No ar, um novo avião brasileiro

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TRANSGÊNICOS: A VEZ DA CIÊNCIA um novo . ,..., , anac brasileiro

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Pesquisa FAPESP - Ed. 93

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TRANSGÊNICOS:A VEZ DA CIÊNCIA

um novo.,...,, anacbrasileiro

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•Pesql!!,a Ciência e Tecnologia no Brasil

SEÇÕES

CARTAS 5

CARTA DO EDITOR 7

MEMÓRIA 8Há 250 anos, Lineu criava os alicercesda nomenclatura científica

ESTRATÉGIASE o Nobel foi para... . 10Enquanto isso,em Harvard... . 11A Terra é azul para os chineses 11Tesouroressurge noAfeganistão 11Índia insiste em reator ultrapassado 12

Patriotismo ou discriminação? 12Ciência na web 12A hora e a vez das pesquisadoras 13Marco da tecnologia nuclear 13A percepçãoda ciência na sociedade 13As cores do milho xavante 14Imagens inaugurais do satélite 14.

wc,z

Volta às origens na Paraíba 14Gestãodas águas 14A ciência vai à escola 15Conversecom a FAPESP 15Segurançae ética ambiental 15Micróbios na vitrine do Butantan 15

www.revistapesquisa.tapesp.br

REPORTAGENS

CAPAEmbraer entrega até o final do anoseu primeiro jato de 70 lugares eentra na disputa por novas faixasdo mercado aeronáutico ..... 64

POLÍTICA CIENTÍFICAE TECNOLÓGICA

ENGENHARIA GENÉTICA

Polêmica sobre sojatransgênica coloca em debatepotencial da biotecnologia .... 16

LEGISLAÇÃOResolução flexibilizao acessoà biodiversidade 24

IMPORTAÇÕESFundação atende toda a demandados pesquisadores 25

FOMENTOMedidas amargaspermitiram à FAPESPretomar investimentos 26

CIÊNCIA

EPIDEMIOLOGIALaboratórios de altasegurança dão autonomiaao país na pesquisade doenças emergentes 34

GENÔMICANova espécie de vírus podeser a causa da mortesúbita dos citros 40

ETOLOGIA

Capacidade de memorizarinformações permite às aranhasmodificar hábitos instintivos .. 42

PESQUISA FAPESP 93 • NOVEMBRO DE 2003 • 3

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________________________ ~~~~~~"j!t-~êl~~ci~ên~cia~e~~=cn=OI~Og~ia~nO~B~ra=Si~1~=_ _

SEÇÕES

LABORATÓRIOUma razão a mais para evitar antibióticos .. 30México cria vacina contra cisticercose 30Pouco espaço faz mal à saúde 30

Para entender os antidepressivos 31Osvulcões e o fim dos dinossauros 31O eclético exército romano 31Contando galáxias ativas 32O risco de ser pedestre 32Alta contaminação entre agricultores 33Remédio ativa gene que incha a gengiva 33Oscromossomos da conservação 33

SCIELO NOTÍCIAS .•.......•...•.... 58

LINHA DE PRODUÇÃORumo à literatura animada 60Avanços na medicina microeletrônica 60Relógio atômico em miniatura 61Novo tipo de vidro amplia a luz 61

Plásticos para sensores 61Portátil e compacta para viagens 62Feromônio controla praga do coqueiro 62Nova tecnologia para extrair petróleo 62Patentes 63

RESENHA ...............•......... 94Fragmentos para a Históriada Filosofia, de Schopenhauer

LANÇAMENTOS 95

CLASSIFICADOS 96

ARTE FINAL 98Claudius

4 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

REPORTAGENS

AMBIENTEDiversidade de espéciese fenômenos peculiaresdesfazem preconceitossobre a Caatinga 48

PALEONTOLOGIA

Fósseis de minicondor e ave gigantereconstituem a pré-históriados seres alados no Brasil .... 52

ASTRO FÍSICAPulsos ultra-rápidos de radiaçãoprecedem gigantescosjatos de partículaslançados pelo Sol 56

TECNOLOGIA

ENGENHARIA DE MATERIAIS

Blindagem garante aviõesimperceptíveis aos radares ... 72

ENERGIATurbina aproveita força daságuas para levar eletricidadea comunidades isoladas 74

TELECOMUNICAÇÕES

Empresa produz equipamentoque monitora dispositivosde redes de fibras ópticas parao mercado externo 76

FÍSICAEsterilizador à basede plasma eliminamicrorganismos 80

HUMANIDADES

TEATROTese revisita a militânciateatral de João do Rio 82

CULTURATese de mestrado deSérgio Buarque de Holandaganha destaque 86

HISTÓRIA

Livro mostraque mito daescrava-rainhaesconde hipocrisiada democraciaracial brasileira 90

Capa: Hélio de AlmeidaFoto: EmbraerTratamento de Imagem: J. R. Medda

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PesaqeTecnüiiaFAPESP

Pesquisador

aran asua revista Pesquisa

em 2004 FAPESP

Desde o seu lançamento, Pesquisa FAPESPé enviada gratuitamente à casa ou ao localde trabalho de 23~5 mil pesquisadores,bolsistas ou assessores ad hoc da FAPESP.Se você faz parte desse grupo, chegou a horade atualizar os seus dados pessoais no sitewww.revistapesquisa.fapesp.br-=======Se você tem interesse em continuara receber a revista sem qualquer ônus,é imprescindível o preenchimentodo cadastro até o dia lS de dezembro

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As reportagens de PesquisaFAPESP retratam a construçãodo conhecimento que seráfundamental parao desenvolvimento do país.Acompanhe essa evolução semperder nenhum movimento.

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Matemática

Em agosto, a revista Pesquisa FA-PESP publicou matéria comparandoos prêmios Abel e Nobel. Em setem-bro, publicou uma carta minha,apresentando crítica à matéria, quefoi acompanhada na mesma seção decartas por um comentário da redaçãojulgando a carta "exagerada", sem darargumentos. Enviei a seguir um textoà redação explicando-me em maisdetalhe. A única resposta veio na se-ção de Cartas de outubro da PesquisaFAPESP. uma carta de Carlos Alber-to Lungarzo, afirmando que "cartascomo essas" (a minha, de setembro,para a revista) "não devem nada aosmanifestos do Ku Klux Klan" Emsuma, passamos de um texto de gos-to duvidoso para uma situação consi-derada pelo Código Penal. Perguntose a Pesquisa FAPESP considera algumtipo de retratação.

CARLOS TOMEI

Rio de Janeiro, RJ

Nota da Redação: A redação de Pes-quisa FAPESP respeita a liberdade deopinião dos leitores e, por isso, publicausualmente as cartas que recebe tal co.mo foram escritas. No entanto, julgatambém que a seção de cartas não devese prestar à manifestação de opiniões'em termos inadequados. No caso emquestão, reconhece que o professor Car-los Lungarzo empregou, em sua carta,termos inteiramente inadequados.

Hidrogênio

o artigo "Caminhos do hidrogê-nio" (edição n> 92) discute um temaatual e relevante para a economia dospróximos anos. Entretanto cometealguns equívocos, entre os quais des-taco a figura da pág. 70 "Funciona-mento básico de uma célula de com-bustível': Por exemplo, o próton estádirigindo-se do pólo negativo para opositivo, e o nome dos eletrodos estáinvertido, ou seja, o pólo negativo é o

cátodo (para onde se dirigem os cá-tions) e o pólo positivo é o ânodo(para onde se dirigem os ânions).

loss AUGUSTO R. RODRIGUES

Instituto de Química/UnicampCampinas, SP

6 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

Resposta do pesquisador Gerhard Ett,diretor da Electrocell:

Na área de baterias e célula a com-bustível, tendo como referência o li-vro do professor Edson Ticianelli,Eletroquímica (Edusp, página 168, ca-pítulo 4.2) e o livro Química Geral; deIohn B. Russell (Mc Graw Hill, pági-na 612), em ambos, o pólo negativo(-) é o ânodo. Dessa forma, a ilustra-ção na edição 92, página 70, está cor-reta. Em uma aplicação inversa, quetalvez justifique a dúvida do leitor,em processos de eletrólise, na área deprocessos de revestimentos, deposiçãoe tratamentos de superfícies, o cátodoé o pólo negativo (-), porque está co-nectado ao pólo negativo do gerador(retificador, fonte de corrente), quefornece os elétrons para a reduçãodo material a ser depositado, vide aapostila da página 1.9, da AssociaçãoBrasileira de Tratamento de Superfí-cie. Em ambos os casos, portanto, osinal dos eletrodos é uma convenção.

Correção

Na reportagem "As lições da tra-gédia" (edição n= 91), o ônibus es-pacial que explodiu em 2003 foi oColumbia e não o Challenger, cujoacidente ocorreu em 1986.

Na reportagem "As praias perdi-das" (edição n> 92), o vilarejo de Ca-beço e o rio São Francisco estão aonorte de Aracaju e não ao sul, comoaparece na reportagem.

Cartas para esta revista devem ser enviadas parao e-mail [email protected], pelo fax <IV 3838-4181ou para a Rua Pio Xl, 1.500, São Paulo, SP,CEP 05468-901. As cartas poderão serresumidas por motivo de espaço e clareza.

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PesquisaFAPESP

CARLOS VOGTPRESIOENTE

PAULO EOUAROO OE ABREU MACHAOOvleE·PRESIOENTE

CONSELHO SUPERIORAOILSON AVANSI OE ABREU, ALAIN FLORENT STEMPFER,

CARLOS HENRIQUE OE BRITO CRUZ, CARLOS VOGT,CELSO LAFER, HERMANN WEVER,

HORÁCIO LAFER PIVA, MARCOS MACARI,NILSON OIAS VIEIRA JUNIOR, RICAROO RENZO BRENTANI,

VAHAN AGOPYAN, YOSHIAKI NAKANO

CONSELHO TÉCNICO-ADMINISTRATIVOFRANCISCO ROMEU LANDI

DIRETOR PRESIDENTE

JOAQUIM J. DE CAMARGO ENGLERDIRETOR ADMINISTRATIVO

JOSÉ FERNANDO PEREZOIRETORC1ENTIFICO

PESQUISA FAPESP

COHSELHOEDITQRIAllUIZ HENRIQUE LOPES DOS SANTOS (COORDENAOORCIENTiFiCO),EDGAR DUTRA ZANono, FRANCISCO ANTONIO BEZERRA

COUTINHO, FRANCISCO ROMEU LANDI, JOAQUIM J.DE CAMARGO ENGLER, JOSt FERNANDO PEREZ,

LUIZ EUG~NIOARAUJO DE MORAES MELLO,PAULA MONTERO, WALTER COLLI

DIRETORA DE REDAÇÃOMARILUCE MOURA

EDITOR CHEFENELDSON MARCOLlN

EOITORA S~NIORMARIA DA GRAÇA MASCARENHAS

DIRETOR DE ARTEH~LlO DE ALMEIDA

EDITORESCARLOS FIORAVANTI (CIÊNCIA), CLAUDIA IZIQUE (POlITlCAC&T>

MARCOS DE OLIVEIRA<TECNOlOGIA), HEITOR SHIMIZU (VERSÃODtHINE)

REPÓRTER ESPECIALMARCOS PIVETTA

EDITORES-ASSISTENTESDINORAH ERENO, RICARDO ZORZETTO

CHEFE DE ARTETÃNIA MARIA DOS SANTOS

DIAGRAMAÇÃOJOS~ ROBERTO MEDDA, LUCIANA FACCHINI

FOTOGRAFOSEDUARDO CESAR, MIGUEL BOYAYAN

COLABORADORESBRAZ, CARLOS HAAG, CLAUDIUS,

EDUARDO GERAQUE IO'·lINEl"FABRICIO MARQUES, GIL PINHEIRO,

LAURABEATRIZ, MARGÔ NEGRO,SAMU EL ANTENOR, SAYONARA LEAL,

Si RIO J. B. CANÇADO, THIAGO ROMERO ION·lINEl,VERÔNICA FALCÃO, YURI VASCONCELOS

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NÚMEROS ATRASADOSTEL. (lJ13038-1438

Osartigos assinados não refletemnecessariamente a opinião da FAPESP

É PROIBIDA A REPRDDUÇÃO TOTAL OU PARCIALDE TEXTOS E FOTOS SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO

~FUNDAÇÃO DE AMPARO A PESQUISA 00 ESTADO DE sÃO PAULO

SECRETARIA DA CltNCIA, TECNOLOGIA,DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E TURISMO•GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO

de alto desempenho e muito confortá-veis, podem substituir com vantagens,em determinadas rotas, os grandes ja-tos produzidos por outras companhias.E foi justamente essa oportunidade, ouseja, a demanda potencial do mercadopor aparelhos com maior capacidadede assentos que os jatos regionais e, si-multaneamente, por aeronaves meno-res e mais econômicas que os jatos commais de cem lugares usados pelas gran-des companhias - voando muitas vezescom capacidade ociosa -, que a Em-braer soube identificar e aproveitar. Jáneste mês de novembro, a empresa, se-diada em São José dos Campos, SãoPaulo, deve entregar à italiana Alitalia oprimeiro avião Embraer 170. O mode-lo, como relata o repórter Yuri Vascon-celos a partir da página 64, faz parte deuma nova geração de jatos com capaci-dade de 70 a 108 passageiros. Enquantoisso, a empresa brasileira já registrava,até setembro, 245 encomendas fecha-das dos novos aviões e 308 opções decompra. Vale lembrar aqui que a histó-ria de sucessos da Embraer escreve-secom a competência tecnológica acu-mulada pela empresa desde sua funda-ção, em 1969, apoiada nos profissionaisformados pelo Instituto Tecnológico daAeronáutica e pelo Centro TecnológicoAeroespacial. Demonstração cabal e con-creta de que o investimento em tecno-logia tem retorno garantido para o país,a reportagem sobre os novos aviões ter-minou se impondo para a nossa capa.

Merece destaque também nesta edi-ção a polêmica em torno dos transgêni-cos, impulsionada pela questão da libe-ração do plantio da soja geneticamentemodificada na safra 2003/2004, no RioGrande do Sul, que embute o risco dese comprometer, sem necessidade, oenorme potencial de desenvolvimentoda biotecnologia brasileira. A partir dapágina 16, a editora de Política Cientí-fica e Tecnológica, Claudia Izique, deta-lha a visão de respeitados pesquisado-res da área sobre os transgênicos e suaavaliação sobre as razões e desrazões quepermeiam o debate. Boa leitura!

CARTA DO EDITOR

Belos engenhos do homem e da aranha

MARlLUCE MOURA - DIRETORA DE REDAÇÃO

PESQUISA FAPESP 93 • NOVEMBRO DE 2003 • 7

Hesitamos mais que o usual naescolha da capa desta edição dePesquisa FAPESP. Tínhamos,

de um lado, uma história deliciosa so-bre a capacidade das aranhas de memo-rizar informações e assim aprimorarseus hábitos instintivos de caça. A repor-tagem parecia-nos tanto mais interes-sante porque a pesquisa que levou a essadescoberta enraíza-se na longínquacuriosidade de um adolescente, fascina-do com os movimentos de uma aranhana teia construída entre as folhas de umarbusto, numa tarde de verão na quen-te Alexandria, Egito, nos idos de 1956. Ofascínio transformou-se em paixão du-radoura e, finalmente, em trabalho pro-dutivo e muito bem-sucedido - tantoque o adolescente egípcio tornou-se umadas maiores autoridades brasileiras emetologia. Estávamos, assim, ante umaespécie de saga construída em torno dodesvendamento de um intrigante com-portamento animal, e dotada de umacarga humana particular, que costumaprovocar o entusiasmo daqueles jor-nalistas que estão convencidos de queas melhores histórias e os melhores tex-tos do jornalismo transportam sempreuma certa dose de emoção por entre aspalavras de densa informação. Por isso,era forte a tentação de destinar.a capadesta edição à reportagem que começana página 42, de Ricardo Zozetto, edi-tor-assistente de Ciência.

Mas, de outro lado, tínhamos umareportagem que relata um novo e im-portante capítulo de sucesso - sem quehaja aqui qualquer traço de ufanismotolo - na história da tecnologia aero-náutica nacional. Veja-se: a brasileiraEmbraer, quarta maior fabricante deaviões do mundo, já bem instalada nosegmento de jatos regionais com, nomáximo, 50 assentos - no qual detémuma fatia de confortáveis 45% do mer-cado global -, agora está prontíssimapara disputar espaço com as gigantesBoeing e Airbus no fornecimento deaeronaves às grandes empresas interna-cionais de aviação. Não que esteja lan-çando equipamentos equivalentes, porexemplo, ao Boeing 767, mas os aviõesde porte médio que está desenvolvendo,

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Há 250 anos, Lineulançava os alicerces danomenclatura científica

8 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

Uma idéia que perduraNELDSON MARCOLlN

O naturalista suecoLineu (ou Carl vonLinné) tinha uma

ambição portentosa empleno século 18: desejavanomear e descrever todosos tipos conhecidos deplantas, animais e minerais.Como se sabe, isso ele nãoconseguiu. Mas foio responsável por um feitonotável ao criar anomenclatura binomial,a mais estável regrada biologia até hoje. Antesde Lineu (1707-1778), asespécies eram identifica daspor expressões descritivaschamadas polinômios,

Exemplar de SpeciesPlantarum e a Pteris vittataoriginal analisada por Lineu

escritas em latim, a línguaculta da época, que tantopodiam ter quatro ou cincopalavras como nove ou dez.A primeira palavrada expressão se referiaao gênero ao qual umaplanta pertenciae as demais a descreviam.O naturalista publicouem 1753 o livro SpeciesPlantarum (Espécies dePlantas) em que apresentavauma simplificação dessesistema. Nas margensdo livro, ao lado do nomeda planta, Lineu escreveuuma única palavra que,combinada com o nome

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õ .Lonchitis non ra fa, longis angufiis & zd bafin auri. culatis foliis. P/11m. filo 5'2" t, 69· Raj. fuppl. 6).

Filix non ramofa, longiffimis anguflis & ad bafin au ·culatis foliis. P/11m. amer, 12, t. 18.

H"bilat i" Domiuicre fylvis juxta rivulos.S. PTERIS frondíbus pinnatis: pinnis linearibus

baft rotundatis.Hauilat ill China Osbulc.Prteçcdenti ualde fimilis.

'.9. P'TERIS fronde pínnata ; pinnisIlípúlis lanceolatis, "

Filix altera longiffimis anguílis & ad baíin foliofis fali'Plur», amer, J 2. t. 19. fil. t. 70. .

Filix Iineata -ad Qaún foliota, Pet . fi/o 130. t. 1).. f. rHaúitat;» America meridi()naJi.

innis fubovatis obmtis r.--------~------.~---Página do livro mostra como Lineucriou sua nomenclatura. Abaixo,a Pteris vitisis, comum no Brasil

por ele, como a Pterisvittata, sabambaia origináriada Ásia que consta no livroe é encontrada no Brasil.Lineu passou a ser chamadode "pai da botânica",embora seu sistema tenhapassado a ser usado tambémpara animais e bactérias.As primeiras regras geraispara taxonomia só foramnormatizadas em 1867."A nomenclatura de Lineuse tornou tão importanteque todas as denominaçõesusadas antes dele não têmvalor científico, apenashistórico", diz JeffersonPrado, pesquisador doInstituto de Botânica (IBt)de São Paulo e tradutor,junto com Carlos Bicudo,do Código Internacionalde NomenclaturaBotânica. No IBt,há um raríssimo exemplarde Species Plantarumque provavelmentefez parte da primeiraedição da obra.

genérico, formava umanova designação para cadaespécie. Ao lado de gatária,por exemplo, que haviarecebido o nome de Nepetafloribus interrupte spicatuspedunculatis, Lineu escreveu"cataria" (associada a gato),chamando a atenção paraum atributo conhecido daplanta. Logo, os botânicosdaquele tempo e os quevieram depois começarama chamar essa plantadeNepeta cataria - o primeironome é o gêneroe o segundo a espécie.O mesmo valeu para todasas outras espécies descritas

PESQUISA FAPESP 93 • NOVEMBRO DE 2003 • 9

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• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

• ESTRATÉGIAS MUNDO

Cinco pesquisadores ame-ricanos, dois britânicos edois russos, além de umaadvogada iraniana e umescritor sul-africano, foramagraciados com o Nobel de2003. No campo científico,a premiação consagrou ra-mos da pesquisa básica, co-mo os canais das células, edescobertas de grande apli-cação prática, como a res-sonância magnética. •

- A máquina quevislumbra doenças

o diagnóstico de doençastornou-se mais preciso, há30 anos, com o advento doexame de ressonância mag-nética. O Nobel de Medici-na de 2003 foi conferido aoquímico Paul Lauterbur, de74 anos, da Universidade deIllinois, e ao físico PeterMansfield, de 69, da Uni-versidade de Nottingham,que ajudaram a criar o tes-te, indolor e não invasivo. Aressonância capta sinaisemitidos por átomos dehidrogênio do corpo e osconverte em imagens de ór-gãos e tecidos. Sessenta mi-lhões de exames são feitos acada ano. •

- A consagração dossuperfenômenos

O russo-americano AlexeiAbrikosov, 75, o russo Vi-taly Ginzburg, 87, e o anglo-americano Anthony Leggett,65, ganharam o Nobel deFísica por suas contribui-

E O Nobel foi para...

A Nobel da Paz Shirin Ebadi defende perseguidos do Irã

ções no desenvolvimento deduas áreas da física quânti-ca - a supercondutividade ea superfluidez. Trabalhandoem separado, Ginzburg eAbrikosov estabelecerambases teóricas para a buscade novos materiais super-condutores - aqueles que,em determinadas tempera-turas, permitem a passagemde corrente elétrica sem re-sistência. Já Leggett desco-briu que um tipo de héliofica superfluido quando atemperatura se aproximado zero absoluto. Seus áto-mos se comportam comoos elétrons da corrente deum supercondutor. •

-A membranae seus canais

Agraciados com o Nobel deQuímica, os médicos ame-ricanos Peter Agre, de 54anos, e Roderick MacKin-non, de 47, ajudaram a en-tender como as células re-gulam o fluxo de substânciasatravés de sua membrana.Agre, da Universidade IohnsHopkins, identificou a aqua-

porina, proteína que con-trola o fluxo de água. Mac-Kinnon, do Howard HughesMedical Institute, revelou aestrutura dos canais de íons,por onde passam os átomoscarregados de cálcio, potás-sio, sódio e cloro. Esses ca-nais estão envolvidos, porexemplo, no controle de ba-timentos cardíacos. •

- Previsões maisseguras .

O americano Robert Engle,de 60 anos, e o britânicoClive Granger, de 69, foramlaureados com o Prêmio deEconomia de 2003. Eles cria-ram métodos que ajudam ainterpretar o significado deséries de dados estatísticos,como a evolução dos preçosde ações e de índices deconsumo. Seus modelos seestabeleceram como umaferramenta para pesquisa-dores, economistas e inves-tidores. Engle é professorda Universidade de NovaYork e Granger, da Univer-sidade da Califórnia, emSan Diego. •

-Sem medodos aiatolás

Quase desconhecida noOcidente, a iraniana ShirinEbadi, de 56 anos, foi lau-reada com o Nobel da Paz,num ano em que o PapaJoão Paulo II era apontadocomo favorito. Como advo-gada e professora da Uni-versidade de Teerã, Shirindefendeu escritores e dissi-dentes presos pelo serviçosecreto do país - e foi elaprópria presa há três anos econdenada a 18 meses, cum-pridos em liberdade condi-cional. Primeira mulher de-signada juíza no país, Shirinfoi afastada da carreira narevolução islâmica. •

- A inutilidade docerto e do errado

O romancista J. M. Coetzee,de 63 anos, é o segundosul-africano a receber oNobel de Literatura. Em1991, o prêmio foi con-cedido a sua conterrâneaNadine Gordimer. Seus li-vros são marcados peloapartheid, mas não se pren-dem à segregação. A Aca-demia sueca, ao justificar oprêmio, comentou que "ointeresse de Coetzee diri-ge-se a situações nas quaisa distinção entre o certo e oerrado, ainda que clara, nãoservem para nada". Entresuas obras, destacam-se NoCoração do País (1977), Vidae Época de Michael K (1983)e Desonra (1999). •

10 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

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• Enquanto isso,em Harvard ...

Pela l3a vez, a revista Annalsof Improbable Research pro-moveu uma festa para cele-brar a face risível da pesquisacientífica. O palco do San-ders Theatre, na Universida-de Harvard, estava lotado, nodia 2 de outubro, para a en-trega dos 10 troféus Ig Nobelde 2003, prêmio paralelo aoNobel que consagra traba-lhos insólitos publicados emrevistas científicas. O prêmiode Medicina foi conquistadopor pesquisadores da Uni-versity College London queestudaram o cérebro dos ta-xistas londrinos e concluíramque são mais desenvolvidosque o dos demais habitantesda cidade. O prêmio de Bio-logia foi destinado a pesqui-sadores do Museu Natural deRoterdã que relataram umcaso inédito de necrofilia ho-mossexual entre patos mal-lard. O artigo narra o ataquesexual sofrido por um patomorto. O prêmio de Físicafoi entregue a sete australia-nos que, numa pesquisa so-bre acidentes entre tosquia-dores, se deram ao trabalho deavaliar a força necessária paraempurrar ovelhas em diversassuperfícies. O Prêmio de Quí-mica coube ao japonês YukioHirose, da Universidade Ka-nazawa, que estudou a com-posição de uma estátua queespanta pombos. A cerimôniafoi dedicada à nanotecnolo-gia. Os organizadores infor-maram que, embora ninguémnotasse, os vencedores leva-vam uma barra de ouro de 1nanomilímetro. Em meio àspremiações, aconteceram na-nopalestras. A mais engraça-da versou sobre o mapea-mento do DNA humano. Apalestra resumiu-se ao se-guinte: "Genoma: comprei olivro; é difícil de ler': •

Yang Liwei, astronauta da pioneira missão da China

• A Terra é azulpara os chineses

Quarenta e dois anos depoisda proeza do cosmonautarusso Yuri Gagarin, a Chinatornou-se o terceiro país domundo a enviar uma missãotripulada ao espaço. No dia15 de outubro, o tenente-co-ronel Yang Liwei, de 38 anos,passou 21 horas e meia emórbita a bordo da cápsulaShenzhou 5, versão chinesada Soyuz russa. Recebido co-mo herói nas ruas de Pequim,proferiu uma daquelas frasestalhadas para o registro dahistória. "Eu vi nosso planeta,é bonito demais", afirmou oastronauta pioneiro, numavariação do bordão ''A terra éazul" eternizado por Yuri Ga-garin. A missão custou aos

chineses US$ 2,2 bilhões e éfruto de um esforço de pesqui-sa de uma década, que levouquatro cápsulas não tripula-das ao espaço. O programaespacial, que tem finalidadescomerciais e militares, já lan-çou 70 satélites. O sucesso dovôo de Yang Liwei, além dealimentar o orgulho nacio-nal, atesta a eficiência dos ser-viços de lançamento de saté-lite, reforça a influência dopaís no panorama asiático edá assento privilegiado à Chi-na em futuras negociaçõessobre a exploração espacial.Não é pouco para uma naçãoque, a despeito de um vigoro-so e contínuo crescimentoeconômico, ainda figura norol das nações em desenvolvi-mento. A revista The Econo-mist, que dedicou a capa da

edição de 18 de outubro aofeito, sugeriu, com ironia, quea China dispense o US$ 1,8bilhão anual de ajuda inter-nacional agora que resolveugastar dinheiro em passeiosespaciais "desnecessários". Epropõe, falando seriamente,que o governo da China in-vista mais verbas na pesquisade vacinas para flagelos queatormentam sua população,como a Aids e a pneumoniaasiática, escamoteada pela cen-sura em vigor no país. •

• Tesouro ressurgeno Afeganistão

Um extraordinário tesouro de20 mil peças de ouro orien-tais e ocidentais, datadas doséculo 1 a.c., reapareceu re-centemente em Cabul, noAfeganistão (Science, 12 desetembro). Os objetos haviamsido descobertos por arqueó-logos durante a ocupaçãosoviética do país, no final dosanos 1970, ao pé de uma coli-na chamada Tyla Tepe. Mastinham desaparecido haviauma década e se imaginavaque haviam sido derretidosno período em que os talibãsestiveram no poder. Agora,garantem as autoridades afe-gãs, encontram-se bem pro-tegidos num cofre no paláciopresidencial. "Tudo está a sal-vo e em seu devido lugar", ga-rantiu o presidente do país,Hamid Karzai. Como o Mu-seu Nacional do Afeganistãocontinua parcialmente des-telhado e totalmente desfal-cado de sistema de segurança,o tesouro deverá permanecerpor algum tempo longe davista do público e dos pesqui-sadores. "Seja como for", pon-dera Robert Knox, arqueólo-go do Museu Britânico, emLondres, "sua recuperação éum grande alento para todosos que amam e respeitam ahistória do Afeganistão." •

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• ESTRATÉGIAS MUNDO

• Índia insiste emreator ultrapassado

o governo da Índia está dis-posto a gastar US$ 760 mi-lhões na construção de umreator nuclear de produçãorápida - forma de geração deenergia abandonada por paí-ses como a França e o Japão(Nature, 11 de setembro). AÍndia utiliza reatores alimen-tados por urânio natural, massó tem reservas para menosde 25 anos. O que não faltano país, no entanto, é o tório,que o governo quer converterem isótopo físsil de urânioutilizando reatores de produ-ção rápida. Apesar das críti-cas de que o sistema seria an-tieconômico, as autoridadesdo setor energético susten-tam que já acumulam umadécada de experiência emtestes com o equipamento. Ejá deram o sinal verde: a pri-meira usina equipada comum reator de produção rápi-da será construída em Chenaicom conclusão prevista parao ano de 2011. •

• Patriotismo oudiscriminação?

O Instituto de EngenhariaElétrica e Eletrônica (IEE),dos Estados Unidos, enfrenta

um fogo cerrado depois deproibir pesquisadores de al-guns países de exercer seusdireitos como sócios da insti-tuição (Science, 19 de setem-bro). A briga, que começou emjaneiro de 2002, prossegueaté hoje. Com 380 mil mem-bros em 150 países e respon-sável por 30% da literaturamundial sobre computado-res, eletrônica e engenhariaelétrica, o IEE resolveu reti-rar dos associados do Irã, Ira-que, Líbia, Sudão e Cuba cer-tas prerrogativas, como o usodo logotipo do instituto paraa promoção de atividades e oacesso a publicações eletrô-nicas. A comunidade cientí-fica do Irã, com seus 1.700membros, vem protestandohá meses por correio e e-mail, sem obter resposta. Oinstituto alega que só impôsrestrições a "nações hostis",submetidas a sanções eco-nômicas pelo governo ame-ricano. Outras organizaçõescientíficas, porém, denunciamque a política é discrimina-dora e hostil. "Está faltandotransparência e decoro éticoao instituto", escreveu KenFoster, professor de bioenge-nharia na Universidade daPensilvânia, na edição de se-tembro do Spectrum, órgãodo próprio IEE. •

12 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

Ciência na webEnvie sua sugestão de site científico para

[email protected]

www.neurodome.psc.brEndereço com informaçõescientíficas e artigos na área de ciênciasdo comportamento e de saúde.

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www.lapa.ufscar.brBanco de teses, publicações e fotosdo Laboratório de Análisee Planejamento Ambiental da UFSCar.

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http://seer.cancer.govJDadosestatísticos sobre incidênciados vários tipos de câncer,do InstitutoNacional de Saúde dos EUA.

Page 13: No ar, um novo avião brasileiro

goria Estudantes, as ganha-doras foram a gaúcha Cris-thiane Assenhaimer, 21 anos,e as paulistas Iuliana Izido-ro, de 20 anos, e GiovanaPasqualini, de 23. Na cate-goria Cientista do Futuro, oslaureados foram Carlos Nu-nes Júnior, de Paragominas,(PA) Anne Cristine Moura,de Aparecida de Goiânia,(GO) e Renata Bossle, de SãoJosé dos Pinhais (PR). •

A hora e a vez das pesquisadoras

Um recente censo feito peloCNPq mostrou que o nú-mero de mulheres já haviasuperado o de homens en-tre os pesquisadores brasi-leiros jovens, na faixa dos 24aos 30 anos. O placar era de53% contra 47%. A lista dosvencedores do Prêmio Jo-vem Cientista 2003 confirmaa tendência. Dos nove pre-miados, sete são mulheres.Adriana Lorenzi, de 23 anos,

• Marco da tecnologianuclear

Em 2004, o Brasil começa afabricar urânio enriquecidopara abastecer as usinas deAngra 1 e 2. O anúncio é ummarco na história da tecnolo-gia do país. Nos anos 1980, oentão presidente José Sarneyanunciou que o país domina-va o ciclo do urânio, mas sóagora, efetivamente, mostrou-se apto a enriquecê-lo em es-cala industrial. O programanuclear vinha patinando nocontingenciamento de ver-bas. Há quase 20 anos o Bra-sil tenta, em vão, concluir aconstrução de um submarinonuclear. "Tivemos de fazerescolhas", diz Geraldo Ca-vagnari, do Núcleo de Estu-dos Estratégicos da Unicamp.

venceu na categoria Gradua-dos. Pesquisadora do Cen-tro de Energia Nuclear naAgricultura da USP e bol-sista da FAPESP,ela mapeoutipos de cianobactérias queespalham toxinas em repre-sas e reservatórios. "As mu-lheres em geral se dão bemna área de microbiologiaporque o trabalho é meti-culoso e exige paciência",opina Adriana. Em 2° lugar,

"Investiu-se no urânio, emdetrimento do submarino,que também tem importân-cia estratégica:' O país tem aterceira maior reserva mun-dial de urânio, mas benefi-ciava o material no exterior.Com a substituição de im-portações, a economia devechegar a US$ 19 milhões acada 14 meses. •

• A percepção daciência na sociedade

Está sendo lançado o livroPercepção Pública da Ciên-cia, da Editora Unicamp,uma análise dos resultadosde uma extensa pesquisa so-bre a ciência vista sob a óti-ca da sociedade, realizadano Brasil, na Argentina, noUruguai e na Espanha. Or-

a gaúcha Liliana Feris, daUniversidade Luterana doBrasil, mostrou que rejeitosde carvão retiram metaispesados de águas contami-nadas. Em 3° lugar, des-ponta o primeiro homem: ocearense Giovanni Cardo-so, de 31 anos, com um tra-balho que incorporou da-dos de previsão climática nogerenciamento da água queabastece Fortaleza. Na cate-

ganizado pelo diretor-pre-sidente da FAPESP, CarlosVogt, ~ Carmelo Polino, doCentro Redes, da Argentina,o livro - com edição bilingueportuguês e espanhol - trazdados eloqüentes: as ima-gens que prevalecem entre

os entrevistados são as daciência como epopéia de des-cobertas (35,5%), como con-dição de "avanço tecnoló-gico" (46,4%) e como "fontede benefícios para a vidahumana" (45,4%). Percep-ções negativas, como "perigo

de descontrole" tive-ram adesão secundária.Dos quatro países pes-quisados, o Brasil foio que teve mais res-postas positivas numaquestão sobre a legi-timidade da ciência:70,4% confiam na ver-dade científica, em de-trimento, por exem-plo, da fé religiosa. •

Brasi I: confiançana verdade científica

PESQUISA FAPESP 93 • NOVEMBRO DE 2003 • 13

Page 14: No ar, um novo avião brasileiro

• ESTRATÉGIAS BRASIL

A entrega simbólica de 55quilos de sementes de mi-lho à aldeia indígena deNossa Senhora de Guadalu-pe, no Mato Grosso, vai aju-dar a restabelecer um as-pecto da cultura dos 10 milíndios xavantes. As semen-tes pertencem a cinco espé-cies coloridas e selvagens

• Imagens inauguraisdo satélite

Técnicos da Estação de Re-cepção de Imagens de Sa-télites em Cuiabá receberam,em 22 de outubro, as fotosinaugurais do CBERS-2, siglaem inglês para o segundo Sa-télite Sino-Brasileiro de Re-cursos Terrestres. O satélitefoi levado ao espaço no dia21 a bordo de um foguete daChina e permanecerá por pe-lo menos. dois anos numaórbita a 778 km da superfí-cie terrestre. A parceria en-tre Brasil e China reduz cus-tos para os dois países eatende a uma grande neces-sidade do país, que desen-volveu tecnologia para cons-trução de satélites, mas aindanão tem foguetes para' lançá-los. O CBERS-2 vai coletar

As cores do milho xavanteque os xavantes plantavamantigamente, mas que aca-baram perdidas, substituídaspor outras mais produtivas.Nos anos 1970, amostrasdas sementes selvagens ha-viam sido recolhidas pelaEmbrapa e guardadas numbanco de germoplasma emMinas Gerais. A pedido da

dados para pesquisas ambien-tais, agrícolas e de planeja-mento urbano. Cada país vaigerenciar as informações co-lhidas em períodos de seismeses. Brasil e China gas-taram US$ 300 milhões paralançar o CBERS-l, em 1999, eagora o CBERS-2. Outrosdois satélites da série irão aoespaço até 2010. •

Funai, essas amostras foramreproduzidas e, agora, en-tregues aos índios. Entre asespécies, há grãos pretos,roxos, brancos, amarelose listrados. "Os mais jovensda tribo ouviam falar domilho colorido e tinhamcuriosidade em conhecê-10", diz Ramiro Vilela de

• Volta às origensna Paraíba

Onze empresas de tecnologiae um instituto de pesquisavão instalar-se nos próximosmeses numa área de 20 milmetros quadrados em Cam-pina Grande, na Paraíba. Ocondomínio Oásis Digital -numa alusão ao bem-sucedi-

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A primeirafoto captadapeloCBERS-2

Andrade, pesquisador daEmbrapa. Outros 265 qui-los de sementes foram en-viados a cem aldeias xavan-teso Além dos xavantes, osíndios bororos, do MatoGrosso, e os maxacalis, deMinas Gerais, vão retomarcontato com seus cultivosprimitivos de milho. •

do Porto Digital, do Recife -resgata a idéia original da in-cubadora Fundação ParqueTecnológico da Paraíba, cria-da nos anos 80. •

• Gestão daságuas

A edição número 4 da revistaCiência e Cultura, uma publi-cação da Sociedade Brasileirapara o Progresso da Ciência(SBPC), tem como tema Ges-tão das Águas. Coordenadapor Carlos José Saldanha Ma-chado, a revista reúne noveartigos e um conjunto de ma-térias que tratam do tema daconservação ambiental, dre-nagem urbana, recursos hídri-cos no semi-árido, drenagemurbana entre outros proble-mas relacionados à preserva-ção das àguas. •

Page 15: No ar, um novo avião brasileiro

• A ciênciavai à escola

As iniciativas são modestas,mas revelam alguma mobili-zação para estimular o ensinode ciências nas escolas. Umadelas é o AEB Escola, um pro-grama-piloto da Agência Es-pacial Brasileira (AEB) pa-ra divulgar a astronomia e asciências espaciais em colégiospúblicos. O projeto vai es-trear numa escola de Brasíliaem novembro e terá duraçãode uma semana. Contarácom uma exposição da AEBsobre o programa espacialbrasileiro, oficinas com pro-fessores e palestras para osalunos. Em 2004, o projetoirá para outras cidades doBrasil, começando por SãoLuís, no Maranhão. Outrainiciativa é o Prêmio GrupoCiências, promovido pela Se-cretaria de Educação Média eTecnológica do MEC. Trintaprojetos que estimulem a re-flexão e a prática científicaem escolas públicas vão rece-ber R$ 20 mil cada. •

• Converse comaFAPESP

A FAPESP implantou em8 de outubro o serviço Con-verse com a FAPESP, umcanal de comunicação mais

eficiente entre a instituiçãoe os diferentes públicos in-teressados em suas atividades.Pela página www.fapesp.br/converse, o interessado terá

acesso direto à Presidência,Diretoria Administrativa, Di-retoria Científica, Setor deInformações e Gerência deComunicação. Em cada umdestes setores, o usuário esco-lhe o assunto de seu interessee envia sua mensagem dire-tamente ao responsável pelaresposta. O objetivo é tornarmais ágil a comunicação, au-mentar o número de consultaspor e-mail e reduzir o volumede ligações telefônicas. •

• Segurançae ética ambiental

Por decisão do Conselho Téc-nico e Administrativo da FA-PESP, a partir de fevereiro,os contratos de pesquisa en-

caminhados à Fundação queenvolverem a produção de re-síduos químicos de qualquernatureza deverão descreverprocedimentos a serem adota-dos no decorrer da pesquisade forma a não produzir ris-cos ambientais. Também seráexigido parecer da Comissãode Ética Ambiental da insti-tuição em que serão realizadasas experiências. Nos projetosenvolvendo experimentaçãocom animais, o pesquisadordeverá documentar os proce-dimentos adotados em con-formidade com a legislaçãopertinente. Também neste casoserá exigido parecer da Co-missão de Ética da instituiçãode origem do pesquisador res-ponsável pelo projeto. •

Micróbios na vitrine do ButantanHá tempos o Instituto Bu-tantan deixou de ter ossoros antipeçonhentos co-mo principal vitrine parase tornar o maior produtorde vacinas da América La-tina, com 213 milhões dedoses fabricadas neste anopara o Ministério da Saú-de. Para valorizar a mu-dança de perfil, a institui-ção, conhecida pelo acervode animais, decidiu cons-truir um segundo museu,dedicado especialmente amicróbios e vacinas. Cons-tituído por uma exposiçãodidática que permite enten-der o que são bactérias, pro-tozoários, fungos e vírus,o Museu de Microbiolo-gia é um espaço interativo.Dispõe de microscópiospara os visitantes vislum-brarem micróbios e exibeum modelo computado-rizado que permite inves-tigar parâmetros de umainfecção e simula a eclosão

rrrtrro

o maior produtor de vacinas da América Latina

de epidemias. O laborató-rio do museu é franqueadoa grupos de estudantes deensino médio, em visitasagendadas e monitoradaspor professores de biolo-gia. As aulas de microbio-logia básica duram duashoras e os alunos levampara a escola um kit pararealização de experiênciase uma caixa-estufa paracultura de microrganis-

mos. A idéia é que os ado-lescentes se tornem agentesmultiplica dores do conhe-cimento entre seus cole-gas. O projeto arquitetôni-co do museu é assinadopor Mareio Kogan e rece-beu referências em revistasinternacionais de arqui-tetura. O Museu de Micro-biologia funciona no ins-tituto, de terça a domingo,das 9hs às 16h30. •

PESQUISA FAPESP 93 • NOVEMBRO DE 2003 • 15

I

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POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

ENGENHARIA GENÉTICA

Polêmica sobresoja RR colocaem debate potencialda biotecnologia

CLAUDIA IZIQUE

Hásinais de que a polêmica em torno da libe-ração do plantio da soja transgênica na safra2003/2004, no Rio Grande do Sul, já estejacomprometendo o enorme potencial de de-senvolvimento da biotecnologia no país. O de-

bate, apaixonado e acalorado, não distingue o produto - nocaso, a soja Roundup Ready (RR), da Monsanto - da tecno-logia de produção de organismos geneticamente modifica-dos (OGMs). Tampouco leva em conta que essa mesma tec-nologia é, por exemplo, a base para a produção da insulinalargamente utilizada por diabéticos, da vacina contra a hepa-tite tipo B, de hormônios de crescimento que estimulam odesenvolvimento infantil e até de 80% do queijo disponívelno mercado nacional, já que a quimosina, componente es-sencial do coalho, é obtida por meio de modificação da bac-téria Escherichia coli, apenas para citar alguns exemplos. "Apolêmica condena a tecnologia como um todo", alerta Fer-nando Reinach, presidente da Alellyx, empresa de biotecno-logia de capital nacional ligada ao grupo Votorantim.

Os OGMs - entre eles, a soja RR - são organismos cujo"material genético foi modificado por meio da introdução deum ou mais genes de outra espécie, previamente seleciona-dos e com um objetivo específico: atribuir vantagens ao pro-duto. A soja RR, por exemplo, vedete da temporada, foi mo-dificada por meio da introdução da proteína cp4-epsps que,incorporada ao código genético da planta, lhe confere tole-rância ao herbicida glifosato, reduzindo a necessidade do usodesse agrotóxico e diminuindo os custos para o produtor.

A mesma tecnologia é utilizada na produção de insulinapara o tratamento da diabetes, doença que atinge 6% da po-pulação mundial. "A produção de insulina a partir do pâncreasdo boi e do porco não pode suprir a demanda, e o produto do-nado pela transferência do gene humano para uma bactéria

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um dos dez Centros de Pes-quisa, Inovação e Difusão(Cepids) mantidos pela FA-PESP."Temos expectativas deque, em breve, o Brasil estaráapto para produzir esse fatorde coagulação:'Na listadepro-dutos transgênicos utiliza-dos na prática médica, Zagoacrescenta ainda a eritropoie-tina, um hormônio utilizadono tratamento da anemia que,até recentemente, tinha de serisolado da urina e, hoje, podeser obtido por meio da enge-nharia genética.

A eficiência e o sucessodos transgênicos na área mé-dica suscita em Raw uma in-dagação: "Por que vacinas,hormônios e enzimas, admi-nistrados à grande maioria dapopulação, não são questio-nados? Por que a soja?Qual aracionalidade disso?':

acordo com Paolo Bartolini, sócio daempresa Hormogen - detentora' da pa-tente brasileira do hGH, apoiada pelaFAPESP,no âmbito do Programa deInovação Tecnológica em PequenasEmpresas (PIPE) - e chefe do Centro deBiologia Molecular do Instituto de Pes-quisas Energéticas e Nucleares (Ipen).

A biotecnologia já é utilizada nosEstados Unidos, Canadá e União Euro-péia para produzir o fator de coagula-ção - conhecido como Fator VIII, fun-damental no tratamento de hemofílicos- isento de contaminação, a partir decélulasde mamíferos. O Brasilainda im-porta o Fator VIII produzido por meioda purificação e fracionamento do plas-ma humano, a um custo anual de US$120 milhões. "Esse método carrega ris-cos que têm de ser eliminados nos testesde plasmas de origem", explica MarcoAntonio Zago, da Faculdade de Medici-na de Ribeirão Preto, da USP,e coorde-nador do Centro de Terapia Celular,

Feijão imune a vírus - Na agri-cultura, a biotecnologia e atecnologia de OGMs têm umcampo enorme. A EmpresaBrasileira de Pesquisa Agro-pecuária (Embrapa) desen-volvevárias linhas de pesqui-sa com plantas transgênicas,com o objetivo de oferecer aosprodutores alternativas de re-

dução de custos e maior competitivida-de. A relação de produtos em fase depesquisa é imensa: vai desde o algodãogeneticamente modificado imune a in-setos - como a lagarta e o bicudo -,passando pelo milho, batata e o ma-mão, até chegar ao feijão resistente aosvírus, que consomem as lavouras e arenda dos produtores. No caso do fei-jão, o principal beneficiário é o pequenoagricultor."O plantio do feijãovem sen-do abandonado porque os produtoresnão ganham dinheiro': justifica ElíbioRech, pesquisador da Embrapa.

Os exemplos se multiplicam em uni-versidades e institutos de pesquisa emtodo o país. Na Universidade Federaldo Rio de Janeiro (UFRJ), pesquisado-res investigam o melhoramento genéti-co do arroz, com o objetivo de aumen-tar sua tolerância a pragas, doenças econdições adversasde solo e clima.O de-partamento de Biotecnologia da Uni-versidade Federal do Rio Grande do Sul

permite produzir a insulinahumana em grande quanti-dade a preços mais baixos eaté mesmo obter insulinasmodificadas que são mais efi-cazes':diz Isaias Raw,pre-sidente da FundaçãoInstituto Butantan. "Eos diabéticos não recla-mam da insulina trans-gênica que salva suasvidas."

O mesmo ocorre coma vacina contra a he-patite tipo B, lembraRaw. A vacina naturalera produzida a partirdos poucos vírus defei-tuosos' sem DNA, queaparecem no sangue dosdoentes. "Garantir que essavacina não transmita hepa-tite é temerário': ele obser-va. Hoje, é possível produ-zir o envoltório protéico dovírus, sem DNA - e, portan-to, incapaz de se reproduzir ecausar a doença -, em levedotransgênico. O Instituto Bu-tantan produz essa vacinaque é administrada gratuita-mente em todos os recém-nascidos e jovens brasileiros."São 34 milhões de dosesproduzidas que evitam novasinfecções que, atualmente,afetam mais de 3 milhões de brasilei-ros", sublinha. A vacina contra a hepa-tite tipo B, do Instituto Butantan, abrecaminho para novas vacinas e medi-camentos. "Certamente, se surgir umavacina contra a Aids, ela será transgê-nica", prevê.

Transgênicos contra o nanismo -Também é transgênico o hormônio docrescimento (hGH) contra o nanismo,doença que afeta 10 mil crianças brasi-leiras. O gene que codifica a moléculado hormônio produzido pela glândulahipófise, localizada na base do cérebro,é clonado e modificado para ser intro-duzido numa bactéria, geralmente a Es-cherichia coli. Uma seqüência é retiradae inserida numa molécula de DNA bac-teriano, o plasmídeo, que na bactériapassa a produzir o hGH. O resultado(veja Pesquisa FAPESP nO 82) é umhormônio idêntico ao fabricado natu-ralmente pelo organismo humano, de

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(UFRGS) procura identificarantígenos com potencial paracompor uma vacina recombi-nante contra o Boophilus mi-croplus, um carrapato que re-duz a produção de leite ecarne do rebanho bovino e étransmissor dos protozoáriosBabesia bovis e B. bigemina eda rickettsia Anaplasma mar-ginale, que causam a tristezaparasitária bovina.

Na Escola Superior deAgricultura Luiz de Queiroz(Esalq), da Universidade deSão Paulo (USP), estuda-seuma variedade geneticamen-te modificada de eucalipto queteve um gene de ervilha inse-rido no seu código genético,o que leva a planta a produzirmais biomassa, aumentandoo rendimento de celulose. Apesquisa interessa diretamen-te à Companhia Suzano dePapel e Celulose, parceira noprojeto desenvolvido no âm-bito do Programa Parceriapara a Inovação Tecnológica(PITE), da FAPESP, já que oeucalipto geneticamente mo-dificado, por ser mais produ-tivo, poderá reduzir a necessi-dade de desmatamento.

Nessa mesma perspecti-va de investigação, a FAPESPapoiou, em parceria com o Fundo deDefesa da Citricultura (Fundecitrus), oprojeto que decifrou o material genéti-co da Xylella fastidiosa, responsável pelapraga do amarelinho - feito comemo-rado pela imprensa nacional e interna-cional -, financiou o seqüenciamentoda bactéria Xanthomonas citri, causa-dora do cancro cítrico, patrocinou aidentificação de 50 mil genes da cana-de-açúcar e, junto com a Central BelaVista Genética Bovina, iniciou o proje-to Genoma Funcional do Boi. A pes-quisa genômica, como se sabe, é o pri-meiro passo para a implantação decompetência na área de biotecnologia eabre caminho para o desenvolvimentode plantas e animais transgênicos, imu-ne a doenças.

Desaceleração da pesquisa" A confu-são que se armou em torno da soja RR,no entanto, está comprometendo oavanço da biotecnologia brasileira. O

projeto de melhoramento do feijão daEmbrapa já está adiantado, pois .já sevão três anos e meio de trabalho inten-so. Mas os pesquisadores, apesar de jácontarem com a autorização da Comis-.são Técnica Nacional de Biossegurança(CTNBio) para avançar os estudos, nãoconseguem de outros ministérios do-cumentos exigidos para a realização detestes em campo, o Registro Temporá-rio (Ret) ou a Licença de Operação paraÁreas de Pesquisa (Loape). Obstáculoidêntico impede o avanço dos estudoscom a batata. Recentemente, a Embra-pa conseguiu a Loape, concedida peloInstituto Brasileiro do Meio Ambientee dos Recursos Naturais Renováveis(Ibama), para dar continuidade às pes-quisas com o mamão.

As pesquisas com grãos não tiverama mesma sorte. A Embrapa desacele-rou as pesquisas com a soja IMI, outraplanta transgênica resistente a herbici-das que vem sendo desenvolvida há sete

anos, em parceria com a Basf.''A IMI está em programa demelhoramento, mas a pers-pectiva de comercialização éde médio prazo, por conta dafalta de regulamentação", la-menta Rech. No caso da IMI,a Embrapa é proprietária datecnologia. Pelo acordo, aempresa brasileira participacom o germoplasma e a Basf,com o gene. ''As plantas sãogeradas no Brasil com se-mentes da Embrapa. É tecno-logia nacional com gene de-les", sublinha Rech.

Em cooperação com aMonsanto, a Embrapa tam-bém faz a tropicalização dasoja RR - já que o produto daempresa multinacional écompatível apenas com o so-lo e clima do Sul e não seadapta a outras regiões do país.Quando for possível concluira pesquisa, a semente tropi-calizada será patenteada pelaEmbrapa. ''A importância tec-nológica desse contrato é pro-duzir sementes que vão re-duzir o custo de produção egarantir sustentabilidade domercado externo para todosos produtores nacionais desoja': enfatiza Rech.

Os pesquisadores da Esalqenfrentam dificuldades semelhantes.Só conseguirão realizar os testes emcampo com o eucalipto transgênico, nomunicípio de Anhembi, em São Paulo,depois de cumprir exigência do Minis-tério do Meio Ambiente (MMA) e rea-lizar uma avaliação detalhada do seuimpacto na flora, fauna e população lo-cais. "Isso é inviável", diz Carlos AlbertoLabate, do Departamento de Genética daEsalq. "Nesse ritmo vamos ter que aca-bar importando tecnologia", ele prevê.

o preço do atraso" A redução do rit-mo das pesquisas pode custar caro aopaís. "Teremos as moléculas genetica-mente modificadas, mas sem testes. Seo país liberar o plantio de transgêni-cos, os produtores vão acabar tendo decomprar sementes e pagar royalties àsempresas estrangeiras. Isso, aliás, já estáacontecendo no caso da soja RR: os pro-dutores pagam royalties à Monsanto,enquanto a Embrapa já tem sementes

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de soja resistentes a herbicidas sem pos-sibilidade de testar': diz Maria LuciaCarneiro Vieira, do departamento deGenética da Esalq, que coordena umgrupo de pesquisadores que desenvol-vem um maracujá transgênico, resis-tente à bactéria Xanthomonas e ao vírusque provoca o endurecimento do fruto.

Essa "moratória branca", como dizLabate, decretada pela ausência de re-gulamentação, se arrasta desde 1998,apesar de o Brasil contar, desde 1996,com uma Lei de Biossegurança - denúmero 8.974 - considerada das maisavançadas em todo o mundo, na ava-liação de Reginaldo Minare, advogadoespecialista em biotecnologia. A leinormatiza as técnicas de biotecnologia,de engenharia genética e de produçãode OGMs com o objetivo de "protegera vida e a saúde do homem, dos ani-mais e das plantas, bem como do meioambiente".

O país também conta com uma equi-pe qualificada, a CTNBio, criada pelaMedida Provisória nv 2.191, de 23 deagosto de 2001, cuja responsabilidade éassessorar o governo federal na formula-ção e implementação da Política Nacio-nal de Biossegurança relativa a OGMs,estabelecer normas técnicas e emitir "pa-receres técnicos conclusivos referentes àproteção da saúde humana, dos orga-nismos vivos e do meio ambiente" paraas atividades que envolvam construção,experimentação, cultivo, manipulação,transporte, comercialização, consumo,armazenamento e descarte de OGMs ederivados. A CTNBio é composta por36 membros - 18 titulares e 18 suplen-tes - entre eles oito especialistas "de no-tório saber científico e técnico': além decontar com representantes dos ministé-rios da Ciência e Tecnologia, Saúde,Meio Ambiente, Educação, Agricultu-ra, Pecuária e Abastecimento e de ór-gãos legalmente constituídos de defesado consumidor, das empresas de bio-tecnologia e dos trabalhadores.

Parecer sob suspeita - A confusão emtorno de OGMs começou quando oInstituto de Defesa do Consumidor(Idec) entrou com uma ação civil pú-blica na 6a Vara da Justiça Federal emBrasília, contestando a competência daCTNBio para dispensar a soja genetica-mente modificada, tolerante ao herbi-cida Roundup Ready, do Estudo de Im-pacto Ambiental (ElA), antes de liberar

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o plantio. A ação invocava a Lei de MeioAmbiente, que, conforme se argumen-tava, conferia essa autoridade ao Mi-nistério do Meio Ambiente. A ação foiacatada e, com isso, ficou suspenso oParecer da CTNBio - publicado no Co-municado de nO 54 - em que a comis-são concluía não haver "evidências derisco ambiental ou de risco à saúde hu-mana ou animal" decorrentes da utili-zação da soja geneticamente modifica-da, razão pela qual decidiu dispensar oElA e manifestar-se favorável à sua co-mercialização. A Monsanto recorreu dadecisão judicial e obteve um voto favo-rável da relatora do processo no Tribu-nal Regional Federal, numa câmaraformada por três juízes. Falta, ainda, aavaliação de outros dois juízes.

Aatalha,ainda em curso, criouum hiato jurídico que aca-bou por lançar os produto-

res de soja na ilegalidade.E, ainda por cima, desor-

ganizou o mercado de sementes, já quese tornou impossível fazer previsãode demanda. Na safra 2002/2003, porexemplo, faltou semente de soja. Osprodutores do Rio Grande do Sul re-correram à Argentina, onde a soja trans-gênica é legalizada: importaram e plan-taram a soja RR. Neste início de ano, acolheita e a comercialização de algo em

torno de 10 milhões de toneladas de sojativeram que ser autorizadas por meiode medida provisória, já que a produçãode transgênicos estava suspensa poruma decisão judicial.

O governo federal - cuja equipe,aliás, também está dividida em relaçãoà liberação dos OGMs -, constituiu en-tão uma comissão formada por noveministérios, capitaneada pela Casa Ci-vil, para analisar a questão da biossegu-rança e formular um projeto de lei como qual pretende pôr fim à polêmica so-bre os transgênicos.

Mas, antes mesmo de a proposta serencaminhada ao Congresso, o governoteve de ceder às injunções da realidade- e à pressão dos produtores gaúchosque ameaçavam com desobediência ci-vil - e editou nova medida provisória,desta vez autorizando o plantio da safra2003/2004. "Neste ano, a área plantadaserá ainda maior': prevê Antonio Sarto-ri, presidente da Brasoja, empresa cor-retora de grãos, no Rio Grande do Sul.

O imbróglio legal está longe de serresolvido: o procurador-geral da Repú-blica, Cláudio Fonteles, apresentou aoSupremo Tribunal Federal (STF) umaação direta de inconstitucionalidadecontra a medida provisória que liberouo plantio desta safra, alegando que elafere cinco princípios da Constituição.Outras duas ações também foram apre-

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sentadas ao STF: uma do Partido Verde(PV) e outra da Confederação Nacio-nal dos Trabalhadores na Agricultura(Contag). Na hipótese - considerada,por muitos, remota - de o SupremoTribunal considerar a iniciativa do Exe-cutivo inconstitucional e desautorizar oplantio desta safra, a União terá de in-denizar os produtores: afinal, a safraestá protegida pela medida provisória.

O impasse vai ser resolvido na Jus-tiça ou no Congresso Nacional, que, noinício de novembro, deverá votar a me-dida que autorizou o plantio da soja RRe, em seguida, começar a examinar oprojeto de lei sobre transgênicos que es-tá sendo elaborado pelo governo federal.

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sDa vanguarda à ilegalidade - Um ba-lanço rápido desse longo período dedebates constata o inevitável: o paísperdeu cinco anos de pesquisa sobreOGMs. Ernesto Paterniani, professortitular de genética da Esalq que, em 1998,integrava a equipe de cientistas daCTNBio, lembra que, na época, alémde analisar a documentação apresenta-da pela Monsanto, examinar a naturezada proteína e da molécula da soja RR erealizar testes de segurança na Faculda-de de Ciências Veterinárias e Agráriasde Iaboticabal, da Universidade Esta-dual Paulista (Unesp) e na USP, a co-missão recomendou, ainda, o monito-

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ramento das áreas a serem plantadaspor um período de cinco anos. Essamedida, aliás, foi acompanhada pelaUnião Européia (UE), que também ava-lia o plantio de OGMs. Mas, no meioda confusão jurídica, o Brasil saiu deuma posição considerada de vanguardapara se enredar num equívoco: a sojatransgênica foi plantada ilegalmente eestá sendo comercializada sem monito-ramento da empresa fornecedora degrãos e sem a fiscalização dos órgãoscompetentes, quer seja a CTNBio, oMMA ou qualquer outro. "O país pas-sou de uma situação de legalidade paraoutra de ilegalidade", lamenta Reinach.

O Brasil já provou ter competência,recursos humanos e conhecimentopara destacar-se na área de biotecnolo-gia de plantas e animais, tecnologia queestá sendo implementada em váriospaíses com o objetivo de melhorar aqualidade e a resistência do produto ereduzir custos de produção. Os pro-dutos geneticamente modificados sãouma opção viável de desenvolvimento,sobretudo para o Brasil, em cuja pautade exportação destacam-se dez produ-tos agrícolas, entre eles a soja. "Os OGMssão, sem dúvida, um componente im-portante no custo de produção, alémde ter como meta a redução do impactode defensivos e resultar em plantas maisresistentes à seca e com menor grau de

proteínas alergênicas, entre outros be-nefícios': argumenta Rech, da Embrapa.

A soja RR, por exemplo, não dispu-ta nutrientes do solo com ervas dani-nhas, o que garante ao agricultor maisprodutividade por hectare. Sem a pre-sença desses invasores, a colheitadeiraentope menos, acelerando o ritmo dacolheita. Mais que isso: as sementes,quando misturadas às ervas daninhas,ficam mais úmidas, o que obriga osprodutores a pagar pela secagem dasoja. E mais: "As plantas são mais resis-tentes e adequadas ao plantio direto,sem necessidade de aragem ou de se re-volver a terra. Depois da colheita, amassa orgânica fica no solo, que, maisfértil, aumenta a população de minho-cas e microrganismos", descreve Pater-niani. E tudo isso sem, aparentemente,apresentar riscos ao meio ambiente: deacordo com parecer da CTNBio, a sojaé uma espécie predominantemente au-tógama, cuja taxa de polinização cruzadaé de cerca de 1%, além de não ter pa-rentes silvestres sexualmente compatí-veis no Brasil.;

Ebom lembrar que o Brasilproduz 52,S milhões de to-neladas de soja, produtoque também é destaque napauta de exportação. O mer-

cado interno consome algo em torno de10 milhões de toneladas, esmagam-sepouco mais de 30 milhões de toneladase são exportados outros 21,S milhões detoneladas do grão. Na safra 2003/2004,a produção do complexo soja - grãos,óleo e farelo - deve chegar a 36,9 mi-lhões de toneladas, superando a norte-americana (34,6 milhões) e a Argentina(35,S milhões), de acordo com Sartori,da Brasoja. As exportações somarãoUS$ 8 bilhões, e a participação brasilei-ra no mercado mundial tem boas pers-pectivas de crescimento. A tendência éaumentar os negócios com a Ásia, prin-cipalmente com a China, que, no anopassado, importou mais de 20 milhõesde toneladas do grão, sendo 40% dosEstados Unidos e 34% do Brasil. "Hámercado para a soja transgênica, nãotransgênica e orgânica", observa Sar-tori. A China, por exemplo, compraqualquer tipo de soja, mas exige que oproduto seja rotulado. Os negócioscom o Brasil, que não usa a rotulagem,estão garantidos por um acordo queexpira em abril do ano que vem e que

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prevê, a partir dessa data, quea soja seja identificada. "Senão regulamentar, o Brasilperde o mercado chinês",prevê Sartori.

Vantagens para o produtor -Nos Estados Unidos, deacordo com dados do UnitedStates Departament of Agri-culture (USDA), aproxima-damente 80% da soja, 38%do milho e 70% do algodãoproduzidos em 2003 são bio-tecnologicamente modifica-dos. Na Argentina, no Cana-dá e na China, o plantio detransgênicos tem crescidonos últimos anos. O NationalCenter for Food and Agricul-tural Policy calculou a vanta-gem do uso de OGMs para osprodutores: os que adotaram a varie-dade de soja RR deixaram de utilizar13 mil toneladas de herbicidas e eco-nomizaram anualmente US$ 1,1 bi-lhão nos custos de produção. No casodo algodão Bt, a redução de uso deherbicidas chegou a 862 mil toneladas,ao mesmo tempo que a produção re-gistrou aumento de 84 mil toneladaspor ano. Também no caso de varieda-des de milho Bt, a queda no uso depesticidas caiu, enquanto a produçãoanual teve aumento de 1,6 milhão detoneladas.

O aumento da produtividade, ob-servada no caso do milho e do algo-dão, e a elevação da renda do produ-tor, no caso da soja, podem ser umaboa alternativa para os países em de-senvolvimento. E deverá contribuirpara promover a aproximação das cur-vas de crescimento da população mun-dial e da produção de grãos. De acordocom o Banco Mundial, entre 1950 e1995, a produção mundial de grãosacompanhou a curva de crescimentopopulacional, enquanto a área cultiva-da permaneceu praticamente inalte-rada (ver gráfico 1). Desde 1985, noentanto, observa-se que o ganho deprodutividade se manteve inalterado,em torno de 2.500 kg por hectare, porconta da queda de eficiência da açãodos fertilizantes (ver gráfico 2). Comisso, desde 1985, a relação grãos/habi-tante entrou em declínio, caindo de350 kg para 300 kg por habitante, em1995. Em 2050, quando o planeta for

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habitado por 9 bilhões de pessoas, es-pera-se que a ciência já tenha encon-trado uma boa resposta para garantiruma produção eficiente de alimentos.

Diga-sede passagem que,qualquer que seja a solu-ção adotada para au-mentar a produção dealimentos - ampliação

da área plantada, intensificação de usode herbicidas ou adoção de plantastransgênicas -, haverá impacto sobre omeio ambiente. "Aspessoas se esquecemde que a agricultura é um dos maioresdestruidores da biodiversidade. Mas te-mos de conviver com a agricultura. Apopulação cresce e as pessoas deveriamestar preocupadas com o desenvolvi-mento de tecnologias agrícolas", avaliaReinach.

As dúvidas em relação à produçãode transgênicos não são uma preocu-pação exclusivamente dos brasileiros.O International Council for Science(ICSU) - www. icsu.org - analisou 50artigos e publicações científicas sobreOGMs, editados entre 2000 e 2003,para verificar o grau de consenso e asdivergências dos autores em relação aostransgênicos. Concluiu que havia con-senso em relação à segurança dos ali-mentos transgênicos disponíveis nomercado e que, até o momento, não ha-viam sido apontadas evidências sobreefeitos adversos decorrentes do consu-mo desses produtos. Ao contrário: oscultivos estão menos expostos a pro-

dutos químicos, já que utili-zam menos pesticidas. OICSU também encontrouunanimidade sobre a neces-sidade de os OGMs seremestudados caso a caso, combases científicas, antes de se-rem cultivados e levados aomercado. As divergênciasrela-cionam-se à abrangência dosatuais métodos das análisesde risco e, principalmente,ao uso do princípio da pre-caução. "A abordagem daprecaução para lidar com in-certezas exige que novas tec-nologias demonstrem au-sência de perigo. Já que ossistemas biológicos nuncaproduzem certezas, o riscozero é um padrão inatingí-vel", observa o estudo do

ICSU."O significado dos estudos de la-boratório é discutível, já que é difícilextrapolar do laboratório para estudosde campo e prever efeitos do uso co-mercial. O que constitui um impactoambiental adverso?", indaga o ICSU.

Processos de precaução são normal-mente usados pela ciência. Antes de umnovo produto para uso humano serlançado no mercado - como é o casodos remédios e vacinas, por exemplo -,são feitos testes exaustivos em animaise, depois, em seres humanos, comamostras crescentes, ao longo de qua-tro fases de experimento. Mas, apesardisso, a prova da certeza absoluta deque o remédio ou vacina não venham acausar algum dano em alguém, a ciên-cia nunca poderá dar. "Todos os remé-dios são perigosos. São utilizados paraque o risco associado à doença seja me-nor", diz Zago. A dúvida que assalta oscientistas é: qual o período de aplicaçãodo princípio da precaução? Seria irra-cional se ele fosse infinito. A resposta aessa pergunta é crucial para que não separalise a ciência, garantindo o avançodas pesquisas.

Além do ICSU, também a RoyalSo-ciety divulgou parecer, em fevereiro doano passado, apresentado à Comissãoda Revisão Científica de OGMs do go-verno britânico (www.royalsoc.ac.uk/gmplants), em que conclui que o usode plantas geneticamente modificadaspode gerar enormes benefícios para aspráticas agrícolas, mais qualidade nosalimentos e trazer benefícios para a nu-

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trição e saúde humanas. Res-salvou que a possibilidade deocorrerem alterações maléfi-cas imprevisíveis no status nu-tricional dos alimentos é idêntica àseventualmente observadas nos proces-sos convencionais de melhoramentos.E sublinhou que, até o momento, nãohá provas de que os OGMs causem rea-ções alérgicas e que esse risco não seriamaior do que os impostos por culturasagrícolas convencionais.

Em outro documento, assinadopor academias de ciências de sete paí-ses, entre elas a Academia Brasileira deCiências (ABC)- www.abc.org.br-. di-vulgado em 2000, afirma-se que os ali-mentos geneticamente modificadospodem ser mais nutritivos e trazer be-nefícios para os consumidores e que es-forços conjuntos devem ser feitos parainvestigarseus efeitos sobre o meio am-biente. Sugere-se que os países signa-tários implantem sistemas reguladorespara identificar e monitorar efeitos ad-versos e que as empresas privadas einstituições de pesquisa compartilhemtecnologias de modificação genéticaque, atualmente, se encontram sobacordos com licenças e patentes muitorestritivos. "Não existe nenhuma asso-ciação de cientistas que se declare fa-vorável à liberação de todo e qualquertransgênico. Todos recomendam que aanálise seja feita caso a caso", enfatizaHernan Chaimovich, diretor do Insti-tuto de Química da USP, membro daABCe da ICSU.

Pressuposto de biossegurança - Aanálisecaso a caso, defendida em todasasmanifestações científicas, é um pres-

suposto da biossegurança e deve pautaros rumos das pesquisas. E, já que a pes-quisa científica pode reduzir os riscosassociados à utilização dos produtosgeneticamente modificados, como ex-plicar a perplexidade e as dúvidas dapopulação em relação aos alimentostransgênicos? Porque o debate sobre ostransgênicos omite a posição da ciênciasobre o assunto, avalia Chaimovich. "Amídia não tem dado espaço para a re-presentatividade dos cientistas': ele ob-serva. "Quem mais aparece são as em-presas de sementes, que defendem ostransgênicos, e algumas organizaçõesnão-governamentais, que atribuem ris-cos e catástrofes à biotecnologia. As en-tidades científicas têm de mostrar estu-dos e a mídia dar espaço para isso."

É imperioso também reconhecerque os cientistas têm falhado na tenta-tiva de manter a sociedade informadasobre o andamento, os riscos e as van-tagens das pesquisas com os OGMs. "Asociedade precisa estar mais bem infor-mada para se posicionar de forma maisequilibrada em relação a algo que tema ver com o seu dia-a-dia, com o meioambiente e com sua saúde",observa JoséFernando Perez, diretor científico daFAPESP."A comunidade científica estáacordando para uma responsabilidadeda qual ela não pode fugir. É funda-mental que exista um canal de comuni-cação para um diálogo mais eficientecom a sociedade, que permita aos cida-dãos informar-se sobre potencialidadee limitações da ciência."

Ao fim e ao cabo - ediante das evidências de queos OGMs não se constituemnecessariamente em ameaça

à saúde humana e ao meio ambiente -a palavra final será do consumidor, jáque os produtos geneticamente modifi-cados, restabelecidas as regras para asua produção, devem ser identificadose rotulados.

Na história do Brasil,não será a pri-meira vez que se hesita em adotar umproduto resultante do avanço da ciên-cia. Em 1904, quando o país começavaa se enquadrar nos termos da novaordem econômica mundial instauradapela Revolução Científico-Tecnológica,no Rio de Janeiro, então capital federal,os brasileiros se insurgiram contra acampanha de vacinação obrigatóriacontra a varíola. A campanha, decididapela presidência da República, foi capi-taneada por Oswaldo Cruz, titular daDiretoria Geral de Saúde Pública. Na-quele mesmo ano, em apenas seismeses,tinham sido contabilizadas oficialmen-te mais de 1.800 internações no Hospi-tal São Sebastião, no Distrito Federal, eo total de óbitos chegava a 4.201, deacordo com Nicolau Sevcenko,no livroA Revolta da Vacina - Mentes Insanasem Corpos Rebeldes. A oposição argu-mentava que os métodos de aplicaçãodo decreto de vacinação eram trucu-lentos, as vacinas e os aplicadores erampouco confiáveis e os funcionários, en-fermeiros e fiscais "manifestavam ins-tintos brutais e moralidade discutível".O governo revogou a obrigatoriedadeda vacina antivariólica e o movimentorefluiu. Mas a ciência, aos poucos, ven-ceu a doença. •

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(• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

LEGISLAÇÃO

De volta ao campoResolução flexibilizao acesso de pesquisadoresao patrimônio genético

OConselho de Gestão doPatrimônio Genético(CGEN), do Ministé-rio do Meio Ambiente(MMA), liberou o aces-

so de pesquisadores ao patrimônio ge-nético em áreas privadas, proibido desde2001. Na época, o governo federal edi-tou a Medida Provisória n= 2.186-16 que,com o intuito de proteger a biodiversi-dade, provocou um verdadeiro estragonas pesquisas que envolviam ativos danatureza, já que submeteu às mesmasregras draconianas tanto as atividadescientíficas como aquelas ligadas à explo-ração comercial. "Antes de ir a campo, ospesquisadores tinham que apresentar aoCGEN o itinerário previsto, com data elocal da coleta e a autorização, por escri-to, dos proprietários das áreas a serem vi-sitadas", conta Miguel Trefaut UrbanoRodrigues, do Instituto de Biociências daUniversidade de São Paulo (USP). Coma Resolução n> 8, publicada no DiárioOficial de 8 de outubro, o MMA come-ça a flexibilizar esse quadro, permitindomaior mobilidade dos cientistas. "Estadecisão é resultado do trabalho que, coma ajuda de alguns pesquisadores, esta-mos desenvolvendo junto ao Conse-lho", diz Carlos Alfredo Ioly, coordena-dor do programa Biota-FAPESP, desdemaio um dos representantes indicadospela Sociedade Brasileira para o Pro-gresso da Ciência (SPBC) para integraro CGEN na condição de convidado.

A Resolução do CGEN não tem for-ça para alterar as regras definidas em2001, mas enquadra as atividades depesquisa num dispositivo previsto noartigo 17 da MP, que prevê a dispensade "anuência prévia de seus titulares"para os casos de "relevante interessepúblico". Assim, caracterizado como"caso de relevante interesse público",

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diz João Paulo Capobianco, secretáriode Biodiversidade e Florestas, doMMA. O Instituto Brasileiro do MeioAmbiente e dos Recursos NaturaisRenováveis (Ibama) também preparauma instrução normativa para facili-tar a coleta do material de pesquisa,igualmente flexibilizando o processode autorização. "Essa medida vai tor-nar mais ágil o processo de coleta';adianta.

Pesquisa científica sobre biodiversidade é caso de relevante interesse público

Projeto de lei - Provavelmente até o fi-nal do ano o MMA encaminhará aoCongresso Nacional um conjunto desugestões para serem incorporadas aoProjeto de Lei de Acesso aos RecursosGenéticos - originalmente de autoriada própria ministra do Meio Ambiente,então senadora Marina Silva - e que jáestá na Câmara dos Deputados. "Que-remos aprimorar o projeto, incorpo-rando inovações positivas, para garan-tir instrumentos rigorosos de proteçãoà biodiversidade sem onerar os pesqui-sadores", afirma Capobianco.

fica liberado o acesso de pesquisa-dores aos componentes do patrimôniogenético existentes em área privada,desde que suas atividades contribuam,simultaneamente, para o avanço do co-nhecimento da biodiversidade no paíse não apresentem potencial de usoeconômico previamente identifica-do, como ocorre nas atividades de bio-prospecção,

Agora, o pesquisador responsávelcomunica ao CGEN a intenção de in-vestigação, mas só deverá apresentar ascoordenadas geográficas de cada pontode coleta, assim como a lista do mate-rial coletado devidamente identificado,até 180 dias após a expedição. Se amos-tras coletadas revelarem potencial deuso econômico, a instituição patroci-nadora da pesquisa deve informar ofato ao Conselho para a formalizaçãode Contrato de Utilização do Patrimô-nio Genético e de Repartição dos Be-nefícios, conforme está previsto na MP.

"Esse é o primeiro passo para me-lhorar a situação dos pesquisadores",

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• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

1M PORTAÇÕES

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Obstáculos superadosFundação atendetoda a demandados pesquisadores

AAPESPiniciou a terceira eta-pa do processo de retomadadas importações de bens eserviços. Iniciou a análise

de solicitações apresen-tadas por pesquisadores responsáveispor projetos de pesquisa já contratadose que tenham conclusão prevista entre·os dias Iv de maio de Zêüô e âl dedezem-bro de 2007. Somente serão autorizadasas importações de material permanen-te, de consumo e serviços de terceiros,que já constarem no Termo de Outorgae Aceitação e que forem absolutamenteindispensáveis para a conclusão do pro-jeto. Não serão atendidas as solicitaçõesde importação de equipamentos já dis-poníveis na instituição do pesquisador.Se, apesar desta restrição, o pleito formantido, deve vir acompanhado de jus-tificativa circunstanciada. A aprovaçãoda solicitação implicará a alteração doTermo de Outorga e Aceitação, com novadata de conclusão do projeto. O saldo dosrecursos de Reserva Técnica eventual-mente existente será utilizado para co-

brir os custos de importação desses bens,cerca de 25% dos valores concedidos.

Outras duas portarias - a CS 25/2003e CS 30/2003 - já haviam autorizadoimportações de bens e serviços para pro-jeto com conclusão prevista no perío-do de 31 de outubro deste ano até 30 deabril de 2004. Com a nova Portaria CS-31/2003, que estende esta cobertura atéo final de 2007, passam a ser atendi-dos todos os pedidos que haviam sidoencaminhados à Fundação. Com isso,a FAPESP estará atendendo todas as de-mandas por equipamentos, bens de con-sumo e serviços importados, sem dei-xar de cumprir, e até ultrapassar, a metaestabelecida pelo seu Conselho Superiorde fechar o ano com uma disponibili-dade líquida de R$ 580 milhões: atingiupouco mais de R$ 600 milhões.

As importações tinham sido inter-rompidas em agosto do ano passado,em caráter emergencial, por conta deuma desvalorização de 67,5% do realem relação ao dólar registrada até o ter-ceiro semestre de 2002. Três meses de-

pois, a FAPESP passou a autorizar, emcaráter excepcional, compras externasde material de consumo e de peças dereposição, apenas na quantidade indis-pensável. Em setembro deste ano, edi-tou a primeira portaria retomando asimportações no valor de até US$ 5,4milhões.

A FAPESP recomenda aos pesqui-sadores que renegociem com os forne-cedores os preços de forma a poderatender a um maior número possívelde solicitações, que devem ser encami-nhadas ao endereço eletrônico [email protected]. Da propostadeverão constar um relatório sucintodescrevendo o estágio de desenvolvi-mento do projeto, itens cuja importa-ção é indispensável, entre outros. Paracada um destes itens deverão constardescrição e quantidade, assim como oseu valor em moeda estrangeira; razõesque tornam indispensável a sua impor-tação; e breve descrição do parque deequipamentos de mesma natureza dis-poníveis na instituição. •

PESQUISA FAPESP 93 • NOVEMBRO DE 2003 • 25

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• POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

FOM ENTO

Balanço positivoMedidas amargas em 2002permitiram à FAPESP retomarinvestimentos em 2003

MARIA DA GRAÇA MASCARENHAS

Foram decisões maduras, tomadasno momento em que a instituição com-pletava 40 anos. "As decisões foram to-madas para preservar a capacidade deatuar de maneira eficiente no fomento àpesquisa e na geração de conhecimen-to, que sempre caracterizaram a atua-ção da FAPESP", comenta o presidenteda Fundação, Carlos Vogt.

A decisão do Conselho Superior,em agosto do ano passado, de suspenderas importações de bens e serviços, emface da instabilidade cambial, foi umremédio amargo mas necessário parapreservar a saúde da instituição. E deforma gradual, pari passu com a estabi-lidade econômica do país, as comprasno exterior foram sendo retomadas.Em outubro deste ano, foram autoriza-

das importações de bens e serviços paraprojetos com vigência até 2007.

"Com a autorização, no mês passa-do, dessas novas etapas de importação, ~

wforam atendidas todas as solicitações ,~".que estavam depositadas na FAPESP. §_~~Todas as demandas estão sendo zera- ."

~=das", diz Vogt. Segundo ele, a retomada ;~.<.>

das importações foi possível exata- ;Emente porque foram tomadas, no mo- ~~mento certo, medidas preventivas de ~~contenção de gastos aliadas a uma ~~

"<programação organizada de investi- ~~mentos. "Isto permitiu a recuperação ~ª<"da disponibilidade financeira da Fun- ~~dação, que alcançou, no final de se- gS

<wtembro passado, a marca de R$ 600 ~~milhões, superando as expectativas de ~~R$ 550 milhões para o final do ano", ê~

Emum ano marcado por cri-se financeira e cambial, co-mo foi 2002 no Brasil, aação da FAPESP pautou-sepela reflexão e pela necessi-

dade de adoção de medidas preventivasde adequação do financiamento querealiza à pesquisa científica e tecnológi-ca à nova realidade conjuntura!. Procu-rando manter o equilíbrio financeiro dainstituição, garantia da sua capacidadede investimento futuro, a Fundação, aomesmo tempo, não se descuidou dosprojetos de pesquisa em andamento.Fechou o ano com o desembolso deR$ 455,5 milhões para a pesquisa noEstado de São Paulo, como mostra oRelatório de Atividades 2002, que estásendo lançado.

26 . NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

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comemora Vogt. E acrescenta: "Arecu-peração da disponibilidade financeiravai permitir que a Fundação mante-nha com tranqüilidade a sua capacida-de de apoio à pesquisa cultural, cientí-ficae tecnológica, por meio de bolsas eauxílios, e, ao mesmo tempo, tenhapreservada a sua capacidade de gerarrecursos próprios para complementarseu orçamento anual':

diversas modalida-des de bolsa no paísR$ 153,15 milhões,ou 33,63% do totaldesembolsado pela

FAPESP no exercício, como mostra ográfico à página 28 e o quadro à página29. Fica evidente que, apesar da altacompetitividade,o desembolso com bol-sas continua elevado, o mesmo aconte-cendo com as concessões, mostradasna tabela à página 29.

No total do ano, foram aprovadas4.108 novas solicitações de bolsas, sen-do 3.959 para bolsas no país. Em algu-mas modalidades, como DoutoradoDireto e Pós-Doutorado, o número deconcessões corresponde, respectiva-mente, a 62,2% e a 66,3% da demanda.

Bolsas regulares - Outra medida amar-gatomada em 2002 foi o maior rigor naanálisedas novas solicitações de bolsas,que já havia sido iniciado no ano ante-rior,motivado pelo expressivoe constan-te aumento da demanda há vários anose agravado pela redução dos investi-mentos das agências federais no Estado

de São Paulo. A essasituação, a FAPESPvinha respondendocom o aumento dasconcessões.Em 1993,a Fundação aprovou 1.160novas bolsasno país; em 2000, 4.965, o que repre-senta uma expansão de 328% no pe-ríodo. Em 2000, os gastos com bolsas járepresentavam 38,38% do total desem-bolsado pela FAPESPno ano.

Para não comprometer o apoio aoutras modalidades de pesquisa, em2001 a análise dos projetos de bolsas demestrado e doutorado se tornou maisrigorosa e, em 2002,os pedidos de bolsapassaram a ser julgados num processode análise comparativa. Ainda assim,no ano passado, foram gastos com as

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Pagamentos de bolsas e auxílios efetuados no período 1995/2000

100

90~

80 - 40,57 33,38 - 28,8617,42 11,83 9,93

44,4410 54,68

f11L34,76 38,35 43,39

% ;&33,47

- 32,3240

40,80 29,97

38,38 - 35,44 - 33,63

Na modalidade IniciaçãoCientífica, as bolsas aprova-das correspondem a 64,4%da demanda.

"Com esse nível de con-cessão, a FAPESP compro-meteu percentual significati-vo de seu orçamento combolsas. A previsão é de que,para 2004,haja um aumentono orçamento e no investi-mento em bolsas da ordemde 12%,o que acarretará umaumento do número de bol-sas concedidas" informa opresidente da FAPESP.

Auxílios regulares - A FA-PESP aprovou, em 2002,3.141 novas solicitações deauxílios regulares em todasas modalidades. O desem-bolso com essa linha de fo-mento totalizou R$ 197,64 milhões,correspondendo a 43,39% do total gas-to pela Fundação no exercício (ver grá-fico e quadro). Do total desembolsado,92,92% destinaram-se à modalidadeauxílio a projeto de pesquisa. Com osprojetos temáticos - aqueles desenvol-vidos por equipes maiores, às vezes dediversas instituições de pesquisa - fo-ram gastos R$ 60,91 milhões e aprova-dos 55 novos projetos.

A demanda e a concessão de auxí-lios regulares pela Fundação cresce-ram ao longo da década de 1990. Noperíodo de 1993 a 2002, as solicitaçõespassaram de 2.800 para 4.896, o quecorresponde a uma expansão de 74,9%.No mesmo período, o número de pro-jetos aprovados passou de 1.788 para3.141,um crescimento de 75,7%.

Junto com as bolsas, os auxílios re-gulares compõem a linha tradicionalde fomento à pesquisa da FAPESP,uma prioridade da Fundação. Nos últi-mos exercícios, eles vêm absorvendocerca de dois terços dos recursos de-sembolsados a cada ano. As modalida-des de auxílio apoiadas pela Fundaçãosão auxílio a pesquisa, auxílio a publi-cação, auxílio à participação em reu-nião científica e/ou tecnológica noBrasil e no exterior, auxílio à vinda depesquisador visitante e auxílio à orga-nização de reunião científica.

Programas - O ano de 2002 não foi delançamento de novos programas, mas

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1995 1996 1997 1998

• Programas Especiais • Inovação Tecnológica• Bolsas • Auxílios

1999 2000 2001 2002

de consolidação dos já existentes. Noano, foram gastos com os ProgramasEspeciais R$ 45,23 milhões e com osProgramas de Inovação Tecnológica,R$ 59,43 milhões. Esses valores repre-sentam, respectivamente, 9,93% e13,05% do desembolso total da FA-PESP (ver gráfico e quadro).

Os Programas Especiais compre-endem aqueles criados pela Fundaçãocom o objetivo de capacitar recursoshumanos para a pesquisa em áreas es-tratégicas ou em que há reduzido nú-mero de quadros, modernizar a infra-estrutura física do sistema estadual depesquisa, assegurar aos pesquisadoreso acesso eletrônico a dados e informa-ções do Brasil e do exterior. Enfim, darsuporte à formação e melhor desem-penho da atividade de pesquisa.

Noano passado, estavamem andamento os se-guintes Programas Es-peciais: Apoio a JovensPesquisadores, Capaci-

ração de Recursos Humanos de Apoio aPesquisa (ou Capacitação Técnica), En-sino Público, Incentivo ao JornalismoCientífico (Mídia Ciência) e RedeANSP- Acadernic Network at São Pau-lo. O Programa de Infra-Estrutura, jáencerrado, teve ainda em 2002 desem-bolsos referentes a projetos aprovadosem anos anteriores

Com o programa Apoio a JovensPesquisadores foram gastos R$ 16,50

milhões. Os projetos remanescentes doPrograma de Infra-Estrutura e a RedeANSP absorveram, respectivamente,R$ 12,61 milhões e R$ 11,33 milhões.

O objetivo do programa Apoio a Jo-vens Pesquisadores é formar novosgrupos e líderes de pesquisa em centrosemergentes do Estado de São Paulo. ARede ANSP,por sua vez, é um suportefundamental às atividades de ensino epesquisa. Ela liga as redes de computa-dores acadêmicas e dos institutos e cen-tros de pesquisa científica e tecnológicado Estado de São Paulo entre si e com oBrasil e o exterior. É a Rede ANSP a viade conexão à Internet de todas as insti-tuições vinculadas ao sistema estadualde ciência e tecnologia.

No Programa de Infra-Estrutura, jáencerrado para recebimento de proje-tos, foram desembolsados, desde a suacriação em 1995, R$ 505 milhões, narecuperação e modernização de labo-ratórios, biotérios, redes de informáti-ca, bibliotecas e museus de universida-des e institutos de pesquisa no estado.

Inovação Tecnológica - Os Programasde Inovação Tecnológicacompreendemaqueles criados pela Fundação cujos re-sultados de pesquisas têm evidente po-tencial de inovação tecnológica ou deaplicação na formulação de políticaspúblicas. Alguns deles têm isso comoseu principal objetivo. Em 2002, esta-vam em andamento os programas Ge-noma-FAPESP, Biota-FAPESP,Pesqui-

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Resumo da evolução dos recursos concedidos e desembolsados pela FAPESP

Bolsas no país - Modalidades

*IC MS DR DO PDBR

Número de bolsas concedidas pela FAPESP em 2002

Total de concessões 1.872 734 651

2001 2002 Variação Porcentual

Recursos Recursos Recursos RecursosCrescimento Crescimento Crescimento

Linhas de Fomento Número de Concedidos (2) Desembolsados (3)Número de Concedidos (2) Desembolsados (3)

do Número dos Recursos dos RecursosProjetos (l)

(em R$l (em R$lProjetos (l)

(em R$l (em R$lde Projetos Concedidos Desembolsados

(em%l (em%l (em%l

Bolsas Regulares 4.030 120.057.394 174.762.669 4.108 113.059.101 153.155.937 1,94 -5,83 -12,36

Auxílios Regulares 3.102 195.381.298 189.226.230 3.141 242.589.392 197.648.045 1,26 24,16 4,45

Programas Especiais I726 92.618.545 129.075.056 763 107.930.474 104.668.919 5,10 16,53 -18,91Inovação Tecnológica (4)

Total 493.063.955 8.012 455.472.901 1,96

(1) O total de projetos inclui somente concessões iniciais.(2) O total de recursos concedidos inclui concessões,suplementações, suplementações por reajuste, anulações e transferências do exercício corrente.(3) O total de recursos desembolsados inclui pagamentos e devoluções do exercício corrente.(4) Inclui Auxílios e Bolsas.

sas em Políticas Públicas, Cen-tros de Pesquisa, Inovação eDifusão, Inovação Tecnológi-ca em Pequenas Empresas(PIPE), Parceria para Inova-ção Tecnológica (PITE), Con-sórcios Setoriais para Inova-ção Tecnológica (ConSITec),Programa de Apoio à Proprie-dade Intelectual (PAPIINu-plitec), Tecnologia para Ino-vação da Internet Avançada(Tidia), Rede de Biologia Mo-lecular Estrutural (SMolB-Net), Rede de DiversidadeGenética de Vírus (VGDN) e SistemaIntegrado de Hidrometeorologia do Es-tado de São Paulo (Sihesp).

Em 2002, foram gastos com os dezCepids financiados pela FAPESP R$15,78 millhões. São eles os centros deToxinologia Aplicada, de Biologia Mo-lecular Estrutural, de Pesquisa emÓptica e Fotônica, de Terapia Celular,de Estudos do Genoma Humano, deEstudos da Metrópole, de Estudos doSono, de Estudos da Violência, CentroMultidisciplinar para o Desenvolvi-mento de Materiais Cerâmicos e Cen-tro Antonio Prudente de Pesquisa eTratamento de Câncer.

Vários deles já têm resultados ex-pressivos, como uma nova droga anti-hipertensiva a partir de veneno da co-bra jararaca, o aprimoramento datécnica de terapia fotodinâmica no tra-tamento de câncer e o desenvolvimen-

Demanda total 2.907 2.598 1.322 397

247

to pela FAPESP com o fo-mento à pesquisa em 2002em três categorias - PesquisaBásica voltada exclusivamen-te para o avanço do conheci-mento, Pesquisa Básica compotencial de aplicação e Pes-quisa Aplicada -, se verificaráque as duas últimas catego-rias têm quase o mesmo peso,com pequena vantagem paraa pesquisa aplicada. Com osprojetos assim classificados,foram gastos 39,83% do totaldo desembolso no ano e

38,06% com a segunda categoria. Emnúmero de projetos aprovados, 39,53%foram classificados na categoria pes-quisa aplicada e 36,89% na pesquisabásica com potencial de aplicação.

Diferentemente do que esses per-centuais podem indicar à primeiravista, o perfil do desembolso traduztambém o compromisso da Fundaçãocom o avanço do conhecimento, fina-lidade primeira da pesquisa básica, emqualquer das duas categorias. Juntas,elas receberam 60,16% dos recursos eseus projetos correspondem a 60,47%do número de aprovados no ano.

Para essa classificação não foramconsideradas as bolsas, mas apenas osauxílios regulares e temáticos e os auxí-lios associados aos programas Apoio aJovens Pesquisadores, Biota-FAPESP,Genoma-FAPESP, PITE, PIPE, ConSI-Tec e Ensino Público. •

% concessão 64,4 28,25 49,24 62,22 66,33

455

*IC-Iniciação Científica; MS-Mestrado; DR-Doutorado;DD-Doutorado Direto; PDBR-Pós-Doutorado no Brasil

to de um sistema de diagnóstico decâncer de pele por luz laser.

Com o programa Genoma-FA-PESP foram desembolsados R$ 14,87milhões e com o PITE e o PIPE, res-pectivamente, R$ 9,89 milhões e R$9,55 milhões. Desde o seu lançamento,em junho de 1997, até o ano passado,o PIPE havia aprovado 235 projetos depesquisa desenvolvidos em pequenasempresas. Somente em 2002 foramaprovados 65 novos projetos. O PITE,por sua vez, desde o seu lançamento,no final de 1994, até o ano passado, jáhavia aprovado 70 projetos de pesqui-sa que se desenvolvem na forma deparceria entre uma instituição de pes-quisa e uma empresa. Em 2002, 12 no-vos projetos foram aprovados.

Perfil dos gastos - Se forem classifica-dos os projetos aprovados e o total gas-

686

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• CIÊNCIA

LABORATÓRIO MUNDO

Uma razão a mais para evitar antibióticosBebês tratados com antibió-ticos durante os primeirosseis meses de vida são maispropensos à asma, de acor-do com um estudo realiza-do pela equipe de ChristineIohnson, do Sistema de Saú-de Henry Ford, em Detroit.Os pesquisadores acompa-nharam 448 crianças donascimento até os 7 anos econcluíram que o uso deantibióticos deve ter umaparcela de responsabilidadeno aumento contínuo doscasos de asma: quase meta-de das crianças recebeu an-tibióticos até os 6 meses deidade; um quarto delas, maisde duas vezes; e um quinto,três vezes ou mais (New-Scientist). Os testes constata-

• México cria vacinacontra cisticercose

Pesquisadores mexicanos de-senvolveram uma vacina con-tra a cisticercose, infecção pa-rasitária que representa umgrave problema de saúde naAmérica Latina e chega àspessoas por meio da ingestãode carne de porco contami-nada por ovos de tênia, ver-me que pode atingir 3 metrosde comprimento e viver maisde 25 anos no organismo hu-mano. Após 15 anos de traba-lho, o grupo de Edda Sciutto,da Universidade NacionalAu-tônoma do México (Unam),identificou no parasita cau-sador da doença, o cisticerco,componentes utilizados naconfecção de uma vacina, quese mostrou eficaz contra a

cisticercose suína em estudospreliminares com ratos. Emum teste de campo, a equipe daUniversidade do México apli-cou a versão sintética da vaci-na em 240 porcos e reduziuem 98% a quantidade deparasitas transmissores dadoença (SciDev.Net). O núme-ro de mortes por cisticercosevem diminuindo com o usode medicamentos que com-batem o parasita, como o al-bendazol e o praziquantel,mas ainda persistem efeitos in-desejados como dores de ca-beça ou crises epilépticas. Alémdisso, exames como a tomo-grafia ou ressonância magné-tica, os mais eficientes paradetectar a doença, permane-cem inacessíveis às populaçõesrurais e mais pobres, justa-mente as mais atingidas. •

30 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

Inversão:assepsia emexcesso podefacilitar osurgimentode alergias

• POUCO espaçofaz mal à saúde

Biólogos da Universidade deOxford, Inglaterra, descobri-ram que problemas como ocomportamento hostil e a altamortalidade dos animais dezoológico se devem à falta deespaço para circular. Os mais

ram que 21 crianças tinhamdesenvolvido alergia asmáti-ca, com ataques desencadea-dos por fatores ambientais,e que as crianças tratadascom antibiótico tinham de2,6 a 8,9 mais chances deapresentar o problema, de-pendendo do medicamento.Os antibióticos devem alte-rar as populações de bac-térias do intestino, dificul-tando a tarefa do sistemaimunológico em distinguirentre as bactérias nocivas eas benéficas ao organismo.Representam, enfim, umaassepsia excessiva: e, quan-to mais, maior é o risco dealergia ou de infecções, umaou outra contribuindo parao surgimento da asma. •

afetados são os grandes ma-míferos como os ursos pola-res e os felinos, acostumadosa territórios amplos (Nature).Os pesquisadores tentam ago-ra dar mais espaço aos ani-mais - ou, ao menos, mu-danças diárias de ambientes.A vida silvestre também nãoestá fácil. Os rinocerontes

Efeitos do cativeiro: hostilidade e alta mortalidade

Page 31: No ar, um novo avião brasileiro

ainda são dizimados por cau-sa dos chifres, usados na con-fecção de cabos de adagas noIêmen e de um pó afrodisía-co na China (New Scientist).Mas dois novos testes pro-metem ajudar a coibir essapilhagem. Um deles, da Aca-demia Central de Polícia deTaoyuan, em Taiwan, detectafragmentos do gene citocro-mo b nos produtos manufa-turados e identifica o tipo deanimal sacrificado. O outro,do Zoológico de Londres,vasculha no pó de chifre si-nais que revelem a espécie e areserva onde o animal vivia.Os dois testes só são viáveisporque o chifre de rinoce-ronte não é feito de osso,mas de tufos compactos depêlos, que denunciam suadieta, influenciada pelo tipode solo, clima e vegetação. •

• Para entender osantidepressivos

a-a-os

Em um estudo com 342 por-tadores de depressão publi-cado no American [ournal ofPsychiatry, uma equipe coor-denada pelo psiquiatra GreerMurphy, da UniversidadeStanford, Estados Unidos,encontrou dois genes queparecem estar associados aofato de um antidepressivobeneficiar ou prejudicar asaúde. Os indivíduos comuma simples mutação emambas as cópias de um dosgenes, o HTR2A, eram trêsvezes mais suscetíveis a so-frer efeitos colaterais, comoinsônia e agitação, que aque-les sem a mutação. O geneHTR2A induz à produção deuma proteína que se liga aoneurotransmissor serotoni-na, cuja falta está associada àdepressão. Os portadores deuma mutação no segundogene, chamado Apolipopro-teína E, apresentavam umaresposta melhor ao uso do

a-lI-

u-es,ioes

Remeron (mitzapina) que aoPaxil (paroxetina) e se livra-vam dos sintomas da depres-são mais rapidamente que osque não apresentavam essamutação. •

• Os vulcões e o fimdos dinossauros

O que levou os dinossauros àextinção? A pergunta nuncadeixou de incomodar GertaKeller, geóloga da universi-dade norte-americana dePrincenton. Ela faz parte deum grupo de estudiosos paraos quais a história do desapa-recimento dos dinossauros ébem mais complexa do quepossa supor a teoria do come-ta ou asteróide que teria atin-gido a Terra e matou a todoseles no fim do Cretáceo, há 65milhões de anos (PrincentonWeekly Bulletin). Mas essateria sido somente a gotad'água, e não a causa do pro-blema. Gerta e seus colegasquestionam até mesmo essepressuposto ao apresentarindícios de que a cratera deChicxulub, no México, oprovável local do choqueque provocou a morte dosdinossauros, teria surgidopelo menos 300 mil anosantes da extinção dos dinos-

Cabeça deafricanoem um vaso:preconceitoapenas contraos bárbaros

sauros. Ela quer provar queum período de intensaserupções vulcânicas acom-panhadas de uma série deimpactos com asteróides te-ria provocado a transfor-mação e a destruição doambiente terrestre daquelestempos. A hipótese ressus-cita em parte a tese do vulca-nismo, que prevaleceu antesda adoção da teoria do co-meta. Agora, Gerta e sua e-quipe estão estudando osindícios de poderosas erup-ções vulcânicas ocorridas hámais de 500 mil anos emáreas como Madagascar, Egi-to e Israel. Os primeiros re-sultados sugerem que os

efeitos do vulcanismo oudos asteróides sobre a vidaanimal não parecem muitodiferentes entre si. •

• O ecléticoexército romano

Não havia discriminação decor entre os romanos que vi-viam nas proximidades daMuralha de Adriano, um pa-redão de 173 quilômetros e 5metros de altura construídono ano 122, onde hoje é Gils-land, Nordeste da Inglaterra,para proteger o império doataque dos bárbaros. Deacordo com artefatos colhi-dos e analisados por pesqui-sadores da Universidade deNewcastle, Reino Unido, ha-via africanos em todos os ní-veis da sociedade romana,desde Victor, um escravo li-bertado nascido em Marro-cos, até o imperador SétimoSevero, que veio da Líbia.Podia não existir uma bar-reira de cor para espanhóis,franceses e alemães ingressa-rem no exército ou mesmono Senado, mas era intenso opreconceito contra quemusava brincos e, principal-mente, contra bárbaros, defi-nido como todo aquele quevivesse fora dos domínios doImpério Romano. •

Ação conjugada: erupções, cometa e transformações na Terra

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• Alta contaminaçãoentre agricultores

• Os cromossomosda conservação

Metade dos trabalhadoresrurais de nove cidades mi-neiras que responderam a umquestionário aplicado, entre1991 e 2000, pela FundaçãoJorge Duprat Figueiredo deSegurança e Medicina doTrabalho (Fundacentro), vin-culada ao Ministério do Tra-balho, estava ao menos mo-deradamente intoxicada pordefensivos agrícolas. A con-clusão consta de um estudofeito por pesquisadores daUniversidade Federal de Mi-nas Gerais (UFMG) e daUniversidade Federal do Riode Janeiro (UFRJ) e publica-do na edição de julho/agostoda revista Cadernos de SaúdePública. Os autores do traba-lho compararam as respostasde 1.064 agricultores queparticiparam da sondagemfeita pela Fundacentro comos resultados de seus examesde sangue. Tal confronto per-mitiu apontar os principaisfatores de risco que aumen-tam a chance de ocorrer in-toxicação, como ter tido oúltimo contato com defensi-vos há menos de duas sema-nas, não usar proteção nahora de aplicar o produto erecorrer a agrotóxicos dosgrupos organofosforados ecarbamatos. Um dado inte-ressante - e preocupante -destacado pelo estudo: ostrabalhadores rurais que sefiavam nas orientações dosvendedores de agrotóxico ti-nham 73% mais chances dese intoxicar do que os quenão faziam isso. Os agricul-tores de três cidades (TeófiloOtoni, Guidoval e Piraúba)também apresentaram riscomaior de contaminação doque os das demais localidadesestudadas (Uberlândia, Ubá,Tocantins, Paracatu, MontesClaros, Guiricema). •

Pesquisadores paulistas e flu-minenses caracterizaram oscromossomos que formam omaterial genético de duasaves silvestres ameaçadas deextinção, o papagaio anacã(Deroptyus accipitrinus), queocorre no norte da Amazô-nia, e a arara-azul (Anodorhyn-chus hyacinthinus), encon-trada no Cerrado e mata degaleria do Brasil Central.Ambas as aves são diplóides(apresentam cromossomosaos pares) e têm 70 cromos-somos. Esse tipo de trabalhopode ser útil para os esforçosque visam preservar a di-versidade genética dessasespécies, uma vez que o cru-zamento constante entre po-pulações aparentadas podeser um fator negativo paraperpetuação de animais comreduzido número de indiví-duos entre sua população.Ainda do ponto de vistaambiental, outra possívelutilidade do estudo é usar acaracterização dos cromos-somos para diferenciar ma-chos de fêmeas dessas duasespécies, tarefa nem semprepossível de ser feita apenaspela análise de seus traços fí-sicos. Estimativas apontampara a existência de menosde 5 mil exemplares da ara-ra-azul. No caso do anacã,que chegou a ser capturado evendido de forma ilegal co-mo animal doméstico, o nú-mero de espécimes remanes-centes na região Norte podeser ainda menor. O estudofoi feito por pesquisadoresda Universidade Federal deSão Carlos (UFSCar), Uni-versidade Estadual Paulista(Unesp), de Botucatu, e Uni-versidade Federal Fluminen-se (UFF) e saiu na edição desetembro da revista Geneticsand Molecular Biology. •

Agrotóxico: risco maior em três municípios mineiros

• Remédio ativa geneque incha a gengiva

sociado a esse problema. Mô-nica constatou que, em pes-soas tratadas com ciclospo-ri na, o remédio intensificouem 54% o funcionamento deum gene que produz o perle-can, uma das moléculas res-ponsáveis pela hidratação econsistência rígida da gengi-va. O trabalho, que tambémcontou com a colaboração depesquisadores do Hospital doRim e Hipertensão da Univer-sidade Federal de São Paulo(Unifesp) e da Faculdade deOdontologia da Universida-de de São Paulo (USP), deve-rá ser publicado em breve no[ournal of Periodontology. •

O crescimento exagerado dagengiva, que pode gerar san-gramentos, dificultar a hi-giene e até deformar a arca-da dentária, é um dos efeitoscolaterais do uso da ciclos-porina, droga que diminui arejeição ao transplante deórgãos. Um estudo coordena-do pela biomédica MônicaValéria Marquezini, do La-boratório de Biologia Tu-moral da Fundação Pró-Sangue/Hemo centro de SãoPaulo, levantou indícios deque um gene pode estar as-

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Massad, da Faculdade de Medicina daUSP,também chegou a essa conclusão,com base nos mesmos argumentos: opaís está na rota das aves migratóriasque espalharam essevírus pelo mundo,e temos em abundância os transmisso-res - os mosquitos do gênero Culex, ospernilongos domésticos. Mas, lembrameles, é preciso conhecer informaçõesbásicas como a taxa de transmissão -apenas uma ou cem aves em um grupode mil carregam o vírus?- antes de defi-nir com precisãoa gravidadeda situação.

~

é agora, os cientistas brasi-leiros não contavam com la-boratórios adequados paratrabalhar em segurançacom vírus como o do

Oeste do Nilo ou o da síndrome respi-ratória aguda severa (Sars), os mais no-vos representantes das chamadas doen-ças emergentes, que causam danosseveros porque o organismo ainda nãoestá habituado a lidar com eles.A situa-ção começa a mudar este mês com ainauguração, no dia 11, do Laborató-rio Klaus Eberhard Stewien, assim cha-mado em homenagem a um virologistaalemão naturalizado brasileiro, hojecom 65 anos, que ajudou a conter a pa-ralisia infantil no Brasil.

36 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

Construído durante um ano e meiono segundo andar de um dos prédiosdo Instituto de Ciências Biomédicas daUSP, o novo laboratório é o primeirono país com o padrão NB3+ (nível debiossegurança 3+). É quase o máximopossível para a pesquisa civil- há insta-lações mais sofisticadas somente nosCentros de Controle e Prevenção deDoenças (CDC), de Atlanta, EstadosUnidos, referência mundial em doen-ças emergentes. "Esse laboratório daUSP está servindo de referência para odesenvolvimento dos projetos da redede 12 laboratórios NB3 que o Ministé-rio da Saúde começou a construir esteano", diz Mário Althoff, coordenadorgeral da rede de laboratórios de saúdepública da Secretaria de Vigilância emSaúde do Ministério da Saúde. Segundoele, oito dessas áreas novas já estão emconstrução e devem entrar em operaçãoaté o final de 2004em Brasilia,Fortaleza,Manaus, Salvador, Recife, Porto Alegree São Paulo, com o propósito de lidarcom vírus e bactérias importantes paraa saúde publica, com riscos mínimos pa-ra a vida dos pesquisadores ou da po-pulação. "Com essa rede': diz Althoff, "apesquisa com os bacilos da tuberculoseserá feita pela primeira vez dentro dascondições adequadas no Brasil."

Macacão, máscara e botas . Não énada fácil nem confortável entrar nes-sas fortalezas. Por enquanto, EdisonDurigon, o coordenador do laborató-rio do ICB, pede para os convidadosapenas cobrirem os sapatos com umaspantufas brancas, por ali chamadas depropé, antes de conhecerem o espaçode quase 50 metros quadrados inteira-mente vedado e cercado por paredes demeio metro de espessura. Mas a partirde janeiro, quando o laboratório estiverfuncionando normalmente, apenas seispesquisadores vão carregar o cartãoeletrônico que destrava a porta de en-trada - e terão de seguir uma série deprocedimentos que lhes tomará pelomenos dez minutos ao entrar e outrosdez ao sair. Numa sala de 1 metro por2, vão se despir e pôr um macacão im-permeável, botas, máscaras e óculos. Sóentão, passando por portas que abremsomente se outras forem travadas, po-derão chegar à sala principal, com osfreezers, estufas de cultivo de vírus, es-paço para experimentos com célulasouanimais e equipamentos de seqüencia-mento de genomas.

O laboratório do ICB será o primei-ro dos quatro NB3+ a serem construí-dos em São Paulo. Até o final do próxi-mo ano, se as obras correrem conforme

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o esperado, deve começar a funcionaroutra unidade na USP de Ribeirão Pre-to, uma terceira na Universidade Esta-dual Paulista (Unesp) em São José doRio Preto e a quarta no Instituto Adol-fo Lutz, na capital. A construção dosquatro laboratórios faz parte de umprojeto maior, a Rede de DiversidadeGenética de Vírus ou VGDN (sigla eminglês para Viral Genetic Diversity Net-work), criada no final de 2000 com umfinanciamento de cerca de R$ 12 mi-lhões da FAPESP.

Hoje,quase 150 pesqui-sadores de 22 grupos depesquisa paulistas - in-cluindo órgãos da Se-cretaria de Estado da

Saúde e um hospital privado, o AlbertEinstein - investigam a diversidade e aspeculiaridades de quatro vírus: a linha-gem do vírus da Aids mais comum noBrasil,o HIV-l, cujo genoma deve serseqüenciado até o final do próximoano; o HCV, causador da hepatite C, aser seqüenciado logo depois; o vírusrespiratório sincicial, ou VRS,causadorde infecçõesgravesnos pulmões e prin-cipal causa de morte de crianças de até18 meses; e o hantavírus, causador depneumonias graves, letais em até 40%

dos casos. O laboratório do ICB vaiabrigar estudos sobre hantavírus, arbo-vírus e o vírus do Oeste do Nilo, combase em amostras de sangue de roedo-res e aves já coletadas na Amazônia ena Mata Atlântica. "Por segurança, nãovamos manter vírus exóticos no labo-ratório antes que apareçam no Brasil',tranqüiliza Durigon, que trabalhou de1990 a 1994 em Atlanta, nos Centrosde Controle e Prevenção de Doenças(CDC), em um laboratório bastantesemelhante ao que agora coordena.

Na Rede, especialistas em insetostrabalham com médicos, virologistas,geneticistas e biólogos moleculares. Asconclusões a que chegarem deverão ex-plicar - ou explicar melhor - a origem,as formas de transmissão e de propaga-ção e as melhores técnicas de tratamen-to das doenças causadas por vírus. Oque se deseja é encontrar marcadoresmoleculares de virulência (genes, tre-chos de genes ou proteínas) que pos-sam, por exemplo, reduzir a resistênciado vírus da Aids aos medicamentos.

Com os dados à mão, torna-se maisfácil dar mais consistência às ações desaúde pública e orientar as campanhasde vacinação. Ao menos para Massad,

não sena a pnmeIravez. Exemplo raro de

médico hábil em equações (estava noquinto ano de medicina quando entrouno curso de física), ele cria modelosmatemáticos que indicam o comporta-mento das epidemias e foram úteis, porexemplo, na epidemia de rubéola de1992: recomendava-se vacinar todas ascrianças e jovens com idade entre 9 me-ses e 15 anos, mas Massad demonstrouque bastaria vacinar as crianças na fai-xa etária de 1 a 10 anos, apenas com 7milhões de vacinas. Foi possível reduziros custos da vacinação quase à metade(veja Pesquisa FAPESPnO61, de janeirode 2001). Novamente convocada quan-do surgiu a epidemia de sarampo de1997,a equipe da Faculdade de Medici-na ajudou a criar uma estratégia de va-cinação que permitiu limitar o impactodo vírus a 20 mil casos, bem menos queos 300 mil previstos inicialmente.

Apoio aos médicos - As informaçõesque emergem dos laboratórios da Redejá chegam aos médicos que atendem asvítimas dos vírus. Danila Vedovello eLarissa do Amaral, duas biólogas doICB, recebem as amostras de secreçãonasal de crianças internadas com sus-peita de infecção pelo vírus sincicial

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Uma dasmetas édescobrirvírus antesque apareçamnas pessoas

nos sete hospitais ligados ao projeto.No laboratório, ao mesmo tempo quereúnem material para pesquisa, elasidentificam o vírus causador dos sinto-mas e em um ou dois dias enviam o re-sultado aos médicos, que assim esco-lhem o tratamento mais adequado, jáque mesmo bactérias efungos podem levar asintomas muito seme-lhantes. Em Ribeirão Pre-to, a equipe de Luiz Ta-deu Moraes Figueiredoelaborou um quadro desintomas que permitemaos médicos reforçar asuspeita de infecçãocausada por hantavírus,transmitido pelo ar emlugares p'or onde anda-ram oJ ratos-de-rabo-peludo ou rato-do-mato (Bolomys la-ziurus)/seus reservatórios naturais. "Jábasta a suspeita de contaminação porhantavírus para mandar os indivíduosatingidos para hospitais que tenhamUTIs (unidades de terapia intensiva)",diz Figueiredo.

Nofinal dos anos 90,quando se intensifica-ram os casos de vítimasde hantavírus na regiãode Ribeirão Preto, Fi-

gueiredo conseguiu ser ágil para desen-volver um método de diagnóstico quereconhece em quatro horas os vírusdessa família. Paolo Zanotto, do ICB daUSP, foi igualmente rápido com o vírusda Sars, responsável por uma formaatípica de pneumonia que matou 800pessoas em mais de 30 países desde quefoi identificada em fevereiro deste ano.Em julho, quando trabalhou na Uni-versidade de Freiburg, na Alemanha,Zanotto desenvolveu um método dedetecção do vírus que aumentou em100 mil vezes a eficiência do teste tradi-cionalmente usado. Ele embarcou paralá apenas com a idéia do novo teste, su-gerida por Carlos Augusto Pereira,pesquisador do Instituto Butantan: aregião terminal do genoma de corona-vírus, a família a que pertence o vírusda Sars, induz a uma produção intensade moléculas de ácido ribonucléico(RNA). Na bagagem de volta, Zanottotrouxe RNA, material clonado e frag-mentos de genes que permitem. umdiagnóstico mais preciso.

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Zanotto só vai mexer nesse material- e mesmo com o vírus, caso a Sars apa-reça no Brasil- dentro do novo labora-tório. O espaço do ICB é mantido sobpressão negativa (menor que a externa)justamente para evitar que qualquermicrorganismo saia de lá. Ali dentro a

temperatura permanecea 20° Celsius - mesmoassim se prevê que ospesquisadores sentirãocalor quando usarem ouniforme completo detrabalho - e o ar é filtra-do e trocado inteira-mente 12 vezes a cadahora. Os instrumentosde trabalho devem seresterilizados e mesmoobjetos pessoais comoóculos passam por um

banho com detergente sob radiação ul-travioleta antes de serem postos paradentro ou para fora. Encerrado o traba-lho, os próprios pesquisadores saempor um caminho que os força a um ba-nho com 50 litros de água, e o macacãoque usaram segue para um tanque fe-chado - uma autoclave - em que são la-vados sob pressão e vapor. Quem senteum pouco de claustro fobia na certa vaise contentar em observar o trabalhoapenas pelo visor de vidro duplo ao la-do da porta de entrada.

Sabiá solto - À medida que se consoli-da, a Rede cria condições mais adequa-das para enfrentar vírus como o Sabiá,que surgiu repentinamente em 1990.Sua história começou quando umaagrimensora que morava no Jardim Sa-biá, em Cotia, na Grande São Paulo, foilevada em estado grave ao hospital do

o PROJETO

Rede de Diversidade Genéticade Vírus

MODALIDADEProgramas Especiais

COORDENADORESEDUARDO MASSAD - Faculdade deMedicina da USp, e EDISON DURIGONe PAOLO ZANOTTO - ICB da U SP

INVESTIMENTOR$ 6.687.937,23 eUS$ 1.674.373)4

Instituto Emílio Ribas. Os médicos pou-co puderam fazer: vítima de hemorra-gias intensas, ela morreu no mesmo dia.Pesquisadores do Adolfo Lutz recebe-ram as amostras de sangue contendo ovírus e as enviaram para o InstitutoEvandro Chagas, de Belém, outro cen-tro de referência em virologia no país,que nos últimos 50 anos caracterizoucerca de II mil cepas (variedades) dequase 200 tipos de arbovírus. Ali, umtécnico se contaminou ao inocular ca-mundongos recém-nascidos com essevírus, que se espalha pelo ar. O materialcom o vírus a ser identificado seguiuentão para uma unidade da Universi-dade de Yale, nos Estados Unidos, cre-denciada pelo Organização Mundial daSaúde (OMS) para lidar com vírus exó-tico. Nem ali o Sabiá se aquietou. Umestagiário francês contaminou-se quan-do um tubo de ensaio estourou em suamão ao ser retirado da centrífuga. Emvez de comunicar o fato à equipe, elelimpou a centrífuga, fechou o labora-tório e foi embora. Uma semana de-pois, como já havia acontecido com otécnico de Belém, estava internado comfebres intensas. Ambos sobreviveram,mas até hoje ninguém sabe como sur-giu, se realmente desapareceu e paraonde foi o vírus só identificado três me-ses depois de encontrado (hoje, basta-ria uma semana).

Constituídos por apenas uma mo-lécula de ácido desoxirribonucléico(DNA) ou ribonucléico (RNA) envol-vida por uma casca protéica, os vírussão estruturas extremamente simples -tão simples a ponto de ainda haver dú-vida se são realmente seres vivos, já queprecisam de outros organismos para sereproduzirem. Mas perseguem os sereshumanos da infância à velhice. Já exis-tem vacinas que detêm os vírus do sa-rampo, da rubéola, da poliomielite(paralisia infantil), varicela (catapora),rubéola e raiva, mas ainda pouco sepode fazer contra outros tormentos dasmães de filhos pequenos como os cau-sadores da cachumba, da meningite vi-ral e da hepatite. Já os adultos devem seprecaver contra o vírus da Aids e tentardriblar os da dengue, da febre amarela edas linhagens que causam alguns tiposde câncer, ainda que de vez em quandoapareçam as dolorosas erupções cau-sadas pelo vírus da herpes. Mais tarde,principalmente para quem tem mais de65 anos, recomenda-se tomar a vacina

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As garças africanas de Fernandode Noronha: possíveis reservatóriosdo vírus do Oeste do Nilocontra o vírus da gripe, que nas déca-

das anteriores pouco preocupou. Hou-ve avanços, claro. Hoje não preocupamtanto as diarréias provocadas por vírus,que nos anos 70 eram a principal causade morte no Brasil.

cilitam a transmissão de microrganis-mos com os quais o organismo huma-no ainda não entrou em contato.

Uma das metas dos coordenadoresda Rede Vírus é antecipar problemas -a virologia preditiva. Ou, em termospráticos, descobrir os vírus antes queapareçam nas pessoas. É com essa finali-dade que o biólogo Luiz Francisco San-filippo passou dois meses acampadonas margens do rio Machado, no Acre,colhendo sangue e amostras da secreçãoda traquéia e da cloaca de aves que fa-zem pouso por lá. Não lhe falta prática:Sanfilippo foi chefe da seção de aves dozoológico durante 12 anos, até o anopassado, quando começou o doutoradona equipe de Durigon. Este mês, Sanfi-lippo deve seguir para Fernando deNoronha e coletar material das duas es-pécies de garça africana, a vaqueira(Bubucus ibis) e a branca (Casmerodiusalbus), reforçando o levantamento daequipe do Instituto Brasileiro do MeioAmbiente e dos Recursos NaturaisRenováveis (Ibarna), que até agora nãoencontrou sinais do vírus do Oeste doNilo no Brasil. Porém a lista das 110 es-

pécies de aves que podem ser infectadasinclui a galinha (Gallus gallus), a pom-ba (Columba livia), a codorna (Coturnixcoturnix) e o marreco (Anas platyrhyn-chos), além de outras migratórias,como a garça-cinza (Ardea cinerea) e omaçarico-pequeno (Calidris minuta).

É também para descobrir proble-mas antes que eles apareçam que aequipe de Ribeirão Preto sai a campoao menos uma vez por mês, em umtrailer ligado a uma caminhonete eadaptado como laboratório móvel - ohantamóvel, como chamam -, para ca-çar roedores que possam abrigar han-tavírus. Nas próximas semanas, assimque o laboratório da USP começar aoperar, começam a ser analisadas as 300amostras de sangue de aves e outras600 de roedores trazidas de Rondônia,da Serra do Mar ou do interior paulistapara serem analisadas. Os pesquisa-dores querem saber como vivem e seespalham os vírus já conhecidos ou sehá espécies novas chegando. •

NOsanos 70, o vírus Ro-cio - outro transmiti-do pelo Aedes - causouuma epidemia de ence-falite em crianças no

Vale do Paraíba, entre as cidades de SãoPaulo e Rio de Janeiro. O Rocio aparen-temente desapareceu, mas ainda há crian-ças com anticorpos contra ele - um si-nal de que ainda pode estar circulando,mesmo que em uma versão menos peri-gosa. Durigon lembra que, além da pos-sibilidade de reaparecerem os vírus an-tigos, sempre podem surgir variedadesnovas, à medida que se derrubam asmatas. Pedro Vasconcelos, virologistado Evandro Chagas, acrescenta outro fa-tor de risco: a necessidade de produziralimentos em maior quantidade favore-ce o crescimento da população de roe-dores silvestres e de mosquitos que fa-

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• CIÊNCIA

GENÔMICA

Mais um suspeito na miraNova espécie de víruspode ser a causa damorte súbita dos citros

Umanova espécie de ví-rus pode ser a causa damorte súbita dos citros(MSC), doença de ori-gem misteriosa que, após

o aparecimento de seus primeiros sin-tomas, aniquila um pé de laranja em al-gumas semanas e representa atualmen-te a maior ameaça para a citriculturado Estado de São Paulo e do sul de Mi-nas Gerais. O anúncio foi feito no mêspassado por pesquisadores da AlellyxApplied Genomics, empresa de biotec-nologia sediada em Campinas e ligadaao grupo Votorantim, que identifica-ram um vírus até então desconhecido,da família Tymoviridae, em plantas comsintomas de morte súbita.

A própria companhia admite queainda não há certeza absoluta de que adoença esteja associada àpresença desse vírus, cujo pe-queno genoma, de 7 mil pa-res de bases e seis genes, foiseqüenciado nos laboratóriosda empresa. Os cientistas nãohesitaram em batizar o mi-crorganismo, literalmente, deCítrus Sudden Death Vírus(CSDV) - Vírus da MorteSúbita dos Citros - e já pedi-ram a patente nos EstadosUnidos sobre o uso de suasseqüências genéticas para odesenvolvimento de formasde prevenção, diagnósticos etratamento da doença. Se forconcedida, a patente também

Laranjeira infectada elaboratório da Alellyx: 90%

das plantas doentestinham o vírus CSDV

valerá para o Brasil. "Desenvolvemos umteste que permite o diagnóstico preco-ce da doença", assegura Fernando Rei-nach, presidente interino da Alellyx. Aeficiência do exame em detectar a pre-sença do novo vírus num pé de laranjaé da ordem de 90%, segundo Reinach.

Identificada pela primeira vez hápouco mais de dois anos em pomaresdo município mineiro de ComendadorGomes, a morte súbita dos citros é, porora, uma doença apenas encontrada noBrasil. O último levantamento feito pe-lo Fundo de Defesa da Citricultura (Fun-decitrus), instituição privada mantidapor produtores e indústrias de suco, in-dica que sua área de incidência abrange23 municípios, 11 do sul de Minas Ge-rais e 12 do norte de São Paulo. Apesarde menos de 1% dos 200 milhões de

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pés de laranja do sul de Minas e SãoPaulo apresentarem a doença, as taxasde expansão e letalidade da MSC sãoassustadoras. Estima-se que a doença jácausou prejuízo de pelo menos US$ 20milhões ao setor, que emprega 400 milpessoas e gera exportações da ordem deUS$ 1,3 bilhão.

A morte súbita afeta as raízes das la-ranjeiras e a priva de seus nutrientes,causando uma espécie de infarto. Seudiagnóstico é quase sempre tardio. Co-mo não se sabe com segurança qual é oagente causador da doença, só é possí-vel descobrir que a árvore está infecta-da após o aparecimento dos sintomasda morte súbita, como a perda de bri-lho em suas folhas. Às vezes, pode de-morar até dois anos para que essas ma-nifestações clínicas se materializem na

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planta. O problema é que, a essa altura,o pé de laranja já está condenado e nãoé possível salvá-lo (não há atualmentecura ou tratamento para a doença). Daío interesse da Alellyx - e de instituiçõespúblicas de pesquisa - em desenvolverum teste que permita o diagnóstico pre-coce da morte súbita.

Para a empresa de biotecnologia,uma das evidências que indicam a for-te associação entre o novo vírus e aocorrência da doença é um experimen-to feito com 110 pés de laranja (53 commorte súbita e 57 sadios). No final doestudo, os pesquisadores da Alellyx:cons-tataram que cerca de 90% das árvoresque apresentavam sintomas da doençatinham o CSDV e mais ou menos essamesma porcentagem das plantas sau-dáveis não tinham o CSDV. Outro indi-cador da possível patogenicidade dorecém-descoberto microrganismo é ofato de que os demais vírus da famíliaTymoviridae atacam vegetais (milho,grama, aveia e uva). No caso da uva, umdesses vírus causa um problema nas raí-zes da planta, que guarda alguma seme-lhança com a morte súbita dos citros.

Esses dados, por si só, não servem deprova definitiva de que o CSDV é real-mente a causa da doença que põe emrisco a citricultura paulista. A própriaAlellyx: reconhece isso, embora aposte amaior parte de suas fichas no novo ví-rus. A confirmação de que essa hipóte-se está correta só virá quando o CSDV

for inoculado em plantas sadias e os pésde laranjas desenvolverem a doença. "Jáfizemos isso e esperamos ter os primei-ros resultados daqui uns oito meses",diz Reinach. "Só então vamos ter certe-za absoluta de que o novo vírus é o cau-sador da morte súbita."

Nadúvida, a própria Alel-lyx, a exemplo das insti-tuições públicas de pes-quisa da área de citros,não abandonou a idéia

que, antes do surgimento do CSDV, eraa mais aceita para explicar a origem dadoença. A morte súbita, de acordo comessa teoria, seria originada por novasmutações no vírus da tristeza dos citros,hoje endêmico nos laranjais. A tristezaé uma doença que quase dizimou oslaranjais paulistas na década de 1940.Além de ter descoberto o CSDV, a Ale-lIyx encontrou mutações em oito re-giões do genoma do vírus da tristezaque podem estar relacionadas com aocorrência da morte súbita. Mas, paraa empresa, as evidências nesse sentidosão mais frágeis do que as que sus-tentam a tese de que o novo vírus, oCSDV, é o agente da morte súbita. Dequalquer forma, a Alellyx também pe-diu a patente sobre o uso das regiõesidentificadas no vírus da tristeza.

A aposta da Alellyx de que o novovírus deve ser a causa da morte súbitafoi recebida com ressalvas por espe-

cialistas do setor de citros. "O estudoda empresa abre uma nova frente deinvestigação, mas ainda não provanada", afirma Nelson Gimenes Fernan-des, pesquisador e secretário executivodo Fundecitrus. "Outros trabalhos,mais detalhados, terão de ser feitos parase chegar a alguma conclusão." ParaFernandes, a maior prova disso é que aprópria Alellyx, apesar de ter encon-trado o CSDV, ainda não descartou ahipótese de que a MSC possa se origi-nar de alterações genéticas do vírus datristeza. Ou até de que ambos os víruspossam atuar juntos para desencadeara doença. O engenheiro agrônomo Mar-cos Antônio Machado, do Centro deCitros Sylvio Moreira, também consi-dera inconclusivos os dados divulgadospela empresa de biotecnologia. "Exis-tem mais de 20 vírus latentes em citros,que podem ou não causar problemas àplanta': pondera Machado, que tambémestuda a origem da morte súbita. "Aamostra de 110 árvores utilizada no es-tudo da empresa é muito pequena parase estabelecer a associação entre a doen-ça e o novo vírus:' O avanço das pes-quisas sobre a nova ameaça que pairasobre o laranjal dirá se o CSDV está ounão por trás da morte súbita.

Para o diretor científico da FAPESP,José Fernando Perez, os resultados ob-tidos pela Alellyx:em seus trabalhos coma MSC, ainda que não totalmente con-clusivos, são um testemunho de que é

possível fazer, no Brasil, ciên-cia de alta qualidade no am-biente empresarial. "Em es-pecial, a pesquisa voltada àárea tecnológica, que temcomo objetivo resolver pro-blemas", comenta Perez. Oanúncio da descoberta donovo vírus, que pode ser oagente causador da mortesúbita, ocorre seis anos apóso lançamento da primeirainiciativa brasileira na áreade seqüenciamento de ge-nomas, o projeto da bactériaXylella fastidiosa. A Xylellatambém provoca uma doen-ça em citros, a Clorose Varie-gada dos Citros (CVC), opopular amarelinho. Os pes-quisadores que fundaram aAlellyx são egressos daquelaempreitada pioneira, finan-ciada pela FAPESP. •

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• CIÊNCIA

ETOLOGIA

As teias daintel igênciaCapacidade de memorizar informaçõespermite às aranhas aprimorarseus hábitos instintivos de caça

RICARDO ZORZETTO

Indiferenteà correria da meninada no jardim,um garoto de 13 anos observa os movimentosdelicados de uma aranha em uma teia cons-truída entre as folhas de um arbusto. Está tãoatento que não se deixa perturbar nem mesmo

pelo calor intenso do verão de Alexandria, cidade doNorte do Egito, à beira do Mediterrâneo. Por curio-sidade, o quase adolescente captura um gafanhoto eo coloca na teia, para em seguida puxar o caderno eanotar em detalhes o que a aranha faz com o insetoque se torna sua refeição. Nascia naquela tarde umapaixão que permaneceria latente quase duas décadasantes de se realizar: o então garoto egípcio, César Ades,hoje com 60 anos, tornou-se uma das maiores auto-ridades brasileiras em etologia, o estudo do com-portamento animal.

A vontade de entender o comportamento animalo levou a comprovar, por meio de experimentos emlaboratório, que as aranhas são capazes de aprendere aperfeiçoar instintos básicos como os ligados à caçae à construção da teia, vistos geralmente como umahabilidade inata e inalterável. "Certamente, os instin-tos funcionam como uma espécie de pré-programa-ção da mente", afirma Ades, diretor do Instituto dePsicologia da Universidade de São Paulo (USP). "Mastambém há janelas para a aprendizagem nesse pré-programa." Segundo ele, a capacidade de aprendertalvez seja uma característica própria do sistemanervoso, que, por meio da experiência, permitiria aadaptação aos desafios do ambiente. Ades não defen-de sozinho essa idéia, que pode alterar até a formacomo se pensa a inteligência humana, além de ates-tar a flexibilidade do instinto - ao menos - das ara-nhas. Se esses animais de oito pernas são mesmo ca-

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Similaridadesnas formas decaçar ou cuidarda prole definemparentescoentre as espécies

pazes de aprender, talvez deixem de serapenas bichos repugnantes, que des-pertam medo e terror. Pode ser quenem todos consigam se livrar dos pre-conceitos e reconhecer a delicadeza e aelegância de uma caran-guejeira ou de uma viú-va-negra, mas talvez se- .ja possível pensar duasvezes antes de esmagar aatrevida que surgiu detrás da cortina.

Leões em miniatura .Numa linha de trabalhoparalela à de Ades, o bió-logo norte-americanoRobert [ackson, da Uni-versidade Canterbury,na Nova Zelândia, chegou a outras des-cobertas sobre a capacidade de apren-dizagem das aranhas. Iackson investi-gou os hábitos de caça de um grupo dearanhas papa-moscas tropicais do gê-nero Portia, comuns na África, na Ásiae na Oceania. Essas aranhas, que rara-mente alcançam 1 centímetro de com-primento, são mais espertas do que seutamanho permite supor. Com quatropares de olhos, maiores e mais eficien-tes que os de outras espécies de aranhas,as papa-moscas colhem informaçõesvisuais do ambiente bastante precisas etraçam estratégias de caça dignas do leão,um predador por excelência. Tambémsão hábeis a ponto de alterar sua estra-tégia de caça frente a uma presa quelhes ofereça mais perigo - por exemplo,uma aranha mais agressiva como a cus-pideira do gênero Scytodes. Em vez deatacar a cuspideira em linha reta, o quepoderia ser fatal, a Portia recua, dá avolta e, em seguida, toma de assalto asua presa por trás, como um generaldiante de um exército mais poderoso.Os resultados mais recentes da pesquisade Iackson atraíram a atenção dos cercade 450 especialistas que participaramem agosto da Conferência Internacio-nal de Etologia, realizada em Florianó-polis, Santa Catarina.

As pesquisas de Ades e de Iackson secompletam. E deixam claro: as aranhassão capazes de memorizar informaçõese aprender com as experiências vividas.Dificilmente se conseguiria treinar umaaranha a pressionar uma barra para re-ceber uma gotinha de água, como fa-zem os ratos de laboratório. O apren-dizado das aranhas - e de qualquer

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animal, enfim - parece ocorrer dentrode certos limites, determinados pelonúmero e pela organização das célulasnervosas (neurônios). O sistema ner-voso das aranhas tem apenas alguns

milhares de células, in-suficientes para cobrir acabeça de um alfinete,enquanto o ser humanoostenta cerca de 100 bi-lhões de neurônios.

Os experimentossobre a capacidade deaprendizado das aranhasse chocam com uma vi-são comum até mesmono ambiente científico,que separa de maneiraradical, em categorias es-

tanques, o que é inato ou instintivo doque é fruto de aprendizagem. Umexemplo claro de instinto é o compor-tamento da rainha das formigas saúvas,a içá. Depois da revoada e do acasa-lamento, ela arranca as asas com ummovimento das patas e cava um ninhosubterrâneo: o ato de arrancar as asasocorre no momento apropriado, semnecessitar de treino. No outro extremo,aparecem os comportamentos flexíveis,a exemplo dos chimpanzés da Costa doMarfim, na África, quebrando nozes:levam anos para adquirir - talvez porimitação - a habilidade de segurar a nozcom uma mão enquanto com a outraaplicam um golpe com uma pedra ouum pau que serve de martelo. "Essa for-ma de avaliar o comportamento consi-derava o instinto como uma espécie depré-programa inalterável e isolado dacapacidade de aprender", afirma Ades.

Hábitos herdados· Incomodado comessa interpretação simplista, o pesqui-sador encontrou nas aranhas um mo-delo capaz de demonstrar a existênciade flexibilidade em comportamentossupostamente fixos. Predadoras natas,sempre foram consideradas seres es-sencialmente instintivos. Mas agora sepode pensar que os padrões instintivosnem sempre são rígidos como se imagi-nava, já que aranhas como as que fazemteias entre as roseiras do jardim ou pas-sam despercebidas nos cantos das pare-des são capazes de modificar seu com-portamento.

Mesmo assim, as aranhas não es-quecem o passado da própria espécie.Ao mesmo tempo que se mostram ap-

tas a modificar hábitos antigos, pare-cem manter ainda hoje alguns doscomportamentos dos antepassados maisdistantes. Mesmo sem predadores porperto, algumas espécies não deixam deconstruir uma proteção de seda ao re-dor de seus ovos. Foi o biólogo HiltonFerreira Iapyassú, ex-aluno e atual cola-borador de Ades, quem descobriu os li-mites da flexibilidade de alguns com-portamentos das aranhas. Além dasdescobertas, o trabalho resultou na ela-boração do EthoSeq, um programa quepermite a análise evolutiva de conjun-tos de atos comportamentais organiza-dos em seqüência - funcionou não sócom as aranhas, mas também com ga-tos e aves.

NoLaboratório de Artró-podes do Instituto Bu-tantan, Iapyassú estu-dou o comportamentode caça de outra aranha

encontrada nos jardins, a aranha-gi-gante ou Nephilengys cruentata, de lon-gas pernas de até 2 centímetros e umvolumoso abdômen rajado de laranja epreto, três vezes maior que o tronco e acabeça. Ele avaliou ainda os hábitos re-produtivos de outra espécie comum noSul do país, a aranha-marrom (Loxosce-les gaucho) - com o corpo castanho deapenas 1 centímetro de comprimento,é bem menor que a aranha-gigante, masproduz um veneno muito mais poten-te, letal até para os seres humanos.

A análise desses hábitos forneceuao biólogo do Butantan dados robus-tos o suficiente para afirmar: similari-dades ou diferenças de comportamen-to revelam o grau de parentesco entreas aranhas. Por essa razão, as formasmais ou menos parecidas de caçar oucuidar da prole podem ser úteis paradefinir com maior precisão o vínculo -nem sempre claro - entre as 44 mil es-pécies de aranhas já identificadas.Além disso, revelam hábitos bastanteprimitivos, como o de construir umaproteção de fibras de seda para os ovos,compartilhados por algumas espéciesdesde que surgiram as primeiras ara-nhas, há 400 milhões de anos. "É a pri-meira vez que se mostra que o com-portamento de espécies atuais podeguardar sinais tão fortes de hábitosmuito antigos", comenta Iapyassú, como aval das revistas Behaviour e [ournalof Arachnology, que nos últimos dois

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A aranha-marrom iLoxoscetes qeucho): mesmo sem predadorespor perto, constrói uma proteção de seda para os ovos

anos têm publicado os resultados maisrecentes de seu trabalho.

comportamento de fato poderia reve-lar o parentesco entre as espécies."

De modo ainda mais amplo, os tra-balhos do biólogo do Butantan revelamque as pequenas unidades que com-põem um comportamento, as ações, per-mitem reconstruir a história evolutivade grupos distantes de aranhas, comoconstatou em um artigo publicado emjulho no [ournal of Arachnology. Com-provam ainda que até mesmo os com-portamentos mais complexos - com-postos por uma seqüência de açõessimples e, portanto, mais suscetíveisà influência do ambiente - guardamtraços do parentesco entre as espécies,como verificou em trabalho publicadona Behaviour de abril de 2002. Assim,criam a possibilidade de adotar o com-portamento como uma ferramenta au-xiliar na classificação e na reconstruçãoda história evolutiva de outros gruposde animais, como as aves e até mesmo osmamíferos - uma tarefa científica com-plexa, que começou no século 18 com obotânico sueco Lineu (Carl von Linné),a partir do estudo das formas e das es-truturas biológicas (morfologia), e naúltima década ganhou o reforço da ge-nética. Como mesmo assim nem tudo

está resolvido, novos métodos que au-xiliem na classificação dos seres vivossão sempre bem-vindos.

Japyassú resolveu se dedicar ao es-tudo do comportamento das aranhasapós assistir a uma palestra de Ades,que tem fama de lotar auditórios e falarde seu trabalho de maneira apaixona-da. Por sua vez, Ades sentiu-se envolvi-do pelas aranhas enquanto lia o livro LaVie des Araignées (A Vida das Aranhas),do naturalista francês Iean-Henri Fabre,presente que ganhou meses antes dasférias em Alexandria de um amigo de suacidade natal, o Cairo, pouco afeiçoadoao assunto. O interesse pelo mundo dosaracnídeos só reapareceu muito depois,durante a pós-graduação em psicologiana USP, com outro presente: uma caixacom uma elegante aranha-dos-jardins(Argiope argentata), oferecida por Wal-ter Hugo de Andrade Cunha, um dospioneiros da etologia no Brasil. De ven-tre marrom com uma faixa amarela, essaaranha se distingue por ter o dorso pra-teado reluzente, marca que lhe rendeuo nome de aranha-de-prata. Comumem todo o Brasil, a aranha-dos-jardinsconstrói a teia em arbustos expostos aosol, perto do solo. Ela permanece imó-

História reconstruída - Ao mostrarque aranhas descendentes de um an-cestral comum compartilham - ao me-nos em parte - um determinado hábi-to, o pesquisador do Butantan reforçao embasamento experimental de umaidéia proposta na década de 1930 porKonrad Lorenz, médico e zoólogo aus-tríaco que iniciou o estudo do com-.portamento animal, a etologia. Reco-nhecido com o prêmio Nobel em 1973por desvendar os padrões de compor-tamentos individuais e sociais dos ani-mais, Lorenz havia afirmado no iníciodo século passado que alguns desseshábitos - como coçar a cabeça, noscães - poderiam ser transmitidos deuma geração a outra. Não era lá umaidéia original. O naturalista inglêsCharles Darwin, o autor da Teoria daEvolução, já havia alerta do para apossibilidade de o comportamento serherdado no livro A Expressão da Emo-ção no Homem e nos Animais, de 1872."Até agora, as discussões eram apenasteóricas", observa Iapyassú, "e faltavamdados empíricos que mostrassem se o

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vel no centro da teia até que um insetose prenda na teia viscosa - é nesse mo-mento que a aranha o ataca com umarapidez impressionante. Foi essa espé-cie que nos anos seguintes proporcio-nou a Ades os resultadosmais gratificantes.

A suspeita de que es-taria em jogo um fatorde memória no com-portamento da aranha-do-jardim surgiu com aobservação de que ela secomportava de formadiferente quando captu-rava rapidamente uminseto após outro. Fun-damentado nos estudosdo etólogo alemão HansPeters, um dos primeiros a falar emmemória das aranhas, ainda nos anos30, Ades pensou: se fosse absolutamenteinstintivo e independente da experiên-cia, o comportamento de caça deveriase repetir, sempre da mesma forma, acada inseto capturado. Mas não era as-sim. De acordo com os experimentos,tão logo um inseto caía em sua teia, aaranha saía do centro em direção à pre-sa e a picava, liberando uma dose de ve-neno que a paralizava. Algumas vezes, aaranha imobilizava a presa, envolven-do-a com fios de seda, antes de a trans-portar para o centro da teia, onde aprendia com um fio de seda. E então,lentamente, a devorava, embebendo-aem sucos digestivos.

de 50 anos, que raposas são capazes deenterrar ovos de gaivotas e os recuperardias depois, guiadas apenas pela lem-brança. Para certificar-se de que o mesmoocorria com as aranhas, o pesquisador

retirou a mosca armaze-nada no centro ou naperiferia da teia. E se sur-preendeu: mesmo de-pois de um intervalo deaté 15 minutos, a aranhaprocurava a presa quedeveria estar lá e não es-tava mais: sacudia os fios,dava voltas pelo meio dateia, depois ampliava abusca pelas bordas. Atédesistir.

Nem tudo nocomportamentoinstintivose modificapor meio daaprendizagem

As presas perdidas - Os experimentosque se seguiram deixaram clara a im-portância do fio que prendia a presa àteia: com ele, a aranha não perderia aprimeira presa se outras caíssem nateia. Se Ades colocava outro inseto nateia durante essa refeição, a Argiopepercebia a chegada da presa, por meiode sua vibração desesperada, e corriaimediatamente em sua direção. Mas,dessa vez, não levava a mosca captu-rada para o centro: deixava-a enroladaem seda na periferia da teia e só a bus-cava bem mais tarde, após terminar arefeição interrompida.

Outros estudos mostram que a ca-pacidade de recuperar uma presa ar-mazenada - mesmo que imóvel e inca-paz de gerar sinais que indiquem suapresença - depende da memória. Porexemplo, o etólogo holandês NicholaasTinbergen já havia constatado, há cerca

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Havia dois tipos de rou-bos, que geravam rea-ções distintas. Se perdes-se uma presa guardadano centro da teia, a Ar-

giope concentrava a busca por ali mes-mo, como se soubesse que o alimentooriginalmente estava por lá. Quandodesaparecia uma presa da periferia,seus movimentos se distribuíam pelaperiferia da teia. Não é tão óbvio assim:se não fosse capaz de memorizar ondeguardara a presa, o animal não mostra-ria essa coerência e buscaria o alimentoperdido, de modo indistinto, por toda ateia. Detalhe: a aranha passava maistempo procurando as presas maiores.Evidentemente, guardar uma informa-ção na memória facilita a sobrevivên-cia. "Uma aranha que se lembra", dizAdes, "consegue alimento mais rapida-mente e em maior quantidade do queoutra, que só reage aos estímulos pre-

sentes, sem qualquer noção dos fatospassados."

As aranhas não aprenderiam tam-bém a construir as próprias teias? Comessa pergunta, Ades mexia em um tabu:mesmo os mais conceituados livros dereferência em aracnologia afirmavamque a construção da teia independe daexperiência - seria um modelo perfeitode instinto. Para verificar um possívelefeito de treino, o pesquisador e sua en-tão aluna Selene da Cunha Nogueiracolocaram aranhas-de-prata em caixashorizontais. Acostumadas a construiras teias em um plano próximo da verti-cal, viram-se em condições inusitadas.No início, desorientaram-se totalmen-te: colocavam os fios ao acaso e produ-ziram uma teia caótica. Só depois dealguns dias é que começaram a tecer es-truturas mais ordenadas, como os raiosconvergentes e os esboços de espirais.Semanas depois, já conseguiam cons-truir teias completas e funcionais nahorizontal. O experimento foi repeti-do com as mesmas aranhas após terema oportunidade de construir a teia navertical. Depois, forçadas a trabalhar nahorizontal, foram mais ágeis do que natentativa anterior, numa indicação deque tinham aprendido a lidar com o es-paço possível.

Gatos de oito olhos - Na Nova Zelân-dia, Iackson investiga o hábito de caçade aranhas tropicais, em especial as quepertencem ao gênero Portia. Conheci-das como papa-moscas, essas aranhassão verdadeiros gatos de oito olhos, porcausa da aparência e da acuidade vi-sual. Com até 8 milímetros de compri-mento, essas aranhas vivem em árvores

OS PROJETOS

Estudos Psicoetológicosem Animais

MODALIDADEBolsa de Produtividadeem Pesquisa (CNPq)

COORDENADORCÉSARADES - Institutode Psicologia-USP

INVESTIMENTOR$ 58.400,00

Comportamento e Evoluçãoem Aranhas: Análise Cladísticada Predação, Construção da Teiae Corte nas Famílias Araneoidea

MODALIDADELinha Regular de Auxílioa Projeto de Pesquisa (FAPESP)

COORDENADORHILTON FERREIRAJAPYASSÚ-Instituto Butantan

INVESTIMENTOR$ 90.536,08

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A aranha-gigante (Nephilengys cruentata) fêmea, com o machono dorso: comportamentos similares ajudam a definir parentesco

e sobre paredes e não constroem teias.Em vez disso, invadem teias alheias e sealimentam de outras aranhas. Em umde seus primeiros experimentos, publi-cado em 1993 na revista científica Be-havior, Iackson analisou como três es-pécies de Portia - a P fimbriata, daAustrália; a P labia ta, do Sri Lanka; e aP schultz, do Quênia - atuavam na cap-tura de algumas de suas presas natu-rais: a aranha Philoponella variabilis,que atinge 4 milímetros de compri-mento quando adulta, e uma outra umpouco maior, a Stegodyphus sarasino-rum, de 1 centímetro.

Assim que chega à teia de sua vítima,a papa-moscas pára de frente para aoutra aranha. A seguir, inicia uma sériede movimentos com o corpo - abaixa eergue o abdômen ou dá puxões nos fiosde seda -, simulando a agitação de al-gum inseto preso à teia. Tão logo perce-be que um dos quase 120 movimentosdistintos que realiza deu resultado echamou a atenção da dona da teia, apapa-moscas passa a repetir apenas ospassos bem-sucedidos até que sua pre-sa ingênua chegue próximo o suficien-te para receber um ataque mortal. Masa Portia se revelaria ainda mais inventi-

va frente a presas agressivas, como aaranha-cuspideira (Scytodes sp). Compatas dianteiras mais longas que as de-mais, essa aranha tropical, de corpomalhado de preto, marrom e amarelo,apresenta como característica marcantelançar sobre sua presa uma saliva co-Jante que a imobiliza.

~

quipe de Iackson colocou qua-tro espécies de Portia diantede aranhas-cuspideiras en-contradas nas Filipinas.Uma dessas espécies de

papa-moscas - a P labiata, também ori-ginária das Filipinas - saía-se melhorna caçada, segundo artigo publicadoem 1998 no [ournal of Insect Behavior.Embora tivessem nascido em laborató-rio, sem nenhum contato anterior comas cuspideiras, as papa-moscas filipinasrevelaram-se verdadeiras estrategistas.Em vez de chamar a atenção de suaspresas com movimentos na teia e, emseguida, atacá-Ias de frente, a P labiataatuava de modo distinto: diante doavanço da cuspideira, recuava e contor-nava a teia, para atacá-Ia por trás. Emoutro teste, Iackson verificou que aspapa-moscas atacavam com mais fre-

quencia as cuspideiras pela frentequando estas seguravam os ovos comas mandíbulas e, portanto, estavam im-possibilitadas de lançar a saliva pegajo-sa - um claro aperfeiçoamento de umhábito instintivo.

Mas nem tudo no comportamentoinstintivo se altera com a aprendizagem.Num trabalho recente, César Ades edois de seus alunos, Mayra Dias Candidoe Fausto Assumpção Fernandes, tenta-ram verificar se a aranha-de-prata gas-taria menos tempo procurando as pre-sas se as perdessem uma após a outra.Até o momento, os resultados indicamque as aranhas não desistem de capturare de armazenar suas presas. Além disso,gastam sempre o mesmo tempo na bus-ca, mesmo com um resultado inútil, jáque durante dez vezes seguidas os pes-quisadores retiraram a presa guardada.Ades percebeu que seus alunos se senti-ram frustrados com esse resultado, masele próprio não se abateu e os consoloucom uma visão positiva, lembrando queo instinto não pode ser inteiramentemoldado e tanto a flexibilidade quantoa rigidez são igualmente importantespara a adaptação de qualquer organis-mo à realidade em que vive. •

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iqueza ocultaDiversidade de espéciespróprias e fenômenos peculiaresdesfazem preconceitossobre a Caatinga

VERONICA FALCÃO, DE RECIFE

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nosertão

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lhados, típicos do período da seca - asfolhas tornam a crescer com as primei-ras chuvas. Nos anos de seca severa, aquantidade de chuva pode diminuirem até 95%, segundo o meteorologistaJosé Oribe Rocha Aragão, da UFPE.

A vegetação começa a mudar ao pédas serras do Ceará, da Paraíba e dePernambuco. Lá no alto, acima de 600metros de altitude, parece outro mun-do: verdadeiras ilhas de floresta verde,densa e úmida, com árvores de até 30metros de altura. Estamos agora nos bre-jos de altitude, que cobrem, por exem-plo, a serra de Maranguape, próximoa Fortaleza, a 30 quilômetros do Atlân-tico, ou o planalto de Ibiapaba, já nadivisa com o Piauí.

Durante a seca, os brejos nutrem ou-tro de grupo de animais que exibem umadiversidade surpreendente: as aves. Vi-vem na Caatinga 510 espécies, quaseum terço do total encontrado no país equase o dobro do levantamento feito em1965 pelo ornitólogo alemão HelmutSick. "Os brejos asseguram a continui-dade de processos ecológicos regionais,como as migrações", diz Cardoso da Sil-va. "Algumas espécies que durante a es-tação chuvosa vivem na Caatinga retor-

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nam para essas áreas úmidas durante oslongos períodos de estiagem:' A ararinha-azul (Cyanopsitta spixii), por exemplo,costumava deixar a região de Curaçá,na Bahia, e voar quilômetros até os bre-jos para se alimentar quando já nãofrutificavam o pinhão (Jatropha mollis-sima), a faveleira ou a baraúna (Schinop-sis brasiliensis). Hoje, as ararinhas-azuisvivem apenas em zoológicos e criadou-ros - há apenas 60 exemplares pelomundo - e a espécie é considerada ex-tinta na natureza: o último exemplar devida livre foi visto em outubro de 2000.

Pelaimportância ecológica, osbrejos de altitude estão en-tre 82 áreas prioritárias paraa conservação da Caatinga,assim como as dunas do São

Francisco, outro espaço igualmenterico em espécies exclusivas, entre as ci-dades de Barra e Sobradinho, na Bahia.As dunas de até 60 metros que se er-guem às margens do rio São Francisco,o Velho Chico, o maior rio perene daregião, concentram cerca de um terçodas espécies do semi-árido, entre elas16 espécies de lagartos, oito de serpen-tes, quatro de anfisbenas e uma de an-

fíbio, exemplos de animais exclusivosdali. Anfisbenas são répteis aparenta-dos das serpentes, sem olhos nem esca-mas visíveis, também chamados de co-bras-de-duas-cabeças ou cobras-cegas.Em uma excursão recente, o especialis-ta em répteis Miguel Trefaut Rodrigues,da Universidade de São Paulo (USP),encontrou outra espécie nova das du-nas, a Amphisbaena arda, assim chama-da por causa do corpo esbranquiçadocom manchas pretas. "De todos os la-gartos e anfisbenas da Caatinga, 37%são endêmicos das dunas, um pequenoterritório que não ultrapassa 7 mil qui-lômetros quadrados, ou 0,8% da áreado sertão nordestino", diz Rodrigues.

Não é apenas o alto endemismo quesurpreende nas dunas do São Francisco.As margens opostas do rio abrigam la-gartos, serpentes e anfisbenas muito se-melhantes na aparência, mas de espéciese constituição genética distintas: são asespécies-irmãs, como os lagartos Tropi-durus amathites e Tropidurus divarica-tus. Ambos têm até 30 centímetros decomprimento e o corpo marrom commanchas pretas e amarelas, mas de pa-drões distintos. Segundo Rodrigues, foio próprio São Francisco que induziu o

(

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surgimento dessas espécies, a partir deum mesmo ancestral. De acordo com ahipótese admitida inicialmente, o riocorria para um lago do interior doNordeste, não para o mar, até o fim doúltimo período glacial, há 12 mil anos.Nas margens desse lago viviam popu-lações de animais adaptados aos solosarenosos. "Quando o rio rompeu essasmargens, isolou em lados opostos po~pulações de uma mesma espécie, queviviam em hábitats similares': diz o bió- .logo da USP. Como conseqüência, essasespécies evoluíram em ambientes sepa-rados e originaram espécies hoje encon-tradas apenas na margem direita ou es-querda do rio (veja Pesquisa FAPESP nO57). O modelo permanece o mesmo,mas os lagartos até então chamados deTropidurus passaram a ser reconheci-dos como um novo gênero (Eurolopho-saurus) e análises de DNA sugerem quesua origem deve ter sido mais antiga,entre 1 e 3 milhões de anos, e não tãorecente como se supunha.

pelo menos 20, como resultado dos le-vantamentos coordenados por JoãoOliveira, da UFRJ. Sabia-se que só naCaatinga vive o mocó (Kerodon rupes-tris), um ratão de até 40 centímetros; orato-bico-de-lacre (Wiedomys pyrrho-rhinos), de 10 a 13 centímetros, semcontar a longa cauda, que serve deapoio na hora de escalar as árvores; e otatu-bola (Tolypeutes tricinctus), omenor tatu brasileiro, de 22 a 27 centí-metros, que enrola o corpo e fica pare-cido com uma bola quando se senteameaçado. A lista dos endêmicos agorainclui o morcego insetívoro Micro-nycteris sanborni, o marsupial Thylamyskarimii, de dorso cinza claro e ventrecreme, e um macaco sauá (Callicebusbarbarabrownae), descrito com base emmaterial coletado no início do séculopassado e encontrado recentemente nointerior da Bahia. Mesmo assim, segun-do Oliveira, o endemismo de mamífe-ros da Caatinga ainda é pelo menos trêsvezes menor que o da Mata Atlânticaou da Amazônia, em vista da própriaextensão de cada ecossistema.

"A Caatinga é o ecos sistema menosprotegido do Brasil, já que as unidadesde conservação de proteção integral co-

brem menos de 2% de seu território",diz Tabarelli, que defende a criação denovas unidades de conservação. O es-tudo das botânicas Isabel Cristina Ma-chado e Ariadna Valentina Lopes, daUFPE, acentua a necessidade de preser-vação, ao revelar uma riqueza inespe-rada de processos especializados depolinização: das 147 espécies de ervas,árvores e arbustos estudados, 30% sãopolinizadas apenas por abelhas, 15%por beija-flores e l3% por morcegos."Essas descobertas ajudam a desfazer omito de que aCaatinga é pobre em es-pécies e fenômenos exclusivos", comen-ta a pesquisadora. Foi por terra tam-bém, por falta de evidências, a antigaidéia de que a vegetação nativa do serni-árido brasileiro seria um prolongamen-to do Chaco argentino. Agora se suspeitado inverso: algumas espécies de plan-tas, a exemplo do quebracho (Aspidos-perma quebracho), uma árvore de até30 metros, podem ter feito a rota opos-ta. Foi uma lenta migração, realizada aolongo de milhares de anos, à medida queo clima mudava e água da chuva, o ven-to e as formigas, com a discrição habi-tual, conduziam suas sementes de umcanto a outro. •

Da Caatinga para o Chaco - Entre osmamíferos. O número total de espéciesque vivem na Caatinga saltou de 80para 143 e o de endêmicas, de três para

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• CIÊNCIA

PALEONTOLOGIA

Asas do passadoFósseis de minicondor e de avegigante reconstituem a pré-históriados seres alados no Brasil

MARCOS PIVETTA

p(izinhançajá nem estranha mais as enco-mendas que chegam à casa ddHerculano

Alvarengal em Taubaté, cidade distantecerca de 120 quilômetros da capitalpaulista. Em julho, encostou no nú-

mero 99 da rua Colômbia um caminhão com centenasde quilos de fósseis descobertos no Nordeste, ondeesse médico de 56 anos empreendera uma missãoexploratória em março. Em outra ocasião, veio umdespacho internacional de 62 quilos remetido porum amigo do Museu Nacional de História Natural,de Washington, o norte-americano Storrs Olson, umdos mais renomados ornitólogos contemporâneos.Em seu interior, claro, mais ossos petrificados de ani-mais de milhões de anos. A maior parte do materialali desembarcado engrossa a coleção de fósseis dessepaulista que contabiliza aproximadamente 2 mil es-queletos - réplicas e originais, inteiros ou incomple-tos - de bichos da pré-história.

Além de enriquecer o acervo do colecionador, que,no próximo ano, deverá ser permanentemente expos-to ao público em geral com a inauguração do Museude História Natural de Taubaté, uma fração desses fós-seis, os esqueletos de seres alados, é ainda objeto de

-sérias pesquisas científicas. É que Alvarenga é dupla-mente apaixonado por ossos. Em seu consultório deortopedista, cuida das articulações dos vivos. Em ca-sa, se ocupa dos mortos: exerce a atividade paralela depaleontólogo especializado em aves fósseis e estudacrânios, úmeros (o osso principal das asas) e fêmuresde animais que viveram há milhares ou milhões deanos na Terra. "Sempre tive facilidade de analisar os-sos e gostava de zoologia", diz o médico, que concluiuseu doutorado nessa disciplina na Universidade deSão Paulo (USP) nos anos 1990. Embora não estejamais ligado formalmente a qualquer universidade,Alvarenga já descobriu e descreveu 15 novas espéciesde aves fósseis, a maioria delas encontradas em sítiosda bacia de Taubaté. Esses achados o tornaram co-

nhecido entre os acadêmicos. "Muito material impor-tante poderia ter se perdido se não fosse o trabalhode Alvarenga", afirma Castor Cartelle, paleontólogoda Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Nos últimos meses, em colaborações com colegasque ocupam assentos em instituições de pesquisa,Alvarenga publicou três artigos científicos reportan-do seus achados. Com Edson Guilherme, do Labora-tório de Paleontologia da Universidade Federal doAcre (Ufac), emplacou um trabalho na edição desetembro do [ournal of Vertebrate Paleontology emque descreve duas novas espécies de biguatingas queviveram há cerca de 5 milhões de anos, a Macranhingaranzii e a Anhinga minuta. Foi uma descoberta cheiade superlativos. "Essas espécies representam, respec-tivamente, a maior e a menor biguatinga que se co-nhece", comenta Alvarenga, que analisou fragmentosde ossos desses bichos descobertos por cientistas daUfac em dois pontos das margens do rio Acre.

Esse tipo de ave, da qual restaram hoje apenasduas espécies vivas no mundo, lembra um pelicanoe vive à beira de rios e lagoas, onde se alimenta depeixes. A Macranhinga ranzii deveria pesar de 8 a 10quilos e ter 1,5 metro de altura, com um porte cercade 20% mais avantajado do que a igualmente extin-ta Macranhinga paranensis, encontrada na Argentinae considerada, até agora, a maior biguatinga. A mas-sa corpórea da A. minuta provavelmente não passa-va de 600 gramas e sua altura beirava os 50 centíme-tros.~ara efeito de comparação, a única espécie vivade biguatinga no continente americano, inclusive noBrasil, a Anhinga anhinga, pesa 1,5 quilo e chega a 90centímetros de altura. .-

Talvez uma das aves pré-históricas mais interes-santes descritas pelo paleontólogo-ortopedista seja ominicondor Wingegyps cartellei, que, provavelmente,cruzava os céus da Bahia e Minas Gerais 12.200 anosatrás. Em dupla com Storrs Olson, do Museu Nacio-nal de História Natural, dos Estados Unidos, Alva-

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Ossos de biguatingas: a extintaMacranhinga ranzii é bem maiordo que a atual Anhinga anhinga

renga apresentou o antigo pássaro naedição mais recente da revista Procee-dings of the Biological Society of Wash-ington. Os fósseis de exemplares desseser alado, que se resumem a um crânioe dois úmeros resgatados, respectiva-mente, em cavernas da Bahia e MinasGerais, podem ser importantes para amelhor compreensão do surgimento dafamília Vu/turidae.

C ondores e urubus são osdois grupos de aves queformam essa família. Co-mo atualmente os con-dores são grandes e os

urubus relativamente pequenos (secomparados àqueles), muitos ornitó-logos pensam que essa diferença de por-te sempre existiu. Logo, segundo esseraciocínio, as menores aves da famíliaVulturidae deveriam ser sempre classifi-cadas como urubus, enquanto as maio-res receberiam automaticamente a de-nominação de condores. O W cartelleimostra que as coisas não são bem assim."No passado, havia uma maior diversi-dade de condores, com espécies grandese pequenas'; afirma Alvarenga. "Hoje po-demos afirmar que o que distingue umcondor de um urubu são particularida-des de seu esqueleto, sobretudo do crâ-nio, e não o seu tamanho."

Com aproximadamente meio metrode comprimento (distância entre a pontado bico e a extremidade da cauda) e umaenvergadura de uns 130 centímetros, ominicondor W cartellei tinha dimensõesmais modestas do que as apresentadashoje pelo menor representante vivo dafamília Vulturidae, o pequeno urubu-de-cabeça-amarela (Cathartes burrovianus).Essa ave atual, cujo hábitat natural seestende do México até a Argentina (noBrasil, com presença mais comum naAmazônia), mede cerca de 60 centíme-tros de comprimento e suas asas, quan-do abertas, se estendem por pouco maisde 1,5 metro. Para ter uma idéia de co-mo era o diminuto exemplar da famíliaVu/turidae cujos vestígios foram encon-trados em Minas e na Bahia, basta olharpara o condor da Califómiaf Gymnogypscalifornianus~ espécie ameaçada de ex-tinção típica do Sudoeste dos Estados

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Fósseis da ave extinta Wingegyps cartellei:versão em miniatura do atual condor da Califórnia

Unidos. Tal ave, da qual só existem 220exemplares, pode atingir até 1,4 metro decomprimento e a envergadura de suasasas chega a 3 metros. "O W cartellei éuma miniatura do condor da Califór-nia e seu parente mais próximo conhe-cido", compara Alvarenga.

ão são só aves de pequeno e médioporte, como as biguatingas e o minicon-dor, foram recentemente descritas porAlvarenga. Em outro trabalho com 01-son, publicado em 2002 no Proceedings ofthe Biological Society of Washington, opaleontólogo-ortopedista, que se dedi-ca aos seus fósseis nos momentos defolga do consultório, identifica um novogênero e espécie de ave gigante, o Tau-batornis campbelli, que habitou a baciade Taubaté (daí o nome científico dogênero) há cerca de 23 milhões de anos.Pertencente à extinta família Terathorni-thidae, constituída de imponentes seresalados que deveriam ser predadores deoutros animais ou simplesmente come-

dores de carcaças e lixo, o T. campbelli éa mais antiga e a menor das aves gigan-tes encontradas pelo homem. "Ela équatro vezes mais velha do que o Argen-tavis magnificens, que viveu há aproxi-madamente 6 milhões de anos", diz Al-varenga, que encontrou um esqueletoincompleto do bicho na formação Tre-membé, dentro da bacia de Taubaté.

Colosso dos céus das zonas central enorte da Argentina, o A. magnificens é amaior ave voadora que um dia singrouos ares deste mundo. Acredita-se queseu comprimento ultrapassava os 3 me-tros e - eis o dado mais impressionante- suas asas, quando abertas, se prolon-gavam por 8 metros, suficientes para,por exemplo, encobrir dois carros po-pulares enfileirados. De tamanho aca-nhado para um membro da família Te-rathornithidae, o T. campbelli tinha umaenvergadura quatro vezes menor, deaproximadamente 1,9 metro. Ainda as-sim, como se vê, era um animal impo-

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nente. Tanto que entrou para a famíliadas aves gigantes. "O fóssil também re-força ainda mais a hipótese de que essafamília tenha se originado na Américado Sul", afirma Olson, que já se hospe-dou três vezes na casa de Alvarenga paraestudar o material de seu colaboradorbrasileiro. Os vestígios mais antigos deaves gigantes encontrados na Américado Norte são do final do Terciário (cer-ca de 5 milhões de anos atrás).

O ortopedista paulista começou avirar especialista em aves da pré- histó-ria - e colecionador de ossos de outrostipos de animais do passado - há qua-se 30 anos. Num golpe de sorte, duran-te uma excursão pela bacia de Taubaté,sabidamente rica em fósseis de animais,deparou com seu primeiro achado: umesqueleto quase completo de um bichoque, mais tarde, batizaria com o nomecientífico de tparaphysornis brasiliensis.Tratava-se de uma ave, justamente otipo de ser que o fascinava desde a in-fância: uma supergalinha carnívora de2 metros de altura, uns 180 quilos, queera incapaz de voar e deve ter peram-bulado pela região há 23 milhões deanos. Depois de analisar o esqueleto emcasa durante algum tempo, o ortopedis-ta pensou em repassá-lo para um pro-fissional da paleontologia, Diógenes deAlmeida Campos, do Departamento Na-cional de Produção Mineral (DNPM),do Rio de Janeiro. "Mas ele me disseque demoraria muito tempo para estu-dar o osso em detalhes como eu haviafeito", conta Alvarenga. "E me encorajoua prosseguir com os estudos e a publi-car um artigo científico sobre a ave."

Assim começou a carreira de caça-dor de aves fósseis. Desde então, o orto-pedista freqüenta congressos de paleon-tologia, dá ocasionalmente aulas emuniversidades e escreve artigos cien-tíficos. Para incrementar sua coleçãode ossos, costuma fazer réplicas de seusachados para trocar, com cientistas einstituições daqui e do exterior, por có-pias de esqueletos de animais que aindanão fazem parte de seu acervo. Por isso,quem visitar o Museu de História Na-tural de Taubaté em meados do próxi-mo ano, época prevista para sua inau-guração, verá muito mais do que fósseisde aves. Haverá de tudo um pouco noempreendimento, que conta com apoioda prefeitura local: réplicas de mamífe-ros, peixes, répteis e dinossauros, comoo famoso Tyrannosaurus rex. •

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Em1989, foi uma tempestadesolar a causa do histórico apa-gão que atingiu o Canadá e osEstados Unidos. A interferênciados campos eletromagnéticos

gerados pela chegada de partículas emitidaspelo Sol desligou as linhas de transmissãoque operavam no limite. Apenas se sus-peitava dessa possibilidade, já que o Solapresenta fases de produção anormal deenergia: a mais conhecida segue um ciclode 11 anos. O sinal mais evidente desse fe-nômeno parece inofensivo - aumenta onúmero de manchas na superfície da estre-la -, mas na verdade esse é o prenúncio deum rebuliço capaz de agitar o regime doclima espacial em todo o Sistema Solar.Durante os anos seguintes, nessasmanchasocorrem explosões que fazem com que re-giões localizadas na superfície do Sol fi-quem mais brilhantes e algumas delas lan-cem ao espaço gigantescas nuvens - são asejeções de massa coronal, às vezes com

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uma extensão superior ao diâmetro dopróprio Sol,de 1,4milhão de quilômetros.Lançadas à velocidade de 1 mil quilôme-tros por segundo, essas bolhas de partícu-las eletricamente carregadas fustigam osastros vizinhos. Se o bombardeio atinge aatmosfera terrestre de dois a três dias apósa explosão, surge um espetáculo de coresque tinge as noites polares - as auroras bo-reais e austrais. Mas há também proble-mas. Dependendo da direção, da veloci-dade e da quantidade de partículas, astempestades solares podem causar panestemporárias em satélites ou mesmo des-truí-los. Depois da fase em que essa ativi-dade é máxima - a mais recente ocorreuem 2001 -, o número de manchas no Soldiminui e as erupções brilhantes se tornammenos freqüentes.

Mas essa calmaria da estrela é apenasaparente, como revelam estudos coordena-dos pelo físico Pierre Kaufrnann, do Cen-tro de Radioastronomia e Astrofísica da

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por Kaufmann três anos atrás e descri-tos em artigo publicado no Astrophysi-cal [ournal de fevereiro de 200l.

A surpresa veio quando a equipe dofísico, formada por brasileiros, alemães,russos e argentinos, verificou que a sériede pulsos sempre antecedia as gigantes-cas expulsões de massa pelo Sol, obser-vadas pelo satélite Soho. As ejeções demassa coronalliberam até 1 mil vezesmais energia que as maiores explosõesque ocorrem perto da superfície da es-trela, a cromosfera, verifica das apenaspoucas vezes em cada ciclo de 11 anosda atividade solar. São também muitomais freqüentes: a cada 11 anos ocor-rem apenas duas ou três explosões gi-gantes acompanhadas de abrilhanta-mentos na cromosfera, enquanto háejeções de massa coronal durante to-do esse período.

Estudo dosfenômenosdo Sol ajudaa aprimorara operação desatélites

Universidade Presbiteriana Mackenzie(UPM). Utilizando um telescópio espe-cial construído nos Andes argentinos eparcialmente financiado pelo Brasil, aequipe de Kaufmann detectou brevís-simos pulsos de radiação em compri-mentos de onda submilimétricos, queajudaram a caracterizaruma atividade aindanão identificada da es-trela. São lampejos tê-nues - com duração de100 a 500 milésimos desegundo - que não po-dem ser captados pelamaioria dos telescópiosem Terra e no espaçopor serem emitidos emum comprimento deonda muito curto, pró-ximo ao das ondas decalor, mas cerca de mil vezes maioresque o da luz visível. Às vezes classifica-da como infravermelho distante, essaradiação tem comprimento de ondainferior ao milímetro e, por essa razão,é também conhecida como submili-métrica. ''As antenas que captam essescomprimentos de onda geralmente nãopodem ser apontadas para o Sol semserem danificadas, nem estão prepara-das para detectar pulsos tão rápidos",diz o pesquisador.

Recentemente, a equipe dofísico paulista obteve da-dos mostrando que essespulsos de luz precedem asgigantescas erupções sola-

res, possível razão de alguns blecautesocorridos na Terra que permanecemsem causa conhecida. Caso se demons-tre a existência de um vínculo entre osincidentes no planeta e as tempestadessolares mesmo fora dos picos de ativi-dade da estrela, o estudo das ondas sub-milimétricas ganha importância pelapossibilidade de explicar inclusive al-terações no clima. Sabe-se que os ciclosda atividade solar influenciam a cober-tura de nuvens no céu, interferindo nosregimes de estiagem e chuva em todoo planeta.

Por essa razão, o Comitê Científicode Física Solar Terrestre (Scostep), queintegra a Organização das NaçõesUnidas para a Educação, a Ciência e aCultura (Unesco), criou um programainternacional com o objetivo de com-preender a influência do Sol no clima

da Terra - além do fornecimento deenergia na forma de luz e calor, é claro.Trata-se do Cawses (Climate, Weatherand the Sun-Earth System), que estu-dará os fenômenos solares que afetam aindústria aeroespacial. Em 2000, um dossatélites Brasilsat foi danificado por par-

tículas solares quandoera colocado em órbita."Com a melhor compre-ensão dos efeitos solaressobre a Terra", diz o físi-co, "será possível evitar olançamento de satélitesem períodos mais vul-neráveis e tornar maisconfiável sua operação."

O grupo coordena-do pelo físico paulista sóobservou as ondas sub-milimétricas emitidas

pelo Sol porque o equipamento insta-lado na Argentina - o Telescópio Solarpara Ondas Submilimétricas (SST),em operação regular desde o ano pas-sado no Complexo Astronômico ElLeoncito - capta radiação eletromag-nética em duas faixas do submilimétri-co, correspondentes às freqüências de212 gigahertz e 405 gigahertz. Após mo-nitorar complexos de manchas solarescom o SST entre março de 2000 e julhode 2002, os pesquisadores compara-ram esses dados com imagens coleta-das por dois equipamentos do satéliteSoho (sigla de Observatório Heliosfé-rico Solar) no exato momento em queapareceram ejeções de massas solares,precedidas por seis seqüências de flas-hes submilimétricos ultra-rápidos. Oobjetivo era verificar qual seria a asso-·ciação entre as ejeções de massa solare as seqüências de pulsos submilimé-tricos, identificados pela primeira vez

o PROJETO

Mistérios do Sol - Em alguns casos, acomparação entre os dados reveloualgo ainda mais curioso. À seqüênciade flashes seguiu-se a ejeção de massacoronal sem a marca típica desses fe-nômenos: o surgimento de áreas maisbrilhantes - as explosões cromosféri-cas - sobre o Sol. Com base nessas ob-servações, os pesquisadores publicaramem julho no [ournal of Geophysical Re-search um artigo sugerindo que essesflashes estariam na origem das gran-des ejeções de massa solares. ''Ainda émisteriosa a origem desses pulsos", dizKaufrnann. "Mas eles indicam um novocaminho para compreender os proces-sos energéticos que ocorrem próximosà superfície do Sol e como eles contri-buem para lançar as partículas rumoao espaço."

Descobertas no início dos anos 70,as ejeções de massa coronal só ganha-ram importância após o observatórioSoho, que fica numa órbita interme-diária entre a Terra e o Sol, registrarimagens do fenômeno que interfere nocampo magnético do nosso planeta emostrar que elas são mais freqüentesdo que se acreditava. Já se sabe queocorrem independentemente da fase deatividade da estrela. Se o Sol está muitoativo, elas são observadas dezenas devezes por semana. Na fase de menoratividade, ocorrem dezenas de vezes acada mês. Agora a equipe de Kaufrnannbusca dados estatísticos que relacionemas aleatórias ejeções de massa solar comfenômenos na Terra. •

Aplicações do TelescópioSolar paraOndas Submilimétricas

MODALIDADEProjeto Temático

COORDENADORPIERRE I<AUFMANN - UniversidadePresbiteriana Mackenzie

INVESTIMENTOR$ 137.496,00 e US$ 83.061,06

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Biblioteca deRevistas Científicasdisponível na Internetwww.scielo.org

ção ativa dos estudantes, despertando sua curiosida-de e interesse, favorecendo um efetivo envolvimentocom sua aprendizagem", afirmam os autores do estu-do, que teve o objetivo de possibilitar uma melhorcompreensão sobre as diferentes possibilidades etendências dessas atividades. Os resultados obtidosrevelaram que a experimentação continua sendotema de grande interesse dos pesquisadores e profes-sores de uma forma geral.

oNotícias

• Psicologia

Variáveis criativasO artigo Contribuições Teóricas Recentes ao Estudo

da Criatividade, de Eunice Soriano de Alencar, daUniversidade Católica de Brasília (UCB), e DeniseFleith, da Universidade de Brasília (Unb), apresentatrês abordagens recentes no estudo da criatividade.Trata-se da Teoria do Investimento em Criatividade,de Sternberg, o Modelo Componencial da Criativida-de, de Arnabile, e a Perspectiva de Sistemas, de Csiks-zentmihalyi. "Esses teóricos atribuem a produçãocriativa a um conjunto de fatores, que interagem deforma complexa, referentes tanto ao indivíduo quan-to a variáveis do ambiente onde ele se encontra inse-rido", segundo consta no texto. As pesquisadoras con-cluem que, embora o indivíduo tenha um papel ativono processo criativo, é essencial que se reconheçatambém a influência dos fatores sociais, culturais ehistóricos na avaliação do trabalho criativo. Seriapreciso levar em consideração a interação entre ca-racterísticas individuais e ambientais para estimulara expressão criativa na escola, no trabalho ou em ou-tro contexto, estabelecendo assim condições favorá-veis ao desenvolvimento da criatividade.

TEORIA E PESQUISA - V. 19 - N° 1 - BRASÍLIA -jAN.lABR.

2003

www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=50102-37722003000100002&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

• Fisica

Experimentos eficientesNo artigo Atividades Experimentais no Ensino de

Física: Diferentes Enfoques, Diferentes Finalidades,foi analisada a produção recente sobre a utilizaçãoda experimentação como estratégia de ensino de fí-sica. A análise dos dados teve como referência os tra-balhos publicados entre 1992 e 2001 na Revista Bra-sileira de Ensino de Física, da Sociedade Brasileirade Física (SBF), em seu encarte Física na Escola,e tam-bém no Caderno Catarinense de Ensino de Física, daUniversidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Fo-ram investigados a área temática das publicações e osdiversos aspectos metodológicos relacionados comas propostas dos experimentos. "As atividades expe-rimentais têm a capacidade de estimular a participa-

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE FiSICA - V. 25 - N° 2- SÃo PAULO - JUN. 2003

www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=501 02-47442003000200007&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

• Educação

Curvas de crescimentoEstimar com relativa precisão o desempenho dos

custos atuais e futuros de produção de uma unidadede mineração de ferro. Utilizando-se de uma sériehistórica de dados, o estudo Modelo de Previsão doCusto de Mineração pelo Sistema de Curvas de Apren-dizado apresenta os custos reais de operação na minae os resultados gerados pelo modelo em questão. Acomparação dos dois universos situou-se dentro deuma faixa aceitável de tolerância próxima de 10%."Urna das vantagens desse modelo é a possibilida-de de incorporar as mudanças técnico-econômicasocorridas no desempenho do custo", segundo ospesquisadores Walmir Carvalho Pereira, da SamarcoMineração S.A, e Saul B. Suslick, da UniversidadeEstadual de Campinas (Unicamp). O trabalho foi de-senvolvido com o objetivo de introduzir o sistema deaprendizado como uma técnica eficiente de previsão,a partir de um estado predefinido do sistema e damanutenção das condições de trabalho. Para avaliar odesempenho dessa técnica, foram analisadas as vá-rias fases de produção de uma empresa, onde os dadosforam distribuídos mensalmente durante três anos,período escolhido por representar uma parte mar-cante da história da companhia. Segundo o artigo, seadequadamente implementada, a metodologia podevir a ser útil nas atividades gerenciais.

REVISTA ESCOLA DE MINAS - V. 56 - N" 2 - OURO PRETO

- ABR.lJUN. 2003

www.scielo.br/sc ielo. ph p?scri ptesclarttextêp id =503 70-44672003000200013&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

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lizado formalmente o termo "pós-graduação" no artigo71 do Estatuto da Universidade do Brasil, no Rio deJaneiro. Já na década de 1950, começaram a ser firma-dos acordos entre Estados Unidos e Brasil que impli-cavam uma série de convênios entre escolas e univer-sidades norte-americanas e brasileiras por meio dointercâmbio de estudantes, pesquisadores e professo-res. ''A faceta da dependência de modelos externosdeve ser considerada, uma vez que trouxe implicaçõesna estrutura dos currículos, programas, nas formas deavaliação e em diversas outras áreas dos cursos de pós-graduação no Brasil': diz o autor. O artigo aborda tam-bém a problemática da incompatibilidade dos títulospós-graduados conseguidos no Brasil e em instituiçõesestrangeiras, assim como a questão do rigor dos mestra-dos acadêmicos brasileiros, cujas exigências são compa-tíveis com doutorados de outros países.

• Agricultura

Ameaça aos laranjaisA proposta do estudoDeclínio dos Citros:Algo a Ver com o Sis-tema de Produção deMudas Cítricas? édesvendar os proble-mas da citriculturapaulista com o sur-gimento de novasenfermidades limi-tantes ao processoprodutivo. Segundoo artigo, dos pesqui-sadores Ricardo Bra-ga Baldassari, daUniversidade Estadual Paulista (Unesp), de Arara-quara, Antonio de Goes e Fernando Tannuri, da Casade Agricultura de Araraquara, "uma das alternativaspara prevenir essas enfermidades é a produção demudas certificadas, com sementes de assegurada qua-lidade genética e sanitária, garantindo-se, assim, a sa-nidade das mesmas': No entanto, verificou-se quegrande parte do processo operacional de produçãode mudas cítricas foi parcialmente adaptado da pro-dução de essências florestais, como o eucalipto, ondesão utilizados tubetes com comprimento de 12 cen-tímetros. Tal prática estaria desencadeando uma gra-ve deformidade morfológica no sistema das mudascítricas, reduzindo o seu potencial de crescimento. Oestudo conclui que a principal causa desencadeadorado declínio dos citros parece ser o estresse hídrico, jáque plantas oriundas desse sistema de produção demudas mostram-se muito mais vulneráveis ao estres-se e, conseqüentemente, a esta anomalia. E como atual-mente todas as mudas produzidas no Estado de SãoPaulo provêm desse sistema, seguramente o declíniodos citros tenderá a ser, futuramente, muito mais fre-qüente e severo.

EDUCAÇÃO & SOCIEDADE - v. 24 - N° 83 - CAM PINAS -

AGO. 2003

www.seielo.br/seielo. php?seript=sei_arttext&pid=501 01-73302003000200016&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

• Comportamento

Bandeira feministaAlém de serem importantes veículos para divulgação

de informações, as publicações feministas também con-tribuem para o aprimoramento e a renovação de pro-postas e discursos políticos sobre a condição da mulher.Este é o fio condutor do artigo Publicar É uma Ação Po-lítica, de Iacira Meio, do Instituto Patrícia Galvão, umaorganização não-governamental feminista especializa-da em comunicação e mídia. "É preciso analisar a pro-dução de publicações feministas como uma ação polí-tica direta, e não apenas como mais um instrumentode divulgação do trabalho desenvolvido pelas organi-zações': escreveu Iacira. Assim, seria preciso analisar aspublicações como uma ação de disseminação de idéias,propostas, questões e conceitos, pois, para a autora, asorganizações feministas precisam compreender que,em termos operacionais e práticos, o que é referênciapara as editoras comerciais também pode fazer parte dasreferências para o trabalho editorial do movimento fe-minista. O estudo cita a década de 1990 como um pe-ríodo de intensa produção editorial feminista, com apublicação de livros, revistas, cadernos, jornais, bole-tins, cartilhas e folhetos, além de uma crescente produ-ção de publicações eletrônicas para divulgação em si-tes na Internet. Trata-se de levantamentos, estudos epesquisas, muitas vezes transformados em livros paradar maior visibilidade ao trabalho realizado, que fun-cionam como memória e registro de eventos feminis-tas relevantes.

REVISTA BRASILEIRA DE FRUTICULTURA - v. 25 - N° 2 -JABOTICABAL - AGO. 2003

www.seielo.br/sei e10. ph p?seri pt-sctarttextêp id =50 100-29452003000200047&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

• Pesquisa

Pós-graduação em questãoO artigo Tradições e Contradições da Pós-graduação

no Brasil, de Cássio Miranda dos Santos, da Universi-dade Estadual Paulista (Unesp), promove uma discus-são sobre o modelo brasileiro de pós-graduação. Sãoenfocados no estudo o caráter dependente dos cursosde mestrado no tocante à produção científica e a forteinfluência do modelo norte-americano de pós-gra-duação na estruturação do modelo brasileiro. O estudorevela que na década de 1940 foi pela primeira vez uti-

REVISTA ESTUDOS FEMINISTAS - V. 11 - N° 1 - FLORIA-NÚPOLlS - JAN./JUN. 2003

www.seielo.br/seielo.php?seript=sei_arttext&pid=50104-026X2003000100022&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

PESQUISA FAPESP 93 • NOVEMBRO DE 2003 • 59

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• TECNOLOGIA

• LINHA DE PRODUÇÃO MUNDO

Rumo à literatura animadaQue tal abrir o jornal demanhã para saber de seucolunista esportivo predile-to o que achou da arbitra-gem no jogo de ontem e,ainda por cima, poder as-sistir, ali mesmo, na páginade esportes, a todos os lan-ces polêmicos em um vídeode alta definição? Ou lerum livro que, na verdade, éum filme projetado em pa-pel eletrônico? Tudo isso,apesar de ainda distante, fi-cou mais factível depois deum estudo publicado na re-vista Nature (25 de setem-bro) pelos cientistas RobertHayes e Iohan Feenstra,dos laboratórios Philips,de Eindhoven, na Holanda.Eles alegam ter conseguidosuperar duas importanteslimitações do chamado pa-pel eletrônico: a lentidão,que impedia a exibição deanimações e vídeos, e o bri-lho insatisfatório, que tor-nava a leitura em telas, e-books ou quaisquer tipos dedisplays eletrônicos bemmais difícil do que em pa-pel. A utilização de umatécnica denominada eletro-umectação (electrowetting,em inglês) - tecnologia quepermite a manipulação defluidos em escala rnicromé-trica - tornou possível con-trolar as combinações deuma interface de água e óleoconfinada em micrométri-cas cápsulas no papel ele-trônico mediante a aplica-ção de voltagem. Quandonenhuma voltagem é apli-cada, a água permanece so-

Mais um passo em direção ao papel eletrônico

Corrente

A corrente elétrica faz a água forçar a mudançade posição do óleo, mostrando o substrato branco

bre o óleo como um livrosobre a mesa, formando umpixel colorido. Quando seaplica uma voltagem, a in-terface entre o óleo e a águamuda - a água vai para ofundo e força o óleo para olado. Isso cria um pixel par-cialmente transparente, ou,se uma superfície reflexivabranca é usada como cor,nada menos que papelbranco. A eletroumectação

tem várias características in-teressantes, como a de per-mitir a alternância de refle-xos brancos e coloridos comvelocidade suficiente paraexibir vídeos. E permite ouso de baixíssimas volta-gem e energia, podendo seraplicada sobre superfíciesplanas e finas. A reflexibili-dade e o contraste obtidospodem ser iguais ou me-lhores que os do papel. •

60 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

• Avanços na medicinamicroeletrônica

Os dispositivos chamados"neurónios biônicos" ou Bions(marca registrada) já estãosendo testados no tratamen-to de diversas doenças de ori-gem neurológica, como a in-continência urinaria, porexemplo. Implantados nasvizinhanças dos nervos, essesaparelhos emitem microim-pulsos elétricos que estimu-lam a atividade dos nervos emúsculos adjacentes. Torna-ram-se possíveis graças à com-binação de três equipamentosdesenvolvidos por três corpo-rações: uma bateria minús-cula que consegue funcionarnas condições da temperaturado corpo, produzida em cola-boração entre Argonne e Qual-lion LLC; um microestimu-lador, da Advanced Bionics; eum sistema de controle re-moto capaz de reprogramar erecarregar a bateria, tambémcriado pela Advanced Bionics.O aparelho completo é 35 ve-zes menor que uma pilha mé-dia comum e é colocado pormeio de procedimentos mi-nimamente invasivos. Já osoutros dispositivos atualmen-te usados com a mesma fi-nalidade são bem mais vo-Iumosos, carregam bateriasmaiores e necessitam de ci-rurgias complicadas para im-plantar fios e conectores nopaciente. "A nossa é a menorbateria cilíndrica e recarre-gável já desenvolvida", dizHisashi Tsukmoto, principalexecutivo da Quallion. "Elagarante uma fonte de energiade longa duração, superandoum dos mais antigos obstácu-los enfrentados pela medici-na microeletrônica." •

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• Novo tipo devidro amplia a luz

Um vidro especial de altíssimodesempenho, desenvolvidocom o auxílio da agência es-pacial norte-americana Nasa,já está disponível para aplica-ção em lasers, comunicaçõesópticas e aparelhos médicos emilitares, entre outros usos.Batizado de Real, o novo vidroé fabricado com óxidos de ter-ras raras e alumínio e peque-nas dosagens de dióxido desilício. Suas características es-peciais não só foram consta-tadas nos laboratórios da em-presa Containerless Research,que inventou o produto, co-mo amplamente confirmadasem um sofisticado dispositi-vo antigravitacional da Nasa,o Levitador Eletrostático, emHuntsville, no Alabama. Umadas aplicações mais promisso-ras do vidro está na tecnologiado laser. Ele consegue ampliarconsideravelmente a luz, pro-piciando um feixe mais inten-so e altamente concentrado,que aumenta muito a precisãodo corte na modelagem de la-taria para fabricação de auto-móveis ou nos mais delicadosprocedimentos cirúrgicos. •

Plásticos para sensores

• Relógio atômicoem miniatura

o protótipo de uma nova ge-ração de relógios superpre-cisos foi apresentado pelaAgência de Pesquisa Naval dosEstados Unidos. A ultrami-niatura de relógio atômico ba-seia-se na radiação do elemen-to químico rubídio e tem pesoe tamanho semelhantes aosde uma caixa de fósforos. Amargem de atraso é de apenas1 segundo a cada 10 mil anos.Equipada com uma bateriade apenas 1 watt de potência,a inovação tem tudo, segun-do Iohn Kim, supervisor detecnologia cronométrica daAgência, para substituir ospesados e volumosos reló-gios atômicos comercializa-dos - como os de césio, que,nas versões portáteis, chegama ter tamanho equivalente aode um aparelho de videocas-sete e consomem cerca de 50watts de potência. A Kernco,tradicional fabricante deequipamentos de precisão, fi-cará encarregada da fabricaçãodo aparelho, cujas dímensõescompactas foram bem rece-bidas em indústrias como a daaviação, por exemplo, ondeeconomia de espaço e baixoconsumo de energia são re-quisitos essenciais. •

Display com material semicondutor orgânico

Em 1839, o físico francês Ed-mond Becquerel descobriuque alguns materiais produ-zem pequenas quantidadesde corrente elétrica quandoexpostos à luz, conhecimen-to utilizado posteriormentepara o desenvolvimento dedispositivos fotovoltaicos,usados tanto para detecçãode luz (fctodetectores) comopara conversão de energialuminosa em elétrica (célu-Ias solares). Uma nova linhade pesquisa, coordenada pelaprofessora Lucimara StolzRoman e pelo professor IvoHümmelgen, do Departa-mento de Física da Univer-sidade Federal do Paraná(UFPR), utiliza materiais se-micondutores orgânicos (po-límeros ou moléculas) comocamada ativa nos dispositi-vos fotovoltaicos. Esses ma-teriais ficam entre dois ele-trodos em uma estrutura desanduíche. Um dos eletrodos,necessariamente transparen-te para a entrada da luz, é oóxido de estanho, tambémdesenvolvido na unrversi-

dade paranaense e aplicadosobre uma base de vidro."Sintetizamos os filmes se-micondutores e deposita-mos em cima do condutorpor processo eletroquímico",explica Lucimara. O plásticoleva vantagem em relaçãoaos materiais usados tradi-cionalmente, como o silício,porque o custo de processa-mento é bem menor e tam-bém porque pode ser colo-cado em superfícies planas ecurvas. Os pesquisadores jáfizeram placas de 10 centí-metros quadrados, que po-dem ser colocadas uma aolado da outra até formaruma área maior. LucimaraRoman cita como exemplode aplicação um fotodetec-tor em superfície cilíndrica,que teria um campo de de-tecção de 360°. Para desen-volver os protótipos e ven-der os substratos de vidrocondutor e transparente, foimontada uma empresa, aFlexitec Eletrônica Orgâni-ca, abrigada no Nemps, in-cubadora da UFPR. •Feixe de luz concentrado

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pncuar

• LINHA DE PRODUÇÃO BRASIL

Uma bicicleta dobrável ecompacta, que pode sertransportada em um porta-malas de carro sem com-prometer o espaço disponí-vel, é a mais recente criaçãodos irmãos Flávio e WagnerDuarte, sócios da ExcentricTecnologia e Pesquisa, em-presa incubada no Centrode Apoio ao Desenvolvimen-to Tecnológico (CDT-UnB).Anteriormente, eles já ha-viam desenvolvido um con-fortável banco plano deespuma, com densidade re-gulada para longos passeios,batizado de Sentta, queacompanha a nova inven-ção. A idéia de criar uma bi-cicleta dobrável surgiu du-rante uma viagem de fériasde Flávio. "Estava com mui-ta vontade de pedalar e fi-

Portátil e compacta para viagens

• Feromônio controlapraga do coqueiro

Os pequenos agricultores daregião litorânea do Estado deA1agoas sobrevivem basica-mente da cultura do coco. Noentanto, a exploração dessaimportante fonte de divisas ede proteínas da populaçãoenfrenta um pequeno besouro(Rhynchophorus palmarum),principal agente transmissordo nematóide responsável peladoença do anel vermelho, quemata o coqueiro e se espalhapor toda a plantação. Paracombater esse inimigo devas-tador, o Grupo de EcologiaQuímica e Comportamentode Insetos do Departamentode Química da UniversidadeFederal de A1agoas (Ufal) sin-

Bicicleta abertae dobrada

manualmente combotões e engates

quei imaginando como seriabom se eu tivesse uma bici-cleta que pudesse levar nasminhas viagens': conta. Navolta das férias, deu início aoprojeto, que teve a parceria

do irmão, encarregado dodesigno O resultado é umabicicleta que, fechada, ocu-pa pouco espaço: são 20 cen-tímetros de largura, 90 decomprimento e 65 de altu-

tetizou em laboratório um fe-romônio, substância químicaliberada pelos besouros ma-chos quando já estão na plantapara atrair as fêmeas. Assimque elas são atraídas, ocorremos acasalamentos e novas pos-turas são realizadas, reinician-do o ciclo de vida do R. palma-rum. Batizado de Rincoforol,o feromônio é distribuído aosprodutores de coco em cápsu-

Ias de plástico. O modo deação, conhecido ~omo capturamas sal, consiste em concen-trar armadilhas em uma áreacom a finalidade de capturarum grande número de insetospara limitar seus danos. Poste-riormente, eles são elimina-dos. "A utilização do ferornô-nio traz benefícios para o meioambiente e não expõe os ope-radores aos riscos de intoxi-

Besouro atraídopara armadilhaé capturadoe eliminado

62 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

ra. "Já as importadas, comodobram lateralmente, ficamcom cerca de 40 centíme-tros de largura", comparaFlávio. Ele conta que não épreciso usar ferramentaspara dobrar e desdobrar abicicleta porque tudo éfeito manualmente. "Usa-mos produtos que existemno mercado para essa tare-fa, como engates rápidos ebotões': diz. Algumas em-presas já demonstraram in-teresse em fabricar a bicicle-ta, mas a fase de testes aindanão foi encerrada. Atualmen-te, estão concentrados nomaterial. "Pretendemos tra-balhar com ligas metálicasutilizadas em rodas de car-ro, um material muito resis-tente e com acabamento fi-nal muito bom", diz. •

cação causados pelos insetici-das", diz o professor IvanildoSoares de Lima, um dos coor-denadores da pesquisa do fe-romônio sintético. •

• Nova tecnologiapara extrair petróleo

O Brasil tem reservas signifi-cativas de óleo ultraviscoso,também chamado de óleopesado, tanto em terra comono mar, não aproveitadas atéagora por falta de tecnologiaapropriada para o seu escoa-mento. Como o óleo é muitoespesso, é difícil fazê-lo che-gar à superfície. Mas um novométodo, desenvolvido peloprofessor Antonio Carlos Ban-nwart, da Faculdade de Enge-nharia Mecânica (FEM) da

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Page 63: No ar, um novo avião brasileiro

Universidade Estadual deCampinas (Unicamp), pode-rá começar a ser utilizado embreve pela Petrobras para ex-trair óleo pesado. A tecnolo-gia, chamada de Core Flow,consiste em injetar água con-tinuamente dentro do tubode escoamento, para reduziro atrito entre o petróleo e asparedes do duto. "A água fun-ciona como uma espécie detrilho para escoar o óleo", dizBannwart. Na superfície, aágua tem de ser separada doóleo. Além de facilitar o fluxo,a técnica proporciona eco-nomia de energia usada nobombeamento do óleo. Elacomeçou a ser desenvolvidaem 1998 e já foi patenteadapela Unicamp. Bannwart con-ta que em 2000 procurou aPetrobras. "Queríamos reali-zar experimentos em escalamaior e precisávamos de umlaboratório compatível:' Doencontro resultaram doisprojetos apoiados financeira-mente pela Petrobras e, re-centemente, a assinatura deum contrato de parceria paraa construção do Laborató-rio Experimental de Petróleo(LEP), no valor de R$ 1,3 mi-lhão, com previsão para ficarpronto até meados de 2004.Bannwart conta que outrosestudos começaram a ser fei-tos com a tecnologia, aproxi-mando as pesquisas do quevai ser encontrado efetiva-mente em um campo de pe-tróleo. "Em 1999 usávamosóleo combustível de refinaria,no ano seguinte começamosa usar óleo cru e na atual fase,que teve início em 2001, colo-camos, além do óleo, gás nointerior do óleo, reproduzin-do as condições de extração",explica Bannwart. "Todos osestudos feitos até agora mos-traram que a tecnologia fun-ciona efetivamente para aprodução e o escoamento doóleo pesado." •

PatentesInovações financiadas pelo Núcleo de Patenteamento e Licenciamento

de Tecnologia (Nuplitec) da FAPESP. Contato: [email protected]

Coacervato impede dispersão de partículas

• Processo imobilizafibras de amianto

Método inibe a dispersãode partículas de materiaisinorgânicos fibrosos, comoamianto, durante sua ma-nipulação e transporte. Umasubstância em forma de gelchamada coacervato, for-mada a partir de um polí-mero inorgânico de poli-fosfato de sódio e cloreto decálcio, é espalhada nas pa-redes internas das minas,antes da extração do amian-to, para imobilizar suas fi-bras. A inalação dessas par-tículas é a causa de doençaspulmonares em trabalha-dores que manipulam omaterial. Para evitar pro-blemas durante o transpor-te e a manipulação, quan-do as fibras já estão secas epodem se dispersar nova-mente, elas passam por umtratamento térmico embaixas temperaturas, tam-bém desenvolvido pelospesquisadores e que reduzem 75% os custos em rela-ção à técnica tradicional.

Título: Processo de Imobi-

lização e Destruição de Fi-bras de AmiantoInventor: YounesMessaddeqTitularidade: Unesp/FAPESP

• Nova técnicapara sexagem

Técnica permite separarespermatozóides X ou Ysem comprometer sua ca-pacidade de fecundação. Aseleção do sexo é feita cen-trifugando os espermato-zóides em um tubo commeio de cultura de diferen-tes densidades, chamadode gradiente de densidade.A centrifugação promove asedimentação de até 86%dos espermatozóides X. Asdoses de sêmen enriqueci-das com a fração de esper-matozóides X ou Y obtidaspor esse processo poderãoser congeladas e comerciali-zadas com a informação dequal deverá ser o desvio naproporção sexual após ainseminação. Apesar de tersido testado apenas em bo-vinos, o método poderá serusado para mamíferos demodo geral.

Título: Seleção do Sexo deEspermatozóides Mamíferospor Centrifugaçãoem Gradien-te de DensidadeInventores: Vera FernandaMartins Hossepian de Lima,Carlos Alberto Moreira-Fi-lho e Mariney RamalhoTitularidade: Unesp/FAPESP

• Revestimento refratárioà base de sílica

Novas formulações à basede sílica amorfa ou crista-lina, para serem aplicadasem revestimentos refratá-rios utilizados na indústriade vidro e de fundição. Es-ses compósitos são forma-dos por diferentes tipos degrãos, com diversos tama-nhos. A maneira como elesse agregam confere ao ma-terial elevada resistência aovapor alcalino, à corrosãopor ferro fundido e ligas deferro e respectivas escórias,que ocorrem no processometalúrgico ou na fabrica-ção de fornos de vidro, econtribui para aumentar otempo de vida útil dos equi-pamentos.

Título: Composições Me-lhoradas de Massas Refra-tárias à Base de SílicaInventores: Carlos AlbertoPaskocimas, Humberto Leo-nardo de Oliveira Brito, Ar-naldo Carlos Morelli, Ricar-do Magnani Andrade, JoãoBaptista Baldo, Edson Ro-berto Leite, José Arana Va-rela, Elson Longo.Titularidade: UFSCar/FAPESP

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YURI VASCONCELOS

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Embraer vai inaugurar uma nova fase de sua his-tória com a entrega, até o final do ano, do pri-

meiro avião Embraer 170para a empresa aéreaitaliana Alitalia. O modelo faz parte de umanova família de jatos com capacidade de

70 a 108 passageiros que inclui o Embraer 175)o Embraer190 e o Embraer 195. O lançamento dessa nova geração deaeronaves leva a empresa a uma posição de destaque nomercado internacional de aviação porque, com eles, a fa-bricante brasileira deixa de produzir exclusivamente jatosregionais, com, no máximo, 50 assentos, e passa a ofere-cer também aviões de maior porte que rivalizam com osproduzidos pelas gigantes Boeing e Airbus. "Esse é o proje-to mais complexo e desafiador que já desenvolvemos'; afir-mou Maurício Botelho, presidente da Embraer, quando daapresentação do modelo 170 à comunidade aeronáutica,em outubro de 2001."Afamília 170-190 é um produto paracompanhias aéreas que está na fronteira das categorias re-gional e major, nome dado às empresas de grande porteque fazem vôos entre capitais, por exemplo, e para o exte-rior", completa o engenheiro Acir Luz Padilha Iúnior, ge-rente de desenvolvimento de projeto do Embraer 170.

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Mais que a inovação para o setor ae-ronáutico e para as companhias aéreas,a nova família de jatos reafirma a capa-cidade brasileira de produzir aerona-ves. Um avião das dimensões do 170 éum projeto complexo de integração depeças e sistemas que, além da participa-ção, em forma de parceira, de empresasbrasileiras e, principalmente, estrangei-ras, contou com a eficiência e a expe-riência acumulada pela engenhariaaeronáutica da Embraer desde a suafundação como empresa estatal, em1969. Ela segue, então, uma espécie delinha de evolução iniciada no CentroTecnológico Aeroespacial (CTA), cria-do em 1945, e continuada no InstitutoTecnológico da Aeronáutica (ITA), em1950, que são os principais formadoresde profissionais capazes de desenvolvere montar aviões. "Ter engenheiros ca-pacitados no Brasil para desenvolverprojetos de aeronaves e seus sistemas éfundamental para uma empresa comoa nossa, que lida com tecnologia deponta", diz Padilha. Segundo o enge-nheiro, a formação de mão-de-obra es-pecializada, por meio, por exemplo, domestrado profissional oferecido peloITA, tem contribuído largamente parao sucesso dos produtos da Embraer.

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p(0mpetênciaem projetos ena montagem de aviões fez

a empresa bater recordesna execução do projetodo 170, primeiro mem-

bro da família a ser colocado no merca-do, com capacidade para 70 passagei-ros. Ele foi lançado oficialmente emjunho de 1999. Ficou pronto em poqcomais de dois anos - o primeiro protóti-po voou pela primeira vez em fevereirode 2002 -, um tempo considerado cur-to.para o desenvolvimento de um avião."Com o suporte de nossos parceiros,conseguimos projetar e fabricar o Em-braer 170 no prazo recorde de 28 me-ses. Nosso avião oferece excepcionalqualidade e desempenho, baixos custosde operação, além de muito confortopara os passageiros': declarou MaurícioBotelho. Os demais membros da famí-lia 170-190 encontram -se em estágiosdiversos de concepção, desenvolvimen-to e produção. O modelo 175, para 78passageiros, já está sendo submetido aensaios de vôo e o 190, equipado com98 assentos, começou a ser montadoneste ano. O 195, com 108 lugares, estána fase final de projeto (leia mais sobreesses aviões no quadro da página 70).Pelo cronograma da empresa, os pri-

meiros modelos do Embraer 175 de-vem ser entregues no segundo semestrede 2004, enquanto o modelo 190, no fi-nal de 2005 e o 195, apenas em 2006.

Mesmo sem nenhum avião em vôocomercial, a nova família já pode serconsiderada um sucesso.Até setembro,a empresa possuía em carteira 245 en-comendas fechadas, aviões com entregaconfirmada, e 308 opções de compra,situação em que a companhia aérea re-servou a aeronave,mas ainda não a con-firmou. Entre os principais clientes dasnovas aeronaves estão as companhiasamericanas USAirwayse Iet Blue,a suí-ça Swiss,a polonesa Lot e a Alitalia.

Tamanho certo - Para que o primeiroprotótipo alçasse vôo em fevereiro de2002, uma longa jornada foi percorri-da. "O projeto do 170, bem como detoda família, nasceu a partir da identi-ficação de uma brecha de mercado fa-vorável", conta Antonio Campello, ge-rente de desenvolvimento de produtodo Embraer 175. "Pesquisas identifica-ram uma janela de oportunidade paraaviões nessa categoria, de 70 a 110 lu-gares, e conversas com consultores dascompanhias aéreas confirmaram essatendência", diz ele. Esses estudos reve-

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e-

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laram, entre outras coisas, empresasaéreas necessitadas de aparelhos comuma maior capacidade de assentos queos tradicionais jatos regionais. Tambémprecisavam de aeronaves menores emais econômicas do que os jatos usadospelas grandes companhias, com maisde 100 lugares. Muitos desses aviões,conforme detectou o estudo, voam comcapacidade ociosa.

Com todos os estudos e in-formações na mão, os di-rigentes e técnicos da em-presa de São José dosCampos apostaram alto e

decidiram construir uma plataformacompletamente nova para fabricarseus aviões. A Embraer descartou, logono início, a idéia de usar a mesma es-trutura dos jatos regionais de 50 as-sentos pertencentes à bem-sucedidafamília ERJ 145 fabricados pela em-presa desde 1995. "Foi aí que nos dife-renciamos de nossa maior concorren-te, a canadense Bombardier, que, paralutar por esse mesmo mercado, prefe-riu alongar seu modelo regional, tam-bém de 50 lugares, o CRJ-200, em vezde criar um novo projeto de família",conta o engenheiro Padilha.

Com a indicação de que os aviõesteriam mercado garantido, a Embraerpassou então a desenvolvê-Ias. Os re-sultados da pesquisa foram levados aosetor de anteprojeto, que é responsávelpela concepção do desenho e da confi-guração do avião. Com o documentoem mãos, os projetistas da Embraerpassaram a esboçar estudos sobre osnovos jatos, definindo, entre outras coi-sas, o desenho do avião, o diâmetro e aconfiguração da fuselagem, a potênciae a localização dos motores (sob as asasou próximo à cauda), a eletrônica em-barcada, a área e o formato da asa."Nessa fase, surgiram inúmeras pro-postas", explica Campello. Fabricantesde motores e de asas e de equipamentosaviônicos apresentaram várias propos-tas. "Os estudos foram amadurecendoe, na fase final de anteprojeto, que teveduração de um ano, projetamos doisou três aviões semelhantes com parcei-ros distintos", afirma.

Durante a fase de concepção dosnovos jatos, a Embraer utilizou umaavançada tecnologia interativa de simu-lação e modelagem, o Centro de Reali-dade Virtual (CRV). Por meio dele, en-genheiros e projetistas agilizaram oprocesso de desenvolvimento das aero-

naves, reduzindo consideravelmente anecessidade de montagem de maque-teso Graças aos desenhos tridimensio-nais dos aviões criados no CRV, falhas emontagens incorretas puderam ser de-tectadas, corrigidas e eliminadas antesmesmo que qualquer peça ou conjuntofosse produzido. A tecnologia dispo-nível no CRV é gerada pelo sistemaOnyx-2 da empresa norte-americanaSGl, conhecida anteriormente como Si-licon Graphics lnc. Esse sistema projetaimagens tridimensionais dos aviões emtempo real em uma tela de 6 metros decomprimento por 2,45 de largura. ''Ainstalação do Centro de Realidade Vir-tual representou um grande passo, poiscolocou a Embraer no mesmo patamardas maiores e mais importantes indús-trias aeroespaciais do mundo", afirmouSatoshi Yokota, diretor vice-presidenteindustrial.

Assim como os jatos da família145, os novos aviões da Embraer fo-ram concebidos para serem fabricadoscom parceiros de risco. Na estruturadas aeronaves, participam do progra-ma a japonesa Kawasaki e a belga So-naca, responsáveis pela fabricação dasasas, a francesa Latécoere, que faz duasseções da fuselagem, e a espanhola Ga-

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mesa, fornecedora da cauda. Dos Esta-dos Unidos, a General Electric forneceas turbinas, a Honeywell, os sistemasaviônicos (equipamentos eletrônicos),a Hamilton Sundstrand, a unidade decontrole de força (APU) e os sistemaselétricos e de controle ambiental e aalemã Liebherr, o trem de pouso, asrodas e os freios. São, ao todo, 16 par-ceiros e 22 fornecedores.

Coube à Embraer, além da lideran-ça do projeto, toda parte de concepção ede anteprojeto, o desenvolvimento e afabricação da fuselagem dianteira, par-

Quarta maior fabricante de aviõesdo mundo, a Embraer detém 45% domercado global de jatos regionais. Acriação da companhia em 1969 e o seuatual sucesso comercial - já foram en-tregues 5.500 aeronaves - foram alicer-çados pela competência e eficiência damão-de-obra nacional, formada emboa parte por engenheiros graduadosno Instituto Tecnológico da Aeronáuti-ca (ITA). Durante as primeiras décadasde atividade, quando a empresa era es-

te da fuselagem central e carenagens dajunção asa-fuselagem, montagem daasa e, no final, a integração total da ae-ronave. "São poucas companhias nomundo que fazem isso", diz AntonioCampello. "A escolha por esses parcei-ros foi resultado de um amplo estudo deviabilidade econômica. Nessa decisão,o que conta não é apenas o preço final doavião, mas qual será o custo operacio-nal do cliente, no caso as companhiasaéreas. O projeto, portanto, é esboçadocom a visão de quem opera e não dequem produz", diz o engenheiro.

História de sucessotatal, a fábrica de São José dos Camposfazia apenas aviões turboélice, com des-taque para os modelos Tucano, Bandei-rante e Brasília. Foi somente após a pri-vatização da companhia, em 1994, queela começou a produzir jatos regionais.

O ERJ 145, lançado em 1995, é umdos mais avançados jatos de transpor-te dessa categoria e o carro-chefe dacompanhia. Desde o seu lançamento,já foram entregues 502 aviões paraclientes em todo mundo. Dois outros

Conforto na bolha - Para conquistarespaço em um mercado cada vez maiscompetitivo, os novos jatos da Em-braer foram dotados das mais avan-çadas tecnologias aeronáuticas. Umagrande inovação é a fuselagem doublebubble (dupla bolha), com diâmetrosdiferentes nas seções superior, quedelimita a cabine de passageiros, e in-ferior, onde fica o compartimento decarga. Ela é mais ovalada do que asfuselagens tradicionais, aumentandoassim o volume interno da aeronave eproporcionando mais espaço e con-

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aviões, o ERJ 135, para 37 pa5sagleile o ERJ 140, para 447 completammília de jatos regionais da Embraoperação.

Atualmente, a empresa é conda por um consórcio formadoCompanhia Bozano e os funpensão Previ, dos funcionários d(jco do Brasil, e Sistél, dos t\mGdas companhias télefôniC3Sí que60% das ações com direito a vot40% restantes estão nas mãos d

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forto para os passageiros. Esse recur-so foi adotado de acordo com os re-sultados da pesquisa de mercado. Elaindicou que o sucesso para um aviãodesse segmento está aliado a um bomespaço interno, porque os passagei-ros naturalmente comparariam seunível de conforto com o dos grandesjatos das empresas major. "Somospioneiros no uso do conceito doublebubble em aviões da categoria de 70 a110 lugares. O conforto proporcio-nado por nossos jatos é muito maiordo que o da concorrência. Durante as

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demonstrações do aviao, potenciaisclientes diziam que o 170 parecia, dolado de fora, um jato regional, mas ti-nha o interior de um avião grande",afirma Padilha.

Outra novidade incorporada à fa-mília 170/190 foi o sistema de controlede vôo jly-by-wire, desenvolvido pelaempresa norte-americana Parker, quetambém forneceu os sistemas de com-bustível e de hidráulica. Essa techolo-gia, baseada no envio de comandos porimpulsos elétricos com gerenciamentopor computador, está presente em mo-

grupo europeu formado pelas empre-sasDassault Aviation, Thales, EADS eSneca,com 20%, o governo brasileirocom 0,8% e investidores individuais,19,2%.Ao final do primeiro semestredeste ano, a Embraer acumulava,abrangendo todos os seus modelos,US$10,3bilhões em encomendas fir-mese US$ 16,8 bilhões em opções decompra - correspondendo, respecti-vamente, a 450 pedidos firmes e 794opções.Além de aviões comerciais, aempresa também fabrica aeronavesmilitares, como o Super- Tucano e oAMX,e o jato executivo Legacy. Em

2002, as exportações da empresa atin-giram US$ 2,396 bilhões, equivalentea 89,5% da receita bruta no ano e a3,97% do total exportado pelo Brasil.No mesmo período, as importaçõessomaram US$ 1,221 bilhão.

O volume de exportação levou aEmbraer a conquistar o segundo lugarna classificação das maiores empre-sas exportadoras do pais - de 1999 a2001, ocupou a liderança nesse ran-king. Segundo dados da companhia, opotencial de exportação da família170/190 é estimado em US$ 15bilhõesnos próximos oito anos.

dernas aeronaves militares e nos gran-des jatos comerciais de última geração."É a primeira vez que usamos essa tec-nologia. Ela facilita o controle do aviãoem vôo e torna sua manutenção maissimples", conta Alexandre Figueiredo,gerente de integração de ensaios devôo. Com o sistema jly-by-wire, os co-mandos do avião localizados nas asas ena cauda, como leme direcional, pro-fundor (leme de profundidade quecomanda os movimentos de subida edescida), estabilizado r (aerofólio queconfere estabilidade ao avião) e spoiler(freio aerodinâmico localizado) sãoacionados pelo piloto por meio de im-pulsos elétricos e não mais por cabos eroldanas do sistema hidráulico.

Comandos digitais - Na cabine de co-mando foi utilizada a tecnologia glasscockpit, na qual o painel de controle àfrente dos pilotos é totalmente digital,com telas de cristal líquido e sem aprofusão de relógios analógicos oubotões comuns em aeronaves mais an-tigas. Além disso, o painel é dotadoda filosofia dark and quite. "Se nãohouver alarmes sonoros ou visuais, estátudo ok. Ao contrário do painel deaviões antigos, que mostrava todos oscomandos ativos, no glass cockpit doEmbraer 170 apenas informações es-

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senciais são mostradas ao piloto. Osalarmes só disparam em caso de falha",afirma o engenheiro Figueiredo.

Todas essas tecnologias fo-ram desenvolvidas porparceiros internacionais,mas centros de pesquisabrasileiros também partici-

param do desenvolvimento dos novosaviões. "Temos parcerias com váriasuniversidades e institutos de pesquisatecnológica relacionadas não apenas àfamília 170-190, mas a futuros aviõesda empresa. São tecnologias específicasusadas em partes localizadas do avião':afirma Acir Padilha. Com a FaculdadeFederal de Santa Catarina (UFSC), porexemplo, foi firmado um acordo pararealização de simulações de ruído e vi-bração a partir de modelos matemáti-cos das aeronaves. Outras parceriascom o ITA e o Instituto Nacional dePesquisas Espaciais (Inpe) tambémcontribuem com o suporte técnico ne-cessário para a consolidação dos atuaise futuros aviõesda empresa. São quatroprojetos desenvolvidos entre esses ins-titutos de pesquisa e a Embraer que tra-tam de tecnologia de túneis de vento,sistemas computacionais para simula-

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ções numencas dos escoamentos dear em torno dos aviões, equipamentospara determinar, em testes, o posicio-namento das aeronaves e um outrosistema de determinação de todos osparâmetros de vôo, útil no desenvolvi-mento de futuros jatos (veja detalhesem Pesquisa FAPESP n° 77). Esses pro-jetos recebem financiamento da FA-PESP por meio do programa Parceriapara Inovação em Ciência e Tecnolo-gia Aeroespacial (PICTA). Iniciados em2000, eles vão receber até 2004 um to-tal de R$ 3,7 milhões e US$ 2,5 milhões,

da Fundação, e mais R$ 8,7 milhões eUS$ 105 mil, da Embraer.

Longos ensaios - Muitos dos novosprojetos feitos em parceria com as uni-versidades e institutos de pesquisa têmo objetivo de aumentar a qualidade dosaviões e diminuir o tempo de ensaiosdos vários sistemas aeronáuticos que seintegram na aeronave. Antes de come-çar a operar comercialmente, um aviãocomo o 170passa por uma série de tes-tes e por uma longa campanha de cer-tificação. No caso desse novo jato, a

Irmãos bem parecidos"O projeto comum entre os aviõesnosdá uma grande vantagem competitiva,pois facilita a operação do avião e geraeconomia no treinamento das equipesde vôo e de manutenção:'

O Embraer 170,com 29,9metrosdcomprimento, é o menor de todos-demais modelos são uma versão alongadadele.O Embraer 175mede 31,6tros, o 190,36,2metros,e o 195,38,6m

O orçamento global do programa170-190, incluindo investimentos daEmbraer e de seus parceiros, é de US$850 milhões. Uma das grandes vanta-gens dos jatos dessa família é o alto graude peças e sistemas em comum entreeles.Essainteração chega a 87%. "É umíndice excelente"comenta o engenheiroAntonio Campello, gerente de desen-volvimento de produto do Embraer 175.

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Embraer gastou mais de um ano emnumerosos ensaios de vôo e de desen-volvimento para validar modelos e es-tabelecer os parâmetros requisitadospela aviação mundial. Durante a con-cepção e consolidação do projeto, perío-do que se estendeu do início do pro-grama até a apresentação da primeiraaeronave, foram mais de 2 mil horas deensaios aerodinâmicos em túnel de ven-to no Brasil e no exterior. O mesmo tem-po foi dedicado aos testes de integraçãode sistemas, principalmente os relativosaos aviônicos e ao jly-by-wire. O avião

também foi submetido a testes de vibra-ção no solo e de fadiga, nos quais a re-sistência da estrutura foi posta à prova.

Certificacão geral - Os ensaios de vôotiveram início em fevereiro de 2002 eforam usados os sete protótipos pro-duzidos. Uma etapa importante dacampanha foi a fase de testes óperacio-nais realizada em ambiente de invernorigoroso no Alasca, estado norte-ame-ricano situado no Noroeste do continen-te americano. Durante esses ensaios, aaeronave foi submetida a temperaturas

os. Os dois primeiros são equipadosm motores General Electric CF34-8E,m 13.800 libras de empuxo (o Boeing

'37-800, com capacidade para 189 pas-eiras tem 27.300 libras de empuxo),

os outros dois com o modelo CF34-OE (18.500 libras). O alcance - dis-

cia que o avião pode voar sem pre-reabastecer - do Embraer 170 é

3.797 quilômetros, suficientes, pormplo, para uma viagem de Porto

egre (RS) a Fortaleza (CE) e do 175,•319 quilômetros. Dotado de motores

mais potentes, o 190 voa até 4.260 qui-lômetros ininterruptos, equivalente aum percurso, com folga, entre Recife(PE) e Buenos Aires, na Argentina, e o195,3.704 quilômetros.

Todos os quatro jatos têm veloci-dade máxima de operação de Mach0.82 (o equivalente a 82% da velocida-de do som), ou 870 km/h, equivalenteà do Boeing 737-800. Na configuraçãointerna da família 170-190, os bancosestão dispostos dois a dois, separadospor um corredor central .

extremamente baixas, de até -31°C,tanto no solo quanto em vôo. Os testesduraram nove dias, período no qual ocomportamento do avião e de seus sis-temas foi avaliado. Na ocasião, tambémforam realizados ensaios adicionais quemediram o desempenho do jato em de-colagem e razão de subida (medida querelaciona o espaço percorrido pelo aviãona pista com o tempo gasto para essatarefa) em clima frio, uma exigência ex-pressa nos requisitos de certificaçãoda Europa.

A certificação final do Embraer 170,a cargo do CTA, estava prevista para serencerrada neste mês de novembro. Paraoperar nos Estados Unidos e na Euro-pa, o avião precisa obter a certificação daFederal Aviation Administration (FAA),dos Estados Unidos, e da Ioint AviationAuthorities (JAA), da Europa. Mas nãoé necessário repetir toda a campanhade testes. "Nesse caso, graças a acordosentre as três entidades certificadoras, oavião só precisa passar por alguns testesde validação", explica o engenheiro Ale-xandre Figueiredo. Enquanto isso, osprimeiros aviões a serem entregues pa-ra as companhias aéreas recebem os úl-timos acabamentos na fábrica da em-presa em São José dos Campos. •

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• TECNOLOGIA

ENGENHARIA DE MATERIAIS

Dribleno radarBlindagem torna aviões militaresimperceptíveis aos detectores e eliminainterferências eletromagnéticas

Dentro de pouco tempo,fazer aeronaves invisíveisaos radares não será maisexclusividade de paísesdetentores de conheci-

mento avançado na área militar. O Ins-tituto de Aeronáutica e Espaço do Cen-tro Técnico Aeroespacial (IAE/eTA), deSão José dos Campos, está desenvol-vendo vários tipos de um produtochamado Material Absorvedor de Ra-diação Eletromagnética (Mare), tradu-ção brasileira para o termo Radar Ab-sorbing material (RAM). Trata-se domesmo material utilizado na pinturade aviões da força aérea dos EstadosUnidos, como o F-117 e o B-2, conhe-cidos por se tornarem imperceptíveis aradares. A técnica baseia-se na absor-ção, pelo material, da energia eletro-magnética emitida pelo radar, que étransformada em energia térmica, fa-cilmente dissipada, impedindo assim areflexão de sinais e a conseqüente de-tecção. Embora o Mare tenha fins mili-tares, porque foi solicitado pelo Minis-tério da Defesa, existe um grandepotencial de uso em aplicações civis.

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No CTA, câmara paratestes de material

absorvedor de radiação

No setor aeronáutico, o produtopode ser empregado na blindagem in-terna de aviões civis,no isolamento doscabos elétricos e na vedação das cabinesde comando, evitando interferências nainstrumentação das aeronaves como asprovocadas por aparelhos celulares. Damesma forma, antenas de radiotrans-missão podem receber anéis absorvedo-respara eliminar ondas eletromagnéticasindesejáveisque interferem nos sistemasde comunicação. Antenas de transmis-são e recepção e os próprios aparelhosde telefonia celular também podem serrevestidos com essematerial absorvedorde energia eletromagnética.

Outros exemplos de usos do Mareestão no revestimento interno dos for-nos de microondas, com o objetivo deimpedir o vazamento da radiação, e nablindagem eletromagnética de mar-capassos. Na pesquisa científica e naindústria é útil no isolamento de câ-maras anecóicas, usadas para testar areflexão de ondas eletromagnéticas. Oisolamento desse tipo de radiação podeser feito também na construção civil,utilizando-se revestimentos do material

em salas ou edifícios com material ele-trônico sensível a interferências.

Atualmente, o material que cumprefunções semelhantes ao Mare ainda éimportado pelo Brasil.Mas elepode seranalisado e caracterizado no próprioCTA,que possui laboratório apropriadopara testes. Desde o início das pesqui-sas com o Mare, o IAEjá recebeu cincoprêmios nacionais, solicitou nove pedi-dos de patentes no Instituto Nacionalde Propriedade Industrial (INPI) e des-pertou o interesse de empresas para aprodução do material, embora nenhumcontrato tenha sido fechado.

Borracha e espuma - Sob a coordena-ção da pesquisadora Mirabel CerqueiraRezende, chefe da Subdivisão de Com-pósitos da Divisão de Materiais do IAE,o Mare está sendo desenvolvido na for-ma de tintas, mantas de borracha e es-pumas, que recebem a adição de absor-vedores com grande capacidade, comoferritas, materiais carbonosos e, maisrecentemente, polímeros condutoresde microondas, que são mais leves eideais para a pintura de aeronaves.

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Para o setor militar aeronáutico, oproduto é estratégico e poderá ser em-pregado no revestimento de aviões, ar-mamentos e antenas. Além de tornarinvisíveis os aviões aos radares, o mate-rial absorvedor vai auxiliar na elimina-ção de radiações eletromagnéticas no-civas a esses equipamentos.

Aecnologia desse material:absorvedor é utilizada pe-los Estados Unidos, Rússia

e Inglaterra em aviões,navios, submarinos, pla-

taformas e veículos terrestres e já estáem desenvolvimento também em Is-rael, Espanha e França. De acordo comMirabel, o Brasil é o primeiro a investirnesse tipo de pesquisa na América La-tina. Até hoje, o país importou mate-rial absorvedor, principalmente à basede espuma, que é aplicado, por exem-plo, na blindagem de câmaras anecói-caso Algo mais arrojado, como o queestá sendo desenvolvido no IAE, nuncafoi sequer importado, por tratar-se deuma tecnologia estratégica, relacionadaà questão da soberania nacional pelos

países que a detêm. Para entender esseaspecto, é preciso compreender que umradar capta as ondas rebatidas de umaaeronave e detecta não apenas o tipo,mas até mesmo o país de origem. Quan-do revestida com material absorvedor,a radiação que incide sobre o alvo é ab-sorvida, tornando o sinal fraco e impe-dindo sua identificação pelos sistemasde dados dos radares.

A tecnologia do Mare em desenvol-vimento no IAE/CTA é efetiva em fre-qüências acima de 2 gigahertz (GHz),não impedindo, porém, a detecção deaeronaves por radares mais antigos, queoperam, por exemplo, na faixa de 500megahertz (MHz). Contudo, sua eficá-cia consiste no fato de, atualmente, cer-ca de 90% dos radares do mundo tra-balharem em freqüências acima de 1GHz ou ainda, preferencialmente, de 8GHz a 12 GHz, na chamada banda lar-ga. "Procuramos desenvolver o materiala partir da combinação de aditivos queaumentem a absorção de radiação emlarga faixa de freqüência, como os polí-meros condutores, elevando sua quali-dade e eficiência': avalia Mirabel.

Para a pesquisadora, o desafio atualé fazer as medições utilizando protótiposrevestidos com Mare em campo aberto,emitindo, recolhendo e interpretandoos sinais dos radares. "Isso é muito im-portante porque, embora o desenvolvi-mento do Mare envolva um controlerígido, é preciso fazer medições em am-bientes naturais, controlando a umidadee a temperatura do material, pois essesparâmetros podem alterar a perrneabi-,lidade do sistema e, conseqüentemente,seu comportamento de absorção demicroondas", explica Mirabel. "Por isso,estamos iniciando um sistema de me-dição completo do material, antes depintarmos as aeronaves, porque o po-tencial dos absorvedores de radiaçãoeletromagnética só será totalmente co-nhecido se conjugado com outros fato-res, como a geometria dos aviões:'

Em 2004, está prevista a montagemde um reator para a produção do Mareem maior escala, viabilizando ensaiosde campo, caso seja aprovado um pro-jeto com recursos de R$ 2,2 milhões daFinanciadora de Estudos e Projetos (Fi-nep). Nessa etapa, será firmado tam-bém um acordo com uma empresa dosetor aeronáutico para que os materiaisproduzidos em escala piloto sejam uti-lizados pelo setor privado.

Sem segredos - Para a pesquisadora, agrande conquista do Mare não está ape-nas no domínio da técnica para tornaras aeronaves invisíveis a radares, mas nacapacitação tecnológica. "Como não tra-balhamos em segredo, mas em parceriacom universidades e agências de fi-nanciamento, formamos pesquisadoresnessa área, o que é um diferencial parao país." Além de seis bolsas de mestra-do, doutorado e pós-doutorado, o La-boratório de Caracterização Eletro-magnética do CTA foi reformado comfinanciamento da FAPESP.

Durante as pesquisas, o IAE formouparcerias com a Universidade Federalde São Carlos (UFSCar), a UniversidadeFederal de Campina Grande (UFCG), aUniversidade Federal de Goiás (UFG),a Universidade Estadual de Maringá(UEM) e a Universidade Estadual deCampinas (Unicamp), além de um con-vênio internacional com o Instituto deEngenharia de Energia de Moscou, daRússia, na área de materiais absorve-dores, inclusive com intercâmbio entrepesquisadores. •

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ITECNOLOGIA

ENERGIA im

A força da correnteza

Turbina hidráulicaleva eletricidadepara comunidadesribeirinhas isoladas

Umaturbina de pequenasdimensões, capaz detransformar a água derios que cortam comu-nidades ribeirinhas em

energia elétrica, está em funcionamen-to em um povoado isolado do municí-pio de Correntina, na Bahia. Essa mini-usina tem capacidade para gerar até 1quilowatt (kW), em tensões alternadasentre 110 e 220 volts, suficiente paraabastecer uma casa com alguns eletro-domésticos e uma bomba-d'água. Podeparecer pouco. Mas para as localidadesdistantes das linhas de transmissão eque não contam com barragens e repre-sas para a geração de eletricidade, essepouco faz a diferença, porque permiteiluminar escolas, postos médicos e pe-quenos conjuntos residenciais.

A proposta de implementar solu-ções alternativas para o uso eficiente de

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energia elétrica em regiões onde essebem é escasso ou inexistente é o objeti-vo da empresa Hidrocinética Engenha-ria, de Brasília (DF), responsável pelodesenvolvimento da turbina. Instaladano campus da Universidade de Brasília(UnB), a empresa integra o Programade Incubação de Empresas do Centro deDesenvolvimento Tecnológico (CDT-UnB). A Hidrocinética foi criada há seismeses, mas os seus sócios fundadores,os engenheiros Rudi Henri van EIs eClóvis de Oliveira Campos, pesquisamum modelo inovador de geração deenergia elétrica desde 1995, com oapoio do Departamento de Engenha-ria Mecânica da universidade. Rudi eClóvis eram pesquisadores e professo-res substitutos na UnB.

A idéia de construir um modelo deturbina movida pela força da corrente-za dos rios surgiu no início da década

de 1990, quando o médico Edgard vanden Beusch, um ex-professor da UnB,pediu ao Departamento de EngenhariaMecânica (DEM) da universidade umasolução para o fornecimento de energiaa um posto de saúde localizado numpovoado à beira do rio Corrente, nomunicípio de Correntina.

Demanda social - O pedido resultou noProjeto Turbina Hidrocinética, apoiadopor engenheiros das áreas de hidráuli-ca, mecânica e elétrica. O autor dos pri-meiros cálculos que viabilizaram oequipamento foram feitos pelo profes-sor Lúcio Salomon, do DEM.

"A origem do projeto está, na verda-de, em uma demanda social. A máqui-na é mais do que um invento, é umatecnologia social", afirma Rudi. O pri-meiro protótipo da turbina hidráulicaficou pronto em 1995. Assim que foi

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ca da Fundação de EmpreendimentosCientíficos e Tecnológicos (Finatec) daUnB e do CDT.

O grupo inicial, formado apenaspor engenheiros, foi ampliado e tor-nou-se um núcleo interdisciplinar queabriga ainda administradores e geógra-fos, cuja principal missão é aperfeiçoaro modelo original da turbina.

No momento, uma terceira ver-são da máquina está sendo construí-da, a pedido do Instituto acionalde Pesquisas da Amazônia (Inpa), em

Manaus (AM). A turbi-na, adaptada de acordocom as especificidadessociais e hidrográficas daregião, deverá ser instala-da até 2004 em uma dascomunidades ribeirinhasdo rio Amazonas. "Asmodificações na máqui-na são necessárias à me-dida que há diferentescomportamentos das cor-rentezas dos rios e perfisdiferenciados de topo-grafia das margens", en-fatiza Rudi.

Na avaliação dos só-cios da empresa, o preçode venda da turbina hi-drocinética, de R$ 10 mil,é um obstáculo para suaaquisição por comunida-des pobres. Por isso elesreconhecem que o atualdesafio do negócio não

está centrado na restrição de mercado,melhoria tecnológica do equipamentoou redução dos custos de produção.

O fundamental para Rudi e Clóvis ésensibilizar o terceiro setor (organiza-ções não-governamentais) e, sobretudo,os governos estaduais e municipais asubsidiar o acesso de populações caren-tes à turbina, porque, segundo dadosdo Instituto Brasileiro de Geografia e Es-tatística (IBGE) de 2000, cerca de 5,2%dos domicílios brasileiros não possuemenergia elétrica. Essa tecnologia já de-monstrou que tem potencial para co-laborar, inclusive, com o crescimentoeconômico e o desenvolvimento socialdessas populações. Sem contar queaproveitar a força da água em seu mo-vimento natural para gerar energia elé-trica evita intervenções no ambiente emudanças radicais no modo de vidadas comunidades ribeirinhas. •

instalado, o posto de saúde coordenadopor Beusch passou a contar com ener-gia elétrica suficiente para o funciona-mento de bombas-d'água, iluminaçãoe eletrodomésticos.

~

Uantidade de energia gera-da a partir da turbina estárelacionada com a veloci-dade das águas e a pro-fundidade do rio. Para o

equipamento funcionar, a velocidadeda correnteza precisa ter, no mínimo,1,5 metro por segundo(rn/s) e a profundidadefluvial precisa ser de pelomenos 1 metro. Com es-ses requisitos, é possívelobter 400 quilowattshora (kW/h) por mês,mas, em melhores condi-ções, os engenheiros res-saltam ser possível atingiruma produção de ener-gia elétrica da ordem de3 mil kW/h por mês, oque representa o consu-mo médio de dez casaspopulares.

Antes de instalar oequipamento em umalocalidade, os pesquisa-dores realizam estudosque envolvem dados to-pográficos, mapeamentovia satélite das áreas quetêm potencial hidráulicoe a identificação do perfildo usuário. As condições geográficasdas margens do rio indicam onde émais apropriada a montagem do su-porte da máquina. Dependendo das es-pecificações hidrográficas, o modelo daturbina pode ser adaptado. Tão impor-tante quanto a identificação da hidro-grafia e geografia locais é a pesquisa decampo feita com a população que seráatendida. A visita à comunidade permi-te diagnosticar as carências e as necessi-dades sociais da região. "A partir de umprocesso democrático de gestão parti-cipativa, a comunidade se reúne paradefinir onde deseja aplicar a carga deenergia para benefício comum, porquea turbina não consegue gerar energiasuficiente para atender a todas as casasde um povoado", explica AlexandreMaduro, integrante da equipe. Após ainstalação do equipamento, os pesqui-sadores ensinam aos moradores como

fazer a manutenção e a operação doequipamento.

O primeiro reconhecimento públi-co e oficial do invento data de 1997. Foiquando os pesquisadores do DEM daUnB receberam o Prêmio Jovem Cien-tista do Instituto de Ciência e Tecnolo-gia do governo do Distrito Federal. Em2000, após quase dez anos de trabalhoexecutado com recursos próprios, eleschegaram a uma versão de turbinamais aperfeiçoada, tanto no que dizrespeito à arquitetura e engenharia da

Turbina hidrocinética,acima, instaladae em funcionamento no rioCorrente, na Bahia

máquina como na redução de custos deprodução. O segundo protótipo tam-bém foi instalado no município deCorrentina, às margens do rio do Meio.

Núcleo interdisciplinar - Com a consa-gração do modelo da turbina hidroci-nética e a crise do setor de energia elé-trica no Brasil, mais conhecida como a"crise do apagão", em 2001, os pesqui-sadores conseguiram captar recursos eapoios, o que permitiu a evolução dosexperimentos. No ano seguinte, Rudi eClóvis receberam subsídios de entida-des financiadoras para melhorar o pro-cesso de produção da turbina e monta-ram a empresa. Entre essas entidadesestão o Fundo Nacional de Desenvol-vimento de Ciência e Tecnologia(FNDCT/CT-Energ) e a Financiadorade Estudos e Projetos (Finep). O proje-to conta ainda com a assessoria técni-

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nal, desenvolvida pelos pesquisadoresda FiberWork, capaz de medir todosesses parâmetros simultaneamente,evitando a utilização de vários equi-pamentos.

~

. portância da multiplicida-de de funções do Ospa estáno aumento de novas tec-nologias de dispositivosfotônicos que foram in-

corporadas nos últimos anos ao merca-do de telecomunicações ópticas. A listaé ampla e inclui filtros, compensadoresde dispersão de luz, multiplexadoresque reúnem em um único sinal váriastransmissões, além de roteadores e aco-pladores usados nas redes de fibras óp-ticas. As características desses elemen-tos devem ser medidas com precisão,para bem avaliar e qualificar a perfor-mance dos equipamentos nas aplica-çõespráticas.O mercado destinatário doOspa é a cadeia produtiva dos fabrican-tes desses dispositivos. Ele será apre-sentado comercialmente ao mercadointernacional na Exposição e Confe-rência de Comunicações por Fibra Op-tica (Optical Fiber Comunnication Con-ference & Exposition), que aconteceráem Los Angeles, em fevereiro de 2004.Essa é a principal feira mundial na áreade comunicações ópticas, reunindocerca de 50 mil profissionais do setor. Olançamento justifica-se porque o mer-cado norte-americano representa algo

O Centro de Empresas de Alta Tec-nologia de Campinas surgiu a partir doprojeto de pós-incubação de iniciati-va do professor Rogério Cezar de Cer-queira Leite, secretário municipal deCooperação Internacional da Prefei-tura de Campinas em 2001 e diretor-presidente da Companhia de Desen-volvimento do Pólo de Alta Tecnologiade Campinas (Ciatec). Assim como aFiberWork, outras cinco pequenas em-presas ex-incubadas - Bioluz, Opto-link, Ecco, Saat e Elemed, que atuamnos segmentos de fotônica (fibra ópti-ca, laser e elementos opto eletrônicospara os setores de telecomunicações,médico-hospitalar etc.), metrologia

78 • NOVEMBRO DE 2003 • PESQUISA FAPESP 93

FIBERPHONE

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Aparelhos para comunicação de voz viafibras ópticas: instalação de novas redes

em torno de 60% do total mundial.Para isso, a FiberWork negocia parceriacom uma empresa norte-americana,que possui forte participação comercialna área de equipamentos de teste ópti-cos e deverá cuidar do marketing doproduto no exterior.

A FiberWork nasceu na incubadoraf Núcleo de Apoio ao Desenvolvimento

de Empresas (Nade), da Companhiade Desenvolvimento do Pólo de AltaTecnologia de Campinas (Ciatec). Des-de 2002, quando atingiu a maioridadedentro da incubadora, ela está instala-da em um condomínio empresarial de

Vida após incubaçãoavançada, equipamentos de segurançae software - fazem parte do Centro deEmpresas de Alta Tecnologia. Criadoem novembro de 2001, o condomínioconta com 65 profissionais, incluindosete doutores, nove mestres e 12 enge-nheiros. Esse diferencial reflete-se naquantidade de projetos tecnológicosdesenvolvidos pelas empresas, oito emparceria com a FAPESP e dois com oapoio do Conselho Nacional de Desen-volvimento Científico e Tecnológico(CNPq). A administração é feita demaneira unificada, com despesas geraiscotizadas entre as empresas e custos va-riáveis, de acordo com a área ocupadano prédio, locado às empresas pela Cia-

1.100 metros quadrados, o Centro deEmpresas de Alta Tecnologia de Cam-pinas (veja quadro abaixo). Além dedesenvolver e produzir o Ospa e ou-tros equipamentos para o setor de co-municações ópticas, a empresa prestaserviços de planejamento, especifica-ção, instalação, treinamento e diagnós-ticos de redes de transmissão ópticas.

Para desenvolver o novo equipa-mento, a FiberWork recebeu apoio fi-nanceiro do Programa de Inovação Tec-nológica em Pequenas Empresas (PIPE),da FAPESP. De acordo com o enge-nheiro eletrônico Sérgio Barcelos, di-

tec. Além da divisão de custos, outravantagem está na troca de informações,experiências e apoio entre as partici-pantes que atuam em áreas comple-mentares e por vezes similares nocampo da fotônica, inclusive com for-necedores e clientes em comum.

Essa sinergia foi decisiva para outrainovação - a fundação da Associaçãode Empresas de Tecnologia (AET), emjulho de 2002. "Decidimos criar a asso-ciação para avançar em diversas frentes,propiciando novos negócios para asempresas", diz Paulo Ricardo StellerWagner, diretor da Bioluz e da associa-ção. A idéia é fomentar o crescimentodas empresas. "Tomamos a iniciativade,--

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caracterização de dispositivos fotônicos,tornando também essas etapas mais rá-pidas e precisas", acredita Barcelos.

retor de tecnologia da empresa e coor-denador do desenvolvimento do apa-relho, o Ospa é um equipamento decaracterização óptica com vantagens emrelação aos dois outros existentes nomundo, norte-americanos, que, apesarde desenvolvidos depois do brasileiro,chegaram antes ao mercado internacio-nal. Para Barcelos, a aceitação do equi-pamento será grande porque, além depossuir tecnologia superior, seu custo émenor que o dos concorrentes. Ele vaichegar ao mercado com preço em tor-no de US$ 100 mil, contra os US$ 200mil dos produtos das outras empresas.Apenas 5% do valor do equipamento érepresentado por insumos importados,apesar de 65% das peças virem de ou-tros países.

o PROJETO

Desenvolvimento do OpticalS-Parameter Analyzer (Osp«) Mercado externo - Embora os resulta-

dos das pesquisas desenvolvidas no paísnesse campo sejam muito bons, a pro-dução de dispositivos ópticos para co-municações é muito pequena no Brasil,porque não há demanda desses insumospara sistemas de comunicações ópticas,principalmente de telecomunicações."Não houve o investimento necessárionessa área e os setores de desenvolvi-mento de dispositivos e equipamentosfotônicos avançaram pouco. Temos tec-nologia de fibra óptica, mas o país per-deu dez anos no desenvolvimento e pro-dução desses produtos", avalia Barcelos,justificando a necessidade de atuaçãoempresarial em outros países, em fun-ção do pequeno mercado interno.

A orientação do Ospa para o mer-cado externo acontece também porqueesse equipamento é uma ferramentapara o desenvolvimento de outras tec-nologias, como o Multiplexagem porDivisão de Comprimento de OndaDensa, DWDM na sigla em inglês. ODWDM é um avançado sistema quepermite o aumento da capacidade detransmissão das fibras ópticas, tornan-do possível o tráfego de dados em taxasde terabits (acima de mil gigabits) porsegundo. "No Brasil, o desenvolvimen-to do DWDM ainda é incipiente", dizBarcelos. "Buscamos trabalhar comesse tipo de tecnologia porque ele é ocaminho para as redes totalmente ópti-cas (também denominadas redes fo-tônicas). O DWDM é um sistema uti-lizado pela maioria das operadoras detelecomunicações no mundo. Ele se de-senvolveu nos anos 1990, tendo comoprincipal precursor uma pequena em-presa norte-americana chamada Ciena,hoje avaliada em cerca de US$ 20 bi-lhões", comenta.

Barcelos acredita que não haverá re-jeição comercial ao Ospa pelo fato deele ser produzido em um país aindasem tradição nesse tipo de equipamen-to. "O mercado internacional não quersaber qual o país onde o equipamento éfabricado, o que importa é ele suprir asnecessidades. Se o produto brasileiro étecnicamente superior e mais baratoque os equipamentos concorrentes,certamente nossa competitividade au-mentará muito", diz. •

MODALIDADEPrograma de Inovação Tecnológicaem Pequenas Empresas (PIPE)

COORDENADORSÉRGIO BARCELOS - FiberWork

INVESTIMENTOR$ 33.620,00 e US$ 120.850,00

minar de estudos de viabilidade estáum sensor com fibra óptica para a in-dústria petrolífera gerenciar e contro-lar a produção de petróleo dentro dopoço, com o objetivo de melhorar aeficiência do óleo extraído e avaliarcampos petrolíferos marginais, em fasede esgotamento.

O foco da FiberWork é aproveitar oaumento rápido do uso de dispositivosfotônicos no setor de telecomunicações,quando as redes baseadas em cabos decobre passam a migrar para as redes detransmissão via laser por meio das fi-bras ópticas, que, por sua vez, necessi-tam de equipamentos de testes e de ca-racterização. Trata-se de um mercadode grande valor agregado e em rápidaascensão. "Com equipamentos como oOspa haverá uma redução drástica noscustos de desenvolvimento, produção e

Sensores avançados - A FiberWork de-senvolveu também uma família deprodutos composta de sistemas de co-municação de voz por meio de fibrasópticas, voltada para empresas respon-sáveis pela instalação de redes dessesdispositivos. Na lista de projetos aindaem fase de desenvolvimento estão umsistema de monitoramento para omercado de segurança com dispositi-vos fotônicos e outro chamado de Co-nexão Óptica Cruzada, que alia a tec-nologia de cristais líquidos a fibrasópticas, em cooperação com o Centrode Pesquisas Renato Archer (CenPRA),de Campinas. Também em fase preli-

participar de feiras internacionais comum projeto enviado para a Agência dePromoção de Exportações (Apex), doMinistério do Desenvolvimento, In-dústria e Comércio Exterior. O projetoBrazilPhotonics prevê a exportação deprodutos fotônicos brasileiros e englo-ba nove empresas da região de Campi-nas, quatro delas instaladas no con-domínio", diz Wagner. "A Apex temestrutura para participação de empre-sasbrasileiras em feiras no exterior, fi-nanciando parte dessa participação."

Para ele, a AET é uma forma demelhor articulação e representação daspequenas empresas de base tecnológicanasociedade, como, por exemplo, paraa divulgação de seus produtos em fei-ras nacionais e internacionais. A boanotícia é que essa experiência começaa se multiplicar. O Serviço Brasileiro

de Apoio às Micro e Pequenas Empre-sas (Sebrae) de São Paulo tem um pro-jeto de viabilização de condomínios depequenas empresas de base tecnológi-ca, a partir da experiência do condo-mínio e da AET.

Para Iracema Aragão, gestora daassociação, um dos principais objeti-vos da AET é dar suporte para que ou-tras pequenas empresas desenvolvamcondomínios bancados pelos própriosempresários. "Queremos divulgar nos-so know-how na formação de condo-mínios de base tecnolágica com o ob-jetivo de auxiliar pequenas empresas."Ela pretende difundir a sinergia geradapelo associativismo das empresas debase tecnológica de Campinas e am-pliar o número de associadas à AET,que não necessariamente precisam seroriundas de incubadoras.e

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ITECNOLOGIA

FÍSICA

Esterilização radicalMicrorganismossão eliminadoscom equipamentoà base de plasmaa baixa temperatura

SAMUEL ANTENOR

Fungos e bactérias quandopresentes em equipamentosmédicos e alimentos podemcausar sérios problemas decontaminação e intoxicação.

A solução, como se sabe, é esterilizar,eliminando esses minúsculos organis-mos, capazes de se multiplicar rapida-mente. Para isso, um grande arsenal jáfoi desenvolvido para combatê-los, comsubstâncias químicas, calor e até comelementos radioativos. Agora, chegou avez do plasma. Considerado o quartoestado da matéria, ele é produzido apli-cando um campo elétrico intenso sobrealguns tipos de gases. A ação desse cam-po fornece energia aos íons e elétrons,que promovem colisões com os átomose as moléculas. Essa situação deixa asmoléculas excitadas, gerando radicaislivres e radiação ultravioleta. O resulta-do é uma ação conjunta contra mem-branas, enzimas e ácidos nucléicos quecompõem as células dos microrganis-mos, destruindo suas funções vitais. Anovidade nesse tipo de esterilizador éum equipamento dotado de uma câma-ra em que o processo é realizado a secoe a baixa temperatura, desenvolvido em

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Equipamento(ao lado) e radiação

ultravioleta dentroda câmara

Campinas por pesquisadores da empre-sa Sterlily com o apoio financeiro do Pro-grama de Inovação Tecnológica em Pe-quenas Empresas (PIPE), da FAPESP.

O primeiro protótipo do aparelho,chamado de Esteriliza 1000, está ins-talado na Companhia de Desenvol-vimento do Pólo de Alta Tecnologia deCampinas (Ciatec), incubadora que abri-ga a Sterlily. Ele já foi utilizado na este-rilização de mais de 12 mil recipientesplásticos para cultivo de plantas clona-das, além de seringas descartáveis e po-tes para análise clínica.

A agilidade do processo é uma dasvantagens em relação a outros méto-dos. O tratamento térmico não eliminacompletamente alguns tipos de bac-térias, resistentes a altas temperaturas.Além disso, o aquecimento exageradoprovoca danos em materiais de baixoponto de fusão, como a maioria das pe-ças produzidas com polímeros. A ra-diação ultravioleta, muito utilizada, éeficiente apenas para superfícies direta-mente expostas à radiação. A esteriliza-ção com óxido de etileno (ETO) é a quemais se assemelha ao processo com plas-ma. Mas, como é considerada cancerí-

gena, vem sendo progressivamente re-jeitada. Esterilização por irradiação decobalto, também utilizada em materiaistermicamente sensíveis, apresenta altocusto e requer área isolada.

Processo rápido - O ciclo de esteriliza-ção com plasma, com cerca de umahora e meia para materiais plásticos, éconsiderado rápido. Com vários tiposde plasma e de tempos de exposição, decinco a 20 minutos, é possível verificara destruição do corpo da bactéria. A eli-minação total é importante porque mi-crorganismos, como a Escherichia coli,mesmo mortos, podem produzir toxi-nas. «Como padrão de validação do pro-cesso, usamos a bactéria Bacillus subti-lis variedade niger, a mais resistente aosprocessos de plasma", afirma TadashiShiosawa, que dirige a Sterlily em par-ceria com Tony Sadahito China e JoséAlonso Corrêa [únior,

O processo a plasma é adequadotambém para esterilizar materiais or-gânicos. «Atualmente, fazemos testescom cogumelos comestíveis, verifican-do as propriedades ativas do produtoapós a esterilização. No caso desses ali-

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mentos, promovemos redução da car-ga microbiana e não esterilização com-pleta, para não matar o cogumelo", ex-plica Shiosawa.

Por enquanto, a maior demanda éa esterilização de produtos plásticos.Mas vidros e produtos metálicos tam-bém podem ser esterilizados com plas-ma. Para atender a um amplo leque deaplicações, o Esteriliza 1000 foi plane-jado para adaptar-se a diferentes parâ-metros. O processo é controlado porcomputador, a partir de um softwaredesenvolvido para o equipamento e deum microprocessador, que monitora afonte de energia.

"Durante o desenvolvimento doprojeto, no Laboratório de Física dePlasmas do Instituto de Física da Uni-versidade Estadual de Campinas (Uni-camp), fizemos experiências para sabercomo seria o processo de caracterizaçãodo plasma, acertando sua potência deacordo com a fonte de energia elétrica",comenta Shiosawa. Isso porque, depen-dendo dos componentes e do ambienteno interior da câmara, tipos diferentes deplasma podem ser criados. Definidas ascaracterísticas, foram adequados os pa-

râmetros em testes feitos no Laborató-rio de Microbiologia da Faculdade deEngenharia de Alimentos da Unicamp.

O equipamento é composto por umcilindro de aço inox. No interior é cria-do um ambiente com pressão reduzidapara gerar vácuo. Dentro, gavetas Vaza-das recebem os materiais. Eles são en-volvidos em uma embalagem de poli-propileno, desenvolvida no Brasil para'esse uso, composta de Trilaminado Não-Tecido (TNT), que permite a passagemde gases, mas impede a de microrganis-mos. Em seguida, gás de peróxido de

o PROJETO

Desenvolvimento de Esterilizadora Plasma

MODALIDADEPrograma de Inovação Tecnológicaem Pequenas Empresas (PIPEl

COORDENADORTADASHI SHIOSAWA- Sterlily

INVESTIMENTOR$ 147.890,00 e US$ 18.494,75

hidrogênio (água oxigenada) é liberadono interior da câmara, onde é aplicadoum campo elétrico de alta freqüência,que gera radiação ultravioleta. Esse tipode esterilização possui aspectos especí-ficos, como a baixa temperatura, de 35°Ca 40°C, tornando-o apropriada paraaplicação em vários materiais.

Os pesquisadores não chegam aapostar que a utilização de plasma devasubstituir os demais processos, masvêem vantagens, sobretudo no caso dosalimentos, por permitir redução con-trolada da carga bacteriana. Shiosawadiz que o custo de produção do Esteri-liza 1000 varia de acordo com o uso. Masele reconhece que o preço de venda ini-cial, estimado entre R$ 400 mil e R$ 500mil, é alto para o mercado interno.

Por isso, o foco da empresa, inicial-mente criada para comercializar o equi-pamento, desviou-se para a prestação deserviços. A tecnologia empregada, à ex-ceção do sistema de vácuo, importadoda Alemanha e Inglaterra, foi desenvol-vida no país. Depois de receber o regis-tro do Ministério da Saúde, o equipa-mento estará pronto para ser inseridodefinitivamente no mercado. •

PESQUISA FAPESP 93 • NOVEMBRO DE 2003 • 81

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• HUMANIDADES

TEATRO

Eleexaltava a "Alma Encan-tadora das Ruas" com amesma força que adorava ointerior das coxias e foyersdos teatros. Reuniu, então,

os dois mundos em seus escritos e asvielas e salões chiques da belle époquecarioca viraram cenários e seus ha-bitantes' personagens. Ao morrer, em1921, de enfarte em plena rua PedroAmérico (cena digna de um melodrama,pois acabara de escreveruma crônica emque afirmava: "Aposto a minha vida -dois anos ainda, se houver muito cuida-do"), seu cortejo atraiu mais de cem milespectadores: mesmo na morte, Joãodo Rio não pôde dispensar o público.

Escritor irrequieto de preocupaçõesmúltiplas, João Paulo Emílio Cristóvão

dos Santos Coelho Barreto, o João doRio (ou ainda, Claude, Caran d'Ache,[oe, José Antonio José, alguns de seusmuitos pseudônimos), dedicou muitatinta de sua pena para discutir a deca-dência pela qual passava o teatro brasi-leiro de prosa no início do século 20."Seus textos para jornais dão uma visãofantástica do teatro da época. Neles,João do Rio discutia as peças, falava so-bre bastidores, autores, o público e, emespecial, atacava a crítica teatral dotempo, que, para ele,dificultava o avan-ço da nossa cena ao impedir a entradade idéiasnovas': diz a pesquisadora Nío-be Abreu Peixoto, cuja tese de doutora-do João do Rio e o Palco recupera o cro-nista como "repórter-de-coxia" e bomavaliador e autor de teatro.

Tese revisitaa militância teatralde João do Rio e suas\\reportagens-de-coxi e"

CARLOS HAAG

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Teatro Municipal do Rio t.eso.)e João do Rio: observadoratento e crítico da sociedade

Registro saboroso - A partir de pes-quisa feita em periódicos da época(entre os quais O País, Revista da Se-mana, A Cidade do Rio, O CorreioMercantil), Níobe traçou a evoluçãocronológica das idéias teatrais de Joãodo Rio, trazendo à luz um interessanteconjunto de opiniões sobre peças edramaturgos, nacionais e europeus.Dequebra, há um registro saboroso decomo era a vida teatral de seu tempo,comdescrição de ensaios, encenações,bastidores, entrevistas com atores, ar-tistas e empresários, numa notávelmistura de ficção e realidade.

"Mas ele sempre manteve uma vi-sãomuito prática de como deveria sero teatro, quase com olhos de um em-presáriodo ramo. Daí, por exemplo, a

sua participação na polêmica da inau-guração do Teatro Municipal do Rio:enquanto muitos defendiam que de-veria ser um espaço apenas para auto-res nacionais, ele argumentava que, emface da incipiência de nossa dramatur-gia, era preciso aprender com o que vi-nha de fora até que nossos autores sedesenvolvessem", afirma a pesquisado-ra. O exemplo destacado, aliás, dá umamostra da importância do teatro navida cotidiana carioca antes da chega-da do cinema. Para o bem ou para omal, tudo girava em torno dos palcos.Nem sempre, porém, na direção prefe-rida por João do Rio.

"Peça para agradar precisa apenasde ter muita dança intercalada, duasdúzias de trocadilhos correntes, piada

grossa de vez em quando para chamaro calor à superfície como sinapismo àindiferença. Quando se tenta agarrardois personagens para um fim decentee conduzi-lo ao terceiro ato o públiconão assiste ao esforço segunda vez",es-creveu em 1908 em A Notícia. Comen-tário preciso: o público de então gos-tava apenas do vaudeville, do teatrosem compromissos cerebrais ou, paraaparentar cultura européia, da óperatrazida pelas companhias estrangeiras.Ambos detestados por João do Rio."E ssa cidade de musicógrafos

está atrasadíssima no mo-vimento musical. Os em-presários não se arriscam atrazer novidades. Um ver-

dadeiro pavor apodera-se das empre-sas quando se fala de trabalhos novos",observou para alfinetar o gênero líri-co, visto por ele como uma "doença",uma "coqueluche estética": "O que fa-zer se toda a gente conhecida deixa aDuse às moscas e bate-se à bilheteriado Lírico para ouvir a Travtata". Culpado público, sem dúvida, mas aindamais da crítica. "A nossa crítica, to-mando gargarejos de pedantismo ofi-cial, vai a campo com uma solenidadepedante de burguês empacotado emfatos domingueiros, atira um cumpri-mento ao amigo da direita, sorri ao daesquerda, e com o desespero da erudi-ção comparativa vem fazer considera-ções estultas, deturpando o pensamen-to alheio com cortes inconvenientes eregouga repleta de convicção caracte-rística dos arcaicos."

"João do Rio acusava a crítica de re-jeitar o que era nosso, impedir a revigo-ração do meio teatral e de apadrinharartistas e companhias. Bem, ele estavacerto, mas em seus escritos, muitas ve-zes, ele também envereda pelo mesmocaminho de tomar o partido de seus fa-voritos", observa a pesquisadora. Irrita-va-se igualmente contra aqueles quepregavam uma "regeneração teatral': emface do número crescente de espetácu-los em cartaz na cidade.

"Aqui, quando a coisa não tem re-médio e está perdida todas a achamesplêndida e os meninos críticos dosjornais falam a sério das 'peças' (dra-malhões e vaudevilles) e todos, com amaior calma, asseguram: 'Movimentoanimador! O Teatro Nacional renas-

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Cenas do Rio no começodo século 20: o cronista dizia, para

ira dos cariocas, que São Pauloera a capital artística do país

cel'" Na realidade, os autores nacio-nais, desestimulados pelo desinteressegeral do público, deixavam de lado aprodução de peças de teatro. Peças sé-rias, conta-nos João do Rio, só se forem francês ou italiano, e por compa-nhias estrangeiras com Eleonora Duseou Sarah Bernhardt. "Criava-se dessaforma uma divisão perversa de traba-lho: os autores brasileiros só escreviampara companhias que visavam aogrande público e, com isso, estavamrestritos a produzir obras de nível in-ferior e desatualizadas. As peças maisintelectualizadas e contemporâneaseram privilégio das companhias euro-péias", nota o professor João RobertoFaria, orientador da tese.

Para piorar ainda mais avida da cena brasileira, ha-via a concorrência da no-vidade: o cinematógrafo."Além de roubar o público

dos teatros, a chegada do cinema obri-gou os produtores teatrais a baratearos ingressos para tentar recuperar opúblico perdido", lembra Faria. "Nessemovimento, criaram-se os chamadosteatros por sessões, em que uma peçaera apresentada em sessões corridas,uma após a outra. As peças eram pico-tadas e imperava o comercialismo, de-nunciado por João do Rio",completa.

"E os nossos autores, vendo quenão podiam levar o sacrifício a morrerde fome, foram entrando para os cine-matógrafos, a princípio como intermé-dio, depois como vozes por detrás dopano e por fim expulsando o aparelhoe representando com uma rapidez detrem expresso, borracheiras indizíveis.Pegar em peças de autores mortos ouausentes e amassá-Ias em almôndegasde uma hora e não indagar a quem osdireitos devem ser pagos é um crimepunível", atacou em um texto de 1911.Os resultados logo são visíveis.

"O público compara, o público écruel, o público vai ao estrangeiro. Osatores nacionais de valor, vendo-se nadura contingência de não poder lutarcontra a corrente, correm aos transa-

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tlânticos. Raros são os que ainda resis-tem heroicamente. As companhias es-trangeiras, que eram raras, começarama vir aos magotes, passaram a demorarmais tempo, quase todo o ano", nota oescritor. O ponto de inflexão dessa de-cadência pareceu a muitos estar naconstrução, polêmica, do novo TeatroMunicipal do Rio de Janeiro pelo pre-feito Pereira Passos.

média, fazer um matadouro modelo ouedificaralgumas dezenas de prédios paraescolas. Gastou-se muito, mas gastou-se bem. Os povos, como os indivíduos,não vivem só de utilidades práticas,querem alguma coisa que lhes encantea existência, que lhes eleve e delicie aalma", observou João do Rio em suacrônica na Ilustração. Enquanto isso, odebate se acalorava na sociedade flumi-nense sobre o que se deveria apresentarna nova e suntuosa casa de espetáculos.Mas nem sempre se podia ser sério.

Para esfriaros ânimos, o cronista,de-fendendo a variedade no palco em faceda incipiência da dramaturgia nacio-

Casa de espetáculos - "Muita gentecensurou a despesa que se faz com aconstrução desse edifício maravilhoso.Podia-se, é certo, com a soma despen-dida, levantar um lindo teatro de co-

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nal, também comentavasobre o sistema de refri-geração do teatro: "OMunicipal tem um apa-relho de distribuição dear frio que tomba do alto.O resultado: gripes con-secutivas. Ainda outrodia, diante de mim, umasenhora teve com essasmudanças um verdadei-ro acesso de gripe: batia oqueixo como se atraves-sasse o Báltico em de-zembro". Igualmente hu-morada é a sua previsãodo deslocamento do eixocultural da Capital Fede-ral para São Paulo, basea-do num comentário feitopela atriz francesa SarahBernhardt em 1893.

Então, a celebradadiva, ao se despedir dospaulistas, elogiou a cida-de como "a capital artísti-ca do Brasil", observaçãocuriosa ante ao poucodesenvolvimento culturalde São Paulo. Mas João doRio relembra o cumpri-mento da atriz para fus-tigar seus conterrâneos."Nós estamos a fingir quenos enganamos, a apa-rentar crer que o públicocarioca freqüenta e apre-cia teatro ou qualqueroutra manifestação de prazer artísticoou é um puro engano. São Paulo con-tinua a ser a capital artística do Brasil.Nós nos assemelhamos muito a essasfamílias de mediania burguesa quequerem dar baile sem poder, convidama vizinhança toda, mais os conhecidosque moram longe e ficam depois atra-palhados para dar de cear a tanta gente.Tanto teatro aberto e tanta desilusão ..."

qualidade deve ser a deamar as suas coisas. Issoacontece com os produ-tos da inteligência, comtudo. Somos um pobrepaís. E o havemos de serindefinidamente enquan-to julgarmos inferior oque é nosso."

Uma de suas últimasbatalhas foi pelos direi-tos do autor. Em 1917,após anos pregando pelanecessidade da criaçãode uma sociedade de au-tores teatrais, João doRio torna-se o primeiropresidente eleito da So-ciedade Brasileira de Au-tores Teatrais, a SBAT.Afinal, ele também eraum autor. "Mas em suaspeças não encontramoso ambiente decadente,pesado e mórbido queenvolve os personagensde seus contos. Sua dra-maturgia mais comenta-da privilegia o perfume,a polidez e a artificiali-dade dos ambientes re-finados", conta Níobe.Em peças como Eva ou ABela Madame Vargas no-tamos a grande influên-cia do escritor inglês Os-car Wilde, de quem eletraduziu Salomé.

w

t

Sarah Bernhardt: atriz deumote para escritorpuxar orelha de cariocas

com a chegada de uma nova geraçãode dramaturgos que trabalhavam so-bre temáticas mais sérias", diz RobertoFaria. Temáticas sérias e que falassemdo Brasil, como preconiza João do Rioem alguns de seus textos. "O brasileironão compreende que sua primeira

Estilo dândi - "Ele traz o universo grã-fino da belle époque para os palcos,captando como teria sido morar noBrasil querendo respirar o ar de Paris. Éuma boa crítica de costumes que dialo-ga com o boulevard francês e com Wil-de, por meio das grandes frases e tira-das espirituosas de personagens comoo Barão Belfort", diz João Roberto Fa-ria. "Ele cultivou o estilo dândi, massua obra foi bem além disso. É umapena essa confusão entre vida e obra,que adora focar no elemento marginal,homossexual. João do Rio retratoucomo poucos uma fatia da sociedade eo fez de forma crítica, embora pareçaalienada à primeira vista. Mas é tudouma caricatura em que o cronista e crí-tico pega a máscara do observadoratento", completa Níobe. •

o PROJETO

João do Rio e o PalcoGênero ligeiro - "Nessas crônicas, Joãodo Rio se aproxima das críticas feitasanteriormente por Machado de Assis,José Veríssimo e Artur de Azevedo so-bre a continuidade no teatro brasileirodo século 20 dos vícios do século 19,com sua preferência pelo gênero ligei-ro. Para eles era preciso superar o dis-tanciamento entre o teatro e a literatu-ra, algo que só iria ocorrer mais tarde

MOOALIOAOEBolsa de Doutorado

ORIENTADORJOÃo ROBERTO GOMES DE FARIA-FLCH/USP

BOLSISTANíOBE ABREU PEIXOTO - FLCH/USP

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• HlJMANIDADES

CULTURA

As raizes deSérgio Buarque

Centenário do historiadortira do limbo suadissertação de mestrado

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do paternalismo. E, em virtude disso,vicejou o caráter cordial do brasileiro -que privilegia as relações pessoais ebusca a intimidade no convívio social,conceito cunhado por Buarque erro-neamente confundido com benevolên-cia. "Em Raízes a nossa cultura é sinô-nimo de ausência e por esse motivo afrase mais célebre desta obra continuasendo: (somos ainda uns desterradosem nossa terra": lembra De Decca. Jána dissertação, o autor se fixa na me-trópole na era dos descobrimentos,mostra a estranheza de Portugal dentroda própria Europa e encontra nesse ce-nário singular diversos aspectos em-brionários da futura colônia. "Delineia-se no trabalho um complexo horizontecultural formado de múltiplas influên-cias étnicas e que traçou um caminhosingular na cenário dos descobrimen-tos': afirma De Decca, que acaba de as-sumir em Lisboa a cátedra Brasil-Por-tugal em Ciências Sociais, criada pelo

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Análise: a formação do portuguêscomo "um tipo humano que ignora fronteiras"

convênio entre a Unicamp e o InstitutoSuperior das Ciências do Trabalho ~ daEmpresa, de Portugal.

Arquivos italianos - O pesquisadoraproveitará a temporada para reconsti-tuir o campo documental da pesquisadesenvolvida por Sérgio Buarque paraa elaboração da dissertação. "Vou visi-tar o arquivo da Torre do Tombo, o ar-quivo e a biblioteca da cidade de Lisboae a Biblioteca Nacional. Mas não pre-tendo encontrar grande novidade alémdaquilo que já é conhecido pelos histo-riadores portugueses e brasileiros, in-clusive porque muitos documentosdesta tese não se encontram em Lisboa,mas provavelmente em arquivos italia-nos. Devem ter sido descobertos porSérgio Buarque no período em que eleviveu na Itália."

A dissertação de Sérgio Buarque eseu livro que nasceu clássico comun-gam de um mesmo ponto de partida: a

formação do português como "um tipohumano que ignora fronteiras" e mol-da a exploração do Novo Mundo a umaética peculiar, uma ética de aventura,na qual sebusca a riqueza com audácia,às vezes com imprevidência, não com otrabalho da ética calvinista. Há premis-sas que se repetem nas duas obras, co-mo a estratégia lusitana de explorar o

Os primórdiosda aventuracolonizadora

"Na aurora dos tempos moder-nos, os estabelecimentos coloniaisdos portugueses compõem-se apenasde praças isoladas, situadas quase in-variavelmente junto à fralda do mar,embora de longe possam lembrarum imenso império e, como tal, se

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litoral da colônia e deixar vazio o inte-rior - que reproduz a ocupação dopróprio território lusitano - em con-traposição à ação do colonizadores es-panhóis, que se fixaram nos altiplanos.Ou a parte que compara a importânciada mão escrava no Brasil do século 19e na Lisboa quinhentista.

Podem ser vistas como obrascomplementares, mas umoceano as separa. Raízes ex-plica o Brasil, enquanto adissertação mergulha em

Portugal e se debruça sobre os primór-dios da aventura colonizadora. Mostraas influências essenciais de mouros ejudeus, ambas reprimidas pelo podermonárquico e católico da época, naconstrução de um tipo nacional diver-so dos europeus, com hábitos frouxos,mas extraordinária vocação mercantil,que concebe a ascensão social no ultra-mar e, por isso, ou está de partida ou jápartiu e está com saudades de casa.Buarque, é verdade, nunca perde o Bra-sil de vista.

Lembra que a origem do sambapode não ser africana, mas islâmica (adança mourisca chamada zembra)."Em maior número, atravessaram ooceano, trazidas pelos primeiros colo-nos, e, implantando-se entre nós, dei-xaram aqui reminiscências que aindaperduram, como é o caso da zambra,que alcançou a América espanhola e oBrasil, tornando-se talvez o remoto an-tepassado de nosso atual samba. Este,conquanto não falte ainda hoje quemse esforce por discernir-lhe a origem -origem de nome, quanto menos -, ounaquele radical bantu, há muitas pro-babilidades de que, no nome, tantoquanto em algumas características co-reográficas, tais como se manifestam

façam administrar. (...). Bem significa-tivas são as palavras por onde Alvia-no, um dos interlocutores dos Diálo-gosdas Grandezas do Brasil, lamentavaque aqui a gente portuguesa fizesse tãocurta a conquista, podendo-a fazermais larga, e admitia que merecessemseuscompatriotas o nome de ruins co-lonizadores, pois 'em tanto tempo ha-bitam neste Brasil não se alargarampara o sertão para haverem de povoarnêledez léguas, contentando-se de, nas

em meios rurais pau listas ou em diver-sos lugares da América Espanhola, pro-venha, não de Angola ou do Congo,mas antes da chamada África branca",escreveu Buarque.

O recato extremodas esposas que nãoapareciam na frente devisitas, exceto na pre-sença dos maridos, tan-to na metrópole comona colônia, está vincu-lado, lembra Buarque,à condição da mulhermuçulmana. "( ... ) mor-mente no período colo-nial, elas não compare-ciam, em suas própriascasas, diante de visitan-tes, nem comiam senãocom os maridos, e aindaassim quando não hou-vesse hóspedes (salvopai ou irmão)", registrao historiador em suadissertação.

Sérgio Buarque deHolanda ainda cita a Revolta de Canu-dos para esmiuçar a tese de que o fervorreligioso dos judeus, forçados a se con-verter pela Inquisição, está na base domovimento messiânico do sebastianis-mo - a volta redentora do jovem rei D.Sebastião, morto sem deixar sucessorna célebre batalha de Alcácer-Quibirem 1578. O mito seria invocado pelobeato Antônio Conselheiro no interiorda Bahia do final do século 19..

A dissertação não tem o tom ensaís-tico e interpretativo de Raízes do Brasil.Sérgio Buarque de Holanda escreveu-anão porque planejou, mas em razão deuma necessidade acadêmica. Precisavado título de mestrado para concorrer àcátedra de História da Civilização Bra-

fraldas do mar, se ocuparem somenteem fazer açúcares' (...) Em carta ende-reçada de Gôa, em novembro de 1585,a seu conterrâneo Bernardo Davan-zati, ponderava o florentino FilippoSassetti sobre esses colonizadores. Osquais escrevia, não merecessem me-lhor nome do que o de bate praias,dado por um 'negro' natural daquelaspartes, já que não se internavam umpalmo terra a dentro." (Trecho da dis-sertação)

sileira na Universidade de São Paulo(USP) - que abandonaria em 1969,aposentando-se voluntariamente emsolidariedade aos colegas perseguidos

pelo Ato Institucionalnúmero 5, o AI-S. Paraconquistar a cadeira, de-fenderia, dois meses de-pois, sua tese de douto-rado, em que analisa a"busca do éden" no ima-ginário dos descobrido-res. Defendeu-a diantede uma multidão reuni-da no Salão Nobre da Fa-culdade de Filosofia, ain-da no prédio da RuaMaria Antônia.

Passos de gafieira -Aprovado com distin-ção pela banca, conta alenda que o historiadorcomemorou ensaiandopassos de gafieira comos alunos. Pois essa obrade conteúdo original se-

ria convertida em 1959 no livro Visãodo Paraíso. Na comparação dos traba-lhos defendidos quase simultanea-mente, Buarque optou por lançar o dedoutorado e guardar o de mestradona gaveta. "Ele considerava o trabalhocomo algo escolar, por isso não quispublicá-lo", diz o professor de TeoriaLiterária Antonio Candido, amigo ecolaborador de Sérgio Buarque deHolanda, que jamais leu a dissertação."Não é um trabalho renegado nem es-quecido, ele sempre esteve disponívelna Unicamp", diz a cantora Ana deHolanda, de 55 anos, filha de SérgioBuarque (o historiador teve sete fi-lhos, vários deles com talento para amúsica, como se sabe).

Para Edgar de Decca, a tese preen-che uma lacuna na obra Sérgio Buar-que. Além da linha de continuidadecom Raízes do Brasil, o historiador daUnicamp identifica elementos que aju-dam a entender Visão do Paraíso. "Adissertação de mestrado nos oferecebases históricas para entender a ence-nação do imaginário da conquista ibé-rica que compõe Visão do Paraíso, obrasem dúvida mais complexa e bem aca-bada que se alinha à tradição históricoliterária de estudo das visões épicas emíticas que comandaram as conquistasibéricas", diz De Decca. •

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• HUMANIDADES

HISTÓRIA

Chica da Silvase

Livro mostra que mito daescrava-rainha esconde hipocrisiada democracia racial brasileira

squeça tudo o que você acha que sabe sobreXica da Silva. Começando, aliás, pelo nomedela: Chica, em verdade, Francisca da Silva,mulata, filha de negra e português, nascidaentre 1731 e 1735 (data incerta) na região de

•••• IIIIIIIIIIII. mineração de diamantes do arraial do Tejuco,comprada e alforriada pelo contratador de diamantes JoãoFernandes de Oliveira, com quem viveu 16 anos e teve 13filhos.A negra sensual que arrancava uivos do senhor por-tuguês e horrorizava a sociedade é mito inventado no sécu-lo 19 e reapropriado, de formas diversas por épocas diver-sas, cada uma interessada na sua visão.

Conhecer a Chica com "ch" é descobrir que a pretensa"democracia racial" do Brasil é um mito tão sem funda-mento como o da própria escrava que foi rainha. "Chicafreqüentava a elite branca da cidade e todas as irmandadesbrancas do Tejuco e, ao morrer, foi enterrada no cemitérioda Igreja de São Francisco de Assis,privilégio dos brancosendinheirados. Isso tudo prova que ela era uma mulher quese portava de acordo com os padrões sociais e morais daépoca", argumenta a pesquisadora [únia Ferreira Furtado,da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), autorado recém-lançado Chica da Silva e o Contratador dos Dia-mantes (Companhia das Letras, 400 pags., R$ 48,50), umestudo histórico sobre as relações de gênero e raça nas Mi-nas Gerais do século 18 que se lê com prazer de romance.

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para o governo de Lisboa e garantiriapara a corte a parte do leão. Um dos con-tratadores foi o sargento-mor João Fer-nandes de Oliveira, pai do futuro ma-rido homônimo de Chica da Silva. Oarraial que o contratador-pai encontrouera habitado predominantemente pormulheres negras. Daí a prodigalidadedas relações entre brancos e elas: Chica,por exemplo, era escrava de Manuel Pi-res Sardinha, que a tomou por amantequando ela ainda era adolescente. Não

Em contraponto com a mítica, [ú-nia mostra que Chica não foi caso suigeneris, embora especial, em que umamulher negra forra, em busca de ascen-são social, se unia a um homem brancopoderoso. E que, na contramão das his-tórias, Chica queria mesmo a inserçãona elite da época, sem nenhum caráterlibertário. A ex-escrava acabou proprie-tária de escravos e adotou os valores daelite para poder pertencer de algumaforma a ela. "Elas procuravam imitarhábitos e costumes da elite, de modoque reproduziam em escala menor omundo daqueles que a haviam subme-tido à escravidão", diz Júnia.

alforria, em vez de ponto departida para a constituiçãoafirmativa de uma iden-tidade negra, era o

início de um pro-cesso de aceitação de valores dessaelite, de forma a inserir-se, assimcomo a seus descendentes, nessasociedade", observa a autora.

E, nada mais comum, dadasas circunstâncias do isolamentonatural da região ("Uma colôniadentro de outra colônia': como de-finiu Charles Boxer em seu The Gol-den Age af Brazilí que deixavam in-teressante a união entre brancos enegras. "O seu caso não é único, mas éum exemplo forte da estratégia de seapagar a origem escrava, ou seja, se po-dia casar com uma negra, desde que elafosse 'branqueada", diz [únia. "Chicafoi usada como o modelo de democra-cia racial (de como os brancos se uniama negras), quando, na verdade, ela re-força a hipocrisia desse conceito e mos-tra como se davam - e ainda se dão - asrelações raciais no Brasil: ter relaçõescom negras não é mau, desde que nãooficial. Depois basta 'limpar' a família.Esse é o pensamento subjacente,"

Também subjacente à união entreChica e o contratador é a própria histó-ria do arraial do Tejuco. Os diamantesforam descobertos lá em 1729, emboraantes disso já houvesse explorações in-cipientes. Sempre que riquezas eram en-contradas na colônia, a metrópole semovimentava para garantir a sua partena exploração e nos impostos. A Coroacriou um modelo exemplar, baseado emcontratos arrematados de quatro emquatro anos por um interessado ou umasociedade que organizaria a exploração

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contente em ter uma Chica, Manuel ti-nha duas Chicas como amantes.

O exagero levou-o a receber repri-menda "paternal" do reverendo-vigárioe, ao reincidir no vício, foi multadopela Igreja. Assim, quando o contrata-dor-filho chegou ao arraial, vindo parasubstituir o pai que decidira ficar emPortugal, Sardinha vendeu, por 800réis, uma das Chicas para o jovem re-cém-chegado. João Fernandes tiveraeducação esmerada, doutor em Coim-

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para elas e para seus descendentes", ex- no Tejuco bens consideráveis", diz aplica [únia. pesquisadora.

Em poucos anos, já livre e com o Ambos ficaram esquecidos até o sé-sobrenome Silva (nome comum para culo 19, quando o advogado de Dia-ex-escravos), Chica viu-se proprietária mantina, Joaquim Felício dos Santos,de casa e de escravos. "Era um meca- ao ser procurador na partilha de bensnismo essencial para sua inserção no de uma parente de Chica, descobriu osmundo dos livres, onde reinava o des- atos do processo de posse dos bens deprezo pelo trabalho, pelo viver das pró- João Fernandes. Fascinado com a histó-prias mãos", analisa a autora. "E não se ria, incluiu, a seu modo, cheio de pre-sustenta a figura de redentora dos es- conceitos e de mitos, a vida de Chica

cravos, como muitas vezes roman- em seu livro Memórias do Distrito Dia-tizou a historiografia. Apenas mantino, de 1868. "Não possuía graças,foi encontrada uma única re- não possuía beleza, não possuía espí-ferência clara de que tenha ~_r_it_o, não tivera educação, enfim, nãoconcedido alforria a uma s- possuía atrativo algum que pudessecrava", conta. Cliica entrou justificar uma forte l2aixão'~ escreveu oem contato com a cultura advogado.européia por meio do con-tratador e deu aos filhos a

elhor educaçãopossível no rin-

cão do Tejuco.Em 1770,

morreu opai de João

Fernandes e uma pen-denga testamentária obrigou-oa voltar a Portugal para lutar porseus interesses, indissociáveisdos negócios paternos dada aparceria entre os dois. Chica fi-cou com os filhos em Minas. Cu-riosamente, a partida do contra-tador provocaria, em dois anos, ocolapso do antigo sistema de con-tratações, pois, na vacância dosgrandes profissionais do ramo, acorte preferiu colocar em vigor omonopólio régio e criava a RealExtração dos Diamantes. A cortequeria ela mesma, por meio deseu funcionários, cuidar da ex-ploração das riquezas.

Dona Francisca da Silva deOliveira morreu em fevereiro de1796. João Fernandes já haviamorrido em 1779. Chica foi en-terrada na tumba número 16 naIgreja de São Francisco de As-sis. No testamento do contra-tador não constava o seunome. "Isso não foi sinal deesquecimento ou ingratidão:ao omitir a existência de Chi-

ca em seus legados, ele buscoudignificar os filhos perante a socieda-

de elitista do reino. João Fernandes es-tava, mesmo a distância, cuidando in-diretamente de Chica, a quem deixara

bra e a alforriou logo após tê-Ia com-prado, fato raro entre os proprietáriosmineiros. Seja como for, mulheres ti-nham maiores chances de ganhar alfor-ria do que homens.

"O sexo foi determinante nas con-dições mais ou menos facilitadas deacesso à alforria e o concubinato comhomens brancos oferecia por um ladoalgumas vantagens às mulheres ne-gras, pois, uma vez livres, viam dimi-nuir o estigma da cor e da escravidão,

Poesia e cinema O mito ganhou mui-tas versões e até mereceu versos de Ce-cília eireles em eu Romanceiro daInconfidência: "Contemplai, branqui-nhas/ na sua varanda,! a Chica da Sil-va,! a Chica-que-rnanda" O CinemaNovo viu na negra que dominava bran-cos com seu sexo uma musa libertária.Em 1976, com roteiro de João Felíciodos Santos (sobrinho-neto de JoaquimFelício), Cacá Diegues inventou Xica daSilva. "No filme, a redenção é alcançadapor meio de Xica : ao colocar a sexuali-dade a seu favor, ela inverte o mecanis-mo por meio do qual os homens bran-cos garantiram a dominação sobre suaraça, ao utilizar as mulheres de cor parasatisfazer seu apetite sexual", observaIúnia Furtado.

"Chica, como as outras forras daépoca, alcançou sua alforria, amou,teve filhos, educou-os, buscou ascendersocialmente para diminuir a marca quea condição de parda e forra impunhapara ela mesma e para os seus descen-dentes", continua. "Pois, sob o mantode uma pretensa democracia racial, sutile veladamente, a sociedade mestiça pro-curava se branquear e escondia a friaexclusão social e racial, simbolizando oque se passava no Brasil." Exclusão quetirou de boa parte dos negros e porbom tempo a sua auto-estima. "Daí afalta de um movimento unificado comonos Estados Unidos. Aqui o racismo erae é escamoteado e os negros compramo discurso das elites do 'para que lutarse posso me integrar'. Até Machado deAssis agiu dessa forma após ascender àelite intelectual." Esse é o X da questão,o X que distorce Chica. •

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A Filosofia como Vontade e RepresentaçãoTexto de Schopenhauer apresenta sua visão da história da filosofia

EDUARDO BRANDÃO Os instrumentos paraessa dupla incisão vêm dopensamento de Schope-nhauer: Vontade, represen-tação, coisa em si, fenô-meno, corpo, idealismo,dogmatismo são noçõesque comandam sua inter-pretação (injusta?) das di-versas filosofias - o quetanto denuncia os referen-ciais teóricos do autor, quevão dos gregos aos moder-

nos, passando pelos neoplatônicos e escolásticos(influências nem sempre devidamente reconhe-cidas - por exemplo, Aristóteles e Plotino), quan-to constitui, acima de tudo, um testemunho desua própria filosofia. E por ser um texto de matu-ridade há nos Fragmentos indicações preciosassobre as transformações que encontramos emsua obra desde a publicação de Sobre a Vontadena Natureza (1836). Assim, não é por acaso que afilosofia dos modernos e suas tentativas de deci-fração do enigma do mundo são vistas a partirdas noções de substância e matéria, centrais paraa meta física da Vontade na segunda edição deO Mundo como Vontade e Representação (1844).Nesse movimento, Schopenhauer, já conhecedorda primeira edição da Crítica da Razão Pura, re-visita a filosofia de Kant, ao mesmo tempo quecritica os "sofistas" Fichte, Schelling e Hegel: osFragmentos constituem um texto-chave para acompreensão do desenvolvimento das relaçõesentre a metafísica da Vontade, o criticismo kan-tiano e o chamado "idealismo alemão':

Pela sua importância no interior da obra deSchopenhauer, traduzir os Fragmentos é uma es-colha precisa de uma profunda conhecedora dofilósofo. Maria Lúcia Cacciola oferece ao leitor,além de um belo ensaio introdutório, uma exce-lente tradução enriquecida com notas, contri-buindo novamente para tornar ainda mais vivo odebate necessário sobre esse pensador muitas ve-zes injustamente encoberto.

Fragmentos para aHistória da FilosofiaArthur Schopenhauer

Tradução, apresentaçãoe notas:Maria Lúcia Cacciola

Editora I1uminuras

128 páginasR$ 33,00

EDUARDOBRANDÃOé doutor em Filosofia pela Uni-versidade de São Paulo e professor de Filosofia daFundação Escola de Sociologia e Política.

«:do filósofoé, para o alemãoArthur Schope-

nhauer, explicitar a de-cifração do enigma domundo. E isto é atingi-do na medida em que sedescobre que o mundoé Vontade e representa-ção: a filosofia deve ser,então, a compreensãodesse mistério. A história da filosofia apenas des-creve o quanto cada filósofo se aproximou da-quela descoberta sobre o mundo.

Essa relação permeia os Fragmentos para aHistória da Filosofia, de Schopenhauer, publica-dos em 1851. Já que a história da filosofia não épara o autor um processo ordenado e que elatem altos (Platão e Kant, por exemplo) e baixos(Hegel, entre outros), percebe-se porque ela éfragmentária: trata-se antes de interpretar al-guns filósofos e parte de suas idéias naquilo quese relaciona à missão da filosofia. Os fragmen-tos, então, não são aleatórios, mas resultam deum corte, digamos, cirúrgico, escolha de alguémque sabe correr o risco de se tornar um legista -fazer mera história da filosofia não é fazer filo-sofia, mas antes uma autópsia, em que se substi-tui o texto vivo dos filósofos pela letra morta docomentário: "Ler, em vez das próprias obras dosfilósofos, variadas exposições das suas doutrinasou a história da filosofia em geral é o mesmoque querermos que alguém mastigue a comidapara nós. Quem leria a história mundial se tives-se a liberdade de observar com os própriosolhos os eventos passados que lhe interessam?Mas, no que diz respeito à história da filosofia,uma tal autópsia do seu objeto nos é verdadeira-mente acessível, a saber, nos próprios escritosdos filósofos - nos quais, todavia, por amor àbrevidade, podemos ainda limitar-nos a bem es-colhidos capítulos principais" (Fragmentos, §l).Vale observar que à atitude de um historia-dor-legista se sobrepõe a do filósofo, digamos,fisiólogo: trata-se de perceber não só do quemorrem, mas principalmente do que vivem asfilosofias.

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Discursos Desconcertados:Linchamentos, Puniçõese Direitos HumanosHelena SingerHumanitas/FAPESP388 páginas I R$ 25,00

Baseado em artigos publicadosna imprensa nacional, durante

o período entre 1980 e 1996, este estudo pretenderessaltar as analogias e descontinuidades entreo discurso dos agentes do direito (delegados,juízes, procuradores, advogados) e dos analistascom acesso aos meios de comunicação(jornalistas, sociólogos, entre outros profissionais).Humanitas FFLCH/USP: u n 3091-2920www.fflch.usp.br/humanitas

Animais Peçonhentosno Brasil: Biologia, Clínicae Terapêutica dos AcidentesVidaI Haddad Jr., João Luiz CostaCardoso, Fan Hui Wen, entre outrosEditora Sarvier/FAPESP468 páginas I R$ 98,00

Partindo da imensa diversidadede serpentes, aranhas, insetos

e peixes do Brasil, um grupo de pesquisadoresse reuniu para estudar como se pode lidar comas perigosas toxinas liberadas por essas espécies.Segundo os autores, é notório o desconhecimentodos profissionais de saúde sobre esses parâmetros,essenciais para o manejo de acidentados.Sarvier Editora de Livros Médicos Ltda.: (11) 5571-3439e-mail:[email protected]

Violência, Saúdee Trabalho: Uma Jornadade HumilhaçõesMargarida BarretoEDUC/FAPESP233 páginas I R$ 29,00

A médica do trabalhoMargarida Barreto decidiumostrar o que havia de concreto

por trás de um assunto polêmico: a violênciamoral no trabalho. Em 97 grandes empresas,ela descobriu que, dos trabalhadores consultados,42% apresentaram histórias de humilhação.

The Cerrados of Brazil:Ecology and Natural Historyof a Neotropical SavannaPaulo S. Oliveira e Robert MarquisColumbia University Press398 páginas I US$ 37,50

Fruto de cinco anos de estudo ereunindo um grupo seleto de 35especialistas de diversos ramos,

esta obra é referência essencial para a comunidadecientífica internacional ao dissecar, em todos osseus aspectos, o ecossistema tipicamente brasileiro:o cerrado, de sua origem a sua fauna e flora. Olivro também trata de como evitar sua destruição.Columbia University Presswww.columbia.edu/cu/cup

Existências Fascinadas:História de Vidae IndividuaçãoMaria Paula Bueno PerroneAnnablume/FAPESP180 páginas I R$ 28,00

A psicóloga pretendeu mostrartoda a riqueza teórica quese esconde por trás da vida

e do discurso dos narradores. Daí, a históriade um indivíduo é transformada em expressãode subjetividade que, ao mesmo tempo,é a história de todos os homens, emtodos os tempos.Annablume Editora Comunicação: n n 3031-9727www.annablume.com.br

Macrófitas, Aquáfitase Perifíton: AspectosEcológicos e MetodológicosMarcelo Luiz Martins Pompêo e VivianeMoschini-CarlosRiMalFAPESP124 páginas I R$ 18,00

O livro traz um histórico sobreos estudos de ecologia aquática

no Brasil, em especial sobre os tópicos dasdeterminações de biomassa e a decomposiçãode macrófitas. Entre os capítulos: Ecologiade Ecossistemas Aquáticos Continentais eas Macrófitas Aquáticas no Brasil; Biomassadas Macrófitas Aquáticas: o Método do Quadro; etc.Rima Editora: (16) 272-5269www.rimaeditora.com.br

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Editora Educ: (11) 3873-3359

e-mail: [email protected]

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CLASSIFICADOS PeiqeTeCniiisaFAPESP

VAGA PARA DOCENTE

Estarão abertas, no período de 17/9 a 15/12/2003, asinscrições ao processo seletivo de provas para a con-tratação de um docente, na categoria de ProfessorDoutor, Referência MS-3, em Regime de DedicaçãoIntegral à Docência e à Pesquisa (RDIDP), na área dePlanejamento e Modelagem de Recursos Hídricos,junto ao Departamento de Hidráulica e Saneamentoda Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) - Uni-versidade de São Paulo (USP).

Maiores informaçõespodem ser obtidas na Assistência Técnicapara Assuntos Acadêmicos da EESC·US~pelo telefone (Oxxl6) 273-9154.

o Edital do processo seletivo podeser acessado pelo link:http://www.shs.eesc.usp.br

VAGAS PARA DOCENTES

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO(USP)

ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS(EESC)

Estão abertas, de 16/9 a 14/11/2003 (D. O. Executivo,Seção I, 12/9/2003, Vol. 113,N° 173), as inscrições aoprocesso seletivo para a contratação de três docentesna categoria de Professor Doutor, Referência MS-3,em Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pes-quisa (RDIDP), no Departamento de Engenharia deMateriais, Aeronáutica e Automobilística conformeos editais a seguir:

Edital: EESC/USP-27/2003

Área de Conhecimento:Materiais Compostos

Edital: EESC/USP-28/2003.Área de Conhecimento:Manutenção e Homologação de Aeronaves

Edital: EESC/USP-29/2003

Área de Conhecimento:Projeto de Aeronaves

Maiores informações, bem como as normas perti-nentes ao processo seletivo, encontram-se à disposi-ção dos interessados na Assistência Técnica para As-suntos Acadêmicos da Escola de Engenharia de SãoCarlos da Universidade de São Paulo, sito à Av.Tra-balhador Sancarlense, 400, São Carlos-SP, ou pelo te-lefone (OxxI6) 273-9154.

Os editais também poderão ser acessados no sítio doD. O. E. de São Paulo www.imprensaoficial.com.br

MUSEU DE ZOOLOGIA DA USP

VAGA PARA DOCENTE

Estão abertas pelo prazo de 90 dias,a contar de 07/10/2003 a 4/01/2004, as inscriçõesao Processo Seletivo de Provas para Contrataçãode 01 Docente na categoria de Professor Doutor,

referência MS-3, junto àDivisão de Difusão Cultural do MZUSP.

Mais informaçõeswww.mz.usp.br

[email protected]

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UNICAMP

Vagas para professor titular

• I - Área - Materiais e Processos de FabricaçãoFaculdade de Engenharia MecânicaDepartamento de Engenharia de MateriaisInscrições - Até 1/12/2003, publicação D.O.E.,30/8/2003,pág.77Disciplinas - Estrutura e Propriedades dosMateriais, Solidificação dos Metais,Transformação de Fase dos Materiais

• 11- Área - Energia, Térmica e Fluidos e PetróleoFaculdade de Engenharia MecânicaDepartamento de Engenharia Térmica e FluidosInscrições - Até 05/11/2003, publicação D.o.E.,07/8/2003, pág. 96Disciplinas - Métodos dos Elementos FinitosAplicados em Fenômenos de Transporte, MétodosComputacionais de Mecânica dos Fluidos

Mais informações - Margarida Seixas MaiaSupervisora da Seção de [email protected] - (19) 3788-3209

• 111- Área - Periodontia - Faculdade deOdontologia de Piracicaba - Departamento dePrótese e PeriodontiaInscrições -'Até 25/11/2003, publicação D.O.E.,27/8/2003, pág. 53Disciplinas - Clínica Odontológica Integrada I,Clínica Odontológica Integrada 11, ClínicaOdontológica Integrada I1I, Clínica OdontológicaIntegrada IV, Pré-Clínica I1I, Pré-Clínica VI

Mais informações - Patrícia Aparecida Tomaz -ATU - [email protected] - (19) 3412-5205

• IV - Área - Mudanças Sociais: Questões emAmbiente e Tecnologia - Instituto de Filosofia eCiências Humanas - Departamento de SociologiaInscrições - Até 12/11/2003, publicação D.o.E.,14/8/2003, pág. 67Disciplinas - Sociologia Ambiental

Mais informações - Maria de Fátima RodriguesMoreira - [email protected] - (19) 3788-1581

G E o

IIF r S I c A

IAG USP

Pós-Graduação em Geofísica

Estão abertas as inscrições para os cursosde Mestrado e Doutorado em Geofísica

no IAG, com os seguintes prazos:

Mestrado: até 10/12/2003 (início março/04)Doutorado: a qualquer tempo.

Mais informações:

Tel.: (Oxxll) 3091-4755/4760hUp://www.iag.usp.br

UNICAMP

Vaga para professor titular

ÁreaAs Inter-Relações do Lazer na Sociedade,Faculdade de Educação FísicaDepartamento de Estudos do Lazer

InscriçõesAté 15/12/2003, publicação D.O.E.,12/9/2003, pág. 54

DisciplinasTópicos Especiais em Recreação e Lazer I

Mais informaçõesLaisez Iael Cabral Puya - [email protected](19) 3788-6603

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Estudos mostram quearanhas são capazesde aprendere aperfeiçoarinstintos básicos

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