de Hitler ao poder, e que se prolongou ao longo da Segunda Guerra Mundial. À medida que o terceiro reich levava à prática o seu plano de conquista e genocídio, a IBM contribuía com soluções tecnológicas para a estratégia de Hitler.

A IBM e o HolocaustoEdwin Black2001

Um drama que envolve várias personagens e que decorre em 88 a.C., quando o mundo está à beira de uma guerra desastrosa e de grandes dimensões, que se estende de roma à Grécia, e ainda ao Egito, onde vive Gordiano, um cidadão romano. Quando não está embrenhado nos seus passatempos lúdicos, como os seus jogos, o jovem desfruta o seu tempo com a escrava Bethesda. No dia do seu aniversário, quando cumpre vinte e dois anos, Bethesda é confundida com a amante de alguém rico e é raptada. Para a salvar, Gordiano tem de encontrar os raptores antes que eles se apercebam do engano. Entretanto, é confrontado com algo que o envolve e absorve: o saque do sarcófago de ouro de Alexandre, o Grande. Não abundam os romances históricos sobre este período em África, onde Os salteadores do Nilo vêm agora ocupar um espaço interessante.

Os Salteadores do NiloSteven SaylorBertrand Editora, 2014, Lisboa

«Vagas e Lumes tem duas componentes. Uma sobre aquilo que chamo de vagas, que são os assuntos do mundo, a volta, a vida. E a parte dos Lumes é a parte mais íntima, os amores, as paixões, etc.». As palavras são de Mia Couto, que assim nos apresenta o seu mais recente livro, uma obra poética com mais de 200 páginas e que se divide em duas partes: a primeira, em que o autor escreve sobre o mundo, e uma segunda, em que disserta sobre aspetos do seu íntimo, mais precisamente os amores e as paixões. Em relação aos versos de Raiz de Orvalho, Mia Couto afirma tratar-se de uma imagem poética. «Isso quer dizer que o mais importante não é o veículo, mas sim aquilo que eu quero transmitir como mensagem. A minha mensagem seria o pólen, aquilo que vai fecundar alguma coisa. Pode ser por via da música, versos, escrita ou intervenção cívica. Portanto, o mais importante não é o veículo que quero trazer

ali, mas é o próprio pólen». Mia Couto nasceu na Beira, Moçambique, em 1955. Foi jornalista e professor e é atualmente biólogo e escritor. Está traduzido em diversas línguas. Em 2013, recebeu o Prémio Camões. Entre outros prémios e distinções destaca-se a nomeação de Terra Sonâmbula como um dos doze melhores livros africanos do século XX, na Feira Internacional do Livro do Zimbabwe.

Vagas e LumesMia CoutoEditorial Caminho, Lisboa, 2014

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Com Saxophonias, Adriano Santos lança-se em duetos com Grace Évora, Kino Cabral, Mirri Lobo, Dudu Araújo, Dany Mariano, rui Pina, Pepe Bana e Belinda Lima, para além de um desafio com o irmão trompetista, Nhela. Paralelamente, utiliza ainda samples dos DJs Brazão e MarkG na melodia Thing Medley. Após os álbuns reencontro I, II e III, com o terceiro dedicado ao mestre e fonte inspiradora de Santos, Luis Morais, chega-nos agora um trabalho a solo do saxofonista, que afirma ter querido fazer um disco diferente, com sax e voz. «Este CD é reflexo do amor à minha terra, em especial à nossa cultura. Nasci no meio da música, ela faz parte da minha alma. Espero que todos gostem», afirma Adriano Santos.

SaxophoniasAdriano Santos

Cresceu a ouvir música tradicional, música urbana local e ritmos de todo o mundo na Guiné-Bissau, de onde é natural. Fez parte, entre outros, do histórico e revolucionário grupo Super Mama Djombo e já partilhou o palco com artistas como tito Paris, Bonga e Boss AC, por exemplo. Afirma que a sua raiz musical são os «convívios de quintal», e que as suas composições sofrem influência da sua vivência em três continentes: África, América e Europa. Mindjer, que significa mulher, é o título do seu primeiro álbum, que aparece como uma homenagem a todas as guineenses e de todo o mundo, pela sua força, determinação e coragem. Nas suas faixas, a cantora quase que viaja pela música do seu país, relembrando os clássicos de compositores como José Carlos Schwarz e Armando Salvaterra, passando pela música tradicional guineense com Mandjuandadi e pelo que carinhosamente intitula de «minha música da Guiné», no fundo as diversas sonoridades que a inspiram e dão corpo à sua própria música.

MindjerKarina Gomes

«O mais interessante foi dar ao meu pai um espaço de escuta sem chegar a julgá-lo, porque isso é muito difícil. tive que compreender a sua história como a de um homem, e não como a de um pai». As palavras são da realizadora, que se serviu do arquivo fotográfico e dos diários do pai sobre a sua experiência durante o serviço militar na colónia espanhola do Sara, em 1964, como base para o seu trabalho. Monsell passou os últimos três anos a trabalhar em África 815, um documentário que vagueia sobre os anos que o seu pai passou em África, «um paraíso perdido ao que sempre quis regressar», como dizia, após o fracasso da sua relação familiar e a aceitação da sua orientação sexual. «Eu sempre soube que o meu pai era homossexual, nunca foi um tema tabu», diz Monsell, que reconhece que partiu para este filme após muitos anos a resistir à leitura dos diários.

África 815Realização Pilar MonsellGénero Documentário

Chegou finalmente a DVD O Último Voo do Flamingo, a história de Mia Couto que nos leva ao interior de Moçambique. Nele, há um ponto de partida: tizangara, uma pequena vila no interior do país, pouco tempo depois do fim da Guerra Civil. Cinco misteriosas explosões matam outros tantos soldados da Missão de Paz das Nações Unidas. Como provas do crime apenas pénis decepados e os emblemáticos capacetes azuis. Dá-se então início à investigação, orientada pelo oficial de serviço designado pelas Nações Unidas, o tenente--Coronel italiano Massimo risi. Nos passos que vai dar, risi mergulha num mundo diferente, que vai necessitar das explicações do tradutor Joaquim (Elliote Alex), que rapidamente lhe vai ensinar que na vida não se pode compreender propriamente tudo. Um excelente livro, traduzido num ótimo filme. Está lá Moçambique, mas não o das multidões. É o interior do país que o filme nos traz, com quase tudo o que contém e representa.

O Último Voo do FlamingoRealização: João ribeiroGénero: Ficção

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Última página

[email protected]ão Melo

ste é o meu último texto, pelo menos por ora, sobre o tema da estabilidade. Começarei com um ponto prévio: a estabilidade, mais do que uma finalidade em si mesma,

deve ser entendida como uma condição e, ao mesmo tempo, um instrumento para o crescimento económico, o desenvolvimento humano e o contínuo aprofundamento da democracia no nosso país. Não deve, por isso, ser utilizada para frenar esses objetivos maiores, perseguidos, em geral, por todos os cidadãos.

O que acabo de dizer significa que, em determinados mo-mentos, é imperioso proceder a mudanças que sejam necessárias para renovar as condições de estabilização do sistema, permitin-do que este último continue a ser capaz, perante as novas condi-ções existentes, de promover aqueles objetivos maiores.

Essas mudanças não implicam necessariamente a mudança do sistema, a não ser em momentos revolucionários. A rigor, «sistema» – ou, se quiserem, «regime» – não é, inclusive, sinóni-mo de «partido» ou de «governo». Em Angola, contudo, estamos ainda bastante longe dessa visão, devido à excessiva partidariza-ção da vida política e social.

Uma coisa é certa: qualquer que seja a visão dos diferentes atores, a manutenção da estabilidade em Angola, a médio e longo prazo, implica mudanças em termos de prioridades, procedimentos e protagonismos que, na minha opinião, são imprescindíveis para a renovação do sistema e para a sua efetiva capacidade de continuar a promover o crescimento, o desenvol-vimento e a democracia.

A pergunta é inevitável: quem deve proceder a tais mudanças?

No atual momento histórico angolano, não reconheço na oposição capacidade e sobretudo interesse em proceder a mu-danças positivas na nossa sociedade, regenerando a capacidade do sistema de construir um país bom para todos vivermos, o que implica renová-lo sem destruí-lo e sem, portanto, voltar a lançar Angola no caos e na instabilidade.

Isto não é histeria, mas, sim, leitura objetiva dos factos. Na verdade, não é simples acaso que o maior partido da oposição angolana se mantenha fiel ao Programa de Muangai ou que es-teja por trás do «Movimento Revolucionário» (o nome diz tudo) de jovens manifestantes antigovernamentais. De igual modo,

é sintomático que políticos oriundos da extrema-esquerda e convertidos presentemente em líderes de partidos «democráti-cos» defendam, em privado, a perseguição a dirigentes do MPLA, caso o mesmo deixe de ser Governo, ou então que hos-tilizem figuras credíveis e reputadas da sociedade civil, apenas por estas terem pertencido ao partido no poder.

Em suma, as mudanças que o sistema exige, neste momento, para que a estabilidade se mantenha a médio e longo prazo e, assim, o país possa continuar as profundas transformações inter-nas desencadeadas, sobretudo, após o fim da guerra, em 2002, devem e podem ser dinamizadas pelo MPLA.

A primeira mudança, quanto a mim, é demonstrar mais ur-gência e determinação em resolver os problemas da maioria da população, como emprego, habitação, água, luz, saúde e educa-ção. Alguns desses problemas podem ser minimizados sem necessidade de projetos grandiosos, que levam demasiado tem-po, exigem muitos recursos e, por vezes, são de eficácia duvidosa.

A segunda é ampliar drasticamente as condições de acesso à riqueza e aos negócios, a começar pela própria «família do MPLA», mas alargando-o a todos os angolanos interessados em tornar-se empreendedores. Como defendi anos atrás, o cruza-mento de interesses entre empresários do campo político do MPLA e da oposição é um poderoso garante da estabilidade. Mas a existência de oportunidades iguais para todos – funda-mental para a criação de uma visão comum de «sistema» e de «regime» – deve ser um processo geral.

Finalmente, a terceira mudança que o MPLA deve realizar é resolver a questão da sucessão. Na minha opinião, o partido no poder precisa de apresentar ao eleitorado, em 2017, uma solução capaz de assegurar a estabilidade do sistema, mas que sinalize ao mesmo tempo o início da sua renovação. No quadro político--constitucional do país isso é perfeitamente possível. Adiá-lo é pôr em risco a estabilidade, a médio e longo prazo.

Acerca da estabilidade – III

MPLA deve fazer mudanças para manter estabilidade

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